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História da arte IIdo renascimento ao neoclacissismoProfa. Dra. Leda Maria de Barros GuimarãesProfa. Dr. Luís Edegar de Oliveira Costa

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  • Histria da arte IIdo renascimento ao neoclacissismo

    Profa. Dra. Leda Maria de Barros GuimaresProfa. Dr. Lus Edegar de Oliveira Costa

  • APRESENTAO

    Caro aluno(a),Voc j iniciou seu estudo de Histria das Artes Visuais que comeou apre-

    sentando o contexto de perodos pr-histricos Idade Mdia. J chamamos ateno anteriormente que essa histria refere-se ao mundo ocidental, e uma viso oficial do que se costumou considerar como uma linha seqencial de su-cesso de perodos e estilos que por meio da instalao de tradies bem como de sucessivas rupturas, vem se constituindo no programa de estudos dos cursos de Artes Visuais. Assim, depois de ter estudado a efervescncia da Idade Mdia (antigamente considerada como idade das trevas), ter visto a economia da arte da poca crist primitiva, da elegncia da arte bizantina, da fora da arte rom-nica e da elegncia da arte gtica e ter acompanhado as diversas manifestaes scio-culturais de cada perodo, voc chega agora a um dos mais conhecidos perodos dessa histria: do Renascimento ao Neoclassicismo.

    De fato as formas artsticas visuais que se desenvolvem nesse perodo so importantes para pensarmos como determinadas formas se constituem em padres e referncias quase universais de boa arte. Como a arte desenvol-vida nesse perodo a grande bssola que norteia nossos currculos, etc. O contedo dessa disciplina pode ser confrontado com o contedo de Histria das Artes Visuais no Brasil. Verifique que estilo monopolizador foi imple-mentado pela Academia Imperial de Belas Artes? Qual a origem do termo academia? Faa transversalizaes tambm com o contedo de Arte Bra-sileira (matrizes) e veja novamente como a transio da produo artstica do Brasil Colonial para o Brasil Imprio at a primeira Repblica. Compare visualmente as imagens, estilos, pintores e tire suas concluses!

    Bom estudo.

    DADOS DA DISCIPLINA

    EMENTAArte do Renascimento ao Neoclassicismo: Arte Europia dos sculos XV

    ao XVIII: Renascimento, Maneirismo, Barrocos, Rococ e Neoclassicismo.OBJETIVOS

    Compreender aspectos do perodo da arte ocidental entre os sculos XV e XVIII (contextos, obras e artistas);

    Entender a construo de uma matriz ocidental de representao realista

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    no imaginrio da Boa Arte; Discutir e questionar as relaes de poder entre os diferentes perodos; Problematizar a construo dessa matriz ocidental como nica referncia

    na formao docente em artes visuais.UNIDADE 1: UM NOVO IDERIO NAS ARTES PLSTICAS1.1. RENASCENA SETENTRIONAL1.2. RENASCENA NOS PASES BAIXOSUNIDADE 2: MANEIRISMO REBELDIA E ELEGNCIA2.1. RESSIGNIFICAO DO TERMOUNIDADE 3: BARROCO A PAIXO, O DRAMA, A TEATRALIDADE3.1. BARROCO CATLICO: O APELO S EMOES3.2. BARROCO PROTESTANTE3.3. ROCOC3.4. PORTUGALUNIDADE 4: O NEOCLASSICISMO4.1. O CLASSICISMO DE DAVID4.2. MULHERES ARTISTAS DO NEOCLSSICO4.3. HOMENS ARTISTAS NO NEOCLASSICISMO 4.4. CONEXES COM O CONTEXTO DAS ARTES NO BRASIL

  • Renascena, ou Renascimento, o termo utilizado para designar um mo-vimento intelectual e artstico que surgiu na Itlia no sculo XIV, mesmo lu-gar em que atingiu seu apogeu, no sculo XVI, e de onde se difundiu para o restante da Europa.

    O Renascimento se contrapunha a concepo medieval do mundo e apresentava uma nova viso do homem e da natureza, uma viso em bases empricas e cientficas. Para isso, dava valor renovado ao pensamento e arte da Antigidade Clssica, com o que defendia a formao de uma cultura hu-manista. Vejamos o exemplo (Figura 1) de uma artista que viveu nessa poca, Christine de Pizan:

    O reflorescimento da cultura clssica identificado ao emprego da metfo-ra Renascimento est datado e nos leva ao sculo XV, quando foi proposta uma restaurao e renovao das artes a partir dessa cultura. Esse o tema de Giorgio Vasari (1511-1574), j no sculo XVI, em As vidas dos mais ex-celentes arquitetos, pintores e escultores, publicadas em Florena em 1550 e com acrscimos e reformulaes em 1568, numa segunda edio, em que

    UNIDADE 1 UM NOVO IDERIO

    NAS ARTES PLSTICAS.

    Figura 01 - Christine de Pizan. Cidade das Damas, 1410-1411.

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    desenvolve de forma sistemtica esse reflorescimento. Durante muito tempo, o livro de Vasari foi fonte de informao dominante sobre a arte renascentista italiana, disseminando uma compreenso da histria da arte como progresso, como uma evoluo que levava desde Giotto at Michelangelo, modelo de excelncia em arte para Vasari. Essa viso predominou at pouco tempo na histria da arte. Para Vasari, a renovao das artes que ocorreu na Itlia no pe-rodo compreendido pela obras de Giotto e Michelangelo tinha como ponto de partida a recusa do antinaturalismo da arte bizantina, recusa que se pauta-va pela concomitante redescoberta da escultura clssica, que teria na obra de Nicola Pisano (1215/20-1278/84) um momento precursor.

    Mas a compreenso predominante ainda hoje sobre a noo de Renasci-mento como um movimento nas artes em direo a um determinado perodo no tempo, apesar de contestada ultimamente e considerada redutora pelos es-pecialistas, foi elaborada no sculo XVIII. Jules Michelet (1798-1874) intitulou de La Renaissance (1855) um captulo de sua histria da Frana. A expresso Renascena tambm foi utilizada por Ruskin no seu livro Pedras de Veneza (1851), em que se refere ao que ele chama de O perodo da Renascena. Po-rm, em 1860 que publicada a obra que popularizou esse termo para desig-nar o perodo da Renascena como de grande florescimento do esprito huma-no, correspondendo a uma espcie de descoberta do mundo e do homem. A obra a que estamos nos referindo o livro A cultura do Renascimento na Itlia (1860), escrito pelo historiador suo Jacob Burckhardt (1818-97).

    Mas por que os especialistas contestam e rediscutem esse conceito de Re-nascena? O termo foi definido de forma abrangente, o que dificulta delimi-tar o perodo. Ora, se por Renascena entendermos a descoberta do mundo e esta descoberta como um progresso em direo ao naturalismo em arte, j no sculo XIII possvel encontrar tendncias para o naturalismo, na arte francesa qualificada como gtica. Ainda, se por Renascena entendermos a descoberta do homem, h personagens medievais que deveriam ser qualifi-cados como precursores. Por isso o conceito de Renascena passou a ser re-discutido, j que o o que ele define como especfico do perodo que pretende nomear pode ser identificado em outros perodos, que o termo aponta como antpodas e que foram superados pela Renascena.

    O termo Renascena, nas artes visuais, comumente associado imitao dos padres clssicos ou como uma retomada dos critrios clssicos de valor. Mas essa imitao ou retomada no simples quando procuramos identificar suas fontes. Em arquitetura isso menos problemtico, afinal nessa arte mais

    Veja na disciplina Teorias da Arte e da Cultura, o mtodo biogrfico, sobre Giorgio Vassari.

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    fcil identificar os modelos clssicos, uma vez que o vocabulrio da arquite-tura romana difere bastante do vocabulrio do estilo gtico. O responsvel pelo reanimar do estilo antigo na arquitetura da Renascena foi Brunelleschi.

    Definir a Renascena em termos de imitao dos modelos antigos na pin-tura e na escultura mais difcil. A escultura renascentista, para Vasari, teria iniciado com Nicola Pisano, que retomara motivos dos sarcfagos clssicos. Mas se esse o critrio para definir o incio do Renascimento na arte da es-cultura, o que dizer do emprego por escultores gticos de motivos retirados da estaturia clssica? Portanto, a arte de Nicola Pisano e dos seus contem-porneos do norte tem muito em comum, o que levou a classificar seu estilo de proto-renascentista. De um modo geral, a escultura italiana do sculo XIV est mais identificada ao gtico do que ao gosto renascentista que encontra-mos, por exemplo, no Davi de Donatello (Figura 02) Desde a Antigidade Clssica, esta a primeira esttua de uma figura nua em tamanho natural. Donatello est associado criao do estilo renascentista na escultura. As fi-guras feitas para os nichos do Or San Michele e para a Catedral de Florena demonstram esse estilo, sua formulao, num tom emocional elevado.

    Tambm na pintura renascentista pouco confivel o critrio de defini-la em termos de imitao dos modelos da Antigidade Clssica. Isso porque praticamente no sobreviveu nenhum modelo de pintura dessa poca. O co-nhecimento que se tinha das obras de mestres famosos como Apeles e Zuxis advinha de fontes literrias. E estas produziram no pblico renascentista uma

    Figura 02 Donatello. Davi, Mrmore, 1,91 cm, 1444 -1446. Museu Nacional de Bargello, Florena.

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    expectativa de que a pintura deveria apresentar um alto grau de fidelidade natureza, almejando a perfeio nessa forma de representao que podemos chamar, genericamente, de naturalista. E por isso que Giotto considerado um precursor, graas s conquistas de sua arte num sentido naturalista.

    No afresco A lamentao de Cristo (Figura 03), a redescoberta da arte de criar iluso de profundidade em uma superfcie plana produz a impresso de que a cena est se passando diante de ns, que o evento est representado de uma forma verossmil, correspondendo, em certa medida, ao que dele po-deramos visualizar quando tentssemos mentaliz-lo, imagin-lo. Gombrich (1985) analisa essa conquista comparando A lamentao de Cristo com tema semelhante, representado em uma miniatura do sculo XIII (O sepultamento de Cristo, de um Saltrio manuscrito de Bonmont, pintado provavelmente entre 1250 e 1300, Besanon, Biblioteca Municipal). O tema dessa miniatura o velrio do corpo de Cristo. A Virgem abraa Cristo pela ltima vez. A cena no est representada como poderia ter sido, como teria acontecido esse en-contro entre a Virgem e o corpo de seu Filho. Os problemas de espao nessa imagem esto sobrepostos necessidade de acomodar as figuras na pgina. E tudo parece muito espremido.

    Porm, seria mais correto dizer que o incio da tradio naturalista-renas-centista se d com Masaccio, inclusive porque com ele havia uma preocupa-o de desenvolver com rigor uma forma de representao em perspectiva na superfcie bidimensional do quadro (Ver Figura 04).

    Figura 03 - Giotto di Bondone. A lamentao de Cristo, 200 x 185 cm, 1306. Capela da Arena, Pdua)

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    Brunelleschi (1377-1446), Donatello (c.1386-1466) e Ma-saccio (1401-1428) eram florentinos. Isso explica, em parte, porque Florena considerada bero da arte da Renascena. Alm disso, para nos situarmos cronologicamente em relao a essa idia de inovao atribuda s obras desses trs artistas, 1420 pode ser considerada uma data emblemtica para a arte europia, uma vez que por volta de 1420 que esses artistas rea-lizaram algumas de suas obras mais significativas.

    O quadro, de Catarina van Hemessen (Figura 05), o pri-meiro auto-retrato conhecido de uma mulher. Representa a artista e contm a inscrio em latim Eu Catarina de He-messen pintando-me a mim mesma com a idade de 20 anos. Curiosa, essa inscrio pretende no deixar dvidas quanto autoria, pois o suposto seria vir a atribuir este retrato a um qualquer pintor da poca. Visionria, Catarina pretendeu so-bre tal no deixar dvidas. Num tempo em que se pretendia dar nfase ao racional e imaginativo ao invs do contedo prtico, uma mulher aparece tende como prioridade mostrar que conseguia pintar.

    Ainda que se deva expandir a compreenso do Renasci-mento, demonstrando que ele no uma exclusividade italia-na e tampouco pode ser compreendido como um fenmeno europeu que se irradia a partir da Itlia, h uma singularidade na Renascena italiana. Isto , entre 1420 e 1520 aqueles que vivem na Itlia se percebem diferentes do restante do mundo. Eles se acham superiores no emprego da tradio clssica lati-na, identificados de modo mais familiar com o passado roma-no. E acreditam que o legado da Antigidade Clssica se mani-festa de modo indito nas letras e nas artes visuais praticadas na pennsula itlica nesse perodo.

    Esse perodo est marcado pelo desenvolvimento de pesquisas cientficas a partir das quais novos mtodos e tcnicas foram elaboradas. Filippo Bru-nelleschi avanou e criou bases para a perspectiva renascentista, descrita por Leon Battista Alberti (1404-1472) no tratado Della Pittura (1435). A partir da o modo de representao do espao pictrico passa a ser feita sem ignorar essa concepo matemtica de organizar e distribuir as figuras nesse espao. Masaccio considerado um dos pintores que aplicaram de forma exemplar a nova cincia da perspectiva arte da representao, criando obras convincen-tes no efeito de terceira dimenso sobre a superfcie bidimensional.

    Entre 1500 e 1520, aproximadamente, afirma-se que foram realizadas as as-piraes que os pintores buscavam desde Giotto, os ideais de equilbrio, har-monia e perfeio foram alcanados respeitando e atualizando os parmetros do belo clssico. Esse curto espao de tempo designado pelo termo Alta Re-nascena e o estilo dessa poca est expresso nas obras de Leonardo da Vinci,

    Figura 05 - Catarina van Hemessen. Auto-retrato, 1548.

    Figura 04 Masaccio. A morte de Cristo, 1490.

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    Michelangelo e Rafael. Esses artistas, com as suas realizaes, tornariam as das geraes anteriores realizaes magistrais, mas sem a perfeio que alcanaram.

    O sfumato de Leonardo da Vinci, justaposio matizada de tons e cores diferentes, seria responsvel por uma modelagem das figuras que superaria o contorno escultural das figuras nos artistas precedentes. Isto , com a tcni-ca do sfumato Leonardo suaviza os contornos mais rgidos caractersticos da pintura do incio do sculo XV.

    Rafael (Ver Figura 06), por sua vez, teria superado Perugino (Ver Figura 07) nas composies, adotando uma disposio piramidal sem abrir mo de uma variedade que no comprometia o equilbrio, fazendo parecer rgidas as com-posies do seu mestre. Em pinturas como as representaes da Virgem com o Menino e da Sagrada Famlia, Rafael expe seu domnio da composio e da ex-presso, fazendo com que as figuras sagradas se aproximem das feies humanas, apaream representadas como seres humanos.

    Figura 06 Rafael. A Virgem e o Menino.

    Figura 07 Perugino. A Virgem e o Menino, c. 1500.

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    Michelangelo, nos estudos de anatomia para composies, como o Estudo para uma das Sibilas (Figura 08), para o teto da capela Sistina, realizou o mo-delo clssico. Isso tambm ocorre no clebre Davi.

    Sfumato o nome da tcnica artstica usada para gerar gradientes perfeitos na criao de luz e sombra de um desenho ou de uma pintura. Leonardo da Vinci tido como o pai do sfumato, mas isso errado, pois a tcnica sempre existiu em materiais/mdias de frico, como o grafite, pastel seco ou carvo.

    O que Leonardo da Vinci contribuiu para a arte do sfumato foi que ele per-cebeu que o verniz de madeira reagia com a tinta a leo. Aps uma primeira mo de tinta, ainda com o quadro apresentando marcas de pincis, Leonardo da Vinci passava uma mo de verniz de madeira sobre a pintura fazendo com que o verniz borrasse a tinta a leo, gerando um gradiente perfeito e mas-carando a sensao de pincelada. O processo de passar o verniz por sobre a pintura era repetido vrias vezes durante o processo de criao da pintura.

    Em materiais de frico como grafite, pastel seco ou carvo, o sfumato realizado esfregando-se o dedo por cima da rea com impresses de risco, para que esses riscos sumam, e fique apenas o resultado limpo do degrad;

    Ainda em materiais de frico, existe tambm a tcnica do esfuminho. Um lpis feito de algodo que substitui a frico do dedo. A oleosidade da pele muitas vezes atrapalha o sfumato, por isso o esfuminho usado.

    SAIBA MAIS

    Figura 08 Michelangelo. Julgamento Final, 1537-1541.

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    1.1 RENASCENA SETENTRIONAL

    O movimento renascentista, ao norte dos Alpes, no se expandiu de maneira uniforme. A arte dessa regio europia mantinha-se in-dependente dos desdobramentos que ocor-riam na pennsula itlica, ainda que isso no signifique ausncia de influncias. Os ideais e o imaginrio italiano foram transmitidos para o resto da Europa, mas isso no quer dizer que essa transmisso permita uma delimita-o tranqila, a partir do termo que utiliza-do para designar esse processo: Renascena Setentrional. Aplicada arte setentrional eu-ropia, o termo Renascena se mostra ainda mais impreciso. Por isso podemos dizer que da maneira como se manifestou em Florena, a Renascena, no seu sentido mais estrito, um fenmeno localizado.

    No sculo XV, Mantegna influenciou a arte do austraco Michael Pacher. Os ideais da Renascena foram assimilados, sobretudo, a partir do esforo de artistas como Albrecht Drer (1471-1528), que procurou levar para as artes feitas em solo germnico as conquis-tas realizadas a partir da perseguio daqueles ideais pelos artistas italianos (Ver Figura 09).

    Entre essas conquistas esto os princpios matemticos da perspectiva, a proporo na ordenao dos corpos e o equilbrio na organizao do espao. Drer esteve duas vezes na Itlia para aprender esses princpios e, a partir deles, desenvolver esforos prprios para uma compreenso visual da beleza clssica.

    1.2. RENASCENA NOS PASES BAIXOS

    J nos Pases Baixos, a resistncia Renascena foi maior, em funo de uma tradio gtica mais forte. Na obra de Lucas van Leyden (1494-1533) aparecem traos da Renascena, que foi recebida, incorporada a partir das gravuras de Drer (Ver Figura 10). possvel tambm identificar a influncia de Leonardo da Vinci na obra de Quinten Metsys (1466-1530). Na arte dos Pases Baixos os efeitos, da Renascena se manifestaram a partir de viagens realizadas para a Itlia por artistas como Gossaert e Jan van Scorel (1495-1562). O primeiro imitou a estaturia clssica, enquanto Scorel absorveu o equilbrio e a serenidades de obras de Renascena italiana.

    Figura 09 - A. Durer, Melancolia I, 1514.

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    Chegamos ao final da unidade que trata o Renascimento. Sabemos que aqui s colococamos alguns aspectos deixando muitos outros a serem pesqui-sados por voc. Fica o desafio, h muito para se descobrir, investigar e refletir.

    Figura 10 - Lucas van Leyden. Jovem segurando a cabea da morte, 1519.

    A primeira obra conhecida do escultor Nicola Pisano o plpito do batist-rio de Pisa (Figura 11). Nele possvel identificar a adaptao de formas an-tigas, como a transformao de Dionsio em Simo quando da apresentao de Cristo; o uso da figura de Hrcules nu para criar uma personificao da virtude crist da fortaleza; e a transmutao de uma Fedra para representar a Virgem Maria.

    Reflita sobre as dificuldades para estabelecer os limites do perodo com-preendido como Renascimento, de acordo com a definio abrangente do termo a partir de Vasari e, sobretudo, a partir da extenso do sentido dado a ele por historiadores do sculo XIX, como Jules Michelet (1798-1874) e Jacob Burckhardt (1818-97).

    PROBLEMATIZANDO

    Figura 11 Nicola Pisano. Plpito do Batistrio de Pisa, 1260.

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    ARGAN, Giulio Carlo. Clssico anticlssico. O Renascimento de Brunelleschi a Bruegel. So Paulo: Cia. das Letras, 1999.GOMBRICH, E.H. A histria da arte. 4 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985.CHASTEL, Andr. A arte italiana. So Paulo: Martins Fontes, 1991.CHILVERS, Ian (org.). Dicionrio Oxford de arte. 2.ed. So Paulo: Martins Fontes, 2001.ARGAN, Giulio Carlo. Clssico anticlssico. O Renascimento de Brunelleschi a Bruegel. So Paulo: Cia. das Letras, 1999.GOMBRICH, E.H. A histria da arte. 4 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985.CHASTEL, Andr. A arte italiana. So Paulo: Martins Fontes, 1991.CHILVERS, Ian (org.). Dicionrio Oxford de arte. 2.ed. So Paulo: Martins Fontes, 2001.

    DICA DE LEITURA

    Assista ao filme Agonia e xtase. Ele conta um pouco sobre a vida e a obra de Michelngello.

    DICA DE FILME

  • O termo Maneirismo utilizado pela crtica moderna para designar, principalmente, a arte italiana que foi produzida entre a Alta Renascena e o Barroco. Isso quer dizer o perodo que vai de 1520 a 1600 aproximadamente, que tambm conhecido como o perodo da arte do Renascimento Tardio.

    Voc deve ter percebido que no perodo do Renascimento temos o que podemos chamar de uma constelao de artistas que fizeram escola, deter-minaram novos rumos na pintura, gravura e escultura. Um artista iniciante faria o seu trabalho maneira de um grande mestre: Rafael, Leonardo, Ti-ciano etc. Essa pode ser uma interpretao, mas esse uma maneira pouco generosa de entendermos esse perodo.

    Nossos olhos podem a princpio no perceber as diferenas entre as obras do perodo anterior e as do Maneirismo, portanto, chamaremos ateno com-parando alguns trabalhos com a mesma temtica de um perodo e do outro.

    Originalmente empregada por Giorgio Vasari (1511-1574), no seu livro Vidas de Artistas, para se referir s ltimas obras de Michelangelo, a palavra maniera, de onde oriundo o termo maneirismo em arte, tinha um senti-do positivo. Era usada para se referir a uma arte graciosa e sofisticada, que era tambm marcada pela simplicidade e pela leveza. Assim, toda a arte que apresentasse essas caractersticas era chamada maneirista, mas isso no durou muito. Nos sculos XVII e XVIII, Maneirismo sinnimo de elegncia ar-tificial e virtuosidade excessiva.

    Portanto, quando a arte italiana do sculo XVI passou a ser vista de forma negativa, de forma preconceituosa, o termo maneirismo ganhou conotao pejorativa, referindo-se, por exemplo, ao emprego das formas de Michelange-lo sem a captura do esprito do estilo dessas formas. Ou seja, entre os artistas que tinham na arte desse mestre da arte italiana um exemplo predominaria a imitao superficial do seu estilo. A partir disso a arte italiana do sculo XVI passou a ser vista, sobretudo, como uma arte decadente se comparada com a perfeio clssica da arte de Michelangelo (1475-1564) e Rafael (1483-1520) a exceo seria a pintura veneziana. A Arte Maneirista, sob essa chave de leitura, imitava de forma distorcida e superficial a arte dos grandes mestres renascentistas, menosprezando o equilbrio, a proporo e a racionalidade em arte, que eram conquistas desses mestres e valores identificados ao Clas-sicismo por eles atualizados.

    UNIDADE 2 MANEIRISMO

    REBELDIA E ELEGNCIA

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    O uso depreciativo do termo maneirismo teve incio logo aps o Bar-roco Tardio, no perodo de transio para o Classicismo da segunda metade do sculo XVIII. No final do sculo XIX o termo era empregado pelos his-toriadores da arte para se referir s produes artsticas que vo de 1520 at 1600, vistas por esses historiadores como tendncias que corrompiam a arte do Alto Renascimento.

    Esse ponto de vista comeou a mudar no faz muito tempo. A noo ma-neirismo, recuperada como categoria histrica no perodo entre-guerras, na dcada de 1920, particularmente, tem uma trajetria acidentada, em que so-bressai a impreciso dessa noo para a diversidade que ela deve designar e as avaliaes negativas que a acompanharam durante a maior parte do tempo. Depois da Primeira Guerra Mundial surgiu, por parte dos historiadores da arte, uma posio progressivamente favorvel ao Maneirismo, que deixou de ser visto com a lente de outros estilos, segundo critrios que eram apropria-dos ou oriundos de outras produes artsticas.

    A dificuldade para uma definio que abranja a produo artstica do scu-lo XVI sugere que ao invs de Maneirismo seria mais apropriado nos referir-mos aos maneirismos que se manifestaram na arte desse perodo. E, ainda, lembramos que a arte de Ticiano e a arte veneziana, a expresso mais acabada da arte do sculo XVI, no podem ser classificadas como Maneiristas.

    Apesar das divergncias, h um ponto em comum, uma concluso que aproxima os diversos juzos e pontos de vista na compreenso do Maneiris-mo. Ele corresponde a um momento de crise da Europa renascentista, crise econmica, religiosa, cultural e poltica. Aquilo que no Renascimento fora formulado como verdade ou modo explicativo passa a ser questionado, pois j no d conta da complexidade crescente do mundo.

    2.1. RESSIGNIFICAO DO TERMO

    A Arte Maneirista muitas vezes significou a superao dos modelos e ide-ais do Alto Renascimento, mas manteve vnculos com essa arte e suas con-quistas. Talvez isso explique porque a contradio apontada como um dos princpios da Arte Maneirista. O Maneirismo tem como base uma arte que ao mesmo tempo em que lhe serve de exemplo precisa ser superada e at mesmo destruda. E dessa relao que podemos extrair uma definio mais geral do Maneirismo, que designa a arte do sculo XVI que levou ao limite as conquistas estticas do Renascimento. Portanto, o Maneirismo no rompe ou se ope ao classicismo, mas quer dar s formulaes clssicas uma perma-nncia, sem que para isso os artistas precisem abdicar da criao e tenham de se contentar em apenas imitar a maneira dos grandes mestres.

    Dessa forma, livre dos preconceitos e dos sentidos pejorativos que lhe foram atribudos pela crtica at o incio do sculo XX, a arte maneirista precisa ser vista e analisada como um desdobramento do Renascimento, um desdobramento cr-tico e no apenas derivao ou imitao da arte mais elevada do Renascimento.

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    Nessa perspectiva, podemos destacar algumas particularidades do Manei-rismo, nas quais possvel observar a ruptura com os modelos clssicos: A perspectiva e a proporcionalidade passam a ser questionadas ou ga-

    nham outra formulao; A representao das figuras envolve um grau de distoro; A regularidade e a harmonia entre os elementos presentes na composio

    passam a ser menos relevantes; nfase maior nos efeitos emocionais; e, por fim, Tambm se destaca como particularidade a mudana de lugar do tema central

    da composio, que se desloca para pontos que seriam menos importantes. A seguir, vamos abordar essas particularidades nos trabalhos de artistas

    chamados maneiristas.

    2.1.1. ROSSO FIORENTINO

    O que chamamos de grau de distoro das figuras nas pinturas maneiristas diz respeito, por exemplo, a um uso quase excessivo do escoro, que a tcnica de representar os corpos em uma perspectiva acentuada. A obra Moiss defendendo as filhas de Jetro (Figura 12), de Rosso Fiorentino (1495-1540), exemplifica isso. Seu nome est ligado primeira gerao maneirista em Florena.

    A concentrao de corpos nus no primeiro plano d a impresso de desordem compositiva, um acmulo que desequilibraria o con-junto e o apresentaria em desarmonia. Essa impresso de tumulto se desfaz pelo recurso simetria e pela perspectiva, que tambm explo-rada atravs do escoro desses corpos nus no primeiro plano da cena representada. Esta cena parece, num primeiro momento, isolada, se-parada do fundo, separao cuja aparncia reforada pela conteno numa forma triangular dos corpos em luta. Mas essa sugesto de iso-lamento se deve ao escalonamento de planos na construo do espa-

    A Corrente Maneirista, se assim lhe podemos chamar, que precedeu o Renas-cimento e antecedeu o Barroco uma das mais sensuais ou at mesmo erti-cas em toda a histria da arte. Corpos sempre retorcidos, em posies quase impossveis de suster coabitam ambientes opulentos de luz e sombra, luxria e prazer. H uma gosto privilegiado pelo artifcio. A forma afetada que pro-positadamente inunda os corpos, gera uma graciosidade incontida, e esta se completa com cores suaves e luminosas. Aqui, Bronzino presenteia-nos com o beijo de Cupido a Vnus. Embora seja intrnseca a natureza maneirista da obra, com todas as solues formais que o comprovam, encontram-se ainda aluses repletas de simbolismo. Disponvel em daminhaaldeia.blogspot.com.

    SAIBA MAIS

    Figura 12 - Moiss defendendo as filhas de Jetro, data.

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    o e da perspectiva e a uma repetio que modula esse mesmo espao, repetio da nfase simtrica que dispe os acontecimentos presentes na cena. Isto porque a figura feminina direita est num segundo plano to importante quanto aquele em que se debatem as figuras do primei-ro plano da tela.

    Nesse segundo plano, a forma em que esto dispostas as figuras que o ocupam no triangular e tampouco aponta para uma profundida-de. A relao, os vnculos entre as duas figuras que ocupam o segundo plano repete a planaridade da tela e como que interrompe a perspecti-va apontada pelo corpo em escoro no primeiro plano. E os vnculos entre esses dois planos, aquele dos corpos nus e o da figura feminina, so definidos por uma diagonal que passa pela luz que incide sobre as costas do homem curvado no primeiro plano, segue pelo sexo da fi-gura central e chega at a figura feminina em azul. Com esse recurso os acontecimentos paralelos, aparentemente isolados, se vinculam e contribuem para enfatizar o dramatismo e a violncia da cena, exem-plificando a nfase no aspecto emocional da cena representada que ca-racteriza a Arte Maneirista.

    2.1.2. FRANCESCO MAZZOLA

    Francesco Mazzola (1503-1540), conhecido como Parmigianino, era do norte da Itlia, e tambm tem o seu nome ligado primeira gerao maneirista. No quadro A Madona do longo colo (Figura 13), podemos identificar aspectos do que seria uma diferena e um esforo de supera-o das geraes anteriores. O tratamento que dado ao tema parece ofensivo se comparado ao que Rafael imprimiu a ele (Ver Figura 14). En-quanto as madonas de Rafael so simples e despojadas, a madona de Par-migianino afetada, sugere uma sofisticao que lhe d uma aparncia mundana. O ttulo do quadro, Madona do longo colo, est associado preocupao de Parmigianino de representar a Virgem Maria com graa e elegncia, apesar do aparente prejuzo s propores corretas e o efeito de uma deformao mais geral do conjunto essa deformao est tam-bm nos dedos longos e delicados, na perna do anjo no primeiro plano, etc. Mas essa forma mais alongada no pode ser atribuda ignorncia do artista s propores corretas. Trata-se de uma escolha, um partido que sacrifica as harmonias convencionais em busca de efeitos mais re-quintados. No se trata de buscar uma proximidade com o que era con-vencionado como beleza natural. Havia outras formas de proporcionar o efeito de beleza na viso de Parmigianino. A serenidade da Virgem, que separa o espao tumultuado em que vrios anjos se acotovelam num canto apertado do espao aberto em perspectiva, onde aparece a figura diminuta de So Jernimo, como que serve de contraponto entre dois mundos aparentemente irreconciliveis, aproximando-os sem abdicar de uma inquietao como viso geral.

    Figura 13 Francesco Mazzola. Madona de Longo Colo, data.

    Figura 14 Rafael Sanzio. Madonna del Granduca, 1504.

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    2.1.3. JACOPO CARUCI

    Jacopo Caruci, dito Pontormo (1494-1557) em virtude do nome de seu vilarejo, Pontormo, localizado entre Florena e Pisa, tambm pertence primeira gerao maneirista. Por volta de 1515 pintou o painel Jos no Egi-to (Figura 16), em que j est presente o estilo prprio desse artista, que o transforma numa espcie de precursor do Maneirismo. Essa pintura apresen-ta uma srie de cenas da vida de Jos numa nica composio. Podemos ver ao mesmo tempo o povo pedindo po, Jos e sua famlia na corte do fara e a morte de Jac, entre outras cenas.

    Os episdios esto separados por planos espaciais unificados por um rit-mo rpido que Pontormo imprime composio e pelo recurso do espao arquitetnico, em especial o movimento em espiral da arquitetura. A impres-so de um movimento incessante. Nada da estabilidade clssica. O espao e a escala so subvertidos, sugerem um universo irracional e em constante movimento. A juno de diferentes episdios num mesmo espao nos torna testemunhas de uma narrativa que desafia os padres convencionais da linea-ridade e sucesso dos acontecimentos. Tudo se faz presente ao mesmo tempo

    Observe as madonas de Mazzola e Rafael. O que tem de diferente de uma madona de Bellini (Figura 15)? Que sensao essa imagem provoca?

    PARA REFLETIR

    Figura 15 Giovanni Bellini. Madonna.

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    e com a mesma relevncia. A idia de profundidade e perspectiva precisa ser reinventada pela percepo do quadro, o que nos torna um pouco autores e testemunhas em carne e osso desses acontecimentos, no fosse o alto grau de sofisticao e requinte que os afasta de ns, o aspecto artificial do conjunto, acentuando a contradio inerente a esse estilo.

    2.1.4. GIOVANNI DA BOLOGNA

    O maior escultor do Maneirismo era flamengo de nascimento, mas tratado como escultor italiano. Isto porque foi estudar na Itlia por volta de 1550 e l se estabeleceu para o resto de sua vida. Estamos falando de Jean de Boulogne (1529-1608), que os italianos chamavam de Giovanni da Bologna. Esse escultor, depois de passar dois anos estudando em Roma, quando volta-va para casa, parou em Florena, cidade que adotou para viver o resto de sua vida. Mas foi para a cidade de Bolonha que ele realizou a obra que lhe deu o prestgio inicial. Trata-se da obra Fonte de Netuno, que demonstra a habilida-de de Giovanni da Bologna para a criao de obras em grande escala.

    Ele tambm trabalhava bem em pequena escala, e criou estatuetas de bron-ze que se tornaram extremamente populares, divulgando seu estilo por toda a Europa. Exemplo desse tipo de trabalho desenvolvido por Bologna a esttua de Mercrio, o mensageiro dos deuses (Figura 17). Nessa esttua, Giovanni da Bologna contraria as regras estabelecidas para a realizao de obras no campo da escultura. Isso porque o mais convencional era as esculturas manterem evi-dncias do peso da matria da qual eram extradas. A esttua de Bologna parece se colocar o desafio de superar o peso da matria e parecer estar suspensa no ar. E ele conseguiu esse efeito: a esttua do mensageiro dos deuses reproduz o efeito de um atleta que corre com graciosidade e velocidade, sem atritos.

    Figura 16 Jacopo Caruci. Jos no Egito, 1515-1518.

    Figura 17 Giovanni de Bologna. Mercrio, o mensageiro dos

    deuses, 1580.

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    2.1.5. TINTORETTO

    O pintor veneziano Jacopo Robusti (1518-94), conhecido como Tinto-retto, ganhou esse apelido por causa dos negcios do pai, que era tintureiro. Pertence gerao que sucedeu a Ticiano, gerao a qual tambm pertence Veronese, que junto com Tintoretto foi um dos artistas mais bem-sucedidos dessa gerao. Mas a obra de Tintoretto est vinculada de modo mais forte aos princpios do maneirismo se comparada com as de Veronese e do prprio Ticiano, em cuja oficina Tintoretto recebeu parte de sua formao. No so poucos os que o consideram o maior dos mestres da parte final do sculo XVI. Em 1539 Tintoretto j tinha sua prpria oficina e era tratado como mestre. A primeira obra-prima desse pintor que passou quase toda sua vida em Veneza o Milagre do Escravo (Figura 18), trabalho em que j aparecem qualidades que vo marcar a obra madura de Tintoretto, como o gosto pelo escoro. O desenho de Michelangelo e as cores de Ticiano eram sua referncia teria es-crito na parede de seu estdio o lema O desenho de Michelangelo e as cores de Ticiano. Mas a sua pintura se revela muito diferente das pinturas desses dois artistas que lhe seguiam de guia no campo do desenho e da pintura.

    As pinturas de Tintoretto exploram mais a emotividade no tratamento dos temas, emprega de forma exponencial a luz e o movimento, criando efeitos perturbadores. Desse modo, a impresso que deixou de descontentamento com os efeitos produzidos pelos quadros de Ticiano, pretendendo super-los. Ao invs de uma beleza simples e aprazvel, Tintoretto queria pintar cenas comovedoras, que passassem a impresso de termos diante dos nossos olhos as histrias da Bblia e as lendas sagradas, queria pint-las como verdadeiros acontecimentos, como coisas vivas, fazendo com que o espectador se emo-cionasse diante da intensidade do drama representado.

    Figura 18 Tintoretto. O Milagre do Escravo, 1549.

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    Tintoretto foi acusado de ser excntrico e descuidado na execuo de seus quadros, como se eles fossem inacabados. Essa crtica se deve a escolha por no suprimir de todo a presena da materialidade da pintura, na forma das pinceladas que podem ser percebidas nos quadros. Mas essa crtica tinha como finalidade demonstrar que os artistas maneiristas no tinham domnio tcnico, ou que abdicaram desse domnio em nome de efeitos visuais suspei-tos e constrangedores. Do ponto de vista do Maneirismo, a recusa daquilo que era compreendido usualmente como perfeio tcnica era para dar des-taque e relevncia ao que consideravam essencial em arte, o tipo de vnculo mais sincero e direto que suas pinturas poderiam criar com os espectadores. E se o trabalho de pincel que visvel nas pinturas de Tintoretto foi censu-rado, o tempo foi sbio e mais tarde esse trabalho foi reconhecido como um recurso bem-vindo para reforar a idia de drama e tenso no quadro.

    Tintoretto e El Greco, de quem vamos falar adiante, partilharam inquie-taes semelhantes e so considerados os maiores pintores do Maneirismo. Tambm tm em comum, obras cujo acabamento foi criticado, apontado como deficincia tcnica. Mas o que lhes importava era no suprimir ou ocul-tar o que era mais importante nos eventos, era reforar e destacar a dramati-cidade deles quando isso se fazia necessrio e pertinente ao tema escolhido. Alm disso, esses dois artistas tm em comum o fato no enquadrarem suas obras como Maneiristas. A generalizao pouco auxilia sua compreenso.. Podemos dizer a respeito delas que so Maneiristas ao mesmo tempo em que desafiam a prpria definio que lhes atribuda com essa classificao. So obras fundamentais para a construo de certas definies, como as do pr-prio Maneirismo em arte, mas que ao mesmo tempo em que so decisivas para que os historiadores possam construir suas categorizaes demonstram as limitaes destas. As obras de El Greco e Tintoretto representam um em-bate com o Classicismo e, sobretudo, a manifestao de uma nova sensibili-dade atravs da pintura.

    2.1.6. EL GRECO

    Domenikos Theotocopoulos, El Greco (1541-1614), foi pintor, escultor e arquiteto. Nasceu em Creta, ento possesso veneziana, e se estabeleceu na Es-panha, sendo considerado o primeiro grande gnio da escola espanhola. Mas antes de se estabelecer em definitivo em Toledo, na Espanha, onde permaneceu at sua morte, estudou em Veneza e morou um perodo em Roma, cidades em que buscou formao artstica. Foi aluno de Ticiano, mas foi Tintoretto o pin-

    Olhando as imagens de Tintoretto, voc concorda com as crticas que rece-beu na sua poca? Porque acha que elas foram feitas?

    PARA REFLETIR

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    tor veneziano que mais influenciou El Greco. Alm de Ticiano e Tintoretto, deve ser mencionada a influncia que as obras de Michelangelo exerceram sobre a formao do estilo de pintar de El Greco. Como Tintoretto, El Greco desenvolveu um estilo caracterstico para representar as histrias sagradas sob uma forma nova e que correspondesse dimenso dos acontecimentos espi-rituais que elas deveriam transmitir (Ver Figura 19).

    Nesse sentido, sua obra tambm aparenta um descaso pelas formas e cores naturais em benefcio de uma viso dramtica e emocionante. Foi gradualmente se afastando da realidade da representao, o que deve ter sido facilitado por morar em Toledo. Dissemos antes que Tintoretto sofreu crticas pela forma como apresentava seus quadros, dando a impresso de acabamento e deficincia tcnica. No h nada mais enftico nesse sentido em relao a El Greco, cuja obra no recebeu crtica semelhante at uma gerao depois. O que provavelmente tenha explicao no ambiente de To-ledo e da Espanha de um modo geral. Portanto, depois de sua morte que seus trabalhos comearam a ser criticados, entre outras coisas, por apresen-

    tarem formas e cores no naturais (Ver Figura 20). Na medida em que se afastava mais da representao naturalista, a figu-

    ra humana dos trabalhos de El Greco parecem cada vez mais distorcidas, o espao em que elas so colocadas tambm parece corresponder cada vez

    menos realidade, no indicando uma submisso a uma construo lgica, como a perspectiva renascentista. Alm disso, num sentido mais geral, o uso da cor no responde a uma expectativa objetiva El Greco no utiliza a cor objetivamente.

    Comeamos nosso estudo aprendendo o contexto que caracteriza a arte produzida no perodo que ficou conhecido como renascimento. (equil-brio, claridade, razo), vimos como essas regras esgotam-se do origem a um estilo conhecido como Maneirista. Agora, veremos como esta maneira de representar d espao para uma representao mais dramtica, mais tea-tral que vem a se conhecida como arte barroca.

    Figura 20 - El Greco. El Espolio, 1577-1579.

    Figura 19 - El Greco. A Ascenso da Virgem, 1577-1579.

  • Oh, este mundo sombrio, / Em cujas trevas ou profunda fossa de escurido,/A humanidade (medrosa como uma mulher) tem de viver.

    Webster Duquesa de Malfi

    Do Renascimento ao Neoclacisissismo assistimos a um desfilar de temas que transitam entre o universo do imaginrio cristo que vestido em estrutu-ras do imaginrio da cultura clssica (o repertrio mitolgico, por exemplo). Essa metamorfose continuar no Barroco, mas aqui, necessrio ressaltar o pano de fundo das manifestaes artsticas: um cenrio poltico e religioso instvel, em constante guerra de convices, inclusive o homem como esse centro do universo. No final do perodo anterior temos as cismas da Reforma que vo cindir a f, o rebanho e o patrimnio da Igreja Catlica.

    Universidades foram criadas desde o sculo XII, mas no sculo XVII o povo continuava analfabeto, poucos sabiam ler. As guildas e corporaes de ofcio ain-da continuavam a servir de reserva de mercado para artistas terem trabalho. Os reis e os nobres competiam com a Igreja nas encomendas e na proteo de artistas considerados mais talentosos de acordo com os critrios e desafios da poca.

    Ento o Barroco surge no sculo XVII sem que ningum saber, surge sem ser cha-mado d ebarroco.[...] Mas s no sculo XVIII...quando a maior parte do Barroco j tinha acontecido, que se comea conceitu-lo, quer dizer, a reconhec-lo como um estilo, mas a conceitua-lo de maneira depreciativa. (Ferreira Gullar, p. 219)

    O Barroco foi um perodo estilstico que desenvolveu-se entre 1600 e 1750. Nascido como uma resposta contra-reforma, tal momento artstico destacou-se como tentativa de renovao da ideologia catlica e a reafirmao de seu poder sobre monarquia vigente. No Barroco, ao contrrio do Renascimento, a igreja perdeu foras com as inmeras reformas surgidas no perodo, tais como as pro-postas por Martim Lutero e o surgimento do Protestantismo. Na tentativa de rea-proximar os fiis de suas fronteiras, o movimento da contra-reforma foi articulado.

    Esse foi um perodo marcado por dualidades; o bem e o mal, o claro e o escuro, o divino e o profano. A teatralidade do barroco foi marcada nas repre-sentaes imagticas como o pice de uma cena, o momento exato em que as emoes transcendem o campo fsico das personagens. A teatralidade do bar-roco, entre movimentos de reformas e contra-reformas traduziu-se em duas

    UNIDADE 3 BARROCO: A PAIXO, O DRAMA, A TEATRALIDADE

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    vertentes o Barroco Catlico e o Barroco Protestante. Na seqncia apresen-taremos as principais relaes entre perodos, artistas e obras relacionadas.

    3.1. BARROCO CATLICO: O APELO S EMOES

    A Arte Barroca nos pases catlicos, tais como Itlia e Espanha, marcada pelo apelo emocional como um meio de atingir a mente lanando-se ao en-contro da suscetibilidade emocionais do espectador; num grau muito maior e mais orientado para o espectador do que qualquer outro estilo at ento. Algumas caractersticas podem ser assim enumeradas: Plano de decorao de tetos, calculando formatos, tamanhos e iluminao

    (possibilidade para o espectador contempl-lo, na medida certa). Uso do Trompe Doil;

    Pinturas de cavaletes e murais, concentrao em primeiro plano (Close-up); nfase na extenso do espao em profundidade (escadarias e corredores),

    nas construes, a atrao deve ser traduzida em aes (tetos e murais), no espao pictrico, a atrao do espectador subjetiva;

    Superao dos limites naturais dos materiais (mrmore parecer cabelo); Associao da obra ao mundo real do espectador (foco fora da obra de arte); Iluso comedida (figura em close-up, e expresso intensa do olhar).

    O esplendor da Arte Barroca proposital. Os artistas barrocos atraiam o observador, pelo uso do ilusionismo, dos mtodos do teatro e de gestos e ex-presses eloqentes, proporcionando qualidades de puro deslumbramento. Uma boa parte dessa opulncia visual era obtida, meramente, pela acumula-o da mxima de material, a opulncia em grande escala.

    Alm da grande escala de material a teatralidade do Barroco deve-se ao uso de luz e sombra em violento contraste (ver Caravagio, Rembrant). Existem v-rios graus de teatralidade na Arte Barroca, e no foram usados com fins em si, mas para transmitir uma mensagem sria com mximo efeito. Outro aspecto o da nfase na agonia fsica abrandada pela exaltao espiritual em suas expres-ses fisionmicas, explorando diferentes estados de esprito (ver Berninni).

    Outro ponto importante para aprendermos a olhar a Arte Barroca o pro-cesso de fuso das artes: a arquitetura tornou-se mais escultural, a escultura mais pictrica e a pintura mais interessada nas aparncias visuais (preceden-tes renascentistas). A nfase da pintura recai na utilizao de efeitos de luz, sombra e cor do que na marcao de linhas e formas.

    Procure uma obra de Franz Hall e procure estabelecer uma linha de contorno em volta das figuras ou de detalhes, ver que uma tarefa difcil. Tambm como recurso de anlise formal podemos prestar ateno na maneira do enquadra-mento das cenas. A tendncia no barroco de negar o enquadramento, sem in-teresse na rea central, desviando assim a ateno de quem olha para as margens.

    PARA REFLETIR

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    Agora, apresentaremos alguns artistas desse perodo, comeando por Ca-ravaggio, artista italiano que torna um cone do perodo e inaugura uma for-ma peculiar e transgressora de pintar.

    3.1.2. CARAVAGGIO

    Patrocinado pelo papado, Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610) foi considerado um dos pintores mais notveis do perodo barroco. O artista ao escolhia os figurantes para suas pinturas em meio as pessoas co-muns, muitas vezes desprovidas de mnimas condies de vida para retratar personagens sacros tais como apstolos ou outras figuras centrais do catoli-cismo. Certamente provm destas escolhas a teatralidade naturalista constru-da nas imagens criadas pelo artista.

    Dotado de uma espcie de aura enigmtica, Caravaggio gerava polmi-cas devido sua postura desafiadora em buscar representar entidades divinas por meio da observao de pessoas comuns, muitas vezes excludas de sua prpria dignidade humana. Conta-se que foi acusado de retratar A Morte da Virgem com a observao de um corpo desfalecido de uma prostituta. Intocado pelo que chamamos de dogma religioso, Caravaggio rompeu com as idealizaes clssicas ao retratar cenas cotidianas em cenrio e temas re-ligiosos, tendo por isso, vrias obras recusadas pelos contratadores do pe-rodo, a igreja catlica. A caracterstica realista de seu trabalho trouxe para reflexo o termo naturalismo, devido proximidade de sua obra sua vida contempornea.

    A teatralidade marcada pelo uso de sombra e luz, do natu-ralismo das personagens e o teor dramtico das cenas constru-das (Ver Figura 21) agradava tanto aos protestantes quanto aos catlicos, tornando-o um artista influente e responsvel por fazer escola e ter vrios seguidores tanto na Itlia quanto em outros pases.

    3.1.3. ARTEMSIA GENTILLESCH

    Artemsia Gentillesch foi exceo ao ser uma das nicas mulheres a serem mencionadas na pintura artstica barroca. Fi-lha de Orazio Gentileschi, discpulo de Caravaggio, romana e tornou-se personalidade de destaque em sua poca. Artista que retratava heronas trgica, tais como Bestsab e Judite, as-sassina do general assrio Holofernes. Artemsia, assim como as demais mulheres da poca, s comearam a ter destaque a partir do sculo XVI. Resultado de uma postura opressora, a artista ao buscar aceitao no ateli do pintor Agostino Tas-si, amigo da famlia, foi estuprada, fato que a levou a vivenciar longo processo judicial e desgaste de seu prestigio como pinto-

    Figura 21 Caravaggio. Morte da Virgem, 1601-1606.

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    ra. Tassi foi condenado a um exlio de Roma por um perodo de cinco anos que durou quatro meses.

    Nesse retrato (Figura 22) a artista representa a si mesma pintando, vemos como sua arte importante para ela, no como mero deleite, mas como uma profisso e como testemunho das suas convices como artista e como mulher.

    Observe bem a obra Judith Decapitando Holofernes (Figura 23) e pense na condio de uma mulher naquela poca enfrentando a hu-milhao pblica e o ultraje? Mas Artemsia tinha uma arma que no era exatamente a empunhada pela personagem bblica Judith. Arte-msia tinha sua arma, e com seus pincis executou uma espcie de vingana que se perpetua na histria e na arte. A obra de Artemisia vai refletir este desejo de vingana. Foi uma pintora produtiva e tra-balhou arduamente para sustentar a famlia. Artemisia vai ser muito influenciada pelos grandes nomes da pintura barroca. Durante mui-to tempo a obra de Artemisia foi injustamente esquecida e por vezes atribuda a seu pai. Hoje o seu reconhecimento consenso e constata-se que a sua obra contm, em muitos casos, um ponto de vista nico, feminino e at feminista, extremamente avanado para a sua poca.

    3.1.4. CARRACCI

    Annibale Carracci nasceu em Bolonha, numa famlia de artistas. Em 1582, Annibale, seu irmo Agostino e seu primo Ludovico Car-racci abriram um estdio de pintura, inicialmente chamado por al-guns como a Academia de Desiderosi (Desejoso de fama e de apren-dizagem) ou depois por Incamminati (progressistas; literalmente aqueles de abertura de um novo caminho). Embora a nfase na obra de Carracci seja no esboo linear (marca da pintura florentina), como exemplificado por Rafael e Andrea del Sarto, o seu estilo deve tambm ao colorido dos pintores venezianos. Esse ecletismo defini-ria artistas do Baroque Emilian ou Escola Bolonhesa.

    Anibale tornou-se bastante conhecido tendo recebido vrias e contnuas encomendas, o que para um artista na poca era determi-

    Figura 22 - Artemisia Gentileschi. Auto-retrato trabalhando, 1630.

    Figura 23 - Artemsia Gentileschi. Judith decapitan-do Holofernes.

    Figura 24 Caravaggio. Judith decapitando Holofernes, 1598-1599.

    Observe as Figuras 23 e 24, e reflita: em que Artemsia herda de Caravaggio? Observe a obra de Caravaggio retratando a cena bblica de Judith e o general Holofernes. Compare com a postura dos trs personagens: Jutih, Artemisia e a escrava. Qual a diferena de entre as mulheres de Caravaggio e as de Artemisia? Seria ela cmplice ou s observadora da vingana?

    PARA REFLETIR

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    nante para ser reconhecido como mestre e ter discpulos. Em 1585, Annibale concluiu o retbulo do Batismo de Cristo para a igreja de San Gregorio, em Bolonha. Em 1587, ele pintou o pressuposto para a igreja de San Rocco em Re-ggio Emilia. Em 1603 pinta o O vo no Egito. Em 1587-88, Annibale viajou para Parma e, em seguida, Veneza, onde se reuniu com seu irmo Agostino. A partir de 1589-92, os trs Carracci completam o trabalho sobre os afrescos da fundao de Roma para o Palazzo Magnani, em Bolonha. At 1593, Annibale havia completado um retbulo, Virgem no trono com So Joo e Santa Catari-na, trabalhando paralelamente com Lucio Massari. Sua Ressurreio de Cristo tambm data a partir do ano 1593. Em 1592, ele pinta um Bonasoni Assuno (Figura 25) para a capela de San Francesco. Durante 1593-1594, todos os trs Carracci trabalham em afrescos, no Palazzo Sampieri, em Bolonha.

    3.1.5. VELSQUEZ

    Assim como Caravaggio, Diego Rodrguez de Silva y Velzquez (1599 - 1660) foi um artista de destaque do perodo barroco. Foi o principal pintor da Corte de Filipe IV, rei da Espanha. Foi o artista de retratos e quadros histricos da corte, ganhan-do o titulo de Pintor Real. Velsquez estudou pin-tura com Francisco Herrera. Apaixonado pela arte de Caravaggio, Herrera foi o primeiro mestre de Diego Velsquez, quanto este foi estudar pintura na corporao de So Luca, em Sevilha. A corporao foi uma espcie de irmandade onde os que dela fa-ziam parte precisam jurar fidelidade aos estatutos que a regia. Velsquez, aps anos de estudo e desen-volvimento comprovado por provas prticas deixou jurou fidelidade corporao em troca do direito de exercer sua atividade artstica. Sua obra mar-cada por caractersticas detalhistas, explorao dos contrastes entre claro e escuro, focos de luz direcio-nados para o realce de volumes e relevos, valoriza-o dos detalhes, fuga do grotesco e da comicidade nas representaes (Ver Figura 26). Figura 26 Diego Velsquez. As Meninas, 1656-1657.

    Figura 25 Annibale Carracci. As-suno da Virgem Maria, 1600-1601.

    Observe na obra Assuno (Figura 25) o emprego das cores quentes, dos contrastes de luz e sombra e a disposio inusual das figuras principais. Pro-cure tambm no quadro que personagem procura manter contato visual com voc espectador.

    PARA REFLETIR

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    Em As Meninas, as variedades de luz direta e indireta so quase ilimitadas, e o artista nos desafia a encontr-las: espera-se que ns que estabeleamos uma relao direta e indireta entre a imagem e o espelho, as pinturas que ocupam a mesma parede e a pintura do homem junto a porta aberta. A iluminao lateral (que vem da direita) os fortes contrastes de luz e sombra ainda sugerem a influncia de Caravaggio, mas a tcnica de Velsquez muito mais difersifi-cada e sutil, com delicadas velaturas que relaam o empastamento dos pontos mais luminosos, e pinceladas mais livres e rpidas que as de Ticiano ou Rubens. As cores tambm possuem um calor e brilho venezianos. Velsquez no apa-rece, entranto, interessado em captar o tempo em movimento; seu objetivo no mostrar figuras em movimento; mas sim o prprio movimento da luz e sua infita variedade de efeitos de forma e cor. Para Velsquez, a luz cria o mundo visvel. S dois sculos mais tarde encontraremos pintores capazes de apreender as implicaes contidas nessa descoberta. (JANSON, 1996, p. 262)

    Como representante do Barroco Espanhol, destacamos o pintor Bartolo-m Esteban Murillo. Nascido em Sevilha, por volta de 1618, foi um artista produtor de imagens sacras, tendo sua primeira encomenda destinada pro-duo de quadros para o convento de So Francisco, em sua cidade natal. As caractersticas de suas obras concentram-se na dualidade entre claro e escuro e no uso de sombras suaves. A teatralidade citada anteriormente em trabalhos como os de Velsquez cede espao para um certo misticismo (Ver Figura 27), cenas distantes da realidade humana, sendo influenciado pelos artistas Van Dyck, Ticiano e Rubens.

    Figura 27 - Bartolom Esteban Murillo. So Joo Batista e Cordeiro. Final do sculo XVII.

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    J vimos bastantes trabalhos no campo bidimensional-pintura. Vejamos agora algumas caractersticas do barroco na escultura. Os elementos visuais que conferem a dramaticidade no campo bidimensional seriam os mesmos da construo tridimensional? Para exemplificar e refletir trazemos aqui a obra O xtase de Santa Tereza Dvila (Figura 28), do italiano Bernini. Ob-servemos a imagem! O que ela provoca no espectador? Como voc se sente diante dessa obra?

    A escultura barroca assim como a pintura, marcada pelo intenso drama, exagero das formas, teatralidade das expresses e movimentos.

    3.1.6 RUBENS

    Peter Paul Rubens foi um dos artistas que contriburam para que o barro-co se tornasse um estilo internacional, rompendo as barreiras artsticas entre o norte e o sul. Nasceu em 1577, na Alemanha. Cresceu na Anturpia onde foi iniciado no aprendizado artstico com pintores locais. Tornou-se mestre em 1958 na guilda de So Lucas, viajando para a Itlia dois anos mais tarde. Rubens permaneceu oito anos na Itlia onde estudou obras primas-primas do Alto Re-nascimento e tambm de pintores como Caravaggio. Posteriormente retornou para Anturpia, capital dos Pases Baixos Espanhis estabelecendo-se como pintor da corte do regente espanhol. Entre as obras dessa fase destacam-se as

    Figura 28 - Bernini. O xtase de Santa Tereza Dvila, 1645-1652.

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    telas monumentais Levantamento da cruz (1610) e Deposio (1612), realiza-das respectivamente para a igreja de Santa Valburga e a catedral de Anturpia.

    No Rapto das filhas de Leucipo (Figura 29), pintado em 1618, o artista de-monstra a grandiosidade de sua obras, destacando atravs das pinceladas a din-mica da cena marcada pela sensualidade, a linearidade na construo das figuras e definio dos planos e pelo contorno exuberante dos corpos femininos, de clara conotao mitolgica, formando uma composio com grande fora dramtica.

    Outro importante conjunto de telas, destinado igreja de So Carlos Bor-romeu de Anturpia, desapareceu quase totalmente num incndio, em 1718.

    Durante a dcada seguinte, Rubens realizou numerosas misses diplomti-cas para os arquiduques da ustria em contnuas viagens pelos Pases Baixos, Frana, Espanha e Inglaterra. Em virtude do papel preponderante que desem-penhou na obteno do acordo de paz anglo-espanhol de 1630, Carlos I da In-glaterra concedeu-lhe o ttulo de Cavalheiro.

    A partir de 1626 a obra de Rubens deslocou-se da monumentalidade para o lirismo, inspirado no artista Ticiano. Rubens, vivo desde 1626, casou-se por volta de 1630 com a jovem Hlne Fourment de 16 anos, seu modelo predileto. So desses perodos a obra O jardim do amor, Ninfas e stiros, As trs graas e Quermesse compostas pela variedade de tons, equilbrio e uso de manchas produtos da diluio das linhas.

    A obraNa Paisagem com o Castelo de Steen revela o tom lrico e nebuloso das cenas campestres referentes ao local onde ele passou a habitar. Foi tam-bm considerado precursor de certos aspectos do estilo Rococ do sculo XVIII, alm de tambm herdeiro de Pieter Brueghel e dos venezianos.

    Figura 29 - Peter Paul Rubens. O Rapto das Filhas de Leucipo, c. 1617.

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    3.1. BARROCO PROTESTANTE

    O Barroco Protestante, ao contrrio do Barroco Catlico, assumiu carac-tersticas mais prximas dos ideais da burguesia em ascenso. Os temas des-se seguimento barroco buscaram maior proximidade com as representaes relacionadas ao cotidiano. Os temas bblicos continuaram, porm em repre-sentaes mais humanas e menos distantes das angustias traduzidas entre o divino e o profano. Neste perodo, muitos artistas passam a retratar pessoas comuns, membros de famlias influentes. O artista nesta vertente deixou de ser um contratado das cortes, para trabalhar e vender sua arte em prol de sua ascenso social.

    3.2.1. REMBRANDT

    Rembrandt Harmenszoon van Rijn (1606, Leiden1669, Amsterdam) considerado maior dentre os gnios da arte holandesa. Suas contribui-es arte surgiram em um perodo denominado pelos historiadores de Sculo de Ouro, na qual a influncia poltica, a cincia, o comrcio e a cultura neerlandesa particularmente a pintura atingiram seu pice.

    Rembrandt foi o pintor das cenas b-blicas, das mitologias dramticas e tam-bm dos famosos auto-retratos. Colecio-nador de objetos do oriente reproduziu vrios deles em suas pinturas. A influn-cia de Caravaggio no incio de sua carrei-ra traduziu-se em pinturas de formatos pequenos, de intenso realismo e lumino-sidade. Aps um perodo de ampla pros-peridade artstica e financeira Rembrandt adotou o lirismo ultrapassando os limites lineares de sua composio. As manchas e o intenso trabalho com cores traduziram a fora e a introspeco presentes em v-rias de suas obras, entre elas O Cavaleiro Polnes de 1655 e Ronda Noturna (Figu-ra 30), de 1642. Rembrandt tambm foi um exmio gravurista, tendo como tcni-ca principal a gua-forte.

    Como voc entendeu as funes pintor da corte com as relaes diplomticas?Voc v alguma semelhana dessa situao de mecenato, do artista viver as custas de um patrono com a situao do artista na contemporaneidade?

    PROBLEMATIZANDO

    Figura 30 Rembrandt. A Ronda Noturna, 1642.

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    3.2.2. VERMEER

    Johannes Vermeer (1632 - 1675), conhecido como o pintor das cenas cotidia-nas, representa junto a Rembrandt a Idade de Ouro Holandesa, assim denomina-da devido s espantosas conquistas culturais e artsticas do pas nessa poca. Na cenas de gnero presentes em sua obra h uma quase inexistncia de narrativas.

    No geral so figuras isoladas, em sua maioria mulheres (Ver Figura 31), que ocupam-se de tarefas simples do cotidiano onde o atemporal encontra-se presente nos detalhes de natureza-morta, transformando a representao da realidade em um grande mosaico de superfcies coloridas. A arte de Ver-meer admirada pelas suas cores transparentes, composies inteligentes e brilhante uso da luz.

    A vida e obra de Vermeer est representada no filme de mesmo nome de um de seus quadros Moa com brinco de prola. Assista para saber mais sobre o artista.

    DICA DE FILME

    Figura 31 Johannes Vermeer. Moa com brinco de prola, 1665.

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    3.2.3. A QUESTO DA LUZ NA ARTE BARROCA

    Talvez o principal elemento compositivo na arte barroca seja o uso da luz. Faamos uma reviso para adentrarmos mais um pouco nessa questo. Se a Arte Barroca religiosa fala sobre as limitaes do olhar objetivo, cientfico e racional sobre o mundo, revela e valoriza a existncia de uma subjetividade, um misticis-mo, uma espiritualidade no homem. O que s pde se concretizar por meio de um olhar que percebia a imagem como algo alm dos elementos representados (temticas, personagens, ambientes, etc.), um olhar que compreendeu que a maneira como usamos os elementos formais (como cor, luz, linha, profundida-de e textura) constituem o contedo da obra. O modo de fazer constri o dizer.

    Nas representaes do Barroco ultrapassa-se o aspecto narrativo, que ain-da predominava na arte renascentista, sendo a luminosidade o elemento fun-damental para isso. A luz costumava ser direcionada a uma parte da imagem, deixando o restante banhado em escurido. Em uma obscuridade relativa na imagem (como defendeu Wolfflin), com a qual o artista revela e oculta ao mesmo tempo. O uso dessa luz parcial contrape-se a narrao explcita da arte renascentista defendendo que a claridade total desumanizava o ser humano ao eliminar sua esfera mstica. Podemos observar isto tanto no Bar-roco Protestante de Rembrandt e Veemeer, como no Barroco Corteso do espanhol Velzquez, principalmente em seus retratos de anes, e no Barroco Catlico de Caravaggio. Alm da luminosidade que penetra o ambiente por uma abertura, prestemos ateno ao recurso de pequenas fontes luminosas espalhadas pelos diversos ambientes do jogo: tochas, lamparinas, velas etc. Interessante tambm percebermos como esses elementos so apropriados por obras de outros artistas.

    Aos poucos, a luz que determina a espiritualidade barroca vai cedendo espao para outros elementos compositivos, como o ornato e a superposio de formas. O Barroco esgota-se numa outra esttica, o Rococ, para muitos um Barroco Cansado.

    3.3. ROCOC

    Rococ o estilo artstico que surgiu na Frana como desdobramento do Barroco, mais leve e intimista que aquele e usado inicialmente em decorao de interiores. Desenvolveu-se na Europa do sculo XVIII, e da arquitetura disseminou-se para todas as artes. Vigoroso at o advento da reao neocls-sica, por volta de 1770, difundiu-se principalmente na parte catlica da Ale-manha, na Prssia e em Portugal.

    Os temas utilizados eram cenas erticas ou galantes da vida cortes (as ftes galantes) e da mitologia, pastorais, aluses ao teatro italiano da poca, motivos religiosos e farta estilizao naturalista do mundo vegetal em ornatos e mol-duras. O termo deriva do francs rocaille, que significa embrechado, tcnica de incrustao de conchas e fragmentos de vidro utilizadas originariamente na

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    decorao de grutas artificiais. Na Frana, o rococ tambm chamado estilo Lus XV e Lus XVI. Suas caractersticas gerais so: Uso abundante de formas curvas e pela profuso de elementos decorati-

    vos, como conchas, laos e flores; Leveza, carter intimista, elegncia, alegria, bizarrice, frivolidade e exuberncia.

    Durante o Iluminismo, entre 1700 e 1780, o Rococ foi a principal corren-te da arte e da arquitetura ps-barroca. Nos primeiros anos do sculo XVIII, o centro artstico da Europa transferiu-se de Roma para Paris. O Rococ surgiu na Frana com a obra do decorador Pierre Lepautre e era a princpio apenas um novo estilo decorativo. Principais caractersticas: Cores vivas foram substitudas por tons pastis, a luz difusa inundou os in-

    teriores por meio de numerosas janelas e o relevo abrupto das superfcies deu lugar a texturas suaves.

    A estrutura das construes ganhou leveza e o espao interno foi unifica-do, com maior graa e intimidade. Um dos principais artistas foi Johann Michael Fischer, (1692-1766), responsvel pela abadia beneditina de Ottobeuren, marco do Rococ Bvaro. Grande mestre do estilo rococ, responsvel por vrios edifcios na Baviera. Restaurou dezenas de igrejas, mosteiros e palcios.Na escultura e na pintura da Europa oriental e central, ao contrrio do que

    ocorreu na arquitetura, no possvel traar uma clara linha divisria entre o Barroco e o Rococ, quer cronolgica, quer estilisticamente.Mais do que nas peas esculpidas, em sua disposio dentro da arquitetura que se manifesta o esprito rococ. Os grandes grupos coordenados do lugar a figuras isoladas, cada uma com existncia prpria e individual, que dessa maneira contribuem para o equilbrio geral da decorao interior das igrejas. Principais Artistas: Johann Michael Feichtmayr (1709-1772): escultor alemo, membro de

    um grupo de famlias de mestres da moldagem no estuque, distinguiu-se pela criao de santos e anjos de grande tamanho, obras-primas dos inte-riores rococs.

    Ignaz Gnther (1725-1775): escultor alemo, um dos maiores representan-tes do estilo rococ na Alemanha. Suas esculturas eram em geral feitas em madeira e a seguir policromadas. Anunciao, Anjo da guarda, Piet.Durante muito tempo, o Rococ Francs ficou restrito s artes decorativas

    e teve pequeno impacto na escultura e pintura francesas. No final do reinado de Lus XIV, em que se afirmou o predomnio poltico e cultural da Frana sobre o resto da Europa, apareceram as primeiras pinturas rococs sob influ-ncia da tcnica de Rubens. Principais Artistas: Antoine Watteau, (1684-1721), suas figuras e cenas se converteram em

    modelos de um estilo bastante copiado, que durante muito tempo obscu-receu a verdadeira contribuio do artista para a pintura do sculo XIX.

    Franois Boucher, (1703-1770), as expresses ingnuas e maliciosas de suas numerosas figuras de deusas e ninfas em trajes sugestivos e atitudes graciosas e sensuais no evocavam a solenidade clssica, mas a alegre des-

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    contrao do estilo rococ (Ver Figura 32). Alm dos quadros de carter mitolgico, pintou, sempre com grande perfeio, alguns retratos, paisagens (O casario de Issei) e cenas de interior (O pintor em seu estdio).

    Jean-Honor Fragonard(1732-1806): desenhista e retratista de talento, destacou-se principalmente como pintor do amor e da natureza, de cenas galantes em paisagens idlicas. Foi um dos ltimos expoentes do perodo rococ, caracterizado por uma arte alegre e sensual e um dos mais antigos precursores do impressionismo.

    3.4. PORTUGAL

    Neste texto colocamos os prespios portugueses dentro da arte do Rococ, pois so exemplos em termos de estilo e perodo. Eles foram o refgio da arte de muitos escultores mais sincerosno naturalismo nas representaes da vida popu-lar, do que na estaturia dasacademias. Mesmo nas cenas mais realistas, dos pas-tores ajoelhados ou dafamlia com os meninos a caminho do prespio, o talento da composio, a arteda modelao e o prprio estilo das roupagens exprimem um requinte de gostoque se no encontra na grande estutria da poca.

    Jaime Brasil, no captulodedicado escultura integrado em A Arte Popu-lar em Portugal (II, Lisboa,s.d.) menciona:

    Os autores que melhor se ocuparam das obras dos barristasportugueses do sculo XVIII parece terem-se preocupado mais com aidentificao dos autores de pres-pios do que com as origens em Portugal dessaarte que repetia, miniaturalmente, a grande escultura, embora a despisse daspompas clssicas e da espetacularidade barroca, para s manter a pureza delinhas de umas e o pitoresco de outras, no movimento das personagens, noflutuar das roupagens, na exuberncia das deco-raes. Dir-se-ia que, porvezes, a cena fundamental, o estbulo de Belm, s um

    Figura 32 Fraois Boucher. Moa Reclinada, 1752.

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    pormenor, emboracentral, perdido no meio da figurao.

    Mas se parece no constituir dvida o fato de ter sido o sculo desetecen-tos designado por Diogo de Macedo, o sculo de presepistas o perodoureo da sua produo, no importa lembrar os casos existentes anteriormente.A tal propsito obrigatrio citar o estudo de Fernando Castelo Branco,publi-cado em 1955, sobre Prespios de Lisboa nos sculos XVI e XVII.

    Os prespios seriam ainda mais populares que as peras, pois espalhavam-se portoda a cidade instalando-se em qualquer local improvisado para o efeito. Masse eram populares no era s o povo que gostava de a eles assitir pois assinalada a sua presena na Capela Real. Os autos da Natividade e dos ReisMagos seriam a componente sacra do repertrio. A parte profana desserepertrio incluiria represen-taes claramente satricas com personagens esituaes caractersticas.

    No Rococ h o excesso de elementos, leveza pictrica, temas do cotidia-no. Isso faz com que reformistas comecem a preparar uma contraposio ao que eles acreditavam ser um amaciamento na arte. Essa resposta seria o Ne-oclassicismo. Veja no quadro abaixo as principais diferenas entre os estilos.

    ROCOC NEOCLASSICISMO

    CONTEXTO HISTRICO

    Primeira metade dos sculos XVIII; Absolutismo; Mercantilismo; Luiz XV;

    Segunda metade sculo XVIII; Iluminismo; Revoluo Francesa; Napoleo ;

    CARACTERSTICAS DA PINTURA

    Temas inspirados na frivolidade aris-tocrtica e nos episdios galantes; Pinceladas rpidas, leves e delicadas; Cores claras e luminosas com predo-minncia de rosas, azuis, verdes e lilases; Tcnica do pastel; Aparecimento de retratistas femininos; Gosto na alta sociedade pela prtica das artes;

    Formalismo na composio, refletindo racionalismo dominante; Exatido nos contornos; Harmonia do colorido; Retorno aos antigos modelos cls-sicos greco-romanos; Temas ricos de sugestes morais e intelectuais; Arte dirigida e de estilo interna;

    TEMTICA

    Alegria dos nobres e cenas domsticas; Sales luxuosos e reunies em jardins; Cenas erticas carnes femininas Valores emocionais;

    Culto s virtudes cvicas mais rgidas; Reao social e moral herosmo; Universo exclusivamente masculino; Valores intelectuais;

    PRINCIPAIS REPRESENTAES

    Watteau; Boucher; Fragonard; Greuze; Chardin;

    David; Ingres; Mengs; Gros; Kauffmann;

  • Por Neoclassicismo definido o movimento dominante na arte e na arqui-tetura europias do final do sculo XVIII e parte do sculo XIX que ambicio-nava retomar os padres da arte antiga, em particular os padres da arte de Grcia e de Roma. Para esse movimento, a arte do Barroco e a arte Rococ, estilos anteriores, esto associadas desmedida, ao excesso de detalhes orna-mentais, que tornariam frvolas as representaes. Em oposio, o Neoclas-sicismo opta por um rigor formal e por uma valorizao da tcnica. Essa va-lorizao envolve a defesa do projeto, isto , a necessidade do desenho como base para a execuo da obra.

    O renovado entusiasmo do Neoclassicismo pela arte antiga, o destaque dado ao esprito herico e aos padres decorativos da Grcia e Roma, esto diretamente relacionados com as pesquisas arqueolgicas, em particular com as descobertas das cidades de Herculano, em 1738, e Pompia, em 1748. Esse um dos aspectos do carter mais cientfico do interesse do Neoclassicismo pela Antiguidade Clssica. Seu principal terico o historiador da arte e ar-quelogo Joachim Johann Winckelmann (1717-1768), que destaca da arte clssica a nobre simplicidade e calma grandeza, que deveriam ser incorpo-rados pela Arte Neoclssica.

    O estilo neoclssico na Franca est associado a fortes implicaes morais e ao desejo de mudana na viso da sociedade, que passa por dotar a vida cvica de antigos valores romanos. Na era do Iluminismo, compreensvel que va-lores como ordem, clareza e racionalidade, associados arte grega e romana, fossem eleitos como princpios formais.

    A Arte Neoclssica apresenta uma tendncia que valoriza e ressalta a vir-tude cvica, o desprendimento. O interesse comum, a igualdade, sobreposto ao interesse individual, seria uma virtude, exemplo de virtude cvica. Nesse sentido, as obras de arte deveriam ressaltar a gestos virtuosos, representati-vos da qualidade de quem tem a disposio para fazer o bem e defender o interesse de todos ou da maioria. Atos exemplares do passado deveriam ser pintados, apresentados na forma de cenas artsticas. Com isso no se preten-dia sobrepor o passado ao presente, mas dar destaque ao presente histrico e o quanto essa historicidade estava associada dimenso clssica da cultura.

    A idia de virtude cvica presente nos temas das pinturas neoclssicas no contemplativa. Ela compreendida como uma atividade que reafirma a dis-posio para fazer o bem, para trabalhar a favor do bem comum num perodo

    UNIDADE 4 O NEOCLASSICISMO

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    que se via em transformao, quando uma nova ordem, como podia se de-preender de acontecimentos como a Revoluo Francesa, estava em constru-o. Era preciso dar exemplo, assumir a exemplaridade, a idia de dever em funo do tempo de transformao e ao qual era necessrio se sacrificar. A virtude vista como uma atividade e no como contemplao significava um aperfeioamento constante. Exercer a virtude significava aperfeioar o espri-to, desenvolvendo a tendncia para o bem e o envolvimento com o interesse comum acima do pessoal.

    A arte deveria ressaltar essas qualidades. Mas para apresentar esses ele-mentos, destac-los, precisaria formular um estilo que no se perdesse em concesses aos devaneios pessoais ou a uma introspeco contemplativa. Para isso adota uma temtica edificante, uma temtica que buscou inspirao em acontecimentos do passado, nos feitos de Esparta e da Repblica Roma-na. Cenas que representam gestos de herosmo, desprendimento, que permi-tem atravs da pintura manifestaes sensveis do dever.

    A Frana foi o centro da Arte Neoclssica. E a Revoluo Francesa foi im-portante para isso, seus acontecimentos influenciaram os rumos do modelo clssico representado pelo Neoclassicismo, que adquiriu sentido tico e moral, deu relevncia histrica para as mudanas na viso do mundo social e na vida cotidiana. Sobretudo, com a Revoluo Francesa, a Arte Neoclssica no se preocupava em enaltecer um passado pura e simplesmente. Os acontecimentos do presente que deveriam se revestir da grandeza herica daquele passado. Vincular-se ao passado no Neoclassicismo assume assim um aspecto singular.

    Em Portugal o estilo neoclssico pode ser encontrado no Palcio da Ajuda (Lisboa), cujas obras tiveram incio em 1796, viu o seu projeto escultrico concretizado entre 1813 e 1833. As esculturas colossais, destinadas aos ni-chos do Vestbulo nascente do Palcio foram elaboradas sob a maestria bar-roca de Machado de Castro e o estilo inovador canoviano de Joo Jos de Aguiar. A temtica escolhida, alusiva ao virtuosismo humano, encarna inten-cionalmente no soberano portugus, que numa conjuntura socio-econmica e poltica fragilizada, necessita de uma garantia que assinale a perenidade de-las e dos valores que lhe so inerentes.

    4.1. O CLASSICISMO DE DAVID

    Jacques-Louis David (1748-1825), pintor francs, foi um dos expoentes do neoclassicismo. Em pinturas como O Juramento dos Horcios, A Morte de Scrates, Brutus e seus Filhos Mortos e Marat Assassinado (Figura 33), David tornou-se o lder do Neoclassicismo. Dissemos acima que os valores da arte neoclssica esto associados ao desenvolvimento de um estilo afinado com a representao de cenas de herosmo e desprendimento, que signifi-cassem manifestaes sensveis do dever. Essas pinturas de David expressam bem esse estilo pinturas que fizeram dele o expoente da Arte Neoclssica. Mas ele tambm foi reconhecido como o pintor da Revoluo e pintor oficial

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    de Napoleo, a quem glorificou atravs de suas obras. Entre essas pinturas est a gigantesca Coroao de Napoleo, que marca uma mudana tcnica e estilstica na arte de David, se comparadas s citadas anteriormente. Foi um excelente pintor de retratos.

    4.2. MULHERES ARTISTAS DO NEOCLSSICO

    A personalidade e a importncia do pintor David no perodo Neoclssico no foi o nico entrave para que o grupo de mulheres artistas, ativamente produzindo naquelas dcadas, fosse eclipsado nos registros da produo ar-tsticas daquele perodo.

    O pintor Frances David gozou de imenso prestgio como revolucionrio e como pintor de Napoleo de 1780 at seu exlio em 1816. Foi um professor bastante popular e sua atuao na reforma dos Sales foi significativa pois os abriu para a participao de mulheres. Assim, o nmero de trabalhos de mulheres cresceu de forma impressionante passando de 28 para 67 obras em 1822. David no s abriu para que as mulheres exibissem seus trabalhos como tambm recebeu um nmero considervel de alunas em seu atelier nos primeiros anos do sculo XIX.

    Ele incentivava suas alunas a pintarem tanto retratos como temas his-tricos e a submeterem os trabalhos regularmente para os sales. De certa forma, esses trabalhos eram feitos no estilo de daviano. Essas mulheres do crculo de David alcanaram no sculo XVIII prestgio e visibilida-de, mas foram depois apagadas da histria e muitos dos quadros foram atribudos ao prprio David gerando contnuas revises. Por exemplo, o Retrato de Charlotte du Val dOgnes atribudo a David, foi reatribudo a pintora Constance Marie Charpentiere em 1951 e mais tarde reatribudo a Marie-Denise Villers.

    Figura 33 Jacques-Louis David. Juramento dos Horcios, 1793.

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    4.2.1. LISABETH-LOUISE VIGE LE BRUN

    lisabeth-Louise Vige Le Brun (1755-1842 foi uma retratista bem con-siderada e gozou das graas da Famlia Real Francesa (Ver Figura 34). Teve estabilidade at a aristocracia ser banida pela Revoluo Francesa. Viajou en-to para a a Itlia, Rssia e ustria. Um admirador escreveu que ela pintou retratos de quase todas as figuras proeminentes na Europa e na Rssia, apro-ximadamente, entre 1770 e 1835. Em primeiro lugar, na Acadmie de Saint Luc em 1774 e, em seguida, na Acadmie Royale de Peinture et de Escultura em 1783, na Accademia di San Luca, em Roma, na Academia de Belas Ar-tes de So Petersburgo e, mais tarde, no suo Socit pour lAvancement des Beaux-Arts . Foi uma pintora cosmopolita.

    Muitas outras mulheres pintaram e participaram dos Sales nesse perodo tais como Marie Gabrielle Capet, Csarine Davin-Mirvault e Adlade Labille-Guiard. interessante notar como os auto-retratos dessas artistas enfatizam o ato de pintar, assim como Caterina no Renascimento e Artemsia no Barroco. Ser que previam ou sabiam que cariam no esquecimento no tempo futuro?

    PARA REFLETIR

    Figura 34 - lisabeth-Louise Vige Le Bruns. Marie-Antoinette e seus filhos, 1787.

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    4.3. HOMENS ARTISTAS NO NEOCLASSICISMO

    Jean Auguste Dominique Ingres, conhecido por Ingres, (1780 1867) foi um pintor francs representante do chamado estilo Neoclssico e mais importante sucessor de David , seu mestre. Suas obras ressaltam mestria na representao do nu feminino, em composies inspiradas nas pinturas e nos baixos-relevos antigos. As formas, de contornos ntidos e concisos consti-tuem representaes de belezas incomparveis.

    A pintura de Ingres revela profundidade psicolgica e exatido fsica em suas composies. As linearidades de suas composies revelam o desenho suave que se mescla suavidade cromtica, cores claras destacando a lumino-sidade presente nas cenas. Os tons escuros foram usados com objetivos claros de criar contrastes, revisitando os grandes mestres. As distores de suas figu-ras o tornam um precursor da arte moderna (Ver Figura 35).

    Da temtica utilizada por Ingres destaca-se, na sua fase final, o gosto pelo extico, de que so exemplo A Odalisca e o Banho Turco (Figura 36). No entanto, foi como desenhador retratista de figuras pblicas e da sociedade que alcanou notoriedade. Mais raramente, foi paisagista e pintor histrico.

    Figura 35 Jean Auguste Dominique Ingres. A Grande Odalisca, 1814.

    Figura 36 - Jean Auguste Dominique Ingres. Banho Turco.

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    4.3.1. JOAQUIM MACHADO DE CASTRO

    A esttua eqestre de D. Jos (Figura 37), que analisamos, foi elaborada nos anos de 1774 e 1775. Este trabalho, feito em bronze, foi a primeira es-ttua eqestre realizada em Portugal. O seu transporte, do Arsenal do Exr-cito at Praa do Comrcio, fez-se, em procisso solene, a 22 de Maio de 1775. No dia 6 de Junho, dia do aniversrio do monarca, a esttua de 14 metros de altura (contando com o pedestral), foi descoberta no meio de esplendorosas celebraes.

    As alegorias ao Iluminismo, que fazia o seu caminho por toda a Europa, chegam a Portugal como podemos ver nesta construo cnica. Alm do ato de esmagar as serpentes aos ps do cavalo real, outras alegorias so visveis, retratando a sabedo-ria, a sageza, a persistncia e a fora do poder real. No magnfico pedestal em pedra, aparece ainda, alm do escudo real, o retrato do primeiro-ministro Sebastio de Carvalho e Melo, mais tarde transformado em Marqus de Pombal. O rei, vestindo uma capa e um elmo de plumas, monta um magnfico cavalo que pisa as serpentes da ignorncia. Esta talvez a alegoria mais pungente desse conjunto eqestre.

    4. 4. CONEXES COM O CONTEXTO DAS ARTES NO BRASIL

    Renascimento, Maneirismo, Barroco, exacerbao Rococ, novas raciona-lidades do Neoclacissismo. Como voc deve ter percebido o que chamamos e organizamos como Histria da Arte no um movimento linear, um ir e vir, feito de restauraes e rupturas de acordo com o contexto poltico, social, eco-nmico, religioso de cada poca. O que estudamos nessa disciplina configura

    Figura 37 Joaquim Machado de Castro. Esttua Eqestre de D. Jos.

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    uma base muito importante para entender uma vertente da arte brasileira, pois a Frana desse perodo se torna a fonte na qual nossos artista vo beber.

    Na montagem da academia brasileira - batizada em 1826 com o nome de Imperial Academia de Belas Artes -, a viagem Europa desempenhou, desde o incio, um papel estratgico: permitia que os aspirantes carreira artstica se defrontassem com as obras e os ensinamentos dos grandes mestres estudados nesse mdulo. Esses funcionavam como modelos que deveriam guiar a produ-o dos mais jovens, lies a serem incorporadas. Foi durante a gesto de Flix mile Taunay, em 1844, com a regulamentao do Prmio de Viagem aos me-lhores alunos, que finalmente se concretizou a meta de enviar alunos ao exte-rior. At 1855, Roma, vista como o bero do classicismo, constitua o principal destino dos estudantes. Mas, aos poucos, a capital italiana cedeu espao para Paris, alada condio de metrpole cultural do sculo XIX. A Cidade Luz concentrava o mais notvel conjunto de instituies artsticas de outrora, como o enciclopdico Museu do Louvre, a escola de formao de artistas acadmicos mais reputada mundialmente - cole des Beaux-Arts (EBA) - e o espao por excelncia de consagrao dos artistas: o afamado Salon Anual. Paralelamente a essas imponentes instituies, publicamente governadas, havia toda uma rede de atelis de artistas e escolas particulares que orbitavam o sistema oficial que tambm serviram de espao de aprendizagem para artistas brasileiros, muitas vezes, transgredindo as rgidas regras do academicismo.

    Tamanha concentrao de atrativos seduzia jovens aspirantes s carreiras artsticas dos quatro cantos do mundo, com percursos e motivaes bastante diversas. Entre eles alguns no passavam de amadores endinheirados em bus-ca de refinamento cultural, vendo nas belas-artes um passatempo importante e estimulante; outros aproveitavam os perodos de frias para receberem lies de mestres renomados e, em especial, havia aqueles que eram obrigados, por serem bolsistas da academia nacional, a estagiarem em instituies previamen-te escolhidas dentro de um rgido programa de estudos. Mas isso voc pode estudar na disciplina Matrizes Culturais da Arte Brasileira na vertente europia.

    Esperamos que voc tenha aproveitado as informaes e reflexes apre-sentadas. No esquea que elas podem e devem ser aprofundadas, servindo no para um acmulo de conhecimentos, mas como base para a construo de suas prprias posies.

    Divirta-se aprendendo. No site http://artequizz.free.fr/, voc pode testar sua aprendizagem e curiosidades em artes visuais. As perguntas esto em ingles, francs, espanhol, assim, alm de arte, estaremos tambm exercitando nosso vocabulrio e cognio ao aceitar desafios em outro idioma. Vamos l. Discu-ta o site e as suas descobertas com os colegas! Visite ainda o site Do Feminino e Do Masculino. No endereo virtual: www. nastintasparaasregras.blogspot.com.

    SAIBA MAIS

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ARGAN, Giulio Carlo. Clssico anticlssico. O Renascimento de Brunel-leschi a Bruegel. So Paulo: Cia. das Letras, 1999.GOMBRICH, E.H. A histria da arte. 4 ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985.CHASTEL, Andr. A arte italiana. So Paulo: Martins Fontes, 1991.CHILVERS, Ian (org.). Dicionrio Oxford de arte. 2.ed. So Paulo: Martins Fontes, 2001.JANSON, H. W. Iniciao a histria da arte. 2.ed. ed. So Paulo: Martins Fontes, 1996.NAVES, Rodrigo. Debret, o neoclassicismo e a escravido. In: ______. A Forma difcil: ensaios sobre arte brasileira. So Paulo: tica, 1996.