“Hegel e a Tradição Hermética”, Glenn A
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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H
Hegel e a tradio
hermtica, Glenn A. Magee
POR LEONILDO TROMBELA JNIOR / FILOSOFIA, REVISTA / MAI 2014
Traduo da introduo a Hegel and the
Hermetic Tradition (2001)
Deus somente Deus enquanto conhece a si mesmo;
Seu prprio autoconhecimento , ademais, um
autoconhecimento no homem e o saber do homem
acerca de Deus que se prolonga at ao
autoconhecimento humano em Deus.
Hegel, Enciclopdia das cincias filosficas. 564
Hegel como pensador hermtico
egel no um filsofo. Ele no amante ou
buscador da verdade, pois ele acredita que j
a encontrou. Hegel escreve no prefcio da
Fenomenologia do Esprito: Colaborar para que a
filosofia se aproxime da forma da cincia da meta em
que deixe de chamar-se amor ao saber para ser saber
efetivo isto o que me proponho. No fim da
Fenomenologia Hegel diz ter chegado ao Conhecimento
Absoluto, que ele identifica como sabedoria.
Notas
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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A afirmao de ter atingido a sabedoria
completamente contrria concepo original grega da
filosofia como amor sabedoria, isto , a busca
incessante pela sabedoria em vez da possesso final
dela. A afirmao dele, todavia, totalmente coerente
com as ambies da tradio hermtica uma corrente
de pensamento que deriva seu nome da chamada
Hermetica (ou Corpus Hermeticum) , uma coleo de
tratados e dilogos gregos e latinos escritos nos dois
primeiros sculos da era crist e que provavelmente
contm ideias que vm de muito antes. O lendrio autor
dessas obras Hermes Trismegistus (Hermes, o trs
vezes grande). O hermetismo representa uma vasta
tradio de pensamento que surgiu dos escritos de
Hermes e foi expandida e desenvolvida por meio da
infuso de vrias outras tradies. Assim, a alquimia, a
cabala, o lullismo e o misticismo de Eckhart e Cusa
para citar apenas alguns exemplos passaram a ser
entrelaados com as doutrinas hermticas. (Com efeito,
o hermetismo usado por alguns autores para se
referir somente alquimia. ) O hermetismo s vezes
chamado de teosofia ou esoterismo; com menos
preciso, frequentemente caracterizado como
misticismo ou ocultismo.
A tese deste livro de que Hegel um pensador
hermtico. Mostrarei que h impressionantes
correspondncias entre a filosofia hegeliana e a
teosofia hermtica, e como essas correspondncias no
so acidentais. Hegel estava diligentemente interessado
no hermetismo: ele foi influenciado por expoentes
desde a sua juventude, e ele mesmo se aliou a
movimentos e pensadores hermticos ao longo da sua
vida. E no que eu simplesmente defenda que ns
possamos conhecer Hegel como um pensador
hermtico assim como podemos conhec-lo como um
pensador alemo da Subia. No. Eu defendo que
1. Antoine Faivre. Access to
Western Esotericism, vol. I
(Albany: State University of
New York Press, 1994), p. 35.
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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devemos conhecer Hegel como um pensador hermtico
ou no o entenderemos de maneira alguma.
A vida e as obras de Hegel oferecem uma abundncia de
exemplos para sustentar esta tese.
H referncias ao longo dos escritos publicados e no
publicados de Hegel endereados a vrias das figuras
eminentes e movimentos da tradio hermtica. Essas
referncias so em grande maioria aprobatrias. Isso
particularmente verdadeiro no caso do tratamento que
Hegel d a Eckhart, Bruno, Paracelsus e Bhme. Este
ltimo o exemplo mais notvel de todos. Hegel
concede-lhe um considervel espao em suas
Conferncias sobre a Histria da filosofia mais
espao, alis, do que ele concede a vrios dos principais
pensadores da tradio filosfica.
H, alm disso, numerosos elementos hermticos nos
escritos de Hegel. Eles incluem, de modo geral, um
subtexto manico de iniciao mstica na
Fenomenologia do Esprito; um subtexto bhmiano
no famoso prefcio da Fenomenologia; uma influncia
cabalstica-bhmiana-lulliana na Lgica; elementos
alqumicos-paracelsianos na Filosofia da Natureza;
uma influncia do milenarismo cabalstico e joaquimita
na doutrina do Esprito Objetivo e da teoria da histria
do mundo hegelianas; imagens alqumicas e
rosacrucianas na Filosofia do Direto; uma influncia da
tradio hermtica da pansofia no sistema hegeliano
como um todo; um endosso da crena hermtica na
philosophia perennis; e o uso de formas simblicas
hermticas perenes (como o tringulo, o crculo e o
quadrado) como recursos estruturais e arquitetnicos.
A biblioteca de Hegel inclua escritos hermticos de
Agrippa, Bhme, Bruno e Paracelsus. Ele leu muito
sobre mesmerismo, radiestesia psquica fenomenal,
2. v. Ernst Benz, The Mystical
Sources of German Romantic
Philosophy, trad. Blair R.
Reynolds e Eunice M. Paul
(Allison Park, Pa.: Pickwick
Publications, 1983), p. 2.
3. Ibid., p. 2.
4. Ibid., p. 2.
5. A bibliografia (presente no
final da obra) contm todas as
informaes sobre todas as
obras mencionadas nesta
introduo. Em geral, eu
mencionei apenas livros aqui.
Na bibliografia, tanto livros
quanto artigos esto listados.
6. M. M. Cottier refere-se
filosofia de Hegel como Une
Gnose christologique [uma
cristologia gnstica] em seu
LAtheisme Du Jeune Marx:
Ses Origines Hegeliennes
(Paris: Vrin, 1969), pp. 20-30.
Eric Voegelin tambm
defendeu, de maneira crtica,
que Hegel um pensador
gnstico, por exemplo, em
Science, Politics, and
Gnosticism (Washington, D.C.:
Regnery Gateway, 1968), pp.
40-44, 67-80.
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premonio e feitiaria. Ele se associou publicamente a
conhecidos ocultistas, sendo um deles Franz von
Baader. Ele estruturou sua filosofia de maneira idntica
ao uso das correspondncias hermticas! Ele contou
com histrias do pensamento que discutiam Hermes
Trimegistus, Pico della Mirandola, Robert Fludd e Knorr
von Rosenroth junto com Plato, Galileu, Descartes e
Newton. Ele declarou em suas conferncias mais de
uma vez que o termo especulativo significa a mesma
coisa que mstico. Ele acreditava em um Esprito do
Terra e se correspondeu com amigos tratando sobre a
natureza da magia. Ele se aliou informalmente a
sociedades hermticas, tais como a Maonaria e a
Rosa-cruz. At mesmo os rabiscos de Hegel eram
hermticos, conforme veremos no captulo 3, quando
discutirmos o misterioso diagrama triangular.
H quatro grandes perodos durante a vida de Hegel aos
quais ele parece ter estado sob forte influncia do
hermetismo, ou pelo menos buscado ativamente esse
hermetismo. Primeiro na sua juventude em Stuttgart,
que foi de 1770 a 1788. Conforme discutirei mais
detalhadamente no captulo 2, durante esse perodo,
Wrttemberg era um grande centro de interesse
hermtico, dado que muitos dos movimentos pietistas
influenciados pelo bhmianismo e rosacrucianismo
(Wrttemberg foi o centro espiritual do movimento
Rosa-cruz). Os principais expoentes do pietismo J. A.
Bengel e em particular F. C. Oetinger foram
fortemente influenciados pelo misticismo alemo, pela
teosofia bhmiana e pela cabala.
Muitos dos estudiosos de Hegel consideraram
desnecessrio considerar esse meio intelectual da
juventude do alemo. Hegel quase universalmente
conhecido como participante do contexto da tradio
filosfica alem e s; como se fosse somente
correspondente a Kant, Fichte e Schelling.
7. J. N. FIndlay, Hegel: A Re-
Examination (New York:
Oxford University Press, 1958),
p. 49.
8. Eric Voegelin, Response to
Professor Altizers A New
History and a New but Ancient
God em Collected Works of
Eric Voegelin, vol. 12,
Published Essays, 1966-1985,
ed. Ellis Sandoz (Baton Rouge:
Louisiana State University
Press, 1990), p. 297.
9. Eric Voegelin, On Hegel: A
Study in Sorcery, Published
Essays, 1966-1985, p. 222; cf.
Science, Politics, and
Gnosticism, p. 68-69 e em seu
Order and History, vol. 5, In
Search of Order (Baton Rouge:
Louisiana State University
Press, 1987), pp. 54-70.
10. v. David Walsh, The Esoteric
Origins of Modern Ideological
Thought: Boehme and Hegel
(Dissertao de Ph.D.,
University of Virginia, 1978). v.
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Desnecessrio dizer que as influncias de Kant, Fichte e
Schelling foram importantes, mas essas no foram as
nicas a serem exercidas sobre Hegel. Parte da razo de
terem esquecido de mencionar ou ignorado as outras
fontes que poucos estudiosos esto familiarizados
com as complexidades da vida religiosa alem do sculo
XVIII. Os que esto familiarizados so quase sempre
oriundos de outras disciplinas no-filosficas e quase
sempre alemes. (O estudo do pietismo alemo um
terreno quase exclusivo dos germanfonos.) A vida
religiosa e intelectual de Wrttemberg , portanto, o
lugar bvio para se comear a entender as prprias
origens intelectuais de Hegel, suas ideias
caractersticas e seus objetivos.
Hegel tem de ser entendido nos termos da tradio
teosfica pietista de Wrttemberg ele no pode ser
simplesmente visto como crtico de Kant. Com efeito,
Hegel, conforme argumentarei, sempre foi um crtico
de Kant e nunca um admirador sincero, precisamente
por que ele foi logo cedo marcado pela tradio da
pansofia, que estava muito viva em Wrttemberg e pelo
ideal de Oetinger da verdade como um Todo (v. captulo
2). Ele no pde aceitar o ceticismo de Kant, tampouco
pde Schelling e por razes idnticas. Ainda assim,
ambos reconheceram a fora do pensamento de Kant e
trabalharam duro para partirem das premissas do
pensador de Konigsberg at chegarem s suas prprias
concluses com o objetivo de conseguirem fugir do
ceticismo a qualquer custo.Tudo em nome do ideal
especulativo de suas juventudes.
De 1793 at 1801, Hegel trabalhou como tutor privado:
primeiro em Berne e depois em Frankfurt. Conforme
discutirei no captulo 3, o bigrafo de Hegel, Karl
Rosenkranz, referiu-se a essa poca como a fase
teosfica do desenvolvimento de Hegel. Nessa poca,
Hegel parece ter se tornado familiarizado com as obras
tambm The Mysticism of
Innerworldly Fulfillment: A
Study of Jacob Bhme
(Gainesville: University
Presses of Florida, 1983), The
Historical Dialectic of Spirit:
Jacob Bhmes Influence on
Hegel em History and and
System: Hegels Philosophy of
History, ed. Robert L. Perkins
(Albany: State University of
New York Press, 1984), p. 28 e
A Mythology of Reason: The
Persistence of Pseudo-Science
in the Modern World em
Science, Pseudo-Science, and
Utopianism in Early Modern
Thought, ed. Stephen A.
McKnight (Columbia:
Universityof Missouri Press,
1992).
11. Alm dos escritos publicados
de Hegel, as fontes primrias
s quais recorri incluem
cartas, manuscritos, notas
tomadas em conferncias,
notas de alunos e relatrios
feitos por seus
contemporneos acerca das
observaes orais do prprio
Hegel. As notas tomadas por
alunos foram publicadas como
Zustse na Enciclopdia das
Cincias Filosficas e nas
edies publicadas das
conferncias de Hegel sobre
histria da filosofia, arte,
religio e histria do mundo,
que em grande parte foram
publicadas a partir de notas
tomadas pelos alunos.
12. Alm do uso da imagtica
rosacruciana por Bacon, da
procura que Descartes fez
Rosa-cruz, da dvida de
Spinoza cabala, da
fascinao de Leibniz pelo
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de Bhme, assim como as de Eckhart e Johannes Tauler.
Tambm durante esse perodo, Hegel se envolveu com
crculos manicos.
Em Jena (1801-1807), o interesse de Hegel pela teosofia
continuou. Ele realizou longas conferncias de tom
aprobatrio sobre Bhme e Bruno. Ele comps vrios
textos que s chegaram a ns de maneira
fragmentada empregando linguagem e simbolismo
hermticos (v. captulos 3 e 4). Suas conferncias sobre
filosofia da natureza nessa poca refletem um
duradouro interesse em alquimia. provvel que
Schelling, que fora Jena pouco antes, tenha
introduzido Hegel ao seu crculo de amigos, que inclua
uma poro de romnticos fortemente interessados no
hermetismo. O prprio Schelling era um vido leitor de
Bhme e Oetinger e provavelmente encorajou esse
interesse de Hegel.
O ltimo perodo hermtico da vida de Hegel foi em
Berlim, indo de 1818 at a sua morte em 14 de novembro
de 1831. Isso vai contra o que se espera. Pode-se supor
que o hermetismo de Hegel tenha sido uma mera
aberrao de juventude superada pelo
arquirracionalista conforme ele foi amadurecendo.
Supreendentemente, parece que precisamente o
contrrio. Em Berlim, Hegel formou uma amizade com
Franz von Baader, o principal mstico e ocultista da
poca. Juntos eles estudaram Meister Eckhart. O
prefcio edio de 1827 da Enciclopdia das Cincias
Filosficas em Compndio cita proeminentemente
Bhme e Baader. Sua edio revisada de 1832 de A
Cincia da Lgica corrige uma passagem para poder
incluir uma referncia a Bhme. Seu prefcio edio
de 1821 da Filosofia do Direito inclui imagens
alqumicas e rosacrucianas. Em suas Conferncias
sobre a Filosofia da Religio de 1831 v-se a influncia
do mstico Joaquim de Fiore, assim como certas
rosacrucianismo, cabala e
alquimia e da fascinao que
Newton tinha com o
milenarismo e com a
alquimia, h evidncias
tambm de que Kant estava
interessado nas vises de
Emanuel Swedenborg; de que
Schelling estava interessado
em Bhme, Swedenborg e
Mesmer; de que
Schopenhauer estava
interessado em Bhme,
Swedenborg e Lavater; de que
William James estava
interessado em Swedenborg,
Fechner, espiritualismo e
percepo extra-sensorial; de
que C. S. Peirce estava
interessado em Swedenborg e
Bhme; de que C. D. Broad
estava interessado em
percepo extra-sensorial; e,
nos dias de hoje, de que
Michael Dummett est
interessado em cartas de tar
(Michael Dummett, The
Visconti-Sforza Tarot Cards
[New York: G. Braziller, 1986]).
13. Antoine Faivre escreve que o
hermetismo passou a ser
usado para designar a atitude
geral do esprito [ou
mentalidade] que subjaz a
uma variedade de tradies
e/ou correntes paralelas
alquimia, tais como
hermetismo [a religio do
Corpus Hermeticum],
astrologia, cabala, teosofia
crist e philosophia oculta ou
magia (no sentido que essas
duas palavras adquiriram na
Renascena, isto , de uma
viso mgica da natureza que
a entendia como um ser vivo
repleto de sinais e
correspondncias que
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estruturas correspondentes ao pensamento de Bhme.
Em suma, todas as evidncias indicam que, no ltimo
perodo da sua vida, o interesse de Hegel pelas
tradies mstica e hermtica se intensificou, alm de
ele ter se tornado mais ousado ao se alinhar
publicamente a movimentos e pensadores hermticos.
As divises da filosofia de Hegel seguem um padro que
tpico de vrias formas da filosofia e da mstica
hermtica. A Fenomenologia representa um estgio
inicial de purificao da ascenso do esprito acima
do nvel do sensitivo e do mundano, uma preparao
para a recepo da sabedoria. A Lgica a equivalente
ascenso hermtica ao nvel da pura forma, do
eterno, do Esprito Universal (Ideia Absoluta). A
Filosofia da Natureza descreve uma emanao ou
alienao do Esprito Universal na forma do mundo
espao-temporal. Suas categorias cumprem uma
transfigurao do natural: ns passamos a ver o mundo
como reflexo do Esprito Universal. A Filosofia do
Esprito efetua um retorno da natureza criada ao
Divino por meio do homem, que pode se elevar acima
do mero natural e atualizar Deus no mundo por meio
das formas concretas de vida (e.g., o Estado e a religio)
e pela filosofia especulativa.
Os estudos sobre Hegel e a tradio hermtica
importante salientar que essas afirmaes no seriam
particularmente controversas nas dcadas que se
seguiram morte de Hegel. Na dcada de 1840,
Schelling acusou Hegel publicamente de ter extrado
muito da sua filosofia de Jakob Bhme. Um dos
discpulos de Hegel, Friedrich Theodor Vischer, uma
vez perguntou: Vocs se esqueceram que a nova
filosofia veio direto da escola dos antigos msticos,
especialmente de Jakob Bhme? . Outro hegeliano,
Hans Martensen, autor de um dos primeiros estudos
poderiam ser decifradas e
interpretadas). v. Faivre,
Renaissance Hermeticism
and Western Esotericism em
Gnosis and Hermeticism, ed.
Roelof van den Broek e Wouter
J. Hanegraaf (Albany: State
University of New York Press,
1998), p. 110. Faivre faz uma
distino entre
hermeticismo e
hermetismo, sendo que
este ltimo designa o Corpus
Hermeticum e seu meio
intelectual.
14. Nota do tradutor: salutar
notar que isso na verdade seria
o desmo. Na crena
catlica tem-se a Igreja, que
o Corpo Mstico de Cristo, e os
Sacramentos que, mais do que
prximos, vo at o mago de
cada um.
15. Hermetica, trad. Brian
Copenhaver (Cambridge:
Cambridge University Press,
1992), p. 20
16. Ibid., p. 30.
17. Ibid., p. 56.
18. Tuveson, entretanto, vai
muito alm quando identifica
essa posio com o
hermetismo stricto sensu e
rejeita outros aspectos tais
como o interesse em alquimia
e correspondncias como se
fossem acidentais ou no
verdadeiramente
hermticos. Ernest Lee
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acadmicos sobre Meister Eckhart, observou que O
misticismo alemo a primeira forma pela qual a
filosofia alem se revelou na histria do pensamento
(filosofia para os hegelianos geralmente significa a
filosofia de Hegel) . Willhelm Dilthey observou a
mesma continuidade entre o misticismo alemo e a
filosofia especulativa.
Possivelmente o mais famoso estudo sobre os aspectos
hermticos em Hegel feito no sculo XIX foi Die
christlich Gnosis (1835) de Ferdinand Christian Bauer.
A obra de Bauer foi uma das primeiras a tentar definir o
gnosticismo e distinguir suas diferentes formas. O
termo gnstico usado de maneira muito dissoluta
mesmo na nossa poca, e muito frequentemente o que
seria mais apropriadamente nominado como
hermtico acaba por ser taxado de gnstico.
(Discutirei a diferena entre os dois na prxima seo).
Aps uma longa discusso sobre o gnosticismo na
antiguidade, Bauer argumenta que Jakob Bhme foi um
gnstico moderno e que Schelling e Hegel podem ser
vistos como herdeiros intelectuais de Bhme e,
portanto, gnsticos. A obra Die christliche Gnosis a
coisa mais prxima de um livro sobre Hegel e a tradio
hermtica que foi publicado, embora, como j disse, o
foco de Bauer tenha sido o gnosticismo e no o
hermetismo . Em 1835, Ludwig Noack publicou uma
obra em dois volumes, Die Christlich Mystik nach
ihrem geschichtlichen Entwicklungsgange im
Mittelalter und in der neueren Zeit dargestellt, onde ele
trata os idealistas como representantes modernos do
misticismo.
Discusses ulteriores acerca da ligao de Hegel com o
hermetismo so frequentemente ligadas a discusses
similares acerca de Schelling. Acontece isso com a obra
Mystical Sources of German Romantic Philosophy de
Ernst Benz, que breve, mas considerada indispensvel
Tuveson, The Avatars of Thrice
Great Hermes: Na Approach to
Romanticism (Lewisburg, Pa.:
Bucknell University Press,
1982), p. 15-16; p. 34.
19. Copenhaver, p. 33.
20. Ibid., p. 42.
21. Garth Fowden, The Egyptian
Hermes: A Historical
Approach to the Late Pagan
Mind (Princeton, N.J.:
Princeton University Press,
1986), p. 104.
22. Nota do tradutor:
precisamente a gratuidade,
pelo menos no cristianismo, a
essncia primeira do amor. O
autor aparentemente quis
deixar a entender que h
aqueles que s acreditam em
amor se houver algum
interesse escuso.
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pelos principais estudiosos da rea. Em 1938, o
estudioso alemo Robert Schneider publicou Schellings
und Hegels scbwbische Geistesahnen em Wrzburg.
Muitas das cpias do livro de Schneider foram
destrudas durante o bombardeio das tropas aliadas a
Wrzburg em 16 de maro de 1945. Schneider foi
destrudo junto com elas. Seu livro um valoroso
estudo sobre o pietismo teosfico prevalecente em
Wrttemberg durante as juventudes de Hegel e
Schelling.
Outras obras de autores alemes que lidam com a
relao do misticismo ou hermetismo com o idealismo
alemo e Hegel so Meister Eckhart der Vater der
Deutschen Spekulation. Ein Beitrag zu einer Geschichte
der deutschen Theologie und Philosophie der mittleren
Zeit (1864) de Josef Back; Geschichte der Entdeckung
der deutschen Mystiker, Eckhart, Tauler u. Seuseim 19.
Jahrhundert (1931) de Gottfried Fischer; Die
idealistische Philosophie und das Christentum (1926)
de Emanuel Hirsch; Philosophie und Theologie im
Sptidealismus, Forschungen zur Auseinandersetzung
von Christentum und idealistischer Philosophie im
19.Jahrhundert(1919) eVon Jakob Boehme zu Schelling.
Zur Metaphysik des Gottesproblems (1927) de Fritz
Leese; Die Religion des Deutschen Idealismus und ihr
Ende (1923) de Wilhelm Ltgert e Die Anfange der
Philosophie des deutschen Idealismus (1930) de
Heinrich Maier. H tambm um considervel nmero
de obras holandesas tratando do assunto: Schelling,
Hegel, Fechner en de nieuwere theosophic(1910) de G.
J. R J. Bolland;Het mystieke karakter van Hegels logica
de J. dAulnis de Bourrouills e Hegeliaansch-
theosofische opstellen(1913) de H. W. Mook.
Em francs, a obra Hegel Secret (1968) de Jacques
dHondt um estudo extremamente importante sobre a
relao de Hegel com as sociedades secretas
23. Veja, por exemplo, Gerald
Hanratty, Hegel and the
Gnostic Tradition I,
Philosophical Studies
(Irlanda), p. 30 (1984): pp. 23-
48; Hegel and the Gnostic
Tradition II, Philosophical
Studies (Irlanda), p. 31 (1986-
1987), p. 301-325; Jeff
Mitscherling, The Identity of
the Human and the Divine in
the Logic of Speculative
Philosophy em Hegel and the
Tradition: Essays in Honor of
H. S. Harris, ed. Michael Baur
e John Russon (Toronto:
University of Toronto Press,
1997), pp. 143-161. O
entendimento que
Mitscherling tem do
gnosticismo deriva do
Colquio de Messina sobre as
Origens do Gnosticismo.
Todavia, como observa Roelof
van denBroek, o Colquio de
Messina define o gnosticismo
de maneira to ampla que
ele perde toda a substncia
concreta. V. Broek,
Gnosticism and Hermetism
in Antiquity em Gnosis and
Hermeticism, p.4.
24. Fowden, The Egyptian
Hermes, p. 106.
25. Giovanni Pico della Mirandola,
Oration on the Dignity of Man,
trad. A. Robert Caponigri
(Chicago: Regnery Gateway,
1956), p. 28.
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hermticas, tais como a Maonaria, Illuminati e Rosa-
cruz.
H tambm em ingls um importante corpo de obras
sobre Hegel e o misticismo, que comea com The
Mystical Element in Hegels Early Theological Writings
(1910) de George Plimpton Adams. Frederick Copleston
tambm foi autor de um valioso artigo intitulado
Hegel and the Rationalization of Mysticism [Hegel e a
Racionalizao do Misticismo] em 1971. Provavelmente,
o intrprete de lngua inglesa mais lido, J. N. Findlay,
era ele mesmo um teosofista, e sua interpretao de
Hegel est sintonizada com os aspectos msticos e
hermticos da obra hegeliana. Na obra Hegel: A Re-
Examination(1958), Findlay sugere tentadoramente que
Hegel foi um representante no sculo XIX de parte da
philosophia Germanica perennis . A biografia
intelectual de dois volumes escrita por H. S. Harris
intitulada Hegels Development (1972/1983) contm
digresses acerca da relao de Hegel com Eckhart,
Bhme, Baader e a alquimia. Recentemente, Cyril
ORegan publicou um inovador estudo sobre as razes
msticas da filosofia de Hegel intitulado The Heterodox
Hegel (1994).
At o momento, entretanto, a abordagem mais
influente em lngua inglesa sobre o hermetismo de
Hegel vem de Eric Voegelin. Em seu ensaio Response
to Professor Altizers A New History and a New but
Ancient God, Voegelin admite: Por um longo tempo
eu evitei calculadamente tecer qualquer crtica sria
sobre Hegel em minhas obras publicadas, pois eu
simplesmente no conseguia entend-lo. Isso mudou
quando Voegelin, em seu estudo sobre gnosticismo,
descobriu que Hegel foi considerado pelos seus
contemporneos um pensador gnstico. Voegelin
segue e afirma que o pensamento de Hegel pertence
contnua histria do hermetismo moderno que vem
26. Joseph Campbell,
Transformation of Myth
Through Time (New York:
Harper and Row, 1990), p. 189.
27. Fowden, The Egyptian
Hermes, p. 106.
28. H.S. Harris, Hegels
Development, vol. 2, Night
Thoughts (Oxford: Oxford
University Press, 1983), p. 191.
29. Vondung, Millenarianism,
Hermeticism, and the Search
for a Universal Science. In
Science, Pseudo-Science, and
Utopianism in Early Modern
Thought, ed. Stephen
McKnight, (Columbia:
University of Missouri Press,
1992), p. 132.
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desde o sculo XV . A principal afirmao de Voegelin,
entretanto, encontra-se no ensaio ferozmente
polmico On Hegel: A Study in Sorcery [Sobre Hegel:
Um estudo em feitiaria], onde ele se refere
Fenomenologia do Esprito como um grimrio que
deve ser tomado como uma obra de mgica, pois, com
efeito, ela [a obra] uma das grandes performances de
mgica .
As afirmaes de Voegelin so mpares, na medida em
que ele no diz simplesmente que Hegel foi
influenciado pela tradio hermtica. Ele afirma que
Hegel era parte da tradio hermtica e no pode ser
bem compreendido como algum fora dela.
Infelizmente Voegelin nunca desenvolveu
adequadamente sua tese. Ele nunca pronunciou em
detalhes de que forma Hegel era um pensador
hermtico. Voegelin, contudo, encorajou outros
estudiosos a desenvolver sua tese de maneira mais
sistemtica (e sbria). David Walsh, por exemplo,
escreveu uma importante tese de doutorado intitulada
The Esoteric Origins of Modern Ideological Thought:
Boehme and Hegel (1978) onde ele faz fortes colocaes
acerta da dvida que Hegel tem com Bhme . Gerald
Hanratty tambm publicou um extenso ensaio divido
em duas partes intitulado Hegel and the Gnostic
Tradition [Hegel e a tradio gnstica](1984-87).
At a presente obra, apesar de toda essa atividade
acadmica, ainda no houve um escrito sistematizado,
do tamanho de um livro, sobre Hegel como pensador
hermtico que levasse em conta no apenas sua
evoluo intelectual, mas tambm todo o seu sistema j
amadurecido.
Considero esta obra no apenas uma continuao da
tradio de estudos que citei acima, mas tambm uma
contribuio para o contnuo projeto da histria das
30. Copenhaver, p. 16-17; grifos
meus.
31. Karl Rosenkranz, Georg
Wilhelm Friedrich Hegels
Leben (Darmstadt:
Wissenschaftliche
Buchgesellschaft, 1969), p. 141.
O fragmento referido por
Harris e Knox como A
Suposta Concluso do Sistema
da Vida tica. V. H. S. Harris
e T. M. Knox, System of
Ethical Life and First
Philosophy of Spirit (Albany:
State University of New York
Press, 1979), p. 178.
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ideias cujos pioneiros foram Eric Voegelin, Frances
Yates, Antoine Faivre, Richard Popkin, Allan Debus,
Betty Jo Teeter Dobbs, Paul Oskar Kristeller, D. P.
Walker, Stephen McKnight e Alison Coudert (v.
bibliografia). Esses estudiosos argumentam que o
hermetismo influenciou vrios dos principais
pensadores racionalistas, tais como Bacon, Descartes,
Spinoza, Leibniz e Newton, e desempenhou at ento
um papel pouco apreciado na formao das ideias
centrais e ambies da filosofia moderna e das cincias,
particularmente o projeto de investigao cientfica
progressiva e do domnio tecnolgico da natureza.
certamente uma das grandes ironias da histria que o
ideal hermtico do homem como mago que atinge o
conhecimento total e empunha poderes divinos a fim
de trazer a perfeio ao mundo tenha sido o prottipo
do cientista moderno. Ainda, conforme escreveu Gerald
Hanratty, a disseminao do apelo s tcnicas mgicas
e alqumicas inspiraram uma nova confiana nos
poderes operacionais do homem. Em contraste com as
atitudes passivas e contemplativas que geralmente
prevaleciam durante os primeiros sculos, os
alquimistas e magos da Renascena afirmaram seus
domnios sobre todos os nveis do ser. O hermetismo
substitui o amor sabedoria pelo desejo de poder.
Conforme veremos, o sistema hegeliano a derradeira
expresso dessa busca pelo controle.
O que o hermetismo?
Se Hegel pode ou no ser entendido como hermtico
depende de como definido o hermetismo. Na verdade,
o hermetismo difcil de se definir rigorosamente.
Seus adeptos tendem a compartilhar certos interesses
frequentemente classificados como ocultos ou
esotricos que so mantidos juntos apenas por
familiaridade. Em parte, meu argumento para o
32. Fowden, The Egyptian
Hermes, p. 77.
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hermetismo de Hegel reside em demonstrar que os
interesses de Hegel coincidem com a curiosa mistura de
interesses tpicas dos hermticos. Dentre esses
interesses podemos incluir alquimia, cabala,
mesmerismo, percepo extra-sensorial,
espiritualismo, radiestesia, escatologia, prisca teologia,
philosophia perennis, lullismo, paracelsimo,
joaquinismo, rosacrucianismo, maonaria, misticismo
eckhartiano, sistemas secretos de simbolismo de
correspondncias, vitalismo e simpatias
csmicas.
H, entretanto, um aspecto essencial que tomarei como
definitivo do hermetismo. Ernest Lee Tuveson, na obra
The Avatars of Thrice Greatest Hermes: An Approach to
Romanticism sugere que o hermetismo constitui uma
posio intermediria entre as concepes do deus
pantesta e do Deus judaico-cristo. De acordo com a
tradio de pensamento judaico-crist, Deus
transcende completamente a criao e est distante
dela . Alm disso, Deus totalmente autossuficiente e,
portanto, no precisava ter criado o mundo, de modo
que Ele no teria perdido nada se no o houvesse
criado. Desta maneira, o ato da criao
essencialmente gratuito e livre de qualquer interesse
prprio. Deus cria da pura abundncia, no da
necessidade. Essa doutrina se mostrou insatisfatria
ou at mesmo perturbadora para muitos, pois
segundo esses que se perturbam, isso torna a criao
arbitrria e absurda. O pantesmo, ao contrrio, envolve
totalmente o divino no mundo, de modo que tudo se
torna Deus, at mesmo a lama, os pelos e o p, de
maneira que o divino abstrado da sua exaltao e
sublimidade. Sendo assim, o pantesmo igualmente
insatisfatrio.
O hermetismo uma posio intermediria, pois
afirma tanto a transcendncia do mundo quanto seu
33. v. Cyril ORegan, The
Heterodox Hegel (Albany:
State University of New York
Press, 1994), p. 86.
34. David Kolb, Critique of Pure
Modernity: Hegel, Heidegger,
and After (Chicago: University
of Chicago Press, 1986), p. 42-
43.
35. Klaus Hartmann, Hegel: A
Non-Metaphysical View in
Hegel: A Collection of Critical
Essays, ed. Alasdair MacIntyre
(Notre Dame: University of
Notre Dame Press, 1972), p.
124.
36. Os que fazem a leitura no-
metafsica e antiteolgica
devem arranjar uma maneira
de explicar a seguinte
passagem: Deus o nico
objeto da filosofia. [O
essencial dela ] se ocupar de
Deus, de apreender tudo Nele,
de levar tudo de volta a Ele,
assim como obter tudo que
prprio de Deus e justificar
tudo apenas como originrio
de Deus, como sustentado
atravs da relao com Ele,
como vivido pelo brilho Dele e
como vivente no interior da
prpria mente de Deus.
Assim, filosofia teologia, e
quando se trabalha com a
filosofia ou melhor, na
filosofia se est a servio de
Deus (Lies Sobre a Filosofia
da Religio: 84 e Lies Sobre a
Filosofia do Direito I:3-4)
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envolvimento nele. Deus metafisicamente distinto do
mundo, mas ainda assim Ele precisa do mundo para se
completar. Assim, o ato da criao no gratuito ou
desinteressado, mas necessrio e racional, segundo o
hermetismo. Considere esse trecho do Discurso de
Hermes a Tat: O receptculo de mistura ou a mnada
(Corpus Hermeticum IV): Se me forares a dizer algo
mais atrevido, essencial [Deus] estar prenhe de todas
as coisas para faz-las. Como impossvel que se crie
algo sem um criador, tambm impossvel a esse
criador no existir a menos que ele esteja o tempo todo
criando tudo Ele prprio as coisas que so e aquelas
que no so . Considere tambm o Corpus
Hermeticum X: A atividade de Deus a vontade e Sua
essncia querer que todas as coisas sejam .
Finalmente, considere o Corpus Hermeticum XIV:
Esses dois representam tudo que h: o que vem a ser e
o que o faz; e impossvel separ-los um do outro.
Nenhum criador pode existir sem algo que est por
vir . Assim, de acordo com o hermetismo, Deus
precisa da criao para ser Deus . Essa abordagem
hermtica da criao central tambm ao pensamento
hegeliano.
Mas no para por a: os hermticos no s defendem
que Deus requer uma criao, como tambm tornam
uma criatura especfica, o homem, um agente crucial na
auto-atualizao de Deus. O hermetismo defende que o
homem pode conhecer Deus, e que o conhecimento do
homem sobre Deus necessrio para a completude
deste mesmo Deus. Considere as palavras do Corpus
Hermeticum X: Deus, pois, no ignora a humanidade;
ao contrrio, ele reconhece-se nela completamente e
deseja ser reconhecido. Para a humanidade, essa a
nica libertao: o conhecimento de Deus. a ascenso
ao Olimpo . No Corpus Hermeticum XI pergunta-se
Quem mais visvel que Deus? Eis por que ele fez
37. Louis Dupr, prefcio ao livro
The Heterodox Hegel de Cyril
ORegan, p. ix
38. Martin Heidegger, The Onto-
Theo-Logical Constitution of
Metaphysics in Identity and
Difference, ed. bilngue, trad.
Joan Stambaugh (New York:
Harper and Row: 1969); Walter
Jaeschke, Reason in Religion:
The Formation of Hegels
Philosophy of Religion, trad. J.
Michael Steward e Peter
Hodgson (Berkeley: University
of California, 1990), Die
Religionsphilosophie Hegels
(Darmstadt:
Wissenschaftliche
Buchgesellschaft, 1983),
Speculative and
Anthropological Criticism of
Religion: A Theological
Orientation to Hegel and
Feuerbach, Journal of the
American Academy of Religion
48 (1980): pp. 345-364; Emil
Fackenheim, The Religious
Dimension of Hegels Thought
(Bloomington: Indiana
University Press, 1967);
Malcolm Clark, Logic and
System: A Study of the
Transition from Vorstellung
to Thought in the Philosophy
of Hegel (The Hague:
Martinus Nijhoff, 1971); Albert
Chapelle, Hegel et la religion,
3 vols. (Paris: ditions
Universitaires, 1964-1971);
Claude Bruaire, Logique et
religion chrtienne dans la
philosophie de Hegel (Paris:
ditions du Seuil, 1964);
IwanIljin, Die Philosophie
Hegels also contemplative
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todas as coisas: para que por meio de todas elas voc
possa olhar para ele . Como observa Garth Fowden, o
que Deus ganha da criao o reconhecimento: A
contemplao humana de Deus de alguma maneira
um processo de mo dupla. No apenas o Homem
deseja conhecer Deus, mas Deus tambm deseja ser
conhecido pela mais gloriosa das Suas criaes: o
Homem . Resumidamente, o objetivo do homem
conquistar o conhecimento de Deus (ou a sabedoria de
Deus, teosofia). Ao fazer isso, o homem atende
prpria necessidade de Deus de ser reconhecido. A
sabedoria humana de Deus se torna o conhecimento de
Deus de si mesmo. Desta maneira, a necessidade pela
qual o cosmo criado a necessidade do
autoconhecimento, atingido por meio do
reconhecimento. Variaes dessa doutrina podem ser
encontradas ao longo da tradio hermtica.
importante entender o significado dessa doutrina na
histria das ideias. Na abordagem judaico-crist da
criao, a criao do mundo e a ordem de Deus para que
a humanidade busque conhece-Lo e am-Lo parece
arbitrria, pois no h razo para que um ser perfeito
deva querer ou precisar de algo . Para os hermticos, a
grande vantagem dessa concepo que ela nos diz
porque o cosmos e o desejo humano de conhecer Deus
existem em primeiro lugar.
Essa doutrina hermtica da relao circular entre
Deus e a criao e a necessidade do homem para a
completude de Deus completamente original. No se
acha essa concepo na filosofia. Todavia, ela
recorrente no pensamento hermtico e a principal
identidade doutrinal entre o hermetismo e o
pensamento de Hegel.
Com efeito, ele frequentemente descrito como um
mstico; de fato, at ele mesmo se descrevia como um
Gotteslehre (Berne: Francke,
1946).
39. Em uma carta de 3 de julho de
1826 endereada a Friedrich
August GottreuTholuch (1799-
1877), Hegel escreve: Eu sou
luterano e, por meio da
filosofia, fui definitivamente e
completamente confirmado
no luteranismo. V. Hegel:
The Letters, trad. Clark Butler
e Christianne Seiler
(Bloomington: Indiana
University Press, 1984), p. 520;
cf. Johannes Hoffmeister,
Briefe von und an Hegel, 4
vols. (Hamburg: Felix Meiner,
1952-1961). Hoffmeister
enumera as cartas. Esta a
514a. Doravante, referncias
s cartas de Hegel sero
escritas da seguinte maneira:
Butler, 520; Hoffmeister
#514a. Em 1826 uma pequena
controvrsia surgiu em Berlim
quando um padre que
compareceu a uma
conferncia de Hegel
reclamou ao governo acerca do
contedo alegadamente
anticatlico proferido por
Hegel. O filsofo respondeu:
Fosse para processar-me por
causa das afirmaes que fiz
do alto pdio que causaram
perturbao aos alunos
catlicos, os culpados seriam
somente eles mesmos por
comparecerem a conferncias
filosficas em uma
universidade protestante e
perante um professor que se
orgulha de ter sido batizado e
criado como um luterano, o
que por sinal ainda e
continuar sendo (v. Butler,
532). Em uma crtica no ano de
1829 de K. F. Gschel,
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(v. captulo 4). Mas o misticismo um conceito elstico
que se insere em vrias ideias radicalmente diferentes;
Todas as formas de misticismo buscam de alguma
maneira o conhecimento, a experincia ou a unidade
com o divino. Se nos perguntarmos que tipo de mstico
Hegel , a resposta ser: um hermtico. O hermetismo
frequentemente confundido com outra forma de
misticismo: o gnosticismo (especialmente nos recentes
estudos sobre Hegel) . Tanto o gnosticismo quanto o
hermetismo acreditam que uma centelha divina est
presente no homem, e que ele pode vir a conhecer
Deus. Entretanto, o gnosticismo d uma abordagem
absolutamente negativa da criao. Ele no considera a
criao parte do ser de Deus ou como algo que d a
completude a Deus, tampouco considera que Deus de
alguma forma precise do homem para conhec-Lo. O
hermetismo tambm frequentemente confundido
com o neoplatonismo. Como os hermticos, Plotino
considera que o cosmos um processo circular em que
o Um emana e tudo a Ele retorna. Diferente dos
hermticos, Plotino no considera que o Um completo
pela contemplao que o homem faz Dele. (Sculos
depois, porm, o neoplatonismo de Proclo e da
Renascena foi influenciado pelo hermetismo.)
Outro paralelo entre o hermetismo e Hegel o processo
de iniciao pelo qual a poro intuitiva do intelecto
treinada para ver a Razo inerente ao mundo. Como
observa Fowden, a iniciao hermtica parece dividir-
se em duas partes: uma lida com o autoconhecimento e
a outra com o conhecimento de Deus . Pode ser
facilmente mostrado no simples nvel terico que essas
duas esto intimamente ligadas, segundo os
hermticos. Conhecer verdadeiramente a si estar apto
a fazer um discurso completo sobre as condies do
prprio ser, e isso envolve falar sobre Deus e todo o Seu
cosmos. Como coloca Pico della Mirandola, aquele que
A Revista Terminal um
projeto sem fins
lucrativos que busca
simplesmente reunir e
divulgar bons trabalhos
de traduo, ensaios,
Aphorismen ber Nichtwissen
und absolutes Wissen im
Verhltnisse zur christlichen
Glaubenserkenntnis, Hegel
deixa claro que ele fica
satisfeito ao ter sua obra
tratada como filosofia
crist. Berliner Schriften,
1818-1831, ed. Eva Moldehauer
e Karl Markus Michel
(Frankfurt am Main:
Suhrkamp, 1986).
40. Em Lies sobre a Histria da
Filosofia, Hegel observa que
os arianos, por no
reconhecerem Deus em Cristo,
acabaram com a ideia de
Trindade e,
consequentemente, com o
princpio de toda a filosofia
especulativa (3:20). J. N.
Findlay escreve que todo o
sistema [de Hegel] pode ser de
fato uma tentativa de ver os
mistrios cristos em qualquer
coisa, em todos os processos
naturais, em todas as formas
de atividade humana e em
toda transio lgica (Hegel:
A Re-Examination, p. 131).
41. Em A Cincia da Lgica (vol. I
Enciclopdia das Cincias
Filosficas em Compndio)
Hegel fala sobre o
pensamento representativo:
Quando se encontra
deslocad[o] para a regio pura
dos conceitos, no sabe onde
est no mundo. (3)
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se conhece, conhece todas as coisas em si . Alm
disso, no Oriente Prximo era comum retratar Deus
como um ser pairando estranhamente entre a
transcendncia e a imanncia. Nesses termos, a
conquista da iluminao envolvia de alguma maneira
ver o divino em si mesmo, tornando-se tambm o
conhecedor neste mesmo ato [um ser] divino.
Ns realmente no sabemos se o culto de Hermes
empregou os textos hermticos como escritos
sagrados. Sabemos pouco ou quase nada dos seus ritos
de iniciao e de como eles viveram. Contudo, podemos
dizer, por exemplo, que a iniciao hermtica se difere
da iniciao aos mistrios eleusinos da Grcia Clssica.
fato tambm que pouco sabemos sobre o que
acontecia em Elusis, mas parece ser o caso que a
iluminao l consistia na participao em algum tipo
de experincia arrebatadora cuja inteno era mudar
permanentemente o iniciado . No sabemos qual era
essa experincia, mas sabemos que ela podia acontecer
com jovens e velhos, ricos e pobres, educados e
analfabetos. No esse o caso quando falamos da
tradio hermtica. A salvao para os hermticos se
d, conforme vimos, por meio da gnosis, ou seja, pelo
conhecimento. Isso pode ser atingido somente por
meio do trabalho duro e, portanto, s alguns
conseguem. Hermes citado no Corpus Hermeticum
XVI afirmando que seus ensinamentos mantm oculto
o significado das palavras, escondido do
discernimento daqueles que no merecem.
Seria um erro, contudo, tratar a iniciao hermtica
como algo puramente intelectual. A iluminao no
ocorre ao simplesmente aprender um conjunto de
doutrinas. O iniciado no deve apenas conhecer a
doutrina, mas tambm deve ter a experincia real da
verdade da doutrina. Ele deve ser cuidadosamente
guiado iluminao; com efeito, ele deve explorar os
poemas e contos. Entre
em contato conosco e
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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becos escuros que prometem a iluminao, mas no a
do. Apenas dessa maneira, ir a verdadeira doutrina
significar algo; apenas dessa maneira mudar de fato a
vida do iniciado. Fowden afirma que a iniciao
hermtica encarada como uma experincia
verdadeira que expande todas as capacidades daqueles
que embarcam nela e cita o Corpus Hermeticum IV,
que diz que um caminho extremamente tortuoso
abandonar aquilo a que se est acostumado e se possui
agora para e retraar os prprios passos rumo s
antigas coisas primordiais . Veremos no captulo 4
que Hegel preserva tanto a importncia intelectual
quanto a emocional dessa concepo hermtica de
iniciao.
A iluminao, tanto para os autores da Hermetica
quanto para Hegel, no apenas um evento intelectual:
espera-se que ela mude a vida do iluminado. A filosofia,
para Hegel, trata-se de ser vivenciada . Em suma, o
homem que atinge a Selbstbewusstsein o homem que
se torna selbstbewusst: confiante, auto-atualizado e
no mais um ser humano ordinrio. Klaus Vondung
escreve que O hermtico no precisa escapar do
mundo para se salvar. Ele quer adquirir conhecimento
do mundo para poder expandir a si mesmo e utilizar
esse conhecimento para penetrar no eu divino. O
hermetismo uma gnosis positiva, por assim dizer,
devota ao mundo . Saber tudo de alguma maneira ter
controle sobre tudo. isso que eu chamo do ideal do
homem como mago, concepo nica da Hermetica.
Veja, por exemplo, o Corpus Hermeticum IV: Todos
aqueles que ouviram a proclamao e se imergiram no
esprito [nous] participaram do conhecimento e se
tornaram perfeitos [ou completos, teleioi], pois
receberam esprito. Mas aqueles que perderam o ponto
de proclamao so pessoas de razo [ou discurso,
logikon] porque no receberam o [dom do] esprito e
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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tambm no conhecem o propsito ou os agentes da
sua ida ao nous . Em outras palavras, os homens de
completo autoconhecimento que conhecem at mesmo
o propsito ou os agentes do seu devir so seres
humanos perfeitos. Se Hegel no acreditava que o
homem podia literalmente se tornar Deus, ele
certamente acreditava que o homem sbio era
daimnico: um participante muito mais do que
meramente humano na vida divina.
No Corpus Hermeticum, encontramos uma posio de
ligao entre o ocultismo egpcio e o hermetismo
moderno de Hegel e outros. Em vez de conceber as
palavras como portadoras de poderes ocultos, elas
passaram a ser vistas como portadoras de um tipo de
capacitao existencial. O ideal da teosofia hermtica se
torna a formulao de um discurso completo (teleeis
logos, discurso perfeito ou talvez discurso
enciclopdico, que significa, evidentemente, discurso
circular). Quando adquirido, o discurso completo que
trata do todo da realidade, transformar e capacitar a
vida do iluminado. Assim escreve Hegel em um
fragmento preservado por Rosenkranz:
Todo indivduo um elo cego na cadeia da absoluta
necessidade ao longo do qual o mundo se desenvolve.
Todo indivduo pode elevar-se para dominar uma
grande parte dessa cadeia, mas apenas se ele
compreender o objetivo dessa grande necessidade e,
por virtude do seu conhecimento, aprender a falar as
palavras mgicas que evocam sua forma. H um
conhecimento para simultaneamente absorver e se
elevar acima da energia total do sofrimento e da
anttese, que dominou o mundo e todas as formas do
seu desenvolvimento por milhares de anos; esse
conhecimento pode ser obtido somente na filosofia.
Outro paralelo entre o hermetismo e Hegel a anlise
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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do divino em um conjunto de modos ou
momentos. Os hermticos no se contentam com a
ideia de um Deus incognoscvel. Em vez disso, eles
buscam penetrar no mistrio divino. Eles afirmam que
possvel conhecer Deus de maneira fragmentada
quando passa-se a entender os diferentes aspectos do
divino. O melhor exemplo a Cabala, tanto na sua
forma judaica quanto na crist. Llio, Bruno,
Paracelsus, Bhme, Oetinger e vrios outros na tradio
hermtica sustentam essa crena.
Outro paralelo entre o hermetismo e Hegel a doutrina
das relaes internas. Para os hermticos, o cosmos
no est frouxamente conectado ou, para usar uma
linguagem hegeliana, disposto em um conjunto
externamente relacionado de particulares. Ao
contrrio, segundo essa doutrina, tudo est
internamente conectado, uma coisa entrelaada com a
outra. Mesmo que o cosmos possa vir a estar
hierarquicamente disposto, h foras que se sobrepe a
isso e unificam todos os nveis. Foras divinas
conhecidas ora por energia e ora por luz
percorrem o todo . Este princpio est expresso mais
claramente na Tbua Esmeraldina de Hermes
Trimegistus, que logo na segunda linha tem a frase O
que est embaixo como o que est em cima. Essa
mxima se tornou o dogma central do ocultismo
ocidental, dado que ele formou a base para uma
doutrina da unidade do cosmos por meio de simpatias e
correspondncias entre seus vrios nveis. A
implicao mais importante dessa doutrina a ideia de
que o homem o microcosmo onde o todo do
macrocosmo refletido. O autoconhecimento,
portanto, leva necessariamente ao conhecimento do
todo.
Em resumo, as doutrinas da Hermetica que se tornaram
caractersticas constantes na tradio hermtica podem
32
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06/05/2015 Hegel e a tradio hermtica, Glenn A. Magee | Terminal
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ser listadas da seguinte maneira:
1. Deus requer a criao para poder ser Deus.
2. Deus , em algum sentido, completado [pelo
homem] ou tem uma necessidade de ser preenchido
pela contemplao do homem a Ele.
3. A iluminao trata-se de capturar o todo da realidade
em um discurso completo e enciclopdico.
4. O homem pode se aperfeioar atravs da gnosis: ele
ganha poder por meio da posse do discurso completo.
5. O homem pode conhecer aspectos ou momentos
de Deus.
6. Necessita-se de um estgio inicial de purificao
para purificar o iniciado de falsos pontos de vista
intelectuais antes de receber a verdadeira doutrina.
7. O Universo um todo internamente relacionado que
pervagado por energias csmicas.
Para deixar claro os paralelos entre essas doutrinas e a
de Hegel, eis uma antecipao do que se ver no
restante do livro:
1. Hegel afirma que o ser de Deus envolve a criao:
esse o assunto da sua Filosofia da Natureza. A natureza
um momento do ser de Deus.
2. Hegel afirma que Deus de alguma maneira
completo ou atualizado (tornado em ato) pela
atividade intelectual da humanidade: a filosofia o
estgio final na atualizao do Esprito Absoluto. Hegel
sustenta a concepo circular de Deus e do cosmos a
que me referi anteriormente, aquela que envolve Deus
retornando a Si e verdadeiramente tornando-se Deus
atravs do homem.
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3. A filosofia de Hegel enciclopdica: para todos os
efeitos, ele busca finalizar a filosofia capturando o todo
da realidade em um discurso completo e circular.
4. Hegel acredita que ns nos elevamos acima da
natureza e tornamo-nos mestres de nossos prprios
destinos por meio da profunda gnosis provida por esse
sistema.
5. A Lgica de Hegel uma tentativa de descobrir os
aspectos ou momentos de Deus como um sistema de
ideias. Em uma famosa passagem da Cincia da Lgica,
Hegel afirma que a lgica deve ser entendida como um
sistema de razo pura, como a esfera do puro
pensamento. Essa esfera a verdade como ela , sem
vus, em sua prpria natureza absoluta. Pode-se dizer,
portanto, que esse contedo a exposio de Deus tal
como Ele em sua essncia eterna, antes da criao da
natureza e de um esprito finito.
6. A Fenomenologia do Esprito de Hegel representa, no
sistema hegeliano, um estgio inicial de purificao ao
qual aquele que quer ser filsofo purificado dos falsos
pontos de vista intelectuais para que assim possa
receber a verdadeira doutrina do Conhecimento
Absoluto (lgica-natureza-esprito).
7. A abordagem da natureza feita por Hegel rejeita a
filosofia mecanicista. Ele sustenta o que os seguidores
de Bradley mais tarde chamariam de doutrina de
relaes internas, contra o entendimento
tipicamente moderno mecanicista das coisas, que so
tratadas em termos de relaes externas.
Hegel: Um olhar metafsico
Dada a evidncia do lugar que Hegel ocupa na tradio
hermtica, parece surpreendente que to poucos
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estudiosos de Hegel tenham percebido isso. O assunto
logo deixado de lado como se fosse algo sem
importncia ou desinteressante (no nenhuma das
duas coisas). Costumeiramente, ele tratado como
relevante apenas juventude de Hegel (o que falso).
Certamente uma das razes dessa atitude a
especializao disciplinar. Poucos estudiosos da
histria da filosofia chegam a estudar os pensadores
hermticos. Outra razo a recente tendncia entre os
influentes estudiosos de Hegel que dizem ser um
disparate tratar Hegel como algum que tivesse
qualquer interesse srio em metafsica ou teologia; o
que dir ento o envolvimento em algum tipo de
metafsica e teologia exticas que encontramos no
hermetismo. Essa a dita leitura no-metafsica de
Hegel. Como observou Cyril ORegan, ela anda de mos
dadas com a leitura antiteolgica . Por exemplo,
David Kolb escreve: Eu quero acima de tudo evitar a
ideia de que Hegel fornea uma cosmologia que inclui a
descoberta de uma nova e maravilhosa super-entidade,
um eu csmico ou esprito do mundo ou super-
mente . Mas exatamente isso que Hegel faz.
A frase leitura no-metafsica parece ter sua origem
em Klaus Hartmann, que em seu influente artigo de
1972, Hegel: Uma leitura no-metafsica, identificou
o sistema de Hegel como uma hermenutica de
categorias . Dentre outros conhecidos propositores
dessa abordagem que Hartmann d, h tambm Kenley
Royce Dove, William Maker, Terry Pinkard e Richard
Dien Winfield.
A leitura no-metafsica/antiteolgica consiste em
ignorar ou no considerar um assunto digno de ser
tratado as vrias passagens francamente metafsicas,
cosmolgicas, teolgicas e teosficas nos escritos e
conferncias de Hegel . Assim, a leitura no-
metafsica passa a ser mais uma reviso de Hegel que
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uma interpretao. Seus defensores admitem isso
(Hartmann, por exemplo), mas com frequncia eles
oferecem sua leitura como oposio s outras
interpretaes de Hegel. Alm disso, no acidental
que os mesmos autores finalizem suas
interpretaes atribuindo uma poltica de esquerda a
Hegel, pois eles so, na verdade, os herdeiros
intelectuais dos jovens hegelianos do sculo XIX que
tambm faziam interpretaes no-metafsicas e
antiteolgicas de Hegel. A leitura no-metafsica
simplesmente trata de um Hegel sem tudo aquilo que
possa parecer ofensivo ao esprito moderno, secular e
liberal. Isso, entretanto, no significa que estou
oferecendo uma leitura hegeliana de direita como
alternativa. Estou simplesmente lendo Hegel. Ao fazer
isso, espero contribuir com a anlise apartidria,
histrica e textual do pensamento de Hegel,
preconizada por Louis Dupr.
Estou convencido de que tal leitura coloca
inequivocamente a filosofia de Hegel na tradio da
metafsica clssica. Ao dar esse olhar, estou em
consonncia com a interpretao amplamente
ontoteolgica que Martin Heidegger que cunhou o
termo e por estudiosos como Walterjaeschke, Emil
Fackenheim, Cyril ORegan, Malcolm Clark, Albert
Chapelle, Claude Bruaire e Iwan Iljin . A
ontoteologia refere-se equao entre o Ser, Deus e
o logos. A abordagem que Hegel d ao Absoluto
estruturalmente idntica que Aristteles faz do Ser
como Substncia (ousia): o que h de mais real,
independente e autossuficiente. Hegel identificou o
Absoluto com Deus tanto publicamente (em livros e
conferncias) como privadamente (em notas): em
ambos os casos de modo franco e direto, sem margem
para interpretaes muito diferentes . Hegel no
oferece as categorias da sua lgica como meros
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O AUTOR
Leonildo Trombela Jnior
dispositivos hermenuticos, mas sim como formas
eternas, momentos ou aspectos da Mente Divina (Ideia
Absoluta). Ele trata a natureza como se ela estivesse
expressando as ideias divinas em formas
imperfeitas. Ele fala de um Esprito do Mundo e o usa
para explicar como a radiestesia e o magnetismo
animal funcionam. Ele estrutura toda a sua filosofia em
volta da Santssima Trindade crist e afirma que com o
cristianismo, o princpio especulativo da filosofia foi
revelado para a humanidade . Ele nos diz
novamente de forma direta que o Estado Deus na
Terra.
No vejo razo para no levar a srio as palavras de
Hegel em qualquer desses assuntos. Mesmo porque
estou interessado apenas no que Hegel pensou, no em
que Hegel deve ter pensado. Indubitavelmente, o
sentido que Hegel d metafsica clssica e ao
cristianismo transformador, pois ele no foi um mero
fiel. Contudo, seus comprometimentos metafsicos e
religiosos no eram exotricos. Ele acredita que o
Absoluto e o Esprito do Mundo, etc. so seres reais;
eles s no so reais no sentido em que as concepes
tradicionais, devotas e representativas tm deles .
Se Hegel se aparta da tradio metafsica em qualquer
momento, para tirar o seu ar de falsa modstia. Hegel
no afirma ser um mero buscador da verdade. Ele
afirma que j a encontrou.
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