Harmonia no Século XX

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1 Harmonia do Século XX 1. Sonoridades convencionais de 3ªs As tríades constituídas por 3ª e os acordes de 7ª são uma parte importante, mas talvez menos preponderante, do vocabulário harmónico da música do século XX. Enquanto alguns compositores baseiam o seu vocabulário harmónico nestes acordes, outros reservam a sua sonoridade para momentos particulares como cadências importantes ou o final de andamentos. Outros compositores raramente recorrem a estas sonoridades tradicionais. Acordes de 3ª com extensões superiores à 7ª – 9ª, 11ª e 13ª – só se tornaram comuns a partir do início do século XX. Em teoria, qualquer acorde pode ser estendido por 3ªs até à 13ª antes de se duplicar a sua nota fundamental. Na prática, no entanto, são os acordes de dominante e de dominante secundária os que mais se adequam a este tratamento (e em menor grau os de sobre-tónica e os de sobre-dominante). As alterações cromáticas, especialmente em acordes com função de dominante, são usadas com frequência. Alguns acordes com extensões superiores à 7ª estão com frequência incompletos. Nestes casos surgem alguns problemas na análise pois podem ser interpretados de diversas maneiras. 2. Acordes de 3ªs com notas acrescentadas É um tipo de acorde que recorda a clássica tríade com 6ª acrescentada. Este tipo de acorde forma-se geralmente sobre uma tríade à qual se acrescenta outro tipo de intervalos sobre a nota

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Material Didáctico - Análise (Século XX)

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Harmonia do Século XX 1. Sonoridades convencionais de 3ªs

As tríades constituídas por 3ª e os acordes de 7ª são uma parte importante, mas talvez menos

preponderante, do vocabulário harmónico da música do século XX. Enquanto alguns compositores

baseiam o seu vocabulário harmónico nestes acordes, outros reservam a sua sonoridade para momentos

particulares como cadências importantes ou o final de andamentos. Outros compositores raramente

recorrem a estas sonoridades tradicionais.

Acordes de 3ª com extensões superiores à 7ª – 9ª, 11ª e 13ª – só se tornaram comuns a partir do

início do século XX. Em teoria, qualquer acorde pode ser estendido por 3ªs até à 13ª antes de se duplicar a

sua nota fundamental. Na prática, no entanto, são os acordes de dominante e de dominante secundária os

que mais se adequam a este tratamento (e em menor grau os de sobre-tónica e os de sobre-dominante). As

alterações cromáticas, especialmente em acordes com função de dominante, são usadas com frequência.

Alguns acordes com extensões superiores à 7ª estão com frequência incompletos. Nestes casos

surgem alguns problemas na análise pois podem ser interpretados de diversas maneiras.

2. Acordes de 3ªs com notas acrescentadas É um tipo de acorde que recorda a clássica tríade com 6ª acrescentada. Este tipo de acorde

forma-se geralmente sobre uma tríade à qual se acrescenta outro tipo de intervalos sobre a nota

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fundamental – 2ªs ou 6ªs, menos frequentes são as 4ªs. Estes acordes podem-se designar também por

‘acorde de notas erradas’.

Do mesmo modo que uma tríade com 6ª acrescentada pode ser interpretada como um acorde de

7ª invertido (no entanto, neste caso o contexto esclarece a dúvida), uma tríade com uma 2ª ou uma 4ª

acrescentada pode ser interpretada como um acorde de 9ª ou de 11ª incompleto.

3. Acordes de 3ªs com elementos ‘desviados’ É um tipo especial de acorde com nota(s) acrescentada(s). Possui uma ou mais notas

acrescentadas que se encontram ‘desviadas’ meio tom em relação a outra(s) nota(s) do acorde. Um dos

exemplos mais comuns são as tríades ou acordes de 7ª com a 3ª ‘desviada’, mas o desvio da nota

fundamental, da 5ª ou da 7ª também é comum. Um exemplo típico deste tipo de acorde é o acorde de 7ª

dominante com a 3ª desviada: o tradicional acorde ‘blues’ (geralmente é analisado como 7ª da dominante

com uma 9ª A acrescentada).

4. ‘Acorde vazio’ de 5ª É o único ‘acorde de omissão’ importante. O ‘acorde de omissão’ é o contrário do ‘acorde de

notas acrescentadas’, é um acorde tradicional que se transforma numa sonoridade diferente pela omissão

de uma nota. O ‘acorde vazio’ de 5ª resulta de uma tríade sem a 3ª é um acorde que havia caído em

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desuso, praticamente desde o final da Idade Média, tendo sido recuperado no início do século XX pelo

seu poder de evocação do Oriente ou de um passado distante.

5. Acordes formados pela sobreposição de intervalos que não a 3ª Os compositores do século XX não se limitaram ao uso de acordes formados por terceiras.

Juntamente com a sobreposição da 3ª existem, essencialmente, apenas quatro possibilidades: acordes

formados por 2ªs (7ªs), acordes formados por 3ªs (6ªs), acordes formados por 4ªs (5ªs) e acordes

formados por intervalos mistos.

5.1 Acordes formados por 4ªs e 5ªs Um ‘acorde de 4ªs’ pode ter apenas três notas ou pode ter muitas notas. É possível omitir um

elemento de ‘acorde de 4ªs’ ou ‘de 5ªs’ sem que este perca o seu carácter. Vários ‘voicings’ e duplicações

à oitava são também usados, mas alguns arranjos podem destruir o carácter da sonoridade de 4ª ou de 5ª.

Exemplos de acordes de 4ªs/5ªs:

5.2 Acordes formado por 2ªs São acordes formados por 2ª maiores ou menores ou pela combinação das duas. Estes acordes

também podem ser organizados, excepcionalmente, por 7ªs em vez de 2ªs. Com mais frequência, as notas

de um ‘acorde de 2ªs’ estão em posição cerrada (adjacentes umas às outras), esta disposição das notas é

muitas vezes referida como ‘cluster’.

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5.3 Acordes formados por intervalos mistos

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Um ‘acorde de intervalos mistos’ é um acorde que não é constituído por uma série de 2ªs, 3ªs ou

4ªs, mas antes que combina dois ou mais destes tipos de intervalos formando uma sonoridade mais

complexa. As possibilidades são numerosas. Muitos ‘acordes de intervalos mistos’ podem ser

interpretados de outra maneira – eles podem ser arranjados de modo parecerem acordes de 2ª, de 3ª ou de

4ª. Em muitos casos o contexto sugere a abordagem analítica correcta.

6. Acordes de Tons Inteiros São acordes cujos componentes podem ser obtidos a partir de uma única escala de tons inteiros.

7. Sobreposição de acordes (o ‘poli-acorde’) O ‘poli-acorde’ combina 2 ou mais acordes numa sonoridade mais complexa. Para que o

resultado seja um verdadeiro ‘poli-acorde’ é crucial que o ouvinte possa compreender que este é

constituído por várias entidades harmónicas. Qualquer acorde de 11ª ou de 13ª poderia ser explicado

como uma combinação de duas sonoridades mais simples, mas esta seria uma análise incorrecta se não os

escutarmos desse modo. Para que um acorde seja compreendido como um ‘poli-acorde’ as sonoridades

individuais que o constituem devem estar separadas pelo registo ou pelo timbre.

Os elementos constituintes de um ‘poli-acorde’ são geralmente tríades de 3ªs ou acordes de 7ª,

mas todos os outros tipos de sonoridades apresentados neste capítulo podem ser susceptíveis deste tipo de

tratamento.

Exemplos de poli-acordes:

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Apontamentos organizados a partir de: Kostka, Stefan – “Materials and Techniques of

Twentieth Century Music”

Pedro Moreira dos Santos, 2006