Hajasaúde 2014 setembrooutubro

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Boletim Bimestral | Tiragem Gratuita Nº 77 - Set. Out. Nov. SER MÉDICO NÃO BASTA Página 6 hajaINTERCÂMBIOS! Não há caminho! Página 11 Por Pedro Peixoto hajaTEMÁTICA Dia da escola! Página 5 Por Sofia Santos e Sofia Milheiro

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77 -

Set

. Out

. Nov

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SER MÉDICO NÃO BASTA

Página 6

hajaINTERCÂMBIOS!

Não há caminho!Página 11Por Pedro Peixoto

hajaTEMÁTICA

Dia da escola!Página 5Por Sofia Santos e Sofia Milheiro

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C L U B E S E Q U Ó I A

2 hajaSaúde!

ÍNDICE

hajaEDITORIAL!

Dia da Escola!

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6 hajaCRÓNICA!

hajaGAP YEAR!1011 hajaINTERCÂMBIOS

Não há caminho.

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hajaPACIÊNCIA!

hajaTECNOLOGIA!

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hajaHUMOR!

hajaSEXUALIDADE!18

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hajaBRAGA!

15

hajaCIÊNCIA!

Mudar de casa para a faculdade.

As “outras” células cerebrais.

Crítica a “Em Parte Incerta”

De portas abertas para uma nova rubrica.

Turismo: Mais do que conhecer.

Como os videojogos mexem com o teu cérebro: as perspectivas de um Gamer e de um Non-gamer

Não tenham pressa em acabar o curso!

hajaMUDANÇA!13

hajaARTE!

hajaPASSATEMPOS!

23

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C L U B E S E Q U Ó I A

hajaSaúde! 3

Sofia Leal, 4º Ano

hajaEDITORIAL!

Boas leituras, e que seja um bom ano!

Há  pouco  mais  de  um  mês  iniciou-­‐se  este  ano  lec3vo,  

e   já   a   ro3na   espreita   a   oportunidade  de   se   instalar  

no  nosso  quo3diano.  Feliz  (e  expectante,  e  nervosa)  

exceção   a   esta   regra   são   os   novos   caloiros:   na   sua  

maioria  estreantes  do  ensino  superior,  fruem  ainda  a  

bênção  da  novidade.  

Nesta  que  é  a  primeira  edição  do  ano   lec5vo,  quero  

deixar  algumas  mensagens:  bem-­‐vindos,  colegas!  Que  

esta   escola   seja   um   importante   palco   de  

aprendizagens   e   vivências,   e   que   se   sintam  

convidados   a   par5cipar   nela:   a   apreendê-­‐la,  

ques5oná-­‐la   e   construí-­‐la,   e   a   se   construírem   em  

novos  papéis,  que  ainda  nem  podem  antecipar.

Aos  estreantes,   e   aos   já  habitantes  de   tão  moderna  

mansão   no   meio   do   monte,   desejo   um   ano   de  

redescobertas   e   novos   desafios.   Nesta   edição,  

trazemos-­‐vos  aragens  de  outras  terras,   onde   colegas  

vossos   alargaram   o   seu   espectro   de   vivências   e  

saberes,  e  somaram  léguas  aos  seus  mundos.  Uma  das  

oportunidades   para   o   conseguir   é   a   realização   de  

intercâmbios,  como  os  organizados  pela  Interna5onal  

Federa5on  of  Medical  Students  Associa5ons  (IFMSA).  

Através  destes  podes  aventurar-­‐te  por   um  mês  num  

de   imensos  países  à  escolha,   e   conhecer   estudantes  

de   todo   o   mundo   –   basta   falares   com   alguém   que  

tenha  feito  um  para  perceberes   as  marcas   posi5vas  

que  deixa.  E  aproveito  a  deixa:  Outubro  está  a  acabar,  

e  as  inscrições  também!

Uma  aventura  mais  exigente  é  a  ousadia  de  fazer  um  

gap   year.  Pedimos  à  nossa  colega  Francisca  Bar5loY  

que  nos  traçasse  um  esboço  do  seu  ano  de  autonomia  

e  descoberta,  desde  as  vinhas  francesas  à  exploração  

da   América   do   Sul,   para,   através   dos   seus   olhos,  

viajarmos   também,   e   projectarmos   planos   de   vida  

mais  ricos  –  ricos  em  experiências,  como  importa.

Deixamos-­‐vos   também   novidades   da   ciência   que   se  

faz  mundo  fora  e  no  ICVS,  as  habituais  crónicas  sobre  

arte,   e   a   recente   rúbrica   sobre   a   cidade   de   Braga,  

entre  outros  ar5gos  a  explorar.  

Neste  que  será  o  meu   úl5mo   editorial,  quero   deixar  

aqui   o   meu   enorme   “Obrigada”   à   equipa   do   Haja!,  

pela  sua  dedicação,  e  cria5vidade.  A   todos  os  outros,  

estendo  o  convite  para  par5ciparem  na  revista!

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C L U B E S E Q U Ó I A

4 hajaSaúde! !

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hajaSaúde! 5

No passado dia 8 de Outubro, celebrou-se, uma vez mais, o Dia da Escola de Ciências da Saúde (ECS).

Após a abertura pelo Coro de Câmara da Universidade do Minho, a cerimónia de graduação contou, inicialmente, com a intervenção do delegado dos alunos recém-graduados. O Dr. João Louro – ou, como soa mais natural para um colega, o João – abordou a marcante jornada, mais fugaz que o esperado, que foi o curso, para si e seus colegas, e o assombro com que se vêem agora a assumir um novo estatuto, ainda duvidando que haja um momento em que, definitivamente, um homem se torna, inteiramente, adulto. Seguidamente, tomaram a palavra a Presidente do NEMUM, Catarina Pereira, e o Presidente da Alumni Medicina, o Professor Pedro Morgado, que salientou o dinamismo dos alunos agora formados, e as saudades que deixariam na escola. Deixou, ainda, um testemunho de gratidão aos parceiros que têm tornado as iniciativas da Alumni Medicina possíveis, e anunciou a concessão ao Professor Nuno Sousa do título de Sócio Benemérito, pelo seu contributo.

O Professor Damião Cunha dirigiu-se, depois, aos alunos recém-graduados, narrando uma viagem pela prática médica, e pelo ensino da medicina, desde os seus

tempos de estudante - com referência aos tempos em que as residências estavam assoberbadas por estudantes que mal tocavam nos doentes, ainda os estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto frequentavam o Hospital de S. António, antes do Hospital de S. João abrir portas.

Deu-se, depois a atribuição de distinções, incluindo distinções dos alunos:

Prémio Joaquim Pinto Machado, atribuído à ex-aluna Dalila Costa, e ainda os Prémios Bolsa de Mérito Escolar e Prémio Almedina. O Prémio de Incentivo à Docência e Investigação foi atribuído ao Professor Patrício Costa. Esta celebração foi ainda enriquecida com um discurso da Professora Cecília Leão, Presidente da ECS, e do Dr. António Cunha, Reitor da Universidade do Minho. Para encerrar em grande, houve um momento de convívio e Porto de Honra no átrio da ECS, que foi animado com um momento musical, trazido pela Orquestra Barroca da Universidade do Minho.

Segundo relatos bastantes fiáveis, ao longo da tarde houve ainda atividades, festividades improváveis, que as autoras desta crónica não tiveram a benesse de testemunhar…Deixamos-vos a sugestão de lá estarem para o ano, e descobrirem.

hajaTEMÁTICA!

Dia da EscolaSofia Santos e Sofia Milheiro, 4º Ano

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6 hajaSaúde!

Pedem-me para resumir um ano num artigo. Não será tarefa fácil, e corro o risco de o resumir demasiado e de não vos conseguir mostrar tudo o que este ano foi para mim. Mas cá vai a tentativa. Decidi parar um ano de estudo para realizar vários projetos de vida que não passavam pelo curso de medicina ou pela profissão de médica. Entendi que, para me tornar a pessoa que queria ser, ainda me faltavam muitos sonhos para realizar. Que a minha vida e o conhecimento que tenho de mim própria e do mundo precisavam de se expandir para fora de um curso de medicina que me fazia dedicar quase exclusivamente à medicina. O final do terceiro ano pareceu-me ser a melhor altura, por ser a metade do curso e por ser a fronteira entre anos pre-clínicos e clínicos. Para facilitar a história, vou dividir este ano em duas etapas: o antes do Natal e o depois do Natal. Parti em Setembro para França, com o objetivo de trabalhar para ganhar o dinheiro que depois me permitiria

viajar. Queria que este ano fosse totalmente financiado por mim, algo conquistado, a bem ou a mal. Foi uma manhã cinzenta, aquela em que entrei na camioneta com destino a Lyon. Partia para as vindimas. Atraía-me o trabalho bem pago para alguém com nenhuma experiência ou currículo e a ideia algo romântica das vindimas em França, que tantos portugueses tinham acolhido. Os primeiros dias em França não foram fáceis. Havia um atraso no início das vindimas e tive de acampar em jardins proibidos e estações de comboio durante vários dias até ter trabalho. Quando finalmente encontrei uma quinta que me acolhesse, trabalhei durante mais de vinte dias seguidos, saltando de quinta em quinta. Os primeiros dias foram bons. Estava calor, comia e bebia muito (boa comida, bom vinho), praticava o francês e fazia trabalho rural, algo que nunca antes tinha feito, cansava o corpo, sujava as mãos com cortes, terra e sumo de uva, no meio de um ambiente de muitos sorrisos. As costas e as pernas queixavam-se muito, mas o convívio superava a dor.

hajaCRÓNICA!

Não há caminhoFrancisca Bartilotti Matos, 4º Ano

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hajaSaúde! 7

Após os primeiros dias, a coisa começou a doer. Trabalhar 8 horas num trabalho absolutamente monótono, com chuva e granizo que faziam com que mal conseguisse fechar as mãos na tesoura, franceses xenófobos que não achavam piada a emigrantes e as costas a queixarem-se já "a sério", foi duro, muito duro. Acordava todas as manhãs bem cedo, e só conseguia pensar: "Mais um dia a cortar uvas...". Eventualmente, este período chegou ao fim, sem nunca ter recusado trabalho ou desistir, e, hoje, conto-o como uma façanha.   Da França, segui para a Suíça, para trabalhar numa quinta a cuidar de 18 cavalos. Mais uma vez, fiz trabalho que nunca antes me tinha passado pela cabeça. Alimentar cavalos, limpar as suas boxes, procurar "bosta" no meio de uma manta de dois metros de neve, carregar baldes e baldes de água de um lado para o outro, alisar picadeiros. Não vou dizer que todos os dias foram bons. Senti-me triste e sozinha várias vezes. Mas quando penso nestes dias, só posso dizer que foram magníficos. O cenário era idílico. Uma pequena aldeia no meio dos Alpes, rodeada por montanhas cheias de neve, florestas e pequenos chalets. O silêncio da montanha e o ar absolutamente despoluído eram a minha companhia enquanto montava a cavalo em tapetes de neve tão fofa que silenciava os cascos. Bebia leite diretamente

da leitaria, ganhava uma relação que nunca tinha tido com os animais e percebia que é na montanha fria que ao respirar me sentia livre e no topo do mundo. Foi um período muito bom - fez-me perceber o que é trabalhar com o corpo e não apenas com o lado intelectual, proporcionou-me vários momentos de retrospeção, desafiou-me como nunca antes tinha sido desafiada e fez-me ver que sou capaz de qualquer coisa. Depois do trabalho, começou então o segundo período, após um Natal no Porto com muitos mimos da família. Parti em Janeiro, rumo a Quito, no Equador. Não tinha voo de regresso marcado, itinerário previsto ou sequer um lugar certo para dormir na primeira noite. Mas tudo correu bem, como corre quase sempre, quando não pomos o receio à frente dos nossos sonhos. Fiquei em Quito dois meses. Fazia voluntariado na Clinica de la Calle, uma clínica de rua que trabalhava

diretamente nos mercados da cidade. Era um projeto ainda no início, o que foi bom, porque pude ver a sua evolução e ter a sensação de estar a fazer trabalho relevante. Os mercados eram onde trabalhavam os indígenas vindos das montanhas para a cidade: havia comida pelo chão, bichos a passear por toda a parte, uma multidão diária que me fazia ter de andar sempre agarrada à carteira,

(...) desafiou-me como nunca antes

tinha sido desafiada e fez-me ver que sou

capaz de qualquer coisa.

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8 hajaSaúde!

pregões que falavam alto naquele espanhol muito musical, encontrões, frutas e legumes deliciosos e muito baratos. O projeto consistia em identificar doentes hipertensos ou diabéticos (ou que estavam em risco de o ser) e, numa articulação entre a organização e os centros de saúde, iniciar nos doentes identificados um trabalho de prevenção e de rastreio. Alimentação saudável, exercício físico, e a maior parte dos cuidados de saúde eram desconhecidos para estas pessoas, o que me ajudou também a sentir que tinha um papel relevante: o simples conselho de não comer massa, batata e arroz no mesmo prato já terá servido para que alguém emagrecesse uns quilos. O nosso trabalho não consistia só na parte da medicina e da saúde pública, e isso foi uma das coisas que gostei mais, nesta organização. O doente era visto como um todo, e qualquer problema do doente em que pudéssemos tentar ajudar era também um problema importante para nós. Para os ajudar, tínhamos parcerias com associações contra o trabalho infantil e com vários assistentes sociais. Havia uma relação muito próxima com os doentes, chegando a ser convidadas para almoçar nas suas casas. Este trabalho foi extremamente gratificante, porque, pela primeira vez, tive a sensação de estar a mudar alguma coisa, de estar a contribuir realmente para melhorar a saúde de algumas pessoas. Entrar no mercado e ouvir um "Francisquita!", muito alto, enquanto alguém vinha a correr ao meu encontro com a manga arregaçada para que lhe medisse a tensão, ou passar pelas pessoas e

ouvir "Já falei com a minha esposa, e vamos começar a caminhar três vezes por semana", era fantástico. Entretanto, vivia no Equador, numa casa com outros 18 estrangeiros e com os fins-de-semana para viajar muito. As distâncias perderam todo o significado, quando fazia viagens de 8 horas para passar um fim-de-semana fora, e o cansaço era esquecido perante um país de tamanhos contrastes e beleza. Percorri as praias, as montanhas e as selvas, os parques naturais. Provei as comidas todas, que nunca dispensavam o arroz, conheci o máximo de pessoas que pude, fiz muitas amizades. Mas eu não queria ir à América do Sul e ficar apenas num país. Então, após estes dois meses à descoberta do Equador, apanhei a camioneta para o Perú e decidi descer até onde o tempo me permitisse, passando um período em cada país que me permitisse conhecê-lo a fundo. Não queria parar em sítios e vê-los com a pressa de passar para o próximo. Estar em cada lugar o meu tempo, aquele em que me sentisse bem, e partir quando me apetecesse. Eis a grande vantagem de viajar sozinha. Passei pelo Perú, Bolívia, Paraguai e Argentina, e contar esta viagem seria material para várias crónicas. Estive na praia, no deserto, em picos de mais de 6000 metros, na selva com macacos na cabeça, em ruínas incas, vinhas argentinas, cidades quase europeias. Não escondo: foi fantástico. Em jeito de resumo, digo-vos que o que me vem à cabeça quando penso na América do Sul e o que me

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hajaSaúde! 9

deixa um sorriso de saudades na cara é a afabilidade das pessoas, os abraços, o chá mate partilhado, a música em cada esquina ao som da qual ninguém deixa de mexer o corpo. Ser uma rapariga a viajar sozinha só me fez ter a certeza do que já há muito pensava: as pessoas são boas. Ao olhar para mim, e las não v iam a minha vulnerabilidade como um factor a aproveitar para o mal: viam-no como uma oportunidade para ajudar alguém. E ajudavam, e ofereciam tudo o que tivessem, ao ponto de, por vezes, eu até me sentir constrangida a aceitar mais generosidade. Mais uma vez, senti o ar livre, frio e solitário da montanha, que já tão bem me tinha sabido na Suíça. Não há nada que supere os Andes numa manhã fria, mas solarenga, com uma cordilheira pontiaguda que nos rodeia, e que contrasta com um céu muito azul, tendo por companhia apenas lamas e alpacas. Como disse no início, resumir este ano num artigo é tarefa impossível, e corro o risco de perder algum do sentimento em prol da tentativa de incluir o máximo de informação. Termino dizendo: hoje, sou uma pessoa radicalmente diferente da que era quando parti. Conheço o mundo com os meus olhos, sei identificar-me com uma muito maior variedade de pessoas, descobri o que me faz verdadeiramente feliz, e aprendi a relativizar as coisas e a saber que não há drama nenhum numa negativa no curso

ou num ano de atraso, se tiver aproveitado o tempo em que não estudei com algo que me fez feliz. Li muito, estudei muito outras matérias, como política, arte ou literatura, escrevi, cantei e toquei instrumentos. Trabalhei, caminhei, conheci essa estrada que só eu poderia traçar. Sou hoje uma pessoa muito mais completa. E tudo o que

eu fiz pode ser feito por qualquer um de vós. Não sou rica, nem especialmente corajosa: apenas decidi que não ia passar uma vida sem cumprir sonhos. Decidi que o ia fazer e fi-lo: sem entraves nem hesitações, parti. Trabalhei duro e tive medo muitas vezes. Saudades, evidentemente. Mas foi o ano mais maravilhoso que alguma vez tive e deixa-me feliz só de o recordar. O meu conselho só pode ser este: descubram o que vos faz feliz e façam-no. Tudo vai correr bem e, mesmo que não corra, não deixam de o ter tentado.

“Trabalhei, caminhei, conheci essa estrada que só eu poderia traçar”.

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10 hajaSaúde!

Se já alguma vez pensaram que é impossível começar um novo ano sem aulas não estejam enganados. Hoje em dia, são cada vez as possibilidades que permitem ao comum dos estudante começar um ano sem aulas. Exemplo disso é o Gap Year, uma experiência de um ano na qual são aliados a aprendizagem e a viagem. Praticado cada vez mais, o Gap Year torna-se uma experiência única e inesquecível para aqueles que são aventureiros ao ponto de o fazerem. Quando se tenta explicar e definir o que é realmente um Gap Year as palavras não são a melhor maneira de o fazer tendo em conta que depende muito daquilo que cada um pode escolher fazer neste período de tempo. Geralmente, associado a experiências no estrangeiro, o Gap Year tem diferentes domínios de atuação que são o de voluntariado, de reflexão, de estágio, de trabalho, de turismo, de festa e descanso e ainda um Gap Year mix que envolve um pouco de todas as modalidades referenciadas. Destas, a mais realizada é obviamente a última, tendo em conta que é a que tem uma maior diversidade de ofertas. Assim, podes pensar na tua vida e no teu caminho ao mesmo tempo que ajudas quem mais precisa e te fazes sentir útil, nunca perdendo a oportunidade para aprender em relação a hábitos, culturas e claro está, nunca perdendo a oportunidade de conhecer aquilo que cada pais tem de melhor para dar: as pessoas, a comida, as paisagens… Não tens de dar necessariamente a volta ao mundo! Podes perfeitamente escolher um determinado número de países nos quais possas dar continuidade a um projeto, ou simplesmente iniciar um novo. O mais importante de um Gap Year acaba por ser aquilo que queres, as tuas aspirações e ambições e assim, estabelecendo bem os teus objetivos, fazer com que os consigas alcançar. No que diz respeito a vantagens e desvantagens, as vantagens ganham claramente. Se por um lado perdes um ano letivo por outro, aquilo que ganhas em troca é realmente compensatório. Sem dúvida que experiências destas permitem o ganho de maturidade e independência

associadas aos diferentes momentos vivenciados. Por outro lado, ganha-se autoconfiança, abrem-se horizontes e aprende-se a dar mais valor às coisas, às pessoas e ganha-se a capacidade de aceitar melhor as diferenças. Se ainda estas com dúvidas acredita que voltas com vontade de estudar, embora pareça difícil de acreditar é verdade, tendo em conta que a maioria dos países onde podes realizar esta pausa te levam, como já foi dito, a valorizar o pouco que pensas que tens mas que para muitos seria mais que suficiente. Chega agora a parte que menos gostamos. Como tudo na vida tem um preço o Gap Year não é exceção, infelizmente para nós. Fica aqui uma pequena tabela onde

é comparado o custo de um Gap Year na Índia ao custo de um ano na Universidade: Se ficaste interessado e queres saber mais consulta o seguinte site: http://www.gapyear.pt/quem-somos/antes-que-desistas-da-ideia. Nele vais encontrar muitos mais pormenores no que diz respeito a detalhes, ao

tipo de material que é preciso de levar mas também te permite fazer simulações tendo em conta as tuas preferência em termos de continente, dos cuidados de higiene que pensas ter e também no grau de segurança que te podem oferecer.

Como disse ainda há esperança para todos nós que, embora cedo, mostramos já sinais

de cansado e o imenso desejo de férias. Essa solução pode ser perfeitamente para os mais aventureiros o Gap Year.

hajaGAP YEAR!

Gonçalo Cunha, 4º Ano

“Não tens necessariamente de

dar a volta ao mundo!”

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hajaSaúde! 11

hajaINTERCÂMBIOS!

Pedro Peixoto, 4º Ano

Ho je em d ia a o fe r ta de expe r i ênc ias extracurriculares é extensa e tem tendência a aumentar de volume, pelo que se torna pertinente questionar a importância de fazer um intercâmbio em detrimento de uma outra atividade, seja ela inserida no voluntariado, no associativismo juvenil, como também na investigação, no desporto, enfim, no rol enorme que podia aqui e agora destraçar.

Em primeiro lugar, realizar um Intercâmbio abre horizontes. Poucas formas melhores que esta existem para expandir a nossa personalidade, para a enriquecer com novas ideias, uma nova cultura, uma forma diferente de estar na vida. Em pouco tempo somos imergidos em toda uma coletânea de costumes, de arte, música, gastronomia, ao mesmo tempo que conhecemos pessoas e personalidades que se distinguem dos fenótipos com que estamos habituados. Em segundo lugar, e particularmente quando realizamos um Intercâmbio com um intuito profissional associado, seja ele clínico ou científico, poderemos aprender a resolver problemas com que nos depararemos, necessariamente, quando tivermos uma vida laboral ativa, de forma que nos é inusitada, incomum ou mesmo roçando o inverosímil. Acabaremos por adquirir conhecimentos que, de outra forma, seria muito improvável obter. A acrescentar ao dito atrás, um intercâmbio contribui de sobremaneira para a desenvoltura de uma capacidade muito apreciada, commumente conhecida como "desenrasque". É a língua, porventura absolutamente estranha, são os sistemas de transporte, a forma de estar das pessoas, a alimentação, o alojamento, basicamente tudo; uma simples ida ao supermercado ou uma saída à noite tornam-se desafiantes, em comparação com o que estamos habituados. Do intercâmbio que eu próprio realizei, na época havia concluído o segundo ano, retirei tudo isto e muito mais, no entanto é difícil colocar em palavras que avaliem com exatidão a minha experiência.

Havia escolhido a República Checa pois procurava um país culturalmente semelhante ao nosso Portugal, europeu e cujo clima não se diferenciasse muito. Foi, portanto, uma opção comodista e bastante conservadora. No entanto, mesmo assim, dificilmente poderia ter tido uma melhor experiência. Em primeiro lugar ficaram as memórias das pessoas que conheci, de todos os cantos do Mundo, desadaptados da realidade desse país, tal e qual como eu estava. Constroem-se laços em dias, que doutra forma seriam absolutamente impensáveis. Talvez tal aconteça por engenho aguçado pela necessidade, mas o facto é que fazemos amigos para uma vida. Claro está que um Intercâmbio não se quer só de trabalho. Um bom programa social a acompanhar é sempre bem vindo. Nestes programas, os "nativos" dão-nos a conhecer o seu país da forma como eles próprios o vêm. Acaba-se, portanto, por contornar o turismo de massas e vai-se além dos clichés que fazem o país ser conhecido. O pior de um Intercâmbio é o regresso a casa, por muito que a saudade tenha apertado. Apesar de ser tão parco em tempo, a experiência é tão intensa que deixa mesmo uma marca e o retorno a casa, á rotina, é em si só, um grande desafio. Quando se chega a casa e o cérebro tem de ligar o português como não fazia já há algum tempo... O que deixo aqui é o desafio para que quem lê este texto se disponha a fazer o mesmo, a desfrutar da experiência de um Intercâmbio. O meu último conselho é para não serem comodistas, como eu fui, mas antes sejam originais, sejam aventureiros, pois quanto maior o choque cultural a que se sujeitarem, mais desfrutarão e maior será a marca que reterão para toda a vida.

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hajaSaúde! 11

hajaMUDANÇA!

Entrar na universidade é um marco na nossa vida. Após árduos anos de trabalho no secundário, de luta, suor e lágrimas, conseguiste alcançar os teus objetivos. Mas como tudo na vida, as coisas não são fáceis. Agora descobriste que, por a tua Escola ser longe da tua casa, terás de arranjar um quarto mais perto da Universidade.

Mudar de casa é um desafio, tanto físico como psicológico. Terás de escolher aquilo que importa trazeres contigo, mas terás de deixar algumas coisas para trás. Provavelmente não vais ver a tua família e os teus velhos amigos com a frequência que querias, tens medo que se esqueçam de ti ou que se afastem. É certo que haverão momentos difíceis, mas com certeza que os irás ultrapassar. Ao longo deste texto, quero deixar algumas dicas para todos aqueles que, como eu, tiveram de mudar de casa. Escolher o local: Informa-te dos vários locais que existem de aluguer de casas e como irás todos os dias para a Universidade. Se não tiveres carro, estuda a possibilidade de ires a pé ou de autocarro. Tem em atenção o movimento da rua, em especial à noite, já que se tiveres perto dos bares, o barulho poderá incomodar.

Condições do teu quarto: dá preferência a um quarto que já esteja mobiliado, porque evitas gastar dinheiro com mobília e o problema de transportar coisas muito pesadas caso sejas obrigado a mudar novamente de casa. Essencialmente, tem de ter uma cama, uma secretária, uma cadeira, um armário e uma mesa de apoio. Vale a pena investir na iluminação de mesa e numa cadeira ergonómica , já que são fulcrais para ajudar nas longas horas de estudo que te esperam. A decoração também é importante, já que torna o quarto visualmente apelativo. Tenta ser o mais minimalista possível (facilita na hora das limpezas), mas não te esqueças de decorar o espaço com objetos que tenham significado pessoal

(como fotografias dos teus amigos, projetos tipo DIY). Condições do resto da casa: uma sala não é obrigatória, mas dá jeito. Em relação à cozinha, se planeias cozinhar, verifica se tem fogão e forno. Caso contrário, um micro-ondas é essencial. Bónus importantes: máquina de lavar roupa (especialmente se não fores aos fins-de-semana a casa), máquina de café, torradeira, tostadeira, televisão, internet e despesas incluídas. Gestão de dinheiro: nos primeiros tempos pode ser complicado. Para ajudar, deves apontar todas as tuas despesas (Desde a pastilha elástica que compraste no bar até o livro de anatomia para estudar). Vai dar-te uma noção onde gastas o teu dinheiro e, caso necessites de poupar, onde podes cortar. Gestão do tempo: Esta é bem complicada para os estudantes de medicina. Hão de chegar os dias em que vais achar que tens mil coisas para fazer e o tempo parece que não existe. Neste caso, o truque é fazer uma lista das coisas que precisas de fazer e dividi-las em Importante e Não Importante, Urgente e Não-Urgente (ver exemplo). Também acho essencial arranjar uma agenda onde coloques as tuas tarefas, o teu horário e aquilo que tens a fazer para poder gerir ainda melhor cada semana.

Importante Não Importante

Urgente

Não Urgente

Arrumação: Em tempos de exame, manter a casa arrumada é um desafio. Para isto aconselho-te seguires a regra dos 2 minutos. Basicamente, se demoras menos de 2 minutos a fazer alguma, fá-la imediatamente, não deixes para depois ou para amanhã. Diz não à procrastinação.

Mudar de casa para a faculdadeSofia Ferreira, 4º Ano

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14 hajaSaúde!

hajaCIÊNCIA!

As “outras” células cerebraisAntónio Mateus-Pinheiro, 4º Ano

Tanto na sua génese como ao longo da sua evolução, a investigação neurocientífica adotou a célula neuronal como objeto de estudo primordial. A identificação precoce das capacidades intrínsecas de condução e excitabilidade destas células assumiu-se como a principal premissa a partir da qual foi gerada a hipótese de que os neurónios seriam os principais executores das funções do sistema nervoso central. De entre outros tipos celulares que os neurocientistas assumiam não pertencer à linhagem neuronal, foram descritas células de morfologia estrelada, que no seu conjunto alguém escreveu um dia “parecerem reproduzir a paisagem do Universo no cérebro do Homem”. Lirismos à parte, e como já certamente adivinham, estas células foram pragmaticamente chamadas de astrócitos, e apesar de rapidamente se ter concluído que estas eram abundantes no cérebro dos mamíferos, o seu papel permaneceu enigmático por longas décadas. Com efeito, os astrócitos eram funcionalmente remetidos para um mero papel de suporte, ou seja constituíam a “matriz tridimensional que suportava os circuitos neuronais”. A descoberta nos anos 80 de que afinal estas células teriam propriedades eletrofisiológicas, embora mecanisticamente díspares das células neuronais, foi alvo de crítica e de difícil aceitação no seio da comunidade científica. De tal modo que torna-se curioso constatar que esta corrente neurocêntrica prevaleceu até há relativamente pouco tempo. A importância dos astrócitos, assim como de outros tipos celulares gliais, foi amplamente revista nos últimos 15 anos, chegando-se à incontestável conclusão de que estes presumíveis “atores secundários” desempenham na prática um papel principal na homeostasia e função cerebrais. Um estudo recente desenvolvido no ICVS vem corroborar isso mesmo. Em síntese, este trabalho publicado na proeminente revista Molecular Psychiatry, demonstra que a simples ablação seletiva de astrócitos no córtex pré-frontal resulta no desenvolvimento de défices cognitivos. Embora algumas doenças psiquiátricas e neurológicas já tivessem sido associadas a défices na função astrocítica, permanecia até à data pouco claro se isto estaria na génese da doença ou se emergiria apenas enquanto consequência desta. João Oliveira, referiu “ser a primeira vez que se induzem défices cognitivos pela simples interferência com a função astrocítica”. Em 3 passos simples, entendamos então qual a abordagem que esta equipa de investigação adotou:

• Num grupo de animais (ratos) teste, injetou-se intracranialmente uma toxina que promove a morte seletiva de astrócitos. A injeção foi direcionada especificamente ao córtex pré-frontal, uma vez que é uma região cerebral que participa no controlo de modalidades cognitivas como o planeamento, tomada de decisão e memória de t raba lho, modal idades estas que estão normalmente comprometidas não só em doentes com doenças psiquiátricas mas também em

doenças neurodegenerativas como é o caso da doença de Alzheimer.

• O procedimento foi reproduzido em animais controlo, injetando-se uma solução inócua, sem toxina na sua composição.

• Os animais foram submetidos a diferentes testes comportamentais para aferir a integridade de diferentes modalidades cognitivas.

Através desta abordagem, tornou-se evidente que os animais injetados com a toxina desenvolveram défices cogni t ivos, enquanto que os animais contro lo a p r e s e n t a r a m f u n ç ã o c o g n i t i v a p r e s e r v a d a (salvaguardando assim que as alterações detetadas não seriam secundárias ao procedimento cirúrgico de injeção intracraniana). A análise cuidada de quais as alterações cerebra is que es ta r iam na base dos défices comportamentais observados revelou algo também surpreendente: se era verdade que a toxina promoveu a morte seletiva de astróctios, era também verdade que após algum tempo as células neuronais que coexistiam com esses astrócitos começavam também a morrer. Assim, o estudo destes investigadores Portugueses demonstra de forma robusta que o compromisso da função astrocítica pode ser uma causa primária dos distúrbios cognitivos típicos de diferentes doenças neuro-psiquiátricas (e não o mero resultado das mesmas), sugerindo ao mesmo tempo o mecanismo subjacente: “Este estudo suporta a perspetiva de que a população astrocítica, enquanto alvo patológico primário no contexto de algumas doenças neuropsiquiátricas, pode promover processos neurodegenerativos em regiões cerebrais específicas. Isto é de tal modo relevante, que a doença psiquiátrica pode ser mimetizada apenas afetando a função dos astrócitos!”, explica João Oliveira. Os resultados deste trabalho consubstanciam uma perspetiva renovadora na patogénese da doença mental, conferindo uma importância chave ao papel dos astrócitos e abrindo perspetivas quanto a novas abordagens terapêuticas. Num mero exercício lúdico, perguntei um dia a uma turma com pouco mais de 20 alunos do ensino secundário quais as células através das quais o sistema nervoso exerce as suas funções. A resposta “neurónios” foi imediata, dada quase em uníssono. Alguns responderam com um semblante sério, como o de quem acabara de ser insultado e pedia implicitamente explicações quanto ao facto de eu lhes ter feito uma pergunta tão absurdamente óbvia. Uma rapariga no canto da sala comentou “existem as outras células do cérebro. Como é que se chamam? Ah, são os astrócitos não são?”. Não sei se naquele instante a aluna do canto da sala percebeu que a sua resposta era tão correta como a que foi dada pelo resto da turma. Não pude deixar de sorrir e de pensar que se repetir a pergunta daqui a 5-10 anos talvez oiça a reposta “astrócitos” mais vezes.

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C L U B E S E Q U Ó I A

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hajaARTE!

«Quando penso na minha mulher, penso sempre na sua cabeça. Para começar, na sua forma. (…) E o que está dentro dela. Também penso nisso: na sua mente. No seu cérebro, com todas aquelas circunvoluções, e os seus pensamentos a percorrerem-

nas como centopeias velozes e frenéticas. Como uma criança, imagino-me a abrir-lhe o crânio, a desenrolar-lhe o cérebro e a vasculhá-lo, tentando agarrar e imobilizar os seus pensamentos. Em que estás tu a pensar, Amy? A pergunta que mais vezes fiz

durante o nosso casamento, mesmo que a não tenha feito em voz alta, mesmo que a não tenha feito à pessoa que podia responder. Suponho que estas perguntas surjam como nuvens ameaçadoras sobre todos os casamentos: Em que estás a pensar?

O que estás a sentir? Quem és tu? O que é que fizemos um ao outro? O que é que vamos fazer?»

Crítica a “Em Parte Incerta”Núria Mascaranhas e João Dourado, 2º Ano

Aler tamos para a poss íve l presença de spoilers nesta crítica.

Talvez para quem tem por hábito ler thrillers, este livro acabe por ser, em parte, semelhante a tantos outros. No entanto, para nós, Em Parte Incerta destaca-se completamente dos demais do mesmo género literário, n ã o s ó p e l o e n r e d o envolvente e pelo brilhante d e s e n v o l v i m e n t o d o mesmo, mas também pela gen ia l recor rênc ia ao humor negro, ao sarcasmo e a uma linguagem brusca e crua pela par te da autora. A tudo isto, e essencialmente, junta-se o inevitável facto de Gillian

Fllyn nos ter ludibriado inteiramente… Um best-seller que se centra, sobretudo, em questões relacionadas ao casamento, faz com que todos os casais que leiam o livro ou vejam a sua recente adaptação cinematográfica, se questionem sobre a sua relação, o quão bem conhecem o seu parceiro, o perigo da rotina e do desleixo inerente a relações que já duram há algum tempo, bem como sobre a forma como o ser humano gosta de manipular e enganar os outros. Em Parte Incerta põe em evidência a dicotomia conjugal entre o ser e o parecer: Amy e Nick aparentam, inicialmente, ser o casal perfeito; no entanto, à medida que a trama se desenrola, podemos perceber que esta realidade está longe de ser verdade. Ela queria ser a "rapariga boazinha" para o agradar, ele queria estar à altura dela, e, dessa forma, acabaram por criar figuras idealizadas um do outro que, com o passar do tempo, se foram desmoronando. O caso do desaparecimento de Amy começa a ganhar maiores repercussões quando a polícia decide marcar uma conferência de imprensa, onde participam tanto o marido, como os pais da mesma. A forma como Nick age perante as câmaras e o comentário dos meios de c o m u n i c a ç ã o s o c i a l i n e re n t e a e s s e m e s m o comportamento, leva a que a polícia rapidamente faça

dele o principal suspeito do caso que envolve a sua esposa. À custa disso, é igualmente feita uma sátira aos media e às redes sociais. São julgadas a forma  como alguns jornalistas mudam de opinião quando lhes convém, a criação de verdadeiras “novelas mexicanas” em torno de casos sérios e reais, o facto de uma pequena selfie poder arruinar a imagem de uma pessoa, entre outras mensagens subliminares... Centrando-nos agora no final do livro, digamos que é absurdamente macabro, arrepiante e algo frustrante… A cereja no topo do bolo! Ao longo de todas as páginas, Flynn vai deixando pegadas que nós, le i tores concentrados e dedicados, seguimos até ao destino final. Acabando este fantástico escrito, apercebemo-nos de que nenhuma ponta fora deixada solta, e a autora fora capaz de nos hipnotizar com tantas voltas e reviravoltas. Um conselho: não acabe de ler este livro à noite! A 2 de Outubro chega-nos aos cinemas a adaptação cinematográfica de Em Parte Incerta – Gone Girl por David Fincher, realizador de outros filmes bem cotados pela crítica de Hollywood. Em resumo: excelente enredo, admirável banda sonora, rigorosa realização e perfeita seleção de atores. Um magnífico exemplo de como um thriller deve fazer a audiência ficar pregada à sua cadeira do início ao fim da sessão, enquanto é brindada com muitas surpresas. Não é necessária uma música assustadora, cenas de ação espampanantes ou diálogos cliché que indiquem que algo de menos bom se vai passar. Fincher consegue-nos fazer tremer de ansiedade com um simples movimento de câmara, um silêncio prolongado das personagens ou o simples som de umas persianas a moverem-se. Ficamos assim, na expectativa, enquanto os protagonistas vão vivendo uma série de intrigas extremamente bem elaboradas, que nos fazem questionar o que acabámos de ver, e mudam a ideia que se tem de cada personagem. De salientar a performance de Ben Affleck e Rosamund Pike, que surpreendem todos os fãs, deslumbrando-nos com uma in te rpre tação espectacu la r de um casa l completamente disfuncional. A narrativa não linear e os vários pontos de vista em que a história é contada fazem nascer muitas dúvidas e questões nos espectadores, estando estes sempre um passo atrás em relação às personagens, nunca sabendo quem está a mentir e quem está a dizer a verdade. Assistam ao filme, acreditem que não darão pelo passar das duas horas e meia que este detém.

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hajaEditorial!NOME, NUMERO, EMAIL

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hajaSaúde! 17

hajaBRAGA!

Antes de mais, penso que não faria sentido continuar esta rubrica sem explicar o conceito em que ela se baseia. Na última edição do HajaSaúde! escrevi uma crónica sobre a Braga Romana – Reviver Bracara Avgvsta, onde para além de abordar o evento em si, abordei a Braga Romana permanente, incentivando-nos a ser Bracaraugutanos durante o ano inteiro. Neste âmbito, esta crónica tem como primordial objectivo, não só no campo da Bracara Avgvsta mas também no universo histórico da cidade de Braga, tornar-nos bracarenses mais inteiros, quer estudantes de outras naturalidades quer estudantes daqui naturais, pois nunca se conhece tudo acerca desta cidade. Assim, serão abordados o património material e imaterial desta cidade, mormente expressões, tradições, lugares, museus e outros. Ora, para estrear esta crónica, nada melhor que uma expressão vulgarmente utilizada – “És de Braga? É que deixaste a porta aberta!”.! Uma das explicações (a mais vulgarmente utilizada) para esta expressão prende-se com a existência do Arco da Porta Nova. No início do século XVI, o Arcebispo D. Diogo de Sousa, mandou edificar uma nova porta na muralha, a Porta Nova. No entanto, como na altura as guerras já haviam cessado e como a cidade já ultrapassara os limites da muralha, não foi colocada nenhuma porta de madeira naquele arco, adquirindo este o nome de Arco da Porta Nova. Assim, e considerando

que todas as outras portas da muralha continuavam a ser fechadas à chave no final do dia, exceptuando esta Porta Nova, os bracarenses assumiram-se como pioneiros em deixar portas das muralhas abertas. Outra explicação relaciona-se com

uma história que nos conta que havia um sábio de Braga que, sendo bom conselheiro, visitava as casas das pessoas para lhes dar conselhos. No entanto, como as moradias eram sombrias, este homem pedia que deixassem as portas das casas abertas, alegando que assim beneficiava de uma brisa que lhe arejava o cérebro, melhorando a sua capacidade de dar conselhos. Finalmente, há ainda uma outra explicação, que defende que a expressão se deve ao espírito comunitário da região minhota, em que era vulgar as pessoas deixarem a porta aberta para que os vizinhos pudessem entrar sempre que precisassem de alguma coisa ou se quisessem falar sobre algo. A verdade é que, independentemente da origem desta expressão, ela reflecte muito daquilo que a cidade de Braga é. Cidade da juventude e em constante progresso, mantém as suas portas abertas para quem cá quiser entrar, seja para estudar, trabalhar, visitar,… O que for. Assim, aos “novos bracarenses” (estudantes recém-chegados) sejam bem-vindos e deixem-se encantar com esta bela cidade e aos “bracarenses experientes” deixem-se encantar de novo e descubram os pormenores desta nossa casa.

De portas abertas para

uma nova rubrica

Joana Silva, 3º Ano

“És de Braga? É que deixaste a porta

aberta!”

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18 hajaSaúde!

hajaSEXUALIDADE!

Turismo: Mais do que conhecerJorge Silva, 4º Ano

O turismo sexual é definido pela Organização Mundial de Turismo, uma área especializada das Nações Unidas, como “uma viagem organizada que objetiva uma relação sexual entre o turista e os residentes do destino da viagem”. Tal é um fenómeno social maioritariamente associado a homens, comummente de regiões ocidentais, e os principais destinos são países da América do Sul e Sudoeste Asiático. Em predomínio, os praticantes deste tipo de turismo procuram atividades pagas como prostituição, acompanhantes ou striptease, o que salienta algumas questões quer legais, quer a nível de saúde, associadas a estas atividades. Já o turismo sexual no sexo feminino é muito menos frequente mas também existe, sendo os locais mais frequentes do mesmo o Brasil e Sul da Europa (Portugal, Espanha e Grécia). A prostituição é uma atividade legal na maioria dos países da América do Sul (10 dos 12, sendo regulada em 7 dos mesmos), enquanto o contrário se verifica nas zonas do Sudeste Asiático, sendo apenas legal na Tailândia e em Timor-Leste. Tal tornou a região Tailandesa como um dos principais destinos de turismo sexual, situação também exacerbada pela pobreza generalizada das regiões rurais do país. Não sendo a prostituição uma atividade regulada neste país, tal levanta problemáticas associadas à saúde não só dos turistas, mas também da população local, nomeadamente a nível de infeções

sexualmente transmissíveis (especialmente a transmissão do VIH, que se mostrou estar altamente correlacionado com a prostituição). Outra problemática a salientar prende-se com o facto de que este tipo de turismo pode também ser explorado e levar a uma exacerbação do tráfico humano, quer de mulheres, quer de crianças: a regularização, controlo e criação de leis associadas à prostituição seriam uma medida de alto impacto quer a nível de saúde pública (sendo em alguns locais onde a prostituição é regulada, obrigatório o rastreio de algumas infeções sexualmente transmitidas), quer a nível da redução tráfico humano, tornando o turismo sexual algo mais seguro, disponível e com menores repercussões sociais. Esta atividade, apesar de atualmente ter uma conotação negativa e se associar a algumas questões legais e de saúde, não deve ser necessariamente visualizada como algo imediatamente pejorativo: apesar dos riscos associados, a melhoria das condições associadas à prostituição tornaria esta atividade mais compreensível globalmente. Contudo, estas melhorias parecem ser ainda muito longínquas, especialmente devido ao estereótipo mundial da prostituição (basta procurar sinónimos desta palavra na internet, para facilmente encontrar vocábulos como “degradação” e “corrupção”…).

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hajaSaúde! 19

Muitos videojogos têm sido criados com um intuito maioritariamente educacional, combinando uma vertente de aprendizagem com uma de entretenimento. Assim como ser um jogador assíduo de Sudoku desenvolve algumas capacidades como a memória, também videojogos como a série mundialmente reconhecida Brain Training têm tais vantagens, fornecendo até alguma informação sobre o progresso do treino. Os benefícios deste tipo de abordagens associadas aos videojogos estão já perfeitamente estabelecidas, mas algumas surpresas estão também por de trás dos tipos de jogos mais negativamente conotados, principalmente os temidos FPS (First Person Shooters). Os jogos do género FPS são caracterizados por várias e muito frequentes cenas que envolvem violência com a utilização de armas de fogo, tendo a maioria dos títulos uma recomendação pela PEGI e pela ESRB (as duas principais entidades que classificam a faixa etária recomendada para cada videojogo) para maiores de 16 ou 18 anos, com a advertência para conteúdos de violência. Este tipo de jogos tem sido visualizado como indutor de comportamentos agressivos nos seus jogadores (especialmente adolescentes), e é geralmente tido como isento de benefícios. Contudo, não só a correlação entre jogos violentos e comportamentos agressivos foi descreditada por vários estudos, como também uma variedade de trabalhos aponta para benefícios a nível da memória, entre outras funções cognitivas. Num estudo publicado na revista Psychological Research (Colzato, 2012), foi demonstrada uma superioridade de jogadores experientes de FPS, em comparação com não jogadores, na capacidade de memória de trabalho,

sendo que os primeiros têm provavelmente uma melhor capacidade de eliminação de memórias dispensáveis, o que lhes permite reter a informação mais importante. A explicação subjacente a tal prende-se, provavelmente, com a necessidade do jogador se adaptar rapidamente a alterações visuais e sonoras de um meio em constante alteração, tendo de rapidamente se focar em novos estímulos e evitar outros (como disparar contra os inimigos e não contra companheiros de equipa), o que leva ao desenvolvimento da capacidade de memória de trabalho.

hajaTECNOLOGIA!

Como os videojogos mexem com o teu cérebro: as perspectivas de um Gamer e de um Non-gamer

Jorge Silva, 4º Ano - GAMER

Ana Sofia Milheiro, 4º Ano - NON-GAMER

Dada a minha experiência limitada no que toca a videojogos, a redação desta rubrica foi um verdadeiro desafio. Mas em vez de me sentir como um peixe fora de água, tentei interiorizar o verdadeiro espírito das poucas personagens de videojogos que conheço e dar o meu melhor. Se surgir o Game Over, paciência. Haverá sempre uma próxima edição deste jornal! O único aviso que a minha preocupada mãe fazia sempre que me encontrava entretida com um videojogo era: “Não jogues muito tempo que isso faz mal à vista!”. Mas, sinceramente, era um comentário usado para videojogos, ler no carro, televisão… Nada específico, portanto. Nesta pesquisa, descobri que não só esta preocupação era infundada, como muitos outros efeitos associados aos videojogos não foram refletidos em estudos científicos. Nem tudo o que encontrei foi novidade para mim: já conhecia o efeito aditivo dos videojogos pelo desafio que podem representar, mas confesso que descobrir que videojogos podem ter um efeito terapêutico em diversas perturbações, como défices visuais ou doenças neurodegenerativas foi prazeroso e, de certa forma, surpreendente. Os videojogos interferem com circuitos dopaminérgicos cerebrais, o que explica não só a adição associada, como também os seus efeitos a nível da aprendizagem e memória. Num estudo publicado na revista PLOS ONE (Holmes, 2012), três grupos de pessoas foram sujeitas a uma série de imagens violentas e perturbadoras e, de

VS.

Figura 1. O jogo Far Cry 3 é um típico exemplo de um FPS com elevado sucesso comercial e de grande conhecimento mundial.

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20 hajaSaúde!

hajaPACIÊNCIA!

Tiago Rosa, 4º Ano

Nota Introdutória ao Leitor: A seguinte rubrica pretende despertar novos sentimentos nos leitores do Haja,

nomeadamente de espanto e estupefação com a estupidez.

Obrigado. Reader discretion is advised (or not).

Anonymous writer is anonymous

Mulher processa Disney por lhe terem roubado a vida no filme “Frozen”

Toda a gente conhece o filme, por isso escuso de o descrever, quem não conhece que o veja. Embora (quase) todo o mundo reconheça que o filme seja baseado no original do dinamarquês Hans Christian Andersen de 1844, a escritora peruana Isabella Tanikumi discorda desta afirmação e alega que o filme se baseia na sua autobiografia “Anseios do Coração” lançada em 2010, no qual a autora descreve a sua infância nas montanhas no Peru. O processo movido pela peruana processa a Disney em 250 milhões de dólares por este “roubo” de identidade. Só é pena que na autobiografia desta autora não haja a aparição de um fantástico boneco de neve falante, gostaria mesmo de confirmar a sua existência.

Supremo Tribunal Administrativo diz que o sexo já não é importante aos 50 anos.

O caso começou em 1995 quando uma mulher com história de infeções genitais frequentes, foi submetida a uma cirurgia para tentar solucionar o problema. Durante a operação um nervo terá sido lesado por acidente, passando a

seguida, um grupo jogou Tetris e outro respondeu a um q u i z , e n q u a n t o o o u t r o g r u p o n a d a f e z . Surpreendentemente, o grupo que jogou Tetris demonstrou uma menor ocorrência de flashbacks. Pensa-se que este efeito não se deve apenas ao efeito distractador do jogo, mas que este interfere com os mecanismos de processamento de memória. Assim, o Tetris pode funcionar como uma espécie de “vacina cognitiva”, reduzindo os flashbacks pós-experiências traumáticas, uma característica importante do Stress Pós-Traumático. Esta pesquisa tornou-se ainda mais interessante quando revelou que até os videojogos com maior conotação negativa, pela sua violência e agressividade, como Grand Theft Auto ou Terminator 2: Judgement Day, têm efeitos benéficos a nível da memória, atenção e até de alívio da dor. Além disso, não parece haver grande evidência que os jogadores apresentem comportamentos mais violentos.

Figura 2. Tetris é um videojogo verdadeiramente intemporal, tendo sido criado em 1984 e, presentemente, pode ser jogado em praticamente qualquer dispositivo electrónico.

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referida mulher a sofrer de incontinência urinária, dores, dificuldade em sentar-se e incapacidade em manter relações sexuais. Após o primeiro julgamento, foi atribuída à vítima uma indeminização de 175 mil euros.

Após um recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, os juízes resolveram reduzir a indemnização para 111 mil euros, fundamentando a redução no acórdão dizendo que “ aos 50 anos, a atividade sexual não tem a importância que assume em idades mais jovens” entre outros argumentos de que o erro médico apenas agravou uma situação inicial já de si dolorosa e de que “à medida que a idade avança, a importância do sexo vai diminuindo.”

The Invisible Art Exposition

Para demonstrar como as pessoas não podem acreditar cegamente em tudo o que lêem.

Há algumas semanas, o CBC (Canadian Broadcasting Corporation) publicou uma noticia onde se relatava uma exposição de arte ocorrida em Nova Iorque. Nesta exposição, as peças de arte eram invisíveis, tendo a artista, Lana Newstrom, dito que “arte é baseada na imaginação e a minha obra requer que o público interaja com ela. Eles têm de imaginar a pintura ou a escultura em frente deles.” A mesma notícia dizia ainda que algumas das peças já tinham sido vendidas em leilão pelo módico preço de 35 mil dólares, aparecendo também uma fotografia da exposição na qual um grupo de pessoas observava as paredes vazias e admirava o trabalho da artista. Não tardou a estalar o escândalo com várias pessoas do mundo da arte a criticar este “novo conceito de arte” e a chamar de farsa à autora.

Exposição interessante, não acham?

Bem, a verdade é que depois de tão “calorosa” reação à notícia, uma segunda notícia foi publicada para explicar aos críticos que na verdade tudo não era mais que uma sátira. Uma sátira dos autores de “This is That”, um programa de sátira da rádio canadiana, que se especializa em criar falsas noticias para satirizar assuntos do quotidiano. “One of the sculptures is really heavy, so I probably will have to lift it with my legs” e “I did painting, I did sculture, installation, mod-podge but no one was biting. No gallery would take my work” são algumas das muitas falas encarnadas pelos dois comediantes Pat Kelly e Peter Oldring. Não será difícil agora de perceber que a foto mostrada era na verdade um photoshop de uma exposição feita em Milão uns anos antes. Se depois de tudo isto ainda ficaram curiosos, podem sempre visitar o site da “artista” LanaNewstrom.com e maravilhar-se com os comentários, que continuam a surgir, às suas belas obras de arte.

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hajaPASSATEMPOS!

hajaSUDOKU!

Dificuldade: Fácil Dificuldade: Dificil

Horizontais

1. O melhor ano da Universidade, ainda que discutivelmente4. Fruto típico desta época bastante associado ao Halloween6. Série de videojogos retratando a criminalidade de grandes metrópoles8. Ouriço azul, personagem de um célebre videojogo12. Número edição do Minho Medical Meeting deste ano13. Boneco de neve falante do mais recente filme da Disney15. As "estrelas" do nosso cérebro17. Série de videojogos que segue as aventuras de um caçador de tesouros19. Cidade onde ocorre Em Parte Incerta20. Primeiro país da América do Sul visitado por Francisca Bartilotti

Verticais

2. País onde surgiu a prática do Gap Year3. Cidade natal do autor do conto que inspirou Frozen4. Estrutura cerebral associada à sensação de prazer e mecanismos de adicção5. País asiático onde a prostituição é legal7. Título religioso de quem mandou construir a Porta Nova14. Apelido da autora de Em Parte Incerta15. Colega de Rebecca que recusou uma bolsa de investigação16. Apelido do director do filme The Nightmare Before Christmas18. A melhor cidade para estudar, ainda que discutivelmente

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C L U B E S E Q U Ó I A

hajaSaúde! 23

hajaHUMOR!

Conselhos da Rebecca

Não tenham pressa em acabar o curso! Ah, um novo ano. O cheiro a sabedoria dos mais velhos, a suor dos mais novos.

A nostalgia é grande. Podem não acreditar, mas aqui a Rebecca também já foi caloura. Foi algures entre a Grande Depressão e a Aterragem na Lua, talvez ali pelo sécu lo XV I I I , no fim-de-semana a segu i r ao Renascimento.

Eram tempos tristes, porque ainda não havia cores, ainda era tudo a preto e branco. E foi numa bonita ocasião de céu cinzento e de árvores cinzentas que o primeiro dia de Universidade chegou. Oh, o nervosismo! – “Será que vou conseguir acabar este curso de Medicina, aqui na UM?”, matutava, desconhecendo por completo que o curso ainda não tinha sido criado. Nem tão pouco a UM. E mesmo Medicina, era um conceito pouco aplicado quando, nas ruas, um texugo morto era tido como uma dádiva alimentar dos Deuses. E foi por uma viela repleta de idosos gastroenteríticos nos seus 30 e poucos anos que enveredei, avistando ao longe o grande edifício que nos próximos anos me serviria de guia profissional, espiritual e ideológico: o Celeiro do Sr. Aníbal.

Lá havia de tudo: porcos, cavalos, sapiência, alface. O tamanho do Celeiro, esse, era directamente proporcional à minha vontade de aprender: era mais ou menos. Mas as maiores aprendizagens, realizei-as nos momentos mais inesperados, aquando da minha participação na Praxis. Os meus Doutores – todos eles de créditos firmados, distinguidos pela revista Nova Gente como o grupo de pessoas com o odor corporal mais vil, em duas edições não consecutivas! – conheceram-me com o pé esquerdo. No meu rabo. “É um pontapé de boas-vindas”, diziam eles, mas eu nunca fiquei 100% convencida. Pouco depois me diziam para confraternizar com os meus colegas: os porcos, os cavalos, a alface – alface essa que acabou por ter a melhor média do ano, tendo-lhe sido oferecida uma bolsa de investigação na Universidade de Harvard. Mas ela era uma alface de família, e por cá ficou. Na minha opinião, bem fez.

Grandes laços foram criados entre nós. Nem todos éramos animais racionais, já que nesse capítulo um dos cavalos levava claro avanço (desde cedo lia autores como Shakespeare ou José Saramago, enquanto que o resto de nós discutia essencialmente a Casa dos Segredos). Mas aprendemos a pensar como um só, ou, na maior parte do tempo, a não pensar de todo, mas igualmente como uma unidade. Recordo com júbilo um episódio marcante, e que certamente demonstra esse bonito espírito que partilhávamos: num dia chuvoso, estava a chover; o Pívias – nome de praxe de um dos porcos – estava a atirar lama à Porca – o meu nome de

praxe. Quando um pouco me entrou para os olhos, perdi momentaneamente a visão; em meu socorro, 20 colegas acudiam o mais rápido que conseguiam. Olhem só para eles a correr! Que vontade! Que camaradagem! Que… chacina. Passavam directamente por um campo de minas, em plena guerra do Vietnam. Nesse dia, milhares de famílias locais não precisaram de ir ao talho, já que receberam encomendas ao domicílio. Até alguns Ikea’s da zona foram atingidos por carne de cavalo – à qual souberam sabiamente dar uso, sempre sem a desrespeitar. E aí está, meus amigos: quando um de nós vai pelos ares, todos vamos! Menos eu, que continuava cega, e só soube da situação quando na minha boca caiu um pedaço de um Doutor meu. Penso eu, se a memória não me atraiçoa, que era da pá.

Hoje, 783 anos depois, encontro-me já numa fase bem avançada da minha vida. Estou, pois, no 5º ano do Curso de Medicina. Há quem me garanta que o curso não é o mesmo, mas ouço relatos de pessoas que perderam quase tanto tempo das suas vidas neste curso quanto eu. Seria demasiada coincidência. Pois então, a Rebecca aconselha: se estão em Medicina na UM, preparem uma marmita, que isto ainda pode demorar. Mas vai valer a pena! E se não valer, uma coisa é garantida – os amigos são para sempre! Isto é, enquanto não explodirem num campo de minas.

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NEMUM - Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade do MinhoEscola de Ciências da Saúde da Universidade do MinhoCampus de Gualtar, 4710 - 057 BRAGA

Email: [email protected]

NEMUM - Núcleo de Estudantes de Medicina da Universidade do MinhoJornal hajaSaúdeTiragem: 100 ExemplaresEdição: Sofia Leal, Emanuel Carvalho, Pedro PeixotoColaboradores: Ana Sofia Milheiro; António Mateus-Pinheiro; Francisca Bartilotti; Gonçalo Cunha; Joana Silva; João Dourado; Jorge Silva; Núria Mascaranhas; Pedro Peixoto; Sofia Ferreira; Sofia Leal; Sofia Santos; Tiago Rosa.Paginação & Grafismo: Sara GuimarãesImpressão por: Copyscan

A Rebecca também quer que venhas para o haja! .

Se queres participar envia um email para:

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