Guia Acadêmico - (Direito Civil - Sucessões)

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O termo “sucessão”, em sentido amplo, significa o in- gresso de uma pessoa na posição jurídica que pertencia a outra. A sucessão pode dar-se por ato “inter vivos” ou “causa mortis”. A sucessão por ato “inter vivos” ocorre com a transferência da titularidade de bens ou direitos entre pessoas, como no caso da compra e venda, doação etc. A sucessão “causa mortis” verifica-se com a transmissão de um patrimônio em virtude da morte de seu titular. É desta última espécie de sucessão que trata o Livro V da Parte Especial do Código Civil (arts. 1.784 a 2.027). Esta é a denominada sucessão em sentido estrito. Nesse contexto, a palavra “sucessão” é empregada para designar aque- la que decorre da morte de alguma pessoa. A morte é o fato que desencadeia a sucessão, uma vez que extingue a personalidade jurídica e impõe a necessidade de que outro indivíduo assuma a posição que era ocupada pelo falecido. O direito das sucessões, como se vê, é o ramo do direito que estabelece os princípios e regras que regu- lam a transmissão do conjunto de direitos e obrigações do morto aos seus sucessores. 1. Momento. Considera-se aberta a sucessão no exato instante da morte do “de cujus”. Essa expressão latina é utilizada para referir-se ao morto e consiste na abreviatura da frase “de cujus sucessione agitur”, que significa “aquele de cuja sucessão se trata”. A morte pode ser real ou presu- mida. Será real quando comprovada por meio de exame médico que ateste a certeza de sua ocorrência. A prova da morte real se faz mediante a apresentação do atestado de óbito. A morte presumida, por outro lado, ocorre quando, embora não haja certeza de sua ocorrência, existe alta probabilidade de que ela tenha se consumado. O Código Civil autoriza a declaração judicial de morte presumida sem declaração de ausência em duas hipóteses: a) se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; b) se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Nos casos de morte presumida, o juiz fixará na sentença a data provável do falecimento (art. 7º, parágrafo único, do CC), e este será considerado o dia da abertura da sucessão. Há ainda a possibilidade de decla- ração de morte presumida com decretação de ausência (arts. 22 a 39 do CC), hipótese em que a presunção ocorre a partir do momento em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva (art. 6º, parte final, do CC). 2. Transmissão da herança. A conseqüência imediata e automática da abertura da sucessão é a aquisição pelos herdeiros da propriedade e da posse dos bens da herança. Essa regra decorre do princípio da “saisine”, previsto no art. 1.784 do CC: “aberta a sucessão, a herança transmite- se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. A transmissão ocorre ainda que os herdeiros não tenham conhecimento da morte e independe de qualquer ato pra- ticado por eles. Vale ressaltar que a posterior aceitação da herança apenas confirma a transmissão, que ocorreu no momento da abertura da sucessão (art. 1.804 do CC). Verifica-se, pois, que o direito de “saisine” constitui uma ficção legal que tem por finalidade impedir que o patrimô- nio do “de cujus” fique temporariamente sem titular. Para que ocorra a transmissão da herança é necessário que o herdeiro sobreviva ao “de cujus”, ainda que por pouco tempo. Em alguns casos, todavia, não é possível determinar qual deles morreu primeiro, por exemplo, em um acidente que resulta na morte de dois ou mais mem- bros da mesma família. Pode ser que um deles tenha so- brevivido alguns minutos a mais que os outros e por isso tenha adquirido a qualidade de herdeiro dos demais, hipótese em que receberia por herança o patrimônio dos envolvidos e logo em seguida o transmitiria aos seus sucessores. O CC estabelece que quando não for possível determinar quem faleceu primeiro, haverá a presunção de que a morte ocorreu no mesmo instante (art. 8º do CC). Essas hipóteses de presunção de morte simul - tânea são chamadas de comoriência. A conseqüência jurídica da comoriência é a de que não há transmissão de herança entre as pessoas. 3. Local da abertura da sucessão. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido (art. 1.785 do CC) e o foro desse local será competente para o inventário, a partilha, a ar- recadação, o cumprimento de disposições de última vontade e todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. Se o autor da herança não pos- suía domicílio certo, será competente o foro da situação dos bens. Se não tinha domicílio certo e possuía bens em lugares diferentes, será competente o do lugar em que ocorreu o óbito (art. 96, parágrafo único do CPC). LINK ACADÊMICO 1 Quanto à fonte do direito sucessório, a sucessão pode ser testamentária ou legítima (art. 1.786 do CC). A sucessão testamentária ocorre quando o autor da herança determina o destino de seus bens por disposição de última vontade, ou seja, por meio de testamento. O testador não terá liberdade total para dispor de seus bens se houver herdeiros necessários (art. 1.845 do CC), caso em que ele só poderá dispor da metade da herança (art. 1.789 do CC), chamada porção disponível. Esses herdeiros têm direito a uma participação mínima na he- rança, chamada legítima, e qualquer disposição testamentária que os afaste será considerada ineficaz. Somente em casos excepcionais admite-se a exclusão dos herdeiros necessários, conforme será estudado no capítulo “excluídos da sucessão”. A sucessão legítima, legal ou “ab intestato” é aquela em que a própria lei determina o destino do patrimônio do “de cujus”, presumindo qual seria sua vontade. A lei estabelece uma or- dem de preferência entre os sucessores, chamada ordem de vocação hereditária, prevista no art. 1.829 do CC. A sucessão legítima ocorre nos casos do art. 1.788 do CC. Verifica-se que a sucessão pode ser legítima e testamentária ao mesmo tempo, por exemplo, quando o testamento for parcial. Quanto aos efeitos ou forma de determinação dos bens a su- cessão pode ser a título universal ou a título singular. Na su- cessão a título universal o herdeiro recebe todo o patrimônio do “de cujus” ou uma fração dele. É o que ocorre na sucessão legítima, mas pode ocorrer também na sucessão testamentária, por exemplo, se o testador deixar 20% de seu patrimônio para determinada pessoa. O sucessor a título universal é chama- do herdeiro e o objeto de seu direito é a herança. Importante ressaltar que a herança abrange tanto os ativos quanto os passivos, e o herdeiro assume a mesma posição jurídica do finado, sendo titular da totalidade ou de parte da universalidade de direitos deixada por herança. A sucessão a título singular só se dá por meio de testamento. Ocorre quando o testador deixa ao sucessor um bem certo e determinado ou vários bens determinados, como um automóvel, uma casa etc. O sucessor a título singular é chamado de legatário e o objeto de seu direito é o legado. A doutrina destaca, ainda, a denominada sucessão contratu- al, pactícia ou pacto sucessório: é aquela regulada por meio de um contrato que tem por objeto direitos sobre a herança de uma pessoa que ainda não morreu. O Código Civil proíbe ex- pressamente esse tipo de contrato (art. 426). Alguns autores sustentam que o art. 2.018 do CC, ao permitir que o ascenden- te faça a partilha em vida entre os descendentes, configuraria uma exceção à proibição dos pactos sucessórios. Outros doutrinadores, no entanto, afirmam que a hipótese não re- presenta uma exceção, pois a partilha em vida é simples doação, cujos efeitos são imediatos e não estão condicio- nados à morte do doador. A preferência entre os herdeiros do “de cujus” é normal- mente regulada pela ordem de vocação hereditária pre- vista no art. 1.829 do CC. Em alguns casos, entretanto, a lei estabelece outra ordem de vocação, diferente daquela contida no mencionado dispositivo legal. Fala-se então em sucessão anômala ou irregular. Podemos citar dois exemplos: a) a sucessão de bens de estrangeiros situa- dos no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do “de cujus” (art. 5º , XXXI, CF, e art. 10, §1º, da LICC); assim, será observada a ordem de vocação hereditária prevista na lei pessoal do finado, e não aquela do art. 1.829 do CC, sempre que for favorável ao cônjuge ou aos filhos brasileiros; e b) outro exemplo decorre da chamada “cláusula de reversão” con- tida em um contrato de doação (art. 547). Por meio dessa estipulação, se o donatário morrer, o bem doado volta ao patrimônio do doador e não é destinado às pessoas elencadas no art. 1.829 do CC. A sucessão anômala ou irregular, portanto, se dá sempre que a lei estabelecer re- gras diferentes da ordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829 do CC. 1. Herdeiro: é aquele que sucede na totalidade da heran- ça ou de parte desta, sem determinação de valor ou indi- vidualização de bem. Herdeiro testamentário é aquele nomeado em testamento pelo autor da herança. Herdeiro legítimo é aquele indicado pela lei em ordem preferencial (art. 1.829 do CC). O herdeiro legítimo pode ser necessá- rio ou facultativo. Herdeiros necessários, obrigatórios, legitimários ou reservatórios: são os ascendentes, descendentes e o cônjuge (art. 1.845 do CC). Estes têm direito à metade dos bens da herança, a denominada le- gítima, razão pela qual o autor da herança não pode fazer qualquer disposição testamentária que avance na parte atribuída por lei a cada um deles. Herdeiros facultativos: são os demais herdeiros indicados pela lei, com exclusão dos herdeiros necessários, ou seja, são herdeiros faculta- tivos os colaterais e o companheiro sobrevivente. O autor da herança poderá excluir os herdeiros facultativos da su- cessão, bastando para tanto que disponha da totalidade de seu patrimônio em testamento sem os contemplar. 2. Legatário: é o sucessor contemplado em testamento com coisa certa e determinada. Não se confunde com o herdeiro testamentário, que é aquele nomeado em testa- mento, mas sem individualização de bens. 1. Conceito: herança é o patrimônio deixado pelo morto, abrangendo seus bens, direitos e obrigações. A herança abrange, como se vê, tanto o ativo quanto o passivo do morto. O direito de herança é garantido constitucionalmen- te (art. 5º, XXX, CF). É importante lembrar que nem todas as relações jurídicas de que o “de cujus” era titular são transferidas a seus herdeiros. Não integram a herança os direitos e deveres sem conteúdo patrimonial, por exem- plo, os direitos decorrentes do poder familiar, a tutela, a curatela etc. 2. Características. O direito à sucessão aberta é bem imóvel para os efeitos legais (art. 80, II, do CC). Em decor- rência dessa característica, a cessão de direitos hereditá- DIREITO DAS SUCESSÕES CONCEITO DE SUCESSÃO ABERTURA DA SUCESSÃO ESPÉCIES DE SUCESSÃO ESPÉCIES DE SUCESSORES HERANÇA 1

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O termo “sucessão”, em sentido amplo, significa o in-gresso de uma pessoa na posição jurídica que pertencia a outra. A sucessão pode dar-se por ato “inter vivos” ou “causa mortis”. A sucessão por ato “inter vivos” ocorre com a transferência da titularidade de bens ou direitos entre pessoas, como no caso da compra e venda, doação etc. A sucessão “causa mortis” verifica-se com a transmissão de um patrimônio em virtude da morte de seu titular. É desta última espécie de sucessão que trata o Livro V da Parte Especial do Código Civil (arts. 1.784 a 2.027). Esta é a denominada sucessão em sentido estrito. Nesse contexto, a palavra “sucessão” é empregada para designar aque-la que decorre da morte de alguma pessoa. A morte é o fato que desencadeia a sucessão, uma vez que extingue a personalidade jurídica e impõe a necessidade de que outro indivíduo assuma a posição que era ocupada pelo falecido. O direito das sucessões, como se vê, é o ramo do direito que estabelece os princípios e regras que regu-lam a transmissão do conjunto de direitos e obrigações do morto aos seus sucessores.

1. Momento. Considera-se aberta a sucessão no exato instante da morte do “de cujus”. Essa expressão latina é utilizada para referir-se ao morto e consiste na abreviatura da frase “de cujus sucessione agitur”, que significa “aquele de cuja sucessão se trata”. A morte pode ser real ou presu-mida. Será real quando comprovada por meio de exame médico que ateste a certeza de sua ocorrência. A prova da morte real se faz mediante a apresentação do atestado de óbito. A morte presumida, por outro lado, ocorre quando, embora não haja certeza de sua ocorrência, existe alta probabilidade de que ela tenha se consumado. O Código Civil autoriza a declaração judicial de morte presumida sem declaração de ausência em duas hipóteses: a) se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida; b) se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Nos casos de morte presumida, o juiz fixará na sentença a data provável do falecimento (art. 7º, parágrafo único, do CC), e este será considerado o dia da abertura da sucessão. Há ainda a possibilidade de decla-ração de morte presumida com decretação de ausência (arts. 22 a 39 do CC), hipótese em que a presunção ocorre a partir do momento em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva (art. 6º, parte final, do CC).

2. Transmissão da herança. A conseqüência imediata e automática da abertura da sucessão é a aquisição pelos herdeiros da propriedade e da posse dos bens da herança. Essa regra decorre do princípio da “saisine”, previsto no art. 1.784 do CC: “aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. A transmissão ocorre ainda que os herdeiros não tenham conhecimento da morte e independe de qualquer ato pra-ticado por eles. Vale ressaltar que a posterior aceitação da herança apenas confirma a transmissão, que ocorreu no momento da abertura da sucessão (art. 1.804 do CC). Verifica-se, pois, que o direito de “saisine” constitui uma ficção legal que tem por finalidade impedir que o patrimô-nio do “de cujus” fique temporariamente sem titular. Para que ocorra a transmissão da herança é necessário que o herdeiro sobreviva ao “de cujus”, ainda que por pouco tempo. Em alguns casos, todavia, não é possível determinar qual deles morreu primeiro, por exemplo, em um acidente que resulta na morte de dois ou mais mem-bros da mesma família. Pode ser que um deles tenha so-

brevivido alguns minutos a mais que os outros e por isso tenha adquirido a qualidade de herdeiro dos demais, hipótese em que receberia por herança o patrimônio dos envolvidos e logo em seguida o transmitiria aos seus sucessores. O CC estabelece que quando não for possível determinar quem faleceu primeiro, haverá a presunção de que a morte ocorreu no mesmo instante (art. 8º do CC). Essas hipóteses de presunção de morte simul-tânea são chamadas de comoriência. A conseqüência jurídica da comoriência é a de que não há transmissão de herança entre as pessoas.

3. Local da abertura da sucessão. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido (art. 1.785 do CC) e o foro desse local será competente para o inventário, a partilha, a ar-recadação, o cumprimento de disposições de última vontade e todas as ações em que o espólio for réu, ainda que o óbito tenha ocorrido no estrangeiro. Se o autor da herança não pos-suía domicílio certo, será competente o foro da situação dos bens. Se não tinha domicílio certo e possuía bens em lugares diferentes, será competente o do lugar em que ocorreu o óbito (art. 96, parágrafo único do CPC).

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Quanto à fonte do direito sucessório, a sucessão pode ser testamentária ou legítima (art. 1.786 do CC). A sucessão testamentária ocorre quando o autor da herança determina o destino de seus bens por disposição de última vontade, ou seja, por meio de testamento. O testador não terá liberdade total para dispor de seus bens se houver herdeiros necessários (art. 1.845 do CC), caso em que ele só poderá dispor da metade da herança (art. 1.789 do CC), chamada porção disponível. Esses herdeiros têm direito a uma participação mínima na he-rança, chamada legítima, e qualquer disposição testamentária que os afaste será considerada ineficaz. Somente em casos excepcionais admite-se a exclusão dos herdeiros necessários, conforme será estudado no capítulo “excluídos da sucessão”. A sucessão legítima, legal ou “ab intestato” é aquela em que a própria lei determina o destino do patrimônio do “de cujus”, presumindo qual seria sua vontade. A lei estabelece uma or-dem de preferência entre os sucessores, chamada ordem de vocação hereditária, prevista no art. 1.829 do CC. A sucessão legítima ocorre nos casos do art. 1.788 do CC. Verifica-se que a sucessão pode ser legítima e testamentária ao mesmo tempo, por exemplo, quando o testamento for parcial. Quanto aos efeitos ou forma de determinação dos bens a su-cessão pode ser a título universal ou a título singular. Na su-cessão a título universal o herdeiro recebe todo o patrimônio do “de cujus” ou uma fração dele. É o que ocorre na sucessão legítima, mas pode ocorrer também na sucessão testamentária, por exemplo, se o testador deixar 20% de seu patrimônio para determinada pessoa. O sucessor a título universal é chama-do herdeiro e o objeto de seu direito é a herança. Importante ressaltar que a herança abrange tanto os ativos quanto os passivos, e o herdeiro assume a mesma posição jurídica do finado, sendo titular da totalidade ou de parte da universalidade de direitos deixada por herança. A sucessão a título singular só se dá por meio de testamento. Ocorre quando o testador deixa ao sucessor um bem certo e determinado ou vários bens determinados, como um automóvel, uma casa etc. O sucessor a título singular é chamado de legatário e o objeto de seu direito é o legado. A doutrina destaca, ainda, a denominada sucessão contratu-al, pactícia ou pacto sucessório: é aquela regulada por meio de um contrato que tem por objeto direitos sobre a herança de uma pessoa que ainda não morreu. O Código Civil proíbe ex-pressamente esse tipo de contrato (art. 426). Alguns autores sustentam que o art. 2.018 do CC, ao permitir que o ascenden-te faça a partilha em vida entre os descendentes, configuraria

uma exceção à proibição dos pactos sucessórios. Outros doutrinadores, no entanto, afirmam que a hipótese não re-presenta uma exceção, pois a partilha em vida é simples doação, cujos efeitos são imediatos e não estão condicio-nados à morte do doador. A preferência entre os herdeiros do “de cujus” é normal-mente regulada pela ordem de vocação hereditária pre-vista no art. 1.829 do CC. Em alguns casos, entretanto, a lei estabelece outra ordem de vocação, diferente daquela contida no mencionado dispositivo legal. Fala-se então em sucessão anômala ou irregular. Podemos citar dois exemplos: a) a sucessão de bens de estrangeiros situa-dos no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do “de cujus” (art. 5º , XXXI, CF, e art. 10, §1º, da LICC); assim, será observada a ordem de vocação hereditária prevista na lei pessoal do finado, e não aquela do art. 1.829 do CC, sempre que for favorável ao cônjuge ou aos filhos brasileiros; e b) outro exemplo decorre da chamada “cláusula de reversão” con-tida em um contrato de doação (art. 547). Por meio dessa estipulação, se o donatário morrer, o bem doado volta ao patrimônio do doador e não é destinado às pessoas elencadas no art. 1.829 do CC. A sucessão anômala ou irregular, portanto, se dá sempre que a lei estabelecer re-gras diferentes da ordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829 do CC.

1. Herdeiro: é aquele que sucede na totalidade da heran-ça ou de parte desta, sem determinação de valor ou indi-vidualização de bem. Herdeiro testamentário é aquele nomeado em testamento pelo autor da herança. Herdeiro legítimo é aquele indicado pela lei em ordem preferencial (art. 1.829 do CC). O herdeiro legítimo pode ser necessá-rio ou facultativo. Herdeiros necessários, obrigatórios, legitimários ou reservatórios: são os ascendentes, descendentes e o cônjuge (art. 1.845 do CC). Estes têm direito à metade dos bens da herança, a denominada le-gítima, razão pela qual o autor da herança não pode fazer qualquer disposição testamentária que avance na parte atribuída por lei a cada um deles. Herdeiros facultativos: são os demais herdeiros indicados pela lei, com exclusão dos herdeiros necessários, ou seja, são herdeiros faculta-tivos os colaterais e o companheiro sobrevivente. O autor da herança poderá excluir os herdeiros facultativos da su-cessão, bastando para tanto que disponha da totalidade de seu patrimônio em testamento sem os contemplar.

2. Legatário: é o sucessor contemplado em testamento com coisa certa e determinada. Não se confunde com o herdeiro testamentário, que é aquele nomeado em testa-mento, mas sem individualização de bens.

1. Conceito: herança é o patrimônio deixado pelo morto, abrangendo seus bens, direitos e obrigações. A herança abrange, como se vê, tanto o ativo quanto o passivo do morto. O direito de herança é garantido constitucionalmen-te (art. 5º, XXX, CF). É importante lembrar que nem todas as relações jurídicas de que o “de cujus” era titular são transferidas a seus herdeiros. Não integram a herança os direitos e deveres sem conteúdo patrimonial, por exem-plo, os direitos decorrentes do poder familiar, a tutela, a curatela etc.

2. Características. O direito à sucessão aberta é bem imóvel para os efeitos legais (art. 80, II, do CC). Em decor-rência dessa característica, a cessão de direitos hereditá-

DIREITO DASSUCESSÕES

CONCEITO DE SUCESSÃO

ABERTURA DA SUCESSÃO ESPÉCIES DE SUCESSÃO

ESPÉCIES DE SUCESSORES

HERANÇA

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rios somente pode ser realizada por escritura pública (art. 1.793, “caput”, do CC). Além disso, exige-se a autorização do cônjuge para a cessão de cotas do herdeiro casado, salvo se o regime de bens do casamento for o da sepa-ração absoluta. Outra característica da herança decorre do art. 1.791 do CC: “a herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros”. A herança, como se vê, é indivisível até o momento da partilha. Cada um dos herdeiros tem direito a uma fração ideal da heran-ça. Enquanto perdurar a indivisibilidade, o direito dos co-herdeiros quanto à propriedade e posse da herança será regulado pelas normas relativas ao condomínio.

3. Cessão de direitos hereditários. Conforme já men-cionado, a herança de pessoa viva não pode ser objeto de contrato. O Código Civil permite, porém, a cessão de direitos hereditários realizada após a abertura da suces-são. Assim, o herdeiro pode transferir a outrem seu direito à sucessão aberta ou o quinhão de que dispõe (art. 1.793 do CC). O cessionário assume a posição jurídica do ce-dente e recebe na partilha o que este haveria de receber. Exige-se escritura pública e outorga uxória ou autorização marital para a prática desse negócio jurídico, tendo em vis-ta o caráter imóvel do direito à sucessão aberta.

Capacidade para suceder é a aptidão para adquirir direitos sucessórios na qualidade de herdeiro ou legatário. Regra geral, legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão (art. 1.798 do CC). Somente pode ser chamado a suceder aquele que sobreviver ao autor da herança, ainda que por pouco tempo. Se ambos morrerem ao mesmo tempo não haverá transmis-são de direitos entre eles, como visto no item que tratou da comoriência. O nascituro, como se vê, é chamado a suce-der, embora não tenha personalidade jurídica. O seu direito sucessório, entretanto, somente será consolidado se houver nascimento com vida. O Código Civil prevê exceções à regra geral de que são capazes de herdar as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão. Dessa forma, po-dem ser chamados a suceder por meio de testamento: a) a prole eventual, ou seja, os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão; o herdeiro esperado somente herdará se for concebido em até dois anos da data da abertura da sucessão, caso contrário, os bens que lhe seriam destinados serão atribuídos aos herdeiros legítimos, salvo previsão em sentido contrário no testamento (art. 1.800, §4º, do CC); A transmissão hereditária, nesse caso, é condicional, pois a aquisição da herança subordina-se a evento futuro e incerto; b) as pessoas jurídicas, de direito público ou de direito pri-vado; exige-se que a pessoa jurídica já tenha existência no momento da abertura da sucessão; c) as pessoas jurídicas, cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de fundação; neste caso, a lei admite a possibilidade de uma pessoa jurídica ainda não existente ser chamada a suceder. É importante frisar que essas exceções somente poderão ter incidência na sucessão testamentária, como prevê o “caput” do art. 1.799 do CC. Falta de legitimação na sucessão testamentária. O Código Civil fez previsão de algumas pessoas que não podem ser beneficiadas em determinada sucessão, ou seja, pessoas que não têm legitimidade para suceder. O art. 1.801 estabelece que não podem ser nomeados herdeiros nem legatários: I - a pessoa que, a rogo, escreveu o testamento, nem o seu cônjuge ou companheiro, ou os seus ascendentes e irmãos; II – as testemunhas do testamento; III - o concubi-no do testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos; IV - o tabelião, civil ou militar, ou o comandante ou escrivão, perante quem se fizer, assim como o que fizer ou aprovar o testa-mento. A disposição testamentária em favor de pessoa não legitimada a suceder será considerada nula, ainda quando simulada sob a forma de contrato oneroso ou feita mediante interposta pessoa (art. 1.802 do CC). O legislador determinou que certas pessoas sempre presumir-se-ão interpostas, tais como os ascendentes, os descendentes, os irmãos e o côn-juge ou companheiro do não legitimado a suceder (art. 1.802, parágrafo único, do CC). O testador pode, no entanto, estipular disposição testamentária que beneficie o filho de sua concubi-na, desde que seja seu filho também (art. 1.803 do CC).

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1. Aceitação da herança: Como visto anteriormente, a herança transmite-se aos sucessores, desde logo, com a morte do autor da herança (princípio da “saisine”), não havendo necessidade de nenhuma providência por parte daqueles para que ocorra a transmissão. A lei prevê, entretanto, a necessidade de um ato que apenas confirme a transferência ocorrida no momento da abertura da sucessão. Fala-se, então, em aceitação da heran-ça, que é o ato pelo qual o herdeiro manifesta sua concordância com a transmissão dos bens do “de cujus”, ocorrida por lei com a abertura da sucessão. Aceita a herança, torna-se definitiva a sua transmissão ao herdeiro, desde a abertura da sucessão (art. 1.804 do CC).

2. Características da aceitação: A aceitação da herança apre-senta as seguintes características: a) é unilateral: aperfeiçoa-se com uma única manifestação de vontade; b) é ato não-receptício: a aceitação é eficaz desde logo, não precisando ser comunicada a outrem para que produza efeitos; c) é indivisível: o herdeiro não pode aceitar uma parte da herança e recusar outra; d) é incondicional: significa que a aceitação da herança é sempre pura e simples, ou seja, o herdeiro não pode estipular que aceita a herança somente sob determinada condição ou a termo (art. 1.808, “caput”, do CC); e) é irrevogável: o ato de aceitação da herança é irrevogável, isto é, uma vez manifestada a concordância com a transmissão, o herdeiro não poderá voltar atrás para renunciar a herança (art. 1.812 do CC).

3 Espécies de aceitação. Há dois critérios de classifi-cação da aceitação da herança: 3.1. Quanto à forma ou ao modo de exercício, a aceitação pode ser: a) Expressa: é aquela feita por declaração escrita do herdeiro (art. 1.805, “caput”, 1ª parte do CC); b) Tácita: é aquela que decorre da prática de atos próprios da qualidade de herdeiro, atos que demonstrem a intenção de aceitar a herança, por exemplo, habilitar-se no inventário que está em andamento ou concordar com as primeiras declarações feitas pelo inventariante. Alguns atos, entretanto, não exprimem aceitação da herança, tais como os meramente conservatórios ou os de administração e guarda provisória dos bens da herança (art. 1.805, §1º, do CC). Também não haverá aceitação quando o herdeiro fizer cessão gratuita, pura e simples, da herança, aos demais co-herdeiros (art. 1.805, §2º, do CC). Essa regra se justifica porque, nesse caso, o ato chamado de “cessão gratuita” é verdadeira renún-cia, uma vez que a quota do referido herdeiro será acrescida à dos outros de mesma classe (art. 1.810 do CC). Para que o herdeiro pudesse ceder seu direito à herança, seria neces-sário que ele aceitasse e depois transferisse o direito; c) Pre-sumida, ficta ou provocada: essa modalidade de aceitação configura-se quando o herdeiro permanece em silêncio ao ser judicialmente provocado por qualquer interessado (um credor do herdeiro, por exemplo). O legislador prevê que, vinte dias após a abertura da sucessão, o interessado poderá reque-rer ao juiz prazo razoável, não maior de trinta dias, para que o herdeiro declare se aceita ou não a herança. Se o herdeiro permanecer em silêncio durante esse período, configurar-se-á a aceitação presumida da herança (art. 1.807 do CC). O silêncio é interpretado como manifestação de vontade. Por outro lado, pode ser que durante esse prazo o herdeiro ma-nifeste sua renúncia à herança com o propósito de prejudicar seus credores. Veremos adiante o que ocorre nessa hipótese. 3.2. Quanto ao agente ou à titularidade do direito de mani-festação, a aceitação pode ser: a) Direta: é aquela em que o direito de aceitar pertence ao próprio herdeiro, o que ocorre na maioria dos casos; b) Indireta: ocorre quando alguém aceita a herança pelo herdeiro, ou seja, a legitimidade para aceitar a herança pertence a outra pessoa. A lei prevê três hipóteses em que ela ocorre: b.1.) Quando o herdeiro estiver sujeito a tutela ou curatela, compete ao tutor, com autorização do juiz, aceitar heranças e legados (art. 1.748, II, do CC); b.2.) Se o herdeiro falecer antes de declarar se aceita a herança, o poder de acei-tar passará aos seus sucessores, exceto se a disposição for subordinada a uma condição suspensiva ainda não verificada (art. 1.809 do CC); b.3.) Quando o herdeiro insolvente renunciar a herança em prejuízo de seus credores, haja ou não má-fé. Os credores prejudicados poderão, com autorização do juiz, aceitar a herança em nome do renunciante. A habilitação dos credores se fará no prazo de trinta dias do conhecimento do fato. Pagas as dívidas, o valor remanescente será devolvido aos demais herdeiros (art. 1.813 do CC).

4. Renúncia da herança. Renúncia é o ato pelo qual o suces-sor declara, expressamente, sua intenção de não participar da sucessão, recusando-se a assumir a qualidade de herdeiro que lhe é atribuída.

5. Características da renúncia: a) é solene: a lei exige forma especial para a prática da renúncia, que só pode ser manifesta-da por meio de instrumento público ou termo judicial (art. 1.806

do CC). Conclui-se, portanto, que não existe a possibili-dade de renúncia tácita ou presumida. Há, contudo, uma exceção prevista no art. 1.913 do CC. Se o testador orde-nar ao sucessor que entregue coisa de sua propriedade a outrem, o não cumprimento do encargo acarreta a presun-ção de que renunciou à herança ou ao legado; b) é irre-vogável: assim como a aceitação, a renúncia da herança é também irrevogável, não podendo o herdeiro emitir nova declaração de vontade para aceitar a herança.

6. Espécies de renúncia. A renúncia pode ser: a) Abdi-cativa, própria ou simples: é a renúncia propriamente dita, ou seja, o herdeiro simplesmente abre mão do direito hereditário e a transmissão tem-se por não verificada (art. 1.804, parágrafo único, do CC). A parte do renunciante será acrescida à dos outros herdeiros da mesma classe; b) Translativa ou imprópria: é a renúncia feita em favor de alguém, ou seja, o herdeiro renuncia para que sua par-te seja destinada a determinada pessoa. Nesse caso, não há tecnicamente renúncia, mas aceitação seguida de ces-são, sendo esses dois atos praticados ao mesmo tempo.

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1. Introdução. A lei estabelece a ordem de vocação heredi-tária de acordo com a vontade presumida do “de cujus”, ou seja, leva-se em conta quem o autor da herança pretende-ria beneficiar com seus bens após sua morte. É natural que o “de cujus” pretenda favorecer pessoas pelas quais sente afeto e por isso a lei estabelece uma ordem de preferência entre os parentes mais próximos. Ocorre que, em alguns casos, essas pessoas praticam atos ofensivos ao autor da herança ou aos seus familiares e consequentemente per-dem o direito à herança, por serem consideradas indignas. A indignidade é uma sanção civil que consiste na exclusão da sucessão de herdeiros ou legatários que praticaram atos ofensivos ao autor da herança ou aos seus familiares. A indignidade é aplicável a qualquer sucessor e dispensa qualquer ato de manifestação de vontade do autor da he-rança. Para efeitos jurídicos, o indigno é considerado como se morto fosse. A indignidade guarda muita semelhança com a deserda-ção, mas com ela não se confunde. Embora ambas tenham a mesma finalidade, qual seja, a de excluir da sucessão quem praticou atos condenáveis contra o de “cujus”, a in-dignidade decorre da lei, enquanto que na deserdação é o autor da herança quem pune o responsável, em testa-mento. A indignidade é um instituto da sucessão legítima, enquanto que a deserdação só pode ocorrer na sucessão testamentária. Assim sendo, trataremos neste momento da indignidade, e mais adiante da deserdação, dentro do con-texto da sucessão testamentária.

2. Causas de Indignidade. Não é qualquer ato ofensivo que a lei considera capaz de gerar a exclusão do indig-no, mas somente os previstos no art. 1.814 do CC: “São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários: I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicí-dio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja su-cessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente; II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro; III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.”

3. Declaração da Indignidade. O simples fato de o herdei-ro praticar um dos atos acima mencionados não acarreta a sua automática exclusão da sucessão. Para que o indigno seja excluído, é necessário o reconhecimento da causa de indignidade em sentença proferida em ação própria. Com efeito, dispõe o art. 1.815 do CC que “a exclusão do herdeiro ou do legatário, em qualquer desses casos de in-dignidade, será declarada por sentença”. Qualquer herdeiro que seria diretamente beneficiado com a exclusão tem legi-timidade para propor esta ação. O direito de propor a ação de indignidade extingue-se no prazo decadencial de quatro anos, contados da abertura da sucessão (art. 1.815, pará-grafo único, do CC). Declarada a indignidade, o herdeiro perde o direito hereditário.

4. Perdão do indigno. O art. 1.818 do CC prevê a possi-bilidade de o indigno ser perdoado pela prática dos atos ofensivos ao “de cujus” ou aos seus familiares, ocasião em que poderá ser contemplado com os bens da herança. O perdão é concedido sempre pelo ofendido e pode ser ex-

CAPACIDADE PARA SUCEDER

ACEITAÇÃO E RENÚNCIA DA HERANÇA

EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO

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presso ou tácito. Será expresso quando manifestado por testamento ou outro ato autêntico. O perdão, portanto, tem caráter solene, pois a lei exige forma especial para sua efetivação. Assim, só será válido quando concedido por meio de uma das duas formas mencionadas. O perdão é irretratável. Uma vez concedido, não pode ser posterior-mente cancelado, ainda que o testamento no qual fora concedido venha a ser revogado. O perdão tácito verifica-se somente por meio de testamento e ocorrerá quando o testador contemplar o indigno após ter conhecimento da ofensa. Neste caso, o indigno poderá suceder só até o limite da disposição testamentária (art. 1.818, parágrafo único, do CC).

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A transmissão dos bens aos herdeiros do “de cujus” dá-se no momento da abertura da sucessão (princípio da “sai-sine”). Em alguns casos, entretanto, o autor da herança morre sem ter deixado testamento, e não há conhecimen-to da existência de herdeiro algum, logo, não ocorre a transferência dos bens da herança, que passa a ser con-siderada jacente. Herança jacente, portanto, é a massa indivisa de bens deixada por quem morreu sem herdeiros conhecidos. A herança permanece jacente enquanto não tiver titular, ou seja, da abertura da sucessão até o surgi-mento de algum herdeiro ou até a transmissão ao Poder Público. O estado de jacência da herança, como se vê, é sempre transitório. Importante esclarecer que o termo “herança jacente” se justifica porque a herança jaz, per-manece imóvel, estacionária, durante o período em que não tem um titular. Estabelece o art. 1.819 do CC que “falecendo alguém sem deixar testamento nem herdeiro legítimo notoriamente conhecido, os bens da herança, depois de arrecadados, ficarão sob a guarda e administração de um curador, até a sua entrega ao sucessor devidamente habilitado ou à de-claração de sua vacância”. Realizada a arrecadação dos bens, o juiz mandará expedir edital, que será publicado três vezes, com intervalo de trinta dias para cada um, para que venham a habilitar-se os sucessores do finado (art. 1.152 do CPC). Se algum herdeiro se habilitar, a arrecada-ção dos bens será convertida em inventário. Decorrido o período de um ano após a publicação do pri-meiro edital, sem que haja herdeiro habilitado ou penda habilitação, será a herança declarada vacante. A declara-ção de vacância dá-se por meio de sentença judicial, que produz dois efeitos: a) exclui da sucessão os parentes co-laterais do “de cujus”, que não terão mais direito aos bens da herança caso apareçam posteriormente; b) transmite a herança ao Poder Público, que adquire a propriedade dos bens em caráter resolúvel. Decorridos cinco anos da abertura da sucessão, os bens serão definitivamente incorporados ao domínio do Municí-pio ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União quando situados em território federal.

A sucessão legítima ou “ab intestato” é aquela que decorre da própria lei. É subsidiária em relação à sucessão tes-tamentária e ocorre nas hipóteses previstas no art. 1.788 do CC. Nesses casos, ou seja, quando não há disposição testamentária determinando o destino de algum bem, a própria lei estabelece a quem ele será atribuído, presumin-do a vontade do autor da herança. O legislador estabelece uma ordem preferencial entre os familiares do autor da herança. Assim, os mais próximos têm preferência diante dos mais remotos, sendo que estes só serão contempla-dos na hipótese de inexistência daqueles. Essa ordem preferencial entre os herdeiros é denominada de “ordem da vocação hereditária” e está prevista no art. 1.829 do CC. A sucessão que não obedecer à referida ordem será considerada “anômala” ou “irregular”, como já menciona-do anteriormente.

Estabelece o art. 1.829 do CC que “a sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casa-do este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, pará-

grafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares”. Como se vê, o legislador defere a herança em primeiro lugar à classe dos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente. Vamos analisar, nesse primeiro momento, a su-cessão dos descendentes. Como se sabe, os parentes de grau mais próximo excluem os de grau mais remoto, via de regra. Assim, se o “de cujus” deixou como herdeiros somente um fi-lho e um neto, o filho receberá a totalidade da herança, pois é o parente de grau mais próximo. Há casos, entretanto, em que a lei permite que um herdeiro de grau mais remoto receba a herança representando um herdeiro de grau mais próximo. Fala-se, então, em direito de representação. Direito de representação. A transmissão da herança aos descendentes pode ocorrer de duas formas diferentes. Se os descendentes ocuparem o mesmo grau (todos são filhos, ou todos são netos, por exemplo), haverá sucessão por cabeça (“per capta”) ou por direito próprio. Nesse caso, a herança é di-vidida em partes iguais entre os herdeiros. Se os descendentes ocuparem graus diferentes, a herança pode não ser dividida de forma igualitária entre eles. Nessa hipótese, haverá sucessão por estirpe ou por direito de representação. Estabelece o art. 1.851 do CC: “dá-se o direito de representa-ção, quando a lei chama certos parentes do falecido a suceder em todos os direitos, em que ele sucederia, se vivo fosse”. O direito de representação ocorre também quando o descendente for excluído da sucessão por indignidade ou por deserdação. Por isso se diz que o indigno ou deserdado é considerado como se morto fosse, pois as consequ ências são as mesmas, ou seja, seus descendentes herdam pelo direito de representação. O direito de representação dá-se na linha reta descendente, mas nunca na ascendente (art. 1.852 do CC). Dessa forma, na sucessão dos ascendentes, não há exceção à regra de que o mais próximo exclui o mais remoto. Já na linha colateral ou transversal, o direito de representação somente se dá em fa-vor dos filhos de irmãos do falecido, quando com irmãos deste concorrerem (art. 1.853 do CC). Em todos os casos de repre-sentação os representantes só podem herdar o que herdaria o representado, se vivo fosse (art. 1.854 do CC). Observa-se, ainda, que o quinhão do representado é sempre dividido por igual entre os representantes (art. 1.855 do CC). Importante frisar que o direito de representação não existe em favor dos descendentes do herdeiro que renunciou à herança. Dessa for-ma, se o filho do “de cujus” renunciou à herança, os netos não poderão herdar representando-o.

Estabelece o art. 1.829 do CC que “a sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o faleci-do no regime da comunhão universal, ou no da separação obri-gatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares”. Superada a análise da primeira parte do dispositivo acima transcrito, vamos examinar agora a sucessão do cônjuge em concorrência com os descendentes. O cônjuge sobrevivente não terá sempre direito à herança. “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem se-parados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente” (art. 1.830 do CC). Nesses casos, ainda que não haja descendentes, o cônjuge não terá direito sucessório. Nota-se, pela redação do art. 1.829, I, do CC, que além de veri-ficar o estado civil do “de cujus”, deve-se averiguar o regime de bens do casamento para saber se o cônjuge sobrevivente terá ou não direito a concorrer com os descendentes. Se o regime de bens for algum dos mencionados no inciso aci-ma transcrito, o cônjuge sobrevivente não terá qualquer direito à herança, que será atribuída exclusivamente aos descendentes. Isso não significa, porém, que o cônjuge nada receberá com a morte do autor da herança, pois, em alguns casos, terá direito à meação. Não se pode confundir, pois, direito sucessório com direito de meação. Meação é o conjunto de bens que seria atri-buído ao cônjuge se o casamento tivesse sido dissolvido em vida pela separação judicial ou divórcio. Essa porção ideal dos bens comuns já pertencia ao cônjuge durante a união conjugal. O direito de meação decorre do regime de bens do casamento. O cônjuge que tem direito à meação é chamado de cônjuge meeiro. Dessa forma, o patrimônio deixado pelo “de cujus” pode ser di-vidido em duas partes: a meação (quando houver) do cônjuge sobrevivente e a herança. É possível que, em alguns casos,

além do direito de meação, o cônjuge também tenha direi-to sobre parte da herança. Assim, o cônjuge sobrevivente pode ser apenas meeiro, meeiro e herdeiro, apenas her-deiro ou não ter direito à meação nem à herança. Feitas essas considerações sobre a meação, vamos analisar as hipóteses em que o legislador excluiu o di-reito sucessório do cônjuge sobrevivente. No regime da comunhão universal o cônjuge supérstite não terá direito à herança se houver descendentes do morto, uma vez que já receberá parte dos bens a título de meação. Nesse regi-me, há comunicação de quase todos os bens, razão pela qual a meação será calculada sobre praticamente todo o patrimônio. O legislador decidiu excluir o sobrevivente da sucessão porque este já receberá a meação calculada sobre todo o patrimônio, não havendo necessidade de receber herança para garantir sua estabilidade material. Como se vê, nessa hipótese o cônjuge sobrevivente é apenas meeiro. O regime da separação obrigatória será necessariamen-te adotado sempre que presente uma das hipóteses do art. 1.641 do CC. Nesse regime, não há comunicação de bens (art. 1.687 do CC). O cônjuge sobrevivente não terá direito à herança, mas, nesse caso, o motivo que o exclui da sucessão é diferente do motivo da hipótese anterior. No presente caso, se o cônjuge não adquiriu direito sobre os bens do outro em vida, com muito mais razão não deve adquirir por ocasião da morte do autor da herança, desde que este tenha deixado descendentes. Dessa forma, o cônjuge supérstite não terá direito à meação nem à heran-ça, repita-se, desde que haja descendentes do “de cujus”. Por fim, não podemos deixar de mencionar o equívoco contido na redação do art. 1.829, I, do CC, ao referir-se ao art. 1.640, parágrafo único; a referência correta seria ao art. 1.641, pois neste estão as causas que acarretam a adoção do regime da separação obrigatória. O legislador refere-se, ainda, ao regime da comunhão parcial de bens em que o autor da herança não deixou bens particulares. Nesse regime, o cônjuge sobrevivente só participará da herança se houver bens particulares dei-xados pelo “de cujus”, como se verá adiante. No regime ora analisado comunicam-se os bens adquiridos onerosa-mente durante a constância do casamento, ainda que em nome de um só dos cônjuges, bem como todos os bens que se incluam em uma das hipóteses do art. 1.660 do CC. Os demais bens integram o patrimônio particular de cada um dos cônjuges. Se o autor da herança não deixou nenhum bem particular, o sobrevivente terá direito, a título de meação, à metade de todos os bens deixados pelo “de cujus”. O cônjuge, portanto, será apenas meeiro e não terá participação sobre a herança, que será destinada aos des-cendentes do falecido. Essas são as três hipóteses em que o cônjuge supérstite deixa de herdar em concorrência com os descendentes do morto, conforme determina o art. 1.829, I, do CC. Va-mos analisar agora as situações em que o cônjuge sobre-vivente concorre com os descendentes do “de cujus”, ou seja, os casos em que a herança será dividida entre os descendentes e o cônjuge. No regime da comunhão parcial de bens, se o autor da he-rança tiver deixado bens particulares (arts. 1.659 e 1.661), o sobrevivente terá direito, além da meação, à herança em relação aos bens particulares. Nesse caso o cônjuge é meeiro e herdeiro. Prevalece na doutrina que a quota da herança do cônjuge será calculada somente em relação aos bens particulares, e não sobre todo o espólio. Há, contudo, entendimento em sentido contrário. Quando o regime de bens for o da separação absoluta ou convencional o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes. Nesse caso o cônjuge é herdeiro, mas não meeiro, pois nesse regime os bens não se comunicam durante a constância da união conjugal. Ressalte-se que esse regime é o escolhido livremente pelos cônjuges e for-malizado por pacto antenupcial. O art. 1.829, I, refere-se ao regime da separação legal ou obrigatória (art. 1.641), não se aplicando ao regime ora analisado. No regime da participação final nos aquestos o cônjuge sobrevivente também concorre com os descendentes do “de cujus”. Garantia de um quarto da herança ao cônjuge sobrevi-vente. Nos casos em que em que o cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes do “de cujus”, seu quinhão será igual ao que couber a cada um dos descendentes por cabeça. A lei determina, contudo, que se o cônjuge for ascendente dos herdeiros com quem concorrer, sua quota não poderá ser inferior à quarta parte da herança (art. 1.832 do CC). Direito real de habitação. Estabelece o art. 1.831 que: “ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de

HERANÇA JACENTE

ORDEM DA VOCAÇÃO HEREDITÁRIA

SUCESSÃO DOS DESCENDENTES

SUCESSÃO DO CÔNJUGE EM CONCORRÊNCIA

COM OS DESCENDENTES

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bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativa-mente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar”. Dessa forma, ainda que o cônjuge não seja herdeiro, terá o direito real de habitação (arts. 1.225 e 1.414, ambos do CC).

Os ascendentes (pais, avós, bisavós etc.) compõem a se-gunda classe na ordem de vocação hereditária. Se o “de cujus” não tiver deixado descendentes, serão chamados à sucessão, em concorrência com o cônjuge, os ascenden-tes, conforme dispõe o art. 1.829, II: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I -... II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge”. Vale ressaltar, novamente, que na sucessão dos ascen-dentes não há direito de representação, razão pela qual o parente de grau mais próximo sempre exclui o de grau mais remoto, sem distinção de linhas (art. 1.836, §1º, do CC). Na sucessão dos ascendentes, ocorre a chamada sucessão por linhas ou “in lineas”. Assim, os ascenden-tes do morto podem ser divididos em dois grupos, um paterno e outro materno. Estabelece o art. 1.836, §2º, que: “havendo igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna herdam a metade, ca-bendo a outra aos da linha materna”. Se o “de cujus”, por exemplo, tem como herdeiros apenas um avô paterno e os dois avós maternos, a herança será dividida em duas partes. Uma será destinada ao avô paterno e a outra será novamente dividida entre os avós maternos. Verifica-se, portanto, que a quota desses três herdeiros será diferente, apesar de todos serem ascendentes de segundo grau.

Na segunda classe da ordem de vocação hereditária encontram-se os ascendentes, em concorrência com o cônjuge (art. 1.829, II, do CC). Se o “de cujus” tiver dei-xado somente ascendentes e cônjuge, a herança será sempre dividida entre eles, seja qual for o regime de bens do casamento. Se o cônjuge concorrer com ambos os pais do “de cujus”, terá direito a um terço da herança. Se, por outro lado, concorrer com apenas um dos pais ou com as-cendente de grau maior (avós, bisavós etc.), sua cota será metade da herança (art. 1.837 do CC).

Se o “de cujus” não tiver deixado descendentes nem as-cendentes, será chamado à sucessão o cônjuge, confor-me dispõe o art. 1.829, III: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I -... II-... III – ao cônjuge sobreviven-te”. No mesmo sentido, o art. 1.838 do CC: “em falta de descendentes e ascendentes, será deferida a sucessão por inteiro ao cônjuge sobrevivente”. Neste caso, o côn-juge sobrevivente receberá toda a herança, seja qual for o regime de bens. É sempre bom lembrar que o cônjuge somente terá direito sucessório se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separa-dos de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que a convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente (art. 1.830 do CC).

Os colaterais só serão chamados à sucessão, como herdeiros legítimos, se o “de cujus” não tiver deixado des-cendentes, ascendentes e cônjuge, conforme determina o art. 1.829, IV, do CC. São parentes em linha colateral, transversal ou oblíqua as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra (art. 1.592 do CC). Na classe dos colaterais, os mais próximos também excluem os mais remotos. Assim, entre os tios e os irmãos do “de cujus”, estes últimos receberão a herança, da mes-ma forma que entre tios e primos do morto, os tios terão di-reito à sucessão, pois são parentes de grau mais próximo. A lei concede, entretanto, o direito de representação aos sobrinhos do autor da herança (arts. 1.840 e 1.853). Estabelece a lei uma regra especial para determinar o qui-nhão dos irmãos do autor da herança, que podem receber

quotas diferentes em determinadas circunstâncias. Os irmãos podem ser classificados em bilaterais ou unilaterais. Irmãos bi-laterais são os filhos do mesmo pai e da mesma mãe, também chamados de irmãos germanos. Irmãos unilaterais são aqueles cuja ascendência comum é apenas paterna ou materna. Con-correndo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar (art. 1.841 do CC). Assim, os irmãos bilaterais receberão sempre o dobro da quantia destinada aos irmãos unilaterais. Se, todavia, todos os herdeiros forem irmãos unila-terais (irmãos apenas por parte de pai ou apenas por parte de mãe), herdarão em partes iguais (art. 1.842 do CC). Os irmãos, como já dito, são parentes na linha colateral em segundo grau. Na falta de irmãos, são chamados a herdar os colaterais de terceiro grau, ou seja, os tios e sobrinhos do morto. A lei estabelece, entretanto, uma ordem preferencial entre estes herdeiros, embora o vínculo seja de terceiro grau em ambos os casos. Assim, na falta de irmãos, herdarão os sobrinhos do autor da herança. Os tios somente serão cha-mados a suceder quando não houver sobrinhos (art. 1.843 do CC). Se concorrerem à herança somente sobrinhos do autor da herança, a sucessão dar-se-á por cabeça (art. 1.843, §1º, do CC). Aos sobrinhos também se aplica a regra utilizada na divisão da herança entre os irmãos. Assim, se concorrerem filhos de irmãos bilaterais com filhos de irmãos unilaterais, cada um destes herdará a metade do que herdar cada um daqueles (art. 1.843, §2º, do CC). Se todos forem filhos de irmãos bilaterais, ou todos de irmãos unilaterais, herdarão por igual (art. 1.843, §3º, do CC). Somente na falta de sobrinhos, repita-se, os tios serão chamados a suceder. Na falta de tios, serão chamados a suceder os colaterais de quarto grau, ou seja, os primos, tios-avós e sobrinhos-netos, que receberão a herança em partes iguais.

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A união estável entre homem e mulher é reconhecida como entidade familiar pela Constituição Federal (art. 226, §3º) e está regulamentada nos arts. 1.723 a 1.727 do Código Civil. A caracterização da união estável garante ao companheiro so-brevivente o direito de participação na herança do morto, nos termos do art. 1.790 do CC. Embora o companheiro sobrevi-vente seja considerado herdeiro legítimo, uma vez que o seu chamamento dá-se por força da lei, não possui ele os mesmos direitos do cônjuge sobrevivente. O legislador estabeleceu re-gras diferentes para a sucessão no casamento e a sucessão na união estável. Em primeiro lugar, deve-se registrar que a participação do com-panheiro ou companheira na sucessão do outro limita-se aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável (art. 1.790, “caput”, do CC). Assim, o companheiro não terá qualquer direito sucessório sobre os bens adquiridos pelo “de cujus” antes da união estável, a título oneroso ou gratuito, e so-bre os bens adquiridos a título gratuito durante a união estável. Esses bens serão destinados aos parentes do morto, de acordo com a ordem de vocação hereditária prevista no art. 1.829 do CC. Importante ressaltar que a meação do companheiro sobre-vivente será calculada também sobre os bens adquiridos one-rosamente durante a união estável, salvo se houver contrato escrito em sentido diverso (art. 1.725 do CC). O direito sucessório do companheiro dá-se na seguinte ordem: I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a meta-de do que couber a cada um daqueles; III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

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Diferentemente da sucessão legítima, que ocorre no silêncio do de “cujus” acerca do destino a ser dado aos seus bens após a sua morte e, justamente por isso, é considerada a “vontade pre-sumida” do de “cujus”, a sucessão testamentária ocorre quando há expressa manifestação de vontade do de “cujus” acerca do destino a ser dado aos seus bens e direitos após a sua morte. A vontade do de “cujus” é a causa fundamental desta forma de sucessão, e será representada por meio de documento escrito (testamento ou codicilo). Assim, a herança será atribuída às pessoas designadas pelo testador em ato de última vontade (testamento).Doutrinariamente, o testamento é definido como o ato unilate-

ral, personalíssimo, gratuito, solene e revogável pelo qual alguém, na forma da lei, dispõe sobre seus bens, no todo ou em parte, ou faz outras disposições para depois da sua morte.Vejamos de que forma cada uma dessas características se apresenta no testamento:Unilateral: é ato unilateral, visto sua constituição depen-der da vontade de uma só pessoa, ou seja, do testador. Irrelevante o fato de eventualmente ser possível que o her-deiro renuncie à herança, pois a classificação se baseia no momento da constituição do negócio.Personalíssimo: é ato personalíssimo, pois somente à pessoa que vai testar cabe a disposição de bens. Em nosso ordenamento não se admite o testamento feito por procurador, ou mesmo o conjunto, por duas ou mais pes-soas no mesmo instrumento (testamento de mão comum ou mancomunado), seja simultâneo, recíproco ou corres-pectivo.Gratuito: é gratuito, pois se realiza por meio da transmis-são de bens independentemente de contraprestação; não visa à obtenção de vantagens para o testador.Solene: é ato solene, pois deve obedecer a formalida-des essenciais prescritas em lei, as quais poderão variar dependendo da modalidade do testamento, mas sempre estarão presentes.Revogável: é revogável, pois cabe ao testador decidir se mantém ou não o testamento, sem precisar motivar, tor-nando sem efeito o testamento anterior. É nula a cláusula que proíbe a sua revogação.

Capacidade para testar e para adquirir por testamen-to. Para que o indivíduo possa manifestar sua vontade para após a sua morte, por meio de testamento, é preciso que ele seja portador da capacidade testamentária ati-va, ou seja, capacidade para fazer testamento. Ser titular de capacidade testamentária ativa é a regra. Apenas ex-cepcionalmente a lei limita essa capacidade. Assim, são incapazes para testar, conforme o art. 1860 do Código Civil, a) os menores de 16 anos; b) os enfermos ou de-ficientes mentais; c) os que, ao testar, não estiverem em seu perfeito juízo; d) os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.Ao mesmo tempo em que se preocupa com a capacidade testamentária ativa, a lei se preocupa com a capacida-de testamentária passiva, ou seja, a capacidade para adquirir por testamento. Também nesse caso a regra é a capacidade, sendo capazes para receber por testamento todas as pessoas, físicas ou jurídicas, existentes ao tem-po da morte do testador e não havidas como incapazes (CC, arts 1.798 e 1.799). A incapacidade é exceção. São incapazes para adquirir por testamento apenas as pes-soas mencionadas nos artigos 1799 e 1.801, ambos do Código Civil.

Formas do testamento: O testamento é um ato extrema-mente solene. Podemos dizer que, ao lado do casamento, o testamento é o ato mais formal do Direito Brasileiro. Exi-ge forma escrita e requisitos “ad substantiam”, cuja ino-bservância torna nula a manifestação de última vontade. Não se admite, portanto, testamento fora dos modelos legais. Em nosso Direito existem três formas de testamen-tos “ordinárias” e três formas de testamentos “especiais”.Formas ordinárias de testamento: testamentos ordiná-rios são aqueles que podem ser adotados por qualquer pessoa nas condições normais de sua existência. Há, no sistema brasileiro, três espécies de testamento ordinário, quais sejam, o testamento público, o cerrado e o particu-lar.O testamento público é escrito por tabelião, de acordo com o que for ditado ou com as declarações do testador, em presença de duas testemunhas. Só pode ser feito em idioma nacional. Deve ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador, na presença de duas testemunhas. Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido em voz alta duas vezes, uma pelo tabelião, ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento, conforme disposto no artigo 1.867 do Código Civil. O analfabeto também só pode testar por meio da forma pública.O testamento cerrado, também chamado secreto ou mís-tico, é escrito pelo próprio testador, ou por alguém a seu rogo, só tendo eficácia após o auto de aprovação lavrado por oficial público, na presença de duas testemunhas. Pode ser datilografado ou manuscrito. Deve ser entregue ao oficial do cartório, na presença de duas testemunhas, devendo o testador dizer que aquele é seu testamento, e que deseja tê-lo registrado. Em seguida, o oficial procede

SUCESSÃO DOS ASCENDENTES

SUCESSÃO DO CÔNJUGE EM CONCORRÊNCIA

COM OS ASCENDENTES

SUCESSÃO DO CÔNJUGE, NA FALTA DE DESCENDENTES

E DE ASCENDENTES

SUCESSÃO DOS COLATERAIS

SUCESSÃO DO COMPANHEIRO SOBREVIVENTE

SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

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a leitura silenciosa do testamento, para verificar se não existem falhas formais. Estando conforme, redige o auto e o lê em voz alta para o testador e as testemunhas. Em seguida, procede a lacração do testamento e seu registro (art. 1868, CC).O testamento particular, também chamado testamen-to hológrafo (expressão que deriva das palavras gregas holos, que significa inteiro, e graphien, que significa es-crever), deve ser inteiramente escrito e assinado pelo testador, lido perante três testemunhas e por elas também assinado (CC, art. 1.876). Pode ser escrito em língua nacional ou estrangeira, contanto que as testemunhas a compreendam (CC, art. 1.880). O testamento particular é facultado apenas aos que podem ler e escrever, não se admitindo a assinatura a rogo. Uma vez morto o testador, será necessário que pelo menos uma das testemunhas re-conheça sua autenticidade em juízo. Se todas as testemu-nhas falecerem, ou não forem encontradas, ou porventura não reconhecerem a autenticidade do testamento, este não será cumprido (art. 1878, CC). O Código Civil prevê ainda, em seu artigo 1879, que em circunstâncias excep-cionais, que devem ser declaradas no próprio documento, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado a crité-rio do juiz. Isto poderá ocorrer em circunstâncias em que seja impossível a constituição formal do testamento, como por exemplo em incêndios, desabamentos, revoluções, ou ainda quando o testador residir em local ermo, sem conta-to com pessoas que possam servir de testemunhas.Formas especiais de testamento: testamentos espe-ciais são testamentos permitidos apenas em circunstân-cias excepcionais, ou ainda, quando certas pessoas são colocadas em circunstâncias particulares. O Direito Bra-sileiro admite três modalidades de testamentos especiais, a saber:Testamento marítimo ou aeronáutico: poderá ocorrer quando o testador estiver a bordo de navios de guerra ou mercante, em viagens de alto-mar (CC, art.1.888). Pode ter forma assemelhada ao testamento público ou ao testa-mento cerrado. O artigo 1.891 do Código Civil estabelece o prazo de eficácia dessa forma especial de testamento: “caducará o testamento marítimo, ou aeronáutico, se o testador não morrer na viagem, nem nos 90 (noventa) dias subseqüentes ao seu desembarque em terra, onde possa fazer, na forma ordinária, outro testamento”.Testamento militar: é declaração de última vontade fei-ta por militares e demais pessoas a serviço do Exército, dentro ou fora do País, que estejam participando de opera-ções de guerra. Comporta três formas: a) assemelhado ao público; b) assemelhado ao cerrado; c) nuncupativo, qual seja aquele feito de viva voz, perante duas testemunhas, por pessoas empenhadas em combate ou feridas, confor-me estabelece o artigo 1.896 do Código Civil.

CodiciloPodemos conceituar codicilo como o ato de última von-tade destinado a tratar de disposições de pequeno valor. Não é exigida grande formalidade na sua constituição, jus-tamente por conter disposições sem conteúdo patrimonial relevante.Será suficiente para considerar-se válido o codicilo que ele tenha a forma escrita, devendo ser inteiramente escrito pelo autor (forma hológrafa), devendo ser por ele datado e assinado, não havendo necessidade de testemunhas (CC, art.1.881).O codicilo pode ser utilizado pelo seu autor para várias finalidades previstas em lei, como por exemplo: deixar disposições sobre seu enterro; deixar esmolas de pou-ca monta; legar jóias, roupas ou móveis de pouco valor, de seu uso pessoal; nomear e substituir testamenteiros, reconhecer filho havido fora do casamento (art. 1609, II, do CC). Em todos os casos, no entanto, as liberalidades previstas em codicilo devem ter por objeto bens e valores “de pouca monta”.Ocorre, no entanto, que a lei não estabelece critério para determinar-se o que seja esta “pouca monta”. Assim, ca-berá ao magistrado, em cada caso, determinar se trata-se de pequeno valor ou não. Tem sido mais ou menos aceita a ideia de que se poderia considerar como “pouca monta” as liberalidades até 10% do valor do total do patrimônio. No entanto, isso não afasta a necessidade de apreciação do caso concreto pelo magistrado.Quanto à revogação do codicilo, esta pode ser feita por outro codicilo, ou pela elaboração de testamento posterior, de qualquer natureza, sem confirmá-lo ou modificá-lo. A falta de referência ao codicilo, no testamento posterior, importa revogação tácita daquele. O testamento, contudo, não pode ser revogado por um codicilo.

Revogação do testamentoA revogação do testamento é o ato pelo qual o testador torna ineficaz um testamento anterior, manifestando vontade contrá-ria à expressa anteriormente. A revogação somente pode ser feita por meio de um novo testamento, que não precisa ser constituído na mesma forma do revogado. Assim, um testa-mento público pode ser revogado por um testamento particular, ou por qualquer outra modalidade. O que importa é que o novo testamento seja válido.Desse modo, a revogação não valerá se o novo testamento for anulado, seja por infração de solenidades essenciais, seja por outros vícios, como por exemplo pela incapacidade do testador no momento de sua constituição. Por outro lado, a revogação permanecerá se o testamento caducar (por exclusão ou pré-morte do herdeiro nomeado, por exemplo). O testamento ca-duco é originalmente válido, e só não é cumprido em razão de algum problema com o beneficiário ou com a coisa deixada.Também não existe repristinação das disposições testamentá-rias, ou seja, não se restaura o testamento revogado em razão da simples revogação do testamento que o revogou. Para que se restaurem as disposições originais, é preciso que o novo tes-tamento expressamente o determine.Podemos classificar a revogação do testamento em total ou parcial, bem como expressa ou tácita.Total: quando o testador posteriormente retira, completamente, a eficácia das disposições precedentes. Todas as disposições testamentárias são alteradas, restando sem efeito as anterior-mente estabelecidas. Não atinge, contudo, a parte não patrimo-nial, salvo se realizada de forma expressa.Parcial: o testamento novo modifica em parte o testamento an-terior, subsistindo o que não for contrário ou incompatível com o posterior.Expressa: quando conste claramente no novo testamento a revogação do anterior.Tácita: resulta de disposição diferente e incompatível com a disposição anterior.

Rompimento do testamentoO testamento estará rompido na hipótese de sobrevir descen-dente sucessível ao testador, que não o tinha ou não o conhe-cia quando testou, se esse descendente sobreviver ao testador (art. 1973 CC). Trata-se de presunção legal de que se o testador soubesse da existência desse descendente, não teria disposto de seus bens por meio de testamento.

Caducidade do Testamento: caducidade é a perda da eficácia do testamento, por ocorrência de fato superveniente que torne prejudicado o objeto testado, ou que impossibilite a recepção da coisa pelo favorecido. Como exemplo podemos relacionar o herdeiro pré-morto ao testador. Assim, se o testador beneficia determinada pessoa como seu único herdeiro testamentário, e no momento da morte do testador o beneficiário já se encontra morto (ou impossibilitado de receber a herança por alguma ou-tra razão), ocorre a caducidade.Poderá ocorrer também quando for impossível a entrega da coi-sa, por inexistência da coisa. Quando, por exemplo, for legado um determinado bem a alguém, e no momento da morte do testador este bem não existir mais em seu patrimônio, ocorrerá também a caducidade.

Disposições testamentáriasUma vez que conhecemos o conceito de testamento, bem como as suas possíveis formas de constituição e revogação, podemos passar a analisar o seu conteúdo. O testamento pode dispor sobre apenas parte dos bens, aplicando-se ao restante a sucessão legítima. Poderá, ainda, o testamento estabelecer outras disposições, além da disposição referente a bens, tais como o estabelecimento das cláusulas restritivas de impenho-rabilidade, incomunicabilidade, inalienabilidade; constituição de usufruto em favor de outrem etc. Pode tratar, também, de assuntos não ligados diretamente ao patrimônio, como no caso de reconhecimento de filho.

LegadosDentre as diversas possibilidades de disposição testamentá-ria, uma das mais comuns é o legado. Denomina-se legado a destinação de uma coisa certa e determinada do conjunto pa-trimonial deixada pelo testador a alguém, ou seja, o legatário, em testamento ou codicilo. O legatário recebe a título singular.Quando o bem (certo e determinado) é atribuído a herdeiro legí-timo denomina-se pré-legado ou legado precípuo.Admite-se ainda a possibilidade de o legado recair sobre coisa genérica, determinada apenas pelo gênero e pela quantidade. Nesse caso, não existindo no patrimônio do testador a coisa legada, no momento de sua morte, o legado não caducará, mas será destinada parcela do patrimônio para a aquisição da coisa a ser entregue ao legatário.O Código Civil e a doutrina admitem diversas possibilidades de

legado, sendo as principais as seguintes:Legado de coisa alheia: o artigo 1.912 do Código Civil estabelece que é nulo o legado de coisa alheia, admitindo-se três exceções: a) se, depois de feito o testamento, a coisa alheia vier a integrar o patrimônio do testador (CC, art. 1912); b) quando o testador determina que o herdeiro, ou o legatário entregue coisa de sua propriedade a ou-trem, sob pena de se entender que renunciou à herança ou ao legado (cc, art 1.913); c) quando há legado de coisa móvel que se determine pelo gênero ou pela espécie (CC, art.1.915).Legado de crédito ou de quitação de dívida (artigo 1.918 do Código Civil): no legado de crédito, o devedor é terceiro, caracterizando-se verdadeira cessão de crédito. O legado será de quitação de dívida, se o devedor for o próprio legatário.Legado de alimentos: o artigo 1.920 do Código Civil es-tabelece que “o legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor”.Os alimentos testamentá-rios não se confundem com os alimentos legais.Legado de imóvel: no legado de imóvel, estabelece o artigo 1.922 do Código Civil que “se aquele que legar um imóvel lhe ajuntar depois novas aquisições, estas, ainda que contíguas, não se compreendem no legado, salvo expressa declaração em contrário do testador”. A restrição é voltada para as ampliações ou os acréscimos externos ao imóvel não-classificados como benfeitorias (parágrafo único do art.1.922).Legado de usufruto: não fixando o tempo do legado de usufruto, entende-se que o testador o fez para toda a vida do legatário – usufruto vitalício (artigo 1.921 do Código Ci-vil). Com a morte do legatário, consolida-se o domínio do nu-proprietário, que pode ser um herdeiro ou terceiro.

Efeitos dos LegadosO artigo 1.784 do Código Civil estabelece que “aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos her-deiros legítimos e testamentários”; o mesmo não ocorre a respeito da posse e da propriedade do legado. Quanto ao legado, o artigo 1.923 dispõe que “desde a abertura da sucessão, pertence ao legatário a coisa certa, exis-tente no acervo, salvo se o legado estiver sob condi-ção suspensiva”. Assim, o legatário adquire apenas a propriedade de coisa certa. Caso se trate de legado de coisa incerta, ou fungível, somente será adquirida com a partilha.Quanto à posse, a abertura da sucessão faculta ao legatário apenas a possibilidade de requerê-la aos her-deiros, não podendo obtê-la por sua própria força, sob pena de incorrer no crime de exercício arbitrário das próprias razões.Os herdeiros não são obrigados a cumprir de imediato o legado, podendo antes verificar se o espólio é solvente, visto que se as dívidas absorverem por completo o patri-mônio, os legados concorrerão para o seu pagamento.

Direito de AcrescerDenomina-se direito de acrescer o direito pelo qual, haven-do dois ou mais herdeiros ou legatários conjuntos sobre o mesmo bem ou bens, e vindo a faltar um deles em razão de morte (premoriência), renúncia, exclusão por indigni-dade ou incapacidade, não-verificação da condição sob a qual foi instituído, a sua parte acresce a do(s) outro(s) herdeiro(s) conjunto(s), salvo se houver substituto para o herdeiro que faltou, ou se o testador, ao fazer a nomeação conjunta, tinha especificado o quinhão de cada um, sendo a quota vaga do contemplado que vier a faltar devolvida aos herdeiros legítimos do testador, conforme especifica o artigo 1.944 do Código Civil.Para que ocorra o direito de acrescer é necessário:a) nomeação de co-herdeiro, ou co-legatário, na mesma disposição testamentária;b) legado dos mesmos bens ou da mesma porção de bens;c) ausência de quotas hereditárias determinadas.O direito de acrescer não é privativo do direito das suces-sões, podendo ocorrer no direito das coisas (artigo 1.411 do Código Civil) e no direito das obrigações (artigo 812 do Código Civil).

Conforme havíamos tratado anteriormente, as hipóteses de exclusão do herdeiro ou legatário são a indignidade e a deserdação. A indignidade foi referida quando falamos da sucessão legítima, cabendo agora tratarmos da deser-dação.

EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO

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Deserdação: a deserdação decorre da vontade do tes-tador. Deve haver uma disposição expressa do testador excluindo o herdeiro (artigos 1.961 e seguintes do Código Civil), desde que presente alguma das causas previstas em lei. A deserdação é possível somente aos herdeiros necessários do autor da herança.As causas para deserdação serão as mesmas da indig-nidade, previstas no artigo 1.814 do Código Civil, e mais as dos artigos 1.962 e 1.963. O artigo 1.962 do Código Civil dispõe que, além das causas mencionadas no arti-go 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes:a) ofensas físicas;b) injúria grave;c) relações ilícitas com a madrasta, ou o padrasto;d) desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.As hipóteses previstas no art. 1963 são as mesmas, po-rém invertendo-se o pólo, ou seja, trata-se da possibilida-de de deserdação do ascendente pelo descendente.Para que a deserdação gere efeitos será necessário que no testamento conste expressamente a causa prevista em lei que justifique a exclusão do herdeiro. Ao mesmo tempo em que é necessário indicar qual a hipótese legal em que incidiu o herdeiro deserdado, não se admitirá nenhuma outra hipótese de deserdação que não seja uma daquelas previstas em lei. Não se admite nenhuma outra hipótese, nem mesmo por emprego da analogia.Ao mesmo tempo, não basta que o herdeiro tenha sido excluído em testamento. É preciso que aquele a quem aproveite a deserdação (por exemplo, o herdeiro instituído em lugar do deserdado) promova a ação ordinária cabível, provando, no seu curso, a veracidade da causa alegada pelo testador (art. 1965 CC). Sem essa comprovação a deserdação não pode gerar efeitos.Os efeitos da deserdação são pessoais, atingindo somen-te o herdeiro deserdado. Assim, seus herdeiros herdarão por direito de representação. Assim como no caso da in-dignidade, o deserdado será considerado como se morto fosse na distribuição da herança.

O testador poderá, caso assim deseje, prevendo a hi-pótese de as pessoas aquinhoadas pelo testamento não poderem ou não desejarem receber sua parte na herança, nomear-lhes substitutos (art. 1947 CC). Para tanto, deverá indicar no testamento quem será benefi-ciado na falta ou impossibilidade do herdeiro ou lega-tário original.No direito brasileiro, são três as modalidades de substi-tuição: a vulgar, a fideicomissária e a compendiosa.Substituição vulgar ou ordinária: ocorre quando o testador nomeia uma ou mais pessoas para ocupar o lugar do herdeiro ou legatário que não pode, ou não quer, aceitar a herança ou o legado. A substituição vul-gar ou ordinária pode ser singular, plural ou recíproca.a) substituição singular ou simples: ocorre quando designado um só herdeiro ou legatário e um só subs-tituto;b) coletiva ou plural: quando há mais de um herdeiro, ou mais de um substituto, a serem chamados simulta-neamente;c) recíproca: ocorre quando são nomeados dois ou mais beneficiários, sendo todos eles substitutos entre si. Nesse caso, devemos lembrar que ao ser realiza-da a substituição devem ser mantidas as proporções originalmente destinadas aos herdeiros ou legatários. Assim, por exemplo, supondo que tenham sido aqui-nhoados por testamento os indivíduos A, B e C, res-pectivamente com 1/6, 2/6 e 3/6 da herança, tendo sido estabelecido que todos são substitutos entre si. Supon-do, nesse caso, que A não possa receber sua parte na herança (por ser pré-morto, por exemplo), esta deverá ser dividida entre B e C, mas não em partes iguais, e sim na mesma proporção com que estes foram agracia-dos na disposição original do testador, ou seja, caberão a B duas partes do que iria ser entregue a A, e caberão a C três partes do que iria ser entregue a A.Substituição fideicomissária: verifica-se a substitui-ção fideicomissária quando o testador nomeia herdei-ros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita a um “herdeiro intermediário” (o fiduciário), resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que poderíamos consi-

derar o “herdeiro definitivo” (fideicomissário).Art. 1.952. A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testa-dor. Se ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, este adquirirá desde logo a propriedade dos bens fideicomitidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário.São partes na substituição fideicomissária:a) fideicomitente: é o testador, que institui a substituição;b) fiduciário ou gravado: chamado a suceder em primeiro lugar. Tem a propriedade resolúvel dos bens da herança, até que chegue o momento de o fideicomissário herdar;c) fideicomissário: destinatário final, que receberá a he-rança (ou legado) tão logo ocorra a condição prevista no testamento.Extinção e caducidade do fideicomisso: a extinção do fideicomisso se dá, ordinariamente, pelo advento do termo, ou condição, pois se tem o alcance do fim almejado pelo testador. Caduca o fideicomisso se o fideicomissário morrer antes do fiduciário; se não ocorrer a condição sob o qual o fideicomissário é instituído; em hipótese de renúncia da he-rança e pela exclusão por indignidade, incapacidade ou falta de legitimação. Caduca ainda o fideicomisso se o conceptu-ro não se tornar nascituro até dois anos após a abertura da sucessão (artigo 1799, § 4.º, do Código Civil).Substiuição compendiosa: a substituição fideicomissária, quando combinada com a vulgar, recebe o nome de com-pendiosa. Assim, estabelece o testador uma substituição fideicomissária, nomeando o fideicomissário e o ficuciário, porém acrescenta um substituto vulgar ao fideicomissário, ou seja, caso este não possa, ou não queira receber a he-rança ou legado, este não se consolida nas mãos do fiduci-ário, mas será transmitido ao substituto.

TestamenteiroTestamenteiro é a pessoa encarregada de fazer cumprir as disposições de última vontade do testamento. É o executor do testamento. Pode ser nomeado pelo testador, em testa-mento ou codicilo (artigos 1.976 e seguintes do Código Civil). O juiz deve confirmar ou não a indicação do testamenteiro.A testamentaria é função remunerada; apenas o herdeiro ou legatário a exercerá desinteressadamente, mas o tes-tador poderá fixar remuneração para o herdeiro instituído, ou legatário. Estabelece o artigo 1.988 do Código Civil que o testamenteiro que for legatário poderá preferir o prêmio ao legado. A testamentaria é personalíssima, intransmis-sível aos herdeiros do testamenteiro, além de indelegável conforme dispõe o artigo 1.985. Não obstante, nada impede que o testamenteiro faça-se representar em juízo e fora dele mediante procurador com poderes especiais.

Redução das disposições testamentáriasOs herdeiros necessários devem, necessariamente, receber pelo menos 50% do valor do patrimônio existente no mo-mento da morte do autor da herança (parcela legítima da he-rança). Assim, se a quota deixada a terceiros por testamento ultrapassar o limite de 50% da parcela disponível, prejudi-cando a legítima, os herdeiros necessários poderão pleite-ar a redução das disposições testamentárias (arts. 1967 e 1968, CC). Não se trata de anulação do testamento,ou da disposição testamentária, mas tão somente do retorno da parte que ultrapassou o limite imposto pela lei, à parcela legítima.Tal redução pode ser feita nos próprios autos do inventário, se houver acordo entre os herdeiros. Senão, poderão os herdeiros necessários, ou seus descendentes, intentar ação de redução para a recomposição do valor da legítima. Serão agraciados apenas aqueles que ingressarem em juízo, não sendo extensível aos herdeiros que não se movimentarem a eventual vantagem obtida por aqueles que propuserem a ação.A redução das disposições testamentárias não se confun-de com a colação, pois esta se destina a igualar as cotas dos herdeiros legítimos, no caso de ter havido doação feita aos descendentes que possa desequilibrar as parcelas da legítima. A redução das disposições testamentárias, por sua vez, tem como objetivo fazer com que as liberalidades se contenham dentro da parte disponível do doador, indepen-dentemente de beneficiarem algum herdeiro legítimo, ou qualquer estranho.

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InventárioDenomina-se inventário o processo destinado a apurar os bens deixados pelo finado, bem como identificar seus su-cessores, com finalidade de proceder-se à partilha. Pode-se

constituir em processo judicial, ou procedimento extra-judicial, e deve ser instaurado no último domicílio do autor da herança (artigo 96 do Código de Processo Ci-vil). As regras referentes ao inventário são de natureza processual, pelo que vamos referir apenas aspectos genéricos de interesse.EspéciesInventário tradicional ou solene: de aplicação resi-dual, regulado nos artigos 982 a 1.030 do Código de Processo Civil.Arrolamento: forma simplificada de inventário. Se sub-divide em:a) sumário: herdeiros maiores e capazes, aplicável quando todos os interessados concordarem com a partilha;b) comum: para bens do espólio quando o valor for igual ou inferior a 2 mil OTNs.Alvará judicial: procedimento simples destinado ape-nas ao levantamento de pequenas quantias.Inventário extrajudicial: procedimento criado pela Lei 11.441/07, que estabelece a possibilidade de partilha feita por meio de escritura pública, desde que todos os herdeiros sejam maiores e capazes, e estejam de acordo acerca dos termos da partilha, desde que não haja testamento.

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A coleção Guia Acadêmico é o ponto de partida dos es-tudos das disciplinas dos cursos de graduação, devendo ser complementada com o material disponível nos Links e com a leitura de livros didáticos.

Direito das Sucessões – 2ª edição - 2009

Coordenador:Carlos Eduardo Brocanella Witter, Professor universitário e de cursos preparatórios há mais de 10 anos, Especia-lista em Direito Educacional; Mestre em Educação e Se-miótica Jurídica; Membro da Associação Brasileira para o Progresso da Ciência; Palestrante; Advogado e Autor de obras jurídicas. Autores:César Bocuhy Bonilha, advogado em São Paulo, Espe-cialista em Direito Público pela Faculdade de Direito Da-másio de Jesus. Professor de cursos preparatórios para o exame de ordem na Memes Tecnologia Educacional. Ângelo Rigon Filho, advogado em São Paulo. Mestre e doutorando em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Professor Universitá-rio em cursos de graduação e pós-graduação, na cadeira do Direito Civil. Professor de cursos preparatórios para a OAB e para as carreiras públicas jurídicas. A coleção Guia Acadêmico é uma publicação da Memes Tecnologia Educacional Ltda. São Paulo-SP.

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