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INOVAÇÃO, MANUFATURA AVANÇADA E O FUTURO DA INDÚSTRIA UMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE SOBRE AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO 1ª Edição SIG Quadra 4, Bloco B, Ed. Capital Financial Center, Brasília - DF + 55 61 3962 8700 [email protected] www.abdi.com

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  • INOVAÇÃO, MANUFATURA AVANÇADA E O FUTURO DA INDÚSTRIA

    UMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE SOBRE AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO

    1ª Edição

    SIG Quadra 4, Bloco B, Ed. Capital Financial Center, Brasília - DF

    + 55 61 3962 [email protected]

    mailto:[email protected]://www.abdi.com

  • INOVAÇÃO, MANUFATURA AVANÇADA E O FUTURO DA INDÚSTRIAUMA CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE SOBRE AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO

    BrasíliaABDI2017

    Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

    1ª Edição

  • República Federativa do Brasil

    Michel Temer

    Presidente

    Ministério da Indústria,

    Comércio Exterior e Serviços

    Marcos Pereira

    Ministro

    Agência Brasileira de Desenvolvimento

    Industrial - ABDI

    Luiz Augusto de Souza Ferreira

    Presidente

    José Alexandre da Costa Machado

    Diretor

    Miguel Antônio Cedraz Nery

    Diretor

    Bruno Jorge Soares

    Gerente de Planejamento

    Equipe Técnica e Revisão da ABDI

    Carlos Henrique de Mello Silva

    Jackson De Toni

    Ricardo Amorim

    Roberto Pedreira

    Rogério Araújo

    Simone Uderman

    Ana Carolina Nogueira

    (Estagiária)

    Projeto gráfico

    Mariana Destro

    Contrato n.029/2015

    “Serviços técnicos especializados para a reali-

    zação de estudos e pesquisas acerca de políticas

    industriais e ações de fomento ao desenvolvimen-

    to tecnológico e à inovação”.

    Gestor do contrato: Roberto Pedreira

    Coordenação

    Carlos Torres Freire, Doutor em Sociologia pela

    USP e Diretor Científico do Cebrap.

    Glauco Arbix, Professor Titular do Departamento

    de Sociologia da Universidade de São Paulo (USP).

    Mário Sérgio Salerno, Professor Titular do

    Departamento de Engenharia de Produção da

    Escola Politécnica da USP.

    Equipe de pesquisa:

    Carolina Mota Mourão, Mestre em Direito

    do Estado pela USP, Professora de Direito

    Administrativo da Universidade Presbiteriana

    Mackenzie.

    Daniel Babinski, Mestre em Direito do Estado

    pela USP, sócio do Gomes & Navarro Advogados

    Associados e pesquisador associado do Cebrap.

    Felipe Massami Maruyama, mestrando em

    Engenharia de Produção na Poli/USP e pesquisa-

    dor associado do Cebrap.

    Graziela Castello, Graduada em Ciências Sociais

    pela Pontifícia Universidade Católica de SP e

    pesquisadora do Cebrap.

  • Guilherme Soares Gurgel do Amaral, Doutor em

    Engenharia de Produção pela Escola Politécnica

    da USP, pesquisador associado do Cebrap.

    Leonardo Melo Lins, Mestre e Doutorando em

    Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e

    pesquisador associado do Cebrap.

    Paula Santana, mestranda em Políticas Públicas

    pela USP, pesquisadora associada do Cebrap.

    Consultores e especialistas:

    André Tortato Rauen (Ipea), Doutor em Política

    Científica e Tecnológica pela Unicamp, pesquisa-

    dor do Ipea.

    André Amaral, economista, consultor em

    finanças públicas.

    Carlos Américo Pacheco, Doutor em Economia,

    Instituto de Economia da Unicamp.

    Cristina Caldas, Doutora em Imunologia pela USP,

    pesquisadora visitante no Center for International

    Studies do Massachusetts Institute of Technology

    (MIT).

    Demétrio G. C. Toledo, Professor Doutor do

    Bacharelado em Relações Internacionais da

    Universidade Federal do ABC.

    Diogo Coutinho, Professor Associado do

    Departamento de Direito Econômico, Financeiro e

    Tributário da Faculdade de Direito da USP.

    Eduardo de Senzi Zancul, Professor do Departamento de

    Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP.

    Evando Mirra, Professor Titular Engenharia

    Metalúrgica da Universidade Federal de Minas

    Gerais (UFMG).

    Fernanda De Negri, Doutora em Economia pela

    Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),

    pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica

    Aplicada (Ipea) e pesquisadora visitante no

    Industrial Performance Center do Massachusetts

    Institute of Technology (MIT).

    Jorge de Paula Costa Avila, Doutor em Saúde

    Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de

    Janeiro.

    João Alberto De Negri, Doutor em Economia pela

    Universidade de Brasília, pesquisador do IPEA.

    Pedro Salomon Bezerra Mouallem, Mestre em

    direito pela Faculdade de Direito da USP.

    Roberto Vermulm, Professor Dr. da Faculdade de

    Economia e Administração da USP.

    Consultoria jurídica:

    Manesco, Ramires, Perez, Marques,

    Sociedade de Advogados.

    Sundfeld Advogados, Consultores em Direito

    Público e Regulação.

    Veirano Advogados.

  • Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP

    Uma contribuição ao debate sobre as políticas de desenvolvimento produtivo: inovação e manufatura

    avançada / Organizador: Jackson De Toni - Brasília : ABDI, 2017.

    v. 1 (545 p.) : il., gráfs. color.

    ����������

    ISBN: 978-85-61323-42-4

    1. Indústria 2. Indústria Brasileira 3. Política Industrial

    4. Desenvolvimento Brasileiro 5. Inovação 6. Tecnologia;

    De Toni, Jackson// I. Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial.

  • INTRODUÇÃO

    APRESENTAÇÃO

    01 / PANORAMA DE POLÍTICAS INDUSTRIAIS E DE INOVAÇÃO NO BRASILINTRODUÇÃO

    PARTE I. INTRODUÇÃO E CONTEXTO

    1. PARÂMETROS PARA UMA NOVA GERAÇÃO DE POLÍTICAS DE INOVAÇÃO

    PARTE II. POLÍTICAS INDUSTRIAIS: TRAJETÓRIA RECENTE NO BRASIL

    1. A INOVAÇÃO COMO POLÍTICA DE ESTADO

    2. A POLÍTICA INDUSTRIAL TECNOLÓGICA E DE COMÉRCIO EXTERIOR (PITCE)

    3. A POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO PRODUTIVO (PDP)

    4. O PLANO BRASIL MAIOR (PBM)

    5. O PLANO INOVA EMPRESA E A OVA GERAÇÃO DE POLÍTICAS DE INOVAÇÃO

    6. PROGRAMA NACIONAL PLATAFORMAS DO CONHECIMENTO (PNPC)

    PARTE III: MARCO REGULATÓRIO E EVOLUÇÃO DO FINANCIAMENTO A CT&I

    1. A CONSTRUÇÃO DO NOVO PADRÃO DE FINANCIAMENTO: 1997-2001

    2. CONSOLIDAÇÃO DO NOVO MODELO DE GOVERNANÇA: 2003-2009

    3. INTEGRAÇÃO DAS POLÍTICAS DE CT&I COM A POLÍTICA INDUSTRIAL: 2011-2014

    NOVOS RUMOS: REVISÃO DO MARCO LEGAL E PROJETOS ESTRUTURANTES

    REFERÊNCIAS GERAIS

    REFERÊNCIAS POR POLÍTICA INDUSTRIAL

    02 / BENCHMARKING DE POLÍTICAS PARA DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL, TECNOLÓGICO E INOVAÇÃO DE PAÍSES SELECIONADOSINTRODUÇÃO

    1. UM NOVO CONTEXTO PARA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS

    1.1. REARRANJO DA CAPACIDADE INDUSTRIAL

    1.2. A INOVAÇÃO COLABORATIVA E O PAPEL CRÍTICO DAS EMPRESAS NASCENTES

    1.3. NOVOS REQUERIMENTOS PARA GOVERNANÇA

    2. QUADRO CONCEITUAL PARA INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS

    INDUSTRIAIS E DE INOVAÇÃO

    3. TENDÊNCIAS RECENTES NO USO DE INSTRUMENTOS DE POLÍTICA

    INDUSTRIAL PARA A INOVAÇÃO

    3.1. AUMENTO DA PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA P&D EMPRESARIAL E DA

    UTILIZAÇÃO DE INCENTIVOS FISCAIS

    11

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    115

    115

    SUM

    ÁRIO

  • 3.2. CRIAÇÃO DE MECANISMOS DE TRANSFERÊNCIA TECNOLÓGICA JUNTO A

    INICIATIVA PRIVADA

    3.3. APOIO AO EMPREENDEDORISMO

    3.4. FORTALECIMENTO DO USO DA ENCOMENDA PÚBLICA

    4. PERFIS NACIONAIS RESUMIDOS

    4.1. ESTADOS UNIDOS

    4.2. CHINA

    4.3. ALEMANHA

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    03/ AVALIAÇÃO DO USO DO ARCABOUÇO JURÍDICO DE INOVAÇÃOINTRODUÇÃO

    1. ESTRUTURAÇÃO DA PESQUISA EMPÍRICA

    1.1. METODOLOGIA ADOTADA

    1.2. TEMÁTICAS EXPLORADAS

    2. AVANÇOS E DEMANDAS NA PERCEPÇÃO DOS USUÁRIOS

    2.1. AVANÇOS PERCEBIDOS NO ARCABOUÇO LEGAL ASSOCIADO ÀS

    PRÁTICAS DE INOVAÇÃO

    2.2. DEMANDAS A RESPEITO DO ARCABOUÇO LEGAL ASSOCIADO ÀS

    PRÁTICAS DE INOVAÇÃO

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    ANEXO I – ROTEIRO DE ENTREVISTA

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    04/ ANÁLISE DA LEI DE INOVAÇÃOSUMÁRIO DO CAPÍTULO

    1. COMPRAS

    2. FLUXO DE CONHECIMENTO

    3. EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO

    4. FINANCIAMENTO

    APRESENTAÇÃO

    INTRODUÇÃO

    1. CONSOLIDAÇÃO DO ARCABOUÇO JURÍDICO-INSTITUCIONAL EM INOVAÇÃO

    2. COMPRAS

    2.1. ELEMENTOS METODOLÓGICOS

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    240

  • 2.2. IMPORTAÇÃO, PESQUISA E INOVAÇÃO NO BRASIL: ASPECTOS LEGAIS E

    INFRALEGAIS

    2.3. O PODER DE COMPRA DO GOVERNO COMO INDUTOR DA MUDANÇA

    TÉCNICA NAS EMPRESAS

    3. FLUXOS DE CONHECIMENTO

    3.1. RECURSOS HUMANOS

    3.2. COOPERAÇÃO ICT-SETOR PRIVADO

    3.3. PROPRIEDADE INTELECTUAL

    3.4. RECOMENDAÇÕES

    4. EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO

    4.1. INCENTIVOS ÀS EMPRESAS INOVADORAS EM ESTÁGIO INICIAL

    4.2. INCENTIVOS ÀS EMPRESAS INOVADORAS EM ESTAGIO INICIAL:

    O FINANCIAMENTO VIA CAPITAL DE RISCO

    4.3. INVESTIMENTO EM EMPRESAS INOVADORAS POR MEIO DE FUNDOS DE

    INVESTIMENTO EM PARTICIPAÇÃO - FIP

    4.4. FUNDOS DE INVESTIMENTOS EM EMPRESAS INOVADORAS COM

    PARTICIPAÇÃO ESTATAL

    4.5. O CAPITAL DE RISCO NA LEI DE INOVAÇÃO: PRINCIPAIS ENTRAVES E

    PROPOSTAS NO PLANO JURÍDICO

    4.6. RECOMENDAÇÕES

    5. FINANCIAMENTO

    5.1. SÍNTESE DA PROPOSTA DE FUNDO NACIONAL DE INOVAÇÃO

    5.2. FOMENTO À INOVAÇÃO POR FINANCIAMENTO PÚBLICO

    5.3. FOMENTO À INOVAÇÃO POR FINANCIAMENTO PRIVADO

    5.4. GOVERNANÇA DO FUNDO NACIONAL DE INOVAÇÃO

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    05/ MANUFATURA AVANÇADA NOS EUA – US NATIONAL NETWORK OF MANUFACTURING INNOVATION: A ESTRATÉGIA AMERICANA PARA A INDÚSTRIA AVANÇADA

    SUMÁRIO EXECUTIVO

    INTRODUÇÃO

    1. A EMERGÊNCIA DA REDE DE MANUFATURA AVANÇADA

    2. POR DENTRO DO PROJETO NNMI

    3. TENDÊNCIAS NAS POLÍTICAS DE INOVAÇÃO A PARTIR DO NNMI

    242

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    427

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    435

    438

  • 3.1. A ORIGEM DO PROJETO NMI

    3.2. ARCABOUÇO INSTITUCIONAL E GOVERNANÇA DO PROGRAMA

    3.3. OS INSTITUTOS: CRIAÇÃO, FUNCIONAMENTO E AVALIAÇÃO

    3.4. FUNCIONAMENTO INTERNO

    3.5. EMPREGO E QUALIFICAÇÃO

    3.6. AVALIAÇÃO

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    1. A CENTRALIDADE DO OSTP NA FORMULAÇÃO DA POLÍTICA DE INOVAÇÃO

    2. “MINISTÉRIOS-FIM” NO FINANCIAMENTO E NAS AQUISIÇÕES DE INOVAÇÕES

    3. CRIAR AMBIENTES COMPARTILHADOS PARA EXPERIMENTAR, ABSORVER,

    GERAR E TESTAR TECNOLOGIAS DE ÚLTIMA GERAÇÃO

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    OUTRAS REFERÊNCIAS

    ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO

    06/ CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM SAÚDE NOS EUA: POLÍTICAS PÚBLICAS E INSTITUIÇÕES

    INTRODUÇÃO

    1. CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NOS EUA: A CIÊNCIA COM MISSÃO

    2. METODOLOGIA DO LEVANTAMENTO DE CAMPO

    3. A POLÍTICA DE C&T NORTE-AMERICANA NA ÁREA DE SAÚDE

    4. TENDÊNCIAS RECENTES NAS POLÍTICAS DE CTI EM SAÚDE

    CONSIDERAÇÕES FINAIS: LIÇÕES DAS EXPERIÊNCIAS DOS EUA E

    RECOMENDAÇÕES DE POLÍTICAS E AÇÕES PARA O BRASIL

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO

    ANEXO 2: LOCAIS VISITADOS E ENTREVISTADOS – SAÚDE NOS EUA

    07/ MANUFATURA AVANÇADA NA ALEMANHA – MODELOS INSTITUCIONAISE POLÍTICAS DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM MANUFATURA

    AVANÇADA: O CASO DA ALEMANHA E DO PROGRAMA INDUSTRIE 4.0SUMÁRIO EXECUTIVO

    INTRODUÇÃO

    1. CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM MANUFATURA NA ALEMANHA:

    UMA VISÃO GERAL

    2. METODOLOGIA DO LEVANTAMENTO DE CAMPO

    438

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    539

  • 3. TENDÊNCIAS RECENTES NAS POLÍTICAS DE CTI

    3.1. GOVERNANÇA DO PROGRAMA INDUSTRIE 4.0 E FORMAS

    DE PARTICIPAÇÃO

    3.2. O PAPEL DOS AMBIENTES DE TESTE E DEMONSTRAÇÃO – TESTBEDS

    3.3. INSTRUMENTOS ESPECÍFICOS DE FOMENTO E ENVOLVIMENTO DE PMES

    CONSIDERAÇÕES FINAIS: LIÇÕES DAS EXPERIÊNCIAS DA ALEMANHA E

    RECOMENDAÇÕES PARA O BRASIL

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO

    08/ ENERGIA E TECNOLOGIA NA ALEMANHA – A POLÍTICA DE INOVAÇÃO PARA ENERGIAS SUSTENTÁVEIS NA ALEMANHA

    SUMÁRIO EXECUTIVO

    INTRODUÇÃO

    1. CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NO SETOR ELÉTRICO DA ALEMANHA:

    UMA VISÃO GERAL

    1.1. 1974 – 1989: FORMAÇÃO INICIAL DA DINÂMICA DO DESENVOLVIMENTO

    TECNOLÓGICO NO SETOR

    1.2. 1990 - 2000: GERAÇÃO DA INDÚSTRIA DE ENERGIAS RENOVÁVEIS

    NA ALEMANHA

    1.3. 2000 EM DIANTE: CONSOLIDAÇÃO DO PROCESSO DE DIFUSÃO DAS

    TECNOLOGIAS DE ENERGIA RENOVÁVEIS NA ALEMANHA

    2. METODOLOGIA DO TRABALHO DE CAMPO

    2.1. ENERGIA E INDÚSTRIA 4.0

    3. TENDÊNCIAS RECENTES NAS POLÍTICAS ENERGÉTICAS

    CONSIDERAÇÕES FINAIS: LIÇÕES DAS EXPERIÊNCIAS DO PAÍS E

    RECOMENDAÇÕES PARA O BRASIL

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    ANEXO 1: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA TRABALHO DE CAMPO

    ANEXO 2: LOCAIS VISITADOS E PROFISSIONAIS ENTREVISTADOS

    NA ALEMANHA

    09/ MANUFATURA AVANÇADA NO BRASIL: DIRETRIZES E RECOMENDAÇÕES PARA A FORMULAÇÃO DE UM PROGRAMA NACIONAL

    SUMÁRIO EXECUTIVO

    INTRODUÇÃO

    543

    543

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    638

  • PRIMEIRA PARTE: INDÚSTRIA DO FUTURO, EUA, ALEMANHA E CHINA

    1. UMA NOVA INDÚSTRIA

    2. CONCEITOS E FUNDAMENTOS

    3. ALEMANHA

    4. ESTADOS UNIDOS

    5. CHINA

    6. TRAJETÓRIAS ADOTADAS NOS PAÍSES ANALISADOS

    7. PONTO DE PARTIDA NO BRASIL

    SEGUNDA PARTE: DIRETRIZES PARA O BRASIL

    VISÃO GERAL DAS DIRETRIZES E RECOMENDAÇÕES

    1. GOVERNANÇA

    2. INTEGRAÇÃO INTERNACIONAL

    3. LABORATÓRIOS

    4. TESTBEDS

    ANEXO 1 – DIRETRIZES PRELIMINARES PARA CHAMADAS PÚBLICAS DE

    FOMENTO A TESTBEDS

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    685

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 11

    INTRODUÇÃO

    Em estudo recente sobre a competitividade, o Brasil ocupou o penúltimo

    lugar num ranking de 18 países selecionados. 1 Entre nove fatores indicados,

    apenas em quatro, disponibilidade de mão de obra, competição e escala do

    mercado doméstico, educação e tecnologia e inovação, o país não ocupa o terço

    inferior do ranking. Entre os fatores mais preocupantes estão o alto custo de

    capital, as deficiências da infraestrutura de energia, a qualidade da educação,

    o baixo investimento em P & D e, é claro, a deterioração dos indicadores ma-

    croeconômicos.

    Essa situação preocupante, entretanto, não deve diminuir o papel da in-

    dústria na nossa trajetória de desenvolvimento nacional. O Brasil construiu

    um diversificado e complexo tecido industrial desde o pós-guerra. Eletroele-

    trônica, química, aeronáutica, automobilística, petroquímica, ..., poucos paí-

    ses emergentes lograram construir em pouco tempo um parque industrial que

    colocou o país entre as dez maiores economias do mundo. A indústria trans-

    formou o país, mais urbano e escolarizado, modernizando as relações econô-

    micas e institucionais.

    Entretanto, não conseguimos acompanhar a revolução tecno-científica

    em curso desde os anos setenta, nem modernizamos nossas instituições sufi-

    cientemente para acompanhar a revolução nas cadeias globais de valor. Como

    1 Competitividade Brasil, 2016, comparação com países selecionados, CNI, Brasília.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 12

    consequência perdemos progressivamente produtividade e agregação de va-

    lor nas nossas exportações, nos posicionamos de forma precária nas transfor-

    mações da estrutura produtiva mundial.

    Sabemos que é a indústria, em especial a manufatura, que gera maiores

    multiplicadores da atividade econômica, maiores efeitos de escala e maiores

    oportunidades para a inovação. Sabemos também que a indústria no mundo

    inteiro vive um período de transição que não é só tecnológica, mas dos pró-

    prios modelos de negócio. Os serviços, por exemplo, já adicionam mais que

    60% do valor aos produtos industriais. A economia digital, baseada em novas

    tecnologias de informação, avança em todos os setores. A assim chamada ma-

    nufatura avançada ou “indústria 4.0” passou a ser um imperativo para insti-

    tuições públicas e privadas que pensam o presente e o futuro do desenvolvi-

    mento produtivo. Segundo o Boston Consulting Group, as tecnologias que es-

    tão transformando a estrutura produtiva são: 1. robôs autônomos; 2. internet

    das coisas em nível industrial; 3. manufatura aditiva; 4. integração de siste-

    mas horizontais e verticais; 5. simulação; 6. realidade aumentada; 7. big data

    e análises; 8. processamento e armazenamento de dados em nuvem; 9. segu-

    rança cibernética. Há também uma diluição entre os antigos setores industrial

    e agrícola na medida dos avanços da bioeconomia, da agricultura de precisão

    e de tecnologias híbridas envolvendo novos materiais e novas cadeias de pro-

    teínas. Essas tecnologias estão na base e são potencializadas por novos mode-

    los de negócios baseados na customização em massa, na conexão instantânea,

    e na “servitização” de bens industriais. Estamos à beira da Quarta Revolução

    Industrial.

    Tornou-se imprescindível pensar o processo de desindustrialização, não

    só como o fim de um ciclo, mas o início de novas fronteiras nas políticas pú-

    blicas, para isso o apoio à inovação, às parcerias público-privada e a um novo

    tipo de política industrial, mais horizontal, compreensiva e flexível, feita em

    camadas que combinem agendas microeconômicas com projetos mais estru-

    turais é fundamental.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 13

    O estudo exploratório apresentado pela ABDI ajuda a debater esse com-

    plexo contexto, de profundas alterações tecnológicas, demográficas, regulató-

    rias e sociais para repensar as políticas tradicionais de apoio ao setor produ-

    tivo e sugerir insights para políticas futuras.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 14

    APRESENTAÇÃO

    A presente publicação resulta da edição e compilação dos relatórios de

    pesquisa realizados pelo projeto de parceria entre a ABDI e o CEBRAP2 com o

    objetivo de subsidiar os debates sobre o balanço das políticas de desenvolvi-

    mento produtivo e as expectativas e possibilidades de novas fronteiras, em es-

    pecial sobre a necessidade de aumentar a inovação no setor produtivo e disse-

    minar as práticas da “Industrie 4.0”, como a chamam os alemães ou a “Advan-

    ced Manufacturing”, denominação dada pelos norte-americanos.

    Os relatórios de pesquisa foram organizados em oito capítulos. O pri-

    meiro capítulo trata de um panorama das políticas industriais executadas na

    última década. A visão é crítica e procura identificar os principais gargalos das

    políticas industriais colocadas em prática no período, com ênfase para o tema

    de inovação. O segundo capítulo aborda um estudo de benchmarking de polí-

    ticas industriais em países selecionados: Estados Unidos, China e Alemanha.

    O terceiro capítulo aprofunda o debate sobre os desafios do marco regulatório

    de inovação. Os temas são segmentados em compras públicas, conhecimento

    e financiamento. O quarto capítulo debate as alterações na Lei de Inovação,

    incluindo o debate sobre os dispositivos da Lei 13.243/2016. Já os capítulos de

    cinco a oito apresentam relatórios de estudos de caso que envolveram visitas

    de campo. Os estudos são sobre a manufatura avançada nos Estados Unidos

    (Capítulo 5), os setores de saúde, tecnologia e inovação nos Estados Unidos (Ca-

    2 CEBRAP é a sigla do “Centro Brasileiro de Análise e Planejamento”, tradicional instituto de

    pesquisa econômica e social, sediado em São Paulo, foi fundado em 1969.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 15

    pítulo 6), o setor de manufatura avançada na Alemanha (Capítulo 7) e final-

    mente os estudos de inovação e energias sustentáveis na Alemanha (Capítulo

    8). O último Capítulo, nove, apresenta, em caráter exploratório e reflexivo, su-

    gestões e recomendações sobre uma eventual política de manufatura avan-

    çada para o Brasil.

    Cabe registrar que as ideias, reflexões e sobretudo as recomendações de

    políticas aqui contidas tem natureza unicamente reflexiva e exploratória, não

    representando necessariamente a agenda oficial da agência e/ou seu posicio-

    namento institucional, ou do Ministério da Indústria, Comércio e Serviços

    (MDIC), ao qual a instituição é vinculada.

    Boa leitura!

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 16

    01 /PANORAMA DE POLÍTICAS INDUSTRIAIS E DE INOVAÇÃO NO BRASIL

    INTRODUÇÃO

    Este capítulo apresenta uma análise de programas e ações de política

    industrial, tecnológica e de inovação formuladas e implementadas pelo go-

    verno federal nos últimos 10 anos.

    O objetivo básico deste documento, além de uma periodização analítica,

    com descrição dos alvos, instrumentos e metas previstos, é reconstruir a tra-

    jetória das políticas de modo a identificar as modalidades de apoio e de finan-

    ciamento públicos ao desenvolvimento tecnológico e à inovação.

    Não se pretende aqui refazer minuciosamente a história das políticas

    públicas voltadas para a indústria. Tampouco se debruçará sobre uma análise

    especializada dos resultados alcançados, o que exigiria outra metodologia e,

    fundamentalmente, séries históricas de dados de maior duração, capazes de

    fornecer informações precisas e comparáveis.

    Neste documento serão definidos os vetores principais que devem ori-

    entar a construção de uma nova geração de política de desenvolvimento tec-

    nológico e de inovação. Para isso, partiremos da reconstrução da evolução das

    diretrizes, escopo e dos objetivos que nortearam as políticas aprovadas desde

    2004, com todas suas virtudes, mas também com as oscilações, imprecisões e

    equívocos mais importantes que marcaram suas trajetórias.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 17

    Como base para esse esforço, foram analisadas as seguintes ações: Polí-

    tica Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE); Política de Desen-

    volvimento Produtivo (PDP); Plano Brasil Maior (PBM); Plano Inova Empresa

    (PIE); Programa Nacional Plataformas do Conhecimento (PNPC). Além destes,

    foram abordados de forma pontual o Programa de Sustentação do Investi-

    mento (PSI), o Inovar Auto e contribuições da Estratégia Nacional de Ciência e

    Tecnologia (ENCTI), definidas pelo Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação

    (MCTI) em 2012.

    Foram analisadas as proposições e carências das políticas após 2004

    pelo prisma do que consideramos ser o eixo estruturante de toda política in-

    dustrial contemporânea: a necessidade urgente de ações voltadas para a dimi-

    nuição da distância que separa a economia brasileira dos países desenvolvidos

    e das práticas industriais mais avançadas.

    Nessa chave, o principal desafio que agentes públicos e privados enfren-

    tam é o de formular políticas que levem à alteração do patamar de competiti-

    vidade do sistema produtivo, em geral, de baixo desempenho e sem condições

    de acompanhar a rápida evolução da indústria nos países avançados. Por isso

    mesmo, a preocupação básica que deve permear as políticas industriais mo-

    dernas é a de avançar rumo a alterações estruturais, que possibilitem a supe-

    ração do gap tecnológico e a acomodação inercial da indústria, típica das eco-

    nomias de concorrência limitada, fruto de décadas de protecionismo e tutela

    estatal. Assim, os esforços para a elevação da baixa produtividade da economia

    e o ainda baixo grau de desenvolvimento tecnológico e de inovação das nossas

    empresas, mesmo das mais dinâmicas, indicam a qualidade das políticas in-

    dustriais, assim como sua eficiência para o desenvolvimento sustentável e de

    longa duração.

    O capítulo está dividido em três partes. Na primeira, fazemos uma in-

    trodução à discussão sobre política industrial, apontando brevemente a im-

    portância de ciência, tecnologia e inovação, assim como fornecemos algumas

    referências para se analisar as políticas no Brasil. Na segunda parte, traçare-

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 18

    mos a trajetória e faremos uma leitura das políticas industriais a partir da pre-

    ocupação central com a inovação. Por fim, a terceira parte retoma o histórico

    de mudanças no modelo de financiamento e no marco legal para C&TI no Bra-

    sil nos últimos anos.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 19

    PARTE I. INTRODUÇÃO E CONTEXTO

    1. Parâmetros para uma nova geração de políticas de inovação

    Desde o final do século XX, avanços sem precedentes nas tecnologias da

    informação e comunicação (TICs), favoreceram uma convergência tecnoló-

    gica inédita, a partir da interconexão entre áreas, disciplinas e técnicas do co-

    nhecimento, e passaram a patrocinar mudanças radicais na indústria de

    transformação que, reestruturada, continuará sendo base e motor para inova-

    ções sociais e econômicas. Setores industriais inteiros, como o químico, ener-

    gético, de mineração, de petróleo e gás, de saúde e toda a matriz manufatu-

    reira, vivem mudanças profundas, a partir de novos materiais, imagens, robó-

    tica, impressão em 3D e, fundamentalmente, de sistemas integradores e ana-

    líticos que geram ou reutilizam dados em escala e qualidade impensáveis há

    poucos anos. Com isso, tecnologias digitais ganharam força inédita e deflagra-

    ram processos inovadores que permitem ganhos em custo, produtividade e

    eficiência.

    Os impactos dessa grande transformação já se anunciam profundos,

    tanto nos países desenvolvidos como nos emergentes. A começar pelas pers-

    pectivas de uma nova geografia da produção e dos sistemas de fornecimento;

    ou por conta dos desafios que os materiais avançados – como a fibra de car-

    bono, o grafeno e outros – colocam para os complexos do alumínio e do aço; ou

    pela diminuição das barreiras de entrada viabilizada pela computação e inter-

    net; ou ainda, pelo consistente entrelaçamento da manufatura e serviços.

    Por mais que esse panorama ainda seja restrito a algumas indústrias, é

    fundamental compreender que o mundo fabril já mudou e vai mudar ainda

    mais. A criação de emprego será mais difícil e, certamente, estará concentrada

    em trabalhadores mais qualificados – engenheiros, designers, técnicos de TI,

    logística, marketing – que operam em centros e escritórios muitas vezes longe

    da produção. O perfil do emprego será muito distinto do que predominou no

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 20

    século XX, com imensas consequências sociais, que nenhum ator relacionado

    à formulação de políticas industriais pode ignorar.

    A elaboração de políticas avançadas, com uma compreensão de con-

    junto e com base em linhas de longa duração, está longe de ser trivial. As pre-

    ocupações dos governos pautam-se, em geral, pelo curto prazo. Mais do que

    isso, governos são muito suscetíveis a ceder diante de pressões protecionistas

    ou a se mostrarem generosos com empresas e indústrias que se enraizaram no

    passado e não têm condições de competir no futuro.

    Foi por isso que, desde 2004, o governo brasileiro retomou a formulação

    de políticas industriais, só que agora, com o foco em inovação. As políticas in-

    dustriais implementadas na época de substituição de importações, tiveram

    como objetivo industrialização do país, como meio de superação do atraso de

    uma sociedade agrária com uma economia baseada em produtos intensivos

    em recursos naturais e insumos de baixo valor agregado. Com uma infraestru-

    tura rudimentar e mão-de-obra despreparada, as políticas industriais dos

    anos 50, 60 e 70 desenvolveram-se em uma sociedade não plenamente demo-

    crática, com uma concorrência controlada e forte presença do Estado, princi-

    pal avalista, patrocinador do investimento de peso e tutor da industrialização.

    Não se trata aqui de reescrever exaustivamente essa história. Mas ape-

    nas de enfatizar alguns traços para deixar claro que o Brasil se transformou

    em uma sociedade muito mais aberta, democrática e descentralizada, com

    uma indústria heterogênea, relativamente integrada e, em muitas áreas, ca-

    paz de competir inclusive mundialmente. Precisamente por isso, as políticas

    industriais de hoje, se quiserem alcançar os resultados que anunciam, preci-

    sam ter uma qualidade diferente das anteriores.

    Para não ficar prisioneiro do passado, o Brasil precisa aproximar rapi-

    damente sua indústria das melhores práticas internacionais, criar marcos re-

    gulatórios propícios ao desenvolvimento tecnológico, de modo que suas em-

    presas consigam endogeneizar os avanços e desenvolver inovações para mu-

    dar o patamar de seus sistemas de produção.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 21

    Como enfatizou Stiglitz, “structural transformation is always taking

    place because of changes in technology, in comparative advantage, and in the

    global economy”. Essas dimensões marcam o desenvolvimento industrial mo-

    derno como um processo contínuo de inovação tecnológica e de diversificação

    econômica. Ainda assim, para que esse processo tenha êxito, os países preci-

    sam migrar seu capital humano e recursos financeiros escassos dos setores de

    baixo desempenho para as áreas e complexos de alta produtividade. Para isso,

    são necessárias políticas públicas com foco em inovação, articuladas com a

    iniciativa privada, uma vez que “… the process to be efficient, coordination is-

    sues and externalities issues must be addressed. Markets typically do not man-

    age such structural transformations on their own well (Stiglitz et alli, 2013,

    p.10).

    Transformações dessa qualidade exigem investimento constante em

    Educação, Ciência e Tecnologia (C&T), assim como em canais institucionaliza-

    dos de comunicação permanente entre as estruturas produtivas e os centros

    geradores de conhecimento e formadores de mão de obra qualificada, sem os

    quais dificilmente os avanços obtidos serão traduzidos em produtos reais, com

    inserção na economia.

    Assim, as políticas públicas podem e devem ser concebidas para aumen-

    tar a produtividade geral da sociedade e, em especial, de cientistas, técnicos e

    engenheiros que atuam nas empresas e em centros de pesquisa, abandonando

    de vez as práticas dirigistas e centralizadoras que marcaram o nosso passado.

    Isso significa que a definição de objetivos e metas deve envolver responsabili-

    dades compartilhadas entre o setor público e o privado, a começar pelo esforço

    conjunto de construção de uma verdadeira cultura da inovação, que rejeite a

    acomodação e a tutela do Estado como único caminho para se evitar o desper-

    dício de recursos e a preservação de práticas empresariais ineficientes.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 22

    No quadro a seguir apresentamos um resumo das mudanças que envol-

    veram as políticas industriais no país nos últimos 60 anos:

    Quadro 1: Contexto, Vetores e Visão das Políticas Industriais no Brasil

    Período 1950-1980 1990-1999 2001-2010

    Contexto Substituição de im-portações

    Dirigismo estatal

    Proteção comercial

    Regime autoritário

    Democracia restrita

    Tecnologias da In-formação

    Estado regulador

    Economia mais aberta

    Regime democrá-tico

    Estabilidade e diminuição das desigualdades

    Crescimento econômico

    Estado indutor da transfor-mação industrial

    Vetores Industrialização Eficiência e quali-dade

    Inovação

    Visão so-bre Tec-

    nologia e Inovação

    Industrialização pro-moveria concorrência, geração de tecnologia e elevação da competi-

    tividade

    Competição e aber-tura econômica ge-

    rariam empresas mais competitivas

    e inovadoras

    Tecnologia e inovação nas empresas dependem de polí-

    ticas públicas de incentivo

    Fonte: Adaptado de Miranda e Mirra, 2012.

    Até 2004, apesar das diferenças de políticas e regimes econômicos ao

    longo do tempo, tecnologia e inovação foram concebidas muito mais como

    subproduto da atividade econômica ou do funcionamento regular dos merca-

    dos. A competição empresarial, no mercado doméstico ou internacional, seria

    o motor do desenvolvimento de inovações tecnológicas. Concepções desse tipo

    e porte, certamente ajudam a entender parte do atraso tecnológico brasileiro

    e o ainda baixo desempenho da nossa indústria.

    A inflexão nessa trajetória começaria a ocorrer a partir de 2004, com a

    retomada das iniciativas públicas relacionadas às políticas industriais e, em

    especial, com o foco explícito na inovação e desenvolvimento tecnológico. Mas

    essa trajetória não seguiu uma linha ascendente nem ocorreu de modo linear.

    O foco na inovação e desenvolvimento tecnológico, essencial para alteração do

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 23

    patamar do sistema produtivo, nem sempre obedeceu aos enunciados e obje-

    tivos fixados pelas políticas que, impreterivelmente, declararam o foco na ino-

    vação e tecnologia.

    As perspectivas reais, porém, mostraram realidade distinta. Não so-

    mente por falhas de execução, mas a natureza mesma das políticas industri-

    ais, que envolveram seus objetos, metas, prioridades e alocação de recursos,

    foram objeto de longas e ainda inconclusivas polêmicas; e isso dentro do go-

    verno, nas agências públicas, nas representações de classe e movimentos em-

    presariais. É importante registrar que a polêmica sobre o desenho das políticas

    está diretamente relacionada ao diagnóstico sobre o estágio da atividade in-

    dustrial, do lugar que a indústria pode (e precisa) ocupar no cenário da econo-

    mia nacional e internacional e sobre a atuação e competência institucional

    que devem ter agências especializadas, como Banco Nacional do Desenvolvi-

    mento Econômico e Social (BNDES), Financiadora de Estudos e Projetos (Fi-

    nep), Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Instituto Naci-

    onal de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), Instituto Nacional da

    Propriedade Industrial (INPI), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (An-

    visa), Agência Brasileira de Promoção das Exportações (Apex), na implemen-

    tação dos programas de governo. É o que veremos a seguir.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 24

    PARTE II. POLÍTICAS INDUSTRIAIS: TRAJETÓRIA RECENTE NO BRASIL

    1. A inovação como política de Estado

    Assim como ocorreu com a ciência brasileira, a preocupação de se estru-

    turar um sistema de inovação é recente. Foi somente nos últimos 20 anos que

    o Brasil construiu uma arquitetura relativamente robusta de inovação, que se

    beneficiou do impulso coordenado pelo Ministério da Educação (MEC) para a

    formação de técnicos e engenheiros especializados, ganhou força com a cria-

    ção dos fundos setoriais – coordenados pelo MCTI e executados legalmente

    pela Finep –, voltados para o financiamento da pesquisa e desenvolvimento

    tecnológico, e adquiriu maior maturidade com a implantação de uma rede de

    instrumentos, estímulos e incentivos econômicos para desenvolvimento tec-

    nológico.

    Assim, na segunda metade dos anos 1990, ainda no governo Fernando

    Henrique Cardoso, foi registrado um grande avanço com a engenharia insti-

    tucional dos Fundos Setoriais (com destaque para o Fundo Verde-Amarelo, de-

    dicado à inovação) e a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientí-

    fico e Tecnológico (FNDCT), que seria regulamentado em lei especial de 2007,

    que será apresentado na Parte III.

    A partir de 2003, o Brasil deu passos mais rápidos para a articulação de

    um sistema mais integrado e coerente para a indução da inovação nas empre-

    sas nacionais, com destaque para a aprovação da Lei da Inovação (Lei nº

    10.973/2004) e da Lei do Bem (Lei nº 11.196/2005), que viabilizaram incentivos

    à P&D semelhantes aos utilizados pelos países avançados. As mudanças no

    marco legal e regulatório abriram a possibilidade de se estruturar programas

    públicos de subvenção econômica (operada pela Finep), voltada para apoiar,

    via FNDCT, projetos de alto risco tecnológico; mais ainda, viabilizaram uma

    rede de subsídios para a fixação de pesquisadores nas empresas (Conselho Na-

    cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq e Finep), a disse-

    minação de programas de financiamento à inovação de capital empreendedor

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 25

    (Finep, BNDES e CNPq), assim como um arcabouço mais propício à interação

    universidade-empresa. Nesse período, as alterações do marco legal ocorreram

    em paralelo a um crescimento acentuado dos recursos e do investimento em

    inovação e tecnologia. Por exemplo, o dispêndio em P&D no país apresentou

    crescimento de 1,01% do PIB em 2003 para 1,24% do PIB em 2013 (MCTI, 2015).

    O país deu passos no rumo certo quando resolveu retomar as políticas

    industriais em 2003-2004. Mas escorregou ao perder o foco da inovação, gene-

    ralizar subsídios e aumentar a proteção para setores que não contribuem para

    o país se aproximar da fronteira mundial do desenvolvido produtivo com base

    em tecnologia.

    A retomada das políticas industriais ativas deu-se com a Política Indus-

    trial Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) em 2004, cujo foco estava ori-

    entado para a inovação tecnológica e em diretrizes para dar suporte às estra-

    tégias de diferenciação de produtos e serviços nas empresas. No entanto, é for-

    çoso registrar, a PITCE não conseguiu efetividade no seu desempenho e seus

    desdobramentos tiveram solução de continuidade. Frágil do ponto de vista de

    sua dotação orçamentária e dos instrumentos para a implementação de seus

    planos, a PITCE teve o mérito maior de colocar a inovação no centro dos desa-

    fios da indústria brasileira. Ainda que tardiamente em relação ao mundo, o

    Brasil ensaiava os primeiros passos para sintonizar a indústria com as novas

    tendências tecnológicas mundiais.

    Nos anos 90, a desconstrução do Estado desenvolvimentista não havia

    encontrado desenlace positivo na tradução de um novo modelo de desenvolvi-

    mento. Com exceção dos programas de qualidade, a indústria seria exposta à

    competição interna e externa sem instrumentos de apoio, preparo e mão de

    obra qualificada. De fato, a PITCE surgiu como uma via de saída, ainda que pe-

    quena, para a crise da nossa indústria, cujos sinais de atraso contrastavam

    com o avanço da microeletrônica, da computação e das TICS nos países avan-

    çados e mesmo em outros, que até a década de 1970 mostravam-se mais atra-

    sados que o Brasil, como a Coréia do Sul e Taiwan.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 26

    Em 2008, uma nova política industrial seria anunciada, a Política de De-

    senvolvimento Produtivo (PDP), com foco principal no aumento do investi-

    mento agregado. Correta do ponto de vista da economia, a PDP ofuscou a sina-

    lização aberta pela PITCE e deu à política industrial contornos tradicionais,

    com o uso intensivo de subsídios e de mecanismos de proteção contra a con-

    corrência internacional. A PDP, executada basicamente pelo BNDES, não es-

    tava estruturada para diversificar o investimento, nem para aumentar a P&D

    nas empresas. O foco genérico da PDP levaria o BNDES a priorizar nada menos

    do que 24 setores da economia – praticamente todos – sem conexão com as di-

    nâmicas internacionais.

    Dos esforços da PDP, porém, nasceria o Programa de Sustentação do In-

    vestimento (PSI, 2009), estruturado diretamente pelo Tesouro Nacional, que

    foi essencial para combater os efeitos da crise econômica originada nos Esta-

    dos Unidos em 2007-2008, pelo menos até 2011.

    O Plano Brasil Maior (PBM), de agosto de 2011, deu continuidade à ten-

    dência de retomada de práticas tradicionais, já prenunciada pela PDP. Mais do

    que isso, o PBM nasceu com o PSI em seus limites de efetividade. Mesmo assim,

    o PSI foi o principal suporte para um programa de desonerações generalizadas

    para o setor produtivo, apresentado como a política industrial do primeiro go-

    verno Dilma. Apesar de ações relevantes, como a concessão de crédito subven-

    cionado e isenções fiscais para empresas inovadoras, essas iniciativas ocupa-

    ram espaço marginal na dotação da PBM. Seu foco não era definitivamente a

    inovação, nem a priorização de áreas de futuro ou mesmo áreas de maior di-

    namismo do ponto de vista tecnológico. Sua formulação, coordenada direta-

    mente pelo Ministério da Fazenda, foi marcada por uma preocupação de hori-

    zontalidade em uma generosa política de subsídios que, além das questões fis-

    cais, pouco contribuiu para superar a ineficiente capacidade instalada. A ex-

    ceção seria o Inovar Auto que, apesar dos problemas mais estratégicos, surpre-

    endeu positivamente, como veremos adiante.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 27

    A partir de 2011, as novas iniciativas implementadas representaram –

    com todas as suas fragilidades – uma nova fronteira para as políticas indus-

    triais modernas. Com recursos volumosos, comparativamente com o passado

    – ainda que modestos se tomados pelo prisma da necessidade – as iniciativas

    públicas voltadas para inovação se esforçaram para sintonizar nossa indústria

    com as tendências mundiais.

    O Programa Ciência Sem Fronteiras (Coordenação de Aperfeiçoamento

    de Pessoal de Nível Superior – Capes e CNPq, MEC e MCTI) e o Programa Nacio-

    nal de Acesso à Escola Técnica (Pronatec, Capes-MEC) enfatizaram a necessá-

    ria formação de recursos humanos qualificados para a inovação nas empre-

    sas. Como forma de diversificar ainda mais o sistema de inovação, o Governo

    Federal criaria em 2013 a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial

    (Embrapii), uma Organização Social (OS) voltada para apoiar serviços tecnoló-

    gicos para as empresas industriais.

    Essas três iniciativas merecem ser aperfeiçoadas, pois, além de enrique-

    cerem o sistema de inovação, representaram, com o Plano Inova Empresa

    (2013), o que de melhor e mais relevante o Brasil construiu para além do arca-

    bouço dos tradicionais instrumentos de políticas públicas de formação de re-

    cursos humanos e desenvolvimento tecnológico.

    O Programa Inova Empresa (PIE), lançado pelo governo em março de

    2013, foi o primeiro na história do país inteiramente voltado para o apoio à

    inovação tecnológica. Representou enorme avanço do ponto de vista do vo-

    lume de investimento destinado à inovação (R$ 32,9 bilhões), da articulação

    interministerial (12 ministérios foram diretamente envolvidos, além da Finep

    e BNDES, as duas principais agências envolvidas com sua execução) e da qua-

    lidade dos instrumentos utilizados – e que, de modo inédito, foram parcial-

    mente integrados – com destaque para o crédito, a subvenção econômica, re-

    cursos não-reembolsáveis para Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs) e in-

    vestimento em empresas de forma direta ou por meio de fundos.

    O êxito do Inova Empresa pavimentou o caminho para a elaboração do

    Programa Nacional de Plataformas do Conhecimento, lançado por decreto

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 28

    pela Presidente da República em junho de 2014. Apesar de ainda não ter sido

    implantado, foi criado nos moldes das melhores práticas internacionais e es-

    truturado para viabilizar no Brasil o uso das encomendas tecnológicas3 a partir

    de demandas do Governo Federal para encontrar soluções de problemas soci-

    ais e econômicos de alto risco e alta complexidade científica e tecnológica.

    A seguir, detalharemos as propostas e as ações efetuadas por esses pro-

    gramas, com o objetivo de salientar êxitos e apontar carências do apoio público

    à inovação e competitividade, de modo a identificar os principais desafios e o

    lugar do Estado como financiador e articulador social.

    3 A figura das encomendas tecnológicas, prevista na Lei de Inovação, é raramente utilizada,

    dados questionamentos legais para sua aplicação.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 29

    2. A Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior(PITCE)

    A PITCE foi anunciada em novembro de 2003 e lançada oficialmente

    pelo Presidente da República, em março de 2004, com três pontos de inflexão

    na trajetória brasileira. Primeiro, a PITCE marcou a volta das políticas indus-

    triais no país, após um hiato de mais de 25 anos. Em segundo lugar, uma arti-

    culação rara entre vários atores do governo, a começar pelo forte envolvi-

    mento do Ministério da Fazenda e do Núcleo de Assuntos Estratégicos da Pre-

    sidência da República (NAE). A PITCE, no interior do governo, foi discutida e

    O que é: Primeira política industrial depois de um longo período de des-

    crença no papel da ação do Estado para elevação da competitividade da

    indústria. A PITCE caracterizou-se como política distinta das implemen-

    tadas durante o desenvolvimentismo. Com foco em setores dinâmicos,

    dotou-se de uma visão de longo prazo para a criação de setores industri-

    ais de alta tecnologia.

    Período: 2004-2006.

    Objetivos Principais: Colocar a inovação como foco da ação do Estado;

    melhoria das exportações e aumento da participação brasileira no co-

    mércio internacional via produtos de alta tecnologia; internacionaliza-

    ção das empresas industriais; aumento do investimento privado em

    P&D; atração de centros de internacionais de P&D.

    Principais Instituições Participantes: Casa Civil (CC); Ministério do De-

    senvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC); Ministério da Fa-

    zenda (MF); Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

    (NAE); Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); Banco Nacional

    de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); Agência de Promoção

    das Exportações (APEX); Conselho Nacional de Desenvolvimento Indus-

    trial (CNDI) e Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI),

    os dois últimos criados com a PITCE.

    Fontes de financiamento e instrumentos: FNDCT, Tesouro Nacional,

    FAT, BNDES, Finep.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 30

    aprovada pela Câmara de Política Econômica, coordenada pelo Ministro da Fa-

    zenda. E, por fim, a inovação como eixo da política industrial, diferenciando-

    se do desenvolvimentismo e da inação do Estado nos anos 90.

    A PITCE descortinou novas modalidades de política industrial, com base

    na rejeição do protecionismo e diferenciando-se das medidas ocasionais e fra-

    gmentadas da década de 1990. Na base de seu diagnóstico residia a perda de

    competitividade da indústria e a necessidade de acelerar os processos de ino-

    vação, via a diferenciação de produtos e processos, bem como a internaciona-

    lização das empresas brasileiras.

    Na sua exposição de motivos, pode-se ler que:

    “O desenvolvimento de novos produtos e usos possibilita a dis-

    puta e a conquista de novos mercados, acentuando o lugar cada

    vez mais importante que ocupa a capacitação para inovação in-

    dustrial. É necessária uma alocação crescente de recursos pú-

    blicos e privados para esse campo, para Pesquisa e Desenvolvi-

    mento (P&D), para a alta qualificação do trabalho e do trabalha-

    dor e para a articulação de redes de conhecimento. Essa intera-

    ção de diferentes áreas do saber, de métodos e alvos constitui

    uma das marcas fundamentais da Política Industrial, Tecnoló-

    gica e de Comércio Exterior. ” (PITCE, 2003, p. 4).

    No início do governo Lula, havia praticamente um consenso sobre a es-

    tagnação da indústria e que formas novas de se pensar a política industrial

    eram necessárias. Durante a década de 1990, não houve esforços sistemáticos

    para se formalizar uma robusta política industrial. O Governo Federal, a partir

    de 2003, considerou fundamental que as instituições de Estado fossem reequi-

    padas e capacitadas para elaborar e implementar políticas públicas de quali-

    dade. O foco em inovação colocava desafios enormes, já que o aparato institu-

    cional brasileiro para políticas industriais, ainda que inativo por anos, ainda

    se encontrava permeado por conceitos e práticas de outras épocas. Não por

    acaso, a integração e coordenação de diversos órgãos públicos e a ampliação

    do diálogo com o setor privado eram grandes desafios colocados para a PITCE.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 31

    Ao mesmo tempo, era inegável que o Brasil possuía uma base industrial

    consolidada, ainda mais se comparada com outros países emergentes; além

    disso, estavam em funcionamento várias modalidades de financiamento que

    poderiam ser direcionados para a inovação, a começar dos Fundos Setoriais,

    instituições especializadas como o Inmetro e INPI, além de agências como o

    BNDES e a Finep.

    Três pilares sustentavam a estrutura da PITCE:

    1. Linhas de ação horizontais: a) inovação e desenvolvimento tecno-

    lógico; b) inserção externa; c) modernização industrial; d) melho-

    ria do ambiente institucional e ampliação da capacidade e escala

    produtiva;

    2. Setores estratégicos: a) semicondutores; b) software; c) bens de ca-

    pital; d) fármacos e medicamentos;

    3. Atividades portadoras de futuro: a) biotecnologia; b) nanotecnolo-

    gia; c) biomassa e energias renováveis.

    Os setores estratégicos englobavam as áreas mais preparadas tecnologi-

    camente e com capacidade de oferecer retornos rápidos para as cadeias nas

    quais estavam inseridas. Essas áreas se diferenciavam do conjunto da indús-

    tria porque investiam mais em P&D, eram mais dinâmicas e contavam com

    uma densa cadeia de fornecedores.

    As atividades portadoras de futuro identificavam e recomendavam in-

    vestimentos de longa duração, já que envolviam aprendizagem e maior tempo

    de maturação. A referência era para setores de alta tecnologia com capacidade

    de competir internacionalmente. A escolha desses setores se deu com base em

    estudos internacionais (executados pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégi-

    cos – CGEE, e pelo NAE) prevendo a aproximação com a fronteira do conheci-

    mento e das práticas industriais mais avançadas.

    O debate público sobre a PITCE trouxe à luz do dia a inadequação das

    instituições responsáveis pelo desenvolvimento tecnológico, assim como as

    imprecisões e lacunas do marco regulatório-legal, criados para outra era,

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 32

    quando a industrialização estava no centro das preocupações. A mudança de

    foco e a necessária transformação da base produtiva deparavam-se com um

    forte despreparo institucional. Essa realidade tornava-se flagrante quando o

    debate tocava em dimensões, disciplinas e aspectos intangíveis – como softwa-

    res, dados, marcas, internacionalização de ativos, propriedade intelectual,

    dentre outros – ou áreas transversais – principalmente a biotecnologia e a na-

    notecnologia – campos férteis para a inovação, e que não podiam prescindir

    de regramento adequado para se desenvolver. Desse ponto de vista, é impor-

    tante registrar que na esteira das ações da PITCE, o Congresso Nacional apro-

    varia a Lei de Inovação e a Lei do Bem, que deram impulso ainda maior ao es-

    forço pela inovação, marcando o início da modernização do sistema regulató-

    rio- legal brasileiro.

    Em que pese o moderno aparato conceitual e da inédita integração da

    Política Industrial com Tecnologia e Política Exterior, a PITCE não alcançou

    efetividade. Estudos do IPEA acentuaram as virtudes da política (cf. De Negri

    e Salerno, 2005), dentre as quais o estabelecimento de relações dinâmicas en-

    tre inovação e desenvolvimento econômico. Evidências reveladas pelo IPEA

    mostraram que as estratégias de inovação e a diferenciação de produto e pro-

    cesso eram centrais para o desenvolvimento do país, pois as firmas mais pro-

    dutivas, mais competitivas e que melhor se inseriam internacionalmente

    eram as que inovavam e diferenciavam produto. Por isso mesmo, as políticas

    públicas mais adequadas eram as que apoiavam fortemente a inovação e dife-

    renciação de produto, o que se identificava com os objetivos centrais da PITCE.

    Mesmo assim, sem a criação de programas na escala e na intensidade

    que o Brasil precisava, a PITCE ajudou a consolidar um diagnóstico sobre a in-

    dústria brasileira, tanto nos órgãos de governo quanto entre empresários, e os

    rumos que seriam retomados com maior intensidade dez anos depois, com ini-

    ciativas mais consistentes, em especial com o Plano Inova Empresa.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 33

    3. A Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP)

    A crise iniciada no sistema financeiro dos EUA ofereceria ótimas opor-

    tunidades para o Brasil, em especial no que se refere à absorção de tecnologia

    (via compra de ativos ou joint ventures) ou seu desenvolvimento doméstico

    (com recursos e instrumentos para P&D empresarial). O Brasil, no entanto, op-

    tou por dar passos de perfil menos ousados e retomar ações mais tradicionais

    de política industrial, como a generalização de subsídios, medidas defensivas

    da indústria e isenções fiscais. O foco na inovação foi o elo que se perdeu, ainda

    que mantido no discurso de apresentação da PDP.

    Lançada em maio de 2008, como mais uma medida implementada pelo

    Governo Federal para minimizar os efeitos da crise econômica, a PDP seguiu

    O que é: Política industrial que buscou o aumento do investimento

    na economia, classificou suas atividades centrais em três grandes

    ações es-tratégicas e priorizou 24 setores para melhorar sua

    competitividade. A PDP reuniu um conjunto de incentivos voltados

    para dinamizar setores no mercado interno e aproveitar

    oportunidades do comércio internacional.

    Período: 2008-2010.

    Objetivos Principais: Sustentar o crescimento econômico iniciado em

    2004. Elevar a capacidade de inovação. Fortalecer as micro, pequenas e

    médias empresas (MPE). Apoiar a integração Brasil-África e consolidar o

    Mercosul. Conquistar novos mercados. Melhorar o posicionamento das

    marcas brasileiras. Ampliar o acesso da população a serviços básicos.

    Principais Instituições Participantes: MDIC, MF, BNDES, ABDI.

    Fontes de financiamento e instrumentos: Redução do prazo de

    apropriação de créditos PIS e COFINS. Eliminação do IOF nas operações

    de crédito do BNDES, FINAME e FINEP. Redução do IPI em setores seleci-

    onados. Financiamentos via crédito, subvenção econômica e incentivos

    fiscais. Certificação de metrologia, promoção comercial e propriedade

    intelectual.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 34

    apenas formalmente as trilhas abertas pela PITCE. Seu foco, instrumentos e

    forma de atuação divergiam das propostas avançadas pela PITCE. Houve dife-

    rença grande na priorização de setores: a PITCE havia selecionado poucos se-

    tores prioritários, todos com potencial de retorno em termos de competitivi-

    dade internacional e de capacitação tecnológica das empresas; na PDP, foram

    muitos os setores escolhidos como prioridade, o que diluía ainda mais a atua-

    ção das agências públicas; e ainda, a base de sustentação da PDP estava nas

    linhas de renúncia fiscal que atendiam praticamente o conjunto da indústria

    nacional.

    Críticas pontuais à PITCE ressaltaram o caráter de carta de princípios da

    política industrial, pois não havia uma manifesta determinação de ações con-

    cretas e metas a serem atingidas. Sendo assim, um plano de ações com objeti-

    vos de curto prazo foi desenvolvido pelo BNDES, de modo a dar maior visibili-

    dade e efetividade às propostas. Assim, as ações se dividiram em:

    1. Nível Sistêmico: Medidas que afetavam diretamente o desempe-

    nho da estrutura produtiva, priorizando ações nos planos fiscal e

    tributário.

    2. Destaques Estratégicos: Fortalecimento das micro e pequenas

    empresas. Expansão das exportações; integração produtiva com a

    América Latina e Caribe, com foco inicial no Mercosul; integração

    com a África; descentralização espacial da produção do País; e pro-

    dução ambientalmente sustentável.

    3. Programas Estruturantes: a PDP se contrapôs à eleição de setores

    como realizado pela PITCE. As ações voltaram-se para equacionar

    necessidades de cada setor, no diálogo entre governo e empresá-

    rios. Nesse ponto, a PDP anunciou três frentes de atuação: Progra-

    mas mobilizadores de áreas estratégicas, Programas para consoli-

    dar e expandir a liderança e Programas para fortalecer a competi-

    tividade. (PDP, 2008, p.15-16)

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 35

    O documento oficial da PDP registrava que havia um ambiente econô-

    mico favorável, com altas reservas em dólar, redução da inflação e aumento

    do número de empregos gerados, mas que era preciso estimular o aumento da

    taxa de investimento privado, de modo a gerar um efeito em cascata por toda

    a estrutura produtiva. Por isso, cada um dos setores contou com uma enge-

    nharia fiscal para equacionar a redução de tributos e as desonerações dos se-

    tores que aumentassem o investimento.

    Com essas diretrizes, a PDP estabeleceu Quatro Metas-País, para 2010:

    1. Aumentar a taxa de investimento da economia para 21% do PIB.

    2. Ampliar os investimentos privados em P&D para 0,65% do PIB.

    3. Ampliar para 1,25% a participação brasileira nas exportações

    mundiais.

    4. Aumentar em 10% o número de MPE exportadoras.

    A característica marcante da PDP foi a multiplicidade de ações e objeti-

    vos, o que diminuiu sua identidade política e aumentou as dificuldades de go-

    vernança, já presentes na PITCE.

    Formulada para dar sustentabilidade ao ciclo de expansão da economia

    a PDP distanciou-se das concepções modernas de política pública, preocupa-

    das em levar a indústria a buscar a diminuição da distância com a indústria

    avançada. Com isso, a PDP deixou passar a oportunidade histórica de interna-

    cionalizar as empresas brasileiras por conta da conjuntura de crise global, que

    disponibilizava empresas relativamente baratas para serem adquiridas no ex-

    terior.

    O lançamento do PSI em 2009 apenas confirmaria tendência de colocar

    a inovação no mesmo nível de outros gargalos da economia. De fato, toda a

    carteira do BNDES passou a ser financiada indistintamente por recursos sub-

    vencionados pelo Tesouro Nacional. Na prática, as linhas do PSI foram formu-

    ladas para atender a carteira do BNDES e, em particular, para a expansão do

    Finame. O foco na formação bruta de capital fixo esteve na raiz da formulação

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 36

    de uma política industrial que acreditava, como nos anos 50 e 60, que o cres-

    cimento do investimento geraria naturalmente a inovação e o desenvolvi-

    mento tecnológico.

    O PSI foi o maior programa de suporte ao investimento privado na his-

    tória do Brasil. No entanto, mesmo com fortes incentivos, a meta de elevação

    do investimento para 21% do PIB jamais foi atingida. O mesmo se deu com a

    meta de elevação do P&D empresarial de cerca de 0,5% para 0,65% do PIB. Ape-

    sar de constar como uma linha do PSI em 2010, nenhuma contratação nesta

    linha seria feita até 2011, quando ocorreu a entrada da FINEP como operadora

    do PSI.

    O PSI e a PDP marcaram a consolidação do predomínio do BNDES na exe-

    cução da política industrial. Os dados sobre os desembolsos diretos e indiretos

    do banco4 não deixam dúvidas: em 2007, o banco movimentou cerca de R$ 65

    bilhões; em 2008, este número subiu para R$ 91 bilhões e atingiu em 2014

    cerca de R$ 188 bilhões. O ano de maior aporte de recursos foi 2013, com cerca

    de R$ 190 bilhões em desembolsos. Percebemos um crescimento considerável

    nas movimentações do BNDES, o que é consistente com sua maior proeminên-

    cia na execução e coordenação da política industrial.

    Por seu caráter abrangente, com tratamento marginal da inovação, a

    PDP foi uma variante de ativismo estatal que, em larga medida, baseou suas

    propostas em desonerações, contando que a redução da carga tributária e au-

    mento de incentivos fiscais levaria a um aumento do investimento por parte

    do empresariado. Nesse sentido, ainda que contenha avanços em relação à

    PITCE, principalmente quanto à sua efetividade e volume de recursos, a PDP

    mostrou-se alheia ao esforço de construção de novas formas de ação para se

    alterar o patamar competitivo da economia.

    4 Valores referentes ao: Finem, Finame, Cartão BNDES, Finame Agrícola, Exim, Mercado de Capitais, Não-reembolsável, Finame Leasing e BNDES Microcrédito. Fonte: www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.html

    http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.htmlhttp://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.htmlhttp://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/BNDES_Transparente/Estatis-ticas_Operacionais/painel1_produtos.html

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 37

    4. O Plano Brasil Maior (PBM)

    O Plano Brasil Maior foi anunciado em agosto de 2011, com muita conti-

    nuidade em relação à PDP e com os efeitos da crise econômica em pleno anda-

    mento. Seu objetivo era o de sustentar o crescimento em contexto econômico

    adverso e sair da crise internacional com a economia melhor posicionada do

    que em 2008. Sua expectativa era que as mudanças estruturais na indústria

    melhorariam a inserção do país na economia mundial. Assim, ainda que o PBM

    anunciasse a inovação e a elevação da competitividade como soluções para

    acelerar o crescimento da economia, as medidas tomadas assemelharam-se

    O que é: Tal como a PDP, o PBM tinha como intuito o aumento da capacidade

    de investimento das empresas por meio de instrumentos como o subsídio e a

    renúncia fiscal. Em termos práticos, o PBM tinha como objetivo a manutenção

    do funcionamento da economia, visando a manutenção do emprego;

    Período: 2011-2014;

    Objetivos Principais: Redução do custo dos fatores de produção; desenvol-

    vimento das cadeias produtivas; indução do desenvolvimento tecnológico e

    qualificação profissional. Promoção de exportações; defesa do mercado in-

    terno; redução dos efeitos da Crise de 2008; fortalecimento de cadeias produ-

    tivas; ampliação e criação de novas competências tecnológicas e de negócios;

    desenvolvimento das cadeias de suprimento de energias; diversificação das

    exportações; consolidação de competências na economia do conhecimento

    natural.

    Principais Instituições Participantes: CC, MDIC, MF, MCTI, MPOG, BNDES,

    ABDI

    Fontes de financiamento e instrumentos: Financiamentos via crédito,

    subvenção econômica e incentivos fiscais; desoneração da folha de pagamen-

    tos; ampliação do Simples Nacional e do Microempreendedor individual; Pro-

    grama de Sustentação do Investimento (PSI); Programas setoriais do BNDES.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 38

    mais às políticas anticíclicas do que a uma efetiva política industrial, como se

    pode ver em suas justificativas oficiais:

    “O Plano adotará medidas importantes de desoneração

    dos investimentos e das exportações para iniciar o enfren-

    tamento da apreciação cambial, de avanço do crédito e

    aperfeiçoamento do marco regulatório da inovação, de

    fortalecimento da defesa comercial e ampliação de incen-

    tivos fiscais e facilitação de financiamentos para agrega-

    ção de valor nacional e competitividade das cadeias pro-

    dutivas. ”

    Ou seja, o PBM ampliou e aprofundou as medidas de desoneração inici-

    adas pela PDP, em meio a um cenário econômico menos favorável.

    O plano contemplou 19 setores industriais e apresentou um conjunto de

    instrumentos diferenciados entre fiscais-tarifários (isenções tributárias e ad-

    ministração das tarifas de comércio exterior), financeiros (condições favorá-

    veis de financiamento corporativo, via BNDES e FINEP) e institucionais (defi-

    nição de marco regulatório, constituição de carreiras públicas e criação de no-

    vas condições de ação para o Estado).

    No que se refere às ações, o PBM definiu duas dimensões: uma setorial e

    outra sistêmica. Na primeira, o Governo Federal e o setor privado se encarre-

    gariam de desenvolver projetos chamados Diretrizes Estruturantes, quais se-

    jam: “fortalecimento de cadeias produtivas”, “ampliação e criação de novas

    competências tecnológicas e de negócios”, “desenvolvimento das cadeias de

    suprimentos de energias”, “diversificação das exportações (mercados e produ-

    tos) e internacionalização corporativa” e “consolidação de competências na

    economia do conhecimento natural”.

    Cada uma dessas diretrizes abarcava uma gama de setores específicos

    da economia variando os objetivos por grau de consolidação e capacidade de

    avanço tecnológico. Na sua concepção original, o plano definiu cinco diretri-

    zes. A primeira, de viés protecionista, voltava-se para setores industriais com

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 39

    baixíssima capacidade de inovação tecnológica e mais intensamente atingido

    pela concorrência das importações. Coibir práticas desleais de competição era

    objetivo explícito. Esta diretriz orientava ações para setores tradicionais, como

    Plásticos, Calçados e Artefatos, Têxtil e Confecções, Móveis, Brinquedos, Higi-

    ene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos e Serviços de apoio à produção.

    A segunda, terceira e quarta diretrizes poderiam ser agregadas, do

    ponto de vista tecnológico, em torno de uma mesma finalidade. Essas diretri-

    zes voltavam-se para setores mais intensivos em tecnologia com o objetivo de

    criar novas competências em: Bens de Capital, TICs, Química-Petroquímica,

    Aeronáutica e Espacial, Defesa, Saúde e Energias (Petróleo e Gás; Bioetanol e

    Energias Renováveis). A quarta diretriz também tinha foco nas exportações e

    internacionalização corporativa, e estímulo à instalação de centros de P&D no

    país.

    A quinta diretriz estava voltada para o comércio atacadista e varejista,

    logística e serviços pessoais direcionados ao consumo das famílias e serviços

    de apoio à produção. Tal como a PDP, a abrangência desmesurada deu lugar à

    diluição da ação governamental.

    A segunda dimensão do programa, a sistêmica, possuía dois objetivos: 1.

    “reduzir custos, acelerar o aumento da produtividade e promover bases míni-

    mas de isonomia para as empresas brasileiras em relação a seus concorrentes

    internacionais” e 2. “consolidar o sistema nacional de inovação por meio da

    ampliação das competências científicas e tecnológicas e sua inserção nas em-

    presas”. Na prática, porém, a PBM também não priorizou a inovação tecnoló-

    gica, apesar de ter estabelecido como mote a ideia de “inovar para competir,

    competir para crescer”.

    Mesmo com essas deficiências, há um avanço em relação às políticas

    passadas: no PBM, buscou-se algum tipo de articulação entre a política indus-

    trial e a política de formação como meio da qualificação da mão de obra. Nesse

    sentido, o PBM integrou nas suas propostas o Ciência Sem Fronteiras e o Pro-

    natec, assim como recomendou a implementação de um programa de fortale-

    cimento da engenharia nacional que, infelizmente, não foi levado adiante. Foi

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 40

    a primeira vez que a qualificação da mão de obra fazia parte do debate sobre

    política industrial. Esse é um fator decisivo em qualquer economia em busca

    da elevação de sua competitividade, ainda mais em países como o Brasil no

    qual a produtividade do trabalho é baixa e não cresce desde os anos 1980, como

    mostram inclusive estudos realizados pelo IPEA em parceria com a ABDI (DE

    NEGRI e CAVALCANTI, 2014; DE NEGRI et. al., 2011).

    A qualidade da mão de obra, no entanto, era uma dentre várias medidas

    da “dimensão sistêmica” da PBM. Reproduzindo a falta de foco da PDP, o PBM

    previa dez metas para serem cumpridas até 2014:

    1. Ampliar o investimento para 22,4% do PIB.

    2. Elevar o dispêndio de P&D privado para 0,9% do PIB.

    3. Aumentar para 65% a participação de trabalhadores com pelo me-

    nos o Ensino Médio.

    4. Ampliar o valor agregado nacional para 45,3%.

    5. Elevar a indústria intensiva em conhecimento para 31,5% de partici-

    pação no total da indústria.

    6. Aumentar em 50% o número de micro e pequenas empresas inova-

    doras.

    7. Diminuir o consumo de energia por unidade de PIB industrial (137

    toneladas equivalente de petróleo - tep/R$ milhão).

    8. Diversificar as exportações brasileiras, representando 1,6% do co-

    mércio mundial.

    9. Elevar para 66% a participação nacional nos mercados de tecnolo-

    gias, bens e serviços para energias.

    10. Ampliar o número de domicílios urbanos com acesso à banda larga

    (40 milhões de domicílios).

    Algumas dessas metas estavam presentes na PDP e apenas tiveram seus

    valores alterados, mesmo com o não cumprimento das metas previstas para

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 41

    2010. Essa mesma profusão de objetivos gerou uma lista enorme de ações atri-

    buídas ao PBM, apresentada pelo governo no seu relatório final (nos relatos

    oficiais são 69 medidas). Na prática, a recorrente falta de foco e a pulverização

    de ações se fizeram presentes.

    O PBM, é importante registrar, inovou no desenho do arranjo político-

    institucional. Criado pelo Decreto nº 7.540/2011, o plano contava com coorde-

    nações setoriais e sistêmicas vinculadas aos eixos da política e que respondiam

    pela articulação com o setor privado e pela formulação das agendas. Para ge-

    renciamento e deliberações do PBM havia um grupo executivo, um comitê ges-

    tor e um conselho superior. O grupo executivo era coordenado pelo MDIC e

    contava com representantes dos seguintes órgãos e agências: Casa Civil, Mi-

    nistério Público (MP), MF, MCT, ABDI, BNDES e FINEP.

    O comitê gestor era formado pelos titulares dos seguintes órgãos: MDIC,

    Casa Civil, MF, MPOG e MCT. Além disso, contava ainda com o CNDI, órgão de

    aconselhamento superior da política industrial, composto por catorze mem-

    bros da sociedade civil, indicados pela presidente da República, além de treze

    ministros de Estado e pelo presidente.

    Esse aparato pode ter tornado as atividades de gestão complexas, conse-

    quentemente, dificultando a formulação e mesmo o acompanhamento das

    ações realizadas. No caso do PBM, tal aparato fragmentou decisões e deu es-

    paço para atenção excessiva a detalhes pouco significativos de diversas fren-

    tes e interesses, por exemplo. O PBM sofreu de outros problemas, como uma

    estratégia de incentivos sem contrapartidas dos beneficiários dos subsídios e

    o aceite demasiado de lobbies empresariais de diferentes setores, o que difi-

    cultou o estabelecimento de prioridades à política.

    Por fim, há três instrumentos que devem ser ressaltados e que merecem

    uma atenção especial: i) políticas creditícias, em particular a continuidade do

    PSI, com ampliação e aumento de seus incentivos; ii) o Inovar Auto; e iii) as

    isenções tributárias generalizadas. A seguir, discutimos brevemente as duas

    primeiras: o PSI e o Inovar Auto.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 42

    4.1. O Programa de Sustentação do Investimento (PSI)

    Uma parcela importante das medidas tomadas a partir de 2008 foi uma

    resposta à desaceleração da economia global. Muitos governos se viram diante

    da necessidade de intervir em suas economias, justamente para evitar que os

    impactos econômicos da crise se tornassem ainda mais desastrosos. No Brasil,

    o PSI ocupou lugar especial.

    Como programa, concedeu subvenção econômica a empresas, na moda-

    lidade de equalização da taxa de juros, para operações de financiamento do

    BNDES e, a partir de 2011, também da FINEP, neste caso, somente para projetos

    de inovação tecnológica (MP 465, junho de 2009, convertida na Lei 12.096 do

    mesmo ano).

    Apesar de o governo ter identificado corretamente a necessidade de ser

    mais ativo na reação à crise internacional, a extensão do regime de incentivos

    do PSI para setores que não corriam risco tecnológico não se refletiu no au-

    mento do investimento privado, conforme o desejado. Ou seja, o investimento

    público, neste caso, pode ter sido um substituto e não uma alavanca para o in-

    vestimento privado.

    No seu lançamento, o PSI possuía diversas linhas de financiamento com

    taxas de juros subsidiadas e cada uma dessas linhas contava com taxas pró-

    prias de juros, que variavam de acordo com as características do objeto a ser

    apoiado. Chama atenção a ausência de uma linha específica para inovação tec-

    nológica desde o início, apesar do discurso pró-inovação.

    O PSI vigorou a partir de 2009 e, ao longo do tempo, sofreu diversas ca-

    librações em suas linhas e taxas. Ou seja, o tipo e a intensidade do fomento

    adotado pelo programa foram ajustados de acordo com a conjuntura e as difi-

    culdades de cada setor, provocando sistemática busca das empresas pelas li-

    nhas mais atraentes.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 43

    Será que as alterações realizadas foram apropriadas? A variação do sub-

    sídio se deu na intensidade adequada? Do ponto de vista da inovação, a pri-

    meira resposta é negativa. O roteiro abaixo mostra os motivos:

    1. O programa foi lançado sem uma linha específica de inovação;

    2. Quando criada, a linha de inovação ficou inativa até 2011;

    3. A FINEP foi incluída como agente operador do PSI somente em

    2011, quando então a linha de financiamento à inovação começou

    a operar (em 2010 a Finep era considerada agente financeiro do

    BNDES. E mesmo assim, não conseguiu realizar nenhum desem-

    bolso por conta dos trâmites burocráticos impostos pelo Banco);

    4. Em 2012, o financiamento pelo PSI de máquinas, máquinas agrí-

    colas, caminhões e ônibus e outros equipamentos de transporte

    passou a operar com taxa fixa de 2,5% a.a, mais baixa que a linha

    de inovação, que operava com 3,5%, com os mesmos prazos de ca-

    rência e de amortização;

    5. Na sequência, as linhas para a compra de silos foram disponibili-

    zadas a 2,5% a.a., com 4 anos de carência e 12 anos para amortiza-

    ção, em contraste com a linha para inovação, que permaneceu a

    3,5% a.a, 3 anos de carência e 10 para amortização.

    Ou seja, era mais vantajoso financiar caminhão do que fazer inovação.

    Entre renovar a frota de caminhões com crédito mais barato do que realizar

    projetos de inovação com maior risco tecnológico, as empresas optaram pelo

    crédito mais barato e não fizeram as inovações que precisavam fazer. O resul-

    tado dessa variação sem critério foi um imenso efeito deslocamento.

    O PSI alcançou a cifra de R$ 472 bilhões em 2014. Ou seja, em seis anos o

    programa cresceu dez vezes. No começo, o PSI abrangia sete linhas distintas,

    com taxas de juros que variavam entre 3,5% a 7,5% para o beneficiário final do

    financiamento, com prazos de até 180 meses para retorno do crédito, em que

    até 36 meses podia ser concedido a título de carência.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 44

    As linhas que possuíam maiores recursos eram as voltadas para a pro-

    dução e aquisição de caminhões, ônibus, chassis, reboques e similares, que re-

    presentaram 44% do montante total (linha 1) e a linha voltada para aquisição

    dos demais bens de capital não associados e capital de giro associados a esses

    bens (linha 2), que representavam 28% do montante de recursos. Para a inova-

    ção, ficaram disponíveis apenas 5% dos recursos, mediante duas linhas. As de-

    mais linhas eram voltadas para o comércio exterior e outra equivalente à linha

    1, mas voltada às pessoas físicas e empresas individuais ou de pequeno porte.

    Nas linhas de inovação, a primeira apresentava taxa ao beneficiário fi-

    nal de 4,5%, enquanto a segunda oferecia taxa mais baixa dentre todas as de-

    mais linhas do programa, ou seja, de 3,5% a.a. Isto é, a taxa média ponderada

    pelo valor disponibilizado para as taxas de inovação era de 4%, inferior a qual-

    quer outra taxa ponderada das demais linhas e, ainda assim, muito próxima

    das demais linhas do PSI.

    O crescimento dos recursos do PSI foi de 375% entre 2009 e 2011, mas o

    valor destinado aos projetos de inovação cresceu apenas 50%. Mesmo com esse

    crescimento, a participação relativa das linhas de inovação caiu consideravel-

    mente, passando de 5% para 1,4% do montante total.

    A partir da entrada da FINEP como operadora do PSI, o enquadramento

    de projetos nas linhas de inovação passou a crescer consistentemente. Assim

    a disponibilidade das linhas de inovação precisou ser ampliada em 2011, pas-

    sando de R$ 3 bilhões no total para R$ 6,2 bilhões. Ainda assim, a participação

    relativa das linhas de inovação permaneceu mais baixa que no início do pro-

    grama – foi de 1,4% para 3% do montante total passível de equalização.

    Já em 2012, algumas linhas do PSI foram desdobradas e outras conden-

    sadas. As taxas de inovação, por sua vez, sofreram um revés e passaram a per-

    der o diferencial de atração em relação às outras linhas. Em 2012, o volume de

    recursos do PSI passou para R$ 227 bilhões, mas o total disponibilizado para

    inovação permaneceu o mesmo. As taxas de juros das linhas de inovação em

    2013 tiveram uma redução, mas não o suficiente para tornar as taxas atrativas

    em relação a outras linhas de bens de capital.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria 45

    Em 2014, o PSI saltou para R$ 372 bilhões, ou seja, uma ampliação de R$

    60 bilhões. Desta ampliação, apenas R$ 2 bi foram concedidos para as linhas

    de inovação, que passa a totalizar um estoque (considerando os exercícios an-

    teriores) de R$ 9,2 bilhões concedidos para apoio a projetos de inovação desde

    o início do PSI. Esse montante representou apenas 2,4% de todo o recurso pas-

    sível de equalização autorizado pelo governo desde o lançamento do pro-

    grama.

    Essas alterações seguidas apenas evidenciam que os projetos com risco

    tecnológico não eram considerados ações especiais e diferenciadas. Isso signi-

    fica que as empresas não contavam com estímulos adequados para a inovação,

    o que levou muitas a optarem pelos caminhos de menor risco e incerteza.

    Há um debate forte sobre o PSI e os efeitos de crowding out, mas ainda

    faltam estudos bem fundamentados utilizando os dados oficiais para tornar

    essa questão mais clara. Ou seja, há uma polêmica para identificar até que

    ponto as atividades financiadas pelo PSI seriam de todo modo conduzidas pe-

    los empresários, mas com seus próprios recursos. O dilema seria saber se di-

    ante da oportunidade de obtenção de capital barato e em condições extrema-

    mente vantajosas em relação ao mercado, as empresas manteriam seus recur-

    sos reservados ou aplicados no mercado financeiro, ao invés de aplicar seus

    próprios recursos na produção.

  • Inovação, Manufatura Avançada e o futuro da indústria

    46

    4.2. Inovar Auto: um foco novo para um cliente conhecido

    No âmbito do conjunto de incentivos fiscais feitos pelo governo a partir

    de 2011, cabe destacar o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Aden-

    samento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores (Inovar Auto) como um

    exemplo a ser discutido. Este programa é um avanço em relação às políticas

    feitas para o setor automotivo nos últimos anos. Isoladamente, é insuficiente

    para inovações mais radicais, mas é positivo o fato de vincular os incentivos

    fiscais para a indústria à inovação tecnológica.

    O objetivo principal do programa foi melhorar a tecnologia e a segu-

    rança para os carros produzidos e vendidos no Brasil, mediante a permissão

    para as empresas habilitadas usufruir de crédito presumido de Imposto sobre

    Produtos Industrializados (IPI). O programa foi voltado para as empresas que

    produziam ou comercializavam veículos no Brasil ou que vieram a apresentar

    projetos de investimento no setor automotivo.

    O Inovar Auto também teve o objetivo de fomen