GOUNET. toyotismo e fordismo na civilização do automóvel

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GOUNET, Thomas

GOUNET, Thomas. Fordismo e Toyotismo na Civilizao do Automvel. So Paulo: Boitempo Editorial, 1999.

Prefcio edio brasileira.Escrito por Gounet em agosto de 1999.

Destaca o momento de crise vivido pela economia mundial e seu impacto no Brasil. Afirma que a crise econmica atinge duramente o pas desde o final de 1997.p. 7

Abaixo segue um trecho do livro a partir do qual acredito ser possvel balizar a primeira etapa do meu projeto: evidenciar o avano do toyotismo nos bancos pblicos.o sistema fordista est sendo progressivamente substitudo por um outro, o toyotismo. Este permite maior explorao dos trabalhadores, por trs meios principais. Antes de mais nada, intensifica o trabalho, sobrecarregando ao mximo cada operrio. Ele deve ser mais rpido, deve reduzir todos os tempos mortos (durante os quais espera o veculo em seu lugar, e que lhe permitem respirar um pouco, diante do ritmo da linha de produo), deve cumprir novas tarefas, como o controle de qualidade ou a manuteno corrente das mquinas. Com o toyotismo, o trabalhador no tem mais um minuto para si.

Em seguida, o toyotismo reduz os salrios e degrada a proteo social nas fbricas, apoiando-se na terceirizao. Em uma fbrica terceirizada, as condies sociais so sempre piores que em uma grande unidade de produo, na qual os trabalhadores podem formar uma fora organizada, capaz de extrair certas vantagens atravs da luta. Finalmente, o toyotismo divide completamente os trabalhadores. Aloca-os em firmas menores. Assim, 10 mil operrios podem participar na execuo de um veculo, mas somente 2 mil so empregados de uma montadora. Os outros 8 mil no tm relao direta com ela. Mas, mesmo no interior de uma fbrica de montagem os contratos de trabalho se tornam cada vez mais diferenciados. Alguns trabalhadores so temporrios, outros tm um emprego de carter permanente. Alguns so chefes de equipe, outros so simples membros.E todos estado divididos em times, a unidade que deve, ela prpria, funcionar como uma pequena empresa. No interior desse time, de novo h diviso, pois os trabalhadores no querem ser acusados de responsveis pela m performance do grupo. Da que todo mundo fiscaliza todo mundo. P. 8-9o Brasil vive essa situao. AS montadoras implantadas introduzem os novo mtodos inspirados no toyotismo. O pas tornou-se, inclusive, objeto de novos experimentos. A Volkswagen inaugurou, na fbrica de caminhes e nibus de Resende, um modelo de produo em que at a montagem realizada por terceiros. Assim, dos cerca de 2 mil operrios do local, somente 300 esto sob as ordens da montadora. E a Ford pretende proceder do mesmo modo na nova fbrica da Bahia.Esses fenmenos, que hoje caracterizam a indstria automobilstica, especialmente no Brasil, no dizem respeito somente aos operrios desse setor. Eles mostram, tambm as tendncias gerais do capitalismo em seu conjunto.Em primeiro lugar, ressaltam que o capitalismo se nutre fundamentalmente da explorao dos trabalhadores. Quanto mais a crise se agrava, mais os empresrios tentam recuperar, s custas dos trabalhadores, os lucros que perdem com a queda das vendas. Quanto mais o capitalismo avana, mais os empresrios e seus servidores introduzem mtodos sofisticados para, ao mesmo tempo, aumentar a contribuio de cada trabalhador para a criao de riqueza, no sentido geral, e reduzir a capacidade de resistncia coletiva dos operrios. A passagem do fordismo ao toyotismo se insere nesse esforo patronal.p. 9

Captulo 1 concorrncia e estratgia de acumulao na indstria automobilstica.

Ao falar das mudanas de peso que antecedem o toyotismo afirma que o sistema de produo dominante na indstria automobilstica do incio dos anos 70 o fordismo. Mas j ento ele virou um smbolo da explorao capitalista: sem qualificao, o operrio da linha de produo aparece como uma mquina de dar lucro para a empresa, seus acionistas e diretores. Muitas lutas operrias pem em xeque este sistema na Frana, Itlia, Gr-Bretanha, Estados Unidos... Os patres se inquietam. Em Kallmar, na Sucia, a Volvo implanta uma fbrica onde a linha de produo foi toda substituda pelo trabalho em equipe. Surgem outras experincias mais limitadas. preciso sair da camisa-de-fora fordista, um sistema que j no produz todos os benefcios que os patres do automvel esperam. P. 17O fordismo (p.18)

No regime de trabalho que antecede o fordismo, eram os operrios extremamente especializados, grande mecnicos, que fabricavam artesanalmente os veculos quase de A a Z. No conjunto das operaes que um trabalhador efetuava, uma tomava um tempo enorme: procurar a pea certa para colocar no lugar certo, e modific-la, adapt-la ao seu uso no automvel. Como um carro tem dezenas de milhares de peas, pode-se compreender que a produo era lenta e, consequentemente, o veculo custava caro.

Ford muda isso tudo. Aplica os mtodos do taylorismo (ou organizao cientfica do trabalho) indstria automobilstica para atender a um potencial consumo de massas. P. 18

O fordismo se apia em cinco transformaes principais (p.18)1. Produo em massa. (p.18)

2. Parcelamento das tarefas, na mais pura tradio taylorista.(p19)

3. Utilizao da linha e montagem.

4. Padronizao de peas.

5. Automatizao da fbrica. (p19)

Resultado dessas inovaes: a antiga organizao da produo precisava de 12:30 horas para montar um veculo. Com o taylorismo, ou seja, apenas com o parcelamento das tarefas, a racionalizao das operaes sucessivas e a estandartizao dos componentes, o tempo cai para 5:50 horas. Em seguida, graas ao treinamento, para 2:38 horas. Em janeiro de 1914, Ford introduz as primeiras linhas automatizadas. O veculo produzido em 1:30 hora, ou seja, pouco mais de oito vezes mais rpido que no esquema artesanal usado pelos concorrentes.p. 19-20

Em 1921, pouco mais da metade dos automveis do mundo (53%) vem das fbricas Ford. O capital da empresa, que era de 2 milhes de dlares em 1907, passa a 250 milhes em 1919 graas aos lucros incessantes. P. 20

O toyotismo (p. 25)

a nova organizao do trabalho foi implantada progressivamente, nas duas dcadas de 1950 a 1970, na Toyota. Tem uma dupla origem, j citada: primeiramente, as empresas japonesas precisavam ser to competitivas quanto as americanas, e depressa, sob pena de desaparecerem. Em 1945, logo aps a derrota japonesa e no momento da ocupao aliada, o presidente da Toyota, Kiichiro Toyoda, declara que vital alcanar os norte-americanos em trs anos, sem o que ser o fim da indstria automobilstica japonesa.A segunda origem a necessidade de aplicar o fordismo no Japo, mas conforme as condies prprias do arquiplago. (...)

Taiichi Ohno, que foi por muito tempo vice-presidente da Toyota e considerado o pai do toyotismo, acrescenta: Creio que foi essa a origem da idia do tempo justo (just-in-time). P. 25

Em que consistem os novos mtodos de produo? Pode-se resumi-los em seis pontos (p.26):

1. Produo puxada pela demanda e o crescimento, pelo fluxo.

2. Combate ao desperdcio (just in time)3. Flexibilizao da produo

as operaes essenciais do operrio passam a ser, por um lado, deixar as mquinas funcionarem e, por outro, preparar os elementos necessrios a esse funcionamento de maneira a reduzir ao mximo o tempo de no-produo. Assim, rompe-se a relao um homem/uma mquina. Na Toyota, desde 1955 um trabalhador opera em mdia cinco mquinas. Enquanto quatro delas funcionam automaticamente, ele carrega, descarrega, prepara a quinta.(...) Isso tem duas conseqncias: o trabalho no mais individualizado e racionalizado conforme o taylorismo; um trabalho de operrios frente a um sistema automatiazado; em segundo lugar, o trabalhador deve tornar-se polivalente para operar vrias mquinas diferentes em seu trabalho cotidiano, mas tambm para poder ajudar o colega quando preciso.p. 27

4. Kanban. uma espcie de placa que indica muitas coisas, porm a mais importante a pea ou elemento ao qual est ligada. Assim, quando a equipe precisa de um painel para o carro que est montando, pega um painel na reserva. Nesse momento, retira o kanbanda pea empregada. Este volta ao departamento que fabrica painis. Essa unidade sabe ento que precisa reconstituir o estoque esgotado. Portanto, o kanban serve antes de mais nada como senha de comando. Mas na organizao flexvel de produo, puxada pela demanda, um mtodo rpido, fcil e essencial.p. 275. Produzir muitos modelos, mas cada um em sries reduzidas.isso quer dizer que uma mesma linha de montagem deve produzir veculos diferentes. Cada vez que h um novo modelo, preciso mudar as mquinas, adapt-las. P. 27-28

6. Desenvolvimento de relaes de subcontratao com os fornecedores de autopeas, em lugar do aprofundamento de relaes verticais.

Muito j se falou da importncia do conjunto da linha de produo na indstria automobilstica. Se os fabricantes japoneses so mais competitivos, devem s-lo em toda a linha. Em vez de aprofundar a integrao vertical, como as empresas norte-americanas, eles desenvolvem relaes de subcontratao com os fornecedores de autopeas. Os fabricantes de autopeas so empresas parte, embora as montadoras as mantenham sob controle por meio de participaes de capital , ajuda em investimentos e a incorporaes dos subcontratados titulares de cada empresa automobilstica. A Toyota impe aos fornecedores seu sitema de produo : mxima flexibilidade, obrigao de instalar-se em um raio de 20 km de suas fbricas, para reduzir o transporte, em prego do kanban dentro da fbrica de autopeas e entre esta e a Toyota. Aproveitando as condies mais penosas de trabalho nas subcontratadas (os custos salariais so geralmente 30 a 50% inferiores), a montadora fixa as condies de preo, prazo e qualidade dessas empresas , de modo a produzir veculos a baixo custo, just-in-time e de qualidade impecvel. um aspecto fundamental da vantagem dos fabricantes japoneses na concorrncia.p. 28Se fosse para resumir o sistema toyotista em uma frase, diramos que um sistema de organizao da produo baseado em uma resposta imediata s variaes da demanda e que exige, portanto, uma organizao flexvel do trabalho (inclusive dos trabalhadores) e integrada.p.30

p. 30 toyotismo e os cinco zeros.

A flexibilidade dos trabalhadores (p. 29)

O novo sistema de produo exige ainda mais do trabalho operrio que o fordismo. Isso vale para a subcontratao, mas tambm para as fbricas da montadora.

1. A intensificao do trabalho atinge o auge. A mo-de-obra empregada ainda mais intensamente que antes. Um exemplo a mudana da relao um homem/ uma mquina para relao de uma equipe/ um sistema (onde cada homem opera em mdia cinco mquinas). No toyotismo, o princpio fundamental do taylorismo, ou seja, a luta patronal contra o cio operrio, atinge um patamar superior.

Porm h mais: o gerenciamento by stress (por presso). Em toda a cadeia de produo h sinais luminosos com trs luzes: verde, tudo em ordem; laranja, h super-aquecimento, a cadeia avana em em velocidade excessiva; vermelha, h um problema, preciso parar a produo e resolver a dificuldade. Algum poderia acreditar que o objetivo acender em todos os setores um verde tranqilizador. Nada disso! Se a luz est verde sinal de que existem problemas latentes, que no aparecem. preciso ento acelerar o fluxo. P. 29

2. A flexibilidade da produo exige flexibilidade do trabalho e dos trabalhadores. Concretamente, a Toyota comea por um nmero mnimo de operrios que montam os carros em condies pessimistas de venda. Se o mercado melhora e permite aumentar a produo, h duas possibilidades: ou os operrios so obrigados a fazer horas extras ou a empresa contrata assalariados temporrios. Caso a alta continue, o fabricante pode admitir mo-de-obra suplementar. Mas a poltica bsica usar o mnimo de operrios e o mximo de horas extras. Um operrio da Toyota fica na fbrica 2.300 horas por ano, em mdia, ou seja, sem levar em contra as licenas, uma mdia de 44 horas por semana. Em comparao, o trabalhador de uma montadora na Blgica (Ford-Genk, General-Motors-Anvers, Volkswagen-Forest, Renault- Vilvorde e Volvo-Gand) permanece entre 1.550 e 1.650 horas/ ano.p. 30

3. Alm disso, para trabalhar em equipe o operrio tem que ser polivalente. Em outras palavras, entrar na grande famlia Toyota exige mais aptides que o fordismo. Mas os salrios no so corrigidos altura do aumento da qualificao. P. 30

Mais produtivos (p.32)

Os resultados falam por si. Evidentemente a melhor prova do xito japons a conquista de fatias do mercado. Entretanto, apesar da dificuldade de fazerem-se comparaes, possvel encontrar indicadores ainda mais precisos. O Massachsetts Institute of Technology (MIT) calculou o nmero de horas/ homem necessrias em 1987 para fabricar um veculo. Embora a amostragem seja relativamente reduzida, a superioridade japonesa indiscutvel: 19 horas no Japo, 26,5 em mdia nos Estados Unidos, 22,6 nas melhores fbricas europias e 35,9 quase o dobro na mdia da Europa.p. 32O desempenho japons liga-se antes de mais nada s mudanas ocorridas desde 1970. Se os construtores japoneses ganham parcelas de mercado, principalmente porque seu sistema produtivo responde melhor s transformaes que ele sofre. P. 32

tal como no caso da Ford no incio do sculo, no a tecnologia que explica a superioridade japonesa. Pelo contrrio, a Toyota faz questo de usar mquians simples, confiveis que no entram em pane de um (sic.) hora para outras. No tem nenhum empenho em transformar suas fbricas em oficinas do futuro, inteiramente robotizadas. P. 33

O toyotismo uma resposta crise do fordismo nos anos 70. Em lugar do trabalho desqualificado, o operrio levado polivalncia. Em vez da linha individualizada, ele integra uma equipe. No lugar da produo em massa, para desconhecidos, trabalho um elemento para satisfazer a equipe que vem depois da sua na cadeia. Em suma, o toyotismo elimina, aparentemente, o trabalho repetitivo, ultra-simplificado, desmotivante, embrutecedor. Afinal chegou a hora do enriquecimento profissional, do cliente satisfeito, do controle de qualidade. P. 33p.35 cita o projeto Saturn da GM como um caso de adaptao da empresa americana lgica do fordismo.

p. 41 defende a validade e aplicabilidade de conceitos de Marx para a anlise e compreenso das relaes de produo contempornea.

p. 44 defende a tese de Marx da queda da taxa de lucro.

Observaes finais (p.51)

Como disse na introduo, o que acontece no setor automobilstico concerne a todos. Tem o valor de exemplo, de ilustrao, do que nos espera, dos processos que opem as empresas umas s outras, de disputa fundamentais para o futuro de nossas sociedades. [p. 51]1. A aplicao dos novos mtodos de produo penetra em outros setores. A comear pela indstria eletrnica, cujo esquema de produo o mais parecido com a produo automobilstica. Mas igualmente em outros ramos: a siderurgia, a produo de mquinas, a indstria manufatureira em geral. AS questes aqui colocadas tm todas as chances de se repetir.p. 51-52Pensar pelo avesso o capitalismo: a viso reformista de Benjamin Coriat e Alain Lipietz sobre o toyotismo.