Gestão Escolar e Formação Continuada de Professores Final 2015 Completo

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Gestão escolar e Formação continuada

de ProFessores

O PrOgrama NaciONal EscOla dE gEstOrEs Na UNivErsidadE FEdEral dE OUrO PrEtO

editar2014

orGanizadores:Breynner r. oliveira

adriana m. tonini

Copyright by Breynner R. Oliveira & Adriana M. Tonini2014

Capa May Picture - Paul Klee

Revisão Raquel Gaudart

Projeto gráfico André Luiz Gama

Editoração e impressão Editar Editora Associada (32) 3213-2529 / 3241-2670 Juiz de Fora/MG

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Gestão Escolar e Formação Continuada de Professores – Breynner R. Oliveira & Adriana M. Tonini – Editar, Juiz de Fora – 2014

232 p.

ISBN 978-85-7851-073-2___________________________________________________________

Todos os direitos reservados

SumárioApresentação ..................................................................................................5Breynner Ricardo de Oliveira e Adriana Maria Tonini

A formação continuada de professores da educação básica e o Programa Nacional Escola de Gestores: o Curso de Especialização em Gestão Escolar na Universidade Federal de Ouro Preto .................... 9Breynner Ricardo de Oliveira, Adriana Maria Tonini e Lídia Gonçalves Martins

A gestão da equipe e das ações implementadas no Programa Escola deGestores da UFOP: os desafios da supervisão pedagógica ....................27Lídia Gonçalves Martins e Magna Campos

A vivência do Projeto de Intervenção nos polos presenciais do Programa Escola de Gestores da UFOP: a experiência em Guaxupé, Ipatinga e Ubá ...........................................................................53Arlana Campos, Débora Prado, Márcia Freitas e Shirley Cristine Ricoy Soares

Planejamento: trabalho pedagógico e currículo em EaD ......................77Maria Aparecida da Silva

Análise do perfil e dos critérios de seleção das escolas públicas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar da Universidade Federal de Ouro Preto ........................................................99Érica Castilho Rodrigues, Breynner Ricardo de Oliveira e Daniel Abud Seabra Matos

O silêncio da escola e a escola do silêncio: resistências e aberturas para a escola democrática .........................................................................125Marisa Bueno de Freitas e Diana de Cássia Silva

O caminho da democratização escolar: entre a premência doinstitucional e a informalidade do social ...............................................153Wagner Diniz Morais e Edilene Eras

Dois anos de PPP: o que construímos? ..................................................185Kele Frossard e Carmen Dias da Cunha

Gestão de políticas públicas na educação básica e os planos de educação: uma questão de planejamento de ações integradas .......207Aparecida Dias de Oliveira Torres e Valéria Duarte Malta

Sobre os autores .........................................................................................227

ApresentaçãoEste livro é fruto da experiência de implementação do Programa

Nacional Escola de Gestores (PNEG) na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), através do Centro de Educação Aberta e a Distância (CEAD). Organizado pelos professores Breynner R. Oliveira e Adriana M. Tonini, a publicação reúne as contribuições dos diversos profissionais que fizeram parte da primeira turma do curso de especialização em Gestão Escolar, entre 2012 e 2014.

Participaram do livro os coordenadores do curso, professores de sala ambiente, professores pesquisadores vinculados a outros departamentos da Universidade e a outras instituições, supervisores, professores de turma (tutores) e cursistas em parceria com seus professores orientadores. Os textos foram organizados buscando-se discutir as políticas de formação continuada, sua execução e percepção pelos atores envolvidos e os resultados obtidos, de modo a articular as reflexões teóricas às vivências práticas, tanto na realização do Programa, quanto nas intervenções realizadas pelos professores-gestores-cursistas em suas escolas.

No primeiro capítulo, intitulado “A formação continuada de professores da educação básica e o Programa Nacional Escola de Gestores (PNEG): O Curso de Especialização em Gestão Escolar na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP)”, Breynner R. Oliveira e Adriana M. Tonini apresentam o curso de Gestão Escolar, que integra o Programa Nacional Escola de Gestores no contexto das políticas nacionais de formação continuada de gestores escolares, visando à ampliação de suas capacidades de análise e resolução de problemas. Partindo de uma reflexão sobre a ampliação do papel da escola, num processo de implementação de políticas públicas que a “atravessam” e as transformam em “arenas políticas”, os autores prosseguem na descrição da proposta pedagógica do curso e na percepção vivenciada nesse projeto.

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No segundo capítulo, “Planejamento: trabalho pedagógico e currículo em EaD”, Maria Aparecida da Silva discute a importância da gestão escolar democrática para a elaboração do planejamento, do projeto político pedagógico e do currículo em EaD. Compreendendo o ato de planejar como um ato político, a autora vê na gestão compartilhada e planejada uma estratégia para evitar a fragmentação das funções da escola e um instrumento para a tomada de decisões capazes de mudar a realidade existente.

O terceiro capítulo, “A gestão da equipe e das ações implementadas na Escola de Gestores da UFOP: os desafios da supervisão pedagógica” é escrito por Lídia Gonçalves Martins e Magna Campos. Ao mesmo tempo em que descrevem os desafios da gestão de uma equipe multidisciplinar, as autoras empreendem um esforço por reconfigurar e ressignificar um saber/fazer que, em princípio, está constituído sob o paradigma da educação presencial. No contexto da difusão das tecnologias de informação e comunicação, o ambiente virtual de aprendizagem surge como o lócus privilegiado para a gestão pedagógica de um curso a distância, em ações que visam promover a mediação entre os diversos agentes envolvidos no processo de ensino e aprendizagem.

O quarto capítulo retrata “A Vivência do Projeto de Intervenção nos Polos presenciais do Programa Escola de Gestores da UFOP: a experiência em Guaxupé, Ipatinga e Ubá”. Arlana Campos, Débora Prado, Márcia Freitas e Shirley Cristine Ricoy analisam os projetos de intervenção desenvolvidos pelos cursistas de três polos/turmas. Elaborados e implementados pelos cursistas tendo como referência a sala ambiente “Projeto Vivencial”, os projetos de intervenção guardam estreita vinculação com o PPP de suas escolas, assumido como mecanismo fundamental para a realização da gestão democrática. Entre os principais temas abordados nos projetos, destacaram-se a elaboração e/ou reelaboração do PPP, a criação e fortalecimento do Conselho Escolar e a integração entre família e comunidade escolar.

No capítulo cinco, “Análise do perfil e dos critérios de seleção das escolas públicas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar da Universidade Federal de Ouro Preto”, Érica Castilho, Breynner R. Oliveira e Daniel Abud analisam os critérios de elegibilidade e focalização do Programa Nacional Escola de

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Gestores na Universidade. Os autores identificam o perfil e os critérios de seleção das escolas públicas participantes do curso e argumentam que, dadas as limitações do Ideb, outros indicadores educacionais como NSE, Infraestrutura e Complexidade são capazes de revelar dados mais contextualizados sobre as escolas e sobre as condições de oferta do ensino, e que tal conjugação apresenta-se como critério mais seguro para definir a seleção das escolas públicas e atingir, assim, o público-alvo desejado.

Os capítulos seis, sete e oito foram selecionados a partir da indicação dos professores orientadores dos trabalhos de conclusão do curso, dentre aqueles que se destacaram ao abordar temáticas relevantes para a gestão escolar. Marisa Bueno de Freitas e Diana de Cássia Silva discutem o fortalecimento dos mecanismos de participação na escola. Kele Frossard e Carmen Dias da Cunha analisam a reelaboração do Projeto Político Pedagógico (PPP) e investigam as motivações da não efetivação dos princípios que embasam tal documento. Wagner Diniz Morais e Edilene Eras recuperam a trajetória de democratização de uma unidade escolar de um município do interior do estado de Minas Gerais, em busca dos lugares dos quais partem as demandas por democratização da escola.

No que se refere à formação continuada de professores, a experiência adquirida com esse projeto através da Educação a Distância desfaz alguns mitos sobre essa modalidade, evidenciando que é possível implementar um projeto qualitativa e pedagogicamente comprometido com a transformação dos espaços escolares. Através dos espaços virtuais de interação, dos encontros de formação e dos projetos de intervenção executados, modificações incrementais na dinâmica das escolas foram potencializadas, dando materialidade e concretude aos desafios que o cyber espaço nos impõe.

Em um contexto marcado pela expansão e diversificação das políticas públicas de formação de professores da educação básica implementadas pelo poder público nas três esferas da federação e pela ampliação do debate sobre a importância da avaliação de políticas como um dos elos da operacionalização dessas ações, espera-se que esse livro contribua para qualificar o debate acerca das questões que permeiam o campo da educação e da gestão escolar, áreas que, naturalmente, dialogam com outros saberes e referências teóricas diversas.

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Finalmente, é importante destacar o inestimável trabalho realizado pelas equipes de supervisão, coordenação e secretaria deste projeto; pelos professores e assistentes de turma e pelos coordenadores de polo em que o curso foi ofertado. Agradecemos imensamente o apoio do Centro de Educação Aberta e a Distância da Universidade Federal de Ouro Preto para que todas as ações propostas fossem levadas a cabo, além da equipe do Programa na Secretaria de Educação Básica/Ministério da Educação, órgão responsável pelo seu financiamento.

Ouro Preto, outubro de 2014.Breynner R. Oliveira

Adriana M. Tonini

A formação continuada de professores da educação básica e o Programa Nacional Escola de Gestores: o Curso de Especialização em Gestão Escolar na Universidade Federal de Ouro Preto

Breynner Ricardo de OliveiraAdriana Maria Tonini

Lídia Gonçalves Martins

IntroduçãoA educação a distância (EaD) tem sido uma estratégia

largamente utilizada pelo Ministério da Educação brasileiro a fim de viabilizar a formação continuada de professores da educação básica em todo o país, sobretudo quando se leva em consideração as dimensões do país, a quantidade de pessoas a serem formadas (especialmente fora dos grandes centros urbanos e das regiões mais desenvolvidas do país), a infraestrutura física disponível e o número de educadores com capacidade para operacionalizar esse processo. Tais projetos contam com soluções criativas e materiais didáticos (impressos ou eletrônicos) de alta qualidade, viabilizados pela estreita cooperação entre instituições de ensino, governos estaduais e municipais, e que expressam o esforço de governos e da sociedade em garantir o direito da população brasileira à educação escolar com qualidade social.

Nesse contexto, o governo federal, através da SEB (Secretaria de Educação Básica), tem investido, nos últimos anos, consideráveis recursos voltados para a formação dos professores da educação básica através da EaD. Ao investir nessa modalidade de ensino, potencializa-se a utilização de novas tecnologias de interação e comunicação (TIC’s), além de permitir que novas redes de trocas e disseminação de saberes sejam construídas.

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Dentre as diversas políticas nacionais de formação continuada de professores, tem-se no âmbito do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública (PNEG), o curso de Especialização em Gestão Escolar, que integra o Plano de Desenvolvimento da Educação, sob a responsabilidade da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). É um curso de pós-graduação lato sensu voltado para a formação continuada e pós-graduada de dirigentes da educação básica, sobretudo gestores das escolas públicas, a realizar-se por meio da educação a distância.

A partir da experiência dos professores do Centro de Educação Aberta e à Distância – CEAD, convite foi realizado pela Coordenação Nacional do Programa Escola de Gestores para que essa equipe assumisse a oferta desse programa na Universidade. Tratativas foram realizadas entre o Ministério da Educação, a Reitoria da Universidade e a equipe de professores no CEAD no sentido de oficializar a adesão dessa Instituição, tendo o mesmo ocorrido em setembro de 2011. A UFOP integra, então, um grupo de Universidades Públicas que estão encarregadas de ofertar vagas para atender a demanda levantada pelo MEC, através de adesão realizada pelos municípios.

O curso é financiado com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, incluindo bolsa de Pesquisadores para os Coordenadores e professores do curso, bolsas para Tutores Presenciais e a Distância, material didático, material de consumo e outros insumos, conforme plano de trabalho aprovado pela SEB.

No que diz respeito à gestão da escola pública, mudanças importantes ocorreram no campo educacional nas últimas décadas, sobretudo em relação aos marcos legais, à sistemática de financiamento, ao processo de gestão dos sistemas de ensino e à ampliação do acesso à escola (PINTO, 2007). O direito à educação escolar se constitui como dimensão fundante da cidadania, estando reconhecido em diversos documentos de caráter nacional e internacional (CURY, 2007).

Nessa direção, pode-se afirmar que embora o direito à educação esteja assegurado em âmbito internacional e nacional, em nosso País ainda não se alcançou o patamar desejado para a educação básica, sobretudo no que se refere ao acesso e à qualidade, considerando

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os diferentes indicadores oriundos, dentre outros, de pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística/IBGE e pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira/INEP/MEC (BRASIL, 2009).

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e os demais indicadores educacionais evidenciam que a melhoria da qualidade da educação depende, de maneira integrada, tanto de fatores internos quanto de fatores externos que impactam do processo ensino-aprendizagem. Portanto, faz-se necessário a implementação e articulação de um conjunto de políticas públicas sociais e educativas que viabilizem melhores condições sociais e culturais e de exercício pleno da cidadania, o que inclui o direito a uma educação de qualidade (BRASIL, 2009).

Esse Programa surgiu da necessidade de se construir um processo de formação de gestores escolares, que contemple a concepção do caráter público da educação e da busca de sua qualidade social, baseada nos princípios da gestão democrática, olhando a escola na perspectiva da inclusão social e da emancipação humana (BRASIL, 2009).

O Programa pretende contribuir com a formação efetiva de gestores educacionais da escola pública, de modo que disponham de elementos teórico-práticos que viabilizem uma educação escolar básica com qualidade social. Esse Programa é componente do compromisso Todos pela Educação que é um plano de metas que integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e diz respeito à mobilização em torno da melhoria da educação básica no Brasil, contribuindo para a melhoria do IDEB das escolas e dos sistemas de ensino (BRASIL, 2009).

Neste processo, vem se destacando a parceria com as universidades públicas federais, principalmente, pela compreensão e reconhecimento de que essas constituem-se lócus privilegiado de formação e produção de conhecimento, o que inclui a formação de gestores educacionais que venham a atuar na perspectiva da gestão democrática e da educação inclusiva (BRASIL, 2009).

A equipe de coordenação da UFOP alinhou o projeto pedagógico do curso com as diretrizes definidas pela Coordenação Nacional do Programa. Dessa forma, aquela equipe assumiu que as políticas voltadas para a articulação, desenvolvimento e

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fortalecimento dos sistemas de ensino e das escolas vêm sendo produzidas e implementadas com a participação de instituições tais como, a UNDIME (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), Secretarias Municipais de Educação, Secretaria estadual de Educação e Associação Mineira de Municípios.

Além disso, sustenta-se no princípio da descentralização e parceria na sua formulação e realização, considerando a realidade multifacetada que define a educação em nosso País. Ressalte-se, ainda, como um dos pilares dessas políticas, a afirmação do princípio da gratuidade do ensino, também no âmbito da formação continuada dos profissionais da educação (BRASIL, 2009).

O curso de especialização ora proposto, por meio da EaD, integrado a um conjunto de ações formativas presenciais, pretende democratizar ainda mais o acesso a novos espaços e ações formativas com vistas ao fortalecimento da escola pública como direito social básico, uma vez que essa modalidade de educação possibilita, dentre outras: maior flexibilidade na organização e desenvolvimento dos estudos; fortalecimento da autonomia intelectual no processo formativo; acesso às novas tecnologias da informação e comunicação; interiorização dos processos formativos garantindo o acesso daqueles que atuam em escolas distantes dos grandes centros urbanos; redução dos custos de formação a médio e longo prazo; criação de infraestrutura adequada nas universidades públicas e de formação de recursos humanos para atuarem com EaD e sua institucionalização no tocante à formação continuada (OLIVEIRA, 2012).

Desse modo, o curso apresenta como meta principal, formar, em nível de pós-graduação lato sensu, especialistas em Gestão Escolar para atuarem nas escolas públicas de Educação Básica do Estado de Minas Gerais, visando à ampliação de suas capacidades de análise e resolução de problemas. E para alcançar as metas traçadas tem como metas específicas: (i) Incentivar os gestores a refletir sobre a gestão democrática e a desenvolver práticas colegiadas de gestão no ambiente escolar que favoreçam a formação cidadã do estudante; (ii) Propiciar aos gestores oportunidades de lidar com ferramentas tecnológicas que favorecem o trabalho coletivo e a transparência da gestão da escola; (iii) Propiciar oportunidades aos gestores para o exercício de práticas inovadoras nos processos

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de planejamento e avaliação da gestão escolar; (iv) Possibilitar aos gestores oportunidades para ampliação de capacidades para: analisar e resolver problemas à luz dos princípios que regem a gestão democrática, elaborar e desenvolver projetos e atividades na área de gestão com o suporte das novas tecnologias de informação e comunicação; (v) Desenvolver uma compreensão pedagógica de gestão democrática, situada nos contextos micro e macro da escola, superando as concepções fragmentadas do processo educacional e contemplando as dimensões da construção e formação como objeto do trabalho pedagógico; (vi) Estimular o desenvolvimento de práticas de gestão democrática e de organização do trabalho pedagógico que contribuam para uma aprendizagem efetiva dos alunos, de modo a incidir, progressivamente, na melhoria do desempenho escolar (OLIVEIRA, 2012).

Revisitando a escola: unidades de gestão e arenas políticas

A escola tem sido, ao longo das décadas, uma instância que desempenha uma multiplicidade de papéis que há muito extrapolam suas funções clássicas. Em outras palavras, a escola, do ponto de vista institucional, não é um espaço exclusivo para a aplicação de políticas curriculares, de formação de professores ou de melhoria da aprendizagem e/ou da qualidade do ensino. Pelo contrário, tem-se atribuído a essa instituição e a seus profissionais um conjunto de ações e rotinas vinculadas às políticas sociais que, de alguma forma, “atravessam” a escola e influenciam o cotidiano escolar.

No que se refere ao processo de implementação de políticas públicas que “atravessam a escola”, na perspectiva da burocracia governamental, os integrantes das instituições escolares emergem como atores estratégicos. Os profissionais da escola – diretores, equipe pedagógica, professores e equipe administrativa – são os agentes públicos que, em maior ou menor grau, traduzirão e implementarão as políticas públicas desenhadas no nível estratégico pelos diversos governos. É nesse espaço institucional que as escolas têm seu papel ampliado e revelado: mais do que espaços educacionais e educativos, são espaços políticos em que diversos aspectos da burocracia estatal são revelados.

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Assim como hospitais, postos de saúde, universidades, postos da previdência social, agências da receita federal, delegacias e repartições públicas de modo geral, a escola pública é um dos vários elos que integram a estrutura governamental e a burocracia estatal, materializando a Administração Pública. Porque integra a estrutura organizacional do Estado, dando visibilidade à sua ação no campo da educação, sua ação deixa de existir isoladamente. Por isso, a escola pública pode ser considerada um dos diversos bureaus que fazem parte da burocracia pública.

As contribuições de Lipsky (1980) e Downs (1966) confirmam essa tese do ponto de vista institucional, organizacional e político, na medida em que analisam o professor como um ator político, isto é, um representante de Estado – e, por que não, do governo – no processo de disponibilização de políticas públicas que elegeram – e ainda elegem – a escola como instância estratégica nesse fluxo.

Tardiff (2002), por outro lado, faz uma análise mais próxima à sociologia das profissões e à sociologia educacional, na medida em que busca traçar os diversos itinerários percorridos pelo indivíduo-professor com o objetivo de evidenciar que esse indivíduo é, na verdade, um sujeito forjado dialeticamente a partir da alquimia que ocorre quando múltiplas variáveis exógenas e endógenas são combinadas. Talvez esse processo explique a “liquidez” do indivíduo discutida por Bauman (2004), na medida em que a articulação entre essas duas dimensões permite conceber o professor como um ator líquido e fluido que “mistura” seus vários saberes, longe de estar restrito apenas ao campo da pedagogia.

A escola desempenha um papel institucional e, conseqüentemente, organizacional. Define regras do jogo ou as influencia, criando outras e/ou modificando as já definidas. Não é, portanto, uma instância comprometida apenas e tão somente com a dimensão curricular, pedagógica e socializadora. Em outras palavras, a escola ultrapassa essas funções. De acordo com Algebaile (2009), há uma série de atribuições conferidas a ela que marcam sua posição como materializadora da ação estatal através da burocracia governamental, sobretudo em relação às políticas sociais historicamente desenhadas para os mais pobres ou desfavorecidos.

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Campanhas de vacinação, consultórios odontológicos itinerantes, programas de combate a desnutrição, ações de promoção da cidadania, educação para o trânsito, campanhas de conscientização sobre os riscos do uso de drogas, programas de combate a pobreza e de promoção da segurança pública, para citar alguns dentre os vários exemplos possíveis, elegeram a escola ao longo das décadas como uma das esferas responsáveis pela mediação entre o estado e a sociedade. Ao analisar o processo de construção da identidade civilizatória no Brasil, Carvalho (1999) sugere que esses ideais civilizatórios, de certa forma, elegeram a escola como uma das principais estruturas burocráticas no aparato estatal para viabilizar esses projetos. Ao reforçar a tese apresentada por Carvalho a partir de uma análise histórica sobre as políticas educacionais no Brasil desde o final do século XIX, Algebaile (2009) constata que o processo de formação do Brasil ao longo do século XX também depositou na escola suas responsabilidades. A preocupação com a formação para o trabalho e, mais recentemente, a crença no papel redentor da escola no equacionamento do binômio crescimento econômico X eliminação da pobreza impuseram a seus integrantes enormes pressões.

É nesse sentido que a escola emerge como instituição permeada por questões organizacionais “informais” ou ocultas, muitas delas desvinculadas do núcleo pedagógico propriamente dito. Em outras palavras, a escola pública é, também, um dos vários elos da ação estatal, estando sujeita aos diferentes objetivos estratégicos de distintos governos. Nessa perspectiva, a escola integra a estrutura burocrática do estado, o que faz com que, em maior ou menor grau, sujeite-se às diretrizes definidas por esses governos. Esse aspecto revela uma questão interessante: como caracterizar a instituição escola se, dadas suas conhecidas especificidades, não há uma, mas várias instituições escolares? Apesar de exercerem a mesma função social, são inúmeras as instituições públicas escolares que traduzem essa função social com intensidades e conotações as mais diversas.

Esta é a contribuição principal de Stephen Ball, em The Micro Politics of School (1987). Amparado por um vasto elenco de casos e relatos a partir de observações realizadas em escolas

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públicas inglesas em virtude das reformas liberais implantadas pelo governo de Margaret Thatcher no início dos anos 1980, que promoveram modificações na gestão das escolas, na definição dos currículos, nas políticas de avaliação e de financiamento, Ball sustenta a tese de que há, de fato, um componente político que é muitas vezes ignorado pelos formuladores de políticas públicas em educação.

Outro aspecto que tem recebido atenção dos pesquisadores ligados à sociologia das organizações escolares concentra-se na distribuição de poder e no exercício da liderança em instituições educacionais nos Estados Unidos e na Europa (BALL, 1987; LIPSKY, 1980). Esses autores afirmam que as reformas educativas têm contribuído para a coletivização do trabalho na escola, fazendo com que os diversos profissionais participem de várias esferas decisórias, que vão desde a formulação do projeto pedagógico até o planejamento transversal dos currículos, passando pelos órgãos de representação colegiada que agregam as diversas partes interessadas, os stakeholders.

Ball (1987), por exemplo, analisa a reforma educacional na Inglaterra pós 1980, sob a influência do governo Tatcher e da chamada “nova gestão pública”. Nesse artigo, o autor avalia o impacto das reformas curriculares e do redesenho organizacional das escolas sob o ponto de vista da liderança e do poder discricionário dos professores. A conclusão do autor é que a descentralização administrativa, dentro desse contexto de reforma, impõe às escolas um leque de modificações de ordem administrativa e pedagógica, ampliando seu poder de decisão sobre um conjunto de ações, tanto na esfera pedagógica quanto administrativa. Essa autonomia das escolas combina elementos de ordem profissional, mas sobretudo institucional na medida em que a escola é “promovida” a organização detentora de poderes e capacidades para definir as regras do jogo com seus diversos stakeholders, os distintos segmentos que participam e constituem a chamada comunidade escolar.

Dessa forma, institucionaliza-se não apenas a autonomia dos profissionais da educação, mas também a dos alunos e de suas famílias, além da comunidade que está distribuída ao seu redor. Assim, a escola, do ponto de vista organizacional,

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abandona estruturas verticais e rígidas e passa a operar a partir de processos flexíveis, horizontais e dinâmicos. Em outras palavras, as escolas deixam de ser burocracias hierarquizadas, autoritárias e rígidas e passam a ser burocracias coletivizadas e mais participativas.

A partir da análise de como diversas políticas e programas educacionais são traduzidos, percebidos e implementados pelos diversos profissionais da escola naquele contexto de reformas profundas, Ball deixa claro que muitas (senão todas) das decisões tomadas no interior da escola são políticas e que, por isso mesmo, podem estar – ou não – alinhadas com os objetivos educacionais priorizados pelos governos. Além disso, tais decisões podem também revelar conflitos de interesses dentro dessas instituições, evidenciando os múltiplos grupos de pressão que se articulam e/ou se opõem nesses espaços.

Interessante notar que não necessariamente esses atores/grupos divergem ou articulam-se entre si tendo como objetivo a consecução de interesses pedagógicos e/ou educacionais. É exatamente essa micro-política que Ball nos revela em seu livro, fundamental para que melhor se compreenda como e porque as políticas públicas são realmente implementadas.

Há outra abordagem que trata dessas questões em uma perspectiva ampliada e bem mais porosa, retratando as escolas como sistemas políticos, apesar de burocráticos (DOWNS, 1966; CROZIER, 1981; SELZNICK, 1966; TULLOCK, 1967). A partir das contribuições desses autores, pode-se afirmar que as unidades escolares são também compostas por uma dimensão política e sistêmica que as afastam da neutralidade ou da imparcialidade postuladas pelo pensamento weberiano. Ao analisar as organizações escolares como sistemas abertos, que estabelecem relações fluidas com o ambiente, a sociologia das organizações alarga os olhares sobre o objeto, inserindo-a em outra perspectiva, mais conectada à realidade observável. Nesse sentido, as escolas podem ser consideradas, ampliando a formulação de Ballion, cidades políticas. Por extensão, os territórios em que estão inseridas também podem ser assim considerados, reforçando a ideia de que operam como arenas políticas (GOMES, 1995, p. 99).

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Curso de Especialização em Gestão Escolar na modalidade a distância: a experiência da Universidade Federal de Ouro Preto

O objetivo do curso é certificar em nível de especialização 400 (quatrocentos) diretores e vice-diretores dos municípios mineiros onde o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) esteja entre os mais baixos.

O curso é desenvolvido na modalidade à distância, usando a Internet como meio de comunicação e integração entre os participantes, os professores e para acesso ao material de apoio ao curso especialmente desenvolvido por uma equipe de especialistas. Tendo os Gestores das Escolas Públicas de Educação Básica dos municípios mineiros como público alvo, sua proposta pedagógica está assentada na relação teoria-prática, que expressa uma concepção de formação humana e de gestão educacional dentro dos marcos da democracia e da cidadania. Busca favorecer melhorias e incentivar inovações na prática cotidiana da gestão escolar que concorram para a elevação qualitativa do padrão de escolaridade da educação básica.

Esse processo de formação implica apropriação de meios, mecanismos e instrumentos que permitam intervenções mais satisfatórias, do ponto de vista pedagógico, no dia-a-dia escolar, a partir da compreensão dos condicionantes sociopolíticos e econômicos que permeiam a escola. Com esse entendimento, o curso será estruturado em três eixos vinculados entre si:

1. O direito à educação e a função social da educação básica. 2. Políticas de educação e a gestão democrática da escola. 3. Projeto Político-Pedagógico e Práticas Democráticas na

Gestão Escolar.

Esses eixos estão consubstanciados em sete “Salas Ambientes”, além de um ambiente introdutório à Plataforma Moodle e ao curso de Especialização:

l Introdução ao Ambiente Moodle - 40h. l Fundamentos do Direito à Educação - 60h.

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l Políticas e Gestão na Educação - 60h. l Planejamento e Práticas da Gestão Escolar - 60h. l Conselhos Escolares - 30h.l Oficinas Tecnológicas - 30h. l Projeto Vivencial - 80h.l Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) - 40h.

A formação com qualidade dos professores-gestores escolares, em nível de pós-graduação lato-sensu, requer, interligadamente, aprofundamento teórico que permita a compreensão sobre o alcance, as possibilidades e os limites das práticas de gestão nas escolas públicas como instituições que compõem a prática social, aliado à possibilidade de oferecer oportunidades para a reflexão a respeito dos aspectos operacionais que lhes são próprios. Assim, pretende-se, também, que os processos formativos impliquem na apropriação de meios, mecanismos e instrumentos que permitam intervenções mais satisfatórias, do ponto de vista pedagógico, no dia-a-dia escolar, a partir da compreensão dos condicionantes sócio-políticos e econômicos que permeiam a organização escolar.

O eixo o direito à educação e a função social da escola básica remete aos fundamentos filosóficos, políticos, sociais, culturais e epistemológicos que permitem a apreensão da gestão escolar como expressão da prática social, bem como à tematização da democracia como valor universal na construção histórica da sociedade.

Nessa direção, na Sala Ambiente Fundamentos do Direito à Educação, são disponibilizadas atividades de caráter teórico-prático, para proporcionar as condições indispensáveis à reflexão crítica da prática da gestão no cotidiano escolar, estabelecendo os nexos com a dimensão macro-estrutural das políticas educacionais em todos os níveis. Duas são as temáticas: (i) Direito à Educação: fundamentos históricos e filosóficos e (ii) Conhecimento, currículo e cultura escolar.

O eixo políticas e gestão na educação possibilita a reflexão teórico-prática, norteada por valores democráticos, sobre as políticas de educação e organização dos sistemas de ensino no Brasil permitindo se conhecer o ordenamento jurídico-político no qual se assentam a educação e a escola, bem como os planos, programas, projetos que a elas se vinculam, a partir de uma perspectiva de produção do conhecimento. Espera-se uma postura investigativa

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que conduza a uma compreensão mais abrangente dos princípios e mecanismos da gestão democrática que implicam ações e decisões participativas e colegiadas, tanto no âmbito das unidades escolares quanto na organização dos sistemas de ensino. Três são as temáticas nesse eixo: (i) Política educacional e gestão escolar; (ii) Financiamento da educação e a gestão escolar e (iii) Gestão democrática da educação escolar e sistemas de ensino.

As temáticas e atividades que integram o eixo Planejamento e Práticas na Gestão Escolar propiciam aos professores-gestores ampliar o conhecimento a respeito de práticas e procedimentos de gestão democrática e a se apropriarem de um instrumental que lhes permita planejar, monitorar e avaliar os processos de execução do Projeto Político-Pedagógico e das políticas educacionais no campo da gestão, de modo a impulsionar a melhoria do desempenho dos estudantes. Os cursistas são estimulados, ainda, a terem papel ativo no lidar com as tecnologias da informação e comunicação (TICs), de modo a ampliar suas capacidades no trato e na utilização das redes tecnológicas de aprendizagem, tendo em vista qualificar o currículo da escola. As temáticas/atividades que compõem esse bloco ajudam os cursistas na construção de um projeto de intervenção que favoreça a melhoria da gestão democrática em sua realidade escolar e nos sistemas de ensino. As temáticas/atividades que compõem esse eixo são: (i) Avaliação Institucional e da Aprendizagem; (ii) Trabalho Pedagógico e Cotidiano Escolar e (iii) Telemática, Sistemas de Gestão e Ferramentas Tecnológicas.

Além das Salas Ambientes que integram os três eixos que compõem a estrutura básica do curso, há ainda três outras Salas Ambientes. São Elas: Tópicos Especiais; Oficinas Tecnológicas e Projeto Vivencial.

A Sala Ambiente Tópicos Especiais inclui apresentações de palestras e/ou minicursos por especialistas, internos ou externos ao corpo docente do curso, de diversas áreas relacionadas ao tema do curso, aprofunda o seu caráter transdisciplinar e favorece a reflexão sobre a construção de uma proposta/projeto de intervenção que será objeto do Trabalho de Conclusão do Curso. No projeto Nacional três são as temáticas sugeridas: (i) Conselhos Escolares; (ii) Qualidade da Educação Básica e (iii) Saúde na Escola. No caso da UFOP optou-se por escolher a temática “Conselhos Escolares”

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uma vez que se tem como princípio que as escolas são instância de participação e mobilização política.

A Sala Ambiente Oficinas Tecnológicas consiste no suporte tecnológico e no desenvolvimento de aprendizagens relativas à utilização dos diversos recursos das Tecnologias da Informação e Comunicação no campo da gestão da educação.

A Sala Ambiente Projeto Vivencial constitui-se em componente curricular articulador do curso. Nesta Sala a atividade central consiste na formulação e desenvolvimento de um projeto de intervenção na escola com estreita vinculação com o Projeto Político-Pedagógico, assumido como mecanismo fundamental para a realização da gestão democrática na educação e na escola. O trabalho do cursista nessa Sala Ambiente se desenvolver desde o início do curso, articulando-se com as demais Salas Ambientes e culmina no Trabalho de Conclusão do Curso (TCC).

Considerando as especificidades de cada sistema de ensino e de cada escola, a construção e/ou avaliação do Projeto Político-Pedagógico (PPP) envolverá etapas como: fundamentação teórica, sensibilização e mobilização da comunidade, diagnóstico da escola, planejamento, implementação e avaliação do projeto. As situações pedagógicas para (re)elaboração do PPP poderão ser as seguintes:

l Na ausência de PPP na escola, desenvolver trabalho para sua elaboração e implementação.l Na existência de PPP na escola, se for o caso, promover sua reelaboração ou desenvolver trabalho de pesquisa e de avaliação crítica sobre o impacto do PPP na realização da gestão democrática na escola e no desempenho escolar.

Além dessas Salas Ambientes haverá, ainda, uma introdução ao Ambiente Virtual (Plataforma Moodle) e ao curso, que consiste em um espaço onde serão desenvolvidas atividades de ambientação dos professores-gestores em relação às ferramentas tecnológicas que serão disponibilizadas durante o processo formativo e forneça uma visão geral do curso.

O resultado dessa ampla vivência é a elaboração de um Trabalho Final de Conclusão do Curso, que tem como eixo central a reflexão sobre a (re)elaboração do Projeto Político-Pedagógico que cada cursista desenvolveu em sua escola.

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A carga horária total do curso é de 400 horas, exigidas para que o aluno faça juz ao título de especialista. Com a duração de 18 meses, o curso teve inicio em outubro de 2012, finalizando em abril de 2014 culminando com as defesas dos TCCs.

As 400 vagas disponibilizadas foram distribuídas em nove pólos de apoio presencial: Guaxupé, Governador Valadares, Ipatinga, Jaboticatubas, João Monlevade, Montes Claros/lagamar, Ouro Preto, Tiradentes e Ubá.

A estrutura acadêmica do curso foi composta por: dois coordenadores (doutores); nove professores de turma com titulação mínima de mestre (tutores a distância); dez assistentes de turma com titulação mínima de especialista (tutores presenciais); oito professores formadores e 48 orientadores de TCC pertencentes ao quadro da UFOP e de instituições de Ensino superior externas. O curso contou ainda com pessoal contratado via fundação de apoio para desempenharem as funções de gestão e supervisão pedagógica com vistas ao acompanhamento sistemático das ações propostas e da equipe de trabalho.

Durante o período do curso foram realizados três encontros presenciais, um no início, um no meio e outro no final do Curso, assim discriminados: primeiro encontro: introdução ao Curso – 20 horas; segundo encontro: formação e avaliação parcial das disciplinas do primeiro bloco – 20 horas e terceiro encontro: final do curso, contemplando a avaliação das disciplinas do segundo bloco do curso e a apresentação do Trabalho Final de Curso para a banca avaliadora composta por três docentes com titulação mínima de mestre.

A aferição da frequência no curso, exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, foi realizada via registro/avaliação da participação dos cursistas nas atividades interativas no ambiente virtual (fóruns, chats, etc.), além da efetiva participação nas sessões presenciais.

Considerações finaisSegundo Nóvoa (1991), a autonomia das escolas combina

elementos de ordem profissional e institucional na medida em que a escola é “promovida” a organização detentora de poderes e capacidades para definir as regras do jogo com suas diversas partes

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interessadas, os distintos segmentos que participam e constituem a chamada comunidade escolar. Pais, professores, alunos, profissionais da educação, vizinhos, bairro, servidores públicas da secretaria de educação e de outras secretarias, sindicatos e organizações sociais. Dessa forma, institucionaliza-se não apenas a autonomia dos profissionais da educação, mas também a dos alunos e de suas famílias, além da comunidade que está distribuída ao seu redor.

Ao mesmo tempo em que fazem parte da macro-estrutura do sistema educacional operam como arenas políticas em função da natureza de sua operação. Conforme exposto por Evangelista e Shiroma (2007), as reformas educativas têm contribuído para a coletivização do trabalho na escola, fazendo com que os diversos profissionais participem de várias esferas decisórias, que vão desde a formulação do projeto pedagógico até o planejamento transversal dos currículos, passando pelos órgãos internos e externos de representação colegiada que agregam as diversas partes interessadas.

Entretanto, percebe-se, que apesar do esforço em assegurar a democratização do processo decisório nas unidades escolares e toda infra-estrutura pedagógica e tecnológica disponibilizada para os diversos cursos de formação continuada financiados pelo MEC, a heterogeneidade das escolas, dos municípios, justificam os resultados abaixo do esperado pelos formuladores de política em nível federal e pelas equipes de coordenação local.

São estes alguns elementos que podem justificar esse descompasso: (1) precária formação dos professores da rede pública; (2) dificuldades econômicas, institucionais e geográficas que os docentes enfrentam para investir na sua formação continuada; (3) o desconhecimento das possibilidades da educação à distância como potencializadora do processo de capacitação e socialização do conhecimento; (4) a falta de intimidade com as mídias e novas tecnologias como recurso pedagógico no ambiente virtual; (5) resistência na utilização das mídias para o desenvolvimento de projetos e para a solução de problemas comuns dentro da escola e da comunidade; (6) apego às metodologias tradicionais de ensino, em sua grande maioria dependente do ensino presencial e (7) falta de planejamento, hábito, tempo e disciplina para dedicarem-se às exigências dos cursos.

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No que se refere ao desenho institucional, a desarticulação entre as diversas Instituições Federais de Ensino Superior e o Ministério da Educação é uma fragilidade importante. Ainda que se saiba que esses programas não podem ser conduzidos isolada ou desarticuladamente, essa parece ser infelizmente, a visão que predomina no Ministério da Educação e nas Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil e em Minas Gerais. Em outras palavras, não há nenhuma estratégia conjunta para a oferta de vagas, regionalização das ações e/ou integração dos esforços a fim de atender o maior número possível de municípios. As rodadas de reuniões de planejamento e avaliação em nível nacional sob a coordenação da equipe central na SEB com todas as Universidades parceiras também não aconteceram, evidenciando a fragmentação do processo.

Ainda nessa direção, o financiamento desses programas esbarra em uma questão delicada: as bolsas pagas aos formadores, tutores a distância e tutores presenciais são muito baixas, produzindo desincentivos que prejudicam a gestão local das ações. Há um grande esforço para formar equipes comprometidas com o acompanhamento qualitativo da rotina pedagógica mas, diante da baixa remuneração e da impossibilidade de que as bolsas sejam cumuláveis, torna-se difícil fazer com que os profissionais permaneçam e/ou que o trabalho desempenhado corresponda aos objetivos inicialmente definidos. O atraso no pagamento das bolsas também emerge como uma dificuldade real, especialmente quando se sabe que os profissionais da educação contam com esses valores para complementar sua renda, já defasada em função dos baixos salários.

Finalmente, a percepção vivenciada nesse curso reforça as experiências acumuladas à frente de outros projetos voltados para a formação continuada de professores na modalidade a distância: a importância das “dimensões ocultas” na formação a distância, que estão atrás da tela do computador mas que são constantemente percebidas pelos alunos durante sua formação; o papel central do tutor no processo de interação; a importância da gestão do trabalho pedagógico em equipe; a transversalidade/interdisciplinaridade do corpo docente e dos tutores, agregando múltiplos olhares ao curso e as potencialidades da interação virtual, especialmente quando ainda se considera a EaD uma formação de “segunda classe”; a relativização das distâncias, encurtadas e redimensionadas com

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a utilização das TIC’s; o papel do coordenador do pólo como um dos atores responsáveis pela articulação e mobilização da equipe e dos cursistas no nível local e a materialização de uma equipe de acompanhamento real, ainda que seu trabalho seja majoritariamente virtual.

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A gestão da equipe e das ações implementadas no Programa Escola de Gestores da UFOP: os desafios da supervisão pedagógica

Lídia Gonçalves MartinsMagna Campos

Introdução Escrever sobre os desafios de uma atividade qualquer ligada

à gestão de um curso na educação pública a distância é, ao mesmo tempo, uma descrição importante para orientar outros profissionais que se iniciam na área e uma análise crítica de um fazer/saber que está em constante movimento, haja vista que se apresenta como uma tentativa de reconfigurar e de ressignificar algo que, em princípio, está constituído sob o paradigma da educação presencial.

Não obstante, dadas as peculiaridades da educação a distância, é preciso, ainda que ensaisticamente, primar pela constituição de uma cultura da educação a distância que tenha identidade própria em relação à cultura da educação presencial.

Assim, ao refletir sobre a atividade de supervisão do curso de especialização em Gestão Escolar da Escola de Gestores, também se apresentam os conceitos norteadores das atividades exercidas na educação a distância, pois pensar tal modalidade é também pensar a educação na complexa sociedade na qual estamos inseridos atualmente.

A Equipe multidisciplinar do Programa Nacional Escola de Gestores na UFOP

Para viabilizar a operacionalização do curso de especialização em Gestão Escolar na Universidade Federal de Ouro Preto e tendo como referência as orientações do Programa Nacional Escola de

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Gestores/MEC (2009), foi constituída uma equipe multidisciplinar, cujos principais profissionais envolvidos são apresentados na figura a seguir:

Figura 1 – Equipe Escola de Gestores CEAD/UFOP.

Fonte: Projeto do curso de especialização em Gestão Escolar.

Além de definir a equipe de gestão do curso na Universidade, a Coordenação Geral é responsável pela coordenação do curso em suas dimensões administrativa, financeira, pedagógica e tecnológica. Atua ainda na articulação da relação da universidade com o Ministério da Educação (MEC) e com instituições parceiras, nas esferas estadual e municipal, e coordena os processos de avaliação do curso.

Os Coordenadores de Sala Ambiente são responsáveis pela coordenação geral das salas ambientes do curso1 e pela orientação a Professores de Turma e Assistentes de Turma para o desenvolvimento dos conteúdos de cada sala ambiente. Participam ainda dos encontros de formação e do processo de avaliação do curso.

Os Professores de Turma são responsáveis pela gestão acadêmica das turmas, por meio da mediação dos conteúdos das salas ambientes e da orientação dos trabalhos de conclusão de curso. Participam dos encontros de formação do curso, realizados na universidade e nos polos de apoio presencial.

1 As sete salas ambientes que compõem o currículo do curso são: Fundamentos do Direito a Educação (60h); Políticas e Gestão na Educação (60h); Planejamento e Práticas da Gestão Escolar (60h); Tópicos Especiais: Conselhos Escolares (30h); Oficinas Tecnológicas (30h), Projeto Vivencial (80h) e TCC (40h). Além dessas salas ambientes, há um ambiente introdutório à Plataforma Moodle e ao curso de Especialização (40h).

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Os Assistentes de Turma prestam orientação presencial e a distância aos cursistas, auxiliando coordenadores de sala ambiente e professores de turma na gestão acadêmica da turma. Também participam dos encontros de formação do curso, realizados na universidade e nos polos.

Enquanto o Professor Coordenador de Sala Ambiente assume a coordenação dos conteúdos de uma sala ambiente específica para todas as turmas/polo do curso, o Professor de turma e o Assistente de turma atuam na mediação pedagógica de uma única turma/polo, acompanhando-a em todas as Salas Ambientes ofertadas ao longo do curso.

O suporte tecnológico e administrativo responde pela secretaria acadêmica e administrativa do curso e pelo gerenciamento do ambiente virtual de aprendizagem (Plataforma Moodle) do curso, atendendo às demandas da coordenação, supervisão, equipe pedagógica e cursistas.

Além destes profissionais, a Escola de Gestores conta com a infraestrutura e suporte técnico do CEAD-UFOP, que é a unidade responsável pela gestão acadêmica e operacional do curso, para o desenvolvimento de suas atividades tecnológicas, administrativas e pedagógicas.

Neste arranjo institucional, em que se observa a constituição de uma equipe multidisciplinar, a supervisão assume papel relevante para a operacionalização do curso. Sua função de articulação junto à coordenação geral, equipe pedagógica e suporte técnico-administrativo mostra-se fundamental para a gestão do curso, em suas ações de planejamento, implementação e avaliação, conforme se procura evidenciar ao longo deste capítulo.

O cenário do conhecimento e da informaçãoUma das características mais marcantes da sociedade atual diz

respeito à difusão das tecnologias de informação e comunicação (TICs) e sua influência nas diversas esferas sociais, inclusive na educação.

Com o advento da globalização, novas relações econômicas, sociais, políticas e culturais se estabelecem e inauguram uma nova fase da modernidade, denominada por Zygmunt Bauman como “modernidade líquida” (2001). A metáfoda da liquidez é utilizada para caracterizar a sociedade atual, em contraposição à solidez que

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caracterizou a sociedade na fase anterior da modernidade, chamada pelo autor de modernidade sólida.

Enquanto a modernidade sólida, cujo símbolo é a fábrica fordista, foi marcada pela rotinização do tempo, pela vinculação do trabalho ao solo e pela produção, a modernidade líquida, cujo símbolo é a empresa, desvinculada da territorialidade e suscetível às oscilações do mercado, é marcada pelo consumo, pela fluidez das relações humanas e pela desvalorização do espaço frente à crescente aceleração do tempo. Nas palavras de Bauman (2001, p. 136),

No universo do software da viagem à velocidade da luz, o espaço pode ser atravessado, literalmente, em ‘tempo nenhum’; cancela-se a diferença entre ‘longe’ e ‘aqui’. O espaço não impõe mais limites à ação e seus efeitos, e conta pouco, ou nem conta. Perdeu seu ‘valor estratégico’, diriam os especialistas militares.

Nesta era do software, de intensificação do acesso à comunicação e informação, possibilitada, sobretudo, pelo advento da internet, tem-se a criação de espaços virtuais que rompem com as tradicionais barreiras de tempo e espaço. Tais espaços permitem a socialização e a interação, que podem ser simultâneas ou não.

No campo educacional, esse avanço tecnológico das últimas décadas trouxe novos desafios: integrar as TICs à educação, como forma de democratizar o acesso e diminuir desigualdades, e considerá-las como ferramentas capazes de promover a aprendizagem ao invés de utilizá-las apenas por suas “virtualidades técnicas” (KENSKI, 2007).

A Liquidez do Ambiente: O Espaço Virtual

Uma vez que o espaço geográfico pode ser atravessado em questões de milésimos de segundos pelo sinal digital, que fluidifica espaços e informações e os transmite quase que simultaneamente, este passa a ser o exemplo máximo da inexorabilidade do espaço e da presencialidade do “agora” em nossas vidas. Em lugar do espaço geográfico, a internet instaura o espaço virtual2.

Assim como os líquidos, o que conta para esse novo espaço fluidificado são as mudanças contínuas de suas formas, em vez da durabilidade e da permanência. Desta forma, a liquidez, metáfora

2 Espaço que alguns estudiosos designaram como espaço digital ou ciberespaço.

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empregada por Bauman (2001, p. 8), serve muito apropriadamente para se pensar essa virtualidade, ao observar que:

os líquidos, diferentemente dos sólidos, não mantêm sua forma com facilidade. Os fluidos, por assim dizer, não fixam o espaço nem prendem o tempo [...], os fluidos não se atêm muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a mudá-la; [...].

Cabe acrescentar aqui que os dispositivos móveis como smartphones, tablets, notebooks e netbooks só fazem tornar o espaço virtual ainda mais onipresente nas vidas das pessoas.

Pode-se, inclusive, pensar que esse processo de liquefação acarretado pelo avanço das TICs promove a passagem do analógico para o digital (digitalização), do físico para o virtual (virtualização) e do fixo para o móvel (mobilidade). E ainda faz a conexão em rede se tornar mais que meramente ligação entre tecnologias, mas conexão entre pessoas:

As redes, mais do que uma interligação de computadores, são articulações gigantescas entre pessoas conectadas com os mais diferenciados objetivos. A Internet é o ponto de encontro e dispersão de tudo isso. Chamada de rede das redes, a internet é o espaço possível de integração e articulação de todas as pessoas conectadas com tudo o que existe no espaço digital, o ciberespaço. (KENSKI, 2007, p. 34).

Os espaços virtuais são capazes de reunir pessoas que não mantêm qualquer contato fora da rede. Mas nestes espaços a mediação primeira vem da linguagem, questão que será tratada mais à frente no texto.

Por hora, cabe ressaltar, conforme propõe Kenski (2007), que o avanço das tecnologias digitais de informação e comunicação, cujas bases são o hipertexto digital (sequências em camadas de documentos interligados, que funcionam como página sem numeração e trazem informações variadas sobre determinado assunto) e as hipermídias (hipertexto acrescido de outras mídias como fotos, vídeos, sons) e que configuram a linguagem digital, alteram significativamente as formas de acesso à informação, de modo descontínuo e fragmentado, mas ao mesmo tempo mais dinâmico, mais aberto e veloz.

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Esse avanço, que fez surgir os espaços virtuais, tornou possível ainda a criação de ambientes virtuais de aprendizagem (AVA), empregados atualmente para se realizar a educação a distância. Esses espaços virtuais de aprendizagem são definidos por Almeida como

sistemas computacionais disponíveis na internet, destinados ao suporte de atividades mediadas por tecnologias de informação e comunicação. Permitem integrar múltiplas mídias, linguagens e recursos, apresentar informações de maneira organizada, desenvolver interações entre as pessoas e objetos de conhecimento, elaborar e socializar produções, tendo em vista atingir determinados objetivos. As atividades se desenvolvem no tempo, ritmo de trabalho e espaço em que cada participante se localiza, de acordo com uma intencionalidade explícita e um planejamento prévio denominado design educacional, o qual constitui a espinha dorsal das atividades a realizar, sendo revisto e reelaborado continuamente no andamento da atividade (ALMEIDA apud KENSKI, 2007, p. 95).

De fato, se não se considerar os efeitos da difusão das tecnologias de informação e comunicação para a utilização do espaço virtual, bem como as implicações que este novo espaço, fluido, movente e movediço, tomado por verdadeiras avalanches de informações traz para se pensar a supervisão do curso de Gestão Escolar, corre-se o risco de falar dela higienizada de suas reais condições de produção e dos desafios que a atravessa.

A Pirâmide do ConhecimentoDe acordo com Machado (2000), na era em que vivemos, é

salutar diferenciar, ainda que conceitualmente, quatro termos para que se possa analisá-los com mais pertinência na área da educação. Trata-se dos termos que formam aquilo que o autor denomina de pirâmide informacional: dado, informação, conhecimento e inteligência, ambos tomados no plural pelo estudioso.

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Figura 2 – Pirâmide Informacional. Fonte: Machado, 2000, p. 65.

Para o autor, os dados referem-se ao conjunto de códigos que servem de matéria-prima da informação. Trata-se dos elementos qualitativos e quantitativos da realidade e remetem à ideia de banco, uma vez que são acumuláveis. São os elementos que, isoladamente, não têm interesse, pois dependem que alguém os atribua significado para que, a partir deles, produzam informações. O seu valor informacional depende da existência de pessoas interessadas que os organize e lhes faça as perguntas adequadas para que sejam transformados em informação.

A informação está relacionada à contextualização dos dados e à ideia de comunicação, pois sem comunicação não há informação. Sua marca é a efemeridade e a fragmentação. Para se chegar ao nível da informação é preciso tratar o dado, selecionar o que interessa e mapear os dados relevantes.

O conhecimento é uma visão (teoria) organizada que leva à compreensão das informações, é a elaboração ou reelaboração daquilo que vem como informação de forma a constituir representações da realidade, portanto, vem da inter-relação e não da fragmentação. Para se produzir conhecimento,

(...) é fundamental a capacidade de estabelecer conexões entre elementos informacionais aparentemente desconexos, processar informações, analisá-las, relacioná-las, armazená-las, avaliá-las segundo critérios de relevância, organizá-las em sistemas (MACHADO, 2000, p. 68).

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Todavia, esse conhecimento nem sempre é explícito para o sujeito, pois há coisas que sabemos que não sabemos explicitar em palavras, pois aprendemos no dia a dia, na convivência e não apenas pelo estudo.

Já a inteligência, como o próprio autor admite, é um termo mais difícil de ser definido, pois quanto mais próximo ao topo da pirâmide informacional, mais complexo e abstrato vai se tornando o conceito. Além disso, não há uma única inteligência, mas várias. Para Machado (2000, p. 68), a inteligência está associada às pessoas e remete à ideia de projetos:

em uma palavra, a inteligência encontra-se diretamente associada à capacidade de ter projetos; a partir deles, dados, informações, conhecimentos são mobilizados ou produzidos.

A inteligência gera ações/projetos que devem estar ancorados em um conjunto de valores socialmente acordados, portanto, os dados, as informações e especialmente os conhecimentos tornam-se meios para a realização de projetos pessoais e/ou coletivos. Mobilizar o conhecimento é a capacidade de realizar projetos.

Assim, ter informações sobre um determinado assunto não quer dizer conhecê-lo; conhecê-lo não quer dizer saber usá-lo para alguma finalidade.

Essa concepção destoa daquela proposta por Alfred Binet, em 1905, que via a inteligência como uma medida unidimensional definida operacionalmente e elaborava as bases para os Testes de QI (quociente de inteligência). Mas acrescenta àquela proposta por Howard Gardner (1983; 1994), de encarar a inteligência como um espectro de competências, configurando sete tipos de inteligências: linguística, lógico-matemática, corporal-cinestésica, espacial, musical, interpessoal e intrapessoal. Segundo ele, todas as pessoas têm essas inteligências, que funcionam de forma integrada, mas cada indivíduo tem maior potencial para desenvolver uma ou outra, devido a razões genéticas e ambientais.

E o como essas conceituações podem orientar a atividade de supervisão do curso de Gestão Escolar oferecido pela Escola de Gestores?

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É importante entender essa diferenciação para que elas possam orientar o trabalho realizado pela supervisão de um curso a distância, especialmente em um curso de pós-graduação lato sensu, uma vez que é possível verificar que existe certa confusão hoje em dia, quando as pessoas afirmam que a internet aumentou o número de conhecimentos disponíveis. Possivelmente, quando assim o fazem, estão se referindo ao aumento exponencial da quantidade de dados e de bancos de dados disponíveis, do volume de informações geradas a cada segundo e ao maior fluxo destas informações com as quais somos “bombardeados” diariamente por nossos gadgets (celulares, smartphones, notebooks, netbooks, tablets, computadores, leitores de mp3 etc.). Neste sentido, têm surgido alguns estudiosos que afirmam, inclusive, que esse excesso de estímulo, especialmente pela internet, tem nos tornado cada vez mais superficiais e dispersos. Não mais conhecedores, mas sim mais acumuladores de informações e mais processadores de dados. É o caso do autor Nicholas Carr, que além de afirmar que estamos nos tornando leitores mais superficiais de textos, por causa das mudanças que a internet trouxe para a leitura, como hipertextos digitais e hipermídia, também propõe que nos “tornamos consumidores insanos de dados” (CARR, 2011, p. 174). Neste âmbito, afirma ainda que:

Mesmo em um nível prático, os efeitos não são tão benéficos como gostaríamos de acreditar. Como mostram muitos estudos de hipertextos e multimídia, a nossa capacidade de aprender pode ser severamente comprometida quando nosso cérebro é sobrecarregado com diversos estímulos on-line. Mais informação pode significar menos conhecimento (CARR, 2011, p. 290).

Mas esse excesso de estímulo que todas as informações trazidas por nossos dispositivos, de forma cada vez mais fluida, efêmera, fragmentada e contínua, precisa ser diferenciado de produção de conhecimento, como vimos na proposta de Machado (2000). O que se faz com a informação de forma que ela não apenas passe superficialmente pelo sujeito, mas faça parte de seu rol de saberes é que é, de fato, importante para a educação, incluindo a modalidade a distância.

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Isso pode ser notado na dificuldade que os professores/conteudistas apresentam em selecionar os conteúdos, ou seja, dados contextualizados sobre um tema – informação – para o ambiente virtual de aprendizagem, dada a facilidade que a digitalização dos textos, vídeos e outros materiais didáticos trouxe para a elaboração das disciplinas no meio digital. Essa facilidade em disponibilizar inúmeros materiais, como, por exemplo, textos em pdf e vídeos do youtube, nem sempre vem acompanhada da desenvoltura em encontrar meios de trabalhar essas informações de forma a produzir conhecimentos.

Esse configura um grande desafio da supervisão, pois auxiliar os professores coordenadores de sala ambiente na seleção de materiais e conteúdos a serem utilizados e/ou ajudá-los a elaborar estratégias didáticas – que possibilitem que as informações selecionadas e disponibilizadas se transformem em conhecimento útil aos projetos individuais dos cursistas ou ao projeto coletivo do curso – é tarefa da supervisão, a quem cabe promover a integração da proposta do professor à proposta do curso.

A concepção de uma disciplina nesta modalidade precisa estar associada à forma como serão “ministrados” os conteúdos, pois não se pode prescindir da dimensão didática na educação a distância, sob pena de se tratar apenas de seleção, ainda que bem realizada, de informações. Como serão tratadas as informações após o mapeamento do que é relevante para o curso, quais estratégias corresponderão, substituirão ou inovarão as explicações, a exposição, o diálogo e os debates comuns a uma aula ministrada na educação presencial3 – nesta tentativa de fazer com que as informações levadas à sala de aula virtual transformem-se em conhecimentos já existentes e em novos – precisam ser pensadas a todo momento.

Nesse sentido, não basta disponibilizar um Professor de turma e um Assistente de turma – os mediadores da Escola de Gestores – para assessoramento do cursista, se o coordenador de sala ambiente, ao planejar a disciplina, não o fizer pensando nas estratégias didáticas necessárias para a transformação da informação em conhecimento,

3 Embora se reconheça aqui que nem sempre a aula presencial se abre a algo mais que a pura exposição de conteúdos.

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pois os mediadores ficarão mais limitados em suas ações com os cursistas. Corre-se, assim, o risco de reduzir consideravelmente a produção de conhecimentos, pois se deixa sob responsabilidade do autodidatismo do cursista a tarefa de aprender. Da mesma forma, se o coordenador de sala ambiente prepara todo o ambiente virtual pensando nas estratégias didáticas para a disciplina, mas os mediadores se acomodam apenas na correção de tarefas, sem, de fato, fazerem a mediação e as intervenções necessárias e proativas para promover o bom aproveitamento do curso, dificilmente o resultado será satisfatório. Encontrar esses caminhos e estratégias que levem a um desenvolvimento qualitativo do curso é também atribuição do supervisor, que em conjunto com o coordenador da sala ambiente e com os mediadores, pode pensar o como fazer-saber. Ou, seja, pensar em novas formas de ensinar indiferentemente da distância.

Além disso, há outro aspecto relacionado a essa questão que não se pode perder de vista. Trata-se de pensar, também na educação a distância, em como criar uma proposta de ensino mais dialógica, para usar um termo de Mikhail Bakhtin. Por vezes, os cursistas recebem um curso pronto e fechado, sem muitas possibilidades de auxiliarem a pensar os conteúdos e a dimensionar as disciplinas. Por isso, é importante refletir sobre como o conhecimento do cursista, que é também um profissional com experiência na educação básica pública, será aproveitado para elaborar ou reelaborar as representações da realidade que apresentam. Caso contrário, a disciplina não os considerará como sujeitos ativos, que constroem/produzem conhecimento a partir de uma diversidade de “lugares” socioculturais e de espectros diferenciados. Em resumo, é preciso identificar o público alvo a que o curso de destina e fazer valer os papéis dos envolvidos.

Para se usar um termo condizente com as teorias de Bauman, é preciso cuidar para que a liquefação da figura do professor, que perpassa, com as devidas proporções, tanto a figura de coordenador de sala ambiente quanto de Professor de turma e Assistente de turma, não se torne apenas um despejar de conteúdos prontos e alheios ao cursistas.

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Inovação e ConhecimentoO dicionário eletrônico Houaiss 3.0 aponta as seguintes

acepções para a palavra inovação:

substantivo feminino1 ação ou efeito de inovar2 aquilo que é novo, coisa nova, novidade3 qualquer elemento ou construção que surge numa língua, e que não havia numa fase mais antiga ou na língua-mãe (DICIONÁRIO ELETRÔNICO HOUAISS 3.0, 2009).

Ao se pensar a educação a distância, facilmente se associa essa inovação, ou seja, a novidade, à questão tecnológica, pois a era digital, com a internet, possibilitou a desvinculação espaço/tempo da informação e, de certa maneira, dos espaços de construção do conhecimento, haja vista que a virtualização possibilita alcançar várias pessoas em locais distintos, invertendo o fluxo tradicional: em lugar de se vir até a universidade, é a universidade, esse espaço de construção do conhecimento por excelência, que chega até o cursista por meio de conexões que “rasgam” o espaço a todo e a qualquer tempo. Sem dúvida, esse potencial de expansão das fronteiras físicas e espaciais, propiciada pela tecnologia digital, permitiu às universidades brasileiras atender as necessidades da formação continuada, pois o tempo/espaço do aprender se expandem para além das instituições de ensino.

Aprender, em tempos de inovação tecnológica, é mais do que usar novos recursos para adquirir conhecimento. A inovação, por sua vez, está na reconfiguração do conhecimento e na relação que estabelecemos com ele.

E se poderia perguntar então: para além do uso da tecnologia, onde está a inovação na educação a distância, relativa ao conhecimento e à relação estabelecida com ele?

Mais que os recursos tecnológicos, que servem de meios possibilitadores, é o que se faz com eles e a partir deles que promove, de fato, a inovação. Pois não se pode perder de vista que os meios – tomem-se como exemplo as TICs – não são fontes de inovação em si, mas mediações entre novas práticas de comunicação, de

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informação e de transformações sociais, conforme sinalizou Martín-Barbero (2001).

Esse conceito de mediação possibilita pensar que tecnologia e cultura estão atreladas, pois pressupõe a cultura como algo que se transforma constantemente nos meios e por meio deles, tal qual se está pensando a cultura educacional neste texto: os meios abrem portas para a criação de uma cultura da educação a distância com identidade própria.

As plataformas digitais que permitem hoje a desterritorialização da “sala de aula” figuram como os ambientes virtuais de aprendizagem, porém, requerem novos caminhos de aprender, novas formas de ler, novas formas de escrever, enfim, novas formas de estudar. Ademais, “a mediação primeira não vem das mídias, mas dos signos, linguagem e pensamento que elas veiculam” e produzem (SANTAELLA, 2003 apud CAMPOS, 2012, p. 20). Sendo assim, ignorar as linguagens dessas novas tecnologias ou considerar apenas seu caráter instrumental é deixar de considerar as questões trazidas pela cultura digital, trabalhando-as por meio de paradigmas da cultura impressa, apenas.

Esse é outro dos desafios encontrados pela supervisão do curso logo no início do curso: possibilitar, por meio de ações complementares às disciplinas disponibilizadas, a criação de material de apoio e de orientação aos cursistas, em forma de tutoriais, escritos ou em vídeo, de forma a aproveitarem melhor os recursos disponíveis. Tais recursos são destinados àqueles cursistas que nunca utilizaram o Moodle ou àqueles que se poderia chamar de “mais analógicos” – pois ainda estão mais ligados aos processos analógicos de se estudar, como a leitura de textos impressos, a escrita a lápis ou à caneta e que possuem dificuldades de usar o computador. Esta intervenção tem por objetivo promover o uso dos processos digitais – como navegação ágil e leitura de hipertextos digitais, elaboração de textos na tela do computador, elaboração de textos colaborativos entre outros –, crucial para o bom aproveitamento dos estudos por parte dos cursistas. Dessa forma, não basta ao cursista apresentar um bom letramento, mas também um bom letramento digital, já que

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O crescente aumento na utilização das novas ferramentas tecnológicas (computador, internet, cartão magnético, caixa eletrônico etc.) na vida social tem exigido dos cidadãos a aprendizagem de comportamentos e raciocínios específicos. Por essa razão, alguns estudiosos começam a falar no surgimento de um novo tipo, paradigma ou modalidade de letramento, que têm chamado de letramento digital. Esse novo letramento, segundo eles, considera a necessidade dos indivíduos dominarem um conjunto de informações e habilidades mentais que devem ser trabalhadas com urgência pelas instituições de ensino, a fim de capacitar o mais rápido possível os alunos a viverem como verdadeiros cidadãos neste novo milênio cada vez mais cercado por máquinas eletrônicas e digitais (XAVIER, 2013, p. 1).

É com este intuito que, no Encontro de Formação de abertura do curso, realizado presencialmente na Universidade Federal de Ouro Preto, é oferecido a todos os cursistas um minicurso de acesso ao ambiente virtual de aprendizagem Moodle, ainda que a primeira disciplina do curso seja Introdução ao Moodle. É trabalho de uma supervisão atenta ao bom desenvolvimento do curso, juntamente com os demais membros da equipe pedagógica, auxiliar o cursista para que ele tenha segurança quanto às ferramentas tecnológicas e recursos digitais que se fazem necessários para os estudos propostos. Não se pode desconsiderar que a falta de domínio destes fatores tecnológicos pode acarretar o “silêncio virtual”, baixo aproveitamento do curso e o aumento da evasão.

Proximidade

Os novos caminhos de aprender estão relacionados também a aprender sem a “presencialidade física” do professor, porém, com a proximidade deste, que pode ser percebida pelo acompanhamento do cursista em todas as atividades propostas, pelas estratégias didáticas selecionadas para explicar os conteúdos selecionados e promover a aprendizagem. Neste ponto, observa-se que a presencialidade é substituída pela proximidade, não física, mas aquela possível pela criação de vínculos com os cursistas. Afinal, os recursos tecnológicos apresentam possibilidades, mas a proximidade vem da troca nas relações estabelecidas, como se lê a seguir:

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A proximidade, instituída por tais aparelhos, consiste meramente numa superação de distâncias espaço-temporais, redução e aceleração ao máximo dos limitados processos de comunicação, e isto não pode ser confundido com “proximidade humana” no sentido da participação mútua e da identificação, que só podem ser gradativamente construídas ao longo do convívio mútuo e da troca de experiências (TüRCKE, 2002 apud ZUIN, 2006, p. 941). grifo do autor

Outra atribuição importante da supervisão de curso consiste na criação de mecanismos e estratégias que permitam a superação da distância existente entre os participantes do ambiente virtual, causada pela separação no espaço e no tempo. Cabe ao supervisor e à equipe de mediação pedagógica encontrar a melhor forma de se utilizar os recursos disponíveis na plataforma Moodle do curso, de modo a promover a interação síncrona e assíncrona constante entre os participantes e favorecer o ensino-aprendizagem, fazendo com que os cursistas estejam “próximos, em conexão, independentemente do lugar em que estejam” (KENSKY, 2007, p. 121).

Uma primeira distância a ser superada é a existente entre a equipe de mediadores. Os professores de turma e assistentes de turma, distantes fisicamente uns dos outros e também dos professores e coordenadores do curso, são também, de certa forma, separados no ambiente virtual. Isto porque, em cada uma das dez turmas/polos, atuam um professor de turma e um assistente de turma, responsáveis pela mediação dos conteúdos junto àquele grupo específico de cursistas (não superior a 50).

Como, então, promover a interação e comunicação entre uma equipe de 20 mediadores (10 professores de turma e 10 assistentes de turma)? Para isso, a supervisão realiza reuniões periódicas com estes profissionais. Estas reuniões, que podem ser gerais ou individuais, a depender da circunstância, ocorrem com periodicidade tanto presencialmente, na UFOP, quanto virtualmente, através de recursos como videoconferências, webconferências e Skype. As reuniões envolvem desde o treinamento da equipe, a apresentação da proposta do curso e das disciplinas, a definição das funções e atribuições de cada um, orientações sobre correções, avaliações e feedbacks, até o planejamento dos encontros presenciais (nos polos e na UFOP).

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Cabe aos professores e assistentes de turma, que atendem a um grupo menor de cursistas em relação ao professor coordenador de sala ambiente e, portanto, conhecem as peculiaridades de suas turmas, promover a mediação e a criação de situações que auxiliem os cursistas na apropriação dos conteúdos e na realização das atividades propostas nas salas ambientes (em geral, chats, fóruns de discussão e postagem de tarefas).

Apesar da realização destas reuniões, o dia-a-dia da mediação pedagógica em um ambiente virtual exige dos professores e assistentes de turma respostas imediatas às dúvidas dos cursistas e às suas próprias dúvidas em relação ao conteúdo ou em relação às orientações dos professores responsáveis pelas salas ambientes.

Para viabilizar esta comunicação bem como o compartilhamento de informações, materiais e experiências, foi criada uma “Sala de Interação Pedagógica” dentro da própria plataforma Moodle do curso, destinada somente à equipe pedagógica. Neste espaço são propostos e discutidos os critérios de correção/avaliação das atividades das disciplinas, e dispostos tutoriais e documentações pertinentes ao curso que os mediadores pedagógicos precisam ter ciência para melhor atuação em suas atribuições.

Na Sala de Interação, não apenas a supervisão disponibiliza materiais e responde a dúvidas, mas a equipe pode dialogar entre si, trocar impressões sobre suas turmas e acrescentar tópicos de discussão, através de recursos de comunicação síncrona e assíncrona.

Essa sala tem sido imprescindível para a discussão de procedimentos e dificuldades que aparecem ao longo do curso, para apresentação de sugestões à supervisão do curso e aos demais colegas de trabalho, bem como para o alinhamento da “filosofia” de trabalho entre assistentes de turma e professores de turma. Ao final de cada disciplina, os mediadores pedagógicos postam a planilha de notas dos cursistas de sua turma/polo, para que todos possam pensar conjuntamente o andamento do curso e as ações necessárias para a próxima disciplina a ser ofertada.

A superação da distância entre a própria equipe pedagógica, que de fato, são “os olhos e os ouvidos do sistema” (Moore, 2007, p.

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149), ou seja, do curso, é fundamental para auxiliar os cursistas não só em suas demandas técnicas e administrativas, mas para facilitar sua comunicação e interação com professores e com o conteúdo do curso em si, evitando o “silêncio” na plataforma.

Por isso, na mediação realizada pelos professores e assistentes de turma, mais importante que postar as notas na plataforma Moodle, é fornecer, em tempo hábil, o feedback aos cursistas sobre suas atividades e incentivá-los a interagir entre si e com os mediadores pedagógicos, ações estas necessárias para apontar o que já foi alcançado e orientar o que pode ser melhorado no processo de aprendizagem. Orientar o tempo, a forma e o tom que esse feedback será realizado, monitorar os padrões de interação, em consonância com as orientações do coordenador de sala ambiente, acompanhar atentamente a forma como toda a equipe está trabalhando na plataforma, os recursos que estão sendo utilizados, de modo a evitar o temido silêncio na plataforma são atividades que perpassam o cotidiano da supervisão.

Além das ações de mediação consideradas “essenciais” ao trabalho dos professores e assistentes de turma com os cursistas – como as orientações sobre conteúdos e correções/feedbacks das atividades –, a supervisão, juntamente com a equipe de mediadores pedagógicos, busca promover a criação de momentos de formação, complementares e paralelos às salas ambientes. Tais situações podem envolver a realização de encontros presenciais (nos polos de apoio presencial) ou virtuais (por meio de videoconferências e webconferências), tendo em vista a necessidade de esclarecer ou aprofundar determinados assuntos importantes para o desenvolvimento do curso, como, por exemplo, orientações sobre realização dos projetos de intervenção e para elaboração do TCC. Diferente dos encontros de formação obrigatórios, que reúnem todos os cursistas na universidade, esses encontros presenciais ou virtuais são sempre realizados por turma/polo, o que permite um atendimento mais individualizado, com a participação da supervisão e equipe de mediação pedagógica responsável por cada turma.

Já os três encontros de formação, – um na abertura, um no meio e outro final do curso – realizados na própria cidade sede da universidade buscam, além de ofertar momentos de formação,

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criar vínculos entre os cursistas e a equipe pedagógica e promover verdadeiras situações de pertencimento à instituição à qual estão vinculados. Essa vinculação é determinante para que os cursistas se envolvam e valorizem ainda mais a oportunidade que lhes é concedida com a vaga no curso.

Os cursistas também dispõem de uma Sala de Interação, na qual todos os cursistas de todas as turmas/polos estão inscritos, sem divisões. Neste ambiente, todos têm acesso aos documentos, vídeo-tutoriais e tutoriais criados para orientá-los sobre vários procedimentos adotados no curso, tais como: calendário acadêmico e cronograma do curso, normas para avaliação e reoferta de disciplinas, informações sobre avaliação presencial, situações que levam ao desligamento do cursista, situações que conferem o direito ao tratamento especial, obtenção de declaração de matrícula, instruções normativas sobre a elaboração de trabalhos acadêmicos e sobre a elaboração dos principais gêneros textuais acadêmicos entre outros.

Neste ambiente são criados, ainda, fóruns de interação destinados à discussão de temáticas relacionadas ao cotidiano dos cursistas nas escolas em que atuam. Trata-se de atividades não pontuadas e de participação livre, mas cuja adesão é frequente e constante, por tratarem de assuntos que buscam uma reflexão sobre a prática dos gestores, como por exemplo: “apresentação da escola em que o cursista atua”, associando a linguagem verbal (a postagem escrita) e a não verbal (fotos e vídeos da escola); “apresentação dos desafios enfrentados na gestão da escola”; “apresentação das ações desenvolvidas pela escola para aproximar-se da comunidade em que está inserida”.

Há, ainda, dois chats permanentes, um em que os cursistas podem interagir entre si, sem a separação de polos e sem temáticas definidas; e outro em que podem conversar com os mediadores pedagógicos, também sem a divisão de polos. Neste caso, mediadores e cursistas agendam data e hora que estarão on-line para “conversarem” sobre questões do curso.

Também é preciso compreender que o aprendizado pela mediação dupla tanto da tecnologia, quanto da equipe que acompanha a disciplina – mediação pedagógica – é muito diferente do aprendizado em uma sala de aula presencial. Em geral, um

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curso a distância conta muito mais com a disciplina na gestão do tempo e com a autonomia de aprendizagem do cursista que os cursos presenciais. Cada vez mais esta modalidade evidencia para o cursista que ele precisa aprender a aprender com competências voltadas para a era da liquidez4.

Pois, uma vez que o espaço já não é tão impeditivo, a disputa atual é pelo tempo, que cada vez é mais ocupado pelas inúmeras atividades exercidas pelos sujeitos ao longo do dia. E, em um curso de formação continuada, como é o caso da pós-graduação em Gestão Escolar, cujo pré-requisito para a matrícula no curso é estar em exercício na rede pública de educação, nenhum cursista pode se dedicar exclusivamente aos estudos, sendo essa mais uma de suas atribuições ao longo dos 18 meses de integralização do curso.

Por isso, conhecer seu próprio ritmo de aprendizagem, um autoconhecimento necessário na educação a distância, e a partir dele realizar a gestão de seu próprio tempo de estudo para cumprir todo desenvolvimento das disciplinas de forma adequada é uma questão que se impõe ao cursista como necessária de ser estabelecida. Afinal, o cursista também precisa reservar tempo suficiente para que não apenas veja e leia superficialmente o conteúdo da disciplina no final de semana, por exemplo, mas saiba aproveitar as estratégias de ensino criadas pelo coordenador de sala ambiente e pelos mediadores, para elaborar e reelaborar as informações necessárias à construção/produção do conhecimento. Para isto, é preciso saber quanto tempo reservar aos estudos, pois o conhecimento depende tanto de estratégias de ensino quando de processos de aprendizagem adequados, para que não apenas se absorva os conteúdos, mas para que se possa trabalhá-los, elaborando-os.

Não obstante, salienta-se que cabe à supervisão do curso, juntamente com a coordenação, planejar o tempo de disponibilização e de desenvolvimento das disciplinas, propostas para o curso, tendo em vista a densidade, a carga-horária e a 4 Optou-se por essa nomeação tendo em vista que é mais condizente com a linha argumentativa aqui seguida, porém não se ignora a grande profusão de nomeações encontradas na literatura, tais como “Sociedade da informação”; “Sociedade do conhecimento”; “Sociedade da inteligência”; “Sociedade informacional”; “Era da informação”; “Era do conhecimento”; “Era informacional”; “Economia do conhecimento”; “Economia da informação”; “Economia informacional”.

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ementa prescritas em seu projeto pedagógico. Neste sentido, vale sempre avaliar se deve-se ou não disponibilizar duas ou mais disciplinas concomitantemente, analisando-se, a todo momento, se esta demarcação de tempo para as disciplinas facilitará ou dificultará a elaboração do conhecimento. Isso porque, sem dúvida, o arranjo temporal das disciplinas pode concorrer para que haja apenas a absorção dos conteúdos em lugar de processos de criação a partir deles.

É preciso entender que a flexibilidade tão alardeada na educação a distância não significa estudar em qualquer lugar e a qualquer momento, tomado de forma ingênua como liberada de toda e qualquer delimitação, mas de uma ampliação nestas possibilidades, porém controladas por um calendário curricular.

E é neste aspecto que muitos cursistas, ao ingressarem no curso de Gestão Escolar, são surpreendidos. Pois, especialmente aqueles que nunca fizeram um curso a distância, acreditam que terão uma flexibilidade total do tempo e da disciplina para estudarem. E se deparam com um cronograma que estabelece prazos para realização de leituras, datas e horários pré-determinados para postagem das atividades avaliativas.

Linguagem

Outra inovação do ensino virtual está em aprender novas formas de linguagem, as quais estão associadas ao escrever e ao ler. É preciso lembrar, como destacado por Orlandi, (2001, p. 16) que “não se pode pensar a linguagem como se ela estivesse separada do seu meio material, das suas condições, das suas conjunturas, da conjuntura em que aparece”. Dessa forma, o domínio da linguagem das textualidades líquidas, ou seja, aquelas comuns aos ambientes virtuais de aprendizagem, bem como de suas especificidades, é fator preponderante para o bom acompanhamento do curso, pois estão ligadas à nova forma de letramento exigida: o letramento digital, que implica

realizar práticas de leitura e escrita diferentes das formas tradicionais de letramento e alfabetização. Ser letrado digital pressupõe assumir mudanças nos modos de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não-verbais, como imagens e desenhos,

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se compararmos às formas de leitura e escrita feitas no livro, até porque o suporte sobre o qual estão os textos digitais é a tela, também digital (XAVIER, 2013, p. 2).

Saber efetuar troca de mensagens eficiente com outro cursista, com os mediadores, com o coordenador de sala ambiente ou com a supervisão do curso, considerando-se sempre a melhor organização do texto para o recurso tecnológico utilizado, de forma a empregar a linguagem adequadamente para permitir a compreensão pela outra instância, é uma questão de garantir maior eficácia no processo de interação na plataforma. Participar de forma colaborativa de um chat ou de um fórum proposto, primando pela qualidade da interação com os colegas do curso e com os mediadores, pela qualidade dos argumentos cientificamente embasados ou por uma escrita interativa de um texto, são desafios que muitos cursistas precisam vencer ao longo do curso.

O assédio de informações obtidas pelo Google, por exemplo, pode fazer com que o cursista, se não contar com a devida orientação de seus mediadores, produza textos rasos ou não autorais e sem o devido credenciamento científico necessário a um curso de pós-graduação. Neste caso, avulta-se o papel dos mediadores na orientação sobre o “consumo” de informações e conteúdos úteis à formação do cursista, que o tornem capaz de usá-las para melhorar e ampliar a qualidade da leitura e da escrita produzida, elaborando trabalhos menos superficiais e cada vez mais autorais.

Na educação a distância, o cursista é comumente solicitado a produzir textos e a responder questões discursivas, tanto em ferramentas assíncronas quanto em ferramentas síncronas, de modo individual ou colaborativo, quer seja em formatos de textos convencionais, como aqueles produzidos em formato .doc através do envio de tarefas, quer seja através da participação em fóruns e em wikis. Enfim, os cursistas se mostram e se fazem dizer mais pela escrita, uma vez que, seguindo uma perspectiva mais discursisva da linguagem, em cada texto autoral que se produz, não apenas “dizemos”, como também “somos ditos” neles. Ou, quando em lugar da autoridade pedagógica dos

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mediadores – necessária para o desenvolvimento educacional – coloca-se o autoritarismo pedagógico, nesta condição de produção, o texto do cursista “diz” o que o “outro” quer ouvir, pois se inibe a interação de fato, a contrapalavra responsiva5 e promove-se o regulamento puro e autoritário. Um risco que está sempre à espreita quando não há a vinculação da equipe pedagógica com as turmas, com os cursistas, já que a “alienação” pode acarretar o “distancimento” das instâncias interacionais cursista-mediadores pedagógicos, gerando um processo que funciona na direção “eu mando você faz, não importam as circunstâncias”.

Sem contar o grande trabalho de conscientização, liderado pela proposta da supervisão do curso, quanto ao plágio, em suas várias modalidades, quer seja o plágio direto (word by word): cópia literal; o plágio indireto (paraphrase): interpretação de um texto original sem indicação da fonte; o plágio de fontes: quando um trabalho é feito com a reprodução de citações de outros trabalhos; o plágio consentido (conluio): apresentação de trabalhos feitos por colegas ou comprados; ou o autoplágio: quando o estudante entrega o mesmo trabalho para disciplinas diferentes, sem informar que o conteúdo já foi apresentado anteriormente6.

Saber ler um hipertexto ou uma hipermídia, um vídeo, uma videoaula, uma webaula ou um podcast, aproveitando-lhe as potencialidades e, não raro, interagir com os colegas para se elaborar um trabalho é uma competência – vista neste capítulo como “a capacidade ou habilidade para realizar tarefas ou atuar frente a situações diversas de forma eficaz em um determinado contexto”, tal qual definem Zabala e Arnau (2010, p. 17) – não restrita à educação a distância, mas muito mais evidenciada nesta modalidade e, portanto, precisa ser bem desenvolvida ou criada, quando ainda não existente. Esse desafio de leitura das textualidades digitais, mediada pelo espaço virtual, na era da liquidez, precisa ser enfrentado, uma vez que:

5 Termo usado por Mikhail Bakhtin para referir-se à reação do sujeito ao que lhe é dito.6 Definições retiradas de: KROKOSCZ, Marcelo. Autoria e plágio: um guia para estudantes, professores, pesquisadores e editores. São Paulo: Atlas, 2012.

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Como sujeito imerso e inscrito nesse entremeio [entre a modernidade sólida e a modernidade líquida], é preciso desenvolver, ou melhor, aprender a ler de uma maneira nova e aprender com mais velocidade, saltando de um texto a outro, formando combinações hipertextuais cada vez mais moventes, fluidas (CAMPOS, 2012, p. 18).

Além disso, dada a gama imensa de informações acessíveis na internet, os mediadores do curso, figuras liquefeitas do professor na educação a distância, têm um papel importante de auxiliar a “conduzir” a leitura dos cursistas de modo que eles não se percam na rede, afinal,

O professor tem o importante papel de orientar o aluno na seleção e no consumo de informações úteis para melhorar a qualidade da leitura. Além disso, é preciso investir no uso produtivo dos links, evitando que o aluno se perca no emaranhado de “fios” da rede (CAMPOS, 2012, p. 17).

Esse imperativo de adaptar-se aos avanços tecnológicos e, ao mesmo tempo, de orientar os caminhos para uma apropriação crítica desses novos meios precisa estar na pauta das preocupações e orientações que a supervisão do curso propõe à equipe pedagógica. Todavia, essa é, indubitavelmente, uma questão que demanda muita cooperação de toda a equipe, tendo em vista que, muitas vezes, se trabalha sob o alicerce da dúvida, essa constante na “incipiente” e “em construção” cultura da educação a distância, cujos estudos estão somente despontando, nesse universo novo de significados e de produção de sentidos, e que também requer dos envolvidos aprender a fazer-conhecer com/(n)esta modalidade.

Considerações finaisA difusão das tecnologias da informação e comunicação e

seu uso cada vez mais frequente na educação e, em particular, na educação a distância, tem contribuído significativamente para a expansão da oferta de cursos de formação continuada no Brasil. Através dos ambientes virtuais de aprendizagem, as instituições de ensino alcançam estudantes dispersos geograficamente, por

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meio de conexões que “rasgam” o espaço a todo e qualquer tempo. É neste contexto que se insere o curso de especialização em Gestão Escolar, ofertado pela Universidade Federal de Ouro dentro das ações do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública (PNEG/SEB/MEC), destinado à formação continuada e pós-graduada de dirigentes da educação básica.

Diante dos inúmeros recursos disponíveis nos AVA’s e da possibilidade de realização dos estudos em espaços, tempos e ritmos próprios a cada estudante – reflexos da desterritorialização da sala de aula e da liquidez que caracteriza os espaços virtuais na atualidade –, o trabalho de supervisão mostra-se fundamental para a gestão de um curso a distância em suas várias dimensões, em especial, na dimensão pedagógica.

É partindo destas considerações que a supervisão de curso da Escola de Gestores busca atuar, no intuito de promover a interação entre os participantes e favorecer a aprendizagem ao longo do curso. Conforme evidenciado neste capítulo, as atividades desenvolvidas pela supervisão atravessam as diversas fases e dimensões do curso, tais como: planejamento das disciplinas, auxiliando professores na seleção de conteúdos e materiais; planejamento dos encontros de formação e de atividades complementares às disciplinas; orientação e supervisão da equipe de mediadores, estimulando a interação entre a equipe e desta com os cursistas; orientação aos cursistas para um melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no ambiente virtual; criação de mecanismos de interação síncrona e assíncrona entre cursistas e destes com os mediadores etc.

Todas estas ações se configuram em verdadeiros desafios para a supervisão, que transita cotidianamente pelas dimensões administrativa, tecnológica e pedagógica do curso e cuja função é promover a mediação entre os diversos agentes envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. Trata-se, portanto, de um saber/fazer que está em constante movimento, tendo em vista a dinâmica própria de um curso de especialização a distância e seu compromisso com a qualidade.

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Referências bibliográficasBAUMAN, Z.. Modernidade Líquida. São Paulo: Editora Zahar, 2001.BRASIL. Ministério da Educação. Projeto do curso de Especialização em Gestão Escolar. Brasília: MEC/SEB, 2007.CARR, N. A geração superficial: o que a internet está fazendo com os nossos cérebros. Tradução de Mônica Gagliotti F. Friaça. Rio de Janeiro: Agir, 2011.CAMPOS, M. Leitura e pós-modernidade. In: Revista Presença Pedagógica, v.18, n.106, jul./ago. 2012.KENSKI, V. M. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas, SP: Papirus, 2007.MACHADO, Nilson José. Epistemologia e didática: as concepções de conhecimento e inteligência e a prática docente. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000.MARTÍN-BARBERO, J. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro: UFRJ, 2001.MOORE, M. G; KEARSLY, G. Educação a Distância: uma visão integrada. São Paulo: Thomson Learning, 2007.ORLANDI, E P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2001. SANTAELLA, L. Cultura e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus, 2003.XAVIER, A C S. Letramento digital e ensino. 2013. (Apresentação de Trabalho). Disponível em: http://www.ufpe.br/nehte/artigos/Letramento%20digital%20e%20ensino.pdf. Acesso em: 12 jan. 2014ZABALA, A.; ARNAU, L. Como aprender e ensinar competências: uma proposta para o currículo. Porto Alegre: Artmed, 2010.ZUIN, A. A. S. Educação a distância ou educação distante? Revista Educação e Sociedade, Campinas, vol. 27, n. 96 - Especial, p. 935-954, out. 2006.

A vivência do Projeto de Intervenção nos polos presenciais do Programa Escola de Gestores da UFOP: a experiência em Guaxupé, Ipatinga e Ubá

Arlana CamposDébora PradoMárcia Freitas

Shirley Cristine Ricoy Soares

IntroduçãoVivemos atualmente um momento ímpar, em que a educação

pública brasileira se consolida na garantia do direito de todos à Educação Básica. Hoje discute-se a expansão e a qualidade. Ocorre que ainda hoje não resolvemos o problema do ensino fundamental em termos de qualidade, ainda não erradicamos o analfabetismo, demoramos a universalizar o ensino e mantemos um déficit educacional grande. Essa oferta requer acima de tudo, qualidade nos serviços educacionais, a partir de práticas interativas, participativas e democráticas. Não basta assegurar a vaga/matrícula na escola, é preciso que o aluno tenha frequência escolar e aprendizagem significativa, pautada na prática da educação como direito social inalienável.

Nesse cenário, todas as unidades escolares são convidadas a revisar sua prática educativa e, portanto, muitas são as propostas de mudança de paradigma. Destaca-se, a importância da autonomia escolar na definição dos mecanismos que assegurem educação de qualidade, expressos no Projeto Político Pedagógico (PPP). Frente a essa liberdade de elaborar seu próprio PPP cada unidade escolar define sua identidade.

Neste contexto, tendo por base uma concepção democrática de gestão escolar e buscando propiciar uma reflexão teórico-prática entre os conteúdos e atividades propostas nas disciplinas do curso, a

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realidade cotidiana e as especificidades de cada escola, foi proposto aos cursistas, a formulação de um Projeto de Intervenção na escola com estreita vinculação com o Projeto Político Pedagógico ou a gestão da mesma.

Dessa forma, os diversos projetos-intervenção foram realizados numa ação conjunta, partilhada entre o diretor e o coletivo da escola e tiveram como objeto: a) a construção do PPP da escola naquelas unidades que ainda não tinham; b) a re-elaboração do PPP, ou de partes do mesmo, nas escolas que já o tinham; c) uma situação problemática e relevante na escola, vinculada ao PPP ou a gestão da mesma.

Abordaremos aqui, sobre os principais temas tratados nos referidos projetos-intervenção dos Polos de Guaxupé, Ipatinga e Ubá. Inicialmente, apontamos traduções sobre o conceito de democracia e sua interface com a escola e a gestão pedagógica. Boa parte dos projetos de intervenção propostos pelos alunos, remetiam à necessidade de elaborar ou reelaborar o PPP com o envolvimento dos profissionais da escola e a comunidade escolar. Apontamos nessa discussão alguns critérios necessários para se oportunizar o envolvimento dos leigos nas decisões que envolvem a prática educativa escolar.

Neste sentido, apresentaremos o processo de formação dos conselhos escolares – instâncias não só reconhecida como instrumento da gestão democrática, mas legalmente garantida pela LDB. Técnicos, especialistas, professores, funcionários, famílias, alunos e comunidade em geral podem debater sobre a oferta e a qualidade da educação em cada unidade de ensino, podendo também deliberar sobre as decisões tomadas. Atualmente os conselhos escolares contam com o Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares, cujo objetivo principal é fomentar a implantação e o fortalecimento dos Conselhos Escolares, no sentido de fortalecer a gestão democrática e participativa na educação.

No quarto item procuramos fazer um diálogo bibliográfico sobre a integração família e comunidade escolar. Em meio às propostas de intervenção dos Gestores Escolares, essa temática constituiu o terceiro objeto de estudo e intervenção na escola, mais formulado pelos alunos. O diálogo que propomos leva à reflexão que a relação

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família/escola, torna oportuno a transformação da realidade escolar e o desenvolvimento da educação para a cidadania.

Discutiremos que a democracia faz parte de um processo histórico e cultural que envolve a definição de quem deve participar das decisões. Defendemos também que o ambiente escolar tem o potencial de fomentar o desenvolvimento de habilidades necessárias para o exercício da democracia dialógica. Apontamos qual seria a contribuição do Projeto Político Pedagógico (PPP) para o debate sobre a democracia e como a forma de sua implantação reflete o tipo de gestão da escola.

Traduções sobre a democracia e a gestão democrática escolar

Embora a palavra Democracia tenha um significado bastante difundido – governo do povo – o que se entende pela sua realização tem uma longa história. Na história ocidental desenvolveram-se a “Tradição clássica ou Aristotélica”, a “Tradição Medieval” e a “Tradição Moderna”.

A tradição Aristotélica das três formas de governo, o “Governo do povo”, a “Aristocracia” e a “Monarquia”, tem sua história remota narrada por Heródoto sobre o diálogo entre Otane, Megabizo e Dario acerca da futura forma de governo do reino da Pérsia sendo que a Democracia é considerada uma forma corrupta de governo (BOBBIO, 1998). Platão (2006) descreve, na República, cinco formas de governo aristocracia, timocracia, oligarquia, democracia e tirania, sendo que somente a aristocracia é considerada boa e a democracia é descrita como a “menos boa das formas e menos má de Governo”.

A tradição romano-medieval postula que independente de quem fosse o detentor da soberania formal do governo, a fonte deste poder emanaria do povo, sendo que este apenas constituiria a outro como seu procurador. Nesta perspectiva existem dois poderes do Estado – o legislativo e o executivo. Ao poder legislativo, um corpo de cidadãos, compete fazer as leis e até mesmo depor o governante. O poder executivo seria delegado pelo povo ao seu representante. O legislador é a causa primaria e o executivo a secundaria. O povo faz a lei a partir do legislativo e o executivo faz cumprir estas leis, portanto, uma democracia representativa.

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A tripartição aristotélica e a forma de ver o poder legislativo e executivo pela tradição romano–medieval foram acolhidas pela tradição do pensamento ocidental. A teoria do Contrato Social de Rousseau (1996), por exemplo, sustenta-se no princípio de que o poder legislativo deve ser assumido diretamente pelos cidadãos. Para ele denomina-se Republica a forma como se organiza o Estado ou o corpo político, sendo que a Democracia insere-se como uma das possíveis formas de governo. O ideal igualitário de Rousseau deve se realizar na forma da vontade geral configurando assim a democracia numa perspectiva participativa como método de organização coletiva.

Vemos neste breve percurso histórico que uma boa parte daquilo que consideramos democracia, estabelece-se na relação a quem ela inclui ou exclui das decisões. O que ela é, muda à medida que as pessoas desenvolvem diferentes concepções do que significa ser um povo autônomo ou de quais habitantes de um determinado território devem participar plenamente (MARKOFF, 2013).

A discussão sobre a ação democrática participativa pode se estender para além de instituições comumente tratadas como espaços privilegiados do exercício da democracia, tais como o Senado, Congresso ou Assembleia legislativa. A sociedade civil é incorporada nos discursos públicos com a criação de ambientes (fóruns, eleições, plebiscitos, associações, dentre outros) que possibilitem a participação ativa nas tomadas de decisões, configurando assim práticas de uma democracia participativa ou dialógica (ROBERTSON, 2008).

Esta perspectiva dialógica da democracia exige que seus membros façam mais do que participar da escolha de seus representantes, mas sejam capazes de identificar problemas, perceberem-se e atuarem como gestores da sociedade (REICH, 2007). Pensando no ambiente educacional escolar alguns autores propõem que a escola contribua para a formação destes cidadãos com a promoção de valores e a criação de ambientes de aprendizagem que oportunizem a vivencia prática e ativa dos alunos e a comunidade nos debates sobre temas discutidos no cotidiano da escola ou em deliberações sobre assuntos que afetem os tempos e espaços escolares (ROTH e DESAUTELS, 2002).

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Alguns autores (p. ex. VEIGA, 1995; ASBAHR, 2005; VASCONCELOS, 1998) sugerem que no ambiente escolar a elaboração do Projeto Político Pedagógico (PPP) favorece a existência de um projeto coletivo de escola. Para tanto a gestão e tomada de decisão acerca da produção e gestão PPP não pode estar centralizado nos especialistas e gestores.

No levantamento de dados realizado nos Polos de Guaxupé, Ipatinga e Ubá os gestores indicaram a preocupação em envolver a comunidade escolar, o conselho escolar, os professores e demais funcionários na reelaboração do PPP e seu cumprimento. Outra demanda também relacionada a gestão democrática é a criação e fortalecimento do Colegiado com foco na formação de novas relações e poder de decisão no espaço escolar.

Estes dados sugerem que o planejamento das ações pedagógicas ainda estão nas mãos dos especialistas e que a comunidade escolar não participa diretamente das decisões. Este cenário sugere que a gestão democrática na escola, como vemos hoje, é mais representativa do que participativa.

Envolvendo a comunidade escolar na discussão dos rumos da escola

Já está consolidado no discurso educacional que o Projeto Político Pedagógico (PPP) é a própria organização do trabalho escolar e que abrange a concepção, realização e avaliação do projeto educativo envolvendo diversos atores (VEIGA, 1998). Neste sentido

Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores e autores (GADOTTI, 1994, p. 579)

Assim o PPP não é simplesmente um amontoado de planos e agrupamento de pessoas. Envolve a associação dos atores

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envolvidos e do compartilhamento de objetivos. Pensando nas pessoas envolvidas nos objetivos educacionais da escola, podemos citar professores, coordenadores, gestores e alunos, mas também, pais e a comunidade atendida pela escola.

A elaboração do PPP é uma ação intencional, com a explicitação de compromissos. Quando estes são definidos coletivamente, comunga com a perspectiva de uma democracia participativa.

O projeto político-pedagógico, ao se constituir em processo democrático de decisões, preocupa-se em instaurar uma forma de organização do trabalho pedagógico que supere os conflitos, buscando eliminar as relações competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as relações no interior da escola, diminuindo os efeitos fragmentários da divisão do trabalho que reforça as diferenças e hierarquiza os poderes de decisão (VEIGA, 1998).

Resgata a escola como espaço público, lugar de debate e do diálogo. Assim na discussão dos rumos da organização da aprendizagem que o PPP propõe, novos atores devem assumir o problema, levantando temas para discussão e redefinindo as possíveis consequências do projeto (CALLON, 2010).

Posto isto, estratégias devem ser pensadas para criar na escola ambientes de diálogo envolvendo a participação efetiva da comunidade. Alguns autores (CALLON et tal, 2010; LATOUR, 2012; LAW, 2012; LAW, 2000) sugerem que os Fóruns de debates oportunizam tal participação e apontam quais os critérios que devem ser observados para que os não especialistas, alunos e professores, sejam incluídos nas discussões.

O Fórum surge com o custo de levantar alguns conflitos. Mas o conflito e a controvérsia podem fortalecer a democracia, pois forçam o estabelecimento do debate e invocam recursos e a mobilização de alianças. Entretanto, como podemos avaliar a qualidade das decisões tomadas a partir dos Fóruns? Como os Fóruns podem influenciar na investigação de estados possíveis de mundo e na composição de coletivos (CALLON, 2010, p. 155)?

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A abordagem dos temas a serem discutidos nos fóruns inicia-se a partir das observações e reflexões da realidade escolar. Para Callon (2010)

(...) começa a partir dos problemas encontrados pelos atores, acompanha-os nas análises que produzem, e nas soluções que inventam; esforça-se a ajudá-los no esclarecimento das lições mais gerais que podem ser estabelecidas com base do acúmulo de experiência” (p. 154).

Assim na discussão e elaboração do PPP os temas mais controversos podem ser discutidos em forma de fórum aberto com a comunidade escolar. Entretanto a realização do fórum não garante por si só a emergência de uma democracia dialógica. Formas de manipulação podem se manifestar tais como, ouvir a comunidade para antecipar reações, deixar as pessoas falarem, mas não considerar suas opiniões nas tomadas de decisões. Utilizar o debate para legitimar uma decisão “é uma questão de levar as pessoas a falarem, a fim de silenciá-las de forma mais eficaz” (CALLON, 2010, p. 155).

Considerando a escola um espaço formador, os educadores devem ser os primeiros a resistir ao silenciamento dos grupos envolvidos na escola. Uma reflexão importante é pensar em até que ponto a comunidade é convidada para se expressar, compartilhar seus pontos de vista e negociar? E, ainda, quais critérios estão sendo utilizados na elaboração do PPP e se eles restringem a entrada destes grupos no debate.

Questões importantes devem ser consideradas: que grupos são incentivados a participar das discussões e compor o coletivo da escola? Os pais, o Conselho Escolar, os alunos? Qual a constituição deste coletivo e a intensidade da participação? Com que frequência e ocasiões são chamados? Até que ponto, os grupos com acesso a discussão têm o poder de modificar ou propor mudanças na escola?

Não basta, portanto, mobilizar os grupos para participarem de reuniões pontuais. A comunidade deve ser ouvida e perceber que o seu papel será ativo na discussão sobre os rumos da escola.

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Se em todo debate é, na verdade, permeado por assimetrias, geralmente transmitidas e reforçadas pelos ranços da democracia representativa e delegativa, na escola, nenhum segmento deve monopolizar a discussão.

É preciso mobilizar tempo, dinheiro e formação para estruturação de coletivos em que a democracia dialógica seja estabelecida, para que “as vozes fracas sejam capazes de fazer-se ouvir, e o mais rapidamente possível, para que possam ser dadas a possibilidade de terem um papel ativo na composição do coletivo”. Callon et tal (2010) aponta quatro critérios de implementação do debate na democracia dialógica ou participativa: Formação: igualdade no acesso ao debate (1), Transparência durante o processo (2) e Clareza das regras (3).

Sobre o critério Formação: igualdade de acesso ao debate, para que os atores possam entrar, de fato, no espaço público, mediadores e facilitadores de debates tem o papel de facilitar e traduzir os temas discutidos. Isso é necessário, pois pais, mães e alunos devem entender os temas do PPP (currículo, avaliação, organização, etc) para fazerem suas escolhas. Não basta, portanto, garantir um quórum da reunião, a igualdade de acesso pressupõe o entendimento das questões discutidas e ações como criar uma palestra ou oficinas para esclarecimentos são necessárias.

A transparência durante o processo é possibilitada com o registro das contribuições e das posições tomadas, de forma escrita (por atas) ou com um vídeo. Assim será possível reconstruir a riqueza dialógica de um debate e acompanhar as diferentes vozes envolvidas. Para evitar manipulações, o que necessariamente beneficia os mais fortes do processo, as diferentes ações e operações que se concretizaram devem ser conhecidas antecipadamente por todos os participantes. Este terceiro critério é a da Clareza (e publicidade) das regras do jogo. O acordo sobre como proceder não deve deixar nenhum ponto obscuro e, uma vez obtido, é um compromisso firme; não deve haver nenhuma questão que faça voltar com as regras acordadas entre as partes envolvidas (CALLON et tal, 2010, p. 163).

A gestão democrática é um princípio consagrado pela Constituição vigente e abrange as dimensões pedagógica, administrativa e financeira. Tornar o espaço escolar realmente

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público exige uma ruptura histórica na prática administrativa da escola, que inclui a implementação de procedimentos que favoreçam o acesso da comunidade escolar e a sua inclusão nas discussões sobre o Projeto Político Pedagógico.

A criação de fóruns na escola considerando os critérios de igualdade de acesso, transparência e clareza, possibilita a ampliação da participação dos representantes dos diferentes segmentos da escola nas decisões/ações administrativo-pedagógicas ali desenvolvidas.

Conselhos escolares: criação e fortalecimentoAs origens atribuídas aos conselhos populares são muitas,

sua origem e natureza são diversificadas, todavia, é possível afirmar que são fruto de longa construção histórica. A história de sua construção se confunde com a história da democracia e da política. Tais conselhos exerciam a democracia direta com um papel de realizar a representação de grupos como estratégia para solucionar tensões e conflitos resultantes das diferenças de interesses. Os papéis, formas de organização e funções atribuídas aos conselhos são diversos, no entanto, na sua origem radica sempre o desejo de participação na formulação e na gestão das políticas públicas.

A concepção dos conselhos no Brasil se instituiu com forte influência das cortes europeias, que, no regime monárquico, concebiam o Estado, como “coisa do Rei”. Mesmo com o advento da República (Res publica – expressão latina que significa coisa do povo, coisa pública), a gestão da “coisa pública” continuou fortemente marcada por uma concepção patrimonialista de Estado. Essa concepção, que situava o Estado como pertencente à autoridade e instituía uma burocracia baseada na obediência à vontade superior, levou à adoção de conselhos constituídos por “notáveis”, pessoas dotadas de saber erudito, letrados. Era comum que os conselhos de governo, compostos pelos letrados, eruditos e notáveis servissem aos governantes. Naquele tempo, e até recentemente, o saber popular não oferecia utilidade à gestão da “coisa pública”. Esta pertencia aos “donos do poder”, e se serviam dos “donos do saber” para administrá-la, discutir e deliberar sobre as coisas e bens comuns.

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Até a década de 1980 predominaram, no Brasil, os conselhos de notáveis. O critério de escolha de seus representantes era sempre o “notório saber”, os conselhos tinham caráter governamental, de âmbito estadual e nacional, especialmente nas áreas de educação, saúde, cultura e assistência social. Uma das principais atribuições desses conselhos era assessorar o governo na formulação de políticas públicas, mas assumiam um caráter técnico especializado e sua atuação se concentrava nas questões da normatização dos respectivos sistemas (BRASÍLIA, 2004, p. 16). Após a década de 1980, com o fim da ditadura no país e com a redemocratização os movimentos populares passaram a exigir maior participação na gestão pública. Os grupos e movimentos populares existentes, até então. tinham um caráter combativo e de enfrentamento ao Estado. Segundo Gohn (2000), enquanto, nos anos 1970, existia consenso de que se deveria criar um contrapoder ao Estado, um poder popular e independente, nos anos 1980, com a redemocratização, os movimentos passaram a ser interlocutores do Estado. Ou seja, de contestadores do poder, passam a parceiros e interlocutores na medida em que oferecem novas possibilidades de construção da democracia no país e passam a ocupar espaços de representação nas instâncias de discussão e deliberação sobre a “coisa pública”.

Atualmente, na sociedade complexa (VELHO, 1999) e com o processo de democratização do público há a imposição e ampliação dos mecanismos de gestão das políticas públicas. Com a criação das políticas setoriais cuja definição é discutida em conselhos próprios e com abrangência variada: unidades da federação, programas de governo, redes associativas populares e categorias institucionais (BRASÍLIA, 2004, p. 19). A participação comunitária se inseriu, efetivamente, nos debates da Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988) que geraram a institucionalização de conselhos gestores de políticas públicas no Brasil. Tais conselhos têm caráter de ação política, aliam o saber erudito com o saber popular, por meio das representações das categorias sociais de base.

Como expressão de uma nova institucionalidade cidadã, nascem os conselhos de gestão de políticas públicas setoriais, caracterizados como conselhos de cidadania, sociais ou populares. A participação cidadã nesses espaços marca a construção de um novo projeto de sociedade que concebe o Estado como patrimônio

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comum e a serviço dos cidadãos. Hoje os conselhos representam uma estratégia privilegiada de gestão e de democratização das ações do Estado e expressão da sociedade organizada. Como espaços de interface entre Estado e sociedade os conselhos têm função mediadora e assumem uma nova institucionalidade.

Nos espaços da federação temos conselhos municipais, estaduais ou nacionais, responsáveis pelas políticas setoriais nas áreas da educação, da saúde, da cultura, do trabalho, dos esportes, da assistência social, da previdência social, do meio ambiente, da ciência e tecnologia, da defesa dos direitos da pessoa humana, de desenvolvimento urbano. Em diversas áreas há conselhos atendendo a categorias sociais ou programas específicos” (BRASÍLIA, 2004, p. 19).

Neste contexto foram também organizados os conselhos de educação, que fazem parte do sistema de ensino formalmente estabelecido pela Constituição (1988) e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996). Cury (2000) explica o conceito de conselho a partir da origem etimológica do termo:

Conselho vem do latim Consilium. Por sua vez, consilium provém do verbo consulo/consulere, significando tanto ouvir alguém quanto submeter algo a uma deliberação de alguém, após uma ponderação refletida, prudente e de bom-senso. Trata-se, pois, de um verbo cujos significados postulam a via de mão dupla: ouvir e ser ouvido. Obviamente a recíproca audição se compõe com o ver e ser visto e, assim sendo, quando um Conselho participa dos destinos de uma sociedade ou de partes destes, o próprio verbo consulere já contém um princípio de publicidade (CURY, 2000, p. 47).

Desta forma, Cury nos auxilia a compreender um conselho de educação como uma instância de representação que fala diretamente ao governo em nome da sociedade, utilizando-se de pareceres e de deliberações, em defesa dos direitos educacionais da cidadania fundados na reflexão ponderada pela discussão democrática, prudente e a favor da coletividade. Os conselhos de educação se inserem na estrutura dos sistemas de ensino como mecanismos de gestão colegiada, para tornar presente a expressão da vontade da sociedade na formulação das políticas e das normas

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educacionais e nas decisões dos dirigentes. Além dos conselhos existentes nos espaços da federação, como os conselhos municipais, estaduais e federal de educação, há também os conselhos escolares, que se constituem como estratégia da gestão democrática de cada unidade pública escolar. A LDB atribui à União a responsabilidade de coordenar a política nacional de educação e busca respeitar a autonomia das unidades federadas afirmando que “os sistemas de ensino terão liberdade de organização” (art. 8º), ao mesmo tempo estabelece um princípio e duas diretrizes, nos arts. 14 e 15 para a implantação da gestão democrática:

Art. 14º. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I- participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II- participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. Art. 15º. Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público (LDB, 1996).

Assim, observa-se que está assegurado que as unidades escolares garantam a participação dos profissionais e da comunidade escolar como estratégia da gestão democrática e instrumento de tomada de decisão. O conselho escolar traz consigo a função de ser a voz e o voto dos diferentes atores da escola, internos e externos, desde os diferentes pontos de vista, deliberando sobre a construção e a gestão de seu projeto político-pedagógico.

Dentre esses atores a participação das famílias na educação formal dos estudantes pode ir muito além do acompanhamento de boletins e de conversas com professores. O envolvimento direto dos pais no dia a dia da escola, acompanhando questões ligadas à administração e ao ensino, pode ser vital para a melhoria da educação - e os conselhos escolares são formas legítimas de participação e deliberação, inclusive sobre questões sobre financiamento.  Assim como a participação do corpo docente também não deve se restringir às ações do processo educativo

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desenvolvidas dentro da sala de aula. O professor precisa compreender o processo democrático de aprendizagem na troca de conhecimentos que efetivamente se constrói na prática do cotidiano escolar entre os pares, a comunidade, a família e os estudantes.

A articulação do conselho escolar e da gestão da escola é fundamental para o funcionamento e organização de cada unidade pública de ensino. O conselho escolar é um instrumento eficaz e eficiente na busca da gestão democrática, uma vez que tem na sua composição representantes dos estudantes, dos docentes, dos funcionários, da direção, moradores do entorno da escola e das organizações que já existem na comunidade. Não é um órgão autônomo e externo à escola que vem para criticá-la, mas ele é um instrumento que faz parte da escola, faz parte de seu funcionamento. Tem a função de fazer um acompanhamento responsável de todo o processo educativo, que abrange desde o aspecto pedagógico até o burocrático.

Assim, penetramos no campo de organização do cotidiano escolar. Ao permitir a participação das diferentes partes envolvidas no processo educativo o conselho escolar busca compreender e descortinar a rede de relações existentes nesse espaço que se apresenta como relevantes fontes de renovação do ensino ao evidenciar convergências, rupturas e conflitos presentes no interior da escola. O debate e a transparência das ações auxiliam em uma análise qualitativa do processo educativo que favorece a compreensão das tensões inerentes a uma sociedade capitalista, como a nossa, que vive em constante transformação, onde os grupos sociais são mutáveis, as instituições, leis e visões de mundo são provisórias e passageiras.

Assim, para dar conta desta sociedade que valoriza e reivindica a participação e enfrentando o desafio de consolidação e fortalecimento dos conselhos o governo federal criou o Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. O Programa tem por objetivo fomentar a implantação e o fortalecimento dos Conselhos Escolares, por meio da elaboração de material didático específico e formação continuada, presencial e a distância. Os beneficiários diretos do Programa são: técnicos das secretarias estaduais e municipais de educação e conselheiros

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escolares, de acordo com as necessidades dos sistemas de ensino, das políticas educacionais, e profissionais de educação envolvidos com gestão democrática.

Diante da realidade atual e da organização em que se encontram as escolas, não são raras as experiências nas quais os conselhos escolares são praticamente inexistentes – existem como uma formalidade, mas não funcionam, efetivamente, como uma estratégia de gestão democrática. Essa afirmação pode ser evidenciada no curso de Gestão da Educação Básica, ministrado pela Escola de Gestores da Universidade Federal de Ouro Preto, que nos trabalhos e discussões realizados pelos alunos (gestores escolares) afirmam, em muitos casos, não haver um conselho escolar efetivo e atuante.

Desta forma, o governo federal considera necessário o investimento na indução da criação e fortalecimento dessas instâncias para atingir os objetivos propostos pelo Programa, quais sejam: a) Ampliar a participação das comunidades escolar e local na gestão administrativa, financeira e pedagógica das escolas públicas; b) Apoiar a implantação e o fortalecimento de conselhos escolares; c) Instituir, em regime de colaboração com os sistemas de ensino, políticas de implantação e fortalecimento de conselhos escolares; d) Promover em parceria com os sistemas de ensino a capacitação de conselheiros escolares; e) Estimular a integração entre os conselhos escolares; f) Apoiar os conselhos escolares na construção coletiva de um projeto educacional no âmbito da escola, em consonância com o processo de democratização da sociedade; g) Promover a cultura do monitoramento e avaliação no âmbito das escolas, para a garantia da qualidade da educação.

Tal iniciativa avança no sentido que Paulo Freire (2002) afirma:

Tudo o que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem, de tomarem um pouco o destino da escola na mão, também. Tudo o que a gente puder fazer nesse sentido é pouco ainda, considerando o trabalho imenso que se põe diante de nós, que é o de assumir esse país democraticamente (FREIRE, 2002).

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Assumir democraticamente o país significa participar ativamente da construção da sociedade, tomando conhecimento das decisões tomadas pelos representantes populares e fazendo parte do processo decisório participando das instâncias de discussão e deliberação, que no âmbito educacional são os conselhos escolares presentes em cada unidade de ensino. A escola é o espaço privilegiado de exercício da vida cidadã. A participação nestes espaços faz parte do processo de produção de nossa própria existência e visa a qualidade da educação e da inclusão universal, como preconizado no Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. A educação é socialmente referenciada quando beneficia a todos e não promove alguns e discrimina a maioria (BRASÍLIA, 2006).

Desafios da gestão escolar: integração família e comunidade escolar

Ao longo da história a soberania do Estado suscitou diversas desigualdades sociais, políticas e educacionais. Sendo compreendido como uma organização política regulamentadora, coercitiva e de controlo social de um determinado território. O Estado sofreu mutações particulares na transição para a modernidade referente à sua configuração, natureza e funções:

[...] o Estado tem já uma longa duração histórica. Tendo isso em conta, e não esquecendo que só poderá ser bem caracterizado por referência às mutações particulares que foram ocorrendo na sua configuração, natureza e funções,o Estado será aqui genericamente entendido como a organização política que, a partir de um determinado momento histórico, conquista, afirma e mantém a soberania sobre um determinado território, aí exercendo, entre outras, as funções de regulação, coerção e controlo social – funções essas também mutáveis e com configurações específicas, e tornando-se, já na transição para a modernidade, gradualmente indispensáveis ao funcionamento, expansão e consolidação do sistema econômico capitalista [...] (AFONSO, 2001, p. 17).

Nesse contexto, os pressupostos do sistema de ensino estiveram ajustados a uma estrutura burocrática e centralizadora de poder. Desta forma, o domínio decisório esteve limitado às esferas

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governamentais que determinavam as ações administrativas e pedagógicas que ocorriam nas escolas. Competia a escolas à tarefa de executar tais programas e projetos de administração, independente das necessidades política, econômica, cultural e social da comunidade escolar.

Na modernidade as perspectivas em desenvolvimento visam viabilizar o processo de democratização, por meio da educação. Sendo essa, a base para o exercício da cidadania e identidade de uma nação de sucesso.

Segundo Veiga (1998), a escola deve ser o lugar de concepção, realização e avaliação de seu projeto educativo, dessa forma, necessita autonomia para organizar seu trabalho administrativo e pedagógico. Este deve ter como base as necessidades da comunidade escolar e o fortalecimento das relações entre escola e sistema de ensino.

Há décadas os diversos segmentos da sociedade vêm reivindicando a democratização da educação pública e de qualidade. Esse movimento se intensificou na década de 80. A constituição federal de 1988 estabeleceu à educação brasileira, os princípios de obrigatoriedade, gratuidade, liberdade e igualdade. Sendo direito garantidas as crianças, conforme determina a lei no art.4°.

...é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a afetivação dos direitos á vida, á saúde, á alimentação, á alimentação, á educação, ao esporte, ao lazer, á profissionalização, á cultura, á dignidade, ao respeito, á liberdade, á convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1998).

Como reflexo das diversas lutas e dos movimentos na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96, a gestão escolar passa a adotar uma postura mais democrática. Dentro disso, abre-se espaço para a integração entre família e escola, na solução dos problemas e processos de aprendizagem em conformidade com as necessidades da escola.

A LDB destaca que os profissionais da educação são os responsáveis pelos processos de aprendizagem e ressalva a ação integrada entre escola e famílias. Assim, expressa em seus artigos:

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Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: (...) VI – articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; (...) Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:(...) VI – colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade.Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:[..] II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes (BRASIL, 1994).

Nos artigos dessa lei fica instituído que os estabelecimentos de ensino, promovam a articulação com as famílias, a fim de criar processos de integração entre sociedade e escola. Da mesma forma, o artigo 13 da LDB, ressalta que as atividades propostas pelos docentes, estejam em conformidade com a articulação entre a escola, as famílias e a comunidade.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece o dever da comunidade, sociedade e poder público em assegurar o direito à educação:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude (BRASIL, 1990).

Ressalta ainda, a necessidade da parceria família/escola e determina as obrigatoriedades dos pais em matricular os filhos nas escolas, assim como, o direito de participar das propostas educacionais:

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Capítulo IV – Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer.Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de:I – maus-tratos envolvendo seus alunos;II – reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares;III – elevados níveis de repetência (BRASIL, 1990).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), anunciam e aferem a educação das crianças e dos adolescentes como uma ação unificada dos agentes escolares e pais ou responsáveis. Esse novo ambiente jurídico-institucional estabelece um período de solidificação de direitos individuais e sociais dos alunos e suas famílias.

Nesse contexto, uma organização escolar funciona por meio da cooperação. Esse diálogo deve ser fundamentado nos esforços de todos os envolvidos no sistema educacional, o que abrange escola, professores, especialistas, família, sociedade e alunos.

Refletir sobre a função social da educação e da escola, envolve a problematização da escola que temos, na tentativa de viabilizar a escola que desejamos. Nesse sentido, é fundamental a articulação entre todas as partes da escola, a criação de espaços em que seja viabilizada a participação de todos no exercício do jogo democrático (DOURADO; MORAES; OLIVEIRA apud SILVA, 2006, p. 3). Isso envolve a contribuição de vários segmentos da comunidade escolar: professores, pais, estudantes, funcionários, família e toda a comunidade escolar. O objetivo dessa parceria é a construção e avaliação dos projetos pedagógicos, na administração dos recursos da escola, nos processos decisórios e na consolidação de um projeto de gestão democrática na escola (OLIVEIRA; MORAES; DOURADO, 2006, p. 3).

Para Regattieri e Castro (2009), o processo escola/família não deve compreender somente a negociação ou cobrança de

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responsabilidades das famílias. Para tal, torna-se imprescindível que os sistemas de ensino e escolas compreendam as condições das famílias dos alunos. Ignorar esse cuidado, na etapa inicial, pode provocar desencontros e não aceitação dos familiares aos projetos de aproximação da escola. Essa integração é um requisito importante para alcançar a melhoria no processo ensino-aprendizagem.

Segundo Paro (2003) a convivência humana motiva no aluno o desejo de aprender. Sucinta um acordo entre o educando, observados e estimulados a serem sujeitos da própria aprendizagem. Da mesma maneira, trazer os familiares para o convívio da escola, apresenta-lhes a importância da sua participação e compromisso com a vida escolar do aluno. O que leva a uma escola pública em conformidade com os seus interesses de cidadãos.

A escola tem o dever de incentivar a participação e o engajamento da família/comunidade nos projetos da instituição, assim como, reconhecer a importância do auxílio da família no projeto escolar. Essa acolhida gera o exercício do seu papel da família na educação, no desenvolvimento e sucesso profissional de seus filhos e na transformação da sociedade. Sendo a escola o espaço privilegiado para o desenvolvimento das ideias, crenças e valores. Deve ir além da apreensão de conteúdos e buscar a formação de cidadãos críticos e agentes de transformação (POLÔNIA E DESSEN, 2005, p. 303-312).

Segundo Paro (1997, p. 30), a escola precisa oportunizar o contato com os pais, a fim de passar informaçoes importantes sobre os objetivos, recursos, problemas e questões pedagógicas. Desta forma, a família assimila o comprometimento com a melhoria da qualidade escolar e desenvolvimento humano do seu filho.

Sendo assim, o intuito deste tópico foi compreender, por meio do levantamento bibliográfico, as demandas dos Gestores escolares em viabilizar propostas de intervenção, que aproxime as famílias dos alunos à comunidade escolar. Esse estudo indica que a família/escola representam instituições do desevolvimento humano, que necessitam de uma maior aproximação de particularidades e similaridades, visando à superação dos desafios apresentados no contexto educacional. Essa aproximação pode atuar de forma progressiva no crescimento físico, intelectual e social do cidadão, na medida que compartilha funções sociais, políticas e educacionais de influencia direta na formação do cidadão.

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Considerações finaisA Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/94),

em seu artigo 12, inciso I, prevê que “os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica”. Este inciso redimensiona o conceito de escola e explicita que está nas mãos dos sujeitos que fazem a escola definir a organização do seu trabalho pedagógico. Está clara a ideia de que a escola não pode prescindir da reflexão sobre sua intencionalidade educativa (visão de mundo, de homem, de conhecimento, de escola, de processo ensino-aprendizagem, de relação professor-aluno e de avaliação).

A escola como parte integrante da sociedade, tendo em conta a função social da escola pública e seu papel formador, precisa refletir sobre sua prática pedagógica, revendo suas posturas e objetivos e buscar, coletiva e colaborativamente a sua reestruturação perante as novas demandas e sob a luz da legislação e da normatividade.

Este capítulo abordou sobre os principais temas tratados e implementados nos projetos-intervenção no contexto do curso de Especialização em Gestão Escolar, nos Polos de Guaxupé, Ipatinga e Ubá, dentre eles a elaboração e/ou reelaboração do PPP da escola, a criação e fortalecimento do Conselho escolar e a integração família e comunidade escolar, com foco na formação de novas relações e poder de decisão no espaço escolar.

O Projeto Político Pedagógico torna-se elemento fundamental para a escola por ser norteador da organização de ações, visando ao sucesso do ensino-aprendizagem, finalidade maior da escola como instituição social. É um instrumento orientador de toda a dinâmica de funcionamento do contexto escolar. Neste sentido, as pessoas envolvidas em tal contexto, necessariamente, precisam participar de todo o seu processo de construção e (re)construção permanente, pois, o seu processo de redimensionamento perpassa por várias situações que podem ser de natureza harmônica como também conflituosa e que implica em redefinições constantes.

Nesse âmbito, o projeto político pedagógico se configura no objeto prioritário de atenção, estudo, elaboração e permanente reconstrução. Ações precisam ser criadas e discutidas coletivamente

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para que sejam superados os problemas que afligem a realidade cotidiana das escolas. Portanto, cabe ao gestor escolar, envolver procedimentos que contemplem em direção a construção do PPP, buscando democraticamente desenvolver um trabalho coletivo que se volte para as questões sociais.

Algumas estratégias são indicadas para envolver a comunidade escolar na discussão dos rumos da escola, favorecendo assim, ambientes de diálogo colaborativo com participação efetiva da comunidade: A criação de fóruns de debate na escola considerando os critérios de igualdade de acesso ao debate, transparência durante o processo e clareza das regras, possibilita a ampliação da participação dos representantes dos diferentes segmentos da escola nas decisões/ações administrativo-pedagógicas ali desenvolvidas.

A criação e o fortalecimento do conselho escolar e da gestão da escola é outro quesito fundamental para o funcionamento e organização de cada unidade pública de ensino. O conselho escolar dá voz e voto aos diferentes atores da escola, estudantes, docentes, funcionários administrativos, gestores, pais, moradores do entorno da escola e das organizações que já existem na comunidade, deliberando sobre a construção e a gestão de seu projeto político-pedagógico. Dessa forma, o conselho escolar é um instrumento eficaz e eficiente na busca da gestão democrática e instrumento de tomada de decisão.

É importante também, reconhecer a importância do auxílio da família no projeto escolar e incentivar a participação e o envolvimento da família/comunidade nos projetos da instituição, tornando oportuna a transformação da realidade escolar e o desenvolvimento da educação para a cidadania.

Sabemos que a gestão democrática participativa na escola está diretamente relacionada com a qualidade da educação. Na prática, a construção da democracia na escola é uma construção coletiva, que presume mudança na forma de conceber os objetivos e fins da educação, as relações que se estabelecem no contexto escolar e a função da escola enquanto instituição social. Portanto, a participação de todos os envolvidos no processo educacional é de fundamental importância para que de fato a escola seja democrática, que colabore para a formação integral do indivíduo, com uma visão global da realidade, na perspectiva da pluralidade cultural brasileira.

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Planejamento: trabalho pedagógico e currículo em EaD

Maria Aparecida da Silva

IntroduçãoA Educação a Distância (EaD), modalidade de educação que

é viabilizada por meio de novas tecnologias da informação e da comunicação, em que professores e alunos estão separados fisicamente no espaço e/ou tempo, porém em estreita relação com os propósitos que ambos têm em relação ao processo educacional. Esta modalidade, também, é constituída com força nos pós-movimentos sociais dos anos 70-80 do século passado, motivada pela demanda por educação por parte da classe trabalhadora.

Vale lembrar que os movimentos sociais do final dos anos 601, o esgotamento do modelo taylorista-fordista de produção, a crise da economia capitalista dos anos 70, houve a necessidade de replanejamento da economia para superar a crise, por meio de um processo que culmina com a implantação do neoliberalismo e da reestruturação do modo de produção, com a adoção de técnicas do que ficou denominado de modelo toytista de produção. As mudanças que já vinha se processando em outras partes do mundo têm início, também, no Brasil, por volta do final dos anos 90, ou seja, a implantação do neoliberalismo, com o Governo Collor, e reestruturação das formas de organização do trabalho. Devido ao incremento de novas tecnologias no processo produtivo decorrentes da implantação do modelo toyotista, ao desemprego em massa, por um lado, e, por outro lado, a necessidade de trabalhadores com maior qualificação, não só para operar com as novas tecnologias, devido ao aumento intensivo destas nas empresas e na sociedade em geral, mas também porque novas exigências intelectuais eram exigidas do trabalhador, tais como capacidade de preditiva, criatividade,

1 Que ficou marcado, pelo ano de 1968, na expressão de Zuenir Ventura, o ano que não terminou.

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compreensão dos mecanismos operacionais, aprendizado de trabalho em equipe, entre outros.

O aumento da consciência e da demanda por educação, nos pós-movimentos sociais dos anos 70-80 do século passado, a crise econômica dos anos 70 do século passado, a reestruturação produtiva, o aumento populacional são fatores importantes de serem destacados. Se, de um lado, houve aumento da consciência dos trabalhadores, a partir dos movimentos sociais de seu direito à apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos, de outro, as exigências do mundo do trabalho exerceram pressão sobre as instituições educativas por mudanças na forma de educar os alunos para fazer frente às mudanças nos processos produtivos, que passam a exigir trabalhos em equipe, participação em reuniões denominadas Círculos de Controle da Qualidade (CCQs), entre outras, e a operação de equipamentos eletrônicos de alto custo e complexidade. Entra em cena o planejamento participativo, o discurso da sociedade do conhecimento, o discurso das competências, o discurso da inclusão, entre outros.

Diante da necessidade de permitir o acesso ao sistema educacional por parte das pessoas que moram longe das universidades, ou não têm condições de frequentarem aulas, nos horários fixados pelas instituições educativas, entra em cena a Educação a Distância, com uso de novas tecnologias da informação e da comunicação que, cada vez mais, tende a ser incrementada nas escolas de diversos níveis e em setores governamentais e empresariais. Não se propõe, neste texto, entrar no mérito de discussões sobre as implicações para o trabalho docente, embora se reconheça estas decorrências, tampouco, polemizar sobre as propriedades e características da educação a distância e da educação presencial suas vantagens e tensões, que são temas pertinentes, mas fogem ao objetivo deste texto, que visa focalizar o processo da ação-reflexão–ação sobre o planejamento, gestão, projeto pedagógico e currículo.

Após expor em linhas gerias os antecedentes, o presente texto volta-se ao seu foco, qual seja planejamento: trabalho pedagógico e currículo em EaD.

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Planejamento escolar participativo: Gestão Escolar, Projeto Pedagógico e Currículo sob o trinômio reflexão-ação-reflexãoAntecedentes

No Brasil, a passagem das tradicionais designações de administração escolar e administração da educação para as denominações de gestão escolar e gestão da educação têm como marco os movimentos sociais, com destaque para os movimentos dos trabalhadores da educação, pela democratização política e social do País, do final da década de 1970 e da década de 1980 (SILVA, 1994). No bojo desses movimentos, criou-se novas formas de organização e intervenção na sociedade e, de modo específico, no espaço escolar, baseadas em princípios da participação cidadã como estratégia de ação humana coletiva. Houve, por parte de políticos progressistas, a assimilação e recuperação dessas bandeiras de lutas dos movimentos sociais, dando origem ao conceito de gestão democrática, consagrado na Constituição Republicana de 1988. Como decorrência da institucionalização do conceito, tanto nas academias como nas escolas de educação básica, houve uma indução no processo de definir novas formas de pensar a gestão, o projeto pedagógico e o currículo. De acordo com o levantamento de Souza (2006) sobre os estudos de administração escolar no Brasil entre 1981 e 2001, os registros mostram que os temas de gestão democrática e de conselhos de escola respondem por 48% dos trabalhos na área, quase todos realizados na década de 1990. Vale lembrar que, além destes, numerosos artigos em periódicos especializados, bem como obras individuais sobre gestão democrática foram publicadas no Brasil depois de 1988, o que coincide com o ano da aprovação da Constituição brasileira de 1988.

No Brasil, a definição de que a escola deve elaborar o seu projeto pedagógico de forma participada aparece na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996) – que em seu art. 14º estabelece:

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Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:I. Participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola;II. Participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

Considerando-se a indissociablidade entre Projeto Pedagógico e Currículo e, ainda, considerando que o currículo está no centro de toda reforma educacional; Este campo de estudo, também, se renovou e novas temáticas emergiram como expressão dos movimentos afirmativos na sociedade, tais como currículo e questão de gênero, currículo e cultura, currículo e etnia, de modo a dar voz e poder aos grupos que constituem minoria nas escolas.

Lugar da organização escolar, da gestão e do planejamento

Tratar a escola como uma organização implica focalizar a escola em seu funcionamento interno e nas relações que mantêm com o entorno – do mais próximo (comunidade, bairro, cidade) – ao mais longínquo – a sociedade (País, mundo), sem perder a especificidade do trabalho que aí se realiza – a Educação. Tal enfoque implica na necessidade de tratar reflexivamente o trabalho que aí se desenvolve. Neste sentido, há necessidade de cautela, porque a tradição vem cada vez marcando o tratamento a partir de variáveis econômicas e empresariais, expressos apenas em índices a partir de avaliações estritamente quantitativas, esquecendo-se da especificidade do trabalho educativo, que tem uma dimensão qualitativa, que é inerente ao tipo de organização – organização escolar.

Neste texto, ainda que se considere importante cada dimensão, o que pressupõe não negá-los, foge-se dos enfoques extremos que ora priorizam a percepção da escola por seus índices, ora a focalizam em relação à função socioeconômica. Pretende-se focalizar a ação da gestão escolar nos aspectos que podem sofrer intervenção dos sujeitos que a compõe – direção, especialistas da educação, professores, alunos – em diálogo com membros da sociedade.

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Parte-se do pressuposto de que, mesmo sob as condições mais intensas de controle, os homens podem modificar, transformar e revolucionar suas condições de trabalho. Tem-se presente que as circunstâncias sob as quais os homens podem agir são legadas do passado e não se parte do zero, mas do patamar em que se encontra rumo ao futuro que se deseja construir. Nestas circunstâncias, aparecem tanto o peso da tradição de gerações passadas, que oprimem e cerceiam possibilidades de mudanças, quanto o desejo da mudança, expresso nas forças emergentes que anseiam pelo novo na instituição.

Não se trata de apresentar fórmulas mágicas de transformações, mas, na vivência diária, os gestores escolares necessitam estar atentos às formas sutis e não sutis que emergem e gritam pelas mudanças nas organizações, bem como àquelas que se empenham na perpetuação de estruturas, ritos e práticas de dominação, de exclusão, de poder e de imposição de visão de mundo e de modo de agir nas organizações tendo em vista o projeto pedagógico que defendem. Cabe ao gestor administrar estes conflitos de modo da tensão e embate de visões antagônicas haja superação e algo novo impulsione a instituição em direção ao futuro.

Ao tratarmos da organização escolar, algumas questões vêm à tona. Qual a força educativa da organização escolar? Que tipo de atmosfera circula nessa organização? Como o cotidiano da escola por sua organização afeta a vida dos alunos e dos profissionais da educação? De que maneira os diversos profissionais da educação, de modo particular o Gestor Escolar, orientam-se e agem neste ambiente?

Cada escola tem sua história, que é feita pelos agentes que nela atuam ou nela interferem. A experiência que se vivencia no dia a dia da escola deixa profundas marcas na história de vida dos alunos, bem como na dos profissionais da educação que nela atuam. Por meio do tipo de organização escolar (mais ou menos hierarquizada – mais ou menos complexa) e das atividades cotidianas que nela são vivenciadas, os alunos internalizam um conjunto de valores e normas que contribuem ou para sua sujeição nas relações sociais ou para sua emancipação frente aos desafios que se colocam na vida social.

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As normas e valores guardam relação estreita com a sociedade da qual faz parte e que desempenha papel importante na preservação das desigualdades, na sua diminuição ou na sua eliminação. Como a estrutura e ação humana não se voltam apenas para reproduzir a lógica da dominação, mas, também, para a mediação e a resistência e a luta contra a opressão, pode-se dizer que a organização escolar, também, pode propiciar um ambiente onde os agentes que nela atuam busquem aprender a eliminar os aspectos repressivos e alienantes e, ao mesmo tempo, aprendam a vivenciar experiências emancipadoras.

A escola, enquanto instituição social resulta da divisão do trabalho, situando-se como instituição formadora de seres humanos, ao lado de outras com funções específicas, tais como as instituições de saúde, de direito, entre outras. Ocupa na sociedade um lugar privilegiado, na medida em que forma pessoas para atuarem nas diferentes instituições sociais e para atuarem na própria escola. Produzida pela divisão do trabalho, a escola vivencia, também, no seu interior, o processo de divisão do trabalho. Tal processo passa pelas divisões em disciplinas do currículo, em funções técnicas, entre as quais se situa a Gestão Escolar.

A divisão do trabalho na escola e a consequente fragmentação das funções podem levar os profissionais da educação a perderem a dimensão global de seu trabalho. A saída consiste numa gestão compartilhada por meio do processo de planejamento e da definição do projeto pedagógico da escola.

O gestor escolar, visto como participante de um processo de planejamento participativo e co-autor de um projeto pedagógico junto com os demais profissionais da educação escolar deixa de ser um lugar no organograma, um burocrata de intermediação e controle, para ser aquele sujeito com ações solidárias e criativas, que atua junto com os demais profissionais, ajudando a equipe a formular e viabilizar um projeto coletivo na instituição.

Planejamento do trabalho pedagógico, do projeto político pedagógico e do currículo

A seção anterior tratou dos antecedentes das novas e complexas maneiras de pensar e, por conseguinte, novas maneiras de agir e de se situar no mundo, as quais exigem mudanças no tratamento das

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práticas de gestão escolar, do currículo e da gestão da sala de aula. Diversas são as razões para planejar, tais como: tomar de decisão sobre o que fazer para mudar os rumos da prática, verificar a adequação entre meios e fins, analisar e avaliar o que foi planejado e o que acontece na prática pedagógica e na sociedade. Todavia, a questão fundamental que se coloca é a da intencionalidade da educação: educar para que? Que homem se quer formar? Em outras palavras, de que formação humana se trata? A reflexão sobre o homem, por decorrência, sobre sua formação, também, por si só não basta, se não estiver articulada socialmente, pois ele é um ser no mundo.  Assim sendo, o tema educação sempre traz consigo a necessidade de discussão da sua tensa relação entre escola e sociedade. Educar para preservar as estruturas sociais? Educar para transformar a sociedade? Em que direção transformar? O que mudar e o que conservar?

Não se propõe responder a todas as questões de forma didática e na ordem como são colocadas. Neste tópico, pretende-se a partir de determinada visão de mundo, de sociedade, de papel da educação, da escola e do gestor escolar, tratar a organização escolar como passível de ser planejada, tendo como foco o currículo e as perspectivas sócio-institucionais da escola por meio de seu projeto pedagógico. Neste recorte, considera-se que a organização escolar por meio de sua gestão tem condições de tomar importantes decisões que respondam, pela prática, às questões colocadas no primeiro parágrafo deste tópico.

Toda organização escolar constrói histórica e socialmente sua cultura, que se denomina de cultura escolar. Por meios de processos contínuos de interação os membros de uma escola em relações sociais de produção constroem uma forma de agir que se reforça na medida em que vai tendo respostas afirmativas dentro dos parâmetros do que em cada instituição se convenciona considerar eficaz. Vale salientar que os termos eficaz, eficácia, eficiência merecem problematização, pois trazem subjacentes o sentido de quantitativo e tecnicista. Todavia, pode-se retomar a discussão por outro ângulo de análise, ou seja, a partir da auto-avaliação que a própria escola pode realizar em relação (i) aos seus objetivos, (ii) aos fundamentos pedagógicos que orientam sua prática, (iii) à cultura da instituição, (iv) à organização interna da escola e (v) o contato da

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escola com o exterior. Estes são aspectos fundamentais da cultura organizacional (THURLER, 1994). Para esta autora, uma cultura que se abra para o exterior, propicie e privilegie a comunicação, a cooperação, a concertação, a negociação e crie uma forte identidade profissional parece ser aquela que confere garantias para a realização do projeto pedagógico da escola. Neste sentido, a autora considera que é necessário refletir sobre o trabalho dos professores com os alunos, pois as estruturas, as regras, e práticas de gestão interferem no tempo e no espaço do processo educativo. Por isso mesmo, a autora considera que a gestão escolar e suas práticas são uma prática pedagógica (THURLER, 2006).

Segundo Thurler (2001), no capítulo I de seu livro, inovar no interior da escola, pode haver práticas que favorecem a mudança, não somente como resposta às circunstâncias excepcionais ou induzidas por autoridades, mas por auto-determinação do coletivo de professores para atingir um patamar desejado de desenvolvimento das práticas educativas. Neste caso, a mudança ocorre sem crises e pode progredir se as lógicas burocráticas e profissionais derem lugar a lógicas organizacionais flexíveis e adaptativas, capazes de considerarem a necessidade de autonomia acompanhada de responsabilidade coletiva e de desenvolvimento de um padrão de qualidade estabelecido pela instituição.

De acordo com esta perspectiva entra em cena o planejamento participativo e a eleição de áreas passíveis de serem planejadas. A construção de uma cultura escolar sensível e receptiva à mudança torna-se, para muitas escolas e sistemas escolares, importante prioridade que os gestores escolares têm que enfrentar, mas não o podem fazer sozinhos. Eles necessitam do aceite e da adesão dos demais profissionais.

Retomando a ideia de planejamento participativo, vale explicitar um dos seus pressupostos, qual seja a da emancipação dos sujeitos envolvidos no processo de planejar e a emancipação daqueles para quem a instituição-escola se organiza para atuar. Como toda palavra, a palavra participação, também, sofre modificações e é preciso explicitar de que tipo de participação se trata. Pode-se participar apenas para colaborar realizando tarefas de modo a serem executadas em tempo hábil e com mais eficiência. Neste caso, a participação é centrada na fase de execução do plano

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e pode ser denominado de planejamento participativo funcional. Outra possibilidade trata-se do planejamento das decisões, em que aspectos decisivos do para que, do por que e do como são colocados para todos decidirem. Neste caso, trata-se de um planejamento efetivamente participativo que leva à emancipação das pessoas envolvidas no processo2.Como afirma Saviani, o ato de planejar:

(...) se instaura a partir do momento em que seu agente [sujeito] antecipa mentalmente a finalidade da ação. Consequentemente, o trabalho não é qualquer tipo de atividade, mas uma ação adequada a finalidades. É, pois, uma ação intencional (SAVIANI, 1991, p. 19).

O trabalho do gestor não é um trabalho isolado. Trata-se de um trabalho junto ao trabalho docente e este se caracteriza por ser intencional, mas também por inserir os indivíduos no mundo no campo da cultura e da sociedade onde está imerso, via formação do homem e para o homem. Por conseguinte, é um trabalho que tem intencionalidade histórica, volta-se para o presente e para o futuro da sociedade. As práticas de gestão são, portanto, práticas sócio-históricas. Neste sentido, são práticas educativas.

O gestor, como planejador, ao antecipar ações em relação à dinâmica cultural em que está inserido as quais pretende, com os demais sujeitos do processo educativo – professores, especialistas e alunos – pode promover ações que busquem formação/educação desses mesmos indivíduos no conjunto de possibilidade sociais que cercam sua ação. Assim sendo, a gestão planejada não é somente educativa para os alunos, mas para todos os envolvidos no processo. Desse modo, pode-se dizer que a instituição-escola pode ser educativa, tanto mais quanto mais promova a capacidade das pessoas de se situarem no mundo e se desenvolverem. De fato,

Planejamento é um processo que se preocupa com o “para onde ir” e “quais as maneiras adequadas de chegar lá”, tendo em vista a situação presente e possibilidades futuras, para que o desenvolvimento atenda tanto as necessidades do desenvolvimento da sociedade, quanto às do indivíduo (COROACY, 1972, p. 79).

2 Para aprofundamento do conceito de participação, propõe-se a leitura do artigo.

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Pode-se concluir, então, que o planejamento educacional é um processo de análise das ações e intenções dos sujeitos – gestor, professores e especialistas da educação – que realizam o trabalho educacional com o intuito de aprimorar o processo de trabalho junto aos sujeitos que nos rodeiam – alunos – por meio de interações mediadas pelo desenvolvimento do currículo. Assim sendo, são tão educativas as práticas de planejamento da gestão quanto às práticas de planejamento do desenvolvimento do currículo e às de gestão da sala de aula, expressas no plano de ensino anual e no plano de aulas, plano de sequência didática sobre determinado tema e de cada aula.

Vale lembrar que, independente da circunstância em que ocorra, o ato de planejar é um ato político, porquanto decisório. Pressupõe-se fazer escolhas sobre os fins da ação planejada, opções sobre metodologias, estratégias e táticas que possibilitem o alcance dos fins a que se pretende. Neste sentido, pode se conceituar o planejamento como um processo de previsão de necessidades e racionalização de emprego de meios materiais e de recursos humanos disponíveis, a fim de alcançar objetivos concretos. Neste sentido, prazos são determinados, etapas são definidas, avaliações são feitas para verificar o andamento do processo segundo o previsto.

O planejamento não ocorre no vácuo, portanto, conhecimentos sobre a realidade e sobre os problemas a serem enfrentados são necessários de serem conhecidos. É o que se chama de avaliação diagnóstica ao planejamento. Igualmente, são necessárias informações do andamento do processo e das distorções que vão ocorrendo na prática, pois a realidade é mais dinâmica e complexa do que qualquer desenho teórico-metodológico que dela se faça. São as avaliações de processo durante as etapas do planejamento. Ao implantar um planejamento, isto é, ao colocar em prática o planejado, investimentos em termos de recursos materiais e recursos humanos têm que acontecer. Importa, portanto, verificar se estes recursos materiais e humanos estão sendo eficientes e se os resultados pretendidos estão sendo alcançados e, ao final e ao cabo da implantação torna-se necessário verificar em que medida os fins pretendidos foram alcançados, enfim, qual a eficácia do planejamento realizado e implantado.

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Decorre do exposto até aqui algumas indagações: Que dimensões da gestão são planejáveis? Onde se situa, no âmbito do planejamento educacional, o projeto pedagógico?

Planejamento no que se refere à gestão escolar significa definir, antecipadamente, uma nova forma de organização escolar, que modifique a realidade presente, pela sua forma de estruturar-se, organizar-se e funcionar, Isso significa, antes de tudo, partir da realidade presente. O primeiro aspecto a focalizar trata-se do foco para onde dirigir a ação do gestor. A organização escolar por sua gestão deve, antes de tudo, colocar-se a serviço do pedagógico e isto implica em dar atenção às seguintes ações, tão bem elencadas por Selma Garrido Pimenta (1995):

l compor turmas, turnos e horários adequados e critérios pedagógicos que favoreçam a aprendizagem;l prever capacitação em serviço e assistência didático-pedagógicos que favoreçam a aprendizagem;l definir equipes didático-pedagógicas (orientação pedagógica e educacional) de assessoria à atividade docente na escola;l assegurar horários para reuniões pedagógicas, abrindo espaço para a discussão sobre questões do ensino, para a troca de experiências, para o estudo sobre temas de Educação que favoreçam a melhoria da qualidade do trabalho docente;l articular as disciplinas do currículo de modo a assegurar conteúdos orgânicos;l acompanhar o rendimento dos alunos e prever formas de suprir possíveis requisitos, sem rebaixar o nível do ensino

Em face ao colocado por Pimenta (1995), acrescenta-se a necessidade de criação de infra-estruturas que proporcionem condições de trabalho pedagógico para docentes e discentes. Isso significa levar em conta o planejamento do uso e limpeza dos espaços físicos, da distribuição dos móveis e objetos e a ornamentação, tornando o ambiente de trabalho agradável. Uma gestão educacional preocupada com a inserção dos alunos na sociedade necessita estabelecer relações com a comunidade, assim sendo o planejamento de reuniões com pais e pessoas da comunidade têm que fazer parte das atividades de gestão. O inventário de recursos pedagógicos na comunidade e o planejamento de contatos para abertura de espaços

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para que os alunos aprendam além dos muros da escola, tais como museus, oficinas de trabalho, laboratórios, empresas, entre outros, podem ser inseridos como atividades da gestão.

Não se pretendeu elencar todas as dimensões planejáveis da gestão, mas apenas indicar focos passíveis de atuação intencional. É neste contexto que passamos a tocar na segunda questão anteriormente levantada qual seja: Onde se situa no âmbito do planejamento educacional, o projeto pedagógico?

Primeiro, faz-se necessário ir atrás da origem da palavra projeto. Do latim, Projecto, projectus é o particípio passado do verbo latino Projectare (CUNHA, 1982, p. 638), que significa lançar para diante, arremessar. Já Ferreira (s/d, p. 1153), coloca a ideia de “plano geral de edificação” Vê-se, assim, que intrínseco à origem e ao significado da palavra, está a indicação de movimento de algo em direção ao futuro que se pretende construir. Para construir é primeiro antecipar a construção no nível do ideal, sendo ideal aqui tomado como as possibilidades ideais da construção, ou seja, aquilo que ainda não se tem, mas que tem possibilidades de se ter de acordo com o desejo e as possibilidades. Como bem coloca Rios (1992, p. 75):

É no próprio real que se encontram as possibilidades de realização de algo ideal. Por isso, é na escola real, aquela de nosso cotidiano, que vamos buscar o possível daquela que se construirá. Entretanto, é necessário refletir sobre o que chamamos de possível, muito frequentemente ele é confundido com algo estático, já dado na situação vivenciado – “Estamos fazendo o possível”, é o que vamos ser afirmado. Ora, o possível não se encontra pronto: ele pode estar presente imediatamente na situação, mas também é construído a partir dela. Muitas vezes ele se encontra escondido “dentro da casca do impossível” como afirma o poeta³. Construir o possível significa explorar os limites, no sentido de reduzi-los, e as alternativas de ação, no sentido de ampliá-las.

O projeto pedagógico é um instrumento que permite ao trabalho docente tomar novos rumos ou outros rumos em face ao trabalho dos sujeitos envolvidos na ação educativa. Isso pressupõe primeiro sentir-se incomodado e inconformado com o existente, vislumbrar o que pode ser feito, verificar as possibilidades e as

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condições existentes, mas é preciso colocar a vontade em ação. Como afirma Gramsci3: “(...) a existência de condições objetivas – ou possibilidade ou liberdade – ainda não é suficiente: é necessário “conhecê-las’ e saber utilizá-las. Querer utilizá-las. Neste sentido,

(...) o projeto político-pedagógico da escola é um processo, um caminhar no cotidiano escolar inserido na realidade mais ampla que o tem como elemento constitutivo, a partir da socialização da discussão crítica de sua história, de sua singularidade, de suas realizações e fracassos, de suas potencialidades e dificuldades. Em resumo, o projeto político-pedagógico da escola é o processo instituinte permanente de uma nova instituição dentro do instituído (...) “O importante não é chegar a um plano acabado, mas é o processo constante de planejar (...)” (PEC, p. 46). E, nesse permanente planejar coletivo, as teorias, as concepções de escola, de espaço e de tempo escolares, de currículos, de relações intra e extra-classes, do instituído enfim, são temas recorrentes do processo instituinte. Em outras palavras, ao invés de o projeto político-pedagógico da escola se constituir numa estrutura, ele é antes um processo de estruturação: a partir do instituído, ele é um instrumento instituinte, por excelência; ou do ventre do velho existente nasce o novo possível, como dizia Karl Marx (ROMÃO, 1997, p. 123-124).

Sem necessidade de prometer um jardim de rosas, ter consciência das contradições existentes na realidade e das possibilidades de superação destas é motivo de esperança de que, em se criando condições, é possível mudar a realidade existente. Vale ressaltar que o colocar em prática a intenção de construir um projeto pedagógico pressupõe inserir-se em um campo de lutas entre as prescrições normativas que se impõe sobre o cotidiano escolar, muitas vezes, vindas de cima para baixo, e a premente necessidade de fazer surgir o novo – o instituinte. A autonomia, delegada por lei, para as escolas elaborarem seu projeto pedagógico esbarra nas estruturas organizadas e constituídas. O gestor escolar, juntamente com todos os educadores da instituição, terá que se mover neste espaço de negação e afirmação da autonomia, criando o novo. E isso não é uma tarefa fácil, pois pressupõem-se negociações, rupturas e, às

3 Antônio GRAMSCI, Concepção dialética da história. 2.ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 47

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vezes, ousadia além das forças, para afirmar que outra escola é possível e que outro mundo é possível. Para isso, é preciso agir intencionalmente nesta direção, recusar tudo o que não contribua para o alcance do desejado/projetado. Neste sentido, o projeto pedagógico será o instrumento que possibilitará planejar ações nesta direção.

Planejamento de EaD com foco na gestão escolar, no currículo e no trabalho pedagógico

Lê-se e ouve-se, com frequência o discurso de novas tecnologias da informação e da comunicação estão provocando mudanças em todas as dimensões da vida e, particularmente, na educação. Não há mais lugar para dúvida de que elas estão modificando as formas de relações sociais no mundo. Todavia, é preciso que fique claro, desde o início, que não são as tecnologias que mudam a sociedade, mas a sua utilização e o modo como são utilizadas. Diante do pressuposto de que é a ação humana que modifica a realidade sem ou com o uso das tecnologias. Assim sendo, diante do tema Educação e as novas tecnologias da comunicação e da informação a questão central é a da intencionalidade no uso dessas.

Na medida em que as invenções, divulgações e distribuição das novas tecnologias da informação e da comunicação vão sendo apropriadas pelas pessoas e instituições e, diga-se desde já, que não são iguais para todos na sociedade em que se vive caracterizada pelo modo capitalista de produção alteram-se o patamar de exigências e impõem necessidades de mudanças de comportamento, de percepções e de interação com o tempo e espaço nas inter-relações entre os homens e natureza e os homens entre si. Na escola, a situação não é diferente. No entanto, vale salientar que as tecnologias da comunicação e informação não mudam a relação pedagógica. Tampouco, substituem o professor. A simples presença de computadores, modens, vídeos, tablets, entre outros aparatos tecnológicos não são suficientes para interferirem na relação pedagógica entre professores e alunos. As novas tecnologias da comunicação e da informação se situam como recursos a mais para o fazer pedagógico e, neste sentido, se situam na esfera dos meios. O fazer pedagógico exige a relação tensa entre fins e meios. A

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intencionalidade ou finalidade do fazer pedagógico é determinada pelo professor e para alcançar determinada finalidade ele necessita dispor de meios. É nesta relação tensa entre fins e meios que o professor tem que indagar e decidir sobre que meios possibilitarão com mais eficiência atingir os fins a que se propõe. Neste sentido, a escolha dos fins e dos meios é fundamental. Escolhe-se determinados fins e se dispõe de meios, tais como as novas tecnologias da comunicação e da informação, que contribuem para aprofundar, ampliar, realizar relações pedagógicas que conduzam a aprendizagens efetivas, esses meios passam a ter uso com significado, isto é, com razão de ser de seu uso.

A Internet se situa, como colocado no parágrafo anterior, na esfera dos meios. Um meio que abre inúmeras e novas possibilidades, desafios e, também, incertezas em relação ao processo ensino-aprendizagem. Por meio da Internet é possível trocar experiências, tirar dúvidas, trocar materiais, estabelecer relações entre pessoas, enfim, constituir o que se denomina de redes. As redes possibilitam que as pessoas, no nosso caso, gestores, professores, alunos, possam discutir assuntos entre si, ter acesso a informações à distância, a bancos de dados, consumir e produzir relatórios de pesquisas conjuntos. Como se depreende, as redes eletrônicas constituem meios que podem modificar profundamente a relação pedagógica entre professor e aluno individualmente e entre professor e alunos em grupos e, ainda, entre professores e professores para troca de experiências. Todavia, não se pode esperar das redes, nem de todos os recursos de novas tecnologias de informação e comunicação soluções mágicas. O intercâmbio por meio que esses recursos proporcionam têm que ficar subordinados às intencionalidades dos que o usam. Assim sendo, as novas tecnologias de informação e da comunicação, a Internet e as redes constituem meios para usos pensados, ou seja, usos de determinados meios mais adequados e disponíveis para atingir determinados fins. Aqui reside o cerne da questão.

A formação de gestores, professores, especialistas de educação não passa apenas por conhecerem tais ou quais tecnologias e saberem usá-las. É óbvio que o educador seja ele gestor, especialista de educação ou professor tem que estar atualizado com as questões de seu tempo. Assim sendo, além de uma formação sólida sobre o

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fenômeno educativo histórica e socialmente constituído, necessita de formação sobre as novas tecnologias da informação e da comunicação e sobre seu uso num processo de formação contínua.

Tal como na Educação Presencial na Educação a Distância (EaD) o currículo e o trabalho pedagógico têm que ser planejados. Isso pressupõe antecipação da ação, escolhas entre fins e meios. Todavia, na Educação a Distância há a possibilidade de se estabelecer relação pedagógica intensa entre o real e o virtual. Pode-se estar conectado aos computadores de milhares de pessoas, estando-se, pessoalmente em um determinado local (casa, escritório, sala de recursos multimídia, entre outros). Pode-se estabelecer relação pedagógica com pessoas que não conheço e que posso, talvez, nunca conhecer, ou, talvez, nem mesmo encontrar outra vez, ainda que virtualmente. O tempo de um pode ser ou não ser o mesmo. Então, o que une o trabalho pedagógico na EaD? Qual o lugar da Gestão Escolar na EaD?

Existem questões prévias que necessitam ser explicitadas. Primeiro, o fato de na sociedade contemporânea enfatizar o discurso da centralidade da educação. Esse discurso desemboca no discurso da importância da formação docente. Segundo, o aluno que é sujeito da aprendizagem que não é uma abstração, mas alguém de carne e osso que se dispõe a entrar em relações sociais de produção com o professor na E a D, visando sua formação. Terceiro, encontram-se professores e alunos uns com outros, ainda que virtualmente, em uma instituição que pressupõe a gestão do escolar na EaD.

A centralidade da educação e a formação docente. Esta é uma das temáticas prioritárias não só para órgãos governamentais, mas para vários setores da sociedade convocados a suprir o recuo do Estado no atendimento às demandas por educação nas décadas passadas, de modo específico antes dos anos 90. O principal desafio que a EaD tem que enfrentar trata-se recuperar a desintelectualização do educador, o que pressupõe investir no exercício da crítica. Só se critica o que se conhece. Conhecer aqui está sendo assumido no sentido de alguém que tem domínio da teoria e que sabe fazer seu uso adequado tanto para analisar a prática quanto para fertilizá-la. E, aqui, entra outro desafio, qual seja o de romper com o discurso da prática pela prática e o da descrença no papel da teoria. Este empobrecimento do ato de conhecer limitado ao campo da prática

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vem causando impactos crescentes na área educacional e, por decorrência, na área social4. Este recuo da teoria tem levado a que educadores se limitem a reprodução de práticas e à incorporação na prática de propostas pragmáticas sem uma reflexão rigorosa da adequação destas propostas tendo em vista finalidades do homem que se quer formar e da sociedade que se quer promover o desenvolvimento e, ainda, que desenvolvimento se quer: o que está em curso ou outro desenvolvimento.

O gestor escolar que desconhece os problemas educacionais que atravancam o desenvolvimento humano também não saberá gerir uma organização escolar para superar o que Sentett bem coloca em seu livro Declínio do Homem Público (1998) e A corrosão do Caráter (1999). Segundo este autor (1999) a organização do trabalho nas organizações não só impede que os sujeitos possam desenvolver experiências coerentes com suas vidas, mas também conduzem à deformação do caráter. Apreender a dimensão simbólica que permeia a relação sujeito-trabalho-organização constitui o cerne do trabalho do gestor escolar e nessa apreensão encontrar os desafios a superar como apresentado anteriormente – desintelectualização do professor e abandono do conhecimento para exercer a crítica.

Apreender o simbólico no contexto do trabalho escolar e das organizações escolares pressupõe como afirma Marx que:

(...) a produção de ideias, de representações, da consciência, está, de início, diretamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, como linguagem da vida real. O repensar, o pensar, o intercâmbio material dos homens aparece aqui como emanação direta de seu comportamento material. O mesmo ocorre com a produção espiritual, tal como aparece a linguagem da política, das leis, da moral, da religião, da metafísica etc., de um povo. Os homens são produtos de suas representações, de suas ideias etc., mas os homens reais e ativos, tal como se acham condicionados por determinado desenvolvimento de suas forças produtivas e pelo intercâmbio que a ele corresponde, até chegar às suas formações mais amplas. A consciência jamais pode ser outra coisa do que o ser consciente, e o ser dos homens é seu processo de vida real (...)

4 Maria Célia Marcondes de Moraes (2003) Iluminismo às avessas: produção de conhecimento e políticas de formação docente. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.

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O tratamento do sujeito nas organizações escolares pressupõe que o gestor em EaD tenha uma formação transversal do conhecimento, pois sua atividade profissional supera em muito as disciplinas de um currículo, mas intervenção em organizações. A intervenção em organizações a partir de conhecimentos transversais tem como foco central sua ação, a saber: o sujeito nas organizações. Como afirma Motta (2000, p. 7) “esse mesmo homem tantas vezes esquecido quando falamos em organizações, empresas, globalização e em mais uma infinidade de termos aparentemente grandiosos e sofisticados”.

O exposto no parágrafo anterior evidencia, por si só, a complexidade no trato da gestão escolar e do currículo de formação em gestão escolar numa perspectiva de transversalidade dos conhecimentos. O homem nasce, é criado, cria e vive em organizações. A organização escolar, nesse contexto, ocupa não um lugar superior, mas um lugar privilegiado, pois ela é a formadora de sujeitos para atuarem nas diferentes organizações inclusive nela. Daí que o planejamento da gestão escolar e o do currículo necessitam ser enfocados como passíveis de serem promotoras de mudanças nos processos de trabalho e de formação de subjetividades. Se o dito é válido para a Educação Presencial o é na mesma intensidade e profundidade para a EaD.

Considerações finaisConsiderando o tema proposto para desenvolver neste texto,

a saber – Planejamento: trabalho pedagógico e currículo em EaD – necessitou-se, em vários momentos fazer recuo na história, ao mesmo tempo, em que se escreveu o texto, voltando-se para o presente e para o futuro. Em tempos de neoliberalismo, de ênfase no produtivismo, nada mais oportuno que refletir sobre a importância do desenvolvimento do planejamento e do currículo em EaD orientados por alguns pressupostos sobre determinada concepção do homem, de sociedade e de educação que norteiem a prática pedagógica dos docentes e alunos, o que aqui se denominou de trabalho pedagógico. O fato de a EaD ter características diferentes da educação presencial não elimina o fundamental que é a relação sujeito que ensina e o sujeito que aprende via um

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processo educacional, mediado por tecnologias, em que tempo e espaço são diferentes. Por trás das tecnologias e do EaD existem sujeitos de carne e osso, com histórias, dores e alegrias, dificuldades e necessidades, logo inacabados. Vivem em organizações o que significa que estão em relações sociais de produção. Tanto as pessoas como as organizações são aprendentes, ou seja, podem perspectivar horizontes diferentes para o encaminhamento de suas ações tendo em vista a emancipação humana e o desenvolvimento social. Desenvolvimento social em que se explicite a sua direção, ou seja, que leve em conta não só os que têm condições de produção, mas os produtores das riquezas e que buscam se qualificar para fazerem frente às novas exigências sociais, econômicas e culturais. A busca por qualificação por parte dos trabalhadores pela EaD coloca às organizações que promovem os cursos de EaD os desafios e as exigências de planejar, tanto o currículo como a organização do trabalho pedagógico, para oferecer os conhecimentos solidamente calcados na produção científica e tecnológica das áreas de conhecimento das habilitações e/ou especializações, sem ignorar os saberes que estes docentes já possuem, gerados em suas atividades laborais. Fazer dialogar os saberes das atividades laborais e os conhecimentos sistematizados constitui desafios para a organização do trabalho pedagógico que precisam ser enfrentados se quiser avançar na proposta de cursos de EaD nas diferentes áreas do conhecimento.

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Análise do perfil e dos critérios de seleção das escolas públicas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar da Universidade Federal de Ouro Preto

Érica Castilho Rodrigues Breynner Ricardo de Oliveira

Daniel Abud Seabra Matos

IntroduçãoNas últimas décadas, mudanças importantes ocorreram no

campo educacional, sobretudo em relação aos marcos legais, à sistemática de financiamento, ao processo de gestão dos sistemas de ensino e à ampliação do acesso à escola. De acordo com Cury (2007), o direito à educação escolar se constitui como dimensão fundante da cidadania, estando reconhecido em diversos documentos de caráter nacional e internacional. Ainda segundo esse autor, esse direito, em âmbito nacional, está claramente definido, por exemplo, no artigo 6º combinado com o artigo 205 da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 4º e 5º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996). Em âmbito internacional, no artigo XXVI da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, no art. 13 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 e, mais recentemente, na Declaração Mundial sobre Educação para Todos.

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e os demais indicadores educacionais evidenciam que a melhoria da qualidade da educação depende, de maneira integrada, tanto de fatores internos quanto de fatores externos que impactam do processo ensino-aprendizagem. Portanto, faz-se necessário a implementação e articulação de um conjunto de políticas públicas sociais e educativas que viabilizem melhores condições sociais e culturais e de exercício pleno da cidadania, o que inclui o direito a uma educação de

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qualidade. A partir dessa compreensão, o MEC vem desenvolvendo programas, projetos e ações de apoio à gestão da educação básica com o propósito de fortalecer a escola pública brasileira, entre os quais, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, que integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).

Neste sentido, o curso de Especialização em Gestão Escolar, no âmbito do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública, integra o Plano de Desenvolvimento da Educação. Este curso tem por objetivo contribuir com a formação de gestores escolares, por meio de um amplo processo de articulação envolvendo a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC), sistemas públicos de ensino e entidades educacionais.

Esse Programa surgiu da necessidade de se construir um processo de formação de gestores escolares que contemple a concepção do caráter público da educação e da busca de sua qualidade social, baseada nos princípios da gestão democrática, olhando a escola na perspectiva da inclusão social e da emancipação humana. Coordenado desde 2006 pela SEB, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica é financiado com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Nas últimas décadas, mudanças importantes ocorreram no campo educacional, sobretudo em relação aos marcos legais, à sistemática de financiamento, ao processo de gestão dos sistemas de ensino e à ampliação do acesso à escola. De acordo com Cury (2007), o direito à educação escolar se constitui como dimensão fundante da cidadania, estando reconhecido em diversos documentos de caráter nacional e internacional. Esse direito, em âmbito nacional, está claramente definido, por exemplo, no artigo 6º combinado com o artigo 205 da Constituição Federal de 1988 e nos artigos 4º e 5º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996), e, em âmbito internacional, no artigo XXVI da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, no art. 13 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966 e, mais recentemente, na Declaração Mundial sobre Educação para Todos.

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e os demais indicadores educacionais evidenciam que a melhoria

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da qualidade da educação depende, de maneira integrada, tanto de fatores internos quanto de fatores externos que impactam do processo ensino-aprendizagem. Portanto, faz-se necessário a implementação e articulação de um conjunto de políticas públicas sociais e educativas que viabilizem melhores condições sociais e culturais e de exercício pleno da cidadania, o que inclui o direito a uma educação de qualidade. A partir dessa compreensão, o MEC vem desenvolvendo programas, projetos e ações de apoio à gestão da educação básica com o propósito de fortalecer a escola pública brasileira, entre os quais, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, que integra o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).

Proposto por meio da Educação à distância (EaD) integrada a um conjunto de ações formativas presenciais, o Curso de Especialização em Gestão Escolar pretende democratizar ainda mais o acesso a novos espaços e ações formativas com vistas ao fortalecimento da escola pública como direito social básico, uma vez que essa modalidade de educação possibilita, dentre outras: maior flexibilidade na organização e desenvolvimento dos estudos; fortalecimento da autonomia intelectual no processo formativo; acesso às novas tecnologias da informação e comunicação; interiorização dos processos formativos garantindo o acesso daqueles que atuam em escolas distantes dos grandes centros urbanos; redução dos custos de formação a médio e longo prazo; criação de infraestrutura adequada nas universidades públicas e de formação de recursos humanos para atuarem com EaD e sua institucionalização no tocante à formação continuada.

Em setembro de 2011, convite foi realizado pela Coordenação Nacional do Programa Escola de Gestores a uma equipe de professores do Centro de Educação Aberta e a Distância (CEAD) para assumir a oferta desse programa na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Tratativas foram realizadas entre o Ministério da Educação, a Reitoria da Universidade e a equipe de professores no CEAD no sentido de oficializar a adesão dessa Instituição, ocorrida em setembro de 2011. A UFOP integra, desde esta data, um grupo de Universidades Públicas que estão encarregadas de ofertar vagas para atender a demanda levantada pelo MEC, através de adesão realizada pelos municípios.

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Um grupo de avaliação foi criado em 2013 com o objetivo de produzir estudos sobre (i) os critérios de eligibilidade e seleção e (ii) sobre a percepção dos cursistas sobre gestão escolar e sobre o curso propriamente dito. Este capítulo trata do primeiro aspecto, debruçando-se sobre os critérios de elegibilidade e seleção. Entre as questões que nortearam o trabalho desse grupo, uma se destaca: o curso está atendendo quem deveria ser atendido? Em outras palavras, as vagas estão sendo ofertadas para gestores escolares em municípios e regiões com baixo Ideb? Para responder a esta questão, analisamos, os critérios de elegibilidade e focalização utilizados, um dos eixos mais importantes do Programa em nível nacional. Neste sentido, identificamos o perfil e analisamos os critérios de seleção das escolas públicas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar da Escola de Gestores no âmbito da Universidade Federal de Ouro Preto.

A implementação do Curso de Especialização, os caminhos percorridos e a formação de um grupo de avaliação

As atividades de implantação do Curso de Especialização em Gestão Escolar no âmbito da Universidade Federal de Ouro Preto tiveram início ainda em 2011 e se desenvolveram no decorrer de 2012. O Projeto Pedagógico do Curso foi aprovado pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFOP em maio de 2012 e ainda nesse mês foi publicado o edital para a seleção dos cursistas. Para orientar esta primeira oferta do curso, o MEC disponibilizou uma planilha de adesão contendo nomes de mais de 1.500 candidatos oriundos de escolas cujos municípios haviam formalizado a adesão em 2011. Contudo, esta planilha possuía fragilidades, como a inexistência de dados (e-mail e telefone) para contato com os candidatos, ausência de uma proposta de regionalização dos municípios e a falta dos dados relativos ao Ideb.

Do ponto de vista institucional, sérias limitações impostas pela greve impediram a equipe de coordenação de produzir estes dados. Diante disso, e visando garantir a isonomia no processo seletivo, optou-se por abrir um edital de seleção, amplamente divulgado

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por meio de parcerias firmadas com a Associação Mineira dos Municípios (AMM), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), além da divulgação através do mailing institucional da UFOP e ofícios enviados às secretarias municipais de educação. Aproximadamente 1500 profissionais da educação se inscreveram nessa etapa.

Seguindo as orientações previstas nas Diretrizes Nacionais do Programa Escola de Gestores (2009), a seleção dos cursistas dentre os mais de 1500 inscritos foi realizada priorizando-se os profissionais que atuavam como diretores e vice-diretores em escolas públicas de Minas Gerais. O passo seguinte seria a definição dos polos. Como este processo ocorreu em meio à greve dos funcionários da Universidade, optou-se por defini-los com base na regionalização já existente na UFOP para os cursos a distância ofertados pela Universidade Aberta do Brasil (UAB). Tal decisão, em consonância com a Coordenação Nacional do Programa, foi decisiva para a implantação do curso, tendo em vista a infraestrutura física e humana já existentes nesses polos, que cooperaram institucionalmente para receber um novo curso da Instituição. Foi assim que se definiram seis dos nove polos de apoio presencial do curso: Governador Valadares, Ipatinga, Jaboticatubas, João Monlevade, Lagamar e Montes Claros (que formaram uma única turma) e Ouro Preto. Para contemplar os candidatos selecionados oriundos de regiões em que a UFOP não possuía polos, a coordenação do curso realizou contato com as secretarias municipais de educação e estabeleceu parcerias. Foi o caso dos polos de Guaxupé, Tiradentes e Ubá.

Além disso, para garantir que cada turma/polo iniciasse o curso com pelo menos 40 alunos matriculados, e que estes alunos/municípios estivessem dentro do raio de abrangência dos polos, outros profissionais, como professores, também foram contemplados. Somados, os nove polos totalizaram 453 cursistas matriculados, oriundos de 150 municípios do estado. Em outras palavras, isso equivale a dizer que 453 escolas foram atendidas, pois cada instituição contava com apenas um cursista. A primeira seleção contemplou, sobretudo, os aspectos: (i) equipe gestora (ii) polos UAB/UFOP e (iii) concentração regional.

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O curso teve início em setembro de 2012, com a realização do primeiro encontro de formação em Ouro Preto, momento destinado à efetivação das matrículas, à apresentação do curso e da equipe pelos coordenadores e à realização de palestras pelos professores responsáveis por algumas das salas ambientes. No mês de outubro desse ano, as aulas começaram através por meio do ambiente virtual Moodle.

Com o curso em andamento, um grupo de avaliação foi criado com o objetivo de mapear o perfil desta primeira turma a partir das dimensões descritas na introdução: focalização e percepção sobre a gestão. Em relação a primeira dimensão, havia a suspeita de que os critérios de seleção utilizados não favoreciam as regiões mineiras que seriam as mais elegíveis, configurando desvio de focalização ou um “vazamento”. Ao perceber a fragilidade da utilização do Ideb como único indicador, decidiu-se alargar o leque de alternativas, incorporando outros indicadores, discussão que será apresentada nas seções seguintes.

O Ideb e avaliação educacionalA avaliação educacional em larga escala tem sido cada vez mais

utilizada no Brasil no monitoramento da qualidade da educação básica. Os seus resultados têm ocasionado grande impacto na sociedade brasileira, sendo bastante utilizados para orientar políticas públicas em educação. Este monitoramento da qualidade inclui a elaboração de indicadores educacionais, sendo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) o mais importante. Como mencionamos anteriormente, o Ideb é utilizado como critério de seleção das escolas públicas participantes do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica. Neste sentido, apresentamos a seguir uma análise sobre o Ideb e outros indicadores educacionais presentes na literatura especializada.

O Ideb foi criado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) no ano de 2006. Este índice é o resultado da combinação de dois outros indicadores: a) indicador de desempenho: pontuação média dos estudantes em exames padronizados (Prova Brasil); b) indicador de rendimento: taxa média de aprovação dos alunos (Censo Escolar) (FERNANDES,

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2007). O valor do Ideb aumenta com a melhoria dos resultados do aprendizado dos estudantes e diminui se as taxas de aprovação caem. Esta é uma das razões da grande utilização do Ideb: conseguir agregar, em um único indicador, uma medida de desempenho e outra de rendimento, dimensões essenciais para a análise dos sistemas de educação básica. Assim, em pouco tempo, o Ideb tornou-se o único indicador da qualidade da Educação Básica, passando a orientar políticas públicas educacionais. Sua repercussão também inclui a cobertura da mídia sobre assuntos educacionais e novas dimensões na pesquisa educacional (SOARES; XAVIER, 2013).

No entanto, apesar da criação do Ideb ter representado uma mudança positiva e substancial no debate educacional brasileiro, especialmente pela incorporação do aprendizado (desempenho) dos estudantes no monitoramento das escolas, diversas questões precisam ser problematizadas sobre este indicador.

Neste sentido, Soares e Xavier (2013) apresentam as seguintes análises e críticas sobre o Ideb:

a) Só alunos presentes ao teste são considerados: apenas os estudantes presentes na escola no dia da Prova Brasil são considerados. Como a portaria do MEC diz que o Ideb é calculado desde que mais de 50% dos alunos tenham comparecido, as escolas podem selecionar seus melhores estudantes e assim ter um valor maior do Ideb. Tudo isso mantendo-se dentro da lei.

b) Proficiência em Matemática tem mais peso do que proficiência em Leitura: por causa dos algoritmos usados na padronização das proficiências, fica implícito no Ideb que o domínio da competência matemática pelos estudantes é maior do que o domínio da compreensão leitora. Isso pode estimular a ênfase do ensino de Matemática para alguns alunos como uma estratégia para melhorar o Ideb.

c) Assume substituições questionáveis entre os diferentes componentes: o Ideb aceita que o bom desempenho de um estudante compensa o mau desempenho de outro, assim como assume que um melhor desempenho compensa uma taxa de reprovação mais alta. Essas características geram a possibilidade de selecionar estudantes para concentrar esforços instrucionais com o intuito de melhorar o indicador, podendo gerar exclusão educacional (prejuízo da equidade).

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d) Não se pode usar a metáfora da nota escolar para analisar o Ideb: embora as proficiências padronizadas dos estudantes assumam valores entre 0 e 10, as proficiências das escolas estão concentradas em um intervalo bem mais restrito, pois a variação das médias é muito menor do que as variações individuais dos alunos. Afirmar que o Ideb varia de 0 a 10 é um equívoco do ponto de vista empírico. Portanto, é errado interpretar o indicador em termos de conceitos escolares. Por exemplo: um Ideb de valor 7 é um resultado excelente. Esta mesma nota para uma avaliação escolar é considerada mediana.

e) Naturaliza baixos desempenhos de muitos alunos: um Ideb de valor 6, considerado a meta nacional, é compatível com um número elevado de estudantes com baixo desempenho. Aqui, mais uma vez, se coloca a questão da agregação de dois indicadores em um único índice: a criação implícita de uma equivalência entre diferentes combinações de desempenho e rendimento. Assim, considerando que o Ideb está em um nível tido como adequado, as dificuldades educacionais de alunos com baixo desempenho não terão relevância (caso o indicador seja usado isoladamente).

f) O Ideb é muito correlacionado com o nível socioeconômico da escola (NSE): a associação entre o Ideb e o nível socioeconômico é alta, pois o desempenho dos estudantes está muito associado ao seu NSE. Por exemplo: os autores calcularam uma correlação de 0,69 entre o Ideb de 2011 e o NSE das escolas públicas do município de São Paulo. Assim, de maneira isolada, o Ideb é também um indicador das condições socioeconômicas das escolas. Essa questão tem ainda outra consequência: a identificação de escolas com projetos pedagógicos exemplares não pode ser realizada exclusivamente com o Ideb, pois ele aponta também escolas que têm bons resultados simplesmente por atender a estudantes com muito capital cultural.

g) Algumas limitações: aqui mais duas críticas são feitas. Primeiro, o Ideb não considera aspectos como infraestrutura e valorização profissional. Assim, não se recomenda a avaliação de escolas e redes de ensino exclusivamente pelo Ideb, que precisa ser contextualizado por indicadores que descrevam as condições reais de oferta do ensino. Portanto, esta não é uma crítica ao indicador em si, mas ao seu uso isolado. Segundo, uma falta

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de clareza de como passar do diagnóstico para a proposição de políticas: um Ideb baixo só diz que algo não vai bem, mas não sinaliza o que fazer nesta situação. Faltam esclarecimentos sobre o significado dos números, sobre qual tipo de intervenção um valor específico do Ideb sugere. Por fim, ainda existe a questão de que as políticas públicas para conter o abandono e a repetência podem ser diferentes daquelas usadas para melhorar o desempenho dos estudantes.

Sendo assim, o Ideb enfatiza resultados finalísticos sem levar em consideração as condições de produção destes resultados. Por isso, é importante considerar o Ideb simultaneamente com as condições contextuais da escola: o perfil dos alunos e as características das instituições de ensino. Neste sentido, utilizamos neste trabalho os seguintes indicadores educacionais: Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), nível socioeconômico, infraestrutura e complexidade da escola (ALVES; SOARES, 2013).

Desenho da pesquisa, caracterização das escolas, definição das variáveis analisadas e elaboração dos indicadores educacionais

Nesta pesquisa utilizamos métodos quantitativos, que se mostram adequados para organizar, descrever e sumarizar dados de grandes coletivos de indivíduos. Após a coleta de dados, realizamos análises estatísticas para descrever tendências e testar os problemas de pesquisa relacionados com o perfil e os critérios de seleção das escolas públicas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar da UFOP. As técnicas estatísticas utilizadas nesse trabalho foram: estatística descritiva e uma técnica multivariada chamada Teoria da Resposta ao Item (TRI).

Os dados das escolas participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar foram provenientes do Censo Escolar de 2013, além de informações oriundas de avaliações educacionais do Inep, incluindo os questionários contextuais e os testes padronizados de proficiência. Dessa forma, participaram deste estudo 453 escolas, sendo cada uma delas representada por um aluno do referido curso.

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Utilizamos diversos indicadores educacionais relativos ao rendimento e desempenho dos alunos, nível socioeconômico, infraestrutura e complexidade da escola. No quadro 1, descrevemos os indicadores utilizados.

Quadro 1Indicadores educacionais utilizados na pesquisa

Indicador Descrição e cálculo

Ideb da escola

Índice de Desenvolvimento da Edu cação da Escola. Produto da média das proficiências padroni zadas em matemática e leitura obti das na Prova Brasil pelo indicador de rendimento (o valor médio das taxas de aprovação da escola) atingido no Censo Escolar. A escala tem valores de zero a 10.

Nível socioeconô-mico da escola

Medida estimada via Teoria da Resposta ao Item (TRI) a partir de informações dos questionários res pondidos pelos alunos em avaliações educacionais do Inep. Itens dos questionários relacionados com a escolaridade e a posição ocupacional dos pais do aluno e a renda familiar (evidenciada pela posse de bens, uso de serviços e rendimento de fontes diversas) foram agregados em uma única medida do nível socioeconômico do alu no. A escala ori ginal foi convertida para valores de zero a 10. Refere-se à média calculada a partir do NSE dos alunos de cada escola.

Infraestrutura da escola

Medida obtida via TRI a partir de in formações do Censo Es-colar, agregando informações de existência de: local próprio de funcionamento da esco la, água tratada, energia elétrica, saneamento básico (coleta de lixo, de esgoto e presença de banheiro na escola), outros espaços e recursos escolares (bi-blioteca, laboratório, cantina, com putadores e outros equi-pamentos eletrônicos). A esca la original foi convertida para valores de zero a 10.

Complexidade da escola

Medida obtida via TRI a partir de informações do Censo Es-colar. Agrega informações sobre o tamanho da escola (nú-mero de alunos - quantidade de salas, funcionários, número de turmas e matrículas nas escolas) e a complexidade da es-cola (modalidades/níveis de ensino ofere cidos e o número de alunos portadores de ne cessidades especiais). A escala final é o produto das escalas parciais de complexidade e de ta manho, convertidas para valores de zero a 10.

Fonte: Alves e Soares (2013).

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Como indicado no Quadro 1, o nível socioeconômico, a infraestrutura e a complexidade da escola são considerados como construtos latentes (não podem ser observados diretamente). Portanto, precisamos utilizar técnicas estatísticas adequadas para medir esse tipo de construto. Nessa pesquisa, utilizamos a Teoria da Resposta ao Item (TRI) (EMBRETSON; REISE, 2000). O objetivo principal da TRI é obter medidas de construtos latentes por meio de indicadores ordinais ou dicotômicos. Neste trabalho, utilizamos o modelo de Samejima, que é considerado o mais adequado para itens com respostas graduadas (SAMEJIMA, 1969).

ResultadosO objetivo inicial é verificar, a partir de uma análise

quantitativa, qual o perfil das escolas atendidas pelo curso. Essa análise será feita inicialmente nos municípios, considerando-se indicadores médios dos locais onde as instituições estão situadas. Em seguida, faremos uma análise mais detalhada, considerando os indicadores das escolas especificamente. Por fim, analisaremos cada um dos Polos.

Como apontamos anteriormente, a seleção dos alunos deveria priorizar aquelas escolas que apresentassem o menor valor do Ideb. Assim, esse será o primeiro indicador que iremos analisar. A figura 1 mostra a distribuição dos alunos do curso em um mapa temático que representa o Ideb médio das escolas de cada município. As circunferências maiores correspondem àquelas cidades nas quais houve um número maior de matrículas. Observa-se que, ao contrário do que seria desejado, não são aqueles municípios com menor Ideb que estão sendo atendidos pelo curso, mas aqueles mais próximos à cidade de Ouro Preto. A região Norte e Nordeste do estado são claramente deficitárias quando consideramos esse indicador. Apesar disso, não foram contempladas por essa política pública.

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Figura 1 – Distribuição dos cursistas no estado de Minas Gerais (Ideb médio dos municípios)1.

Considerando o Ideb como critério para a seleção dos cursistas, verificamos que não foram selecionados os locais mais recomendados. Entretanto, é necessário verificar se tal resultado se deve ao fato dos gestores de locais com Ideb mais baixo não terem se interessado em participar do curso. Dessa forma, iremos analisar a distribuição espacial dos candidatos inscritos. A figura 2 apresenta essa informação.

Percebemos que os candidatos estão mais distribuídos por todo o estado, aparecendo inclusive um número razoável de inscritos em cidades com Ideb bastante reduzido. Isso evidencia que, apesar de candidatos de vários municípios do estado terem demonstrado interesse em fazer o curso, a seleção não foi capaz de focalizar este público alvo dessa política de formação continuada. Foram contemplados, em sua maioria, os candidatos situados geograficamente mais próximos à cidade de Ouro Preto.

1 Os tons de cinza no mapa representam o Ideb médio dos municípios. Aqueles com um tom mais escuro correspondem aos locais com nota média mais elevada.

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Figura 2 – Distribuição dos candidatos no estado de Minas Gerais (Ideb médio dos municípios)2.

É importante destacar que outras variáveis concorreram para que a seleção ocorresse desta maneira. Vale ressaltar que a inscrição de candidatos oriundos de municípios com baixo Ideb como os da região norte e nordeste se deu de modo mais disperso, o que dificultou a constituição de um polo que os congregasse.

Ainda assim, foi possível selecionar candidatos da região norte e noroeste para integrar, por exemplo, o polo de Montes Claros e Lagamar.

Mas foi necessário reunir os candidatos dessas duas regiões para conseguirmos formar uma turma e distribuí-los em duas sedes para que os cursistas pudessem usufruir de atendimento presencial. Apesar deste esforço, alguns municípios que integraram esta turma permaneceram muito distantes de ambas as sedes dos polos.

Havia, ainda, a orientação do Programa Nacional para que a UFOP priorizasse a regionalização de polos já existentes em sua estrutura (que já ofertavam cursos da Universidade Aberta do Brasil). Tal orientação foi fundamental para a implantação desta primeira turma, uma vez que tais polos já possuíam a infraestrutura necessária para abrigar o curso, fator que contribuiu para a definição dos polos de Governador Valadares, Ipatinga, Jaboticatubas, João Monlevade, Lagamar e Montes Claros (que formaram uma única turma) e Ouro 2 Os tons de cinza do mapa representam o Ideb médio dos municípios. Aqueles com um tom mais escuro correspondem aos locais com nota média mais elevada.

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Preto. Quando isto não foi possível, como nos casos de Guaxupé, Ubá e Tiradentes, que não são polos da UFOP, a coordenação fez contato com os municípios e por meio das secretarias de educação, formalizou uma parceria para a oferta do curso.

Como já discutido anteriormente, o Ideb é um indicador muito limitado para refletir todos os aspectos da realidade da escola. Portanto, iremos analisar outros três indicadores a fim de ter um perfil mais completo das escolas. O primeiro deles é o Nível Socioeconômico (NSE) dos alunos matriculados. Já é fato conhecido na literatura que o NSE e o Ideb são dois indicadores altamente correlacionados, uma vez que escolas que atendem alunos com melhores condições socioeconômicas apresentam maior facilidade em atingirem níveis melhores de desempenho e menores taxas de reprovação (SOARES; XAVIER, 2013). A figura 3 mostra a distribuição desse indicador em todo o estado. Observa-se que o padrão de distribuição espacial é muito semelhante ao mapa do Ideb. Nota-se claramente que o Norte e Nordeste do estado são regiões mais desprivilegiadas quando usamos qualquer um dos indicadores como medida. Isso significa que o curso deixa de atender não só aqueles municípios mais carentes em termos de desempenho escolar, mas também os mais carentes em termos de condições socioeconômicas.

Figura 3 – Distribuição dos cursistas no estado de Minas Gerais (NSE dos municípios)3

3 Os tons de cinza do mapa representam o NSE dos municípios. Aqueles com um tom mais escuro correspondem aos locais com valores mais elevados para o indicador.

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Passamos agora para os outros dois indicadores apresentados anteriormente: Índice de Complexidade e Índice de Infraestrutura da escola.

A figura 4 mostra o perfil das escolas mineiras no que diz respeito à Infraestrutura, sobrepondo a distribuição dos cursistas a fim de verificar o contexto de onde vêm os alunos que participam do curso. Percebemos que a infraestrutura não segue o mesmo padrão de distribuição do nível socioeconômico. Entretanto, observamos que as escolas que estão sendo atendidas correspondem aos municípios que apresentam valores mais altos para esse indicador. Esses dados confirmam novamente o fato de que o curso não está atendendo aqueles alunos que de fato mais precisariam cursá-lo.

Figura 4 – Distribuição dos cursistas no estado de Minas Gerais (Infraestrutura dos municípios)4

O próximo indicador avaliado é a Complexidade da Escola. A figura 5 mostra o padrão de distribuição em todo o estado. Neste caso, percebemos que as escolas localizadas em municípios com maior índice de complexidade estão sendo atendidas pelo curso. Portanto, no que se refere a esse indicador, a seleção parece ter

4 Os tons de cinza do mapa representam o Índice de Infraestrutura médio dos municípios. Aqueles com um tom mais escuro correspondem aos locais com valores mais elevados para o indicador.

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sido mais adequada. É possível inferir que os municípios que apresentam escolas mais complexas, que atendem uma gama maior e mais variada de alunos, são aqueles mais desenvolvidos socioeconomicamente.

Figura 5 – Distribuição dos cursistas no estado de Minas Gerais (Complexidade dos municípios)5

As análises feitas até o momento foram todas por município. Analisaremos agora os indicadores voltados especificamente para as escolas atendidas pelo curso. Infelizmente, não foi possível calcular os indicadores para todas as escolas atendidas, devido à falta de dados. Entretanto, para essas análises verificamos que todos os polos estavam bem representados.

Para o Ideb foi possível recuperar os dados das escolas de 90 cursistas do total de 453, o que representa uma proporção de 19,87%. A tabela 1 mostra, na primeira coluna** (C1), a distribuição da proporção de todos cursistas em cada um dos polos e, na segunda Coluna (C2), a mesma distribuição, porém agora considerando apenas aqueles cursistas para os quais temos dados sobre o Ideb disponíveis. Notamos que todos os polos estão bem representados na amostra analisada, com exceção dos polos Tiradentes e Ubá. 5 Os tons de cinza do mapa representam o Índice de Complexidade médio dos municípios. Aqueles com um tom mais escuro correspondem aos locais com valores mais elevados para o indicador.

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Tabela 1Proporção das escolas com Ideb disponível de

acordo com o polo

Polo C1 C2Governador Valadares 9,49 7,78Guaxupé 10,15 8,89Ipatinga 13,47 15,56Jaboticatubas 10,59 13,33João Monlevade 11,48 12,22Montes Claros/Lagamar 11,48 14,44Ouro Preto 12,14 17,78Tiradentes 10,81 4,44Ubá 10,37 5,55

Ainda com relação ao Ideb, a figura 6 mostra a distribuição deste indicador calculado para todas as escolas mineiras. Já a figura 7 mostra essa distribuição para as escolas atendidas pelo Curso de Especialização em Gestão Escolar. Percebemos que as escolas atendidas apresentam um valor maior para esse indicador do que as escolas mineiras em geral. A média desse índice para todo o estado é 4,51 enquanto a médias das escolas do curso é 4,8. Isso fica ainda mais evidente quando comparamos nas figuras as faixas mais baixas do Ideb. Dessa forma, reforçamos nosso argumento de que o curso, de uma maneira geral, atendeu escolas com Ideb mais alto.

Figura 6 – Distribuição do Ideb de todas as escolas mineiras.

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Figura 7 – Distribuição do Ideb das escolas atendidas pelo curso.

Passamos agora para a distribuição do NSE. Para esse indicador, das 453 escolas fomos capazes de recuperar os dados de 179 (em torno de 40%). A tabela 2 mostra, na primeira coluna (C1), a distribuição da proporção de todas as escolas em cada um dos polos e, na segunda coluna (C2), a mesma distribuição, porém agora considerando apenas aquelas escolas para os quais temos dados sobre o NSE. Observamos que apenas o polo de Ubá não está bem representado. Para os demais, percebemos que a proporção de escolas da nossa amostra é praticamente a mesma da população original.

Tabela 2Distribuição das escolas com NSE disponível de acordo com o polo

Polo C1 C2Governador Valadares 9,49 8,93

Guaxupé 10,15 10,61Ipatinga 13,47 13,41Jaboticatubas 10,59 18,43João Monlevade 11,48 11,73Montes Claros/Lagamar 11,48 11,73Ouro Preto 12,14 15,64

Tiradentes 10,81 10,05

Ubá 10,37 0,00

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Para o caso do NSE, existe uma distribuição de referência. Alves et al. (2013) classificaram as escolas em sete categorias “Mais Baixo”, “Baixo”, “Médio-Baixo”, “Médio”, “Médio-Alto”, “Alto” e “Mais alto”. Portanto, nesse caso é desnecessário comparar a distribuição com os dados do Estado. Vejamos como se apresenta a distribuição desse indicador para as escolas atendidas pelo curso. A figura 8 mostra que a maior parte das escolas apresenta um valor classificado como Médio-Baixo (39,7%) e Médio (34,6%) para esse indicador. Percebe-se também que a distribuição do NSE possui uma assimetria em direção aos valores mais elevados. Isso confirma que o curso não está atendendo as escolas mais vulneráveis no que se refere a aspectos socioeconômicos.

Figura 8 – Distribuição de frequências do Nível Socioeconômico das escolas atendidas pelo curso. Nota: o curso não teve escolas na categoria “mais alto”.

Com relação aos índices de Infraestrutura e Complexidade, ambos foram obtidos a partir da mesma base de dados, que é a base do Censo. Como esta base contempla todas as escolas brasileiras, fomos capazes de calcular os indicadores para muitas instituições atendidas pelo curso. Só não foi possível recuperar esses dados para os casos em que os cursistas forneceram códigos inválidos das escolas.

Das 453 escolas, conseguimos os dados de 322, o que corresponde a 71,08% das instituições. A tabela 3 mostra, na primeira coluna (C1), a distribuição da proporção de todas as escolas em cada um dos polos e, na segunda coluna (C2), a mesma distribuição, porém agora considerando apenas aquelas escolas para as quais temos dados sobre os índices de Complexidade e Infraestrutura disponíveis. Notamos que todos os polos estão bem representados na amostra analisada.

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Tabela 3Distribuição das escolas com Infraestrutura e Complexidade

disponíveis de acordo com o polo

Polo C1 C2Governador Valadares 9,49 7,81

Guaxupé 10,15 10,62

Ipatinga 13,47 10,62

Jaboticatubas 10,59 13,12

João Monlevade 11,48 9,68Montes Claros/Lagamar 11,48 11,56Ouro Preto 12,14 10,62

Tiradentes 10,81 11,56

Ubá 10,37 14,4

A figura 9 mostra a distribuição do Índice de Infraestrutura calculado para todas as escolas mineiras. Já a figura 10 mostra a distribuição para as escolas atendidas pelo Curso de Especialização em Gestão Escolar. Percebemos que as escolas atendidas pelo curso apresentam um valor maior para esse indicador do que as escolas mineiras em geral. A média desse índice para todo o estado é 3,42 enquanto a média das escolas do curso é 6,21. Portanto, quando comparado ao contexto estadual, o conjunto das escolas atendidas pelo curso encontra-se em posição privilegiada no que se refere à infraestrutura.

Figura 9 – Distribuição do Índice de Infraestrutura de todas as escolas mineiras.

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Figura 10 – Distribuição do Índice de Infraestrutura das escolas atendidas pelo curso.

Quanto ao Índice de Complexidade, a figura 11 indica a distribuição deste indicador para todas as escolas mineiras. Já a figura 12 mostra a distribuição para as escolas atendidas pelo Curso de Especialização em Gestão Escolar.. Percebemos que as escolas atendidas pelo curso apresentam um valor maior para esse indicador do que as escolas mineiras em geral. A média desse índice para todo o estado é 3,96 enquanto a média das escolas do curso é 5,38. Portanto, esses dados confirmam o fato de que o curso está atendendo as escolas mais complexas e que demandam mais de seus gestores.

Figura 11 – Distribuição do Índice de Complexidade de todas as escolas mineiras.

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Figura 12 – Distribuição do Índice de Complexidade das escolas atendidas pelo curso.

Por fim, analisaremos a situação dos polos no que se refere a esses indicadores. Para tanto, vamos computar a média de cada um dos quatro indicadores de todas as escolas localizadas em cada um dos polos do curso. A tabela 4 mostra os resultados obtidos. Observamos que os polos de Governador Valadares e Montes Claros apresentam os valores mais baixos para todos indicadores, como já era esperado pela realidade do estado. Os polos de Guaxupé e Jaboticatubas apresentam valores altos para os quatro indicadores analisados. Os polos de Ouro Preto e Ipatinga apresentam resultados mistos: valores baixos para o Ideb e o NSE e valores altos para Infraestrutura e Complexidade.

Tomados em conjunto, esses resultados indicam a complexidade de se realizar uma análise do perfil e dos critérios de seleção das escolas/polos: a realidade das escolas/polos é bastante singular e deve ser analisada caso a caso na elaboração de qualquer política pública. Em outras palavras, a partir de indicadores múltiplos, a seleção de uma escola/polo pode ser feita em função de critérios diversos: uma escola pode ser atendia por ter Ideb e NSE baixos, outra por ter alta complexidade e assim por diante.

Destacamos ainda que o índice de complexidade possui uma lógica diferente dos outros índices, pois quanto maior o seu valor mais complicada será a escola para o gestor. Já nos outros três indicadores, valores maiores são “melhores” para a escola.

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Tabela 4Média dos indicadores por Polo do curso

Polo Ideb NSE Infraestrutura ComplexidadeGovernador Valadares 3,91 4,45 5,80 5,38

Guaxupé 5,06 5,09 6,62 5,29

Ipatinga 4,71 4,88 6,39 5,58

Jaboticatubas 5,11 5,13 6,61 5,83

João Monlevade 5,74 4,91 6,52 5,98

Montes Claros/Lagamar 4,36 4,22 5,68 5,12

Ouro Preto 4,49 4,85 6,47 5,71

Tiradentes 5,19 4,61 5,71 4,50Ubá 4,93 - 6,05 5,05

Nota: amostra observada: Ideb (90), NSE (179), Infraestrutura (322), Complexidade (322).

Considerações finaisA análise do perfil e dos critérios de seleção das escolas públicas

participantes do Curso de Especialização em Gestão Escolar revelou algumas questões importantes sobre a implementação da política de formação continuada empreendida pela Escola de Gestores da UFOP. Embora esta primeira oferta do curso não tenha contemplado plenamente os municípios e escolas com baixo Ideb, foco do Programa, a utilização de outros indicadores educacionais para analisar as escolas atendidas nos leva a concordar com a literatura em sua crítica ao uso do Ideb de modo isolado para avaliar a qualidade da educação.

Em termos de seleção dos municípios e das escolas atendidas pelo curso, reconhecemos que, nesta primeira experiência, não foi possível atender exclusivamente as escolas e municípios com baixo Ideb. Isto se deveu a um conjunto de fatores como a inconsistência dos primeiros dados fornecidos pelo MEC à Universidade, a dispersão geográfica dos inscritos oriundos de regiões com menor Ideb, a definição dos polos de apoio presencial em função da regionalização e infraestrutura já existentes na UFOP. Por outro lado, notamos que a adoção do Ideb como único critério de seleção das escolas não parece ser o melhor caminho.

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No que se refere à política pública voltada para a formação nacional de gestores escolares, nossa pesquisa fornece uma referência importante para as próximas seleções. Além do Ideb, o nível socioeconômico, a infraestrutura e a complexidade são indicadores imprescindíveis para a definição das escolas a serem atendidas pelo curso. Como afirmamos anteriormente, é importante considerar o Ideb simultaneamente com as condições contextuais da escola: o perfil dos alunos e as características das instituições de ensino (ALVES; SOARES, 2013). A partir de indicadores múltiplos, a seleção de uma escola/polo pode ser feita em função de critérios diversificados.

Como vimos, indicadores educacionais como NSE, Infraestrutura e Complexidade revelam dados mais contextualizados sobre as escolas e sobre as condições de oferta do ensino, interferindo de modo distinto no desempenho e nos resultados educacionais.

Com base nos resultados obtidos, somos capazes de propor uma metodologia para realizar uma seleção mais adequada das escolas e municípios que comporão as novas turmas da Escola de Gestores da UFOP. Fica claro que a conjugação do Ideb com os outros indicadores educacionais aqui elencados se apresenta como critério mais seguro para definir a seleção das escolas públicas e atingir, assim, o público-alvo desejado.

Por fim, essa metodologia de seleção também nos permite fazer uma avaliação diagnóstica e o planejamento prévio das atividades didáticas de cada turma. Por exemplo: se uma determinada turma apresenta um percentual elevado de escolas de alta Complexidade, podemos planejar disciplinas ou atividades específicas voltadas para esta questão. A combinação dos indicadores aqui analisados permitirá a conjugação de diferentes estratégias de intervenção que, integradas, poderão contribuir para o acompanhamento qualitativo das ações pedagógicas implementadas pela equipe de professores envolvida no processo de formação dos cursistas.

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Referências bibliográficasALVES, M. T. G.; SOARES, J. F. Contexto escolar e indicadores educacionais: condições desiguais para a efetivação de uma política de avaliação educacional. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 39, n. 1, p. 177-194, 2013. ALVES, M. T. G.; SOARES, J. F.; XAVIER, F. P. O Nível Socioeconômico das Escolas de Educação Básica Brasileiras. In: VII Reunião da Associação Brasileira de Avaliação Educacional - ABAVE, 2013, Brasília. Anais da VII Reunião da ABAVE - Avaliação e Currículo: um diálogo necessário, 2013. p. 15-32. BRASIL. Diretrizes Nacionais do Programa Escola de Gestores da Educação Básica Pública. Brasília: MEC/SEB, 2009.CURY, C. R. J. A Gestão Democrática na Escola e o Direito à Educação. In: Revista Brasileira de Política e Administração da Educação. v. 23, n. 3. Rio de Janeiro: ANPAE, set./dez. 2007. p. 483-496.EMBRETSON, S. E.; REISE, S. P. Item response theory for psychologists. New York: Routledge, 2000.FERNANDES, R. Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). INEP/MEC, n. 26, 2007. SAMEJIMA, F. Estimation of Latent Ability Using a Response Pattern of Graded Scores (Psychometric Monograph No. 17). Richmond, VA: Psychometric Society, 1969.SOARES, J. F.; XAVIER, F. P. Pressupostos educacionais e estatísticos do IDEB. Educação e Sociedade, v. 34, n. 124, p. 903-923, 2013.

O silêncio da escola e a escola do silêncio: resistências e aberturas para a escola democrática

Marisa Bueno de FreitasDiana de Cássia Silva

IntroduçãoAs Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil

(BRASIL, DCNEI, 2010) definem a Educação Infantil como a primeira etapa da educação básica, oferecida em creches e pré-escolas que se caracterizam como espaços institucionais constituídos por estabelecimentos educacionais que cuidam e educam crianças de 0 a 5 anos, em jornada integral ou parcial, regulada e supervisionada pelo sistema de ensino competente e submetida ao controle social.

O Art. 31 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional propõe, em seu inciso I, que a Educação Infantil será organizada de acordo com “avaliação mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento das crianças, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao Ensino Fundamental” (BRASIL, LDBEN 9394, 1996).

Neste âmbito, e como base na análise do Art. 29, da LDBEN 9394/96, que dispõe como desenvolvimento integral os aspectos físico, psicológico, intelectual e social somado à proposição de avaliação do Art. 31, citado acima, fica evidenciada a necessidade de as instituições de ensino que atendem à Educação Infantil formular instrumentos avaliativos apropriados. Neste aspecto, o formato de portfólio de aprendizagem destaca-se, por se constituírem em um sistema de registros paulatino do desenvolvimento das crianças.

E, uma vez que as diretrizes, definidas pelo Curso de Especialização em Gestão Escolar da UFOP referentes o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), definiram que tal atividade deveria ser elaborada tomando-se por referência o Projeto Político Pedagógico da escola a qual o cursista estivesse vinculado, vislumbrou-se ser a questão da avaliação na Educação Infantil um importante caminho

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de intervenção e de análise a ser explorado no TCC aqui adaptado para um capítulo deste livro.

Assim, este trabalho pretende descrever e analisar a proposta de intervenção pedagógica na forma de avaliação realizada em uma instituição escolar com o objetivo de fortalecer os mecanismos de participação da escola democrática.

A escola em que se deu a pesquisa atende aproximadamente 200 crianças, na creche e na pré-escola, com idades entre seis meses e cinco anos, provenientes de camada popular. A comunidade, na qual está situada a escola, pertence a um bairro de periferia, com demandas relacionadas a esse estrato social. Observa-se que historicamente seus habitantes carregam um estigma de subeducados e de pertencerem a uma subcomunidade.

Imersas nesta realidade, boa parte das crianças tem naturalizado o convívio com tons de voz ríspidos e situações de destrato ou preconceituosas, tanto no campo familiar quanto, e de uma maneira mais sutil, no espaço da sala de aula, margeando a ideia de violência simbólica, tratada por Pierre Bourdieu (1989). Além disso, convivem com um sistema de poder que barra, proíbe e invalida o discurso e o saber das massas e que não se encontra apenas na censura oficial, mas que penetra profunda e sutilmente em todas as tramas sociais, conforme percebe Michel Foucault (2012).

Consoante a essa realidade, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) detecta em a Situação Mundial da Infância (2012) que “as dificuldades encontradas pelas crianças em comunidades pobres frequentemente são obscurecidas e, portanto, perpetuadas. Como consequência, crianças que já são menos favorecidas ficam privadas de serviços sociais”, dentre eles a educação com qualidade.

No contexto da realidade social, e à luz das diretrizes educacionais e de documentos acerca das crianças, é que se deu o projeto de intervenção cujos resultados foram objeto de análise no TCC.

A execução da proposta permitiu vislumbrar que o sentimento de pertença e a qualidade da escola estão diretamente ligados ao valor social que é dado à escola. Tal valor só é passível de ser construído mediante a promoção de aberturas participativas.

Pode-se perceber, tanto na experiência com os pais quanto com os professores, os silêncios que se estabeleceram nos momentos de

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participação e de formação do coletivo da escola. Assim, indagações inquietantes surgiram: por que os atores silenciam? Em que lugar se instaura a imposição do silêncio tácito? Qual o significado de se comprometer e de se sentir autorizado? O que é possível ler no silêncio? Como promover o debate e o diálogo?

Identificar possíveis variáveis para o porquê de a comunidade escolar considerar a educação oferecida pela instituição como satisfatória e de qualidade, em um contexto e que, por falta de mecanismos de acompanhamento, a educação com déficits não é mostrada explicitamente, também se constituiu como objeto de reflexão.

Promover a interação entre objetivos distintos de pais e de professores significa desfazer as reproduções sociais que abrem o abismo entre escolarização, diferenças culturais e condições de vida com dignidade Para tanto, apoia-se na defesa de que a pedagogia precisa produzir recursos técnicos e científicos humanizados para diagnosticar e resolver os problemas quando o fracasso escolar impera.

Educação como um direito: educação para todos e a gestão democrática da escola

As relações mundiais, estreitadas pela velocidade das informações e pela interdependência econômica, social e ambiental entre as nações conduzem os órgãos internacionais e os Estados, em sua maioria, democráticos de direito, à discussão sobre a educação e sobre a necessidade de normatizá-la como um direito.

É da preocupação com um resultado que, ao mesmo tempo em que produz riqueza, gera um contínuo de miséria e analfabetismo, que surgem as discussões internacionais sobre a legitimidade da educação e sua normatização como um direito humano, simultaneamente, inerente ao direito ao desenvolvimento.

Para Cury (2002), a maior parte das nações do mundo busca garantir em seus textos legais a normatização e o acesso de seus cidadãos à educação básica. O caráter de lei nacional é a primeira garantia para a efetivação da educação, pois é ela quem indicará os direitos, os deveres e as proibições, assim como suas possibilidades e seus limites de atuação.

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Com vistas a atender a um direito, tomado como basilar na formação humana, a Declaração de Jomtien (1990) prevê que,

a aprendizagem começa com o nascimento. Isto implica cuidados básicos e educação inicial na infância, proporcionados seja através de estratégias que envolvam as famílias e comunidades ou programas institucionais, como for mais apropriado. O principal sistema de promoção da educação básica fora da esfera familiar é a escola fundamental. A educação fundamental deve ser universal, garantir a satisfação das necessidades básicas de aprendizagem de todas as crianças, e levar em consideração a cultura, as necessidades e as possibilidades da comunidade.

Dessa forma, evidencia-se um entendimento consensual sobre a necessidade de se ofertar a educação, desde os anos iniciais, como educação básica. Ao qual se pese o fato de que se deve desenvolver mediante relação estreitada com a família e a comunidade.

Entender que a família é fundamental no desenvolvimento do estudante nos anos de educação básica e que, todo o ensino e aprendizagem precisam se desenvolver no contexto social do qual crianças e comunidade são membros constitutivos, é compreender o cerne da escola democrática. Isto porque, os mecanismos que precisam ser ativados para a plena participação e efetivação da escola democrática passam pela consolidação da educação como um direito e da escola como espaço para a concretização desse fim.

Ferreira (2000) entende a gestão democrática como a possibilidade de consubstanciação de um valor historicamente universal em realidade, permitindo aos seres humanos que se desenvolvam fortes intelectualmente, ajustados emocionalmente, capazes tecnicamente e ricos de caráter. Nestes termos, reafirma o entendimento de que, mais que uma participação ampliada, a gestão democrática precisa ser também um mecanismo de mediação que permita à escola construir, conscientemente, as bases que fundamentam o desenvolvimento e a qualidade social.

De acordo com o resultado do Censo de 2010, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os indicadores sociais brasileiros foram definidos com dois pilares de sustentação: a alfabetização e o saneamento. Conforme análise feita a partir da base de dados, “o crescimento social aconteceu com a promoção

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dos direitos legislados, mas ainda não efetivados para todos” (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011), o que se pode perceber pelo número de habitações que ainda não possuem saneamento básico adequado e pela incidência de crianças e jovens fora da escola, apesar da significativa melhora nos números compilados.

Desse modo, a educação como direito que precisa ser garantido com vistas à formação humana plena, tomada como básica desde o nascimento, ofertada pela escola, com relações ajustadas entre a família e a comunidade, no âmbito das distintas realidades e necessidades, concretizada por meio de uma gestão democrática e com participação atuante. Esses são acertos que precisam se dar, para que o movimento pela justiça social e qualidade de vida, por meio da educação com qualidade social, de fato, aconteçam.

Para dimensionar a população de zero a cinco anos do país, grupo próprio da Educação Infantil, o Censo de 2010 analisou a distribuição social das crianças e as matrículas em creches e pré-escolas, realizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Tal abordagem teve como objetivo verificar a demanda pela Educação Infantil, como ela tem sido ofertada e quais os tipos de problema que enfrenta. Conforme os dados, em 2009, apenas 38,1% dessa população tinha frequência bruta nessas instituições. De acordo com o relatório, “mesmo com a diminuição da participação de crianças e jovens na população total é importante chamar atenção para a necessidade de ampliação de foco de políticas educacionais, com ênfase na qualidade dos serviços e no público de zero a cinco anos de idade” (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011, p. 36).

Quem são essas crianças? Elas estão matriculadas na escola? Quais são as políticas públicas e legislações dispensadas para uma população que se pretende que seja uma população educacional? Como efetuar os princípios constitucionais de garantia de acesso e permanência universal à educação e Escola Democrática com qualidade social? Em que a gestão democrática com participação do coletivo democrático pode contribuir para que a educação para a formação humana plena se dê, desde o nascimento?

O processo de avaliação e monitoramento é visto como um dos caminhos para que a educação aconteça, de fato. Para

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Souza (2005), a avaliação permite comparar os resultados que a escola alcança com aqueles pretendidos em seu plano de metas. Como instrumento indicador, ela possibilita que novas proposições sejam acertadas, permitindo focar as áreas de atuação e delimitar os problemas a serem resolvidos. As informações que decorrem da avaliação podem indicar tanto o que os alunos sabem e o que eles precisam saber, quanto oferecer informações sobre o ensino e a proposta pedagógica da instituição.

Freire (2001) entende que a questão fundamental da educação é política, uma vez que sua atuação e seus resultados incidem não apenas sobre a aprendizagem do conteúdo, específica do aluno, mas a todo o conjunto de pessoas, antropologicamente entendidas como grupo, a que ela atinge. Enquanto objeto político que incide sobre os sujeitos históricos, a escola, no contexto da avaliação e do acompanhamento, tem que ver com

que conteúdos ensinar, a quem, a favor de quê, de quem, contra quê, contra quem, como ensinar. Tem que ver com quem decide sobre que conteúdo ensinar, que participação têm os estudantes, os pais, os professores, os movimentos populares na discussão em torno da organização dos conteúdos programáticos (FREIRE, 2001, p. 45).

Desta forma, pensar a avaliação está relacionado com entender, captar e selecionar entre os diversos problemas que envolvem a escola, aqueles cuja solução converge para a melhoria da qualidade da educação, que deve ser feita a partir da responsabilização de todos os envolvidos no processo educativo, visando consolidar as políticas públicas de maneira eficiente, bem como pensar medidas e políticas internas que contribuam para que a aprendizagem aconteça para todos.

Imprimir na escola procedimentos de gestão democrática requer desconstruir pontos de vista alienados e alienantes. Requer compreender e agir contra comportamentos de obediência e aceitação tácita, contra o entendimento da educação como assistencialismo e não como um direito humano e social. E contra o mais degradante dos entendimentos, a naturalização das condições

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sociais e da incapacidade dos alunos oriundos das camadas populares de aprender, além dos limites estabelecidos pela escola aristocrática.

A escola pública básica não anda bem, não porque faça parte de sua natureza não andar bem, como muita gente gostaria que fosse e insinua que é. A escola pública básica não anda bem, repitamos, por causa do descaso que as classes dominantes neste país têm por tudo que cheira a povo (FREIRE, 2001, p. 51).

Ao que Bourdieu (1989, p. 186) convalida,

Os que dominam [...] e têm interesses ligados com a existência e persistência desta instituição e com os ganhos específicos que ela assegura, encontram na liberdade, que o monopólio da produção e da imposição dos interesses políticos instituídos lhes deixa, a possibilidade de imporem os seus interesses de mandatários como sendo os interesses de seus mandantes.

Pensar a escola pública popular implica na desconstrução desses estigmas. Tal desconstrução faz-se ainda mais necessária e desafiadora quando se abre como pano de fundo desse cenário a Educação Infantil. Primeiro, porque durante toda a construção histórica da educação no país, a educação dos infantes foi alijada, enquanto educação básica, do processo das garantias, e, nessa perspectiva, as famílias das crianças, bem como a escola, padecem de indicadores de qualidade para delimitarem seus objetivos, acerca do que esperam da escola de Educação Infantil em termos pedagógicos e de construção sócio-histórica. E posteriormente, porque o pouco ou nenhum acesso à Educação Infantil, à época em que os pais das crianças eram alunos, e os aspectos sociais de assistência que a creche e a pré-escola têm conferido a esta etapa da educação fazem com que a esmagadora maioria dos pais e comunidade escolar das camadas populares entenda uma escola que carece de mudanças estruturais e formativas profundas, como boa ou muito boa.

Nestes termos, os conselhos escolares, as reuniões de pais e os conselhos de classe se constituem como locus privilegiado de debate, estudos, proposições e do fazer junto, acerca do que

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se espera da escola e de seus objetivos, mediante a frequência e a oitiva qualificada do grupo que vai tomando forma, conforme participa. É fato que, quanto mais se efetive os processos decisórios democráticos na escola, mais se amplia a sua qualidade. Todavia, sabe-se que ainda pesa aos conselhos o fato de seus representantes serem “capturados” pela necessidade burocrática e não possuírem atuação efetiva em seus espaços de ação. A esse respeito, Saviani observa que:

É importante registrar o desafio representado pelo modo como a representação popular é instituída nas instâncias governamentais na forma de Conselhos, Comissões ou Fóruns. [...] Assim, além de a representação popular ser geralmente minoritária, [...] não têm qualificação prévia nem estudo técnico dos assuntos a serem discutidos, não dispõem do tempo para o preparo das reuniões e às vezes sequer conseguem liberar-se do trabalho para estarem presentes nas reuniões. [...] seria preciso encontrar mecanismos que permitissem, ao menos, que os representantes populares participassem em condições equivalentes àquelas dos representantes dos setores governamentais (SAVIANI, 2013, p. 256).

O processo de empoderamento do coletivo democrático esbarra em duas questões necessárias de serem mitigadas para que os grupos participativos da escola possam se posicionar quanto à forma como veem a escola e o que esperam dela: a violência simbólica presente no silêncio das participações e a Ordem do Discurso, na qual os membros participantes observam uma espécie de obediência tácita de hierarquia, desconsiderando que nos movimentos democráticos todos deveriam caminhar com seus posicionamentos em pé de igualdade. Entender que o silêncio da escola é fruto da escola do silêncio é fundamental na luta pela efetivação da democracia nesse espaço social, entendida como instituição histórico-cultural de legitimação do poder.

Como lugar do debate, as reuniões colegiadas são acontecimentos recentemente incorporados, ou ainda, em fase de incorporação nas escolas. Entender as próprias funções parece bastante relevante para desmistificar as reuniões. A posse da fala é uma autorização cultural que precisa ser colocada

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em prática pelo sentimento de pertença. Advindos da escola tradicional, que sempre reconheceu como legítimo apenas certo tipo de linguagem, a qual determina substancialmente as estratificações sociais e as impõe hierarquicamente, pais e professores não se reconhecem enquanto produtores de discursos legítimos.

Há, no poder hierárquico – que precisa ser desmistificado para deixar de existir, uma vez que sua permanência tem que ver com o valor simbólico que exerce – ainda presente no espaço do coletivo democrático, o medo que a imposição do discurso incorpora. “[...] não nos encontramos no verdadeiro senão obedecendo às regras de uma ‘polícia’ discursiva que devemos reativar em cada um de nossos discursos” (FOUCAULT, 1996, p. 35).

Sem o pertencimento, o que se produz em reuniões burocratizadas são acenos consensuais de certa ingenuidade que se precisa tornar crítica, conforme orienta Freire. As pessoas ocupam espaços e suas ações limitam-se a lugares determinados por uma história educacional coercitiva e naturalizante. É preciso criar na escola o discurso e a ideologia democrática. Discurso que forma cidadãos que falam e que reconhecem como legítimo o direito de todos de participar e de atuar. Ainda que segundo esse autor:

Sabe-se que a educação, embora seja, de direito, o instrumento graças ao qual todo indivíduo, em uma sociedade como a nossa, pode ter acesso a qualquer tipo de discurso, segue, em sua distribuição, no que permite e no que impede, as linhas que estão marcadas pela distância, pelas oposições e lutas sociais. Todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, como os saberes e os poderes que eles trazem consigo (FOUCAULT, 1996, p. 43-44).

Os membros constitutivos da escola pública precisam se entender como sujeitos políticos, em suas singularidades, e, como grupos que agem por uma causa que acreditam pelo direito humano e social de educação com qualidade para todos como forma de emancipação.

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Análise e problematização do Projeto de Intervenção

A análise e a problematização apresentadas são o resultado das observações e das reflexões acerca das ações do projeto que se orientou por dois eixos básicos da escola democrática: a educação compreendida como um direito social a ser suprido pelo Estado e a gestão democrática da escola como meio indispensável à realização da finalidade social da educação.

A proposta de intervenção partiu da análise/avaliação de uma problemática considerada relevante, nestes termos, que se tratava da construção coletiva de um portfólio de avaliação e acompanhamento das aprendizagens dos alunos. Enquanto instrumento de trabalho acadêmico, caracterizou-se como um projeto vivencial, o qual partiu do pressuposto da pesquisa-ação, cujo objeto de atuação foi ao mesmo tempo, tanto da ação quanto da observação.

De acordo com Thiollent, apud Projeto Vivencial da Escola de Gestores da Educação Básica/UFOP (2013, p. 2),

Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com uma resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

A escolha da problemática relevante levou em consideração o cotidiano da escola: as crianças, seus pais, seus professores e os indícios que revelavam a qualidade da educação que recebiam. Os pais dos alunos e os educadores da escola, professores e cuidadores, foram os grupos delimitados para o campo de observação empírica e as técnicas de coleta de dados qualitativos se ativeram a grupos focais, diários de bordo, reuniões de estudo sequenciais e questionários.

A escola em que se deu o evento é uma instituição de Educação Infantil, situada em um bairro periférico, com demandas sociais ligadas a esse segmento. A comunidade do bairro compreende a população historicamente mais marginalizada, incidindo sobre o local a presença de influências ligadas às drogas ilícitas, ao tráfico

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e ao uso, ao considerável consumo de bebidas alcoólicas nas famílias e à baixa renda familiar, aliada ao número considerável de moradores/casa.

Para a maioria das crianças atendidas, a escola se constitui como o principal espaço social e de aprendizagem saudável, conforme os parâmetros do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Observando as pretensões que incluem os países em desenvolvimento, o UNICEF BRASIL, no relatório, Todas as crianças na escola em 2015 – Iniciativa global pelas crianças fora da escola orienta que,

Fundamental para assegurar o pleno desenvolvimento de crianças e adolescentes, a Educação Infantil também vem sendo uma das prioridades das políticas públicas nos últimos anos. Um bom atendimento nessa fase tem reflexos importantes para a evolução das crianças na etapa seguinte da educação escolar. A criança que frequenta a Educação Infantil acaba tendo, em média, um ano a mais de escolaridade do que a que entra na escola a partir do Ensino Fundamental e 32% mais probabilidade de concluir o Ensino Médio, benefício que é mais acentuado entre as crianças de famílias carentes, de acordo com a pesquisa sobre Padrões de Vida (PPV) do IBGE, 1996-1997. Isso acontece porque esses estudantes acabam desenvolvendo mais motivação para permanecer na escola, mesmo com dificuldades de aprendizado, e porque, ao ter mais tempo de exposição aos conteúdos dos anos iniciais de escolarização, chegam com melhor nível de conhecimento às etapas seguintes (UNICEF BRASIL, 2012, p. 88).

Atendidas, ainda que de modo precário em alguns setores da escola, essas crianças são filhas de famílias compostas por pelo menos quatro membros, 66% delas, nas quais apenas um ou nenhum responsável legal possui emprego formal, 67% das famílias é formada por pai, mãe e filhos e 14% das famílias são constituídas, apenas, por mãe e filhos. De acordo com entrevista para essa pesquisa realizada com os pais em 2013, no ato da matrícula para o ano subsequente, a renda familiar se firma no trabalho informal, muitas mães são diaristas, ou apoiam-se na aposentadoria dos avós, e, 86,7% das famílias no benefício Bolsa Família.

Nas reuniões de pais que antecederam ao projeto ficou nítido que eles não traziam expectativas no referente a conhecer as

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aprendizagens de seus filhos. Conduta forjada pela prática da escola, à qual estavam habituados. As reuniões possuíam um formato cuja presença do gestor escolar era figurativa, o gestor estava na escola à disposição para quaisquer esclarecimentos, e o evento acontecia dentro das salas de aulas, na presença das crianças.

Os assuntos discutidos eram o comportamento dos pequenos, se cada aluno estava bom ou fraco e se faziam os deveres. A aprendizagem das crianças era definida pelos critérios bom, fraco e “está melhorando”, ou “seu filho X aprende”, “é devagar mesmo”, “precisa de acompanhamento” ou “de reforço”. A família levava para casa tais conceituações classificatórias como a forma de a escola avaliar a criança.

A forma de descrever as aprendizagens do aluno a partir de juízos de valores como bom, ruim, fraco, forte, devagar e a aceitação tácita desse julgamento, feito por pessoa em condição hierárquica naturalizada, referenda o entendimento de Bourdieu (Pro-Posições, 2013, p. 227) acerca da formação do inconsciente escolar, o qual entende que,

[...] é imputável a todos os ambientes escolares. É, portanto, em grande parte, comum a todos os produtos de um mesmo sistema escolar – nacional – ou, sob uma forma especificada a todos os membros de uma mesma disciplina. Ele é aquilo que faz com que, para além das diferenças, associadas notadamente às disciplinas, e das concorrências, os produtos de um sistema escolar nacional apresentem um conjunto de disposições comuns, frequentemente imputadas a um ‘caráter nacional’; que permite compreender por meias palavras e possibilita que muitas coisas, não necessariamente as menos importantes, sejam compreendidas sem que seja necessário falar delas.

A partir do entendimento dessa praxe, construir com o coletivo dos pais um instrumento que orientasse sobre a aprendizagem de seus filhos, para além de classificações, era uma das intenções do portfólio. Era preciso buscar uma participação que revelasse o que a família esperava da escola, ao passo que a escola também pudesse revelar à família o que esperar dela. A outra intenção era exatamente entender o porquê dos professores informarem a aprendizagem de seus alunos dessa maneira.

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Ao solicitar o compartilhamento da organização do trabalho pedagógico foi possível perceber que os professores não possuíam um planejamento anual, nem uma referência curricular da Educação Infantil que os orientasse, tampouco possuíam um histórico de apoio pedagógico da gestão escolar, além de tempo didático determinado para a construção coletiva e compreensiva desses mecanismos de planejamento.

Apesar da existência dos Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI), tal documento não se constituía como instrumento de trabalho do grupo de professores. Era preciso construir o portfólio, também, sob a perspectiva do coletivo dos professores, de modo que o currículo da instituição considerasse as teorias contemporâneas do desenvolvimento infantil e que fosse estabelecido por meio de uma prática pertinente.

Observando-se o quadro docente, verifica-se que todas as professoras da escola possuem formação em nível superior. Desse contingente, 53,3% tem mais de 20 anos de profissão, 40% está há mais de dez anos na instituição e 33,3% está há pelo menos três anos. Menos de 10% das professoras possui menos de dez anos de profissão.

Gráfico 1 – Tempo de profissão das professoras da escola.

Fonte: Arquivo pessoal. (Produzido para essa pesquisa), 2014.

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Ao longo dos históricos profissionais, nenhuma professora participou, alguma vez, de curso ou formação continuada destinada à Educação Infantil. De acordo com uma pesquisa informal no Arquivo da SME/RP-MG, em fevereiro de 2013, 61,5% das professoras da Educação Infantil estão na profissão por fatalidade, 23% estão na profissão por algum tipo de relação afetiva e apenas 15,5% das professoras por opção.

O estudo acima visou compreender como as professoras de Educação Infantil se percebem, devido à grande resistência dos profissionais de educação de ingressarem em salas de aula desse segmento. Objetivou também apontar variáveis que orientassem a busca de diretrizes para uma possível formação continuada. A pesquisa qualitativa se estabeleceu em torno de quatro perguntas: O que é ser mulher na sociedade; O que é ser mulher trabalhadora na sociedade; O que é ser mulher professora e O que é ser professora no município.

De acordo com os dados, 50% das professoras sentem-se desvalorizadas, 37% buscam reconhecimento e 12,5% alegaram trabalhar por necessidade e para o sustento. Com relação à profissão, mais da metade das professoras alegou estar na profissão por fatalidade, porque foram obrigadas, por falta de opção, por não ter outro curso a se fazer ou porque, “já que entrou tem que fazer direito”. O estudo, embora informal, ajudou a esclarecer a grande dificuldade de as professoras definirem as funções atribuídas à sua profissão e o porquê de a maioria não entender o magistério como uma profissão, atribuindo-lhe características apenas de serviço e de trabalho.

Diante do levantamento acerca da realidade local, do cotidiano da escola, das características e comportamentos de pais e professores e do desenvolvimento dos alunos delineou-se o projeto de intervenção. A proposta foi construída para ser executada em um período de seis meses. As discussões teóricas que permearam o planejamento basearam-se no levantamento de pontos que incitavam o debate sobre a escola democrática, o currículo contextualizado com o universo local e a compreensão do que seja um portfólio e porque é necessário que ele seja construído com o coletivo da escola.

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O desenvolver de um cronograma com propostas sequenciadas permitiu perceber a necessidade de contextualizar as discussões com vídeos que serviriam de suporte para iniciar os debates e endossar o que era discutido à luz da realidade local. Os conceitos de educação para todos, qualidade na educação, as relações família e escola e a função social da escola foram os temas abordados pelos filmes.

O recurso didático surgiu das reflexões sobre a primeira ação e intentava vencer a barreira do silêncio que se instaurava nas reuniões. Outra medida tomada a partir das primeiras reflexões foi a prática de leituras de fruição estética, sempre no início dos encontros. Lia-se pelo prazer de ler e ouvir histórias antes de começar as discussões, uma vez que se diagnosticou que os pais não conheciam e nunca tiveram acesso ao acervo literário da escola.

No referente aos grupos de estudo com as professoras, percebeu-se o problema de documentos e regras estabelecidos verticalmente e sem participação coletiva. Diante de perguntas sobre conhecer o portfólio e o Projeto político pedagógico (PPP) da escola, o silêncio e expressões de estranhamento se estabeleceram profundamente. Foi possível identificar que nenhum professor tivera acesso ou sabia da existência do documento e que a concepção de portfólio era de um compilado de escritas espontâneas dos alunos. Tal constatação deixou o grupo desconfortável e apontava para a necessidade de formar um grupo de estudos permanente.

Sobre o apropriar-se das próprias funções e a dificuldade de comunicação, evidenciou-se pontos desconhecidos do currículo da Educação Infantil. Com relação às expectativas quanto ao apoio pedagógico, as respostas, umas mediadas pelas outras, centraram-se no medo de errar e no desejo de direcionamento. “A gente não sabe o que é para trabalhar, se está trabalhando muito, se está pouco, se pode ‘puxar’ mais.” (professora 3).

Para Bourdieu (1989, p. 15; p. 39),

O que faz o poder das palavras e das palavras de ordem, poder de manter a ordem ou a de a subverter, é a crença na legitimidade das palavras e daquele que as pronuncia, crença cuja produção não é da competência das palavras. [...] A linguagem levanta um problema particularmente dramático [...] ela é, com

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efeito, um enorme depósito de pré-construções naturalizadas, portanto ignoradas como tal que funcionam como instrumentos inconscientes de construção.

As discussões apontavam, também, para um conhecimento superficial ou desconhecimento completo do referencial curricular da Educação Infantil e para a ausência de planejamento baseado em metas e objetivos relacionados ao desenvolvimento infantil. O estudo de um possível currículo era, portanto, uma necessidade urgente.

Sobre os planejamentos e discussões coletivas Souza (2005, p. 22) orienta que,

as discussões coletivas entre todo o professorado sobre o currículo da escola, suas escolhas metodológicas, as definições de conteúdo e as práticas avaliativas, isto é, o constante estudo sobre as questões mais pedagógicas é muito importante de ser desenvolvido no interior da escola, para tanto a escola deve organizar o tempo necessário para isto, na constituição de momentos de formação continuada e de reuniões pedagógicas e essas ações poderão levar à melhoria do ensino e consequentemente a uma aprendizagem mais qualificada.

A dificuldade de transposição de paradigmas foi observada por meio da rejeição ao trabalho em grupo com as crianças, escondida em justificativas contraditórias como na passagem, “Atividades em grupo não dá pra mim, o espaço da sala é muito pequeno para trabalho em grupo, tenho que planejar de acordo com meu espaço” (professora 4), e, “os meninos têm muita dificuldade de concentração e de obedecer às nossos comandos, a gente fala, fala e eles não entendem nada” (professora 3), “é porque eles vêm assim de casa” (professora 1), “eles acham que a escola é a continuação da casa deles.” (professora 2). Era nítido nos relatos o desejo de todo o grupo de ter alunos silenciosos e com seus corpos de três, quatro e cinco anos de idade disciplinados à carteira escolar.

A reflexão sobre “o que sabemos que nossos alunos já sabem” e “o que sabemos que nossos alunos precisam aprender” desvelou avaliações superficiais e baseadas em deduções e no perfil fisiológico das crianças. “Sabíamos as etapas do desenvolvimento infantil e

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os níveis de evolução da escrita, mas não sabíamos quantos alunos tínhamos em cada situação, nem quem estava como e nem que eram tantos” (professora 3).

A análise dos primeiros resultados ofereceu indicadores que obrigavam à busca dos referenciais curriculares. Se o professor não sabe, de modo prático-teórico e descritivo (dentro das competências necessárias à sua profissão) o que um aluno sabe, não há possibilidade de que ensine dentro das necessidades reais de aprendizagem das crianças, logo, os aprendizes desenvolvem menos suas capacidades e o professor perde tempo didático, porque terá sempre de retornar com medidas paliativas, tentando recuperar o que acredita que as crianças tenham perdido.

Se a escola não tem clareza do que ensina, que é a sua função primeira, ela não tem como dividir com as famílias o que seus filhos aprendem.

Dessa forma, foram analisadas, com as professoras, as relações e dissensões estabelecidas entre três parâmetros: o ensinar, o aprender e qual a concepção de criança a escola aborda e, se existe nexo entre o que foi ensinado pela escola e as expectativas quanto ao desenvolvimento dos pequenos. Os posicionamentos se estabeleceram em torno da ética, da formação de sujeitos históricos e de valores como responsabilidade, solidariedade e pertencimento. Concluiu-se que o que as crianças aprendem não é a resposta do que a escola ensina. Por isso é que,

[...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. [...] O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto, que quase se confunda com a prática. O seu ‘distanciamento’ epistemológico da prática enquanto objeto de sua análise, deve ‘aproximá-lo’ ao máximo. Quanto melhor faça essa operação tanto mais inteligência ganha na prática em análise e maior comunicabilidade exerce em torno da superação da ingenuidade pela rigorosidade (FREIRE, 2004, p. 39).

Diante da colocação específica, “esperamos que reconheçam a importância da escola para suas vidas”, obteve-se a possibilidade de concluir com o grupo um conceito coletivo acerca de qual seja a função social da escola. Conceito validado na discussão sobre a

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importância dos professores na vida dos alunos e no reconhecimento da transmissão implícita de valores como a partilha de crenças, concomitante aos espaços de abertura de pensamento que também podem ser oferecidos pela educação, os quais contribuíram para desconstruir a ideia de naturalização do espaço escola, entendendo-o como uma construção social.

Bourdieu (1989, p. 141) entende que,

As categorias de percepção do mundo social [...] levam os agentes a tomarem o mundo social tal como ele é, a aceitarem-no como natural, mais do que a rebelarem-se contra ele, a oporem-lhes possíveis diferentes [...] implica uma aceitação tácita da posição..

As discussões finais sobre o portfólio foram baseadas na provocação, “o que é possível medir?”, para a qual o grupo estabeleceu que é possível medir os avanços, os retrocessos e as estagnações, conforme observáveis pré-estabelecidas.

Para Souza (2005), a avaliação deve servir para identificar em que medida os resultados alcançados se aproximam dos objetivos, permitindo que as questões consideradas distantes sejam alvo de planejamentos mais precisos. Além de contribuir para a resolução dos problemas, os procedimentos permitem compreender as razões dos resultados obtidos.

Os aspectos afetivos também foram considerados como observáveis. Dentre eles os mais mencionados dizem respeito ao que as crianças trazem de casa. Boa parte dos professores considerava aspectos negativos dos comportamentos e emoções das crianças, como “as crianças trazem expressões que não são de crianças” (professora 3), “elas falam muitas coisas que fazem alusão ao sexo” (professora 4), “elas gostam de falar de polícia’’ (professora 5), “nas segundas-feiras as crianças trazem um aspecto repreendido ou agressivo” (professora 6). A partir dos elementos levantados, que dialogavam também com os eixos pertinentes ao RCNEI, foram estabelecidas as questões que fariam parte da construção do portfólio.

A proposta de intervenção com os pais contou com reuniões, grupo focal e entrevistas. As primeiras reuniões trataram das garantias do direito à educação perante a lei. Foram reuniões

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bastante silenciosas, com várias intervenções para que as pessoas falassem e mesmo as que falavam, emitiam frases muito curtas. Fato que pode ser associado ao que Foucault menciona abaixo:

Em uma sociedade como a nossa [...] sabe-se bem que não se tem o direito de dizer tudo, que não se pode falar de tudo em qualquer circunstância, que qualquer um, enfim, não pode falar de qualquer coisa. Tabu do objeto, ritual da circunstância, direito privilegiado ou exclusivo do sujeito que fala (FOUCAULT, 1996, p. 9).

A situação mais conflitante para reflexão foi o fato de as mães assistirem à reunião do lado de fora da porta e da janela da sala, mesmo havendo espaço para que se acomodassem entre o grupo.

Das primeiras reflexões surgiu a necessidade de se pensar reuniões em que as pessoas tivessem argumentos, para além da realidade da escola, para se manifestar e que todos se sentissem autorizados a fazer parte do grupo.

A vontade e a motivação para aprender, bem como quais são as crianças que ficam fora da escola e os meandros do preconceito foram temas abordados a partir da mediação com os vídeos. Esse foi o debate mais impactante no sentido de os pais revelarem suas emoções. Muitos se reconheceram como crianças que foram educadas no campo e nas cenas de exclusão apresentadas. Esse foi também o primeiro momento em que os pais se permitiram falar de seus incômodos, “Esse ano meu filho está muito agitado, chega em casa contando que cada dia chega uma professora nova na sala. Ele está aprendendo pouco. No ano passado não estava assim.” (pai 1). Tal depoimento foi o instrumento utilizado para propor ao grupo discutir o que precisavam saber que seus filhos estavam estudando e o que esperavam que seus filhos aprendessem na escola.

A função social da escola foi o último tema de discussão. Sob a mediação, “A escola também é um espaço de conflito?” os pais disseram que, “Sim, a escola é um espaço de conflito porque falta diálogo. Acontecem coisas que a escola não sabe, que os professores não sabem e que os pais não sabem. As perguntas precisam ser feitas para melhorar a escola, para conseguir mais verba do governo” (mãe 1). A possibilidade de os pais fazerem

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perguntas contribuiu para horizontalizar as participações, num momento em que uma das grandes preocupações do processo de implementação da gestão democrática é a transformação desse processo em “simples organização formal dos espaços de representação” (SOUZA, 2005, p. 15).

Ao serem perguntados se a escola, hoje como está, é boa para seus filhos, as principais questões observadas foram aquelas ligadas à infraestrutura. As observações realizadas apontavam para a satisfação da maioria dos pais com a aprendizagem de seus filhos. A fim de se obter um número maior de indícios sobre essa observável, uma pesquisa escrita, amostral, foi enviada aleatoriamente a 20% dos pais. Seis questões com respostas fechadas foram mandadas para casa. As questões foram basicamente, referentes a como foi o desenvolvimento da criança durante o ano escolar, o que ela mais aprendeu, como compartilhava com a família suas aprendizagens, qual o interesse da criança pela escola, como percebiam o caderno dos filhos e qual avaliação a família fazia da escola.

Gráfico 2 – Como a família percebeu o desenvolvimento do filho

Fonte: Arquivo pessoal. (Produzido para essa pesquisa), 2014.

Apenas 17% dos pais consideraram o desenvolvimento de seus filhos regular ou ruim, 59% consideraram o desenvolvimento ótimo. Escrever foi a competência mais aprendida, 44%, seguida de 25% de aprendizagens acerca do respeito às regras. 65% das crianças contam espontaneamente como foi a aula e 94% delas gostam de vir à escola. 59% dos pais consideraram o caderno das crianças

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bonito, organizado e com todas as atividades. Apenas 6% dos pais não estavam satisfeitos com o material. Ao avaliarem a escola, 76% dos pais consideraram a escola ótima ou muito boa e apenas 24% percebeu que a escola é boa, mas precisa melhorar em alguns aspectos.

De posse dos dados quantificados, era preciso entender quais eram as possíveis razões escondidas nas entrelinhas dos números. O grupo focal foi a metodologia utilizada para esse fim. As perguntas mediadoras das discussões foram: “Que diferença os estudos fizeram ou não em suas vidas? Como era a escola no tempo em que iniciaram seus estudos? Vocês gostariam que seus filhos tivessem a mesma profissão dos pais? O que representa a escola para a comunidade? Em que a escola contribui para a aprendizagem de seus filhos? O que gostariam que seus filhos aprendessem? e A que atribuem o silêncio da maioria dos pais?”.

A respeito da importância dos estudos em suas vidas, as mães disseram que o estudo fez e faz tanta falta que interfere, inclusive, no fato de conseguirem ou não, acompanhar os deveres dos filhos. Há mães que voltaram a estudar para poder ajudá-los na escola. Comentaram que, no tempo em que estudavam, final da década de 70 e início da década de 80, eram muito pobres, os cadernos eram guardados em pacotes de arroz, dentro de embornais. Todas as mães do grupo focal começaram a trabalhar ainda adolescentes, todas de doméstica. Apesar de se orgulharem da faxina que ainda fazem, nenhuma das mães admite a hipótese de que seus filhos sigam a profissão dos pais. “Joaozinho (nome fictício) - 5 anos - vai fazer faculdade, ele vai ser médico. É por isso que voltei a estudar. Quando ele era bebê, na casa de minha mãe, disse assim: ‘Cadê o médico da mamãe?’ e minha mãe disse: ‘O que é isso minha filha? Não existe médico preto!’ e eu disse que ele seria sim e que eu sonho alto pra que ele alcance o melhor.” (mãe 2).

A escola é considerada como muito boa para a comunidade, as respostas a essa questão se concentraram no apoio ao combate da vulnerabilidade social. “A escola é muito boa. Tirou os meninos da rua. Ajudou crianças que passavam falta, com família numerosa. Ajudou as crianças e as famílias. Muitas entraram aqui magrinhas e saíram umas pelotinhas.” (mãe 1). “É muito boa. O meu filho pede pra ler pra ele todas as noites e esse foi um hábito adquirido

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na escola.” (mãe 3). A respeito do que esperam que as crianças aprendam disseram, “Nós não estamos estudando o portfólio?”, a resposta revelava o início do processo de empoderamento e de sentimento de pertença do grupo.

Sobre o fato de a escola considerar o grupo de pais muito silencioso e o que pensavam a respeito disso, a retaliação dos filhos foi a principal resposta. “Aqui tem mães que não participam por não atribuírem tanto valor.” (mãe 3), “As mães dos meninos assim, mais burros, não gostam de falar” (mãe 1), “Os pais não procuram a escola, as queixas acontecem com os vizinhos” (mãe 3), “Tem pais que têm medo de falar e vingar nas crianças.”(mãe 1), “A gente tem que ter abertura para ir na escola e ouvir e falar.”(mãe 2), “Acontece que tem pais que não cuida e não acompanha, então senti medo, mas senti culpa também pelo descuido com o filho.”(mãe 3), e a resposta que mais provocou incômodo no processo de análise das falas: “Olha, quando os pais fazem muito silêncio é porque têm cumplicidade”.

A condição histórica dos pais, revelada no narrar dos fatos e no uso das expressões, explicitou como o ambiente interfere nos processos de formação dos sujeitos, o modo como esses sujeitos atuam como reprodutores da realidade e o quanto é difícil superar estigmas naturalizantes. De acordo com Bourdieu (1989), a cultura que une é também a cultura que separa e legitima as distinções.

A respeito da necessidade de se desenvolver o processo emancipatório da autonomia, Freire (2004, p. 81) orienta que:

O diálogo em que se vai desafiando o grupo popular a pensar sua história social como a experiência igualmente social de seus membros, vai revelando a necessidade de superar certos saberes que, desnudados, vão mostrar sua ‘incompetência’ para explicar os fatos..

Ao que Bourdieu (1989) também se posiciona:

Reduzir os agentes ao papel de executantes, vítimas ou cúmplices, de uma política inscrita na Essência dos aparelhos, é permitirmo-nos deduzir a existência da Essência, ler as condutas na descrição dos Aparelhos e, ao mesmo tempo, fugir à observação das práticas e identificar a pesquisa como a leitura de discursos encarados como matrizes reais das práticas.

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Tanto os pais quanto os professores percebem a importância da escola na vida do aluno e o quanto ela pode ser promotora de mudanças em seu status quo. A educação tem sua função social reconhecida e o processo de construção da escola democrática tem se apresentado como uma abertura bastante contemporânea, com a qual os atores da relação escolar começam a se envolver.

As resistências fazem parte tanto do processo de abertura, quanto do processo histórico de sujeição e de hierarquização das classes e posições sociais. Vencer as barreiras de um paradigma que se reconstrói todos os dias com sutileza e como uma condição natural não é tarefa simples.

Oportunizar o diálogo e as participações faz parte de um grupo de condutas que precisam ser planejadas e horizontalizadas. Para o Ministério da Educação, em o caderno, Conselhos Escolares: uma estratégia de gestão democrática da escola pública (2004), “no exercício do poder está a essência da democracia. E a qualidade do exercício do poder está referida ao espaço da autonomia que fundamenta o ser cidadão e a finalidade da instituição educacional” (MEC, Conselhos Escolares: uma estratégia de gestão democrática da escola pública, 2004, p. 5).

Nenhum discurso democrático se fundamenta sem espaços de abertura que ofereçam oportunidade e conhecimento, sob pena de se tornar apenas reprodução ideológica. Formar e executar são ações indissociáveis quando se pretende fortalecer os mecanismos de participação, descentralizando as tomadas de decisão. Tanto mais elas serão democráticas, quanto mais se aprimorem como prática e como reflexões sobre essa mesma prática.

Considerações finaisA gestão democrática da educação é um processo permanente de

espaços de discussão, participação e de sucessivas reflexões acerca das experiências vivenciadas na escola. Ultrapassa o compartilhar e se estabelece no fazer coletivo, observando as necessidades e as especificidades locais, bem como a sua história.

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Considerar o contexto sócio-histórico da comunidade escolar e compreender as variáveis que delimitam a realidade local são possibilidades que embasam as decisões coletivas e que clareiam as metas da instituição, contribuindo para a ampliação da qualidade social almejada.

Construir um coletivo escolar participativo requer compreender que em muitas das experiências a escola parecerá “não sair do lugar” e que é preciso resistir ao processo mais simples e rápido de concentrar as decisões na figura do gestor escolar. A educação não possui um histórico de formação que viabilize esse ensejo. Na escola pública brasileira os mecanismos de participação se constroem ao mesmo tempo em que se formam, delegam e são instrumentos da ação.

A escola democrática que visa construir mecanismos de participação e descentralizar a gestão é orientada por dois princípios: a educação compreendida como um direito social a ser suprido pelo Estado e a gestão democrática da escola como meio indispensável à realização da finalidade social da educação. Entender essas diretrizes significa saber que a participação coletiva não se limita à gestão financeira compartilhada da escola, mas conhecer e intervir, para se construir juntos, o calendário mais adequado, os processos de avaliação, o planejamento, o currículo, as programações sociais e da família na instituição e o projeto político-pedagógico, que é a sua carta de intenções.

Ao se desenvolver um trabalho que busque o fortalecimento do coletivo participativo é preciso considerar, de início, dois grupos distintos que precisam ser ouvidos em suas peculiaridades e necessidades, de forma que a caracterização de cada um deles contribua para as reflexões que posteriormente farão o alinhamento de ambos: o grupo dos pais e o grupo dos professores. Clareza quanto às distinções desses dois grupos é fundamental para perceber que eles veem a escola de formas diferentes e esperam coisas diferentes dela. A função social da escola não é a mesma para os dois grupos. O alinhamento das possibilidades que convergem para um núcleo comum de expectativas deve fazer parte do planejamento de uma gestão que se pretende descentralizar.

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Construir o portfólio como um instrumento de avaliação e acompanhamento das aprendizagens dos alunos, sob a perspectiva mais contemporânea do desenvolvimento da Educação Infantil, considerando as possibilidades da realidade local e do contexto histórico-social, foi a problemática relacionada à escola democrática, alvo do projeto de intervenção, objeto dessa análise. Desenvolvê-lo por meio das provocações: “o que esperamos que nossos filhos e nossos alunos aprendam” e “o que sabemos que eles já sabem e o que sabemos que eles precisam aprender”, objetivou contextualizar o currículo à realidade da escola e às necessidades de cada criança em suas especificidades, bem como ampliar a presença e a participação dos pais na escola.

Um cronograma de reuniões sequenciadas, entrevistas e grupos focais foram os instrumentos de coleta de dados que revelaram que o silêncio da escola é fruto da perpetuação da escola do silêncio, ao que Bourdieu denominou inconsciente escolar.

A pesquisa com os professores revelou profissionais com longos anos de carreira em um mesmo segmento da educação que nunca tiveram a possibilidade de refletir sobre o próprio trabalho. A superficialidade do conhecimento acerca do currículo e dos Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Infantil é demonstrada em as metodologias de aula tradicionais e nas expectativas contraditórias acerca do que esperam de seus alunos.

O desejo de alunos autônomos, proativos e com bom espírito de convivência contrasta com a resistência ao trabalho em grupo, o falar limitado à autorização do professor e o tempo em que permanecem sentados enfileirados na sala de aula. Nesse espaço-tempo, os professores têm dificuldade de definir o que estão ensinando e se calam ao debate, esperando que a proposta curricular e o plano anual, bem como os critérios de avaliação cheguem hierarquicamente às suas mãos.

Fruto de uma ideologia histórica da educação, que visa alunos passivos e reprodutores de conhecimento e da própria realidade, ao mesmo tempo em que os professores demandam espaços de formação, fica evidente o incômodo de ter que refletir sobre a própria prática, estabelecendo-se o silêncio. O conceito de formação ainda perpassa a ideia de estudar os instrumentos que já vêm prontos para aplicá-los adequadamente.

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Boas reflexões não redefinem de imediato as práticas habituais. No inconsciente escolar do grupo, o desenvolvimento educacional das crianças é diretamente proporcional à educação familiar. Nesse ínterim, o baixo desenvolvimento também está condicionado às individualidades familiares. A possibilidade de ampliar os mecanismos de participação dos professores almeja o entendimento de que a escola tem responsabilidade sobre o ensino que oferece e que ela é o espaço formal dessa oferta.

O trabalho com o grupo de pais também revelou um silêncio fruto da aceitação tácita da situação e de seu entendimento como o melhor. A ideia de hierarquia como detentora da verdade, do discurso de Foucault, é uma realidade proeminente. O currículo é entendido como aquilo que os professores relatam que os alunos sabem, o que eles não sabem, se estão ruins ou se estão “bonzinhos”.

Os espaços de discussão demandam aberturas de diálogo para além da realidade imediata, baseada no princípio da empatia, no qual as pessoas se reconhecem a partir da perspectiva do outro e, então, conseguem tornar observável sua própria condição.

Fica inviável construir mecanismos de participação sem planejamentos baseados na reflexão das próprias práticas. É no repensar das ações que se faz possível construir ambientes que permitam que os participantes questionem, observem e se posicionem. As resistências fazem parte tanto do processo de abertura, quanto do processo histórico de sujeição e de hierarquização das classes e posições sociais.

Vencer as barreiras de um paradigma que se reconstrói todos os dias com sutileza e como uma condição natural não é tarefa simples. Oportunizar o diálogo e as participações faz parte de um grupo de condutas que precisam ser planejadas e horizontalizadas para ajudar a construir o discurso dos atores da escola, Validar os diferentes pontos de vista e mediar as interseções a favor do desenvolvimento da instituição e da qualidade da educação são pressupostos da escola democrática.

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O caminho da democratização escolar: entre a premência do institucional e a informalidade do social

Wagner Diniz MoraisEdilene Eras

IntroduçãoO presente capítulo compreende uma síntese do Trabalho de

Conclusão do Curso de Especialização em Gestão Escolar – Escola de Gestores da Educação Básica – oferecido na modalidade de educação à distância, pela Universidade Federal de Ouro Preto.

Mesmo tendo a realidade específica de uma escola como objeto de análise e foco da reflexão aqui desenvolvida, um pressuposto fundamental que este trabalho assume é o de que nenhuma escola deve ser compreendida como se existisse em um vácuo, como uma unidade apartada e isolada, sem conexão com conjuntos institucionais e sociais mais amplos.

Sob esse pressuposto, o qual procura compreender a escola como uma entidade permeável às dinâmicas institucionais e sociais, que a afetam direta e decisivamente, este capítulo colocará em análise a trajetória de democratização do Colégio Municipal Professora Didi Andrade (CMPDA), escola pública de Educação Infantil e Ensino Fundamental, do município de Itabira – Minas Gerais.

Com a plena consciência e sem qualquer pretensão de que o espaço deste trabalho seja preenchido com reflexões mais aprofundadas das áreas da sociologia e da política educacionais, este trabalho procurará destacar e analisar alguns fatos recentes, referentes aos dois últimos anos (2012-2013) na história desta unidade escolar. O intuito da análise é elaborar uma compreensão mínima sobre como os fatos deste período do recorte favorecem ou comprometem a qualidade das medidas de democratização da gestão escolar, nesta escola.

Para isso, tomaram-se por base alguns questionamentos, quais sejam:

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1º: como os fatores de celeridade e de centralização da responsabilidade, a partir das demandas e premências do institucional, podem converter mecanismos de democratização da gestão da escola pública em mecanismos burocráticos e até mesmo antidemocráticos? 2º: ao conjunto disperso de pessoas, ao qual se atribui o nome de comunidade escolar – geralmente com algum grau de autossuficiência, com elementos para se reconhecerem como representação coletiva ou grupo de interesse – ou será que conviria atribuir a ela outro nome, mais atinente ao seu caráter de dispersão? 3º: a demanda pela democratização da gestão escolar surge como uma demanda do social ou como uma demanda do institucional? Haveria diferença caso a demanda pela democratização da gestão da escola surja de um campo (social) ou de outro (institucional), na qualidade da democratização que pode vir a ser praticada na escola? 4º: qual a relação entre a escola e os movimentos sociais e como a participação democrática tende a aparecer em cada um destes contextos? Quais são afinal os limites da participação formal e induzida, bem como de todos os produtos visados pela assunção formal do princípio da gestão democrática da educação?

Constitui-se como objetivo central deste trabalho desvelar ou tornar visível o quanto o institucional pode mascarar e até impedir a experiência social na escola, do princípio de gestão democrática da educação pública, principalmente, quando os assim chamados “produtos” da gestão democrática acabam sendo mais enfatizados e ansiados do que os meios e os processos que devem levar até eles.

Pode-se afirmar que, a mera existência formal na escola de mecanismos como o Conselho Escolar, a Associação de Pais e Mestres, o Grêmio Estudantil, entre outros, bem como a existência de instrumentos como o Projeto Político Pedagógico (PPP) e o Regimento Escolar são indicadores fracos ou insuficientes para se avaliar a qualidade da democratização praticada por qualquer instituição de ensino.

Institucionalmente, a simples existência de todos esses mecanismos e instrumentos pode até parecer suficiente, no entanto, como acontece em muitos casos, pode ser que esses mesmos mecanismos e instrumentos disponham de um significado e

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relevância social mínima ou nula, conforme seja a sua organização, e, de acordo com os conteúdos que eles apresentem. Figurando apenas como uma existência pro forma.

Outro objetivo é, a partir da ação de recontar os fatos recentes da história dessa escola, e, de alguma maneira recriá-los, abrir oportunidade para a avaliação e transformação da própria prática de administração desta unidade escolar1.

O cotejamento dos fatos recentes da unidade em foco, com os conceitos que compõem o referencial teórico deste trabalho, acaba por informar também, sobre a metodologia de pesquisa aqui adotada, um tipo de pesquisa denominado pesquisa-ação, em que a prática é entendida enquanto práxis e, na qual, os sujeitos, completamente imersos na situação social em estudo, “ao pesquisarem sua própria prática produzem novos conhecimentos e, ao assim fazê-lo, apropriam-se e ressignificam sua prática, produzindo novos compromissos, de cunho crítico, com a realidade em que atuam” (MEC, Projeto-intervenção, [s.d], p. 2).

Além da metodologia da pesquisa-ação, o método do estudo de caso também perfaz importante procedimento científico para este trabalho. Paro (2000) demonstra o valor do estudo de caso pelos elementos “explicativos” e de “exemplaridade”, que podem se fazer presentes nesse tipo de pesquisa, no sentido do pesquisador fazer apostas explicativas para determinadas ocorrências e, porventura verificar, diante de fenômenos similares, a pertinência ou validade de suas apostas.

E ainda, porventura, conseguir, a partir de um caso analisado, fazer a transposição do singular para o universal, na medida em que a compreensão sobre determinada unidade de ensino permita trazer na sua esteira alguma compreensão válida sobre os sistemas de ensino, como conjuntos maiores ou contextos englobadores.

Paro procura ainda mostrar o valor do estudo de caso pela própria necessidade de se considerar seriamente a eficácia de objetivos, que partem das instâncias superiores dos sistemas, de maneira a saber como estes objetivos “estariam sendo alcançados na ponta inferior dessa cadeia, ou seja, no local onde se dá a apropriação dos serviços educacionais pela população” (Paro, 2000, p. 83).

1 Um dos autores do capítulo esteve inserido, na condição de vice-diretor, na escola analisada.

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O interesse de aproximar o mais de perto e relacionar de maneira o mais estreita possível o cotidiano da escola com as orientações e demandas das diversas instâncias institucionais, está relacionado ao interesse de averiguar como um determinado contexto escolar acaba recebendo e se apropriando de todas as orientações e demandas das instâncias superiores de poder, cujas decisões estão sempre a afetar, de maneira positiva ou negativa, o trabalho e a rotina das escolas.

A propósito da gestão democrática da educação pública, por exemplo, pode ser muito interessante observar como, mesmo os discursos e as medidas de ação muito bem fundamentados e bem-intencionados, revestidos do melhor espírito ou verniz democrático, mesmo eles podem ser recebidos como atitude de imposição burocrática, se os seus autores desconsideram justamente as condições de recepção das propostas entre os sujeitos que se querem envolvidos.

Gestão democrática“O fórum será social ou institucional?” Esta breve pergunta

constante no Caderno de Número 12, do material de apoio do Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares (MEC/SEB) serve como elemento gerador de uma polarização sobre a qual orbitam muitas das argumentações e reflexões do presente capítulo e, assim sendo, as noções do que seja o institucional e também o social são de fundamental importância dentro do referencial teórico deste trabalho.

No texto “Estado, democracia e institucionalização das lutas sociais nas práticas educativas do MST: um estudo de caso da escola itinerante”, Viegas e Luciano (2011) citam um trecho do livro “Educação e Contradição” de Carlos Roberto Jamil Cury, no qual o conceito de institucionalização se traduz basicamente pela ação de atribuir “certa forma” ao que é “espontâneo”. Essa ação é marcada, no entanto, por uma ambiguidade fundamental, de modo que as instituições “ao mesmo tempo em que conformam, refinam, ao mesmo tempo em que reproduzem também transformam” (CURY apud VIEGAS; LUCIANO, 2011, p. 331).

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Este enfoque particular daquilo que se denomina aqui como institucional permite, de um lado, situar o seu par oposto – o social – dentro daquilo que Cury chama de espontâneo, abrindo assim uma perspectiva, por outro lado, de aperfeiçoamento das instituições, quando elas apresentam potenciais não apenas de conformação e reprodução, mas também de refinamento e transformação das relações sociais.

Outro ponto de vista, mais comum e mais dicotômico, acerca da relação entre o institucional e o social, associa o primeiro termo a ideias como as de desmobilização, distanciamento no tocante aos interesses das bases sociais, especialização, hierarquização, engessamento de processos e burocratização. Enquanto que o segundo termo perfaz todo o conjunto de ideias que escapam ou são contrárias àquelas a que estão associadas o primeiro.

Certo é que este trabalho assume o enfoque dicotômico do par conceitual institucional-social, por considerar, ao contrário de Cury, que as instituições apresentam uma tendência maior à conformação e à reprodução, do que ao refinamento e à transformação. O dinamismo e a qualidade do institucional depende diretamente do espaço que o espontâneo ou o social desfruta dentro e fora dele.

O presente trabalho se serve, em grande medida, de alguns dos trabalhos de dois pesquisadores brasileiros do tema da gestão democrática da educação pública, os professores Elie Ghanem e Vitor Paro, com o intuito de estabelecer uma confrontação mais franca e direta com a específica realidade da educação pública brasileira.

Estes autores oferecem muitos elementos teóricos para a reflexão em torno de conceitos comumente aceitos, como o de comunidade escolar, por exemplo, que é problematizado por Ghanem, numa das suas muitas obras voltadas para as experiências de gestão democrática nos sistemas de ensino brasileiros, bem como os próprios conceitos de participação e democracia, a partir das elaborações de Paro sobre a especificidade da administração escolar, quando comparada à administração da empresa capitalista.

As argumentações desenvolvidas por outros autores como Oliveira, Moraes e Dourado (2008) a propósito das vantagens e desvantagens presentes nas diferentes modalidades de escolha dos dirigentes escolares, também contribuíram, de maneira significativa,

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para a problematização do próprio processo de eleição democrática, que envolveu no final do ano de 2013, as escolas da rede municipal de ensino de Itabira.

Corrêa (2010) e os dois autores já citados Viegas e Luciano (2011) ainda trazem outras contribuições teóricas muito importantes ao presente trabalho, tais como: a noção de movimento social como prática educativa e os problemas da institucionalização e da burocratização escolar, na produção de instrumentos de coerção pelo Estado e de dominação de classe.

É interessante destacar a denúncia feita por Paro (2000) quanto ao “discurso liberal” e ao “caráter excessivamente livresco” que podem marcar a defesa do princípio da gestão democrática da educação. Como sabido, o discurso democrático pode acabar por servir aos gestores escolares “tão somente como uma espécie de escudo a evitar que revejam criticamente seu comportamento” (PARO, 2000, p. 18).

Breve caracterização da unidade escolarOs dados que se seguem descrevem a estrutura pedagógico-

administrativa do Colégio Municipal Professora Didi Andrade (CMPDA), no ano letivo de 2013.

No ano de 2013, a escola atendeu às etapas de Educação Infantil e de Ensino Fundamental da Educação Básica. A escola esteve funcionando em dois turnos, matutino e vespertino, sendo sete turmas de anos finais do Ensino Fundamental no primeiro turno; quatro turmas de Educação Infantil; três turmas de anos iniciais e duas turmas de anos finais – totalizando nove turmas –, no segundo turno.

Na Educação Infantil (1º e 2º períodos), a escola contou com 82 (oitenta e dois) alunos matriculados; nos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º e 2º anos), a escola atendeu a 64 (sessenta e quatro) alunos; nos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), houve 257 (duzentos e cinquenta e sete) alunos matriculados, sendo que 199 (cento e noventa e nove) deles estudavam no turno matutino e 58 (cinquenta e oito) no turno vespertino.

O quadro de funcionários do CMPDA foi formado, no ano de 2013, de 8 (oito) auxiliares de serviço, 5 (cinco) cozinheiras e 2

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(dois) porteiros. Duas empresas terceirizadas são corresponsáveis, junto com a Secretaria de Educação, pela supervisão técnica e administrativa das funcionárias dos serviços de apoio.

A Secretaria Escolar teve em sua composição, no último ano, duas secretárias escolares, dois oficiais administrativos (professoras reabilitadas) e duas funcionárias na função de contínuo ou auxiliar administrativo.

Com relação à equipe pedagógica e diretiva, o quadro de pessoal da escola foi composto, no ano de 2013, de 1 (uma) diretora; 2 (dois) vice-diretores (uma para cada turno escolar); 2 (duas) especialistas em educação básica; 1 (uma) coordenadora de turno (vespertino); 5 (cinco) coordenadores pedagógicos, nas áreas de Português, Matemática, Ciências, História e Geografia; 2 (duas) professoras no exercício de função de biblioteca; 28 (vinte e oito) professores regentes de turma e 2 (duas) professoras acompanhantes para alunos com laudos de deficiências múltiplas. Do total de 43 profissionais que compuseram a equipe pedagógica e diretiva do CMPDA, no ano de 2013, 27 (vinte e sete) eram servidores efetivos e 16 (dezesseis) eram servidores contratados.

No que diz respeito à estrutura física do CMPDA, no ano de 2013, 9 (nove) salas funcionaram como salas de aula – duas delas com mobiliário (carteiras e cadeiras) próprio para as crianças da Educação Infantil. Há ainda na escola uma brinquedoteca, uma lanchonete, a Secretaria Escolar, Sala de Biblioteca, Sala de Vídeo, Sala de Informática, Sala dos Professores, Refeitório dos professores, Sala da Direção, Sala da Especialista, Sala da Coordenação Pedagógica, três salas reservadas às oficinas do Programa Mais Educação, Laboratório de Ciências, Cozinha, Refeitório dos alunos e Quadra coberta.

O encontro da escola com a “comunidade escolar” Em seu livro “Democracia: uma grande escola”, o pesquisador

Elie Ghanem problematiza um conceito bastante caro aos defensores da gestão democrática da educação, que é o conceito de “comunidade” escolar. Ghanem escreve:

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Apesar de ser um termo bastante utilizado, é difícil identificar exatamente uma “comunidade”. O que a população atendida por uma escola tem de mais importante em comum, geralmente, é o fato de morar nas proximidades da escola e utilizar seus serviços. Em princípio, a população atendida é um agregado formado artificialmente em torno desses serviços (GHANEM, 1998, p. 31).

E é preferível, conforme expõe o autor:

chamar aquele agregado de área escolar, ou seja, a área servida pela escola, cujos limites são os da distribuição geográfica das moradias dos alunos. Somente num sentido muito amplo a área escolar poderia ser considerada uma comunidade, uma vez que lhe falta certo grau de autossuficiência e seus limites geográficos não constituem uma representação coletiva, pois não estão definidos na consciência dos moradores (GHANEM, 1998, p. 31).

A partir da redefinição que este autor propõe, da expressão que nomeia o conjunto de pais e responsáveis que são usuários da unidade escolar, encontra-se nas linhas a seguir uma caracterização da “área escolar”, tal como esta expressão aparece na citação acima, e também do entorno do Colégio Municipal Professora Didi Andrade (CMPDA).

É facilmente verificável pela variedade de bairros atendidos atualmente pela escola que, o próprio conceito de área escolar, defendido por Ghanem (1998), precisa ser muito ampliado ou mesmo problematizado, tamanha é a pulverização da distribuição geográfica das residências dos alunos.

Localizada na Avenida Tabelião Osório Sampaio, Bairro Vila Santa Rosa, no município de Itabira – Minas Gerais, o CMPDA atende a mais de outros 30 (trinta) bairros, localidades ou comunidades, incluindo uma variedade de localidades ou comunidades rurais, nas quais residem 44 (quarenta e quatro) dos 199 alunos do turno matutino da escola (aproximadamente 20% dos alunos do turno).

O CMPDA recebe alunos do bairro Vila Santa Rosa e também de outros circunvizinhos como São Marcos, Vila São Geraldo, Vila Piedade, Vila São Joaquim, Vila Amélia, Esplanada da Estação, Juca Rosa, Major Lage de Baixo, Panorama, São Bento, Novo Amazonas,

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Amazonas, São Francisco, Colina da Praia, Centro, São Cristóvão, Cônego Guilhermino, mas também recebe alunos de bairros mais distanciados como Água Fresca, Penha, Eldorado, Nossa Senhora das Oliveiras, Gabiroba, Pedreira, Fênix e Chapada.

As localidades rurais atendidas pela escola se são: Bálsamos, Ribeirão São José, Oliveira Castro, Machado, Laboriaux, Córrego Pari, Rio Tanque, Capitinga e Gomes.

Alguns fatores como a centralidade na localização da escola e a aparente facilidade que tal situação cria para o deslocamento e o transporte podem ser elencados para explicar a pulverização da distribuição geográfica das moradias dos alunos do CMPDA.

As consequências dessa pulverização para a busca de uma gestão escolar democrática tornam-se evidentes, considerando que o trabalho para formar e desenvolver uma “comunidade escolar” – que não está dada de início, como bem aponta Ghanem (1998), torna-se bastante dificultado, na medida em que uma representação coletiva desse segmento precisa ser construída, a partir de localizações e contextos sociogeográficos tão díspares como o do CMPDA.

Outro dado relativo à área escolar e ao entorno da escola, que também aparece como um fator relevante para a pulverização da distribuição geográfica de seus alunos, está relacionado à contiguidade do prédio escolar do CMPDA ao Aglomerado Marajó. Tal aglomerado é associado pela população do município, inclusive os funcionários e professores da escola, ao tráfico de drogas, dadas as frequentes notícias veiculadas pelos órgãos de imprensa local, ligadas à prisão de traficantes e apreensão de drogas no local.

Verifica-se que, durante muito tempo e inclusive até os dias de hoje, a vizinhança do CMPDA com o Aglomerado Marajó constituiu-se e constitui-se no principal fator de resistência e até de rejeição de muitas famílias, no momento de matricular suas crianças e adolescentes na escola.

Essa perspectiva com relação à escola e à sua vizinhança, que é assumida e compartilhada por muitas famílias, tem determinado de maneira significativa a distribuição e a composição do alunado da escola há muitos anos e isto acontece apesar do zoneamento escolar e a despeito do fato recente de desapropriação de muitas

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casas do aglomerado, num acordo entre o poder público e uma empresa local. Tal desapropriação é relativa à doação de terreno para a construção de via pública e de um posto de saúde dentro de uma área considerável do aglomerado.

As descrições acima sobre a área escolar e o entorno da escola servem, sem dúvida, como base para deduções acerca da qualidade de muitas das relações que se estabelecem na escola, desde a da escola com as famílias, da escola com a vizinhança, bem como das relações das famílias e dos alunos entre si e com a escola. Como observa Ghanem,

quando se utiliza o termo “comunidade”, esperam-se dos moradores da área escolar ou atribuem-se a eles condutas homogêneas. É muito comum que na presumida “comunidade” encontrem-se comportamentos diferentes e até opostos entre si (GHANEM, 1998, p. 31).

Como se depreende a partir da citação, a presunção da existência de uma comunidade escolar, antes de facilitar, pode ao contrário comprometer a qualidade das relações democráticas na e pela escola, a partir do momento em que comportamentos e interesses opostos entre si são ignorados ou homogeneizados, na presunção de que o “comum acordo” ou o “consenso” sejam posições dadas de início e não horizontes a serem buscados ou trabalhados no coletivo.

Do institucional para o social: a realidade escolar voltada para o atendimento de demandas de outras Instituições

Alguns fatos recentes do CMPDA serão aqui reconstituídos e analisados com o objetivo de desenvolver um mapeamento mínimo das relações de poder dentro da escola, e da relação desta com outras instâncias de poder, às quais ela está hierarquicamente vinculada e submetida sob vários aspectos.

Situa-se no ano de 2012 a reativação do Conselho ou Colegiado Escolar do CMPDA. Tal reativação veio a se realizar apenas em decorrência de um compromisso firmado, na forma de um Termo

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de Ajustamento de Conduta (TAC), entre as diretoras das escolas municipais, o secretário municipal de educação e a promotora da Vara da Infância e da Juventude, do Ministério Público de Minas Gerais. Dentre os vários compromissos estabelecidos nesse Termo, estavam a capacitação dos conselheiros pela Secretaria Municipal de Educação (SME), o estudo e a revisão dos regimentos internos dos projetos político-pedagógicos pelos colegiados das escolas.

O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ao mesmo tempo em que impôs à secretaria de educação e às escolas municipais um cronograma bastante restrito e rigoroso – tanto em termos de tempo para realização dos compromissos, quanto em termos de sanções administrativas e pecuniárias, em caso de descumprimento dos prazos, estabeleceu para a SME, para o CMPDA e para todas as outras escolas do município compromissos que estavam, todos eles, voltados para a efetiva gestão democrática da escola pública. Principalmente para as escolas municipais, por atenderem apenas até o 9º ano do nível fundamental de ensino, uma inovação importante se deu então na estrutura dos colegiados escolares, a partir da Resolução SEE-MG Nº 26.754, de 14 de Fevereiro de 2012, que permitiu a representação de alunos com idade igual ou superior a 14 (catorze) anos.

Tendo como principal propósito o cumprimento do TAC, o processo de eleição dos representantes do Colegiado do CMPDA, no ano de 2012, foi organizado estritamente em conformidade com o estabelecido pelo Termo e pela legislação educacional vigente.

O Colegiado esteve composto paritariamente por representantes de alunos (com idade igual ou maior que 14 anos), pais e responsáveis, professores regentes de turma, professores em outras funções e funcionários da escola.

Uma vez eleitos, os membros do Colegiado Escolar do CMPDA conseguiram estabelecer e cumprir, pelo menos no ano de 2012 – período de vigência do TAC –, uma agenda regular de reuniões ordinárias mensais.

Com relação aos demais compromissos do TAC, um número bem pequeno e, portanto, insuficiente de reuniões do Colegiado foram destinadas ao estudo e revisão do Regimento Escolar e do Projeto Político-Pedagógico (PPP).

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O cronograma do Termo estabelecia que a análise e adequação dos dois documentos (Regimento e PPP) deveriam se dar em até 90 (noventa) dias, após a capacitação dos conselheiros escolares pela SME. As reuniões ordinárias do Colegiado do CMPDA conseguiram obedecer à frequência mensal e à capacitação dos conselheiros pela rede municipal aconteceu na forma de duas reuniões no mês de Junho.

No que se refere ao Regimento Escolar, após o pequeno número de reuniões do Colegiado, o que aconteceu foi que, em única reunião na Secretaria Municipal de Educação, com presença apenas das diretoras municipais, e tendo por base o regimento de uma das escolas, que já se encontrava redigido e aprovado por seu Colegiado, definiram as diretoras por um regimento mais ou menos comum a todas as escolas da rede municipal.

Dessa forma, os colegiados das escolas, por meio de seus membros, exerceram apenas a função consultiva, conhecendo e ratificando o documento, dentro do tempo hábil que se apresentou para o cumprimento de um prazo.

No que diz respeito ao Projeto Político-Pedagógico (PPP), o documento já havia sido analisado e reformulado no ano anterior (2011), basicamente pela equipe diretiva e pedagógica da escola, quando o funcionamento do colegiado escolar se encontrava em suspenso no CMPDA.

Após a reestruturação do Colegiado em 2012, já na primeira reunião ordinária, uma cópia do PPP foi entregue a cada um dos membros mas, após o restrito número de reuniões – possíveis de realizar para o estudo e revisão do documento – os membros do Colegiado conseguiram apenas ter um primeiro contato e logo tiveram que aprovar o texto do PPP, para envio ao Ministério Público, dentro do prazo estipulado pelo TAC.

Até o final do ano de 2013, ainda esteve vigente o mandato dos membros do Colegiado, considerando que eles foram eleitos em 2012 e a duração de seus mandatos fosse de 2 (dois) anos.

No entanto, mesmo no ano de 2012, em que esteve vigorando o TAC e quando o Colegiado do CMPDA esteve funcionando normalmente, obedecendo, pelo menos, a um cronograma de reuniões ordinárias mensais e com boa frequência e participação dos representantes do segmento “alunos” e do segmento “pais

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de alunos”, tal frequência não aconteceu da mesma maneira com relação ao segmento professores regentes de turmas.

Nesse segmento em particular (professores regentes), desde 2012, se tornou inviável a substituição dos representantes infrequentes, em vista da indisponibilidade de participação da maioria dos professores regentes, tanto pelo fato de a maioria deles estar ocupando cargos em duas ou três escolas quanto ainda por eles não encontrarem interesse na participação do Colegiado, por considerarem esta participação como uma obrigação extra e, no mais, desnecessária, dentro do seu rol de obrigações profissionais e pessoais.

Ainda, no que se refere a esse segmento (professores regentes de turmas), a escolha da direção ou da presidência do Colegiado do CMPDA teve que se dar entre manterem-se os nomes dos professores por mera questão de formalidade ou deixar o segmento sem qualquer representante, formal ou real, inviabilizando desta forma a própria existência do Colegiado.

Outras perspectivas sobre o compromisso firmado, através do TAC, entre a SME e o Ministério Público são passíveis de conhecimento e de análise. Conforme publicação no blog da Secretaria Municipal de Educação de Itabira, do dia 17 de Agosto de 2012, destaca-se aqui o depoimento extraído da referida publicação, pertencentes a dois membros do Colegiado do CMPDA, no ano de 2012. Em depoimento, a representante do Colegiado do CMPDA, do segmento mãe de aluno, diz:

aquela escola é muito boa, pela liberdade de convívio que a direção dá. Na escola, temos liberdade de assistir as aulas. Foi a primeira vez que tive coragem de me candidatar e por sorte ganhei. Tenho liberdade de falar e ouvir. Eu acompanhava, mas hoje eu vivo a história da escola. Hoje, depois do Colegiado, eu vejo que posso chegar em qualquer pessoa (Professores, Advogados, Promotora) para conversar. Eu me senti respeitada (AZEVEDO, 2012, [s.p]).

Na mesma publicação do blog da SME-Itabira, lê-se ainda o depoimento do representante do Colegiado do CMPDA, no segmento aluno:

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antes, era uma coisa meio chata, mais teórica, mas no decorrer do trabalho, vimos que não era um bicho de sete cabeças ... não era tanto de adultos. Comecei a falar mais com a Diretora. As mudanças foram mais rápidas, facilitou o trabalho da Diretora, junto com os Especialistas, a gente ficava mais guardado com a fala, ficava mais entre a gente. Agora, podemos confiar” (AZEVEDO, 2012, [s.p]).

É certo que, as perspectivas apresentadas, através dos depoimentos dos membros do Colegiado Escolar do CMPDA, no ano de 2012, podem ser analisadas. Pois, por um lado, há a possibilidade de se depreender que, para muitos pesquisadores do tema da gestão democrática da educação, como Paro e Ghanem já citados, mais importante do que a institucionalização de um princípio, através de legislações e mecanismos como o Conselho Escolar, o Grêmio Estudantil, a Associação de Pais e Mestres, entre outros, faz-se mais necessário e mais importante, que a materialização do princípio da gestão democrática da escola pública seja propiciadora, a cada pessoa que dele compartilha, o desenvolvimento de uma personalidade democrática e de um aprendizado político. Isso só se estabelece a partir de um dado contexto de relações democráticas e que deve ser aperfeiçoado par a par com a busca da democratização da própria sociedade, em seu conjunto, conforme Paro:

[...] na medida em que a prática leva ao aprendizado político, é possível apostar, também, que aquele que tem os seus direitos respeitados (pelo menos) dentro da escola, fazendo-se sujeito de relações democráticas na situação de ensino, estará mais predisposto a relacionar-se democraticamente e a defender os seus direitos de forma mais convincente na sociedade em geral (PARO, 2000, p. 92).

A partir dessa análise, de que o desenvolvimento permanente de relações democráticas na escola representa algo muito mais importante do que a insistência na manutenção de instâncias aparentemente democráticas (como o Conselho Escolar), por mera formalidade e burocracia, os depoimentos dos membros do Colegiado do CMPDA assinalados acima, podem ser interpretados do ponto de vista de um importante avanço dessas relações democráticas dentro dessa escola.

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O fato de poder ter acesso às figuras de autoridade (diretor de escola, advogado e promotor de justiça) para poder conversar em condições mínimas de igualdade e também o sentimento de não precisar ficar com uma fala guardada apenas para si, mas poder externalizá-la e confiá-la a outros, que não apenas os seus pares do segmento, é de suma importância. Essas possibilidades descobertas pelos dois membros do Colegiado do CMPDA permitem, em alguma maneira, a aproximação de seus depoimentos com o desenvolvimento de personalidades democráticas e o início de um aprendizado político, tal como defendido nas linhas anteriores.

Por outro lado, tomando-se por base ainda o texto de Paro (2000), torna-se interessante fazer valer aqui outras análises em torno dos depoimentos apresentados. Se ambos os depoimentos podem indicar um avanço no desenvolvimento de relações democráticas dentro da escola, eles também acabam por tornar explícita uma dificuldade considerável para a participação de pais e alunos nas decisões da administração escolar, em específico, e na administração pública, de modo geral.

Essa dificuldade, tal qual escreve Paro, “refere-se ao fato de que os pais das camadas populares, em geral, sentem-se constrangidos em relacionar-se com pessoas de escolaridade, nível econômico e status social acima dos seus” (PARO, 2001, p. 61). No depoimento da representante do segmento mães de alunos, por exemplo, no trecho em que ela faz referência às figuras de autoridade, ficam evidentes tanto o sentimento de aproximação quanto o de distanciamento da mãe, com relação àquelas figuras: secretária de educação, técnicos da secretaria de educação, dirigentes escolares, promotora de justiça etc.

De maneira idêntica, a fala do representante dos alunos do Colegiado do CMPDA permite constatar, de maneira muito clara, o que Paro chama de “medo do desconhecido”. Um medo que pode muito facilmente acometer a uma pessoa “leiga” quando esta precisa, dentro de um debate democrático, manifestar uma opinião ou estabelecer um diálogo, com qualquer pessoa que se posiciona, antes de mais, como representante de um dado saber “técnico” ou saber “especializado”.

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Nota-se também uma espécie de “medo do desconhecido” por conta da ignorância dos usuários a respeito das questões pedagógicas e das relações formais e informais que se dão no interior da escola, sendo essas questões e relações vistas como assunto cujo acesso deve ser franqueado apenas aos técnicos e “entendidos” e fechado, portanto, aos “leigos” que utilizam seus serviços (PARO, 2000, p. 61).

A expressão “bicho de sete cabeças” que aparece no depoimento do adolescente, representante do segmento alunos do Colegiado do CMPDA, converte-se então num símbolo de grande eloquência e informação de extrema relevância para qualquer gestor público que pretenda incorporar o princípio da gestão democrática em sua prática cotidiana.

Por fim, os fatos descritos no início do subitem assim como os depoimentos dos membros do Colegiado do CMPDA podem constituir-se em fontes bastante úteis de reflexão sobre os caminhos tomados – e os que se podem tomar – para a efetiva democratização do ensino público.

Ao longo da leitura deste subitem, espera-se que tenha sido possível acompanhar a legitimidade da intenção, bem como a seriedade e a responsabilidade das partes envolvidas, em todo o processo de cumprimento das cláusulas do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Todavia, há que se tornar manifesta uma atenção e um cuidado, que estão relacionados ao fato de a democratização das relações na escola ficarem na “dependência deste ou daquele diretor magnânimo, que ‘concede’ democracia” (PARO, 2000, p. 19).

Neste sentido, não parece despropositado acrescentar que ao lado da figura do diretor escolar, poderia estar arrolada qualquer outra figura de autoridade que, a partir de um determinado âmbito de poder, se convence de que a participação seja algo importante, urgente, e, revestida da nobre intenção de outorgá-la às pessoas, pretende que essa participação aconteça desde logo, em detrimento das condições materiais, institucionais, culturais, ideológicas e políticas para a sua efetivação.

Desta forma, para que se torne possível, pelo menos, vislumbrar a adequação do caminho tomado pela escola analisada, no seu intento de garantir o princípio da gestão democrática da

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educação, faz-se necessário considerar uma série de fatores, alguns já descritos e outros que serão acrescentados a seguir:

1º: a intenção de efetivação do princípio de gestão democrática no CMPDA deu-se a partir de um compromisso formal, estabelecido entre o dirigente escolar e o promotor de justiça, por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC); 2º: este compromisso formal também envolveu o representante máximo do poder municipal e o secretário municipal de educação à época; 3º: o cumprimento das cláusulas do TAC deu-se dentro de um cronograma bastante restrito, compreendido entre os meses de Fevereiro e Agosto de 2012; 4º: dentro desse período de tempo, foi necessário organizar o processo de eleição e posse dos novos membros do Colegiado, bem como o estudo e a atualização do Regimento Escolar e do Projeto Político-Pedagógico do CMPDA;5º: para isto, para o estudo e a atualização do Regimento Escolar e do PPP do CMPDA, foram destinadas exatamente 4 (quatro) reuniões do Colegiado (dentro de uma proposta legal de frequência mensal para as reuniões ordinárias dos conselhos escolares); 6º: a capacitação dos conselheiros escolares, de todas as escolas da rede municipal, aconteceu em dois encontros no mês de Junho de 2012; 7º: o TAC foi cumprido dentro do último ano de gestão de um governo que esteve 8 (oito) anos à frente do poder municipal e na vigência de um modelo de escolha dos dirigentes escolares baseado na indicação política;8º: o documento TAC elencava em seu texto sanções administrativas e pecuniárias às direções das escolas e ao poder público, em caso de descumprimento de suas cláusulas.

Todos os fatores listados acima não pretendem servir de justificativa, tampouco se prestam à culpabilização de quaisquer dos agentes ou das instituições envolvidas. Tal afirmação se apresenta tanto mais verdadeira quanto melhor se verifica que, nenhuma das interveniências acima apresentadas converteu-se em pretexto para que as pessoas envolvidas não se empenhassem, ao menos, minimamente, no cumprimento dos compromissos firmados.

De toda maneira, no momento em que se busca a tradução do princípio e da lei para a realidade concreta institucional, seja

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qual for a trajetória escolhida, ela será invariavelmente atravessada pela variedade de concepções e de pontos de vista dos agentes envolvidos, bem como por seus interesses – sejam eles imediatos ou estratégicos – que dificilmente coincidem entre si, vindo a ser, não raro, opostos.

O que se depreende então desse estudo de caso é que a garantia da manutenção do princípio da gestão democrática, dentro de uma escola, será tanto mais assegurada e terá uma perspectiva de continuidade tanto maior, quanto menos os usuários da educação pública dependerem da outorga de uma figura de autoridade para fazerem o exercício de controle democrático da escola. Senão, veja-se.

Um dentre muitos projetos de intervenção na escola

Em ata da reunião pedagógica do Colégio Municipal Professora Didi Andrade, do dia 08 de Agosto de 2013, verifica-se que o grupo de professores da escola esteve envolvido na implementação e acompanhamento de ações do Projeto de Intervenção Pedagógica (PIP).

O PIP é uma iniciativa da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais (SEE-MG) e, segundo documento oficial, o Guia de Revisão e Reorganização do Plano de Intervenção Pedagógica 2013, encontra-se o PIP dentro do rol de uma série de ações da política educacional mineira, expressos no objetivo e na finalidade assinalados abaixo.

[...] implementado com o objetivo de oferecer apoio às escolas de Ensino Fundamental, com acompanhamento sistemático através de visitas das Equipes Central e Regionais, com formação continuada dos professores, tem demonstrado significativos avanços nos resultados do desempenho dos alunos, especialmente nos anos iniciais, garantindo o 1º lugar do Brasil com o IDEB 6,0 (SEE-MG, Guia de Revisão 2013, p. 5).

Embora não seja o tema nem o propósito deste trabalho fazer uma avaliação sistemática e exaustiva de políticas públicas de educação, há a possibilidade, através do trecho citado, de ao menos

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se entrever quais são os princípios que, no caso do sistema de ensino mineiro, estão a orientar as concepções e tendências pedagógicas, no objetivo de validação de um determinado modelo de política educacional.

De qualquer maneira, levando em consideração a metodologia de pesquisa na qual este trabalho está pautado, que consiste basicamente numa aproximação, o mais acurada possível, da realidade concreta de um determinado contexto escolar, cabe descrever aqui algo sobre certo modelo de gestão – a gestão de desempenho e por resultados – não detém muita atenção nem está propriamente interessado.

É possível afirmar que esse algo está relacionado a uma série de fatores como: o modo de recepção; a qualidade da participação; o nível de envolvimento e o alcance formacional dos quais um modelo de gestão de desempenho e por resultados pode perfeitamente prescindir, uma vez que os resultados se colocam, dentro deste modelo, como a referência-chave para todo o processo de gestão.

No que se refere ao modo de recepção de uma determinada medida de ação, como o Projeto de Intervenção Pedagógica (PIP), por exemplo – instituído, como se pretende sustentar aqui, dentro de um modelo de gestão por resultado –, o que se verifica, não poucas vezes, tal como foi possível verificar também no CMPDA, são as equipes administrativo-pedagógicas das escolas recebendo e realizando esses projetos, justamente como propostas de intervenção. Apesar de ser essa a maneira como eles afinal se apresentam, todavia compreendendo-os, ainda que intuitivamente, a partir da acepção de ingerência e de interferência externas, que este termo “intervenção” pode também assumir. Em outras palavras, encara-se a intervenção do ponto de vista do cumprimento de uma obrigação estritamente burocrática, para gerar uma série de resultados, indicadores, porcentagens etc., que supostamente informam sobre a qualidade do serviço público oferecido, por uma dada administração governamental.

No que concerne à participação e à qualidade desta, verifica-se que o documento Guia do PIP preconiza realmente a participação dos segmentos escolares em sua consecução – inclusive a dos segmentos de pais e de alunos da escola. No entanto, segundo o documento, essa participação precisa estar organizada, “de forma

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eficiente e prazerosa” (SEE-MG, Guia de Revisão 2013, p. 14), pela Equipe Gestora e Especialista da escola. Essa participação se torna objetiva e comprovável, basicamente, a partir da promoção de um encontro, dentro do ano letivo (data específica dentro do mês de Agosto) chamada de “Dia D”. Com a realização do “Dia D”:

toda escola deve fazer a diferença”, esperamos que sejam discutidos os resultados das avaliações internas e externas de cada escola e as metas acordadas e que possam, também, reavaliar as ações, refletir sobre a realidade da aprendizagem dos alunos e planejar as ações de intervenção pedagógica para os casos de não aprendizagem. Temos certeza de que ideias inovadoras e estratégias eficazes vão surgir nesse momento, contribuindo, assim, para melhorar cada vez mais a aprendizagem dos alunos e, consequentemente, os resultados educacionais de sua escola e de Minas Gerais (SEE-MG, Guia de Revisão 2013, p. 5).

Vale destacar que o “Dia D”, da maneira como se encontra no documento guia, se subdivide, na verdade, em dois encontros, o que significa dois dias decisivos para a consubstanciação da participação na escola. O primeiro deles – “Toda escola deve fazer a diferença”, como um momento de a Equipe Gestora, Especialista e Equipe da Escola (subentende-se, professores) elaborarem o Plano de Intervenção Pedagógica (PIP), dentro de um quadro muito bem definido de mensuração dos problemas, das estratégias, das metas, das ações e das responsabilidades, inclusive com a sugestão de uma agenda. E o segundo dia – “Toda a comunidade participando”, que também pode se dar dentro de uma agenda sugerida, para que nele aconteça a efetiva participação dos pais e dos alunos na escola, mas, principalmente, para que os resultados da escola e das políticas públicas de educação de um determinado governo sejam devidamente apresentados à comunidade, muitas vezes, na forma de índices, porcentagens, tabelas e gráficos comparativos entre unidades de ensino.

Com relação ao nível de envolvimento e o alcance formacional, dentro de uma medida de intervenção na escola, como o PIP, compreende-se que estes dois aspectos podem ser deduzidos a partir da elaboração que foi dada, nos parágrafos acima, tanto ao modo de recepção quanto ao nível de participação, verificáveis na execução desse projeto.

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Percebe-se então que, mesmo que o documento Guia do PIP apresente, na sua composição formal, ações e perspectivas que se encaixam perfeitamente dentro de um horizonte democrático de gestão da escola, por meio de expressões como “formação para o exercício pleno da cidadania” (p. 05), “foco no trabalho em equipe” (p. 06) e “toda a comunidade participando” (p. 17), apesar desses elementos esparsos, que poderiam sugerir um nível de envolvimento bastante ampliado na condução do trabalho, é, ao final, à Equipe Gestora que se atribui o papel preponderante na condução do PIP, principalmente no que se refere à adequada promoção dos dois eventos do “Dia D”, comprobatórios da efetividade da participação de todos na escola.

Quer dizer, para além do documento oficial, na prática, o envolvimento maior é mesmo o da equipe gestora da escola (seja ela qual for a sua composição), da qual se espera uma prática inovadora de gestão e de liderança (p. 06), para a produção dos resultados almejados pela administração governamental.

Enquanto medida de intervenção, percebe-se que o documento guia do PIP roteiriza de maneira bem esquemática as suas propostas de ação, dentro de quadros de tarefas ou fluxogramas de estilo empresarial, agendas com compromissos devidamente cronometrados, organização eficiente e prazerosa de eventos, e, portanto, dispondo do trabalho docente a partir de um alto grau de diretividade e automatismo. Mostram-se assim muito restritas as possibilidades reais, tanto em termos temporais como também formacionais, para problematização dos valores e dos princípios, embutidos numa dada política educacional.

O alcance formacional de medidas de intervenção como o PIP mostra-se bastante limitado, tanto para o aluno quanto para o professor, na medida em que circunscreve todos os problemas da escola aos problemas de defasagem nas capacidades do aluno, para realização de avaliações internas e externas. O próprio princípio da avaliação padronizada em larga escala, da pedagogia das habilidades e das competências, dentro do contexto de uma dada ideologia de política educacional, assim como as condições institucionais concretas da unidade de ensino, tais “detalhes” passam completamente ao largo das discussões tanto da Equipe Escolar, quanto dos pais e dos alunos, no momento da realização dos eventos do “Dia D”.

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O alheamento dos segmentos escolares com relação aos princípios e valores das políticas educacionais vigentes fica tanto mais evidente à proporção que, no documento oficial, encontra-se previamente definida, a própria pauta, bem como os materiais a serem discutidos nas reuniões, todos eles voltados para os resultados da escola nas avaliações externas.

Ainda com relação ao processo de alheamento mencionado, vale destacar uma fala recorrente e bastante significativa dos professores, indicativa do quanto estes estão adaptados a um modelo de gestão de desempenho e por resultados.

Assim, muitos professores que vivem a experiência de trabalhar nas redes municipal e estadual de ensino, por precisarem ter dois ou mais cargos, costumam estabelecer uma comparação toda especial entre as duas redes, e essa comparação aparece em suas falas, mais ou menos, nos seguintes termos: “o interessante é perceber que a escola da rede estadual, mesmo ela não oferecendo quase nenhum apoio ao professor, com relação a materiais e acompanhamento de especialista e de coordenador pedagógico, mesmo assim a escola da rede estadual consegue ter um resultado muito melhor do que a da rede municipal”.

Fica patente assim, por meio dessa fala recorrente dos professores, a característica de ênfase exclusiva nos resultados, em detrimento de procedimentos, meios e dotação de recursos, próprio de um determinado modelo de gestão educacional, voltado para desempenhos e resultados, que se encontra em pleno vigor, nos dias de hoje, e ao qual a escola está, em grande medida, submetida.

Uma experiência de eleições democráticas para os diretores das escolas municipais

Se no período entre os meses de Agosto e de Setembro de 2013, verifica-se, por meio das atas de reunião pedagógica do CMPDA, a mobilização de sua Equipe Escolar – entendendo-se esta como equipe gestora, especialista, coordenação pedagógica e professores – em torno da realização do PIP da Secretaria de Estado da Educação; acontece, logo após o recesso escolar do mês de Outubro, a publicação do decreto municipal nº 1.011 de 18 de Outubro de 2013, que dispôs sobre a instituição de eleições democráticas para diretores das escolas municipais de Itabira.

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Conforme notícia da edição on-line do Jornal Diário de Itabira, de 14 de Novembro de 2013, essas eleições surgem depois de, aproximadamente, 15 (quinze) anos, desde o primeiro processo de eleição direta de diretores, acontecido durante a administração municipal, que esteve no governo da cidade, no período entre 1997 e 2000.

Dentre as etapas previstas no referido decreto, que organizou o processo de eleição dos diretores e dos vice-diretores das escolas municipais de Itabira, uma delas, conforme Artigo 2º, Inciso III, consistiu na elaboração e na divulgação dos Planos de Trabalho das chapas inscritas, para a comunidade escolar.

E foi basicamente a este trabalho – de campanha eleitoral – que a equipe diretiva do CMPDA esteve dedicada até o dia da votação, em 30 de Novembro, na condição de chapa única. Por meio de notícia do dia 29 de Novembro de 2013, edição on-line do Jornal Diário de Itabira, verifica-se que esta situação de chapa única se deu em 10 das 18 escolas municipais, nas quais houve processo de eleição para diretores e vice-diretores.

Sobre essa modalidade de escolha de dirigentes escolares no Brasil, argumentam Oliveira, Moraes e Dourado (2008, p. 6):

As eleições diretas para diretores, historicamente, têm sido a modalidade considerada mais democrática pelos movimentos sociais, inclusive dos trabalhadores da educação em seus sindicatos. Mas ela não está livre de uma grande polêmica. A defesa dessa modalidade vincula-se à crença de que o processo conquista ou retoma o poder sobre os destinos da gestão. A eleição direta tem sido apontada como um canal efetivo de democratização das relações escolares.

Explicitado então o hiato temporal (aproximadamente quinze anos), até que acontecesse uma mudança na modalidade de escolha dos dirigentes escolares, na rede municipal de ensino de Itabira, e considerando ainda o dado sobre a quantidade de chapas únicas no conjunto das unidades nas quais houve eleição, surge como oportuno buscar nesse trabalho uma reconstituição, mínima, da polêmica, ou ainda, das discussões que podem ser levantadas, a partir das próprias informações do decreto.

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O primeiro ponto que suscitou, quando da publicação do decreto, e ainda agora pode suscitar discussão está relacionado à natureza ad nutum atribuída ao cargo de diretor escolar, e que se encontra expressa logo no primeiro artigo do documento. A influência do agente político, no caso, o prefeito municipal, no processo de escolha dos diretores das escolas fica perfeitamente evidenciada, estando a ele reservado, nos próprios termos do documento, “o livre direito de nomeação e de exoneração” (PREFEITURA MUNICIPAL DE ITABIRA, DECRETO nº 1.011, 2013).

Este foi então o primeiro ponto que despertou discussões entre agentes da imprensa, liderança do sindicato dos servidores municipais e também entre os professores, na perspectiva de averiguar o nível de democraticidade das eleições que estavam sendo instituídas, a partir da publicação do decreto.

A propósito do fato da chapa única em 10 das 18 escolas municipais nas quais houve eleição, além do inevitável empobrecimento do debate nas escolas, na ausência da possibilidade de confrontação entre propostas, a partir de diferentes planos de trabalho de duas ou mais chapas candidatas, percebe-se também, de forma clara, aquilo no qual acaba se convertendo qualquer eleição de chapa única, a saber, um plebiscito ou um referendo. Quer dizer, na ausência de uma chapa concorrente, o que coube aos funcionários, professores, pais e alunos da maioria das unidades escolares foi basicamente aprovar ou não o trabalho das equipes diretivas que já estavam atuando nas escolas.

Por outro lado, a iniciativa de instituição de eleições democráticas para diretores no município de Itabira precisa ser remetida a um contexto político mais amplo, para ser mais bem nuançada. Assim, considerando que foi no ano de 2013, a partir do resultado das eleições municipais de 2012, que se estabeleceu uma mudança com relação ao grupo político à frente da administração da cidade (após doze anos contínuos no poder de outro grupo político), houve também, consequentemente, uma mudança com relação à Secretaria Municipal de Educação, desde a pessoa escolhida por Secretária até os funcionários selecionados para a composição das equipes técnicas, dentro dos departamentos e das seções dessa Secretaria.

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Na esteira dessas mudanças, brevemente descritas, no cenário político-administrativo da cidade, também aconteceu de a maioria das direções das escolas municipais serem substituídas, logo no início do ano de 2013, pela nova Secretária de Educação. Amparada no Estatuto e Plano de Cargos e Carreiras do Magistério Público Municipal de Itabira (§ 2º, I e III, do artigo 61 da Lei Municipal 4.062/2007), a Secretária defendeu e fez valer o que ela própria definiu como critério estritamente técnico para a escolha e a nomeação das direções das escolas. Desta forma, o ano letivo de 2013 já começa com a grande maioria das escolas municipais de Itabira sob uma nova direção.

Apenas depois de realizada essa breve referência ao contexto político mais amplo da cidade, é que se torna possível retomar a análise do documento do decreto, das eleições dos diretores das escolas municipais de Itabira, e procurar reconstruir a partir dessas informações, outro aspecto da decisão do executivo municipal que foi alvo de discussões.

Esse outro aspecto, gerador de discussões, diz respeito ao que determina os parágrafos 1º e 2º, do artigo 5º do decreto em estudo, que exclui do pleito eleitoral servidores que tenham ocupado o cargo de direção por período superior a 3 (três) anos, sem o cumprimento do interstício de um mandato. Essa decisão, eminentemente política, foi considerada por alguns servidores como excludente, especificamente na perspectiva daqueles diretores nomeados na gestão municipal anterior, já que a eles não se permitiu sequer se inscreverem nas chapas, para participação nas eleições nas escolas.

Por fim, outro ponto suscitador de discussões, dentro do texto do decreto, foi o seu artigo 7º, que retoma o tema da natureza ad nutum do cargo do diretor e prescreve que, a qualquer tempo, seja por descumprimento das diretrizes da Secretaria Municipal de Educação, seja por descumprimento das determinações legais, o diretor ou o vice-diretor podem ser exonerados.

Para muitos esse outro ponto do texto figura como um elemento limitador do princípio democrático, que o decreto pretende garantir, porque não menciona quaisquer procedimentos de sindicância ou de garantia do direito de ampla defesa para o dirigente escolar, sob o qual recair a suspeita ou for alvo de denúncia, por descumprimento das diretrizes da Secretaria Municipal de Educação.

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A concisa reconstituição, aqui desenvolvida, das discussões em torno do decreto, que dispôs sobre a instituição de eleições democráticas para diretores das escolas municipais de Itabira, não pretende, de maneira alguma, esgotar e estabelecer um posicionamento diante do debate sobre o nível de democraticidade, quer dizer, os limites e as potencialidades, dessa medida de ação implementada pelo Executivo Municipal.

Ao contrário, o que se espera que desponte desta, bem como das outras narrativas que compõem este trabalho, tem a ver com o discernimento, mais ou menos claro, quanto aos diferentes níveis que, um único princípio, como o da gestão democrática da escola pública, precisa atravessar, desde o ponto da criação, pelos altos escalões dos sistemas de ensino, das diretrizes legais e normas jurídicas, passando pela adesão e assimilação pelas diferentes esferas institucionais e seus agentes, chegando até ao ponto do esforço de implantação do princípio, pelos dirigentes escolares, em suas respectivas unidades de ensino.

Nesse longo e tortuoso percurso, verifica-se que a pureza conceitual da democracia, do princípio de gestão democrática das instituições sociais, sobretudo as públicas, que estes ideais se transformam, de maneira considerável e inevitável, na proporção em que relações de poder e jogos de força a eles se misturam, em nome de uma imensa variedade, quase infinita, de interesses.

Do social para o institucional: a referência ao movimento dos trabalhadores rurais sem terra e as escolas itinerantes

No breve percurso da realidade escolar, descrita neste trabalho, presume-se que tenha ficado evidenciada a força da vontade das instâncias institucionais, no objetivo da efetivação do princípio da gestão democrática da escola pública, seja dentro de uma proposta de um curso de especialização para gestores escolares de uma universidade federal; seja em relação à iniciativa de uma promotora de justiça local, em sua atuação dentro do Ministério Público; seja também dentro do contexto de programas e políticas públicas de educação, na esfera de governo estadual; seja ainda, no que diz

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respeito à vontade política de uma dada administração municipal, na intenção de instituir a eleição democrática como modalidade de escolha das direções das escolas.

No entanto, conforme se lê no referido Caderno 12, Conselho Escolar e sua organização em fórum, do Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares:

[...] não é por ter “vontade de fundar” um Conselho Escolar que uma pessoa está provida do direito de impor a alguém que crie e participe do mesmo. As raízes profundas de um Conselho Escolar germinam no interior das pessoas que têm necessidade de melhorar a escola do seu filho, ou de educadores que acreditam nas pessoas que educam (MEC/SEB. Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. Caderno 12, Conselho Escolar e sua organização em fórum, p. 15).

Se, como é sabido e atestado pelo trecho acima, a vontade institucional de criar e implementar o Conselho Escolar não é suficiente para garantir a participação e sequer a criação de mecanismos de gestão democrática nas instituições públicas de ensino, muito interessante é notar como a institucionalização pode se converter num fator de mascaramento, de arrefecimento e até de repulsão da participação das comunidades nas escolas.

Viegas e Luciano (2011), ao discutirem o problema da democracia e da institucionalização das lutas sociais, tendo como referência as escolas itinerantes, fundadas dentro dos acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), demonstram como a institucionalização das práticas educativas do movimento, a partir do imperativo formalizador e normatizador do Estado, a burocracia pedagógica enfim, foram responsáveis por um distanciamento das escolas com relação aos interesses os trabalhadores sem-terra.

No que se refere à realidade daquelas escolas, Viegas e Luciano verificam:

A educação no MST, ao se qualificar na busca de direitos, como a conquista da Escola Itinerante, pode ficar dependente do Estado, reforçando as características da democracia representativa. Como consequência, a escola torna-se burocrática, o que dificulta sua

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capacidade de mobilização e a do próprio MST. A prática educativa entrega-se à conformidade e ao consentimento dos responsáveis, engessando-se como instrumento transformador ao cumprir as leis institucionais (VIEGAS; LUCIANO, 2011, p. 331).

A despeito das especificidades das práticas educativas desenvolvidas dentro de movimentos sociais, como o MST, e sem desconsiderar, dentro da passagem citada, o tipo de institucionalização que está em discussão, com relação às escolas itinerantes, há uma pergunta importante que surge do contexto dessas escolas, a saber: até que ponto a premência de institucionalização dos mecanismos de participação, em favor da gestão democrática da escola pública, não se constitui numa postura que dissimula – como uma casca, ou um escudo liberal-democrata, que esconde ações e comportamentos autoritários, tal como apontado por Paro (2000, p. 18) – e até mesmo obstaculiza o aperfeiçoamento das relações democráticas na e pela escola?

No caso do MST, ainda é possível de se discernir, de maneira clara, a antecedência do “social”, permeando a prática pedagógica do movimento, e o “institucional” aparecendo como uma etapa posterior, com consequências de distanciamento da escola com relação à comunidade, na medida em que a primeira propõe-se a adequar-se às regras e preceitos dos sistemas de ensino, em detrimento, em grande medida, dos anseios e dos interesses da segunda.

No entanto, no que diz respeito às circunstâncias analisadas anteriormente, com relação ao Colégio Municipal Professora Didi Andrade, o que se verifica é a premissa e a premência do “institucional” fazendo-se valer, sem que haja uma demanda e mesmo uma organização do “social”, minimamente discerníveis, no processo de efetivação do princípio de gestão democrática da escola pública.

Desse ponto de vista, pode-se observar não apenas uma perspectiva de institucionalização, mas também de burocratização dos mecanismos e instrumentos de democratização das instituições de ensino. Ou seja, um aparato burocrático se faz presente e é instituído com o propósito de produzir uma aparência democrática, prescindindo, em grande medida, do aspecto “social”, e dentro de um contexto onde prevalecem a centralidade da responsabilidade

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(o diretor escolar no papel de burocrata, como responsável último e culpado primeiro pela condução da escola) e a celeridade no tempo de tomada de decisões e para cumprimento de prazos.

Assim, no momento em que as conformações institucionais são priorizadas, mesmo que em prol do cumprimento do princípio da gestão democrática da educação, mas não levando em consideração a preocupação pelo desenvolvimento de relações democráticas, dentro dessas instâncias formalmente democráticas, esta priorização do “institucional” em prejuízo do “social” parece não resultar em outra coisa que não na figura do conselheiro “assinador de atas”, como acontece em muitos conselhos escolares, dentro das instituições de ensino.

A reflexão e a crítica em torno do “institucional” neste trabalho não estão sendo desenvolvidas com a intenção de desconsiderar a importância da existência institucional nas instâncias e instrumentos de participação na escola, até porque o preferível e o desejável é que as relações democráticas sejam desenvolvidas e aperfeiçoadas a partir desses mecanismos devidamente institucionalizados.

Todavia, a partir do momento em que se verifica uma separação entre a direção e a base, na busca da mobilização e movimentação das pessoas, para a efetiva participação de todos os segmentos na gestão da escola, bem como a dependência e a subordinação da escola com relação a indivíduos ou instituições externas, para o cumprimento efetivo do princípio de gestão democrática, estes são dois mecanismos fundamentais, segundo Corrêa (2010), para um primeiro processo de burocratização, a que mesmo o princípio da democratização da gestão das instituições de ensino pode acabar submetido.

Os fatos analisados, dentro da história recente do CMPDA, demonstram como as diferentes instituições ou agentes externos acabam por atribuir ao gestor escolar justamente a função de direção de todo o processo de efetivação do princípio de gestão democrática na escola. Como escreve Corrêa, ao refletir sobre mecanismos burocratizantes, dentro de movimentos sociais: “é natural que, em espaços coletivos, alguns tenham destaque em relação a outros no que diz respeito à liderança. No entanto, reconhecer isso não significa a mesma coisa que separar o movimento entre base e direção” (CORRÊA, 2010).

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No contexto dos procedimentos de institucionalização da gestão democrática da escola, essa separação entre direção e base pode ser ainda mais acentuada e grave, se se considerar que, ao diretor competem as responsabilidades não apenas de buscar uma formação adequada, planejar e organizar todo o processo de democratização da gestão, mas também realizar encontros, reuniões, articular e, em última instância, até mesmo formar uma consciência de grupo entre as bases (entendendo as bases aqui como os representantes dos diversos segmentos escolares), consciência de grupo ou de coletividade da qual na maioria das vezes estas bases de início não dispõem.

Considerações finaisNo paralelo que se estabelece, no tópico de conclusão do

presente trabalho, entre o processo de democratização da gestão escolar e a trajetória de movimentos sociais, as diferenças entre demandas institucionais e demandas sociais, em prol da efetivação do princípio de gestão democrática da escola pública, parecem ficar melhor evidenciadas.

Se a demanda por práticas e mecanismos de gestão democrática na escola está partindo de instituições ou agentes externos à escola, ou se a demanda por relações e espaços democráticos, dentro da instituição de ensino, está partindo de representantes dos segmentos de base (professores, funcionários, alunos, pais de alunos, agentes comunitários etc.), a diferença entre os lugares dos quais partem as demandas por democratização da escola aparece então como um fator decisivo para se avaliar a qualidade dos processos desenvolvidos dentro da instituição de ensino, na persecução desse objetivo.

O período de duração da mobilização dos diferentes segmentos, a qualidade da participação e o potencial reivindicatório dos diferentes grupos, de seus representantes e de seus representados, a organização e o adequado funcionamento de processos e estruturas, a maior ou menor eficiência das instâncias e mecanismos da gestão democrática, a utilização racional de recursos para a realização de fins determinados, o próprio discernimento entre o que são meios e o que são fins dentro do trabalho da administração escolar, além da

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presença ou da ausência de perspectivas a médio e a longo prazo, todos estes fatores encontram-se atrelados e em dependência direta do lugar de onde parte a demanda pela democratização da escola e de sua gestão.

Mesmo sabendo da indissociabilidade entre a educação formal e o processo de institucionalização, a partir do qual ela precisa ser organizada, e ainda que a burocracia pedagógica prevaleça, na maior parte das vezes, dentro dos sistemas e das instituições de ensino, a partir de princípios como o da concentração da responsabilidade e o da celeridade no processo de tomada de decisões e no cumprimento de prazos, os desafios com os quais este trabalho pretendeu lidar estão todos relacionados, a despeito da força dos condicionantes burocráticos e institucionais, com a qualidade dos processos de participação e de democratização desenvolvidos na e pela escola.

Resultados ou produtos visados a partir da assunção do princípio de gestão democrática da educação, como o Colegiado Escolar, o Projeto Político-Pedagógico, o Regimento Escolar, entre outros instrumentos e mecanismos de participação, eles podem existir como meras demandas institucionais, esvaziados de sentido pela força do cumprimento de uma série de burocracias dos sistemas educacionais, podendo figurar dentre estas burocracias a própria gestão democrática da educação, como pretendeu mostrar este trabalho, mas também estes mesmos resultados e produtos podem começar a ser perseguidos a partir de demandas sociais que abrem horizontes de participação na escola muito mais interessantes e legítimos, para o início da construção de um projeto político pedagógico para a escola.

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Dois anos de PPP: o que construímos?Kele Frossard

Carmen Dias da Cunha

IntroduçãoO Projeto Político-Pedagógico (PPP) é o resultado de conquistas

dos mais variados setores da sociedade e é parte integrante do conjunto de diretrizes teóricas e práticas de qualquer instituição. Sua concepção deve, obrigatoriamente, envolver os mais variados atores do processo escolar: profissionais da educação, alunos, pais e demais funcionários de uma unidade escolar.

Seu objetivo é o de respaldar, o mais democraticamente possível, as ações administrativas e pedagógicas da escola. O instrumento é dinâmico e mutante e encontra-se aberto às reelaborações, de acordo com o contexto e a avaliação dos resultados de suas propostas.

Assim, ciente que nenhum projeto político pedagógico pode ser dado como pronto e finalizado, sob pena de se cristalizar e deixar de acompanhar os movimentos da história, o presente trabalho visa abordar de forma revisional o PPP do Colégio Municipal Professora Didi Andrade, instituição localizada na cidade de Itabira, e que atende alunos das séries iniciais e séries finais da educação básica.

Este trabalho pretende ser um esforço pela assunção do princípio da gestão democrática do ensino público, mas, ao mesmo tempo, um exercício de cautela, e, principalmente, de crítica, na intenção de que o discurso em torno de um belo princípio não sirva de escudo nem se sobreponha à confrontação necessária com a realidade ou as realidades de uma dada instituição educacional, objeto primeiro da reflexão que será desenvolvida aqui.

Inicialmente, o Projeto de Intervenção Pedagógica, propunha a revisão do PPP da escola. O documento em questão foi elaborado em 2011, em um momento de transição administrativa, com uma mudança de gestão e de perfil da escola, a qual passou de uma escola de segmentos finais do Ensino Fundamental e da EJA para o atendimento de Educação Infantil, séries Iniciais e finais do Ensino Fundamental.

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A implementação do documento, em alguns momentos, não esteve em primeiro plano, diante de necessidades, não mais importantes, porém mais urgentes. Essa mudança de gestão e de perfil de atendimento da escola demandou uma profunda reconfiguração e um repensar na identidade da escola.

Se por um lado o PPP auxiliou na reelaboração identitária, por outro, sua construção se deu em um momento em que a instituição sofria uma mutação ainda em processo. No momento da proposta, dois anos depois da elaboração, os profissionais acreditavam que a revisão do PPP proporcionaria uma reflexão sobre o processo de mudanças pelas quais a escola passou e uma avaliação sobre se as propostas anteriores ainda seriam pertinentes.

O processo de interrogação sobre a efetivação do PPP

Durante as discussões, percebeu-se que a falta de tempo pedagógico prejudicou a redação do documento, porém, o grupo não percebia disparidade entre as propostas daquele momento e os anseios da atualidade. Se inicialmente as perguntas giravam em torno “do que acreditamos”, agora os questionamentos tiveram como questão central o “por que não efetivamos o que acreditamos”.

Os debates em grupo e os resultados apontados pela análise dos instrumentos didáticos – atividades, avaliações de aprendizagem, planejamentos, instrumentos de pesquisa, questionários sobre o perfil docente e avaliação institucional da escola, levantamentos do absenteísmo docente – referente aos últimos dois anos e a análise das interferências externas no processo escolar trouxeram reflexões que apontam os possíveis entraves na implantação das propostas do PPP.

Dentro da escola se relacionam uma pluralidade de pessoas e, embora as relações que mantêm entre si estão sujeitas a diretrizes que definem a conduta adequada, o PPP é um dos instrumentos que apresenta uma “conduta pedagógica adequada” proposta pelo grupo. O debate e a análise apontados acima permitem supor que o PPP, não só não foi efetivado, como de fato, não norteia as ações político – pedagógicas da escola.

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Os mesmos instrumentos e as reflexões em grupo também permitem levantar hipóteses das possíveis causas da não efetivação de propostas discutidas e sugeridas pelo grupo. O discurso dos professores, em debates em grupos, observado nas respostas dos questionários e na observação cotidiana, aponta invariavelmente para causas externas à escola. Não se pretende aqui negar os sabidos, e nem por isso, menos graves e urgentes, problemas da educação pública brasileira, mas se acredita que a efetivação de um pensamento coletivo possa acontecer ainda que na presença desses problemas. Não se trata aqui de estabelecer uma situação ideal, tal qual a descrição do PPP, pois se sabe que o projeto é um processo em longo prazo, é uma visão do futuro que queremos. Entretanto, foram analisamos se as propostas foram iniciadas, se a viga mestra já está sendo cimentada, mesmo com os percalços que alongarão o caminho.

Nessa perspectiva, o discurso direto dos profissionais apontava apenas o caminho do portão da escola. Os problemas estavam lá fora, no Estado, na família, no mundo contemporâneo. A análise de si mesmos oscilou em dois panoramas distintos, ora o excesso dos discursos, afinados com as atuais tendências pedagógicas, confrontava-se com a pobreza das práticas; ora o discurso assume a posição de confronto com essas tendências.

Se a defesa da necessidade de se desenvolver as inteligências múltiplas dos alunos, tal qual defende Gardner (1995) e apontada no PPP da escola, é uma unanimidade, o cotidiano e as avaliações ainda apresentam ao aluno uma realidade monológica.

Surge então o questionamento: o professor dissimula e adere ao discurso vigente – já que não compactua ou o professor compactua do pensamento – mas não consegue traduzir na prática pedagógica o que acredita? Ambas as situações puderam ser percebidas. Nos questionários, os professores assinalaram opções que demonstram certos entendimentos que se conflitam com a marcação de outras questões. Nas atividades cotidianas, percebem-se tentativas de implementação, que esbarram, muitas vezes, na formação inadequada, nas questões externas, como a falta de tempo para a elaboração, e ainda na demonstração manifesta de que a execução seria apenas para cumprir uma tarefa imposta pela instituição.

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O absenteísmo docente, percebido nos gráficos dos últimos dois anos, é muito alto para que haja uma continuidade no planejamento. Se partir-se da premissa de que as inteligências são múltiplas e interligadas, a interrupção dos conteúdos linguísticos interfere na aprendizagem dos conteúdos lógicos, por exemplo. O tema é delicado, na medida em que as motivações das faltas são variadas e, por vezes, tangem ao tema do adoecimento docente diante das condições de trabalho. Porém, a reflexão das consequências é de extrema importância para a escola.

Avaliar os possíveis fatores que influenciaram a não efetivação das propostas do PPP de 2011, sem medo da responsabilização de cada um, é o objetivo geral deste trabalho. Se por um lado existe uma facilidade em levantarem-se os problemas externos à escola, em sua maioria legítimos e pertinentes (faltam de recursos, constantes interferências externas, currículo nacional defasado, salários baixos e outros), por outro lado existe uma dificuldade quase cristalizada em analisar se a intencionalidade declarada corresponde as práticas educacionais.

A conscientização da condição docente é, portanto, outro objetivo do trabalho. Essa hipótese não se propõe ao maniqueísmo simplista de impor aos professores a culpa pela falta da educação de qualidade que todos vislumbram na escola pública brasileira, mas sim, aponta uma parte do problema.

Um dos importantes embasamentos teóricos do PPP da escola havia sido elaborado com base na teoria das inteligências múltiplas, proposta por Howard Gardner. O estudioso amplia o conceito de inteligência, tratando-a no plural como “inteligências”.

O conceito foi considerado nas discussões com os professores, à época de elaboração do PPP, como moderno e alinhado com as atuais exigências do mundo contemporâneo, no qual os alunos estão inseridos. Sendo assim, a inteligência que busca compreendê-los também deve ser múltipla e a escola deve propiciar o desenvolvimento multifacetado do aluno. O reconhecimento de que todos são capazes de desenvolver essas potencialidades, mesmo que com mais aptidão para algumas delas, facilita a intervenção do professor para que o aluno compreenda os conteúdos que tem mais dificuldade através de suas habilidades mais desenvolvida.

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Se, dois anos depois da redação do PPP, após a análise dos instrumentos e documentos escolares, não se percebe a aplicação prática deste conceito, a investigação e o levantamento de hipóteses que possam contribuir para que, no interior da escola, os discursos estejam alinhados com a prática são de essencial importância para a efetivação da aprendizagem dos alunos.

Reconhecendo também que a tecnologia é hoje a principal interface dos alunos com o mundo, o conceito das inteligências múltiplas vem ao encontro à era cibernética. Diversificar a natureza dos estímulos é inerente ao ambiente tecnológico e o papel do educador de incorporar o conceito aos planos de aula, é essencial para oportunizar ao aluno um ambiente plural, que estimule suas habilidades múltiplas.

A organização da rotina, os critérios de enturmação, o modelo de avaliação de aprendizagem, a recuperação, a gestão democrática, a necessidade de atualização profissional constante e outros temas, foram abordados em grupo, a partir dessas reflexões.

Sobre a intervenção realizadaSeguiram-se os caminhos propostos pelo conceito de “pesquisa-

ação” e iniciou-se a análise da própria prática para produzir novos compromissos. De acordo com Thiollent (2005, p. 16):

Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os sim pesquisadores e os participantes representativos da situação ou problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.

O que caracteriza a “pesquisa-ação” é a participação efetiva das

pessoas implicadas no problema proposto como alvo da intervenção. Assim, a investigação coletiva após a delimitação do problema foi um dos métodos propostos.

Como foi dito, inicialmente o Projeto de Intervenção propunha uma revisão do PPP, pois se acreditava que o contexto em que o documento foi elaborado, além de não ser favorável à uma reflexão identitária, já havia sofrido mutações que demandavam adequações.

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Nessa fase indicações de leituras de textos de Gardner e de Celso Antunes foram feitas para que o referencial teórico do projeto fosse revisitado por todos. Outros autores como Ilma Veiga e Vítor Paro foram indicados para reflexões acerca da construção e do viés democrático do PPP.

As reflexões foram positivas, mas não houve debate em torno da adequação ou revisão do referencial teórico. Ao se perceber que as propostas ainda eram adequadas para a realidade de hoje, o problema deslocou-se para as motivações da não efetivação do discurso.

Depois das primeiras reuniões de grupo em que as reflexões se centravam nas dificuldades externas, percebeu-se que a abordagem deveria ser diferente. Foram utilizados os dados produzidos pela prática pedagógica para se iniciar uma análise das condições internas que impossibilitaram a transposição dos conceitos do PPP para o cotidiano escolar.

A escola vem tentando produzir e organizar dados sistemáticos a serem apresentados à comunidade escolar, desde a elaboração do PPP em 2011: as avaliações e os planejamentos devidamente arquivados; as intervenções pedagógicas elaboradas em forma de projeto, também devidamente arquivadas; os índices da escola em formato de gráficos (aprovação, reprovação, distorção idade série e outros); os resultados das avaliações externas acessíveis na internet; a criação e arquivamento de uma Agenda Programada (agenda mensal afixada na sala dos professores com a anotação das faltas e a motivação delas, de cada profissional; criada inicialmente para facilitar a comunicação interna e usada aqui para elaboração de gráficos do absenteísmo docente, na escola, nos últimos dois anos) e o uso de questionários como instrumento da gestão democrática, da autoavaliação e de pesquisa de campo, com resultados indicativos tabulados desde 2011, facilitaram o trabalho.

Por um lado os documentos estavam acessíveis, por outro, as primeiras reuniões demonstraram que, mesmo os dados internos da escola, por possuírem ligações intrínsecas com problemas externos, poderiam ser avaliados apenas por este viés.

A indicação do autor António Nóvoa, em um artigo intitulado “Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas”, suscitou discussões calorosas e introduziu a difícil temática da responsabilização de cada um.

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Além do trabalho das discussões em grupo que acompanharam todo o processo de pesquisa, envolvendo a leitura dos textos indicados e a análise dos dados apresentados, foram elaborados questionários específicos para investigação do problema.

Os resultados da tabulação das respostas dos professores e dos alunos foi bastante elucidativos em relação às respostas que cada segmento ofereceu para os questionamentos.

Projeto político pedagógico e gestão escolarNa busca da implantação de norteadores democráticos na

constituição político-social, as instituições escolares têm como dever fomentar a conscientização da importância da participação ativa da comunidade, no que tange aos direcionamentos proporcionados por tais instituições.

O PPP é um dos instrumentos que as instituições escolares têm utilizado para consolidar a participação ativa e a implantação da gestão democrática – conceito discutido por vários teóricos da educação nas últimas décadas.

O princípio constitucional de gestão democrática do ensino público, tal como aparece no Inciso VI do Artigo 206 da Constituição de 1988 – justamente pela sua condição de princípio, de começo, de origem, de fonte de um determinado fenômeno – carece tanto de desenvolvimento teórico quanto prático, caso se deseje realmente proceder com a assunção e a efetivação desse princípio.

No plano de uma vasta bibliografia que se ocupa do tema da relação entre democracia e educação, o presente trabalho representa uma escolha particular por um determinado conjunto de autores e conceitos, que foram aqui utilizados com o propósito de subsidiar uma reflexão em torno do que acontece quando há a tentativa de fazer com que um princípio, como o da gestão democrática do ensino público, seja transposto para a realidade concreta de uma específica escola pública brasileira.

O presente trabalho se serve ainda e amplamente de alguns dos trabalhos de dois pesquisadores brasileiros, os professores Elie Ghanem e Vitor Paro, com o intuito de estabelecer uma confrontação mais franca e direta com a específica realidade da educação pública brasileira. Estes autores oferecem muitos

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aportes teóricos para a reflexão de conceitos fundamentais como os de educação, cultura, poder, representação, participação, entre outros, mais diretamente relacionados ao tema da gestão democrática da educação, na escola pública brasileira e, embora não foram trabalhados diretamente no texto, foram de essencial importância como leituras introdutórias para a percepção crítica das questões aqui mencionadas.

O PPP cumpre ainda o papel de traduzir as discussões e reflexões proporcionadas por um ambiente democrático, em propostas pedagógicas que serão a viga mestra da construção do conhecimento dentro da escola, ou seja, possibilita vivenciar os processos denominados por Ilma Veiga de ato situacional, ato conceitual e ato operacional.

O ato situacional vem ao encontro dos preceitos da gestão democrática: o diagnóstico da instituição através da participação de todos os atores envolvidos. O ato conceitual permite que este levantamento possa direcionar a que concepção de educação a análise das prioridades da instituição aponta. Esta concepção carece de ser compreendida e pactuada pelo grupo para que o ato operacional possa ser efetivado.

Neste alinhamento, a contribuição da teoria das inteligências múltiplas de Howard Gardner, para a gestão democrática da educação, pode ser muito significativa. Assim, tanto as concepções propostas pelo psicólogo cognitivo e educacional Howard Gardner, com a sua teoria das inteligências múltiplas, bem como a de outros pesquisadores dessa teoria, como o brasileiro Celso Antunes, contribuem com alguns importantes insights para se relacionar à perspectiva de democratização da gestão escolar com uma abordagem também democratizante na própria compreensão do conhecimento e do aprendizado humanos. Isso porque à medida que um determinado tipo de inteligência é retirado de seu pedestal, recursos e potencialidades diversos passam a ser identificados e valorizados numa instituição como a escola.

Cabe destacar um argumento de Vitor Paro, em “Gestão democrática da escola pública”, que compõe a bibliografia desse trabalho, e que denuncia um “discurso liberal” e de um “caráter excessivamente livresco” que podem marcar a defesa do princípio da gestão democrática da educação. O autor escreve:

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Este fenômeno mostra-se particularmente sério quando atentamos para o comportamento de pessoas que, de uma forma ou de outra, se convenceram, um dia, da importância da democracia, mas ao depararem com as dificuldades da prática, foram adotando paulatinamente atitudes cada vez mais distantes do discurso democrático, acomodando-se a elas, mas sem renunciar ao antigo discurso liberal, que acaba servindo tão somente como uma espécie de escudo a evitar que revejam criticamente seu comportamento. Esta constatação deveria levar a se repensar o caráter excessivamente livresco da formação e treinamento do educador, no sentido de propor atividades que ensejem maior contato com a realidade das escolas [...] (PARO, 2000, p. 18).

O caráter democrático do PPP e sua importância para a escola tem sido senso comum entre os profissionais da educação. O Estado afirma que o documento é o resultado dos anseios da comunidade, embora saibam que, imersa em seus dramas pessoais, a comunidade alega não ter meios de participar.

Os professores declaram estar em concordância com as pactuações que emergiram das sugestões do próprio grupo, mas a efetivação das propostas não pode ser percebida no cotidiano escolar que ainda está imerso nas antigas práticas. Os pedagogos asseguram que o documento é de essencial importância, na medida em que instiga a reflexão coletiva na busca de soluções para a realidade única da escola, mas se confrontam com a realidade de que este sentimento de pertencimento e comprometimento dos profissionais ainda é muito aquém do esperado.

A lógica excesso-pobreza, usada por Antonio Nóvoa, oferece uma chave de análise para esta realidade discursiva, que muitas vezes não corresponde à intencionalidade declarada. Do excesso da retórica política, do discurso científico e dos professores até a pobreza das políticas educativas e das práticas pedagógicas, o autor afirma:

O verbo substitui a ação e confronta-nos com o sentimento de que estamos fazendo alguma coisa. [...] Mas grande parte das crenças fundadoras da profissão docente continuam atuais. Para isso, é fundamental que os professores ocupem um espaço mais dinâmico, e menos defensivo nas mudanças em curso (NÓVOA, 1999, p. 13).

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Por um lado, a defesa desses e outros conceitos tidos como “consensos pedagógicos” vêm sendo repetida, por outro lado, as práticas apontam que a realidade se confronta com uma verdadeira inflação retórica.

Processo de análiseO Colégio Municipal Professora Didi Andrade, fundado em

1992, tipologia 31232190 - foi criado pela Lei nº 22.085 de 21/05/1992, de acordo com o preceito constitucional e a Lei Orgânica do município de Itabira. Pelo parecer nº 820 de 19 de novembro de 1993, foi autorizado o funcionamento para Ensino Fundamental II, conforme Portaria nº 004/94 - MG 13/01/94 - Pág. 11, Coluna 04 e nos termos do Art. 31 da Resolução CEE nº 306 de 29/12/1983.

Sob administração do Colégio Método Vestibular de Belo Horizonte, inclusive com uso de sua logomarca, funcionava à Avenida Madalena Pereira Santos, 126, Vila São Joaquim, em dois turnos: matutino e vespertino. A primeira administração teve como principal meta a consolidação de um colégio diferente dos demais, buscando na parceria público-privada uma experiência de inovação e enriquecimento. No ano seguinte, a criação é transferida para o novo prédio, à Avenida Tabelião Osório Sampaio, 515, Vila Santa Rosa, atual endereço do colégio.

A justificativa do nome da escola é a de prestar justa homenagem à Dona Didi Andrade, educadora itabirana, mestre competente e dedicada que exerceu o magistério no Grupo Estadual Coronel José Batista, acreditando firmemente na alfabetização como instrumento na luta pela conquista da cidadania.

Atualmente, a escola é atendida por programas e projetos, como o Programa Mais Educação (governo federal), o programa Vale Juventude, parceria da Prefeitura Municipal com a Fundação Vale. Na perspectiva da construção de uma educação inclusiva, o Colégio Municipal Professora Didi Andrade conta com assistência e parceria do CEMAE – Centro Municipal de Apoio ao Educando – que realiza atendimentos psicológicos, fonaudiológicos e oftalmológicos.

A partir de 2011, a instituição vem passando por um processo de transição, pois até 2010, o Colégio atendia unicamente alunos dos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano). Em 2011,

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quando a atual gestão assumiu a escola, deparou-se com um problema: embora mais de cem alunos fossem encaminhados pela Secretaria Municipal de Educação (SME), através do cadastramento escolar, no turno da tarde não havia nenhum aluno matriculado.

A ausência de matrículas refletia a percepção negativa que a comunidade possuía da escola, naquele momento. A solução encontrada pela SME do município foi conciliar o excesso de matrículas na Escola Municipal Américo Gianetti, que atende Educação Infantil e 1º ao 5º ano do Fundamental, com um turno vazio do Colégio Municipal professora Didi Andrade.

De 2011 a 2013, a escola absorveu turmas destes segmentos sem que os alunos estivessem formalmente matriculados. Em setembro de 2013, a Secretaria Regional de Educação (SRE) de Nova Era aceitou o pedido de legalização de atendimento à Educação Infantil e ao primeiro segmento do Ensino Fundamental, que hoje funcionam no turno vespertino.

A dupla transição, da gestão da escola e das séries de atendimento, iniciou uma reflexão identitária que culminou na redação do Projeto Político Pedagógico.

A ausência de matrículas em um turno fomentou a discussão das motivações dos pais ao não efetivarem a matrícula. Novamente os problemas estavam fora do portão da escola: a proximidade do prédio com um conglomerado conhecido na cidade pelo envolvimento no tráfico, a alegação da existência de discordâncias políticas que teriam prejudicado a escola e outros foram apontados.

A nova gestão iniciou nesse momento o processo de consulta à comunidade escolar através de questionários em que a tabulação de resultados era apresentada posteriormente para análise em grupo.

Através deste primeiro instrumento ficaram patentes as fragilidades internas da escola: pais e alunos assinalaram opções que afirmaram que a metodologia, a didática, a gestão e a política de relacionamento afetavam a imagem da escola perante a comunidade. Ao se depararem com a concretude dos resultados, os professores se mostraram surpresos e afirmaram desconhecer essa percepção da escola pela comunidade. Foi um processo doloroso para todos, especialmente para profissionais que atuavam na escola desde sua fundação em 1992. Os tempos áureos do colégio foram sempre evocados nas reuniões e as narrações das filas que se formavam no

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portão para as matrículas se contrastavam com a realidade de que a escola não atraía mais aos pais e alunos.

A percepção de que a inteligência é plural foi entendida pelo grupo como uma visão moderna, neste sentido a opção pelo referencial teórico do PPP refletiu o momento da escola, no qual o grupo sentia que era necessário alinhar-se com as exigências do mundo contemporâneo, já que a percepção da comunidade apontava para uma visão retrógada da escola. Ao se discutir novamente o documento ficou patente que, mesmo com problemas na redação, os professores não discordavam dos preceitos, o que levou ao questionamento dos motivos pelos quais as propostas do projeto não foram efetivadas.

Embora as discussões em grupo, as respostas nos questionários e as conversas informais apontassem sempre para as causas externas, a análise dos instrumentos de pesquisa e das atividades pedagógicas se voltaram, sem deixar de considerar a existência dos fatores externos, para o interior da escola e suas práticas cotidianas.

O primeiro instrumento analisado foi a tabulação de dados da Agenda Programada. Mensalmente o instrumento é afixado no quadro da sala dos professores, este contém cada dia do mês com dois campos: um a ser preenchido caso algum professor falte naquele dia e o próximo com a motivação da falta. Todos os meses são arquivados para que sejam tabulados ao fim do ano e apresentados aos professores no começo do ano seguinte. O absenteísmo docente, percebido nos gráficos dos últimos dois anos é muito alto para que haja uma continuidade no planejamento.

Em 2013, somente no primeiro semestre no turno da manhã, o gráfico 1 apontou duzentas e vinte e uma faltas, em pouco mais de cem dias letivos, ou seja, mais de dois professores não estavam presentes para ministrar suas aulas a cada dia. A tabulação traz também o número de faltas por semana e evidencia o fato de que em algumas semanas houve concentração de mais de vinte faltas, ou seja, mais de quatro professores não estavam presentes por dia. Na última semana de agosto, que antecedeu ao início da terceira etapa escolar, foram contabilizados vinte e três faltosos, configurando a semana com mais absenteísmo do ano e coincidindo justamente com o período das recuperações, no qual o aluno necessita da orientação do professor.

197

Gráfico 1 N° de Registros na Agenda Programada Turno Matutino -

Março a Agosto/2013

A análise das motivações das ausências no gráfico 2 permite inferir que as capacitações promovidas pela SME (48 faltas), o adoecimento (38) e as faltas injustificadas (38) respondem pelos maiores índices, em um universo de 221 faltas.

Gráfico 2 Motivos das Ausências dos Docentes - N° de Registros na

Agenda Programada - Março a Agosto/2013

É evidente que as formações são necessárias, mas há de se repensar nas consequências da ausência frequente dos professores, conforme mostram os dados. O tema do adoecimento docente é delicado, uma vez que tange às condições de saúde e trabalho.

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As faltas injustificadas representam aqui os professores que se ausentam sem avisar antecipadamente ou se justificar a posteriori. A apresentação desses dados, junto a um texto que tratava do absenteísmo docente, não gerou discussões: é senso comum e unanimidade que a ausência frequente do professor compromete a aprendizagem.

Se era evidente uma perda no tempo pedagógico pelas ausências, a análise da produção do tempo presente na escola, foi importante para compreender o nível de alinhamento das práticas pedagógicas com as propostas do PPP. Nas observações das aulas se percebeu que, embora um dos objetivos do Projeto Político Pedagógico seja “desenvolver competências múltiplas durante o processo aprendizagem”, as aulas foram predominantemente expositivas, sem uso de outros recursos além do quadro e o livro didático, prevalecendo os raciocínios verbais e lógicos.

Neste sentido, as avaliações estiveram alinhadas com as práticas em sala de aula: o visual normalmente não foi atrativo, trazendo imagens muito similares às do livro didático, e com questões repetitivas em relação as mesmas habilidade.

Em muitas avaliações não existia padronização na disposição dos itens de resposta, tampouco na linguagem dos enunciados. De forma geral, as avaliações não privilegiam a reflexão e a análise, prevalecendo a memorização como recurso principal para a resolução das questões. A reflexão não foi realizada em reunião, pois o grupo ainda precisa amadurecer as questões referentes à produção e à apropriação coletiva do conhecimento. A maioria ainda acredita que analisar as avaliações desta forma seria uma exposição desnecessária do professor, constrangendo-o com seus erros em público. Essa foi opção assinalada por mais de 80% dos profissionais em um questionário sobre o perfil pedagógico.

Em outro questionário, elaborado com questões relacionadas às práticas proposta pelo PPP, as respostas dos professores apontam na perspectiva contrária às observações feitas acima: na maioria das questões as respostas apontam para um cenário ideal, no qual a metodologia é diferenciada, o conteúdo não é um fim em si mesmo, as aulas objetivam o desenvolvimento multifacetado do aluno e as avaliações contemplam habilidades diversas. (ver Apêndice)

199

Nas afirmações referentes à metodologia diferenciada (Questão 4 do Apêndice), os professores, embora concordem com a primeira afirmação de que novas metodologias são apenas um complemento aos métodos tradicionais, afirmam estar sempre desenvolvendo dinâmicas, atividades diferenciadas, projetos e configurações diferentes de sala de aula. A multiplicidade de métodos, em substituição a metodologia monológica, é essencial para oportunizar aos alunos o contato com diferentes formas de aprender, respeitando o tempo e as formas com que cada um apreende o conteúdo.

A hipótese da motivação das aulas essencialmente tradicionais estar ligada ao desconhecimento ou a dificuldade de inserir novas metodologias, inicialmente, foi descartada, pois na mesma questão, poucos professores concordaram com o terceiro item, que afirmava que o entrevistado possuía dificuldades nesse tema.

Em relação à reprovação, a questão 1 também apresentou ambiguidade nas respostas. Se a maioria dos professores concorda com a afirmação do primeiro item, de que a reprovação não é a solução para os casos em que o conteúdo não foi apreendido, no item quatro os professores se dividem e quase metade afirma reprovar o aluno que não alcançou a pontuação mínima em sua disciplina.

Curiosamente na única questão unanime, todos os professores concordam que a avaliação não avalia somente o aluno, mas a capacidade do professor em mediar o processo de aprendizagem, como pode ser visto no segundo item da questão 5. Sendo a base teórica do PPP, a teoria das inteligências múltiplas, o entendimento de que o aluno pode se desenvolver em áreas distintas do conhecimento aponta outro um caminho diverso do assinalado por esta parcela dos professores.

Outras questões apontaram resultados surpreendentes. Mais da metade de nossos professores não concorda com a afirmação de que, se os pais não querem ou não podem acompanhar a vida escolar dos filhos, cabe à escola realizar as intervenções possíveis, como pode ser observado no item dois da segunda questão. Na questão 15, quase trinta por cento dos professores concordou com a afirmação do primeiro item de que as negociações em relação às faltas e atrasos podem ser realizada pela direção de forma irrestrita,

200

pois a totalidade de nossos profissionais não apresenta problemas com esses temas, mesmo depois de apresentada a tabulação dos dados da Agenda programada, na qual foram contabilizadas mais de duas faltas todos os dias.

Ao ser confrontado com essas contradições, o grupo assume uma postura reativa, deixando entrever de forma latente, que o mal-estar docente em relação às condições de trabalho – carga horária excessiva, baixos salários, falta de preparação para lidar com a recente universalização do ensino, a patente desvalorização da profissão e outros, está instalado entre a maioria dos professores, que alegam que a desmotivação somada à falta de tempo não permitem que o profissional desempenhe suas funções como seria esperado.

Considerações finaisA proposta inicial da revisão do Projeto Político Pedagógico

foi suplantada pela constatação junto aos professores de que, antes de uma revisão de conceitos e demandas, era imperativo investigar as motivações da não efetivação dos princípios que embasam o documento. As reflexões em grupo se concentraram inicialmente em fatores externos, porém a análise da rotina escolar, das atividades pedagógicas, das tabulações de questionários ligados ao tema e a observação das aulas apontaram a incoerência do discurso dos professores, no momento da elaboração do PPP e das discussões posteriores, com a realidade observada.

Como os professores, de forma geral, ainda assumem uma postura defensiva, houve momentos de tensão. O sentimento de que o grupo estava sendo culpabilizado por todos os resultados negativos da escola era latente, talvez por isso as frequentes declarações de responsabilização do Estado, da família e das condições de trabalho.

O fato de os problemas políticos tenderem a ser redefinidos como problemas pedagógicos têm pesado aos professores. Ao mesmo tempo, esse desgaste tem causado uma fuga de questões que, não podem sozinhas responder por temas complexos, mas apontam uma parte do problema.

201

Ainda há um longo caminho a percorrer para que a transposição didática se efetive na sala de aula. O discurso dos professores ainda não se alinhou às práticas pedagógicas e ao cotidiano escolar. A dicotomia entre teoria e prática ainda tem na universidade uma instituição reprodutora a despeito da retórica inversa. A formação dos professores ainda não oferece as ferramentas básicas para propostas de ação, difusão de novos métodos de ensino, ou reflexões da prática.

As políticas públicas muitas vezes são impostas de forma verticalizada e se mostram desgarradas ou contraditórias. As condições de trabalho têm levado a mutilação da identidade profissional do professor, que não se sente motivado a investir em uma carreira da qual se envergonha.

Os tempos de hoje são mais complexos do que os tempos passados. E mais difíceis. Mas grande parte das crenças fundadoras da profissão docente continuam atuais. A começar por esse sentimento de que nos compete cuidar das crianças e do seu futuro. Para que isso seja possível, é fundamental que os professores ocupem um espaço mais dinâmico (e menos defensivo) nas mudanças em curso (NÒVOA, 1999).

Nesta perspectiva, o trabalho contribuiu para o início das reflexões de forma mais franca e direta sobre temas delicados. É preciso que os professores sejam capazes de refletirem sobre sua própria profissão, para além da dimensão reivindicatória. Introduzir a difícil temática da responsabilização de cada um foi um passo importante para o amadurecimento do grupo.

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202

NOGARO, A. Reflexão sobre pressupostos que Norteiam o Projeto Político Pedagógico da Escola. Perspectiva. Erechim. v. 19, n. 67 - 74, setembro 1995.NÓVOA, A. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Cadernos de Pedagogia, nº 286, Dezembro, 1999.PARO, V. H. Administração escolar: introdução crítica. 16. ed. São Paulo: Cortez, 2010.PARO, V. H. Educação como exercício do poder: crítica ao senso comum em educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2010.PARO, V. H. Gestão democrática da escola pública. 3. ed. São Paulo: Ática, 2000.SOUSA, S. Z. Avaliação Escolar: constatações e perspectivas. Revista de Educação AEC, Brasília-DF, ano 24, nº 94, p. 59-66, jan./mar., 1995.VEIGA, I. P. A. Perspectivas para reflexão em torno do projeto político-pedagógico. In: VEIGA, Ilma Passos A. e RESENDE, Lúcia G. de (orgs.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 1998.

203

Apêndice - Questionário desenvolvido a partir da proposta de análise das motivações da não aplicação das propostas do PPP

1. Em

relação à aprovação/reprovação, assi-nale quais as frases você concorda ou discorda:A

reprovação, nos moldes em

que acontece hoje, não é a solução para recuperar os conteúdos perdidos.

o C

oncordo o D

iscordoA

pressão das várias instâncias do governo para que os alu-nos sejam

aprovados tem sido um

dos maiores problem

as da educação no Brasil.

o C

oncordo o D

iscordoA

reprovação, mesm

o que prejudicial ao aluno em

curto prazo é uma tentativa para que ele recupere o

conteúdo perdido do ano em que ele não adquiriu as

competências necessárias.

o C

oncordo o D

iscordoA

provar o aluno mesm

o quando este não alcançou a pon-tuação m

ínima faz parte de um

entendimento de que o

meu conteúdo pode não fazer parte das potencialidades

que o aluno pretende desenvolver.o

Concordo o

Discordo

2. Em

relação ao contexto familiar de nossos

alunos, assinale quais frases você concorda ou discorda: A

falta de apoio familiar está entre os principais proble-

mas da educação em

nosso país e enquanto não houver responsabilização de abandono intelectual não podem

os atingir os resultados esperados.

o C

oncordo o D

iscordo

De form

a geral, as famílias não querem

ou não podem

acompanhar os alunos, por isso, cabe a nós realizarm

os as intervenções possíveis dentro deste contexto.

o C

oncordo o D

iscordo A

s reuniões de pais deveriam ser m

enos burocráticas e trazer propostas concretas para orientar os pais em

relação ao seu papel na educação dos filhos.

o C

oncordo o D

iscordo A

s reclamações sobre a falta de apoio da fam

ília são constantes, porém

, diante da constatação deste fato, nós devem

os agir com m

ais propositividade em rela-

ção ao problema.o

Concordo o

Discordo

204

3. Em

relação ao currículo proposto para sua disci-plina, assinale quais frases você concorda ou discorda:

O currículo apresenta os conteúdos básicos para o que o alu-

no adquira as habilidades mínim

as para a vida adulta.o

Concordo o

Discordo

Não sigo a proposta curricular na íntegra, pois a proposta

não permite aprofundam

ento dos conteúdos e não está ali-nhada com

minhas convicções enquanto profissional da edu-

cação.o

Concordo o

Discordo

A proposta curricular está em

consonância com as exigên-

cias dos concursos públicos, vestibulares e outros.o

Concordo o

Discordo

O currículo é baseado em

uma educação ilum

inista e deixa de contem

plar vários aspectos importantes para a form

ação dos alunos.

o C

oncordo o D

iscordo

4. Em

relação ao uso de novas metodologias, assi-

nale quais frases você concorda ou discorda:

Pela especificidade de minha disciplina, em

bora eu insira no-vas m

etodologias, elas são um com

plemento aos m

étodos tra-dicionais.

o C

oncordo o D

iscordo N

ão acredito que a metodologia seja um

dos principais proble-m

as que enfrentamos hoje na educação, pois m

esmo em

aulas diferenciadas os alunos não m

ostram m

ais interesse que nas au-las tradicionais.

o C

oncordo o D

iscordo Tenho dificuldade em

inserir novas metodologias, sendo

assim, a m

aioria das minhas aulas são tradicionais e desen-

volvidas através do livro didático, quadro e explicação dis-cursiva.

o C

oncordo o D

iscordoEstou sem

pre buscando métodos que possam

ajudar na aprendizagem

dos meus alunos, frequentem

ente realizo di-nâm

icas, trabalhos diferenciados, projetos, configurações diferentes em

sala de aula, uso de materiais alternativos e

outros.o

Concordo o

Discordo

Embora os alunos dem

onstrem m

ais interesse por aulas dife-renciadas e eu reconheça o papel de novas tecnologias, m

inha sobrecarga de trabalho não perm

ite que planeje este tipo de atividade.

o C

oncordo o D

iscordo

205

5. Em

relação às avaliações, assinale quais frases você concorda ou discorda:

Acredito que o conteúdo não é um

fim e sim

o meio dos alu-

nos se inserirem no m

undo em que vivem

, sendo assim m

inhas avaliações são desenvolvidas com

ênfase nas competências e

habilidades. o

Concordo o

Discordo

Minhas aulas são m

inistradas em torno do conteúdo, por

isso as avaliações são feitas para verificar a aprendizagem do

conteúdo.o

Concordo o

Discordo

As avaliações não avaliam

somente o aluno, m

as a minha

capacidade de mediar o processo de aprendizagem

e o de ela-borar avaliações condizentes com

o que foi ensinado.o

Concordo o

Discordo

As avaliações revelam

o interesse que o aluno demonstrou

durante o ano letivo, é, portanto o resultado de seu processo educativo.

o C

oncordo o D

iscordo

6. Em

relação aos suportes usados nas avaliações, assinale quais frases você concorda ou discorda:N

ão utilizo sempre suportes, pois m

inha disciplina apresen-ta especificidades que não perm

item o uso constante.

o C

oncordo o D

iscordo Sem

pre utilizo algum suporte, pois a contextualização da

questão é importante para o aluno e tem

sido utilizada de for-m

a constante nas avaliações externas, evidenciando uma ten-

dência pedagógica.o C

oncordo o D

iscordo A

cho que a utilização dos suportes é uma tendência que não

acrescenta no aprendizado dos alunos, pois tende a facilitar a resposta e contribuir para que o aluno avance sem

consolidar as habilidades.

o C

oncordo o D

iscordo U

so os suportes em algum

as questões, porém acredito que o

uso deles não é tão necessário como vem

sendo apresentado pelas principais tendências pedagógicas.

o C

oncordo o D

iscordo

7. Em

relação ao uso de imagens, na prática cotidiana

em sala de aula, nos trabalhos e atividades escolares e nas

avaliações, assinale quais frases você concorda ou discorda:A

lém de utilizar as im

agens nas atividades citadas, penso que a leitura im

agética é um tem

a tão importante quanto a leitura

textual e deveria ser desenvolvida em todas as disciplinas em

que exista essa possibilidade.

206

o C

oncordo o D

iscordo

Não faço uso regular de im

agens, pois minha disciplina apre-

senta especificidades que não permitem

o uso constante.o

Concordo o

Discordo

Tenho percebido uma valorização cultural excessiva da im

a-gem

, invertendo valores e alocando o texto escrito em segun-

do plano, neste sentido, por acreditar que o papel da escola é tentar reverter este processo, não m

e utilizo muito de im

a-gens.

o C

oncordo o D

iscordo A

credito que a geração dos nossos alunos é imagética e con-

cordemos ou não, essa realidade é irreversível, sendo assim

, o uso de im

agens em m

inha disciplina é constante.o

Concordo o

Discordo

Reconhecendo que a im

agem é hoje a principal interface dos

alunos com o m

undo, tenho feito um banco de dados de im

agens que possam

ser úteis como introdução e/ou aprofundam

ento dos conteúdos.

o C

oncordo o D

iscordo

8. Em

relação à comunicação na escola, assinale

quais frases você concorda ou discorda: D

entro da imprevisibilidade do cotidiano escolar, acredito

que a escola consegue comunicar a m

aioria dos processos, porém

, poderíamos concentrar os recados urgentes em

um

lugar específico para facilitar a visualização.o

Concordo o

Discordo

Precisamos dar ênfase na com

unicação, pois a escola não com

unica os processos em tem

po hábil e as informações não

repassadas de forma clara.o

Concordo o

Discordo

Acredito que a com

unicação pode ser melhorada em

ambos

os lados: a escola pode aperfeiçoar os meios e os m

étodos de com

unicação e os profissionais podem ser m

ais atentos aos inform

es repassados em reunião e nos quadros de aviso.

o C

oncordo o D

iscordo

9. Em

relação às negociações de faltas e atrasos, as-sinale quais frases você concorda ou discorda: A

flexibilização é positiva, e pode ser feita de m

aneira irres-trita, pois a totalidade de nossos profissionais não apresen-tam

problemas graves de faltas e/ou atrasos.

o C

oncordo o D

iscordo A

flexibilização é positiva, porém

a direção precisa ter um

olhar diferenciado para alguns casos de faltas e/ou atrasos frequentes dos m

esmos profissionais, pois os que cum

prem

seus deveres funcionais se sentem prejudicados.

o C

oncordo o D

iscordo A

credito que a flexibilização proposta pela escola tem

cau-sado prejuízo aos alunos, pois são sem

pre os mesm

os profis-sionais, ou seja, a carga horária de algum

as disciplinas fica prejudicada.

o C

oncordo o D

iscordo

Gestão de políticas públicas na educação básica e os planos de educação: uma questão de planejamento de ações integradas

Aparecida Dias de Oliveira Torres Valéria Duarte Malta

IntroduçãoA educação é o arrimo de um estado democrático que busca

fazer valer os direitos e deveres ao qual um indivíduo está sujeito em relação à sociedade em que vive. Portanto, a cidadania só é legitimada quando há a prática dela e esta por sua vez, só pode ser alcançada quando há uma preparação social que se inicia na escola.

De acordo Duarte (2007) o direito à educação está previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 como um direito fundamental e de natureza social. Diante do contexto, o Estado brasileiro tem o papel de garantir o direito à educação de qualidade e de organizar todo o sistema escolar.

Para concretizar seu papel de assegurar o direito à educação aos brasileiros, o Estado criou espaços para acompanhar as ações desenvolvidas visando verificar se estas ações têm sido suficientes para alcançar as metas pactuadas. Os conselhos federais, estaduais e municipais foram criados com o intuito de garantir, na sua especificidade, um direito constitucional da cidadania.

Segundo Cury (2006):

(...) os conselhos devem buscar, junto com a legalidade, a sua legitimidade por meio do espírito e da força do § único do art.1 da CF/88 e do espírito do art. 204, II. Trata-se de incluir mecanismos de participação corroborados pelo princípio constitucional da gestão democrática do art. 206 e do Estado Democrático de Direito.

Outra forma de tentar cumprir seu papel de estado foi à criação dos planos de educação. Esses planos têm um período de dez anos

208

para serem executados, portanto as ações neles contempladas devem ser monitoradas para possíveis correções.

Baseado neste contexto o presente trabalho analisa as estruturas e o alinhamento das metas estabelecidas na hierarquia das instâncias públicas dos seguintes planos: Plano Nacional de Educação; Plano Estadual de Educação de Minas Gerais e do Plano Municipal de Educação de Santa Maria de Itabira.

Propõe-se aqui responder as seguintes perguntas: há consonância entre as metas pactuadas no Plano Municipal de Educação (PME) e o Plano Desenvolvimento da Educação (PDE) de Santa Maria de Itabira? Essas metas estão alinhadas com os demais planos das instâncias superiores?

Planos Decenais de EducaçãoO ato de planejar é uma ação humana. Segundo Menegolla e

Sant’Anna (2007, p. 15) “A história do homem é o reflexo do seu pensar sobre o presente, o passado e o futuro”. Assim, a pessoa planeja porque deseja realizar algo. “Planejar é uma exigência do ser humano; é um ato de pensar sobre um possível e viável a fazer. E como o homem pensa sobre o seu ‘quê fazer’, o planejamento se justifica por si mesmo” (MENEGOLLA e SANT’ANNA, 2007).

A ideia de elaborar planos decenais de educação, conforme histórico do Plano Nacional de Educação – PNE (2000) vem desde o Manifesto dos pioneiros da Educação Nova. Em seguida a Constituição de 1934, determinou em seu artigo 150 que a União deveria estabelecer o Plano Nacional de Educação.

O tema retornou nos textos das constituições de 1946 e de 1967. Assim, o primeiro Plano Nacional de Educação foi elaborado em 1962 quando foram estabelecidos objetivos e metas para um período de oito anos. A Constituição de 1988 acolheu a proposta e dispôs em seu Art. 214 sobre um PNE plurianual que propunha a:

(...) articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: (Redação dada pela Emenda

209

Constitucional nº 59, de 2009): I - erradicação do analfabetismo; II  - universalização do atendimento escolar; III  - melhoria da qualidade do ensino; IV - formação para o trabalho; V - promoção humanística, científica e tecnológica do País (BRASIL, 1988).

Em 2009, foi proposta uma Emenda constitucional que acrescentou como diretriz no plano de educação o “estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.” (BRASIL, EC nº 58, 2009) como diretriz no plano de educação.

A Lei nº 9.394, de 1996, que “estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional”, também traz em sua redação orientações para a elaboração de um plano decenal. Essa lei determina no artigo 9º, que cabe à União, a elaboração do Plano, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e no Artigo 87 institui a Década da Educação e estabelece o prazo de um ano para que esse plano seja encaminhado ao Congresso Nacional “com diretrizes e metas para os dez anos posteriores, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos” (BRASIL, 1996).

O PNE sancionado em 2001 estabelece a obrigatoriedade de Estados e municípios de elaborarem os seus planos, segundo diretrizes da Educação Nacional: “Art. 5º Os planos plurianuais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serão elaborados de modo a dar suporte às metas constantes do Plano Nacional de Educação e dos respectivos planos decenais” (BRASIL, 2000)

A importância da participação de toda a comunidade escolar e extra escolar na elaboração do Plano Decenal Municipal se expressa pela necessidade de articular ideias na elaboração de uma proposta com a identidade local. Assim como a aprovação do plano ser realizada na Câmara Municipal pelo poder Legislativo. Essa participação popular na elaboração do Plano da Educação evidencia que as metas constantes no plano, são metas dos cidadãos, da sociedade e das organizações existentes no município. Nesse sentido não é um plano do setor administrativo ou dos administradores.

Os objetivos e as metas deste plano somente poderão ser alcançados se ele for concebido e acolhido como Plano de

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Estado, mais do que Plano de Governo e, por isso, assumido como um compromisso da sociedade para consigo mesma (BRASIL, 2000).

O Governo Federal, em suas orientações, esclarece que:

A construção de um Plano Municipal de Educação significa um grande avanço, por se tratar de um plano de Estado e não somente um plano de governo. A sua aprovação pelo poder legislativo, transformando-o em lei municipal sancionada pelo chefe do executivo, confere poder de ultrapassar diferentes gestões. Nesse prisma, traz a superação de uma prática tão comum na educação brasileira: a descontinuidade que acontece em cada governo, recomeçar a história da educação, desconsiderando as boas políticas educacionais por não ser de sua iniciativa (BRASIL, 2005, p. 9).

Percebe-se então, a necessidade de articular a participação de diversos segmentos na elaboração do plano, assim como ter conhecimento do Plano Nacional de Educação. Assim sendo:

A elaboração de um PME constitui-se como o momento de um planejamento conjunto do governo com a sociedade civil que, com base científica e com a utilização de recursos previsíveis, deve ter como intuito responder às necessidades sociais. Todavia, só a participação da sociedade civil (Conselho Municipal de Educação, associações, sindicatos, Câmara Municipal, diretores das escolas, professores e alunos, entre outros) é que garantirá a efetivação das diretrizes e ações planejadas. O desafio para os municípios é elaborar um plano que guarde consonância com o Plano Nacional de Educação e, ao mesmo tempo, garanta sua identidade e autonomia (BRASIL, 2005, p. 10).

A estrutura do Plano Municipal de Educação (PME) é semelhante ao PNE. O ideal é que ele inicie com um diagnóstico seguido de princípios e objetivos gerais. Assim, os conselhos municipais devem partir de uma análise de como está a Educação, observando no seu contexto atual, os aspectos demográficos, informações dos censos escolares, padrão de desempenho das escolas, padrões da gestão e análise do currículo escolar. Somente depois de analisar as avaliações e resultados obtidos nas avaliações internas e externas é que se deve propor as diretrizes, os objetivos

211

e metas para a educação no município. Um dos princípios que se propõe na elaboração do PME, se refere à gestão do ensino público:

Deve observar o princípio constitucional de “gestão democrática do ensino público” (C.F. art. 206, inciso VI), gestão democrática de ensino e da educação, proporcionando a garantia de princípios como a transparência e impessoalidade, autonomia e participação, liderança e trabalho coletivo, representatividade e competência. Nessa direção, o Plano Municipal de Educação deve estar em consonância com o espírito e as normas definidas no Plano Nacional de Educação estabelecidas na Lei n° 10.172, de 9 de janeiro de 2001 (BRASIL, 2005, p. 12).

É importante destacar que elaborado e aprovado, o plano não está finalizado. Ele deve ser objeto de constante análise para avaliação e implementação das metas. Nas orientações de elaboração dos planos, solicita-se a criação de uma equipe que forma o Comitê permanente de avaliação do plano. É tarefa desse comitê, solicitar sempre encontros para análise das propostas e políticas públicas referentes à educação. Por isso é fundamental que:

O Plano Municipal deve prever e determinar os momentos estratégicos para realizar uma avaliação das ações e das atividades que estão sendo desenvolvidas e analisar os resultados que estão sendo alcançados com o objetivo de poder redirecionar as estratégias de execução. Dessa forma, é importante elaborar alguns instrumentos que sirvam não apenas para realizar o acompanhamento das ações, como também para avaliar os resultados alcançados e realimentar a dinâmica do processo executivo do Plano (BRASIL, 2005, p. 31).

O Plano de Educação torna-se um plano vivo, que deve nortear as ações dos gestores da educação. Ao mesmo tempo em que é alimentado pelas propostas dos cidadãos, de acordo com os seus anseios, propostas federais e estaduais em regime de colaboração entre os entes federados.

A seguir, apresentaremos uma análise crítica e política das metas estipuladas para o decênio de cada um dos planos.

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A Relação de interdependência entre os Planos de Educação

A relação de interdependência entre os planos é uma relação de planejamento estratégico nas políticas públicas, sendo esse planejamento uma das mais importantes ferramentas administrativas, pois estabelece caminhos que orientam os gestores públicos na condução das atividades.

Planejamento é, portanto, de acordo com Nogueira, Barros et al (2007, p. 03) “Um processo contínuo e dinâmico que consiste em um conjunto de ações intencionais, integradas, coordenadas e orientadas para tornar realidade um objetivo futuro, de forma a possibilitar a tomada de decisões antecipadamente.”

Segundo Menegolla e Sant’Anna (2007, p. 35) “o planejamento educacional não se limita a ser estruturado por uma série de projetos isolados e desenvolvidos em regiões específicas, ele é um processo global que vai desde a definição de uma filosofia da educação até o estabelecimento dos processos.”

Observa-se que os planos educacionais estabelecem uma hierarquia nas políticas públicas, principalmente quando se necessita de regime de cooperação entre os entes federados: União – Unidade Federativa – município e ou Distrito Federal. Ao analisar tais planos, percebe-se que há necessidade de um planejamento integrado e coordenado para que, desde a base até a ponta, todas as ações estejam em consonância com o planejamento.

Figura 1 – As relações de interdependência entre os planos Diretores da Educação pública. Fonte: Os autores, 2013

213

Percebe-se que o Plano Nacional de Educação é a proposta base para as demais propostas de educação. Neste sentido o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e o Plano de Ações Articuladas (PAR) toma como base o PNE. E assim, de forma hierárquica os estados e municípios também articulam suas propostas públicas, as quais são base para as propostas de cada escola. Esse alinhamento leva em conta tanto as propostas de ação quanto a gestão da educação.

Cada escola e seu respectivo gestor implementam suas ações em parceria com as secretarias de educação estadual ou municipal, e estas por sua vez, alinhadas às propostas federais planejam as suas propostas públicas. As escolas públicas, atualmente possuem autonomia para planejar suas ações e seu orçamento a partir de um sistema integrado disponibilizado pelo governo federal, levando em conta as suas especificidades, necessidades e PDE nacional. Porém, essas ações só são efetivadas se as Secretarias de Educação aderirem a tais propostas, porque essas ações precisam ser integradas.

Percebe-se aqui a responsabilidade do gestor escolar no seu fazer diário. O foco de todo o trabalho do gestor é o aluno, ou seja, o produto final de todo o planejamento é o resultado apresentado pelos alunos. Para isso o alinhamento das propostas deve estar em consonância com os planos das instâncias superiores e somar esforços para se alcançar os objetivos e metas definidas. Assim, o planejamento da educação escolar, PPP e PDE (atualmente de forma interativa – PDE Interativo) para ser eficaz, deve considerar a implementação de ações práticas.

Segundo Lück, (2009, p. 34):

O tempo e o esforço despendido em planejamento, são válidos caso o plano ou projeto delineado seja implementado, isto é, que as ideias desenvolvidas e as decisões tomadas sejam postos em ação. Um plano ou projeto constitui, portanto, um compromisso de ação, com percepções claras e específicas sobre o que será feito, como, quando, por quem, para quem e com que objetivos.Para tanto, o planejamento envolve a previsão, provisão, organização,ordenação, articulação, sistematização de esforço e de recursos voltados para promovera realização de objetivos.

214

É de fundamental importância que se tenha definido quem será o responsável por cada etapa do desenvolvimento do plano de trabalho na escola, ao mesmo tempo em que as partes se articulam e formam um grupo único, com objetivos comuns.

Para isso é necessário pensar que cada tarefa feita com responsabilidade contribui para o sucesso: o censo escolar que revela quantos são os alunos e onde eles estão; as condições físicas da instituição escolar; o capital humano e sua formação acadêmica; os registros das matrículas e dos resultados em avaliações periódicas; o tombamento do patrimônio escolar e a preocupação com a conservação e manutenção dos mesmos e o registro de documentos de todos os servidores e ocorrências afins. Todos esses dados se constituem indicadores para elaboração de metas a serem alcançadas.

Pensando nesse alinhamento de ações, percebe-se que desde a sala de aula, passando pela gestão escolar e estreitando o relacionamento com as instâncias superiores, o planejamento da educação só se faz concreto se houver integração das equipes.

Sendo assim, o financiamento da educação, para atingir o objetivo principal deve estar alinhado, desde o PDE Nacional até a ponta que é a sala de aula e o trabalho realizado com os alunos. Todo o planejamento da educação só tem razão de ser se se pensar o aluno como resultado final. Fazemos educação para e pelo aluno. Somos agentes transformadores de uma sociedade e os alunos estão desenvolvendo essa capacidade de transformar a comunidade onde vive.

Para melhor compreensão do alinhamento das metas e ações dos planos decenais, comparamos os planos das três esferas governamentais no quadro 1, seguida de análise de cada um deles.

Observa-se que não será feita análise de nenhum PDE escolar. Aqui propomos, além da análise do Plano Nacional e do Plano Estadual de Educação, a análise do Plano Decenal de um município de pequeno porte com aproximadamente dez mil habitantes que tem como principal fonte de recurso o Fundo de Participação dos Municípios – (FPM).

Para efeito de análise, foi estudado o Plano de Educação Nacional de 2001, pois o novo plano (2011 – 2020) ainda não foi aprovado, nem tampouco colocado em ação. Nessas condições não se pode analisar se as metas e ações estão sendo implementadas.

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Quadro 1: Quadro Comparativo - Planos de Educação: Nacional, Estadual e Municipal

PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

Brasil (2001- 2011)

PLANO ESTADUAL DE EDUCAÇÃO

UF – Minas Gerais (2011 – 2020)

PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

Santa Maria de Itabira-MG(2005 – 2015)

I - Introdução, com o his-tórico, os objetivos e as prioridades;

II - Níveis de ensino, que trata da Educação Básica (Educação Infantil, Ensi-no Fundamental e Ensino Médio) e da Educação Su-perior;

III - Modalidades de ensi-no (Educação de Jovens e Adultos, Educação a Distância e Tecnologias Educacionais, Educação Tecnológica e Formação Profissional, Educação Especial e Educação In-dígena);

IV - Magistério da EducaçãoBásica (formação dos professores e valorização do magistério);

V - Financiamento e gestão;

VI - Acompanhamento e avaliação do plano.Subdivisões: diagnósti-cos, diretrizes, objetivos e metas setoriais para cada nível ou etapa e mo-dalidade de educação ou ensino.O plano consta de trezen-tas metas nos diferentes níveis e modalidades.

Anexo I: Níveis de ensino (Educação

Infantil- Ensino Fundamen-tal - Ensino Médio e Supe-rior) Modalidades de Ensino (Educação Especial, Educa-ção Quilombola, do campo e Indígena; Educação de Jovens e Adultos; Educação nos sistemas prisional e so-cioeducativo)

Ações estratégicas seguidas das metas para cada nível e modalidade

Anexo II:1 – Introdução2 – Antecedentes históricos (contexto nacional e estadual)

2.1 – O contexto nacional2.2 – O contexto estadual2.3 – Princípios e diretrizes

2.3.1 – Equidade e justiça social

2.3.2 – Qualidade2.3.3 – Diálogo entre as

redes de ensino e sua interação

2.3.4 – Democratização da gestão e articulação com a

Comunidade. 2.4 – Objetivos gerais:

I- erradicação do analfa-betismo;

II – universalização do atendimento escolar;

III – melhoria da quali-dade do ensino;

IV – formação para o trabalho;

V – promoção humanís-tica, científica e tec-nológica

2.5 – Prioridades

1 – Introdução1.1 Um breve Histórico da

Educação no Município.1.2 Contextos nacional, es-

tadual e municipal1.3 Pressupostos do plano:

político-institucionais, conceituais e metodoló-gicos.

1.4 Caracterização do mu-nicípio.

2 - Desenvolvimento do plano2.1 – Diagnóstico educacio-

nal do município2.2 Objetivos e Metas.

Por nível de Ensino (Médio, Educação infantil, Ensino Fun-damental)Modalidades (Educação Qui-lombola, Educação de Jovens e Adultos, Educação Especial, Educação a Distância)Formação e valorização do Ma-gistérioFinanciamento e Gestão da Educação.

3- Mecanismos de acompanha-mento e Avaliação do Plano

Fonte: Os autores, 2013.

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Análise da Estrutura e Metas dos Planos de EducaçãoPlano Nacional de Educação

De acordo com as instruções do Governo Federal, os Planos devem seguir uma linha para sua estrutura. Assim os Planos Estaduais e Municipais devem ser elaborados em consonância com o Plano Nacional de Educação.

O Plano Nacional de Educação compõe-se por partes iniciando com objetivos gerais e prioridades. Em seguida dispõe os textos por Níveis de Ensino. O Plano aborda a Educação básica, dividido em sessões: Educação Infantil; Ensino Fundamental e o Ensino Médio. Depois trata o Ensino Superior, em seguida destaca as modalidades: Educação de Jovens e Adultos; Educação à Distância, Educação Tecnológica e Formação Profissional, Educação Especial esta última é descrita com metas de atendimento no Ensino Regular e com propostas de adequação dos prédios e formação dos professores para atendimento a essa clientela além da criação e centros de atendimento especializado e finalmente Educação Indígena. Observa-se aqui a falta de uma política específica para a Educação Quilombola.

Em cada Etapa, o Plano prevê numa sequência padronizada: ampliação da oferta, infraestrutura física, formação/ qualificação dos professores, políticas públicas de financiamento de programas em regime de colaboração com os entes federados, propostas de inovação curricular e tempo escolar finalizando com a avaliação de desempenho escolar, exceto para a Educação infantil.

O Plano Nacional de Educação de 2001 foi analisado e avaliado por uma equipe coordenada pelo Dr.Luiz Fernandes Dourado, contando com a participação de pesquisadores de Universidades e Institutos Federais com apoio do MEC e INEP. O objetivo da avaliação conforme o Relatório de Avaliação do Plano Nacional de Educação 2001-2008 “foi identificar os progressos realizados como também os obstáculos e desafios ao cumprimento das metas do PNE, tendo por base as políticas, programas e ações do Ministério da Educação” (DOURADO, 2009).

A equipe avaliadora esclarece que:

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É importante ressaltar que, além dos vetos, o PNE não tem sido levado em conta no processo de elaboração do Plano Plurianual (PPA) e de suas revisões. Considerando que o PPA, juntamente com a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), é instrumento fundamental do orçamento público, não se alcançou, ainda, a organicidade orçamentária exigida para dar concretude às metas do PNE (DOURADO, 2009).

O Plano Decenal de Educação de Minas GeraisO Plano Decenal de Educação do Estado de Minas Gerais

apresenta uma estrutura descrita em dois anexos da LEI 19481 2011 de 12/01/2011. O anexo I descreve os Níveis de Ensino, metas e ações estratégicas. O anexo II trata o contexto educacional mineiro e nacional, os princípios e diretrizes, os objetivos e as propostas de diálogo entre as redes e a democratização da gestão.

No anexo I, esse plano segue uma sequência por níveis de ensino, iniciando pela Educação Infantil, seguida pelo Ensino Fundamental, Ensino Médio, logo após aborda as modalidades: Educação de Jovens e Adultos, Educação Especial, Educação Tecnológica e Formação Profissional; Educação Indígena do Campo e Quilombola; Educação nos Sistemas Prisional e Socioeducativo.

As ações estratégicas que constam no plano mineiro propõem: 1) a definição de padrões básicos de atendimento como quadras, bibliotecas, laboratórios de ciências e informática, infraestrutura para acessibilidade; 2) a criação de centros especializados de atendimento ao aluno com NEE nos municípios sede das SREs; 3) estabelecimento de Matriz de habilidades e competências dos alunos seguida de metas a serem alcançadas; 4) regularização e autorização de estabelecimentos de EI; 5) garantir a elaboração do PPP das escolas de todos os níveis; 6) assegurar a realização dos exames de acuidade visual e auditiva e outras avaliações de saúde; 7) cumprir com as determinações legais a respeito da alimentação escolar; 8) promover programa de formação inicial e continuada aos dirigentes das escolas; 9) aumentar o atendimento de creche;10) universalizar o atendimento quatro e cinco anos; 11) ampliar jornada escolar e 12) inova com a proposta de garantia de Educação física ministrada por professor habilitado no ensino fundamental e Plano de segurança para as escolas públicas. Vinculada à proposta

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do Plano Nacional, propõe projetos de melhoria no ensino público e atendimento as especificidades das escolas indígenas e quilombolas, incluindo a garantir da participação comunitária dando ênfase às lideranças nas comunidades indígenas.

A preocupação com a Educação básica e com a promoção da cidadania está expressa nas estratégias de atendimento no sistema prisional e socioeducativo. Já o plano mineiro não deixa de abordar a avaliação qualitativa e quantitativa e reforça o sistema que vem sendo trabalhado em todas as escolas.

Ao se tratar do financiamento e gestão, o plano propõe a descentralização da autonomia e Gestão democrática nas escolas por meio da participação dos conselhos escolares. O plano estadual é um plano recente, novo, em relação ao plano nacional e municipal aqui analisados, nele já está expressa a preocupação com a oferta do transporte escolar, de forma que são 05 submetas para esse atendimento, destacando-se a proposta de aumentar a frota de veículos.

O Plano mineiro de Educação contém quatro metas para a Educação infantil, dezenove metas para o Ensino Fundamental e vinte e duas metas para o Ensino Médio. Este estudo não aprofunda na análise de outros níveis, pois seu foco é a Educação básica.

A sequência das propostas em cada nível de ensino é a mesma, sendo infraestrutura física, ampliação de atendimento à demanda, formação e qualificação profissional, incentivo a construção do Projeto Político Pedagógico; Plano de segurança nas escolas; ampliação da jornada escolar; proposta de políticas públicas e programas de apoio ao estudante em regime de colaboração com os municípios e união, avaliação de desempenho da escola e dos estudantes, exceto, essa última, para a Educação infantil.

Encontra-se nesse plano uma inovação quanto à integração das instituições ao propor intercâmbio cultural e pedagógico, inclusive competições esportivas

Outra novidade que o plano mineiro traz é a exigência de professor habilitado na área para ministrar as aulas de Educação Física nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Esse Plano apresenta também propostas claras para atendimento à Educação Indígena, do Campo e Quilombola.

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Segundo o plano, a prioridade da Educação em Minas Gerais é “atender às carências e às deficiências que perpassam estruturalmente todo o sistema de ensino e que incidem diretamente sobre problemas que não se resolvem a partir de uma ação ou um programa isolado” (MINAS GERAIS, 2011).

O Plano Decenal Municipal de Educação – Santa Maria de Itabira-MG

A primeira parte do Plano Decenal Municipal de Educação de Santa Maria de Itabira apresenta uma estrutura conforme orientações do Governo Federal. Após a criação da comissão por meio de Decreto Municipal, o plano apresenta o contexto educacional nacional, estadual e municipal, seguido dos pressupostos políticos, conceituais e metodológicos do plano.

Na sequência, apresenta o histórico do município. A segunda parte do plano municipal é composta pelo desenvolvimento do plano, onde é feito o diagnóstico da Educação municipal por meio e estudo e análise dos dados coletados nas escolas e no Censo realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira  (INEP) e dados do Atlas da Educação de Minas Gerais, elaborado pela Fundação João Pinheiro.

Os objetivos, metas e ações compõem a terceira parte do plano que ficou estruturado da seguinte forma: 1) Propostas para o Ensino Médio; 2) Proposta para a Educação quilombola; 3) Proposta para a Educação infantil: 4) Propostas para o Ensino Fundamental Anos Iniciais; 5) Propostas para o Ensino Fundamental Anos Finais; 6) Propostas para a Creche; 7) Propostas para a Educação de Jovens e Adultos e 8) Propostas para a Educação Especial e Ensino Superior.

A Formação e Valorização do Magistério da Educação Básica têm os objetivos e metas à parte, assim como o financiamento da Educação. Essas últimas metas contemplam as políticas públicas a serem implantadas para melhoria da educação básica municipal, tais como estruturas pedagógicas e controle social e gestão escolar. Inclusive ações que devem ser realizadas em regime de cooperação com outras secretarias municipais, com o Estado de Minas Gerais e a União. Destaca-se aqui o apoio à formação do Conselho Municipal de Educação e elaboração do Projeto Político Pedagógico em todas

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as escolas. As metas asseguram a melhoria da infraestrutura física das escolas, apoio às escolas conveniadas e estaduais e apoio à formação docente e valorização profissional.

O plano propõe ainda, o acompanhamento da execução, desenvolvimento das metas e a elaboração de um relatório anual contendo análise das metas alcançadas e dos problemas evidenciados, seguidos de propostas de solução.

Embora a avaliação esteja proposta no plano, o município não possui nenhum relatório realizado pela comissão permanente. A falta desse relatório dificulta a análise de quais metas foram atingidas e quais ainda faltam para serem cumpridas. Foi realizado, então um estudo das metas propostas e quais foram alcançadas nos sete anos de vigência do plano, juntamente com a atual Secretária Municipal de Educação. Os dados coletados são explicados a seguir na tabela1.

Tabela1: Percentual das metas alcançadas e não alcançadas do Plano Municipal de Educação de Santa Maria de Itabira - MG

Etapas / Modalidades de Ensino

Total de Metas propostas

Metas alcançadas

Metas não alcançadas

Educação Infantil 23 12 (52,2%) 11 (47,8%)

Ensino Fundamental Anos Iniciais 29 19(65,5%) 10(34,5%)

Ensino Fundamental Anos finais 14 04(28,5%) 10(71,5%)

Ensino Médio 12 06 (50%) 06 (50%)

EJA 10 02(20%) 08(80%)

Educação Quilombola 13 04(30%) 08(70%)

Educação Especial 12 10(83%) 02(17%)

Formação e valorização do Magistério 05 04(80%) 01(20%)

Financiamento e Gestão da Educação 11 03(27%) 08(73%)

TOTAL 129 65 64

Fonte: Os Autores/ SME, 2013.

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O Plano Municipal de Educação do município de Santa Maria de Itabira apresenta um total de cento e vinte e nove metas sendo que a proporção da soma das metas alcançadas e das metas não alcançadas é quase a mesma. Porém ao analisar isoladamente cada etapa ou modalidade de ensino, essas proporções variam de forma não equilibrada. Em algumas etapas de ensino, houve mais metas atingidas como é o caso da Educação Infantil, Ensino Fundamental Anos Iniciais e Educação Especial enquanto o Ensino Fundamental Anos Finais, Educação Quilombola apresentam maior número de metas não alcançadas. Já o Ensino Médio apresentou uma proporção igual nos dois casos.

O item Formação e Valorização do Magistério atingiu quatro metas das cinco projetadas e o Financiamento e Gestão da Educação não ultrapassou um terço das metas.

Gráfico 1: Metas alcançadas até outubro de 2013

Fonte: Os autores, 2013.

O PME de Santa Maria de Itabira evidencia que as metas não alcançadas são aquelas que não estão em consonância com o Plano Nacional de Educação, e como o financiamento da educação municipal foi baixo, conforme mostra o gráfico, faltaram recursos para implementar tais ações. Como, por exemplo, o Ensino Fundamental Anos Finais que propunha metas de extensão de série (6º ao 9º ano) nas comunidades rurais quando o número de habitantes da zona rural diminuiu consideravelmente. Assim como a implantação desta modalidade de ensino na Escola da comunidade quilombola e Educação de Jovens e Adultos.

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Outro problema evidenciado foi o financiamento da Educação. Neste caso percebe-se a falta de interlocução entre planejamento financeiro e o planejamento setorial, uma vez que o investimento almejado para a Educação não foi executado. Algumas ações observadas foram apenas iniciadas no primeiro ano de vigência do plano e paralisadas em seguida.

Após as análises apresentadas foram feitas algumas entrevistas informais com ex-gestores da Educação no município de Santa Maria de Itabira e gestores atuais para levantamento de opiniões sobre as políticas públicas na educação municipal e as metas do Plano Municipal de Educação.

A descontinuidade das ações tem sua explicação em dois fatores fundamentais: a troca de gestores e a falta de planejamento orçamentário em consonância com o plano, conforme argumento de um dos ex-gestores entrevistados1:

O que causa a descontinuidade dos projetos e propostas da educação é a mudança da gestão municipal e a substituição dos gestores da Secretaria Municipal de Educação somado a falta de planejamento orçamentário tomando como base o Plano de Educação (entrevistado A).

Da mesma forma, outra entrevistada explica que houve ruptura na execução das ações e que há falta de conhecimento de profissionais da área contábil sobre o Plano Municipal de Educação:

As ações devem estar interligadas para haver bons resultados. Os gestores que chegam precisam conhecer o trabalho anterior e dar continuidade. Muitas vezes isso não acontece por falta de conhecimento do profissional da área contábil. Não é raro esse profissional desconhecer o que já está proposto numa lei anterior. É preciso que esses profissionais participem mais da elaboração dos planos municipais (entrevistado B).

A atual Secretária Municipal de Educação, ao analisar o plano, esclarece que:

1 Todas as entrevistas foram realizadas em 2013.

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“uma de minhas primeiras preocupações ao assumir o cargo foi procurar pelo plano e que essa análise ajude a rever as ações já realizadas e as que ainda faltam de forma que possamos implementar e ou modificá-las nos próximos anos e no próximo plano”.

Outros dois gestores do executivo também foram ouvidos. Um deles desconhecia o plano e mostrou interesse em saber o que estava sendo proposto para não deixar de planejar ações voltadas para a execução das metas. Um dos entrevistados afirmou que:

“Eu me lembro de quando os planos foram elaborados, tanto o federal, o municipal e o estadual. Acredito que as metas devem estar em consonância com o plano gestor e vice-versa” (entrevistado C).

A desarticulação revelada pela análise foi explicada como descaso de alguns gestores em conhecer os planos em vigência e desconsiderar o que foi realizado, propondo recomeçar do zero, com novos planos de governo. Atitudes que inviabilizam a continuidade das ações e fragmentam todo o trabalho em busca da melhoria da educação no município.

Considerações finais Partindo da concepção da educação como direito social e do

estudo bibliográfico, entende-se que a elaboração desses planos é resultado da luta pelo direito à educação de qualidade para todos.

A partir das análises dos planos, percebe-se que o planejamento da educação ainda não está articulado na hierarquia das instâncias públicas: Município, Unidade Federativa e União, embora as políticas públicas sejam realizadas por meio de convênios e repasses diretos.

No caso do município de Santa Maria de Itabira, a descontinuidade das políticas públicas e o não cumprimento das metas do Plano de Educação, foi explicado pela mudança de gestão e lideranças no governo e pela falta de consonância do Plano de Educação com o Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA).

224

Na busca por entender as políticas públicas como política de Estado, onde há alinhamento das ações federais, estaduais e municipais, percebe-se que fazer gestão da educação sem planejamento acarreta a descontinuidade dos projetos e ou programas educacionais.

O Plano de Educação de Santa Maria de Itabira apresenta deficiências evidenciadas por um planejamento público fragmentado. Tal análise indica que as ações devem ser (re) planejadas e retomadas no cumprimento das determinações legais.

Observa-se que o Plano de Desenvolvimento da Educação de Santa Maria de Itabira não tem tomado como base o Plano Nacional/ Estadual e Municipal de Educação e teve, portanto, a sua implementação ameaçada pelas restrições orçamentárias, além de não contar com o devido compromisso e empenho dos gestores locais.

Fica evidente nesta análise que as metas para a educação estão em consonância com a Declaração Mundial de Educação para Todos e demais declarações mundiais que têm objetivos de erradicação do analfabetismo e promoção da igualdade social, porém o orçamento público para a educação não garante que as propostas sejam colocadas em prática. Percebe, no entanto, um descompasso entre propostas de trabalho e ação por falta de investimento adequado e em proporção que se garanta uma educação de qualidade.

Referências bibliográficasBRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Documento norteador para elaboração de Plano Municipal de Educação – PME / Elaboração: Clodoaldo José de Almeida Souza. – Brasília: Secretaria de Educação Básica, 2005. 98p._________Presidência da República. Lei Nº 10.172, De 9 de Janeiro de 2001. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Brasília: 2001._________ Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: 2006._________ Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acessado em: 12 de novembro de 2013.CURY, Carlos Roberto Jamil. Conselhos de Educação: Fundamentos e funções. Revista de Política e Administração da Educação, 2006. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/rbpae/article/view/18721> Acessado em: 11 de outubro de 2013.

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DOURADO, Luiz Fernandes. Avaliação do Plano Nacional de Educação 2001-2008. Políticas, Programas e Ações do Governo Federal. Vol 1. Brasília: 2009. Disponível em: < http://fne.mec.gov.br/images/pdf/volume1.pdf > Acessado em 11 de outubro de 2013.DUARTE, Clarice Seixas. A educação como um direito fundamental de natureza social. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial p. 691-713, out. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v28n100/a0428100.pdf> Acessado em 11 de outubro de 2013.LUCK, Heloísa. Dimensões da gestão escolar e suas competências. Editora Positivo, Curitiba: 2009MENEGOLLA, Maximiliano e SANT’ANA Ilza Martins. Porque Planejar? Como Planejar? Currículo e Área-Aula. 15ª Ed. Editora Vozes. Petrópolis: 2007.MINAS GERAIS. Governo de Estado. Lei 19.481 de 12 de janeiro de 2011. Institui o plano Decenal de Educação do Estado. Belo Horizonte: 2011.SANTA MARIA DE ITABIRA. Lei 1.243 de 14 de dezembro de 2005. Aprova o Plano Decenal Municipal de Educação de Santa Maria de Itabira e dá outras providências. SMI: 2005.NOGUEIRA, Viviane Barreto Mota; BARROS, Amanda Souza et al. Proposta de Planejamento Estratégico na Casa Vênus – Campina Grande-PB. 2008. Disponível em: <http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/viewFile/258/225> Acessado em: 12 de outubro de 2013.

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Sobre os autores

Adriana Maria ToniniPossui graduação em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (1992), graduação em Licenciatura Plena pela Fundação de Educação para o trabalho de Minas Gerais (1995), Mestrado em Tecnologia pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (1999) e Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (2007). Atualmente é professora Adjunta da Universidade Federal de Ouro Preto. Coordenadora Geral do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa – PNAIC – na UFOP. Vice-Coordenadora Geral do Programa Escola de Gestores na UFOP. Coordenadora dos Cursos de Especialização em Coordenação Pedagógica e Mídias da Educação na UFOP. Professora do Mestrado em Educação Tecnológica do CEFET-MG. [email protected]

Breynner Ricardo de OliveiraGraduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (1999) e em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro (2007). Doutor em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. É professor adjunto do Centro de Educação Aberta e a Distância da Universidade Federal de Ouro Preto. Coordenador Geral do Programa Escola de Gestores na UFOP. Coordenador do Curso de Especialização em Gestão Escolar. Vice-Coordenador do Núcleo de Avaliação Educacional (NAVE) da UFOP. Tem experiência na área de Administração Pública e Política Educacional, com ênfase em gestão, avaliação e monitoramento de políticas sociais e educacionais.

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Aparecida Dias de Oliveira Torres Gaduada em Normal Superior pela UNIMONTES. Especialista em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto. Professora da Rede Municipal de Ensino de Santa Maria de Itabira/[email protected]

Arlana Campos Faria MartinsMestre em Educação pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, professora de turma do Curso de Especialização em Gestão Escolar, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica/UFOP.

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Carmen Dias da CunhaMestre em Administração pelas Faculdades Integradas de Pedro Leopoldo Área de Concentração: Gestão da Inovação e Competitividade

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Daniel Abud Seabra MatosGraduado em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Educação pela UFMG. Doutor em Educação pela UFMG, com período Sanduíche na University of Florida. Professor Adjunto II do Departamento de Educação da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). Orientador no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFOP. Coordenador de área de gestão de processos educacionais do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) da UFOP. Coordenador do Núcleo de Avaliação Educacional (NAVE) da UFOP.

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Débora do Prado Lisboa Batista Mestre em Educação pelo Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, professora de turma no Curso de Especialização em Gestão Escolar, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica/UFOP. [email protected]

Diana de Cássia Silva Possui mestrado em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais e graduação em História pela Universidade Federal de Ouro Preto.Professora Orientadora de TCC no Curso de Especialização em Gestão Escolar do Programa Nacional Escola de Gestores, na Universidade Federal de Ouro Preto. Atua como professora da União Nacional das Instituições de Ensino Superior Privadas, na unidade da cidade de Santa Luzia (FACSAL) e é professora de História da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Tem experiência na área do Ensino de História, Projeto de Pesquisa e Metodologia Científica. Os temas de estudo e orientação são: gestão democrática, gestão educacional, mídias na educação e prática docente.

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Edilene ErasPossui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal de Minas Gerais (1987); Pós-Graduação Latu Sensu; - Especialização em Língua Portuguesa, pela UNI-BH (1996), e Mestrado em Educação e Linguagem pela Universidade Federal de Minas Gerais (2000). Designada da FAE/UEMG/CBH, Universidade Estadual de Minas Gerais, na Faculdade De Educação, campus de Belo Horizonte. Professora a distância pela UFOP. Foi contratada pela FaE/UAB/UFMG, Universidade Federal de Minas Gerais, na função de professora tutora a distância no Curso de Pedagogia, pela Universidade Aberta do Brasil, no

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pólo de Governador Valadares e como professora coordenadora no pólo de Teófilo Otoni. Até 2/2012 foi professora adjunta designada da FHA/ISEAT (Fundação Helena Antipoff / Instituto Superior de Educação Anísio Teixeira), em Ibirité, onde atuou por sete anos consecutivos.

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Érica Castilho RodriguesGraduou-se como Bacharel em Estatística pela Universidade Federal de Minas Gerais em 2009. Iniciou no programa de Mestrado em Estatística da Universidade Federal de Minas Gerais em 2010 concluindo-o em 2011. Em 2012, concluiu o Doutorado em Estatística pela mesma Universidade. Atualmente é Professora Adjunta na Universidade Federal de Ouro Preto.

[email protected]

Kele FrossardGraduou-se em História pela  UFMG em 2003. Conclui a pós-graduação latu senso em 2014, em Gestão Escolar pela UFOP. Atuou professora no Ensino Fundamental na rede pública e atualmente ocupa o cargo de gestora escolar. [email protected]

Lídia Gonçalves MartinsGraduada e mestre em História pela Universidade Federal de Ouro Preto. Membro do grupo de pesquisa “Justiça, Administração e Luta Social” - CNPq. Tem experiência na área de História, com ênfase em História do Brasil Império, atuando principalmente nos seguintes temas: História de Minas Gerais, escravidão, crime, Justiça. Na Educação a Distância, tem experiência na área de tutoria e supervisão de cursos de graduação e especialização. Atualmente atua como supervisora do Programa Nacional Escola de Gestores/UFOP. [email protected]

Magna CamposGraduada em Letras pela Universidade Federal de Ouro Preto – Instituto de Ciências Humanas e Sociais (2003), Especialista em Língua Portuguesa – PUC-MINAS (2005) e Mestre em Letras: Discurso e Representação, pela Universidade Federal de São João Del-Rei (2009). Especialização em Gestão Pública, Especialização em Letramento e Alfabetização, Especialização em Supervisão Escolar. Foi professora da Rede pública e particular, na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Foi tutora a distância no curso de Administração Pública do CEAD/UFOP. É supervisora pedagógica do Curso de Especialização em Gestão Escolar, pela Universidade Federal de Ouro Preto. É membro efetivo da ALACIB e do conselho cultural dessa instituição, na qual ocupa a cadeira de nº 18 cuja patrona é Cora Coralina.

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Márcia de Freitas Vieira BorgesDoutoranda em Educação pela Universidade Aberta de Portugal, Mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET/MG, professora assistente na Faculdade Pitágoras e professora de turma no Curso de Especialização em Gestão Escolar, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica da UFOP. [email protected]

Maria Aparecida da SilvaDoutorado em Educação pela UNICAMP. Professora do Ensino Superior do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, professora aposentada da Universidade Federal de Minas Gerais.

[email protected]

Marisa Bueno de FreitasPedagoga e Especialista em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Administração Educacional.

[email protected]

Shirley Cristine Ricoy Soares Mestre em Educação Tecnológica do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, professora na rede municipal de ensino de Belo Horizonte, na educação profissional de nível técnico e professora de turma no Curso de Especialização em Gestão Escolar, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica da UFOP.

[email protected]

Valéria Duarte MaltaGraduada em Letras pela Fundação Comunitária de Ensino Superior de Itabira. Especialista em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto. Mestre em Administração pela Universidade FUMEC. Professora da Secretaria de Educação de Minas [email protected]

Wagner Diniz MoraisPossui graduação em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (2007). Especialização em Gestão Escolar pela Universidade Federal de Ouro Preto (2014). Professor de Anos Finais do Ensino Fundamental / Ensino Religioso – Secretaria Municipal de Educação de Itabira/MG (2007-2011). Atualmente, ocupa o cargo de vice-diretor em escola pública de Ensino Fundamental, no município de Itabira/MG.

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Informações GráficasFormato: 15,5 x 22,5 cmMancha: 11 x 20,5 cmTipologia: Linux Libertine e WingdingsPapel: Pólen 80 g/m² (miolo) - Supremo 250 g/m² (capa)Tiragem: 500 exemplaresImpressão e acabamento: Editar Editora Associada - Juiz de Fora/MG Tel.: (32) 3213-2529 em novembro de 2014.