Gazeta Russa #8

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O adeus do Último Imperador Vaidade é lucro certo na capital Emeliánenko fala sobre sua vida depois das lutas Gasto em salão de beleza chega a R$ 800 por mês Página 05 Página 08 Bolsas RTS e MICEX se fundem RTS resistiu a ofertas internacionais Página 04 SEGUNDA-FEIRA, 29 DE AGOSTO DE 2011 NOTAS A Russian Helicopters e o grupo brasi- leiro de investimentos Qualy Grupo Bra- sil assinaram um acordo de cooperação para promover o helicóptero Mi-34S1 no Brasil com base em contratos de conces- são. O documento prevê também a pos- sibilidade de fornecimento e comerciali- zação de aeronaves. As companhias planejam criar um cen- tro de serviço técnico, logístico e de es- tudos para a manutenção da frota brasi- leira do Mi-34S1. Segundo comunicado da Russian Helicopters, o Mi-34S1 pode- ria ser adquirido por empreiteiras e em- presas públicas na preparação e realiza- ção da Copa do Mundo 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016 no Brasil. Por enquan- to, o fornecimento de 150 helicópteros ainda está sendo negociado. A apresentação do novo modelo de heli- cóptero foi realizada no dia 5 de agosto no Salão Aeroespacial Internacional MAKS-2011, na cidade de Tomílino, nos arredores de Moscou. Orújie Rossii Qualy Grupo negocia 150 aeronaves com Russian Helicopters EXCLUSIVO SERGUÊI LAVROV Em artigo exclusivo, ministro escreve para a Gazeta Russa sobre as relações do país com a América Latina e o Caribe. Apesar das diferenças cultu- rais e históricas, Brasil e Rús- sia têm muita coisa em comum, especialmente em relação ao desempenho econômico das últimas duas décadas. Essa é a avaliação de um grupo de pesquisadores e de técnicos do Instituto de Pes- quisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão ligado ao gover- no federal que voltou os olhos para o país do leste europeu há dois anos. O interesse cresceu na medi- De olho na Rússia Instituto ligado ao governo brasileiro mostra interesse por país do leste europeu Braço de pesquisa e análise brasileiro, instituto lançou três publicações sobre a Rússia nos últimos dois anos. O motivo do interesse: os paralelos identificados entre os dois países. da em que foram sendo iden- tificadas semelhanças na eco- nomia das duas nações, nos últimos 20 anos. O resultado foi o lançamento de três pu- blicações sobre o país nos úl- timos três meses. A Rússia começou a ser estu- dada pelos técnicos do insti- tuto por fazer parte, junto com Brasil, Índia, China e África do Sul, dos Brics - bloco de que se destaca pelo forte cres- cimento econômico. “Começamos com dois estu- dos de aspectos que poderiam ajudar o Brasil no futuro: gestão do petróleo, uma vez que o país é um grande pro- dutor, e políticas de apoio à internacionalização de empre- sas”, diz André Pineli Alves, pesquisador que estuda a Rús- sia dentro do Ipea. Com o avanço dos estudos, os Ipea identifica semelhanças com Brasil Nova fase para velhas relações Publicações oficiais abordam liberalização comercial e privatização JOÃO PEDRO NETTO ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA pesquisadores observaram uma série de semelhanças. “Vários problemas e experi- ências que a Rússia enfrentou também ocorreram no Bra- sil”, assinala Pineli Alves. aumento da participação do Estado na economia ao longo dos últimos 20 anos. Esses são alguns dos aspec- tos abordados no livro “Uma Longa Transição: Vinte Anos de Transformações na Rús- sia”, no comunicado “Ameaça ou oportunidade? Desdobra- mentos da crise financeira glo- bal para as empresas trans- nacionais russas”, e no boletim “Os condicionantes políticos de uma nova estratégia de de- senvolvimento da Rússia”. As publicações abordam ainda a transição política na Rús- sia, estratégias de desenvol- vimento no período pós-crise, a internacionalização de em- presas russas, o sistema ban- cário e a conjuntura político- econômica do país. “Distância geográfica não é obstáculo nas re- lações com a Rússia”, diz ministro CONTINUA NA PÁGINA 5 As relações da Rússia com a América Latina e o Caribe (ALC) têm raízes profundas e que existem há séculos. Ao longo de sua extensa trajetó- ria, esse intercâmbio passou por altos e baixos – incluin- do, algumas vezes, um duro confronto ideológico. Apesar URBANISMO ENTREVISTA Moscou quer sua Brasília Káshin sem medo Capital prevê satélite como sede administrativa.. Epancado há um ano, jorna- lista fala sobre superação e coragem à Gazeta Russa. OPINIÃO Olhares sobre o Oriente Ian Pryde e Delther Wermuth analisam os modelos econômicos russo e o chinês. PÁGINA 7 PÁGINA 2 PÁGINA 3 CONTINUA NA PÁGINA 2 NESTA EDIÇÃO Os dois países, acrescenta, passaram por processos de li- beralização comercial, priva- tização de empresas e servi- ços, políticas de combate à inflação, crises financeiras e de todas as vicissitudes his- tóricas, estes povos nunca dei- xaram de ter interesse um pelo outro. A distância geográfica não se tornou um obstáculo ao res- peito mútuo, à amizade e à co- operação em vários setores. Esses países são civilizações únicas, com rico patrimônio histórico e cultural, além de um potencial econômico sig- nificativo. De acordo com o conceito de política externa da Federação Russa aprovado Objetivos comuns Russos e latinos estão unidos pela proximidade de pontos de vista sobre questões-cha- ve da política e da economia mundial. Isto é importante, já que a ALC tem conquis- tado cada vez mais peso nos assuntos internacionais, tor- nando-se um dos centros emergentes da ordem mundial. Publicado e distribuído com The New York Times (EUA), The Washington Post (EUA), The Daily Telegraph (Reino Unido), Le Figaro (França), La Repubblica (Itália), El País (Espanha), Folha de S.Paulo (Brasil), The Economic Times (Índia), Clarín (Argentina), Süddeutsche Zeitung (Alemanha), The Yomiuri Shimbun (Japão) e outros grandes diários internacionais MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA RÚSSIA pelo presidente Dmítri Med- vedev, desenvolver uma polí- tica de cooperação com os go- vernos desses países é uma das prioridades das atividades in- ternacionais da Rússia. A estratégia da Rússia para reforçar a multifacetada par- ceria tem objetivos de longo prazo e é baseada no pragma- tismo e no desejo de se materializar em negócios concretos a atração mútua e a simpatia existente entre nossos povos. 20 anos de golpe frustrado Também conhecida como Putsch de Moscou ou Golpe de Agosto, a tentativa fracassada de toma- da do poder por um grupo linha dura do Partido Comunista da União Soviética, 20 anos atrás, foi fundamental para o fim do regime soviético. Durante os três dias em que du- rou o golpe, entre 19 e 21 de agosto de 1991, o então presi- dente Mikhail Gorbatchov foi deposto por conservadores que rejeitavam a glasnost e a peres- troika do líder reformista e acre- ditavam que o novo Tratado da União delegava poderes dema- siados às repúblicas da URSS. Gorbatchov retomou o poder, com apoio do então presidente da República Russa, Boris Iélt- sin, que enfrentou os comunis- tas proferindo discursos sobre um tanque em frente ao Parla- mento do país. Iéltsin tornou-se extremamente popular com o feito e os acontecimentos, que prejudicaram a legitimidade do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) – e contribuí- ram também para o colapso fi- nal da URSS, em dezembro daquele ano. PÁGINA 6 PHOTOXPRESS GETTY IMAGES/FOTOBANK(2) FOTOSOYUZ AP AFP/EAST NEWS KOMMERSANT LEGION MEDIA

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O adeus do Último Imperador

Vaidade é lucro certo na capital

Emeliánenko fala sobre sua vida depois das lutas

Gasto em salão de beleza chega a R$ 800 por mêsPágina 05 Página 08

Bolsas RTS e MICEX se fundem RTS resistiu a ofertas internacionaisPágina 04

SEGUNDA-FEIRA, 29 DE AGOSTO DE 2011

NOTAS

A Russian Helicopters e o grupo brasi-leiro de investimentos Qualy Grupo Bra-sil assinaram um acordo de cooperação para promover o helicóptero Mi-34S1 no Brasil com base em contratos de conces-são. O documento prevê também a pos-sibilidade de fornecimento e comerciali-zação de aeronaves. As companhias planejam criar um cen-tro de serviço técnico, logístico e de es-tudos para a manutenção da frota brasi-leira do Mi-34S1. Segundo comunicado da Russian Helicopters, o Mi-34S1 pode-ria ser adquirido por empreiteiras e em-presas públicas na preparação e realiza-ção da Copa do Mundo 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016 no Brasil. Por enquan-to, o fornecimento de 150 helicópteros ainda está sendo negociado.A apresentação do novo modelo de heli-cóptero foi realizada no dia 5 de agosto no Salão Aeroespacial Internacional MAKS-2011, na cidade de Tomílino, nos arredores de Moscou.

Orújie Rossii

Qualy Grupo negocia 150 aeronaves com Russian Helicopters

EXCLUSIVO SERGUÊI LAVROV

Em artigo exclusivo, ministro escreve para a Gazeta Russa sobre as relações do país com a América Latina e o Caribe.

Apesar das diferenças cultu-rais e históricas, Brasil e Rús-sia têm muita coisa em comum, especialmente em relação ao desempenho econômico das últimas duas décadas. Essa é a avaliação de um grupo de pesquisadores e de técnicos do Instituto de Pes-quisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão ligado ao gover-no federal que voltou os olhos para o país do leste europeu há dois anos. O interesse cresceu na medi-

De olho na Rússia Instituto ligado ao governo brasileiro mostra interesse por país do leste europeu

Braço de pesquisa e análise brasileiro, instituto lançou três publicações sobre a Rússia nos últimos dois anos. O motivo do interesse: os paralelos identificados entre os dois países.

da em que foram sendo iden-ti� cadas semelhanças na eco-nomia das duas nações, nos últimos 20 anos. O resultado foi o lançamento de três pu-blicações sobre o país nos úl-timos três meses. A Rússia começou a ser estu-dada pelos técnicos do insti-tuto por fazer parte, junto com Brasil, Índia, China e África do Sul, dos Brics - bloco de que se destaca pelo forte cres-cimento econômico. “Começamos com dois estu-dos de aspectos que poderiam ajudar o Brasil no futuro: gestão do petróleo, uma vez que o país é um grande pro-dutor, e políticas de apoio à internacionalização de empre-sas”, diz André Pineli Alves, pesquisador que estuda a Rús-sia dentro do Ipea.Com o avanço dos estudos, os

Ipea identifica semelhanças com Brasil

Nova fase para velhas relações

Publicações oficiais abordam liberalização comercial e privatização

JOÃO PEDRO NETTOESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

pesquisadores observaram uma série de semelhanças. “Vários problemas e experi-ências que a Rússia enfrentou também ocorreram no Bra-sil”, assinala Pineli Alves.

aumento da participação do Estado na economia ao longo dos últimos 20 anos. Esses são alguns dos aspec-tos abordados no livro “Uma Longa Transição: Vinte Anos de Transformações na Rús-sia”, no comunicado “Ameaça ou oportunidade? Desdobra-mentos da crise � nanceira glo-bal para as empresas trans-nacionais russas”, e no boletim “Os condicionantes políticos de uma nova estratégia de de-senvolvimento da Rússia”. As publicações abordam ainda a transição política na Rús-sia, estratégias de desenvol-vimento no período pós-crise, a internacionalização de em-presas russas, o sistema ban-cário e a conjuntura político-econômica do país.

“Distância geográfica não é obstáculo nas re-lações com a Rússia”, diz ministro

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As relações da Rússia com a América Latina e o Caribe (ALC) têm raízes profundas e que existem há séculos. Ao longo de sua extensa trajetó-ria, esse intercâmbio passou por altos e baixos – incluin-do, algumas vezes, um duro confronto ideológico. Apesar

URBANISMO

ENTREVISTA

Moscou quer sua Brasília

Káshin sem medo

Capital prevê satélite como sede administrativa..

Epancado há um ano, jorna-lista fala sobre superação e coragem à Gazeta Russa.

OPINIÃO

Olhares sobre o OrienteIan Pryde e Delther Wermuth analisam os modelos econômicos russo e o chinês.

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NESTA EDIÇÃO

Os dois países, acrescenta, passaram por processos de li-beralização comercial, priva-tização de empresas e servi-ços, políticas de combate à in� ação, crises � nanceiras e

de todas as vicissitudes his-tóricas, estes povos nunca dei-xaram de ter interesse um pelo outro. A distância geográ� ca não se tornou um obstáculo ao res-peito mútuo, à amizade e à co-operação em vários setores. Esses países são civilizações únicas, com rico patrimônio histórico e cultural, além de um potencial econômico sig-nificativo. De acordo com o conceito de política externa da Federação Russa aprovado

Objetivos comunsRussos e latinos estão unidos pela proximidade de pontos de vista sobre questões-cha-ve da política e da economia mundial. Isto é importante, já que a ALC tem conquis-tado cada vez mais peso nos assuntos internacionais, tor-nando-se um dos centros emergentes da ordem mundial.

Publicado e distribuído com The New York Times (EUA), The Washington Post (EUA), The Daily Telegraph (Reino Unido), Le Figaro (França), La Repubblica (Itália), El País (Espanha), Folha de S.Paulo (Brasil), The Economic Times (Índia), Clarín (Argentina), Süddeutsche Zeitung (Alemanha), The Yomiuri Shimbun (Japão) e outros grandes diários internacionais

MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA RÚSSIA

pelo presidente Dmítri Med-vedev, desenvolver uma polí-tica de cooperação com os go-vernos desses países é uma das prioridades das atividades in-ternacionais da Rússia.A estratégia da Rússia para reforçar a multifacetada par-ceria tem objetivos de longo prazo e é baseada no pragma-tismo e no desejo de se materializar em negócios concretos a atração mútua e a simpatia existente entre nossos povos.

20 anos de golpe frustradoTambém conhecida como Putsch de Moscou ou Golpe de Agosto, a tentativa fracassada de toma-da do poder por um grupo linha dura do Partido Comunista da União Soviética, 20 anos atrás, foi fundamental para o fim do regime soviético. Durante os três dias em que du-rou o golpe, entre 19 e 21 de agosto de 1991, o então presi-dente Mikhail Gorbatchov foi deposto por conservadores que rejeitavam a glasnost e a peres-troika do líder reformista e acre-ditavam que o novo Tratado da União delegava poderes dema-siados às repúblicas da URSS.Gorbatchov retomou o poder, com apoio do então presidente da República Russa, Boris Iélt-sin, que enfrentou os comunis-tas proferindo discursos sobre um tanque em frente ao Parla-mento do país. Iéltsin tornou-se extremamente popular com o feito e os acontecimentos, que prejudicaram a legitimidade do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) – e contribuí-ram também para o colapso fi-nal da URSS, em dezembro daquele ano.

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Gazeta Russawww.gazetarussa.com.brPolítica e sociedade

Há cinco anos, Evguênia Tchi-rikova, moradora da cidade de Khímki, nos arredores de Moscou, não possuía uma le-gião de fãs - exceto os amigos e a própria família. Era uma típica mulher russa de 30 e poucos anos, focada nos filhos e na carreira, e desinteressa-da por política. “Eu não ima-ginava que fosse possível mudar algo, então a política me parecia um esforço sem sentido”, diz.Tchirikova, 34, tem uma voz suave. Vestindo jeans e cami-seta, poderia facilmente se passar por estudante. A prin-cípio, não parece ser o alvo da atenção de diversos partidos e movimentos da oposição, au-tora de críticas ferrenhas ao primeiro-ministro Vladímir Pútin e ao partido governista Rússia Unida. Sua transmutação de mãe tra-balhadora a uma das mais co-

renovação Iniciativas individuais contra os desmandos de autoridades formam lideranças fora dos grupos políticos tradicionais

nhecidas ativistas do país aconteceu quando o governo da cidade de Moscou decidiu derrubar parte da floresta local para construir uma ro-dovia ligando a capital a São Petersburgo.

Tchirikova reuniu os mora-dores da região e se engajou na luta pela alteração da rota da estrada. Os burocratas não reagiram bem a essa iniciati-va, e muitos moradores pare-ciam desconfiar da validade de seus esforços. Na Rússia, um projeto inter-nacional envolvendo milhões de dólares nunca teve seu

prosseguimento impedido por causa de uma floresta. “O governo de Khímki não entendia o que nós queríamos. Eles nos disseram que se que-ríamos viver no meio do mato, que então nos mudássemos para a Sibéria”, conta.

“medo é derrota”Com a movimentação que gerou, Evguênia Tchirikova descobriu uma nova identida-de para si mesma – e para mi-lhões como ela. “Eu era muito ingênua no começo, achava que a rota dessa estrada não passava de um ledo engano, e que vivíamos em um Esta-do no qual se respeitavam as leis”, diz Tchirikova. Durante os conflitos gerados no local, dez ativistas foram mutilados por criminosos não identificados. Tchirikova tam-bém recebeu ameaças anôni-mas, mas se recusou a desistir. “Todas as vezes que algum de nós era espancado, dizia para mim mesma: ‘Na próxima vez, largo tudo.’ Mas não se pode passar a vida inteira fugindo. Se existe medo, a batalha já está perdida”, afirma.

O conflito em torno da flores-ta de Khímki terminou com a decisão de estreitar a rodo-via de 600 para 100 metros de largura, e proibir construções comerciais em ambos os lados da estrada.

envolver-se para quê?Um dos que duvidaram da vi-tória de Tchirikova foi o ad-vogado Aleksêi Naválni, ati-vista e blogueiro famoso por

sem pretensões políticas, evguênia tchirikova (centro) tornou-se ativista para proteger a floresta onde seu avô lutou durante a segunda guerra

Focados em questões práticas, figuras como evguênia tchirikova e aleksêi Naválni podem se consolidar como vozes dissidentes.

VLaDÍmIr ruVINsKIgazeta russa

“Os burocratas me transformaram em líder da oposição. tornei-me cidadã muito tarde, aos 30”

temendo trocar slogans por ações concretas, opositores tradicionais perdem popularidade

aleksêiNaválni

evguêniatchirikova

Casado e pai de duas crianças, Aleksêi Naválni formou-se em Direito em 2003 na Universi-dade Russa da Amizade dos Povos, em Moscou. Tornou-se conhecido pela luta contra a corrupção. Depois de comprar pequenas ações de estatais e não receber informações finan-ceira solicitadas, como é direi-to dos acionistas, denunciou arbitrariedades em seu blog.

Casada e mãe de duas me-ninas, Evguênia Tchirikova formou-se em Engenharia e Economia pelo Instituto de Aviação de Moscou. No fim dos anos 1990, mudou-se para Khímki para criar as filhas mais perto da natureza. Administra, com o marido, du-as pequenas empresas no mer-cado de equipamentos eletro-magnéticos.

raIo-x

Maioria defende minorias

A maioria dos russos (55%) acredita que defender minorias políticas, étnicas, religiosas e sexuais é uma prioridade. Uma pesquisa do site Gayrussia.eu, entretanto, revela que 66% dos russos não acreditam na apli-cação de padrões ocidentais em sua própria sociedade, e que boa parte dos contrários às manifestações homossexu-ais são a favor de que se res-peite a vontade das maiorias.

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Formação: advogado

IDaDe: 34cIDaDe NataL: MoscouFormação: engenheIra e econoMIsta

Nova oposição russa nasce da floresta

sua luta contra a corrupção em empresas estatais. Há muitos anos, ele foi mem-bro do partido liberal Iábloko e trabalhou em um comitê de proteção aos moscovitas. “Algumas pessoas chegaram a mim se queixando da cons-trução da rodovia em Khímki. Naquele momento, respondi que não fazia sentido se en-volver nessa questão. Ainda que se organizasse, o grupo sofreria retaliações”, conta Naváli.Entre os que o procuraram, estava Tchirikova. “Agora vejo o quão errado eu estava”, afir-ma o advogado. Atualmente, Naválni apoia ativamente o movimento de Khímki e está ajudando os membros do grupo a entender os fatores por trás da construção da ro-dovia. De acordo com sua alia-da Elena Panfilova, diretora da filial russa do grupo Trans-parência Internacional, “a corrupção é um grande com-ponente” da obra.Assim como Tchirikova, Na-válni se tornou popular gra-ças a suas ações - e não a meras palavras - em defesa dos direitos dos acionistas mi-noritários nas grandes esta-tais russas. “Eles representam um novo tipo de oposição na Rússia, comprometida com a resolu-ção de problemas reais”, acre-dita Nikolai Petrov, acadêmi-co do Centro Carnegie de Moscou. “Enquanto Evguênia emergiu de uma posição civil, ao contestar uma iniciativa isolada, Aleksêi tinha o obje-tivo de participar da ativida-de política desde o início”, afir-ma Petrov. Tchirikova não tinha intenção de entrar na política, mas foi empurrada pelas “autoridades locais”, ex-plica Múkhin, acrescentando que tanto Naválni quanto Tchirikova “têm a imagem de líderes populares correspon-dente ao desespero social”.

Foi a soma que Naválni arreca-dou por meio de seu blog para apoiar a batalha travada contra a corrupção em estatais.

us$250 milNúmeros

Algumas pessoas pensaram que aquela jovem mãe esta-va louca; outras, que ela tinha aspirações políticas e buscava uma forma de se tornar conhecida. Teve ainda quem afirmasse haver interesses comerciais envol-vidos. “Foram os burocra-tas que me transformaram em líder da oposição”, acre-dita Tchirikova. “Tornei-me cidadã muito tarde, aos 30 anos.” Nas constantes conversas com as autoridades, diziam-lhe que a estrada era um projeto fe-deral e que, por isso, não es-tava sujeito a alterações. Mas isso não contribuiu em nada para que a confiança de Ev-guênia nos poderes constitu-ídos aumentasse. “A multidão de pessoas que apoiam Tchirikova mostra que a sociedade russa tem muitos problemas específicos para re-solver”, afirma o diretor do Centro de Informações Polí-ticas, Aleksêi Múkhin. “É por isso que os movimentos de oposição tradicionais, com re-ceio de trocar seus slogans por ações concretas, têm perdido popularidade”, completa.

Os países da região partici-pam cada vez mais ativamen-te na formação da agenda glo-bal. Brasil, México e Argentina entraram no seleto grupo das vinte maiores economias do mundo. Com o Brasil, a Rús-sia também está trabalhando em cooperação, junto com China, Índia e África do Sul, no formato dos Brics. Os latino-americanos são nos-sos aliados naturais em ques-tões como a necessidade de apoio às regras do direito in-ternacional, o fortalecimento de mecanismos multilaterais para a resolução de proble-mas internacionais, o papel central da ONU e a busca de respostas coletivas aos desa-fios contemporâneos e aos pro-blemas ambientais globais. Na prática, nossos pontos de vista coincidem em vários outros pontos: na reforma da arqui-tetura financeira global, nas regras do comércio interna-cional e na importância do respeito à diversidade cultural. Nossos países têm demonstra-do foco no alinhamento de co-operação intensiva com base na igualdade e nos benefícios mútuos relativos a uma ampla gama de questões. Nos últimos três anos, foram

realizadas 22 cúpulas e mais de 60 reuniões de alto nível, além de terem sido assinados mais de 70 documentos bila-terais – quase a metade dos 150 assinados dos anos 1990 para cá. Os encontros se tor-naram regulares no que diz respeito a estruturas gover-namentais, diálogos interpar-lamentares e consultas entre os ministérios das relações ex-teriores. Minha visita recente a El Salvador, Peru e Vene-zuela deve dar um novo im-pulso no fortalecimento da nossa cooperação.

aproximação comercialHoje, nossa tarefa fundamen-tal é reforçar o diálogo polí-tico desenvolvido pelo siste-ma de relações comerciais e econômicas. É preciso dizer que o ritmo de desenvolvimen-to econômico da região é bas-tante elevado. O volume de ne-gócios, que diminuiu no período da crise em quase um terço, chegando a US$ 12,4 bi-lhões no ano passado, atingiu US$ 7,4 bilhões nos cinco pri-meiros meses deste ano, dando a impressão de que o futuro será mais favorável. É urgente não apenas elevar o volume de comércio, mas também expandir suas mati-zes, em primeiro lugar, intro-

duzindo produtos de alta tec-nologia. É bem sabido que muitos países latino-america-nos estão desenvolvendo alta tecnologia, incluindo a nucle-ar. Esforços conjuntos estão sendo promovidos em vários projetos promissores na área aeroespacial. O interesse dos

círculos de negócios russos na região é cada vez maior. Gran-des empresas locais, como a Lukoil, a Gazprom, a UES RAO e a Russal, estão traba-lhando no México, na Vene-zuela, na Bolívia, na Colôm-bia, nas Guianas, em Cuba. Além disso, negociações para aprofundar a cooperação com a Argentina, o Brasil, o Peru e o Chile estão em curso e es-tratégias para conectar pe-quenas e médias empresas estão sendo estudadas.

Valores a maisA criação de ramificações das relações interbancárias é um fator de aprofundamento da cooperação mútua entre a Rús-sia e os países da ALC. Já está em funcionamento o banco russo-venezuelano e foram as-sinados acordos de coopera-ção com o russo Vnesheconom-bank e com a Corporação Andina de Fomento e com a Associação Latino-America-na de Instituições Financei-ras de Desenvolvimento. A possibilidade de a Rússia ade-rir ao Banco Interamericano de Desenvolvimento também está sendo considerada. Nos países da região, temos cerca de 300 mil compatrio-tas, que atuam como peça fun-damental para o lançamento de ações conjuntas humani-tárias. Também são desenvol-vidos trabalhos em educação, com a criação da Confedera-ção Latino-Americana de Graduados em Russo. A entrada de latinos sem visto na Rússia cresce gradualmen-te, o que contribui para a ex-pansão das relações de negó-cios e do contato entre os povos. Há tratados de livre circulação com a Argentina, o Brasil, a Venezuela, a Co-lômbia, Cuba, a Nicarágua, o Peru e o Chile. Um acordo se-melhante foi assinado com o Equador e outros estão em

Relações russo-latino americanascoNtINuação Da PágINa 1

Um ambicioso projeto quer transformar uma grande área periférica de Moscou numa es-pécie de Brasília russa, para onde ministérios e prédios do governo seriam deslocados. O título provisório do projeto é “Moscou-2”. O local favorito para a cons-trução é um terreno de 144 mil hectares entre as rodovias Varschavskoie e Kievskoie, a sudoeste da capital. Novos imóveis ainda poderiam ser construídos em uma área de mais de 100 milhões de me-tros quadrados, que abrigaria 2 milhões de pessoas. Mas ainda não se especificou se a área será um município, um distrito ou parte de Moscou.“Construir a cidade-satélite será uma injeção de ânimo para o desenvolvimento dos distritos vizinhos da região de Moscou”, diz Vladímir Avdê-iev, sócio da empresa de imó-veis comerciais S.A. Ricci. “Ainda que a atividade em-presarial fique concentrada no centro administrativo, os mo-radores vão gastar seu tempo de lazer nos municípios vizi-

urbanismo Nova sede administrativa

nhos, onde haverá casas e con-domínios para os funcioná-rios”, completa.Moscou-2 também contará com lojas e restaurantes luxu-osos, além de uma vida notur-na bastante agitada. A difi-c u ld ade de combi n a r escritórios administrativos e centros empresariais com o desenvolvimento residencial e infraestrutura social vai exi-gir muito planejamento. “O projeto deve ser implemen-tado em um período que vai de 25 a 50 anos; caso contrá-rio, a nova cidade vai crescer descontroladamente”, diz o ar-quiteto e diretor do instituto de design Mosproekt-2, Pável Andrêiev.Alguns arquitetos sugerem a construção de Moscou-2 de forma simétrica. Astana, a nova e exuberante capital do Cazaquistão, foi construída assim: vias partindo de um centro que se ramificam e cul-minam em áreas administra-tivas e residenciais. Na atual região de Moscou, o objetivo principal é criar redes de transporte a fim de evitar que a nova área se torne um pro-blema para as já sobrecarre-gadas vias locais. Com a realização do projeto, os preços dos imóveis na nova área devem aumentar em 20% a 30%, já que muitos preferem viver perto do trabalho.

Moscou também quer sua BrasíliaDiante dos constantes engarrafamentos e dos altos preços imobiliários, governo propõe ampliar os limites atuais da capital.

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documentos bilaterais foram assinados entre a Rússia e pa-íses da América Latina e do Caribe nos últimos três anos.

de dólares foi o volume de crescimento do comércio no ano passado.

russos moram nos países da América Latina e do Caribe.

70

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300 mil

Números

Mais em:www.gazetarussa.com.br

fase de desenvolvimento com a Guatemala, o Panamá e o Uruguai. Como resultado, aumentamos a cooperação com todas as or-ganizações políticas regionais, incluindo a OMC (Organiza-ção Mundial de Comércio). Conduzimos um diálogo po-lítico com o Grupo do Rio e promovemos contatos com o Mercosul, a Aliança Boliva-riana para os Povos das Amé-ricas, o Sistema de Integração Centro-Americano e a Comu-nidade do Caribe. Observa-mos com interesse as ativida-des da União dos Estados Sul-Americanos e a formação da Comunidade dos Estados da América Latina e do Ca-ribe, que têm todas as chan-ces de consolidar os processos de integração na região para dar-lhes um denominador comum. Ressaltamos a impor-tância de que Cuba esteja ple-namente integrada na comu-nidade latino-americana.

sem clichês ideológicos Novas perspectivas motivam a cooperação multilateral no âmbito da APEC (Coopera-ção Econômica Ásia-Pacífico). Em 2012, pretendemos refor-çar iniciativas conjuntas, in-cluindo o desenvolvimento da infraestrutura comercial e econômica e a políticas de co-operação para a moderniza-ção das nossas economias e para a garantia de segurança energética. Estamos convencidos de que o aumento da colaboração entre as duas regiões, que que-remos construir em cima de princípios pautados no prag-matismo, sem nos apoiarmos em quaisquer ideologias, mas sim na igualdade e no bene-fício mútuo, responderá aos nossos interesses comuns.

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notas

O presidente russo Dmítri Medvedev assinou uma lei que qualifica a cerveja como bebida alcoólica. Até então, toda bebida que contivesse menos de 10% de álcool era considerada “produto ali-mentício” no país, e a venda de cerveja não era limitada a maiores de idade ou aos horários aplicados a outras bebidas. “Nos últimos 15 anos, o con-sumo de cerveja na Rússia quadruplicou” , afirma o pre-sidente do Sindicato de Pro-dutores de Bebidas Alcóoli-cas, Dmítri Dobrov. O valor de uma garrafa no país para o consumidor final é de cerca de R$1,50, o que colabora sig-nificativamente para o alto consumo. Com a nova medi-da a venda de cerveja deve ser banida de quiosques e lojas no período noturno.

Vladímir ruvínski

O Comitê Olímpico Russo criou uma nova marca es-portiva, a Team Russia. O símbolo, que pretende unir atletas e torcedores no país, já é uma estratégia conheci-da em outros países, como os Estados Unidos, com seu US Team, a Itália, com o Ital Team e a Grã-Bretanha com o GB Team. Até então, seu desenvolvimento já custou o equivalente a R$ 270 mil e calcula-se que os custos com publicidade cheguem a até R$ 8 milhões. A expectativa dos organizadores é que os gastos sejam recuperados em breve e gerem receita para o orçamento público de es-portes russo.

anton makhrov

cerveja é álcool também na rússia e terá venda limitada

seguindo outras sedes, rússia ganha marca “team”

A cidade de Tomsk, na Rús-sia central, recebe neste mês microcirurgiões brasileiros para o simpósio russo-bra-sileiro “Microcirurgia de Nervos Periféricos e Cirur-gia da Mão”. O evento, que será realizado de 31 de agos-to a 4 de setembro, terá transmissão ao vivo da Uni-versidade do Sul de Santa Catarina (Unisul). Entre os médicos convida-dos estão Jaime Augusto Bertelli (professor de neuro-cirurgia da Unisul) e Cris-tiano Tacca (especialista do departamento de ortopedia do Hospital Governador Celso Ramos - SC).“O simpósio proporciona uma oportunidade única para a troca de conhecimen-tos entre especialistas da Rússia e do Brasil sobre a ci-rurgia moderna em geral”, disse um dos cirurgiões do Instituto de Microcirurgia de Tomsk.Os brasileiros chegaram à cidade, localizada a mais de 3,5 mil quilômetros de Mos-cou, no dia 10 de agosto.

Vassíli Krilov

médicos da rússia e do brasil trocam experiências

entreVistaOleg Káshin

Superação, coragem e ceticismo

VeroniKa dormangazeta russa

Quase nove meses após ter sido espancado por defender a floresta de Khímki, jornalista não vê melhora quanto à violência e não quer se tornar um símbolo.

Qual é a atual situação dos jornalistas na rússia?Nunca acreditei que exista um problema específico para o jornalismo. A Rússia é um país perigoso para todos. O núme-ro de pessoas mortas aqui é, em geral, 40 vezes maior que na Europa. Por isso, as mor-tes de jornalistas aqui são 40 vezes mais frequentes que em outros lugares. O jornal “Káshin”, criado em homena-gem a mim no período em que estive hospitalizado, fez uma lista dos jornalistas assassi-nados. Eu fiquei com vergo-nha da tal lista, porque ela incluía pessoas que obviamen-te tinham morrido por outras razões que não o trabalho.

Para o chefe do comitê minis-terial de direitos humanos da

rússia, mikhail Fedotov, a si-tuação, em geral, melhorou nos últimos três anos.Ele também declarou: “O caso Káshin está praticamente re-solvido.” Quase resolvido é o mesmo que estar quase grá-vida: não existe. Meses se pas-saram e duvido seriamente que a verdade venha à tona.

Sou um tanto cético. Pesso-almente não falaria em me-lhoria. Por exemplo a floresta Khímki, cuja defesa tornou-se motivo para ataques a jor-nalistas. A violência continua, inclusive contra os ambienta-listas. As pessoas não estão respirando mais aliviadas.

como você vive e trabalha desde o ataque?Minha vida mudou. E, às vezes, as pessoas se recusam

a me dar entrevistas porque pensam: “Ele foi espancado, deve ser porque escreveu al-guma coisa que não devia; vai acontecer a mesma coisa comigo.”

e o medo?Esse ataque é apenas um em um longo histórico de provo-cações e ameaças. Ficar pen-sando sobre isso o tempo todo seria insuportável.

Você vai deixar de escrever sobre algum assunto?Não, e acho que agora estou mais afiado e tenho uma po-sição mais dura em relação aos inimigos do que é certo.

Você acha que se tornou um símbolo?Esse era um risco, mas feliz-mente consegui evitá-lo e tra-balho normalmente. Meu úl-timo texto, as memórias imaginárias de Konstantin Ernst [um olhar satírico sobre o diretor da TV estatal Canal 1] é mais importante para mim que os acontecimentos de no-vembro, porque está gerando

d e -bat e s o b r e temas atu-a is . A lém disso, tem o julga-mento de Vassíli Iakemenko [criador do movimento juve-nil governista Nashi], conti-nuação de um processo de dez anos. Agora ele me acusa de comprometer sua honra, por-que eu disse acreditar que ele esteja envolvido na agressão. Káshin: “as pessoas não estão respirando mais aliviadas”

biograFia

Káshin, de marinheiro a jornalistatornou conhecido mundo afora quando foi espancado, em 6 de novembro do ano pas-sado. Naquela noite, dois ho-mens não identificados – um deles carregando um buquê de flores que continha um bastão de ferro dentro – o atacaram perto de sua casa em Moscou. Quebraram suas pernas, os maxilares e os dedos das

mãos. O jornalista teve uma concussão cerebral e trauma-tismo craniano. Essa não foi a primeira agres-são física sofrida por Káshin relacionada ao jornalismo, mas foi a mais cruel e pode ter si-do um recado de ultranaciona-listas. Os criminosos não foram encontrados até hoje.

marina darmaros

“O número de pessoas mortas na rússia é, em geral, 40 vezes maior que na europa”

empreendedorismo novos projetos na internet permitem que elas tenham liberdade para trabalhar e criar os filhos

iniciativas seriam resposta às demissões massivas que atingiram sobretudo as mulheres após a crise econômica de 2008.

Tatiana Smolova, 30 anos, nunca planejou abrir o pró-prio negócio. Graduada em le-tras, ela trabalhou alguns anos como assistente em uma pequena empresa privada. Mais tarde, conseguiu um sa-lário melhor em outra com-panhia, mas após um mês des-cobriu que estava grávida. Depois disso, nunca mais en-controu trabalho. Voltar para o emprego antigo não era opção. Onde trabalhar e con-tinuar cuidando do filho? Então, teve a ideia de abrir um negócio na internet. Meses atrás, Tatiana inaugurou uma loja on-line de roupas para gestantes. Ainda não tem lu-cros fabulosos, mas a loja gera uma boa renda , que permite a ela dedicar mais tempo ao filho pequeno.Nos últimos três anos, apare-ceram na internet russa de-zenas de companhias “star-tup” - empresas de tecnologia que saíram do papel há menos de um ano - iniciadas por mu-lheres. A maioria delas opta claramente por marcas femi-ninas: lojas on-line para mães que estão amamentando, ven-das de roupas, calçados infan-tis, fraldas e brinquedos, cen-tros de contratação de babás, entre outras iniciativas.

investimento baixoMontar o próprio negócio on-line não sai tão caro como abrir uma loja física, e a prin-cipal vantagem para muitas mulheres - especialmente para jovens mães -, está na ausência de uma programa-ção rígida: o trabalho pode ser feito em casa, a qualquer momento. Aliona Popova, 29 anos, é jor-nalista. Depois de terminar a universidade, foi contratada por um dos maiores canais de televisão do país, que resol-

veu abandonar em troca do negócio próprio na internet. Agora, Popova tem 12 novos projetos. O mais famoso, Start-up Women, existe há três meses e é uma escola on-line para mulheres empreen-dedoras, onde elas podem re-ceber todas as informações necessárias e ajuda - inclusi-ve financeira - para abrir o próprio negócio.

donas do próprio narizSegundo Popova, a ideia do projeto surgiu durante a crise de 2008, quando a maioria de suas conhecidas ficou sem em-prego. “As companhias logo começaram a demitir as pes-soas que desempenhavam fun-ções duplicadas, especialmen-te o pessoal de relações públicas e marketing. Na Rús-sia, 70% dos empregados nes-ses segmento são mulheres, por isso várias amigas minhas

foram demitidas”, conta. De acordo com a empresária, en-contrar um emprego é mais difícil para mulheres do que para os homens, especialmen-te para as que tem filhos e os cria sem ajuda do marido.No entanto, as próprias mu-lheres ainda têm certo pre-conceito com os empreendi-mentos femininos. Aliona Vladimirskaia, 38, dona de um dos maiores sucessos do setor na internet russa, a agência de empregos Pruffi, afirma que ainda são raras as mu-lheres que fazem um traba-lho sério e independente. “Como nos velhos tempos existiam grupos de interesse e mulheres se encontravam para costurarem ou lerem jun-tas, hoje se tornou moda mar-car reuniões para discutir sobre como nós abriremos nossa ‘lojinha de chocolates’”, ironiza Vladimirskaia.

mulheres dominam “startups”

aliona Popova (esq.) reúne-se com participantes de sua escola feminina start-up women

elena noViKoVagazeta russa

a lei garante que homens e mulheres são iguais, mas há funções que elas não podem exercer, como conduzir os trens do metrô.

Desde os tempos da URSS o número de mulheres com en-sino superior na Rússia ultra-passa o de homens. Sua re-muneração e posição no mercado de trabalho, entre-tanto, ficam bem abaixo das do sexo oposto, segundo o re-latório de pesquisas de gêne-ro do serviço federal de esta-tísticas Rosstat de 2010.De acordo com o documento, em 1989 as mulheres com for-mação superior completa no país, incluindo pós-gradua-ção, eram 6,73 milhões, con-tra 6 milhões de homens. Em 2002, as diferenças se acen-tuaram ainda mais: no ano havia mais de 2 milhões de mulheres diplomadas do que

homens na mesma situação. “É um círculo vicioso: sem completar o colégio, os homens recebem salários mais altos que os das mulheres que têm formação superior e por isso eles não têm estímulo para es-tudar. Enquanto isso, as mu-lheres, que já entenderam estar em desvantagem, cor-rem para se especializar cada vez mais”, explica Zoia Kho-tkina, especialista em estudos relacionados à colocação pro-fissional feminina do Centro de Pesquisas de Gênero de Moscou. Segundo ela, as rus-sas recebem em média um sa-lário equivalente a 40% da re-muneração masculina.

tendência ocidentalizadaPara a socióloga brasileira Marília Moschkovich, pesqui-sadora de questões de gênero na educação pela Unicamp (Universidade de Campinas), as disparidades são uma ten-dência generalizada em paí-

iguais, mas só na superfície

marina darmarosgazeta russa

ses ocidentais como Brasil, Es-tados Unidos, França e Alemanha. “Como diz o so-ciólogo francês Christian Bau-delot, é como se a escola ti-vesse criado um ambiente de

oportunidades mais igualitá-rias - então as mulheres con-seguem ir bem na escola e obter sucesso lá -, mas a so-ciedade não tivesse apoiado essa igualdade fora da acade-mia”, explica.“São dois eventos concomi-tantes: a concentração hori-zontal das mulheres em áreas de especialização superior, porém, menos prestigiosas e remuneradas, e a vertical, em que, dentro de cada área,

quando se tem cargos mais altos e mais baixos, as mu-lheres costumam ocupar os últimos, mesmo se tiverem es-colarização superior à dos ho-mens”, completa.Com a crise econômica mun-dial, o tratamento desigual dado às mulheres no merca-do de trabalho russo ficou ainda mais evidente. Se em 2008 o número de mulheres em cargos de comando era de 416,8 mil (39,2%), contra 645,64 mil homens (60,8%), em 2009, apenas 33,7% dessas po-sições eram ocupadas por mu-lheres, enquanto o sexo opos-to ficava com os 66,3% restantes, de acordo com dados do Rosstat.No mesmo período, a porcen-tagem de profissionais independentes da parcela feminina da população eco-nomicamente ativa foi de 93,7% a 94,1%, enquanto o correspondente masculino manteve-se - de 92,2% a

92,1%. A variação pode ser um indício de como as mulheres tiveram que se virar depois da crise.Na Rússia, a igualdade entre homens e mulheres é garan-tida pela Constituição. O ar-tigo 253 do Código de Leis do Trabalho do país, entretanto, inclui um rol de cerca de 600 “trabalhos aos quais se proí-be o uso de mão-de-obra feminina”.“Isso dá possibilidade de res-trições a posições que não ofe-recem nenhum perigo. Como resultado, as mulheres não podem ser maquinistas do metrô, mas faxineiras, sim”, explica Khotkina.Em 2009, a estudante Anna Klevets, então com 22 anos, abriu um processo em São Pe-tersburgo contra a proibição de mulheres no cargo de ma-quinista do metrô , depois de ser rejeitada no ano anterior pela companhia estatal. Ela perdeu a ação.

Oleg Káshin nasceu em junho de 1980, na cidade de Kalinin-grado, quase 1,3 mil quilôme-tros a oeste de Moscou. For-mado em Navegação Marítima, passou a exercer a função de jornalista em 2001, como cor-respondente especial do jor-nal “Komsomólskaia Pravda” em Kaliningrado. Trabalhou em grandes jornais do país, mas se

elas têm nível de escolarização mais alto, mas amargam salários e posições mais baixas

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Page 4: Gazeta Russa #8

Gazeta Russawww.gazetarussa.com.breconomia e mercado

A fusão entre as bolsas de valores RTS (Russian Tra-ding System) e Micex (Mos-cow Interbank Currency Ex-change) une sob a mesma empresa os dois mercados de ações do país. A operação foi concretiza-da depois da negativa por parte da RTS às intenções de fusão com a bolsa alemã Deutsche Börse. Os alemães então voltaram-se para a NYSE Euronext - gigante que reúne a bolsa de Nova York e de diversos países eu-

mercado financeiro RTS resiste a ofertas estrangeiras e vende controle de suas ações para a Moscow Interbank Currency Exchange

Depois de a alemã Deutsche börse mostrar interesse de fusão, rts dá preferência à micex (moscow Interbank currency exchange).

ropeus -, onde é negociado um terço das ações do mundo. E a RTS fechou o acordo com a Micex. Ambas as fusões criarão enormes volumes de negócios para os mercados de ações.No caso russo, as duas ins-tituições até então eram complementares e de certa forma concorrentes. Elas vi-viam em uma espécie de guerra fria: não entravam no mesmo espaço financei-ro e usavam instrumentos diferentes, mas lutavam por clientes da mesma área. A RTS foi originalmente projetada para os players estrangeiros, que fazem aplicações em dólares. Para o mercado russo, a RTS sem-pre foi um indicador da re-lação entre a economia in-terna e os investidores

e s -trangeiros. Como ela negocia-va ações de um nicho específi-co da empre-sa, os volumes de negocia-ções ali sem-pre foram infe-r ior e s ao s d a Micex, onde os prin-cipais investidores eram russos.Em 2010, a RTS negociou 1,5 trilhão de dólares, e o Micex, 2,1 trilhões. Investidores es-trangeiros, de acordo com especialistas de mercado, não estão interessados em títulos de terceiro escalão e títulos de dívida. Assim, a RTS tem uma menor varie-d a d e d e v a l o r e s e m circulação.

organização e elevar a liqui-dez do mercado russo”, acre-dita Aleksêi Uliukaev, pri-meiro vice-presidente do Banco Central do país.Apesar das diferenças na maioria dos parâmetros-chave, a fusão da RTS e da

Micex é um fato e deve estar completa

até o final desse ano, q u a n d o o c o r r e r á uma oferta pública ini-

cial de ações da nova em-

presa, avaliada em pelo menos US$ 1 bilhão.Apesar de a deci-são ter sido anun-ciada, o formato da união e o futuro dos

trabalhos da empre-sa unificadas não

estão claros. Enquanto o governo

acredita que a fusão po-derá tornar Moscou um

verdadeiro hub do mer-cado mundial de capitais,

os críticos veem o movimen-to com certa desconfiança. Eles temem que, ao unificar o mercado, a nova bolsa fique livre para criar as re-g ras e taxas que bem entender.

Por isso a RTS é uma em-presa extremamente conser-vadora: ações lucrativas, leis rígidas, transparência má-xima, risco mínimo. A Micex, na busca por uma base mais ampla de clien-

tes, desenvolveu uma tática muito mais agressiva e dinâmica. Por isso ela constantemente traz novos produtos e ferramentas, abrindo mercado para títu-los e derivativos. “A fusão

da RTS com a MICEX, que criará uma estrutura única, elevando os padrões de gestão corporativa e re-alizando um IPO de quali-dade, vai contribuir para au-mentar a capitalização da

bolsas russas se fundem

NIkIta DulNevaNtoN makhrovgazETa RuSSa

Índices e capitais russos

eliminadas por stálin, bolsas só voltaram em 1989 acionista russo é homem, jovem e usa mediadorA primeira Bolsa de Valores surgiu na Rússia em 1831. Até meados do século 19, a Bolsa de Valores de Moscou foi uma das organizações mais influen-tes do país. Naquele mesmo século o país já tinha cerca de 100 praças de comércio. Mas a própria ideia de bolsa de valores contrariava a ide-ologia comunista e, por isso, nos primeiros anos do poder soviético todo o setor foi sus-penso. No entanto, nos início dos anos 20, o governo enten-

O perfil do investidor russo é, na esmagadora maioria, com-posto por homens (cerca de 90%) na faixa etária de 20 a 40 anos. A geração mais ve-lha é mais cautelosa no merca-do de ações desde os anos 90, quando as “pirâmides financei-ras” invadiram o país e levaram à falência muitos pequenos investidores. Por esse motivo, o investidor clássico russo em mercado de ações geralmente não aplica diretamente. Na maioria das

deu que sua existência era im-prescindível. Durante dez anos, afloraram de novo quase cem praças de comércio - todas es-tatais ou cooperativadas, ne-gociando exclusivamente com-modities.Com a ascensão de Josef Stá-lin ao poder, porém, a União Soviética mais uma vez abriu mão das bolsas, já que a eco-nomia entrou no modelo de planejamento pré-definido de venda e de consumo. Até o colapso do sistema soviético

vezes, ele confia seu dinheiro a um intermediário para ge-renciá-lo - empresas de inves-timento, fundos ou casas de corretagem. Esse mediador é quem de-cide onde e quanto dinhei-ro investir, quando deixar os ativos, e assim por diante. O russo médio não compra na bolsa ações escolhidas de sua própria empresa, para depois receber os dividendos, certo de que a empresa de investi-mento pode fazer rendimen-

no país, a Rússia não conta-va com nenhuma bolsa. Ape-nas em 1989 surgiu a “Alissa”, criada pelo milionário German Sterligov para comercializar exclusivamente ouro. Pouco tempo depois, nasceram a Mi-cex, e, logo depois, a RTS.Hoje a Rússia tem 11 mercados apenas de comércio de câm-bio, a maioria em Moscou e em São Petersburgo. Além dis-so, as bolsas de commodities são em número consideravel-mente maior: cerca de 300.

tos muito melhores com seu capital. No todo, o envolvimento da so-ciedade nos mercados de ações no país é significativamente menor do que costuma ser na Europa e nos Estados Unidos. Mesmo assim, existem exce-ções. Um dos exemplos mais brilhantes e conhecidos é o de Aleksêi Naválni, advogado que é acionista minoritário de gran-des estatais e luta pelo direito a informação financeira das com-panhias, defendido por lei.

será abalado: outros modelos competitivos de negócio emer-girão e os usuários vão final-mente entender o que eles devem pagar e a quem.O governo russo, contudo, está cético diante de tais iniciati-vas. Além disso, está claro que as autoridades não entendem o que esses jovens querem. Há pouco tempo, o Ministé-rio da Justiça negou registro oficial ao Partido Pirata da Rússia. O motivo? O Artigo 227 do Código Criminal, que trata e especifica a responsa-bilidade de ataques contra na-vios ou barcos.

Certa vez, o fundador do Google, Serguêi Brin, chamou a Rússia de “Nigéria com neve”, referindo-se a seu ele-vado nível de corrupção. No entanto, quando se trata de propriedade intelectual, os ocidentais a associam a outro país africano: a Somália. Diferentemente da região ao sul do Saara, porém, os pira-tas russos não tomam navios como reféns – mas, de acordo com os detentores dos direi-tos autorais de músicas, fil-mes e softwares baixados ile-galmente, o dano que causam é igualmente significativo.Acredita-se que a pirataria seja o motivo pelo qual mui-tos dos produtos de mídia pro-duzidos no Ocidente não che-gam ao país em suas versões licenciadas.

Direitos autorais Partido não registrado busca ajuda política para derrubar a Sociedade dos autores Russos e instituir concorrência na web

liderança jovem luta para estabelecer licenças como a creative commons no país e incentivar pagamento voluntário por obras.

No entanto um grupo de jo-vens conhecidos como piratas - afinal, eles são membros do Partido Pirata da Rússia - acha que os usuários devem pagar pelo conteúdo acessa-do, desde que tenham dinhei-ro para fazê-lo. “Eu e muitos dos meus ami-gos pagaríamos com prazer para acessar sites de filmes ou de programas via pay-per-view ou por qualquer outro sistema, desde que fosse sim-ples, conveniente, e por um preço razoável”, diz o líder da agremiação, Stanislav Schakirov.Enquanto isso não acontece, o número de usuários de sites com conteúdo ilegal está em constante crescimento. Para Schakirov, essa atitude é a raiz de todos os problemas. “Culturalmente, não estamos acostumados a pagar pelas coisas. Ao baixar um jogo por meio de um torrent do Oci-dente, a descrição do produto virá acompanhada da seguin-te frase: se você ficar satisfei-to, faça uma contribuição para

o criador do produto. Os rus-sos, porém, sequer pensariam nessa possibilidade. Afinal, por que pagar se você já ob-teve aquilo que desejava?”, explica.Os piratas russos não defen-dem a ausência total de con-teúdo pago, mas sim a revisão do atual sistema de distribui-ção do dinheiro, de forma a satisfazer a todos. Segundo

eles, os usuários que desejam obter seus direitos autorais se-riam protegidos e os autores ganhariam até mais do que recebem hoje. A Sociedade dos Autores Rus-sos (SAR), contudo, estaria emperrando o processo. “A SAR é uma máquina gigante com lobistas no governo, que faz pressão por leis equivoca-

das, como a ideia de cobrar impostos sobre cada disco vir-gem importado”, afirma Schakirov. Além disso, segun-do ele, os autores recebem ape-n a s 45% do s v a lor e s adquiridos.“A geração mais antiga de mú-sicos e cineastas está acostu-mada a pensar em propinas, então está absolutamente sa-tisfeita com o esquema pro-posto pela SAR. Jovens artis-t a s , é c l a r o , p o d e m disponibilizar na rede um álbum como fez o Radiohead, ou seja, ‘baixe as músicas e pague o quanto puder’. Mas, mesmo assim, eles sairão per-dendo”, diz o representante do Partido Pirata Internacional, Boris Túrovski.

Novas opçõesOs piratas russos acreditam que há uma alternativa ao falho sistema atual: o estímu-lo à concorrência. “O mundo está mudando, os detentores de direitos autorais entendem que devem olhar para novos modelos de negócios, que não

atrapalhem a vida dos usuá-rios e garantam uma vida tranquila aos autores”, diz Schakirov. A Mosfilm, por exemplo, mais antigo estúdio da Rússia, abriu um canal licenciado no You-Tube, obtendo lucro com pu-blicidade. “Mas este exemplo positivo é anulado por cente-nas de ações movidas pela SAR por execuções suposta-mente ilegais de músicas em restaurantes”, conta o líder do partido.O apoio do Estado, então, seria crucial para a resolução do problema, em particular no

que diz respeito ao fim da per-seguição criminal por viola-ção de direitos autorais. “A que tipo de direitos auto-rais eles se referem?”, pergun-ta Túrovski. “As autoridades russas ignoram as licenças in-ternacionais gratuitas.” Segundo o Partido Pirata In-ternacional, a Constituição russa deveria respeitar licen-ças como a Creative Commons e outras, além de ajudar em sua implantação. Caso isso não aconteça, um duplo pa-drão será estabelecido, garan-te ele. Só assim o monopólio da SAR

Partido pirata quer legalizar downloads

Presidente do Partido Pirata Pável rassudov (esq.) e vice-presidente stanislav scharikov (dir.)

aleksaNDr vostrovESPECIaL PaRa gazETa RuSSa

O Ipea conseguiu articular uma rede de pesquisas com especialistas de outras insti-tuições para viabilizar as pu-blicações. Entre os estudos sobre países emergentes, as pesquisas sobre Rússia e China foram as que mais pros-peraram na Diretoria de Es-tudos e Relações Econômicas e Políticas Internacionais.A expectativa do órgão é lan-çar um segundo livro sobre o país europeu, abordando as-

pectos como a modernização tecnológica, política industrial e desindustrialização. “Dessa forma, estaremos cobrindo praticamente todas as áreas de interesse”, aponta Pineli. “O governo brasileiro tem in-tensificado os contatos com a Rússia. Procura-se conhecer a forma de pensamento do povo e dos dirigentes russos, o funcionamento de sua so-ciedade e dos sistemas políti-co e econômico para saber como melhor se relacionar com esse país”, afirma Ange-

lo Segrillo, coordenador do la-boratório de estudos da Ásia no departamento de história da Universidade de São Paulo. Ele contribuiu para o livro do Ipea com um texto sobre os dois últimos presidentes rus-sos, Vladímir Pútin, hoje pri-meiro-ministro, e Dmítri Medvedev.De acordo com Segrillo, os le-vantamentos do instituto ofe-recem uma “visão brasileira” sobre a Rússia e fornecem sub-sídios não apenas ao governo, mas também às empresas e

organizações do país. “O estudo da experiência eco-nômica russa pode ser muito proveitoso para o Brasil, tanto em aspectos bem-sucedidos quanto no sentido de aprovei-tar lições das políticas mal-sucedidas”, afirma Segrillo.A avaliação é reforçada pelo coordenador do centro de es-tudos russos da Universidade de Brasília, Paulo Afonso de Carvalho. “Como não estudar um país que, assim como o Brasil, é continental, apresen-ta um mercado interno dinâ-

mico, depende de exportações de produtos primários, pas-sou por experiências neolibe-rais depois fracassadas e por um processo de aumento da participação do Estado?”

modelo diferenteContudo, o parecer não é unâ-nime. “A economia russa é própria. O modelo deles é di-ferente de qualquer outro”, afirma o presidente da Câma-ra de Comércio e Indústria Brasil–Rússia, Antonio Car-los Rosset. “A forma como

Rússia superou problemas foi completamente diferente da-quilo que o Brasil enfrentou. Não dá para o Brasil apren-der com os russos. São reali-dades totalmente distintas”, completa.Mesmo no setor do petróleo o Brasil teria pouco a aprender. “As grandes jazidas na Rús-sia são controladas pelo go-verno, assim como no Brasil, mas a forma de explorar os poços e de administrar a ex-tração é diferente. Além disso, lá a extração é feita no conti-

nente, em condições climáti-cas inóspitas. Já aqui, ocorre em alto mar.”Mesmo assim, defende Ros-set, o Brasil deve apostar na aproximação comercial com o país europeu e na troca de tecnologias. “É importante co-nhecer para explorar o mer-cado russo, seja na exporta-ção ou na importação.” De acordo com Rosset, o Brasil engatinha em tecnologias do-minadas pelos russos, como nas áreas ferroviária e de semicondutores.

Rússia e Brasil: mais próximos do que parececoNtINuação Da PágINa 1

“Sociedade de autores russos é uma máquina de lobistas que só passa 45% de lucros para artistas”

Os principais índices de ações na Rússia são dois: RTS-1 e Mi-cex. Estrangeiros, em geral, fa-zem negócios com a RTS, uma vez que lá as transações são feitas em dólares. No entanto, é possível comprar ações das principais companhias russas em qualquer grande bolsa de valores do mundo. Eles nego-ciam na forma conhecida como recibos de depósito, ADR (re-cibo de depósito americano) e GDR (recibo de depósito glo-bal) na Alemanha, na Grã-Bre-tanha, na França, nos Estados Unidos e em outros países.

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Page 5: Gazeta Russa #8

GAZETA RUSSAWWW.GAZETARUSSA.COM.BR Economia e Mercado

NOTAS

Entre 16 e 21 de agosto rea-lizou-se o Maks, maior salão aeroespacial do mundo, na cidade de Jukóvski, próxi-ma a Moscou. Neste ano, a principal novidade do even-to foi o lançamento da quin-ta geração do avião de com-bate T-50 (FGFA), da Sukhôi. As maiores companhias de aviação civil participaram da última edição do evento, com o Airbus-380 e o Boeing-787 Dreamliner, bem como com veículos de transporte militar das forças aéreas dos Estados Unidos e da Rússia. O MAKS 2011 tem ainda no-vidades relativas à indústria russa de helicópteros, com os leves Mi-34S1, Ka-226T e ao Mi-38.

Aleksandr Korolkov

Novidades marcam a edição 2011 do MAKS

De acordo com comunicado do Grupo Sodrujetsvo, a companhia russa adquiriu 100% das ações da brasilei-ra Líder Armazéns Gerais S.A., que trabalha com o ar-mazenamento e o transpor-te de grãos e possui 15 de-pósitos de cereais em zonas agrícolas do Brasil, alugados para grandes companhias agroindustriais.A área de atuação do grupo russo concentra-se no pro-cessamento de soja e canola, na fabricação de farinha de peixe e mistura de proteínas animais, na importação de glúten de milho e lisina e na distribuição de produtos.

InterFax

Sodrujestvo adquire 100% das ações da Líder Armazéns

O presidente russo Dmítri Medvedev lançou uma cam-panha para melhorar o clima de investimento na Rússia. O governo irá aplicar US$ 10 bi-lhões em dinheiro público no FIDR (Fundo de Investimen-to Direto da Rússia), que será responsável por atrair os prin-cipais fundos mundiais para coinvestimento em grandes projetos no país. A intenção é que ele aumente signi� cati-vamente a participação de ca-pital privado, reduzindo a per-cepção de risco em fazer negócios na Rússia. A nomeação de Kirill Dmí-triev para a gestão do fundo é uma prova da natureza co-mercial do projeto. “Não sou político, sou gestor de fundos, e o objetivo primordial do FIDR é obter retorno para os investidores”, disse Dmítriev à Gazeta Russa, sentado em um café na Praça Vermelha. Um dos principais nomes da nova geração de empresários da Rússia, Dmítriev começou

Kirill Dmítriev garante que a prioridade é investir em negócios rentáveis, e não fazer política com os recursos de US$ 10 bilhões.

como gestor no Delta Private Equity Partners, fundo de in-vestimento que recebe dinhei-ro do governo norte-america-no e � nancia o desenvolvimento de negócios independentes na Rússia com o intuito de pro-mover o capitalismo no país. Depois disso, criou o bem su-cedido Icon Private Equity, fundo de US$ 1 bilhão que investia em projetos dos mem-bros da CEI (Comunidade dos Estados Independentes). Paralelamente, fundou a As-sociação Russa para Capita-listas de Risco e aconselhou o governo a criar a Compa-

nhia de Especulação da Rús-sia, fundo para alavancar o setor de capital de risco do país que conta com apoio � -nanceiro do governo russo promovido pelo primeiro-mi-nistro Vladímir Pútin.“O � nanciamento estatal será limitado a não mais que 50% de cada projeto. Não vejo o FIDR como uma iniciativa po-

os russos se esquecem desse fato –, e o número de pessoas que ganham mais de US$ 10 mil por ano triplicou nos úl-timos seis anos. Não estou di-zendo que tudo é uma mara-vilha, mas o aumento da renda tem levado a uma incrível quantidade de mudanças em um período extremamente curto”, completa.A estrutura do FIDR foi pro-jetada para reduzir os temo-res dos investidores estrangei-ros e estimular aplicações � nanceiras no mercado russo, com o Estado limitado a uma participação minoritária. Um comitê de investimento poderá aprovar acordos de até US$ 250 milhões e contará com investidores pro� ssionais do mundo todo.O conselho supervisor vai de-terminar as estratégias e apro-var acordos de até US$ 500 milhões. Funcionários do go-verno também vão integrar esse conselho, mas a maioria dos participantes será com-

posta de pro� ssionais e inves-t idores i nst ituciona is internacionais. O nível final de supervisão será um comitê consultivo in-ternacional composto por re-presentantes dos principais fundos globais, que se reuni-rão uma vez por ano. “Haverá alguns investimen-tos óbvios, já que o principal objetivo do fundo é produzir

BEN ARIS GAZETA RUSSA

“Objetivo é dar retorno a investidores”

FIDR quer atrair os principais fundos mundiais e desfazer imagem do país de lugar de risco

PERFILKIRILL DMÍTRIEV

PRESIDENTE DO FIDR (FUNDO DE INVESTIMENTODIRETO DA RÚSSIA)

Kirill Dmítriev foi gestor do Delta Private Equity Partners, fundo que tem apoio financei-ro do governo dos EUA

lítica. Os objetivos do gover-no, quando atingidos por meio desses investimentos, serão um produto secundário”. Dmítriev está atualmente con-tratando pro� ssionais de mer-cado, em sua maioria russos, e os primeiros US$ 2 bilhões serão liberados pelo governo em setembro. “O primeiro in-vestimento é esperado até o � m deste ano”, calcula. Depois disso, a agência de dí-vida pública e o banco para desenvolvimento Vnescheco-nombank (VEB) irão liberar outros US$ 2 bilhões anual-mente ao longo dos próximos

quatro anos. A esperança do Kremlin é que o fundo tam-bém atraia US$ 90 bilhões de investidores privados.“A Rússia é um destino de in-vestimentos bastante atrativo e as pessoas, até certo ponto, perderam a noção do que o país tem a oferecer”, a� rma Dmítriev. “É a sexta maior economia do mundo – mesmo

10 bilhões

de dólares é o va-lor do recém-criado fundo de investi-mentos. A institui-ção pode oferecer mais segurança a empresários estran-geiros ao coinvestir nos projetos e parti-lhar riscos.

6º lugar

é a classificação da Rússia entre as maiores economias do mundo. Nos úl-timos seis anos, tri-plicaram as pessoas que ganham mais de US$ 10 mil/ano. Classe média é a mais rica dos Brics.

40 bilhões

de dólares entraram no país em investi-mento estrangeiro direto em 2010, se-gundo maior volu-me entre emergen-tes. Só a venda dos laticínios Wimm-Bill-Dann gerou US$ 3,8 bilhões.

NÚMEROS

retornos, mas também que-remos aproveitar a experiên-cia dos nossos parceiros”, diz Dmítriev.Entre os investidores interna-cionais que já manifestaram interesse em participar do fundo estão Goldman Sachs, Blackstone, Corporações de Investimento de Abu Dhabi, do Kuwait e da China, Per-mira e Caisses des Depots.

“As pessoas, até certo ponto, perderam a noção do que o país tem a oferecer”

Salões de beleza Setor não para de crescer na capital russa, mas investimentos são altos e retorno é lento

Alta competição e investimentos astronômicos são compensados pelo alto gasto dos moscovitas todos os meses: R$ 800.

Segundo a mais famosa fer-ramenta de buscas da Rússia, o site Yandex.ru, Moscou tem hoje mais de 6 mil salões de beleza. Se a cifra é mais ou menos constante, a rotativi-dade do mercado é grande: na cidade, todos os meses até dez novos salões de beleza são abertos e aproximadamente o mesmo número fecha. Segundo estimativas do jor-nal Moskóvski Komsomolets, antes da crise de 2008 os mo-radores da capital russa gas-tavam em média até R$ 800 por mês em salões de beleza. Os norte-americanos, segun-do o relatório anual de 2008 da organização americana de direitos humanos YWCA, gas-tam na sua aparência uma média mensal cinco vezes menor, de R$ 160.

Mercado de luxo “As pessoas não estão mais satisfeitas com apenas boa téc-nica e cosméticos da moda. Agora o proprietário precisa investir nos melhores decora-dores, e os spas inaugurados na capital nos últimos anos lembram mais palácios orien-tais, ornamentados com ouro e mármore”, diz Iana Koma-

Mercado da vaidade gera lucros em Moscou

Um dos filões explorados é o de espaços de beleza ao lado ou anexos a academias

EKATERINA FROLOVAESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

rova, sócia de uma rede de sa-lões de beleza de luxo em Moscou. Em julho do ano passado, ela decidiu expandir seus negó-cios para mais dois pontos co-merciais, exclusivamente no centro da cidade. “Se você tem salões de luxo, simplesmente não faz sentido procurar ins-talações fora do centro: seus

é o número atual de salões de beleza em Moscou, segundo a ferramenta de buscas russa Yandex.ru

É o retorno médio do inves-timento em um spa de luxo após cinco anos - dependendo também de fatores como loca-lização. O baixo retorno torna o investimento pouco atraente para leigos.

6 mil.

2% a 5%

NÚMEROS

clientes não irão até lá”, ex-plica. O custo deste capricho gira em torno de US$ 10,5 mil mensais por 140 metros quadrados. Komarova também convidou um designer moscovita, inves-tiu em equipamentos europeus e cosméticos tops de linha. “Cada salão nos custou 16 mi-lhões de rublos [R$ 900 mil]”. E o valor não inclui a publi-cidade necessária - em revis-tas, outdoors, festas, permu-tas etc.Dos dois pontos abertos por Iana há um ano, apenas um atingiu o ponto de autossu� -ciência: o salão arrecada US$

abertos pelos próprios donos das academias, ou em espa-ços alugados por eles. Formalmente, esses salões de beleza são regidos por leis de mercado e não abusam do su-cesso do negócio vizinho para cobrir suas próprias despesas. O que eles têm como enorme vantagem sobre os concorren-tes é o fluxo garantido de clientes. “Ficar sem trabalhar em um salão de beleza próximo a uma academia é simplesmente im-possível porque, assim que você abre, os clientes surgem instantaneamente de dentro da academia”, diz a diretora

Brasileiros deixam cada vez mais dinheiro nos salões

da cor” e móveis do designer Phillipe Starck. Nas pratelei-ras, produtos de marcas como Kérastase, além de boutiques com perfumes e acessórios. “Tudo escolhido a dedo para a nossa clientela”, diz ele. Por lá, um corte de cabelo com di Biaggi custa R$ 480. A hi-dratação pode valer até R$ 550. Pé e mão saem por R$ 100.

O aluguel de um salão de beleza no centro de Moscou pode chegar a US$ 10,5 mil por mês

O mercado de beleza e cos-méticos no Brasil é expressi-vo e, atualmente, só fica atrás do Japão e dos EUA. A maior preocupação da brasileira é o cabelo. Com a economia em crescimento, artigos e trata-mentos para os fios deixaram de ser itens supérfluos e entra-ram no orçamento mensal das famílias no país. Estudo recen-

Vânia GoyEspecial para Gazeta Russa

1,5 mil por dia, suficientes apenas para pagar o aluguel, os salários dos funcionários e compra de cosméticos. Para pagar os investimentos e co-meçar a lucrar com o negócio, segundo os cálculos de Iana Komarova, são necessários pelo menos mais dois anos.

De corpo e almaMas ganhar dinheiro na in-dústria da beleza e mesmo assim não estar na vanguar-da de um mercado movimen-tado é possível – para quem abrir um salão de beleza pró-ximo a academias de grande porte. Geralmente, os spas são

te divulgado pela Fecomercio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) aponta que os salões de cabeleireiros movimentaram R$ 1 bilhão por mês em 2008. Os gastos men-sais feitos com profissionais da beleza cresceram 44% entre 2002 e 2008. Nessa lista, en-tram o corte de cabelo, tintura,

lavagem, escova e serviços de manicure e pedicure – os dois últimos, considerados absolu-tamente necessários pelas bra-sileiras. “O que surpreende nos dados é que, com o crescimen-to econômico, o aumento de renda não gerou apenas gastos com itens essenciais”, diz Alta-miro Carvalho, economista da Fecomercio. “O gasto mensal com estética é equivalente, por exemplo, ao que as famílias gastam comprando frango,”, compara o economista.

As famílias de classe B são as que mais gastam, R$ 281 mi-lhões por mês. As classes D e C aparecem em seguida, e gas-tam, respectivamente, R$ 236 e R$ 208 milhões mensais. As classes A e E ficam por último, com R$ 143,3 e R$ 138,3 mi-lhões por mês.A classe A pode não figurar entre as que mais gastam com serviços de beleza, mas, certa-mente, é a que conta com mais mordomias e serviços varia-dos. “Os salões de beleza dire-

cionados para a classe alta são sofisticadíssimos no Brasil”, garante Carvalho.Os espaços de luxo localizados em São Paulo oferecem cada vez mais serviços. No M.G. Hair, comandado por Marco Antonio di Biaggi – con-siderado o cabeleireiro das celebridades brasileiras – é possível agendar massagens, sessões de acupuntura, banhos especiais e até os serviços de um quiroprata.Localizado no Jardim Paulis-

ta, bairro nobre da capital pau-lista, o endereço tem apenas quatro anos. Antes, o salão fi-cava no mesmo bairro, mas era cinco vezes menor. “Mudei porque precisava de mais es-paço”, diz di Biaggi. “Conta-mos com três andares e dois mil metros quadrados agora.”A construção do novo prédio foi pensada nos mínimos de-talhes para agradar as clien-tes mais exigentes: luz natural em todo o ambiente “para que as loiras tenham noção real

de um desses espaços, Tatia-na Savalova. “As pessoas tendem não só a deixar de lado os músculos, mas a passar por alguns tipos de procedimentos que deixem a pele ainda mais elástica e bela, para se tornarem ainda mais atraentes”, completa.O principal é não se confun-dir na interpretação das ne-cessidades dos clientes. Ofe-recer nesses lugares serviços de stylling, cosmetologia ou tentar impressionar com tra-tamentos exóticos não faz sen-tido. A coisa mais importante é criar uma equipe para be-leza do corpo: massagens, ba-nhos, procedimentos de dre-nagem e a nt ice lu l it e , juntamente com depilação e duchas. Estes são os serviços mais populares entre os visi-tantes de spas próximos a academias. “Quando cheguei a este salão de beleza, a primeira coisa que � z foi baixar todos os preços em 20%. Meu segundo passo foi remover procedimentos desnecessários, tais como pe-dicure, que não tinham de-manda, e comprar aparelhos modernos para o cuidado do corpo. Agora nós contamos com uma receita mensal de de US$ 110 mil no salão de 300 metros quadrados”, orgu-lha-se.

Seja bem-vindoPara investidores casuais e en-tusiastas, o mundo da beleza

pode exigir muita paciência. “Investir ou não na indústria da beleza moscovita depende da taxa de rentabilidade, de retorno e da ambição de cada investidor. Quem tem recur-sos para aplicar em fundos, no mercado � nanceiro ou na abertura de spas constante-mente considera os spas uma opção pior. Isso porque para recuperar os investimentos é preciso, pelo menos, quatro, cinco, ou até seis anos”, ex-plica Vadim Juk, proprietário de uma grande construtora que decidiu investir em um centro de estética há um ano.“O retorno médio para um bom spa é em torno de 2% a 5%, mas esses valores, natu-ralmente, dependem da loca-lização e da relação custo-be-nefício de seus serviços. Em outras palavras, para o inves-tidor que procura ganhar di-nheiro rápido, este mercado é de pouco interesse”, completa. Mas um dos principais ingre-dientes de um negócio bem sucedido no setor, segundo Juk, está em deixar a fanta-sia rolar. Serviços de beleza exclusivos para crianças e adolescentes, complicadas tranças africanas, bem como centros de estética para a par-cela masculina da sociedade são algumas das novidades pós-soviéticas que fazem dos moscovitas os recordistas em gastos nos salões.

Mais em:www.gazetarussa.com.br

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Page 6: Gazeta Russa #8

GAZETA RUSSAWWW.GAZETARUSSA.COM.BREspecial

20º Aniversário do golpe Tentativa de tomada do poder por comunistas linha-dura colaborou para a queda da URSS e de seu presidente

O agosto que mudou a Rússia

Como tantos outros dias, na-quela inesquecível manhã cinzenta e chuvosa, fui acor-dado por um telefonema. “Ligue o rádio”, disse, em tom agitado, um amigo do outro lado do telefone. “Golpe de Estado!”, completou. Corri para o aparelho. O lo-cutor, com a voz inalterável, lia: “Guiado pelos interesses fundamentais dos povos da nossa pátria mãe, o governo declarou estado de emergên-cia em algumas regiões da União Soviética por um pe-

Também conhecida como “Putsch de Moscou”, a tentativa de golpe durou três dias, durante os quais Gorbatchov foi deposto.

ALEKSANDR EMELIÁNENKOVESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

ríodo de seis meses a partir das 4h, horário de Moscou, do dia 19 de agosto de 1991.”Aumentei o volume. “Um Co-mitê Estatal para Situações de Emergência (GKChP) vai governar o país e adminis-t r a r a s i t u a ç ã o c o m e� cácia.” Naquela manhã de agosto, ouvi uma conversa enquan-to estava a caminho do tra-balho. “Não é ruim. Pelo menos haverá ordem...” Eles tinham 30 e poucos anos, assim como eu. Eram � lhos do degelo de Khruschov que tinham vivido no máximo a perestroika de Gorbatchov e, no entanto, já desejavam uma mão � rme. A redação da editora Pravda – pela qual minha revista,

“Sobesednik”, era publicada – recebeu uma intimação do Comitê Estatal de Emergên-cia para suspender “até se-gunda ordem” a impressão de todos os jornais e revis-tas, exceto o “Pravda”, a “Krásnaia Zvezdá” (ou “Es-trela Vermelha”, órgão das Forças Armadas soviéticas) e outras sete publicações con-troladas pelo governo. Descarregamos nossa raiva convertendo os jornais em cartazes e folhetos. Enquan-to isso, � leiras de tanques, veículos blindados e cami-nhões com soldados circula-vam pela capital. Até então, não havia infor-mações confiáveis sobre o paradeiro do presidente da União Soviética. A última informação que se tinha era

de que ele estava em Foros, casa de veraneio dos gover-nantes do país localizada na Crimeia. O vice, Guennádi Ianáiev anunciou que o es-tado de saúde de Mikhail Gorbatchov era delicado, m a s o t om ne r vo so e pouco s i ncero de sua declaração era claramente perceptível.Durante o golpe, o ministro da Defesa, Dmítri Iazov, não abandonou seu gabinete. Assim como o resto do país, o Exército se encontrava di-vidido e o marechal fazia o que podia para impedir que as Forças Armadas se envolvessem diretamente no impasse. Havia também as unidades especiais de combate contro-ladas por Vladímir Kriu-

tchkov, chefe do KGB (Co-mitê de Segurança do Estado). Iázov sabia que essas unida-des tinham recebido ordens para avançar sobre Moscou e tinha colocado em alerta todas as tropas que estavam na cidade.Nesses três dias tensos, nin-guém conseguiu prever o de-senrolar dos acontecimentos. Duas divisões do KGB que avançavam sobre Moscou foram detidas e tiveram que recuar. Mas Iéltsin e os seus seguidores permaneceram nos tanques, cercando o Par-lamento. Os motoristas dos blindados faziam a guarda e abraçavam os cidadãos nas barricadas.

Aleksandr Emeliánenkov foi vice-diretor da “Sobesédnik”.

GETTY IMAGES/FOTOBANK

24 de agosto de 1991: uma multidão ergue a bandeira rus-sa no funeral de três mortos durante o golpe em Moscou

Nos meses seguintes à queda da União Soviética, os produ-tos ocidentais, antes proibidos pelo Partido Comunista, inun-daram o país. Vendedores de rua abasteceram suas barra-cas com papel higiênico macio, jeans da Levi’s, sapatos de qualidade e cigarros de mar-cas estrangeiras. Mas qual a vantagem dos produtos de qualidade se não há dinheiro para consumi-los? “Muitas pessoas anseiam pelo passado, época em que a vodca custava 3,62 rublos, a salsi-nha saía por 2,20 rublos, e o pão, apenas 13 copeques. Hoje, não se compra nada com um rublo”, diz Margarita Vodiá-nova em uma reportagem do jornal Óbschaia Gazeta.O salário mínimo de um russo

Há 20 anos, um grupo da linha dura do Partido Comunista da União Soviética tentou der-rubar o presidente soviético Mikhail Gorbatchov e, assim, interromper seu programa de reformas econômicas e polí-ticas. Mas a tentativa de golpe fracassou, e os moscovitas se reuniram a Boris Iéltsin, pre-sidente da República Russa, que liderava as massas de

Salário de 548 rublos na URSS era equivalente a 72 centavos de dólar, mas ainda assim dava saúde, alimentação e descanso. Hoje, porém, russos têm mais posses.

Diferentes gerações de russos relembram os acontecimentos turbulentos de agosto de 1991 com uma misturam de incerteza e de esperança.

Quanto valem esses copeques?

Uma época de medo e expectativas

BEN ARIS GAZETA RUSSA

VLADÍMIR RUVINSKI, ANASTASSIA GORÓKHOVAGAZETA RUSSA

logo após a queda da União Soviética, em 1991, era de 548 rublos por mês – o equivalen-te a 72 centavos de dólar ame-ricano, considerando a taxa de câmbio – de acordo com Evguêni Gavrilenkov, econo-mista-chefe do banco de in-vesimento Troika Dialog. Mas isso ainda era su� ciente para ter uma vida decente, já que o Estado fornecia mora-

cima de um tanque de guer-ra em frente à Casa Branca, a sede do governo russo. Assim como muitas crianças russas, o estilista lliá Polive-ev, 26, presenciou em agosto de 1991 os momentos dramá-ticos do fracassado golpe con-tra Gorbatchov na expressão de choque de sua mãe, en-quanto a família assistia aos noticiários pela televisão e seus pais sussurravam inquietamente. “Ainda consigo me lembrar de muitas imagens dos noticiá-rios: a sede do governo russo com marcas pretas das cha-mas e o olhar no rosto de Gor-batchov, que era basicamente o mesmo da minha mãe”, re-corda Poliveev, que então vivia

dia, educação, serviços, assis-tência médica, creches, férias e casas de repouso. Embora nada disso fosse particular-mente de boa qualidade, o acesso a tais benefícios era universal e gratuito. Com o salário mínimo padrão, era possível comprar 74 pa-cotes de pão de forma ou es-colher entre: 6,2 kg de carne, 6,5 kg de linguiça, 13,5 litros

Dinâmica do Consumo

Onde você estava quando aconteceu o golpe?

A LEMBRANÇA DOS POLÍTICOS

Aleksandr Livchits2011: VICE-DIRETOR GERAL DA RUSAL (ALUMÍNIO DA RÚSSIA)

1991: PROFESSOR NO INSTITUTO DE MAQUINARIA DE MOSCOU

Eu estava em um retiro per-to de Moscou. Depois de ouvir sobre o golpe, eu e um amigo pegamos uma garrafa de vod-ca, fomos para a floresta e be-bemos em silêncio. Sentados no meio do mato, escutamos o ronco dos motores dos veícu-

los militares em direção a Mos-cou. Mais tarde, um homem nos irritou, gritando no dia 19 que nem a forca seria punição suficiente para nós. Dois dias depois, esse mesmo homem começou a nos intimar a enfor-car os comunistas.

Boris Nemtsov2011: PRESIDENTE DO PARTIDO DA LIBERDADE DO POVO, OPOSICIONISTA E NÃO REGISTRADO 1991: : DEPUTADO DO SOVIETE SUPREMO DA REPÚBLICA RUSSA

Na noite do dia 18 para 19 de agosto, vim para Moscou com minha esposa e dei entrada no Hotel Ucrânia. Logo pela ma-nhã, ouvi falar sobre o golpe e corri para sede do governo. Lá encontrei [Boris] Iéltsin, que me mandou pegar uma arma.

Recebi um fuzil Kaláchnikov e uma máscara de gás, e me en-viaram para as unidades mili-tares dos distritos de Kante-mírovski e Dzerjínski a fim de convencer os militares a não apoiarem o Comitê Estatal pa-ra Estado de Emergência.

Aleksandr Korjakov2011: DEPUTADO DA DUMA FILIADO AO PARTIDO GOVERNISTA RÚSSIA UNIDA

1991: GENERAL DO SERVIÇO SECRETO (KGB) E CHEFE DO SERVIÇO DE SEGURAN-ÇA DE BORIS IÉLTSIN

No dia 18 de agosto, eu estava no Cazaquistão com Iéltsin em uma reunião com [o presiden-te cazaque Nursulatan] Nazar-baiev. Voltamos para Moscou a uma da manhã e fomos para

Arkhanguelskoie. Pela manhã, um funcionário do Kremlin que estava de plantão nos contou sobre o golpe. Logo procurei Iéltsin. Depois disso, teve início um trabalho incessante.

Vladímir Pútin2011: PRIMEIRO-MINISTRO DA FEDERAÇÃO RUSSA

1991: DIRETOR DO COMITÊ PARA RELAÇÕES EXTERNAS DA PREFEITURA DE LENINGRADO (ATUAL CIDA-DE DE SÃO PETERSBURGO)

Eu estava de férias. E quando tudo começou, fiquei realmen-te chateado por estar sabe-se lá onde naquele momento tão importante. Mudei diversas ve-zes de carro e cheguei a Lenin-grado no dia 20. [Anátoli] Sobtchak e eu praticamente nos instalamos no prédio da prefeitura de Leningrado. Ha-

via muita gente lá. Era peri-goso deixar o prédio, mas saí-mos. Chegamos até a entregar armas para algumas pessoas, embora eu mantivesse a minha em um cofre. As pessoas nos apoiavam em todos os lugares. Era claro que, se alguém qui-sesse reverter a situação, have-ria muitas vítimas.

de óleo vegetal, 163 litros de leite, 6 kg de queijo, 160 ovos, 28 kg de açúcar ou 3,5 litros de vodca.Um estudo recente da Escola Superior de Economia em par-ceira com a revista Ekspert sobre as mudanças do padrão de vida dos russos entre 1990 e 2009 constatou que a renda per capita aumentou em 45%. Enquanto isso, o volume de consumo per capita mais do que dobrou, de acordo com os índices de consumo baseados no PIB.Medindo a qualidade de vida em posses, os russos estão vi-vendo muito melhor hoje em dia que há 20 anos. Em 2008, um consumidor podia com-prar 70% mais bens duráveis, 25% mais comida, e duas a três vezes mais cigarros, vodca, carros e roupas, do que na era soviética.Ao mesmo tempo, porém, as despesas familiares com edu-cação e cuidados médicos au-mentaram substancialmente. A pesquisa aponta que, segun-do a OMS (Organização Mun-

dial de Saúde), as despesas com planos privados repre-sentam, hoje, 40% dos gastos totais dos russos na área da saúde – um nível bem acima d a m é d i a n a U n i ã o Europeia.A média de espaço vital cres-ceu cerca de 40% ao longo das últimas duas décadas, atin-gindo o nível atual de 22 me-tros quadrados per capita - embora ainda se esteja bem atrás de países como a Fin-lândia, onde esse índice em 2009 correspondia a 39 me-tros quadrados per capita. O aumento de 45% da renda é baixo para um período de 20 anos, especialmente por-que as receitas caíram duran-te a maior parte dos anos 90 e só começaram a crescer após a crise � nanceira de 1998. E, embora a maioria das pesso-as goze de rendas mais altas hoje que há 20 anos, a pesqui-sa mostrou que um em cada cinco russos vive atualmente abaixo de linha da pobreza, em condições piores do que na época dos comunistas.

na cidade de Magadan, no ex-tremo norte da Rússia. Gorbatchov, que tinha � cado em prisão domiciliar na Cri-meia, retornou a Moscou de-pois do fracasso do golpe, mas já estava fatalmente enfraque-cido como líder, e a dissolu-ção da União Soviética come-çou quase imediatamente. A promotora de shows Vera Grant, 26, lembra-se de estar colhendo batatas na casa de veraneio dos avós, perto de Moscou, enquanto os adultos ouviam o rádio. “A tensão era grande”, conta Grant.Apenas 8% dos russos veem os acontecimentos de agosto de 1991 como uma revolução democrática, de acordo com o Centro Levada. Ecoando os

sentimentos do primeiro-mi-nistro Vladímir Pútin, 36% dos russos consideram a queda da URSS uma tragédia, e 43% acreditam que o golpe foi nada mais que uma disputa de poder entre burocratas.“Foi uma ilusão de liberdade e de mudanças”, diz o diretor de arte Filip Botchkov, 25. Ele lembra de sua família enga-tinhando pelo apartamento, próximo à sede do governo em Moscou. Havia rumores na vi-zinhança de que atiradores se postavam nos telhados dos prédios escolhendo aleatoria-mente suas vítimas.“Hoje ninguém luta por nada, mas todo mundo está sempre contra alguma coisa”, diz Grant.

A publicitária Natalia Mos-chkina, 34, levada pela mãe e pela avó às comemorações em frente à Casa Branca, lem-bra-se da alegria das multi-dões com o fracasso do golpe. “Havia um espírito de demo-cracia, excitação e fomento so-cial”, diz Moschkina. “Hoje, a maioria dos russos vê a década de 1990 sob uma perspectiva negativa, asso-ciando-a ao colapso econômi-co, ao caos, à degradação cul-tural, enquanto uma parcela minúscula das pessoas mais socialmente ativas falam sobre a recuperação das liberdades básicas da época”, explica Boris Dubin, chefe do Depar-tamento de Estudos Sociais e Políticos do Centro Levada.

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as empresas russas sempre foram extre-mamente dependen-tes do governo e das

boas relações com as autori-dades. Esse inter-relaciona-mento entre as corporações e o Estado existe desde a Rús-sia imperial, quando os ne-gócios privados não se desen-volviam tanto pela iniciativa e capacidade pessoal, mas sim pela permissão do tsar. As empresas russas tanto temem o Estado e as autori-dades governamentais quan-to dependem deles. No mundo todo, empresários evitam pre-judicar o Estado, mas com a certeza de serem protegidos de abusos de poder por siste-mas jurídicos eficientes.Essa proteção não existe na Rússia. Se um empresário tenta levar um prefeito ou go-vernador à justiça, sabe que pode perder o negócio e até

mesmo acabar atrás das gra-des. Aqui, qualquer empresa de tamanho considerável não busca proteção nos tribunais ou no governo, mas na fiel obe-diência às instruções dos go-vernantes. Hoje, entretanto, o país tem dois chefes: o presi-dente Dmítri Medvedev e o primeiro-ministro Vladímir Pútin. Aparentemente, Medvedev seria a preferência mais óbvia dos proprietários de negócios para as próximas eleições pre-sidenciais. Afinal, foi ele quem disse que “liberdade é melhor do que ausência de liberdade”, e pediu às autoridades que pa-rassem de intimidar empre-sários e assediá-los com audi-torias onerosas e duvidosas. Foi também Medvedev quem sugeriu que as sentenças para crimes econômicos fossem atenuadas e quem colocou a luta contra a corrupção como uma das prioridades do go-verno. Além disso, ele jamais direcionou um ataque pesso-al contra qualquer oligarca.

o empresariado e a dobradinha do poder

cracia e da corrupção que, na maioria das vezes, simples-mente ignora as recomenda-ções que vêm de cima, in-cluindo as ordens diretas do presidente e do primeiro-ministro. Nem Medvedev nem Pútin podem mudar o cenário atual sem promover uma reforma e uma reestruturação radical de todo sistema do governo, introduzindo mais concorrên-cia e estabelecendo um Judiciário independente. Nenhum deles tem vontade política – ou as ferramentas

necessárias – para implantar tais reformas.O setor privado talvez se desse melhor se a atual estrutura po-lítica ficasse intacta. Afinal, a disputa entre presidente e pri-meiro-ministro dá aos negó-cios o gostinho de liberdade que nenhum dos dois poderia oferecer individualmente. Mesmo quando se trata de en-cenação, a concorrência esti-mula os membros do governo a superarem um ao outro na tentativa de obter maior apoio dos eleitores. Na verdade, essa dupla não

irá sobreviver após as elei-ções para a Duma (câmara dos deputadas na Rússia), em dezembro, muito menos à eleição presidencial em março. Em breve, descobri-remos quem cairá fora do jogo e quem permanecerá como candidato à presidên-cia. A comunidade empre-sarial, infelizmente, deve desempenhar papel muito pequeno na escolha do candidato.

gueôrgi bovt

historiador

Gueôrgui Bovt integra o par-tido Causa Justa.

Recentemente, contudo, a ad-ministração presidencial dis-cordou da decisão do governo Pútin de aumentar as contri-buições sociais de 26% para 34%.O Kremlin acredita que essa mudança irá sufocar as em-presas e exigiu que o governo encontrasse um meio de re-duzir o imposto. O governo, por sua vez, ignorou comple-tamente o pedido. As partes também não con-

seguem chegar a um consen-so no aumento de 4% do im-posto sobre o lucro, em troca da redução das contribuições sociais para 26%.Enquanto isso, Pútin tem as-sumido uma posição bastan-

te ativa com a categoria nos últimos meses, promovendo reuniões com pequenos e mé-dios empresários e participan-do de fóruns do setor. Considerando seus discursos nessas ocasiões, Pútin soa como um liberal defensor da economia de mercado. Além disso, ele criou uma comissão de economistas liberais de destaque, liderada por Vladí-mir Mau e pelo presidente da Escola Superior de Economia, Iaroslav Kuzminov. Parece que os dois políticos estão promovendo campanhas e tentando emplacar a ima-gem de candidatos solidários às empresas. Então, qual deles seria a melhor aposta para essas instituições?Provavelmente nenhum. Isso porque nem Pútin - tanto no cargo de presidente, como no de primeiro-ministro -, nem Medvedev conseguiram con-ter a corrupção. Os dois se mostraram incapazes de der-rotar – ou até mesmo de domar – o monstro da buro-

apesar das declarações, nem pútin nem medvedev avançaram na proteção ao setor

ian prydecientista político

e historiador

deiter wermuth

the moscow times

na abertura do Fórum Eco-nômico Internacional de São Petersburgo, a minis-tra do Desenvolvimento

Econômico, Indústria e Comércio da Rússia, Elvira Nabiúllina, falou sobre a transferência da liderança global para os mercados emergen-tes, em virtude dos seus altos índi-ces de crescimento e das economias debilitadas e com imensas dívidas dos países desenvolvidos do Ocidente. Muitos investidores ocidentais também concordam com essa ló-gica. Jim O’Neill, economista da Goldman Sachs que inventou a sigla BRIC em 2001, disse, por exemplo, que o termo “mercados emergentes” já está ultrapassado devido ao atual e potencial cres-cimento desses países e ao deslo-camento do poder econômico do Ocidente para o Oriente. Nos úl-timos anos, e em especial desde a crise econômica e financeira mun-dial, “o resto”, portanto, não só afirmou seu desenvolvimento eco-nômico, mas também a sua supe-rioridade moral sobre “o Ociden-te”. E, no entanto, apesar do êxito da China ao longo dos últimos 30 anos, esse país permanece longe de corresponder aos níveis ociden-tais de desenvolvimento, padrão de vida e tecnologia.Não importa o quão rápido possam estar se desenvolvendo, os merca-dos emergentes permanecem dé-cadas e até mesmo séculos atrás das nações mais avançadas. Por de-finição, não são desenvolvidos e con-tinuam fracos no que diz respeito à democracia, ao estado de Direito e à governança corporativa, en-quanto a corrupção e a degradação do meio ambiente imperam sobre seus territórios.Analisando a renda per capita, al-guns continuam pobres ou extre-mamente pobres, e todos enfren-ta m enor mes desa f ios de desenvolvimento. Portanto, embo-ra certamente haja um forte inves-timento e estímulo aos negócios nos mercados emergentes, os padrões ocidentais não serão facilmente atingidos pelos Brics, pelos Próxi-mos Onze, pelos CIVETS ou por qualquer outra sigla de estimação

a velha teoria perpetuada por economias desenvolvi-das de que o livre comér-cio e o livre fluxo de capi-

tais são sempre bons está cada vez mais sob ameaça. Os mercados ge-ralmente produzem os resultados desejados, mas não o tempo todo. No caso da Rússia, tenho cada vez mais me perguntado se algumas restrições ao comércio e os contro-les de capital são, de fato, conve-nientes para a população e o país. Poderia a grande diferença das taxas de crescimento a médio prazo no PIB (produto interno bruto) da China e da Rússia ter alguma re-lação com o controle chinês sobre sua taxa cambial, bem como sobre os fluxos de capital no geral? A eco-nomia chinesa se expande a um ín-dice de quase 10%, enquanto a Rús-sia se arrasta com uma taxa inferior a 5%. A história do sucesso chinês se deve principalmente aos resultados ob-tidos por meio de altos investimen-tos. Com investimentos sobre cerca de 45% do PIB, a taxa da China é pelo menos duas vezes maior que a da Rússia. Isso significa que o

QUe modeLo seGUir? emerGentes ainda não são desenvoLvidos

rússia deve copiar o sUcesso chinÊs

dos banqueiros focados em investimentos.A Rússia é um desses casos. A ar-rogância e o analfabetismo econô-mico do país durante o período de expansão, entre os anos 2000 e 2008, levaram as autoridades a co-meter grandes erros políticos pelos quais o país ainda padece. Quan-do os primeiros sinais da crise eco-nômica global apareceram, Pútin cometeu exatamente o mesmo erro do ministro das Finanças da Ale-manha Peer Steinbrück. Cheios de schadenfreude (palavra alemã usada para designar o sentimento

de prazer pelo sofrimento alheio), ambos os políticos se gabaram de que a crise era um problema dis-tante e meramente anglo-saxão que não afetaria seus países. Ambos não foram capazes de entender que a recessão norte-americana afeta-ria as exportações europeias, que, por sua vez, atingiriam os setores

estoque de capital se eleva com mais rapidez e que quase não há pontos de estrangulamento no sistema de produção. Este, por sua vez, man-tém a inflação em baixa, permite políticas monetárias simples e o crescimento econômico aumenta. Com base nas tendências atuais de 9% de crescimento real, 4% de in-flação e 5% de valorização anual da moeda chinesa em relação ao dólar, o PIB da China vai superar o dos Estados Unidos em apenas sete ou oito anos, quando já será 10 vezes maior do que o da Rússia.

Em 2011, tanto os excedentes chi-neses quanto os russos represen-tarão cerca de 5% do PIB. A dife-rença é que o Banco Popular da China realiza exportação de capi-tal na forma de acúmulo de reser-vas em moeda estrangeira, princi-palmente em dólar, enquanto o Banco Central da Rússia se abs-

de energia e de metal da Rússia, sem falar do setor financeiro mundial. Como resultado desse pensamen-to, a Rússia teve uma lenta reação à crise e perdeu um tempo valioso. Pútin e a Rússia agora reivindicam o crédito por evitar os tumultos de rua em países como Grécia e Es-panha, mas a solução para o pró-prio país, assim como para a China, era puramente ocidental, isto é, o corte de despesas deficitárias.Muito antes da crise, a Rússia ig-norou completamente as advertên-cias sobre a sua economia de alto risco, continuou com seu capitalis-mo de Estado e não conseguiu go-vernar em meio à crescente buro-cracia e corrupção. Moscou, portanto, perdeu sua melhor chan-ce em décadas de diversificar a eco-nomia durante os anos de glória até 2008 e, agora, enfrenta um desafio de desenvolvimento e crescimento ainda maior em um cenário mais crítico e cheio de riscos. Medvedev agora recebe alguns elogios dos in-vestidores por suas iniciativas de reforma, mas, na verdade, muitos dos seus esforços, como o avanço das privatizações ou a retirada de ministros governamentais dos con-selhos das empresas estatais, ape-nas revertem políticas que jamais deveriam ter sido criadas.Quem está de fora geralmente acre-dita que o Estado russo é uma forte instituição, mas a verdade é que, na maioria das vezes, não conse-gue realizar grandes feitos. A re-sistência burocrática, a apatia e a mera incompetência minam diver-sas políticas governamentais e im-pedem o crescimento da nação.

Ian Pryde é presidente do Eurasia Strategy and Communication.

tém de intervir em mercados cam-biais. Suas reservas são mais ou menos constantes, por volta de 500 bilhões de dólares.A implicação disso é que o setor privado da Rússia vai ser um ex-portador líquido de capital de mais de US$ 70 bilhões neste ano. De-vido ao estado precário do estoque de capital do país, não seria me-lhor manter uma parte do dinhei-ro em casa? Desse modo, a oferta de capital monetário aumenta e as taxas de juros reais caem. O esto-que de capital e o PIB irão, assim, crescer a um ritmo mais rápido do que nos últimos anos.É evidentemente mais fácil restrin-gir as entradas de capital que as saídas. A China mantém com êxito as entradas indesejadas de capital externo, enquanto a Rússia enfren-ta o problema oposto: deve traba-lhar para atrair investimento es-trangeiro e, paralelamente, agir contra a fuga de capitais. Existem muitas formas para burlar os con-troles de exportação de capitais. Um método é exportar mercado-rias a preços abaixo do mercado. Outro é importar a preços acima do mercado. Essas diferenças podem então ser aplicadas em con-tas estrangeiras. O esforço admi-nistrativo para acompanhar o fluxo monetário é considerável e vai fun-cionar apenas parcialmente. A longo prazo, é evidente que se trata da melhor estratégia para melho-rar o clima dos negócios internos.A estabilização da taxa de câmbio do rublo também ajudaria, já que as altas e baixas confundem os par-ticipantes do mercado, e os inves-tidores hesitam em investir na Rús-sia, ou, ao menos, exigem recompensas mais altas pelos ris-cos assumidos. Ambos os efeitos r e d u z e m o c r e s c i m e n t o econômico. Uma vez que o valor externo do rublo tem frequentemente varia-do de forma brusca em resposta às também drásticas variações nos preços das commodities, a admi-nistração deveria considerar a ado-ção do modelo chinês – uma taxa de câmbio estruturalmente desva-lorizada e relativamente estável em relação às moedas estrangeiras.Uma grande valorização do rublo na esteira do novo boom de com-modities iria inevitavelmente levar a um grande aumento das impor-tações e, assim, destruir uma parte do sistema de produção doméstica da Rússia. A esse efeito se dá o nome de “doença holandesa”. Se o ine-vitável acontecer e o rublo ceder novamente, as empresas que po-deriam se beneficiar com a melho-ria da competitividade internacio-nal simplesmente não existirão mais.

Dieter Wermuth é sócio da Wermu-th Asset Management.

com arrogância, rússia se gabou de a crise ser um problema distante e perdeu tempo precioso com sua reação lenta

administração deveria adotar modelo chinês de taxa de câmbio desvalorizada em relação às moedas estrangeiras

niyaz karim

dmitry divin

Page 8: Gazeta Russa #8

GAZETA RUSSAWWW.GAZETARUSSA.COM.BREm Foco

RECEITA

Pepinos frescos, embora em conserva

A arte da conserva chegou à Rússia a partir da China, por meio dos tártaro-mongóis, no século 13. Hoje, os pepi-nos em conserva – ou picles – fazem parte da culinária tanto quanto a vodca. Esses dois itens básicos são geral-mente usados juntos para es-timular o apetite dos convi-dados à espera do jantar. Os picles também são um acompanhamento tradicio-nal para muitos pratos típi-cos russos, como o estrogo-nofe de carne. E, assim como os pepinos em conserva são importantes para o início de um jantar no país, o suco de picles ou “rasol” é a base pa-ra o preparo da sopa de le-gumes da maioria dos russos, bem como um eficaz remé-dio para curar a ressaca. Até

pouco tempo atrás, o suco de picles também era usado como um eficiente tônico para pele.A época de plantio na Rús-sia é curta, mas intensa, espe-cialmente no verão, durante as “Noites Brancas”, quando a luz do sol toma o céu por qua-se 20 horas. Essas são as con-dições ideais para o pepino. Nessa época do ano, eles são baratos e abundantes, e en-contram-se a cada esquina. O problema é que, uma vez colhidos, os pepinos apodre-cem muito rápido. A conserva é, portanto, uma solução prática para preservá-los por mais tempo e resolver esse problema.Para quem acha que o legume é um pouco azedo, a opção russa são os pepinos semi-sal-gados, da receita abaixo.

Jennifer Eremeeva

ESPECIAL PARA GAZETA RUSSA

Ingredientes:• 5 litros de água• 2 ½ a 3 quilos de pepinos (quanto menores forem, me-lhor)• 2 ramos grandes de dill fres-co• 1 xícara de chá de sal grosso (kosher ou sal marinho)• 15 dentes de alho descasca-dos e cortados em pedaços• 5 cravos-da-índia• 1 colher de chá de semente de mostarda• 1 colher de chá de semente de coentro• Folhas frescas de carvalho, de groselha ou de cereja. Se não encontrar, substitua por folhas frescas de estragão ou de coentro.• 5 folhas de louro• 1 /8 de xícara de chá de pi-menta do reinoSe preferir os picles levemente picantes, adicione raiz-forte ou lascas de pimenta dedo-de-moça sem sementes

Modo de preparo:1. Lave e esterilize todos os utensílios, recipientes e super-fícies. Lave e enxágue bem as mãos.2. Prepare os pepinos: lave-os com cuidado, descarte aque-les que estiverem machuca-dos e corte ambas as pontas. Mergulhe-os em um recipiente grande contendo água gelada.

3. Ferva os 5 litros de água em uma panela limpa e esteriliza-da, e então dissolva o sal. Está pronta a salmoura. Deixe esfriar até que chegue a uma tempe-ratura um pouco superior à am-biente. 4. Coloque um ramo de dill no fundo do pote e, depois, aco-mode uma camada de pepinos na vertical.5. Despeje a solução de água com sal ainda morna sobre os pepinos até que fiquem com-pletamente submersos. Acres-cente metade de cada um dos demais ingredientes. Coloque uma segunda camada de pepi-nos e, em seguida, adicione os temperos que restaram.6. Despeje o resto da salmou-ra sobre os pepinos, garantindo que fiquem completamente co-bertos pela solução. Darra Goldstein, autora do livro de re-ceitas “A La Russe”, recomenda colocar uma tampa esterilizada sobre os pepinos para que ela exerça pressão sobre a conser-va. Isso vai garantir que os pe-pinos permaneçam submersos durante todo o processo. 7. Cubra o pote com um pano de prato, e coloque-o sobre blo-cos de madeira ou em uma pra-teleira de arame, para permitir a circulação de ar sob o recipiente. 8. Os picles ficarão prontos em dois dias.

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O público do escritor Serguêi Dovlatov pode ter se dissipa-do desde sua morte, em 1990, em Nova York. Mas agora fãs e amigos mais abastados do soviético exilado reuniram-se para transformar em museu seu último lar na Rússia. O objetivo da empreitada é re-avivar o interesse dos leitores pelo trabalho de Dovlatov, es-pecialmente as obras de � c-ção que 25 anos atrás estam-pavam as páginas da revista The New Yorker.A casinha simples na proprie-dade da família do aclamado poeta Aleksandr Púchkin foi paradeiro de Dovlatov em 1979. Antes de deixar a União Soviética, o escritor trabalhou como guia turístico na reser-va � orestal do poeta do sécu-lo 19, no povoado de Mikhai-lovskoie (extremo oeste russo), onde alugou um quarto em uma casa de madeira. Profundamente frustrado com as di� culdades em publicar seu trabalho, Dovlatov vivia na pobreza e atormentado por dívidas. Sua experiência pes-soal como um intelectual fa-zendo bico de guia virou a base do romance “Zapovêd-nik” (“A Reserva Florestal”, 1983), considerado pela críti-ca como uma de suas melho-res obras.

Prestígio estrangeiroMuita coisa mudou desde que Dovlatov viveu na proprieda-de. As “multidões de turistas” que tiravam o autor do sério já se foram. “Sumiram junto com a União Soviética”, diz a gerente de um hotel literário local, Svetlana Kovschirko. Quase todas as casas da re-gião foram compradas por desconhecidos e reformadas, mas a em que Dovlatov viveu

Literatura Casa do escritor que completaria 70 anos em setembro é restaurada e vira memorial

é uma das poucas exceções. Sua estrutura foi mantida por-que os proprietários não ti-nham dinheiro para moder-nizá-la. Quando Dovlatov alugou um dos quartos, a pro-priedade pertencia ao lenha-dor Ivan Fiodorovitch e sua mulher, Elizaveta. O cenário é associado à � cção de “Zapovednik” e também aos planos de emigração do escritor. Apenas um ano de-pois de chegar ali, Dovlatov partiu para encontrar a mu-lher nos Estados Unidos, onde en� m foi reconhecido.Durante os anos 80, ele pu-blicou histórias na The New Yorker e lançou uma suces-são de livros – tristes, irôni-cos e imbuídos de compaixão pelos seres humanos. Uma de suas maiores recompensas foi um comentário do poeta russo e Prêmio Nobel Joseph Bro-

dsky, que disse valorizar a “si-lenciosa harmonia do senso comum” presente no trabalho de Dovlatov.

Descoberto em casaMais tarde, Dovlatov gozou de imensa popularidade em sua terra natal e a expressão “uma história de Dovlatov” passou a denotar um aconte-cimento paradoxal que resis-te aos estereótipos. Os textos dele só chegaram ao leitores russos na década de 1990, de-pois de sua morte. Mas o senso de liberdade presente nas obras encontrou o ambiente certo para ecoar.Há cerca de um ano, um grupo de admiradores adquiriu a propriedade, que se encontra-va em estado deplorável. “Cães vira-latas entravam na casa pelos buracos do chão”, já havia descrito Dovlatov. E a

situação pouco mudou desde que ele deixou o local.Nos anos 1990, o proprietário Fiodorovitch morreu em con-sequência de alcoolismo e Eli-zaveta vendeu a pequena casa para Vera Khalizeva, uma aposentada de Moscou que mandou cobrir os buracosno chão com madei ra compensada. Hoje o piso está afundando e o teto é sustentado por vigas de madeira. Alguns dos obje-tos usados pelo escritor ainda estão presentes: uma cama de ferro, um banquinho de ma-deira e um pedaço de espelho. O papel de parede da década de 1970 continua a revestir o interior da moradia.“Nossa tarefa é preservar tudo que existe ali, substituin-do o que está destruído”, ex-plicou à Gazeta Russa um dos envolvidos na restauração que

Romancista exilado, Dovlatov ganha museu

O romancista posa para foto em frente a um cinema de Tallinn, capital da Estônia, em 1974

Admiradores restauram última morada de dissidente para reacender interesse por sua obra, que vive primeiro impulso na Rússia e começa a ser esquecida nos EUA.

VLADÍMIR RUVINSKIGAZETA RUSSA

não quis ser identificado.“Os investidores são pessoas bem sucedidas que não têm nenhum desejo de lucrar”, ex-plicou o representante dos novos proprietários, Ígor Ga-vriúschkin. Segundo ele, o grupo é motivado “pelo amor e respeito a Dovlatov”. Segundo Gavriúschkin, a ideia é ter a casa ao menos parcialmente reformada até 3 de setembro, data do 70° ani-versário do escritor.Os novos proprietários ainda esperam obter objetos pesso-ais de amigos e parentes do autor. Apesar das boas inten-ções, o próprio Dovlatov tal-vez não aprovasse um memo-rial em sua homenagem. “É sempre assim: primeiro eles acabam com a vida de uma pessoa, e depois começam a ir atrás dos seus pertences”, escreveu ele sobre Púchkin.

Às 6h, coberta de ferrugem e sujeira, a velha estação de trem da pequena cidade de Stári Oskol, de 221 mil habitantes, parece vazia e abandona-da. Mas não para Fiódor Emeliá-nenko, que há muito tempo co-meça seus dia bem ali, com uma corrida de quase dez quilômetros. “Gosto daqui”, diz Emeliánenko. “Tenho minha família, meus amigos e minha aca-demia. Por que deve-ria mudar ?”Em sua velha acade-mia, com sacos de pan-

Perfil Terror do UFC mostra intimidade de homem religioso depois de abandonar o octógono

Lutador russo, que já foi um dos mais temidos do mundo, diz que quer apenas “ser lembrado como um cara normal”.

cada costurados e equipamen-tos ultrapassados, ele parece feliz e em casa.O treinamento do lutador, ape-

lidado pelos fãs de “Último impe-

rador”, inclui exercícios como corri-da, � exões e – o mais es-petacular

parece tranquilo como um monge: sob o som do hino or-todoxo russo e sem expressar emoções, vai direto para o posto. Ele é famoso por sua fé. Quando está em casa, joga xadrez e passa o tempo com as crianças.

Brasileiros no caminhoHá cerca de um ano, Emeli-ánenko sofreu sua primeira derrota para valer, contra o brasileiro Fabrício Werdum. “Aquele que não cai nunca se levanta”, a� rmou o russo de-pois da luta, causando uma tempestade de aplausos da-plateia americana. Mais duas derrotas, para o também bra-sileiro Antônio “Pezão” Silva, e para americano Dan Hen-derson na Strikeforce pare-cem ter colocado um ponto � nal em sua carreira.Ainda assim, com uma série de 27 vitórias e apenas qua-tro derrotas, ele é considera-do um dos maiores lutadores de artes marciais mistas de todos os tempos. Graças a seu trabalho, treinamento pesa-do e generosidade, transfor-mou-se em uma estrela inter-nacional sem perder a identidade ao longo do cami-nho. “Não quero ser lembra-do como uma lenda, mas como um cara normal”, diz.

O adeus de Emeliánenko, o “Último imperador”

Fo-ram

27 vi-tórias e

quatro derro-tas na carreira

MAKAR BUTKOVGAZETA RUSSA

de todos – bater em um velho pneu de caminhão com uma pesada marreta.A família de Emeliánenko mudou-se para Stári Oskol dois anos depois de seu nas-cimento, em 1976, em Rubij-ne, região da União Soviética que hoje pertence à Ucrânia. Após se graduar com honras em uma faculdade de comér-cio, o lutador entrou para o exército russo em 1994. Foi lá que tomou a disciplina e o tra-balho diário como hábitos. Campeão Europeu de Sambô (arte marcial russa) e vence-dor de campeonatos de judô, Emeliánenko partiu em 2010 para o MMA (categoria de artes marciais mistas, na sigla em inglês). Embora seja um lutador ver-sátil, com extrema capacida-de de ataque e excelente guar-da, ele é reverenciado principalmente por sua téc-nica “ground-and-pound”, que consiste em golpear con-tinuamente o adversário no

chão. Suas principais técni-cas de luta são o sambô e o judô. Nenhum dos dois espor-tes de combate são comuns nas artes marciais mistas, já que a maioria dos lutadores trei-nam a vertente brasileira do jiu-jitsu e o muay thai.O início de sua carreira na modalidade ocorreu em uma liga japonesa, e foi marcado por três impressionantes vi-tórias. Também ali teve sua primeira derrota, ocasionada por uma interrupção médica quando seu adversário, Tsuyoshi Kohsaka, deu-lhe uma cotovelada na cabeça, re-abrindo um antigo corte. A primeira luta de Emeliá-nenko nos Estados Unidos, quando derrotou o bicampeão Tim Sylvia em apenas 36 se-gundos, deu início a sua pró-pria rede de promoção de lutas. “O cara é um cavalo. Eu não acho nem que ele seja hu-mano”, disse Sylvia depois da derrota.Ao entrar no ringue, Fiódor

CALENDÁRIO CULTURAL E EMPRESARIAL

MILLIONAIRE FAIR 2011 DE 21 A 23 DE OUTUBRO, CENTRO DE EXPOSIÇÕES MANEJ, MOSCOUFundada em Amsterdã, a fei-ra internacional de artigos de luxo está baseada em Moscou desde 2005. A gama de pro-dutos oferecidos varia desde carros a celulares incrustados de diamantes, passando por iates, joias, relógios e até casas. › www.millionairfair.ru

ATO SOLENE NA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO 30 DE AGOSTO, 19H, NO PALÁCIO 9 DE JULHO, SÃO PAULOAberto ao público, o ato vai homenagear figuras de co-munidades estrangeiras re-sidentes no país, inclusive a russa. O evento, que conta com um espetáculo do ma-estro Alexei Lisounenko com trechos de músicas de vá-rias nações, terá ainda bar-racas de comidas típicas e grupos de música e dança.

www.al.sp.gov.br ›

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Serguêi Dovlatov

Reprovado no curso de Letras (fin-landês) da então Universidade Es-tatal de Leningrado - hoje Estatal de São Petersburgo -, Serguêi Do-vlatov foi designado ao cargo de agente penitenciário durante o ser-viço militar. Sua história como escritor só come-ça de fato com a emigração para os Estados Unidos, em 1979, quando entra para a elite literária local.Até 1989, um ano antes de sua mor-te, era um desconhecido na terra natal. Mas sua popularidade tem se invertido, e seus livros, antes acessí-veis nos EUA, tornaram-se tão raros que hoje são vendidos por mais de US$ 100 no país.

NASCIMENTO: 3 DE SETEMBRO

DE 1941, UFA - URSS

MORTE: 24 DE AGOSTO DE 1990,

NOVA YORK - EUA

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