Fernando Camilher Almeida - PUC-SP
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, CONTÁBEIS E
ATUARIAIS PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM ECONOMIA POLÍTICA
Fernando Camilher Almeida
MÉTODOS PARA ELABORAÇÃO DE UMA AGENDA
COMUM DE DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA
São Paulo
2018
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO, CONTÁBEIS E
ATUARIAIS PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM ECONOMIA POLÍTICA
Fernando Camilher Almeida
MÉTODOS PARA ELABORAÇÃO DE UMA AGENDA
COMUM DE DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como
exigência parcial para obtenção do título de MESTRE
em Economia Política, sob a orientação do Prof. Dr. Ladislau Dowbor.
São Paulo
2018
BANCA EXAMINADORA
___________________________________
___________________________________
___________________________________
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha família, minha esposa Ariane e meus filhos, Fernanda e Heitor,
que sem seu apoio este projeto não seria possível. O excepcional carinho e suporte deles,
nos melhores e piores momentos, me deram forcas para superar obstáculos, encontrar os
melhores caminhos e extrair o máximo dessa experiência.
Agradeço ao Prof. Dr. Ladislau Dowbor pela orientação e por ser uma fonte de
sabedoria, que com seus constantes conselhos muito ampliaram a visão do projeto que
inicialmente eu tinha e aprofundou os temas, sempre contribuindo para o meu
crescimento tanto acadêmico quanto pessoal. Seu exemplo sempre foi inspirador.
Agradeço também aos amigos que fiz no mestrado e aos professores do Programa
de Estudos Pós-graduados em Economia Política da PUC-SP pelo convívio nesses
últimos anos e pelos valiosos ensinamentos, em especial à banca de qualificação, nas
pessoas do Prof. Hoyos e Pamplona, que contribuiram com a inspiração que faltava ao
trabalho.
Cada região é uma região particular e distinta. De sorte que não há “receita de bolo”
simples e unívoca para o “desenvolvimento regional”. Porque não há um único regional, mas inúmeros.
Carlos Águedo Nagel Paiva (2013, p.15)
“Human ordeals thrive on ignorance. To understand a problem with clarity is already half way towards solving it”. “The master-economist must possess a rare combination
of gifts. He must be mathematician, historian, statesman, philosopher—in some degree. He must understand symbols and speak in words. He must contemplate the particular in
terms of the general and touch abstract and concrete in the same flight of thought. He must study the present in the light of the past for the purposes of the future. No part of
man’s nature or his institutions must lie entirely outside his regard. He must be purposeful and disinterested in a simultaneous mood; as aloof and incorruptible as an
artist, yet sometimes as near to earth as a politician”. John M. Keynes (1924, p. 321-2)
“Meditai se só as nações fortes podem fazer ciência ou se é a ciência que as torna fortes.” (Oswaldo Cruz)
MÉTODOS PARA ELABORAÇÃO DE UMA AGENDA COMUM DE
DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL
Fernando Camilher Almeida
RESUMO
Um dos grandes dilemas da nossa sociedade é conseguir crescer e distribuir mais
equanimemente a renda. Uma das soluções para tal dilema aparece na possibilidade de
trabalhar o desenvolvimento da unidade territorial mais próxima dos cidadãos, a cidade
ou o bairro, no caso específico deste trabalho o bairro da Casa Verde em São Paulo,
capital. Para isto foram pesquisados métodos e experiências práticas pelo mundo que
dessem embasamento teórico e prático para o desenho do projeto de uma agenda comum
de desenvolvimento local sustentável. Tal pesquisa evidenciou a necessidade básica de
fomentar a sociedade local para um engajamento cívico, item importante para a
construção de um projeto de desenvolvimento local com sustentabilidade. Tal
engajamento pressupõe que as demandas de cada grupo sejam descobertas, discutidas e
compartilhadas, o que pode ser facilitado com o uso de tecnologias de informação. Nossa
hipótese é que, a partir deste fortalecimento cívico e de um diagnóstico das cadeias
produtivas instaladas, confrontando as expectativas de setores de grande crescimento
previsto para as próximas décadas, é possível coconstruir um projeto de desenvolvimento
para o território. A pesquisa evidenciou ainda que a criação de ecossistemas de inovação,
hoje denominados habitats de inovação, impulsionam a inovação no território. Estes
locais, além de serem áreas de pesquisa e conecção das organizações do território com as
universidades, são locais onde os membros deste ecossistema residem, compram,
pesquisam, desenvolvem, produzem e se divertem, ampliando o contato com a
comunidade e amplificando o potencial de integração. Este projeto se materializa com a
criação de um Núcleo de inovação e conexão do território, núcleo este responsável por
coconstruir um objetivo comum claro, mensurável e transparente de forma que todos
possam perceber a situação atual e evolução do território por meio do monitoramento dos
planos de ação desenhados para gerar uma melhor qualidade de vida.
Palavras-chave: Desenvolvimento Local; Engajamento Cívico Objetivo Comum; Habitats de Inovação.
METHODS FOR THE ELABORATION OF A COMMON AGENDA FOR SUSTAINABLE LOCAL DEVELOPMENT
Fernando Camilher Almeida
SUMMARY One of the great dilemmas of our society is to grow and distribute more equanimously
the income. One of the solutions to this dilemma appears in the possibility of working on
the development of the territorial unit closest to the citizens, the city or the neighborhood,
in the specific case of this work the neighborhood of Casa Verde in São Paulo, the capital.
For this, methods and practical experiences around the world were researched, which
provided a theoretical and practical basis for the design of a common sustainable local
development agenda. Such research evidenced the basic need to foster local society for
civic engagement, an important item for the construction of a sustainable local
development project. Such engagement presupposes that the demands of each group are
discovered, discussed and shared, which can be facilitated by the use of information
technologies. Our hypothesis is that, starting from this civic strengthening and a diagnosis
of the installed productive chains, confronting the expectations of sectors of great growth
predicted for the next decades, it is possible to build a development project for the
territory. The research also showed that the creation of innovation ecosystems, now called
innovation habitats, drive innovation in the territory. These sites, in addition to being
areas of research and connection between the organizations of the territory and
universities, are places where members of this ecosystem reside, buy, research, develop,
produce and have fun, expanding contact with the community and amplifying the
potential of integration. This project materializes with the creation of a nucleus of
innovation and connection of the territory, which is responsible for building a clear,
measurable and transparent common objective so that everyone can perceive the current
situation and evolution of the territory through the monitoring of the plans of designed to
generate a better quality of life.
Keywords: Local Development; Civic Engagement; Common Objective; Innovation
Habitats.
Lista de Figuras: Figura 1 – Multidimensionalidade do Desenvolvimento Sustentável.............................21
Figura 2 – Aplicativo EJ – Disponível também em plataformas móveis........................47
Figura 3 – Francesca Bria em pé conversando com os cidadãos de Barcelona...............78
Figura 4- Reunião com moradores de bairro de Seul, feitos em plena rua......................81
Figura 5 - Relação entre crescimento do PIB Canadense e o CIW................................112
Figura 6 – IPS................................................................................................................113
Figura 7 - Renda no Território da Casa Verde..............................................................123
Lista de Tabelas: Tabela 1- Domicílios Particulares e Permanentes por faixa de renda............................17
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AGT - Agência de Gestão Tecnológica AGE - Agência de Gestão de Empreendimentos AMFRI - Associação dos Municípios da Região da Foz do Rio Itajaí BCD - Barcelona Centre de Disseny BRA - Boston Redevelopment Authority C.E.S.A.R - Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife CIW - Canadian Index of Wellbeing C&T - Ciência e Tecnologia CUF - Cenários Urbanos Futuros DFC - Detroit Future City EC - Economia Criativa EJ - Empurrando Juntos ETS - École de Technologie Superieure FOIA - Freedom of Information Act HT - Hélice Tríplice
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICT - Institutos de Ciência e Tecnologia
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano,
IETS - Instituições de Ensino Técnico e Superior INOVAMFRI - Projeto de inovação do do Gov. Santa Catarina, Parceiros e Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí (Amfri)
IPS – Índice de Progresso Social
QI - Quartier de l'Innovation NITs - Núcleos de Inovação Tecnológica NGPD - Núcleo de Gestão do Porto Digital
ODS – Objetivo do Desenvolvimento Sustentável
OEHR - Escritório de Equidade e Direitos Humanos OS - Organização Social PCR - Prefeitura da Cidade do Recife PIB - Produto Interno Bruto PDI - Programa de Desenvolvimento Industrial PqTec - Parque Tecnológico de São José dos Campos PPNADL. - Projeto Política Nacional de Apoio ao Desenvolvimento Local PNMPO - Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado P&D - Pesquisa e Desenvolvimento RTP - Research Triangle Park TICs. - Tecnologias da Informação e Comunicação QL - Quociente Locacional URA - Urban Redevelopment Authority USP – Universidade de São Paulo VCF - Venture Café́ Foundation
Sumário
Introdução ..................................................................................................................... 13
Cap. 1 – O DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E A
ARTICULAÇÃO DOS ATORES DO TERRITÓRIO. ............................................ 20
1.1 - A Economia e o Objetivo Comum .................................................................... 30
1.2 - Como Colher a Vontade do Território? ............................................................. 38
1.3 - O Conceito de Desenvolvimento Endógeno e Sua Aplicação no Território ..... 49
1.4 – A Melhoria de Produtividade e o Crescimento com Igualdade ........................ 58
Cap. 2 – EXPERIÊNCIAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS DE
ARTICULAÇÃO NO TERRITÓRIO ........................................................................ 66
2.1 – Modelos de Instituições, Experiências Internacionais de Desenvolvimento .... 67
2.2 - Como Fomentar a Inovação e o Formato das Instituições ................................ 83
2.3 - Qual a Institucionalidade que Catalisa o Projeto de Integrar Comunidade e
Inovação ..................................................................................................................... 95
2.4 - O Morador e o Trabalhador do Território como Foco. ................................... 107
2.5 - Indicadores de Qualidade de Vida - Caso Canadense CIW e seus Impactos .. 110
Cap. 3 – A EXPERIÊNCIA DA CASA VERDE: UM PROJETO EM
CONSTRUÇÃO .......................................................................................................... 118
3.1 - Métodos e Atividades ...................................................................................... 118
3.2 – Inovação, Visão e Gestão Compartilhada e o Engajamento Cívico Como Eixos
Centrais .................................................................................................................... 122
3.3 - Parceria com a Área de Educação e Cultura, com Foco no Cidadão .............. 129
3.4 – Potencial Econômico, Desenho Compartilhado de Futuro e Governança ...... 135
3.5 – Crédito e Fomento .......................................................................................... 141
3.6 – Alinhamento Internacional dos Indicadores e Riscos do Projeto ................... 145
CONTRIBUIÇÕES ESPERADAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................... 154
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 156
13
Introdução
Nem todas as histórias que nos contam refletem uma verdade absoluta, como
parecem tratar alguns dos textos tidos como referência na área econômica. Duas histórias
nos contam. A primeira vem do “... neoliberalismo que nos ensina que devemos evitar de
nos intrometer na construção do mundo que nos cerca, porque existe uma ‘mão invisível’,
o mercado, que asseguraria que chegaremos automaticamente ao melhor dos mundos”. A
segunda história “é a da visão ‘estatizante’, que nos assegura que o planejamento central
porá ordem em nossas vidas, simplificação que já foi desmentida pelos fatos”
(DOWBOR, 2016).
Estas duas grandes simplificações ideológicas não nos ajudam a construir um
caminho que de fato melhore a qualidade de vida das pessoas. Afinal temos que começar
a perceber que a soma de eu's jamais produzirá nós, apesar do que prega a teoria
neoclássica. Nossa sociedade é por demais complexa, precisamos nos debruçar sobre um
caminho coconstruído para que de fato possamos alcançar uma sociedade socialmente
justa, economicamente próspera, politicamente democrática, ambientalmente sustentável
e culturalmente diversa.
Esta dissertação busca por foco no Poder Local, na possibilidade de construirmos
conjuntamente em um território as condições de qualidade de vida. Tal objetivo já se
mostrou possível no Canadá, onde, para a formação do índice canadense de bem-estar
(CIW1) eles ouviram a população, distrito a distrito, para perceber na visão de cada
comunidade o que é bem-estar, que mede a vida real para pessoas reais. Começaram com
oito domínios que se concentram nos principais aspectos da vida e os utilizaram para
medir o que realmente importa para os canadenses.
Com este foco vamos trabalhar para deixar clara a diferença entre o
desenvolvimento econômico sustentável e o crescimento econômico puro e simples.
Diferenciar estes dois, crescimento e desenvolvimento econômico, é de vital importância,
uma vez que a grande maioria das pessoas não os distinguem. Isto se deve ao fato que,
em um primeiro momento, o crescimento econômico gerou nos países desenvolvidos um
desenvolvimento econômico conjuntamente.
1 CIW – Canadian Index Wellbeing - https://uwaterloo.ca/canadian-index-wellbeing/. O Índice Canadense de Bem-Estar (CIW) registra mudanças em oito categorias ou domínios de qualidade de vida, incluindo: vitalidade comunitária, engajamento democrático, educação, meio ambiente, populações saudáveis, lazer e cultura, padrões de vida e uso do tempo.
14
Todavia, com o passar dos tempos, as externalidades, que são os aspectos
adjacentes gerados por esta política de crescimento, começaram a demonstrar que este
crescimento não poderia ser sustentado a longo prazo, pois geraria para as futuras
gerações condições de vida inferiores à desta geração, nos aspectos sociais, econômicos
e ambientais. “Foram surgindo evidências de que o intenso crescimento econômico,
ocorrido durante a década de 1950 em diversos países semi-industrializados (entre os
quais o Brasil) não se traduziu necessariamente em maior acesso de populações pobres a
bens materiais e culturais, como ocorrera nos países considerados desenvolvidos
(VEIGA, 2006, p.19).
Se olharmos a história do termo desenvolvimento econômico, vemos em Celso
Furtado, se referindo ao Brasil, inaugurando o termo “mau desenvolvimento”, que seria
uma característica básica do nosso país, “a emergência de uma classe média afluente, em
meio à pobreza, quando não miséria, de praticamente um terço da população, é a
evidência maior do malogro da política de desenvolvimento seguida” (FURTADO, 2004,
p.484).
Buscando diferenciar desenvolvimento de crescimento econômico, o autor afirma
que o crescimento econômico está na base dos interesses da elite privilegiada, sedenta por
modernidade, enquanto o desenvolvimento se caracteriza pelo projeto social que está por
detrás. Os conceitos embora distintos podem andar juntos, contanto que o projeto social
envolvido signifique melhora nas condições de vida da população. Neste caso, “o
crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento” (FURTADO, 2004, p.484).
Esta metamorfose não ocorrerá por si só. Há de existir um planejamento rigoroso
para gerar este cenário. Se não o fizermos e seguirmos a corrente do crescimento
econômico, normalmente gera-se benefícios para poucos, e para muitos miséria,
violência, poluição e desemprego, que se resume em uma degradação social e ambiental
para todos (FURTADO, 2004, p.484).
Crítica relevante merecem os indicadores econômicos, tais como o PIB – Produto
Interno Bruto e a renda per capita. É geralmente a partir destes indicadores que se medem
o desenvolvimento e o crescimento econômico de um país ou de uma sociedade. Quando
os indicadores são defeituosos, essa medição fica comprometida e perde-se a clareza e a
visibilidade sobre o que ocorre no mundo real. Aparentemente pode-se imaginar um
mundo de enriquecimento quando na realidade pode-se estar promovendo um
empobrecimento da sociedade ao destruir sua base natural e os serviços ambientais.
O produto interno bruto (PIB) e sua evolução, conhecida como taxa de
crescimento, tornou-se, em nossas sociedades obcecadas pela medição monetária, um
15
verdadeiro “indicador social”, que é evocado sem que nunca se esclareçam com precisão
seus paradoxos e seus limites. Ele é confundido com a riqueza de um país, embora ignore
o conjunto considerável das riquezas não monetárias e um grande número de atividades
úteis ou até vitais que se tornam invisíveis na medida em que elas não descrevem
movimentos financeiros. Ainda pior, contabiliza positivamente diversas formas de
destruição, desde que elas gerem fluxos monetários de reparação, indenização ou
reposição (VIVERET, 2006).
Os indicadores têm utilização nas gestões públicas e privadas. Acontece que, na
gestão pública, não têm sido utilizados como instrumento de gestão e transparência,
apesar dos esforços muito importantes do IRBEM2. Ao invés disso, utiliza-se de forma
geral indicadores pouco amplos, focando-se no PIB, emprego e renda, que limitam a
compreensão dos problemas, suas causas e possíveis soluções. Na iniciativa privada os
indicadores têm foco no aspecto financeiro e promovem a baixa ou nenhuma medição
dos ativos intangíveis, como conhecimento, inovação e cultura, fundamentais para criar
valor e produtividade. Nas ONG’s não é diferente, raras são as que possuem indicadores
que as ajudem a gerir e a se integrarem com maior sinergia com o território.
Desta forma, é premente que haja uma revisão do conjunto de indicadores
utilizados para medir o real nível de desenvolvimento sustentável e evitar a baixa
compreensão das populações de suas reais condições, permitindo comparações nacionais
e internacionais que ajudem a construir caminhos mais curtos para o desenvolvimento
sustentável, respeitando os desejos das populações locais e o meio ambiente.
Então surge a motivação para esta dissertação: como criar indicadores específicos
de um território que captem os desejos e aptidões das populações locais, cruzá-los com o
potencial e vocação da região, com o objetivo de gerar um aumento da qualidade de vida
englobando renda, saúde, educação e lazer de qualidade, sem com isto destruir o meio
ambiente?
A hipótese deste trabalho é que é necessário criar um objetivo comum
(SENGE,1990), uma visão que seja negociada com todos os membros do território; de
empresários a donas de casa, passando pelos vários poderes públicos e o sistema de ONGs
que já ajudam nas questões do dia a dia. A ideia é ouvir com muita atenção todos os entes
do território para a partir disto e de um amplo debate, ter um conjunto de objetivos claros,
que sejam traduzidos em indicadores e metas, conseguindo com isto uma gestão mais
2 IRBEM- Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município https://www.nossasaopaulo.org.br/portal/irbem
16
transparente e realmente participativa sem exclusão de nenhum dos atores da região,
dando clareza a cada um, com seus indicadores e integrando seus objetivos.
O objetivo geral deste trabalho é construir uma proposta de desenvolvimento
sustentável de um território, ouvindo as vontades e necessidades de todos os moradores e
das pessoas que trabalham na região, fomentando a participação cívica, fundamental para
um projeto que busca a melhoria da qualidade de vida para todo o território, seus
moradores e população flutuante. A partir disto, cruzar vontades com o potencial
econômico instalado, analisar suas cadeias produtivas, trabalhar seus gargalos e seu
potencial futuro, com foco em aproveitar a revolução tecnológica na qual estamos
vivendo, para alinhar as vontades e potenciais às tendências das evoluções setoriais e as
tecnologias exponenciais que prometem um mundo de abundância (DIAMANDINS,
2012), tudo isto monitorado por indicadores discutidos e acordados com todos os
moradores e trabalhadores do território. Para isto o bairro da Casa Verde em São Paulo –
Capital, será utilizado como projeto piloto.
Porque o bairro da Casa Verde? Primeiro porque acredito que, para intervir em
algum território, há de haver uma chamada e um vínculo. Neste caso eu moro em um
condomínio no bairro no qual, apenas nele, moram 3500 pessoas. Tendo participado de
um trabalho que visava a melhoria da qualidade de vida dos moradores do condomínio,
nós em conjunto percebemos que não faria o menor sentido e sequer seria possível
melhorar a vida do condomínio sem melhorar a vida do entorno. Portanto, deste ponto em
diante, ao ler “território” leia-se “bairro da CASA VERDE”.
O segundo e também importante motivo é o fato do bairro da Casa Verde possuir
uma série de indicadores que muito se assemelham aos indicadores do município de São
Paulo, dentre eles o de distribuição de renda nas famílias (tabela 1).
17
Tabela 1- Domicílios Particulares e Permanentes por faixa de renda, Casa Verde e SP
Distritos
Domicílios particulares permanentes
Total (1)
Classes de rendimento nominal mensal domiciliar (salário mínimo) (2)
Até
1/2
Mais de
1/2 a 1
Mais de
1 a 2
Mais de 2
a 5
de 5 a
10
Mais de
10 a 20
Mais de
20
Sem
renda(3)
Casa
Verde 27.035 61 1.176 3.419 8.895 6.714 3.802 1.486 1.475
São Paulo 3.574.286 20.129 225.166 588.778 1.212.485 714.900 380.801 224.798 202.016
% Casa
Verde 100% 0% 4% 13% 33% 25% 14% 5% 5%
% MSP (4) 100% 1% 6% 16% 34% 20% 11% 6% 6% Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010. Elaboração: SMDU/Dipro
Disponível em: http://infocidade.prefeitura.sp.gov.br/htmls/13_domicilios_por_faixa_de_rendimento_em_sa_2010_233.html
(1) Inclusive os domicílios sem declaração de rendimento nominal mensal domiciliar. (2) Salário mínimo utilizado: R$ 510,00. (3) Inclusive os domicílios com rendimento mensal domiciliar somente em benefícios.
Para efetivar este trabalho estão se formando parcerias com os entes do território,
do escritor do livro sobre o bairro, passando pelo empresariado até os times de futebol de
várzea. Chamamos para o projeto também a Universidade de São Paulo (USP), o Centro
Universitário FEI, o Instituto Mauá de Tecnologia (MAUÁ) e a Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP), com foco em montar um laboratório de inovação.
Contamos também com ferramentas de pesquisa como o portal Cidade Democrática e seu
aplicativo de pesquisa e debate “Empurrando Juntos” (EJ) e levantamentos de dados
georeferenciados realizados pela Urban3.
Em suma, a proposta é unir os vários setores do bairro, com foco em melhorar a
qualidade de vida segundo a visão de sua população, atender as demandas a partir de um
grande esforço de utilização e maximização do potencial instalado e de inovações
incrementais, e quem sabe disruptivas, no território. Conjuntamente mostrar a nós
mesmos que podemos inovar em produtos, serviços, na forma como compartilhamos
nosso conhecimento e usamos nossos recursos, em processos e modelos de negócio
(privados e públicos) e em como comunicar para todos as necessidades da região.
Tudo isto para gerar um bairro da Casa Verde que todos queiram morar, seja pelo
baixo tempo que se leva para chegar ao trabalho, pelos equipamentos públicos de
3 Urban Systems – empresa de pesquisa e inteligência de mercado.
18
qualidade ou por possuir empresas e organizações mais produtivas que distribuam seus
resultados de forma mais equânime por todo o território.
Ter no território uma visão compartilhada significa mostrar de forma clara, com
indicadores balanceados e adequados às necessidades do território e das pessoas, como
podem promover uma grande mobilização e um ganho de produtividade e inovação geral
no território, realizando de fato um desenvolvimento sustentável para todo o território e
sua população fixa e flutuante.
Além desta introdução e das considerações finais, este trabalho está dividido em
mais três capítulos. O primeiro capítulo descreve os conceitos fundamentais para o
desenvolvimento local sustentável, como podemos colher a vontade dos vários públicos
do território, a necessidade de um engajamento cívico vigoroso para suportar a construção
de um objetivo comum e se separar definitivamente de visões individuais, que não levam
ao bem comum e ao desenvolvimento do território. Apresenta também como foi possível
aos vários territórios pelo mundo terem o desenvolvimento das suas populações a partir
do entendimento de suas cadeias produtivas e da inovação com agregação de valor, sendo
isto decisivo para a prosperidade (CHANG, 2004, p.80).
No capítulo 2 são descritos as experiências nacionais e internacionais de
articulação no território para permitir construir a institucionalidade que é fomentadora do
desenvolvimento local. Nesse capítulo são analisadas as experiências europeias (Conti,
2017), os casos asiáticos e americanos, e se faz um mergulho no caso canadense (CIW),
muito rico no desenho da diferenciação de crescimento e desenvolvimento econômico,
com exemplos claros da não conexão automática dos dois.
Também são abordados casos nacionais, como o da AMFRI em Santa Catarina,
consórcio de desenvolvimento dos municípios do vale do Itajaí, que com muita
competência desenha e fomenta o desenvolvimento da região. Um olhar também é dado
ao IRBEM, que conseguiu em algumas cidades ser usado como parâmetro de indicadores
de governança e política pública, e em outras simplesmente serviu para cumprir um
compromisso de ter os indicadores, não os fazendo com qualidade ou não os utilizando
para gestão. É também abordado o exemplo de crédito do banco Palmas, com 20 anos de
trabalho fomentando a região via microcrédito e organização comunitária.
No capítulo 3 são descritos os métodos e as atividades previstas no projeto, tendo
como eixo central uma escuta ativa da comunidade, a importância de aumentar a
vitalidade cívica do território, aumentando a compreensão de sua realidade para permitir
um discussão mais aprofundada dos caminhos possíveis à Casa Verde, construindo um
ferramental permanente de comunicação entre a comunidade e o grupo gestor do Núcleo
19
Casa Verde. O grupo gestor terá a função de coordenação e fomento do encontro da
tríplice hélice (poder público local, empresas e universidades) para o desenvolvimento no
território, utilizando para isto o mapeamento dos potenciais econômicos, os potenciais
futuros e um método de desenho de um projeto de desenvolvimento sustentável. Tal
projeto será baseado na visão compartilhada por todos os entes do território, tendo-se
definidos cenários a se atingir em 2022, 2030 e 2050, com o cidadão no foco principal,
representado em objetivos e metas claras, alinhadas com os indicadores internacionais.
Por fim o trabalho encerra-se com a descrição das contribuições esperadas e
considerações finais.
20
Cap. 1 – O DESENVOLVIMENTO LOCAL SUSTENTÁVEL E A ARTICULAÇÃO DOS ATORES DO TERRITÓRIO.
“Se a governança catalítica fosse um barco ela geraria mais resultado pela
direção do que pela força do remo” 4(OSBORNE, 1992, p.25).
Para começarmos, afinal o que é desenvolvimento local?
“Local”, segundo o Dicionário Aurélio (1995), é um adjetivo que indica o que é
“relativo ou pertencente a determinado lugar”, circunscrito ou limitado a uma região. E
pelo senso comum, local surge como o oposto de global ou nacional. “Desenvolvimento”
significa “estágio econômico, social e político de uma comunidade, caracterizado por
altos índices de rendimento dos fatores de produção”.
Neste projeto busca-se um desenvolvimento local com inclusão social, embasado
na cooperação, criação e alargamento de esferas públicas em que diferentes atores
políticos, econômicos e sociais dialoguem de maneira transparente a partir de seus
próprios interesses em conflito (DANIEL, 2002, p.33).
Não nos esqueçamos da grande distinção entre desenvolvimento e crescimento
econômico. A noção de desenvolvimento busca não só a evolução quantitativa da
reprodução da riqueza material, mas também as possibilidades de sua melhor distribuição.
Para Sachs (2004), o crescimento econômico, mesmo em ritmo acelerado, não deve ser
confundido com desenvolvimento. Este último fenômeno só existirá se houver redução
da pobreza e das desigualdades sociais, assim como a geração de novos empregos ou
alternativas de renda para a população. Sachs avança na definição do conceito de
desenvolvimento sustentável acrescentando a dimensão ambiental à sustentabilidade
social (Figura 1).
4 Tradução Livre, Reinventing Government, OSBORNE, 1992, p.25
21
Figura 1 – Multidimensionalidade do Desenvolvimento Sustentável
Fonte: Buarque (2002)
Para termos a visão da importância do território na economia mundial, lembramos
os dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) segundo os
quais 20% do PIB mundial é produzido globalmente, enquanto 80% corresponde à
produção local (POCHMANN, 2007, p.19)
Logo, falar em geração de desenvolvimento em um território nos remete à ideia
de que as pessoas estejam vivendo de uma forma mais prazerosa, com acesso aos bens e
serviços produzidos por aquela sociedade ou importados de outro território, e ninguém
espera que, na sociedade capitalista aos moldes brasileiros, que alguém consiga tal
resultado sem estar empregado ou vivendo em uma família ou território que não tenha
condições de prover renda de forma direta ou indireta. Para este propósito é importante
que entendamos quais os meios para gerar o desenvolvimento sustentável, a começar pelo
investimento.
Muito do que se diz atualmente em matéria de economia e crescimento
econômico, principalmente na mídia e até de maneira hegemônica na academia
mainstream, baseia-se no princípio de que há uma mão invisível no mercado que
consegue ajustar oferta e demanda de bens e serviços, taxa de juros e poupança, tudo
automaticamente, isto claro se nenhum governo perdulário gastar mais do que deve ou
resolver agir alterando as expectativas do ente “mercado”. No entanto isto não reflete o
que realmente acontece no processo real do dia a dia para a decisão de investimento.
Para trabalharmos o desenvolvimento sustentável do território será fundamental
entender como se dá a decisão de investir por parte do lado privado da economia, como
os investimentos públicos no território são realizados e quais seus impactos na vida das
pessoas e das empresas e qual seria o impacto no território de uma organização conjunta
destas duas fontes de investimento. Pretende-se um desenvolvimento sustentável, gerado
22
a partir das potencialidades locais, que propicie um crescimento por uma mão e por outra
distribua os resultados de forma mais equânime sobre o território.
Quando fugimos das respostas fáceis e olhamos como de fato os investimentos
privados se dão, em geral vemos os empresários olhando para a demanda futura de
determinado produto ou serviço e se esta se mostra maior que a capacidade instalada. De
forma agregada, se deduz que no futuro haverá demanda e no presente se faz o
investimento. Esta demanda pode ser tanto de produtos para consumo como produtos para
o próprio investimento. Logo, a decisão de investir é em geral uma decisão tomada no
presente, almejando uma demanda futura prevista de bens e ou serviços de consumo ou
investimento (KEYNES, 1985, pag. 107).
Além disso, é importante considerar a questão alocativa dos investimentos em
diferentes áreas da economia, pois estas alocações produzem resultados diferentes.
Existem setores que o investimento de cada real pode gerar adicionalmente, por exemplo,
R$1,50 na economia, aumentando o multiplicador econômico. Tal multiplicador é
calculado por meio do modelo de Leontief, que permite comparar os multiplicadores de
produção de modo a identificar os setores que mais impulsionariam a economia. A
próxima etapa seria identificar a presença de tais setores no território e analisar suas
cadeias produtivas, demandas e mão de obra, priorizando-os com investimentos
específicos, tendo como uma das consequências possíveis a diminuição do desemprego.
Outro componente da demanda agregada fundamental para o investimento e para
um crescimento sustentável no território é o consumo das famílias, pois o capital não é
uma entidade que subsista por si mesma, independentemente do consumo. Como já
mencionado, o empreendedor olha a demanda futura para seu investimento presente, mas
ele também busca com o investimento ter o direito ao fluxo de rendas futuras que espera
obter da venda de seus produtos ou serviços, enquanto durar esse capital, deduzindo as
despesas correntes.
O resultado desta série temporal de retornos da renda esperada do investimento é
chamado de eficiência marginal do capital, sendo calculada pela taxa de desconto que
tornaria o valor presente do fluxo de anuidades das rendas esperadas desse capital, durante
toda a sua existência, maior que a taxa de juros corrente. Logo o volume de investimento
depende da relação entre a taxa de juros e a curva da eficiência marginal do capital.
Em suma, é fundamental para o investimento sabermos qual é no território a
capacidade e a quantidade de mão-de-obra disponível, a qualidade e quantidade do
equipamento disponível, o estado da técnica, o grau de concorrência, os gostos e hábitos
dos consumidores, a utilidade das diferentes intensidades de trabalho e das atividades de
23
supervisão e organização, bem como a estrutura social, incluindo as forças que
determinam a distribuição da renda no território. Desta forma as chances de atração de
investimento no território aumentam à medida que o território prover melhores retornos
em função da sinergia e agregação de valor por meio de sua infraestrutura, correlação
entre as várias empresas locais, áreas de inovação e escolas.
O crescimento econômico mundial tirou centenas de milhões da pobreza e
melhorou a vida de muito mais pessoas ao longo da última metade do século. No entanto,
a concentração de renda das últimas décadas mostra de forma evidente que um modelo
de desenvolvimento baseado somente no progresso econômico é incompleto.
Uma sociedade que não é capaz de atender às necessidades humanas básicas, de
fornecer às pessoas meios para melhorar a qualidade de vida, proteger o meio ambiente e
oferecer oportunidade para muitos de seus cidadãos não é bem-sucedida. “Devemos
ampliar o entendimento do que são sociedades bem-sucedidas para além dos resultados
econômicos. O crescimento inclusivo requer a obtenção tanto do progresso econômico
quanto do social” (IPS, 2016). Utilizar somente o PIB, indicador usado como mantra pelo
main stream, é inadequado, pois mede apenas o fluxo de uso dos fatores de produção sem
registrar se esse uso é útil a quem beneficia, se tem sido distributivo e que impactos tem
causado ao meio ambiente. Logo, com base somente neste indicador não é possível
construir políticas públicas eficientes (DOWBOR, 2017).
Neste trabalho vamos demonstrar a importância da estrutura e institucionalidade
(destacada na Figura 1) dos territórios para o desenvolvimento sustentável, em função da
estrutura das organizações e sua institucionalidade influenciar no comportamento de seus
membros e da coletividade (SENGE, 2009, p.49).
A forma pela qual uma região trabalha e se engaja civicamente pode ajudar a
determinar, em conjunto com seus recursos, o seu desenvolvimento econômico
(PUTNAM, 2006, l.5945). Se juntarmos o engajamento cívico com uma forma mais
criativa de solução de um problema, que não se resume a eliminar algo indesejado, mas
a criação e realização de algo almejado (SENGE, 2009, p.59), podemos contribuir
fortemente com a mudança da institucionalidade local. E com a criação vem a energia de
sonhos e de visões sobre o que realmente almejamos. Para isto precisamos entender
profundamente e de forma original a realidade. O foco é primar pela criação e não
simplesmente tratar de forma reativa a realidade lidando com os problemas que aparecem
ou estão lá a tempos. O foco é em criar uma nova forma de agir que vá ao encontro das
necessidades, gerando uma nova e melhor forma de viver. O futuro sustentável
necessitará processos de criação coletivos de todos os tipos imagináveis.
24
A exploração e desenvolvimento do potencial das pessoas e das organizações para
criar o futuro, ao invés de reagir ao presente, baseia-se em dois fundamentos que sempre
se situaram no âmago do trabalho de aprendizado organizacional: visão de futuro e
compreensão do presente (SENGE, 2009, p.50). Só existem duas fontes fundamentais da
motivação humana: o desespero e a aspiração. Na falta de orientação criativa, prevalece
o desespero, mas podemos escolher outro caminho.
A estrutura dos sistemas humanos é sutil e se inter-relacionam de forma a
controlar o comportamento de seus membros. Todavia, como dizia Margareth Mead,
“Nunca duvide do que é capaz uma pessoa isolada ou um pequeno grupo de
coconspiradores. Nunca duvide de que um pequeno grupo de cidadãos conscientes e
interessados seja capaz de mudar o mundo. Na verdade, essa é a única maneira de fazê-
lo.”
Para a execução de mudanças significativas em grandes sistemas será necessária
a construção de redes semelhantes, que interliguem as várias organizações e até entidades
de tipos diferentes dentro do território. É um trabalho difícil, exige coragem resoluta,
paciência persistente, requerendo enfrentamento de problemas difíceis. Fatalmente
encontraremos no território a coexistência de muitos pontos de vista, que muita gente
prefere negar ou até evitar as soluções que muitos transferem para terceiros, nos quais
parece que o problema é sempre o outro. Por detrás disto estão as razões para que não
abordemos a solução dos problemas de maneira sistemática, e implementemos os
insighits daí resultantes, porque tal ação, nos forçaria a sair de nossas zonas de conforto
intelectual e institucional, teríamos que necessariamente ser parte da solução dos
problemas, que de forma direta ou indireta ajudamos ou permitimos a existência (SENGE,
2009, p.55).
Com a face humana do pensamento sistêmico, a colaboração, consegue ser bem-
sucedida a capacidade de arregimentação, de modo a reunir as pessoas certas, promover
debates mais abertos e produtivos. Também se requer que a realidade seja vista sobre os
olhos alheios, a fim de melhor compreender o que talvez esteja impedindo outras pessoas
e você mesmo de construir parcerias mais autênticas e produtivas. Por fim, impõe-se
como condição o cultivo de aspirações genuinamente compartilhadas, com as quais todos
os participantes se sintam comprometidos.
Para que este bom cenário se desenhe precisamos cuidar para que nestas
interações com as instituições do território, nos ambientes de negociação, não estejamos
com o foco muito preso nas ideias do passado, onde a polidez dissimulada ou debate
exacerbado são duas faces da mesma moeda, produzindo resultados semelhantes, pois
25
assim todos estariam trabalhando para manter o status quo. Enquanto os grupos
dissimulados evitam questões ameaçadoras, nos grupos exacerbados todos se abrem na
expressão de suas opiniões mas se fecham à mudança de opinião, e não é de nenhuma
destas coisas que precisamos para mudar a institucionalidade do território (SENGE, 2009,
p.248).
Quando bem-sucedidas, as interações no território geram algumas boas
consequências. A primeira consequência que emerge, como denominador comum da
ampla maioria das experiências, é uma nova arquitetura de articulações sociais. Podem
ser parcerias de diversos tipos, convênios entre diversas instituições, consórcios, acordos,
contratos ou até simplesmente um espaço informal de articulação, mas o fato é que o
ponto chave de renovação da governança local é a decisão conjunta, participativa, de
atores que até então agiam isoladamente.
A segunda consequência, diretamente ligado à primeira, é o nascimento de uma
filosofia de busca de equilíbrios dos diversos interesses em jogo. Não se trata mais de
derrotar os outros, de obter sucesso às custas dos outros, mas de somar o máximo de
proveitos para o conjunto. É o jogo win-win, ou ganha-ganha, que podemos encontrar,
por exemplo, em uma experiência de capacitação profissional, na qual ganham as
empresas com a imagem, os jovens com o emprego, os conselhos na sua eficiência de
trabalho e a prefeitura pela visibilidade política da experiência.
Outro ponto importante para a construção de sinergia no território é entender que
uma atividade que funciona representa sempre um ciclo completo. Não adianta formação
profissional se não se gera emprego. Não é suficiente gerar uma incubadora de empresas
se não se cria o mecanismo de crédito correspondente e assim por diante (DOWBOR,
2017).
Fundamentais também são as iniciativas essenciais como a organização de
sistemas integrados de informação local, envolvendo o centro de informação, indicadores
de qualidade de vida, informação gerencial e modernização de arquivos. Informação gera
transparência, e transparência gera empoderamento. Neste quesito é fundamental uma
medição inicial clara dos indicadores do território, principalmente aqueles que se pretende
melhorar. A partir disto poderemos gerar clareza e avaliar a velocidade com que estamos
evoluindo ou não e gerar as alterações ou intensificações nos planos de ação do território.
A comunicação de forma geral é um dos maiores problemas da humanidade,
comunicamos de forma falha os nossos progressos e aprendizados. Muitos territórios
ainda trabalham comunicação como marketing político, outros comunicam mal por
deficiência de organização de informação sistematizada, outros ainda simplesmente por
26
não entenderam que a comunicação é essencial, que faz parte dos direitos fundamentais
do cidadão, o que nos Estados Unidos, por exemplo, se caracteriza como right to know,
direito de saber (DOWBOR, 2000, pág. 49).
Agora precisamos de um road map, um caminho feito pela pactuação de qual
território queremos e quais caminhos seguir para torná-lo real. A construção de agendas
para cidades sustentáveis parece ser o “local” onde há a oportunidade de visualizar a
profunda interconexão dos desafios urbanos e identificar sinergias. Desde a conferência
das Nações Unidas Rio-92, se propõe uma abordagem multi-setorial de desenvolvimento
e um processo amplamente participativo de construção de consensos e cenários futuros,
em regime de corresponsabilidade. A forma da construção, portanto, assume a mesma
importância que o conteúdo das agendas, seu grau de pertinência técnica e de
conhecimento aplicado. Ambos são determinantes para a efetividade dos resultados.
Logo, entender a realidade do território e construir de forma conjunta uma visão
de futuro com um olhar sistêmico é a primeira parte de um desafio que deve desembocar
na confecção final do plano de desenvolvimento do território, que será também o início
de uma trajetória de décadas de realização. Para ser um instrumento vivo, com aderência
na sociedade e poder real de transformação, as agendas de desenvolvimento sustentável
devem ser entendidas menos como um fim em si mesmas e mais como processos, cuja
implementação demanda constante monitoramento e repactuação. E em todas as etapas,
o vínculo entre o poder público e o amplo espectro de partes interessadas precisa ser
continuamente fortalecido, gerando constantes aprendizados.
Vemos então a importância da fase de planejamento, que é frequentemente onde
são fincadas as bases para essa interação dos vários entes do território, buscando
aprendizados em participação, com melhores desenhos e criação de vínculos mais fortes,
que são materializados nas várias iniciativas de construção de agendas de
desenvolvimento sustentável, tanto no Brasil como no mundo, como vamos demonstrar
ao longo do trabalho, trazendo exemplos da AMFRI em Santa Catarina, Portland e Detroit
nos EUA, além das experiências europeias e asiáticas.
Criar uma institucionalidade onde uma gestão ouve e articula diversos interesses
é novo na cultura política do País. A mudança no território deve ter um foco de atuação
para todos os seus membros, componentes do território. A mudança de cultura política
vem ao buscar introduzi-la não apenas nos segmentos mais pobres da sociedade, mas
também nos segmentos privilegiados os quais são frequentemente politicamente mais
atrasados. Buscamos uma articulação social no sentido mais amplo assim como a
modernização da visão geral, na qual todos percebam que melhorar o território impacta
27
positivamente não só aos mais pobres, pois pode gerar efeitos multiplicadores para toda
a comunidade (DOWBOR, 2000, pág. 55).
A gestão social que funciona, ou seja, produz resultados a todos, consiste menos
em saber mandar ou em empurrar um modelo de plano desenhado por alguns iluminados,
do que em saber ouvir e interagir. No resgate da cidadania, e na descoberta do fazer junto,
vem a confiança e a lenta construção da solidariedade social. A força disto vem não
apenas do fato de resgatar a dignidade do excluído, mas do fato de que a perda de
cidadania é de todos nós, e que o processo não consiste apenas em resolver o problema
do pobre, mas em criar outras relações sociais. Há um grande prazer e um entusiasmo
nos relatos de pessoas, das mais variadas camadas sociais, que participaram de um
processo como este, nos vários países do mundo pesquisados. O grande ganho dos
participantes foi reencontrar um propósito ou um prazer em conviver e construir, ou ainda,
simplesmente o seu lugar ao sol, ou à sombra da mangueira, como escrevia Paulo Freire
(DOWBOR, 2000).
Parece claro que os modelos centralizados de gestão não funcionam mais. Não é
crível que uma pessoa ou grupo em Brasília consiga gerar uma política que caiba em mais
de 5.000 municípios no país afora. As áreas sociais e os problemas são melhor resolvidos
com um olhar local, dando prioridade ao que é prioridade em cada território, segundo a
vontade de quem mora e trabalha lá.
Em termos práticos, sabemos que quando ultrapassamos cinco ou seis níveis
hierárquicos, os dirigentes vivem na ilusão de que alguém lá embaixo da hierarquia
executa efetivamente os seus desejos, enquanto na base se imagina que alguém lá em
cima esteja realmente no comando. A agilidade e flexibilidade que exigem situações
sociais muito diferenciadas não podem mais depender de intermináveis hierarquias
estatais que paralisam as decisões e esgotam os recursos. Uma vantagem muito
significativa das políticas locais é o fato de poderem integrar os diferentes setores e
articular os diversos atores (DOWBOR, 2000).
Recursos são também o ponto de partida para uma outra razão de buscar alianças
ou parcerias: a criação de oportunidades de alavancagem. Programas, projetos e
atividades não são estáticos, são processos, e tampouco o mundo dentro do qual eles se
configuram é estático. Existem obstáculos, situações não previstas e oportunidades que,
de repente, se abrem, mas estão fora de alcance. Também temos a busca constante pela
“massa crítica”, que pode gerar o momento no qual sentimos as oportunidades chegarem
finalmente e com um pouco mais de apoio efetivo, conseguirá chegar lá.
28
Desta forma, busca-se a alavancagem social, a utilização de oportunidades e
recursos para fazer mais do que é possível fazer sozinho. Recursos de gestão, de cogestão
e apoios administrativos, vários deles subutilizados no território, são muitas vezes
importantes na alavancagem de um projeto, garantindo um maior impacto e também
recuperando atrasos e resolvendo problemas.
Frequentemente há múltiplos recursos envolvidos nos processos de gestão de
programas, projetos e atividades e uma boa parte deles se manifestam via pessoas. A
câmara de comércio ou uma associação de moradores podem trazer o apoio técnico de
seus membros ou possibilidades de locais para reunião, como também seus membros
podem ser individualmente recursos chave para abrir portas e sinalizar que o programa
ou projeto trata de algo sério e que vale a pena ser apoiado.
Outra razão para buscar alianças e parcerias é que algumas vezes esta razão
é mais visível, outras vezes é mais oculta, mas sempre presente. É uma razão mais substantiva, refletindo em uma ética maior em relação ao “público” e às crenças morais sobre a maneira como a vida social deve ser vivida. Trata-se de uma busca para redefinir e expandir a noção de esfera pública e de interesse público; de ampliar e juntar a ação cívica com a cidadania. Quando um prefeito ou prefeita convence uma empresa local de separar cinco vagas de aprendiz mecânico para os egressos do seu projeto de reinserção social e profissional de adolescentes infratores em regime de semiliberdade, os dois não estão somente concordando na mobilização de recursos ou agindo em interesses próprios. Sem dúvida o prefeito vai ser feliz porque o projeto da Secretaria Municipal de Bem-Estar vai se consolidar um pouco mais e o dono da indústria vai ficar feliz porque o nome da indústria vai aparecer no jornal local. Estes motivos estão presentes e são reais e honestos. Mas há algo além disso: ambos estão trabalhando para ampliar a noção do que é a responsabilidade pública; o que é agir em nome do interesse público (SPINK, 2001, p.147).
O território da Casa Verde tem uma grande vida cívica, organizados desde clubes
de futebol até escolas de samba, só no bairro existem quatro escolas, e há sempre muito
mais organizações presentes em um município do que imaginamos. Vale a pena sempre
fazer um levantamento para reconhecer a contribuição que isso pode representar em
recursos, alavancagem e oportunidades. Esta tem sido a primeira fase do projeto, conhecer
e se integrar às associações cívicas locais, pedindo contribuições para o projeto (SPINK,
2001, p.162).
Outro fator determinante do desenvolvimento é entender as cadeias produtivas do
território, seus gargalos e lacunas, para a partir daí buscar inovações conectadas às várias
realidades locais. Um choque de inovação no território, acompanhado de um
retreinamento da mão de obra local, poderá implicar em uma elevação dos salários e
ganhos de capital. Como Keynes demonstrou, o nível de emprego depende unicamente
29
da demanda efetiva, que será elevada por mais inovação (investimento produtivo), que
gera mais salário, que gera mais consumo.
A inovação pode aumentar a quantidade e melhorar a qualidade dos empregos a
médio e longo prazo, pois conferem aos setores que a empregam maior valor agregado a
seus produtos e serviços e, consequentemente, a possibilidade de pagarem melhores
salários. Todavia, no curto prazo, o impacto da inovação pode não ser tão perceptível de
forma agregada no território. Neste caso, uma das formas possíveis de aumento da
quantidade de emprego é alocar a mão de obra disponível em empregos próximos de suas
casas ou em atividades no território de melhoria de infraestrutura, que normalmente
consegue abrigar mão de obra em maior volume e sem tanta especialização. Tal estratégia
foi implementada em Portland, Oregon, EUA, onde os orçamentos municipais foram
redirecionados para a criação de mais empregos a curto prazo (THE PORTLAND PLAN
PROGRESS REPORT, 2017).
Ainda falando em inovação, ela não precisa ser disruptiva, pois a simples melhora
do processo produtivo pode modificar o custo para qualquer indústria, o que pode estar
parcialmente dependente da produção das demais indústrias fornecedoras. No caso do
projeto aqui apresentado, que busca incentivar as cadeias produtivas instaladas no
território, é útil o conceito de desenvolvimento endógeno, no qual as empresas ampliam
as relações informais entre elas, por meio de contato direto dos empresários e seus
técnicos, subcontratando atividades entre elas, com acordos de cooperação e alianças
estratégicas. Isto possibilita os modernos sistemas de trabalho em rede de empresas,
aumentando suas eficiências e diminuindo seus custos de transação, seguindo uma
estratégia territorial, o que leva à melhoria da competitividade e do posicionamento em
mercados (BARQUERO, 2002, pag. 241).
O desafio que acompanha o projeto de desenvolvimento territorial sustentável é
evitar o colapso da eficiência marginal do capital, ou seja, evitar que setores de baixa
tecnologia, que normalmente dão retornos baixos, desinvestam no bairro, pois há um
forte aumento da preferência pela liquidez quando as taxas reais de juros estão acima da
eficiência marginal, gerando uma fuga das atividades produtivas.
Duas alternativas seriam possíveis para esta questão: 1) aumentar o consumo
agregado por meio de um investimento em infraestrutura no território, com foco no
recrutamento de mão de obra local; 2) aumentar a eficiência marginal do capital por meio
das melhorias das cadeias produtivas e da inovação.
Para o crescimento econômico, o que mais nos convém é reduzir a taxa de juros
até o nível em que, em relação à curva da eficiência marginal do capital, se realize o pleno
30
emprego (Keynes, 1985). No território tal trabalho se faria melhorando as questões de
financiamento com os novos meios de crédito, por meio das novas fintechs, que podem
aproximar as poupanças locais de seu uso em investimentos no território, ou de
cooperativas locais de crédito ou mesmo em determinados pontos mais carentes do
território por meio do micro crédito, por meio de um banco e moeda local a serem criados
a exemplo do Banco Palmas (NESOL -USP -BANCO PALMAS, 2013).
Como vimos acima, o papel das empresas, a articulação das várias instituições no
território, construindo uma visão compartilhada, torna possível um projeto de
desenvolvimento sustentável local. Aumentamos a chance de êxito se buscarmos formas
de financiamento dos investimentos e olharmos para o papel da inovação, sem nos
esquecermos do papel fundamental de entender o ambiente em que propomos um
desenvolvimento territorial sustentável, com foco na melhoria da qualidade de vida e na
visão dos moradores e população flutuante desta região escolhida.
1.1 - A Economia e o Objetivo Comum
Em resumo, a economia funciona movida por quatro motores: as exportações, a
demanda das famílias, as iniciativas empresariais e as políticas públicas (DOWBOR,
2017).
No Brasil, as exportações não constituem nem de longe o principal motor. Os
cerca de 200 bilhões de dólares de exportações, equivalentes a cerca de 700 bilhões de
reais, representam pouco mais de 11% do PIB. Apesar das exportações possuírem um
papel importante por permitirem importar bens e serviços fundamentais para a economia,
a economia brasileira, com uma população de mais de 207 milhões de habitantes e um
PIB de 6,3 trilhões de reais, é prioritariamente vinculada ao mercado interno (IBGE,
2010). Logo, se as dinâmicas internas não funcionam, o setor externo pouco poderá
resolver (DOWBOR, 2017).
Semelhante ao que ocorre no Brasil como um todo, a economia do território estará,
ao menos inicialmente, concentrada no mercado interno, no consumo das famílias, nas
atividades empresariais e nos investimentos públicos em infraestruturas e políticas
sociais. Com a instabilidade internacional gerada por um caos financeiro que não
consegue definir instrumentos de regulação, as soluções para o Brasil aparecem
essencialmente nas dinâmicas internas, compensando com a expansão do mercado interno
a fragilidade das perspectivas internacionais (DOWBOR, 2017). O território tem papel
31
relevante neste quesito, pois as pessoas moram, consomem e investem de fato no
território.
O projeto de desenvolvimento local se coloca frontalmente contra a ideologia do
livre mercado que domina o mundo desde a década de 1980. Nos informaram que, como
nas palavras de Chang:
“... se não interferíssemos, os mercados produziriam os resultados mais eficientes e justos. Eficientes, porque as pessoas sabem como utilizar da melhor maneira possível os recursos que controlam, e justos, porque o processo do mercado competitivo garante que as pessoas sejam recompensadas de acordo com a sua produtividade. Fomos informados de que os negócios deveriam ter o máximo de liberdade possível. As empresas, por estar mais perto do mercado, sabem o que é melhor para os seus negócios. Se deixarmos que façam o que desejam, a criação da riqueza será maximizada, beneficiando também o resto da sociedade. Fomos informados de que a intervenção do governo no mercado frequentemente é concebida para limitar o escopo da criação da riqueza por razões igualitárias equivocadas. Mesmo quando isso não é verdade, os governos não podem aprimorar os resultados do mercado, pois não possuem as informações nem os incentivos necessários para tomar boas decisões de negócios. Em resumo, fomos informados de que deveríamos confiar cegamente no mercado e sair do caminho. Seguindo esse conselho, quase todos os países introduziram uma política econômica de livre mercado ao longo das três últimas décadas, como a privatização de indústrias e instituições financeiras de propriedade do governo, a desregulamentação das áreas financeira e industrial, a liberalização do comércio e dos investimentos internacionais e a redução do imposto de renda e dos pagamentos da previdência social. Essas diretrizes, como admitiram os seus defensores, poderiam criar temporariamente alguns problemas, como o aumento da desigualdade, mas em última análise todos seriam beneficiados pela criação de uma sociedade mais dinâmica e mais rica. A maré ascendente levanta todos os barcos ao mesmo tempo, era a metáfora.” (CHANG, 2015).
Porém para a maioria das pessoas no mundo, as estratégias de livre mercado
geraram um crescimento mais lento, o crescimento da desigualdade, e o aumento da
instabilidade na maioria dos países. Muitos países ricos disfarçaram estes problemas com
uma grande expansão do crédito. Por exemplo, nos Estados Unidos, o fato dos salários
terem permanecido estagnados e as horas de trabalho aumentado a partir dos anos de 1970
foi opacado pelo grande boom do consumo alimentado pelo crédito. Os problemas foram
grandes nos países ricos, mas o maior impacto foi para o mundo em desenvolvimento. Na
África subsaariana o padrão de vida ficou estagnado nas últimas três décadas, enquanto
o índice de crescimento per capita na América Latina declinou dois terços nesse mesmo
período. Nações em desenvolvimento, como a China e a Índia, cresceram rápido neste
período, mas estes foram países que, embora parcialmente liberalizantes, recusaram-se a
introduzir uma política integral de livre mercado (CHANG, 2015).
32
Qual seria então a lógica de se criar um desenvolvimento sustentável no território
da Casa Verde, e onde buscar inspiração? Uma vez que a lógica unicamente pró mercado
não trouxe os resultados prometidos, temos exemplos de outra lógica, a política de
complementar os mercados ao invés de substituí-los. Isto foi o que propiciou o chamado
“milagre do Leste Asiático”, se contrapondo aos dois paradigmas dominantes para o
desenvolvimento, um focado nos mercados e o outro no governo e no planejamento.
Como largamente conhecido, o primeiro teve suas raízes intelectuais na “mão invisível”
de Adam Smith: os mercados levam a resultados eficientes. Tudo que o governo precisa
fazer para promover o crescimento é sair do caminho. O slogan básico é “acertar os
preços”. Se os preços estão certos, todos terão um incentivo para fazer as alocações
corretas de recursos. “Países que seguiram esse mantra acatando todos os conselhos dos
pregadores visitantes do livre mercado, embora tenham aparentemente acertado os
preços, muitas vezes não conseguiram crescer. A exemplo da medicina medieval, havia
a alegação de que o paciente não havia seguido as ordens do médico com precisão, e era
isso que explicava o fracasso do remédio” (CHANG, 2015).
Do outro lado haviam aqueles com pouca fé no mercado e que esperavam que o
governo garantisse, por meio do processo de planejamento, que os recursos fossem
desdobrados de maneira a promover o crescimento econômico. A falta de sucesso dos
países que seguiram esse paradigma levou à virtual extinção dessa escola de pensamento.
O mais interessante a observar é que quase nenhum dos países industrializados de
sucesso seguiu uma dessas estratégias extremas. As economias mistas, nas quais o
governo desempenha um papel importante, geraram melhores resultados, sempre
perguntado qual o papel do estado e como ele pode ser realizado com mais eficiência. O
erro fundamental dos países da antiga União Soviética e dos países em desenvolvimento
que tentavam se basear no planejamento central foi que eles procuravam corrigir as falhas
do mercado substituindo o mercado. Os governos do Leste da Ásia, por outro lado,
reconheceram as limitações dos mercados, mas confinaram o papel do governo.
Trazendo o exemplo para o território, buscamos construir com o projeto uma nova
governança local, um projeto com objetivos comuns que possa, por meio de processos e
medições claras, mas com forte participação dos entes do território, gerar transparência e
focar no que realmente importa para melhorar a vida de todos na região. Afinal de contas
o objetivo é ter um desenvolvimento sustentável econômico, social e ambientalmente para
melhorar a vida dos habitantes hoje sem comprometer a vida das próximas gerações.
33
A importância das Instituições na sociedade.
Nossa sociedade é moldada pelas instituições que foram sendo criadas, das
governamentais às privadas passando pelas mistas, prova disto é que um individuo
sozinho não consegue destruir uma espécie ou aquecer o planeta, fomos fazendo isto
conosco e com o planeta de forma colaborativa, mesmo sem nos darmos conta disto. Se
estamos percebendo que nossas empreitadas coletivas não nos têm levado a uma melhora
na condição de vida da grande maioria da população mundial, temos que melhorar nossas
instituições. Para isto precisamos de mudanças, que advém de uma nova maneira de
pensar, perceber e agir, parafraseando Einstein “Não podemos resolver problemas
seguindo o mesmo tipo de raciocínio que adotávamos quando os criamos”. Embora as
instituições sejam importantes, o funcionamento delas depende da forma como pensamos,
percebemos e atuamos frente aos problemas (SENGE, 2007, p.12).
Precisamos revisar nossas fórmulas de aprender, passamos muito tempo pensando
que devíamos aprender técnicas para melhorar as empresas e instituições por meio de
inovação e criatividade, para que possam servir melhor seus públicos. Todavia para se
criar um mundo sustentável há de se agir de outra forma, precisamos gerenciar, liderar de
novas maneiras para que consigamos criar valor para as necessidades de hoje e de
amanhã. Esta é a forma de como empresas e comunidade podem trabalhar juntas.
“Precisamos de pragmáticos de mente aberta, que se importem com o futuro mas não
acreditem em remendos e nem em respostas superficiais para problemas complexos. Eles
sabem como funcionam suas organizações e sabem que ninguém faz nada sozinho”
(SENGE, 2007, p.12).
Existem problemas que nos assolam coletiva ou individualmente, e percebê-los é
central. Temos que lidar com a diferença gritante de renda no Brasil, um desemprego na
casa dos 13,1% em 20185, a falta de moradia em uma cidade com uma quantidade enorme
de imóveis fechados, sem falar da qualidade do ar que impacta a saúde da população nas
grandes cidades, a escassez de água cada vez mais próxima de todos nós, a destruição da
diversidade de flora e fauna com o sobre consumo destes recursos naturais sem dar tempo
a natureza de se reequilibrar, os problemas de comunicação que nos afastam da clareza
dos reais problemas de cada comunidade. Tudo isto, adicionado às mudanças no mundo
do trabalho e da seguridade social no planeta, constrói um grau de ansiedade em boa parte
5 https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/20995-desemprego-volta-a-crescer-no-primeiro-trimestre-de-2018
34
da população. Todos percebemos grandes desequilíbrios e sentimos a necessidade de
grandes mudanças para lidar com eles (SENGE, 2007, p.17).
Raciocínios Sistémicos
Há de se construir uma visão de conjunto, ou como Senge chama, raciocínio
sistêmico, afinal o todo é maior que as partes quando lidamos com grandes sistemas. Para
lidar de forma mais assertiva dentro do território vamos precisar mudar a mentalidade
local, onde encontramos os atores falando da complicação do sistema e que não
conseguem mudá-lo, para deixar de ver as partes para ver o todo e se sentirem aptos a
agir como participantes ativos nas formulações das soluções locais. Sem isto não se
conseguirá reagir ao presente e criar o futuro.
Para isto precisaremos mobilizar o território e seus atores. Estes por sua vez
precisarão apropriar-se do que se chama de Domínio pessoal, que consiste no
entendimento de seus objetivos individuais, sejam pessoais ou das organizações que
representam, para poderem trabalhar por eles, de forma clara e transparente. A partir
disso, o próximo passo é a construção de um Objetivo comum, uma imagem de futuro
que queremos criar (SENGE, 1990, p. 18). Esta imagem de futuro deve conter os
objetivos, os valores e os compromissos de uma forma bem concreta e, sendo negociada
com todos os entes do território, será legítima, e fundamentalmente não será de uma
pessoa ou grupo, mas de toda a coletividade que ajudou a construí-la (SENGE, 1990, p.
190).
Aprendizado generativo
Para lidarmos com os dilemas do território precisamos sair do aprendizado
adaptativo e irmos para o aprendizado generativo. Normalmente as organizações colocam
mais ênfase no aprendizado adaptativo, que é lidar com o meio, ajustando-se ao que está
em volta. Desta forma, elas estão muito mais voltadas à administração dos sintomas do
que na busca das causas efetivas dos problemas. Instituições adaptativas podem até
acompanhar com agilidade as mudanças do ambiente, mas não inovam, deixando de
atender de forma mais criativa as demandas locais. Com isto têm uma ótima visão do
próximo e imediato, mas perdem de vista o sistema como um todo e as influências sobre
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suas pretensões futuras. Se utilizarmos o que é mais natural, a curiosidade dos indivíduos,
o aprendizado generativo aparece com melhores chances de criação, é como instituições
líderes têm agido. Essas organizações sabem que são parte de um sistema muito maior e
que problemas vão muito além da febre que se manifesta. Apresentado o sintoma, esse
tipo de organização busca pelas causas sistêmicas, procurando atuar sobre elas (SENGE,
1990, p. 215).
Quando as pessoas estão criando um objetivo comum, de forma criativa, que
abarca objetivos de curto, médio e longo prazo, não constroem seus objetivos porque
precisam, mas sim porque querem. Existem duas fontes fundamentais de energia que
motivam a organização: o medo e a aspiração. Cabe aos mobilizadores do território fazer
com que os objetivos se alastrem devido a um processo de reforço positivo, no qual ocorre
um aumento de clareza, entusiasmo, comunicação e engajamento. O processo de
construção dos objetivos pode enfraquecer-se à medida que mais pessoas se envolverem
nele, a diversidade de ideias pode dissipar o foco de concentração e gerar conflitos de
difícil resolução. Para se evitar isto, devemos mapear os objetivos comuns do território
antecipadamente de forma a promovê-los e construirmos uma sinergia local (SENGE,
1990, p. 220).
Se o objetivo comum se tornar um retrato claro do que queremos criar, o que
normalmente é diferente do que temos hoje e usarmos o raciocínio sistêmico para revelar
como criamos o que temos hoje, podemos evitar muitas armadilhas, pois a tendência do
ser humano é repetir seus comportamentos. Ter clareza do que gerou nossos problemas
atuais vai nos ajudar a trilhar novos caminhos, contando com a criatividade local
(SENGE, 1990, p. 225).
Aprendizado em Grupo
Como característica fundamental das equipes pouco alinhadas temos a perda de
energia. Se bem alinhados os objetivos comuns se tornam uma extensão do objetivo
pessoal (SENGE, 1990, p. 212). O alinhamento é uma questão fundamental antes de se
dar poder aos indivíduos e às equipes. Um poder individual alto antes do alinhamento
dificulta a organização e aumenta a confusão.
O grupo precisa aprender a aprender conjuntamente. Preparo individual e talento,
mesmo com um objetivo comum, não levam obrigatoriamente a um aprendizado da
organização. Melhor dizendo, o bom uso do QI coletivo depende de uma conversa franca.
36
Esta dinâmica se dá por meio da diferença entre a discussão e o diálogo, onde no segundo
consegue-se perceber pontos importantes na visão de todos, o que acaba promovendo uma
visão mais ampla do cenário e das soluções possíveis.
Para se construir uma nova institucionalidade que dê conta de forma criativa dos
problemas do presente, serão necessárias três capacidades: visualizar os sistemas,
colaborar para além das fronteiras e construir futuros almejados (SENGE, 2007, p.43).
As redes por elas desenvolvidas moldam o funcionamento do mundo no presente, sendo
então uma das melhores promessas de mudança sistêmica. Estas capacidades devem ser
desenvolvidas em conjunto. Há de haver uma orientação criativa, pois isto ajuda o
genuíno comprometimento do grupo com as visões de hoje e com os objetivos e os
resultados almejados no longo prazo. “Sem capacidade de colaboração, as pessoas não
aprendem a desenvolver a inteligência sistêmica coletiva para lidar com problemas
complexos. Sem a capacidade de visualizar os sistemas e de identificar o próprio lugar
nesses conjuntos mais amplos, os indivíduos e as organizações naturalmente se
concentram em otimizar apenas o seu papel no quebra-cabeça social, ao invés de
promover a compreensão compartilhada”. E sem uma visão mais ampla, não se consegue
apoio e clareza para modificar, o que evita os sistemas no presente a lidar de forma mais
produtiva com as questões do território. Em suma, as três pernas são necessárias para
criação de organizações, de setores e de economias regenerativas (SENGE, 2007, p.44).
O Núcleo Casa Verde não poderá querer determinar direções unilateralmente. No
território devemos buscar o alinhamento dos objetivos dos entes locais para incrementar
as sinergias. Isto fará com que se agregue à instituição cada vez mais membros, gerando
um ciclo virtuoso no bairro.
Economia regenerativa e o futuro do planeta
Nas economias regenerativas pode-se restringir o acesso aos bens de capital
originais de maneira que sua escassez seja evitada. Os defensores dessa teoria vão contra
os princípios neoliberais e propõem em seu lugar que o mercado se autorregule por meio
de relações eficientes e transparentes, isso tudo em conjunto com outros oito princípios
chaves:
1- Relacionamento: estamos em um único planeta, não existe nós e eles, tudo
que fazemos aos outros nos afeta;
37
2- Riqueza holística: a verdadeira riqueza, a material, a social, a cultural e
ambiental deve ser compartilhada;
3- Inovação, adaptação e sensibilidade: devem ser usadas para o bem de todos,
não apenas dos mais fortes (fazendo menção a Darwin);
4- Participação: como o sistema é interdependente, as partes devem procurar a
saúde e o bem-estar dos conjuntos;
5- Honra, Comunidade e Local: deve-se nutrir comunidades e regiões de forma
saudável e resilientes de acordo com a história de cada comunidade;
6- Abundância do efeito de borda: afirma que trabalhar de modo colaborativo
em todas as margens (onde os ecossistemas se encontram) gera aprendizagem
e desenvolvimento contínuo proveniente da diversidade que existe nesses
locais, sendo isto transformador tanto para as comunidades onde os
intercâmbios estão acontecendo quanto para os indivíduos envolvidos;
7- Fluxo circulatório robusto: que busca minimizar os impactos dos sistemas
econômicos, buscando no limite o impacto zero no território, por meio do
aproveitamento dos rejeitos de uma atividade como matéria prima ou insumo
da próxima e ainda reciclando produtos ao final de sua vida útil;
8- Equilíbrio: deve ser sempre buscado o equilíbrio entre a eficiência e
resiliência, colaboração e competição, diversidade e coerência, pequenas,
médias, grandes organizações e necessidades.
Como pode ser visto, a economia regenerativa pode ser de grande valia para um
território se conseguirmos emular alguns países nórdicos que conseguiram criar territórios
de pegada ambiental zero (ou próximo de zero), gerando diferencial competitivo, com
rejeitos de empresas sendo usados como insumos de outras (SENGE, 2007, p.115). A era industrial criou muitas coisas boas como a educação pública, direitos
humanos e bem estar material, pelo menos para alguns, mas trouxe também problemas como a destruição dos ecossistemas, engoliu culturas tradicionais pela homogeneização dos costumes e criou um estilo de vida que não se poderá manter durante muito tempo, principalmente em função de precisar de recursos do equivalente a 6 planetas terra, para prover a toda a população mundial o padrão de consumo californiano. Toda nova fase traz um dilema: proteger os costumes do passado ou participar da criação de um futuro diferente? (Senge, 2007, p.8 e 9).
A forma como atualmente medimos nosso desenvolvimento, baseada no PIB, foi
criada após a 2ª Guerra Mundial, com o propósito de medir o ritmo de reconstrução da
Europa, contabilizando, por exemplo, o uso de cimento e ferro. Para o contexto atual, o
uso do índice não é mais adequado. Utilizar apenas o PIB é como pilotar nossa
38
espaçonave Terra baseando-se apenas em um contador de velocidade sem atentar-se para
o mostrador do tanque de combustível, para saber como estão as reservas, os recursos
naturais (DOWBOR, 2000).
1.2 - Como Colher a Vontade do Território?
A fim de evitar o dirigismo que muitos projetos têm ao tentar impor uma ideia a
um grupo de pessoas ou território, buscamos tecnologias para nos auxiliar na escuta atenta
local. O primeiro passo é fazer um levantamento detalhado da sociedade organizada no
território, com uma aproximação com estas instituições e organizações, desde o
empresariado passando pelas ONG’s locais, clubes de futebol e escolas de samba. Cada
qual desses grupos têm visões sobre o território que podem ajudar profundamente em um
diagnóstico correto e profundo do que aflige a comunidade que trabalha, se diverte e mora
no território.
Além de conversar e entender os problemas na visão dos locais, moradores ou
trabalhadores, precisamos fazer que esta visão do território encontre pontos comuns, pois
é por meio deles que conseguiremos mobilizar com maior facilidade, pertinência e
engajamento. Usaremos aqui o conceito crowdsource, significando um processo onde
uma massa de participantes se organiza para convergir a objetivos comuns. Uma
arquitetura de participação desse tipo é aquela que permite engajar milhares de pessoas
em uma mesma discussão, absorvendo diversos níveis de engajamento (INSTITUTO
CIDADE DEMOCRÁTICA (ICD), 2017).
Se nos utilizarmos de formas de interação nas quais o passado não é o fator
predominante, onde procuramos criar valor sustentável para todos, onde as iniciativas
colaborativas são capazes de produzir inovações estratégicas e podem florescer,
criaremos um ecossistema propício a mudança. Do contrário, a falta de espontaneidade e
a busca de agendas individuais acabarão impedindo inovações significativas.
Essas conversas se iniciam quando pessoas em quantidade suficiente
começam apreciar as maneiras umas das outras encarar a realidade. A primeira fase dessas conversas, a escuta empática, é fácil de adotar, mas difícil de praticar; pois todos nós aferramos de tal maneira as nossas visões da realidade que, em geral, temos dificuldade até em prestar atenção ao que outras pessoas realmente estão dizendo. A segunda fase, de conversas mais profundas e diálogos criativos, pode ser muito diferente das conversas normais sobre negócios. As pessoas falam com franqueza sobre o que é verdadeiro para elas, sem pretensão de que tais verdades sejam universais. Do mesmo modo, aceitam as verdades das outras pessoas. Não há muitas
39
pressões em busca de concordância. Com efeito, desenvolve-se certa confiança de que, ao falarem e ao ouvirem com honestidade, possibilita-se compreensão mais profunda do mundo ou de determinado tema. Aqui que começa o verdadeiro pensamento conjunto (SENGE, 1990, p.50).
A partir do mapeamento dos entes do território e de um primeiro contato de forma
presencial, com o intuito de solicitar a visão daquele grupo ou comunidade para o
território em 2022, 2030 e 2050, constrói-se um laboratório de ideias que serão coletadas
e compartilhadas para se encontrar as sinergias entre elas e entre os diversos grupos locais.
Nesta fase reside um problema central: como sistematizar a informação potencial
de um universo de um território inteiro, que pode chegar no seu limite a mais de 87.000
pessoas? Um caminho fácil seria usar umas das mídias sociais existentes, simplesmente
um grupo de What’sApp ou do Facebook para este trabalho de comunicação e compilação
das ideias. O problema central é que não conhecemos os algoritmos que priorizam,
entregam e aparecem aos membros dos grupos, gerando uma distorção potencial muito
grande.
Então buscamos para esta tarefa o nosso atual parceiro no projeto, o Instituto
Cidade Democrática (ICD), que inspirado pela experiência do LABIC Ibero americano,
desenvolveu uma metodologia de um Laboratório de Inovação Cidadã que se conecta ao
Desafio Ideias (feito presencialmente). O laboratório de inovação cria conexões entre
criativos, empreendedores sociais, ONGs, empresários, pessoas comuns e comunidades
que emergiram dos desafios. O mandato do laboratório é promover e sistematizar a
inteligência coletiva produzida pelo desafio, que é executado por um aplicativo de fácil
acesso e amigável, o “Empurrando Juntos” (EJ). Isso ajuda a articular conhecimentos e
recursos necessários para a prototipação dos desejos da comunidade.
Os desafios de ideias permitem e incentivam as pessoas a produzir diretrizes de
políticas juntas, comunidade a comunidade, segundo suas prioridades e interesses e a
compartilhar preferências entre elas. Isso ajuda a criar um senso compartilhado de
propósito e identidade coletiva, pois as ideias dos vários entes daquela comunidade dentro
do território estarão no futuro breve, via aplicativo EJ, sendo vistos e discutidos por todos
os membros do território, segundo seus interesses e preocupações.
Com as atividades locais de oficinas, entrevistas e mapeamento do que se está
discutindo, criando relevância e pertinência aos membros do território, podemos com o
aplicativo fomentar e aprofundar temas. Isto é conseguido pois o aplicativo EJ tem uma
abordagem algorítmica do feedback de multidões, buscando temas de consenso, que
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possibilitam o surgimento de agendas que normalmente são ignoradas pela mídia, mas de
grande pertinência para o território (ICD, 2017).
O ICD, desde 2011, participou de processos de escuta pública em quinze cidades,
como Jundiaí, Sorocaba e Altamira no Pará, onde a ideia foi criar e experimentar novas
arquiteturas de debate e algoritmos para deliberação em massa, em vez de apenas analisar
as mídias sociais. Isto é fundamental por duas razões principais. Primeiro, o desejo de ser
independente da tecnologia proprietária, pois as plataformas de mídia social não são
transparentes. Em segundo lugar, as plataformas de mídia social não estão focadas em
possibilitar colaborações entre diferentes facções, ou entre o governo e a sociedade para
causar impacto coletivo nas comunidades (ICD, 2017).
O modelo de ação do ICD, que usaremos como base é:
1- INSPIRAÇÃO, onde mobilizar os grupos locais por meio de rodas de
conversa nas instituições locais;
2- PROPOSTAS, nesta fase os diversos públicos colocam suas propostas para o
território na plataforma do Cidade Democrática;
3- APLAUSO, onde todos podem apoiar, votando nos projetos mais
interessantes, independentemente de terem sido propostos por seu grupo ou
instituição;
4- UNIÃO, onde os projetos mais votados são ranqueados e se constroem o
projeto global para o território; o que compõe a fase um e dois, que é a
vontade da comunidade.
As ferramentas e inovações criadas pelo ICD são viabilizadores importantes para
construirmos uma democracia com o DNA do povo brasileiro, que responda, de um lado,
às imensas oportunidades criadas pela web e, por outro, dê conta de aproveitar a grande
energia e disposição de participar do nosso povo para construir um território com
igualdade de oportunidades, sustentabilidade ambiental e justiça social (ICD, 2017). Teoria de Mudança
A teoria de mudança que relaciona empresas, instituições, governos e sociedade
e as trocas entre cada um deles é feita por meio da participação social desejada, que é
aquela capaz de criar e desenvolver espaços infinitamente, sempre que necessário,
imprimindo a dinâmica e a vida que a sociedade tem e distribuindo, ao invés de criar e
institucionalizar, espaços de poder. São processos em que os cidadãos participam da
41
tomada de decisão sobre questões públicas e de interesse geral, ajudando a construir um
território com melhores opções a todos.
O resultado disto vem por meio do fortalecimento do tecido social, das ações
políticas diretas e pacíficas (mutirões etc.), dos investimentos de recursos públicos de
forma priorizada e ajustada ao maior impacto local e no desenho das políticas públicas.
O Instituto Cidade Democrática (ICD) oferece software livres e presta serviços
para que governos e organizações sociais possam criar pesquisas de opinião e
consultas participativas e qualifiquem a tomada de decisão de políticas e investimentos.
O tamanho desse desafio é enorme. A Pesquisa TIC Governo Eletrônico de 2015 revelou
que 96% das prefeituras brasileiras nunca criaram ou disponibilizaram aplicativos
próprios, sendo o diálogo e promoção da participação realizados utilizando basicamente
as mídias sociais.
Travessia para a Democracia em Rede
O desenvolvimento da internet e das TICs aponta para a emergência de uma
democracia em rede que promete, entre outras coisas, protagonismo da sociedade em
relação ao Estado e a distribuição de poder. Nos últimos anos, houve uma explosão de
iniciativas de tecnologias que, de alguma forma, se articulam em relação a essa promessa
que parece ainda não respondida.
Uma das razões, pode ser o fato que, defender um papel protagonista para o
cidadão comum e distribuição de poder é algo que ameaça os interesses de políticos,
partidos e empresas que tem se beneficiado do paradigma autocrático e centralizado por
centenas e talvez milhares de anos. Então estamos cientes de que a missão que temos
diante de nós tomará algum tempo e esforço para ser realizada, assim como está inscrita
na grande transição que estamos todos passando.
Acreditar na máxima da cultura digital de que “tecnologia é mato, o importante
são as pessoas” nos parece promissor para evitar o fetiche da tecnologia por si e a criação
de soluções que não realizam o potencial da arquitetura distribuída da rede, respondendo
ao desafio de consolidar processos de ação coletiva autônoma que levem à distribuição
de poder (PARRA, 2017).
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Ativistas de minorias
É no meio deste amplo debate que nos parece interessante uma aplicação que
distribua poder para ativistas em situação de minoria. Com esta intenção vamos testar no
projeto Núcleo Casa Verde este novo aplicativo que vai aproximar e qualificar o debate
de temas relevantes de maneira a escutar nichos de opiniões, sem oprimir opiniões
diferentes. Dentro da arquitetura do EJ (Aplicativo Empurrando Juntos)”, o nosso ativista
é o autor de uma proposta com apoio representativo no seu próprio grupo de afinidade.
Assim, vamos proporcionar que os ativistas que não concordam com a opinião majoritária
possam abrir um evento e mobilizar diretamente aqueles de seu mesmo grupo de
afinidade.
A tese aqui é a seguinte: estas pessoas têm afinidade de opinião e às vezes relação
de confiança com este ativista. Por isso, estão abertas a um debate informado com ele.
Tal função pode servir para converter opiniões, reforçar a capacidade de mobilização de
minorias e criar um fluxo de informação contra hegemônico. Nossa aposta é que esses
eventos se tornem momentos sincronizados, até mesmo encontros presenciais. O usuário
terá bastante flexibilidade para formatar estes encontros ou bate papos (PARRA, 2017).
A ferramenta EJ, possibilitará tal comunicação pontual e pertinente aos subgrupos do
território, afim de obtermos os vários prismas das vontades e realidades.
Pessoa ponte de diálogo
Opiniões majoritárias podem ser perigosas, pois é o momento em que uma maioria
heterogênea converge para um mesmo fim, uma mesma ideia. Quando este fim é
identificado, atualmente as estratégias de marketing centram fogo e os algoritmos das
redes sociais amplificam seus esforços, entregando a pauta para esta “ideia majoritária”.
Alguns grupos conseguem manter um canal de conversa interna, mas também são
influenciados pela opinião da maioria.
Queremos criar um contrapeso, ou seja, chamar a atenção para “pontes
consensuais” representadas por ideias que concordam com uma opinião da maioria mas
estejam “entre” grupos, com uma afinidade balanceada entre conjuntos distintos de
opinião.
43
Conectar as pontes é uma estratégia para trazer diversidade aos grupos. Como
funciona? Suas mensagens são apresentadas para todos aqueles que concordam com a
opinião majoritária e que sejam de grupos próximos, mas diferentes desta pessoa ponte.
O que significa isso? Apostar que justamente aqueles que têm opiniões complexas
ou contraditórias podem cumprir o importante papel de dialogar com esta maioria
emergente e incluir complexidade e diversidade para que seus membros reflitam. Está aí
o potencial de re-embaralhar os grupos, distender certas polarizações e apresentar
opiniões contraditórias em uma linguagem que viabilize o diálogo (PARRA, 2017).
Criador da consulta
Para que o EJ se torne uma ferramenta capaz de apoiar deliberações e tomada de
decisões por parte de instituições e governos, é preciso que os responsáveis pela
governança da consulta possam se comunicar e mobilizar os participantes e grupos
formados.
Assim, a organização criadora da consulta, no nosso caso o Núcleo Casa Verde,
assim como qualquer outro participante, poderá criar frases que sejam chamadas às várias
discussões, com uma metáfora visual diferente (cor, badges etc.). As mensagens vindas
da organização terão prioridade de apresentação aos usuários (sempre no começo da fila).
A ideia é que estas sejam conteúdos orientadores ou norteadores para a construção de
propostas que ajudem a melhorar as condições do território na ótica das pessoas da região,
procurando encontrar sinergias entre as propostas e fomentando a participação.
Além de poder escrever as frases que aparecerão primeiro aos participantes,
o criador da consulta terá o poder de enviar um PUSH convidando os participantes para hangouts que tenham a temática proposta na consulta. Estes hangouts são momentos de transmissão online (com voz e vídeo) no qual qualquer pessoa pode participar diretamente (inclusive não participantes da consulta) e que terão o objetivo de aprofundar o debate e/ou dar respostas às questões e propostas que emergiram nas consultas. Como exemplo do que o ICD tem encontrado, os Pushs operados pelas instituições públicas, aumentam a incidência nas decisões sobre investimentos públicos (PARRA, 2017).
A utilização de aplicativos de consulta/sonda participativa para identificar pessoas
e temas e que possam ser convidados a deliberações mais estruturadas ou contato direto
com governantes tem sido recorrente por parte de governos, como deixam claro
44
experiências passadas do Gabinete Digital do RS, Dialoga Brasil e a atual do VTaiwan
(PARRA, 2017).
A importância de uma ferramenta digital adequada
Apesar da vontade manifestada por diversos tipos de organizações em oferecer
alternativas para diálogos democráticos na rede, essas experiências em geral não escalam
nem estão gerando resultados com impacto. Por quê? Porque elas ainda partem do perfil
do ativista que tem recursos cognitivos, tempo, motivação e formação para atuar nessas
plataformas. Em outras palavras, a forma com que essas soluções são feitas requer
cidadãos empoderados, que tenham recursos cognitivos ou que já tenham adquirido voz
política por meio de outros processos de participação offline. Elas acabam chegando
apenas à “elite da participação”, ou seja, pessoas que já têm predisposição e tempo de
participar.
Por isso, acreditamos que o desenho da deliberação coletiva deve levar em
consideração o aspecto pedagógico da interação. Para nós, a aposta correta consiste em criar arquiteturas e algoritmos de participação com interfaces minimalistas e dinâmicas, que vamos chamar aqui de arquiteturas de discussão crowdsource, capazes de promover um aumento gradual na energia de engajamento que os participantes podem oferecer em cada momento. O processo é capaz de considerar diversos tamanhos e disponibilidades de participação, e todos os elementos são aproveitados para o resultado. Quase nenhuma informação se perde. (EJ 2017, pag.5)
Um dos grandes problemas para o engajamento é a complexidade do processo,
em algumas plataformas, estabelecendo fases, regras e obrigações que acabam por
diminuir ainda mais o potencial de engajamento, mesmo que a sensação de efetividade
da discussão aumente para aqueles que ultrapassaram a barreira.
Na última década, portanto, parte considerável das iniciativas cívicas e
governamentais se resumiu a arquiteturas pouco inclusivas e com pouco potencial de
engajamento em escala, ao mesmo tempo em que as mídias sociais conquistaram bilhões
de usuários e consolidaram uma lógica de audiência que impulsionou o
novo advocacy mas contribuiu pouco para a colaboração entre Estado e sociedade.
Quem já percebeu estar limitado a uma bolha de opinião com amigos que pensam
igual ou parecido e deixar de estar em contato com a diferença e de debater com o
diferente? Em resumo, quem nunca se sentiu nadando contra uma corrente de
manipulação e medo que acaba dominando a vista das pessoas, sem ter voz para contrapor
45
por estar confinado, sem condições de disputar os fluxos dominantes de informação,
construídos cada vez mais artificialmente (EJ, 2017)?
Junto com a baixa inclusão (tanto de acesso como das altas barreiras
cognitivas das ferramentas cívicas), avaliamos que a questão da polarização/manipulação é um dos principais problemas da democracia digital. O desafio parece estar em desenvolver tecnologias que respondam a duas perguntas. Em primeiro lugar, como dar mais poderes para quem fica em uma situação de minoria cujas mensagens não conseguem visibilidade nas redes sociais, chegando a cada vez menos gente, sendo esmagadas pela avalanche de mensagens manipuladas? Além disso, como permitir que os indecisos sejam informados e possam trazer perguntas e diversidade para a maioria (EJ, 2017)?
Os recentes experimentos conduzidos pelo Instituto Cidade Democrática buscam
o desenvolvimento de tecnologias que respondam a essas questões, superando a
arquitetura complicada e excludente das ferramentas utilizadas pelos governos e trazendo
diversidade para as bolhas de opinião, que alienam as pessoas do debate informado e
prejudicam a capacidade das minorias de comunicarem suas agendas. A metáfora é a dos
freios e contrapesos democráticos, para garantir diversidade ao debate ao impedir que um
só lado domine o fluxo principal de comunicação, como acontece nas principais
plataformas de redes sociais utilizadas (EJ, 2017).
Para efetivar uma democracia em rede, devemos fomentar ações coletivas
autônomas, que respondam aos interesses singulares e a contextos hiperlocais
estimulando o papel de produtor de pautas que cada pessoa pode assumir. No atual
contexto, no entanto, há poucos incentivos para esse tipo de ação encontrar destaque e
repercussão, pois as iniciativas acabam sendo marginalizadas pelas atuais estruturas de
intermediação. Além de estar limitada pela audiência, a ação autônoma traz consigo um
risco adicional de se descolar da realidade dos grandes desafios coletivos, já que é fruto
da reunião de interesses singulares de pequenos grupos de pessoas, podendo se descolar
do que é deliberado, planejado e priorizado pelas instituições políticas (atribuições
constitucionais, eleições, orçamentos, conselhos, conferências, etc.) (EJ, 2017).
Dessa forma, parece necessário que haja um tipo de “cola” entre as agendas
societais oriundas da ação coletiva autônoma e as agendas estatais para as quais já existe
recurso público mobilizado (orçamento público) e que respondem às demandas mais
críticas (indicadores sociais). Quando a ação coletiva autônoma inclui esses dois
diagnósticos na sua estratégia de atuação, aumenta a probabilidade de impacto no
resultado da sua própria ação, levando o Estado a planejar e executar melhor o orçamento
público nas áreas que mais precisam da política.
46
Hoje, tanto os processos de advocacy como os de participação social
implementados pelo Estado e a sociedade civil não têm levado em consideração esses
diagnósticos de evidência, sofrendo pela ausência de impacto e transformação das
instituições. Desenhar processos de participação que dêem escala para fomentar ações
coletivas autônomas em torno dos pontos de interseção entre desejos populares, recursos
públicos existentes e indicadores sociais deficitários parece ser o caminho para resolver
este problema. Além disso, essa opção fornece uma narrativa forte para motivar o
engajamento público em torno de soluções de problemas críticos para os quais há pontos
de contato nas instituições públicas (EJ, 2017).
Para que essa “cola” exista, defendemos a articulação entre as iniciativas de
participação social com iniciativas que mapeiem recursos públicos e privados,
indicadores e dados abertos, apresentando-as por meio de visualização. Por outro lado, a
disponibilização pública, aberta e acessível de informações sobre recursos públicos,
necessidades privadas e indicadores sociais aumenta a efetividade das ações coletivas
autônomas de participação social.
A despeito dos recentes avanços na discussão sobre governo aberto e na mudança
da perspectiva de governo eletrônico para governança digital, o Estado ainda mantém
uma exagerada prevalência na definição dos métodos e tecnologias de participação. Tanto
o modelo de adoção de tecnologias proprietárias como o modelo fechado de produção por
empresas públicas acabam por impor barreiras à participação direta da sociedade na
governança (produção, uso e modificação) de tais tecnologias.
Para atender estas demandas o EJ (Figura 2) foi o aplicativo selecionado para o
projeto Casa Verde, por sua possibilidade de criar por meio das interações dos vários
grupos do território pontos de convergência, um software livre, que permite ouvir e
interagir de forma a propiciar a percepção e a construção de objetivos comuns,
fundamental para gerar o engajamento que o projeto precisa.
47
Figura 2 – Aplicativo EJ – Disponível também em plataformas móveis
Fonte: (ICD, 2017)
O EJ, além de ajudar a construir um objetivo comum, pode ajudar na avaliação de
políticas, programas, serviços ou equipamentos, facilitando correções e resposta aos
cidadãos. Pode também ajudar na formulação de orçamento, políticas e planos setoriais
ou urbanísticos, facilitando decisões coletivas e devolver à comunidade os resultados das
ações implementadas (ICD, 2017).
Para que o processo de conhecimento das demandas locais para o projeto Núcleo
Casa Verde funcione bem, como já dissemos, primeiro precisamos ter entrada e contato
pessoal com cada uma das organizações do território, para em seguida poder
disponibilizar a ferramenta EJ para cada membro de cada comunidade e instituição. Com
isto, a ferramenta de deliberação deve alcançar níveis mais altos de engajamento em
massa na deliberação coletiva livre (próxima fase), onde cada membro pode votar em
propostas de suas comunidades ou de outras e também pode incluir propostas individuais.
Segundo, deve fomentar o engajamento coletivo que supera a lógica de confrontação das
mídias sociais (enxames e campanhas) e possibilitar a colaboração entre as instituições e
a sociedade em relação aos bens comuns. A maneira mais fácil das pessoas poderem
participar de seu mecanismo é apenas lançar uma reação, do tamanho desejado, a um
comentário (proposta) selecionado aleatoriamente de todos os comentários enviados. Esse
tipo de participação pode ser completado em menos de um minuto. De maneira
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progressiva, depois de reagir a um comentário, as pessoas podem continuar reagindo até
que reajam ao último dos comentários ou apresentem sua própria perspectiva como
comentário. Este novo comentário fará parte do painel de comentários e estará disponível
para os outros participantes lançarem suas reações (ICD, 2017).
Todas as informações fornecidas pelos participantes são contabilizadas.
Bons comentários e ideias não serão perdidos em enormes árvores de discussões, mas serão apresentadas como iguais às reações de outros participantes. A arquitetura de discussões utilizada pela pol.is, ferramenta de código livre base do EJ, é chamada “Discussão com Crowdsourced”, diferente da utilizada nos fóruns tradicionais, chamada “Discussão com Threads”. Em uma “Discussão com Crowdsourced” todas as informações fornecidas são utilizadas. Em uma “discussão encadeada” (Threads), como depende da sistematização posterior, parte da informação (às vezes a maior parte dela) é descartada durante o processo. Não estamos defendendo especificamente o abandono da arquitetura "Discussão encadeada", pois achamos que ela ainda é importante para muitas experiências de deliberação, especialmente para grupos pequenos e médios. Mas percebemos que isso representa sérias limitações de engajamento em massa (ICD, 2017).
Outro aspecto desafiador é como promover o engajamento dos participantes em
ações coletivas. O mecanismo pol.is usa algoritmos de aprendizado de máquina para
interpretar a matriz de dados construída pelos comentários e reações das pessoas em
tempo real. Essa matriz é processada de forma que as pessoas possam ser organizadas em
grupos de afinidade com base em como participam de cada comentário. As informações
sobre essas formações de grupo são atualizadas em tempo real e exibidas de forma que as
pessoas possam se movimentar em um espaço físico e tátil para sua tribo. Isso é muito
inovador, já que a interface pol.is fornece um painel democrático e transparente que não
apenas a administração do sistema pode ver, mas todos os participantes ou visualizadores.
Todos podem entender e baixar os dados sobre os grupos que foram formados na
discussão, como cada comentário foi realizado em cada grupo, quais foram os
comentários da maioria dentro de todos os grupos, em que grupo você está e quem são os
outros membros do grupo (ICD, 2017).
O Projeto do ICD é muito aderente ao projeto do Núcleo Casa Verde, mas eles
têm continuado a inovar para resolver problemas que aconteceram com projetos
anteriores, principalmente na fase de desdobramento das ações práticas no território. Para
ser um think and do tank, não basta ser um think tank, precisamos também ser o do tank.
O Cidade Democrática foi bastante bem sucedido em produzir produtos que criam o
diálogo entre a sociedade, instituições e os governos, permitindo a organização de
laboratórios de inovação social, mas o engajamento dos participantes após os resultados
49
do concurso acaba sendo insuficiente. Veremos como outras cidades pelo mundo lidaram
com tal desafio no próximo capítulo.
Além de ver bem mapeada as vontades das populações do território, precisamos
entender como podemos e a partir de onde podemos gerar forte engajamento para um
desenvolvimento sustentável. O conceito de Desenvolvimento Endógeno, na seção
seguinte, nos servirá como base para pensar o potencial econômico instalado e futuro do
território.
1.3 - O Conceito de Desenvolvimento Endógeno e Sua Aplicação no Território
Frente ao novo paradigma de globalização da economia e da sociedade, todos os
mercados foram adquirindo uma dimensão global e o Estado foi cedendo seu papel de
protagonista para as empresas inovadoras, na maioria multinacionais. Tudo isto
viabilizado pelas novas tecnologias de comunicação, informação e transportes que
facilitaram o funcionamento das empresas em cadeias globais (VÁZQUEZ
BARQUEIRO, 2002). Todavia o território tem também sua importância, pois em última
instância é nele que os investimentos ocorrem. Nele é onde ocorre o chamado
desenvolvimento endógeno:
“(...) um processo de crescimento econômico e de mudança estrutural,
liderado pela comunidade local ao utilizar seu potencial de desenvolvimento que leva à melhoria do nível de vida da população. Arocena (1995) acrescenta que se trata de um processo no qual o social se integra ao econômico. A distribuição de renda e riqueza e o crescimento econômico são dois processos que não ocorrem paralelamente. Na verdade, só adquirem uma dinâmica comum pelo fato de os atores públicos e privados tomarem decisões de investimento que visam elevar a produtividade e a competitividade das empresas, solucionar os problemas locais e aumentar o bem-estar da sociedade” (VÁZQUEZ BARQUERO, 2001, p.41).
“O desenvolvimento econômico local pode ser definido como um processo
de crescimento e mudança estrutural que ocorre em razão da transferência de recursos das atividades tradicionais para as modernas, bem como pelo aproveitamento das economias externas e pela introdução de inovações, determinando a elevação do bem-estar da população de uma cidade ou região. Quando a capacidade local é capaz de utilizar o potencial de desenvolvimento e liderar o processo de mudança estrutural, pode-se falar de desenvolvimento local endógeno ou, simplesmente, de desenvolvimento endógeno.” (VÁZQUEZ BARQUERO, 2001, p.57)
50
Neste novo cenário de competição definido entre empresas e territórios foram
sendo introduzidas as inovações, tanto em empresas quanto em organizações. Isto foi
possível também em virtude de uma forma mais flexível de organização da produção.
Neste contexto, cidades e territórios passaram a dar respostas estratégicas aos desafios de
concorrência nos mercados e voltaram a se preocupar com a questão do desenvolvimento,
fundamentalmente no foco do território, buscando aumentar a acumulação de capital a
fim de melhorar o atendimento das necessidades e demandas dos cidadãos (VÁZQUEZ
BARQUEIRO, 2002).
O que determina o investimento no território são os fatores de atração. Não é
somente o incentivo nacional que consegue alocar uma empresa em determinado
território, mas é a possibilidade deste território prover as necessidades de infraestrutura,
capital intelectual, setores instalados, em suma como seus atores locais podem ou não
ajudar a produtividade da empresa ingressante.
O entorno produtivo pode ser determinante para a capacidade concorrencial das
empresas, pois no fundo a divisão internacional do trabalho é um fenômeno urbano e
regional. A melhoria de produtividade e da competitividade das cidades depende da
introdução de inovações nas empresas e instituições do território (VÁZQUEZ
BARQUEIRO, 2002).
Logo o desenvolvimento econômico ocorre em consequência da utilização do
potencial e do excedente gerado localmente, e muitas vezes em função da qualidade do
território, da atração de investimentos externos, que também possibilitam a incorporação
das economias externas ocultas nos processos produtivos.
Para se retirar um território do estado estacionário será necessário ativar a criação
e difusão de inovações no sistema produtivo local, propiciar uma organização flexível da
produção no território, gerando economias de aglomeração e de diversidade com o
fortalecimento das instituições.
A nova dinâmica econômica se caracteriza pelo desenvolvimento de redes
explícitas de colaboração entre as organizações, como são os sistemas produtivos locais,
e fundamentalmente em acordos estratégicos realizados entre as empresas do território.
Por meio destas alianças, que são feitas para desenvolver projetos específicos, de produtos
a processos de produção passando por mercados, as empresas fortalecem a
competitividade e expandem os rendimentos, propiciando à economia local um ganho
competitivo e ao mesmo tempo uma ampliação de renda (VÁZQUEZ BARQUEIRO,
2002).
51
Um grande setor composto de muitas empresas em uma região ligadas horizontal
e verticalmente pode beneficiar-se do crescimento local e ao mesmo tempo beneficiar
cada empresa e o local onde se insere. Essa é em última análise a bandeira das economias
de aglomeração, ou seja, uma atividade vocacionada de uma determinada área pode
beneficiar-se significativamente do crescimento local por meio do fornecimento
especializado em matérias-primas e componentes requeridos, serviços e mão de obra
treinada passível de desenvolver-se na região, agregando habilidades particularmente
úteis ao setor. Um processo compartilhado de informações e a geração de novas
tecnologias, como pretendemos criar através do Núcleo Casa Verde, tendem também a
desenvolver-se naquele espaço geográfico, onde cada empresa se beneficia ao conhecer,
ainda que informalmente, o que está acontecendo com seus competidores e quais as
tendências do setor tornando-se desse modo mais dinâmico e competitivo.
Para que o desenvolvimento endógeno consiga chegar a bom termo é central que
se busque a distribuição da renda no território, pois sem ela o território não conseguirá
gerar a satelitização ou a diversificação produtiva que precisa ser alcançada para obter
uma autonomia crescente. Quanto mais concentrada a renda, menores as chances da
economia periférica superar a monocultura de exportação (no caso de território agrícola)
ou de cadeia produtiva preponderante (no caso de território majoritariamente urbano,
como o nosso) e ingressar em um processo de diversificação produtiva e autonomização
dinâmica. A segunda determinação central da satelitização ou diversificação
autonomizante das economias regionais periféricas é o padrão de encadeamento (grau de
integração vertical) das atividades propulsivas no território (PAIVA, 2013, p.41).
Buscando no município um diagnóstico sobre suas perspectivas de
desenvolvimento e uma estratégia capaz de maximizar o aproveitamento de suas
potencialidades, determinaremos o “território-foco” da análise. Todavia, normalmente
quando o “território-foco” é um município ou um território (parte do município), poucas
vezes ele é o “território-relevante”, entendido aqui como o território cuja dinâmica
determinará as potencialidades e os desafios do foco. Via de regra, quando o território-
foco é um município, o território-relevante é uma região mais ampla. Sendo assim, o
primeiro procedimento de diagnóstico é realizar comparações sistemáticas dos
indicadores do território-foco com os indicadores levantados para seus “múltiplos
entornos” (PAIVA, 2013, p.70-71). Isto provavelmente ocorrerá com o território da Casa
Verde, uma vez que faz limites com dois bairros de forte atração, Santana e Barra
Funda/Perdizes.
52
O ponto de partida do desenvolvimento mercantil de um território periférico é a
identificação de um produto (ou, de forma mais geral, de uma atividade) em que o
território apresenta vantagens absolutas suficientes para se especializar e exportar para
outras regiões. Mas o engate mercantil não é garantia de continuidade do
desenvolvimento. Esta continuidade depende da integração no território dos elos à
montante (fornecedores de insumos) e à jusante (processadores e comercializadores) do
produto-atividade de especialização inicial. Ou seja, é preciso superar o padrão setorial
de classificação e convertê-lo em um sistema de encadeamento. Esta é a condição
fundamental da Análise e do Planejamento de Economias Regionais necessária para que
se avalie o potencial de alavancagem das especializações atuais para desenvolvimento
futuro do território.
A determinação do território-relevante ocorre pela conversão do sistema setorial
de classificação em um sistema de encadeamento. Fundamental para isto na identificação
de cadeias é a segmentação das atividades em “propulsivas” (de exportação, no nosso
caso do território) e “multiplicativas” (voltadas ao mercado interno, de consumo ou
utilização do território) (PAIVA, 2013, p.87).
Apesar das ambiguidades inerentes à classificação por encadeamento, este
sistema classificatório é muito mais relevante para a análise econômica. Primeiro, porque ele revela a especialização efetiva (por trás da aparente diversidade) dos territórios, permitindo a identificação das atividades responsáveis pela geração (e posterior multiplicação) da renda básica. Em segundo lugar, porque ele permite a hierarquização destas cadeias em termos de seu poder de geração de emprego e renda em todos os elos instalados no território, por oposição à geração de emprego e renda apenas no elo central mais evidente. E em terceiro lugar, porque as políticas públicas de enfrentamento dos obstáculos, ou “gargalos” do crescimento regional tendem a ser muito mais eficazes quando incidem sobre cadeias do que sobre atividades não encadeadas (PAIVA, 2013, p.100).
Outros fatores devem ainda ser considerados se o território-foco é um pólo urbano.
Os pólos urbanos têm como uma das principais funções o fornecimento de serviços
relativamente complexos a uma população não domiciliada no mesmo. A canalização da
renda (gerada e apropriada em outro território) para dentro dos pólos se torna uma das
suas principais fontes de “renda básica”. Apesar de terem caráter propulsivo, tais fontes
não podem ser classificadas como “atividades de exportação”. Neste caso, ao invés de se
produzir um bem tradable e vendê-lo em outro mercado, é o agente demandante de
serviço que se desloca até o pólo para usufruir de seu sistema produtivo. Normalmente,
observa-se a dependência das periferias frente aos pólos. Mas os pólos também dependem
(e, de certa forma, em maior intensidade) de suas periferias, pois a renda básica dos
53
primeiros (a demanda por seus serviços) advém da renda básica dos últimos, derivada da
exportação de bens. Logo o crescimento dos pólos é dependente do crescimento de suas
periferias (PAIVA, 2013, p.101).
Também importante é distinguir renda interna e regional. A renda interna de
municípios ou territórios, que contam com sistemas produtivos complexos e de alta
agregação de valor, tende a ser elevada. Mas a renda regional pode corresponder a uma
parcela ínfima da renda interna, caso os agentes que fazem jus a esta renda se encontrem
domiciliados fora do território, pois a renda gerada no território pode ser enviada para o
exterior (para fora do território). De outro lado, municípios pólo capazes de oferecer
serviços de alta qualidade tendem a atrair moradores que auferem rendimentos gerados
no exterior, de sorte que sua renda regional pode ser maior do que sua renda interna. Há
aí, portanto, uma oportunidade de construir infraestruturas atrativas de qualidade de vida
no território que possam atrair estes domiciliáveis de maior renda (PAIVA, 2013, p.125).
O primeiro passo de qualquer estratégia de planejamento é avaliar as atividades e
cadeias “propulsivas”, tendo como ponto de partida: 1) entrevistas com os líderes
empresariais e sindicais das distintas cadeias, com vistas a entender e mapear o potencial
e os obstáculos à integração das mesmas; 2) análise da estrutura final de cadeias similares
que tenham atingido sua maturidade em outros territórios (sejam eles do mesmo país ou
do exterior).
O objetivo desta análise é avaliar se os obstáculos interpostos à integração são
estruturais e intransponíveis ou circunstanciais e passíveis de superação.
Simultaneamente, é preciso avaliar se as principais cadeias propulsivas do território
desenvolveram elos secundários capazes de atomização e qual o potencial de
integralidade das mesmas. A partir da identificação das cadeias com grande potencial de
mercado, que tendem à integração e que estimulam a emergência de elos secundários
geradores de novas cadeias, devem ser mapeados os obstáculos ao seu pleno
desenvolvimento no território e definidas as políticas necessárias e suficientes para a
superação daqueles obstáculos.
No caso do território-foco ser um município ou território pólo altamente
dependente da demanda externa sobre sua rede de serviços, a estratégia fundamental de
crescimento é tríplice:
1) Avaliar as vantagens e desvantagens competitivas do pólo sob análise frente
àqueles municípios ou territórios que concorrem na função de polarização e
definir as políticas eficientes para a alavancagem das vantagens e depressão das
desvantagens;
54
2) ampliar o leque de serviços oferecidos aos não domiciliados, com vistas a
explorar as sinergias inerentes às distintas demandas “turísticas” sobre os
serviços do pólo; e
3) estreitar suas conexões com o entorno por meio da integração à sua estrutura
produtiva de sistemas de beneficiamento e assistência técnica às atividades das
cadeias propulsivas dos municípios e territórios satelitizados.
Não se esquecendo de que é fundamental que os pólos estejam atentos para a sua
relação de dependência vis-à-vis com as demandas oriundas de suas periferias e busquem
contribuir com reflexões e propostas de política econômica voltadas ao enfrentamento
dos obstáculos atuais e potenciais para o crescimento das atividades e cadeias propulsivas
do entorno.
Se o território foco for periférico, a estratégia é dúplice. Em primeiro lugar, é
preciso avaliar o potencial e os obstáculos ao desenvolvimento de suas cadeias
propulsivas e desenvolver políticas de diversificação produtiva quando necessário. Mas,
igualmente importante, é a busca de minimização da evasão de recursos em direção ao(s)
pólo(s) via implantação no próprio território-foco de um sistema básico, todavia eficiente
e qualificado, de prestação de serviços.
Para isto, é muito importante qualificar o comércio local e os sistemas
públicos básicos de educação e saúde. A centralidade do comércio se encontra no fato deste ser o principal “dreno” de rendimentos internos para fora dos territórios satelitizados. E as carências nos sistemas de saúde e educação básica contribuem para ampliar este dreno, pois o cidadão não tem opção se não a de se deslocar em direção ao polo para usufruir de serviços públicos básicos via de regra tende a diluir seus custos de deslocamento aproveitando a oportunidade para usufruir das vantagens de preço e diversificação de centros comerciais maiores. Outra vantagem é que tendo o controle local sobre a educação básica (e, se possível, técnica) permite compatibilizar os sistemas educacionais com as necessidades específicas de qualificação da mão de obra local para as necessidades do território (PAIVA, 2013, p.132).
A teoria de Goldratt enxerga o sistema de priorização de investimentos com base
em gargalos da “teoria das restrições”. Esta última teoria não é mais do que a
generalização do princípio do multiplicador Keynesiano. De acordo com Keynes (e
Kalecki), sempre que a disponibilidade de recursos produtivos (que define a oferta
potencial) supera a demanda efetiva, esta última funciona como o “gargalo” do sistema.
Nestes casos, qualquer ampliação dos recursos à disposição do sistema, mesmo que sejam
de inovações poupadoras de recursos, além de inoperante, seria contra produtiva, pois
ampliaria a capacidade ociosa e desestimularia novos investimentos. O único
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“investimento” capaz de ampliar o fluxo de produto e renda é aquele que alarga a bitola
do gargalo sistêmico, localizado na demanda final. A ampliação desta última é a chave
para ampliar o fluxo global de produto e renda (PAIVA, 2013, p.149).
Ocorre que é virtualmente impossível emergirem atividades propulsivas sem
que emerjam elos à montante e à jusante cujas capacidades são desequilibradas. Em geral, os elos novos são insuficientes para o pleno atendimento das demandas dos elos centrais. Todavia pode ocorrer o oposto: se a escala mínima competitiva de alguns dos elos novos for muito elevada, eles podem apresentar uma capacidade superior aos elos centrais consolidados. Mas o que importa entender é que como regra geral, os distintos elos de uma cadeia produtiva operante em um determinado território apresentam capacidades distintas, apresentam desequilíbrios, e, portanto, apresentam gargalos. Entender e apoiar o alargamento dos gargalos é uma prioridade de interesse para o desenvolvimento do território (PAIVA, 2013, p.151).
A existência de cadeias produtivas no território não é suficiente para a consciência
de que há interesses comuns entre seus distintos elos. Normalmente acontece o contrário,
no primeiro momento a percepção dos conflitos de interesses entre fornecedores, que
afinal estão buscando ampliar seus preços e rentabilidade, e clientes, que a principio
buscam deprimir os custos e melhorar a qualidade dos insumos demandados, tende a se
sobrepor à consciência da unidade estratégica de interesses dos distintos elos. Mas a
Teoria dos Jogos ensina que a recorrência de jogos e processos de negociação tende a
fortalecer a consciência da prevalência dos interesses estratégicos, que estes sim são
comuns, sobre os conflitos imanentes às relações de cada elo com seus fornecedores e
clientes imediatos. Nestes sistemas não existe a possibilidade da cooperação e competição
andarem separados, são denominados “sistemas “coopetitivos”. Um governo, ou no nosso
caso o Núcleo (composto, por governo local, empresários, universidades e comunidade),
consciente das particularidades destes sistemas, deve trabalhar para a constituição de um
sistema de governança da(s) cadeia(s) voltado ao enfrentamento de gargalos e à promoção
de estratégias concertadas, com foco na obtenção de equilíbrios ótimos e de soluções
ganha-ganha. Com isto realizado, praticamente asseguramos os elementos necessários à
superação do “dilema de Hirschman”, que é a crônica dificuldade de priorização de
dispêndios e investimentos pelo setor público em regiões subdesenvolvidas (PAIVA,
2013, p.153).
Para terem melhores condições de desenvolvimento, os territórios devem contar
com um sistema de instituições que permitam gerar bens públicos e relações de
cooperação entre os entes do território que contribuem para o aprendizado e a inovação.
A ideia é que o Núcleo Casa Verde desempenhe este papel, construindo sinergias, por
meio de um objetivo claro e comum que alavanque o território. Importante então que o
56
território construa uma rede de relações envolvendo empresas, instituições de ensino e de
pesquisa, associações empresariais, sindicatos e governos locais. Com isto podem utilizar
de maneira compartilhada os recursos locais e melhorar a competitividade geral.
Em suma a política de desenvolvimento econômico local, endógena, está
associada a uma estratégia de baixo para cima, onde os atores locais têm papel
preponderante na definição, controle e implementação. Nossa ideia no Núcleo é utilizar
formas de organização em rede, para construir uma sinergia, pois isto permite ao território
conhecer e entender a dinâmica do sistema produtivo local e suas instituições, podendo
alinhar iniciativas e executar ações que compõe a estratégia de desenvolvimento do
território. Acreditamos que se estas estratégias forem executadas com foco em prover
também melhores condições de vida à população local, por meio de oportunidades de
maior valor agregado, contribuiremos para um território gerido de forma sustentável
(VÁZQUEZ BARQUEIRO, 2002).
A plena superação do “dilema de Hirschman”, contudo, envolve um último
passo. Este passo não escapa a arguta análise de Goldratt, mas encontra seu pleno desenvolvimento em um trabalho de pesquisa do final dos anos 50. Estamos nos referindo a The Theory of the Growt of the Firm, de Edith Penrose (1959). Neste trabalho, Penrose procura demonstrar que, ao contrário do que supõe o senso comum Ricardiano, os processo inovativos mais bem-sucedidos não estão associados nem a revoluções técnico-científicas nem a investimentos em novos equipamentos. A típica inovação Schumpeteriana está associada ao aproveitamento criativo e inusual de recursos disponíveis que se encontram parcialmente ociosos ou são utilizados de forma subótima, nos sistemas produtivos convencionais (PAIVA, 2013, p.163).
Ora, todo o sistema encadeado tem gargalos. E todo o sistema que tem gargalos,
tem sobras. A outra face do gargalo é a redundância relativa, em maior ou menor grau, de
recursos e equipamentos alocados nos “não-gargalos”, nas “bitolas largas” do sistema. O
processo inovativo mais eficaz, de maior rentabilidade por unidade de dispêndio é aquele
que dá aproveitamento econômico original a recursos cuja mobilização envolve
“dispêndio próximo de zero”. Neste ponto chegamos ao cerne do programa de
desenvolvimento regional de base endógena (PAIVA, 2013, p.173).
Como regra geral, os exogeneistas defendem que as regiões periféricas não
podem arcar com os elevados custos dos investimentos, sejam em equipamentos ou infraestrutura, e das inovações, que normalmente estão ligadas a custosas pesquisas básicas geradoras de inovações tecnológicas disruptivas, custos estes que seriam necessários à promoção do desenvolvimento de qualquer território. Já a teoria endógena procura demonstrar que o ponto de partida do desenvolvimento regional não pressupõe necessariamente investimentos pesados, podendo se basear no aproveitamento dos recursos do território que definem “a sua” vantagem absoluta, ou talvez vantagens (dependendo do que for encontrado). É claro que esta lógica tem
57
suas limitações, todavia este ponto de partida será eficiente desde que o território alcance integrar verticalmente parcela expressiva da cadeia produtiva articulada à montante e/ou à jusante de seus elos originais. Ao longo do processo de encadeamento, surgem gargalos e redundâncias. Os investimentos efetivamente necessários à ampliação do fluxo de renda são tão somente aqueles que se dirigem ao alargamento dos gargalos. E o fluxo de renda regional, desde que o sistema produtivo se encontre sob controle dos domiciliados no território, deve ser suficiente para financiar estes investimentos indispensáveis (PAIVA, 2013, p.179).
O processo de crescimento do território, contudo, não fica restrito ao
fortalecimento dos elos fracos e alargamento dos gargalos. Os não gargalos são parte
fundamental do processo, mas a mobilização dos recursos redundantes dos não gargalos
não pressupõe investimentos pesados, pelo contrário. Os investimentos chaves estão no
centro do processo definitivo de diversificação produtiva do território, pois enquanto a
diversificação se restringir ao processo de encadeamento, integração vertical, ela não
suprime a dependência do território das vendas de um único ou de uns poucos produtos.
Mas a diversificação por integração vertical é apenas o ponto de partida
natural e mais simples, pois se volta ao atendimento de uma demanda local previamente estabelecida, da diversificação produtiva regional. A diversificação efetivamente superadora da hiper-especialização que caracteriza os momentos iniciais do desenvolvimento periférico depende do aproveitamento dos recursos subutilizados dos não-gargalos para o atendimento de outras demandas externas. Se estes momentos forem aproveitados as cadeias evoluem para sistemas em rede e se avança em direção a arranjos produtivos e sistemas produtivos locais de crescente complexidade. O desenvolvimento regional endógeno assentado em atividades X propulsivas6, cadeias regionais e arranjos produtivos locais são momentos distintos de um único processo. Esta relação só não é auto-evidente porque inúmeros processos ficam truncados pela especialização do território em atividades X propulsivas de cadeia curta. E em sistemas de cadeia curta, nem emergem gargalos, capazes de articular o esforço coletivo em prol de sua superação, nem emergem equipamentos redundantes em não-gargalos, que são as bases “naturais” da diversificação horizontal e da constituição de arranjos produtivos locais (PAIVA, 2013, p.155).
O sistema padrão de classificação de atividades econômicas é o setorial. No
entanto, este sistema de classificação não leva em consideração quaisquer informações
sobre as cadeias produtivas. E vejam que isto não é gratuito pois, como regra geral, as
empresas surgem para atender determinadas demandas, porém sua base tecnológica e
produtiva permite o atendimento de outras e diversas demandas. E é justamente a
diversificação das relações de fornecimento a base da inovação para Penrose. E, como
6 Há três tipos de cadeias propulsivas: as exportadoras (X Propulsivas), as baseadas em transferências governamentais (G Propulsivas) e as baseadas na oferta de serviços a agentes não domiciliados (TrS Propulsivas)
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tal, é a base do crescimento do lucro e do crescimento da firma. Assim, o correto seria
criar e manter uma classificação das empresas por suas relações de clientela. No entanto,
enquanto a classificação setorial envolve tão somente o resgate dos dados
disponibilizados no processo de concessão do alvará de funcionamento da empresa, a
classificação proposta envolve uma nova e custosa pesquisa, marcada pela
transitoriedade, uma vez que inovação e o crescimento da empresa pressupõem a
diversificação crescente dos laços de clientela e do número de cadeias das quais a empresa
participa (PAIVA, 2013, p.156).
O desenvolvimento econômico de forma sustentável e endógena pressupõe que
possamos transformar a sinergia potencial, que já existe no território, em sinergia real, o
que fará a produtividade de todos os agentes do território crescerem. Um objetivo comum
acordado é fundamental para manter a tendência de sinergia do território.
1.4 – A Melhoria de Produtividade e o Crescimento com Igualdade
Usando o modelo de centros de pesquisa profissional, o projeto aqui proposto
busca concretizar o sistema de inovação no território por meio da criação de uma agência
de desenvolvimento, inovação e um coworking, para trazer fisicamente ao território um
ponto de encontro de todos os entes locais, empresas, ONGs, universidades, poder
público, sociedade organizada e o público em geral, com suas demandas de melhorias e
ou inovação, o qual chamamos de Núcleo Casa Verde.
Para as empresas do território, os riscos do projeto são o impacto da destruição
das tecnologias antigas, o que demanda o retreinamento dos trabalhadores e o
reequipamento das firmas, processo este muitas vezes difícil e oneroso, mas como vimos
na seção anterior, há opções. Os perdedores no processo de inovação são os trabalhadores
que não conseguem se retreinar e as firmas que não conseguem se reequipar.
Queremos com o projeto reverter o quadro do Brasil ter um maior número de
pesquisadores alocados na universidade e não nas empresas, além de serem
predominantemente públicos os investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D).
Observa-se que o volume alto de patentes depositadas por ICTs (Institutos de Ciência e
Tecnologia) não se reflete no incremento dos indicadores de transferência de tecnologia
e na inovação propriamente dita. As atividades de transferência de tecnologia, as quais
resultam em licenciamentos e geração de novos negócios, permanecem como um desafio
59
para a atuação dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) brasileiros, talvez até pela
pouca maturidade da maioria deles. Torkomian et al (2016) argumentam, todavia, que,
embora o foco de muitos dos NITs brasileiros seja proteger tecnologia ao invés de
transferi-la para a empresa, há uma quantidade significativa de instituições engajadas em
transferência de tecnologia que já apresentam importantes resultados dessa atividade.
A tecnologia muda não só a estrutura produtiva como a sociedade e as instituições.
Por isto um estudo claro de cada subdistrito do bairro da Casa Verde será fundamental.
Quando estivermos promovendo a inovação tecnológica no território, temos que levar em
consideração as instituições, os estágios dos vários negócios e a cultura sócio-
institucional local para que os impactos positivos sejam maiores que os possíveis
problemas a serem criados com a evolução do território. Além disso, há de se priorizar as
necessidades específicas de cada subdistrito. Por exemplo, colocar semáforos inteligentes
onde não há esgoto não resolve as principais necessidades daquela sub-comunidade.
Todo o processo que se busca desenvolver no território da Casa Verde tem como
foco a melhoria de qualidade de vida na visão dos moradores e população flutuante do
bairro. O primeiro desafio será justamente entender este território nas esferas técnico-
econômica e sócio-institucional para identificar qual a governança a ser constituída e
gerar uma visão compartilhada de todos os interessados.
Há um papel decisivo do crédito na difusão da inovação radical, e o capital
“ocioso”, financeiro, que é capaz de assumir grandes riscos, pode ser parceiro destas
iniciativas. Havendo no território, ou fora dele, a falta de oportunidades rentáveis na
velha tecnologia pode levar o capital a financiar projetos de novas trajetórias de inovação,
assumindo mais riscos, desde que tenhamos no Núcleo Casa Verde área que consiga
conectar as pontas, da necessidade de mercado, dos empresários interessados em atender
a demanda, a tecnologia disponível ou passível de desenvolvimento, juntamente com os
detentores de capital com apetite pelo risco inovativo.
O fundamental para que o projeto funcione é que possamos utilizar o modelo de
Hélice Tríplice (HT), que é composto pelo governo, universidade e empresas. Ter as
universidades desempenhando papel central, por vezes ligadas a institutos, no Brasil
como a Embrapa, na Alemanha como as Fraunhofer, é um dos modelos que mais têm
facilitado a inovação. No território, o que pretendemos é imolar as melhores práticas
destes e de outros institutos do Brasil e do mundo para tornar nosso projeto Núcleo Casa
Verde um piloto de qualidade de desenho e execução (CARLOTA PEREZ, 2002).
A atual era das TICs (as Tecnologias de Informação e Comunicação) tem
favorecido a participação das pequenas empresas. Todavia o P&D profissional é
60
fortemente concentrado nas firmas grandes. Por exemplo, nos EUA a esmagadora maioria
do P&D está concentrado nas empresas com mais de 5000 funcionários. Logo, sem um
apoio de uma política local de inovação imitando os P&D das grandes empresas, há pouca
possibilidade agregada de grandes saltos do território.
Se trouxermos as vantagens das empresas menores no processo de inovação
(motivação, menores custos, flexibilidade, rapidez da tomada de decisão) para dentro de
uma estrutura compartilhada de inovação, diminui-se as desvantagens, como dificuldade
de acesso a financiamento, dificuldade de lidar com a regulação e falta de capacidade
administrativa especializada. Desta forma, poderemos ter um impacto sistêmico de
inovação no território.
No território encontraremos várias realidades, logo não poderemos desconsiderar
as mudanças incrementais como se fossem fenômenos de pouca importância, pois são
muitas vezes as inovações menores que definem as trajetórias produtivas das inovações
radicais. Ainda, as inovações incrementais servem de acumulação de conhecimento,
antecedendo inovações radicais, ou servem de mecanismo de difusão das inovações
radicais.
O processo de aprendizagem é praticamente indissociável das mudanças
incrementais. O aprendizado está escrito ou evidenciado em rotinas (codificadas ou
tácitas) que, a rigor, definem a própria firma. As firmas são organizações que aprendem
e inscrevem esse aprendizado em rotinas e os codificam.
Existe uma co-evolução das tecnologias e das instituições. O avanço tecnológico
depende da mudança institucional. Logo é importante a existência de instituições
favoráveis à tecnologia em questão. Além disso é necessária uma instituição com
tecnologia física e social (dimensão coletiva) que acorde e coordene as iniciativas
inovadoras (NELSON 1994), que será justamente o papel do Núcleo Casa Verde na
coordenação dos agentes econômicos e na construção de sinergia estratégica.
Fator decisivo na política de desenvolvimento sustentável do território será como
pretendemos lidar com a propriedade desta inovação, qual a forma de compartilhar, quais
as contrapartidas que serão solicitadas, as empresas ou organizações que terão acesso a
ela. Duas estratégias semelhantes para permitir que uma empresa tenha acesso à
tecnologia e ou contratos dos governos (no nosso caso compras governamentais
regionais), uma em Portland (2017) outra no Japão (STIGLITZ, 1996), foi exigir que a
empresa em questão apresente uma diferença máxima de dez vezes entre o menor e o
maior salário na sua organização. Isto força uma distribuição de renda e uma diminuição
da desigualdade no território.
61
Em suma, parece claro que para construir o desenvolvimento sustentável local
não podemos prescindir de uma boa coordenação e, dentre as várias políticas, a utilização
da melhor maneira das parcerias com os órgãos de estado, a criação de projetos que
permitam a estabilidade do funding e a utilização da flexibilidade institucional que o
Núcleo Casa Verde pretende incorporar.
Parece claro que uma iniciativa como a do Núcleo Casa Verde está em
consonância com a teoria que fundamenta a inovação nos seus aspectos chave e que foi
utilizada por muitos países como ferramenta de desenvolvimentos sustentável e
distribuição mais equânime dos benefícios à população como um todo.
Para isto precisaremos combater uma questão institucional que dificulta a
inovação e a conexão dos centros de pesquisa e universidades às empresas, que é a
obsessão pelos detalhes e pela forma pela qual as coisas devem ser feitas com o dinheiro
público, regulando tão rigidamente o processo e todos os inputs de forma a ignorar os
resultados (OSBORNE, 1992, p.14).
Como dissemos anteriormente, as melhorias de produtividade devem levar em
conta as questões das cadeias produtivas e seus gargalos, para que possamos acompanhar,
projetar e planejar a dinâmica econômica do território. A regionalização pertinente será a
que resgata e diferencia as determinações da dinâmica econômica regional, que são:
1) o número, a distribuição espacial e a taxa de crescimento das atividades
propulsivas em um dado território;
2) o padrão de distribuição, absorção local e destinação da renda do território;
3) as características técnicas das atividades e cadeias produtivas que
impulsionam (ou circunscrevem) o adensamento e complexificação das
cadeias propulsivas regionais e sua transformação (ou não) em Arranjos
Produtivos Locais; e
4) a capacidade das lideranças empresariais e dos trabalhadores que atuam nas
atividades (e/ou cadeias; e/ou APLs) propulsivas e multiplicativas de
reconhecerem os desafios interpostos ao desenvolvimento do território e
articularem os instrumentos necessários à superação dos mesmos.
62
A importância da participação cívica para crescer e distribuir os ganhos
Em um projeto como o do Núcleo Casa Verde, conforme descrito anteriormente,
é central que haja a distribuição de renda no território como forma de manter a
sustentabilidade e o desenvolvimento do território, e não simplesmente manter a roda da
economia girando. A distribuição de renda permite manter um ambiente onde as pessoas
percebam o resultado do esforço de organização necessário feito até então para melhorar
o bairro. É fundamental que o resultado não se concentre no território em meia dúzia de
privilegiados, pois do contrário a sinergia sistêmica pode desaparecer antes de colher
todos os frutos do projeto.
Como investigado empiricamente, por Putnam (2006), o êxito de um governo
democrático depende de quão próximo seu meio se acha do ideal de uma “comunidade
cívica”, na qual a cidadania se caracteriza primeiramente pela participação nos negócios
públicos e implica em direitos e deveres iguais para todos. Esta comunidade se mantém
unida por relações horizontais de reciprocidade e cooperação, e não por relações verticais
de autoridade e dependência. Logo associações locais têm mais chance de progredir,
sendo fundamental agir fora do interesse do núcleo familiar para desenvolver o território.
Há governos regionais mais eficientes simplesmente porque neles há maior participação
cívica. A ligação entre comunidade cívica e desenvolvimento econômico é em si mesma
interessante e importante para a construção de um projeto coletivo no território
(PUTNAM, 2006, l. 2751-2752).
O bem-estar social como fim e o econômico como meio
Para se melhorar o balanço sistêmico, como Celso Furtado já chamou de
“rentabilidade social”, devemos ter claro que “se só medimos a produção podemos ser
levados a achar que o progresso é privado e o setor público um ônus. Quando avaliamos
de maneira sistêmica os resultados para a sociedade no seu conjunto, podemos ter uma
visão inteligente do progresso real obtido. (...) A construção de sistemas mais realistas de
avaliação do nosso progresso econômico e social vem corrigir uma deficiência estrutural
da ciência econômica.” (DOWBOR, 2000)
Uma busca interessante, que têm sido preocupação de pesquisadores, é um novo
sistema mais próximo dos sistemas naturais, onde “todos os resíduos alimentam outros
sistemas” conforme fala Buckminster Fuller (SENGE, 2007, p.8). Buscamos com isto o
63
Progresso Social, que segundo a organização Social Progress Imperative (SPI) “é a
capacidade de uma sociedade em satisfazer as necessidades humanas básicas dos seus
cidadãos; estabelecer os elementos essenciais que permitam às pessoas e às comunidades
melhorar e manter sua qualidade de vida; e criar as condições para que todos os indivíduos
atinjam pleno potencial”.
Para se perceber que a visão da comunidade é fundamental para uma mudança
trazemos o exemplo de Detroit, EUA, que para a viabilização de seu projeto de longo
prazo de criação da visão de Detroit Future City (DFC) de amplo e multifacetado espaço,
foram necessárias abordagens inovadoras para enfrentar os desafios de propriedade e
financiamento, dada a escala do espaço aberto previsto e as restrições fiscais da cidade.
Esses desafios não deviam impedir que as partes interessadas da cidade buscassem
ardentemente uma rede de espaço aberto robusta e integrada que apoie a estabilização e
o crescimento da cidade, oferecendo oportunidades de geração de receita e melhora da
qualidade de vida, saúde e ecologia da cidade. O relatório criado pela comunidade e
técnicos contratados e da prefeitura, forneceu uma visão geral de diversos modelos de
propriedade e mecanismos de financiamento para a reutilização de espaços abertos em
larga escala e de longo prazo que podem informar a DFC e outros líderes de Detroit ao
embarcarem em um abrangente processo de planejamento de espaço aberto. Afinal a
cidade tinha literalmente quebrado e sua população despencou nos últimos anos, era
fundamental reconverter bairros inteiros semiabandonados em espaços que construiriam
o futuro almejado por Detroit.
Assim, podemos desde olhar as carências locais e trabalharmos com os recursos
subutilizados no território, até definirmos uma base de produtos e serviços que
“exportamos” para outros territórios ou cidades, onde a economia passará por um
processo de diversificação por meio da internalização de atividades voltadas ao
atendimento das demandas de consumo da população local que será tão maior quanto
melhor distribuída for a renda e a riqueza no território . Fica cada vez mais claro que o
processo comporta opções e decisões políticas e estratégicas endógenas que podem
impactar a todos no território, e que a participação das decisões de forma clara e
transparente podem fazer toda a diferença para uma distribuição mais equânime da renda
e dos resultados da estratégia (PAIVA, 2013, p.45).
A conclusão do modelo é que, mesmo se a especialização inicial circunscrever a
integração vertical da cadeia produtiva e a emergência de novos produtos de
“exportação”, desde que a segunda etapa, diversificação de consumo, tenha sido levada
suficientemente longe, a região contará com recursos financeiros e humanos suficientes
64
para planejar e administrar a diversificação de sua pauta exportadora a partir da
identificação de alternativas com maior potencial propulsivo de longo prazo (PAIVA,
2013, p.45).
No livro Chinas Economy, fica claro como a descentralização e agregação de
valor no conjunto gerou o equilíbrio, que conseguiu construir políticas juntando o setor
público, os interesses empresariais privados e os grupos internacionais, que em última
instância assegurou o sucesso do conjunto. Formou-se uma arquitetura diferente de poder
e de gestão, aparentemente mais equilibrada do que as nossas economias ocidentais, que
nas últimas décadas têm pendido a um único lado da balança, sem gerar benefícios
igualmente distribuídos, muito pelo contrário.
O autor Kroeber faz prova de um bom senso impressionante: “Em qualquer país
os verdadeiros inimigos na luta por uma prosperidade de base ampla não são os
competidores internacionais, mas elites domésticas que batalham constantemente para
preservar os seus próprios privilégios às custas de todos os outros. Inovação, educação,
abertura e um Estado redistributivo constituem armas confiáveis nesta batalha.”
No projeto Núcleo Casa Verde, planeja-se aumentar a renda a partir de um choque
de produtividade nas empresas que, com melhoras contínuas, localização das cadeias
produtivas do território e o trabalho em seus gargalos, como amplamente explicado nas
seções anteriores. Para isto será necessária mão de obra mais treinada, que virá das
parcerias com escolas e universidades, promovendo um crescimento do salário médio do
território, pois suas empresas terão produtos, serviços e processos que agreguem mais
valor.
Além disso, as políticas que garantem a alfabetização universal aumentam a
produtividade e promovem maior igualdade. Outra ênfase na educação feminina e na
implementação de ações para um emprego mais próximo e em volume adequado pode
levar à redução da natalidade, mitigando assim os efeitos adversos da pressão
populacional sentida em tantos países em desenvolvimento e aumentando diretamente a
oferta de mão-de-obra qualificada.
Neste primeiro capítulo procuramos mostrar como a economia funciona, o peso e
a importância do investimento para o desenvolvimento econômico, se praticado com um
olhar mais sistêmico. Mostramos como o foco no desenvolvimento endógeno, buscando
a cooperação e a criação de uma rede integrada de instituições e empresas no território,
pode aumentar o valor de produtos e serviços produzidos localmente. Para isto, como
demonstramos, é fundamental a criação de uma institucionalidade com uma construção
de uma visão comum aos entes do território dos caminhos para melhorar a vida neste
65
bairro, para a qual a tecnologia de comunicação e de indentificação das demandas locais
será de grande auxílio. Nosso objetivo no Núcleo Casa Verde é utilizar estas melhores
práticas para fomentar no território um desenvolvimento sustentável com foco no desenho
de bairro e tipo de vida que nossa população quer viver, usar o Núcleo como um ponto
de encontro do território, para propor e desenhar caminhos, disseminar inovação e
compartilhar capacidade instalada e conhecimento, pertinente a cada empresa, instituição
ou mesmo subdistrito do bairro, encontrando fontes de financiamentos viáveis para se
construir um desenvolvimento feito de forma compartilhada, unindo os saberes do
território em um projeto que melhore a vida de todos.
66
Cap. 2 – EXPERIÊNCIAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS DE
ARTICULAÇÃO NO TERRITÓRIO
Neste capítulo vamos tratar de várias experiências que se utilizaram de teorias
como as descritas no capítulo um e foram bem sucedidas, no todo ou em partes, nas suas
ações de criar territórios melhores para suas populações.
Nesta análise, pensamos o desenvolvimento de forma holística, considerando
todos os aspectos relacionados à qualidade de vida, buscando o aumento das
possibilidades de escolhas das pessoas e o enriquecimento de suas vidas, em todos os
aspectos, econômicos, políticos, ou culturais, mas vistos a partir de suas perspectivas
(HAQ, 1995).
Como diz Haq (1995), os quatro principais componentes para o entendimento do
desenvolvimento humano são 1) a equidade, não em termos de renda, mas em relação às
oportunidades e possibilidades para que os indivíduos realizem seus objetivos e
potenciais; 2) a sustentabilidade, não relacionada exclusivamente à questão ambiental,
mas em termos de proporcionar que as gerações futuras tenham suas oportunidades
garantidas; 3) a produtividade, para possibilitar um ambiente macroeconômico que
desenvolva negócios prósperos e permita que as pessoas alcancem seu potencial máximo;
4) e o empoderamento, para promover um processo participativo político que faça com
que os indivíduos tenham um papel ativo na definição de questões que impactam
profundamente suas vidas (HAQ, 1995).
Ignacy Sachs também apresenta os países desenvolvidos e subdesenvolvidos, as
nações metropolitanas e as periféricas. Segundo ele, o desenvolvimento traz consigo a
promessa da modernidade inclusiva propiciada por uma mudança estrutural. E que no
contexto histórico em que surgiu, a ideia de desenvolvimento implica a expiação e a
reparação de desigualdades passadas, criando uma conexão capaz de preencher o abismo
civilizatório entre as antigas nações metropolitanas e a sua antiga periferia colonial, entre
as minorias ricas modernizadas e a maioria ainda atrasada e exausta dos trabalhadores
pobres. [...] Igualdade, equidade e solidariedade estão, por assim dizer, embutidas no
conceito de desenvolvimento, com consequências de longo alcance para que o
pensamento econômico sobre o desenvolvimento se diferencie do economicismo redutor
(SACHS, 2004, p. 13-4).
Na busca de materializar experiências que promoveram as ideias levantadas
acima, buscamos neste capítulo localizar quais foram as estratégias de países e regiões
para conseguir seu desenvolvimento sustentável.
67
2.1 – Modelos de Instituições, Experiências Internacionais de Desenvolvimento
Aqui vamos descrever experiências de cidades europeias como Copenhagen,
Londres, Hamburgo, Amsterdã e Barcelona (CONTI, 2017), americanas (Portland e
Detroit) e também as asiáticas (Singapura e Seul).
Para se entender as experiências sobre desenvolvimento das cidades e/ou
territórios, temos que nos debruçar sobre diversas ações e acordos que são discutidos e
constituídos todos os dias, na expectativa desta civilização desenvolver modelos de
governança capazes de mitigar os efeitos negativos das questões sociais, econômicas,
ambientais e culturais que atuam sobre o território (PACHECOA, VASCONCELOS e
SANTOS, 2014; GUPTA, 2016). Portanto, a nova agenda do desenvolvimento
sustentável coloca a governança como um elemento chave para a resolução de problemas
complexos, dada a sua capacidade institucional para a articulação de interesses, o
engajamento de diferentes stakeholders e a maximização de resultados positivos,
tornando-se importante instrumento para uma gestão mais transparente, inovadora e
democrática (CONTI, 2017).
Cidades europeias
A partir da teoria e de dados empíricos, Conti (2017) mostra que os diferentes
sistemas de governança impactam diretamente nos resultados das organizações, no nível
de comprometimento para o atingimento de seus objetivos e na eficácia das estratégias de
sustentabilidade, fortalecendo a ideia de que quanto mais colaborativo, participativo e
profissional for o sistema de governança de uma cidade ou território, melhores serão os
seus resultados para o desenvolvimento sustentável (HAWKINS e WANG, 2011).
Os princípios balizadores de uma boa governança trazem aspectos de equilíbrio
de poder, consenso, confiança e transparência, os quais podem se dar em diferentes níveis:
local, regional, nacional ou global (BARROS- PLATIAU, VARELLA e SCHLEICHER,
2004; GONÇALVES, 2006). A conexão entre os temas de governança colaborativa e de sustentabilidade
se transcreve nas palavras dos professores Heinrichs e Laws (2014, p. 2626), do Instituto de Governança e Sustentabilidade da Leuphana Universität Lüneburg na Alemanha, ao argumentarem que o “desenvolvimento sustentável pode ser descrito como uma tarefa coletiva” e que esse tema pode ser visto como um "guarda-chuva",
68
o qual cobre diferentes áreas de conhecimentos e significados. Isso indica que a sustentabilidade de uma cidade, seja econômica, social, ambiental ou cultural, deve ser construída por meio da cooperação e colaboração (CONTI,2017).
Estamos focando na lógica de Cidades para pessoas, do arquiteto dinamarquês
Jan Gehl (2013). No livro, o autor traz uma perspectiva de como converter o caos urbano
em uma cidade mais humana e saudável para se viver. Queremos olhar a experiência
europeia à luz de modelos de governança que fossem capazes de tornar as cidades mais
justas e sustentáveis, por meio da criação de ferramentas e instrumentos que promovam
a melhoria da qualidade de vida e um desenvolvimento local participativo, equilibrado,
ecologicamente correto, economicamente viável e socialmente justo, garantindo um
padrão de crescimento harmônico que suporte a vida agora e no futuro (FLINT e RACO,
2012).
O desenvolvimento sustentável das cidades passa também pela criação de cidades
e bairros mais compactos, uma vez que o adensamento das áreas urbanas pode oferecer a
um número maior de cidadãos a infraestrutura e os serviços públicos necessários para
viver, reduzindo as distâncias e ampliando o acesso aos equipamentos públicos de um
determinado território (WOLSINK, 2016).
O desenvolvimento de uma cidade sustentável requer a construção de
compromissos de longo prazo com foco nos seus cidadãos, a elaboração de planos estratégicos que passam pelo estabelecimento de ações sistêmicas e, também, o desenvolvimento de modelos articulados por sistemas de governança participativa. Isso dá qualidade à gestão pública e otimiza a utilização de recursos. Ao mesmo tempo, as cidades devem fazer um resgate ao passado para reencontrar os seus propósitos de existência, se tornando novamente o grande ponto de encontro das pessoas (CONTI, 2017).
O autor (CONTI, 2017) fez extensa pesquisa de campo analisando cidades
europeias como Copenhagen, Londres, Hamburgo, Amsterdã e Barcelona, com o foco de
ver seus resultados à luz da governança colaborativa, seus instrumentos e mecanismos e
o que leva à boa governança. Também é fruto da pesquisa os papeis da liderança do agente
público, os arranjos e aspectos institucionais, a estrutura profissional, mecanismos de
interação, as políticas públicas sustentáveis, capacidade de colaboração.
Conti em sua conclusão traz uma interessante figura de linguagem, dizendo que
“pode-se dizer que a cidade é o hardware e os atores sociais o software”, querendo com
isto mostrar que os valores e a consciência dos indivíduos que compõe um território, no
caso dele cidades, influenciam diretamente no desenvolvimento. Reputa ele na sua
pesquisa que a relação é contínua, quando um “indivíduo evolui, a cidade também
69
evolui”, dá peso na participação, que todavia vem da cultura local, diferente em várias
das cidades pesquisadas. Tanto a teoria quanto os entrevistados colocaram os indivíduos
como o coração de uma cidade, levando a entender que a cidade se desenvolve a partir
dos valores e ideias das pessoas. Assim, os indivíduos são decisivos em uma cidade,
devendo estar presentes definindo caminhos e planos de ação.
Na cidade de Copenhague, o autor faz luz a uma entrevista na qual enalteceu que
a cidade estava trabalhando ‘a próxima prática’, rompendo com o paradigma das ‘boas
práticas’, trazendo para o território o protagonismo de criar seu próprio futuro, definindo
tendências e construindo ações e projetos inovadores. Ele enfatizou o papel da gestão
pública, que deve abandonar as estruturas tradicionais e inovar, junto com a população,
sendo mais audaciosos nas suas práticas para poder atender a busca genuína das cidades
que deve ser os cidadãos, que são o coração dos processos de construção de políticas
públicas.
A pesquisa europeia alerta que, independentemente da evolução tecnológica de
hoje, é fundamental para a governança que sejam utilizadas plataformas digitais e
mecanismos presenciais, para que não se perca diversas pessoas e para aumentar o
processo de participação. Outro fator importante é que as ferramentas presenciais dão
mais força ao estabelecimento de compromissos de longo prazo, feitos face a face,
permitindo a percepção de variáveis subjetivas e o estabelecimento de confiança entre as
pessoas, aumentando o engajamento e o compromisso com as causas coletivas, que de
outra forma poderiam ser relegadas a segundo plano.
Finalmente, os resultados demonstraram que a sustentabilidade depende da
formação de redes, que são compostas por diferentes indivíduos e ou diversas
organizações da sociedade civil, do mercado e do governo, com foco em colaborar para
que se encontre soluções e se construa de forma coletiva os planos de longo prazo. Estes
planos de longo prazo devem ser construídos a partir de uma metodologia fundamentada
em princípios de uma governança colaborativa, pois ajudaria na construção de cenários,
construindo objetivos coletivos para o futuro.
Nas cidades europeias se percebe claramente que muitos dos problemas que
afligem aos sulamericanos e norte americanos estão melhor equacionados, por uma
distribuição de renda mais equitativa, um estado de bem-estar social de maiores
proporções, ou simplesmente não são os prioritários para eles, ao menos não aparecem
como foco dos entrevistados, seja governo ou cidadãos. Mas o projeto com foco no Brasil,
em especial na Casa Verde, terá que lidar com problemas sérios de diferença de renda e
acesso a bens públicos, além do sub emprego e lacunas de formação e de estado da técnica
70
muito maiores que os europeus. Teremos ainda que construir uma participação coletiva
com agentes muito diferentes e ajustar uma agenda e visão comum, para que possamos
construir um futuro melhor na visão de todos.
Cidades americanas – Portland e Detroit
Enquanto a experiência europeia no processo de desenvolvimento teve foco na
organização, os exemplos americanos apresentados a seguir (Portland e Detroit) focaram
prioritariamente na mudança da infraestrutura, visão compartilhada e emprego nos
territórios, enquanto na Ásia, no exemplo de Singapura, uma forte coleta de opiniões e
projetos feitas por um aplicativo e com debates presenciais melhorou o foco nas pessoas
dentro do território.
A cidade de Portland, no ano de 2013, tomou uma decisão de se reorganizar, pois
como eles mesmos dizem em seu site sobre o projeto “grandes cidades não acontecem
por acidente”. O conselho da cidade aprovou por unanimidade um plano para forjar um
caminho estratégico.
O Plano Portland reuniu mais de 20 parcerias com várias agências e
milhares de residentes, empresas e organizações sem fins lucrativos para criar um plano
estratégico
para tornar Portland próspera, saudável, educada e equitativa (The Portland Plan7). Ele
fornece uma estrutura para alinhar orçamentos e projetos em várias agências públicas,
orientando as políticas com vistas ao ano de 2035 e um plano de ação de cinco anos para
início dos projetos.
Portland instituiu em seu plano medidas de sucesso como: crescimento do
emprego, juventude educada, emissões de carbono reduzidas, trânsito e transporte ativo,
bacias hidrográficas saudáveis, bairros completos, negócios crescentes, pessoas
saudáveis, cidades mais seguras, satisfação dos residentes, patrimônio, inclusão e famílias
prósperas.
O Plano Portland foca em um conjunto central de prioridades: prosperidade,
educação, saúde e equidade. Este plano ajudou a cidade e as agências parceiras a trabalhar
de maneira mais inteligente e eficiente as prioridades, pressupondo que não haveria
7 The Portland Plan- http://www.portlandonline.com/portlandplan/?c=47906&
71
significativamente mais recursos no futuro e que as melhores parcerias impulsionariam a
mudança. O Plano de Portland quebrou os tradicionais silos burocráticos a fim de
incentivar o trabalho coletivo. Os órgãos públicos que operam dentro de Portland gastam
quase US$ 8 bilhões anualmente em atividades relacionadas à prosperidade, educação,
saúde e equidade. Para obter mais dos orçamentos existentes, o Plano Portland enfatiza
estratégias integradas com ações que alinham esforços e investimentos, apresentam
múltiplos benefícios e melhoram a eficiência.
Outro pilar foi a construção e manutenção de uma infraestrutura cívica mais forte.
As parcerias devem ir além do alinhamento das prioridades orçamentárias. Os residentes
e empresas de Portland construiram uma infraestrutura cívica que aproveita o potencial
de seus setores privados e sem fins lucrativos, comunidades e agências governamentais.
Todos trabalham juntos para realizar as metas do Plano, concebido para ser um plano para
as pessoas, com abordagem diferente de muitos planos anteriores. Começou com um foco
nas pessoas e não no uso da terra: “como estão os moradores de Portland hoje e como
podemos melhorar suas vidas e negócios nos próximos 25 anos? De quê os residentes de
Portland e as empresas precisam? Em que tipo de lugar os Portlanders querem morar
hoje e em 2035? Então se perguntaram: Como chegamos lá?”
Por meio do alcance de cada lar e empresa de Portland, os Portlanders ajudaram
a responder a essas perguntas com mais de 20.000 comentários e ideias para o plano. A
criação do Plano de Portland desafiou muitas suposições. Depois de mais de dois anos de
pesquisa sobre a história de Portland e as condições existentes, bem como a análise das
tendências locais, nacionais e globais, criaram um plano baseado em fatos, com medidas
objetivas e metas numéricas para avaliar o progresso. Esses fatos e objetivos foram
discutidos entre milhares de Portlanders, com ajuda local e nacional, por meio de
especialistas que forneceram perspectivas adicionais.
A equipe da cidade e os parceiros procuraram as melhores ideias, desafiando a
cultura confortável de algumas agências públicas, concentrando-se em maneiras de unir
e compartilhar recursos. Em 2012 o Bureau de Panejamento e Sustentabilidade e suas
diversas agências e organizações parceiras começaram a implementar o Plano. O relatório
de progresso de 2017 mostra como as 142 ações do Plano de Portland estão avançando e
destaca novas oportunidades e prioridades para o avanço das metas da cidade. É
importante reconhecer o valor do Plano de Portland ao estabelecer claramente as
prioridades da comunidade, pois contou com a participação de mais de 15.000 pessoas no
processo de concepção. Isso ajudou a catalisar uma nova onda de ativismo e engajamento
que moldou e continuará moldando o futuro da cidade e como ela responde aos desafios.
72
A grande pergunta dos moradores é: onde estaria a cidade sem o Plano de Portland
e as milhares de conversas com moradores individuais, empresas e grupos comunitários?
Sem o plano, a cidade não teria: estabelecido prioridades da comunidade sobre equidade,
prosperidade, saúde humana e ambiental e as métricas para medir o progresso, não teria
criado o Escritório de Equidade e Direitos Humanos e estabelecido a expressão “lente da
equidade” como parte da lógica cívica de Portland.
Portland também desenvolveu novas iniciativas como parques, planejamento da
polícia até os serviços ambientais, que abordam moradias acessíveis a todos, direitos de
locatários e deslocamento, direitos civis e inclusão, proteção ambiental, transporte,
acessibilidade e muito mais. Galvanizou as agências do governo local e os líderes de
comunidades carentes, educadores e organizações sem fins lucrativos para trabalhar fora
dos silos tradicionais para desenvolver estratégias conjuntas, promovendo prosperidade
econômica e acessibilidade para beneficiar tanto os negócios quanto as residências de
Portland. A cidade ficou mais conectada, composta por bairros completos para apoiar
uma vida mais saudável. A juventude tornou-se mais educada com uma cultura de altas
expectativas e propriedade compartilhada.
Um compromisso com o avanço da equidade foi incorporado em todas essas
estratégias. O Plano de Portland começa com uma estrutura de equidade na qual a
comunidade define a equidade e explica claramente por que isso é importante. Ele
identifica ações para o setor público liderar por meio de decisões, investimentos e
engajamento público, tendo com isto sido percebido um progresso notável nas estratégias
integradas. A estrutura de equidade tem o maior número de ações em andamento, mas
poucas foram totalmente concluídas. Isso reflete tanto a natureza complexa dos desafios,
como abordar a igualdade racial, quanto o aumento do nível de esforço que a Prefeitura
de Portland direcionou para o avanço da equidade como um valor central.
Mais da metade das ações na estratégia de educação estão concluídas ou estão no
caminho certo para um progresso significativo. Esse progresso impressionante reflete a
ampla colaboração entre os provedores de educação e outras agências públicas e
organizações comunitárias que apoiam seu trabalho. O nível impressionante de realização
das ações de “prosperidade econômica” e “cidade conectada saudável” reflete a liderança
da cidade. Como percebe-se no exemplo de Portland, o envolvimento de todos foi
fundamental, tanto para desenhar o plano, como para dar seus primeiros passos,
independentemente da evolução de cada ação.
Outro exemplo americano é encontrado em Detroit, uma cidade que já teve nos
anos 60 mais de 1.800.000 habitantes, mas que em função da crise do setor
73
automobilístico literalmente quebrou em 2013. Para reverter o quadro da cidade foi criado
um projeto, com foco no desenvolvimento e constante mudança dos 139 quilômetros
quadrados de área da cidade e de seus mais de 672.000 residentes. Tal como acontece
com muitas cidades, Detroit tem muitos bairros em diferentes condições, enquanto que
uma cidade próspera exige que todos os seus bairros sejam bem-sucedidos.
O Detroit Future City (DFC) criou um documento claro que é apresentado
periodicamente a uma ampla gama de interessados, incluindo residentes, governo, líderes
empresariais e cívicos e filantropia. Tal documento conta a história de Detroit e suas
potencialidades, por meio dos dados disponíveis, a fim de promover constantemente o
engajamento e capacitação dos moradores de Detroit. Além disso, divulgou um plano
estratégico de cinco anos que traz uma abordagem de pesquisa de opinião, defesa e
programas para galvanizar os moradores de Detroit e as partes interessadas na
implementação contínua do Strategic Framework. A organização se concentra em três
áreas prioritárias, desenvolvimento comunitário e econômico, uso e sustentabilidade da
terra e comunicação.
Nas palavras dos cidadãos: "Como a cidade mudou rapidamente desde o
lançamento do Strategic Framework, o DFC tem servido como um recurso duradouro
para orientar a tomada de decisões", disse Anika Goss-Foster, diretora executiva da
DFC. “O plano de cinco anos do DFC coloca as recomendações em ação para nossa
organização, parceiros e várias partes interessadas para abordar as oportunidades e
desafios enfrentados por Detroit hoje, ao mesmo tempo em que constrói em direção à
meta de sustentabilidade de longo prazo para a cidade.”
As áreas prioritárias do DFC serão alcançadas ao longo de um período de cinco
anos por meio de esforços que incluem a defesa de abordagens, políticas e sistemas
inovadores; integração da participação cívica e comunitária; e a garantia da equidade
racial em todas as práticas. Cada uma das prioridades do DFC visa a alcançar objetivos
específicos, apoiados por programas robustos que começam a atender as necessidades
imediatas em Detroit, enquanto se constrói um caminho para um futuro mais sustentável
para a cidade.
A prioridade de uso da terra e sustentabilidade do DFC capacita moradores e
interessados em Detroit com ferramentas e informações para abordar questões que cercam
as terras desocupadas da cidade por meio de práticas sustentáveis. Isto está sendo
alcançado por meio de avanço do espaço aberto como um uso da terra em Detroit por
meio da mudança de políticas, parcerias público-privadas e apoio ao ecossistema das
74
organizações não-governamentais de Detroit para reduzir os transbordamentos de águas
pluviais.
A prioridade da Comunidade e do Desenvolvimento Econômico busca promover
oportunidades de emprego e criação de riqueza para todos os moradores de Detroit em
bairros saudáveis, acessíveis e diversificados. Isto está sendo alcançado por meio do
fortalecimento do sistema de prestação de serviços para o desenvolvimento,
gerenciamento e melhoria da qualidade das propriedades de aluguel unifamiliar existentes
nos bairros de Detroit. Estas medidas estão sendo apoiadas pelo recém-desenvolvido
“Detroit Neighborhood Housing Compact”, que está organizando um grupo de partes
interessadas intersetorialmente focado no fortalecimento do mercado de moradias
unifamiliares nos bairros de Detroit.
A DFC projetou abordagens pioneiras para a reutilização adaptativa de
propriedades industriais vagas em Detroit, liderando um esforço para explorar estratégias
para a reutilização inovadora destas áreas. Trabalhando com um amplo grupo de parceiros
dos setores público e privado, o estudo busca catalisar o desenvolvimento de maneiras
que reduzam a deterioração, mitigar os riscos ambientais, criar empregos na vizinhança e
promover bairros saudáveis, seguros e sustentáveis, buscando melhorar a equidade racial
e econômica no empreendedorismo e fortalecer pequenas empresas locais e corredores
comerciais.
A fim de que os investidores de Detroit e outras partes interessadas importantes
recebam coletivamente informações atualizadas, a DFC produz regularmente publicações
e relatórios baseados em pesquisas e análises especializadas. Esta comunicação é usada
para informar continuamente os residentes e fornecer à organização as ferramentas para
defender o plano de revitalização de terras em toda a cidade. A DFC também está
comprometida com um forte envolvimento da comunidade, em um marco da fundação da
organização, que permite que todos os moradores de Detroit tenham a oportunidade de
compartilhar a recuperação da cidade.
“Quando o DFC Strategic Framework foi lançado em 2013, muitas pessoas
estavam animadas para usar suas ideias para resolver os desafios de longa data de
Detroit. Cinco anos depois, como organização sem fins lucrativos, a DFC está trazendo
recursos para os bairros para transformar essas ideias em ações por residentes e partes
interessadas”, disse Laura Trudeau, presidente do conselho de diretores da DFC.
O Strategic Framework foi desenvolvido com a contribuição de mais de 100.000
pessoas. Logo após seu lançamento em 2013, o DFC foi lançado como iniciativa para
defender a visão de 50 anos de Detroit. Em 2016, a organização tornou-se oficialmente
75
sem fins lucrativos, solidificando seu papel em impactar o futuro de Detroit. Nos últimos
dois anos, ao desenvolver o plano quinquenal, a DFC tem sido notada por seus programas
e relatórios impactantes, que foram indicadores iniciais da nova direção da organização.
Todas essas experiências foram analisadas a fim de inspirar a concepção do
projeto Núcleo Casa Verde e para serem melhoradas à luz das informações que serão
obtidas acerca das opiniões dos entes do território e do seu atual e futuro potencial
econômico.
Democracia direta, a lição de Roma e Barcelona
Uma questão provoca a comunidade de Roma: a democracia web representa uma
saída à crise de participação política dos cidadãos? Esta questão levanta muita polêmica,
simbolizada pela prefeita de Roma Virginia Raggi e a secretária municipal Flavia
Marzano quando apresentaram a proposta de alteração do estatuto comunal de Roma
introduzindo instrumentos de democracia direta, assim definidos por elas, tais como
petições online, orçamento participativo e referendo sem quórum.
Imediatamente houve quem apontou que não haveria nada de novo sob o sol, visto
que as petições e referendos são instrumentos de participação popular previstos também
pela Constituição. Danilo Toninelli, o deputado do Movimento Cinco Estrelas e adjunto
da Comissão dos Assuntos Constitucionais, respondeu usando o espaço do programa
“Tutta lá città ne parla” na Radio 3 (Roma) que há 70 anos estão pendentes as regras e
leis que regulamentariam os princípios relativos à democracia direta da Carta e que os
prefeitos italianos não têm hábito de responder às petições no conselho da cidade. Roma
então, decidiu passar das palavras à ação. Roma é uma das cidades italianas, junto com
Turim, Milão e Nápoles, que tem uma ligação direta com Barcelona, a capital catalã, onde
a democracia participativa online é parte da vida quotidiana dos cidadãos.
Em Barcelona, desde junho de 2016, a economista italiana Francesca Bria é a
secretária de inovação tecnológica. Antes de ser chamada pela prefeita Ada Colau, que
dirige a cidade graças à vitória de seu movimento “Barcelona En Comu”, Bria trabalhou
em um projeto europeu gerido pelo Laboratório de Inovação Inglês, focado no estudo da
democracia digital na Europa. O projeto envolveu os piratas Alemães (partido pirata), o
Podemos, os M5s e algumas experiências de mutualismo organizadas a partir de baixo.
“O objetivo era ver como estava sendo o uso da tecnologia em outros países e como
estavam mudando os partidos políticos”, diz a economista. Esse trabalho de
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experimentação e análise sobre a construção de novas plataformas digitais tem sido o
núcleo fundante de sua atividade em Barcelona. O papel de Bria é na verdade para
coordenar e definir a estratégia digital da cidade catalã. Um caminho “natural”, após a
vitória de Colau. “Barcelona En Comu” foi ter uma experiência de governo bastante nova
e este nasce com a característica da democracia participativa, pela história da própria
prefeita que é oriunda de movimentos populares. A participação dos cidadãos nas
políticas públicas é uma das pedras angulares desta experiência de governo”. A aplicação
da democracia digital, explica ela, passa pelas políticas de moradia, do direito à habitação,
ao planejamento urbano e orçamento participativo.
“Nós também temos um “Pam”, um documento de planejamento para esta
administração e que foi escrito com a participação de 30 mil cidadãos, ativos tanto online
como offline, por meio de assembleias de bairro e consultas mais ou menos tradicionais”,
continua Francesca Bria, que explica também como funciona o portal Decidim
Barcelona8 por meio do qual os cidadãos estão criando propostas para “implementar os
nossos projetos.”
Mas porque a parte tecnológica é tão importante? “É como se tivéssemos co-
criado uma oficina de políticas públicas. E fazemos isso com uma tecnologia muito
intuitiva, porque o nosso aplicativo também está no celular. E então nós trabalhamos
muito na análise de dados, e para explicar aos cidadãos o problema a resolver, também
usamos infográficos e colocamos os dados abertos a disposição”. Porque, explica
Francesca Bria, “não é apenas uma experiência mecânica, não se trata de dar um clique
ou um ‘like’, para que se possa falar de democracia participativa.” Convém, no entanto,
que o conhecimento do problema seja disseminado, que os cidadãos sejam informados,
que os problemas a resolver sejam discutidos, exibidos com todos os dados disponíveis:
“Comparado com a participação automática em mídias sociais ou em relação às notícias
consumidas rapidamente, estamos trabalhando no sentido da participação dos cidadãos e
também a respeito das necessidades de seus próprios bairros”. Também porque a
democracia web por si só não tem nenhum efeito, “Há uma interação contínua entre a
participação na plataforma digital e na assembléia dos bairros”, explica a economista.
A transparência do governo, um objetivo tão difícil de alcançar na Itália, dado o
fracasso do FOIA (Freedom of Information Act) depois de 4 meses da sua entrada em
vigor, em Barcelona parece agora ter se tornado realidade. “Todos os dados são passíveis
de verificação, há um feedback contínuo mesmo com os profissionais de jornalismo de
8 https://www.decidim.barcelona
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dados. E, por outro lado, dado que tanto Barcelona En Comu, como Podemos chegaram
ao poder também por meio de uma crítica à casta e à corrupção institucional, abrimos
todos os dados, inclusive os nossos próprios”, ri Bria. Não só isso: é possível
também denunciar qualquer abuso de poder ou corrupção, “Nós criamos uma
infraestrutura a ‘Caixa Ética’, baseada em uma tecnologia de encriptação de dados, que
protege o anonimato e que também vem sendo usada pelo Wikileaks. Então eles
incentivam o ‘wistleblowing’ interno com proteção das fontes”. Também neste exemplo,
Barcelona é uma das cidades pioneiras na Europa. Mas quais são os possíveis riscos da
democracia web? “O problema é quando você não vê que esses processos de organização
on-line não são uma alternativa excludente para a forma de participação no território, nas
praças, por meio da discussão, do debate,” acrescenta Bria: “A rede não pode substituir
esta vivência de participação ao vivo”, como exemplificada na Figura 3. E, em seguida,
continua a secretária, não se pode resolver a questão da democracia digital de acordo com
a dicotomia da Democracia sim ou Democracia não, mas em como ela é praticada. “Além
disso, a participação digital tornou-se agora parte integrante da vida das pessoas, por isso
é normal que se faça um uso político”, sublinha. Como tem registrado sempre na
transmissão da Radio 3 Nadia Urbinati, “a web democracia é real e global e não se pode
surpreender-se tanto. A inovação tecnológica, que inventa novas estratégias e práticas
políticas de cidadania, não pode ser interrompida, no sentido de que a democracia é por
sua natureza, desde os tempos antigos, aberta à inovação para resolver os problemas da
participação.
Não se pode demonizar ou exaltar. De acordo com Francesca Bria, com a
crescente falta de confiança pública nas políticas de austeridade, “o único antídoto, a
única resposta possível ao populismo de direita que se alavanca sobre o
descontentamento, sobre a decepção e sobre o protesto, são essas formas de democracia
direta. Só desta forma, os cidadãos reassumem o protagonismo na política e se colocam
no jogo. Uma frase simboliza muito a importância do tema “A lição que vem de Espanha
é esta: ampliar os espaços da democracia, se não o que vence é o populismo de direita
“(Left n.16, de 22 de abril, 2017).
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Figura 3- Francesca Bria em pé conversando com os cidadãos de Barcelona
Fonte: Decidim Barcelona
Como um aplicativo móvel está moldando a democracia na Coreia do Sul
Seul, na Coréia do Sul, é o lar de uma das populações mais eletronicamente
conectadas e politicamente ativas do mundo. Quase 78% de todos os sul-coreanos com
idade para votar votaram nas eleições presidenciais mais recentes do país, segundo o Pew
Research Center, em comparação com os cerca de 56% dos americanos que votaram na
corrida eleitoral de 2016.
O rigor político do país, combinado com a conexão de internet mais rápida do
mundo e a maior taxa de propriedade de smartphones, parecia a receita perfeita para o
engajamento dos cidadãos. Por volta de 2013, Seul criou um aplicativo chamado mVoting,
que permite que os cidadãos se submetam e votem em propostas de políticas locais
(KASULIS, 2017).
Imagine votar em questões locais em um aplicativo que deseja ouvir sua opinião
sobre os parques públicos da cidade, rotas de ônibus e áreas designadas para fumantes.
Isso é exatamente o que o mVoting faz. Melhor ainda, é eficaz: pelo menos 181 propostas
se transformaram em políticas reais da Cidade de Seul. “É bastante singular em todo o
mundo que uma cidade passe por esses esforços para realmente observar como os serviços
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são prestados e pedir feedback dos cidadãos”, disse Marc Holzer, professor de
administração pública do Instituto de Serviço Público da Universidade de Suffolk.
O mVoting, que foi baixado pelo menos 100.000 vezes no Google Play, permite
aos usuários navegar por propostas de políticas locais com base na relevância geográfica
ou popularidade. Algumas das questões mais recentes do mVoting incluíam a walkability
de partes de Seul; o que as bibliotecas públicas podem fazer para melhorar a si mesmas;
e quais lições devem ser ensinadas nos programas pós-escolares. “Os cidadãos podem
participar em questões políticas contemporâneas, como rotas de ônibus, restrições à
direção quando há muita poluição do ar ou designação de áreas para não fumantes em
parques”, disse Holzer. “É realmente uma maneira de os cidadãos expressarem suas
opiniões sobre os serviços com os quais têm mais contato ou que mais afetam a eles e a
sua família”.
Os votos no mVoting não estão incluídos nas eleições “reais”. O aplicativo é
principalmente para os moradores para dar feedback ao governo da cidade em assuntos
de todos os tipos, seja trivial ou grave, desde o nome do centro de bem-estar animal local,
conhecimentos sobre as políticas de imposto predial, até a discussão de se a Coreia do
Sul deveria legalizar o casamento gay, no qual podiam debater a questão na seção de
comentários.
Em junho de 2016, mais de 1,1 milhão de usuários haviam votado no aplicativo,
de acordo com a Seoul Solution, e pelo menos 4.400 propostas e agendas de votação foram
publicadas, 88% das quais vieram de cidadãos. “Eles podem moldar os líderes eleitos e
dizer-lhes o que é provável que faça uma diferença real lá fora.” Basicamente, o mVoting
ajuda os políticos a determinarem se estão resolvendo os problemas certos.
Como dissemos, nas seções anteriores, o desenho das estratégias de engajamento
que nos parece mais promissor nestes dias fortemente marcados por algoritmos de
segmentação e polarização é aquele que vai articular, num arranjo de código aberto e de
comuns, uma arquitetura de interação crowdsource, antídoto para as bolhas e a
manipulação e que contenha recursos para interação com o poder público, com demandas
dos cidadãos e com indicadores públicos de fácil acesso e compreensão para podermos
ver, se e como estamos evoluindo (PARRA, 2017).
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Singapura - moldando a cidade futura
O ano de 2017 foi um ano frutífero e gratificante para a Urban Redevelopment
Authority (URA), pois continuaram a desenvolver planos para Singapura como uma
cidade altamente distinta e sustentável para as gerações futuras. Introduziram inovações
urbanas para tornar a cidade mais vibrante e conveniente para se viver. Também
ampliaram e aprofundaram parcerias com as partes interessadas para construir uma casa
mais agradável e encantadora.
Os planos de longo prazo continuam a ancorar os esforços da URA para construir
uma cidade economicamente competitiva e sustentável, com um ambiente de qualidade
que atenda às necessidades e aspirações de todos os singapurianos. Uma estratégia
fundamental foi criar centros de crescimento em toda a ilha. Esses centros ajudam a
impulsionar diferentes setores da economia e contribuem para as metas de transformação
da economia de Singapura. Eles também ajudam a trazer bons empregos para mais perto
de onde as pessoas vivem e proporcionam mais oportunidades de crescimento para as
empresas.
A URA revelou os planos principais de dois grandes centros de crescimento no
ano passado: Jurong Lake District e Punggol Digital District. Esses planos diretores de
distritos ajudaram o planejamento, de maneira mais abrangente para as empresas e para a
comunidade, e a promoção de inovações para uma maior habitabilidade. Ambos os
distritos terão espaços flexíveis e adaptáveis que atendam às necessidades de mudanças
rápidas das empresas, e serão apoiados por soluções urbanas eficientes em termos de
recursos, como transporte pneumático de resíduos, refrigeração distrital e sistemas de
logística. Haverá um bom acesso a uma ampla variedade de comodidades sociais e
espaços altamente conectados, vibrantes e ecológicos.
Continuaram a explorar usos criativos dos espaços urbanos. O lançamento do
programa LUSH 3.0 (Paisagismo para Espaços Urbanos e Altos Terrenos) literalmente
levou a vegetação a novos patamares por meio de esquemas planejados para incentivar
fazendas e jardins mais altos, ajudando a posicionar Singapura como a capital verde
vertical. A exposição “Cultivando mais com menos” foi outra plataforma útil que gerou
conscientização sobre o potencial das fazendas urbanas de alta tecnologia para aumentar
a resiliência dos alimentos e, ao mesmo tempo, liberar terras para sustentar as
necessidades futuras de desenvolvimento.
O objetivo de implantar soluções inteligentes é melhorar o ambiente de vida e a
qualidade de nossas vidas diárias. O novo aplicativo Parking.sg, por exemplo,
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demonstrou como a tecnologia digital pode ser aplicada para fornecer serviços públicos
inovadores que beneficiam os cidadãos de forma prática e centrada no usuário.
Figura 4- Reunião com moradores de Singapura, feitos em plena rua
Fonte: URA, 2017/2018
Desenvolveram o Programa de Voluntariado da URA para melhorar o
engajamento. O apoio dos voluntários permitiu envolver os cidadãos de forma mais eficaz
para aumentar a conscientização no panejamento da cidade e envolvê-los mais
extensivamente na definição de seus planos.
Uma grande cidade para o povo, pelo povo
O trabalho de criar uma grande cidade nunca termina e os meios desse
empreendimento evoluirão com o tempo. A única constante é que uma grande cidade
sempre será definida por seu povo, então o planejamento centrado no cidadão será o
principal ingrediente para tornar uma grande cidade e uma grande casa.
Décadas de experiências com projetos de desenvolvimento comprovam, no
entanto, que a capacidade de auto-organização local, a riqueza do capital social, a
participação cidadã e o sentimento de apropriação do processo pela comunidade são
elementos vitais em sua consolidação. O desenvolvimento não é, meramente, um
conjunto de projetos voltados ao crescimento econômico. É uma dinâmica cultural e
política que transforma a vida social. Os que deixaram de esperar, arregaçaram as mangas
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e já dinamizam um conjunto de atividades, partindo de novos pactos e arranjos sociais e
da mobilização dos recursos disponíveis, colhem melhores resultados. Os aportes
externos são importantes, mas devem existir como complementos a uma dinâmica que
pertence à própria sociedade local.
Do ponto de vista da comunidade local, o que se propõe é uma profunda mudança
de enfoque. Trata-se de trocar a pergunta “o que o governo pode fazer por nós?”, por
“como o governo pode apoiar o que estamos empreendendo?”. Do ponto de vista das
diversas instâncias de governo, das instituições públicas ou privadas de apoio, da própria
academia, trata-se de entender que, somando-se às iniciativas que a comunidade assimila
como suas, a produtividade dos esforços aumenta, maximizando resultados.
A produtividade sistêmica exige integração e coerência no conjunto do processo,
e não adianta assegurar formação profissional se não houver recursos para investimentos
que gerem empregos, assim como não será suficiente o investimento se não houver apoio
tecnológico (PPNADL, 2006, pag.13).
As experiências de desenvolvimento local bem estruturadas têm como
característica central o fato de se apoiarem quase sempre em parcerias. Portanto, não se trata apenas de iniciativas pontuais, mas de organizações plurais que se articulam para dinamizar uma região, envolvendo diversos atores. As parcerias permitem que modalidades distintas de iniciativas isoladas se tornem coerentes e complementares, em vez de fragmentadas e dispersas. Quando se pensa numa empresa, se pensa numa unidade de grande densidade organizacional. Não se pode imaginar uma economia que seja produtiva sem que as suas empresas o sejam. Da mesma forma como a economia se apóia num conjunto de empresas, o desenvolvimento precisa se apoiar em unidades territoriais básicas, que têm de ser administradas de forma racional e produtiva. Na realidade, os municípios constituem os blocos com os quais se constrói o país. Ainda que as instâncias superiores de gestão sejam importantes, criando grandes infraestruturas, assegurando equilíbrio macroeconômico e desenvolvendo políticas tecnológicas, todo esse empenho deve se materializar em territórios bem geridos, sendo apropriado de forma inteligente, democrática e participativa pelos atores locais (PPNADL, 2006, pag.13).
De forma geral é necessário que chegue mais apoio, e que este apoio seja menos
fragmentado e mais integrado no nível local. Precisamos assegurar, no entanto, que esse
apoio não substitua, mas fomente a apropriação local do processo de desenvolvimento.
Para isto é fundamental formar pessoas para que os recursos sejam melhor aproveitados,
buscando as soluções institucionais menos rígidas, facilitando a estruturação de
consórcios intermunicipais, de parcerias entre os diversos setores, de conselhos, foros e
agências de desenvolvimento. A Prefeitura e a Câmara de Vereadores formam apenas
parte do universo, precisamos de menos burocracia, mais instrumentos e meios, mais
flexibilidade na gestão, mais participação organizada dos atores locais, mais formação e
83
informação, soluções que apontem para o pleno emprego e para a sustentabilidade do
processo (PPNADL, 2006 pág. 14).
Toda empresa busca alocar racionalmente os fatores de produção. Para aprender
a fazê-lo, existem os cursos de administração de empresas, que ensinam como gerir de
maneira integrada e eficiente o conjunto dos recursos disponíveis. De forma semelhante,
a unidade territorial deve aprender a otimizar o uso dos seus recursos naturais, humanos,
sociais, culturais e econômicos. E sempre de forma democrática, pois os membros da
comunidade, neste caso, são os donos do empreendimento. O desenvolvimento econômico real, inclusivo, participativo e democrático,
não é promovido só de cima, ou só de baixo, mas resulta da articulação inteligente de diversos tipos de aportes. O “circuito superior” da economia, para utilizar a categoria de Milton Santos, tende a ter os apoios necessários. A necessária recuperação de equilíbrio situa-se, hoje, na área do “circuito inferior”, que apresenta um imenso potencial não só em termos produtivos, mas também de redução das desigualdades herdadas, por meio da inclusão sócio produtiva com sustentabilidade (PPNADL, 2006, pág. 17).
O desenvolvimento do país se apoia, em última instância, na racionalidade de
gestão da rede dos mais de cinco mil municípios, onde o equilíbrio do conjunto exige
ação afirmativa dos governos federal e estaduais, mas a produtividade sistêmica depende
de todas as unidades serem geridas com um mínimo de racionalidade no plano local.
A simplificação, a transparência e a participação constituem os eixos norteadores
do novo marco institucional, pois a racionalização não se faz apenas no interior da
máquina administrativa, mas interagindo com os atores interessados no resultado final, a
participação exige a simplificação dos procedimentos, mas também informação adequada
do cidadão e dos atores locais (PPNADL, 2006, p.47).
2.2 - Como Fomentar a Inovação e o Formato das Instituições
Um pensamento que vêm a mente com constância quando se conversa com
pessoas envolvidas com inovação e suas instituições para desenvolvimento local, é que
talvez fosse mais útil não forçar o crescimento, mas remover os fatores que o limitam.
O desempenho econômico dos países e dos territórios apresenta estreita ligação
com sua capacidade de inovar e criar novos conhecimentos. Os que atingem melhor
desempenho apresentam diversos estímulos às atividades de ciência e tecnologia (C&T)
e conexão estreita com as empresas. Essa interação e troca de conhecimentos contribuem
para a geração de novos produtos, serviços e processos para o mercado, além de
84
tecnologias que aumentam a produtividade e a competitividade das empresas (BRITO
CRUZ; PACHECO, 2007). O indicador de investimento em PDI (Programa de
Desenvolvimento Industrial) frente ao Produto Interno Bruto (PIB) é um importante
indicador, que exprime em grande grau o comprometimento e o potencial de inovação da
economia de um país (MORI, 2017).
De acordo com dados do Industrial Research Institute (2016), os gastos dos países
mais desenvolvidos com PDI estão acima de 2% do PIB, sendo que Finlândia, Coreia do
Sul e Japão apresentam gastos acima de 3,5%. No Brasil, os investimentos em PDI ainda
são modestos, em torno de 1,2% do PIB. Estimular o aumento desses investimentos é um
importante desafio, incluindo maior integração entre empresas e ICTs (Institutos de
Ciência e Tecnologia). Estudos que analisam os estímulos e as formas de conexão entre
mercado e ICTs apontam que em países com melhor desempenho inovador há ICTs que
assumem perfil mais empreendedor. Nas ICTs, os NITs (Núcleos de Inovação
Tecnológica) desempenham importante papel no sentido de intensificar o engajamento
da instituição com o mercado (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000).
Em países desenvolvidos, como EUA e a maior parte da Europa, essas estruturas
de comercialização foram se proliferando ao longo dos últimos 30 anos, muitas vezes por
força de legislação que estipulou a necessidade das ICTs terem estrutura própria ou
compartilhada. Assim, diversos estudos foram realizados para se compreender como os
NITs se estruturam em termos de arranjo organizacional e os resultados obtidos por sua
operação (BRESCIA, COLOMBO e LANDONI, 2016; LINK e SIEGEL, 2005;
CARLSSON, 2005; BERCOVITZ e FELDMAN, 2011; O’GORMAN, BYRNE e
PANDYA, 2008).
Pelo mundo, habitats de inovação com a proposta de viabilizar a economia criativa
tornando-se distritos de inovação vêm se multiplicando, com exemplos como Barcelona,
na Espanha, Boston e o estado da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, no Canadá e
em muitos outros países em franco desenvolvimento e avanço tecnológico, como
Singapura. Um deles é a remodelação do The Research Triangle Park (RTP), um dos
maiores parques tecnológicos de pesquisa do mundo, criado em 1959 no estado
americano da Carolina do Norte e concentrado nas cidades de Durham, Raleigh e Chapel
Hill, que sediam, respectivamente, a Duke University, a North Carolina State University
e a University of North Carolina. O projeto de distrito de inovação consiste no
estabelecimento do chamado Park Center, um núcleo policêntrico concentrado na vida.
O distrito conta com projetos comerciais, empresariais, lojas, lazer e serviços e a
construção de até 1.400 unidades habitacionais. O início da reconfiguração deu-se em
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2012, com a compra de uma área de 450.000 m2, e divide-se em diversas etapas de
desenvolvimento (MORI, 2017).
Outro caso que serve como exemplo é o Parque Tecnológico de São José dos
Campos (PqTec). Fundado em 2006, o empreendimento integrado pela USP, a
Universidade Camilo Castelo Branco, a Universidade Estadual Paulista e a Universidade
Federal de São Paulo envolve pelo menos cinco centros de desenvolvimento tecnológico
e atua em áreas diversas como energia, aeronáutica, saúde, águas e saneamento ambiental,
tecnologia espacial, tecnologia automotiva, automação industrial, arquitetura e design de
transportes, tecnologia de defesa, sistemas de informação e Tecnologias da Informação e
Comunicação (TICs) (TEIXEIRA; MACEDO; EHLERS, 2015).
Ao reforçarem os objetivos para a constituição dos habitats de inovação, Hassink
e Hu (2012) reconhecem algo em comum na pluralidade de nomes utilizada.
“Independentemente de suas diversas denominações, como por exemplo, pólos de
tecnologia, centros de alta tecnologia, centros de incubação, tecnoparques ou cidades
científicas, parques científicos e tecnológicos, ou simplesmente parques tecnológicos,
buscam fomentar a transferência tecnológica e a inovação, aumentando a competitividade
de empresas, regiões e até mesmo nações” (HASSINK; HU, 2012; in MCTI, 2014).
Dentre as definições existentes, algumas denominações passam a se destacar
representando um momento social, cultural e econômico, como a que dá origem ao
conceito de distrito de inovação. Katz e Wagner (2014) contextualizam que, como
resultado da grande recessão de 2008, os Estados Unidos tornaram a emergir com uma
mudança marcante na geografia e ênfase na inovação. Segundo os autores, nos últimos
50 anos o desenvolvimento tecnológico criou uma paisagem característica, a exemplo do
Vale do Silício: situada em subúrbios ou corredores de negócios, praticamente isolados
ou acessíveis somente de carro e pouco voltadas para a qualidade de vida e integração
entre vida, trabalho e lazer. As mudanças pós-crise estão ocorrendo neste sentido, com os
distritos de inovação sendo consolidados como áreas geográficas que podem ser
ancoradas por instituições e um cluster empresarial, conectando startups, incubadoras de
empresas e aceleradoras. Esses habitats são comumente compactos fisicamente,
tecnicamente conectados, com trânsito acessível e oferta de múltiplos serviços, habitação,
escritórios, comércio e varejo. Este novo desenho se adapta perfeitamente na estrutura de
um bairro já formado como a Casa Verde, podendo utilizar de instalações abandonadas
ou mesmo subutilizadas, mas que têm residências, indústrias e comércio em seu entorno,
promovendo vida à região de inovação.
86
Em suma, os distritos estão “reconfigurando os antigos parques tecnológicos, que
se estabeleceram distantes dos centros urbanos e que ignoraram, quando projetados, o
aspecto humano e a diversidade urbana” (DE MELLO; MELLO, 2015). De tendência, o
conceito de distritos passa a figurar como recomendação entre autores na área. De Mello
e Mello (2015) argumentam que “parques tecnológicos para serem bem-sucedidos
precisam estruturar-se já em sua concepção como distritos de inovação (...) pensar na
característica multiuso para que a classe criativa nele situada se sinta atraída a ali
permanecer”. Já Iqué (2015), trazendo à tona a função dos Centros de Inovação, defende
que um distrito de inovação pode resolver diversas questões em um território
(INOVAMFRI, 2015).
Aí surgem as possibilidades de caminhos: “Vou criar um parque tecnológico
ou um parque industrial? Esta é uma forma de promover inovação, e uma forma oportuna. Mas muitas vezes os parques não podem dar solução a todo o território, então está se falando cada vez mais de parques extramuros, de áreas de inovação. Estas áreas são preparadas para produzir inovação e para atrair empresas para o seu entorno. É uma mentalidade mais aberta. E acredito que os Centros de Inovação serão os epicentros de diferentes áreas de inovação” (IQUÉ, 2015, in Gente que Inova, 2015).
Apesar dos grandes desenhos e implementações das áreas de inovação mundo
afora, aqui no Brasil, em especial no projeto do Núcleo Casa Verde, teremos que trabalhar
a construção de uma institucionalidade onde haja um Espaço de Consenso, trazendo o
governo local com sua legitimidade para apoiar e ajudar a coordenar e implementar ações
reconhecidas pelos outros stakeholders afetos à temática da inovação. Sem um consenso
no território do caminho a se trilhar, faltará clareza quanto a quais são os objetivos e
setores prioritários da política. Em relação aos programas de fomento à inovação, os
governos adotam estratégias de estímulo ao empreendedorismo como forma de contornar
a dificuldade de interação com as empresas existentes. Já os programas para promoção
de interação entre universidades e empresas esbarram em barreiras culturais e
institucionais que o governo não consegue romper sem mudança de mentalidade dos
representantes das outras hélices acerca da relevância dessas parcerias.
A hélice empresa ainda tem a dificuldade em reconhecer que o governo pode
desempenhar outras atribuições na política além de atividades de financiamento e de fornecer as condições para que as próprias empresas inovem. Em sua percepção, o governo continua desempenhando as mesmas funções que em um modelo de inovação laissez-faire e não de um modelo Hélice Tríplice no qual o governo pode desempenhar mais papeis. As organizações da hélice empresa consideram a firma o único lugar onde a inovação pode ser feita, não enxergando potencial de inovar nas universidades e tampouco nos governos (JAROSZEWSKI, 2018).
87
As transformações na divisão internacional do trabalho e as inovações
tecnológicas criam oportunidades para promover o tripé do desenvolvimento econômico,
crescimento, igualdade social e alto padrão tecnológico. Porém essas oportunidades não
se efetivam naturalmente, elas necessitam para isso de políticas públicas, ou no nosso
caso, políticas públicas construídas também com o privado e as universidades, bem
concebidas e operadas, o que ressalta os desafios que continuam a existir para as
instituições em geral e o Estado em particular (Pamplona, 2017).
Os Habitats de Tecnologia
Como vimos anteriormente a criação de espaços adequados nos territórios para o
surgimento de inovação e interação são centrais para o desenvolvimento sustentável.
Vamos agora fazer uma peregrinação por entre os Habitats de referência.
As áreas avaliadas nesses empreendimentos foram financiamento, governança,
espaço físico, atividades desenvolvidas, presença digital, transporte e logística e inovação
social. Constatou-se que muitos dos habitats têm investimento público (quatro entre sete).
Entre a existência de espaços de convenções e artes, como coworking, salas de reuniões,
incubadoras, aceleradoras, centros de pesquisa, entretenimento e lazer e residências,
percebe-se tal infraestrutura na maior parte dos habitats pesquisados, com a observação
de que os habitats brasileiros não possuem áreas residenciais e um deles não conta com
incubadora dentro da área do parque. Vamos percorrer os seguintes habitats e também
no projeto do futuro Centro de Inovação de Itajaí, AMFRI.
• Barcelona 22@, Espanha;
• Boston Innovation District, Estados Unidos;
• Montreal - Quartier de l’Innovation, Canadá;
• Porto Digital, Recife, Brasil;
• Tecnopuc, Porto Alegre, Brasil;
• Sapiens Parque, Florianópolis, Brasil.
Falando agora dos formatos para o processo de desenvolvimento regional
sustentável trazemos o exemplo envolvendo um grupo de cidades, a iniciativa do
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AMFRI9, que congrega um conjunto de nove cidades na região de Itajaí (Santa Catarina)
para desenvolver um projeto conjunto de desenvolvimento calcado na inovação. Ao invés
de se construir um centro por cidade, se buscou o modelo de um centro de inovação
compartilhado, situado próximo ao centro da área geográfica das cidades membro. Para
o desenho do projeto foram feitos estudos sobre os principais habitats de inovação no
Brasil e no exterior, sendo eles os parques Barcelona 22@, na Espanha; Boston
Innovation District, nos Estados Unidos; Montreal - Quartier de l’Innovation, no Canadá;
Porto Digital, em Recife, Brasil; Tecnopuc, em Porto Alegre, Brasil e Sapiens Parque, em
Florianópolis. Além disto foram feitos estudos sobre as características socioeconômicas
dos municípios da região da AMFRI no Programa de Desenvolvimento Industrial
Catarinense (PDIC) (FIESC, 2013) e no Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) (BRASIL, 2014).
Barcelona 22@
Foram identificados cinco focos considerados âncoras para o avanço econômico:
Multimídia, Energia, Tecnologias Médicas, TIC e Design. Os principais atores deste
habitat são representados por:
• empresas estratégicas inseridas na área com conhecimentos especializados;
• instituições públicas locais e nacionais;
• universidades e centros de pesquisa;
• incubadoras e serviços multifuncionais geridos por associações locais e
• plataformas estratégicas de relacionamento entre diferentes stakeholders para a
troca de informações, inovação e conhecimento.
A política urbana procurou criar uma grande vizinhança tecnológica baseada em
setores de inovação como forma de revitalizar o sistema econômico local. Assim,
Poblenou passou de uma área considerada fragmentada e degradada, responsável por
apenas 2% da atividade econômica de Barcelona, para se tornar um novo centro
econômico. Hoje, 70% das novas empresas em operação no Barcelona 22@ estão dentro
dos clusters estratégicos e localizadas na própria vizinhança e 45% destas novas empresas
são, de fato, novas criações e geraram 42.000 empregos, com uma perspectiva futura de
150.000 (INOVAMFRI, 2015).
9 AMFRI- Associação dos Municípios da Região da Foz do Rio Itajaí - https://www.amfri.org.br/
89
Boston Innovation Disctrict
Boston, que figura entre as 30 cidades de maior poder econômico do mundo, é o
segundo pólo de atração de capital de risco nos EUA, atrás apenas do Vale do Silício.
Diversas multinacionais têm escritórios, laboratórios, centros de pesquisa e
desenvolvimento na cidade e trabalham em colaboração com as universidades para levar
inovações para o mercado. A cidade acolhe organizações de desenvolvimento científico
e tecnológico, do setor financeiro e turismo, como suas principais forças econômicas,
havendo disponibilidade de mão de obra qualificada em todos os setores mais relevantes
da economia da cidade. A cidade já era um pólo atrativo de trabalhadores com alta
qualificação, graças aos setores educacionais, de pesquisa cientifica, entre outros.
Boston é a cidade com a maior concentração de instituições de ensino superior da
América do Norte. Diversas das mais renomadas e altamente classificadas do país estão
na cidade e arredores. Harvard e o MIT (Massachussets Institute of Technology) estão
entre as de maior prestígio. A alta qualidade destas instituições e o fluxo de estudantes de
todas as partes dos Estados Unidos e de diversos países fazem da cidade um centro
internacional de ensino superior, pesquisa e desenvolvimento de tecnologia. Estima-se
uma população de 350.000 estudantes universitários em atividade na cidade. Além de sua
contribuição à economia local, esta característica também atrai indústrias de produtos e
serviços de conhecimento (INOVAMFRI, 2015).
Em função destas características, o Distrito de Inovação de Boston foi criado com
três princípios:
• ser um laboratório urbano que oferece a oportunidade de testar tecnologias
que envolvam energia limpa, cidadania, transporte e infraestrutura social;
• desenvolver liderança sustentável, pensando no crescimento econômico
sustentável da cidade e região e
• promover inovação compartilhada, de forma que todos os cidadãos
possam se beneficiar da ideia de uma economia compartilhada e que as
ideias e inovações ultrapassem os limites do distrito.
No Distrito de Inovação de Boston os setores de Biotecnologia, Saúde e Serviços
Financeiros estão entre os de maior destaque, mas diversas outras áreas são bastante
relevantes, como as engenharias de automação e computação.
90
Montreal - Quartier de l’Innovation
O District of Innovation (DI) representa uma área de desenvolvimento potencial
em Montreal. É localizada entre dois bairros (Ville-Marie e Le Sud-Ouest) e engloba uma
zona estratégica de revitalização econômica. A moldura territorial é muito interessante
porque dela se espera que seja o primeiro parque urbano científico localizado no centro
de Montreal. A política local formulada para o DI foi considerada um eixo fundamental
da regeneração da estratégia urbana “Montreal 2025 - Montreal Technopole” que planeja
transformar Montreal em uma cidade criativa internacional. Montreal representará a nova
metrópole que será caracterizada por um alto nível de inovação e criatividade. É
importante destacar que o potencial Distrito de Inovação já contém uma alta concentração
de empresas criativas e inovadoras. O Quartier de l'Innovation (QI) teve seu lançamento
oficial em maio de 2013. Hoje conta com um Conselho Administrativo que lidera a gestão
do programa de inovação (INOVAMFRI, 2015).
A origem foi a Universidade ETS - École de Technologie Superieure, que tem
funcionado como coordenadora do projeto e, desta forma, exercido o papel de Centro de
Inovação na atração e desenvolvimento de negócios e oportunidades de cooperação entre
academia, empresas e setor público. Ela é a principal articuladora de novos
relacionamentos.
O investimento na primeira etapa do desenvolvimento do Distrito de Inovação foi
advinda predominante de recursos públicos, tanto do Governo Federal quanto da
Província e Município.
Porto Digital, Recife, Brasil
O Porto Digital, Recife, Brasil, está situado no bairro de Santo Amaro e no sítio
histórico do Bairro do Recife, acrescentando ao projeto a componente de revitalização
urbana. O bairro possui infraestrutura adequada para a instalação de empresas de
tecnologia da informação e comunicação por dispor de excelente estrutura de serviços e
de telecomunicações.
O Porto Digital, no Recife, é visto como o principal candidato ao posto de Vale
do Silício brasileiro. As empresas da região são da área de software, jogos, multimídia,
cine/vídeo/animação, música, design, fotografia, propaganda e publicidade.
91
Como diferencial, o Parque traz uma infraestrutura aos empreendedores que
engloba: Suporte ao empreendedorismo e Laboratórios de testes de aplicativos,
disponibilidade de mão de obra e as universidades oferecem cursos na área de tecnologia
desde a década de 70. O Porto Digital demonstrou-se um elemento estratégico para evitar
a evasão de mão de obra qualificada de áreas importantes como Ciência da Computação
dentre outras (INOVAMFRI, 2015).
O Recife conta com importantes universidades públicas e privadas, sendo a
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) um dos parceiros do Parque, além das
instituições de ensino como: Faculdade Boa Viagem, Faculdade Joaquim Nabuco,
Faculdade Marista, Faculdade Maurício de Nassau, Faculdade Nova Roma, Faculdade
dos Guararapes, Escola Politécnica de Pernambuco e AESO Barros Melo. Além disso,
cita-se o Cesar.edu, a Softex Recife e a Qualiti.
O Porto Digital abriga hoje 250 empresas e instituições dos setores de Tecnologia
da Informação e Comunicação (TIC) e de Economia Criativa (EC). O parque conta com
duas incubadoras de empresas, duas aceleradoras de negócios, dois institutos de pesquisa
e organizações de serviços associados, além de diversas representações governamentais.
Tecnopuc, Porto Alegre, Brasil
O Tecno PUC tem uma peculiaridade por ser um parque inserido no campus de
uma instituição de ensino superior. A PUC, uma das maiores universidades privadas de
Porto Alegre, acolhe mais de 30 mil estudantes, 2 mil professores e 5 mil funcionários.
Situa-se em local privilegiado da capital do Estado do Rio Grande do Sul, em uma área
central da cidade, ficando distante cerca de, no máximo, 20 minutos dos principais pontos.
Há um ambiente também na cidade de Viamão, na qual o Tecnopuc está integrado
a uma área verde de mais de 15 hectares, oferecendo áreas de convívio ao ar livre e
agradáveis espaços em meio à natureza. Conectado a espaços flexíveis e modulares, o
Tecnopuc Viamão é ideal para atividades criativas e inovadoras.
O Parque é multi-setorial, focado em quatro áreas, sendo: Tecnologia da
Informação e Comunicação, Energia e Meio Ambiente, Ciências da Vida e Indústria
Criativa. Estas áreas temáticas foram definidas a partir da competência acadêmica da
Universidade, envolvendo grupos de pesquisa científica e tecnológica e cursos de pós-
graduação (mestrado e doutorado), associados à existência de demanda da sociedade. Os
92
fatores de atração do Tecnopuc se associam a categorias técnicas, sociais, fiscais,
econômicas e ambientais.
A equipe organizacional é constituída por um comitê gestor que é composto pelos
pró- reitores (pró-reitor de extensão e assuntos comunitários, pesquisa, pró-reitor de
inovação e desenvolvimento, e pró-reitor de administração e finanças) e pelo diretor da
Agência de Gestão Tecnológica e pelo Coordenador da Procuradoria Jurídica. O ambiente
de inovação da PUCRS é formado pelo Parque Científico e Tecnológico, pela Incubadora
de Empresas da PUCRS – Raiar, pelo Escritório de Transferência de Tecnologia da
PUCRS, pelo Núcleo Empreendedor, pela Agência de Gestão de Empreendimentos
(AGE) e pela Agência de Gestão Tecnológica (AGT). A PUCRS possui a Agência de
Gestão Tecnológica, que mantém a gestão dos projetos de P&D cooperados com
empresas e agências governamentais de fomento, atuando em conjunto com a Tecnopuc
no âmbito do Parque Científico e Tecnológico. A AGT traça diretrizes e políticas do
Parque, bem como avalia periodicamente o seu desempenho, enquanto a administração é
feita por uma diretoria (INOVAMFRI, 2015).
Sapiens Parque, Florianópolis
O Sapiens Parque se desenvolveu a partir do ambiente para a geração e
desenvolvimento de empreendimentos de base tecnológica existentes em Florianópolis,
como as incubadoras CELTA, acionista do Sapiens Parque e MIDI Tecnológico
(ACATE).
A cidade conta com três universidades públicas, além de universidades privadas e
diversas outras instituições que promovem o Ensino Superior. A Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC) deu início ao processo de desenvolvimento tecnológico na Grande
Florianópolis, nos anos de 1980 com cursos como os da área de engenharia. Com a
retenção dos profissionais formados, começaram a surgir as primeiras empresas de
tecnologia (INOVAMFRI, 2015).
O Sapiens é uma área de 4,5 milhões de metros quadrados, estruturada como um
condomínio que pode vir a comportar até 257 prédios. O objetivo é receber empresas de
tecnologia e serviços. O habitat comporta várias empresas que trocam informação, que
desenvolvem produtos em conjunto e configuram um endereço para atrair clientes.
Os eixos nos quais o Sapiens Parque se sustenta são: Scientia (unidades
acadêmicas e de P&D voltadas para a geração de conhecimentos científicos e
93
tecnológicos avançados); Artis (galerias, escolas, museus e outras iniciativas de Arte e
Cultura que contribuam para agregar o fator humano e gerar um ambiente criativo);
Naturallium (projetos e empreendimentos voltados para a preservação e sustentabilidade
ambiental do parque e ecossistemas conectados) e Gens (ações e programas de promoção
de qualificação, desenvolvimento regional e integração positiva do Sapiens com o entorno
da região).
O Sapiens Parque, consolidado desde 2007, é um espaço onde se instalam
empresas, institutos de pesquisa, para promover um desenvolvimento acelerado por meio
da proximidade de interação entre esses atores. Primeiro foi implementado o parque, que
tem 13 lotes, e, no início dos anos 2000, uma nova etapa foi planejada para a implantação
de um futuro parque de inovação. O habitat trata-se de um espaço com mais do que
empresas de tecnologia, mas também de serviços, de suporte a empresas de tecnologia;
de governo, com características inovadoras; e o setor de turismo, com a ideia de estimular
o turismo na área de conhecimento. O parque continua em implantação, com previsão de
conclusão para até 2023, com 400 empresas e 30 mil pessoas trabalhando. A maior
dificuldade apontada é o aporte de recursos. Dos R$ 200 milhões que devem ser
demandados para o pleno funcionamento, apenas cerca de R$ 40 milhões foram
investidos desde a implantação (INOVAMFRI, 2015).
Por qual tipo de tecnologia começar?
Quando vemos os exemplos acima dos vários habitats de tecnologia é natural
ficarmos animados com o poder da integração da Tríplice Hélice nestes locais. Todavia
precisamos olhar para nosso território e começar por onde ele mais precisa.
Quando se menciona tecnologia, as pessoas pensam em inovações “duras”, do tipo
sementes melhoradas ou máquinas de melhor desempenho. Na realidade, são igualmente
essenciais os avanços na área das tecnologias de processos, envolvendo o encadeamento
dos sistemas produtivos e as tecnologias organizacionais. O soro caseiro constitui uma
típica tecnologia de imenso impacto social, simples na concepção, barata na aplicação e
fácil de ser disseminada. Mas só se tornou possível a sua generalização por meio da
atuação de redes como a Pastoral da Criança, que articula 250 mil mulheres envolvidas
na melhoria da condição da criança, em 3500 localidades brasileiras, e que atuam de
forma organizada, com alta densidade de informação (PPNADL, 2006, p.30).
94
Os avanços tampouco precisam estar concentrados no setor produtivo tradicional.
No exemplo mencionado da Pastoral, o setor foi a Saúde e os avanços foram muito
significativos. Basta calcular o quanto essa tecnologia economizou de gastos em
medicamentos, número de dias de trabalho desperdiçados, hospitalizações evitáveis, para
que a dimensão da racionalidade econômica fique evidente. Da mesma forma, tecnologias
simples de pré-tratamento de esgotos podem reduzir radicalmente a poluição de uma
região, reforçando o potencial turístico, melhorando as condições de saneamento e
evitando gastos com doenças. Essa visão sistêmica do avanço tecnológico despontou em
numerosos trabalhos desenvolvidos no PPNADL (Projeto Política Nacional de Apoio ao
Desenvolvimento Local). Ficou particularmente clara a excessiva tendência a se
concentrar o apoio em tecnologias propriamente de produção, subestimando tecnologias
que melhorem o financiamento e a comercialização, mas também a comunicação e a
informação. Apesar do apoio tecnológico já existente aparecer como profissionalmente
competente, não está articulado nem integrado na diversidade das regiões onde atua. Uma instituição assegura formação profissional, outra, apoio técnico, outra, inovações tecnológicas, mas as pequenas iniciativas, sejam empresariais ou de organizações comunitárias, dificilmente terão conhecimento ou contatos para buscar nas mais diversas instituições os apoios potenciais para obter um resultado coerente. Um exemplo prático mencionado por representantes do SEBRAE: a entidade forma as pessoas para abrirem pousadas, mas não tem como assegurar financiamento e, considerando os juros cobrados pelo mercado financeiro, o entusiasmo dos formandos tende a morrer (PPNADL, 2006, p.32).
Precisamos construir um apoio organizado ao desenvolvimento local, que deve se
apresentar de forma integrada a quem queira tomar uma iniciativa, num tipo de “janela
única” ou “Poupatempo” tecnológico, onde os diversos atores sociais interessados
possam obter as respostas adequadas ou os contatos necessários para obter as que faltam.
Cada território, como aqui entendido, município ou região, deverá portanto contar com
um núcleo polivalente de apoio tecnológico, articulando as instituições existentes,
facilitando os contatos, dinamizando a absorção criativa do conjunto do que tem sido
chamado de “tecnologias sociais”, conforme desenhamos para o Núcleo Casa Verde.
É importante constatar a que ponto muitas universidades e vários centros de
pesquisa, ainda que tenham, em alguns casos, desenvolvido algumas formas de
relacionamento com empresas ou administrações públicas da região, no conjunto
continuam alheias aos processos de tecnologia aplicada. Com a economia aumentando
drasticamente o conteúdo de conhecimento inerente a todas as atividades, a necessidade
de parcerias muito mais eficientes torna-se cada vez mais óbvia. O acesso ao
95
conhecimento técnico se tornou tão vital quanto o acesso aos recursos financeiros e aos
circuitos comerciais (PPNADL, 2006, p.32/33).
Mas a Índia, para dar um exemplo, está constituindo nada menos que 600
mil unidades de fomento tecnológico, em todos os pontos do país, unidades que estarão conectadas em rede, permitindo que inovações locais de todo tipo circulem por todo o território, gerando a chamada fertilização entre experiências. O Japão tem um sistema extremamente dinâmico de informação tecnológica para todas as pequenas unidades de produção (no sentido amplo, tanto manufatura, como serviços e áreas sociais). As regiões mais dinâmicas da Itália articulam as pequenas iniciativas por meio de uma rede densa de cooperativas, permitindo sinergias tanto setoriais como territoriais.
É evidente que, enquanto as grandes empresas conseguem criar as suas próprias estruturas de apropriação de inovações tecnológicas, o “circuito inferior” da economia – envolvendo desde pequenas e médias empresas, até organizações comunitárias, entidades da sociedade civil e administrações públicas locais, bem como instituições acadêmicas universitárias e de formação profissional, carecem de um sistema articulado de apoio, capaz de assegurar que os avanços tecnológicos não constituam ilhas de grandes empresas num contexto de atraso (PPNADL, 2006, p.35).
2.3 - Qual a Institucionalidade que Catalisa o Projeto de Integrar Comunidade e
Inovação
Nesta seção falaremos sobre as questões que auxiliaram e dificultaram a
implantação dos Núcleos de inovação pelo mundo. Na área empresarial considera-se
normal que unidades de diversos tamanhos ou naturezas de atividades se administrem de
forma diferente. As novas tecnologias geraram reformas organizacionais profundas, com
a redução do leque hierárquico, descentralização, responsabilização na base da pirâmide,
sistemas densos em informação, na linha do knowledge organization.
Observando o espaço local como unidade de gestão, como território que tem de
racionalizar o uso dos seus recursos e melhorar sua produtividade sistêmica, verifica-se
que o setor público no Brasil está preso em um cipoal jurídico complexo, com instituições
rígidas, que não conversam entre si, baseadas na verticalidade e no controle burocrático,
com pouca ou nenhuma sinergia com os movimentos da sociedade civil organizada e com
as empresas. Em outros termos, o espaço local como unidade territorial, como “bloco” da
construção do país no seu conjunto, necessita de um choque de racionalidade
administrativa (PPNADL, 2006, p.37).
Aspecto central dessa racionalidade se prende à própria administração pública
municipal, que geralmente não possui sequer um sistema de informação gerencial e
96
tampouco a obrigatoriedade de prestação de contas sobre os avanços da qualidade de vida
do território, ou seja, sobre os resultados. Esta opacidade informativa da administração
local torna a gestão hostil a qualquer crítica ou movimento de racionalização. O resultado
é a fragmentação setorial, com feudos e caciques que dificultam a gestão democrática e
transparente.
Os diversos tipos de financiamento e a microlocalização de projetos podem
perfeitamente ser condicionados a um sistema de prestação de contas, que obrigue as
administrações locais a introduzirem formas modernas de responsabilização e de
avaliação de resultados. Vários municípios brasileiros que recebem financiamentos da União Européia, foram levados, por exigência dos financiadores, a desenvolver
metodologias adequadas de avaliação da produtividade de projetos sociais
(PPNADL, 2006 p.39).
O Banco do Brasil, que administra grande parte das contas municipais do país,
assim como a Caixa Econômica Federal, pilar dos programas habitacionais e de
saneamento, podem perfeitamente apoiar e assessorar a introdução de formas mais
avançadas e transparentes de prestação de contas. É legítimo e recomendável favorecer a
modernização institucional por meio de alavancas financeiras que motivem, com
assessoria nos aspectos técnicos e cursos que capacitem. É importante salientar que a modernização das instituições públicas locais não
se dará sem a participação ativa dos principais atores sociais interessados. A participação organizada dos possíveis parceiros, por meio de foros, conselhos ou agências de desenvolvimento, tornou-se hoje vital. Um grupo particularmente interessado no processo são as instituições de apoio como o sistema “S”, núcleos de pesquisa e outros, que só têm a ganhar com um espaço organizado de planejamento das ações necessárias ao desenvolvimento do território. Mas também as empresas têm tudo a ganhar com a geração de um espaço econômico mais organizado, bem como as organizações da sociedade civil, que hoje ajudam a compensar os desequilíbrios mais críticos no território, mas que poderiam ganhar muito em produtividade ao participar de um processo equilibrado de desenvolvimento (PPNADL, 2006, p.42).
O próprio Orçamento Participativo abriu espaço para formar uma comunidade
mais informada e participativa. São avanços positivos, mas é preciso lembrar que uma
Região Metropolitana como a de São Paulo, com quase 20 milhões de habitantes, não
dispõe de nenhum instrumento de gestão e de racionalização das dinâmicas do seu
território (PPNADL, 2006, p.43).
A racionalidade de gestão local, a chamada governança, com suas dimensões de
transparência, participação e responsabilização, exige o desenvolvimento de uma
97
capacidade institucional muito mais ampla no nível local, capaz de constituir, de certa
forma, a demanda organizada dos programas.
Nos diversos habitats de inovação pelo mundo não foi diferente, a participação
dos entes do território fez todo a diferença.
O 22@ em Barcelona representa um hub de players em rede e áreas de interface
baseadas nas relações multiescalas e transversais. A sinergia entre instituições,
comunidades de negócios, universidades e centros de pesquisa deveria ser o principal
fator de governança estratégica. Desde sua fundação, em 2000, o distrito de inovação
conseguiu atrair mais de 1.400 empresas nas áreas de NTIC, Biotecnologia, Energia e
Multimídia, tendo também atraído talentos de diferentes regiões do país para ativar o
processo de revitalização que busca transformar Barcelona na cidade digital da Europa.
Diversas universidades de prestígio (IESE, ESADE, EADA, UB, UAB, UPC, UPF, URL,
UIC, UOC, and IAAC), Centros de P&D/P&I e outros serviços digitais criaram uma bem-
sucedida plataforma de sinergias, intercâmbio e interconexões na Catalunha.
Consequentemente, a reforma urbana da região metropolitana de Poblenou está fundada
sobre a nova atividade econômica do 22@ e os serviços tecnológicos com o objetivo de
transformar os ativos locais e a organização econômica (INOVAMFRI, 2015).
O Distrito de Inovação conta com uma agência de desenvolvimento local, a
22@BarcelonActiva, que cumpre um papel estratégico no suporte e atração de empresas
locais e internacionais. Além desta agência, cada setor estratégico do 22@ (Mídia, TIC,
Energia, Tecnologia Médica e Design) conta com uma instituição agremiadora com o
papel de integrar os diferentes agentes e fomentar seu desenvolvimento buscando
sinergias.
No Distrito de Inovação de Boston há o District Hall, o Centro de Inovação do
Distrito, como animador e ponto de apoio da comunidade, um espaço cívico, público, de
encontros e intercâmbios entre a comunidade de inovação e empreendedorismo. Nele são
realizados diversos eventos, além da oferta de informações e suporte para
empreendedores já instalados ou se mudando para o distrito. O ambiente é fruto de uma
parceria público-privada. O prédio foi construído com recursos privados do grupo de
investimento que está desenvolvendo o Seaport Square. Sua operação é realizada pela
Venture Café Foundation (VCF), fundação sem fins lucrativos que se especializa na
gestão de espaços semelhantes, com o foco de fomentar o desenvolvimento de
ecossistemas de empreendedorismo e inovação. É a VCF que realiza eventos, encontros
e ativa a comunidade ao redor do District Hall. O centro de convenções Boston
98
Convention & Exhibition Center, capaz de receber eventos de grande porte, também
cumpre papel bastante relevante na animação do distrito (INOVAMFRI, 2015).
Como Fator Liderança os principais stakeholders que participaram do design do
Distrito de Inovação de Boston são: o ex-prefeito da cidade Thomas Menino, a Boston
Redevelopment Authority (BRA) e os investidores imobiliários. A BRA é a agência de
desenvolvimento econômico da cidade de Boston que vem articulando a visão do prefeito
com a das empresas de desenvolvimento imobiliário. As construtoras queriam realizar
projetos tradicionais de residência e comércio, como condomínios de luxo e shopping
centers. O prefeito Thomas Menino, a Cidade de Boston e a BRA tiveram de persuadi-
las a realizar projetos não tradicionais, inserindo componentes inovadores em seus planos.
Ao invés de utilizar recursos públicos e incentivos para atrair negócios para a área, a
cidade está encorajando empreendedores e startups a se relocar para o distrito.
A estratégia e as metas do Distrito de Inovação foram claramente definidas em
um discurso do prefeito quando anunciou o projeto Seaport Square em 2010, dizendo,
“para sermos ousados, criativos e manter nossa economia crescendo. Juntos, estamos
criando uma vizinhança única, diversa e empreendedora que vai ajudar Boston a atrair e
reter novos negócios e a força de trabalho jovem e talentosa da cidade”.
Para a geração de empregos e oportunidades, são realizados programas
específicos com o propósito de gerar oportunidades de negócios. Entre eles estão o
StartHub, Captains of Innovation e o Innovation Visitors Bureau. O Captains of
Innovation é um programa de inovação que conecta startups a grandes empresas com
necessidades específicas de inovação. As atividades são realizadas sob demanda e
articuladas pela VCF, que avalia as startups e tecnologias, assim como as necessidades
das empresas, antes de fazer as conexões. O Innovation Visitors Bureau (IVB) procura
conectar atores internacionais de inovação com o ecossistema de inovação do estado de
Massachusetts. Para tanto, o IVB oferece apresentações e facilita oportunidades de visita
às instituições relacionadas ao ambiente de inovação na região de Boston. Sua meta é
criar valor real a partir destas conexões. E o StartHub é uma plataforma online completa
que centraliza informações para conectar, apoiar e desenvolver a comunidade de
tecnologia e negócios em estágios iniciais de Boston. É como a página de entrada para o
ecossistema de startups de Boston. Articulação com agentes da tríplice hélice acontece
por meio de constantes cooperações entre agentes públicos, empresas e universidades.
Nota-se em especial pelos diversos eventos e programas desenvolvidos pela VCF que,
regularmente, contam com a participação de atores de todas as áreas da tríplice hélice.
99
Esta cooperação, por sinal, marca todo o projeto do Distrito de Inovação desde o início
(INOVAMFRI, 2015).
Em Montreal as universidades são pivôs do desenvolvimento do Distrito de
Inovação, cumprindo o papel de articular atores de diferentes horizontes que formam uma
sinergia estratégica para este desenvolvimento. A abordagem estratégica em termos de
governança deve combinar a inovação tecnológica e social para implementar a estratégia
de participação e inclusão das comunidades locais. É preciso criar um sistema de inovação
aberta no território, e não um sistema fechado, de forma a evitar a criação de um gueto
tecnológico. O objetivo é desenvolver um parque urbano híbrido, fundado sobre a
pesquisa científica e inovação.
A universidade ETS, junto com a McGill University e a Concordia University são
as principais fomentadoras do projeto. A partir de suas iniciativas, foi fundada uma
organização sem fins lucrativos independente, que é responsável pela gestão do programa
de inovação. O Quartier de l'Innovation é o programa do Distrito de Inovação.
Configurado como organização sem fins lucrativos, reúne um conselho administrativo
responsável pelo desenvolvimento do programa.
O Conselho Administrativo se reúne ordinariamente quatro vezes por ano e tem
cada reunião realizada na sede de um dos parceiros do QI. A iniciativa do Distrito de
Inovação é apoiada sobre quatro pilares, cada um representado no Conselho Diretivo do
Quartier de l'Innovation, a fim de manter fidelidade aos seus interesses. O QI é mantido
por financiamento público e privado na proporção 50/50. Da parte do investimento
público há recurso da cidade de Montreal, da província do Québec e do governo federal.
O investimento privado vem das instituições mantenedoras, entre elas as próprias
universidades fundadoras e outras grandes empresas que têm interesse na proximidade
com as universidades e se preocupam com sua visibilidade e impacto social
(INOVAMFRI, 2015).
O Porto Digital Recife também conta com uma instituição de ensino superior, o
Cesar.edu, iniciativa do C.E.S.A.R - Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife,
considerado por duas vezes a melhor instituição de Ciência e Tecnologia do País pela
Financiadora de Estudos e Projetos do Ministério da Ciência e Tecnologia (FINEP). O
Porto Digital possui ainda duas unidades avançadas nas cidades de Caruaru e Petrolina,
respectivamente, no Agreste e Sertão de Pernambuco. O conjunto das empresas que
fazem parte do Porto Digital faturou nos últimos três anos mais de R$ 1 bilhão. Desse
montante, 65% são originados de contratos firmados fora do Estado de Pernambuco. O
100
parque tecnológico hoje reúne mais de 7.100 profissionais altamente qualificados, sendo
500 deles empreendedores.
O Porto Digital já́ atraiu para o Bairro do Recife dezenas de empresas de outras
regiões do Brasil, além de várias multinacionais e centros de tecnologia. Agora, com a
ampliação territorial para o bairro de Santo Amaro e interior do Estado, a expectativa é
que até 2020 em torno de 20 mil pessoas trabalhem em empresas embarcadas no parque
tecnológico. Em 100 hectares no Bairro do Recife, são 8 Km de fibra ótica instalados e
26 km de dutos, tornando a região uma das mais modernas do país.
Para dar suporte ao empreendedorismo, a Lei Municipal 27 17.762 de 28 de
dezembro de 2011 incorpora ao território do Porto Digital o bairro de Santo Amaro e
amplia o escopo de atividades para abranger o setor da Economia Criativa. Ou seja,
empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e também de Economia Criativa
que se instalarem tanto no Bairro do Recife como em Santo Amaro, poderão usufruir da
redução de 60% do imposto sobre serviço (ISS) e de outros benefícios oferecidos pelo
Parque (INOVAMFRI, 2015).
Ao todo, o Porto Digital possui treze imóveis empresariais e de suporte às
empresas. Desses, cinco estão em operação e oito estão sendo requalificados para atender
empresas novas e embarcadas. O Porto Digital também possui dois escritórios avançados,
um na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e outro em São Paulo. Os valores
que norteiam o Porto Digital são: criatividade e austeridade. Os eixos estratégicos do
Parque são oito e buscam atingir a sociedade e os setores de Tecnologia da Informação e
Economia Criativa. A fundação do Porto Digital está intimamente ligada à academia. Foi
da universidade que surgiu a ideia de criar um pólo de tecnologia para impulsionar a
economia do Estado.
O Parque do Rio Grande do Sul tem como objetivo inserir a PUC-RS diretamente
no processo de desenvolvimento tecno-econômico-social da região e do país. Além disso,
os objetivos específicos do Parque são: atrair empresas de pesquisa e desenvolvimento
(PD&I) para trabalhar em parceria com a Universidade; promover a criação e o
desenvolvimento de novas empresas de base tecnológica; atrair projetos de pesquisa e
desenvolvimento tecnológico em geral; estimular a inovação e a interação empresas-
universidade; gerar uma sinergia positiva entre o meio acadêmico e o empresarial; atuar
de forma coordenada com as esferas governamentais, particularmente no âmbito do
Projeto Porto Alegre – Tecnópole (INOVAMFRI, 2015).
Para a gestão do TecnoPUC foi escolhido o Modelo de Parceria Universidade-
Empresa. Neste modelo encontra-se a visão de que as empresas e a universidade elaborem
101
suas estratégias de forma a garantir o futuro de suas instituições, buscando equilíbrio entre
as tecnologias desenvolvidas no Parque e as necessidades do mercado. A gestão é
compartilhada entre o pesquisador e o executivo da empresa parceira. O foco da pesquisa
é interdisciplinar, contemplando atividades integradas. A relação é simbiótica por meio
dos projetos de pesquisa que buscam o crescimento de ambas as instituições. O indicador
de sucesso do Parque é quando a empresa parceira lança nova tecnologia, ampliando os
conhecimentos do pesquisador e sua equipe, de acordo com o Parque. Tendo a
universidade como pivô, a atração de empresas e a interação com o poder público fazem
parte das atividades fundamentais deste ambiente de inovação.
A Sapiens Parque S.A. é uma sociedade de propósitos específicos e economia
mista que tem como objetivo principal executar o projeto Sapiens Parque e está
estruturada sob a forma de uma sociedade anônima de capital fechado que possui
atualmente um capital social subscrito de R$ 254 milhões. A sociedade é administrada
pelo Conselho de Administração e Diretoria, e também possui os Conselhos Consultivos
que atuam no debate e fornecimento de orientações à tomada de decisões estratégicas pela
administração da Companhia. Com um espaço de aproximadamente 2 mil m2, o InovaLab
tem como missão abrigar e articular institutos, empresas nascentes, empresas
consolidadas e outras iniciativas que sejam consideradas estratégicas para a estruturação
e desenvolvimento dos clusters planejados no Sapiens Parque.
Além da venda de terrenos, o Sapiens Parque foca em locação de espaços.
Atualmente dois centros estão disponíveis para a locação, sendo Centro de Inovação –
InovaLab (O InovaLab é o Centro de Inovação para incubação dos clusters de inovação
do Sapiens) e iCentro de farmacologia pré-clínica, CRF (com Biotério para Ensaios pré-
clínicos; Laboratórios de Pesquisa Farmacológica e Incubadora de Life Sciences). O
parque conta com estratégias e modelos profissionais para atração de investimentos de
venture capital, real estate/imobiliário e políticas de incentivo à região, além de
programas e ações voltados para a formação/qualificação de pessoas e para a oferta de
qualidade de vida dos profissionais.
102
O papel do governo local e a participação cívica
A ação do governo é importante para o desenvolvimento regional e local. Em
primeiro lugar, porque a iniciativa e a coordenação das políticas de desenvolvimento
regional devem partir do governo ou, pelo menos, contar com o seu apoio militante. Mas
isto não é tudo. O governo tem um papel crucial na elevação do multiplicador e na
ampliação do parâmetro ∞ que multiplica seus gastos e determina a percentagem dos
mesmos que se transforma em renda disponível para a população local por meio de sua
política fiscal. Quanto maior for a incidência dos tributos sobre aquele segmento da
população cujos padrões de consumo (e de gasto em geral) implicam em evasão de
recursos para fora, e quanto menor for a exação imposta à população de baixa renda,
maior será o multiplicador dos gastos autônomos e maior será a ampliação da renda
disponível local associada aos gastos do governo. Infelizmente, os governos locais
raramente adotam as políticas tributárias mais consistentes com a alavancagem do
desenvolvimento. Isto se dá, em parte, porque parcela não desprezível dos impostos locais
são de base indireta, de forma que os segmentos de alta renda, ao canalizarem seus gastos
para fora, são taxados fora do território. Além disso, a hegemonia dos projetos
exogeneistas de desenvolvimento (assentados na concessão de subsídios para atração de
empresas com potencial de “modernizar” a matriz produtiva local) dissemina práticas
tributárias estimuladoras da concentração da renda, que estão na contramão das práticas
teoricamente consistentes com o desenvolvimento local (PAIVA, 2013, p.130).
E, por fim, há que se entender que o amplo predomínio das teses exogeneistas
não expressa apenas ignorância da literatura mais moderna sobre desenvolvimento
regional: existem sólidos interesses econômicos por trás desta “ignorância”. Não
obstante, nenhuma das limitações apontadas acima é impositiva. Existem impostos de
responsabilidade local que incidem sobre o patrimônio (como o imposto predial e
territorial urbano, IPTU) e que podem (e devem) garantir o caráter progressivo da
tributação local. Além disso, mesmo os impostos indiretos de competência municipal
(como o imposto sobre serviços de qualquer natureza, ISSQN) podem ser administrados
e diferenciados com vistas a garantir que as taxações maiores incidam sobre serviços
prestados às empresas, por oposição aos serviços prestados às famílias de baixa renda.
As políticas públicas voltadas ao apoio das atividades mistas devem ser tal que
exponencie a dimensão propulsiva das mesmas. A construção civil e a educação técnica
são típicas atividades mistas, na medida em que atendem tanto a famílias quanto a
empresas que investem na região e a estudantes de outras localidades. Sempre que as
103
administrações locais apoiam o desenvolvimento e a qualificação destes serviços, estão
apoiando também a ampliação relativa da dimensão propulsiva dos mesmos vis-à-vis sua
dimensão multiplicativa. Isto implica aproximar as atividades mistas das atividades “X e
TrS propulsivas10” e, por extensão, ampliar a renda do território por um valor multiplicado
(PAIVA, 2013, p.134).
Como já citado anteriormente, a implementação da política local de
desenvolvimento depende da participação cívica. A despeito de sua politização, os
cidadãos das regiões menos cívicas sentem-se explorados, alienados, impotentes. A falta
de instrução e o ambiente pouco cívico acentuam o sentimento de exploração e
impotência. Em toda comunidade, os mais instruídos sentem-se mais eficazes, pois a
educação representa status social, capacidade pessoal e contatos. Mas mesmo essas
vantagens não suprem inteiramente o cinismo e a alienação que imperam nas regiões
menos cívicas, por exemplo da Itália (PUTNAM). Os cidadãos instruídos das regiões
menos cívicas sentem-se quase tão impotentes quanto os cidadãos menos instruídos das
regiões mais cívicas. O ambiente comunitário influencia ainda mais a eficácia entre os
menos instruídos do que entre os mais instruídos.
Nas regiões menos cívicas acentuam-se as diferenças de classe no tocante ao
sentimento de impotência do cidadão. Honestidade, confiança e observância da lei são aspectos enfatizados na maioria das definições filosóficas da virtude cívica. Diz-se que na comunidade cívica os cidadãos procedem corretamente uns com os outros e esperam receber em troca o mesmo tratamento. Esperam que seu governo siga padrões elevados e obedecem de bom grado às regras que impuseram a si mesmos. Numa tal comunidade, diz Benjamin Barber, “os cidadãos não fazem nem podem fazer o que bem entendem, pois sabem que sua liberdade é uma consequência de sua disposição para deliberar e agir de comum acordo”. Numa comunidade menos cívica, ao contrário, há maior insegurança, os cidadãos são mais desconfiados, e as leis, concebidas pelos maiorais, são feitas para ser desobedecidas. Honestidade, confiança e observância da lei são aspectos enfatizados na maioria das definições filosóficas da virtude cívica.
Por não terem a mesma autodisciplina confiante dos cidadãos das regiões cívicas, as pessoas das regiões menos cívicas têm que apelar para o que os italianos chamam de “forças da ordem”, isto é, a polícia. Esses cidadãos não dispõem de outro
10 Existêm três tipos de cadeias propulsivas: as exportadoras (X Propulsivas), as baseadas em transferências governamentais (G Propulsivas) e as baseadas na oferta de serviços a agentes não domiciliados (TrS Propulsivas). Vale observar a mudança no padrão de referência ao último tipo de cadeia propulsiva que era referida como “M Propulsiva” (porquanto M é o símbolo consagrado na economia para importação e estas cadeias se estruturam sobre a atração/importação de consumidores) no relatório de 2012. A partir de meados de 2013 passamos a nos referir às mesmas como TrS Propulsivas com vistas a deixar mais claro que sua capacidade dinamizadora encontra-se na transferência privada de recursos em função da atratividade turística e da qualidade dos serviços do território.
104
recurso para solucionar o dilema hobbesiano fundamental da ordem pública, pois carecem dos vínculos horizontais de reciprocidade coletiva que funcionam mais eficientemente nas regiões cívicas. Na falta de solidariedade e autodisciplina, a hierarquia e a força constituem a única alternativa à anarquia (PUTNAM, 2006, l.3370-3374).
Em uma série de sondagens nacionais realizadas entre 1975 e 1989, perguntaram
(PUTNAM) a cerca de 25 mil pessoas se estavam “muito satisfeitas, razoavelmente
satisfeitas, não muito satisfeitas ou nada satisfeitas com a vida que levam”. Os cidadãos
das regiões cívicas estão muito mais satisfeitos com a vida. A felicidade mora em uma
comunidade cívica. No outro pólo estão as regiões “não cívicas”, devidamente
caracterizadas pelo termo francês incivisme. Nelas a vida pública se organiza
hierarquicamente, em vez de horizontalmente, e o próprio conceito de “cidadão” é
deformado. Do ponto de vista do indivíduo, a coisa pública é problema dos outros, dos i
notabili, “os chefões”, “os políticos” e não meu. Poucos querem tomar parte das
deliberações sobre o bem público e poucas oportunidades existem para isso.
Nas regiões menos cívicas, a participação política é motivada pela dependência
ou ambição pessoais, e não pelo interesse coletivo. A afiliação a associações sociais e
culturais é inexpressiva. A religiosidade individual substitui o interesse público. A
corrupção geralmente é considerada a norma, mesmo pelos políticos, e estes são cínicos
com relação aos princípios democráticos. “Transigir” só tem conotação negativa. As leis
são feitas para serem desobedecidas, mas, por temerem a insubordinação dos outros, as
pessoas exigem maior disciplina. Presos nessa cadeia de círculos viciosos, quase todos se
sentem impotentes, explorados e infelizes. Considerando a experiência da Itália moderna,
conseguimos perceber a importância para o território do envolvimento cívico de nossos
dias (PUTNAM, 2006, l.3374-3377).
A questão cívica impacta também no financiamento das iniciativas locais, o
fato básico da história econômica europeia do século XII em diante foi a mobilização da poupança para fins produtivos num grau inimaginável em séculos anteriores (...). Foi o senso comum de honestidade, fortalecido pelo sentimento de pertencer a uma comunidade integrada, independentemente das obrigações contratuais, que tornou possível a todo tipo de pessoas participar do processo produtivo com sua poupança (PUTNAM, 2006, l.4096-4102).
Os dados históricos, tanto de épocas remotas quanto recentes, nos levam a suspeitar (assim como outros) que os fatores socioculturais têm papel importante na explicação. A bem dizer, qualquer interpretação baseada num único fator certamente será equivocada. As tradições cívicas por si só não desencadearam (nem, nesse sentido, “causaram”) o rápido e duradouro progresso econômico do Norte Italiano no século passado; tal decolagem deveu-se a mudanças no contexto nacional, internacional e tecnológico. Por outro lado, as tradições cívicas ajudam a explicar por
105
que o Norte conseguiu reagir mais eficazmente do que o Sul aos desafios e oportunidades dos séculos XIX e XX (PUTNAM, 2006, l.4883-4889).
Para reforçar nossa tese da necessidade, ou pelo menos de uma grande ajuda, de
uma forte participação cívica na estruturação de uma institucionalidade propícia ao
desenvolvimento, uma das características distintivas desses distritos industriais
descentralizados, porém integrados, na Itália é a combinação aparentemente contraditória
de concorrência e cooperação. As empresas competem acirradamente no campo da
eficiência e da inovação em produtos, mas cooperam nos serviços administrativos, na
aquisição de matérias-primas, no financiamento e na pesquisa. Essas pequenas empresas
combinam baixa integração vertical com alta integração horizontal, subcontratando para
trabalho extra concorrentes temporariamente subempregados. Associações industriais
prestam assistência administrativa e até mesmo financeira, enquanto os governos locais
propiciam a infraestrutura e os serviços sociais indispensáveis, como treinamento
profissional, informação sobre mercados de exportação e tendências mundiais da moda
etc. O resultado é uma estrutura econômica tecnologicamente adiantada e altamente
flexível, que se mostrou a mais indicada para competir no dinâmico mundo econômico
dos anos 1970 e 1980. Não admira que nessas duas décadas essas regiões de
especialização flexível tenham gozado de uma prosperidade acima da média (PUTNAM,
2006, l.4904-4908).
Essa estrutura econômica peculiarmente produtiva tem por fulcro
um conjunto de mecanismos institucionais que possibilita a coexistência da competição com a cooperação, na medida em que impede o oportunismo. “Uma vasta rede de associações econômicas privadas e de organizações políticas (...) gerou um ambiente propício aos mercados, promovendo a cooperação e propiciando às pequenas empresas a infraestrutura que elas sozinhas não teriam como obter.” (PUTNAM, 2006, l. 4909-4913).
Nos distritos industriais há grande mobilidade social: os trabalhadores deixam de
ser assalariados para tornarem-se autônomos e vice-versa. Os sindicatos geralmente são
fortes e as greves não são raras, mas o “pacto social” incentiva a flexibilidade e a
inovação. É comum haver mútua assistência, e as inovações técnicas propagam-se
rapidamente de uma empresa para outra. A importância da cooperação horizontal
entre as pequenas empresas e os trabalhadores-proprietários contrasta com o predomínio
da autoridade e da comunicação verticais nas grandes empresas convencionais de outras
partes da Itália. Em suma, à diferença das economias de escala “internas” enfatizadas
pelas teorias empresariais clássicas, os distritos industriais marshallianos priorizam as
“economias externas”. “O rigor das ideias econômicas alia-se ao cálculo menos preciso
106
das vantagens coletivas, criando um senso de solidariedade profissional que serve de pano
de fundo e limite à concorrência entre as empresas.”
Piore e Sabel concluem que “a coesão da indústria repousa sobre um senso
comunitário mais fundamental, do qual as várias formas institucionais de cooperação são antes o resultado do que a causa (...). Uma das ironias do ressurgimento da produção artesanal é que o emprego da moderna tecnologia depende do revigoramento das afiliações que estão associadas ao passado pré-industrial”. Em geral considera-se que as normas de reciprocidade e os sistemas de participação cívica são a chave do sucesso dos distritos industriais, seja na Itália ou em outros países. Tais sistemas facilitam o fluxo de informações sobre os avanços tecnológicos, a capacidade creditícia de eventuais empresários, as qualificações de cada trabalhador etc. A inovação depende da “constante interação informal nos cafés, nos bares e nas ruas”. As normas sociais que coíbem o oportunismo se acham tão internalizadas que o problema do oportunismo à custa do dever comunitário é aqui menos frequente do que nas áreas caracterizadas pelos sistemas verticais e clientelistas. O fundamental nesses distritos de pequenas indústrias, segundo a maioria dos observadores, é a confiança mútua, a cooperação social e o forte senso do dever cívico, em suma, o apanágio da comunidade cívica. Não admira que esses distritos altamente produtivos estejam concentrados naquelas mesmas regiões da Itália setentrional e central que apontamos como centros das tradições cívicas, da comunidade cívica contemporânea e do governo regional de alto desempenho (PUTNAM, 2006, l.4928-4934).
Entendemos que essas constatações a respeito dos antecedentes culturais do
desenvolvimento econômico são mais instigantes do que propriamente conclusivas. Seria
ridículo supor que as tradições cívicas são o único, ou mesmo o mais importante, fator
determinante da prosperidade econômica. Na verdade, como afirmam os geógrafos
históricos britânicos John Langton e R. J. Morris, “se é o legado cultural ou o
desenvolvimento econômico que constitui um elemento independente é algo que depende
muito da escala temporal na qual se concebe o processo histórico. Obviamente ambos
interagem, influenciando-se mutuamente. Não há uma relação de causa e efeito, mas um
processo dialético de reciprocidade”. Nosso modelo de duas variáveis é demasiado
simples para dar conta de todos os fatores capazes de influenciar o progresso econômico
regional, tais como recursos naturais, situação em relação aos principais mercados e
políticas econômicas nacionais (PUTNAM, 2006, l.4934-4943).
Demonstramos nos exemplos mencionados acima, que envolvem territórios de
dimensões variadas, que a construção de uma vitalidade cívica é inspiradora de uma
institucionalidade. Para usarmos um exemplo nacional, na área do crédito, merece
também destaque uma ação muito afirmativa de um conjunto de pessoas em um bairro
muito pobre da periferia de Fortaleza. Pessoas que resolveram arregaçar as mangas e, por
meio de um banco e de uma moeda local, alavancaram a qualidade de vida de sua
comunidade, o conjunto Palmeiras, através do Banco Palmas. Mais uma vez, a força
107
cívica pode não ter sido o único elemento para a melhora do território, mas com certeza
ajudou.
2.4 - O Morador e o Trabalhador do Território como Foco.
Nesta seção vamos abordar como os exemplos internacionais contemplaram os
moradores e trabalhadores dos territórios onde instalaram os habitats de inovação.
Em Barcelona, para a geração de empregos e oportunidades para os profissionais
que habitam e/ou trabalham no distrito, há o acesso a oportunidades educacionais e
ambientes de relacionamento em eventos como o 22@Update Breakfast, realizado
mensalmente. Nele há articulação com agentes da tríplice hélice, comunicação com
diferentes públicos e comunidade e atrações culturais, com a finalidade de atualizar a
comunidade sobre os novos desenvolvimentos urbanos e inovações desenvolvidas no
Distrito. O evento é itinerante, sendo realizado em diferentes empresas e instituições
presentes no distrito (INOVAMFRI, 2015).
Para a Cultura e Inovação Social há um esforço pelo desenvolvimento de um
sentimento de orgulho de pertencer ao Distrito, como profissional ou residente. Assim, as
diferentes organizações agremiadoras do Distrito procuram manter canais de
Comunicação com os moradores, e iniciativas como o 22@ Districte Digital, que busca
incentivar o uso das novas tecnologias de informação e comunicação no quotidiano dos
cidadãos locais. O estímulo é mutuamente benéfico, já que leva serviços inovadores que
suportam uma melhor qualidade de vida para os moradores e também estimula empresas
a desenvolver novos serviços. O estímulo ao voluntariado é uma das políticas de
engajamento dos cidadãos e profissionais do distrito 22@.
Organizações do 3o setor fazem uso do programa 22@Voluntariat que procura
reunir profissionais voluntários para apoiar projetos culturais, educacionais e sociais. São
diversas as atividades, como apoiar na alfabetização digital, assistência a pessoas com
mobilidade reduzida, consultorias de gestão para projetos sociais e culturais, e
intercâmbios linguísticos. Diferentes projetos educacionais e culturais são articulados
pela própria agência do Distrito de Inovação. Iniciativas de educação nas áreas de
inovação do Distrito são ofertadas em parceria com os cinco clusters, além de incentivar
o gosto por ciência e tecnologia. Não foram identificadas iniciativas independentes com
foco específico em Empreendedorismo Social (INOVAMFRI, 2015).
108
Em Boston há diversas organizações de artistas na região que focam no resgate e
manutenção da arte local urbana. Há políticas públicas específicas que regulam projetos
residenciais em Boston. Entre eles, as empresas de construção civil têm a obrigação de
construir unidades habitacionais acessíveis à classe trabalhadora. Um projeto de 2006
obriga que 15% das unidades construídas sejam precificadas para famílias de classe
média. Seu principal propósito é estimular a diversidade. Estas famílias não se qualificam
para programas de habitação com custos reduzidos. Neste projeto, 325 unidades de custo
reduzido e 325 unidades acessíveis para a classe média serão criadas.
O District Hall6, que abriu em 2014, é uma área de 1100 metros quadrados que
funciona como Centro de Inovação e é locado pelas empresas imobiliárias para a BRA e
a cidade de Boston por $1 por ano por um período mínimo de 5 anos com direitos
renováveis por um período adicional de mais 5 anos. É um espaço cívico dedicado no
qual a comunidade de inovação pode se reunir e trocar ideias. Há um espaço aberto de
trabalho, salas de aulas, auditórios e é revestido de paredes internas nas quais se pode
escrever à vontade. Ele é resultado de uma colaboração público- privada. A visão da
Cidade de Boston para o Distrito de Inovação pedia um ambiente de encontros para
inovadores e suas ideias. O prédio foi construído pelo fundo privado Boston Global
Investors, sendo seu primeiro projeto no masterplan do Seaport Square. Ele não é um
espaço de eventos comum. Com propósito público e natureza cívica, sua missão é
construir, fortalecer e conectar indivíduos e comunidade de inovadores enquanto expande
o alcance, visibilidade e benefícios da economia de inovação da Grande Boston
(INOVAMFRI, 2015).
O principal serviço prestado pelo District Hall é de locação de espaços para
trabalho e eventos. Contudo, a realização de eventos com o propósito de apoiar a
comunidade é, também, uma atividade relevante para seu papel de incentivador da
inovação. A VCF parte da premissa de que toda inovação tem uma raiz social. Ou seja,
acontece graças a conexões entre pessoas. Em Montreal há diversas organizações
orientadas ao Empreendedorismo Social que interagem com o QI. Vale destacar:
• Communautique14 - Hub de Inovação Aberta dedicado à aprendizagem,
colaboração, pesquisa e experimentação em Empreendedorismo Social e
Tecnologia. Entre seus diversos projetos, a organização tem um FabLab, um
laboratório de fabricação digital que abre gratuitamente ao público, cobrando
apenas o uso de máquinas e insumos. O FabLab realiza cursos e laboratórios de
codesign, apoiando a comunidade empreendedora em iniciativas de fabricação
digital.
109
• Salon 1861 - é um ambiente de coworking que abriga diversas iniciativas locais
de empreendedorismo com foco em impacto social.
• A Social Economy Initiative, da Universidade McGill, desenvolve programas de
graduação e pós-graduação com foco em gestão integrada, motivando estudantes
a integrar iniciativas globais com foco em empreendedorismo social. Um dos
projetos desenvolvidos pelo SEI é o Social Innovator's Integration Lab, que é um
observatório para monitorar iniciativas e desenvolver uma maior compreensão da
inovação e empreendedorismo social.
• École innovation citoyenne - A Escola de Inovação Cidadã é uma iniciativa da
Universidade ETS que consiste em um laboratório urbano de inovação social que
reúne diversos agentes para propor soluções criativas para problemas sociais,
econômicos, culturais e ambientais.
• Société de développement social - Uma iniciativa que se apresenta como uma
“corretora de valores sociais”, propondo ser uma ponte entre o mundo dos
negócios e a comunidade, engajando pessoas de diferentes áreas de conhecimento
na solução de problemas sociais.
O Porto Digital em Recife, localizado na região central da cidade, já conta com
suficiente oferta de acomodações permanentes e temporárias. Como benefícios
intangíveis, o Parque cita a formação de um ecossistema único no Brasil, que inclui a
proximidade com os clientes, a qualidade de vida, o networking, a promoção institucional
das empresas embarcadas no Parque, a integração e cooperação, o direito do uso da marca
do Porto Digital, a responsabilidade socioambiental e a natureza inovadora do projeto
(INOVAMFRI, 2015).
O Porto Digital administra dezenas de projetos voltados à melhoria da
competitividade do setor de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e Economia
Criativa (EC). O parque também promove ações de sustentabilidade e melhoria do bem
estar nas cidades e mobilidade urbana. Com o objetivo de ampliar a oferta de mão de obra
qualificada em seu ambiente, o Porto Digital mantém um programa permanente de
qualificação voltado para os colaboradores do Parque. São cursos de idiomas, linguagens
de programação, cursos técnicos em tecnologias e processos. Especificamente, o
programa de qualificação visa eliminar gargalos técnicos dos profissionais dos setores de
TIC e EC, dando suporte ao crescimento do ecossistema e aumentando o nível de
competitividade dos dois setores.
O site da Tecnopuc apresenta informações sobre a origem e estruturas do parque.
Suas mídias digitais apresentam boa oferta de informações e atualidade das publicações.
110
Não há, contudo, evidências da articulação do Tecnopuc com a comunidade não
relacionada ao parque.
Em Florianópolis, Cultura e inovação social estão ligadas ao Centro de Apoio à
Inovação Social, uma iniciativa do ICom, que oferece espaço e serviços a organizações e
pessoas que desejam fazer a diferença na Grande Florianópolis. Por meio da oferta de
espaços colaborativos para trabalho e troca de experiência, o projeto busca inspirar ideias
que levem a soluções para desafios da comunidade. Uma agenda de eventos dinâmica
procura reunir empreendedores sociais, líderes, voluntários e investidores em prol de um
bem comum (INOVAMFRI, 2015).
Resumindo a argumentação até aqui apresentada, em todas as sociedades os
dilemas da ação coletiva obstam as tentativas de cooperar em benefício mútuo, seja na
política ou na economia. A coerção de um terceiro é uma solução inadequada para esse
problema. A cooperação voluntária (por exemplo, associações de crédito rotativo)
depende do capital social. As regras de reciprocidade generalizada e os sistemas de
participação cívica estimulam a cooperação e a confiança social porque reduzem os
incentivos a transgredir, diminuem a incerteza e fornecem modelos para a cooperação
futura. A própria confiança é uma propriedade do sistema social, tanto quanto um atributo
social. Os indivíduos podem ser confiantes (e não simplesmente crédulos) por causa das
normas e dos sistemas em que se inserem seus atos.
Criar capital social não será fácil, mas é fundamental para fazer a democracia
funcionar. Para o projeto Núcleo Casa Verde será o grande desafio, que viabilizará o
projeto.
2.5 - Indicadores de Qualidade de Vida - Caso Canadense CIW e seus Impactos
Parece claro que estabelecer um projeto em um território e não medir seus
resultados e a quem está se beneficiando, não faz o menor sentido. No território nacional
temos uma série de experiências bem sucedidas, dentre elas a do IRBEM11, que de forma
muito criativa desenvolveu um painel de controle flexível para cada cidade para monitorar
as questões chaves do território. Um grande legado do IRBEM foi criar em muitos
municípios uma lei que obrigava os prefeitos, logo após sua posse, criar indicadores para
11 IRBEM- Indicadores de Referência de Bem Estar no Municipio - https://www.nossasaopaulo.org.br/irbem/
111
mostrar à população seus objetivos e progressos de forma clara, dando transparência às
promessas de campanha e às estratégias de implementá-las. No entanto, no que se refere
à cidade de São Paulo, a partir de 2014 a prefeitura preferiu criar seu próprio painel de
indicadores, o “Observa Sampa”. Nele encontramos os indicadores propostos pela
administração municipal, desde 2014, de forma regionalizada, mas bem afastado da
lógica de ouvir a população.
No extremo oposto da América encontramos o caso canadense, que trabalha na
direção contrária da lógica tradional da cidade de São Paulo, com o seu “Observa Sampa
2018” top down, que pouco escuta as demandas das pessoas. Os canadenses fizeram a
leitura das necessidades das pessoas no Canadá, região a região, e a partir disto foi criado
um indicador claro para verificar se as regiões, e em consequência o país, estava rumando
na direção correta. Este indicador, o Canadian Index of Wellbeing (CIW), busca avaliar
o nível de bem-estar da população combinando diferentes aspectos, descolando-se
totalmente do PIB Canadense, com grandes impactos no entendimento das estratégias de
crescimento e suas derivações para a qualidade de vida das pessoas.
Para vermos a precisão de tal instrumento de medida, os canadenses tinham
a sensação de que nem tudo ia bem no Canadá, mas perceberam que era mais que um
sentimento, e sim um fato. Quando compararam as tendências do bem-estar dos
canadenses com o crescimento econômico no período de 1994 a 2014, a diferença entre
o PIB e o bem-estar era enorme e continuava crescendo. Quando os canadenses vão para
a cama à noite, eles não estão preocupados com o PIB. Eles estão preocupados em reunir
horas suficientes de emprego de meio período, aumento de mensalidades e moradia
acessível. Eles estão pensando na última vez em que se reuniram com amigos ou na
próxima vez que podem tirar férias. Talvez seja por isso que estão dormindo menos que
há 21 anos atrás.
Por mais de 10 anos o CIW, criado na Universidade de Waterloo, forneceu
análises abrangentes de como os canadenses realmente estão nas áreas que mais importam
para suas vidas. Ele baseia-se em quase 200 fontes de dados confiáveis, principalmente
da Statistics Canada, que fornecem 64 indicadores representando oito domínios
interconectados de importância vital para a qualidade de vida. A estrutura da CIW é o
resultado de amplas consultas com canadenses de todo o país, bem como com
especialistas nacionais e internacionais.
O CIW adota uma abordagem sistêmica e identifica os principais pontos de
alavancagem que têm impacto positivo no bem-estar em vários domínios, como:
112
vitalidade comunitária, engajamento democrático, educação, meio ambiente, populações
saudáveis, lazer e cultura, padrões de vida e uso do tempo.
Após a recessão de 2008, a economia se recuperou com base no PIB. Porém o
bem-estar dos canadenses deu um passo significativo para trás e só começou a se
recuperar mais recentemente. De 1994 a 2014, enquanto o PIB cresceu 38,0%, o bem
estar aumentou apenas 9,9%. De fato, a diferença entre o crescimento do PIB per capita
e o bem-estar dos canadenses é ainda maior do que durante o período imediatamente
anterior à recessão. Em 2007, a diferença entre o PIB e o CIW foi de 22,0%. Em 2010, a
diferença subiu para 24,5% e, em 2014, saltou para 28,1% (Figura 5).
Figura 5 - Relação entre crescimento do PIB Canadense e o CIW
Fonte: Relatório Canadense CIW, 2016
Com inspiração no exemplo canadense, no projeto Núcleo Casa Verde serão
confrontadas as imagens de futuro a serem materializadas com a pesquisa dos entes do
território e cruzá-las com os indicadores do CIW, a fim de identificarmos se estamos de
alguma maneira perdendo uma perspectiva de medição importante para monitorar a real
qualidade de vida do território. Existem vários indicadores no Brasil, por exemplo o IPS
(índice de progresso social), um de nossos parceiros no projeto Núcleo Casa Verde. Nele
são levados em consideração as necessidades Humanas Básicas, fundamentos de Bem-
Estar e Oportunidades, vide Figura 6.
113
Figura 6 – Estrutura do Índice de Progresso Social (IPS)
FONTE: IPS BRASIL
A importância de medir os esforços com indicadores balanceados
Indicadores atuais, como o PIB ou qualquer outro baseado somente no
crescimento econômico, não medem a qualidade de vida no sentido amplo da palavra e
dão uma resposta parcial às questões do desenvolvimento econômico sustentável, sendo
portanto inadequados para gestão pública.
Logo, seria importante realizar uma revisão do conjunto de indicadores usados
para medir o real nível de desenvolvimento sustentável a fim de se evitar a baixa
compreensão das populações, empresas e cidades acerca de suas reais condições,
permitindo comparações nacionais e internacionais que nos ajudem a construir caminhos
mais curtos para o desenvolvimento.
É fundamental mostrar que indicadores balanceados e adequados às necessidades
do território e das pessoas podem promover uma mobilização e um ganho de
produtividade e inovação geral no território, respeitando a natureza. Também importante
é apresentar modelos de desenvolvimento locais que, se bem implementados e
monitorados com indicadores que sejam inteligíveis e apropriados pela população e
demais entes do território, podem encurtar o tempo de implementação dos projetos e
aumentar o nível de bem-estar locais.
114
Algumas estatísticas apresentadas por Jackson (2009) merecem atenção. Nos
últimos 25 anos a economia mundial duplicou de tamanho, enquanto se estima que 60%
dos ecossistemas mundiais foram degradados. Além disso, as emissões de carbono
cresceram 40% desde 1990, sendo as emissões de carbono uma das principais causas
morte da cidade de São Paulo.
Existem indicadores alternativos, como por exemplo o IDH, um indicador que
busca sintetizar abundantes e relevantes informações em um número único. Ele teve o
mérito de quebrar a hegemonia do PIB, conquistando um espaço na agenda mundial,
independentemente de suas fragilidades.
O IDH é composto pelo índice de expectativa de vida, o índice de nível de
instrução (alfabetização + escolaridade) e índice de renda por habitante, calculado pela
média aritmética dos três sub-índices, resultando em valores de 0 a 1, onde:
• Baixo IDH está entre 0 e 0,499;
• Médio IDH está entre 0,50 e 0,799;
• Alto IDH está entre 0,8 e 0,899 e
• Muito alto IDH está entre 0,9 e 1.
O índice de bem-estar do Canadá (CIW) é, no entanto, mais holístico. Com ele foi
possível identificar, por exemplo, que entre 1994 e 2010 algumas áreas foram bem
avaliadas (como a educação) e em outras nem tanto (ambiente físico). Assim, o índice
permite a comparação composta, ao mesmo tempo permitindo a desconstrução até suas
partes componentes para análise posterior e resposta política. A vantagem deste modelo
é que ele se baseia em dados secundários, dados já coletados para outros fins, por isso
mantém os custos baixos e prazos apertados. Esse aspecto do modelo também garante a
sustentabilidade do índice ao longo do tempo.
Para exemplificar a utilidade do índice (CIW) usamos um estudo feito por Susan
Elliott (professora da Universidade de Waterloo, membro do Canadian Index of
Wellbeing, e principal pesquisadora do Global Index of WellBeing) e Paul Yip (professor
da Universidade de Hong Kong), comparando o Canadá com Hong Kong. Neste estudo
mostram que Hong Kong alcançou um PIB elevado com baixo desemprego, mas o bem-
estar em uma sociedade tão competitiva foi negligenciado. Hong Kong tem um dos
maiores PIB per capita nesta região (US $ 56.719) mas não é conhecida pela felicidade
do seu povo. Já o Canadá tem um PIB per capita inferior (US $ 44.310) mas é visto como
desfrutando de um considerável bem-estar. Os butaneses só ganham US $ 8.077, mas
parece que as pessoas estão felizes e contentes. O que realmente importa?
115
Desde 1944, os Estados membros da ONU usaram o produto interno bruto como
medida padrão do bem-estar econômico de sua população. Tem havido debate sobre o
uso e utilidade de tal medida. Isso realmente mede o bem-estar das pessoas? Para
ser justo, o principal arquiteto do PIB - Simon Kuznets - entendia suas limitações.
Segundo ele: “O bem-estar econômico não pode ser adequadamente medido a menos que
a distribuição pessoal de renda seja conhecida. E nenhuma medida de renda se
compromete a estimar o lado reverso da renda, ou seja, a intensidade e o desagrado do
esforço que vai para a obtenção de renda. O bem-estar de uma nação não pode, portanto,
ser inferido de uma medida da renda nacional.”
A ideia é medir o valor de um país, estado ou cidade para além do PIB, citando
Robert F. Kennedy: “Observando que o produto nacional bruto não considera a saúde de
nossos filhos, a qualidade de sua educação ou a alegria de suas brincadeiras. Não inclui a
beleza de nossa poesia ou a força de nossos casamentos, a inteligência de nosso debate
público ou a integridade de nossos funcionários públicos ... Não mede nem o nosso
espírito nem nossa coragem, nem nossa sabedoria nem nosso aprendizado, compaixão
nem nossa devoção ao nosso país. Ele mede tudo, em suma, exceto o que faz a vida valer
a pena”.
Revisando a bibliografia acerca dos indicadores, cujas perguntas de pesquisa
englobam quais os indicadores mais funcionais, quais as vantagens e desvantagens de
suas aplicações e comparando experiências nacionais e internacionais do uso destes
indicadores na gestão de cidades e no desenvolvimento tanto público como privado,
podemos perceber que o Canadá fez um trabalho muito bem feito.
Então, o que faz a vida valer a pena? Tomamos emprestado uma definição de
Angus Deaton, o vencedor do Prêmio Nobel de Economia 2015. O bem-estar, diz ele,
refere-se a “todas as coisas que são boas para uma pessoa, que fazem para uma vida boa”.
Inclui “o bem-estar material, como renda e riqueza, bem-estar físico e psicológico,
representado pela saúde e felicidade, a educação e a capacidade de participar na sociedade
civil por meio da democracia e do Estado de Direito”.
Estes indicadores têm servido como termômetros das realizações das cidades,
mas acredito que podemos ir além a partir do uso de ferramentas mistas de comunicação,
medição e execução dos projetos do município. Alinhados aos stakeholders da cidade,
pode-se criar um objetivo comum evidenciando a estratégia de desenvolvimento
sustentável usando a teoria dos Prof. Robert Kaplan e David Norton de Balanced
Scorecard (BSC) que aparece no livro Mapas Estratégicos (2004), por meio dos quais
podemos construir uma visão de desenvolvimento comum e clara a toda a comunidade e
116
traduzir estes interesses em objetivos claros de curto, médio e longo prazo, que possam
ser medidos e acompanhados por todos. Mas que isto não se limite a um painel de controle
ou termômetro e sim que sirva de ferramenta de implementação de ações no território,
cidade, estado ou país sustentável.
Por fim um alinhamento destes indicadores com os ODS, Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável, que foi desenvolvida pela ONU, desde a RIO + 20, que
contém 17 Objetivos, que serão medidos por uma parceria dos institutos de estatísticas de
vários países membros, pode trazer a comparação internacional dos esforços locais e
buscar soluções para os problemas em várias comunidades espalhadas pelo globo. O
desafio é mobilizar a comunidade para um objetivo comum de desenvolvimento
sustentável.
Frente ao que foi exposto nesta seção, justifica-se então um projeto que seja
balizado pelos indicadores corretos e mais sistêmicos. Sem um conjunto de indicadores
sistêmicos se perderá o monitoramento correto da estratégia de desenvolvimento
econômico. É fundamental monitorar as correlações de causa e efeito de cada um dos
objetivos, para que se atinja o objetivo geral de desenvolvimento econômico sustentável.
Com um sistema claro de objetivos, indicadores, metas e com planos de ação detalhados
para cada objetivo, todos os envolvidos poderão monitorar os avanços à medida que
ocorrerem e propor correções ou ajudar a implementar planos de ação que estão fora do
prazo, impactando nos indicadores, se aproximando ou superando as metas e levando a
efeito os objetivos gerais do projeto.
Também parece que o município tem papel relevante na solução dos problemas
de nossa sociedade, como diz o Prof. Ladislau Dowbor em seu livro O que é poder local?,
em suas palavras: “Que o mercado já não constitui um mecanismo suficiente para pôr
ordem na nossa economia é uma evidência. A intervenção do Estado, seja por meio de
planejamento ou diversos mecanismos de financiamento, é necessária, mas não responde
à necessidade de implantação de milhares de iniciativas dispersas em 5.562 municípios
do país”.
O poder local, com os seus instrumentos básicos que são a participação
comunitária e o planejamento descentralizado, constituem, neste sentido, um mecanismo
de ordenamento político e econômico que já deu as suas provas, e é sem dúvida o grande
recurso subutilizado no país.
Em resumo, neste Capítulo dois buscou-se evidenciar a importância da
participação de todos os entes do território para a construção de um objetivo comum,
fundamental para que se possa construir uma relação de pertencimento do plano. Para
117
isso usamos exemplos nacionais e internacionais na América, Europa e Ásia, que a partir
visão compartilhada construída, juntaram o potencial econômico instalado, o poder
público e todos os entes do território para a implantação de um projeto de
desenvolvimento sustentável.
Fica claro pelos exemplos do capítulo que a participação melhora o controle, a
transparência e o envolvimento de todos, e nos dá embasamento para propor as ações do
projeto Núcleo Casa Verde descritas no capítulo três.
118
Cap. 3 – A EXPERIÊNCIA DA CASA VERDE: UM PROJETO EM
CONSTRUÇÃO
O objetivo geral deste trabalho é construir uma proposta de desenvolvimento
sustentável de um território, ouvindo as vontades e necessidades de todos os moradores e
das pessoas que trabalham na região, cruzar estas vontades com o potencial econômico
instalado e seu potencial futuro, com foco em aproveitar as cadeias produtivas instaladas
e a revolução tecnológica na qual estamos vivendo, para alinhar as vontades e potenciais
às tendências das evoluções setoriais e as tecnologias exponenciais que prometem um
mundo de abundância, tudo isto monitorado por indicadores discutidos e acordados com
todos. Para isto o bairro da Casa Verde em São Paulo, Capital, será utilizado como projeto
piloto.
O projeto se propõe a construir uma visão compartilhada, ou como denomina Peter
Senge um Objetivo Comum, que muda a perspectiva das pessoas e das empresas em
relação ao projeto de governo, que em geral é top down. Desta forma o projeto passa a
ser “nosso” ao invés de ser deles, pois é por meio do objetivo comum que pessoas e
empresas, que antes não confiavam uma nas outras, passam a trabalhar juntas. A partir
deste objetivo comum surge uma coragem que as pessoas não sabiam que possuíam,
sendo coragem neste caso o fazer o necessário para atingir o objetivo (SENGE,1990).
A visão compartilhada também auxilia a manter a direção quando as pressões
aparecem. Com o objetivo comum ficamos mais propensos a expor nossas ideias, abrir
mão de ideias arraigadas e reconhecer nossas deficiências pessoais e organizacionais. Os
problemas ficam pequenos quando comparados com a importância do que estamos
trabalhando para criar. Como diz Robert Fritz: “Na presença da grandiosidade, a
mediocridade desaparece”. Na ausência de um grande objetivo, a mediocridade prevalece
(SENGE,1990, pag. 192).
3.1 - Métodos e Atividades
Existem vários métodos e teorias a respeito da construção e implementação de um
projeto de desenvolvimento local sustentável e sua implementação. Aqui vamos discorrer
a partir de quais referências propomos um método para o Projeto Núcleo Casa Verde.
119
A metodologia do DLIS – Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável, onde
se busca a indução do desenvolvimento local por meio do investimento em capital social,
é um software livre, que pode ser usado, transferido, emprestado, vendido, modificado, e
como tal vamos emprestar algumas de suas partes. O DLIS hoje é mais uma espécie de
“filosofia” de promoção do desenvolvimento humano e social sustentável por meio do
investimento em capital social, priorizando a articulação e animação de redes sociais
distribuídas (P2P) e a democratização das relações na base da sociedade e no quotidiano
do cidadão, do que simplesmente uma metodologia stricto sensu.
Capital social é um recurso para o desenvolvimento aventado para explicar por
que certos conjuntos humanos conseguem criar ambientes favoráveis à boa governança,
à prosperidade econômica e à expansão de uma cultura cívica capaz de melhorar as suas
condições de convivência social. A metodologia do desenvolvimento local por meio do
investimento em capital social se baseia na idéia de que o capital social depende,
fundamentalmente, de duas coisas: das redes sociais (que ligam horizontalmente pessoas-
com-pessoas, peer-to-peer, ou P2P) e da democracia (na base da sociedade e no
quotidiano do cidadão).
Esta metodologia compreende um conjunto de oito passos:
1. Instalação da Equipe de Articulação da Rede
2. Articulação da Rede (Local)
3. Seminário Visão de Futuro
4. Pesquisa Diagnóstico dos Ativos e Necessidades
5. Elaboração do Plano (Horizonte 10 anos)
6. Agenda Local (1 ano)
7. Pacto Local em torno da Agenda
8. Realização da Agenda (começando por um Projeto Demonstrativo)
Nossa ideia conta na primeira fase deste projeto conhecer a sociedade organizada
desde as escolas de samba do bairro até a indústria e comércio organizados, passando
pelo poder público e ONGs do território. A partir desta aproximação, o próximo passo é
propor uma escuta ativa de como cada um destes grupos gostaria de ver o Bairro da Casa
Verde em 2022, 2030 e 2050, como feito com o CIW e o Planejamento estratégico de
Portland e Detroit.
Nas palavras de Carlos Fuentes “Toda sociedade se constrói tanto com base em
sua história quanto em seus sonhos.” Ou como diz Peter Druker, “A melhor forma de
prever o futuro é criá-lo”. Em um mundo de mudanças enormes de nova realidade batendo
120
à nossa porta gerando uma série de desafios a serem enfrentados, se construirmos o futuro
de forma coletiva, possivelmente teremos melhores resultados.
Consultando os entes do território, de forma presencial e também ampliando e
aprofundando de forma virtual, poderemos ter as percepções e as vontades da população
residente e flutuante do território. Estas ideias e projetos captados serão sistematizados
em uma plataforma da ONG Cidade Democrática12 que, por meio de um aplicativo, o
EJ13, podem ser votados e comentados por todos os membros do território
independentemente do grupo que postou a ideia. Ao final do processo teremos temas e
projetos prioritários votados por toda a comunidade, o que nos dará uma ideia do que é
mais urgente para o território na opinião das pessoas, empresas, poder público e sociedade
organizada.
Um segundo trabalho concomitantemente é um estudo de potencial econômico,
feito a quatro mãos pelo pesquisador e pela URBAN, que vai buscar apresentar um
olhar estatístico, econômico e da infraestrutura do território, com os mapeamentos das
cadeias produtivas instaladas no território.
Como terceira etapa, será feito um estudo do trabalho contratado pela AMFRI
sobre setores de maior potencial de crescimento nos próximos anos, em função das
mudanças tecnológicas e tendências setoriais, tanto para o Brasil como para diversos
países do mundo.
Haverá uma quarta etapa em que estes materiais coletados nas fases um, dois e
três serão transcritos e materizados em imagens ilustrando cenários idealizados do
território em 2022, 2030 e 2050. Tais imagens serão criadas em parceria com urbanistas
e arquitetos do Cenários Urbanos Futuros (CUF) e de um mapa estratégico da região, com
objetivos, indicadores e metas, descrevendo tais imagens, que serão levadas à apreciação
na fase cinco.
A fase cinco é onde a sociedade organizada se depara com as imagens idealizadas
para 2022, 2030 e 2050, a partir das escutas feitas na fase um, dois e três, as valida e ou
as altera, juntamente com o mapa estratégico construído para dar forma às imagens da
Casa Verde ideal das três datas futuras. Deste encontro do território sairão grupos
multidisciplinares que irão materializar os planos de ação de cada um dos objetivos
12 O Instituto Cidade Democrática (ICD) oferece software livres e presta serviços para que governos e organizações sociais possam criar pesquisas de opinião e consultas participativas e qualifiquem a tomada a decisão de políticas e investimentos. 13 EJ -Empurrando Juntos- O objetivo do app é oferecer uma ferramenta de baixo custo que possa servir tanto para consulta a programas e políticas, quanto para a avaliação de serviços e equipamentos públicos em cidades.
121
estratégicos acordados, validando com este processo um projeto de objetivo comum para
uma CASA VERDE de 2022, 2030 e 2050.
A partir destes trabalhos, o projeto promove a criação de uma agência de inovação,
desenvolvimento e acompanhamento dos projetos do território, denominada NÚCLEO
CASA VERDE, responsável em conjunto com a comunidade, e com parcerias com USP,
FEI, MAUÁ e PUC-SP, empresas e setor público local, por acompanhar os desenhos dos
planos de ação e sua execução. O Núcleo Casa Verde será o responsável por coordenar a
validação do desenho, criar os indicadores e metas do território, com toda a comunidade,
e de cocoordenar os grupos de ações, que são compostos pelos entes do bairro.
No projeto estão previstos uma incubadora de aplicativos para territórios, para
testar melhorias na gestão, um banco local e moeda local para o microcrédito nas partes
mais vulneráveis do bairro, uma agência de inovação que buscará, em função da demanda
das empresas e dos desenvolvimentos das Universidades parceiras, melhorar a
produtividade média do bairro tanto de empresas como do poder público e ONGs locais,
além é claro de viabilizar as demais demandas do território segundo a estratégia e a
priorização dos projetos decididos pela comunidade.
O cronograma será o seguinte:
• Fase I: Levantamento e contato com as várias entidades representativas do
bairro, de igrejas a escolas de samba, passando pelos empresários e poder
público (segundo semestre de 2018 e 2019);
• Fase II:coleta dos dados e vontades dos entes do território da Casa Verde,
por meio da ferramenta disponibilizada pelo ONG Cidade Democrática
(primeiro semestre de 2019);
• Fase III: acompanhamento e ajuda no levantamento de potencial instalado
no território da Casa Verde, com as respectivas plotagens
georeferenciadas no mapa do território (primeiro semestre de 2019);
• Fase IV: cruzamento dos resultados das Fases II e III com os resultados
das tendências para os setores mais promissores e ver o que há de sinergia
com o território, quais as cadeias produtivas relevantes, seus gargalos, o
que deveria ser incentivado e o que não, além de observar necessidades de
projetos de baixo custo e alta alavancagem para o território (segundo
semestre de 2019);
• Fase V: transcrição dos resultados das Fases II, III e IV em imagens com
ajuda dos urbanistas e arquitetos do CUF (segundo semestre de 2019);
122
• Fase VI: construção do mapa estratégico representado nas imagens da
Casa Verde de 2022, 2030 e 2050, e validá-los com a comunidade local,
em um evento com a maior participação possível dos públicos ouvidos do
território (segundo semestre de 2019);
• Fase VI: criação da agência de inovação, desenvolvimento e
acompanhamento dos projetos do território, denominada NÚCLEO CASA
VERDE, com foco na execução e monitoramento do projeto (segundo
semestre de 2019).
3.2 – Inovação, Visão e Gestão Compartilhada e o Engajamento Cívico Como
Eixos Centrais
Conforme De Mello e Mello (2015), a partir da crise financeira global em 2008,
países como os Estados Unidos passaram a reforçar investimentos em ambientes para a
inovação, a fim de proporcionar incremento na economia e aumentar as oportunidades de
emprego em determinadas regiões. A mudança de pensamento interfere na concepção dos
parques tecnológicos, os quais vêm sendo planejados como distritos de inovação. Na
definição dos autores, os distritos de inovação são arranjos imobiliários que contam com
os elementos da chamada tríplice hélice, composta por academia, setor privado e governo,
e buscam a “transformação do conhecimento em desenvolvimento, por meio de atividades
fundadas em ciência, tecnologia e inovação”. A estruturação dos distritos visa à formação
de ambientes sustentáveis para os usuários, a chamada classe criativa, dentro do conceito
de espaço de trabalho, de vida e de lazer (work, live and play).
Entender as tendências tecnológicas é muito importante para projetar
corretamente as políticas econômicas, tanto no nível nacional quanto no internacional
(bem como para tomar as decisões profissionais adequadas no nível individual).
Entretanto, o nosso fascínio pelo o que é mais recente e a nossa depreciação do que já se
tornou comum pode fazer, e fez, com que seguíssemos os mais diferentes tipos de
direções erradas. Algumas questões levantadas por Chang (2015) nos trazem a
preocupação de perceber que o território da Casa Verde se encontra em vários níveis de
desenvolvimento diferentes, cada nível cobrindo grandes áreas sub-territoriais, e com
hiatos de renda do topo ao piso da pirâmide social, necessitando de soluções muito
123
simples tecnologicamente em determinadas áreas e outras extremamente complexas em
outras (Figura 7).
Figura 7 - Renda no Território da Casa Verde
Fonte: IBGE – Urban Systems
Uma maneira de desenvolver cada subdistrito será fornecer a inovação específica
a cada demanda do bairro, priorizando as de maior impacto social, econômico e
ambiental. O processo de inovação pode ser uma solução para se criar um pólo de
desenvolvimento de uma nova cadeia produtiva ou fomentar a existente, onde a empresa
líder esteja no território permitindo uma agregação de valor e de renda para a região. Com
isto melhora-se a qualidade do emprego no território e se atrai novos players que
aumentam o emprego e a renda, gerando um ciclo virtuoso no bairro.
Em suma, entender os verdadeiros caminhos do investimento pode propiciar a um
território um caminho mais curto para o desenvolvimento econômico, pleno emprego e
maior renda e qualidade de vida para a população local. Para isto há de se mobilizar, com
um planejamento claro e objetivos bem estruturados, políticas detalhadas de implantação
de um projeto de território que, depois de muito trabalho, colha frutos e inspire outros
territórios no cuidado de sua população.
A partir das cadeias produtivas surgidas na fase três do projeto poderemos dizer
com mais profundidade onde agir em inovação no território. Para que o planejamento
reflita os desejos e as aspirações da população local vamos utilizar no território o
124
aplicativo Empurrando Juntos (EJ), detalhado na seção 1.2. Nossa intenção com a escolha
do EJ é viabilizar os grandes debates políticos nessa ferramenta, podendo envolver toda
a população, sem a elitização atual dos fóruns e plataformas cívicas, e sem os efeitos da
polarização, das bolhas de opinião e de manipulação existentes nas principais redes
sociais, em uma lógica de audiência que é operada por patrocínios e robôs (bots) e onde
a manipulação e a desinformação ajudam a constituir maiorias formadas por um grande
número de fakes.
O aplicativo permite visualizar os grupos de opinião e suas opiniões majoritárias.
Com isto, o EJ criará freios e contrapesos que trazem diversidade para a opinião da
maioria e impedem que só um lado domine o fluxo principal de comunicação. O EJ é
formado também por uma “plataforma de serviços digitais” que tem as seguintes
características:
1) Permitir plugar ferramentas livres de deliberação coletiva e participação;
2) Protocolo de identidade distribuído com privacidade (ao estilo do login
cidadão);
3) Pushes/notificações de engajamento e ação coletiva direcionada aos Apps
móveis;
4) Licença aGPLv3, documentação e estratégia de acolhimento de contribuições
da comunidade.
Para viabilizar a integração com a comunidade se criou três perfis de push no EJ:
criador de consulta, ativista de minoria e ponte de diálogo. Estes três perfis foram
discutidos na seção 1.2.
Os criadores de consulta são os responsáveis pela governança da consulta, ou seja,
os integrantes da equipe do Núcleo Casa Verde, que utilizam o aplicativo para se
comunicar e mobilizar os participantes e grupos formados.
Os ativistas de minorias são lideranças emergentes ou já institucionalizadas (na
sociedade civil ou no Estado) e que propõem a agenda pública ou comunitária na luta por
direitos, representando um conjunto maior de pessoas e opiniões. A ideia é conseguir
conversar com pessoas de seu grupo de afinidade sobre as questões mais polêmicas do
debate, e também permitir que ativistas que não concordem com a opinião majoritária
possam abrir um evento e mobilizar diretamente aqueles de seu grupo.
O terceiro perfil que receberá o “poder” do push é o que chamam de “pessoa
ponte” ou “ponte de diálogo”, atribuído àquelas pessoas identificadas que concordam com
uma opinião da maioria mas estejam “entre” grupos, com uma afinidade balanceada entre
conjuntos distintos de opinião. A ideia então será conectar as pessoas pontes a fim de
125
trazer diversidade aos grupos. Suas mensagens serão apresentadas para todos aqueles que
concordam com a opinião majoritária e que sejam de grupos próximos mas diferentes
desta pessoa ponte. Com isto apostamos que justamente aqueles que têm opiniões
complexas ou contraditórias podem cumprir o importante papel de dialogar com esta
maioria emergente e incluir complexidade e diversidade para que seus membros reflitam.
Está aí o potencial de reembaralhar os grupos, distender certas polarizações e apresentar
opiniões contraditórias em uma linguagem que viabilize o diálogo (PARRA, 2017).
A plataforma de serviços do EJ trabalhará inicialmente com esses três perfis
identificados, porém as possibilidades são inúmeras. O conceito de usar gameficação para
furar as bolhas e trazer diversidade para as discussões online vai requerer
acompanhamento da adoção e os efeitos da utilização do aplicativo e plataforma, levando
a ajustes dos perfis criados e abertura para criação de novos perfis.
Todo este trabalho de ouvir as comunidades têm como foco buscar onde agir
prioritariamente para construir um desenvolvimento sustentável que faça sentido ao
território da Casa Verde, para que esta informação das vontades posteriormente sejam
cruzados com os potenciais instalados no território e mapeadas as possibilidades de novos
segmentos com tendência de crescimento, e a partir deles se contrua uma visão comum.
Este projeto levará algum tempo pois teremos que construir pontes entre os diversos
atores do território, do governo local (nas suas variadas instâncias), da sociedade civil,
das ONGs, enfim, de todos os que compõem o território, por meio de muitas reuniões
pontuais e de muitas consultas via EJ. A partir disto, usaremos no Núcleo Casa Verde o
conhecimento dos parceiros e Universidades para ajudar na implementação das inovações
pertinentes a cada área ou cadeia produtiva local, das mais incrementais até as mais
disruptivas (às vezes apenas para aquela comunidade).
Quando falamos de inovação, muitas vezes tratado como sinônimo de
modernização, as políticas e os instrumentos são diferentes daqueles imaginados por
quem a concebe como meio para transformação de paradigmas tecnológicos, com
potencial para modificar toda a estrutura produtiva de uma região. A revolução
tecnológica na qual o conhecimento se apresenta como componente essencial traz como
consequência a maior participação da CT&I na agenda. Por meio de investimentos em
pesquisa e desenvolvimento, torna-se possível diversificar a produção econômica de uma
localidade, permitindo acoplar conhecimento a produtos e processos existentes bem como
desenvolver novos negócios e mercados. Temas como indústria 4.0, internet das coisas e
smart cities, nos quais a inovação é componente essencial, inexistiam há alguns anos e
hoje já são objetos de programas governamentais. Adicionalmente, a inovação
126
tecnológica quando inserida nas organizações, precisa ser tratada como política
transversal porque ela não se faz apenas com ciência e tecnologia. Embora dependa do
conhecimento científico, a inovação tecnológica precisa de políticas educacionais para
garantir recursos humanos qualificados, infraestrutura de pesquisa, uma política industrial
que apoie investimento empresarial em P&D, política econômica que estimule o
empreendedorismo etc. Portanto, a inovação resulta da participação de distintas
iniciativas, e, consequentemente, decorre da coordenação na tripla hélice, mas com
necessário apoio do governo permitindo a esta temática atravessar múltiplas secretarias e
demais estruturas administrativas (MORI, 2017).
Para se organizar a inovação tecnológica, a esfera institucional precisa estar
articulada com todas as hélices para definir as prioridades e os objetivos a serem
alcançados com a política de inovação. Ao demarcar áreas estratégicas de atuação, o
Núcleo e o poder público local poderá agir como Estado Empreendedor, induzindo e
estimulando a criação de novos mercados, trazendo novos temas como a já citada
indústria 4.0 ou a questão de tecnologias limpas. O Núcleo supera assim a visão
tradicional do Estado, de que seu papel na política de inovação se limita a financiar e
garantir um ambiente propício para inovação para apresentar-se como esfera institucional
capaz de coordenar e conduzir os processos desta política. A construção conjunta de
alternativas de ação vale-se da hélice tripla para gerar um Espaço de Consenso capaz de
agregar diferentes stakeholders para discussão e tomada de decisões, a exemplo dos
Conselhos de Inovação já existentes em alguns estados, cuja composição conta com
representantes das três hélices exercendo uma função de construção de convergências.
Mas sem a definição de objetivos explícitos, pactuados e assimilados por todos os atores
como as grandes metas da política de inovação, a agenda pública para o tema tende a
diluir-se em ações descoordenadas com resultados de pouca expressividade, a menos que
se tenha uma tradução para os desafios locais destas políticas macro (JAROSZEWSKI,
2018).
A implementação de programas para aproximação entre universidades e
empresas encontra nas barreiras culturais obstáculos ao trabalho conjunto dessas duas hélices. As estratégias institucionais adotadas de nada adiantam sem a compreensão mútua de universidades e empresas quanto à importância do trabalho conjunto para criar soluções e melhorias pertinentes a todos. Em relação às organizações híbridas, elas devem agir para atingir os objetivos definidos pelas políticas. As incubadoras de empresas devem selecionar propostas em setores econômicos definidos como prioritários, direcionando o surgimento de novas empresas para esses mercados. No entanto, as incubadoras devem destinar parte das vagas para a demanda espontânea da sociedade garantindo apoio a propostas de qualquer segmento. Quanto aos NIT,
127
além da dificuldade em encontrar profissionais especializados para trabalhar nessas organizações, há a lentidão para a celebração de contratos com as empresas sendo uma das principais causas para essa morosidade os questionamentos de ordem jurídica. Como o marco legal que regula a inovação no Brasil é recente, sendo o último decreto federal da área editado em fevereiro de 2018, há ainda insegurança por parte dos profissionais da hélice universidade em realizar parcerias que possam ser questionadas futuramente pelos órgãos de controle. Assim, diversas ações do NIT seguem para análise das procuradorias/consultorias jurídicas das universidades que não conseguem responder em tempo hábil as demandas pelo excesso de pedidos e escassez de funcionários nessas consultorias (JAROSZEWSKI, 2018).
É preciso superar esse gargalo jurídico ampliando as procuradorias ou mesmo
trazendo para dentro dos NITs advogados especializados em processo de inovação e
propriedade intelectual. Afinal o que buscamos com a inovação são produtos e processos
inovadores com potencial para transformar a vida das pessoas e como reflexo melhorar a
vida no território.
Por fim, formular e implementar política de inovação tecnológica não significa
buscar uma solução “one size fits all”. Conhecer experiências internacionais, como o Vale
do Silício dos Estados Unidos e 22@ de Barcelona, ajuda a compreender a articulação
entre as hélices e o potencial dinamizador da inovação enquanto elemento de
desenvolvimento regional. Entretanto não são modelos replicáveis integralmente porque
a configuração territorial e o processo histórico do desenvolvimento de cada região são
variáveis constituintes de cada sistema de inovação. A solução para os problemas
enfrentados pelos sistemas de inovação pode inspirar-se em modelos externos, mas que
serão reinterpretados à luz da realidade de cada local (JAROSZEWSKI, 2018).
Cassiane Jaroszewski (2018) sistematizou e analisou as formas pelas quais os
governos interagem com as esferas institucionais universidade e empresa em prol da
inovação e do empreendedorismo de base tecnológica. Nas unidades da federação
estudadas, os representantes das hélices universidade e empresas consultados não
conseguiram identificar qual a prioridade da política de inovação tecnológica estadual.
Os indicativos fornecidos por Pernambuco, com sua política de inovação “localmente
inspirada e globalmente conectada”, ou Santa Catarina, como “estado máximo da
inovação”, não foram suficientes para transmitir, com clareza, aos representantes das
outras hélices, o que o governo almeja atingir com o fomento à inovação tecnológica. A
identificação de setores econômicos prioritários encontra-se melhor equacionada em
Pernambuco, com foco na indústria 4.0 e no apoio aos APLs. No Amazonas surge um
movimento para associar inovação aos recursos da biodiversidade e possibilitar um novo
modelo de desenvolvimento em contraponto ao modelo da ZFM. Já em Santa Catarina, a
128
prioridade da política de inovação não está vinculada a algum setor econômico, mas sim
aos programas Sinapse da Inovação e aos Centros de Inovação.
Os três estados avançaram construindo políticas de inovação que incluem a
dimensão do desenvolvimento regional. Enquanto Pernambuco incrementa os arranjos
existentes, Santa Catarina opta por um caminho distinto ao construir Centros de Inovação
esperando que a infraestrutura física seja elemento dinamizador do ecossistema de
inovação local. Na busca por novos modelos de desenvolvimento para evitar a
dependência da ZFM, o Amazonas investe em empreendedorismo com a primeira edição
do programa Sinapse da Inovação, com particular interesse nos setores que agregam valor
aos recursos naturais da biodiversidade (JAROSZEWSKI, 2018).
No caso específico do território da Casa Verde, para minimizarmos tais problemas
e sermos mais efetivos tanto no diagnóstico como no prognóstico do território, devemos
levar em consideração as questões das cadeias produtivas conforme discutido na seção
1.3. Logo, para reclassificarmos o sistema produtivo local por cadeias (ao invés de
setores), será realizada uma pesquisa primária entrevistando empresários, pesquisadores,
consultores, contadores e demais analistas dos sistemas produtivos locais, como está
previsto na fase dois e três do projeto Núcleo Casa Verde (PAIVA, 2013, p.156).
Mas se não podemos deixar de lado a pesquisa primária, ela não é o ponto
de partida da reclassificação de atividades. Na realidade, a riqueza informacional do quociente locacional (QL) é tamanha que os dados secundários nos permitem constituir hipóteses muito sólidas acerca do sistema de encadeamento em cada território. O ponto de partida é o cálculo do QL de cada uma das atividades do território. Para as atividades urbanas formais (indústria e serviços especificamente capitalistas) o cálculo deve se basear na relação entre emprego setorial e emprego global (tal como propõem Hildebrand e Mace). Para os serviços informais, que abundam nos setores de livre entrada (que vão da prostituição à produção e comércio de alimentos), a melhor base informacional são os Censos Demográficos (PAIVA, 2013, p.157).
Ora, todas as atividades que apresentam um QL particularmente elevado (acima
de 1,5) muito provavelmente são atividades propulsivas, e já sabemos que o número de
cadeias propulsivas em um território periférico é restrito. Logo, é de se pressupor que as
atividades de QL elevado façam parte de algumas poucas (ou mesmo de uma única)
cadeias propulsivas locais. A formulação de hipóteses começa pela identificação das
atividades que apresentam valores elevados, tanto nos QLs, quanto na produção absoluta.
O QL destas atividades serve de referência para a formulação de hipóteses acerca das
cadeias a que estão vinculadas as atividades urbanas (em especial, as atividades
industriais) de QL elevado. A pesquisa primária volta-se apenas à confirmação de
129
hipóteses que, normalmente, são formuladas a partir de deduções extraídas de
informações secundárias. Na realidade, o movimento mais complexo da reclassificação
das atividades econômicas do padrão setorial para o padrão encadeado não se encontra
tanto no desvendamento dos encadeamentos quanto na identificação das cadeias
autônomas (PAIVA, 2013, p.158).
3.3 - Parceria com a Área de Educação e Cultura, com Foco no Cidadão
Como diz o poeta, “nós queremos diversão e arte”. O território tem sempre suas
produções culturais, e a Casa Verde não é diferente: o samba das escolas de samba e o
samba rock aparece forte na região, o futebol tem na região os últimos seis grandes
campos de várzea ao norte da capital, com milhares de frequentadores. Todas estas
atividades pedem um melhor aproveitamento do seu imenso potencial, seja na cadeia
produtiva dos carros alegóricos, que a tecnologia de construção é trazida de fora, seja no
futebol que se tratado com o devido cuidado poderia prover aos vários membros da
comunidade um futuro melhor fazendo o que gostam e com um rendimento crescente.
Para isto escolas do bairro, escolas técnicas, cursos e universidades podem ajudar
a concretizar o objetivo comum desenhado por todos. A educação é fundamental para
gerar as competências e não expulsar do bairro sua comunidade original com o
crescimento que virá.
Com as fases um, dois e três do projeto concluídas, ficará mais fácil perceber
cadeias da economia criativa distribuídas pelo território e o que elas precisam. O foco é
gerar um desenvolvimento sustentável que abarque todos os moradores e população
flutuante do bairro, crescer a capacidade produtiva das pessoas por meio de educação para
prover o que o território valoriza hoje e o que pode levar o território a um padrão de vida
melhor a todos no futuro. A ideia é gerar um desenvolvimento olhando para as pessoas,
que elas possam continuar morando em um bairro mais desenvolvido porque também
puderam se desenvolver e com isto dispor de recursos diretos ou indiretos que lhes
permitem não serem expulsos do bairro em função de uma especulação imobiliária ou
aumentos de custo de vida no território.
O entendimento do perfil profissional dos moradores, os gaps de formação para
um emprego no território, juntamente com o perfil de empresas locais, irão propiciar,
juntamente com as escolas da região, a realização de um mutirão de treinamento para
130
aproveitamento destes tão importantes recursos e melhora na qualidade de vida dos
moradores e população flutuante.
Comunicação
As grandes empresas de comunicação cumprem um papel importante de
entretenimento e informação em escala nacional, mas não substituem a necessidade de
cada comunidade dispor dos seus próprios meios de comunicação. Cabe salientar a
importância da comunicação local como fator dinâmico do desenvolvimento. Projetos
isolados podem ser geridos por mecanismos burocráticos simples, mas criar um clima de
dinamismo e uma cultura de mobilização para resolver os problemas locais exige
mecanismos de comunicação vinculados à problemática local, gerando e difundindo
conteúdos que reflitam efetivamente as aspirações e o cotidiano diferenciado de cada
região, com forte participação dos principais atores sociais (PPNADL, p.60).
Localidades pequenas e pobres são essencialmente isoladas. Porém, as tecnologias
atuais permitem generalizar a inclusão digital de forma simples e barata. O EJ, aplicativo
Empurando Juntos, e outras formas de comunicar serão fundamentais para criar uma
comunicação focada nas necessidades locais, seus projetos, necessidades de mobilização
e informar o andamento e o resultado dos projetos locais de forma clara e na linguagem
local.
Um sistema público municipal, no nosso caso distrital, de acesso à internet banda
larga, poderia conectar a baixo custo o pequeno produtor ou um pequeno comerciante,
que poderia então comprar mais barato, pois passaria a conhecer melhor a oferta e a
ampliar as opções de venda. A generalização da conexão atrairá empresas novas, além de
melhorar o funcionamento das existentes. Como a iniciativa é pública, a Sub-Prefeitura
poderá cobrar um pouco mais das empresas, subsidiando assim o acesso de famílias mais
pobres. Já existe hoje um projeto da Prefeitura de São Paulo para criar grandes áreas com
wi-fi, e prevê grande crescimento para o ano de 2019. Ter acesso banda larga nas escolas,
em casa, em cada comércio, no hospital, muda radicalmente o modo de funcionamento
da cidade: é a informação que circula, e não necessariamente as pessoas. Um território
onde os diversos atores sociais e a própria população estão conectados racionaliza o uso
do tempo e de outros recursos. A conectividade em bairros pobres muda a atitude dos
jovens, melhora a produtividade escolar, gera novos interesses, constrói uma outra
131
cultura. Ninguém mais que o jovem sente o que é estar isolado, desconectado (PPNADL,
p.61).
Marcar uma consulta hospitalar por via digital não custa quase nada,
enquanto tomar o carro ou o ônibus e perder uma manhã gera custos não-desprezíveis. Quem tem de correr, na sociedade atual, não são as pessoas, é a informação. Cabe considerar também o processo na sua evolução: um número crescente de serviços estão sendo deslocados para gestão via internet, como as contas bancárias, e a não conexão significa um aprofundamento da exclusão digital dos pequenos produtores e dos pobres em geral. Assegurar conectividade generalizada tende a ser, hoje, tão essencial como a conexão com a eletricidade ou com a água potável. Generalizar a co- nectividade moderna significa romper o principal freio ao desenvolvimento das pequenas iniciativas, que é o isolamento. Trata-se de generalizar o direito de acesso (PPNADL, p.61).
Nesta direção, algumas das propostas do PPNADL, são muito pertinentes ao
projeto Núcleo Casa Verde:
1. Apoiar a constituição de emissoras locais, controladas por associações ou
consórcios sem fins lucrativos, com forte representação de entidades educacionais
e culturais, de forma a multiplicar, no nível local, meios abertos e participativos
de comunicação para e entre os atores locais de desenvolvimento, que podem hoje
ser uma emissora por internet, captada por um aplicativo nos mais simples
smartphone;
2. Promover a generalização da conectividade de internet, articulando infra-estrutura
pública, software livre e sistema de crédito para compra de computadores básicos,
dinamizando a liberação dos fundos previstos no FUST – Fundo de
Universalização dos Serviços de Telecomunicações, e assegurando
cofinanciamento com o Ministério das Comunicações no caso de iniciativas
municipais e das organizações comunitárias;
3. Apoiar e Fomentar a criação de uma agência nacional de informações sobre
desenvolvimento local, capitalizando e disponibilizando os bancos de dados
existentes sobre iniciativas locais na FGV-SP, PUC-SP, Instituto Pólis, Rede de
Tecnologias Sociais, Fundação Banco do Brasil e outros;
4. Estimular a organização de uma rede de informações/comunicações de micro e
pequenas empresas, com conteúdos específicos de informações comerciais e
tecnológicas, aproveitando experiências pontuais já existentes, em parceria com o
132
Ministério do Trabalho e as iniciativas de Economia Solidária e a Rede de
Tecnologias Sociais;
5. Incentivar a constituição de emissoras de rádio e TV nos colégios ou nas
universidades, como parte integral das atividades educativas, contribuindo para
transformar as unidades escolares em irradiadores de conhecimento para a
comunidade local e regional;
Aos pobres, como já afirmado, não falta criatividade, faltam oportunidades. Uma
família ou um grupo de famílias isoladas, sem informações sobre o mundo ao seu redor,
assistindo a programas desconectados das suas realidades, tornam-se naturalmente
espectadoras de um universo que não lhes pertence, e não protagonistas do seu
desenvolvimento. A comunicação e a informação efetivamente ligadas à sua realidade,
aos problemas do seu cotidiano e à apresentação das oportunidades da região, constituem
um componente essencial do desenvolvimento e uma das contribuições fundamentais das
novas tecnologias. Não é só na educação que as oportunidades de- vem ser iguais, mas
crescentemente também na conexão ao mundo do conhecimento digital (PPNADL, p.62).
Educação e capacitação
A formação aqui focalizada refere-se ao desenvolvimento de competências
necessárias para que uma região possa tomar em mãos a sua própria dinâmica de
transformação, visando no conjunto a uma comunidade economicamente viável,
socialmente justa e sustentável em termos ambientais. Isso requer a qualificação de um
contingente de pessoas capazes de analisar de forma integrada a realidade local e de
promover uma visão e propostas concretas para a melhoria da qualidade de vida
(PPNADL, p.67).
Precisamos de uma formação escolar completamente vinculada ao
conhecimento da realidade local, e fugindo dos atuais cursos mais avançados, que se encontram segmentados em fatias setoriais de conhecimento, sem que haja uma compreensão integrada da problemática concreta de um território. É premente a criação de um curso de gestão integrada territorial com uma visão holística, a exemplo dos cursos de administração empresarial que articulam cursos de finanças, de logística, de marketing, de gestão de pessoas, de contabilidade, de relações humanas, de gestão do conhecimento, sempre visando a preparar administradores capazes de entender, de forma articulada, as diversas dinâmicas que compõem a
133
gestão competente da unidade empresarial. Não existe, no plano da unidade territorial, nada que se pareça com isso.
A capacitação nesse conteúdo envolve diretamente o eixo Informação. Trata-se de assegurar a compreensão do potencial sócio-econômico local, partindo dos recursos subutilizados. Do ponto de vista do aproveitamento da nossa capacidade de trabalho, verifica-se que o Brasil tem milhões de pessoas desempregadas ou subempregadas, processo que se materializa em situações diferenciadas em cada município ou região do país. Conhecer a dimensão e a forma como se apresenta este problema localmente, permite conscientizar os moradores relativamente à irracionalidade que representa ter tantas pessoas paradas quando há tantas coisas para fazer (PPNADL, p.68).
Há outros tipos de potenciais subutilizados, como os da área turística, recursos do
subsolo, pesca, biodiversidade, muitos outros. O desafio é organizar um sistema de
capacitação que forme um contingente de pessoas que conheçam bem os problemas e os
potenciais da região. Justamente neste ponto entra o Projeto Núcleo, buscando com
pesquisa séria e georeferenciada organizar a informação e capacitar as pessoas nesse
conhecimento, bem como no conhecimento das alternativas tecnológicas e
organizacionais adotadas em outras regiões e municípios, cria-se uma nova dinâmica de
desenvolvimento na base da sociedade.
Até agora, no entanto, a inclusão produtiva da massa de excluídos do país não tem
sido o foco central dos sistemas de capacitação, prevalecendo o falso entendimento de
que a simples elevação do nível educacional (mais anos de estudo), ou a dinâmica de
crescimento econômico, resolverão o problema.
O PPNADL reuniu algumas propostas no campo da capacitação para o
desenvolvimento local integrado, que fazem muito sentido ao Projeto Núcleo:
1. Aumentar a parceria com as universidades parceiras do Núcleo, para que no futuro
breve, se formem cursos universitários de Desenvolvimento Local Integrado,
articulando conhecimentos de administração, economia, educação, engenharia,
serviço social e meio ambiente;
2. Reconhecer a formação e certificação de agentes de desenvolvimento como um
campo de ação educacional legítimo e prioritário, passível de ser exercido por
universidades e instituições especializadas a serem credenciadas;
3. Criar uma porta colocando em rede as instituições de formação na área, incluindo
universidades, sistema “S”, ONGs especializadas e organizações de
responsabilidade social empresarial (Instituto Ethos e outros), de modo a
favorecer a circulação de experiências e conhecimentos na área;
134
4. Assegurar, em cada local ou região, um programa de formação de lideranças
comunitárias em desenvolvimento local integrado, articulando as instituições
existentes;
5. Garantir, por meio de parcerias com instituições de pesquisa ou unidades
acadêmicas da região, e aproveitando os avanços em matéria de organização de
informações desagregadas por parte de instituições como IBGE, IPEA, Seade e
outras, a produção de material didático geral, tanto sobre a metodologia de
fomento do desenvolvimento local, como sobre as próprias regiões;
6. Propiciar parcerias com os meios de comunicação da região, visando a veiculação
de experiências exitosas de inovação na área do desenvolvimento local,
aproveitando o acúmulo de numerosas instituições que têm hoje milhares de
cadastros de inovações de desenvolvimento local;
7. Fortalecer, nas instituições regionais de formação profissional, o enfoque de
desenvolvimento integrado, junto com a formação nas cadeias produtivas com
maior potencial local ou regional;
8. Inserir no currículo escolar do ensino fundamental e médio, o estudo da realidade
local e regional, aproveitando em particular disciplinas como história, geografia e
ciências sociais;
9. Organizar ciclos de seminários regionais sobre o enfoque integrado de
desenvolvimento local, visando a formação de professores e a geração de uma
cultura de desenvolvimento participativo.
A visão geral que informa esta orientação é gerar as capacidades técnicas
que correspondam à necessidade de mobilizar a imensa capacidade subutilizada do “circuito inferior” da economia. A formalização, frequentemente apresentada como essencial para a modernização das inúmeras atividades com as quais os segmentos marginalizados da economia se defendem, não é um processo burocrático, mas sim um ponto de chegada, que envolve um conjunto de esforços de modernização e, portanto, pessoas formadas para empreendê-los.
Não se pode exigir da ampla base desempregada, semi-empregada, ou organizada de maneira mais ou menos caótica nos subsistemas informais, que participem de forma mais organizada do chamado circuito superior da economia, sem oferecer os instrumentos correspondentes. Nesse sentido, há uma convergência necessária entre a capacitação, a organização de sistemas locais de informação e a utilização dinâmica dos meios de comunicação. No plano institucional, esse esforço exige uma convergência de ações dos mais diversos atores que detêm segmentos do conhecimento sobre o desenvolvimento local. (PPNADL, p. 74)
135
3.4 – Potencial Econômico, Desenho Compartilhado de Futuro e Governança
Este setor do projeto visa a entender como, na prática, alguns potenciais
econômicos se criam a partir de decisões compartilhadas de um grupo com uma visão
comum. Exemplo disso é que nenhuma teoria econômica respaldaria a construção de uma
fábrica de aviões no Brasil dos anos 60, mas ela existe e ainda exporta para o mundo todo.
Serão comparadas as lógicas de construção de outras agências de inovação e
desenvolvimento, buscando qual delas mais se adequa à realidade encontrada no bairro,
buscando pontos que alavanquem a construção e operação do Núcleo Casa Verde, seus
desafios e qual será a estratégia de mobilização e engajamento no projeto com vistas à
execução do projeto desenhado por toda a comunidade.
A partir da receptividade do poder instituido na região, tanto formal como
informalmente, será desenhado o projeto conjunto de governança e transparência. Após
o término da fase 1 teremos como identificar como estão a governança do território e a
aceitação de projetos de desenvolvimento sustentável feitos a partir de um desenho
compartilhado.
O ponto de partida necessário de todo e qualquer planejamento do
desenvolvimento econômico territorial é a identificação e hierarquização das cadeias (ou
atividades encadeadas) propulsivas em função da geração atual de emprego e renda total
(direta, nas atividades nucleares; e indireta, nas atividades à montante e à jusante dos
núcleos da cadeia). Uma vez identificadas as cadeias mais importantes, o passo seguinte
é avaliar a capacidade diversificativa das mesmas. As cadeias com maior capacidade de
diversificação são aquelas que tendem a se integrar verticalmente no território.
Usualmente, as cadeias com maior potencial de integração vertical são aquelas que
utilizam fundamentalmente insumos manufaturados (por oposição a insumos produzidos
em processos contínuos) e não estandardizados (PAIVA, 2013, p.145).
Além disso, é fundamental avaliar o potencial de expansão da demanda sobre os
núcleos centrais da cadeia e a capacidade de resposta competitiva do território à demanda
expandida. Se a demanda externa apresentar sinais de estagnação, ou se a demanda estiver
crescendo a taxas inferiores à expansão da oferta em outros territórios (que apresentam
perfil mais competitivo para a produção dos bens nucleares da cadeia), o crescimento
econômico local estará comprometido. A única forma de driblar os desafios postos por
uma demanda estagnada e/ou pela emergência de concorrentes com vantagens
competitivas incontestáveis é por meio da adoção de políticas de diversificação (e, no
limite, reconversão) produtiva local (PAIVA, 2013, p.147).
136
Caso as principais cadeias propulsivas apresentem grande potencial de expansão
de demanda, oferta e integração vertical, o planejamento deve se voltar à identificação
dos gargalos. A despeito de haver apenas um gargalo mais apertado e a despeito dele ser
o único cuja expansão possa contribuir para a ampliação do fluxo de renda, a identificação
dos gargalos secundários deve ser feita imediatamente. E isto porque o tempo necessário
para o alargamento dos gargalos é diversificado. De sorte que, se o gargalo mais estreito
for de fácil alargamento, e os gargalos secundários solicitarem investimentos de longa
maturação para serem superados, é preciso dar início simultaneamente ao enfrentamento
de gargalos distintos. Assim, a expansão dos gargalos subsequentes se seguirá
rapidamente à superação do gargalo mais apertado. Em especial, gargalos de oferta que
pressupõem a realização de novos investimentos para a sua superação devem ter seu
enfrentamento iniciado com significativa antecedência. A atração de investimentos
externos ou a construção de um sistema local de financiamento dos investimentos
necessários à superação dos gargalos de oferta por produtores locais via de regra envolve
tempo, e devem ser tratados em simultâneo à expansão de gargalos mais apertados, mas
de superação mais simples e rápida (PAIVA, 2013, p.160).
Simultaneamente, é preciso apoiar as firmas que operam em não-gargalos com
vistas a inovarem na utilização de seus recursos. Este passo é decisivo para a
diversificação horizontal da produção regional e a superação de sistemas de cadeia única
para sistemas de multi-cadeias e organização em rede. O padrão inovativo de referência
é o padrão de Penrose, que busca maximizar os benefícios por unidade de dispêndio a
partir da correta identificação de recursos subutilizados ou utilizados de forma subótima.
Por fim, é preciso atentar para a expressão relativa, grau de diversificação e para
a existência de eventuais gargalos limitadores da expansão das atividades reflexas de consumo. Afinal, a centralidade das atividades propulsivas encontra-se no fato delas serem a origem da renda primária. Mas a renda total do território também depende do multiplicador do mesmo. E, muitas vezes, o gargalo não se encontra no valor das exportações (venda para fora do território) ou no grau de integração vertical no território das atividades X propulsivas nucleares, mas na capacidade de multiplicação da economia local. Apoiar o comércio local e a oferta local de serviços de educação, saúde, cultura e lazer não são tarefas economicamente secundárias. Territórios submetidos a uma polarização particularmente intensa, como os municípios da periferia das grandes regiões metropolitanas, encontram, via de regra, no vazamento da renda para fora e no baixo multiplicador local o principal gargalo de seu crescimento. Enfrentar este gargalo pode ser muito mais relevante para a dinamização da economia local do que a atração de novos empreendimentos e cadeias X propulsivas (PAIVA, 2013, p.163).
137
Enfim, o padrão de diagnóstico é sempre essencialmente o mesmo, e é dele que
parte todo o resto. Todavia a realidade, os desafios e as soluções serão sempre
essencialmente distintos. O único princípio absolutamente universal é o princípio grego
inscrito no pórtico do templo de Apolo em Delfos: conhece-te a ti mesmo. Uma vez
conhecida a realidade e os desafios únicos de cada território, será mais fácil encontrar as
alternativas de trajetória e a melhor forma de superar obstáculos e expandir gargalos.
(PAIVA, 2013, p.164)
Trabalho, emprego e renda
A concentração de renda no Brasil se deve a uma distribuição injusta. Mas esta,
por sua vez, está baseada na inserção produtiva desigual da população ativa. A divisão do
país em “circuito superior” e “circuito inferior” da economia não separa apenas o país
entre ricos e pobres, mas, sobretudo, entre incluídos e excluídos do acesso aos sistemas
econômicos mais produtivos. Em outros termos, grande parte da população está privada
do direito de ganhar decentemente a sua vida. É preciso ir além da espera pelo emprego
e além de formar as pessoas para torná-las empregáveis. É preciso gerar as atividades
econômicas necessárias.
A grande empresa é produtiva não só porque é bem gerida, mas porque tem acesso
à tecnologia, aos financiamentos, aos circuitos comerciais, a sistemas bancários de
cobrança, a especialistas bem formados, além de funcionar numa rede de fornecedores, a
montante, e de distribuição, a jusante. A pequena empresa, as pequenas iniciativas
comunitárias, as ONGs que promovem atividades socioeconômicas de diversos tipos e
até as iniciativas públicas locais carecem desse tipo de rede de sustentação. Quando se
apresenta a mortalidade infantil da pequena e média empresa, as dificuldades dos
assentamentos rurais, a fragilidade das unidades escolares ou de saúde que servem às
comunidades mais pobres, foca-se, em geral, problemas de gestão incompetente, quando
na realidade trata-se essencialmente de um sistema inadequado de suporte (PPNADL,
2006, p. 75).
São problemas muito concretos. No sul da Bahia, uma comunidade litorânea
que dispõe de um grande potencial turístico precisaria de uma dinâmica integrada de apoio a essa atividade, que envolve uma rede de informações sobre nichos turísticos menos conhecidos. Mas recebeu como apoio, apenas um curso do Sebrae para formação de garçons e camareiras. A iniciativa é boa, mas insuficiente, pois se trata de atrair o turista e retê-lo. É preciso assegurar o ciclo completo da atividade turística.
138
No caso dos catadores de castanha do Amapá, formaram uma cooperativa que firmou parceria com a universidade, o que lhes deu acesso a um laboratório químico. Hoje, extraem das castanhas essências para fabricantes de perfumes e, em vez de vender o produto bruto aos atravessadores, vendem as essências diretamente à perfumaria francesa, pois se conectaram em circuitos comerciais via internet. No caso da Pastoral da Criança, seus 3.500 núcleos dispõem do apoio técnico, informativo e organizacional de uma rede bem organizada: trata-se de comunidades pobres, com gente de formação relativamente limitada, mas apoiadas de maneira simples e eficiente em todos os cantos do país, inclusive com um sistema de comunicação rico em informações. Não há um plano de saúde no país que se compare, em termos de eficiência orga- nizacional e de relação custo-benefício, com a Pastoral: o custo criança-mês é de R$ 1,37. Pobre não é menos criativo que rico, precisa apenas de um sistema comparável de apoio (PPNADL, 2006, p. 76).
O problema básico é simples: os serviços de apoio da grande empresa,
intermediação financeira, publicidade, sistemas de transporte e estocagem, apoio técnico,
são de capital privado e não se interessam por pequenos produtores ou organizações
comunitárias, interessados que estão em economias de escala, em grandes contratos. É
isso que levou os países hoje desenvolvidos a formarem sistemas capilares e
descentralizados de serviços de apoio, sob a forma de cooperativas de crédito, bancos
comunitários, cooperativas de distribuição e núcleos de apoio tecnológico. O apoio às
unidades menores exige iniciativa pública.
A situação dos desempregados é particularmente dramática. Pelos critérios do
DIEESE, eles representam algo na ordem de 15 milhões de pessoas. Tanta gente parada constitui um paradoxo. É preciso considerar que o Brasil necessita de milhões de residências, para pessoas que vivem em habitações sub-humanas. Também são necessárias milhares de pequenas obras de saneamento básico, em praticamente todas as cidades do país. Ambas as atividades são pouco intensivas em capital e muito intensivas em mão de obra pouco qualificada, que existe de sobra. São atividades de retorno quase imediato, pois casas decentes melhoram as condições de estudo das crianças, o clima doméstico em que vive o trabalhador, a segurança dos bairros. No caso do saneamento, cada real gasto reverte em quatro reais economizados na área da saúde. Existem ainda inúmeras atividades de manutenção urbana a serem realizadas nas cidades, efeito da urbanização acelerada e caótica das últimas décadas. Há que desenvolver um conjunto de atividades agrícolas peri-urbanas, na linha dos “cinturões verdes” de horti-fruti-granjeiros (PPNADL, 2006, p. 77).
Como essas atividades terminam se auto-financiando, pela redução de gastos em
outros setores, é racional direcionar recursos públicos para dinamizá-las. Isto poderá ser
feito por meio de cooperativas de serviços urbanos ou de associações de bairro, de
emprego temporário, mas o essencial é conjugar o conjunto de pessoas que querem ganhar
seu sustento e as atividades que clamam por serem realizadas.
Há numerosos exemplos tanto no Brasil como no exterior, em que se gera
emprego, tirando as pessoas do desespero, ao mesmo tempo em que se desenvolvem infra-
139
estruturas necessárias e se dinamiza a economia local pelo fluxo de renda gerado. Como
essas atividades associam trabalho e requalificação profissional, a dinâmica tende a abrir
outras frentes de atividades e a melhorar o emprego em geral. Na Índia, foi aprovada a
Lei de Garantia do Emprego (Employment Guarantee Act), que assegura a toda família
um mínimo de 100 dias de emprego por ano; a iniciativa está sendo generalizada a todo
o país, depois de 10 anos de funcionamento experimental com sucesso no Estado de
Maharashtra (PPNADL, 2006, p. 79).
No caso das inúmeras iniciativas da sociedade civil organizada, sua maior
presença tem sido na área social, como educação, saúde, cultura, serviços social e
semelhantes, área que coincide com os maiores atrasos e, portanto, com as necessidades
mais urgentes do país. O cofinanciamento nessa área pode ser particularmente produtivo,
pois estas formas de prestação de serviços levam a dinâmicas participativas que tendem
a organizar as comunidades em torno aos seus interesses, criando capital social. Ajudar
as comunidades a se ajudarem não livra o Estado de sua responsabilidade, pelo contrário,
gera uma comunidade mais participativa, consciente e capaz de exigir e de controlar. Um
esforço especial tem de ser feito no apoio às lideranças comunitárias, pois são essenciais
para gerar dinâmicas de desenvolvimento em qualquer agrupamento.
No conjunto, é essencial que a dinâmica do desenvolvimento seja vista como um
esforço integrado e articulado em cada território, pois cada região tem suas
especificidades, sua cultura própria, seus ritmos e interesses. Cada município tem de fazer
o seu próprio balanço, avaliar a sua racionalidade econômica, social e ambiental, e
maximizar o uso dos recursos disponíveis. O apoio ao planejamento dessas atividades, e
a articulação das diversas instituições de suporte, podem contribuir na criação de um
clima dinâmico de mobilização para o desenvolvimento (PPNADL, 2006, p. 85).
Das várias propostas selecionadas no programa de estudos, selecionamos algumas
com maior pertinência ao Projeto Núcleo:
1. Criar um sistema público/privado local de intermediação de mão-de-obra,
contendo tanto o cadastro detalhado dos desempregados como alternativas de
capacitação e encaminhamento para o desenvolvimento de atividades laborais
locais públicas e privadas;
2. Assegurar instrumentos para que o território possa constituir parcerias
institucionais direcionadas à formação e qualificação ocupacional, não apenas em
conformidade com a vocação econômica local, mas também acoplada à prestação
de serviços públicos locais;
140
3. Adotar o princípio da prioridade na contratação de trabalhadores residentes na
localidade, seja nas atividades vinculadas ao gasto público em manutenção
urbanística, lazer e merenda escolar, seja em investimentos na infraestrutura,
construção residencial e semelhantes;
4. Divulgar e disponibilizar a legislação referente à prestação temporária de serviços
públicos remunerados e com carteira assinada, conforme experiências adotadas
com sucesso em cidades como Santos, Mauá, São Paulo, entre outras;
5. Gerar as condições necessárias para que cada prefeitura possa organizar uma lista
dos serviços públicos a serem desenvolvidos anualmente, contendo o valor
estabelecido pelo orçamento municipal, com vistas à criação de empreendimentos
locais voltados à prestação dos serviços públicos no território;
6. Construir ambiente para que cada município desenvolva e generalize informações
sobre o custo da geração de postos de trabalho nas diferentes atividades, com o
objetivo de privilegiar o aproveitamento da força de trabalho disponível
localmente;
7. Promover parcerias entre o setor público local e as organizações da sociedade
civil, empresas locais e regionais, com o objetivo de promover a plena utilização
de força de trabalho local;
8. Assegurar as condições gerais para que seja possível a subprefeitura estabelecer
co-financiamento das atividades de saneamento básico, construção habitacional,
produção alimentar, disponibilização de água limpa, iniciativas de segurança
alimentar (cinturões verdes, merenda escolar produzida localmente, entre outras)
com mão-de-obra local;
9. Adotar as medidas necessárias para a flexibilização das iniciativas de prestação
de serviços de educação, saúde, habitação e outros em regiões pobres, com a
participação de organizações da sociedade civil.
A recomendação de que qualquer pessoa disposta a trabalhar possa ganhar o
pão da sua família não pode ser considerada subversiva ou assistencialista. Constitui um mecanismo concreto para assegurar um mínimo de respeito à dignidade intrínseca da pessoa humana, além de assegurar o desenvolvimento de obras e serviços necessários nos planos econômico, social e ambiental.
Quando se vê um esgoto a céu aberto, com crianças se contaminando, gerando custos sociais e econômicos incalculáveis, além de representar uma situação revoltante em termos de dignidade humana, não se pode ficar esperando que apareçam grandes recursos para grandes obras: se a comunidade interessada está disposta a participar, deve-se assegurar o complemento de recursos técnicos, organizacionais e financeiros necessários (PPNADL, 2006, p. 86).
141
Uma vez mais, não se trata de retirar as responsabilidades do Estado: uma
comunidade que se organiza para resolver os seus problemas saberá exigir de maneira
organizada os seus direitos, condição básica para a produtividade sistêmica do território
e passo concreto na afirmação de uma verdadeira democracia participativa. Finalmente,
importa lembrar que o avanço na geração de em- pregos e da inclusão produtiva depende
do conjunto dos eixos já analisados: sistemas mais flexíveis de financiamento, apoio
tecnológico generalizado, suporte institucional, capacitação, informação e comunicação
descentralizados (PPNADL, 2006, p. 86).
3.5 – Crédito e Fomento
Como discorrido longamente, o processo do investimento é fundamental para a
criação das condições para a aproximação do pleno emprego. O consumo das famílias
sozinho, por melhor que seja a propensão em consumir, que no caso dos assalariados é
próxima de um, sem o consumo dos empresários e os gastos em infraestrutura do Estado
não atingirá o objetivo. Este investimento pode ser dirigido e facilitado pelo Estado se
houverem linhas de crédito para tal fim, por meio de políticas para eliminação da escassez
de capital e a diminuição de seu custo, viabilizando número maior de empreendimentos
com taxas de retorno que do contrário não se viabilizariam.
O setor a ser investido pode, por meio de um multiplicador econômico maior ou
menor e de uma elasticidade de emprego maior ou menor, ter seu resultado aumentado
em várias vezes a partir do valor inicial, podendo também promover mais velocidade e
quantidade de empregos se bem estudado, em função das necessidades e potencialidades
do território.
Como vimos, o investimento gera seu próprio financiamento se os sistemas de
financiamentos bancários estiverem voltados a esta modalidade e não a ter lucro de
tesouraria em função das altas taxas Selic, como no caso brasileiro. Uma política de
crédito regional, como é feito na Alemanha (sparrkassen), ajudaria a viabilizar os projetos
de investimento no território.
O estudo do ciclo econômico, para entender a forma de se manter o crescimento,
e o estudo das empresas na forma de concorrência, permitem entender se o investimento
escolhido para o território irá propiciar uma participação estratégica na cadeia produtiva,
podendo gerar um subserviência ou não das empresas do território a outras empresas
142
líderes da cadeia produtiva, redistribuindo contra o território a renda do negócio e a favor
da empresa líder, fora do território.
A partir das fases um, dois e três saberemos onde e o que deveremos financiar e
porquê. Com foco nisto, o próximo passo é entender quais são as medidas de nível
nacional que melhoram o espaço e a eficiência da gestão local. A reforma tributária, a
descentralização e a democratização da mídia, a flexibilização do acesso aos
financiamentos para a área social e outras iniciativas deverão constituir preocupações
crescentes, à medida em que as ações locais adquirem maior peso e presença no cenário
nacional.
Crédito
Os Estados Unidos, ainda que apoiem a globalização financeira, criaram uma lei
de reinvestimento comunitário (Community Reinvestment Act- CRA), obrigando as
agências bancárias a reaplicarem boa parte dos recursos captados na própria comunidade,
por meio de um sistema de pontuação que as priva de acesso a projetos com financiamento
público caso não atinjam a produtividade exigida. Essa precaução é necessária, na medida
em que as novas tecnologias de informática tornam muito fácil drenar as poupanças e
transferi-las para aplicações financeiras nas grandes praças (DOWBOR, 2017).
Na Alemanha, a maior parte da poupança do país é administrada por caixas de
poupança dispersas nas cidades e vilas, assegurando que seja utilizada segundo as
necessidades efetivas das comunidades. Na França, generalizou-se o sistema de ONGs de
intermediação financeira, permitindo que os poupadores tenham controle do uso final das
suas poupanças, com garantia do Estado. Na Suécia, 72% dos recursos públicos são
administrados no nível local. É de se lembrar ainda que a Coréia do Sul assegurou, durante
o seu acelerado processo de crescimento econômico, uma política de Estado dirigindo
crédito aos pequenos produtores e às regiões mais pobres, mantendo distribuição de renda
equilibrada durante todo o período (PPNADL, 2006, p. 22).
No Brasil, já é possível contabilizar a presença de uma série de iniciativas
significativas, que procuram dar resposta a uma situação que atinge patamares preocupantes. Assim, há esforços buscando desenvolver o crédito cooperativo,
micro-crédito, agências de garantia de crédito e empreendimentos congêneres. O
programa de Desenvolvimento Regional Sustentável do Banco do Brasil constitui um
143
exemplo da evolução de instituições financeiras para uma visão de apoio territorial
integrado ao desenvolvimento. O Programa Nacional de Micro-crédito Produtivo
Orientado (PNMPO) envolve hoje 158 instituições. São iniciativas importantes, que começam a reverter a tendência, mas o que se tornou urgente é a elaboração de uma
política sistemática de re-capitalização das comunidades por meio de um conjunto de
medidas convergentes (PPNADL, 2006, p. 22).
Como propostas aderentes ao território da Casa Verde, e que na sua maioria
dependem de legislação específica, mas viabilizaria muitos projetos locais e nos colocaria
em linha com melhores práticas internacionais de financiamento local, temos:
1 No conjunto, aumentar o volume de crédito disponível para o “circuito inferior”
da economia, revertendo o processo de descapitalização em curso, por meio de
regulamentação mais rigorosa das políticas de crédito das instituições financeiras.
Uma meta possível seria assegurar, no prazo de quatro anos, que os recursos
destinados ao micro e pequeno empreendedor representem pelo menos 25% do
total de operações de crédito destinadas ao fomento de atividades produtivas, e
10% do volume de recursos aplicados pelos bancos comerciais;
2. Articular uma política integrada de apoio aos tomadores de crédito nas
comunidades mais pobres: a simples disponibilização não é suficiente, na medida
em que falta generalizar as iniciativas de organização da demanda nas
comunidades, já adotadas por várias instituições, bem como a capacitação de
lideranças comunitárias sobre formas de acesso;
3. Fixar uma porcentagem de reinvestimento local das poupanças, na linha do CRA
norte-americano, e assegurar mecanismos de incentivo às agências que
privilegiem investimentos produtivos locais relativamente às aplicações
financeiras. A proposta envolve igualmente que os intermediários financeiros
informem a distribuição geográfica dos empréstimos, de forma a dar transparência
aos fluxos locais e regionais de capitalização e descapitalização existentes;
4. Condicionar a bonificação de agentes de crédito das instituições tradicionais de
intermediação financeira ao desempenho de aplicações produtivas locais,
premiando as iniciativas que gerem inclusão produtiva;
5. Agilizar e flexibilizar a abertura de cooperativas de crédito, seja por meio da
aprovação de um novo marco legal para o setor, seja por meio da
desburocratização do processo de formação e fechamento das mesmas;
6. Promover a formação de agências locais de garantia de crédito, na linha das que
já estão dando resultados para cooperativas no Sul do País, com amplo esforço de
144
divulgação das formas práticas de implementação. Uma forma de apoio poderá
ser a orientação de recursos do Programa de Apoio ao Microcrédito Produtivo do
BNDES para a formação de fundos de aval para Agências Locais de Garantia de
Crédito;
7. Oferecer co-financiamento aos municípios interessados em lançar projetos de
desenvolvimento local, potencializando os recursos do governo. O co-
financiamento deverá se constituir em alavanca poderosa de racionalização, ao
promover articulação entre iniciativas das diversas esferas de governo;
8. Organizar formação e informação sobre as atividades, direitos e deveres da
intermediação financeira, gerando e divulgando cartilhas informativas e
promovendo cursos de popularização de conhecimentos, visando a compensar a
assimetria de informação existente no setor;
9. Facilitar o financiamento a organizações da sociedade civil que atuem na
prestação de serviços sociais e ambientais, exigindo a mesma transparência de
prestação de contas de qualquer empresa, facilitando, na linha do que ocorreu na
Europa, a formação de organizações sem fins lucrativos de intermediação
financeira;
10. Montar um serviço online de informação comercial para o pequeno e médio
produtor, em rede nacional, de forma a reduzir o peso dos atravessadores no
processo, e desintermediando as atividades produtivas;
11. Reforçar a criação de mecanismos públicos ou cooperativos de comercialização
para pequenos e médios produtores, assegurando alternativa de canal de
comercialização à dos atravessadores;
12. Assegurar que as compras feitas com recursos públicos sejam realizadas
diretamente com os produtores finais, emancipando-os dos intermediários, e
priorizando bens e serviços de micro, pequenos e médios empreendimentos
existentes no município ou na micro-região, promovendo as necessárias alterações
na legislação das licitações (Lei Federal 8666), bem como nas demais normas que
regulam as compras governamentais;
13. Assegurar financiamento a iniciativas de desenvolvimento institucional voltadas
para entidades que operam com micro-crédito, estimulando sua maior integração
com processos de desenvolvimento de base territorial, particularmente quando
envolvem cooperativas ou associações;
145
14. Constituir um fundo de apoio à implementação de planos integrados de
desenvolvimento local, visando ao cofinanciamento das iniciativas, articulando-
as com as agências de crédito e com as instâncias locais de produção.
As propostas visam a recapitalizar as comunidades através de maior volume de
recursos, juros radicalmente mais baixos, maior capilaridade, simplicidade de acesso,
desburocratização, flexibilização das garantias, formação de agentes de crédito capazes
de trabalhar com demanda diversificada, desintermediação comercial e outros. Não se
pedem donativos, pedem-se eficiência e adequação à demanda real de financiamento de
pequenas iniciativas capazes de gerar emprego e renda. Cabe lembrar, ainda, que o objetivo geral de recapitalização do desenvolvimento
local exige que se respeite a extrema diversidade de situações e necessidades. Uma das idéias-força reiteradas em numerosas entrevistas é que um sistema de
intermediação financeira trabalhando apenas com oferta rígida, produtos de
prateleira, em vez de escutar os problemas e se adaptar à demanda, pode ser eficiente em termos de gerar lucros ao banco, mas não para dinamizar a economia. A atividade-
fim é a produção, não a intermediação. Nunca é demais lembrar que os intermediários
financeiros recebem uma carta-patente do governo, autorizando-os a captar dinheiro que é da população e que deve, minimamente, ser utilizado segundo interesses sociais
(PPNADL, 2006 pag 27).
3.6 – Alinhamento Internacional dos Indicadores e Riscos do Projeto
Serão alinhadas as metas e os indicadores do território aos 17 Objetivos de
desenvolvimento sustentável da ONU, a fim de poder comparar as melhorias de qualidade
de vida do território ao Brasil e ao Mundo.
De acordo com o PNUD, a nova agenda para o desenvolvimento sustentável,
intitulada “Transformando Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento
Sustentável”, é um plano de ação para que a humanidade fortaleça a paz universal com
mais liberdade por meio de uma declaração com 17 ODS e 169 metas. Destaca-se que os
ODS trazem uma forte perspectiva de resolução dos problemas globais por meio do poder
local, colocando gestores locais e cidades como protagonistas da conscientização e
mobilização em torno da agenda da sustentabilidade. Um grande exemplo é o 11º
objetivo, que tem como foco tornar as cidades e os assentamentos humanos em inclusivos,
seguros, resilientes e sustentáveis (Conti, 2018, p.19). Pretende-se que os indicadores do
146
mapa estratégico do território tenham convergência com os 17 ODS, facilitando com isto
nossa comparação com outros territórios mundo afora e também o acesso a fundos de
investimento internacionais, alguns a fundo perdido.
Todo projeto vive dois grandes dilemas, primeiro a força do engajamento de todos
os públicos envolvidos no desenho, incluindo os parceiros para implementação do projeto
no bairro, e a falta de recursos para impulsionar as ações. Teremos um bom retrato destes
riscos à medida que nos aprofundarmos na fase um, dois e três. Até o presente momento
a recepção têm sido muito boa. Nas apresentações do projeto e posterior indagação acerca
das necessidades de cada ente do território, na grande maioria das vezes os vários públicos
encantam-se com a ideia e nos perguntam o que podem fazer para ajudar. Parece que,
apesar de ser grande o desafio, há muitos que querem ajudar.
Informação
A produtividade sistêmica do território depende de uma grande densidade de
informação, bem organizada e disponibilizada para todos os atores sociais interessados.
Com as novas tecnologias de informação e comunicação, ter uma comunidade bem
informada sobre os seus problemas, suas oportunidades e potenciais, tornou-se
relativamente fácil e barato. Considerando os ganhos de produtividade obtidos e os custos
hoje reduzidos das novas tecnologias, organizar um bom sistema local de informação
constitui uma das ações de melhor relação custo-benefício.
Costuma ser alto o grau de desinformação dos vereadores, frequentemente dos
prefeitos, e também dos empresários e movimentos sociais, sobre os dados concretos da
região onde atuam. Nenhum diretor assumiria uma empresa sem informações gerenciais.
No entanto, é essa a situação real de grande parte dos responsáveis pelas decisões de nível
local. O resultado é a grande dificuldade de se administrar o território de forma a que as
diversas iniciativas possam convergir e gerar sinergias (PPNADL, 2006, p. 49).
As informações existem. Cada secretaria do município produz informações,
as empresas são registradas em cadastros, há pesquisas e estudos, levantamentos de empresas especializadas, estatísticas do IBGE e dos órgãos estaduais. Mas as informações são fornecidas às instâncias superiores de decisão e não são devolvidas de maneira organizada para os atores locais. Elas possibilitam a publicação de anuários estatísticos nacionais e a elaboração de teses de pós-graduação nas universidades, mas para dinamizar a produtividade sistêmica local é preciso que a informação gerada seja organizada e desagregada territorialmente, em função das necessidades de racionalização do processo decisório local.
147
Não há participação cidadã sem informação organizada. A fragmentação das informações existentes, segmentadas em setores, obedecendo a metodologias diferenciadas segundo a instituição externa que elabora, não permite que as informações sejam integradas no plano local. As próprias informações financeiras do município são organizadas em função das classificações do Tribunal de Contas, para efeitos de controle, e não para efeitos de gerenciamento e racionalização da alocação de recursos (PPNADL, 2006, p. 50).
O problema é agravado pelo fato de as divisões territoriais de cada setor serem
diferentes, formando regiões dos mais variados recortes, segundo se trate de educação ou
de saúde, do processo eleitoral ou das atividades de segurança. Cada setor organiza o seu
próprio mapa, dificultando a construção de um sistema integrado e coerente de
conhecimento. Como integrar as políticas sociais, por exemplo, e organizar dinâmicas
participativas, se um cidadão pertence a diferentes regiões segundo o setor social que será
discutido?
O fato é que as administrações locais são vistas, de forma geral, como
fornecedoras de informações, para que os centros de decisão que ficam mais acima
possam levar os seus interes- ses em consideração, ou assegurar melhor os seus próprios
interesses. Esse tipo de filosofia da informação é coerente com uma ideologia política que
vê a sociedade como usuária, ou até como cliente, mas não como sujeito do processo
decisório. O eixo central consiste, portanto, em entender que é o conjunto dos atores locais
que devem ser adequadamente informados, para que possam participar ativamente das
decisões sobre os seus destinos. É uma condição tanto da racionalidade da gestão local,
como da promoção de processos mais democráticos (PPNADL, 2006, p.51).
De certa forma, o mundo tecnológico da informação mudou radicalmente, mas a
informação continua sendo produzida da maneira tradicional, segundo categorias, formas
de organização e de acesso que obedecem a outra era. A luz mal direcionada apenas
ofusca, não ilumina o caminho. O grande desafio que se coloca é o da organização da
informação conforme as necessidades práticas dos atores sociais que intervêm no
processo de desenvolvimento local.
A Prefeitura de Porto Alegre passou o seu cadastro de empresas que atuam na
cidade, e que se registram para obter alvará de funcionamento, para um mapeamento microrregional. Com isto, fica-se sabendo onde estão os bares, as padarias, as farmácias, as indústrias químicas e outros tipos de unidade. Quando um cidadão quer abrir uma farmácia, por exemplo, em vez de registrar apenas, de forma burocrática, o pedido de autorização, permite-se ao candidato ver no mapa da cidade onde estão localizadas as farmácias existentes, quais regiões estão sobre-equipadas e em que áreas faltam farmácias. Gera-se assim uma distribuição adequada dos equipamentos, dispensando planos autoritários sobre a rede de farmácias e outros serviços, e sem
148
privar o cidadão da liberdade de iniciativa, inclusive sobre a microlocalização final. (PPNADL, 2006, p. 52)
O objetivo central no eixo referente à informação é promover as formas de
organização, disponibilização e divulgação das informações referentes a determinado
município ou região, de modo integrado e coerente, aproveitando as mais variadas fontes,
visando um universo onde o desenvolvimento local integrado tenha sólidas bases
informativas. A força da proposta reside, em boa parte, no fato de haver um imenso
esforço de numerosas instituições, produzindo e estocando informação, sem que se tenha
criado uma forma adequada de disponibilização em função da demanda local existente.
O grande investimento, que é a produção da informação, já foi efetuado. Trata-se de
agregar uma forma complementar de sua utilização. Com as tecnologias atualmente
existentes, trata-se de um projeto relativamente simples e de produtividade social
extremamente elevada.
O que se propõe é a construção de um território denso em informações,
disponibilizadas de forma clara e simples para o conjunto de atores. Das propostas
recolhidas a respeito deste eixo e que podem nortear a agenda da geração de um melhor
ambiente de dinamização econômica e social para o projeto Núcleo, separamos:
1. Formalização de um tronco básico de informações locais integradas, aproveitando
os diversos subsistemas já desenvolvidos (IBGE, SIM - Sistema de Informações
Municipais da Caixa Econômica Federal, DATASUS, etc.), a ser
obrigatoriamente disponibilizado em cada município e no nosso caso em
subregiões iguais (como o IBGE já vêm fazendo com SP- Capital);
2. Implantar metodologia de balanços anuais de qualidade de vida municipal ou
micro-regional, dando à população local instrumentos para avaliar os avanços
reais da sua região;
3. Inclusão de estudos sobre a própria localidade nos currículos escolares, em
particular nas disciplinas geografia, história e ciências sociais, na linha da cartilha
de formação dos conselheiros municipais de educação adotada pelo MEC, visando
a formar uma geração de jovens que conheçam a sua região, os seus potenciais e
as suas necessidades;
4. Incentivar, na rede de universidades, a elaboração de monografias regionais e de
material de ensino sobre a realidade local e regional, tanto através dos TCCs
(trabalhos de conclusão de curso) como dissertações de mestrado e teses de
doutorado, formando assim bancos de dados de informações de cada região,
livremente acessíveis por todos os atores sociais interessados;
149
5. Ampliar no IBGE e instituições estaduais a capacidade de elaboração e
disponibilização de estatísticas básicas municipais, capilarizando a capacidade de
organização de dados no nível local pelo IBGE, e incentivando a generalização de
iniciativas de organização de dados locais na linha dos trabalhos do Seade –
Sistema Estadual de Análise de Dados, do Estado de São Paulo;
6. Adotar metodologia de disponibilização de informações financeiras gerenciais,
ampliação e generalização do Siafem – Sistema de Administração Financeira para
Estados e Municípios, e metodologias semelhantes, assegurando assim a
transparência para os atores locais do uso dos recursos públicos;
7. Regulamentar a lei de direito de acesso à informação no nível municipal, aprovada
em 2005, garantindo maior transparência da gestão pública local e aperfeiçoando
suas disposições no sentido de definir o marco jurídico do sistema de informação
local; o princípio jurídico adotado nos EUA, The Right to Know (o direito de
saber), serve como referência;
8. Organizar um núcleo/centro de informações municipais autônomo, por meio de
parcerias com instituições afins (escolas locais, eventuais faculdades, parcerias
com o sistema S, organizações não governamentais), assegurando que cada região
tenha uma fonte claramente identificada de recolha e redistribuição das
informações locais e regionais, como pretendemos fazer no Núcleo Casa Verde,
para medir nossos avanços:
9. Desenvolver os sistemas de informação inter-institucional no nível local e
regional, na linha do Guia de Geração de Trabalho e Renda, (www.mds.gov.br)
de forma a permitir a visualização, por parte de cada instituição, das atividades
conexas das outras instituições na região, fortalecendo a sinergia dos esforços de
desenvolvimento.
Nas empresas, já se trabalha há tempos com a noção de knolwedge organization,
pois se entende que a organização racional do acesso à informação é essencial para a
produtividade de uma instituição. No caso do desenvolvimento local, estando envolvidos
muitos atores diferenciados, trata-se de gerar o equivalente a um knowldege territory,
assegurando o acesso público e gratuito ao conjunto de informações referentes ao
território (PPNADL, 2006, p. 55).
As propostas apresentadas trazem idéias a serem discutidas para dinamizar o
projeto de uma cidadania informada. Envolvem a área jurídica (criação de um referencial
jurídico de direito à informação), a área da administração (gestão da informação), da
economia (metodologia de contas), da política (articulação de parcerias), além de ajustes
150
facilitando o diálogo entre áreas específicas como a educação, saúde, segurança, lazer e
outros.
O desafio é grande. Criar instituições especializadas que tratam de uma fatia da
realidade é relativamente simples. Organizar a colaboração e as redes inter-institucionais
é bastante complexo. No entanto, vale lembrar sempre que, para o cidadão, a realidade
não é fatiada em setores: a qualidade de vida é um processo integral.
Da mesma forma, gerar informações específicas para uma instituição de pesquisa
é relativamente simples. Organizar a devolução da informação produzida para a própria
comunidade, para os cidadãos que são em última instância os titulares do processo, é
evidentemente mais complexo. Mas se trata, nesta era que evolui para a sociedade do
conhecimento, de um desafio vital (PPNADL,2006, p. 56).
Sustentabilidade ambiental
A sustentação ambiental tem sido vista como um tipo de sobremesa de luxo frente
às dinâmicas econômicas. É tempo de superar definitivamente essa noção, que leva à
queda na fertilidade do solo, cria gastos elevados com doenças, agride a qualidade de vida
nas cidades, promove desmatamento e alimenta uma cultura geral de desleixo e de
desperdício dos recursos naturais.
Qualquer empresário ou trabalhador de empresa sabe a que ponto um ambiente
limpo, organizado, agradável e respeitoso gera uma atitude correspondente, que se
transforma em cultura organizacional. Muito já se escreveu sobre como os usuários de
metrô contribuem para a sua preservação, reconhecendo sua boa qualidade como meio de
transporte e considerando esse espaço público como seu. Esse tipo de arrumação da casa,
que cada cidade pode e deve realizar, é parte integrante do desenvolvimento local, da
construção de uma cultura da qualidade de vida e de respeito generalizado pelo meio
ambiente.
A construção de uma consciência ambiental planetária é indispensável neste
início de Século XXI. O aquecimento global, a destruição da vida dos mares, o esgotamento dos lençóis freáticos, a contaminação dos rios, a erosão dos solos, a poluição visual e sonora das cidades, a agressão à biodiversidade, a liquidação das florestas, o desperdício do petróleo, os esgotos a céu aberto nas cidades, enfim, existe um leque de graves desafios que obrigam a uma revisão profunda da forma predadora e pouco inteligente como o ser humano tem utilizado os recursos naturais, bem como do processo absurdo de desperdício que preside o modelo vigente de desenvolvimento em quase todo o planeta.
151
A visão de que é preciso “pensar globalmente e agir localmente” não veio do vazio. Está diretamente vinculada ao fato que, no nível local, os problemas ambientais deixam de ser difusos e se tornam pontuais e pessoais. A situação planetária serve de alerta, mas para tomar medidas concretas cabe agir no plano local. Uma comunidade litorânea que contamina a água está gerando doenças, matando o turismo, liquidando a pesca, dificultando a sua própria vida. E as medidas concretas necessárias para remediar a situação são diferentes em cada localidade, exigindo participação direta das pessoas que conhecem a sua própria realidade (PPNADL,2006, p.90).
A destruição ou desperdício dos recursos disponíveis em cada região afeta
diretamente a produtividade sistêmica do território. O Brasil tem um bom arcabouço
jurídico para a área ambiental, mas a lei é apenas uma alavanca que requer força política
para manejá-la. Portanto, a gestão organizada dos bens públicos locais e das reservas
naturais, a geração de uma cultura de respeito aos interesses da comunidade por parte dos
atores públicos e privados, a busca de soluções concretas e diferenciadas em cada
localidade são caminhos que passam pela gestão local do capital natural de que uma
região dispõe.
Igualmente importante é disponibilizar a informação desagregada, no mínimo ao
nível municipal, pois é nesse nível que as pessoas podem mais facilmente se organizar e
participar. O desmatamento na Amazônia costuma provocar suspiros de impotência e
clamor por atividade de âmbito nacional, mas a derrubada de uma árvore na vizinhança
leva frequentemente a que os moradores saiam às ruas, para defender um patrimônio que
percebe como seu. Numerosos municípios ou regiões estão elaborando o seu próprio
“Atlas Ambiental”, para entender os impactos das diversas iniciativas, para entender se a
região está realmente crescendo ou simplesmente se descapitalizando ao destruir sua
riqueza natural, ou sendo ineficiente ao desperdiçar matérias primas e produtos. Em
termos metodológicos, a contabilização do PIB do território deve ser complementada com
a avaliação dos custos ambientais e sociais gerados (“externalidades” na linguagem
econômica) (PPNADL,2006, p.91).
As ONGs e as entidades comunitárias desempenham um papel fundamental nessa
área, já que o impacto ambiental tende a ser diluído entre toda a população, água menos
saudável, maior frequência de doenças, sobrecarga sensorial e poluição visual-sonora por
publicidade agressiva, tempo perdido no trânsito por insuficiência de transporte público,
doenças respiratórias, dias de trabalho perdidos, gerando inúmeros pequenos custos que,
somados, se tornam imensos, mas que cada um suporta porque parece um problema de
todos e de certa maneira inevitável.
152
Um poluidor pode economizar muito dinheiro ao jogar dejetos diretamente no rio,
mas o prejuízo é distribuído entre milhares de pessoas que têm outras coisas a fazer.
Assim, entre os interesses pontuais do poluidor e o imenso prejuízo diluído na sociedade,
a luta é desigual e exige formas organizadas de defesa dos interesses sociais. O reforço e
o apoio às organizações da sociedade civil torna-se, portanto, essencial, particularmente
quando, como no caso da Articulação do Semi- Árido (ASA) ou do Grupo de Trabalho
Amazônico (GTA), se articulam para buscar um impacto territorial convergente.
A ação responsável das empresas é igualmente essencial. Muitas já publicam
balanços sociais e ambientais, e, na realidade, sem uma contribuição ativa de empresários conscientes a tendência é ficarmos apenas com ações punitivas, um ambiente caro e pouco eficiente de regulamentações complexas, um clima de controles, fiscais e multas. O controle e as multas funcio- nam quando o comportamento geral está saneado, ficando em evidência os transgressores. Em outros termos, criar uma cultura de respeito ambiental é o elemento decisivo. A lei e o fiscal da visão tradicional não são suficientes (PPNADL, 2006, p.96).
Propõe-se, basicamente, implantar e consolidar em cada município, em cada
região, uma política responsável no sentido de reduzir desperdícios, coibir a depredação
da herança natural, favorecer processos produtivos mais inteligentes, visando a uma vida
de qualidade superior e sustentável no longo prazo. Medidas nacionais responsáveis em
termos ambientais são necessárias, mas se obtêm ao organizar sistemas de apoio às
iniciativas locais, incorporando ao esforço ambientalista geral a grande massa de pessoas
e organizações que querem uma vida mais decente no lugar onde moram. Trata-se, em
síntese, de gerar e ampliar uma nova cultura ambiental.
As medidas sugeridas no decorrer do PPNADL resgatam, de forma geral, a longa
batalha e o imenso acervo de experiências de movimentos ambientalistas e outros,
visando à ampliação e aprofundamento de um processo que já se tornou claro. No
território imaginamos desejável:
1. Utilizar na elaboração do Projeto Núcleo Casa Verde o “Perfil Ambiental do
Município”, com análise da situação e hierarquização das prioridades de ações
locais;
2. Dar clareza na construção dos Indicadores do território da Casa Verde os
indicadores ambientais locais, aproveitando as metodologias hoje amplamente
desenvolvidas (pegada ecológica, indicadores de progresso genuíno e outros),
assegurando que cada comunidade possa conhecer e monitorar o uso dos recursos
naturais e das situações sociais críticas;
153
3. Priorizar e apoiar tecnicamente, bem como através de co-financiamento,
iniciativas locais ou regionais de saneamento ambiental, levando em conta as
situações de maior impacto, observando e respeitando os diagnósticos do SUS –
Sistema Único de Saúde, já que a contaminação das águas constitui um dos
principais vetores de doenças no país;
4. Inserir o estudo dos problemas ambientais locais nos currículos do ensino regular
e dos cursos técnicos, de modo a gerar em cada local e microrregião um amplo
conhecimento dos problemas e das soluções ambientais correspondentes;
5. Estimular, através de parcerias com a universidade, a elaboração de monografias
regionais sobre a situação ambiental local, tanto em nível de graduação como de
pós-graduação, buscando formar um acervo de conhecimento ambiental básico
em cada região;
6. Assegurar a formação de um fundo de iniciativas ambientais locais, articulando o
Ministério do Meio Ambiente, instituições financeiras públicas, Estados e
Municípios, visando ao co-financiamento de iniciativas ambientais locais;
A urbanização caótica e acelerada que caracterizou o êxodo rural brasileiro tornou
premente uma intervenção integrada nas favelas, cortiços e periferias miseráveis, configurando uma evidente prioridade nacional. No conjunto das ações deste tipo, assume particular importância o saneamento básico, que provoca diariamente mais de mil internações hospitalares de crianças por contato direto ou via alimentos com água contaminada, gerando custos absurdos frente ao que custaria a ação preventiva. Uma vez mais, o meio ambiente depende vitalmente de uma cultura de ação preventiva, da criação de um sentimento de apropriação e de cuidados com a realidade que nos envolve (PPNADL, 2006, p.97).
154
CONTRIBUIÇÕES ESPERADAS E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Espera-se, ao final deste projeto:
• Entender de forma aprofundada as demandas e necessidades do território,
por meio de pesquisa de campo de qualidade e de dados econômicos
georeferenciados;
• contribuir para uma institucionalidade criada a partir de um aumento na
participação cívica do território, a partir do conhecimento mais claro dos
problemas e potencialidades de nosso bairro;
• gerar ferramentas online de pesquisa e acompanhamento, que
possibilitem o cidadão tanto propor como acompanhar o que acontece no
território, de forma constante;
• ajudar a desenhar, articular e implementar projetos para as cadeias
produtivas locais, com foco em aumento de renda geral do território e
diminuição do desemprego e subemprego;
• gerar programas para melhorar as condições de vida da população do
território na visão dos moradores e população flutuante;
• gerar uma base prática, a partir das experiências nacionais e
internacionais, para a construção de um território com desenvolvimento
sustentável;
• construir um modelo de relevância de desenvolvimento sustentável, que
seja replicável em sua maior parte a outros territórios, e com foco no
respeito das peculiaridades de cada território, procurando levar as
experiências teóricas e práticas de implementação do projeto, com
resultados no aumento da qualidade de vida no território que passe pelo
projeto.
Dos eixos acima apresentados, procuramos focar nas sugestões concretas e viáveis
que foram reunidas desde o PPNADL (Projeto Política Nacional de Apoio ao
Desenvolvimento Local), passando por todas as experiências locais e internacionais e
constituem uma proposta portadora de forte consistência para implementação e
embasamento do projeto Núcleo Casa Verde. Trata-se de liberar forças que existem e que
já estão dando provas da sua energia. O leque de ações é amplo, mas as situações em
termos de desenvolvimento local são diversificadas. As prioridades serão diferentes
segundo as regiões do próprio território da Casa Verde.
155
Quem estuda e acompanha a produtividade das pequenas unidades rurais da
Europa, o peso da pequena e média empresa nos Estados Unidos, o processo de redução
de pobreza que ocorre na China e os esforços de inclusão que são empreendidos na Índia
adquire uma visão mais realista. Por trás das grandes corporações, existe nos países que
estão crescendo e enfrentando seus dramas sociais e ambientais um imenso leque de
pequenas iniciativas locais de desenvolvimento, que naturalmente aparecem pouco por
serem pequenas e dispersas, mas que oferecem poderosa sustentação ao conjunto. Pensar
que só a grande iniciativa resolve é desconhecer o poder da progressão geométrica.
Pequenas iniciativas que se multiplicam, se convertem em grandes políticas. Apoiar as
iniciativas que surgem na base da sociedade equivale a abrir uma grande avenida para a
inclusão produtiva das maiorias (PPNADL, 2006, p .99).
Neste documento abordamos a base teórica para a construção do desenvolvimento
sustentável territorial, revisamos as iniciativas semelhantes que foram executadas com
maior facilidade por territórios (cidades) do que por estados nacionais e propomos um
modelo de construção de objetivo compartilhado e escuta contínua da população e
entidades locais, que embora seja geral o suficiente para ser aplicado em outros locais,
está sendo implementado no bairro da Casa Verde.
Foi demostrado que não é suficiente ter um potencial no território, é necessário
organizar institucionalmente este local para que se possa tirar proveito e alavancar suas
potencialidades. Além disto a participação do maior número possível de entes do
território aumenta a eficácia do projeto e o engajamento, que são atributos que fazem toda
a diferença.
Por fim, esperamos que este projeto possa ajudar a construir territórios mais
prósperos, com mais qualidade de vida, medidos claramente segundo os interesses locais
a fim de que a comunidade construa sua própria versão de felicidade. Começamos o
desafio pelo Bairro da Casa Verde, por meio do Núcleo Casa Verde, que os espera de
braços abertos, para sugerir e ajudar a implementar uma visão conjunta de bem-estar para
todos no território, moradores, visitantes ou parceiros. Sejam bem-vindos a uma nova
Casa Verde, que nos espera ansiosa em 2022, 2030 e 2050.
156
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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