EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA …§ão_Civil... · Município de Goiânia,...
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EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA __ VARA
DA FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL DA COMARCA DE GOIÂNIA-GO
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, pela
Promotora de Justiça titular da 50a Promotoria de Justiça,
vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com
fulcro nos artigos 129, inciso III e 37, “caput”, e seu
parágrafo 4º, da Constituição Federal; nos artigos 117, III
e 92, “caput”, e seu parágrafo 4º da Constituição Estadual;
na Lei nº 7.347/85, na Lei nº 8.429/92 e no artigo 25, IV,
“a” e “b”, da Lei nº 8.625/93, propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
com pedido de tutela provisória de urgência,
observado o rito ordinário e disposições especiais
previstas na Lei nº 8.429/92, em face de
FÁTIMA MRUÉ, brasileira, médica, CPF nº
285.954.911-00, RG 5067 CRM/GO, residente e domiciliada na
Rua S5, quadra S 34, lote 25, nº 81, apto. 102, Setor Bela
Vista, CEP: 74823-460, Goiânia/GO.Edifício Sede do Ministério Público
Rua 23 c/ Av. B , QD.A-06 , LT. 15/24, Sala 321 - Jardim Goiás, Goiânia-GO. - CEP: 74.805-100 FONE - (62) 3243-8411 – E-mail ([email protected]) 1/22
pelos fatos e fundamentos jurídicos que passa a
expor.
1) DOS FATOS
Trata-se a presente demanda de Ação Civil
Pública por Ato de Improbidade Administrativa proposta em
face de Fátima Mrué por, no exercício do cargo de
Secretária Municipal da Saúde em Goiânia, ter autorizado o
pagamento de curso de mestrado em Direito da Saúde para as
servidoras Ana Paula Custódio Carneiro e Andréia Alcântara
Barbosa às custas do Fundo Municipal da Saúde – FMS.
Como será exposto nos próximos tópicos, o
financiamento do curso de Mestrado com recursos do FMS
desvirtua a finalidade deste Fundo.
Outrossim, tendo em vista a atual situação
financeira do Município de Goiânia e considerando a
precariedade em que se encontra a saúde municipal, a
concessão deste benefício às servidoras é, no mínimo,
imoral e ilegal.
Desta forma, pela prática do ato aqui narrado,
a requerida incorreu em prática de ato de improbidade
administrativa que causou prejuízo ao erário e que atentou
contra os princípios que regem a administração pública.
Edifício Sede do Ministério PúblicoRua 23 c/ Av. B , QD.A-06 , LT. 15/24, Sala 321 - Jardim Goiás, Goiânia-GO. - CEP: 74.805-100
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1.1) Do Pedido, Concessão e Pagamento da Ajuda de Custo
No ano de 2017, as servidoras Ana Paula
Custódio Carneiro e Andréia Alcântara Barbosa requereram à
Secretária Municipal de Saúde o custeio integral do curso
de mestrado em Direito da Saúde ofertado pela Universidade
Santa Cecília, localizada no Município de Santos/SP, com
mensalidade no valor de R$ 2.377,00 (dois mil, trezentos e
setenta e sete reais) para cada uma das servidoras (pág. 14
do Arquivo 2).
Sob a justificativa de que Ana Paula e Andreia
são servidoras efetivas dos quadros da Administração
Municipal, Fátima Mrué autorizou o custeio das mensalidades
do curso de mestrado para ambas, o que corresponde a um
gasto mensal no valor de R$ 4.754,001 (quatro mil,
setecentos e cinquenta e quatro reais) (pág. 24 do Arquivo
1).
Além das mensalidades do curso, também foi
deferido o custeio das despesas referentes a passagens de
avião e hospedagem das servidoras em Santos/SP (pág. 5 do
Arquivo 6).
Desta forma, o curso de mestrado das servidoras
Ana Paula e Andréia custou ao Fundo Municipal de Saúde, no
ano de 2017, R$ 33.278,00 (trinta e três mil, duzentos e
setenta e oito reais) referentes às mensalidades2 e R$
14.895,85 (quatorze mil, oitocentos e noventa e cinco reais
1 R$ 4.754,00 = R$ 2.377,00 x 22 R$ 33.278,00 – valor referente a sete mensalidades no valor de R$ 2.377,00
para cada servidora. R$ 2.377,00 x 2 = R$ 4.754,00 x 7 = R$ 33.278,00.Edifício Sede do Ministério Público
Rua 23 c/ Av. B , QD.A-06 , LT. 15/24, Sala 321 - Jardim Goiás, Goiânia-GO. - CEP: 74.805-100 FONE - (62) 3243-8411 – E-mail ([email protected]) 3/22
e oitenta e cinco centavos) referentes ao pagamento de
passagens e hospedagens (pág. 5 do Arquivo 6).
Assim, no ano de 2017 foi indevidamente
despendido com as servidoras o total de R$ 48.173,85
(quarenta e oito mil, cento e setenta e três reais e
oitenta e cinco centavos) oriundo do FMS.
1.2) Do Fundo Municipal de Saúde
A aplicação dos valores do Fundo Municipal de
Saúde - FMS é regulamentada pela Portaria nº 204/2007 do
Ministério da Saúde, que divide as ações e serviços de
saúde em blocos de financiamento (pág. 41 do Arquivo 6).
Ao autorizar o custeio do curso de mestrado às
custas do FMS em prol das servidoras Ana Paula e Andréia, a
Secretária Municipal de Saúde amparou a decisão no artigo
14, inciso V da referida portaria (pág. 24 do Arquivo 1,
pág. 30 do Arquivo IV), que assim dispõe:
Art. 14. O Componente Limite Financeiro da Média
e Alta Complexidade Ambulatorial e Hospitalar –
MAC dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios será destinado ao financiamento de
ações de média e alta complexidade em saúde e de
incentivos transferidos mensalmente.
§ 1º Os incentivos do Componente Limite
Financeiro MAC incluem aqueles atualmente
designados: (…)
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V - Fator de Incentivo ao Desenvolvimento do
Ensino e da Pesquisa Universitária em Saúde –
FIDEPS; (…)
Contudo, Excelência, o Fator de Incentivo ao
Desenvolvimento do Ensino e da Pesquisa Universitária em
Saúde – FIDEPS não ampara o dispêndio de verbas do FMS com
o curso de mestrado em Direito da Saúde.
Pois bem. O FIDEPS foi criado pelo Ministério
da Saúde pela Portaria nº 15, de 08 de Janeiro de 1991,
exclusivamente para atender aos Hospitais Universitários,
que são centros de formação de recursos humanos e de
desenvolvimento de tecnologia para a área da medicina3.
Os Hospitais Universitários são mantidos por
universidades ou atuam colaborando com estas instituições,
e possuem como objetivo cooperar nas atividades de formação
na área da saúde (como medicina, enfermagem, fisioterapia e
nutrição) e na pesquisa em área de saúde4.
No ano de 2005, pela Portaria nº 1.082, de 04
de julho de 2005, o Ministério da Saúde extinguiu o FIDEPS,
definindo que os recursos financeiros relacionados ao
incentivo do ensino e da pesquisa passariam a ser
incorporados ao valor da contratualização do âmbito dos
Programas de Reestruturação dos Hospitais de Ensino do
Ministério da Educação no Sistema Único de Saúde e do
Programa de Reestruturação dos Hospitais de Ensino no
âmbito do Sistema Único de Saúde.
3 http://portal.mec.gov.br/hospitais-universitarios4 http://www.ebserh.gov.br/web/portal-ebserh/apresentacao1
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Entretanto, posteriormente, pela Portaria nº
204/2007, o Ministério da Saúde restabeleceu o FIDEPS.
Após o reestabelecimento do FIDEPS, não houve
novo ato do Ministério da Saúde que definisse o objetivo
deste Fator, motivo pelo qual entende-se que os critérios
de sua destinação são os mesmos anteriormente previstos, ou
seja, aplicação exclusiva para formação na área da saúde e
pesquisa em área de saúde.
Inclusive, o artigo 14 da Portaria nº 204/2007
– MS categoriza a aplicação do FIDEPS como de “média e alta
complexidade em saúde”, o que rassalta que este Fator é
destinado exclusivamente para formação na área da saúde e
em pesquisa na área da saúde.
Além da Portaria nº 204/2007 – MS, o Fundo
Municipal de Saúde também é regulamentado, no âmbito do
Município de Goiânia, pela Lei Municipal nº 7.047/1991.
O artigo 1º desta Lei define que o FMS tem por
por objetivo criar condições financeiras e de gerenciamento
dos recursos destinados ao desenvolvimento das ações e
serviços de saúde, executadas e coordenadas pela Secretaria
Municipal de Saúde.
Ainda, conforme dispõe o artigo 3º da Lei
Municipal nº 7.047/1991, a despesa do FMS se constituirá
de:
a) financiamento total ou parcial de programas
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integrados de saúde desenvolvidos pela Secretaria ou com
ela conveniados;
b) aquisição de material permanente e de consumo e
de outros insumos necessários ao desenvolvimento dos
programas;
c) construção, reforma, ampliação, aquisição ou
locação de imóveis para adequação da rede física de
prestação de serviços de saúde;
d) desenvolvimento de programas de capacitação e
aperfeiçoamento de recursos humanos em saúde;
e) atendimento de despesas diversas, de caráter
urgente e inadiável, necessária à execução das ações e
serviços de saúde mencionados no art. 1º da presente lei.
Desta forma, a legislação deixa claro que a
despesa em “programas de capacitação e aperfeiçoamento de
recursos humanos” deve ser na área da saúde, o que vai ao
encontro com possibilidade de aplicação do FIDEPS. Como se
sabe, este não é o caso das servidoras, já que o mestrado
em que elas estão inscritas é na área jurídica, o que
configura patente ilegalidade no pagamento do curso às
expensas do FMS.
Isto posto, é ilegal que o Fundo Municipal de
Saúde arque com despesas relativas ao mestrado em Direito
da Saúde, eis que este curso não se enquadra como “Pesquisa
Universitária em Saúde”.
Logo, a Secretária Municipal de Saúde Fátima
Mrué cometeu ato ilegal e que causa prejuízo ao erário ao
autorizar despesa não prevista na legislação.
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1.3) As Servidoras Beneficiadas
As servidoras Ana Paula Carneiro Custódio e
Andréia Alcântara Barbosa são servidoras efetivas dos
quadros de pessoal do Município de Goiânia. Contudo,
nenhuma delas é ocupante de cargo jurídico ou desempenha
funções jurídicas.
Ana Paula Carneiro Custódio e Andréia Alcântara
Barbosa ocupam, respectivamente, os cargos efetivos de
Assistente Administrativo – Nível IV e Assistente
Administrativo – Nível III. O nível de escolaridade exigido
para estes cargos é o ensino médio completo (Lei Municipal
nº 9.129/2011) (págs. 26 e 28 do Arquivo 7).
No ano de 2017, pelo Decreto nº 920/2017, Ana
Paula foi nomeada para exercer o cargo em comissão de
Assessora Especial Técnica I, com lotação na Secretaria
Municipal de Saúde (pág. 25 do Arquivo 7).
O cargo de Assessor Especial Técnico I foi
criado pela Lei Complementar Municipal nº 276/2015 e é
exigido de seu ocupante nível de escolaridade superior em
qualquer área de formação5. Ou seja, não se trata de um
cargo jurídico ou com atribuições jurídicas.
Andreia Alcântara, por sua vez, foi nomeada no
5Art. 46. Ficam criados os cargos de provimento em comissão, nos níveis deAssessoramento Especial, a serem preenchidos preferencialmente por pessoas comnível de escolaridade fundamental, Assessoramento Técnico por pessoas comnível de escolaridade média e Assessoramento Especial Técnico com escolaridadesuperior, especificados no Anexo III desta Lei Complementar, de acordo com assuas necessidades de mão de obra específica para prestação de serviço público.
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ano de 2017 para exercer o cargo em comissão de
Superintendente de Regulação e Políticas de Saúde, com
lotação na Secretaria Municipal de Saúde. Esta
Superintendência também não possui atribuições jurídicas
(pág. 27 do Arquivo 7).
Desta forma, está sendo despendido um alto
valor oriundo do Fundo Municipal de Saúde, de forma ilegal
e imoral, com curso de mestrado em Direito da Saúde para
duas servidoras efetivas ocupantes de cargo de nível médio
de formação, que temporariamente ocupam cargos
comissionados que, ressalta-se, não possuem atribuição
jurídica.
Logo, o custeio deste curso de mestrado não
trará nenhum retorno ou benefício para a sociedade, mas
apenas incrementará o currículo das próprias servidoras,
que, embora ocupem cargo de nível médio de ensino, possuem
diploma de curso superior em Direito.
A previsão de duração do mestrado é de 24
meses, o que implica em dizer que, ao final deste período,
será despendido no mínimo R$ 114.096,00 (cento e quatorze
mil e noventa e seis reais) com as servidoras apenas com a
mensalidade do curso6, fora os valores despendidos com
inscrição, passagem de avião, hospedagem e alimentação,
valores estes que não serão revertidos para a coletividade.
6 R$ 114.096,00: vinte e quatro mensalidades no valor de R$ 2.377,00 para duasservidoras. R$ 2377,00 x 2 = R$ 4.754,00 x 24 = R$ 114.096,00
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1.4) Outros Apontamentos
Além do exposto, é público e notório que o
Município de Goiânia tem enfrentado graves problemas
financeiros, problemas estes que se agravam diante da má
gestão do dinheiro público.
Um dos serviços públicos que mais tem
enfrentado problemas decorrentes da falta de verba e da
negligência com a coisa pública é a saúde municipal, como é
diariamente noticiado pelos canais de comunicação.
A mídia goianiense tem exposto com frequência a
falta de insumos e medicamentos nos postos de atendimento
de saúde, bem como tem exposto a escassez de profissionais
e a descoberta de medicamentos e insumos vencidos no galpão
da Secretaria Municipal de Saúde, além de vários outros
problemas que assolam a saúde em Goiânia (pág. 11 do
Arquivo 7).
Inclusive, está em curso na 50ª Promotoria de
Justiça o Inquérito Civil Público nº 201700529285, que tem
como objeto a falta de insumos odontológicos (falta, até
mesmo, anestesia!) nos postos de atendimento do Município
de Goiânia (pág. 21 do Arquivo 7).
Além do exposto, foi instaurada na Câmara dos
Vereadores de Goiânia Comissão Especial de Inquérito - CEI
para tratar da saúde neste Município (pág. 47 do Arquivo
5).
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Em uma das reuniões promovidas pela CEI, o
gestor do Fundo Municipal de Saúde, Cássio Muriel da Silva,
expôs que a Secretaria Municipal de Saúde possui alto valor
em dívidas com prestadores de serviços, hospitais e
fornecedores, as quais não foram pagas por falta de
dinheiro (pág. 47 do Arquivo 5).
Desta forma, além de ser ilegal e imoral o fato
de a Secretária Municipal de Saúde Fátima Mrué ter
autorizado o patrocínio do curso de mestrado em Direito da
Saúde, às custas do Fundo Municipal da Saúde, em prol de
duas servidoras efetivas ocupantes de cargo administrativo
de nível médio, o fato de tê-lo feito em meio à crise
financeira enfrentada pela administração municipal reforça
a imoralidade administrativa por parte da secretária e a
deslealdade com a instituição que representa.
Ante o exposto, considerando que houve gravosa
lesão ao erário, aos princípios administrativos e à
sociedade, propõe-se a presente Ação Civil Pública por Ato
de Improbidade Administrativa em face de Fátima Mrué.
2) DO DIREITO
Pelos fatos aqui narrados, a requerida Fátima
Mrué incorreu na prática dos atos de improbidade
administrativa descritos no artigo 10, caput e incisos IX e
XI, e no artigo 11, caput, ambos da Lei nº 8.429/1992, in
verbis:
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Art. 10. Constitui ato de improbidade
administrativa que causa lesão ao erário qualquer
ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje
perda patrimonial, desvio, apropriação,
malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres
das entidades referidas no art. 1º desta lei, e
notadamente: (…)
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas
não autorizadas em lei ou regulamento; (…)
XI - liberar verba pública sem a estrita
observância das normas pertinentes ou influir de
qualquer forma para a sua aplicação irregular;(…)
Art. 11. Constitui ato de improbidade
administrativa que atenta contra os princípios da
administração pública qualquer ação ou omissão
que viole os deveres de honestidade,
imparcialidade, legalidade, e lealdade às
instituições, e notadamente:
Em relação ao dano causado ao erário, este, no
momento, se encontra em, no mínimo, R$ 57.681,85 (cinquenta
e sete mil, seiscentos e oitenta e um reais e oitenta e
cinco centavos).
Tal montante corresponde ao valor que o gestor
do Fundo Municipal de Saúde informou ter despendido com as
mensalidades do mestrado, passagens aéreas e hospedagem
pagas em prol das servidoras Ana Paula e Andréia até o mês
de dezembro de 2017 (R$ 48.173,85), somado ao valor
correspondente a duas mensalidades pagas para ambas as
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servidoras (R$ 9.508,007).
Este prejuízo aumenta a cada mês com as novas
mensalidades, custeio de passagens aéreas e hospedagem das
servidoras em Santos/SP.
Quanto aos princípios administrativos, segundo
preceitua a doutrina e a jurisprudência, a Lei de
Improbidade Administrativa visa tutelar o patrimônio
público – que é o conjunto de bens e interesses da
Administração Pública, não só de natureza patrimonial, mas
também moral –, impondo aos agentes públicos e aos
particulares um padrão de comportamento probo, honesto,
íntegro, leal e eficiente.8
Sobre o dever do agente público de agir com
respeito à moralidade administrativa, discorre Emerson
Garcia:
A moralidade limita e direciona a atividadeadministrativa, tornando imperativo que os atosdos agentes públicos não subjuguem os valoresque defluam dos direitos fundamentais dosadministrados, o que permitirá a valorização eo respeito à dignidade da pessoa humana. Alémde restringir o arbítrio, preservando amanutenção dos valores essenciais a umasociedade justa e solidária, a moralidadeconfere aos administrados o direito subjetivode exigir do Estado uma eficiência máxima dosatos administrativos, fazendo que a atividadeestatal seja impreterivelmente direcionada aobem comum, buscando sempre a melhor soluçãopara o caso.A correção dessas conclusões, no entanto,pressupõe que um caminho mais árduo e tortuoso
7 R$ 9.508,00: duas mensalidades de R$ 2.377,00 para ambas as servidoras(2.377 x 2 = 4.754 x 2 = 9.508).
8 REsp 1075882/MG, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgadoem 04/11/2010, DJe 12/11/2010.
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seja percorrido: a necessária conscientizaçãode todos os setores da sociedade de que devemzelar pela observância do princípio damoralidade. O controle sobre os atos dosagentes públicos deve ser rígido e intenso, oque permitirá um paulatino aperfeiçoamento daatividade estatal e, o que é mais importante, anecessária adequação dos agentes públicos aosvalores próprios de um Estado Democrático deDireito, no qual o bem comum representa o pilarfundamental. (ALVES, Rogério Pacheco e GARCIA, Emerson.Improbidade Administrativa. 6ª Edição. P 90.Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2011.)
Diante destes conceitos, verifica-se que a
requerida Fátima Mrué, ao autorizar o custeio do curso de
mestrado em Direito da Saúde às custas do Fundo Municipal
de Saúde em prol de duas servidoras efetivas ocupantes de
cargo administrativo de nível médio, violou os princípios
da impessoalidade, da moralidade, da eficiência, da
legalidade e da lealdade às instituições.
Estes princípios também foram violados em
decorrência de a autorização aqui discutida ter se dado em
momento que o Município de Goiânia e, especialmente, a
Secretaria Municipal de Saúde, enfrentam grave crise
financeira, tendo deixado, inclusive, de pagar fornecedores
e prestadores de serviço.
Dito isto, tem-se que a requerida violou o
princípio da impessoalidade por ter privilegiado as
servidoras Ana Paula Custódio e Andréia Alcântara em
detrimento do pagamento de credores e da aquisição de itens
essenciais para a saúde no âmbito municipal. Desta forma, o
dinheiro público que deveria custear estes gastos foram, na
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verdade, despendidos com as servidoras.
O princípio da legalidade também foi gravemente
violado pela requerida que, a despeito de as despesas do
Fundo Municipal de Saúde estarem minunciosamente
discriminadas na Portaria nº 204/2007 – MS e na Lei
Municipal nº 7.047/1991, inovou ao agir além do que
permitem estes atos, autorizando custeio que não foi
legalmente previsto.
Ainda, a requerida desrespeitou o princípio da
moralidade administrativa por ter utilizado dinheiro
público oriundo do FMS para arcar com despesas que não
trarão benefício para a sociedade, mas apenas para as
servidoras que dele estão usufruindo.
Ressalta-se que, ao final dos dois anos
previstos de mestrado, poderão ser gastos com as servidoras
no mínimo R$ 114.096,009 (cento e quatorze mil e noventa e
seis reais) apenas com as mensalidades do curso. O valor do
prejuízo é ainda maior em razão de o FMS arcar, também, com
as despesas de passagens áreas e hospedagem das servidoras
em Santos/SP.
O pagamento do curso de mestrado para as
servidoras não está dentro da seara da discricionariedade
da Secretária de Saúde, posto que é ilegal. Desta forma, a
autorização deste custeio a despeito de todas as vedações
legais e morais configura clara imoralidade administrativa.
9 R$ 114.096,00: R$ 2.377,00 * 24 = R$ 57.048,00 * 2 = R$ 114.096,00Edifício Sede do Ministério Público
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Mesmo que a autorização do custeio do curso de
Mestrado estivesse dentro do limite da discricionariedade
administrativa, seu deferimento esbarraria no interesse
público.
Ora, o interesse público é pela aquisição de
insumos e medicamentos, pela contratação de profissionais
qualificados na área da saúde e pelo acesso a laboratórios
localizados no setor de residência de cada cidadão.
Certamente não atende ao interesse público o pagamento de
curso que beneficia apenas as próprias servidoras que o
frequentam.
Além do exposto, foi violado também o princípio
da eficiência, já que, com o desvio de finalidade dos
valores do Fundo Municipal de Saúde, pessoas deixaram de
ser atendidas nos postos de saúde, credores deixaram de ser
pagos e insumos e medicamentos deixaram de ser adquiridos,
prejudicando a eficiência da administração pública na
prestação dos serviços de saúde.
Por fim, o princípio da lealdade às
instituições foi maculado, eis que dos atos aqui expostos
resulta uma “quebra” de confiança entre os administrados e
a administração pública, já que esta administração
privilegiou de forma ilegal e imoral duas servidoras
públicas em prejuízo do socorro à saúde dos que dependem da
saúde pública.
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Sobre o tema, Fábio Medina Osório10 destaca que:
Veja-se que o legislador não quis estabelecer
somente os deveres de imparcialidade ou honestidade.
Esses deveres se encontram entrelaçados, mas é certo
que a lealdade institucional, além de abranger tais
deveres públicos, também traduz a perspectiva de
punição à intolerável ineficiência funcional, no
marco do qual o improbus se releva desleal em face
do setor público.
Diante do que foi narrado, requer-se sejam
aplicadas à requerida Fátima Mrué as sanções previstas no
artigo 12, incisos II e III, da Lei nº 8.429/1992, in
verbis:
Art. 12. Independentemente das sanções penais,
civis e administrativas previstas na legislação
específica, está o responsável pelo ato de
improbidade sujeito às seguintes cominações, que
podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente,
de acordo com a gravidade do fato: (…)
II - na hipótese do art. 10, ressarcimento
integral do dano, perda dos bens ou valores
acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se
concorrer esta circunstância, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de
cinco a oito anos, pagamento de multa civil de
até duas vezes o valor do dano e proibição de
contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio
10OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da Improbidade Administrativa. Editora Revista dos Tribunais. São Paulo, 2007, págs. 137/138.
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de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de cinco anos;
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral
do dano, se houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de três a cinco
anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o
valor da remuneração percebida pelo agente e
proibição de contratar com o Poder Público ou
receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por
intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de três anos.
Ressalta-se que, no caso em comento, deixar de
aplicar pena à gestora que praticou atos ilegais, imorais e
desleais implica na transferência da punição à sociedade,
que tem que suportar o prejuízo que lhe é diariamente
causado, inclusive o prejuízo moral decorrente do fato de
que duas servidoras estão recebendo benefício ilegal,
enquanto a saúde pública municipal está em situação de
caos.
3) DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA
Tendo em vista o que foi narrado nesta peça
exordial, é cediço que a atuação de Fátima Mrué perante a
Secretaria Municipal de Saúde tem causado prejuízo ao
erário, aos princípios administrativos e à coletividade.
Desta forma, para evitar que ainda mais
prejuízos venham a ser causados, é essencial o seuEdifício Sede do Ministério Público
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afastamento do posto de Secretária Municipal da Saúde, com
base no que dispõem os artigos 294, caput, 297, 300 e 301,
todos do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 294 - A tutela provisória pode fundamentar-
se em urgência ou evidência.
Parágrafo único. A tutela provisória de urgência,
cautelar ou antecipada, pode ser concedida em
caráter antecedente ou incidental.
Art. 297 - O juiz poderá determinar as medidas
que considerar adequadas para efetivação da
tutela provisória.
Art. 300 - A tutela de urgência será concedida
quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o
risco ao resultado útil do processo.
Art. 301 - A tutela de urgência de natureza
cautelar pode ser efetivada mediante arresto,
sequestro, arrolamento de bens, registro de
protesto contra alienação de bem e qualquer outra
medida idônea para asseguração do direito.
A possibilidade de concessão de tutela de
urgência, em ação civil pública, é expressamente prevista
no artigo 12 da Lei 7.347/85:
Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar,
com o sem justificação prévia, em decisão sujeita
a agravo.
Para a concessão da tutela antecipada, em se
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cuidando de tutela coletiva, exige o legislador que o
fundamento da demanda seja relevante e, ainda, que haja
urgência que justifique o deferimento da liminar.
A verossimilhança e relevância do fundamento da
demanda baseia-se em toda a argumentação jurídica exposta
nessa peça exordial, especialmente quanto à prática de ato
evidentemente ilegal, que mostra deslealdade não apenas com
instituição que a requerida representa, mas também com a
sociedade que depende da saúde pública.
Outrossim, como abordado, o afastamento de
Fátima Mrué é urgente e indispensável a bem do interesse
público, eis que, uma vez tendo a requerida praticado atos
graves e lesivos ao patrimônio público, aos princípios
administrativos e ao interesse social, é inadmissível que
continue a ocupar o cargo de Secretária Municipal de Saúde,
sob risco de macular ainda mais a probidade administrativa,
os cofres públicos e a confiança da sociedade na
administração pública municipal
Desde que a requerida assumiu o posto de
Secretária Municipal de Saúde, a qualidade dos serviços da
saúde municipal tem decaído (pág. 11, Arquivo 7). Foram
encontrados medicamentos e insumos vencidos no galpão da
SMS, pessoas doentes têm enfrentado dificuldades para
atendimento nas unidades de saúde pública, faltam insumos e
medicamentos, a SMS não tem adimplido com as dívidas com os
credores, além de vários outros problemas decorrentes da
gestão da requerida.
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De acordo com o artigo 2º da Lei n. 8.437/92,
quando se tratar de ação civil pública, a liminar deve
concedida após a audiência do representante judicial da
pessoa jurídica de direito público, que deverá se
pronunciar no prazo de setenta e duas horas.
Porém, o Ministério Público pleiteia que a
concessão da tutela antecipada no caso em tela seja feita
sem a ouvida da requerida, como autorizado no artigo 9º,
parágrafo único, inciso I, e no artigo 300, § 2º, ambos do
CPC.
4) DOS PEDIDOS
Ante o exposto, o Ministério Público Estadual
requer:
1) a concessão da tutela provisória de urgência
consistente no afastamento de Fátima Mrué do cargo de
Secretária Municipal da Saúde;
2) a notificação da requerida para ofertar,
caso queira, defesa preliminar no prazo de 15 (quinze)
dias, conforme dicção do artigo 17, § 7º, da Lei n.º
8.429/92;
3) apresentada ou não a defesa, o recebimento
da petição inicial;
4) a citação da requerida para que tome ciência
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da demanda e, caso queira, conteste o pedido, nos termos do
artigo 246 do CPC, sob pena de confissão e revelia;
5) a intimação do Município de Goiânia na
pessoa de seu Procurador-Geral, com endereço na Avenida do
Cerrado, nº 999, Park Lozandes, CEP: 74884-900, nesta
Capital, nos termos do art. 17, § 3º, da Lei nº 8.429/1992;
6) a produção de toda a prova em direito
admitida;
7) a procedência do pedido, a fim de que a
requerida seja condenado nas penas do artigo 12, inciso
III, da Lei nº 8.429/1992.
Dá-se a causa o valor de R$ 57.681,85
(cinquenta e sete mil, seiscentos e oitenta e um reais e
oitenta e cinco centavos)11.
Termos em que pede deferimento.
Goiânia, 1º de março de 2018.
LEILA MARIA DE OLIVEIRAPromotora de Justiça
11 Montante correspondente ao valor do prejuízo causado ao erário até o mês dedezembro de 2017 pelos atos narrados nesta ação. Ressalta-se que o valor doprejuízo será ainda maior caso continue sendo pago o curso de mestrado àsservidoras Ana Paula e Andréia às custas do FMS.
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