ÉTICA - A MORAL, O OUTRO E NÓS TODOS JUNTOS
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FACULDADE DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO DE TAQUARAAUTORIZADA PELA PORTARIA DE N 1.300 de 23/11/98 - DOU 24/11/98
Disciplina: ÉTICA E LEGISLAÇÃO EM COMUNICAÇÃO
Código: 3212 Créditos: 04 Horas/Aula: 60 Ano/Semestre: 2007/2
Curso: COMUNICAÇÃO SOCIAL - Habilitação: Publicidade /Propaganda e Relações Públicas_______________________________________________________________________________________
FONTE: http://professores.faccat.br/leandrop/material/Aula%20moral.doc
A moral, o outro e nós todos juntos
Até agora, distinguimos o campo de estudos da ética e observamos como o
pensamento ético sofreu alterações ao longo da história, na medida em que interagia com as
condições de convívio social a cada época. É momento, então, de passarmos à
caracterização da moral, definindo-a desde as possibilidades de sua efetivação.
1. A origem...
Para iniciarmos, poderíamos dizer que a moral efetivamente surge quando o homem
desenvolve uma condição social de vida, isto é, quando já é membro de uma coletividade.
Da necessidade de garantir regras de convivência para um coletivo se origina a prática
moral, com a finalidade de assegurar a concordância do comportamento de cada um com os
interesses coletivos.
A função da moral consistiria, assim, na regulamentação das relações entre os
homens, para contribuir assim no sentido de manter e garantir uma determinada ordem
social. A cada organização social que produzimos, esperamos que os indivíduos aceitem,
por convicção pessoal, os fins, princípios, valores e interesses dominantes numa
determinada sociedade.
Desta forma, o comportamento moral está permeado por uma qualidade social. Isso
significa que se manifesta somente articulada à vida em sociedade. E, neste sentido, uma
mudança radical da estrutura social provoca uma mudança fundamental de moral, que
resulta, por conseguinte, em alterações nas reflexões éticas.
2. Para dar uma definição
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Vasquez (1993) apresenta a seguinte definição para moral:
“A moral é um sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são
regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a
comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e
social, sejam acatadas livre e conscientemente, por uma convicção íntima, e não de
uma maneira mecânica, externa ou impessoal.” (p. 84)
A partir do conceito proposto pelo autor, podemos compreender uma noção tão
comum aos debates éticos, como a virtude. Esta supõe uma disposição estável ou uniforme
de comportar-se moralmente de maneira positiva; isto é, de querer o bem. Tal busca e
aposta, de certa forma, resume muito do fim das reflexões sobre os comportamentos
morais. A necessidade de regular a vida em sociedade parte de um horizonte inalcançável,
mas ao mesmo tempo, de uma esperança por construir relações humanas pautadas pelo
respeito mútuo.
Ainda que a definição de bem seja relativa (dada sua condição histórica e subjetiva),
vale a pena prestigiarmos a intencionalidade de uma reflexão ética aberta e
problematizadora de nosso cotidiano. Como afirma Edgar Morin, precisamos voltar a
debater grandes questões, como a vida, a liberdade, o futuro da humanidade, etc.
3. Moral e mudanças sociais
Para visualizarmos diferenças entre modelos de organização social e moral, não
precisamos fazer uma incursão detalhada pela história humana; podemos, sim, fazer um
exercício de contrastes. Pensemos, para começar, no exemplo da vida em tribos ou clãs. A
necessidade de ajustar o comportamento de cada membro aos interesses da coletividade
leva a que se considere como bom ou proveitoso tudo aquilo que contribui para reforçar a
união ou a atividade comum. Destacam-se, assim, uma série de deveres: todos são
obrigados a trabalhar, a lutar contra os inimigos da tribo, etc. Essas obrigações comuns
comportam o desenvolvimento das qualidades morais relativas aos interesses da
coletividade: solidariedade, ajuda mútua, disciplina, amor aos filhos da mesma tribo, etc.
Portanto, esta moral coletivista, característica das sociedades chamadas ‘primitivas’,
que não conhecem a propriedade privada nem a divisão em classes, é uma moral única e
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válida para todos os membros da comunidade. Mesmo a noção de ‘indivíduo’ tem
importância bastante relativa.
Já na Idade Moderna, as características da civilização ocidental diferiam bastante
dos modelos coletivistas. Vivia-se nesta época: um movimento intelectual antropocentrista
crescente; uma forte busca de liberdade individual frente a instituições tradicionais como a
Igreja e a monarquia; e um aumento geral da produtividade do trabalho e do uso de
tecnologias, elevando a produção material até o ponto de dispor de uma quantidade elevada
de excedentes. Tivemos, então, as condições para a valorização do ‘indivíduo’, seja como
unidade básica nas relações mercantis, seja como ideal libertário político. Desta maneira
ademais, quando chegamos ao capitalismo do século XIX, o operário fabril era considerado
principalmente como um ‘homem econômico’.
Em cada época, a realização da moral é inseparável de certos princípios básicos ou
regras básicas de comportamento que a sociedade em seu conjunto, ou uma de suas partes,
apresentam a toda a comunidade social ou a um grupo de seus membros. Por exemplo,
independentemente do grau de elaboração teórica, o princípio do ‘individualismo’ é
fundamental na moral efetiva da sociedade moderna. Isso ocorre porque o fato de vigorar
um princípio básico como este – e não outro diferente, como o coletivismo – não depende
tanto de razões puramente teóricas, quanto práticas, sociais, dado que a moral satisfaz a
necessidade social de regulamentar as relações entre os homens numa dada comunidade e
esta regulamentação se faz de acordo com os interesses concretos de uma parte social ou da
sociedade inteira. Por conseguinte, estes princípios revestem um duplo caráter: de um lado,
respondem a uma determinada necessidade social e, de outro, por serem fundamentais,
constituem o fundamento das normas que regulamentam o comportamento, numa
determinada sociedade, em certa direção.
4. Sobre as características principais
A ação moral deve apresentar algumas características para que possamos classifica-
la como tal.
A estrutura do ato moral comporta que consideremos o motivo do ato. Por motivo,
pode-se entender aquilo que impulsiona a agir ou a procurar alcançar determinado fim. O
motivo que pode impulsionar, por exemplo, a denunciar a injustiça cometida contra um
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amigo pode ser ou uma paixão sincera pela justiça, ou alguma coisa muito diferente como o
desejo de publicidade. O motivo de que o sujeito tem consciência faz parte do conteúdo do
ato moral.
Outro aspecto é a consciência do fim e a decisão de realiza-lo. E a este poderíamos
acrescentar a consciência dos meios. Assim, o ato moral precisa ser analisado conforme a
motivação do sujeito, mas também de acordo com os meios utilizados (ex. persuasão,
carisma, tortura, mentira, argumentação franca, etc.) e os resultados gerados, porque
devemos ponderar intencionalidade e conseqüências práticas/reais para o indivíduo e para a
coletividade.
Neste ínterim, o ato moral supõe um sujeito real dotado de consciência moral, isto é,
de capacidade de interiorizar as normas ou regras de ação estabelecidas pela comunidade e
atuar de acordo com elas, de forma livre, consciente e responsável. Sem tais condições, sem
a possibilidade de imputar ‘responsabilidade’, o comportamento não pode ser observado
como moral e as reflexões éticas perdem sentido.
Atos propriamente morais são somente aqueles em que podemos atribuir ao agente
uma responsabilidade, não só pelo que se propôs realizar, mas também pelos resultados ou
conseqüências da ação. Cabe enfatizar, porém, que o problema da responsabilidade moral
está estreitamente relacionado, por sua vez, com o da necessidade e liberdade humanas,
pois somente admitindo que o agente tem certa liberdade de opção e de decisão é que se
pode responsabiliza-lo. Por isto, não basta julgar determinado ato segundo uma norma ou
regra de ação, mas é preciso também examinar as condições concretas nas quais ele se
realiza.
5. Para finalizar...
Por fim, gostaria de propor uma reflexão a partir das contribuições de Maturana
(1998).
Encontramos a moral em dois planos: o normativo, constituído pelas normas ou
regras; e o factual, constituído por certos atos humanos que se realizam efetivamente, isto é,
que são independentemente de como pensemos que deveriam ser. Sobre este contexto, já
afirmamos antes a necessidade de ponderarmos o comportamento na relação com as
condições objetivas de sua realização. Da mesma forma, já assinalamos a busca de uma
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ética articulada à prática cotidiana, evitando posturas normativistas, especulativas ou
idealistas.
Maturana traz uma proposição que me parece coerente com o que escrevemos até
aqui, acrescentando a dimensão emocional a um discurso tão exclusivo da razão, como o
pensamento ético. Exemplificando, este autor afirma que a Declaração dos Direitos
Humanos e os discursos racionais sobre os direitos humanos, por impecáveis que sejam, só
convencem os que já estão convencidos.
Com este exemplo, Maturana deseja assinalar que as preocupações moral e ética,
como preocupação com as conseqüências que nossas ações tem sobre o outro, são um
fenômeno que tem a ver com a aceitação do outro e pertence ao domínio do amor. Por isso,
a preocupação ética nunca ultrapassa o domínio social no qual ela surge, ou seja, nossa
intencionalidade ética não chegará àqueles cuja condição nos é indiferente.
O autor conta uma passagem de sua vida para explicar seu argumento. Tempos
depois da explosão em Hiroshima, na Segunda Guerra Mundial, ele e alguns colegas de
curso em Londres teriam visitado uma exposição fotográfica com imagens do desastre. Um
de seus amigos teria dito então: “que me importa que tenham morrido todos esses
japoneses; eu não conhecia nenhum deles”. Embora seja uma demonstração incrível de
indiferença, serviu a Maturana e pode nos servir como exemplo. Diz o autor: “se não tenho
imaginação para incorporar aqueles ‘japoneses’ no meu mundo, aceitando-os como
legítimos outros na convivência, não posso preocupar-me com o que lhes acontece como
conseqüência de meus atos” (Maturana, 1998, p. 73).
Para Maturana, a disponibilidade para incluir o outro em nossas preocupações éticas
tem fundamento emocional, antes que racional. Racionalizações em si não nos
convenceriam se não estivéssemos emocionalmente dispostos/comprometidos, se não
tivéssemos real empatia. E, neste sentido, declarações escritas ou faladas, normas ou
retóricas podem não dizer muito sobre nossas práticas morais efetivas.
O que vocês acham?
Referências Bibliográficas:
MATURANA, Humberto. A ética. In: MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na
Educação e na Política. Belo Horizonte: UFMG, 1998, p. 72-75.
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VASQUEZ, Adolfo Sanchez. Ética. Rio de Janeiro : Civilização Brasileira, 1993.
Questões para fórum:
a) Considerando o conteúdo da aula (e, sobretudo, os tópicos “Para dar uma definição”
e “Sobre as características principais”), relate uma situação perpassada por questões
morais que tu conheceste ou vivenciaste.
b) Dê tua opinião sobre o argumento de Humberto Maturana descrito ao final do texto
da aula.
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