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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X ESTRANHAMENTOS E DESESTABILIZAÇÕES NO DEBATE JURÍDICO SOBRE DEFICIÊNCIA: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA CRIP À (DES)CONSTRUÇÃO DA CAPACIDADE LEGAL Jacqueline Lopes Pereira 1 Francielle Elisabet Nogueira Lima 2 Resumo: A pessoa com deficiência é assim denominada em oposição a um ideal normativo de “normalidade” ou de “eficiência”, o qual tende a excluir realidades concretas divergentes de um imperativo padronizado de corporalidade. Nessa esteira, sabe-se que o direito ocidental oitocentista produziu códigos com o objetivo de regular exaustiva e previamente a existência e atos da vida dos sujeitos, racionalidade esta também vigente nos dias atuais. Dentre os mecanismos de regulação está o regime da capacidade civil que, no caso brasileiro, classificava pessoas com deficiência como absolutamente ou relativamente incapazes até o início de 2016, quando mudanças trazidas pela edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência e diretrizes da Convenção de Nova Iorque atingiram essa estrutura tradicional e binária, alinhando-se com pautas há décadas defendidas por movimentos sociais. Nesse sentido, observa-se o campo profícuo de diálogo interdisciplinar entre a teoria Crip e o direito civil. Aquela, ao questionar a corponormatividade, aponta para possíveis críticas ao sistema jurídico e direciona para potenciais reformulações de paradigmas que construíram e ainda mantêm a noção estável do que se entende por sujeito de direito, as quais são exploradas pelo presente trabalho. Palavras-chave: Pessoa com deficiência. Capacidade legal. Teoria Crip. Introdução Em 2015, instituiu-se a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015, Brasil, 2015), a qual, baseada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e em seu Protocolo Facultativo (ratificados pelo Congresso nacional em 2008), prevê uma série de disposições para assegurar e promover em condições de igualdade o exercício de direitos e liberdades fundamentais das pessoas com deficiência, visando à sua inclusão social 3 . 1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná na área de concentração em Relações Sociais. Bolsista CAPES/PROEX. Telefone: (41) 99941-6713. E-mail: [email protected]. Curitiba- Brasil. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná na área de concentração em Direitos humanos e democracia. Assessora no Tribunal de Justiça do Paraná. Telefone: (41) 99102-2733. E-mail: [email protected]. Curitiba- Brasil. 3 Art. 1 o . É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

ESTRANHAMENTOS E DESESTABILIZAÇÕES NO DEBATE JURÍDICO SOBRE

DEFICIÊNCIA: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA CRIP À

(DES)CONSTRUÇÃO DA CAPACIDADE LEGAL

Jacqueline Lopes Pereira1

Francielle Elisabet Nogueira Lima2

Resumo: A pessoa com deficiência é assim denominada em oposição a um ideal normativo de

“normalidade” ou de “eficiência”, o qual tende a excluir realidades concretas divergentes de um

imperativo padronizado de corporalidade. Nessa esteira, sabe-se que o direito ocidental oitocentista

produziu códigos com o objetivo de regular exaustiva e previamente a existência e atos da vida dos

sujeitos, racionalidade esta também vigente nos dias atuais. Dentre os mecanismos de regulação

está o regime da capacidade civil que, no caso brasileiro, classificava pessoas com deficiência como

absolutamente ou relativamente incapazes até o início de 2016, quando mudanças trazidas pela

edição do Estatuto da Pessoa com Deficiência e diretrizes da Convenção de Nova Iorque atingiram

essa estrutura tradicional e binária, alinhando-se com pautas há décadas defendidas por movimentos

sociais. Nesse sentido, observa-se o campo profícuo de diálogo interdisciplinar entre a teoria Crip e

o direito civil. Aquela, ao questionar a corponormatividade, aponta para possíveis críticas ao

sistema jurídico e direciona para potenciais reformulações de paradigmas que construíram e ainda

mantêm a noção estável do que se entende por sujeito de direito, as quais são exploradas pelo

presente trabalho.

Palavras-chave: Pessoa com deficiência. Capacidade legal. Teoria Crip.

Introdução

Em 2015, instituiu-se a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº

13.146/2015, Brasil, 2015), a qual, baseada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com

Deficiência e em seu Protocolo Facultativo (ratificados pelo Congresso nacional em 2008), prevê

uma série de disposições para assegurar e promover em condições de igualdade o exercício de

direitos e liberdades fundamentais das pessoas com deficiência, visando à sua inclusão social3.

1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná na área de concentração em

Relações Sociais. Bolsista CAPES/PROEX. Telefone: (41) 99941-6713. E-mail: [email protected].

Curitiba- Brasil. 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná na área de concentração em

Direitos humanos e democracia. Assessora no Tribunal de Justiça do Paraná. Telefone: (41) 99102-2733. E-mail:

[email protected]. Curitiba- Brasil. 3 Art. 1o. É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência),

destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais

por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.

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Referido diploma legal ocasionou mudanças no Código Civil (Lei nº 10.406/2002, Brasil,

2002), sendo a transformação do regime das capacidades a mais notória delas, excluindo a previsão

de incapacidade absoluta para pessoas com deficiência, e impactando nas searas existencial e

patrimonial da regulamentação da vida privada deste segmento populacional.

A título exemplificativo4, nota-se como a LBI, ao impor tais modificações no ordenamento

jurídico, possibilitou às pessoas com deficiência exercerem com maior autonomia atos civis como a

formação de família através de união estável e casamento – garantindo, ainda, direitos sexuais e

reprodutivos, portanto -, bem como o amplo exercício do poder familiar (guarda, custódia, tutela e

adoção de crianças e adolescentes), derrotando, ainda, a sistemática do antigo procedimento

conhecido como curatela e instituindo a tomada de decisão apoiada5, a fim de fornecer à pessoa

com deficiência elementos e informações necessários para gozar plenamente de sua capacidade.

Não obstante, tal ampliação das liberdades fundamentais da pessoa com deficiência trouxe

perplexidade a alguns juristas6 que, a partir de uma visão tendencialmente conservadora, perguntam

se o estabelecimento da capacidade legal das pessoas com deficiência em pé de igualdade com

as(os) demais é de fato vantajoso para a proteção daquele primeiro grupo, tendo em vista sua

condição de vulnerável.

De outro norte, pode-se apontar como estas pretensas preocupações e o que se entendeu

tradicionalmente por “regime das incapacidades”, previamente à instituição da LBI, no âmbito do

direito civil, contribuem (contribuíram) para a segregação da pessoa com deficiência, por terem

classificado juridicamente alguns indivíduos como dotados de capacidade para exercer alguns atos e

outros como inaptos para tanto, pautando-se em um ideal de “normalidade” corpórea ou psíquica –

4 Joyceane Bezerra de Menezes retrata que “além do destaque especial que a CDPC dedicou à capacidade legal, outros

pontos que importam diretamente ao direito civil também foram ressaltados. Dentre eles, o direito das pessoas com

deficiência à integridade fisiopsíquica (art.17); à liberdade de locomoção e à nacionalidade (art.18); à vida independente

e à inclusão na comunidade, facultando-lhes a escolha do local de sua residência e daqueles com quem deseja morar, de

sorte que não seja obrigado a viver em determinado tipo de moradia (art.19); à ampla mobilidade (art.20); à liberdade de

expressão e opinião (art.21); à privacidade (art.22). Merece relevo o direito à constituição e proteção da família (art.23).

Nesse ponto, a CDPD estabelece para os Estados, o dever de assegurar à pessoa com deficiência a possibilidade de

exercer o poder familiar, a guarda, a custódia, a curatela e pleitear a adoção de crianças, respeitado sempre o superior

interesse dessas” (Menezes, 2015, p. 6). 5 Previamente às alterações da LBI, para que uma pessoa com deficiência fosse considerada absolutamente incapaz,

deveria enfrentar processo de “interdição”, através do qual seria nomeado(a) curador(a), que a representaria nos atos da

vida civil. A denominação “interdição” é rechaçada pela lógica da Convenção, sendo mais apropriado falar de

“processo de curatela”, o qual atualmente encontra limitações na LBI, em razão de qualificá-lo como medida

excepcional e atinente apenas a atos civis de natureza patrimonial, de forma que se resguardam as decisões existenciais

à vontade da pessoa com deficiência, nos termos do artigo 85 da LBI (Rosenvald, 2015). Ainda, inovação que não passa

despercebida é a tomada de decisão apoiada, documento que deve ser homologado pelo Poder Judiciário e que afasta o

paradigma da substituição de vontade para seguir o modelo de “apoio” de decisões através da eleição, pela própria

pessoa com deficiência, de ao menos duas pessoas de sua confiança com a função de esclarecer elementos e possíveis

efeitos que envolvem uma escolha (Menezes, 2016, p. 608). 6 Nesse sentido, ver: Simão, 2015.

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dados apontam que, do percentual de 14,5% da população brasileira que possui algum tipo de

deficiência, 70% vivem abaixo da linha da pobreza, 33% são analfabetas ou têm até 3 anos de

escolaridade e 90% estão fora do mercado de trabalho (De Oliveira; Matos, 2016, p. 19).

Além disso, de maneira geral, percebe-se por parte de operadoras(es) do direito escassas

tentativas de diálogo com outros ramos do saber que há muito já vem tratando, no campo

acadêmico, da existência (e, por conseguinte, da corporalidade) da pessoa com deficiência partindo

de analíticas críticas, como é o caso dos disability studies (ou estudos sobre deficiência7).

Nota-se, nesta área, crescente contribuição da epistemologia feminista e da teoria queer

desde os anos 1990 (Block; Mello; Nuernberg, 2014, p. 96), mormente no que diz respeito ao

desenvolvimento da “teoria Crip”, a qual almeja, dentre outros objetivos, uma posição crítica com

relação à materialidade fixa do corpo deficiente, questionando a naturalidade de corpos

capazes\hábeis\eficientes (Gavério; Oliveira, 2015, p. 1), desestabilizando a oposição binária

eficiência versus deficiência.

Partindo desses pressupostos, observa-se profícuo potencial, na seara jurídica, de se

estabelecer interfaces com as teorizações crip, a fim de questionar a corponormatividade intrínseca

aos enunciados normativos jurídicos acerca da capacidade legal, os quais sistematicamente

reproduziram exclusões das pessoas com deficiência para a prática dos atos da vida civil,

apontando para possíveis reavaliações do sistema jurídico e para reformulações de paradigmas que

construíram e que ainda mantêm, em vasta medida, uma noção abstrata e estável do que se entende

por sujeito de direito.

A pessoa com deficiência e o “padrão” de normalidade no direito civil ocidental: a

capacidade civil nas codificações

O direito é prática social que envolve um conjunto de normas criadas pelo Estado, as quais

têm caráter universalizante e buscam genericamente abranger toda a contingência e pluralidade

humana em padrões de conduta pré-ordenados. Tanto a noção do próprio Estado de Direito, quanto

7 De acordo com Block, Mello e Nuenrberg (2014, p. 94), disability ou discapacidad traduz-se no neologismo

“discapacidade”, que combina o prefixo “dis”, significando “dificuldade”, com a palavra capacidade, “não possuindo

nenhuma relação conceitual com as palavras deficiência e incapacidade”. Afirmam estes autores, para ilustrar a questão,

que certo tipo de deficiência gera discapacidades diferentes, da seguinte forma: “Palacios (2008, p. 123) argumenta que

Morris (1991) sintetiza claramente esta diferença entre deficiência e discapacidade ao afirmar que ‘una incapacidad para

caminar es una deficiencia, mientras que una incapacidad para entrar a un edifício debido a que la entrada consiste en

una serie de escalones es una incapacidad” (Idem). Feitas essas considerações, no entanto, opta-se, nesta oportunidade,

pela adoção do termo “deficiência” como referência a “disability”, por aquele já ter se consolidado como tradução

oficial deste, na esteira do que preconizam referidos autores.

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a produção de normas que visam regular a vida da pessoa desde seu nascer até após sua morte,

desenvolveram-se com afinco na modernidade jurídica (Pereira, 2011, p. 167-168).

Nessa esteira, observa-se como o direito civil8, na qualidade de ramo que regula as relações

interpessoais tanto em âmbito existencial como em âmbito patrimonial (consubstanciadas nos eixos

dos contratos, do regime das apropriações e das relações familiares), teve suas bases construídas no

contexto das codificações oitocentistas9. Através de enunciados abstratos, estas contribuíram, por

um lado, para o desenho de uma igualdade formal entre os membros da sociedade, e, por outro,

ocultaram a diversidade inerente à humanidade, por se alicerçar na figura abstrata e simplificada de

um “sujeito de direito” estável, com vistas a absolutizar uma visão parcial de mundo, à luz de um

ordenamento sexista masculino (De Oliveira, 2016).

Houve, portanto, a construção de um ideal de subjetividade que não necessariamente

correspondia à pessoa que vive, sente e transita pelos nossos dias (Meirelles, 1998, p. 91), e que,

para ter seus atos reconhecidos como válidos no mundo jurídico, deveria ser dotado de algumas

características: o “regime das capacidades” contribuiu para essa qualificação.

Tal regime classificatório trata da capacidade jurídica em duas dimensões: a capacidade de

ter direitos, isto é, “capacidade de direito” e a capacidade de gozar e exercer esses direitos por conta

própria, referida como “capacidade de exercício” ou “de fato” (Amaral, 2006, p. 227). Não há

divergências a respeito de todo ser humano deter a capacidade jurídica de direito, porém, o próprio

sistema jurídico estabeleceu gradações ao definir quem é e quem não é plenamente capaz de exercer

atos da vida civil (tratando-se, aqui, da capacidade de fato).

Em breve retrospecto legislativo, o Código Civil de 1916, vigente até 2003, classificava em

seu artigo 5º como absolutamente incapazes os “loucos de todo o gênero” e os “surdos-mudos, que

não puderem exprimir a sua vontade”, os quais seriam representados por curador(a) após processo

judicial de “interdição”. Essa norma foi reproduzida no Código Civil de 2002, que além de prever

como absolutamente incapazes os “que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o

necessário discernimento” para os atos da vida civil no artigo 3º, também incluiu como

relativamente incapazes os “excepcionais, sem desenvolvimento mental completo” em seu artigo 4º

(Brasil, 2002).

8 De maneira mais específica, eis o conceito exposto por Francisco Amaral: o direito civil “regula as relações entre

indivíduos nos seus conflitos de interesses e nos problemas de organização de sua vida diária, disciplinando os direitos

referentes ao indivíduo e à sua família, e os direitos patrimoniais, pertinentes à atividade econômica, à propriedade dos

bens e à responsabilidade civil” (Amaral, 2006, p. 26-27). 9 O Código Civil francês de 1804 pretendia ser a única fonte do direito privado por abarcar as relações particulares com

coerência, completude, estabilidade e certeza. Não foi diferente a intenção do Código Civil Alemão, o BGB de 1896,

que intencionou ordenar formalmente conceitos abstratos referentes à relação jurídica (Fonseca, 2014, p. 29-30).

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Verifica-se, assim, que o regime das capacidades contribuiu para invisibilizar a vontade de

pessoas com deficiência – principalmente mental e intelectual– e, em sentido contrário, colaborou

para celebrar a figura de sujeito de direito “normal” e plenamente capaz de decidir os rumos de sua

vida sem ingerência de terceiros.

Diante desse quadro, observa-se que a limitação da capacidade de fato, ou de exercício,

dialoga diretamente com o um ideal normativo de “eficiência”, que exclui realidades concretas

divergentes de um padrão idealizado disposto pelo dito direito civil e constrói uma lógica binária de

contraposição da “capacidade” à “incapacidade” (ou “discapacidade”).

Tal modelo binário de classificação de pessoas como incapazes para atos da vida civil é

altamente influenciado pelo saber médico e patologizante (Barbosa; Diniz; Santos, 2009, p. 66), que

torna ainda mais evidente a segregação da relação com as pessoas com deficiência, reputando-as a

existências negadas e sem vontade qualificada para definir os rumos de suas próprias escolhas de

vida e patrimônio.

Modelo social, Convenção sobre os direitos da pessoa com deficiência e a desestabilização

do regime das capacidades

Percebe-se, assim, como a lógica patologizante e estigmatizante do regime das capacidades

confronta o que se define como “modelo social da deficiência”, horizonte que indica a compreensão

da pessoa com deficiência como resultado de uma dinâmica entre sociedade e a sua subjetividade.

Tal modelo inaugurou o paradigma defendido por movimentos de bandeira “Nothing about

us without us” (Charlton, 2000), isto é, que defendiam a participação ativa e direta das pessoas com

deficiência no desenvolvimento de políticas públicas e garantia de direitos fundamentais,

reivindicação esta que foi reconhecida, praticada e expandida pela Convenção Internacional de

Direitos das Pessoas com Deficiência.

Em 2009, o Brasil internalizou a Convenção Internacional de Direitos da Pessoa com

Deficiência10 e, em 2015, com a instituição da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência

ou Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015, Brasil, 2015), eliminou-se a hipótese

10 Esse tratado internacional foi assinado pelo Brasil em Nova Iorque, Estados Unidos da América, em 30.03.2007 e sua

ratificação pelo Congresso Nacional ocorreu em 2008 através do Decreto Legislativo n. 186, em consonância com o

procedimento previsto no artigo 5º, parágrafo 3º da Constituição Federal (votação com maioria qualificada de três

quintos dos votos dos membros das respectivas Casas do Congresso Nacional em dois turnos). Isto é, o referido tratado

internacional é o primeiro – e, até então, único – que possui status material e também formal de Emenda à Constituição,

com vigor no plano interno desde a vigência do Decreto Presidencial n. 6.949 de 2009.

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de essas pessoas serem consideradas absolutamente incapazes pelo sistema jurídico. O tratado

internacional (primeiro instrumento ao qual se referiu neste parágrafo) visou à emancipação da

pessoa com deficiência e sua garantia como sujeito de direito em sua plenitude, de modo a tentar

romper com o capacitismo que as excluía do fruir da liberdade.

Dentre os maiores impactos produzidos pela Convenção está a determinação contida em seu

artigo 12, que tornou a capacidade legal da pessoa com deficiência a regra a ser seguida dentre os

ordenamentos jurídicos dos países signatários. Essa alteração estrutural recai sobre as balizas do

regime das capacidades do direito civil clássico e concede maior liberdade de autodeterminação à

pessoa com deficiência.

Assim, permite-se uma aproximação dos enunciados normativos regulatórios à concretude

da vida, bem como o afastamento gradual do binarismo “eficiência”-“deficiência”, sem deixar

também de amparar a vulnerabilidade da pessoa individualmente considerada, uma vez que existe

expressa preocupação a respeito das salvaguardas às pessoas com deficiência cuja capacidade para

discernimento se encontre limitada.

Essas mudanças são condizentes com o modelo social de percepção da deficiência, pois ele a

compreende como resultado da relação entre pessoa e sociedade (Diniz, 2012, p. 19), sendo a

condição de vulnerabilidade a consequência da incapacidade da sociedade – e não da pessoa –

interagir com uma corporalidade (não apenas física, mas mental, intelectual e sensorial) em

desigualdade de condições (Schramm, 2005, p. 3).

Sob essa perspectiva, a teorização do modelo social da deficiência, perpetrada nos estudos

sobre a deficiência (disability studies), vislumbra que não é a pessoa em si quem se apresenta como

deficiente, mas que essa convencionada “incompletude” está na sociedade em virtude de não

fornecer recursos mínimos que ampliam as escolhas e proteção das preferências dessas pessoas.

Abandona-se, assim, a perspectiva médica que tanto pugnava pela reabilitação individual,

porquanto, através do modelo social, parte-se do pressuposto de que a deficiência é uma construção

que resulta das interações entre um indivíduo e o entorno que foi concebido para ele (Bueno;

García, 2007, p. 1.553).

Esses estudos teóricos se devem à atribuição do significado de “deficiência” como

corporalidade incompleta, elaborado no período após as Duas Grandes Guerras a partir da presença

de vítimas flageladas (física e psicologicamente) pela violência do conflito (Asís, 2013, p. 19) e

desenvolvimento nas décadas seguintes do século XX. Ana Paula Barbosa-Fohrmann e Sandra

Filomena Wagner Kiefer notam a transição de um modelo reabilitador e assistencialista da

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deficiência a modelo social, libertador e integrador, devido à participação ativa de movimentos da

sociedade civil representativos de pessoas com deficiência:

A partir da década de sessenta, teve início, especialmente na Inglaterra e nos Estados

Unidos, um movimento liderado pelas próprias pessoas com deficiência e suas entidades,

com forte atuação política, jurídica e acadêmica, que buscava uma participação social

igualitária e o reconhecimento de direitos. Destacam-se a britânica “Union of Physically

Impaired against Segragation (UPIAS)”, a “Disable People’s International (DPI)” e o

Movimento de Vida Independente (CVIs), os quais difundiram informações e ações sobre

acessibilidade, em todas as suas dimensões. Por meio dessas organizações, começou-se a

demonstrar o elo entre a limitação que vivencia cada pessoa com deficiência e design, a

estrutura do ambiente e a atitude da sociedade. (BARBOSA-FOHRMANN; KIEFER, 2016,

p. 72).

Esses movimentos influenciaram a citada Convenção Internacional e exigem a releitura da

deficiência sob o paradigma de que todo ser humano é passível de estar em relação comparativa de

desigualdade e, por isso, não há que se ocultar ou tratar a diferença como “anormalidade”.

Assim, no direito civil atual, emerge a noção de capacidade legal sem a bifurcação da

capacidade de direito e capacidade de fato que outrora vigia no ordenamento jurídico, na tentativa

de eliminação das subdivisões incapacidade relativa e incapacidade absoluta (Concil of Europe,

2012). O que se vê, portanto, é que o regime clássico das capacidades adotado pelo tradicional

direito civil se depara com diferentes perspectivas sobre a deficiência, que enfatizam a necessidade

de tomar corporalidades consideradas anormais ou incompletas pelo saber científico como

diversidades de expressão da existência humana.

Nesse trilhar, é possível verticalizar a crítica à limitação da capacidade jurídica por vertente

de estudos engendrada nos disability studies, qual seja, a teoria Crip, que exsurge em contexto de

expansão daqueles estudos pós anos 1990, nas humanidades (Gavério, 2015, p. 105).

A teoria Crip como contributo à crítica ao regime das capacidades e à racionalidade

jurídica vigente

Como visto, o regime da capacidade civil presente no ordenamento jurídico brasileiro

corroborou uma estrutura binária em que, por um lado, havia sujeitos plenamente capazes de decidir

a respeito dos rumos de seu patrimônio e existência e, por outro, sujeitos desprovidos de

autodeterminação relativa ou absoluta, a partir de categorias fixas pré-ordenadas, sem se atentar

para a complexidade e a diversidade das deficiências.

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Tal classificação, através da técnica jurídica da gradação da capacidade de exercício, muito

contribui para o estado de abjeção (Butler, 2013, p. 156) das pessoas com deficiência quanto ao

reconhecimento jurídico de sua personalidade como dotada de autodeterminação e vontades; isto é,

o direito, por meio do regime das capacidades, ratificou expressamente o apagamento de existências

e corporalidades que não gozavam de um status de sujeito pleno para o ponto de vista normativo.

Nesse sentido, dialoga-se com a teoria Crip11, vertente filosófica com proximidade da teoria

Queer, a(s) qual(is) favorece(m) a crítica à subjetividade jurídica excludente da pluralidade de

vivências humanas.

Um dos propósitos da teoria Crip, em apertada síntese, é a ressignificação de conceitos que

desqualificam corporalidades por não se adequarem à normalidade e, por isso, são excluídos de uma

condição de maior igualdade. Nas palavras de McRuer (2006, p. 33), reportado como idealizador de

referida teoria, pauta-se na análise crítica de “como corpos e deficiências foram concebidos e

materializados em vários locais culturais, e como podem ser entendidos e imaginados como formas

de resistência à homogeneização cultural”.

Observa-se, de igual sorte, que a exclusão da pessoa com deficiência no campo normativo-

jurídico se operou, por longa data, pelo contraste entre seres humanos “eficientes” e “aptos” e

outros “deficientes” e “inaptos” para tomarem as rédeas da própria vida - como se viu, na

codificação de 1916, havia a previsão de incapacidade absoluta para pessoas com deficiência que

poderiam ser classificadas como “loucos de todo o gênero”, para não mencionar a generalização da

experiência da surdez também como causadora de incapacidade; já o diploma civil de 2002, apesar

de abrandar tais termos, manteve a ratio discriminatória ao tolher a capacidade de exercer atos da

vida civil de pessoas com enfermidade ou deficiência mental, sem observar a gradação que

deficiências podem ter na realidade vivida.

Percebe-se, destarte, que a manutenção da regra da pessoa com deficiência como

absolutamente incapaz para o exercício de atos da vida civil significou mantê-la em um lugar oculto

para o direito, o que restringe a sua fruição de direitos fundamentais (Menezes, 2016). E essa

restrição restou, em certa medida, atenuada pela ruptura do clássico regime das capacidades feita

pela mudança de paradigma exposta no item antecedente.

11 Como bem explica Gavério (2015, p. 111), “fazendo uma analogia ao uso ressignificado do termo pejorativo queer

(que, sinteticamente, poderia ser traduzida para o adjetivo “esquisito”, “estranho”), a palavra crip é diminutivo de

cripple, que pode ser traduzida como aleijado(a), defeituoso(a) e tem sido pensada de maneira geral e estratégica, por

partes da comunidade deficiente ativista, como uma tentativa de romper com definições estanques e objetivas que

categorizam e especificam, perante uma norma pré-estabelecida, corpos, deficiências e comportamentos”.

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Daí a relevância da teoria Crip às reflexões ora desenvolvidas, pois ao se pensar a exclusão

da capacidade civil plena da pessoa com deficiência, nota-se uma normatividade que condena uma

forma de vida humana a uma condição secundária ou abjeta. Também se constata nas proposições

crip sintonia com o modelo social de apreensão da deficiência e o propósito integrador da

Convenção de Nova Iorque, buscando-se, assim, arcabouço teórico-crítico para a construção de um

novo conceito de capacidade legal que não mais reproduza discriminação em relação às pessoas

com deficiência e, que, ao mesmo tempo, confira a tais pessoas maior autodeterminação, em

conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana.

Além disso, em visão mais ampliada, os aportes teóricos crip também se prestam a

questionamentos que extrapolam a construção do novo paradigma da capacidade legal para pessoas

com deficiência. Essa possibilidade analítica se evidencia, por exemplo, na observação à

modificação trazida pela própria LBI ao Código Civil, no que se refere ao artigo 1.557 do Código

Civil, dispositivo que atualmente possui a seguinte redação:

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu

conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;

II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a

vida conjugal;

III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize

deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr

em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência.

Muito embora se tenha retirado a referência à deficiência física e mental do rol de erros

essenciais capazes de ensejar a anulação de matrimônio, a menção a “defeito físico irremediável”

reproduz fortemente ideal de um corpo “naturalmente” normal, “são”, sem “anomalias”, o que, por

sua vez, propulsiona nova crítica à corponormatividade inserida no bojo da racionalidade jurídica,

que traz grandes estigmas àqueles que não possuem funcionalidade corporal considerada plena

dentro de um parâmetro fixo de normalidade.

Considerações finais

Reconhece-se nas alterações trazidas pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com

Deficiência relevantes avanços legislativos que impactam diretamente no desfrutar da

autodeterminação das pessoas com deficiência, o que reflete em ampla gama de direitos

fundamentais (planejamento familiar, direitos sexuais e reprodutivos, liberdades para contratar e

adquirir propriedade, etc).

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Não obstante, a crítica ao clássico regime das capacidades, na seara jurídica, ganha especial

olhar ao se associar às contribuições dos estudos sobre deficiência (disability studies), que

identificam mecanismos de produção e reprodução de abjeções a formas de vida destoantes de um

pretenso ideal de normalidade.

Observa-se, nesta mesma toada, que a teoria Crip, partilhando de tais perspectivas críticas,

auxilia na superação do modelo biomédico de compreensão da pessoa com deficiência e se alinha a

um modelo social, que a compreende em perspectiva relacional, configurando-se como importante

arcabouço teórico para o desenvolver prático da concretização da capacidade plena das pessoas com

deficiência.

Em outras palavras, ao se propugnar pelo incremento de contributos interdisciplinares que

excedem o comum viés celebratório em relação à LBI, prioriza-se o contínuo pensamento crítico

em relação à racionalidade jurídica, pois “é a partir deste movimento de negação criativa que se

deve, enfim, apostar para aportarmos na tão sonhada afirmação deste sem número de vivências

humanas contemporaneamente negadas” (De Oliveira; Matos, 2016, p. 30).

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Estrangements and destabilization on judicial debate about disability: possible contributions

from Crip theory to (de)construction of legal capacity

Abstract: Disabled people is a nomination opposed to “normal” or “abled” people, which reveals

an exclusion of different ways of life by imperative standarts of corporality. Western Law has

produced Codes trying to rule previously the subject’s whole existence and acts. Civil capacity is

one of the tools of regulation. Brazilian Law used to classify disabled people as absolutely or

relatively incapable until the beggining of 2016, when this traditional binary structure has been

changed by Disabled People’s Statute and UN Convention on the Rights of Persons with

Disabilities. These innovations show a paradigm desired for a long time by disabled people’s social

movements. Thereby, we can see a beneficial interdisciplinary dialogue between Crip theory and

Brazilian private Law. That theory questions corponormativity, heading to possible reviews to

Brazilian’s Legal system. These criticisms demonstrate potential reformulations of paradigms that

try to signify the "subject of Law", which this paper studies.

Keywords: Disabled people. Legal capacity. Crip Theory.