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ESPECTROS VIBRACIONAIS DE MACROMOLÉCULAS FERNANDA DE LOURDES ALMEIDA
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ESPECTROS VIBRACIONAIS DE MACROMOLÉCULAS
Fernanda de Lourdes Almeida
DISSERTAÇÃO SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DA COORDENAÇÃO DO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO MULTIDISCIPLINAR EM FÍSICA, QUÍMICA E
NEUROCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL-REI COMO
PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE
MESTRE EM CIÊNCIAS.
SÃO JOÃO DEL-REI, MG - BRASIL
SETEMBRO DE 2004
ii
ALMEIDA, FERNANDA DE LOURDES
Espectros Vibracionais de Macromoléculas
[Minas Gerais] 2004
XI, 210 p. 29,7 cm (UFSJ, M.Sc., Física,
2004)
Dissertação – Universidade Federal de São
João del-Rei, Multidisciplinar em Física, Química
e Neurociência
1. Investigação teórica de possíveis sítios de
sorção de cobre em celulose e lignina. 2.
Estudo teórico comparativo entre os métodos
ab initio Hartree-Fock e semi-empírico MNDO
na caracterização de fullerenos. 3. Estudos
experimental e teórico de espectros de
infravermelho e Raman de fullerenos.
I. UFSJ II. Título (série)
iii
“Não sei o que possa parecer aos olhos do mundo, mas aos meus pareço apenas ter
sido como um menino brincando à beira-mar, divertindo-me com o fato de encontrar
de vez em quando um seixo mais liso ou uma concha mais bonita que o normal,
enquanto o grande oceano da verdade permanece completamente por se descobrir à
minha frente (...). O que sabemos é uma gota, o que não sabemos é um oceano...”
Isaac Newton
Dedico este trabalho
aos meus queridos pais, Antônio e Aparecida,
ao meu querido irmão Rodrigo
e, de uma maneira muito especial,
ao meu companheiro Willyan.
iv
Agradecimentos
Ao meu orientador, Prof. Dr. José Luiz Aarestrup Alves, pelo qual tenho grande
apreço e enorme consideração. Sua atenção e dedicação permanentes para com meu
trabalho, nossas discussões científicas extremamente enriquecedoras e nossas
conversas cotidianas preciosas constituíram a base sólida para o bom andamento de
todas as atividades propostas, possibilitando-me um crescimento singular, tanto a
nível profissional quanto pessoal.
Aos Profs. Dr. Horácio Wagner Leite Alves (UFSJ), pelo apoio e estímulo e pelas
importantes discussões em sala de aula, no período em que vigoraram as disciplinas
do curso; Dr. André Luiz Mota (UFSJ), pela disponibilidade e atenção sempre
constantes; Dra. Honória de Fátima Gorgulho (UFSJ), pelo esclarecimento acerca da
investigação estrutural da lignina e Dra. Regina Pinto de Carvalho (UFMG), pela
contribuição experimental acerca da caracterização espectroscópica da celulose.
Aos colegas, professores e funcionários do DCNAT, que de alguma forma
contribuíram para o sucesso deste trabalho, em especial aos colegas Regina Lélis de
Sousa, pelo companheirismo de todas as horas e Luiz Cláudio de Carvalho, pelo
auxílio prestado no decorrer do processo.
Um agradecimento especial à Inês, secretária da Pós-Graduação, pela
assistência e esclarecimentos das inúmeras dúvidas do cotidiano e pelo espírito
sempre gentil e cortês em todos os momentos.
Aos professores Dr. Luiz Orlando Ladeira, Dr. Marcos Assunção Pimenta e Dra.
Aríete Righi, do Departamento de Física do ICEx/UFMG, pela atenção, dedicação e
disponibilidade no decorrer da execução de todas as atividades experimentais.
Aos colegas Sérgio (UFMG), do Laboratório de Preparação de Amostras,
Cristiano Fantini Leite (UFMG), do Laboratório de Espectroscopia Micro-Raman, pela
paciência, desprendimento e zelo na execução de todos os experimentos e
especialmente à minha amiga Elisângela Silva Pinto (UFMG), por todo o apoio e
acolhimento durante minha estadia em Belo Horizonte.
Ao CENAPAD-MG/CO, pelo suporte técnico na execução dos cálculos
computacionais. Ao Instituto do Milênio, pela concessão das amostras de fullereno
adquiridas do Laboratório Sigma-Aldrich. À CAPES, pela concessão da bolsa e pelo
suporte financeiro recebido durante todo o período em que vigorou este projeto.
Por último, e incontestavelmente, o mais sublime dos agradecimentos a Deus, na
pessoa de Jesus Cristo, por Sua presença fiel, constante e essencial em minha vida,
sem a qual nada poderia ter sido realizado.
v
Resumo da Dissertação apresentada à UFSJ como parte dos requisitos necessários
para a obtenção do grau de Mestre em Ciências (M.Sc.)
ESPECTROS VIBRACIONAIS DE MACROMOLÉCULAS
Fernanda de Lourdes Almeida
Setembro/2004
Orientador: José Luiz Aarestrup Alves
Programa: Mestrado Multidisciplinar em Física, Química e Neurociência
Este trabalho divide-se em duas áreas de pesquisa distintas, conectadas entre si
principalmente pela caracterização espectroscópica de infravermelho e Raman das
estruturas moleculares analisadas. Em sua primeira parte, desenvolve um estudo
sobre a investigação de possíveis sítios de sorção de cobre nas estruturas
moleculares da celulose e da lignina, que são biomoléculas constituintes da biomassa
vegetal. Inclui a proposição de sítios de sorção de cobre dos tipos substitucional e
intersticial como as estruturas de configuração de equilíbrio mais estáveis nestes
sistemas. Em sua segunda parte, este trabalho desenvolve um estudo teórico das
propriedades estruturais, eletrônicas e vibracionais de fullerenos e alguns de seus
derivados, principalmente de caráter exploratório, visando a comparação da eficiência
de cálculo entre métodos de química quântica teórica, tais como o método ab initio
Hartree-Fock e o método semi-empírico MNDO. Para sistemas maiores, em que o
emprego do método ab initio torna-se impraticável, o método semi-empírico é capaz
de prover uma alternativa de cálculo satisfatória. Desenvolve ainda um estudo
experimental acerca das propriedades espectroscópicas de infravermelho e Raman
de fullerenos, no sentido de corroborar a conjugação entre teoria e experimento como
uma ferramenta útil na interpretação de resultados experimentais, bem como na
previsão de novos resultados ainda não disponíveis experimentalmente.
vi
Abstract of Dissertation presented to UFSJ as a partial fulfillment of the requirements
for the degree of Master of Science (M.Sc.)
VIBRATIONAL SPECTRA OF MACROMOLECULES
Fernanda de Lourdes Almeida
September/2004
Advisor: José Luiz Aarestrup Alves
Course: Multidisciplinary in Physics, Chemistry and Neuroscience
This work is separated in two different areas of research, connected themselves
mainly by the spectroscopic characterization of infrared and Raman of the analyzed
molecular structures. In the first part, it presents a study about the possible sites
responsible for the copper biosorption in the molecular structures of the cellulose and
of the lignin, that are biomolecules constituent of the vegetable biomass. In addition,
this work proposes the substitutional and interstitial sites for copper sorption as the
most stable structures in these systems. In the second part, this work develops a
theoretical study of structural, electronic and vibrational properties of fullerenes and
some of their derivatives, having mainly an exploratory aim, seeking the comparison of
efficiency among methods of theoretical quantum chemistry, such as the ab initio
method Hartree-Fock and the semiempirical method MNDO. For large systems, for
which the use of the ab Initio method becomes impracticable, the semiempirical
method is capable to provide an efficient alternative of calculation. In addition, an
experimental study is made concerning the spectroscopic properties of infrared and
Raman of fullerenes; the conjugation between theory and experiment turns to be an
extremely useful tool in the interpretation of experimental results, as well as in the
prediction of results not available experimentally.
vii
Índice
1. Introdução ............................................................................................................ 01
1.1.Motivação ........................................................................................................... 01
1.1.1. As Biomoléculas de Celulose e Lignina ................................................... 01
1.1.2. Fullerenos e Alguns de Seus Derivados .................................................. 02
1.2. Estrutura Geral do Trabalho .............................................................................. 04
2. Metodologia ......................................................................................................... 06
2.1. Introdução .......................................................................................................... 06
2.2. O Método Hartree-Fock ..................................................................................... 09
2.2.1. A Equação de Schrödinger ...................................................................... 09
2.2.2. A Aproximação de Born-Oppenheimer .................................................... 11
2.2.3. Unidades Atômicas .................................................................................. 13
2.2.4. Teoria do Orbital Molecular ..................................................................... 14
2.2.5. Expansões em Conjuntos-Base ............................................................... 17
2.2.6. O Método Variacional e a Teoria de Hartree-Fock .................................. 20
2.2.6.1. Sistemas de Camada Fechada ....................................................... 22
2.2.6.2. Sistemas de Camada Aberta ........................................................... 25
2.2.7. Análise Populacional de Mulliken ............................................................ 27
2.2.8. Conjuntos-Base Atômicos de Funções Gaussianas ................................ 29
2.2.8.1. O Conjunto-Base Mínimo STO-3G ................................................. 30
2.2.8.2. O Conjunto-Base Estendido 6-31G ................................................ 31
2.2.8.3. O Conjunto-Base Polarizado 6-311G** .......................................... 32
2.3. O Método MNDO ............................................................................................... 33
2.4. Cálculo de Forças .............................................................................................. 35
2.4.1. Introdução ............................................................................................... 35
2.4.2. O Método da Força ................................................................................. 36
2.4.3. Determinação da Geometria de Equilíbrio .............................................. 37
2.5. Derivadas Analíticas de 2a e 3a Ordens no Procedimento SCF ......................... 39
2.5.1. Intensidades de Infravermelho ................................................................. 39
2.5.2. Intensidades Raman ................................................................................. 42
3. Espectroscopias de Infravermelho e Raman ............................................... 44
3.1. Introdução .......................................................................................................... 44
viii
3.1.1. O Espectro Eletromagnético .................................................................... 45
3.2. Espectros de Infravermelho ............................................................................... 50
3.2.1. Espectro Vibracional de Moléculas Diatômicas ...................................... 50
3.2.2. Espectroscopia de FTIR ......................................................................... 53
3.2.2.1. Princípios Básicos da Técnica de FTIR ......................................... 53
3.2.2.2. Do Interferograma ao Espectro ..................................................... 56
3.3. Espectros Raman .............................................................................................. 61
3.3.1. Espectro Vibracional de Moléculas Diatômicas ....................................... 61
3.4. Vibrações Moleculares e Coordenadas Normais .............................................. 66
4. Estudo das Biomoléculas de Celulose e Lignina ....................................... 70
4.1. O Problema ....................................................................................................... 70
4.2. A Molécula de Celulose: Um Polissacarídeo Estrutural .................................... 73
4.2.1. Os Carboidratos ..................................................................................... 74
4.3. A Celulose e a Lignina ....................................................................................... 83
4.3.1. Estrutura Molecular da Lignina ............................................................... 83
4.3.2. A Lignocelulose ...................................................................................... 85
4.4. Estudos Experimentais na Literatura ................................................................. 87
4.4.1. Modelo para a Sorção de Cobre em Folhas Secas Usando
Espectroscopia de Infravermelho ................................................................................ 87
4.4.1.1. Preparação de Materiais e Métodos Experimentais .................... 87
4.4.1.2. Resultados ................................................................................... 89
4.4.1.2.1. Isotermas de Sorção .......................................................... 89
4.4.1.2.2. Espectros de EPR .............................................................. 90
4.4.1.2.3. Espectros de FTIR ............................................................. 91
4.4.1.3. Conclusões .................................................................................. 93
4.4.1.4. Discussão .................................................................................... 93
4.4.2. Espectros de FTIR por Derivada Segunda de Eucalyptus regnans
(Madeira Dura) e Pinus radiata (Madeira Macia) ........................................................ 96
4.4.2.1. Introdução ................................................................................... 96
4.4.2.2. Descrição Experimental .............................................................. 97
4.4.2.3. Resultados e Discussão ............................................................. 97
4.4.2.3.1. Espectros de FTIR Convencionais .................................... 97
4.4.2.3.2. Espectros de FTIR por Derivada Segunda ........................ 98
4.4.2.4. Conclusão ................................................................................. 101
4.5. Estudo Teórico ................................................................................................ 102
4.5.1. Resultados, Análise e Discussão .......................................................... 102
ix
4.5.1.1. Propriedades Estruturais: Celulose Pura e Contendo Cobre ...... 102
4.5.1.2. Propriedades Estruturais: Lignina Pura e Contendo Cobre ........ 108
4.5.1.3. Propriedades Vibracionais: Celulose Pura e Contendo Cobre .... 111
4.5.1.4. Propriedades Vibracionais: Lignina Pura e Contendo Cobre ...... 117
4.6. Observações Finais e Conclusões .................................................................. 122
5. Estudo dos Fullerenos e Alguns de Seus Derivados .............................. 123
5.1. Introdução ........................................................................................................ 123
5.2. A Molécula de C60 e o Grupo Icosaédrico ....................................................... 126
5.2.1. Estrutura Molecular do C60 .................................................................... 126
5.2.2. O Grupo Icosaédrico Ih .......................................................................... 129
5.3. A Molécula de C70 ............................................................................................ 130
5.4. Alguns Derivados da Molécula de C60 ............................................................ 132
5.4.1. Os Endofullerenos ................................................................................. 132
5.4.2. Os Heterofullerenos .............................................................................. 133
5.4.3. As “Fuzzyballs” ...................................................................................... 135
5.5. Síntese, Extração e Purificação de Fullerenos ................................................ 137
5.5.1. Síntese de Fullerenos ........................................................................... 137
5.5.2. Extração de Fullerenos ......................................................................... 140
5.5.2.1. O Método de Extração por Solventes ......................................... 141
5.5.2.2. O Método de Extração por Sublimação ...................................... 142
5.5.3. Purificação de Fullerenos ...................................................................... 143
5.6. Estudo Teórico ................................................................................................ 145
5.6.1. Resultados, Análise e Discussão .......................................................... 145
5.6.1.1. A Molécula de C60: Propriedades Estruturais e Eletrônicas........ 145
5.6.1.2. A Molécula de C60: Propriedades Vibracionais ........................... 148
5.6.1.3. A Molécula de C70: Propriedades Estruturais e Eletrônicas ....... 152
5.6.1.4. A Molécula de C70: Propriedades Vibracionais ........................... 155
5.6.1.5. A Molécula de C48N12: Propriedades Estruturais e Eletrônicas... 157
5.6.1.6. A Molécula de C48N12: Propriedades Vibracionais ...................... 160
5.6.1.7. As “Fuzzyballs” C60X60 (X = H, F): Propriedades Estruturais e
Eletrônicas.................................................................................................................. 164
5.6.1.8. As “Fuzzyballs” C60X60 (X = H, F): Propriedades Vibracionais .... 166
5.6.1.9. Os Endofullerenos X@C60 (X = H, Li, Na, K): Propriedades
Estruturais e Eletrônicas ............................................................................................ 169
5.7. Estudo Experimental ....................................................................................... 184
5.7.1. Amostras ............................................................................................... 184
x
5.7.1.1. Amostras Obtidas no LPA ......................................................... 184
5.7.1.2. Amostras Adquiridas do LSA ..................................................... 186
5.7.2. Equipamentos e Medidas ...................................................................... 187
5.7.2.1. Espectroscopia de FTIR ............................................................ 187
5.7.2.2. Espectroscopia Micro-Raman .................................................... 188
5.7.3. Resultados, Análise e Discussão ......................................................... 190
5.7.3.1. Os Espectros de FTIR ............................................................... 190
5.7.3.2. O Espectro Micro-Raman .......................................................... 192
5.8. Comparação Entre Nossos Resultados Teóricos e Experimentais ................. 194
5.9. Observações Finais e Conclusões .................................................................. 196
6. Perspectivas Futuras ....................................................................................... 200
7. Referências Bibliográficas ............................................................................. 206
xi
1. Introdução
1.1. Motivação
1.1.1. As Biomoléculas de Celulose e Lignina Dentre as macromoléculas que estudamos no presente trabalho estão a
celulose, envolvida na biossorção de metais pesados e de interesse em estudos
ambientais, e a lignina, uma substância polimérica intimamente ligada à matriz da
estrutura celulósica. Juntas, estas biomoléculas constituem a biomassa estrutural
extracelular mais abundante do mundo vegetal. Os compostos lignocelulósicos, como
são chamados, apresentam elevada capacidade de sorção de metais pesados em
suas estruturas moleculares. Estes metais são incluídos em determinados sítios
moleculares e, para a identificação dos mesmos, várias técnicas experimentais
complementares são necessárias, dentre as quais podem ser citadas a ressonância
paramagnética eletrônica (EPR) e a espectroscopia de infravermelho por transformada
de Fourier (FTIR). Entretanto, em todos os casos, a análise teórica é fundamental para
a interpretação dos resultados experimentais obtidos.
A biossorção, que consiste na retenção de íons metálicos contidos numa
solução, por biomassa viva ou seca, tem aplicação na descontaminação de efluentes
industriais, com subseqüente reaproveitamento do metal. Embora existam muitos
estudos sobre o comportamento sortivo de diversas biomassas para diferentes metais,
pouco se conhece sobre os mecanismos e sítios responsáveis pela captura de íons
metálicos. FREITAS [1] e CARVALHO et al. [2,3] utilizaram as técnicas de EPR e de
FTIR para o estudo de biomassas carregadas com metal. Com a técnica de EPR é
possível identificar um íon paramagnético e determinar a simetria de sua vizinhança na
matriz da biomassa. A técnica de FTIR é capaz de mostrar as ligações moleculares
existentes na biomassa e as alterações nestas ligações provocadas pela entrada do
íon metálico na matriz. Como exemplo do uso dessas técnicas, os autores
investigaram a sorção de cobre em folhas secas, estudada no Laboratório de
Biossorção do Departamento de Física da UFMG. Em todos os casos estudados, os
autores detectaram a presença de íons metálicos na biomassa e observaram que a
1
sorção de cobre em folhas secas ocorreu essencialmente nas fibras ricas em celulose.
Concluíram, então, que o cobre poderia ocupar um sítio com forte simetria axial (EPR),
afetando as ligações dos anéis de carbono das fibras (FTIR). Verificaram que as
técnicas de EPR e FTIR eram úteis nos estudos de biossorção, embora
necessitassem ser complementadas por informações teóricas para a formulação do
modelo de sorção.
Dessa forma, inspirados no problema experimental exposto acima, fomos
motivados a reproduzir teoricamente o modelo proposto por FREITAS [1] e
CARVALHO et al. [2,3] para possíveis sítios de sorção de cobre na estrutura da
celulose, a fim de investigar a viabilidade física do modelo experimental sugerido.
1.1.2. Fullerenos e Alguns de Seus Derivados
Um outro grupo de macromoléculas que também estudamos é aquele formado
pela família dos fullerenos, em especial a molécula de C60. Desde sua descoberta, em
1985, os materiais fullerenos têm se tornado alvo de intensas investigações científicas.
As sínteses recentes de quantidades macroscópicas de C60 têm sugerido possíveis
aplicações em química orgânica, em eletroquímica e na tecnologia de semicondutores.
A caracterização dos materiais fullerenos requer uma análise vibracional completa,
comparável com os dados experimentais. A análise vibracional tradicional, em termos
de estiramentos de ligações, dobramentos de ângulos de ligação e torções nas
estruturas, torna-se uma tarefa difícil nestes materiais, o que é justificado pelo número
extremamente elevado de coordenadas internas acopladas.
A motivação inicial para nosso estudo acerca destes materiais surgiu devido à
existência de um grupo experimental de pesquisa bastante diversificado, pertencente
ao Departamento de Física da UFMG e especializado no estudo de nanomateriais,
como fullerenos e nanotubos de carbono. Dentre as principais técnicas experimentais
empregadas na investigação destes materiais, destacam-se a síntese, a extração e a
purificação de fullerenos e nanotubos, realizadas no Laboratório de Preparação de
Amostras, os estudos espectroscópicos, realizados nos Laboratórios de
Espectroscopias Micro-Raman e de Infravermelho, entre outras técnicas. A motivação
inicial consistiu na interação entre teoria e experimento, no sentido de haver uma
complementação entre os mesmos e, conseqüentemente, culminando com a obtenção
de resultados teóricos e experimentais mais confiáveis e precisos.
2
Uma outra motivação consistiu em verificar o desempenho e a eficiência de
métodos de química quântica teórica, tais como o método ab initio Hartree-Fock e o
método semi-empírico MNDO no cálculo das propriedades estruturais, eletrônicas e
vibracionais de moléculas grandes como os fullerenos e seus derivados, tendo em
vista o estudo posterior de moléculas ainda maiores, ou mesmo de sistemas
mesoscópicos, para os quais o método ab initio torna-se impraticável, uma situação na
qual o método semi-empírico pode ser uma alternativa viável.
3
1.2. Estrutura Geral do Trabalho
Os principais objetivos do presente trabalho se referem ao estudo teórico das
biomoléculas de celulose e lignina, bem como aos estudos teórico e/ou experimental
de fullerenos e alguns de seus derivados. Mediante a execução de cálculos quânticos
ab initio e/ou semi-empíricos, investigamos as propriedades estruturais, eletrônicas e
vibracionais de todas as macromoléculas estudadas. Realizamos estudos
experimentais acerca dos processos de síntese, extração e purificação de fullerenos,
bem como sua caracterização espectroscópica de infravermelho e Raman.
No Capítulo 2, “Metodologia”, descrevemos os principais métodos de cálculo
empregados em nossos estudos teóricos, o método ab initio Hartree-Fock e o método
semi-empírico MNDO.
No Capítulo 3, “Espectroscopias de Infravermelho e Raman”, fazemos uma
descrição a respeito da teoria envolvida nas transições vibracionais, tanto nos
espectros de infravermelho como de Raman.
No Capítulo 4, “Estudo das Biomoléculas de Celulose e Lignina”, descrevemos
detalhadamente as estruturas moleculares das moléculas de celulose e lignina,
fazemos uma discussão sobre alguns estudos experimentais propostos na literatura,
referentes a estas biomoléculas; apresentamos nossos resultados teóricos a respeito
da investigação das propriedades estruturais e vibracionais destas moléculas, tanto
puras como contendo cobre; estudamos dois possíveis sítios de sorção do cobre
nestas estruturas moleculares; apresentamos os espectros vibracionais teóricos de
infravermelho e Raman para todas as unidades monoméricas investigadas e
comparamos nossos resultados com valores teóricos e experimentais disponíveis na
literatura.
No Capítulo 5, “Estudo dos Fullerenos e Alguns de Seus Derivados”,
descrevemos as características gerais dos fullerenos C60 e C70 e alguns derivados da
molécula de C60, com base na literatura. Apresentamos nossos estudos teóricos ab
initio Hartree-Fock e semi-empírico MNDO, resultantes da investigação das
propriedades estruturais, eletrônicas e vibracionais das moléculas de C60, C70, C48N12,
C60X60 (X = H, F) e X@C60 (X = H, Li, Na, K). Apresentamos os resultados de nosso
estudo experimental, realizado nos laboratórios do Departamento de Física da UFMG,
referentes à preparação de amostras e às medidas espectroscópicas de FTIR e micro-
Raman dos fullerenos C60 e C70. Fazemos uma comparação entre nossos resultados
teóricos e nossos resultados experimentais.
4
No Capítulo 6, “Perspectivas Futuras”, apresentamos algumas de nossas
possíveis perspectivas futuras de trabalho, tendo em vista as vastas aplicações de
complexos à base de fullerenos funcionalizados, nas mais diversificadas áreas de
pesquisa.
No Capítulo 7, “Referências Bibliográficas”, são listadas as principais
referências bibliográficas utilizadas em nosso estudo.
5
2. Metodologia
2.1. Introdução
Existem três grandes áreas, dentro da química computacional, devotadas à
estrutura de moléculas e suas reatividades: a dinâmica molecular clássica, a dinâmica
molecular quântica e a teoria de estrutura eletrônica. Nestas aproximações, executam-
se, por exemplo, a computação da energia de uma estrutura molecular particular
(arranjo físico de átomos ou núcleos e elétrons), bem como as propriedades a ela
relacionadas; a execução de optimizações de geometria, as quais localizam a
estrutura molecular de energia mais baixa e que dependem primariamente do
conhecimento do gradiente de energia em relação às posições atômicas; a
computação de freqüências vibracionais moleculares resultantes do movimento
interatômico na molécula (as freqüências dependem da derivada segunda da energia
em relação à estrutura atômica. Tais cálculos podem também prever outras
propriedades que dependem da derivada segunda).
A dinâmica molecular clássica, ou simplesmente dinâmica molecular, usa as
leis da física clássica para prever as estruturas moleculares e suas propriedades. Os
métodos baseados em dinâmica molecular estão disponíveis em muitos programas
computacionais, incluindo HyperChem, Quanta, Sybyl e Alchemy. Há muitos métodos
diferentes em dinâmica molecular; cada um deles é caracterizado por seu campo de
força particular.
Os cálculos de dinâmica molecular clássica não tratam os elétrons
explicitamente em um sistema molecular. Ao invés disso, executam computações
baseadas nas interações entre núcleos. Os efeitos eletrônicos são incluídos
implicitamente nos campos de força por intermédio de sua parametrização. Esta
aproximação permite cálculos computacionalmente baratos, sendo aplicável a
sistemas muito grandes, contendo milhares de átomos. Entretanto, a técnica
apresenta algumas limitações. Os cálculos de dinâmica molecular clássica são
capazes de prever propriedades de equilíbrio e de não equilíbrio de diversos sistemas.
Entretanto, em todas as aplicações práticas destes cálculos, são usados potenciais
interatômicos empíricos. Esta aproximação, embora seja apropriada para sistemas tais
como os gases inertes, pode falhar para o caso de sistemas covalentes e/ou
6
metálicos. Além disso, estes cálculos não fornecem nenhuma informação a respeito de
propriedades eletrônicas. Por exemplo, tais métodos não são capazes de descrever a
formação ou a quebra de uma ligação química ou ainda prever propriedades que
dependam de interações entre orbitais moleculares.
A dinâmica molecular quântica, primeiramente proposta por CAR e
PARRINELLO [5], é um método capaz de computar as propriedades eletrônicas de
sistemas grandes e/ou desordenados, no nível do estado da arte de cálculos de
estrutura eletrônica; também é capaz de executar simulações ab initio, em que as
únicas suposições são a validade da mecânica clássica na descrição do movimento
iônico e a aproximação de Born-Oppenheimer para separar as coordenadas nucleares
e eletrônicas.
Já os métodos de estrutura eletrônica usam os princípios da mecânica quântica
como a base para suas computações. A mecânica quântica afirma que a energia e
outras propriedades relacionadas de uma molécula podem ser obtidas pela resolução
da equação de Schrödinger. Entretanto, mesmo para os menores sistemas, ainda que
totalmente simétricos, soluções exatas da equação de Schrödinger não são
praticáveis. Os métodos de estrutura eletrônica são caracterizados por várias
aproximações matemáticas para sua solução. Há duas classes principais de métodos
de estrutura eletrônica:
• métodos semi-empíricos, tais como MINDO/3, MNDO, AM1, PM3, PM5, etc.
(implementados em programas como MOPAC, AMPAC, HyperChem e Gaussian),
usam parâmetros provenientes de dados experimentais para simplificar a computação.
Estes métodos resolvem uma forma aproximada da equação de Schrödinger, que
depende de parâmetros apropriados disponíveis para o tipo de sistema químico em
questão;
• métodos ab initio, ou de primeiros princípios, que diferem tanto dos métodos de
dinâmica molecular clássica quanto dos métodos semi-empíricos, os quais não fazem
uso de parâmetros experimentais em suas computações. Ao invés disso, seus
cálculos são baseados somente em princípios da mecânica quântica (os primeiros
princípios referidos na designação ab initio) e nos valores de um pequeno número de
constantes físicas: a velocidade da luz, as massas e cargas de elétrons e núcleos e a
constante de Planck.
Em nossos cálculos, empregamos o código Gaussian94 de química quântica
teórica [6,7], um pacote que dispõe de ambos os métodos de estrutura eletrônica:
semi-empíricos e ab initio. Estes métodos diferem no compromisso entre custo
computacional e precisão de resultados. Cálculos semi-empíricos são relativamente
baratos e em geral fornecem descrições qualitativas razoáveis de sistemas
7
moleculares, bem como previsões quantitativas bastante precisas de energias e
estruturas, para sistemas em que haja bons conjuntos de parâmetros. Em contraste,
computações ab initio fornecem informações quantitativas de alta qualidade para os
mais diversos sistemas. Os cálculos ab initio não se restringem a nenhuma classe
específica de sistemas. Os primeiros programas ab initio eram limitados ao tamanho
do sistema que poderiam tratar. Entretanto, isso já não é válido para os “softwares” ab
initio modernos. Em um microcomputador típico, o código Gaussian é capaz de
computar as energias e as propriedades relacionadas para sistemas contendo muitos
átomos pesados em questão de poucos minutos. Métodos ab initio são também
capazes de tratar qualquer tipo de átomo, computando uma variedade de
propriedades moleculares, além das energias e das estruturas atômicas e estão aptos
a investigar moléculas em seus estados excitados e em solução.
Os métodos de química quântica, ab initio e semi-empíricos, a nível Hartree-
Fock e MNDO, evoluíram na última década o suficiente para se tornarem ferramentas
muito poderosas na determinação da estrutura eletrônica de moléculas grandes.
Assim, neste capítulo, apresentamos os principais aspectos teóricos destes métodos,
os quais empregamos em nossos estudos teóricos.
8
2.2. O Método Hartree-Fock
A teoria de Hartree-Fock aproxima a função de onda de um sistema de muitos
elétrons como um único determinante de funções spin-orbitais normalizadas. Vários
níveis de teoria Hartree-Fock são possíveis e a escolha apropriada depende do tipo de
sistema a ser investigado. A discussão que se segue a respeito do método Hartree-
Fock baseia-se no trabalho de HEHRE et al. [4].
2.2.1. A Equação de Schrödinger Como já mencionado, a teoria molecular orbital ab initio relaciona-se com o
cálculo de primeiros princípios das propriedades de sistemas atômicos e moleculares.
Baseia-se nos princípios fundamentais da mecânica quântica e utiliza-se de uma
enorme variedade de transformações matemáticas e aproximações técnicas para
solucionar suas equações essenciais. De acordo com a mecânica quântica, a energia
e muitas propriedades de um estado estacionário de uma molécula podem ser obtidas
pela solução da equação de Schrödinger independente do tempo, uma equação
diferencial parcial dada por
Ψ=Ψ EH . (2.1)
Nesta equação, H é o operador Hamiltoniano, um operador diferencial representando
a energia total, E é o valor numérico da energia do estado, isto é, a energia relativa a
um estado no qual as partículas constituintes (núcleos e elétrons) estão infinitamente
separadas, Ψ é a função de onda, que depende das coordenadas cartesianas de
todas as partículas (que podem tomar qualquer valor de -∞ a +∞) e também das
coordenadas de spin (que podem assumir somente um número finito de valores,
correspondendo às componentes de spin do momento angular em uma direção
particular). O quadrado da função de onda, Ψ2 (ou Ψ*Ψ, se Ψ for uma função
complexa) é interpretado como uma medida da distribuição de densidade de
probabilidade das partículas na molécula. O Hamiltoniano, H , como a energia total
em mecânica clássica, é a soma dos termos referentes às energias cinética e
potencial,
. (2.2) VTH ˆˆˆ +=
9
O operador energia cinética T é uma soma de operadores diferenciais:
∑ ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛∂∂
+∂∂
+∂∂
−=i iiii zyxm
hT 2
2
2
2
2
2
2
2 18
ˆπ
. (2.3)
A soma é feita sobre todas as partículas (núcleos e elétrons), sendo mi a
massa da partícula i e h a constante de Planck. O operador energia potencial é dado
pela interação coulombiana,
∑∑>
⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛=
i ij ij
ji
ree
V , (2.4)
em que a soma é feita sobre pares distintos de partículas (i, j) com cargas elétricas ei,
ej, separadas pela distância rij. Para elétrons, e ei −= , enquanto para um núcleo com
número atômico Zi, . eZe ii +=
O Hamiltoniano acima descrito é não-relativístico. Dessa forma, não é
apropriado quando as velocidades das partículas, particularmente dos elétrons, se
aproximam da velocidade da luz. Pequenos efeitos magnéticos, como por exemplo, o
acoplamento spin-órbita, as interações spin-spin etc., são também omitidos neste
Hamiltoniano. Estes efeitos são usualmente pouco significativos em discussões
envolvendo energias químicas.
Uma outra restrição deve ser imposta às funções de onda. As únicas soluções
fisicamente aceitáveis da Eq. (2.1) são aquelas que possuem simetria apropriada na
permutação de partículas idênticas. Para partículas do tipo bósons, a função de onda
permanece inalterada, ou seja, é simétrica na permutação. Para partículas do tipo
férmions, a função de onda deve ser multiplicada por –1, ou seja, é antissimétrica na
permutação. Elétrons são férmions, de modo que Ψ deve ser antissimétrica com
relação à permutação das coordenadas de qualquer par de elétrons. Este é o
chamado princípio da antissimetria de Pauli, pelo qual a função de onda deve trocar de
sinal sob uma operação de troca das coordenadas (espaciais e de spin) de dois
elétrons quaisquer,
,...),...,,...,,(,...),...,,...,,( 2121 jiji xxxxxxxx Ψ−=Ψ . (2.5)
A equação de Schrödinger para qualquer molécula terá muitas soluções,
correspondendo a diferentes estados estacionários. O estado com energia mais baixa
10
é o estado fundamental e os procedimentos descritos neste capítulo são concernentes
a moléculas neste estado.
2.2.2. A Aproximação de Born-Oppenheimer
A primeira e maior etapa na simplificação do problema molecular geral em
mecânica quântica é a separação dos movimentos nuclear e eletrônico. Isto é possível
porque as massas nucleares são muito maiores do que as massas dos elétrons e,
dessa forma, os núcleos se movem mais lentamente. Como conseqüência, os elétrons
em uma molécula ajustam rapidamente suas distribuições às mudanças das posições
nucleares. Numa aproximação razoável, pode-se supor que a distribuição dos elétrons
depende somente das posições instantâneas dos núcleos e não de suas velocidades.
Em outras palavras, pode-se resolver primeiramente o problema quantum-mecânico
do movimento dos elétrons no campo de núcleos fixos, conduzindo a uma energia
eletrônica efetiva )(REefr
, que depende das coordenadas nucleares relativas,
denotadas por Rr
. Esta energia efetiva funciona como uma energia potencial para o
movimento nuclear. Para uma molécula diatômica, é requerida somente a distância
internuclear Rr
e )(RE efr
é a curva de potencial da molécula. Para um sistema
poliatômico, é necessário um maior número de coordenadas relativas e )(RE efr
é
denominada superfície de potencial da molécula. Esta separação do problema geral
em duas partes é freqüentemente chamada de aproximação adiabática ou
aproximação de Born-Oppenheimer.
Quantitativamente, a aproximação de Born-Oppenheimer pode ser formulada
escrevendo-se a equação de Schrödinger para elétrons no campo de núcleos fixos,
),()(),(ˆ RrRERrH elefelel vrrrrΨ=Ψ . (2.6)
Nesta equação, ),( Rrelrr
Ψ é a função de onda eletrônica que depende das
coordenadas eletrônicas rr e das coordenadas nucleares Rr
. O Hamiltoniano
eletrônico, elH , corresponde ao movimento dos elétrons no campo dos núcleos fixos e
é dado por
, (2.7) VTH elel ˆˆˆ +=
em que elT é o operador energia cinética eletrônica,
11
∑ ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛∂∂
+∂∂
+∂∂
⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛−=
elétrons
i iii
el
zyxmhT 2
2
2
2
2
2
2
2
8ˆ
π (2.8)
e V é a energia potencial coulombiana, ˆ
∑ ∑∑ ∑ ∑ ∑>>
++−=núcleos
s
núcleos
ts st
tselétrons
i
núcleos
s
elétrons
i
elétrons
ij ijis
s
ReZZ
re
reZ
V222
ˆ . (2.9)
O primeiro termo da Eq. (2.9) corresponde à atração elétron-núcleo; o segundo,
à repulsão elétron-elétron e o terceiro, à repulsão núcleo-núcleo. Este último é
independente das coordenadas eletrônicas e é uma contribuição constante para a
energia molecular de uma configuração nuclear particular.
A principal tarefa nos estudos teóricos de estrutura eletrônica consiste na
resolução, pelo menos aproximada, da equação de Schrödinger eletrônica (Eq.2.6) e,
dessa forma, encontrar a função potencial nuclear efetiva )(RE efr
. A partir daqui,
serão omitidos os superescritos na Eq.(2.6); será suposto que o Hamiltoniano H , a
função de onda Ψ e a energia E se referirão somente ao movimento eletrônico, cada
uma destas grandezas sendo implicitamente função das coordenadas nucleares Rr
.
A superfície de potencial, )(REr
, é fundamental para a descrição quantitativa
das estruturas químicas e dos processos de reação. Se forem consideradas soluções
da equação de Schrödinger de mais baixa energia, )(REr
será a superfície de energia
potencial do estado fundamental. Quando explorada como uma função de Rr
, esta
superfície apresentará, em geral, mínimos locais, os quais se referem a estruturas de
equilíbrio, como ilustrado esquematicamente na Fig. 2.1.
Se houver vários mínimos distintos, a molécula apresentará várias formas
isoméricas e a teoria pode ser usada para explorar tanto suas estruturas quanto suas
energias relativas. Além disso, a superfície de potencial pode também conter pontos
de sela, isto é, pontos estacionários onde há uma ou mais direções ortogonais nas
quais a energia é um máximo. Em termos matemáticos, a matriz da derivada segunda
de E em relação às coordenadas nucleares possui um ou mais autovalores negativos
em cada ponto.
12
Figura 2.1. Seção esquemática de superfícies de potencial. Na figura, A e B são mínimos
distintos, correspondendo a isômeros com energias diferentes; C é a estrutura de transição que
conecta A e B.
2.2.3. Unidades Atômicas
Antes de discutirmos acerca das funções de onda eletrônicas, é útil adotar
novas unidades que eliminem as constantes físicas fundamentais da equação de
Schrödinger eletrônica (2.6). Isto envolve a introdução do raio de Bohr, ao, definido
como
)4( 22
2
0 meha
π= , (2.10)
que é a unidade atômica de comprimento. As coordenadas x’, y’ e z’ podem agora ser
introduzidas:
000
';';'azz
ayy
axx === . (2.11)
De maneira similar, podemos introduzir uma nova unidade atômica de energia,
EH, que é a repulsão coulombiana entre dois elétrons separados por 1 Bohr,
0
2
aeEH = . (2.12)
Esta unidade é denominada Hartree (que equivale a 27.21166 eV). As novas energias
(E’) são dadas por
13
HE
EE =' . (2.13)
Se as Eqs. (2.11) e (2.13) são substituídas na equação de Schrödinger (2.6),
teremos:
''''ˆ Ψ=Ψ EH , (2.14)
em que o Hamiltoniano 'H , em unidades atômicas, será dado por
.''
1'
'''21'ˆ
2
2
2
2
2
2
∑ ∑ ∑ ∑ ∑∑
∑
>>⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+⎟
⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛−
−⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛∂∂
+∂∂
+∂∂
−=
elétrons
i
núcleos
s
elétrons
i
núcleos
s
núcleos
st st
tselétrons
ji ijis
s
elétrons
i iii
RZZ
rrZ
zyxH
(2.15)
2.2.4. Teoria do Orbital Molecular
A teoria do orbital molecular é uma aproximação empregada em mecânica
quântica molecular que faz uso de funções das coordenadas de um único elétron, ou
orbitais eletrônicos, para uma descrição aproximada da função de onda completa de
um sistema de muitos elétrons. Um orbital molecular, Ψ(x, y, z), é uma função das
coordenadas cartesianas x, y e z de um único elétron. Seu quadrado, Ψ2 (ou Ψ*Ψ, se
Ψ for uma função complexa), é interpretado como a distribuição da densidade de
probabilidade de um elétron no espaço molecular. Para uma descrição completa de
um elétron deve também ser incluída a dependência nas coordenadas de spin, ξ. Esta
coordenada admite um dos dois valores possíveis (±1/2) e mede a componente do
momento angular de spin ao longo do eixo z, em unidades de h/2π. Para spin ao longo
do eixo z positivo, a função de onda de spin é escrita como α(ξ). Então:
;121
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛+α .0
21
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−α (2.16)
Similarmente, para spin ao longo do eixo z negativo, a função de onda de spin é β(ξ),
tal que
14
;021
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛+β .1
21
=⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−β (2.17)
A função de onda completa para um único elétron é o produto de um orbital
molecular e de uma função de spin, )](),,([ ξαzyxΨ ou )](),,([ ξβzyxΨ e é
denominada spin-orbital, ),,,( ξχ zyx . A princípio, poderíamos pensar que o tipo mais
simples de função de onda apropriada para a descrição de um sistema de n elétrons
seria aquele na forma de um produto de spin-orbitais,
)()()...2()1( 21 ni niproduto χχχχ K=Ψ , (2.18)
em que ),,,()( iiiiii zyxi ξχχ = é a função spin-orbital do elétron i. Entretanto, tal
função de onda não é aceitável, uma vez que ela não possui a propriedade de
antissimetria. Se as coordenadas dos elétrons i e j são permutadas nesta função de
onda, o produto KKK )()( ji ji χχ torna-se KKK )()( ij ji χχ , o que não equivale à
multiplicação por –1. Para assegurar a antissimetria, os spin-orbitais podem ser
arranjados em uma função de onda determinantal,
)()()(
)2()2()2()1()1()1(
21
21
21
nnn n
n
n
χχχ
χχχχχχ
L
MMMM
L
L
=Ψ taldeterminan . (2.19)
Nesta equação, os elementos da primeira linha do determinante contêm informações
do elétron 1 para todos os spins orbitais nχχχ ,,, 21 K ; a segunda linha contém todas
as informações do elétron 2, etc.
A função de onda determinantal (2.19) possui a propriedade de antissimetria,
que é garantida porque a permutação das coordenadas dos elétrons i e j é equivalente
à permutação das linhas i e j no determinante, que têm o efeito de mudança de sinal.
Na expansão, o determinante se torna uma soma de produtos de spin-orbitais,
∑ −=ΨP
nP nP )]()...2()1([ˆ)1( 21 χχχtaldeterminan , (2.20)
em que é o operador-permutação, que atua na função de onda mudando as
coordenadas 1,2,...,n de acordo com uma das n! permutações possíveis entre os n
P
15
elétrons. O termo (-1)P vale +1 ou – 1 para permutações pares ou ímpares,
respectivamente. A função de onda em (2.20) é algumas vezes denominada função-
produto antissimetrizada.
Na construção de uma função de onda determinantal, o uso prático consiste
em escolher um conjunto de orbitais moleculares Ψ1, Ψ2, Ψ3,... e então associar
elétrons de spin α ou β a estes orbitais. Uma vez que cada orbital está associado a
uma auto-energia, esta designação de elétrons é freqüentemente representada por um
diagrama de configuração eletrônica, tal como mostrado na Fig. 2.2. Os elétrons são
representados por setas (↑ para α, ↓ para β), sendo os orbitais de energia mais baixa
localizados na base do diagrama.
Figura 2.2. Diagrama de configuração eletrônica para (Ψ1α)(Ψ1β)(Ψ2α)(Ψ2β)(Ψ3α).
Não é possível que um orbital molecular seja ocupado por dois elétrons de
mesmo spin. Este é o Princípio da Exclusão de Pauli, que é válido uma vez que a
função de onda determinantal (2.19) se anula se duas colunas forem idênticas. Dessa
forma, os orbitais podem ser classificados como duplamente ocupados (Ψ1 e Ψ2 na
Fig. 2.2), com ocupação simples (Ψ3) ou desocupados (Ψ4). A maioria das moléculas
possui um número par de elétrons em seus estados fundamentais de mais baixa
energia e podem ser representadas por funções de onda de camada fechada com
orbitais moleculares duplamente ocupados ou vazios.
É possível “forçar” os orbitais a serem ortogonais entre si, isto é,
, para i ≠ j. (2.21) ∫ =ΨΨ= 0* dzdydxS jiij
(O asterisco denota o complexo conjugado). Isto pode ser efetuado sem mudar o valor
da função de onda total, pela mistura das colunas do determinante. As funções de
spin, α e β, são ortogonais pela integração no espaço de spins (efetivamente, a soma
sobre os dois valores possíveis de ξ),
16
∑ =⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−⎟
⎠⎞
⎜⎝⎛−+⎟
⎠⎞
⎜⎝⎛+⎟
⎠⎞
⎜⎝⎛+=
ξ
βαβαξβξα 021
21
21
21)()( . (2.22)
Os orbitais moleculares podem ser normalizados, isto é,
1* =ΨΨ= ∫ dzdydxS iiii , (2.23)
pela multiplicação de um individual por uma constante. A normalização
corresponde à exigência de que a probabilidade de se encontrar um elétron em
qualquer região do espaço seja igual à unidade. Dada a equação (2.23), a função de
onda determinantal (Eqs. 2.19 ou 2.20) pode ser normalizada pela multiplicação pelo
fator (n!)
iΨ
-1/2, isto é,
∫ ∫ =ΨΨ 1!
121
*nddd
nτττ LL . (2.24)
A integração da Eq. (2.24) é feita sobre todas as coordenadas (cartesianas e de spin),
de todos os elétrons. Considerando-se estes aspectos, uma função de onda molecular
orbital completa, para um estado fundamental de camada fechada, de uma molécula
de n elétrons (sendo n par), ocupando duplamente n/2 orbitais, é escrita como:
)()()()()()()()(
)2()2()2()2()2()2()2()2()1()1()1()1()1()1()1()1(
)!(
2/211
2/211
2/211
21
nnnnnnnn
n
n
n
n
βαβα
βαβαβαβα
ΨΨΨΨ
ΨΨΨΨΨΨΨΨ
=Ψ−
L
MMMMM
L
L
(2.25)
O determinante da Eq. (2.25) é freqüentemente chamado de determinante de Slater.
2.2.5. Expansões em Conjuntos-Base
Na seção anterior, foi descrita a forma pela qual uma função de onda de muitos
elétrons pode ser construída a partir de orbitais moleculares na forma de um único
determinante. Em aplicações práticas da teoria, uma restrição posterior é imposta,
requerendo que os orbitais moleculares individuais sejam expressos como
17
combinações lineares de um conjunto finito de N funções de um elétron, conhecidas
como funções-base. Se as funções-base são Φ1, Φ2,..., ΦN, então um orbital molecular
individual Ψi pode ser escrito como
, (2.26) ∑=
Φ=ΨN
ii c1µ
µµ
em que cµi são os coeficientes da expansão do orbital molecular. (Segue-se aqui uma
convenção de se usar subscritos romanos para orbitais moleculares e subscritos
gregos para funções-base). Estes coeficientes fornecem a descrição do orbital com
alguma flexibilidade, mas obviamente não permitem uma liberdade total, a não ser
pelo fato de definirem uma expansão sobre um conjunto completo de funções. O
problema de se encontrar os orbitais é reduzido a uma busca de um conjunto finito de
coeficientes lineares que descreva cada função tridimensional Ψi.
Em versões qualitativas simples da teoria do orbital molecular, os orbitais
atômicos dos átomos constituintes são usados como funções-base. Tais tratamentos
são freqüentemente descritos como teorias de combinação linear de orbitais atômicos
(LCAO’s). Entretanto, o tratamento matemático é mais geral e qualquer conjunto de
funções definido apropriadamente pode ser usado como uma base na expansão.
Para prover um conjunto-base que seja bem definido para qualquer
configuração nuclear e, dessa forma, útil para um modelo teórico, é conveniente definir
um conjunto particular de funções-base associado com cada núcleo, dependendo
somente da carga nuclear. Tais funções podem apresentar as propriedades de
simetria de orbitais atômicos e são classificadas como s, p, d, f, ..., de acordo com
suas propriedades angulares.
Dois tipos de funções-base atômicas têm sido largamente empregados. Os
orbitais atômicos do tipo Slater (STO’s), que apresentam parte radial exponencial e
são designados como os orbitais atômicos do hidrogênio (1s, 2s, 2px,...), possuindo a
forma normalizada,
)exp( 1
21
31
1 rs ζπζ
−⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛=Φ ,
⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛=Φ
2exp
962
21
52
2rrs
ζπ
ζ, (2.27)
⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛=Φ
2exp
322
21
52
2rx
xpζ
πζ
,
18
em que ζ1 e ζ2 são constantes que determinam a extensão radial dos orbitais. As
funções-base do tipo STO proporcionam representações razoáveis de orbitais
atômicos com valores de ζ recomendados por Slater. Entretanto, estas funções não
são apropriadas para trabalhos numéricos e seu uso em cálculos práticos de orbitais
moleculares tem sido limitado.
O segundo tipo de base consiste em funções atômicas do tipo gaussianas.
Estas funções são potências de x, y, z multiplicadas por , sendo α uma
constante que determina a extensão radial da função. Na forma normalizada, as
primeiras dez funções são:
)exp( 2rα−
)exp(2),( 24
3
rrgs απαα −⎟⎠⎞
⎜⎝⎛= ,
)exp(128),( 24
1
3
5
rxrg x απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(128),( 24
1
3
5
ryrg y απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(128),( 24
1
3
5
rzrg z απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(9
2048),( 224
1
3
7
rxrg xx απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(9
2048),( 224
1
3
7
ryrg yy απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= , (2.28)
)exp(9
2048),( 224
1
3
7
rzrg zz απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(9
2048),( 24
1
3
7
rxyrg xy απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(9
2048),( 24
1
3
7
rxzrg xz απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= ,
)exp(9
2048),( 24
1
3
7
ryzrg yz απαα −⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛= .
As funções gaussianas gs, gx, gy e gz possuem as simetrias angulares de s e
dos três tipos de orbitais atômicos p. As funções de segunda ordem gxx, gyy, gzz, gxy, gxz
19
e gyz não possuem a simetria angular de orbitais atômicos. Entretanto, podem ser
combinadas para fornecer um conjunto de cinco funções atômicas do tipo d, isto é, gxy,
gxz e gyz e duas outras funções,
)2(21
3 yyxxzzrrzz gggg −−=− ,
)(43 2
1
yyxxyyxx ggg −⎟⎠⎞
⎜⎝⎛=− . (2.29)
Uma sexta combinação linear resulta em uma função do tipo s,
)(5 21
zzyyxxrr gggg ++= −. (2.30)
De maneira similar, as dez funções gaussianas de terceira ordem podem ser
recombinadas em um conjunto de sete funções do tipo f e um conjunto adicional de
três funções do tipo p.
As funções do tipo gaussianas são menos satisfatórias que as funções do tipo
STO como representações de orbitais atômicos, particularmente pelo fato de
apresentarem derivada nula na origem. Entretanto, estas funções possuem a
vantagem importante de que todas as integrais nas computações podem ser avaliadas
explicitamente, sem recorrência à integração numérica.
Uma terceira possibilidade consiste em usar combinações lineares de funções
gaussianas como funções-base. Por exemplo, uma função-base do tipo s, Φµ, pode
ser expandida em termos de gaussianas do tipo s,
∑=Φs
ss gdµµ . (2.31)
Nesta equação, os coeficientes dµs são fixos. Funções-base deste tipo são
denominadas gaussianas contraídas, sendo as expressões gs denominadas
gaussianas primitivas.
2.2.6. O Método Variacional e a Teoria de Hartree-Fock
Até este ponto, foi descrito de que forma uma função de onda determinantal
pode ser construída a partir de orbitais moleculares e como estes orbitais podem ser
20
expandidos em termos de um conjunto de funções-base. Resta ainda especificar um
método para fixar os coeficientes da expansão. Este é o domínio da teoria de Hartree-
Fock. A teoria de Hartree-Fock é baseada no método variacional em mecânica
quântica. Se θ é qualquer função antissimétrica normalizada das coordenadas
eletrônicas, então o valor esperado da energia correspondente a esta função pode ser
obtido da integral,
∫= τθθ dHE ˆ' * , (2.32)
em que a integração é feita sobre as coordenadas de todos os elétrons. Se θ for uma
função de onda exata, então Ψ, para o estado eletrônico fundamental, satisfará a
equação de Schrödinger (2.1). Uma vez que Ψ é normalizada, E’ será portanto a
energia exata,
EdEE =ΨΨ= ∫ τ*' . (2.33)
Entretanto, se θ é qualquer outra função antissimétrica normalizada, pode ser
mostrado que E’ é maior que E:
∫ >= EdHE τθθ ˆ' * . (2.34)
O método variacional pode ser aplicado para determinar os orbitais ótimos na
função de onda determinantal. Selecionamos um conjunto-base para a expansão do
orbital e os coeficientes cµi (como na Eq. 2.26) podem então ser ajustados a fim de
minimizar o valor esperado da energia E’. O valor resultante de E’ será tão próximo
quanto possível da energia exata E. Conseqüentemente, a melhor função de onda na
forma de um determinante para o conjunto-base particular empregado é obtida pela
minimização de E’ com relação aos coeficientes cµi. Isto implica nas equações
variacionais,
0'=
∂∂
icE
µ
, (para todo µ, i). (2.35)
Estas equações serão inicialmente empregadas para sistemas de camada
fechada, conforme será descrito a seguir.
21
2.2.6.1. Sistemas de Camada Fechada
A condição variacional da Eq. (2.35) leva a um conjunto de equações
algébricas para os coeficientes cµi. Estas equações foram obtidas independentemente
para a função de onda de um sistema de camada fechada por Roothaan e Hall, em
1951. As equações de Roothaan-Hall são dadas por
, µ = 0, 1, 2,..., N, (2.36) ∑=
=−N
ii cSF1
0)(ν
νµνµν ε
com as condições de normalização,
∑∑ . (2.37) = =
=N N
ii cSc1 1
* 1µ ν
νµνµ
Na Eq. (2.36), εi é um multiplicador de Lagrange, interpretado como a energia de um
elétron do orbital molecular ; SiΨ µν são os elementos de uma matriz ,
denominada matriz de “overlap”,
NxN
∫ ΦΦ= 111* )1()1( dzdydxS νµµν (2.38)
e Fµν são elementos de uma outra matriz , a chamada matriz de Fock, NxN
∑∑= =
−+=N N
caroço PHF1 1
)]|(21)|[(
λ σλσµνµν νσµλλσµν . (2.39)
Nesta expressão, é uma matriz representando a energia de um único elétron
no campo dos núcleos atômicos. Seus elementos são:
caroçoH µν
, 111* )1()1(ˆ)1( dzdydxHH caroçocaroço ∫ ΦΦ= νµµν
∑=
−⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛∂∂
+∂∂
+∂∂
−=M
A A
Acaroço
rZ
zyxH
1 121
2
21
2
21
2
21)1(ˆ . (2.40)
Na Eq. (2.40), ZA é o número atômico do átomo A e o somatório é feito sobre todos os
átomos. Os termos (µν|λσ) e (µλ|νσ) que aparecem na Eq. (2.39) são as chamadas
integrais de repulsão de dois elétrons,
22
.)2()2(1)1()1()|(
,)2()2(1)1()1()|(
222111*
12
*
222111*
12
*
dzdydxdzdydxr
dzdydxdzdydxr
σνλµ
σλνµ
νσµλ
λσµν
ΦΦ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛ΦΦ=
ΦΦ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛ΦΦ=
∫∫
∫∫ (2.41)
Os orbitais atômicos , µΦ νΦ , λΦ e σΦ podem estar todos localizados no
mesmo centro, cada um em um centro diferente, etc. Então, no método Hartree-Fock,
as integrais de interação entre dois elétrons podem envolver 1, 2, 3 ou 4 centros. Os
termos )|( λσµν e )|( νσµλ são multiplicados pelos elementos da chamada matriz
densidade de um elétron,
. (2.42) ∑=
=ocup
iiiccP
1
*2 σλλσ
O somatório é considerado somente sobre os orbitais moleculares ocupados. O fator 2
indica que cada orbital molecular é ocupado por dois elétrons e o asterisco denota o
complexo conjugado (requerido se os orbitais moleculares não forem funções reais).
A energia eletrônica resultante é então dada por
∑∑= =
+=N N
caroçoel HFPE1 1
)(21
µ νµνµνµν , (2.43)
que, quando somada à Eq. (2.44), referente à repulsão internuclear,
∑∑>
=M
A
M
AB AB
BAnuclearrep
RZZE , (2.44)
(em que ZA e ZB são os números atômicos dos átomos A e B e RAB é a separação
entre eles) leva a uma expressão para a energia total,
∑∑∑∑>= =
++=+=M
A
M
AB AB
BAN N
caroçoel
RZZHFPEEE
1 1)(
21
µ νµνµνµν
nuclear repulsão . (2.45)
A Fig. 2.3 representa as etapas requeridas para a solução das equações de
Roothaan-Hall para um sistema de camada fechada, empregadas no código Gaussian.
23
Figura 2.3. Seqüência de etapas do programa requeridas para a solução das equações de
Roothaan-Hall para um sistema de camada fechada. O diagrama envolvendo as etapas
denominadas “Formação da Matriz de Fock”, “Resolução da equação matricial”, “Formação da
Matriz-densidade” e “Cálculo da energia” é iniciado pela especificação de uma suposição inicial
para a matriz-densidade e finalizado sob satisfação do critério de convergência para a matriz-
densidade, para a energia ou para ambas. As integrais de um e dois elétrons, ( e µνµν HS ,
)|( λσµν ) são calculadas e armazenadas a priori para iniciar a execução do procedimento
SCF. Estas integrais são acessadas durante cada ciclo do procedimento auto-consistente.
24
As equações de Roothaan-Hall (Eq. 2.36) são não-lineares, uma vez que a
matriz de Fock, Fµν, depende dos coeficientes da expansão do orbital molecular, cµi,
através da expressão da matriz densidade (Eq. 2.42). A solução envolve
necessariamente um processo iterativo. Uma vez que os orbitais moleculares
resultantes são provenientes de seu próprio potencial efetivo, a técnica é
freqüentemente chamada de teoria de campo auto-consistente (SCF).
2.2.6.2. Sistemas de Camada Aberta
Para sistemas de camada aberta, nos quais os elétrons não ocupam os orbitais
moleculares aos pares, as equações de Roothaan-Hall necessitam de alguma
modificação. Isto se aplica, por exemplo, ao dubleto de radicais livres ou a estados de
tripleto, para os quais uma componente terá excesso de elétrons α. Para dubletos,
haverá um elétron α extra; para tripletos, dois elétrons α extras, etc.
A teoria do orbital molecular simples pode ser estendida a sistemas de camada
aberta de duas maneiras possíveis. A primeira é descrita como teoria Hartree-Fock de
spin restrito (RHF). Nesta abordagem, um único conjunto de orbitais moleculares é
usado, alguns orbitais sendo duplamente ocupados e alguns sendo ocupados por um
único elétron de spin α. Este é o caso ilustrado na Fig. 2.2 para o estado de dubleto de
cinco elétrons. Os spin-orbitais no determinante são então
))()()()(( 32211 αβαβα ΨΨΨΨΨ . Os coeficientes cµi são ainda aqueles definidos pela
expansão da Eq. (2.26) e seus valores ótimos são obtidos das condições variacionais
da Eq. (2.35). Entretanto, os detalhes são mais complicados, uma vez que diferentes
condições se aplicam a orbitais com ocupação simples e a orbitais duplamente
ocupados.
O segundo tipo de teoria molecular orbital em uso comum para sistemas de
camada aberta é a teoria Hartree-Fock de spin irrestrito (UHF). Nesta abordagem,
orbitais espaciais diferentes são ocupados por elétrons α e β. Então, há dois conjuntos
distintos de orbitais moleculares, e (i = 1, 2,...,N). A configuração eletrônica
para um dubleto de cinco elétrons pode ser escrita como
e está ilustrada na Fig. 2.4.
αiΨ β
iΨ
))()()()(( 32211 αβαβα αβαβα ΨΨΨΨΨ
É importante notar que o orbital 1Ψ , antes duplamente ocupado no RHF, é
agora substituído por dois orbitais distintos, e . Uma vez que a função RHF é α1Ψ
β1Ψ
25
um caso especial, mais restrito, da função UHF, segue-se do princípio variacional que
a energia UHF optimizada deve estar abaixo do valor RHF optimizado.
Figura 2.4. Diagrama de configuração eletrônica para . ))()()()(( 32211 αβαβα αβαβα ΨΨΨΨΨ
Na teoria UHF, os dois conjuntos de orbitais moleculares são definidos por dois
conjuntos de coeficientes,
; . (2.46)∑=
Φ=ΨN
ii c1µ
µαµ
α ∑=
Φ=ΨN
ii c1µ
µβµ
β
Estes coeficientes sofrem variação independentemente, levando às generalizações
UHF das equações de Roothaan-Hall, que passarão a ser dadas por
; ; (µ = 1, 2, ..., N). (2.47) 0)(1
=−∑=
αµ
νµν
ααµν ε i
N
i cSF 0)(1
=−∑=
βµ
νµν
ββµν ε i
N
i cSF
Nestas equações, as duas matrizes de Fock são definidas como,
(2.48) )].|()|)([(
)];|()|)([(
1 1
1 1
νσµλλσµν
νσµλλσµν
βλσ
λ σ
βλσ
αλσµν
βµν
αλσ
λ σ
βλσ
αλσµν
αµν
PPPHF
PPPHF
N Ncaroço
N Ncaroço
−++=
−++=
∑∑
∑∑
= =
= =
A matriz densidade é também separada em duas partes,
; . (2.49) ∑=
=ocup
iii ccP
ααν
αµ
αµν
1* ∑
=
=ocup
iii ccP
ββν
βµ
βµν
1*
26
As integrais , e (µν|λσ) que aparecem nas equações UHF são as mesmas
já definidas no procedimento de Roothaan-Hall para cálculos de camada fechada.
µνS caroçoHµν
2.2.7. Análise Populacional de Mulliken
A função densidade eletrônica ou função-distribuição de densidade de
probabilidade eletrônica, )(rrρ , é uma função tridimensional definida de tal forma que
rdr rr)(ρ é a probabilidade de se encontrar um elétron em um pequeno elemento de
volume, , em algum ponto do espaço, rdr rr . A condição de normalização requer que
∫ = nrdr rr)(ρ , (2.50)
em que é o número total de elétrons. Para uma função de onda unideterminantal, na
qual os orbitais são expandidos em termos de um conjunto de N funções-base, Φ
n
µ,
)(rrρ é dada pela expressão
, (2.51) ∑∑ ΦΦ=N N
Prµ ν
νµµνρ )(r
em que Pµν são os elementos da matriz-densidade (Eq. 2.42).
É desejável distribuir os elétrons de alguma forma entre as várias partes
constituintes de uma molécula (átomos, ligações, etc.). Pode ser útil, por exemplo,
definir uma carga eletrônica total em um átomo particular, a fim de que um sentido
quantitativo possa ser dado a conceitos como afinidade eletrônica e
eletronegatividade.
A integração da Eq. (2.51) leva a
, (2.52) ∫ ∑∑ ==N N
nSPrdrµ ν
µνµνρ rr)(
em que Sµν é a matriz de “overlap” das funções-base (Eq. 2.38). O número total de
elétrons é então decomposto em termos individuais Pn µνSµν. Considerando que as
funções-base Φµ sejam normalizadas, isto é, Sµµ = 1, os termos da diagonal na Eq.
(2.52) são exatamente Pµµ, cada um dos quais representando o número de elétrons
27
associado diretamente com uma função-base particular, Φµ. As componentes fora da
diagonal na Eq. (2.52) ocorrem aos pares, PµνSµν e PνµSνµ, de magnitudes iguais. Sua
soma é referida como uma população de “overlap”,
µνµνµν SPQ 2= , (µ ≠ ν). (2.53)
Pode-se notar que a população de “overlap” está associada a duas funções-base,
Φ
µνQ
µ e Φν, que podem ser do mesmo átomo ou de dois átomos diferentes.
A carga eletrônica total é agora distribuída em duas partes, a primeira
associada com funções-base individuais e a segunda com pares de funções-base,
∑ ∑ . (2.54) ∑>
=+N N N
nQPµ µ µν
µνµµ
Esta representação da distribuição eletrônica não é sempre conveniente e,
algumas vezes, é desejável dividir a carga total somente entre as funções-base
individuais. Uma maneira como isso pode ser feito é dividir igualmente as populações
de “overlap”, Qµν, entre as funções-base Φµ e Φν, adicionando metade de cada uma às
populações líquidas Pµµ e Pνν. Isso dá a população “grosseira” para Φµ, definida de
acordo com
∑≠
+=νµ
µνµνµµµ SPPq . (2.55)
A soma das populações “grosseiras” para todas as N funções-base, Φµ, é
certamente igual ao número total de elétrons,
. (2.56) ∑ =N
nqµ
µ
Este esquema particular de partição não é o único. A escolha da divisão das
populações de “overlap”, Qµν, em contribuições iguais de Φµ e Φν é arbitrária.
As populações de funções-base “grosseiras” podem ser usadas para definir as
populações atômicas “grosseiras”,
. (2.57) ∑=A
A qqµ
µ
28
Nesta equação, o somatório é feito sobre todas as funções Φµ em um átomo particular
A. Considerando que todas as funções-base sejam centradas nos átomos, segue-se
que a soma das populações atômicas “grosseiras” é igual ao número total de elétrons.
Finalmente, uma carga atômica total em A pode ser definida como ZA - qA, onde ZA é o
número atômico de A. A soma das cargas deve ser nula para uma molécula neutra, +1
para um monocátion e assim por diante.
Uma população total de “overlap”, qAB, entre dois átomos A e B, pode ser
definida de maneira similar,
. (2.58) ∑∑=A B
AB Qqµ ν
µν
Neste caso, o somatório é feito sobre todos os µ’s no átomo A e sobre todos os ν’s no
átomo B. As populações totais de “overlap” fornecem informação quantitativa da
ligação entre átomos. Um valor muito positivo para qAB indica uma população
eletrônica significativa na região entre A e B. É um aspecto geralmente associado às
ligações fortes. Reciprocamente, um valor muito negativo de qAB implica que os
elétrons tenham se deslocado para fora das regiões interatômicas, indicando uma
interação anti-ligante.
Embora as populações de Mulliken freqüentemente forneçam informação
valiosa a respeito das distribuições eletrônicas em moléculas, elas devem ser usadas
com certa precaução. Como mencionado previamente, a partição de Qµν em
contribuições de orbitais individuais é arbitrária. Além disso, grandezas tais como
populações atômicas “grosseiras” ou populações totais de “overlap” são fortemente
dependentes do conjunto-base particular empregado.
2.2.8. Conjuntos-Base Atômicos de Funções Gaussianas
Um conjunto-base representa a descrição matemática dos orbitais (que se
combinam a fim de aproximar a função de onda eletrônica total) em um sistema,
usada na execução do cálculo teórico. Os conjuntos-base mais completos aproximam
mais precisamente os orbitais, impondo algumas poucas restrições às localizações
dos elétrons no espaço. De acordo com a mecânica quântica, os elétrons têm uma
probabilidade finita de existência em qualquer lugar do espaço; este limite
corresponde à expansão do conjunto-base infinito.
29
Um tratamento Hartree-Fock exato (limite Hartree-Fock) envolveria um conjunto
infinito de funções-base , o que é, obviamente, impraticável do ponto de vista do
custo computacional. Assim, a escolha apropriada do tamanho do conjunto-base
depende de um compromisso entre precisão e eficiência. Os conjuntos-base padrão
usam combinações lineares fixas e pré-definidas de funções gaussianas para formar
os orbitais moleculares. O código Gaussian94 [6,7] dispõe de uma série de funções-
base pré-definidas, que podem ser classificadas pelo número e tipo de função que
cada uma contém. Os conjuntos-base atribuem um grupo de funções-base para cada
átomo na molécula, a fim de aproximar seus orbitais. Tais funções podem ser
escolhidas como gaussianas primitivas (ou não-contraídas) ou como combinações
lineares fixas e predefinidas de tais funções, as gaussianas contraídas.
. A discussão que se segue trata da descrição dos conjuntos-base utilizados em
nossos cálculos, STO-3G, 6-31G e 6-311G**, desenvolvida em conjunção com a série
Gaussian de programas computacionais de química quântica teórica [6,7].
µΦ
2.2.8.1. O Conjunto-Base Mínimo STO-3G
O nível mais simples da teoria do orbital molecular ab initio envolve o uso de
um conjunto-base mínimo de funções centradas nos núcleos. Tal representação inclui
estritamente o número de funções requeridas para acomodar todos os elétrons do
átomo, enquanto mantém a simetria esférica global. Os conjuntos-base mínimos
contêm o número mínimo de funções-base necessário em cada átomo, como nos
exemplos abaixo:
H: 1s;
C: 1s, 2s, 2px, 2py, 2pz.
Pode-se então definir o número de funções-base por átomo como:
H, He: 1;
Li a Ne: 5;
Na a Ar: 9;
K, Ca: 13;
Sc a Kr: 18;
Rb, Sr: 22;
30
Y a Xe: 27, etc.
Os conjuntos-base mínimos usam orbitais atômicos de tamanhos fixos. O
conjunto-base STO-3G, empregado em nossos cálculos envolvendo fullerenos e
alguns de seus derivados, conforme será descrito no Capítulo 5, é um exemplo de
base mínima (embora não seja o menor conjunto-base possível).
O conjunto-base STO-3G usa três gaussianas primitivas por função-base, o
que justifica a designação “3G” em sua nomenclatura. “STO” significa “Slater-type
orbitals” ou orbitais do tipo Slater, representados nas Eqs. (2.27). Assim, o conjunto-
base STO-3G aproxima os orbitais de Slater por funções gaussianas. Os orbitais de
Slater, conforme já discutido na seção 2.2.5, são muito mais precisos nas
computações, embora não sejam convenientes matematicamente como as funções
gaussianas.
2.2.8.2. O Conjunto-Base Estendido 6-31G
Uma das formas pelas quais um conjunto-base pode se tornar maior do que a
representação mínima consiste em aumentar o número de funções-base por átomo,
através das chamadas representações estendidas. Tais representações possuem dois
ou mais tamanhos de funções-base para cada orbital de valência, permitindo que as
componentes individuais se ajustem independentemente, de maneira adequada para
um dado ambiente molecular.
Um conjunto-base formado pela duplicação das funções de uma representação
mínima é usualmente denominado base “double zeta”. Uma extensão mais simples de
um conjunto-base mínimo consiste em duplicar somente o número de funções-base
que representam a região de valência. (Os elétrons de camadas internas são
importantes no que se refere à energia total, mas seu efeito na ligação molecular
apresenta apenas pequenas conseqüências). Por exemplo, para os elementos dos
períodos 1, 2 e 3, temos:
H, He: 1s;
1s’;
Li a Ne: 1s;
2s’, 2p’x, 2p’y, 2p’z;
2s”, 2p”x, 2p”y, 2p”z;
Na a Ar: 1s;
31
2s, 2px, 2py, 2pz;
3s’, 3p’x, 3p’y, 3p’z;
3s”, 3p”x, 3p”y, 3p”z,
em que as funções-base das camadas de valência são denotadas por ( ’ ) e ( ” ),
respectivamente, as quais diferem em tamanho.
O conjunto-base 6-31G é um exemplo de base estendida, sendo definido para
a segunda linha da Tabela Periódica. Este conjunto compreende as funções das
camadas atômicas internas, cada qual escrita em termos de uma combinação linear
de 6 gaussianas e as funções de duas camadas de valência, a primeira representada
por 3 gaussianas primitivas e a segunda por 1 gaussiana primitiva, justificando a
atribuição da nomenclatura “6-31G”. Este conjunto-base foi aplicado em nossos
cálculos no estudo teórico do dímero da molécula de celulose, conforme será descrito
no Capítulo 4.
2.2.8.3. O Conjunto-Base Polarizado 6-311G**
Os conjuntos-base estendidos permitem uma mudança nas extensões radiais
dos orbitais, mas não permitem que estes orbitais sejam alterados em suas formas. Os
chamados conjuntos-base polarizados, por sua vez, removem esta limitação pela
inclusão de orbitais com momento angular além do que é requerido para o estado
fundamental na descrição de cada átomo. Por exemplo, os conjuntos-base polarizados
adicionam funções d aos átomos de carbono e funções f aos metais de transição,
sendo que alguns deles adicionam funções p ao átomo de hidrogênio.
A representação 6-311G** é um exemplo de conjunto-base polarizado. A
notação “311” foi escolhida no lugar da representação “31” (na base 6-31G) para
aperfeiçoar a descrição da região de valência. A base 6-311G** compreende uma
camada interna descrita por 6 gaussianas do tipo s e uma região de valência mais
externa, dividida em três partes, a primeira parte representada por 3 gaussianas
primitivas, a segunda por 1 e a terceira por 1. O primeiro asterisco indica que são
adicionadas funções p aos átomos de hidrogênio da molécula e o segundo asterisco
indica a adição de funções d aos átomos pesados (são usadas 5 componentes das
funções d), justificando assim a atribuição da nomenclatura “6-311G**”.
Em nossos cálculos, empregamos o conjunto-base 6-311G** na descrição das
moléculas de celulose e lignina, tanto puras como contendo cobre, conforme será
descrito no Capítulo 4.
32
2.3. O Método MNDO
O MNDO (“Modified Neglect of Diatomic Overlap”) é um método semi-empírico
de química quântica que consiste em uma simplificação do método ab initio Hartree-
Fock. Este método faz parte de um subconjunto de aproximações semi-empíricas
denominado NDDO (“Neglect of Differential Diatomic Overlap”), o qual pertence à
classe geral NDO (“Neglect of Differential Overlap”). O MNDO pode ser usado no
estudo de estruturas, estabilidades, reatividades, propriedades vibracionais, etc., de
moléculas grandes, tipicamente acima de 1000 átomos (sistemas muito maiores que
aqueles calculados pelos códigos ab initio).
O MNDO faz uso de um conjunto-base mínimo consistindo de uma função-
base por orbital atômico [8]; sua autoconsistência é feita apenas nos elétrons de
valência, os elétrons das camadas internas, criando apenas um campo efetivo para
eles.
Conforme já discutido na seção 2.2.6, na teoria de Hartree-Fock, a equação
secular é expressa de acordo com a Eq. (2.36), , sendo µ = 0, 1,
2,..., N. Os elementos gerais da matriz de Fock ( e ) são dados pelas Eqs.
(2.48), em que as integrais de dois elétrons do tipo
∑=
=−N
ii cSF1
0)(ν
νµνµν ε
αµνF β
µνF
)|( λσµν e )|( νσµλ são
definidas nas Eqs. (2.41).
No método MNDO, são desprezadas todas as integrais nas quais intervém um
produto do tipo 1)1()1( rdrνµ ΦΦ (em que os argumentos dos orbitais atômicos e µΦ νΦ
se referem ao elétron 1) se estes orbitais estiverem localizados em centros diferentes.
Rigorosamente falando, nesta aproximação tem -se que:
(2.59) ⎩⎨⎧
≠===
ΦΦ= ∫ .0;1
)1()1( 1 νµνµ
νµµν sese
rdS r
Isso reduz a matriz de “overlap” a uma matriz-identidade. A Eq. (2.36) então
torna-se:
0=− iii cFc νµνν ε . (2.60)
Com base nesta aproximação, todos os termos de repulsão entre dois elétrons,
envolvendo três e quatro centros são desprezados . Somente os termos envolvendo as
33
integrais de dois centros e dois elétrons, dois centros e um elétron, um centro e dois
elétrons e um centro e um elétron, bem como as integrais de repulsão caroço-caroço
permanecem nesta aproximação.
As integrais de um centro e dois elétrons, tais como,
21*
12
* )2()2(1)1()1( rdrdr
rrµµµµ ΦΦ⎥
⎦
⎤⎢⎣
⎡ΦΦ∫∫ , 21
*
12
* )2()2(1)1()1( rdrdr
rrννµµ ΦΦ⎥
⎦
⎤⎢⎣
⎡ΦΦ∫∫ e
21*
12
* )2()2(1)1()1( rdrdr
rrνµνµ ΦΦ⎥
⎦
⎤⎢⎣
⎡ΦΦ∫∫ são obtidas a partir de dados experimentais em
átomos isolados, tais como potenciais de ionização, afinidades eletrônicas, espectros
atômicos, etc.
Nas integrais de dois centros e dois elétrons, as distribuições de densidade
eletrônica são aproximadas por uma série de cargas puntuais, tais como as
distribuições em monopolos, dipolos, quadrupolos lineares e quadrupolos quadrados,
usadas para representar os produtos de orbitais atômicos.
As integrais de um centro e um elétron, , são avaliadas analiticamente e
representam a energia que um elétron em um orbital atômico
caroçoHµµ
µΦ teria se todos os
elétrons fossem removidos do sistema. Esta aproximação é feita adicionando-se à
energia de um elétron no orbital atômico do átomo totalmente ionizado, o potencial
devido a todos os núcleos do sistema.
As integrais de dois centros e um elétron, , algumas vezes chamadas de
integrais de ressonância, são aproximadas usando a verdadeira integral de “overlap”,
S
caroçoHµν
µν. (Pode-se notar que esta consideração viola a aproximação NDO; esta é a origem
do termo “Modified” na nomenclatura do método MNDO). é escrita como: µνH
)(21
ννµµµνµν HHSH += . (2.61)
Por outro lado, a interação de repulsão caroço-caroço é dada por
, (2.62) )1(|),( ABBABA RRBBAABAN eessssZZBAE αα −− ++><=
em que é a distância de separação entre os átomos A e B; ABR Aα e Bα são
parâmetros atômicos; e são as cargas nucleares efetivas; e são orbitais
atômicos do tipo Slater, referentes aos átomos A e B, respectivamente. Portanto, no
método MNDO, a interação caroço-caroço é parametrizada.
AZ BZ As Bs
34
2.4. Cálculo de Forças
A descrição completa de uma superfície de potencial multidimensional que
caracteriza um sistema molecular é uma tarefa complexa. Uma forma de caracterizá-la
é através do cálculo analítico direto das derivadas da energia em relação a seus
parâmetros. Embora tais procedimentos exijam esforços significativos de programação
e, em princípio, conduzam à mesma informação obtida por cálculos numéricos,
apresentam vantagens consideráveis em cálculos práticos.
Nesta seção, será discutida a expressão geral para as forças exatas sobre os
núcleos dentro do método Hartree-Fock, baseada no trabalho de PULAY [9]. Será
discutido também o procedimento para a determinação rápida da geometria de
equilíbrio pela relaxação das coordenadas nucleares até que as forças se anulem.
2.4.1. Introdução Uma constante de força Fij é definida como a derivada segunda da energia
molecular E com relação às coordenadas nucleares qi e qj na configuração de
equilíbrio:
0
2
⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛
∂∂∂
=ji
ij qqEF . (2.63)
Para cálculos ab initio das constantes de força e das geometrias de equilibro, o
método mais conveniente é aquele em que as diferenciações da Eq. (2.63) são feitas
primeiro analiticamente e então numericamente. Neste método, derivando primeiro a
energia analiticamente, podemos calcular a força que atua na direção de qi,
i
i qEf
∂∂
−= . (2.64)
A geometria de equilíbrio é determinada permitindo a relaxação das
coordenadas nucleares até que as forças líquidas se anulem. A constante de força Fij,
que é o negativo da derivada da força fi como uma função de qj é então determinada
numericamente, executando cálculos para diferentes valores de qj próximos da
configuração de equilíbrio. Este método apresenta a vantagem de tornar possível um
35
rápido procedimento de iteração para determinar a configuração nuclear de equilíbrio,
o que se torna um de seus aspectos mais interessantes.
2.4.2. O Método da Força
Seja Φ uma função de onda tentativa normalizada, dependente das
coordenadas q (= q1, q2, ..., qn) e dos parâmetros variacionais ρ (= ρ1, ρ2, ..., ρm) . Os
parâmetros são determinados de tal forma que eles minimizem a energia total
, sendo tais parâmetros funções dos q’>ΦΦ<= || HE s. No que se segue, o símbolo
denota uma diferenciação na qual a dependência dos parâmetros com as
coordenadas nucleares não foi considerada, isto é, os ρ’
q∂∂ /
s são tomados como
constantes. O símbolo d/dq denota a derivada total, incluindo a dependência dos
parâmetos em q. Para a derivada primeira, temos que
,qE
dqdE
∂∂
= (2.65)
pois 0/ =∂∂ iE ρ . Isso significa que não é necessário saber de que forma os
parâmetros variacionais mudam com as coordenadas nucleares na computação da
força, o que simplifica o formalismo.
Consideremos, por simplicidade, que Φ seja real. Então:
Φ∂Φ∂
−Φ∂∂
Φ−=−= ||2 Hqq
HdqdEf
iiii , (2.66)
em que a energia total é escrita como:
).2)(|()||(2
)]|1|()|1|(2[)||(2
1
122
122
1
nsmrrsmnrs
mnmn
mn
kjj jk
kjkjjj
PPPPrsmnPnHm
rrHE
−+=
=ΦΦΦΦ−ΦΦ+ΦΦ=
∑∑
∑ ∑ (2.67)
Na Eq. (2.67), H1 é o termo de um-elétron do Hamiltoniano, os s'Φ são os orbitais
moleculares SCF, relacionados às funções-base χ por uma transformação com a
matriz retangular C†: Φ = C†χ e P é a matriz densidade, definida como P = CC†. As
36
notações )||()||( 11 nm HnHm χχ= e )|/1|()|( 12 srnm rrsmn χχχχ= foram
introduzidas. Os termos que vêm da diferenciação de H1 na Eq. (2.67) são calculados
de uma forma muito simples. Um ponto que requer atenção é que a Eq. (2.67) é válida
somente se os orbitais moleculares forem ortonormais. Isto equivale à condição de
que P deve ser idempotente:
PSP = P, (2.68)
em que S é a matriz de “overlap”, )|( nmSmn = . A Eq. (2.67) deve ser diferenciada
com a condição de que P permaneça idempotente. A derivada da Eq. (2.68) é dada
por:
./)/()/()/( qqqq ∂∂=∂∂+∂∂+∂∂ PPPSPSPSPP (2.69)
Esta equação tem um número infinito de soluções ∂ P/∂ q. Qualquer uma delas conduz
ao mesmo valor das forças, uma vez que a energia total deve ser estacionária com as
mudanças infinitesimais na matriz densidade, se estas mudanças não violarem a
idempotência de P. A solução mais simples da Eq. (2.69) é dada por:
PSPP )/(/ qq ∂∂−=∂∂ . (2.70)
A expressão para a força é então escrita como: f
∑
∑
⎪⎭
⎪⎬
⎫
⎪⎩
⎪⎨
⎧
∂∂−∂∂−∂∂+∂∂++−∂∂+
+∂∂+∂∂+∂∂−
−⎭⎬⎫
⎩⎨⎧
∂∂++∂∂+∂∂
−
=>Φ∂Φ∂<−=
mnrsnsmrnsmrrsmnrsmn
nsmrrsmn
mn mn
mn
qPPqPPqPPqPPrsmnPPPPqsrmn
qsrmnrsqnmrsqnm
qPnHmPqnHmnHqm
Hqf
.
1
11
)///2/2)(|()2)](/|(
)/|()|/()|/[(
)/)(||()]/||()||/[(
2
||/2
(2.71)
2.4.3. Determinação da Geometria de Equilíbrio Na determinação da configuração nuclear de equilíbrio, podemos nos restringir
a espécies de simetria totalmente simétricas se a simetria da configuração de
equilíbrio é conhecida. Seja q0 o vetor de coordenadas internas inicial e seja F0 uma
37
suposição inicial para a matriz da constante de força. Para obter uma melhor
aproximação de q1, calculamos as forças f0 e construímos a seguinte expressão:
q1 = q0 + ∆q = q0 + F0-1 f0 . (2.72)
É evidente que se F0 fosse igual à constante de força da matriz calculada e se
as forças f dependessem linearmente das coordenadas q, então q1 forneceria a
geometria final de equilíbrio. Se isto não for inteiramente válido, q1 diferirá deste valor
de equilíbrio. Contudo, se as suposições iniciais para F0 e q0 não estiverem muito
distantes dos valores corretos, um melhoramento considerável pode ser esperado em
q1, comparado a q0. O processo de iteração qi+1 = qi + F0-1fi então convergirá para o
equilíbrio. Em geral, três ou quatro etapas são suficientes para atingir a configuração
final. Suposições iniciais apropriadas para q0 e F0 são quase sempre disponíveis; a
configuração final de equilíbrio não depende de , o qual determina somente a taxa
de convergência.
0F
38
2.5. Derivadas Analíticas de 2a e 3a Ordens no Procedimento SCF
Nesta seção, apresentamos as expressões analíticas empregadas no
procedimento auto-consistente SCF para a determinação das derivadas do momento
de dipolo e da polarizabilidade. Tais expressões serão importantes no estudo dos
espectros de infravermelho e Raman descritos no Capítulo 3, referentes à análise das
transições vibracionais permitidas e das regras de seleção envolvidas nestas
transições. Dessa forma, se K,,, zyxa = são coordenadas nucleares, hgff ,,=r
são as componentes de um campo elétrico uniforme aplicado e E é a energia total do
sistema, então são as constantes de força e fornecem a curvatura da
superfície de energia potencial nuclear, bem como as freqüências vibracionais.
Similarmente, são as derivadas do dipolo e determinam as intensidades de
infravermelho, assim como são as derivadas da polarizabilidade e
determinam as intensidades Raman vibracionais. Nas seções 2.5.1 e 2.5.2, discutimos
estes aspectos, com base nas referências [10] e [11], respectivamente.
yxE ∂∂∂ /2
fxE ∂∂∂ /2
gfxE ∂∂∂∂ /3
2.5.1. Intensidades de Infravermelho
Consideremos perturbações no operador Hamiltoniano, H , tais que:
, (2.73) ffaa HHHH ''ˆˆ0 λλ ++=
em que é o operador Hamiltoniano não-perturbado, 0H fλ e aλ são perturbações do
campo elétrico ( ) e das coordenadas nucleares ( a ), respectivamente. Para
conjuntos-base padrão de orbitais atômicos, que dependem das coordenadas
nucleares, mas não do campo elétrico, afeta ambas as integrais de um e dois
elétrons, enquanto afeta somente as integrais de um elétron. Com estas
perturbações, as integrais dos orbitais atômicos de um elétron, , as integrais de
f
aH '
fH '
µνH
39
“overlap”, , as integrais de dois elétrons,µνS )]1()1()1()1()[|( σλνµλσµν e o µ-ésimo
coeficiente do i-ésimo orbital molecular são expressos como: icµ
K+∂
∂+
∂
∂+=
fH
aH
HH faµνµν
µνµν λλ0 , (2.74)
K+∂∂
+=a
SSS a
µνµνµν λ0 , (2.75)
K+∂
∂+=
aa)|()|()|( 0 λσµνλλσµνλσµν , (2.76)
=+∂
∂+
∂
∂+= K
fc
ac
cc if
iaii
µµµµ λλ0 (2.77)
, (2.78) K+++= ∑∑todos
m
mfmif
todos
m
mamiai cUcUc 000
µµµ λλ
em que a palavra ”todos” implica em uma soma feita sobre todos os orbitais
moleculares, ocupados e virtuais; e são definidos pelas relações aU fU
0mtodos
m
ami
i cUa
cµ
µ ∑=∂
∂, (2.79)
0mtodos
m
fmi
i cUf
cµ
µ ∑=∂
∂. (2.80)
Nestas equações, o superescrito “0” designa um valor não perturbado. As Eqs.
(2.77) a (2.80) expandem os orbitais moleculares sob a(s) perturbação(ões) aλ e/ou
fλ em termos dos orbitais moleculares não-perturbados.
Para uma função de onda SCF de camada fechada, os elementos da matriz de
Fock na teoria RHF são dados pela soma sobre os orbitais duplamente ocupados,
(2.81) ∑ −+=..
)}|()|(2{od
kijij jkikkkijHF
e as energias orbitais (não-perturbadas) são
. (2.82) 00iji F=ε
40
A equação de Hartree-Fock com perturbação de primeira ordem é expressa
para uma perturbação arbitrária x como:
, (2.83) ∑∑ =−−virt
k
od
l
xij
xklklijij
xij BUAU
..
,)( εε
em que
)|()|()|(4, jkiljlikklijA klij −−= . (2.84)
Para uma perturbação nuclear ( ax = ), os elementos da matriz B da Eq. (2.83)
são dados por
. (2.85) ∑∑ −−−=.. ..
)]|9)|(2[od
k
od
l
aklj
aij
aij
aij jlikklijSSFB ε
Na Eq. (2.85), o termo é escrito como aijF
. (2.86) })|()|(2{..
aod
k
aaij
aij jkikklijHF −+= ∑
Os elementos da matriz B para uma perturbação do campo elétrico ( )
são simplesmente dados por
fx =
. (2.87) fij
fij HB =
Para sistemas SCF de camada fechada, a energia eletrônica é expressa como
. (2.88) ∑ ∑ −+=.. ..
,)}|()|(2{2
od
i
od
jiiiSCF ijijjjiiHE
As derivadas de primeira ordem da energia com relação à coordenada nuclear
( ) e ao campo elétrico ( ) são a f
∑∑∑ −−+=∂
∂ ....
,
..
2})|()|(2{2od
ii
aii
aod
ji
aod
i
aii
SCF SijijjjiiHa
E ε , (2.89)
e ∑=∂
∂ ..
2od
i
fii
SCF Hf
E. (2.90)
41
A Eq. (2.90) é uma expressão para o momento de dipolo elétrico ao longo do eixo . f
Uma expressão analítica para a derivada do dipolo pode ser obtida tomando a
derivada da Eq. (2.89) com relação ao campo elétrico ( ). O resultado final é dado
por
f
aij
od
i
fji
todos
ji
aii
od
i
fi
od
i
aij
todos
j
fji
od
i
afii
SCF SUSFUHaf
E ∑∑∑∑∑∑ −−+=∂∂
∂ ....)(
....2
4242 εε , (2.91)
em que
><∂∂
−=⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛
∂∂
∂= ∑∑ νµν
µνµ
µνν
µνµ ||00
200
fi
OA
ii
OA
iafii r
acce
fah
ccH (2.92)
e as são derivadas das energias orbitais. )( fiε
Uma equação alternativa é obtida tomando-se a derivada da Eq. (2.90) com
relação à coordenada nuclear ( ). O resultado final é dado por a
∑∑∑ +=∂∂
∂ ....2
42od
i
fij
todos
j
aji
od
i
faii
SCF HUHfa
E. (2.93)
Embora as Eqs. (2.91) e (2.93) aparentem ser bastante diferentes, são
matematicamente equivalentes. Subtraindo a Eq. (2.93) da Eq. (2.91), teremos um
termo que se anula como resultado das equações de Hartree-Fock perturbadas.
A diagonalização da matriz de constante de força em coordenadas ponderadas
pela massa fornece os modos normais e as freqüências vibracionais. As derivadas do
dipolo em relação às coordenadas normais produzem as intensidades de
infravermelho, conforme discutiremos na seção 3.2.2.
Esta teoria pode ser uma ferramenta útil para prever de maneira confiável quais
modos vibracionais de espécies ainda não observadas experimentalmente terão
intensidade suficiente para serem detectados através de técnicas de espectroscopia
de alta resolução. O emprego de conjuntos-base mais completos, a inclusão de efeitos
de correlação eletrônica e uma descrição das funções de onda vibracionais que vá
além da aproximação harmônica são fatores obviamente importantes para uma melhor
precisão quantitativa dos resultados.
2.5.2. Intensidades Raman
As intensidades Raman são obtidas teoricamente a partir das derivadas
primeiras da polarizabilidade com relação às coordenadas nucleares. Uma vez que a
42
própria polarizabilidade é a derivada segunda da energia com relação a um campo
elétrico aplicado, a intensidade Raman é uma propriedade de derivada terceira.
As derivadas da polarizabilidade são estimadas analiticamente tomando-se a
derivada terceira da energia total do sistema em relação à componente x das
coordenadas nucleares e às componentes e do campo elétrico externo aplicado,
de acordo com a seguinte expressão:
f g
xgf
Ex
fg
∂∂∂∂
=∂
∂ 3α, (2.94)
em que
.
)(
22
023
xD
fP
xH
gfP
gfW
xS
PGgf
PgPG
fP
gP
xD
xgfE
gcaroço
xxf
∂∂
∂∂
+∂
∂∂∂
∂+
∂∂∂
∂∂
−
−∂∂
∂+⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛∂∂
∂∂
=∂∂
∂
∂=
∂∂∂∂ µν
(2.95)
A obtenção da expressão (2.95) não é trivial. Nesta equação, e f g são
componentes de um campo elétrico aplicado e x é uma coordenada nuclear; o
símbolo denota o traço da matriz; νµµν || fD f = é a matriz da componente
do dipolo;
f
P é a matriz-densidade. denota a contração da derivada das
integrais de dois elétrons com uma matriz X, de acordo com a expressão geral:
, em que
)(xG
∑ ><=λσ
λσµν νσµλ |)( XXG >< νσµλ | é a integral de dois elétrons
antissimetrizada sobre os spin-orbitais µ , ν , λ e σ . Na notação , as
derivadas são indicadas por superescritos que especificam a variável da diferenciação
(neste caso, em relação a
)(xG
x ). é a matriz de “overlap”; W = PFP (em que F é a
matriz de Fock), denota a matriz densidade ponderada na energia;
ScaroçoH é o
Hamiltoniano do caroço. Uma descrição analítica mais detalhada do procedimento de
obtenção da Eq. (2.95) encontra-se disponível na referência [11].
As freqüências vibracionais de infravermelho e as intensidades Raman são
preditas estritamente dentro da aproximação harmônica. As freqüências harmônicas
teóricas são, em geral, mais altas do que as freqüências fundamentais observadas
experimentalmente. Tais intensidades teóricas estão geralmente em boa concordância
com os dados experimentais.
43
3. Espectroscopias de Infravermelho e Raman
3.1. Introdução
Várias técnicas permitem a obtenção de informações sobre estrutura
molecular, níveis de energia e ligações químicas, podendo-se citar, como exemplo, a
ressonância magnética nuclear (NMR), a difração de elétrons, de nêutrons e de raios-
X, a ressonância paramagnética eletrônica (EPR), o efeito Mössbauer, as
espectroscopias Raman e de infravermelho, etc. [12].
A espectroscopia usando radiação eletromagnética em todas as regiões de
comprimentos de onda é uma das mais importantes fontes de informação experimental
para a física de átomos e moléculas. Relaciona-se a estudos da interação da radiação
eletromagnética com a matéria, sendo um de seus principais objetivos a determinação
dos níveis de energia de átomos ou moléculas. Obtêm-se diretamente as energias das
transições entre os estados e, conseqüentemente, as posições relativas dos níveis
energéticos. No caso de moléculas, a região espectral em que estas transições são
observadas depende essencialmente dos tipos de níveis envolvidos: eletrônicos,
vibracionais ou rotacionais. Normalmente, as transições eletrônicas estão situadas na
região do ultravioleta ou visível, as vibracionais na região do infravermelho e as
rotacionais na região de microondas (em casos particulares também no infravermelho
distante). As diferentes regiões espectrais exigem espectrômetros com elementos
dispersivos e detectores apropriados. Assim, cada tipo de espectroscopia tem uma
tecnologia própria associada.
Os espectros atômicos originam-se apenas de transições eletrônicas, ao passo
que os espectros moleculares são extremamente complexos, originando-se em
transições eletrônicas, vibracionais e rotacionais, com modos espectrais
interdependentes [13]. Informações sobre a estrutura molecular e sobre a interação de
moléculas com seus vizinhos podem ser obtidas de diversos modos a partir dos
espectros de emissão e absorção gerados quando a radiação interage com átomos e
moléculas.
44
Medidas dos comprimentos de onda das linhas espectrais permitem a
determinação de níveis de energia de sistemas atômicos e moleculares. A intensidade
da linha é proporcional à probabilidade de transição, que mede quão fortemente dois
níveis de uma transição molecular (ou atômica) estão acoplados. Uma vez que a
probabilidade de transição depende das funções de onda de ambos os níveis de
energia, medidas de intensidade são úteis para verificar a distribuição espacial dos
elétrons, a qual pode ser estimada a partir de soluções da equação de Schrödinger. A
largura natural de uma linha espectral pode ser resolvida por técnicas especiais,
permitindo a determinação dos tempos de vida médios de estados moleculares
excitados [14]. Medidas da largura Doppler dão a distribuição de velocidades das
moléculas emitindo ou absorvendo radiação e, com isto, a temperatura da amostra. Do
alargamento por pressão e dos deslocamentos por pressão de linhas espectrais,
podem ser obtidas informações de processos de colisão e dos potenciais
interatômicos. Os efeitos de desdobramento Stark e Zeeman por campos elétricos e
magnéticos externos são importantes para medir momentos de dipolo elétricos ou
magnéticos e esclarecem o acoplamento dos diferentes momentos angulares em
átomos ou moléculas, mesmo com configurações eletrônicas complexas. A estrutura
hiperfina das linhas espectrais dá informação sobre a interação entre os núcleos e a
nuvem eletrônica e permite determinar, também, momentos de dipolo magnético
nuclear ou momentos de quadrupolo elétrico. Medidas resolvidas no tempo permitem o
acompanhamento da dinâmica das moléculas nos estados fundamental e excitado,
para estudos de processos de colisão e mecanismos de transferência de energia [14].
Estes são alguns exemplos das formas pelas quais a espectroscopia contribui
para o conhecimento do mundo sub-microscópico dos átomos e das moléculas.
Contudo, a quantidade de informação que pode ser extraída de um espectro depende
essencialmente do tipo de fonte de radiação usada para “iluminar” as amostras, se
coerente (laser) ou incoerente, da resolução temporal ou espectral dos instrumentos
de dispersão empregados e, finalmente, da sensibilidade de detecção atingida.
3.1.1. O Espectro Eletromagnético
O espectro de radiações eletromagnéticas (Fig. 3.1) estende-se, em ordem
crescente de energia, das ondas de rádio, com longos comprimentos de onda (103 –
100 m), até radiações de altíssima energia (raios-X e raios-γ) com comprimentos de
onda muito curtos, entre 10-10 e 10-15 m.
45
O espectro inclui também regiões de radiação com energias intermediárias,
entre as microondas e o ultravioleta. Cada uma dessas regiões tem suas formas
próprias de serem produzidas e detectadas e não existe uma interface perfeitamente
definida entre regiões adjacentes, sendo o espectro contínuo do ponto de vista
macroscópico.
(a)
(b)
Figura 3.1. (a) Esquema do espectro eletromagnético, desde as ondas de rádio, com longos
comprimentos de onda, até a região dos raios-X e da radiação γ, com comprimentos de onda
muito curtos. (b) Esquema do espectro eletromagnético na região do visível.
As microondas são ondas eletromagnéticas com freqüências na faixa de 1 a
100 GHz. Esta é a região da espectroscopia rotacional, especialmente para moléculas
pequenas na fase gasosa. O extremo superior desta região já se sobrepõe com a
região espectral do infravermelho distante.
O infravermelho se estende do limite superior da faixa de microondas até o
começo da região do espectro visível, em um comprimento de onda de cerca de 800
46
nm. A parte de comprimentos de onda mais longos (0.1–1 mm) é aplicável à excitação
de espectros rotacionais, enquanto a extremidade de comprimentos de onda menores
(o infravermelho próximo, λ = 10-3 – 10-1 mm) é a região em que espectros vibracionais
típicos das moléculas são observados, os chamados espectros rotacionais-
vibracionais.
As transições eletrônicas começam no infravermelho; contudo elas ocorrem
mais freqüentemente nas regiões do visível e do ultravioleta, em que são observados
espectros de banda de moléculas, no sentido próprio do termo, isto é, espectros
consistindo de transições eletrônicas com transições vibracionais e rotacionais
superpostas.
Além da extremidade de comprimentos de onda curtos do ultravioleta, e
sobrepondo-se com ela, está a região dos raios-X e, em seguida, da radiação γ. Com
radiações de energias tão elevadas, transições e estados dos elétrons mais internos,
aqueles nas camadas mais internas do átomo, podem ser investigados, especialmente
por espectroscopia de fotoelétrons.
Desconsiderando a energia devida aos movimentos translacionais, podemos
expressar a energia total de excitação de uma molécula, com boa aproximação, como
a soma das energias de excitações parciais dos níveis eletrônico, vibracional e
rotacional mencionadas acima, sendo esta última considerada somente no caso de
moléculas pequenas na fase gasosa:
rotvibel EEEE ++= , sendo . (3.1) rotvibel EEE >>>>
Isto permite, numa primeira aproximação, que estes níveis possam ser
considerados separadamente, isto é, cada tipo de espectro possa ser estudado
independentemente das interações entre eles. Na realidade, as transições eletrônicas
envolvem uma estrutura vibracional e rotacional que pode ou não estar resolvida. As
transições vibracionais envolvem níveis vibracionais e rotacionais e somente os
espectros rotacionais seriam puros, no sentido de que as transições ocorrem entre
níveis rotacionais de um mesmo estado vibracional e eletrônico [9].
Conforme foi descrito no Capítulo 2, a separação entre os movimentos dos
núcleos e dos elétrons, a aproximação de Born-Oppenheimer, resulta principalmente
da grande diferença entre as massas dos núcleos e dos elétrons. Sendo o movimento
dos elétrons muito mais rápido do que o dos núcleos, pode-se considerar a posição
dos núcleos como fixa durante a transição eletrônica. Do mesmo modo, durante o
movimento dos núcleos, pode-se considerar uma distribuição média dos elétrons. A
47
interação da radiação eletromagnética com o movimento vibracional dos núcleos
origina o espectro vibracional no infravermelho ou o espalhamento Raman.
A Fig. 3.2 ilustra os níveis vibracionais e rotacionais em dois estados
eletrônicos de uma molécula (I e II) e as possíveis transições entre eles.
Figura 3.2. Níveis vibracionais (v) e rotacionais (J) de dois estados eletrônicos de uma
molécula, denotados por I e II. As três setas indicam (da esquerda para a direita) transições
rotacional, rotacional-vibracional e eletrônica da molécula.
As transições obedecem às chamadas regras de seleção e podemos distinguir
três tipos de espectros ópticos:
- espectros rotacionais: são transições entre os níveis rotacionais de um dado
nível vibracional em um estado eletrônico particular. Estes espectros estão na região
de microondas ou no infravermelho distante e consistem tipicamente de um grande
número de linhas espectrais aproximadamente eqüidistantes. Os espectros rotacionais
também podem ser observados por meio de espectroscopia Raman;
48
- espectros rotacionais-vibracionais: consistem de transições dos níveis
rotacionais de um certo estado vibracional para os níveis rotacionais de um outro
estado vibracional no mesmo estado eletrônico. O estado de excitação eletrônica,
assim, permanece inalterado. Estes espectros se encontram na região do
infravermelho e consistem de “bandas”, que são grupos de linhas estreitamente
espaçadas, denominadas de linhas de banda, podendo ser observados com
espectroscopias Raman e de infravermelho;
- espectros eletrônicos: consistem de transições entre os níveis rotacionais dos
vários níveis vibracionais de um estado eletrônico e os níveis rotacionais e vibracionais
de um outro estado eletrônico. Isto é chamado sistemas de bandas. Nestes espectros,
estão contidas todas as bandas vibracionais da transição eletrônica em observação,
cada uma das quais com sua estrutura rotacional.
A discussão abordada neste capítulo se restringe apenas ao estudo dos
espectros Raman e de infravermelho vibracionais, tendo em vista que em nossos
estudos teóricos e experimentais investigamos somente espectros desta natureza.
49
3.2. Espectros de Infravermelho
A discussão que se segue nesta seção baseia-se na referência [12], exceto
pela seção 3.2.2.
3.2.1. Espectro Vibracional de Moléculas Diatômicas
Rigorosamente falando, as vibrações moleculares devem ser tratadas
quanticamente. Contudo, no caso de moléculas poliatômicas, o método clássico é
considerado como uma maneira prática de resolver o problema vibracional. Por outro
lado, para moléculas pequenas, resultados semelhantes podem ser obtidos pelos
métodos clássico e quântico para algumas propriedades físicas, particularmente
aquelas relacionadas com as freqüências vibracionais.
Mesmo classicamente, o tratamento de moléculas poliatômicas seria
geralmente bastante difícil, se não fizéssemos uso das propriedades de simetria
molecular e de teoria de grupos. Cada um dos N átomos de uma molécula possui 3
graus de liberdade. Se houver interesse somente no estudo dos movimentos
vibracionais, podem ser descartados os 3 graus de liberdade translacional, devidos ao
movimento em fase de todos os átomos nas direções x, y ou z, ou seja, dos
movimentos translacionais do centro de massa da molécula. Mais 3 graus de liberdade
podem ser eliminados para moléculas não-lineares, correspondentes aos movimentos
rotacionais da molécula. Os 3N-6 graus de liberdade restantes correspondem a
movimentos vibracionais, ou seja, podemos esperar 3N-6 modos vibracionais
fundamentais.
Se não houver modos degenerados, haverá, portanto, 3N-6 freqüências
fundamentais, caso contrário, o número de freqüências observadas será menor do que
3N-6. No caso de moléculas lineares, haverá somente dois graus de liberdade
rotacionais, pois considerando-se os núcleos como puntuais, não ocorrerá rotação no
eixo da molécula e teremos 3N-5 graus de liberdade vibracionais. Isso nos permite
prever que numa molécula com 5 átomos, relativamente simples, chegaríamos a uma
equação de movimento de nono grau, cujas raízes seriam relacionadas às freqüências
vibracionais. Os métodos de cálculo utilizando propriedades de simetria e de teoria de
grupos permitem o fatoramento da equação em várias equações de menor grau, mais
fáceis de serem resolvidas.
Classicamente, a absorção (ou emissão) de radiação por um sistema se deve à
variação periódica de seu momento de dipolo elétrico, sendo a freqüência absorvida
50
(ou emitida) idêntica à da oscilação do dipolo. Assim, desde que o momento de
dipoloµr , ou uma de suas três componentes, possa oscilar com a mesma freqüência
da radiação incidente, a molécula absorverá esta radiação. A manifestação ou não
dessa ressonância caracteriza os chamados modos normais de infravermelho polares
ou apolares.
O momento de dipolo é determinado pela configuração nuclear e quando a
molécula vibra, o momento de dipolo pode sofrer variação. No caso de moléculas
diatômicas, a única coordenada normal do sistema coincide com a coordenada interna
da ligação, q. Portanto, podemos expandir o momento de dipolo em série de Taylor da
coordenada q, para cada uma das componentes µx, µy e µz ou, numa forma
condensada,
L
rrrr
+⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+= 2
02
2
00 !2
1 qdqdq
dqd µµµµ , (3.2)
em que 0µr
é o vetor momento de dipolo permanente e as derivadas são tomadas na
posição de equilíbrio. Para pequenos deslocamentos em relação a esta posição, os
termos de ordens mais altas podem ser desprezados. A condição de variação do
momento de dipolo com a vibração, para haver absorção no infravermelho, implica em
0)( 0 ≠dqdµr , pelo menos para uma das componentes µx, µy ou µz.
Pela mecânica quântica, a transição entre dois estados, caracterizados pelas
funções de onda Ψm e Ψn, é descrita pelo momento de transição de dipolo,
∫ ΨΨ= τµµ dnmmnrr * , (3.3)
ou, explicitamente, pelas suas componentes:
xmnnxmmnx d )()( * µτµµ =ΨΨ= ∫ ,
ymnnymmny d )()( * µτµµ =ΨΨ= ∫ , (3.4)
zmnnzmmnz d )()( * µτµµ =ΨΨ= ∫ .
Os valores dessas integrais determinam a intensidade no infravermelho, que é
proporcional à probabilidade de transição |µmn|2 (ou à soma dos quadrados das
51
componentes). Para a transição ser permitida, é necessário que pelo menos uma das
integrais da Eq. (3.4) seja diferente de zero.
Expandindo a expressão do momento de transição de dipolo em série de
Taylor, na aproximação considerada, podemos escrever:
∫∫ ΨΨ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+ΨΨ= τµτµµ dq
dqdd nmnmmn
*
0
*0
rrr
. (3.5)
A primeira integral do segundo membro é igual a zero, pela condição de
ortogonalidade das funções de onda (a não ser quando m = n, caso em que não
ocorre transição e µmm é o valor do dipolo permanente e não mais do momento de
transição). Para o segundo termo da Eq. (3.5) ser diferente de zero, é necessário que
sejam satisfeitas as seguintes condições:
(1) 0)( 0 ≠dqdµr , ou seja, deve haver variação do momento de dipolo com a pequena
vibração em torno da posição de equilíbrio;
(2) . Para esta integral ser diferente de zero, o produto deve
ser uma função par. Como q é uma função ímpar, é necessário que o produto [Ψ
0* ≠ΨΨ∫ τdq nm ][ *nmqΨΨ
mΨn]
seja uma função ímpar, isto é, as duas funções de onda devem ter paridades
diferentes. A regra de seleção para o oscilador harmônico é 1±=−=∆ nmv (para
uma única excitação), sendo v o número quântico vibracional. Neste caso, o sinal “+”
vale para a absorção e o sinal “-” para a emissão.
Como conseqüência da primeira condição, uma molécula diatômica
homonuclear não apresenta espectro vibracional no infravermelho, pois seu momento
de dipolo continua sendo nulo durante a vibração.
Para uma molécula diatômica heteronuclear, o movimento vibracional causará
variação do momento de dipolo e haverá atividade no infravermelho. Sendo as
transições vibracionais usualmente dadas em unidades de cm-1 (número de onda), os
termos de energia, aqui denotados por Gv, podem ser convenientemente escritos
nesta unidade. Embora esta unidade de medida corresponda ao número de onda,
ainda é usual em espectroscopia vibracional associá-la à freqüência (ou à freqüência
em cm-1). Assim, a freqüência observada será dada pela expressão:
eeeGG ωνωνωνν =⎟⎠⎞
⎜⎝⎛ +−⎟
⎠⎞
⎜⎝⎛ +=−+ 2
123
1 , (3.6)
em que v é o número quântico vibracional, ωe = ν/c é o valor clássico da freqüência do
oscilador harmônico, sendo c a velocidade da luz no vácuo (3,0 x 108 m/s).
52
Na seção 3.2.2, descrevemos a técnica de espectroscopia de infravermelho
por transformada de Fourier (FTIR), com base na referência [15]. Esta discussão é
feita a fim de proporcionar embasamento teórico aos nossos estudos experimentais,
realizados no Laboratório de Espectroscopia de Infravermelho da UFMG, no qual
empregamos a referida técnica.
3.2.2. Espectroscopia de FTIR
A espectroscopia de infravermelho é considerada uma técnica bastante
importante no universo dos modernos equipamentos utilizados na investigação das
propriedades da matéria. Sendo uma técnica atualmente bem estabelecida, serve
tanto à realização de trabalhos de rotina – caracterização de amostras – quanto à
elucidação de estruturas moleculares complexas.
Até a década de 70, os equipamentos eram baseados em princípios
dispersivos: presença de prismas, redes de difração, fendas, etc. A partir daí,
começaram a ser progressivamente substituídos por equipamentos baseados em
princípios interferométricos, propiciando uma espécie de “renascimento” do
interferômetro de Michelson, tendência que se consolidou na década de 80.
A descrição das funções periódicas pelo método de transformada de Fourier,
associada aos então modernos sistemas computacionais, permitiram o nascimento da
espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier (FTIR). É importante
salientar que, tanto os princípios interferométricos quanto a própria transformada de
Fourier já eram há muito tempo conhecidos, ficando a modernidade da técnica por
conta do desenvolvimento de novos algoritmos ou, em termos finais, às inúmeras
possibilidades computacionais.
3.2.2.1. Princípios Técnicos Básicos
A partir de 1970, um número significativo de trabalhos foram dedicados aos
aspectos básicos da técnica de FTIR. Esta técnica é baseada na geração de um
interferograma, o chamado Interferômetro de Michelson. De acordo com o esquema
da Fig. 3.3, um feixe proveniente da fonte F é dividido em dois, FF e FM, após
atravessarem um divisor de feixe DF (“beam-splitter”), colocado a 45o em relação aos
espelhos EF e EM, espelho fixo e espelho móvel, respectivamente. O material do qual é
53
fabricado e a espessura do divisor de feixe DF são escolhidos de modo que seu poder
de transmissão seja igualmente sensível à região de interesse no infravermelho. O
feixe FF é refletido pelo espelho EF e o feixe FM pelo espelho EM, que interagem
construtiva ou destrutivamente, dependendo da diferença de fase introduzida pela
diferença de caminho percorrido; por fim atingem o detector D. Um dispositivo permite
conhecer a distância x/2, entre o plano O e o espelho EM (o qual executa movimento
harmônico simples),. em relação ao divisor de feixe.
Figura 3.3. Esquema de um interferômetro de Michelson.
Na Fig. 3.4 é mostrado um esquema geral, mais detalhado, de um
espectrômetro baseado na transformada de Fourier. A radiação policromática,
proveniente de uma fonte F, é colimada através dos espelhos E1, E2 e E3, indo incidir
sobre o divisor de feixe DF que, como já mencionado, divide a radiação para os
espelhos móvel EM e fixo EF. A luz enviada atravessa os espelhos E5 e E6, que focam
os feixes sobre o compartimento da amostra. (Saliente-se aqui que a radiação, ao
passar pelo interferômetro, torna-se modulada). Após passar pelo compartimento da
amostra, a radiação encontra toda uma óptica de condensação e focalização,
constituída pelos espelhos E7, E8, E9 e E10 que enviam a radiação transmitida para o
detector D.
54
Figura 3.4. Esquema geral de um espectrômetro interferométrico. Algumas partes podem variar
de acordo com o modelo e a marca, porém os componentes principais estão presentes em
todos os equipamentos: fonte, divisores de feixe, compartimentos das amostras, detector.
A eletrônica associada ao detector é concebida de modo que não responda a
ruídos, desprezando a radiação não-modulada que eventualmente possa estar sendo
emitida pela amostra ou proveniente de alguma fonte quente próxima. Um
interferograma típico observado é representado na Fig. 3.5. A interferência construtiva
(máximo) corresponde a uma situação na qual os caminhos ópticos dos feixes FF e FM
são iguais (em fase). A interferência destrutiva, por outro lado, se manifesta quando os
feixes estão fora de fase. É importante frisar que, diferentemente dos equipamentos
dispersivos (nos quais se tem uma “varredura” de freqüências individuais), nos
instrumentos interferométricos cada interferograma é a somatória dos componentes de
cada freqüência. Isso equivale a afirmar que cada interferograma contém toda a
informação espectral dentro da região na qual o detector apresenta sensibilidade. O
laser que aparece no esquema da Fig. 3.4 é utilizado para calibrar o número de onda
do espectrômetro.
55
Figura 3.5. Exemplo de um interferograma.
3.2.2.2. Do Interferograma ao Espectro
Como vimos no tópico precedente, designam-se como interferogramas as
variações de intensidade I(x) medidas pelo detector em função da posição x do
espelho móvel EM. Assim sendo, se forem consideradas as vibrações luminosas de
número de onda ν , o “atraso” óptico será dado por xνπ2 . Considerando-se
νν dI )( como a intensidade da fonte no intervalo νd , nas proximidades do número de
onda ν , temos:
)2cos1()()( xdAIxdI νπνν += , (3.7)
em que é a intensidade do feixe, resultante da combinação das vibrações
luminosas no intervalo
)(xdI
νd ; o produto νν dAI )( é a intensidade da fonte e o fator
)2cos1( xνπ+ corresponde ao termo que dá conta da defasagem das vibrações
luminosas. O termo está associado à eficiência do divisor de feixe e às perdas de
luminosidade que podem ocorrer nos espelhos.
A
Todo o domínio espectral é observado simultaneamente. Na ausência da
amostra, integrando sobre todos os números de onda, a expressão seguinte
corresponde à intensidade do feixe,
56
∫∞
+=0
)2cos1)(()( ννπν dxAIxI . (3.8)
Uma vez que vários termos da Eq. (3.8) são constantes, em particular o termo
νν dI )( , que corresponde à intensidade total da fonte, podemos dizer que:
∫∞
=0
2cos)()( ννπν xdIxF . (3.9)
O valor de depende somente da posição do espelho móvel E)(xF M e do
espectro )(νI . Como é possível observar na Fig. 3.5, o interferograma é simétrico em
relação ao eixo x.
A expressão é uma transformada de Fourier, sendo assim, a intensidade
espectral é dada por:
)(xF
∫∞
=0
2cos)()( xdxxFI νπν . (3.10)
A Eq. (3.10) relaciona o interferograma ao espectro óptico, ou seja, o espectro que se
obtém é a transformada de Fourier do interferograma.
Algumas considerações sobre a transformada de Fourier são importantes neste
ponto. O deslocamento do espelho móvel EM está necessariamente limitado a um
domínio . Assim sendo, a intensidade será dada pela seguinte expressão: ),( xx +−
∫+
−
=x
x
xdxxFI νπν 2cos)()(' . (3.11)
Uma das maneiras de se obter a Eq. (3.11) consiste na realização de cálculos
concomitantemente com o deslocamento do espelho. Os valores de são
medidos ponto a ponto para todos os ∆x. Assim, quando o espelho móvel E
)(xF
M estiver na
posição x0 , mede-se e calcula-se )( 0xF xxF ∆)( 0 . Para a posição x1, mede-se
e efetua-se o cálculo:
)( 1xF
xxxFxxF ∆+∆ 110 2cos)(2)( νπ . (3.12)
Na posição , mede-se e calcula-se: nx )( nxF
AxxxFAxxxFAxxFI nn νπνπν 2cos)(22cos)(2)()(' 110 L++= . (3.13)
57
Estes cálculos são realizados atribuindo-se todos os valores ν necessários à
obtenção do maior número de pontos sobre a faixa espectral de interesse. Tal
procedimento é mostrado na Fig. 3.6.
Figura 3.6. Procedimento para o cálculo da função )(' νI para os diferentes valores de x.
Outros métodos de cálculo são também utilizados. Um deles está baseado na
adição sucessiva de diversos interferogramas. Nesse caso, a transformada de Fourier
é efetuada sobre a soma dos interferogramas. O resultado desse tipo de procedimento
revela-se através de um aumento notável de sensibilidade. Atualmente, os
equipamentos comerciais, mesmo os mais simples, além de permitirem a visualização
quase instantânea dos espectros, possuem incorporados em seus sistemas
computacionais “softwares” que permitem os mais diferentes tipos de tratamento de
dados.
A título de ilustração, na Fig. 3.7 mostramos um interferograma de um filme de
poliestireno, onde podemos identificar as regiões de interferência construtiva e
destrutiva. Na Fig. 3.8 temos o espectro )(νI em número de onda, após a aplicação
da transformada de Fourier e eliminação da radiação de fundo. Na Fig. 3.9 é mostrado
um “background” típico em referência de KBr, no qual é possível observar as bandas
de absorção devidas à presença da água (3400 cm-1 e 1600 cm-1) e do CO2 (~ 2300
cm-1) na atmosfera.
58
Figura 3.7. Exemplo de interferograma do poliestireno.
Figura 3.8. Exemplo do espectro de infravermelho do poliestireno.
59
Figura 3.9. “Background” utilizado para a obtenção do espectro do poliestireno mostrado na
Fig. 3.8.
60
3.3. Espectros Raman
A discussão apresentada nesta seção baseia-se na referência [12].
3.3.1. Espectro Vibracional de Moléculas Diatômicas
Uma maneira indireta de se observar os espectros vibracionais, transferindo
para a região do visível as informações que seriam normalmente obtidas no
infravermelho, é através do espalhamento Raman, ou seja, do espalhamento inelástico
da radiação eletromagnética monocromática que interage com as moléculas. As
freqüências vibracionais são determinadas pelas diferenças entre as freqüências das
radiações espalhadas e a da radiação incidente.
Embora, como resultado, a molécula possa passar de um estado vibracional
para outro, o fenômeno é fisicamente diferente da absorção de radiação. A absorção
na região do infravermelho envolve uma ressonância entre a diferença de níveis de
energia da molécula e a radiação eletromagnética. No espalhamento Raman, uma
radiação, geralmente no visível ou no ultravioleta, interage com a molécula e é
espalhada com freqüência ligeiramente modificada. Esta variação de freqüência
corresponde à diferença de energia entre dois estados vibracionais. Considerando os
mesmos estados vibracionais, a freqüência Raman seria a mesma do infravermelho.
Embora os mesmos valores de freqüências vibracionais sejam obtidos através
dos espectros Raman e de infravermelho, o fato de diferentes mecanismos estarem
envolvidos leva a um questionamento: estes espectros seriam ou não idênticos? Como
visto, para um modo vibracional ser ativo no infravermelho é necessário que haja
variação do momento de dipolo intrínseco durante essa vibração. A atividade Raman
difere no sentido de que o momento de dipolo a ser considerado é o induzido pela
radiação eletromagnética, isto é, deve haver variação da polarizabilidade da molécula
durante a vibração. O estudo envolvendo medidas de intensidades das bandas é bem
mais complicado, exigindo tratamento por mecânica quântica. Contudo, para uma
análise vibracional envolvendo somente os valores de freqüências, é suficiente ter
noção das propriedades de simetria e de teoria de grupos. Utilizando-se a teoria de
grupos, podemos prever o número de modos vibracionais ativos no Raman e no
infravermelho.
61
Classicamente, o vetor do momento de dipolo induzido pode ser escrito como
Err αµ = , sendo α a polarizabilidade da molécula e E
r o vetor campo elétrico da
radiação incidente. A polarizabilidade α, num desenvolvimento em série na
coordenada interna q (considerando-se um sistema diatômico) pode ser escrita como:
L+⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+= 2
2
2
00 !2
1 qdqdq
dqd αααα . (3.14)
Supondo que a coordenada q e o campo elétrico Er
sejam descritos por
)2cos(0 tqq vπν= e )2cos( 00 tEE πνrr
= , (3.15)
em que νν e 0ν são, respectivamente, as freqüências vibracional e da radiação
incidente, o momento de dipolo induzido será dado por
)2cos()2cos()2cos()( 0000
000 ttEqdqdtEt vπνπναπναµ
rrr⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+= . (3.16)
Nesta equação, os termos de ordens mais altas podem ser desprezados para
pequenas variações da coordenada q em torno da posição de equilíbrio. Tem-se então
que
]})(2cos[])(2{cos[21)2cos( 0000
0000 ttEq
dqdtE vv ννπννπαπναµ −++⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+=
rrr. (3.17)
O primeiro termo contém somente a freqüência da radiação incidente e
corresponde ao espalhamento Rayleigh (espalhamento elástico). No segundo termo,
aparecem radiações espalhadas com freqüências vνν −0 (espalhamento Raman
Stokes) e vνν +0 (espalhamento Raman anti-Stokes). Para os dois últimos termos
terem contribuição, é necessário que 0)/( 0 ≠dqdα , ou seja, deve haver variação da
polarizabilidade com o pequeno deslocamento da coordenada q em torno da posição
de equilíbrio.
No efeito Raman, tanto moléculas diatômicas heteronucleares como
homonucleares apresentam atividade, pois em ambos os casos ocorre variação da
62
polarizabilidade com a vibração. No espectro, tem-se simetricamente em relação à
linha Rayleigh uma banda do lado de freqüências mais baixas, correspondendo à
banda Stokes e uma do lado de freqüências mais altas, correspondendo à banda anti-
Stokes. Classicamente, as duas deveriam ter a mesma intensidade, mas observa-se
que a banda Stokes é mais intensa que a anti-Stokes. Para explicar esse
comportamento, é necessário recorrer ao modelo quântico.
Correspondendo ao momento de transição de dipolo, a polarizabilidade é
expressa como
∫ ΨΨ= ταα dnmmn* . (3.18)
A relação entre as componentes do momento de dipolo induzido e as
componentes do campo elétrico é dada pelas seguintes equações:
zxzyxyxxxx EEE αααµ ++= ;
zyzyyyxyxy EEE αααµ ++= ; (3.19)
zzzyzyxzxz EEE αααµ ++= .
As componentes ijα que relacionam os dois vetores formam um tensor
simétrico no efeito Raman normal, isto é, zyyzzxxzyzxy αααααα === ;; .
Para cada transição entre os estados vibracionais m e n, devem ser
consideradas as componentes mnij )(α , em que i e j são x, y ou z. Para haver atividade
no Raman, pelo menos uma das componentes ∫ ΨΨ= ταα dnijmmnij*)( deve ser
diferente de zero.
Substituindo-se a Eq. (3.14) na expressão de αmn, na aproximação harmônica
considerada, temos que
∫∫ ΨΨ⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛+ΨΨ= ταταα dq
dqdd nmnmmn
*
0
*0 . (3.20)
No espalhamento Raman Stokes ou anti-Stokes, os estados vibracionais m e n
são diferentes e a primeira integral do segundo membro é sempre igual a zero, pela
condição de ortogonalidade entre Ψm e Ψn. Para o segundo termo ser diferente de
zero, é necessário que sejam satisfeitas as duas condições seguintes:
63
(1) ( ) 00 ≠qddα , ou seja, deve haver variação da polarizabilidade com a pequena
vibração em torno da posição de equilíbrio;
(2) . Esta condição já foi discutida na atividade no infravermelho, na
sub-seção 3.2.1. A regra de seleção para o oscilador harmônico é
0* ≠ΨΨ∫ τdq nm
1±=−=∆ nmv
(considerando-se apenas uma excitação), em que o sinal “+” vale para Stokes e o
sinal “-“ vale para anti-Stokes, sendo v o número quântico vibracional. Se m = n, tem-
se o espalhamento elástico Rayleigh.
A intensidade Raman depende da probabilidade de transição, ou seja, do
quadrado do momento de transição e da quarta potência da freqüência da radiação
espalhada, de acordo com a equação:
∑∑⎟⎟⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛=
i jmnijmn I
cI
2404
2
)(9
16 ανπ, (3.21)
em que I0 é a intensidade da radiação incidente e ν é a freqüência da radiação
espalhada.
Os mecanismos de espalhamento podem ser representados pelo esquema da
Fig. 3.10.
Figura 3.10. Representação esquemática dos mecanismos de espalhamento Raman.
No espalhamento Raman Stokes, a molécula num estado inicial sofre colisão
com um fóton de energia hν0, passa para um estado intermediário (ou virtual), que não
precisa ser um estado estacionário da molécula e decai em seguida para um estado
vibracionalmente excitado, de energia eν; o fóton espalhado terá energia menor do que
64
o incidente, [hν0 - eν]. No espalhamento Rayleigh, após a interação do fóton com a
molécula, esta retorna ao mesmo nível de energia inicial e o fóton é espalhado sem
modificação de freqüência. No espalhamento Raman anti-Stokes, o fóton encontra a
molécula já num estado excitado e, após a interação, a molécula decai para seu
estado inicial. Esta diferença de energia é cedida ao fóton, que é espalhado com
energia [hν0 + eν].
O esquema mostrado na Fig. 3.10 é útil para visualizar o espalhamento
Raman, mostrando que, além dos estados inicial e final da molécula, também
comparece o estado intermediário. Na realidade deve-se pensar que, após a colisão
do fóton com a molécula, este é aniquilado e a molécula sofre uma perturbação em
todos os seus estados de energia. Isto é representado por uma somatória sobre todos
os seus estados. Quando ocorre que a radiação excitante tem comprimento de onda
situado dentro de uma banda de absorção intensa do composto, funções de onda
cujos auto-valores estão próximos ao nível intermediário, no esquema da Fig. 3.10,
terão contribuição preponderante.
Como a população de estados excitados segue a distribuição de Boltzmann,
deve-se esperar para as bandas anti-Stokes uma intensidade menor do que para as
Stokes. Isto se verifica experimentalmente e a relação entre as intensidades anti-
Stokes/Stokes, , é dada por SA II /
⎟⎠⎞
⎜⎝⎛−⎟⎟
⎠
⎞⎜⎜⎝
⎛−+
=kTe
II v
v
v
S
A exp0
0
νννν
. (3.22)
Para baixas freqüências, as intensidades Stokes e anti-Stokes são
comparáveis, mas para freqüências vibracionais muito altas, torna-se difícil observar
as bandas anti-Stokes.
65
3.4. Vibrações Moleculares e Coordenadas Normais
A discussão que se segue nesta seção é baseada na referência [16].
Seja U a energia potencial de um sistema de n átomos, escrita em função das
coordenadas generalizadas )3,,2,1( niqi K= , apresentando um mínimo para .
Considerando para pequenos deslocamentos em torno da posição de
equilíbrio e expandindo U como uma função de para os termos quadráticos,
obtemos a energia potencial como uma forma quadrática positiva ,
0ii qq =
0iii qqx −=
ix
kiki
ik xxkU ∑=,2
1, (3.23)
,
em que tomamos o valor minimo da energia potencial como zero. Uma vez que os
coeficientes na Eq. (3.23) multiplicam a mesma quantidade , obviamente
podemos considerar .
ikk ki xx
kiik kk =
A energia cinética T também pode ser escrita como uma forma quadrática
positiva das velocidades,
∑=ki
kiik xxmT,2
1&& . (3.24)
Os coeficientes também podem sempre ser considerados como simétricos:
. Então, a Lagrangeana de um sistema executando pequenas oscilações
livres é dada por:
ikm
kiik mm =
kiikki
kiik xxkxxmL −= ∑,2
1&& . (3.25)
Dessa forma,
kk
iki
xmxL
&&
∑=∂∂
, kk
iki
xkxL ∑−=∂∂
. (3.26)
66
As equações de Lagrange são escritas como
0=+∑ ∑k
kk
ikkik xkxm && , (i = 1,2, ...,k). (3.27)
Estas equações formam um conjunto de k equações diferenciais homogêneas
com coeficientes constantes. Procurando soluções da forma k )(txk
)exp( tiAx kk ω= , (3.28)
em que são constantes a serem determinadas, obtemos um conjunto de equações
algébricas lineares homogêneas a serem satisfeitas pelas :
kA
kA
0)( 2 =+−∑k
kikik Akmω , (3.29)
com equação característica
02 =− ikik mk ω . (3.30)
Em geral, esta equação terá raízes reais e distintas, ; em
casos particulares, algumas dessas raízes podem coincidir. As grandezas
determinadas são as freqüências características ou as auto-freqüências do sistema.
k ),...,2,1(2 k=αωα
2αω
Tendo sido encontradas as freqüências αω , substituímos cada um destes
termos nas Eqs. (3.29) e encontramos os coeficientes correspondentes . Se todas
as raízes
kA
αω da equação característica forem diferentes, os coeficientes serão
proporcionais aos menores do determinante da Eq. (3.30), com
kA
αωω = . Sejam estes
menores . Uma solução particular das equações diferenciais (3.30) é, então, αk∆
)exp( tiCx kk ααα ω∆= , em que é uma constante complexa arbitrária. αC
A solução geral é a soma das soluções particulares. Tomando a parte real
dela, temos:
k
, (3.31) ∑=
Θ∆=∆=n
kkk tiCrex1
)exp(α α
ααααα ω ∑
67
em que
)]exp([ tiCre ααα ω=Θ . (3.32)
A variação temporal de cada coordenada do sistema é uma superposição de
oscilações periódicas simples,
n
nΘΘΘ ,...,, 21 , com amplitudes e fases arbitrárias, mas
com freqüências definidas. As coordenadas generalizadas podem ser escolhidas de tal
forma que cada uma delas execute somente uma oscilação simples. Considerando a
Eq. (3.31) como definindo um conjunto de equações de n incógnitas , podemos
expressar em termos das coordenadas . As grandezas
αΘ
nΘΘΘ ,...,, 21 nxx, 2x ,...,1 αΘ
podem ser consideradas como novas coordenadas generalizadas, as chamadas
coordenadas normais, as quais executam oscilações periódicas simples, chamadas
oscilações normais do sistema.
As coordenadas normais αΘ satisfazem as equações:
. (3.33) 02 =Θ+Θ ααα ω&&
Isto significa que, em coordenadas normais, as equações de movimento tornam-se
equações independentes. A aceleração em cada coordenada normal depende
somente do valor daquela coordenada e sua dependência temporal é inteiramente
determinada pelos valores iniciais da coordenada e da velocidade correspondente. Em
outras palavras, as oscilações normais do sistema são completamente independentes.
n
É evidente que a Lagrangeana, expressa em termos de coordenadas normais,
é uma soma de expressões, cada uma das quais correspondendo à oscilação em uma
dimensão com uma das freqüências αω :
∑ Θ−Θ=α
αααα ω )(21 222&mL , (3.34)
em que são constantes positivas. Definindo αm ααα Θ= mQ , temos que
)(21 222
ααα
α ω QQL −= ∑ & . (3.35)
A discussão acima necessita de pequena alteração quando algumas raízes da
equação característica coincidem.
68
Neste caso, a cada freqüência degenerada corresponde um conjunto de
coordenadas normais em número igual à sua multiplicidade, mas a escolha destas
coordenadas não é única: as coordenadas normais com αω em comum podem ser
transformadas linearmente umas nas outras, continuando soluções.
A energia total do sistema,
∑=
+=+=n
QQUTE1
222 )]()[(21
αααα ω& , ... (3.36)
é a soma das energias de osciladores harmônicos, em que cada coordenada normal
oscila independentemente das demais. Em outras palavras, o tratamento aplicado
permite desacoplar os osciladores em osciladores harmônicos independentes por meio
das coordenadas normais.
69
4. Estudo das Biomoléculas de Celulose e Lignina
4.1. O Problema A utilização de biomateriais em processos de acumulação e remoção de metais
pesados de soluções aquosas tem sido proposta por muitos pesquisadores como um
método alternativo e relativamente barato para o tratamento da água e na recuperação
de íons metálicos de interesse na indústria e no comércio [17].
Tradicionalmente, a recuperação efetiva de áreas contaminadas requer
procedimentos complicados e onerosos, dentre os quais podem ser citados a remoção
e o transporte arriscado de solos e as enormes taxas de desperdício de água em
tratamentos químicos, como a utilização de carvão ativado e os mecanismos de troca
iônica. Devido ao alto custo destes métodos há uma necessidade crucial de se
desenvolver novos procedimentos, não somente economicamente viáveis, mas que
possam ser facilmente postos em prática [18].
Recentemente, a fitorremediação usando sistemas biológicos vem emergindo
como uma tecnologia alternativa eficaz na remoção de poluentes ambientais. Novas
linhas de pesquisa vêm fazendo uso intensivo de plantas para a remediação
ambiental, devido à sua capacidade de retenção natural de metais pesados e de
compostos orgânicos degradados.
A bioacumulação é uma das ferramentas tecnológicas empregadas em
processos de retenção de contaminantes à base de metais pesados pelo uso de
organismos vivos. Esta retenção depende fundamentalmente das atividades
metabólicas das células, uma vez que variações significativas nas taxas de retenção
de íons metálicos influenciam diretamente na capacidade de sobrevivência dos
organismos. O processo de bioacumulação é bastante eficiente em baixas
concentrações. Entretanto, sistemas orgânicos vivos são limitados pelos efeitos
tóxicos de altos níveis de contaminação. Dessa forma, embora seja de grande
interesse em toxologia, é um processo menos eficiente na recuperação de metais, pois
70
requer o metabolismo celular ativo, exigindo um ambiente de cultura adequado, além
de apresentar certas dificuldades na recuperação do metal absorvido pela célula [1].
Diversos outros sistemas de tratamento biológico para resíduos industriais
foram instalados nos países industrializados nas últimas décadas. Na maioria dos
casos, entretanto, não há uma etapa de tratamento específica para a remoção ou
recuperação dos metais de interesse. Com o acúmulo de metais durante o tratamento
biológico, o lodo resultante pode conter uma concentração razoável de metais, o que
restringe os benefícios do uso dos lodos como fertilizantes. Isto requer que estes
sejam incinerados ou dispostos adequadamente em solos, causando poluição do ar e
dificuldade de disposição das cinzas, com conseqüente geração de gastos e perdas
de elementos de valor econômico [17].
Inúmeras pesquisas tentam avaliar se a biossorção poderia prover uma
ferramenta alternativa com características de custo-benefício atraentes. Determinadas
espécies de biomassa são capazes de acumular íons metálicos, que podem depois
ser removidos por procedimentos específicos [1]. Uma característica importante deste
processo é que ele pode ser observado mesmo na ausência de atividades metabólicas
pelas células. As paredes celulares dos vegetais, por exemplo, que constituem
materiais residuais da célula morta, ainda manifestam poderosa ação biossorvente,
com alta capacidade de captura de íons metálicos. Materiais biossorventes podem ser
rejeitos de indústrias fermentativas ou biomassa naturalmente abundante, ricas em
polissacarídeos celulósicos. A técnica permite o tratamento de resíduos e minimiza
problemas como, por exemplo, o excesso de biomassa, além de possuir um custo
extremamente baixo. O biossorvente usado e “carregado” com os metais pode ser
incinerado em temperaturas moderadas e depositado em aterros, minimizando o
volume do efluente, o que significa dizer que a biossorção é útil na redução do volume
do rejeito. Alternativamente, a regeneração do biossorvente é possível pela dessorção
do metal por intermédio de ácidos ou soluções salinas. A solução resultante, altamente
concentrada em metais, pode ser processada por outras técnicas, como a
eletrorrecuperação, a fim de se resgatar o metal de interesse. As vantagens no uso
destes sistemas derivam dos baixos custos e da possibilidade de reutilização da
biomassa após cada ciclo de captura metálica [1]. A biotecnologia apresenta-se,
portanto, como uma solução conveniente para o tratamento de resíduos e efluentes
industriais. É um processo ambientalmente correto e economicamente viável.
Dentre os vários compostos de origem biológica com capacidades biossortivas,
os ligno-carboidratos comportam-se como uma fonte potencial de biomateriais para a
remoção de metais pesados de soluções aquosas, devido à sua abundância e
facilidade de aquisição. Os complexos de ligno-carboidratos consistem de cadeias de
71
polissacarídeos celulósicos contendo fragmentos relativamente pequenos de lignina,
conectados às ligações pendentes da cadeia polissacarídica, sendo biossintetizados
por vegetais em grandes quantidades [19]. Estudos experimentais e teóricos têm
mostrado que os níveis de tolerância de polissacarídeos celulósicos e lignina à
presença de íons metálicos superam outros tipos de biomassa. Esta capacidade pode
estar associada à existência de grupos funcionais nos meios intracelulares, capazes
de inibir os efeitos causados por metais pesados.
Recentemente, o comportamento sortivo de diversas biomassas para
diferentes metais vem sendo bastante estudado na literatura; entretanto, os
mecanismos e sítios responsáveis pela captura do metal são pouco conhecidos. Assim
sendo, neste capítulo temos por objetivos principais a investigação teórica das
biomoléculas de celulose e lignina, as principais constituintes da biomassa vegetal,
bem como a caracterização de alguns possíveis sítios responsáveis pela sorção do
átomo de cobre nestas estruturas.
72
4.2. A Molécula de Celulose: um Polissacarídeo Estrutural
A celulose é uma substância orgânica fibrosa, insolúvel em água e bastante
resistente, encontrada na parede celular de proteção das plantas, particularmente de
troncos, hastes e caules e em todas as partes lenhosas dos tecidos vegetais. É o
principal constituinte de plantas superiores, incluindo linho, palha de cereais, madeira,
algodão, etc., sendo os dois últimos as suas principais fontes industriais [20].
A celulose é a mais abundante das biomoléculas, quer de origem vegetal, quer
de origem animal. Estimativas têm mostrado que a fotossíntese anual de biomassa
atinge cerca de 170 bilhões de toneladas, 40% das quais consistindo de
polissacarídeos, principalmente celulose e amido. Enormes quantidades de celulose
são produzidas, não apenas nas florestas em crescimento, como também pelas
plantas destinadas às colheitas [20]. Estima-se que todos os dias, cerca de 50 Kg de
celulose sejam sintetizados para cada ser humano existente no planeta.
A molécula de celulose foi pioneiramente estudada no século XIX [20], por
Anselm Payen. As estruturas celulósicas e seus derivados são ainda largamente
investigados, embora em menor escala devido à atual disponibilidade de uma enorme
gama de polímeros sintéticos. Entretanto, é importante salientar que a celulose ocupa
lugar de destaque junto aos polímeros superiores. A regeneração de cadeias
celulósicas e as sínteses de seus derivados constituem áreas ativas de pesquisa.
A celulose é classificada como um homopolissacarídeo linear não-ramificado,
constituído de 10.000 ou mais unidades monoméricas de anéis piranosídicos de D-
glicose (Fig. 4.1), unidos entre si por ligações glicosídicas do tipo β(1→4). Devido a
estas ligações, as cadeias de D-glicose assumem uma conformação alongada ou
equatorial e agregam-se lado a lado, formando fibrilas insolúveis, em forma de cadeira
(Fig. 4.2).
Na seção 4.2.1, descrevemos detalhadamente as propriedades estruturais e
conformacionais dos carboidratos, a classe de compostos orgânicos à qual pertence a
molécula de celulose. Serão descritos desde o processo de formação do anel cíclico
da molécula de D-glicose, a unidade monomérica da celulose, até a formação das
cadeias celulósicas poliméricas. Veremos ainda que a co-existência das duas formas
estereoisoméricas da molécula de D-glicose (α e β) são responsáveis por diferentes
funções biológicas. Estas discussões baseiam-se principalmente no trabalho de
LEHNINGER [21].
73
(a) (b)
Figura 4.1. Esquema dos estereoisômeros da D-glicose. Em (a), conformação da α-D-glicose;
em (b), conformação da β-D-glicose.
Figura 4.2. Estrutura conformacional da molécula de celulose, representando as unidades
monoméricas de β-D-glicose, sob a forma de cadeira, com todos os substituintes orientados
equatorialmente.
4.2.1. Os Carboidratos
Em 1838, Payen propôs pela primeira vez a composição elementar da celulose,
C6H12O5, classificando-a como um carboidrato [20].
Os carboidratos, na forma de açúcar ou amido, compõem a maior parte da
ingestão calórica diária do homem, da maioria dos animais e de muitos
microorganismos. Também ocupam posição central no metabolismo das plantas
verdes e de outros organismos fotossintetizantes que utilizam a energia solar na
síntese de carboidratos a partir de CO2 e H2O. As vastas quantidades de amido e
outros carboidratos provenientes da fotossíntese são fontes de energia e de átomos
de carbono para as células não-fotossintetizantes.
Os carboidratos apresentam outras propriedades biológicas importantes. O
amido e o glicogênio, por exemplo, servem como depósitos temporários de glicose.
Polímeros insolúveis de carboidratos, como a celulose, podem atuar como elementos
estruturais de sustentação das paredes celulares de vegetais e microorganismos
bacterianos. Outros atuam nos tecidos conjuntivos e no revestimento celular de
74
animais, lubrificando as junções ósseas e conferindo especificidade biológica à
superfície celular.
Quimicamente, os carboidratos podem ser classificados como poli-hidróxi-
aldeídos ou poli-hidróxi-cetonas ou ainda compostos que, por hidrólise, liberam estas
substâncias químicas. A designação “carboidrato” se deve ao fato de a maioria dos
compostos da classe apresentar fórmulas empíricas na proporção 1:2:1 entre os
átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio, respectivamente, sugerindo a idéia de
carbono “hidratado” ou “hidrato” de carbono. Na natureza, existem basicamente três
grandes classes de carboidratos: os monossacarídeos, os oligossacarídeos e os
polissacarídeos.
Os monossacarídeos (ou açúcares simples) consistem de uma única unidade
de poli-hidróxi-aldeído ou cetona. São sólidos cristalinos, incolores, muito solúveis em
água e insolúveis em solventes não-polares, a grande maioria possuindo sabor
adocicado. Apresentam fórmula empírica (CH2O)n, com 3 ≤ n ≤ 7. O esqueleto dos
monossacarídeos é uma cadeia não-ramificada de átomos de carbono unidos entre si
por ligações sigma. Um dos átomos de carbono se une a um átomo de oxigênio por
ligação dupla, formando um grupo carbonila. Cada um dos demais átomos de carbono
está ligado a um grupo hidroxila. O monossacarídeo do tipo aldose ocorre quando o
grupo carbonila se localiza numa das extremidades da cadeia, dando origem a um
composto aldeído; se o grupo carbonila estiver em qualquer outra posição
intermediária, o monossacarídeo é uma cetona e é chamado de cetose. Os
monossacarídeos mais simples são as trioses (com 3 átomos de carbono),
representadas pelo composto gliceraldeído, uma aldose (Fig. 4.3a), e pela di-hidróxi-
cetona, um composto cetona (Fig. 4.3b).
Os monossacarídeos com 4, 5, 6 e 7 átomos de carbono em suas estruturas
são chamados, respectivamente, tetroses, pentoses, hexoses e heptoses, cada um
dos quais existindo em duas séries: aldoses e cetoses. As hexoses são os
monossacarídeos mais abundantes na natureza. Entre elas, podem ser citadas a D-
glicose, a unidade monomérica da molécula de celulose (Fig. 4.4a) e a D-frutose,
constituinte básica da molécula de sacarose (Fig. 4.4b).
Todos os monossacarídeos, com exceção da di-hidróxi-cetona (representada
na Fig. 4.3b), contêm um ou mais carbonos assimétricos ou quirais, ocorrendo
portanto em formas isoméricas opticamente ativas. A aldose mais simples, o
gliceraldeído (representado na Fig. 4.3a), contém apenas um centro quiral e é capaz
de existir como dois isômeros ativos, os quais são, um em relação ao outro, imagens
especulares não-superponíveis. As aldoexoses apresentam quatro carbonos
75
assimétricos e podem existir na forma de 16 estereoisômeros diferentes, entre os
quais está a forma comum da glicose.
O
O
O
O
OO
O (a) (b)
Figura 4.3. Representação das duas trioses: em (a), o composto gliceraldeído, uma aldose; em
(b), o composto di-hidróxi-cetona, uma cetose. As ligações simbolizadas por ( ) dirigem-se
para cima do plano do papel e as simbolizadas por ( ) dirigem-se para baixo do mesmo
plano.
O
O
OO
OO
O
O
OO
OO
(a) (b)
Figura 4.4. As duas hexoses mais comuns: em (a) a estrutura da molécula de D-glicose, uma
aldoexose; em (b) a estrutura da molécula de D-frutose, uma cetoexose. As ligações
simbolizadas por ( ) dirigem-se para cima do plano do papel e as simbolizadas por ( )
dirigem-se para baixo do mesmo plano.
A Fig. 4.5 representa algumas estruturas das séries D e L das aldotetroses,
aldopentoses e aldoexoses, mostradas como fórmulas de projeção. Os prefixos D e L
são usados em referência à configuração do carbono quiral mais distante do átomo de
carbono da carbonila. Quando o grupo hidroxila desse átomo de carbono mais distante
projeta-se para a direita, ele designa um D-açúcar; quando ele se projeta para a
esquerda, designa um L-açúcar.
76
O
O
OO
O
O
OO
O
O
O
OO
O
O
O
OO
O
O
O
OO
O
L-Eritrose L-Ribose D-Arabinose L-Xilose L-Lixose
O
O
OO
OO
O
O
OO
OO
O
O
OO
OO
O
O
OO
OO
O
O
OO
OO
L-Altrose D-Glicose L-Manose L-Gulose L-Galactose
Figura 4.5. Alguns representantes da família das aldoses mais abundantes na natureza,
contendo 4, 5 ou 6 átomos de carbono na cadeia. As ligações simbolizadas por ( ) dirigem-
se para cima do plano do papel e as simbolizadas por ( ) dirigem-se para baixo do mesmo
plano.
Os monossacarídeos com cinco ou mais átomos de carbono ocorrem quando
em solução como estruturas cíclicas ou em forma de anel, nas quais o grupo carbonila
não está livre, mas formando uma ligação covalente com um dos grupos hidroxila
existentes ao longo da cadeia. Uma evidência de que a D-glicose apresenta um
estrutura cíclica se deve ao fato de haver duas formas cristalinas, de composição
química idêntica, porém com propriedades ligeiramente diferentes. Quando a estrutura
é cristalizada a partir de solução aquosa, obtém-se uma forma denominada α-D-
glicose. Se a D-glicose é cristalizada a partir de piridina, obtém-se a forma β-D-glicose.
A partir de uma série de considerações químicas, deduziu-se que os isômeros α e β
da D-glicose não são estruturas com cadeia reta, mas sim dois compostos diferentes
em forma de anel hexagonal (Fig. 4.6). A D-glicose é um hemiacetal intramolecular no
qual houve reação entre o grupo hidroxila do carbono 5 e o grupo aldeído do carbono
1, transformando-o em carbono assimétrico (Fig. 4.6). Como resultado, a D-glicose
apresenta um centro quiral a mais do que os existentes na forma aberta linear. As
77
formas isoméricas dos monossacarídeos que diferem entre si apenas na configuração
ao redor do átomo de carbono pertencente ao hemiacetal, como ocorre com α e β-D-
glicose, são denominadas anômeros. Apenas as aldoses que possuem 5 ou mais
átomos de carbono podem formar anéis piranosídicos estáveis.
Figura 4.6. Formação de dois isômeros da molécula de D-glicose. Quando o grupo aldeído do
carbono 1 reage com o grupo hidroxila do carbono 5, forma-se a ligação hemiacetal e dois
estereoisômeros diferentes com relação ao carbono 1 podem ser formados, designados por α-
D-glicose e β-D-glicose.
Estas formas cíclicas dos carboidratos são denominadas piranoses, uma vez
que se assemelham ao anel hexagonal do composto pirano (representado na Fig. 4.6).
Os isômeros α e β são interconvertíveis em solução aquosa. A formação dos anéis
piranosídicos pela D-glicose é o resultado de uma reação geral entre aldeídos e
78
álcoois com a formação de derivados hemiacetais, que contêm um átomo de carbono
assimétrico, podendo ocorrer sob duas formas estereoisoméricas (Fig. 4.7).
O C
H
R1
+ HO R2 OR2R1
OH
H
Aldeído Álcool Hemiacetal
O C
R2
R1
+ HO R3 R2R1
OH
OR3
Cetona Álcool Hemicetal
(a)
(b)
Figura 4.7. Aldeídos e cetonas podem reagir com álcoois formando hemiacetais (a) e
hemicetais (b). O carbono do grupo funcional carbonila torna-se, então, um centro quiral.
Usualmente, para a representação das formas em anel dos monossacarídeos,
são empregadas as chamadas fórmulas de projeção de Haworth. Na maioria dos
açúcares, os anéis piranosídicos têm conformação em cadeira, embora também haja
arranjos conformacionais em forma de barco (Fig. 4.8). As conformações
tridimensionais específicas dos açúcares com 6 átomos de carbono são extremamente
importantes na determinação das propriedades biológicas e das funções vitais de
alguns polissacarídeos.
(a) (b) (c)
Figura 4.8. Fórmulas conformacionais das formas cadeira (a) e barco (b) do anel piranosídico.
(c) Fórmula conformacional da β-D-glicose em conformação do tipo cadeira.
79
Os oligossacarídeos consistem de pequenas cadeias de unidades
monossacarídicas unidas entre si por ligações covalentes. Os dissacarídeos, os mais
abundantes dos oligossacarídeos, são açúcares formados pela ligação de duas
moléculas de monossacarídeos. Esta ligação, chamada glicosídica, é formada pela
reação entre um grupo hidroxila de um dos açúcares e o carbono anomérico do outro
açúcar. As ligações glicosídicas são facilmente hidrolisadas por ácidos, mas são
altamente resistentes à ação de agentes básicos. Portanto, por processos de fervura
em ácidos diluídos, os dissacarídeos podem ser hidrolisados em seus
monossacarídeos constituintes.
A terceira grande classe dos carboidratos, os polissacarídeos, na qual se
insere a molécula de celulose, consiste de longas cadeias, com centenas ou milhares
de unidades monossacarídicas. Alguns polissacarídeos, como a celulose, possuem
cadeias lineares, enquanto outros, como o glicogênio, apresentam cadeias
ramificadas. Os polissacarídeos mais abundantes, a celulose e o amido dos vegetais,
são formados por unidades recorrentes de D-glicose, diferindo na forma com que
estas unidades estão ligadas entre si.
A maior parte do total de carboidratos encontrados na natureza ocorre sob a
forma de polissacarídeos de alto peso molecular. Alguns deles são formas biológicas
de reserva de monossacarídeos, outros são elementos estruturais de paredes
celulares de tecidos conjuntivos. Pela ação de enzimas específicas ou pela hidrólise
ácida completa, os polissacarídeos liberam monossacarídeos ou seus derivados.
Os compostos polissacarídicos diferem entre si na natureza de suas unidades
monoméricas, no comprimento de suas cadeias e no grau de ramificação, existindo
sob duas formas distintas: os homopolissacarideos, como a celulose e o amido, que
contêm apenas um tipo de unidade monomérica, e os heteropolissacarídeos, formados
por diferentes unidades monossacarídicas, como o ácido hialurônico.
A celulose é o polissacarídeo estrutural extracelular mais abundante do mundo
vegetal. As ligações glicosídicas do tipo (1→4) tornariam a celulose extremamente
semelhante à amilose e às cadeias principais do glicogênio (polissacarídeos de
reserva energética vegetal e animal, respectivamente). No entanto, há uma importante
diferença: na celulose, as ligações (1→4) apresentam configuração β (Fig. 4.9a),
enquanto nos carboidratos de reserva estas ligações são do tipo α (Fig. 4.9b),
resultando em estruturas poliméricas com propriedades muito distintas.
As cadeias principais de D-glicose no glicogênio e no amido, devido à
geometria de suas ligações α(1→4), assumem uma conformação enrolada em hélice,
favorecendo a formação de grânulos densos, como observado em vegetais e animais.
80
Estas ligações são rapidamente hidrolisadas pela enzima intestinal α-amilase dos
vertebrados, com conseqüente absorção e utilização da glicose formada, como
combustível rico em energia. Na celulose, entretanto, as ligações β proporcionam uma
configuração alongada às cadeias de D-glicose, cujo agregamento lado a lado dá
origem a fibrilas insolúveis. As ligações do tipo β(1→4) da celulose não são
hidrolizadas pelas α-amilases. A celulose, dessa forma, não pode ser digerida pelos
vertebrados, uma vez que o sistema digestivo dos mesmos não secreta nenhuma
enzima capaz de realizar a hidrólise da estrutura. Suas unidades de D-glicose são
completamente inaproveitáveis como alimento para a maioria dos organismos
superiores.
(a) (b)
Figura 4.9. As diferentes conformações assumidas pelas cadeias β(1→4) da celulose e pelas
cadeias α(1→4) do amido. Em (a), esquema de segmentos das cadeias paralelas de celulose,
evidenciando a conformação dos resíduos de D-glicose e as interligações feitas por pontes de
hidrogênio; em (b), esquema de segmentos da amilose. As ligações α(1→4) da amilose, da
amilopectina e do glicogênio forçam a cadeia a assumir uma estrutura enrolada em hélice, na
qual os numerosos grupos hidroxila ficam voltados para o exterior.
Segundo MICHELL e HIGGINS [22], o conhecimento da conformação da
celulose pode ser obtido do estudo de suas unidades monoméricas, os cristais de D-
glicose, nos quais as fortes ligações de hidrogênio intermoleculares tornam a molécula
de celulose extremamente insolúvel em solventes apolares. As moléculas de celulose,
com seus grupos hidroxila na orientação equatorial, manifestam forte tendência a
formar ligações de hidrogênio intra e intermoleculares. A estrutura cristalina dos
carboidratos revela que o modelo usual envolve todos os grupos hidroxila em ligações
81
de hidrogênio. Através de investigações experimentais, por difração de raios-X e
espectroscopia de infravermelho, MICHELL e HIGGINS [22] concluíram que os grupos
hidroxila relevantes não estão livres, mas envolvidos em ligações de hidrogênio muito
fracas, podendo ser evidenciadas por vibrações térmicas. As ligações de hidrogênio
intramoleculares são responsáveis pela natureza rígida e espessa da molécula de
celulose. Já as ligações de hidrogênio do tipo intermoleculares são responsáveis pela
natureza laminar da molécula.
82
4.3. A Celulose e a Lignina
4.3.1. Estrutura Molecular da Lignina
A maioria das células vegetais é envolvida por estruturas polissacarídicas
rígidas muito resistentes, comparáveis em resistência ao plástico reforçado com fibra
de vidro. As paredes celulares são muito espessas nas porções lenhosas dos troncos
das árvores, o que as tornam capazes de suportar enormes forças de compressão. A
rede das paredes celulares vegetais é constituída de camadas entrecruzadas de
longas fibrilas de celulose, as quais são mais resistentes que fios de aço de mesmo
diâmetro. Esta rede fibrilar é impregnada por uma matriz de propriedades cimentantes,
que consiste de polissacarídeos de tipos diferentes e de uma substância polimérica
denominada lignina [21].
As ligninas são polímeros naturais formados por compostos aromáticos
macromoleculares e polifuncionais. Sendo componentes dos tecidos vegetais, as
ligninas são responsáveis pelas funções vitais mecânicas, químicas e biológicas,
proporcionando durabilidade e proteção contra efeitos de oxidação e ação de
patógenos [23]. A lignina é biossintetizada nas proximidades dos sítios de
macromoléculas de celulose e de polissacarídeos não-celulósicos, resultando em
matrizes poliméricas de lignocelulose. As interações químicas, físico-químicas e
mecânicas da lignina com a celulose asseguram a formação de uma composição
polimérica complexa, os tecidos vegetais, e predeterminam as reatividades de seus
principais componentes nos processos químicos e tecnológicos.
Em diversas aplicações possíveis para a madeira e as fibras vegetais, não se
faz necessária a separação de seus componentes básicos (celulose, lignina e
polioses), exceto pelas indústrias de papel, onde a lignina não é utilizada. A cada ano,
muitas toneladas de madeira são processadas pela indústria química de papel e
celulose, sendo a maior parte da lignina perdida ou queimada. Apenas uma pequena
parcela é transformada em produtos químicos de importância comercial, com diversas
aplicações, como dispersantes, umectantes, colas, adesivos e outros. A pasta
celulósica obtida pela deslignificação da madeira é a maior fonte de lignina disponível
[24].
A estrutura molecular da lignina é proveniente da polimerização iniciada por
ação enzimática de seus compostos precursores: álcool trans-sinapílico (Fig. 4.10a),
álcool trans-coniferílico (Fig. 4.10b) e álcool trans-para-cumárico (Fig. 4.10c). As
ligninas são constituídas de unidades substituintes de propano-fenol (Fig. 4.11a).
83
Estas unidades são comumente referidas como guaiacil (R=H; R’=OCH3), siringil
(R=R’=OCH3) e para-hidróxi-fenil (R=R’=H). Outra unidade monomérica é o composto-
modelo contendo o grupo funcional carbonila C=O (R=R’=H) (Fig. 4.11b). Estes grupos
se unem por ligações carbono-carbono ou carbono-éter-carbono, dando origem à
estrutura da lignina. Sendo o núcleo aromático dos compostos-modelo da lignina de
natureza fenólica, a eletro-oxidabilidade dos fenóis dependerá do caráter de seus
substituintes. Esta capacidade eletro-oxidativa aumenta com a presença de grupos
doadores de elétrons e diminui se os substituintes forem aceitadores. A inserção de
novas unidades ou ramificações na estrutura-base da lignina é aleatória, gerando uma
substância heterogênea, de alto peso molecular e constituída por inúmeros grupos
funcionais, o que a torna uma molécula de reatividade bastante complexa [23].
OH
OCH3H3CO
CHCH2OHCH
OH
OCH3
CHCH2OHCH
CH CHCH2OH
OH (a) (b) (c)
Figura 4.10. Compostos precursores da lignina: (a) álcool trans-sinapílico; (b) álcool trans-
coniferílico e (c) álcool trans-para-cumárico.
(a) (b)
Figura 4.11. (a) Esquema das unidades monoméricas básicas da estrutura da lignina. As
unidades de guaiacil-propanol (R=H e R’=OCH3), siringil-propanol (R=R’=OCH3) e para-hidróxi
fenil (R=R’=H) são os elementos estruturais mais comuns. (b) Esquema de um tipo de
composto-modelo contendo o grupo funcional carbonila C=O (R=R’=H).
84
As ligninas estão presentes em muitas espécies vegetais, com teores que
variam de 15 a 36%, de acordo com a espécie, não possuindo a mesma estrutura
química em todas elas. Não deve portanto ser considerada como uma substância
química de estrutura molecular definida, mas sim como uma classe de materiais
correlatos, sendo uma importante fonte de carbono, hidrogênio e oxigênio, os quais
são seus principais constituintes. Devido à irregularidade estrutural e à grande
variedade de ligações químicas existentes na lignina, a descrição desta
macromolécula como uma simples combinação de poucos monômeros (unidades de
propano-fenol substituídas) parece ser impossível. Dessa forma, sua estrutura ainda
não é totalmente resolvida e está sujeita a estudos e investigações [23]. Várias
estruturas da lignina têm sido propostas, baseadas em resultados obtidos por técnicas
experimentais, tais como: etanólise, tioacetólise, produtos de hidrólise e oxidação,
determinação de grupos funcionais, análise comparativa de propriedades de lignina
nativa e de dehidropolímeros (DHP - construídos a partir da substituição de unidades
propano-fenólicas), dados espectroscópicos, tais como ressonância magnética nuclear
(NMR), espectroscopia de infravermelho, de ultravioleta e ainda resultados de
cromatografia em gás e gel e espectrometria de massa [23].
Embora haja uma grande variedade de unidades monoméricas como
compostos-modelo da lignina, nem todas as combinações e acoplamentos ocorrem
com igual probabilidade. Cálculos quantum-químicos realizados mostraram que a
distribuição de densidades eletrônicas favorece a ligação C-O-C do tipo éter [23]. Com
efeito, este é o tipo de ligação predominante em sua estrutura macromolecular.
4.3.2. A Lignocelulose
A questão da existência e da natureza de ligações químicas entre ligninas e
carboidratos em sistemas vegetais é de fundamental interesse industrial e tem sido
sujeita a muitos experimentos e especulações. Evidências espectroscópicas foram
aduzidas à ligação lignina-carboidrato, na qual a banda no espectro de infravermelho
próxima a 1710 cm-1 estava presente em um grande número de ligninas isoladas, mas
ausente nos espectros contendo vários tipos de madeira. Ligações do tipo acetal ou
hemiacetal estão presentes entre os grupos carbonila da lignina e os grupos hidroxila
dos polissacarídeos. Em ligninas isoladas, a ruptura desta ligação dá origem a grupos
β-aril do tipo encontrado na estrutura do guaiacil [22].
85
KOSHIJIMA et al. [24] demonstraram experimentalmente que complexos de
lignocarboidratos (CLC’s) consistem de cadeias de polissacarídeos com fragmentos
relativamente pequenos de lignina como ramificações laterais dos anéis de açúcar,
originando estruturas de alto peso molecular. A ligação entre carboidratos e lignina é
principalmente do tipo benzil-éter. Alguns dos CLC’s exibem uma forte tendência a
formar micelas ou agregados em solução aquosa devido às interações hidrofóbicas e
eletrostáticas.
A biomassa vegetal (seca) é constituída quase que integralmente de
lignocelulose, nome dado a um conjunto de três polímeros: celulose, hemicelulose
(formada principalmente de aldopentoses, entre as quais se destaca a poli-xilose) e
lignina (contendo várias funções químicas oxigenadas), os quais representam a fonte
renovável de carbono mais abundante da Terra. A habilidade da biosfera em produzir
quantidades vastas de compostos lignocelulósicos é, certamente, um dos fatores
responsáveis pela manutenção da vida no planeta.
FAULON et al. [25] propuseram um modelo teórico tridimensional baseado em
dinâmica molecular para a lignocelulose de gimnospermas, composto de celulose,
hemicelulose e lignina. De acordo com o modelo, as estruturas de lignina formam
ligações de hidrogênio com as cadeias de hemicelulose e celulose. As ligações de
hidrogênio estão presentes entre os radicais do grupo funcional álcool da lignina e das
diferentes unidades de açúcar (Fig. 4.12).
Figura 4.12. Quatro possíveis sítios para as ligações de hidrogênio entre lignina e
polissacarídeos, propostos por FAULON et al. [25] mediante investigações teóricas.
86
4.4. Estudos Experimentais na Literatura
Nesta seção serão feitas descrições experimentais acerca de estudos
referentes às estruturas de celulose e lignina disponíveis na literatura [1,2,3,26]. Tais
estudos serviram de base e pré-requisito para nossas investigações, tanto em nível de
comparação direta de resultados teóricos e experimentais já existentes, quanto de
averiguação de modelos e simulações propostos para estas biomoléculas.
4.4.1. Modelo para a Sorção de Cobre em Folhas Secas Usando Espectroscopia de Infravermelho
A biossorção, como citado anteriormente, é a capacidade de retenção de íons
metálicos de solução através de biomassa. O processo tem sido largamente
investigado, entretanto poucos estudos propõem modelos de sorção capazes de
explicar satisfatoriamente o fenômeno. FREITAS [1] e CARVALHO et al. [2,3] fizeram
estudos experimentais acerca dos sítios responsáveis pela sorção de cobre em folhas
secas de plantas típicas do cerrado brasileiro, usando as técnicas de Espectroscopia
de Absorção Atômica (AAS), Ressonância Paramagnética Eletrônica (EPR) e
Espectroscopia de infravermelho por transformada de Fourier (FTIR). De acordo com
os autores, o sitio de sorção poderia estar localizado próximo às fibras das
macromoléculas de celulose e lignina, uma vez que a rede fibrilar se mostrou mais
efetiva no processo sortivo do que a folha completa.
A seguir será feita uma descrição do estudo experimental mencionado acima,
baseado no trabalho de CARVALHO et al. [2]. Na seção 4.4.1.4, fazemos uma
discussão inicial acerca de alguns dos principais resultados obtidos pelos autores
neste trabalho, comparando-os com nossos resultados teóricos preliminares referentes
à investigação do sítio axial de sorção do cobre em celulose. De início, observamos
uma boa concordância entre os modos vibracionais experimentais atribuídos à
celulose, porém somente aqueles considerados na faixa de 880 a 1450 cm-1. Por outro
lado, a manifestação de alguns modos experimentais na faixa de 1525 a 1745 cm-1 se
opuseram aos nossos resultados e nos levaram a uma investigação mais detalhada a
este respeito, conduzindo-nos a um estudo posterior da molécula de lignina, conforme
será descrito posteriormente.
87
4.4.1.1. Preparação de Materiais e Métodos Experimentais Para o estudo da sorção de íons cobre, foram utilizadas soluções de CuSO4; as
amostras contendo a biomassa foram preparadas com folhas secas de alface (Lettuce
sativa) e palha de milho (Zea mays). Estas amostras ficaram expostas ao sol durante
quatro semanas e passaram por um processo de secagem a 35o C durante sete dias.
Em seguida, grãos de biomassa de ~ 1 mm foram novamente submetidos ao processo
de secagem numa temperatura de 70o C durante 24h e lavados em solução aquosa
de pH 4, usando solução de HCl diluído. Foram utilizados compostos químicos Aldrich
em todos os procedimentos laboratoriais.
Os experimentos de sorção foram feitos como descrito a seguir: 100 mg de
biomassa foram misturados com 50mL de solução de CuSO4, com concentrações de
Cu iniciais variando de 20 µg/mL a 200 µg/mL, numa solução de pH = 4. Após uma
hora de contato, a solução foi submetida a filtragem e a concentração de Cu final foi
determinada. As concentrações de Cu das soluções inicial e final foram determinadas
por AAS em um equipamento CG-AA-7000, seguindo os procedimentos tradicionais de
manipulação. As absorções relativas do metal ( ) foram determinadas a partir das
concentrações final ( ) e inicial ( ) de cobre, em uma solução de volume V com
uma biomassa de massa M:
q
fC iC
M
CCVq fi )( −= . (4.1)
Para cada tipo de biomassa em análise, os resultados foram ajustados usando
o modelo de sorção de Langmuir:
)1(
0
f
f
bCbCq
q+
= , (4.2)
em que q0 e b são os parâmetros característicos da isoterma de Lagmuir; q0
representa o valor de saturação de q para altas concentrações de equilíbrio e b
designa a afinidade do íon metálico pela estrutura da biomassa, definindo a inclinação
da isoterma para baixas concentrações de equilíbrio. Para medidas de EPR, amostras
de L. sativa carregadas com cobre foram submetidas à secagem e inseridas no
espectrômetro em tubos de quartzo. O espectro de Cu2+, incluindo a biomassa
pulverizada, foi simulado e comparado com o espectro obtido experimentalmente.
88
Para estudos de FTIR de amostras de L. sativa, tanto in natura quanto carregadas
com cobre, foram preparadas pastilhas de KBr como substrato.
4.4.1.2. Resultados
4.4.1.2.1. Isotermas de Sorção
A Fig. 4.13 mostra as isotermas de sorção construídas pelo ajuste de curvas do
tipo Langmuir aos valores de q medidos para L. sativa – alface (L) e Z. mays – palha
de milho (Z), comparadas com as curvas registradas para fibras de M. truncata –
espinheira santa (F) e folhas completas (C). A Tabela IV.1 mostra os valores ajustados
de q0 e b para as biomassas estudadas, bem como os coeficientes de correlação χ2
para as curvas ajustadas.
Figura 4.13. Isotermas de sorção para L. sativa (L - ), fibras de M. truncata (F - ▲), folhas
completas de M. truncata (C - X) e Z. mays (Z - ●) [2].
Tabela IV.1. Valores para q0, b e χ2 referentes às biomassas mostradas na Fig. 4.13 [2].
Biomassa q0 (mg/g) b (L/mg) χ2
L. sativa (L) 33 ± 1 0.22 ± 0.04 11 M. truncata (F - fibra) 26 ± 4 0.04 ± 0.02 10
M. truncata (C - folha completa) 21 ± 1 0.02 ± 0.03 9 Z. mays (Z) 6 ± 3 0.04 ± 0.01 7
89
Mediante análise dos resultados obtidos, CARVALHO et al. [2] concluíram que
a capacidade sortiva do íon metálico da espécie Z. mays era muito menor que a
capacidade sortiva de outras biomassas e que a amostra de L. sativa apresentava o
maior potencial sortivo. Com base em seus resultados, os autores então concluíram
que a celulose poderia ser a macromolécula responsável pela captura do metal em
folhas secas, uma vez que Z. mays é formada principalmente de lignina, ao passo que
L. sativa é principalmente composta de celulose.
4.4.1.2.2. Espectros de EPR
A Fig. 4.14 mostra o espectro de EPR para L. sativa carregada com cobre (A) e
o espectro obtido por simulação (B). Desses resultados, CARVALHO et al. [2]
concluíram que o íon Cu2+ estaria incorporado em um sítio da estrutura da biomassa
com simetria aproximadamente axial, com o íon centrado no eixo formado por dois
anéis de glicose paralelos.
Figura 4.14. Espectros de EPR experimental (A) e simulado (B) para a amostra de L. sativa
carregada com cobre [2].
90
4.4.1.2.3. Espectros de FTIR
A Fig. 4.15 mostra os espectros de absorção normalizados, referentes à
amostra de L. sativa natural (A) e carregada com cobre (B). Segundo CARVALHO et
al. [2], a presença do cobre modificaria a absorção no infravermelho da amostra na
região entre 800 cm-1 e 1800 cm-1. Esta região, ampliada e desconvoluída, é mostrada
na Fig. 4.16 (A: L. sativa natural e B: L. sativa carregada com cobre).
Figura 4.15. Espectros FTIR de absorção para amostras de L. sativa natural (A) e carregada
com cobre (B) [2].
Figura 4.16. Espectros FTIR de absorção e de deconvolução para amostras de L. sativa natural
(A) e carregada com cobre (B) [2].
Os autores atribuíram os picos de absorção mostrados na Fig. 4.16 a modos
vibracionais de ligações moleculares das ramificações dos anéis glicosídicos da
celulose, conforme mostrado na Tabela IV.2. De acordo com os autores, a presença
91
do cobre causaria mudanças nos seguintes picos: 8 e 9 (vibrações dos radicais -CH2);
2, 4 e 7 (modos vibracionais das ligações C-O) e 11 (vibrações do grupo OH). Dos
resultados obtidos, concluíram que nenhum pico de absorção seria criado ou
extinguido pela presença do cobre na biomassa, indicando que nenhuma ligação
molecular seria formada ou destruída em decorrência da sorção do íon metálico. Na
Tabela IV.3, são listadas as freqüências vibracionais referentes ao espectro de
absorção no infravermelho da amostra de L. sativa natural e carregada com cobre [1],
na região de 1300 a 1800 cm-1.
Tabela IV.2. Picos FTIR de absorção (referentes à Fig. 4.16) atribuídos a vibrações
moleculares da celulose [2].
Pico Freqüência (cm-1) Atribuição 1 880 Deformação C-H fora do plano 2 1010 Estiramento C-O acoplado aos modos do anel 3 1055 Estiramento C-O acoplado aos modos do anel 4 1120 Estiramento C-O acoplado aos modos do anel 5 1160 Estiramento C-O-C 6 1245 Estiramento C-O 7 1325 Respiração do anel com estiramento C-O 8 1385 Dobramento C-H 9 1450 Dobramento CH2 simétrico
10 1525 C=C em anéis aromáticos 11 1645 Estiramento C=C ou dobramento OH 12 1745 Estiramento C=O
Tabela IV.3. Freqüências experimentais (em cm-1) referentes à amostra de L. Sativa (alface),
rica em celulose, tanto natural quanto carregada com cobre, na região espectral ente 1300 e
1800 cm-1, extraídos da referência [1]. Amostra de L. sativa in
natura Amostra de L. sativa
contendo cobre 1245 1245 1330 1330 1373 1373 1413 1411 1430 1428 1459 1459 1527 1526 1609 1608 1666 1664 1739 1739
Entretanto, os autores ressaltaram que suas investigações estavam limitadas à
região do infravermelho médio (de 500 a 2000 cm-1). Assim sendo, os possíveis picos
de absorção originários de modos vibracionais de espécies iônicas, como é o caso do
cobre, localizados em regiões de baixas freqüências (abaixo de 500 cm-1), não
puderam ser observados.
92
4.4.1.3. Conclusões
As isotermas de sorção, os espectros de EPR e os espectros de absorção de
FTIR da biossorção de íons cobre em biomassas de L. sativa (alface) e Z. mays (palha
de milho), levaram os autores a concluírem que a celulose seria a molécula
responsável pela biossorção em folhas secas e que, após a sorção, o íon cobre
hidratado estaria localizado próximo a dois anéis de glicose da estrutura da celulose,
em um sítio com simetria axial da vizinhança, próximo à ramificação da glicose.
Folhas secas de alface se mostraram um material eficiente na biossorção
metálica e poderiam ser usadas em larga escala no tratamento de água contaminada
por metais pesados, devido ao seu baixo custo e à facilidade de aquisição, além de
constituírem um material orgânico não poluente.
4.4.1.4. Discussão Observamos que os picos 10, 11 e 12, listados na Tabela IV.2, são atribuídos
por CARVALHO et al. [2] aos grupos funcionais C=C e C=O da celulose, bem como
os picos em 1527, 1609, 1666 e 1739 cm-1, listados na Tabela IV.3 [1]. No entanto, de
acordo com as discussões feitas na seção 4.2, observamos que estes grupos
funcionais não pertencem à estrutura molecular da celulose e, conseqüentemente, os
modos vibracionais a eles associados não podem ser atribuídos a esta biomolécula.
De fato, tais grupos estão presentes na estrutura da molécula de lignina, que é
formada essencialmente por anéis aromáticos, contendo também o grupo carbonila
C=O em algumas de suas unidades monoméricas. Dessa forma, constatamos que as
análises dos resultados experimentais devem ser cautelosas na interpretação dos
espectros de amostras de biomassa vegetal, devido à associação intrínseca existente
entre a celulose e a lignina, como discutido anteriormente.
De acordo com os espectros de EPR obtidos, o íon cobre estaria localizado em
um sítio com forte simetria axial. A partir da análise dos espectros de FTIR, os autores
concluíram que a presença do íon cobre poderia afetar as ligações CH2, CO e OH da
celulose e que nenhuma ligação molecular seria criada ou destruída no processo
sortivo. Os grupos CH2 e OH estão presentes na ramificação do anéis glicosidicos e o
grupo CO é encontrado nos anéis de glicose da estrutura da celulose. As ligações OH
também poderiam advir de moléculas de H2O presentes na estrutura.
A fim de ajustarem as informações obtidas, os autores propuseram o modelo
mostrado na Fig. 4.17, em que o íon cobre, hidratado com 4 moléculas de água,
93
estaria localizado próximo a duas ramificações CH2-OH da celulose, de duas cadeias
glicosídicas diferentes ou da mesma cadeia. As ligações CO do anel de glicose
próximas à ramificação seriam também afetadas pela presença do íon metálico.
Em solução, os íons cobre seriam hidratados com 6 moléculas de água, em
uma simetria octaédrica; após a sorção na biomassa o íon perderia duas das
moléculas de H2O, situadas na posição axial, afim de se acomodar no interior da
estrutura da biomassa. As 4 moléculas de água remanescentes estariam localizadas
em um plano ortogonal ao eixo formado pelo cobre e pelas ramificações CH2-OH, o
que explicaria a simetria axial nas vizinhanças do íon cobre, identificada nos estudos
de EPR.
Figura 4.17. Modelo experimental proposto por CARVALHO et al. [2] para um possível sítio de
sorção do íon cobre após o processo de biossorção por L. sativa.
Nossos cálculos iniciais foram realizados na tentativa de reproduzir o modelo
proposto na Fig. 4.17 por CARVALHO et al. [2] para o sítio de sorção do cobre na
estrutura celulósica. Para isso, inicialmente fizemos optimizações parciais de
geometria (obtenção de comprimentos de ligação e ângulos de ligação interatômicos
de equilíbrio), empregando o método Hartree-Fock irrestrito (UHF), com o conjunto-
base 6-31G. As etapas deste cálculo foram as seguintes:
(1) optimização completa do átomo de cobre com 6 moléculas de H2O, dispostas em
um arranjo octaédrico, conforme mostrado na Fig. 4.18(a);
(2) optimização do monômero de celulose, saturado nas extremidades com radicais
metil, conforme representado na Fig. 4.18(b);
(3) aplicação da operação de inversão no monômero de celulose optimizado
(conforme mostrado na Fig.4.18c), que consistiu na transformação das coordenadas
94
(x, y, z) em (-x, -y, -z), a fim de reproduzir o modelo experimental proposto, no qual os
anéis de glicose paralelos são dispostos inversamente entre si;
(4) optimização da estrutura mostrada na Fig. 4.18(d), em que duas das moléculas de
H2O, anteriormente ligadas ao átomo de Cu na simetria octaédrica, foram substituídas
pelos dois monômeros de celulose previamente optimizados. Podemos observar que o
átomo de cobre está localizado próximo a duas ramificações CH2-OH dos dois
monômeros, conforme proposto pelo modelo.
(a) (b) (c)
(d)
Figura 4.18. (a) Representação da simetria octaédrica do átomo de Cu com 6 moléculas de
H2O, usada em nossas simulações; (b) Monômero de celulose optimizado, saturado com
radicais metil; (c) monômero de celulose optimizado, após a aplicação da operação de
inversão; (d) montagem final da conformação estrutural proposta experimentalmente. Os
átomos de C, O, H e Cu estão representados nas cores cinza, vermelha, branca e azul,
respectivamente.
Entretanto, após a execução desta forma de simulação, não obtivemos
resultados que corroborassem o modelo, uma vez que não houve convergência da
estrutura calculada para o ponto de energia mínima. A conformação estrutural do
sistema estudado não foi capaz de reproduzir teoricamente o modelo experimental
proposto e não atingiu as conformações da geometria de equilíbrio do sistema. A Fig.
95
4.19 representa a configuração não convergida da estrutura mostrada na Fig. 4.18(d)
após a execução de inúmeros ciclos auto-consistentes.
Figura 4.19. Configuração geométrica atingida pela estrutura proposta no modelo experimental
para o sítio de sorção do átomo de cobre em celulose, após a execução do cálculo auto-
consistente. Os átomos de C, O, H e Cu estão representados nas cores cinza, vermelha,
branca e azul, respectivamente.
Assim sendo, partimos para a investigação de novos possíveis sítios de sorção
do cobre na estrutura da molécula de celulose, tais como sítios de sorção do tipo
substitucional e intersticial, conforme será descrito na seção 4.5.
4.4.2. Espectros de FTIR por Derivada Segunda de Eucalyptus
regnans (Madeira Dura) e Pinus radiata (Madeira Mole)
4.4.2.1. Introdução
Nos espectros de infravermelho convencionais de amostras de madeira, as
bandas tendem a ser largas e fracamente resolvidas, mesmo quando registradas à
temperatura do nitrogênio líquido. Entretanto, a técnica de FTIR por derivada segunda
é capaz de proporcionar uma resolução espectral bastante eficaz. MICHELL e
HIGGINS [22] aplicaram este método no estudo de amostras de celulose provenientes
de algas, bactérias, algodão e madeira, verificando um aumento expressivo da
resolução.
Nesta seção, será descrito o trabalho experimental de MICHELL [26] no estudo
dos espectros de FTIR por derivada segunda em amostras de madeira dura,
96
Eucalyptus regnans, madeira mole, Pinus radiata e de seus constituintes (celulose,
polissacarídeos não-celulósicos e lignina). Os resultados experimentais obtidos por
MICHELL [26] para os modos vibracionais atribuídos às estruturas da celulose e da
lignina contribuíram enormemente para fins de comparação com nossos resultados
teóricos de caracterização espectroscópica destas biomoléculas.
Os estudos experimentais realizados mostraram que os espectros tornam-se
mais bem resolvidos que aqueles obtidos por técnicas convencionais de absorção
atômica. Além disso, contribuições de bandas das multicomponentes de vários grupos
funcionais constituintes são elucidadas mais facilmente. O número de bandas
observadas em espectros de infravermelho convencionais de madeiras é bastante
reduzido quando comparado ao número de diferentes grupos funcionais existentes e
seus possíveis modos normais de vibração. Isto se deve, pelo menos em parte, às
dificuldades na resolução da sobreposição de bandas originárias das vibrações dos
numerosos grupos OH e CH, que possuem freqüências de absorção bastante
próximas. Com o uso dos espectrômetros de FTIR, capazes de armazenar
computacionalmente as informações espectrais, as técnicas de derivação e
desconvolução foram facilitadas; a técnica da derivada segunda aumenta a resolução
de bandas nos espectros de FTIR. Assim, algumas das atribuições espectrais para
Eucalyptus regnans e Pinus radiata foram re-examinadas pelo autor, tendo em vista o
melhoramento da resolução.
4.4.2.2. Descrição Experimental
A amostra de lignina foi extraída das madeiras de Pinus radiata e Eucalyptus
regnans moídas. As amostras apresentaram a seguinte percentagem de composição
de carboidratos, respectivamente: (1) galacto-glucomanose - glicose: 10.2%; xilose:
3.1%; galactose: 4.6%; arabinose: 1.5%; manose: 26.8%; (2) arabino-4-O-metilglucoxilose - glicose: 0.9%; xilose: 29.0%; galactose: 2.0%; arabinose: 5.0% e
manose: 0.7%. Os espectros das amostras de madeira foram medidos tanto em fatias
finas de KCl como em pastilhas de KBr, com uma resolução de 4 cm-1.
4.4.2.3. Resultados e Discussão
4.4.2.3.1. Espectros de FTIR Convencionais
97
Os espectros de FTIR das duas amostras de madeira são comparados na Fig.
4.20. Pequenas diferenças podem ser discernidas entre os espectros nas regiões
entre 2700-3100 cm-1 e 3100-3800 cm-1 (Figs. 4.20B e 4.20A). Entretanto, diferenças
significativas são evidentes na região entre 1200-1800 cm-1 (Fig. 4.20C), que podem
estar associadas com bandas próximas a 1735, 1595, 1505, 1460, 1370, 1265 e 1240
cm-1. Diferenças adicionais são também evidentes em bandas próximas a 1120, 875,
835 e 810 cm-1 (Fig. 4.20D). Na região entre 500 – 800 cm-1 são observadas apenas
poucas diferenças (Fig. 4.20E).
Figura 4.20. Espectros de FTIR da madeira macia, Pinus radiata, (linha pontilhada) e da
madeira dura, Eucalyptus regnans, (linha contínua). Região A: 3100-3800 cm-1; região B: 2700-
3100 cm-1; região C: 1200-1800 cm-1; região D: 800-1200 cm-1e região E: 500-800 cm-1.
4.4.2.3.2. Espectros de FTIR por Derivada Segunda
A derivada segunda de perfis de banda nos espectros de infravermelho possui
uma estrutura de picos com resolução muito melhor do que o espectro original. Para
98
se comparar as bandas provenientes de espectros ordinários com aquelas obtidas por
métodos de derivada segunda, é necessário considerar que as alturas dos picos das
bandas no espectro derivativo dependem tanto das larguras quanto das alturas das
bandas originais. A Fig. 4.21 representa um dos espectros de FTIR obtidos por
derivada segunda, na região espectral entre 1200 e 1800 cm-1.
FREQÜÊNCIA (CM-1)
Figura 4.21. Espectros de FTIR por derivada segunda (região entre 1200 e 1800 cm-1) dos
componentes das madeiras. Madeira macia: (A) madeira; (B) celulose; (C)
galactoglucomanose; (D) arabino-4-O-metil glucoronoxilano; (E) lignina da madeira moída.
Madeira dura: (F) madeira; (G) celulose; (H) 4-O-metil glucoronoxilano; (I) lignina da madeira
moída.
99
A análise deste espectro forneceu uma série de informações detalhadas, que
não puderam ser identificadas no espectro convencional. Foi verificado, por exemplo,
que a banda próxima a 1730 cm-1, originária do estiramento C=O dos grupos acetil e
carboxila, está presente no espectro de ambas as madeiras (Figs. 4.21A e 4.21F) e no
espectro dos compostos arabino-4-O-metil-glucoronoxilano e 4-O-metil
glucoronoxilano (Figs. 4.21D e 4.21H).
Segundo MICHELL [26], a banda em 1600 cm-1, proveniente da vibração de
estiramento C=C na lignina, é muito mais fraca nos espectros da madeira macia do
que nos espectros da madeira dura (e em suas respectivas ligninas). A banda próxima
a 1510 cm-1, proveniente do estiramento C=C em anéis aromáticos, ocorre
similarmente nos espectros das ligninas dos dois tipos de madeira, mas os espectros
da madeira macia (e de sua lignina) mostram um dubleto próximo a 1470 e 1455 cm-1,
ao passo que os espectros da madeira dura (e sua lignina) mostram um pico simples
próximo a 1470 e um ombro na região próxima a 1447 cm-1. As bandas em 1470 cm-1
têm sido geralmente atribuídas à vibração de dobramento assimétrico nas ligações
dos grupos metil, mas há indicações de que sua origem seja mais complexa. As
bandas próximas a 1430 cm-1 nos espectros de ambas as madeiras têm contribuições
tanto de celuloses quanto de ligninas. A vibração da celulose é atribuída ao modo de
estiramento simétrico CH2 no grupo hidróxi-metil e a vibração da lignina é atribuída ao
estiramento C=C do anel aromático.
De acordo com os resultados obtidos [26], as principais contribuições das
bandas em 1380 cm-1 nos espectros das madeiras parecem vir das vibrações de
dobramento das ligações CH da celulose e de polissacarídeos não-celulósicos. Os
espectros das madeiras também diferem nas regiões próximas a 1330, 1270 e 1245
cm-1. A banda em 1330 cm-1 parece ser devida à absorção presente no espectro da
lignina da madeira dura, mas ausente no espectro da lignina da madeira macia. Foi
atribuído ao anel aromático da lignina um modo de respiração, com estiramento C-O,
referente aos compostos siringil. As bandas próximas a 1270 cm-1, no espectro da
madeira macia e 1245 cm-1, no espectro da madeira dura, são as componentes que
apresentam as maiores contribuições das ligninas e dos polissacarídeos não-
celulósicos. Estas bandas são provavelmente provenientes das vibrações de
estiramento C-O na lignina e nos grupos acetil e carbonila dos polissacarídeos.
Observamos que as bandas em 1510, 1600 e 1730 cm-1 identificadas e
atribuídas por MICHELL [26] ao estiramento da ligações C=C, C=C e C=O,
respectivamente, são associadas aos grupos funcionais existentes na estrutura da
lignina. Tais resultados estão em concordância com nossas considerações anteriores,
baseadas na literatura [21], descritas na seção 4.3, bem como com nossos resultados
100
teóricos (conforme veremos na seção 4.5); estão, entretanto, em desacordo com os
picos 10, 11 e 12, listados na Tabela IV.2 e os picos em 1527, 1609, 1666 e 1739 cm-1,
listados na Tabela IV.3, que foram atribuídos à molécula de celulose. Conforme
discutido anteriormente, esta molécula não apresenta grupos funcionais do tipo C=C e
C=O.
Uma descrição detalhada de cada uma das demais regiões espectrais
mostradas na Fig. 4.20 é feita por MICHELL [26], nas quais os espectros, as
freqüências e os modos normais de vibração dos vários grupos funcionais presentes
nas amostras são identificados e atribuídos a compostos tais como celulose, lignina e
polissacarídeos não-celulósicos presentes na composição das madeiras analisadas.
4.4.2.4. Conclusão
MICHELL [26] concluiu que o uso da derivada segunda para o estudo dos
espectros de FTIR de madeiras é capaz de fornecer bandas com maior e melhor
resolução do que aquelas obtidas no caso de espectros ordinários. Este aspecto se
torna particularmente útil em uma região como a do estiramento CH, na qual
previamente apenas poucas informações estavam disponíveis, devido à falta de
resolução das bandas. Os espectros mais detalhados são mais eficazes para
evidenciar a natureza das contribuições dos componentes da madeira no espectro
total da amostra.
101
4.5. Estudo Teórico
Nesta seção, apresentamos nossos estudos teóricos ab initio, resultantes da
investigação das biomoléculas de celulose e lignina, enfatizando a análise dos sítios e
mecanismos de sorção do cobre nestas estruturas. Fazemos uma análise das
propriedades estruturais e vibracionais das unidades monoméricas constituintes
dessas moléculas, tanto puras como contendo cobre; obtemos os espectros
vibracionais Raman e de infravermelho e comparamos nossos resultados com dados
teóricos e experimentais disponíveis na literatura.
4.5.1. Resultados, Análise e Discussão
4.5.1.1. Propriedades Estruturais: Celulose Pura e Contendo Cobre A estrutura-modelo da molécula de celulose que serviu de ponto de partida
para a construção das estruturas usadas em nossas simulações é mostrada na Fig.
4.22. A unidade monomérica da molécula de celulose, a β-D-glicose, foi calculada
teoricamente considerando dois tipos de saturação. No primeiro caso, as ligações
pendentes (“dangling bonds”) foram saturadas com átomos de hidrogênio (Fig. 4.23a);
no segundo caso, a saturação das extremidades do monômero foi feita por radicais
metil (CH3), conforme está evidenciado na Fig. 4.23b. Um outro tipo de simulação
considerada foi a estrutura do dímero de celulose, formado por duas unidades
monoméricas de β-D-glicose, unidas entre si por uma ligação glicosídica do tipo
β(1→4) (Fig. 4.23c).
Figura 4.22. Fragmento da cadeia celulósica que serviu de ponto de partida para nossas
simulações, evidenciando as ligações glicosídicas do tipo β(1→4), características da estrutura
conformacional. Os átomos de C, O e H estão representados por esferas nas cores cinza, preta
e branca, respectivamente.
102
Os monômeros de celulose sem cobre, representados nas Figs. 4.23a e 4.23b
foram calculados pelos métodos Hartree-Fock restrito (RHF), utilizando o conjunto-
base 6-311G**; para o dímero da Fig. 4.23(c), empregamos método RHF no conjunto-
base 6-31G, permitindo a relaxação completa de todas as estruturas, de modo a
minimizar a energia total. Todos os comprimentos de ligação e ângulos de ligação
interatômicos foram optimizados. A Tabela IV.4 mostra alguns dos parâmetros
geométricos obtidos após o processo de optimização das estruturas moleculares, em
conexão com a notação dada na Fig. 4.23. Os dados experimentais listados na última
coluna da Tabela IV.4 se referem a valores típicos atribuídos a pequenas moléculas
que contêm os grupos funcionais listados na primeira coluna, extraídos na literatura
[4].
Figura 4.23. Estruturas moleculares de compostos celulósicos. Os átomos de C, O, e H estão
representados por esferas nas cores cinza, preta e branca, respectivamente. (a) Monômero de
celulose saturado nas extremidades com átomos de hidrogênio. (b) Monômero de celulose
saturado nas extremidades com radicais metil (CH3). (c) Dímero de celulose saturado com
radicais metil.
Tabela IV.4. Comprimentos de ligação (em Å) e ângulos de ligação (em graus) referentes às
estruturas celulósicas mostradas na Fig. 4.23. Os valores experimentais mostrados na última
coluna se referem a valores típicos da literatura [4], atribuídos a pequenas moléculas que
contêm os grupos funcionais listados na primeira coluna.
Parâmetros
Monômero (Fig. 4.23a)
Monômero (Fig. 4.23b)
Dímero (Fig. 4.23c)
Dados experimentais [4]
d(C1-O2) 1.402 1.400 1.394 1.421 d(O2-C8) 1.403 1.398 - 1.421 d(O2-C4) - - 1.444 1.421 d(O3-H4) 0.942 - - 0.958 d(C3-H4) - 1.081 - 1.092 d(C3-H8) - - 1.077 1.092 d(O5-H6) 0.942 0.942 0.953 0.958 d(C1-C7) 1.531 1.531 - 1.531 d(C7-C9) 1.518 1.525 1.519 1.531
<C1-O2-C8 116.28o 115.04o - 114.80o
<C1-O2-C4 - - 124.09o - <C1-C7-C9 109.22o 109.69o 110.82o 110.80o
<C9-O5-H6 109.41o 109.53o 112.86o 108.00o
103
Reações entre o átomo de cobre e compostos orgânicos de natureza
bioquímica, como os carboidratos, têm sido largamente investigadas. Como já
mencionado, uma das características intrínsecas dos compostos polissacarídicos é a
presença de várias ligações de hidrogênio intramoleculares. BOUTREAU et al. [27]
estudaram a interação entre o monocátion Cu+ e o anel de α-D-glicose, através do
método teórico ab initio da Teoria do Funcional da Densidade (DFT), usando o
funcional B3LYP no conjunto-base 6-31G(d,p) e verificaram que estas ligações são
capazes de influenciar significativamente a estabilidade relativa dos complexos
formados, bem como sua capacidade de interagir com outros sistemas, dependendo
das cargas induzidas pela associação com o cátion metálico.
Em nossas investigações, verificamos que estas interações são seguidas por
uma drástica reorganização da densidade eletrônica do sistema. Estas redistribuições
nas densidades de carga usualmente se refletem em processos de ativação ou reforço
das ligações de hidrogênio. As perturbações causadas pelo cátion Cu+ quando o
sistema apresenta uma ou mais ligações de hidrogênio intramoleculares são
particularmente interessantes. Observamos um enfraquecimento da ligação quando o
metal se fixa ao átomo ligante mais eletronegativo na estrutura do anel. Além disso,
para átomos muito eletronegativos, esta fixação pode conduzir, no limite, a uma
ruptura da ligação química. Por outro lado, quando a fixação do cátion se dá no átomo
ligante menos eletronegativo, as ligações se tornam mais fortes. Este comportamento
se deve principalmente à baixa estabilidade das ligações de hidrogênio
intramoleculares das espécies protonadas com relação ao composto puro. Diversos
monocátions, em particular metais de transição, podem apresentar efeitos similares.
Com base nas idéias propostas por BOUTREAU et al. [27], estudamos a
inserção do átomo de cobre nos monômeros de celulose representados nas Figs.
4.23a e 4.23b. Investigamos dois possíveis sítios de sorção do metal, conforme
representado na Fig. 4.24. O primeiro caso consistiu na substituição de um átomo de
hidrogênio do monômero da Fig. 4.23b, H6, pelo átomo de cobre, Cu6, representado
na Fig. 4.24a. No segundo caso, estudamos o átomo de cobre, Cu10, num sítio em que
este afetava as ligações de hidrogênio intramoleculares, existentes naturalmente nas
estruturas dos açúcares (Fig. 4.24b).
A Tabela IV.5 lista os valores calculados para os mesmos parâmetros
geométricos mostrados na Tabela IV.4 (comprimentos de ligação e ângulos de ligação
interatômicos) para as unidades monoméricas da celulose na presença do cobre, em
conexão com a notação dada na Fig. 4.24.
104
Figura 4.24. Estruturas monoméricas da molécula de celulose contendo cobre, usadas nas
simulações. Os átomos de C, Cu, O e H estão representados por esferas nas cores cinza
escura, cinza clara, preta e branca, respectivamente. (a) Monômero de celulose saturado nas
extremidades com radicais metil, em que o átomo de cobre Cu6 ocupa um sítio substitucional
ao hidrogênio H6 do grupo hidroxila. (b) Monômero de celulose, saturado nas extremidades
com átomos de hidrogênio, em que o átomo de cobre Cu10 afeta as ligações de hidrogênio
intramoleculares presentes na estrutura.
Tabela IV.5. Comprimentos de ligação (em Å) e ângulos de ligação (em graus) referentes aos
monômeros de celulose contendo cobre, mostrados na Fig. 4.24.
Parâmetros
Monômero de Celulose (Fig. 4.24a)
Monômero de Celulose (Fig. 4.24b)
d(C1-O2) 1.401 1.435 d(O2-C8) 1.402 1.440 d(O3-H4) - 0.949 d(C3-H4) 1.082 -
d(O3-Cu10) - 3.659 d(Cu10-O11) - 2.434
d(O5-H6) - 0.947 d(O5-Cu6) 1.877 - d(C1-C7) 1.531 1.522 d(C7-C9) 1.530 1.514
<C1-O2-C8 115.49o 116.41o
<C1-C7-C9 110.94o 108.85o
<C9-O5-H6 - 112.18o
<C9-O5-Cu6 118.39o -
Como mostrado na Fig. 4.24a, um possível sítio de sorção do átomo de cobre
na estrutura da celulose é aquele formado pela substituição do átomo de hidrogênio H6
do grupo O5-H6 (Fig. 4.23b) pelo átomo de cobre Cu6 (Fig. 4.24a). As alterações
causadas por esta substituição são refletidas no comprimento de ligação d(O5-H6), que
no monômero mostrado na Fig. 4.23(b) vale 0.942 Å. Este parâmetro obviamentesofre
um aumento de 0.935 Å (99.26%) quando o átomo de cobre Cu6 é introduzido na
105
estrutura. Da mesma forma, o ângulo de ligação <C9-O5-H6, cujo valor é 109.53o no
monômero da Fig. 4.23b, aumenta de 8.86o (8.09%) devido à presença do cobre (Fig.
4.24a). Neste sítio de sorção, as alterações conformacionais da estrutura monomérica
foram alteradas localmente nas proximidades do sitio substitucional, afetando muito
pouco os demais sítios da molécula, conforme pode ser evidenciado pela análise dos
dados contidos nas Tabelas IV.4 e IV.5.
Como ilustrado na Fig. 4.24(b), outro possível sítio de sorção do átomo de
cobre origina um complexo formado pelo monômero de celulose, no qual o metal foi
introduzido de modo a afetar as ligações de hidrogênio intramoleculares existentes no
composto. Isso pode ser visto como o resultado da interação entre o átomo de cobre
Cu10 e o oxigênio O2 da estrutura, seguido por uma mudança conformacional no grupo
CH2OH ligado ao oxigênio O1, a fim de favorecer a formação de um quelato, no qual o
metal interage simultaneamente com os dois átomos de oxigênio (O3 e O11) dos
grupos hidroxila vizinhos (O3-H4 e O11-H12). Um efeito similar foi também observado
por BOUTREAU et al. [27], em concordância com nossos resultados.
O posicionamento do átomo de cobre Cu10 próximo ao oxigênio cíclico O2 do
monômero implica numa rotação interna do grupo O11-H12 (correspondendo ao grupo
O10-H11 na Fig. 4.23a), de modo a evitar a interação repulsiva entre o hidrogênio
positivamente carregado H12 (que corresponde ao hidrogênio H11 na Fig. 4.23a) e o
metal. Este comportamento pode ser explicado pela presença do cobre, que ocasiona
baixa estabilidade às ligações de hidrogênio intramoleculares. A mudança
conformacional da estrutura também favorece uma estabilização na interação entre o
cobre Cu10 e os átomos de oxigênio negativamente carregados O3 e O11 (Fig. 4.24b),
cujos comprimentos de ligação calculados d(O3-Cu10) e d(Cu10-O11) valem,
respectivamente, 3.659 Å e 2.434 Å, conforme mostrado na Tabela IV.5.
A conseqüência mais importante é que a ligação de hidrogênio O10-H11...O2 no
monômero da Fig. 4.23a é destruída, ao passo que as demais ligações de hidrogênio
intramoleculares do complexo, embora preservadas, são perturbadas. Os
comprimentos de ligação d(C1-O2) e d(O2-C8), no monômero da Fig. 4.23a, aumentam
de 0.03 Å (2.14%) e 0.04 Å (2.85%), respectivamente, quando o cobre é introduzido na
estrutura (Fig. 4.24b). Pode-se notar ainda que os comprimentos de ligação d(C1-C7) e
d(C7-C9) sofrem um decréscimo de 0.009 Å (0.59%) e 0.004 Å (0.26%), devido à
presença do cobre, ao passo que o ângulo de ligação <C1-O2-C8 praticamente não é
modificado. Todavia, o ângulo de ligação <C9-O5-H6 sofre um aumento de 2.77o
(2.53%) quando o cobre é introduzido na estrutura. Portanto, a presença do cobre na
estrutura monomérica da celulose, afetando as ligações de hidrogênio
106
intramoleculares, é capaz de provocar um maior número de alterações
conformacionais no monômero ao longo de todo o arranjo da molécula.
Na estrutura do dímero representado na Fig. 4.23c, o ângulo de ligação <C1-
O2-C4 vale 124.09o e os comprimentos de ligação d(C1-O2) e d(O2-C4) valem 1.394 Å e
1.444 Å, respectivamente, em boa concordância com os valores experimentais
disponíveis na literatura [4]. Estes parâmetros caracterizam a ligação β(1→4), típica
das cadeias celulósicas. A Tabela IV.6 traz uma comparação entre nossos resultados e os valores
teóricos obtidos por BOUTREAU et al. [27], especificamente para os comprimentos de
ligação O-H do monômero de celulose saturado com hidrogênios, tanto puro como
contendo cobre no sítio intersticial. A notação utilizada na Tabela IV.6 é dada de
acordo com o esquema da Fig. 4.25. É importante salientar que nossos cálculos foram
realizados empregando o conjunto-base triple-zeta 6-311G**, ao passo que
BOUTREAU et al. [27] empregaram uma base double-zeta do tipo 6-31G.
Tabela IV.6. Comprimentos de ligação O-H (em Å) dos monômeros de celulose saturados com
átomos de hidrogênio, mostrados na Fig. 4.25, tanto puros como contendo corbre, comparados
com valores teóricos disponíveis na literatura [27].
Ligação Monômero puro (Fig. 4.25a)
Monômero com Cu (Fig. 4.25b)
Monômero puro [27]
Monômero com Cu [27]
O2-H2 0.9421 0.9489 0.9746 0.9840 O3-H3 0.9423 0.9480 0.9703 0.9713 O4-H4 0.9422 0.9473 0.9707 0.9704 O5-H5 0.9430 0.9462 0.9715 0.9707 O6-H6 0.9398 0.9465 0.9715 0.9710
(a) (b)
Figura 4.25. Esquema das estruturas optimizadas do monômero de celulose saturado com
hidrogênios. (a) Puro; (b) contendo cobre num sítio intersticial. Os átomos de C, Cu, O e H são
representados por esferas nas cores cinza escura, cinza clara, preta e branca,
respectivamente.
107
De acordo com nossos resultados, os comprimentos de ligação O2-H2, O3-H3,
O4-H4, O5-H5 e O6-H6, listados na Tabela IV.6, sofrem um aumento de 0.0068 Å
(0.72%), 0.0057 Å (0.60%), 0.0051 Å (0.54%), 0.0032 Å (0.34%) e 0.0067 Å (0.71%),
respectivamente, quando o cobre é inserido na estrutura do monômero. Verificamos
que os comprimentos de ligação O-H que sofrem maior alteração são O2-H2 e O6-H6,
exatamente aqueles localizados nas proximidades do sítio intersticial do cobre.
Comparando nossos resultados com os valores obtidos por BOUTREAU et al. [27],
não verificamos a mesma tendência. Em seus cálculos, apenas os comprimentos de
ligação O2-H2 e O3-H3 aumentam de 0.0094 Å (0.96%) e 0.0010 Å (0.10%),
respectivamente; ao passo que os comprimentos de ligação O4-H4, O5-H5 e O6-H6
sofrem decréscimos de 0.0003 Å (0.03%), 0.0008 Å (0.08%) e 0.0005 Å (0.05%),
respectivamente, quando o cobre é inserido na estrutura do anel celulósico.
A Tabela IV.7 lista as energias totais para as seguintes unidades monoméricas:
Fig. 4.23a), que representa o monômero de celulose puro, com saturação de
hidrogênio; Fig. 4.23b), que representa o monômero puro, com saturação de radicais
metil; Fig. 4.24a), que traz o monômero de celulose com o cobre num sítio
substitucional (saturação de radicais metil); Fig. 4.24b), representando o monômero
com o cobre num sítio intersticial (saturação de hidrogênio).
Tabela IV.7. Energias totais (em eV) calculadas para os monômeros de celulose, tanto puros
como contendo cobre em suas estruturas.
Unidade Monomérica ERHF (104 eV) EUHF (104 eV) Monômero puro (saturação de H) -1.860 - Monômero puro (saturação de CH3) -2.072 - Monômero com Cu (sítio intersticial) - -6.319 Monômero com Cu (sítio substitucional) - -6.530
4.5.1.2. Propriedades Estruturais: Lignina Pura e Contendo Cobre
Simulamos quatro tipos de unidades monoméricas, também denominadas
moléculas-modelo, que compõem a estrutura da lignina, representadas na Fig. 4.26.
São elas: guaiacil (Fig. 4.26a), siringil (Fig. 4.26b), para-hidróxi-fenil (Fig. 4.26c) e a
molécula-modelo contendo o grupo carbonila C=O (Fig. 4.26d), com base em modelos
propostos na literatura [19,24,25]. Todas as estruturas estudadas foram optimizadas
usando o método Hartree-Fock irrestrito (UHF), com o conjunto- base 6-311G**.
108
Figura 4.26. Representação das unidades monoméricas da molécula de lignina. (a) Guaiacil;
(b) siringil; (c) para-hidróxi fenil; (d) molécula-modelo contendo o grupo carbonila C=O. Os
átomos de C, O e H estão representados por esferas nas cores cinza, preta e branca,
respectivamente.
Na Tabela IV.8 mostramos alguns parâmetros geométricos (comprimentos de
ligação e ângulos de ligação interatômicos) obtidos após o processo de minimização
da energia total, em conexão com a notação dada na Fig. 4.26. No caso das unidades
monoméricas constituintes da lignina, analisamos o sítio substitucional do átomo de
cobre, conforme representado na Fig. 4.27. Na Tabela IV.9 estão listados os valores
dos mesmos parâmetros geométricos mostrados na Tabela IV.8 (comprimentos de
ligação e ângulos de ligação interatômicos) para as quatro unidades monoméricas da
lignina, na presença de cobre, em conexão com a notação dada na Fig. 4.27.
Tabela IV.8. Comprimentos de ligação (em Å) e ângulos de ligação (em graus) para as
unidades monoméricas da lignina mostradas na Figura 4.26.
Parâmetros
Guaiacil (Fig. 4.26a)
Siringil (Fig. 4.26b)
P-hidróxi fenil (Fig. 4.26c)
Molécula-modelo com C=O (Fig. 4.26d)
d(C1-C2) 1.383 1.390 1.384 1.392 d(C2-C3) 1.386 1.377 1.382 1.378 d(C2-O4) 1.379 1.374 1.378 1.363 d(O4-H5) 0.946 0.948 0.946 0.948 d(O6-H7) 0.947 0.947 0.947 - d(C6-O7) - - - 1.222 d(C1-O8) - 1.380 - 1.381 d(H5-O8) - 2.143 - 2.170
<C1-C2-C3 119.68o 119.33o 120.28o 120.09o
<C2-O4-H5 114.07o 111.46o 114.46o 112.57o
<C2-C1-O8 - 113.42o - 113.92o
<C3-C2-O4 117.96o 120.64o 117.19o 119.72o
<O4-H5-O8 - 110.36o - 109.24o
109
Na unidade guaiacil (Fig. 4.27a), a inserção do átomo de cobre Cu7,
substitucional ao átomo de hidrogênio H7 (Fig. 4.26a) ocasiona um aumento de 0.911
Å (96.20%) ao comprimento de ligação d(O6-H7), referente ao composto sem cobre.
Os comprimentos de ligação d(O4-H5) nas estruturas siringil, para-hidróxi-fenil e
na molécula-modelo contendo C=O obviamente aumentam de 0.998 Å (105.27%),
0.922 Å (97.46%) e 1.014 Å (106.96%), respectivamente, devido à substituição do
átomo de hidrogênio H5 (Fig. 4.26) pelo átomo de cobre Cu5 (Fig. 4.27). Nestas
mesmas estruturas, os ângulos de ligação <C2-O4-H5 também sofrem um aumento de
3.24o (2.88%), 14.99o (13.09%) e 0.57o (0.51%), respectivamente.
Por outro lado, os ângulos <O4-H5-O8 nas estruturas do siringil (Fig. 4.27b) e da
molécula-modelo com C=O (Fig. 4.27d) diminuem de 29.44o (26.68%) e 29.94o
(27.41%), respectivamente, quando o hidrogênio H5 é substituído pelo cobre Cu5.
Nenhuma modificação significativa é observada nos demais parâmetros geométricos
das estruturas analisadas, conforme pode ser constatado pelos valores listados nas
Tabelas IV.8 e IV.9, evidenciando, portanto, que a inserção do átomo de cobre num
sítio substitucional perturba as estruturas moleculares localmente, alterando muito
pouco o restante da conformação estrutural. Este mesmo comportamento foi verificado
nos compostos celulósicos estudados na seção anterior.
Figura 4.27. Representação das unidades monoméricas da molécula de lignina contendo
cobre. (a) Guaiacil; (b) siringil; (c) para-hidróxi fenil; (d) molécula-modelo contendo o grupo
carbonila C=O. Os átomos de C, Cu, O e H estão representados por esferas nas cores cinza
escura, cinza clara, preta e branca, respectivamente.
Tabela IV.9. Comprimentos de ligação (em Å) e ângulos de ligação (em graus) para as
unidades monoméricas da lignina contendo cobre, mostradas na Fig. 4.27.
Parâmetros Guaiacil
(Fig. 4.27a) Siringil
(Fig. 4.27b) P-hidróxi fenil (Fig. 4.27c)
Molécula-modelo com C=O (Fig. 4.27d)
d(C1-C2) 1.383 1.408 1.401 1.410
110
Tabela IV.9. (continuação) d(C2-C3) 1.386 1.400 1.400 1.407 d(C2-O4) 1.383 1.330 1.333 1.314 d(O4-H5) 0.946 - - -
d(O4-Cu5) - 1.946 1.868 1.962 d(O6-H7) - 0.947 0.947 -
d (O6-Cu7) 1.858 - - - d(C1-O8) - 1.413 - 1.413 d(C6-O7) - - - 1.227
d(Cu5-O8) - 2.230 - 2.305 <C1-C2-C3 119.54o 115.41o 117.21o 116.14o
<C2-O4-H5 113.63o - - - <C2-O4-Cu5 - 114.70o 129.45o 113.14o
<C2-C1-O8 - 114.85o - 117.13o
<C3-C2-O4 118.06o 122.24o 120.45o 122.78o
<O4-Cu5-O8 - 80.92o - 79.30o
Na Tabela IV.10, listamos as energias totais para as seguintes unidades
monoméricas da lignina, tanto puras (Fig. 4.26) como contendo cobre (Fig. 4.27): para-
hidróxi-fenil, guaiacil, siringil e a molécula-modelo contendo C=O.
Tabela IV.10. Energias totais (em eV) calculadas para os monômeros de lignina, tanto puros
como contendo cobre em suas estruturas.
Unidade Monomérica ERHF (104 eV) EUHF (104 eV) Para-hidróxi-fenil (puro) -1.557 - Para-hidróxi-fenil (com Cu) - -6.015 Guaiacil (puro) -1.867 - Guaiacil (com Cu) - -6.325 Siringil (puro) -2.177 - Siringil (com Cu) - -6.635 Molécula-modelo contendo C=O (pura) -1.554 - Molécula-modelo contendo C=O (com Cu) - -6.012
4.5.1.3. Propriedades Vibracionais: Celulose Pura e Contendo Cobre A Tabela IV.11 traz uma comparação entre nossos resultados e os valores
teóricos obtidos por BOUTREAU et al. [27], especificamente para as freqüências
vibracionais de estiramento dos grupos O-H do monômero de celulose saturado com
hidrogênios, tanto puro como contendo cobre no sítio intersticial. A notação
considerada na Tabela IV.11 é mesma adotada no esquema da Fig. 4.25.
De acordo com nossos resultados, verificamos uma diminuição das freqüências
vibracionais de estiramento dos grupos O-H do monômero quando o cobre é inserido
na estrutura. Os modos normais atribuídos às ligações O2-H2, O3-H3, O4-H4, O5-H5 e O6-
111
H6 listadas na Tabela IV.11 são reduzidos de 96 cm-1 (2.60%), 112 cm-1 (3.00%), 75
cm-1 (2.02%), 90 cm-1 (2.43%) e 79 cm-1 (2.14%) devido à presença do cobre.
Comparando nossos resultados com os valores obtidos por BOUTREAU et al. [27],
não verificamos o mesmo comportamento. Em seus cálculos, ocorre uma diminuição
nas freqüências vibracionais de estiramento das ligações O2-H2, O3-H3 e O5-H5 de 140
cm-1 (3.80%), 5 cm-1 (0.13%) e 10 cm-1 (0.27%), respectivamente. Já as ligações O4-H4
e O6-H6 têm suas freqüências de estiramento aumentadas de 13 cm-1 (0.35%) e 16 cm-
1 (0.43%), respectivamente, devido à presença do cobre na estrutura do monômero.
Tabela IV.11. Freqüências vibracionais de estiramento (em cm-1) do monômero de celulose
saturado com átomos de hidrogênio, mostrado na Fig. 4.25, tanto puro como contendo cobre,
comparados com os valores teóricos disponíveis na literatura [27].
Ligação Monômero puro
(Fig. 4.25a)
Monômero com Cu
(Fig. 4.25b)
Monômero puro [27]
Monômero com Cu [27]
O2-H2 3687 3591 3681 3541 O3-H3 3731 3619 3745 3740 O4-H4 3704 3629 3742 3755 O5-H5 3702 3612 3732 3722 O6-H6 3700 3621 3727 3743
Nas Tabelas IV.12 e IV.13 estão listados alguns modos normais de vibração
atribuídos às estruturas dos monômeros e dímeros da molécula de celulose mostrados
nas Figs. 4.23 e 4.24, respectivamente, comparados aos dados teóricos e
experimentais disponíveis na literatura.
Tabela IV.12. Modos normais de vibração (em cm-1) calculados para as estruturas celulósicas
mostradas na Fig. 4.23, comparados com os valores experimentais propostos na literatura [22].
Monômero (Fig. 4.23a)
Monômero (Fig. 4.23b)
Dímero (Fig. 4.23c)
Dados Experimentais
[22]
Nossas Atribuições
880 881 871 880 Deformação C-H fora do plano 964 961 971 965 Estiramento C-O 973 989 995 998 Estiramento C-O 1000 1027 1001 1010 Estiramento C-O acoplado 1035 1041 1041 1032 Estiramento C-O 1051 1055 1056 1055 Estiramento C-O acoplado 1123 1123 1123 1120 Estiramento C-O acoplado 1159 1163 1162 1160 Estiramento C-O 1225 1237 1243 1245 Estiramento C-O 1322 1337 1321 1325 Resp. do anel com estiram. C-O 1378 1372 1371 1371 Dobramento C-H 1385 1382 1384 1385 Dobramento C-H
112
Tabela IV.12. (continuação) 1428 1423 1423 1428 Dobramento CH21442 1446 1443 1450 Dobramento CH2 simétrico 2869 2884 2887 2894 Estiramento C-H
- 2914 2947 2935 Estiramento anti-simétrico CH2- - 2968 2967 Estiramento C-H - - 2974 2985 Estiramento C-H
3687 3694 3471 3475 Estiramento O-H
Tabela IV.13. Alguns modos normais de vibração (em cm-1) calculados para as estruturas
celulósicas contendo cobre, mostradas na Fig. 4.24, comparados com os valores experimentais
propostos na literatura para amostras de fibras de L. sativa (alface), tanto pura como contendo
cobre [1].
Monômero da Fig. 4.24(a)
Monômero da Fig. 4.24(b)
Dados experimentais (amostra com Cu) [1]
Dados experimentais (amostra in natura) [1]
1243 1232 1245 1245 1334 1336 1330 1330 1370 1379 1373 1373 1420 1406 1411 1413 1431 1424 1428 1430 1458 1484 1459 1459
Observando os valores listados na Tabela IV.12, verificamos que para todas as
estruturas celulósicas analisadas, os espectros vibracionais obtidos apresentaram uma
ausência de picos na faixa entre 1442 e 2869 cm-1. MICHELL e HIGGINS [22]
constataram experimentalmente esta faixa espectral ausente, de 1450 a 2894 cm-1,
conforme mostrado nesta tabela. Por comparação entre os modos vibracionais
atribuídos aos monômeros das Figs. 4.23(a) e 4.23(b), concluímos que o tipo de
saturação das ligações pendentes (com átomos de hidrogênio ou radicais metil) não
foi capaz de causar alterações significativas nos valores das freqüências calculadas.
Estes valores também não apresentaram variações expressivas quando calculados
considerando monômeros ou dímeros de celulose, conforme pode ser evidenciado se
compararmos os valores da Tabela IV.12 entre os monômeros e o dímero. Portanto,
de acordo com os resultados obtidos, concluímos que esta faixa espectral ausente não
pode ser atribuída nem ao tamanho da cadeia celulósica nem ao tipo de saturação
aplicado nas simulações das estruturas.
Esta faixa espectral ausente pode então ser justificada, considerando a
inexistência de grupos funcionais nas cadeias celulósicas, capazes de originar modos
vibracionais com freqüências localizadas nesta região do espectro. Picos incluídos
nesta região podem ser atribuídos, por exemplo, a grupos funcionais presentes na
molécula de lignina que, como já discutido anteriormente, se ligam fortemente à
113
celulose, formando uma matriz de propriedades cimentantes e, portanto, presente nos
espectros experimentais em que se consideram amostras de biomassa vegetal.
Os dados listados na Tabela IV.13 mostram que a presença do cobre altera
muito pouco os valores das freqüências vibracionais dos monômeros de celulose na
região espectral considerada, entre ~ 1232 e 1484 cm-1.
A sorção de cobre nos monômeros de celulose, tanto substitucional ao átomo
de hidrogênio dos grupos hidroxila (Fig. 4.24a) quanto afetando as ligações de
hidrogênio intramoleculares, (Fig. 4.24b), é efetivamente responsável apenas pela
manifestação de modos vibracionais de baixas freqüências, como pode ser notado na
Tabela IV.14. Estes modos não foram detectados pelos equipamentos de FTIR usados
nos trabalhos de CARVALHO et al. [2,3], uma vez que foram limitados à região do
infravermelho médio, de 500 a 2000 cm-1.
Notamos que a presença do átomo de cobre é efetivamente responsável tanto
pelo aparecimento de novos modos vibracionais, quanto pela supressão de alguns
modos existentes antes de sua inserção nas estruturas moleculares dos monômeros
puros. Por exemplo, para o monômero de celulose com cobre (Fig. 4.24a), os picos
calculados em 31, 57, 78, 132, 173, 206, 277, 301, 381, 448 e 472 cm-1 não aparecem
no monômero puro da Fig. 4.23(b). Similarmente, para o monômero de celulose com
cobre mostrado na Fig. 4.24(b), os picos calculados em 25, 42, 81, 138, 212, 229, 233,
293, 307, 392, 422, 432 e 490 cm-1 também não se manifestam no monômero puro
correspondente (Fig. 4.23a). Portanto, foi possível constatarmos que o átomo de cobre
é de fato responsável somente pelo aparecimento de modos vibracionais de baixas
freqüências, como é naturalmente esperado para o comportamento vibracional de um
metal pesado. Nos trabalhos realizados por FREITAS [1] e CARVALHO et al. [2,3], os
autores mostraram experimentalmente que os valores das freqüências vibracionais
acima de 500 cm-1 são, de fato, muito pouco alterados quando o cobre é introduzido
nas amostras de biomassa ricas em celulose ou lignina, conforme fica evidenciado na
Tabela IV.13, corroborando nossos resultados teóricos. Outra observação importante a
ser feita é que a presença do cobre provoca uma alteração menor nos modos
vibracionais das unidades monoméricas de celulose saturadas com hidrogênio,
quando comparada ao seu efeito no monômero com saturação por radicais metil.
Tabela IV.14. Modos normais de vibração de baixas freqüências (em cm-1), calculados
teoricamente para os monômeros de celulose mostrados nas Figs. 4.23 e 4.24.
Monômero puro (saturado com H)
(Fig. 4.23a)
Monômero com Cu (saturado com H)
(Fig. 4.24b)
Monômero puro (saturado com CH3)
(Fig. 4.23b)
Monômero com Cu (saturado com CH3)
(Fig. 4.24a) 63 25 41 31
114
Tabela IV.14. (continuação) 98 42 60 43
109 67 67 57 163 81 93 67 195 98 96 78 223 107 121 93 247 138 164 105 255 212 168 132 272 229 189 169 288 233 212 173 324 255 232 206 332 257 254 216 375 293 257 230 381 307 271 258 398 321 296 260 406 371 308 277 418 392 331 301 455 396 340 307 468 401 390 343
- 422 422 381 - 432 434 434 - 490 465 448 - - 496 472 - - - 499
As Figs. 4.28 e 4.29 trazem os espectros vibracionais de infravermelho e
Raman calculados para as estruturas celulósicas representadas nas Figs. 4.23 e 4.24.
Podemos observar que, tanto nos espectros de infravermelho quanto de Raman, está
evidenciada a faixa espectral ausente, entre ~ 1440 e 2870 cm-1. Particularmente, no
monômero de celulose da Fig. 4.23b, a sorção do cobre provoca um aumento das
intensidades de infravermelho na região de freqüências em torno de 1500 cm-1 e um
decréscimo nas intensidades Raman na região de altas freqüências (em torno de 3700
cm-1), como pode ser evidenciado nas Figs. 4.28(b) e 4.29(b), respectivamente.
115
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Monômero de celulose puro: saturado com H saturado com CH3
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Monômero de celulose saturado com -CH3:
sem cobre com cobre
(a) (b)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30
35
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Monômero de celulosesaturado com H:
sem cobre com cobre
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Dímero de celulose puro, saturado com radicais CH3
(c) (d)
Figura 4.28. Espectros de infravermelho calculados para as estruturas celulósicas. (a)
Monômero de celulose puro, saturado com átomos de hidrogênio (linha vermelha) e com
radicais metil (linha azul); (b) monômero de celulose saturado com radicais metil, puro (linha
vermelha) e com o átomo de cobre no sítio substitucional (linha azul); (c) monômero de
celulose saturado com átomos de hidrogênio, puro (linha vermelha) e com o átomo de cobre no
sítio intersticial (linha azul); (d) dímero de celulose puro, saturado com radicais metil (linha
vermelha). (Obs.: largura de resolução das lourencianas: 2.00).
116
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)
Monômero de celulose saturado com -CH3: sem cobre com Cu
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15A
tivid
ade
Ram
an (A
4 /u.m
.a.)
Freqüência (cm-1)
Monômero de celulose puro: saturado com H saturado com CH3
(a) (b)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30 Monômero de celulose saturado com H:
sem cobre com cobre
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)0 1000 2000 3000 4000
0
5
10
15
20
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)
Dímero de celulose puro, saturado com radicais CH3
(c) (d)
Figura 4.29. Espectros Raman calculados para as estruturas celulósicas. (a) Monômero de
celulose puro, saturado com átomos de hidrogênio (linha vermelha) e com radicais metil (linha
azul); (b) monômero de celulose saturado com radicais metil, puro (linha vermelha) e com o
átomo de cobre no sítio substitucional (linha azul); (c) monômero de celulose saturado com
átomos de hidrogênio, puro (linha vermelha) e com o átomo de cobre no sítio intersticial (linha
azul); (d) dímero de celulose puro, saturado com radicais metil (linha azul). (Obs.: largura de
resolução das lourencianas: 2.00).
4.5.1.4. Propriedades Vibracionais: Lignina Pura e Contendo Cobre
Equivalentemente, nos compostos de lignina analisados neste estudo, o átomo
de cobre presente nas estruturas é também responsável pelo aparecimento de modos
117
vibracionais de baixas freqüências, abaixo de 500 cm-1, conforme pode ser verificado
na Tabela IV.15.
Tabela IV.15. Modos normais de vibração de baixas freqüências (em cm-1), calculados
teoricamente para as unidades monoméricas da molécula de lignina, representadas nas Figs.
4.26 e 4.27.
Monômero (Fig.
4.26a)
Monômero (Fig.
4.27a)
Monômero (Fig.
4. 26b)
Monômero(Fig.
4.27b)
Monômero(Fig.
4.26c)
Monômero(Fig.
4.27c)
Monômero (Fig.
4.26d)
Monômero(Fig.
4.27d) 24 18 21 19 34 20 82 68 47 33 37 23 55 36 105 76 65 47 56 46 86 54 127 123 85 63 60 69 127 57 176 149 123 70 85 78 160 87 258 157 128 101 122 86 193 131 309 213 155 125 126 100 237 158 329 248 158 130 137 119 270 191 427 331 202 154 155 130 273 234 435 343 231 159 163 143 277 239 489 355 236 172 188 151 313 269 - 407 267 213 216 168 349 277 - 454 272 220 244 179 394 346 - 482 286 245 266 203 424 357 - - 290 280 271 227 447 429 - - 337 288 274 260 482 453 - - 364 326 279 272 - 472 - - 421 364 294 277 - - - - 445 411 317 282 - - - - 476 432 358 295 - - - - 495 476 387 307 - - - -
- 486 425 367 - - - - - - 442 391 - - - - - - 456 440 - - - - - - 485 453 - - - - - - - 460 - - - - - - - 492 - - - -
Analisando os valores listados nas Tabelas IV.2 e IV.3, verificamos que os
picos experimentais em 1745 cm-1 (Tabela IV.2) e 1739 cm-1 (Tabela IV.3) são
provenientes do estiramento da ligação C=O do grupo acetil e estão em boa
concordância com nosso pico calculado, em 1744 cm-1 para a unidade monomérica da
molécula de lignina mostrada na Fig. 4.26(d), e definitivamente não podem ser
atribuídos à molécula de celulose. Com a inserção do cobre, este pico sofre um
decréscimo de 14 cm-1 (Fig. 4.27d).
Conforme pode ser verificado na Tabela IV.16, para as unidades monoméricas
mostradas nas Figs. 4.26a, 4.26b, 4.26c e 4.26d os picos calculados em 1502, 1494,
1503 e 1508 cm-1, respectivamente, provenientes do estiramento da ligação C=C dos
118
anéis aromáticos, estão em boa concordância com os picos experimentais em 1527
cm-1 [1] e 1510 cm-1 [26]. Para as mesmas estruturas, os picos calculados em 1606,
1606, 1608 e 1608 cm-1, respectivamente, estão em boa concordância com os picos
experimentais em 1609 cm-1 [1] e 1600 cm-1 [26], também provenientes do estiramento
da ligação C=C dos anéis aromáticos.
Tabela IV.16. Modos vibracionais de estiramento C=C (em cm-1) calculados para as
componentes da molécula de lignina pura, representadas na Fig. 4.26. Os valores
experimentais (em cm-1) se referem às referências [1] e [26].
P-hidróxi fenil
(Fig. 4.26a)
Guaiacil (Fig. 4.26b)
Siringil (Fig. 4.26c)
Molécula-modelo com C=O
(Fig. 4.26d)
Freqüência experimental
[1]
Freqüência experimental
[26] 1503 1502 1494 1508 1527 1510 1608 1606 1606 1608 1609 1600
Nas Figs. 4.30 e 4.31 são mostrados os espectros de infravermelho e Raman,
respectivamente, referentes às unidades monoméricas da molécula de lignina,
representadas nas Figs. 4.26 e 4.27.
119
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20Componente siringil da lignina:
sem cobre com cobre
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)Freqüência (cm-1)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30 Componente guaiacil da lignina: sem cobre com cobre
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
(a) (b)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Componente p-hidróxi-fenil da lignina: sem cobre com cobre
0 1000 2000 30000
5
10
15
20
25
Inte
nsid
ade
de IR
(Km
/mol
)
Freqüência (cm-1)
Molécula-modelo contendo C=O: sem cobre com cobre
(c) (d)
Figura 4.30. Espectros de infravermelho calculados para as unidades monoméricas da lignina,
puras (linha vermelha) e contendo cobre (linha azul). (a) Guaiacil; (b) siringil; (c) para-hidróxi-
fenil; (d) molécula-modelo contendo o grupo funcional carbonila (C=O). (Obs.: largura de
resolução das lourencianas: 2.00).
120
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20 Componente guaiacil da lignina: sem cobre com cobre
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)0 1000 2000 3000 4000
0
5
10
15
20
25Componente siringil da lignina:
sem cobre com cobre
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)
(a) (b)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25
30
35Componente p-hidróxi-fenil da lignina:
sem cobre com cobre
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)
0 1000 2000 3000 40000
5
10
15
20
25 Molécula-modelo contendo C=O: sem cobre com cobre
Ativ
idad
e R
aman
(A4 /u
.m.a
.)
Freqüência (cm-1)
(c) (d)
Figura 4.31. Espectros Raman calculados para as unidades monoméricas da lignina, puras
(linha vermelha) e contendo cobre (linha azul). (a) Guaiacil; (b) siringil; (c) para-hidróxi-fenil; (d)
molécula-modelo contendo o grupo funcional carbonila (C=O). (Obs.: largura de resolução das
lourencianas: 2.00).
121
4.6. Observações Finais e Conclusões
Com relação às propriedades estruturais da molécula de celulose, nossos
resultados teóricos mostraram que, para o sítio de sorção substitucional, com o átomo
de cobre substituindo um átomo de hidrogênio do grupo hidroxila do anel celulósico, a
estrutura conformacional do anel é alterada apenas nas proximidades do sítio do
metal, o mesmo ocorrendo com todas as estruturas da molécula de lignina. Para o
sítio intersticial, com o cobre afetando as ligações de hidrogênio intramoleculares,
ocorrem alterações conformacionais significativas em toda a extensão do monômero,
com rotação da ramificação CH2OH e com ruptura de algumas ligações de hidrogênio
intramoleculares existentes na estrutura do monômero.
Nossos resultados teóricos também mostram que a localização do átomo de
cobre nos sítios de sorção investigados, tanto nas estruturas da celulose como da
lignina, é responsável pelo aparecimento de novos modos vibracionais somente na
região de baixas freqüências (abaixo de 500 cm-1) e que estes modos estão ausentes
nos compostos puros.
Para os compostos-modelo que constituem a molécula de lignina, os picos
experimentais em 1510, 1600 e 1745 cm-1, ausentes na estrutura da celulose, estão
em concordância com nossos cálculos.
Nossos resultados evidenciam a ausência de freqüências espectrais na faixa
de 1442 a 2869 cm-1 para a molécula de celulose; por outro lado, algumas das
freqüências nesta faixa espectral estão presentes em nosso espectro calculado para a
lignina, em concordância com os resultados experimentais de MICHELL e HIGGINS
[22], os quais constataram esta ausência de picos na faixa de 1450 a 2894 cm-1. Por
outro lado, verificamos que nossos resultados estão em desacordo com as conclusões
de FREITAS [1] e CARVALHO et al. [2,3], os quais associam os picos em 1525, 1527,
1609, 1645, 1666, 1739 e 1745 aos grupos funcionais da molécula de celulose.
Pela comparação entre nossos resultados calculados e os dados experimentais
disponíveis na literatura, podemos concluir que as ferramentas teóricas usadas são
suficientemente precisas no intuito de antecipar e interpretar os espectros vibracionais
experimentais destas biomoléculas, tanto puras como contendo cobre em diferentes
sítios de sorção.
122
5. Estudo dos Fullerenos e Alguns de Seus Derivados
5.1. Introdução
Pelas mais diversas razões, os fullerenos têm sido alvo dos cientistas em
muitos campos de aplicações. Algumas destas razões estão relacionadas à Física,
pelas temperaturas críticas de supercondutividade relativamente elevadas de materiais
derivados (Tc ~ 33K), pela simetria icosaédrica apresentada pelas estruturas e pelo
comportamento quase unidimensional dos nanotubos de fullereno; à Química, pela
natureza molecular da fase sólida e pela grande família de novos compostos que
podem ser sintetizados a partir de fullerenos; à Geologia, devido à idade geológica
avançada da shungita, um mineral rico em carbono, em cuja composição encontram-
se materiais fullerenos; à Ciência dos Materiais, pelo fato de representarem uma fonte
de nanoestruturas que podem ser construídas sob as formas de filme e cristais e cujas
propriedades podem ser controladas por dopagem e intercalação; à Engenharia
Eletrônica, devido ao uso potencial destes materiais em dispositivos ópticos e
eletrônicos altamente flexíveis, em aplicações fotocondutoras, entre muitas outras [28].
Um grande número de sugestões teóricas antecipou em várias décadas a
descoberta em laboratório de moléculas pertencentes à simetria icosaédrica. Em 1933,
Tisza considerou a simetria do grupo de ponto para moléculas icosaédricas e Osawa,
em 1970, sugeriu que uma molécula de C60 icosaédrica poderia ser quimicamente
estável. Em 1973, cálculos semi-empíricos realizados mostraram que o C60 poderia ter
um grande “gap” eletrônico entre o orbital molecular mais alto ocupado (HOMO) e o
orbital molecular mais baixo desocupado (LUMO) [28].
A identificação experimental da molécula de C60 como um icosaedro truncado
regular ocorreu devido à união entre atividades de pesquisa de duas áreas
aparentemente independentes, em meados dos anos 80. Astrofísicos trabalhavam em
colaboração com espectroscopistas a fim de identificar certa emissão não usual no
infravermelho, proveniente de grandes “clusters” de carbono expelidos de estrelas
vermelhas gigantes. Simultaneamente, SMALLEY et al. [29], em 1981, sugeriram a
possibilidade da criação em laboratório de moléculas de carbono não-usuais, ou de
123
“clusters”, possuindo o mesmo espectro de infravermelho das estrelas vermelhas
gigantes. Esta motivação levou à colaboração entre KROTO e SMALLEY [30] no uso
da técnica de vaporização a laser de um alvo de grafite para sintetizar e estudar os
aglomerados de carbono. Foi durante estas investigações que um “cluster” incomum,
altamente estável e contendo 60 átomos de carbono foi descoberto e identificado
como uma molécula de simetria icosaédrica.
As sugestões teóricas preliminares propostas para o C60 icosaédrico só foram
reconsideradas após os trabalhos experimentais de KROTO e SMALLEY [30],
comprovando a estabilidade da molécula de C60 na fase gasosa. Nestes experimentos,
uma variedade de “clusters” e espécies moleculares foram produzidas e a
espectroscopia de massa foi usada como a principal ferramenta na caracterização dos
chamados fullerenos. Esta denominação foi dada por Kroto e Smalley, em 1985, à
família de moléculas observadas na fase gasosa, devido à semelhança de suas
estruturas moleculares com as cúpulas geodésicas projetadas e construídas por R.
Buckminster Fuller. O nome “buckminsterfullerene” ou simplesmente “buckyball” foi
atribuído especialmente à molécula de C60. O termo “fullereno” é atualmente usado
para denotar a classe de moléculas fechadas, sob a forma de “gaiola”, consistindo
somente de átomos de carbono. De acordo com o chamado Teorema de Euler, uma
“gaiola” possuindo somente faces pentagonais e hexagonais deve conter exatamente
12 pentágonos, podendo diferir no número de hexágonos. Os arquitetos usam a
distância de ligação de primeiros vizinhos entre faces pentagonais em um icosaedro
truncado regular para estimar o tamanho de uma cúpula geodésica, da mesma forma
que os químicos usam este argumento para estimar o tamanho de grandes moléculas
de fullereno. As estruturas em forma de cúpula são largamente usadas em arquitetura
moderna, devido à sua grande resistência, possuindo uma área superficial mínima
para um volume máximo (esfera). A unidade básica nestas estruturas é principalmente
um triângulo. Cinco triângulos compondo um vértice correspondem a um pentágono e
seis triângulos compondo um vértice formam um hexágono.
Em 1990, KRÄTSCHMER et al. [31] desenvolveram um método simples para a
preparação de grandes quantidades de C60, que até então estavam disponíveis
apenas em pequenas quantidades, baseado na evaporação resistiva de grafite em
uma atmosfera de hélio. Em 1991, HADDON et al. [32] descobriram que a inserção de
metais alcalinos no interior do C60 era capaz de modificar drasticamente as
propriedades eletrônicas dos fullerenos hospedeiros e conduzir a um comportamento
supercondutor com temperatura de transição relativamente elevada (na faixa de 18 a
33 K).
124
Seguiram-se posteriormente diversos estudos de estabilidade química da
molécula, experimentos envolvendo dopagens endoédricas (nos quais as espécies
dopantes são inseridas no interior de fullerenos), estudos de fotofragmentação, entre
outros. A evidência direta de que o C60 exibia a simetria icosaédrica ocorreu através da
realização de experimentos de ressonância magnética nuclear (NMR), nos quais uma
única linha de ressonância foi observada, o que era consistente com a existência de
um único tipo de sítio químico para os átomos de carbono nesta molécula. Por outro
lado, o espectro de infravermelho com quatro linhas características forneceu uma
evidência direta da simetria icosaédrica. Recentemente, diversas investigações têm
sido feitas no intuito de explorar as diversas possibilidades de aplicação destes novos
materiais.
Neste capítulo, abordamos inicialmente algumas informações introdutórias
referentes às características gerais dos fullerenos e seus derivados, baseadas em
registros disponíveis na literatura e diretamente associadas ao nosso estudo acerca
dessas estruturas. Apresentamos nossos estudos teóricos ab initio Hartree-Fock e
semi-empírico MNDO, resultantes da investigação das moléculas de C60, C70, C48N12,
C60X60 (X = H, F) e X@C60 (X = H, Li, Na, K), enfatizando a análise de suas
propriedades estruturais, eletrônicas e vibracionais; comparamos nossos resultados
com os valores teóricos e experimentais da literatura. Realizamos uma série de
cálculos de caráter exploratório, através dos quais os desempenhos dos métodos
teóricos ab initio Hartree-Fock e semi-empírico MNDO foram comparados, tendo em
vista o estudo futuro de moléculas grandes, para as quais o método Hartree-Fock
torna-se impraticável. Apresentamos os resultados de nossos estudos experimentais
realizados nos laboratórios do Departamento de Física da UFMG, referentes aos
processos de síntese e preparação de amostras de fullereno e às medidas
espectroscópicas de FTIR e micro-Raman. Fazemos uma comparação entre nossos
resultados teóricos e experimentais. Uma das ênfases deste capítulo consiste na
conjugação entre os estudos teórico e experimental, a fim de consolidar a importância
da teoria como ferramenta extremamente útil no auxílio à interpretação dos resultados
experimentais e na confiabilidade da previsão de novos resultados experimentais.
125
5.2. A Molécula de C60 e o Grupo Icosaédrico
5.2.1. Estrutura Molecular do C60
Uma série de experimentos independentes tem mostrado que materiais
cristalinos formados a partir de fullerenos são sólidos moleculares. Dessa forma, a
estrutura e as propriedades destes sólidos tornam-se fortemente dependentes da
estrutura e das propriedades de suas moléculas de fullereno constituintes. Assim
sendo, nesta seção, serão descritos alguns aspectos referentes à estrutura interna da
molécula de C60, com base na referência [28].
Os 60 átomos de carbono da molécula de C60 estão localizados nos vértices de
um icosaedro truncado (Fig. 5.1), no qual todos os sítios de carbono são equivalentes.
Um icosaedro truncado regular possui 90 arestas de mesmo comprimento, 60 vértices
equivalentes, 20 faces hexagonais e 12 faces pentagonais, formando uma estrutura
fechada, em forma de “gaiola”. Uma vez que a distância de ligação média carbono-
carbono na molécula de C60 (dC-C = 1.44 Å) é quase idêntica à do grafite (dC-C = 1.42 Å),
cada átomo de carbono, tanto no grafite quanto no C60, encontra-se trigonalmente
ligado a três outros átomos. As ligações do tipo sp2 entre átomos de carbono
adjacentes ocorrem numa superfície curva, em contraste com o caso do grafite, no
qual as ligações trigonais sp2 são verdadeiramente planares. Esta curvatura das
ligações trigonais do C60 conduzem a certas misturas de configurações do tipo sp3,
características da estrutura tetraédrica do diamante, mas ausentes no grafite.
(a) (b) (c)
Figura 5.1. (a) Esquema de um icosaedro regular, um poliedro de 20 faces formadas por
triângulos eqüiláteros; (b) representação do truncamento do icosaedro; (c) estrutura geométrica
da molécula de C60, sob a forma de um icosaedro truncado regular, contendo 12 pentágonos
ligados a 20 hexágonos, exatamente como numa bola de futebol. As ligações d5 e d6 se
lcalizam nas junções entre um pentágono e um hexágono e entre dois hexágonos,
respectivamente.
126
No C60 observamos, para cada vértice, duas ligações simples C-C, localizadas
na junção de uma face pentagonal com uma face hexagonal. O comprimento das
ligações simples, d5, vale 1.46 Å (conforme medidas de NMR) ou 1.455 Å (conforme
medidas de espalhamento de nêutrons). O comprimento da ligação dupla, d6, vale 1.40
Å (conforme medidas de NMR) ou 1.391 Å (conforme medidas de difração de
nêutrons). Uma vez que os comprimentos de ligação na molécula de C60 não são
exatamente equivalentes, os vértices da molécula formam um icosaedro truncado
mas, estritamente falando, um icosaedro não regular. Entretanto, em muitas
descrições do C60, as pequenas diferenças entre as ligações d5 e d6 são geralmente
desprezadas e a molécula é freqüentemente considerada como um icosaedro
truncado regular.
A inspeção da estrutura molecular do C60 mostra que todas as faces
pentagonais são circundadas por cinco hexágonos. Cada pentágono, juntamente com
seus cinco hexágonos vizinhos, apresenta a forma da molécula de coranuleno (Fig.
5.2a, cuja curvatura é mostrada na Fig. 5.2b). No coranuleno, as ligações duplas se
dispõem em diferentes posições relativas no C60, pois suas arestas são ligadas a
átomos de hidrogênio. Outra sub-unidade molecular do C60 é o piracileno (Fig. 5.2c),
que consiste de dois pentágonos e dois hexágonos, arranjados conforme indicado.
Novamente, as ligações duplas diferem entre a sub-unidade do C60 e a molécula de
piracileno devido à presença do átomo de hidrogênio nas ligações pendentes desta
última. O piracileno apresenta interesse particular por evidenciar a separação entre os
pentágonos mais próximos. Considerando a chamada regra do pentágono isolado, por
meio da qual a distância entre os pentágonos do fullereno é maximizada, observamos
uma redução da curvatura local, conferindo estabilidade à molécula de C60.
(a) (b) (c)
Figura 5.2. (a) Vista de cima e (b) vista lateral da molécula de coranuleno; (c) molécula de
piracileno. Estas estruturas podem ser identificadas na superfície do C60 e de outros fullerenos.
O diâmetro em torno de 7.09 Å é calculado para a molécula de C60 mediante
considerações geométricas, tratando os átomos de carbono como pontos e
considerando dC-C = 1.40 Å para as ligações entre hexágonos e dC-C = 1.46 Å para os
comprimentos de ligação nos pentágonos. Técnicas experimentais de NMR
determinaram o diâmetro da molécula de C60 em 7.10 ± 0.07 Å. Quando consideramos
127
o tamanho da nuvem de elétrons π associada aos átomos de carbono, o diâmetro
externo da molécula pode ser estimado em 7.09 ± 3.35 = 10.34 Å, em que o valor 3.35
Å corresponde a uma estimativa da espessura da nuvem eletrônica em torno dos
átomos de carbono da “gaiola”. Esta estimativa provém da distância interplanar entre
as camadas de grafite. A energia de ligação por átomo de carbono no grafite vale 7.4
eV. A energia de ligação correspondente à molécula de C60 tem sido calculada por
vários autores e é menor que a energia de ligação do grafite por ~ 0.4 - 0.7 eV,
embora os valores absolutos destas energias para ambas as estruturas ainda não
sejam bem estabelecidos.
Na Tabela V.1 listamos algumas das constantes físicas atribuídas à molécula
de C60 .
Tabela V.1. Constantes físicas atribuídas à molécula de C60.
Grandeza Valor Distância C-C média 1.44 Å Comprimento de ligação C-C em um pentágono 1.46 Å Comprimento de ligação C-C entre hexágonos 1.40 Å Diâmetro interno a 7.10 Å Diâmetro externo b 10.34 Å Momento de inércia I 1.0 x 10-43kg . m2
Volume por molécula 1.87 x 10-22/cm3
Número de sítios de C distintos 1 Número de ligações C-C distintas 2 Energia de ligação por átomo de C 7.40 eV Calor de formação (por g de átomo de C) 10.16 kcal Afinidade eletrônica 2.65±0.05 eV Energia de coesão por átomo de C 1.4 eV/átomo Desdobramento de spin-órbita do C (2p) 0.00022 eV Primeiro potencial de ionização 7.58 eV Segundo potencial de ionização 11.5 eV Limiar de absorção óptica c 1.65 eV
a Este valor foi obtido por medidas de NMR. O valor geométrico calculado para o diâmetro é de
7.09 Å; b este valor para o diâmetro externo foi encontrado considerando que a espessura da
casca de C60 seja de 3.35 Å. No sólido, a distância C60-C60 entre vizinhos é 10.02 Å; c os
valores da literatura para os limiares de absorção óptica da molécula de C60, livre em solução,
variam entre 1.55 e 2.3 eV.
128
5.2.2. O Grupo Icosaédrico Ih
Muitas das propriedades especiais que os fullerenos exibem estão diretamente
relacionadas à elevada simetria da molécula de C60, em particular, devido ao fato de
que os 60 átomos de carbono equivalentes estão nos vértices de um icosaedro
truncado.
As operações de simetria do grupo icosaédrico Ih são:
• operação identidade E;
• seis eixos S10 (cada qual contendo as operações
); ESSCSSCSiSSCSSCSS ======= 1010
910
45
810
710
35
6102
510
25
410
3105
21010 ,,,,,,,,,
• dez eixos S6 (contendo as operações
, nas quais as operações E e i já estão
incluídas no caso anterior);
ESSCSiSSCSS ===== 66
56
23
462
363
266 ,,,,,
• seis eixos C5, colineares aos eixos S10 (contendo as operações
já incluídas nas operações do eixo S
45
35
255 ,,, CCCC
10);
• dez eixos C3, colineares aos eixos S6 (as operações já estão contidas
nas operações de S
233 ,CC
6);
• quinze eixos C2;
• quinze planos σ que contêm dois eixos C2 e dois eixos C5 .
As 60 operações de rotação próprias (que podem ser identificadas a partir do
esquema mostrado na Fig. 5.3), conjugadas com a operação de inversão (rotações
impróprias), resultam em 120 operações de simetria no grupo icosaédrico Ih. As
moléculas pertencentes a este grupo apresentam o mais alto grau de simetria
conhecido.
Figura 5.3. Representação das 60 operações próprias de simetria rotacional da molécula de
C60.
129
5.3. A Molécula de C70
Na síntese por arco elétrico do C60, fullerenos de pesos moleculares mais
elevados são também formados. Dentre eles, o fullereno mais abundante é a molécula
de C70, conhecida como “rugby-ball”. A abundância relativamente alta do C70 está
intimamente ligada à sua estabilidade, que se relaciona em parte com sua alta energia
de ligação, de 7.42 eV/carbono ou ~ 0.02 eV/carbono maior que a energia de ligação
do C60 [28]. Embora com energia de ligação mais elevada, o C70 é provavelmente
menos abundante que o C60 por razões cinéticas ao invés de energéticas. Mesmo
possuindo um poço de potencial de maior profundidade, as barreiras a serem vencidas
para a formação da molécula de C70 são maiores que aquelas referentes ao C60, de tal
forma que a taxa de síntese torna-se menos favorável.
A molécula de C70 pode ser formada ou pela adição de um anel de 10 átomos
de carbono à molécula de C60 ou, equivalentemente, adicionando-se um cinturão de 5
hexágonos em torno do plano equatorial do C60, normal a um dos eixos pentagonais e
girando-se apropriadamente os hemisférios do C60 de 36º de tal forma que eles se
ajustem continuamente aos hexágonos do cinturão. Em contraste com a molécula de
C60, que apresenta somente um sítio de carbono, a molécula de C70 possui cinco sítios
inequivalentes. A Fig. 5.4 ilustra as moléculas de C60 (simetria Ih), C70 (simetria D5h) e
C80 (uma extensão da molécula de C70, com formas isoméricas de simetrias D5d e Ih).
(a) (b)
(c) (d)
Figura 5.4. (a) A molécula de C60 icosaédrica; (b) a molécula de C70 (simetria D5h); (c) isômero
do C80, uma extensão da molécula de C70; (simetria D5d); (d) outro isômero do C80, um
icosaedro (simetria Ih).
130
Alem disso, enquanto o C60 apresenta dois tipos distintos de comprimentos de
ligação C-C, o C70 possui oito tipos diferentes de ligação C-C. Os comprimentos de
ligação maiores tendem a pertencer às arestas entre pentágonos e hexágonos e os
comprimentos de ligação mais curtos, à junção entre faces hexagonais, exatamente
como no C60. Algumas das propriedades físicas da molécula de C70 são sumarizadas
na Tabela V.2.
Tabela V.2. Constantes físicas para a molécula de C70.
Grandeza Valor Distância média C-C (Å) 1.43 Diâmetro do C70 (eixo c) (Å) 7.96 Diâmetro do C70 (eixo a-b) (Å) 7.12 Momento de inércia I (paralelo) 1.24 x 10-43
Momento de inércia I (perpendicular) 1.44 x 10-43
Volume por C70 (cm-3) a 1.56 x 10-22
Número de sítios de C distintos 5 Número de ligações C-C distintas 8 Energia de ligação por átomo de C (eV) b 7.42 Calor de formação (kcal/g . C) 9.65 Afinidade eletrônica (eV) 2.72 Primeiro potencial de ionização (eV) 7.61 Limiar de absorção óptica (eV) c 1.7 Movimento atômico do ponto zero (Å) 0.07
a O volume da molécula de C70 é definido como abcV π34
= , em que , e denotam os
semi-eixos de um elipsóide, como mostrado nesta tabela;
a b c
b a energia de ligação por átomo de
carbono calculada é ~ 20 meV maior para o C70 em relação ao C60 e ~ 690 meV menor que a
do grafite, mas a magnitude absoluta da energia de ligação é menos evidente. c Segundo
registros da literatura, o “gap” de banda calculado varia de 1.55 eV a 1.76 eV.
131
5.4. Alguns Derivados da Molécula de C60
Uma rica variedade de compostos derivados de fullerenos tem sido sintetizada,
com base principalmente na molécula de C60, devido à disponibilidade relativamente
baixa de fullerenos superiores. Na literatura, somente a partir de 1997 há registros da
síntese de fullerenos de pesos moleculares mais elevados.
Os aspectos básicos e especiais da química do C60, que são diretrizes para a
funcionalização e síntese químicas, têm sido amplamente discutidos e explicados
exaustivamente. A principal propriedade do C60 é a sua elevada eletroafinidade. Esta
propriedade tem possibilitado a síntese de novos compostos, mediante processos
redutíveis químicos ou eletroquímicos. Outra característica da molécula de C60 é a
reatividade especial de suas ligações “duplas”. Estas ligações permitem diversas
reações precursoras de vários processos de funcionalização e polimerização, dando
origem aos mais diversos derivados [33].
Nas seções 5.4.1, 5.4.2 e 5.4.3, discutiremos algumas das classes de
derivados da molécula de C60, que têm se tornado recentemente alvos de grande
interesse e inúmeras investigações por parte da comunidade científica e para as quais
as concepções teóricas podem prover compreensões cruciais dos aspectos
fundamentais da química e da física dos fullerenos, justificando nosso interesse em
estudá-las, uma vez que a resposta às investigações teóricas é um bom exemplo tanto
do sucesso como das limitações dos métodos de cálculo utilizados.
A primeira classe é constituída dos chamados endofullerenos, que são
complexos originados da inserção de um átomo no interior da molécula de C60; a
segunda classe se refere aos heterofullerenos, provenientes da substituição de um ou
mais átomos de carbono da “gaiola” por átomos com diferentes configurações
eletrônicas; já a terceira classe engloba as chamadas “fuzzyballs”, que são moléculas
resultantes da passivação completa da molécula de C60.
5.4.1. Os Endofullerenos
Endofullereno (X@C60) é a designação genérica dada aos complexos formados
por fullerenos contendo átomos aprisionados. Dentre os endofullerenos, os
metalofullerenos, que são resultantes da inserção de um átomo metálico na estrutura
da “gaiola”, constituem o caso mais interessante do ponto de vista do desenvolvimento
de materiais modernos. Estes sistemas são capazes de fornecer uma possibilidade
132
singular na descrição das propriedades específicas dos materiais, tais como resposta
dielétrica, espectros ópticos e reatividade a nível molecular. Particularmente, espera-
se que novas fases ferroelétricas ou ferromagnéticas possam ser obtidas a partir
destes materiais [34]. Uma aplicação potencialmente importante para estas moléculas
dopadas internamente consiste na possibilidade de suas ligações a uma “bulk”
supercondutor com um valor de temperatura crítica Tc superior àquele normalmente
encontrado em cristais de C60 puros. A geometria de equilíbrio e a estabilidade de
vários sistemas têm sido computadas por diversos cálculos de estrutura eletrônica ab
initio e semi-empíricos. Tais cálculos têm sugerido que, similarmente aos derivados de
C60 exoédricos, os sistemas mais estáveis envolvem átomos doadores, especialmente
metais alcalinos, metais alcalinos terrosos e terras raras.
Informações diretas com relação às posições do átomo aprisionado no interior
da “gaiola” podem correntemente ser inferidas através de técnicas experimentais de
precipitação iônica, usando especialmente metais alcalinos e por técnicas de difração
de raios-X. Um trabalho teórico completo pode efetivamente dar suporte a estes
resultados experimentais, retratando as propriedades físicas e químicas de tais
complexos.
Para maiores progressos na pesquisa de metalofullerenos, seria desejável
obter um discernimento dos possíveis efeitos do ambiente em suas propriedades
físicas e químicas. “Ambiente” aqui se refere às soluções nas quais a maioria dos
experimentos é realizada, bem como a existência de outras unidades moleculares, no
caso da fase sólida. Esta última é obviamente importante, do ponto de vista da ciência
dos materiais, pois a extensão e a natureza de suas correlações eventualmente
determinarão as propriedades eletrônicas e magnéticas dos materiais reais. Pesquisas
objetivando a busca de uma forma adequada de abertura e fechamento das “gaiolas”
de fullerenos num padrão controlado poderiam, em princípio, se beneficiar de
simulações computacionais e de cálculos quânticos [33].
5.4.2. Os Heterofullerenos
Heterofullereno é o nome genérico dado aos derivados do C60 e de outros
fullerenos superiores, originados da substituição de átomos de carbono da “gaiola” por
átomos que possuem configurações eletrônicas distintas. Desde sua descoberta,
inúmeros cálculos teóricos de diversos níveis têm sido realizados, na tentativa de
identificar as propriedades físicas e químicas específicas induzidas pela substituição
dos átomos de carbono.
133
Nos últimos dez anos, inúmeras técnicas experimentais têm sido empregadas
com bastante sucesso na síntese de muitos tipos de heterofullerenos. Quando a
substituição dos átomos de carbono se dá por nitrogênio, os compostos formados são
conhecidos como azafullerenos. A substituição de um único átomo de carbono por um
átomo de nitrogênio corresponde à adição de um elétron extra ao sistema π do C60.
Esta substituição representa um caso especial, no qual a perturbação provocada na
estrutura do fullereno é limitada. Embora a produção em escala de azafullerenos seja
certamente baixa e o conhecimento acerca de suas ricas propriedades químicas seja
ainda reduzido, é natural esperar que outros derivados interessantes sejam obtidos
por substituição.
Muito recentemente [35], o C60 com mais de um átomo de nitrogênio
substituindo os átomos de carbono na “gaiola” foi sintetizado. Em 2001, a existência
de um novo azafullereno, o C48N12, foi registrada na literatura (Fig. 5.5). Desde então,
a investigação das propriedades estruturais, eletrônicas, vibracionais e magnéticas
deste composto vem se tornando bastante intensificada, mediante a execução de
inúmeros cálculos teóricos.
Figura 5.5. Estrutura geométrica da molécula de C48N12. Os átomos de C e N estão
representados por esferas nas cores cinza e azul, respectivamente.
A molécula de C48N12 apresenta vários aspectos peculiares: somente um átomo
de nitrogênio por pentágono, dois átomos de nitrogênio preferencialmente em um
hexágono, simetria S6, seis tipos distintos de ligação N–C e nove tipos distintos de
ligação C–C. Estudos teóricos realizados têm mostrado que a molécula de C48N12
apresenta aplicações potenciais como componentes semicondutores, materiais ópticos
134
não-lineares e como possíveis precursores em eletrônica molecular e em dispositivos
fotônicos.
5.4.3. As “Fuzzyballs”
Devido à sua conformação geométrica peculiar, espera-se naturalmente que o
“cluster” de C60 apresente propriedades químicas internas e externas inteiramente
diferentes. Embora menos exóticas que os compostos formados por dopagem
endoédrica ou mesmo por substituição dos átomos de carbono, as moléculas com
ligações químicas localizadas na parte externa da “gaiola” do C60, as chamadas
“fuzzyballs”, são também bastante interessantes. As “fuzzyballs” apresentam
excelentes propriedades lubrificantes, com inúmeras aplicações comerciais e
industriais. As “teflon balls” resultantes, como são chamadas, podem inclusive estar no
ranking dos melhores lubrificantes do mundo. Em particular, a passivação completa
dos substituintes aderidos na superfície externa da “gaiola” e o desvio da hibridização
sp3 dos átomos de carbono insinuam que a ligação nestes sistemas pode ser diferente
daquela presente em moléculas orgânicas saturadas ordinárias. Informações parciais
ou completas disponíveis acerca destes derivados são ainda muito limitadas [36].
A molécula de C60 parcialmente hidrogenada, C60H36, foi a primeira de uma
série de novas moléculas sintetizadas a partir da “gaiola”. Das muitas estruturas
hidrogenadas e fluoretadas à base de C60 possíveis, as espécies completamente
saturadas (Fig. 5.6), como as moléculas de C60H60 e C60F60, apresentam um grau de
simetria elevado e, conseqüentemente, são mais fáceis de serem estudadas por
métodos teóricos de primeiros princípios.
Figura 5.6. Molécula de C60X60 (X = H, F) icosaédrica.
135
SCUSERIA [37] realizou estudos ab initio das moléculas de C60H60 e C60F60 e
concluiu que estas estruturas seriam bastante estáveis para serem observadas
experimentalmente. Segundo CIOSLOWSKI [36], as estruturas eletrônicas das
moléculas de C60H60 e C60F60 exibem alguns aspectos interessantes, quase sempre
inesperados. As grandes repulsões entre os substituintes conduzem a um
alongamento significativo das ligações C-C. Isto é especialmente pronunciado na
molécula de C60F60, resultando na desestabilização de cada ligação C-F, precipitando
a formação de caminhos de ligação F-F e alongando as ligações C-C. À luz destas
considerações, CIOSLOWSKY [36] considera que, contrariamente a algumas
sugestões preliminares propostas por SCUSERIA [37], parece ser difícil o isolamento
da molécula de C60F60.
136
5.5. Síntese, Extração e Purificação de Fullerenos A discussão que se segue nesta seção é baseada na referência [28].
5.5.1. Síntese de Fullerenos Os fullerenos podem ser sintetizados em laboratório sob uma larga variedade
de formas, todas envolvendo a geração de vapor ou plasma carbônicos. Os métodos
usuais de síntese de fullerenos produzem primariamente C60 e C70. Atualmente, estas
moléculas vêm sendo isoladas em grande quantidade estando, inclusive, disponíveis
comercialmente. Fullerenos de pesos moleculares mais elevados, bem como
complexos endoédricos, também podem ser produzidos e isolados, embora em
quantidades substancialmente reduzidas. O procedimento atual mais eficiente na
produção de fullerenos envolve uma descarga elétrica entre eletrodos de grafite, em
uma atmosfera inerte de ~ 200 torr de gás de hélio. Os fullerenos sintetizados
encontram-se imersos na fuligem de carbono produzida no processo, devendo ser
extraídos e subseqüentemente purificados. Os primeiros procedimentos na síntese de
fullerenos basearam-se em técnicas de vaporização a laser, que produziam somente
quantidades microscópicas destes compostos na fase gasosa. A Fig. 5.7 ilustra o
equipamento utilizado neste processo.
Figura 5.7. Esquema da técnica de vaporização a laser usada na síntese de fullerenos. Na
seqüência de eventos, a válvula do tanque de gás de He se abre, permitindo o escape do gás
no compartimento. A seguir, um pulso de laser atinge a superfície do disco de grafite,
vaporizando o material e originando átomos e íons carbônicos. Os “clusters” de carbono
formados são condensados na câmara de integração e a mistura resultante sofre expansão
supersônica a vácuo, seguida de resfriamento.
137
Um pulso de laser intenso (~ 10 - 100 mJ de energia, de um laser de dupla
freqüência Nd: YAG) é usado para vaporizar o material a partir de uma superfície de
grafite, formando plasma carbônico quente. Este plasma interage com o fluido de gás
inerte (He), dando origem a “clusters” de carbono. A formação dos “clusters” ocorre
entre 30 – 200 µs, depois da qual o fluxo gasoso é expandido e sofre resfriamento,
finalizando o processo de crescimento dos aglomerados. A fonte de laser pode ser
acoplada a um espectrômetro de massa para identificação dos produtos.
A Fig. 5.8 traz o espectro de massa proveniente dos “clusters” e moléculas
formados no processo. Neste espectro são mostrados os dois principais agrupamentos
de “clusters” carbônicos: (1) aqueles com pesos moleculares menores (nC < 30, em
que nC é o número de carbonos da molécula), contendo predominantemente um
número ímpar de átomos de carbono e (2) os “clusters” de massas moleculares mais
elevadas (nC > 36), contendo somente um número par de átomos de carbono. Em
1959, Pitzer e Clementi já previam que aglomerados de carbono de pesos moleculares
mais elevados poderiam ser formados a partir da fase de vapor. O espectro da Fig. 5.8
foi um dos primeiros a mostrar experimentalmente a existência desses “clusters”
superiores. O espectro de massa acima de 40 átomos de carbono mostra uma
preponderância de “clusters” do tipo C60.
Figura 5.8. Espectro de massa dos “clusters” de carbono produzidos em um feixe supersônico,
pela vaporização a laser de um alvo de grafite (cujo procedimento é mostrado na Fig. 5.7).
138
Estudos teóricos e experimentais têm mostrado que a forma mais estável para
os “clusters” de carbono com mais de 10 átomos consiste em uma cadeia linear. Para
“clusters” contendo entre 10 – 30 átomos, a conformação em anel é a mais estável.
Certos tamanhos de anéis são mais favoráveis energeticamente, como pode ser
observado na Fig. 5.8, onde os máximos são encontrados em nC = 11, 15, 19 e 23
átomos de carbono. Cálculos semi-empíricos realizados mostraram que um anel
neutro é estável contendo 4j+2 átomos de carbono; um anel negativamente carregado
adquire estabilidade contendo 4j+1 átomos e para um anel carregado positivamente,
4j+3 para j = 3, 4, 5 e 6, ou seja, para 10 < nC < 30. A Fig. 5.8 indica também que a
formação de aglomerados carbônicos para 30 < nC < 40 é pouco provável.
A constatação de que havia algo especial em torno do C60 sugeriu a KROTO et
al. [30] que o C60 e outros “clusters” com nC > 40 tinham uma estrutura em forma de
“gaiola”, explicando assim a ocorrência de picos somente para valores pares de nC.
Além da estabilidade do C60, KROTO et al. [30] identificaram uma estabilidade
especialmente elevada para a molécula de C70, estimulando o interesse da
comunidade científica no intuito de encontrar meios de produção de quantidades
macroscópicas de fullerenos isolados.
Um outro meio eficiente nos processos de síntese de grandes quantidades de
fullerenos em laboratório consiste em uma descarga elétrica de corrente contínua ou
corrente alternada em ~ 200 torr de gás de He entre dois eletrodos de grafite. (Fig.
5.9).
Figura 5.9. Esquema da técnica de arco elétrico, usada na síntese de materiais fullerenos. O
calor gerado da descarga elétrica entre eletrodos de grafite evapora carbono, originando
fuligem e fullerenos.
139
Segundo registros da literatura [28], a formação destes compostos requer uma
pressão gasosa mínima de ~ 25 torr. Um aumento na pressão de gás de He acentua a
produção de fullerenos de pesos moleculares mais elevados. O calor gerado da
descarga entre os eletrodos de grafite evapora carbono, formando fuligem e fullerenos.
A técnica de descarga em arco elétrico pode também ser usada para sintetizar
nanotubos de carbono. Aparentemente, uma variedade de sólidos à base de carbono
pode ser usada como eletrodos nos processos de síntese de fullerenos. Entretanto,
nesta técnica, vários parâmetros afetam a conversão dos eletrodos de grafite em
fullerenos. Embora estes materiais sejam formados em uma variedade de atmosferas
de gases inertes, tais como argônio e nitrogênio moleculares, geralmente utiliza-se gás
de He de alta pureza. A maioria das câmaras geradoras de fuligem usa uma pressão
de gás de He na faixa de 100 – 200 torr. Sabe-se que a pressão ótima é altamente
sensível às especificações do equipamento, sendo determinada para cada tipo de
gerador.
Um outro procedimento usado na produção de fullerenos se deu com o
aprimoramento da técnica de vaporização a laser. Em um aparato experimental típico,
um laser pulsado Nd: YAG operando em 532 nm e 250 mW de potência é usado como
fonte; o alvo (grafite) é mantido em um forno à temperatura de 1200oC. Fullerenos têm
sido também produzidos em chamas de fuligem envolvendo, por exemplo, a
combustão de benzeno e acetileno, embora em baixas taxas de síntese.
5.5.2. Extração de Fullerenos
No processo de formação de fullerenos por vapor de carbono, gerado a partir
de vários materiais carbonáceos ou hidrocarbonetos gasosos, ocorre a formação de
fuligem carbônica, juntamente com fullerenos solúveis. Dois métodos distintos são
empregados no processo de extração de fullerenos provenientes de fuligem. No
método mais usual, denominado “método dos solventes”, o tolueno ou algum outro
solvente apropriado é usado para dissolver primariamente os fullerenos, embora no
solvente também haja impurezas de hidrocarbonetos insolúveis. A fuligem e outros
compostos insolúveis são facilmente separados desta solução por filtração ou
simplesmente por decantação da solução. No segundo método, chamado “método de
sublimação”, a fuligem contendo fullerenos é aquecida em um tubo de quartzo, em gás
de He ou em vácuo (~ 10-5 Torr) para sublimar os fullerenos, que são então
condensados em uma seção de resfriamento do tubo, conduzindo a fuligem e outros
compostos não-voláteis para trás, na seção mais quente.
140
Ambos os métodos de extração têm a tendência de carregar impurezas
juntamente com os fullerenos mais estáveis (isto é, C60 e C70). Dessa forma, uma
etapa final de purificação química deve ser realizada para a obtenção de uma solução
de fullereno de alta pureza, bem como para a obtenção de microcristais pulverizados.
5.5.2.1. O Método de Extração por Solventes
A extração “Soxhlet” usando solvente quente foi empregada nas primeiras
tentativas de remoção de fullerenos da fuligem carbônica gerada na etapa de síntese.
Técnicas mais modernas à base de solventes são aplicáveis nos processos de
produção em maior escala. A técnica “Soxhlet” é usada em uma variedade de
extrações, nas quais as espécies moleculares a serem removidas da fase sólida são
solúveis em solventes orgânicos. Na Fig. 5.10, mostramos o esquema de uma unidade
de extração “Soxhlet”.
Figura 5.10. Esquema de uma unidade de extração “Soxhlet” usada na separação de fullerenos
da fuligem formada no processo de síntese em arco elétrico.
141
A amostra sólida (contendo fullerenos, fuligem e outros materiais) é introduzida
em um compartimento localizado na porção central do aparato. O solvente entra em
ebulição em um frasco localizado na base do equipamento. O vapor de solvente
resultante se propaga através do braço esquerdo do extrator “Soxhlet”, condensando-
se na base da unidade condensadora representada no esquema, formando gotículas
aquecidas do solvente destilado no interior do compartimento ou mesmo de uma série
de compartimentos concêntricos, que são permeáveis à solução.
A solução contendo as moléculas extraídas retorna ao frasco ebulidor, via
braço direito do extrator. Este sistema fechado é normalmente operado por várias
horas. Durante este período de tempo, os fullerenos solúveis no solvente empregado
são coletados no frasco e a porção insolúvel da amostra sólida permanece no
compartimento.
5.5.2.2. O Método de Extração por Sublimação
Sabe-se que amostras de pó microcristalino de C60 e C70 sofrem sublimação a
vácuo, em temperaturas relativamente baixas, isto é, Ts ~ 350o C (C60) e Ts = 460o C
(C70) e este aspecto pode ser usado diretamente para separar C60 e C70 da fuligem
gerada pelo método de arco elétrico, sem introduzir solventes tais como hexano,
benzeno, dissulfeto de carbono ou tolueno. Para alguns experimentos que são
particularmente sensíveis à contaminação por solventes nas amostras, esta técnica
poderia prover uma alternativa útil à extração por solvente. No método de extração por
sublimação, a fuligem é colocada numa das extremidades de um tubo de quartzo
evacuado e lacrado (ou dinamicamente bombeado) e o conjunto é então inserido em
um forno com um gradiente de temperatura. O bombeamento dinâmico (no qual a
bomba é ligada ao tubo de quartzo durante o processo de sublimação) é preferível,
uma vez que há a possibilidade de que a fuligem possa também conter
hidrocarbonetos poliaromáticos ou outras impurezas voláteis. A extremidade do tubo
contendo fuligem bruta é mantida a uma temperatura mais elevada (Ts ~ 600 – 700o
C), tal que C60, C70 e possivelmente fullerenos superiores sejam sublimados da fuligem
e posteriormente conduzidos pelo gradiente de temperatura até as regiões mais frias
do tubo, sofrendo condensação nas paredes. O C70 e quantidades relativamente
pequenas de fullerenos superiores (como C76 e C84) são também condensados nas
proximidades da fuligem, uma vez que suas temperaturas de sublimação são maiores
que a do C60.
142
A diferença nas temperaturas de sublimação entre C60 e C70 é usada para
produzir um feixe molecular de C60 de uma mistura microcristalina de C60 e C70. Neste
caso, esta mistura é primeiramente aquecida em vácuo dinâmico (~ 250 – 300o C) por
um intervalo de tempo extendido (> 4 – 6h) a fim de expelir o solvente residual. O pó
resultante é então aquecido acima da temperatura de ebulição do C60. Em T ~ 400o C,
a taxa de sublimação de C60 em vácuo é favorecida por um fator de 20 sobre aquela
do C70. Dessa forma, considerando-se que o C70 apresenta um fator de abundância 7
vezes menor que o do C60 na fuligem, um feixe molecular de C60 razoavelmente puro
pode ser obtido.
5.5.3. Purificação de Fullerenos Um dos processos de purificação de fullerenos relatados na literatura faz uso
do método dos solventes, baseado em cromatografia líquida (CL). Por purificação
entende-se a separação dos fullerenos em um extrato contendo C60, C70, C84, etc. A
fim de se verificar a eficiência do processo de purificação, os fullerenos são
caracterizados por ferramentas sensíveis tais como espectrometria de massa,
ressonância magnética nuclear (NMR), cromatografia líquida e espectroscopia de
absorção óptica.
A cromatografia líquida (CL) é a principal técnica usada na purificação de
fullerenos. De maneira breve, pode-se definir a CL como uma técnica química
envolvendo umidade, na qual uma solução (denominada fase móvel) contendo uma
mistura molecular é forçada a passar através de uma coluna envolvida por uma
grande área superficial sólida (denominada fase estacionária). A identificação das
frações separadas na coluna de CL é verificada qualitativamente pela cor (magenta ou
púrpura para C60 em tolueno e laranja-avermelhado para C70 em tolueno) e, mais
quantitativamente, por comparação entre espectros vibracionais de infravermelho
observados, espectros ópticos, dados de NMR, etc. A CL geralmente permite a
separação dos fullerenos de acordo com seus pesos moleculares, mas este método
pode também ser usado para isolar um único alótropo quiral distinto, tal como C76, ou
para separar isômeros de mesmo peso molecular, mas com diferentes conformações,
como por exemplo, a separação entre C78 com simetria C2v e C78 com simetria D3.
O princípio do processo de cromatografia líquida é descrito a seguir. Por uma
série de mecanismos físicos ou químicos, uma molécula particular em uma fase móvel
é diferenciada por ser forçada a interagir com a fase estacionária. Esta interação
143
aumenta (ou diminui) o tempo de retenção daquela molécula na coluna ou,
equivalentemente, diminui (ou aumenta) a taxa de migração daquela espécie
molecular através da coluna cromatográfica. Dessa forma, como uma função do
tempo, os componentes moleculares separados da mistura emergem, a fim de diminuir
a interação com a fase estacionária. As espécies moleculares mais “adiantadas”
emergem primeiro e assim por diante. A separação das espécies moleculares é obtida
quando uma diferença suficiente no tempo de retenção na coluna puder ser atingida.
Diferenças físicas ou químicas significativas das espécies moleculares (como massa,
forma e adsorção na superfície) são necessárias para atingir uma separação
cromatográfica nítida.
As técnicas efetivamente empregadas em nossos estudos experimentais
referentes aos fullerenos, realizados nos laboratórios do Departamento de Física da
UFMG, serão descritas na seção 5.7.
144
145
5.6. Estudo Teórico
Nesta seção, apresentamos nossos resultados teóricos referentes ao estudo
das propriedades estruturais, eletrônicas e vibracionais das moléculas de C60, C70,
C48N12, C60X60 (X = H, F) e X@C60 (X = H, Li, Na, K). O principal objetivo deste estudo
consiste na execução de cálculos exploratórios, mediante a aplicação dos métodos
teóricos ab initio Hartree-Fock e semi-empírico MNDO na investigação das
propriedades destes fullerenos, a fim de examinar o desempenho destes métodos de
cálculo e comparar sua eficiência. A opção pelo emprego do método semi-empírico
MNDO justifica-se pelo fato de que esta aproximação contém todo um arcabouço
teórico embasado na teoria Hartree-Fock, uma vez que o MNDO consiste numa
simplificação do método ab initio HF, conforme discutimos na seção 2.3. Neste
sentido, a comparação entre os resultados torna-se bastante apropriada. Visando o
estudo teórico posterior de fullerenos de pesos moleculares mais elevados, bem como
de nanotubos de carbono quirais (com grandes células unitárias), para os quais o
cálculo ab initio torna-se inviável, testamos a qualidade dos resultados fornecidos pelo
método MNDO, que é implementado para comportar moléculas grandes, tipicamente
acima de 1000 átomos. Em todos os cálculos realizados, empregamos o conjunto-
base STO-3G.
No decorrer de nossos estudos, tomamos conhecimento de investigações
teóricas similares, realizadas por XIE et al. [35], os quais empregaram o mesmo nível
de cálculo no estudo das moléculas de C60 e C48N12, e cujo trabalho já estava em vias
de publicação na literatura. Entretanto, tal fato foi bastante positivo, no sentido de que
corroborou a exatidão de nossos resultados, mediante a possibilidade de comparação
direta entre os mesmos.
5.6.1. Resultados, Análise e Discussão
5.6.1.1. A Molécula de C60: Propriedades Estruturais e Eletrônicas
A geometria da molécula de C60 foi totalmente optimizada, com relaxação
completa de todos os átomos, através dos métodos ab initio RHF e semi-empírico
MNDO. A opção pelo uso do método Hartree-Fock restrito (RHF), ao invés de UHF
justifica-se pelo fato de a molécula de C60 apresentar camada fechada. O diâmetro
interno calculado para esta molécula foi de 7.09 Å (método RHF) e de 7.07 Å (método
146
MNDO), em boa concordância com o valor experimental, em 7.10 Å, conforme listado
na Tabela V.1.
A Tabela V.3 faz uma comparação entre os comprimentos de ligação C-C e
C=C calculados e os valores teóricos e experimentais da literatura.
Tabela V.3. Comprimentos de ligação C-C e C=C da molécula de C60, obtidos a partir de
valores teóricos e experimentais disponíveis na literatura, comparados aos nossos cálculos
(RHF e MNDO). Os valores entre parênteses indicam o erro percentual em relação à média dos
valores experimentais. Método Ligação simples C-C (Å) Ligação “dupla” C=C (Å)
RHF/STO-3G a,b 1.463 (0.76) 1.376 (1.65) MNDO/STO-3G a,c 1.473 (1.45) 1.400 (0.07) SCFMO b 1.49 (2.62) 1.43 (2.29) Hückel b 1.436 (1.10) 1.418 (1.43) QCFF/PI b 1.471 (1.31) 1.411 (0.93) EHM b 1.446 (0.41) 1.402 (0.29) Exp./XRCT b 1.4459 1.3997 Exp./XRPD b 1.455 1.391 Exp./NMR b 1.45 1.40 Exp./GPED b 1.458 1.401
a Nossos cálculos; b referência [35]; c referência [38]. As siglas referentes aos método
teóricos e experimentais denotadas nesta tabela são definidas na página seguinte.
Os comprimentos de ligação optimizados em 1.463 Å para a ligação C-C
(localizada na junção entre uma face pentagonal e uma face hexagonal) e em 1.376 Å,
para a ligação C=C (localizada na junção entre duas faces hexagonais), obtidos por
nossos cálculos RHF, concordam com os valores teóricos e experimentais listados. Os
valores entre parênteses indicam o erro percentual em relação aos valores
experimentais médios (1.452 Å para a ligação simples C-C e 1.399 Å para a ligação
dupla C=C). Como podemos observar, considerando o baixo custo computacional do
método MNDO, os comprimentos de ligação preditos por este método são
satisfatórios. O método semi-empírico QCFF/PI (“quantum-chemical-force-field for π
electrons”) [35] não fornece resultados tão satisfatórios quanto aqueles obtidos a partir
da teoria MNDO, uma vez que sua parametrização é efetuada principalmente com
relação a freqüências de hidrocarbonetos conjugados. Notamos ainda que os
comprimentos de ligação calculados pelo uso dos métodos semi-empíricos Hückel e
do modelo Hubbard estendido (EHM) [35] são eficazes. É interessante observarmos
que estas aproximações teóricas semi-empíricas incluem implicitamente o efeito de
correlação eletrônica encontrado em sistemas π conjugados, com exceção do modelo
147
de Hubbard estendido, cujos efeitos de correlação são explícitos. Observamos
também que os valores obtidos pelo método SCFMO (“self-consistent field molecular
orbitals”) [35] concordam com nossos resultados RHF/STO-3G, embora os
comprimentos de ligação obtidos pela aproximação SCFMO sejam um pouco mais
longos.
Em comparação com os valores experimentais listados na Tabela V.5,
percebemos que os dois tipos de comprimentos de ligação calculados usando nossos
métodos teóricos RHF e MNDO estão em boa concordância com os resultados
medidos pelas técnicas de XRPD (“X-ray powder diffraction”), GPED (“gas-phase
electron diffraction”), NMR (“nuclear magnectic resonance”) ou XRCT (“X-ray
crystallography technique”).
A molécula de C60 possui somente dois tipos de ângulos de ligação: o ângulo
entre duas ligações simples C-C adjacentes e aquele entre uma ligação “dupla” C=C e
uma ligação simples C-C adjacentes. Nossos resultados foram calculados em 108.0o e
120.0o, respectivamente.
A Tabela V.4 mostra nossos valores calculados para as energias eletrônicas
referentes à molécula de C60, comparados aos valores teóricos da literatura [35].
Tabela V.4. Energias eletrônicas da molécula de C60, calculadas através de nossos métodos
teóricos ab initio (RHF) e semi-empírico (MNDO), comparadas aos valores teóricos disponíveis
na literatura.
Energias (eV) RHF/ STO-3G a
MNDO/ STO-3G a
RHF/ STO-3G b
DFT/ STO-3G b
ETOTAL -61068.985 37.651 -61067.132 -61446.662 ECARBONO -1012.230 7.411 - - EATÔMICA -60733.801 444.634 - - ELIGAÇÃO 5.586 6.783 5.581 7.715 EHOMO -5.618 -9.129 -5.456 -4.356 ELUMO 3.037 -2.566 2.688 -1.127 ∆EGAP 8.655 6.563 8.144 3.229
a nossos cálculos; b referência [35].
A energia de ligação por átomo de carbono na molécula de C60, ELIGAÇÃO, foi
obtida a partir da seguinte equação:
nEE
E ATÔMICATOTALLIGAÇÃO
−= , (5.1)
148
em que n é o número total de átomos. Calculamos a energia eletrônica de um único
átomo de carbono, através dos métodos RHF e MNDO, mediante o uso do mesmo
conjunto-base empregado no cálculo da molécula de C60 (STO-3G). A energia atômica
∑=N
nEEATÔMICA , na Eq. (5.1), foi obtida multiplicando o valor da energia eletrônica de
um único átomo de carbono, nE , pelo número de átomos equivalentes existentes na
molécula (neste caso, 60). Em seguida, substituindo os valores calculados de ETOTAL e
EATÔMICA na Eq. (5.1), obtivemos o valor de ELIGAÇÃO na molécula de C60: 5.586 eV
(método RHF) e 6.783 eV (método MNDO). Nosso resultado ab initio está em
concordância com o valor calculado por XIE et al. [35] em 5.581 eV (método
RHF/STO-3G). O valor calculado por XIE et al. [35] mediante o método DFT/STO-3G
foi de 7.715 eV. O valor experimental para a energia de ligação por átomo de carbono
no C60 é de 7.40 eV [28], conforme pode ser observado na Tabela V.1.
Devemos ressaltar que a energia de ligação depende da exatidão das energias
dos átomos isolados, do conjunto-base empregado e da inclusão de efeitos de
correlação eletrônica. Dessa forma, a comparação direta entre resultados obtidos por
diferentes métodos teóricos de cálculo, ou mesmo pelo uso de diferentes funções-
base em um mesmo método, deve respeitar as devidas restrições. Podemos observar,
por exemplo, analisando os dados listados na Tabela V.4, que os valores RHF e
MNDO para a ETOTAL, ECARBONO e EATÔMICA não são diretamente comparáveis, visto que
são calculados tendo diferentes zeros de energia. Por outro lado, a ELIGAÇÃO é uma
grandeza diretamente comparável, uma vez que se refere à diferença entre as
energias total e atômica da molécula.
A distribuição de cargas atômicas na molécula da C60, segundo a análise
populacional de Mulliken, obviamente apresentou carga nula para todos os átomos.
5.6.1.2. A Molécula de C60: Propriedades Vibracionais
As freqüências vibracionais harmônicas da molécula de C60 foram calculadas
com o mesmo conjunto-base empregado na optimização da estrutura molecular.
Nossos resultados mostraram que os 174 modos normais de vibração da molécula de
C60 correspondem a 46 freqüências fundamentais. A Tabela V.5 compara nossos
resultados teóricos RHF e MNDO com os valores teóricos e experimentais disponíveis
na literatura. Uma importante observação a ser feita é que os resultados obtidos para
os modos vibracionais através do nível de cálculo RHF/STO-3G foram multiplicados
149
pelo fator de ajuste 0.89, recomendado por FORESMAN et al. [6], visto que o método
Hartree-Fock superestima o valor da freqüência vibracional em relação aos valores
experimentais. Por outro lado, os valores calculados pela aproximação MNDO não
foram corrigidos por qualquer fator, uma vez que não encontramos na literatura
nenhum registro ou recomendação para tal correção.
Tabela V.5. Os 46 modos normais de vibração fundamentais calculados para a molécula de C60
(em cm-1), comparados ao valores teóricos e experimentais disponíveis na literatura. Os
números entre parênteses indicam os erros percentuais (%) relativos às freqüências
experimentais.
Paridade par Modo RHF/
STO-3G a, b MNDO a, c DFT/
STO-3G b QCFF/PI b Experimental b
Ag 1498 (1.9) 1667 (13.4) 1549 (5.4) 1442 (1.9) 1470 492 (1.2) 610 (22.5) 502 (0.9) 513 (3.0) 498
Gg 1604 (5.2) 1650 (8.2) 1594 (4.5) 1585 (3.9) 1525 1363 (0.5) 1404 (3.5) 1380 (1.8) 1450 (6.9) 1356 1070 (0.6) 1235 (14.8) 1127 (4.7) 1158 (7.6) 1076 808 (0.3) 856 (6.2) 788 (2.2) 770 (4.5) 806 581 (6.4) 579 (6.9) 592 (4.6) 614 (1.1) 621 511 (5.1) 491 (1.0) 208 (4.6) 476 (2.1) 486
Hg 1702 (7.9) 1722 (9.1) 1677 (6.3) 1644 (4.2) 1578 1476 (3.4) 1596 (11.8) 1500 (5.1) 1465 (2.7) 1427 1319 (6.2) 1407 (12.5) 1332 (6.5) 1265 (1.1) 1251 1148 (4.3) 1261 (14.5) 1166 (5.9) 1154 (4.8) 1101 788 (1.7) 924 (19.2) 802 (3.5) 801 (3.4) 775 744 (4.6) 771 (8.4) 734 (3.3) 691 (2.8) 711 453 (4.6) 447 (3.2) 449 (3.7) 440 (1.6) 433 269 (1.5) 263 (3.7) 271 (0.6) 258 (5.5) 273
T1g 1340 (1.3) 1410 (3.8) 1357 (0.1) 1398 (2.9) 1358 860 (11.9) 865 (11.4) 865 (11.3) 975 (0.1) 976 612 (21.9) 627 (24.9) 594 (18.3) 597 (18.9) 502
T2g 1441 (5.9) 1483 (9.0) 1431 (5.2) 1470 (8.1) 1360 812 (11.2) 919 (0.5) 827 (9.5) 890 (2.6) 914 803 ( 7.2) 784 (9.4) 809 (6.4) 834 (3.6) 865 576 (1.6) 591 (4.2) 581 (2.5) 637 (12.3) 567
Paridade ímpar Au 989 (13.47) 972 (15.0) 994 (13.0) 1206 (5.5) 1143 Gu 1514 (4.7) 1587 (9.8) 1513 (4.7) 1546 (6.9) 1446
1359 (3.7) 1436 (9.6) 1381 (5.4) 1401 (6.9) 1310 991 (2.2) 1110 (4.1) 1009 (4.1) 1007 (3.8) 970 820 (11.3) 914 (1.1) 815 (11.8) 832 (10.0) 924 768 (1.1) 750 (1.3) 784 (3.1) 816 (7.4) 760 368 (8.0) 362 (9.5) 368 (8.1) 358 (10.5) 400
Hu 1696 (8.8) 1709 (9.6) 1668 (7.0) 1646 (5.6) 1559 1422 (2.7) 1467 (5.9) 1427 (3.0) 1469 (6.1) 1385 1293 (15.8) 1344 (20.3) 1295 (16.0) 1269 (13.6) 1117 788 (1.62) 822 (2.6) 771 (3.7) 812 (1.4) 801 692 (0.6) 706 (1.4) 696 (0.1) 724 (4.0) 696 569 (1.1) 546 (3.0) 564 (0.1) 531 (5.7) 563 412 (20.11) 403 (17.5) 417 (21.5) 403 (17.5) 343
T1u 1457 (2.0) 1628 (13.9) 1505 (5.3) 1437 (0.6) 1429 1242 (4.9) 1353 (14.4) 1266 (7.0) 1212 (2.5) 1183
150
Tabela V.5 (continuação) 584 (1.4) 719 (24.8) 596 (3.4) 637 (10.6) 576 558 (5.9) 577 (9.5) 546 (3.6) 544 (3.2) 527
T2u 1627 (3.2) 1687 (7.0) 1622 (2.8) 1558 (1.2) 1577 1181 (1.7) 1314 (9.4) 1235 (2.8) 1241 (3.3) 1201 956 (6.8) 1134 (10.5) 1002 (2.4) 999 (2.6) 1026 743 (9.3) 776 (14.1) 734 (7.9) 690 (1.5) 680 350 (1.7) 348 (2.2) 354 (0.5) 350 (1.7) 356
a Nossos cálculos; b referência [35]; c referência [38].
Os 46 modos vibracionais do C60 são classificados, de acordo com a paridade,
nas dez representações irredutíveis do grupo de ponto Ih. Os modos {Ag, Au} são não-
degenerados e os modos {T1g, T1u, T2g, T2u}, {Gg, Gu} e {Hg, Hu} apresentam
degenerescências 3, 4 e 5, respectivamente. Comparando, por exemplo, nossos
valores calculados pelo método MNDO com aqueles obtidos pelo método semi-
empírico QCFF/PI, observamos que este último apresenta em geral melhores
resultados, o que é natural, pois, conforme já mencionado, sua parametrização é feita
com relação às freqüências vibracionais de hidrocarbonetos aromáticos e conjugados,
embora forneça uma optimização de geometria menos satisfatória. Tais resultados
indicam que a estrutura eletrônica do C60 não é muito diferente das estruturas de
outros hidrocarbonetos aromáticos.
A molécula de C60 apresenta apenas 4 modos vibracionais ativos no
infravermelho, todos com simetria T1u. Isso pode ser compreendido mediante
considerações de teoria de grupos. Conforme já discutido no Capítulo 3, utilizando as
propriedades de simetria do sistema, podemos estabelecer as regras de seleção das
transições para a formação do espectro no infravermelho. Estas regras são
determinadas a partir dos valores das integrais das componentes do momento de
dipolo elétrico µr : zyx µµµ ,, . Uma operação de simetria R, aplicada a tais
componentes, correspondendo à vibração molecular, afetará os eixos de coordenadas
de tal forma que zyx µµµ e, se transformem da mesma forma que zyx e, ,
respectivamente. A representação T1u tem como funções-base as coordenadas
),,( zyx , as quais estão associadas às componentes do momento de dipolo µr .
Portanto, na molécula de C60, somente os modos vibracionais com simetria T1u são
ativos no infravermelho. O espectro de infravermelho da molécula de C60 é então
bastante simples, uma conseqüência direta da alta simetria do grupo icosaédrico.
“Clusters” de carbono de tamanhos comparáveis, mas com menores graus de simetria,
apresentam um número maior de freqüências vibracionais com atividade no
151
infravermelho. Por exemplo, o grafiteno, um isômero do C60, possui simetria D6h e 20
freqüências ativas no infravermelho.
Os modos vibracionais com atividade Raman na molécula de C60 são apenas
10: 2 com simetria Ag e 8 com simetria Hg, podendo ser identificados na Tabela V.7.
Como já discutido, para que haja transição vibracional via espalhamento Raman, é
necessário que pelo menos uma das integrais envolvendo as componentes do tensor
de polarizabilidade ijα seja diferente de zero. Tais componentes transformam-se, por
uma operação de simetria R, como formas quadráticas yzxzxyzyx ,,,,,( 222 ou
combinações das mesmas). No grupo de ponto icosaédrico Ih, somente as
representações Ag e Hg têm como funções-base )( 222 zyx ++ e
( ),,,,2 22222 yzxzxyyxyxz −−− , respectivamente, as quais estão associadas às
componentes do tensor de polarizabilidade ijα . Portanto, na molécula de C60, somente
os modos vibracionais com simetrias Ag e Hg são ativos no Raman.
Nossos resultados nos permitiram verificar que o método semi-empírico
MNDO, embora em geral apresente erros da ordem de até ~ 25% em relação aos
valores experimentais, é capaz de identificar corretamente os modos normais que são
ativos no infravermelho. Entretanto, é importante salientar que no pacote Gaussian94
[6,7], o método MNDO não está parametrizado para o cálculo das intensidades
Raman.
A Fig. 5.11 mostra os espectros vibracionais teóricos de infravermelho e
Raman obtidos para a molécula de C60. Estranhamente, observamos que os espectros
de infravermelho da molécula de C60, calculados pelos métodos ab initio RHF (Fig.
5.11a) e semi-empírico MNDO (Fig. 5.11c), quando comparados entre si, apresentam
diferenças notáveis de comportamento quanto à intensidade dos picos. Uma possível
justificativa poderia estar relacionada com a pobreza do conjunto-base empregado no
cálculo RHF (base mínima STO-3G).
152
(a)
(b)
(c)
Figura 5.11. Espectros teóricos calculados para a molécula de C60: (a) infravermelho (método
RHF); (b) Raman (método RHF); (c) infravermelho (método MNDO).
5.6.1.3. A Molécula de C70: Propriedades Estruturais e Eletrônicas
Realizamos cálculos de optimização completa da geometria da molécula de
C70, com relaxação completa de todos os átomos de carbono, através do métodos
RHF e MNDO. Como citado na seção 5.3, o volume da molécula de C70 é aproximado
como abcV π= , em que a, b e c denotam os semi-eixos de um elipsóide. Assim, os
diâmetros dos eixos c e (a-b) na molécula de C70 foram calculados em 7.96 Å e 7.09 Å,
153
respectivamente (método RHF). De acordo com os dados listados na Tabela V.2, os
valores em 7.96 e 7.12 Å estão em boa concordância com nossos resultados.
Na Tabela V.6, nossos resultados teóricos RHF e MNDO para os
comprimentos de ligação C-C da molécula de C70 são comparados com valores
teóricos e experimentais da literatura [28] para os oito tipos de comprimentos de
ligação C-C da molécula de C70. Verificamos que esta molécula apresenta um número
maior de sítios de carbono distintos, bem como um número maior de diferentes
comprimentos de ligação, quando comparada ao C60. Evidentemente, com o aumento
do número de átomos de carbono nos fullerenos, tais números tendem a aumentar,
juntamente com a complexidade da estrutura geométrica.
Analisando nossos resultados teóricos RHF e MNDO listados na Tabela V.6,
verificamos uma boa concordância com os valores teóricos obtidos pelos métodos de
dinâmica molecular “tight binding” (TBMD), aproximação de densidade local (LDA) e
com os valores experimentais de difração de elétrons (ED), espalhamento inelástico
de nêutrons (NIS) e dados de difração de raios-X.
Tabela V.6. Comprimentos de ligação (em Å) calculados para a molécula de C70 (métodos RHF
e MNDO), comparados com os valores teóricos e experimentais da literatura. A notação
adotada se refere à Fig. 5.12.
Métodos teóricos Métodos experimentais Ligação RHF/STO-
3G a MNDO/STO-
3G a, b TBMD b LDA b ED b NIS b Raios-X b
C1-C1 1.461 1.473 1.457 1.448 1.46 1.460 1.434 C1-C2 1.379 1.402 1.397 1.393 1.37 1.382 1.377 C2-C3 1.455 1.469 1.454 1.444 1.47 1.449 1.443 C3-C3 1.364 1.389 1.389 1.386 1.37 1.396 1.369 C3-C4 1.470 1.478 1.456 1.442 1.46 1.464 1.442 C4-C4 1.417 1.442 1.443 1.434 1.47 1.420 1.396 C4-C5 1.414 1.430 1.418 1.415 1.39 1.415 1.418 C5-C5 1.459 1.484 1.452 1.467 1.41 1.477 1.457
a Nossos cálculos; b referência [28].
154
Figura 5.12. Geometria da molécula de C70 (simetria D5h). No “cluster” de C70, existem cinco
sítios atômicos não-equivalentes (numerados de 1 a 5) e oito tipos diferentes de ligação C-C
(numeradas de 6 a 13).
A Tabela V.7 mostra nossos valores calculados para as energias eletrônicas
referentes à molécula de C70.
Tabela V.7. Energias eletrônicas da molécula de C70, calculadas através dos métodos teóricos
ab initio (RHF) e semi-empírico (MNDO). Energias (eV) RHF/
STO-3G a MNDO/
STO-3G a
ETOTAL -71249.851 40.675 ECARBONO -1012.230 7.411 EATÔMICA -70856.101 518.740 ELIGAÇÃO 5.625 6.829 EHOMO -5.132 -8.675 ELUMO 2.747 -2.842 ∆EGAP 7.879 5.833
a Nossos cálculos.
A energia de ligação da molécula de C70 foi obtida mediante procedimento
análogo ao descrito para o C60. Analisando os resultados listados nas Tabelas V.6 e
V.10, observamos que a diferença entre as energias de ligação das moléculas de C60
e C70 vale 0.03 eV (método RHF) e 0.05 eV (método MNDO). Estes valores estão em
boa concordância com a diferença experimental de 0.02 eV [28]. Observamos, no que
se refere à comparação entre diferenças de energia, o efeito de cancelamento dos
erros de correlação eletrônica, os quais estão ausentes no método RHF. Comparando
nossos resultados RHF e MNDO, verificamos que a energia do “gap”, EHOMO - ELUMO,
155
diminui cerca de 2.046 eV e que a ELIGAÇÃO aumenta de 1.204 eV, do valor RHF para o
valor MNDO. Uma possível explicação para este comportamento poderia ser o fato de
que o método MNDO utiliza dados experimentais em sua parametrização, os quais
apresentam efeitos de correlação eletrônica embutidos.
A distribuição de cargas atômicas da molécula de C70, segundo a análise
populacional de Mulliken, apresentou uma configuração de cargas essencialmente
nula para todos os átomos de carbono.
5.6.1.4. A Molécula de C70: Propriedades Vibracionais
As freqüências vibracionais harmônicas da molécula de C70, pertencente ao
grupo de ponto D5h, foram calculadas através do método semi-empírico MNDO, visto
que o método ab initio Hartree-Fock não comportou o cálculo da estrutura. Nossos
resultados mostraram que os 204 modos normais de vibração da molécula de C70
apresentam 31 picos de absorção permitidos no infravermelho (correspondendo às
espécies de simetria 10A2” + 21E1’) e 53 modos permitidos no Raman
(correspondendo às espécies de simetria 12A1’ + 22 E2’ + 19 E1”) [44]. Os modos
remanescentes (9A2’ + 9A1” + 20E2”) são inativos. Considerando o grupo de ponto D5h,
ao qual pertence a molécula de C70, podemos constatar que somente os modos
vibracionais com simetria A2” e E1’ são ativos no infravermelho e se transformam de
acordo com as coordenadas z e ),( yx , respectivamente. Os modos vibracionais com
atividade Raman nesta molécula pertencem às representações A1’, E2’ e E1”, cujas
funções-base correspondem às formas quadráticas ( 222 , zyx + ), ),( 22 xyyx − e
),( yzxz , respectivamente.
A Tabela V.8 mostra os modos vibracionais ativos no infravermelho e Raman
calculados para esta molécula, mediante o método MNDO, comparados com os
valores teóricos da literatura.
Tabela V.8. Modos vibracionais ativos no infravermelho (A2” e E1’) e Raman (A1’, E2’e E1”),
calculados para a molécula de C70 (em cm-1), obtidos mediante o método semi-empírico
MNDO, comparados aos valores teóricos da literatura. Método Simetria do
modo Freqüências Vibracionais
MNDO a,b A2” 325, 493, 700, 772, 996, 1159, 1313, 1447, 1637, 1742 Tabela V.8. (continuação) E1’ 334, 367, 428, 518, 627, 650, 669, 740, 832, 863, 929,
156
1051, 1248, 1327, 1397, 1429, 1470, 1555, 1592, 1659, 1721
A1’ 259, 407, 560, 625, 775, 849, 1222, 1374, 1433, 1617, 1666, 1736
E2’ 222, 310, 393, 515, 504, 529, 697, 770, 831, 822, 869, 910, 1103, 1226, 1282, 1340, 1387, 1449, 1527, 1536, 1662, 1710
E1” 250, 414, 532, 583, 660, 754, 783, 775, 878, 883, 1165, 1266, 1317, 1425, 1491, 1484, 1626, 1652, 1670
Modelo da constante de força c
A2” 374, 525, 668, 741, 1053, 1202, 1271, 1450, 1508, 1588
E1’ 389, 397, 420, 468, 550, 574, 623, 719, 744, 809, 982, 1026, 1187, 1213, 1262, 1316, 1375, 1377, 1430, 1503, 1563
A1’ 230, 308, 475, 536, 737, 825, 1160, 1253, 1290, 1335, 1483, 1585
E2’ 260, 348, 415, 494, 508, 620, 685, 705, 809, 850, 856, 980, 1070, 1182, 1203, 1305, 1325, 1350, 1414, 1415, 1548, 1571
E1” 285, 460, 555, 592, 632, 716, 796, 839, 874, 955, 1172, 1202, 1253, 1345, 1384, 1422, 1494, 1540, 1586
Método QCFF/PI d A2” 326, 485, 592, 684, 895, 1168, 1217, 1270, 1389, 1565 E1’ 327, 361, 412, 498, 560, 585, 650, 711, 748, 819, 931,
961, 1118, 1200, 1245, 1369, 1383, 1424, 1499, 1568, 1640
A1’ 251, 404, 474, 570, 682, 732, 1085, 1187, 1220, 1383, 1465, 1633
E2’ 216, 305, 425, 501, 570, 667, 722, 756, 773, 781, 822, 868, 966, 1064, 1212, 1265, 1332, 1433, 1463, 1526, 1583, 1645
E1” 243, 419, 489, 538, 559, 699, 753, 766, 806, 909, 1069, 1186, 1232, 1317, 1360, 1440, 1461, 1592, 1647
a Nossos cálculos; b referência [39]; c referência [40]; d referência [41].
A Figura 5.13 representa o espectro de infravermelho teórico MNDO calculado
para a molécula de C70.
Figura 5.13. Espectro teórico de infravermelho calculado para a molécula de C70 (método
MNDO).
5.6.1.5. A Molécula de C48N12: Propriedades Estruturais e Eletrônicas
157
A geometria da molécula de C48N12, representada na Fig. 5.14, foi totalmente
optimizada, com relaxação completa de todos os átomos, através dos métodos RHF e
MNDO.
Figura 5.14. Representação da molécula de C48N12 usada em nossas simulações. Os átomos
de C e N estão representados por esferas nas cores cinza e azul, respectivamente.
Na Tabela V.9, os comprimentos de ligação carbono-carbono (CC) e
nitrogênio-carbono (NC), calculados para a molécula de C48N12 através dos métodos
RHF e MNDO, são comparados aos valores RHF e DFT extraídos da literatura [35].
Observamos que há 6 tipos distintos de ligação NC e 9 tipos de ligação CC diferentes.
Em comparação com os comprimentos de ligação CC da molécula de C60, notamos
que, em geral, as ligações simples C-C são menores no C48N12, o que deve ser devido
à redistribuição da densidade eletrônica na molécula. Os ângulos de ligação <C-C-C,
<C-N-C e <C-C-N na molécula de C48N12 são 108.0o e 120.0o e 120.0o,
respectivamente.
Tabela V.9. Comprimentos de ligação CC e NC (em Å) calculados para as moléculas de C48N12
e C60, mediante os métodos RHF e MNDO, em comparação com os valores teóricos
disponíveis na literatura.
Fullereno Ligação RHF/STO-3G a, b MNDO/STO-3G a DFT/STO-3G (Å) b
C48N12 CC 1.3914 1.4283 1.4275 CC 1.4151 1.4280 1.4371 NC 1.4601 1.4594 1.4742
Tabela V.9, (continuação) CC 1.4662 1.4643 1.4701
158
CC 1.3590 1.4014 1.4092 CC 1.4566 1.4465 1.4559 NC 1.4553 1.4491 1.4707 CC 1.4580 1.4454 1.4567 NC 1.4637 1.4404 1.4749 CC 1.4352 1.4495 1.4399 CC 1.3641 1.4077 1.4119 CC 1.3705 1.4133 1.4195 NC 1.4419 1.4313 1.4586 NC 1.4313 1.4388 1.4510 NC 1.4360 1.4457 1.4612
C60 C=C 1.3759 1.4002 1.4130 C-C 1.4628 1.4734 1.4773
a Nossos cálculos; b referência [35].
Na Tabela V.10, mostramos os valores calculados para as energias eletrônicas
referentes à molécula de C48N12, em comparação com os resultados teóricos
disponíveis na literatura [35].
Tabela V.10. Energias eletrônicas da molécula de C48N12, calculadas através dos métodos
teóricos ab initio (RHF) e semi-empírico (MNDO), comparadas aos valores teóricos disponíveis
na literatura.
Energias (eV) RHF/ STO-3G a
RHF/ STO-3G b
MNDO/ STO-3G a
DFT/ STO-3G b
ETOTAL -66400.460 -66397.387 39.643 -66795.835 ECARBONO -1012.230 - 7.411 -
ENITROGÊNIO -1461.783 - 4.915 - EATÔMICA -66128.442 - 414.689 - ELIGAÇÃO 4.534 4.510 6.251 6.888 EHOMO -4.204 -3.287 -8.476 -2.365 ELUMO 3.563 3.797 -2.671 -0.188 ∆EGAP 7.767 7.084 5.807 2.177
a nossos cálculos; b referência [35].
A energia de ligação da molécula de C48N12 foi obtida mediante o emprego da
Eq. (5.1) e os valores encontrados foram 4.534 eV (método RHF) e 6.251 eV (método
MNDO). Observamos que nosso resultado RHF concorda com o valor calculado por
XIE et al. [35] em 4.510 eV, também obtido pelo método RHF. Comparando nossos
resultados RHF com os resultados DFT, verificamos que a energia do “gap” (EHOMO-
ELUMO) diminui de 5.590 eV. De fato, os valores calculados para o “gap” de energia são
superestimados no método Hartree-Fock, em relação ao valor experimental. Por outro
lado, na teoria DFT, estes valores são subestimados em relação ao valor
experimental.
159
A distribuição de cargas atômicas na molécula de C48N12, segundo a análise
populacional de Mulliken, apresentou a configuração mostrada na Tabela V.11.
Tabela V.11. Distribuição de cargas atômicas na molécula de C48N12 (em unidades de carga do
elétron, e), obtida segundo a análise populacional de Mulliken.
Átomo Carga Átomo Carga Átomo Carga C1 .095334 C2 .060001 C3 .089332 C4 .071873 N5 -.234421 C6 .107181 C7 -.023773 C8 -.019225 C9 .094249 N10 -.240551 C11 -.019225 C12 .094249 N13 -.240551 C14 .107181 C15 -.023773 C16 .060001 C17 .095334 N18 -.234421 C19 .071873 C20 .089332 C21 .107181 N22 -.240551 C23 .094249 C24 -.019225 C25 -.023773 N26 -.234421 C27 .071873 C28 .089332 C29 .060001 C30 .095334 C31 .071873 N32 -.234421 C33 .095334 C34 .060001 C35 .089332 C36 .107181 N37 -.240551 C38 .094249 C39 -.019225 C40 -.023773 N41 -.234421 C42 .071873 C43 .089332 C44 .060001 C45 .095334 C46 .107181 C47 -.023773 C48 -.019225 C49 .094249 N50 -.240551 C51 -.019225 C52 .094249 N53 -.240551 C54 .107181 C55 -.023773 C56 .060001 C57 .095334 N58 -.234421 C59 .071873 C60 .089332
A análise da distribuição de cargas desta molécula nos permitiu verificar que
os átomos de carbono e nitrogênio estão simetricamente dispostos. A Fig. 5.15 mostra
tais agrupamentos, representados por um código de cores. Os átomos de N estão
agrupados formando 2 grupos de 6 átomos cada um, ao passo que os átomos de C se
agrupam formando 8 grupos de 6 átomos cada um:
a) primeiro grupo: N5, N18, N26, N32, N41 e N58 (carga: –0.234e; em azul claro);
b) segundo grupo: N10, N13, N22, N37, N50 e N53 (carga: –0.240e; em azul escuro);
c) terceiro grupo: C1, C17, C30, C33, C45 e C57 (carga: +0.095e; em amarelo);
d) quarto grupo: C2, C16, C29, C34, C44 e C56 (carga: +0.060e, em vermelho);
e) quinto grupo: C3, C20, C28, C35, C43 e C60 (carga: +0.089e; em verde escuro);
f) sexto grupo: C4, C19, C27, C31, C42 e C59 (carga: +0.071e; em marrom);
g) sétimo grupo: C6, C14, C21, C36, C46 e C54 (carga: +0.107e; em branco);
h) oitavo grupo: C7, C15, C25, C40, C47 e C55 (carga: -0.237e; em cinza);
i) nono grupo: C8, C11, C24, C39, C48 e C51 (carga: -0.019e; em verde claro);
j) décimo grupo: C9, C12, C23, C38, C49 e C52 (carga: +0.094e; em laranja).
160
Figura 5.15. Representação da distribuição de cargas na molécula de C48N12, segundo a
análise populacional de Mulliken. Os átomos de C e N estão simetricamente agrupados de
acordo com a carga adquirida, sendo representados na figura através de um código de cores.
Primeiro grupo: N (em azul claro); segundo grupo: N (em azul escuro); terceiro grupo: C (em
amarelo); quarto grupo: C (em vermelho); quinto grupo: C (em verde escuro); sexto grupo: C
(em marrom); sétimo grupo: C (em branco); oitavo grupo: C (em cinza); nono grupo: C (em
verde claro); décimo grupo: C (em laranja).
5.6.1.6. A Molécula de C48N12: Propriedades Vibracionais
A molécula de C48N12, pertencente ao grupo de ponto S6, apresenta um total de
174 modos normais de vibração, dos quais 58 são ativos no infravermelho e 58 no
Raman. Os 58 modos vibracionais com atividade no infravermelho pertencem às
representações Au e Eu. À representação Au, cuja função-base está associada à
coordenada z , correspondem 29 modos não-degenerados; à representação Eu,
associada às coordenadas ),( yx correspondem 29 modos duplamente degenerados.
Os 58 modos vibracionais com atividade Raman pertencem às representações
Ag e Eg. À representação Ag, cujas funções-base são ( 222 , zyx + ), estão associados
29 modos não-degenerados. À representação Eg, cujas funções-base são
combinações do tipo [ ),();,( 22 yzxzxyyx − ], estão associados 29 modos duplamente
degenerados.
Nas Tabelas V.12 e V.13, listamos nossos resultados RHF e MNDO referentes
aos modos vibracionais da molécula de C48N12 ativos no infravermelho e Raman,
respectivamente. Estas tabelas também trazem alguns valores teóricos comparativos
RHF e DFT extraídos da literatura [35]. Observamos que o método semi-empírico
161
MNDO é eficaz na determinação qualitativa dos modos normais de vibração da
molécula de C48N12, identificando eficientemente todas as degenerescências
existentes na molécula e prevendo corretamente quais freqüências vibracionais são
ativas no infravermelho. Novamente, os modos vibracionais calculados pela
aproximação RHF/STO-3G estão multiplicados pelo fator de ajuste 0.89, o que ocorre
com os valores calculados pelo método MNDO.
Tabela V.12. As 58 freqüências vibracionais ativas no infravermelho (em cm-1), calculadas para
a molécula de C48N12, através dos métodos RHF e MNDO, comparadas aos valores teóricos
disponíveis na literatura.
Modos Vibracionais Ativos no Infravermelho para a molécula de C48N12 RHF/STO-3G a, b MNDO/STO-3G a DFT/STO-3G b
Duplamente degenerados
Não degenerados
Duplamente degenerados
Não degenerados
Duplamente degenerados
Não degenerados
317 271 337 303 314 286 356 329 366 345 363 328 383 360 394 367 394 362 401 381 406 390 406 391 456 469 485 487 437 450 490 495 515 625 465 470 514 570 526 688 496 581 551 619 667 716 566 592 643 654 704 770 623 645 657 683 709 775 632 656 679 714 738 783 656 692 686 747 763 792 675 735 713 775 780 872 695 784 750 800 837 1080 722 798 782 942 1092 1102 788 958 954 958 1174 1166 973 972
1034 975 1301 1338 1055 990 1189 1037 1331 1381 1203 1057 1222 1202 1385 1382 1231 1220 1259 1239 1458 1405 1275 1276 1336 1287 1462 1429 1348 1331 1381 1303 1476 1458 1391 1362 1440 1355 1505 1502 1440 1421 1466 1433 1555 1505 1478 1437 1541 1444 1624 1538 1525 1466 1574 1513 1666 1613 1555 1506 1637 1575 1691 1663 1602 1560 1651 1666 1702 1682 1628 1617 1727 1686 1728 1729 1680 1627
a Nossos cálculos; b referência [35].
162
Tabela V.13. As 58 freqüências vibracionais ativas no Raman (em cm-1), calculadas para a
molécula de C48N12, através dos métodos RHF e MNDO, comparadas aos valores teóricos
disponíveis na literatura.
Modos Vibracionais Ativos no Raman para a molécula de C48N12 RHF/STO-3G a, b MNDO/STO-3G a DFT/STO-3G b
Duplamente degenerados
Não degenerados
Duplamente degenerados
Não degenerados
Duplamente degenerados
Não degenerados
234 262 250 270 245 264 255 396 265 411 259 382 382 412 406 437 376 406 418 454 431 469 410 444 457 465 463 521 447 471 519 513 566 545 493 498 537 541 573 564 549 544 580 575 594 589 580 578 645 579 651 606 617 585 688 590 691 612 649 621 694 662 728 695 665 625 740 692 773 723 716 658 755 740 811 792 767 730 775 772 834 812 782 768 832 822 854 834 841 836 855 848 911 872 858 856
1103 1082 922 910 1124 1115 1140 1182 1240 955 1162 1194 1169 1196 1269 1229 1182 1221 1266 1246 1293 1303 1274 1316 1314 1307 1397 1306 1318 1337 1376 1334 1442 1410 1386 1367 1431 1365 1504 1434 1452 1416 1466 1410 1555 1485 1466 1439 1528 1473 1620 1548 1504 1481 1585 1532 1668 1624 1571 1531 1630 1573 1674 1667 1595 1558 1676 1618 1703 1699 1633 1581 1704 1732 1725 1736 1662 1683
a Nossos cálculos; b referência [35].
Na Fig. 5.16 mostramos os espectros vibracionais teóricos de infravermelho e
Raman calculados para a molécula de C48N12, mediante os métodos RHF e MNDO.
163
Figura 5.16. Espectros teóricos calculados para a molécula de C48N12. (a) infravermelho (RHF);
(b) Raman (RHF); (c) infravermelho (MNDO).
164
5.6.1.7. As “Fuzzyballs” C60X60 (X = H, F): Propriedades Estruturais e Eletrônicas
As moléculas de C60H60 e C60F60 foram totalmente optimizadas, com relaxação
completa de todos os átomos, a fim de minimizar a energia total, através dos métodos
RHF e MNDO. A Tabela V.14 lista nossos resultados obtidos para os comprimentos de
ligação e os ângulos de ligação interatômicos referentes às geometrias de equilíbrio
das moléculas de C60H60 e C60F60.
Tabela V.14. Comparação entre as estruturas de equilíbrio das moléculas de C60H60 e C60F60,
obtidas pelos métodos teóricos ab initio RHF e semi-empírico MNDO e os valores teóricos
disponíveis na literatura. Os comprimentos de ligação estão em Å e os ângulos de ligação em
graus.
X
Variável
RHF/ STO-3G a
RHF/ STO-3G b
MNDO/ STO-3G a, c
AM1 c PM3 c
H C-C (pent) 1.568 1.568 1.554 1.530 1.527 C=C (hex) 1.561 1.561 1.537 1.504 1.508 C-H 1.084 1.084 1.132 1.146 1.122 <HCC 101.9 101.0 100.9 101.3 100.1 H…H (pent) 2.015 - 2.027 1.999 2.014 H...H (hex) 1.981 - 1.964 1.954 1.901
F C-C (pent) 1.600 1.600 1.645 1.584 1.585 C=C (hex) 1.594 1.594 1.633 1.565 1.569 C-F 1.394 1.394 1.362 1.412 1.381 <FCC 101.3 - 101.1 101.3 101.5 F…F (pent) 2.171 - 2.209 2.164 2.147 F...F (hex) 2.141 - 2.157 2.118 2.118
a Nossos cálculos; b referência [37]; c referência [42].
Analisando os valores listados na Tabela V.20, verificamos que todos os
métodos prevêem um aumento dos comprimentos de ligação C-C e C=C quando se
vai do C60H60 para o C60F60, devido à maior eletronegatividade do flúor. Nossos
resultados RHF mostram que ambos os comprimentos de ligação, C-C e C=C, sofrem
um acréscimo de 0.03 Å do C60H60 para o C60F60. Já nossos valores obtidos pelo
método MNDO, para estes mesmos comprimentos de ligação, sofrem um aumento de
0.09 Å. Por outro lado, os ângulos de ligação <HCC e <FCC são muito pouco
alterados, conforme pode ser evidenciado na Tabela V.14. Estes resultados são
consistentes com o efeito que se espera da saturação dos átomos de carbono.
Salientamos que os resultados semi-empíricos AM1 e PM3 fornecem comprimentos de
165
ligação mais curtos quando comparados aos demais valores da Tabela V.14, visto que
em tais aproximações, o tratamento empírico da energia total é diferente.
Em média, nas moléculas de C60X60 (X = H, F), a distância X...X entre dois
átomos X vizinhos, sejam eles ligados a dois átomos de carbono da aresta de um
pentágono ou da aresta entre hexágonos, são maiores no C60F60 do que no C60H60.
Este aumento varia na faixa de 0.15 a 0.16 Å (RHF) e na faixa de 0.18 a 0.19 Å
(MNDO). Isto pode ser justificado tendo em vista a maior repulsão interatômica entre
os átomos de flúor, quando comparada àquela entre os átomos de hidrogênio.
A Tabela V.15 mostra nossos valores calculados para as energias eletrônicas
referentes às moléculas de C60H60 e C60F60 (métodos RHF e MNDO), em comparação
com os valores teóricos disponíveis na literatura.
Tabela V.15. Energias eletrônicas das moléculas de C60H60 e C60F60, calculadas através dos
métodos ab initio RHF e semi-empírico MNDO, comparadas aos valores teóricos disponíveis na
literatura.
C60H60 C60F60 Energias
(eV) RHF/
STO-3G a RHF/
STO-3G b MNDO/
STO-3G a RHF/
STO-3G a RHF/
STO-3G b MNDO/
STO-3G a
ETOTAL -62002.783 -62029.362 12.375 -221131.300 -221131.300 -34.871 ECARBONO -1012.230 - 7.411 -1012.230 - 7.411
EHIDROGÊNIO -12.696 - 2.259 - - - EFLÚOR - - - -2666.375 - 0.819
EATÔMICA -61495.589 - 580.197 -220716.328 - 493.783 ELIGAÇÃO 4.227 - 4.732 3.458 - 4.405 EHOMO -8.574 -8.572 -12.481 -11.241 -11.328 -15.150 ELUMO 12.746 12.762 1.687 7.803 7.810 -3.258 ∆EGAP 21.320 21.334 14.168 19.044 19.138 11.892
a Nossos cálculos; b referência [37].
A energia ELIGAÇÃO calculada para a molécula de C60H60 foi de 4.227 eV (método
RHF) e 4.732 eV (método MNDO). Observamos que estes valores sofrem uma
diminuição de 0.77 eV (RHF) e 0.33 eV (MNDO), quando comparados aos valores da
energia de ligação da molécula de C60F60. Ainda assim, o grande “gap” de energia
EHOMO - ELUMO observado nestas moléculas é típico de hidrocarbonetos saturados.
As distribuições de carga, segundo a análise populacional de Mulliken mostram
que, para a molécula de C60H60, os átomos de carbono adquirem carga negativa
(~ -0.044e), agindo como aceitadores de elétrons dos átomos de hidrogênio, os quais
adquirem carga positiva (~ +0.044e), agindo como doadores. Por outro lado, no caso
da molécula de C60F60, os átomos de carbono adquirem carga positiva (~ +0.110e),
166
agindo como doadores de elétrons aos átomos de flúor, os quais ficam negativamente
carregados (~ -0.110e), agindo como aceitadores.
5.6.1.8. As “Fuzzyballs” C60X60 (X = H, F): Propriedades Vibracionais
Realizamos cálculos de freqüências vibracionais para a molécula de C60H60,
empregando os métodos RHF (empregado para sistemas de camada fechada) e
MNDO e para a molécula de C60F60, apenas através do método MNDO, visto que o
método RHF não comportou o cálculo vibracional do C60F60. Nossos resultados
mostraram que dos 354 modos normais de vibração apresentados por ambas as
moléculas, apenas 9 são ativos no infravermelho e somente 20 no Raman. Da mesma
forma que a molécula de C60, as moléculas de C60H60 e C60F60 pertencem ao grupo de
simetria icosaédrico Ih. Assim, somente os modos T1u são permitidos no infravermelho,
da mesma forma que somente os modos Ag e Hg são permitidos no Raman.
Na Tabela V.16 fazemos uma comparação entre nossos resultados RHF e
MNDO e os valores MNDO e AM1 disponíveis na literatura para as freqüências
harmônicas ativas no infravermelho, correspondentes às moléculas de C60H60 e C60F60.
As transições permitidas no Raman (modos Ag e Hg) são listadas na Tabela V.17. Os
dados AM1 são listados nas Tabelas V.16 e V.17 apenas no intuito de indicar o quanto
os métodos semi-empíricos relacionados podem diferir em suas predições (por
exemplo, para X = H, as diferenças entre os resultados são menores).
Tabela V.16. Freqüências harmônicas calculadas (em cm-1) para as transições de
infravermelho permitidas, T1u, das moléculas de C60H60 e C60F60.
X = H (método RHF) a
X = H (método MNDO) a, b
X = F (método MNDO) a, b
X = F (método AM1) b
470 564 282 275 546 577 392 328 1048 1142 462 448 1331 1329 582 490 1495 1427 722 757 1534 1445 1054 1124 1560 1524 1172 1305 3247 3114 1461 1359 3280 3145 1482 1376
a Nossos cálculos; b referência [42].
167
Tabela V.17. Freqüências harmônicas calculadas (em cm-1) para as transições Raman
permitidas, Ag e Hg, das moléculas de C60H60 e C60F60.
X Método Simetria do modo
Freqüências Vibracionais
H RHF a Ag 426, 1500, 1570, 3284 Hg 231, 392, 611, 738, 917, 1151, 1331, 1332, 1370, 1461,
1532, 1544, 1563, 3259, 3259, 3273 MNDO a,b Ag 491, 1443, 1545, 3154 Hg 234, 430, 720, 748, 1000, 1245, 1338, 1353, 1414, 1434,
1449, 1493, 1498, 3104, 3128, 3143 F MNDO a,b Ag 281, 586, 1183, 1493 Hg 154, 299, 312, 382, 467, 521, 558, 575, 824, 1026, 1047,
1166, 1221, 1467, 1475, 1487 AM1 b Ag 294, 453, 1322, 1383 Hg 160, 274, 287, 366, 394, 426, 452, 600, 875, 1090, 1128,
1282, 1316, 1358, 1369, 1381
a Nossos cálculos; b referência [42].
A Fig. 5.17 representa os espectros vibracionais teóricos de infravermelho e
Raman calculados para as moléculas de C60X60 (X = H, F), obtidos mediante os
métodos ab initio RHF e/ou semi-empírico MNDO.
168
(a)
(b)
(c)
(d)
Figura 5.17. Espectros teóricos calculados para as moléculas de C60X60 (X = H, F). (a) C60H60:
infravermelho (método RHF); (b) C60H60: Raman (método RHF); (c) C60H60: infravermelho
(método MNDO); (d) C60F60: infravermelho (método MNDO).
169
5.6.1.9. Os Endofullerenos X@C60 (X = H, Li, Na e K): Propriedades Estruturais e Eletrônicas
Algumas questões pertinentes, no que se refere ao aprisionamento de metais
no interior de fullerenos, ainda permanecem em aberto. Uma delas é se haveria regras
simples e gerais capazes de descrever a ligação X-C60 ou se a localização do mesmo
no interior da molécula de fullereno sofreria variações em cada caso particular.
Nesta seção fazemos uma análise dos efeitos da inserção dos átomos de H, Li, Na e K
no interior da molécula de C60, a fim de investigar o comportamento e as condições de
estabilidade dos mesmos, tanto interna quanto externamente à estrutura da “gaiola”.
Nossos cálculos foram realizados em duas etapas. Na primeira, partindo das
coordenadas cartesianas de equilíbrio da molécula de C60, os átomos de H, Li, Na e K
foram inseridos no centro da “gaiola”. As geometrias moleculares dos compostos
X@C60 (X = H, Li, Na, K) foram totalmente optimizadas, com relaxação completa de
todos os átomos, através do método UHF. Na segunda etapa, congelamos a “gaiola” e
calculamos a energia total E(UHF) à medida que os átomos aprisionados eram
forçados a se deslocarem ao longo de determinadas direções de simetria escolhidas,
partindo do centro da “gaiola”. Para cada simetria, nossos cálculos forneceram as
estruturas eletrônicas dos complexos X@C60.
Nas Tabelas V.18, V.19, V.20 e V.21, listamos as respectivas distribuições de
carga dos complexos H@C60, Li@C60, Na@C60 e K@C60, obtidas segundo a análise
populacional de Mulliken
Tabela V.18. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) do
complexo endoédrico H@C60, obtida segundo a análise populacional de Mulliken. Átomo Carga Átomo Carga Átomo Carga H1 -.001202 C2 .000020 C3 .000021 C4 .000020 C5 .000020 C6 .000021 C7 .000020 C8 .000022 C9 .000018 C10 .000022 C11 .000020 C12 .000020 C13 .000020 C14 .000019 C15 .000020 C16 .000020 C17 .000019 C18 .000021 C19 .000018 C20 .000021 C21 .000020 C22 .000020 C23 .000021 C24 .000018 C25 .000021 C26 .000019 C27 .000020 C28 .000020 C29 .000019 C30 .000020 C31 .000020 C32 .000020 C33 .000021 C34 .000020 C35 .000021 C36 .000020 C37 .000020 C38 .000021 C39 .000018 C40 .000021 C41 .000019 C42 .000020 C43 .000020 C44 .000019 C45 .000020 C46 .000020 C47 .000020 C48 .000022
170
Tabela V.18. (continuação0 C49 .000018 C50 .000022 C51 .000020 C52 .000020 C53 .000020 C54 .000019 C55 .000020 C56 .000020 C57 .000019 C58 .000021 C59 .000018 C60 .000021 C61 .000020
A análise desses resultados nos permite verificar que, no caso do complexo
H@C60, o átomo de hidrogênio estabiliza-se exatamente no centro da “gaiola”, nas
coordenadas cartesianas 0.0000, 0.0000, 0.0000, com carga aproximadamente nula,
bem como os 60 átomos de carbono.
Tabela V.19. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) do
complexo endoédrico Li@C60, obtida segundo a análise populacional de Mulliken. Átomo Carga Átomo Carga Átomo Carga Li1 -.139558 C2 -.020499 C3 -.020423 C4 -.020459 C5 -.020557 C6 -.020583 C7 .002953 C8 .002054 C9 .001821 C10 .002032 C11 .002949 C12 .002969 C13 .002085 C14 .001895 C15 .002077 C16 .002968 C17 .002959 C18 .002055 C19 .001863 C20 .002073 C21 .002963 C22 .002937 C23 .002005 C24 .001769 C25 .002023 C26 .002941 C27 .002933 C28 .002004 C29 .001744 C30 .001998 C31 .002932 C32 .005106 C33 .005103 C34 .005110 C35 .005117 C36 .005115 C37 .008313 C38 .005380 C39 .004088 C40 .005391 C41 .008320 C42 .008315 C43 .005388 C44 .004090 C45 .005383 C46 .008313 C47 .008327 C48 .005394 C49 .004089 C50 .005380 C51 .008318 C52 .008332 C53 .005388 C54 .004087 C55 .005385 C56 .008328 C57 .008322 C58 .005380 C59 .004087 C60 .005392 C61 .008330
Quanto a complexo Li@C60, nossos resultados mostraram que o átomo de Li
estabiliza-se fora do centro da molécula de C60, nas coordenadas cartesianas de
equilíbrio (-0.0011, -0.0031, 1.1613). Como pode ser notado, há um deslocamento
predominante do átomo de Li na direção z, que é a direção do centro de uma das
faces pentagonais da molécula de C60. Isso pode também ser evidenciado, uma vez
que as distâncias de ligação interatômicas Li-C2, Li-C3, Li-C4, Li-C5 e Li-C6 (em que C2,
C3, C4, C5 e C6 são os carbonos da face pentagonal para a qual o átomo de Li se
171
move) sofrem um decréscimo de 1.05 Å (29.75%), indo de 3.53 para 2.48 Å, à medida
que o átomo de Li se desloca do centro da “gaiola” para a posição de equilíbrio.
Verificamos que, na distribuição das cargas atômicas listadas na Tabela V.19,
o átomo de Li adquire carga negativa, -0.139e, bem como os carbonos C2, C3, C4, C5 e
C6, cuja carga é de -0.020e. Os demais carbonos da “gaiola” adquirem cargas
positivas, de ~ +0.002e a +0.008e.
Nossos resultados mostraram que, para o complexo Li@C60, a distância de
ligação do Li ao centro da “gaiola” estabilizou-se em ~ 1.2 Å. Este mesmo
comprimento de ligação foi calculado por LI e TOMÁNEK [34] em 1.5 Å, usando o
método DFT/LDA. Esta diferença (~ 25%) pode ser explicada levando-se em conta
que, no método DFT/LDA, a interação interatômica é superestimada, fazendo com que
o átomo aprisionado seja atraído mais intensamente pelos carbonos da “gaiola”,
sofrendo um deslocamento maior e, conseqüentemente, afastando-se mais do centro.
De acordo com os resultados obtidos em [34], a interação Li-C60 é predominantemente
iônica, na qual o Li adquire carga positiva, +0.58e, apresentando apenas uma
pequena contribuição covalente envolvendo os elétrons do estado 2s do átomo de Li;
além disso, tais cálculos indicam que a carga transferida do Li para a casca do C60
diminui de 0.8e para 0.3e quando o Li se move do centro do C60 para a sua posição de
equilíbrio.
Nossos resultados não concordam com os resultados descritos acima para o
composto Li@C60. Nossos cálculos mostraram que o átomo de Li age como aceitador
de elétrons, bem como os 5 átomos de carbono que compõem a face pentagonal na
direção da qual o Li se estabiliza. Os demais carbonos da “gaiola” agem como
doadores de elétrons aos átomos de Li e aos carbonos do pentágono, ficando
carregados positivamente. O caráter da ligação Li-C60 é essencialmente covalente, em
contraposição aos resultados de LI e TOMÁNEK [34], que identificam apenas uma
pequena contribuição covalente nesta região. O grau de hibridização pode ser
investigado qualitativamente, usando a análise populacional de Mulliken. Nossos
resultados obtidos indicam que a carga do Li passa de –0.10e para –0.14e quando o Li
se move do centro do C60 para a sua posição de equilíbrio. Este aumento na
transferência de carga para o Li se reflete em um aumento da hibridização entre Li e
C60 e em um aumento do caráter covalente. Este comportamento covalente do Li
poderia ser explicado levando-se em conta que sua eletroafinidade (~ 0.620 eV) é
maior que a eletroafinidade do Na (~ 0.548 eV) que, por sua vez, é maior que a do K
(~ 0.501 eV). Dessa forma, a quantidade de energia liberada quando o átomo de Li
captura um elétron é maior, quando comparada à energia dos átomos de Na e K.
172
Por outro lado, LI e TOMÁNEK [34] realizaram cálculos de dinâmica molecular.
Para determinar as forças que atuam sobre os átomos aprisionados na “gaiola”, os
autores usaram um potencial modelo, )(rV r, capaz de ajustar seus resultados obtidos
por DFT/LDA para a interação X-C60. Contraditoriamente, tais resultados refletiram um
grande grau de covalência na ligação Li-C60, causando um grande potencial
anisotrópico. Tais resultados concordam com nossos cálculos UHF de relaxação
dinâmica do complexo Li@C60.
Vamos analisar a seguir o comportamento do átomo de Na.
Tabela V.20. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) do
complexo endoédrico Na@C60, obtida segundo a análise populacional de Mulliken. Átomo Carga Átomo Carga Átomo Carga Na1 .862770 C2 -.089712 C3 -.021090 C4 -.026259 C5 -.026950 C6 -.021064 C7 -.025625 C8 -.020975 C9 -.086849 C10 -.021271 C11 -.025938 C12 -.010023 C13 -.011006 C14 -.041358 C15 -.040209 C16 -.011037 C17 -.006202 C18 -.006028 C19 -.008424 C20 -.024455 C21 -.000074 C22 .000053 C23 -.025308 C24 -.008660 C25 -.006173 C26 -.006244 C27 -.010515 C28 -.041184 C29 -.042382 C30 -.010443 C31 -.009960 C32 -.001702 C33 -.004722 C34 -.003871 C35 -.004622 C36 -.001569 C37 -.023671 C38 -.000234 C39 -.006094 C40 -.005961 C41 -.008210 C42 -.011059 C43 -.001904 C44 -.002014 C45 -.010955 C46 -.001575 C47 -.001634 C48 -.004786 C49 -.003755 C50 -.004848 C51 -.001678 C52 -.001507 C53 -.010905 C54 -.001982 C55 -.001934 C56 -.011109 C57 -.008529 C58 -.006060 C59 -.006078 C60 .000019 C61 -.024455
As coordenadas cartesianas de equilíbrio adquiridas pelo átomo de Na,
(0.6461, -0.0137, 1.0642) revelam que há um deslocamento do metal alcalino
predominantemente no plano xz, estabilizando-se preferencialmente na direção da
aresta formada por duas faces hexagonais (região de uma ligação “dupla”), contendo
os carbonos C2 e C9. As distâncias de ligação interatômicas Na-C2 e Na-C9 sofrem
uma diminuição de 1.11 Å (31.44 %), indo de 3.53 Å para 2.42 Å à medida que o
átomo de Na se desloca da origem da “gaiola” para a posição de equilíbrio.
A análise dos dados listados na Tabela V.20 mostra que o Na adquire carga
positiva (~ +0.862e), agindo como doador de elétrons aos átomos de carbono da
“gaiola”, os quais atuam como aceitadores de elétrons, ficando carregados
negativamente (~ -0.041e a –0.001e). Observamos que uma maior quantidade de
173
carga é transferida aos carbonos C2 e C9, os quais se tornam mais negativos que os
demais carbonos da “gaiola”, adquirindo cargas em ~ –0.089e e –0.086e,
respectivamente. Se considerarmos a heterogeneidade da distribuição de carga e o
modelo de ligação específico dos fullerenos, as regiões ricas em elétrons, as ligações
“duplas”, atuarão em geral como centros atrativos para o íon Na. Dessa forma,
considerando sua propensão a fornecer uma ligação direcional com os carbonos, o
átomo de Na aprisionado se posiciona fora do centro da unidade de piracileno que
circunda as ligações “duplas”.
Analisemos agora o comportamento do átomo de K.
Tabela V.21. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) do
complexo endoédrico K@C60, obtida segundo a análise populacional de Mulliken. Átomo Carga Átomo Carga Átomo Carga K1 .795353 C2 -.007568 C3 -.007202 C4 -.013999 C5 -.013999 C6 -.007202 C7 -.017122 C8 -.006870 C9 -.010262 C10 -.006870 C11 -.017122 C12 -.025550 C13 -.007382 C14 -.013541 C15 -.011257 C16 -.010887 C17 -.021773 C18 -.007269 C19 -.020443 C20 -.011859 C21 -.014776 C22 -.014776 C23 -.011859 C24 -.020443 C25 -.007269 C26 -.021773 C27 -.010887 C28 -.011257 C29 -.013541 C30 -.007382 C31 -.025550 C32 -.013999 C33 -.007200 C34 -.007567 C35 -.007200 C36 -.013999 C37 -.014777 C38 -.011859 C39 -.020445 C40 -.007269 C41 -.021779 C42 -.010883 C43 -.011254 C44 -.013539 C45 -.007382 C46 -.025548 C47 -.017116 C48 -.006869 C49 -.010259 C50 -.006869 C51 -.017116 C52 -.025548 C53 -.007382 C54 -.013539 C55 -.011254 C56 -.010883 C57 -.021779 C58 -.007269 C59 -.020445 C60 -.011859 C61 -.014777
Nossos resultados indicam que, na molécula de K@C60, o átomo de K
estabiliza-se nas proximidades da origem do C60, com coordenadas cartesianas de
equilíbrio em (0.0001, 0.0000, 0.0001). Este átomo adquire carga positiva (+0.795e) e
os 60 átomos de carbono ficam carregados negativamente (~ -0.025e a –0.006e). O
maior confinamento radial do potássio nas proximidades da origem (quando
comparado ao Li e ao Na) resulta de uma repulsão K-C60 maior. Isso se deve ao
grande raio iônico do K, rion(K) = 1.38 Å, em comparação com os raios iônicos do Li,
rion(Li) = 0.76 Å e do Na, rion(Na) = 1.02 Å. A análise populacional de Mulliken indica
que o potássio perde seu elétron de valência 4s para a “gaiola”, atuando com doador
174
de elétrons, ao passo que os 60 carbonos agem como aceitadores. Neste caso, o
potencial de ionização do C60 (PIC60 = 7.40 eV), sendo muito maior que o valor de sua
afinidade eletrônica (AEC60 = 2.65 ± 0.05 eV), faz com que o C60 seja muito melhor
aceitador do que doador de elétrons. Os resultados DFT/LDA obtidos por LI e
TOMÁNEK [34] indicam que o K estabiliza-se a 0.25 Å do centro da “gaiola”, ao passo
que segundo nossos cálculos, este átomo praticamente não sofre deslocamento em
relação ao centro.
Na Fig. 5.18 estão representadas as posições relativas dos átomos de H, Li, Na
e K, obtidas após o processo de relaxação completa das estruturas, com minimização
da energia total, vistas em diferentes perspectivas. A análise desta figura nos permite
verificar que, ao contrário do que acontece com os átomos de H e K, as posições
favoráveis energeticamente para os átomos de Li e Na são fora do centro da “gaiola” e
que este último não corresponde a um mínimo da superfície de potencial. Tais
sistemas são primariamente estabilizados ou por uma grande interação coulombiana,
proveniente da transferência de cargas entre os átomos aprisionados e a estrutura da
“gaiola” (como é o caso dos átomos de Na e K) ou pelo compartilhamento de elétrons
(como é o caso do átomo de Li), caracterizando uma interação covalente. Na Fig.
5.18(a), observando a disposição dos eixos cartesianos xyz, verificamos que o átomo
de H permanece exatamente na origem da “gaiola”. As Figs. 5.18(b), 5.18(c) e 5.18(d)
representam a configuração de equilíbrio atingida pelo átomo de Li no interior da
molécula de C60, vista sob três direções de deslocamento diferentes: eixo z, eixo x e
eixo y, respectivamente, todos perpendiculares ao plano do papel. Conforme podemos
observar, estas figuras evidenciam que o átomo de Li se desloca essencialmente na
direção z positiva. Da mesma maneira, as Figs. 5.18(e), 5.18(f) e 5.18(g) representam
a configuração de equilíbrio atingida pelo átomo de Na no interior da molécula de C60,
vista sob três direções de deslocamento diferentes: eixo z, eixo x e eixo y,
respectivamente, todos perpendiculares ao plano do papel. Como pode ser verificado,
o Na se desloca preferencialmente no plano xz, tendendo à aresta entre duas faces
hexagonais. A Fig. 5.18(h) mostra que o átomo de K praticamente não se desloca para
fora do centro.
175
(a)
(b) (c) (d)
(e) (f) (g)
(h)
Figura 5.18. Visão em perspectiva das posições relativas dos átomos de H, Li, Na e K inseridos
no interior da molécula de C60. (a) H@C60; (b, c, d), Li@C60; (e, f, g), Na@C60; (h) K@C60.
176
Com o objetivo de detalhar a estabilidade dos principais sítios de localização
dos átomos X, congelamos a “gaiola” e realizamos cálculos de energia total E(UHF)
em determinados pontos escolhidos a priori, verificando as condições de energia
mínima das estruturas em cada configuração em particular. Assim, as principais
direções de deslocamento dos átomos, tanto interna quanto externamente à estrutura
do C60 foram escolhidas da seguinte forma: (1) direção do centro de uma face
pentagonal; (2) direção do centro de uma face hexagonal; (3) direção de um vértice;
(4) direção de uma aresta entre dois hexágonos e (5) direção de uma aresta entre um
pentágono e um hexágono.
Para os compostos Li@C60, Na@C60 e K@C60, calculamos os valores da
energia total E(UHF) na origem da molécula de C60 e os valores das energias totais
em cada ponto, à medida que os átomos aprisionados eram forçados a se deslocarem
nas direções escolhidas. Obtivemos em cada ponto as diferenças de energia ∆E (em
eV), calculadas em relação à energia total na origem. Nas Tabelas V.22, V.25 e V.26
sumarizamos estes valores calculados para as moléculas de Li@C60, Na@C60 e
K@C60, respectivamente. As representações ∆Emin interno, ∆Ebarreira pot e ∆Emin externo
denotam as diferenças de energia mínimas obtidas no interior da “gaiola”, nas
proximidades da barreira de potencial e na parte externa da molécula de C60,
respectivamente. Os números entre parênteses indicam as aproximações máximas,
em termos de percentuais das distâncias do centro da gaiola às barreiras de potencial,
conseguidas nos cálculos.
Tabela V.22. Diferenças de energia, em relação ao centro da “gaiola”, calculadas para os vários
sítios de deslocamento do átomo de Li, no complexo Li@C60, tanto interna quanto
externamente à estrutura da “gaiola”.
Direções de deslocamento do átomo de Li no C60
∆Emin interno (eV) ∆Ebarreira pot (eV) ∆Emin externo (eV)
Centro do pentágono -0.3609 24.6394 (100%) -1.5278 Centro do hexágono -0.3422 13.2246 (100%) -1.6647 Vértice 0.4999 25.6117 (75%) -1.4178 Aresta entre dois hexágonos 0.5170 58.0421 (87.5%) -1.4992 Aresta entre pentágono e hexágono 0.3280 52.2920 (87.5%) -1.4492
Analisando os dados mostrados na Tabela V.34 observamos que, para o caso
da molécula de Li@C60, a menor diferença de energia no interior do C60, em –0.3609
eV, ocorre exatamente num ponto localizado na direção do centro de uma face
pentagonal, reproduzindo nosso cálculo ab initio em que permitimos a relaxação
completa desta molécula. Por outro lado, os resultados teóricos obtidos por
177
ANDREONI [33], usando o método da Teoria do Funcional da Densidade (DFT), na
aproximação LDA, indicam que a posição mais estável para o átomo de Li no
complexo endoédrico Li@C60 ocorre nas proximidades do centro de uma face
hexagonal; o átomo de Li age essencialmente como doador de elétrons aos carbonos
da “gaiola”. Conforme listado na Tabela V.34, nossos resultados evidenciam que a
diferença entre as energias calculadas para o átomo de Li nas direções das faces
pentagonal e hexagonal é da ordem de ~ 0.02 eV. Essa pequena diferença de energia
poderia estar associada a possíveis erros numéricos, de forma que a posição mais
estável do Li possa variar entre as referidas direções.
No intuito de verificarmos esse comportamento do átomo de Li, realizamos
cálculos de energia total para as moléculas de LiC5, na qual o átomo de Li posiciona-
se na direção do centro de uma face pentagonal, e LiC6, com o Li localizado no centro
da face hexagonal. A Fig. 5.19 traz a representação de ambas as moléculas com os
respectivos átomos de carbono convenientemente numerados.
Figura 5.19. Representação das moléculas de LiC5 (a) e LiC6 (b).
As tabelas V.23 e V.24 listam as distribuições de carga das moléculas de LiC5 e
LiC6, obtidas segundo a análise populacional de Mulliken. Observamos que ambas as
moléculas respeitam certas restrições de simetria quanto à distribuição das cargas
atômicas. Tais resultados evidenciam que o Li adquire carga positiva quando
localizado na direção hexagonal, ao passo que apresenta-se negativamente carregado
178
na direção do pentágono. Estes são, portanto, fortes indícios de que possa realmente
haver duas direções preferenciais de estabilidade para o Li no interior da “gaiola”.
Tabela V.23. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) da molécula
de LiC5, obtida segundo a análise populacional de Mulliken.
Átomo Carga atômica Li -0.053602 C1 -0.000854 C2 -0.003582 C3 +0.030789 C4 +0.030813 C5 -0.003564
Tabela V.24. Distribuição de cargas atômicas (em unidades de carga do elétron, e) da molécula
de LiC6, obtida segundo a análise populacional de Mulliken.
Átomo Carga atômica Li +0.115652 C1 -0.019354 C2 -0.018847 C3 -0.019629 C4 -0.019620 C5 -0.018844 C6 -0.019359
A maior barreira de potencial, em 58.0421 eV, ocorre nas proximidades da
aresta entre dois hexágonos. Curiosamente, a menor diferença de energia no exterior
do C60, em –1.6647 eV, ocorre quando o átomo de Li se localiza na direção do centro
de uma face hexagonal. Portanto, a posição mais estável do átomo de Li ocorre
externamente à estrutura do C60, na direção do centro de uma face hexagonal.
Vejamos a seguir o caso do átomo de Na.
Tabela V.25. Diferenças de energia, em relação ao centro da “gaiola”, calculadas para os vários
sítios de deslocamento do átomo de Na, no complexo Na@C60, tanto interna quanto
externamente à estrutura da “gaiola”. Direções de deslocamento do
átomo de Na no C60 ∆Emin interno (eV) ∆Ebarreira pot (eV) ∆Emin externo (eV)
Centro do pentágono -0.2875 67.4999 (100%) 0.4492 Centro do hexágono -0.5312 38.9176 (100%) 0.2059 Vértice -0.4906 52.8784 (75%) 0.3373 Aresta entre dois hexágonos -0.5404 108.6692 (87.5%) 0.0826 Aresta entre pentágono e hexágono -0.4216 93.9927 (87.5%) 0.2676
Os dados mostrados na Tabela V.25 indicam que o comportamento do átomo
de Na é bastante distinto daquele exibido pelo átomo de Li. A menor diferença de
179
energia interna, em –0.5404 eV, ocorre exatamente num ponto localizado na direção
da aresta entre dois hexágonos, sítio no qual se localiza a ligação dupla, o que
também reproduz nosso cálculo ab initio UHF de relaxação completa da molécula de
Na@C60. A maior barreira de potencial, em 108.6692 eV, também ocorre nesta mesma
direção. Externamente à estrutura da “gaiola”, o átomo de Na é menos estável do que
na parte interna. A menor diferença de energia externa, em 0.0826 eV, é positiva e
ocorre quando o átomo de Na também está na direção da aresta entre dois
hexágonos. Portanto, a posição mais estável do átomo de Na ocorre internamente à
estrutura do C60, na direção da ligação dupla, formada pela aresta entre duas faces
hexagonais.
Tabela V.26. Diferenças de energia, em relação ao centro da “gaiola”, calculadas para os vários
sítios de deslocamento do átomo de K, no complexo K@C60, tanto interna quanto externamente
à estrutura da “gaiola”. Direções de deslocamento do
átomo de K no C60 ∆Emin interno (eV) ∆Ebarreira pot (eV) ∆Emin externo (eV)
Centro do pentágono 0.2718 8.6123 (50%) 0.1486 Centro do hexágono 0.2486 51.3968 (75%) 0.1484 Vértice 0.3752 118.7169 (75%) 0.1197 Aresta entre dois hexágonos -0.0001 225.7013 (87.5%) 0.1500 Aresta entre pentágono e hexágono 0.3477 196.3245 (87.5%) 0.1203
Os valores mostrados na Tabela V.26 indicam que a menor diferença de
energia no interior da “gaiola”, em –0.0001 eV, ocorre num ponto em que o átomo de K
está levemente deslocado do centro, tendendo à direção da aresta entre dois
hexágonos, reproduzindo também nosso cálculo ab initio UHF de relaxação completa
da molécula de K@C60. A energia da barreira de potencial, em 225.7013 eV, ocorre na
direção da aresta entre dois hexágonos. Dessa forma, faz-se necessário acelerar o íon
K+ para que este possa ser introduzido na “gaiola”. Similarmente ao comportamento do
Na, o átomo de K é menos estável na parte externa do C60. A menor diferença de
energia externa, em 0.1197 eV, ocorre na direção de um vértice do C60. Portanto, a
posição mais estável do átomo de K ocorre internamente à estrutura do C60, nas
proximidades da origem, com tendência ao deslocamento na direção da aresta entre
duas faces hexagonais.
Nas Figs. 5.19, 5.20 e 5.21 estão representadas as curvas das diferenças de
energia (em eV) em função da distância à origem (em Å) para os compostos Li@C60,
Na@C60 e K@C60, respectivamente, referentes ao deslocamentos dos átomos de Li,
Na e K nas cinco direções de simetria consideradas; nestas figuras indicamos os
pontos de energia mínima localizados interna ou externamente à estrutura da molécula
de C60.
180
(a) (b)
(c) (d)
(e)
Figura 5.19. Curvas de energia em função da distância à origem (em Å) para a molécula de
Li@C60, com o átomo de Li se deslocando nas direções: (a) do centro de uma face pentagonal;
(b) do centro de uma face hexagonal; (c) de um vértice (barreira de potencial infinita); (d) da
aresta entre dois hexágonos; (e) da aresta entre um pentágono e um hexágono.
0 1 2 3 4 5 6 7 8
0
5
10
15
20
25
30
Emínima
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)0 1 2 3 4 5 6
0
5
10
15
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
10
20
30
40
50
60
70
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
10
20
30
40
50
60
Ene
rgia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9-5
0
5
10
15
20
25
30
35
Ene
rgia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
181
(a) (b)
(c) (d)
(e)
Figura 5.20. Curvas de energia em função da distância à origem (em Å) para a molécula de
Na@C60, com o átomo de Na se deslocando nas direções: (a) do centro de uma face
pentagonal; (b) do centro de uma face hexagonal; (c) de um vértice (barreira de potencial
infinita); (d) da aresta entre dois hexágonos; (e) da aresta entre um pentágono e um hexágono.
0 1 2 3 4 5 6 7 8
0
20
40
60
80
Ene
rgia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)0 1 2 3 4 5 6
0
10
20
30
40
50
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
10
20
30
40
50
60
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
20
40
60
80
100
120
Emínima
Ene
rgia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 90
20
40
60
80
100
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
182
(a) (b)
(c) (d)
(e)
Figura 5.21. Curvas de energia em função da distância à origem (em Å) para a molécula de
K@C60, com o átomo de K se deslocando nas direções: (a) do centro de uma face pentagonal;
(b) do centro de uma face hexagonal; (c) de um vértice (barreira de potencial infinita); (d) da
aresta entre dois hexágonos; (e) da aresta entre um pentágono e um hexágono.
0 1 2 3 4 5 6 7 8
0
2
4
6
8
10
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV
)
Distância à origem (Å)0 1 2 3 4 5 6
0
10
20
30
40
50
60
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
20
40
60
80
100
120
140
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
40
80
120
160
200
240
Emínima
Ener
gia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV
)
Distância à origem (Å)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
40
80
120
160
200
Ene
rgia
tota
l em
rela
ção
à or
igem
(eV)
Distância à origem (Å)
183
Na Tabela V.27 sumarizamos os valores calculados para as energias
eletrônicas referentes às moléculas de H@C60, Li@C60, Na@C60 e K@C60. As
representações α e β designam as orientações de spin “up” e “down”,
respectivamente. De acordo com os valores listados nesta tabela, os complexos
H@C60, Li@C60, Na@C60 e K@C60 são mais estáveis do que o sistema constituído da
molécula de C60 livre e do átomo alcalino isolado.
Tabela V.27. Energias eletrônicas UHF calculadas para as moléculas de X@C60 (X = H, Li, Na,
K). As representações α e β indicam as polarizações de spin “up” e “down”, respectivamente.
Energias (eV) H@C60 Li@C60 Na@C60 K@C60 ETOTAL (UHF) -61081.692 -61272.198 -65419.074 -77274.875 EH -12.696 - - - ELi - -199.068 - - ENa - - -4344.843 - EK - - - -16131.715 EATÔMICA -60746.497 -60932.868 -65078.644 -76865.516 ETOTAL(C60) + Eátomo X -61081.681 -61268.053 -65413.828 -77200.700 ELIGAÇÃO 5.495 5.563 5.581 6.711 EHOMO(α) -5.616 -2.688 -2.969 -1.568 EHOMO(β) -5.616 -5.463 -4.434 -5.286 ELUMO(α) 3.037 3.052 2.653 2.727 ELUMO(β) 3.037 3.057 2.756 2.729 ∆EGAP(α) 8.653 5.740 5.622 4.295 ∆EGAP(β) 8.653 8.520 7.190 8.015
Para os compostos endoédricos Li@C60, Na@C60 e K@C60, verificamos que as
energias do orbital mais alto ocupado (HOMO) e do orbital mais baixo desocuopado
(LUMO) diferem quanto ao potencial de spin (α ou β). Isso se deve à diferença quanto
ao número de elétrons.
Uma comparação entre os “gaps” de energia do complexo K@C60 mostra que o
∆EGAP(α) é cerca de duas vezes menor do que o ∆EGAP(β). Isso se deve provavelmente a
possíveis efeitos de contaminações de spin presentes no método UHF.
5.7. Estudo Experimental
Nesta seção, descrevemos nosso estudo experimental realizado nos
laboratórios do Departamento de Física/ICEx da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG), em que empregamos as técnicas espectroscópicas de FTIR e micro-
Raman na análise de amostras de fullerenos.
5.7.1. Amostras
Em nossos estudos experimentais, foram utilizadas amostras de fullereno com
duas procedências diferentes. Nas medidas de FTIR, utilizamos as amostras
sintetizadas, extraídas e purificadas no Laboratório de Preparação de Amostras (LPA),
sob coordenação do Prof. Dr. Luiz Orlando Ladeira, do Departamento de Física da
UFMG, bem como as amostras de C60 provenientes do Laboratório Sigma-Aldrich
(LSA). Nas medidas de espectroscopia micro-Raman, utilizamos apenas as amostras
provenientes do LSA.
5.7.1.1. Amostras Obtidas no LPA
O equipamento utilizado no LPA para o processo de síntese das amostras de
fullereno é similar ao mostrado na Fig. 5.22. Seu princípio de funcionamento é análogo
ao descrito na seção 5.5.1 para a técnica de descarga em arco elétrico entre eletrodos
de grafite. Tal equipamento, a princípio projetado e construído no LPA para o
crescimento de cristais, foi adaptado para sintetizar tanto fullerenos como nanotubos
de carbono. O procedimento experimental é descrito como se segue. Inicialmente, a
câmara do sistema foi evacuada através de uma bomba de vácuo mecânica e em
seguida, pressurizada com gás de He a uma pressão de 80 torr. Os bastões cilíndricos
de grafite utilizados possuíam um grau de pureza superior a 99%. Entre os eletrodos
de grafite foi aplicada uma diferença de potencial elétrico de ~ 25 V, o que produziu
uma corrente contínua de ~ 100 A entre os dois eletrodos, gerando um arco elétrico. O
arco elétrico gerado produziu uma erosão no bastão de grafite catodo. O carbono
sublimado na região do arco elétrico solidificou-se numa região próxima do arco,
gerando nanoestruturas de carbono. O bastão anodo de grafite possuía um sistema de
translação acoplado de modo a manter constante a distância entre os eletrodos,
184
produzindo um arco elétrico de potência constante. O anodo fixo possuía 10 mm de
diâmetro e 12 cm de comprimento e o catodo transladável, 20 mm de diâmetro e 30
cm de comprimento. Uma vez estabelecido o arco elétrico, a uma distância de 1 a 2
mm entre os eletrodos foi mantida constante durante a erosão, a uma taxa de ~ 8 mm
de eletrodo/minuto. Ao término do processo, foram sintetizados ~ 2g de amostras, sob
a forma de fuligem, contendo fullerenos.
Figura 5.22. Esquema do equipamento empregado no processo de síntese de fullerenos no
LPA da UFMG.
Para o procedimento de extração de fullerenos da fuligem obtida, utilizamos o
método Soxhlet de extração por solventes, já descrito detalhadamente na seção
5.5.2.1. O extrator Soxhlet do LPA da UFMG é análogo ao representado na Fig. 5.23.
Figura 5.23. Esquema do extrator Soxhlet empregado no LPA da UFMG.
185
Foram submetidas ao processo de extração ~ 2 g de fuligem, utilizando 600 mL
de tolueno. Este solvente apresenta uma taxa de solubilidade de 2,8 mg/mL de C60. O
procedimento de extração decorreu durante ~ 5 h, sendo extraídos ao final do
processo ~ 170 mg de fullerenos.
Em seguida ao processo de extração, a amostra resultante foi submetida ao
processo de purificação pelo método de sublimação a vácuo. Neste processo, a
amostra obtida diretamente do extrator Soxhlet, foi introduzida em uma das
extremidades de um tubo de quartzo, com comprimento em torno de 30 cm e diâmetro
interno de 20 mm. Uma das extremidades do tubo foi lacrada e a outra foi acoplada a
um sistema de alto vácuo (~ 10-5 torr). Em seguida, este tubo contendo a amostra foi
inserido em um forno, aquecido resistivamente e mantido a uma temperatura de ~
650o C. A extremidade do tubo contendo a fuligem foi posicionada horizontalmente e
colocada no centro do forno (ponto mais quente), enquanto a extremidade oposta foi
posicionada externamente, ficando em contato com a temperatura ambiente. Uma
baixa pressão de gás de Ar foi introduzida no sistema (~ 10-3 torr) a fim de assegurar
uma baixa difusão das moléculas para a base do recipiente, aumentando, portanto, a
chance de equilíbrio térmico local com a parede do tubo. Em seguida, o material foi
submetido a um tratamento térmico a ~ 1000º C, a fim de eliminar as impurezas
eventualmente presentes na amostra, decorrentes dos solventes empregados na
extração Soxhlet. O sistema sofreu um novo bombeamento a vácuo, atingindo
novamente a pressão de 10-5 torr, com a finalidade de extrair as impurezas liberadas.
A câmara foi submetida a uma temperatura em torno de 850oC e o processo de
sublimação transcorreu por ~ 2 h. O gradiente de temperatura possibilitou que os
fullerenos sublimassem da fuligem remanescente na amostra e ficassem aderidos na
parede do tubo de quartzo, difundindo-se para a extremidade mais fria. Foram
extraídos ~ 5 mg de fullerenos não separados, uma vez que o método empregado não
ofereceu mecanismos de separação entre tais compostos.
5.7.1.2. Amostras Adquiridas do LSA
Em nossas medidas espectroscópicas de FTIR e micro-Raman, utilizamos
também uma amostra de fullereno proveniente do Laboratório Sigma-Aldrich (LSA),
consistindo de 25 mg de C60 com 99.5% de pureza.
186
5.7.2. Equipamentos e Medidas
5.7.2.1. Espectroscopia de FTIR As medidas de infravermelho por transformada de Fourier (FTIR) foram
realizadas no Laboratório de Óptica – Infravermelho, sob orientação da Prof.a Dr.a
Aríete Righi, do Departamento de Física da UFMG. Para a obtenção dos espectros de
FTIR, tanto dos fullerenos provenientes do LPA quanto do LSA, foi necessário o
preparo de pastilhas, uma contendo a amostra de fullereno e outra do material de
referência. Tais pastilhas foram preparadas com uma prensa sob vácuo de 10-3 mbar.
A referência utilizada foi uma pastilha de KBr de 185 mg preparada nas mesmas
condições.
É interessante observar que a escolha apropriada da referência está
diretamente relacionada com a região espectral a ser analisada e com as condições
da amostra. Para este método de obtenção de medidas de infravermelho, torna-se
altamente desejável que a amostra seja misturada com uma substância resistente
(para evitar sua quebra), inerte (para não haver alteração das propriedades da
amostra) e transparente (para não apresentar linhas espectrais no intervalo a ser
estudado). São utilizados, em geral, os halogenetos alcalinos, particularmente o NaCl,
que é transparente até a região espectral de 625 cm-1. Para obter espectros de
freqüências menores, os materiais normalmente utilizados são de KBr (até 400 cm-1) e
CsI (até 200 cm-1). Para as amostras de fullereno utilizadas em nossas medidas
espectrais de FTIR, tanto do LPA quanto do LSA, empregamos a referência de KBr. O
processo de obtenção do espectro de FTIR, já descrito detalhadamente na seção
3.2.3, está esquematizado na Fig. 5.24a.
O espectro de transmissão por FTIR foi obtido com uma resolução de 4 cm-1,
usando um espectrômetro de micro-infravermelho por transformada de Fourier, do
modelo Nexus 870 Thermo Nicolet (mostrado na Fig. 5.24b) com faixa espectral de
500 a 4000 cm-1, em atmosfera inerte de gás nitrogênio. Um detector de telureto de
cádmio e mercúrio (MCT/A) resfriado a nitrogênio líquido foi usado em conjunção com
um divisor de feixe (“beamsplitter”) de KBr. O espectro foi obtido para pastilhas de ~ 1
mg da amostra de fullereno LPA ou LSA por 185 mg de KBr, com 1064 “scans”
(acumulações) com referência ao espectro de uma pastilha de KBr pura (1064 scans).
187
(a) (b)
Figura 5.24. (a) Esquema do processo de obtenção de um espectro por FTIR; (b) fotografia do
espectrômetro de micro-infravermelho por transformada de Fourier (modelo Nexus 870 Thermo
Nicolet) do Laboratório de Óptica – Infravermelho da UFMG, utilizado em nossos experimentos.
5.7.2.2. Espectroscopia Micro-Raman
As medidas dos espectros micro-Raman da amostra de C60 foram realizadas
no Laboratório de Espectroscopia Micro-Raman, sob coordenação do Prof. Dr. Marcos
Assunção Pimenta, do Departamento de Física da UFMG. O espectro foi obtido a
partir da amostra de C60 do LSA. O preparo foi bastante simples e consistiu na
deposição direta de uma pequena quantidade da amostra em pó ( ~ 5mg) sobre uma
placa de vidro, à temperatura ambiente, em contato com o ar atmosférico.
O espectrômetro Raman utilizado nos experimentos consistiu de um triplo
monocromador (DILOR XY), equipado com um detector CCD (“charge-coupled
device”) refrigerado a nitrogênio líquido para trabalhar à temperatura de 140K. Um
microscópio óptico (OLYMPUS BH - 2) foi acoplado ao espectrômetro a fim de
focalizar o feixe do laser na amostra e coletar a luz espalhada. Um laser de Ar – Kr
(COHERENT INNOVA 70C) foi usado para excitar a amostra com uma linha de
comprimento de onda de λ = 488.0 nm. Em nossas medidas utilizamos uma objetiva
de 80x, com a focalização do laser sob uma potência de 0.22 mW. Os espectros foram
coletados durante 60 segundos em 20 acumulações.
Na Fig. 5.25a é mostrado um esquema do espectrômetro Raman utilizado em
nossas medidas. O princípio de funcionamento deste espectrômetro é descrito como
se segue. A luz proveniente do laser passa por um filtro de interferência, onde são
eliminadas as freqüências de plasma do laser e incide na amostra focalizada pelo
microscópio óptico. O microscópio permite analisar uma região da amostra da ordem
de ~ 1µm. A luz retro-espalhada pela amostra (180o) é coletada pela objetiva do
188
microscópio e levada ao espectrômetro. No espectrômetro, a luz passa primeiro por
um duplo monocromador (Fig. 5.25b) que é formado por quatro espelhos esféricos de
distância focal de 500 mm e duas redes de difração de 1800 linhas/mm. O duplo
monocromador é usado para eliminar a luz espalhada que possui a mesma freqüência
do laser (espalhamento elástico), permitindo apenas a passagem da luz espalhada no
intervalo de freqüências que se deseja analisar. Ao sair do duplo monocromador, a luz
é enviada a um espectrógrafo (Fig. 5.25c), que é formado por dois espelhos esféricos
de distância focal de 500 mm e uma rede de difração de 1800 linhas/mm. Ele é usado
para dispersar a luz espalhada. Ao sair do espectrômetro, o sinal é então enviado para
o detector CCD. O sinal é então amplificado, digitalizado e enviado ao computador.
(a)
(b) (c)
Figura 5.25. Esquema do espectrômetro Raman utilizado em nossos experimentos [43]. (a)
Espectrômetro; (b) duplo monocromador; (c) espectrógrafo.
189
5.7.3. Resultados, Análise e Discussão
5.7.3.1. Os Espectros de FTIR
Na Fig. 5.26, fazemos uma comparação entre os espectros de FTIR das
amostras de fullereno provenientes do LSA (linha azul) e do LPA (linha preta),
evidenciando a concordância entre os modos ativos no infravermelho para a molécula
de C60. As freqüências observadas para os quatro picos intensos da molécula de C60,
em 526, 576, 1182 e 1428 cm-1 (indicadas em vermelho na Fig. 5.27), reproduzem os
resultados experimentais já reportados na literatura por BETHUNE et al. [44] em 527,
577, 1183 e 1428 cm-1.
600 800 1000 1200 1400 16000,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
1428
1182
576
526
1428
1182
576
526
C60 + C70 - LPA
Abs
orbâ
ncia
(uni
dade
s ar
bitrá
rias)
Frequência (cm-1)
C60 - LSA
Figura 5.26. Comparação entre os espectros de FTIR da amostra de fullereno proveniente do
LPA (em preto) e da amostra de C60 proveniente do LSA (em azul).
O espectro obtido para a amostra de fullereno do LPA é mostrado novamente
na Fig. 5.27, subtraído de uma linha de base (“background”) a fim de exibir
detalhadamente as linhas observadas. Os picos de infravermelho atribuídos à
molécula de C70 em 535, 565, 578, 642, 672, 795, 1086, 1133, 1252, 1321, 1412,
1430, 1460 e 1558 cm-1 foram observados na amostra de fullereno do LPA e estão
indicados em azul na Fig. 5.27. Observamos que estes picos também reproduzem os
valores medidos por BETHUNE et al. [44] em 535, 565, 578, 642, 674, 795, 1086,
190
1134, 1252, 1321, 1414, 1430, 1460 e 1562 cm-1. Neste espectro, observamos
também picos extras em 696, 726, 1042 e 1375 cm-1 (indicados por *), os quais não
são atribuídos aos fullerenos C60 e C70. Na Fig. 5.28 é feita uma comparação entre o
espectro da amostra de fullereno do LPA e aquele obtido para o composto orgânico
thiol, provavelmente oriundo dos solventes orgânicos empregados no processo de
extração Soxhlet do LPA. Analisando as linhas espectrais do thiol, foi possível
identificar estes picos extras como pertencentes efetivamente ao thiol e não aos
fullerenos.
600 800 1000 1200 1400 16000,0
0,1
0,2
0,3
0,4Amostra do LPA
1252
1321
1430
1086
578
535
565
1375
*
1558
1460
1412
1428
1182
576
526
1042
*
1133
795
726
*69
6 *
672
642
Abs
orbâ
ncia
(uni
dade
s ar
bitrá
rias)
Frequência (cm-1)
Figura 5.27. Espectro de FTIR da amostra de fullereno do LPA, com subtração do
“background”. (Em vermelho: modos vibracionais do C60; em azul: modos vibracionais do C70;
em preto: modos vibracionais de possíveis impurezas presentes na amostra).
Verificamos então que uma possível solução para o problema da presença de
impurezas poderia ser a submissão das amostras sintetizadas diretamente ao
processo de sublimação, sem passar pela etapa intermediária de extração Soxhlet.
Haveria possibilidade, inclusive, de se efetuar a separação entre o C60 e o C70 a partir
deste método. No decorrer deste processo, uma molécula de fullereno específica
eventualmente prende-se na parede do tubo, numa localização dependente de sua
temperatura de sublimação particular. Dessa forma, os fullerenos com temperaturas
de sublimação mais elevadas (altos pesos moleculares) estariam localizados nas
paredes do tubo nas regiões mais quentes, o que possibilitaria que os diversos
191
fullerenos sublimados fossem recolhidos separadamente. Além disso, uma vez que os
fullerenos superiores e os fullerenos endoédricos são muito menos solúveis em
solventes orgânicos do que o C60 e o C70, é uma conseqüência natural que uma
quantidade significativa desses fullerenos menos abundantes possam permanecer na
fuligem quando são usados os métodos de extração por solventes.
Figura 5.28. Comparação entre os espectros de FTIR da amostra de fu
500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 40000,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
Abs
orbâ
ncia
(uni
dade
s ar
bitrá
rias)
Freqüência (cm-1)
Thiol
Amostra do LPA
llereno do LPA (em
.7.3.2. O Espectro Micro-Raman
Conforme já discutido, a molécula de C60 apresenta dez modos vibracionais
ativos
preto) e do composto orgânico thiol, uma possível impureza presente na amostra (em
vermelho).
5
no Raman. No espectro obtido, identificamos dois picos intensos e oito picos de
menor intensidade, correspondendo aos modos de simetria Ag e Hg, respectivamente.
Os modos Ag, medidos em 496 e 1465 cm-1, concordam com os modos Ag já
reportados na literatura por BETHUNE et al. [44] em 496 e 1470 cm-1. Os modos Hg,
medidos em 273, 430, 711, 773, 1101, 1250, 1423 e 1572 cm-1 também concordam
com os valores experimentais em 273, 437, 710, 774, 1099, 1250, 1428 e 1575 cm-1,
obtidos por BETHUNE et al. [44].
192
O espectro Raman não-polarizado obtido a partir da amostra de C60 do LSA é
mostrado na Fig. 5.29.
(a)
(b
igura 5.29. Espectro Raman experimental da amostra de C60 proveniente do LSA. (a) Modos
500 750 1000 1250 1500 1750 20000
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
496
1465
Inte
nsid
ade
(uni
dade
s ar
bitrá
rias)
Freqüência (cm-1)
Amostra do LSA: (modos Ag)
200 400 600 800 1000 1200 1400 160080
100
120
140
160
180Amostra do LSA: (modos Hg) 1572
1423
1250
1101773711
273
430
Inte
nsid
ade
(uni
dade
s ar
bitrá
rias)
Freqüência (cm-1)
)
F
normais de simetria Ag; (b) modos normais de simetria Hg.
193
5.8. Comparação entre Nossos Resultados
esta seção, fazemos um estudo comparativo entre nossos resultados teóricos
e expe
tre os modos vibracionais
ativos
abela V.28. Modos vibracionais ativos no infravermelho, referentes à molécula de C60, obtidos
-1) d Representação do
Teóricos e Experimentais
N
rimentais acerca dos modos normais de vibração ativos no infravermelho e
Raman para as moléculas de C60 e C70, no intuito de averiguar a precisão dos
resultados fornecidos por intermédio dos cálculos teóricos.
As Tabelas V.28 e V.29 trazem uma comparação en
no infravermelho para as moléculas de C60 e C70, respectivamente, obtidos em
nossos métodos teóricos e experimentais.
T
teórica (RHF e MNDO) e experimentalmente. Os valores entre parênteses indicam o erro
percentual em relação aos nossos valores experimentais.
νIR (cm-1) a νIR (cm-1) b νIR (cm-1) c νIR (cmmodo
526 526 5 8%) 558 (6.0 77 (9.67%) T1u576 576 584 (1.39%) 719 (24.83%) T1u1182 1182 1242 (5.08%) 1353 (14.47%) T1u1426 1426 1457 (2.17%) 1628 (14.17%) T1u
Nossos resultados exp ntais (a o L s mentais
abela V.29. Modos vibracionais ativos no infravermelho, referentes à molécula de C70, obtidos
Representação do modo
a erime mostra d PA); b nossos resultado experi
(amostra do LSA); c nossos cálculos (RHF/STO-3G); d nossos cálculos (MNDO/STO-3G).
T
teórica (MNDO) e experimentalmente. Os valores entre parênteses indicam o erro percentual
em relação aos nossos valores experimentais.
νIR (cm-1) a νIR (cm-1) b
535 4 93 (5.79%) A2” 565 627 (6.37%) E1’ 578 650 (0.52%) E1’ 642 669 (1.25%) E1’ 672 700 (4.32%) A2” 795 863 (3.40%) E1’
1086 996 (11.79%) A2” 1133 1248 (10.15%) E1’ 1252 1397 (7.03%) E1’ 1321 1429 (5.37%) E1’ 1412 1555 (5.10%) E1’ 1430 1592 (11.33%) E1’ 1460 1637 (7.88%) A2” 1558 1721 (7.19%) E1’
Nossos resultados experimentais b nossos cálculos (MNDO/STO-3G). a (amostra do LPA);
194
A Tabela V.30 traz uma comparação entre os modos vibracionais ativos no
abela V.30. Modos vibracionais ativos no Raman, referentes à molécula de C60, obtidos
-1) c Representação
Raman para a molécula de C60, obtidos por nossos métodos teóricos e experimentais.
T
teórica (RHF e MNDO) e experimentalmente. Os valores entre parênteses indicam o percentual
de erro em relação aos nossos valores experimentais.
νRaman (cm-1) a νRaman (cm-1) b νRaman (cmdo Modo
273 269 (1.47%) 263 (3.66%) Hg430 453 (5.35%) 447 (3.95%) Hg496 492 (0.81%) 610 (22.98%) Ag711 744 (4.64%) 771 (8.44%)
Hg
773 789 (2.07%) 924 (19.53%) Hg1101 1148 (4.27%) 1261 (14.53%) Hg1250 1319 (5.52%) 1407 (12.56%)
1596 (1Hg
1423 1476 (3.72%) 2.16%) Hg1465 1498 (2.25%) 1667 (13.79%) Ag1572 1702 (8.27%) 1722 (9.54%) Hg
a Nossos resultad erime a ssos cál os (RHF/STO-3G); c
Analisando os valores listados nas Tabelas V.38, V.39 e V.40, verificamos que
fornecidos pelo método ab initio RHF está
is teóricos Hartree-Fock
existente quando comparamos os resultados entre si.
os exp ntais (amostr do LSA); b no cul
nossos cálculos (MNDO/STO-3G)
os maiores erros percentuais contidos no método ab initio Hartree-Fock são da ordem
de até 8.27% em relação aos nossos valores experimentais, ao passo que no método
semi-empírico MNDO tais erros são superiores (da ordem de até 22.98%). Embora o
MNDO contenha erros percentuais maiores, verificamos que os resultados fornecidos
por este método são eficazes, no sentido de fornecer informações qualitativas rápidas
e corretas acerca da atividade espectral dos modos normais. É um método eficiente no
cálculo de moléculas grandes, para as quais um tratamento ab initio torna-se
impraticável. Dessa forma, verificamos que o método semi-empírico MNDO pode ser
capaz de contribuir eficazmente na previsão de espectros de moléculas grandes ainda
não observados experimentalmente.
A precisão dos resultados
intimamente relacionada à qualidade e ao tamanho da base de funções empregada.
Portanto, erros percentuais de até 8.27% em relação ao valor experimental poderiam
ser reduzidos com a utilização de bases mais sofisticadas.
Salientamos novamente que os modos vibraciona
foram multiplicados pelo fator de ajuste 0.89, ao passo que os resultados teóricos
semi-empíricos MNDO não sofreram qualquer ajuste, justificando assim a diferença
195
5.9. Observações Finais e Conclusões
Nesta seção, apresentamos nossas principais considerações, resultantes dos
studos teórico e experimental dos fullerenos.
do o método ab initio RHF e em 1.473
Å e 1.4
distintas. A energia de ligação do C70 foi calculada em 5.625 eV
resultados
e
- Na molécula de C60, os comprimentos de ligação C-C e C=C foram calculados
em 1.463 Å e 1.376 Å, respectivamente, segun
00 Å, respectivamente, segundo o método semi-empírico MNDO. A energia de
ligação por átomo de carbono no C60 foi calculada em 5.586 eV (RHF) e em 6.783 eV
(MNDO), sendo o valor experimental igual a 7.40 eV. Esta molécula, pertencente ao
grupo de ponto icosaédrico Ih, apresenta 4 modos normais de vibração ativos no
infravermelho, de simetria T1u, calculados em 558, 584, 1242 e 1457 cm-1 (RHF) e em
577, 719, 1353, e 1628 cm-1 (MNDO). O C60 possui ainda 10 modos normais com
atividade no Raman: 2 com simetria Ag, calculados em 492 e 1498 cm-1 (RHF) e em
610 e 1667 cm-1 (MNDO) e 8 com simetria Hg, calculados em 269, 453, 744, 788,
1148, 1319, 1476 e 1702 cm-1 (RHF) e em 263, 447, 771, 924, 1261, 1407, 1596 e
1722 cm-1 (MNDO).
- A molécula de C70 apresenta cinco sítios atômicos não-equivalentes e oito
tipos de ligação C-C
(RHF) e 6.829 eV (MNDO). Observamos que tais valores são da ordem de 0.03 eV
(RHF) e 0.04 eV (MNDO) maiores do que a energia de ligação da molécula de C60, em
concordância com a diferença experimental de 0.02 eV. Quanto às propriedades
vibracionais, a molécula de C70, pertencente ao grupo de ponto D5h, possui 31 picos de
absorção permitidos no infravermelho e 53 picos permitidos no Raman. O maior
número de modos ativos no C70, quando comparado ao C60, é justificado com base na
redução da simetria no primeiro, o que implica em uma redução na degenerescência
dos modos e, conseqüentemente, no aumento do número de modos ativos.
- A molécula de C48N12 apresenta seis tipos distintos de ligação nitrogênio-
carbono e nove tipos distintos de ligação carbono-carbono. Nossos
mostraram que, em comparação com os comprimentos de ligação C-C e C=C da
molécula de C60, as ligações simples C-C são menores no C48N12, o que pode ser
devido à redistribuição de densidade eletrônica nesta última. A energia de ligação
calculada para a molécula de C48N12 foi de 4.524 eV (RHF) e 6.251 eV (MNDO).
Observamos que tais valores são da ordem de 1.05 eV (RHF) e 0.53 eV (MNDO)
menores do que na molécula de C60. A distribuição de cargas, segundo análise
populacional de Mulliken, mostrou que os átomos de nitrogênio e carbono estão
simetricamente agrupados, formando dois grupos de seis nitrogênios cada um e oito
196
grupos de seis carbonos cada um. Quanto às propriedades vibracionais, esta
molécula, pertencente ao grupo de ponto S6, apresenta 58 modos normais ativos no
infravermelho, correspondentes a 29 modos não-degenerados e a 29 modos
duplamente degenerados. O C48N12 apresenta ainda 58 modos ativos no Raman,
correspondentes a 29 modos não-degenerados e a 29 modos duplamente
degenerados.
- Para as moléculas de C60H60 e C60F60, calculamos os comprimentos de ligação
C-C (nas arestas entre pentágonos e hexágonos), C=C (nas arestas entre
o
estabilizados de duas maneiras principais: ou por uma grande interação coulombiana,
hexágonos), C-X (X = H, F) e X...X, bem como os ângulos de ligação <XCC, através
dos métodos RHF e MNDO. Os dois métodos forneceram resultados similares, uma
vez que ambos previram um aumento dos comprimentos de ligação C-C e C=C
quando se vai do C60H60 para o C60F60. Ambos os comprimentos de ligação sofrem um
acréscimo de 0.03 Å (RHF) e de 0.09 Å (MNDO). Por outro lado, os ângulos de ligação
<XCC são muito pouco alterados quando se vai do C60H60 para o C60F60. Estes
resultados são consistentes com o que se espera do efeito da saturação dos átomos
de carbono. Em média, nas moléculas de C60X60, a distância X...X entre dois átomos X
vizinhos, sejam eles ligados a dois átomos de carbono da aresta de um pentágono ou
da aresta entre hexágonos, são maiores no C60F60 do que no C60H60. Esse aumento
varia de 0.15 a 0.16 Å (RHF) e de 0.18 a 0.19 Å (MNDO), o que pode ser devido à
maior repulsão interatômica entre os átomos de flúor, quando comparada àquela entre
os átomos de hidrogênio. A energia de ligação calculada para a molécula de C60H60 foi
de 4.227 eV (RHF) e 4.732 eV (MNDO). Observamos que estes valores sofrem uma
diminuição de 0.77 eV (RHF) e 0.33 eV (MNDO), quando comparados aos valores da
energia de ligação da molécula de C60F60. O grande “gap” de energia, EHOMO – ELUMO,
observado nas moléculas de C60H60 (21.320 eV (RHF) e 14.168 eV (MNDO) e C60F60
(19.044 eV (RHF) e 11.892 eV (MNDO)) é típico de hidrocarbonetos saturados. A
análise da distribuição das cargas de Mulliken na molécula de C60H60 mostra que os
átomos de carbono adquirem cargas negativas, agindo como aceitadores de elétrons
dos átomos de hidrogênio, os quais ficam carregados positivamente, agindo como
doadores. Por outro lado, na molécula de C60F60, os átomos de carbono adquirem
carga positiva, agindo como doadores de elétrons aos átomos de flúor, os quais ficam
carregados negativamente, agindo como aceitadores. Quanto às propriedades
vibracionais, as moléculas de C60H60 e C60F60, pertencentes ao grupo de ponto Ih,
apresentam 9 modos normais ativos no infravermelho e 20 modos ativos no Raman.
- Quanto aos endofullerenos, nossos resultados ab initio UHF de relaxação
completa mostraram que os complexos H@C60, Li@C60, Na@C60 e K@C60 sã
197
proven
corre nas proximidades do centro de uma face
hexago
penas uma
pequen
positiva, agindo como doador de elétrons aos carbonos da
“gaiola
iente da transferência de cargas entre os átomos aprisionados e a “gaiola” ou
por um compartilhamento de elétrons, de caráter predominantemente covalente. Em
geral, a estabilização é atingida quando o átomo aprisionado move-se para fora do
centro, causando uma polarização da “gaiola”, à exceção do átomo de H, que
permanece exatamente no centro do C60, com carga essencialmente nula, bem como
os átomos de carbono e do átomo de K, que praticamente não se desloca. O sistema
Li@C60 comporta-se como um complexo de caráter covalente, em que tanto o átomo
de Li quanto os cinco átomos de carbono da face pentagonal na direção da qual o Li
se estabiliza adquirem carga negativa, ao passo que os demais carbonos da “gaiola”
ficam carregados positivamente.
- Por outro lado, os resultados teóricos obtidos por ANDREONI [33], usando o
método DFT/LDA, indicam que a posição mais estável para o átomo de Li no
complexo endoédrico Li@C60 o
nal e que o Li age essencialmente como doador de elétrons. Nossos resultados
evidenciam que a diferença entre as energias calculadas para o átomo de Li nas
direções das faces pentagonal e hexagonal é da ordem de ~ 0.02 eV. Essa pequena
diferença de energia poderia estar associada a possíveis erros numéricos, de forma
que a posição mais estável do Li possa variar entre as referidas direções.
- Nossos resultados obtidos para o complexo Li@C60 não concordam com os
resultados ab initio (DFT/LDA) obtidos por LI e TOMÁNEK [34], segundo os quais o
átomo de Li possui caráter predominantemente iônico, apresentando a
a contribuição covalente. Entretanto, contraditoriamente, os resultados obtidos
pelos mesmos autores através de cálculos de dinâmica molecular indicam um grande
caráter covalente na ligação Li-C60 e uma grande anisotropia na superfície de potencial
do complexo Li@C60.
- Os sistemas Na@C60 e K@C60 comportam-se como complexos doadores de
elétrons, com diferentes graus de ionicidade. No caso do complexo Na@C60, o átomo
de Na adquire carga
”, os quais comportam-se como aceitadores, ficando negativamente carregados.
Os dois átomos de carbono que formam a ligação dupla na aresta entre dois
hexágonos, que é a direção de estabilização do átomo de Na, adquirem uma carga
negativa maior. Por outro lado, no caso do complexo K@C60, verificamos que o átomo
de K praticamente não sofre deslocamento em relação ao centro da “gaiola”. O
potássio, devido ao seu raio iônico elevado (quando comparado ao Li e ao Na), sofre
uma repulsão maior em relação aos carbonos da “gaiola”, estabilizando-se nas
proximidades do centro. O K perde seu elétron de valência 4s para o C60, agindo como
doador, ao passo que os 60 átomos de carbono agem como aceitadores.
198
- De acordo com nossos resultados, os complexos Li@C60, Na@C60 e K@C60
são mais estáveis do que o sistema constituído da molécula de C60 livre e do átomo
alcalino isolado.
r resultados qualitativos satisfatórios, consumindo um tempo de
síduos de compostos orgânicos provenientes dos
solvent
atura.
na previsão de espectros ainda não observados
experim
- Quanto à aplicabilidade dos métodos teóricos, concluímos que o método
semi-empírico MNDO, por consistir em uma simplificação do método Hartree-Fock, é
capaz de fornece
cálculo muito menor quando comparado ao método Hartree-Fock, além de poder ser
parametrizado para o cálculo de inúmeras propriedades de moléculas grandes como,
por exemplo, fullerenos de pesos moleculares mais elevados, para os quais o método
Hartree-Fock torna-se inviável. Por outro lado, é importante salientar que os valores
teóricos fornecidos pelo método Hartree-Fock são tanto mais próximos do valor
experimental quanto maior a sofisticação da base de funções empregada. Já o método
MNDO, conforme já discutido, tem como característica a utilização de um conjunto-
base mínimo, fator que contribui para que seus resultados sejam menos precisos em
relação ao valor experimental.
- Os resultados experimentais fornecidos pela espectroscopia de FTIR
mostraram que nas amostras de fullereno provenientes do LPA havia a presença de
impurezas, provavelmente re
es empregados no processo de extração Soxhlet. Mediante os resultados
obtidos, observamos que uma possível solução para o problema seria a submissão
das amostras sintetizadas diretamente ao processo de sublimação, sem passar pela
etapa intermediária de extração à base de solventes; o processo de purificação de
fullerenos em um gradiente de temperatura que não envolva o uso de solventes pode
ser mais adequado.
- As medidas dos espectros vibracionais de infravermelho e Raman de
fullerenos, através das técnicas de FTIR e micro-Raman reproduzem os valores
experimentais da liter
- Verificamos que a conjugação entre teoria e experimento é uma ferramenta
extremamente útil na interpretação de resultados experimentais já existentes e pode
contribuir com eficácia
entalmente.
199
6. Perspectivas Futuras
No decorrer da execução das atividades de pesquisa propostas, nos foi
possível constatar que a conjugação entre teoria e experimento pode ser
extremamente frutífera, de forma que pretendemos que tal interação seja levada à
frente na execução de estudos posteriores. Nosso estudo realizado foi bastante útil no
sentido de que serviu como treinamento para trabalhos experimentais futuros,
pretendidos na fase de doutoramento, tendo em vista que a aquisição de um traquejo
teórico contribuirá enormemente para o bom andamento de atividades de pesquisa
futuras.
Nossas perspectivas futuras se referem ao estudo experimental relacionado à
caracterização espectroscópica de nanoestruturas, em especial fullerenos e seus
derivados, bem como nanotubos de carbono. A UFMG já dispõe de um grupo
experimental ativo dedicado a esta linha de pesquisa, especialmente com relação à
síntese e à caracterização de materiais à base de fullerenos funcionalizados, os quais
são capazes de apresentar vastas aplicações em diversas áreas de conhecimento.
Diversas aplicações recentes, envolvendo fullerenos e seus derivados, têm
sido relatadas na literatura e, sem dúvida, nos servirão de estímulo para futuras
pesquisas relacionadas. Em um artigo de revisão de 2003, BOSI et al. [45] reportam
os avanços mais recentes no desenvolvimento e nas aplicações físicas, químicas e
biológicas de fullerenos e seus derivados. Os aspectos químicos e físicos do C60 têm
propiciado muitas expectativas de aplicações, especialmente nas áreas biológicas.
Um dos aspectos negativos da molécula de C60 para uso em química medicinal
consiste em sua insolubilidade em solventes polares e na conseqüente formação de
agregados em soluções aquosas. Em 2001, foram realizados cálculos computacionais
da solubilidade do C60 em 75 tipos de solventes orgânicos, a fim de se obter relações
quantitativas dos mecanismos de solubilidade; desde então, diferentes métodos têm
sido extensivamente explorados. A metodologia mais versátil é baseada na
modificação química da “gaiola”, dando origem a derivados do C60, que possuem
diferentes propriedades químicas e físicas.
Várias funcionalizações da molécula de C60 têm sido testadas a fim de
aumentar o caráter hidrossolúvel e possibilitar o preparo de novos compostos à base
de fullerenos, que apresentem atividades biológicas e farmacológicas. O caráter
200
lipossolúvel da “gaiola” pode ser útil nas interações com o sítio ativo de várias enzimas
como, por exemplo, a HIV protease; tal caráter pode ser útil ainda na capacidade das
moléculas de C60 de se intercalarem em membranas biológicas, desestabilizando-as.
Tais ações poderiam apresentar atividades anti-bacterianas associadas a muitos
derivados do C60. A inserção de átomos metálicos no interior da “gaiola”, originando os
metalofullerenos endoédricos, pode dar origem a materiais que funcionem como
rastreadores radioativos em imagens de ressonância magnética e de raios-X. Os
fullerenos podem também ser úteis como transportadores de drogas para o
bombardeamento seletivo de tecidos.
De acordo com relatos presentes na literatura [45], muitas patologias
neurodegenerativas, tais como as síndromes de Parkinson, Alzheimer e Lou Gehrig,
se devem à hiper-produção de oxigênio e óxido nítrico, provavelmente devido à super-
excitação de receptores de ácido glutamínico. O chamado stress oxidativo causado
por radicais oxigênio é conhecido por induzir a instabilidade celular mediante uma
cascata de eventos, conduzindo à morte celular. Em tais situações, tem-se
demostrado que o uso de radicais absorvedores tendem a diminuir a morte neuronal.
A atividade neuroprotetora de fullerenos é baseada em sua capacidade de reagir com
os radicais oxigênio, tais como superóxidos ( ) e hidroxilas , os quais
atacam os lipídeos, as proteínas, o DNA e outras macromoléculas. Os carbóxi-
fullerenos, por exemplo, (Fig. 6.1) têm demonstrado sua eficácia in vivo no combate
aos processos neurodegenerativos.
−2O )( −OH
Figura 6.1. Esquema dos carbóxi-fullerenos, compostos eficazes no tratamento de patologias
neurodegenerativas.
Um número considerável de estudos realizados têm demonstrado que a ruptura
das cadeias nucleotídicas de DNA e RNA pode ser realizada na presença de
derivados de fullerenos, como aqueles ilustrados na Fig. 6.2. Compostos com um
caroço de fullereno ligado covalentemente a uma porção do DNA são capazes de
201
melhorar a ação e a seletividade do medicamento ao atuar na cadeia de DNA. A
principal conseqüência direta da ruptura de ácidos nucléicos é a citotoxidade,
observada em muitos tecidos. Derivados de fullerenos têm mostrado um caráter
inibitório contra a ação de várias enzimas, tais como as proteases cisteínicas e
serínicas.
igura 6.2. Esquema das interações entre fullerenos e cadeias nucleotídicas, com conseqüente
Mesmo com os avanços atingidos no tratamento da AIDS, a mutação rápida do
vírus H
é um elipsóide hidrofóbico semi-aberto. O
diâmet
F
fragmentação ou ruptura dos filamentos de DNA e RNA.
IV, capaz de resistir às modernas terapias, e a toxidez elevada das drogas
geralmente utilizadas, estimulam a busca de novos agentes. A HIV protease é uma
enzima fundamental para a sobrevivência do vírus. Esta proteína é capaz de romper
uma poliproteína em curto intervalo de tempo após a germinação viral. O efeito desta
ruptura consiste em ativar as enzimas transcriptase reversa, RNAse II, integrase e
protease. Esta última completa o ciclo de vida do vírus HIV e sem esta etapa não é
possível ao vírus infectar novas células. Entretanto, há uma necessidade constante de
obtenção de novos agentes inibidores, devido aos problemas usuais de resistência
virótica à ação inibitória, causada por mutação genética do vírus e pela similaridade
química entre os inibidores disponíveis.
O sítio ativo da HIV protease
ro desta cavidade é de cerca de 10 Å, que é aproximadamente o diâmetro da
esfera de C60. Em 1993, FRIEDMAN et al. [46] realizaram estudos de modelagem
molecular e descobriram que a HIV protease poderia ser complexada e inibida pela
introdução de uma molécula de C60 no interior da cavidade catalítica, permitindo a
202
formação de interações de Van der Waals entre a enzima e a superfície do C60. O
mesmo grupo de pesquisa realizou a primeira síntese de um fullereno inibidor da HIV
protease (composto mostrado na Fig. 6.3). O composto mostrou fortes interações de
van der Waals entre a superfície do C60 e a enzima, inibindo com sucesso a atividade
da HIV protease.
Figura 6.3. O primeiro inibidor da HIV protease, sintetizado em 1993.
Nos últimos anos, a intenção de se utilizar fullerenos em diferentes campos
farmac
ig. 6.4. C60 funcionalizado, atuando como agente inibidor de genes infectados.
Estes derivados possuem quatro cargas positivas, as quais permitem uma
ligação com a molécula de DNA, sem reconhecimento de bases específicas, mas no
ológicos tem aumentado consideravelmente, juntamente com os estudos de
suas propriedades físicas e químicas. Uma aplicação muito importante reportada na
literatura consiste na utilização de derivados de fullerenos (Fig. 6.4) como agentes
inibidores de genes infectados.
F
203
sentido
l (Fig. 6.5).
Este d
Fig. 6.5. A interação e regamento de
élulas sangüíneas do tipo eritrócitos.
Estes materiais apresentam ainda uma série de outras aplicações fotofísicas e
spectroscópicas extremamente interessantes. FOLEY et al. [47] estudaram tais
proprie
rmados por polímeros conjugados e derivados
de fullerenos. Os autores investigaram as propriedades ópticas e as respostas
de interações eletrostáticas entre os sais de amônia e os grupos fosfato
negativamente carregados do DNA. As células englobam o complexo através do
mecanismo biológico de fagocitose, sendo a ligação ao DNA reversível.
A síntese de muitos derivados de fullerenos contendo moléculas de açúcar
também tem sido explorada, como é o caso do complexo D-manosil-fullero
erivado é capaz de evitar o agregamento entre eritrócitos (um tipo de célula
sangüínea), tipicamente devido ao fullerol. Estudos têm mostrado que a presença de
porções de α-D-manosil reduz significativamente este agregamento, bem como a
redução da ligação de uma proteína β-galactose específica. Em particular, para o
derivado mostrado na Fig. 6.5, esta agregação entre eritrócitos não se manifesta,
mesmo em concentrações maiores do que 10-2 mol/litro.
ntre fullerenos e açúcares específicos é capaz de inibir o ag
c
e
dades para uma série de derivados do C60, usando uma combinação de
técnicas resolvidas no tempo, incluindo contagem simples de fótons e fotólise de
pulsos de laser. Os autores verificaram que os espectros de absorção eletrônica e de
fluorescência são desviados para o vermelho com relação àqueles referentes à
molécula de C60. Os resultados obtidos mostraram que as propriedades fotofísicas dos
derivados de fullerenos hidrossolúveis dependem essencialmente do tipo de radical
que é aderido à estrutura da molécula.
KIM et al. [48] fabricaram recentemente em laboratório células orgânicas
fotovoltáicas baseadas em complexos fo
204
fotovol
Figura 6.6. Estrutura química PCBM, como precursores de
células orgânicas fotovoltáica
reportaram seus resultados mais recentes sobre a
odelagem das propriedades ópticas de heteroconjunções de “bulks” de células
olares plásticas, consistindo de uma blenda no estado sólido do polímero conjugado
poli-[2-
s mais vastas aplicações científicas.
táicas de um dispositivo formado por poli[2-metóxi,5-(2’-etil-hexilóxi)-1,4-
fenileno-vinileno (MEH-PPV) e um derivado do C60, [6,6]-fenileno C61-ácido-butírico
metil-éter (PCBM), representados na Fig. 6.6, com várias concentrações de PCBM e
os resultados obtidos demonstraram a potencialidade destes materiais como uma
nova classe de células orgânicas fotovoltáicas.
da interação entre o MEH-PPV e do
s.
HOPPE et al. [49]
m
s
(3,7-metil-etilóxi)-5-metilóxi]-para-fenileno-vinileno e do derivado do C60, 1-(3-
metóxicarbonil) propil-1-fenil [6,6]C61. Estas e muitas outras aplicações são fatores estimulantes para que realizemos
novas pesquisas, objetivando o avanço na compreensão dos fullerenos e seus
derivados, como fonte potencial para a
205
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