Efetividade Dos Direitos Humanos Internacional

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1 A CONSOLIDAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS: JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E RELATIVIZAÇÃO DA SOBERANIA NACIONAL Wedner Costodio Lima Nara Suzana Stainr Pires RESUMO: A importância da discussão do tema no cenário do constitucionalismo contemporâneo é identificada a partir da necessidade de abranger a efetividade do direito internacional dos direitos humanos e sua aplicabilidade no direito interno dos Estados através do exercício jurisdicional constitucional pleno, discutindo por fim, a relativização da soberania nacional. Evidencia-se a existência do sistema interamericano de direitos humanos, com objetivo de buscar orientações acerca da existência do confronto entre a soberania nacional, direito interno e sistema interamericano. Palavras-chave: Direitos Humanos; Soberania Nacional, Sistema Interamericano, Conflito de interesses. Abstract: The importance of the topic of discussion in the contemporary constitutionalism scenario is identified from the need to discuss the effectiveness of international human rights law and its applicability in domestic law of states, discussing the relativity of national sovereignty and emphasizing the existence of applicability in national law of the jurisdiction of the inter-American human rights system, in order to seek guidance about the existence of confrontation between national sovereignty, national law and inter-American system. Keywords: Human Rights; National Sovereignty, Inter-American System, Conflict of interest. Introdução Diante a necessidade global de discussão sobre a efetividade de garantir os direitos humanos, sendo que a existência de convenções, tratados, pactos são

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1A CONSOLIDAO DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS:JURISDIO CONSTITUCIONAL E RELATIVIZAO DA SOBERANIANACIONALWedner Costodio LimaNara Suzana Stainr PiresRESUMO:Aimportnciadadiscussodotemanocenriodoconstitucionalismocontemporneo identificada a partir da necessidade de abranger a efetividade dodireito internacional dos direitos humanos e sua aplicabilidade no direito interno dosEstados atravs do exerccio jurisdicional constitucional pleno, discutindo por fim, arelativizaodasoberanianacional.Evidencia-seaexistnciadosistemainteramericano de direitos humanos, com objetivo de buscar orientaes acerca daexistnciadoconfrontoentreasoberanianacional,direitointernoesistemainteramericano. Palavras-chave:DireitosHumanos;SoberaniaNacional,SistemaInteramericano,Conflito de interesses. Abstract:Theimportanceofthetopicofdiscussioninthecontemporaryconstitutionalism scenario is identified from the need to discuss the effectiveness ofinternationalhumanrightslawanditsapplicabilityindomesticlawofstates,discussingtherelativityofnationalsovereigntyandemphasizingtheexistenceofapplicabilityinnationallawofthejurisdictionoftheinter-Americanhumanrightssystem,inordertoseekguidanceabouttheexistenceofconfrontationbetweennational sovereignty, national law and inter-American system.Keywords: Human Rights; National Sovereignty, Inter-American System, Conflict ofinterest.IntroduoDiante a necessidade global de discusso sobre a efetividade de garantir osdireitoshumanos,sendoqueaexistnciadeconvenes,tratados,pactosso2instrumentosefetivosnocombateacondutasarbitrriaseautoritriasdosagentesdeEstadonodescumprimentoadireitosfundamentaisdevidoaofortecrescimentotecnolgico informacional, questiona-se: A soberania dos Estados est abalada pelonovoconceitocontemporneo,atravsdaefetivaododireitointernacionaldosdireitoshumanos,relativizandoassimopoderdeaodosEstados,ouaderiraosistema, autorizando a interveno externa no direito interno justifica a necessidadede globalizao dos direitos humanos como forma de proteo a violaes claras esistmicas.OpresenteartigotemcomoobjetivogeralbuscarumentendimentoepromoverumadiscussoarespeitodarelativizaodasoberaniadosEstadosemfacedaefetivaodaproteointernacionaldosdireitoshumanos,emrazodaquelatrazeremconceitooelementodignidadehumana,sendoquesuaproteoinerente.Deoutromodo,quandoocorreaintervenohumanitrianajurisdio domstica dos Estados para proteger direitos humanos, discutir se a aogeraumapretensadiminuiodasoberania,ouaconcretizaodagarantiadodireitointernacionaldosdireitoshumanosque,aofinal,traduz-senavontadegeralda nao. Justifica-seadiscussodoproblema,umavezqueumadasexignciasintelectuais nos tempos modernos repensar a questo da soberania dos Estadosdeacordocomanecessidadedeaplicaoeintervenointernacionalparaefetivaodedireitoshumanos.Comometodologia,utiliza-seapesquisabibliogrfica como tcnica de pesquisa para elaborao deste artigo. 1 A Evoluo da Proteo Internacional dos Direitos HumanosA proteo internacional dos diretos humanos fruto de um processo longoegradativodeamadurecimentodasidiaseposiesdasociedadeinternacionalsobre o tema de efetivar e assegurar sobre aplicabilidade nos estados. EsseamadurecimentoteveseumaiordesenvolvimentoapartirdofinaldaSegunda Guerra Mundial quando a sociedade internacional percebe a necessidadedeseconstruirumnovomodelodeDireitoInternacionalPblico,voltadocriao3demecanismosdeproteoaosdireitosfundamentaisdapessoahumana,emdespeitoasarbitrariedadesdosautoritrios,ditadoresagentesdeEstado.EssamudanaradicaldepensamentoseencontradelineadaporRogerioTaiar(TAIAR,2010, p. 206), ao arguir que: VriaslinhasdepesquisaquepoderiamseradotadasparaanalisaramudanaparadigmticasofridapelodireitointernacionalpsSegundaGuerraMundial,contudo,optou-sepeladiscussoacercadapretensarelativizaodoprincpiodasoberaniaemfacedaefetivaodaproteointernacionaldosdireitoshumanos,comintuitodeseverificaremquemedida o direito internacional dos direitos humanos pode influenciar a ordemjurdica nacional e se possvel existir uma relao de compatibilidade entrea ordem jurdica internacional e a soberania dos Estados.Frisa-sequeopontodepartidaparaaconstruoepensamentodeefetivaodosdireitoshumanossurgeapenasapsaSegundaGuerraMundial,devido aes monstruosas e violadoras aos direitos mais bsicos do Homem, razopela qual se efetiva discusso pelos Estados, como forma inclusive de amenizar osofrimentomundial.ComoenfatizaValriodeOliveiraMazzuoli(MAZZUOLI,2001,p. 67): Anormatividadeinternacionaldeproteodosdireitoshumanos,quesetraduznodireitointernacionaldosdireitoshumanos,foiconquistadaapsincessanteslutashistricas,econsubstanciadaeminmerostratadosconcludos com este proposito,foi fruto de um lento e gradual processo deinternacionalizao e universalizao desses mesmos direitos. O surgimento de uma disciplina que regule a efetivao e concretizao dosdireitoshumanosfaznasceresperanadaaplicabilidadeecumprimentodasnormasnospasessignatrios,denominadoDireitoInternacionaldosDireitosHumanos,sendoqueapartirdaaprovaodaDeclaraoUniversaldosDireitosHumanosedaconcepoporelaintroduzidaquesecomeaadesenvolveradisciplinaemepgrafe,comadoodeinmerasmedidasetratadosvoltadosproteodosdireitosfundamentais.AlexandreMiguel(MIGUEL,2006,p.286)citaque: A necessidade sempre premente de dar proteo e efetividade aos direitoshumanosdezsurgiremnvelinternacional,umadisciplinavinculadaaodireitointernacionalpblico,quesedenominouchamardedireitointernacionaldosdireitoshumanos,cujafinalidadebasiliarconcretizaraeficciaplenadosdireitoshumanos,pormeiodenormastuteladorasdebens primordiais da vida, a exemplo da prpria vida humana, da dignidade,4daliberdade,dasegurana,dahonra,dentreoutros,comprevisesdeinstrumentos jurdicos e polticos de implementao. No entanto, enfatizando este contexto histrico de mudana de paradigmasecriaodemeiosdeefetivarasgarantiasindividuaisedospovos,dentrodeumsistemahumanitrioqueprotejamdireitos,inibindoqualqueraoautoritriaearbitrariaqueatinjadireitoshumanos,criadoumsistemainteramericanoquegerenciaaproteodosdireitoshumanosnosEstados-membrosdaOrganizaodos Estados Americanos (OEA), da qual o Brasil faz parte, chamado de ConvenoAmericanasobreDireitosHumana,maisconhecidacomoPactodeSanJosedaCosta Rica. OsantecedentesdaConvenoAmericanavmcitadosnoseuterceirosconsiderando.Soeles:aCartadaOrganizaodosEstadosAmericanoseaDeclaraoAmericanadosDireitoseDeveresdoHomemnoplanoregionalinteramericano,enoplanoglobal,aprpriadeclaraoUniversaldosDireitosHumanos, todos de 1948. (GOMES, 2008, p.14) AConvenoAmericanasobreDireitosHumanosoprincipaltratadointernacionaldosistemainteramericanodedireitoshumanos,sendoograndecdigo, cdex, dos direitos civis e polticos no Continente Americano e o tratado dediretos humanos mais utilizados nos pases interamericanos, em especial os latinos.No entanto, no atual cenrio brasileiro, ainda encontra-se resqucios de pensamentoditadoreseautoritrios,frenteaexercerasoberaniaabsolutadoEstado,sendopraticamente,segundoaDoutrina(MAZZUOLLI,2008),desconhecidonoBrasil,emboraasdiscussessobreimpossibilidadedeprisocivilpordepositrioinfieltenhamdeflagradoadiscussodoPactodeSanJosedaCostaRicanocenriojurdico interno. Nesse cenrio, os princpios e as normas sobre direitos humanos passam aseremconsideradospeladoutrinaepelaspraticasinternacionaiscomonormassuperiores de vigncia erga ommes, representando a evoluo do processo histricodeinternacionalizaodosdireitoshumanosumtraoinicialparaumsistemajurdico universal destinado a reger as relaes entre Estado e pessoas, tendo como5fundamentosprimriosaproteo,promoodadignidadedapessoahumanaeelevao ao patamar de sujeito de direito internacional. 2 Ativismo Jurisdicional e a proteo aos Direitos Humanos A ultima ratio do Direito a proteo dos direitos da pessoa humana, sendonecessriotambmoasseguramentodosdireitoshumanos.Noentanto,paraquese atinja toda a amplitude exigida, faz-se necessrio que a atividade jurisdicional seefetivedentrodeumafacetapositiva,encontrando-seosjuzesetribunaisobrigados, por meio de aplicao, interpretao e integrao, a outorgar s normasde direitos humanos fundamentais a maior eficcia possvel no mbito jurdico. Tal fato se relaciona com a participao efetiva dos magistrados no controledaefetividade,tantoporaoquantoporomisso,tendocomojustificativaanecessidadedeimunizaocontraapossvelaodanosadoprocessopolticomajoritrio,oquesechamadeativismojudicial.ConformeLuisRobertoBarroso(2009), longe de ser uma ditadura de togas, o ativismo judicial uma atitude, ummodoproativoeexpansivodeinterpretaraConstituio,permitindoumaatuaomaisampladoJudicirio,ocupandoespaosqueforamdeixadosvagosouqueforam ocupados de maneira deficiente pelos demais Poderes.SocristalinososposicionamentoscontrriossdecisespeloPoderJudicirio onde h uma zona de penumbranalei, mas pode-severificar a partir doelevado nmero de aes diretas promovidas perante o Supremo Tribunal Federal,e, especialmente, pelas inmeras decises declaratrias de inconstitucionalidade deleis editadas pela Unio Federal e pelos Estados, comprovando que h um dficit dequalidadelegislativaeporvezparteonecessrioequilbrioentreosPoderesecompromete os direitos e principalmente as garantias fundamentais dos cidados. Nosetratadeaesarbitrariasnoexercciofuncional,masdoexercciodafunojulgadorapautadoemditamesprincipiolgicos,comoamoralidade,ajustiaeadignidadedapessoahumana,estabelecidosnospelaConstituio,masgravadosnaconscinciadacoletividade.SegundoNaraS.S.Pires(2014)oativismojudicialnoselimitaaumcontrolenegativodeconstitucionalidade,6retirandodoordenamentojurdicoaquelasnormasquesoincompatveiscomoespritodaConstituioFederal.Oativismojudicialtambmpossuiumcontroledeconstitucionalidadepositivo,nomomentoemquecrianormajurdicaeexigeasuaobedinciapelosdemaisPoderesepelosparticulares,naquelescasosemqueoLegislativoeoExecutivomantiveram-seomissos,oquesenotamaisevidentenoque tange a proteo efetiva dos direitos humanos.Deste modo, necessria uma conscincia crtica dos prprios magistradosquantoaorelevantepontoquelhesincumbe,devendosempresubmeterlegislaoelaboradapeloPoderPolticoanlisedecompatibilidadecomasnormas,valoreseprincpiosconstitucionaisecomostratadosinternacionaisrelativos aos direitos humanos, isto , com o moderno direito humanitrio. Sem estanecessriaconscinciacrtica,ouseja,procedendo-seaplicaocegaeautomticadalei,corre-seoriscodedesempenharopapelcoadjuvantedereprodutor das relaes de domnio. Segundo Luiz Flvio Gomes, (GOMES, 1997,p. 107),O juiz, por isso, tem que ter conscincia de que um instrumento do podere saber que papel est cumprindo: se est atrelado clssica ideologia daneutralidade(assptica),serumfuncionalinstrumentodoPoderPoltico;se deseja, no obstante, superar tal ideologia, deve ter conscincia tica desuatarefa,constitucionalizando-seetransformando-seassimeminstrumento da Justia, socialmente equilibrada e equitativa.Noentanto,paraestatransformaoeefetivaodoativismojurisdicionalsofundamentaisumaprimoramentodeconhecimentosnotocantesnormasinternacionaisdeproteodosdireitoshumanos,umavezqueascondieseefeitos de sua integrao ao sistema jurdico nacional ainda so questes obscuraspara muitos operadores do direito. Nessatotalidadedeargumentos,desenvolve-seaimportnciadanormatividade dos princpios, os quais, outrora, no eram distinguidos como normajurdica,sendoabordadossomentecomofontesubsidiriadodireito,aplicveisquando houvesse lacuna na lei e no fosse possvel a aplicao da analogia ou docostume.7Tambmsedestacaadimensomaterialdoativismojudicialqueounejustia e ainda uma dimenso instrumental que, une-o justa medida da incidnciadanormaemdeterminadocasoconcreto.Ofundamentalvalordoativismojudicialincidenaefetividadequeosjuzes,verdadeirosintrpretesconstitucionais,devemempregarcomafinalidadedeconcretizarasnormasconstitucionaisdemaioralcancepossvel,privilegiandoainterpretaoqueadmitaarealizaodosdireitosfundamentais. Conforme Nara S.S.Pires (2015) tal realizao possvel:Atravs do ativismo judicial, permite-se uma interpretao constitucional queselibertedealgunsmitosligadosaoformalismojurdico,interpretaomecnicadasnormasjurdicaslimitadaspelopositivismojurdiconormativista.Nessecontexto,altera-seopapeldojuiz,queselimitavaarevelarumasoluoquejseencontravaclarapelasimplesincidnciadanormaaocasoconcretoequeagora,diantedecasoscomplexosenaausnciadeumanormaespecficaaplicvelaocaso,precisaparticiparativamente do processo de criao do direito, pois, uma vez que a respostaparaolitgionoseencontraprontananorma,ojuizterquecriar,argumentativamente,asoluoparaaquelecasoespecficoqueforasubmetido deciso do Poder Judicirio 2014).Compreende-se queo ativismo judicial se diferencia por um modo proativodeinterpretaoconstitucionalporpartedoPoderJudicirio,ondenabuscaparalitgios com lacunas na lei, vo alm do caso concreto e instituem novas construesconstitucionais,demonstrandoumaforma deinterpretaoconstitucionalcriadora especial visando a proteo dos direitos humanos.Importantefrisar,dianteomomentoatualedevidodecisorecentedoPoderJudicirio,maisprecisamentenoEstadodeSantaCatarinaonde,ojulgadoraplicouochamadocontroledeconvencionalidadeparaafastaratipicidadedelitivada conduta do delito de desacato, restando assim assentado na fundamentao dovotoredigidopelojulgador.(http://emporiododireito.com.br/desacato-nao-e-crime-diz-juiz-em-controle-de-convencionalidade/), (...)Noqueconcerneespecificamenteaochamadocontroledeconvencionalidadedasleis,inarredvelamenoaojulgamentodoRecurso Extraordinrio 466.343, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, noqual ficou estabelecido o atual entendimento do Supremo Tribunal Federalnoquedizrespeitohierarquiadasnormasjurdicasnodireitobrasileiro.AssentouoSTFqueostratadosinternacionaisqueversemsobrematria8relacionadaaDireitosHumanostmnaturezainfraconstitucionalesupralegal exceo dos tratados aprovados em dois turnos de votaoportrsquintosdosmembrosdecadaumadascasasdoCongressoNacional,osquais,ateordoart.5,3,CR,osquaispossuemnaturezaconstitucional. Por conseguinte, cumpre ao julgador afastar a aplicao denormasjurdicasdecarterlegalquecontrariemtratadosinternacionaisversandosobreDireitosHumanos,destacando-se,emespecial,aConvenoAmericanadeDireitosHumanosde1969(PactodeSoJosdaCostaRica),oPactoInternacionalsobreDireitosCivisePolticosde1966eoPactoInternacionaldosDireitosEconmicos,SociaiseCulturaisde1966(PIDESC),bemcomoasorientaesexpedidaspelosdenominadostreatybodiesComissoInternamericanadeDireitosHumanoseConselhodeDireitosHumanosdasNaesUnidas,dentreoutroseajurisprudnciadasinstnciasjudiciriasinternacionaisdembitoamericanoeglobalCorteInteramericanadeDireitosHumanoseTribunalInternacionaldeJustiadaOrganizaodasNaesUnidas,respectivamente.(...)Nessesentido,destaque-sequenombitodaComisso Interamericana de Direitos Humanos foi aprovada, no ano 2000,aDeclaraodePrincpiossobreaLiberdadedeExpresso,tendotaldocumentocomoumadesuasfinalidadesadecontribuirparaadefiniodaabrangnciadogarantiadaliberdadedeexpressoasseguradanoart.13 da Conveno Americana de Direitos Humanos. E, dentre os princpiosconsagrados na declarao, estabeleceu-se, em seu item 11, que as leisquepunemaexpressoofensivacontrafuncionriospblicos,geralmenteconhecidascomoleisdedesacato,atentamcontraaliberdadedeexpresso e o direito informao.Nesse sentido, como bem anota Flavia Piovesan (2013, p.170): ODireitoInternacionaldosDireitosHumanospodereforaraimperatividadededireitosconstitucionalmentegarantidosquandoosinstrumentosinternacionaiscomplementamdispositivosnacionaisouquandoestesreproduzempreceitosenunciadosnaordeminternacionalouaindaestenderoelencodosdireitosconstitucionalmentegarantidosquandoosinstrumentosinternacionaisadicionamdireitosnoprevistospela ordem jurdica interna.Na contemporaneidade a tutela efetiva dos direitos fundamentais carece dainternacionalizao da proteo jurisdicional, exigindo-se no s reconhecimento dacompetnciadosrgosecortesinternacionaisdefiscalizaoeproteo,comotambmaconcessodemaioreficciaeaplicabilidadepossvelaostratadoseconvenesinternacionaisrelativosaosdireitoshumanos,fontesdodireitointernacionaldosdireitoshumanoseequivalentesemhierarquiaanossaordemjurdicaconstitucional(intelignciadoart.5,3daConstituioFederal).Destemodo,osdireitoshumanosencontramguaridaeamparonosnoordenamentoconstitucional(interno),mastambmnoplanointernacional,complementariamente9(intelignciadoart.5,2,c.c.art.4,II,ambosdaCartaFederal).SegundoAntnio Augusto Canado Trindade, Com a desmistificao dos postulados do positivismo voluntarista, tornouseevidentequessepodeencontrarumarespostaaoproblemadosfundamentosedavalidadedodireitointernacionalgeralnaconscinciajurdicauniversal,apartirdaasserodaidiadeumajustiaobjetiva.Comoumamanifestaodestaltima,tm-seafirmadoosdireitosdoserhumano, emanados diretamente do direito internacional, e no submetidos,portanto, s vicissitudes do direito interno (TRINDADE, 2006, p. 401)Emsuma,muitossoosempecilhosdifusodaculturadosdireitoshumanos, que objetiva, acima de tudo, ampliar ao mximo sua proteo e reduzir aimpunidadedosseusvioladores.Dentrodestaperspectiva,cabemagistraturapapelativonaconsecuodesteresultado,exigindo-selaborpermanenteedeterminado para superao de to nefastos obstculos. Dentrodestaperspectivafaz-senecessrioalinharconsideraesnoquetange soberania do Estado frente efetivao do Direito Internacional dos DireitosHumanos.3ArelativizaodasoberaniadoEstadofrenteefetivaodoDireitoInternacional dos Direitos HumanosAsoberaniaeintegridadedoEstado,dianteaevoluodalutapelaefetivao dos Direitos Humanos, a muito deixou de ser reconhecida e aplicada deforma absolutae exclusiva,como era concebida teoricamente pelaantiga doutrina.Umadasmaioresexignciasintelectuaisnostemposmodernosrepensaraquesto da soberania dos Estados. Enfatizar e efetivar direitos dos indivduos e dospovos,doserhumano,medidaessencialparaconcretizaodosDireitosHumanos na atual dimenso do Direito Internacional.Nessecenrioconstata-sequeoprocessohistricoocidentaldemonstraocrescimentodevariadostiposdeEstados,suasmudanaseevoluesnoconstitucionalismoqueporvezacenderamoaparecimentodealgumasparidadesconstitucionais. Tais ocorrncias provocam alguns pensadores do direito e juristas, aconstataes e analises que resultam no aparecimento de novas teorias. Para Peter10Hberle(HABERLE,2007,p.12),noEstadoConstitucionalCooperativoseobservaumefeitorecprocoentreasrelaesexternasouDireitoInternacionaleaordemconstitucionalinterna(nacional),quepartesdoDireitoInternacionaledodireitoconstitucionalinternocrescemjuntasnumtodo.Logo,nohqualquerrelaodeprimazia do Direito Constitucional ou do Direito Internacional. Assim, no h que sepreocuparcomaincidnciadasteoriasmonistaoudualistanasrelaesentredireito interno e internacional.O auxlio se desenvolve e se ativa fazendo com que o Estado constitucionalestejaobrigadoaumaresponsabilidadecomum.AsmanifestaesdecooperaosovariantesesurgemapartirdousodeferramentasdeligaoentreoDireitoInternacional e o Direito Interno. Para viabilizar a ideia de um Estado ConstitucionalCooperativo,Hberle(2000,p.24)sugereumateoriadaConstituiocomocinciada cultura. AConstituiocomocinciaabertadacultura,naconcepodeHberle(1997),demonstrananecessriaaberturadoprocedimentodeinterpretaoconstitucional, o que rege ideia de sociedade aberta de intrpretes da Constituiocomopremissabsicadainterpretaopluralista.EstateoriadaconsolidaodoEstado Constitucional Cooperativo se depara com alguns obstculos, com destaqueoprincpiodasoberaniaeoprincpiodoprimadodaConstituiosobretodososdemaisatosnormativos,procedentesdoDireitointernacional,integradosaoordenamento interno.Nestaperspectivanota-sequeatualmente,apreocupaodasociedadeglobal a busca no equilbrio entre as aes para efetivao do direito internacionaldos direitos humanos, e o respeito no exerccio da soberania de cada Estado, e aomesmotempo,criarmecanismosregulatriosquefuncionemcomoinstrumentovoltado a soluo de conflitos e tendo como finalidade o ser humano. Percebe-seque,aintervenohumanitriarelativizariaasubjetividadedepredicados internacionais de soberania e autodeterminao dos Estados, embora aprocedimentalizaosejalegtimadianteagravidadedecasosconcretos,osquaisnecessitamaultimaratiohumanitria,constitudapelanecessriagarantiainternacional dos direitos humanos. Outro ponto a ser destacado, em ordem diversae contraria ao supra, refere-se premissa que sustenta que o sistema de proteo11internacionaldosdireitoshumanosnoameaariaasoberanianacionaldosEstados,soboargumentodequeocarterprotetivoseriacomplementaresubsidirio,ouseja,apenasnashiptesesgraves,emqueoEstadonoestaarespeitar os diretos humanos que o sistema internacional humanitrio entraria emao, no caso do Brasil, o Pacto de San Jose da Costa Rica. Rogerio Taiar (2010, p.273) define a situao sob dois aspectos: A primeira premissa tem como base a relativizao da soberania em face danecessriaproteodosdireitoshumanos.Asegundaautorizaainterveno internacional para garantir a tutela dos direitos humanos quandodono-exercciooum-gestodadevidaproteopeloEstado,situaoque extrapolaria a questo da devida proteo pelo Estado, pois, embora, asoberania permanea como poder estatal em um primeiro momento, a partirdo instante em que o Estado deixa de atender aos direitos humanos, abdicada sua soberania nesse particular.Percebe-seafimdeexemplificaraatuaointernacionalhumanitrionodireito interno, que o Brasil j restou intimado atravs de representao a ComissoInteramericana de Direitos Humanos (CIDH) por meio de Medida Cautelar n. 8-13,aprestaresclarecimentoseefetivarmedidasparasoluescleresaoproblemapenitencirio recorrente no Presdio Central de Porto Alegre RS, o que demonstraumaefetivaintervenonasoberaniaEstatalatravsdeConvenohumanitria.(http://www.ajuris.org.br/sitenovo/wp-content/uploads/2014/01/Medida-Cautelar-Pres%C3%ADdio-Central-30-12-2013.pdf). Asoberaniaentoseaproximadeumcontextorelativo,nosomenteemdecorrnciadainternacionalizaodosdireitoshumanos,mastambmporqueseaboliuasoberaniaabsoluta,emboradiariamentepercebe-seEstadoscomarbitrariedades,travestidosdeDitaduraseautoritarismos,emrazodequeoserhumano,socivelpornaturezaevivendoemumasociedade,submete-searegrasdeconduta,institudasparadirimirconflitosepromoverapazsocial,isto,convencionou-secederpartedesualiberdadeembenefciodaconvivnciasocial.EmrelaobuscapeloHomemdeumaentidadequerepresentasseocoletivo,Jean Jacques Rousseau (1987, p.31), afirmou o seguinte: Ao perceber que os obstculos a sua conservao no estado de naturezasuperamasforasquecadaindivduotemparasobreviver,ohomemmudaoseumododevidaebuscaumaformadeassociaoqueo12defendaeproteja.Destamaneira,abremodesuaplenaliberdade,cercadadeincerteza,edepositaparceladestaliberdadeemumcorpo,umanicapessoapblicaformadapelauniodetodas,aqualganhouonome de repblica ou de corpo poltico. A liberdade do Estado est limitada pelos direito humanos, haja vista que adignidadehumana,emborapreexistenteatodaequalquernormatividade,asseguradacomoverdadeiroprincpiouniversaleinviolvel,sendoquesuanormatizao jurdica serve justamente para realar o compromisso tico-jurdico doEstado em velar pela dignidade humana.Os desafios da humanidade e a luta por um direito mundial apresentados porMireilleDelmasMartypartemdosDireitosHumanoscomoalicerceparasuaproteojurdica.Aautoraevocaodireitointernacional,maisdesignadamenteosDireitosHumanos,parainsitarumdireitonico.OsDireitosHumanosprocuramauniversalidade,conservandoasparticularidadesdecadacultura,enquantoessasadaptem-se em seus preceitos. Mireille Delmas-Marty (2003, p.8/9) avulta:PareceserfactvelestruturarumDireito universalizado quandoduasquestes so interpeladas: os Direitos Humanos e a presso econmica daglobalizaodosmercadosfinanceirosquecoagemnosentidodauniformizaodosordenamentosjurdicos.Antesdisso,destaca-seadistinodossinnimos: mundializao,universalizao e globalizao:Amundializao remete difuso espacial de um produto, de uma tcnica oude uma idia. A universalidade implica um compartilhar de sentidos () Dolado da Economia, e mais precisamente do Direito Econmico, trata-se, comefeito, de globalizao, caso seja entendida como difuso espacial da escalaglobal (2003, p.8/9).O discurso de cooperao, universalizao e internacionalizao dos DireitosHumanos se mostram desafiadores para o ordenamento jurdico. Destaca-se que oBrasil um dos pases que assinaram a Declarao de 1948, e procurou colocar otexto de acordo com suas realidades, para resguardar suas culturas e soberania. Adiferenaefetivaparatalencontra-senaferramentadecontroleestabelecidoporconvenoregionalparadefenderosDireitosHumanos.MireilleDelmas-Marty(2003, p.34) aponta as diferenas constitutivas desse controle de forma mais polticado que jurdica:13verdadequeaConvenodeVienasobreodireitodostratadosadmitemuitoamplamenteoprincpiodasreservasquelimitamoengajamentodoEstado signatrio sobretalouqual ponto, mas ela se aplica principalmenteaostratadosclssicos,internacionaisnosentidoprprioemqueelescomportam o engajamento recproco dos Estados. Os tratados relativos aosdireitosdohomemsodiferentes,vezquesobaseadosnoprincpiodareciprocidadeentreosEstados,sendoosdestinatrios,naverdade,osindivduos situados sob a jurisdio de um Estado contratante. Aorelativizarasoberania,deve-selevaremcontaqueosDireitosHumanosderegraserconcretizadapeloDireitoInternacional,atravsdeconvenesquealteramasnormasestatais.ApesardasoberaniadosEstadoscontinuaremdelimitandoasrelaesinternacionais,confere-seasuperioridadedoexercciodoExecutivo no domnio dessas relaes. Portanto,adignidadehumana,princpiouniversaldodireitointernacionaldosdireitoshumanos,nodiminuiasoberaniadosEstados,aocontrrio,reafirmaseuconceitoenquantomanifestaodopoderestatallimitadopelodireito.Oexercciodopoderdesoberanialimitado,destarte,pelosdireitos,quersejadapessoahumanacomodosgruposeassociaes,tantonombitointernoouinternacional. Consideraes finais OprocessohistricoconstitucionalbrasileirofrenteaosDireitosHumanostemdemonstrado,tantoemconhecimentosliberaiscomoemregimesautoritrios,que, fechados, os Poderes Legislativo e Executivo no tm sido capazes de garantirefetivamenteorespeitoaosdireitosmnimodoserhumanocomoumadasfundamentais caractersticas da democracia.Desta forma a intercesso do Judicirio aparece como forma de equacionareventualdesacertoentreLegislativoeExecutivonadeliberaoquelhescabe,ouparaaliviarasviasdemocrticas,umavezquesepodeasseverarqueajurisdioconstitucional prestada pelo Supremo Tribunal Federal possui um intuito mediador. NaatualidadeaConstituiodeveseracatadacomonormaimpositiva,emrazo de sua fora normativa, ensejo pelo qual a Lei Maior no promete, mas exigeocumprimentodeseuspreceitos,avisarpelaefetividadedecadaumdeseus14dispositivos.Deve-se,ento,partirdaidiasuperadadequeosdireitosfundamentaisprevistosnaConstituioseriamendereadossomenteaoPoderExecutivo,paraqueesteosimplantassedamaneiraquelheconviesse,eigualmentedeveajurisdioconstitucional,namedidadesuascompetncias,empenhar-se pela concretizao de tais direitos.Defato,emqueincidamascriticasdeparceladadoutrina,intui-sequeoativismonoumesteretipoquedesqualificaodesempenhodaJurisdioimputando-lheumaparcelanegativa,comoseexistisseumabsolutismodetogas.Emverdade,umaJurisdioempenhadacomumcatlogodedireitosfundamentaisequeapiaaconsolidaodaexigibilidadededireitoseoacessojustia. Dentrodoquestionamentolevantadonopresenteartigonosepretendeexauriroassuntoourealizarafirmaescategricas,maspode-seperceberque,inegavelmente, o que se refere soberania dos Estados, mesmo na contra mo doquealgunsatoresdodireitodefendem,estanoseencontraabaladapelonovoconceitocontemporneo,atravsdaefetivaododireitointernacionaldosdireitoshumanos,poisestepoderrelativizado,ouseja,mantm-seopoderdeaodosEstados, adere-se ao sistema, no como uma interveno externa no direito interno,masumacooperaoentreasesferas,oquesejustificananecessidadedeglobalizaodosdireitoshumanoscomoformadeproteoaviolaesclarasesistmicas.REFERENCIASBARROSO, Luis Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporneo: Osconceitos fundamentais e a construo do novo modelo. So Paulo: Saraiva, 2009.DELMAS-MARTY, Mireille. Trs Desafios para um Direito Mundial. Trad. FauziHassan Choukr. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003.15FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razn. Teoria del garantismo Penal. 2 ed. 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