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EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA PARA PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA VISUAL/AUDITIVA: ESTUDOS DESENVOLVIDOS NO
CONTEXTO AMAZÔNICO
O presente painel trata da inclusão de estudantes com deficiência visual/auditiva a partir
dos resultados de pesquisas desenvolvidas de forma independente, em três Estados da
Amazônia Legal: Acre, Rondônia e Mato Grosso. Os resultados das referidas pesquisas
são debatidos e entrelaçados aos referenciais teórico-metodológicos diferenciados. O
estudo desenvolvido no Acre deu centralidade à formação inicial de professores de
Matemática, mais especificamente à disciplina Prática de Ensino realizada em escolas
do Ensino Médio que incluem estudantes cegos. As análises foram voltadas para a
aprendizagem possibilitada pela utilização de recursos táteis (blocos de Luria). O estudo
desenvolvido em Rondônia também analisa experiências de formação de professores
que enfrentam o desafio de ensinar de Matemática, Física, Química para estudantes
cegos. Tais experiências foram realizadas em um curso de extensão que incluiu estudos
teóricos, diagnósticos da inclusão, produção de material didático e avaliação dos
resultados da utilização dos materiais no ensino. A extensão universitária também foi
objeto de estudo da pesquisa realizada no Mato Grosso, porém, o foco foi voltado para a
análise dos desafios e potencialidades da configuração de projetos como redes de
conversação sobre ciência, cultura e educação na contemporaneidade. Os
entrelaçamentos desses três estudos realçam a importância da formação de professores
para a adoção de práticas pedagógicas mais inclusivas. Realçam também as
potencialidades do trabalho coletivo que aproxima universidade e escola de educação
básica, pois, assim, a inclusão constitui-se numa via de mão dupla onde todos aprendem
e são incluídos.
Palavras-chave: Inclusão. Ciências/Matemática. Formação de Professores.
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FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO DE
ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL
Marcia Rosa Uliana
Universidade Federal de Rondônia - UNIR/REAMEC
Gerson de Souza Mól
Universidade de Brasília–UnB/REAMEC
RESUMO: O presente estudo objetivou investigar como uma disciplina/curso de
formação para futuros professores de Matemática, Física e Química, centrada em
estratégias de ensino a estudantes com deficiência visual, pode contribuir para a
preparação docente, tendo em vista a promoção do ensino inclusivo. O estudo aconteceu
no Estado de Rondônia e constituiu em uma pesquisa-ação orientada pelo referencial
metodológico da abordagem qualitativa. O processo formativo/investigativo se
subdividiu em três fases: Exploratória/Diagnóstica, Ações Formativas e Avaliação. Ao
todo participaram da investigação 87 pessoas dentre essas professores que enfrentam o
desafio de ensinar Matemática, Física ou Química para estudantes com deficiência
visual; estudantes do Ensino Médio com deficiência visual e licenciandos das três áreas
mencionadas. Foram utilizados questionários, entrevistas semiestruturadas, vídeo-
gravações e narrativas/casos de ensino para produzir/coletar dados juntos aos
participantes. No desenvolvimento do estudo utilizou-se a técnica de Análise de
Conteúdo. Os dados da fase Exploratória/Diagnóstica evidenciaram que estudantes com
deficiência visual do Ensino Médio não estão vivenciando um processo
verdadeiramente inclusivo e que a temática educação de estudante com deficiência está
ausente ou posta de forma muito tímida nos projetos pedagógicos dos cursos de
licenciatura analisados. Professores que estão ministrando aulas para estudantes com
deficiência não tiveram preparação pedagógica específica para esse fim. Concluintes
dos cursos de licenciatura analisados, também, não se sentem preparados para
promoverem um ensino inclusivo. Dados produzidos/coletados durante as ações
formativas/investigativas revelaram que a disciplina/curso centrada em estratégias de
ensino para estudantes com deficiência visual, gerou múltiplas e significativas
contribuições, no que tange principalmente aos saberes docentes para a promoção de um
ensino inclusivo para estudantes com deficiência visual. Dentre as ações formativas
desenvolvidas, as que se mostraram mais produtivas foram as que correlacionaram
teoria e prática, como a produção e testagem de material didático com estudantes com
deficiência visual.
Palavras-chave: Deficiência visual. Formação de professores. Matemática, Física e
Química.
INTRODUÇÃO
Neste artigo apresentamos e discutimos resultados de uma pesquisa de
doutorado que planejou, propôs e avaliou a repercussão de uma disciplina/curso voltada
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para o ensino de conteúdos de Matemática, Física e Química para estudantes com
deficiência visual. Trata-se do processo de formação inicial de futuros professores de
tais disciplinas. A pesquisa foi desenvolvida no Estado de Rondônia, entre o segundo
semestre de 2013 e o primeiro de 2015, numa abordagem metodológica referenciada na
pesquisa qualitativa (BOGDAN & BIKLEN (1994) e na pesquisas-ação (THIOLLENT,
2011). O processo formativo/investigativo aconteceu em três fases distintas, que foram
assim intituladas: Exploratória/Diagnóstica, Ações Formativas e Avaliação.
Exploratória/Diagnóstica: Esta fase foi orientada pelo propósito de conhecer
como tem ocorrido a formação e atuação de professores das áreas de Matemática, Física
e Química no que se refere ao fazer pedagógico em salas de aula que possuem
estudantes com deficiência visual.
Ações Formativas: Norteados pelos resultados da análise dos dados da primeira
fase e ancorados na revisão bibliográfica, planejamos e desenvolvemos uma
disciplina/curso. Essa disciplina/curso buscou sensibilizar e preparar futuros professores
de Matemática, Física e Química para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que
atendessem as demandas particulares de estudantes com deficiência visual no processo
de ensino-aprendizagem.
Avaliação: Refere-se ao propósito de conhecer a repercussão da disciplina/curso
na formação de futuros professores. Para tanto, analisamos em que medida as ações
formativas desenvolvidas no curso contribuíram para o desenvolvimento de saberes
docentes. Pautando-nos na organização dos saberes docentes nos conglomerados,
delineados por Tardif (2012): Saberes da formação profissional; Saberes disciplinares;
Saberes curriculares; e Saberes experienciais.
Na realização da pesquisa partimos do entendimento de que o movimento da
inclusão escolar, iniciado na década de 90 do último século, aumentou
consideravelmente o número de alunos com deficiência no âmbito das escolas de
Educação Básica, demandado assim, inovações no fazer pedagógico e de novas
pesquisas na área. Conforme indicam estudos realizados por Costa (2012), Amiralian
(2009), Camargo (2008) os professores não se sentem preparados para promover a
aprendizagem da diversidade de estudantes. Em se tratando do ensino da Matemática,
Física e Química para estudantes com deficiência visual, o professor precisa adotar
metodologias e materiais pedagógicos que permitam a compreensão de conceitos
abstratos e, em muitos casos, de grande complexidade.
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Diante desses entendimentos orientamos este estudo pela seguinte pergunta:
Quais as possíveis contribuições de uma disciplina/curso sobre estratégias de ensino a
estudantes com deficiência visual, na formação de professores de Matemática, Física e
Química?
Para tanto, a referida pesquisa teve por objetivo investigar como uma
disciplina/curso de formação de futuros professores de Matemática, Física e Química,
centrada em estratégias de ensino a estudantes com deficiência visual, pode contribui
para a preparação docente, tendo em vista a promoção do ensino inclusivo.
Para produzir/coletar os dados da presente pesquisa foram utilizados
questionários, vídeos-gravações, entrevistas semiestruturadas, narrativa/caso de ensino e
observação como instrumento.
O PROCESSO DE INCLUSÃO DE ESTUDANTE COM DEFICIÊNCIA VISUAL
A diversidade humana presente nas escolas de Educação Básica tem exigido a
adoção de práticas de inclusão. “Aceitar a diversidade possui muitas e complexas
implicações” (IMBERNÓN, 2000, p. 84), demandado da escola inovações em termos de
organização do espaço, do currículo (habilidades, conhecimentos, materiais didáticos,
metodologias de ensino e de avaliação) e da formação do quadro de pessoal. Nesse
processo faz-se necessário despir-se dos pré-conceitos construídos historicamente no
que se refere à capacidade de aprendizagem das pessoas com deficiência.
Esteve (1999, p. 122) nos lembra que avançamos em termos da universalização
da educação das nossas crianças, “agora, temos de modificar o nosso sistema de ensino,
para que haja flexibilidade suficiente para nos ocuparmos com essas crianças e seus
problemas reais, com certo nível de qualidade”. Para tanto, é necessário resgatar a
integridade dos professores, melhorar a qualidade da educação num geral, efetivar na
prática o que é de direito de todos os cidadãos e pagarmos uma dívida que a sociedade
tem com essas pessoas marginalizadas socialmente.
Amiralian (2009) ressalta que os professores de estudantes com deficiência
visual precisam saber sobre os efeitos da ausência ou limitação do sentido da visão no
processo de desenvolvimento e aprendizagem para então, definir atitudes e
procedimentos pedagógicos. A autora pontua ainda que “é importante também
incentivar os professores a descobrir o melhor caminho para interagirem com as
crianças cegas [...] de modo que elas possam alcançar seus objetivos” (2009, p. 30).
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Oliveira (2009) defende que os professores precisam, mesmo que não dominem,
estimular seus estudantes para utilizarem o código de escrita braille durante as aulas
para fazerem anotações, atividades e realizarem leituras. Esse é o único código de
escrita até o momento que é plenamente acessível ao estudante cego. É até
compreensível que os professores não o dominem, mas o seu uso pelo estudante cego é
de fundamental importância.
Não há modelos prontos para a educação inclusiva. Por isso, é de fundamental
importância que os professores interajam com os estudantes com deficiência e
descubram juntos maneiras de desenvolver práticas pedagógicas que os contemplem.
Cada estudante é um ser único, constituído pelas suas experiências familiares e sociais,
pela sua constituição genética, pelas suas crenças, pelos costumes e hábitos
(AMIRALIAN, 2009).
Claro que existem diferenças significativas entre os estudantes ditos normais, os
de baixa visão, os que já nasceram cegos e os que contraíram a deficiência na infância
ou na fase adulta. Mas, mesmos os que estão na mesma condição em relação à
deficiência, são diferentes uns dos outros. Por isso, promover a inclusão de estudantes
com deficiência é sempre um desafio.
Apresentaremos a seguir a análise de uma experiência que vivenciamos no
processo formativo/investigativo de professores para o ensino de Matemática, Física e
Química para estudantes com deficiência visual. Não se trata de uma receita de
educação inclusiva, mais sim de reflexões sobre possibilidades de formação de
professores para a diversidade.
DISCUSSÃO E RESULTADOS
Na primeira fase – Exploratória/Diagnóstica – intentamos fazer uma leitura
panorâmica de como vem acontecendo a formação docente, tendo em vista o processo
de educação da pessoa com deficiência visual no Estado de Rondônia. Analisamos o
conteúdo de entrevistas semiestruturadas realizadas com três estudantes com deficiência
visual e com quatro professores que enfrentam o desafio de ensinar Matemática, Física e
Química para alunos com deficiência visual. Analisamos também a grade curricular de
cinco projetos pedagógicos de cursos de Licenciatura em Matemática, Física e Química
e as respostas de um questionário aplicado a 54 licenciandos de cinco cursos.
Na Figura 1 apresentemos uma síntese do desvelado com o estudo diagnóstico
realizado e como foi planejadas/estruturadas a ações formativas
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Considerando a realidade atual do processo de inclusão de estudantes com
Resultados do estudo diagnóstico
Projetos Pedagógicos
- A temática Educação Inclusiva esta posta de forma
tímida ou ausente nos projetos dos cursos;
- A educação de estudante com deficiência visual não é
mencionada em nenhum dos projetos analisados;
- Dois cursos não oferecem nem a disciplina de Libras
que é obrigatória por força de lei;
- Distanciamento entre a formação proposta e a
demanda emergente da Educação Básica.
Licenciandos
- Inclusão escolar é algo importante e de direito dos
estudantes com deficiência, concebe os licenciandos;
- Os licenciandos conseguem perceber que o ensino
que está sendo praticado nas escolas de Educação
Básica não é o inclusivo;
- Os licenciandos não sem sentem preparados para
promover um ensino que inclua estudante com
deficiência;
- A presença da disciplina de Libras, soma no
entendimento no processo inclusivo além do
atendimento do aluno com deficiência auditiva;
- Disciplina que aborda questões gerais sobre a
Educação Inclusiva, não é o suficiente, mas já suscita
contribuições relevantes no processo formativo;
- Os conhecimentos dos futuros professores sobre as
particularidades da deficiência visual em si e sobre as
adequações metodologia necessária no processo
didático para esses estudantes são muito limitado.
Resultados do estudo diagnóstico
Professores
- A temática Educação Inclusiva, educação de aprendiz
com deficiência visual não foi assunto de estudo na
formação inicial nem continuada dos professores;
- Desconhecimento por parte dos professores das
particularidades do estudante com deficiência visual;
- Ausência de material didático adaptado nas escolas
para estudantes com deficiência visual;
- As ações pedagógicas desenvolvidas pelos professores
com estudantes com deficiência visual estão vinculadas
ao que os mesmos concebem por Educação Inclusiva;
- Descredito por parte de alguns professores da
capacidade intelectual e cognitiva do estudante cego;
- A efetivação da inclusão escolar do estudante com
deficiência visual é possível mediante um somatório de
ações concatenadas.
Estudantes
- Estudantes são alfabetizados em braille, mas não o
utilizam no processo de aprendizagem;
- Os estudantes são críticos com as mazelas do sistema
educacional que não permite que eles participem
ativamente do processo de aprendizagem;
- As escolas não estão preparadas fisicamente e
pedagogicamente para promover a inclusão de
estudantes com deficiência visual;
- A Matemática está sendo, forjadamemte, ensinada
apenas por intermédio de definições teórico;
- O ensino da Física e da Química aos estudantes com
deficiência visual, também, está sendo superficial.
Principais amarras teóricas que nortearam as ações formativas
1 Os professores são os protagonistas no processo de inclusão (MITTLER, 2003).
2 Os professores tem direito de esperar e receber formação que demanda o ensino
inclusivo (BRASIL, 1996).
3 “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”(ONU,
1948).
4 O estudante com deficiência visual é um estudante diferente, mas não menos capaz
no processo de aprendizagem (VYGOSTSKI, 1997).
5“Em geral, atribui-se às pessoas com deficiência uma status de segunda classe, são
consideradas inferiores” (VALLE, CONNOR, 2014, p. 39).
6 O processo de ensino aprendizagem para estudante com deficiência visual precisa
ser assessorado com materiais adaptados (COSTA, 2012; AMIRALIAN, 2009).
7 Os saberes oriundos da experiência são os mais utilizados na prática docente
(TARDIF, 2012).
8 A aprendizagem da docência deve se dá por meio de situações práticas que sejam
efetivamente problemáticas (NÓVOA, 1999).
Estratégias formativas propostas considerando os resultados dos estudosdiagnósticose teóricos
1 e 2 - Promover um curso de formação docente tendo em vista o fazer pedagógico com estudantes com deficiência;
3 - Apresentar aos licenciandos as leis e documentos que ampara o processo educacional dos estudantes com
deficiência evidenciando que atender as demandas educacionais desses alunos não é caridade e sim obrigação
docente;
4 - Apresentar e discutir com os futuros professores as particularidades dos alunos com deficiência visual;
4 e 5 - Sensibilizar os futuros professores de Matemática, Física e Química que é possível ensinar os conteúdos de
suas áreas, proporcionando que eles conheçam experiências exitosas nesse âmbito;
4 e 5 - Proporcionar que os futuros professores conheçam pessoas cegas bem sucedidas no processo educacional e
socialmente para desmitificar a ideia que são pessoas menos capazes;
6 e 7 - Incentivar e assessorar os futuros professores a desenvolver/adaptar materiais e atividades que possibilite o
aluno deficiente visual aprender conteúdos curriculares utilizando como acesso os sentidos remanescentes;
4, 5, 6, 7 e 8 - Viabilizar para que os futuros professores vivencie a experiência de testar os materiais/atividades
desenvolvidos/adaptados por eles com estudantes com deficiência visual.
O que fazer para mudar
essa realidadede
in/exclusãode alunos
com deficiência visual
no processo de ensino
aprendizagem? Uma
disciplina/curso de
formação para futuros
professores? Que ações
formativas favorecem o
desenvolvimento de
saberes demandados no
fazer pedagógico em
contexto de aprendizes
com deficiência visual?
Figura 1- Esquema síntese da Fase Exploratória/Diagnóstica e estruturação das ações Formativas
Fonte: Elaborado pelos autores com base em dados da Primeira Fase da pesquisa
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Considerando os dados do diagnóstico da realidade atual do processo de inclusão
de estudantes com deficiência visual no Estado de Rondônia e ancorados nas
contribuições de pesquisadores que discutem questões como: processo de inclusão de
estudantes com deficiência, formação de professores e o que ditam as leis e documentos
sobre a educação das pessoas com deficiência, promovemos um curso de extensão (com
a estrutura de uma disciplina 40 horas) por isso a designação disciplina/curso, do qual
participaram 26 licenciandos em Matemática, Física e Química.
Esse processo formativo constituiu a segunda fase da pesquisa - Ações
Formativas – que buscou contribuir diretamente com a superação de obstáculos
(apresentado na Figura 1) que dificultam a efetivação do processo de inclusão do
estudante com deficiência visual no Estado de Rondônia. Buscou ainda investigar a
repercussão de um processo formativo nos moldes do desenvolvido na preparação
docente tendo em vista o fazer pedagógico em contexto que possui estudante com
deficiência visual.
Os 26 licenciados que participaram da Segunda Fase da pesquisanão foram os
mesmos que participaram da Primeira. Com isso, julgamos necessário realizar um
diagnóstico inicial para se ter condições de analisar, ao final, a repercussão da formação
desenvolvida. Cabe destacar que a Terceira Fase – Avaliação – aconteceu
simultaneamente e concatenada as ações da segunda fase do estudo.
Aplicamos um questionário com perguntas dissertativas para os 26 licenciandos
no primeiro dia do processo formativo e promovemos situações para que eles
expressassem suas percepções e conhecimentos sobre o processo de inclusão, em
especifico dos de estudante com deficiência visual.
Considerando o exposto, fizemos as seguintes perguntas aos licenciandos: Para
você, o que é Educação Inclusiva? Qual a sua opinião sobre Inclusão Escolar? Para
você, existe diferença entre inclusão e integração? Em sua opinião, quais as vantagens e
desvantagens de aluno com deficiência estudar junto com alunos sem deficiência? Você
acredita que é possível ensinar aluno com deficiência na sala de aula do ensino regular?
Que tipo de ação/metodologia/recursos você, como professor da área de conhecimento
que está se formando, iria utilizar em suas aulas, se possuísse um aluno cego?
Analisamos as respostas apresentadas pelos licenciandos em interface com as
contribuições de Mittler (2003), Valle e Connor (2014), Stainback e Stainback (1999)
sobre o ensino inclusivo e as contribuições de Tardif (2012) e Nóvoa (1999) sobre
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formação de professores. Com isso, conseguimos explicitar requisitos que constituíram
quatro categorias temáticas que expressam o nível de conhecimento e percepção dos
licenciandos sobre aspectos diversos da Inclusão Escolar, inclusão de alunos com
deficiência visual.
No Quadro 1 explicitamos as categorias, os requisitos basilares que nortearam a
constituição dessas categorias e a classificação dos licenciandos nomeando-os com
siglas. Utilizamos a sigla LQ para identificar licenciando em Química, LM licenciando
em Matemática e LF licenciando em Física e o número para identificar e diferenciar os
sujeitos.
Quadro 1 - Classificação dos conhecimentos dos licenciandos sobre inclusão escolar em categorias
Categoria Requisitos Licencian
dos
Inclusivista
(1)
-Conhece os princípios básicos da Educação Inclusiva;
-Percebe que o professor é responsável por promover a aprendizagem
de todos os alunos;
-Acredita que é possível ensinar os conteúdos curriculares para alunos
com deficiência visual junto com os ditos normais.
-Consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação
Inclusiva;
-Acredita na capacidade de aprendizagem dos alunos com deficiência;
-Mostra dominar mecanismos didáticos que possibilitam desenvolver
um ensino no qual os estudantes com deficiência visual possuam
equidade de oportunidades de aprendizagem.
LQ2
Integracion
ista
(7)
- Conhece os princípios básicos da Educação Inclusiva;
-Percebe que o professor é responsável por promover a aprendizagem
de todos os alunos;
- Acredita que é possível ensinar os conteúdos curriculares para alunos
com deficiência visual junto com os ditos normais.
-Consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação
Inclusiva;
- Mostra ter ideia vaga de metodologia que possibilita desenvolver um
ensino no qual os estudantes com deficiência visual possuam equidade
de oportunidades de aprendizagem.
LM20,
LQ1,
LM12,
LM7,
LF4, LM8
e LM11
Sensível
(15)
- Conhece pelo menos em partes, os princípios básicos da Educação
Inclusiva;
- Percebe que o professor deve promover a aprendizagem de todos os
alunos;
- Tem dúvidas se é possível ensinar os conteúdos curriculares de suas
áreas para alunos com deficiência visual junto com os ditos normais;
- Concebe que o objetivo maior da Educação Inclusiva é o convívio
social;
- Mostra não possuir saberes que possibilitam desenvolver um ensino
que contemple os alunos com deficiência visual no processo de
aprendizagem.
LM1,
LM2,
LM3,
LM4,
LM5,
LM6,
LF1,
LM13,
LF3,
LM14,
LM15,LM
16, LM17,
LM18 e
LM19
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Insensível
(3)
- Conhece alguns princípios da Educação Inclusiva;
- Concebe que o objetivo maior da educação inclusiva é o convívio
social;
- Não acredita ser possível ensinar os conteúdos curriculares para
alunos com deficiência visual junto com os ditos „normais‟;
-Não consegue contemplar benefícios proporcionados pela Educação
Inclusiva;
-Evidencia não ter nem ideia, que metodologia poderia utilizar no
processo didático que iria atender as demandas de estudantes com
deficiência visual no processo de aprendizagem.
LM9, LF2
e LM10
Fonte: Elaborado pelos autores
Somente o licenciando LQ2 demonstrou com as respostas e falas que teria
condições no presente momento de desenvolver um ensino numa sala de aula que
possui estudante com deficiência visual de modo que esse estudante tivesse
oportunidade de participar ativamente do processo de aprendizagem. Por isso, o nome
da categoria: inclusivista. Esse futuro professor de Química respondeu que iria “usar
recursos que o aluno possa pegar, sentir o cheiro ou ouvir” (LQ2), evidenciando, assim,
que iria adaptar materiais para explorar os sentidos remanescentes do estudante, algo
que coaduna com as demandas desse público de estudante para a aprendizagem de
conteúdos da disciplina Química.
Sete licenciandos (LM20, LQ1, LM12, LM7, LF4, LM8 e LM11) ficaram
categorizados como Integracionistas, pois suas respostas evidenciaram que
apresentavam noção do como deveriam proceder didaticamente para promover um
ensino que incluísse o estudante com deficiência visual. Todavia, deixaram dúvidas se,
de fato, iriam contribuir para que esses estudantes tivessem aprendizagens
significativas dos conteúdos que iram ministrar, ou se contentariam com a efetivação
dos aspectos sociais do processo de inclusão.
A maioria (15 licenciandos) mostrou ter entendimento coerente do que é
inclusão escolar e da corresponsabilidade em promovê-la. No entanto, esse grupo
evidenciou não saber como gerir um processo didático que atenda as particularidades
de alunos com as diferentes limitações, dentre eles, os estudantes com deficiência visual
no processo didático.
Os licenciandos LM9, LM10 e LF2 deixaram transparecer que tem um
entendimento muito limitado do que seja Educação Inclusiva e não conseguem
vislumbrar os benefícios dessa para os estudantes num geral. Tampouco conhecem
procedimentos didáticos que permitam desenvolver um ensino que contemple a
diversidade de alunos.
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Cabe elucidar que o processo formativo vivenciado por esse grupo de
licenciando estruturou-se em 12 encontros de estudos presenciais, correspondendo a 30
horas-aula. Nesses encontros foram realizados estudos teóricos sobre a inclusão de
estudantes com deficiência nas escolas de Educação Básica, mais especificamente do
estudante com deficiência visual, sobre as demandas e particularidades desses
estudantes, e sobre as legislações que ampara a inclusão. Foram realizadas também
palestras por dois professores cegos. Além disso, foi desenvolvida uma investigação de
materiais disponíveis no mercado para identificar aqueles que poderiam ser utilizados
no ensino da Matemática, Física e Química para estudantes com deficiência visual.
Também foram discutidos, planejados e desenvolvidos materiais didáticos e estratégias
com essa finalidade.
Nas atividades realizadas a distância (10 horas aula) os licenciandos foram
organizados em pequenos grupos para planejar, desenvolver e testar materiais e
estratégias pedagógicas para ensinar estudantes com deficiência visual. Cabe destacar,
que todo o curso aconteceu num intervalo de tempo de seis meses entre o segundo
semestre de 2014 e primeiro de 2015 e que todos os encontros presenciais e a distância
foram gravados em vídeo para futura análise. No término do processo formativo foi
aplicado um segundo questionário para o 26 licenciandos, tendo em vista analisar
possíveis mudanças de percepção e desenvolvimento de novos saberes docentes.
O resultado da reavaliação do nível de conhecimento dos licenciandos,
considerando os requisitos basilares que nortearam o processo formativo foi ilustrado no
Quadro 2. Nele são apresentas as categorias, a classificação do licenciando ao iniciar a
participação no curso desenvolvido, e a que passou a ocupar ao término do curso.
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Figura 2 - Reavaliação dos conhecimentos dos licenciandos sobre inclusão escolar em categorias
Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados produzidos/coletados durante o curso de extensão
Conforme pode ser contemplado na Figura 2, com exceção do licenciando LQ2
que já se enquadrava na categoria de professor inclusivista, todos os outros, ao terem
reavaliado sua „bagagem‟ de conhecimentos e percepções, em específico, sobre inclusão
escolar de estudantes com deficiência visual, mudaram de categoria. Somente oito não
atingiram a classificação máxima de professores que mostraram ter capacidade e estar
preparados para promover a inclusão no processo de ensino aprendizagem de suas áreas
de conhecimento. Ficaram classificados como professores inclusivistas 16 licenciandos.
No início do curso havíamos identificado os requisitos necessários para a classificação
de inclusivista em apenas um licenciando (LQ2).
Cabe enaltecer que dentre as várias ações formativas desenvolvidas as que se
mostraram mais produtivas/significativas foram as que conciliaram/entrelaçaram teoria
e prática, como o planejamento, desenvolvimento/adaptação e testagem de
materiais/atividades com estudantes com deficiência visual e as palestras de dois
professores cegos. No caso das palestras, o diferencial não esteve no que abordaram os
professores, mas no desmitificado, construído ao conhecê-los.
Inclusivista
(1)
Insensível
(3)
Sensível
(15)
Integracionista
(7)
Insensível
(0)
Sensível
(0)
Integracionista
(7)
Inclusivista
(19)
LQ2
LQ1 LM20
LM12 LM7
LF4 LM8
LM11
LM15
LM18
LM1
LM2 LM3
LM5
LF1
LM6
LM4
LM13 LF3
LM19
LM17
LM14
LM10
LF2
LM9
LM16
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Visto que um dos „achados‟ inusitados do curso de formação foi perceber como
é forte o preconceito estigmatizante que os futuros professores traziam sobre a
capacidade das pessoas com deficiência visual ter desenvolvimento cognitivo,
aprendizagem dos componentes curriculares ensinados nas escolas e dessas pessoas
terem uma vida social com qualidade e independência. Isso configurava fortes
condicionantes negativos, os quais ofuscavam/limitavam esses futuros professores a
pensar em práticas pedagógicas inclusivas com esses aprendizes. Esses condicionantes,
por vez, foram desmitificados no momento que os licenciandos tiveram a possibilidade
de conhecerem dois professores cegos que lidam bem com a tecnologia e tem uma vida
independente, trabalham, estudam e se comunicam com o mundo; além da experiência
que tiveram de ensinar conteúdos de suas áreas de formação para estudantes com
deficiência visual.
Ao terem desmitificado as ideias negativas que traziam sobre a capacidade de
aprendizagem dos estudantes com deficiência visual, os futuros professores mostraram-
se mais comprometidos e entusiasmados com o processo de inclusão e em particular
com o desenvolvimento/adaptação de material didático para o ensino de sua disciplina
para estudante com deficiência. E mudaram seus discursos e percepção sobre a
capacidade de aprendizagem das pessoas com deficiência visual.
No entanto, acreditamos que o êxito alcançado no processo formativo, se deve
ao conjunto das ações concatenadas desenvolvidas e não exclusivamente é mérito das
ações de cunho prático e o contato com pessoas cegas. Visto que os estudos teóricos, as
discussões em grupos, os seminários, os estudos de casos de ensino, as vivências de se
colocar no lugar da pessoa com deficiência foram importantes e serviram para
alicerçarem reflexões e tomadas de decisões no planejamento das ações práticas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com os resultados apurados ao procedermos à reavaliação dos conhecimentos e
concepções dos licenciandos e da experiência vivenciada, concluímos que é possível
com uma disciplina/curso, mesmo com uma carga horária pequena, proporcionar
melhoras significativas na formação de futuros professores no que se refere à educação
para estudantes com deficiência e reduzir a discrepância que há entre o que é
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
10947ISSN 2177-336X
13
proporcionado na formação inicial de professores e as demandas das salas de aula da
Educação Básica.
Identificamos ainda, na análise dos dados, que a formação desenvolvida
possibilitou que diferentes tipos de saberes demandados no exercício da docência
fossem desenvolvidos/construídos ou mesmo ressignificados. Contudo, os saberes da
formação docente e os da experiência foram os que sobressaíram, seja pela recorrência
seja pela consistência desses nos discursos, nas ações e posturas dos licenciandos.
Confirmamos com esse estudo, que investir na formação do protagonista do
processo didático, do professor, é um caminho próspero e eficiente rumo a melhoria da
qualidade de ensino para todos os alunos, inclusive, do considerado „diferente‟ que se
encontram nas escolas de ensino regular.
Com isso, chegamos ao fim da nossa „viagem‟ na estrada que é infindável de
extensão e possibilidades, ressaltando que o processo formativo/investigativo realizado
está emoldurado no que entendemos e acreditamos sobre inclusão. No entanto, o
deixamos em aberto à possibilidade de olhares críticos da diversidade humana, tendo
ciência que o estudo em pauta tem suas limitações, mas, abre possibilidades para novas
investigações e discussões, além de proporcionar argumentos para estudos futuros no
mesmo ou em outros focos.
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10950ISSN 2177-336X
16
FORMAÇÃO INICIAL DE MATEMÁTICA E NEUROCIÊNCIA: PRÁTICAS
COM POSSIBILIDADES DE INCLUSÃO DE ESTUDANTES CEGOS
Salete Maria Chalub Bandeira
Universidade Federal do Acre - UFAC/FAPAC/ REAMEC
Evandro Luiz Ghedin
Universidade Estadual de Roraima – UERR/REAMEC
RESUMO: Este trabalho relata uma pesquisa na formação inicial de docentes de
matemática privilegiando a práxis para uma formação do professor crítico reflexivo,
com ênfase nos processos cognitivos da aprendizagem que decorrem e emergem das
neurociências aplicadas à educação, destacando os blocos de Luria. A investigação se
desenvolveu na formação inicial de estudantes do Curso de Licenciatura em Matemática
da Universidade Federal do Acre (UFAC) no contexto das disciplinas Práticas de
Ensino de Matemática III e IV e em quatro escolas do Ensino Médio da rede estadual de
Rio Branco (AC) que se encontram em processo de inclusão de cinco estudantes cegos
em classes regulares. Tem por objetivo propiciar a oferta de espaços, tempos, conceitos
e práxis pedagógicas mediadas pelos processos cognitivos da reflexão no contexto da
Formação Inicial de Docentes de Matemática possibilitando a construção de saberes que
tornam possível a inclusão de estudantes cegos nas Escolas de Ensino Médio, ao invés
de sua simples integração escolar. Utilizando-se como referencia central às
recomendações da pesquisa-ação colaborativa, o processo se iniciou em 2011 e aponta
os resultados: desenvolvimento profissional da formadora através da pesquisa e
comunicação científica; construção de saberes e identidade profissional de docentes de
matemática; mudança de paradigma com os envolvidos passando de uma
adaptação/integração de cegos para efetiva inclusão em aulas de matemática; construção
e adaptação de recursos didáticos de forma colaborativa, para o ensino-aprendizagem de
matemática; no âmbito das disciplinas de Práticas de Ensino de Matemática, a pesquisa
possibilitou uma mudança de prática eminentemente teórica para uma prática inserida
na realidade escolar; a pesquisa aponta que há a necessidade de criar uma política
universitária que implique mudanças no currículo da formação para as disciplinas de
inclusão constar como ofertas a partir do primeiro ano de curso e a formação de
formadores para a educação na diversidade.
Palavras-Chave: Formação Inicial de Matemática. Neurociência – blocos de Luria.
Inclusão de Cegos.
INTRODUÇÃO
Na última década no Estado do Acre, temos acompanhado o aumento de
estudantes com necessidades educacionais especiais em escolas nas classes comuns.
Dados apresentados pela Divisão de Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE), ligado
ao Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) apontam que
no ano de 2011, foram matriculados 4.852 estudantes cegos nas escolas estaduais do
Acre, conforme o censo realizado pela Secretaria de Educação Especial do Estado
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Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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(SEESP/AC). Em 2013, esse número foi 6.405 estudantes matriculados do 6º ao 9º ano
do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.
Com o objetivo de formar professores em matemática para lidar com os desafios
da inclusão de estudantes cegos no espaço escolar, à pesquisa articulou-se em torno do
seguinte problema: como a oferta de espaços, tempos, conceitos e práxis pedagógicas,
no contexto da Formação Inicial de Docentes de matemática, pode favorecer a inclusão
de estudantes cegos nas Escolas de Ensino Médio de Rio Branco-Acre e possibilitar aos
professores em formação inicial uma formação para a inclusão?
No intento de oferecer aos discentes do Curso de Licenciatura em Matemática
“uma formação docente com atenção voltada à diversidade” (BRASIL, 2002)
contemplando conhecimentos para atuar com estudantes com necessidades educacionais
especiais, vinte discentes do 3º período do Curso de Licenciatura em Matemática,
juntamente com a docente da disciplina de PEM III da UFAC construíram um „Kit
Pedagógico de Matrizes e Determinantes – Kit MD’. Esse recurso didático – produzido
com uma prancheta de papelão com cartelas de remédio coladas com cola quente,
tampas de refrigerante pet, semente de mulungu (representando os valores positivos) e
de lentilha (para os valores negativos) – foi utilizado no ensino/avaliação de matrizes e
determinantes para estudantes do 2º ano do Ensino Médio e, em particular, um dos
estudantes cegos que não pode compreender o assunto sem recursos táteis.
Essa experiência foi objeto de uma pesquisa de abordagem qualitativa,
utilizando-se como referencia central às recomendações da pesquisa-ação. A
investigação–formação adotou a proposta de Ibiapina (2008), com ciclos de
planejamento, ação e avaliação/reflexão se sucedendo em três fases: diagnóstico,
intervenção e avaliação. Para efeito do registro dos fatos e acontecimentos ocorridos na
sala de aula com o grupo de professores em formação inicial, na aplicação de
metodologias no contexto da UFAC e da escola utilizamos uma filmadora, um tripé e a
filmagem como instrumento de registro.
Com a intencionalidade de formarmos na UFAC professores para a diversidade
que investigam a própria prática, e dispostos a repensar a formação inicial e contínua
dos professores nos apoiamos em Pimenta (2008, p.16) que têm demonstrado que os
cursos de formação, ao desenvolverem um currículo formal com conteúdos e atividade
de estágios distanciados da realidade das escolas, pouco tem contribuído para gestar
uma nova identidade do profissional docente.
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Outro referencial abordado na pesquisa foi a Neurociência Cognitiva definida
como, “o campo de estudos que vincula o cérebro e outros aspectos do sistema nervoso
ao processamento cognitivo e, em última análise, ao comportamento”, de acordo com
Sternberg (2012, p. 29), destacando os blocos de Luria (Oliveira, 1997), Gazzaniga e
Heatherton (2007), Cosenza e Guerra (2011), Coquerel (2011) e outros.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Em quatro escolas pesquisadas, em 2011 e 2012 nos momentos de observações
em aulas de matemática, o único material didático utilizado pelos estudantes cegos era o
livro de matemática do Ensino Médio adaptado em Braille. Entendemos que, o processo
de aprendizagem do estudante cego, se dá através do tato, da audição, da olfação e da
gustação, ou seja, das percepções sensoriais remanescentes. Para a aprendizagem
escolar, quando o estudante é cego, emprega-se o sistema Braille, e com isso “o tato
passa a ser a percepção sensorial mais utilizada, em conjunto com a audição”, pois os
estudantes ficam escutando as explicações do professor no decorrer da aula
(BANDEIRA, 2015, p. 158). Somando-se ao sistema Braille e a explicação verbalizada
com a linguagem matemática utilizada pelo professor, na pesquisa utilizamos recursos
táteis adaptados, destacando dentre eles a “cartela de remédios para ensinar o conceito
de matrizes, reconhecer seus elementos e seus tipos”.
No processo de efetivação desta parte da pesquisa utilizamos os conceitos das
estruturas luriana (Blocos de Luria) e mediações simbólicas para a efetiva abordagem
do conceito de matrizes e seus tipos. No material didático tátil “cartela de remédio” para
conceituar matrizes, colamos cartelas de remédio (para representar os tipos de matrizes
e abstrair seus conceitos) numa prancheta de papelão forrada com papel cartão
vermelho, ilustrado na Figura 1.
Na parte superior da prancheta de papelão representamos primeiramente a matriz
que batizamos de “matriz cela Braille”(com três linhas e duas colunas - B3×2), em
seguida outros tipos de matrizes, dentre elas, a matriz quadrada (com duas linhas e
duas colunas – Q2×2), a matriz coluna (com três linhas e uma coluna – C3×1), a matriz
linha (com uma linha e três colunas – L1×3) e outra matriz quadrada (com uma linha e
uma coluna – Q1×1). Na parte inferior da prancheta representamos outra matriz
quadrada (com três linhas e três colunas – Q3×3), uma matriz M transposta à “matriz
Braille” (com duas linhas e três colunas – M2×3), matriz linha (com uma linha e duas
colunas – L1×2), matriz coluna (com duas linhas e uma coluna – C2×1) e repetimos a
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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19
matriz linha (com uma linha e três colunas – L1×3), para verificar se o aluno perceberia
que tinham matrizes iguais coladas em cantos diferentes da prancheta.
O significado apreendido mediante diferentes associações perceptivas permite
um trabalho mental e se torna uma representação que serve como signo mediador na
compreensão de mundo do sujeito. O grupo cultural em que o sujeito vive lhe fornece
maneiras de perceber e organizar a realidade. Esses elementos são os mediadores entre o
indivíduo e o mundo. Quando o indivíduo não vê e precisa conhecer o objeto “cartelas
de remédio”, por exemplo, ele fará a representação mental do objeto utilizando os
outros sentidos, tais como o tato e a audição. Com o tato ele percebe as linhas, forma,
textura etc. Com a audição precisará que outra pessoa descreva as características do
objeto, qual sua utilidade em nossa cultura. Assim, o conceito “cartelas de remédio”
teve seu significado esvaziado. Em seu lugar, foi atribuído o significado de matrizes,
uma nova representação mental que faz a mediação entre o indivíduo e a matemática.
Figura 1 - Cartelas de Remédio e pastilhas: Matrizes e seus tipos.
Fonte: Acervo da pesquisadora - PEM III - 2013.
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Ao relacionar os tipos de matrizes e seu conceito com o recurso didático tátil
com os blocos de Luria conceituados na Figura 1, o estudante cego com o seu foco de
atenção direcionado (em vigília) reconheceu os objetos que estavam na prancheta.
Primeiramente foi tocando com as mãos as cartelas de remédio coladas sobre a
prancheta. Nesse primeiro momento de funcionamento do cérebro, 1º bloco de Luria
(sentir) foi acionado: o estudante cego focou sua atenção tocando a prancheta com as
cartelas de remédio, reconhecendo as formas, apresentando coordenação corporal e
equilíbrio com o uso das mãos para movimentar o braço (integrando as informações
motoras e sensoriais e alguns aspectos da memória relacionados aos movimentos).
Com o uso do tato (lobo parietal) e da audição (lobo temporal), da explicação do
professor, o estudante movimentou suas mãos nas cartelas de remédio. E, reconhecendo
a similaridade da “cela Braille” na primeira cartela tocada verbalizou “parece à cela
Braille”. Nesse momento, o estudante utilizou as funções táteis-cinestésicas e auditivas
para ativar o 2º bloco de Luria (pensar) e relacionar as percepções novas com um
conceito já conhecido. Assim, o estudante recebeu, analisou e armazenou as
informações que chegaram do mundo exterior e dos aparelhos do próprio corpo. A
cinestesia (cine = movimento; estesia = sensação), que informa a posição do corpo no
espaço e os movimentos que estão sendo executados (COSENZA e GUERRA, 2011, p.
20).
Quando ele conseguiu pensar de forma mais elaborada e agir, reconhecendo os
tipos de matrizes quadradas, linha, coluna, transposta, dizendo sua compreensão e
resolvendo situações-problema utilizando o lobo frontal, empregou o 3º bloco de Luria
(agir).
Com o estudante cego Ezequiel do EJORB, desenvolvemos as atividades com
matrizes, primeiramente com o kit de cartela de remédios, identificando seus tipos
(Figura 1). Fazendo uso de outro recurso didático, construído com tampinhas de garrafa
pet, miçangas (representando os números positivos) e argolas (para os números
negativos) fixadas numa prancheta e formamos tipos de matrizes (conforme a sua ordem
- Am×n) em que representamos os valores dentro das tampinhas, de acordo com a sua
lei de formação para em seguida explicar as operações com matrizes e o assunto de
determinantes (Figura 1). No decorrer das ações para representarmos os elementos das
matrizes e calcularmos o determinante passamos a utilizar a semente de mulungu e
grãos de lentilha.
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A intervenção acima descrita teve por base o exercício dos conceitos de
sensação e percepção em relação ao tato.
O CAMINHO PARA A INCLUSÃO: A PESQUISA-AÇÃO
Em nossa pesquisa a investigação–formação foi fundamentada na proposta de
Ibiapina (2008), com ciclos de planejamento, ação e avaliação/reflexão se sucedendo
em três fases: diagnóstico, intervenção e avaliação, com as seguintes ações possíveis,
ilustrados na Figura 2:
Importante salientar que para Ibiapina (2008, p. 19), “os partícipes são
considerados como co-produtores da pesquisa”, é uma colaboração entre os diferentes
sujeitos (pesquisadores, professores, estudantes em formação, gestores, coordenadores)
que realizam na pesquisa a co-produção de conhecimentos e ciclos sucessivos de
reflexão crítica.
Na 1ª. Fase Diagnóstico: Iniciamos com uma investigação exploratória da
literatura da área e do referencial teórico ao longo de todo o processo, dado que a equipe
não dispunha de conhecimento suficiente sobre o tema, especialmente sobre o apoio à
inclusão. Paralelamente procedemos a uma investigação documental para identificar
instituições estaduais, federais e nacionais que desenvolvem ações (e ou políticas) na
área. Buscamos informações também sobre os recursos humanos, materiais disponíveis,
necessidades das escolas, do NAI/UFAC, da clientela escolar. Dessa forma, pudemos
identificar problemas enfrentados pelos professores e gestores para a inclusão efetiva
dos alunos deficientes visuais.
Figura 2- Proposta de investigação-formação adotada na pesquisa.
Fonte: Elaboração da pesquisadora baseada em Ibiapina (2008) e Azevedo (2014).
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Na 2ª. Fase Intervenção: Continuamos os estudos teóricos e realizamos
reuniões com os colaboradores da pesquisa para planejamento, confecção de
instrumentos para coleta de dados, planejamento de atividades de intervenção,
elaboração e implementação do plano de ação. Como recursos didáticos, utilizamos o
multiplano (FERRONATO, 2002), aplicado ao ensino de matemática; o sorobã para
trabalhar problemas contextualizados envolvendo as operações de adição, subtração,
multiplicação, divisão, além de mínimo múltiplo comum, máximo divisor comum, raiz
quadrada e outros; os softwares aplicativos: DOSVOX, Braille fácil, Braille Virtual,
GeoGebra e Materiais didáticos adaptados em alto relevo, voltados para o Ensino
Médio, construídos pelos alunos do curso de licenciatura em matemática e professores
colaboradores envolvidos na pesquisa.
Na 3ª. Fase Avaliação: Realizamos avaliação e replanejamento de ações com
vistas ao desenvolvimento do currículo e ao aperfeiçoamento profissional dos
envolvidos. Promovemos reuniões de avaliação formativa; elaboração de relatórios
parciais e finais; divulgação através de seminários das atividades desenvolvidas;
replanejamento de ações e elaboração de novos planos de trabalho (IBIAPINA, 2008).
Utilizamos uma filmadora e um tripé para o registro em vídeos dos
acontecimentos ocorridos na sala de aula com o grupo de professores em formação
inicial com a aplicação de metodologias no contexto da UFAC e da escola.
Tais atividades foram gravadas com o consentimento de todos, nas aulas na
UFAC e nas escolas. Outros registros utilizados foram os memoriais dos alunos, diário
de campo da pesquisadora e análise de documentos, dentre eles o Projeto Político do
Curso de Licenciatura em Matemática da UFAC e das Escolas, e o banco de dados (de
2011 à 2013) do Estado do Acre de alunos com necessidades educacionais especiais
fornecido pela Secretaria de Estado de Educação e Esporte (SEEE-AC) na Divisão de
Estudos e Pesquisas Educacionais (DEPE), ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) que realiza a filtragem do censo do Estado do
Acre, obtidos pela Secretaria da Educação Especial do Estado do Acre (SEESP-AC).
A pesquisa-ação desenvolvida com os estudantes cegos e professores em
formação inicial de matemática serviu para comprovar esta realidade. Jesus e Vieira
(2011, p.143) apontam para:
A necessidade de ruptura da escola, como instituição pensada para poucos,
quando aberta ao trabalho educacional com crianças com necessidades
educacionais especiais, se configura na dependência de diagnósticos clínicos
para a elaboração de trabalhos diversificados. Isso reforça a necessidade de
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ressignificação dos processos de formação inicial de educadores e
investimentos na formação continuada.
Jesus e Vieira (2011, p. 206) ressaltam também que para construirmos uma
escola inclusiva,“[...] precisamos pensar com o outro, precisamos de um processo de
reflexão-ação-crítica dos profissionais que fazem o ato educativo acontecer”.
Nessa perspectiva, consideramos que um investimento é a existência das
disciplinas de inclusão na Estrutura Curricular do Curso de Licenciatura em
Matemática. No percurso por nós vivenciado foi relevante a colaboração dos
professores especialistas da escola, do CEADV/CAP-AC, do NAI/UFAC, da família e
principalmente dos próprios estudantes cegos que se mostraram dispostos à aprender
matemática e à contribuir com a pesquisa. Esse tipo de pesquisa realça a importância de
“sólidos” processos de formação inicial e continuada para que os professores
se sintam capazes de promover diálogos entre a teoria e a prática e ainda para
que possam refletir sobre o vivido, o experienciado e aquilo que consideram
conflitivo, pois a reflexão sobre essas questões “[...] ajuda o profissional e
seus colegas de profissão a pensar sobre sua identidade e competências e
como elas são construídas, seja no âmbito individual ou coletivo, na
formação acadêmica ou no campo da prática” (FOERSTE, 2005, p. 33-34).
Para possibilitar esse tipo de vivência aos professores em formação inicial de
matemática da UFAC foi necessário a pesquisadora ao longo do percurso adquirir uma
formação para a inclusão, fazendo cursos no Centro de Apoio Pedagógico para
Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual do Acre (CAP-AC), no Núcleo de
Apoio a Inclusão da UFAC (NAI/UFAC) e participar de eventos científicos buscando
minicursos e pesquisadores que ensinam matemática, física, química e biologia para
deficientes visuais.
No caso do deficiente visual, os canais de sensibilização envolvem o contato e a
estimulação dos sentidos remanescentes, evitando o sentimento de isolamento. É
preciso falar com ele, mostrar-lhe os objetos, deixar que o toque, dizer qual é a sua cor,
falar de cheiros; e, ao procurar avaliar o seu processo de desenvolvimento-
aprendizagem, ter como referência as suas potencialidades e não a comparação com as
pessoas que enxergam.
Também é preciso adotar o suporte de recursos mediadores adaptados para
adquirir informações por meios não visuais. Como princípio básico consideramos que o
acesso a informação deve ser proporcionado a todos numa sala de aula, independente
das diferenças individuais para tal apropriação. Para tanto se faz necessário criar
condições que favoreçam a acessibilidade, visto que é tarefa inerente da sociedade
possibilitar instrumentalização que garanta a participação de todos os alunos nos mais
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variados espaços escolares e sociais. Na seção seguinte apresentamos os resultados de
nossa pesquisa com os depoimentos de nossos colaboradores.
DEPOIMENTOS
Os depoimentos com os momentos de intervenção dos professores em Formação
Inicial de Matemática da UFAC presentes em seu Memorial (M_PFI na Figura 3):
Na sequência mostraremos na íntegra o depoimento gravado do professor de
matemática da turma, de alguns estudantes do 2º ano F (do EJORB) sobre a intervenção
de matrizes e determinantes com o Kit de MD na figura 4, da intervenção do dia
02/10/2013:
Para o Professor de Matemática do 2º ano F:
Trabalhar com esse material foi muito bom. Porque é muito excelente,
porque os alunos além deles terem o conhecimento teórico eles podem
visualizar o que eles estão fazendo. Então o aprendizado dele fica muito
bom em relação a esse material.[Grifo nosso]. (Fonte: Professor de
Matemática do 2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).
Figura 3 - Reflexão dos PFI com os momentos de intervenção com a PEM III.
Fonte:M_PFI I e M_PFI II de PEM III – 30/10/2013.
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O estudante cego Ezequiel destacou que:
Achei muito mais facilitador. Comparado a explicação que o professor
passa, mas não pelo fato dele ser ruim ou não. O professor explica bem. A
diferença é que comigo tocando no material fica melhor para eu
trabalhar em vez de apenas ouvir [Grifo nosso]. (Fonte: Estudante cego do
2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).
A estudante Fátima apontou que “foi uma forma bem fácil que ajudou muito
nosso aprendizado”. Já o aluno Lucas:
Eu achei excelente porque além de visualizar, interagir, é bom que todos
participam das aulas e tem com você, é tipo assim, com uma pessoa
explicando no quadro não tem como a gente ir lá e ver é apenas teórico. Na
prática não, já vai lá pega o material, tem contato com aquilo e facilitou
bastante. A fixação foi ótima e gostaria que voltassem com certeza.
(Fonte: Estudante Lucas do 2º ano do Ensino Médio, 02/10/2013).
Na Figura 4 alguns depoimentos por escrito dos estudantes do 2º ano F da
Escola EJORB dos momentos de intervenção com os PFI do 3º período com a PEM III:
Em nossa reflexão consideramos importante a avaliação positiva dos PFI por
O fato de ainda estarem no 3º período e serem avaliados positivamente lhes deu
segurança para atuar na profissão docente. A intervenção com o conteúdo de matrizes e
determinantes com o material didático tátil adaptado intitulado de Kit de Matrizes e
Figura 4 - Avaliação escrita dos estudantes do EJORB sobre os momentos de intervenção com os PFI
de PEM III da UFAC.
Fonte: Avaliação escrita dos Estudantes do 2º ano F do EJORB - PEM III.
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Determinantes (Kit MD)revelou-se facilitador, inovador e inclusivo no processo de
ensino e aprendizagem da matemática, aliando a teoria com a prática.
Na Figura 5 trazemos outras avaliações dos estudantes do 2º ano F:
Estas foram algumas das vozes mais proeminentes de nossa pesquisa-ação
colaborativa, destacadas como importantes desde o ano de 2012. Professores de
matemática, especialistas da SRM e alunos da escola, PFI do 3º, 4º e 5º períodos do
Curso de Licenciatura em Matemática, gestores das escolas e da SEEESP e do CAP-AC
e NAI/UFAC, todos apontaram caminhos inovadores que possibilitaram a inclusão de
estudantes cegos nas aulas de matemática em turmas do 1º, 2º e 3º ano do Ensino
Médio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa apontou o potencial dos recursos táteis e a habilidade do professor
em formação inicial em matemática mediar a aprendizagem do conteúdo de matrizes e
determinantes com o kit de matrizes e determinantes, a cartela de remédios e os próprios
alunos da turma construindo matrizes humanas facilitou a aprendizagem do conteúdo de
matemática de todos os estudantes. Diante das vozes, a ida dos professores em formação
inicial apresentar suas intervenções com sequências didáticas inovadoras com o
acompanhamento da docente/pesquisadora da UFAC em todos os momentos de
intervenção facilitou a integração entre a Universidade e a Escola, possibilitando
resolver uma situação de um estudante cego sem nota na disciplina de matemática e aos
professores em formação inicial de fato sentirem-se professores e conhecer a realidade e
os desafios da profissão docente.
Fechamos a trilha percorrida sugerindo a necessidade do diálogo e reflexão com
uma equipe de aprendizagem que atue na e para a diversidade com novas possibilidades
Figura 5 - Avaliação escrita dos estudantes do EJORB dos momentos de intervenção com os PFI de
PEM III da UFAC.
Fonte: Estudantes do 2º ano F do EJORB – PEM III.
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de aprimorar as vivências na Formação Inicial de Professores e integrar a Universidade
e a Escola. Nesse contexto, os PFI precisam atuar no seu futuro ambiente de trabalho,
desde o início do curso já com as Práticas de Ensino de Matemática. Sugerimos que o
Estágio Supervisionado seja ofertado por Educadores Matemáticos do Curso de
Licenciatura em Matemática da UFAC com vivências no Ensino Fundamental e Médio.
Também lançamos com a pesquisa que se ampliem as discussões sobre o ato de ensinar
para pessoas com deficiências, ao apontar o diálogo entre a Neurociência e a Educação
Matemática.
REFERÊNCIAS
BANDEIRA, S. M. C. Olhar sem os olhos: cognição e aprendizagem em contextos de
inclusão - estratégias e percalços na formação inicial de docentes de matemática. 2015.
489 p.Tese (Doutorado em Educação em Ciências e Matemática). Universidade Federal
de Mato Grosso - UFMT, Mato Grosso - Cuiabá, 2015.
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para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de
licenciatura, de graduação plena. Brasília/DF, 2002.
COSENZA, R. M.; GUERRA, L. B. Neurociência e Educação: como o cérebro
aprende. Porto Alegre: Artmed, 2011.
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matemática. 2002. 124f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) –
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10962ISSN 2177-336X
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PARTICIPAÇÃO DE SURDOS EM ATIVIDADES DE EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA: QUEM SÃO OS INCLUIDOS?
Tânia Maria de Lima – Docente PPGE/UFMT
Amanda Yasmim Cezarino – Discente PPGE/UFMT
Ana Paula Medeiros Destro – Discente PPGE/UFMT
Resumo
A palavra extensão está relacionada à expansão de algo em direção ao espaço
circunvizinho, pressupondo movimento unidirecional de dentro para fora. A palavra
inclusão, por sua vez, expressa incorporação de algo/alguém de fora para dentro. Essas
concepções de caráter centralizador são questionadas no presente trabalho face o
entendimento de que elas expressam relações de poder. Busca-se refletir sobre
potencialidades de práticas educativas que se configuram como redes de conversação
tendo como base experiências vivenciadas em um projeto de extensão universitária
pautado na relação entre ciência, cultura e educação. Trata-se de uma rede constituída
por estudantes e docentes vinculados a diversos cursos de graduação e de pós-graduação
da UFMT, bem como por estudantes e professores da educação básica de Mato Grosso.
O referencial teórico foi ancorado em autores que tratam do lugar da ciência na
contemporaneidade mantendo interfaces com a cultura e as práticas pedagógicas. Os
dados sobre desafios e potencialidades da rede de conversação foram extraídos de
relatórios de duas atividades desenvolvidas em 2015, no contexto do projeto estudado,
uma delas realizada na UFMT e outra na escola de educação especial, uma das
instituições parceiras. Os dados foram extraídos também de narrativas elaboradas por
três professores surdos que participam do projeto. As análises impelem ao
reconhecimento de que a extensão configurada como redes de conversação produz
entrelaçamentos de conhecimentos, experiências e culturas que resultam em
aprendizados coletivos. Nessa configuração extensão-inclusão compõem uma via de
mão dupla, na qual todos podem se reconhecer como aprendizes que ensinam e como
incluídos.
Palavras-chave: Extensão universitária, Redes de conversação, Inclusão.
Situando o estudo
Neste trabalho colocamos em pauta o papel pedagógico da extensão universitária
a partir de análises de alguns sentidos que são atribuídos a essa dimensão da vida
acadêmica. O propósito é refletir sobre as possibilidades educativas de projetos de
extensão que se configuram como redes de conversação sobre relações entre ciência,
cultura e prática pedagógica. Nesse sentido, buscamos amparo teórico em autores que
chamam atenção para a crise instaurada na ciência moderna (SANTOS, 2004, SANTOS
et al 2006, LOPES & MACEDO, 2012) e, por conseguinte, no interior das
universidades e de suas ações, incluindo a extensão Recorremos também a autores que
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buscam caracterizar o currículo como uma rede de conversação na qual não há um
centro para situar o conhecimento, a aprendizagem e a inclusão (FERRAÇO, 2012a,
2012b).
Para alcançar o objetivo proposto organizamos este trabalho em três partes.
Inicialmente apresentamos algumas considerações sobre o princípio da
indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão no modelo de universidade
referenciada nos postulados da ciência moderna. Na segunda parte argumentamos que a
crise que se processa dentro do próprio campo científico precisa ser vista, pela
universidade, como uma possibilidade para aprofundar o debate sobre a ciência
enquanto forma de conhecimento e prática social. Isso implica em análises sobre os
princípios que fundamentam as atividades acadêmicas, incluindo a extensão. Com base
neste entendimento discutimos, no tópico terceiro, desafios e possibilidades de
configuração de projetos de extensão universitária como redes de conversação sobre
ciência, cultura, educação e inclusão. Nessa perspectiva, apresentamos uma breve
caracterização do projeto adotado como objeto deste estudo, dando destaque aos
desafios e possibilidades de configurá-lo como entrelugar, como um espaço de fronteira
que não pressupõem um centro para a palavra, para a cultura e exercício do poder.
O lugar da extensão universitária na modernidade
No ocidente, as universidades surgiram durante a Idade Média sob forte controle
da Igreja. Tais instituições configuravam-se como espaços de estudos de base filosófica
desenvolvidos em sintonia com os preceitos bíblicos. Dessa forma, as explicações para
os acontecimentos do mundo eram desestimuladas, pois se supunha que tudo acontecia
por determinação divina. Não havia, portanto, disposição para produção de
conhecimentos voltados à aplicação na vida humana.
Fatos marcantes que caracterizaram a modernidade (grandes navegações,
surgimento das cidades, criação dos estados nacionais, revolução científica, reforma
protestante) promoveram rupturas com o paradigma da sociedade medieval para
desencadear diversas mudanças de ordem religiosa, econômica, política, social e
cultural. Os ideais do iluminismo exigiram que as universidades assumissem a tarefa de
promover o culto à ciência enquanto uma forma de conhecimento fundamentado na
razão para compreensão e explicação dos fenômenos do mundo. Desde então, tudo
passou a ser explicável com base no novo paradigma pautado na lógica mecanicista.
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Acreditava-se que a ciência iria ensinar as pessoas a pensar racionalmente rompendo
com dogmas e mitos que restringiam a liberdade humana. Supunha-se que a liberdade
de pensamento resultaria na paz e na felicidade da humanidade, uma vez que o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia resultaria em benesses que poderiam acabar
com a miséria, com as doenças e com o trabalho pesado que, a partir de então, passaria a
ser realizado por máquinas. Ao servir de modelo para outros campos da atuação humana
– incluindo a política – a racionalidade técnico-científica apresentou-se também como
um modelo de produção de conhecimento que poderia contribuir para por fim aos
conflitos sociais potencializando o exercício da democracia.
Os postulados da ciência moderna buscaram afastar o sujeito iluminista não
apenas das formas de conhecimentos consideradas irracionais e obsoletas (religião,
senso comum, saberes tradicionais, etc.), mas também da própria natureza, ou seja, dos
seres e fenômenos adotados como objeto de estudo. Paradoxalmente, as ciências
naturais foram produzidas pela negação das intrincadas relações ser humano-natureza.
Essa cisão artificial foi justificada pela necessidade de emergir o conhecimento
supostamente objetivo, imparcial (politicamente neutro) e de valor universal. Acreditou-
se que assim se chegaria ao conhecimento verdadeiro e inquestionável por ser científico.
A universidade moderna foi incitada a se configurar como uma instituição
devotada ao desenvolvimento da ciência e à formação de novas gerações de
pesquisadores e de profissionais qualificados em diferentes campos da atuação humana,
mantendo distância das demais formas de conhecimento. Esse propósito implicaria na
articulação ensino-pesquisa e na tradução dessas atividades em produtos que poderiam
ser apresentados à sociedade por meio da extensão universitária.
Nessa conceituação a extensão universitária é associada à expansão das ações da
universidade para seu entorno (espaço circunvizinho). Pressupõe, portanto, um
movimento unidirecional de conhecimentos, tecnologias e serviços que jorram da fonte
da sabedoria para a sociedade, da mesma forma que a água verte de uma nascente em
direção às áreas mais baixas. Nessa mesma conceituação a inclusão está relacionada
com a ideia de incorporação, pela universidade, de algo ou alguém que está fora,
excluído, distante da ambiência universitária.
Schwartzman (2008), em suas análises sobre a política do conhecimento a partir
da relação entre ciência, universidade e ideologia, amealha argumentos para mostrar que
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os postulados da universidade moderna estão em crise. Na perspectiva do autor os
problemas não ficaram restritos apenas às questões de ordem sociológica. A
universidade enfrentou problema também na proclamada articulação entre ensino e
pesquisa. Uma das explicações para este fato está nas diferenças entre atividades de
pesquisa e atividades de ensino e, sobretudo, no valor a elas estabelecido.
[...] existe uma incompatibilidade quase natural entre as atividades científicas
e as atividades docentes de formação profissional. O estudante que está
adquirindo conhecimentos para o trabalho profissional interessa-se por
informações já digeridas, consolidadas e utilizáveis; o cientista interessa-se
por áreas de conhecimento novas, de fronteira, e por isso mesmo ainda pouco
consolidadas. Além disso, a carreira do cientista é essencialmente orientada
para a obtenção do reconhecimento de sua comunidade pelos trabalhos que
realiza, suas pesquisas e publicações; o ensino, e mais particularmente o
ensino ao nível de graduação, é visto como um estorvo e um desperdício de
tempo em relação a suas atividades mais importantes (p. 76).
No Brasil a articulação entre ensino e pesquisa mostra-se frágil porque nosso
modelo de universidade foi inspirado nas escolas profissionais francesas que difundiram
o "modelo napoleônico". Tais instituições foram voltadas especialmente para o
propósito de outorgar títulos e de qualificar profissionais para alavancar o
desenvolvimento em diversas áreas. A fragilidade está relacionada também com a
tradição religiosa que desvalorizou a atividade científica para não promover abalos na
fé. Ademais, o modo de desenvolvimento econômico adotado pelo nosso país impeliu à
dependência científica e tecnológica arrefecendo o interesse pela pesquisa científica.
[...] a atividade de pesquisa científica pode eventualmente se implantar e
desenvolver em instituições excepcionais relativamente marginais ao sistema
de ensino superior do país; mas nunca coube, e talvez nem deva caber, no
centro do sistema de ensino superior, cujas funções efetivas são, e quase
certamente continuarão sendo, profundamente distintas dos objetivos e
necessidades do trabalho científico. (SCHWARTZMAN, 2008, p. 76)
Consideramos, portanto, que no âmbito das universidades brasileiras, a
indissociabildade ensino-pesquisa-extensão ainda está longe de ser efetivada. Essa
questão precisa ser analisada de forma mais efetiva considerando que, os debates sobre
a crise na ciência potencializam reflexões sobre os processos de produção dessa forma
de conhecimento e suas relações com a prática social (SANTOS et al, 2006).
Crise na ciência, crise na universidade: reflexões sobre possibilidades da extensão
Do nosso ponto de vista, a frágil relação entre pesquisa-ensino-extensão
observada no interior das universidades está relacionada a diversos fatores,
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notadamente, a ideia de que a ciência se constitui numa forma de conhecimento
universal que goza de maior status em relação às outras formas de conhecimento. Com
base nesta conceituação a ciência pode promover o apagamento do termo cultura para
dar destaque ao conhecimento. A cultura tornou-se apenas o exterior constitutivo da
ciência (LOPES & MACEDO, 2012, p. 161). Embora a ciência tenha incluído em seu
projeto epistemológico conhecimentos de outras culturas, a exemplo da cultura do
Oriente, ela criou condições técnicas e ideológicas para negar saberes e práticas
consideradas diferentes contribuindo assim, para a expansão colonial que a alimentava.
Ao tentar aproximar o Oriente daquilo que podia compreender, a cultura
científica criou-o como o passado das nações ocidentais, justificando, com
isso, a importância da dominação. Apesar de simétrico inferior do Ocidente o
Oriente seria o berço da civilização mundial, tendo dela se destacado por não
participar da cultura científica moderna (LOPES & MACEDO, 2012, p. 161)
Os vínculos entre ciência e colonialismo permitem compreender as relações de
desigualdades não apenas entre ocidente/oriente, mas também entre ciência/senso
comum, hemisfério norte/hemisfério sul, brancos/negros, ricos/pobres, homem/mulher,
escolarizado/analfabeto, etc. Tais desigualdades não estão restritas às questões sociais
mais amplas. Elas estão presentes no interior das instituições educativas e têm
implicações no currículo e nas práticas pedagógicas extracurriculares, incluindo a
extensão universitária. Nesse caso, elas podem ser observadas na valorização da cultura
acadêmica (científica) em detrimento de outras manifestações culturais. Por
conseguinte, as culturas nativistas, as artes, o senso comum, os saberes populares são
tratados como os “outros” que se opõem à ciência e por isso devem ser subjugados,
ignorados ou excluídos dos espaços educativos.
Ao trazer para o debate a inclusão de surdos em projetos de extensão
universitária julgamos ser necessário abordar a crise na ciência moderna estudada por
Boaventura Sousa Santos. Conforme observou esse autor, tal crise foi forjada dentro da
própria ciência.
A primeira observação, que não é trivial quanto parece, é que a identificação
dos limites, das insuficiências estruturais do paradigma científico moderno é
o resultado do grande avanço no conhecimento que ele propiciou. O
aprofundamento do conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares em
que se funda. (SANTOS, 2004, p. 54)
Os abalos nos pilares da ciência moderna foram intensificados com novas
formulações teóricas da Física e da Biologia que evidenciam inadequação de conceitos
racionalistas tais como: ser vivo/matéria inerte, orgânico/inorgânico, natural/artificial,
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10967ISSN 2177-336X
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todo/partes. Tais conceitos foram assentados numa concepção mecanicista que não
permite compreender a complexidade dos fatos. Com base nos conflitos enfrentados
pela ciência, o autor faz um delineamento do paradigma que tende a emergir
apresentando quatro teses.
Todo o conhecimento científico-natural é científico-social – A ciência é uma
produção humana e, portanto, uma prática social que não admite distinção rígida entre
as ciências naturais e as ciências sociais. A distinção hierárquica entre conhecimento
científico e conhecimento vulgar tenderá a desaparecer.
Em resumo, à medida que as ciência naturais se aproximam das ciências
sociais estas aproximam-se das humanidades [...] A superação da dicotomia
ciências naturais/ciências sociais tende assim a revalorizar os estudos
humanísticos. Mas esta revalorização não ocorrerá sem que as humanidades
sejam, elas também profundamente transformadas (SANTOS, 2004, p. 69-
70).
Todo o conhecimento é local e total, por isso, a princípio deve-se pensar
globalmente para agir localmente – No paradigma dominante a ciência avança pela
especialização, ou seja, o rigor aumenta na proporção que a análise da parte se dá pela
criação de fronteiras arbitrárias entre os conhecimentos. Faz-se necessário reconhecer
que o conhecimento tem como horizonte a totalidade universal/indivisa. Sendo total é
também local. A produção de conhecimentos tende a se processar em redor de temas
que se convergem.
Todo conhecimento é autoconhecimento – Há um movimento no sentido da
maior personalização do trabalho científico que é a dimensão subjetiva, que sempre foi
combatida pelo paradigma dominante e ganha agora uma importância fundamental. A
ciência moderna consagrou o homem como sujeito epistêmico, mas expulsou-o
enquanto sujeito empírico, pois sendo o conhecimento objeto, factual e rigoroso, as
influências da subjetividade humana na pesquisa deveria ser evitada. Assim, “a
distinção epistemológica entre sujeito e objeto teve de se articular metodologicamente
com a distância empírica entre sujeito e objeto” (SANTOS, 2004, p. 67). Na atualidade
questiona-se essa possibilidade de separar o sujeito epistêmico do sujeito subjetivo.
Todo o conhecimento científico visa constituir-se em senso comum – Atualmente
a ciência procura reabilitar o senso comum por reconhecer nesta forma de conhecimento
algumas virtualidades para pensar o ser humano no mundo. Sabe-se que nenhuma forma
de conhecimento é essencialmente racional e descolada de outras formas de
conhecimento.
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Reiteramos os posicionamentos desse autor no que se refere a defesa de
proposições como: configurações mais adequadas da ciência visando sua apropriação
pelos cidadãos; reconhecimento das relações da ciência com o contexto social, análises
das transformações promovidas pela ciência no mundo e inter-relações entre ciência e
outras formas de conhecimento que compõem a cultura.
Por uma extensão universitária configurada como rede de conversação
O Plano Nacional de Extensão Universitária apresentado em 1999, expressa
proposições do Fórum de Pro-Reitores de Extensão das Universidades Públicas
Brasileiras (FORPROEX) como um marco conceitual para a definição de políticas no
âmbito da Universidade. No documento a extensão é concebida como “o processo
educativo, cultural, científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e
viabiliza a relação transformadora entre Universidade e Sociedade” (CORREA, 2003, p.
13). Com base nesta concepção foram definidas as seguintes diretrizes para extensão:
Relação social de impacto, Bilateralidade, Interdisciplinaridade, Indissociabilidade
ensino, pesquisa e extensão (CORREA, 2013, p. 13).
Destacamos aqui a defesa de que a política de extensão universitária seja
configurada numa relação de bilateralidade e, portanto, de quem se põe ao lado de
outros setores da sociedade. Busca-se assim, superar a relação hegemônica que se
estabeleceu entre a universidade e a sociedade sob influências da racionalidade técnico-
científica. Nessa perspectiva a extensão tende a ser assumida como via de mão-dupla,
como troca de saberes, de participação, de interdisciplinaridade, de democratização do
conhecimento e de confronto com a realidade. Enquanto prática social ela pode
favorecer a aproximação entre ensino e pesquisa.
No intento de contribuir com o debate sobre o papel da extensão universitária no
contexto da crise da ciência que hora atravessamos apresentamos a seguir algumas
reflexões resultantes deste estudo. Elas foram ancoradas em experiências vivenciadas no
projeto de extensão “Rede de estudos e colaboração para inclusão social e
desenvolvimento da cultura científica”, financiado pela Capes, no contexto do Programa
Novos Talentos. O prazo de vigência do projeto é de 2013 a 2016.
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10969ISSN 2177-336X
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As análises apresentadas a seguir indicam que, em muitos aspectos, o projeto
coaduna com os postulados do referido Plano Nacional de Extensão Universitária.
Como a própria denominação indica o projeto busca se caracterizar como rede
colaborativa interessada tanto nas relações entre educação e cultura científica como na
inclusão. A configuração como rede expressa a ideia de bilateralidade, de disposição
para se por ao lado do outro. Esse princípio é observado tanto no âmbito da própria
universidade – o projeto envolvimento cerca de 08 docentes e 23 estudantes vinculados
a diversos cursos de graduação e de programas de pós-graduação do campus central da
UFMT. Dessa forma é possível estabelecer conversações entre vários campos do
conhecimento (História, Geografia, Comunicação Social, Química, Física, Biologia,
Geologia, Pedagogia). O movimento no sentido de “estar ao lado” se expressa também
na participação de 125 estudantes e 25 professores de 05 escolas parceiras do projeto,
sendo uma delas de educação especial. Cada escola é representada por 25 estudantes e
05 professores.
As atividades do projeto em tela foram organizadas em três Subprojetos assim
denominados: 1. Cibercultura: a produção e circulação da cultura científica; 2.
Tecnologias da informação e da comunicação: potenciando novos talentos para uma
nova cultura científica; 3. Diálogos entre pesquisa e ensino: em pauta as águas em
Mato Grosso. Cada um desses subprojetos é coordenado por um docente vinculado a
um programa de pós-graduação. O coordenador tem a tarefa de articular o trabalho dos
docentes e dos estudantes (monitores) para o desenvolvimento das atividades.
(seminários, oficinas, minicursos que tratam da ciência e da educação em ciências (no
plural) em interfaces com a cultura. Incluem também atividades nas cinco escolas. Cada
uma delas elaborou e está desenvolvendo um projeto de pesquisa sobre o tema “Águas
em Mato Grosso”, contando com apoio de docentes e estudantes (monitores) vinculados
à UFMT. No desenvolvimento da pesquisa os estudantes são motivados a fazer uso de
tecnologias e dos conhecimentos postos em circulação nas atividades dos subprojetos.
Os resultados dos estudos e atividades realizados no âmbito da escola são apresentados
a cada ano no Seminário final. Em tais seminários a palavra é “pronunciada”
especialmente pelos estudantes da educação básica tendo como público os demais
participantes do projeto. Em todos os eventos as atividades são acompanhadas por
interpretes de Libras. Reconhecemos que as experiências relatadas a seguir não
expressam a dinâmica do projeto em toda a sua complexidade. No entanto, acreditamos
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que elas oferecem matéria suficiente para fomentar o debate em torno do tema em
pauta.
A experiência é concebida aqui como “o que nos passa, ou nos acontece, ou nos
toca” (LARROSA, 2004, p, 154 apud FERRAÇO, 2012 p. 100). Trata-se, portanto, de
situações vividas que nos afetam e dão sentido ao que fazemos e somos enquanto parte
de um coletivo.
Do ponto de vista da experiência, o importante não é nem a posição (nossa
maneira de pôr-nos), nem nossa o-posição (nossa maneira de opor-nos), nem
a im-posição (nossa maneira de impo-nos), nem a pro-posição (nossa maneira
de propor-nos), mas a explicação, nossa maneira de ex-por-nos, com tudo o
que isso tem de vulnerabilidade e de risco. [...] é incapaz de experiência
aquele a quem nada lhe passa, a quem nada lhe acontece, a quem nada lhe
sucede, a quem nada lhe toca, nada lhe chega, nada lhe afeta, a quem nada lhe
ameaça, a quem nada lhe fere (LARROSA, 2004, p, 154 apud FERRAÇO,
2012 p. 100)
Nas análises apresentadas a seguir buscamos identificar desafios e possibilidades
da rede de conversação entre surdos e ouvintes. Os dados foram extraídos de relatórios
de duas atividades desenvolvidas em 2015, sendo uma delas realizada na UFMT e a
outra na escola de educação especial que é uma das instituições parceiras. Os dados
foram extraídos também de narrativas elaboradas por três professores (surdos) que
participam do projeto.
Uma das experiências refere-se ao Seminário Raça e ciência nas mídias que foi
realizado, em 2015, em três tardes (12 horas), num auditório da UFMT, sob a
coordenação de três professores e três monitores do curso de História. A programação
desse seminário incluiu apresentação de filmes, documentários, cenas de novela,
imagens de super-heróis. Esses recursos potencializaram as conversas sobre
preconceitos que, em alguns casos, são justificados em bases científicas. Foi
evidenciado então, que embora a ciência traga benefícios para a vida humana ela pode
ser utilizada também para subjugar pessoas e/ou grupos raciais, notadamente negros. A
dinâmica dos trabalhos permitiu a exposição de concepções, de posicionamentos e de
experiências dos participantes em relação ao assunto. Um dos problemas identificados
foi a compreensão dos filmes e documentários por estudantes e professores surdos uma
vez que alguns recursos audiovisuais não tinham legenda e, quando tinham, era
apresentada em Português, no ritmo adequado apenas para um leitor fluente. Esse fato
deu azo para discussão das práticas de inclusão na cultura acadêmica, pois, ela ainda é
pensada para estudantes que não têm deficiência.
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Apesar dos limites da participação mais efetiva dos surdos nas atividades
entendemos que elas permitiram praticar alguns dos princípios do projeto: inserção de
estudantes e professores da educação básica no ambiente universitário, socialização de
resultados de estudos e pesquisas por docentes e discentes da educação superior,
promoção de debates/conversações sobre a cultura científica como produção humana.
A presença de surdos na rede de conversação criada pelo do projeto tem exigido
dos sujeitos participantes o reconhecimento de que esse grupo social tem uma cultura
própria. Vale ressaltar que em 2011 foi criado o Movimento surdo que milita em favor
da educação e da cultura surda, bem como das escolas bilíngues para surdos (EDENIA,
2015). A defesa das escolas bilíngues como espaços de fortalecimento da cultura surda e
de construção da identidade surda é apresentada também por Perlin e Quadros (1997).
No projeto que foi objeto deste estudo os participantes ouvintes são motivados a
aprender Libras é a conhecer a cultura surda. Nesse sentido foram realizadas duas
oficinas de Libras na escola de educação especial para todos os sujeitos participantes.
As duas oficinas foram ministradas por professores e estudantes surdos apoiados por
interpretes de Libras. Dados do relatório da experiência analisada (oficina de Libras
realizada em 2015), mostram que além do ensino de alguns sinais considerados básicos,
foi apresentada uma breve encenação em libras por professores surdos. Foram
realizadas também atividades lúdicas que possibilitaram interações entre surdo e
ouvinte. Assim, os sujeitos participantes vivenciaram situações de aprendizagem da
língua/cultura do Outro.
Por entender que neste estudo os dados não poderiam emergir apenas dos
relatórios solicitamos que professores surdos que participam do projeto apresentassem
suas opiniões sobre a experiência por eles vivenciadas. Apresentamos a seguir trechos
de tais narrativas.
O mais importante em participar do Projeto Novos Talentos é a aquisição de
conhecimento, tanto para o professor surdo como para o aluno. Além disso, o
projeto desenvolve o crescimento humano das pessoas envolvidas, pois,
participam de atividades em diferentes espaços como na UFMT e na escola
de educação especial de surdos. (Prof 1)
O Projeto Novos Talentos nos proporciona conhecer diversos espaços como a
UFMT, o Museu Histórico, o Instituto Nacional de Educação de Surdos que
contribuem imensamente para o nosso conhecimento. (Prof. 2)
A troca de experiências entre pessoas surdas e ouvintes é o que eu acho mais
importante nas experiências da escola e do Projeto Novos Talentos. Podemos
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ensinar os sinais da Libras para ouvintes e aprender palavras da língua
portuguesa com os ouvintes. Eu me sinto feliz e orgulhoso, pois, esse Projeto
é um meio de mostrar para todo mundo que a inclusão existe nesse espaço.
Após as atividades do projeto, como oficinas, palestras e aulas de campo, os
professores de cada disciplina davam aulas para responder algumas duvidas
que surgiam sobre a água, solo e etc. O professor de educação física explicou
para eles o que era capoeira, pois, tinham visto em uma escola em que
visitaram. (Prof. 3)
Os relatos desses professores surdos reiteram a relevância das atividades
expressas nos relatórios analisados. Fica evidente que o projeto é uma via de mão-dupla
que possibilita não apenas a inclusão de surdos na cultura ouvinte, mas também a
inclusão de ouvintes na cultura surda.
Considerações Finais
As análises apresentadas neste trabalho permitem reafirmar a importância da
extensão universitária na promoção de ações que possibilitam aproximações entre
diferentes campos do conhecimento e entre a universidade e outros setores sociais. No
caso, a extensão pode contribuir na formação de todos os sujeitos participantes,
especialmente no que se refere a inter-relações ciência-educação-inclusão.
Consideramos que o formato da extensão como rede de conversação
experimentada no projeto analisado potencializa aprendizagens a todos os sujeitos
participantes. Nessa configuração a “palavra” não tem um centro e nem um formato
único. Ela não é imposta por alguém em especial, mas proposta por todos os que
manifestam interesse na conversação inclusive em situação de oposição. A “palavra”
não foi apresentada apenas na língua portuguesa. Os surdos fazem uso da Libras (com o
apoio de interpretes) difundindo a sua cultura. Ademais, a palavra não é exposta apenas
na forma de texto oral ou escrito, mas também por meio de imagens potencializadoras
de debates. Em síntese, dando resposta a indagação apresentada no título podemos dizer
que numa rede de conversação todos podem se reconhecer como aprendizes que
ensinam e, portanto, como incluídos
Referências
CORREA, Edson José. Extensão Universitária, política institucional e inclusão social.
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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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