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1 Edifícios sustentáveis: estratégia bioclimática de ventilação natural e movimento de evacuação em situação de incêndio ALVES, Alessandra Beatriz Carneiro Gonçalves Alves Arquiteta e Urbanista, especialista em engenharia de segurança do trabalho, doutora em Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo pela UnB, professora efetiva do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). [email protected] RESUMO Edifícios sustentáveis ou verdes estão cada vez mais presentes nas cidades e os arquitetos e urbanistas projetam utilizando estratégias bioclimáticas que visam ao conforto ambiental. Uma dessas estratégias é a ventilação natural. Este artigo apresenta uma análise comparativa entre dois edifícios altos de escritórios: um com características verdes e outro tradicional, através de simulações computacionais de incêndio e evacuação, aplicando-se ou não a ventilação natural integrada à fumaça produzida por incêndio, influenciando no movimento de saída dos ocupantes até um local seguro. ABSTRACT Green and sustainable buildings are becoming more and more common in cities and architects and urbanists are designing these using bioclimatic strategies that aim at environmental comfort. One of such strategies is natural ventilation. This article presents a comparative analysis between two tall office towers: a typical building and a green one. They are compared through computational simulations in fire and evacuation situations, when natural ventilation is (or not) mixed with the smoke from the fire, affecting how their occupants would move while hurrying to a safer place. Keywords: Sustainable Buildings; Bioclimatic Strategies; Environmental Comfort.

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Edifícios sustentáveis: estratégia bioclimática de ventilação natural e movimento de evacuação em

situação de incêndio

ALVES, Alessandra Beatriz Carneiro Gonçalves Alves Arquiteta e Urbanista, especialista em engenharia de segurança do trabalho, doutora em Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo pela UnB, professora efetiva do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). [email protected]

RESUMO

Edifícios sustentáveis ou verdes estão cada vez mais presentes nas cidades e

os arquitetos e urbanistas projetam utilizando estratégias bioclimáticas que

visam ao conforto ambiental. Uma dessas estratégias é a ventilação natural.

Este artigo apresenta uma análise comparativa entre dois edifícios altos de

escritórios: um com características verdes e outro tradicional, através de

simulações computacionais de incêndio e evacuação, aplicando-se ou não a

ventilação natural integrada à fumaça produzida por incêndio, influenciando no

movimento de saída dos ocupantes até um local seguro.

ABSTRACT

Green and sustainable buildings are becoming more and more common in cities

and architects and urbanists are designing these using bioclimatic strategies

that aim at environmental comfort. One of such strategies is natural ventilation.

This article presents a comparative analysis between two tall office towers: a

typical building and a green one. They are compared through computational

simulations in fire and evacuation situations, when natural ventilation is (or not)

mixed with the smoke from the fire, affecting how their occupants would move

while hurrying to a safer place.

Keywords: Sustainable Buildings; Bioclimatic Strategies; Environmental

Comfort.

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INTRODUÇÃO

O projeto de arquitetura exerce papel fundamental na definição dos meios de

escape ou saídas de emergência de uma edificação. É a provisão de medidas

passivas na segurança contra incêndio inseridas no edifício. Mesmo assim,

sabe-se que para constituir um sistema eficiente e adequado, a segurança dos

ocupantes não depende somente das medidas de ordem física e construtiva,

mas também de um bom gerenciamento predial e estratégias e simulações de

abandono pré-estabelecidas. (VALENTIN, 2008)

As circulações devem ser acessíveis a todas as pessoas. Acessível é o

espaço, edificação, mobiliário, equipamento urbano ou elemento que possa ser

alcançado, acionado, utilizado e vivenciado por qualquer pessoa, inclusive

aquelas com mobilidade reduzida (Norma Brasileira 9050/2004). Em alguns

casos, é necessária a ajuda de outras pessoas para que as dificuldades de

movimentação sejam vencidas dentro da edificação, principalmente em

situações de incêndio e pânico.

Os edifícios altos possuem algumas especificidades por possuírem maior

população e maior espaço a ser percorrido até um local seguro. E atualmente,

a inserção de edifícios verdes e sustentáveis nas cidades são os maiores

desafios dos arquitetos, engenheiros, técnicos e empresários. E integrar as

estratégias de segurança contra incêndio e as estratégias bioclimáticas ou

sustentáveis torna esse desafio ainda maior. Uma das estratégias bioclimáticas

aplicadas ao edifício é a ventilação natural que pode direcionar a fumaça

produzida pelo incêndio e ainda influenciar no movimento de evacuação segura

dos ocupantes da edificação. E para esse estudo foram feitas simulações

computacionais de incêndio e evacuação em dois edifícios, um verde e outro

típico, simulações em ambientes ventilados e ambientes não ventilados em

situação de incêndio.

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2. EDIFÍCIOS VERDES: ARQUITETURA SUSTENTÁVEL

Termos como “sustentável”, “verde” ou “ecológico” remetem a uma mesma

questão: responsabilidade ambiental. No cenário de política ambiental, o termo

“ecológico” aparece inicialmente em 1960, com ênfase no desenvolvimento,

nas preocupações relacionadas ao crescimento populacional, à poluição e aos

resíduos. Em 1970, começa a ganhar força o termo “verde”, principalmente

após a crise do petróleo, com enfoque nos recursos naturais e fontes

energéticas. Mas foi em 1980 que o termo “sustentabilidade” aparece com toda

sua força temática. (SOBREIRA, 2009) A Organização das Nações Unidas

(ONU), em 1987, definiu o desenvolvimento sustentável como aquele “[...] que

satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das

gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”.

Em relação às construções sustentáveis, o professor de Ciência da Arquitetura

e Engenharia contra Incêndio, Chow Wan-Ki, da Universidade Politécnica de

Hong Kong, na China, em resposta a um e-mail enviado pela autora deste

artigo em 2010, define: “construção verde é mais técnica, relacionada ao

próprio conhecimento e técnica construtiva arquitetônica e de engenharia (em

uma escala relativa); construção sustentável, além de conhecimento e técnica,

inclui outros fatores como os sociais, econômicos e políticos, se a construção

seria viável, inclusive para 3eixa-la às gerações futuras (como se os fatores

forem medidos por escalas absolutas).

E em se tratando de projetos de arquitetura e engenharia, sabe-se que após a

II Guerra Mundial (1939-1945) e com a abundância de combustível barato, a

tecnologia dos engenheiros – como, por exemplo, o uso de iluminação artificial

(engenheiros eletricistas), o uso de equipamentos de ar-condicionado e

aquecedores (especificados e dimensionados por engenheiros mecânicos), a

despreocupação com a interação dos edifícios e seu entorno – foi suplantando

uma série de atribuições dos arquitetos. (CORBELLA; YANNAS, 2003).

Quando houve uma primeira crise de energia, produzida pelo grande aumento

do preço do petróleo em 1973, o mundo industrializado tomou consciência de

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que os recursos naturais do planeta não eram inesgotáveis e que seu uso

precisava ser urgentemente racionalizado. A partir daí, novas alternativas

energéticas foram pesquisadas e desenvolvidas, enquanto os setores

industriais mais modernos e ágeis responderam com produtos que consomem

cada vez menos energia. A arquitetura também evoluiu e segundo Corbella e

Yannas (2003), passou por várias fases até a fase atual, a chamada

Arquitetura Sustentável. (Quadro 1)

Quadro 1 – Desenvolvimento da Arquitetura em relação às suas características para minimizar o consumo da energia e preservar os recursos naturais

Fases Conceitos e características

Arquitetura Solar Incorpora o estudo da Energia Solar ao edifício.

Arquitetura Bioclimática

Energia Solar + arquitetura integrada ao Clima Local Visando à habitação centrada sobre o CONFORTO AMBIENTAL do ser humano e sua repercussão no planeta.

Arquitetura Sustentável

Aumento da QUALIDADE DE VIDA no AMBIENTE CONSTRUÍDO e no seu ENTORNO – edifício e o contexto urbano; Integração com características da vida e do Clima Local; Menor consumo de energia; Preocupação com o projeto e o MEIO AMBIENTE; Mundo MENOS POLUÍDO para as futuras gerações; Aspectos sociais, econômicos e culturais.

Fonte: Corbella e Yannas (2003): quadro resumido pela autora.

O projeto de edifícios verdes (greenbuildings) ou sustentáveis segue algumas

estratégias e diretrizes, aliadas ao conhecimento e experiência do profissional

envolvido em sua elaboração. Segundo o Guia de Sustentabilidade da

Associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura (AsBEA, 2012), as diretrizes

projetuais são as informações a serem trabalhadas no desenvolvimento do

projeto. E as estratégias aplicadas aos edifícios sustentáveis são chamadas

estratégias bioclimáticas e que devem garantir o conforto no ambiente

construído, como por exemplo: controlar os ganhos de calor; dissipar a energia

térmica do interior dos edifícios; remover a umidade em excesso e promover o

movimento de ar; promover o uso da iluminação natural e controlar o ruído.

Sem esquecer que o edifício faz parte de um contexto urbano – e o desenho

urbano e a cidade de certa forma também influenciam na elaboração do projeto

do edifício – o que indica que o projeto arquitetônico do edifício deve ser

desenvolvido juntamente com as características urbanísticas e com os

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impactos que poderão ser provocados pela inserção do edifício (consequências

em relação ao conforto ambiental urbano), seus sistemas e materiais

construtivos. A implantação da edificação no terreno é uma das estratégias

bioclimáticas mais importantes do edifício sustentável, aliada à forma da

edificação e aberturas de ventilação. O melhor posicionamento do edifício com

relação aos ventos deve ser compatibilizado com a melhor localização

recomendada pelas trajetórias solares.

Deve-se buscar sempre a utilização da ventilação natural na edificação, visto

que em muitos edifícios já construídos considerados verdes, utiliza-se um

sistema híbrido (ventilação natural + ventilação mecânica) integrado conforme

as necessidades de conforto do edifício. Aliás, para o arquiteto Ken Yeang,

referência em projetos de edifícios altos sustentáveis, define o projeto

ecologicamente correto, ou simplesmente ecodesign, como sendo um desenho

da integração dos sistemas artificias com os naturais (integrando os impactos

do ambiente construído com o ambiente natural). Em outras palavras, Yeang

considera o termo INTEGRAR a palavra chave do ecodesign. Ele considera

ainda, que o edifício verde não é composto somente de elementos verdes

(vegetação), mas também de estratégias bioclimáticas/sustentáveis, tais como:

proteções solares, ventilação natural, sistemas de eficiência energética, entre

outros. (YEANG, 2008)

No projeto integrado, é necessário encarar as variáveis do projeto como um

único conjunto, utilizando-as como ferramentas para a solução de problemas.

Nas faculdades de arquitetura e engenharia, os futuros profissionais da área

aprendem a ser solucionadores de problemas, o que desde já, desenvolvem a

capacidade de prever possíveis implicações de todas as decisões de projeto, o

que com o estudo do projeto integrado, consolida essas habilidades e ainda a

capacidade de fazer parte de uma equipe de maneira produtiva e eficiente.

(KEELER, 2010)

O projeto sustentável (integração de estratégias) deve ser algo inerente ao

projeto arquitetônico, aparecendo de maneira natural como dever de todo

projetista. Para o arquiteto francês Jacques Ferrier: “[...] é preciso tornar o

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desenvolvimento sustentável algo desejável”. (Arquiteturas do Mundo, vol. 2,

2009 – DVD).

2. A ESTRATÉGIA DE VENTILAÇÃO NATURAL E O

MOVIMENTO DE EVACUAÇÃO NOS EDIFÍCIOS SUSTENTÁVEIS

A ventilação natural é uma das estratégias bioclimáticas aplicadas aos edifícios

sustentáveis.

Conforme Corbella e Yannas (2003), as estratégias para se construir um

edifício com boa ventilação natural e um controle eficiente são:

Implantação do edifício no lote para conseguir uma corrente de ar no

seu interior, quando desejado; se isso não pode ser realizado por razões

práticas, estudar a disposição de elementos do envelope

(envoltória/fachada), de maneira a desviar o vento, para que possa ser

produzida uma corrente cruzada no seu interior;

Boa qualidade aberturas, garantindo renovações de ar;

Estudar as divisões internas para apresentar o menor obstáculo possível

para o deslocamento do ar; e

Se necessário, aplicar ventilação mecânica em conjunto com a

ventilação natural.

Assim, relacionando a estratégia de ventilação natural com o movimento de

evacuação das pessoas de edifício em situação de emergência, como na

ocorrência de incêndios, pode-se observar que a fumaça produzida, que é um

fluido e se movimenta dentro da edificação – ela seja espalha primeiramente na

parte superior ocupando posteriormente o restante do ambiente –, pode trazer

consequências graves aos ocupantes e dificultar sua locomoção dentro do

local1. Isso se deve porque a fumaça apresenta cinco características: é opaca

(seus produtos, principalmente a fuligem, permanecem suspensos na massa

gasosa diminuindo a visibilidade), tóxica (seus produtos prejudicam a

respiração), móvel (porque é um fluido que está sofrendo empuxo constante,

1 Pelo menos 80% dos casos de morte em incêndio são causados pelos efeitos da fumaça

produzida (KATO E SEITO, 1988)

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podendo atingir diferentes ambientes e propagar o incêndio), quente (eleva a

temperatura a ponto de gerar novos focos de incêndio e ainda provocar danos

à pele) e inflamável (porque possui subprodutos da queima capazes de reagir

com o oxigênio e queimar).

Comparando-se a movimentação da fumaça com o movimento do ar natural

para conforto ambiental, verifica-se que além de aberturas favoráveis à

ventilação cruzada, as especificações de divisões internas que apresentem o

menor obstáculo possível ao deslocamento do ar influenciam na implantação

de estratégias de segurança contra incêndio em edificações, visando como

ponto principal à saída segura de seus ocupantes na ocorrência de sinistros.

É importante ressaltar que os edifícios altos apresentam características

diferenciadas de edificações térreas em relação à saída segura de seus

ocupantes, pois o tempo é o maior aliado na segurança humana, quanto mais

rápido os ocupantes desocuparem o prédio, mais chances de serem salvos, e

nos edifícios em altura, o espaço percorrido e a população são maiores. Os

projetos de arquitetura devem ser elaborados de forma a favorecer e facilitar o

movimento das pessoas em circulações horizontais e verticais até um local

seguro.

Através de estudos simulados (utilizando programa computacional) em edifícios

altos, pode-se verificar que o posicionamento de aberturas, velocidade da

ventilação que entra na edificação e compartimentação interna influenciam

diretamente na ventilação natural eficiente no edifício e também na

movimentação da fumaça nos ambientes que atingem diretamente as

circulações e saídas utilizadas pelos ocupantes da edificação.

2.1 SIMULAÇÕES COMPUTACIONAIS DE INCÊNDIO E DE MOVIMENTO DE

EVACUAÇÃO EM EDIFÍCIOS ALTOS

O software utilizado para as simulações computacionais de incêndio foi o FDS

(Fire Dynamics Simulator), desenvolvido pelo National Institute of Standards

and Technology (NIST). O FDS é um modelador de incêndio com base em

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dinâmica computacional de fluidos (Computational Fluid Dynamics - CFD). O

Smokeview é um programa de visualização que é usado para mostrar os

resultados da simulação FDS. Utilizou-se também do módulo de evacuação do

FDS, o EVAC, também desenvolvimento pela NIST, juntamente com o

Laboratório VTT, da Finlândia, que possibilita simular simultaneamente o

incêndio e a evacuação.

Foram escolhidos dois edifícios altos com características diferenciadas para

obtenção de resultados através das simulações. Um deles é o Bloco C do

Complexo Brasil 21, situado em Brasília-DF, Brasil, considerado um edifício

típico de escritórios, com planta retangular, e subdividida em salas. O projeto é

do escritório brasileiro D’Ávila Arquitetura. O outro edifício escolhido é o

Commerzbank Tower, em Frankfurt, Hesse, na Alemanha, considerado o

primeiro edifício “verde” no mundo, quando concluída sua construção em 1997,

devido à presença de jardins suspensos ao longo do arranha-céu, o que

garante a entrada de ventilação natural, e à aplicação da tecnologia para

reduzir o consumo de energia no edifício. Possui planta triangular e livre, de

uma só empresa, o Commerzbank. É um projeto de Norman Foster.

Os dois edifícios possuem escadas de emergência à prova de fumaça

pressurizada. O Bloco C do Brasil 21 apresenta, ainda, uma escada de serviço,

não considerada nas simulações.

Figura 1 – Foto e planta-baixa de maior população e área do Edifício C do Complexo Brasil 21, Brasília, Brasil

Norte

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Figura 2 – Imagem e planta-baixa do Commerzbank Tower, Frankfurt, Alemanha

Em relação às saídas de emergência, indicadas nas plantas-baixas dos

edifícios, considerou-se, para as simulações, que na medida em que as

pessoas encontrassem a entrada da escada de emergência, a antecâmara,

elas já estariam protegidas.

Para o cálculo da população do pavimento simulado, utilizou-se o que

prescreve a norma brasileira da Associação Brasileira de Normas Técnicas, a

NBR 9077/2001 – Saída de emergência em edifícios, para o tipo de ocupação:

escritórios, o que é dado por uma pessoa por 7,00m² de área. Assim pavimento

considerado do Bloco C – Brasil 21 tem 146 pessoas e o Commerzbank Tower

possui 130 pessoas. As divisórias entre as salas no ambiente de trabalho foram

consideradas incombustíveis (inertes) para melhor visualização do movimento

da fumaça no pavimento e todas as portas foram consideradas totalmente

abertas. Outros pontos importantes são os tempos de pré-detecção e pré-

movimento que foram considerados quase zero, mesmo sabendo que a reação

das pessoas não é imediata, lembrando o que é adotado pelo documento BS

7974 no caso de escritórios: 180s para evacuação não orientada. Isto porque

observou-se que, para as simulações de movimento de evacuação, sem

incêndio, o tempo de 180s foi suficiente para a saída de todas as pessoas do

pavimento (sem tempo de pré-detecção e pré-movimento), desconsiderando

retenção ou lentidão na entrada da escada de emergência, que provavelmente

aconteceria se existissem outras pessoas nas escadas vindas de outros

Norte

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pavimentos. O fato dos pavimentos dos dois edifícios estarem também

praticamente tomados pela fumaça em 180 segundos nas simulações de

incêndio fez com que se adotasse o tempo de pré-movimento quase zero e o

tempo de simulação de 180 segundos. As características das pessoas da

edificação foram consideradas segundo os padrões do programa EVAC –

Adultos (mulheres e homens) – em condições físicas normais.

O material da queima escolhido foi o Poliuretano, padrão do FDS, o qual

produz bastante fumaça, visto que os materiais presentes em escritórios são

bastante inflamáveis, como madeira, sintéticos e papéis. O local escolhido para

a colocação do queimador, isto é, do foco de incêndio, foi buscado pela

posição mais central à área de trabalho em ambos os edifícios, para observar a

movimentação da fumaça em ambos os lados do pavimento.

Para as simulações com a aplicação da ventilação foram considerados os

dados climáticos de cada cidade, juntamente com a velocidade dos ventos.

Considerou-se a estação mais quente do ano: o verão, pois a ventilação natural

corresponde a uma estratégia de resfriamento natural do ambiente, relacionada

diretamente com sua temperatura. Assim para a cidade de Brasília, considerou-

se a velocidade 5m/s, a mais alta do verão, na direção NOROESTE, dado

obtido pela Rosa dos Ventos, do software SolAr. Já para a cidade de Frankfurt,

os índices de velocidade dos ventos é alto no verão, o que neste caso, a partir

de dados meteorológicos para os meses do verão no hemisfério norte,

considerou-se a velocidade de 7m/s, obtida pela média das velocidades dos

ventos, na direção SUDOESTE. Aliada a esses dados obtidos, foi considerada

a velocidade de ventilação média de conforto para ambientes de escritórios que

é de 0,5m/s.

Em ambos os projetos as janelas são do tipo maxim-ar. Para o

dimensionamento das aberturas das janelas foi considerada a abertura máxima

na horizontal (por causa deste tipo de esquadria) e transferida

“retangularmente” para as paredes, adequando-se à geometria do software

FDS.

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Foram realizados três tipos de simulação para cada edifício: Simulação

somente de evacuação (sem incêndio) no pavimento de maior área; Simulação

de evacuação e incêndio – pavimento de maior área sem a entrada de

ventilação externa (chamado AMBIENTE FECHADO) e Simulação de

evacuação e incêndio – pavimento de maior área recebendo ventilação externa

ao edifício (chamado AMBIENTE ABERTO). Para obtenção de resultados mais

próximos dos reais foram realizadas 3 (três) simulações de cada tipo. Os

valores apresentados a seguir são valores médios retirados dos resultados

gerais. Todas as imagens capturadas das simulações foram retiradas do

Smokeview, um visualizador do FDS + EVAC.

Os resultados das simulações do Bloco C, Brasil 21 foram os seguintes:

A primeira simulação realizada foi somente do movimento de evacuação dos

ocupantes do edifício. O pé-direito é de 2,40m. Em 1 minuto e 19 segundos a

população total do pavimento já havia atingido as saídas de emergência.

Foram 62 pessoas (42,45%) que saíram pela Saída 1 em 62,65s e 84 pessoas

(57,55%) saíram pela Saída 2 em 79 segundos.

A segunda simulação realizada é de AMBIENTE FECHADO (sem a presença

de ventilação natural externa ao edifício) e a terceira é de AMBIENTE ABERTO

(com a presença de ventilação natural que entra pelas janelas do edifício). Para

efeitos comparativos são apresentados os dois tipos de simulação (incêndio e

evacuação) em conjunto no mesmo intervalo de tempo. Para as simulações de

incêndio, foi especificado um “queimador” com taxa de liberação de calor de

1000 kW/m².

Figura 3 – Imagem AMBIENTE FECHADO no tempo de 17s

Fonte de ignição (queimador)

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Figura 4 – Imagem AMBIENTE ABERTO no tempo de 17s

Nota-se que no AMBIENTE ABERTO, no tempo de 17s, a entrada da Saída 2

ainda não foi atingida pela fumaça, diferentemente do que acontece no

AMBIENTE FECHADO. Em 23 segundos, no AMBIENTE FECHADO, a fumaça

tomou conta do hall de entrada da Saída 1 e comparando com a situação do

AMBIENTE ABERTO, no tempo de 30s que a fumaça começa a invadir as

salas à esquerda da Saída 1, e a Saída 2 encontra-se praticamente nas

mesmas condições do tempo de 17s do AMBIENTE FECHADO.

Figura 5 – Imagem AMBIENTE FECHADO no tempo de 60s

Figura 6 – Imagem AMBIENTE ABERTO no tempo de 60s.

Observa-se que para o tempo de 60s, o AMBIENTE ABERTO apresenta

condições mais favoráveis em relação a invasão da fumaça nas salas à direita

da Saída 2. No tempo de 120s, o pavimento já está todo tomado pela fumaça

no AMBIENTE ABERTO, enquanto que até o final da simulação no AMBIENTE

ABERTO, a ventilação contribuiu para que a fumaça chegasse mais lentamente

às salas do lado direito do pavimento.

VEN

TO N

OR

OES

TE

VEN

TO N

OR

OES

TE

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No AMBIENTE FECHADO, aos 69s ocorreu a primeira morte, devido a

presença de gases tóxicos (CO, CO2, O2). Além disso, houve um decréscimo

da velocidade de movimentação dos ocupantes a partir de 30s, e ainda

faltavam cerca de 95 pessoas para atingirem uma saída, enquanto que para o

AMBIENTE ABERTO, o decréscimo de velocidade se deu em tornou de 90s e

restavam apenas 42 pessoas. O Quadro 2 apresenta os resultados do número

de pessoas que atingiram uma das duas saídas de emergência para os três

tipos de simulação.

Quadro 2 – Número de pessoas que alcançaram a saída de emergência, resultado das três simulações.

Tempo (s)

Número de pessoas que alcançaram a saída de emergência

Simulação 1 Somente evacuação

Simulação 2 Ambiente Fechado

Simulação 3 Ambiente Aberto

17 19 13% 24 16% 16 11%

30 52 36% 50 34% 46 32%

60 126 86% 54 37% 77 53%

79 146 100% 55 38% 94 64%

120 - - 60 41% 107 73%

150 - - 64 44% 109 75%

180 - - 69 47% 113 77%

Os resultados das simulações para o Commerzbank Tower são:

Para a realização das simulações do Commerzbank no software FDS, que

possui uma malha retilínea, alterou-se as extremidades da planta, sem perda

de área de trabalho, circulações e posicionamento das saídas, ambas

relevantes para a obtenção dos resultados próximos a realidade. Para

simulação somente de evacuação em 61s, o último ocupante do pavimento

atinge uma saída de emergência. Para simulação evacuação e incêndio, em

30s já nota-se uma trajetória diferenciada para cada simulação. No AMBIENTE

ABERTO, além do vento a Sul/Sudoeste que entra pelos jardins suspensos há

uma exaustão pelo átrio, o que parece não favorecer quanto a propagação da

fumaça nas salas superiores à planta. E em relação ao movimento de

evacuação, tem-se o que apresenta o Quadro 3, em geral.

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Figura 7 – Simulação de evacuação e incêndio no AMBIENTE FECHADO (a) e no AMBIENTE ABERTO (b) no tempo de 30s.

Quadro 3 – Número de pessoas que alcançaram a saída de emergência, resultado das três simulações.

Tempo (s) Número de pessoas que alcançaram a saída de emergência

Simulação 1 Somente evacuação

Simulação 2 Ambiente Fechado

Simulação 3 Ambiente Aberto

15 12 9% 10 7% 10 7%

30 59 45% 54 42% 43 33%

60 128 98% 119 92% 113 87%

61 130 100%

90 - - 128 98% 125 96%

100 - - 128 98% 125 96%

Os resultados de evacuação são representados na análise do Commerzbank

para o tempo de até 100s, visto que a partir de 90s até o final da simulação em

180s não apareceram resultados para a saída das 2 pessoas na Simulação 2 e

5 pessoas na Simulação 3. Isso pode ter ocorrido devido ao posicionamento

das pessoas definido pelo programa, que em cada simulação realizada, o

software FDS as coloca em locais diferentes, a escolha é aleatória, ou então,

essas pessoas saíram após o tempo de simulação considerado neste estudo, o

que é mais difícil de ocorrer.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente, vem sendo discutido um conceito que se emprega em todos os

níveis de conhecimento, a sustentabilidade. A ventilação natural é uma das

Vento SUL/SUDOESTE

(a) (b)

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estratégias bioclimáticas aplicadas em projeto de edifícios e pode ser também

utilizada como estratégia de segurança contra incêndio se aplicada para tal fim.

Com os resultados das simulações, observou-se que a ventilação natural

quando aplicada ao pavimento influencia no movimento da fumaça em seu

interior, independente de ser um edifício verde, de forma positiva, se estiver

sua direção posicionada de forma que defina a trajetória da fumaça de incêndio

afastando-a das rotas de fuga. Outra observação seria que a fumaça fica

menos densa, o que não prejudicaria, na maioria das vezes, a visão das

pessoas. Ainda assim, a ventilação natural é uma vantagem pela qualidade de

vida que pode proporcionar aos ocupantes do edifício. Não se deve esquecer

que além disto, a eficiência da aplicação de ventilação natural do edifício

depende de outros fatores como o partido arquitetônico do edifício dado pela

forma e pela distribuição em planta das escadas, funcionalidade, além da

especificação de materiais desfavoráveis à produção de fumaça tóxica. Em

ainda em relação à evacuação, “existe uma variação do movimento,

determinada pelo sexo e idade da pessoa, pelo sentido da evacuação, se em

subida ou em descida, e pelo leiaute dos pavimentos.” Além disso, fatores

como a camada de fumaça, a visibilidade, a temperatura do ambiente e a

velocidade do ar no interior do edifício influenciam no movimento de escape em

situação de incêndio. E para este estudo, foi aplicada a ventilação em um só

ponto para a obtenção dos resultados, o que poderiam ser diferentes se

houvesse outros pontos de entrada de ar no edifício. As simulações

computacionais de movimento de evacuação, juntamente com as de incêndio,

poderão fornecer informações valiosas para aplicação em projeto e elaboração

de normas, como por exemplo, se as saídas estão bem posicionadas ou se são

suficientes para aquele tipo de edifício, informações importantíssimas

considerando a segurança das pessoas.

Page 16: Edifícios sustentáveis: estratégia bioclimática de ... · PDF filereferência em projetos de edifícios altos sustentáveis, define o projeto ecologicamente correto, ou simplesmente

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