Ecossistemas de água doce da Europa

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PPaaccoottee ddooss AAlluunnoossLivro de texto

CCaatthheerriinnaa VVoorreeaaddoouuCCoooorrddeennaaddoorraa ddoo pprroojjeeccttoo CCOONNFFRREESSHH

Doutora em Biologia, Coordenadora do Laboratório de Educação e Hidrobiologia, Museu de História Natural de Creta, Universidade de Creta, Grécia

OS ECOSSISTEMAS DE ÁGUADOCE DA EUROPA

Uma Abordagem Educacional

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Olá!

A água é um recurso essencial para o desenvolvimento sustentável da Terra, motivo pelo qual2003 foi designado o Ano Mundial da Água. O aumento do consumo da água, associado à suapoluição são umas das principais ameaças aos ecossistemas de água doce. O conhecimento dofuncionamento destes ecossistemas ajuda-nos a compreender a estreita relação entre qualidade daágua e qualidade de vida humana, mostrando-nos a necessidade de proteger estes ecossistemas.

O presente material pedagógico foi produzido no âmbito do projecto CONFRESH “TeachingMethods and Pedagogical Strategies for the Promotion to Schools of CONservation and SustainableDevelopment of FRESHwater Ecosystems”, com o titulo “ Ecossistemas de água doce da Europa:Uma abordagem educacional”.

“Os Ecossistemas de Água Doce da Europa: Uma abordagem educacional” está disponívelnuma versão impressa e electrónica, consistindo em duas partes:

Parte A. Material para os alunos que inclui:• Livro de textos;• Actividades a desenvolver no campo e no laboratório;• Folhas de registo de campo;• Fichas de identificação de invertebrados aquáticos para orientação das actividades de campo e de laboratório;• CD Rom com um caso de estudo;• Fichas de avaliação.

Parte B. Material para os professores que inclui: • Material de suporte para os seminários de formação dos professores; • Directivas para a implementação do material pedagógico dos alunos no programa curricular.• Fichas de avaliação

Esperamos que a participação nas actividades propostas seja do teu agrado e que te divirtasaprendendo!

Os editors

PREFACE

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Contributors in alphabetical order:

Bis Barbara Prof. of Biology, Dept of Limnology and Invertebrate Ecology, Institute of Ecology andEnvironmental Protection, University of Łódž, Poland

Demetropoulos Andreas Biologist M.Sc., Cyprus Wildlife Society, Cyprus

Gonçalves Cecília Biologist, Teacher of Secondary Education, Education Regional Directorate of Alentejo, Ministry ofEducation, Portugal

Gouletsa Sofia Biologist M.Sc., Hydrobiology Lab, Natural History Museum of Crete, University of Crete, Greece

Hadjichristophorou Myroula Biologist M.Sc. Dept of Fisheries and Marine Research, Ministry of Agriculture, Natural Resourcesand Environment, Cyprus

Kłos Ewa Biologist M. Sc., Certified Teacher, Center of Teachers’ Education and Practical TrainingEnhancement, Łódž, Poland

Komodromos Nikos Biologist M.Sc. Teacher of Secondary Education, Secondary School of Pera Choriou & Nisou,Cyprus

Kosmala Grażyna Biologist M.Sc., Teacher of Secondary Education, Tadeusz Kościuszko Secondary School,Pabianice, Poland

Madeira Ana Cristina Language and Modern Literature, Director, Dr. Rui Grácio Training Center, Education RegionalDirectorate of Algarve, Portugal

Mainwaring Jane Paleontologist Ph.D., Special Projects and Innovation, Natural History Museum, London, UnitedKingdom

Morais Manuela Prof. of Biology, Environmental Ecology Centre, University of Évora, Portugal

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Mousteraki Sofia Geologist, Teacher of Secondary Education, Andreas Delmouzos 5th Secondary School, Crete,Greece

Pinto Paulo Prof. of Biology, Environmental Ecology Centre, University of Évora, Portugal

Tapadinhas Helena Biologist, M.Sc. in Creativity, Dr. Rui Grácio Training Centre, Education Regional Directorate ofAlgarve, Portugal

Turska – Sikorska Katarzyna Language Teacher, Director, Primary School Nr 173, Łódž, Poland

Voreadou Catherina Biologist Ph.D., Head of Education & Hydrobiology Lab, Natural History Museum of Crete,University of Crete, Greece

Design/Layout:

Selena Publications

email: [email protected]

Copyright 2008

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6 Capítulo 1 - Água

ÁGUABarbara BisDoutorada em Biologia, Departamento de Limnologia e Ecologia de Invertebrados. Instituto de Ecologia eProtecção Ambiental, Universidade de Łódž, Polónia

Grażyna KosmalaMestre em Biologia. Escola Secundária Tadeusz Kościuszko, Pabianice, Polónia

CAPÍTULO 1

O elemento mais importante para a existên-cia de vida é a água. A água no ambiente estápresente na atmosfera, no solo e nos ecossis-temas aquáticos. A água é o suporte de vida ede todos os processos que se desenvolvem nosecossistemas, sendo um bem essencial paratodos os seres vivos. (Fig.1).

1.1. Estrutura damolécula de água

A água é uma pequena molécula simétrica,com forma de V e fórmula química H2O (Fig.2).É o composto mais simples formado por doisdos elementos mais comuns no Universo – doisátomos de Hidrogénio (H) ligados a um átomode Oxigénio (O) relativamente mais pesado.Numa molécula de água, os dois átomos de

hidrogénio são carregados positivamente,atraindo o oxigénio de uma molécula de águadiferente, que é carregado negativamente.molécula de H2O é electricamente neutra, masas cargas positivas e negativas não estão uni-formemente distribuídas, tal como se verifica naFig. 3.Esta estrutura molecular da água (dipolo)

influencia o modo como muitas substâncias sedissolvem nela. A água é chamada de "solventeuniversal" porque dissolve mais substâncias doque qualquer outro liquído. Isto significa queonde quer que a água se movimente, sejaatravés do solo ou através dos nossos corpos,ela transporta consigo valiosos elementosquímicos, minerais e nutrientes.

1. A águao elemento essencial para a vida

Fig. 1. A água é essencial à vida.

Fig.2. Esquema ilustrativo de uma molécula de água.O átomo maior de oxigénio liga-se a dois átomos dehidrogénio mais pequenos

Hidrogénio Hidrogénio

Oxigénio

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Capítulo 1 - Água 7

1.2. Propriedades Físicase Químicas da Água.

A água é única uma vez que é também aúnica substância natural que se encontra nostrês estados(Fig. 4, 5): líquido, sólido (gelo) egasoso (vapor de água) às temperaturas quenormalmente ocorrem na Terra.A água distingue-se entre mais de 15 milhões

de substâncias químicas conhecidas devido àsua forma sólida, o gelo, ser mais leve (menosdenso) do que a líquida. O que explica porque éque o gelo flutua em água líquida. A densidademáxima da água é atingida aos 4ºC (Fig.6).É necessário calor para quebrar as ligações

de hidrogénio entre as moléculas de água per-mitindo-lhes passar ao estado gasoso (a100ºC). Quando as moléculas de água vapor-izam consomem calor. A uma escala maior,quando as moléculas de água vaporizam dasuperfície do oceano carregam consigo calorproveniente deste, facto que ajuda a controlar eregular o clima da Terra. Como consequência,do enorme volume de água nos oceanos (1.35milhões de Km3), existe uma grande capaci-dade de armazenamento de calor que impedegrandes mudanças de temperatura (efeito tam-pão). A enorme quantidade de calor absorvidaspelos oceanos, através da energia solar, é trans-portada desde o Equador até aos Pólos.As forças coesivas entre as moléculas de um

líquido são partilhadas com todos os átomos viz-inhos. As moléculas da camada superficial daágua por não terem átomos vizinhos na partesuperior, reforçam entre si as forças de atracçãocom as moléculas vizinhas laterais (Fig.7A).Esta intensificação das forças de atracção inter-moleculares à superfície é denominada de ten-são superficial. A “película” da superfície daágua pode ser usada como habitat para algunsinsectos aquáticos, por exemplo o alfaiate, cujopeso não é suficiente para quebrar as forças datensão superficial pode caminhar sobre a super-fície da água (Fig. 7B).

Fig. 4. Água em três estados num ambiente natural

Gasoso

Sólido

Líquido

Fig. 3. Estrutura molecular da água: forma aproxima-da e distribuição de cargas eléctricas.

Fig.6. Relação entre a densidade da água e atemperatura.

Densidade(g/cm

3 )

Temperatura (ºC)

Máxima aos 4ºC

Fig. 5. Diferentes estados moleculares da água

Ponte de Hidrogénio

Cubo deGelo

Água no estadolíquido

Ligações de Hidrogénioem constantereordenação

Gelo

Ligações estáveispor pontes deHidrogénio

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8 Capítulo 1 - Água

A tensão superficial é também responsávelpela forma das gotas dos líquidos (Fig. 8).Apesar de facilmente deformáveis, as gotas deágua tendem a apresentar uma forma esféricadevido às forças de coesão da camada dasuperfície e à gravidade.A tensão superficial da água decresce à

medida que a temperatura aumenta (Fig. 6).Consequentemente, a água quente é um mel-hor agente de limpeza porque a tensão superfi-cial mais baixa torna-a num melhor “agentemolhante” para chegar a poros e fissuras.A tensão superficial é também responsável

pela capilaridade. A capilaridade é o resultadoda adesão e da tensão superficial. A adesão daágua às paredes de um recipiente provoca, noslimites do líquido, uma força no sentido ascen-dente formando um menisco que vira paracima. A tensão superficial (forças de coesão)

age de modo a manter a superfície intacta, con-sequentemente, não só os limites se moveremno sentido ascendente, mas toda a superfíciedo líquido é arrastada nesse sentido (Fig. 9).

Fig. 9. O esquema ilustra as forças envolvidas nofenómeno da capilaridade. Um líquido sobe nas pare-des de um tubo capilar sem pressão externa – a capi-laridade ocorre quando a adesão às paredes do tuboé mais forte do que as forças de coesão entre asmoléculas do líquido

Fig. 7. A. Ilustração das forças coesivas entre asmoléculas e água, B. Um alfaiate (insecto aquáticoda família Gerridae) caminhando à superfície daágua.

Fig. 8 Gotas de água

Tensão Superficial

Adesão

Coesãotensão superficial

Adesão> Coesão

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Capítulo 1 - Água 9

O pH, ou potencial de hidrogénio iónico,é um índice que indica a acidez, a neutrali-dade e a alcalinidade de um meio. A águapura tem um pH neutro de 7. A gama incluipH de 0 a 14. pH inferior a 7 indica acidez (aágua tem mais iões de hidrogénio livres),enquanto que um pH maior que 7 indicaalcalinidade/basicidade (a água tem menosiões de hidrogénio livres). O pH por dependerdas substâncias químicas pH, ou potencialde hidrogénio iónico, é um índice que indicaa acidez, a neutralidade e a alcalinidade deum meio. A água pura tem um pH neutro de7. A gama inclui pH de 0 a 14. pH inferior a 7indica acidez (a água tem mais iões dehidrogénio livres), enquanto que um pH maiorque 7 indica alcalinidade/basicidade (a águatem menos iões de hidrogénio livres). O pHpor depender das substâncias químicas dis-solvidas é um importante indicador de conta-minação química. A poluição pode alterar opH de uma água, o que pode interferir comosa animais e plantas que vivem na água. OpH pode ser medido usando papel indicador

Temperatura da água – A temperaturainfluência a solubilidade do oxigénio na água,variando inversamente. Ou seja, quantomaior for a temperatura menor será a solubil-idade do oxigénio atmosférico na água

Oxigénio dissolvido – O oxigénio dissolvidoexistente na água resulta de processos físi-cos e bioquímicos. Num pequeno rio de mon-tanha com corrente turbulenta a oxigenaçãoda água é rápida atingindo-se valores eleva-dos de oxigénio. Nestas situações quantomenor for a temperatura da água maior a dis-solução do oxigénio. Dizemos neste caso,que a oxigenação da água é feita através deprocessos físicos. Pelo contrário num lago ouem sistemas aquáticos de águas estag-nadas, durante o dia em presença de radi-ação solar dá-se a fotossíntese com liber-tação de oxigénio. Em situações extremascom elevada produtividade primária atingem-se valores extremos de sobre-saturação,superiores a 100%, com libertação para aatmosfera. Nestas situações, o oxigénio dis-solvido na água tem sobretudo uma origembioquímica. Este Oxigénio dissolvido é uti-lizado durante a noite nos processos de res-piração e decomposição orgânica.

Condutividade - A condutividade é a medidada capacidade da água para conduzir a cor-rente eléctrica e é dependente da quantidadede sólidos dissolvidos (tais como o sal) naágua. A água pura, tal como a água destila-da, apresenta baixa condutividade, pelo con-trário, a água do mar tem uma elevada con-dutividade. A água da chuva muitas vezesdissolve gases e poeiras transportados peloar, por isso, apresenta uma maior condutivi-dade do que a água destilada. A condutivi-dade é uma importante medida de qualidadeda água porque nos dá ideia da quantidadede material dissolvido

Turbidez - A turbidez é a quantidade dematéria particulada em suspensão na água.A turbidez mede o efeito de dispersão dossólidos suspensos na radiação luminosa:quanto maior a intensidade de dispersão daluz, maior é a turbidez. Os materiais quecausam turbidez da água podem ter umaorigem inorgânica, tais como a argila e o silteou orgânica, incluindo os compostos orgâni-cos solúveis, o plâncton e organismosmicroscópicos patogénicos ou não.

CAIXA 1. AS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E QUÍMICAS DA

Oxigénio

(mg/L)

Temperatura (ºC)

Variação da solubilidade do oxigéniona água com atemperatura

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10 Capítulo 1 - Água

1.3. A água para a saúdehumana

A água líquida é essencial para a vida.Em particular, a espécie humana nãosobrevive sem água por mais de 100horas, enquanto que outros nutrientespodem ser negligenciados por semanasou meses.

Todos os dias os seres humanos têmde substituir 2,4 litros de água (Tabela 1).A água é distribuída entre as células e o flu-ido extracelular. A excelente capacidadeda água para dissolver substâncias per-mite às células usarem nutrientes, mineraise elementos químicos preciosos emtodos estes processos biológicos.

1.4. A água como ummeio para a vida.

A água é de extrema importânciapara todos os seres vivos. Possui pro-priedades específicas que mantêm avida. Assim sendo, nenhum outro líqui-do pode substituir a água dentro oufora do corpo de um organismo. Aspropriedades da molécula de águaestão ligadas à sua estrutura física(Caixa III).

A água é também muito importantepara as sociedades humanas: para alimpeza e a remoção de detritos; para aprodução de energia; para produçãoalimentar, para arrefecimento e o aque-

Balanço de Água

Entrada de água, ml dia-1 Saída de água, ml dia-1

Bebidas 1500 Urina, fezes 1600

Comida 700 Da pele, suor 500

Águametabólica 300 Respiração 400

Tabela 1. Valores de entrada e saída de água num adulto em clima temperado (segundo Stirling & Parsons,2000).

Sem água, o teu corpo também iria pararde trabalhar. O teu corpo é cerca de doisterços água e uma pessoa não conseguesobreviver por mais de alguns dias sem ela.Porquê?

O corpo tem muitas funções importantese precisa de água para as realizar. Por exem-plo, o teu sangue, que contem muita água,transporta oxigénio para todas as células docorpo. Sem oxigénio, as células morreriam eo teu corpo pararia de funcionar. A água estátambém na linfa, um fluído que faz parte doteu sistema imunitário e que nos ajuda a

combater as infecções. Tu precisas de águapara digerir os alimentos e também para telivrares dos resíduos. A água é necessáriapara os sucos digestivos, urina e fezes; étambém o ingrediente principal no suor resul-tante da transpiração. Uma vez que é umaparte importante dos fluidos do teu corpo,cada célula depende de água para funcionarnormalmente. O teu corpo não obtém águaapenas por beber água ou leite. Muitos ali-mentos contêm água, tal como os frutos e osvegetais. Quando o teu corpo não tem águasuficiente ficas desidratado

CAIXA. 2. A ÁGUA PARA A TUA SAÚDE

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Capítulo 1 - Água 11

cimento; para o transporte e para activi-dades recreativas.

O uso da água para as necessi-dades de outros consumidoreshumanos, deve ser racional e susten-tável. Assim sendo, temos de conhecera importância da água nas nossasvidas e aprender mais acerca do fun-cionamento dos ecossistemas de águadoce. Com estes conhecimentos

podemos estaremos aptos paraempreender acções de protecção egestão sustentável da água e dosecossistemas.

De forma geral, à medida que a temper-atura aumenta a água torna-se menosdensa. Inversamente, torna-se mais densa àmedida que a temperatura baixa. A excepçãoa esta regra é que a água atinge a sua den-sidade máxima aproximadamente a 4°C.Abaixo dos 4°C, à medida que arrefece, onúmero de moléculas de água ligadas por lig-ações de hidrogénio aumenta, formando lig-ações de gelo desorganizados. As moléculasde gelo formam uma estrutura básica abertabastante estruturada, de modo que o própriogelo é menos denso que a água, permitindo-lhe flutuar nela. A relação da temperaturacom a densidade explica a ocorrência deestratificação térmica em lagos.

Durante a Primavera (A) - depois do gelo aágua tem normalmente a mesma temperatu-ra desde a superfície até ao fundo. O movi-mento do vento sobre a superfície conduz àcirculação e mistura de água. A água dasuperfície desce para o fundo do lago e a

água do fundo ascende à superfície. Esta cir-culação permite que quantidades relativa-mente grandes de oxigénio cheguem aofundo do lago. A mistura da água do lagonesta altura do ano é chamada de retorno daPrimavera.

Durante o Verão (B), as águas superficiaissão aquecidas, em grande parte pela radi-ação solar, mais rapidamente do que se dá adistribuição do calor por mistura da água. Àmedida que a água superficial aquece e setorna menos densa, a resistência térmica àmistura aumenta. O lago estratifica com a for-mação de três zonas: o epilimnion, um estra-to superior de água menos densa, mais oumenos uniformemente aquecida, que circulae possui alguma turbulência; o hipolimnion, oestrato inferior de águas mais densas, maisfrias e relativamente calmas. Sem a misturade águas que fornece o oxigénio dissolvido ecom falta de luz para a ocorrência de foto-ssíntese, o fundo do lago pode apresentar

condições de ausência de oxigénio. A respi-ração dos animais e bactérias faz decrescerainda mais o oxigénio no fundo do lago. Esteprocesso num lago é chamado deEstratificação de Verão.

No Outono (C), a água apresenta geral-mente temperaturas mais frias e uniformes,contribuindo o vento para uma mistura damassa de água. A água superficial, que estáem contacto directo com o ar frio, arrefecemais rapidamente que a água em profundi-dade. Esta água fria e mais densa afunda-se,misturando-se a água no lago. Uma vezmais, o oxigénio e os nutrientes circulamatravés da coluna de água. Este processo échamado de mistura de Outono.

Vento

A - C

Nutrientes

Oxigénio

CAIXA 3. COMO É QUE A ÁGUA SE COMPORTAA DIFERENTES TEMPERATURAS EM LAGOS?

B

Vento

Hipolimnion

Nutrientes

Oxigénio

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1.5. A Hidrosfera daTerra

A hidrosfera inclui toda a água da Terra. Aabundância de água na Terra é uma caracterís-tica única que distingue o nosso "Planeta Azul"dos outros planetas no sistema solar (71% daTerra é coberta por água). Nem uma gota deágua líquida foi ainda encontrada em qualqueroutro local do nosso sistema solar.

A Terra tem exactamente a massa, a com-posição química, a atmosfera e a distância aoSol (Principio de "Goldilocks") certas, o que per-mitem a existência de água principalmentelíquida. De qualquer forma, A estrutura molecu-lar da água e a gama de temperaturas epressões do nosso planeta possibilitam a suaexistência nos três estados.

A hidrosfera interage e é influenciada portodos os outros sistemas, a litosfera e a atmos-fera. (Fig. 10).

12 Capítulo 1 - Água

Durante o Inverno (D) a água de superfíciearrefece. As suas moléculas começam aorganizar-se (formam-se mais ligações dehidrogénio) para solidificar. À medida que astemperaturas da água à superfície atingem0°C, o gelo cobre a superfície do lago. Estacamada de gelo impede a mistura, podendoocorrer estratificação. Uma camada de águade baixa densidade, inferior a 4°C, mas maisquente do que os 0°C forma-se por baixo do

gelo. Abaixo desta camada, a água está nor-malmente próximo dos 4° C. Nesta situação,diz-se que o lago está em estratificação deInverno.

Camada de água a umatemperatura inferior a 4ºC

e superior a 0ºCGrande volume da água auma temperatura inferior ou

igual a 4º C

4ºCNutrientes

Gelo

Vento

A - C D

Nutrientes

Oxigénio

Fig. 10. Sistemas na Terra: Hidrosfera, Litosfera,Atmosfera e Biosfera

LitosferaHidrosferaBiosferaAtmosfera

Energia Solar

Page 14: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 1 - Água 13

O mundo vivo, ou biosfera, contribui para acirculação da água entre a hidrosfera, litosferae atmosfera, nomeadamente pelos processosde absorção radicular que, captando a água dalitosfera a enviam para a atmosfera por evapo-transpiração.

1.6. Hidrosfera da Terra

Cerca de 97% da água existente na Terraestá nos oceanos (Fig.11) sob a forma de águasalgada. Por este motivo a água doce é umbem precioso que deve ser preservado e con-servado.

A figura 12 mostra a distribuição da águadoce: (1) a maioria – cerca de 69% encontra-senos glaciares e calotes polares, principalmentena Gronelândia e na Antárctica; (2) a restante ésubterrânea; (3) apenas cerca de 0.3% seencontra nos rios e lagos.

1.7. O Ciclo da Água

O ciclo da água descreve as transferências daágua na Terra, dentro e sobre ela. A água na Terraestá constantemente em movimento e a mudar deestado, de liquido para gasoso, para sólido e deforma inversa de novo (Fig. 13, Fig. 14). Fig. 11. Oceanos (Pacífico, Atlântico, Índico, Árctico) e continentes (Europa, América, África, Ásia,

Austrália, Antárctica).

Fig. 12. Distribuição da água na Terra. A - Distribuição global da água; B - Água doce disponível; C - Distribuição da água doce superficial.

A B C

Calotes polares e GlaciaresÁgua subterrâneaOutraÁgua Superficial

LagosPântanosRios

Oceanos Água Doce

Page 15: Ecossistemas de água doce da Europa

14 Capítulo 1 - Água

A água inicia o ciclo nos oceanos (Fig. 13),começando por ser evaporada pela energiasolar. A evaporação remove apenas moléculasde água, deixando os sais nos oceanos. Ámedida que o vapor de água ascende para aatmosfera, arrefece e condensa em nuvens. Asnuvens são empurradas pelo vento, podendoem certas condições produzir precipitação(chuva, neve, granizo). Na superfície da Terra aágua escoa-se superficialmente, formando riose lagos, ao mesmo tempo que se infiltra nosolo, originando águas subterrâneas que circu-lam no subsolo. Quando as águas subterrâneassão bastante superficiais ocorre transferênciada aguas subterrâneas para os ecossistemasaquáticos superficiais. O ciclo pode completar-se de diferentes formas, antes de atingir denovo o oceano, nomeadamente pela evapo-ração da água existente nos rios e lagos oupelos processos de evapotrranspiração dasplantas que lançam de novo a água para aatmosfera onde por condensação volta de novoa originar percipitação (Fig. 13, Fig. 14).

Fig. 13. The water cycle - showing the movement of water in the major processes.

Fig. 14. The schematic outline of water cycle with including the main processes, contributed in three water statesforming.

Água armazenada emforma de gelo e neve

Água armazenada na atmosfera

PrecipitaçãoEscorrência daneve derretidapara as linhasde água

Caudal da linha de água

Infiltração

Escorrência deágua subterrânea

Caudal da linhade água

Evaporação

Evaporação

Condensação

Evapotranspiração

Sublimação

Água armazenadanos Oceanos

Reserva de água subterrânea

O Ciclo da Água

Gás(vapor)

Evaporação

SublimaçãoInversa

Sublimação Fusão

Sólido (gelo)

Solidificação

CondensationÁgua no

estado líquido

Page 16: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 1 - Água 15

Componentes do ciclo da água Definição

Armazenamento de água nos oceanos A Água salgada existente nos oceanos ou mares interiores (96,5% da água daTerra).

Evaporação O processo através do qual a água passa do estado liquido ao estado gasoso.

SublimaçãoA passagem do estado sólida ao estado gasoso sem passar pelo estado líquidointermédio. O termo sublimação é muitas vezes usado para descrever o proces-so em que a neve ou o gelo passa a vapor de água no ar sem passar a chuva.

Evapotranspiração O processo pelo qual a água é libertada na atmosfera no estado gasoso comoresultado dos processos respiratórios das plantas.

Água na atmosfera Água armazenada na atmosfera, sob a forma de vapor de água e nuvens.

CondensaçãoO processo pelo qual a água passa do estado gasoso ao estado liquido. A con-densação é responsável pela formação de nuvens, que podem produzir precipi-tação .

Precipitação A precipitação é a queda de água no estado líquido (chuva) ou sólido (neve egranizo). Resulta da condensação do vapor de água que existe na atmosfera.

Armazenamento de água no gelo e neve Água doce armazenada na forma sólida, geralmente em glaciares.

Escorrência da neve derretida para as linhas de água Escorrência da água superficial a partir da neve e gelo.

Escorrência superficial Fluxo da água à superfície do solo

Fluxo de uma linha de água Movimento de água num canal natural, i.e, um rio.

Page 17: Ecossistemas de água doce da Europa

16 Capítulo 1 - Água

1.8. Intensificação dociclo da água ealterações climáticas

O clima da Terra tem mudado aolongo do tempo, sendo evidente essamudança nos últimos cem anos. Existeuma forte evidência que a grande partedo aquecimento observado nos últimos50 anos é devido a actividadeshumanas. Modelos desenvolvidos porcomputador prevêem que devido àsemissões de gases do efeito de estufa,as temperaturas continuarão a aumen-tar ao longo do século 21 (Fig.15).O clima descreve as condições

meteorológicas que ocorrem ao longode um período de tempo, num determi-nado local. Isto inclui condições meteo-rológicas médias, sequências meteo-rológicas regulares (como o Inverno, aPrimavera, o Verão e o Outono) e even-tos meteorológicos extremos (como ascheias e as secas).

As condições meteorológicas incluementre outros parâmetros, a temperatura,a pressão atmosférica, a humidade, ovento, a nebulosidade e a precipitação,em determinado lugar, num dadomomento. O estudo das condiçõesmeteorológicas e a sua previsão a curtoprazo denomina-se por meteorologia.Para horizontes temporais mais vastos,a climatologia estima, ainda que commaiores níveis de incerteza, cenáriosde variação climáticaOs fenómenos meteorológicos são

eventos observáveis e ligados pelasvariáveis que existem na atmosfera daTerra, como a temperatura, a pressão,o vapor de água, os gradientes e inter-acções de cada variável (Fig. 16).Uma estação meteorológica é umainfra-estrutura com instrumentos eequipamentos para realizar obser-vações meteorológicas, monitorizandoas condições atmosféricas. As estaçõesmeteorológicas típicas (Fig. 17) têm os

Tabela 3. O ciclo da água – os processos físicos mais importantes

Infiltração O movimento descendente da água da superfície da terra através solo ou rochas porosas.

água subterrânea Água existente abaixo da superfície terrestre por um largo período de tempo. Amaior parte destaágua provem da precipitação que se infiltra a partir da superfície.

água subterrânea Water existing for an extended period below the Earth's land surface. Most of the water in theground comes from precipitation that infiltrates downward from the land surface.

Descarga de água subterrânea Movimento de água para fora do solo. A água subterrânea é um importante contribuinte para ofluxo superficial de muitas linhas de água e/ou lagos

Nascente Local onde uma descarga de água subterrânea atinge a superfície do solo.

Page 18: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 1 - Água 17

seguinte instrumentos:• Termómetro para medir a temper-atura;• Anemómetro para medir a intensi-dade do vento;• Cata vento para medir a direcçãodo vento;• Barómetro para medir a pressãoda atmosférica. O ar frio é mais pesa-do do que o ar quente, originandoaltas pressões. O ar quente é maisleve e está relacionado com baixapressão;• Higrómetro para medir a humi-dade do ar;• Pluviómetro para medir a precipi-tação;• Radiómetro para medir a intensi-dade da radiação solar;• Tinas de evaporação para medir aevaporação.

Fig. 16. Esquema que mostra as condições meteorológicas gerais: (1) alta pressão atmosférica significa que oar está a ser empurrado para baixo; o ar no hemisfério Norte, num sistema de alta pressão, desloca-se no sen-tido horário; (2) baixa pressão atmosférica significa que o ar está a ser empurrado para cima. O ar que sobe émais quente; no hemisfério Norte, num sistema de baixa pressão, o ar desloca-se no sentido anti-horário.

Fig. 15. A – Comparação das tendências de evolução da temperatura média global; B – Previsões do aquecimento global a partir de 8 modelos climáticos diferentes.

ÁÁ ÂÂ

Anomalia na temperatura

Temperaturas Globais Projecções de Aquecimento Global

Média AnualMédia de cinco anos

Frio e com sol Quente e nublado

Alta Pressão Baixa Pressão

Alta PressãoNo sentido anti – horário

Vento puxadopara baixo

Baixa PressãoNo sentido do relógio

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18 Capítulo 1 - Água

Com excepção do anemómetro e dopluviómetro, que requerem umaexposição directa aos elementosatmosféricos, os restantes instrumentossão acondicionados numa câmara ven-tilada para evitar a incidência directa deluz solar no termómetro e de vento nohigrómetro. A instrumentação (Fig. 16)pode permitir o registo periódico; deoutra forma, é necessário o trabalhomanual para manter os registos. Atransmissão automática dos dados étambém desejável, uma vez que paramuitas estações meteorológicas essesdados são necessários para a previsãodo tempo.

Fig. 17. Estação meteorológica com instrumentos de medida. Em baixo câmara ventilada com termómetro eanemómetro.

Anemómetro (conjuntamente com a medição da evaporação)

Câmara do termómetro

Tinas de evaporação

Pluviómetro

Α

Β

Page 20: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 1 - Água 19

1. Chaplin, M. F. 2001. Water: its importance to life. Biochem. Mol. Biol.Educ. 29 (2), 54-59.

2. Chaplin, M. F. 2000. A proposal for the structuring of water. Biophys.Chem., 83 (3), 211-221.

3. Finney. J. L. 2001. The water molecule and its interactions: the interac-tion between theory, modelling and experiment, J. Mol. Liquids, 90:303-312.

4. Stirling, M. H. & K. C. Parsons. 2000. A model of human water balance.J. Therm. Biol. 25,187-190.

5. Campins, H. & M. J. Drake. 2004. Evaluating comets as a source ofEarth's water. In: Origins, Evolution and Biodiversity of Microbial Life inthe Universe. Ed. J. Seckbach (Kluwer, Dordrecht, 2004) pp. 569-591.

Referências

Outras partes temáticas adicionais para literatura estãodisponiveis nas seguintes fontes:

Água

� Water - Learning and Living - teaching and learning resources aboutintegrated water protection: water, catchments, biodiversity andhuman impact: http://www.watercare.net/wll/wc-watercycle.html

� Water Words Dictionary - a compilation of technical water, waterquality, environmental, and water-related terms:http://water.nv.gov/Water%20planning/dict-1/ww-index.htm

� Water Science for Schools - http://ga.water.usgs.gov/edu/index.html� H2O - The Mystery, Art & Science of Water - webside focused on the

nature, properties, place, significance, importance, and role of waterin Earth's life and culture; http://witcombe.sbc.edu/water/

� The Global Water Cycle - the webside page with the most importantlinks related to GWC:http://www.usgcrp.gov/usgcrp/links/waterlinks.htm

� Water Resources of the U.S.A. - http://water.usgs.gov/� Water resources in Europe -

http://maps.grida.no/go/graphic/world_s_water_cycle_schematic_and_residence_time

� Chemistry of Water -http://www.biology.arizona.edu/biochemistry/tutorials/chemistry/page3.html

� UNESCO Water Portal: http://www.unesco.org/water/� UNESCO-IHE Institute for Water Education: http://www.unesco-

ihe.org/education/intro.htm� UN Water: http://www.unwater.org/flashindex.html� Schools resource on water rights: http://www.worldaware.org.uk/edu-

cation/projects/water.html� United Nations GEMS/Water Programme: http://www.gemswater.org/

http://www.gemswater.org/

Hidrosfera e Ciclo Global da Água

� Hydrosphere: http://earth.rice.edu/MTPE/hydro/hydrosphere/hydros-phere_what.html

� Global Hydrology and Climate Center:http://www.ghcc.msfc.nasa.gov/ghcc_home.html

� Visible Earth:http://visibleearth.nasa.gov/view_set.php?categoryID=629

� Oceans and Water Issues WebPages: http://www.publicforuminsti-tute.org/issues/oceans/index.asp

� World Water Forum: http://www.worldwaterforum.org/home/home.asp� Water in School/educational page:

http://www.epa.gov/highschool/water.htm

Referências de apoio

Page 21: Ecossistemas de água doce da Europa

20 Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa

CAPÍTULO 2

1.1 Localização doslimites

A Europa localiza-se entre as lat-itudes 36o e 71o Norte, situação quelhe confere vantagens naturais porgrande parte do seu território sesituar na zona temperada, comclima moderado e húmido.

Os limites da Europa são oOceano Árctico a Norte; o MarMediterrâneo a Sul; o OceanoAtlântico a Oeste e Nordeste; consti-tuindo a cordilheira dos Montes Uraise o rio Ural a continuação da fron-teira a Nordeste com a Ásia; a Sul, oMar Cáspio, o Azerbeijão, a Arménia,o Mar Negro, o Bósforo, o Mar deMármara e o estreito de Dardanelos,completam a fronteira com a Ásia.

A Europa, juntamente com aÁsia, forma uma grande massa con-tinental, conhecida como Eurásia,separada do continente Africanopelo Mar Mediterrâneo.A Europa é a terceiro continentemais povoado depois da Ásia e daÁfrica. Em 2005, a populaçãoeuropeia foi estimada em 728 mil-hões segundo as Nações Unidas,representando mais de um nono dapopulação mundial.

1.2 Países Europeus

A Europa é constituída pelosseguintes países:Europa Oriental – Bielorrússia,Bulgária, República Checa, Hungria,Moldávia, Polónia, Roménia,Federação Russa, Eslováquia eUcrânia.Europa do Norte – Dinamarca,Estónia, Ilhas Feroe, Finlândia,Gronelândia, Islândia, Irlanda,Letónia, Lituânia, Noruega, Suécia eReino Unido, (constituído pelaInglaterra, Irlanda do Norte, Escóciae País de Gales).Europa do Sul – Albânia, Andorra,Bósnia Herzegovina, Croácia,Chipre, Gibraltar (RU), Grécia, SantaSé (Cidade Estado do Vaticano),Itália, Macedónia, Malta,Montenegro, Portugal, São Marinho,Sérvia, Eslovénia, Espanha e TurquiaEuropa Ocidental – Áustria, Bélgica,França, Alemanha, Liechtenstein,Luxemburgo, Mónaco, Holanda eSuiça.

1.3 Fisiografia

A Europa pode ser consideradacomo um conjunto de penínsulas lig-adas entre si, correspondendo asduas maiores ao “continente”Europeu propriamente dito e àEscandinávia, com o Mar Báltico asepara-las. Três penínsulas demenores dimensões — Ibérica,

1. Europe

ECOSSISTEMASAQUÁTICOS NAEUROPACatherina VoreadouDoutora em Biologia, Coordenadora do Laboratório de Educação e Hidrobiologia, Museu de História Natural de Creta,Universidade de Creta, Grécia

Sofia GouletsaMestre em Biologia, Laboratório de Hidrobiologia, Museu de História Natural de Creta, Universidade de Creta, Grécia.

Page 22: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa 21

Italiana e Balcânica — avançam aoSul para o Mar Mediterrâneo. ALeste, o continente europeu alarga-se em forma em forma de funil,atingindo a fronteira com a Ásia nosMontes Urais. A Oeste, a Europadivide-se numa série de ilhas, sendoas maiores, a Grã-Bretanha, aIrlanda e a Islândia (Fig. 1).

Como resultado das forçasgeológicas que actuaram no passa-do, a topografia da Europa apresen-ta grande variação dentro de umaárea relativamente pequena, sendoa actual urografia europeia resul-tante de três períodos diferentes deformação geológica.

Maioritariamente a Europa apre-senta baixa altitude, apesar daexistência de cadeias montanhosasimportantes, localizadas nas zonascentral e sul:

•Os Pirinéus representam a fron-teira natural entre a França e aEspanha• Os Alpes estendem-se por 4países, França, Itália, Suiça eÁustria.• Os Cárpatos, um grande sis-tema montanhoso na Europacentral e Sul, estende-se daPolónia até á Eslováquia.• O Cáucaso, conjuntamentecomo os Montes Urais, separa aEuropa da Ásia.• Mais a Norte, os AlpesEscandinavos formam uma com-prida cordilheira que atravessa aPenínsula Escandinava, separan-do a Noruega da Suécia.A Ocidente, a Península Ibérica

apresenta formações montanhosasrecentes, como a Serra Nevada e aSerra Morena, sendo esta menoselevada, mais antiga e erodida.

No Sul, nas penínsulas Italiana eBalcânica, existem zonas montan-hosas, resultantes da mais recentefase de formação de montanhasAlpinas (dobramento alpino). Tantoa Itália como a Grécia apresentamcordilheiras montanhosas denomi-nadas respectivamente por

Apeninos e Balcãs.Entre estas cadeias montanhosas

existem planícies importantes,sendo as de maiores dimensões: aplanície do Pó, situada entre osAlpes e os Apeninos; a grande planí-cie Panoniana na Hungria, aSudoeste dos Cárpatos; e a planícieda Galiza, a nordeste dos Cárpatos.No sul, a dispersão do terreno pro-porciona apenas a existência deplanícies e planaltos de pequenadimensão.A Europa é caracterizada por umagrande variedade de paisagens nat-urais, encontrando-se montanhas deelevada altitude, grandes vales, ter-ras semi-áridas e áreas cobertas porglaciares, estas últimas numa exten-são de 10.180.000 km2.Relativamente à paisagem, podem-se identificar 4 regiões principais:

• Região de baixa altitude, situa-da no Norte Europeu (TerrasBaixas)• Região de elevada altitude,localizada a Ocidente (TerrasAltas)• Região de elevada altitude,localizadas na Europa Central(Terras Altas)• Região Alpina

Fig. 1. Relief map of Europe.

Page 23: Ecossistemas de água doce da Europa

22 Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa

1.4 Clima

A Europa pertence, em grandeparte, à zona temperada incluindoapenas uma pequena mancha nazona polar (situada entre as lati-tudes 30o e 70o Norte). Por estarazão, o seu clima é principalmentetemperado embora com algumasvariações. Por exemplo, na costaOeste de França as geadas noctur-nas são raras; todavia, à mesmalatitude, 800km para Leste, no valedo Reno, longe do mar, as geadasnocturnas são comuns. Fica destemodo evidente que o principal reg-ulador do clima Europeu é o OceanoAtlântico juntamente com osrestantes mares quentes, como oMar Mediterrâneo. Quanto maisafastada uma região está dooceano, mais frio é o Inverno emais quente é o Verão.

Os padrões Europeus de precip-itação também variam. A queda dechuva é mais comum próximo doAtlântico reduzindo para Leste. Nascostas Oeste da Irlanda e daNoruega, a chuva anual atinge 1mem 200 dias, enquanto nos

arredores de Moscovo é ligeira-mente superior a 40cm em 90-100dias. A Europa também apresentagrandes variações de precipitaçãorelativamente às estações do ano.Nas zonas com clima Mediterrânico,a chuva ocorre principalmente noInverno e no Outono; na EuropaCentral e Ocidental, com influênciaAtlântica, chove durante o Outono ea Primavera e na Europa Oriental,com clima Continental, a pluviosi-dade é maior durante o período deVerão.

A Europa divide-se em 5 zonasgeográficas que partilham carac-terísticas climáticas comuns (princi-pais zonas climáticas):a) O Mediterrâneo, ou seja, o Sulda Península Balcânica Ocidental, aItália, o Sul de França, Sudeste deEspanha e Sul de Portugal, apre-senta clima tipicamenteMediterrânico onde o Inverno émoderado e húmido com temperat-uras a rondar os 5o C e o Verão équente e seco, com uma temper-atura média de 25o C.

b) A Europa Ocidental, for-mada pelas costas Norte daPenínsula Ibérica, a maior parte doNorte da Europa Ocidental e asilhas Britânicas, juntamente com ascostas Norte e Ocidental daNoruega, é caracterizada pelo climamarítimo. Este clima é fortementeafectado pela influência moderado-ra do Oceano Atlântico, com umInverno muito moderado e umVerão quente.

c) Toda a Europa Central,longe das costas, até á planícierussa e a parte Sul da PenínsulaEscandinava apresenta um clima detransição. Perto da costa, o climapode ser considerado temperadomas à medida que se caminha paraLeste, torna-se continental, comum Inverno severo e um Verãoquente.

Fig.2. As principais regiõespaisagísticas da Europa

Terras Altas OcidentaisTerras baixas doNorte Europeu

Terras Altas CentraisSistema Alpino

Page 24: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa 23

d) A Europa do Norte, forma-da pela planície russa e uma grandeparte da Escandinávia (incluindo osAlpes Escandinavos) apresentaclima continental típico. O Invernoé frio e o Verão é quente e húmido.Geralmente as condições sãoextremas com formação de gelo nosolo durante 3 a 6 meses por ano.Com o degelo, ocorrem cheias quearrastam detritos e lama. O Verão équente e seco e o vento levantanuvens de pó.

e) À medida que se caminhapara Norte; no Nordeste da Europao clima torna-se mais frio. Noentanto, acima da latitude 70o

Norte, no Norte da Finlândia e emparte da Rússia, localiza-se o climapolar. Aqui não existem estações ea temperatura média mensal man-tém-se estável abaixo de 10o C. Aqueda de chuva é escassa. A pais-agem é um “deserto gelado”.

a. Clima Mediterrânicob. Clima Marítimoc. Clima Transitóriod. Clima Continentale. Clima Polar

Com a altitude a temperaturatende a diminuir, atingindo valoresnegativos, por este motivo, todas asmontanhas de elevada altitude apre-sentam uma variante de clima Polar.

O Mediterrâneo é o maior mar interior donosso planeta. É limitado a Sudeste pelaPenínsula Ibérica, a Norte pelo sul deFrança, pelo sul de Itália e pelo sul e centroda Grécia, a Este pela Ásia menor e a Sulpelo Norte de África.O clima Mediterrânico é um regime tran-sição, onde à excepção das montanhas,raramente cai neve, ocorrendo, no entanto,

períodos de geadas. O Inverno é suave ehúmido e o Verão é quente e seco, comdisponibilidade hídrica bastante reduzida.Por este motivo, os ecossistemas mediter-râneos de água doce apresentam flutu-ações intra-anuais dos níveis de água e desalinidade, que reflectem a assimetria dopadrão de variação anual da precipitação.

CAIXA 1: O CLIMA MEDITERRÂNICO

Fig.3 As zonas climáticas da Europa

Clima MediterrânicoClima Marítimo

Clima Transitório Clima PolarClima Continental

Page 25: Ecossistemas de água doce da Europa

Os ecossistemas de água doce resultamda presença de água que pode ter origem noescoamento superficial, ou na afluência prove-niente da água subterrânea. Estes ecossis-temas são diversos, podendo apresentar carac-terísticas lóticas (rios) ou características lênti-cas (lagos).

A água subterrânea representa o maiorrecurso de água doce no ciclo hidrológico(cerca de 95%), maior em volume do que todaa água nos rios, lagos e zonas húmidas juntos.(UNEP-GRID, 2003).

Os ecossistemas de água doce estão irreg-ularmente distribuídos na Europa, como conse-quência do clima (radiação solar, vento, razãoprecipitação/evaporação), da paisagem e dageologia.

2.1 Bacia de drenagem

A bacia de drenagem é uma unidade natu-ral da paisagem que liga o sistema terrestre eos sistemas de água doce. Corresponde a umaárea que escoa água, sedimento e substânciasdissolvidas para um corpo receptor comum quepode ser um rio, um lago ou um estuário. Abacia de drenagem liga as várias componentesbióticas e abióticas dos sistemas, os sistemasaquático e terrestre, as plantas e o solo, aatmosfera e a vegetação, os solos e a água, afauna e a água. A bacia de drenagem inclui tam-bém a água subterrânea que estabelece lig-ações com a água superficial. A forma e dimen-são de um rio ou de um lago dependem do tipoe das dimensões das suas bacias dedrenagem.

2. Ecossistemas de água doce

24 Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa

Fig. 4. Principais bacias de drenagem na Península Ibérica.

Fig. 5 Lago Kastoria na Grécia

Fig. 6 A albufeira do rio Nestos na Grécia.

Page 26: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa 25

2.2 Lagos, Albufeiras echarcas

Os lagos ocupam menos de 2% da superfí-cie europeia. São corpos de água com profun-didade superior a 2 m, em média, que mantêmágua por longos períodos de tempo (ver capítu-lo 3) (Fig. 5). Todavia, alguns corpos de águapouco profundos, em especial no Árctico, sãoconsiderados lagos devido às suas enormesáreas superficiais.

Para além dos lagos naturais, existemalbufeiras ou lagos artificiais formados pelaconstrução de barragens em rios. O objectivodestas construções é o armazenamento de

água para actividades humanas, como pro-dução de energia eléctrica para consumodoméstico e industrial, rega transporte, recreioe regularização (Fig. 6). Na Europa estima-seque o número de albufeiras é de cerca de 3350.

A distribuição dos lagos pelas regiões pais-agísticas da Europa é a seguinte:

Terras baixas do Norte EuropeuEsta região paisagística inclui os 10

maiores lagos naturais da Europa (Quadro 1),incluindo também duas das dez maioresalbufeiras do mundo (Quadro 2).

Quadro 1. Localização e área dos dez maiores lagos naturais da das terras baixas do Norte Europeu

Quadro 2. Albufeiras existentes nas terras baixas do Norte Europeu

Nome País Área (km2)

Ladoga Rússia 17700

Onega Rússia 9610

Vanern Suécia 5585

Greater Saima Finlândia 4377

Peipsi Estónia-Rússia 3550

Vattern Suécia 1912

Ilmen Rússia 1410

Vygosero Rússia 1250

Malaren Suécia 1140

Paijanne Finlândia 1081

Nome País Área superficial (km2)Samara Rússia 6450

Bratsk Rússia 5426

Page 27: Ecossistemas de água doce da Europa

26 Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa

Terras Altas OcidentaisNo Reino Unido, o lago Windermere é o

maior lago natural. Tem 17 km de comprimento,a largura varia entre 400 a 1500 m e a profun-didade é cerca de 65m. Os lagos Lomond(Lough Lomond) com 71 km2 e Ness (LochNess) com 56 km2 são também grandes lagossituados na Escócia, enquanto que o lagoNeagh (Lough Neagh) com 388 km2 localiza-sena Irlanda do Norte.

Na Islândia, o maior lago chama-seThorisvatn e situa-se nas terras altas do sul dailha. A Islândia, tal como as ilhas dos Açores(Portugal), possui lagos vulcânicos.As nove ilhas dos Açores, Portugal, são únicasem todo o mundo uma vez que cada ilha assen-ta em vulcões ou nasceu de uma erupção vul-cânica há milhões de anos atrás. Na Ilha deSão Miguel, os lagos vulcânicos são de umabeleza única.

Terras Altas CentraisO terreno plano desta região é atravessado

por lagos e zonas húmidas principalmente juntoà fronteira entre a Holanda e a Alemanha aolongo da costa frísia. A região de SandyMecklenburg no norte da Alemanha apresentamuitos lagos glaciares, que datam da últimaidade do glaciar.

Europa AlpinaNa longa cadeia montanhosa da Europa

Alpina encontram-se lagos alpinos glaciares.Refira-se, o lago Constance na Suiça, os lagosde Salzburg na Áustria e os lagos Como,Garda, Lugano e Maggiore na Itália.

Uma charca é um pequeno corpo de águasuperficial com menos de 2 m de profundidade.São alimentadas por escorrência superficial oupor afluência subterrânea através de nascentesde pequenas dimensões. As charcas sãoextremamente vulneráveis às mudanças detemperatura; podem gelar no Inverno e secarno Verão.

Na Europa existem charcas de dimensõesconsideráveis tais como as charcas Milicz com77 km2 de área total, localizadas na Polónia eprotegidas pela convenção de Ramsar (vercapítulo 6). Estas charcas são importanteslocais de descanso de aves migratórias.

2.3 Rios

A existência de um rio depende de três fac-tores essenciais: a disponibilidade de águasuperficial; a existência de um canal no solo e;uma superfície inclinada. Neste sentido, otermo “rio” inclui todos os tipos de cursos deágua, desde os riachos mais pequenos até aosgrandes rios como o Amazonas, que corre aolongo de 6400 km de extensão e atinge cercade 3 km de largura em alguns locais. No quadro3 apresentam-se os 20 maiores rios da Europa.A distribuição dos rios ao longo das regiõespaisagísticas da Europa é a seguinte:

Terras Baixas no Norte da Europa e TerrasBaixas e Terras Altas no Centro da Europa.

Os grandes rios encontram-se nas TerrasBaixas no Norte da Europa, onde os maisimportantes à excepção do Danúbio, nascemna Rússia e desaguam no Mar Cáspio ou noMar Negro. O rio Pechora, desagua no Mar deBarents, no Oceano Árctico. O rio Volga, o maislongo da Europa e o rio Pechora correm inteira-mente na Rússia. Os outros flúem tambématravés do Cazaquistão, Bielorússia e Ucrânia.A principal planície do norte Europeu contém assecções mais baixas de outros grandes rios taiscomo o Vístula, o Oder, o Elba, o Reno, o Sena,o Loire, o Garonne e o Ródano. Estes rios antesde afluirem às planícies do Norte da Europa,passaram pelas terras Altas da Europa Central.

Terras Altas Ocidentais• Península Ibérica Ocidental: O rio Douro

nasce na Serra de Urbion, na Espanha central,fluindo para ocidente através de Espanha e donorte de Portugal até ao Oceano Atlântico. O rio

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Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa 27

Tejo é o rio mais longo na Península Ibérica.Nasce na Serra de Albarracin na Espanha cen-tral, desloca-se através de Portugal ondedesagua no Oceano Atlântico perto de Lisboa.O Guadalquivir e o Guadiana, nascem nasmontanhas da Serra Morena desaguando noOceano Atlântico na costa Sul da penínsulaIbérica.

• Reino Unido e República da Irlanda: OSevern é o rio mais comprido do Reino Unido,nasce nas montanhas Cambrian e desagua noOceano Altântico, através do canal de Bristol(Mar da Irlanda).

O rio Tamisa (Fig. 8) no Reino Unido tem346 km de comprimento, nasce em Cotswolds,flúi para leste atravessa a Londres e desagua

Quadro 3. Área e comprimento dos 20 maiores rios da Europa.

Nome Área da Bacia(km2)

Comprimento(km)

Volga 1380000 3690

Danúbio 817000 2860

Ural 231000 2428

Dnieper 503000 2290

Don 425600 1950

Pechora 322000 1809

Kama 522000 1805

Oka >100000 1500

Bélaya >100000 1430

Dniester 72000 1352

Rhine 185000 1320

Elbe 148000 1165

Vistula 194000 1047

Loire 120000 1012

Sava 95719 945

Ródano 98000 810

Guadiana 66800 778

Guadalquivir ? 666

Pó 74000 650

Garonne 57000 525

Page 29: Ecossistemas de água doce da Europa

28 Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa

no Mar do Norte.Os rios Tay na Escócia, Bann na Irlanda doNorte e Towy no País de Gales, são tambémimportantes rios do Reino Unido.

Europa Alpina• Parte oeste da Europa Alpina e a

Península dos Balcãs: Esta região contém osegundo maior rio da Europa, o rio Danúbio.Nasce nos Alpes (Floresta Negra na Alemanha)e corre através de áreas montanhosas duranteum terço do seu comprimento antes de atingir abase das montanhas e as planícies, desaguan-do depois no Mar Negro. O rio Danúbio (Fig. 9)separa os Alpes dos Cárpatos e estes dosBalcãs.

O rio Sava nasce nos Alpes e percorrerquatro países (Eslovénia, Croácia, Bósnia eHerzegovina e Servia) confluindo no rioDanúbio. É o rio mais longo da PenínsulaBalcânica e o segundo maior tributário do rioDanúbio, depois do rio Tisa.O rio Evros em conjunto com os rios Nestos eStrymonas, têm origem nas montanhas daBulgária. Os rios Nestos e Strymonas corrempara sul em direcção à Grécia e desaguam noMar Egeu. O rio Axios (Vardar) nasce nos AlpesDináricos e desagua no Mar Egeu.

• Península Italiana: O Pó é o rio maisimportante desta região. Nasce nos Alpes edesagua no Mar Adriático, depois de passarpela França e pela Suiça. Os rios Arno e Tibresão também grandes rios de Itália, ambos flúemdos Apeninos para o Mar Tirreno.

2.4 Estuários

Um estuário é um corpo de água que resul-ta da mistura da água salgada do mar com aágua doce proveniente do sistema terrestre (vercapítulo 3). São zonas de transição entre os sis-temas terrestre e marinho e entre a água docee salgada. São influenciados pelas marés e pro-tegidos da força das ondas oceânicas, dos ven-tos e de tempestades, por falésias, barreiras,ilhas ou penínsulas.

Os estuários e as águas costeiras encon-tram-se entre os ecossistemas mais produtivosda Terra, sendo por este motivo importantes doponto de vista ecológico, económico, cultural eestético.

2.5 Zonas Húmidas

As zonas húmidas são áreas onde a águacobre o solo, ou está presente junto da superfí-cie, durante todo o ano ou por períodos detempo variáveis. Por esta razão, são zonas detransição, apresentando características do sis-tema terrestre e do sistema aquático. Variamprincipalmente devido a diferenças regionais elocais, tais como estruturas físicas e químicas,clima, topografia, geologia, movimento e quan-tidade de água. As zonas húmidas encontram-se desde as regiões das tundras até aos trópi-cos, em todos os continentes excepto naAntárctica.

Fig 7. Rio Nestos na Grécia.

Fig. 8 Delta do rio Danúbio, cobrindo uma área deaproximadamente 5800 km2

Page 30: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 2- Ecossistemas aquáticos na europa 29

O sul da Europa é caracterizado porapresentar, um Verão seco e quente quasesem chuva, em oposição ao Inverno comtemperaturas moderadas e chuva. Em con-sequência, são raros os ecossistemas deágua doce de grandes dimensões, sendo adistribuição dos ecossistemas de dimen-sões mais reduzidas esparsa. Todavia são

de grande importância, influenciando oclima local e constituindo importantes locaisde descanso para as aves migratórias. Oslagos salgados de Chipre são lagos sazon-ais característicos: como o lago Larnacaque é inundado durante o Inverno, secandono Verão. É usado para a produção de salque é colhido na sua superfície seca.

CAIXA 2: ECOSSISTEMAS DEÁGUA DOCE NO SUL DA EUROPA

1. Blondel J. & Aronson J., "Biology and wildlife of the Mediterranean Region", 1999, OxfordUniversity Press

2. www.nationsonline.org/oneworld/europe3. www.geography.learnontheinternet.co.uk/topics/climatezones.html4. www.wikipedia.org5. www.blueplanetbiomes.org6. http://www.krassanakis.gr/7. http://dictionary.reference.com

Referências

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30 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

LAGOS, RIOS EESTUÁRIOSManuela MoraisDoutor em Biologia, Laboratório da Água, ICAM, Universidade de Évora, Portugal

Paulo PintoDoutor em Biologia, Laboratório da Água, ICAM, Universidade de Évora, Portugal

Cecilia GonçalvesBióloga, Professora do Ensino Secundário, Direcção Regional de Educação do Alentejo, Ministério deEducação, Portugal

CAPÍTULO 3

Escolhemos a distinção entre águasparadas, por exemplo os lagos e águas cor-rentes, por exemplo os rios e ribeiras; nestaabordagem também considerámos os estuáriospor serem zonas de transição entre a terra e omar e entre a água doce e a água salgada.

1.1. Como se formam oslagos?

A geomorfologia e o clima influenciam ascaracterísticas físicas e químicas dos lagos.Enquanto que a maior parte dos lagos são for-mados por eventos catastróficos outrosevoluem de uma forma mais gradual (Fig. 1).

1. Qual a melhor maneira de classificara enorme variabilidade de ecossis-temas de água doce que variam emtamanho, tempo de residência da águaou regime de escorrência?

Fig. 1. Diferentes origens de lagos

Lago caldeira

Lago fluvialMeandros

Represas naturais

Lago artificial Lake

Lago glaciar LakeLago tectónicoectonicoo Lake

Page 32: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 31

1.1.1 Lagos glaciares

A última glaciação foi responsável pelamodelação da paisagem nas regiões temper-adas do norte. O gelo glaciar poliu as superfí-cies rochosas relativamente lisas, causando aformação de um vasto número de pequenoslagos. Estes lagos são particularmente comunsem regiões montanhosas onde os movimentosglaciares removeram o material rochosodesagregado. Quando os glaciares recuaram,as bacias rochosas formadas encheram-se comágua do degelo. Estes lagos glaciares podem-se encontrar em vários locais da Europa (Fig.2).

1.1.2 Lagos tectónicos

As bacias tectónicas são depressões for-madas por movimentos das zonas mais profun-das da crosta terrestre. Entre estes pode-sereferir, no Leste da Sibéria, o Lago Baikal, omais profundo do mundo, que foi formado noinício do período Terciário à aproximadamente65 milhões a 1.8 milhões de anos. O lago Baikale outros lagos tectónicos têm um interesse par-ticular para compreendermos a evolução davida na Terra porque mantêm um grandenúmero de antigas espécies endémicas.

Os movimentos na crosta da Terra causaramum levantamento moderado do leito marinho,isolando várias bacias de grandes lagos. A anti-ga bacia marinha da Europa de Este foi eleva-da e dividida pela formação de uma crista mon-tanhosa que isolou o Mar Cáspio de um lado eo Mar Aral do outro.

1.1.3 Lagos formadospor represas naturais

Estes lagos formam-se em vales de riospor trás de barreiras criadas por deslizamentosde terras e materiais rochosos. Grandes quanti-dades de material rochoso não consolidadodeslizam para o sopé dos vales, represando osrios e criando lagos. É um tipo de lago muitasvezes transitório, existindo apenas durantealgumas semanas ou meses. Muitas cheiascom efeitos catastróficas resultaram da rápidaremoção do material da represa devido à forçado próprio rio.

1.1.4 Lagos vulcânicos

Eventos relacionados com a actividade vul-cânica podem gerar bacias de lagos. As baciasformadas pelo abatimento do telhado de umacâmara magmática parcialmente vazia são

Fig. 2. Um dos três lagos glaciares no topo das montanhas Pindos, Grécia. Estes são os lagos glaciares localizados mais a sul, no hemisfério norte. O seu nomeDrakolimnes - lagos do dragão, foi influenciado por mitos com dragões e deuses que foram surgindo ao longo tempo associados a estes lagos isolados nas montanhas.

Page 33: Ecossistemas de água doce da Europa

32 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

chamadas caldeiras. A Lagoa das Sete Cidadesnos Açores é o exemplo mais espectaculardeste tipo de lago (Fig. 3).

1.1.5 Lagos Cársicos

Os lagos cársicos são comuns em regiõescalcárias do planeta, nomeadamente nasregiões cársicas do Adriático, da PenínsulaBalcânica e dos Alpes, na Europa central. As

bacias cársicas são quase circulares e de formacónica profunda, desenvolvendo-se à medidaque o calcário solúvel é corroído pela chuva.Normalmente, as depressões criadas são sufi-cientemente profundas, estendo-se até aolençol freático e proporcionando a existênciaágua em permanência.

1.1.6 “Oxbow” ou lagosfluviais

Muitos lagos formaram-se ao longo degrandes rios à medida que os sedimentos trans-portados pelo rio principal são depositados naconfluência dos tributários (Fig. 5). Como resul-tado, o tributário inunda o vale formando-se umlago lateral. Este tipo de lagos laterais ocorreespecialmente nas zonas de cabeceira dasbacias de drenagem.

À medida que um rio meanderiza ao longoda sua planície aluvial, a turbulência provoca aerosão no lado côncavo da curva do rio,enquanto que do lado convexo, onde a correntee a turbulência da água são reduzidas, ocorredeposição. Por vezes um meandro curva tantoque se torna quase uma volta completa. Nestecaso o rio cria um novo canal entre o início e ofim da volta, cortando o meandro e formandoum lago fluvial ou um “Oxbow” (Fig.5).

1.1.7 Lagoas ou LagosCosteiros

Os lagos costeiros normalmente resultamda formação de uma zona de deposição desedimentos ao longo da foz de um estuário. Oescoamento do rio e as correntes de maré sãosuficientes para evitar a separação completaentre o lago e o mar. Desta forma, o lago podeconter água doce, salgada ou salobra, depen-dendo das marés.

Fig. 4. O lago Kournas na Ilha de Creta, Grécia

Fig. 3. Um lago vulcânico. Lagoa das Sete Cidades, Açores, Portugal

Page 34: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 33

1.2 Como podemosclassificar os rios?

Os sistemas de águas correntes, rios eribeiras, ocorrem sob uma vasta gama decondições diferentes de vegetação, topografia egeologia. Contudo, todas estas condições estãoligadas pelo efeito da precipitação e da evapo-ração que afecta as suas bacias de drenagem.É útil classificar as águas correntes de acordocom a disponibilidade de água em termos deprevisibilidade e permanência. Neste contexto,os rios podem ser classificados desde os sis-temas menos previsíveis, menos permanentes,efémeros e episódicos até aos sistemas maisprevisíveis, sazonais e permanentes.

1.2.1 Rios efémeros

Só se formam depois da ocorrência de chu-vas imprevisíveis. A água superficial seca pas-sados alguns dias e raramente suportam vidaaquática macroscópica.

1.2.2 Rios episódicos

Estão secos a maior parte do ano com cau-dal superficial raro e irregular que pode persistirdurante meses.

1.2.3 Rios intermitentes

Apresentam alternadamente períodossecos e com caudal superficial, sendo contudomenos frequentes e menos regulares que osrios do tipo sazonal (Fig. 6).

1.2.4 Rios sazonais

Apresentam anualmente períodos secos ecom água corrente, em função da estação doano (Fig. 7). Enchem durante o período húmidoe secam previsivelmente no final da Primaveraprincípio de Verão. A água superficial mantém-

Fig. 5. Formação de um “oxbow” ou lago fluvial

Fig. 6. Rio Kratis em Creta na Grécia. Um rio intermitente

Page 35: Ecossistemas de água doce da Europa

34 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

se durante meses, o tempo suficiente paraalguns organismos macroscópicos com-pletarem as fases aquáticas dos seus ciclos devida.

1.2.5 Rios permanentes

Apresentam água corrente permanenteapesar do nível puder variar (Fig 8). As suascomunidades não toleram a falta de água.

1.3 Como podemosclassificar os estuários?

Os estuários classificam-se em quarto tiposde acordo com a sua origem (Fig 9).

1.3.1 Estuários deplanícies costeiras

Estuários que ocorrem quando a elevaçãodo nível do mar inundou os vales dos rios.

1.3.2 Estuáriostectónicos

Estuários que resultaram da elevação oudo abaixamento de falhas geológicas.1.3.3 Estuários lagunaresEstuários que se formaram em lagoas costeirasou baías pouco profundas protegidas dooceano por bancos de areia ou por barreiras deilhas.

1.3.4 Fiordes

Os fiordes são um tipo muito específico deestuários que resultaram do enchimento devales glaciares, geralmente com secção trans-versal em forma de U. Os fiordes existem emregiões sujeitas a um passado geológico deactividade glaciar, tal como sucedeu no Norteda Europa, Alasca e Canadá.

Poderemos agora perguntar: Será queexistem características ecológicas comunsentre estes ecossistemas de água doce? Quaissão as suas principais diferenças? Quais são osprincipais processos envolvidos?

Fig. 8. Rio Kalamafkianos. Um rio permanente, Creta, Grácia

Fig. 7. Rio sazonal no sul de Portugal, Ribeira da Pardiela – bacia do Guadiana

Page 36: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 35

Fig. 9. Tipos de estuários de acordo com a suaorigem. À esquerda encontra-se a vista superior e àdireita a secção transversal assinalada por letras noesquema da esquerda.

Banco de areia

Estuários de planície costeira costeirascos costeiras

RioBanco deareia

Banco deareia

Banco deareia

Secção transversal

Rio

Secção transversal

Secção transversal

Secção transversal Secção transversal

Sandsplit

Mar

Mar

Vista superior

Vista superior

Vista superior

Vista superior

Fiorde

Fiorde

Fiorde

EscarpaBarreira

BarreiraA B

C D

Estuários Tectónicos

Falhas

Falhas

DeltaDelta

Sandsplit

Page 37: Ecossistemas de água doce da Europa

36 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

a) A comunidade de plâncton é a fracção vivado material que flutua na água e é passiva-mente movido pelo vento ou pela corrente. Écomposto por plantas microscópicas – o fito-plâncton – que são os produtores primários porexcelência em ecossistemas lacustres. A com-ponente animal nutricionalmente dependentedo fitoplâncton é o zooplâncton. O fitoplânctonposiciona-se, assim, na base das cadeias ali-mentares dos sistemas aquáticos. Está por suavez dependente das actividades de outrosmicrorganismos, principalmente bactérias, queconvertem a matéria orgânica nos nutrientesinorgânicos necessários às plantas. Os consti-tuintes do fitoplâncton são algas unicelulares.b) As algas podem também crescer no sedi-

mento de fundo, na zona litoral, e, juntamentecom outras comunidades como os fungos ebactérias, constituindo o perifiton.c) As macrófitas são plantas aquáticas. São

descritas como aquáticas porque as partes daplanta envolvidas na fotossíntese estão subm-ersas ou flutuam à superfície da água perma-nentemente ou pelo menos durante algunsmeses por ano. Na sua maioria, são plantas ter-restres que ao longo do seu processo evolutivose adaptaram ao ambiente aquático. O termo"macrófitas" refere-se a todas as plantas sufi-cientemente grandes para serem visíveis a olhonu, não só plantas com flor mas também fetos,briófitas e algas macroscópicas.

d) Os macroinvertebrados bentónicos vivemno sedimento do fundo dos lagos. Estespequenos animais aquáticos são maiores queuma cabeça de alfinete (cerca de cincomicrons). Tal como as bactérias, estes organis-mos são importantes no processamento edecomposição da matéria orgânica, propor-cionado alimento as outras formas de vidaaquáticas. ~e) Os peixes são vertebrados e os habitantes

mais conhecidos dos sistemas de água doce.Os peixes são os maiores predadores doslagos. A pesca de água doce é importante parauso doméstico e comercializada em todo omundo.

2. Quais são as comunidades aquáticasdos ecossistemas de água doce?

Fig. 10. A complexidade das diferentesescalas de paisagem de uma bacia hidro-gráfica. Esta escala influencia os processosfísicos, químicos e biológicos uma vez queestes estão dependentes na sua posição aolongo da bacia hidrográfica.

BaciaHidrográfica

Ecoregião

Bacia dalinha de água

Troço dalinha de água

Zonas de rápidos ezonas de deposição

Page 38: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 37

A principal fonte de energia nos ecossis-temas aquáticos é a energia solar. Esta podeser armazenada através das relações químicascom origem na fotossíntese. Para entenderestes processos precisamos de saber a quanti-dade de radiação solar que atinge a superfíciede uma massa de água e como é que os organ-ismos a usam e são afectados por ela.

Os processos biológicos podem serdescritos a vários níveis, desde processos queocorrem à escala do indivíduo, por exemplo, omovimento, a reprodução, o crescimento edesenvolvimento, a respiração; passando porprocessos a nível das populações e das comu-nidades, por exemplo, a colonização e as inter-acções tróficas; até aos processos que ocorremnos ecossistemas, por exemplo, os ciclos bio-geoquímicos dos nutrientes. (Fig. 10). Osprocessos que ocorrem num dado nível influen-ciam os outros que de desenvolvem a níveis deorganização superior e inferior. Por exemplo, acolonização pelos microrganismos de umafolha que cai num pequeno lago com água(CPOM – Matéria orgânica particulada grossa),influencia a taxa de decomposição da folha econsequentemente o ciclo do carbono no lago.(Fig. 11).

Os ecossistemas de água doce são dinâmi-cos, reflectindo alterações em muitas compo-nentes. O estado trófico de qualquer sistemaaquático depende da entrada de nutrientesprovenientes da bacia e da vegetação ripícola,sobretudo em forma de ramos e de folhas. (Fig.11, Fig 12 e Fig. 13). Por exemplo, quando umafolha (CPOM - Matéria orgânica particuladagrossa) cai num rio, pode ser transportada atése afundar numa zona de deposição ou ser reti-da por uma rocha ou por um tronco de árvoretombado. No espaço de 1-2 dias, a matériaorgânica dissolvida (DOM) é lixíviada da folhacontribuindo para a formação de matériaorgânica particulada fina (FPOM). Entretanto, afolha forneceu substrato aos microrganismos

Fig. 11. Ciclo do carbono. O diagrama mostra a importância do carbono alóctone proveniente da bacia dedrenagem (árvores e águas subterrâneas).

Fig. 12. O ciclo do azoto, mostrando as principais transferências e os diferentes habitats envolvidos.

Entrada de detritos orgânicos

Água subterrânea e escoa-mento superficial and over

land flow

Escorrência de água subterrâneaprofunda

Assimilação pelosorganismos

Plantasaquáticasssasplants

Decomposição

POC

Fixação atmosférica(NH3, NO3, NO2)

Fertilizantes e efluentes(NH3, NO3, NO2)

Decomposição

Escorrência

FixaçãoDecomposição

Para água subterrânea ground water

NH3 NH3

NH4N2

N2

NO3 NO3

NO2 NO2

NO3NO2

Fixaçãopelas algase bactérias

Assimilaçãodas plantas

Denitrification

3. Será que existem característicasecológicas comuns entre os diferentestipos de ecossistemas de água doce?

Page 39: Ecossistemas de água doce da Europa

38 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

(fungos e bactérias). Estes microrganismos tor-nam a folha mais apetecível aos invertebrados(detrítivoros) ao mesmo tempo que digeremparcialmente o tecido foliar.

A produção primária pode ser limitada emzonas onde as concentrações de azoto e defósforo são reduzidas. Nos locais onde estesnutrientes estão disponíveis, os factores limi-tantes para o desenvolvimento das algas e dasmacrófitas, podem estar relacionados com acompetição pela luz e pelo espaço. A luz podeser limitante para as plantas submersas quesão afectadas pela sombra resultante da densi-dade fitoplanctónica, das plantas flutuantes edos materiais suspensos. As plantas flutuantese emergentes dominam muitas vezes a biomas-sa em lagos pouco profundos.

Nos ecossistemas aquáticos, a competiçãoentre organismos por espaço, luz e alimento écontrolada, ao longo do espaço e do tempo,através das interacções que ocorrem entre osprodutores e os consumidores. Por exemplo, osconsumidores primários, na base da cadeia tró-fica, podem ser o zooplâncton dos lagos e dosestuários e os macroinvertebrados bentónicosdos rios e ribeiras. Os macroinvertebrados ben-tónicos podem ser classificados de acordo comas suas características tróficas, ou seja, assuas preferências alimentares, em fitófagos,colectores, detrítivoros e predadores (Caixa 1).

Fig. 13. O ciclo do fósforo, mostrando as principais transferências e os diferentes habitats envolvidos

Fig. 14. Modelo simplificado da cadeia trófica funcional num rio, mostrando os principais componentes biológi-cos, fontes de energia e transferências de matéria orgânica. A importância relativa das transferências irá diferirde rio para rio e de segmento para segmento em função da sua posição ao longo do curso longitudinal do rio.As setas azuis mais grossas correspondem à contribuição do sistema terrestre. As setas azuis finas correspon-dem ao fluxo directo de energia ao longo da cadeia alimentar. As setas castanhas a ponteado mostram as difer-entes origens da matéria orgânica particulada fina (FPOM).

Atmosfera

SoloPO4 Organismos

PO4 dissolvido esuspenso

Fósforo

PO4 Algal

PO4 dissolvido esuspenso

Sedimentos

EcossistemasTerrestres

MatériaOrgânica

Particulada Grossa

Detrítivoros Detrítivoros

MatériaOrgânica

Particulada Fina

Macrófitas

Fitófagos

Predadores

Luz solar

Page 40: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 39

Nota: Os organismos não estão representados à escala.

Fig. 15. Cadeia alimentar. A luz solar é fixada pelas plantas através da fotossíntese, que por sua vez são con-sumidas vivas ou em formas decompostas por pequenos invertebrados. Estes invertebrados servem de alimen-to aos peixes que podem também ser comidos pelas aves. A energia retida pelos produtores primários flúi aolongo da cadeia alimentar, sendo finalmente exportada para o ecossistema terrestre através dos dejectos dasaves.

CPOM = Matéria orgânica particulada grossaFPOM = Matéria orgânica particulada fina

Grupo trófico Tipo de alimento Modo de alimentação Exemplos

Detrítivoros Depósitos de folhas (CPOM),plantas aquáticas verdes Mastigação Tricopteros, alguns Crustáceos

Colectores filtradores FPOM em suspensão na água Filtração através de sedas especial-izadas, redes ou secreções

Tricopteros, larvas de Dipteros, algumas larvasde Chironomidios

Colectores escavadores FPOM depositada nosedimento

Raspagem e escavação em sedi-mento fino

Muitos Efemeroptros, Plecopteros, Tricopteros,Dipteros, Oligochaeta, alguns Crustáceos

Fitófagos Biofilme algal Raspagem do biofilme algal Alguns Efemeropteros, Tricopteros,Gastropodes, larvas de Coleopteros

Predadores Pequenos animais Mastigação Odonatas, Herudinios, alguns Tricopteros,Dipteros, e Coleopteros

CAIXA 1 GRUPOS TRÓFICOS DOSMACROINVERTEBRADOS BENTÓNICOS

Protozoário

Plantas aquáticasAnfípodo

Peixe

Ave

Page 41: Ecossistemas de água doce da Europa

40 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

4.1 Sistemas de águasparadas

As comunidades de águas paradas emlagos organizam-se de acordo com um eixo ver-tical de penetração da luz solar.

A estratificação térmica, que contribui paraa estrutura funcional de um lago, é o resultadodirecto do aquecimento pelo sol. A estratifi-cação térmica é o fenómeno através do qual oslagos desenvolvem duas camadas de águacom diferentes temperaturas: quente no topo(epilimnion) e fria por baixo (hipolimnion) (Fig.16). Este gradiente vertical representa o factorfísico determinnate, na medida em que afectaos padrões de distribuição, comportamento etaxas de metabolismo dos organismos quehabitam os lagos. Por exemplo, os nutrientes

antes de serem exportados para fora do lagopodem ser reciclados repetidamente entre ascamadas de água, o plâncton e os organismosdo sedimento, à medida que o sistema estratifi-ca e se mistura alternadamente (veja o Capítulo1).

4.2 Sistemas de águascorrentes

As águas correntes, ou rios, são distintasde outros ecossistemas de água doce devidoao seu fluxo unidireccional da corrente, o quesignifica que os troços a jusante são influencia-dos pelos de montante. O transporte de matériaorgânica dissolvida ou particulada ocorre desdea nascente até à foz do rio, mantendo sempreuma estreita ligação com o sistema terrestre cir-

4. Quais são as principais diferençasentre os tipos de ecossistemas aquáti-cos de água doce e quais os principaisprocessos envolvidos?

Fig. 16. Perfil vertical da temperatura, mostrando a estratificação e as zonas do epilimnion e do hipolimnion.

Estratificação de um lago

Epilimnion“Água quente” Epilimnion

Termoclino

Hipolimnion

Temperatura (ºC)

DepthTermoclino

“Mudança rápida detemperatura”

Hipolimnion“Água fria”

Page 42: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 41

cundante. Nos troços iniciais de cabeceira deum rio, esta ligação ocorre maioritariamente nosentido do sistema terrestre para o sistemaaquático; passando a dar-se nos dois sentidos,entre o sistema aquático e as planícies aluviais,nos troços com maior largura, situados mais ajusante, normalmente nas zonas médias oufinais de um rio junto à foz. Nos rios, o ciclo denutrientes é controlado pelo movimento longitu-dinal da água, produzindo-se a espiral de nutri-entes. (Fig. 17).

Quando os ecologistas pensarm nos rioscomo fontes de energia, ou como sistemas fun-cionais com capacidade para processar amatéria orgânica, começaram a desenvolver-semodelos que descrevem o padrão longitudinaldesses processos.

O modelo mais conhecido designado porContínuo Lótico (River Continuum Concept)representa uma tentativa para descrever aestrutura funcional dos rios desde a suanascente até à foz. O RCC descreve umasequência longitudinal de processos à medidaque o rio alarga, dependentes das várias fontesde alimento e organismos. Em rios de cabe-ceira, os detrítivoros reduzem a matéria orgâni-ca, tornando-a disponível para os colectores,mais abundantes a jusante, em troços mais lar-gos onde crescem algas e musgo; nestestroços as proporções de detrítivoros diminueme as de fitófagos aumentam. Descendo aindamais ao longo do rio, o sedimento inorgânicofino contribui para o aumento da turbidez, limi-tando a penetração de luz e consequente a pro-dução primária. Nestas situações, os colectoressão dominantes, estando os detrítivoros prati-camente ausentes. Ao longo do continuum, aproporção de predadores permanece relativa-mente constante uma vez que estes não estãodependentes nem da disponibilidade de luznem do processamento da matéria orgânica,dependendo unicamente da existência de out-ros organismos (Fig. 18).

Fig. 17. Espiral de nutrientes em sistemas de águacorrente. As espirais mais próximas indicam uma ele-vada retenção, como acontece em condições olig-otróficas ou em rios de cabeceira de substrato gros-seiro. Espirais mais afastadas com diâmetros maisamplos representam baixa retenção; são característi-cas de sistemas eutróficos com excesso de nutri-entes.

Fig.18. Relação entre a dimensão dos segmentos do rio (ordem), as fontes de energia e o funcionamento doecossistema, segundo o modelo do Contínuo Lótico (Vannote et al., 1980)

Eficiênciadociclo/espiral

Distância entre ciclos

Sentido dacorrente

CPOMDetrítivoros

Detrítivoros

Fitófagos

Fitófagos

Predadores

Predadores

Predadores

Microrganismos Colectores

Colectores

Colectores

FPOM

Ordemdorio

P/R<1

P/R<1

P/R<1

Microrganismos

Microrganismos

Page 43: Ecossistemas de água doce da Europa

42 Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários

4.3 Os estuários

A mistura de água nos estuários é com-plexa e é afectada pela geologia, topografia ecaudal da água doce afluente. A água do riotransporta sais e partículas dissolvidas. Estacarga juntamente com a mistura física conduz atransformações biológicas importantes. Porexemplo, os deltas ocorrem nos estuários ondea carga sedimentar é tão elevada, que as acu-mulações de sedimento na foz do rio se esten-dem em direcção ao mar. As costas dos com-plexos canais que se formam nos deltasfornecem habitats protegidos e pouco profun-dos, que, invariavelmente, suportam umadensa vegetação de plantas vasculares. Osestuários e as águas costeiras apresentam mis-tura de água doce e salgada, o que criacondições físicas óptimas para o desenvolvi-mento de diversos organismos. Por outro lado,a constante mudança entre a água doce e aágua salgada desenvolve gradientes osmóticosque afectam os organismos.

A circulação da água junto à margem écomplexa e resulta de uma combinação de fac-tores: diferenças de densidade entre a águadoce e a água salgada; diferenças de temper-atura da água; correntes de maré; ventos eforças gravitacionais terrestres. A água maisquente e menos densa tem tendência a ocuparas camadas mais próximas da superfície,enquanto que a água mais fria e mais densa iráocupar os níveis inferiores, originando-se,assim, uma coluna de água estratificada. Noentanto, por acção do vento e das marés, estaestratificação pode ser quebrada, resultando namistura vertical da coluna da água, em queocorre uma troca vertical entre as camadas àsuperfície e as camadas mais profundas (Fig.19).

Fig. 19. Mistura entre água doce e água salgada num estuário, mostrando a estratificação associada à diferençade densidades. A água salgada, por ser mais densa, penetra no interior do estuário junto a fundo. A água doce,menos densa, ocupa as camadas superficiais da coluna da água.

Direcção do fluxo do rio

Água doce

Leito do rio

Maré de água salgada

Page 44: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 3 - Lagos, rios e estuários 43

Page 45: Ecossistemas de água doce da Europa

CAPÍTULO 4

O declínio da diversidade biológica e da qual-idade da água a nível mundial, mostrou que agestão dos ecossistemas aquáticos necessitade um conjunto de ferramentas, suportadas pormetodologias eficazes, que permitiam controlar

a poluição que aflui aos ecossistemas aquáti-cos provenientes da bacia de drenagem.Consciente desse problema, o Concelho da

Europa acordou e publicou em 22 de Dezembrode 2000, uma regulamentação para a acção

1 Porque temos de proteger os ecos-sistemas aquáticos?

44

AVALIAÇÃO OESTADO ECOLÓGICODAS ÁGUAS DOCESBarbara BisDoutorada em Biologia, Departamento de Limnologia e Ecologia de Invertebrados. Instituto de Ecologia e Protecção Ambiental,Universidade de Łódž, Polónia

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Fig. 1. Identificação dos países da União Europeia onde a Directiva Quando da Água está a ser aplicada (azul).No canto superior esquerdo pode-se observar o logótipo da UE-DQA)

Page 46: Ecossistemas de água doce da Europa

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dos estados membros no domínio da politica daágua. Essa regulamentação denomina-seDirectiva Quadro da Água, 2000/60/EC (DQA).A implementação da DQA a uma escala Pan-europeia representa um enorme desafio aosestados membros (Fig. 1). O principal objectivoda DQA é estabelecer uma estrutura base paraa protecção dos diferentes tipos de águas:águas superficiais, águas de transição, águascosteiras e águas subterrâneas. Em segundolugar, as recentes discuções cientificas sobresustentabilidade e gestão da água conduzirama mudanças consideraveis dos objectivos políti-cos destinados a proteger e fomentar a diversi-dade biológica e a integridade ecológica deecossistemas aquáticos na Europa (Fig. 2).

Neste sentido, os principais objectivos daDirectiva Quadro da Água são:

• Prevenir qualquer deterioração do estadoecológico dos corpos de água;

• Manter o estado ecológico excelente(condições de referência) de todos os cor-pos de água sempre que este já exista;• Atingir pelo menos o bom estado ecológi-co relativamente a todos os corpos de águaEuropeus até 2015.• Melhorar a protecção dos ecossistemasaquáticos, terrestres e zonas húmidas,directamente dependentes dos ecossis-temas aquáticos;• Promover protecção a longo prazo dosrecursos de água disponíveis baseando-seno uso sustentável da água;• Estabelecer um registo de áreas protegi-das, designadas pela protecção de habitatse/ou espécies;• Providenciar a protecção e a reabilitaçãodos ecossistemas aquáticos, reduzindo asemissões e perdas de substâncias prior-itárias (de risco);• Fornecer a água de boa qualidade paraum uso sustentável, equilibrado, e equitati-vo da água.

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Fig. 2. Biodiversidade de ecossistemas aquáticos.

Page 47: Ecossistemas de água doce da Europa

A DQA estabelece três categorias de águasuperficiais:� Ecossistemas naturais que incluem:�rios�lagos�águas de transição�águas costeiras

� Ecossistemas superficiais fortemente mod-ificados (com fortes alterações decorrentesda actividade humana);

� Ecossistemas artificiais.

De acordo com a DQA, os ecossistemasnaturais terão de atingir o bom estado ecológi-co, enquanto que os ecossistemas fortementemodificados e artificiais terão de atingir o bompotencial ecológico, compatível com os usoshumanos a que se encontram sujeitos.

3. Como devem ser geridos os corposde água superficiais de acordo comDirectiva Quadro da Água?

Os corpos de água na perspectiva da DQAincluem as águas interiores (águas superficiaise subterrâneas), as águas de transição e aságuas costeiras. A gestão integrada destes cor-pos de água passa a ser atribuída a unidadesde gestão – as Administrações de RegiãoHidrográfica (WFD CIS 2, 2003; WFD CIS 10,2003) (Fig. 2).

Estas administrações são independentesdas fronteiras administrativas. No casos de riosinternacionais, que partilham mais do que umpaís, a gestão terá que ser repartida.

2. Como devem ser geridos os corposde água de acordo com a DirectivaQuadro da Água?

46

Fig. 3. Ecossistemas superficiais de água

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 48: Ecossistemas de água doce da Europa

47

Fig. 4 Ecoregiões europeias definidas com base na fauna que habita os ecossistemas de águas interiores superficiais (os dados foram publicados como mapa no AnnexXI, Water Framework Directive, in Official Journal of the European Communities).

Ecoregiões para rios e lagos

1. Região Ibérico-Macaronésica2. Pirinéus3. Itália, Córsega e Malta4. Alpes5. Balcãs Ocidentais Dináricos6. Balcãs Ocidentais Helénicos7. Balcãs Orientais8. Terras Altas Ocidentais9. Terras Altas Centrais10. Cárpatos11. Planície Húngara12. Região Pôntica13. Planícies Ocidentais14. Planícies Centrais15. Região Báltica16. Planícies Orientais17. Irlanda e Irlanda do Norte18. Grã-Bretanha19. Islândia20. Terras Altas Boreais21. Tundra22. Placa Fino-Escandinava23. Taiga24. Cáucaso25. Depressão Cáspica

A DQA estipula que as bacias hidrográficassão a unidade básica de gestão, encontrando-se estas agrupadas em Ecoregiões (Fig. 4),delimitadas por barreiras biogeográficas quedificultam a passagem da fauna aquática.

Dentro das ecoregiões os estados membrosdeverão utilizar parâmetros abióticos obri-gatórios para definir e caracterizar os tipos, osquais correspondem a grupos de corpos deágua (rios ou lagos) em que a variabilidadeinterna é inferior às diferenças registadas relati-vamente a outros tipos.

4. Como se devem caracterizar osecossistemas aquáticos de acordo coma Directiva Quadro da Água?

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 49: Ecossistemas de água doce da Europa

A identificação das condições de referênciadentro de cada tipo é essencial uma vez que oestado ecológico de um determinado localpassa ser medido pelo seu afastamento relati-vamente à situação de referência. Sãodefinidas como as melhores condições de umtipo de rio (rios de planície ou rios de montan-ha) com um grau mínimo de alteração antrópi-ca.

48

5. Qual a importância das condiçõesde referência para a avaliação daqualidade ecológica?

Condições de Referência (CR) – nãocorrespondem a situações pristinas, comtotal ausência de perturbações antrópicasuma vez que essas situações quase nãoexistem. É possível a existência depressões humanas mínimas desde que osseus reflexos sobre os ecossistemas aquáti-cos e as comunidads sejam praticamentenulos� CR corresponde ao estado ecológicoexcelente, sem ou apenas com sinais deperturbações mínimas para cada um doselementos biológicos, físico-químicos ehidromorfológicos);� CR serão estabelecidas para cada tipode corpo de água, para cada elemento de

qualidade e devem ser revistas de 5 em 5anos;� A DQA estabelece duas formas difer-entes para a selecção das condições dereferência:� com base em avaliações efectuadas emverdadeiros locais de referência, quando épossível encontrar um número razoável derios e/ou troços com impactes antrópicosmínimos;� com base em extrapolações efectuadaspara os melhores locais, quando a frequên-cia de rios e/ou troços com impactesantrópicos mínimos é bastante reduzida oumesmo ausente.

CAIXA. 1. CONDIÇÕES DE REFERÊNCIADE ACORDO COM A DQA

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 50: Ecossistemas de água doce da Europa

A DQA define o estado ecológico das águassuperficiais como "... uma expressão da estrutu-ra e funcionamento dos ecossistemas aquáticosassociados a cada tipo de água."

Consequentemente, o estado ecológico deum determinado local, deve avaliar em que medi-da a estrutura biológica e o funcionamento doecossistema se afasta das situações de referên-cia quando esse local se encontra sujeito apressões antrópicas, tais como carga de nutri-entes, acidificação, substâncias tóxicas eperigosas e alterações físicas do habitat.A aplicação da DQA corresponde a uma novaabordagem da política europeia da água queanteriormente se baseava apenas na presençade poluição. Agora o mais importante é o bomestado do ecossistema na sua globalidade,incluindo água, organismos e morfologia

ADQA corresponde a uma nova abordagemda política da água. Anteriormente esta era uni-camente baseada na avaliação de valores deemissões de poluentes, estando agora essen-cialmente focada no controlo estrito daspressões antrópicas comportáveis pelo ecossis-tema receptor. Esta abordagem conceptual écompatível com outras legislações no âmbito daconservação ambiental da UE, tal como a“Directiva das Aves” (79/409/EEC) e a “Directivade Habitats” (92/43/EEC).

De acordo com a DQA, existem três tiposdiferentes de elementos básicos de qualidadepara avaliação do estado ecológico (Fig. 6):

1. Elementos de qualidade biológica;2. Elementos físico-químicos de suporte;3. Elementos hidromorfológicos de suporte

(condições do canal do rio e do seu vale).Os elementos biológicos assumem um papelpreponderante na avaliação do estado ecológi-

co. As condições hidromorfológicos e ascondições físico-químicas são consideradascomo elementos de suporte que condicionam edeterminam as comunidades biológicas.

49

6. De acordo com a Directiva Quadroda Água, como se deve ser avaliado oestado ecológico das águassuperficiais?

Fig. 5. Um exemplo de condições de referência paradiferentes tipos de rios: pequenos rios de montanha àdireita e pequenos rios de planície à esquerda.

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 51: Ecossistemas de água doce da Europa

50

� O estado ecológico necessita de serdeterminado utilizando elementos de quali-dade biológica (fitobentos/fitoplâncton;macrófitas; macroinvertebrados; peixes)� A avaliação biológica é a base para aclassificação do ecossistema aquático;

� O resultado da classificação ecológicapode obrigar à implementação de medidasde gestão para que os objectivos da DQAsejam alcançados, nomeadamente paraatingir o estado de bom

CAIXA 2. AS CONSEQUÊNCIASDA DQA NA GESTÃO DA ÁGUA

E DOS ECOSSISTEMAS

Elementos deQualidade Biológica

Fitoplâncton (apenas em riosde maior dimensão e lagos)FitobentosMacrófitosMacroinvertebradosBentónicosFauna Piscícola

Elementos deQualidade Físico-Química

Condições de oxigenaçãoConcentração de nutrientesSalinidadeCondições TérmicasAcidificaçãopHSubstâncias perigosas

Elementos deQualidade Hidromorfológica

Condições MorfológicasRegime HidrológicoConectividade ribeirinha

Fig. 6. Parâmetros de avaliação do estado ecológico: (1) elementos de qualidade biológica (algas, fitoplâncton,macrófitas, macroinvertebrados, peixes); (2) avaliação hidromorfológica do canal do rio e do seu vale; (3)parâmetros físicos – com limites de qualidade para as substâncias perigosas.

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 52: Ecossistemas de água doce da Europa

A DQA define a existência de cinco classesde qualidade para a avaliação do estadoecológico, competindo aos estados membrosda EU, a definição das respectivas fronteirasentre elas (Fig. 7), para os diferentes tipos deecossistemas e para todos os elementos dequalidade biológica (WFD CIS 10, 2003;UKTAG, 2005; Urkiaga et al., 2006).

A DQA define as diferentes classes dequalidade da água da seguinte forma:�Estado Excelente: reflecte condições comausência ou com ligeira perturbaçãoantrópica; não provocando alterações signi-ficativas das comunidades relativamente àscondições de referência;

�Estado Bom: Baixo nível de perturbaçõesantrópicas; com um ligeiro desvio dascomunidades relativamente às condiçõesde referência;

�Estado Razoável: Moderado nível de per-turbações antrópicas; com alterações signi-ficativas relativamente às situações dereferência.

�Estado Mediocre: Elevadas alterações dascomunidades relativamente às situaçõesde referência.

�Estado Mau: Graves alterações das comu-nidades relativamente às situações dereferência; com ausência substancial decomponentes das comunidades associadasas condições não perturbadas.A fronteira entre os estados Bom eModerado é particularmente importante

para os objectivos ambientais da DQA, uma vezque é objectivo da DQA que, num futuro próxi-mo, todas as águas da UE atinjam pelo menoso Bom estado ecológico. Desta forma, todos oscorpos de água com classificação inferior dev-erão ser sujeitos a programas de reabilitação(Fig.7).

Os objectivos ambientais são em si o con-ceito mais inovador da DQA. No passado amonitorização baseava-se unicamente emparâmetros físico-químicos, estabelecendo-seas fronteiras entre classes unicamente combase nos diferentes usos potenciais da água.

51

Fig. 7. Diagrama das cinco classes de qualidade definidas pela DQA com base na avaliação do estado ecológi-co (elementos biológicos, hidroquímicos e hidromorfológicos de qualidade), indicando as classes que obrigam amedidas de reabilitação.

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

7. Como se estabelecem as fron-teiras entre classes de qualidadeavaliação do estado ecológico.

Excelente

Bom

Razoável

Medíocre

Mau

Próximo de uma situação seperturbação perturbação

Pequenas alteraçõesOk

Alterações moderadasGrandes alteraçõesAlterações Severas

Necessária a reabilitação

Page 53: Ecossistemas de água doce da Europa

De acordo com o novo paradigma subja-cente à DQA, o foco principal da avaliaçãoecológica é a integridade dos ecossistemas.Neste contexto, os elementos de qualidadebiológica, como componente fundamental dosecossistemas, adquirem uma nova importância.São eles as algas unicelulares e os macroinver-tebrados bentónicos, que reflectem sobretudo adegradação à escala do habitat/local; as macró-fitas e os peixes que funcionam a uma escalamaior, dando-nos indicação sobre a integridadede segmentos de rio e da bacia.

A permanência dos organismos aquáticosnos seus habitats naturais permite que acomunidade amostrada num dado momentoreflicta o passado ecológico desse local.Complementarmente, a mobilidade, carac-terística da fauna aquática, como por exemploos peixes, permite que organismos amostra-dos num dado local possam também reflectiras condições ecológicas de áreas mais vastas,como o segmento ou a bacia. Neste sentidopoderemos dizer que as comunidades aquáti-cas são integradoras espaciais e temporaisdas condições ecológicas.

As algas como indicadores biológicos.As algas unicelulares são os principais pro-

dutores primários da maioria dos rios nasregiões temperadas. Por serem organismosunicelulares, têm reduzida complexidade fisi-ológica, sendo portanto bastante sensíveis.Dentro destas, as diatomáceas bentónicas sãoconsideradas essenciais na monitorização daqualidade ecológica devido às suas caracterís-ticas específicas, nomeadamente: estarem pre-sentes em abundância desde a nascente até àfoz do rio; apresentarem uma distribuiçãoubíqua que permite comparações entre diver-

sos habitats apesar de algumas espécies evariedades apresentarem uma distribuiçãorestrita; desenvolverem-se em habitat especí-fico, bem definido e facilmente amostrável.Complementarmente, possuem parede celularsiliciosa, o que evita a deterioração aquandoda remoção dos substratos.

As comunidades de diatomáceas bentóni-cas respondem ao aumento de nutrientes, prin-cipalmente de azoto e de fósforo, na águamediante alteração da sua composição que;razão porque em sistemas eutróficos os sub-stratos se apresentam cobertos de uma pelícu-la verde acastanhada constituída pordiatomáceas. Convém referir contudo, que asdiatomáceas bentónicas são pouco sensíveis apressões hidromorfológicas (ex. alteração doregime hidrológico).

Plantas aquáticas e terrestres como indi-cadores biológicos.

As macrófitas são plantas vascularesaquáticas que necessitam ter as raízes total-mente emersas dentro de água ou em solo bas-tante húmido. Por este motivo podem ocorrerdentro ou nas proximidades da água. A suamaior complexidade fisiológica torna-as menossensíveis dos que as diatomáceas a pertur-bações locais. As macrófitas são bons indi-cadores da concentração de nutrientes e deoutros poluentes, tais como contaminantes tóx-icos, herbicidas e metais. A grande maioria dasmacrófitas encontra-se fixa ao solo, sendo poresse motivo bastante influenciadas pela suaestrutura e composição. Tal facto torna-asdependentes da geologia e da granulometria dosedimento, muitas vezes associada a alter-ações morfológicas.

8. Porque são os elementos de qual-idade biológicos (EQB) a base para aclassificação ecológica?

52 Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Page 54: Ecossistemas de água doce da Europa

Os Macroinvertebrados bentónicos comoindicadores biológicos. Os invertebradosaquáticos, utilizados na avaliação biológica,vivem junto ao fundo no leito dos rios. São tam-bém chamados de macroinvertebrados bentóni-cos, ou bentos (bento = fundo, macro =grandes, invertebrado = animal sem coluna dor-sal). Constituem uma comunidade bastantediversificada, incluindo anelídeos, moluscos eartrópodes. Os macroinverterbrados, para alémde apresentarem uma multiplicidade de níveisde tolerância às pressões humanas, são fáceisde colher, colonizam todos os habitats pre-sentes e não requerem um nível muito especial-izado de identificação para obtenção de resulta-dos. A elevada diversidade taxonómica destacomunidade corresponde a uma multiplicidadede características ecológicas, apresentandomuitas espécies preferências por habitatsespecíficos, geralmente associados a carac-terísticas morfológicas dos ecossistemasaquáticos. Por estes motivos, os macroinverte-brados são bons indicadores das pressõeshumanas que se reflectem, não só nas carac-terísticas físico-químicas da água, como tam-bém na morfologia.

Diferenças nas características tróficas dosmacroinvertebrados são muito importantes paraa avaliação funcional do ecossistema, permitin-do-nos por exemplo perceber se um segmentode rio está dependente da entrada alóctone dematéria orgânica, ou da produção interna dosprodutores primários (ver capítulo 3). Noprimeiro caso a comunidade estaria sobretudoconstituída por detritívoros, colectores epredadores; no segundo caso os fitófagos seri-am dominantes.

Peixes como indicadores biológicosOs peixes são a comunidade aquática com

fisiologia mais complexa e com maior mobili-dade. A conjugação destas duas característicastorna-os na comunidade aquática menos sen-sível às pressões humanas. Não só as alter-ações ambientais demoram mais tempo arepercutir-se na sua filologia, como a sua mobil-idade permite-lhes fugirem para zonas onde asperturbações sejam menos intensas. Por outrolado, como precisam de uma quantidade míni-ma de água para sobreviver, podem não ocor-rer em locais onde naturalmente a quantidadede água é reduzida (caso dos sistemas tem-porários). No entanto, devido à sua mobilidade,são sobretudo indicadores de segmentos derios, dando-nos frequentemente informaçõessobre a integridade da bacia. Por este motivosão particularmente sensíveis a pressõeshumanas que quebram a conectividade longitu-dinal dos rios, como barragens e açudes, queimpedem a passagem de peixes migradores.Complementarmente, a necessidade de muitasespécies requererem habitats específicos parase reproduzirem, torna-as boas indicadoras dealterações morfológicas.

53Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Fig. 8. Função dos macroinvertebrados na cadeia alimentar aquática, mostrando a importância estrutural e fun-cional deste grupo nos sistemas aquáticos (marcada pelas janelas a amarelo).

Page 55: Ecossistemas de água doce da Europa

54 Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

A biodiversidade representa o conjuntode todos os seres vivos, incluindo toda asua diversidade de formas. Todos os organ-ismos dependem de outras formas de vidapara a sua existência. Os organismos queutilizam o oxigénio para respiração depen-dem das plantas para produção de oxigénio.O seu alimento provém de plantas, animaise fungos. Qualquer mudança na densidadede uma espécie afecta outras espécies,bem como o funcionamento do ecossis-tema.

O termo biodiversidade é tambémmuitas vezes usado para descrever a diver-sidade de organismos numa determinada

área. A biodiversidade 'local' é alvo de pre-ocupação quando a actividade humanainterfere nos habitats, provocando adiminuição das populações de uma ou demais espécies que podem mesmo vir a serextintas.

Na Terra, extinguem-se mais de 10.000espécies todos os anos. Apesar da dificul-dade de exactidão deste cálculo, é certoque este número aumentou de forma alar-mante nos últimos anos. A causa principalda extinção de espécies é a destruição dehabitats naturais pelos seres humanos.

A biodiversidade não tem preço.

CAIXA. 3. PORQUÊ MANTER ABIODIVERSIDADE É TÃO IMPORTANTE?

Page 56: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 4 - Avaliação o estado ecológico das águas doces

Directiva Quadro da Água�The EU Water Framework Directive - integrated river basin manage-ment for Europe: http://ec.europa.eu/environment/water/water-frame-work/index_en.html

�Implementation of the EU-WFD:http://ec.europa.eu/environment/water/water-framework/implementa-tion.html

�Common Implementation Strategy for the Water FrameworkDirective:http://www.eeb.org/activities/water/Common%20EU%20Strategy%20for%20WFD%20Implementation.pdf

�WFD page at EMWIS website: http://www.emwis.org/WFD/WFD.htm�Environmental Agency – the WFD:http://www.environmentagency.gov.uk/abou-tus/512398/289428/655695/

�CIRCA Forum Implementing the WFD:http://forum.europa.eu.int/Public/irc/env/wfd/home

�Join Research Centre - Institute for Environment and Sustainabilityhttp://www.jrc.cec.eu.int/default.asp@sidsz=our_organisation&sidst-sz=ies.htm

Protecção e gestão sustentável de agues doces�European Rivers Network: http://www.rivernet.org/�WaterWeb: http://www.waterweb.org/resources.php�Freshwater Life: http://freshwaterlife.info/index.jsp�WWF - Freshwater Work:http://www.panda.org/about_wwf/what_we_do/freshwater/index.cfm

�Euro-Mediterranean Information System on the Know-how in theWater Sector - EMWIS: http://www.emwis.org/

�US Environmental Protection Agency - http://www.epa.gov/�International Year of Freshwater 2003:http://www.wateryear2003.org/en/ev.php-URL_ID=1456&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html;

�European Environmantal Bureau Hanbook: http://www.eeb.org/publi-cation/chapter-4_5.pdf

Protecção de aguas doces, bioindicadores�CEH's School Net - is the educational section of CEH Web, and isintended to be used as a resource by teachers of primary andGCSE-aged school children:http://schools.ceh.ac.uk/

�EEK! Environmental Education for Kids:http://www.dnr.state.wi.us/org/caer/ce/eek/teacher/index.htm

�Educational Materials: http://www.ucar.edu/learn/1_1_2_1t.htm�Stream Biomonitoring Unit - Key to Aquatic Macroinvertebrates:http://www.dec.state.ny.us/website/dow/stream/index.htm

�Digital Key to Aquatic Insects – North Dacota:http://www.xerces.org/CD-ROM%20for%20web/id/index.htm�Freshwater Macroinvertebrates - Oregonhttp://www.nwnature.net/macros/�EPA - Biological Indicators of Watershed Health:http://www.epa.gov/bioindicators/html/invertebrate.html�Stream Biomonitoring�http://www.yni.org/yi/monitoring/stream_biomonitoring.html�ACD Technical Assistance - Stream Monitoring http://www.anokasw-cd.org/tech_assist/monitoring/biomonitoring.htm

�Drinking Water and Groundwater Kids Stuffhttp://www.epa.gov/safewater/kids/kids_9-12.html�NSW Water Bug Survey - Bugasaurus Explorus!:http://www.bugsurvey.nsw.gov.au/�Water Dictionary: http://ga.water.usgs.gov/edu/dictionary.html�http://water.nv.gov/Water%20planning/dict-1/ww-index.htm�Environmental Contaminent Encyclopedia from the National ParkService - http://www1.nature.nps.gov/toxic/intro.html

�WVDEP - Glossary of Environmental Terms from the West VirginiaDivision of Environmental Protection -http://www.dep.state.wv.us/glossary.html

�Geographic Glossary http://geography.about.com/science/geogra-phy/library/misc/blgg.htm

�Dictionary of Water Terms from the Nevada Division of WaterPlanning, Department of Conservation and Natural Resources -http://www.state.nv.us/cnr/ndwp/dict-1/ww-index.htm

�Water Quality Dictionary from EurekAlert Reference Desk -http://www.wqa.org/glossary.cfm

�Aquatic, Wetland and Invasive Plant Glossary from the University ofFlorida - http://aquat1.ifas.ufl.edu/glossary.html

55

RReeffeerrêênncciiaass ddee ssuuppoorrttee::

Page 57: Ecossistemas de água doce da Europa

CAPÍTULO 5

Uma perturbação é um acontecimento queocorre durante um determinado período detempo relativamente curto e causa grandes anível dos organismos, das populações ou doecossistema. Uma perturbação pode resultarde causas naturais (perturbação natural) taiscomo fogos, cheias, secas, erupções vulcâni-cas, furacões, tornados e erosão natural dossolos. Pode também resultar de actividadeshumanas (perturbação antropogénica) o queinclui, por exemplo, desflorestação e drenagemde zonas húmidas, desmatação para cultivo,extracção de água para irrigação, ou introduçãode espécies exóticas.

Uma perturbação pode ocorrer ao longo dediferentes escalas de tempo. As perturbaçõesmais prolongadas envolvem eventos à escalada paisagem, tais como as glaciações, quepodem afectar continentes inteiros. Contudo,algumas perturbações têm um efeito mais localincidindo apenas numa determinada zonahúmida.

Sempre que um ecossistema é afectadopor um evento perturbador, alguns organismose até mesmo populações inteiras podem serseriamente afectadas, podendo mesmo desa-parecerem irreversivelmente. Outros danosecológicos podem ocorrer, tais comodegradação morfológica de um rio, alteraçãodas características hidrológicas ou contami-nação de solos. Sempre que o evento pertur-bador termina, inicia-se um processo que podeeventualmente produzir conduzir a um ecossis-tema similar ao que existia antes da pertur-bação. Por outro lado, a diversidade biológicadepende de perturbações naturais. Muitasvezes, uma grande diversidade de espéciesestá intimamente relacionada com pertur-bações naturais de intensidade intermédia, taiscomo fogos, cheias e tempestades de vento.

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas56

PERTURBAÇÕESNATURAIS EPERTURBAÇÕESANTROPOGÉNICASCatherina VoreadouDoutorada em Biologia, Coordenadora do Laboratório de Educação e hidrobiologia, Museu de História Naturalde Creta, Inversidade de Creta, Grécia

Sofia MousterakiGeóloga, professora da Escola Secundária Andreas Delmouzos 5th Secondary, Creta, Grécia

Nikos KomodromosMestre em Biologia, professor da Escola Secundária Pera Choriou & Nisou, Nicósia, Chipre

Page 58: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas

Secas e as cheias (episódicas ou súbitas)são as perturbações naturais mais comuns nosecossistemas de água doce.

Secas

As secas são causadas por queda de chuvainsuficiente durante um longo período de tempoe devem ser relacionadas com valores médiosdo balanço entre a precipitação e evapotranspi-ração (evaporação + transpiração). Outros fac-tores climáticos, tais como a temperatura, osventos e a baixa humidade relativa, estão muitasvezes relacionados com a seca. Com uma secahá um declínio sequencial na quantidade deágua superficial, na humidade do solo e nosníveis de águas subterrâneas. Em secas sev-eras, troços inteiras de rios podem perder qual-quer vestígio de água superficial, perdendo-seigualmente a conectividade hidrológica, com ostributários (Fig. 1). Os rios fragmentam-se numasérie de pegos permanentes que podem manterágua durante todo o período de seca, ou tem-porários que secam ao fim de algum tempo. Semcaudal superficial ou reduzido os estuáriospodem-se desconectar do mar e formar lagoas.

As secas representam um enorme con-strangimento para os organismos que não con-seguem desenvolver as respectivas estratégiasde adaptação. As comunidades aquáticas têmcapacidade de adaptação a diferentescondições, no entanto, ultrapassado o limite detolerância, a sua sobrevivência pode ser postaem causa. Uma vez que as secas são seguidaspor uma queda nos níveis de água, os habitatsdisponíveis para os organismos aquáticos ficamreduzidos. Elevadas densidades de organismospodem ficar retidos nos pegos onde ascondições adversas, tais como elevadas temper-aturas da água, baixas concentrações deoxigénio e baixa disponibilidade de alimento,podem ser letais.

Cheias imprevisíveis

As cheias provocam alterações severasnas comunidades aquáticas. Uma cheia estásempre relacionada com o aumento significati-vo do caudal afluente a um rio ou a outro ecos-sistema aquático. São rápidas e normalmenteocorrem como resultado de queda intensa dechuva durante um curto período de tempo, algu-mas horas ou menos (enxurradas). São muitosos factores que contribuem para a cheia. Osdois elementos determinantes são a intensi-dade e duração da precipitação, ou seja, aquantidade de chuva que cai num determinadoespaço de tempo; todavia, a topografia, ascondições do solo, nomeadamente a sua per-meabilidade e cobertura vegetal, assumem umpapel relevante nos impactes que uma cheiapode assumir. Em dois rios em Espanha, “LaRambla del Moro”, na bacia hidrográfica do rioSegura e “La Rambla de Matarranya”, na baciahidrográfica do rio Ebro, após uma intensa enx-urrada a população de macroinvertebradossofreu uma redução na ordem dos 98 %, man-tendo-se apenas 32 a 40% da riqueza específi-ca existente antes do evento; resultados queindicam a ocorrência de uma elevada mortali-dade.

As actividades humanas têm agravado asconsequências das cheias imprevisíveis. Aurbanização desenfreada sem estudos deimpacte ambiental, representa um risco comconsequências por vezes demasiado graves.Refira-se, por exemplo, a construção no leitoprincipal dos rios e a impermeabilização desolos. O mau planeamento urbano, associado àconstrução desenfreada a que se tem assistidonos últimos anos, levam à constatação que80% das construções em zonas com propensãopara inundar foram construídas há menos dequarenta anos.

Perturbações naturais

57

Page 59: Ecossistemas de água doce da Europa

A desflorestação efectuada com o objectivode aumentar as terras de cultivo e diminuir aocorrência de fogos, tem conduzido também aoagravamento das consequências de uma cheiaimprevisível. Por outro lado, a mudançasclimáticas a que se tem assistido nos últimosanos, têm intensificado a ocorrência de eventosextremos relacionados com cheias e secas.

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas58

Na região Mediterrânica (Fig. 2)a maioria dos rios são temporários,com interrupção do caudal superfi-cial durante o Verão e ocorrênciasde enxurradas durante o Outono, oInverno e a Primavera. A interrupçãodo caudal superficial sazonal não éconsiderada uma verdadeira pertur-bação, uma vez os organismosbiológicos que habitam nestesecossistemas adaptaram estratégiasde sobrevivência, ao longo dosanos, de forma a evitarem esteevento extremo mas previsíveis notempo. Refira-se nomeadamente aadaptação do ciclo de vida dosinsectos aquáticos. Estes insectosvivem enquanto larvas no sistemaaquático, emergindo como adultospara o sistema terrestre envolventedurante o Verão, em período deinterrupção do caudal superficial.

CAIXA 1

Fig. 2. Interrupção do caudal superficial noVerão e uma cheia sazonal no mesmo local deum rio mediterrânico.

Page 60: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas

As águas doces contêm elementos quími-cos dissolvidos provenientes dos solos e rochassobre os quais escorrem. Os elementosinorgânicos principais incluem o cálcio, o mag-nésio, o sódio, o potássio, o carbono, o cloro, oenxofre, o azoto, a sílica e o fósforo. Os ele-mentos orgânicos resultantes da decomposiçãodos materiais biológicos estão também pre-sentes, nalguns casos com concentraçõesmuito elevadas. O resultado de actividadeshumanas pode aumentar as concentrações decompostos químicos específicos acima deníveis naturais, causando, nestas situações,problemas de poluição da água; nestes casosesses compostos químicos são chamados depoluentes. Os poluentes podem afectar ascomunidades através do contacto com os sedi-mentos contaminados, ou directamente a partirda água.

A poluição da água abrange uma grandevariedade de efeitos adversos sobre os lagos,os rios, as águas subterrâneas e os oceanos,apresentando diferentes causas e característi-cas. A agricultura moderna depende de fertil-izantes químicos, pesticidas e irrigação intensa.Para maximizar o rendimento da produção agrí-cola, fertilizantes à base de azoto, fósforo eminerais, são espalhados na terra. Para melho-rar a qualidade da produção, herbicidas (paraeliminar as ervas daninhas) e insecticidas (paraeliminar insectos) são frequentemente aplica-dos nas terras de cultivo. Todavia, nem todos osfertilizantes e pesticidas permanecem no localonde são aplicados; alguns são libertos para aatmosfera, outros infiltram-se na terra afectan-do as águas subterrâneas ou são arrastadospara os lagos e rios, causando problemas depoluição da água. Pesticidas, herbicidas einsecticidas, podem causar toxicidade, enquan-to os fertilizantes, que contêm grandes concen-trações de azoto e fósforo, podem conduzir àeutrofização da água, originando o crescimento

Perturbações antropogénicas

59

Fig. 3. Eutrofização num lago, rios. Veja-se a cor verde característica de um elevadodesenvolvimento de algas fitoplanctónicas

Page 61: Ecossistemas de água doce da Europa

excessivo de plantas aquáticas, nomeada-mente de algas unicelulares (Fig. 3). Após odeclínio e morte das plantas em final de Verão,os processos de decomposição utilizam ooxigénio dissolvido na água, reduzindo a quan-tidade disponível para os peixes e outros organ-ismos aquáticos.

A indústria descarrega para os sistemasaquáticos diferentes poluentes através dassuas águas residuais. Incluem-se nestes,metais pesados, toxinas orgânicas, óleos, nutri-entes e sólidos suspensos, que por vezespodem conduzir a níveis de toxicidade na água.A indústria é também maioritariamente respon-sável pela chuva ácida que ocorre quando odióxido de enxofre e os óxidos de azoto sãoemitidos para a atmosfera, onde sofrem trans-formações químicas e são absorvidos pelasgotículas de água nas nuvens. Posteriormente,as gotículas caem então como chuva, neve,neblina, pó seco e granizo. Este facto aumenta

a acidez do solo e da água, afectando o bal-anço químico de lagos e rios. Como conse-quência a vida biológica nos sistemas aquáticospode ser eliminada.

A indústria é também a principal respon-sável pelo aumento do dióxido de carbono eoutros gases na atmosfera o que conduz ao"efeito de estufa" (Fig 4.). Acredita-se que aacumulação destes gases tem alterado o bal-anço de radiação na Terra, resultando numaumento do calor proveniente da radiação dosol que fica preso na atmosfera terrestre, pro-duzindo o aquecimento global. O aumento datemperatura, com a consequente fusão dosgelos polares, provocará uma subida do níveldo mar. Neste panorama, algumas das maiorescidades do mundo situadas na costa ficaramseriamente ameaçadas. À escala do ambiente,uma alteração no nível da água do mar afectaráos ecossistemas costeiros tais como os deltasdos rios e as zonas húmidas costeiras, habitatsnaturais que albergam uma enorme diversidadebiológica.

Outra grande ameaça para os ecossis-temas de água doce relaciona-se com aextracção de água para usos comerciais,domésticos e industriais. A irrigação é o maiorconsumidor de água em todo o mundo. O con-sumo excessivo de água conduz à necessidadede construir barragens, abrir poços e retirarágua de ecossistemas naturais. Paralelamentedeverão ser adoptadas medidas legislativas epreços que inibam o consumo não sustentávelda água. Por outro lado, a consciência públicasobre a necessidade de preservar os ecossis-temas aquáticos, terá obrigatoriamente queconduzir a uma redução no consumo da água.Os programas de conservação e reabilitaçãodos ecossistemas aquáticos desenvolvidos emmuitos países deverão também conduzir a umaconsciência colectiva como forma de preservaro nosso “Planeta Azul”.

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas60

Fig. 4. Emissão global de dióxido de carbono proveniente de actividades humanas

CO2 emissions from liquid fuel consumptionCO2 emissions from solid fuel consumptionCO2 emissions from cement productionCO2 emissions from gas flaring

CO2 emissions from gas fuel consumptionTotal CO2 emissions from fossil fuels

Emissão global de dióxido de carbono proveniente de actividades humanas

Ìillion

metric

tonsofcarbon

Page 62: Ecossistemas de água doce da Europa

Capítulo 5 - Perturbações naturais e perturbações antropogénicas 61

O clima Mediterrâneo caracteriza-sepor ausência de chuva no Verão com umagrande variabilidade anual e inter-anual nasua distribuição. As massas de água super-ficiais são escassas apresentando um vol-ume limitado e um escoamento temporal.Ao longo do tempo tem-se assistido a umadegradação da qualidade da água superfí-cie e subterrânea, intimamente ligadas.Poluentes de origem agrícola (Fig. 5),urbana e industrial, tais como nutrientes,compostos químicos tóxicos, fertilizantes epesticidas alteraram o balanço dos ecossis-temas, resultando no desenvolvimentoexcessivo de algas potencialmente produ-toras de toxinas (as cianobactérias). Poroutro lado, o volume limitado de água docesuperficial reduz a diluição dos poluentes,resultando em efeitos mais pronunciadosnos ecossistemas. Por estas razões, énecessário o desenvolvimento de planos degestão integrados e interligados com asexigências da Directiva Quadro da Água60/2000.

CAIXA 2

Fig. 5. Efluente de um lagar de azeite num riomediterrânico.

Page 63: Ecossistemas de água doce da Europa

CAPÍTULO 6

Os ecossistemas de água doce são detodos, os ecossistemas os mais ameaçados.Os ecossistemas de água doce são ricos emhabitats, desenvolvendo uma elevada biodiver-sidade, nomeadamente de espécies endémi-cas, (Figuras 1 e 2).

Ao longo do tempo, os ecossistemas deágua doce perderam mais biodiversidade doque os ecossistemas terrestre e oceânico,encontrando-se em risco de sofrerem aindapercas maiores e irreversíveis.

Os ecossistemas de água doce são muitovulneráveis porque dependem de um constantereabastecimento de água (chuva e nascentessubterrâneas). Em muitas regiões, tais como oMediterrâneo, a água é um recurso escasso. Adrenagem artificial, a extracção excessiva deágua subterrânea e a construção de barragens,são apenas algumas das ameaças à disponibil-idade hídrica dos ecossistemas de água doce.

Capítulo 6 - Protecção e sustentabilidade dos ecossistemas de água doce62

PROTECÇÃO ESUSTENTABILIDADEDOS ECOSSISTEMASDE ÁGUA DOCEMyroula HadjichristophorouMestre em Biologia. Dpt de Pescas e Investigação Marinha, Ministério da Agricultura, Recursos Naturais e Ambiente, Chipre.

Andreas DemetropoulosMestre em Biologia, Sociedade Cipriota da Vida Selvagem, Chipre.

Fig. 1. Campanula pelviformis, uma espécieendémica de Creta, que cresce junto aosrios, Grécia.

Fig. 2. Pelophylax cretensis, endémica deCreta, Grécia.

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Capítulo 6 - Protecção e sustentabilidade dos ecossistemas de água doce 63

As plantas e animais que habitam aszonas húmidas dependem das alteraçõesdo regime hídrico. Por exemplo, o camarãodas salinas (Artemia salina) necessita deágua com baixa salinidade no início doInverno para assegurar que os ovos enquis-tados ecludam e se reinicie um novo ciclode vida (Fig 3). Se os ovos do camarão dassalinas não eclodirem toda a cadeia alimen-tar é perturbada e, omo consequência, osflamingos, que normalmente se alimentamdesta espécie, passariam a ter menos ali-mento, sendo obrigados a deslocarem-separa outros locais com maior riqueza ali-mentar.

CAIXA 1.CAMARÕES DAS SALINAS E FLAMINGOS

Fig. 3. Ovos enquistados de camarãodas salinas na margem do lago salgadode Larnaka. Os camarões resultantes daeclosão destes ovos servirão de alimentoa flamingos e outras aves

Os fertilizantes escoam através dabacia de drenagem até aos pontos maisbaixos – os rios e os lagos. Os fertilizantesagrícolas podem causar o enriquecimentoem nutrientes, conduzindo a um crescimen-to excessivo de algas (Fig 4), estas, durnatea noite, por respiração, podem esgotar ooxigénio, provocando a morte dos organis-mos com diminuição da biodiversidade.

CAIXA 2.EUTROFIZAÇÃO

Fig. 4. Crescimento excessivo de algasnuma linha de água em Creta, Grécia.

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Capítulo 6 - Protecção e sustentabilidade dos ecossistemas de água doce64

A perca do Nilo é um peixe de águadoce de grandes dimensões; pode cresceraté aos 200 kg e atingir 2m de comprimen-to. Foi introduzido no Lago Victoria em 1954onde contribuiu para a extinção de mais de200 espécies endémicas através dapredação e competição por alimento.

O lagistim vermelho do Louisiana(Procambarus clarkii) é uma outra espécieexótica que tem invadido rios lagos ealbufeiras do Chipre e do Sul da Europa

CAIXA 3.INTRODUÇÃO DE ESPÉCIES EXÓTICAS

Fig. 5. Procambarus clarkia Uma espécieexótica que invadiu muitos ecossistemasaquáticos no Sul da Europa.

A Convenção de Ramsar reconhece aszonas húmidas como ecossistemas extrema-mente importantes para a conservação dabiodiversidade em geral e para o bem-estardas comunidades humanas. A Convenção foiadoptada em 1971 na cidade iraniana deRamsar, entrou em vigor em 1975, e em 1 deMaio de 2003 já tinha mais de 136 paísesaderentes. Mais de 1280 ecossistemas deágua doce foram incluídos na Lista de ZonasHúmidas de Importância Internacional,cobrindo 108.7 milhões de hectares (1.87 mil-hões de km2), uma superior à área superfi-cial conjunta da França, Alemanha e Suiça.

Iniciativa Mediterrâneo húmido “MedWetInitiative” integrado na Convenção deRamsar, é um esforço de colaboração alongo prazo, com vista à conservação e usoracional das zonas húmidas mediterrânicas.No Chipre dois locais foram designados paraconstar na lista internacional de locaisRamsar: o lago salgado de Larnaka (Fig. 6) eo lago salgado de Akrotiri (Limassol). Sãolagos sazonais que albergam grandes popu-lações de flamingos e de outras aves.

CAIXA 4. PROTECÇÃO

Fig. 6. Larnaca Salt Lake was the firstRamsar site in Cyprus.

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Capítulo 6 - Protecção e sustentabilidade dos ecossistemas de água doce

Torna-te um jornalista!Faz a tua própria análise!

O teu ecossistema de água doce está emrisco! O que pode a tua turma fazer?Marca as tuas acções passo a passo!Para teres ideias mais concretas faz a tuaprópria análise jornalística: procura artigos nosjornais e revistas do ano passado; navega naInternet; pergunta aos cientistas da tua zona.

Selecciona as ideias que consideraresmais importantes e tenta transmiti-las na tuaregião. Tenta mesmo fazer as tuas propostas àsautoridades locais (Câmara Municipal, Junta deFreguesia ou outras).

Pensa no quanto podes fazer. E lembra-te!Os adultos escutam cuidadosamente as tuasideias!

O ambiente está em perigo! – coisas que podemos fazer

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CAPÍTULO 7

Há muita informação que nós não sabe-mos sobre a água, nomeadamente sobre asua quantidade e qualidade para consumo.Também há aspectos importantes c consider-ar quando pensamos na forma como a uti-lizamos, quer individual quer colectivamente.

A educação ambiental é, primeiro detudo, estar consciente dos problemas e, emsegundo lugar, é acção para a mudança, porisso, propomos uma metodologia baseadano conflito entre inimigo e guardião da água,personagens que acabamos por interpretarno nosso dia-a-dia, quer sozinhos quer comogrupo, resultantes deste conflito.

Estamos conscientes do facto de nãotermos o poder para resolver todos proble-mas relacionados com a gestão da água.Mas podemos dar um primeiro passo funda-mental para identificar alguns destes proble-mas e sensibilizar a nossa comunidade paraeles. Com objectividade: identificar situaçõesóbvias, fáceis de caracterizar, de quantificare de transmitir.

A nossa proposta é criarmos uma equipade Guardiões que combatam os Inimigos daÁgua.

Os inimigos são caricaturas dos difer-entes problemas, são eles:

• Tó Clismo, para o consumo de águanas nossas casas• Xico Alagado, para o consumo público• General Nitrato, para a contaminaçãodos aquíferos

• Arquitecto Kaos Hurbanisticum, para aescorrência superficial e não recarga dosaquíferos• Dom Eucaliptus Globus, para a mágestão florestal• Engª Bondoza Catrapila, para a mágestão das máquinas• Dr Xorume Suíno, para a contaminaçãodas águas de superfícieAcreditamos que através das

expressões artísticas é possível abordarproblemas sérios sem causar nenhum tipo dedesconforto a qualquer sector da sociedadeenvolvido nesta problemática. Porque os“Guardiões da Água” oferecem os seusserviços a todos de forma a contribuir paraque, juntos, possamos combater o “Inimigo”.

Quanto aos temas, os “Guardiões daÁgua” pretendem promover uma reflexãoque nos leve à origem dos problemas daágua, ou seja, tomar consciência que os“problemas ambientais” são inerentes aonosso modelo de sociedade. Os Guardiõesquerem contribuir para a criação e desen-volvimento de valores, atitudes e comporta-mentos de auto – limitação.

Estas são algumas preocupações dosguardiões da água:

• O grande consumo de água nas esco-las e nas casas• O desperdício de água na rega deespaços verdes públicos

Capítulo 7 – Os Guardiões da Água66

OS GUARDIÕESDA ÁGUAHelena TapadinhasCentro de Formação Dr. Rui Grácio, Direcção Regional de Educação do Algarve, Ministério da Educação, Portugal

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Capítulo 7 – Os Guardiões da Água

• O uso de plantas com grandes necessi-dades de água• O consumo exagerado de produtos queusam para a sua produção grandesquantidades de água• O esforço da nossa sociedade centradona reciclagem em vez de estar centradona redução de consumos

Os Inimigos da ÁguaO fio condutor basea-se no conflito entre

os “Inimigos da Água” (personagens conce-bidos como caricatura de problemas concre-tos da gestão e uso da água) e os“Guardiões da Água” (a serem criados paracada inimigo, capazes de conceber e imple-mentar medidas concretas para combatê-los).

O Algarve foi invadido por um grupode inimigos da água que querem fazê-ladesaparecer completamente da região. Aúnica forma de vencê-los é através depequenos gestos que cada um pode fazerno dia-a-dia, como fechar a torneira enquan-to lava os dentes para combater o Tó Clismoou não deixar que o Xico Alagado molhe oasfalto em vez de regar as plantas nosespaços públicos. Se agirmos todos juntoscomo "guardiões da água" conseguire-mos salvá-la.

Os Inimigos da Águasão:

Tó ClismoBandido implacável que mais água pura

desperdiça através das descargas dos auto-clismos; leva as famílias à ruína pelo paga-mento de facturas com consumos exorbi-tantes. Enquanto as pessoas lavam osdentes abre-lhes as torneiras, enche asbanheiras e acciona as máquinas deroupa e de loiça sem a carga máxima.

Xico AlagadoTerrorista responsável pelos grandes

desperdícios públicos de água: a cobertoda noite abre as regas dos espaços verdespúblicos e toma banho nos charcos. Vira osaspersores para o asfalto, criando ribeiras elagos nas estradas e regula as regas para ashoras de maior calor e para quando chove.Desloca-se no interior das redes municipaisde distribuição de água provocando roturase perdas consideráveis de água tratada paraconsumo. Como se propaga à velocidade daluz, consegue actuar em simultâneo emvários locais.

General NitratoPerigosíssimo mercenário a soldo da

agro-indústria para destruir os lençóisfreáticos e envenenar as populações deFaro, Olhão, Tavira e Loulé. Ataca com espe-cial violência na Campina de Faro e Olhão.

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Figura 1: Tó Clismo, cartoon da autoria de alunos do2º ciclo da escola EB2,3 Poeta Ibne Ammar, Lagoa,2004

Figura 2: Xico Alagado, cartoon da autoria de alunosdo 1º ciclo da escola EB1 de Castro Marim, 2003

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Engenheira Bondoza Catrapila"Ramba" japonêsa que entra à revelia dos

guardas florestais nos leitos das ribeiras; diz-ima importantes galerias ripícolas e destróio maquis mediterrânico das encostas dasnossas serras. Gosta de se referir aos seus tra-balhinhos como: LIMPEZAS.

Arquitecto Kaos HurbanísticumDissidente da ordem dos arquitectos a

soldo da poderosíssima multinacional WildDuks Corporation. Espalha a eito por todo oAlgarve uma interminável camada de betãoe de asfalto. Apelida os seus "raids" deDESENVOLVIMENTO.

Capítulo 7 – Os Guardiões da Água68

Figura 3: General Nitrato, cartoon da autoria dealunos do ensino secundário da escola secundáriaDra Laura Ayres, Quarteira, 2002

Figura 4: Engª Bondoza Catrapila, cartoon da autoriade alunos do ensino secundário da escola secundáriaDra Laura Ayres, Quarteira, 2002

Figura 5: Arquitecto Kaos Hurbanisticum, graffiti daautoria de alunos do 3º ciclo da escola EB2,3 de Vilado Bispo, 2004

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Capítulo 7 – Os Guardiões da Água

A metodologia que se propõe com asseguintes actividades põe em prática umasequência de técnicas de grupo sobre o temada gestão privada de água, ou seja, sobre aágua que gastamos nas nossas casas, e quepode ser aplicada a diferentes tipos específicosde comportamentos.

Algumas destas actividades, pela suanatureza, implicam que de entre os partici-pantes, um assuma o papel de coordenador ouque vários participantes formem um júri.

O assunto para a sessão deve ser aprimeira decisão. Para o presente exemplo,escolhemos o problema acima referido: o con-sumo de água nas nossas casas.

Como ser um Guardião?

Dom Eucaliptus GlobusCriminoso vegetal de origem australiana, de

sangue verde, internacionalmente conhecido pelasua sede insaciável, tem sugado até à exaustãoas melhores nascentes das nossas serras.

Dr Xorume SuínoCélebre terrorista que nas noites de chuva, à

revelia dos proprietários, abre criminosamenteas comportas dos tanques de efluentes dassuiniculturas libertando o seu conteúdo para asribeiras.Tem actuado com muita frequência nazona deMarmelete, Casais e outras localidades daSerra de Monchique.É um especialista em camu-flagem e pensa-se que tem o seu esconderijo nosbosques de medronho desta serra.

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Figura 6: Do Eucaliptus Globus, cartoon da autoria dealunos do ensino secundário da escola secundáriaDra Laura Ayres, Quarteira, 2002 Figura 7: Dr Xorume Suíno, cartoon da autoria de

alunos do ensino secundário da escola secundáriaDra Laura Ayres, Quarteira, 2002

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fase 1: sensibilização

Jogo: poupar água em casaDistribuídos em grupos de cinco, no máxi-

mo, enumerar através de chuva de ideias omaior número possível de comportamentosquotidianos que nas nossas casas nos podemajudar a diminuir o desperdício de água potáv-el, a começar pelo verbo, por exemplo: conser-tar torneiras que pingam ou fechar a torneiraenquanto se ensaboam as mãos. O tempo parao jogo é de cinco minutos.É constituído um júri que recebe por escrito osresultados de cada grupo e analisa os compor-tamentos. Ganha o grupo que tiver o maiornúmero de comportamentos considerados cor-rectos.

Alice no País da ÁguaTodos os participantes estão colocados

em círculo e cada um diz o seu nome utilizandopara isso uma composição semelhante à ”Aliceno País da Água”. Ao dizer a sua composiçãodeverá dar um passo em frente na roda e fazerum gesto, findo o qual dá um passo atrás eretoma o seu lugar na roda. Todos os partici-pantes deverão imitá-lo de seguida.Pode repetir-se o exercício, apenas com osmovimentos coreográficos e com música.

Jogo das cadeirasColocam-se no centro da sala cadeiras em

número inferior à dos participantes. Todos osparticipantes se passeiam em torno dascadeiras utilizando o corpo para andar como sefossem pingas de chuva a bater na terra seca.Quando o coordenador bater palmas significa“sentem-se”. O(s) participante(s) que não con-seguir(am) ter cadeira não volta(m) a jogar, eassim sucessivamente até ficarem duascadeiras e definir-se o vencedor. As sugestõespara o “passeio” entre cadeiras podem ser:- são pingas a caírem rapidamente de umatorneira mal apertada

- estão a tomar duche e sempre que se ens-aboam fecham a torneira- são gotas de água a serem evaporadas aomeio-dia- são gotas de água a viajar através das condu-tas que unem a barragem à torneira do labo-ratório de ciências da escola- são gotas de água a serem borrifadas em altapressão de uma rotura numa conduta de dis-tribuição.

fase 2: criar personagens

Chuva de ideiasCada participante, individualmente, selec-

ciona um dos comportamentos referidos pelogrupo no primeiro exercício e regista-o numafolha, por exemplo, reparar as torneiras quepingam.

Depois anota as primeiras ideias que lhesurgirem sobre uma personagem que sejaobcecada por esse comportamento ou pelo seucontrário, por exemplo, por consertar astorneiras que pingam ou por colocar torneiras apingar, de acordo com a seguinte lista:

nome, alcunha, idade, religião, caracterís-ticas físicas e psíquicas, qual a causa em quese empenha, qual o feito porque é conhecidomundialmente, qual o trauma de infância quedeterminou essa sua “obsessão”, qual o nomedo seu pior inimigo, onde está neste momento ea fazer o quê.

Não há problema se não se conseguirresponder a todos os parâmetros: o importanteda técnica é gerar ideias para construir umapersonagem e o seu inimigo. Umas ideiasgeram outras, todas são boas e quanto maisdivergentes forem, melhor. A personagem cria-da em primeiro lugar, quer seja o “inimigo” ou o“guardião”, o “bom” ou o “mau”, é determinadapelo seu autor, que a apresenta ao grupo. Asegunda personagem pode ser caracterizadaem maior profundidade no decurso da criaçãoda história.

Capítulo 7 – Os Guardiões da Água70

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Capítulo 7 – Os Guardiões da Água

A criação das personagens pode tambémser feita através da analogia: seleccionar umadupla herói / vilão bem conhecida, caracterizá-la de acordo com os parâmetros acima referi-dos e, paralelamente, criar uma nova dupla,com força e coerência, tendo em conta a men-sagem que se quer trabalhar.

Quando todos terminaram, cada partici-pante apresenta a sua personagem.

Como exemplo, imaginemos que o TóClismo é um autoclismo grande e gordo queadora divertir-se a descarregar água, e por issoleva o dia a “descarregar” no seu própriobotão… Tem um imenso orgulho em saber queé o responsável pelos maiores gastos de águapotável em casa! O único capaz de conseguirfazer-lhe frente é o Capitão Litro e Meio quecom o seu corpo de garrafa se atira para dentrodo Tó Clismo para o obrigar a poupar um litro emeio em cada descarga!

Jogos criativos de linguagemPara encontrar nomes criativos para as

personagens:em chuva de ideias anotar palavras que se

relacionem com o local associado à mensagemque se quer transmitir. Por exemplo, se for “con-sertar torneiras que pingam”, fazer chuva deideias com locais onde há torneiras, como acasa de banho. Ex: lavatório, bidé, autoclismo,escova, shampoo, chuveiro, sabão, luz, piaça-ba, toalha, etc.

Depois seleccionar as palavras e associá-las, ex: Sr Piaçaba da Luz; dar-lhes termi-nações diferentes, ex: Dona Torneirina; dividi-las e juntar diferentes porções, ex: Dom ChuchuVeiro.

fase 3 - criar produtosde expressão artísticacom mensagem

Os participantes organizam-se por gruposde acordo com as afinidades temáticas dassuas personagens. Em cada grupo define-se:

1. mensagem clara e concreta2. personagens3. o conflito4. o espaço / tempo5. o argumento6. os meios de expressão

Exemplo:1. mensagem clara e concreta: reduzir odesperdício de água através da colocaçãode uma garrafa de litro e meio dentro doautoclismo2. personagens: Capitão Litro e Meio e TóClismo3. o conflito: Capitão Litro e Meio atira-separa dentro do Tó Clismo, com o seu corpode garrafa, para o obrigar a poupar um litroe meio em cada descarga4. o espaço / tempo: na nossa própria casa5. o argumento: sequência de acções,desde que o Capitão Litro e Meio consegueentrar em casa, chegar à casa de banho econseguir abrir a tampa do Tó Clismo semque ele se aperceba…6. os meios de expressão: teatro radiofóni-co e cartoon

contar um conto em grupoDepois de definidos os parâmetros anteri-

ores cada grupo tem uma narrativa que poderácontar colectivamente.Para isso define que parte do conto cabe acada participante e contam-no em grupo, emcírculo, dispostos aleatoriamente entre todos oselementos presentes na sessão.

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Figura 8 : Capitão Litro e Meio, escola EB2,3 de Vilado Bispo, 2002

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fase 4: proposta deintervenção /apresentação pública erespectiva avaliação

O grupo prevê formas de acção face aocomportamento de cada elemento e à forma dedivulgar e obter resultados.No presente exemplo, os participantes compro-metem-se individualmente a colocar uma gar-rafa dentro do seu autoclismo e a criar um fol-heto e enviá-lo pelo correio para cada casa dasua localidade. No folheto propõe-se a colo-cação da garrafa e o posterior registo donúmero de descargas efectuado durante umasemana. Solicita-se que o folheto, devidamentepreenchido, seja remetido aos participantespara cálculo do volume de água poupado.

fases 5 e 6:apresentação /discussão dostrabalhos/ conclusão

Os trabalhos são apresentados, discutidose seleccionados face a uma estratégia de inter-venção local definida pelo grupo. Por exemplo,é apresentada uma sessão de contos à comu-nidade, onde se apresentam os contos criadose os resultados obtidos a partir das acçõesconcretas de poupança realizadas.

A metodologia descrita ajuda, numprimeiro momento, à tomada de consciência, ouseja, à auto-descoberta dos quadros de refer-ências dos participantes face a uma temáticaambiental concreta.

Num segundo momento segue-se a dis-cussão de que caminhos se pretende seguir epropô-los a nós e aos outros como forma demudança. É essa a mensagem a ser tratadacriativamente e o produto artístico resultanteapresentado na comunidade.

Num terceiro momento trata-se de fazer aavaliação e divulgar os seus resultados.

Ao apresentar um projecto artístico cadaparticipante sente-se pertença de um grupo,com uma identidade, com um lugar, com valor;ao realizar e ao propor uma forma de acção acaminho da sustentabilidade, o grupo passatambém a ser interventor social.

Capítulo 7 – Os Guardiões da Água72

Figura 9: Capitão Litro e Meio atira-se para dentro doTó Clismo, com o seu corpo de garrafa, para o obri-gar a poupar um litro e meio em cada descarga, esco-la EB2,3 de Vila do Bispo, 2002

Conclusão

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