DPOC: Como diagnosticar e tratar?

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Como Diagnosticar e Tratar Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) Chronic obstructive pulmonary disease João Valente Barbas Filho Professor livre-docente de Pneumologia. Professor associado emérito de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Endereço para correspondência: João Valente Barbas Filho Avenida Angélica, 916 Tel.: (11) 3826-1422 E-mail: [email protected] Recebido para publicação em 04/2004 Aceito para publicação em 05/2004 Unitermos: doenças pulmonares, doença pulmonar obstrutiva crônica. Unterms: pulmonary diseases, chronic obstructive pulmonary disease. Numeração de páginas na revista impressa: 337 à 342 Doença pulmonar obstrutiva crônica é a doença caracterizada por limitação ao fluxo aéreo, não completamente reversível ao uso de broncodilatadores e comumente progressiva. O diagnóstico de DPOC deve ser considerado nos pacientes com sintomas de dispnéia aos esforços ou mesmo em repouso, tosse e expectoração evoluindo já algum tempo, com períodos freqüentes de exacerbação. Doença pulmonar obstrutiva crônica é a doença caracterizada por limitação ao fluxo aéreo, não completamente reversível ao uso de broncodilatadores e comumente progressiva. O diagnóstico de DPOC deve ser considerado nos pacientes com sintomas de dispnéia aos esforços ou mesmo em repouso, tosse e expectoração evoluindo já algum tempo, com períodos freqüentes de exacerbação. Muitos pacientes têm idade de 40 a 75 anos e são ou foram tabagistas, sendo nos períodos de exacerbação que procuram auxílio médico(1).

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Diagnóstico, tratamento e principais características clínicas no manejo da doença obstrutiva crônica.

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Como Diagnosticar e Tratar

Doena pulmonar obstrutiva crnica (DPOC)

Chronic obstructive pulmonary disease

Joo Valente Barbas Filho

Professor livre-docente de Pneumologia. Professor associado emrito de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP).

Endereo para correspondncia:Joo Valente Barbas FilhoAvenida Anglica, 916Tel.: (11) 3826-1422E-mail: [email protected]

Recebido para publicao em 04/2004Aceito para publicao em 05/2004

Unitermos: doenas pulmonares, doena pulmonar obstrutiva crnica.

Unterms: pulmonary diseases, chronic obstructive pulmonary disease.

Numerao de pginas na revista impressa:337 342

Doena pulmonar obstrutiva crnica a doena caracterizada por limitao ao fluxo areo, no completamente reversvel ao uso de broncodilatadores e comumente progressiva.

O diagnstico de DPOC deve ser considerado nos pacientes com sintomas de dispnia aos esforos ou mesmo em repouso, tosse e expectorao evoluindo j algum tempo, com perodos freqentes de exacerbao.

Doena pulmonar obstrutiva crnica a doena caracterizada por limitao ao fluxo areo, no completamente reversvel ao uso de broncodilatadores e comumente progressiva.

O diagnstico de DPOC deve ser considerado nos pacientes com sintomas de dispnia aos esforos ou mesmo em repouso, tosse e expectorao evoluindo j algum tempo, com perodos freqentes de exacerbao. Muitos pacientes tm idade de 40 a 75 anos e so ou foram tabagistas, sendo nos perodos de exacerbao que procuram auxlio mdico(1).

VR = volume residual, CRF = capacidade residual funcional, CPT = capacidade pulmonar total,DCO = capacidadee pulmonar de difuso do monxido de carbono.

Exame importante na confirmao do DPOC a espirometria que revela diminuio do volume expiratrio forado do primeiro segundo (VEF1) < 80% do previsto. Diminuio mais acentuada do que da capacidade vital forada (CVF) com uma relao VEF1/CVF < 70%(1). Estes dados podero aumentar aps o uso de broncodilatadores, porm se mantm sempre abaixo dos limites assinalados.

A DPOC apresenta como casos tpicos o enfisema pulmonar crnico que definido anatomopatologicamente como a dilatao dos espaos areos distalmente aos bronquolos terminais, com destruio, porm, sem fibrose dos septos alveolares. No outro extremo, a bronquite crnica obstrutiva, caracterizada por tosse, expectorao muco purulenta e dispnia, evoluindo em surtos de durao de pelo menos trs meses, por dois anos consecutivos. Porm, se o paciente for tabagista estas duas vertentes participaro em propores variveis do quadro clnico-patolgico, da a preferncia por DPOC.

Quando predomina o enfisema, caracteriza-se o que se chama pink-puffer ou tipo A e quando predomina a bronquite crnica obstrutiva o blue-bloater ou tipo B(2).

Em estudo efetuado por ns a sensibilidade do centro respiratrio ao CO2 que separa os portadores de DPOC em pink-puffers e blue-bloaters.

Os pacientes com centro respiratrio mais sensvel ao CO2 no permitem o aparecimento de hipoventilao com hipoxemia e reteno de CO2 mesmo custa de maior esforo ventilatrio (dispnia) so os pink-puffers. Enquanto um centro respiratrio pouco sensvel ao CO2 permite o aparecimento de hipoventilao, reteno de CO2, hipoxemia e elevao da presso arterial pulmonar (cor pulmonale) so os blue-bloaters(3).

interessante definirmos a exacerbao em DPOC como sendo a piora das condies do paciente em estado estvel, alm da variao normal do dia-a-dia, necessitando uma mudana na medicao de rotina. Adicionalmente pode-se estabelecer uma graduao da gravidade das exacerbaes.

A maioria das exacerbaes se referem a sintomas respiratrios, como aumento da dispnia ou aumento da tosse, do volume e da purulncia da expectorao, ou de sintomas sistmicos, como febre, aumento do pulso ou da freqncia cardaca ou alterao do estado mental.

As exarcerbaes so mais comuns nos pacientes com predominncia da bronquite crnica obstrutiva e so devido, na maioria das vezes, a surtos de infeces virais das vias areas superiores, principalmente aos rinovrus(5), acompanhados de acentuao das infeces bacterianas pelos Streptococcus pneumoniae, Streptococcus viridans, Haemophylus influenza etc. Quando no tratadas, as infeces bacterianas podem acentuar-se a curto prazo, provocando novas exacerbaes ou piorando as condies respiratrias do dia-a-dia do paciente.

O tratamento das exacerbaes feito com antibiticos(6) aos quais os germes citados so sensveis, sendo os principais a eritomicina e seus derivados, como a claritromicina e azitromicina, a tetraciclina e seu derivado: doxaciclina; cefalosporinas; ciprofloxacina, levofloxacina, gatifloxacina e moxifloxacina devem ser receitadas nas doses habituais por dez dias, em mdia.

Nas exacerbaes em que predomina a dispnia com ausculta de roncos difusos deve-se tambm prescrever corticide, principalmente a prednisona ou prednisolana, na dose diria de 40 mg por dez dias, em mdia. A dose do corticide deve ser reduzida gradualmente e substituda por corticide inalatrio associado a broncodilatador beta-agonista, ambos de longa durao. Os produtos mais empregados associam o propionato de fluticasona e o salmoterol ou budesonida e formoterol, apresentandos com doses variveis dos dois componentes, para ser usados sob forma de spray ou em p, a serem aspirados, de 12 em 12 horas. Nas exacerbaes deve-se usar bronco-dilatador beta-agonista de curta durao, associado ao brometo de ipatrpio, quantas vezes for necessrio para aliviar a dispnia.

Nos pacientes com hipoxemia (SaO2 < 90%) e sem reteno de CO2 (Pa CO2 < 45 mmHg) deve ser usar oxignio por cateter nasal, com fluxo entre um e dois litros/minuto. No paciente pink-puffer de um modo geral no h reteno de CO2, com uso de oxignio.

Nos pacientes blue-bloaster a hipoxemia mais acentuada e acompanhada de hipercapnia, isto , reteno de gs carbnico (CO2). Nas exacerbaes aparece acidose respiratria que vai agravar-se com o uso de oxignio para corrigir a hipoxemia. O paciente vai ficar obnubilado, confuso e muitas vezes comatoso. Nestes casos esta indicada a ventilao pulmonar no invasiva (VPNI) que feita por mscara bem adaptada ao rosto do paciente, com dois nveis de presso positiva: a inspiratria e a expiratria - o bippap.Nos pacientes pink-puffer em que a hipoxemia pode ser corrigida com oxignio por cateter nasal, est indicada a VPNI, caso esteja fazendo muito esforo para respirar e entrando em fadiga. A VPNI mantida enquanto a medicao proposta melhora as condies respiratrias permitindo sua suspenso.

A VPNI deve ser a primeira interveno em adio ao tratamento mdico usual de insuficincia respiratria, provocada pela exacerbao aguda e grave do DPOC, nas condies assinaladas acima. Deve ser tentado o quanto antes no curso da insuficincia respiratria, prevenindo a acentuao da acidose respiratria, para reduzir a mortalidade, evitar a intubao endotraqueal e diminuir a durao da hospitalizao do paciente(7).

Se o paciente no se adaptar a VPNI ou se esta no conseguir ventilar satisfatoriamente o paciente, est indicada a entubao endotraqueal e a ventilao mecnica. Porm, esta modalidade de ventilao s deve ser feita nos pacientes cuja exacerbao seja presumivelmente reversvel, isto , se os fatores obstrutivos brnquicos forem removveis pelo tratamento. No pink-puffer, em que predomina o enfisema pulmonar crnico em fase terminal, quando se instala a hipoxemia e a hipercapnia o desmame do aparelho muito difcil e muitas vezes impossvel. Nesses casos, a instalao dessa modalidade de tratamento deve ser muito ponderada e discutida com os familiares.

Outras causas do agravamento das condies dos portadores de DPOC podem ser o tromboembolismo pulmonar, pneumonia, pneumotrax, arritmias e insuficincia cardaca. Cada uma dessas complicaes produz sintomas e sinais particulares.

No tromboembolismo pulmonar h agravamento sbito da dispnia, dor torcica e diminuio da presso parcial do gs carbnico (CO2) no sangue. Para sua confirmao a cintilografia pulmonar da ventilao e perfuso de pequeno auxlio, devido as alteraes entre ventilao e perfuso induzidas pelo DPOC que se vo sobrepor e confundir as alteraes provocadas pela embolia pulmonar. O melhor exame a tomografia computadorizada helicoidal como bolo de contraste que mostrar a artria pulmonar ou um de seus ramos obstrudos como falha de enchimento.

No pneumotrax haver dor torcica e piora sbita da dispnia, sem antecedentes de infeco das vias areas. A semiologia pulmonar estar modificada pela presena de hipersonoridade a percusso e ausncia de rudos respiratrios e do fremitotraco-vocal em uma regio do trax. Os raios de trax evidenciaro o aspecto tpico de pneumotrax. Mesmo pequeno, o pneumotrax dever ser drenado, pois aliviar muito a dispnia do paciente.

Na exacerbao, devido pneumonia, a febre ser alta e prolongada. Poder haver escarros hemopticos, dor torcica do tipo pleural e a semiologia pulmonar ir mostrar macics, sopro tubrio e pectorilquia fnica ou afona, geralmente na metade inferior da face posterior do trax. Os raios de trax revelaro opacidade pulmonar e o hemograma, leucocitose e desvio esquerda. As arritmias cardacas sero constatadas ao tomar o pulso ou auscultar o corao e sero confirmadas e esclarecidas pelo eletrocardiograma (ECG). Na insuficincia cardaca haver tarquiacardia e na ausculta do corao poder se ouvir o ritmo de galope.

Curada a exacerbao, os pacientes devero ser mantidos com uma associao de corticides e broncodilatadores beta-agonista de longa durao sob a forma de spray ou p, para aspirar a cada 12 horas. Tambm pode ser usado o brometo de ipratrpio nos intervalos ou seu derivado de longa durao, uma vez ao dia.Vrios trabalhos tm demonstrado que h diminuio do nmero de exacerbaes, melhora na qualidade de vida e aumento da sobrevida nos pacientes assim tratados(8-10). Se a SaO2 ficar abaixo de 90%, em repouso, o paciente dever receber oxignio por cateter nasal, principalmente aps esforos ou durante a noite, quando a ajuda consciente a ventilao cessa, principlamente no pink-puffer. No blue-bloater, devido obesidade, pode haver o aparecimento de perodos de hipopnia e apnia.

Para melhorar a dispnia e a capacidade para executar exerccios nos pacientes com predomnio de enfisema pulmonar, pode-se recorrer a cirurgia redutora de volume pulmonar, com objetivo de remover o parnquima pulmonar hiperdistentido e pouco funcional. Caso o paciente apresente grandes bolhas de enfisema, estas podem ser removidas ou colabadas e suturadas cirurgicamente com grande reduo do volume pulmonar. Esto sendo feitas redues de volume pulmonar atravs da broncoscopia, em que os brnquios dos segmentos mais hiperdistendidos so obstrudos pela insero de vlvulas que permitem a sada de muco e ar e impedem a entrada do ar, com conseqente colapso destes segmentos e reduo do volume pulmonar(11).

Os trabalhos tm demonstrado que os melhores resultados obtidos na cirurgia de reduo de volume pulmonar so de ex-tabagistas, portadores de enfisema dos lobos superiores, com capacidade reduzida na execuo de exerccio, porm no oferecem maior sobrevida em relao ao tratamento clnico medicamentoso(12).

A cirurgia no deve ser realizada nos portadores de enfisema homogneo com VEF1 e DCO2 < 20% do predito e nos portadores com predomnio de enfisema, no nos lobos superiores e boa capacidade de executar exerccios(13).Resta a esperana de transplante de pulmo, porm os resultados no tm sido animadores no enfisema pulmonar.

A fisioterapia respiratria deve acompanhar o tratamento medicamentoso durante as exacerbaes, os perodos de estabilidade, no preparo e ps-operatrio das cirurgias de reduo do volume pulmonar e nos transplantes de pulmo.

Bibliografia

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