Dislexia e Disgrafia

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Rev. Psicopedagogia 2004; 21(65): 127-34 127 127 127 127 127 INTRODUÇÃO Um seminário sobre Desenvolvimento Neurológico e Aprendizagem, no Programa de Mestrado de Educação na Universidade do Vale do Itajaí, despertou-nos o interesse em apro- fundar estudos relacionados aos distúrbios adqui- ridos na linguagem oral e escrita, mais especi- DISLEXIA ISLEXIA ISLEXIA ISLEXIA ISLEXIA E DIS DIS DIS DIS DISGR GR GR GR GRAFIA AFIA AFIA AFIA AFIA: DIFICULD DIFICULD DIFICULD DIFICULD DIFICULDADES ADES ADES ADES ADES NA NA NA NA NA LINGU LINGU LINGU LINGU LINGUAGEM GEM GEM GEM GEM Elisabeth Caldeira; Dulce Maria Lázzaris de Oliveira Cumiotto Elisabeth Caldeira – Doutora em Educação Desenvolvimento Humano e Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Docente e Pesquisadora do Programa de Mestrado Acadêmico em Educação da Universidade do Vale do Itajaí/SC. Dulce Maria Lázzaris de Oliveira Cumiotto Especialista em Psicopedagogia e Metodologia de Ensino. Professora da Rede Estadual de Ensino do Estado de Santa Catarina. Pesquisadora no Programa de Mestrado Acadêmico em Educação da Universidade do Vale do Itajaí/SC. ficamente, a dislexia e a disgrafia. Presenciamos, constantemente, em nossa função de educadores, que muitos de nós desconhecem tais diagnósticos, seus sintomas e suas características, atribuindo inclusive adjetivos preconceituosos aos alunos que apresentam dificuldades na aprendizagem devido a tais distúrbios. ARTIGO DE REVISÃO ARTIGO DE REVISÃO ARTIGO DE REVISÃO ARTIGO DE REVISÃO ARTIGO DE REVISÃO RESUMO – A dislexia e a disgrafia têm preocupado educadores, fonoaudiólogos, psicólogos, psicopedagogos e neuropsicólogos, no que se refere à aquisição da linguagem oral e escrita como habilidades sociais e culturais vitais. Neste artigo, tratamos das dislexias e das disgrafias em suas múltiplas diversidades, tais como: de superfície, fonológica ou profunda. Porém, a dislexia pode apresentar-se de modo periférico: negligência, de atenção, letra-por-letra e central. No seminário de Desenvolvimento Neurológico e Aprendizagem, no Programa de Mestrado em Educação na Universidade do Vale do Itajaí, aprofundou-se este tema no sentido de colaborar com os programas de formação inicial e continuada de professores. Propõem-se, ainda, atividades relevantes que, integradas à terapia multidimensional, contribuem para a minimização destes distúrbios. UNITERMOS: Dislexia, reabilitação, terapia. Agrafia, reabilitação, terapia. Desenvolvimento da linguagem. Transtornos de desenvolvimento da linguagem. Correspondência Universidade do Vale do Itajaí Rua: Uruguai, 458 – Centro – Itajaí – SC – Brasil 88302-202 – Fone: (047) 341-7516 E-mail: [email protected]

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DISLEXIA E DISGRAFIA

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INTRODUÇÃOUm seminário sobre Desenvolvimento

Neurológico e Aprendizagem, no Programa deMestrado de Educação na Universidade do Valedo Itajaí, despertou-nos o interesse em apro-fundar estudos relacionados aos distúrbios adqui-ridos na linguagem oral e escrita, mais especi-

DDDDDISLEXIAISLEXIAISLEXIAISLEXIAISLEXIA EEEEE DISDISDISDISDISGRGRGRGRGRAFIAAFIAAFIAAFIAAFIA:::::DIFICULDDIFICULDDIFICULDDIFICULDDIFICULDADESADESADESADESADES NANANANANA LINGULINGULINGULINGULINGUAAAAAGEMGEMGEMGEMGEM

Elisabeth Caldeira; Dulce Maria Lázzaris de Oliveira Cumiotto

Elisabeth Caldeira – Doutora em EducaçãoDesenvolvimento Humano e Educação pela PontifíciaUniversidade Católica do Rio Grande do Sul. Docentee Pesquisadora do Programa de Mestrado Acadêmicoem Educação da Universidade do Vale do Itajaí/SC.Dulce Maria Lázzaris de Oliveira CumiottoEspecialista em Psicopedagogia e Metodologia deEnsino. Professora da Rede Estadual de Ensino doEstado de Santa Catarina. Pesquisadora no Programade Mestrado Acadêmico em Educação da Universidadedo Vale do Itajaí/SC.

ficamente, a dislexia e a disgrafia. Presenciamos,constantemente, em nossa função de educadores,que muitos de nós desconhecem tais diagnósticos,seus sintomas e suas características, atribuindoinclusive adjetivos preconceituosos aos alunosque apresentam dificuldades na aprendizagemdevido a tais distúrbios.

ARTIGO DE REVISÃOARTIGO DE REVISÃOARTIGO DE REVISÃOARTIGO DE REVISÃOARTIGO DE REVISÃO

RESUMO – A dislexia e a disgrafia têm preocupado educadores,fonoaudiólogos, psicólogos, psicopedagogos e neuropsicólogos, no que serefere à aquisição da linguagem oral e escrita como habilidades sociais eculturais vitais. Neste artigo, tratamos das dislexias e das disgrafias em suasmúltiplas diversidades, tais como: de superfície, fonológica ou profunda.Porém, a dislexia pode apresentar-se de modo periférico: negligência, deatenção, letra-por-letra e central. No seminário de DesenvolvimentoNeurológico e Aprendizagem, no Programa de Mestrado em Educação naUniversidade do Vale do Itajaí, aprofundou-se este tema no sentido decolaborar com os programas de formação inicial e continuada de professores.Propõem-se, ainda, atividades relevantes que, integradas à terapiamultidimensional, contribuem para a minimização destes distúrbios.

UNITERMOS: Dislexia, reabilitação, terapia. Agrafia, reabilitação, terapia.Desenvolvimento da linguagem. Transtornos de desenvolvimento dalinguagem.

CorrespondênciaUniversidade do Vale do ItajaíRua: Uruguai, 458 – Centro – Itajaí – SC – Brasil88302-202 – Fone: (047) 341-7516E-mail: [email protected]

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A relevância do tema, além de auxiliar nacapacitação profissional, vem contribuir para aaceitação e inclusão destes educandos,oportunizando-lhes um acompanhamentoadequado no decorrer do seu processo educativo,evitando a evasão escolar.

Tendo em vista que o uso da leitura e da escritasão habilidades sociais e culturais vitais em nossosdias, faz-se necessário que a dislexia e a disgrafiasejam estudadas e que se proponham algumasatividades para o educador realizar no cotidianopedagógico com crianças, jovens e adultos.

DISLEXIA E DISGRAFIA ADQUIRIDASDistúrbios na linguagem oral e escritaÉ constatada, mediante estudos, a existência

de uma grande preocupação por parte de algunsprofissionais, não somente da área da educação,mas também por fonoaudiólogos, psicólogos,psicopedagogos e neuropsicólogos, quanto àscausas dos distúrbios diagnosticados durante oprocesso de aquisição da linguagem oral e escrita.

Através de intensas pesquisas, verificou-seque tais distúrbios mencionados afetam aaprendizagem em crianças e adultos ante-riormente alfabetizados, e que esses problemasdizem respeito à dislexia e disgrafia, tantocongênitas como adquiridas.

Em nossa memória, temos uma parte respon-sável pela identificação de todas as palavras jáconhecidas. É o léxico, ou seja, o nosso “dicionáriomental”. Segundo Jamet1, esse processo deidentificação recebe o nome de acesso ao léxico,porém, conseqüentemente, quanto mais rara apalavra, mais demorada será sua localização noléxico, não importando quanto uma pessoa tenhalido, já que sempre aparecerão em seu idiomapalavras com as quais nunca havia se deparado.Afirmam Bonne e Plante2 que o léxico cresce aolongo de sua existência.

Segundo Ellis3, existem palavras que sãoinventadas e por esse motivo são denominadaspela literatura psicológica de “pseudopalavras”ou “não-palavras”, daí o fato da leitura tornar-seproblemática para as crianças e adultos comdistúrbios lingüísticos.

Os distúrbios podem ser congênitos ouadquiridos por meio de doenças da infância nohemisfério direito ou dano cerebral.

Já que o cérebro poderá estar sujeito a doençase sendo ele um órgão de extrema importânciapara o funcionamento de todo o organismo, cabe-nos também conhecer um pouco sobre a formacomo pode vir a prejudicar a linguagem, seja elaescrita ou falada.

Diferente das “dislexias desenvolvimentais”,ou seja, aquelas “ligadas a uma perturbaçãoespecífica do reconhecimento visual das palavras,isso na ausência de qualquer atraso intelectualda criança, [...] as dislexias adquiridasapresentam origem neuropsicológica”1.

Ainda, segundo Ellis3, uma das doençascerebrais mais comuns é o acidente cerebro-vascular, isto é, a perturbação do suprimentosangüíneo para uma parte do cérebro, que podeser causado pelo rompimento de uma artéria ouveia (hemorragia) ou através do bloqueio dacirculação por coágulo sangüíneo (isquemia).

O lado do cérebro que é responsável,basicamente, pelas capacidades de linguagem,incluindo a leitura e a escrita, é a metadeesquerda ou hemisfério esquerdo, no indivíduodestro (Figura 1).

Conforme Bonne e Plante2:“O hemisfério direito também desempenha um

papel na comunicação. [...] É comum que aspessoas com danos no hemisfério direitoapresentem dificuldades de compreender piadase linguagem não-literal. [...] Portanto, amboshemisférios do cérebro contribuem para acomunicação humana normal.“

De acordo com estudos feitos até então,Stelling4 destaca a “importância de um sistemanervoso central e de um sistema nervoso peri-férico intacto, bem como um bom potencialpsiconeurológico”, já que certas anormalidadesem nível cortical podem produzir perturbaçõesna língua, na linguagem (disfasia) e nalinguagem lida-escrita (dislexia e dificuldades noesquema corpo-espaço).

Quanto à escrita, diz o mesmo autor que elaenvolve símbolos, um sistema de códigos e a

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utilização de um código visual e se dá,geralmente, no início da leitura, possibilitandoao leitor com alguma habilidade identificar tantoas representações ortográficas quanto àsrepresentações fonológicas. Por outro lado, sehouver limitações, estas irão corresponder àsdificuldades para a leitura.

Dislexia - um distúrbio na linguagem oralA identificação, compreensão e pronúncia das

palavras são permitidas através de algunsprocessos mentais que podem ser explicados emforma de diagrama, conforme Ellis3, objetivandodemonstrar o funcionamento dos modelos dereconhecimento das palavras.

Tal reconhecimento é produto de umaatividade interligada ocorrida dentro de diversossubsistemas cognitivos, que operam em parte,independentemente uns dos outros. Sendo essessubsistemas cognitivos semi-independentes,podemos identificá-los com o nome de“módulos”.

Uma vez que as operações envolvidas sãorealizadas por diferentes módulos cognitivos, odano ou o desenvolvimento anormal do cérebropode ocasionar transtornos de leitura.

Para um maior entendimento de como funcionao reconhecimento das palavras escritasisoladamente, faz-se necessário conceituar algunssignificados, segundo Ellis3, existentes no modelofuncional de alguns processos cognitivosenvolvidos:

• “Sistema de análise visual: identifica rabiscosimpressos com diferentes letras do alfabeto ea posição de cada letra dentro da palavra.

• Léxico de input visual: identifica as cadeiasde letras como palavras familiares.

• Sistema semântico: fornece o significado dapalavra que está sendo lida.

• Léxico de produção da fala: permite que aspalavras aprendidas sejam produzidas maisrapidamente, tanto na citação de nomesquanto na leitura em voz alta.

• Nível do fonema: armazena os fonemasmantendo-os em intervalos entre a produçãoda fala e a escrita.”Convém observar, ainda, de uma forma mais

clara, o esclarecimento deste modelo funcionalatravés do diagrama apresentado na Figura 2.

Esse modelo representa os procedimentoslexicais que convertem a palavra impressa emsom.

A dislexia pode ser observada quando, nomomento da leitura, existirem dificuldadespertinentes à identificação, à compreensão e àinterpretação dos símbolos gráficos. Neste caso,

Figura 1 – Hemisférios cerebrais e principais domínios Figura 2 – Modelo funcional de processos cognitivosenvolvidos na linguagem oral e escrita

Palavra Escrita

SISTEMASEMÂNTICO

SISTEMA DEANÁLISE VISUAL

LÉXICODE INPUTVISUAL

LÉXICO DAPRODUÇÃODA FALA

NÍVEL DOFONEMA Fala

Fonte: Ellis3

Fonte: Boone e Plante2

Hemisfério direito

Árealinguagemexpressiva

Áreaauditivaprincipal

Área derecepção

de linguagem

Hemisfério esquerdo

Fissura de Silvio

Fissura de rolando

Áreamotora

principal

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a criança ou o adulto terá uma tendência em trocarsílabas, substituir ou omitir letras ou palavra,podendo ainda invertê-las ou lê-las de trás parafrente.

Como não é uma doença, ela não tem curae pode ser identificada logo na pré-escola e,mesmo que esteja submetida a uma instruçãoconvencional, não possua distúrbios cognitivosnem sensoriais, a criança disléxica falha nomomento em que for adquirir a linguagem.

A dislexia se apresenta de diferentes formasde dificuldades e de linguagem, onde sãofreqüentes os problemas de leitura e de escrita.

Existe a Dislexia Acústica que se manifestana insuficiência para diferenciar os sons,ocorrendo omissões, distorções, transpo-sições ou substituições dos fonemas; DislexiaVisual, manifesta-se na confusão de letrascom semelhança gráfica. Nesses casos os paislogo tomam a iniciativa de levar o filho aooftalmologista; e Dislexia Motriz, que émanifestada no campo visual, provocandoretrocessos e principalmente intervalos mudosao ler.

De acordo com observações feitas porprofissionais da área, Stelling4 destaca que talsituação pode ser também conseqüência daimportância dada aos progressos escolares dacriança (imaturidade), bem como a intran-qüilidade dos pais.

Em se tratando das dislexias adquiridas,passaram a ser estudadas, segundo Ellis3, a partirde meados dos anos 70, quando neuropsicólogoscognitivos investigaram que partes do processonormal da leitura foram danificadas ou perdidas,ocasionando perturbações como: dislexiasadquiridas periféricas (transtornos nos quais osistema de análise visual está danificado) edislexias adquiridas centrais (agrupamento detranstornos em que o sistema visual é danificado,resultando em dificuldades na compreensão e/ou comunicação das palavras escritas).

Conforme Ellis3, as dislexias adquiridasperiféricas dividem-se em:• “Dislexia por negligência: afeta a capacidade

de identificar as letras iniciais”, embora haja

consciência de sua existência naquelasposições.Ex: medo por cedo, tábua por dábua...

• Dislexia de atenção: gera problemas comvárias letras em uma cadeia ou diversaspalavras na página. Neste caso, as letraspodem migrar de uma palavra para outra,formando uma terceira.Ex: grade alta acaba ficando gralta, malamuito pesada acaba ficando mala musada oumato pesada...

• Leitura letra-por-letra: os leitores iden-tificam as letras uma de cada vez antes detentarem dizer a palavra completa. Quantomais longa a palavra, mais tempo levam parapronunciá-la.Ex: soletram s-a-p-a-t-o para dizer sapato.As dislexias adquiridas centrais, de acordocom o mesmo autor, apresentam também suassubdivisões:

• Leitura não semântica: a compreensão daspalavras escritas é muito baixa. O paciente écapaz de ler em voz alta usando as conexõesentre o léxico de input visual e o léxico deprodução da fala, sendo considerado umprocesso lexical e não semântico.

• Dislexia de superfície: na conversão letra-som,os pacientes usam a via que conecta o sistemade análise visual ao nível de fonema, fazendo-os ler mal as palavras irregulares, pronun-ciando-as como se fossem regulares. Nestecaso, ele não saberá o significado da palavraque não conseguir pronunciar corretamente.

• Dislexia fonológica: são incapacidades queos disléxicos têm em ler palavras nãofamiliares em voz alta.

• Dislexia profunda: dificuldade quase quecompleta para ler não-palavras em voz alta,além de apresentar erros semânticos e visuais.Ex: se forem ler simpatia podem acabar lendosinfonia ou, até mesmo, palavras que nãotenham nada a ver com a grafia.Existem alguns sinais que podem nos auxiliar

na caracterização de um aluno disléxico: fracodesenvolvimento de atenção, dificuldade embrincar com outras pessoas, atraso na fala, na

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escrita e no desenvolvimento visual, falta decoordenação motora, dificuldade em aprenderrimas, canções, acompanhar histórias, memorizare desinteresse por livros impressos.

Para que haja sucesso na educação de pessoasdisléxicas, há de se basear numa terapiamultisensorial combinando sempre a visão, aaudição e o tato, além de se fazer uso deestratégias práticas tais como:• Relógio digital• Calculadora• Gravador• Confecção do próprio material de alfabe-

tização• Usar gravuras e fotografias, pois a imagem é

essencial para a sua aprendizagem• Folhas quadriculadas para a matemática• Máscara para leitura de texto• Letras com várias texturas

Algumas atitudes éticas elevam a auto-estimados educandos que apresentam dislexia edisgrafia:• Evitar menosprezá-los diante dos amigos não

os forçando a ler em voz alta nem dizendoseus erros ou suas notas baixas para que todosescutem.

• Rever falas e mensagens constantemente.• Ser paciente quando estiverem copiando do

quadro ou fazendo alguma avaliação, dando-lhe mais tempo do que aos outros eestimulando-os.

• Ao ler palavras longas, ensine-os a separá-lacom a ponta do lápis.

• Usar sempre uma linguagem clara e, em lín-guas estrangeiras, utilizar trabalhos e pes-quisa, pois eles têm ainda mais dificuldade.Quanto aos pais, cabe o apoio em pro-

curar ajuda profissional de fonoaudió-logos, psicólogos, neurologistas ou psico-pedagogos. Devem ainda encorajá-los a possuiroutras atividades fora do colégio como a prá-tica de esportes, cursos de música, fotografia,desenho, etc.

Um alerta aos pais é não permitir que suasdificuldades impliquem em um malcomportamento e na falta de limites.

Disgrafia - um distúrbio na linguagem escritaÉ visível a grande quantidade de estudos e

pesquisas dedicados à leitura, ao mesmo tempoem que o processo de escrita vem sendonegligenciado por parte de alguns profissionaisda educação.

As pesquisas que têm sido realizadas sobre aescrita, focalizam a nossa capacidade de produziruma cadeia de letras, a qual identificamos pelonome de ortografia.

No momento em que falamos ou escrevemosum texto casual, temos a liberdade de nosexpressar de maneira diferente daquela utilizadana escrita típica, que por sua vez é maiscomplexa, formal e explícita. Quaisquer que sejamesses processos utilizamos em ambos umaaltíssima carga mental para organizarmos nossasidéias.

Isso vem comprovar que tanto a fala quanto aescrita utilizam diferentes formas gramaticais,mas as duas compartilham de processos comuns,como a construção e o planejamento inicial dafrase, destaca Ellis3.

Outro fator que difere a leitura da escritarefere-se à articulação dos fonemas (sons dasletras) e a produção das letras respectivamente,ou seja, quando estamos aprendendo a escrever,o domínio envolvido no idioma escrito é o formal,o que comprova um desconforto no momento denos expressarmos através da escrita, promovendocom isso os “erros” que, anteriormente à invençãoda imprensa e do dicionário, eram aceitosnormalmente, mesmo porque estas escritascomunicavam o som das palavras sem nenhumproblema.

Conforme Ellis3, para a escrita também existeum modelo funcional apropriado ao armazena-mento lexical (conjunto das palavras usadas)dedicados à ortografia das palavras familiares,reconhecido pelo nome de “léxico de produçãodos grafemas”.• Léxico de Input Visual: espécie de depósito

mental contendo as representações das formasescritas de todas as palavras familiares.

• Sistema Semântico: produz o significado dapalavra que está sendo lida.

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• Léxico da produção da fala: acesso àspronúncias das palavras.

• Léxico de Produção dos grafemas: retém aortografia das palavras familiares.

• Nível do Fonema: armazena, em curto prazo,os fonemas, mantendo-os em intervalos entreo resgate do léxico de produção da fala e aarticulação.

• Nível do Grafema: armazena, em curto prazo,a ortografia de uma palavra entre arecuperação e a execução, retendo também aúltima porção da palavra, enquanto a primeiraestá sendo escrita”.Faz-se necessário também, analisar estes

significados através do diagrama funcional dalinguagem escrita (Figura 3).

Tanto quanto no diagrama da leitura, omesmo se dá para a escrita, ou seja, oreconhecimento das palavras se dá através dediferentes subsistemas cognitivos independentesuns dos outros e nomeados como “módulos”.

No caso de existirem erros na escrita pelo fatodo escritor desconhecer a ortografia correta de

uma palavra, ou quando ocorrer um lapsomomentâneo, impedindo-o de escrever, mesmoquando souber a forma exata, há uma interrupçãono funcionamento do modelo ortográfico.

Como foi visto anteriormente, os danoscerebrais também são causadores dos prejuízosreferentes à escrita correta das palavras,ocasionando as disgrafias adquiridas.

Ellis3 classificou, adequadamente, a disgrafiaem:• Disgrafia de superfície: dificulta o

reconhecimento e a escrita de palavras játrabalhadas anteriormente.Ex: são aqueles erros ortográficos vistos comfreqüência.

• Disgrafia fonológica: permite aos pacientesa escrita de palavras familiares, impedindo-os de escreverem pseudopalavras.Ex: não apresentam consciência fonológicano momento da escrita de palavras poucousadas no dia a dia.

• Disgrafia profunda: dificulta aos pacientesa possibilidade de estarem escrevendopalavras abstratas, ditados ou nomes deobjetos.Ex: se for ditada a palavra cadeira, ele acabaescrevendo mesa, se ditar hora e ele escreverelógio.Baseado em estudos realizados por meio de

pesquisa bibliográfica, constatou-se que adislexia e a disgrafia são transtornos oudificuldades que um indivíduo possui na leituraou na escrita.

De acordo com a linguagem dos médicos, elastambém são conhecidas como cegueira verbal,justamente pelo fato de se darem através de umimpedimento cerebral que danifica o sistemasemântico.

O fato do nosso educando possuir um destesdistúrbios não deve servir de impedimento paraque dê continuidade aos seus estudos. Ele podeapresentar problemas para ler ou escrever, maspode, porém, ter grandes habilidades em outrasáreas como matemática, música, teatro, desenho,pintura, enfim, diversos campos do saber,não esquecendo ainda dos computadores e

Figura 3 – Diagrama funcional da linguagem escrita

Fonte: Ellis3

Do Léxico de Input Visual

SISTEMA SEMÂNTICO

Do Léxico deInput Visual

LÉXICO DEPRODUÇÃODOS GRAFEMAS

LÉXICO DEPRODUÇÃODA FALA

DO SISTEMADE ANÁLISE VISUAL

NÍVEL DOFONEMA

NÍVEL DOGRAFEMA

Produçãooral

escrita

datilografia

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da internet como grandes aliados nestes ca-sos, já que possuem seus próprios corretoresortográficos.

ATIVIDADES RELEVANTESIntencionado em colaborar no tratamento

desses distúrbios, Valett5 propôs algumasatividades relevantes a serem realizadas em salade aula, tais como:• Imitar ações: sentar, levantar, tocar o nariz,

orelhas, boca, bater os pés, bater palmas, etc;• Imitar ações e sons: bater palmas e dizer

BANG, tocar tambor e falar BUM;• Imitar sons: de animais, iniciando por sons

simples como os do gato, cachorro, vaca, cabra,indo gradativamente para sons maiscomplexos como os do cavalo, leão, tigre, etc;

• Ditado mudo: apresentar gravuras do dia adia e pedir que a criança escreva as palavrascorrespondentes às gravuras;

• Jogos ativos e marchas rítmicas: incluir sons;• Analisar palavras foneticamente: identificar

palavras através de sons vocálicos ouconsonantais;

• Trabalhar com rimas: cantigas infantis, recitarrimas e poesias, trava-língua, charadas, etc;

• Histórias em rodízio: o professor inicia umahistória e os demais alunos vão continuandoum a um;

• Envolver os alunos em atividades complexas:confecção de murais artísticos, encenação depeças teatrais, descrição de envolvimentos emsituações ou eventos globais;

• Trabalhar com histórias em quadrinhos:através de recortes de revistas ou desenhospróprios os alunos poderão elaborar históriasorais e escritas seqüencialmente;

• Jogos de quebra-cabeça em seqüência;• Copiar e escrever palavras soletradas de

memória através de palavras cruzadas;

• Desenhos e pinturas livres ou sugestionados.

CONSIDERAÇÕES FINAISEmbora pesquisas comprovem que irregu-

laridades no funcionamento cerebral ocasionamdistúrbios como a dislexia e a disgrafia, alerta-se sobre a importância que a escola tem em estaroferecendo esclarecimentos e orientações aospais destas crianças, para que os mesmo possamauxiliá-las em suas atividades diárias.

Os diversos fatores causadores dosdistúrbios lingüísticos mais freqüentes em salasde aula e responsáveis pelas dificuldades noprocesso ensino-aprendizagem precisam seracompanhados e corrigidos e, para tanto, algu-mas atividades foram propostas neste trabalho.

A dislexia e a disgrafia requerem umatendimento profissional mais adequado, capazde auxiliar tanto o professor como o aluno, umavez que a inflexibilidade através de tarefas ouavaliações e a utilização de materiais e métodosinapropriados, geram as humilhações e ofracasso escolar.

De acordo com a nossa realidade comoeducadores, estamos cientes que muitos destesprofissionais são obrigados a permaneceremisolados em sua rotina diária sem que ao menosconheçam tal questão, antecipando conse-qüentemente seus conceitos em relação a seusalunos, agravando ainda mais o problema.

Sugere-se que, nos cursos de formaçãoinicial e continuada de professores, aconteçammomentos que venham oportunizar aosmesmos, conciliando teoria e prática.

Diversificar metodologias e estratégias,intercaladas a um acompanhamento profis-sional especializado, é, sem dúvida, o caminhomais seguro para o sucesso no decorrer da vidaescolar de alunos portadores da dislexia edisgrafia.

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SUMMARYDyslexia and dysgraphia: language difficulties

The dyslexia and the dysgraphia have been worried educators,phonologists, psychologists, psychopedagogue and neuropsychologists,concerning to the acquisition of the oral language and writing as vital, socialand cultural abilities. In this article, we deal with to the dyslexias and thedysgraphias in their multiple diversities, such as: of surface, phonological ordeep. However, the dyslexia can be presented in peripherical way:negligence, of attention, letter-for-letter and central. In the seminary ofNeurological Development and Learning, in the Program of Master Degreein Education in the Universidade do Vale do Itajaí, this subject wasapproached to collaborate with the programs of initial and continued formationof teachers. This article presented important activities integrated to themultidimensional therapy that help to minimalize these disorders.

KEY WORDS: Dyslexia, rehabilitation, therapy. Agraphia, rehabilitation,therapy. Language development. Language development disorders.

REFERÊNCIAS1. Jamet E. Leitura e aproveitamento escolar.

São Paulo: Loyola; 2000.2. Boone DR, Plante E. Comunicação humana

e seus distúrbios. 2 ed. Porto Alegre: ArtesMédicas; 1994.

3. Ellis AW. Leitura, escrita e dislexia: uma

Trabalho realizado na Universidade do Vale do Itajaí. Artigo recebido: 30/04/2004Aprovado: 08/06/2004

análise cognitiva. Porto Alegre: ArtesMédicas; 1995.

4. Stelling S. Dislexia. Rio de Janeiro: Revinter;1994.

5. Valett RE. Tratamento de distúrbios daaprendizagem. Manual de ProgramasPsicoeducacionais. São Paulo: EDUSP; 1977.