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1 Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás D I R E I T O C I V I L R E A I S Dr. Sebastião Neto 2011

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Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás

D I R E I T O C I V I L

R E A I S

Dr. Sebastião Neto

2011

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S U M Á R I O

1. Conceito..................................................................................................................

1.1. Distinções entre os direitos reais e os direitos pessoais.......................................

2. Posse .......................................................................................................................

2.1. Teorias sobre a posse...........................................................................................

2.1.1. Teoria subjetiva.................................................................................................

2.1.2. Teoria objetiva..................................................................................................

2.2. Localização tópica da posse.................................................................................

2.3. Classificações da posse........................................................................................

2.4. Manutenção dos caracteres da posse....................................................................

2.5. Aquisição da posse...............................................................................................

2.5.1. Quanto à origem................................................................................................

2.5.2. Transmissão da posse........................................................................................

2.5.3. Acessio possessionis..........................................................................................

2.5.4. Atos de mera tolerância e presunção de posse das coisas móveis....................

2.6. Efeitos da posse....................................................................................................

2.6.1. Direito aos interditos possessórios....................................................................

2.6.1.1. Alegação de domínio na pendência do processo possessório........................

2.6.2. Direito aos frutos...............................................................................................

2.6.3. Perda ou deterioração da coisa..........................................................................

2.6.4. Direito às benfeitorias.......................................................................................

2.6.4.1. Noções............................................................................................................

2.6.4.2. Possuidor de boa-fé........................................................................................

2.6.4.3. Possuidor de má-fé.........................................................................................

2.7. Perda da posse......................................................................................................

3. Direitos reais...........................................................................................................

4. Propriedade.............................................................................................................

4.1. Breve histórico da propriedade............................................................................

4.1.1. Concepção conflituosa......................................................................................

4.1.2. Concepção absolutista....................................................................................... 4.1.3. Concepção relativista – função social da propriedade.................................................. 4.2. Conceito......................................................................................................................... 4.3. Propriedade e domínio.....................................................................................................

4.4. Elementos....................................................................................................................... 4.5. Delimitação do direito de propriedade.............................................................................

4.5.1. Direito aos frutos e produtos....................................................................................

4.5.2. Descoberta..................................................................................................................

4.6. Limitações ao direito de propriedade.........................................................................

4.6.1. Princípio da função social da propriedade e limitações ao exercício do

direito de propriedade.................................................................................................

4.6.2. Elementos da função social da propriedade rural............................................

4.6.3. Elementos da função social da propriedade urbana.........................................

4.6.4. Limitações ao exercício do direito de propriedade no Código Civil................

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4.6.4.1. A chamada desapropriação judicial (art. 1.228, §§ 4.º e 5.º)........................

4.6.4.1.1. Natureza jurídica.........................................................................................

4.6.4.1.2. Requisitos....................................................................................................

4.6.4.1.3. Exercício.....................................................................................................

4.6.5. Outras limitações......................................................................................................

4.7. Aquisição da propriedade............................................................................................

4.7.1. Aquisição da propriedade imóvel............................................................................

4.7.1.1. Usucapião................................................................................................................

4.7.1.2. Conceito.........................................................................................................

4.7.1.3. Natureza.........................................................................................................

4.7.1.4. Extensão.........................................................................................................

4.7.1.5. Espécies de usucapião....................................................................................

4.7.1.5.1. Usucapião extraordinária............................................................................

4.7.1.5.2. Usucapião ordinária....................................................................................

4.7.1.5.3. Usucapião especial urbana..........................................................................

4.7.1.5.4. Usucapião especial rural.............................................................................

4.7.1.6. Aplicação de institutos da prescrição extintiva..............................................

4.7.1.7. Aspectos processuais.....................................................................................

4.7.1.7.1. Eficácia da sentença...................................................................................

4.7.1.7.2. Usucapião como defesa...............................................................................

4.7.1.8. Acessio possessionis......................................................................................

4.7.2. Aquisição pelo registro do título.......................................................................

4.7.3. Aquisição por acessão.......................................................................................

4.7.3.1. Conceito.........................................................................................................

4.7.3.2. Da formação de ilha.......................................................................................

4.7.3.3. Aluvião...........................................................................................................

4.7.3.4. Avulsão..........................................................................................................

4.7.3.5. Abandono de álveo

4.7.3.6. Das construções e plantações.........................................................................

4.7.3.6.1. Noções........................................................................................................

4.7.3.6.2. Plantação ou construção em solo próprio com sementes, plantas ou

materiais alheios.........................................................................................................

4.7.3.6.3. Plantação ou construção em terreno alheio.................................................

4.7.3.6.3.1. Direito de retenção...................................................................................

4.7.3.6.3.2. Aquisição da propriedade do solo alheio pelo terceiro plantador ou

construtor.....................................................................................................................

4.8. Aquisição da propriedade móvel..........................................................................

4.8.1. Usucapião..........................................................................................................

4.8.2. Ocupação...........................................................................................................

4.8.3. Achado do tesouro.............................................................................................

4.8.4.1. Constituto possessório....................................................................................

4.8.4.2. Alienação de coisa sob poder de terceiro.......................................................

4.8.4.3. Traditio brevi manu........................................................................................

4.8.5. Especificação.....................................................................................................

4.8.6. Confusão, comistão e adjunção.........................................................................

4.8.6.1. Confusão, comistão ou adjunção de má-fé....................................................

4.8.6.2. Formação de espécie nova.............................................................................

4.9. Perda da propriedade............................................................................................

5. Direitos de vizinhança.............................................................................................

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5.1. Natureza jurídica..................................................................................................

5.2. Uso anormal da propriedade................................................................................

5.2.1. Interferência determinada pelo interesse público..............................................

5.2.2. Ação demolitória e ação de dano infecto..........................................................

5.3. Árvores limítrofes................................................................................................

5.4. Passagem forçada.................................................................................................

5.5. Passagem de cabos e tubulações..........................................................................

5.6. Águas....................................................................................................................

5.6.1. Águas naturais...................................................................................................

5.6.2. Águas artificiais................................................................................................

5.6.3. Águas pluviais e de nascente............................................................................

5.6.4. Poluição de águas..............................................................................................

5.6.5. Barragens, açudes e represamento de água.......................................................

5.6.6. Direito de aqueduto ou servidão legal de aqueduto.........................................

5.6.7. Limites entre prédios e direito de tapagem.......................................................

5.6.8. Direito de construir...........................................................................................

6. Condomínio.............................................................................................................

6.1. Conceito...............................................................................................................

6.2. Dos direitos e deveres dos condôminos...............................................................

6.3. Administração do condomínio.............................................................................

6.4. Condomínio necessário........................................................................................

6.5. Condomínio edilício.............................................................................................

7. Propriedade resolúvel..............................................................................................

7.1. Conceito...............................................................................................................

7.2. Hipóteses..............................................................................................................

7.2.1. Propriedade resolúvel........................................................................................

7.2.2. Propriedade ad tempus......................................................................................

8. Propriedade fiduciária.............................................................................................

8.1. Conceito...............................................................................................................

8.2. Requisitos.............................................................................................................

8.3. Desdobramento da posse......................................................................................

8.4. Vencimento da dívida..........................................................................................

9. Direitos reais sobre coisas alheias...........................................................................

9.1. Forma de constituição..........................................................................................

9.2. Direito de superfície.............................................................................................

9.2.1. Direitos e deveres do superficiário....................................................................

9.2.2. Extinção do direito de superfície.......................................................................

9.2.3. Constituição de direito de superfície por pessoa jurídica de direito público

interno.........................................................................................................................

9.3. Servidões. ............................................................................................................

9.3.1. Conceito. ..........................................................................................................

9.3.2. Características. .................................................................................................

9.3.3. Formas de constituição. ...................................................................................

9.3.4. Classificação. ...................................................................................................

9.3.5. Exercício das servidões. ...................................................................................

9.3.5.1. Direito de conservação. .................................................................................

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9.3.5.2. Livre exercício da servidão. ..........................................................................

9.3.5.3. Remoção da servidão. ...................................................................................

9.3.5.4. Restrição ao exercício da servidão.................................................................

9.3.6. Extinção das servidões......................................................................................

9.3.6.1. Regra geral.....................................................................................................

9.3.6.2. Cancelamento judicial....................................................................................

9.3.6.3. Extinção pelo não-uso, confusão ou contrato................................................

9.4. Usufruto...............................................................................................................

9.4.1. Conceito............................................................................................................

9.4.1.1. Distinção com outros institutos......................................................................

9.4.2. Direitos do usufrutuário....................................................................................

9.4.2.1. Regra geral.....................................................................................................

9.4.2.2. Direito aos frutos............................................................................................

9.4.2.3. Direito de arrendar/Proibição de modificação da destinação econômica......

9.4.2.4. Direito de acrescer.........................................................................................

9.4.3. Deveres do usufrutuário....................................................................................

9.4.3.1. Dever de conservação....................................................................................

9.4.3.2. Reparações extraordinárias............................................................................

9.4.3.3. Usufruto de patrimônio..................................................................................

9.4.3.4. Dever de ciência quanto às lesões..................................................................

9.4.3.5. Pagamento do seguro.....................................................................................

9.4.3.6. Destruição de edifício sujeito a seguro..........................................................

9.4.3.7. Desapropriação do prédio sujeito a usufruto..................................................

9.4.4. Espécies de usufruto..........................................................................................

9.4.5. Extinção do usufruto.........................................................................................

9.5. Uso.......................................................................................................................

9.5.1. Conceito............................................................................................................

9.5.2. Regras................................................................................................................

9.6. Habitação..............................................................................................................

9.6.1. Conceito............................................................................................................

9.7. Direito real de aquisição – direito do promitente comprador..............................

9.7.1. Conceito............................................................................................................

9.7.2. Regras................................................................................................................

9.8. Direitos reais de garantia......................................................................................

9.8.1. Conceito............................................................................................................

9.8.2. Princípios...........................................................................................................

9.8.2.1. Vinculação do bem dado em garantia............................................................

9.8.2.2. Capacidade do sujeito e idoneidade do objeto...............................................

9.8.2.3. Acessoriedade................................................................................................

9.8.2.4. Direito de preferência ou prioridade..............................................................

9.8.2.5. Direito de seqüela...........................................................................................

9.8.2.6. Indivisibilidade da garantia............................................................................

9.8.2.7. Vencimento antecipado da dívida garantida..................................................

9.8.2.8. Transitoriedade...............................................................................................

9.8.3. Disposições gerais.............................................................................................

9.8.3.1. Prazo máximo do direito de retenção do credor anticrédito..........................

9.8.3.2. Requisitos de eficácia do contrato constitutivo da garantia...........................

9.8.3.3. Garantia prestada por terceiro........................................................................

9.8.3.4. Proibição do pacto comissório.......................................................................

9.8.3.5. Caráter quirografário do saldo remanescente................................................

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9.8.4. Penhor...............................................................................................................

9.8.4.1. Penhor em geral..............................................................................................

9.8.4.1.1. Conceito......................................................................................................

9.8.4.1.2. Pluralidade de penhores e subpenhor..........................................................

9.8.4.1.3. Espécies de penhor......................................................................................

9.8.4.1.4. Direitos do credor pignoratício...................................................................

9.8.4.1.5. Deveres do credor pignoratício...................................................................

9.8.4.1.6. Extinção do penhor.....................................................................................

9.8.4.2. Penhores especiais..........................................................................................

9.8.4.2.1. Penhor rural.................................................................................................

9.8.4.2.2. Penhor industrial e mercantil......................................................................

9.8.4.2.3. Penhor de direitos e títulos de crédito.........................................................

9.8.4.2.3.1. Penhor de direitos.....................................................................................

9.8.4.2.3.2. Penhor de títulos de crédito......................................................................

9.8.4.2.4. Penhor de veículos......................................................................................

9.8.4.3. Penhor legal...................................................................................................

9.8.5. Hipoteca............................................................................................................

9.8.5.1. Conceito.........................................................................................................

9.8.5.2. Classificação da hipoteca...............................................................................

9.8.5.3. Princípios........................................................................................................

9.8.5.4. Regras.............................................................................................................

9.8.5.4.1. Aquisição do imóvel hipotecado.................................................................

9.8.5.4.1.1. Remição....................................................................................................

9.8.5.4.2. Prazo da hipoteca........................................................................................

9.8.5.4.3. Hipoteca para garantia de dívida futura......................................................

9.8.5.4.4. Loteamento do imóvel hipotecado..............................................................

9.8.5.5. Hipoteca legal.................................................................................................

9.8.5.6. Registro da hipoteca.......................................................................................

9.8.5.7. Extinção da hipoteca......................................................................................

9.8.5.8. Hipoteca de vias férreas.................................................................................

9.8.6. Anticrese...........................................................................................................

9.8.6.1. Conceito.........................................................................................................

9.8.6.2. Direitos do credor anticrético.........................................................................

9.8.6.3. Deveres do credor anticrético.........................................................................

9.8.6.4. Aquisição de imóvel objeto de anticrese........................................................

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................

EXERCÍCIOS.............................................................................................................

Gabarito.......................................................................................................................

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DIREITO DAS COISAS

1. Conceito

Muita discussão existe a respeito da denominação correta desta parte do Direito

Civil, porquanto se entende que o designativo correto seria direitos reais e não direito

das coisas, uma vez que, em expressão de origem irônica, as coisas não têm direitos.

Entretanto, a discussão não se resume a isso, porquanto a denominação que se

deve dar a um ramo do direito deve ser aquela que melhor signifique a abrangência de

seu objeto.

Com efeito, sob a rubrica direito das coisas, o código disciplina não só os

direitos reais, que são aqueles taxativamente previstos no art. 1.225, mas, também, a

posse e outros direitos derivados diretamente da propriedade, como, por exemplo, os

direitos de vizinhança.

Destarte, a denominação direitos reais não abrangeria todo o objeto da

disciplina, de forma que o legislador deve ter por preocupação o conteúdo material das

questões tratadas. No caso específico, a relação do sujeito de direitos com as coisas é, de

fato, o critério que fornece maior amplitude para emprestar à disciplina um nome.

1.2. Distinções entre os direitos reais e os direitos pessoais

Existem várias concepções acerca da diferenciação entre direitos pessoais e

reais. Existem a teoria realista e a teoria personalista. Assim, a) pela teoria realista, o

direito real encerra uma relação entre a pessoa e a coisa; b) pela teoria personalista, o

direito real, assim como o direito pessoal, também encerra relação entre pessoas,

entretanto, o sujeito passivo não é certo e determinado, mas, sim, um sujeito passivo

universal.

De qualquer sorte, o direito real se diferencia, principalmente, do direito pessoal,

por não necessitar de intermediário (outra pessoa) para ser exercido, mas, apenas, da

própria coisa e, em regra, opõe-se erga omnes (contra todos).

Pode-se traçar o seguinte traço entre as principais diferenças entre direitos reais

e pessoais:

a) Direitos pessoais: a1) são exercidos contra outra pessoa; a2) é oponível

somente contra o devedor ou quem por ele se obrigar, por lei ou por contrato;

a3) os direitos pessoais são transitórios, ou seja, extinguem-se com o

cumprimento da obrigação; a4) podem ser violados por fato positivo (obrigações

de não fazer) ou negativo (inadimplemento); a5) não se adquire direito pessoal

por usucapião; a6) podem ser criadas novas formas de direito pessoal,

livremente, pela vontade das partes.

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b) Direitos reais: b1) são exercidos sobre a coisa; b2) são oponíveis erga omnes,

ou seja, podem ser exercidos contra todos; b3) são perpétuos, porquanto não

dependem do cumprimento de uma prestação, por outrem, para serem satisfeitos;

b4) somente podem ser violados por fato positivo; b5) podem ser adquiridos por

usucapião; b6) Tipicidade: não podem ser criados, livremente pelas partes,

novos modos de direitos reais, uma vez que o rol de direitos reais constante da

lei é taxativo (numerus clausus) e não pode ser ampliado por convenção

particular, mas somente pela própria lei (independentemente de ser o próprio

código civil); b7) Seqüela: atributo específico dos direitos reais, a seqüela é a

prerrogativa que faz com que referido direito tenha o efeito de seguir a coisa

sobre a qual incide onde quer que esteja1.

2. Posse

2.1. Teorias sobre a posse

São duas as teorias mais discutidas a respeito da natureza jurídica da posse,

quais sejam, a teoria subjetiva de Savigny e a teoria objetiva de Ihering.

2.1.1. Teoria subjetiva

Para Savigny, a posse é um estado de fato sobre a coisa, segundo o qual o

possuidor, além de deter a coisa em seu poder (corpus), tem o ânimo de detê-la como

dono (animus domini). Em razão disso, sua teoria é conhecida como subjetiva, pois

depende da análise subjetiva da vontade do detentor de possuir a coisa como dono.

As conseqüências da teoria subjetiva importam em classificar a posse como

atributo exclusivo do proprietário, qualificando, pois, como simples detenção, situações

como a do locatário, do credor pignoratício, do arrendatário, etc.

2.1.2. Teoria objetiva

A teoria de Ihering explica melhor a diferença entre posse e detenção e

possibilita enxergar o fenômeno da divisão da posse em direta e indireta.

Para Ihering, a posse existe quando exercida de forma a aparentar o domínio

sobre a coisa, ou seja, para o referido doutrinador, a posse é a exteriorização do

domínio. Para que haja posse, não é necessário que o possuidor tenha ânimo de dono

sobre a coisa, mas apenas que detenha a coisa (corpus) de forma a exercer poderes

próprios de proprietário.

Assim, sua teoria é objetiva, pois não exige a pesquisa do ânimo do possuidor de

ter a coisa como dono, mas apenas os caracteres de sua detenção sobre a coisa.

1 Assim, no direito pessoal resultante de um contrato de compra e venda, por exemplo, o credor tem

apenas uma expectativa de direito real sobre a coisa, que somente se concretiza com a tradição. Se o

alienante transfere a coisa a terceiro, o direito pessoal dá ao credor apenas a prerrogativa de exigir o seu

cumprimento, com a conversão em perdas e danos em caso de impossibilidade. Já com o direito real

(compromisso de compra e venda registrado, por exemplo – art. 1.417), o comprador tem, nesse direito, a

prerrogativa de fazê-lo seguir a coisa onde quer que esteja, podendo opô-lo a terceiro adquirente, ainda

que de boa-fé.

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Destarte, aquele que possui a coisa, exercendo poderes típicos de proprietário,

será considerado possuidor, independentemente de ter o domínio sobre a coisa ou o

ânimo de adquiri-lo. Assim, contempla-se a situação do locatário, por exemplo, que

exerce poderes típicos de proprietário como usar a coisa ou dispor deste uso

(sublocação).

Para a teoria objetiva, portanto, a posse se difere da detenção, não porque na

posse haja o animus domini, mas porque, se na mera detenção o detentor age sob o

mando ou instruções de outrem, não tem essa detenção nenhuma das características da

propriedade.

Além disso, situações como a do locatário, credor pignoratício, arrendatário, etc

explicam a divisão da classificação da posse em direta (exercida por quem está na

detenção da coisa, com caracteres específicos de dono) e indireta (exercida pelo

proprietário que cede a outrem a posse direta).

O Código Civil de 1916 já adotava esta teoria, quando rezava, em seu art. 485,

que “considera-se possuidor toda aquele que tem de fato o exercício, pleno, ou não, de

algum dos poderes inerentes ao domínio ou propriedade”.

O Código Civil de 2002 também acata a teoria objetiva, ao dispor, no art. 1.196:

“Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de

algum dos poderes inerentes à propriedade”.

2.1.3. Teoria social

O francês Raymond Saleilles formulou uma teoria própria, partindo, no entanto,

dos princípios da teoria objetiva de Ihering.

Para Saleilles, tal como para Ihering, a caracterização da posse prescinde do

elemento subjetivo (animus domini), bastando seus elementos externos, ou seja, a

aparência de domínio na conduta do possuidor.

No entanto, Saleilles defende que a posse só pode merecer proteção jurídica

quando o estado de fato sobre a coisa estiver acompanhado da realização de algum

objetivo sócio-econômico. Desta forma, evita-se que o ordenamento jurídico ampare

situações em que se exerce posse sem nenhum objetivo social ou econômico, mas por

mera especulação.

Em seu projeto de modificação do Código Civil (Projeto 6.960/02), o deputado

Ricardo Fiúza propõe a seguinte redação para o art. 1.196 do Código Civil:

Considera-se possuidor todo aquele que tem poder fático de ingerência

sócio-econômica, absoluto ou relativo, direto ou indireto, sobre

determinado bem da vida, que se manifesta através do exercício ou

possibilidade de exercício inerente a propriedade ou outro direito real

suscetível de posse.

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10

Como se vê, o projeto de autoria do deputado Ricardo Fiúza adota, claramente, a

teoria da função social da posse, de Saleilles, porque exige, para configuração da posse,

o exercício de poder fático de ingerência sócio-econômica sobre a coisa. Não basta,

para tanto, deter a coisa com aparência de dono, mas exercer sobre ela alguma atividade

relevante do ponto de vista sócio-econômico.

2.2. Localização tópica da posse

Independentemente da teoria que se adote (objetiva ou subjetiva), a posse é um

estado de fato sobre a coisa e não propriamente um direito que se exerce sobre ela. Por

isso, o Código Civil não admite a posse como direito real, deixando de arrolá-la como

tal no art. 1.225.

Assim, temos no código civil, no livro a respeito do direito das coisas, o título I

a respeito da posse e, posteriormente, o título II a respeito dos direitos reais.

2.3. Classificações da posse

Conforme certas características da posse, ela pode ser classificada, conforme

veremos adiante:

a) Posse direta e indireta: é a divisão da posse conforme o proprietário ou outro

detentor de direito real sobre a coisa transfere a outrem a posse direta sobre a

coisa. Reza o art. 1.197 do Código Civil que “a posse direta, de pessoa que

tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal,

ou real, não anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o

possuidor direto defender a sua posse contra o indireto”;

b) Posse e detenção: A posse, como vimos, é o estado de fato de uma pessoa

sobre a coisa que faz exteriorizar alguns dos caracteres da propriedade;

assim, o possuidor possui em nome próprio, tendo ou não a propriedade. A

detenção, por sua vez, caracteriza-se pelo apoderamento da coisa em nome

de outra pessoa ou em cumprimento de ordens ou instruções desta outra

pessoa (ex.: a detenção do caseiro sobre a terra rural que lhe é confiada).

Assim, disciplina o art. 1.198: “Considera-se detentor aquele que, achando-

se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome

deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas. Parágrafo único.

Aquele que começou a comportar-se do modo como prescreve este artigo,

em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o

contrário”. Também se têm entendido como mera detenção as situações dos

arts. 1.208 e 1.224 do Código Civil: “Art. 1.208. Não induzem posse os atos

de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição

os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a

clandestinidade”; “Art. 1.224. Só se considera perdida a posse para quem

não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar

a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido”. A esta última

hipótese PONTES DE MIRANDA dá o nome de tença. Na consideração da

detenção relevam três conclusões distintas: 1 – a mera detenção não é capaz

de gerar posse ad usucapionem, a não ser que se convole em posse (art.

1.224); 2 – a detenção não pode se convolar em posse por ato unilateral do

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detentor, mas sempre com a participação do possuidor, ainda que por inércia,

como no caso do art. 1.224; 3 – a ocupação ou apropriação de bens públicos

não gera posse, mas sempre detenção, por se tornar impossível a aparência

de dono exigida pela teoria objetiva2;

c) Composse: É o fenômeno pelo qual duas ou mais pessoas possuem, em

comum, uma coisa indivisa, hipótese na qual “poderá cada uma exercer

sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros

compossuidores” (art. 1.199);

d) Posse justa e injusta: posse justa é aquela exercida a justo título. Classifica-se

a posse como justa por exclusão, ou seja, será justa quando não for adquirida

de forma violenta, clandestina ou precária (nec vim, nec clam, nec precario),

hipóteses em que se qualifica como injusta. Assim, temos: d1) posse

violenta: aquela adquirida pela força contra o justo possuidor. A violência

pode ocorrer tanto no momento da aquisição da posse como em momento

posterior. Assim, há posse violenta quando a violência é dirigida à retirada

da posse do justo possuidor; da mesma forma, é violenta a posse quando o

justo possuidor, não tendo presenciado o esbulho, é repelido posteriormente.

Enfim, entende-se por violência somente aquela praticada contra a pessoa do

possuidor e não contra a coisa, de forma que o rompimento de obstáculo, por

exemplo, para apossamento de coisa abandonada, não caracteriza a violência

prevista no disposito; d2) posse clandestina: aquela que se adquire às

escondidas, em detrimento do justo possuidor; d3) posse precária: aquela que

se adquire com abuso de confiança, resultando, geralmente, da retenção

indevida da coisa que se deve restituir ao justo possuidor;

e) Posse de boa-fé e de má-fé: A posse será de boa ou de má-fé conforme o

possuidor conheça ou não eventual obstáculo que lhe impede de adquirir a

coisa. Ignorando o obstáculo, o possuidor está de boa-fé; conhecendo-o,

considera-se de má-fé. Daí resulta concluir que, para estar de boa-fé, o

2 USUCAPIÃO NA FORMA EXTRAORDINÁRIA - POSSE PRECÁRIA INVASÃO DE TERRAS -

AUSÊNCIA DE "ANIMUS DOMINI" PRESCRIÇÃO AQUISITIVA NÃO CONSUMADA. 1- A posse

decorrente de invasão de lote de terreno urbano é clandestina e precária, não ensejando a prescrição

aquisitiva. 2- A usucapião na forma extraordinária somente se consuma com a posse mansa e pacifica,

com "animus domini", exercida durante vinte anos. Apelação desprovida. (Apelação Cível nº

0075543100, Ac.: 3928, 8ª Câmara Cível do TAPR, Andira, Rel. Juiz Conv. R. Cristo Pereira. j.

12.06.1995, Publ. 04.08.1995).

TJSC. Posse. O fâmulo ou detentor não pode alterar unilateralmente a sua situação e tornar-se possuidor.

Inteligência do art. 1.198 do CC/2002. Quanto a esse aspecto, diz Sílvio de Salvo Venosa(in Código Civil

Comentado: direito das coisas, posse, direitos reais, propriedade. Vol.XII. coord. Álvaro Villaça

Azevedo. São Paulo : Atlas. 2003, p. 41): A idéia básica é de que quem inicia a detenção como mero

fâmulo ou detentor não pode alterar por vontade própria essa situação e tornar-se possuidor. Para que o

detentor seja considerado possuidor, há necessidade de um ato ou negócio jurídico que altere a situação

de fato. Isso porque o fato da detenção da coisa é diverso do fato da posse. Por essa razão, como

sufragado de há muito pela doutrina, mas por vezes obscuro em decisões judiciais, presume-se que o

fâmulo se tenha mantido como tal até que ele prove o contrário. Essa modificação de animus, como

apontamos, não depende unicamente da vontade unilateral do detentor. (Decisão Monocrática: Agravo de

Instrumento nº 2007.026671-9/0000-00, da comarca da Capital. Relator: Des. Jaime Luiz Vicari. Data da

decisão: 23.07.2007. Publicação: DJSC Eletrônico n. 255, edição de 26.07.2007, p. 129)

MANUTENÇÃO DE POSSE. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, ADMINISTRADA PELA

―TERRACAP – COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA‖. INADMISSIBILIDADE DA

PROTEÇÃO POSSESSÓRIA. – A ocupação de bem público não passa de simples detenção, caso em que

se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. – Não induzem posse os

atos de mera tolerância (art. 497 do Código Civil/1916). Precedentes do STJ. Recurso especial conhecido

e provido. (REsp 489.732/DF, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, julgado em

05.05.2005, DJ 13.06.2005 p. 310)

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possuidor deve acreditar que sua posse não prejudica a ninguém, hipótese

que se chama de posse de boa-fé real. Além disso, se o possuidor tiver justo

título sobre a coisa, presume-se a sua boa-fé, salvo prova em contrário, caso

em que se tem posse de boa-fé presumida (esta presunção é juris tantum).

Além disso, “a posse de boa-fé só perde este caráter no caso e desde o

momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não

ignora que possui indevidamente” (art. 1.202).

2.4. Manutenção dos caracteres da posse

Nos termos do art. 1.203, salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o

mesmo caráter com que foi adquirida.

Tal dispositivo importa em afirmar, por exemplo, que se a posse é adquirida por

direito pessoal (locação, comodato, etc.), conservará, sempre, esta característica, de

forma que a sua não-devolução ao final do contrato transformá-la-á em posse precária.

Além disso, ainda que a posse comodatária ou locatícia perdure por longo período de

tempo, ela não perderá essa característica, de forma que não autoriza ao possuidor direto

a aquisição do domínio pela usucapião.

2.5. Aquisição da posse

O novo código (art. 1.204) estatui que se adquire a posse desde o momento em

que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à

propriedade. Tal dispositivo atende à teoria objetiva, já que considera a caracterização

da posse por elementos objetivos, quais sejam, os poderes próprios de proprietário

exercidos pelo possuidor.

Ao disciplinar como a posse pode ser adquirida, o art. 1.205 permite a aquisição

da posse, diretamente, pela pessoa que a pretende, ou por representante; mas permite,

também, que a posse seja adquirida por terceiro sem mandato, dependendo de

ratificação.

O novo código não previu a aquisição da posse pelo chamado constituto

possessório (cláusula constituti). Para entendermos o que seja o constituto possessório,

devemos recorrer a duas situações: a) a primeira é a da pessoa que possui a coisa alheia

por algum fator (locação, comodato, arrendamento, depósito, etc.), mas adquire, depois,

sua propriedade. Neste caso, diz-se que o possuidor tinha animus nomine alieno (ânimo

de possuir coisa alheia) e passou a ter animus domini (ânimo de dono), ao adquirir a

propriedade. Em verdade, ao adquirir a propriedade, esse possuidor já tinha a posse

direta, razão por que não necessita de uma tradição real sobre a coisa, mas apenas da

chamada traditio brevi manu; b) a segunda hipótese é o inverso, ou seja, a pessoa possui

a coisa em virtude do direito de propriedade que exerce sobre ela, entretanto, aliena essa

propriedade a outrem, mas continua a exercer a posse sobre ela (também, por locação,

comodato, arrendamento, depósito, etc.). Neste caso, não houve tradição real da coisa

para o adquirente, pois o alienante continua na posse. Neste caso, podem as partes

celebrar a chamada cláusula constituti, a qual faz com que o vendedor continue na posse

direta da coisa e permite que o comprador adquira a posse, de forma simbólica.

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Este, então (hipótese da letra b), é o constituto possessório. Muito embora o art.

1.205 não o tenha previsto como forma de aquisição da posse, tem entendido a doutrina

que, por não ter sido proibido pela lei, pode continuar a ser celebrado por vontade das

partes, tal como se observa na conclusão da Jornada I STJ, n.º 77: “A posse das coisas

móveis e imóveis pode ser transmitida pelo constituto possessório”.

2.5.1. Quanto à origem

a) Aquisição originária: o adquirente fica isento dos vícios que a posse anterior

pudesse ter porque não há qualquer relação entre o possuidor atual e o anterior,

como nos casos de apreensão, acessão, ocupação ou usucapião;

b) Aquisição derivada: sendo derivada a aquisição, porque fundada numa relação

entre a posse atual e a anterior, a nova conservará os vícios e defeitos dela. Este

modo de aquisição é o que decorre de negócio jurídico.

2.5.2. Transmissão da posse

A posse pode ser adquirida, também, pela abertura da sucessão. Esta ocorre no

momento do falecimento do autor da herança. Importante ressaltar, entretanto, que “a

posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos

caracteres” (art. 1.206), ou seja, se o autor da herança tinha posse decorrente de

contrato com o proprietário, a esse título se dará a sua aquisição pelos herdeiros; se for

violenta, clandestina ou precária, igualmente;

Assim, se for justa a posse do autor da herança, inclusive tendente a legitimar a

usucapião, os herdeiros continuam nesta posse com o mesmo título, tal como prevê o

art. 1.207, primeira parte, que prevê que o sucessor universal continua de direito a

posse do seu antecessor.

2.5.3. Acessio possessionis

A aquisição por acessão da posse pode ocorrer de forma universal, como se

observa na primeira parte do art. 1.207 (item 2.5.1 supra), chamada de sucessão, ou de

forma singular, conforme prevê o art. 1.207, segunda parte, que prevê, in verbis: “ao

sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais”.

Como se observa, no caso de sucessão, a continuação da posse é automática e

imperativa de acordo com a lei. No caso da sucessão singular, ou união, ao sucessor

singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais, o que ocorre,

geralmente, para o efeito de se adquirir a coisa por usucapião.

Para haver acessio possessionis, por sucessão singular, é necessário que a

aquisição da posse, pelo sucessor, seja contínua e pacífica, não podendo o novo

possuidor unir sua nova posse à do possuidor anterior se a adquiriu contra este de forma

injusta (violenta, clandestina ou precária).

2.5.4. Atos de mera tolerância e presunção de posse das coisas móveis

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Nos termos do art. 1.208, não induzem posse os atos de mera permissão ou

tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou

clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.

Assim, a posse precária nunca irá se convalidar, porquanto se arrima em mera

permissão ou tolerância do proprietário, que pode derivar, inclusive, de negócio jurídico

no qual se transfere a posse direta (locação, comodato, depósito, etc.). Quanto à posse

clandestina ou violenta, somente pode se convalidar após cessar a violência ou

clandestinidade, ou seja, após a ciência do antigo possuidor que, ciente, não pratica atos

de recuperação da posse.

E, consoante o art. 1.209, a posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a

das coisas móveis que nele estiverem.

2.6. Efeitos da posse

2.6.1. Direito aos interditos possessórios

Um dos principais efeitos da posse é conferir ao possuidor a proteção jurídica ao

exercício do poder de fato que lhe é conferido de forma justa. Assim, nos termos do

caput do art. 1.210, o possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de

turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo

receio de ser molestado.

Subdivide-se, portanto, a proteção possessória, em três hipóteses diferentes:

a) esbulho: ocorre esbulho quando o possuidor da coisa se vê completamente

impedido de exercer a posse sobre a totalidade ou parte dela, por ato de

terceiro que sobre ela passa a exercer posse injusta (clandestina, violenta ou

precária). Dá origem à ação de reintegração de posse;

b) turbação: ocorre a turbação quando o possuidor sofre embaraço no exercício

de sua posse, deixando de conseguir exercer alguns de seus atributos. Não

pode ser confundido com o esbulho parcial sobre a coisa, pois neste existe

impedimento para o exercício de todos os atributos da posse, pelo possuidor,

mas apenas sobre parte da coisa; na turbação, o possuidor se vê apenas

impedido de exercer alguns dos atributos de sua posse, sem, entretanto,

deixar de exercê-la sobre a totalidade do objeto. (ex.: assim, é esbulho

parcial a invasão de dez hectares de uma gleba de cem hectares; é turbação a

atitude do confinante de guardar máquinas, na terra do vizinho, sem seu

consentimento, atrapalhando-o a exercer atributos da posse sobre o local). A

turbação legitima a ação de manutenção de posse;

c) violência iminente: a violência iminente caracteriza-se por atos de terceiro

que caracterizem ameaça de esbulho ou de turbação da posse, dando ao

possuidor o direito ao interdito proibitório.

Essas são as hipóteses que legitimam o possuidor a requerer a proteção judicial

da posse. Autoriza-se, entretanto, que o possuidor se mantenha ou se restitua na posse

por força própria, contanto que o faça logo e que os atos de defesa da posse não

ultrapassem os limites do indispensável à manutenção ou restituição. A isso se dá o

nome de desforço imediato ou desforço incontinenti, previsto no art. 1.210, § 1.º:

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O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por

sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de

desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou

restituição da posse.

Por fim, deve-se mencionar, também, a proteção possessória conferida pelos

embargos de terceiro senhor e possuidor ou apenas possuidor. Com efeito, ao permitir

a norma processual (CPC, art. 1.046, § 1.º) a defesa da posse contra atos judiciais de

constrição, confere-se previsão clara de proteção possessória ao possuidor da coisa.

2.6.1.1. Alegação de domínio na pendência do processo possessório

A exemplo da normatização anterior, continua vedada a alegação (ou exceção)

de domínio sobre a coisa na pendência do processo possessório. É que, sendo a ação de

caráter possessório, destina-se ela à proteção da justa posse do possuidor, a qual se pode

dar, inclusive, contra o proprietário. Por isso, não se admite, na ação puramente

possessória, a alegação de domínio.

A respeito, disciplina o art. 1.210, § 2.º do Código Civil: “não obsta à

manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito

sobre a coisa”.

No mesmo sentido, a norma do art. 923 do Código de Processo Civil, que reza

que “na pendência do processo possessório, é defesa, assim ao autor como ao réu,

intentar a ação de reconhecimento do domínio”.

A Súmula 487 do Supremo Tribunal Federal, no entanto, esclarece que “será

deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio; se com base neste for ela

disputada”, ou seja, somente se defere a posse com base no domínio se a ação for

intentada, pelo autor, com fundamento na propriedade. Neste caso, a ação possessória se

aproxima da petitória (ação na qual se pretende o reconhecimento da propriedade),

embora não perca o caráter possessório.

Em verdade, admite-se a decisão em favor de quem seja o proprietário não só

quando a posse é disputada com base no domínio, mas, também, quando houver, nos

autos, sobre quem detenha a posse justa sobre a coisa.

2.6.2. Direito aos frutos

a) possuidor de boa-fé: o possuidor de boa-fé que perder a posse e, por isso, for

obrigado a restituir a coisa ao legítimo dono, tem direito sobre os frutos

percebidos e colhidos no devido tempo em que conservava a boa-fé (art. 1214).

Os frutos pendentes ao tempo que cessar a boa-fé, assim como os colhidos por

antecipação, devem ser restituídos. Para efeito de restituição, reputam-se

colhidos ou percebidos os frutos naturais ou industriais logo que são separados,

enquanto os frutos civis se reputam dia a dia (art. 1215);

b) possuidor de má-fé: de má-fé o possuidor, além de não ter direito a nenhum

fruto, deverá restituir ou indenizar pelos frutos colhidos e percebidos, bem como

pelos percepiendos ou pendentes que não houver colhido por sua culpa, desde o

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momento em que se constituiu a má-fé. Todavia, tem direito de ser indenizado

das despesas de produção e custeio (art. 1216).

2.6.3. Perda ou deterioração da coisa

A perda representa a completa inutilização da coisa, por incêndio, terremoto,

perda em sentido próprio, ou outra causa; a deterioração, decorre da diminuição da

utilidade para o fim a que se destina.

a) possuidor de boa-fé: o possuidor de boa-fé não responde pela perda, nem pela

deterioração da coisa, salvo se a culpa for sua;

b) possuidor de má-fé: o possuidor de má-fé responderá pela perda ou a

deterioração ainda que o seja acidental, salvo se provar que uma ou outra

ocorreria mesmo que a coisa estivesse em mãos do legítimo possuidor (art.

1218).

2.6.4. Direito às benfeitorias

2.6.4.1. Noções

O direito às benfeitorias varia conforme a sua natureza e conforme a qualidade

do possuidor. As benfeitorias podem ser necessárias, úteis ou voluptuárias, conforme

tenham por fim conservar a coisa ou evitar que se deteriore, aumentar ou facilitar o seu

uso ou sirvam para simples deleite ou recreio, sem aumentar o uso habitual, embora a

torne mais agradável ou seu valor seja elevado (art. 96).

Conforme seja de boa-fé ou de má-fé o possuidor e conforme a natureza da

benfeitoria, varia a solução do problema em caso de restituição da coisa.

2.6.4.2. Possuidor de boa-fé

Ao possuidor de boa-fé que tiver de restituir a coisa em que houver introduzido

benfeitoria, é assegurado o direito de ser indenizado pelo valor delas, podendo inclusive

exercer o direito de retenção da coisa em seu todo até que o seja pelo valor das

benfeitorias úteis ou necessárias. Quando voluptuária a benfeitoria, ao invés de direito

de retenção, tem direito de retirá-la do local, se o puder sem danificar a coisa.

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das

benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não

lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e

poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias

necessárias e úteis.

2.6.4.3. Possuidor de má-fé

Se de má-fé o possuidor, outros serão os desfechos: direito de ser indenizado

somente pelas benfeitorias necessárias, mas sem direito de retenção, e perda

incontinenti das benfeitorias voluptuárias sem qualquer indenização.

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Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as

benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela

importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

É omisso o Código quanto às benfeitorias úteis. A doutrina tem opinião de que o

possuidor de má-fé perde tanto as benfeitorias úteis como as voluptuárias.

2.7. Perda da posse

A posse se perde, em se adotando a teoria objetiva de Ihering, assim que o

possuidor deixa de exercer sobre as coisas os poderes próprios do domínio, tal como

reza o art. 1.223: “perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do

possuidor, o poder sobre o bem , ao qual se refere o art. 1.196”.

Por outro lado, dispõe o art. 1.224 que só se considera perdida a posse para

quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a

coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido. Tal não significa que, sendo

violentamente repelido o justo possuidor, a posse do agressor ou clandestino passe a ser

justa. O dispositivo tem o condão apenas de fixar o exato momento da perda da posse.

Tanto é que, para se adquirir a propriedade por usucapião ordinário, exige-se justo

título e boa-fé, circunstâncias que são excluídas em caso de posse injusta.

Tal dispositivo quer dizer que a posse violenta ou clandestina somente se

convalida, pelo decurso de prazo, se obtida na presença do antigo possuidor e sem

nenhuma reação posterior deste.

Se o possuidor não presenciou o esbulho nem teve notícia posterior dele, não se

convalida a posse injusta, não gerando, pois, nenhum efeito a apreensão violenta ou

clandestina. Da mesma forma, só se considera perdida a posse para o que tenta

recuperá-la após ser repelido violentamente. Enquanto perdurarem os atos de tentativa

de recuperação da posse, não se considera esta perdida.

3. Direitos reais

No título específico sobre os direitos reais, o Código Civil dispõe, no art. 1.225,

o rol dos direitos reais, dele constando: I - a propriedade; II - a superfície; III - as

servidões; IV - o usufruto; V - o uso; VI - a habitação; VII - o direito do promitente

comprador do imóvel; VIII - o penhor; IX - a hipoteca; X - a anticrese.

Com relação ao antigo código, o legislador excluiu a enfiteuse3 e incluiu o

direito de superfície.

Além disso, o código estabelece que a propriedade ou qualquer outro direito

3 No art. 2.038, o Código proíbe a constituição de novas enfiteuses, mas excepciona as já existentes, que

continuarão regidas pelo CC-1916 e aquelas constituídas sobre terrenos de marinha verbis: Art. 2.038.

Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção,

às disposições do Código Civil anterior, Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, e leis posteriores. § 1º Nos

aforamentos a que se refere este artigo é defeso: I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas

transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações; II - constituir subenfiteuse. §

2º A enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial.

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real, de fato, não se transmite, no regime jurídico pátrio, pelo mero concurso da vontade

das partes, mas apenas com a tradição, em se tratando de bens móveis (art. 1.226) ou

pelo registro em cartório, em caso de bens imóveis (art. 1.227).

4. Propriedade

4.1. Breve histórico da propriedade:

4.1.1. Concepção conflituosa: Richard Pipes4 conta que, na Antigüidade Clássica,

sobretudo na chamada Idade do Ouro (período que o autor chama de passado místico)

preponderou a ausência de propriedade privada, existindo, somente, a chamada

propriedade comunal, época na qual, portanto, são desconhecidas as palavras meu e seu.

Conta-nos, ainda, sobre as filosofias divergentes de Platão e Aristóteles. O

primeiro defendia a comunidade ideal, a exemplo da sociedade do pretérito, porquanto a

propriedade era a motivação da luta de classes. Sem ela, portanto, não mais haveria

motivo para “a violência, as disputas ou a adulação”.5 Já Aristóteles, embora

compartilhasse com seu mestre a concepção de que desigualdades extremas levassem à

luta de classes, via na propriedade um atributo da família, e não da comunidade ou do

Estado. Aristóteles baseou sua filosofia em argumentos utilitaristas e não idealistas.

Para ele, a propriedade comunal era impraticável, porque ninguém cuida bem de objetos

que não sejam seus e, ainda mais, pessoas que possuem coisas em comum tendem a

brigar mais do que aquelas que as possuem individualmente.6 Sendo a causa da

discórdia, portanto, o desejo, e não a propriedade em si, era mais viável conseguir-se a

paz social com o esclarecimento do que pela abolição da propriedade privada.

Entretanto, Aristóteles tinha como ideal a propriedade que não causasse

diferenças extremas, tendo, como sociedade perfeita, aquela que fosse baseada na classe

média.

4.1.2. Concepção absolutista: Paulo Torminn Borges7 traça um histórico de evolução do

direito de propriedade no mundo, dizendo-a absoluta entre os romanos. Isto quer dizer

que o direito do proprietário, de usar, gozar e dispor da coisa, não poderia ser

restringido de forma alguma, nem sob qualquer pretexto.

- Propriedade feudal: exercida por uma pequena casta, sob a legitimação do

poder clerical, possibilitando aos ocupantes da terra apenas a posse, com pagamento de

tributos aos senhores feudais. Sobrevive, de certa forma, no instituto da enfiteuse.

- Revolução francesa: Para o ideário liberal, o que não se concebia era a

desigualdade de oportunidades entre os homens para aquisição da propriedade,

contrapondo-se, portanto, às teorias cristãs (que legitimavam a propriedade apenas nas

mãos dos escolhidos de Deus), fundamento básico da manutenção da propriedade feudal

na Idade Média. Segundo Paulo Torminn8, o ideário liberal da revolução francesa só fez

4 PIPES, Richard. Propriedade e Liberdade. Rio de Janeiro : Recordd, 2001, ps 24-33.

5 PIPES, Richard. Ob. citada, p. 27.

6 PIPES, Richard. Ob. citada, p. 28.

7 BORGES, Paulo Torminn. Institutos Básicos do Direito Agrário. 3.ª ed., São Paulo : Pró-Livro, 1978,

ps. 21/29 8 Idem.

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19

solidificar a idéia absolutista de propriedade, quando, em seu art. 544, o Código de

Napoleão reza que a propriedade é o direito de gozar e dispor das coisas da maneira

mais absoluta. Entretanto, observa-se, no mesmo dispositivo, que referido uso não

poderia violar as leis e regulamentos.

- O Código Civil de 1916 adotava essa vertente, em seu art. 524, quando

dispunha apenas os poderes de uso, gozo, disposição e seqüela do proprietário, sem

adotar nenhuma limitação ditada pelo interesse social, mas apenas as limitações

decorrentes do direito de vizinhança, que, em outras palavras, eram ditadas pela

propriedade de outrem.

4.1.3. Concepção relativista – função social da propriedade: do conceito individualista

visto acima, a propriedade evoluiu para o conceito de função social.

Paulo Torminn9 traça esta evolução desde Santo Tomás de Aquino.

Para Tomás de Aquino, a propriedade é legitimada por ser um direito natural,

existindo três planos distintos, na ordem de valores:

- direito natural de apossamento: como animal racional, é natural ao homem

apossar-se de bens materiais para satisfazer-se, economicamente, deles;

- direito de apropriação: decorrente do direito de apossamento, o direito de

apropriação consiste em que o homem, apossando-se dos bens materiais, tem,

por sua natureza de auto-preservação e preocupação com as gerações futuras, o

direito de reservar, para si (para seu próprio futuro e para os sucessores),

reservas econômicas que lhe garantam o sustento;

- possibilidade de condicionamento da propriedade ao momento histórico do

povo, desde que não se chegue ao extremo de negá-lo;

Já as encíclicas papais, com especial enfoque nas encíclicas rerum novarum

(Leão XIII), Quadragésimo anno (Pio XII) e Mater et Magistra, reconhecem na

propriedade um direito natural do homem, mas enfatizam a necessidade da realização

do bem comum.

Por fim, o Estatuto da Terra, em 1964, em seu art. 2.º, § 1.º, traz os requisitos

para que a propriedade cumpra sua função social.

Atualmente, a função social ampara-se também no art. 5.º, XXIII da

Constituição Federal e no novo Código Civil, cujo art. 1.228, §§ 1.º a 5.º dispõe sobre a

necessidade de a propriedade cumprir suas finalidades econômicas e sociais, devendo

ser exercida de modo que sejam preservados a flora, a fauna, as belezas naturais, o

equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição

do ar e das águas, podendo o proprietário ser privado da coisa em caso de utilidade

pública, interesse social, ou de posse coletiva da terra extensa, ocupada por mais de

cinco anos.

4.2. Conceito

9 Ibidem.

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20

Propriedade é direito de usar, gozar e dispor de uma coisa, bem como de reavê-

la de quem quer que injustamente a possua ou detenha, consoante definição legal do art.

1.228, caput do Código Civil.

Assim, a propriedade envolve o elemento interno, relativo ao proprietário, de

poder usar e gozar da coisa, conforme suas necessidades, bem como de dispor desse

poder, caso queira, seja alienando a propriedade em si ou transferindo a outrem alguns

de seus atributos, como a posse direta e a dação em garantia pelo pagamento de dívidas,

por exemplo.

Envolve, também, o elemento externo, que é o de se poder reaver a coisa de quem quer

que injustamente a possua.

4.3. Propriedade e domínio

Tem-se entendido, na lei, que propriedade e domínio são sinônimos. Entretanto, a

doutrina difere os dois conceitos, da seguinte forma:

a) Propriedade: direito que dá ao proprietário a faculdade de usar e gozar de coisa

incorporada ao seu patrimônio, como queira, podendo ser exercido, portanto, sobre

coisas corpóreas e incorpóreas;

b) Domínio: direito que dá ao dominus faculdade de dominação total da coisa,

incluindo não só a noção de jus utendi et fruendi, mas também a de jus abutendi, ou

seja, faculdade de dispor da coisa como bem entender, até mesmo com sua

destruição. Em função dessas características, entende-se que o domínio se exerce,

exclusivamente, sobre coisas corpóreas.

4.4. Elementos

Disciplina o art. 1.228 que ―o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e

dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua

ou detenha‖

Assim, podemos atribuir, como elementos da propriedade:

a) jus utendi: é o direito de usar a coisa, auferindo a sua utilidade;

b) jus fruendi: é o chamado direito de gozo, que envolve a percepção dos

frutos e produtos e demais vantagens provenientes da coisa;

c) jus abutendi: é o direito de dispor da coisa, o que envolve alienar,

gravar de ônus, destruir, consumir ou transformar a coisa;

Além desses elementos clássicos, vê-se que o dispositivo do art. 1.228 dá ao

proprietário, também, o direito de seqüela, ao lhe permitir o direito de reaver a coisa de quem

quer que injustamente a possua ou detenha.

4.5. Delimitação do direito de propriedade

A propriedade se presume plena e exclusiva, até prova em contrário, consoante dicção

do art. 1.231 do Código Civil. Entretanto, pode o proprietário mesmo limitar o alcance de seu

direito, ao gravar a coisa com ônus reais (hipoteca, penhor, anticrese, etc.) ou conferir a outrem

alguns de seus atributos, como nos direitos reais de uso, usufruto, habitação. Algumas dessas

limitações pode decorrer também da lei e não somente da vontade do proprietário, como ocorre

no caso de usufruto legal dos bens dos filhos pelos pais (art. 1.689, I), o direito de habitação do

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21

cônjuge sobrevivente (art. 1.831), etc.

Além das limitações ao conteúdo do direito de propriedade, a lei estabelece, com

relação aos imóveis, o âmbito espacial de seu alcance, ao dispor, no art. 1.229:

1.229. A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo

correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo

o proprietário opor se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma

altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las.

Referido dispositivo estabelece a parêmia de que o direito de propriedade do

solo não tem alcance ad sidera et ad ínferos, porque somente pode servir até onde

importar a utilidade de interesse do proprietário.

Além disso, em função do interesse público, bem como de expressa

determinação constitucional presente nos arts. 176 e 177 da Constituição Federal,

disciplina o art. 1.230:

Art. 1.230. A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais

recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos

arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais. Parágrafo único. O

proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego

imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação

industrial, obedecido o disposto em lei especial.

4.5.1. Direito aos frutos e produtos

Ademais, ―os frutos e mais produtos da coisa pertencem, ainda quando

separados, ao seu proprietário, salvo se, por preceito jurídico especial, couberem a

outrem (art. 1.232).

4.5.2. Descoberta

A descoberta (denominada de invenção no sistema anterior) está prevista no art.

1.233:

Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono

ou legítimo possuidor. Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará

por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade

competente.

Assiste ao inventor, nos termos do art. 1.234, direito de recompensa não inferior

a 5% do valor da coisa, além de indenização pelas despesas que houver feito com a

conservação e transporte da coisa. Se o dono preferir abandoná-la, o inventor adquire a

propriedade.

Se o inventor não encontrar o proprietário, deverá levar a coisa à autoridade, que

dará conhecimento da descoberta através da imprensa (art. 1.235). Não encontrado o

dono, a propriedade se transfere ao Município onde se encontrou a coisa, deduzidas as

despesas e a recompensa do inventor (art. 1.237).

Sendo de diminuto valor, poderá o Município abandonar a coisa em favor de

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quem a achou (art. 1.237, parágrafo único)

4.6. Limitações ao direito de propriedade

4.6.1. Princípio da função social da propriedade e limitações ao exercício do direito de

propriedade

A função social da propriedade não significa que este direito não seja mais

garantido, até porque a localização tópica do princípio da função social (CF, art. 5.º,

XXIII) vem logo após o da própria garantia do direito de propriedade (CF, art. 5.º,

XXII).

Entende-se, por função social, portanto, a exigência legal de que a propriedade,

rural ou urbana, atenda a requisitos mínimos, estabelecidos em lei, de atendimento ao

interesse da sociedade. Assim, temos:

4.6.2. Elementos da função social da propriedade rural

a) Na Constituição Federal de 1988 (art. 186)10

:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio

ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

b) Na Lei 8.629/93 (art. 9.º)

I – aproveitamento racional e adequado (art. 9.º, § 1.º): Considera-se racional e

adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de

eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta Lei. Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e

racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na

exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

§ 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou

superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área

efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

§ 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100%

(cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática: I - para os

produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos

índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para

cada Microrregião Homogênea; II - para a exploração pecuária, divide-se o número

total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo

órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea; III - a

soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área

10

O Estatuto da Terra, editado em 30/11/1964, já traçava, parcialmente esses requisitos, em seu art. 2.º, §

1.º, in verbis: A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando,

simultâneamente: a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim

como de suas famílias; b) mantém níveis satisfatórios de produtividade; c) assegura a conservação dos

recursos naturais; d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os

que a possuem e a cultivem.

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23

efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na

exploração.

§ 3º Consideram-se efetivamente utilizadas: I - as áreas plantadas com produtos

vegetais; II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação

por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo; III - as áreas de exploração

extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo

órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a

legislação ambiental; IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com

plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente; V -

as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de

culturas permanentes.

§ 4º No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente

utilizada a área total do consórcio ou intercalação.

§ 5º No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo

espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.

§ 6º Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a

área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º

deste artigo.

§ 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de

força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida,

devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano

respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio

ambiente;

II.a) utilização adequada dos recursos naturais (art. 9.º, § 2.º): Considera-

se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a

exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a

manter o potencial produtivo da propriedade.

II.b) preservação do meio ambiente (art. 9.º, § 3.º): Considera-se

preservação do meio ambiente a manutenção das características

próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na

medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade

e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho (art. 9.º, §

4.º): A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica

tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como

às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores

(art. 9.º, § 5.º): A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e

trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas

dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não

provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.

4.6.3. Elementos da função social da propriedade urbana

O imóvel urbano atende a função social quando cumpre as exigências

estabelecidas pelo Plano Diretor do Município, que é constitucionalmente obrigatório

apenas para as cidades com mais de vinte mil habitantes (art. 182, § 3º, CF), sem

prejuízo de outras cidades, cuja exigência decorre do art. 41 do Estatuto da Cidade, o

qual também dispõe acerca da função social da propriedade urbana:

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Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências

fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o

atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e

ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no

art. 2º desta Lei.

4.6.4. Limitações ao exercício do direito de propriedade no Código Civil

A necessidade, portanto, de se respeitar a função social da propriedade,

determina que esse direito sofra limitações que não só aquelas que provinham dos

chamados direitos de vizinhança. Por tais razões, o art. 1.228 do novo código, embora

reconheça o direito de usar, gozar e dispor da coisa, determina algumas limitações ao

direito de propriedade, como se pode ver, in verbis:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da

coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a

possua ou detenha.

§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as

suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam

preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a

flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio

histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer

comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar

outrem.

§ 3º O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de

desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse

social, bem como no de requisição, em caso de perigo público

iminente.

Outras limitações existem em dispositivos esparsos, como a do art. 1.278 do

Código Civil, que prevê que o interesse público pode determinar a interferência no

exercício do direito de propriedade. Veja-se:

Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de

fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à

saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade

vizinha.

Parágrafo único. Proíbem-se as interferências considerando-se a

natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que

distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância

dos moradores da vizinhança.

Art. 1.278. O direito a que se refere o artigo antecedente não

prevalece quando as interferências forem justificadas por interesse

público, caso em que o proprietário ou o possuidor, causador delas,

pagará ao vizinho indenização cabal.

4.6.4.1. A chamada desapropriação judicial (art. 1.228, §§ 4.º e 5.º)

O art. 1.228, §§ 4.º e 5.º prevê:

§ 4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel

reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-

fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas

nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e

serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico

relevante.

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§ 5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização

devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para

o registro do imóvel em nome dos possuidores.

Trata-se de claro exemplo de limitação ao direito de propriedade, pois o

proprietário será privado da coisa, se presentes os requisitos acima previstos.

4.6.4.1.1. Natureza jurídica

A natureza jurídica é de desapropriação, e não de usucapião, embora esteja

condicionada ao decurso de prazo, pois, na usucapião, não existe indenização ao

proprietário. É judicial, pois depende de iniciativa dos interessados e de sentença

judicial constitutiva. Na desapropriação pública, existe ato administrativo declaratório

da desapropriação, o que não ocorre no caso em estudo.

4.6.4.1.2. Requisitos

Segundo NERY Jr e ANDRADE NERY11

, os elementos da desapropriação

judicial são referentes à posse exercida e ao imóvel objeto da medida.

a) com relação ao imóvel:

a1) exercício de posse sobre imóvel de outrem

a2) imóvel com área extensa

b) com relação à posse:

b1) boa-fé12

;

b2) ininterrupta por cinco anos;

b3) exercício conjunto por número considerável de pessoas;

b4) realização, no imóvel, em conjunto ou separadamente, de obras e

serviços consideráveis de interesse social e econômico relevante. Tem-se

chamado esta característica da posse de posse-trabalho.

4.6.4.1.3. Exercício

Exerce-se esse direito não só através da defesa na ação reivindicatória, mas,

também, através de ação autônoma. A transcrição no Registro de Imóveis, entretanto,

nos termos do art. 1.228, § 5.º, fica condicionada ao pagamento do preço estabelecido

para a indenização.13

11

NERY Jr, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante.

3.ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais. 2005, p. 635. 12

A lei exige a boa-fé, mas não o justo título. 13

Jornada STJ, Enunciado 241: “O registro da sentença em ação reivindicatória, que opera

transferência da propriedade para o nome dos possuidores, com fundamento no interesse social (art.

1.228, § 5.º), é condicionada ao pagamento da respectiva indenização, cujo prazo será fixado pelo juiz”.

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4.6.5. Outras limitações

Como já se frisou, existem limitações ao direito de propriedade impostas pelo

próprio proprietário, como a faculdade de gravar a coisa de ônus reais e de instituir

sobre ela direito real em favor de terceiro, como servidão, usufruto, uso e habitação.

Outras limitações, embora civis, podem não decorrer da vontade do proprietário,

como a penhora, as chamadas servidões legais (direito de passagem, aqueduto, etc.) e as

limitações impostas pelo Poder Público, de cunho militar (CF, art. 5.º, XXV),

administrativo (desapropriações, servidões administrativas, como postes de rede

elétrica, etc). ou eleitoral (requisição de locais de votação, de veículos, etc.)

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4.7. Aquisição da propriedade

a) Formas de aquisição da propriedade:

a1) Derivada: adquire-se a propriedade de forma derivada quando a

aquisição decorre de relação negocial entre alienante e adquirente (ato

inter vivos) ou decorra de relação sucessória (causa mortis).

a2) Originária: diz-se originária a aquisição da propriedade quando o

adquirente a obtém sem o intermédio de relação negocial com algum

proprietário antigo, como se dá na ocupação, na acessão e, para a

maioria da doutrina, na usucapião14

. A principal característica que difere

a aquisição originária da derivada é o fato de que, na aquisição originária,

a propriedade se transfere ao adquirente sem os vícios e ônus que

incidiam, anteriormente, sobre a mesma coisa.

b) Sistemas de aquisição da propriedade:

b1) Aquisição pelo contrato: no ordenamento jurídico francês, o negócio

jurídico válido é suficiente para transmitir a propriedade;

b2) Aquisição pela tradição ou transcrição: no direito brasileiro,

inspirado no sistema alemão, a propriedade não se transmite

simplesmente pelo contrato, mas somente após a tradição (no caso de

móveis) ou transcrição (no caso de imóveis) Dispõe o art. 1.267 do

Código Civil que “a propriedade das coisas não se transfere pelos

negócios jurídicos antes da tradição”. Por sua vez, o art. 1.245 prevê:

“Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título

translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o

título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do

imóvel”. Na prática, enquanto não operada a tradição ou transcrição, a

ação do adquirente, contra o alienante será pessoal, para cumprimento da

obrigação de fazer consistente na transmissão da propriedade.

4.7.1. Aquisição da propriedade imóvel

4.7.1.1. Usucapião

4.7.1.2. Conceito

Usucapião é forma originária de aquisição da propriedade, na qual o possuidor

de coisa alheia exerce a posse, de forma contínua e pacífica (sem oposição) por período

de tempo suficiente, segundo a lei, para adquirir a propriedade.

Costuma-se denominar a usucapião, também, de prescrição aquisitiva.

Prescrição porque implica na perda de um direito (propriedade) pelo não exercício, pelo

decurso do tempo; aquisitiva porque leva à aquisição da propriedade pelo possuidor, em

oposição à prescrição extintiva, que importa apenas na perda do direito.

14

Caio Mário da Silva Pereira, por exemplo, entende que a usucapião é forma derivada de aquisição da

propriedade.

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Importante notar que a posse apta a gerar usucapião é somente aquela exercida

com animus domini, ou seja, se o possuidor tem poder sobre a coisa em virtude de

relação jurídica com o dono (nos casos de locação, comodato e depósito, por exemplo),

ou em hipótese de mera detenção (ou fâmulo da posse) a posse nunca poderá ser capaz

de gerar usucapião, porque não é vestida do ânimo de ser dono.

Assim, a lei utiliza-se, constantemente, da expressão possuir como seu/sua nos

dispositivos referentes à usucapião (arts. 1.238/1.242).

4.7.1.3. Natureza

Enquadra-se a usucapião entre os modos de aquisição originária da propriedade,

porque entre o usucapiente e o proprietário não existe vínculo. Como conseqüência, a

propriedade adquirida pela usucapião se incorpora sem os ônus e vícios porventura

existentes sobre o direito do anterior proprietário.

4.7.1.4. Extensão

A usucapião é modo de aquisição não só do direito de propriedade, como

também da servidão (art. 1.379).

Além disso, somente bens particulares podem ser objeto de usucapião, já que os

arts. 183, § 3.º e 191, parágrafo único da Constituição Federal dispõem, expressamente,

que os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

Não obstante, o Estatuto da Cidade (lei nº 10.257/01) instituiu a concessão de

uso para fins de moradia em imóveis públicos, prevista em seus arts. 15 e ss, entretanto,

tal disposição foi vetada pelo presidente da república.

4.7.1.5. Espécies de usucapião

4.7.1.5.1. Usucapião extraordinária

A usucapião extraordinária está prevista no art. 1.238 do Código Civil. Reza o

dispositivo:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição,

possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de

título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a

qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Diante do dispositivo, percebe-se que os requisitos da usucapião extraordinária

são:

a) posse, com animus domini, com os seguintes caracteres:

a1) ininterrupção: não pode haver interrupção no exercício da

posse ad usucapionem. Assim, a perda da posse, ou mesmo a

simples oposição, pelo proprietário, desse poder de fato sobre a

coisa, inviabiliza a aquisição da propriedade;

a2) pacificidade: a posse do usucapiente deve ocorrer sem

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oposição do proprietário. A oposição se caracteriza por atos que

caracterizem a intenção de retomar a coisa, como o desforço

imediato, a notificação extrajudicial, o ajuizamento de ação

reivindicatória, etc;

a3) prazo de quinze anos: o prazo de posse mansa e ininterrupta,

para a usucapião extraordinária, é de quinze anos. Esse prazo

“reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no

imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou

serviços de caráter produtivo”. (art. 1.238, parágrafo único);

a4) independência de justo título e boa-fé: no caso da usucapião

extraordinária, o legislador privilegia o grande lapso de tempo em

que a coisa já se encontra em poder do possuidor, razão por que

não se lhe exige a prova de justo título ou boa-fé para o exercício

da posse. Na prática, conclui-se que, ainda que o possuidor tenha

obtido a posse de forma injusta, nas modalidades violenta ou

clandestina, caracteriza-se a posse ud usucapionem, para efeito de

usucapião extraordinária, a partir do momento em que o

proprietário se desinteressa de reaver a coisa, pois, nos termos do

art. 1.224, “só se considera perdida a posse para quem não

presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de

retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente

repelido”.

4.7.1.5.2. Usucapião ordinária

A usucapião ordinária encontra-se disciplinada no art. 1.242, in verbis:

Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e

incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

São requisitos da usucapião ordinária, portanto:

a) posse, com animus domini, com os seguintes caracteres:

a1) continuidade: aqui, da mesma forma, não pode haver

interrupção (solução de continuidade) no exercício da posse ad

usucapionem. Assim, a perda da posse, ou mesmo a simples

oposição, pelo proprietário, desse poder de fato sobre a coisa,

inviabiliza a aquisição da propriedade;

a2) incontestabilidade: de igual modo, a posse do usucapiente,

para a modalidade ordinária, também deve ser pacífica, ou seja,

sem oposição do proprietário. A oposição se caracteriza por atos

que caracterizem a intenção de retomar a coisa, como o desforço

imediato, a notificação extrajudicial, o ajuizamento de ação

reivindicatória, etc.;

a3) prazo de dez anos: o prazo de posse mansa e ininterrupta, para

a usucapião ordinária, é de dez anos. “Será de cinco anos o prazo

previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido,

onerosamente, com base no registro constante do respectivo

cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores

nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado

investimentos de interesse social e econômico”. (art. 1.242,

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parágrafo único);

a4) Justo título e boa-fé: quando se trata de usucapião ordinário, é

imprescindível que o possuidor demonstre que adquiriu a posse de

boa-fé, o que significa o desconhecimento de circunstâncias que

tornem a posse injusta; além disso, exige-se o justo título. Por

justo título, tem-se, em doutrina, o título que, em tese, seria apto

para transferir a propriedade. Diz-se em tese porque se, na prática,

ele for apto, a usucapião é desnecessária. Assim, segundo Orlando

Gomes, o justo título é o título de aquisição ineficaz. O mesmo

autor dispõe sobre três casos nos quais se impede a eficácia do

título: a4.1) aquisição a non domino, ou seja aquisição da coisa,

pelo possuidor, de quem não seja dono; a4.2) aquisição a domino

nula, seja por incapacidade do dominus ou por alguma outra

nulidade de pleno direito; a4.3) erro no modo de aquisição, como

no caso da aquisição, por instrumento particular, de bem para cuja

aquisição a lei exigia escritura pública.15

4.7.1.5.3. Usucapião especial urbana

A usucapião especial urbana, agora expressamente disciplina no Código Civil, já

era prevista pelos arts. 183 da Constituição Federal e 9.º do Estatuto da Cidade. Prevê o

art. 1.240 do Código Civil:

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e

cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição,

utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio,

desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º O título

de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a

ambos, independentemente do estado civil. § 2º O direito previsto no parágrafo

antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

Seus requisitos são aqueles estabelecidos para a usucapião extraordinária, em

resumo: posse ininterrupta, pacífica e independente de justo título e boa-fé. Além

destes, exige-se, também:

a) utilização da área para moradia do usucapiente ou de sua família;

b) área máxima de 250 m2;

c) inexistência de outros imóveis (urbanos ou rurais) em nome do

possuidor;

d) limitação à aquisição da propriedade, por esta modalidade, somente

uma vez.

O Estatuto da Cidade previu, em seu art. 10, o chamado usucapião coletivo:

Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados,

ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos,

ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos

ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas

coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro

imóvel urbano ou rural.

15

GOMES, Orlando. Direitos Reais. 7.ª ed. Rio : Forense. 1980, ps. 164-165.

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Usucapião familiar:

o Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e

cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem

oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á

o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou

rural. § 1o O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao

homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

4.7.1.5.4. Usucapião especial rural

A usucapião especial rural, agora também expressamente disciplina no Código

Civil, já era prevista pelos arts. 191 da Constituição Federal e 1.º da Lei 6.969/81. Diz o

art. 1.239 do Código Civil:

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano,

possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em

zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu

trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a

propriedade.

Seus requisitos são aqueles estabelecidos para a usucapião extraordinária, em

resumo: posse ininterrupta, pacífica e independente de justo título e boa-fé. Além

destes, exige-se, também:

a) utilização da área para moradia do usucapiente ou de sua família;

b) área máxima de 50 hectares

b) inexistência de outros imóveis (urbanos ou rurais) em nome do

possuidor;

4.7.1.6. Aplicação de institutos da prescrição extintiva

Aplicam-se ao usucapião as disposições gerais acerca da prescrição extintiva,

por força do art. 1.244:

Art. 1.244. Estende-se ao possuidor o disposto quanto ao devedor acerca das

causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição, as quais também

se aplicam à usucapião.

Institutos como a citação em ação reivindicatória, por exemplo, então,

interrompem a prescrição aquisitiva em favor do possuidor.

Assim, excluem-se da aplicação da prescrição aquisitiva os proprietários

absolutamente incapazes, porque contra esses não corre a prescrição (art. 198, I).

4.7.1.7. Aspectos processuais.

Para as ações de usucapião ordinária e extraordinária, o Código de Processo

Civil prevê rito especial.

Já as usucapiões especiais devem ser processadas sob o rito sumário, consoante

determinação da Lei 6.969/81, art. 5.º e 14 do Estatuto da Cidade.

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4.7.1.7.1. Eficácia da sentença

A sentença proferida na ação de usucapião é meramente declaratória. Já houve

quem defendesse a natureza constitutiva da sentença, entretanto, o texto do art. 1.241 do

Código Civil (que já encontrava similar no art. 550 do revogado código) é claro ao

estatuir:

Art. 1.241. Poderá o possuidor requerer ao juiz seja declarada adquirida,

mediante usucapião, a propriedade imóvel. Parágrafo único. A declaração

obtida na forma deste artigo constituirá título hábil para o registro no Cartório

de Registro de Imóveis.

Na prática, tal disposição equivale a dizer que o possuidor, após o decurso do

prazo necessário, já é proprietário da área usucapida, sendo a sentença meramente

declaratória dessa propriedade, com eficácia para transcrição no registro de imóveis.

4.7.1.7.2. Usucapião como defesa

A alegação de usucapião como matéria de defesa, em ação dominial, dá ao

possuidor, em regra, apenas a prerrogativa de permanecer no imóvel, tendo em vista o

reconhecimento da propriedade na fundamentação da sentença.

Assim, a regra é a de que, na ação reivindicatória, por exemplo, a alegação de

usucapião, pelo réu, não terá o efeito de servir como título para transcrição no Registro

de Imóveis.

Esse tratamento decorre de dois motivos básicos: o primeiro é o de que a

alegação de usucapião, em defesa, não tem o condão de modificar o procedimento

ordinário adotado para a reivindicação, por isso, não sendo citados os confinantes, nem

as fazendas públicas, como exige o rito especial da usucapião, não pode a sentença

servir como título para registro; o segundo é o de que a alegação de usucapião como

defesa configura questão prejudicial ao exame do mérito da reivindicatória. Sendo

assim, segue-se o regramento geral do art. 469, I do Código de Processo Civil, que

prevê que não fazem coisa julgada: (...) III – a apreciação da questão prejudicial,

decidida incidentemente no processo.

Há aqueles, entretanto, que defendem a possibilidade de alegação de usucapião

através de ação declaratória incidental (CPC, arts. 5.º, 325 e 470), hipótese em que seu

reconhecimento faria coisa julgada e deveria servir de título para transcrição. Pensamos

que, para que se faça coisa julgada, a usucapião deve ser alegada sempre como

prejudicial externa, ou seja, em outro processo, tendo em vista a incompatibilidade de

seu procedimento com o ordinário estabelecido para a reivindicatória.

Essa regra, entretanto, aplica-se somente às usucapiões ordinária e

extraordinária, pois, nas usucapiões especiais (rural e urbana), existe regramento

expresso na legislação especial. A respeito, o art. 7.º da Lei 6.969/81:

Art. 7.º A usucapião especial poderá ser invocada como matéria de defesa,

valendo a sentença que a reconhecer como título para transcrição no Registro

de Imóveis.

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De igual teor o art. 13 do Estatuto da Cidade:

Art, 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada como

matéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para

registro no cartório de registro de Imóveis.

4.7.1.8. Acessio possessionis

Já vimos que a acessio possessionis (item 2.5.3) é a união da posse do possuidor

sucessor com a do possuidor antecessor, para as finalidades legais.

Essa prerrogativa pode ser utilizada pelo usucapiente, a fim de demonstrar o

prolongamento da posse ininterrupta e pacífica pelo prazo exigido em lei. Para a

usucapião ordinária, entretanto, a posse do antecessor deve conter os requisitos do justo

título e boa-fé, sob pena de inviabilidade da aquisição.

No sistema anterior do Código Civil de 2002, entendia-se que a acessio

possessionis se destinava exclusivamente às usucapiões ordinária e extraordinária, por

ausência de expressa previsão na legislação referente às usucapiões especiais (A Lei

6.969/81, por exemplo, não a previa).

A partir do Estatuto da Cidade, entretanto, passou a ser admitida a acessão de

posse para a usucapião especial urbana, por força dos arts. 9.º, § 3.º e 10, º 1.º.

O novo Código Civil resolveu, definitivamente, a dúvida, ao disciplinar, no art.

1.243:

Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos

artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art.

1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242,

com justo título e de boa-fé.

Repare que os artigos antecedentes ao art. 1.243, no novo código, tratam das

quatro hipóteses de usucapião (extraordinária, especial rural, especial urbana e

ordinária, respectivamente), razão por que se aplica a acessio possessionis a todas elas.

4.7.2. Aquisição pelo registro do título

A forma mais corrente de aquisição da propriedade imóvel, em nosso sistema

jurídica, é o do registro do título. Por registro do título, portanto, tenha-se a transcrição,

no Registro Imobiliário, de algum título hábil para a aquisição da propriedade

imobiliária, como: a escritura pública de compra e venda ou outro negócio jurídico que

vise transmitir a propriedade, como a doação ou a permuta, por exemplo (para imóveis

com valor superior a trinta salários mínimos); a escritura particular, quando o valor do

imóvel não superar os trinta salários mínimos; o formal de partilha, etc.

Já vimos que, em nosso ordenamento, a propriedade não se transmite antes da

tradição ou transcrição (item 4.7, letra b), seguindo a tradição dos sistemas romano e

germânico. Por isso, disciplina o art. 1.245:

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Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título

translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o título

translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. § 2º

Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de

invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser

havido como dono do imóvel.

Assim, antes do registro, pelo adquirente, o alienante continua a ser havido como

dono do imóvel; de igual forma, uma vez registrada a propriedade em nome do

adquirente, passa ele a ser o dono e assim continua a ser havido até que se promova, por

ação própria, a ação de decretação da invalidade do registro.

A ação para retificação ou anulação do registro se encontra prevista no art.

1.247. A conseqüência do reconhecimento judicial de invalidade do registro é o retorno

da propriedade ao proprietário anterior que conste no cartório de registro de imóveis.

Por isso, o parágrafo único do dispositivo citado prevê que “Cancelado o registro,

poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente da boa-fé ou do título

do terceiro adquirente”.

Essa desconsideração da boa-fé do terceiro adquirente se dá porque, caso não

fosse assim, a causa de nulidade ou anulabilidade do título não produziria o efeito

previsto pelo art. 182 do Código Civil, que estatui que “anulado o negócio jurídico,

restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível

restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.

A eficácia do registro se dá a partir do momento em que se apresenta o título ao

oficial, com a prenotação no protocolo (art. 1.246).

4.7.3. Aquisição por acessão

4.7.3.1. Conceito

Acessão significa acréscimo, aumento. Assim, pode o proprietário de um bem

imóvel adquirir propriedade pelo acréscimo, ao bem que já lhe pertencia, de nova

propriedade.

A acessão, portanto, pode ser natural ou por construções e plantações. Aqui

devemos diferenciar o que seja imóvel por natureza (como o solo, a vegetação natural,

os minerais, rios, etc.) dos bens imóveis por acessão natural.

Acessão natural é aquela que ocorre por acontecimento da natureza, sem a

intervenção humana, como na formação de ilhas, na aluvião, na avulsão e no abandono

de álveo.

Nas construções e plantações, diversamente, o acréscimo se dá pelo concurso da

ação humana.

4.7.3.2. Da formação de ilha

O conteúdo do art. 1.249, que disciplina a acessão pela formação de ilhas,

conduz à conclusão de que, ao se formar uma ilha em uma corrente de águas, sua

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propriedade é automaticamente acrescida à propriedade daquele que for dono de um

imóvel que seja fronteiro à referida ilha.

A aquisição da propriedade, entretanto, ocorre na proporção da proximidade do

imóvel com a ilha.

Assim, as ilhas que se formarem no meio do rio consideram-se acréscimos

sobrevindos aos terrenos ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção da

testada de cada imóvel. Tenha-se, por testada, a extensão da margem do imóvel à frente

da ilha. Além disso, o acréscimo de cada imóvel vai somente até a linha que divide o

álveo (leito do rio) em duas partes iguais.

Destarte, se a ilha se situa entre uma margem e a linha divisória (situada na

metade do leito), pertencerá somente aos proprietários dos imóveis que se situam do

lado onde ela se formar.

Se a ilha se formar pela formação de um novo braço do rio, ela pertencerá ao

proprietário da área invadida pela água.

4.7.3.3. Aluvião

Aluvião é o acréscimo, sucessivo e imperceptível, de depósitos e aterros naturais

pelas correntes nos terrenos marginais. Segundo conceituação de Coelho da Rocha (in

Nery Jr. e Nery, ob. Citada, p. 654), “é o aumento que as correntes dos rios e ribeiras

depositam pouco a pouco nas terras das margens”.

O acréscimo formado pela aluvião pertence ao proprietário do prédio ao qual

adere, sem direito à indenização ao proprietário que teve seu imóvel diminuído.

4.7.3.4. Avulsão

A avulsão, diferentemente da aluvião, ocorre de forma abrupta, quando, por

força natural violenta, uma porção de terra se destacar de um prédio e se juntar a outro.

Nesse caso, o dono do prédio acrescido adquire a propriedade se indenizar o

dono do prédio diminuído. Esse direito de indenização, no entanto, sofre decadência se,

no prazo de 01 (um) ano, não houver reclamação (art. 1.251, caput, parte final).

Se, dentro do prazo, o proprietário prejudicado reclamar e o proprietário

acrescido se negar a indenizar, terá o primeiro o direito à remoção da parte acrescida

(art. 1.251, parágrafo único).

4.7.3.5. Abandono de álveo

Álveo é o leito do rio, por onde passam suas águas. Pode ocorrer de a água

abandonar o álveo, formando porção de terra. Essa terra pertencerá aos proprietários

ribeirinhos de ambas as margens. A propriedade de cada prédio é estendida, portanto,

até o meio do álveo, sem direito de indenização aos donos dos terrenos por onde as

águas abrirem novo curso.

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Só se caracteriza o álveo abandonado se o abandono for total e permanente. Se

ocorre abandono parcial, por desvio ou retração de águas, ocorre o que se chama de

aluvião imprópria, dando ao proprietário ribeirinho o domínio da porção de terras

acrescida.

4.7.3.6. Das construções e plantações

4.7.3.6.1. Noções

Adquire-se a propriedade imóvel, também, quando se planta ou constrói. O art.

1.253 prevê a regra geral para as construções e plantações, ao dispor que “toda

construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietário e à

sua custa, até que se prove o contrário”.

Assim, o proprietário que constrói ou planta em solo próprio adquire, de plano, a

propriedade da construção e plantação que se incorpora ao chão.

Diversas circunstâncias, entretanto, podem indicar a necessidade de tratamento

especial pela lei, dada a possibilidade de realização de construção ou plantação por

terceiros possuidores, de boa ou má-fé. Vejamos:

4.7.3.6.2. Plantação ou construção em solo próprio com sementes, plantas ou materiais

alheios

O proprietário do terreno que planta ou edifica em solo próprio, utilizando-se de

sementes, plantas ou materiais de outrem, adquire a propriedade da plantação ou

construção, entretanto, deve pagar o valor da matéria-prima ao proprietário dela. Se

estiver de má-fé, responde ainda por perdas e danos.

4.7.3.6.3. Plantação ou construção em terreno alheio

Quem realizar plantação ou construção em solo alheio, de qualquer forma perde,

em proveito do proprietário do solo, as sementes, plantas ou construções. A lei lhe dá

diferente tratamento em caso de boa ou má-fé:

a) se age de boa-fé: tem direito à indenização pelo valor da construção ou

plantação;

b) se age de má-fé: não tem direito à indenização;

c) se de ambas as partes houve má-fé: adquirirá o proprietário as sementes,

plantas e construções, devendo ressarcir o valor das acessões. Presume-se má-fé

no proprietário, quando o trabalho de construção, ou lavoura, se fez em sua

presença e sem impugnação sua (art. 1.256, parágrafo único)

d) Construção ou plantação em terreno alheio com sementes plantas ou materiais

alheios: nesse caso, aplica-se o art. 1.256, devendo o proprietário do solo, que

adquire a propriedade da acessão ressarcir o seu valor. O proprietário das

sementes, plantas ou materiais poderá cobrar do proprietário do solo a

indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou construtor (art.

1.257, parágrafo único)

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4.7.3.6.3.1. Direito de retenção

Muito se tem discutido acerca do direito de retenção do plantador ou construtor

que planta ou semeia de boa-fé em solo alheio. O ordenamento positivo não o prevê, ao

contrário do que faz, expressamente, para as benfeitorias (art. 1.219).

Lembre que construção e plantação são modalidades de acessão, ou seja, modo

de aquisição da propriedade, significando acréscimo original ao solo nu. Já a benfeitoria

caracteriza-se como melhoramento a uma construção já existente, não se podendo

confundir, portanto, os dois conceitos.

A jurisprudência tem se inclinado no sentido da impossibilidade do exercício do

direito de retenção pela construção ou plantação, a exemplo do seguinte julgado:

Acessão. Direito de retenção. Impossibilidade. Cuidando-se de acessão, não

há possibilidade de exercício do direito de retenção (RT 616/144)16

VENOSA, por exemplo, opina no sentido da existência de direito de retenção ao

possuidor que constrói ou planta em solo alheio de boa-fé:

No entanto, seja o conceito de benfeitora, seja de acessão voluntária, o que a lei

busca é evitar o injusto enriquecimento. O regime da construção e da

semeadura em terreno alheio pode ensejar o direito de retenção ao possuidor de

boa-fé, da mesma forma que as benfeitorias, pois a índole é a mesma17

Na Jornada I do STJ, concluiu-se, no enunciado 81: “o direito de retenção

previsto no CC 1.219, decorrente da realização de benfeitorias necessárias e úteis,

também se aplica às acessões (construções e plantações) nas mesmas circunstâncias.

4.7.3.6.3.2. Aquisição da propriedade do solo alheio pelo terceiro plantador ou

construtor

O novo código contempla hipóteses de aquisição da propriedade do solo por

aquele que planta ou constrói em terreno alheio. Podemos dividir as inovações em três

hipóteses:

A – Aquisição total da propriedade do solo alheio, por construção ou plantação

O parágrafo único do art. 1.255 do Código Civil prevê que “se a construção ou

a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé,

plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da

indenização fixada judicialmente, se não houver acordo”.

Havendo boa-fé, portanto, de quem plantou ou edificou, este adquire a

propriedade do solo de terceiro, desde que o valor da plantação ou construção exceda

consideravelmente o valor do terreno e o edificante ou plantador pague indenização

fixada judicialmente, se não houver acordo.

16

Apud NERY JR e NERY, ob. Citada, p. 655. 17

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direitos Reais. 6.º ed. São Paulo : Atlas. 2006, ps. 187-188.

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A discussão jurídica em torno do assunto é mais tenaz a respeito do significado

da expressão “exceda consideravelmente o valor do terreno”. Com efeito, trata-se de

conceito legal indeterminado cuja aplicação caberá à interpretação do juiz no caso

concreto.

Aqui, portanto, diferentemente das hipóteses a seguir, existe ocupação total do

solo alheio, com a conseqüente aquisição total dessa propriedade.

B – Aquisição parcial da propriedade do solo alheio, por construção, em porção não

excedente à vigésima parte do terreno invadido

Os arts. 1.258 e 1.259 trazem dispositivos sem precedentes no código antigo,

que se aplicam, entretanto, apenas às construções e não às plantações.

De acordo com o art. 1.258, aquele que constrói, parcialmente, em solo próprio e

invade, em parte, solo alheio, de boa-fé, tem direito à aquisição do solo invadido, desde

que a construção não exceda a vigésima parte do terreno total invadido e se o valor da

construção exceder o dessa parte, mediante pagamento de indenização correspondente

ao valor da área perdida e à desvalorização da área remanescente.

Se o construtor estiver de má-fé, deverá pagar em décuplo o valor da

indenização prevista no caput do art. 1.258 e só terá direito à aquisição do solo se o

valor da construção exceder consideravelmente o da parte invadida, que não pode ser

superior à vigésima parte do terreno total invadido. Além disso, o direito de aquisição

está condicionado, também, à circunstância de não se poder demolir a porção invasora

sem grave prejuízo para a construção.

C – Aquisição parcial da propriedade do solo alheio, por construção, em porção

excedente à vigésima parte do terreno invadido

Finalmente, o art. 1.259 prevê o direito de adquirir a propriedade do solo alheio,

em caso de invasão parcial, se a invasão exceder a vigésima parte do terreno de terceiro.

Entretanto, para este caso, embora a lei não exija que o valor da construção exceda

consideravelmente o da área invadida, a indenização se fixa pelo valor da área invadida,

acrescida da desvalorização da área remanescente e, enfim, do valor que a invasão

acrescer à construção.

Se o construtor estiver de má-fé, neste caso, não há direito à aquisição da parte

invadida, devendo ser demolida a construção e condenado o edificante de má-fé ao

pagamento de perdas e danos em dobro. Em resumo, a aquisição pelo construtor de má-

fé só se dá na hipótese do art. 1.258, parágrafo único, ou seja, se a invasão não exceder

a vigésima parte do terreno invadido.

4.8. Aquisição da propriedade móvel

4.8.1. Usucapião

A usucapião também é forma de aquisição da propriedade móvel. Aqui, também,

subdivide-se em ordinário e extraordinário.

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39

Na ordinária, exige-se justo título e boa-fé a par da posse contínua e incontestada

da coisa por três anos.

Na extraordinária, não se exige justo título e boa-fé, mas apenas a posse contínua

e incontestada da coisa por cinco anos.

4.8.2. Ocupação

Ocorre a ocupação quando alguém se assenhoreia de coisa sem dono, desde que

a ocupação não seja defesa por lei.

A caracterização da coisa sem dono pode se dar por se tratar de bem que nunca

teve proprietário (res nullius) ou de coisa abandonada pelo dono (res derelictae), desde

que se demonstre a vontade expressa do dominus de abandonar a propriedade da coisa.

Por ocupação defesa em lei podemos ter a apropriação de animais vedada pela

legislação ambiental ou de bens cuja exploração resulta de monopólio da União, como

jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os

monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais.

4.8.3. Achado do tesouro

O tesouro pode ser encontrado de forma casual ou premeditada.

Sendo casual o encontro, tem o descobridor o direito à metade do tesouro,

dividindo-o com proprietário do prédio.

Sendo premeditado o encontro do tesouro, aplica-se o art. 1.265, parte final, que

dispõe que pertence por inteiro ao proprietário do prédio o tesouro achado por ele, em

pesquisa por ele ordenada, ou por terceiro não autorizado.

4.8.4. Tradição

A tradição é o negócio jurídico translativo da propriedade móvel no direito

brasileiro. Com efeito, segundo o art. 1.267, “a propriedade das coisas não se transfere

pelos negócios jurídicos antes da tradição”.

4.8.4.1. Constituto possessório

Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir a coisa pelo

constituto possessório. Nesse caso, tem-se hipótese em que o alienante da coisa

continua a possuí-la, agora sob outro título (locatário, depositário, etc.) Assim, a lei dá

ao fenômeno o nome de constituto possessório, possibilitando ao adquirente a aquisição

da propriedade através da tradição simbólica da coisa.

4.8.4.2. Alienação de coisa sob poder de terceiro

Subentende-se também a tradição, de forma simbólica, quando o transmitente

aliena ao adquirente coisa que se encontra em poder de terceiro, constando no título

negocial o direito à restituição. Assim, tem o adquirente o direito de exigir do terceiro a

entrega real da coisa, uma vez que já adquiriu sua propriedade pela tradição simbólica.

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40

Essas disposições, entretanto, não podem violar direito do possuidor que decorra

de negócio jurídico com o alienante, como o contrato de locação por tempo determinado

que ainda não tenha chegado ao seu termo final na época da alienação.

4.8.4.3. Traditio brevi manu

Ocorre a tradição brevi manu quando o adquirente já está na posse da coisa, por

ocasião do negócio jurídico, ou seja, tradição real não há, pois o adquirente já se

encontra com a coisa quando a adquire.

4.8.5. Especificação

Especificação é a aquisição da propriedade de coisa que se obtém com a

transformação de matéria-prima, não sendo possível restituir tal matéria à forma

anterior.

Se o especificador é o proprietário da matéria-prima, não há dificuldade no

fenômeno.

Se o especificador, no entanto, não é proprietário da matéria-prima, a lei dá as

seguintes soluções:

a) Matéria-prima em parte alheia: se o especificador obtém a espécie

nova com matéria-prima somente em parte alheia, adquire ele a

propriedade dessa nova espécie, desde que não seja possível restituir-se à

forma anterior;

b) Matéria-prima integralmente alheia: se a matéria-prima for

integralmente alheia, e impossível a redução à forma precedente, o

especificador somente adquire a propriedade se tiver agido de boa-fé;

b1) Especificador de má-fé: estando o especificador de má-fé, a

espécie nova será do dono da matéria-prima, ainda que se possa

reduzi-la à forma anterior;

b2) Espécie nova de valor consideravelmente superior ao da

matéria-prima: Em qualquer caso, inclusive o da pintura em

relação à tela, da escultura, escritura e outro qualquer trabalho

gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do

especificador, se o seu valor exceder consideravelmente o da

matéria-prima (art. 1.270, § 2.º).

O art. 1.271 estabelece ao dono da matéria-prima, em qualquer caso (utilização

parcial ou total), o direito ao ressarcimento do dono que sofrer, a não ser no caso do

especificador de má-fé, porque, nesse caso, adquire ele a propriedade da espécie nova.

4.8.6. Confusão, comistão18

e adjunção

a) Confusão: mistura de líquidos;

b) Comistão: junção de coisas sólidas ou secas, formando uma só coisa (Ex.:

18

A Lei (CC, Livro III, Título III, Cap. III, Seção VI), utiliza-se equivocadamente da palavra comissão,

quando o correto é comistão.

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41

mistura de duas espécies de café). Neste caso, não há formação de espécie

nova, pois, em sendo assim, ocorre especificação;

c) Adjunção: justaposição de uma coisa sobre outra. Difere-se da comistão no

sentido de que, na adjunção, não há mistura das coisas justapostas, mas a

junção de duas coisas que continuam distintas, mas impossíveis de serem

separadas (Ex: soldagem de uma peça a um motor).

A regra ditada pela lei para o caso é o condomínio (art. 1.272, § 2.º), cabendo a

cada um dos donos quinhão proporcional ao valor da coisa com que entrou para a

mistura ou agregado.

Sendo uma das coisas, no entanto, considerada principal, e a outra, acessória, o

dono da principal adquirirá o todo, indenizando os demais (ex.: incrustação de uma

pedra preciosa a um anel de metal de valor bastante inferior).

4.8.6.1. Confusão, comistão ou adjunção de má-fé

Se a confusão, comissão ou adjunção se operou de má-fé, à outra parte caberá

escolher entre adquirir a propriedade do todo, pagando o que não for seu, abatida a

indenização que lhe for devida, ou renunciar ao que lhe pertencer, caso em que será

indenizado.

4.8.6.2. Formação de espécie nova

Se da confusão, comistão ou adjunção se obtém espécie nova, temos

especificação. Entretanto, ao contrário do que dizia o código de 1916, que determinava

que se aplicassem as regras da especificação, o novo código manda aplicar regras dos

arts. 1.272 e 1.273, razão por que, em sendo assim, não se dá mais ao especificador,

nesses casos, a propriedade automática da coisa, mas sim o condomínio estabelecido

pelo art. 1.272.

4.9. Perda da propriedade

O Código Civil de 2002 previu, no art. 1.275, os modos de perda da propriedade

(móvel ou imóvel).

Temos, portanto, segundo a dicção legal, os seguintes modos de perda da

propriedade:

a) Alienação: embora a lei diga que se perde a propriedade pela

alienação, o negócio jurídico, por si só, como vimos, não gera esse efeito,

pois o adquirente não obtém a propriedade senão após a tradição ou

transcrição. Depende, portanto, de registro do título no Registro de

Imóveis, em caso de bem imóvel;

b) Renúncia: a renúncia é modo especial de abandonar a propriedade,

como no caso de renúncia à herança, por exemplo. Com a morte do autor

da herança, transmite-se imediatamente a propriedade dos bens aos

herdeiros (princípio da saisine). A renúncia, portanto, importa em perda

dessa propriedade. Por expressa determinação legal (art. 1.275, parágrafo

único), depende, também, de registro do título no Registro de Imóveis,

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42

em caso de bem imóvel;

c) Abandono: o abandono, ou derrelição, é ato de vontade do

proprietário, o qual deixa de exercer os direitos à propriedade (usar,

gozar) com vontade expressa de dispor dela. Não pode ser presumido,

como no caso da simples ausência de exercício, sem vontade de

abandonar. Também não se caracteriza o abandono no caso de perda ou

sumiço da coisa, pois, nos termos do art. 1.233, “quem quer que ache

coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor”;

d) Perecimento da coisa: é a destruição da coisa, que não se confunde

com sua perda. É hipótese na qual o objeto do direito deixa de existir;

e) Desapropriação: é forma de perda da propriedade para o poder

público, por interesse social ou utilidade pública. A desapropriação pode

ser: e1) direta: quando decorrer, previamente, de decreto de

desapropriação, podendo ser amigável ou judicial. No respectivo

processo, não cabe ao proprietário discutir a justiça ou injustiça da

desapropriação, mas apenas o valor da indenização ou possível

extrapolação da área desapropriada; e2) indireta: quando o poder público

se utiliza da área particular, nele constituindo um bem público de uso

comum do povo ou especial (como abertura de ruas, estradas ou

construção de prédios públicos), sem o prévio decreto desapropriatório,

de forma que ocorre uma afetação implícita da coisa. Nesse caso, assiste

ao proprietário o direito de indenização, através de ação contra o poder

público.

Além dos casos estabelecidos no art. 1.275, podemos citar a desapropriação

judicial prevista pelo art. 1.228, §§ 4.º e 5.º) e pelo abandono de coisa imóvel,

disciplinado pelo art. 1.276, passando o bem para o domínio do Poder Público.

5. Direitos de vizinhança

5.1. Natureza jurídica

A primeira discussão que se estabelece a respeito dos direitos de vizinhança diz

respeito à sua natureza jurídica.

Sua ausência no rol dos direitos reais do art. 1.225 pode induzir à conclusão de

que se tratam de direitos pessoais, no entanto, é de se observar, de plano, que não se

caracterizam os direitos de vizinhança como direitos pessoais, uma vez que não têm

eles um sujeito passivo fixo e determinado; pelo contrário, exercem-se em favor de um

imóvel e em desfavor de outros, quaisquer que sejam seus proprietários.

Alguns enxergam nos direitos de vizinhança obrigações propter rem, no que não

se contém equívoco, já que se estabelecem, em desfavor do proprietário, obrigações

(negativas e positivas) decorrentes da coisa.

De logo, entretanto, nota-se que os direitos de vizinhança não se impõem

somente a imóveis contíguos, mas a quaisquer imóveis que possam interferir no

exercício dos atributos da propriedade pelo dono.

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43

Os direitos da vizinhança, portanto, são, antes de obrigações propter rem,

atributos da propriedade imóvel, os quais, entretanto, favorecem não só o proprietário

como, também, o possuidor, já que estabelece limite à propriedade imóvel vizinha.

Orlando Gomes19

destaca que são dois os sistemas que visam classificar os

direitos de vizinhança: a) sistema das servidões legais: nesse sistema, os direitos de

vizinhança se impõem como ônus imposto a um prédio serviente; b) sistema das

limitações legais da propriedade: por este, conceituam-se os direitos de vizinhança

como obrigações negativas impostas ao proprietário, consistentes na proibição de

perturbar a propriedade vizinha.

É certo que o ordenamento jurídico não adotou a posição das servidões legais,

pois os direitos de vizinhança se encontram disciplinados em capítulo diverso daquele

dispensado às servidões. No entanto, percebe-se, em alguns casos, nítida situação de

servidão, como no de passagem forçada (art. 1.285) e no direito de aqueduto (art.

1.293). Nos demais, trata-se de limitação ao direito de propriedade, como na proibição

do uso anormal da propriedade, árvores limítrofes, passagem de cabos e tubulações,

águas, limites entre prédios, direito de tapagem e direito de construir.

5.2. Uso anormal da propriedade

Disciplina o art. 1.277 que “o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o

direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde

dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha”.

Esta norma dá ao proprietário ou possuidor o alcance geral do sentido de

limitação do direito de propriedade do vizinho. Pelo dispositivo, portanto, dá-se ao

proprietário ou possuidor o direito à ação de nunciação de obra nova, desde que esta

possa ser prejudicial à segurança, ao sossego e à saúde dos que habitam o imóvel

prejudicado.

O parágrafo único define: “proíbem-se as interferências considerando-se a

natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as

edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da

vizinhança”. Assim, por exemplo, pode-se proibir a interferência resultante de

estabelecimento comercial, em imóvel vizinho, quando for erguido em zona

exclusivamente residencial, consoante a respectiva lei municipal de zoneamento urbano.

5.2.1. Interferência determinada pelo interesse público

Em claro atendimento às normas de direito administrativo, que dá ao Poder

Público a prerrogativa de se utilizar da propriedade vizinha para finalidades públicas (as

chamadas servidões administrativas, como no caso da passagem de linhas elétricas, por

exemplo), o art. 1.278 prevê que “o direito a que se refere o artigo antecedente não

prevalece quando as interferências forem justificadas por interesse público, caso em

que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho indenização

cabal”.

19

Ob. Citada, p. 183.

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44

No entanto, “ainda que por decisão judicial devam ser toleradas as

interferências, poderá o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando estas se

tornarem possíveis” (art. 1.279).

5.2.2. Ação demolitória e ação de dano infecto

O 1.280 prevê que “o proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono

do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como

que lhe preste caução pelo dano iminente”.

Quando a única solução para que a ruína do imóvel vizinho não se transforme

em prejuízo para o proprietário ou possuidor for a destruição da obra, assiste-lhe o

direito à ação demolitória.

Quando a ruína do prédio vizinho decorrer de obra já existente, pode o

proprietário ou possuidor exigir caução pelo dano iminente, ao que se denomina de

ação de dano infecto e é prevista como procedimento cautelar no art. 830 do Código de

Processo Civil.

Se se tratar de obra nova que possa prejudicar a propriedade vizinha, a solução é

a ação de nunciação de obra nova (CPC, art. 934, I).

Pode ocorrer que a obra pretensamente nociva tenha de ser realizada dentro do

imóvel do proprietário pretensamente prejudicado. Assim, prevê o art. 1.281 que “o

proprietário ou o possuidor de um prédio, em que alguém tenha direito de fazer obras,

pode, no caso de dano iminente, exigir do autor delas as necessárias garantias contra o

prejuízo eventual”.

5.3. Árvores limítrofes.

Se o tronco da árvore se situar na linha divisória entre dois prédios, presume-se

pertencer em comum aos donos dos dois prédios confinantes (art. 1.282).

Além disso, assiste ao proprietário de um prédio o direito de cortar as raízes e

ramos de árvore situada no prédio vizinho que, porventura, ultrapassarem a estrema do

prédio, mas só até o plano vertical divisório (art. 1.283).

Por fim, assiste também ao proprietário do prédio o direito aos frutos caídos de

árvore do terreno vizinho, desde que caiam em propriedade particular (art. 1.284).

5.4. Passagem forçada

O direito de passagem decorre do encravamento do prédio, ou seja, para que haja

direito à passagem forçada, é indispensável que o prédio não tenha acesso à via

pública, nascente ou porto (art. 1.285).

Obviamente, a existência de acesso à via pública para o prédio não impede o

estabelecimento de servidões de trânsito entre prédios vizinhos, entretanto, a servidão

depende do consenso entre proprietários. No encravamento, a passagem é forçada.

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45

Divide-se em direito de passagem para: a) acesso à via pública; b) acesso à

nascente de águas, para delas se aproveitar; c) acesso porto, para nele atracar ou

desatracar.

Tem-se admitido que, se o imóvel detiver acesso, mas este for extremamente

penoso ou inseguro, caracteriza-se o direito à passagem forçada20

.

Por fim, o exercício desse direito depende de pagamento de indenização ao

vizinho pelos prejuízos que a utilização possa causar ao seu imóvel.

5.5. Passagem de cabos e tubulações

Em atendimento ao interesse público, disciplina o art. 1.286 que “mediante

recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área

remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel,

de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública,

em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou

excessivamente onerosa”.

É o que ocorre com a passagem de tubulações de água e esgoto, ou de fiações

subterrâneas de rede elétrica ou telefônica.

Assiste ao proprietário prejudicado o direito de “exigir que a instalação seja

feita de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como, depois, seja removida, à

sua custa, para outro local do imóvel” (art. 1.286, parágrafo único), bem como de

exigir a realização de obras de segurança “se as instalações oferecerem grave risco”

(art. 1.287).

5.6. Águas

5.6.1. Águas naturais

O dono ou o possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que

correm naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu

fluxo; porém a condição natural e anterior do prédio inferior não pode ser agravada por

obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio superior (art. 1.288).

5.6.2. Águas artificiais

Quanto às águas artificiais, no entanto, disciplina o art. 1.289: ―Quando as águas,

artificialmente levadas ao prédio superior, ou aí colhidas, correrem dele para o inferior,

poderá o dono deste reclamar que se desviem, ou se lhe indenize o prejuízo que sofrer.

Parágrafo único. Da indenização será deduzido o valor do benefício obtido‖.

5.6.3. Águas pluviais e de nascente

20

Cf. VENOSA, ob. Citada, ps. 286-287

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46

Segundo o art. 1.290, “o proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas

pluviais, satisfeitas as necessidades de seu consumo, não pode impedir, ou desviar o

curso natural das águas remanescentes pelos prédios inferiores”.

5.6.4. Poluição de águas

Disciplina o art. 1.291 que “o possuidor do imóvel superior não poderá poluir

as águas indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis

inferiores; as demais, que poluir, deverá recuperar, ressarcindo os danos que estes

sofrerem, se não for possível a recuperação ou o desvio do curso artificial das águas”.

A poluição de águas configura dano ambiental. Ainda que as águas se situem em

imóvel particular, em se tratando de dano ambiental, a lei não deixa ilesa nem a auto-

lesão, até porque, como se vê, a poluição de águas prejudica terceiros e, como um todo,

a sociedade. Assim, não se exige culpa na conduta do proprietário que polui águas, pois,

de qualquer forma, deverá ele recuperá-las.

5.6.5. Barragens, açudes e represamento de água

De acordo com o art. 1.292, “o proprietário tem direito de construir barragens,

açudes, ou outras obras para represamento de água em seu prédio; se as águas

represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado pelo dano

sofrido, deduzido o valor do benefício obtido”.

5.6.6. Direito de aqueduto ou servidão legal de aqueduto

A servidão legal de aqueduto é prevista, também, no Código de Águas (Decreto

24.643/34).

O art. 1.293, caput reza que “é permitido a quem quer que seja, mediante prévia

indenização aos proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios

alheios, para receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras

necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à

indústria, bem como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a

drenagem de terrenos”.

Trata-se, também, de servidão forçada. Ao proprietário do prédio serviente

assiste o direito ao “ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da

infiltração ou irrupção das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a

canalizá-las”, bem como o de “exigir que seja subterrânea a canalização que

atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais”.

Por fim, prevê o parágrafo terceiro do art. 1.293 que ―o aqueduto será construído

de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários dos imóveis vizinhos, e a

expensas do seu dono, a quem incumbem também as despesas de conservação‖.

A expressão “águas a que tenha direito” exposta no caput do dispositivo

encontra complemento no art. 1.290, acima referido. Quer dizer, o proprietário do

prédio favorecido tem o direito a buscar as águas remanescentes de correntes pluviais

ou de nascentes nos imóveis vizinhos.

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5.6.7. Limites entre prédios e direito de tapagem

O art. 1.297 traduz ao proprietário o direito de cercar, murar, valar ou tapar de

qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural. Para tanto, assiste a ele o direito de

constranger o confinante a proceder, em conjunto, à demarcação, bem como a aviventar

rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados (direito à ação

demarcatória).

5.6.8. Direito de construir

O direito de construir, nos termos do art. 1299, é limitado pelo direitos dos

vizinhos e pelos regulamentos administrativos.

Assim, o Código Civil estabelece, por exemplo, regras como: vedação a

construir obras que despeje águas sobre o prédio vizinho (art. 1.300); vedação à abertura

de janelas, terraço ou varanda a menos de metro e meio do prédio vizinho; direito à

utilização de parede-meia (art. 1.305); vedação de construções capazes de poluir, ou

inutilizar, água de poço ou nascente alheias; direito de entrada em prédio vizinho para

dele temporariamente usar, quando indispensável ou à reparação, construção,

reconstrução ou limpeza de casa ou muro divisório ou para apoderar-se de coisas suas,

inclusive animais.

De qualquer sorte, as disposições do Código Civil estabelecem os conteúdos

mínimos dos regulamentos de vizinhança. Podem as legislações de posturas e

regulamentos administrativos de construção (estabelecidos em leis municipais),

disciplinar, de forma mais rigorosa, esses limites, podendo, por exemplo, estabelecer

distância maior do muro divisório para a construção de janelas ou varandas.

6. Condomínio

6.1. Conceito

O condomínio é o direito real de propriedade exercido comumente por mais de

uma pessoa.

Pode se estabelecer de forma absoluta, ou seja, de fato e de direito, de forma que

todos os condôminos são proprietários do todo (condomínio pro indiviso), ou relativa,

dividindo-se em frações ideais (condomínio pro diviso), quando, então, o condomínio é

apenas de direito, mas não de fato, porque cada condômino ocupa parte certa e

determinada da coisa.

Divide-se, também, o condomínio em voluntário e necessário. Caracteriza-se,

como se vê, pela incidência ou não da vontade dos condôminos para sua constituição. O

condomínio necessário ou legal, no entanto, pode decorrer: a) do estado natural de

indivisão da coisa, como nas paredes, cercas, muros, valas, pastagens, formação de

ilhas, comistão, confusão, adjunção e tesouro; b) de direito hereditário, ocasião em que

os herdeiros são condôminos, independentemente de sua vontade, até a partilha final.

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48

Nesse caso, sendo a coisa, também indivisível, o condomínio perdurará até que seja

adotada a solução prevista pelo art. 1.32221

.

6.2. Dos direitos e deveres dos condôminos

O Código Civil prevê os direitos e deveres dos condôminos, dentre os quais,

podemos destacar:

a) Direito de uso: Cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação,

sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de

terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la

(art.1.314). O direito de uso compreende, portanto, os atributos normais da

propriedade, com exceção do jus abutendi (disposição), que somente

compreende a parte ideal. Quanto à destinação, ―nenhum dos condôminos pode

alterar a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a

estranhos, sem o consenso dos outros‖ (art. 1.314, parágrafo único);

b) Dever de conservação: Disciplina o art. 1.315 que “o condômino é obrigado,

na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou

divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita”. Para tanto, o

parágrafo único reza que se presumem iguais as partes ideais dos condôminos;

c) Direito de renúncia: mediante renúncia à parte ideal, pode o condômino

eximir-se da obrigação de pagar as despesas e dívidas para conservação e

divisão da coisa (art. 1.316);

d) Direito de regresso nas obrigações contraídas em proveito da comunhão: Reza

o art. 1.318: “As dívidas contraídas por um dos condôminos em proveito da

comunhão, e durante ela, obrigam o contratante; mas terá este ação regressiva

contra os demais”;

e) Responsabilidade pelos frutos e danos: “Cada condômino responde aos

outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou”. (art.

1319);

f) Direito à divisão da coisa comum: A todo tempo será lícito ao condômino

exigir a divisão da coisa comum, respondendo o quinhão de cada um pela sua

parte nas despesas da divisão (art. 1.320, caput). Podem, entretanto os

condôminos acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo não maior de

cinco anos, suscetível de prorrogação ulterior (§ 1.º). Em caso de doação ou

testamento, não poderá exceder de cinco anos a indivisão estabelecida pelo

doador ou pelo testador (§ 2.º). Por fim, disciplina o § 3.º que “a requerimento

de qualquer interessado e se graves razões o aconselharem, pode o juiz

determinar a divisão da coisa comum antes do prazo”.

21

Art. 1.322. Quando a coisa for indivisível, e os consortes não quiserem adjudicá-la a um só,

indenizando os outros, será vendida e repartido o apurado, preferindo-se, na venda, em condições iguais

de oferta, o condômino ao estranho, e entre os condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais

valiosas, e, não as havendo, o de quinhão maior. Parágrafo único. Se nenhum dos condôminos tem

benfeitorias na coisa comum e participam todos do condomínio em partes iguais, realizar-se-á licitação

entre estranhos e, antes de adjudicada a coisa àquele que ofereceu maior lanço, proceder-se-á à licitação

entre os condôminos, a fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço,

preferindo, em condições iguais, o condômino ao estranho

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6.3. Administração do condomínio

A administração será atribuída a quem for escolhido pela maioria, que poderá ser

estranho (art. 1.323). O mesmo dispositivo prevê que, em caso de aluguel da coisa, o

condômino terá preferência, em condições iguais, ao estranho.

Em não havendo decisão de escolha do representante, aquele que administrar

sem oposição dos outros presume-se representante comum (art. 1.324).

A maioria calcula-se pelo valor dos quinhões, bem como o direito aos frutos. As

deliberações são tomadas por maioria absoluta, e, não sendo possível alcançá-la, será a

deliberação tomada pelo juiz (arts. 1.325 e 1.326).

6.4. Condomínio necessário

O condomínio por meação de paredes, cercas, muros e valas regula-se pelas

normas estabelecidas, especificamente, pelos direitos de vizinhança.

Segundo o art. 1.328, “o proprietário que tiver direito a estremar um imóvel

com paredes, cercas, muros, valas ou valados, tê-lo-á igualmente a adquirir meação na

parede, muro, valado ou cerca do vizinho, embolsando-lhe metade do que atualmente

valer a obra e o terreno por ela ocupado” Não convindo os dois no preço da obra, será

este arbitrado por peritos, a expensas de ambos os confinantes (art. 1.329).

Qualquer que seja o valor da meação, enquanto aquele que pretender a divisão

não o pagar ou depositar, nenhum uso poderá fazer na parede, muro, vala, cerca ou

qualquer outra obra divisória (art. 1.330).

6.5. Condomínio edilício

Chama-se condomínio edilício aquele instituído em edificações, como prédios

residenciais, comerciais, condomínios horizontais, etc.

Pode ser instituído por ato entre vivos ou testamento (art. 1.332), mas deve ser

registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar do ato de instituição,

além do que exigir a lei especial: I - a discriminação e individualização das unidades de

propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns; II - a

determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes

comuns; III - o fim a que as unidades se destinam.

O condomínio edilício tem regras próprias definidas em convenção subscrita

pelos titulares de, pelo menos 2/3 (dois terços) das frações ideais. Para ser oponível

contra terceiros, a convenção do condomínio deverá ser registrada no Cartório de

Registro de Imóveis.

O Código Civil disciplina as cláusulas mínimas da convenção do condomínio

(arts. 1.332 e 1.334); os direitos e deveres do condômino (arts. 1.335 e 1.336); aplicação

de multa a condômino que descumpre reiteradamente seus deveres (art. 1.337); direito

de preferência na locação de área de garagem (art. 1.338); direitos referentes às áreas

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comuns (arts. 1.339 e 1.340); quorum mínimo para deliberação pela construção de obras

(arts. 1.341 a 1.343); despesas de conservação do terraço (art. 1.344); obrigação propter

rem para o adquirente, em decorrência de débitos do alienante para com o condomínio

(art. 1.345); seguro obrigatório (art. 1.346); administração (arts. 1.347 a 1.355) e

extinção do condomínio (arts. 1.357 e 1.358), em caso de destruição, ruína ou

desapropriação.

7. Propriedade resolúvel

7.1. Conceito

A propriedade é, em regra, um direito perene do proprietário. Somente por

exceção se pode admitir que a propriedade seja um direito temporário ou sujeito a

extinção pré-determinada.

Os arts. 1.359 e 1.360 tratam de duas hipóteses distintas de propriedade sujeita à

extinção pré-determinada, mas com denominação indistinta: propriedade resolúvel.

Em verdade, propriedade resolúvel é aquela sujeita a termo final ou condição

resolutiva, por determinação da própria vontade das partes em seu título constitutivo, o

que o ocorre no caso do art. 1.359. No caso do art. 1.360, a propriedade se resolve por

fato superveniente não sujeito ao arbítrio das partes no momento de consorciar sua

vontade com a da outra.

7.2. Hipóteses

7.2.1. Propriedade resolúvel

A hipótese do art. 1.359 é de propriedade resolúvel propriamente dita:

Art. 1.359. Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo

advento do termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos

na sua pendência, e o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode

reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.

Neste caso, a imposição de uma condição resolutiva da propriedade ou de um

termo final a ela surge da própria vontade das partes. Já se sabe, desde o nascedouro,

que a propriedade é resolúvel. Assim, aquele em favor de quem se resolve a propriedade

(proprietário diferido) tem o direito a receber a coisa sem possíveis direitos reais

constituídos durante o domínio do proprietário atual, como o penhor, a hipoteca, o

usufruto, etc.

Além disso, resolvida a propriedade, tem o proprietário diferido o direito de

reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha.

Com tudo isso, quer-se dizer que, nesse caso, a resolução da propriedade tem

efeito ex tunc, dando-se ao proprietário diferido o direito de receber a coisa no estado

em que se encontrava quando o proprietário atual adquiriu a coisa.

Orlando Gomes cita alguns exemplos de propriedade resolúvel, como os de

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fideicomisso22

, retrovenda, venda a contento, doação com cláusula de reversão e na

alienação fiduciária.23

7.2.2. Propriedade ad tempus

A denominação propriedade ad tempus é dada por Orlando Gomes. Referido

autor considera que, nesse caso, a propriedade é apenas potencialmente temporária.

Reza o art. 1.360:

Art. 1.360. Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o

possuidor, que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será

considerado proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a

resolução, ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria

coisa ou o seu valor.

Aqui, como se vê, a propriedade se resolve por causa superveniente não oriunda

da vontade das partes, como ocorre, por exemplo, na revogação da doação por

ingratidão do donatário. Outro exemplo que se pode imaginar é o da resolução do

contrato de compra e venda por aplicação da cláusula resolutiva expressa em caso de

inadimplência (no CC – 1916: pacto comissório)

Os efeitos são diversos, pois, nesse caso, aquele em benefício de quem houve a

resolução recebe a coisa no estado em que se encontra, pois os efeitos, aqui, são ex

nunc. Por isso, se alguém tiver adquirido a coisa por título anterior à resolução, o

proprietário diferido terá ação apenas contra aquele cuja propriedade se resolveu para

haver a própria coisa ou o seu valor.

Atente-se para o fato de que este dispositivo é aplicável às causas de resolução

da propriedade, e não para as de nulidade ou anulabilidade do título aquisitivo, pois,

nesses casos, ocorre rescisão do negócio jurídico. A solução, para casos de invalidade

do negócio jurídico translativo da propriedade, dependerá da aferição da boa-fé do

terceiro adquirente.

8. Propriedade fiduciária

22

Art. 1.951. Pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua

morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a

certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário. 23

GOMES, Orlando. Ob. Citada, p. 236.

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8.1. Conceito

O próprio Código Civil conceitua a propriedade fiduciária quando reza, no art.

1.361: “Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que

o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor.”

Ocorre propriedade fiduciária, portanto, quando o devedor de certa quantia dá ao

credor a propriedade resolúvel de uma coisa sua, com a finalidade de garantir a dívida.

Não pode ser considerada como direito real de garantia sobre coisa alheia, pois,

na propriedade fiduciária, o credor adquire, de fato, a propriedade, passando a ser dono

da coisa, embora de forma resolúvel e sem a posse direta.

8.2. Requisitos

Depende a propriedade fiduciária de registro do contrato no Registro de Títulos

e Documentos ou na repartição competente para licenciamento, em se tratando de

veículos (art. 1.361, § 1.º).

Reza o art. 1.362 que o contrato, que serve de título à propriedade fiduciária,

conterá: I - o total da dívida, ou sua estimativa; II - o prazo, ou a época do pagamento;

III - a taxa de juros, se houver.

8.3. Desdobramento da posse

Reza o art. 1.361, § 2.º que ―Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se

o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa‖. Por isso,

―antes de vencida a dívida, o devedor, a suas expensas e risco, pode usar a coisa

segundo sua destinação, sendo obrigado, como depositário: I - a empregar na guarda da

coisa a diligência exigida por sua natureza; II - a entregá-la ao credor, se a dívida não

for paga no vencimento‖ (art. 1.363).

Veja-se que o direito de uso da coisa, pelo devedor, extingue-se com o

vencimento da dívida, sendo essa a condição de resolução da propriedade

expressamente ditada pela vontade das partes.

Reza o art. 1.361, § 3.º que “a propriedade superveniente, adquirida pelo

devedor, torna eficaz, desde o arquivamento, a transferência da propriedade

fiduciária”.

8.4. Vencimento da dívida

Vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou

extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e

das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor (art. 1.364), mas

“é nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada

em garantia, se a dívida não for paga no vencimento”. (art. 1.365, caput). Não obstante,

“o devedor pode, com a anuência do credor, dar seu direito eventual à coisa em

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pagamento da dívida, após o vencimento desta” (parágrafo único). Trata-se, portanto,

de dação em pagamento, pelo devedor, de seu direito eventual à coisa para quitar a

dívida havida com o credor por ocasião da constituição da propriedade fiduciária.

Reza o art. 1.366 que “quando, vendida a coisa, o produto não bastar para o

pagamento da dívida e das despesas de cobrança, continuará o devedor obrigado pelo

restante”. Aqui, já se extinguiu a propriedade fiduciária em favor do credor, bem como

o direito eventual do devedor de recuperar o domínio da coisa. Os efeitos posteriores aí

previstos são meramente pessoais.

O art. 1.367 manda aplicar, no que for cabível, disposições acerca dos direitos

reais de garantia e, em especial, do penhor.

Enfim, disciplina o art. 1.368 que “o terceiro, interessado ou não, que pagar a

dívida, se sub-rogará de pleno direito no crédito e na propriedade fiduciária”. Além

disso, as espécies de propriedade fiduciária disciplinadas de forma especial (alienação

fiduciária de veículos, por exemplo) são disciplinadas pelas respectivas leis especiais

(como o Decreto-lei 911/69), aplicando-se o Código Civil apenas de maneira supletiva.

9. Direitos reais sobre coisas alheias

O Código Civil traça o rol de direitos reais em seu art. 1.225, dispondo, ao lado

da propriedade, a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do

promitente comprador do imóvel, o penhor, a hipoteca e a anticrese.

Pode-se afirmar que a propriedade, embora sofra limitações legais e, às vezes,

convencionais, é o direito real ilimitado por excelência, pois envolve as prerrogativas

de usar, gozar e dispor da coisa. Todos os demais direitos reais expostos no art. 1.225

são limitados, porque não se exercem sobre coisa própria (jus in re própria), mas, sim,

sobre coisa alheia (jus in re aliena), ou seja, sobre coisa de que o titular do direito real

não é proprietário.

Subdividem-se os direitos reais limitados ou sobre coisas alheias em:

a) Direitos reais de gozo ou fruição: a superfície, as servidões, o usufruto, o uso

e a habitação;

b) Direitos reais de garantia: o penhor, a hipoteca e a anticrese;

c) Direitos reais de aquisição: o direito do promitente comprador do imóvel.

9.1. Forma de constituição

De acordo com o art. 1.226, “os direitos reais sobre coisas móveis, quando

constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição”. A

formalidade crucial, portanto, para a formação do direito real sobre coisa alheia móvel,

é a tradição, sem o que ele não se constitui.

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Esta regra sofre exceção no art. 1.431, parágrafo único, que dispõe: ―no penhor

rural, industrial, mercantil e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do

devedor, que as deve guardar e conservar‖.

Da mesma forma, para os bens imóveis, a constituição do direito real sobre coisa

alheia exige, na forma do art. 1.227, o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Essa

disposição, entretanto, aplica-se para os casos de constituição por ato inter vivos, já que,

causa mortis, os bens herdáveis se transmitem automaticamente com a extinção do

autor da herança.

Além disso, o próprio art. 1.227 ressalva outros casos expressos no código,

como no direito real de habitação do cônjuge sobrevivente (art. 1.831) e no usufruto

decorrente do poder familiar (art. 1.689, I), pois, nesses casos, independe de transcrição

no Registro de Imóveis a aquisição do direito real.

9.2. Direito de superfície

Pode o proprietário do terreno convencionar com terceiro o direito de construir

ou plantar em sua área, durante determinado tempo a ser convencionado em escritura

pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.

A natureza jurídica do direito de superfície, portanto, é a de ―direito real

imobiliário, autônomo e limitado, sendo resolúvel a propriedade superficiária‖. A

escritura pública é da substância do ato, porque expressamente exigida pelo art. 1.369,

de forma que, consoante os arts. 104, III e 108, não se constitui esse direito real sem a

escritura. Institui-se, portanto, o direito de superfície, por negócio jurídico entre o

concedente (proprietário – detentor da propriedade plena) e o superficiário (detentor da

propriedade superficiária).

De regra, o direito de superfície deve ser instituído, sempre, por tempo

determinado e não autoriza obra do subsolo, a não ser que esta seja inerente ao objeto da

concessão (art. 1.369, parágrafo único). A exceção a esta regra é a instituição do direito

de superfície urbana, prevista pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01), que prevê a

possibilidade de sua instituição por tempo indeterminado e com abrangência do subsolo

e do espaço aéreo.

9.2.1. Direitos e deveres do superficiário

Prevê o art. 1.370 que ―a concessão da superfície será gratuita ou onerosa; se

onerosa, estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só vez, ou

parceladamente‖.

Além disso, nos termos do art. 1.371, ―o superficiário responderá pelos encargos

e tributos que incidirem sobre o imóvel‖. Essa regra incide, entretanto, no silêncio das

partes quando da instituição do direito de superfície, porquanto, conforme conclusão da

Jornada I STJ, Enunciado 94, ―as partes têm plena liberdade para deliberar, no contrato

respectivo, sobre o rateio dos encargos e tributos que incidirão sobre a área objeto da

concessão do direito de superfície‖. Podem as partes, portanto, estipular previsão

diversa.

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55

Em se tratando de direito real, ainda que resolúvel, assiste ao superficiário o

direito de transferi-lo a terceiros, conforme permissão do art. 1.372. O mesmo

dispositivo prevê, também, a transmissão do direito aos herdeiros do superficiário e

veda ao proprietário (concedente) a estipulação de qualquer pagamento pela

transferência.

Assiste ao superficiário, por fim, o direito de preferência em caso de alienação

do imóvel sobre o qual incide o direito de superfície, segundo inferência do art. 1.373.

Por outro lado, o mesmo dispositivo prevê que, se o superficiário exercer o direito que

lhe resulta do art. 1.372, caput, ou seja, se for transferir o direito de superfície a terceiro,

tem o proprietário o direito de preferência para adquiri-lo. Sujeita-se o exercício do

direito de preferência, entretanto, à igualdade de condições.

9.2.2. Extinção do direito de superfície

Extinguir-se-á o direito de superfície, em regra, no termo final estipulado pelo

concedente e o superficiário. Entretanto, segundo diz o art. 1.374, se o superficiário der

ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida, resolver-se-á a concessão.

Com a extinção do direito de superfície, passa o proprietário a ter a propriedade

plena sobre o terreno, incluindo as construções ou plantações acrescidas pelo

superficiário, independentemente de indenização (art. 1.375). O mesmo artigo

possibilita, entretanto, que as partes estipulem o contrário, ou seja, o direito de

indenização do superficiário ao final da concessão.

O art. 1.376 fixa critério de proporcionalidade quando o direito de superfície for

extinto em conseqüência de desapropriação, ou seja, ―a indenização cabe ao proprietário

e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um‖. Esta

proporcionalidade não quer dizer que o proprietário terá direito ao valor do terreno, sem

as construções ou plantações e que o superficiário terá direito ao valor das construções

ou plantações. Cada um terá direito à indenização pelo valor do direito real que possuir.

Isto quer dizer que o proprietário terá direito ao valor do imóvel levando em

consideração o preço que ele receberia em caso de venda a terceiro que,

conscientemente, suportaria o ônus do direito de superfície exercido pelo superficiário.

Por outro lado, o superficiário teria direito ao valor pelo qual ele poderia transferir o

direito de superfície do qual é detentor a terceiro.

9.2.3. Constituição de direito de superfície por pessoa jurídica de direito público interno

Diz o art. 1.377 que ―o direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de

direito público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente

disciplinado em lei especial‖. Isto quer dizer que, quanto à instituição do direito de

superfície em área rural, por pessoa jurídica de direito público, aplica-se o Código Civil;

quanto à sua instituição em área urbana, aplica-se o Estatuto da Cidade.

O direito de superfície pode ser instituído pela pessoa jurídica de direito público

interno tanto na qualidade de concedente como na de superficiário. O direito de

superfície constituído pelo Poder Público, na qualidade de concedente, não se confunde

com a concessão de direito real de uso, pois esta se limita aos caracteres do uso,

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disciplinado pelos arts. 1.412 e 1.413, o qual é caracterizado pela intransmissibilidade

(art. 1.393, c/c art. 1.413).

9.3. Servidões

9.3.1. Conceito

A servidão é direito real caracterizado pela imposição de um encargo sobre um

prédio denominado serviente, em benefício de outro prédio, denominado dominante,

conferindo ao titular deste o uso e gozo da utilidade proporcionada pelo serviente.

É direito real porque, embora constituído entre duas pessoas (titulares dos

prédios dominante e serviente), é oponível contra terceiros (inclusive futuros donos do

prédio serviente), que não podem embaraçar o exercício da servidão pelo titular do

prédio dominante.

Não se confunde com os direitos de vizinhança, porque estes, quando impõem

limitação à propriedade para servir a prédio alheio, o fazem por determinação legal,

enquanto as servidões se constituem por declaração de vontade ou por usucapião.

Também não se confunde com o usufruto, uso e habitação, porque, nestes, existe

transmissão da posse da coisa para o titular do direito real sobre coisa alheia, o que não

se dá na servidão.

No Direito Romano, dividiam-se as servidões em prediais e pessoais. Prediais

eram as servidões decorrentes da limitação de um prédio em favor de outro. Pessoais

eram o uso, o usufruto, a habitação e a escravidão.

O Código Civil de 1916 tratava apenas das servidões prediais. O atual diploma

também trata, como servidões, apenas as prediais, embora não tenha adotado

expressamente esse título.

9.3.2. Características

A servidão se caracteriza por: a) necessidade de pertencerem os prédios

(dominante e serviente) a proprietários diversos, pois, pertencendo os dois prédios ao

mesmo proprietário, não há que se falar em servidão; b) prazo indeterminado: alguns

dizem que a servidão é perpétua, entretanto, melhor é dizer que se constitui sempre por

prazo indeterminado, pois a própria lei prevê casos legais de extinção (arts.

1.387/1.389); c) indivisibilidade: subsiste a servidão ainda que o imóvel serviente seja

dividido por ato entre vivos ou em partilha decorrente de inventário (art. 1.386); d) é

exclusiva para bens imóveis, não havendo que se falar em servidão de bens móveis.

9.3.3. Formas de constituição

As servidões se constituem, voluntariamente por atos entre vivos ou causa

mortis. Involuntariamente, constituem-se por usucapião, desde que aparentes. Por isso,

podem ser constituídas: a) por contrato, oneroso ou gratuito, demandando, portanto,

declaração expressa dos proprietários; b) por testamento; c) por usucapião. Admite-se,

ainda, a constituição da servidão por: d) sentença em ação divisória (porque se dividem

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dois prédios, podendo um deles ficar encravado ou com outra necessidade); e)

destinação do proprietário: o que ocorre quando uma mesma pessoa, proprietário de

dois imóveis, constitui servidão entre eles e depois aliena um dos dois.

De qualquer forma, a servidão somente se constitui por declaração expressa dos

proprietários, quer dizer, não pode o possuidor instituir servidão, embora possa,

eventualmente, dela usufruir, desde que tenha sido instituída em favor do prédio sobre o

qual exerce a posse.

Além disso, o ato constitutivo deve ser levado a registro no Cartório de Registro

de Imóveis, sob pena de a servidão não atingir o efeito erga omnes. Este princípio

comporta exceções quanto às servidões aparentes, como veremos no tópico pertinente.

Disciplinam os arts. 1.378 e 1.379:

Art. 1.378. A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava

o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante

declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subseqüente

registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Art. 1.379. O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por

dez anos, nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado a registrá-la em seu

nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar

consumado a usucapião. Parágrafo único. Se o possuidor não tiver título, o

prazo da usucapião será de vinte anos.

9.3.4. Classificação

a) Quanto à situação do prédio: no que pertine à situação do prédio, a servidão

pode ser: a1) urbana, se a utilidade incide sobre um prédio edificado, “e não

porque localizadas na zona urbana. O critério da distinção coloca-se na

natureza da servidão”24

; a2) rústica, se a utilidade é proporcionada ao solo

do imóvel.

b) Quanto à exteriorização: b1) Aparente: é aparente a servidão conforme ela se

caracterize por alguma obra ou circunstância que faça ver a sua existência.

Assim, podemos exemplificar com a passagem de água por aqueduto. Já a

servidão de trânsito pode ser aparente ou não aparente, conforme exista ou

não alguma obra que confira visibilidade à passagem; b2) Não aparente: é

aquela que não se caracteriza por elemento de visibilidade. A lei confere

proteção possessória somente à servidão aparente, como podemos inferir dos

arts. 1.213 e 1.379. Nestes dispositivos, observa-se que a usucapião, pelo

exercício da posse contínua e incontestada da servidão, pelo prazo, somente

incide sobre as servidões aparentes. Além disso, reza o art. 1.213 que “o

disposto nos artigos antecedentes não se aplica às servidões não aparentes,

salvo quando os respectivos títulos provierem do possuidor do prédio

serviente, ou daqueles de quem este o houve”. Observa-se, portanto, que a

servidão não aparente somente confere proteção possessória ao titular do

prédio dominante se provier de título conferido pelo possuidor do prédio

serviente ou daqueles de quem este o houve. O Código Civil de 1916 era

mais claro sobre o tema, quando previa, no art. 697: “as servidões não

aparentes só podem ser estabelecidas por meio de transcrição no Registro

24

VENOSA, ob. Citada, p. 436.

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de Imóveis”. O conteúdo do atual art. 1.379 pode levar à mesma conclusão,

pois somente se admite a usucapião sobre as servidões aparentes. A Súmula

415 do Supremo Tribunal Federal é um bom indicativo de como a

jurisprudência tem conferido proteção possessória às servidões aparentes,

independentemente de título registrado: ―Servidão de trânsito não titulada,

mas tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras realizadas,

considera-se aparente, conferindo direito à proteção possessória‖;

c) Quanto ao modo de exercício: c1) Contínua: é a servidão que não depende de

ação humana para se caracterizar, mas apenas de elementos que a

caracterizem continuamente, como na passagem de águas; c2) Descontínua:

depende de ação humana para seu exercício, como na servidão de passagem;

d) Quanto ao encargo: d1) Positiva ou afirmativa: quando impõe ao titular do

prédio serviente a tolerância a alguma prática pelo titular do prédio

dominante, como a passagem, por exemplo; d2) Negativa: quando se impõe

ao titular do prédio serviente a obrigação de não fazer algo, como na

servidão de edificar a certa altura, por exemplo.

9.3.5. Exercício das servidões

9.3.5.1. Direito de conservação

Reza o art. 1.380 que o dono de uma servidão pode fazer todas as obras

necessárias à sua conservação e uso, e, se a servidão pertencer a mais de um prédio,

serão as despesas rateadas entre os respectivos donos. As obras, portanto, devem ser

feitas pelo dono do prédio dominante, a não ser que o contrário resulte do título

constitutivo (art. 1.381).

Neste último caso, quando a obrigação incumbir ao dono do prédio serviente,

este poderá exonerar-se, abandonando, total ou parcialmente, a propriedade ao dono do

dominante (art. 1.382, caput). Reza o parágrafo único que “se o proprietário do prédio

dominante se recusar a receber a propriedade do serviente, ou parte dela, caber-lhe-á

custear as obras”.

9.3.5.2. Livre exercício da servidão

A lei impede o dono do prédio serviente de embaraçar, de qualquer modo, o

exercício legítimo da servidão pelo titular do prédio dominante (art. 1.383).

9.3.5.3. Remoção da servidão

A lei dá ao dono do prédio serviente a prerrogativa de remover a servidão, de um

local para outro, desde que em nada diminua as vantagens do prédio dominante (art.

1.384, primeira parte).

Da mesma forma, confere-se ao dono do prédio dominante o mesmo direito,

qual seja de remover a servidão de um local para outro, e à sua custa, desde que haja

considerável incremento da utilidade e não prejudique o prédio serviente.

9.3.5.4. Restrição ao exercício da servidão

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O exercício da servidão deve se restringir às necessidades do prédio dominante.

Assim, busca-se evitar, quanto possível, o agravamento do encargo do prédio serviente

(art. 1.385, caput).

Por isso, reza o parágrafo primeiro do referido dispositivo que “constituída para

certo fim, a servidão não se pode ampliar a outro”, a não ser, é lógico, que a ampliação

resulte de declaração expressa dos proprietários, na forma do 1.378.

Também por isso, disciplina o parágrafo segundo que “nas servidões de trânsito,

a de maior inclui a de menor ônus, e a menor exclui a mais onerosa”. Isto quer dizer

que, na servidão de trânsito, se há previsão de um encargo de gravame maior (passagem

de veículos, p. ex.), isto implica em se admitir também o menor (passagem a pé, p. ex.);

a contrario sensu, se o título indica apenas o encargo menos gravoso (passagem a pé),

não se pode exigir do dono do prédio serviente o mais gravoso (passagem de veículo).

Exceção à regra é a contida no parágrafo terceiro, que disciplina que “se as

necessidades da cultura, ou da indústria, do prédio dominante impuserem à servidão

maior largueza, o dono do serviente é obrigado a sofrê-la”. Entretanto, reza a parte

final do dispositivo: “mas tem (o proprietário do prédio serviente) direito a ser

indenizado pelo excesso”.

9.3.6. Extinção das servidões

9.3.6.1. Regra geral

A regra geral para extinção da servidão, uma vez registrada, é o cancelamento

(art. 1.387), para o qual, entretanto, deve haver consentimento do titular do prédio

dominante, inclusive do credor hipotecário (art. 1.387, parágrafo único).

9.3.6.2. Cancelamento judicial

Reza o art. 1.388 que “o dono do prédio serviente tem direito, pelos meios

judiciais, ao cancelamento do registro, embora o dono do prédio dominante lho

impugne:

I - quando o titular houver renunciado a sua servidão;

II - quando tiver cessado, para o prédio dominante, a utilidade ou a

comodidade, que determinou a constituição da servidão: isso pode

ocorrer no caso de abertura de nova estrada, por exemplo, para o caso de

servidão de trânsito

III - quando o dono do prédio serviente resgatar a servidão: o que se dá

pelo pagamento da vantagem ao dono do prédio dominante.

9.3.6.3. Extinção pelo não-uso, confusão ou contrato

Segundo o art. 1.389. Também se extingue a servidão, ficando ao dono do prédio

serviente a faculdade de fazê-la cancelar, mediante a prova da extinção:

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I - pela reunião dos dois prédios no domínio da mesma pessoa

(confusão);

II - pela supressão das respectivas obras por efeito de contrato, ou de

outro título expresso (contrato);

III - pelo não uso, durante dez anos contínuos (não uso).

9.4. Usufruto

9.4.1. Conceito

O art. 713 do Código Civil de 1916, sem dispositivo correspondente no novo

código, conceituava o usufruto: “Constitui usufruto o direito real de fruir as utilidades

e frutos de uma coisa enquanto temporariamente destacado da propriedade”.

Caracteriza-se, portanto, pela transferência, a pessoa que não seja o proprietário,

do direito de usar e fruir da coisa, seja por ato negocial (inter vivos ou causa mortis –

contrato de doação, testamento, etc.), ou por imposição legal25

.

De acordo com o art. 1.390, “o usufruto pode recair em um ou mais bens,

móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo

ou em parte, os frutos e utilidades”. Pode recair, portanto, sobre bens móveis ou

imóveis. Como se trata de direito real, ―o usufruto de imóveis, quando não resulte de

usucapião, constituir-se-á mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis‖ (art.

1.391).

O usufruto tem o condão de transferir ao usufrutuário a posse direta da coisa e o

direito de usá-la e fruir todas as suas utilidades, por isso, salvo disposição em contrário,

estende-se aos acessórios da coisa e seus acrescidos (art. 1.392, caput). Ao proprietário

resta a nua-propriedade, mas tem ele o direito à restituição dos acessórios e acrescidos

consumíveis que ainda existirem ao tempo da extinção do usufruto, bem como o

equivalente ou o valor daqueles já consumidos (art. 1.392, § 2.º) 26

.

Embora o usufruto torne nua a propriedade do dono da coisa, este pode alienar o

seu domínio a terceiro. Este, porém, deve respeitar o direito do usufrutuário de usar e

fruir a coisa.

Por outro lado, a lei veda ao usufrutuário o direito a alienar a titularidade do

direito ao usufruto (art. 1.393). Entretanto, o mesmo dispositivo lhe resguarda a cessão,

25

Art. 1.652. O cônjuge, que estiver na posse dos bens particulares do outro, será para com este e seus

herdeiros responsável: I - como usufrutuário, se o rendimento for comum; (...) Art. 1.689. O pai e a mãe,

enquanto no exercício do poder familiar: I - são usufrutuários dos bens dos filhos; II - têm a

administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade. (...) Art. 1.952. A substituição

fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador.

Parágrafo único. Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá este a

propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário. 26

§ 2º Se há no prédio em que recai o usufruto florestas ou os recursos minerais a que se refere o art.

1.230, devem o dono e o usufrutuário prefixar-lhe a extensão do gozo e a maneira de exploração. § 3º Se

o usufruto recai sobre universalidade ou quota-parte de bens, o usufrutuário tem direito à parte do tesouro

achado por outrem, e ao preço pago pelo vizinho do prédio usufruído, para obter meação em parede,

cerca, muro, vala ou valado.

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a título gratuito ou oneroso, do exercício do direito resultante do usufruto. Isto quer

dizer que o cessionário do usufruto responde perante o usufrutuário, sendo este, sempre,

o titular dos direitos e deveres inerentes ao usufruto, perante o proprietário, previstos no

Código Civil (arts. 1.394/1.409).

9.4.1.1. Distinção com outros institutos.

O usufruto não se confunde com a enfiteuse. Esta, abolida pelo atual Código

(excepcionadas apenas as já existentes e aquelas incidentes sobre terrenos de marinha,

reguladas por lei especial – art. 2.038), era perpétua e transmissível, enquanto o usufruto

extingue-se com a morte do usufrutuário (art. 1.410, I) e não se transmite ou aliena, a

não ser com relação ao exercício do direito.

Também não se confunde com a locação, o arrendamento e o comodato. Tais

contratos geram apenas direitos pessoais e a transferência da posse direta da coisa para

o locatário, arrendatário ou comodatário. No usufruto, cria-se direito real em favor do

usufrutuário, com todas as características desta espécie de direitos e sua respectiva

natureza jurídica.

Por fim, não há que se misturar o usufruto com o fideicomisso. Neste, o testador

institui uma pessoa, chamada de fiduciário, ao qual se transmitirá a propriedade

resolúvel de um dos bens da herança, com o encargo de transmitir a coisa a outra,

chamada de fideicomissário, por ocasião da morte do fiduciário, a certo tempo ou sob

certa condição. Portanto, vê-se que, no fideicomisso, o fiduciário adquire a propriedade

da coisa, podendo, inclusive, aliená-la. No usufruto, o usufrutuário adquire apenas a

posse direta e direito de uso e gozo, sem direito de alienar a coisa nem o próprio

usufruto.

9.4.2. Direitos do usufrutuário

9.4.2.1. Regra geral

A regra geral instituída pelo art. 1.394 do Código Civil reza que “o usufrutuário

tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos”. É a consagração do

conceito supra desenvolvido, pois, nesse dispositivo, percebe-se que o legislador dá ao

usufrutuário a posse e os direitos de uso da coisa, administração e fruição, ou seja,

percepção dos frutos advindos dela.

Quanto à posse direta e o direito de uso e administração da coisa, as

denominações já se explicam.

9.4.2.2. Direito aos frutos.

Quanto ao direito aos frutos, aí reside a principal razão de permanência do

instituto, visando proteger o usufrutuário e dar-lhe, na maioria das situações, condições

de subsistência. Disciplina o art. 1.396 que, salvo direito adquirido por outrem (o que se

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pode dar no caso de anticrese, por exemplo), o usufrutuário faz seus os frutos naturais,

pendentes ao começar o usufruto, sem encargo de pagar as despesas de produção.

Neste regramento, importa aplicar as regras referentes à classificação dos frutos

em pendentes e separados, pois o parágrafo único do art. 1.396 prevê que ―os frutos

naturais, pendentes ao tempo em que cessa o usufruto, pertencem ao dono, também sem

compensação das despesas.‖. Entretanto, prevê o art. 95 que “apesar de ainda não

separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio

jurídico”. Por isso, antes da constituição do usufruto, pode o proprietário ter constituído

negócio jurídico sobre os frutos pendentes, o qual deve ser respeitado pelo usufrutuário,

consoante se observa, inclusive, do caput do art. 1.396. Após a constituição do usufruto,

no entanto, não pode mais o proprietário transigir sobre os frutos naturais, porque

passam a pertencer ao usufrutuário.

Recaindo o usufruto sobre animais, as crias pertencem ao usufrutuário,

deduzidas quantas bastem para inteirar as cabeças de gado existentes ao começar o

usufruto (art.1.397).

No tocante aos frutos civis (rendimentos), pertencem ao proprietário aqueles já

vencidos quando da data inicial do usufruto. Aqueles que se vencerem na constância do

usufruto pertencerão ao usufrutuário (salvo a hipótese do art. 95, já referida acima). Por

fim, pertencem também ao usufrutuário, também, aqueles já vencidos ao tempo em que

cessar o usufruto, ainda que não tenham sido adimplidos na data do vencimento.

9.4.2.3. Direito de arrendar/Proibição de modificação da destinação econômica

O art. 1.399 dá ao usufrutuário o direito de usufruir da coisa em pessoa, ou

mediante arrendamento. Entretanto, não pode ele modificar a destinação econômica da

coisa sem expressa autorização do proprietário. Exemplo de modificação da destinação

econômica seria a transformação de prédio residencial, dado em usufruto, em

estabelecimento comercial.

9.4.2.4. Direito de acrescer

O direito de acrescer está previsto, genericamente, pelo art. 1.411 do Código

Civil: “Constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-se-á a parte

em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação expressa, o

quinhão desses couber ao sobrevivente”.

Assim, se o usufruto for constituído em favor de duas ou mais pessoas, a morte

de uma delas somente gera ao(s) demais o direito de acrescer o objeto do usufruto se

houver estipulação expressa. Se não, a morte de um deles é causa de extinção do

usufruto quanto à parte da pessoa que falecer.

9.4.3. Deveres do usufrutuário

9.4.3.1. Dever de conservação

O usufrutuário tem o dever de conservar a coisa que lhe é dada em usufruto,

tanto é que lhe incumbem: I - as despesas ordinárias de conservação dos bens no estado

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em que os recebeu; II - as prestações e os tributos devidos pela posse ou rendimento da

coisa usufruída. (art. 1.403).

Para tanto, deve, antes de assumir o usufruto, inventariar, à sua custa, os bens

que receber, determinando o estado em que se acham.

Pode o proprietário exigir do usufrutuário a prestação de caução, fidejussória ou

real, para garantia da conservação dos bens dados usufruídos e de sua entrega ao final

do usufruto. Reza o art. 1.401 que “o usufrutuário que não quiser ou não puder dar

caução suficiente perderá o direito de administrar o usufruto; e, neste caso, os bens

serão administrados pelo proprietário, que ficará obrigado, mediante caução, a

entregar ao usufrutuário o rendimento deles, deduzidas as despesas de administração,

entre as quais se incluirá a quantia fixada pelo juiz como remuneração do

administrador”.

Pode o usufruto, no entanto, e aliás, com freqüência, decorrer de doação,

reservando-se o doador no direito de usufruto vitalício da coisa. Neste caso, por

imposição lógica, o legislador prevê, no art. 1.400, parágrafo único, que “não é

obrigado à caução o doador que se reservar o usufruto da coisa doada”.

De qualquer sorte, o usufrutuário não é obrigado a pagar as deteriorações

resultantes do exercício regular do usufruto (art. 1.402). Assim, se o usufruto é de um

veículo, não pode o usufrutuário ser responsabilizado pela conservação de seu valor de

mercado, pois a desvalorização resulta do exercício regular do usufruto.

9.4.3.2. Reparações extraordinárias

Incumbem ao dono as reparações extraordinárias (imprevistas) e as que não

forem de custo módico; mas o usufrutuário lhe pagará os juros do capital despendido

com as que forem necessárias à conservação, ou aumentarem o rendimento da coisa

usufruída (art. 1.404, caput). Se o dono não fizer as reparações a que está obrigado, e

sendo elas indispensáveis à conservação da coisa, pode o usufrutuário realizá-las e

cobrar do proprietário a importância despendida. Para esses efeitos, não se consideram

módicas as despesas superiores a 2/3 (dois terços) do líquido rendimento de um ano

9.4.3.3. Usufruto de patrimônio

Reza o art. 1.405 que “se o usufruto recair num patrimônio, ou parte deste, será

o usufrutuário obrigado aos juros da dívida que onerar o patrimônio ou a parte dele”.

9.4.3.4. Dever de ciência quanto às lesões

O usufrutuário é obrigado a dar ciência ao dono de qualquer lesão produzida

contra a posse da coisa, ou os direitos deste (art. 1.406).

9.4.3.5. Pagamento do seguro

Se a coisa estiver segurada, a obrigação de pagar o prêmio do seguro é do

usufrutuário, mas é do proprietário o direito de cobrar a indenização contra o segurador,

ainda que o seguro tenha sido feito pelo usufrutuário (art. 1.407). O parágrafo segundo

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do referido dispositivo reza, porém, que, “em qualquer hipótese, o direito do

usufrutuário fica sub-rogado no valor da indenização do seguro”. Tal quer dizer que o

usufrutuário tem direito a ser ressarcido, pelo valor do direito real que perdeu, a ser

deduzido da indenização a ser paga ao proprietário.

9.4.3.6. Destruição de edifício sujeito a seguro

Reza o art. 1.408 que “se um edifício sujeito a usufruto for destruído sem culpa

do proprietário, não será este obrigado a reconstruí-lo, nem o usufruto se

restabelecerá, se o proprietário reconstruir à sua custa o prédio; mas se a indenização

do seguro for aplicada à reconstrução do prédio, restabelecer-se-á o usufruto”.

9.4.3.7. Desapropriação do prédio sujeito a usufruto

Em caso de desapropriação, extingue-se o usufruto, mas, sendo o proprietário

indenizado, aplica-se regra semelhante à do art. 1.407, parágrafo segundo, ou seja, sub-

roga-se no ônus do usufruto a indenização paga (art. 1.409), devendo deduzir-se do

valor dado ao proprietário a quantia referente ao direito real perdido pelo usufrutuário.

9.4.4. Espécies de usufruto

a) quanto aos bens: pode ser geral, parcial ou particular; geral quando

recai sobre todo um patrimônio (universalidade de bens); parcial quando

recai sobre parte de um patrimônio; particular quando recai sobre bens

determinados;

b) quanto à constituição: o usufruto pode ser legal, quando decorre da lei

(vide nota 23) ou convencional, quando decorre de ato inter vivos ou

mortis causa;

c) quanto à duração: pode ser temporário, se estabelecido com termo

final, ou por algum motivo do qual se origina, cessando este; ou vitalício,

quando estabelecido para vigorar até a morte do usufrutuário. Com

relação às pessoas jurídicas, pode o usufruto ser constituído com o prazo

máximo de 30 (trinta) anos (art. 1.410);

d) quanto à extensão: usufruto pleno, aquele que abrange os acessórios da

coisa e seus acrescidos (art. 1392); usufruto, o que se limita a certas

utilidades da coisa;

e) Usufruto próprio: estabelecido sobre coisas infungíveis; usufruto

impróprio ou quase-usufruto: é aquele que se estabelece sobre coisas

fungíveis ou consumíveis. Chama-se de impróprio ou quase-usufruto

porque se, ao final, o usufrutuário deverá devolver ao proprietário coisa

equivalente ou o seu valor, não devolverá a própria coisa, tendo

ocorrido, portanto, em seu favor, a propriedade. Era disciplinado pelo

art. 726 do Código Civil (Art. 726. As coisas que se consomem pelo uso caem para

logo no domínio do usufrutuário, ficando, porém, este obrigado a restituir, findo o

usufruto, o equivalente em gênero, qualidade e quantidade, ou, não sendo possível, o

seu valor, pelo preço corrente ao tempo da restituição)‖. Não é previsto no Novo

Código e pode ser substituído, livremente, pelo arrendamento ou pelo

mútuo. Admite-se que o caso do art. 1.395 é de usufruto impróprio: “Art.

1.395. Quando o usufruto recai em títulos de crédito, o usufrutuário tem

direito a perceber os frutos e a cobrar as respectivas dívidas. Parágrafo

único. Cobradas as dívidas, o usufrutuário aplicará, de imediato, a

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importância em títulos da mesma natureza, ou em títulos da dívida

pública federal, com cláusula de atualização monetária segundo índices

oficiais regularmente estabelecidos”.

9.4.5. Extinção do usufruto

O usufruto se extingue pelas causas previstas pelo art. 1.410 (I - pela renúncia ou

morte do usufrutuário; II - pelo termo de sua duração; III - pela extinção da pessoa

jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso

de trinta anos da data em que se começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de

que se origina; V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407,

1.408, 2ª parte, e 1.409; VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando

aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de

conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias

recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395; VIII - Pelo não uso, ou

não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399), ressalvado o direito

de acrescer (cf item 10.4.2.4).

9.5. Uso

9.5.1. Conceito

Segundo a definição de NERY JR e NERY:

Uso é direito real sobre bem móvel ou imóvel de propriedade de terceiro,

instituído exclusivamente ex voluntate, pelo qual o usuário tem o direito de

gozar da coisa e perceber os seus frutos (naturais ou civis), mas limitadamente

(modica perceptio) ao necessário à sua vida e de sua família (tantum necessitati

servit).27

Caracteriza-se o uso, portanto, e diferencia-o do usufruto as seguintes

circunstâncias: a) somente se constitui por ato voluntário, não existindo uso decorrente

da lei; b) como no usufruto, o usuário tem o direito a usar da coisa e perceber os frutos,

mas esta percepção se limita às necessidades dele e de sua família; c) o uso é

personalíssimo ou incessível, ou seja, não admite, como no usufruto, a cessão de seu

exercício a outrem; d) o uso é, por fim, indivisível, pois não admite a sua constituição

pro parte.

9.5.2. Regras

Na conceituação de necessidades pessoais do usuário, o art. 1.412, § 1.º define-

as conforme a sua condição social e o lugar onde viver. Já com relação às necessidades

da família do usuário, o parágrafo segundo do mesmo dispositivo informa que elas

compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço

doméstico.

Por fim, o art. 1.413 dispõe que “são aplicáveis ao uso, no que não for contrário

à sua natureza, as disposições relativas ao usufruto”. Contrário à natureza do uso é, por

exemplo, o disposto no art. 1.393, parte final, que dá ao usufrutuário o direito de ceder,

por título gratuito ou oneroso, o exercício do direito dele decorrente.

27

NERY JR, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Ob. Citada, p. 712.

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9.6. Habitação

9.6.1. Conceito

Dispõe o art. 1.414 do Código Civil que “quando o uso consistir no direito de

habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a pode alugar, nem

emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua família”.

Observa-se, portanto, que a habitação é uma espécie de uso que incide,

entretanto, sobre imóvel residencial, dando ao usuário o direito real de habitar

gratuitamente casa alheia (se houver pagamento, torna-se locação), não podendo ele

alugar nem emprestar a coisa, mas simplesmente ocupá-la com sua família. O conceito

de família, para esse efeito, deve ser o do art. 1.412, § 2.º, embora, segundo Orlando

Gomes, ele não esteja impedido “contudo, de ter entre os moradores da casa pessoas

que não sejam de sua família, desde, porém, que não paguem hospedagem”.

À semelhança do uso, do qual a habitação, como se vê, é modalidade, esta

também é personalíssima e para ela também se aplicam as disposições relativas ao

usufruto, no que não for incompatível (art. 1.416), entretanto, enquanto o uso recai

sobre coisas móveis ou imóveis, a habitação tem por objeto somente ocupação de

imóvel residencial (urbano ou rural); além disso, na habitação se admite a constituição

do direito real em favor de mais de uma pessoa (art. 1.415), hipótese em que qualquer

delas que sozinha habite a casa não terá de pagar aluguel à outra ou às outras, mas

não as pode inibir de exercerem, querendo, o direito, que também lhes compete, de

habitá-la.

Por fim, o direito real de habitação, diferentemente do uso, pode decorrer de lei,

como no caso do art. 1.831:

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será

assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito

real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família,

desde que seja o único daquela natureza a inventariar28

.

9.7. Direito real de aquisição – direito do promitente comprador

9.7.1. Conceito

O direito do promitente comprador, como se vê na epígrafe, é direito real de

aquisição da coisa. Para se compreender a necessidade do legislador de disciplinar a

matéria nesses termos, é necessário que se faça digressão sobre a eficácia do negócio

jurídico de compra e venda no ordenamento jurídico brasileiro.

É que, como vimos, no sistema brasileiro, inspirado no romano-germânico, a

simples contratação não tem o condão de transmitir a propriedade, o que só ocorre, em

28

Existe discussão doutrinária a respeito da permanência em vigor do art. 7.º, parágrafo único da Lei

9.278/96, que dava ao companheiro (União Estável) direito real de habitação sobre o imóvel utilizado

como moradia pelos companheiros, em razão de sua não previsão expressa no novo Código Civil (cf.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 15.ª ed. Rio : Forense. 2004. Vol. VI, p.

162).

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se tratando de imóvel, com a transcrição do título no Registro de Imóveis (art. 1.245), o

que já era regra no Código Civil de 1916 (arts. 530, 531, caput, 533 e 860, parágrafo

único).

Ocorre que nem sempre as partes que celebravam negócios jurídicos de compra

e venda de imóveis tinham condições imediatas de transferir a propriedade junto ao

Cartório de Registro de Imóveis, seja por não poderem custear as despesas da

transferência ou por algum impedimento legal momentâneo. Celebravam, portanto, um

compromisso de compra e venda.

Esse compromisso de compra e venda, em regra, era irretratável. No entanto, o

promitente comprador, em várias oportunidades, era constrangido por atos do vendedor,

que continuava proprietário da coisa. Isso significava que a coisa vendida em

compromisso de compra e venda, continuando no patrimônio do vendedor, estava

sujeito à penhora, hipoteca, e até mesmo venda a terceiros.

Para proteger a situação do promitente comprador, portanto, o legislador previu,

no Decreto-Lei 58, de 10 de dezembro de 1937, o direito real de aquisição àquele que

adquirisse imóvel loteado, desde que averbasse o título. Veja-se o texto dos s. 4.º e 5.º:

Art. 4.º. Nos cartórios do registro imobiliário haverá um livro auxiliar na forma

da lei respectiva e de acordo com o modelo anexo. Nele se registrarão,

resumidamente: a) por inscrição, o memorial de propriedade loteada; b) por

averbação, os contratos de compromisso de venda e de financiamento, suas

transferências e rescisões. Parágrafo único. No livro de transcrição e à marge

do registro da propriedade loteada, averbar-se-á a inscrição assim que efetuada.

Art. 5.º. A averbação atribui ao compromissário direito real oponível a terceiro,

quanto à alienação ou oneração posterior, e far-se-á à vista do instrumento de

compromisso de venda, em que o oficial lançará a nota indicativa do livro,

página e data do assentamento.

O mesmo diploma legal conferiu o mesmo direito aos promitentes compradores

de imóveis não loteados, em seu art. 22:

Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e

venda e cessão de direitos de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago

no ato de sua constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações, desde que

inscritos a qualquer tempo, atribuem aos compromissários direito real oponível

a terceiros, e lhes conferem o direito de adjudicação compulsória nos termos

dos arts. 16 desta Lei, 640 e 641 do Código de Processo Civil.

A Lei 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, também previu

o compromisso de compra e venda em seu art. 25.

Passou-se a se considerar esse direito, portanto, como direito real, porque, uma

vez registrado, era oponível a terceiros. Implementando a necessidade de registro para

oponibilidade erga omnes, o STF editara a Súmula 621, que previa que “não enseja

embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro

de Imóveis”.

A Súmula 621, no entanto, era equivocada, pois o art. 1.046 do Código de

Processo Civil protege, por embargos de terceiro, não só o senhor (proprietário), como o

possuidor. Por isso, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 84, na qual se prevê

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que “é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse

advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de

registro”.

É o direito do promitente comprador, portanto, direito real de aquisição

decorrente de promessa de compra e venda, dando ao promitente comprador o direito a

exigir a escrituração do imóvel, uma vez cumprida sua prestação, bem como o de opor

esse direito a terceiros, uma vez registrado no Registro de Imóveis.

9.7.2. Regras

Dispõe o art. 1.417 do Código Civil:

Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou

arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada

no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito

real à aquisição do imóvel.

O texto fornece a interpretação de que a formação do direito real de aquisição

depende do registro no Cartório de Registro de Imóveis, o que é verdade, pois, nos

termos do art. 1.227, “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por

atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos

referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código”.

Para a configuração do direito real de aquisição, portanto, é necessário o registro

do título no Registro de Imóveis, máxime para o efeito da oponibilidade erga omnes

desse direito.

Coisa diversa, entretanto, é o direito pessoal do promitente comprador à

adjudicação compulsória do imóvel adquirido. Vejamos o texto do art. 1.418:

Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do

promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a

outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no

instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do

imóvel.

Assim, quando o direito à escrituração definitiva da compra e venda é exercido

diretamente contra o promitente vendedor, não se lhe condiciona ao registro, consoante

conclusão do Enunciado 95 da Jornada I do STJ: “o direito à adjudicação compulsória,

(CC, 1.418), quando exercido em face do promitente vendedor, não se condiciona ao

registro da promessa de compra e venda no cartório de registro imobiliário (Súmula

239 do STJ)”.

E o texto da Súmula 239: “O direito à adjudicação compulsória não se

condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”.

Lembre-se, entretanto, que, em se tratando de cumprimento de obrigação, cabe

ao devedor a exceção de contrato não cumprido, prevista no art. 476, in verbis: “Nos

contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação,

pode exigir o implemento da do outro” e no art. 640 do Código de Processo Civil:

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“Tratando-se de contrato, que tenha por objeto a transferência da propriedade de coisa

determinada, ou de outro direito, a ação não será acolhida se a parte, que a intentou,

não cumprir a sua prestação, nem a oferecer, nos casos e formas legais, salvo se ainda

não exigível”.

9.8. Direitos reais de garantia

9.8.1. Conceito

Direito real de garantia é o que dá ao credor de algum crédito a prerrogativa de

fazer valer seu direito pessoal sobre um específico do patrimônio do devedor.

A garantia nem sempre recaiu, exclusivamente, sobre o patrimônio do devedor.

Em período anterior à chamada Lex Poetelia Papiria (326 a.C.), o devedor garantia o

pagamento da dívida com a disponibilidade física de seu corpo, podendo ser

escravizado em caso de inadimplemento.

O sistema de execução de dívidas, no direito atual, é patrimonial, com as

raríssimas exceções do inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação

alimentícia e a do depositário infiel (CF, art. 5.º, LXVII), nos quais se autoriza a prisão

civil do devedor.

Destarte, ainda que subsistam garantias pessoais ou fidejussórias (fiança e aval,

por exemplo), estas, por sua vez, recairão sobre o patrimônio do fiador, e não sobre sua

pessoa.

O fim, portanto, do patrimônio do devedor, é a constrição judicial (penhora) em

eventual ação de execução proposta pelo credor, para futura venda em juízo e satisfação

do crédito.

Como, em muitas vezes, torna-se trabalhoso ao credor descobrir algum bem no

patrimônio do devedor, após o inadimplemento, podem as partes de uma relação

jurídica obrigacional estabelecer, já no contrato, ou em momento posterior, a vinculação

de uma coisa pertencente ao patrimônio do devedor para garantir o pagamento do

débito.

9.8.2. Princípios

A garantia, como se vê, gera para o credor um direito sobre a coisa alheia, mas

destacado da propriedade. É, pois, direito real sobre coisa alheia, porque confere a

terceiro um poder sobre a coisa dada em garantia.

Diferencia-se das preferências e dos privilégios creditórios (arts. 964 e 965), pois

estes estabelecem, em favor de determinados credores, a preferência para receber

primeiro, entretanto, sem vinculação a um bem determinado. A preferência, portanto

(ex.: crédito privilegiado da Fazenda Pública e dos empregados em falência), é direito

pessoal e recai, genericamente, sobre todo o patrimônio do devedor.

Tem o direito real de garantia certas características, algumas dos direitos reais

em geral e outras próprias da garantia.Vejamos:

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70

9.8.2.1. Vinculação do bem dado em garantia

A garantia tem o efeito de vincular o bem gravado ao cumprimento da obrigação

(art. 1.419). Em caso de descumprimento, tem o credor o direito de fazer valer o crédito

sobre o bem especificamente dado em garantia. Isto revela, também, o caráter de

especialidade ou especialização da garantia, pois, com ela, não só se dá ao credor o

direito de excutir, especificamente, o bem gravado, como ao devedor a prerrogativa de

liberar o restante de seu patrimônio.

9.8.2.2. Capacidade do sujeito e idoneidade do objeto

Tema de bastante relevância nos direitos reais de garantia é a necessidade de que

o sujeito que empenha, hipoteca ou dá em anticrese tenha capacidade para alienar.

Trata-se, portanto, da capacidade e legitimidade do sujeito. Assim, por exemplo, os bens

de menores somente podem ser alienados e, portanto, hipotecados ou empenhados pelos

pais com autorização judicial. Em alguns casos, como o da tutela e curatela, não se

admite a gravação do bem com ônus real. Por fim, o cônjuge, qualquer que seja o

regime de bens, não pode dá-los em garantia real sem a outorga do outro.

Veja-se, aliás, a opinião de PEREIRA:

Nesta ordem de idéias, salienta-se que os bens do menor sob pátrio poder

exigem prévia autorização judicial para serem dados em garantia real; que os

imóveis pertencentes a menor sob tutela jamais poderão ser hipotecados, pois é

conditio legis de sua alienação a hasta pública e esta é incompatível com a

hipoteca (CLÓVIS BEVILACQUA); que os bens pertencentes a curatelados

não podem ser hipotecados (salvo o caso dos pródigos, art. 459 do Cód. Civil).

Não obstante opiniões em contrário, a jurisprudência assentou-se no sentido da

opinião aqui esposada, que se ampara aliás em boas autoridades.

Qualquer que seja o regime de bens, a outorga do outro cônjuge é

indispensável à constituição de qualquer ônus real sobre imóvel, e, pois, à

instituição das garantias de hipoteca e anticrese.29

Como se vê, trata-se não só da capacidade do sujeito, devendo ser ele maior,

como, também, da sua legitimidade, ou seja, deve o agente ser titular do direito sobre a

coisa (proprietário) e não possuir nenhum impedimento legal para alienar (ausência de

outorga do cônjuge, cláusula de inalienabilidade, etc.).

O art. 1.420 dispõe:

Art. 1.420. Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em

anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor,

anticrese ou hipoteca. § 1º A propriedade superveniente torna eficaz, desde o

registro, as garantias reais estabelecidas por quem não era dono. § 2º A coisa

comum a dois ou mais proprietários não pode ser dada em garantia real, na sua

totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada um pode individualmente

dar em garantia real a parte que tiver.

Observa-se que o texto legal impõe não só a capacidade do sujeito, mas,

também, a sua titularidade sobre a coisa, excetuando, entretanto, o caso em que o

29

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 4.ª ed. Rio : Forense. 1981. Vol. IV, p.

252

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sujeito, ainda não sendo proprietário, dá a coisa em garantia, valendo esta em caso de

aquisição superveniente da propriedade (§ 1.º). Em caso de condomínio, a coisa não

pode ser dada, na totalidade, em garantia, sem o consentimento de todos, entretanto,

cada condômino pode dar em garantia sua parte ideal na coisa.

Por fim, entende-se, também, que, por aplicação do art. 496 (É anulável a venda de

ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente

houverem consentido), não pode o ascendente oferecer garantia em favor de descendente,

pois não pode alienar a ele seus bens sem o consentimento dos demais. Não é a opinião

que prevalece, entretanto, na jurisprudência30

Além da capacidade e legitimidade do agente, o dispositivo supra transcrito

exige, também, a idoneidade do objeto, pois “só os bens que se podem alienar poderão

ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca” (art. 1.420, caput, parte final). Assim, os

bens fora do comércio (bens públicos, por exemplo) não são idôneos para a garantia.

Também não o são os bens gravados com cláusula de inalienabilidade, em caso de

doação ou testamento, por exemplo (art. 1.911).

A idoneidade do objeto significa também, por fim, que o objeto da garantia deve

ser próprio e adequado para a espécie convencionada. Assim, objeto idôneo do penhor

são os bens móveis; da hipoteca, os bens imóveis, os navios e as aeronaves; da

anticrese, somente os imóveis.

9.8.2.3. Acessoriedade

A garantia é um direito acessório de um direito principal, qual seja, o direito de

crédito. Assim, em respeito à regra geral acessorium sequitur principale, uma vez

reconhecida a invalidade da obrigação principal, invalida-se, também, a garantia, em

aplicação ao art. 184:

Art. 184. Respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio

jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável; a invalidade

da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas

não induz a da obrigação principal.

9.8.2.4. Direito de preferência ou prioridade

O direito de preferência significa conferir ao credor hipotecário ou pignoratício o

direito de excutir, em primeiro lugar, o bem dado em garantia, ou seja, terá ele

preferência específica, sobre qualquer outro crédito, para a constrição judicial do bem

empenhado ou hipotecado.

O 1.422 prevê: “O credor hipotecário e o pignoratício têm o direito de excutir a

coisa hipotecada ou empenhada, e preferir, no pagamento, a outros credores,

observada, quanto à hipoteca, a prioridade no registro”. Além da preferência sobre

outros créditos, portanto, dá-se, na hipoteca, a preferência do credor de primeiro grau

sobre os de grau de menor, o que se verifica pelo registro.

30

―Hipoteca entre ascendentes e descendentes. A hipoteca não é venda, e, sendo legal, não há como

presumi-la simulada, ou fraudulenta, donde não se poder, sob qualquer aspecto, equipará-la à venda

prevista no citado inciso legal (RT 182/340)‖ (NERY JR, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Ob.

Citada, p. 413).

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Esse direito, entretanto, não prevalece quando a lei estabelece, em favor de

algum crédito, preferência sobre quaisquer outros, como no caso do art. 965 e dos

créditos com privilégio geral na falência. Dispõe o parágrafo único do art. 1.422:

“Excetuam-se da regra estabelecida neste artigo as dívidas que, em virtude de outras

leis, devam ser pagas precipuamente a quaisquer outros créditos”.

9.8.2.5. Direito de seqüela

O direito de seqüela, inerente aos direitos reais, dá ao credor a prerrogativa de

fazer com que a garantia possa seguir a coisa onde quer que esteja. Assim, ainda que o

proprietário da coisa hipotecada ou empenhada a aliene a terceiro, o adquirente suporta

os ônus da garantia em favor do credor.

9.8.2.6. Indivisibilidade da garantia

A indivisibilidade significa que, em regra, a coisa dada em garantia responde

pela integralidade do débito, até que ele seja totalmente quitado. Isso importa em que o

pagamento parcial do débito, ou de parcelas ajustadas, não implica em liberação parcial

da garantia, a não ser que haja expressa previsão contratual. Veja-se, a respeito, o art.

1.421: “O pagamento de uma ou mais prestações da dívida não importa exoneração

correspondente da garantia, ainda que esta compreenda vários bens, salvo disposição

expressa no título ou na quitação”.

Corolário desse princípio é a letra do art. 1.429, in verbis:

Art. 1.429. Os sucessores do devedor não podem remir parcialmente o penhor

ou a hipoteca na proporção dos seus quinhões; qualquer deles, porém, pode

fazê-lo no todo. Parágrafo único. O herdeiro ou sucessor que fizer a remição

fica sub-rogado nos direitos do credor pelas quotas que houver satisfeito.

9.8.2.7. Vencimento antecipado da dívida garantida

Por fim, as dívidas garantidas por ônus real geram, em certos casos, o efeito de

antecipar o vencimento do débito, tal como se observa pelo texto do art. 1.425:

Art. 1.425. A dívida considera-se vencida: I - se, deteriorando-se, ou

depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor,

intimado, não a reforçar ou substituir; II - se o devedor cair em insolvência ou

falir; III - se as prestações não forem pontualmente pagas, toda vez que deste

modo se achar estipulado o pagamento. Neste caso, o recebimento posterior da

prestação atrasada importa renúncia do credor ao seu direito de execução

imediata; IV - se perecer o bem dado em garantia, e não for substituído; V - se

se desapropriar o bem dado em garantia, hipótese na qual se depositará a parte

do preço que for necessária para o pagamento integral do credor.

Importante ressaltar que esse princípio, resultante da lei, aplica-se somente às

dívidas garantidas com ônus real. Nos créditos quirografários, o vencimento antecipado,

em qualquer caso, inclusive quando não se pagar alguma prestação, deve decorrer do

contrato ou de lei especial, como no caso da alienação fiduciária, por exemplo (DL

911/69).

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Mas, nos termos do art. 1.426, “nas hipóteses do artigo anterior, de vencimento

antecipado da dívida, não se compreendem os juros correspondentes ao tempo ainda

não decorrido”.

9.8.2.8. Transitoriedade

Os direitos reais de garantia, ao contrário dos direitos reais, em geral, que são

perpétuos, são transitórios, porque somente duram até a extinção da obrigação à qual se

vinculam.

9.8.3. Disposições gerais

O legislador dispôs, como regras gerais sobre os direitos reais de garantia,

algumas determinações legais, como:

9.8.3.1. Prazo máximo do direito de retenção do credor anticrédito.

O credor anticrético tem, pela natureza da anticrese, direito de retenção da coisa

até o pagamento da dívida. Dispõe o art. 1.423, no entanto: “O credor anticrético tem

direito a reter em seu poder o bem, enquanto a dívida não for paga; extingue-se esse

direito decorridos quinze anos da data de sua constituição”.

9.8.3.2. Requisitos de eficácia do contrato constitutivo da garantia

A lei estabelece requisitos para eficácia do contrato constitutivo do direito real

de garantia. De acordo com o art. 1.424 são eles: I - o valor do crédito, sua estimação,

ou valor máximo; II - o prazo fixado para pagamento; III - a taxa dos juros, se houver.

IV - o bem dado em garantia com as suas especificações (princípio da especialidade ou

da especialização). Acrescente-se a esses requisitos o registro: em caso de penhor

comum e sobre títulos de crédito, no cartório de títulos e documentos; no penhor rural,

industrial e mercantil e na hipoteca, no cartório de registro de imóveis.

O caput do art. 1.424 fala, expressamente, em eficácia, localizando tais

requisitos, portanto, no plano da eficácia do negócio jurídico constitutivo da garantia.

Assim, há de se concluir que a falta dos requisitos acima faz com que o negócio

jurídico não tenha a eficácia de criar direito real em favor do credor. A conseqüência

disto é a de que o negócio vale entre as partes, sujeitando o bem específico à quitação

do débito, entretanto, não possui a oponibilidade erga omnes própria dos direitos reais,

máxime em caso de ausência de registro. Não pode a garantia carente dos requisitos

legais, portanto, ser oposta a terceiros.

9.8.3.3. Garantia prestada por terceiro

A garantia pode ser prestada por terceiro que não seja o devedor. Essa hipótese

consagra caso legal de responsabilidade sem obrigação, já que os bens do terceiro

respondem sem que ele tenha contraído obrigação com o credor. Por isso, salvo

cláusula expressa, o terceiro que presta garantia real por dívida alheia não fica

obrigado a substituí-la, ou reforçá-la, quando, sem culpa sua, se perca, deteriore, ou

desvalorize (art. 1.427).

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9.8.3.4. Proibição do pacto comissório

O pacto comissório que, em direito contratual, significa cláusula resolutória

expressa em contrato de compra e venda para o caso de inadimplemento, tem, na

garantia real, o efeito de outorgar ao credor a propriedade da coisa dada em garantia,

também em caso de não pagamento da dívida no vencimento.

O art. 1.428 veda, expressamente, essa prática, ao estatuir que “é nula a cláusula

que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da

garantia, se a dívida não for paga no vencimento”.

Entretanto, “após o vencimento, poderá o devedor dar a coisa em pagamento da

dívida” (parágrafo único). Destarte, somente por vontade livre e consciente do devedor,

e não por imposição contratual, poderá haver a dação em pagamento da coisa dada em

garantia para extinguir o débito.

9.8.3.5. Caráter quirografário do saldo remanescente

Prevê o art. 1.430 que “quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca, o

produto não bastar para pagamento da dívida e despesas judiciais, continuará o

devedor obrigado pessoalmente pelo restante”.

Assim, se, depois da venda das coisas dadas em garantia, ainda subsistir débito

(saldo remanescente) em favor do credor, assume este saldo o caráter quirografário, ou

seja, de dívida sem garantia real.

9.8.4. Penhor

9.8.4.1. Penhor em geral

9.8.4.1.1. Conceito

O penhor, em geral, é a garantia real incidente sobre coisa móvel. Entretanto, as

fontes romanas contam que, pelo pignus, em geral, se gravavam tanto bens móveis

como imóveis. O que caracterizava o instituto, na Antigüidade, era a transferência da

posse da coisa para o credor, a fim de garantir o adimplemento da prestação do devedor.

Com o tempo, o penhor passou a se destinar, exclusivamente, aos bens móveis,

guardando, ainda, a característica de se instituir com a transferência da posse coisa para

o credor.

Reza o art. 1.431, caput:

Art. 1.431. Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que, em

garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém

por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação.

Observa-se, portanto, dos termos legais, que a regra para constituição do

penhora é a transferência efetiva da posse de coisa móvel, suscetível de alienação, para

o credor, para garantia do débito.

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Há exceções, no entanto, à regra da transferência da posse ao credor, previstas

pelo parágrafo único do art. 1.431, que reza que “no penhor rural, industrial, mercantil

e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do devedor, que as deve

guardar e conservar”.

Afora essas exceções, portanto, o contrato de penhor (acessório de um contrato

de mútuo, por exemplo), pelo qual se cria a garantia, é considerado contrato real, e não

meramente consensual, porque depende da entrega da coisa ao credor para se constituir.

Por fim, reza o art. 1.432 que “o instrumento do penhor deverá ser levado a

registro, por qualquer dos contratantes; o do penhor comum será registrado no

Cartório de Títulos e Documentos”.

9.8.4.1.2. Pluralidade de penhores e subpenhor

É princípio básico do penhor a impossibilidade de constituição de mais de um

penhor sobre a coisa, já que, em regra, o devedor transfere ao credor a posse. Entretanto,

nos casos em que essa transferência não se sucede (no penhor rural, industrial,

mercantil e de veículos), nada impede que isso ocorra. Veja-se, aliás, a opinião de

VENOSA:

O penhor típico, em face da necessidade de transmissão da posse, não admite,

em princípio, um segundo penhor sobre a coisa. Contudo, quando a posse

permanece com o devedor, não há obstáculo para que isso suceda. A Lei n.º

492/37, regulador do penhor rural, autoriza que o devedor institua novo penhor

sobre os bens ou animais já empenhados, sem consentimento do credor,

ressalvada a prioridade (art. 4.º, § 1.º). Com o presente Código, como não

houve revogação específica da legislação civil especial, haverá questões a

serem levantadas como, por exemplo, a manutenção das leis especiais de

penhor perante o atual diploma. Também ocorrerá o fenômeno do segundo

penhor nas hipóteses de penhor legal, quando a coisa já estava empenhada

convencionalmente. Também sobre o mesmo crédito pode ocorrer segundo

penhor.31

Já o subpenhor é a instituição de penhor pelo credor pignoratício que tem a

posse da coisa empenhada, ou seja, o credor dá em penhor coisa sob sua posse, mas de

propriedade do devedor pignoratício. Venosa admite sua constituição32

, desde que o

contrato não o proíba. Entretanto, o art. 1.431 exige, para o penhor, que a coisa seja

suscetível de alienação. Ora, embora o credor receba a posse da coisa empenhada, não

tem ele o direito de aliená-la, portanto, não poderá ele dá-la em garantia, a não ser que

se trate de penhor legal ou que o credor adquira, supervenientemente, a propriedade da

coisa (art. 1.420, § 1.º).

9.8.4.1.3. Espécies de penhor

O penhor pode ser classificado conforme a fonte ou o objeto. Assim, podemos

estabelecer a seguinte classificação

a) Quanto à fonte:

31

VENOSA, ob. Citada, p. 531. 32

Idem.

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a1) Penhor convencional: é aquele cuja fonte é a vontade das

partes, sendo estatuído em contrato;

a2) Penhor legal: origina-se da lei, independentemente do

concurso da vontade de ambas as partes.

b) Quanto ao objeto:

b1) Penhor comum: é aquele que incide sobre qualquer objeto,

desde que não seja destinado, pela lei, aos penhores especiais;

b2) Penhor especial: é aquele estabelecido sobre objeto específico

e com regras próprias, como o rural (agrícola e pecuário),

industrial e mercantil, de direitos e títulos de crédito e de veículos.

9.8.4.1.4. Direitos do credor pignoratício

Segundo o art. 1.433 são direitos do credor pignoratício:

a) posse: tem o credor pignoratício, em regra, a posse da coisa

empenhda;

b) direito de retenção: o credor pignoratício tem direito de retenção

sobre a coisa, até que o indenizem das despesas devidamente

justificadas, que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua. De

acordo com o art. 1.434, “O credor não pode ser constrangido a

devolver a coisa empenhada, ou uma parte dela, antes de ser

integralmente pago, podendo o juiz, a requerimento do proprietário,

determinar que seja vendida apenas uma das coisas, ou parte da

coisa empenhada, suficiente para o pagamento do credor”;

c) Ressarcimento por vício da coisa: tem o credor, também, o direito por

ressarcimento do prejuízo que houver sofrido por vício da coisa

empenhada;

d) Excussão da coisa: tem o credor o direito de executar judicialmente o

devedor, recaindo a execução sobre o bem empenhado.

Eventualmente, desde que o contrato autorize expressamente, ou o

devedor dê procuração, o credor pode vender amigavelmente o bem.

Relembre-se, entretanto, o texto do art. 1.428, que faz nula a cláusula

que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar

com o objeto da garantia, se a dívida não for paga no vencimento;

e) Percepção dos frutos: Diz o art. 1.433, V que o credor tem direito “a

apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu

poder. Aqui, no entanto, aplicam-se as regras gerais quanto à

percepção de frutos pelo possuidor de boa-fé, pois é obrigação do

credor a restituição da coisa com os respectivos frutos e acessões,

uma vez paga a dívida. Além disso, uma vez apropriando-se dos

frutos, tem ele o dever de imputar o valor deles nas despesas de

guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação

garantida, sucessivamente (art. 1.435, III e IV);

f) Venda antecipada: Além disso, compete ao credor “promover a

venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que

haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore,

devendo o preço ser depositado. O dono da coisa empenhada pode

impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo outra

garantia real idônea” (art. 1.433, VI);

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9.8.4.1.5. Deveres do credor pignoratício

O art. 1.435 estabelece os deveres do credor pignoratício. São eles:

a) Depósito: Reza o art. 1.435, I que o credor é obrigado “à custódia da

coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou

deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida,

até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade”. O

credor pignoratício, portanto, passa a ser depositário da coisa

empenhada, desde que lhe transferida a posse, com todas os deveres

inerentes ao contrato de depósito;

b) Defesa da posse: Como o penhor é direito real, cria-se, em favor do

credor que tem a posse, o direito de seqüela, podendo seguir a coisa

onde quer que se encontre. Entretanto, o credor não só tem esse

direito, mas também o dever de partir em “defesa da posse da coisa

empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que

tornarem necessário o exercício de ação possessória”;

c) Frutos: Tendo o credor o direito aos frutos, como já vimos, terá, por

corolário, a obrigação de “imputar o valor dos frutos, de que se

apropriar (art. 1.433, inciso V) nas despesas de guarda e

conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida,

sucessivamente” bem como de “restituí-la (a coisa empenhada), com

os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida”;

d) Saldo remanescente: Uma vez vendida a coisa (judicial ou

amigavelmente), tem o credor a obrigação de “entregar o que sobeje

do preço, quando a dívida for paga”.

9.8.4.1.6. Extinção do penhor

Como o penhor é pacto acessório a uma dívida, para garanti-la, sua extinção

depende, em primeiro plano, da extinção da própria obrigação, eis que a ela vinculado.

Assim, pode ocorrer com o pagamento, a prescrição, a remissão, a confusão, a

compensação, etc. e com a venda amigável ou judicial da coisa.

Entretanto, pode derivar da vontade do próprio credor, que renuncia à garantia

ou ocorrer pelo perecimento da coisa. Nesses casos, porém, extingue-se a garantia, e

não a dívida.

Assim, cinco são os casos de extinção do penhor previstos no art. 1.436 do

Código Civil:

a) extinguindo-se a obrigação;

b) perecendo a coisa;

c) renunciando o credor. A renúncia, entretanto, se presume quando: c1) o

credor consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, c2)

quando restituir a posse da coisa ao devedor c3) ou quando anuir à sua

substituição por outra garantia;

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d) confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa.

Entretanto, operando-se a confusão tão-somente quanto a parte da dívida

pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto.;

e) dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada,

feita pelo credor ou por ele autorizada

A extinção do penhor, entretanto, somente produz efeitos depois de averbado o

cancelamento do registro, à vista da respectiva prova.

9.8.4.2. Penhores especiais

9.8.4.2.1. Penhor rural

O penhor rural se caracteriza por incidir, especificamente, sobre os objetos

descritos nos arts. 1.442 (penhor agrícola) e 1.444 (penhor pecuário).

Além disso, é regra especial do penhor rural a não transferência da posse da

coisa para o credor, razão por que se constitui mediante instrumento público ou

particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição em que

estiverem situadas as coisas empenhadas (art. 1.438).

Pode o penhor rural dar origem à cédula rural pignoratícia, regida pela

legislação especial.

Por fim, o penhor rural tem prazos máximos previstos em lei (art. 1.439), sendo

de três anos para o agrícola e de quatro anos para o pecuário, prorrogáveis, uma só vez,

pelo mesmo tempo, devendo a prorrogação ser averbada à margem do registro

respectivo, mediante requerimento do credor e do devedor.

Disciplina o parágrafo primeiro do art. 1.439 que “embora vencidos os prazos,

permanece a garantia, enquanto subsistirem os bens que a constituem”.

Podem ser objeto de penhor agrícola:

I - máquinas e instrumentos de agricultura;

II - colheitas pendentes, ou em via de formação;

III - frutos acondicionados ou armazenados;

IV - lenha cortada e carvão vegetal;

V - animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.

São objeto de penhor pecuário: os animais que integram a atividade pastoril,

agrícola ou de lacticínios.

9.8.4.2.2. Penhor industrial e mercantil

O penhor industrial e mercantil também se caracteriza por não conferir ao credor

a posse da coisa empenhada.

São objetos de penhor industrial ou mercantil:

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a) máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos, instalados e em

funcionamento, com os acessórios ou sem eles;

b) animais, utilizados na indústria;

c) sal e bens destinados à exploração das salinas;

d) produtos de suinocultura, animais destinados à industrialização de carnes e

derivados;

e) matérias-primas e produtos industrializados.

Constitui-se mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório

de Registro de Imóveis da circunscrição onde estiverem situadas as coisas empenhadas

e pode dar origem à cédula de crédito industrial ou mercantil, conforme o caso, regida

por lei especial.

9.8.4.2.3. Penhor de direitos e títulos de crédito

9.8.4.2.3.1. Penhor de direitos

O penhor de direitos constitui-se sobre direitos sobre coisas móveis, desde que

suscetíveis de cessão.

Para constituir-se, deve ser registrado no Registro de Títulos e Documentos e o

devedor (titular do direito empenhado) deverá entregar ao credor pignoratício os

documentos comprobatórios desse direito, salvo se tiver interesse legítimo em conservá-

los.

Não tem eficácia senão quando notificado ao devedor, mas por notificado se tem

o devedor que, em instrumento público ou particular, declarar-se ciente da existência do

penhor.

Se o mesmo crédito for objeto de vários penhores, só ao credor pignoratício,

cujo direito prefira aos demais, o devedor deve pagar; responde por perdas e danos aos

demais credores o credor preferente que, notificado por qualquer um deles, não

promover oportunamente a cobrança (art. 1.456).

9.8.4.2.3.2. Penhor de títulos de crédito

Já o penhor, que recai sobre título de crédito, constitui-se mediante instrumento

público ou particular ou endosso pignoratício, com a tradição do título ao credor.

Aqui tem-se hipótese, entretanto, em que o devedor, em verdade, possui um

crédito contra terceiro representado por um título, podendo dá-lo em penhor a um credor

seu.

Rege-se pelas disposição gerais do penhor e, em especial, pelas seguintes regras:

a) Direitos do credor pignoratício de título de crédito: a1) conservar a posse do

título e recuperá-la de quem quer que o detenha; a2) usar dos meios judiciais

convenientes para assegurar os seus direitos, e os do credor do título empenhado;

a3) fazer intimar ao devedor do título que não pague ao seu credor, enquanto

durar o penhor; a4) receber a importância consubstanciada no título e os

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respectivos juros, se exigíveis, restituindo o título ao devedor, quando este solver

a obrigação.

b) Efeitos do penhor em relação ao devedor do título de crédito: b1) O devedor

do título empenhado que receber a intimação prevista no inciso III do artigo

1.459, ou se der por ciente do penhor, não poderá pagar ao seu credor. Se o fizer,

responderá solidariamente por este, por perdas e danos, perante o credor

pignoratício; b2) Se o credor der quitação ao devedor do título empenhado,

deverá saldar imediatamente a dívida, em cuja garantia se constituiu o penhor.

9.8.4.2.4. Penhor de veículos

O penhor pode recair sobre veículos e, nesse caso, não depende da transferência

da posse ao credor pignoratício. Tem prazo máximo de dois anos, prorrogável uma vez

por igual prazo (art. 1.466) e se constitui mediante instrumento público ou particular,

registrado no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, e anotado no

certificado de propriedade. Pode dar origem, também, à respectiva cédula de crédito.

Não se fará o penhor de veículos sem que estejam previamente segurados contra

furto, avaria, perecimento e danos causados a terceiros (art. 1.464).

Por fim, consoante o art. 1.465. “a alienação, ou a mudança, do veículo

empenhado sem prévia comunicação ao credor importa no vencimento antecipado do

crédito pignoratício”.

9.8.4.3. Penhor legal

Como vimos, o penhor pode ter como fonte, também, a lei, constituindo-se,

nesse caso, em penhor legal. Para o penhor legal, a lei não exige o registro em cartório,

já que decorre da lei, independentemente de convenção, mas, de acordo com o art.

1.471, depende de homologação judicial (CPC, arts. 874 a 876).

É previsto em lei para garantir a determinados credores o pagamento da dívida,

tendo em vista a natureza da própria obrigação, que pode ser de difícil execução em

razão da evasão do devedor do local da origem do débito, como no caso de débitos

originados por hospedagem em hotéis ou pela locação de prédios urbanos ou rústicos.

Assim, prevê o art. 1.467:

Art. 1.467. São credores pignoratícios, independentemente de convenção:

I - os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens,

móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem

consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo

que aí tiverem feito;

II - o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou

inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas.

Podemos citar, ainda, o caso do art. 31 da lei nº 6.533/78, que estabelece penhor

legal em favor dos artistas e técnicos de diversão, sobre todo o equipamento e material

de propriedade do empregador, utilizado na realização de programa, espetáculo ou

produção, pelo valor das obrigações não cumpridas.

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Pode o locatário impedir a constituição do penhor mediante caução idônea (art.

1.472).

9.8.5. Hipoteca

9.8.5.1. Conceito

A hipoteca, assim como o penhor, constitui-se por contrato acessório a uma

obrigação, para garantir seu pagamento. É, pois, direito real de garantia, conferindo ao

credor hipotecário os direitos naturalmente inerentes aos direitos reais, como a seqüela e

a oponibilidade erga omnes. Para tanto, depende de registro (art. 1.492).

Diferencia-se do penhor tanto pelo fato de incidir, em regra, sobre imóveis,

como também por não exigir a transferência da posse para o credor.

Além disso, a hipoteca admite, em regra, a pluralidade, podendo ser conferidas

hipotecas de vários graus a credores, tendo prioridade aqueles que as registrarem

primeiro33

. A respeito, dispõem os arts. 1.476 a 1.478:

Art. 1.476. O dono do imóvel hipotecado pode constituir outra hipoteca sobre

ele, mediante novo título, em favor do mesmo ou de outro credor.

Art. 1.477. Salvo o caso de insolvência do devedor, o credor da segunda

hipoteca, embora vencida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a

primeira. Parágrafo único. Não se considera insolvente o devedor por faltar ao

pagamento das obrigações garantidas por hipotecas posteriores à primeira.

Art. 1.478. Se o devedor da obrigação garantida pela primeira hipoteca não se

oferecer, no vencimento, para pagá-la, o credor da segunda pode promover-lhe

a extinção, consignando a importância e citando o primeiro credor para recebê-

la e o devedor para pagá-la; se este não pagar, o segundo credor, efetuando o

pagamento, se sub-rogará nos direitos da hipoteca anterior, sem prejuízo dos

que lhe competirem contra o devedor comum. Parágrafo único. Se o primeiro

credor estiver promovendo a execução da hipoteca, o credor da segunda

depositará a importância do débito e as despesas judiciais.

9.8.5.2. Classificação da hipoteca

A hipoteca classifica-se, também, pela fonte ou pelo objeto.

Pela fonte pode ser convencional ou legal.

Pelo objeto pode ser comum ou especial, conforme incida sobre imóveis em

geral ou sobre bens especialmente designados pela lei.

Assim, podem ser objeto de hipoteca:

I - os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com

eles. Envolve, portanto, os bens acessórios ao imóvel, como as

construções, plantações, etc.;

33

Art. 1.493. Os registros e averbações seguirão a ordem em que forem requeridas, verificando-se ela

pela da sua numeração sucessiva no protocolo. Parágrafo único. O número de ordem determina a

prioridade, e esta a preferência entre as hipotecas.

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II - o domínio direto;

III - o domínio útil. Domínio útil é o que resulta da enfiteuse, em

que o proprietário transfere ao enfiteuta o domínio útil sobre a

coisa;

IV - as estradas de ferro;

V - os recursos naturais a que se refere o art. 1.230,

independentemente do solo onde se acham. Reza o art. 1.230: “A

propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais

recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os

monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis

especiais. Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito

de explorar os recursos minerais de emprego imediato na

construção civil, desde que não submetidos a transformação

industrial, obedecido o disposto em lei especial”;

VI - os navios;

VII - as aeronaves.

A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel.

Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o

mesmo imóvel (art. 1.474).

Por outro lado, é nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel

hipotecado (art. 1.475), mas se pode convencionar que vencerá o crédito hipotecário, se

o imóvel for alienado

9.8.5.3. Princípios

A hipoteca, como os direitos reais de garantia em geral, demanda a confluência

de dois princípios: o da publicidade e o da especialização.

A publicidade é essencial para a oposição do direito do credor hipotecário a

terceiros, realizando-se com a inscrição no Registro de Imóveis.

A especialização é a necessidade de indicação precisa do bem que serve de

objeto da garantia.

Destarte, assim como já informado no item 9.8.3.2, há de se concluir que a falta

dos requisitos acima faz com que o negócio jurídico não tenha a eficácia de criar

direito real em favor do credor. A conseqüência disto é a de que o negócio vale entre as

partes, sujeitando o bem específico à quitação do débito, entretanto, não possui a

oponibilidade erga omnes própria dos direitos reais, máxime em caso de ausência de

registro. Não pode a garantia carente dos requisitos legais, portanto, ser oposta a

terceiros.

9.8.5.4. Regras

9.8.5.4.1. Aquisição do imóvel hipotecado

Sendo nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado, a

coisa dada em hipoteca pode, livremente, ser adquirida por terceiro. Este porém, sujeita-

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se ao ônus real dela decorrente. Embora não fique obrigado ao pagamento da dívida,

pode ter a coisa adquirida tomada em função da excussão judicial. Assim, o art. 1.479

lhe dá solução para não se exonerar da hipoteca:

Art. 1.479. O adquirente do imóvel hipotecado, desde que não se tenha

obrigado pessoalmente a pagar as dívidas aos credores hipotecários, poderá

exonerar-se da hipoteca, abandonando-lhes o imóvel.

Para tanto, “o adquirente notificará o vendedor e os credores hipotecários,

deferindo-lhes, conjuntamente, a posse do imóvel, ou o depositará em juízo” (art.

1.480). Assim, diz o parágrafo único que “poderá o adquirente exercer a faculdade de

abandonar o imóvel hipotecado, até as vinte e quatro horas subseqüentes à citação,

com que se inicia o procedimento executivo”.

9.8.5.4.1.1. Remição

Dá o art. 1.481 do Código Civil ao adquirente do imóvel hipotecado o direito de

remi-lo. Veja-se:

Art. 1.481. Dentro em trinta dias, contados do registro do título aquisitivo, tem

o adquirente do imóvel hipotecado o direito de remi-lo, citando os credores

hipotecários e propondo importância não inferior ao preço por que o adquiriu.

§ 1º Se o credor impugnar o preço da aquisição ou a importância oferecida,

realizar-se-á licitação, efetuando-se a venda judicial a quem oferecer maior

preço, assegurada preferência ao adquirente do imóvel.§ 2º Não impugnado

pelo credor, o preço da aquisição ou o preço proposto pelo adquirente, haver-

se-á por definitivamente fixado para a remissão do imóvel, que ficará livre de

hipoteca, uma vez pago ou depositado o preço. § 3º Se o adquirente deixar de

remir o imóvel, sujeitando-o a execução, ficará obrigado a ressarcir os credores

hipotecários da desvalorização que, por sua culpa, o mesmo vier a sofrer, além

das despesas judiciais da execução. § 4º Disporá de ação regressiva contra o

vendedor o adquirente que ficar privado do imóvel em conseqüência de

licitação ou penhora, o que pagar a hipoteca, o que, por causa de adjudicação

ou licitação, desembolsar com o pagamento da hipoteca importância excedente

à da compra e o que suportar custas e despesas judiciais.

9.8.5.4.2. Prazo da hipoteca

Conforme o art. 1.485, “mediante simples averbação, requerida por ambas as

partes, poderá prorrogar-se a hipoteca, até perfazer vinte anos, da data do contrato.

Desde que perfaça esse prazo, só poderá subsistir o contrato de hipoteca,

reconstituindo-se por novo título e novo registro; e, nesse caso, lhe será mantida a

precedência, que então lhe competir”.

9.8.5.4.3. Hipoteca para garantia de dívida futura

Segundo o art. 1.487, ―a hipoteca pode ser constituída para garantia de dívida

futura ou condicionada, desde que determinado o valor máximo do crédito a ser

garantido. § 1º Nos casos deste artigo, a execução da hipoteca dependerá de prévia e

expressa concordância do devedor quanto à verificação da condição, ou ao montante da

dívida; § 2º Havendo divergência entre o credor e o devedor, caberá àquele fazer prova

de seu crédito. Reconhecido este, o devedor responderá, inclusive, por perdas e danos,

em razão da superveniente desvalorização do imóvel‖.

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9.8.5.4.4. Loteamento do imóvel hipotecado

Nos termos do art. 1.488:

Art. 1.488. Se o imóvel, dado em garantia hipotecária, vier a ser loteado, ou se

nele se constituir condomínio edilício, poderá o ônus ser dividido, gravando

cada lote ou unidade autônoma, se o requererem ao juiz o credor, o devedor ou

os donos, obedecida a proporção entre o valor de cada um deles e o crédito.

§ 1º O credor só poderá se opor ao pedido de desmembramento do ônus,

provando que o mesmo importa em diminuição de sua garantia.

§ 2º Salvo convenção em contrário, todas as despesas judiciais ou

extrajudiciais necessárias ao desmembramento do ônus correm por conta de

quem o requerer.

§ 3º O desmembramento do ônus não exonera o devedor originário da

responsabilidade a que se refere o art. 1.430, salvo anuência do credor.

9.8.5.5. Hipoteca legal

Independentemente de convenção, haverá hipoteca para os seguintes casos:

I - às pessoas de direito público interno sobre os imóveis pertencentes aos

encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos

fundos e rendas;

II - aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras

núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior;

III - ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente,

para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas

judiciais;

IV - ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha,

sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente;

V - ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do pagamento do

restante do preço da arrematação.

Diferentemente do penhor legal, a hipoteca legal deve ser registrada e, além

disso, especializada. Veja-se, aliás, o conteúdo do art. 1.497:

Art. 1.497. As hipotecas legais, de qualquer natureza, deverão ser registradas e

especializadas. § 1º O registro e a especialização das hipotecas legais

incumbem a quem está obrigado a prestar a garantia, mas os interessados

podem promover a inscrição delas, ou solicitar ao Ministério Público que o

faça. § 2º As pessoas, às quais incumbir o registro e a especialização das

hipotecas legais, estão sujeitas a perdas e danos pela omissão.

9.8.5.6. Registro da hipoteca

O art. 1.492 estabelece a necessidade de registro da hipoteca, determinando que

ele seja feito no lugar do imóvel e à vista do título, por qualquer interessado.

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Faz-se o registro de acordo com a ordem em que são requeridas as hipotecas,

determinando-se a prioridade pelo número de ordem.

De acordo com o art. 1.494, “não se registrarão no mesmo dia duas hipotecas,

ou uma hipoteca e outro direito real, sobre o mesmo imóvel, em favor de pessoas

diversas, salvo se as escrituras, do mesmo dia, indicarem a hora em que foram

lavradas”.

9.8.5.7. Extinção da hipoteca

A hipoteca também se extingue, de regra, pela extinção da obrigação, mas pode

terminar, também, por outras circunstâncias, como pelo perecimento da coisa ou pela

resolução da propriedade do devedor.

Vejamos o rol de causas extintivas do art. 1.499:

Art. 1.499. A hipoteca extingue-se:

I - pela extinção da obrigação principal;

II - pelo perecimento da coisa;

III - pela resolução da propriedade;

IV - pela renúncia do credor;

V - pela remição;

VI - pela arrematação ou adjudicação.

A extinção da obrigação principal pode se dar pelas várias causas do código em

geral, seja por pagamento, prescrição, novação, ou pelas espécies previstas no próprio

dispositivo, como na remição e na arrematação e adjudicação.

Por outro lado, perecendo a coisa dada em hipoteca, extingue-se, também, a

garantia real. Quanto à resolução da propriedade, é de se observar que o art. 1.359

prevê: “Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do

termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e

o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder

de quem a possua ou detenha”.

A par desses modos de extinção, pode o credor renunciar à hipoteca, caso em

que esta, obviamente, se extingue.

Além disso, o cancelamento do registro da hipoteca no respectivo cartório

também tem o condão de extingui-la (art. 1.500).

Por fim, o art. 1.501 estabelece norma de ordem processual, ao estatuir que “não

extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que

tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não

forem de qualquer modo partes na execução”.

9.8.5.8. Hipoteca de vias férreas

A hipoteca pode recair sobre estrada de ferro, caso em que será registrada no

Município da estação inicial da respectiva linha (art. 1.502).

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86

Os credores hipotecários não podem embaraçar a exploração da linha, nem

contrariar as modificações, que a administração deliberar, no leito da estrada, em suas

dependências, ou no seu material (art. 1.503).

Essa hipoteca será circunscrita à linha ou às linhas especificadas na escritura e

ao respectivo material de exploração, no estado em que ao tempo da execução

estiverem; mas os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, à de suas

linhas, de seus ramais ou de parte considerável do material de exploração; bem como à

fusão com outra empresa, sempre que com isso a garantia do débito enfraquecer (art.

1.504).

Enfim, na execução das hipotecas sobre vias férreas, será intimado o

representante da União ou do Estado, para, dentro em quinze dias, remir a estrada de

ferro hipotecada, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação (art. 1.505).

9.8.6. Anticrese

9.8.6.1. Conceito

A anticrese é o direito real pelo qual o devedor transfere ao credor a posse de

coisa imóvel, para que este compense a dívida com os frutos e rendimentos decorrentes

do imóvel.

É exclusivo, portanto, de bens imóveis e depende da entrega do imóvel ao

credor (art. 1.506).

9.8.6.2. Direitos do credor anticrético

São direitos do credor anticrético:

a) administrar os bens dados em anticrese e fruir seus frutos e utilidades (art.

1.507), com direito de retenção até a compensação total da dívida;

b) arrendar, salvo pacto em sentido contrário, os bens dados em anticrese a

terceiro, mantendo, até ser pago, direito de retenção do imóvel, embora o aluguel

desse arrendamento não seja vinculativo para o devedor (art. 1.507, § 2.º);

c) vindicar os seus direitos contra o adquirente dos bens, os credores

quirografários e os hipotecários posteriores ao registro da anticrese (art. 1.509).

9.8.6.3. Deveres do credor anticrético

a) apresentar anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração (art. 1.507).

Se o devedor anticrético não concordar com o que se contém no balanço, por ser

inexato, ou ruinosa a administração, poderá impugná-lo, e, se o quiser, requerer

a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel, o

qual poderá ser corrigido anualmente (art. 1.507, § 1.º);

b) responder pelas deteriorações que, por culpa sua, o imóvel vier a sofrer, e

pelos frutos e rendimentos que, por sua negligência, deixar de perceber;

9.8.6.4. Aquisição de imóvel objeto de anticrese

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Conforme o art. 1.510, “o adquirente dos bens dados em anticrese poderá remi-

los, antes do vencimento da dívida, pagando a sua totalidade à data do pedido de

remição e imitir-se-á, se for o caso, na sua posse”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Pró-Livro, 1978.

GOMES, Orlando. Direitos Reais. 7.ª ed. Rio : Forense, 1980.

NERY Jr, Nélson e NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil Comentado e Legislação

Extravagante. 3.ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2005.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 4.ª ed. Rio : Forense.

1981. Vol. IV.

___________________. Instituições de Direito Civil. 15.ª ed. Rio : Forense. 2004. Vol.

VI.

PIPES, Richard. Propriedade e Liberdade. Rio de Janeiro : Recordd, 2001.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direitos Reais. 6.º ed. São Paulo : Atlas,

2006.

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E X E R C Í C I O S

1) – MAGISTRATURA-SP-168 Sobre o conceito de posse as duas principais teorias

são:

a) Teoria objetiva de Planiol e Teoria subjetiva de Ripert.

b) Teoria subjetiva de Savigny e Teoria objetiva de Ihering.

c) Teoria subjetiva de Ihering e Teoria objetiva de Savigny.

d) Teoria objetiva de Keisen e Teoria subjetiva de Ennecerus.

2) – MAGISTRATURA-SP-168 São atinentes ao registro da propriedade imóvel os

seguintes princípios:

a) da continuidade, da equivalência e da simetria.

b) da continuidade, da especialidade e da presunção legal.

c) da continuidade, da concentração e da verdade transcendental.

d) da continuidade, da eventualidade e da presunção de hominis.

3) – MAGISTRATURA-SP-170 Diz o art. 485, do Código Civil, que "considera-se

possuidor todo aquele que tem de fato o exercício pleno ou não de algum dos poderes

inerentes ao domínio ou propriedade". O Código Civil adotou teoria de quem? Como se

define?

(A) De Ihering, com sua teoria objetiva. A posse é conduta de dono. É, então, a

exteriorização da propriedade, a visibilidade do domínio, o uso econômico da coisa.

(B) De Ihering, com sua teoria subjetiva. A posse caracteriza-se pela conjugação de dois

elementos: o corpus e o animus.

(C) De Savigny, com sua teoria objetiva. A posse consiste na detenção física da coisa.

(D) De Savigny, com sua teoria subjetiva. A posse consiste na intenção de exercer sobre

a coisa um poder no interesse próprio.

04) – MAGISTRATURA-SP-171 O contrato de compromisso de compra e venda de

bem imóvel não loteado, para assegurar à parte direito real deverá conter, além das

assinaturas do vendedor e do comprador,

(A) ausência de cláusula de arrependimento e registro no Cartório do Registro de

Imóveis.

(B) cláusula de arrependimento e registro no Cartório Imobiliário.

(C) celebração por escritura pública, mesmo com pagamento em prestações.

(D) celebração por compromisso particular, porém com pagamento à vista.

5) – MAGISTRATURA-SP-171 Usucapião.

(A) O processo de arrecadação de herança jacente, a respeito do mesmo imóvel, impede

o reconhecimento do usucapião.

(B) Área incluída em reserva florestal não podeser objeto de usucapião.

(C) Nas ações de usucapião, de interesse de particular que apenas objetiva uma sentença

favorável para regularização do domínio, a intervenção do Ministério Público não é

necessária.

(D) O usucapião é forma originária de aquisição da propriedade e não apenas exercício

de posse por um lapso de tempo estipulado em lei.

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6) – MD-DF-24 Julgue os itens subseqüentes.

I Podem ser objeto de usucapião tanto os bens móveis quanto os imóveis; em relação

aos imóveis, a Constituição de 1988 apresentou inovação — o usucapião especial

urbano —, ao prever a possibilidade de aquisição do imóvel por aquele que possuir,

como sua, área urbana de, no máximo, 250 m2, por cinco anos, initerruptamente e sem

oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, desde que não seja

proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

II A introdução de criança ou adolescente em família substituta estrangeira é feita,

observadas as devidas cautelas, por meio de adoção, tutela ou guarda.

III O Ministério Público não tem legitimidade para requerer a perda ou suspensão do

pátrio poder quando a criança ou o adolescente possuírem avós paternos ou maternos.

IV O mútuo feneratício é caracterizado pela cobrança capitalizada de juros.

A quantidade de itens certos é igual a

A) 1.

B) 2.

C) 3.

D) 4.

7) – MD-DF-25 Assinale a opção incorreta.

A De acordo com o novo Código Civil, a coação, para viciar a declaração de vontade,

há de ser tal que incuta ao paciente fundado termo de dano iminente e considerável à

sua pessoa, à sua família ou aos seus bens e, em circunstâncias específicas, a pessoa

não-pertencente à família do paciente.

B De acordo com o novo Código Civil, o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e

dispor da coisa; são defesos, todavia, os atos que não tragam ao proprietário qualquer

comodidade ou utilidade e sejam animados pela intenção de prejudicar terceiros.

C Tanto o Código Civil em vigor como o novo Código Civil explicitam que os bens

públicos não estão sujeitos ao usucapião.

D O novo Código Civil estabelece que os direitos reais sobre coisas móveis, quando

constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com a tradição.

8) – OAB-GO-18.08.02 Assinale a alternativa correta:

a) – posse justa é aquela obtida por meios não precários, clandestinos mas não

violentos;

b) – o constituto possessório se caracteriza pelo ato em que aquele que possuía em seu

nome passa a possuir em nome de outrem;

c) – a manutenção de posse, reintegração de posse, interdito proibitório, imissão de

posse, nunciação de obra nova, reivindicatória são as ações admitidas no direito

brasileiro para defesa da posse;

d) – penhor é o contrato formal, acessório, pelo qual o devedor dá, geralmente, em

garantia, um bem imóvel ao credor.

9) Magistratura-BA-2004 (modificada) Julgue os itens seguintes, referentes a posse e

propriedade.

81. A aquisição da posse só ocorre com o exercício do poder de ingerência sobre o bem.

82. Os julgamentos dos interditos possessórios pautam-se apenas nas questões

pertencentes ao mundo dos

fatos; a eventual alegação de direito real sobre o bem litigioso servirá apenas como mais

um elemento de prova.

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83. Apenas o possuidor de posse velha, no caso de turbação ou esbulho, pode manter-se

ou restituir-se na posse por sua própria força.

84. O possuidor de má-fé tem direito de ser ressarcido apenas pelas benfeitorias

necessárias, assistindo-lhe direito de retenção pela importância a elas referente.

85. A adjudicação compulsória de bem imóvel é devida ao promitente comprador titular

de direito real.

Estão certos:

a) Os itens 82 e 85

b) Os itens 81, 83 e 84

c) Todos os itens

d) Nenhum item

10) MAGISTRATURA-SC-Abr/2003 Consideradas as disposições do Código Civil em

vigor, assinale, dentre as alternativas abaixo, a correta:

a. Além da propriedade, a enfiteuse também esta inscrita como direito real.

b. A anticrese não se constitui em direito real de garantia.

c. O direito do promitente comprador do imóvel constitui-se em direito real.

d. A habitação e o uso não são previstos como direitos reais.

e. As rendas expressamente constituídas sobre imóveis caracterizam-se como direitos

reais.

11) MAGISTRATURA-SC-Nov/2003 Assinale a alternativa correta:

Há propriedade resolúvel:

a) Na superfície e na anticrese.

b) Na retrovenda e na alienação fiduciária em garantia.

c) Na venda a contento sob condição suspensiva e no fideicomisso.

d) Na venda a contento sob condição resolutiva e no usufruto.

e) Nenhuma das alternativas é correta.

12) MAGISTRATURA-SC-Nov/2003 Assinale a alternativa correta:

É possível o convalecimento de posse precária?

a) Sim, desde que date de mais de ano e dia.

b) Sim, desde que antes de um ano seja ajuizada ação possessória.

c) Sim, desde que antes de dois anos seja ajuizada ação possessória.

d) Sim, desde que também não seja clandestina.

e) Não, porque a precariedade não cessa.

13) MAGISTRATURA-MG-2003/2004 Sobre a disciplina dos Direitos Reais de Garantia

no Novo Código Civil é CORRETO afirmar

que:

(A) qualquer que seja a espécie de penhor, sua constituição sempre pressupõe a

transferência efetiva da posse pelo devedor ao credor de coisa móvel, suscetível de

alienação.

(B) são direitos do credor pignoratício reconhecidos no novo Código Civil, entre outros: o

de apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder; o de promover

a venda antecipada, independentemente de prévia autorização judicial, sempre que haja

receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore.

(C) na excussão judicial da garantia hipotecária, realizada a praça, o executado poderá, até a

assinatura do auto de arrematação ou até que seja publicada a sentença de adjudicação,

remir o imóvel hipotecado, oferecendo preço igual ao da avaliação. Igual direito caberá ao

cônjuge, aos descendentes ou ascendentes do executado.

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(D) o penhor de veículos só se pode convencionar pelo prazo máximo de 1 (um) ano,

prorrogável até o limite de igual tempo.

(E) a hipoteca não pode jamais ser constituída para garantia de dívida futura ou

condicionada, ainda que determinado o valor máximo do crédito a ser garantido.

14) MAGISTRATURA-MG-2003/2004 Pedro edificou, de boa-fé, casa em terreno que

acreditava lhe pertencer na totalidade. Constatou, porém, após o término da construção, que

por um erro da descrição das linhas limítrofes de seu registro, parte da edificação invadiu

metade do terreno de seu vizinho. Assim, parte da casa encontra-se em terreno próprio e

parte ocupa metade do terreno alheio. Marque, a seguir, a alternativa CORRETA.

(A) Pedro adquirirá a propriedade da área invadida, devendo pagar o décuplo do valor do

terreno perdido e o da desvalorização da área remanescente.

(B) Pedro, embora esteja de boa-fé, terá que demolir a parte da construção que invadiu o

terreno alheio, ainda que com grave prejuízo para a edificação.

(C) Pedro, independentemente de sua boa ou má-fé, adquire a propriedade da parte do solo

invadido, mediante o pagamento de indenização correspondente ao valor do terreno objeto

da invasão.

(D) Pedro adquirirá a propriedade da parte do solo invadido apenas se o valor da construção

exceder o valor do terreno.

(E) Estando Pedro de boa-fé, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde

por perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área

perdida e o da desvalorização da área remanescente.

15) MAGISTRATURA-SP-174 Na defesa da posse, o desforço imediato

(A) cabe ao possuidor apenas nos casos de turbação de posse.

(B) cabe apenas a quem seja, ao mesmo tempo, possuidor direto e indireto.

(C) cabe apenas nos casos de esbulho ou de turbação de posse.

(D) cabe nos casos de esbulho, de turbação de posse e ante justo receio de moléstia à

posse.

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Gabarito:

1 B

2 B

3 C

4 A

5 D

6 A

7 C

8 B

9 A

10 C

11 B

12 E

13 C

14 E

15 C