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SUMÁRIO

A EFETIVAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA NO DIREITO DE FAMÍLIA COM BASE NA

RESOLUÇÃO 125 DO CNJ E SEUS RESULTADOS NO CEJUSC DE LINS/SP ................... 4

Aliffer Henrique dos Santos; Yuri Vicentino da Silva; Meire Cristina Queiroz Sato

A IMPORTÂNCIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO DIREITO BRASILEIRO...... 16

André Alves Andrade de Castro

A PASSIVIDADE DO POVO BRASILEIRO FRENTE ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS

DE SUFRÁGIO E PARTICIPAÇÃO DIRETA ................................................................. 26

Alessandro Paulo Junior; Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff

ADMISSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO NA ESTRUTURA DO SISTEMA POLÍTICO

BRASILEIRO POR MEIO DE PARTICIPAÇÃO POPULAR.............................................. 30

Júlia do Nascimento Simião; Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff

AS MEDIDAS PROTETIVAS E SOCIOEDUCATIVAS PREVISTAS NO ESTATUTO DA

CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA ...................................................................... 43

Cesar Augusto Rodrigues Mortari

COPARENTALIDADE RESPONSÁVEL: Um Novo Modelo Familiar? ............................. 51

Gabriel Francisco Cabrera de Sá; Meire Cristina Queiroz Sato

DA EXTENSÃO DO ACRÉSCIMO PREVISTO NO ARTIGO 45 DA LEI Nº 8.213/91 ÀS

DEMAIS APOSENTADORIAS .................................................................................... 56

Lohaine Milena Alexandre; Vinicius Roberto Prioli de Souza

FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA COMO GARANTIA DA TUTELA DO DIREITO DA

PERSONALIDADE DO FILHO E DA IGUALDADE JURÍDICA ......................................... 69

Melissa Mariano Ribeiro; Mariana Botasso Costa; Meire Cristina Queiroz

O CASAMENTO DO MENOR DE DEZESSEIS ANOS E A REFORMA PENAL DE 2005: Conflito de Leis e seus Reflexos no Direito de Família com Impacto na Convivência

Familiar .................................................................................................................. 82

Ana Carolini Bezerra Gomes; Tamiris da Silva Alves; Meire Cristina Queiroz

O CRIME DE PARTICIPAÇÂO EM SUICÍDIO E A INFLUÊNCIA DOS MEIOS DE

COMUNICAÇÃO DE MASSA ..................................................................................... 86

Julia Neves Miranda; Pedro Lima Marcheri

O DIREITO DO TRABALHO EM TEMPOS DE CRISE MEDIANTE O FENÔMENO DA FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS E DO PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO

RETROCESSO SOCIAL ............................................................................................ 97

Ana Beatriz da Silva Dantas; Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff

OS IMPACTOS DA DIGITALIZAÇÃO DA SOCIEDADE E O SURGIMENTO DO DIREITO

DIGITAL ................................................................................................................ 110

Marcela Cioccia Neves; Vinicius Roberto Prioli de Souza OS PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL E SUA APLICABILIDADE PARA A

EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DA SEGURIDADE ....................................................... 123

Lohaine Milena Alexandre; Vinicius Roberto Prioli de Souza

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PARADIGMAS CONCEITUAIS ACERCA DA DIGNIDADE HUMANA ............................. 133

Danieli Larissa de Souza Pereira; Vinicius Roberto Prioli de Souza RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ESTACIONAMENTOS DE VEÍCULOS E CONGÊNERES

............................................................................................................................ 145

Adriano Liel Previatto; Danilo César Siviero Ripoli

SOBRE O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA:

Conceito, Natureza Jurídica e sua Relação com a Teoria dos Direitos Fundamentais .. 156

Maiara Fernanda de Souza Vieira; Juliano Napoleão Barros

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A EFETIVAÇÃO DO ACESSO À JUSTIÇA NO DIREITO DE FAMÍLIA COM

BASE NA RESOLUÇÃO 125 DO CNJ E SEUS RESULTADOS NO CEJUSC

DE LINS/SP

Aliffer Henrique dos Santos - [email protected] Yuri Vicentino da Silva - [email protected]

Graduandos em Direito – UniSALESIANO Lins Prof.ª Ma. Meire Cristina Queiroz Sato – [email protected]

Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente projeto, utilizando-se do método dedutivo e da pesquisa qualitativa, quantitativa e descritiva, através do levantamento bibliográfico e da coleta e análise de dados, busca verificar se a conciliação e mediação são métodos eficazes de solução de conflitos nos litígios pertencentes à seara do Direito de Família. A resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça trouxe importantes inovações no cenário jurídico brasileiro por meio da Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado de Conflitos, apresentando os atuais meios alternativos de solução de conflitos. O presente trabalho buscará elucidar sobre a importância e efetividade desses métodos nas demandas familiares visando um processo mais célere e humanizado, nos quais as próprias partes buscam resolver o conflito entre elas, por meio do diálogo, da escuta e do respeito às divergências existentes, buscando uma solução reciprocamente satisfatória e benéfica e mais humanizada, facilitando a continuação da relação jurídica entre as partes. Palavras-chave: Direito de Família. Acesso à Justiça. Conciliação. Mediação Familiar. Métodos de solução de conflitos.

INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos, a família vem passando por significativas mudanças

que acompanham, naturalmente, a evolução na sociedade e, com isso, vem se

modificando e alterando seus valores e costumes. Diante dessa realidade,

pode-se caracterizar o Direito de Família como um direito dinâmico e sensível,

que necessita de uma proteção jurídica ampla e especial, justamente por lidar

com sentimento e vivências de pessoas dentro de uma convivência familiar.

Em gerações passadas a resolução de conflitos era permeada por

aspectos contenciosos e desgastantes, o que acentuava ainda mais os

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sentimentos de rivalidade entre partes dentro de um processo e, não poucas

vezes, ainda não se chegava a um consenso comum e satisfatório a ambas.

Neste cenário, no decorrer dos anos e com a preocupação em se ter

uma justiça mais ligada aos direitos humanos, fez-se necessário o uso dos

meios alternativos de solução de conflitos, como uma forma mais humana e

menos contenciosa na busca de uma resolução de determinado litígio.

Diante do contexto apresentado, a proposta do presente artigo é verificar

a possibilidade de aplicação dos meios alternativos de solução de conflitos nas

divergências familiares, bem como a efetividade positiva ou negativa desses

instrumentos no Direito de Família e a celeridade ao acesso à justiça pelos

pares nas relações familiares conflitantes. Para isso, far-se-á como instrumento

fundamental, a pesquisa realizada no Centro Judiciário de Solução de Conflitos

e Cidadania (CEJUSC) da Comarca de Lins, Estado de São Paulo, localizado

nas imediações do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium – Lins/SP.

O trabalho é centrado na abordagem de caminhos com soluções

pacíficas para os processos no ramo do Direito de Família, utilizando-se do

CEJUSC da Comarca de Lins, como instrumento principal e juntamente com a

pesquisa, elucidar através dos resultados obtidos, o quão é benéfico para essa

pacificação social entre os envolvidos no processo.

OBJETIVOS

O presente trabalho tem por escopo investigar a efetividade dos

Métodos Alternativos de Solução de Conflitos, mas precisamente a mediação

na solução das demandas ligadas ao Direito de Família, verificando se tais

instrumentos contribuem de maneira positiva ou negativa nessas relações e se

garantem maior acesso à justiça e celeridade na solução dos conflitos de

âmbito familiar.

Nesse interim, baseando-se no método dedutivo com o levantamento da

pesquisa bibliográfica, serão analisados os aspectos constitucionais do acesso

a justiça, os meios alternativos de resolução de conflitos, bem como os

institutos jurídicos inerentes ao tema, tendo como base os resultados obtidos

no Centro Judicial de Solução de Solução de Conflitos da comarca Lins/SP.

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METODOLOGIA

No presente artigo optou-se pelo método dedutivo e da pesquisa

qualitativa, quantitativa e descritiva, através do levantamento bibliográfico e da

coleta e análise de dados, fazendo-se o levantamento através da legislação

brasileira, jurisprudências, doutrinas, livros, artigos científicos e publicados na

internet, bem como coletando dados dos atendimentos no CEJUSC de Lins.

1 ASPECTOS CONSTITUCIONAIS DO ACESSO À JUSTIÇA

A expressão “acesso à justiça”, juridicamente, pode ser compreendida

como uma garantia ao direito de dar entrada num processo. Porém, é

necessário, aplicar aspectos sociais ao conceito, como uma garantia que além

de poder dar entrada num processo lhe proporcione efetividade e o verdadeiro

papel social que possui.

O Direito é um meio que sempre deve estar em compasso com as

mudanças e as novas interações dos povos, das sociedades e dos diversos

países do mundo, logo, os seus institutos, como o acesso à justiça, devem

acompanhar essas transformações.

O conceito de acesso à justiça, no mundo contemporâneo, deve ser compreendido como a garantia de entrada a um justo processo, capaz de proporcionar a resolução de controvérsias com rapidez, segurança e efetividade, mediante a implementação de mecanismos de pacificação social (...) (ROCHA; SALOMÂO, 2015, p.7).

No ordenamento jurídico do Brasil, o acesso à justiça, tem viés

constitucional e é tido como uma garantia fundamental, pois vem expresso no

artigo 5ª, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988 com a seguinte

redação: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça

a direito.”

Dessa forma, compreende-se que o acesso à justiça, também

denominado acesso judicial, decorre essencialmente do princípio da

inafastabilidade da jurisdição. Conforme Tartuce (2015, p. 77):

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O cerne do acesso à justiça não é possibilitar que todos possam ir à corte, mas sim que a justiça possa ser realizada no contexto em que se inserem as partes, com a salvaguarda da imparcialidade da decisão e da igualdade das partes.

O princípio supracitado trata-se da garantia da obtenção da justiça

substancial, emergindo o entendimento de que para garantir uma composição

mais efetiva das demandas sociais, ou seja, a busca em demonstrar que além

do já tradicional acesso aos tribunais é possível, e necessário, a criação ou

encorajamento de alternativas ao sistema judiciário formal permitindo uma

efetiva resolução de cada caso concreto.

Diante desta realidade é perceptível a preocupação do legislador em

assegurar a proteção ao direito de ação do indivíduo e de resolução das lides

de maneira célere e eficiente, demonstrando que o acesso à justiça é

intrínseco ao princípio da dignidade da pessoa humana, assegurando o

respeito à integridade física e psíquica do indivíduo, a consideração pelos

pressupostos mínimos para o exercício da vida e o respeito pelas condições

básicas de liberdade e convivência social.

Ainda, do princípio constitucional do acesso à justiça advém o da

assistência jurídica gratuita e integral aos necessitados, previsto no artigo 5º,

LXXIV da Constituição, abrangendo a consultoria e atividade jurídica

extrajudicial, que garante a proteção isonômica a todos.

Ante o exposto, se verifica que os princípios garantidores do acesso à

justiça, advindos com a Constituição Federal de 1988, trouxeram novas

possibilidades de proteção na busca do cidadão pela tutela do judiciário,

abrindo ainda um leque maior de possibilidades para resoluções das

demandas de forma ágil e eficiente, podendo citar, por exemplo, os métodos

alternativos de solução de conflitos os quais serão abordados como principal

inovação no decorrer do presente artigo.

1.1 Direito de Família e a Ampliação ao Acesso à Justiça

A família, interligada através dos vínculos afetivos existentes entre seus

integrantes, assim como todo núcleo social tem suas divergências de

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pensamento, ideais e vivências, ocasionando conflitos que, se não resolvidos

rapidamente, acabam ocasionando rupturas profundas no seio familiar. Ante

esta realidade se faz necessária a busca por meios mais céleres, efetivos e

menos desgastantes aos entes envolvidos nas lides familiares. Sendo assim, o

acesso à justiça que antes era entendido apenas como o acesso a tutela de

ação diretamente ao judiciário, necessita de ampliação em sua definição.

Assim, trazendo inovações significativas para resolução de demandas,

logo, entrando em cena, os métodos alternativos de solução de conflitos não só

como uma forma mais humana e menos contenciosa na busca de uma

resolução de determinado litígio por meio do consenso entre as partes, como

também cumprindo o papel da pacificação social, logo se entendendo que

Novas abordagens no tratamento das controvérsias sugerem que a tônica é encontrar os pontos comuns nos interesses de ambas as partes. No modelo consensual, busca-se o “ganha-ganha”, de modo que os envolvidos sejam aptos a se compor e alcançar uma situação mais favorável em relação aos seus interesses, por intermédio de conversações e debates. (TARTUCE, 2015, p. 85).

Com o advento da resolução nº 125 do Conselho Nacional de Justiça, os

métodos alternativos de solução de conflitos passaram a fazer parte das

formas de acesso à justiça. Através da conciliação e da mediação, o legislador

busca a facilitação do acesso à justiça visando principalmente uma mudança

de mentalidade dos envolvidos e a efetiva da resolução da lide.

Portanto, atualmente é possível compreender a importância que a

ampliação ao acesso à justiça traz às novas demandas sócio familiares,

buscando-se a solução de conflitos através de soluções pacíficas para os

processos na seara do Direito de Família.

2 OS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS E A

RESOLUÇÃO Nº 125 DO CNJ

Com o advento da resolução nº 125, foi reconhecida a instituição de uma

política judiciária nacional de tratamento de conflitos e interesses, visando

assegurar a todos direito de solucionar conflitos por meio adequados a sua

peculiaridade.

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Muito mais do que um viés processualista ou uma mera “porta” do Poder

Judiciário, os Meios Alternativos de Solução de Conflitos inauguram também

uma nova forma de gerenciamento de litígios, de maneira mais célere e

humanizada, logo, havendo uma “ressignificação do conflito”, proporcionando

uma “cultura de paz e da inclusão social”. (SAMPAIO, 2011, p. 77).

Assim, a introdução dos métodos alternativos de solução de conflitos na

sociedade brasileira, com a criação da cultura de paz e inclusão social, significa

produzir cidadão melhores enquanto ser humanos, no que tange a própria

capacidade humana em solucionar conflitos de forma não violenta. Diante

desse contexto, por meio da Resolução nº 125 do CNJ temos a inserção mais

ativa no ordenamento jurídico a conciliação e a mediação.

A conciliação, eventualmente podendo ser chamada de negociação,

compõe o rol dos Meios Alternativos de Solução de Conflitos sendo uma

técnica de autocomposição, ou seja, em um conflito, é dada autonomia às

partes, para que as mesmas cheguem, juntas, a um consenso final, assim,

“pode ser entendida como a comunicação diretamente estabelecida entre as

partes, com avanços e retrocessos, em busca do acordo”. (GABBAY et al,

2013). Vale ressaltar que, o instituto da conciliação geralmente pode ser

aplicado quando as partes envolvidas no conflito, não possuem vínculo jurídico

anterior ao fato que gerou a demanda e que, neste caso, o papel do conciliador

é fundamental, uma vez que a todo tempo ele irá estimular a resolução da

contenda com o referido método de autocomposição.

A mediação, prevista também na resolução nº 125 do CNJ e regulada

pela Lei 13.140, de 26 de junho de 2015 consiste no método consensual de

resolução de conflitos através da atuação de um terceiro imparcial que atua

para facilitar a comunicação entre os envolvidos e contribuir para que eles

possam encontrar formas produtivas para lidar e resolver a disputa que os

envolvem.

O Código de Processo Civil de 2015 traz a política de atuação dos

mediadores estabelecendo que a mediação deve ser aplicada

preferencialmente nos casos em que há vínculo anterior entre as partes,

auxiliando-as a compreender a dimensão dos interesses em conflito de modo

que elas possam, pelo restabelecimento da comunicação, restabelecer por si

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mesmas as relações que as envolvem e identificar soluções que gerem

benefícios mútuos, sendo este método de resolução o mais adequado para

resolução efetivas das demandas familiares, haja vista há o vinculo de afeto e

proximidade dos membros da instituição familiar e que não há melhor solução

de conflito do que aquela em que eles mesmos dialogam e alcançam o

resultado mais satisfatório baseado em suas próprias vivências.

3 OS CEJUSCs COMO INSTRUMENTOS DE AMPLIAÇÃO DE ACESSO

À JUSTIÇA: uma análise dos resultados obtidos nos CEJUSC de

Lins/SP

Visando uma abordagem prática acerca dos métodos de solução de

conflitos, tendo como premissa maior a conciliação e a mediação familiar,

buscou-se neste trabalho uma analise da efetividade dos mesmos por meio

dos dados disponibilizados pelo chefe de seção responsável pelo Centro

Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania da Comarca de Lins/SP.

3.1 A Instalação do CEJUSC da Comarca de Lins/SP

O presente trabalho teve como parâmetro a verificação da efetividade

dos métodos alternativos da solução de conflitos o Centro Judiciário de

Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSC) da comarca de Lins, estado de

São Paulo. Para acrescentar tais resultados neste trabalho foi realizada uma

entrevista pessoal no dia 20 de outubro de 2016 às 16:30 horas nas

dependências do órgão com o Chefe de Seção Judiciário Mário Nishimoto,

bem como no dia 19 de maio de 2017 às 16:00 horas com o objetivo de

atualizar os dados pesquisados.

Em suma, o questionário contém perguntas em relação a estrutura e

funcionamento desta unidade do Poder Judiciário. Assim, foi obtido que o

Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania da Comarca de Lins/SP,

funciona nas imediações do Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium

de Lins/SP - UniSALESIANO com tempo de funcionamento de 03 (três) anos e

10 (dez) meses.

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Conforme informações cedidas pelo chefe de seção, o Centro Judiciário

de Solução de Conflitos e Cidadania foi inaugurado em 19 de dezembro de

2012 graças a parceria entre o Tribunal de Justiça, o UniSALESIANO e os

Cartórios Extrajudiciais da Comarca. O Centro Universitário Salesiano Auxilium

de Lins cedeu o espaço físico com todos os equipamentos, inclusive

responsabilizando-se pelas despesas necessárias ao pleno funcionamento do

CEJUSC, bem como disponibiliza uma funcionária (recepcionista) e estagiários

do Curso de Direito. Os Cartórios Extrajudiciais se responsabilizaram pelas

despesas da rede de internet que viabiliza a utilização do Sistema SAJ –

Digital.

No Centro Judiciário são realizadas sessões de conciliação e mediação

Processuais e Pré-Processuais na Área Cível e Família. O procedimento do

CEJUSC é totalmente digital e o serviço é gratuito colaborando para o acesso

da população linense de maneira célere, sem despesas com documentos,

produção de provas e custas judiciais. As partes envolvidas resolvem suas

questões em conjunto, de modo que todos saem ganhando, de forma mais

rápida que o trâmite normal de um processo.

3.2 Resultados do CEJUSC de Lins/SP: levantamento dos dados

através da análise dos termos de ajuizamento e dos termos de

audiência.

Diante da temática do trabalho, concentrou-se analisar as informações

voltadas ao atendimento das demandas correlatas a área do direito de família.

Conforme informações levantadas, o número de atendimentos processuais e

pré-processuais na seara do direito de família desde a instalação do CEJUSC

foi de 1.202 (mil duzentos e dois) atendimentos, sendo que, de acordo com a

natureza do objeto, os princípios litígios relacionados ao direito de família na

seara da mediação e conciliação no CEJUSC de Lins/SP se dividem conforme

o gráfico abaixo:

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Figura 1: Atendimentos Realizados no Cejusc de Lins/SP

Fonte: CEJUSC de Lins/SP

Com base nos números indicados e no cálculo do número das

demandas e acordos, verificou-se que com relação a quantidade de

atendimentos que não resultaram mediação, nos atendimentos pré-processuais

é de 1,57% e processual 25,71%. O grau de satisfação dos envolvidos nos

atendimentos mediação nos atendimentos pré-processuais é de 98,43%,

enquanto na seara processual é de 74,29%, conforme dados levantados no

questionário aplicado durante este trabalho.

Por fim, foi indagado ao funcionário entrevistado qual a quantidade de

acordo cumpridos em mediação familiar o qual foi respondido que não é

possível a quantificação, pois não são notificados quanto ao cumprimento ou

não dos acordos. Relata também que no pré-processual, após a homologação

do acordo realizado, o expediente pré-processual é remetido automaticamente

ao arquivo pelo Sistema Informatizado.

No processual, uma vez realizada a sessão conciliatória, os autos são

devolvidos ao Juízo Competente, onde o processo seguirá o seu curso. Por

derradeiro, o funcionário relata no questionário que no CEJUSC não há

previsão de execução dos acordos não cumpridos, cabendo ao exequente

interpor ação judicial de Execução de Título Judicial, pelos meios próprios.

71%

11%

4%

6%

4% 4% Alimentos (860)

Divórcio (131)

Regulamentação de Visitas (47)

Guarda (72)

Reconhec/Dissolução UniãoEstável (46)

Outros (46)

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RESULTADOS

Os métodos alternativos de solução de conflitos têm estado cada vez

mais presentes dentro da seara judicial graças a mudanças advindas com o

Código de Processo Civil de 2015, tornando-se norma fundamental do rito

processual conforme expressa o art. 3º, §3º dispondo que “a conciliação, a

mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser

estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do

Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”

Assim sendo, é visível que o legislador abarcou no texto legal da referida

lei as inovações advindas da resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça e

da lei de Mediação supracitada, bem como das atuais necessidades de

transformação dos meios judiciais de solução de conflitos deixando de lado a

resolução dos conflitos de forma integralmente litigiosa e trazendo a frente o

apoio a cultura de pacificação social, buscando a efetivação da função

pacificadora dos tribunais, no sentido de trazer uma efetiva solução aos

conflitos existentes.

No município de Lins com base nos dados levantados, as demandas

processuais e pré-processuais encaminhadas à seara da mediação ligadas ao

direito de família desde o início dos atendimentos do CEJUSC em 2013 até o

mês de Abril de 2017 foi, conforme já exposto, 1202 demandas. Levando em

consideração o número de conflitos que as partes foram direcionadas a

resolver por meios conciliatórios e ainda que a porcentagem de acordos

realizados foi de 74,29% no âmbito processual e 98,43% no pré-processual,

percebe-se que um grande número de demandas que poderiam causar mais

demora na vagarosa fila de processos judiciais findaram-se de maneira célere,

colaborando para que outras demandas de maior complexidade chegassem

mais rapidamente a uma sentença do juiz.

Além disso, o número de demandas também expressa que parte da

população do munícipio que foi encaminhada ao CEJUSC já tomou

conhecimento dos métodos alternativos e compreendendo seus benefícios,

provavelmente em próximas situações que sentir a necessidade da busca pelo

judiciário, primeiramente buscará o auxílio dos Centros Judiciário, colaborando

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para o ajuizamento de cada vez menos demandas diretamente no fórum da

cidade e a compreensão de que só será necessária a busca pelo aval do juiz

em último caso.

Tais benefícios trazidos com o funcionamento do CEJUSC na cidade de

Lins não se refletem somente para o judiciário, mas também, e principalmente,

para os cidadãos da comarca de Lins, colaborando com processo de inclusão

social e com o efetivo acesso a justiça:

A inclusão social gera uma conscientização maior dos direitos e dos deveres dos envolvidos no conflito, possibilitando, na maioria das vezes, uma reflexão profunda no sentido da descoberta de que todos têm ferramentas para resolver seus próprios problemas, por meio do diálogo e da construção da paz social. (SAMPAIO, 2011, p. 98)

É essa inclusão social que o Centro Judiciário de Solução de Conflitos

de Lins tem buscado e desde seu atendimento tem colaborado para que isso

efetivamente ocorra. A utilização cada vez maior dos métodos alternativos de

solução de conflitos tem colaborado para a propagação da cultura de paz e

para o entendimento da importância do diálogo pessoal e receptivo dentro do

município, no qual as próprias partes envolvidas encontram uma solução

efetiva para o conflito facilitando assim o entendimento que o procedimento foi

justo e que ambas tem maturidade para dirimir essas questões por si sós.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto e da pesquisa realizada no CEJUSC da

comarca de Lins/SP compreendeu-se a importância do centro para efetivação

do acesso a justiça e para a acessibilidade do cidadão a uma forma célere,

vantajosa e útil para os conflitos existentes, principalmente nas demandas de

âmbito familiar. Graças a pesquisa prática e a valiosa colaboração do Chefe de

Seção Mario Nishimoto foi possível atestar e verificar no cotidiano do CEJUSC

os benefícios do mesmo para toda a população.

Porém, ainda que conforme demonstrado no trabalho o número de

atendimentos no CEJUSC tenha sido gradativo ao longo dos anos, ou seja, só

tem aumento tanto na seara processual como pré-processual, o contingente de

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profissionais (mediadores/conciliadores) ainda é baixo tendo em vista que no

estado de São Paulo esse ofício ainda é voluntário, bem como com a proibição

no Código de Processo Civil de advogados que trabalhem na subsecção que

estão inscritos de atuarem como mediadores e conciliadores, reduzindo o

número de profissionais do centro judiciário da cidade.

O presente trabalho concluído, que teve como premissa a efetividade

dos métodos de solução de conflitos com base no CEJUSC de Lins/SP, sendo

possível quantificar e demonstrar as atividades realizadas no CEJUSC bem

como dar maior visibilidade ao mesmo, pode servir como base para analises

semelhantes em outras comarcas do estado de São Paulo, afim de verificar o

atendimento dos centros e colaborar para a troca de experiências e melhorias

entre os Centros Judiciários, alcançando assim cada vez mais cidadãos,

colaborando ativamente para a cultura de pacificação e solução de conflitos.

REFERÊNCIAS

AZEVEDO, André Gomma de. Manual de Mediação Judicial. Brasília: FUB, CEAD, 2013. FALECK, Diego; GABBAY, Dabiela Monteiro; TARTUCE, Fernanda. Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Rio de Janeiro: FGV, 2013. MEDINA, Eduardo Borges de Mattos. Meios alternativos de solução de conflitos. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabri Editor, 2014. REIS, Adacir. A Mediação e impactos positivos para o Judiciário. In: ROCHA, Caio Cesar Vieira Rocha. SALOMÃO, Luis Felipe (Coordenação) Arbitragem e Mediação: A reforma da Legislação Brasileira. São Paulo: Atlas, p. 219-236. SAMPAIO, Alice Maria Borghi Marcondes. Conflito e sua ressignificação por meio da cultura da pacificação e da inclusão social. In: MANDELBAUM, Helena Gurfinkel. GROSMAN, Claudia Frankel (Organizadoras). Mediação no Judiciário: Teoria na prática e prática na teoria. São Paulo: Primavera Editorial, p. 77-99. TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Civis. 2. ed. São Paulo: Método, 2015. TARTUCE, Flávio. Direito Civil - direito de família. V. 5., 9. ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: METODO, 2014.

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A IMPORTÂNCIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO DIREITO

BRASILEIRO

André Alves Andrade de Castro - [email protected] Graduando em Direito – UniSALESIANO Lins

RESUMO

A presente pesquisa versa sobre o estudo do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, fundamento da República Federativa do Brasil, positivado no artigo 1º inciso III da Constituição Federal, o qual é de suma importância, pois visa o homem como um fim em si mesmo e não como um instrumento do Estado. Nos dias atuais mesmo com toda a conscientização que é feita pela mídia, ainda são constantes as situações em que se verifica lesões a este princípio e entender os seus conceitos, bem como seus fundamentos é muito relevante para a sociedade.

Palavras-chave: Dignidade Humana. Constituição.

INTRODUÇÃO

O princípio da dignidade da pessoa humana foi elencado na

Constituição Federal de 1988 entre os fundamentos essenciais da república.

Colocar este princípio na Carta Magna consiste em grande importância para

todos, isto ocorre, pois, este princípio atribui dignidade ao homem pelo mero

fato de nascer humano, ou seja, como um fim em si mesmo.

Dignidade da pessoa humana é a qualidade intrínseca e distintiva de

cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por

parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de

direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e

qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as

condições existenciais mínimas para uma vida saudável. (SARLET, 2001, p.

60).

Nesta pesquisa foram pesquisadas a origem, conceito, e também os

problemas atuais relativos à aplicação deste princípio.

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OBJETIVOS

O objetivo da pesquisa é dissertar sobre a Dignidade da Pessoa

Humana, mostrando sua origem histórica, importância, conceito, e problemas

atuais da aplicação deste princípio no direito Brasileiro.

METODOLOGIA

A metodologia utilizada na presente pesquisa consiste na análise do

texto constitucional trazido pela magna carta de 1988, bem como, pesquisas

bibliográficas e artigos científicos.

1 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA: ORIGEM, CONCEITO,

PROBLEMAS NA APLICAÇÃO

A Constituição Federal de 1988 elencou a dignidade da pessoa humana

no artigo 1º inciso III, colocando-a entre os fundamentos essenciais da

República Federativa do Brasil.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. (BRASIL, 1988)

De acordo com Sarlet (2001, p. 60):

Dignidade da pessoa humana é a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

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Deste modo, dizer que a dignidade da pessoa humana é uma qualidade

intrínseca significa dizer que é nasce do mero fato de nascer humano não

necessitando de mais nada para ser detentor deste direito.

Certo é que os princípios constitucionais não nasceram prontos, eles

vão evoluindo juntamente com a sociedade.

Desde a Idade Média já se tem a ideia de que o homem foi uma criação

diferenciada por Deus pelo fato de ser racional, ideia reforçada pelo livro de

Genesis o qual faz menção que o homem foi criado como imagem e

semelhança de Deus, tais pensamentos já evidenciavam o pensamento de

superioridade do homem em relação aos outros seres e de igualdade entre os

próprios homens. Até a modernidade era exclusivamente na religião em que se

encontravam explicações a dignidade humana. O reconhecimento da dignidade

humana como princípio jurídico é muito recente surgindo no século XX,

especialmente após a 2ª Guerra mundial. (SARMENTO, 2016)

A primeira menção à dignidade da pessoa humana em um texto legal se

deu na França em 1848 no preâmbulo do decreto que aboliu a escravidão.

Outro texto que deu início a dignidade foi a Constituição Brasileira de 1934, em

seu artigo 115 que dizia que “a ordem econômica deve ser organizada

conforme os princípios da justiça e as necessidades da vida nacional, de modo

que possibilite a todos uma existência digna”. Porém, a positivação de tal

princípio ganhou força após a segunda guerra como resposta aos estragos

causados pelo nazismo, pelo horror causado pela grande guerra, a maioria dos

países se preocupou em positivar o princípio da dignidade. (SARMENTO,

2016).

No Brasil a Dignidade da Pessoa Humana está atualmente positivada

pela Constituição Federal de 1988 e se classifica como fundamento da

república no artigo 1°, inciso III. Vale frisar, também que o Brasil incorporou

todos os tratados internacionais que se referem à dignidade da pessoa humana

ficando evidente a importância atribuída ao princípio pela ordem jurídica

brasileira.

Nos últimos anos a invocação da dignidade da pessoa humana perante

a justiça tornou-se muito frequente, o que preocupa doutrinadores quanto à sua

banalização, pois este princípio é muito amplo dando margem a várias

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interpretações diferentes.

A dignidade no Brasil teve sua aplicação vulgarizada sendo desviada a

sua finalidade de igualdade, com decisões polemicas e conflitantes, um

exemplo disso é uma decisão do Tribunal de justiça do Rio de Janeiro que

alegou a dignidade do juiz para obrigar os empregados do condomínio em que

vive a chamar ele apenas de doutor ou Senhor, por outro lado o STF negou

danos morais aos presos encarcerados em situações degradantes e precárias.

(SARMENTO, 2016).

Neste sentido Daniel Sarmento se posiciona:

Enfim, o principal déficit de efetividade da dignidade da pessoa humana no Brasil deriva não de uma razão puramente jurídica ou mesmo econômica. A sua origem está em uma cultura muito enraizada, que não concebe a todas as pessoas como igualmente dignas. Nesse cenário, a dignidade humana periga, paradoxalmente, converter-se no seu inverso: um veículo adicional para reprodução e reforço do status quo de hierarquias e assimetrias, que consagra privilégios para uns à custa do tratamento indigno dispensado a outros. (SARMENTO, 2016, p. 66)

A dignidade da pessoa humana é um princípio que possui várias

funções, dentre elas as mais relevantes são: como fator de legitimação do

Estado e do Direito, norte para hermenêutica jurídica, diretriz para ponderação

entre interesses colidentes, fator de limitação de direitos fundamentais,

parâmetro para o controle de validade de atos estatais e particulares, critério

para a identificação de direitos fundamentais e fonte de direitos não

enumerados. (SARMENTO, 2016)

Apesar da importância do princípio da dignidade da pessoa humana

para todos, é importante frisar que nenhum princípio fundamental é absoluto. A

alegação de que o princípio da dignidade é absoluto conduz a resultados que

poucos aceitariam.

Basta observar o sistema penitenciário brasileiro, pois nos dias atuais a

prisão é absolutamente contrária à dignidade daquele que está preso, sendo o

mesmo colocado em situações desumanas e degradantes. Deste modo, se o

princípio da dignidade da pessoa humana fosse absoluto dever-se-ia soltar

todos os presos e impedir novas prisões até que fosse possível colocá-los em

locais mais dignos, todavia isso não seguro, encontrando o princípio da

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dignidade limites, por exemplo, na busca por efetivação do princípio da

segurança pública. É claro que a recíproca é verdadeira.

O conteúdo essencial do princípio da dignidade da pessoa humana na

ordem jurídica brasileira compreende: “o valor intrínseco da pessoa, a

autonomia, o mínimo existencial e o reconhecimento”. Tais componentes não

se separam um dos outros, não é possível ter uma clara distinção entre eles.

(SARMENTO, 2016)

O tema valor intrínseco apresenta-se em várias decisões do STF que

tratam de uma das mais graves violações aos direitos humanos presentes no

Brasil: a precariedade do sistema prisional brasileiro.

Nesse sentido, Daniel Sarmento:

As prisões brasileiras são verdadeiros infernos Dantescos, com celas superlotadas, imundas e insalubres, em que frequentes os episódios mais bárbaros de tortura e violência sexual contra presos, praticados por outros detentos ou agentes do Estado. O déficit prisional existente no momento de finalização desta obra ultrapassa as 230 mil vagas, e não para de crescer. Os presos não têm acesso à justiça, à alimentação adequada, à saúde, à educação e ao trabalho, e a ressocialização não passa de quimera: os detentos normalmente saem do cárcere muito mais perigosos do que entraram. (SARMENTO, 2016, p. 116).

Tal afirmação de Sarmento demonstra o quanto o sistema carcerário

Brasileiro é precário e afrontam-te ao princípio da dignidade. Não possuindo o

preso, independente da gravidade de seus crimes, condições mínimas de

dignidade para viver.

Uma questão que causa muita polêmica é a relação entre a dignidade e

a autonomia. Enquanto uns acreditam em possibilidade de o ser humano tomar

suas próprias decisões e segui-las sem que isso atinja o direito de outras

pessoas já torna o homem apto a ser digno, outros acreditam que a autonomia

pode ser limitada quando referir-se a certas situações consideradas indignas

pela sociedade. No Brasil há decisões nos tribunais que se inclinam aos dois

sentidos tornando incerta essa questão. (SARMENTO, 2016)

Já o mínimo existencial corresponde aquilo que se considera como as

condições básicas para que uma pessoa possa viver com dignidade, é um

direito que se aplica a todas as pessoas, independente de outros fatores,

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inclusive os presos são protegidos pelo mínimo existencial independentemente

da gravidade da infração que tenham cometidos. (SARMENTO, 2016)

A Constituição Brasileira de 1988 atribuiu ao mínimo existencial Status

de direito Fundamental, tal atribuição tem forte relação com o princípio da

dignidade como fundamento do Estado e da ordem jurídica brasileira.

O mínimo existencial desempenha dois papéis muito importantes, e nenhum deles fragiliza a dimensão social da Constituição. O primeiro papel é o de fundamentar pretensões positivas ou negativas que visem assegurar as condições materiais essenciais para a vida digna e que não estejam abrigadas por outros direitos fundamentais expressamente positivados. (SARMENTO, 2016, p. 211)

Frisa-se que apesar do mínimo existencial estar previsto no rol dos

direitos fundamentais, grande parcela da população brasileira ainda não tem

acesso a condições de vida digna.

Como o governo não pode atender a todas as demandas no país devido

a limitação de recursos foi então forçado a atender aquelas que são

consideradas prioritárias, com isso surgiu o que se chama de reserva do

possível. Sendo a ideia de reserva de possível invocada com frequência pela

jurisprudência brasileira desde que o Ministro Celso de Mello proferiu a decisão

da ADPF 45 no qual citou o instituto da reserva do Possível em sua decisão.

(SARMENTO, 2016)

Nos debates contemporâneos quando se fala de “reconhecimento” nas

ciências sociais não figura como a mera identificação do outro. Reconhecer

alguém soa como lhe respeitar. Já não reconhecer significa que tal pessoa

cometeu uma conduta desonrosa que o torna indigno de participar de

interações sociais, sendo assim é possível identificar grande relação do

reconhecimento com a dignidade de determinado indivíduo. Violam o

reconhecimento as práticas estatais ou privadas, que desrespeitam as

identidades de suas vítimas, impondo-lhes estigmas ou humilhações. Contudo

não há na Constituição brasileira previsão de um direito ao reconhecimento

(SARMENTO, 2016)

Barroso (2012, p. 73) define a sua concepção minimalista da dignidade

da pessoa humana como valor intrínseco de todos os seres humanos, a

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autonomia de cada indivíduo e em valor comunitário:

Realmente, não é fácil elaborar um conceito transnacional de dignidade humana, capaz de levar em conta da maneira adequada toda a variedade de circunstâncias religiosas, históricas e políticas que estão presentes nos diferentes países. Apesar isso, na medida em que a dignidade tem ganhado importância, tanto no âmbito interno quanto no discurso transnacional, se faz necessário estabelecer um conteúdo mínimo para o conceito, a fim de unificar o seu uso e lhe conferir alguma objetividade. Para levar a bom termo esse propósito, deve-se aceitar uma noção de dignidade humana aberta, plástica e plural. Grosso modo, esta é a minha concepção minimalista: a dignidade humana identifica 1. O valor intrínseco de todos os seres humanos; assim como 2. A autonomia de cada indivíduo; e 3. Limitada por algumas restrições legítimas impostas a ela em nome de

valores sociais ou interesses estatais (valor comunitário).

O valor intrínseco diz respeito a um conjunto de características que são

inerentes aos seres humanos, que confere a ele status especial no mundo e o

difere de outros seres humanos. (BARROSO, 2012, p. 77).

A autonomia é o que rege o livre arbítrio entre os seres humanos, de

modo que possa ter liberdade de fazer suas próprias escolhas e viver de

maneira que ache melhor para si. (BARROSO, 2012, p 82).

A dignidade como valor comunitário tem diz respeito a função do Estado

e da comunidade em estabelecer metas coletivas e restringir direitos e

liberdades individuais em busca de uma concepção de vida boa. (BARROSO,

2012, p. 89).

É extremamente preocupante a forma como a dignidade da pessoa

humana vem sendo invocada nos dias atuais. A sua abstração provoca muitas

vezes vagueza de sentido, sendo a dignidade invocada para muitas coisas

distintas, podendo ser invocada muitas vezes em lides por ambos os lados, um

exemplo disso é em relação ao aborto. Alguns defendem a dignidade da mãe

poder decidir seu futuro, principalmente em casos de estupro, e por outro lado

outros invocam a dignidade da criança de nascer com vida independentemente

da aprovação da mãe como um direito nato.

Diante desse cenário de tamanha amplitude da dignidade da pessoa

humana é necessário delimitar seu campo de atuação, pois deixá-lo vago é

extremamente perigoso para a sociedade, tendo em vista o decorrente

incremento da discricionariedade judicial e a insegurança jurídica.

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Sendo assim, é necessária a adoção de algumas medidas para controlar

o uso descontrolado de argumentos relativos ao princípio da dignidade da

pessoa humana.

Daniel Sarmento (2016) elenca quatro medidas para a solução do

problema.

A primeira é considerar a dignidade como um norte hermenêutico, mas

que não ultrapassa outros direitos fundamentais. Tal ideia consiste que a

dignidade é instituto de sempre deve ser buscado, mas que não pode passar

por cima de outros princípios fundamentais.

A segunda é exigir daquele que está julgando que fundamente com

maior especificidade toda vez em que envolver o princípio da dignidade da

pessoa humana. Tal medida visa dar mais segurança a aplicação desse

princípio evitando que se aplique de maneira vulgar.

Segundo Daniel Sarmento (2016, p. 309):

A fundamentação deve, no mínimo, explicitar porque a situação concreta se enquadra no princípio da dignidade da pessoa humana e qual a derivação jurídica que resulta desse enquadramento. O interprete deve exteriorizar esses elementos, permitindo o controle intersubjetivo sobre tais passos argumentativos. No afã de fazê-lo, o interprete bem-intencionado poderá também se beneficiar da oportunidade de exercer um controle racional sobre a sua “intuição de decisão”, que pode ter se baseado em impulso emotivo que não sobreviva a um esforço genuíno de racionalização.

A terceira é exigir que os fundamentos se conformem com o estado laico

e do uso de razões públicas para o exercício do poder político.

A terceira medida guarda relação com a primeira medida, ou seja, deve

sempre respeitar a laicidade estatal e razões que seja a de interesse universal.

Um exemplo disso seria a proibição por parte do estado de pílulas

anticoncepcionais com o fundamento católico de dignidade, toda decisão deve

respeitar a laicidade se orientar por razões públicas. A imposição jurídica que

diz respeito às razões públicas pelo poder judiciário exige o tratamento de

todas as pessoas como sujeitos morais, merecedores do mesmo respeito e

consideração.

A quarta medida seria a defesa de um minimalismo judicial ao aplicar o

princípio da dignidade, de modo que o interprete da lei não busque fundamento

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questões que se enquadram como questões filosóficas difíceis e divisavas,

mas somente quando for realmente necessário para resolver a lide.

Que o princípio da dignidade deve ser devidamente fundamentado é

fato, mas isso não significa que cada vez que se invocar esse princípio deva-se

mergulhar em debates complexos e intermináveis, ou seja, o minimalismo

jurídico propõe que o poder judiciário não vá além do necessário para a

resolução da lide, somente até o que lhe seja necessário.

O princípio da Dignidade da Pessoa humana positivada no Brasil pela

Constituição Federal de 1988 é de grande importância para o povo Brasileiro,

pois visa garantir o homem como fim em sim mesmo, e não como instrumento

do Estado, pelo simples fato de ter nascido humano. Também é importante

este princípio para nos protegermos de qualquer ameaça a nossa dignidade.

RESULTADOS

Concluiu-se que a Dignidade da Pessoa Humana é um princípio muito

importante, pois reconhece o valor intrínseco do homem, ou seja, como um fim

em si mesmo, possuindo direitos pelo mero fato de nascer humano.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que foi exposto, resta concluir que pelo fato de a Dignidade

estar prevista na Constituição Federal como um fundamento da Republica, e

ter como fundamento de considerar o homem como um fim em si mesmo, este

é um importante instrumento para a preservação dos direitos humanos, sendo

essencial para a proteção humana contra situações degradantes e

humilhantes.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: A Construção de um Conceito Jurídico à Luz da Jurisprudência Mundial. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2014.

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BRASIL. Constituição (1988). Lex. Brasil. SARLET, Ingo Wolfgand. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. SARMENTO, Daniel. Dignidade da Pessoa Humana: Conteúdo, trajetória e metodologia. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2016.

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A PASSIVIDADE DO POVO BRASILEIRO FRENTE ÀS GARANTIAS

CONSTITUCIONAIS DE SUFRÁGIO E PARTICIPAÇÃO DIRETA

Alessandro Paulo Junior - [email protected]

Graduando em Direito – UniSALESIANO Lins Prof. Me. Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff –[email protected]

Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

A Constituição Federal em seu art. 14 estabelece que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, mediante os institutos do plebiscito, referendo e da iniciativa popular de lei. Entretanto, a historicidade do assunto demonstra uma dissociação entre o Direito e a realidade social, já que apenas 4 projetos de iniciativa popular se tornaram Leis. Esse baixo índice pode ser explicado pela passividade do povo brasileiro em relação a assuntos de ordem política e social. Dessa maneira, esse projeto pretende contribuir para uma visão crítica das relações sociais de participação popular e na tomada das decisões estatais, contribuindo, assim para a formação das reais possibilidades do exercício da cidadania.

Palavras-chave: Política. Povo. Sufrágio. Alienação. Corrupção.

INTRODUÇÃO

A cidadania pode ser entendida enquanto a titularidade de direitos e

deveres na ordem civil. Bem assim, está relacionada com a possibilidade de vir

a ter novos direitos. No entanto, não é somente por meio das eleições e do

“voto” que isso pode se realizar, mas pela participação efetiva do povo na

tomada de decisões estatais. No quadro social contemporâneo, tem se

evidenciado uma diminuição no interesse em política por parte do povo

brasileiro, de tal forma que há uma baixa participação do cidadão no processo

de tomada das decisões mais significativas ao longo do mandato dos

representantes eleitos. Dessa forma, essa passividade decorrente de um

complexo sistema de alienação máscara e permite as relações sociais de

dominação, ou seja, de obediência disciplinada, que impede o desenvolvimento

social e uma melhor qualidade de vida.

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OBJETIVOS

O presente trabalho científico tem por finalidade estabelecer reflexões e

debates sobre este tema, visando compreender e esclarecer a partir do ponto

de vista politico, social e jurídico o exercício de uma democracia mais

consciente e participativa.

A justificativa se relaciona com a atual crise de representatividade, seja

pelas más escolhas, mas também pelo alto índice de abstenções nas ultimas

eleições.

METODOLOGIA

A metodologia de abordagem é a interdisciplinar, percorrendo os

campos da Política, da Sociologia, e do Direito Constitucional, notadamente.

Assim, utilizar-se-á o método dedutivo com pesquisa bibliográfica.

1 DESENVOLVIMENTO

Para Rousseau o Estado é criado e sujeito à vontade do povo, que é a

fonte do poder político (2014). Nasce, então, um corpo político que é

governado e governa a si mesmo e sua liberdade está baseada na igualdade

na criação e cumprimento das leis.

Entretanto, para que o poder político seja concretizado, surge à

necessidade de Representação. Assim caberá ao Estado realizar a vontade

soberana do povo por meio dessa representatividade. No entanto, há um risco:

o governo representativo pode ocupar o lugar do povo que é soberano,

deixando o Estado de ser um funcionário e passando a ser o poder sem

controle ou em desacordo com a vontade da maioria. Dessa maneira, o povo

passa a ter direito de resistência, pois não tem a quem recorrer senão a ele

mesmo. Todavia, para que isso possa ocorrer se faz necessária a participação

ativa, fato este que não é observado no Brasil.

Sociologicamente a Nação é definida como o grupo humano no qual os

indivíduos se sentem mutuamente unidos, por laços materiais e espirituais.

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Nesse contexto, cabe a aplicação do termo latino idem sentire que significa “ser

dotado de valores e aspirações comuns”. (BONAVIDES, 1994).

Em um regime democrático, a Nação é um ato de vontade coletiva, com

unidade de território, costumes e língua, estruturados numa comunhão de vida

e consciência social, embora esses elementos não sejam suficientes e únicos

atualmente. Saindo do plano teórico e indo para a realidade social brasileira,

será mesmo que o povo brasileiro se mantém unido por laços materiais e

espirituais que possam permitir participar efetivamente na tomada de decisões?

Será que no Brasil os indivíduos são dotados de valores comuns?

Segundo o Geógrafo Milton Santos (2005): “A força da alienação vem

dessa fragilidade dos indivíduos que apenas conseguem identificar o que os

separa e não o que os une”. Desse modo, como um país pode ser próspero, se

o povo que é titular do poder se mantém fragmentado em grupos sociais?

Resposta: Não se tem prosperidade, mas sim alienação, violência e

dominação.

RESULTADOS PRELIMINARES

Como resultado preliminar, entende-se que os problemas políticos do

quadro social brasileiro contemporâneo além de se relacionarem com a

corrupção político-partidária, também podem ser associados com a alienação e

a falta de participação consciente do povo frente a assuntos sociais e às

garantias constitucionais de participação na tomada de decisão.

REFERÊNCIAS

ROUSSEAU, Jean Jacques. Do Contrato Social. São Paulo: Hunter Books, 2014. BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 10. ed. São Paulo: Helvética Editorial, 1994. CARDOSO, Fernando Henrique; MARTINS, Carlos Estevam. POLÍTICA & SOCIEDADE v. 1. 2. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1983. PLATÃO. O castigo dos bons que não fazem política e serem governados

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pelos maus. São Paulo 2007. Disponível em: <https://www.pensador.com/frase/NTkwNTE4>. Acesso em 1 jun. 2017. SANTOS, Milton. A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos que apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une. São Paulo, 2005. Disponível em: <https://www.pensador.com/autor/milton_santos>. Acesso em: 28 maio. 2017.

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ADMISSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO NA ESTRUTURA DO SISTEMA

POLÍTICO BRASILEIRO POR MEIO DE PARTICIPAÇÃO POPULAR

Júlia do Nascimento Simião – [email protected] Graduanda em Direito –UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff - [email protected] Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

A Constituição Federal do Brasil confere ao povo a soberania, que tem em seus representantes eleitos o meio para o exercício desse poder. Aos eleitores é dada a oportunidade de tomar parte nos assuntos do governo por meio do plebiscito, referendo e iniciativa popular, contudo, não lhe é reservado o direito ao arrependimento consubstanciando-se este no instituto da revogação de mandato eletivo, mais precisamente no recall norte americano e abberufungsrecht suíço. Tais institutos, apresentam-se como ferramentas políticas que permitem aos eleitores substituir ou destituir um membro ou toda a assembleia legislativa por meio de consulta de opinião pública do eleitorado. Nesse sentido, tramitam no Senado Federal Propostas de Emendas à Constituição, que visam aprovação para alterar o artigo 14 da Constituição Federal visando a inclusão do instituto da revogação de mandato eletivo, tendo em vista as crises agudas que se instalam no contexto democrático e representativo da política nacional e o descrédito que marca o quadro representativo brasileiro.

Palavras-chave: Democracia. Participação popular. Revogação de Mandato eletivo.

INTRODUÇÃO

Promulgada em 1988 a Constituição Federal do Brasil é considerada

como Constituição “cidadã” por conter textos especialmente voltados para as

garantias individuais e aos direitos políticos que garantem aos cidadãos o

exercício da cidadania. Após 28 anos de sua promulgação é ainda alvo de

críticas pois carece de efetivação em diversos pontos e, embora assegure

direitos e busque estabelecer uma democracia plena alguns aspectos

relacionados aos direitos políticos são ainda passíveis de serem analisados.

O exercício da soberania popular é exaltado e materializa-se em seu

artigo 14 que confere aos eleitores ferramentas para a escolha de seus

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representantes por meio do voto direto e sem muita frequência lhe são dados o

poder e a liberdade de interferir nos assuntos do governo por meio do

plebiscito, referendo, iniciativa popular, porém, não lhe é reservado o direito ao

arrependimento consubstanciado no instituto da revogação de mandato.

A revogação de mandato eletivo ou “recall político" é objeto de PECs –

Propostas de Emendas à Constituição que tramitam no Congresso Nacional, e

visam alterar o art. 14 para a aprovação de um instrumento que possibilite ao

eleitor revogar o seu voto na medida em que seu representante não mais haja

no interesse da coletividade e passe a agir em interesse próprio não

correspondendo mais as expectativas de seus eleitores.

Assim, busca o presente estudo discutir-se-á a temática que envolve o

direito de revogação de voto eletivo, mais precisamente no tange ao recall

norte americano e o abberufungsrecht suíço, desenvolvendo análise dos

conceitos e características destes institutos e, analisar a sistemática da

democracia participativa no Brasil e as Propostas de Emendas Constitucionais

de n.º 075/2005 e 08, 21 e 160 do ano de 2015 apresentadas ao Senado

Federal nesse sentido.

Pretende-se concluir com um diagnóstico frente a possibilidade ou

impossibilidade de aplicação destes institutos no Brasil, tentando demonstrar

quais seriam as chances do povo brasileiro por meio do efetivo exercício da

soberania popular e de participação no processo político, formar um quadro

representativo que atenda aos anseios da população.

OBJETIVOS

O presente estudo tem por objetivo analisar e tecer considerações

quanto aos aspectos mais relevantes dos institutos do recall e o

abberufungsrecht e sua aplicação como instrumentos para revogação de

mandato eletivo em alguns países;

Comparar os modelos norte americano e suíço aos aplicados no Brasil;

Investigar o conhecimento técnico e prático da Sociedade quanto à

aplicabilidade destes institutos;

Contribuir para uma maior integração da população a questões políticas

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de maior relevância para a o efetivo exercício da soberania popular.

METODOLOGIA

A pesquisa será realizada por meio da bibliografia existente sobre o

assunto, bem como a possibilidade de documentos pertinentes. Nesse sentido,

também será possível se valer do método comparativo baseado em doutrinas

que possibilitem identificar os meios de participação e o exercício da soberania

popular. Indispensável o uso da legislação vigente como: Leis complementares

e Ordinárias, Decretos, Decisões Jurídicas e publicações.

1 ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

O Brasil constitui-se em estado democrático de direito, o que significa

dizer que é imposto a todos os cidadãos o respeito às leis, sob as quais

vinculam-se Estado e Sociedade, contudo, é regido por uma Carta Magna que

afirma ser o povo soberano e terem seus representantes eleitos o meio para o

exercício desse poder estabelecendo assim, em seu artigo 14 e incisos os

institutos que visam assegurar o exercício da soberania popular por meio do

sufrágio universal, pelo voto direto e secreto e ainda indiretamente por meio

dos institutos denominados plebiscito, referendo e iniciativa popular.

O Estado Democrático de Direito tem como principal característica a

democracia onde o povo, definido por Dallari como, “o conjunto dos indivíduos

que através de um momento jurídico se unem para constituir o Estado,

estabelecendo com este um vínculo jurídico de caráter permanente

participando da formação da vontade e do exercício do poder soberano” (2013,

p.104), é o elemento principal e o legitimo titular do poder , ressalta ainda que

"Sendo o Estado Democrático aquele em que o próprio povo governa, é

evidente que se coloca o problema do estabelecimento dos meios para que o

povo possa externar sua vontade" (2013, p. 152), ou seja, por meio de

representantes eleitos para a realização dos ideais propostos pelos cidadãos.

Adota, portanto, o Brasil o sistema político da democracia semidireta,

sistema hibrido onde se alternam a democracia direta onde há a participação

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do povo de forma direta, sendo a população convidada a discutir sobre

aprovações de leis e assuntos do governo, tendo como referência a

Landsgemeinde (assembleia cantonal), realizada ainda em alguns cantões da

Suíça (DALLARI, 2013, p. 152). Sendo este tipo de democracia viável e efetivo

em áreas restritas e de número populacional reduzido. E, o sistema da

democracia indireta ou representativa onde por meio de eleições periódicas os

eleitores são convocados para a escolha de seus representantes, onde a

soberania do povo é exercida por força do sufrágio universal, entendido como

direito de escolha, assegurado pelo voto.

Na visão de Alexandre Sanson:

A representação, mecanismo adotado nos Estados contemporâneos para a tomada de decisões, baseada no livre exercício das atividades pelos governantes, configura-se uma necessidade nas realidades democráticas atuais. Não se encontra, contudo, imune a críticas, devendo-se sempre encontrar alternativas que permitam uma maior integração do povo no parlamento. (SANSON, 2007, p. 79)

A representação é, portanto, uma situação de fato onde é imputado ao

representante eleito deveres e responsabilidades políticas para agir em nome

dos eleitores. A lei é o imperativo que deve nortear o processo democrático de

um Estado, exigindo a participação de todos os cidadãos na vida política do

país com o fim de garantir o respeito aos fundamentos pelo qual o Estado

Democrático de Direito se constitui, devendo ser governado por poderes

legitimados que se submetam as leis e a soberania do povo obedecendo aos

princípios fundamentais da democracia.

2 DIREITO DE REVOGAÇÃO

A democracia direta é compreendida ainda pelo direito de revogação de

mandato eletivo, instituto que possibilita a um determinado número de eleitores

levarem à população a apreciação quanto a possibilidade de manter ou

destituir do cargo um político sem que tenha o seu mandato chegado ao final.

Maria Benedita Malaquias Pires Urbano define o direito de revogação

popular como:

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Um meio ou procedimento ao dispor de um certo número ou percentagem de cidadãos eleitores, o qual tem como finalidade permitir-lhes requerer a destituição de um ou mais dos seus representantes, hajam sido eles eleitos ou nomeados (a lógica desta figura compagina-se bem melhor, porém, com a ideia da eleição: se o povo tem o poder de eleger os seus representantes, deverá também deter o poder de os destituir quando estes frustrarem as expectativas neles depositadas). (URBANO apud SANTANA, 2004, p. 23).

Sendo este um direito político poderá ser exercício por meio de consulta

popular onde um grupo de eleitores convoca os demais para decidir quanto ao

afastamento não só de um representante, bem como de todo o parlamento

eleito antes de findar o prazo legal.

Ainda segundo Urbano, a revogação de mandato eletivo tem sua

origem histórica em:

Procedimento de responsabilidade denominada Grabeau, comumente utilizado na cidade de Genebra até o final do século XVII tratando-se de uma espécie de censura exercida pela Assembleia do povo em relação a funcionários públicos que não fossem dignos de exercerem

seus cargos”. (URBANO apud SANSON, 2007, p. 93).

Assumindo duas modalidades distintas o direito de revogação é admitido

principalmente nos Estados Unidos com o recall e na Suíça por meio do

abberufungsrecht, onde a aplicação de tais institutos é defendida por

representarem a legitimidade da vontade popular valorizando a democracia e,

possibilitando uma “ação efetiva do povo sobre as autoridades, permitindo-lhe

pôr termo ao mandato eletivo de um funcionário ou parlamentar, antes da

expiração do respectivo prazo legal” (BONAVIDES, 2011, p. 313).

Embora tais institutos não sejam adotados no Brasil, outros países

adotam e defendem sua aplicação por se tratar de instrumentos que tornam

possível a participação popular servindo de controle e viabilizando a

valorização e legitimidade da democracia.

2.1 Recall

O recall apresenta-se como um instituto político, um ato jurídico que em

determinadas condições confere ao eleitorado o poder de substituir e destituir

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um político eleito ou funcionário público conforme conceituado por Thomas E.

Cronin.

O dispositivo de democracia formal que confere aos eleitores a possibilidade de destituir e substituir uma autoridade pública. E sobre a concepção do instituto, registra o mesmo autor a ideia de que recall baseia-se na noção de que os eleitores devem conservar o direito de controlar suas autoridades eleitas. Os candidatos podem ter sido eleitos por um grande número de razões, incluindo algumas que não tem qualquer relação com sua capacidade para exercer seus deveres públicos de forma competente. A premissa do recall é que se as pessoas podem ser eleitas por motivos não-relacionados à sua capacidade para exercer a função pública, eles também podem ser destituídos por uma série de motivos. (CRONIN apud AVILA, 2009, p. 53)

O recall norte americano segundo Dalmo Dallari, foi introduzido em 1903

por Theodore Roosevelt, que sugeriu em suas campanhas eleitorais de 1912 o

recall judicial que tinha uma principal finalidade: “ que as decisões de juízes e

Tribunais, excluída apenas a Suprema Corte, negando a aplicação de uma lei

por julgá-la inconstitucional deveriam poder ser anuladas pelo voto da maioria

dos eleitores”. (DALLARI, 2013, p. 155). Acolhido por vários Estados norte-

americanos o recall judicial foi motivo de controvérsias, tendo em vista que

comprometeriam a isenção e limitariam os magistrados em suas decisões.

O recall político é aquele que “Capacita o eleitorado a destituir

funcionários cujo comportamento, por qualquer motivo, não lhe esteja

agradando” (BONAVIDES, 2011, p. 313).

É forma de revogação individual e pode ser aplicado em duas hipóteses

distintas: “para revogar a eleição de um legislador ou funcionário eleito, ou para

reformar decisão judicial sobre constitucionalidade de lei” (DALLARI, 2013, p.

155).

Segundo Caio Márcio de Brito Ávila:

O recall, como visto, nos Estados Unidos da América do Norte, foi introduzido nas legislações estaduais e locais, para fiscalizar os mandatos políticos das autoridades públicas, para a aproximação entre representantes e representado, e também com o objetivo de tornar a Administração Pública menos corrupta e mais eficiente. (ÁVILA, 2009, p. 66)

Para a revogação de um mandato eletivo é indispensável que certo

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número de eleitores pleiteie consulta de opinião junto ao eleitorado sobre a

revogação de mandato de determinado representante eleito, para tanto, é

necessário que os requerentes depositem certa quantia de dinheiro. Ao

candidato é dado a oportunidade de defesa e, “se a maioria decidir pela

revogação esta se efetiva, caso contrário o mandato não se revoga e os

requerentes perdem para o Estado o dinheiro depositado” (DALLARI, 2013, p.

155).

Ainda segundo Ávila o recall:

Servirá também como verdadeira forma de expressão da oposição política, responsável, e não para oposição inconsequente, sem medidas. [...], existe, hoje, o caráter pessoal da relação de representação, os candidatos invadem as casas dos eleitores através dos meios de comunicação, fazem inúmeras promessas e, depois de eleitos, deixam de dar satisfação às pessoas. Não se representa mais nação. Também não se representa o partido. O que deve ser representado por aquele que exerce função pública eletiva é o interesse público, o bem comum, que corresponde ao interesse dos eleitores. (ÁVILA, 2009, p. 124)

Importante salientar que o recall não se confunde com o impeachment,

enquanto que no recall a decisão parte diretamente do povo e “ocorre em

razão da insatisfação de um grande segmento do corpo eleitoral com as

decisões dos funcionários públicos” (SGARBI apud SANSON, 2007, p. 94); o

impeachment, é um processo que se inicia por meio de órgão legislativo,

desencadeado após suspeita da pratica de crime, onde há a necessidade de

uma acusação criminal e a comprovação de que o eleito tenha cometido crime

de responsabilidade.

2.2 Abberufungsrecht

O Abberufungsrecht, “é a forma de revogação coletiva” (BONAVIDES,

2011, p. 315), admitido em alguns cantões da Suíça, trata-se de requerimento

para a dissolução de toda a Assembleia Legislativa por um determinado

número do corpo eleitoral pondo fim ao mandato de seus eleitos. Dessa forma,

com um posicionamento positivo da população, destitui-se todos os eleitos e

torna-se necessário novas eleições.

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A expressão germânica abberufungsrecht significa, literalmente, direito

de revogação, onde recht significa “direito”; e abberufung significa “revogação,

destituição” (SANTANA, 2004. p. 19). Contudo, para Dalmo Dallari, tanto o

recall quanto o abberufungsrecht mostram-se inconvenientes e dificilmente

serão adotados pelos parlamentares, que certamente darão preferência por

eliminá-los para não ficarem sujeitos a vontade do povo (2013. p.156).

A dissolução de toda a assembleia legislativa além de inconveniente e

inadequada, mostra-se inviável devido ao gasto excessivo que acarretaria ao

Estado, tendo em vista ser necessário iniciar outro pleito eleitoral com

campanhas políticas, divulgação e todo o aparato necessário para que novas

eleições ocorram.

3 ANÁLISE DAS PROPOSTAS DE EMENDA CONSTITUCIONAL

O modelo democrático representativo ora vivenciado no Brasil está em

descrédito frente aos cidadãos. Isto posto, analisemos algumas propostas que

tramitam ou tramitaram na Câmara do Senado Nacional basicamente com os

mesmos objetivos: a alteração do artigo 14 da Constituição Federal

possibilitando ao eleitor a revogação de mandato eletivo.

3.1 PEC 073/2005

No ano de 2005 foi apresentada ao Senado Federal a PEC 073/2005 de

autoria do Senador Eduardo Suplicy onde se objetivava a revogação de

mandato eletivo de forma individualizada para Presidente da República e

Senadores e para deputados a dissolução total da câmara. Nota-se que a ideia

era inserir em só momento o recall e a abberufungsrecht como instrumento da

democracia direta conferindo ao povo teoricamente uma participação ativa nas

decisões políticas do país.

A proposta estabelecia que depois de transcorrido um ano da posse dos

eleitos para o cargo de Presidente da República ou membros do Congresso

Nacional, poderiam ter seus mandatos submetidos a processo de revogação;

dispunha ainda que, o eleitorado poderia por meio de iniciativa popular

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requerer junto ao Tribunal Superior Eleitoral a dissolução da Câmara dos

Deputados, enquanto que a revogação do mandato do Presidente da

República se daria por meio de referendo a requerimento da maioria absoluta

dos membros do Congresso Nacional, dirigido ao Tribunal Superior Eleitoral.

Salienta que, se a soma dos votos nulos e em branco fossem superiores a

mais da metade do total dos votos expressos o referendo seria considerado

sem efeito.

Contudo, após ser analisada pelo Relator Senador Romero Jucá no ano

de 2013, a proposta foi rejeitada na sua integralidade tendo em vista sua

inconsistência por prever a perda de mandato do Presidente, mas não do seu

vice; a dissolução da Câmara dos Deputados, mas não do Senado e ainda por

não prever a possibilidade de revogação e mandatos dos eleitos nos Estados,

Distritos Federal e Municípios, ou seja, Governadores, Prefeitos e Vereadores.

3.2 PEC 08/2015

PEC nº 08/2015 – Senador Reguffe e outros Senadores. “Acrescenta o

art. 14-A a Constituição Federal, instituindo a revogabilidade de mandatos

políticos no Brasil”.

Dispõe que, todos os candidatos deverão levar a registro junto à Justiça

Eleitoral suas propostas e compromissos de campanhas que deverão ser

veiculados e disponibilizados em sites oficiais e internet para consultas dos

eleitores. Não sendo cumpridos, poderá o eleitor ajuizar ação de

revogabilidade de mandato político perante a Justiça Eleitoral que deverá julgá-

la em 90 (noventa) dias.

Justifica a proposta no sentido de que a revogabilidade do mandato é a

garantia legal ao eleitor, verdadeiro titular do poder. A proposta até o presente

momento aguarda designação de relator para parecer, porém verifica-se que

de acordo com o texto mostra-se incoerente, com a sistemática democrática

que se busca inserir, pois, um único eleitor poderá pleitear a revogação do

mandato do eleito, não sendo necessária consulta previa a população.

Ademais, não traz expressa as condições da ação e as consequências caso a

mesma seja julgada improcedente.

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3.3 PEC 021/2015

PEC nº 21/2015 – Senador Antonio Carlos Valadares. “Altera a redação

do art. 14 da Constituição Federal, inserindo incisos que criam dois novos

institutos da democracia participativa, o Direito de Revogação e o Veto

Popular.

Traz como justificativa a importância da matéria para o aperfeiçoamento

da democracia. Esclarece ainda, que tal iniciativa teve início com a PEC nº

80/2003 quando essa mesma proposta foi apresentada a Câmara, embora

tivesse tido parecer favorável do Relator Senador Walter Pinheiro a mesma foi

arquivada ao final da legislatura por força de Regimento Interno do Senado.

Aguardando designação de relator até a presente data, a proposta visa

ainda assegurar a democracia participativa e aperfeiçoar o Estado Democrático

de Direito, muito embora não apresente as regras pelas quais se efetivariam os

institutos se aprovados.

3.4 PEC 160/2015

PEC nº 160/2015 – Senador Cristovam Buarque. “Acrescenta o art. 14-A

da Constituição Federal, para prever a revogação de mandato eletivo pelo voto

popular”. Passando a vigorar a Constituição Federal acrescida do seguinte art.

14-A. Apresenta como justificativa a tese de que é preciso prosseguir e ampliar

o alcance do exercício da soberania popular no Brasil.

Tendo sido designado como relator o Senador Magno Malta, o mesmo

deu parecer favorável a proposta muito embora ela não traga a previsão de

revogação de mandato para os eleitos pelo voto proporcional, que por ser de

natureza constitucional o sistema proporcional garante e protege a

representação política das minorias no parlamento. Embora seja uma garantia

constitucional, há que lembrar que os eleitos por sistema proporcional não

foram reconhecidos pela maioria eleitoral, portanto, deveriam sim, ser

submetidos a análise e se for o caso, destituídos de seus mandatos.

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RESULTADOS

O Brasil não vive a sua Constituição na plenitude democrática, embora

seja este seu principal objetivo e inspiração. Há claramente uma dissociação

entre a norma fundamental e a realidade social e política vivenciada pela

população, o que evidencia a ausência de experiencia no exercício da cidadania.

A multiplicidade de propostas com o mesmo cunho político denota a falta

de interesse de agir dos parlamentares, cuja preocupação não está na defesa

dos interesses da população e sim, de seus próprios, tendo em vista que o

poder político é exercido por pequenos grupos que provavelmente não

permitirão a ascensão popular.

Propostas anteriormente apresentadas foram rejeitadas por não trazer

expressas as condições ou procedimentos sobre as quais os institutos se

efetivariam, e os mesmos erros são ainda cometidos sem que haja a

preocupação com a adequação do pedido.

Da análise das propostas que tramitam no Senado restaram mais

questionamentos que soluções: Uma vez postulado o pedido de revogação de

mandato, quem seria legitimado para recebe-lo? Quais os procedimentos a

serem adotados quanto aos impedidos até que o processo fosse apreciado?

Como se daria a publicidade de tal procedimento? Esta o eleitorado brasileiro

apto para assumir a responsabilidade de uma destituição? Não seria essa mais

uma forma de manipular a população para se obter resultados que favoreçam os

interesses da elite política? Quais as consequências que uma interrupção de

mandato traria ao Estado?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A busca pela promoção de uma democracia que realmente transfira ao

eleitor o poder político com a viabilização e utilização de mecanismos de

controle político deveria ser uma constante, principalmente tendo em vista o

desenvolvimento das sociedades.

A inserção do recall como forma de revogação de mandado eletivo é um

instrumento que se mostra compatível com a Constituição Federal do Brasil,

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pois se efetivaria por meio de iniciativa popular e plebiscito, dois instrumentos

já consolidados no ordenamento jurídico brasileiro e, podendo, portanto, ser

usado desde que de forma responsável, como remédio democrático. Contudo,

percebe-se a necessidade de politização do eleitor, para que o modelo de

representatividade brasileiro seja resgatado e o mesmo entenda que a sua

responsabilidade vai muito além da escolha dos seus representantes, sendo

também um grande passo para a formação de uma sociedade que realmente

se identifique com o modelo democrático participativo.

Desenvolver um programa de educação política, decerto contribuiria

para que comportamentos e atitudes que revelam desconsideração e

indiferença sobre política sejam superados para que a população se

conscientize e se reconheça como ser político, conferindo à democracia sua

real função, a de garantir direitos e limitar o poder dos representantes eleitos

prevalecendo assim, a vontade soberana da maioria.

REFERÊNCIAS

ÁVILA. C. M. de B. Recall – a Revogação do mandato Político pelos Eleitores: uma proposta para o sistema jurídico brasileiro. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo: São Paulo, 2009. BONAVIDES. P. Ciência Política. 18. ed. São Paulo. Malheiros, 2011. ______. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília. 1988. DALLARI. D. de A. Elementos de teoria Geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013 ______. O que é Participação Política. São Paulo: Abril Cultural: Brasiliense. 1984. FERNANDES. B. G. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. Salvador: Jus PODIVM. 2015 MORAES. A. de. Direito Constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2007. NOVELINO. M. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. Salvador: Jus

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PODIVM. 2015 PROPOSTA de Emenda à Constituição. PEC nº 8, de 2015. Brasília. Disponível em: http://www25.senado.leg.br. Acesso em: 22/02/2016. PROPOSTA de Emenda à Constituição. PEC nº 21, de 2015. Brasília. Disponível em: http://www25.senado.leg.br. Acesso em: 10/02/2016. PROPOSTA de Emenda à Constituição. PEC nº 160, de 2015. Brasília. Disponível em: http://www25.senado.leg.br. Acesso em: 22/02/2016 RIBEIRO. F. J. Soberania Popular. Dissertação de Mestrado. Monografia (especialização) - Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento (Cefor), da Câmara dos Deputados, Brasília, 2009. SANTANA. A. O direito de revogação do mandato político representativo. Monografia (bacharelado). Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2004. SANSON. A. Dos institutos de democracia semidireta (plebiscito, referendo e iniciativa popular) como fontes de fortalecimento da cidadania ativa. Dissertação de Mestrado. Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, 2007 SILVA. J. A. da. Curso de direito Constitucional Positivo. 33. ed. São Paulo. Malheiros, 2009.

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AS MEDIDAS PROTETIVAS E SOCIOEDUCATIVAS PREVISTAS NO

ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA

Cesar Augusto Rodrigues Mortari – [email protected]

Graduando em Direito – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo a analisar aplicação do ECA proporcionando maior entendimento sobre as regras do Estatuto, mostrando que este não são somente direitos, mas também deveres. O antigo código de menores submetia crianças e adolescentes a um critério de menoridade absoluta, utilizando doutrina de exclusão social. Criou-se posteriormente uma nova legislação que entrou em conflito com a lei maior dando origem ao Estatuto da Criança e do Adolescente, levando á aplicação de medidas socioeducativas quando o adolescente pratica atos infracionais e quando forem crianças, medidas protetivas. O ECA reconhece este grupo como sujeitos de direitos e não somente de obrigações tornando-se um grande avanço na legislação brasileira mundial. A existência de um texto legal que reconhece este grupo como sujeito de direito por si só não mudaria a realidade, o desafio maior encontra-se na efetivação ou concretização das medidas relativas ao ECA. É necessário o compromisso de todos, da família, sociedade e o poder público, deste modo garante-se a obediência e o cumprimento desse desafio. Palavras-chave: Estatuto da Criança e do Adolescente. Medidas socioeducativas. Medidas Protetivas.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho surgiu diante da grande duvida e desconhecimento

sobre as medidas protetivas e socioeducativas que estão dispostas no ECA.

Essa linha de pesquisa refletiu em um avanço significativo, pois os meios

utilizados para elaboração do Estatuto atenderam ao art. 277 da Constituição

Federal, buscando construir uma sociedade comprometida com os Direitos

Humanos.

Desde 1990 com o ECA, as crianças e os adolescentes são

reconhecidos como sujeitos de direitos, e estabelece que a família, o Estado e

a sociedade são responsáveis pela sua proteção, já que são pessoas que

estão vivendo um período de intenso desenvolvimento físico, psicológico, moral

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e social.

É grande o questionamento, ainda nos dias atuais, se as medidas

protetivas relativas ao ECA realmente „‟pune‟‟ o menor, ou banaliza seu real

compromisso. O ECA rompeu com o passado marcado pela presença de

menores nas ruas, em situação irregular, reconhecendo este grupo como

sujeitos de direitos fundamentais inerentes a qualquer pessoa humana, que

merecem proteção integral dada à condições da pessoa em desenvolvimento.

OBJETIVO

O objetivo do artigo é trazer ao leitor, conhecimentos sobre as medidas

socioeducativas e as protetivas impostas pelo ECA a esses menores infratores,

com objetivo de evitar que um novo delito ocorra. Proporcionar um melhor

entendimento sobre as regras do Estatuto, mostrando que este não somente

garante direitos, mas também impõe deveres, á criança e adolescentes que

venham cometer algum ato infracional.

METODOLOGIA

A metodologia empregada consistiu no levantamento doutrinário e

legislativo a respeito do tema.

1 CONCEITOS BÁSICOS

O Estatuto da Criança e do adolescente (ECA) é uma Lei Federal n°

8.069/90, que trata sobre os direitos das crianças e do adolescente em todo o

Brasil. Trata-se de um ramo especializado, dividido em partes geral e especial,

onde o primeiro traça, como as demais codificações existentes, aos princípios

norteadores do Estatuto. Já a segunda parte estrutura a política de

entendimento, medidas, conselho tutelar, acesso jurisdicional e apuração de

atos infracionais.

A partir do Estatuto, crianças e adolescente brasileiros, sem distinção de

raça, cor ou classe social, passaram a ser reconhecidos como sujeitos de

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direitos e deveres, considerando como pessoas em desenvolvimento a quem

se deve prioridade absoluta do Estado.

O objetivo estatutário é a proteção dos menores, proporcionando a eles

um desenvolvimento físico, mental, moral e sociais condizentes com os

princípios constitucionais da liberdade e da dignidade, preparando para a vida

adulta em sociedade.

2 RESPONSABILIZAÇÃO PELO ATO INFRACIONAL

No Brasil, a criminalidade infantil é uma realidade, de modo que nossa

vive cada vez ameaçada. Mesmo diante de uma enorme proteção do Estatuto

para as crianças e adolescentes, cresce cada vez mais os números de crimes

cometidos por menores.

Os fatores que contribuem para a entrada destes jovens á criminalidade

são diversos, como por exemplo, a falta de estrutura familiar, drogas, a vida

nas ruas, falta de educação e oportunidades para melhores condições de vida

e o principal fator á desigualdade social.

Esses menores respondem pelas práticas de crimes ou contravenções

penais, mas aplicação da pena não se dá conforme o sistema do Código

Penal, mas sim pelo ECA, sendo que este Estatuto não se aplica

responsabilização penal mas sim aplicação de medidas socioeducativas, como

forma de „‟punir‟‟ tais condutas praticas pelos adolescentes. Já no caso das

crianças ficam sujeitas as medidas protetivas, conforme disposto no art. 101 do

referido Estatuto.

A não responsabilização penal encontra-se alicerçada na Constituição

Federal em seu art. 228 „‟são penalmente imputáveis os menores de dezoito

anos, sujeitos às normas da legislação especial‟‟.

2.1 Considerações gerais sobre os Direitos Humanos e o ECA

Os direitos humanos estão relacionados á dignidade do indivíduo,

independentemente de sua nacionalidade ou condição social. Ao que tange os

direitos inalienáveis estamos reconhecendo que os direitos não estão em

conjunto com a nacionalidade (PIOVESAN, 1998).

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De acordo com a denominação do novo ordenamento, o art. 2° do

Estatuto refere-se à sua competência em razão da pessoa, em princípio, o

menor de 18 anos.

Art. 2°. Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescentes aquela entre doze e dezoito anos de idade.

O ECA afirma que o menor é uma pessoa incapaz de entender e de

discernir acerca do fato ilícito, não possuindo assim capacidade suficiente de

desenvolvimento psíquico para compreender tal fato ou ação criminosa.

A decisão de incluir no Estatuto o menor de 18 anos está de acordo com

a Convenção sobre direitos da criança, que, como se sabe, em seu dispositivo,

estabelece que, se entende por criança todo o ser humano menor de 18 anos.

Em decorrência do art. 2° dispões que o Estatuto é aplicável aos que se

encontram entre 18 e os 21 anos. (ISHIDA, 2010, p.34).

O Estatuto, seguindo a decisão adotada pela Constituição de 1988,

estabelece que os menores de 18 anos sejam penalmente inimputáveis,

sujeitos às medidas previstas nesta lei, de acordo com o art. 104.

2.2 Das medidas socioeducativas

As medidas socioeducativas são aplicadas aos maiores de doze anos e

menores de dezoito anos, quando praticarem atos infracionais. Para efeitos de

aplicação, deve ser considerada a idade e á data do fato.

A este menor, é aplicada uma sanção diferenciada ao que é aplicado a

um adulto que pratique o mesmo crime, visto que são inimputáveis, será

aplicado de acordo com o ECA, do qual será aplicado um medida

socioeducativa a este infrator, com objetivo que não venha ocorrer outro delito.

(BARROSO, 2011).

A Lei n°. 8.069/90 que regulamenta o ECA trouxe inúmeras mudanças

ao atendimento aos direitos das crianças e dos adolescentes e principalmente

aos que cometem ato infracional.

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Art. 106°. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão e flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

2.2.1 Das medidas socioeducativas em espécies

As medidas socioeducativas são aplicadas aos adolescentes em conflito

com a lei, devem oferecer respeito à condição de pessoa em desenvolvimento,

oferecendo de forma digna à sua ressocialização.

Essas medidas são gradativas, podendo ser aplicadas tanto de forma

isolada como cumulativamente, bem como podem ser substituídas a qualquer

tempo.

As medidas socioeducativas estão no rol taxativo do artigo 112 do ECA,

sendo eles:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas: I - advertência; II - obrigação de reparar o dano; III - prestação de serviços à comunidade; IV - liberdade assistida; V - inserção em regime de semi-liberdade; VI - internação em estabelecimento educacional; VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. § 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração. § 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado. § 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições

Essas medidas são previstas como uma forma de evitar que o menor

infrator venha cometer novos delitos, para sua aplicação o juiz deve observar

alguns aspectos, sendo os quais: a capacidade do menor em cumprir estas

medidas circunstâncias e a gravidade da infração, bem como a personalidade

do adolescente, e sua referência familiar.

Quanto às medidas socioeducativas, a jurisprudência se pronuncia

nesse sentido de acordo com Ishida (2010, p. 193):

Se o objetivo da lei é proteção da criança e do adolescente com a aplicação de medidas socioeducativas tendentes a permitir a sua remissão dos maus atos e procedimento irregular que possa impedir

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seu desenvolvimento e integração na sociedade, o que deve ser analisado é sua conduta, sob o aspecto da sua adequação social e da sua conformação com os hábitos e costumes tradicionalmente aceitos. Em outras palavras, não se exige que o menor tenha praticado um crime para, só então, aplicar-lhe medidas socioeducativas. Se assim for, a medida perderá esse caráter de

proteção social e educativa, para transmudar em verdadeira pena.

É de extrema relevância que diante de qualquer aplicação

socioeducativa deve-se fazer uma análise do contexto social em que vive o

adolescente, bem como suas condições sociais, políticas e econômicas.

O Estado tem o dever de oferecer ao adolescente melhores condições

de vida, educação, saúde, moradia, lazer, segurança, etc. Estas condições

poderiam ser consideradas como um método de prevenção do Estado, do qual,

poderia evitar-se que cada vez mais crianças e adolescentes entre para

criminalidade mais cedo.

2.3 Das medidas protetivas

Essa medida é utilizada quando ocorre violação ou simples ameaça de

violação aos direitos das crianças ou adolescentes. O objetivo é fazer cumprir

os direitos deste grupo. Estão previstas no art. 98°, do Estatuto, sendo:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta.

2.3.1 Características

Essas medidas são direcionadas tanto para as crianças como pra os

adolescentes. O que se leva em consideração é o desenvolvimento desses

indivíduos, por isso merece atenção especial do Estado, da sociedade e

principalmente dos pais ou responsáveis.

Tais medidas podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativamente

ou substituídas por outras a qualquer tempo. Devem-se observar as

necessidades pedagógicas dos menores na aplicação dessas medidas, bem

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como os que buscam fortalecer os vínculos familiares.

O artigo 101 do ECA, traz um rol exemplificativo de quais são essas

medidas de proteção:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - acolhimento institucional VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX - colocação em família substituta.

2.3.2 Competência

As medidas de proteção especificadas no art. 101 serão aplicadas pelo

Conselho Tutelar, conforme disposto nos artigos 136, 98 e 105 do ECA.

Há de se esclarecer que as Varas de Infância e Juventude serão

competentes para administrar as medidas, além de aplicá-las, enquanto não

instituído os Conselhos tutelares, nos termos do artigo 262 do ECA.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao término desta pesquisa observamos que o ECA é uma legislação que

direcionada sobre os direitos das crianças e dos adolescentes. Além dos

direitos deste grupo, prevê os modos de responsabilização aos menores que

praticaram atos infracionais. Tem por objetivo a ressocialização aos menores

que se encontram na criminalidade, a fim de evitar a reincidência.

A atual situação da prática ainda se encontra longe da ideia prevista no

Estatuto, pois ainda é evidente que a criminalidade infantil vem aumentando de

forma significativa em nosso país. A criação do Estatuto é fonte de diversas

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opiniões, pois enquanto vários defendem a redução da maioridade penal,

outros consideram essa redução um desrespeito aos Direitos Humanos.

De modo geral cabe não somente ao Estado, mas á família, á

comunidade, á sociedade em geral de contribuir para assegurar a efetividade

destes direitos e obrigações impostas aos menores, pois temos amparo

constitucional de acordo com o respeito e o princípio da dignidade da pessoa

humana.

É dever de todos oferecermos condições para que os menores possam

sair da criminalidade e ter um desenvolvimento educacional, psicológico e

social de forma saudável e de acordo com que a sociedade e as famílias

esperam.

REFERÊNCIAS

BARROSO FILHO, J. Do ato infracional. Jus Navegandi, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2011 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. CASTRO. Lúcia Maria Xavier. ECA comentado- Tema: Medidas de Proteção. Disponível em: <http://www.promenino.org.br/noticias/arquivo/eca-comentado-artigo-99livro-2---tema-medidas-de-protecao>. Acesso em: 14/06/2017. VIEGAS. C. M. A. R; Cesar Leandro de Almeida. Principais Considerações sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: < http://ambitojuridico.com.br/site/?artigo_id=10593&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 14/06/2017. ISHIDA, V. K. Estatuto da Criança e do Adolescente: doutrina e jurisprudência. 12.ed., São Paulo: Atlas, 2010. PEREIRA, Cássio Rodrigues. Estatuto da Criança e do Adolescente: à luz do direito e da jurisprudência. Belo Horizonte: Líder, 2010. PIOVESAN, F. Direitos humanos e o Direito Constitucional Internacional. 3.ed., São Paulo: Max Lemonad, 1998.

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COPARENTALIDADE RESPONSÁVEL: Um Novo Modelo Familiar?

Gabriel Francisco Cabrera de Sá - [email protected] Graduando em Direito - UniSALESIANO Araçatuba

Prof.ª Ma. Meire Cristina Queiroz Sato – [email protected] Docente UniSALESIANO Araçatuba/Lins

RESUMO

A coparentalidade responsável vem se despontando como um novo método de procriação e filiação sem, contudo, criar-se uma família com base na afetividade do casal. Por meio de contrato escrito entre as partes interessadas, propicia-se uma alternativa para as pessoas terem os seus filhos, sobretudo para quem não tem relacionamento afetivo ou que não pode gerar filho com seu parceiro por questões biológicas. Assim, a pesquisa tem por objetivo investigar se por esse novo método de procriação cria-se um novo modelo de entidade familiar com as consequências advindas, tais como a guarda do filho, o reconhecimento e proteção estatal, entre outros. A pesquisa utilizará o método indutivo-dedutivo e qualitativo, através de levantamento bibliográfico e da aplicação de questionário em redes sociais diretamente ao público que utilizou esse novo método de procriação, para averiguar se ter filho com alguém, que não seja o seu cônjuge ou companheiro, estabelece ou não vínculo familiar entre os contratantes ou um novo modelo de família entre o filho concebido com cada uma das partes envolvidas.

Palavras-chave: Coparentalidade responsável. Direito de Família. Filiação. Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente.

INTRODUÇÃO

O trabalho visa mostrar uma nova forma de procriação e de filiação que

vem ganhando espaço e reconhecimento na sociedade brasileira, a

coparentalidade, divulgado por meio de redes sociais na internet sob a forma

de fanpage e blog para divulgar a ideia entre os interessados. A

coparentalidade responsável se estabelece quando dois adultos, sem a

constituição de nenhum laço amoroso ou conjugal, resolvem ter um filho,

compartilhando entre si as obrigações e responsabilidades impostas com a

criação do filho. Para a organização e desenvolvimento da pesquisa, o trabalho

foi dividido em dois capítulos, tendo como foco no primeiro capítulo o estudo

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sobre a evolução do Direito de Família e os princípios constitucionais que o

fundamentam, buscando-se identificar o processo evolutivo do conceito e

abrangência das novas formas de família. No segundo capítulo já se ingressa

no conceito de coparentalidade responsável, investigando se esse instituto cria

novo modelo familiar ou nova forma de procriação, sendo imperial analisar a

natureza jurídica do contrato de obrigações entre os parceiros genitores e, por

derradeiro, estabelecer quais os efeitos jurídicos da coparentalidade

responsável no exercício do poder familiar, levando-se em conta o melhor

interesse da criança e do adolescente.

OBJETIVOS

A pesquisa tem por objetivo investigar se por esse novo método de

procriação cria-se um novo modelo de entidade familiar, partindo-se do

seguinte questionamento: 1) É possível criar família sem relação de afetividade

entre o casal? 2) Como dividir a responsabilidade na criação e educação do

filho em comum, no tocante ao exercício da guarda, da pensão alimentícia,

enfim, no exercício do poder familiar?

A pesquisa visa, ainda, investigar recorrentes problemas relacionados

ao exercício do poder familiar, analisando os benefícios do filho, tendo como

fundamento o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente e da

proteção integral versus a liberdade dos que procuram esse novo modelo para

a satisfação de uma necessidade de procriar.

METODOLOGIA

A pesquisa é classificada como qualitativa e descritiva, tendo como

técnica a pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo, em que se realizará em

redes sociais da internet, onde se observará os fatos e os fenômenos em

análise e interpretação desses dados, seja pelo perfil dos adeptos, até um

questionário do por quê pela escolha desse método, enfatizando desde o seu

meio social, até pretensões futuras familiares.

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1 A EVOLUÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA NORTEADA PELOS

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

1.1 Do Código Civil de 1916 à Constituição de 1988 e o Código Civil de

2002

O Direito de Família passou por várias modificações ao longo de sua

evolução legislativa. O Código Civil de 1916 tinha uma visão muito retrograda

comparada à visão de família de hoje. Neste tópico será elencado como era a

familiar e pressupostos por ela defendidos.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, e partir dela todo, o

ordenamento jurídico modificou, trazendo novos conceitos e institutos, sendo

um grande avanço para o Direito de Família, fazendo uma releitura das famílias

sob a ótica dos princípios constitucionais, destacando-se a dignidade da

pessoa humana, resultando abrangência do conceito de família para abarcar

uma pluralidade de modelos.

1.2 Princípios e modificações do conceito familiar a partir da vigência

da Constituição Federal de 1988

Os princípios foram e são a base para todo esse avanço ocorrer, tais

como o princípio da dignidade humana, da igualdade jurídica, da afetividade,

do livre planejamento familiar, entre outros que, além de ser base no Direito de

Família.

2 COPARENTALIDADE RESPONSÁVEL: novo modelo familiar ou

nova forma de procriação?

2.1 Coparentalidade e seus efeitos jurídicos no exercício do poder

familiar

Variadas podem ser as justificativas para quem escolhe a

coparentalidade, seja por motivos biológicos ou livre escolha,

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homossexualidade. Os efeitos jurídicos serão como para qualquer outro casal,

se adequando à realidade inerente aos pais adeptos a coparentalidade.

2.2 O melhor interesse da criança e do adolescente versus o livre

planejamento familiar na busca da coparentalidade

O melhor interesse da criança sempre será mantido, pois os pais por

desejo e busca de sua satisfação familiar atenderão tais premissas defendidas

em lei, em favor a criança, caso não obedecida, deverá ser responsabilizado.

RESULTADOS PRELIMINARES

Evidente que não se cria um novo modelo familiar, mas sim um vínculo

jurídico do contrato de parceria entre as partes, constituindo um negócio

jurídico na orbita do Direito de Família, porém, tendo o nascituro todos os seus

diretos resguardados garantido desde a concepção, propiciando aos pais a

satisfação da procriação, seu direito da personalidade de procriar, sendo o

Estado incapaz de negá-lo. O presente projeto de pesquisa, em fase de

desenvolvimento, tem o objetivo de ser desenvolvido em artigo científico para

publicação oportuna, como conclusão do PIBIC 2017/2018.

REFERÊNCIAS

BITTAR, Eduardo C. B. O Direito na Pós Modernidade, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense universitária, 2009. COUTO, Lindajara Ostjen. O Direito Fundamental da Autonomia privada no Direito de Família. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 64, maio 2009. Disponível em . Acesso em 14 abr 2017. DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. PRATI, Laisa Eschiletti; KOLLER, Silvia Helena. Relacionamento Conjugal e Transição para a Coparentalidade: perspectiva da psicologia positiva. Revista de Psicologia Clínica, vol.23, n. 01, Rio de Janeiro, 2011. Disponível em <http://www.pepsic.bvsalud.org.br>. Acesso em 14 abr 2017.

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TARTUCE, Flávio. Direito Civil - Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2015. VERRUMO, Marcel. Faça um Filho Comigo. Revista Super Interessante, Nov. 2016, p. 55. Disponível em: Acesso em março de 2017.

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DA EXTENSÃO DO ACRÉSCIMO PREVISTO NO ARTIGO 45 DA LEI

Nº 8.213/91 ÀS DEMAIS APOSENTADORIAS

Lohaine Milena Alexandre – [email protected]

Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Vinicius Roberto Prioli de Souza – [email protected]

Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente trabalho busca analisar o art. 45 da Lei nº 8.213/91, que institui a modalidade de aposentadoria por invalidez, dispondo que os segurados que necessitarem da assistência permanente de um terceiro terão direito a um acréscimo de 25% em seu benefício. Todavia, o dispositivo legal preocupou contemplar somente os aposentados por invalidez, não tutelando os segurados beneficiários de outras modalidades de aposentadoria, desconsiderando os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia. Assim, estudou-se os princípios constitucionais que autorizam a concessão deste acréscimo, notadamente o princípio da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como os princípios e dispositivo normativo que denega tal extensão, especialmente o art. 195, §5º, da Constituição Federal, e os princípios da precedência da fonte de custeio, legalidade e equilíbrio financeiro e atuarial. Ainda, como salientado, o objetivo estabelecido consiste na propositura da ampliação da majoração dos 25% para todos os aposentados do sistema previdenciário e não somente para os beneficiários da aposentadoria valetudinária, verificando, outrossim, que o cerne do problema enfrentado baseia-se na discussão acerca do artigo 45 da Lei nº. 8.213/1991, que prevê o referido acréscimo somente para a aposentadoria por invalidez, lesando dessa forma o princípio da isonomia e também o princípio da dignidade da pessoa humana. Portanto, a extensão da referida majoração seria viável para o sistema previdenciário, bem como para efetivação dos princípios mencionados? Palavras-Chave: Aposentadoria Por Invalidez. Adicional de 25%. Princípio da Isonomia. Princípio da Dignidade Humana.

INTRODUÇÃO

Atualmente, no sistema previdenciário, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 45,

disciplina a majoração do benefício previdenciário de aposentadoria por

invalidez em 25% quando o seu titular necessitar da assistência permanente de

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outra pessoa, possuindo referido adicional natureza de compensação para os

gastos que o segurado terá ampliado em sua renda.

Nesse diapasão, infere-se que os segurados titulares de aposentadoria

por idade, por tempo de contribuição e na modalidade especial não terão

aumento na renda de seu benefício previdenciário, caso sejam acometidos de

invalidez que os incapacite para as atividades de tal forma que venham a

depender do auxílio permanente de terceiros. Assim, o objetivo estabelecido

consiste na propositura da ampliação da majoração dos 25% para todos os

aposentados do sistema previdenciário e não somente para os beneficiários da

aposentadoria valetudinária.

Vê-se, pois, que o cerne do problema enfrentado baseia-se na

discussão acerca do art. 45 da Lei nº. 8.213/1991, que prevê o referido

acréscimo somente para a aposentadoria por invalidez, lesando dessa forma o

princípio da isonomia e também o princípio da dignidade da pessoa humana.

Portanto, a extensão da referida majoração seria viável para o sistema

previdenciário, bem como para efetivar o princípio da dignidade da pessoa

humana e da isonomia?

Considerando que a Constituição Federal prevê expressamente no art.

1º o princípio da dignidade da pessoa humana, tratando-se de uma qualidade

intrínseca a todo ser humano, independente de requisitos, tais como condições

financeiras, idade, posição social, origem, bem como sendo o princípio em que

o Estado deva respeitar a autonomia de cada indivíduo, e observando que no

art. 5º do mesmo diploma está expresso o princípio da isonomia, conferindo

igualdade aos cidadãos para gozar de tratamento isonômico pela lei, no qual

são vedadas diferenciações discrepantes, não justificáveis pelo ordenamento

jurídico, vê-se que é lícita a extensão da majoração de 25% nas

aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especiais quando o

segurado necessitar de assistência permanente de terceiros devido a

problemas de saúde.

Nesse sentido, estuda-se os princípios da dignidade da pessoa humana

e da isonomia, bem como o princípio da fonte de custeio, analisando-se

posteriormente a possibilidade e impossibilidade do acréscimo de 25% às

demais aposentadorias que não a aposentadoria por invalidez.

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OBJETIVOS

Propor a ampliação da majoração dos 25% para todos os aposentados e

não somente para os beneficiários da aposentadoria valetudinária, bem como

identificar os aspectos da Aposentadoria por Invalidez.

Analisar o princípio da dignidade humana e da isonomia no que

concerne ao adicional de 25% e as outras modalidades de aposentadoria, que

não a aposentadoria por invalidez e conceituar a aposentadoria valetudinária, a

aposentadoria por tempo de contribuição, a aposentadoria por idade e a

aposentadoria especial. Por fim, verificar a extensão do direito do aumento de

25% para todos os beneficiários de aposentadoria que necessitam de

assistência permanente.

METODOLOGIA

Os métodos e técnicas utilizados no tocante à vertente metodológica

foram dois, abarcando a jurídico-dogmática e a jurídico-sociológica. Quanto aos

tipos metodológicos utilizou-se o método jurídico-interpretativo, na

decomposição de um problema jurídico em seus diversos aspectos, relações e

níveis. Por fim, concernente às técnicas de pesquisa e ao procedimento, optou-

se pela pesquisa bibliográfica e documental, com levantamento bibliográfico

coletado em livros de doutrina, artigos em revista científica e publicados na

internet e legislação, com abordagem exploratório e análise qualitativa.

1 ASPECTOS DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

ATINENTES À MAJORAÇÃO DO ADICIONAL DE 25% ÀS DEMAIS

APOSENTADORIAS

Um dos princípios constitucionais mais abordados no campo jurídico,

acadêmico e popular, possui um conceito extremadamente abrangente, de

modo que se torna laborioso defini-lo juridicamente. Sob esse aspecto, Daniel

Sarmento (2016, p. 92) entende que o princípio da dignidade da pessoa

humana cuida-se da pessoa vista como fim em si, e não como um objeto a

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serviço de terceiros, da comunidade e do Estado; como indivíduo que possui

autonomia; como detentor do mesmo respeito e consideração dos outros;

ainda, como ser racional, mas que também tem sentimentos, necessidades

materiais e psíquicas e por fim, como ser social, integrado nas relações

intersubjetivas necessárias para a sua identidade.

Dessa forma, impende consignar que o princípio da dignidade da pessoa

humana encontra-se no art. 1º, III, da Constituição Federal, estabelecendo que

“a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados

e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de

Direito e tem como fundamentos a dignidade da pessoa humana” (BRASIL,

1988). Nesse sentido, explica Ingo Wolfgang Sarlet:

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos (2007, p. 62)

Posto isso, o princípio supramencionado revela a intenção do legislador

constituinte em rechaçar alguma forma de distinção ou ato que coloque o

cidadão em situação de disparidade em relação aos demais, de forma que

cada um veja superadas suas necessidades básicas de forma igualitária e

proporcional, atendido o mínimo existencial, proporcionando condições digna

de vida. Ademais, pondera Rizzatto Nunes (2009, p. 48) que “a dignidade

humana é intangível. Respeitá-la, e protegê-la é obrigação de todo o poder

público”.

Portanto, infere-se do explanado que “toda interpretação ou aplicação

jurídica deve respeitar de forma íntegra o princípio da dignidade da pessoa

humana” (SILVA, 2013), de sorte que, trazendo tal princípio ao cerne desta

pesquisa, observa-se que o segurado aposentado por qualquer das

modalidades de aposentadoria estudadas neste trabalho, que não a

aposentadoria por invalidez, adoecendo posteriormente e necessitando do

auxílio permanente de terceiro, em nada se diferencia daquele aposentado por

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invalidez, exceto no que atine ao momento da incapacidade permanente.

Dessa forma, o segurado fica impossibilitado de prover suas

necessidades básicas, encontrando-se em contexto desfavorável face às

limitações decorrentes da invalidez; nesse aspecto, as consequências de

ordem econômica, física e psíquica permite verificar que a não extensão do

adicional afronta o princípio estudado, afasta a garantia do mínimo existencial,

uma vez que o segurado inválido passará a ter de despender aumento

significativo nos gastos médicos, fraldas, recursos com a assistência

permanente de terceiros e/ou equipamentos adaptados, tais como cadeiras de

rodas.

2 ASPECTOS DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE PERTINENTES À

EXTENSÃO DO ADICIONAL DE 25% ÀS DEMAIS APOSENTADORIAS

Consagrado no art. 5º, caput, da Constituição Federal, destacou o

constituinte que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a

inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade” (BRASIL, 1988). Nessa perspectiva, o princípio da igualdade,

também intitulado como princípio da isonomia, externa o desejo do constituinte

de combater quaisquer formas que venham a discriminar os sujeitos de direito

ou inseri-los em situações desiguais em relação às demais pessoas. Assim,

ensina Carmem Lúcia Antunes (apud SILVA, 2014, p. 216) que “igualdade

constitucional é mais que uma expressão de Direito; é um modo justo de se

viver em sociedade”.

Também, é de extrema relevância consignar que os cidadãos possuem

particularidades que o distinguem dos outros, o qual verificado isto, necessário

promover a igualização, e ocorrendo tal situação em processos judiciais,

impende ao Poder Judiciário efetivar o princípio da isonomia. Nesse contexto,

“o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam,

é exigência do próprio conceito de Justiça” (FERREIRA, 2012, p. 240).

Como explanado acima, o princípio da isonomia além de limitar o poder

legislativo para que não conceba privilégios de qualquer natureza, atribui

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conjuntura para que o Poder Judiciário interprete a legislação de forma sensata

e isonômica. Assim, conferir restritamente o adicional de 25% aos aposentados

por invalidez afronta este princípio, pois explicitamente, trata de forma desigual

os que se acham em situação igual, pois não há diferenças entre o aposentado

por invalidez que necessite do auxílio permanente de um terceiro e outro

aposentado segurado de outra modalidade de aposentadoria que, após a

fruição do benefício, venha a necessitar do mesmo suporte prestado por outra

pessoa. Veja-se, que o requisito fundamental para fruir o adicional de 25%

presente no art. 45 da Lei nº 8.213/91 é exatamente a necessidade da

assistência permanente de outra pessoa, contingência à qual abarca os

segurados presentes nesta situação.

3 DA POSSIBILIDADE DOS SEGURADOS DE OUTRAS

APOSENTADORIAS RECEBEREM O ACRÉSCIMO DE 25%

A grande invalidez ou aposentadoria valetudinária ocorrerá quando o

segurado necessitar da assistência permanente de terceiro, sendo dever do

Instituto Nacional do Seguro Social a concessão do adicional de 25% sobre a

renda do benefício, quando preenchido os requisitos fundamentais.

Primeiramente, salienta-se que tramita no Senado Federal o Projeto de

Lei nº 493 de 2011, de responsabilidade do Senador Paulo Paim, cuja

pretensão é alteração do teor do caput do art. 45 da Lei nº 8.213/91, que

passaria a reger com a seguinte redação: “o valor da aposentadoria por

invalidez, por idade e por tempo de contribuição e da aposentadoria especial

do segurado que necessitar de assistência permanente de outra pessoa, por

razões decorrentes de doença ou deficiência física, será acrescido de 25%

(vinte e cinco por cento)”.

Referido projeto de lei fora remetido para a Câmara dos Deputados, sob

o número 4282/2012, apensados aos Projetos de Lei nº 2044/2011, 5053/2013;

8094/2014; 167/2015; 2155/2015, que também possuem o escopo de alterar a

mesma norma previdenciária para majorar o adicional de 25% às demais

aposentadorias.

Desse modo, indispensável uma avaliação sobre as duas posições

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existentes sobre o adicional: o primeiro, minoritário na jurisprudência, o qual

defende a extensão para as demais aposentadorias; e o segundo, majoritário,

antagônico à ampliação e que possui como fundamento principal a ausência de

previsão legal para a extensão em comento.

O art. 5º da Constituição Federal assegura aos cidadãos o direito à vida,

à liberdade, à igualdade, dentre outros, garantindo a equidade de direitos. Sob

o prisma dos princípios da dignidade da pessoa humana e isonomia, bem

como os direitos constitucionais à assistência social e à saúde, verifica-se que

o cerne da lei é tutelar situações de evidente necessidade de apoio à condição

de inválido, ou seja, é desvelado o intento do legislador em enfrentar

circunstâncias que possam causar discriminação ou desigualdade aos sujeitos

de direito.

Além disto, quando o julgador realiza a avaliação de uma norma, a

aplicação mais favorável é medida que se impõe, não podendo deixar as

partes de um processo sem a devida resposta, seja por meio de uma sentença,

decisão interlocutória, acórdão. Nesta seara, existem casos concretos que não

abarcam uma norma jurídica que se amolda ao caso específico, devendo o

magistrado se valer dos institutos cabíveis para a execução do direito, como a

analogia, sendo esta estendida “a um caso não previsto aquilo que o legislador

previu para outro semelhante, em igualdade de razões” (REALE, 2002, p. 211).

Neste sentido, Mauricio Pallota Rodrigues (ca. 2013, p. 9) explana que é

evidente a “natureza assistencial do art. 45 da Lei nº 8.213/91, posto que é

inegável que a verdadeira intenção do legislador foi de alguma maneira garantir

a subsistência daqueles que se enquadrassem na hipótese legal”. Afirma que

ainda que o art. 45 tenha o intento de tutelar a velhice e a pessoa portadora de

deficiência, aplicar literalmente o teor normativo deste artigo violaria os

princípios da dignidade da pessoa humana e isonomia, uma vez que não há

diferenças entre o segurado aposentado por invalidez e outro segurado

aposentado por idade, tempo de contribuição ou na modalidade especial, que

for acometido de doença posterior ao recebimento do benefício e vier a

depender permanentemente do auxílio de terceiros, com exceção do

acontecimento da “grande invalidez” na percepção destes benefícios.

Nada obstante, percebe-se que há um legalismo exacerbado, ou seja,

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cumpre-se as leis, mas despreza-se os princípios norteadores de um Estado

Democrático de Direito, como os princípios estudados neste trabalho, quais

sejam, princípio da isonomia e dignidade da pessoa humana, além dos

princípios orientadores da assistência social, tal como o princípio da

universalidade da cobertura e do atendimento, a supremacia do atendimento

das necessidades sociais e o princípio da uniformidade.

Posto isto, vê-se que o que acontece na legislação previdenciária

atualmente é a incompatibilidade da norma com as necessidades da

população. Repise-se, a imobilidade da lei ocasiona a sua ineficácia perante

todos, onde o bem que se tenciona tutelar com a extensão do acréscimo do de

25% é a vida, e esta, sendo um direito universal e inalienável, independe do

cenário social para ser protegida.

Surge daí a necessidade de atualizar a norma em estudo, a fim de

efetivar o direito em comento, conferindo aos indivíduos isonomia e dignidade.

O Poder Judiciário, ante a ausência de posição do Poder Legislativo, vem

proferindo decisões em consonância com os princípios estudados, conferindo

tal benefício aos segurados, não podendo argumentar que se está

ultrapassando os limites do Poder Judiciário, mas sim, realizando uma

interpretação sistemática da norma.

Assim, observando-se a realidade social ante ao caso concreto, e

verificando que o segurado possui este direito, a norma deve ser aplicada de

forma mais benéfica, uma vez que o aposentado que não seja por invalidez e

venha a depender permanentemente de terceiros, tem as mesmas

necessidades e dificuldades do aposentado por invalidez que perpassa pela

mesma situação. Não conceder esta extensão é injusto, pois o segurado que

contribuiu corretamente para a Previdência necessita suportar gastos elevados

que poderiam ser reduzidos com o adicional de 25%, conferindo-lhe, reitera-se,

maior dignidade e isonomia.

Ademais, em que pese o argumento do princípio da precedência de

fonte de custeio, conforme o art. 195, §5º da Constituição Federal, não merece

prosperar, uma vez que, como já ressaltado, a natureza do art. 45 da Lei nº

8.213/91 é assistencial, não havendo que se falar em previsão de fonte de

custeio.

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Deveras, reitera-se, aqueles que são titulares de benefício previdenciário

que não a aposentadoria por invalidez, que tornaram-se dependentemente de

terceiros em decorrência de um infortúnio da vida, ainda que este amparo seja

posterior ao recebimento da aposentadoria, deve ter majorado seu benefício

em 25%, assentando assim o princípio da igualdade e dignidade da pessoa

humana, bem como com alicerce na saúde e proteção da vida do segurado,

uma vez que a legislação adveio como tutela ao cidadão no momento da

necessidade, sendo que ao conferir este acréscimo estar-se-ia efetivando a

justiça e respeitando os ditames da Constituição Federal.

3.1 Da impossibilidade dos segurados de outras aposentadorias

receberem o acréscimo de 25%

O fundamento para denegação do acréscimo de 25% às demais

aposentadorias é estritamente legal, haja vista que inexiste previsão normativa

para concessão de tal benesse. A jurisprudência majoritária utiliza

exclusivamente este embasamento para indeferir o adicional em questão.

Consigna-se, ademais, que a extensão afronta o princípio constitucional da

precedência da fonte de custeio, previsto, como já analisado, no art. 195, §5º

da Constituição Federal.

Outrossim, em total conformidade com o expendido, André Studart

Leitão e Augusto Grieco Sant‟anna Meirinho (2015, p. 345) indagam a

possibilidade de estender o acréscimo de 25% ao aposentado por tempo de

contribuição, a qual atribuem como resposta, a impossibilidade, em razão “do

princípio da legalidade, a grande invalidez pressupõe que o benefício-base seja

obrigatoriamente, a aposentadoria por invalidez”. Ainda, asseveram que

mesmo que o segurado aposentado por tempo de contribuição dependa de um

cuidador permanente, não é devida a referida extensão, devendo sempre

rememorar que sem a fonte de custeio, não poderá nenhum benefício

previdenciário ser majorado, estendido ou criado, de acordo com o citado art.

195, §5º da Constituição Federal.

Outro argumento de destaque é o fato da extensão do adicional de 25%

violar o princípio da legalidade, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer

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ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (BRASIL, 1988), nos

termos do art. 5º, II, da Constituição Federal. De outra banda, o art. 37, da

legislação citada, prevê que tanto a administração pública direta, como a

administração pública indireta “de qualquer dos Poderes da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de

legalidade” (BRASIL, 1988).

Desse modo, denota-se que o administrador público somente poderá

realizar atos expressamente autorizado por lei. Além do explanado, referida

majoração transgrediria o Princípio da Separação dos poderes, previsto

constitucionalmente no art. 2°, o qual explana que “são poderes da União,

independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”

(BRASIL, 1988).

Nada obstante, verifica-se que a Previdência Social se submete ao

princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, previsto no caput do art. 201, da

Constituição, impondo que a previdência social obedeça os “critérios que

preservem o seu equilíbrio financeiro e atuarial, a fim de assegurar a

incolumidade das contas previdenciárias para as presentes e futuras gerações”

(AMADO, 2015, p. 125).

Em vista disso, há que se ter em mente que, é necessário haver um

equilíbrio concernente às receitas do fundo previdenciário juntamente com as

despesas relacionadas ao pagamento de benefícios, de modo que eventual

ampliação do art. 45 da Lei nº 8.213/91 para outras modalidades de

aposentadoria, dependeria de alteração legislativa e de prévia fonte de custeio,

nos moldes do teor normativo.

Assim, o magistrado, ao promover a majoração do benefício

previdenciário que não seja a aposentadoria por invalidez, estaria atuando

como legislador positivo, em virtude de criar espécie de benefício não previsto

nas normas de seguridade social. Por analogia, lê-se o conteúdo da Súmula nº

339 do Supremo Tribunal Federal, dispondo que “não cabe ao Poder Judiciário,

que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos

sob fundamento de isonomia”, ou seja, é defeso ao Juiz legislar positivamente

com argumento no princípio da igualdade.

Por todo o exposto, diante do estudo perpetrado na doutrina,

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jurisprudência e teor normativo, infere-se que são dois os embasamentos

principais para denegação do acréscimo de 25%, contido no art. 45 da Lei nº

8.213/91, sendo o primeiro a literalidade da norma, pois o citado dispositivo

legal dispõe que o acréscimo em apreço limita-se ao benefício previdenciário

de aposentadoria por invalidez; o segundo critério, dominante para a negativa é

a ausência de precedência de fonte de custeio, exposta no art. 195, §5º, da

Constituição Federal.

Por conseguinte, somente é plausível a majoração de benefícios

previdenciários regrados por lei, vedada a interpretação analógica ou

extensiva, em acatamento aos princípios da precedência da fonte de custeio,

legalidade, equilíbrio financeiro e atuarial e separação de poderes, todos ora

analisados, proibindo-se, portanto, a extensão aos aposentados por idade,

tempo de contribuição e na modalidade especial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo revelou que o tema explicita variadas possibilidades

de solução, impondo-se aprofundamento e reflexão, notadamente no que

concerne à ausência de jurisprudência consolidada sobre o tema e à

indispensabilidade de conferir-se segurança jurídica aos titulares de

aposentadoria.

Portanto, conclui-se que a luz dos princípios constitucionais estudados –

da dignidade da pessoa humana e da isonomia - é de enorme valia o

deferimento do adicional de 25% aos demais aposentados, uma vez que há

ofensa direta ao princípio da isonomia, de sorte que não há diferença entre o

aposentado por invalidez que precisa do cuidado ininterrupto de um terceiro e

de outro aposentado por idade, tempo de contribuição ou na modalidade

especial, que sofre de uma doença diagnosticada posteriormente e que

necessite do mesmo auxílio de outrem.

A elaboração de uma solução para a lacuna legislativa urge para a

manutenção do bem-estar social, devendo-se empregar, destarte, os princípios

fundamentais da Constituição Federal de 1988, bem como os fundamentos da

própria Previdência Social. Repise-se, é admissível uma interpretação

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extensiva do adicional aos demais segurados, independentemente da espécie

de aposentadoria recebida, quando preenchido o requisito da necessidade de

assistência permanente de outra pessoa, fazendo jus o segurado ao

recebimento do acréscimo, pois entendimento reverso violaria o princípio da

dignidade da pessoa humana e da igualdade, colocando em ameaça a garantia

das condições existenciais mínimas.

Por fim, como medida e solução viável merecem ser apontados a

necessidade de enfrentamento da celeuma no âmbito do Supremo Tribunal

Federal, bem como a existência do Projeto de Lei nº 493/2011, em trâmite no

Senado Federal, de autoria do Senador Paulo Paim, remanescendo, dessa

maneira, o aguardo da evolução jurisprudencial, singularmente no âmbito das

Cortes Superiores, além do prosseguimento da proposição legislativa, que

poderá assegurar expressamente o direito controvertido tema deste trabalho,

suprindo as dúvidas e as omissões hoje existentes, conferindo o adicional

presente no art. 45 da Lei nº 8.213/41 aos demais segurados aposentados que

não sejam beneficiários da aposentadoria por invalidez.

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FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA COMO GARANTIA DA TUTELA DO DIREITO DA

PERSONALIDADE DO FILHO E DA IGUALDADE JURÍDICA

Melissa Mariano Ribeiro – [email protected] Mariana Botasso Costa - [email protected]

Graduandas em Direito - UniSALESIANO Lins Prof.ª Ma. Meire Cristina Queiroz - [email protected]

Docente - UniSALESIANO Lins

RESUMO

A presente pesquisa, utilizando o procedimento da pesquisa bibliográfica, se propõe a estudar a filiação socioafetiva, com suas atuais implicações no Sistema Jurídico Brasileiro, e com principal foco na igualdade jurídica entre os filhos. A problemática envolve a relevância da possibilidade de se estabelecer a relação jurídica entre pais e filhos, reconhecimento dos direitos à filiação, bem como os pais afetivos deixarem para seus ”filhos de afeto” a herança, apesar de não existir nenhum vínculo jurídico formal entre eles, como o registro de nascimento. Analisando-se a legislação vigente verifica-se que o artigo 1.593 do Código Civil abriu uma brecha para o reconhecimento da filiação socioafetiva quando faz referência ao parentesco de outra origem, para, então concluir-se pelo reconhecimento da filiação socioafetiva como legítima e garantir os direitos filiais dela decorrentes.

Palavras-chave: Socioafetividade. Filiação. Direito da Personalidade. Igualdade. Afeto.

INTRODUÇÃO

Atualmente os parâmetros definidores da família estão em constante

evolução, fazendo com que valores e princípios, existentes há um tempo,

passem a ser debatidos ou rediscutidos por já não mais atender ao que

permeia e anseia a sociedade atual. Conceitos e valores no Direito de Família

passaram a ser ampliados, pois antes o que se levava em consideração era

somente o fator biológico como formador da família; agora, o principal é o valor

do afeto entre pais e filhos e demais membros da família.

Na atual sociedade, crises conceituais nas famílias estão cada vez mais

constantes em razão dos novos arranjos familiares e de novas posições na

conjugalidade e na parentalidade, fazendo com que as Varas de Família

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estejam congestionadas e tratando do assunto, que serve de base para a

sociedade, com lentidão.

O ditado popular de que “pai é quem cria” ganhou tamanha força que fez

com que a afetividade entre pais e filhos se colocasse em um patamar maior

que o biológico. Diante do conceito de pai e filho ou de família, é fundamental e

necessário abrir um espaço para se tratar da relação socioafetiva entre ambos,

que está se tornando um vínculo comum em nossa sociedade.

Busca-se analisar o reconhecimento da paternidade e maternidade

socioafetivas, a legislação que abrange o tema e a aplicação prática que se dá

atualmente em nossa sociedade e, sobretudo, nas decisões judiciais.

É necessário analisar os direitos, deveres e conflitos que envolvem esta

relação entre pai e filho afetivo, ressaltando os impactos sociais, emocionais e

abrangendo o aspecto patrimonial do direito de herança do filho socioafetivo.

Para tanto, o trabalho será divido em três itens. No primeiro item far-se-á

uma análise sobre o conceito, espécies de filiação e princípios constitucionais

que norteiam o assunto. No segundo item, será analisado e discutido o e

conhecimento do valor do afeto e, no terceiro item abordar-se-á sobre o

reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva e os direitos inerentes a ela,

como a certidão de nascimento e a herança.

OBJETIVOS

A pesquisa tem por objetivo mostrar a importância do afeto na relação

entre pais e filhos, analisando que essa passou a ser essencial não só para o

convívio familiar, mas para a formação da própria família, e até mais importante

que a relação biológica. Passando este afeto a ser um dos mais relevantes

princípios do Direto de Família. No caso da filiação socioafetiva o principal é o

sentimento de afeto que é firmado entre pai e filho ao longo da vida e perante

todos.

Especificadamente, é também objetivo neste projeto mostrar que o afeto

deve refletir sobre o direito do filho, que faz com que este passe a ser

recebedor dos direitos inerentes à filiação legítima, como a herança, bem como

ter todos os direitos de um filho biológico, como ser reconhecido como tal

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perante a sociedade.

Enfim, será demonstrado que sendo o assunto tratado com mais rigor

nas Varas de Família, descongestionara o Judiciário e com isso terá maior

agilidade nos processos de filiação socioafetiva.

Em uma primeira análise, verificando-se a legislação vigente, conclui-se

que o artigo 1.593 do Código Civil abriu uma brecha para o reconhecimento da

filiação socioafetiva quando faz referência ao parentesco de outra origem, para,

então concluir-se pelo reconhecimento da filiação socioafetiva como legítima e

garantir os direitos filiais dela decorrentes.

METODOLOGIA

Na presente pesquisa optou-se pelo método dedutivo e da pesquisa

qualitativa e descritiva, através do levantamento bibliográfico e da coleta e

análise de dados. Fazendo o levantamento através da legislação brasileira,

jurisprudências, doutrinas, livros, artigos científicos e publicados na internet.

1 FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL DO DIREITO À FILIAÇÃO

1.1 Conceito de Filiação e espécies reconhecidas no Direito de Família

O conceito de filiação anda em constante mudança devido à evolução

das famílias brasileiras e não está expressamente presente em nosso

ordenamento jurídico, cabendo aos doutrinadores conceituarem. Segundo

Maria Helena Diniz, (2004, p.396) “Filiação é o vinculo existente entre pais e

filhos”. Portanto, a filiação é a relação social, a dependência, o vínculo afetivo

que existente na relação entre pais e filhos, sendo esses por consanguinidade,

como ascendente e descendente ou por afetividade, que se da pela relação e o

afeto existente entre ambos.

O Código Civil de 2002 não dispõe expressamente a respeito da filiação

socioafetiva, apesar de a afetividade ser a principal relação que une pais e

filhos. De acordo com o art. 1.593, C.C “o parentesco é natural ou civil,

conforme resulte de consangüinidade ou outra origem”.

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Em sequência, o art. 1.596, C. C. dispõe que “os filhos, havidos ou não

da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e

qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à

filiação”. Hoje em dia, a filiação pode ser biológica ou consanguínea, ou

socioafetiva, caracterizada pela adoção ou por inseminação artificial.

1.2 Princípios constitucionais que fundamentam o direito de filiação

Conforme versa Flávio Tartuce (2014, p.41), “O Direito de família vem

passando por profundas transformações estruturais, diante de novos princípios

que são aplicáveis a esse ramo jurídico, alguns de índole constitucional”. A

Constituição Federal de 1988 trouxe consigo princípios e direitos para proteger

o direito de filiação e o direito de família como um todo.

1.2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, institui o Estado

Democrático de Direito, o qual traz consigo o principio da dignidade da pessoa

humana. De acordo com Maria Berenice Dias (2009, p. 61-63) “Na medida em

que a ordem constitucional elevou a dignidade da pessoa humana a

fundamento da ordem jurídica, houve uma opção expressa pela pessoa,

ligando todos os institutos a realização de sua personalidade”.

Segundo Flávio Tartuce (2014, p. 7) “a dignidade da pessoa humana é

algo que se vê nos olhos da pessoa, na sua fala e na sua atuação social, no

modo como ela interage com o meio que a cerca”. Este princípio possui um

valor supremo que visa à proteção e defesa dos direitos fundamentais da

pessoa humana, que está totalmente presente no Direito de Família. A família

merece a proteção da Constituição, tanto as relações de sangue como as

afetivas, para o desenvolvimento de seus membros.

1.2.2 Principio da afetividade

O afeto é um princípio presente e um dos mais relevantes para o Direito

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de Família. Flávio Tartuce (2014, p.25) enaltece que, “apesar da falta de sua

previsão legal expressa na legislação, percebe-se que a sensibilidade dos

juristas é capaz de demonstrar que a afetividade é um principio do nosso

sistema”.

Conforme versa Maria Berenice Dias (2015, p. 52): “A afetividade é o

princípio que fundamenta o Direito de Família na estabilidade das relações

socioafetivas e comunhão de vidas, como primazia em face de considerações

de caráter patrimonial ou biológico”. É principalmente levada em consideração

a prioridade da criança e o adolescente terem um convívio familiar.

1.2.3 Principio do melhor interesse da criança e do adolescente

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, caput prevê o

princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. De acordo com este

artigo:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O art. 3º do ECA dispõe que as crianças e os adolescentes devem ter

seus direitos fundamentais, sem prejuízo de sua proteção integral. Este

principio traz com ele os cuidados para viver da melhor maneira, cujos

interesses são dos pais, mas sem esquecer do Poder Público. Portanto, o

Direito de família deve valorizar e proteger o interesse dos menores com seus

direitos fundamentais, não importando se trata de filiação biológica ou

socioafetiva, para favorecer no seu desenvolvimento.

1.2.4 Principio da proteção integral da criança e do adolescente

Tal princípio tem previsão legal no art. 227, caput, CF/88, assim como

no art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8069/90. Essa

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proteção se faz importantíssima, visto que crianças e adolescentes são sujeitos

em desenvolvimento. A Constituição Federal 1988 e o Estatuto da Criança e do

Adolescente visam à proteção integral da criança e do adolescente, dispondo

que é dever da família, da sociedade e do Estado protegê-las. De acordo com

o artigo 3° do Estatuto da Criança e do Adolescente,

Art. 3°. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

1.2.5 Princípio da igualdade jurídica entre os filhos

Não há que se falar em distinção entre os filhos, seja consangüíneo ou

não, todos devem ser reconhecidos igualmente, sem privilégios e prioridades.

De acordo com o artigo 227, §6.º da C.F/88, é proibido estabelecer qualquer

diferença entre os filhos havidos durante ou fora do casamento, mesmo que

seja adotivo, assegurando-lhes seus direitos e qualificações: “os filhos, havidos

ou não da relação de casamento, ou por adoção

terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações

discriminatórias relativas à filiação”. Conforme Flávio Tartuce (2014, p.15):

Está superada, nessa ordem de ideias, a antiga discriminação de filhos que constava da codificação anterior, principalmente do art.332 do CC/1916, cuja lamentável redação era a seguinte: “O parentesco é legítimo, ou ilegítimo, segundo procede, ou não de casamento; natural, ou civil, conforme resultar de consanguinidade, ou adoção”.

Portanto, deve-se reconhecer os princípios constitucionais no Direito de

Família, pois ambos estão interligados e devem basear e valorizar as famílias

brasileiras atuais. Tais princípios devem assegurar o direito de todos a ter uma

convivência em família saudável e ter o direito a felicidade.

2 A AFETIVIDADE COMO PRINCIPAL REQUISITO PARA A

EXISTÊNCIA DA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

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Nos dias de hoje, não é mais possível fixar um único modelo de família e

um único modo de constituí-la. Com a existência de novos modelos de família,

a única coisa que é igual para todas e uniforme, é o afeto, o principal requisito

para a existência das famílias.

Conforme versa Flávio Tartuce (2014, p.24) “o afeto talvez seja

apontado, atualmente, como o principal fundamento das relações familiares”.

Sendo assim, a entidade familiar está hoje diretamente ligada com a

efetividade, visando promover a dignidade e realização pessoal de seus

membros.

2.1 Reconhecimento da família de afeto

O afeto é uma manifestação de um sentimento bom por alguém. De

acordo com Maria Berenice Dias (2016, p. 84), “O termo affectio societatis,

muito utilizado no direito empresarial, também pode ser utilizado no direito das

famílias, como forma de expor a ideia da afeição entre duas pessoas para

formar uma nova sociedade: a família.” No direito de família, afeto é o laço que

faz a união entre a família, fazendo com que essa se considere por esse afeto

uma instituição familiar, como todas as outras. Segundo Maria Berenice Dias

(2016, p.14):

É o envolvimento emocional que subtrai um relacionamento do âmbito do direito obrigacional - cujo núcleo é a vontade - e o conduz para o direito das famílias, cujo elemento estruturante é o sentimento de amor, o elo afetivo que funde almas e confunde patrimônios, fazendo gerar responsabilidades e comprometimentos mútuos.

Pode-se dizer, então, que o afeto é um sentimento de carinho e ternura

na relação entre pais e filhos socioafetivos. Muitos são os fatores que fizeram a

mudança do reconhecimento jurídico do afeto, alguns deles são: A mudança da

postura da mulher, participando agora no trabalho e na economia da casa, as

mudanças na vida humana decorrentes do trabalho, à urbanização, aos

avanços científicos no campo do exercício da sexualidade, entre outros fatores,

impuseram mudanças na função e na concepção das novas famílias.

O art. 1.593 do Código Civil traz a possibilidade de vários tipos de

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filiação, mencionando que o parentesco pode derivar do laço de sangue, da

adoção ou de outra origem, podendo se estender a aplicação da afetividade.

Segundo Flávio Tartuce, “apesar da falta de sua previsão expressa na

legislação, percebe-se que a sensibilidade dos juristas é capaz de demonstrar

que a afetividade é um princípio do nosso sistema”.

Em relação à paternidade socioafetiva, ainda há muita discussão na

justiça brasileira para analisar o caso concreto, fazendo com que os princípios

constitucionais amparem o Direito de Família.

2.2 A Igualdade de Direitos de uma família biológica para uma família

socioafetiva

Com a mudança na formação das famílias brasileiras, surgiram diversas

modalidades de família para adaptar-se à sociedade, como já verificamos.

Através disto, veio à tona a modalidade de família que é constituída pelo afeto.

Hoje em dia, em nossa sociedade, há várias discussões a respeito da

igualdade entre a família biológica e a socioafetiva. É necessário que ambos

sejam tratados de forma igualitária.

Tudo o que for feito com o filho biológico, deve ser feito também com o

filho afetivo. Todos os direitos e deveres devem ser os mesmos para ambos,

sem quaisquer formas de distinção. Deve-se priorizar o bem de todos.

A família socioafetiva não pode sofrer injustiças pelo fato de o nosso

ordenamento jurídico não reconhecer explicitamente este tipo de filiação.

Conforme Maria Berenice Dias (2016, p. 85):

O princípio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais. O sentimento de solidariedade recíproca não pode ser perturbado pela preponderância de interesses patrimoniais.

Portanto, os princípios constitucionais que baseiam a afetividade devem

ser respeitados para se adaptar ao modelo de família, em que o que mais se

preza são os laços afetivos. Devem ser assegurados os direitos fundamentais a

ambos os filhos, biológicos e afetivos, com igualdade, para que todos tenham

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uma convivência familiar pacifica.

3 OS DIREITOS DECORRENTES DO RECONHECIMENTO DA

FILIAÇÃO SOCIOAFETIVA: PROTEÇÃO INTEGRAL À FAMÍLIA E

AOS FILHOS MENORES

A parentalidade registral dá-se com o registro de nascimento do filho,

além de poder ser através de escritura pública, documento particular,

testamento, além de declarar a paternidade diante do juiz. De acordo com

Maria Berenice Dias (2016, p.668):

Embora o valor do liame registral, hoje, seja inferior ao valor do liame socioafetivo, ainda é a principal fonte de direitos e deveres: gera dever de alimentos e de mútua assistência, alicerça o direito sucessório e as limitações legais que regulam os atos jurídicos entre ascendentes e descendentes.

Na filiação socioafetiva há o reconhecimento da posse de estado de filho

baseado na afetividade, que possui valor jurídico. Segundo versa Maria

Berenice Dias (2016, p. 679):

Em matéria de filiação, a verdade real é o fato de o filho gozar da posse de estado. Esta é a prova o vínculo parental. Não é outro o fundamento que veda a desconstituição do registro de nascimento feito de forma espontânea por aquele que, mesmo sabendo não ser o pai consanguíneo, tem o filho como seu.

Verifica-se que, nas palavras de Maria Berenice Dias, o registro do filho

socioafetivo poderá ser feito no Cartório de Registro Civil, dispensando-se a

necessidade de entrar com ação judicial para que seja feito tal reconhecimento,

porém, só em alguns estados. Ainda, a mesma dispõe que “É autorizado o

reconhecimento espontâneo da filiação socioafetiva se não existe paternidade

registral. Basta a anuência, por escrito, do filho maior de idade” (DIAS, 2016,

p.680).

3.1 A situação jurídica do filho socioafetivo e o princípio da igualdade

jurídica: os direitos e a proteção da filiação socioafetiva

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A filiação socioafetiva é reconhecida e considerada como parentesco

civil, nos termos do art. 1.593 do Código Civil, na expressão “outra origem”: “O

parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra

origem”. A filiação socioafetiva e a biológica trazem o principio da igualdade

jurídica à tona. Ambas as filiações possuem igualdade jurídica entre si. Para

que tenha efeitos jurídicos, a filiação socioafetiva deve ser reconhecida por

sentença, assim que for provado o afeto existente entre ambos.

Conforme Maria Berenice Dias (2016, p.678). “A consagração da

afetividade como direito fundamental subtrai a resistência em admitir o elo

afetivo na relação com os pais e filhos”.

Para se estabelecer a filiação o que deve ser levado em conta é

realmente o sentimento de paternidade que se desenvolve entre o pai e o filho,

o que a afetividade leva em consideração não é somente o vínculo biológico

sem nenhum tipo de cuidado, mas leva-se em consideração aqueles pais ou

mães que apesar de não ter gerado biologicamente, tem os cuidados e

deveres perante o filho que lhe são trazidos no Art. 1634, Seguintes, CC.

Assim estabelecendo a filiação e consequentemente o poder familiar.

Ao reconhecer a paternidade, assumiu o pátrio poder e com ele todos os

encargos decorrentes. Pelo princípio da igualdade entre os filhos, o direito ao

sobrenome se faz também necessário ao filho de afeto, pois se o filho biológico

faz jus ao direito ao sobrenome, o filho socioafetivo também terá.

Tanto que, os efeitos jurídicos da socioafetividade são idênticos aos

efeitos gerados pela adoção, dispostos nos artigos 39 a 52 do ECA, quais

sejam: a) a declaração do estado de filho afetivo; b) a feitura ou a alteração do

registro civil de nascimento; c) a adoção do sobrenome dos pais afetivos; d) as

relações de parentesco com os parentes dos pais afetivos; e) a

irrevogabilidade da paternidade e da maternidade sociológicos; f) a herança

entre pais, filhos e parentes sociológicos; g) o poder familiar; h) a guarda e o

sustento do filho ou pagamento de alimentos; i) o direito de visitas, entre

outros.

Disposto na letra “C” o direito ao sobrenome é um importante direito que

faz com que esse filho se sinta ainda mais parte da família e o seu bem-estar

perante a sociedade só melhore.

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Verificando-se o art. 52, do ECA, o direito a alimentos ao filho adotado,

faz com que se equipare ao filho socioafetivo. Os alimentos são necessários

para o desenvolvimento físico e psicológico dos filhos, e esse é consequência

do poder familiar, que engloba o dever de sustento deste filho, Art. 1634, e

seguintes, CC.

Atualmente, há muita controvérsia que diz respeito ao direito a herança

ao filho socioafetivo. Há correntes contrárias a este possível direito de herança

e correntes a favor deste direito, visto que se fosse dado ao filho socioafetivo,

estaria contrariando o princípio da igualdade e da isonomia entre os filhos

biológicos e socioafetivos de acordo com o art. 277, § 6º da Constituição

Federal, que proíbe qualquer distinção entre os filhos.

Com a evolução da família socioafetiva ficou mais visível a isonomia no

tratamento dos filhos. Entretanto, a questão referente ao direito patrimonial, ou

seja, direito de herança, não está explicitamente disposto e normatizado,

fazendo com que o direito de passar ou não a herança ao filho socioafetivo

dependerá do juiz aliado ao seu bom senso ao caso concreto.

3.2 O reconhecimento do vínculo biológico ante a paternidade

socioafetiva

Em referência a paternidade biológica, o que se leva em conta é

unicamente o vínculo sanguíneo, que se faz pela gestação, não importando os

cuidados e deveres posteriores a isso.

Já se fazendo um comparativo entre a paternidade socioafetiva, esta

não se leva em consideração o sangue, mas sim aquele, que tem os cuidados,

protege a criança e tem todos os deveres para com ela. Criando-se perante a

família e a sociedade, uma paternidade socioafetiva. Portanto, o critério da

socioafetividade deve prevalecer na hipótese de confronto com o biológico.

Para que a paternidade socioafetiva seja reconhecida, deve haver a

existência de um reconhecimento social deste tipo de família e a existência do

afeto, que é o principal aspecto da filiação socioafetiva. A partir do momento

em que a filiação socioafetivo é reconhecida, seus efeitos e seus direitos

deverão permanecer. Os direitos são decorrentes do reconhecimento do ato

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jurídico e assim, poderão os filhos socioafetivos realmente desfrutar de seus

direitos, assim como os filhos biológicos.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão, em sessão no Plenário, em 21

de setembro de 2016, entendeu que a paternidade socioafetiva não exime de

responsabilidade o pai biológico. Para o relator do RE 898060, ministro Luiz

Fux (BRASIL, 2016), o princípio da paternidade responsável dispõe que, tanto

os vínculos de filiação biológica ou socioafetiva, devem ser acolhidos pela

legislação.

Portanto, diante o exposto, não há impedimento que ambas as formas

de paternidade, biológica ou socioafetiva, sejam reconhecidas conjuntamente,

sendo necessário, porém, o interesse do filho.

RESULTADOS

Com as mudanças do conceito de família, na atualidade, muitas

relações entre pais e filhos são constituídas tendo como base o afeto, através

da convivência familiar, se sobrepondo às relações consanguíneas. Pai afetivo

é considerado aquele que tem a função de agir como pai na vida de um filho de

afeto, com demonstrações de carinho, cuidado, respeito, educação, que

enlaçam essa relação com reciprocidade, que são aspectos imprescindíveis

para a concepção de família.

O vínculo biológico é substituído pelo laço afetivo, o qual é caracterizado

por uma relação com zelo e assistência para o bem-estar de ambos, formados

ao longo da vida. É de extrema importância que a relação afetiva também se

torne juridicamente mais relevante, de modo a garantir o direito de convívio

familiar, fator preponderante na formação do caráter e educação da criança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da pesquisa realizada compreendeu-se a importância deste

modelo de família socioafetiva para o amparo de muitas crianças e jovens, já

que o laço entre pais e filhos já é existente, não necessitando passar por

órgãos de adoção formal, pois já se encontra em poder e afeto desta nova

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família, que apesar de não existir de fato uma certidão que comprove essa

paternidade ou o laço sanguíneo que o faça ser biológico, existe o mais

importante que é a afetividade, que os faz ser uma família com valor tão

importante como se biológico fosse.

Conforme demonstrado no trabalho o valor da filiação socioafetiva,

verificou-se a importância de firmar novos parâmetros para a família brasileira e

como o tema deve ser tratado nas Varas de Família, para que diminua o tempo

de espera das partes interessadas no processo, e que os direitos inerentes à

filiação socioafetiva sejam expressamente reconhecidos em nosso

ordenamento jurídico brasileiro, para que todos aqueles que tem uma família

formada por laços afetivos tenho seus direitos e deveres efetivamente firmados

e garantidos, para que realmente haja igualdade jurídica entre a filiação

biológica e a filiação socioafetiva.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1998). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. Disponível em Erro! A referência de hiperlink não é válida.. Acesso em 14 de outubro de 2016. BRASIL. Código Civil (Lei nº 10.406/2002). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acessado em: 20 de maio de 2017. BRASIL, Supremo Tribunal Federal. RE 898060, ministro Luiz Fux, 2016. Disponível em: <http:\www.stf.jus.br>. Acesso em 05 Mai 2017. DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. São Paulo: Saraiva, 2016. MADALENO, Rolf. Revista Brasileira de Direito de Família n 37, 2006, p. 148. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil Direito de Famílias. As famílias em Perspectiva Constitucional. Volume VI. São Paulo: Saraiva, 2011. TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito de Família. 8. ed. v. 5. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2013.

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O CASAMENTO DO MENOR DE DEZESSEIS ANOS E A REFORMA PENAL

DE 2005: Conflito de Leis e seus Reflexos no Direito de Família com

Impacto na Convivência Familiar

Ana Carolini Bezerra Gomes – [email protected] Tamiris da Silva Alves – [email protected]

Graduando em Direito – UniSALESIANO Lins Prof.ª Ma. Meire Cristina Queiroz – [email protected]

Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente trabalho busca verificar se o art. 1.520 do Código Civil ainda possui eficácia e se tem possibilidade de aplicação nos dias atuais face à grande discussão na doutrina circunda sobre sua revogação tácita. O art.1.520 do Código Civil trata, de forma excepcional, a capacidade para o casamento de menores de dezesseis anos, sendo a primeira delas quando houver gravidez, e a segunda para evitar imposição de pena ou sanção criminal. No entanto, duas legislações penais supervenientes à legislação civil trouxerem mudanças significativas com reflexos no Direito de Família: a primeira delas pela Lei nº 11.106/2005, e a segunda pela Lei nº 12.015/2009. Vale ressaltar que este trabalho não visa tratar a mulher como uma excludente de punibilidade ou mascarar situações violadoras de direitos, mas sim demonstrar situações que desprotegem o instituto família, principalmente o direito fundamental à convivência familiar. Utilizou-se o método dedutivo e da pesquisa qualitativa e descritiva, por meio da pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: Direito de Família. Conflito de Lei. Revogação Tácita. Capacidade para o casamento. Direito à Convivência Familiar.

INTRODUÇÃO

O trabalho de pesquisa tem como finalidade investigar a possibilidade da

aplicação da norma do artigo 1.520 do Código Civil que trata do casamento

daquele que ainda não completou a idade núbil, em virtude das mudanças

trazidas pelas legislações supervenientes, Lei nº 11.106/2005 e Lei Nº

12.015/2009. A primeira delas, a Lei n° 11.106/2005, que revogou os incisos

VII e VIII do art. 107 do atual Código Penal, que previam a possibilidade do

casamento da vítima com o autor do crime contra os costumes para extinguir a

punibilidade do agressor. A segunda Lei nº 12.015/2009 alterou completamente

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os crimes contra os costumes, hoje em dia conhecidos como crimes contra a

liberdade sexual, estabelecendo a violência presumida (art. 217-A), que trata

do estupro de vulnerável.

Nestas considerações preliminares reside a preocupação com a nova

interpretação que se faz quanto ao casamento do menor de dezesseis anos

quando resultar gravidez ou para evitar imposição de sentença penal

condenatória diante da prática de crime contra os costumes, vez que o art.

1.520 do Código Civil trata essa situação com excepcionalidade para autorizar

o casamento dos menores impúberes.

Diante da nova ordem penal estabelecida a partir das Leis nº

11.106/2005 e nº 12.015/2009, não mais constitui como causa de extinção de

punibilidade o casamento do autor do crime com a vítima nos crimes contra os

costumes. Sendo assim, mesmo que se estabeleça um vínculo de afeto entre

ambos e resulte em casamento, formando-se família, o autor da prática do

crime responderá por ele condenado por sentença penal, residindo ai a

problemática do casamento e do direito à convivência familiar.

Também não há que se pensar que o casamento seria uma excludente

criada pelo Código Civil, sendo necessária uma análise minuciosa a

aplicabilidade dessa norma em vista do grande número de casos de pedofilia, o

que estaria então vinculando à aplicação dessa norma à vontade do casal, isto

é, ambos devem ter vontade de legalmente constituir uma família, cabendo

destacar nesta parte o princípio da afetividade.

OBJETIVOS

O problema de pesquisa apresentado deve guiar sua solução à luz da

aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, pois com uma

análise minuciosa e cuidadosa da situação estudada, o direito estaria

desprotegendo e desestabilizando as relações jurídicas estabelecidas com a

criação de uma família pelo casamento, ao se aplicar a sanção penal,

ocasionando consequências desfavoráveis aos envolvidos na relação amorosa,

privando-os do direito à convivência familiar.

Nesse sentido, tendo como base o método dedutivo e qualitativo, com o

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levantamento da pesquisa bibliográfica, se estará analisando os princípios

constitucionais do Direito de Família, as formalidades para o casamento em

busca de uma nova interpretação da norma civil em razão das necessidades

das relações contemporâneas, utilizando como base doutrina e jurisprudência.

Diante dos fatos aqui apresentados surgem alguns questionamentos: 1)

A norma civil estaria sem efeito em vista da sua impossibilidade de aplicação

jurídica? 2) Estaria o Direito Civil mitigado à norma do Direito Penal? 3) A

imposição da pena ou seu cumprimento seria a melhor solução para o caso

concreto? 4) O operador do direito poderá oferecer uma nova interpretação

para a norma, em vista das necessidades do caso concreto? 5) Se houvesse a

imposição de pena ou seu cumprimento, qual seria a proteção que o Direito

daria ao outro membro da relação?

METODOLOGIA

Na presente pesquisa optou-se pelo método dedutivo e da pesquisa

qualitativa e descritiva, através do levantamento bibliográfico e da coleta e

análise de dados. Fazendo o levantamento através da legislação brasileira,

jurisprudências, doutrinas, livros, artigos científicos e publicados na internet.

1 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DA FAMÍLIA E AS

FORMALIDADES DO CASAMENTO

Serão expostos os aspectos constitucionais do Direito de Família,

apresentando de forma sintética princípios constitucionais que fundamentam

esse ramo do Direito, fazendo-se também uma reflexão sobre as formalidades

para o casamento, envolvendo a capacidade e requisitos.

2 A REFORMA PENAL DE 2005 E SEUS REFLEXOS NO CASAMENTO

DE MENORES DE 16 ANOS

Será investigado sobre a nova interpretação da norma civil à luz dos

princípios constitucionais que regem o Direito de Família e a hermenêutica que

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envolve a atual eficácia e aplicação do art. 1.520, que trata da exceção para o

casamento dos menores de dezesseis anos, face às mudanças trazidas pelas

Leis nº 11.106/2005 e nº 12.015/2009, e seu reflexo no direito à convivência

familiar.

RESULTADOS PRELIMINARES

Nas considerações preliminares reside a preocupação com a nova

interpretação que se faz quanto ao casamento do menor de dezesseis anos

quando resultar gravidez ou para evitar imposição de sentença penal

condenatória diante da prática de crime contra os costumes, vez que o art.

1.520 do Código Civil trata essa situação com excepcionalidade para autorizar

o casamento dos menores impúberes.

Como resultado preliminar tem-se a conclusão que a

constitucionalização do Direito de família e a valoração a afetividade dá ensejo

a aplicação da norma do art. 1520 do Código Civil, uma vez que se busca

preservar o convívio familiar, evitando assim uma situação de desamparo do

filho.

REFERÊNCIAS

BARROS, Sérgio Resende. Direitos humanos e direito de família, Agosto de 2003. Disponível em: <http://www.srbarros.com.br/pt/direitos-humanos-e-direito-de-familia.cont > Acesso em Out 2016. COSATO, Paulo. A vigência do art. 1.520 do c.c. após a lei 11.106/2005. Revogação ou não da extinção da punibilidade, através do casamento, em casos de estupro de vulnerável, Fevereiro de 2010. Disponível em:<http://www.webartigos.com/artigos>. Acesso em Out 2016. GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo Filho. Direito Civil - direito de família. V. 6. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro - vol.1 – Parte Geral, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Lei 13.146 acrescenta novo conceito para capacidade civil. Revista Consultor Jurídico. Publicado em: 10. ago.2015. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015>. Acesso em Ago 2017.

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O CRIME DE PARTICIPAÇÂO EM SUICÍDIO E A INFLUÊNCIA DOS MEIOS

DE COMUNICAÇÃO DE MASSA

Julia Neves Miranda - [email protected] Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Pedro Lima Marcheri – [email protected] Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente artigo tem a pretensão de abordar o suicídio, e o crime de participação em suicídio tipificado no artigo 122 do código penal. Elucida-se a caracterização do crime de participação de suicídio, apontando os verbos penais e o bem jurídico tutelado. Em seguida, traça-se um paralelo entre o crime por influência de meios virtuais e seus influxos na realidade objetiva contemporânea. Têm-se por objetivo verificar como alguns meios de comunicação podem indiretamente ou diretamente induzir o indivíduo, na maior parte jovens, a tirar a própria vida. Concluiu-se que o crime de participação em suicídio adquire novas formatações diante da realidade atual, principalmente em virtude dos valores e dinâmicas oriundos dos meios de comunicação em massa e da rede mundial de computadores.

Palavras-chave: Suicídio. Participação em suicídio. Influência da Tecnologia. Internet.

INTRODUÇÃO

Este estudo visa, em um primeiro momento, aclarar os principais

atributos do crime de participação em suicídio, em especial o objetivo da

criminalização deste ato e a conceituação dos sujeitos do tipo. Em seguida,

articular o artigo 122 do código penal com a realidade objetiva em que há

grande influência das mídias de massa e da Internet.

O ato de tirar a própria vida não é criminalizado pelo direito penal

brasileiro, portanto, a tentativa de suicídio é considerada um indiferente penal.

Não obstante, o Código Penal prevê o crime de participação em suicídio

conceituado como o ato de induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou então

prestar auxílio para que o faça, verbos penais que serão analisados

posteriormente.

A legislação brasileira tem por intuito e política criminal a não punição

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do suicida, mas sim, demonstrar solidariedade ao indivíduo, posto que, esse

fenômeno é resultado de uma complexidade de fatores psicológicos, e pode

ser considerado como uma espécie de escape da vítima a situações que lhe

são aversivas, ou até mesmo uma forma de se comunicar. O ato punível é a

participação de um indivíduo no suicídio, com o objetivo de estimular o outro a

tirar sua própria vida. Defende-se a punição para o agente, visto que, é de sua

competência que ao observar um indivíduo com a intenção suicida, lhe preste

auxílio e não que o influencie a cometer o ato, de fato.

O suicídio, para Durkheim (1897) seria “todo o caso de morte que

resulta, direta ou indiretamente, de um ato, positivo ou negativo, executado pela

própria vítima, e que ela sabia que deveria produzir esse resultado”. Ou seja, as

ações ou omissões de um indivíduo a fim de alcançar um objetivo final, qual

seja, a sua própria morte.

A onda de suicídios no Brasil é progressiva e preocupante, leva-se a

questionar os motivos pelos quais os jovens estão dispostos a tirar a própria

vida. No momento atual, muitos casos apresentam possíveis ligações com o

jogo “Baleia Azul”, que se baseia na relação entre os desafiantes e os

curadores, tendo em vista o objetivo final de levar o participante a tirar a própria

vida. A abordagem para que o indivíduo comece a participar é feita através da

veiculação de um convite, geralmente, por meio de aplicativos com acesso à

Internet. O jogo apresenta 50 desafios, sendo que alguns deles colocam em

risco a vida e a integridade física do indivíduo. A proposta para entrar no jogo

acompanha uma ameaça, se a vítima bloquear ou ignorar a mensagem o

“administrador” descobrirá seus dados. As vítimas geralmente são crianças,

adolescentes, sendo mais suscetíveis a influências do gênero.

Além disso, a série “13 reasons why” também se mostrou polêmica.

Retrata no campo artístico o suicídio de uma jovem de dezessete anos, que

após sofrer diversos tipos de situações desfavoráveis como a divulgação de

imagens constrangedoras, bullying e estupro, encontra no suicídio a saída para

esses problemas por ela considerados insolúveis. Antes de cometer o ato

suicida, a protagonista grava uma série de fitas cassete, contendo nelas os

treze motivos que a levaram a tomar essa decisão. Apesar de aclarar a

existência de um problema real, a trama de certo modo glorifica o ato e peca na

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romantização de um assunto que pode influenciar jovens que estão passando

pela mesma situação a reconhecerem-se na personagem, e à considerarem

que essa seja realmente a única saída, assim como na série. Ao dar

protagonismo a um ambiente e toda uma seara de relacionamentos e conflitos

gerados a partir do ato suicida, dá-se gênese a uma indevida valorização ou

apologia deste.

OBJETIVOS

O presente trabalho científico tem por intento tratar do suicídio, do crime

de participação de participação em suicídio e como essa problemática coincide

em nossa sociedade, correlacionando dessa forma o crime com a influência da

informação.

Caracterizar o crime de participação em suicídio, bem como definir e

analisar os verbos dos tipos e observar a ocorrência do suicídio na sociedade

brasileira, examinar se, a informação pode ter influência na conjunção do

suicídio, citar e conceituar os meios que hoje, podem ter relação com o

fenômeno, e se estes podem ser considerados crime.

METODOLOGIA

A pesquisa será elaborada por meio da análise crítica da literatura penal

e da jurisprudência pertinente ao caso, estudando os respectivos influxos na

criminalização da apologia ao suicídio.

1 CARACTERIZAÇÂO GERAL E ELEMENTOS DO CRIME

São três os verbos penais que traduzem as ações que caracterizam o

crime. O induzimento, ato ou efeito de induzir, trata-se de persuadir ou levar

alguém a praticar algum ato. Instigar, não se distancia muito do ato de induzir,

além do mesmo sentido já exposto, acrescenta um encorajamento para tal

desígnio. O induzimento aborda a iniciativa para formar à vontade em outrem

de praticar determinado ato. A instigação, pode ter um caráter secundário,

trata-se de estimular, reforçar ideia já existente.

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A situação de maus-tratos à uma pessoa, de forma que está venha a se

matar de desespero, desde que exista dolo, intenção ou aceitação do risco para

que a vítima se suicide, também é considerada induzimento. Em “prestar

auxílio” cabe o sentido de auxiliar materialmente o indivíduo.

A participação pode ser moral ou material. Em se tratando de

participação moral, diz-se respeito ao induzimento ou instigação ao suicídio. Na

participação material, o indivíduo auxilia materialmente a vítima fornecendo um

meio para realizar o ato, ou então esclarecendo a forma como realizar.

O bem jurídico protegido pelo tipo do artigo 122 do Código Penal, é a

vida. A objetividade jurídica é proteger o direito à vida humana extrauterina. Os

núcleos contidos no tipo presumem um comportamento comissivo por parte do

agente. No entanto, o crime pode ocorrer de forma comissiva omissiva, no caso

do sujeito conter obrigação de custódia e assistência em face do suicida e

assim, não impedi-lo de praticar o ato.

A pena para o crime de participação de suicídio, por força do artigo 122

do código penal, prevê uma pena de reclusão de 2 a 6 anos, se o ato se

consuma. Caso haja tentativa de suicídio com o resultado de lesão corporal

grave, a pena é de 1 a 3 anos de reclusão. Existem formas qualificadas de

participação em suicídio, sendo elas: motivo egoístico, se a vítima é menor, ou

se a vítima tem diminuída, por qualquer causa, sua capacidade de resistência.

Por motivo egoístico, entende-se quando o agente tira proveito da

situação da vítima. É aquele em que o autor demonstra preocupação apenas

consigo, desprezando a vida alheia. Por exemplo: induzir alguém a cometer

suicídio para obter a herança, desejo de vingança.

No caso de a vítima ser menor - refere-se à vítima menor de dezoito

anos e maior de quatorze anos - e tem relação com o discernimento do

indivíduo com sua condição de pessoa vulnerável. Se a vítima é capaz, é

menor de 18 anos e é consciente da compreensão dos fatos, a pena é

aumentada pela metade, caso for incapaz, ou seja, menor de 14 anos, o

Curador responderá pelo crime de homicídio, com pena de reclusão de 6 a 20

anos. Nesse caso, somente é caracterizado o suicídio, se a vítima se despede

da vida, de outro modo, ela apenas é um instrumento de responsabilidade do

Curador.

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Caso a vítima tenha diminuída sua capacidade de resistência, o agente

terá a pena duplicada. Pode-se exemplificar a diminuição da capacidade de

resistência como em casos de embriaguez, uso de entorpecentes, algum tipo

de enfermidade grave, entre outras.

O sujeito ativo do crime, pode ser qualquer indivíduo que induza,

instigue ou preste auxílio para que outrem cometa o suicídio, uma vez que o

tipo penal não especifica o sujeito ativo. O sujeito passivo também pode ser

qualquer pessoa, desde que, a vítima tenha capacidade de resistência e

entendimento, caso contrário o sujeito ativo será responsabilizado pelo crime de

homicídio.

O ambicídio, ou pacto de morte, refere-se à decisão - por dois ou mais

indivíduos - de colocar fim em suas próprias vidas, mutuamente. Nesse caso, o

agente que praticar o ato executório e sobreviver será responsabilizado pelo

crime de homicídio. Caso o agente somente pratique o induzir, instigar ou

prestar auxílio, caracteriza-se o crime de participação em suicídio. Na hipótese

de não suceder a morte, se o agente praticar o ato executório, responderá por

tentativa de homicídio e se, somente induzir, instigar e auxiliar o desígnio

suicida, implica-se o artigo 122 do código penal.

Caso ambos realizem o ato de execução e sobrevivam, os dois

responderão por tentativa de homicídio. E se, ambos auxiliarem mutuamente e

os dois sobreviverem, apresentando como resultado lesões corporais graves,

os dois responderão pela participação de suicídio. Por fim, se apenas um

realizar o ato executório e os dois sobreviverem, o que praticou responde por

tentativa de homicídio, o outro, por participação em suicídio, desde que o

executor, através da tentativa, apresente lesões corporais graves.

Compreende-se crime de participação em suicídio consumado, quando

há a ocorrência da morte da vítima, ou o resultado de lesões corporais de

caráter grave, previstas nos parágrafos 1 e 2, do artigo 129 do Código Penal. Se,

porventura, mesmo induzida, instigada ou auxiliada a vítima não obter êxito em

tirar a própria vida, não causar nenhum dano à sua saúde ou integridade física e

o resultado se der por lesões de natureza leve, o agente não será

responsabilizado pelo crime em questão.

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2 O TABU DO SUICÍDIO

Apesar do tema estar atualmente em debate, o suicídio não é um

fenômeno recente e alheio à população brasileira. Existem incontáveis motivos

que podem levar um indivíduo a querer tirar sua própria vida, mas os que aqui

serão tratados, são aqueles os quais de certa forma contagiam, que

desencadeiam o suicídio por imitação, e apresentam um padrão. O tema é

encarado como um tabu, as pessoas evitam falar sobre, em face da

complexidade e do desconforto que a ideia apresenta.

O suicídio é resultado de uma complexa relação entre uma

interdisciplinaridade de fatores: biológicos, genéticos, psicológicos,

sociológicos, culturais e ambientais. Não se restringe a um único fato ou

acontecimento isolado, mas sim um compilado de situações que mescladas à

sensação de carência de compreensão, ou uma vontade de comunicar-se

através do ato, estimula o jovem cogitar uma saída rápida, um escape para

essas situações.

De acordo com Julio Jacobo Waiselfisz, sociólogo e criador do Mapa da

Violência, a taxa de aumento é de 60% desde 1980 e afirma ainda que, por ser

um tabu, o suicídio não recebe a atenção que deveria. “É como se os suicídios

se tornassem invisíveis, por serem um tabu sobre o qual mantemos silêncio.

Os homicídios são uma epidemia. Mas os suicídios também merecem atenção

porque alertam para um sofrimento imenso, que faz o jovem tirar a própria vida"

(WAISELFISZ, 2017).

Os aspectos da era da globalização têm influência direta nesse

aumento, vivemos em uma época de pessoas inseguras, onde revela-se não

somente a apreensão cotidiana em relação a condutas criminais mais

incidentes, como o roubo, o tráfico e o homicídio, mas também a insegurança

emocional, derivada do aumento da intensidade com que os indivíduos sentem

as coisas e da materialização das relações. Os valores econômicos são

superestimados e as pessoas classificadas como vencedoras ou perdedoras, o

que se opõe à nossa constituição, que assegura a todos uma vida com os

padrões mínimos de saúde, cultura e dignidade. Uma era em que a sociedade

se encontra excessivamente preocupada consigo mesma.

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Um tempo em que se é comum ignorar um problema, pela complexidade

de sua solução.

Tratando-se do suicídio mostra-se inevitável tratar de problemas como a

depressão e a ansiedade, posto que, são duas aflições que marcam nosso

século. Pessoas depressivas estão mais suscetíveis à serem vítimas de

suicídio, já que, a depressão é caracterizada como sendo um distúrbio afetivo,

cujo os principais sintomas são a presença de tristeza e pessimismo constante.

Segundo Andrew Solomon “Muitos depressivos nunca se tornam

suicidas. Muitos suicídios são cometidos por pessoas que não são depressivas.

Os dois elementos não são partes de uma única equação lúcida, uma

ocasionando a outra. São entidades separadas que com frequência coexistem,

influenciando-se mutuamente” (SOLOMON, 2000). Esses transtornos

psicológicos, como a depressão, evidentemente possuem relação com o

suicídio, grande parte dos casos de suicídio tem como vítima indivíduos que

sofreram com esse distúrbio, mas não quer dizer que uma pessoa mentalmente

sadia nunca estará sujeita ao fenômeno.

Nesse contexto, existe uma diversidade de meios que podem levar um

indivíduo ao suicídio, na realidade, esses meios funcionam como um gatilho,

um pressuposto para realizar o ato, quando a ideia já foi concebida.

3 INFLUÊNCIA DA INFORMAÇÂO

A facilidade com que a informação se espalha na internet mostra-se ao

mesmo tempo benéfica e preocupante. Há uma preocupação quando o

conteúdo veiculado se torna prejudicial para os indivíduos que acessam, como

no caso do jogo “Baleia azul”, que aparentemente surgiu na Rússia e tem se

dispersado para outros países, inclusive o Brasil. A seriedade do assunto vem

à tona, já que existem casos de suicídio no Brasil, que possivelmente estão

relacionados com o jogo. Essa não é a primeira vez que jogos entre

adolescentes viralizam mostram-se alarmantes por conter apelos de riscos

letais, como exemplo o “Choking game” onde o indivíduo interrompe o fluxo de

ar com as mãos, ou outro objetivo, para induzir o desmaio.

Outra questão polêmica, que divide opiniões é a série, baseada em um

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livro, intitulada “13 reasons why” (ÁTICA, 2007). Trata do suicídio da

personagem principal, além de abordar problemáticas como o bullying, estupro

e divulgação de imagens íntimas. A série acerta ao salientar um problema que

é real, e merece atenção. Mas erra na forma em que aborda o tema,

romantizando e tornando o suicídio um ato poético, que deveria ser tratado

com mais seriedade levando em conta os resultados que pode causar, a

resposta que o jovem que assiste à série, pode ter. Há uma mensagem no

início de seus episódios mais intensos que alerta sobre o conteúdo que vem a

seguir, apesar de ser um ato legal, isso não impede que jovens, principalmente

aqueles que já possuem transtornos e buscam uma resposta para os

problemas que enfrentam, assistam, e para estes, o resultado pode ser letal, já

que demonstra uma aparente solução para os que passam pelas mesmas

situações que a jovem.

A problemática do suicídio é uma situação anterior à série e ao jogo, é

um problema da indústria de entretenimento, no geral. Outras obras que tratam

do suicídio de maneira poética, como “Os sofrimentos do jovem Werther”

(GOETHE, 1774) que não atingiu um resultado benéfico. Nessa obra o jovem

protagonista se suicida após uma desilusão amorosa, um romance platônico

trágico que não obteve uma repercussão positiva e foi responsável por uma

onda de suicídios em massa. A partir dele, foi criado o termo “Efeito Werther”

referência ao personagem principal da obra. O “Efeito Werther” trata do suicídio

como algo viral, uma epidemia, refere-se ao aumento de casos de suicídio

após a divulgação ampla de casos do mesmo, e pressupõe que a exposição do

tema de forma equívoca, pode funcionar como um estímulo para pessoas

vulneráveis à ideia do suicídio.

4 VIOLÊNCIA CIBERNÉTICA E A PARTICIPAÇÂO EM SUICÍDIO

O fenômeno da globalização evidentemente trouxe uma quantidade

numerosa de benefícios aos seres humanos, não obstante, deu abertura para

diversos crimes, conhecidos como “crimes cibernéticos”, aqueles que são

praticados por meio da internet, advindos do alcance e da interação instantânea

que esta proporciona. Esses crimes, que são praticados através de

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computadores, admitem diversas classificações. A classificação doutrinária

posta por Higor Vinicius Nogueira Jorge (2012) e Emerson Wendt (2012)

apresenta esses delitos divididos em “cibernéticos” e “ações prejudiciais

atípicas”.

O primeiro ainda encontra-se subdividido em “ crimes cibernéticos

abertos” e “crimes exclusivamente cibernéticos”. As ações prejudiciais atípicas

são aquelas que apesar de causarem um transtorno e prejuízo para a vítima

por meio da internet, a conduta não está tipificada no Código Penal, sendo

assim, o agente responde apenas na área cível. Em se tratando de crimes

cibernéticos abertos, entende-se aqueles que podem ocorrer por meio da

internet, bem como, de forma tradicional. Já os crimes exclusivamente

cibernéticos delimitam-se à ocorrência pela rede mundial de computadores.

É conveniente afirmar, que a participação em suicídio enquadra-se na

categoria de crimes cibernéticos abertos, podendo ocorrer também de outras

formas, que não sejam através de computadores.

Sendo o jogo “Baleia Azul” vinculado ao crime de participação de

suicídio, uma situação de ampla abrangência, a identificação dos “curadores”

que anunciam o jogo à vítima, torna-se um obstáculo. É importante que o

indivíduo, ao sofrer qualquer abordagem relacionada ao jogo, procure pelas

autoridades, considerando que o discurso aplicado pelos “mentores” tem a

pretensão de controlar à vítima, utilizando- se de ameaças e linguagem de

caráter manipulador.

É válido identificar os possíveis delitos, pelos quais os “curadores”

podem ser responsabilizados. Além do crime de participação em suicídio, os

sujeitos que transmitem às vítimas as informações e desafios, com o objetivo de

levá-las à decisão de participar do jogo, podem responder pelos crimes de

associação criminosa, ameaça, lesão corporal e até mesmo por homicídio.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que, de fato, os meios de comunicação influenciam a vida do

cidadão brasileiro. O direito penal tem papel de tutelar os bens primordiais de

cada ser humano, e, sendo a vida o maior bem juridicamente tutelado, faz-se

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necessário a tomada de medidas que evitem situações que a coloquem em

risco. O jogo “baleia azul” adequa-se ao artigo 122 do código penal, que tipifica

a conduta de participação em suicídio. O curador apresenta-se induzindo, ou

instigando à vítima, a fim de estimulá-la a chegar ao objetivo final do jogo, que

seria o suicídio. Através da denúncia da vítima e da quebra de sigilo, apoiada

pelo marco civil da Internet, é provável o reconhecimento do agente, que será

responsabilizado pelo crime.

Já a série, contém seu potencial de gravidade relativamente diminuído,

uma vez que não é premeditado o intuito de levar o telespectador a cometer o

suicídio, e sim, tem por objetivo salientar o assunto, com o propósito de evitá-

lo. A crítica faz-se presente em relação ao modo como o assunto é abordado,

considerando a seriedade do tema. O suicídio é um assunto grave, que

evidentemente deve ser discutido, no entanto, é fundamental que haja cautela,

uma vez que lida com pessoas, seres humanos com uma complexidade

inerente ao meio social, posto isso, é incabível arriscar tratar o suicídio de

maneira idealista sem prever se o resultado será inteiramente positivo.

Nesse sentido faz-se indispensável a criação de projetos

interdisciplinares, buscando a prevenção do suicídio e a repressão de condutas

que venham a incentivá-lo. É de grande importância o papel da família,

juntamente com as escolas, que venham a debater sobre o tema e prestar

auxílio àqueles que apresentam uma sensibilidade ao tema ou tendências

depressivas. Fica sob responsabilidade dos pais ou familiares, o

acompanhamento das relações virtuais que os jovens mantêm: é importante a

atenção às páginas que são acessadas, conteúdo publicado e a busca pela

ajuda de especialistas, na hipótese de notar-se algum comportamento que não

seja de costume, e que aponte qualquer indício de preocupação.

REFERÊNCIAS

ASHER, Jay. Os 13 Porquês. São Paulo: Ática, 2016. COLLI, Maciel. Violência Cibernética, Investigação Preliminar e Prevenção da Participação no Suicídio na Internet, 2008. Disponível em: <http://icofcs.org/2008/ICoFCS2008-pp05.pdf>. Acesso em: 12 de Maio de 2017.

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O DIREITO DO TRABALHO EM TEMPOS DE CRISE MEDIANTE O

FENÔMENO DA FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS E DO

PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL

Ana Beatriz da Silva Dantas – [email protected] Graduanda em Direito- UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Marcelo Sebastião dos Santos Zellerhoff [email protected]

Docente - UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente artigo refere-se a um plano de investigação científica, com a utilização de pesquisa bibliográfica acerca do tema Direito do Trabalho em tempos de crise mediante o fenômeno da flexibilização das normas trabalhistas e do princípio da vedação do retrocesso. No que tange o Direito do Trabalho, podemos destacar a evolução dos direitos trabalhistas através da promulgação da Constituição Federal de 1988, ao tratar dos Direitos Sociais como sendo direitos fundamentais. Existem princípios que protegem as garantias trabalhistas e fundamentam as conquistas obtidas pelos trabalhadores como imprescindíveis à sua subsistência e que uma vez conquistados não podem ser perdidos ou renunciados, pois, se assim ocorresse, haveria um choque entre princípios. Tais questões são analisadas num contexto já antigo, mas que tem se evidenciado devido à crise econômica e seus reflexos na sociedade, Portanto, há uma vedação ao retrocesso, que corresponde ao advento que a ordem jurídica não pode eliminar a previsão normativa de direitos, porque prevê o progresso e não regressão, estando diretamente ligada a manutenção da segurança jurídica.

Palavras-chave: direitos sociais. Flexibilização. Crise econômica. Princípio da vedação ao retrocesso.

INTRODUÇÃO

O Brasil e o mundo estão vivenciando a pior crise negativa da história.

Para nossa sociedade, tais fatores estão relacionados ao alto índice de

impostos e inflação do Brasil, à massa de trabalhadores que estão

desempregados devido à substituição da mão de obra pelo uso de máquinas

especializadas, que se intensificou por causa do fenômeno da globalização,

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mostrando assim, o lado cruel da tecnologia e os impactos que tais questões

têm causado nas relações de trabalho.

A importância do embate entre crise econômica e seus aspectos

negativos e direitos sociais historicamente conquistados e consolidados, tem se

contraposto com o instituto da flexibilização das normas trabalhistas, surgido a

indagação a respeito da Constituição admitir ou não a flexibilização dos direitos

trabalhistas e como solucionar conflitos que derivem dessa situação.

Tendo em vista que a própria Constituição põe limites ao instituto da

flexibilização, temos o princípio da vedação do retrocesso social como um dos

principais fundamentos que limitam a flexibilização, num contexto de direitos

sociais serem classificados como cláusulas pétreas, ressaltando a supremacia

da Constituição Federal, mas expondo que é errôneo analisar qualquer área do

Direito como imutável e que fatos devem ser analisados conforme as

modificações sociais.

Assim, devemos considerar as mudanças que se apresentam

necessárias, mas nunca abandonarmos a noção de que os direitos sociais, que

promovem a igualdade social devem ser priorizados e protegidos, afinal,

reduzir as desigualdades é um dos princípios da ordem econômica e um dos

objetivos fundamentais de nosso ordenamento Republicano.

OBJETIVOS

Com toda problemática, conhecer o princípio da vedação ao retrocesso,

considerando a normatividade e eficácia dos direitos sociais.

Discorrer sobre a evolução dos direitos fundamentais sociais e

esclarecer os riscos da flexibilização das normas desses direitos frente ao atual

cenário do Direito do Trabalho e da sociedade, tendo em vista a crise

econômica vivenciada pelo Brasil e pelo mundo.

METODOLOGIA

Optou-se, neste estudo, pela pesquisa bibliográfica, com levantamento

bibliográfico em livros de doutrina, artigos jurídicos publicados na internet e

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legislação pertinente.

1 DIREITO DO TRABALHO EM TEMPOS DE CRISE

1.1 Crise econômica e sua interferência no Direito do Trabalho

Atualmente se verifica na mídia constantes reportagens sobre a crise

econômica que assola o mundo. Isso se dá por força da real situação

econômica frente aos efeitos do processo de globalização, de desemprego,

importação, exportação, inflação, entre outras causas que desestabilizam a

estrutura econômica e social do país.

Apesar de ser um país dotado de riquezas naturais, com relevante

potencial no mercado interno, em decorrência de sua economia subserviente e

todos os problemas em sua estrutura interna, acaba sofrendo um impacto

ainda maior por causa da sua dependência das relações internacionais,

notadamente a atuação dos atores na sociedade internacional, que são

resultados do fenômeno da globalização que dificulta a situação, confrontando

países ricos e países pobres/subservientes. (ROCHA, 2006, p.39).

O Brasil encontra-se no auge da crise e nesse momento histórico,

grande pessimismo foi lançado sobre nosso futuro. São crises de diversas

naturezas, como crise econômica, crise moral, crise política decorrente de toda

a questão de corrupção e de inúmeras manifestações que estão sendo feitas

para reivindicação de todos os tipos de direitos.

Tal crise é tão intensa e negativa que afeta nosso futuro a curto, médio e

longo prazo e em sua maioria baseia-se nas ideologias de política e partidos,

contudo, espera-se que a partir daí possa surgir à recuperação de nosso país.

Contudo, tal pretensão não é garantida, pois é necessária a atuação de

toda a sociedade e não apenas de quem detém o poder nos representando, já

que estamos perdendo muito tempo em termos de desenvolvimento econômico

do país, por isso, precisamos de atuações agora, bem como no futuro após

superarmos esse crítico momento, pois transformar a ideologia de mudança em

algo concreto depende de cada um de nós enquanto membros de uma

coletividade. (AMORIM, 2016, p.15).

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Conforme Amorim (2016), ao analisar a corrupção num aspecto

econômico, pode-se evidenciar que ela prejudica diversas questões, como

promover a ineficiência do gasto público, reduz o crescimento do país, dos

empregos e torna pior os serviços relacionados à saúde, educação,

notadamente ao âmbito do trabalho que é um dos mais afetados com a crise.

Todas essas políticas econômicas desastradas afetam toda a

coletividade, mas surtem mais efeitos para os atores envoltos no âmbito de

direito do trabalho, que são os empregadores, empresariado e notadamente os

trabalhadores.

A crise caminha lado a lado com essas variações do sistema econômico

e por mais que seja um fenômeno econômico e não jurídico, é muito importante

que providencias sejam tomadas a fim de proteger os interesses dos

trabalhadores e das empresas, pois relaciona-se diretamente com toda a

problemática de desempregos em massa e por consequência afeta

severamente o Direito do Trabalho.

Em artigo publicado que trata do tema “Crise econômica e alternativas

do Direito do Trabalho”, o advogado Marcelo C. Mascaro Nascimento, dispôs

sobre essa interferência da crise nas relações de trabalho, assim vejamos:

Não temos, em nosso país, um Direito do Trabalho de Emergência ou de Crise. Mas dispomos, em nossa legislação, de algumas alternativas das quais as empresas podem se valer para evitar o mais perverso efeito da crise econômica: a dispensa individual ou coletiva de trabalhadores. (NASCIMENTO, 2015).

O que expõe é que no direito do trabalho brasileiro, existem poucas

providencias a fim de apoiar as empresas a superarem os problemas

decorrentes da crise econômica e que o mais importante é que as

particularidades de cada caso sejam analisadas para que o objetivo principal

de crescimento econômico seja promovido satisfatoriamente pelo Estado, que

é quem mais deveria protegê-los.

Diversos aspectos ocasionam e intensificam a crise e para entendermos

os pontos mais críticos dessa situação, passa-se a uma análise dos principais

relacionados ao direito do trabalho.

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1.1.1 Crise à luz do fenômeno da globalização

Uma das causas que impacta os países é a globalização que se

caracteriza como a intensificação das trocas comerciais e das relações

internacionais, tendo como principal alavanca o aspecto econômico, pois,

reflete diretamente o capitalismo ao passo que há aumento dos fluxos

financeiros, sendo uma versão mais atual deste. É assunto que sempre esta

em evidência, mas surgiu há muito tempo, quando ganhou impulso na época

das grandes navegações e, das revoluções francesas e industriais.

(ROESLER, 2014, p.41-42).

Há influência de vários fatores socioeconômicos nas relações

econômicas e com isso, acabam por se introduzirem na ordem capitalista. O

que gera muitos problemas, pois, uma vez que essa ordem econômica é

atingida pela crise capitalista, o poder acaba sendo concentrado em poucos

centros, apenas nos que possuem avanço tecnológico e melhores condições

de circulação do capital devido a melhor dinâmica de seus países. (ROESLER,

2014, p.37).

Esses aspectos relacionados à globalização repercutem no capital e no

trabalho e devido às fortes características capitalistas, sua tendência é de

valorizar uma coisa em detrimento da outra. Por que a economia globalizada

passa a regular questões sociais e políticas, assim, liberalismo é deixado de

lado, cedendo lugar ao neoliberalismo.

Ao dispor sobre as relações de trabalho e globalização, Roesler (2014)

faz menção de Jorge Luiz Souto em seus discursos, ao falar sobre o que é

esse neoliberalismo, conforme segue: “O neoliberalismo é a linha teórica que

fundamenta a globalização econômica para o fim de destruir direitos

trabalhistas e a organização da classe trabalhadora”. (ROESLER, 2014, p.39).

Grande fato que reflete essa situação é que essas corporações, e

grandes potências acabam impedindo concorrência com empresas que ainda

estão em desenvolvimento e, antes mesmo que se consolidem não lhe restam

muitas opções, ou cedem e se juntam às maiores ou acabam sendo eliminadas

da competição.

Esses preceitos defendidos pelo neoliberalismo trazem a ideia de

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intervenção mínima do Estado, ou seja, de que ele não atue significativamente

nas relações, vinculando àqueles que participarem.

Diz respeito a uma ideologia que valoriza a vantagem individual e não

coletiva, afinal, para eles é mais importante o fluxo do lucro e a concentração

de poder acima de qualquer outra coisa e, para isso todos os outros valores

acabam sendo difundidos, inclusive a pessoa humana enquanto indivíduo

integrante dessa sociedade extremamente capitalista é vista como mais um

produto que esta a serviço do lucro. (ROESLER, 2014, p.39).

Essa situação acaba gerando mais consequências negativas, porque a

globalização com todos os seus aspectos, não têm intenção em ser um projeto

de paz mundial, de constitucionalização da ordem jurídica nacional ou

internacional, mas é uma faceta de um novo capitalismo. é um projeto de

concentração de poder, de expansão da economia e de concentração de

dinheiro nas mãos de poucos, o que acaba caracterizando uma ordem política

extremamente injusta e monopolista, o que resulta o desemprego estrutural e

exclusão social. (ROESLER, 2014, p.43).

Tais situações interferem diretamente para que a crise econômica se

intensifique, sendo vista como um dos maiores problemas da sociedade atual.

Pois, mediante a revolução tecnológica que resulta no aumento da

produtividade, progressivamente o trabalho humano foi sendo substituído pelas

máquinas, com isso menos mão de obra foi sendo utilizada e o índice de

desemprego cresceu severamente.

1.1.2 O desemprego como efeito da crise

Considerando os momentos históricos no que concerne o direito do

trabalho, ressaltando as questões de escravidão que permaneceu por muito

tempo no Brasil, o surgimento do trabalho e do emprego na vida social

caracterizou uma conquista da democracia no mundo capitalista em que

vivemos, pois, foi algo idealizado por muito tempo. (ROESLER, 2014, p.39).

Atualmente, vivemos em uma sociedade onde os trabalhadores

percebem como fruto de seus esforços um salário/remuneração respectivo à

prestação de seus serviços, ou seja, é a fase ou regime do salariado.

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Com isso todos dependem efetivamente de um emprego e por

consequência, sem um emprego não há salário, portanto, o trabalhador não

poderá mais prover seu sustento e de sua família, com isso surge a questão do

desemprego ser uma síntese da crise econômica, pois é outra causa que

interfere diretamente na economia e desenvolvimento do país, por causar uma

involução social, conforme explana Rocha:

Estamos em pleno movimento histórico paralelo, jamais evolutivo no respeitante a conquistas sociais. Nossa evolução, no que se relaciona com direitos sociais e, especialmente com a garantia do emprego, é não apenas pendular [...], mas vai além esta evolução, transformando-se em involução. (ROCHA, 2006, p.27).

Como já mencionado, com essa tendência de neoliberalismo, o que foi

conquistado através de um longo período, acaba sendo esquecido no tempo

para que outras coisas sejam priorizadas, notadamente os interesses

individualistas.

O problema é que nesse impasse, surgiu a ideia de suprimir direitos,

onde há confronto entre a recuperação das empresas que sofrem os fortes

impactos da crise e as garantias constitucionais, que são minimamente

indispensáveis para que os cidadãos e trabalhadores mantenham sua

dignidade.

O alto índice de desemprego é um dos argumentos mais utilizados pelos

sujeitos ao flexibilizarem as relações de trabalho. Objetivam que tal situação

permita flexibilizar direitos e garantias historicamente conquistadas por toda

classe trabalhadora, tendo em vista que eles estão em condição de

inferioridade e submissão e não possuem muitas escolhas, ou fazem parte da

massa dos desempregados, ou se adéquam as mudanças impostas por

aqueles que detêm o poder econômico. (ROESLER, 2014, p.40).

Tal adequação às propostas de mudança, por vezes não se dá somente

porque os trabalhadores desejam manter única e exclusivamente a sua

sobrevivência por meio de seu trabalho, mas porque possuem outros ideais,

anseios de uma vida melhor que conforme o próprio artigo 6° da Constituição

dispõe, ter direito ao lazer, ao desfrutar de situações que transcendem a

subsistência, é realmente existir e fazer algo a mais do que apenas servir como

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mercadorias à função do lucro.

Esses ideais acabam sendo dificultados, não somente pelo fator

desemprego, mas também porque atualmente tudo no mundo é caro e

inacessível à grande maioria, que é a classe pobre e trabalhadora,

notadamente em nosso país.

1.1.3 Brasil: um dos países mais caros – interferência dos impostos na

crise econômica

Como o desemprego, outra causa que tem forte influência sobre a crise

são os impostos e altos índices de inflação em nosso país. Afinal, a diferença

dos preços no Brasil em comparação com o resto do mundo é algo muito

alarmante, sobre todos os aspectos, pois reflete sobre tudo, desde os produtos

que compramos que visam garantir nossas necessidades básicas, até

restaurantes, lazer, enfim, tudo aqui é mais caro em comparação com outros

lugares.

O Brasil possui uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo,

notoriamente sobre aspectos de consumo e produção, portanto tudo o que é

produzido aqui é mais caro, nesse mesmo sentido os produtos que são

exportados para os outros países. O que causa tamanha estranheza, tendo em

vista que os avanços ocorrem há mais de duas décadas e a distribuição de

renda aqui é classificada como uma das piores. (AMORIM, 2016, p.153).

Essa distribuição ocasiona as desigualdades sociais, pois são as

condições de consumo que cada indivíduo possui é que o individualiza como

pertencente a uma classe baixa ou uma classe alta e consequentemente já

define quais suas reais participações enquanto sujeito de uma sociedade

totalmente capitalista e consumista.

Num país onde há tanta falta de estrutura, ao analisarmos o mercado, as

relações comerciais tanto internas como externas, logo surge a questão de que

empresas sofrem diversas dificuldades ao enfrentar a crise, isto é fato, o que

reflete diretamente na relação destas com seus empregados e

consequentemente no modo como irão lidar com a relação contratual.

Com isso por vezes, frente a uma situação conflituosa, acaba ocorrendo

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negociação entre as partes envolvidas, onde uma parte tem que abrir mão de

seus direitos em detrimento do outro, causando reflexos em alguns direitos

pertinentes e convenientes àquela pessoa que os negociou.

Essa situação acaba por excluir um ator fundamental nessa relação, que

é o Estado, de modo que a intervenção estatal que deveria proteger a parte

mais necessitada acaba se mantendo longe com fundamento de respeitar a

autonomia do trabalhador, onde as partes exercem e regulamentam suas

relações de trabalho sem qualquer subordinação estatal. Mas isso traz sérias

consequências, pois o Estado quem mais deveria promover a proteção desses

trabalhadores, por vezes acaba sendo um de seus maiores violadores.

Tais fatos impõem a necessidade de várias mudanças e, na seara

trabalhista há forte discussão nesse sentido. Disso decorrem vários discursos,

sendo um deles a flexibilização das normas trabalhistas.

1.2 Intensificação do discurso de flexibilização das normas trabalhistas

Como acima exposto diversos fatores colaboraram para que todas as

áreas do direito, principalmente o Direito do Trabalho se encontrassem

vivenciando uma das mais severas crises econômicas.

Através da crise econômica financeira, da intensificação do processo

globalizante, do aumento de desemprego, do alto índice de inflação e

impostos, o processo de flexibilização que existe há muito tempo, tornou-se

ainda mais evidente e veio à tona agora com diversos fundamentos para sua

ocorrência sendo visto como uma alternativa de mudança, ou seja, uma

adequação dos atores sociais a todos esses aspectos negativos.

Por se tratar de um tema complexo, notadamente essa flexibilização que

é a de normas trabalhistas, muitos direitos são postos em questão e não há

como compreender tal relação sem abordar os direitos mais afetados, que são

os direitos sociais ante sua aplicabilidade e eficácia, considerando sua

evolução após a Constituição Federal de 1988 e somente após essa análise,

abordar de forma pormenorizada o instituto da flexibilização.

1.3 Alguns aspectos a respeito dos direitos sociais

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Para melhor compreender o que significará essa proposta de alteração e

simplificação de leis trabalhistas em decorrência do confronto de direitos já

conquistados e positivados, com aspectos reflexos da globalização e crise

econômica que ensejam a flexibilização, torna-se essencial analisar os direitos

sociais que fundamentam grande parte dessas conquistas.

A ideia de direitos sociais surgiu, depois de um longo período de lutas,

marcado pela desigualdade e pela necessidade de direitos que disciplinassem

a convivência dos indivíduos enquanto integrantes de uma mesma sociedade,

e foram incorporados na Constituição federal de 1988, quando esta, ao tratar

dos direitos fundamentais, trouxe os direitos sociais como valores essenciais

da dignidade da pessoa humana, os regulando notadamente em seus artigos

6° e 7°.

Com o surgimento dos direitos sociais, a Constituição coloca os direitos

dos trabalhadores como direitos sociais e, por consequência o trabalho que

exercem para garantir uma vida digna para si e sua família é imprescindível

para o indivíduo, portanto, é considerado como base fundamental da ordem

econômica vigente. (ROESLER, 2014, p. 83).

A efetividade destes direitos é sem dúvida umas das preocupações mais

pertinentes no que tange a problemática de flexibilização, tendo em vista que, a

inobservância da eficácia das normas constitucionais, em especial, aos direitos

sociais, gera uma condição de vida indigna e desigualdade aos cidadãos, em

especial, os trabalhadores, pois se encontram em condição de

inferioridade/hipossuficiência com relação ao empregador.

Sendo os direitos sociais fundamentais, previstos na ordem

constitucional, sua proteção torna-se ainda mais importante, onde princípios

basilares do direito agem como “escudo” objetivando que tais direitos não

sejam violados.

A Constituição preceitua princípios, deveres, direitos e garantias

fundamentais inerentes à pessoa humana. Em se tratando de normas

(princípios e regras) que possuem caráter principiológico, é necessário analisar

princípios fundamentais gerais bem como os princípios específicos de direito

do trabalho que refletem diretamente na proteção dos direitos sociais e

consequentemente nas propostas de alteração de leis.

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Como principais princípios fundamentais aplicáveis a todo o

ordenamento, pode-se citar o princípio da igualdade ou isonomia, da

segurança jurídica e, o mais importante na análise da possibilidade de

ocorrência ou não da flexibilização que é o princípio da vedação do retrocesso

social.

O princípio da Vedação do retrocesso está previsto implicitamente na

Constituição Federal e, está diretamente relacionado ao princípio da segurança

jurídica, pois se direitos já estão positivados e estáveis no ordenamento jurídico

tem-se a ideia de que tem que haver a manutenção da proteção de seus

detentores, pois ambos os institutos tem como finalidade a efetividade dos

direitos.

Corresponde a um dos principais argumentos críticos à ocorrência da

flexibilização, assim, para Fernandes (2015), o princípio da vedação do

retrocesso social deve ser entendido como limite material implícito conforme

expõe:

O princípio da proibição do retrocesso ou da não reversibilidade dos direitos fundamentais sociais deve ser entendido como um limite material implícito, de forma que os direitos fundamentais sociais já constitucionalmente assegurados e que alcançaram um grau de densidade normativa adequado não poderão ser suprimidos por emenda constitucional e nem mesmo por legislação infraconstitucional [...]. (FERNANDES, 2015, p.600 - grifo do autor).

Na doutrina existem muitas divergências acerca da aplicação ou não

deste princípio, pois é muito complexo analisar que direitos conquistados saiam

do ordenamento jurídico, principalmente em se tratando de direitos sociais que

estão previstos na ordem suprema que é a Constituição Federal. Contudo,

ainda assim, demonstra-se como forte impedimento ao discurso de

flexibilização.

CONCLUSÃO

De todos os argumentos contrários a flexibilização, acredita-se que são

realmente necessárias algumas adequações, mas que estas não devem

ocorrer com a intenção em suprimir direitos em função de interesses

exclusivamente capitalistas, mas que os direitos que fossem flexibilizados

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pudessem ser supridos por alternativas equivalentes e compatíveis com o

cenário atual, o que evidencia tamanha dificuldade, pois limitar uma restrição

ou flexibilização é algo muito difícil.

A realidade é que a flexibilização importa no sacrifício de todos e deve

ser vista num contexto excepcional, não deve ser a regra cogitar mudanças a

respeito de direitos essenciais notadamente que refletem sérios impactos no

trabalho, que é um direito fundamental do homem e esta diretamente

relacionado com a sua subsistência, sua dignidade e de toda a sua família.

REFERÊNCIAS

AMORIM, Ricardo. Depois da tempestade. Prata, 2016 BRASIL. CLT (1940). Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Consolidação das Leis do Trabalho. Portal do Palácio do Planalto. Brasília: Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 10 nov. 2017. BRASIL. Constituição (1988). Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Portal do Palácio do Planalto. Brasília: Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm >. Acesso em: 20 jan. 2017. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8. ed. São Paulo: LTR, 2009. MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 29. ed. São Paulo: Atlas, 2013. ______. Flexibilização das condições de trabalho. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015. NASCIMENTO, Marcelo C. Mascaro. Carreira & Sucesso, 2015. Disponível em: <http://www.catho.com.br/carreira-sucesso/colunistas/convidados/crise-economica-e-alternativas-do-direito-do-trabalho>. Acesso em: 20 mar. 2017. NETO, F. F. J; CAVALCANTE, J. Q. P. Direito do Trabalho. 7. ed. São Paulo: Atlas. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo, 2010.

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ROCHA, Paulo Santos. Flexibilização e Desemprego. Rio de Janeiro: Forense, 2006. ROESLER, Átila da Rold. Crise econômica, flexibilização e o valor social do trabalho. São Paulo: LTr, 2014.

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OS IMPACTOS DA DIGITALIZAÇÃO DA SOCIEDADE E O SURGIMENTO

DO DIREITO DIGITAL

Marcela Cioccia Neves – [email protected] Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Vinicius Roberto Prioli de Souza – [email protected] Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

Ante as inovações tecnológicas e a complexidade da sociedade digital, o Direito Digital também passou a ser discutido como auxiliar de outras áreas na solução das demandas jurídicas decorrentes desta nova realidade. Dada a crescente relevância da matéria, ainda não explorada com a devida importância pela doutrina pátria, aborda-se no presente artigo à contextualização do Direito no âmbito tecnológico, bem como se apresenta brevemente o conceito, origem e características mais relevantes do Direito Digital. Os conceitos utilizados abordam temas acerca da realidade cibernética e da Revolução Tecnológica, bem como os aspectos do ramo jurídico em comento, propondo-se uma reflexão aos operadores do Direito quanto à inserção do assunto nas instituições de ensino superiores.

Palavras-chave: Digitalização da sociedade. Direito Digital. Tecnologia.

INTRODUÇÃO

Têm sido levadas aos Tribunais várias situações novas decorrentes das

relações virtuais, sendo que, nestas ocasiões, nem sempre os operadores do

Direito estão prontos para enfrenta-las. Seguem os exemplos: ataques hackers,

a pornografia de vingança, questões contratuais relacionadas às empresas

virtuais, propriedade intelectual e plágio na internet, violação de privacidade do

usuário, etc.

Nos tempos hodiernos, as inovações na área da tecnologia andam em

passos mais largos do que o legislativo possa acompanhar. Há de se convir,

portanto, a necessidade de novas legislações para regulamentar alguns

aspectos das tendências que surgem neste campo, sendo que, nesta toada,

pode-se citar o Marco Civil da Internet, que foi de grande contribuição. Nesta

toada, o objetivo geral do presente artigo consiste em contextualizar o Direito

nesta realidade tecnológica, bem como apresentar brevemente o Direito Digital

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– ramo dinâmico que está se desenvolvendo cada vez mais, atuando como

auxiliar de outras disciplinas jurídicas tradicionais na busca da solução dos

problemas do mundo virtual.

Os objetivos específicos foram formulados da seguinte forma: efetuar

investigações do contexto histórico em que surgiu o Direito Digital; pesquisar o

conceito, origem e características mais relevantes deste ramo.

No plano metodológico traçado se adotou a vertente metodológica

jurídico-sociológica; quanto ao tipo metodológico, utilizou-se o jurídico

exploratório e jurídico-compreensivo. Por fim, quanto ao procedimento, a

pesquisa se pautou em buscas bibliográficas e documentais.

1 DA DIGITALIZAÇÃO DA SOCIEDADE E O DIREITO

Vive-se atualmente imerso na tecnologia. Desde o momento em que o

indivíduo desperta, cotidianamente checa o seu e-mail, verifica as mensagens,

seleciona o melhor caminho até o local de trabalho. Lê as principais notícias

nos portais de jornalismo, “curte” na rede social a foto nova do final de semana

entre os amigos, ou então acessa a meteorologia online para constatar se não

irá mudar o tempo. Ao chegar em casa, repete este mesmo ciclo algumas

outras vezes, assim o fazendo diariamente.

Entretanto, a rotina da maioria das pessoas nem sempre foi assim. Esta

realidade, onde se encontra o usuário das tecnologias, teve como ponto de

partida a Revolução Industrial, que teve seu início por volta do final da

Segunda Guerra Mundial. Com os Estados Unidos como pioneiros, houve o

aperfeiçoamento dos computadores e tecnologias de comunicação, permitindo-

se o armazenamento de dados e a transmissão da informação com uma

velocidade cada vez maior. Estas transformações, no entanto, foram ficando

mais intensas nas últimas três décadas (ALMEIDA; RIGOLIN, 2013, p. 17), de

tal forma que afetaram vários ramos da vida em sociedade, podendo-se

perceber rupturas ocorridas no sistema social-político-econômico-jurídico.

Um dos resultados da Revolução Tecnológica é a Internet. Do ponto de

vista técnico, sua origem remonta da Guerra Fria, em meados dos anos 60, nos

Estados Unidos, tendo originalmente fins militares, com o objetivo de criar um

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meio para transmissão de dados entre um computador e outro. (SOUZA, 2009,

p. 75).

A ARPANET – Advance Research Projects Agency Network, como foi

denominado esse sistema tecnológico, permitia que diversos pesquisadores de

vários centros de pesquisa pudessem compartilhar recursos sem o risco de

terem seus dados e informações perdidos por conta de um evento danoso.

(CASTELLS, 1999, p. 82-83).

Pequenas redes locais (LAN) foram criadas e posicionadas em lugares

estratégicos do país, coligadas por meio de redes de telecomunicação

geográfica (WAN), recebendo a denominação de Internet, ou seja, Inter

Networking. (PAESANI, 2000 apud SOUZA, 2009, p. 76).

Posteriormente, esse sistema passou a ser usado para fins civis, sendo

utilizado inicialmente em algumas universidades americanas como um canal de

divulgação, troca e propagação de conhecimento. Esse ambiente possibilitou o

desenvolvimento da Internet como conhecemos atualmente.

Paesani (2008, p. 12) explica, também, que na Internet se depara com

uma gigantesca fonte de informações destinadas ao navegador, que é uma

pessoa. A rede constitui uma oportunidade de encontro, de confronto, de troca

de opiniões de relações interpessoais.

Ninguém porá em dúvida que a transição que vivemos é evidente. Assim como a Revolução Industrial modificou, no passado, as feições do mundo moderno, a ainda incipiente Revolução Digital já está transformando as faces do mundo pós-moderno. A diferença entre uma e outra [...] situa-se na velocidade surpreendentemente maior com que as referidas transformações irão ocorrer durante a segunda. Enquanto na sociedade industrializada era a quantidade de trabalho investida nos produtos e serviços que servia de paradigma de valor, na sociedade digitalizada será a quantidade de informação e conhecimento que tais produtos e serviços conseguirem agregar que determinará a formação do paradigma (DE LUCCA, 2013, p. 21).

É visível que esta complexidade tecnológica foi agravada pelo fator

tempo e pela velocidade crescente com que os efeitos de algum acontecimento

específico são sentidos em várias outras partes do mundo. Assim, é necessário

que as relações tecnológicas, sejam entre pessoas, empresas, ou instituições,

passem a exigir novas regras, princípios e regulamentos, aplicando-se também

antigos princípios que continuam atuais para o Direito. (PINHEIRO, 2013, p.

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40).

Portanto, não bastam novas leis, mas também é preciso que os

estudiosos e os profissionais do Direito saibam interpretar de forma dinâmicas

as consequências das relações que se formam neste ambiente digital.

2 DA ORIGEM DO DIREITO DIGITAL

É no cenário supra retratado que nasceu o Direito Digital, ramo que vem

tentar regulamentar e auxiliar em situações que nem sempre as outras

vertentes jurídicas tradicionais conseguem resolver, pois, em sua maioria,

foram pensadas em uma época em que sequer existia o computador:

[...] o surgimento, em âmbito mundial, de diversos centros de estudos dedicados à análise das implicações jurídicas, sociais e culturais advindas da Internet. Destacam-se, entre outros: a) nos Estados Unidos: Berkman Center for Internet and Society, da Faculdade de Direito da Universidade de Harvard; Stanford Center for Internet and Society, da Faculdade de Direito da Universidade de Stanford; Information Society Project, da Faculdade de Direito da Universidade de Yale; b) no Canadá: Citizen Lab, do Munk Centre for International Studies da Universidade de Toronto; c) na Inglaterra: Oxford Internet Institute (OII), mantido pela Universidade de Oxford, e Advanced Network Research Group, do Cambridge Security Programme, mantido pela Universidade de Cambridge; d) no Brasil: Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS), da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (LEONARDI, 2011, p. 29-30).

A primeira corrente doutrinária que tratava sobre o Direito Digital surgiu

nos Estados Unidos, propondo “um direito próprio para a rede. Trata-se da

„corrente libertária‟ do direito virtual, que tem em doutrinadores norte-

americanos seus principais expoentes”. (ROHRMANN, 2005, p. 12-13).

No Brasil, Leonardi (2011, p. 30-31) explica que o primeiro curso de

“Informática Jurídica” foi ministrado na Faculdade de Direito da USP em 1973,

por Mario Giuseppe Losano. Inspirado em tal curso, Celso Lafer criou em 1993

a disciplina “A informática jurídica”. Na Faculdade de Direito da Universidade

de São Paulo, Newton de Lucca foi o primeiro professor a ministrar uma

disciplina dedicada às relações entre o Direito e a Internet, em nível de pós-

graduação.

Atualmente outras faculdades brasileiras de Direito oferecem, já no

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curso de graduação, disciplinas a respeito das relações entre o Direito e a

Internet. Ademais, como se não bastasse o interesse da comunidade

acadêmica pelo Direito Digital, também insta dizer que, como se vive em uma

era tecnológica, é natural que o Poder Judiciário busque formas de alcançar a

celeridade e eficiência em seu serviço, o que pode ser conseguido através dos

meios eletrônicos. Para exemplificar como a Informática Jurídica está presente

no Judiciário, tem-se a prática eletrônica dos atos de comunicação dos atos

processuais (arts. 193 a 199, CPC).

Como se observa, é cada vez maior o interesse da comunidade

acadêmica, das instituições e da sociedade em geral sobre questões jurídicas

concernentes à Era Digital. A Informática Jurídica, aliada ao Direito Digital, abre

novos caminhos para o Judiciário.

3 DAS DIVERSAS TERMINOLOGIAS

Alguns estudiosos pátrios utilizam, dentre outras, as terminologias

Direito da Sociedade da Informação, Direito Virtual, Direito da Internet, Direito

Eletrônico, Direito Digital, Direito da Informática e Direito Informático, dentre

outras nomenclaturas. Nos países de língua inglesa, fala-se em Cyberlaw,

Cyberspace Law, Information Technology Law e Internet Law; e na Itália, Diritto

dell‟Informatica e Diritto dell‟Internet; na França, Droit de L‟Informatique.

(LEONARDI, 2011, p. 36-37).

O termo Direito da Informática foi o mais divulgado no Brasil

inicialmente, pois assim que surgiu propagou o interesse em estudar os efeitos

jurídicos causados pela era da informação. A título de exemplo de autores que

usam o termo, tem-se Elias e Castro. Entrementes, há críticas que se opõem a

esta denominação, devido a sua limitação. (MONTEIRO, 2011).

Nessa toada, o mesmo pode ser dito sobre as nomenclaturas Direito da

Sociedade da Informação, Direito das Novas Tecnologias, Direito do

Ciberespaço, etc. É notável que tais terminologias limitam sua abrangência.

Neste ponto é interessante trazer a lume a opinião de Pinheiro (2013, p.

46): o rádio, o telefone, a televisão, dentre outros aparelhos, trouxeram

desafios aos direitos autorais, à liberdade de imprensa, ao direito do

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consumidor, etc.; porém, mesmo tendo peculiar relevância, não há um Direito

Televisivo, um Direito Telefônico ou um Direito Radiofônico, logo não fazendo

sentido criar um Direito da Internet, um Direito do Espaço Virtual, ou utilizar

qualquer outra terminologia que é mais específica em si mesma, trazendo

limitações de abrangência. Outros pensadores compartilham de opiniões

similares.

Quanto ao Direito Eletrônico, autores como Blum, Lucca e Paiva utilizam

este termo. Paiva (2003, p. 01), por sua vez, o delimita como:

[...] estudo do conjunto de normas, aplicações, processos, relações jurídicas, doutrina, jurisprudência, que surgem como consequência da utilização e desenvolvimento da informática, encontrado direcionamento para a consecução de fins peculiares.

Neste passo, Monteiro (2011) elucida, quanto ao Direito Digital, que não

há qualquer oposição quanto ao uso desta terminologia, sendo utilizada até

como sinônimo de Direito Eletrônico. Ambas terminologias (Direito Digital e

Eletrônico) indicam um ramo do Direito que surgiu para tentar solucionar

problemas que passaram a existir graças às modificações sociais advindas dos

avanços tecnológicos. Apresentar diversas nomenclaturas não é novidade, vez

que outros ramos do Direito também já apresentam mais de uma.

Diante destas análises, optou-se, neste artigo, por utilizar a

denominação Direito Digital, pois o termo abarca diferentes tecnologias da

informação – não apenas algumas tecnologias específicas –, sendo, também,

uma nomenclatura muito utilizada no meio acadêmico, como por exemplo,

pelos doutrinadores Blum, Pinheiro e Abrusio.

4 DO CONCEITO

O objetivo deste tópico é conceituar o Direito Digital, mas não defini-lo.

Conceito e definição possuem significados distintos. Quando um termo é

definido, há um fechamento a respeito de determinada ideia. A expressão

“definição” está intrinsecamente ligada à palavra “definitivo”. Enquanto isso, o

termo “conceito” visa apenas um trabalho cognitivo do ser humano a respeito

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de algo, não tornando seu resultado definitivo. O “conceito” permite uma

ampliação da compreensão que determinada pessoa tem a respeito de algo.

Conceituar corresponde, portanto, a trazer uma ideia de mente aberta, uma

noção ou uma concepção sobre algo. Logo, o que se faz aqui é uma

“conceituação” e não uma “definição”.

Vale transcrever aqui as seguintes palavras de Pinheiro (2013, p. 46):

O Direito Digital consiste na evolução do próprio Direito, abrangendo todos os princípios fundamentais e institutos que estão vigentes e são aplicados até hoje, assim como introduzindo novos institutos e elementos para o pensamento jurídico, em todas as suas áreas (Direito Civil, Direito Autoral, Direito Comercial, Direito Contratual, Direito Econômico, Direito Financeiro, Direito Tributário, Direito Penal, Direito Internacional etc.).

Em suma, o Direito Digital abarca todas as áreas já existentes do Direito

e as aplica à realidade social, sendo este ramo caracterizado pelo dinamismo

das relações, bem como por estabelecer uma conexão entre o Direito

Codificado e o Direito Costumeiro, usando o que ambos têm de melhor para

solucionar questões que envolvem o novo paradigma da sociedade digital.

(PINHEIRO, 2013, p. 47).

Destaca-se que, quando se analisa o Direito Digital, percebe-se que é

um caso de transdisciplinaridade. No escólio de Nicolescu (2000, p. 22), o

prefixo “trans” significa “aquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas,

através e além de qualquer disciplina”.

A transdisciplinaridade vai além da multidisciplinaridade e da

interdisciplinaridade. Almeida Filho (2005, p. 5) traz um exemplo para ilustrar tal

conceito no âmbito do Direito Digital: quando uma determinada pessoa cede

sua assinatura para que seja reproduzida por meio de scanner, tem-se uma

reprodução originária de meios próprios da informática; porém, a partir do

momento em que esse meio digital é reproduzido, como no caso de utilizar a

assinatura do indivíduo em notas promissórias, passa-se a um universo maior,

que importa em conhecimentos mais abrangentes que os restritos à informática

(no caso da nota promissória, conhecimentos de Direito Empresarial ou do

Decreto nº 2.044, de 31 de dezembro 1908, dentre outros).

Deste modo, o Direito Digital não é totalmente inédito, muito pelo

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contrário, tem guarida na maioria dos princípios do ordenamento jurídico pátrio,

além de aproveitar a maior parte da legislação em vigor, sendo necessário,

inclusive, realizar uma interpretação extensiva dos dispositivos legais

(PINHEIRO, 2013, p. 49).

Duranske explana o seguinte sobre as leis virtuais ou leis da Internet:

A Lei Virtual ou “Lei da Internet, refere-se a uma generalidade pré-existente de leis que é aplicada de forma diferente num novo contexto. Na verdade, muito do que entendemos como “direito da Internet” aplica-se ao mundo virtual. Em sua, o direito virtual é o caso do Direito onde há necessidade de preenchimento de lacunas. Também refere-se às estruturas internas do governo que estão começando a aparecer em forma de esboços no mundo virtual [...] em casa área, questões similares às do mundo real aparecem quando a atividade laboral aparece no mundo virtual, com implicações diferentes e às vezes surpreendentes (2008, p. 14).

Pode-se afirmar, no mesmo passo, que o Direito Digital é fundado na

liberdade de acesso ao meio e à forma da comunicação. O art. 220 da

Constituição Federal institui que “A manifestação do pensamento, a criação, a

expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não

sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”

(ZANATTA, 2010, p. 08).

Atualmente, cabe dizer que, diante das particularidades que permeiam o

meio digital, aplica-se a legislação em vigor do mundo físico, cabendo ao juiz

fazer interpretações analógicas a casos anteriores.

5 DAS CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DIGITAL

O Direito Digital possui algumas características, que passarão a ser

estudadas a seguir. Referido ramo estabelece uma conexão entre o Direito

Codificado e o Direito Costumeiro, usando o que ambos têm de melhor para

solucionar questões que envolvem o novo paradigma da sociedade digital

(PINHEIRO, 2013, p. 47). A partir desta colocação, iniciar-se-á os estudos

pelos elementos (ou características) trazidos pelo Direito Costumeiro. São eles:

a generalidade, a uniformidade, a continuidade, a durabilidade e a notoriedade

(ou publicidade).

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Primeiramente, a generalidade determina que certo comportamento

deva ser repetido razoavelmente para evidenciar a existência de uma regra,

amparada pela ideia de que a norma deve ser genérica, sendo aplicada ao

caso concreto pelo uso da analogia e com o recurso à arbitragem. Quanto à

uniformidade, esta característica reza que, a partir do momento em que há uma

decisão prolatada, é recomendável que outras empresas, sites, provedores,

etc., procurem adequar-se a tal posicionamento, a fim de não sofrerem

sanções semelhantes.

O elemento da continuidade também é importante, pois as decisões

devem ser repetidas ininterruptamente. Tal pensamento nos leva à

durabilidade, sendo que esta promove a criação da crença no uso dos

elementos supramencionados, trazendo segurança ao ordenamento jurídico.

Completando o raciocínio, é importante entender a notoriedade, que nada mais

é que tornar públicas as decisões arbitrais, para que sirvam de referência para

todas as pessoas (PINHEIRO, 2013).

Ademais, no nosso ordenamento jurídico, ninguém pode alegar

desconhecimento da lei, portanto, trazendo isso no Direito Digital:

[...] deve haver a publicação das “normas digitais” no formato de disclaimers, como já fazer os provedores de acesso à Internet, ou seja, deve estar publicada na página inicial a norma à qual se está submetido, sendo ela um princípio geral ou um a norma-padrão para determinada atuação. Deste modo, a publicidade das regras possibilitar maior conhecimento do público, consequentemente, aumenta sua eficácia (ZANATTA, 2010, p. 08).

Além destas características trazidas pelo Direito Costumeiro, no Direito

Digital, por existirem muitas questões previstas em contratos, o princípio do

pacta sunt servanda é de suma importância (arts. 104 e 166, II do Código Civil).

O Direito Digital deve regulamentar as relações advindas do uso da

tecnologia e intermediar os conflitos resultantes das mesmas, seja por meio da

aplicação das leis (especificamente os arts. 107 e 112 do CC, que tratam da

manifestação de vontade válida), seja recorrendo à analogia, aos costumes ou

aos princípios gerais de Direito (art. 4º da Lei de Introdução às Normas do

Direito Brasileiro - Decreto-Lei n° 4.657/42). Outras características que podem

ser listadas são a celeridade, dinamismo, a auto-regulamentação e poucas leis.

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Depreende-se que há um elemento muito importante presente no Direito

Digital, que de certa forma assegura outros elementos já listados acima: o

tempo. Toda norma tem um tempo determinado em que produz efeitos no

ordenamento jurídico, sendo este elemento chamado de “vigência”. Entretanto,

Pinheiro doutrina no sentido de que o tempo, na disciplina do Direito Digital,

extrapola o conceito de vigência, abrangendo a capacidade de resposta

jurídica a um fato específico (2013, p. 49). Isso porque o conjunto “fato, valor e

norma” necessita certa velocidade de resposta para que tenha validade dentro

da sociedade digital. Ainda, Zanatta explica sobre a questão da territorialidade

no Direito Digital:

A convergência tecnológica elimina a barreira geográfica quando aplicada a um plano virtual paralelo, onde o conceito de localização é efêmero, sendo representado por sequências binárias e não latitude e longitude. Os princípios do endereço eletrônico, do local em que a conduta se realizou ou exerceu seus efeitos, do domicílio do consumidor, da localidade do réu e da eficácia na execução judicial devem ser o norte para determinar qual a aplicação mais adequada ao caso. Dependendo da situação, pode ser aplicado mais de um ordenamento. No Brasil, especificamente no tocante ao crime eletrônico, que hoje não tem barreiras físicas, ocorre de todo lugar e em todo lugar, o Código Penal brasileiro alcança a grande maioria das situações, por meio da aplicação de seus arts. 5º e 6º (2010, p. 11).

Estas são, portanto, as características do Direito Digital que mais

despontam, devendo ser seguidas a fim de se trazer uma solução mais

eficiente aos problemas jurídicos decorrentes da sociedade digital, sempre

prezando pela rapidez das decisões, vez que a velocidade das transformações

tecnológicas está também cada vez maior, consistindo em um desafio aos

operadores do Direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ressalta-se que, em um primeiro momento, embora esta seção traga

em seu bojo a ideia de término, o que ora se conclui não esgota o que pode se

expor e o que pode se pode extrair a respeito do Direito Digital. A principal

finalidade da pesquisa foi apresentar uma visão geral da matéria, com suas

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características e o contexto social que serviu de alicerce para o seu

desenvolvimento.

Deste modo, tanto o objetivo principal quanto os específicos delineados

na introdução foram plenamente atingidos, ainda que brevemente. Com

resultado, verifica-se que a Revolução Tecnológica e o advento da Internet

propiciaram diversas transformações na sociedade, que se tornou cada vez

mais convergente e digitalizada, se tornando tênue a linha entre a realidade e a

digitalidade. Esta complexidade tecnológica é agravada pelo fator tempo e pela

velocidade das informações (estas últimas tão preciosas e poderosas na

modernidade).

Ante essas mudanças tão rápidas, o ordenamento jurídico encontra

algumas dificuldades em se adaptar. Todavia, há vários esforços neste sentido,

destacando-se, no âmbito da modernidade tecnológica, o ramo do Direito

Digital, que vem se desenvolvendo a fim de solucionar vários entraves que os

ramos tradicionais do Direito não conseguem resolver. Optou-se pelo uso do

termo Direito Digital por ser mais pertinente e abrangente, abarcando diferentes

tecnologias da informação, sendo, também, uma nomenclatura popular no

meio acadêmico. Este ramo do Direito não é totalmente inédito, pelo contrário,

possui guarida na maioria dos princípios do ordenamento jurídico pátrio, além

de aproveitar a maior parte da legislação em vigor, sendo necessário, inclusive,

realizar uma interpretação extensiva dos dispositivos legais.

Encerrou-se o tema falando sobre algumas características do Direito

Digital, tais como a generalidade, observância do princípio do pacta sunt

servanda, o uso da analogia e arbitragem, dentre outras.

Por fim, salienta-se que não há aqui a pretensão de esgotar o assunto,

riquíssimo em possibilidades de abordagens críticas. Com efeito, o Direito

Digital é um ramo em construção e reclama acompanhamento pelos

profissionais da área jurídica. Porém, deixa-se aqui a reflexão sobre o Direito

Digital, salientando-se que é pertinente a implementação nas instituições de

ensino superior, a fim de melhor preparar os profissionais da área jurídica,

sendo importante, também na formação dos cidadãos desta nova era, a fim de

poder continuar a exercer a liberdade individual sem prejuízo da vida coletiva

em uma sociedade totalmente conectada, em que a ação de um pode gerar

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efeitos e consequências em cascata para todos.

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OS PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL E SUA APLICABILIDADE PARA

A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS DA SEGURIDADE

Lohaine Milena Alexandre – [email protected]

Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Vinicius Roberto Prioli de Souza – [email protected]

Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente trabalho busca analisar os princípios da seguridade social e a importância de sua aplicabilidade para efetivação dos direitos da seguridade social. Neste diapasão, analisa-se os princípios da Universalidade da cobertura e do atendimento; Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; Irredutibilidade do valor dos benefícios; Equidade na forma de participação no custeio; Diversidade da base de financiamento; Caráter democrático e descentralizado da administração e por fim, o princípio da solidariedade. Outrossim, estuda-se o conceito dos princípios e sua importância para o ordenamento jurídico, analisando-se os princípios da seguridade social acima explanados e por conseguinte, a importância de sua aplicabilidade para efetivação dos direitos da seguridade, quais sejam, saúde, assistência social e previdência social. Palavras-chave: Princípios. Seguridade Social. Constituição Federal.

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal em seu capítulo II, que trata da seguridade

social, estabelece em seu parágrafo único, objetivos que se traduzem como

autênticos princípios. Desse modo, aborda-se os princípios englobados pela

Seguridade Social, que estão ordenados no art. 194, parágrafo único, da

Constituição Federal. Embora o legislador constituinte estabeleceu que a

organização da seguridade social se daria com base em determinados

objetivos, pode-se considerar tais como autênticos princípios, uma vez que

embasam os dispositivos supramencionados, bem como pelo próprio

significado da palavra princípio, sendo o que constitui a matéria, a base,

orientando tanto o intérprete como o legislador.

Na sequência, estuda-se os princípios da Universalidade da cobertura e

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do atendimento; Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às

populações urbanas e rurais; Seletividade e distributividade na prestação dos

benefícios e serviços; Irredutibilidade do valor dos benefícios; Equidade na

forma de participação no custeio; Diversidade da base de financiamento;

Caráter democrático e descentralizado da administração e por fim, o princípio

da solidariedade, todos dispostos no rol do art. no art. 194, parágrafo único, da

Constituição Federal, analisando tais princípios e sua consequente importância

de aplicabilidade para efetivação dos direitos da seguridade social.

OBJETIVOS

Os objetivos da pesquisa consistem em verificar o conceito dos

princípios e sua importância para o ordenamento jurídico, analisando-se os

princípios da seguridade social e, por conseguinte, a relevância de sua

aplicabilidade para efetivação dos direitos da seguridade, quais sejam, saúde,

assistência social e previdência social.

METODOLOGIA

Os métodos e técnicas utilizados no tocante à vertente metodológica

foram dois, abarcando a jurídico-dogmática e a jurídico-sociológica, uma vez

que a primeira trabalha com os elementos internos ao ordenamento jurídico,

visando à investigação de suas estruturas internas e eficácia das relações

entre e nos institutos jurídicos; e a segunda vertente foi utilizada pois o Direito

se modifica conforme a sociedade também se modifica, bem como será feito

um estudo aprofundado sobre o dispositivo legal e a sua eficácia perante a

sociedade, no que concerne ao tema abordado.

Quanto aos tipos metodológicos utilizou-se o método jurídico-

interpretativo, na decomposição de um problema jurídico em seus diversos

aspectos, relações e níveis, com objetos de maior complexidade e com maior

aprofundamento, atribuindo esse estudo acerca da importância da efetividade

dos princípios da seguridade sócia.

Por fim, concernente às técnicas de pesquisa e ao procedimento, optou-

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se pela pesquisa bibliográfica e documental, com levantamento bibliográfico

coletado em livros de doutrina, artigos em revista científica e publicados na

internet e legislação, com abordagem exploratório e análise qualitativa.

1 OS PRINCÍPIOS PREVISTOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

CONCERNENTE À SEGURIDADE SOCIAL

Primeiramente, impende conceituar o que são princípios, definindo

Paulo Bonavides (2014, p. 230) como diretrizes de natureza geral e

fundamental, “que se possam deduzir da conexão sistemática, da coordenação

e da íntima racionalidade das normas, que concorrem para formar assim, num

dado momento histórico, o tecido do ordenamento jurídico”.

Por sua vez, ensina Wagner Balera (2010, p. 103), que “princípios são

normas que descrevem o que se poderia chamar o estado ideal a ser

alcançado pelo sistema. Deles derivam as regras que concretizarão, a partir

das concretas situações da vida, os planos de programas tracejados pela Lei

Suprema.

Assim, forçoso reconhecer que os princípios são normas que traçam

orientações para o sistema jurídico que devem, no sentido obrigatório, ser

efetivados, e especificamente, no tocante à Seguridade Social, são úteis para

integração e execução das regras jurídicas da Seguridade Social e para

conduzir criação de novas normas.

Os princípios abarcados pela Seguridade Social estão ordenados no art.

194, parágrafo único, da Constituição Federal. Embora o legislador constituinte

estabeleceu que a organização da seguridade social se daria com base em

determinados objetivos, pode-se considerar tais como autênticos princípios,

uma vez que embasam os dispositivos supramencionados, bem como pelo

próprio significado da palavra princípio, sendo o que constitui a matéria, a

base, e “para o Direito o papel do princípio nesse sistema será fundamental,

pois irá informar e orientar tanto o legislador como o intérprete”. (MARTINS,

2015, p. 50).

Nessa toada, serão explanados os princípios da Universalidade da

cobertura e do atendimento; Uniformidade e equivalência dos benefícios e

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serviços às populações urbanas e rurais; Seletividade e distributividade na

prestação dos benefícios e serviços; Irredutibilidade do valor dos benefícios;

Equidade na forma de participação no custeio; Diversidade da base de

financiamento; Caráter democrático e descentralizado da administração e

Princípio da solidariedade.

1.1 Princípio da universalidade da cobertura e do atendimento

A acepção do que é universalidade consiste no caráter do que é total,

geral, onde referido princípio contempla a possibilidade de todos que vivem no

Brasil, sejam estrangeiros, trabalhadores urbanos ou rurais, de forma mais

abrangente possível, serem resguardados em situações de carência, quer na

invalidez, desemprego, morte, velhice, dentre outros.

Em relação à saúde, esta é literalmente universal, pois como o próprio

dispositivo constitucional (art. 196) prevê, a saúde é direito de todos e dever do

Estado, não tolerando discriminações. Também, a assistência social atinge

àqueles que dela necessitar, de forma igualitária. No entanto, no que concerne

à Previdência Social, esta é limitada, uma vez que a cobertura ocorre em riscos

predeterminados, devendo ainda haver o requisito da contribuição.

A universalidade da cobertura “refere-se aos sujeitos protegidos. Os

atingidos por contingências sociais que retirem ou diminuam a capacidade de

trabalho, de ganho, devem ser protegidos” (TSUTIYA, 2013, p. 73). Por sua

vez, a universalidade do atendimento importa os acontecimentos que decorrem

a proteção social, de acordo com previsão legal.

Neste diapasão, Kertzman (2015, p. 54) acentua que em consonância

com o teor do princípio da universalidade do atendimento, a Previdência Social

facultou ao cidadão que não exerce atividades laborativas remuneradas e

acobertadas pelo sistema, a possibilidade de filiar-se ao sistema, instituindo-se

a categoria de segurado facultativo.

1.2 Princípio da uniformidade

O tratamento oferecido pela Seguridade Social aos trabalhadores

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urbanos e rurais deve ser invariável, de forma proporcional, referente ao valor

pecuniário, impondo que o âmbito de proteção social seja o mesmo. Tal

princípio visa reduzir as desigualdades sociais, em atenção ao princípio

constitucional da Igualdade.

Saliente-se que a expressão igualdade não significa tratar todos de

forma igual, mas sim aceitando diferenciações a depender do caso concreto.

Assim, no caso de trabalhadores rurais, a idade mínima para aposentar-se

difere dos trabalhadores urbanos, tendo em vista as peculiaridades de cada

exercício laborativo, onde “os benefícios devem ser os mesmos (uniformidade),

mas o valor da renda mensal é equivalente, não igual. É que o cálculo do valor

dos benefícios se relaciona diretamente com o custeio da seguridade”.

(SANTOS, 2013, p. 45).

1.3 Princípio da Seletividade e distributividade na prestação dos

benefícios e serviços

Cuida-se de princípio destinado às situações específicas pregadas na

legislação, englobando os riscos e contingências previstos no art. 201 da

Constituição Federal. A título ilustrativo, somente será devida a aposentadoria

por invalidez àqueles que estiverem incapacitados total e permanentemente,

sem hipótese de reversão de seu quadro clínico, às atividades laborativas.

Ainda, este princípio tem intrínseca relação com o Princípio da Universalidade.

Neste diapasão, é o ensinamento de Ivan Kertzman:

[...] Desta forma, o que realmente este princípio seleciona são os riscos sociais carecedores de proteção. Uma vez selecionado o risco, todas as pessoas que incorrerem na hipótese escolhida farão jus à proteção social. Em outra análise, a seletividade serve de contrapeso ao princípio da universalidade da cobertura, pois, se de um lado a previdência precisa cobrir todos os riscos sociais existentes, por outro os recursos não são ilimitados, impondo à administração pública a seleção dos benefícios e serviços a serem prestados, com base na relevância dos riscos sociais. É o chamado princípio da reserva do possível (2015, p. 55).

Portanto, a distributividade implica na definição de critérios para os

sujeitos que mais precisam de proteção, distribuindo-se recursos aos

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necessitados de forma ampla. Já a seletividade, ao ser aplicada, pode ser

destinada de forma particularizada, no que concerne às prestações específicas

de previdência social, saúde e assistência social.

Ressalte-se, por fim, que se difere o princípio em comento da

Universalidade, pois a cobertura é universal, contudo, para obtenção do

benefício ou serviço, o segurado deve enquadrar-se nas situações seletivas

previstas na legislação.

1.4 Princípio da irredutibilidade do valor dos benefícios

Condizente com o seu nome, é defeso a redução do valor dos benefícios

da seguridade social, uma vez que se deve manter o poder aquisitivo dos

segurados. O art. 201, §4º, da Carta Magna ratifica este princípio,

estabelecendo que é assegurado o reajustamento dos benefícios para

preservar aos segurados, em caráter permanente, o valor real.

A irredutibilidade tem por objetivo a manutenção do poder real de compra, resguardando os benefícios da corrosão causada pela inflação. Ressalte-se que os benefícios previdenciários não estão atrelados ao salário-mínimo em virtude das regras adotadas pelo atual sistema previdenciário. A Constituição Federal assegura que os benefícios sofrerão reajuste periódico que preserve o valor real ou o poder de compra do benefício. A periodicidade e os critérios de reajustamento são aspectos que devem ser estabelecidos pelas normas infraconstitucionais. (HORVATH, 2011, p. 23).

Ainda, tal princípio, indiretamente, tem previsão na Constituição Federal,

constatando-se com relação aos salários dos empregados (art. 7º, VI), ao

salário mínimo (art. 7º, VI), sendo irredutível, à remuneração dos componentes

do Poder Judiciário (art. 95, III) e Membros do Ministério público (art. 128, §5º,

I, c), e outros, conforme preceitos na legislação. (TAVARES, 2014, p. 5).

1.5 Princípio da equidade e diversidade da base de financiamento

O princípio da equidade na forma de participação do custeio decorre do

princípio da igualdade, em virtude do seu significado, que determina aos

contribuintes a participação no custeio de forma proporcional, isto é, conforme

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a sua capacidade e devendo ser tributados de maneira igual, em consonância

com sua situação fática. Dessa forma, “cada contribuinte deve participar na

medida de suas possibilidades. Assim, quem pode mais, contribui com mais;

quem pode menos, contribui com menos”. (VIANNA, 2014, p. 18).

Além disso, em situações específicas, é cabível a cobrança variada de

tributos, como sucede com o teor do art. 195, §9º da Constituição Federal,

dispondo que as contribuições sociais do empregador “poderão ter alíquotas ou

bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização

intensiva de mão-de-obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do

mercado de trabalho”. (BRASIL, 1988).

Por seu turno, o princípio da diversidade da base de financiamento tem

expressa previsão no art. 195, caput e incisos I, II, III e IV da Constituição

Federal, compreendendo um complexo de recursos que serão alcançados por

diversas fontes, sendo a seguridade social financiada por toda a sociedade, de

forma direta e indireta, por meio de recursos provenientes dos orçamentos da

União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, empregadores, a

receita ou o faturamento, sobre a receita de concursos de prognósticos, dentre

outros previstos no artigo supracitado.

Ainda, segundo o art. 195, §4º, da Carta Magna, há a previsão de outras

fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social,

em atenção ao disposto no art. 154, I, podendo instituir a União, mediante lei

complementar, impostos, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato

gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição.

1.6 Princípio do caráter democrático e descentralizado da

administração

O princípio do caráter democrático e descentralizado da administração,

mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos

empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados, como

aborda sua própria denominação, é a regulamentação da participação destes,

justamente porque a seguridade social cuida com interesse de todos esses

“protagonistas” sociais.

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O caráter democrático exprime o fato da seguridade social contar com a

participação desses quatros integrantes, daí a gestão quadripartite, sendo os

trabalhadores, empregadores, aposentados e o Governo nos órgãos

colegiados; a descentralização representa a transferência, distribuição que a

Administração Direta realiza para a Administração Indireta ou para o particular,

como ocorre com o sistema previdenciário, sendo de responsabilidade de uma

autarquia federal, o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.1

1.7 Princípio da solidariedade

Trata-se de objetivo fundamental da República Federativa do Brasil,

prescrito na Constituição Federal, art. 3º, I, o qual dispõe que a construção de

uma sociedade livre, justa e solidária é objetivo da República. Outrossim, o

caput do art. 40 da mencionada legislação assegura aos servidores titulares de

cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

incluídas suas autarquias e fundações, o regime de previdência de caráter

contributivo e solidário. Assim, elucida Frederico Amado:

Essencialmente a seguridade social é solidária, pois visa a agasalhar as pessoas em momentos de necessidade, seja pela concessão de um benefício previdenciário ao segurado impossibilitado de trabalhar (previdência), seja pela disponibilização de um medicamento a uma pessoa enferma (saúde) ou pela doação de alimentos a uma pessoa em estado famélico (assistência). Há uma verdadeira socialização dos riscos com toda a sociedade, pois os recursos mantenedores do sistema provêm dos orçamentos públicos e das contribuições sociais, onde aqueles que pagam tributos que auxiliam no custeio da seguridade social, mas hoje ainda não gozam dos seus benefícios e serviços, poderão no amanhã ser mais um dos agraciados, o que traz uma enorme estabilidade jurídica no seio da sociedade (2015, p. 34-35).

Ademais, faz-se importante trazer o conceito de solidarismo, presente no

dicionário Aurélio (2009, p. 1870) que conceitua referido termo como: “[de

solidário + -ismo). S.m. Filos. Doutrina que dá prioridade à solidariedade como

princípio moral, situando-se acima da justiça, ou da caridade; etc.”

1 Oportuno ler o disposto na obra: MAZZA, Alexandre. Manual de direito administrativo. 2.

ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 719.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise principiológica mostra-se necessária por serem os princípios

normas que traçam orientações para o sistema jurídico que devem, no sentido

obrigatório, ser efetivados. Destarte, por meio do estudo dos princípios

ordenados no art. 194, parágrafo único, da Constituição Federal, vislumbra-se

a importância destes para o Sistema da Seguridade Social, tendo em vista que

os mesmos oferecem diretrizes fundamentais e são considerados norteadores

na criação e aplicação do direito neste ramo. Ademais, cabe salientar que os

princípios da Seguridade Social estão presentes em seus três

desdobramentos, quais sejam, Saúde, Assistência Social e Previdência Social.

Nesse aspecto, pode-se inferir que com relação à saúde, esta é

literalmente universal, pois como o próprio dispositivo constitucional (art. 196)

prevê, a saúde é direito de todos e dever do Estado, não tolerando

discriminações. Ocorre que, vê-se diariamente a não efetivação deste princípio,

visto o caos no Sistema Único de Saúde, como falta de atendimento, ausência

dos medicamentos necessários, lotação nos leitos de hospitais, dentre outros.

Assim, um Estado que tem como fundamento a promoção do direito

fundamental à saúde, a todos os cidadãos, garantindo constitucionalmente o

acesso integral, gratuito, universal e igualitária desta, torna-se incoerente

quando deixa desamparados os mais necessitados desta prestação.

Diante disso, torna-se imperioso exigir do Estado, entendido nas suas

três esferas, o cumprimento de sua função estabelecida na Constituição

Federal, de modo que garanta o direito à saúde conforme a ordem

constitucional, não permitindo, a diferenciação de classes, aumentando cada

vez mais as desigualdades sociais existentes. Outrossim, é um desafio a

efetivação dos princípios da seguridade social, notadamente o princípio da

Universalidade, mas somente com a correta adoção de uma estrutura e

planejamento adequado que se viabilizaria a proteção dos direitos relativos à

saúde, à previdência e à assistência social. Portanto, conclui-se que, acima de

tudo, os que princípios têm papel de destaque na aplicação de direitos relativos

à seguridade social, possuindo conteúdo próprio que dá eficácia ao direito

social assegurado, e com sua correta direção e aplicação, a saúde, previdência

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social e assistência social não portaria imensos desafios e problemas a serem

sanados.

REFERÊNCIAS

AMADO, Frederico. Direito previdenciário. 5 ed. Bahia: JusPodivm, 2015. BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. 2. ed. São Paulo. QuartierLatin, 2010. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo. Malheiros Editores, 2014. DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de Direito Previdenciário. São Paulo: Método, 2008. KERTZMAN, Ivan. Curso prático de direito previdenciário. 12. ed. Bahia: JusPodivm, 2015. MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. 35 ed. São Paulo: Atlas, 2015. SANTOS, Marisa Ferreira dos; LENZA, Pedro (Coord.). Direito previdenciário esquematizado. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. SOUZA, Vinicius Roberto Prioli de. Conhecimentos Essenciais da Justiça: Constituição Federal, Processo e Poder Judiciário. v. 1. Birigui: Boreal Editora, 2016. ______. Novo Código de Processo Civil: Alterações e Inovações Comentadas. Birigui: Boreal Editora, 2016. TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. TSUTIYA, Augusto Massayuki. Curso de direito da seguridade social. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

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PARADIGMAS CONCEITUAIS ACERCA DA DIGNIDADE HUMANA

Danieli Larissa de Souza Pereira – [email protected] Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Vinicius Roberto Prioli de Souza – [email protected] Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente trabalho expõe a crítica em torno dos diversos conceitos da dignidade humana e o uso indiscriminado da mesma, no qual é possível constatar de modo universal que a dignidade é inerente a todos os seres humanos, independente de classe social, cor, religião ou qualquer outra característica. Diante da mutabilidade social o princípio da dignidade humana adquire novas características ao passar dos anos. Palavras-chave: Dignidade humana. Conceito. Dever. Qualidade. Valor.

INTRODUÇÃO

É notório que o princípio da dignidade humana está presente em todas

as áreas da vida humana. Como se trata de um princípio abstrato, a

problemática se encontra na tentativa de conceitua-la, uma vez que a

dignidade humana é um compilado de conteúdos jurídicos, além de ser

considerado um valor fundamental para o ordenamento jurídico de vários

países.

Desta forma, o presente trabalho tem por objetivo analisar os diversos

aspectos da dignidade da pessoa humana e a possiblidade de conceituá-la ou

não.

Considerando o fato de o homem ter sido feito através da imagem e

semelhança de Deus e por esse motivo é ser digno, faz-se presente os

pensamentos de filósofos e religiosos.

Ainda neste trabalho será abordada a questão da relativização do

princípio da dignidade humana no que tange a colisão de direitos.

O trabalho será composto por cinco partes: onde a primeira consta

conceito de dignidade apresentado por diversos estudiosos renomados no

campo da Filosofia e do Direito; a segunda é um breve progresso histórico do

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princípio da dignidade desde a antiguidade até os dias atuais; de forma

comparativa a terceira parte mostra a diferença da língua grega e a falta de

expressões específicas para a palavra “dignidade”; a quarta consiste nos

aspectos de valores, normas e efetividade no caso concreto; e, por fim, os

resultados da pesquisa diante do estudo realizado.

1 CONCEITO DE DIGNIDADE

A expressão dignidade da pessoa humana é usada constantemente

para defender direitos. Com o intuito de estabelecer uma base sólida para a

compreensão de dignidade da pessoa humana, renomados estudiosos

iniciaram o processo de conceituação.

Segundo Marcelo Novelino (2015, p. 293), tanto a elaboração quanto a

aplicação das normas jurídicas são resultado da observância do princípio da

dignidade no qual transluz o dever de respeito a ser seguido pela sociedade.

Esse valor jurídico é fruto de um processo inicialmente apenas moral que ao

passar dos anos tornou-se necessária a sua positivação. O Estado passou a

ter a obrigação de proteger a dignidade do homem evitando o tratamento de

qualquer pessoa como objeto. De acordo com o autor a dignidade, em si, não é

um direito, mas uma qualidade intrínseca a todo ser humano,

independentemente de sua origem, sexo, idade, condição social ou qualquer

outro requisito. (NOVELINO, 2015, p. 293).

Nesse contexto podemos associar aqui o princípio da igualdade, no qual

todos estão no patamar de “ser humano”, e, consequentemente, todos

possuem dignidade.

Na posição de Ailton Cocurutto (2008, p. 50) dignidade da pessoa

humana é princípio fundamental da estrutura organizacional do Estado

Democrático de Direito.

O autor coloca a dignidade como núcleo de uma estrutura organizada

que deverá predominar em colisão de princípios e conflito de regras. Mesmo

que os princípios sejam válidos existe a necessidade de fazer uma análise de

qual é mais eficaz e próximo da dignidade humana, visto que cada princípio

busca um objetivo com peculiaridades próprias.

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Conforme este raciocínio é valido lembrar o entendimento de Luiz

Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior (2010, p.123) no qual o

princípio da dignidade humana passou a entrelaçar intimamente a ideia de

cidadania, por meio do qual o indivíduo tem direito de exigir e ter direitos, não

apenas políticos, mas sim uma amplitude dos mesmos.

A dignidade da pessoa humana foi ganhando sentidos religiosos,

filosóficos e políticos, mas foi com o pensamento clássico que iniciou o

desenvolvimento da compreensão de dignidade humana que temos hoje. Um

marco histórico muito significativo foi o fim da Segunda Guerra Mundial, a

barbárie cometida pelo fascismo fez com que as pessoas lutassem pelos

direitos humanos e uma vida digna.

A partir desse momento a dignidade da pessoa humana foi incorporada

ao discurso político, aos tratados e documentos internacionais, em busca de

uma era de paz e proteção dos direitos humanos. (BARROSO, 2014, p.19).

Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade ascendeu ainda mais a

chama para a busca da vida digna e da autodeterminação. Nesse sentido, vale

salientar o conceito de dignidade da pessoa humana apresentado por

Alexandre de Moraes:

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais. (MORAES, 2010, p.22).

A autodeterminação dá-se no sentido de autonomia. Segundo Luís

Roberto Barroso existem três categorias de autonomia sendo elas: privada,

pública e o mínimo existencial.

A autonomia privada significa autogoverno do indivíduo que com o uso

da razão protege-se para que o Estado não intervenha de forma abusiva em

sua vida pessoal. Esta proteção é conhecida como “liberdade dos modernos”.

Dessa forma o raciocínio jurídico objetivo atingir o equilíbrio adequado diante

de fatos complexos e da existência de normas aparentemente contraditórias. É

importante frisar que a dignidade humana em termos de autonomia se

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apresenta de várias formas, neste caso da autonomia privada o seu papel

principal é reconhecer que a intimidade do indivíduo deve ser respeitada.

A autonomia pública está associada com a cidadania e a participação

política por meio do direito ao voto, a possibilidade de concorrer aos cargos

públicos, entre outros. Nesse sentido, por meio da democracia o povo exerce

sua soberania o que configura a autonomia pública conhecida como “liberdade

dos antigos”.

Já a autonomia no sentido de mínimo existencial é reconhecer que para

os seres humanos serem livres e iguais eles precisam de acesso a algumas

prestações essenciais e elementares como saúde, educação, alimentação,

moradia e vestuário, configurando assim os direitos sociais. A concessão dos

mínimos existências por parte do Estado efetiva a dignidade na prática e da

margem a concretização da autonomia, passando da ficção para a realidade.

(BARROSO, 2014, p.82-87).

Ingo Wolfgang Sarlet, ao conceituar a dignidade da pessoa humana,

afirma que se trata da:

(...) qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida (SARLET, 2015, p. 70-71).

Este valor intrínseco é atribuído a todos os seres humanos e coloca-os

em condição superior diante das outras espécies existentes.

O indivíduo do presente é fruto de uma cultura passada que vem

sofrendo alterações e se adaptando com a tecnologia, nesse sistema aqueles

que se encontra em uma situação econômica muito restrita são os mais

afetados e tratados de forma desigual. Neste caso o papel do princípio da

dignidade é utilizado no sentido de demonstrar a potencialidade do ser e esse

processo é feito normalmente pelo próprio Estado com medidas de inclusão

social.

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O conceito de dignidade ainda é abstrato e adquire características

próprias na exposição de cada autor. Sendo assim, torna-se um tema muito

aberto à discussão por juristas, sociólogos, filósofos, entre outros.

2 PROGRESSO HISTÓRICO

Na antiguidade (476 d.C.), a dignidade estava associada ao status

pessoal de alguns indivíduos. O grau de dignidade era associado de acordo

com a posição política ou social, bem como certas instituições como a pessoa

do soberano, a coroa ou o Estado. Estes indivíduos e instituições gozavam de

um tratamento especial, com direitos exclusivos, diferente das demais pessoas.

Já no pensamento estoico (século III a.C.) sem vinculação com a

posição político-social, a dignidade era considerada como qualidade inerente a

cada ser humano, qualidade esta que o distinguia das demais criaturas. A

razão e a capacidade de autodeterminação do homem era a chave da

liberdade para fazer suas próprias escolhas, seus atos passaram a ser mais

cautelosos de modo a não causar prejuízos aos outros, pois aqui todos eram

iguais em sua dignidade. Este pensamento é fruto de Marco Túlio Cícero,

político e filósofo que denotou a vinculação da noção de dignidade com a

pretensão de respeito que deve prevalecer em todo ser humano. (SARLET,

2015, p.33-34).

Com a Idade Média (século XIII), a dignidade passou a ter aspecto

religioso no sentido do ser humano ter sido feito à imagem e semelhança de

Deus, destacando seu valor intrínseco, ou seja, desde o seu nascimento o

homem já era considerado um ser dotado de dignidade, no qual podia sofrer

alterações perante os atos praticados por ele durante sua existência, segundo

os preceitos da religião cristã.

No antropocentrismo renascentista (século XV), o homem está no centro

do mundo, o que faz com que se torne capaz de escolher o seu próprio

caminho, essa capacidade é um atributo que Deus proporcionou ao próprio

homem diferenciando-o dos demais seres, conforme o pensamento de

Giovanni Pico della Mirandola (1486, p. 38 - 40).

A dignidade humana até então apresentada de acordo com o aspecto

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social e religioso, passou por um processo de racionalização com o surgimento

do Iluminismo compreendido entre os anos de 1650 e 1700, o uso da razão

passou a ser o instrumento para a reforma da sociedade, compreendendo o

valor de igualdade em dignidade perante os seres humanos.

Um grande percursor do Iluminismo (século XVII e XVIII) com a

concepção de dignidade humana em liberdade moral foi o filósofo Samuel

Pufendorf, não se esquecendo de Thomas Hobbes, John Locke e Jean

Jacques Rousseau, filósofos que contribuíram com as ideias de direito natural,

liberdade e democracia para o avanço da dignidade. (BARROSO, 2014, p.17-

18).

A dignidade como valor exclusivo do ser humano, passível de autonomia

e inalienável demonstra o início de uma sociedade ética, onde o ser humano

não pode ser tratado como objeto para atender desejos de outrem. Immanuel

Kant afirma que:

No reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade... Esta apreciação dá pois a conhecer como dignidade o valor de uma tal disposição de espírito e põe-na infinitamente acima de todo o preço. Nunca ela poderia ser posta em cálculo ou confronto com qualquer coisa que tivesse um preço, sem de qualquer modo ferir a sua santidade (KANT, 2015, p.40).

É a concepção de Immanuel Kant que a maior parte da doutrina jurídica

busca a fundamentação do conceito de dignidade.

Nesse processo em busca do conceito contemporâneo de dignidade

humana, é de muita relevância recordar as atrocidades da guerra civil inglesa e

as crueldades ocorridas. Na prática, o ser humano não era respeitado, a busca

por batalhas, o desejo do homem de destruir o outro era claro e aterrorizante. A

guerra de todos contra todos mostra que nem sempre há segurança para uma

vida digna.

Outro marco foi a Segunda Guerra Mundial, o qual ficou marcada na

história com o fascismo e as barbáries. O seu fim foi decisivo para que a

dignidade humana fosse incorporada no discurso político dos vitoriosos, como

base de uma era de paz e proteção dos direitos humanos. (BARROSO, 2014

p.18 – 19).

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Os atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade fez surgir

a Declaração Universal dos Direitos Humanos para proteger a dignidade da

pessoa humana, promovendo assim as relações amistosas entre as nações.

No entanto, é necessário analisar os ajustes que vão acontecendo de

acordo com a evolução social, econômica e jurídica. A dignidade até então

comentada nos remete ao ser humano, diferenciando-o dos demais seres

vivos. Todavia, com o direito contemporâneo deve ser reconhecida a dignidade

de modo geral, para que dessa forma possa reconhecer a necessidade de

preservação das outras formas de vida existentes no planeta.

O antropocentrismo excessivo sustenta a ideia de a dignidade ser

atributo exclusivo da pessoa humana, ocupando um lugar privilegiado em

relação aos demais seres vivos. De certo modo, isso faz com que os animais

sejam tratados como objetos.

Na perspectiva de proteção dos mesmos, surgiu o abolicionismo animal

que rejeita a sua exploração e maus tratos, argumentando que a capacidade

de sofrimento e de sentir prazer seria a característica vital de conferir a um ser

o direito à igual consideração.

Nesse sentido, a ampliação do conceito de dignidade não seria atributo

exclusivo do homem, mas sim de todas as espécies, como forma de aceitar os

deveres de proteção que essas espécies necessitam.

Em todos estes aspectos que envolvem a sua evolução histórica, vale

lembrar que o seu conceito não se restringe aqui, pois a dignidade é mutável e

construída de acordo com os acontecimentos históricos e culturais.

3 A DIGNIDADE X LÍNGUA GREGA

O significado das palavras é a base para iniciar o processo de

conceituação de qualquer matéria que se queira obter uma visão mais conexa.

O universo cultural considerado como conjunto de hábitos,

manifestações artísticas, sociais e linguísticas, possibilita o emprego de

características próprias que define o perfil social de um povo.

A linguagem verbal como a não verbal, por exemplo, é o veículo do

conhecimento e da comunicação que possibilita as relações sociais e a vida

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em comunidade, a forma de pensar e trocar informações vai depender do

ambiente que a pessoa vive ou viveu a maior parte do tempo, pois cada povo,

cada nação se comunica com a língua que lhe é peculiar.

O grego, por exemplo, é um idioma da família linguística indoeuropeia e

caracteriza-se pela sua flexibilidade formal e extraordinária riqueza léxica,

assim várias palavras englobam um mesmo radical, como por exemplo, a

expressão “amor”.

O amor na língua grega é expresso de três formas distintas, porém

todas se completam conforme André Comte Sponville (2009, p.245).

A primeira utiliza a expressão Eros que é apresentada como amor no

sentimento de falta, ou seja, o desejo polarizado por aquilo que não possui e

quando o conquista se torna felicidade. Segundo Socrates aquilo que não

temos, que não somos e que nos falta são objetos do amor. (SPONVILLE,

2009, p.253).

A segunda é philia, no qual amor é amizade em sentido lato, ou seja,

sentimento forte que desperta entre humanos, esse amor pode ser sentido de

diversas maneiras desde que não se resuma à falta. (SPONVILLE, 2009, p.261

- 286).

E a terceira e última forma de expressar amor é a palavra agapé onde o

amor é Deus, sendo assim universal e desinteressado, pois aqui se ama até os

inimigos. (SPONVILLE, 2009, p.286 - 311).

Todas essas expressões são específicas e claras o suficiente a ponto de

não haver equívoco no momento da interpretação.

A palavra Direito, por exemplo, que antes era designada como

jurisconsulto, sofreu alguns ajustes e hoje ela possibilita conceituações

diversas na qual engloba comportamentos sociais, sistema de normas jurídicas

que tem como objetivo o alcance da justiça de forma efetiva.

Em relação ao conceito de dignidade que vem sendo apresentado, ainda

não existe uma expressão que traduz dignidade como direito ou garantia. Esta

supressão de sentidos e rigidez linguística impede outras formas específicas de

dignidade dentro de uma única palavra. A pobreza de vocabulário é como

andar somente em círculo, sem a existência de outro caminho que possa ser

percorrido para encontrar outras soluções para um mesmo conteúdo, a

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generalização neste caso é ponto principal para notar essa diferença.

A expressão dignidade traz inúmeros conteúdos jurídicos, porém é

considerada uma expressão vaga por apresentar uma ampla possibilidade de

acolher matérias ditas como dignas. O uso de subespécies, por exemplo,

permite a partição das diversas formas de dignidade.

Assim como a expressão amor, deriva as expressões gregas eros, philia

e agapé para diferenciar as formas existentes de amor. Na língua portuguesa,

em decorrência de sua pobreza de vocabulário, não há expressões próprias

para cada sentido da palavra dignidade, o que aumenta, ainda mais, o uso

indiscriminado da referida expressão.

4 VALORES, NORMAS E EFETIVIDADE

A dignidade assim como o direito é um fenômeno histórico e cultural,

marcada por determinados momentos da vida social. Essa culturalidade que

outorga ao Direito um sentido útil. (ALARCON, 2014, p. 42).

De acordo com o desenvolvimento dos povos é impossível estabelecer

um padrão jurídico regular para todos visto que existem diferentes contextos

culturais. A dignidade da pessoa humana por ser universal é atribuída no

sentido de manter o equilíbrio da dualidade existente entre a questão cultural e

o sujeito formulador de normas.

Assim como o direito é visto sobre vários aspectos a dignidade também

é. No que tange ao valor superior do princípio da dignidade humana o seu grau

de reconhecimento e proteção irá depender de sua efetiva realização e

promoção no contexto constitucional pátrio, melhor dizendo, a sua efetivação

no caso concreto que irá demonstrar o seu grau de proteção. Esse

mandamento de otimização deve ser realizado na sua maior medida possível.

A dignidade humana como norma jurídica é classificada em princípio e

regra. Enquanto princípio, a sua elevada margem de precedência em face dos

demais princípios e seus diversos aspectos levam a impressão de sê-lo

absoluto.

Sendo todas as pessoas iguais em dignidade com dever de respeito

recíproco a questão é saber até que ponto a dignidade da pessoa humana na

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condição de princípio e/ou direito fundamental pode ser tida como absoluta

(que não cabe restrição) e/ou relativa, ou seja, se a dignidade pode ser objeto

de algum tipo de limitação perante seu exercício. (SARLET, 2015, p.158).

A dignidade da pessoa humana, mesmo considerada como valor

supremo do ordenamento jurídico, não está imune das intervenções para

solucionar o caso concreto. Melhor dizendo, em face de um conflito de pessoas

que são consideradas iguais em dignidade com valor permanente e

insubstituível que devem ser respeitados, não se dispensa o juízo de

ponderação.

Nem toda a restrição de direito afeta a dignidade do seu titular,

consequentemente deve ser feita uma análise de intervenção para constatar se

ela é legítima ou não. A pena de prisão que priva a liberdade do indivíduo, por

exemplo, não afeta sua dignidade, pois se trata de uma forma de punir o

indivíduo pelo crime que cometeu, para que depois de reeducado possa

retornar à sociedade.

Dando sequência ao entendimento de Ingo Wolfgang Sarlet (2015,

p.84), a condição de princípio vincula a dignidade da pessoa humana na sua

dupla dimensão jurídica objetiva e subjetiva no qual guarda relação com os

valores fundamentais de uma determinada comunidade.

Podemos usar como exemplo a cultura ocidental onde as mulheres

mulçumanas utilizam burca como vestimenta para esconder o rosto e o corpo,

deixando apenas os olhos descobertos como forma de demonstrar sua fé

perante a religião que adotam. Exigir que uma muçulmana suspenda o uso da

burca por questões de segurança ou outro motivo em um determinado país

(até mesmo em seu próprio território) é uma ofensa a sua dignidade.

Entretanto, outros países que não adotam esta cultura, o uso de uma roupa

que mostre mais o corpo não violaria sua dignidade.

O que deve ser analisado é o valor intrínseco de cada individuo, a sua

igualdade perante a lei. Conforme traz Luís Roberto Barroso (2014, p.78) todos

os indivíduos têm igual valor e por isso merecem o mesmo respeito e

consideração. O reconhecimento do outro como pessoa é afirmar que ele

possui valor e dignidade.

A dignidade também é considerada como valor comunitário, que

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representa o elemento social da dignidade. O indivíduo ao viver dentro de uma

comunidade e de um Estado, tem sua autonomia restringida por valores,

costumes e regulação estatal.

Em busca do bem comum de todos, a dignidade como valor comunitário

é efetivada através do papel do estado e da comunidade que estabelece

restrições sobre direitos e liberdades individuais, com o objetivo de impedir atos

que violem os direitos de outrem.

Não é difícil compreender que diante de todos os aspectos

apresentados, a dignidade da pessoa humana enquanto valor fundamental é

efetivada através de normas jurídicas que engloba tanto os princípios como as

regras jurídicas. Nesse sentido, diante das situações teóricas e práticas o que

deve ser levado em consideração para fins de solução de conflito é

reconhecimento da dignidade de acordo com o ambiente cultural/religioso que

se encontra o indivíduo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A dignidade humana no ponto de vista universal é uma qualidade

intrínseca ao ser humano, composta por valores éticos, morais, sociais,

espirituais que vão sofrendo alterações com o passar dos anos. Como valor

fundamental do Estado Democrático de Direito, ela serve como base para que

os direitos fundamentais possam ser efetivados.

Dessa forma é possível constatar que o conceito da dignidade humana é

construído através das diversidades dos povos e acontecimentos históricos da

humanidade.

REFERÊNCIAS ALARCON, Pietro de Jesús Lora. Ciência política, estado e direito público. 2. ed. São Paulo: Verbatim, 2014. ARAUJO, Luiz Alberto David; JÚNIOR, Vidal Serrano Nunes. Curso de direito constitucional. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo. Belo Horizonte: Fórum, 2014.

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COCURUTTO, Ailton. Os princípios da dignidade da pessoa humana e da inclusão social. São Paulo: Malheiros, 2008. MIRÀNDOLA, Giovanni Pico della. A dignidade do homem. São Paulo: Escala, 1486. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 26. ed. São Paulo: Atlas, 2010. NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. Salvador: JusPodivm, 2015. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,2015. SOUZA, V. R. P. Contratos Eletrônicos & Validade da Assinatura Digital. Curitiba: Juruá, 2009. ______. Novo Código de Processo Civil: Alterações e Inovações Comentadas. Birigui: Boreal Editora, 2016. SPONVILLE, André Comte. Pequeno tratado das grandes virtudes. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ESTACIONAMENTOS DE VEÍCULOS E

CONGÊNERES

Adriano Liel Previatto - [email protected] Graduando em Direito - UniSALESIANO Lins

Prof. Me. Danilo César Siviero Ripoli - [email protected] Docente - UniSALESIANO Lins

RESUMO

O presente trabalho verifica a responsabilidade civil dos estacionamentos de veículos e congêneres, firmados por meio de contrato de depósito. A problemática envolve os aspectos legais dos avisos fixados nas paredes dos estacionamentos pagos ou gratuitos, no sentido de excluir a responsabilidade civil do fornecedor do serviço em caso de furto do veículo ou de pertences deixados no seu interior. O trabalho torna-se relevante já que esse acontecimento verifica-se de forma corriqueira no cotidiano das pessoas, que se utilizam desses serviços em diversos ambientes e espaços e se deparam com avisos fixados nas paredes dos estabelecimentos. No entanto, o depositário tem responsabilidade civil objetiva sobre os bens que estão sob o seu poder e, ainda que se tenha afixada a cláusula de não indenizar, entendidas como cláusulas de não segurança, não o exime de culpa quanto ao dever de reparar o dano ao depositante. O presente trabalho tenta alcançar como resultado da pesquisa, a conclusão de que a doutrina e a jurisprudência brasileiras estabelecem o entendimento de que os estabelecimentos destinados como depositários de veículos, respondem independente de culpa, pelos danos causados nos veículos e objetos guardados em seu interior, firmando a responsabilidade civil objetiva. Palavras-chave: Proibição da não segurança. Relação de consumo. Responsabilidade civil.

INTRODUÇÃO

No presente trabalho, buscou-se a explicação e elucidação de uma

relação jurídica denominada contrato de depósito, que trata de um negócio

jurídico corriqueiro, muito utilizado no cotidiano das pessoas em sociedades

que se utilizam de estacionamentos para guardarem os seus veículos, sejam

estacionamentos de bancos, supermercados, escolas, hospitais, shoppings,

clubes, postos de combustíveis, estabelecimentos de lavagens e lubrificação e

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outros e em muitos deles, gratuitos ou não, senão na grande maioria, podem

ser visto fixado nas paredes o aviso, em letras garrafais, da irresponsabilidade

do estacionamento por eventual furto ou dano ocorrido no veículo estacionado,

intimidando o cliente.

A compreensão da aplicabilidade da responsabilidade civil na vida das

pessoas permite que ambas as partes do processo, ou seja, depositante ou

depositário, não sejam lesados e lutem pelos seus direitos e pela garantia que

eles sejam plenamente efetivados. Assim sendo, a responsabilidade civil se

aplica em diversas situações cotidianas, entretanto, neste momento atentará

no seu enfoque em relação aos estacionamentos e congêneres, por ser um

aspecto usualmente utilizado por diversas pessoas.

OBJETIVOS

Para o desenvolvimento do presente trabalho foi necessário elencar

alguns objetivos que nortearam a pesquisa bibliográfica, bem como a análise e

correlação entre as hipóteses levantadas e os resultados obtidos. A

problemática da pesquisa do presente trabalho é qual seria a responsabilidade

civil dos estacionamentos de veículos ou congêneres, tendo como palavras-

chave: relação de consumo, responsabilidade civil, proibição da não

segurança. A hipótese consiste em que os estacionamentos ou similares,

respondem independente de culpa, pelos danos causados nos veículos e

objetos guardados em seu interior, firmando a responsabilidade civil objetiva.

O objetivo geral foi investigar se os avisos de não indenizar em

estacionamentos de veículos e similares, tem validade ou se contraria a norma

jurídica.

Os objetivos específicos foram analisar os meios de proteção aos

usuários dos estabelecimentos de veículos e congêneres; verificar se as placas

de avisos de exclusão da responsabilidade são legais; analisar as

possibilidades existentes dentro do ordenamento jurídico para se excluir a

responsabilidade civil; identificar como é a responsabilidade civil numa relação

de consumo e analisar a responsabilidade civil dos estacionamentos de

veículos se é objetiva ou subjetiva.

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METODOLOGIA

Para o desenvolvimento do trabalho foi escolhido o método da pesquisa

bibliográfica, realizando o aporte teórico de autores que defendem os direitos

dos depositantes e depositários, bem como as decisões dos tribunais.

1 RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ESTACIONAMENTOS DE

VEÍCULOS E CONGÊNERES

O presente artigo trata da responsabilidade civil dos estacionamentos de

veículos e congêneres. Segundo Maria Helena Diniz, trata-se de

responsabilidade objetiva do depositário, contraída por meio de um contrato

unilateral, que é possível apenas no contrato de depósito, ou bilateral nos

casos em que há contraprestação de ambas as partes. (DINIZ, 2010).

Para melhor entendimento do objeto de estudos em comento, se torna

de suma importância o estudo da relação de consumo entre o depositante e o

depositário sob a luz da legislação vigente.

1.1 Relação de consumo versus relação jurídica de natureza civil

A relação de consumo entre fornecedor e consumidor, de acordo com a

legislação consumerista, é de responsabilidade civil objetiva do fornecedor, que

deve garantir o produto ou serviço fornecido ou prestado. (LISBOA, 2008, p.

316).

O consumidor é a parte vulnerável na relação de consumo, muitos de

seus direitos não poderiam ser tutelados pelo Código Civil, ficando evidente a

necessidade de um dispositivo normativo que tratasse exclusivamente da

relação de consumo.

Conforme o Código de Defesa do Consumidor (art. 14), os donos de

estabelecimentos comerciais e congêneres são prestadores de serviços,

respondem independentemente de culpa pela reparação de danos causados

aos consumidores. Já o Código Civil de 2002 (art. 650), diz que a

responsabilidade cessa se o depositário provar que o prejuízo do depositante

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não poderia ser evitado, equiparado ao caso fortuito e força maior.

Nessa linha, o doutrinador Gonçalves relata com propriedade que:

Cabem aos tribunais decidir, pois, em cada caso, se o assalto à mão armada, nas condições em que foi realizado, no caso em julgamento, era inevitável, equiparado ao fortuito ou força maior, ou não, dizendo se era de se presumir, em face da atividade do depositário, tivessem sido tomadas especiais providências, visando a segurança (GONÇALVES C., 2011, p. 299).

A responsabilidade do depositário é objetiva e independe de culpa, não

importando se o depósito é oneroso ou gratuito, visto que o estacionamento faz

parte do estabelecimento comercial, segundo Venosa (2012, p. 288),

reforçando o posicionamento do Código de Defesa do Consumidor.

A súmula 130 do Superior Tribunal de Justiça, quase sempre é utilizada

nas fundamentações das decisões dos Tribunais:

RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. ARROMBAMENTO DE VEÍCULO. ESTACIONAMENTO DE UNIVERSIDADE. IRRELEVÂNCIA DA GRATUIDADE DO ESTACIONAMENTO. SÚMULA 130 DO STJ. DANO MATERIAL CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. Trata-se de ação de indenização, na qual o autor pleiteia o ressarcimento dos danos materiais sofridos em decorrência do arrombamento de seu veículo e o furto do notebook no estacionamento da universidade. Conjunto probatório que demonstra os danos suportados, bem como a utilização do estacionamento, conforme se extrai da ocorrência policial, dos orçamentos acostados, da declaração da fl. 25 e do depoimento do autor (fls. 7/11 e 18/25). Responsabilidade da requerida pela guarda dos automóveis, ainda que o estacionamento seja gratuito e o proprietário ex-aluno, pois caracterizado o contrato de depósito, conforme a Súmula 130 do STJ. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - RESSARCIMENTO DE VALORES DESPENDIDOS PELA SEGURADORA. FURTO DE VEÍCULO. ESTACIONAMENTO DE UNIVERSIDADE PRIVADA. 1.- O entendimento firmado por esta Corte, inclusive sumulado (Súmula 130/STJ), é no sentido que "a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veiculo ocorridos em seu estacionamento". Os precedentes que culminaram na edição da referida Súmula destacam a irrelevância da gratuidade, falta de vigilância ou de controle de entrada e saída de veículos do estacionamento para caracterizar a responsabilidade da... empresa, uma vez que caracterizado o contrato de depósito para guarda do veículo e, inclusive, em razão do interesse da empresa em angariar clientela. 2.- Agravo Regimental improvido.(AgRg no REsp 1249104/SC, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 27/06/2011) Correção monetária mantida na forma da sentença, pois mera atualização do valor da moeda, devendo incidir desde a data do orçamento, quanto delimitado o dano material sofrido pela parte e que deve ser ressarcido. Sentença que

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merece ser confirmada por seus próprios fundamentos, consoante o disposto no artigo 46 da Lei n.º 9099/95. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004980793, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Cintia Dossin Bigolin, Julgado em 18/03/2015). (TJ-RS - Recurso Cível: 71004980793 RS, Relator: Cintia Dossin Bigolin, Data de Julgamento: 18/03/2015, Segunda Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 20/03/2015)

Com propriedade, Lisboa traz a responsabilidade pela custódia do bem

guardado em cofres de hotéis ou estabelecimentos que prestem o serviço de

guarda de coisa móvel, sendo objetos pessoais ou veículos:

Na eventualidade de guarda de bens em cofres próprios do hotel ou estabelecimento congênere, este responderia no sistema clássico de responsabilidade civil por culpa in custodiendo, ante o eventual dano à coisa ou sua subtração, constituindo-se a relação contratual como uma obrigação de resultado para o hospedeiro. (LISBOA, 2008, p. 288).

A relação de consumo entre o depositante e o depositário abrange a

vigia e a custódia da coisa, constituindo uma relação contratual com obrigação

de resultado por parte do depositário.

Então, na forma da legislação especial, o contrato de depósito para

estacionamento de veículos e congêneres tem natureza de relação de

consumo, sendo disciplinada pelo Código de Defesa do Consumidor, afastando

a validade da cláusula de não indenizar, pois fere direito básico do consumidor,

sendo prevista como cláusula abusiva pelo Código de Defesa do Consumidor.

(DIAS, 1980).

Os estacionamentos de veículos e congêneres que exploram a atividade

de guarda de veículos, gratuita ou onerosamente, respondem de forma objetiva

pelo roubo ou danos causados ao bem móvel e pertences que nele estiverem,

exceto nos casos em que ficar comprovado os casos de excludentes da

responsabilidade civil. (GONÇALVES C., 2003).

No mesmo sentido, classificados como congêneres, os donos de

oficinas mecânicas, de restaurantes, hotéis, shopping, cinemas,

supermercados, dentre outros, tentam se eximir da responsabilidade civil

utilizando-se de avisos indicativos de que não se responsabilizam por dano ou

furto do veículo e dos pertences em seu interior, ocorridos em seus

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estacionamentos, alegando que não cobram pelo serviço prestado.

Para melhor compreensão desses avisos que não visam a segurança da

coisa depositada, é de suma importância o estudo das cláusulas que

estabelecem a não segurança no estacionamento gratuito.

1.2 A proibição da não segurança no estacionamento gratuito

O estacionamento gratuito pode ser considerado inserido dentro de um

conglomerado, fazendo parte de um dever anexo ao principal, relacionado ao

contrato em escopo. Faz parte da atividade empresarial, seja do

supermercado, do shopping, ou de qualquer estabelecimento que forneça

estacionamento gratuito com intuito de que o usuário seja seu freguês.

(GONÇALVES C., 2003).

Na Constituição Federal está disposto no seu art. 170, III, que todo o

exercício decorrente à propriedade privada, seja acessória ou principal,

somente poderá ser feito da função social esperada e desejada.

O Código Civil, no art. 421 dispõem que “a liberdade de contratar será

exercida em razão e nos limites da função social do contrato”, finalizando para

asseverar o assunto.

Ambas as normas são consideradas de caráter cogente, de interesse

público, não podendo ser separado por atitudes privadas. A função social é um

dever em todas as partes do contrato.

Nesse contexto, o Código de Defesa do Consumidor proíbe falta de

segurança dos usuários de estacionamentos de veículos gratuitos pela

cláusula de não indenizar. Levando em consideração que a coletividade de

veículos é mais importante que o singular, a falta de segurança para os

mesmos é mais prejudicial aos usuários. Esta hipótese está disposta no art. 10

do Código de Defesa do Consumidor, que deixou claro que “o fornecedor não

poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou

deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou

segurança”.

Dessa forma, ocorrendo lesão a uma das partes, pode-se judicialmente

pleitear a sua reparação, pela não observância do dever objetivo de

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atendimento à função social específica relacionada à guarda de veículos.

O empresário pode alegar legalidade da prática, comumente observada

na declaração de exoneração de responsabilidade, com dizeres, por exemplo,

“não nos responsabilizamos por objetos deixados no interior dos veículos”,

sendo uma declaração equivocada, visto que a proteção oferecida ao veículo

abrange os acessórios que poderão ser alcançados, violando o bem maior.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado:

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE DO RELATOR NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO COM BASE NO ARTIGO 557, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ASSALTO EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. RESPONSABILIDADE DO ESTABELECIMENTO QUE OFERECE O ESTACIONAMENTO. JURISPRUDÊNCIA. DECISÃO DO TRIBUNAL A QUO COM BASE EM ELEMENTOS FÁTICOS-PROBATÓRIOS. SÚMULA 7 DO STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. I - Nos termos do artigo 557 do Código de Processo Civil, o relator poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com jurisprudência dominante no respectivo tribunal. II - EMPRESA QUE, EM ATENÇÃO AOS SEUS OBJETIVOS EMPRESARIAIS, OFERECE LOCAL PRESUMIVELMENTE SEGURO PARA ESTACIONAMENTO, ASSUME OBRIGAÇÃO DE GUARDA E VIGILÂNCIA, O QUE A TORNA CIVILMENTE RESPONSÁVEL POR FURTOS DE VEÍCULOS ALI OCORRIDOS. (REsp 49071; Quarta turma; Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA; DJ 27.6.94); III - O Tribunal de origem decidiu a demanda após detido exame dos elementos fático-probatórios contidos nos autos, cujo reexame é providência vedada pelo enunciado 7 da Súmula do STJ. IV - Não se vislumbra, em face da quantia afinal mantida pelo acórdão a quo, razão para provocar a intervenção desta Corte. V - Agravo regimental improvido (REsp 49071; Quarta turma; Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA; DJ 27.6.94).

Os proprietários de supermercados, shopping center, cinemas,

restaurantes, dentre outros estabelecimentos comerciais que forneçam

estacionamento a seus clientes, independentemente de cobrarem ou não pelos

serviços, são responsáveis objetivamente pela guarda da coisa móvel,

devendo indenizar o depositante em caso de dano, furto ou roubo. Com

propriedade, os tribunais têm atribuído à esses casos a responsabilidade civil

objetiva:

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RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO SHOPPING CENTER POR DANO CAUSADO A VEÍCULO NO INTERIOR DE SUAS DEPENDÊNCIAS. CIRCUNSTÂNCIAS QUE CONDUZEM À CONCLUSÃO DE VERACIDADE DA VERSÃO DA PARTE AUTORA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 130, DO STJ. RESSARCIMENTO DO PREJUÍZO MATERIAL. 1. O dano a veículos em estabelecimento comercial acarreta o dever de reparar, em conformidade com o disposto na Súmula nº 130 do STJ, segundo a qual "a empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento". 3. No tocante à comprovação de que o autor esteve, de fato, nas dependências do estabelecimento requerido, há o cupom fiscal de fl. 27, somado ao ticket de estacionamento. Tais provas, aliadas ao Boletim de Ocorrência Policial (fl. 19/20), são suficientes para a verossimilhança da alegação do autor, desincumbindo-o da prova que estava ao seu alcance produzir. 4. Ademais, a verossimilhança das alegações do recorrido restam corroboradas pelo próprio depoimento do preposto do réu em audiência de instrução (fl. 06), o qual referiu ter tido conhecimento do fato porque houve atendimento ao cliente no estacionamento por um "inspetor" que comunicou o fato ao depoente, reconhecendo, dessa maneira, que houve o fato narrado na inicial nas dependências do recorrente. 5. Quanto aos documentos impugnados pelo recorrente, o simples fato de não terem sido emitidos em papel timbrado não tem o condão de afastar a verossimilhança das alegações do autor. 6. Dessa maneira, correta a condenação do réu ao pagamento da importância de R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais) ao autor, equivalente ao dano material sofrido. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004295846, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Lucas Maltez Kachny, Julgado em 26/11/2013) (TJ-RS - Recurso Cível: 71004295846 RS, Relator: Lucas Maltez Kachny, Data de Julgamento: 26/11/2013, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/11/2013)

Tal falta de segurança contradiz a função social da atividade

empresarial desenvolvida pelos estacionamentos de veículos, portanto, essa

prática é considerada abusiva. Na relação de consumo, estas práticas são

rechaçadas pela responsabilidade civil dos estacionamentos de veículos, que

se obrigam de forma objetiva na reparação do dano, conforme o disposto no

art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor: “são direitos básicos do

consumidor: [...] a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e

morais, individuais, coletivos e difusos”.

A proteção do contrato vem expressa na legislação consumerista:

São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: I – impossibilitem, exonerem ou alterem a responsabilidade do fornecedor por vício de qualquer natureza dos produtos e serviços ou

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impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor-pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada em situações justificáveis (CDC, art. 51, I).

Portando, a responsabilidade dos estacionamentos de veículos e

congêneres é de resultado, pois, por meio do depósito, assume o dever de

segurança sobre a coisa depositada. Logo é objetiva, independe de culpa, nos

termos do art. 14, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor: “respondem,

independente de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores,

por defeitos relativos à prestação do serviço”.

As escolas públicas estão sujeitas à reparação de danos morais e

materiais, mediante indenização decorrente de dano ou roubo de veículos e

pertences em seu interior, desde que haja disponibilidade de serviço de

estacionamento. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE ESCOLA PÚBLICA. 1. "O Poder Público deve assumir a guarda e responsabilidade do veículo quando este ingressa em área de estacionamento pertencente a estabelecimento público, desde que haja serviço especializado com esse fim" (REsp 438.870/DF, 2ª Turma, Min. Castro Meira, DJ de 01.07.2005). 2. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ - REsp: 858772 SP 2006/0056807-8, Relator: MIN. CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ CONVOCADO DO TRF, Data de Julgamento: 10/06/2008, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: --> DJe

04/08/2008).

Assim, não tem validade jurídica à cláusula de não indenizar quando

colocadas as placas e avisos nos estacionamentos de veículos e congêneres,

onerosos ou gratuitos, de não responsabilização pelos veículos estacionados e

objetos que estejam em seu interior, pois a proteção do carro abrange o

principal e o acessório.

RESULTADOS

Os estacionamentos de veículos e congêneres, por desenvolver

obrigação de resultado, são obrigados a ter na guarda e conservação da coisa

depositada o cuidado e diligência que costuma ter com o que lhe pertence,

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respondendo de forma objetiva pelo dano causado, independentemente se o

contrato de depósito foi constituído de forma gratuita ou onerosa.

As cláusulas de não indenizar não se encontram respaldadas no

ordenamento jurídico. A doutrina e a jurisprudência partem da ideia da culpa in

vigilando, atribuindo a culpa aos proprietários de estabelecimentos que

oferecem serviço de estacionamento, seja de forma gratuita ou onerosa.

O Superior Tribunal de Justiça, assim como os demais tribunais, vêm se

posicionando nos termos da súmula 130 do STJ, que a empresa responde,

perante o cliente, pela reparação do dano ou pela indenização nos casos de

furto ou roubo do veículo e seus acessórios ocorridos no seu estabelecimento,

tendo a responsabilidade civil objetiva mesmo que o fato ocorra por culpa de

terceiros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio da pesquisa realizada e dos resultados obtidos, conclui-se que

os estabelecimentos destinados como depositários de veículos,

estacionamentos ou similares, responde independente de culpa, pelos danos

causados nos veículos e objetos guardados em seu interior, firmando a

responsabilidade civil objetiva.

Nos casos em que o serviço de guarda é oferecido de forma gratuita,

respondem objetivamente pelos danos causados aos veículos sob sua guarda,

da mesma forma quando há uma contraprestação, nos casos em que o

estabelecimento cobra pelo serviço oferecido, configurando a responsabilidade

civil objetiva do proprietário do estabelecimento comercial, visto que na relação

de consumo, o consumidor é a parte mais fragilizada que o fornecedor de bens

e serviços.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Dispõe sobre o Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm> Acesso em: 18 mai. de 2017. BRASIL. Presidência da República. (Constituição, 1988). Constituição da

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República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C#%A7ao.htm>. Acesso em: 18 mai. 2017. BRASIL. Presidência da República. Lei Nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 18 mai. 2017. BRASIL. STJ. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO : AgRg no Ag 1003299 SP 2008/0006822-6. Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/7076172/agravo-regimental-no-agravo-de-instrumento-agrg-no-ag-1003299-sp-2008-0006822-6>. Acesso em: 18 mai. de 2017. BRASIL. STJ. ESPECIAL : REsp 858772 SP 2006/0056807-8. Rel. Min. Carlos Fernando Mathias. Disponível em: <https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/791220/recurso-especial-resp-858772-sp-2006-0056807-8>. Acesso em: 18 mai. de 2017. BRASIL. TJ-RS. Recurso Cível: 71004295846. Rel. Lucas Maltez Kachny. Disponível em: <https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113387169/recurso-civel-71004295846-rs>. Acesso em: 18 mai. de 2017. BRASIL. TJ-RS. Recurso Cível: 71004980793. Rel. Cintia Dossin Bigolin. Disponível em: <https://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/175676508/recurso-civel-71004980793-rs>. Acesso em: 18 mai. de 2017. DIAS, J. A. Cláusula de não indenizar. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. DINIZ, M. H. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. GONÇALVES, C. R. Comentários ao código civil: do direito das obrigações. Vol. 11. São Paulo: Saraiva, 2003. ______. Direito civil brasileiro 3: contratos e atos unilaterais. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. LISBOA, R. S. Direito civil de A à Z. Barueri: Manole, 2008. VENOSA, S. S. Direito civil: contratos em espécie. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

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SOBRE O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA: Conceito, Natureza Jurídica e sua Relação com a Teoria dos

Direitos Fundamentais

Maiara Fernanda de Souza Vieira - [email protected] Graduanda em Direito – UniSALESIANO Lins

Prof. Dr. Juliano Napoleão Barros – [email protected] Docente – UniSALESIANO Lins

RESUMO

O Direito a dignidade da pessoa humana é um dos princípios fundamentadores da República Federativa do Brasil, servindo como base para todo o ordenamento jurídico. O respeito à dignidade foi transformado em princípio pelo poder constituinte, na Constituição Federal de 1988, sendo considerado o princípio que rege todos os demais princípios e, ao mesmo tempo, é inerente à vida humana. A Constituição Federal ao garantir a dignidade como fundamento da republica estabeleceu limites aos poderes constituinte, executivo e legislativo, bem como à conduta da sociedade. A dignidade humana é inerente a cada pessoa, está ligada, dessa forma de modo íntimo e necessário, a cada um. Estabelecer um conceito de dignidade humana é buscar os meios necessários para tornar o princípio efetivo. Os direitos fundamentais só são possíveis de concretização quando respeitado o direito da dignidade, nenhum direito fundamental poderá afrontar a dignidade da pessoa humana, mas sim basear-se no mesmo. A dignidade da pessoa humana hoje ocupa papel fundamental para a garantia do Estado democrático de Direito. Por ser a principal proteção dos direitos fundamentais, cabe a dignidade da pessoa humana defender toda forma de vida humana existente. A visão de dignidade protegida pelo princípio fundamental deve ser comum a cada indivíduo devendo todos terem sua dignidade garantida individualmente, ao mesmo tempo o Estado deve proporcionar a todos os cidadãos a efetivação de todos os direitos Fundamentais sociais estabelecidos pelo legislador constituinte. Palavras-chave: Dignidade da pessoa humana. Direitos sociais. Direitos fundamentais. Democracia.

INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira contemporânea passa por diversas mudanças no

cenário político, social e econômico. Dentre tais mudanças, merece destaque o

incremento da necessidade de controle das políticas públicas relativas à

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promoção e proteção dos direitos sociais, frente aos desafios que nascem em

decorrência da omissão ou ineficiência do poder executivo. Neste cenário,

possui especial relevância o princípio da dignidade da pessoa humana, sua

essencialidade no dispositivo constitucional como base e preceito norteador de

todas as ações pertinentes à condição humana, caracterizando os direitos

sociais como aqueles que visam garantir uma existência digna ao indivíduo e a

á sociedade.

O princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, inciso

III da Constituição Federal, constitui um dos fundamentos do Estado

Democrático de Direito, inerente à República Federativa do Brasil. Sua

finalidade, na qualidade de princípio fundamental, é assegurar ao ser humano

um mínimo de direitos que devem ser respeitados pela sociedade e pelo poder

público.

O valor contido na dignidade da pessoa humana como fundamento da

República é absoluto, inafastável, não podendo inclusive ser renunciado,

porque consiste no respeito à integridade do homem e deve sempre ser levado

em conta por constituir a essência e o fim maior do Estado Democrático de

Direito. Existe uma complexidade com relação ao conceito da dignidade da

pessoa humana, visto que o mesmo possui uma diversidade de valores

existentes dentro da sociedade. A existência digna, pressupõe o cumprimento

dos deveres expostos no texto constitucional.

OBJETIVOS GERAL

Analisar a máxima do princípio da dignidade da pessoa humana na

aplicação e efetivação dos direitos sociais.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

a) Analisar a dignidade da pessoa humana como princípio

fundamental.

b) Conceituar o princípio da dignidade da pessoa humana.

c) Demonstrar a importância do princípio da dignidade da pessoa

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humana no ordenamento jurídico brasileiro.

d) Organizar os trabalhos de acordo com as normas da ABNT e da

Instituição Salesiana de Lins.

e) Iniciar trabalhos de pesquisa a fim de aprimorar a vida acadêmica e

a capacidade de escrita.

METODOLOGIA

O método de utilização de pesquisa foi realizado através de consultas

bibliográficas e documental, com abordagem qualitativa e descritiva de dados.

1 A AMPLITUDE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA

“A dignidade da pessoa humana tem seu berço secular na filosofia.

Constitui, assim, em primeiro lugar, um valor, que é conceito axiológico, ligado

à ideia de bom, justo, virtuoso. ” (BARROSO, 2010, p. 09). Nessa condição, ela

se situa ao lado de outros valores centrais para o Direito, como a justiça, a

segurança e a solidariedade. Em outra dimensão, a dignidade da pessoa

humana passa a integrar documentos internacionais e constitucionais, vindo a

ser considerada como um dos principais fundamentos dos Estados

democráticos.

No que diz respeito à sua natureza jurídica, a dignidade humana ganha

também status de princípio constitucional, sem deixar de ser também vista

como um valor moral fundamenta, que ocupa especial papel no desafio de

ponderação em casos difíceis, em que se verifica a colisão entre direitos

fundamentais. Os direitos humanos fundamentais não podem ser

compreendidos como fruto das estruturas do Estado, mas dá vontade de todos,

ou seja, as liberdades não são criadas e não se manifestam senão, em sua

maior parte, quando o povo as quer.

A Constituição Federal de 1988, inaugurou uma sofisticada dogmática

jurídico-constitucional, notadamente no que se refere aos direitos

fundamentais. A dignidade da pessoa humana ocupa a categoria dos princípios

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maiores da Carta Magna de 1988 (art. 1, inciso III), sendo um dos fundamentos

da República Federativa do Brasil. Assim, como a maioria das atuais

Constituições Latino-Americanas, a Constituição Federal Brasileira de 1988, é

fruto da luta contra o autoritarismo do regime militar. Surge em um contexto de

luta pelos direitos fundamentais do indivíduo e da coletividade, marca do

constitucionalismo contemporâneo.

Neste contexto, o reconhecimento de força normativa ao princípio da

dignidade da pessoa humana impõe um dever de abstenção e de condutas

positivas tendentes a efetivar e proteger a pessoa humana. Tal dever, deve ser

efetivado pelo Estado, o qual deve respeitar, proteger e promover condições

que viabilizem a vida da sociedade com o mínimo de dignidade.

Em suma, “a dignidade humana possui importância significativa

existindo como princípio-valor fundamentador do ordenamento jurídico

brasileiro [...]” (SARLET, 2006, p.65). Fortalece, assim, o conceito sobre a

dignidade como limite e tarefa dos poderes estatais, destacando os dizeres de

Kant de que o ser humano é um fim em si mesmo (2002, p.85), nela

fundamentam o direito de cada ser humano, percebido pela ordem

constitucional como finalidade essencial do Estado.

Desta feita, os indivíduos não podem ser instrumentalizados pela

atividade estatal, ou seja, a dignidade da pessoa humana possui valor supremo

de imperativo constitucional, capaz de transmitir a exigência de efetividade dos

direitos e garantias constitucionais inerentes a todo ser humano.

A amplitude do princípio-valor é de tal ordem que ele é a razão de ser e

a medida dos direitos fundamentais constitucionalmente elencados, podendo

se dizer que a Constituição Federal de 1988 é uma Constituição da pessoa

humana, pois o Brasil, nessa época, tinha enfrentado grandes desafios com a

ditadura militar. Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, o

cenário nacional mudou significativamente, os direitos e garantias

fundamentais foram ampliados de modo a conferir uma vida digna a sociedade.

2 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE HUMANA COMO

FUNDAMENTO DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

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A dignidade da pessoa humana é a razão que embasa os direitos

fundamentais, justificando um direito inalienável da existência digna da pessoa

humana. Silva (2010, p.40) conceitua o princípio da dignidade da pessoa

humana como um valor de extrema importância, o qual fundamenta a

República, o país e a democracia, irradiando-se não só por toda a ordem

jurídica, como também pela ordem política, social, econômica e cultural.

Para a interpretação deste princípio, o pensamento kantiano foi de suma

importância, pois deixou para trás a cultura cristã, onde o homem passou a ter

capacidade, liberdade e independência dando origem as suas próprias leis. A

partir desse marco o ser humano ao possuir autonomia de vontade possui a

característica de racionalidade, constituindo-se no fundamento da dignidade da

pessoa humana. Com base nessa premissa, os seres irracionais, que são

regidos por instinto puro, têm, contudo, apenas um valor relativo como meios, e

por isso se chamam “coisas”, à medida que, os seres racionais se chamam

pessoas, não podendo ser empregado como meio, limitando assim todo arbítrio

devendo ser considerado objeto de respeito.

Neste sentido, Ingo Wolfgang Sarlet afirma que:

Kant construiu sua concepção a partir da natureza racional do ser humano, observando que a autonomia da vontade é um atributo próprio dos seres racionais. Há uma citação interessante do autor que valora a dignidade: no reino dos fins, tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela, qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo preço, e não permite equivalente, então tem ela dignidade. Tal é a situação singular da pessoa humana. Portanto, as coisas têm preço, mas as pessoas têm dignidade. (SARLET, 2006, p. 33).

Esse conceito sobre a dignidade humana é manifestado na capacidade

de o homem alçar a sua máxima à categoria de legislação universal, a qual ele

se submete. “A autonomia é, pois, o fundamento da dignidade da natureza

humana e de toda a natureza racional”. (KANT, 2007, p. 80).

Fabio Konder Comparato destaca:

Ora, a dignidade da pessoa humana não consiste apenas no fato de ser ela, diferentemente das coisas, um ser considerado e tratado, em si mesmo, como um fim em si e nunca como meio para a consecução de determinado resultado. Ela resulta também do fato de que, pela

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sua vontade racional, só a pessoa vive em condições de autonomia, isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita. (COMPARATO, 2015, p. 34).

Destarte, a dignidade humana tornou-se o princípio fundamental da

ordem jurídica colocando-se acima de todo preço e ocupando, juridicamente,

um lugar privilegiado em relação aos demais seres vivos. É ainda a finalidade

principal do Estado, com todas as características hermenêuticas que esse

status jurídico confere, traduzindo-se na concretização da norma constitucional

direcionando, sobretudo, ao legislador, que tem o dever de estatuir uma ordem

jurídica correspondente as exigências reais do princípio, sobretudo mediante a

efetivação dos direitos fundamentais que são inerentes a todo ser humano.

3 A TEORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUA RELAÇÃO COM

O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A Revolução Francesa do século XVIII considerou como base

fundamental dos revolucionários três princípios de suma importância: a

liberdade, a igualdade e a fraternidade. Desse modo, os direitos do homem

ganharam força e legitimidade, ou seja, a partir de todo contexto histórico de

conquistas e batalhas os direitos fundamentais começam a surgir através de

um movimento conhecido como direitos fundamentais de primeira, segunda e

terceira dimensão.

Os direitos de primeira dimensão compreendem a liberdade do homem,

direitos civis e políticos, como o direito à vida, à liberdade, à propriedade etc.

São direitos individuais de cunho negativo pois exigem diretamente uma

abstenção do Estado, seu principal destinatário. Na visão de Sarlet (2012,

p.32) “os direitos de primeira dimensão são de cunho individualista, surgindo e

afirmando-se como direitos do indivíduo frente ao Estado [...]”.

Os direitos fundamentais de segunda dimensão, reconhecidos como

direitos econômicos, sociais e culturais, baseados na igualdade, surgiram no

século XIX, como forma de resposta à revolução industrial.

Ainda hoje, verifica-se que as prestações sociais estatais são conferidas

ao indivíduo como assistência social, saúde, educação, trabalho etc.,

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afirmando tais liberdades formais até então abstratas para as liberdades

materiais concretas. Como destaca Bonavides (1996 apud SARLET, 2012, p.

33) “estes direitos fundamentais [...], nasceram abraçados ao princípio da

igualdade, entendida em um sentido material. ” Influenciados pela teoria

Marxista, tais direitos foram proclamados nas constituições como na do México,

na constituição de Weimar, bem como em outras promulgadas no período pós-

guerra.

No tocante aos direitos fundamentais de terceira dimensão,

denominados também de direitos de fraternidade ou de solidariedade, em

especial o direito ao desenvolvimento, á paz, a qualidade de vida e ao meio

ambiente, que ganhou força após a segunda Guerra Mundial, principalmente

logo após a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, contempla

em sua titularidade uma forma prestacional coletiva que em sua maior parte,

ressalvadas algumas exceções, não encontrou respaldo na seara do direito

constitucional, perfazendo inúmeros tratados e documentos transnacionais no

âmbito do direito internacional.

Sarlet (2012, p. 34) diz que “ os direitos da terceira dimensão são

denominados usualmente como direitos de solidariedade ou fraternidade [...], e

exigem esforços em escala até mesmo mundial para sua efetivação. ”

Não obstante, foram introduzidos no âmbito jurídico os direitos de quarta

dimensão, que ainda aguarda sua consagração na esfera do direito

internacional e nas ordens constitucionais internas, seu fundamento

caracteriza-se pela globalização política, e compreendem direitos à

democracia, pluralismo e a informação.

Neste sentido, cumpre destacar inclusive que, atualmente a expressão

“gerações” tem como conotação, tão somente, demonstrar uma evolução

histórica dos direitos fundamentais, e que estes foram construídos em

diferentes momentos históricos, transmitindo a ideia de substituição, o que na

prática não ocorre. Já expressão “dimensão” exprime de forma efetiva a noção

de que todos esses direitos convivem juntos na ordem constitucional

contemporânea e não foram substituídos ao longo do tempo. (FRANCISCHINI,

2013).

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4 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO STATUS JURÍDICO

FUNDAMENTAL

“Dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo

de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida” (SILVA,

2013, p.107). Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar

a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça

social (art.193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para

o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais,

mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa

humana.

José Afonso Silva demostra que:

Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma intensificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma ideia qualquer apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana em defesa dos direitos fundamentais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invoca-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. (SILVA, 2014, p. 107).

Da mesma forma, não restam dúvidas de que a dignidade da pessoa

humana engloba necessariamente respeito e proteção da integridade física e

emocional em geral da pessoa, do que decorrem, por exemplo, a proibição da

pena de morte, da tortura e da aplicação de penas corporais e até mesmo a

utilização das pessoas para experiências científicas.

Nesse diapasão, a força normativa do princípio, de tão importante, torna-

se essencial a qualquer cidadão que necessite para sua sobrevivência de

todos os meios constitucionais existentes, sua força é traduzida em conduta

imperativa, onde não existe qualquer meio que justifique a imposição estatal

em não garantir seu efetivo cumprimento, ou seja, o Estado tem a tarefa

principal de sustentação e efetivação dos direitos fundamentais implícitos em

todo ordenamento jurídico.

Ingo Wolfgang Sarlet, afirma que:

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[...] O princípio da dignidade da pessoa humana assume posição de destaque, servindo como diretriz material para a identificação de direitos implícitos (tanto de cunho defensivo como prestacional) e, de modo especial, sediados em outras partes da Constituição. Cuida-se, em verdade, de critérios basilar, mas não exclusivo, já que em diversos casos outros referenciais podem ser utilizados (como, por exemplo, o direito à vida e à saúde na hipótese do meio ambiente, ou mesmo a ampla defesa e os recursos a ela inerentes, no caso da fundamentação das decisões judiciais e administrativas). (SARLET, 2006, p. 101-102).

Destaca-se, portanto, a grande relevância que os direitos a pessoa

humana conduziu ao longo de toda sua formação histórica, independentemente

de seu caráter, capacidade ou de qualquer outra espécie de superação,

inclusive as que considerem a sua existência como um núcleo gerador de tudo

aquilo que é considerado fruto de longas lutas e revoluções, ou seja, as

conquistas em todos os sentidos, introduzidas e colocadas à disposição de

todos os cidadãos representam inúmeros obstáculos alcançados

gradativamente durante séculos transformando reinados, povos e

constituições, e que ao integrar os conceitos de liberdade, igualdade, dignidade

humana e justiça em sua trajetória resultou no atual Estado democrático de

direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A razão do princípio da dignidade humana ser de grande importância se

baseia principalmente no desafio que as normas constitucionais estabelecem,

sendo a base fundamental da garantia e proteção dos direitos ali elencados, ou

seja, o princípio da dignidade humana é o alicerce para a existência e

aplicação de todo ordenamento jurídico em favor do ser humano, conferindo a

todos estes uma existência digna, pautada na efetividade jurídica e na

imperativa que o seu significado traduz.

Por outro lado, o constituinte preferiu não incluir a dignidade da pessoa

humana no rol dos direitos e garantias fundamentais, inserindo-as pela primeira

vez à condição de princípio e valor fundamental (artigo 1º, inciso III). Tal

dispositivo constitucional, contém não apenas mais de uma norma, mas vai

além da condição de princípio e valor fundamental, é também fundamento de

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posições jurídico-subjetivas, isto é, normas definidoras de direitos e garantias,

inclusive de deveres fundamentais. Dentre os principais aspectos que o

conceito de democracia trouxe ao cenário político e social, seu ponto marcante

foi a ideia de um processo de liberação da pessoa humana das formas de

opressão e das desigualdades sociais, econômicas e culturais.

Não obstante, ressalta-se a função instrumental integradora e

hermenêutica do princípio, na medida em que este serve de parâmetro para a

aplicação, interpretação e integração normativo-constitucional, não apenas dos

direitos fundamentais e das demais normas constitucionais, mas de todo o

ordenamento jurídico. O valor incalculável do princípio da dignidade humana

torna todos os precedentes legais importantes para a construção de uma vida

pautada na liberdade, na proteção, na segurança e principalmente na

sobrevivência em conformidade com todos os direitos fundamentais e sociais

previstos constitucionalmente.

Portanto, o conceito de dignidade da pessoa humana seria o princípio

fundamental de um Estado Democrático de Direito, abrangendo tanto a ordem

jurídica como a ordem social e econômica. A dignidade da pessoa humana

estabelece o limite em que o estado pode atuar. Assim todo o seu aparato

institucional deve se consolidar de forma compatível com o reconhecimento da

dignidade da pessoa humana no epicentro da ordem jurídica. Desse modo, o

valor do princípio da dignidade da pessoa humana é fundamental para todos os

conceitos básicos existentes, a necessidade e a disponibilidade tornam-se,

sobretudo, o modo de obtenção do básico que é imposto a um cidadão que

pertence a um Estado Democrático de direito.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto, A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: Natureza Jurídica, Conteúdos Mínimos e Critérios de Aplicação. Versão provisória para debate público. Mimeografado, dezembro de 2010. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2015.

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. FRANCISCHINI, Nadialice. Análise descritiva sobre as gerações dos direitos fundamentais. Blog Revista Direito. 2013. Disponível em: <http://revistadireito.com/analise-descritiva-sobre-as-geracoes-dos-direitos-fundamentais/>. Acesso em 28 abr. 2017. KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes e outros escritos; Conforme Caio Tácito, do Estado Liberal ao Estado do Bem-Estar Social. Temas de Direito Público. São Paulo: Renovar, 1997. SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2006. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.