Deus como mercadoria na era digital

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Comunicação, Mercado e Religião Pe. Leomar Antônio Brustolin (PUCRS) Brasil

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Comunicação, Mercado e Religião

Pe. Leomar Antônio Brustolin (PUCRS) Brasil

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Até que ponto a comunicação religiosa veiculada na mídia,

não reduz o anúncio da fé em marketing religioso?

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mídia brasileira atual a relação entre comunicação, mercado e

religião, Teologia cristã contemporânea. discutir os desafios e possibilidades que

a mídia apresenta para a vivência da fé, especialmente a cristã.

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investigar a relação do sagrado experimentado, tradicionalmente, no espaço presencial com o sagrado reconstruído pela mídia moderna.

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A partir dos anos 1980 emerge a cultura das mídias, onde se associa tecnologias, equipamentos e as linguagens que permitem a escolha e o consumo mais personalizado e individualizado possível das mensagens, em oposição ao consumo massivo.

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é o ambiente natural das novas gerações.

interatividade, que possibilita superar uma relação de simples espectador ou ouvinte

profundo impacto sobre a vida das pessoas e da sociedade

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inovaçãotransformação interaçãopluralidade de engajamentos

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enfrenta a crise de suas estruturas de plausibilidade

foi tirada da religião a função de sustentar e explicar a realidade.

deixou de ser ordenadora do cosmos, vive-se num pluralismo no qual muitas instituições passam a explicar a realidade

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A pluralidade marca o indivíduo em sua consciência.

A questão religiosa passa a ser opcional, de acordo com a preferência do indivíduo.

evidencia-se o desaparecimento das verdades de fé e o crescimento da emergência da subjetividade para normatizar a experiência religiosa que passa a ser privatizada.

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[...] o império do consumo e da comunicação gerou um indivíduo desinstitucionalizado e operacional, disposto, em todos os planos, a ter o direito de dirigir a si mesmo. [...] Os lugares tradicionais de sociabilidade (trabalho, Igreja, sindicatos, cafés) cedem, por toda parte, terreno ao universo privatizado do consumo de objetos, de imagens e de sons.

LIPOVETSKY, G. Metamorfoses da cultura liberal, p. 71.

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A procura da religião por:2. cura, 3. conquista no amor,4. negócios, 5. segurança, 6. ideal de viver sem angústia, 7. realização do seu ser profundo, 8. O fim último.

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A fé passou a ser transmitida e experimentada através das multimídias.

Não dá para subestimar e nem supervalorizar tais experiências.

Estamos diante de uma nova forma de vivência religiosa.

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Os ritos religiosos são polissêmicos linguagem simbólica não é linguagem

literal não está associada ao significado

conceitual claro. ritos e símbolos apelam para a experiência

da pessoa como um todo: inteligência, vontade, emoção, valores e imaginação.

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A abertura dos ritos para a pluralidade de interpretações possibilita a vulnerabilidade.

Eles podem ser mal interpretados, reduzidos em seus significados e sujeitos a influências degeneradoras, manipuladas por ideologias.

Eles possibilitam, ou não ,o reconhecimento do mistério de forma existencial e experiencial.

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É complexa, pois se afrontam fenômenos inapreensíveis, cuja conciliação não pode ser simplificada, pois correria numa redução medíocre, seja do sentido teológico do rito, seja pelo significado da comunicação.

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Essas propõem novos modelos comunicativos que não se limitam à informação ou à argumentação, elas permitem uma performance quase ritual.

Há uma política de expansão fundada na idéia de que “nada, em nenhuma parte, deve permanecer secreto”.

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Uma comunicação sem resíduos e nem segredos, totalmente transparente, acaba eliminando as diversificações, homologando tudo sob um critério único.

É justamente esse critério único da transparência que não tem consistência na comunicação religiosa.

O rito religioso tem um valor testemunhal que jamais é totalmente captado no processo comunicativo.

Há uma irredutibilidade que reflete o caráter inalienável do mistério que fundamenta o rito.

A comunicação ritual testemunha o que permanece escondido quando se discursa sobre o mistério.

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Manipula-se o aspecto simbólico em vista do consumo e para fins próprios.

O problema: a mídia da era digital pode distorcer e manipular os conteúdos religiosos.

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A linguagem religiosa muitas vezes assume a linguagem do espetáculo, para fazer aparecer o aspecto fantástico e capturar a atenção

Manipulam-se símbolos, pessoas e realidades religiosas de acordo com a expectativa do público.

Na relação com o mercado, o espetáculo é acentuado em detrimento da ética e dos princípios religiosos.

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O marketing está relacionado com a ciência do vender, e para vender, o mercado procura seduzir, encantar, manipular os seus clientes.

a mídia da era digital pode distorcer e manipular os conteúdos religiosos.

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O consumo evidencia a nossa incompletude, conforme Baudrillard, isso ocorre porque “o consumo se firma sobre uma falta que lhe é irreprimível” .

BAUDRILLARD, J. A Sociedade de Consumo, p. 42.

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o desejo de consumo está relacionado à busca de completude no ser humano.

Numa sociedade que acabou com utopias e sonhos e transformou o desejo das pessoas em “sonhos de consumo”, como não associar consumo e religião?

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Embora aparentemente ambíguos, o ser humano religioso e o consumista buscam a mesma realidade: a plenitude.

Quando se deseja o ilimitado não interessam os outros, a partilha e a ética. Nunca sobra nada para partilhar, sempre falta.

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O religioso caminha em direção a um horizonte que dê sentido à existência apesar da dor e da morte.

O consumidor vive numa sociedade que mascara a morte e refuta a dor, por isso tende a preencher seus vazios comprando sua satisfação: carro, casa, tênis da moda, viagem... .

“Na tradição religiosa a esperança vem acompanhada da fé, que é o fundamento da esperança. A esperança no mercado para solução dos nossos problemas exige, como seu fundamento, a fé no mercado” .

Jung Mo Sung. Deus numa economia sem coração., p.57.

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Para atrair fiéis-clientes, muitos grupos religiosos passam a usar a lógica da economia de mercado. É bom recordar que o pluralismo é uma situação de mercado.

No cenário de pluralismo algumas tradições religiosas se transformam em empresas prestadoras de serviços religiosos, agências de mercado, e sofrem até a pressão por resultados que provoca a racionalização das estruturas que visam minimizar gastos, tempo e dinheiro.

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pela demanda de mercado, pela preferência dos consumidores.

adaptados às diversas situações demandantes. camuflagem das questões doutrinais da religião

para ressaltar os aspectos pragmáticos. Questões de moral e de dogma ficam quase

diluídas em vantagens que o fiel-cliente recebe ao participar dos processos de troca (comércio) de bens simbólicos propostos.

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A comunicação midiática e a tecnologia que lhe dá suporte nunca são neutras, mesmo que assim sejam consideradas.

A Mídia pode dirigir a opinião pública, convencer sobre verdades inexistentes, e fazer passar como um bem para todos o que na realidade é interesse pessoal ou de um grupo de poder.

A verdade fica sempre mais dependente do consenso ou do grau de visibilidade que os meios de comunicação imprimem.

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(...) os meios realmente não são simples instrumentos neutros; eles são, ao mesmo tempo, meio e mensagem, portadores de uma nova cultura, que nasce antes mesmo dos conteúdos, do próprio fato de existir novos modos de comunicar, com novas linguagens, novas técnicas, novas atitudes psicológicas.

CONFERENZA EPISCOPALE ITALIANA. Comunicazione e Missione. Direttorio sulle Comunicazioni Sociali nella Missione della Chiesa, n. 4.

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Para as promoções do mercado, o símbolo deve transmitir confiança, tornando o homo videns em homo consumericus.

Desta forma o símbolo publicitário relaciona um valor com um produto que, por sua vez, passa a adquirir uma valorização especial.

Não é uma ação simbólica, mas diabólica, pois divide o sujeito de si mesmo, porque de um lado lhe confere uma identidade fictícia, mas de outro lado lhe subtrai a identidade real.

Quanto mais consumidor, mais o sujeito se torna refém da linguagem simbólico-diabólica, e, portanto, perde sempre mais suas raízes e suas tradições.

O uso dos símbolos no marketing da fé destrói a transcendência de cada raiz e tradição, para reduzir tudo na perspectiva do consumo.

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Será preciso vencer dois desafios que se impõem: a insuficiência do significante e a dissociação entre significante e significado.

No significante o ser humano não encontra a realidade concreta, sólida e consistente para apoiar sua contemplação e dirigir-se ao invisível.

A percepção muitas vezes fica reduzida a um mecanismo racional que vincula, necessariamente, um objeto e um conceito.

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Em cada nova etapa da história, a Igreja, impulsionada pelo desejo de evangelizar, não tem senão uma preocupação: quem enviar para anunciar o mistério de Jesus? Em que linguagem anunciar esse mistério? Como conseguir que ressoe e chegue a todos os que devem escutar?

PAULO VI. Evangelii Nuntiandi, 22.

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A grande questão que se impõe hoje não é como dizer as coisas, mas o que dizer!

Para o apóstolo Paulo a dificuldade era como chegar às pessoas e aos povos, porque ele sabia o que dizer.

Atualmente, o problema não é mais como chegar às pessoas, mas o que dizer para elas, porque se multiplicam os canais de comunicação e fragmentam-se os conteúdos.

Num mundo sempre mais rápido e sedento de imediatismo o conteúdo da comunicação também fica afetado.

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Apesar da intensa visibilidade midiática da religião, associada ao marketing da fé, o resultado final do processo é um secularismo crescente, que consome utopias e transforma o sonho de um mundo melhor num paraíso a ser consumido.

A transcendência é experimentada mais como um produto de mercado.

Apropria-se da linguagem religiosa mas vive-se como se Deus não existisse.

Há um descompasso entre a estética religiosa e a ética no cotidiano, para a maioria dos crentes.

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