Desafios para uma formação inicial qualificada dos ... · Entretanto, alguns atores levantam...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós Graduação em Educação Desafios para uma formação inicial qualificada dos profissionais da educação sobre a prática do ensino: um estudo sobre o Projeto de Lei de Residência Pedagógica Janaína Lilian Benigna Sobreira Belo Horizonte 2010

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós Graduação em Educação

Desafios para uma formação inicial qualificada dos

profissionais da educação sobre a prática do ensino:

um estudo sobre o Projeto de Lei de Residência

Pedagógica

Janaína Lilian Benigna Sobreira

Belo Horizonte

2010

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Janaína Lilian Benigna Sobreira

Desafios para uma formação inicial qualificada dos

profissionais da educação sobre a prática do ensino:

um estudo sobre o Projeto de Lei de Residência

Pedagógica

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como parte dos requisitos à obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: Sociologia e história da Profissão Docente e da Educação Escolar. Orientador: Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury

Belo Horizonte

2010

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FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Sobreira, Janaína Lilian Benigna S677d Desafios para uma formação inicial qualificada dos profissionais da

educação sobre a prática do ensino: um estudo sobre o Projeto de Lei de Residência Pedagógica / Janaína Lilian Benigna Sobreira. Belo Horizonte, 2010.

186f. : il. Orientador: Carlos Roberto Jamil Cury Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas

Gerais. Programa de Pós-Graduação em Educação. 1. Professores – Formação. 2. Curso de pedagogia. 3. Programas de

estágio. 4. Residentes (Pedagogia). I. Cury, Carlos Roberto Jamil. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Educação. III. Título.

CDU: 371.133

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Janaína Lilian Benigna Sobreira

Desafios para uma formação inicial qualificada dos profissionais da

educação sobre a prática do ensino: um estudo sobre o Projeto de Lei da

Residência Pedagógica

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como parte dos requisitos à obtenção do título de Mestre em Educação

___________________________________________________________

Professor Doutor Carlos Roberto Jamil Cury - Orientador

____________________________________________________________

Professora Dra. Magali de Castro

_____________________________________________________________

Professora Dra. Ângela Xavier de Brito

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Dedico esta pesquisa à memória de Benigna Rodrigues da Silva,

amada guerreira que se foi há pouco e

virou estrela...

E aos meus amados pais por todo amor,

carinho, sabedoria e amizade.

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AAggrraaddeecciimmeennttooss

Ao nosso Criador por me proteger e por dar-me forças sempre.

Ao meu estimado orientador pelas aulas e orientações que me valeram

de um rico aprendizado diante de tanta magistratura, simplicidade e sabedoria.

Obrigada por me ensinar, pelo apoio, pela dedicação, pela inspiração, por me

entender e, principalmente, por acreditar em mim.

Obrigada, do fundo da minha alma aos meus pais, que além de me apoiarem

são também a minha fortaleza. Obrigada por receber-me de volta na fase final

dessa pesquisa. Sem vocês eu não conseguiria.

Mãe, você é minha amiga. Suas orações, seus conselhos e sua imensa

sabedoria são a minha sustentação. Mãe guerreira, cheia de bondade!

Obrigada meu Deus por me fazer ser a filha dessa mulher digna e honrada,

simples e amável, amiga, batalhadora, fiel e sábia. Te amo!

Pai, amado e dedicado. Nem sempre aprendemos nos livros o que é mais

importante. Honro-lhe e me orgulho de ser a sua filha. Desculpe-me se não

faço suas vontades sempre. Os seus sonhos também são meus e por isso é

tão difícil tomar uma decisão que o contrariaria. Mesmo assim, espero que

essa vitória seja sua também. Que o senhor fique feliz por eu ser uma

Pedagoga e agora uma Mestra! Te amo infinitamente e o admiro muito!

Aos professores deste curso, especialmente, Profa. Dra. Magali de

Castro, Profa. Dra. Dorinha por todos os momentos de amizade e

aprendizagem.

Ao querido e estimado Prof. Dr. Hermas Arana por toda a

diferença que fez em nossas vidas. Obrigada pelas aulas

sensacionais e por todo carinho.

Aos que contribuíram de forma direta ou indireta para a conclusão desse

estudo. Aos coordenadores, professores e alunos das universidades visitadas.

Às pesquisadoras entrevistadas, pelo tempo e disposição cedidas a mim.

À minha irmã Jane por ser uma amiga amorosa, querida e talentosa, mãe

dedicada, mulher maravilhosa, que sempre me apoiou e sempre cuidou de

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mim. Agradeço ao José, por tanto carinho, pelas conversas, pelos vinhos e,

principalmente, pela querida companhia. Agradeço ao Miguel, que é o

estímulo e a luz das nossas vidas. Foi duro sentir sua falta e estar longe de

você para a conclusão desse estudo.

Agradeço a Flávia, irmã de coração, por sua amizade incondicional. Sempre

ao meu lado, sempre doando seu tempo, ouvidos, cuidados e amor. Quero que

saiba que sempre a admirei e sempre a respeitarei!

À Silmônica e família Tocafundo que sempre foram muito carinhosos

e dedicados a mim, especialmente, ao meu afilhado Bruno. Obrigada por

tanto amor! Vocês estarão eternamente em meu coração!

À Maristela Santos pelo apoio, orientação e por ter sido o pontapé inicial

para o ingresso no Mestrado.

À Juliana Valéria pela amável presença em nossas vidas. Fico muito feliz

de poder caminhar nessa estrada da vida, tendo você como uma amiga querida

e especial.

À Mayara pelo apoio, pela alegria de menina, pelo companheirismo, pelos

conselhos e ouvidos... à amizade predileta! Amizade verdadeira e fundamental

para todos os momentos!

Aos meus padrinhos (tio Carlos e Jair), madrinhas (tia

Regina e Alaíde), e afilhados (Miguel, Bruno, Maria Luiza,

Jojow), meu sincero amor.

Agradeço aos amigos fiéis: Sabrina, Juliana Garayp, Helbert, Sr.

Gedy, Nanda, Luciano, Pedro, Paula, Ana Paula, Laila,

Andrezza, Luís Cláudio, Raphaela, Aline, Laiza, Rafinha ,

Vera, João Carlos e família, Pery e demais amigos, pela

amizade sincera e zelosa. Obrigada por entender a minha ausência e por estar

sempre comigo de alguma forma.

Agradeço a minha querida avó Benigna e a minha querida tia Elza que

tanto amei e que continuo amando. Saudades intermináveis...

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“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem

de nós mesmos.” Fernando Pessoa

"Ensino que a vida jamais deveria ser modificada ou esmagada devido à promessa de outro tipo de vida futura. O imortal é esta

vida, este momento." Nietzsche

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RESUMO

Esta dissertação se inscreve na Linha de Pesquisa: “Educação, direito à

educação e a políticas educacionais para os diferentes níveis e modalidades de

ensino”, vinculada à Área de Concentração: “Educação escolar e profissão

docente”, do Mestrado em Educação, da PUC Minas. Desenvolveu-se neste

estudo uma delimitação das regulamentações do curso de Pedagogia e das

possibilidades de formação docente. O objetivo desta pesquisa foi analisar e

acompanhar a tramitação do Projeto de Lei n. 227, de autoria do Senador

Marco Maciel, sobre uma possível implantação de uma Residência Pedagógica

ao final do curso de Pedagogia, licenciatura. Dessa forma, os recém-graduados

passariam a ter o direito a uma bolsa residência e a um contato direto com a

sala de aula, aumentando em 800 horas a prática educativa e assim, diminuir o

fracasso escolar. Cabe destacar, que a justificativa dada pelo senador para a

implantação do Projeto de Lei volta-se para o despreparo dos professores

diante das realidades dos alunos. Sobretudo, aponta para a forma que os

estágios têm sido realizados, perpassando em campos diferentes ao da sala de

aula. Analisamos como se daria a Residência Pedagógica caso ela fosse

aprovada nos moldes em que se encontra. O estudo qualitativo e a análise dos

dados coletados, por meio de questionários e das entrevistas semi-

estruturadas, indicou que as pesquisadoras, coordenadoras, professoras e

alunos do curso de Pedagogia consideram importantes, para a formação dos

professores, as atividades teóricas e as atividades práticas serem articuladas e

desenvolvidas ao longo da formação inicial, como sugere as diretrizes. Muitos

deles afirmam que o estágio poderia ser mais bem supervisionado e com carga

horária maior. Entretanto, alguns atores levantam questões a respeito da

inviabilidade de uma Residência Pedagógica, pois muitos dos alunos são

trabalhadores e não poderiam abrir mão de seu salário por uma bolsa. Esse

estudo revelou que os estágios necessitam de mais orientações e coordenação

de forma a articular a teoria com a prática dentro das salas de aula do ensino

fundamental. Examinou-se que até a entrega dessa dissertação o Projeto de

Lei em questão, permaneceu sem alterações.

Palavras-chave: Residência Pedagógica; Curso de Pedagogia; Estágio.

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ABSTRACT

This purpose of this paper is to describe a line of research on Education, right to

education and educational politics for the different levels and modes of

teaching, linked to the Concentration of Area:" School education and teaching

profession, "the Master of Education, PUC - Minas . Developed in this study a

definition of the rules of the Faculty of Education and the possibilities of teacher

education. The objective of this research was to analyze and monitor the

conduct of Bill No 227, authored by Senator Marco Maciel, about a possible

deployment of a Residence at the end of the Pedagogical Faculty of Education,

degree. Thus, new graduates then had the right to grant a residence and a

direct contact with the classroom, increasing by 800 hours to educational

practice and thereby reduce school failure. It is worth noting that the justification

given by the senator for the implementation of the Bill back to the

unpreparedness of teachers with the realities of the students. Above all, points

to the way that the stages have been carried out, passing in different fields to

the classroom. We analyze how to give the Educational Housing if it were

approved in the manner in which it is. The qualitative study and analysis of data

collected through questionnaires and semi-structured interviews indicated that

the researchers, coordinators, teachers and students of Pedagogy consider

important for the training of teachers, the activities of theoretical and practical

activities be articulated and developed during the initial training, as suggested

by the guidelines. Many argue that the stage could be better supervised and

with greater workload. However, some stakeholders raised questions about the

inevitability of an Educational Housing, because many of the students are

workers and they could not forgo his salary for a scholarship. This study

revealed that the stages need more guidance and coordination in order to

articulate the theory and practice in the classrooms of elementary school.

Examined that until the delivery of this dissertation the Bill in question remained

unchanged.

Keywords: Educational Housing; Pedagogy; Stage.

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LISTA DE QUADROS

Quadro A: Estrutura do Sistema de Brasileiro........................................74

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Gráfico 1 – Gênero dos Alunos........................................................148

Figura 2: Gráfico 2 – Tipo de Instituição que cursou a maior parte da vida

escolar.............................................................................................................149

Figura 3: Gráfico 3 – Alunos que trabalham....................................................149

Figura 4: Gráfico 4 – Setores em que trabalham.............................................150

Figura 5: Gráfico 5 – Satisfação com o curso..................................................150

Figura 6: Gráfico 6 – Sobre o que acham das aulas teóricas..........................151

Figura 7: Gráfico 7 - O que pensam sobre a Residência Pedagógica.............155

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LISTA DE ABREVIATURAS

art. – artigo

cap. - capítulo

ed. – edição

n. - número

org. - organizador

p. - página

v. – volume

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LISTA DE SIGLAS

ABL – Academia Brasileira de Letras

APL – Academia Brasileira de Letras

BH – Belo Horizonte

Bac – Baccaréault

BEP – Brevê de Estudos Profissionais

BTS – Brevê de Técnico Superior

CAP – Carreira Profissional

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBPE – Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais

CDIUFM - Conférence des Directeurs d'IUFM (Conferência dos Diretores de

IUFM)

CEFET – Centro Federal de Educação Tecnológica

CFE – Conselho Federal de Educação

CNE – Conselho Nacional de Educação

CNRMS - Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde

CTC da EB – Conselho Técnico-Científico da Educação Básica

CP – Conselho de Pedagogia

CRPEs – Centros Regionais de Pesquisas Educacionais

DEM – Partido dos Democratas

DUT – Diploma Universitário de Tecnologia

ENADE – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes

FCC – Fundação Carlos Chagas

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

IFES – Instituições Federais de Ensino Superior

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

IUFMs - Instituts Universitaires de Formation de Maitres (Institutos

Universitários de Formação de Mestres)

LDB – Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação

MEN - Ministère de l'Éducation Nationale (France)

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MM – Marco Maciel

PAR – Plano de Ações Articuladas

PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação

PFL – Partido da Frente Liberal

PIBID – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência

PNE – Plano Nacional de Educação

PL – Projeto de Lei

PREPES – Programa de Especialização de Professores do Ensino Superior

PROFOR – Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica

PROUNI – Programa Universidade para Todos

PUC MINAS – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

PUC SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

RE – Residência Educacional

RM – Residência Médica

RP – Residência Pedagógica

SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

SINAES – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior

UAB – Universidade Aberta do Brasil

Uni-BH – Centro Universitário de Belo Horizonte

Unesp – Universidade Estadual Paulista

Unifesp – Universidade Federal de São Paulo

USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 16

1.1 Caracterização da Pesquisa ................................................................... 16

1.2 Aportes Metodológicos ......................................................................... 26

1.3 Procedimentos Metodológicos .............................................................. 28

1.4 Fontes da Pesquisa ................................................................................ 30

1.4.1 Fontes Documentais ............................................................................ 30

1.4.2 Fontes Orais ......................................................................................... 32

2 A FORMAÇÃO DOCENTE .......................................................................... 34

2.1 A origem da Formação Docente no Brasil ............................................ 34

2.2 O Curso de Pedagogia no Brasil: os marcos legais da formação do

Pedagogo ...................................................................................................... 50

2.2.1 A primeira regulamentação do curso de Pedagogia (1939) .............. 53

2.2.2 A segunda regulamentação do curso de Pedagogia (1962) .............. 55

2.2.3 A terceira regulamentação do curso de Pedagogia (1969) ............... 59

2.2.4 A quarta regulamentação do curso de Pedagogia (2006) ................. 62

2.3 As quatro possibilidades de formação docente ................................... 67

2.4 A Estrutura Educacional Brasileira e o Sistema de Ensino Francês ... 72

3 Entendendo o Projeto de Lei sobre a Residência Educacional ou

Pedagógica .................................................................................................... 87

3.1 O Projeto de Lei sobre o perfil dos professores – do 1° ao 5°

parágrafos ..................................................................................................... 90

3.2 A Residência Médica como parâmetro para a Residência Pedagógica –

7° parágrafo ................................................................................................... 94

3.3 A articulação entre a teoria e a prática: a importância do estágio – 6°,

8° e 9° parágrafos .......................................................................................... 98

3.4 Sobre as exigências e a obrigatoriedade de uma Residência

Pedagógica – do 10° ao 13° parágrafo .......................................................106

4 As percepções das pesquisadoras, coordenadoras, professoras e

alunos sobre o Projeto de Lei E O curso de Pedagogia............................111

4.1 Sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia

.......................................................................................................................112

4.2 O Estágio ................................................................................................121

4.3 Culpabilização ........................................................................................129

4.4 O Projeto Lei da Residência Pedagógica .............................................137

4.5 Alunos: o que pensam sobre a Residência Pedagógica? ...................147

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................161

REFERÊNCIAS .............................................................................................170

ANEXO ............................................................... Erro! Indicador não definido.80

APÊNDICES ..................................................................................................183

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Caracterização da Pesquisa

O interesse pela pesquisa aqui apresentada foi se consolidando quando

eu1 ainda estava cursando o curso de Pedagogia no Centro Universitário de

Belo Horizonte – Uni-BH, no ano de 2003. Naquele momento, os cursos para a

formação de Professores detinham as conhecidas habilitações que, num futuro

bem próximo, seriam extintas das suas grades curriculares em âmbito

Nacional. Tal extinção se formalizou em 2006 com a promulgação das

Diretrizes Curriculares Nacionais do Conselho Nacional de Educação para os

cursos de Pedagogia.

Até então, enquanto graduanda, o que mais me incomodava era o

descompromisso entre as instituições universitárias e as escolares para o

efetivo cumprimento das 300 horas de Estágio Supervisionado, que deveriam

ser realizadas prioritariamente em Educação Infantil e nos anos iniciais do

Ensino Fundamental em instituições reconhecidas dos sistemas de ensino.

Porém, muitas dessas instituições escolares faziam do estagiário um mero

auxiliar administrativo, ou um ajudante que resolve pequenos problemas de

disciplina ou de necessidades fisiológicas dos menores. Acabam por ignorar a

necessidade de se formar um profissional engajado e compromissado com a

educação o que se dá, muitas vezes, com a conivência tácita da instituição

formadora.

A razão de se sistematizar e discutir as Políticas Educacionais na

Formação Docente se enfatizou na minha vida acadêmica no momento em que

ingressei no Programa de Graduação Lato Sensu (PREPES), da Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), no ano de 2005, em

Docência no Ensino Superior: novas linguagens e novas abordagens. Muito do

meu caminhar, demonstrou que a questão da prática, prevista na legislação

1 Nesta pesquisa, quando fizer referência à minha pessoa, lançarei mão da 1ªpessoa do

singular, a fim de tomar minha exposição mais compreensível.

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educacional, era fundamental para se construir uma educação fortalecida que

desenvolvesse o conhecimento dos professores junto com os educandos.

Percebia então, que mudanças aconteciam nas bases curriculares do

curso, mas ainda sentia um desconforto ao falar do papel, das funções e das

competências atribuídas aos pedagogos. Qual seria a identidade desse

profissional? Sua prática o constitui como um bom profissional? Os cursos de

Pedagogia conseguem preparar os estudantes para as diversidades dos alunos

nas salas de aulas?

Segundo Silva (1999), o curso de Pedagogia no Brasil foi instituído na

organização da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil,

pelo Decreto-Lei n°1.190 de 4 de abril de 1939, durante o Estado Novo. Com a

aprovação da Lei de Diretrizes e Bases de 1961 (Lei n. 4.024/61) o Conselho

Federal de Educação (CFE) consoante suas competências, fixava um currículo

mínimo de formação de professores nos cursos superiores. O curso de

Pedagogia teve sua regulamentação definida pelos Pareceres do CFE n.

251/62 e 252/69, tendo como redator o Professor Valnir Chagas. O parecer n.

251/62 regulamentava o currículo mínimo e a duração do curso de Pedagogia,

o qual explicitava a fragilidade do curso por causa discussão a respeito da

conservação ou supressão do mesmo.

Após a Reforma Universitária da Lei n. 5540 de 1968, veio o segundo

Parecer do CFE n. 252/69. O Cons. Valnir Chagas aponta claramente que

nesse documento se discutia o curso de Pedagogia e as suas habilitações. De

acordo com Silva (1999), no Parecer ficou instituído, então, que o curso visaria

“a formação de professores e de especialistas para as atividades de

orientação, administração, supervisão e inspeção no sistema educacional.”

(SILVA, 1999, p. 45).

Ora, foi a partir da Lei n. 9.394/96, cujo artigo 64 se refere ao curso de

Pedagogia, que percebi como as Instituições Superiores, as Instituições de

Educação Infantil e do Ensino Fundamental ainda não compreendiam bem o

que se esperar do Pedagogo, bem como do normalista a nível superior e

médio.

Após longos anos de debates, veio à luz a Resolução do CNE/CP 01/06,

com as quais ficaram instituídas as:

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Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura, definindo princípios, condições de ensino e de aprendizagem, procedimentos a serem observados em seu planejamento e avaliação, pelos órgãos dos sistemas de ensino e pelas instituições de educação superior no país (...). (BRASIL, 2006)

Sendo assim, as instituições que ofereciam o curso de Pedagogia com

habilitações em orientação, supervisão, inspeção e administração começam a

entrar em regime de extinção a partir de 2007.

Já para os cursos de Normal Superior, também previstos na LDB, foi

disponibilizada a opção de se transformarem, caso assim fosse da opção da

instituição, em cursos de Pedagogia. Para isso, deveriam elaborar um projeto

pedagógico que obedecesse a essas novas diretrizes.

De acordo com essas mudanças, presenciei como Tutora de Sala de

Aula, em uma faculdade de Ensino à Distância, de fevereiro de 2006 a agosto

de 2008, durante o período noturno, muitos questionamentos a respeito das

funções e do cargo dos Pedagogos e dos Normalistas Superiores, bem como

ao antigo curso de Magistério de nível médio. E, no que se refere às atividades

práticas, os alunos tinham bastante dificuldade de realizar as horas destinadas

ao estágio, talvez por motivos econômicos (por trabalharem em outros setores

que não eram da educação em tempo integral, por dificuldade de se

deslocarem ou por não terem acesso às escolas), ou sociais (por serem donas

de casa ou arrimo de família).

Ao ler a Revista Nova Escola de março de 2007, que é uma publicação

de perfil educacional voltada para professor em exercício em escolas, encontrei

uma reportagem sobre um Projeto de Lei (PL) do Senador Marco Maciel2 (MM),

2 Marco Antonio de Oliveira Maciel nasceu em 21 de julho de 1940 em Recife, Pernambuco. É Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Casou-se com Anna Maria Ferreira Maciel e tiveram três filhos. Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), da Academia Pernambucana de Letras (APL) e da Academia de Ciências Morais e Políticas, possuindo mais de cinquenta publicações sobre diferentes assuntos. De Deputado a Vice-Presidente da República, Maciel assumiu dentre outras funções a de Ministro de Estado da Educação e Cultura por 2 anos (de 1985 a 1987). Assumiu a Vice-Presidência da República em dois períodos 1995-1998 e 1999-2002, dos quais exerceu a Presidência por duas vezes, como Presidente interino. Sua atuação como Ministro da Educação de José Sarney, apesar de ter sido por um ano, levou o reconhecimento das entidades estudantis União Nacional Estudantil e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas. Também proporcionou que o livro didático fosse distribuído duas vezes mais em apenas um ano. Deixou o cargo para assumir a Presidência do Partido da Frente Liberal (PFL). Atualmente exerce mandato de Senador por

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que muito me chamou à atenção. Conhecido como PL sobre a Residência

Pedagógica, ou Residência Educacional3.

Diante de tal reportagem, busquei o PL4 na íntegra. Nele, o Senador

propõe que, ao final do curso de Pedagogia, os graduados tenham um contato

direto com a sala de aula, para aumentar a prática educativa e diminuir o

fracasso escolar.

Com mais 800 horas de práticas ao final do curso, numa espécie de

Residência Médica5 (RM), o Senador acredita que os índices de evasão e

repetência diminuirão, já que o principal motivo para o crescimento do fracasso

escolar, segundo o projeto, é o despreparo do docente e a sua insegurança

dentro da sala de aula.

A residência educacional, tal como se propõe neste projeto de lei, não é um

período de estudos integrado aos cursos normais ou cursos de pedagogia, mas

um período de formação e trabalho ulterior a eles, que deve ser regulamentado

nos aspectos pedagógicos pelos Conselhos de Educação e, nos aspectos

administrativos e financeiros, pelos sistemas de ensino, com a necessária

colaboração da União. A força do atual projeto é dada pela exigência da

residência educacional como pré-requisito de atuação nos anos iniciais de

qualquer rede de ensino, pública ou privada. No caso da pública, o certificado

de residência poderia ser obrigatório como título nos concursos públicos, de

acordo com lei geral ou dos sistemas de ensino.

O âmbito da obrigatoriedade fica limitado aos dois anos iniciais do ensino

fundamental não somente em razão da importância desse momento de

alfabetização no processo educativo como também para permitir viabilidade

financeira aos órgãos contratantes e de formação que irão investir nesse

reforço estratégico de formação docente. (BRASIL, 2007, p.2). (Grifos nossos).

Por se tratar de um PL que aguarda os trâmites do Senado e depois da

Câmara, venho propor uma discussão sobre as possíveis contribuições dessa

Pernambuco (2003-2011), pelo Partido dos Democratas, outro nome dado ao PFL. No atual mandato ele lança o PL n.227 sobre a RP. 3 A Residência Educacional ou Residência Pedagógica são termos utilizados com o mesmo

fim. Embora a Residência Educacional seja utilizada pelo seu autor com mais frequência, daremos preferência ao segundo termo, já que o mesmo deve ser atribuído apenas ao curso de licenciatura em Pedagogia e também ao Normal Superior. 4 Projeto de Lei n. 227 de 2007, de autoria do Senador Marco Maciel e consta nesta pesquisa

em dois momentos: no Anexo A e nas páginas 87 a 89. 5 Segundo Marco Maciel, “a residência médica inspira o presente projeto de lei.” No modelo de

residência sugerido, o (a) graduado (a) em Pedagogia passaria um período de 800 horas dentro da sala de aula nas duas primeiras séries da Educação Básica, por acreditar que o período imediatamente seguinte ao da diplomação e a intensa prática junto à profissionais mais experientes dariam ao professor iniciante mais habilidades para lidar com os diversos problemas do cotidiano escolar.

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proposta, bem como analisar as desvantagens ou os inconvenientes se

aprovada nos termos em que se encontra. O reconhecimento de sua relevância

ou não pode ser útil, como fonte de informação mais sistemática, no próprio

processo de tramitação do projeto ou mesmo para futuras propostas de revisão

do curso de pedagogia.

Por isso, é necessário trazer para esta pesquisa dados empíricos6 que

serão investigados, à luz da importância da prática docente, enquanto lócus

indispensável para a formação do educador, além, de discutir as justificativas

para a sua implantação.

Segundo o Senador MM, o objetivo central desse PL é a melhoria da

qualidade da educação pública e privada no Brasil. O foco é proporcionar aos

Pedagogos a serem formados sob essa nova prática, uma experiência direta

com os alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, já que para ele, é nela

que se concentra o processo básico de ensino-aprendizagem da alfabetização

e é nela que se instaura a crise.

As taxas de reprovação na primeira série do ensino fundamental são

alarmantes. A cada ano, ingressam no ensino fundamental público cerca de

2.900.000 crianças. Mas, estão matriculadas na antiga primeira série 5.600.000

crianças – o que indica a existência de 2.700.000 repetentes. Entre as

inúmeras causas desta catástrofe, que irá comprometer o futuro de milhões de

brasileiros, está o atual despreparo dos professores e professoras para o

desafio da alfabetização. E se examinarmos a situação entre os jovens e

adultos, a situação é ainda mais grave: há décadas tentamos erradicar o

analfabetismo e ainda convivemos com 19 milhões de analfabetos absolutos e

quase 40 milhões de outros analfabetos funcionais. Sem dúvida alguma, a falta

de preparo dos alfabetizadores está na raiz da questão. (BRASIL, 2007a, p.2).

Soares (2003), em seu livro sobre o Letramento: um tema em três

gêneros, já assinalava que o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa

omite “curiosamente”, que alfabetizar é também “ensinar a escrever”.

(SOARES, 2003, p.16).

Essa autora nos leva a pensar sobre o significado de alfabetismo,

analfabetismo e letramento. Segundo a pesquisadora, apesar de não ser de

uso corrente em nossa língua, a palavra alfabetismo se corresponde ao “estado

6 Nesse caso, a palavra empírico quer designar a espécie do saber que se adquire através da

prática, através da experiência e da memória. É o atributo do conhecimento válido, do conhecimento que pode ser posto à prova ou verificação.

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ou qualidade de alfabetizado”, enquanto, analfabetismo, é o “estado ou

condição de analfabeto”. Contudo, “alfabetizado nomeia aquele que apenas

aprendeu a ler e escrever, não aquele que adquiriu o estado ou a condição de

quem se apropriou da leitura e da escrita, incorporando as práticas sociais que

as demandam”. (SOARES, 2003, p.19). Já o conceito de letramento seria “o

resultado da ação de ensinar ou de aprender a ler e escrever: o estado ou a

condição social ou um indivíduo como conseqüência de ter-se apropriado da

escrita.” (SOARES, 2003, p.18).

A preocupação com a qualidade do ensino e com a formação

profissional dos professores nos conduz a questionarmos sobre as

oportunidades oferecidas para o aprimoramento docente e sobre a valorização

desses profissionais. De acordo com os dados do Instituto Nacional de

Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), até em 2006, um

ano antes da apresentação do PL da RE de MM, existiam no Brasil, 1.562

cursos de graduação presencial em Pedagogia, com cerca de 281.000 alunos

matriculados.

Gatti e Nunes (2009) analisam os dados do INEP e pontuam, em suas

pesquisas sobre os cursos presenciais de licenciatura em Pedagogia, os

percentuais que revelam que 56% desses cursos eram oferecidos por

instituições de educação superiores privadas (das quais 32% particulares e

24% comunitárias ou confessionais); “32% eram oferecidos em instituições

estaduais e apenas 10% dos cursos de Pedagogia eram oferecidos em

instituições federais e 2%, por instituições municipais.” (GATTI; NUNES, 2009,

p.11).

Quanto ao perfil desse educador, Gatti e Nunes (2009) em seu estudo

nos revelam que a categoria dos professores é uma categoria vista como

homogênea e, atualmente, proveniente das classes menos favorecidas da

população. Um dos fatores que contribuem para gerar esses dados é o fator:

bagagem cultural. Segundo a autora, em um país com a escolarização tardia,

como o Brasil, cerca de 10% dos alunos do curso de Pedagogia são filhos de

pais analfabetos, e mais 40% filhos de pais com a escolaridade até a 4ª. série

de Ensino Fundamental, ou seja, pais e mães dos estudantes de Pedagogia

são sistematicamente menos escolarizados que os dos estudantes dos demais

cursos. Não distante disso, podemos identificar que muitos deles vieram de

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uma educação pública desprovida de recursos materiais e de outros

componentes para uma educação de qualidade onde realmente pertençam a

uma sociedade, ou melhor, se incluam a uma cidadania7. E é por isso que não

devemos analisar o fato brasileiro do fracasso escolar, analfabetismo,

reprovação e evasão isoladamente.

O reconhecimento das carências do sistema educacional não pode nos levar a esquecer a responsabilidade específica que as escolas e professores têm individualmente para combater o fracasso escolar. A escola deve refletir sobre a origem e as conseqüências do fracasso escolar e apontar soluções que dependam dela. (MARCHESI. GIL, 2004, p.27).

Neste trabalho, proponho percorrer os caminhos que institucionalizaram

a formação docente dos anos iniciais e assim identificar em qual contexto

histórico surge a proposta da RP como complemento para esta formação no

Brasil, mediante um PL do senador MM.

Além disso, discutir um PL, o qual pode ser ou não aprovado pelo

Legislativo, coloca-nos em posição de cidadão político que pode sugerir

alterações nos processos legislativos e mesmo nas implementações das

Políticas Educacionais do país.

Sendo assim, como cidadãos políticos, retomamos o pensamento sobre

os frequentes debates, reflexões e iniciativas públicas sobre gestão

democrática, na área educacional, como um princípio posto

constitucionalmente e reposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional. (CURY, 2002, p.21). Ou seja, a concepção de gestão democrática

implica um novo modelo de administração, globalizada e ativa, que se distingue

pelo reconhecimento da participação sensata e esclarecida das pessoas nas

decisões. “Gestão provém do verbo latino gero, gessi, gestum, gerere e

significa: levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer, gerar.”

(CURY, 2005, p.14). Nesse sentido, “o Estado Democrático de Direito é aquele

7 Em um estudo feito por Abbagnano (2007) ele traduz que cidadania é o fato de pertencer a

uma comunidade política; Conjuga os direitos de igualdade e liberdade com os deveres de solidariedade; esta ligada também ao conceito de democracia e é caracterizada pela necessidade de combinar a participação com a de governabilidade, por um lado, e a de justiça com o mercado, por outro. Nesse aspecto identifica-se com o exercício dos Direitos Humanos: os civis (p. ex., à vida, à expressão, à propriedade); os políticos (p. ex., à função eleitoral, a associação em partidos e sindicatos); e aos sociais (p. ex., ao trabalho, ao estudo, à saúde).

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que reconhece e explicita concretamente a soberania da lei e do espírito

representativo e, por isso, é um Estado de Direito.” (CURY, 2002, p.18).

A gestão democrática é um princípio do Estado nas políticas educacionais que espelha o próprio Estado Democrático de Direito e nele se espelha, postulando a presença dos cidadãos no processo e no produto de políticas dos governos. Os cidadãos querem mais do que ser executores de políticas, querem ser ouvidos e ter presença em arenas públicas de elaboração e nos momentos de tomada de decisão. Trata-se de democratizar a própria democracia. (...) A gestão democrática da educação é, ao mesmo tempo, transparência e impessoalidade, autonomia e participação, liderança e trabalho coletivo, representatividade e competência. Voltada para um processo de decisão baseado na participação e na deliberação pública, a gestão democrática expressa um anseio de crescimentos dos indivíduos como cidadãos e do crescimento da sociedade enquanto sociedade democrática. Por isso, a gestão democrática é a gestão de uma administração concreta. Por que concreta? Porque o concreto (cum crescere, do latim, é “crescer com”) é o que nasce com e que cresce com o outro. Este caráter genitor é o horizonte de uma nova cidadania em nosso país, em nossos sistemas de ensino e em nossas instituições escolares. (CURY, 2002, p.18).

Por outro lado, pesquisas recentes, como a de Oliveira (2007),

confirmam ser o “Poder Executivo que subordina o Poder legislativo na

tramitação das proposições sobre educação, inserindo com sucesso no

processo legislativo a sua agenda educacional”. 8 (OLIVEIRA, 2007, p.135).

De todo o modo, torna-se importante acompanhar uma proposta de

legislação nascida no âmbito do próprio legislativo para saber de suas

possibilidades e limites.

Além disso, buscamos entender se o eventual despreparo dos

professores da Educação Básica está relacionado com o de sua formação

docente, entre eles, o curso de licenciatura em Pedagogia qual entendemos ser

o foco do projeto senatorial da RP. Para tanto, evidenciaremos os modelos

institucionais de Formação Docente em âmbito nacional. Propomos ainda, usar

os dados lançados pelo Ministério da Educação (MEC) a propósito do Plano

Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR)

estabelecido pelo Decreto n. 6.755 de 2009. O objetivo principal desse Plano é

formar aqueles professores da rede pública que atuam na Educação Básica e

que ainda não são graduados, ou que ainda exercem sua função em diferentes

8 Oliveira (2005) faz um estudo sobre o Papel do Poder Legislativo na formulação das Políticas

Educacionais e descreve ser este secundário em relação ao Executivo, atuando como ratificador das políticas educacionais e como formulador de regras acessórias e subordinadas a essas políticas.

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áreas da sua formação e, com isso, buscamos rever as propostas para a

melhoria da qualidade do ensino no âmbito da formação docente. Além disso,

será fundamental considerar quais são as percepções dos coordenadores,

professores e dos graduandos do curso de Pedagogia sobre a RP. (BRASIL,

2009).

Partindo dessas questões, a pesquisa tem como objetivo geral:

- analisar, o PL n. 227 referente à introdução de uma RP que conduz à

atuação do profissional de educação no âmbito escolar, nos anos iniciais do

Ensino Fundamental, nos cursos de graduação: Licenciatura em Pedagogia.

Os objetivos específicos deste estudo, inicialmente, são:

acompanhar o processo de tramitação legislativa do PL da RP;

identificar situações internacionais que possuam em seu

ordenamento uma RP ou similar;

elaborar um histórico do processo da Formação Docente no

Brasil que caracterize o lugar institucional da formação do

professor dos anos iniciais;

analisar o estágio supervisionado próprio do curso de

licenciatura em Pedagogia nas instituições: Pontifícia

Universidade Católica de Minas Gerais (Puc/MG);

Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da

Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG) a partir da

Resolução do CNE/CP n.1/06, e o seu impacto na formação

inicial;

Para facilitar a leitura e interligar os elos que envolvem a questão, esta

pesquisa foi sistematizada em 3 capítulos.

A Introdução informa ao leitor os motivos de se averiguar a proposta de

uma RP para o referido curso, partindo dos questionamentos sobre os tipos de

formação docente para o Ensino Infantil e para os anos iniciais da Educação

Básica, instituídos por Lei no Brasil. Nela há 4 tópicos que tratam da

caracterização da pesquisa, dos motivos da escolha dos instrumentos e das

técnicas metodológicas aos quais chamamos de Aportes Metodológicos,

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Procedimentos Metodológicos e Fontes da Pesquisa. Este último com mais

dois subtópicos: Fontes Documentais e Fontes Orais.

O Capítulo 1, intitulado: A Formação Docente foi descrever um breve

histórico sobre a profissão do professor desde a sua origem em âmbito

nacional até os atuais modelos brasileiros de formação docente para atuar em

nível do Ensino Infantil e da Educação Básica (primeiras séries) existente.

Todavia, para entender a proposta do PL sobre a implantação de uma RP,

achamos necessário apresentar ao leitor como seria esse modelo diante da

nossa estrutura educacional. Visando a isso, encontramos, no Sistema

Educacional da França, um modelo similar de formação docente ao do Projeto

de Lei em questão. Ainda nesse capítulo, como o foco da proposta é sobre os

cursos de Pedagogia, torna-se relevante identificarmos os marcos legais da

formação do Pedagogo e, para tanto, descrevemos as quatros

regulamentações do curso.

O capítulo 2, intitulado Entendendo a Residência Educacional ou

Pedagógica, traz, em seu texto, o PL do senador MM na íntegra para que

assim o leitor possa entendê-lo e analisar as considerações a que chegamos.

Também se pontuou em subdividir os parágrafos da justificativa desse PL e

discuti-los conforme a proximidade dos assuntos.

O capítulo 3 apresenta as afirmativas e análises dos depoimentos

trazidos pelos atores selecionados que estão envolvidos com o processo de

formação docente seja participando dele como alunos ou como profissionais.

As entrevistas nortearam quatro momentos distintos: aquele que institui as

Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia; a pertinência do

estágio supervisionado; a culpabilização dada aos profissionais do ensino

sobre a justificativa que são eles os responsáveis pelo fracasso escolar; e

sobre a implantação do PL da RP ao final dos cursos de Pedagogia. Buscamos

ainda, nos estudos de Gatti e Barreto (2009), alguns dados sobre o perfil dos

professores da educação Básica. Os questionários aplicados aos alunos do

último ano da formação inicial de Pedagogia visaram a investigar o que

pensam a respeito desse PL, caso tivessem que se submeter a esse modelo

de residência para concluírem sua formação. Busquei também retratar a

profissão docente, trazendo à tona, os diálogos de Libâneo (2001; 2003);

Nóvoa (1992; 1998; 1999; 2001); e Severino (2003).

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O capítulo 4 contém as considerações finais, algumas reflexões

produzidas a partir do diálogo sobre a formação dos professores da Educação

Básica e da percepção dos atores sobre a implantação deste PL na estrutura

educacional vigente.

1.2 Aportes Metodológicos

Esta pesquisa se baseia na abordagem qualitativa, que, de acordo com

Bogdan e Biklen (1994), enfatiza mais o processo do que o produto e se

preocupa em conhecer a perspectiva dos participantes.

Ao pesquisar em qual das técnicas esse estudo se encaixaria,

percebemos que a modalidade da pesquisa deveria ser confrontada com

abordagens comumente apontadas.

Primeiramente, não se trata de uma história oral, pois não incide sobre o

passado de atores que fazem uma narrativa sobre a sua existência através do

tempo. Em segundo lugar, não se trata de uma pesquisa histórica, embora seja

importante ressaltar que para se entender o contexto atual da Formação

Docente no cenário brasileiro, torna-se relevante buscar os registros e fatos

ocorridos no passado em relação à formação docente. Nesse sentido, a

pesquisa está sistematizada a partir do surgimento das Escolas Normais no

Brasil, em que podemos localizar uma preocupação em definir o papel do

professor e onde ele se formaria. Trabalhos existentes e publicados que se

ocuparam do assunto serão tomados como referência.

Em terceiro lugar não se trata de um estudo de caso, que, embora se

assemelhe na observação e no processo de desenvolvimento de uma situação

específico, não se espera que o mesmo seja tomado como um esquema pré-

experimental de pesquisa, em que podem indicar variáveis que serão

manipuladas e controladas em estudos experimentais.

Em quarto lugar, não se trata de etnometodologia. Segundo os

entendimentos de Garfinkel (1967) o qual na década de quarenta, usou o termo

“etno” para se referir, “de alguma forma, à maneira como um membro de uma

comunidade, baseada em conhecimentos de senso comum, desenvolve esses

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conhecimentos sobre seu mundo circundante.” Sendo assim, a

etnometodologia:

é um estudo sobre a organização do conhecimento de um membro sobre suas atividades diárias; sobre o seu próprio empreendimento organizado, onde o conhecimento é tratado por nós como parte do mesmo ambiente que ele também organiza. (GARFINKEL, 1967, p.32).

Também não se trata de uma etnografia, que, segundo Spradley9 citado

por André e Lüdke (1986), “é a descrição de um sistema de significados

culturais de um determinado grupo.” (ANDRÉ; LÜDKE. 1986. p.14).

De acordo com Bourdieu (1997), os pesquisadores, geralmente, tendem

a enquadrar suas pesquisas em uma determinada abordagem metodológica,

seguindo criteriosamente seus padrões. Após décadas de estudos, ele afirma

que não se tem que, obrigatoriamente, enquadrar a pesquisa em uma

abordagem tradicionalmente aceita, afirmando que:

Por mais úteis que possam ser para esclarecer tal ou qual efeito que o pesquisador pode exercer “sem o saber”, lhes falta quase sempre o essencial, sem dúvida porque permanecem dominados pela fidelidade a velhos princípios metodológicos que são freqüentemente decorrentes, como o ideal da padronização dos procedimentos, da vontade de imitar sinais exteriores mais reconhecidos do rigor das disciplinas científicas; não me parece, em todo caso que eles levem em consideração tudo aquilo que sempre fizeram, e sempre souberam os pesquisadores que respeitavam seu objeto e os mais atentos às sutilezas quase infinitas das estratégias que os agentes sociais desenvolvem na conduta comum da sua existência. Muitas dezenas de anos de prática da pesquisa sob todas as formas, da etnologia à sociologia, do questionário fechado à entrevista mais aberta, convenceram-me que esta prática não encontra sua expressão adequada nem nas prescrições de uma metodologia freqüentemente mais cientista que científica, nem nas preocupações anticientíficas das místicas da fusão afetiva. (BOURDIEU, 1997, p. 693)

Na pesquisa qualitativa, os investigadores tendem a se interessar mais

pelo modo de vida, experiências ou situações particulares de seus atores. Isso

caracteriza uma pesquisa que se fundamenta nos depoimentos dos sujeitos, ou

seja, o pesquisador necessita captar o significado do seu objeto por meio da

participação dos atores envolvidos.

Finalmente, tomando-se o PL como referência da proposta de RP, a

pesquisa possui o texto em tramitação no Parlamento como objeto de análise.

9 SPRADLEY, J. The ethnographic interview. Forth Worth: Hancourt Brace Jovanovich

College, 1979.

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1.3 Procedimentos Metodológicos

Mesmo ainda nos trâmites do Senado, o PL em vista da implantação da

R P poderá ser analisado como uma proposta de inovação pedagógica apoiada

nas Políticas Públicas Educacionais de legislação e organização.

Tornou necessário para o desenvolvimento desse trabalho, aplicar aos

diferentes atores participantes, a entrevista semi-estruturada, que tende a

deixá-los mais à vontade para se expressar, enriquecendo assim a pesquisa.

André e Lüdke (1986) dizem que, especialmente nas entrevistas semi-

estruturadas:

[...] onde não há uma imposição de uma ordem rígida de questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto com base nas informações que ele detém e que no fundo são a verdadeira razão da entrevista. Na medida em que houver um clima de aceitação mútua, as informações fluirão de maneira notável e autêntica. (ANDRÉ; LÜDKE, 1986, p.31, 32). A grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas é que ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos. .(ANDRÉ; LÜDKE, 1986, p. 32).

A entrevista semi-estruturada foi escolhida por permitir a obtenção de

“dados comparáveis entre os vários sujeitos”, deixando os entrevistados “mais

à vontade e falarem livremente sobre os seus pontos de vista”, mas sempre

com a direção que o pesquisador lança através do seu roteiro. (BOGDAN;

BIKLEN, 1994, p. 136).

Após pleitear sem sucesso, por consecutivas vezes, por telefone e

email, o contato com o Senador MM, chegamos à conclusão que não seria

possível uma audiência com o mesmo. Também tentamos chegar a ele por

meio de pessoas que o conhecem, mas também não tivemos êxito. Com isso,

não conseguimos verificar quando ou baseado em que situações ou fatos, o

Senador MM trouxe à tona a problemática da formação docente e a criação da

RP. Contudo, esta pesquisa preocupou-se em identificar ações similares a de

uma residência em outros países e também buscar, em documentos, algumas

resoluções e pareceres que apresentam aproximações a esse PL.

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Com a RP, teríamos o fim da desvalorização do Pedagogo e o início de

uma integração entre teoria e prática, ou seria uma depreciação e limitação das

habilidades e competências do profissional da educação básica? Quem estaria

a favor e por quê? O problema da alfabetização, da evasão e da repetência

deixariam de existir? A fim de buscar o sentido dessa proposta de Residência

Pedagógica, cotejá-la-emos com o estágio supervisionado tal como

estabelecido na LDB, nas Resoluções e Diretrizes do Conselho Nacional e com

a Lei n. 11.788 de 25 de setembro de 2008. Torna-se importante discutir a

importância de uma formação inicial de qualidade, considerando os prós e os

contras para a implantação desse projeto.

Pode-se, então, interrogar como ficariam as Diretrizes Curriculares

Nacionais para o curso de pedagogia? Para contribuir com dados desse

estudo, buscamos as vozes de alguns estudiosos que pesquisam sobre a

formação docente, entre eles, pesquisadoras especialistas em educação que

chamaremos de Pesquisadora 1 ou P1, Pesquisadora 2 ou P2 e Pesquisadora

3 ou P3.

Se pensar no estágio tal como ele é definido nesta Lei, ou seja, como

integrador do projeto pedagógico do curso e que visa ao aprendizado das

competências próprias da atividade profissional, questionamos como se dão os

estágios nos cursos de Pedagogia. Por outro lado, é importante verificar o

estabelecido na LDB, nas Resoluções e Diretrizes do Conselho Nacional e,

certamente, torna-se fundamental analisar o Parecer CNE/CP n. 28/01, a

Resolução do CNE/CP n.1 de 15 de março de 2006, pois eles definem as

Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia – e que

determinam as 300 horas obrigatórias de estágio. Essa análise servirá de apoio

comparativo para debater a proposta feita pelo Senador que investiria, a

contraponto, com mais 800 horas de prática obrigatória. Para identificarmos o

modelo do estágio nesses cursos, é relevante uma detalhada observação nas

universidades, que para esta pesquisa foi definida uma instituição pública

federal (UFMG) e estadual (UEMG), e outra privada (Puc MG), tomando como

objeto investigador, o processo do estágio supervisionado no curso de

Pedagogia dessas instituições.

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1.4 Fontes da Pesquisa

1.4.1 Fontes Documentais

“Os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde

podem ser retiradas evidências que fundamentem afirmações e declarações do

pesquisador.” (ANDRÉ; LÜDKE, 1986, p.39).

Como já dissemos, um dos objetivos específicos dessa pesquisa é

analisar o processo de tramitação do Projeto de Lei sobre a Residência

Pedagógica e também identificar como se dá o estágio nos cursos de

Pedagogia a partir da Resolução CNE/CP n.01/06, que institui as diretrizes do

curso. Para tanto, esclareceremos ao leitor como se desenvolveu o curso de

Pedagogia, fazendo algumas inferências com o curso Normal Superior e com o

curso normal médio. Os documentos consultados que definem o curso de

pedagogia foram:

Decreto-Lei n. 1.190 de 4 de abril de 1939 que é a primeira

regulamentação do curso de Pedagogia;

Lei n. 4.024/61 que fixou as primeiras Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (revogada pela Lei n. 9.394/96);

Parecer CFE n. 251/62 e Parecer CFE n. 252/69 que são a

segunda e a terceira regulamentação do curso de em questão,

respectivamente;

Lei n. 5692/71 que institui as Diretrizes e Bases para a Educação

Básica de 1° e 2° graus.

Lei n. 9.394 de 20 de dezembro de 1996 que institui as Diretrizes

e bases da Educação Nacional;

O Parecer CNE/CP n. 28/2001, que estabelece a duração e a

carga horária dos cursos de Formação de Professores da

Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura,

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graduação plena, além de dar uma nova redação ao Parecer

CNE/CP n. 21/200110;

Parecer CNE/CP n. 5/2005, que discute a implantação das

Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia;

Parecer n. 3/2006 de 15 de maio de 2006 e a sua respectiva

Resolução CNE/CP n. 01/06, que define e institui as Diretrizes

Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia,

licenciatura11 e que é a quarta e última regulamentação do curso;

Para entendermos claramente o significado do termo Residência

Pedagógica, recorremos à expressão Residência Médica. Pode-se aí identificar

um motivo por homologia no qual o Senador se espelha para justificar a

necessidade e importância de semelhante ação para a Pedagogia.

Os documentos analisados para a realização dessa fase se constituem

na:

Lei n. 11.129 de 30 de junho de 2005;

Portaria Interministerial n. 593 de 15 de maio de 2008, da

Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde

(CNRMS).

Utilizamos ainda:

Lei n. 11.788 de 25 de setembro de 2008 que institui o estágio do

estudante;

o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE);

o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação

Básica (PARFOR);

dados do Plano Institucional de Iniciação à Docência (PIBID);

dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

Anísio Teixeira (INEP);

10

Nesse Parecer discutem-se as qualificações obrigatórias para a formação docente, entre elas a questão das horas mínimas de prática como componente curricular, a questão do estágio supervisionado de ensino e a da monitoria para efeito das licenciaturas.

11 Nas diretrizes, estão definidos os princípios, as condições de ensino e de aprendizagem, a

carga horária mínima do curso, as atribuições do papel e função desse profissional e, sobretudo, as horas dedicadas ao estágio supervisionado.

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dados que foram obtidos por meio do Relatório de Síntese do

Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) em

Pedagogia;

dados foram inseridos na pesquisa, tais como os da Fundação

Carlos Chagas12 (FCC), referente à análise dos cursos

presenciais de licenciatura em Pedagogia;

dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior (Capes), que além da pós-graduação, recentemente

veio se ocupar do aperfeiçoamento da Educação Básica, como

por exemplo, a Iniciação a Docência. Diante de tal importância

das reformulações das políticas setoriais, estabeleceu-se como

órgão responsável o Conselho Técnico-Científico da Educação

Básica (CTC da EB).

Além desses dados, outras leis, decretos, resoluções que abordam a

formação de professores foram aproveitados para melhor apreciação deste

estudo.

1.4.2 Fontes Orais

Foram entrevistadas as três pesquisadoras listadas anteriormente, que

têm estudado os cursos de formação inicial. Sendo assim, a análise

documental, associada à entrevista semi-estruturada e ao arcabouço teórico

são técnicas que permitem colher dados qualitativos valiosos. (ANDRÉ;

LUDKE, 2003 p. 38).

Buscamos as coordenadoras dos cursos de Pedagogia da Universidade

Federal do Estado de Minas Gerais (UFMG), da Universidade do Estado de

Minas Gerais (UEMG) e da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

12

A Fundação Carlos Chagas é uma instituição privada sem fins lucrativos, reconhecida como de utilidade pública pelo Decreto Federal 87.122/82, pelo Decreto Estadual 4.500/74 e pelo Decreto Municipal 14.250/77, dedicada à seleção e pesquisa na área de educação. Foi fundada em 1964, e suas atividades foram rapidamente divulgadas, realizando, em âmbito nacional, tanto exames vestibulares quanto concursos de seleção para entidades privadas e públicas. Foi criado em 1971, o Departamento de Pesquisas Educacionais, que desenvolveu amplo programa de investigação, treinamento de pessoal e divulgação científica, nas áreas de educação, creche e estudos sobre a mulher.

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(UEMG), que se disponibilizaram a falar a respeito do estágio supervisionado

no modelo das Diretrizes Curriculares Nacionais e da proposta da RP.

Entendendo que o professor que atua na Educação Básica é o principal

sujeito de interlocução desse processo do ensino-aprendizagem, além de ser

para ele o modelo de RP sugerido pelo Senador MM, buscamos os alunos do

último ano do curso de Pedagogia das referidas instituições superiores, que se

dispuseram a participar do questionário.

Tentando criar uma relação entre aluno e professor, entrevistamos de

forma semi-estruturada os professores dos cursos de Pedagogia cujos alunos

responderam os questionários e buscamos que a mesma temática fosse

discutida.

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2 A FORMAÇÃO DOCENTE

2.1 A origem da Formação Docente no Brasil

No dia 28 de julho de 1759, por meio do Alvará régio, foi sancionada a

expulsão dos jesuítas das terras de Portugal e do Brasil, e estabeleceu a

reforma dos estudos menores. Inicia-se a chamada Pedagogia Pombalina, que

tinha como primeiro ministro o Marquês de Pombal. Nesse momento, surgem

os primeiros ensaios para uma escola pública estatal. Com o fechamento dos

colégios da Companhia de Jesus, introduzem-se no currículo as Aulas Régias13

a ser assistida pela Coroa Portuguesa, da qual em 1772 foi instruído o subsídio

literário14, que era um imposto do qual o povo arcava para manter o ensino

público. Porém, não somente na colônia, mas em todo o continente europeu,

ainda havia várias formas de transmissão de conhecimentos. Quando a família

ou o tutor não conseguiam atingir o objetivo de ensinar as letras ao menino,

este era levado à escola. Qualquer pessoa que “dominasse alguma habilidade

(leitura, escrituração, cálculos, etc.) certamente não se sentiria constrangido

em retransmiti-la no âmbito doméstico.” (VILLELA, 2003, p.99).

Contudo, a expulsão dos jesuítas e o fechamento de seus colégios foi

bastante precipitado. De acordo com Marcílio (2005),

Portugal expediu no mesmo ano de 1759, para todas as capitanias, uma cartilha manuscrita e um manual de ensino das primeiras etapas da alfabetização silábica, seguidos do ensino de gramática latina elementar, para servir de guia aos professores que se improvisariam. (MARCÍLIO, 2005, p.20)

A procura por um “mestre-escola” ou por um “especialista” apenas era

solicitada quando essa família, ou quando esse tutor reconhecia a falência e os

limites de sua missão. De acordo com Azevedo (1976), os docentes revelaram

13

As aulas Régias ou aulas avulsas compreendiam: “Primeiras Letras”, Gramática, Latim e Grego. Posteriormente ampliaram-se com Retórica, Matemática, Filosofia e Teologia. Cada uma delas formava uma unidade de ensino; pois era autônoma. Essas aulas assim se denominaram e constituíram por serem dadas em diferentes locais, uma vez que não se podia contar com as instalações próprias, como ocorriam com as escolas jesuíticas. 14

“Nos estudos de Marcílio (2005), ele menciona que, o subsídio é um valor que deveria se pagar a toda a libra de carne de vaca que matassem nas vilas e seus distritos; e dez réis para cada medida de aguardente que no mesmo se fabricassem.

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“não só uma espessa ignorância das matérias que ensinavam, mas uma

ausência absoluta do senso pedagógico”. (AZEVEDO, 1976, p. 51).

O Alvará de 1759 omitiu, no entanto, a regulamentação das escolas de primeiras letras e com essa falha a Reforma só teve início em 1772, quando foram redigidos os estatutos dos estudos menores, para as comarcas e vilas do Reino. Esses 13 primeiros anos da reforma foram o período mais negativo depois da expulsão dos padres. Até 1772, predominou a improvisação, quando se instituíram às pressas algumas “aulas” de gramática latina, grego e de retórica para evitar a ausência total do ensino formal. (MARCÍLIO, 2005, p.20)

Com a vinda da Corte Portuguesa para o Brasil, em 1808, e de

especialmente, do príncipe Regente Dom João VI para a Colônia, grandes

mudanças aconteceram. No âmbito educacional, foi instituído o ensino superior

nas áreas de Engenharia, Medicina, Química e Agricultura. Segundo Caetano

(2007) “esse nível de ensino superior nasceu sob o signo do Estado Nacional e

tinha como objetivo proporcionar educação para a elite aristocrática e formar

quadros que dariam suporte ao aparelho administrativo aqui implantado.”

(CAETANO, 2007, p. 117).

Apesar de se ter uma preocupação em nível superior e grandes

realizações em atividades culturais sob a regência de D. João VI, apenas no

início do século XIX, é que se inicia um controle gradual do Estado sobre a

educação formal e ocorrem as primeiras iniciativas para organizar um sistema

de instrução primária.

Até então, cabia ao professor providenciar o local das aulas e,

geralmente, essas aulas eram dadas na sua própria residência. Cabia a ele

também a provisão dos materiais a serem utilizados, a infraestrutura e os

recursos pedagógicos.

[...] o príncipe regente (rei D. João VI), a partir de 1817 não criou universidades, apesar de aqui reproduzir tantas instituições metropolitanas. Em vez de universidades criou cátedras isoladas de ensino superior para a formação de profissionais, conforme o figurino do país inimigo naquela conjuntura: de Medicina, na Bahia e no Rio de Janeiro, em 1808; e de Engenharia, embutidas na Academia Militar, no Rio de Janeiro, dois anos depois. Essas eram unidades de ensino de extrema simplicidade, consistindo num professor que com seus próprios meios ensinavam seus alunos em locais improvisados. Foram as escolas, as academias e as faculdades, surgidas mais tarde, a partir de cátedras isoladas, as unidades de ensino superior que possuíam uma direção especializada, programas sistematizados e organizados conforme uma seriação preestabelecida,funcionários

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não docentes, meios de ensino e local próprios. (CUNHA, 2006, p.153-154).

Diante dos crescentes pensamentos oriundos do Iluminismo, que

chegavam ao Brasil por meio dos jovens brasileiros que estudaram em

Coimbra, Paris, ou em outras universidades europeias, ou ainda por meio de

livros contrabandeados, há uma aversão ao predomínio das ideias religiosas, e

há também, uma crescente inspiração nos ideais laicos, estabelecendo assim,

o Estado como sujeito principal da responsabilidade da instrução. Porém, o

Estado se limitou ao estabelecimento de um quadro curricular e ao pagamento

do salário do professor. Essa nossa primeira versão da Educação Pública

Estatal não chegou a cumprir seus objetivos. No campo da instrução pública,

as reformas pombalinas constituíram expressão do iluminismo português, de

caráter reformista e de uma política mercantilista e fisiocrata. Apesar de se

basear nos ideais franceses, o seu espírito não era revolucionário, nem anti-

histórico, nem irreligioso, mas essencialmente nacionalista e humanista.

(MARCÍLIO, 2005, p.18)

Após a Proclamação da Independência em 1822, começou a se pensar

a formação dos professores. Para o ensino público primário, algumas

mudanças vieram com a Carta Outorgada de 1824, que institui o ensino

fundamental público e gratuito. Em 1827, a era pombalina chegou ao seu fim

com a Lei Geral do Ensino de 1827.

Em 15 de outubro de 1827, o Brasil conheceu sua primeira lei de educação a fim de fazer jus ao mandamento constitucional da gratuidade do ensino primário para os considerados cidadãos. Ela possuía um caráter nacional e pressupunha a formação de docentes com incumbência dos poderes gerais. (CURY, 2007, p.3).

Porém, Villela (2003) lembra que a proposta de formação de professores

contida nessa Lei não teve muitos resultados. Em 1834, o Ato Adicional,

colocou sob a responsabilidade das províncias não só a administração das

escolas primárias e secundárias como também a capacidade de legislar sobre

elas. Resultou daí também a implantação das primeiras Escolas Normais

brasileiras como modo de formação docente tendo como referência geral o

modelo francês de tal formação. Se a Constituição de 1824 instituiu a

gratuidade da educação elementar como direito para os considerados

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cidadãos, o Ato Adicional de 1834 implicou, na prática descentralizada, uma

renúncia a um projeto de escola pública nacional. Ficando sob a

responsabilidade das Províncias, iniciativas oficiais foram bastante limitadas.

De um lado porque os impostos reservados às províncias eram bem menos

significativos do que os atribuídos aos Poderes Gerais. Além disso, a extensão

do país associada ao quadro social escravagista tornava a educação

doméstica uma saída para as elites, e se tem registro de escolas funcionando

em espaços privados.

Devido à influências Iluministas advindas da Europa, que marcaram

fortemente o novo continente, os dirigentes que assumiram o poder nas várias

províncias no período regencial acreditavam que a falta de instrução da

população era responsável pela distancia entre o Brasil e os países civilizados

da Europa e dessa forma, “somente pela instrução se atingiria os estágios mais

elevados da civilização.” (VILLELA, 2003, p.103). Havia, por traz dessa

retórica, “o propósito de unificar certos padrões sociais”, difundindo “hábitos

intelectuais e morais que constituiriam a unidade e a nacionalidade.” (VILLELA,

2003, p.103).

Tal retórica também relacionava a criminalidade com a falta de instrução

e comparava os índices de criminalidades a dos países mais desenvolvidos

para enfatizar que quanto maior era o nível de instrução de um cidadão, menor

era o número de ocorrências de crimes no país. De acordo com o pensamento

oitocentista, era o encontro pela uniformidade que se organizariam a

sociedade, livrando-se da criminalidade, ou seja, “abrir escolas era fechar

prisões.” (VILLELA, 2003, p.104).

As escolas normais podem se relacionar com o que leciona Nóvoa

(1998) ao afirmar que o processo de profissionalização docente se iniciou no

momento em que o Estado passou a substituir a igreja, como entidade

responsável pela tutela da educação. Esse processo se desenvolveu de modo

mais acirrado e de maneira lenta, em termos nacionais.

Só a partir de 1835, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, em 1836 na

Bahia, em 1846 em São Paulo, de acordo com Villela (2003), foram

implantadas as primeiras escolas e, em 1837, foi fundado o Imperial Colégio

Pedro II, que servia para atender a elite e deveria ser o modelo da estrutura-

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didática pedagógica e curricular a ser seguido. Entretanto, a profissionalização

apontada por Nóvoa se confronta com a afirmação de Nunes:

O magistério não possuía, nessa época, o estatuto de profissão, mas, sobretudo de “vocação”, valorizando-se mais a idoneidade moral do professor e seus princípios religiosos do que sua competência teórica e didática, sendo que o peso dessa “história” perdura até os nossos dias. Somando-se a isso a baixa remuneração oferecida, havia uma carência de profissionais do magistério. (NUNES, 2006, p.24).

Com o surgimento das primeiras Escolas Normais, outro fator também

foi idealizado: o professor. A Escola Normal torna-se o local oficial para o

desenvolvimento e aprendizagem do magistério. Algumas fases dessa Escola

Normal foram fortemente marcadas pelo descrédito da sua eficiência e pela

ausência de melhorias, chegando a sua extinção. Vale ressaltar que junto com

a sua instabilidade, outro elemento se erguia lentamente, o professor, mas que

buscando o princípio de sua identidade, só perceberá a importância de sua

profissão após anos de muitas mudanças e de luta.

Devemos ressaltar que, ao longo do Império, a função docente irá se

transformar de uma ocupação secundária, não especializada para um projeto

de laicização onde os antigos docentes passam “a ser recrutados e vigiados

pelas instancias do poder estatal.” (VILLELA, 2003, p.100).

A partir de 1835, com a implantação das Escolas Normais, o candidato à

formação de professor deveria possuir algumas características, tais como,

idade (maior de dezoito anos), ser brasileiro, saber ler e escrever, ter bons

costumes e boa educação. O peso maior para o ingresso do candidato era o de

se ter boa morigeração, em detrimento de uma formação intelectual. Isso,

certamente, devido aos dirigentes que desejavam muito mais ordenar, do que

instruir o povo. (VILLELA, 2003, p. 106).

O método lancasteriano15 foi adotado porque procurava desenvolver nos

alunos a disciplina de hierarquia e de ordem, por um controle exercido por meio

da suavidade sem a necessidade de uma punição física.

15

O método lancasteriano também ficou conhecido como método mútuo, ou monitorial que foi experimentado nas escolas de primeiras letras nas décadas de 1820 e 1830. A introdução desse método nas escolas elementares já havia disseminado as primeiras experiências oficiais com a utilização de alunos dessas mesmas escolas como auxiliares de seus professores. Nesse modelo, para Gondra e Shueler (2008), os monitores eram responsáveis pela transmissão de conhecimentos escolares aos outros alunos, ocupando a posição do docente,

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Desse período à Proclamação da República, em 1889, ocorreram muitas mudanças no cenário sócio-político e econômico do Brasil, originando novas demandas, provocadas pela necessidade de uma maior capacitação de trabalhadores, e conseqüente avanço na formação de professores (...). (NUNES, 2006, p.24).

Sendo assim, os dirigentes não pretendiam perder o controle e a

submissão de seus funcionários. Para tanto, eles se preocupavam em dominar

ideologicamente os futuros professores. De acordo com Villela (2003) o

currículo da Escola Normal quase não possuía nenhuma diferença em relação

ao da escola primária, apenas se diferenciava pelo acréscimo da parte

metodológica, observando que os mestres deveriam dominar o método

lancasteriano. “Isso indica que inexistia uma intenção de oferecer ao futuro

mestre da escola primária uma formação mais aprofundada em termos de

conhecimentos laicos, ao passo que a formação moral e religiosa era muito

enfatizada.” (VILLELA, 2003, p.107).

Dentro dessa sociedade, só cabiam aqueles que eram reconhecidos

como pessoas de bons valores, possuidoras de títulos ou propriedades e de

boa moral. Certamente, esperava-se do professor, um sujeito cujas habilidades

se pautassem em seguir as recomendações e ordens dos dirigentes. O

domínio que esse professor exercia sobre os alunos deveria ser o ponto chave

para a educação escolar.

Ainda na ótica de Villela (2003), o conceito de cidadania era estreito,

reduzido a um grupo restrito. Os negros não eram considerados como pessoas,

ou cidadãos, eram tidos como propriedades de outrem e não podiam frequentar

nem as escolas de primeiras letras públicas, nem as Escolas Normais. Mesmo

quando iam às escolas, as mulheres eram excluídas dos saberes mais

aprofundados em consonância com o padrão patrimonial da época e o currículo

das escolas de meninas era diferenciado ao da escola de meninos. Elas

deveriam aprender a ler, escrever e fazer as quatro operações e, sobretudo, a

aprender a bordar, costurar e a administrar os afazeres domésticos.

De acordo com Veiga (2007), os poucos cursos superiores no Brasil:

que era regulada pelo mestre. Isso contribuiu para disseminar ou, ao menos, para não afastar práticas seculares de reprodução da docência através dos processos de aprendizagem do ofício pela prática, nos quais se valorizava o aprender-fazendo, a face artesanal do mestre-escola.

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[...] eram da alçada administrativa do governo central e até 1879 só podiam ser freqüentados por homens. O Brasil tinha, à época, duas faculdades de direito, duas de medicina, uma de farmácia e duas de engenharia, além das academias militares e algumas aulas avulsas de estudos superiores. (VEIGA, 2007, p.188).

A formação dos professores se dava da seguinte forma:

[...] como o curso da Escola Normal não era seriado, à medida que o diretor ia dando os alunos como prontos, estes submetiam-se a exame perante o presidente da província e uma banca de três examinadores convidados. Só então estariam aptos para concorrerem a uma cadeira do magistério público. (VILLELA, 2003, p.110)

A primeira Escola Normal foi a de Niterói, capital da província fluminense

e representou um importante lócus de formação de professores no Império,

pois essa província funcionou como um laboratório de práticas que foram

estendidas a todo país, pela supremacia que os políticos fluminenses exerciam

em nível nacional. O primeiro currículo dessa escola era simplificado demais e

as disciplinas seriam ministradas pelo seu diretor, que, naquele momento, era o

seu único professor.

A escola será regida por um diretor que ensinará: os conhecimentos de leitura e escrita pelo método lancasteriano, cujos princípios doutrinais e práticos explicará; as quatro operações de aritmética, quebrados, decimais e proporções; noções de geometria teórica e prática; elementos de geografia; princípios da moral cristã e da religião oficial e gramática nacional.(VILLELA, 2003, p.109).

Esse Diretor recebeu professores adjuntos com a Reforma de 1847 e se

unificou a Escola Normal ao Liceu Provincial, que proporcionava uma formação

mais diversificada com um currículo com duração de dois anos para o ensino

“preliminar” e três anos para o ensino médio. Nesse momento, temos o início

de uma seriação e de uma graduação de disciplinas em relação ao nível que

cada aluno se destinava.

Surge o termo didática pela primeira vez e disciplinas novas como álgebra, música e canto e desenho linear (...) história nacional, história universal e história sagrada. Aparecem também as noções de ciências físicas e de história natural aplicáveis aos usos da vida. (VILLELA, 2003, p. 111).

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Os Liceus, como chamavam esses cursos, não vingaram por muito

tempo, apenas quatro anos após a sua implantação. As Escolas Normais foram

extintas por quase dez anos, durante o Ministério de Couto Ferraz e ficou

conhecida como Reforma Couto Ferraz (Decreto 1.331 de 17 de fevereiro de

1854). Nesse momento, a formação dos professores estava relacionada à sua

prática, ou seja, a sua experiência juntamente a outro professor com mais

tempo de “casa”. Temos aqui, o primeiro vestígio de uma prática do ensino

relacionado a um professor com mais experiência, numa espécie de ancestral

que pode indicar uma direção em vista de uma “residência pedagógica”, mas

que também nos leva a refletir sobre o estágio supervisionado que tende a

levar o aluno a vivenciar a prática educativa orientado por um professor.

Mesmo com a extinção das Escolas Normais, a profissão docente era

algo que o Estado tinha interesse. Oficialmente, a extinção da Escola Normal

do Rio de Janeiro ocorreu em 1851, mas quando Couto Ferraz ainda estava

como presidente dessa província expediu o Regulamento de Instrução Primária

e Secundária. Em 1849, já havia o interesse de formar os professores em um

outro sistema. “Paralelamente à tentativa, aliás mal sucedida de se formarem

os professores num dos cursos oferecidos pelo Liceu, abria-se uma outra

possibilidade – formá-los por um sistema austríaco-holandês.16”(VILLELA,

2003, p.123).

[...] Couto Ferraz, quando presidente da província do Rio de Janeiro, fechou a Escola Normal de Niterói em 1849, substituindo-a pelos professores adjuntos, regime que adotou no Regulamento de 1854, ao exercer o cargo de ministro do Império. Os adjuntos atuariam como ajudantes do regente de classe, aperfeiçoando-se nas matérias e práticas do ensino. Por esse meio seriam preparados os novos professores, dispensando-se a instalação de Escolas Normais. (SAVIANI, 2008, p.16)

Gondra e Schueler apontam, em seus estudos, que o século XIX foi

definido por fortes mudanças no estatuto da profissão docente, originária da

“crescente afirmação da forma escolar moderna que passou a disputar a

legitimidade de educar com mecanismos tradicionais de formação e

recrutamento docentes.” (GONDRA; SCHUELER, 2008 p.190).

16

Esse sistema austríaco-holandês consistia em deixar os professores formarem-se pela prática, passando de inspetores subordinados a monitores e finalmente a mestres adjuntos e então recebem para se aperfeiçoarem em algumas lições de pedagogia.

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Apesar da instabilidade institucional que as Escolas Normais viveram no

Império Brasileiro, um desses mecanismos estava relacionado à aprendizagem

do oficio docente pela prática. Identificamos aqui o primeiro relato que relaciona

a prática do ensino como um importante exercício para que os aprendizes de

professores se tornassem mais experientes.

Segundo Gondra e Schueler, é por meio da

aprendizagem do ofício docente pela prática, por meio da qual os alunos auxiliares e monitores, também chamados de professores adjuntos, se preparavam para iniciar o exercício da docência no interior das próprias escolas e dos processos de ensino. Os aprendizes, alunos e alunas das escolas na medida em que auxiliavam os professores efetivos, adquiriam os saberes, as técnicas, as regras e os segredos das práticas de ensino, apreendendo, por impregnação cultural, pela experiência, as regras do ofício. (GONDRA; SCHUELER, 2008. p.190).

Os professores adjuntos17, após a nomeação, deveriam estar ligados às

escolas, por três anos, no mínimo, como auxiliares do docente efetivo,

pretendendo que se aperfeiçoassem “teórica e praticamente nas matérias de

ensino primário, exercendo o oficio em um processo contínuo de aprendizagem

na experiência escolar.” (GONDRA; SCHUELER, 2008, p.191).

Outro dado importante apontados pelos autores é que durante os três

anos de exercício, os adjuntos deveriam ser avaliados por exames diante de

uma banca examinadora composta por um Inspetor Geral, que tinha o objetivo,

por sua vez, de analisar “os graus de aproveitamento e de aprendizagem dos

saberes e disciplinas curriculares da escola primária.” (GONDRA; SCHUELER,

2008, p.191). Caso os adjuntos fossem reprovados nesses exames poderiam

ser eliminados da classe de auxiliares de ensino. Ao final dos três anos, o

exame final seria:

em torno não apenas das matérias de ensino, mas também de métodos e tecnologias pedagógicas adequadas ao ensino das respectivas disciplinas escolares. Aprovado nesse exame, o ajunto

17

De acordo com a Reforma Couto Ferraz em seu artigo 35, os professores adjuntos deveriam ser recrutados entre os alunos das escolas públicas primárias da Corte, meninas ou meninos com 12 anos de idade completos, que possuíssem bom rendimento escolar e que correspondesse às normas de comportamento exigidas para ser professor. Segundo Uekane (2005), esse modelo de formação demonstra que para ser um candidato era necessário o domínio de pouco saberes, apenas conhecer as noções de primeiras letras, também ter um pouco de método utilizado nas escolas e, sobretudo, a questão da moralidade.

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ou adjunta das escolas públicas adquiria o „Título de Capacidade‟ para o magistério, continuando adido às escolas até a abertura de concursos para o preenchimento de vagas efetivas. (GONDRA; SCHUELER, 2008, p.191).

A regulamentação do ingresso dos professores adjuntos às escolas

públicas feita pela reforma Couto Ferraz, de 1854, na Corte, não estabeleceu

apenas

[...] um novo modelo de formação docente, nem somente buscou inspiração em modelos e legislações estrangeiras, como se mantivesse o olhar fora do lugar. Ao contrário, a reforma legislativa, para além de instituir uma nova política oficial de formação de professores, subtraindo tal competência das Escolas Normais, referendava e consolidava práticas tradicionais de aprendizagem e de reprodução do ofício, ao passo que lhes conferia um caráter oficial, submetendo-as (ou tencionando submetê-las) à racionalização e ao controle estatal. (GONDRA; SCHUELER, 2008, p.194).

Quanto à criação de cargos de professores adjuntos, a reforma de 1854

veio assegurar aos professores primários o exercício de um monopólio sobre

os processos de reprodução da docência, mediante a direção e

responsabilidade da formação de aprendizes, ou seja, os futuros professores

efetivos das escolas. Isso proporcionou certa conservação do monopólio dos

“segredos do ofício” sobre os saberes, as técnicas e as artes de ensinar, por

meio das práticas tradicionais de aprendizagem e transmissão, além de se ter

uma preocupação em garantir o acesso de parentes aos empregos oficiais.

Essa, digamos, tradição, na reprodução da docência é uma forte indicativa do

relativo sucesso do sistema de formação de professores pela prática. Apesar

disso, as indicações dos adjuntos pelos professores, depois dessa reforma,

não ficaram imunes às intervenções impostas pelas novas regras jurídicas

estatais. O Estado, a partir da regulamentação, buscava estabelecer normas,

regras e controles políticos sobre o recrutamento de professores primários para

as escolas públicas e privadas, pois, de certa forma, já se era regulamentado

que a nomeação definitiva dos professores adjuntos e efetivos seria feita pelo

governo, depois de efetivados os exames, e pelos decretos e portarias

instituídos pelos órgãos administrativos do ensino. (GONRA; SCHUELER.

2008).

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O que se pretendia com a institucionalização da inspeção escolar era

nada menos que o enfraquecimento da autonomia e autoridade dada aos

mestres. Certamente, as posições favoráveis ao modelo escolar de formação

de professores, em detrimento da formação pela prática centrada em ofícios

pela política de recrutamento dos adjuntos, estavam relacionadas aos

interesses do Estado em implementar uma política formal e efetiva de controle

da formação docente, que transformasse

[...] as práticas tradicionais de reprodução artesanal do ofício (o adestramento pela experiência, na expressão do Ministro Paulino) em uma aprendizagem ao mesmo tempo teórica e prática adquirida em instituições formais de educação pedagógica. (GONDRA; SCHUELER, 2008, p.196).

As Escolas Normais reaparecem assim, por volta de 1859, e surgem as

cátedras e a criação de um curso especial para as mulheres (que estudariam

em dias alternados aos dos homens), com o destaque para a ausência da

álgebra e da geometria e a inclusão de afazeres domésticos. Como passou a

se exigir o diploma de normalista para a docência do primário, quem se

formava nesses cursos era considerado como possuidor de vocação, pois o

magistério valorizava mais os conhecimentos religiosos, sua idoneidade moral

do que seus conhecimentos teórico-didáticos. “As escolas normais, no século

XIX, substituem definitivamente o „velho‟ mestre-escola pelo „novo‟ professor do

ensino primário”. (VILLELA, 2003, p.101).

Contudo, o professorado ainda se encontrava desorganizado. Existia

certa “conformação”, uma ausência de posicionamento em relação a carreira e

a profissão docente. Esse “mal-estar” devido ao “vai-e-vem” (sic) das escolas

da implantação das Escolas Normais e depois da sua extinção e, novamente,

sua reaparição, trazia à tona um fenômeno que marcaria a história da

identidade do professor em quase todo o século XIX. Ao mesmo tempo em que

foi recorrente o discurso de valorização da formação docente pelas Escolas

Normais, foi necessário levar em conta os poucos recursos que as Províncias

dispunham para o desenvolvimento da instrução, o que apontava para a

fragilidade do processo de qualificação docente, e para a dificuldade de se

estruturar um sistema de ensino que uniformizasse as práticas educativas.

(GONDRA; SCHUELER, 2008, p.198).

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Em 1859, a pioneira Escola Normal de Niterói foi reaberta e, duas

décadas depois, Leôncio de Carvalho institui a Reforma que leva o seu nome e

que:

[...] regulamenta o funcionamento das Escolas Normais fixando o seu currículo, a nomeação dos docentes, o órgão dirigente e a remuneração dos funcionários. Essa Reforma baixada pelo Decreto n. 7.247, de 19 de abril de 1879, reformou o ensino primário, secundário e superior para a adoção do método intuitivo. (SAVIANI, 2008, p.16).

De acordo com Nóvoa (1998), o professorado só se beneficiou com as

Escolas Normais, pois elas estão no início de uma verdadeira transição

sociológica do corpo docente: “o velho mestre escola é definitivamente

substituído pelo novo professor de instrução primária.” (NOVOA, 1998, p.18).

Existia um embate entre os modelos de formação docente que havia no

contexto nacional o qual direcionava atenção à progressiva constituição do

“campo educacional como um campo de saberes científicos, cujo domínio

deveria pertencer a um corpo de especialistas, as autoridades da ciência

pedagógica, formado pelas modernas Escolas Normais.” (GONDRA;

SCHUELER, 2008, p.196).

Só em 1890, com o advento da República, o Poder Público Estadual

assume a tarefa de organizar e manter integralmente as escolas primárias do

estado de São Paulo, dando a elas o caráter de uniformidade, gratuidade e, por

vezes, da obrigatoriedade do ensino. Nesse mesmo ano, São Paulo torna-se

exemplo a ser seguido em toda a capital, já que foi o precursor desses ideais,

conhecido como a Reforma da Instrução Pública do Estado de São Paulo.

Sabendo disso, podemos imaginar o cenário de contradições e jogos de

poder da época. Para os reformadores,

[...] sem professores bem preparados, praticamente instruídos nos modernos processos pedagógicos e com cabedal científico adequado às necessidades da vida atual, o ensino não pode ser regenerado e eficaz. (SÃO PAULO apud SAVIANI, 2008, p.17).

Essa reforma estadual paulista, de 1890, trouxe algo realmente

inovador: a criação da Escola-Modelo anexa à Escola Normal, que foi a

principal referência do modelo pedagógico-didático para a formação de

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professores a ser seguido pelas cidades do interior de São Paulo e mais tarde

a inspirar iniciativas semelhantes em outros estados.

Segundo Peixoto (1983), em Minas Gerais, no ano de 1926, Antônio

Carlos Ribeiro de Andrada assume o poder do Estado e convoca Francisco

Luís da Silva Campos, um jovem político mineiro, para colaborar no

planejamento e na implementação de seu programa de governo. De acordo

com a autora, ambos encontram no filósofo e educador americano, John

Dewey, os pressupostos e as justificativas que necessitavam para a

reconstrução da sociedade pela escola. Dessa forma, a reforma educacional

atingiu o ensino primário e o normal. Nesse governo, a democracia significava:

a ampliação do direito de voto a todos os cidadãos, sendo cidadão o indivíduo escolarizado e formado. Logo, a ampliação do direito de voto se liga diretamente à ampliação da escolaridade primária, através da oferta de maiores oportunidades educacionais. (PEIXOTO, 1983, p. 86-87).

Como o país se encontrava no âmbito de grandes mudanças

sociopolíticas e econômicas, aumentou-se a demanda pela capacitação dos

trabalhadores e isso gerou uma busca por professores que ensinassem aos

alunos do ensino profissional. Ocorreu, assim, a primeira tentativa de elevar os

estudos de educação ao nível superior em São Paulo, mas essa tentativa não

foi implantada. Tinham-se os seguintes dizeres:

a lei n.88, de 8 de setembro de 1892, instituiu o curso superior da Escola Normal organizado em duas seções, a científica e a literária, com dois anos de duração, tendo como finalidade a formação de professores para a Escolas Normais e ginásios. (SAVIANI, 2008, p.18).

Com o avanço da indústria, a educação no Brasil em 1920, passa a ter

outro enfoque: o combate ao analfabetismo. Com o início da Era Vargas na

década de 30, os ideais capitalistas passam a ser impulsionados fortemente e

novas demandas educacionais. Também nessa década foi criado o Mistério da

Educação e da Saúde Pública, tendo como seu primeiro ministro o renovador

mineiro, de quem já falamos, Francisco Campos.

De acordo com Castro (2007) a Escola de Aperfeiçoamento em Minas

Gerais, criada em 1929, era uma escola de nível pós-médio que oferecia

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cursos específicos de Administração Escolar “com o objetivo de aprimorar a

formação do professor nos aspectos técnico e científico, preparando o corpo

docente das escolas normais e os administradores das escolas primárias.”

(CASTRO, 2007, p.200). Segundo a autora, esse curso foi responsável por

inovações na área educacional e pode ser considerado como a gênese do

Curso de Pedagogia.

Peixoto (2003) cita algumas das contribuições provenientes de

professores dessa escola:

Helena Antipoff criou e fez funcionar um dos primeiros laboratórios de Psicologia Educacional de que se tem notícia no país. Lúcia Monteiro Casasanta testou e divulgou, para todo o Brasil, o Método Global para o ensino da Leitura e da Escrita e uma de suas alunas, Anita Fonseca, produziu, durante o curso, o famoso Livro de Lili, manual que alfabetizou toda uma geração de mineiros. (PEIXOTO, 2003, p.111).

Em 1931, retoma-se a discussão sobre a formação dos educadores no

Brasil e o Decreto n.19.851/31 baixou normas gerais para a organização das

universidades e propunha que o ensino superior poderia ser ministrado em

institutos isolados. No mesmo ano, foi instituído o Decreto-Lei n. 19.852 que

legislava especificadamente sobre a Universidade do Rio de Janeiro, a qual foi

modelo para o estatuto das Universidades Brasileiras, e que também se

instituiu. (CASTRO, 2007, p.201).

Finalmente, podemos perceber que nesse momento, temos uma

abertura no âmbito educacional, na qual as Faculdade de Educação, Ciências

e Letras estariam ao lado das tradicionais faculdades de Direito, de Medicina e

de Engenharia. Os estudos educacionais alcançaram as escolas de nível

superior e, por consequência, o professor também. (SAVIANI, 2008).

Com o movimento dos escolanovistas, em 1932, pretendia-se instaurar

no Brasil uma escola democrática, pública, laica e um direto de todos e para

formar o cidadão era preciso se preocupar com a formação dos professores

que ali se encontravam. De acordo com o Manifesto dos Educadores de 1932,

a preparação dos professores era tratada de uma maneira descuidada, como

se a função educacional,

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de todas as funções públicas a mais importante, fosse a única para cujo exercício não houvesse necessidade de qualquer preparação profissional. Todos os professores, de todos os graus, cuja preparação geral se adquirirá nos estabelecimentos de ensino secundário, devem, no entanto, formar o seu espírito pedagógico, conjuntamente, nos cursos universitários, em faculdades ou escolas normais, elevadas ao nível superior e incorporadas às universidades. A tradição das hierarquias docentes, baseadas na diferenciação dos graus de ensino, e que a linguagem fixou em denominações diferentes (mestre, professor e catedrático), é inteiramente contrária ao princípio da unidade da função educacional, que, aplicado, às funções docentes, importa na incorporação dos estudos do magistério às universidades, e, portanto, na libertação espiritual e econômica do professor, mediante uma formação e remuneração equivalentes que lhe permitam manter, com a eficiência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos educadores. (Manifesto, 1932).

Entendia-se, portanto, que a formação universitária dos professores era

mais que uma necessidade da função educativa, era o meio de se estender e

estabelecer a cultura e o espírito comum nas aspirações e nos ideais. Sendo

assim, Nóvoa (1998) diz:

As instituições ocupam um lugar central na produção e reprodução do corpo de saberes e do sistema de normas da profissão docente, desempenhando um papel crucial na elaboração dos conhecimentos pedagógicos e de uma ideologia comum. Mais do que formar professores (a título individual), as escolas produzem a profissão docente (a nível coletivo), contribuindo para a socialização dos seus membros e para a gênese de uma cultura profissional. (NÓVOA, 1998, p.18)

O responsável pelo Estatuto das Universidades Brasileiras foi o

ministro Francisco Campos, que acreditou na alta função que a vida cultural

de um povo em formação, como o povo brasileiro, no caso, deveria ter para

progredir. Sendo assim, a Faculdade de Educação, Ciências e Letras seria o

local onde os professores poderiam ampliar seus conhecimentos, pois nestes

faltavam os largos e profundos quadros tradicionais da cultura, nos quais se

processam continuamente a rotação e renovação dos valores didáticos, de

maneira a constituir para o ensino superior e secundário padrão, cujas

exigências de crescimento e de aperfeiçoamento se desenvolvem em linhas

ascendentes. (CAMPOS apud SAVIANI, 2008, p.22).

Com isso, o referido ministro pautava a formação de professores,

sobretudo, do ensino normal e secundário. (SAVIANI, 2008, p.16).

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De acordo com Veiga (2007), não podemos nos esquecer de que, nas

primeiras décadas do século XX, o número de analfabetos no Brasil era de,

aproximadamente, 75% da população total e, nas salas de aulas, havia a

predominância da elite sócio-burguesa. O professor detinha o domínio da

classe e do método por meio da pedagogia tradicionalista18, que colocava o

docente como detentor de todo o saber, e o aluno como o aprendiz passivo.

Certamente, naquele contexto cultural e social, as competências e habilidades

exigidas do professor eram diferentes do presente momento. Nóvoa (1998)

diz que a profissão docente exerce-se a partir da adesão coletiva (implícita ou

explícita) a um conjunto de normas e valores. No início do século XX, este

“fundo comum” é reforçado pela crença que a escola é um ambiente onde

seus professores serão os agentes que iram protagonizar e a exercer o seu

poder simbólico. (NÓVOA, 1998, p.19).

Com a criação da Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do

Brasil, foi implantado o curso de Pedagogia, por meio do Decreto-Lei n. 1.190

de 4 de abril de 1939. Essa Universidade foi entendida como exemplo padrão

a ser seguido por todas as instituições de ensino superior do país, e define a

maneira de organização desse nível de ensino durante o período que vai de

1940 a 1968 (SAVIANI, 2008, p.37), quando é aprovada e instituída a Lei da

Reforma Universitária, ou seja, a Lei n. 5.540/68.

De acordo com Castro (2007), as Leis Orgânicas do Ensino Primário

(Decreto-Lei n 8.529/1946) e do Ensino Normal (Decreto-Lei n 8.530/1946)

marcaram indícios da atuação do Pedagogo. A primeira o tratava como um

“técnico em educação, um diretor de estabelecimentos de ensino e um

docente.” (CASTRO, 2007, p.203). A segunda se preocupava com “uma

formação de qualidade para os professores do ensino primário, em especial

os das áreas rurais” (CASTRO, 2007, p.203), embora não se referisse

explicitamente à Pedagogia.

18

A Pedagogia Tradicionalista foi introduzida no final do século XIX com o advento do movimento renovador que, para definir a novidade das propostas que começavam a ser veiculadas, classificou como “tradicional” a concepção até aquele momento determinante. De acordo com Saviani (2009) esta concepção provém de correntes pedagógicas que se formularam desde a Antiguidade, tendo em particular “uma visão filosófica essencialista de homem e uma visão pedagógica centrada no educador (professor), no adulto, no intelecto, nos conteúdos cognitivos transmitidos pelo professor aos alunos, na disciplina, na memorização.

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A fim de situar o contexto histórico desta pesquisa buscamos trazer à

memória, alguns traços que consideramos fundamentais para discutir nos

próximos capítulos, os propósitos de uma RP. Para tanto, no tópico e nos

sub-tópicos a seguir descrevemos os marcos legais do curso de Pedagogia.

2.2 O Curso de Pedagogia no Brasil: os marcos legais da formação do

Pedagogo

Perceber a educação como arte19 também foi um momento marcante no

início do século XX, quando se pautava no cenário educacional a definição do

papel do educador. Esse discurso ainda está latente e podemos utilizá-lo para

entendermos a educação como ciência e arte de educar. Para tanto,

remetemos à Anísio Teixeira20 (1900-1971), que representou um dos

educadores mais importantes da nossa época, com suas idéias que,

certamente, avançaram toda a sua geração. Ele se dedicou à implantação de

uma instrução pública de qualidade para o povo brasileiro e participou

ativamente dos movimentos dos escolanovistas21. Acreditava que o Brasil

deveria acompanhar o desenvolvimento da arte de educar, revisando os

conceitos e as técnicas de estudo para incorporar a ciência à arte. Seus

estudos comparativos sobre a educação e sobre a medicina trouxe algo

bastante novo, próprios da investigação no campo educacional e da prática

docente. Expõe-se da seguinte forma:

19

Arte como “modos de fazer”. 20

Anísio Teixeira nasceu no Rio de Janeiro, na cidade de Caetité em (1900-1971). Advogado, intelectual, educador e escritor brasileiro. Personagem central na história da educação no Brasil, nas décadas de 1920 e 1930, difundiu os pressupostos do movimento da Escola Nova, que tinha como princípio a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de julgamento, em detrimento da memorização. Reformou o sistema educacional da Bahia e do Rio de Janeiro, exercendo vários cargos executivos. Foi um dos mais destacados signatários do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, em defesa do ensino público, gratuito, laico e obrigatório, divulgado em 1932. Fundou a Universidade do Distrito Federal, em 1935, depois transformada em Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. 21

Esse movimento também conhecido como Movimento da Escola Nova aconteceu inicialmente na década de 30, e alcançou seu ápice com o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932, do qual Anísio Teixeira participou ativamente. Objetivava-se implantar no Brasil, uma instrução pública e de qualidade, baseada nos princípios da laicicidade, da coeducatividade, da obrigatoriedade e que, sobretudo, fosse gratuita e de acesso a todos.

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Arte consiste em modo de fazer. Modos de fazer implicam no conhecimento da matéria com que se está lidando, em métodos de operar com ela e em um estilo pessoal de exercer a atividade artística. (TEIXEIRA, 1957, p.6)

Consideremos a educação uma arte da qual o homem necessita por em

prática. Todo o progresso nas artes está diretamente relacionado a um

progresso científico mantido sobre regras, sobre certo domínio do

conhecimento e sobre o domínio de técnicas.

Esse progresso científico sobre regras e técnicas também deve ocorrer

no âmbito educacional. A observação, a experiência, isto é, a passagem “do

empirismo para a ciência foi e é uma mudança de métodos de estudo” que

levam “à novas buscas e novas descobertas.”(TEIXEIRA, 1957, p.6).

A educação, nessa ótica, vista como ciência e também como arte, deve

se desenvolver não como uma ciência autônoma, mas como uma ciência

ligada e desenvolvida pela seleção de material para o currículo, de métodos de

ensino e disciplina, e de organização e administração das escolas.

Trata-se de levar a educação para o campo das grandes artes científicas – como na engenharia e a medicina – e de dar aos seus métodos, processos e materiais a segurança inteligente, a eficácia controlada e a capacidade de progresso já asseguradas às suas predecessoras relativamente menos complexas. (TEIXEIRA, 1957, p.7).

É interessante refletirmos sobre essa comparação, já que o PL de MM

se ampara na RM para instituir uma RP. Assim, a Educação ou a Pedagogia

poderiam ser pensados como a engenharia e ou a medicina. Mazzotti (2001)

lembra-nos que esse debate sobre a natureza da Pedagogia ou da Educação,

raramente considera que se possa estabelecer uma ciência autônoma que

examinaria as práticas educativas.

Contudo, Mazzotti (2001) sustenta que a negação da possibilidade de

uma ciência da prática apóia-se na negação da lógica indutiva, que, segundo o

autor os opositores revelam que: “não seria possível a indução porque jamais

teremos certeza absoluta dos encadeamentos dos enunciados, como diz a

lógica e a epistemologia clássicas.” (MAZZOTTI, 2001, p.13-14). Porém, em

seus estudos apoiou-se em Piaget e Garcia os quais pressupõem que a lógica

indutiva não apenas é possível, como pode ser regulada. Afirmam também é

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possível erigir uma teoria científica a partir da prática. Dessa forma, Mazzotti

(2001) acredita que é “através de suas investigações, que toda antecipação de

uma ação implicava, necessariamente, um conjunto de inferências, sendo

possível estabelecer uma lógica das significações e uma lógica das ações.”

(MAZZOTTI, 2001, p.13-14).

Pretendemos aqui enfatizar a criação do curso de Pedagogia no Brasil e

para tanto, necessitamos analisá-lo desde a sua formação. A palavra

Pedagogia era utilizada para designar a própria prática educativa, depois

passou a referir-se à teoria, mas nunca desligada da sua prática. Seu léxico

etimológico vem do grego da palavra “pedagogo que quer dizer pais, paidós,

criança, e „ago, agog‟ significa guiar, conduzir. (PATRASCOIU, 1926, p.14).

Se entendermos a Pedagogia como um estudo sistemático da educação,

podemos pressupor que ela também é uma arte educativa e sobre ela

desenvolve a reflexão da filosofia e das ciências, para aprofundar o seu

conhecimento consciente e melhorar o seu exercício. Ao longo da história, a

pedagogia foi se firmando e cada vez mais, sendo relacionada como a maneira

de apreender ou de instruir o processo educacional. (SAVIANI, 2008, p.1)

Segundo Patrascoiu (1926), a Pedagogia iniciou sendo uma arte, uma

habilidade prática e com o passar dos anos, na medida em que o homem

ganhava mais conhecimento e cultura, a busca pela ciência e pela reflexão

constituíram em uma ciência da educação.

Laeng (1973) expõe seu olhar sobre a pedagogia como arte, filosofia e

ciências:

A pedagogia como arte foi a primeira a surgir, na mais remota antiguidade: e ainda hoje compreende grande parte da actividade educativa. Como objecto reflexo da história da educação, fazem parte desta primeira forma a invenção educativa e as regras deduzidas da prática empírica e transmitidas pelo costume. A pedagogia como filosofia nasceu da necessidade de garantir um fundamento criticamente válido à acção educativa, dirigida do homem para o homem e que, por isso, envolvia os problemas essenciais da natureza e dos destinos humanos. A pedagogia estuda o indivíduo pessoa no seu devir para actuações cada vez mais elevadas de razão e de liberdade, na relação típica de pensamento e de vontade, que se verifica na vida associada (problemas da comunicação e da autoridade) e na relação com os valores da cultura. A pedagogia como ciência, sobretudo a partir da época contemporânea, os a exigência de uma pesquisa positiva e experimental confirmada pelos factos, a qual tomou forma de estudo interdisciplinar de várias ciências auxiliares, psicológicas, sociológicas, antropológico-culturais,

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e de verificação comparada de planos, sistemas, métodos e técnicas. (LAENG, 1973, p.230).

De acordo com Veiga, muitos pensadores contribuíram

significativamente para uma nova mentalidade para a educação das crianças.

Entre eles destacamos Comenius, Rousseau, Pestalozzi e Fröbel que

afirmavam que as crianças possuíam necessidades específicas das quais os

adultos deveriam ser responsáveis pelos seus cuidados (saúde, alimentação,

higiene, atenção e carinho), pelo seu desenvolvimento, socialização, educação,

progresso e adaptação ao meio.

Alguns saberes foram criados para estudar a criança em todos os seus

aspectos22: fisiológicos, psicológicos e morais. Segundo Saviani (2008), a

primeira vez que a palavra Pedagogia apareceu na história da educação

brasileira foi com a “Lei das Escolas de Primeiras Letras promulgada em 15 de

outubro de 1827 que prescrevia originalmente no seu artigo 1º: Haverão [sic]

escolas de primeiras letras, que se chamarão pedagogias (...)” (SAVIANI, 2008,

p.14). Mas, de acordo com o autor, essa expressão foi repudiada por Ferreira

França, deputado da época, que reforçou que a palavra Pedagogia, de origem

grega, significava guia de crianças, o que levou à mudança pelo termo

“instrução pública” ou por “escolas de primeiras letras”.

2.2.1 A primeira regulamentação do curso de Pedagogia (1939)

A partir do Decreto-Lei n.1190 de 4 de abril de 1939, que implantou os

cursos de Pedagogia na Faculdade Nacional de Filosofia, todas as instituições

deveriam adaptar seus currículos ao chamado “padrão federal” que buscava “a

dupla função de formar bacharéis e licenciados para várias áreas, inclusive

para ao setor pedagógico.” (SILVA, 1999, p.33).

A duração de todos os cursos, bem como a fixação dos chamados

currículos plenos foram criados a partir do referido documento. Estabelecia-se

que, para a formação de bacharéis, a duração determinada era de três anos,

após os quais, acrescentando-se mais “um ano de curso de Didática, formar-

22

Esse estudo ficou conhecido como ciência da criança ou pedologia.

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se-iam os licenciados, num esquema que passou ser conhecido como 3+1.”

(SILVA, 1999, p.33).

Porém, a distinção bacharelado-licenciatura também separavam as

concepções de teoria e método. Esse modelo de formação revelava muitas

discrepâncias desde a sua formação, entre elas, a criação de um bacharel em

pedagogia sem a real necessidade dele nas instâncias públicas educacionais.

A partir desse Decreto-Lei n.1.190/39, em 1943, teve-se a exigência dessa

diplomação para o preenchimento dos cargos técnicos de educação do

Ministério da Educação Além disso, criaram um bacharel sem definir ao certo

quais seriam os elementos que poderiam caracterizar esse novo profissional.

São os Técnicos em Assuntos Educacionais tais como estatísticos,

conhecedores de leis, regulamentações, ocupantes de cargos técnico-

burocráticos do aparelho de Estado. (SILVA, 1999, p. 34).

De acordo com Silva, não constava nesse documento a preocupação de

limitar o currículo mínimo, nem era claro que tipo de profissional seria esse. E,

certamente, com a exclusão das disciplinas de Didática Geral e Especial, o

curso de bacharel dificultava ainda mais o encontro com a sua identidade.

Essa inadequação é representada, principalmente, pela tensão provocada, de um lado, pela expectativa do exercício de funções de natureza técnica a serem realizadas por esse Bacharel e, de outro, pelo caráter exclusivamente generalista das disciplinas fixadas para a sua formação. (SILVA, 1999, p.35).

Mas, tanto para o bacharel quanto para o licenciado, a situação não era

das melhores. Além desses problemas já citados pela autora, também é

discutido o seu campo de trabalho. O curso normal não era um campo

exclusivo de atuação para os licenciados em pedagogia, já que a

Lei Orgânica do Ensino Normal – o Decreto-Lei n 8.530/46 – estabelecia que para lecionar nesse curso, era suficiente, em regra, o diploma de ensino superior. Enfim, prova de quão difuso era o mercado de trabalho do licenciado em Pedagogia foi o direito de lecionar Filosofia, História e Matemática a ele conferido. (SILVA, 1999, p.35)

Paralelamente, o campo da educação ia se desenvolvendo. Em 1938, foi

criado o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), hoje Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira; em 1951, a

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fundação da CAPES, do CBPE (Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais),

e do CRPEs (Centro Regional de Pesquisas Educacionais) em 1955, que foram

os espaços responsáveis pela oxigenação do campo educacional,

principalmente, para o campo da pedagogia. (SAVIANI, 2008, p.42).

A estrutura até aqui descrita permaneceu até a sanção da primeira

LDBEN, a Lei n.4.024, de 20 de dezembro de 1961. Esta Lei tinha o intuito de

“padronizar a educação brasileira e atribuía ao Curso Normal de nível médio a

tarefa de formar os professores para o magistério primário, não se referindo ao

curso de Pedagogia.” (CASTRO, 2007, p.203). A partir dessa Lei, foram

elaborados os Pareceres que nos próximos tópicos esclareceremos.

2.2.2 A segunda regulamentação do curso de Pedagogia (1962)

A segunda regulamentação do curso de pedagogia foi o Parecer CFE n.

251/62, de autoria do conselheiro Valnir Chagas23, e já sob a lei n. 4.024/61,

principais que alterou, de forma mínima, o currículo, permanecendo os

problemas citados anteriormente. Silva (1999) relata que o professor Valnir

Chagas explicita a fragilidade do curso de Pedagogia ao se referir à

controvérsia existente a respeito da manutenção ou extinção do mesmo.

Faltavam ao curso conteúdos próprios, já que a formação do professor

primário deveria acontecer em nível superior e a formação de técnicos em

Educação em pós-graduação. (CASTRO, 2007, p.204). Sendo assim, Chagas

trata de fixar um currículo mínimo e a duração para o curso. Fica nas

entrelinhas, a idea de provisoriedade do mesmo, já que, para aquela época, a

formação para os cursos primários em cursos secundários, escolas normais,

era tida como uma solução adequada. Dessa forma, a idea de uma

reformulação, antes de 1970, era desenvolvida nos dizeres desse Parecer,

visando o deslocamento dos pedagogistas ou técnicos de educação, para a

23

Valnir Chagas teve forte presença no cenário da educação nacional brasileira, sobretudo, nas décadas de 60 e 70, principalmente, ao que tange a formação de professores. Foi relator de inúmeros Pareceres e membro por 18 anos consecutivos do Conselho Federal de Educação.

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pós-graduação e a redefinição para o curso de formação dos professores

primários.

Apesar da expectativa mencionada, o Curso de Pedagogia permaneceu

separado entre bacharelado e licenciatura, diplomando profissionais para atuar

como “técnico de educação ou especialista de educação ou administrador de

educação ou profissional não-docente do setor educacional, além do professor

de disciplinas pedagógicas do Curso Normal.” (CRUZ, 2008, p.51).

De acordo com o Parecer CFE n. 251/62, podemos perceber a polêmica

em torno do curso:

Não há dúvida, assim, de que o sistema ora em vigor representa o máximo a que nos é lícito aspirar nas atuais circunstâncias: formação do mestre primário em cursos de grau médio e conseqüentemente, formação superior, ao nível de graduação, dos professores desses cursos e dos profissionais destinados às funções não-docentes do setor educacional. Na porção maior do território brasileiro, sem a ocorrência de fatores que no momento estão fora de equação, vários lustros serão ainda necessários para a plena implantação deste sistema. Nas regiões mais desenvolvidas, entretanto, é de supor que ela seja atingida – e comece a ser ultrapassada – talvez até 1970. À medida que tal ocorrer, a preparação do mestre escola alcançará níveis post-secundários, desaparecendo progressivamente os cursos normais e, com eles, a figura do respectivo professor. Ao mesmo tempo, deslocar-se-á para a pós-graduação a formação do pedagogista, num esquema aberto aos bacharéis e licenciados de quaisquer procedências que se voltem para o campo da educação. O curso de pedagogia terá então de ser redefinido; e tudo leva a crer que nele se apoiarão os primeiros ensaios de formação superior do professor primário. (BRASIL, 1962, p.98).

A identidade desse profissional ainda sofria por sua fragilidade e por não

possuir definições latentes do seu campo educacional, onde era preciso que

ele atuasse. De maneira muito vaga, o Parecer 251/62 chama o bacharel em

Pedagogia de “técnico de Educação” ou de “especialista de Educação” e inclui

como disciplina obrigatória do curso a Administração Escolar como

fundamental para a construção da “base da formação específica do chamado

Técnico em Educação.” (SILVA, 1999, p.38). Além disso, as disciplinas

ministradas eram difusas e sem propósitos definidos e contextualizados para a

formação desse profissional.

Uma nova proposta de reformulação do curso foi apresentada por meio

do movimento dos estudantes da Região do Rio Claro na ocasião do

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Congresso Estadual de Estudantes de Pedagogia, em 1967. Eles se sentiam

prejudicados e marginalizados com a falta de uma regulamentação da

profissão do licenciado em Pedagogia, com a indefinição do currículo; da

ausência de uma formação prática; ignora outros “aspectos essências à

formação de profissionais no campo educacional; possui um currículo

„enciclopédico‟; favorece a perda do campo profissional pedagógico, por

oferecer insuficientemente capacitação.” (SILVA, 1999, p.38-9).

Além da indefinição do campo de trabalho do bacharel em Pedagogia, a

questão levantada por Silva, em seus estudos, relata que o pedagogo poderia

se ligar a um cargo público, porém, nenhum dos cargos era exclusivo desse

profissional, ainda na década de 60.

A situação do licenciado em Pedagogia também não era das melhores se considerarmos que o ultimo concurso realizado pela Secretaria de Educação do Estado para as cadeiras de educação havia ocorrido em 1961. Como conseqüência, era muito comum que profissionais não formados pelos cursos de Pedagogia ministrassem as aulas referentes a elas. (SILVA, 1999, p. 39).

Ainda de acordo com a autora a invasão do mercado de trabalho era

tamanha que outros profissionais como médicos, dentistas, engenheiros,

advogados e psicólogos exerciam as atividades como professores primários. O

que se percebia nesse cenário é que muito estava para ser feito.

Existia ainda, um grande número de “vacâncias24 no cargo no que se

referia às cadeiras de Educação – em função da não realização de concursos

públicos” para os licenciados em Pedagogia. (SILVA, 1999, p.41). Os

estudantes foram bastante atuantes e exigiram o aumento dessas vagas,

abertura anual de concurso público, preenchimento dos cargos do magistério

de nível médio e recomendaram inserir o Pedagogo em sistemas de

treinamento e aperfeiçoamento de todo o funcionalismo público. Diante de

tantas insatisfações e problemas reais, algumas transformações ocorreram e

algumas reivindicações dos estudantes foram consideradas. Porém, naquela

época, no período pós-golpe militar, por volta de 1964, o Brasil se encontrava

sob o regime ditatorial e toda e qualquer proposta educacional deveria se

submeter ao projeto de desenvolvimento nacional ditado pelos dirigentes

24

Estado que se encontra vago ou desocupado; Cargo ou emprego não preenchido; (HOUAISS, 2001, p.1254).

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militares. “A década de 60 foi efervescente política, econômica e socialmente,

provocando grandes demandas em torno da educação escolar.” (CRUZ, 2008,

p.52).

Dessa forma, a necessidade de formação por novos profissionais

habilitados para atender ao modelo desenvolvimentista que se instaurava

ocorreu na articulação da escola média com o ensino superior resultando na

Reforma Universitária que se deu em 1968, por meio da Lei n. 5.540/68,

quando o movimento estudantil estava no auge de suas reivindicações,

passeatas e ataques à ditadura. Apesar de se ter a intenção de “disciplinar o

estudantado” por meio dessa reforma, ela foi aceita tanto pelos estudantes,

quanto pelos educadores, pois parecia ainda ser melhor do que o modelo já

existente. (CRUZ, 2008, p.52).

Sendo assim, Cruz (2008) revela que a Faculdade de Filosofia nos

parâmetros em que foi gerada na década de 30 se tornou alvo de numerosas

críticas, sobretudo no que tange o cumprimento da perspectiva de formação

cultural e científica. É o que Silva (1999) também nos revela em seus estudos:

Com aprovação da Lei Federal nº. 5540 de 28 de novembro de 1968 – a Lei da Reforma Universitária -, triunfam os princípios da racionalidade, eficiência e produtividade no trato do ensino superior. A tradição liberal de nossa universidade fica interrompida e nasce o que alguns críticos passaram a chamar de universidade tecnocrática, ainda que mesclada com nuanças do pensamento liberal. (SILVA, 1999, p.44).

Ainda no mesmo ano e em 1969, outras normas foram decretadas e, no

conjunto, têm-se medidas que vinculam a universidade e a pesquisa às

exigências econômicas e do mercado de trabalho. No âmbito acadêmico e

pedagógico, estipulou-se a carreira acadêmica por meio dos níveis e titulação:

professor titular (doutorado e concurso público), professor adjunto (doutorado),

professor assistente (mestrado) e auxiliar (graduação). Ainda pela reforma,

houve um desmembramento das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras em

institutos ou em outras faculdades que já culminava essa cisão desde 1961.

Dessa forma,

a faculdade de educação se organizou autonomamente, pela oferta do curso de pedagogia (com habilitações específicas) e cursos de

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licenciatura, destinados à formação de professores do ensino secundário de todas as áreas. (VEIGA, 2007, P.312).

Veiga (2007) acredita que dessa maneira as faculdades de educação

contribuíram para o aprofundamento da cisão entre a educação e outras áreas.

Contudo, no último ano do curso de Pedagogia, eram oferecidas as disciplinas

para as habilitações, o que fragmentava muito a teoria e a prática. Esse

Parecer detinha um caráter transitório, que segundo Castro (2007) não era

consistente, e que seria estabelecido pelo mercado de acordo com as políticas

educacionais de cada Estado.

2.2.3 A terceira regulamentação do curso de Pedagogia (1969)

Agora, sob a Lei n. 5.540/68, veio o Parecer do CFE n. 252/69 da autoria

do conselheiro Valnir Chagas, que apontava claramente a qual profissional

destinava-se esse documento: aos Pedagogos. Designava, no entanto, o

currículo mínimo, “a duração do curso visando à formação de professores e de

especialistas para as atividades de orientação, administração, supervisão e

inspeção no sistema educacional”. (SILVA, 1999, p.45). Esse documento

considerou que dessa forma estava caracterizando os especialistas.

O Parecer 252/69 nos revela que “a profissão correspondente ao setor

da educação é uma só e, por natureza, não só admite como exige

„modalidades‟ diferentes de capacitação a partir de uma base comum”.

(BRASIL,1996). Dessa forma, entende-se que autor conclui que não há razão

para se instruir mais de um curso e que os diferentes aspectos da formação do

profissional da educação podem ser reunidos sob o título geral de curso de

pedagogia.

Com a reformulação do currículo, fragmentou-se esse curso com o

aparecimento das habilitações, tendo agora uma base comum (para todos) de

estudos, e outra diversificada, em função de habilitações específicas.

(SAVIANI, 2008, p.45). Identificamos que, em sua essência, outros problemas

e outras questões surgiram diante desse Parecer. Silva (1999) relata que as

disciplinas cursadas em cada habilitação pouco se diferiam uma das outras, e o

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graduado se desejasse poderia solicitar a conclusão em todas as habilitações

se assim quisesse25.

Saviani (2008), em suas análises do Parecer em questão, argumenta

que, embora o curso comportasse várias habilitações, como todas elas

resultavam de um curso único, deveriam supor um só diploma.

Havia sim uma discrepância nessa situação. Saviani (2008) nos revela

que Valnir Chagas acreditava que, no caso da pedagogia,

o pedagógico já constitui o próprio conteúdo do curso, que outra coisa não é senão o desenvolvimento em anos do que se estuda em meses para a licença comum de magistério. E que embora propusesse que o título a ser concedido fosse o de bacharel, o Plenário do CFE aprovou a emenda do Conselheiro D. Luciano Duarte fixando como título único o de licenciado. (SAVIANI, 2008, p.45).

Fica instituído que, com exceção daqueles que queriam fazer o curso de

curta duração, os diplomados em Pedagogia sejam professores do Ensino

Normal. Daí, acreditou-se por muito, desde o Parecer n. 251/62, que os

Pedagogos ainda não estariam aptos a lecionarem nos cursos primários.

Todavia, talvez pela interpretação do próprio Parecer, pairavam dúvidas sobre

o fato desse profissional poderia lecionar nas escolas primárias. Certamente,

se estes eram os docentes que preparavam os professores primários, logo

suas competências e suas habilitações poderiam assistir aos mesmos. O art.1º

da Resolução ficou assim redigido:

Art. 1º. – A formação de professores para o ensino normal e de especialistas para as atividades de orientação, administração, supervisão e inspeção, no âmbito de escolas e sistemas escolares, será feita no curso de graduação em Pedagogia, de que resultará o grau de licenciado com modalidades diversas de habilitação. (BRASIL, 1962).

“Do ponto de vista legal, considera que não há nenhuma dúvida, porque

„quem pode o mais pode o menos‟: quem prepara o professor primário tem

condições de ser também professor primário.” (SILVA, 1999, p.49-50).

Ainda nesse Parecer, para que se esclarecesse melhor este profissional

licenciado, passou a se exigir que para a conclusão do curso o cumprimento de

25

Essa ideia de aproveitamento de estudos idênticos ou equivalentes é concebida na visão de Silva (2009) como resultante de um princípio mais amplo: o da educação permanente.

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algumas disciplinas tais como: “Metodologia do Ensino de 1º. Grau e Prática de

Ensino na Escola de 1º. Grau, com estágio Supervisionado.” De acordo com

Silva (1999), o Parecer entendia que o aluno não poderia concluir o curso sem

antes ter em sua formação a vivência da especialidade escolhida. Lança-se

então, a obrigatoriedade por meio da Resolução nº. 2/69, que a determina em

5% da duração máxima para o curso, na espécie de estágio supervisionado.

Após a lei 5.692/71, a formação mínima para o exercício do magistério

ficou subtendida no art. 30, da seguinte forma:

a) no ensino de 1º grau, da 1ª à (sic) 4ª séries, habilitação específica de 2º grau; b) no ensino de 1º grau, da 1ª à 8ª séries, habilitação específica de grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1o grau, obtida em curso de curta duração; c) em todo o ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente a licenciatura plena. § 1º Os professores a que se refere a letra "a" poderão lecionar na 5ª e 6ª séries do ensino de 1º grau se a sua habilitação houver sido obtida em quatro séries ou, quando em três, mediante estudos adicionais correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for o caso, formação pedagógica. § 2º Os professores a que se refere a letra "b" poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2ª série do ensino de 2º grau mediante estudos adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo. § 3º Os estudos adicionais referidos aos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores. (BRASIL,1971).

De acordo com essa Lei, as licenciaturas de 1º grau e os estudos

referidos no parágrafo anterior deveriam ser ministrados nas universidades e

demais instituições que mantivesse curso de duração plena.

Reafirmando o que está no Parecer 252/69, o art. 33 da Lei n. 5692/71

institui que a formação de administradores, planejadores, orientadores,

inspetores, supervisores e demais especialistas de educação fosse feita em

curso superior de graduação, com duração plena ou curta, ou ainda a nível de

pós-graduação. (BRASIL,1971).

Para Silva (1999), os legisladores vacilaram na cobrança por essa

formação precipitada, levando a desqualificação e desmerecimento do próprio

curso. “Eles não conseguem coaduná-las com a formação desses especialistas

em nível de graduação.” (SILVA, 1999, p.61).

Para Saviani (2008), pretendia se superar o caráter generalista dado ao

curso pela parte comum, dando o perfil de especialista aos professores com as

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habilitações e, dessa forma, configurariam um mercado de trabalho

supostamente já constituído. Porém, anos depois, reconheceram que não

existia uma demanda de trabalho para esses profissionais que saiam como

habilitados. E o que acontecia era que continuavam

[...] formando o generalista, pela parte comum do currículo e, pela parte diversificada, formavam também o especialista. E ambas as coisas num curso de graduação, com duração média de quatro anos e, mais grave ainda, admitida a possibilidade de se fazer isso em um curso de curta duração (...) de dois a dois anos e meio. (...) resultou-se numa descaracterização e em um esvaziamento ainda maior do curso, em que pese a lógica bem articulada e, de certo modo, convincente de argumentação desenvolvida no parecer. (SAVIANI, 2008, p.50).

A década de 80 foi marcada pela reflexão crítica do modelo educacional

da época, apontando para a necessidade de se redefinir as políticas de

formação dos profissionais da educação. De acordo com Castro (2003) estudos

e discussões visaram subsidiar o CFE na reformulação dos cursos de formação

dos educadores brasileiros e que, mais tarde resultou em um Encontro

Nacional, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Esse encontro proporcionou aos

educadores a formação de uma Comissão Nacional de Reformulação dos

Cursos de Formação de Educadores e que depois se transformou na

Associação Nacional pela Formação do Profissional da Educação (ANFOPE),

que se reuni bianualmente para se discutir os princípios da (re)estruturação dos

cursos de formação dos profissionais da educação. (CASTRO, 2007, p.208).

Sendo assim, essa regulamentação, permaneceu em vigor até para

além da aprovação da nova LDB (Lei n. 9.9394/96), de 20 de dezembro de

1996, obtendo a sua alteração formal com as Diretrizes Curriculares Nacionais

homologadas pela Resolução CNE/CP n. 1 de 15 de maio de 2006.

2.2.4 A quarta regulamentação do curso de Pedagogia (2006)

“Década da Educação”: assim ficou conhecida a década de 1990, que

teve como marco principal no âmbito educacional a promulgação da LDB – Lei

9394/96, a qual definiu como prioritária a formação, em nível superior, de todos

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os professores para os anos iniciais da Educação Básica, conforme institui o

seu art. 62:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério da educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal. (BRASIL, 1996).

Enquanto o curso de Pedagogia continuava formando o Pedagogo nas

diferentes modalidades das habilitações, o mercado de trabalho se configurava

de forma adversa, não estando amplamente aberto para inseri-lo a um cargo

para ele pré-determinado. A esse respeito, Castro (2007) aponta que:

O cargo de diretor vem sendo exercido por professores e especialistas da escola, através de eleições diretas e o Supervisor Escolar divide o seu espaço com o coordenador de área que, na maioria das vezes, é um professor licenciado, que não possui formação específica em Pedagogia. (CASTRO, 2007, p. 209).

Antes, a formação dos professores da educação básica acontecia quase

que exclusivamente no curso normal de nível médio e após a LDB, esses

cursos perderam um pouco da importância. Agora a formação desses

professores deveria acontecer nos Institutos Superiores de Educação (IES) que

ofereciam cursos formadores de professores da Educação Básica,

principalmente o Curso Normal Superior que foram regulamentados pela

Resolução n. 01/99 de 30 de setembro de 1999. De acordo com Castro (2003),

a interpretação dessa Lei fazia-se difusa e acreditou que no 4º. parágrafo do

art. 87 onde se lê: “ somente serão admitidos professores habilitados em nível

superior” tem-se o entendimento de que “serão demitidos aqueles que não o

tiverem”. (CASTRO, 2007, p. 210).

Segundo Castro (2003), as discussões a respeito do curso de formação

de professores só aumentavam e em 1999, as Diretrizes Curriculares

Nacionais para a Formação de docentes da Educação Infantil e do Ensino

Fundamental, em nível médio, foi instituída como uma medida a atestar essa

formação, porém apesar de existirem oficialmente, a procura pelos cursos em

nível médio era cada vez menor.

Do outro lado, o volume da procura pelos cursos superiores eram

alarmantes e a necessidade de se definir melhor o profissional Pedagogo, leva

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a Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia, a divulgar a primeira

versão para o curso, em maio de 1999. Foi elaborado o Documento Norteador

para Elaboração das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação de

Professores, o qual a ANFOPE e a Comissão de Especialistas em Pedagogia

apontavam claramente a necessidade de se estabelecer de forma integrada, a

formação dos profissionais da educação, licenciados e pedagogos. (CASTRO,

2007, p.212).

Após algumas pressões dos profissionais da área e das associações

científicas, como ANFOPE, ANPAE, entre outras, se reuniram e apresentaram

um documento chamado de “Posicionamento Conjunto das Entidades que

serviu de base para a Proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais para o

Curso de Pedagogia, encaminhado ao CNE em abril de 2002.” (CASTRO,

2007, p.212).

O Parecer CNE/CP n. 28/2001 que deu nova redação ao Parecer

CNE/CP n. 21/2001, também já indicava que deveria reconhecer e determinar

a especificidade própria dos cursos de formação, em nível superior, de

licenciatura plena. Nesse Parecer, há o esclarecimento de alguns conceitos,

bem como da duração, carga horária e a indicação de um estágio realmente

supervisionado que viabiliza a relação da teoria com a prática para os curso de

Pedagogia.

Como não era aprovada as diretrizes, o presidente do CNE instituiu uma

comissão que tinha como objetivo estabelecer as bases para um sistema

nacional de formação que consolidou os documentos existentes sobre a

formação de professores em um projeto de resolução, instaurado em setembro

de 2003 e que, sobretudo, não vingou. Os motivos estavam em garantir uma

discussão democrática, participativa e que recebesse criticas e sugestões das

associações. Somente após muitas negociações dessas entidades com o CNE,

foi aprovado o Parecer n. 15/2005 em 13 de dezembro de 2005, que

estabelecia as Diretrizes Curriculares para o Curso de graduação em

Pedagogia, licenciatura. Porém, apresentavam em seu conjunto uma

divergência ao art. 64 da LDB. Dessa forma, após analisarem esse documento,

retificam essa incoerência no Parecer CNE/CP n. 3/2006 de 15 de maio de

2006, assegurando os direitos dos profissionais da educação, mantendo a

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Licenciatura em Pedagogia, o que gera finalmente, a Resolução CNE/CP

n.01/06. (CASTRO, 2007).

Os cursos de Pedagogia, a partir da Resolução do CNE/CP 01/06, não

formam mais o Pedagogo tal como posto na legislação anterior e sim, o

licenciado que estabelece funções educativas na educação infantil, nos anos

iniciais do Ensino Fundamental e no Ensino Normal Médio, ou Normal Superior,

no apoio escolar e nas áreas que necessitem de conhecimentos pedagógicos.

Os cursos que ofereciam as habilitações em Pedagogia, sob o Parecer de

Valnir Chagas, entram em regime de extinção, a partir do ano seguinte à

publicação dessa Resolução, ou seja, a partir de 2007.

De acordo com ela, o curso de Pedagogia passa a ter suas próprias

Diretrizes Curriculares Nacionais, que estabelece e definem os princípios, as

condições de ensino e aprendizagem, os procedimentos a serem observados

em seu planejamento e avaliação, pelos órgãos do sistema de ensino e pelas

instituições de educação superior do país.

De acordo com a Resolução,

As instituições de educação superior que mantêm cursos autorizados como Normal Superior e que pretenderem a transformação em curso de Pedagogia e as instituições que já oferecem os cursos de Pedagogia deverão elaborar novo projeto pedagógico. (BRASIL, 2006a).

Sendo assim, os cursos de Pedagogia passam a exigir uma

obrigatoriedade de 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico, que são

distribuídas em:

2.800 horas de atividades formativas como assistência a aulas, realização de seminários, participação na realização em pesquisas, consultas a bibliotecas e centros de documentação, visitas a instituições educacionais e culturais, atividades práticas de diferente natureza, participação em grupos cooperativos de estudo e visitas a instituições educacionais e culturais;

300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado, prioritariamente em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, contemplando também outras áreas especificas, se for o caso, conforme o projeto político pedagógico da instituição;

100 horas de atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas especificas de interesse dos alunos, por meio, da iniciação científica, da extensão e da monitoria; (BRASIL, 2006a).

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O Parecer CNE/CP n. 03/06 (BRASIL, 2006b)e a Resolução CNE/CP n.

1/06 (BRASIL, 2006a), orientam que o curso de Licenciatura em Pedagogia

destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na

Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de

Ensino Médio, na modalidade/ Normal, de Educação Profissional na área de

serviços e apoio escolar e em outras áreas sejam previstos conhecimentos

pedagógicos. Essas novas orientações alteraram o perfil do curso de

Pedagogia, imprimindo-lhe uma identidade única nacionalmente, criando novos

referenciais para o (a) Pedagogo (a) que se vê frente à necessidade de

conhecer novos instrumentos conceituais para pensar a realidade das práticas

humanas. O conceito de atividades docentes é ampliado no parágrafo único,

do art. 4°dando margem a participação na organização e na gestão:

Parágrafo único: As atividades docentes também compreenderm participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:

I – planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; II – planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares; III – produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional,em contextos escolares e não escolares. (BRASIL, 2006a).

Castro nos chama a atenção para perceber que apesar das diretizes

serem uma conquista de uma classe depois de anos de debates e movimentos

dos educadores e de apontarem pontos positivos como, por exemplo, a

docência como base da identidade dos Pedagogos, ela necessita: aprofundar o

debate com os alunos de Pedagogia e das licenciaturas; formar um professor

que domine as atividades educativas dos anos iniciais da escolarização formal

e em outros espaços; articular a preparação desse profissional, entre a

instituição superior e a escola, visando melhorar as condições de trabalho entre

os professores e alunos; (CASTRO, 2007, p. 223).

Acreditamos que essa articulação diminuiria consideravelmente, os

problemas enfrentados pelos professores e pelos alunos no âmbito da

aprendizagem escolar, principalmente, na alfabetização e na escrita. Todavia,

as instituições formadoras, visando melhorar o curso devem criar meios de

preparar esse professor dentro do âmbito escolar. Assim, a efetivação das

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Diretrizes está nas aulas fundamentadas nas ciências humanas e sociais, na

articulação da teoria com a prática, no conhecimento da criança e da infância,

na elaboração de projetos, na gestão, na criatividade metodológica e,

sobretudo, superar a fragmentação do currículo e articular a teoria com a

prática. Contudo, sabemos que o curso de Pedagogia e o campo de atuação

do Pedagogo deixa margem para novas discussões e novos aprimoramentos.

2.3 As quatro possibilidades de formação docente

Hoje, as concepções sobre a formação inicial do professor, para a

Educação Básica vêm ocupando espaço amplo na literatura nacional e

internacional e nas propostas de ensino e de formação docente no Brasil.

Considerando-se cada contexto histórico, a formação do professor sofreu

mudanças significativas tanto na sua forma de aprender-ensinar, quanto na

forma de entender seu papel como sujeito reflexivo e transformador da

sociedade.

Neste tópico, apresento as possibilidades de formação para o professor

da Educação Básica. De acordo com a LDBN 9394/96 que traz em seu Art. 62,

do Título VI da Lei: Dos Profissionais da Educação, temos o seguinte:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. (BRASIL, 1996).

Nesse artigo, entende-se que os professores da Educação Infantil e das

primeiras séries da Educação Básica formar-se-ão em nível superior ou na

modalidade Normal, do Ensino Médio.

Esta modalidade, em nível médio, é a primeira possibilidade de

formação docente, a mais antiga e que continua vigente. (CURY, 2009, p.298).

Muitos professores das redes (pública e privada), pelo modo confuso

com que a Lei foi posta, não entendiam que o curso Normal feito em nível

médio tinha assegurado seus direitos de exercerem o magistério nas referentes

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modalidades até o fim de suas vidas, mesmo que a legislação venha a ser

alterada.

Considerando-se o enorme número de questões levantadas, reitera-se especialmente aos portadores de diploma de nível médio, em exercício nas redes públicas que eles têm direito a manterem seus cargos mesmo que não freqüentem curso superior. (BRASIL, 2003a).

Diante das interpretações difusas da lei, como já foi dito, sobrepunha

uma pressão moral, mais do que intelectual, sobre o corpo docente - uma

cobrança das instituições escolares para que esse professor se aperfeiçoasse

em nível superior o quanto antes.

A segunda possibilidade surgiu logo após a LDBEN, que “criou o Curso

Normal Superior com os mesmos objetivos do curso normal médio, mas com

formação superior (...)”, devendo se “situar nos Institutos Superiores de

Educação (IES).” (CURY, 2009, p.299).

E, diante das Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2006a) as

instituições que detém a autorização dos cursos do Normal Superior podem

transformá-los em cursos de Pedagogia. As regras para isso devem ser

obedecidas e um novo projeto pedagógico deve ser elaborado26.

A terceira possibilidade surgiu na década de 80, quando o debate sobre

a formação do educador se consolidou ainda mais, trazendo à tona discussões

sobre o caráter político da prática pedagógica e o compromisso do educador

com a transformação social. Foi quando “muitas universidades passaram a

oferecer, dentro dos cursos de Pedagogia, a modalidade que habilita os

formados para lecionar na educação infantil e nos quatro primeiros anos da

escolarização.” (CURY, 2009, p.299).

A quarta e última possibilidade, legalmente prevista na LDB, é vista

como uma situação especial e é voltada para pessoas que se formaram como

bacharéis e que desejam dedicar-se a educação escolar, especialmente em

26 Enquanto tutora presencial dos cursos superiores de EaD, percebi a grande lacuna que existia entre os diferentes modelos de curso. Na prática, tínhamos alunos do curso Normal Superior que desejavam o título de graduados para aumentarem sua perspectiva salarial nas instâncias públicas. De outro lado, tínhamos alunos que queriam migrar do curso Normal Superior para a Pedagogia, por acreditarem que, quando surgissem novos concursos, a nomenclatura poderia atrapalhar ou impedir seu ingresso na carreira pública. No entanto, o currículo era praticamente o mesmo.

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locais em que não haja professores licenciados. O inciso II do artigo 63 da LDB

assegura que os institutos superiores de educação manterão esses programas

de formação pedagógica para os portadores de diplomas de educação superior

que queiram se dedicar a educação básica. (BRASIL, 1996, p.40)

Neste caso especial, devem se cumprir certas exigências de formação

pedagógica. (CURY, 2009, p.299). No texto do parecer CNE/CP n. 02/97 já

explicitava a ausência em várias regiões nacionais de professores formados

em diferentes áreas do conhecimento, em especial, nas disciplinas de

matemática, física, química, geografia e ciências. Também se alega nesse

parecer, que algumas medidas deveriam ser tomadas para tornar menos

burocrático e, que hoje impedem, o acesso de um aluno, por exemplo, de

engenharia, de cursar simultaneamente disciplinas do curso de licenciatura,

tornando-se ao final um professor de matemática, além de engenheiro.

(BRASIL, 1997a).

Diante do exposto, a resolução CNE/CP n. 02/97 “dispõe sobre os

programas especiais de formação pedagógica de docentes para as disciplinas

do currículo do ensino fundamental, do ensino médio e da educação

profissional.” (BRASIL, 1997b). Sendo assim, fica instituída a formação desses

profissionais num curso de no mínimo 240 horas de teoria e 300 horas de

prática.

A constituição de 1988 e a LDB de 1996 insistem na valorização do

magistério e em um padrão de qualidade cujo teor de excelência deve dar

consistência à formação dos profissionais do ensino. Dentro dessa perspectiva,

a partir de abril de 2007, temos a implantação do Plano de Desenvolvimento da

Educação (PDE), um programa de governo, que estabelece formas de

colaboração da União com os estados federados e municípios e traça metas e

ações visando a superar e acabar com as fragmentações do sistema

educacional. O objetivo do PDE é acabar com a visão fragmentada e errônea

sobre a educação que inviabiliza construir uma sociedade livre, justa e de ter

acoplado em seus fatores determinantes a multiplicidade e não um grau

adequado de coesão nacional. Com ele, os estados e municípios, mas,

sobretudo esses últimos, podem dar adesão ao Plano de Metas Compromisso

Todos pela Educação, instituído pelo Decreto 6.094 de 24 de abril de 2007.

Isso proporcionou que os municípios elaborassem seus respectivos Planos de

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Ações Articuladas (PAR), pelos quais puderam rever as suas necessidades e

aspirações, “em termos de ações, demandas, prioridades e metodologias,

visando assegurar a formação exigida na LDB para todos os professores que

atuam na educação básica.” (BRASIL, 2010c, p.6).

Um dos fatores essenciais do PAR é a formação inicial de professores

em exercício da rede pública de educação básica. Para que isso acontecesse,

o MEC adotou estratégias para estimular arranjos educacionais no âmbito do

estado, coordenados pela Secretaria de Estado da Educação, envolvendo

também administrações municipais e instituições públicas que oferecem cursos

de licenciatura. Sendo assim, criou-se o Plano Nacional de Formação de

Professores da Educação Básica (PARFOR) que é consequência da “ação

conjunta do MEC, de Instituições públicas de Educação Superior e das

secretarias dos estados e municípios, no âmbito do PDE.” (BRASIL, 2009c,

p.6).

Com esse Plano Nacional de Formação de Professores da Educação

Básica,

a intenção é formar, até 2014, 330 mil professores que atuam na educação básica e ainda não são graduados. De acordo com o Educacenso 2007, cerca de 600 mil professores em exercício na educação básica pública não possuem graduação ou atuam em áreas diferentes das licenciaturas em que se graduaram. (BRASIL, 2009c).

O plano institui ainda a Política Nacional de Formação Dos Profissionais

do Magistério da Educação Básica, estabelecida pelo Decreto n° 6.755, de 29

de janeiro de 2009, que traz em seu Art. 2° os princípios dos quais abordam o

compromisso com uma formação docente e o direito à educação de qualidade,

construída em bases científicas e técnicas sólidas, para crianças, jovens e

adultos. Destacam:

IV - a garantia de padrão de qualidade dos cursos de formação de docentes ofertados pelas instituições formadoras nas modalidades presencial e à distância; V - a articulação entre a teoria e a prática no processo de formação docente, fundada no domínio de conhecimentos científicos e didáticos, contemplando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão;

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VI - o reconhecimento da escola e demais instituições de educação básica como espaços necessários à formação inicial dos profissionais do magistério; VII - a importância do projeto formativo nas instituições de ensino superior que reflita a especificidade da formação docente, assegurando organicidade ao trabalho das diferentes unidades que concorrem para essa formação e garantindo sólida base teórica e interdisciplinar; VIII - a importância do docente no processo educativo da escola e de sua valorização profissional, traduzida em políticas permanentes de estímulo à profissionalização, à jornada única, à progressão na carreira, à formação continuada, à dedicação exclusiva ao magistério, à melhoria das condições de remuneração e à garantia de condições dignas de trabalho; (BRASIL, 2009a).

Nesse decreto, ficou claro que existe uma concreta preocupação com a

formação inicial e continuada dos profissionais da educação básica. Essas

ações visam não apenas a melhorar a qualidade dos cursos de licenciatura,

bem como promover a valorização do docente, mas de, sobretudo, promover a

integração da educação básica com a formação inicial dos professores dessa

modalidade do ensino. (BRASIL, 2009a). Sendo assim, uma possível RP

conforme é apresentada pelo senador, apenas acrescentaria mais horas de

prática aos recém-formados e aos que já estivessem na ativa, como um estudo

continuado.

No dia 30 de junho de 2009, o Ministro da Educação Fernando Haddad

lançou a Plataforma Paulo Freire que é um programa dentro do PAR que visa

a incluir os professores da Educação Básica pública nas instituições públicas

de ensino superior. É um sistema desenvolvido pelo MEC que oferece cursos

presenciais e à distancia (pela Universidade Aberta do Brasil27 ou por outras

instâncias), destinados aos professores em exercício da rede estadual e

municipal sem a formação adequada à LDB, oferecendo cursos superiores

gratuitos. Por meio dessa proposta, o professor poderá cadastrar e atualizar o

seu currículo, inscrever-se no curso de seu interesse e necessidade, além dar

sequência a sua graduação, buscando uma formação continuada (até 300

horas) ou especialização.

27

A Universidade Aberta do Brasil (UAB) foi instituída pelo “Decreto n. 5.800 de 8 de junho de 2006, a cargo da Diretoria de Educação à Distancia do MEC, ligada à Capes e em parceria com a Secretaria de Educação á Distancia. A UAB realiza a articulação entre as instituições públicas de ensino superior, estados e municípios brasileiros, visando expandir e interiorizar a oferta de cursos e programas de educação superior, além de ampliar o acesso à educação superior pública, levando esses cursos a diferentes regiões do país.” (GATTI; BARRETO, 2009, p.99).

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(...) o docente sem formação adequada poderá se graduar nos cursos de primeira licenciatura, com carga horária de 2.800 horas mais 400 horas de estágio para professores sem graduação, de segunda licenciatura, com carga horária de 800 a 1.200 horas para professores que atuam fora da área de formação, e de Formação Pedagógica, para bacharéis sem licenciatura. (BRASIL, 2009c, p.7).

O PDE acredita que “investir na educação básica é também investir na

educação superior e na educação profissional, porque elas estão ligadas direta

ou indiretamente.” (BRASIL, 2007b). Dessa forma, foi criado pelo Inep o Índice

de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), em 2007, como parte dessas

ações do PDE. Esse processo engloba alunos das redes públicas e privadas

de todo país, matriculados na 4ª série e 8ª séries (ou 5º e 9º anos) do ensino

Fundamental e também do 3º ano do Ensino Médio. Tem por objetivo avaliar o

ensino de Língua Portuguesa e Matemática. Esse índice é calculado com base

na taxa de rendimento escolar (aprovação e evasão), no desempenho dos

alunos nas provas do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica

(SAEB) e na Prova Brasil. (BRASIL, 2009c).

No próximo subcapítulo, abordaremos a estrutura educacional brasileira

demonstrando ao leitor como se dá a formação escolar desde a Educação

Infantil até o ingresso em uma instituição de ensino superior. Neste momento,

buscamos entender também o sistema educacional francês e como se dá a

formação de professores naquele país. Com isso, esperamos encontrar

algumas relações entre a RP proposta em PL e a formação desses

profissionais.

2.4 A Estrutura Educacional Brasileira e o Sistema de Ensino Francês

No Brasil, ainda não temos um Sistema Nacional de Educação, no

sentido estrito do termo, organizado pelo Governo Nacional. Agora com a

Ementa Constitucional n.59/09, tornou-se possível falar em um Sistema

Nacional de Educação de modo articulado e federativo.

Em nossa LDB de 1996, encontra-se o título II da Lei que trata,

especificamente, “Dos Princípios e Fins da Educação Nacional”, e em seu art.

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3°, inciso VIII, vem exprimir que o ensino será ministrado com base na “gestão

democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas

de ensino” sem esclarecer, o sentido em que se emprega o termo sistemas de

ensino. (BRASIL, 1996).

Segundo Saviani (2005), na estrutura educacional brasileira, coexiste

várias redes de Ensino Municipais e Estaduais, bem como escolas federais e

privadas. Cada rede de ensino ou escola privada pode oferecer todos os níveis

da Educação Básica, ou somente um ou dois desses níveis: Educação infantil,

Ensino Fundamental: dividido em primeiro e segundo ciclos e oferecido, por

vezes, em estabelecimentos diferentes, além do Ensino Médio. Ao Ministério

da Educação (MEC), cabe orientar a elaboração de currículos e a organização

institucional, avaliar o ensino ofertado nas redes públicas, autorizar e fiscalizar

as instituições educacionais, no cumprimento das normas e regulamentações.

Porém, cada rede funciona de forma autônoma, o que, de certa forma, torna a

participação do MEC muito restrita.

Em outros países, como a França, há um Sistema Nacional de

Educação, em que todos os níveis de ensino estão interligados, e existe uma

oferta nacionalmente organizada. Ou seja, tudo organizado e dirigido pelo

Governo Nacional por meio do Ministério da Educação Nacional.

A fim de ilustrar o recrutamento, a seleção e a carreira dos professores

franceses, para que possamos dialogar com a proposta do Projeto de Lei,

objeto dessa pesquisa, tomamos o estudo realizado por Oliveira (2009), para

entendermos como os professores se preparam para exercer sua atividade de

docência na França. As instâncias públicas da Educação Maternal na França,

embora ofereça uma universalização de vagas, não são de frequência

obrigatória. O mesmo acontece no caso brasileiro, onde a Educação Infantil faz

parte da Educação Básica gratuita, mas também não é obrigatória até os 3

anos de idade, na etapa denominada creche. (BRASIL, 2009b).

Enquanto no Brasil o Ensino obrigatório abrange 11 anos, ou seja, dos 4

aos 14 anos de idade28 a segunda etapa da educação infantil, todo o ensino

fundamental e gradativamente o ensino médio, na França, a obrigatoriedade

28

Na verdade, a educação infantil já é obrigatória a partir dos 4 anos enquanto o ensino médio se-lo-á em 2016 e até lá os Estados, com o apoio da União, devem prever programas de oferta cada vez mais progressiva. (Para saber mais conferir a Emenda Constitucional n.59/09).

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abrange onze anos, dos 6 aos 16 anos de idade. (OLIVEIRA, 2009, p.44). O

Ensino Secundário francês abrange o Colégio, que deve ser concluído em 4

anos, dos 11 aos 14 anos de idade, após o qual o aluno se submete à

avaliação de conhecimentos e competências, recebendo o Diploma Nacional

do Brevê. Vejamos, a seguir, o quadro da organização da Educação no Brasil:

Quadro A – Quadro Organizacional dos níveis de Ensino brasileiro

Idade Organização Educacional Brasileira

17 Terceiro ano

Ensino Médio 16 Segundo ano

15 Primeiro ano

14 Nono ano 2° ciclo do

Ensino

Fundamental

Ensino Fundamental

13 Oitavo ano

12 Sétimo ano

11 Sexto ano

10 Quinto ano

1° ciclo do

Ensino

Fundamental

9 Quarto ano

8 Terceiro ano

7 Segundo ano

6 Primeiro ano

5 Pré 3

Pré-escola

Educação Infantil

4 Pré 2

3 Pré 1

0-3 Creche

Fonte: Dados da Pesquisa 2010.

Segundo Oliveira (2009), o que se desenvolve no sistema educacional

francês é que, após a entrada do aluno ao Ensino Secundário, cada etapa do

ensino corresponde a um tipo de preparação para a obtenção de um certificado

ou diploma. Sendo assim, o aluno, após o Colégio, presta um exame que

“atesta o nível alcançado nos conhecimentos e competências do socle

commun29”, que o certifica com o Diploma Nacional de Brevê. Daí em diante,

vem o Liceu30, que se subdivide em:

29

Um saber comum; uma base comum; pedra fundamental comum; 30

Os Liceus franceses equivalem ao nosso Ensino Médio brasileiro.

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Carreira Geral e Tecnológica: segunda “série” geral, seguida de uma primeira “série” e uma “série” terminal gerais (conduzindo a um bac geral), ou uma primeira e uma terminal tecnológicas (conduzindo ao bac tecnológico).

Carreira Profissional: via, segunda e terminal BEP, conduzindo ao Brevê de Estudos Profissionais, ou via CAP, segunda e terminal CAP, conduzindo ao Certificado de Aptidão Profissionais, podendo ser seguido de uma primeira e uma terminal profissional, conduzindo ao bac profissional. (OLIVEIRA, 2009, p.42).

Interessa-nos saber como se dá a formação superior voltada para os

professores desse país, uma vez que tratamos sobre a possibilidade de uma

implantação de uma RP na estrutura nacional brasileira e discutimos, à luz das

políticas educacionais, os depoimentos de pesquisadores, professores e

estudantes, o estágio no curso de Pedagogia de acordo com as suas diretrizes.

Observamos que após concluir o ensino obrigatório e ter alcançado

sucesso no baccalauréat31, o estudante francês pode continuar seus estudos

em nível superior. A disponibilidade de ensino superior francesa, em sua maior

parte, “é estatal e gratuita, entendendo-se a gratuidade como quase total

subvenção por parte do Governo, cabendo aos estudantes o pagamento de

pequenas taxas anuais”. (OLIVEIRA, 2009, p.45).

O ensino superior brasileiro, por sua vez, é proporcionado tanto pelos

Governos (Federal, Estaduais e só excepcionalmente Municipais) e nesse caso

é gratuito, como pela iniciativa privada de ensino, podendo receber subvenção

parcial ou total por parte do Governo Federal, como é o caso das bolsas do

Programa Universidade para Todos (PROUNI). Esse tipo de ensino poderá ser

ofertado por instituições tais como Universidades ou Centros Universitários,

assim como Faculdades ou Institutos isolados.

Segundo Oliveira (2009),

Os cursos superiores em nosso país, em geral, classificam-se em graduação, técnicos ou tecnológicos e licenciaturas (denominação dos cursos de formação de professores). Já o nível superior do ensino francês divide-se em 3 tipos de formação: formações curtas, longas ou em alternâncias, também oferecidos por diferentes instituições. (OLIVEIRA, 2009, p. 45).

31

O baccalauréat conhecido na linguagem coloquial francesa como Le bac ou Le bachôt, é uma qualificação acadêmica que franceses e estudantes internacionais, ao final do liceu (ensino secundário ou no Brasil, o ensino médio), obtém para ingressar à educação superior.

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Já a formação de todos os professores do Ensino obrigatório francês até

2007 era feita no nível superior de Ensino, dentro dos Instituts Universitaires de

Formation de Maitres (Institutos Universitários de Formação de Mestres –

IUFMs) e, desde 1990, era considerada uma formação em alternância. Ou seja,

uma formação que acontece entre momentos de formação teórica dentro de

uma instituição educacional superior e momentos de formação prática, dentro

de uma escola. Essas formações podem acontecer em 2, 3 ou 5 anos.

Com a criação desses institutos e com a implantação deles em cada

região francesa, pretendia-se elevar o nível da formação dos professores no

mínimo a de Certificado de Aptidão Profissional (CAP) ou a um Brevê de

Estudos Profissionais (BEP) e 80% ao nível do baccalaurèat. (OLIVEIRA,

2009).

Sendo assim, Moreira; Cunha e Ludke (1999), apoiados nos estudos de

Chartier sobre o ensino na França revelam que:

Os IUFMs surgiram em meio a injunções políticas fortes, visando atender à polêmica questão da formação de um corpo único de professores, para enfrentar o desafio do ensino de 2

o grau. No fundo

da questão, encontra-se a antiga separação entre professores do primário e do secundário, cada grupo com um tipo de formação marcadamente diferente. Os IUFMs pretendiam aproximar esses dois grupos que carregam culturas profissionais distintas. Para dar apenas um indicador dessas diferenças, podemos lembrar que há cerca de século e meio o ensino primário na França já exibia vocação clara para se distribuir a todos os cidadãos, enquanto o ensino secundário, com forte conotação elitista, só recentemente vem assumindo uma posição mais democratizante, sem entretanto saber muito bem como corresponder praticamente a ela (MOREIRA; CUNHA; LUDKE, 1999, p.285-286).

Oliveira (2009), em seus estudos, nos revela que para ser professor é

necessário fazer um exame para uma das vagas oferecidas pelo Estado e

assim, cursar dentro das IUFMs um ano de curso preparatório e obrigatório

para atuarem como profissionais da formação docente. O interessado poderá

optar ainda em ingressar primeiramente nas IUFMs e fazer uma espécie de

curso preparatório para o concurso nacional. A autora explica:

A formação profissional específica para um posto de trabalho – professor das escolas, professor de liceu/colégio ou ensino técnico – acontece em dois anos: após a entrada no IUFM, segue-se um primeiro ano de preparação ao concurso de recrutamento do Estado, não sendo esse primeiro ano obrigatório, havendo a possibilidade de entrada no

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IUFM somente no segundo ano, após ter passado pelo concurso nacional de recrutamento de professores. O acesso à formação inicial para o 1° e 2° Graus ocorre de maneiras diferentes em cada IUFM: alguns fazem análise de dossiê dos candidatos, outros aplicam testes e/ou fazem entrevistas. (...) A formação inicial, obtendo sucesso no concurso de recrutamento, o estudante do IUFM torna-se "professor estagiário", funcionário contratado e remunerado pelo Estado, e segue um ano de formação profissional em alternância. Essa formação em alternância compõe-se de módulos de ensino teórico, estágios profissionais de diferentes configurações e análise de prática profissional, resultando, até o início do ano de 2007, na elaboração de um mémoire (memória: uma espécie de monografia de atuação profissional). Entretanto, a forma e o objeto de avaliação de desempenho na formação no IUFM, que resulta na integração definitiva do estagiário como funcionário do Estado, professor titular, mudará a partir do ano letivo 2007/2008, com a integração dos IUFMs às Universidades. (OLIVEIRA, 2009, p.).

Cabe ressaltar que percebemos um modelo de teoria e prática

concomitante à formação que nos faz pensar no modelo de residência. Pois, o

aluno, após a obtenção do diploma de licence na universidade, passará mais

dois anos numa formação profissional dentro das IUFMs. Se obtiverem

sucesso na prova do concurso, conquistarão o certificado de aptidão para o

exercício de um dos níveis de ensino. Se o aluno não tiver êxito nesse exame,

ele poderá ainda cursar mais uma vez o ano preparatório e prestar novamente

o concurso.

Os estagiários das IUFMs, diante da aprovação no concurso são

“contratados como professores do sistema nacional de educação, e continuam

no 2° ano de formação profissional nos IUFMs, ao mesmo tempo que em que

assumem a regência de uma sala de aula.” (OLIVEIRA, 2009, p. 56).

Ainda ao final desse segundo ano de formação em alternância, os

alunos se submeterão novamente, a outro exame, porém que os integrarão em

definitivo ao quadro de funcionários do Estado Nacional, caso não queiram

lecionar em uma das escolas privadas sem contrato com o MEN.

Sendo assim, ao final da formação profissional no IUFM, os professores que passarem pelas avaliações são diretamente integrados à profissão, sem receberem, no entanto, um outro diploma, pós-licence, que valide sua formação. Apesar de a formação nos IUFMs não conceder, até o momento, um diploma, ela é considerada, segundo o Ministério da Educação Nacional, como uma formação do nível de Mestrado, uma vez que se trata de uma formação bac+5, pois exige como pré-requisito a formação universitária de 3 anos do tipo licence, mais 2 anos de formação em um IUFM, a qual comportava até 2007 uma introdução à pesquisa científica, que desembocava na

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78

elaboração de uma monografia32

. (...) Não obstante, embora essa formação seja alongada e tenha o mesmo nível de exigência de uma formação tipo master, oficialmente é ela tida como uma formação profissional em alternância. No início do ano de 2008, entretanto, o atual Presidente, Nicolas Sarkozy, divulgou a decisão do governo de elevar a certificação dos professores ao nível do mestrado e modificar, novamente, a formação (...). Considerando a certificação, podemos esboçar a seguinte análise: o fato de os IUFMs terem sido criados fora das Universidades e da autonomia universitária, e se configurarem como instituição com caráter profissionalizante, pode ser o principal motivo que levou autores brasileiros a visualizarem uma possível influência sobre os ISEs

33 brasileiros, uma vez que esses institutos

também são de nível superior, porém não Universitários. Entretanto, apesar dessa semelhança inicial, os dois institutos diferem quanto à sua configuração e ao seu propósito. (OLIVEIRA, 2009, p.57).

Essa projeção de uma formação em parte comum não alcançou tantos

êxitos, pois a criação das IUFMs agregou, numa mesma instituição, a formação

de todos os professores: os do Ensino primário, os do secundário e também os

dos secundário profissionalizante.

A partir de 2007, os IUFMs foram gradualmente sendo substituídos pela

criação dos “Centros Internos às Universidades”. A partir de então, o certificado

dessa formação passou a ser o de máster34

.

Alguns dos motivos para o fracasso na integração dos diferentes corpos

de professores a essa formação se deu a uma tradição de separação e

estranhamento dos professores dos dois níveis de ensino, que segundo

Isambert-Jamati (1985) citado por Oliveira (2009), foi uma conquista a favor do

estatuto dos professores primários (antes formados em nível secundário). Essa

situação, no entanto, foi vista “como uma desqualificação relativa para os

professores secundários que tinham uma formação fundamentalmente

acadêmica, não-profissionalizante, se a concebermos como uma formação em

Pedagogia ou Ciências da Educação.” (OLIVEIRA, 2009, p. 82).

Além do mal-estar entre os professores primários e secundários pela

aproximação de títulos, ainda era posto em pauta que uma pedagogia única

para os dois níveis de ensino era praticamente impossível, tendo em vista que

somente 8% das disciplinas ofertadas abarcavam em uma formação comum.

32

Tal monografia se configurava como uma análise teórica da prática profissional. 33

Instituto Superior de Educação Brasileiro. 34

Organiza-se após a Licence: o primeiro ano é uma etapa comum. No segundo ano, o estudante opta pela via acadêmica da pesquisa equivalente a um mestrado, chamada Master Recherche, que o conduzirá ao Doctorat, ou pela via profissionalizante que equivale a uma especialização, chamada Máster Professionenel, formação especializada que inclui estágios.

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Nos anos 90, a competição do mercado, o surgimento de novas

potências econômicas mundiais, principalmente, o aumento do progresso

técnico e científico da mercantilização da educação impostas pela globalização,

fez com que a Europa enfrentasse entre outros problemas, o aumento do

desemprego, o envelhecimento da população e a massificação do ensino

superior. Para tentar inverter esse quadro, a União Europeia, no tocante ao

Ensino Superior, decidiu adaptar às mudanças no contexto social. Após a

Declaração de Sorbonne firmada em Bolonha, ocorreu uma conferência que

definiria uma nova declaração definindo como padrão avaliativo da educação,

um encontro bienal para avaliar os processos alcançados no contexto

educacional.

A Declaração de Bolonha é um processo intergovernamental, que

extrapola a União Europeia. Começou com 29 países, mas, até 2005, já tinha

45 países. Possui os seguintes objetivos:

1. Adoção de um sistema com graus acadêmicos de fácil equivalência, também através da implementação, do Suplemento ao Diploma, para promover a empregabilidade dos cidadãos europeus e a competitividade do Sistema Europeu do Ensino Superior.

2. Adoção de um sistema baseado essencialmente em duas fases principais, a pré-licenciatura e a pós-licenciatura. O acesso à segunda fase deverá requerer a finalização com sucesso dos estudos da primeira, com a duração mínima de 3 anos. O grau atribuído após terminado a primeira fase deverá também ser considerado como sendo um nível de habilitações apropriado para ingressar no mercado de trabalho Europeu. A segunda fase deverá conduzir ao grau de mestre e/ou doutor, como em muitos países Europeus.

3. Criação de um sistema de créditos - tal como no sistema ECTS (European Credit Transfert and Accumulation System)

35 - como uma

forma adequada de incentivar a mobilidade de estudantes da forma mais livre possível. Os créditos poderão também ser obtidos em contextos de ensino não-superior, incluindo aprendizagem feita ao longo da vida, contando que sejam reconhecidos pelas Universidades participantes.

4. Incentivo à mobilidade por etapas no exercício útil que é a livre circulação, com particular atenção: - aos estudantes, o acesso a oportunidades de estudo e de estágio e o acesso aos serviços relacionados; - aos professores, investigadores e pessoal administrativo, o reconhecimento e valorização dos períodos dispendidos (sic) em

35

É um sistema que mede as horas que o estudante tem que trabalhar para alcançar os objetivos do programa de estudos. Esses objetivos são especificados em termos de competências a adquirir e resultados de aprendizagem. As horas de trabalho do estudante incluem as horas lectivas (aulas teóricas, aulas práticas/laboratoriais, aulas teórico-práticas, seminários), as eventuais horas de estágio, as horas dedicadas ao estudo e à realização de trabalhos, assim como as horas de realização de avaliações (testes, exames escritos/orais e apresentações de trabalhos).

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ações Européias de investigação, letivas e de formação, sem prejudicar os seus direitos estatutários.

5. Incentivo à cooperação Européia na garantia da qualidade com o intuito de desenvolver critérios e metodológias comparáveis;

6. Promoção das necessárias dimensões a nível Europeu no campo do ensino superior, nomeadamente no que diz respeito ao desenvolvimento curricular; cooperação inter-institucional, projetos de circulação de pessoas e programas integrados de estudo, de estágio e de investigação. (DECLARAÇÂO DE BOLONHA, 2009).

Segundo Oliveira (2009) o Processo de Bolonha teve como princípio a

indissociabilidade entre ensino e pesquisa. Logo, a França se instaurou sob

este modelo e a integração dos IUFMs às universidades conduziu a formação

dos professores ao um caminho oposto proposto pelo MEC no Brasil, com a

criação dos ISE e dos Cursos Normais Superiores.

Ao integrar os IUFMs às Universidades, as quais se incluem num processo que vincula ensino e pesquisa, os Centros Internos às Universidades serão conduzidos, provavelmente, a integrar, de fato, pesquisa e formação de professores, objetivo pouco alcançado pelos IUFMs até agora. Já no caso do Brasil, ao se tentar isolar a formação dos professores da formação dos demais profissionais da educação, desvinculando-a da formação para a pesquisa, os ISEs caminham no sentido inverso ao modelo francês. (OLIVEIRA, 2009, p. 96).

Voltando ao caso específico da França, em 2005, a Lei de Orientação

substitui a Lei de 1989, “em resposta ao longo processo de discussão com a

sociedade francesa e, coordenado pela Comissão Thélot, desde 2003,

conhecido como Debate sobre o Futuro da Escola.” (OLIVEIRA, 2009, p.91).

O resultado final dessa discussão da Comissão Thélot em Assembleia

nacional resultou na Lei de Orientação e de Programa para o futuro da Escola,

conhecida também como Lei Fillon36, aprovada em abril de 2005. Em seu

relatório final, vem “propor 8 programas de ação a serem contemplados pela

escola no futuro, e dentro desses programas de ação está a redefinição do

trabalho docente.” (OLIVEIRA, 2009, p.92).

Alguns pontos chaves da educação francesa foram apontados, entre

eles “como motivar os alunos e fazê-los trabalhar com eficácia”, seguidos por

“como lutar contra a violência e as incivilidades”; “como lidar com alunos em

dificuldade”; “como a escola deve se adaptar à diversidade dos alunos”; “como

36

Essa Lei traça a evolução desejada para o sistema de ensino nos 15 anos seguintes.

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os pais e parceiros externos da escola podem favorecer o sucesso escolar dos

alunos” e, finalmente, “definir a base comum de conhecimentos, competências

e regras de comportamento que os alunos devem prioritariamente dominar ao

final de cada fase do ensino obrigatório”. (Oliveira, 2009, p.92).

Além desse debate, entre maio e outubro de 2006, o então Ministro da Educação Nacional, Gilles de Robien, convidou o conjunto dos representantes da comunidade educativa para uma série de visitas a diversos países da Europa, com o objetivo de aprofundar o estudo comparativo dos diferentes sistemas de formação de professores dos países da União Européia. Fizeram parte da comissão de Gilles de Robien os presidentes dos Sindicatos de professores (...) e das federações de pais de alunos (...), além do presidente da DIUFM

37, de

professores estagiários do 1° e 2° Graus e de mestres-formadores de diferentes cidades. A formação por competências, a formação continuada, a articulação entre formação disciplinar, didática e prática desde o início da formação dos professores, assim como o contato precoce com a prática de sala de aula estão entre os dispositivos observados nos países visitados e que interessaram ao Ministro da Educação francesa. Os melhores dispositivos implementados na Áustria, Alemanha, Suécia, Grã-Bretanha e Bélgica deveriam ser identificados para, eventualmente, nutrir a reforma que estava em vias de ser implementada na França. (OLIVEIRA, 2009, p.92-93).

De acordo com a autora citada, algumas mudanças se iniciaram em

2007 sob a administração de Gilles de Robien e outras ainda estão em curso,

sob a responsabilidade do novo Ministro da Educação Nacional, Xavier

Darcos38. Porém, para ela, o futuro da formação de professores na França,

ainda parece incerto.

O socle commum foi uma das principais mudanças advindas da Lei de

Orientação da educação daquele país, que nada mais é que a parte

fundamental indispensável à formação dos alunos na educação obrigatória, a

ser aferidas nos exames do Diploma Nacional do Brevê, ao final do Colégio, o

1° ciclo do ensino secundário.

Com o intuito de analisar as iniciativas e os programas de formação

inicial em seis países europeus (Espanha, Finlândia, França, Grécia, Itália e

Suécia), o Institut Européen pour La Promotion dês Innovations et de La

Culture em Éducation (EPICE) promoveu um estudo que enfatizava a

importância da didática para a formação ao longo da vida.

37

Conférence des Directeurs d'IUFM (Conferência dos Diretores de IUFM). 38

Xavier Darcos é professor agregé de Letras, já ocupou a função de Inspetor Geral (IG) e algumas funções ministeriais.

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A necessidade de uma formação continuada, ou seja, ao longo da vida,

para todas as idades, foi um ponto bastante enfatizado durante os anos de

1990, pela UNESCO, OCDE e a Comissão Europeia que, segundo Oliveira

(2009),

a UNESCO concebia essa formação como uma educação geral do indivíduo para viver melhor no mundo, ao passo que a OCDE e a Comissão Européia a concebiam como a formação individual para um mercado em constante mutação, como uma defesa contra o desemprego. (OLIVEIRA, 2009, p.98).

Diante dos problemas advindos da livre circulação de trabalhadores

pelos países da Europa, como por exemplo, da dificuldade do reconhecimento

de diplomas, do baixo nível de domínio de outra língua estrangeira moderna

pelos estudantes europeus, da mão de obra em constante necessidade de

atualização e da necessidade de se ter professores em continua formação,

observou-se que era necessário o desenvolvimento da educação desde a

escola maternal. Isso implicaria, de acordo com a autora, a preparação dos

professores para ensinar tais competências, o que determina em alterações na

formação de docentes, desde a formação inicial, pois é fundamental que eles

saibam outro idioma europeu, se contextualizem e apropriem das novas

tecnologias de informação e comunicação, bem como dominem as novas

metodologias para que assim possam transmitir o conhecimento e fazer com

que os alunos aprendam a trabalhar com autonomia, no âmbito particular e

coletivo, desenvolvendo cada vez mais todas as competências necessárias ao

mercado de trabalho. (OLIVEIRA, 2009).

Sendo assim, a definição pelo socle commum definiu também as

competências necessárias que os professores deveriam possuir, ou seja, uma

combinação de conhecimentos, capacidades e de atitudes indispensáveis a

serem dominadas. Para os professores-estagiários, a mudança também

ocorreu na forma de que eram avaliados. Até 2007, eram avaliados conforme o

desempenho obtido “nos módulos de ensinos teóricos, nos estágios em

situação e pela elaboração de uma monografia”. A partir de 2008, passam a ser

examinados pela elaboração, “pela coordenação de formação do IUFM, de um

dossiê de competências, que deve conter informações sobre o nível alcançado

pelos estagiários de 2° ano de IUFM em cada competência”. (OLIVEIRA, 2009,

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p.100). Porém, após várias discussões oriundas da integração à Universidade,

ficou estabelecido que a avaliação dos estagiários das IUFMs só poderia ser

realizada por outro comitê externo.

Esse dossiê de competências é importante, pois avalia o nível em que

cada professor-estagiário está e assim o informa em que deve melhorar, caso

não o alcance todas as competências, determinando sua melhoria para o seu

ingresso efetivo ao corpo de professores da Educação Nacional.

A seguir, as competências determinadas no dossiê:

1- Ética e responsabilidade 2- Domínio da Língua 3- Domínio das Disciplinas e da cultura geral 4- Domínio da concepção e da aplicação de situações de

ensino/aprendizagem 5- Gestão do trabalho de classe 6- Competência para trabalhar dentro da diversidade 7- Competência para avaliar os alunos 8- Domínio das Tecnologias de Informação e Comunicação em

Educação 9- Capacidade para trabalhar em equipe e em cooperar 10- Formação própria e inovação

(OLIVEIRA, 2009, p.102).

A grande preocupação dos formadores dos IUFMs se refere à

configuração dos estágios, já que os mestres-formadores que acompanhavam

a integração dos estagiários nas escolas, não serão incorporados ao corpo de

formadores dos Centros Universitários. Daí surge uma importante questão:

quem será o responsável pela orientação dos estagiários, e ainda, como esses

estágios se configurarão no currículo dos novos centros de formação?

Os futuros professores entrariam diretamente em trabalho e o segundo ano de formação profissional no IUFMs seria substituído pelo que os franceses chamam de “camaradagem” intensiva em início de carreira, ou seja, os professores aprenderiam a pratica do serviço diretamente “em serviço”, com o auxílio dos seus colegas de trabalho. O papel daqueles Institutos seria, portanto, sensivelmente reduzido. (OLIVEIRA, 2009, p. 103).

Dessa forma, se pensarmos no âmbito do Brasil, podemos lembrar que

a RP proposta pelo PL do senador MM tem uma semelhança com esse tipo de

formação francesa de professores. “A França foi por muito tempo a maior fonte

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de inspiração para o sistema educacional brasileiro.” (MOREIRA; CUNHA;

LUDKE, 1999, p.285).

Contudo, como não tivemos a oportunidade de dialogar diretamente com

o senador, instaura-se aí a possibilidade de se pensar que o modelo europeu

francês possa inspirar reformas no âmbito nacional brasileiro, até mesmo, na

construção do PL em questão.

A partir de 2010, o Presidente Sarkozy e o Ministro da Educação, Xavier

Darcos, passaram a recrutar os futuros professores ao nível bac+5, ou seja,

com formação em nível máster 2, o que segundo Oliveira (2009) equivaleria no

Brasil ao mestrado.

Quanto aos formadores de professores, a preocupação maior é redefinir a formação inicial necessária à profissionalização dos professores, encontrando uma dinâmica adequada de articulação do conhecimento acadêmico e o desenvolvimento do hábito de pesquisa (mais freqüentemente concebida como pesquisa ação ou pesquisa sobre a prática) com o contato com a prática de sala de aula, ou seja, a inserção no trabalho de professor. (OLIVEIRA, 2009, p. 104).

Essas preocupações, no entanto, ocuparão em se discutir a

profissionalização dos professores na França, frente às novas medidas

anunciadas em maio de 2008 pelo então, Ministro Nicolas Sarkozy.

No caso brasileiro, a estabilidade profissional dos professores se dá hoje

em meio ao ingresso a um cargo na função pública. Essa estabilidade obedece

a certas exigências e requisitos legais: “aprovação em concurso público,

estágio probatório de 3 anos e avaliação de desempenho.” (VIEIRA, 2008,

p.44).

O estágio probatório é um período o qual as aptidões e capacidades

para o exercício da função ocupada pelo servidor serão avaliadas pela

Administração Pública por meio da avaliação de desempenho. De acordo com

Vieira (2008) os fatores a serem observados são:

a) assiduidade;

b) disciplina;

c) capacidade de iniciativa;

d) produtividade;

e) responsabilidade;

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Antes do término desses 3 anos, no último semestre, avaliação do

desempenho “será submetida à homologação da autoridade competente. O

servidor não aprovado no estágio probatório será exonerado ou, se estável,

reconduzido ao cargo anteriormente ocupado.” (VIEIRA, 2008, p.47).

Nota-se que os principais objetivos que devem pautar ou direcionar tal

avaliação, conhecida como Avaliação Especial de Desempenho (AED), sejam

mencionados aqui, a título de compreensão e conhecimentos do que é exigido

para que o professor tenha estabilidade. São eles:

1. contribuir para a implementação do princípio da eficiência na Administração Pública do Poder Executivo Estadual, para a melhoria da prestação do serviço público e, em especial, da qualidade da educação escolar; 2. aferir aptidão do servidor para o efetivo desempenho das funções; 3. identificar necessidades de capacitação do servidor; 4. fornecer subsídios à gestão da política de recursos humanos; 5. aprimorar o desempenho do servidor e do Sistema Estadual de Educação; 6. possibilitar o estreitamento das relações interpessoais e a cooperação dos servidores entre si e com suas chefias; 7. promover a adequação funcional do servidor. (MINAS GERAIS, 2004, p.3 ).

De acordo com Vieira (2008) esses objetivos estão direcionados para a

realidade educacional da nossa atualidade, visando melhorias nas políticas

públicas, sobretudo, identificar os profissionais que não se adaptaram na

função educacional e o encaminhando a cursos de aperfeiçoamento, a fim de

obter um trabalho mais produtivo, “que redunde em qualidade de serviços

educacionais na escola pública, o que colabora no princípio da eficiência.”

(VIEIRA, 2008, p. 49).

Todavia, o estágio probatório poderia servir como um período

preparatório para os novos professores, semelhante ao que acontece com a

formação na França, para as funções docentes. Poderia ser instaurado um

programa de capacitação para os professores iniciantes e concursados para

que assim, se desenvolvesse suas habilidades e competências de forma a dar

mais segurança e orientação aos professores. Se o modelo de RP fosse

reformulado e implantado nas esferas desse estágio, após a aprovação em

concurso público, poderia contar como título de pós-graduação e dessa forma

viabilizaria a procura e o ingresso nos cursos de formação de professores.

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Para contextualizarmos a prática na formação docente do Brasil,

aproximamos nosso olhar dos dados coletados nas universidades pesquisadas

e concentramos a nossa atenção na posição dos profissionais entrevistados

sobre os estágios e o que pensam sobre a RP, bem como aos questionários

respondidos pelos alunos do curso de Pedagogia do último ano de cada

instituição.

No próximo capítulo, chamamos a universidade federal pesquisada de

ALFA e seus profissionais como Coordenadora Alfa e Professora Alfa. Já para

a universidade estadual chamaremos de BETA e, consequentemente,

Coordenadora Beta e Professora Beta. E, para a universidade privada, damos

o nome de GAMMA e aos seus profissionais o termo correspondente.

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3 ENTENDENDO O PROJETO DE LEI SOBRE A RESIDÊNCIA

EDUCACIONAL OU PEDAGÓGICA

Para melhor entendimento e facilidade de acompanhar as análises aqui

feitas pelo leitor, optamos em colocar o PL na íntegra nesse corpo de texto.

Acreditamos assim, que estamos não só facilitando a parte técnica da leitura,

mas que dessa forma o leitor poderá acompanhar onde estão os textos que

iremos trabalhar isoladamente ao longo desse estudo.

Até o momento da entrega dessa pesquisa, o PL n 227 de um RE ou RP

encontrava-se sem emendas e nos trâmites do Senado. Ocorreu na data de 15

de abril de 2009 uma Audiência Pública para se discutir o referido documento.

No entanto, aguardamos o Parecer oficial da Comissão que teve a

oportunidade de se discutir o presente projeto nessa acareação.

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 227, DE 2007

Acrescenta dispositivos à Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, para instituir a

residência educacional a professores da educação básica.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O art. 65 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 passa a vigorar acrescido

do seguinte parágrafo único:

“Art. 65.

.......................................................................................

Parágrafo único. Aos professores habilitados para a docência na educação infantil e

nos anos iniciais do ensino fundamental será oferecida a residência educacional,

etapa ulterior de formação, com o mínimo de oitocentas horas de duração, e bolsa de

estudo, na forma da lei. (NR)”

Art. 2º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com o acréscimo do

seguinte artigo 87-A:

“Art. 87-A. Decorridos dois anos após a vigência do parágrafo único do art. 65, torna-

se obrigatório, para a atuação do professor nos dois anos iniciais do ensino

fundamental, o certificado de aprovação na residência educacional.”

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

¶1 A formação de professores para atuar na educação básica, mormente nos anos

iniciais do ensino fundamental, quando se concentra o processo básico do ensino-

aprendizagem da alfabetização, tem passado nos últimos anos por intensa crise.

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¶ 2 Durante mais de um século, os professoras e professores dos cursos então

chamados de “primário” e “pré-primário”, destinados a crianças de quatro a dez anos

de idade, eram formadas nas Escolas Normais.

¶ 3 A história da educação brasileira registra uma consonância quase perfeita

entre as demandas dessas crianças e as professoras “normalistas”, que, durante três

anos de intensivo estudo de conteúdo e de metodologia, se preparavam para seu

atendimento. Nos cursos normais, alternavam-se as aulas teóricas e práticas, de forma

que fossem adquiridas as principais habilidades e competências necessárias aos

futuros mestres. É certo que nem todos perseveravam na difícil empreitada de

alfabetizar crianças e adultos. Mas o sucesso da aprendizagem da maioria atestava a

adequação do processo formativo.

¶ 4 Enquanto isso, os poucos professores demandados pelos antigos ginásios e

colégios, que constituíam nosso ensino secundário, na maioria recrutados da classe

média, eram profissionais liberais ou licenciados em faculdade de filosofia, ciências e

letras. Com a massiva democratização do acesso às escolas primárias e secundárias,

dois fenômenos ocorreram simultaneamente: a necessidade de muitíssimos mais

professores e a premência de uma formação em nível superior, esta última requisitada

pelas situações mais complexas a serem enfrentadas nas escolas.

¶ 5 Ao mesmo tempo em que caía a qualidade do ensino e da aprendizagem no

ensino fundamental e médio, deteriorava-se a formação dos docentes. Em grande

parte, pelo dito antes – a formação tradicional não atendia as novas situações.

Também pelas condições dos que passaram a demandar a profissão do magistério,

oriundos agora das classes populares menos escolarizadas. Muito mais pelo

relaxamento dos processos de ensino nas habilitações para o magistério que

sucederam os cursos normais a partir de 1972 e na maioria dos cursos superiores de

pedagogia, que se multiplicaram sem critério desde o mesmo ano.

¶ 6 Os resultados estão aí, há mais de duas décadas: os estudantes aprendendo

cada vez menos e os professores cada vez mais inseguros, quer os preparados em

nível médio, quer os que freqüentaram os cursos “normais superiores” ou cursos de

pedagogia, muitos em período noturno, muitos em regime modular como “escolas de

fins de semana”, todos sem a necessária articulação entre teoria e prática.

¶ 7 A “residência médica” inspira o presente projeto de lei. Sabemos da

importância na formação dos médicos os dois, ou mais anos, de residência, ou seja,

do período imediatamente seguinte ao da diplomação, de intensa prática junto a

profissionais já experientes, em hospitais e outras instituições de saúde, quando não

somente são testados os conhecimentos adquiridos como se assimilam novas

habilidades exigidas pelos problemas do cotidiano e pelos avanços contínuos da

ciência.

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¶ 8 A Lei nº. 9.394, de 1996, que fixa as diretrizes e bases da educação, já previu,

em seu artigo 65, trezentas horas de prática de ensino obrigatórias durante a formação

dos professores. Entretanto, nem as escolas que atualmente oferecem cursos normais

nem as instituições superiores com cursos de pedagogia estão tendo condições de

desenvolver esse estágio de forma satisfatória, nem os alunos, geralmente já

trabalhadores, têm previsto tempo adequado durante os quatro anos de formação para

se dedicarem a esta carga horária de prática. Além disso, no caso dos cursos de

pedagogia, abriu-se um leque tão amplo de campos de estágio que poucos alunos têm

oportunidade de exercer sua prática no lugar e no momento mais importantes da vida

dos educandos, que são os dois anos de maior intensidade da alfabetização – os seis

e sete anos de idade.

¶ 9 As taxas de reprovação na primeira série do ensino fundamental são

alarmantes. A cada ano, ingressam no ensino fundamental público cerca de 2.900.000

crianças. Mas, estão matriculadas na antiga primeira série 5.600.000 crianças – o que

indica a existência de 2.700.000 repetentes. Entre as inúmeras causas desta catástrofe,

que irá comprometer o futuro de milhões de brasileiros, está o atual despreparo dos

professoras e professores para o desafio da alfabetização. E se examinarmos a

situação entre os jovens e adultos, a situação é ainda mais grave: há décadas

tentamos erradicar o analfabetismo e ainda convivemos com 19 milhões de

analfabetos absolutos e quase 40 milhões de outros analfabetos funcionais. Sem

dúvida alguma, a falta de preparo dos alfabetizadores está na raiz da questão.

¶ 10 A residência educacional, tal como se propõe neste projeto de lei, não é

um período de estudos integrado aos cursos normais ou cursos de pedagogia, mas

um período de formação e trabalho ulterior a eles, que deve ser regulamentado nos

aspectos pedagógicos pelos Conselhos de Educação e, nos aspectos administrativos

e financeiros, pelos sistemas de ensino, com a necessária colaboração da União. A

força do atual projeto é dada pela exigência da residência educacional como pré-

requisito de atuação nos anos iniciais de qualquer rede de ensino, pública ou privada.

No caso da pública, o certificado de residência poderia ser obrigatório como título nos

concursos públicos, de acordo com lei geral ou dos sistemas de ensino.

¶ 11 O âmbito da obrigatoriedade fica limitado aos dois anos iniciais do ensino

fundamental não somente em razão da importância desse momento de alfabetização

no processo educativo como também para permitir viabilidade financeira aos órgãos

contratantes e de formação que irão investir nesse reforço estratégico de formação

docente.

¶ 12 A proposta concede tempo superior a um ano para a implantação de seus

dispositivos, de modo a viabilizar a oferta da residência para os recém-formados e os

que irão se habilitar no decorrer do ano de sua publicação. Obviamente, garantem-se

os direitos adquiridos aos atuais professores em exercício, embora um programa de

residência como atualização profissional possa ser oferecido pelos sistemas de

ensino aos professores que atuam nos anos iniciais do ensino fundamental.

¶ 13 Acreditando que esta medida contribui para a melhoria da qualidade de nossa

educação, pública e privada, confio na compreensão e aprovação do projeto por meus

Pares.

Sala das Sessões, 04 de maio de 2007.

Senador MARCO MACIEL

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Segundo os art. 1° e 2° deste PL, a RE ou RP será oferecida de modo

obrigatório e o seu certificado de aprovação será exigido como uma proficiência

para o ingresso como professor nos dois anos iniciais do Ensino Fundamental.

Porém, de forma geral, o PL não esclarece se essa máxima valeria para os

professores que desejam ingressar na carreira pública bem como na rede

particular de ensino.

Subtende-se que a RP poderia ser exigida nos concursos públicos para

a carreira de Professor do nível Básico, já que, para o ingresso em instituições

privadas, as contratações passam pelo interesse e exigências particulares dos

contratantes.

Para analisar a justificativa do PL, dividimos os parágrafos em 4 tópicos:

do 1° ao 5°parágrafo, analisamos a transição da formação dos professores de

nível médio para o nível superior; no 7° parágrafo falamos sobre a Residência

Médica como parâmetro para entender a Residência Pedagógica; no 6°, 8° e

9°parágrafos sobre os estágios e a capacitação dos professores; e, do 10° ao

13°parágrafos, analisamos como se instauraria uma RP caso ela fosse pré-

requisito para a atuação nos anos iniciais bem como obrigatória.

Os próximos tópicos seguem a lógica descrita acima.

3.1 O Projeto de Lei sobre o perfil dos professores – do 1° ao 5°

parágrafos

Do primeiro ao quarto parágrafo da justificação do Senador, trata-se da

história educacional da formação dos professores e, nesta pesquisa, em seu

primeiro capítulo, analisamos como o processo de formação docente vem se

modificando frente às transformações sociais, culturais e econômicas.

Acreditamos que, nessa trajetória, ocorreram mudanças provenientes de

adequações e regulamentações, ao passo que o país se modernizava num

contexto geral. A função docente começa a ser entendida como uma profissão

e, diante disso, as Escolas Normais de nível médio tornaram-se o palco oficial

para o desenvolvimento e aprendizagem do magistério no final do século XIX e

princípio do século XX. No entanto, a elevação dos patamares de formação

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docente foi uma constante ao longo deste século nos países desenvolvidos e

se fez também acompanhar no Ocidente pelos países com indicadores médios

de desenvolvimento. (GATTI; BARRETO, 2009, p.55).

A realidade é que, em muito pouco tempo, apenas dez anos desde a Lei

nº. 9.394/96, como já se viu, ao estabelecer que a formação dos professores

do ensino básico deveria acontecer em nível superior, o lócus da formação se

deslocou para esse local, o da graduação superior. Segundo Gatti e Barreto

(2009), o que se observa:

após a LDB é uma explosão de cursos superiores de licenciatura voltados para os professores das séries iniciais do ensino fundamental e da educação infantil, embora em vista do grande número de docentes que apenas freqüentaram cursos de nível médio, haja ainda um longo caminho para percorrer para universalizar a formação de professores em exercício em nível superior, sem contar das novas gerações que devem ingressar no magistério. (GATTI; BARRETO, 2009, p.56).

De acordo com o censo obtido na Sinopse Estatística da Educação

Superior, havia em 2006 no Brasil 22.101 cursos presenciais de graduação,

sendo que 33,7% eram destinados aos cursos de formação docente, ou seja,

um terço do total de cursos. Sendo assim, em 2006 existiam no Brasil, 1.562

cursos de graduação presencial só em Pedagogia, com cerca de 281.000

alunos matriculados. (GATTI; NUNES, 2009, p.11).

Embora as Escolas Normais formassem os professores e professoras

dos cursos chamados de primário e pré-primário, hoje essa educação tende a

estar mais voltada para a Educação Infantil (creche e pré-escola). Ainda que a

escola normal média dê o diploma também para os anos iniciais do ensino

fundamental, de acordo com o primeiro capítulo desta pesquisa, percebemos

que, após a LDB, o PNE e mais especificamente após as Diretrizes

Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia (BRASIL, 2006a), vai se

afirmando a necessidade de uma formação superior qualificada ao processo

formativo, tanto para Educação Infantil, quanto para a Educação Básica. Sendo

assim, a exigência que a formação de professores (que antes eram formados

nessas Escolas Normais) se desse a partir da LDB em nível superior, fez com

que muitos gestores acabassem com a oferta de cursos normais em nível

médio e, por isso, muitos passaram a buscar tal graduação.

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De acordo com Gatti e Nunes (2009), o que se observou quanto ao

número de cursos de Pedagogia, entre os anos de 2001 e 2006, é que houve

um crescimento de cerca e 70% na oferta desse tipo de curso, sobretudo

dentre aqueles vinculados às instituições estaduais (170%) e às privadas

(98%). Contudo, as autoras evidenciam que o aumento foi predominantemente

entre os anos de 2001 e 2004, sendo que entre 2004 e 2006 o aumento foi de

9%. (GATTI; NUNES, 2009, p.12).

De acordo com MM, a necessidade de mais professores e premência de

uma formação em nível superior se deu com a massiva democratização do

acesso às escolas primárias e secundárias. Porém, segundo Gatti e Nunes

(2009):

A ampliação do número de cursos de Pedagogia não foi acompanhada por um crescimento da demanda. Uma explicação possível é a de que o grande aumento de cursos e matriculas verificado no início da década foi devido à prescrição, pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9.394/96), de que a formação docente para a educação básica deverá ser feita em nível superior. Uma vez atendida a demanda de credenciamento em nível superior dos professores em exercício que antes tinham apenas nível médio, é provável que a procura por esses cursos venha a se estabilizar em um patamar mais baixo. Devemos considerar aqui também a questão geracional, especialmente na região Sudeste e Sul pela redução do crescimento demográfico nas gerações mais jovens, e ainda, o fator atratividade da carreira que se torna pequeno nas regiões mais desenvolvidas. (GATTI; NUNES, 2009, p.12).

Portanto, não havia uma correspondência entre a explosão de cursos de

licenciaturas e o crescimento das matrículas.

Em 2001 havia 220.906 estudantes cursando Pedagogia e, em 2006, cerca de 281.000, verificando-se que um acréscimo de 27%, ou seja, o número de alunos não aumentou na mesma medida que o número de cursos. (GATTI; NUNES, 2009, p. 12).

Tanto as matrículas nos cursos regulares de Licenciatura para o ensino

infantil e séries iniciais39 (crescimento de 37,2), quanto para o ensino

fundamental e médio (crescimento de 40%) tiveram um crescimento baixo,

39

Quando se tratar da pesquisa feita por Gatti e Barreto (2009), usarei as mesmas nomenclaturas e referencias utilizadas pelas autoras. Elas utilizam Licenciatura I para designar os cursos destinados à formação de professores para a educação infantil e séries iniciais (Pedagogia, Normal Superior e similares). Denominam Licenciatura II os cursos voltados à formação de professores das disciplinas específicas do magistério da educação básica.

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sobretudo, nos cursos privados. (GATTI; BARRETO, 2009). Isso poderia ser

explicado pelos programas especiais de graduação, desenvolvidos em caráter

especiais e de caráter emergencial por vários estudos para elevar os níveis de

formação dos professores dos cursos de Licenciatura I nas suas redes

estaduais e municipais, os quais teriam aliviado a demanda pelos cursos

regulares dessa mesma formação nos respectivos estados. Dentre eles,

destacamos o Programa de Educação Continuada: PEC – Formação

Universitária - que é uma formação universitária, da Secretaria da Educação do

Estado de São Paulo, destinada a este Estado e desenvolvido pela USP,

Unesp e PUC-SP; PEC - Municípios – atendendo os municípios do Estado de

São Paulo e se desdobrando no Programa Pedagogia Cidadã; Projeto Veredas

– Formação Superior de Professores – Parceria feita entre o Governo do

Estado de Minas Gerais com várias instituições de ensino superior; (GATTI;

BARRETO, 2009, p. 57; 181).

O terceiro parágrafo da justificativa de MM aponta que, durante os três

anos do curso normal, existia um estudo intensivo de conteúdo e de

metodologias, em que alternavam-se as aulas de teoria e prática, de forma que

fossem adquiridas as principais habilidades e competências necessárias aos

futuros professores. O que se verificou é que esse processo ainda acontece,

porém o que se faculta é como se dá essa articulação entre a teoria e a prática.

Os cursos de Pedagogia estabelecidos pelas diretrizes abarcam 2800 horas de

teoria e 400 horas de prática, ao longo da formação. Enquanto o aluno tem

aulas teóricas na sua graduação, ele também poderá exercer seu estágio

dentro de uma escola. Nada o impede de adquirir sua experiência desde o

primeiro período de seu curso.

De acordo com Gatti e Barreto (2009) os estudantes que optam pela

docência estão em sua maioria nas instituições privadas, que costumam

apresentar menor qualidade acadêmica. Muitos dos alunos desse curso estão

concentrados em instituições no turno noturno, o que em seu PL Maciel

também aponta e de forma geral,

tendem a ter um funcionamento mais precário do que os diurnos, particularmente no que diz respeito às atividades ligadas às práticas docentes requeridas pela formação específica para o magistério, o que sugere que a formação dos estudantes de licenciatura, realizada no período noturno, tende a ocorrer em condições de qualidade

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menos satisfatórias que a dos demais licenciados. (GATTI; BARRETO, 2009, p. 68).

Ainda para MM, a defasagem educacional também tem sua origem na

classe em que o professorado é proveniente, ou seja, de uma classe popular

menos escolarizada. E, se pensarmos que o fator socioeconômico está

diretamente ligado ao fator cultural, obviamente, as diferenças ocorrem por não

se proporcionar as mesmas condições de conhecimento e oportunidade de

trabalho a essa classe.

“Os estudos sobre professores costumam descrevê-los como uma

categoria profissional relativamente homogênea, proveniente em larga medida,

dos estratos médios da população”. (GATTI; BARRETO, 2009, p. 163).

Não obstante, os estudantes da docência, em sua maior parte são

“trabalhadores, sendo que apenas 26% dos alunos não trabalham e são

inteiramente custeados pela família.” (GATTI; BARRETO, 2009, p. 163-164).

Dessa forma, a obrigatoriedade de se cumprir mais 800 horas de

trabalho prático dentro da escola, numa RP, sem que esta seja colocada em

nível de pós-graduação, traz algumas indagações referentes ao conteúdo do

PL, como por exemplo, as questões que norteiam o estágio e a culpabilização

dada aos professores pela baixa qualidade do ensino da Educação Básica. Nos

próximos tópicos (3.3 e 3.4), discutiremos essas questões.

3.2 A Residência Médica como parâmetro para a Residência Pedagógica –

7° parágrafo

Para não perder a linearidade de se discutir todo o PL e, sobretudo,

entender o que é uma residência recorremos ao seu significado segundo o

Dicionário Houaiss (2001). O verbete segundo transcreve: “fase do treinamento

avançado de um médico em sua especialidade, uma vez formado e licenciado

para exercer a profissão e dar consultas.” E ainda acrescenta no mesmo tópico

após o verbete oitavo, que “residência médica é um curso de duração variável

que os médicos, após a graduação, realizam geralmente em um hospital, a fim

de se especializarem”. (HOUAISS, 2001, p. 2.437).

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De acordo com Maciel

A “residência médica” inspira o presente projeto de lei.

Sabemos da importância na formação dos médicos os dois, ou

mais anos, de residência, ou seja, do período imediatamente

seguinte ao da diplomação, de intensa prática junto a

profissionais já experientes, em hospitais e outras instituições

de saúde, quando não somente são testados os conhecimentos

adquiridos como se assimilam novas habilidades exigidas pelos

problemas do cotidiano e pelos avanços contínuos da ciência.

(BRASIL, 2007a).

Desta forma, de acordo com o MEC, a Residência Médica no Brasil

constitui modalidade de ensino de pós-graduação, destinada aos médicos, sob

a forma de cursos de especialização, caracterizada por treinamento em

serviço, funcionando sob a responsabilidade de instituições de saúde,

universitárias ou não, sob a orientação de profissionais médicos que segundo o

Ministério da Educação, esses médicos devem possuir elevada qualificação,

ética e profissionalismo. Foi instituída no Brasil através do Decreto n. 80.281 de

5 de setembro de 1977. (BRASIL, 1977).

Considerando que a Lei n. 11.129/2005 que estabelece a Residência em

Área Multiprofissional em Saúde (RMS), que criou a Comissão Nacional de

Residência Multiprofissional em Saúde (CNRMS), e que, por meio da Portaria

Interministerial MEC/MS n. 45/2007, vem sancionar que esta Comissão cabe

entre outras atribuições, a elaboração de seu regimento de funcionamento, na

atuação, no controle e na execução desses programas. Portanto, essa

Comissão é responsável por elaborar diretrizes e estabelecer competências

para a organização dos Programas de Residência Multiprofissional em Saúde.

Como não se trata de um programa de formação durante o curso, e sim

após a sua conclusão, MM diz que cabe aos Conselhos de Educação a

regulamentação dos aspectos pedagógicos e, nos aspectos administrativos e

financeiros, pelos sistemas de ensino com a devida colaboração da União. Ou

seja, caberia ao MEC a responsabilidade técnico-administrativa do Programa.

Para analisarmos como isso seria, buscamos alguns dados da área de

saúde que asseguram e institui a RMS. Segundo a Portaria Interministerial

n.2.117 de 3 de novembro de 2005, que institui no âmbito dos Ministérios da

Saúde e da Educação, a RMS, apoiando-se na Lei 11.129 de 30 de junho de

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2005, institui de forma a executar o Programa de Bolsas para a Educação pelo

Trabalho.

Segundo Feuerwerker (1998) a CNRM determinou, no processo de

regulamentação da RM, requisitos e condições mínimas para o processo

pedagógico e de trabalho, reconhecendo o residente como trabalhador (porém

autônomo, sem reconhecimento do vínculo empregatício com a instituição que

mantém o programa). Sendo assim, o residente da área da saúde tem

assegurado o direito de receber uma bolsa pela execução dos projetos e

programas destinados a esse período de prática, bem como outros direitos

trabalhistas, como férias e licença-maternidade. Contudo, o graduado em

medicina que não desejar fazer uma especialização nos parâmetros de uma

residência médica, poderá ainda assim ser o médico clínico, generalista. Fica

assegurado por lei sua graduação e o exercício de sua profissão. De acordo

com a Lei n.11.381 de 1° de dezembro de 2006 que altera a Lei 6.932 de 7 de

julho de 1981 que dispõe sobre as atividades do médico residente, instituiu-se

uma bolsa no valor correspondente de R$1.916,45, em regime especial de

treinamento em serviço de 60 horas semanais. (BRASIL, 2006c).

No caso dos cursos de Pedagogia, instaura-se a dúvida de se estabelecer

uma bolsa de estudos que seja compatível a realidade desse aluno, que,

conforme descrevemos nessa pesquisa, são alunos provenientes de camadas

mais populares e que em sua maioria trabalham para o próprio sustento.

Questionamos se os valores dessa bolsa estariam abaixo dos salários

recebidos dos professores da rede pública, por exemplo, já que para o ingresso

nessa rede a RP seria obrigatória, conforme vimos anteriormente.

Todavia, o piso salarial para os profissionais do magistério da educação

básica pública foi instituído pela Lei n.11.738 de 16 julho de 2008, no valor de

R$950,00 por uma jornada de até 40 horas semanais e com formação mínima

a nível médio. (BRASIL, 2008). Essa foi a primeira categoria a ter um piso

salarial definido, esperando-se assim uma melhora nas condições salariais dos

docentes.

A representação de docência como “vocação” e “missão” de certa forma afastou socialmente a categoria dos professores da idéia de uma categoria profissional de trabalhadores que lutam para a sobrevivência, prevalecendo a perspectiva de “doação de si”, o que determinou, e determina em muitos casos, as dificuldades que

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professores encontram em sua luta categorial por salários, dificuldades estas que estão presentes no âmbito social e político, bem como na cultura intracategórica. Essa representação está associada à própria gênese histórica da profissão e tem peso não só nas dimensões materiais dos sistemas educacionais, como também nas “mentalidades dos professores, suas identidades e suas práticas”. (GATTI; BARRETO, 2009, p.239).

De acordo com Gatti e Barreto, se considerarmos as condições reais da

profissionalização docente e as fontes de recursos, orçamentos, legislações

nos 5.561 municípios, 26 estados e 1 Distrito Federal do Brasil, veremos que

existe uma heterogeneidade quanto à carreira e salário dos professores. Sendo

assim, no que diz respeito à carreira docente na educação básica:

[...] é preciso lembrar que carreiras pouco atraentes do ponto de vista salarial acabam por não ser objeto de procura entre as novas gerações, e especialmente não se mostram atraentes para aqueles que se consideram em melhores condições de domínio de conhecimentos, ou com melhores chances em outras atividades. (GATTI; BARRETO, 2009, p.239).

As autoras apontam ainda que a valorização social real de uma área

profissional traz reflexos nas estruturas de carreira e nos salários, e/ ou

condições de trabalho, a ela relativos. (GATTI; BARRETO, 2009, p.238). Dessa

forma, o professor entre as

[...] diversas carreiras profissionais no âmbito das sociedades contemporâneas mostram características ligadas não só à especialização associada ao exercício do trabalho, como também ligadas ao valor simbólico, social à elas atribuído, o que varia no tempo e nos espaços em função de aspectos da cultura, da educação e de formas políticas de regiões onde determinada profissão é exercida. (GATTI; BARRETO, 2009, p.238).

Quanto à certificação, MM não aponta em seu PL se a RP seria instituída

como uma especialização no nível de pós-graduação. Pois o certificado

conferido “pelos programas de Residência Médica foi elevado à categoria de

título especialista, reconhecido pelo MEC, sem deixar de reconhecer como

válidos os títulos aprovados pelas sociedades de Especialização.”

(FEUERWERKER, 1998).

Sendo assim, não se pode limitar aos profissionais pedagogos que sua

formação se restrinja a único caminho e as Diretrizes Curriculares Nacionais

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aponta que o Pedagogo poderá atuar em outras instancias diferentes ao meio

escolar, por exemplo.

3.3 A articulação entre a teoria e a prática: a importância do estágio – 6°,

8° e 9° parágrafos

De acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, estágio é o

período de prática em que o profissional se habilita a exercer proficientemente

a sua profissão. Pode ser “a permanência em algum posto, serviço, empresa

etc., durante um tempo, para efeito de aprendizagem e aprimoramento

profissional.” (HOUAISS, 2001, p.1245).

A dificuldade de ensinar muitas vezes está na relação entre professores

e alunos e de certa forma, essa desvinculação pode interferir na capacidade de

adaptação dos professores com o saber.

Segundo Maciel, para justificar que a RP, seria uma medida a fim de

contribuir para a melhoria da qualidade da educação, pública e privada, aponta

para os cursos de Pedagogia a responsabilidade pela formação de professores

incapacitados e desqualificados para a realidade da sala de aula. De acordo

com ele, essa má preparação do professor reflete na educação como um todo,

principalmente, ao que tange na defasagem do ensino na Educação Básica do

Ensino Fundamental.

Os estudantes aprendendo cada vez menos e os professores cada vez mais inseguros, quer os preparados em nível médio, quer os que freqüentaram os cursos normais superiores ou cursos de pedagogia, muitos em período noturno, muitos em regime modular como escolas de fim de semana, todos sem a necessária articulação entre a teoria e a prática. (BRASIL, 2007a).

Sendo assim, MM continua:

(...) a Lei nº. 9.394, de 1996, que fixa as diretrizes e bases da educação, já previu, em seu artigo 65, trezentas horas de prática de ensino obrigatórias durante a formação dos professores. Entretanto, nem as escolas que atualmente oferecem cursos normais nem as instituições superiores com cursos de pedagogia estão tendo condições de desenvolver esse estágio de forma satisfatória, nem os alunos, geralmente já trabalhadores, têm previsto tempo adequado

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durante os quatro anos de formação para se dedicarem a esta carga horária de prática. Além disso, no caso dos cursos de pedagogia, abriu-se um leque tão amplo de campos de estágio que poucos alunos têm oportunidade de exercer sua prática no lugar e no momento mais importantes da vida dos educandos, que são os dois anos de maior intensidade da alfabetização – os seis e sete anos de idade. (BRASIL, 2007a).

Um ponto fundamental de discussão é o da teoria e o da prática. Os

cursos de Pedagogia, diante das diretrizes, devem cumprir 300 horas de

estágio supervisionado prático, na Educação Infantil e nos anos iniciais do

Ensino Fundamental e mais 100 horas de atividades teórico-práticas de

interesse dos alunos, por meio de monitoria, iniciação científica e extensão.

Nas três universidades pesquisadas (ALFA, BETA e GAMMA), comprovamos

que essas 400 horas são efetivadas em seus currículos, de forma a consolidar

a teoria e a prática.

O estágio é um momento muito importante na vida do estudante, pois é

alicerçando a teoria com a prática que se podem construir novas interpretações

e novas reflexões da própria prática. De acordo com Nóvoa (2004), o aluno é o

responsável por querer aprimorar seus conhecimentos no estágio, trocado

informações com outros alunos e com seus professores, e dessa forma, ele

potencializa suas competências e habilidades.

O potencial formador de cada um depende das ponderações feitas com os colegas, com quem está sendo observado e com o supervisor. Sem isso, a observação transforma-se em exercício mecânico, sem interesse. É essencial estudar os processos de organização do trabalho escolar, da gestão das turmas e da sala de aula, bem como as formas de utilização dos métodos de ensino e a capacidade de resposta às situações inesperadas. As competências para realizar essa análise são individuais e coletivas. A pertinência do estágio reside na compreensão da contribuição específica dos professores e na identificação da cultura profissional docente. (NÓVOA, 2001, p.13).

40

Em cada universidade visitada para a realização desse estudo,

entrevistamos a coordenadora dos cursos e uma professora, visando a coletar

informações a cerca da formação dos futuros pedagogos em seus campos de

estágios, bem como suas impressões a respeito desse PL.

40

NÓVOA, Antônio. Professor se forma na escola. Nova Escola, São Paulo, n.142, p. 13-15, maio, 2001. Entrevista concedida a Paola Gentile.

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Nas universidades pesquisadas, encontramos modelos de cursos bem

similares, cumprindo as determinações das Diretrizes Curriculares Nacionais

para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura, ou seja, uma

preocupação voltada para os professores da educação infantil e da educação

básica – primeiras séries.

De acordo com o Parecer CNE/CP 28/2001, que antecedeu essas

diretrizes, a obrigatoriedade de 300 horas de prática de ensino é requerida

como patamar mínimo posto no art. 65 da LDB e normatizado também no

Parecer CNE/CP 9/2001 e respectiva Resolução. (BRASIL, 2001b).

Diante da formação dos profissionais docentes e a importância da

prática do ensino, “percebe-se que este mínimo estabelecido em lei não será

suficiente para dar conta de todas as exigências em especial a associação

entre teoria e prática tal como posto no Art. 61 da LDB.” (BRASIL, 2001b).

Ainda de acordo com esse mesmo Parecer, acredita-se que a carga

horária estabelecida poderia ser ampliada, mas que para tanto também deveria

ser justificada.

A prática não é uma cópia da teoria e nem esta é um reflexo daquela. A prática é o próprio modo como as coisas vão sendo feitas cujo conteúdo é atravessado por uma teoria. Assim a realidade é um movimento constituído pela prática e pela teoria como momentos de um dever mais amplo, consistindo a prática no momento pelo qual se busca fazer algo, produzir alguma coisa e que a teoria procura conceituar, significar e com isto administrar o campo e o sentido desta atuação. Esta relação mais ampla entre teoria e prática recobre múltiplas maneiras do seu acontecer na formação docente. Ela abrange, então, vários modos de se fazer a prática tal como expostos no Parecer CNE/CP 9/2001. (BRASIL, 2001b, p.9).

É o que diz também o Parecer CNE/CP n.09/2001 (BRASIL, 2001a):

Uma concepção de prática mais como componente curricular implica vê-la como uma dimensão do conhecimento, que tanto está presente nos cursos de formação nos momentos em que se trabalha na reflexão sobre a atividade profissional, como durante o estágio nos momentos em que se exercita a atividade profissional. (BRASIL, 2001a, p. 22)

Contudo, o Parecer CNE/CP n. 28/2001, distingue e deixa claro o que

vem a ser a prática como componente curricular e, a prática de ensino e o

estágio obrigatório definidos por lei.

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A prática como componente curricular é, pois, uma prática que produz algo no âmbito do ensino. Sendo a prática um trabalho consciente cujas diretrizes se nutrem do Parecer 9/2001 ela terá que ser uma atividade tão flexível quanto outros pontos de apoio do processo formativo, a fim de dar conta dos múltiplos modos de ser da atividade acadêmico-científica. Assim, ela deve ser planejada quando da elaboração do projeto pedagógico e seu acontecer deve se dar desde o início da duração do processo formativo e se estender ao longo de todo o seu processo. Em articulação intrínseca com o estágio supervisionado e com as atividades de trabalho acadêmico, ela concorre conjuntamente para a formação da identidade do professor como educador. Esta correlação teoria e prática é um movimento contínuo entre saber e fazer na busca de significados na gestão, administração e resolução de situações próprias do ambiente da educação escolar. (CNE/CP 2001b, p. 22).

A importância dos dizeres desse Parecer está justamente no modelo de

formação de professores que integre e interaja a prática docente com a teoria.

Com isso, acreditamos, que mediante os apontamentos deste documento, já se

pensava que as 300 horas acrescida de 1/3 (mais 100 horas) seria o mínimo de

atividades práticas para dar conta das exigências de qualidade educacionais,

totalizando as 400 horas.

O Parecer ainda enfatiza a correlação entre as instituições formadoras

superiores e as escolas onde os alunos farão suas atividades práticas.

A prática, como componente curricular, que terá necessariamente a marca dos projetos pedagógicos das instituições formadoras, ao transcender a sala de aula para o conjunto do ambiente escolar e da própria educação escolar, pode envolver uma articulação com os órgãos normativos e com os órgãos executivos dos sistemas. Com isto se pode ver nas políticas educacionais e na normatização das leis uma concepção de governo ou de Estado em ação. Pode-se assinalar também uma presença junto a agências educacionais não escolares tal como está definida no Art. 1º da LDB. Professores são ligados a entidades de representação profissional cuja existência e legislação eles devem conhecer previamente. Importante também é o conhecimento de famílias de estudantes sob vários pontos de vista, pois eles propiciam um melhor conhecimento do ethos dos alunos. (BRASIL, 2001b).

MM pontua que seria necessário que o professor tivesse um momento

maior de trabalho prático, diretamente ligado à sala de aula, mais

especificamente, os dois primeiros anos de ensino, e requer em seu PL a

regulamentação de uma RP diante do nosso quadro de formação de professores

e diante da nossa estrutura educacional, mais especificamente, da Educação

Básica.

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Tomando como base esse modelo de residência, poderíamos acreditar

que o Conselho de Educação seria o responsável por indicar uma Comissão

para delegar as funções e responsabilidades frente a uma implantação de uma

RP. Segundo a Lei n. 11.129/2005, o regime de dedicação para os residentes

deve ser exclusivo e ainda, ser supervisionado por um docente-assistencial.

Suponhamos que um residente na educação, juntamente com o seu

professor docente-assistencialista, pudesse realizar um excelente trabalho, já

que o profissional mais antigo provavelmente passaria todos os encalces que ele

já vivenciou e que agora faz parte de sua prática reflexiva. Mesmo assim,

questionamos se dessa maneira conseguiríamos índices relativamente positivos

que demonstrasse que o fracasso escolar41 seria superado?

Na Justificação de seu PL, MM aponta que “ao mesmo tempo em que

caía a qualidade do ensino e da aprendizagem do ensino fundamental e médio,

deteriorava-se a formação dos docentes.” De acordo como documento, a partir

da alta demanda do curso pelas classes populares menos escolarizadas e do

aumento dos cursos superiores de pedagogia, a formação do professor deixou

de articular a teoria e a prática. (BRASIL, 2007a).

As taxas de reprovação na primeira série do ensino fundamental são alarmantes. A cada ano, ingressam no ensino fundamental público cerca de 2.900.000 crianças. Mas, estão matriculadas na antiga primeira série 5.600.000 crianças – o que indica a existência de 2.700.000 repetentes. Entre as inúmeras causas desta catástrofe, que irá comprometer o futuro de milhões de brasileiros, está o atual despreparo das professoras e professores para o desafio da alfabetização. E se examinarmos a situação entre os jovens e adultos, a situação é ainda mais grave: há décadas tentamos erradicar o analfabetismo e ainda convivemos com 19 milhões de analfabetos absolutos e quase 40 milhões de outros analfabetos funcionais. Sem dúvida alguma, a falta de preparo dos alfabetizadores está na raiz da questão. (BRASIL, 2007a).

Nessa passagem, MM culpabiliza a formação dos professores para

justificar os índices alarmantes de analfabetismo. Todavia, o fracasso escolar

está distribuído desigualmente. Segundo Marchesi e Gil (2004), “uma alta

41

O informe da OCDE sobre o fracasso escolar aponta três manifestações diferentes desse fenômeno. A primeira se refere aos alunos com baixo rendimento escolar, quer dizer, aqueles que ao longo de sua escolarização não alcançaram um nível mínimo de conhecimentos. A segunda abrange alunos que abandonaram ou terminaram a educação obrigatória sem o título correspondente. A terceira aponta para as conseqüências sociais e profissionais na idade adulta dos alunos que não alcançaram a preparação adequada.

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porcentagem de fracasso escolar tem sua origem direta nas carências

econômicas, sociais e culturais que determinados grupos da população

sofrem.” Ou seja, os alunos que vivem em piores condições sociais tem mais

chances de estarem situados em grupos de alunos com avaliações mais

baixas. (MARCHESI; GIL, 2004, p.23).

Para Marchesi e Pérez (2004), o termo fracasso escolar é amplamente

discutível, pois propaga a idéia de que o aluno é “fracassado”, ou seja, sugere

que ele

[...] não progrediu praticamente nada durante seus anos escolares, nem no âmbito de seus conhecimentos nem no seu desenvolvimento pessoal e social, o que não corresponde em absoluto à realidade. (MARCHESI; PÉREZ, 2004, p.17).

Esse termo, segundo Marchesi e Pérez (2004), também oferece uma

imagem negativa ao aluno, o que atinge a auto-estima e sua confiança para

progredir no futuro. Assim como para a escola, se a etiqueta de fracasso for

aplicada a ela, provavelmente aumentará as dificuldades e distanciará dela

alunos e famílias que poderiam contribuir para a sua melhora. O termo ainda,

segundo os autores, “centra no aluno o problema do fracasso e parece

esquecer a responsabilidade de outros agentes e instituições como as

condições sociais, a família, o sistema educacional ou a própria escola”.

(MARCHESI; PÉREZ, 2004, p.17).

Também para Charlot (2005), a relação que o sujeito tem com o saber,

com a linguagem e com a cultura, estabelece vínculo entre o sistema escolar e

a estrutura das relações de classe. Se desejarmos compreender a

desigualdade social perante a escola, é preciso se interessar por essa relação.

A relação com o saber é o conjunto das relações que um sujeito estabelece com um objeto, um “conteúdo de pensamento”, uma atividade, uma relação interpessoal, um lugar, uma pessoa, uma situação, uma ocasião, uma obrigação, etc., relacionados de alguma forma com a linguagem, relação com o tempo, relação com a atividade no mundo e sobre o mundo, relação com os outros e relação consigo mesmo, com mais ou menos capaz de aprender tal coisa, em tal situação. (CHARLOT, 2005, p.45).

Em seus estudos Nóvoa (1999), critica a maneira como sociedades

assinaladas por crises de legitimidade política e por efêmera participação

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tentam reparar a falta de uma autêntica vivência democrática a partir da

pregação do civismo e da projeção de todas as expectativas na “sociedade do

futuro” e depositam nos professores o papel salvador necessário à consecução

desses propósitos.

De acordo como autor, os docentes passam a ser o alvo das atenções

dos políticos e da opinião pública, na medida em que não dispõe de outras

alternativas para os problemas.

O excesso dos discursos esconde a pobreza das práticas políticas. Neste fim de século, não se vêem surgir propostas coerentes sobre a profissão docente. Bem pelo contrário. As ambigüidades são permanentes. Por um lado, os professores são olhados com desconfiança, acusados de serem profissionais medíocres e de terem uma formação deficiente; por outro lado, são bombardeados com uma retórica cada vez mais abundante que os considera elementos essenciais para a melhoria da qualidade do ensino e para o progresso social e cultural. (NÓVOA, 1999).

Para Charlot (2005), uma imposição dirigida aos professores é que eles

resolvam os problemas encontrando as soluções e mobilizando os recursos

necessários. Segundo o especialista, “o problema é que ensinar não é somente

transmitir, nem fazer se aprender saberes. É por meio dos saberes, humanizar,

socializar, ajudar um sujeito singular acontecer.” (CHARLOT, 2005, p.85).

De toda forma, as universidades e os cursos de formação de

professores para o magistério, preocupados em estabelecer uma relação de

conhecimento e identidade profissional, devem estar antenados para as

mudanças que caracterizam o momento atual. Segundo Libâneo (2003), essas

instituições devem se preocupar em formar um professor que tenha

conhecimentos:

[...] de uma cultura geral mais ampliada, capacidade de aprender a aprender, competência para saber agir na sala de aula, habilidades comunicativas, domínio da linguagem informacional, saber usar meios de comunicação e articular as aulas com as mídias e multimídias. (LIBÂNEO, 2003, p.10).

Uma pesquisa feita sobre o perfil dos professores brasileiros pela

UNESCO revela que a recuperação da dignidade e da credibilidade do ofício

dos professores passaria por uma reconfiguração de sua identidade

profissional, que envolveria “o fortalecimento de suas lutas por melhores

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salários e condições dignas de trabalho, destacando-se uma formação de

qualidade.” (UNESCO apud GATTI; BARRETO. 2009).

Dentro dessa perspectiva, Nóvoa (2004) acredita que uma formação de

qualidade está alicerçada no equilíbrio entre o tradicional e a inovação das

práticas educativas. Ele enfatiza que:

O aprender contínuo é essencial em nossa profissão. Ele deve se concentrar em dois pilares: a própria pessoa do professor, como agente, e a escola, como lugar de crescimento profissional permanente. Sem perder de vista que estamos passando de uma lógica que separava os diferentes tempos de formação, privilegiando claramente a inicial, para outra que percebe esse desenvolvimento como um processo. Aliás, é assim que deve ser mesmo. A formação é um ciclo que abrange a experiência do docente como aluno (educação de base), como aluno-mestre (graduação), como estagiário (práticas de supervisão), como iniciante (nos primeiros anos da profissão) e como titular (formação continuada). Esses momentos só serão formadores se forem objeto de um esforço de reflexão permanente. (NÖVOA, 2001, p.14).

Assim como para Tardif (2002) “a prática docente não é apenas um objeto

de saber das ciências da educação, ela é também uma atividade que mobiliza

diversos saberes que podem ser chamados de pedagógicos.” (TARDIF, 2002,

p.37). Dessa forma, segundo o autor, esses saberes pedagógicos mostram-se

como:

doutrinas ou concepções advindas de reflexões sobre a prática educativa no sentido amplo do termo, reflexões racionais e normativas que conduzem a sistemas mais ou menos coerentes de representação e de orientação da atividade educativa. (TARDIF, 2002, p.37).

Devemos, portanto, repensar as relações entre a teoria e a prática, em

que esta assume o espaço de aplicação dos saberes provenientes da teoria,

mas que também assume um espaço de produção de saberes específicos

provenientes dessa mesma prática. Diante disso, os depoimentos que serão

analisados no capítulo 4, das pesquisadoras, das coordenadoras, professoras

e alunos servirão como referências para a análise do estágio como campo da

prática educativa durante a formação docente.

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106

3.4 Sobre as exigências e a obrigatoriedade de uma Residência

Pedagógica – do 10° ao 13° parágrafo

Os quatro últimos parágrafos do PL explicam melhor o que seria a RP, a

quem se destina, como e de que forma se aplica e o por quê.

No 10°parágrafo, o primeiro em questão, MM declara que a RE ou RP

seria uma exigência para que o professor possa atuar dentro da sala de aula das

séries iniciais. Dessa forma, o recém-graduado exerceria a prática do ensino,

numa espécie de proficiência. Porém, essa exigência cabe somente aos

professores da Educação Básica, ou seja, professores da Licenciatura I, ficando

de fora os professores das licenciaturas específicas, ou Licenciatura II.

Apesar de MM indicar que a regulamentação far-se-ia nos aspectos

pedagógicos pelos Conselhos de Educação, nada se refere a que tipo de

avaliação os residentes seriam submetidos, ao final desse processo.

A residência educacional, tal como se propõe neste projeto de lei, não é um período de estudos integrado aos cursos normais ou cursos de pedagogia, mas um período de formação e trabalho ulterior a eles, que deve ser regulamentado nos aspectos pedagógicos pelos Conselhos de Educação e, nos aspectos administrativos e financeiros, pelos sistemas de ensino, com a necessária colaboração da União. A força do atual projeto é dada pela exigência da residência educacional como pré-requisito de atuação nos anos iniciais de qualquer rede de ensino, pública ou privada. No caso da pública, o certificado de residência poderia ser obrigatório como título nos concursos públicos, de acordo com lei geral ou dos sistemas de ensino. (BRASIL, 2007a).

Ainda no mesmo parágrafo, enfatiza que a residência se destina a todos

professores que atuarão nos anos iniciais de qualquer rede de ensino, pública

(estadual, municipal) e privada. Contudo, a obrigatoriedade volta-se como

exigência para o ingresso numa carreira pública, mas da forma de Títulos.

O âmbito da obrigatoriedade fica limitado aos dois anos iniciais do ensino fundamental não somente em razão da importância desse momento de alfabetização no processo educativo como também para permitir viabilidade financeira aos órgãos contratantes e de formação que irão investir nesse reforço estratégico de formação docente. (BRASIL, 2007a).

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Nesse parágrafo, MM acredita que apenas, nas duas primeiras séries,

estão alocados os problemas de alfabetização. Para tanto, determina que sejam

realizadas as 800 horas de trabalho prático nos dois anos iniciais do ensino

fundamental.

Em seu penúltimo parágrafo, diz que ficam garantidos os direitos

adquiridos aos atuais professores em exercício, mas que “um programa de

residência como atualização profissional possa ser oferecido pelos sistemas de

ensino aos professores que atuam nos anos iniciais do ensino fundamental.”

(MACIEL, 2007, p.3).

Uma forma que o Governo vem buscando como via de melhorar a

qualidade do ensino é investindo na formação permanente dos professores.

Pelo Decreto 6.755/09, o Presidente Luís Inácio Lula da Silva, instituiu a

Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação

Básica. Decreta, no 2°artigo, do inciso VII ao XII, a importância e a necessidade

do docente no processo educativo escolar, bem como a sua valorização

profissional diante de políticas permanentes de estímulo à profissionalização,

tanto na formação inicial, quanto na formação continuada.

VIII - a importância do docente no processo educativo da escola e de sua valorização profissional, traduzida em políticas permanentes de estímulo à profissionalização, à jornada única, à progressão na carreira, à formação continuada, à dedicação exclusiva ao magistério, à melhoria das condições de remuneração e à garantia de condições dignas de trabalho; IX - a eqüidade no acesso à formação inicial e continuada, buscando a redução das desigualdades sociais e regionais; X - a articulação entre formação inicial e formação continuada, bem como entre os diferentes níveis e modalidades de ensino; XI - a formação continuada entendida como componente essencial da profissionalização docente, devendo integrar-se ao cotidiano da escola e considerar os diferentes saberes e a experiência docente; e XII - a compreensão dos profissionais do magistério como agentes formativos de cultura e, como tal, da necessidade de seu acesso permanente a informações, vivência e atualização culturais. (BRASIL, 2009a).

Dessa forma, algumas ações têm sido feitas, como por exemplo, o Pró-

Letramento, que é um programa de formação continuada para os professores

das séries iniciais da educação básica, visando à melhoria da qualidade de

aprendizagem da leitura/escrita e da matemática, em parceria com as

universidades.

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Sobre os cursos de formação de professores, revelou-se que a maioria

dos docentes acreditam que as universidades ou as instituições de educação

superior são os agentes mais apropriados para oferecer a formação docente,

obtendo-se 97, 6% em relação à 2,4% de outro tipo de instituição. Os

professores também consideram as instituições de ensino superior como as

mais adequadas para executarem os cursos de formação continuada. De

acordo com Gatti e Barreto (2009), a formação continuada a princípio foi

oferecida com o propósito de atualização e aprofundamento de conhecimentos

face aos avanços, as mudanças tecnológicas, os rearranjos nos processos

produtivos e suas repercussões sociais. Com vista aos problemas cada vez

mais evidentes nos cursos de formação inicial de professores,

a formação continuada como formação profissional foi se deslocando também para uma concepção de formação compensatória destinada a preencher lacunas da formação inicial. (GATTI; BARRETO, 2009, p.200).

Embora não se possa estabelecer uma relação de causa e efeito entre a

constatação da UNESCO e essa iniciativa do MEC, o fato é que foi criado um

Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) pela

CAPES/MEC em janeiro de 2008. Tal programa tem por finalidade a de

valorizar o magistério e dar suporte aos estudantes de licenciatura, das

instituições públicas, de educação superior bem como as instituições de ensino

superior reconhecidas como comunitárias. Essas bolsas são voltadas ao

aprimoramento da formação docente e visam elevar o padrão de qualidade da

educação básica. (BRASIL, 2010b).

Um dos objetivos do PIBID é a elevação da qualidade das ações acadêmicas voltadas à formação inicial de professores nos cursos de licenciatura das instituições de educação superior. Assim como a inserção dos licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de educação, o que promove a integração entre educação superior e educação básica. O programa visa também proporcionar aos futuros professores participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas docentes de caráter inovador e interdisciplinar e que busquem a superação de problemas identificados no processo de ensino-aprendizagem. Além de incentivar as escolas públicas de educação básica a tornarem-se protagonistas nos processos formativos dos estudantes das licenciaturas, mobilizando seus professores como co-formadores dos futuros professores. (BRASIL, 2010b).

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Para participar é necessário que as Instituições Federais de Ensino

Superior (IFES) e Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs)

possuam curso de licenciatura com a avaliação satisfatória no Sistema

Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES). Ainda é necessário

que as IFES tenham firmado convênio ou acordo de cooperação com as redes

de educação básica pública dos Municípios, Estados ou do Distrito federal,

prevendo a participação dos bolsistas do PIBID nas atividades de ensino-

aprendizagem desenvolvidas na escola pública. Quanto às bolsas, são

oferecidas quatro modalidades de concessão, sendo para:

bolsistas de iniciação à docência; docência, para os estudantes do curso de licenciatura plena; bolsistas de supervisão, para professores da escolas públicas estaduais ou municipais; e bolsistas coordenadores institucionais de projetos e coordenadores de área de conhecimento, para docentes das instituições municipais públicas e comunitárias, sem fins econômicos de educação superior.(BRASIL, 2010b).

Este Programa tem a proposta de levar o aluno das licenciaturas a

vivenciar o estágio dentro das salas de aula das escolas da rede pública,

fazendo com que este se comprometa com o exercício do magistério depois de

formado. “Os alunos de licenciatura têm direito a bolsa de R$350,00 e os

supervisores, que são os professores das disciplinas nas escolas onde os

estudantes universitários vão estagiar, recebem bolsa de R$600,00 por mês.”

(BRASIL, 2010b). Já os coordenadores de áreas de conhecimento, vinculados

à universidade recebem uma bolsa mensal de R$1.200,00.

A intenção do programa é unir as secretarias estaduais e municipais de educação e as universidades públicas, a favor da melhoria do ensino nas escolas públicas em que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) esteja abaixo da média nacional, de 4,4. Entre as propostas do Pibid está o incentivo à carreira do magistério nas áreas da educação básica com maior carência de professores com formação específica: ciência e matemática de quinta a oitava séries do ensino fundamental e física, química, biologia e matemática para o ensino médio. (BRASIL, 2010b).

Dessa forma, para analisar e acompanhar este projeto do PIBID as

instituições participantes deverão encaminhar relatórios sobre o andamento

das atividades e resultados obtidos com a periodicidade de um ano, além de

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informar ao MEC e à Capes informações sempre que solicitadas. (BRASIL,

2010b).

Contudo, o PIBID é uma proposta que se assemelha ao PL do senador

MM que visa à implantação de uma RP, porém a proposta do PIBID é conciliar

a formação inicial, com o estágio supervisionado dentro das escolas da rede

pública, dando suporte metodológico e de práticas docentes, valorizando o

espaço da escola pública como campo de experiência e de construção do

conhecimento.

Dessa forma, envolvendo instituição superior e instituição de educação

básica e concedendo bolsas acredita-se que essa integração apóie a

valorização do magistério e a melhoria da qualidade do ensino como um todo.

No próximo capítulo iremos analisar as falas dos entrevistados sobre o

que pensam a respeito do curso de Pedagogia de acordo com suas diretrizes,

o estágio supervisionado, a responsabilidade atribuída ao professor pelo

Senador MM sobre o fracasso escolar, e finalmente, sobre a RP.

Todos os tópicos até aqui tiveram a intenção de situar em que âmbito se

encontra o PL, tendo em vista que a formação dos professores para atuarem

na Educação Básica passou por vários momentos históricos e constitucionais.

Daí, entende-se que o PL articula com as Diretrizes Curriculares do curso de

Pedagogia, com as possibilidades de formação docente, com o estágio

supervisionado e com o que se espera desse educador.

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4 As percepções das pesquisadoras, coordenadoras, professoras e

alunos sobre o Projeto de Lei e sobre o curso de Pedagogia

Este capítulo traz para o leitor as análises feitas das percepções dos

atores que participaram desse estudo. As pesquisadoras, coordenadoras e

professoras participaram, conforme já foi dito, de uma entrevista semi-

estrutura, a qual seguiu um roteiro42, apresentado no apêndice A. Nos

subcapítulos 4.1 ao 4.4 constam as considerações e os relatos de cada

participante a respeito das Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de

Pedagogia; o estágio; a culpabilização dada aos professores a respeito do

fracasso escolar e sobre o PL de uma RP. O subcapítulo 4.5 foi destinado à

analise das percepções dos alunos de acordo com o questionário aplicado.

Preocupou-se em investigar o que pensam a respeito da RP, das aulas teóricas

e práticas, bem como a satisfação com o curso.

Os resultados revelaram que a maioria dos atores sentem que o estágio

não é de fato supervisionado como deveria acontecer, pois as instituições de

ensino superior e as escolas não estão interligadas num mesmo processo de

aquisição do conhecimento. Os alunos se sentem prejudicados e inseguros por

acreditar que são poucas as horas destinas à prática educativa, por se

sentirem muito desamparados e por não terem uma boa orientação nesse

momento da aprendizagem. Algumas pesquisadoras, coordenadoras e

professoras norteiam um pensamento de que a RP poderia ser uma boa

iniciativa, mas se contudo, o aluno ainda estivesse na graduação, porque

depois que o mesmo sái da instituição, não há quem o ampare. Porém, outras

acreditam que a RP é um projeto descabido, pois os problemas que norteiam a

educação vão além da formação dos professores. Diante disso, acreditam que

é inviável a instauração desse PL nos moldes em que se encontra,

perpetuando que é necessário um estudo mais detalhado sobre o estágio dos

cursos de licenciatura. Veja a seguir mais considerações sobre esse assunto.

42

Apêndice A: ir à pag.183.

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4.1 Sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia-

Licenciatura

Depoimento das Pesquisadoras

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia

estabelecem normas e funções que instituem o currículo e o estágio de forma a

contemplar uma formação técnica e científica dos educadores. Conforme

depoimentos das pesquisadoras P1 e P3, as Diretrizes têm como prioridade

definir a questão da formação básica dos professores nos cursos de

Pedagogia.

Para Severino (2003) desde a década de 70 do século XX, “A

mobilização da comunidade educacional do Brasil com vistas ao estudo,

análise, crítica e encaminhamento de propostas de reformulação dos cursos de

professores dos cursos de formação”, vem se dinamizando. (SEVERINO 2003,

p.140). Diante disso, a pesquisadora P1 reforça, em este argumento com o seu

depoimento sobre a institucionalização das Diretrizes:

Para falar das Diretrizes a gente teria que retomar uma luta histórica do curso de Pedagogia, do movimento dos educadores e desde que o final da década de 70 vem pautando, que o curso de Pedagogia era o espaço da formação de professores. Ele adquiriu um caráter de bacharelado para a formação das habilitações, juntamente com a 4024, 5692 (sic) e o Parecer 262 e 69. E quando o Professor Valnir Chagas, no Conselho Federal de Educação, faz um Parecer sobre o curso de Pedagogia deslocando para a pós-graduação a formação das habilitações e situando no curso de Pedagogia exclusivamente, a formação de professores... Naquele momento nós educadores nos mobilizamos porque a intenção do Parecer (...) era fazer do curso de Pedagogia quase um curso Normal Superior, ou seja, repetir o que o curso Normal de nível médio vinha desenvolvendo na formação de professores. E na nossa compreensão e que se mantém ate hoje, o curso de Pedagogia é um espaço de produção de conhecimento sobre a área da Educação. Sobre a escola, sobre o ensino sobre os processos de ensino-aprendizagem, sobre os processos de produção da educação, da produção do pensamento pedagógico, enfim... ele não é um curso que no nosso ponto de vista, se assemelha...né... a outros de licenciatura que tem o conteúdo pedagógico muito reduzido. Então, nesse embate, aparece a discussão que ao curso de Pedagogia cabe a formação do educador, ele ganha força...né... E a concepção de que a docência é a base da formação ela se dá nesse contexto. Ou seja, o curso de Pedagogia ele forma o professor, mas ele forma para outras dimensões também, da compreensão do campo pedagógico. Compreensão de que os fundamentos da educação tem um peso forte nos cursos de Pedagogia, né...da história da educação, da sociologia da educação, da psicologia, da filosofia, da antropologia, e da ciência que lhe dá o suporte. No nosso

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ponto de vista ela é essencial, porque o estudante que se forma ali como educador tem um compreensão ampla do complexo fenômeno que é o processo de ensino-aprendizagem. Para que ele não fique reduzido na sua dimensão técnica. Mas que ele tenha uma dimensão técnica, científica e uma formação mais geral na compreensão de determinantes dos fatos históricos dos processos de escolarização e do processo de ensino-aprendizagem. (Pesquisadora P1). (...) os cursos de Pedagogia, com as novas diretrizes curriculares deve ter como eixo a formação dos professores, sem desprezar uma cultura geral, sem desprezar a possibilidade de formar em gestão. A idéia de se formar em gestão é importante para o professor porque ele vai ter a gestão da sala de aula, futuramente ele poderá ser um coordenador pedagógico, um supervisor de ensino, terá que fazer algumas complementações de formação também, claro, mas eu não excluo isso da formação básica. Só que o eixo formador, pelas diretrizes, é formar um profissional professor, de primeira a quarta e de educação infantil. E isso exige o quê? Que ele saiba fazer, que ele alie a informação de fundamentos com a prática, que ele saiba o que fazer com crianças, agora até de creche, de 0 a 6 anos, criança de 0 a 3, de 3 a 5, de 3 a 6, de 6 a 10. Que ele volte a conhecer, por exemplo, métodos de alfabetização, que tem os seus fundamentos em psicologia cognitiva, em teoria de comunicação, em filosofia da educacional, porque todo método tem uma filosofia embutida. E isso é conhecer psicologia do desenvolvimento, porque a gente precisa saber quem é aquela criança que está ali. (Pesquisadora P3)

Encontramos, nesses relatos, o que Severino (2003) diz sobre o

processo educacional. Ele acredita que deve ser intencional e é indispensável:

“a presença da filosofia na formação e na atuação do educador, já que sua prática e preparação precisam ser guiadas por uma intenção significadora a ser apropriada pela atividade subjetiva do conhecimento.” (SEVERINO, 2003, p.140).

De acordo com as pesquisadoras P1 e P3, as políticas educacionais que

norteiam a formação do professor, bem como definem as diretrizes do curso de

Pedagogia sempre tiveram interferências ideológicas que, de certa forma,

delimitam o campo de formação. Sendo assim, P1 declara que as diretrizes de

outros cursos não tiveram tantas participações no seu desenvolvimento, ou na

sua elaboração quanto a Resolução CNE/CP n.1 de 15 de maio de 2006. De

acordo com seus estudos, P1 acredita que, na área da educação, a formação

qualificada de professores é estratégica para o desenvolvimento do capital. Já,

para a pesquisadora P3, a educação necessitaria de uma política educacional

articulada e específica que não desamparasse a formação do professor e que,

além disso, desse uma base estrutural e coerente aos professores e alunos da

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escola pública, pois eles são os primeiros a sentir as conseqüências das

mudanças. Diante disso:

(...) se você olhar para qualquer outra área ou campo de formação, nós vamos ver que a interferência (...), a possibilidade que diferentes profissionais têm de se desenvolverem e intervirem na organização curricular do seu curso, ela é muito pequena comparando com aquelas possibilidades que hoje ta posta no campo da educação. Por outro lado, (...) nós não tivemos nas outras diretrizes uma interferência tão forte, onde o Estado, (...) os diferentes Ministérios, do Ministério da Saúde ao próprio Ministério da Educação como no âmbito das Diretrizes da Pedagogia, da formação. Tudo que é formação de professores ela é estratégica para o desenvolvimento do capital. Ele precisa, para poder inclusive se desenvolver e aprofundar o seu processo de acumulação de professores bem formados, que possam formar novos quadros que vão reproduzir o próprio desenvolvimento do capitalismo, ou seja, auxiliar nesse processo de desenvolvimento. (...) nenhuma outra área (sic) foi questionada tanto quanto das Diretrizes para a Formação de Professores da Educação Básica em 2002, quanto da Pedagogia, que acabou sendo só em 2005, 2006 a redação final. Então, eu acho que tem esse ponto, né? A formação de professores tem um outro papel na sociedade. Ela tem um papel estratégico que as outras áreas não necessariamente desempenham. (Pesquisadora P1). (...) a educação precisa ter um pensamento especifico, precisaria ter um financiamento especifico e precisaria ter uma política educacional articulada e especifica. Nós tropeçamos muito porque não temos uma política articulada entre União, Estados e Municípios. Porque existem interferências de ideologias partidárias que acabam convergindo apenas nas brigas interpessoais e não em brigas ideológicas efetivas. Você junta as duas coisas, divergências pessoais com diferenças ideológicas e você não consegue um consenso na educação. E você joga rios de dinheiro fora. Porque projetos iniciados e que estavam sendo bem sucedidos são simplesmente interrompidos porque são do governo anterior, porque entra um novo grupo, desculpe, de “iluminados” que acha que sabe mais...e não é por ai! E a escola pública paga um preço muito alto por isso. A escola particular não, porque ela tem dono e ela segue uma trajetória que é a de passar conhecimentos básicos necessários a uma participação cidadã. Ela pode fazer ajustes, se adaptar a novas tecnologias, metodologias, mas isso é feito com muito cuidado e devagar, e feito localmente. Os projetos na escola pública não. Eles atingem milhões de alunos. E o professor que está na escola pública, que é sujeito dessas programações, ele acaba ficando desamparado porque uma hora é para alfabetizar de um jeito, outra hora não é mais, uma hora é para ele usar o livro, outra hora não é para usar o livro, uma hora é para fazer isso, outra hora para fazer aquilo. Ele fica um tanto desamparado. Ele procura um caminho porque a escola caminha, mas ele está desamparado. Então, nós temos uma série de fatores que interferem especialmente na escola pública e que acaba tendo um efeito não muito positivo em relação à aprendizagem e desempenho dos alunos e das escolas. O professor é um entre N elementos, como a gente vê. Porque se as políticas fossem um pouco mais coerentes e se não houvesse tanta interrupção nessas políticas, o professor se formaria melhor na sua experiência, ele acumularia experiência. Desse jeito as rupturas são muito grandes. (Pesquisadora P3).

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Como de fato, os alunos das escolas públicas, bem como os professores

dessas escolas são os primeiros a sentirem as mudanças provenientes das

alterações no campo educacional, pois, sob o domínio do Governo, ficam a

mercê das políticas e programas educacionais, muita vezes desarticulados. De

acordo com Esteve (1987), o mal-estar docente é uma expressão que resume

o conjunto de reações dos professores como grupo profissional desajustado

devido às mudanças que ocorrem na sociedade. Para ele, os professores

enfrentam situações “de mudanças que os obrigam a fazer mal o seu trabalho,

tendo de suportar a crítica generalizada, que, sem analisar as circunstancias,

os considera como responsáveis imediatos pelas falhas do sistema de ensino.”

(ESTEVE, 1998, p.97).

Isso determina um aumento das exigências em relação ao professor, o

que leva a sociedade a acreditar que ele é o principal responsável pelas falhas

da aprendizagem, pois certamente, esse docente não desenvolveu seu papel

como deveria. Sendo assim, se o aluno não aprende a ler ou a escrever, a

atenção volta-se para o responsável: o professor – e não para o conjunto de

contradições impostas por essas mudanças, como por exemplo, o nível

socioeconômico e o acesso a cultura.

Depoimento das Coordenadoras

Ao pesquisarmos o curso de Pedagogia nas universidades, vimos que

todas estão dentro das exigências curriculares impostas pelas Diretrizes.

Deparamo-nos com uma mudança recente no currículo dessas instituições, que

visou cumprir as determinações dentro do prazo previsto, ou seja, de 2 anos

após a promulgação dessas diretrizes, onde a docência é o centro dessas

preocupações. Diante das entrevistas realizadas com as coordenadoras de

cada instituição, percebeu-se que existe uma preocupação maior com a

formação do professor da Educação Infantil e da Educação Básica, após as

diretrizes. Os seguintes dados sobre as mudanças curriculares ao longo do

tempo. O currículo agora com uma única base, na opinião das Coordenadoras

deve ser sempre dinâmico e fazer com que os envolvidos façam um movimento

de reflexão sobre o trabalho docente, sobre o trabalho pedagógico e se houver

algum aprofundamento ou ênfase deverá acontecer dentro do curso.

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O currículo de Pedagogia aqui na ALFA sempre teve uma

peculiaridade que era a preocupação com a formação do professor

da educação infantil e das séries iniciais. Ou seja, se você analisar o

currículo, antes desse currículo novo e das diretrizes, você vai achar

lá que desde os anos 80 tem essa preocupação de formar também o

professor. Preparar o aluno para que ele assumisse turmas,

sobretudo, no ensino fundamental. E isso não estava determinado

ainda em nível nacional. Então, quando as diretrizes colocaram esse

desafio, explicitaram e normatizaram essa questão, de que o

professor formado em nível superior para atuar nas séries iniciais da

educação infantil era uma competência do curso de Pedagogia não

foi uma grande surpresa para a ALFA. Então, a ALFA vinha mais ou

menos nesse caminho, de ter uma atenção para a docência. Agora,

é claro que quando as diretrizes explicitam essa questão, a docência

é a base da formação de qualquer outra atuação do pedagogo,

quando você vai olhar a distribuição das disciplinas, a quantidade de

carga horária definida para uma coisa ou outra, você verifica que a

gente precisava fazer ajustes, isso não estava assegurado, apesar

de ser uma preocupação, ainda não era a ênfase do curso. Então,

essa nova versão curricular foi uma versão para atender essa

exigência das diretrizes curriculares nacionais, dar conta da

formação do professor dos anos iniciais do ensino fundamental e da

educação infantil. (Coordenadora Alfa).

Aqui na BETA, nós temos dois currículos acontecendo. Um que

começou 1998, que tem as habilitações, ele habilita para a docência

nas séries iniciais do ensino fundamental e para a gestão de

processos educativos onde quer que eles aconteçam, supervisão,

inspeção, administração, planejamento, processos educativos. Então

nós temos esse currículo que está a partir do quinto período. Então,

quinto, sexto, sétimo e oitavo. E nós temos um que começou no ano

passado, 2008, que já atende o formato, as orientações das

diretrizes curriculares de 2006, que está no 4° período e que a

ênfase é a informação do docente para atuar na educação infantil e

nas séries iniciais do ensino fundamental. Então, quer dizer, nós

temos ai uma certa diferença entre os currículos e que de certa

forma se faz necessário que a gente analise, discuta, se há

realmente uma perda nessa formação, se houve um ganho. Tanto

que nós hoje da BETA nos encontramos nesse processo de

discussão dos currículos. Um ciclo de debates que nós iniciamos no

ano passado. Desde a comissão de formação do currículo, e ai

quando o currículo foi implantado, e agora a gente vem discutindo,

por exemplo, o que é o trabalho pedagógico e trabalho docente, a

concepção de trabalho pedagógico e trabalho docente, o que nós

queremos, formar um profissional que desenvolva um trabalho

pedagógico ou que apenas desenvolva um trabalho docente? Qual é

a base de formação da Pedagogia? É a docência ou a Pedagogia é

a base para a docência? Nós estamos nesse estágio, porque o

currículo é dinâmico, ele está em movimento. Dentro das discussões

pode ser que a gente possa fazer algum ajuste no currículo. E ai nós

temos um movimento que é positivo que é quando a gente retorna às

diretrizes. As diretrizes também nos instigaram para esse movimento

de reflexão, de repensar essa estrutura. (Coordenadora Beta).

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O curso de Pedagogia era dividido em três ênfases. Tinha a ênfase

em ensino religioso, em necessidades educacionais especiais e a

ênfase em gestão e docência. Só que o MEC, depois das Diretrizes

Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia, instituiu que não

formam cursos separados, tudo deve ser um curso só. Se tiver

algum aprofundamento, alguma especialização, alguma coisa que o

curso queira oferecer, é dentro do curso. Então, nesse novo modelo

as três ênfases viraram aprofundamentos e o curso ficou um só.

(Coordenadora Gamma).

Embora as Coordenadoras falem em currículo, salientamos que a

proposta aqui é identificar os processos de introdução das atividades práticas

da docência, ou seja, a parte em que os alunos executam as atividades

práticas dentro do contexto escolar. Severino (2003) afirma que

[...] a formação de profissionais da educação não diz respeito apenas a formação de professores. A docência em ambientes escolares não exaure o campo de atuação do profissional, pois educação não é sinônimo de ensino e sim uma intervenção mais abrangente, alcançando outros espaços da vida da sociedade. (SEVERINO, 2003, p.141).

No tocante ao que a Coordenadora Beta aponta em sua fala sobre as

práticas educativas e sobre a prática docente, Libâneo e Pimenta (2002)

também concordam com Severino (2003), ao afirmarem que as práticas

educativas ocorrem em muitas instâncias formais, não-formais e informais. Não

se pode afirmar que o trabalho pedagógico se reduz ao trabalho docente nas

escolas. Sendo assim, a Coordenadora da Universidade Beta acredita que saber

identificar o papel do Pedagogo, sua identidade e suas competências, veio a

partir das Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia, que de

certa forma vieram para

[...] clarear mesmo a formação do profissional da Pedagogia. Eu digo clarear porque já vem de muito tempo, muitos anos, essa discussão: que profissional que é esse, quais seriam as atribuições, quais seriam as funções e o que iria delinear a formação desse profissional. (Coordenadora Beta).

E sobre o campo de atuação desse profissional, ela afirma que não se

deve pensar no Pedagogo apenas no espaço escolar:

[...] o profissional da Pedagogia, hoje ele está sendo muito requisitado para atuar em ambientes fora da sala de aula, extra-muros da escola.

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Que seja em ONGs, que seja em projetos sociais, empresas, ambiente empresarial, onde quer que o processo educativo acontece. Daí, nós temos as diretrizes que propõem licenciatura, mas numa formação de profissional que atue, preferencialmente, em educação infantil e ensino fundamental. Mas, temos também o Artigo 14 que nos dá abertura para que ele possa receber uma formação onde ele possa atuar em outros ambientes ou então que essa formação venha por meio da própria graduação lato senso. Contudo, o quê que a gente percebe? Que a interpretação das diretrizes tende muito mais, preferencialmente, a essa formação do profissional em educação infantil para atuar na docência da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental do que propriamente atuar na gestão de processos educativos, onde quer que eles aconteçam, porque ela dá essa ênfase para a atuação no ambiente escolar. (Coordenadora Beta)

Libâneo e Garrido (2002) acreditam que “a ação pedagógica não se

resume a ações docentes, de modo que, se todo trabalho docente é trabalho

pedagógico, nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente.” (LIBÂNEO;

GARRIDO; 2002. p.30). Porém afirmam que a ação pedagógica e a ação

docente são termos inter-relacionados, mas que, são conceitualmente distintos.

De acordo com os autores, “a Pedagogia é mais ampla que a docência.”

(LIBÂNEO; GARRIDO. 2002. p.30).

Contudo, as Diretrizes prevêem que as atividades de práticas sejam

desenvolvidas concomitantemente com as aulas teóricas, ou seja, ao longo do

curso, para que o aluno de Pedagogia tenha assegurado a experiência de

exercício profissional. Já, no Parecer CNE/CP 28/2001, apontava-se a ideia de

ser fundamental ter tempo e espaço para a prática, como componente

curricular, desde o início do curso e que haja uma supervisão da instituição

formadora como forma de apoio até mesmo à vista de uma avaliação de

qualidade. (BRASIL, 2001b p.9). Dessa forma, as diretrizes enfatizam a

formação do Pedagogo, principalmente, no âmbito escolar, voltado para a sala

de aula.

Depoimento das Professoras

As professoras entrevistadas mostraram-se positivamente em relação

aos avanços dados a partir das Diretrizes, porém todas apontam que, em

algum momento, exista um ponto o qual deixe a desejar. Conforme as opiniões,

a Professora Alfa e Gamma entendem que a sala de aula é o local de

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permanência do professor, entendendo que os curso de Pedagogia de suas

instituições estão bem estruturados. A Professora Alfa acredita que, antes das

diretrizes, havia uma lacuna no sentido que o curso de Pedagogia não era

entendido como um curso de Licenciatura, e que as Diretrizes compreendem e

quer fazer compreender que a formação do Pedagogo não se limita a dizer que

o trabalho docente não é só sala de aula. Já a Professora Beta, acredita que,

com as Diretrizes, o profissional ficou com um sentimento de desvalorização,

por entender que a Educação Básica é menos prestigiada porque forma

apenas para o Magistério. Porém acredita que a proposta pedagógica e

curricular das instituições determinam e muito, o olhar que o pedagogo terá ao

longo da sua formação. Sendo assim, os depoimentos mostraram o

entendimento de cada um sobre as Diretrizes e todas em algum momento

revelaram uma certa preocupação com a Gestão:

(...) eu acho que essas diretrizes avançaram em relação ao que a gente tinha antigamente, ainda que, é claro, nós tenhamos problemas com ela. Um dos problemas que eu vejo ser apontado e que eu concordo é que a ênfase do trabalho docente saiu muito da sala de aula, como se ensinar não fosse tão importante, quer dizer, as diretrizes acabam pecando por um extremo. Antes havia uma lacuna nesse sentido. Um extremo de dizer que a docência não é só sala de aula; é importante participar da gestão, dos outros espaços da educação, dos outros espaços da escola, planejamento, acompanhamento, relação com a comunidade, com os pais e tal. E ai acaba que a ênfase no ensino fica menor. Essa tem sido uma critica recorrente, com a qual eu concordo. Mas, eu acho que essas diretrizes avançaram muito. Primeiro em colocar o curso de Pedagogia como um curso de licenciatura, é um curso que tem sua base na docência. Essa eu acho que foi durante muitos anos uma luta de um setor dentro da educação, que eu julgava majoritário, um setor que faz a defesa da educação pública, da escola pública, da qualidade da educação pública socialmente referenciada e que a gente compreende (a gente porque eu me sinto uma militante desse setor), a gente compreende que o curso de Pedagogia só faz sentido se ele for um curso que forma esse docente que vai atuar naquela educação mais elementar, naquela educação infantil, no ensino fundamental. (...) Então, do meu ponto de vista essas diretrizes têm uma compreensão de que o trabalho docente não é só sala de aula, felizmente, de que o trabalho docente se estende por espaços muito mais amplos do que a sala de aula e, portanto, que a atividade “ensinar” tem mais do que a atividade de “ensino” no trabalho docente. (Professora Alfa). Considero que as Novas Diretrizes Curriculares despertaram no estudante de Pedagogia e, até mesmo, nos demais profissionais da área um sentimento de desvalorização, pelo fato de ele habilitar somente para o magistério. Eu, particularmente, não penso da mesma forma. Mesmo o curso não habilitando para a gestão dos processos pedagógicos, ele pode qualificar para essa função, lógico

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que depende da Proposta Pedagógica de cada Curso. (Professora Beta) O curso de Pedagogia aqui da GAMMA, o qual eu leciono, ele ta muito bem estruturado, no meu entendimento, ele atende as Diretrizes Curriculares de 2006. Ele é um curso que tem um nível de dificuldade muito grande, porque nós temos do 1º. ao 5º. período que é o núcleo básico e depois, nos temos mais três períodos que são de aprofundamentos. E hoje a Universidade oferece o curso de Pedagogia com três aprofundamentos: (...) em Educação Infantil, Gestão e Docência; o aprofundamento em Ensino Religioso, que forma o professor para trabalhar com o ensino religioso nas escolas; e o aprofundamento em necessidades educacionais especiais, que vai trabalhar com essa proposta de inclusão. (Professora Gamma).

De acordo com Cury (2005), para se ter uma qualidade na educação é

necessário o exercício efetivo da cidadania e os pilares para se atingir isso é

ter uma gestão dos sistemas de ensino e das escolas públicas pautadas na

democracia. Na fala da Professora Alfa revelou-se que para ela, as diretrizes

apontam para a docência não só como o “estar dentro da sala de aula” e que a

ênfase no ensino fica comprometida, mas que isso também pode ser positivo,

pois dá ao professor oportunidades de se viver outros espaços além da

docência. Já a Professora Beta acredita que as diretrizes proporcionaram um

sentimento de desvalorização por só habilitar o Pedagogo para o magistério,

mas que mesmo assim, ele pode se qualificar para outras funções dependendo

da Proposta Pedagógica de cada curso. Dessa forma, entendemos o que Cury

(2005) nos revela em seus estudos, ser o grande desafio para se obter a

democracia pela cidadania: a autonomia. É necessário que cada um faça a sua

parte, seja ele professor, coordenador ou aluno.

Uma educação emancipadora é condição essencial para a gestão democrática. Escolas e cidadãos privados da autonomia não terão condições de exercer uma gestão democrática, de educar para a cidadania. A abordagem da gestão do ensino público passa pela sala de aula, pelo projeto político pedagógico, pela autonomia da escola. (CURY, 2005, p.12).

Sobre a participação dos professores na elaboração de suas diretrizes

P1, ressalta:

Uma outra questão que eu acho que vale a pena também chamar a atenção é o da compreensão do papel da educação para o Estado e para o desenvolvimento do capitalismo nas suas bases atuais. Os professores tem papel secundário e os próprios educadores também,

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nessa possibilidade de intervir nos rumos do seu trabalho, (...) na determinação de suas formas de formação, inclusive. Sendo que nas outras áreas se tem muito mais liberdade. As pessoas definem um pouco mais como elas querem ser formadas, na educação isso é menos possível. (Pesquisadora P1).

Sendo assim, acreditamos que esta pesquisa sobre um PL tem cumprido

o seu papel de debater e analisar como professores, coordenadores,

pesquisadores e alunos pensam a respeito dele, caso fosse aprovado. Pois

aqui podemos criar um vértice para o debate e para novos estudos.

Não obstante, a pesquisadora P1 enfatiza que o “ponto modal das

diretrizes é o tempo destinado ao estágio de ação”, pois a prática é o momento

de intervenção profissional desses alunos. (Pesquisadora P1). De acordo com

Cavaco (1998), o valor da apropriação dos saberes profissionais através da

experiência sempre teve seu mérito. Ela diz que: “aprende-se com as práticas

do trabalho, interagindo com os outros, enfrentando situações, resolvendo

problemas, refletindo as dificuldades e os êxitos, avaliando e reajustando as

formas de ver e proceder.” (CAVACO, 1998, p. 162). Isso reafirma o que

Libâneo (2001) e Severino (2003) e Nóvoa (2001) refletem sobre a prática

educativa, sobre os saberes dos professores, ou seja, eles acreditam que a

ação docente deve ser uma prática refletida e articulada entre os saberes

técnicos e científicos aliados a certa competência criativa, ética e política.

4.2 O Estágio

As horas de estágio destinadas ao aprimoramento das capacidades

e das habilidades necessárias para ser um professor da Educação Básica,

ou da Educação Infantil estão determinadas por essas Diretrizes. De

acordo com Nóvoa (2001), o estágio é o momento em que se deve alinhar

a prática com a reflexão.

O potencial formador de cada um depende das ponderações feitas com os colegas, com quem está sendo observado e com o supervisor. Sem isso, a observação transforma-se em exercício mecânico, sem interesse. É essencial estudar os processos de organização do trabalho escolar, da gestão das turmas e da sala de

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aula, bem como as formas de utilização dos métodos de ensino e a capacidade de resposta às situações inesperadas. As competências para realizar essa análise são individuais e coletivas. A pertinência do estágio reside na compreensão da contribuição específica dos professores e na identificação da cultura profissional docente. (NÓVOA, 2001).

Libâneo (2001) acredita que o professor, ao tematizar a sua prática,

experimenta uma nova reflexão das situações e novas formas de trabalho,

“fazendo com que sua prática vire conteúdo de reflexão, ele vai ampliando

a consciência sobre a sua própria prática”. (LIBÂNEO, 2001, p.127).

Depoimento das Pesquisadoras sobre o estágio

Sobre o estágio, P1 acredita que outros cursos das áreas de saúde

ou da área de exatas possuem duas ou três vezes mais a quantidade de

horas dedicadas à vivencia prática. Já, para P3, são raras as instituições

que acompanham o estágio de forma responsável, não tendo assim um

efetivo aproveitamento desse importante momento dentro das salas de

aulas.

Se você olhar para qualquer área prática, as medicinas, as engenharias, as enfermagens...são áreas profissionais práticas, de intervenção profissional. Elas tem muito mais que 300 horas de práticas de estágio. Elas estão no campo das 900, 1000, 1200 horas. Um tempo de formação inclusive muito superior ao que hoje esta proposto ao curso de Pedagogia. Então, eu acho que esse é um campo ainda que a gente precisaria mexer nas diretrizes. Precisaríamos olhar melhor para esse campo dos estágios... principalmente dos estágios, né. (Pesquisadora P1). [...] O que eu vejo é que o estágio supervisionado, na verdade, freqüentemente, não é supervisionado e não é prático. O sujeito vai lá para observar a aula do professor. Então, quando eu penso no estágio, o estágio supervisionado deveria ser essa possibilidade de concretizar a teoria com a prática (...). O aluno no estágio vai trabalhando passo a passo ao que ele esta aprendendo em teoria, (...) se não for a prática durante o curso, que façam simulações, estudos de caso. Tem muitas maneiras de você simular a prática, só não pode ficar só na simulação. Mas você pode de início já começar com uma simulação da prática. E assim que puder botar o cara lá. Primeiro para observar e depois pra ele...dar uma aula inteira... fazer um plano de aula. Ele vai começando paulatinamente, porque você também não pode botar o sujeito completamente “cru” para dar aula, para não prejudicar as pobres das crianças que vai aprender tudo errado. Mas você pode ir preparando. Preparar para o magistério não é só botar para dar aula. Tem muito outras coisas, como fazer um

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plano de aula, uma prova... Mas o importante é que a prática comece a ser inserida o mais rápido possível. (Pesquisadora P2). As horas das práticas de ensino nem sempre são dedicadas às práticas. Na maioria das vezes elas repetem teorias de fundamentos e não se discute as práticas. Os estágios, as horas de estagio, tirando raríssimas instituições, cinco em 71 que eu pesquisei, encontrei um projeto de estágio, com supervisor de estágio, com convênio com escolas, um acompanhamento mais bem definido. As demais não especificam a forma de estágio nem a responsabilidade da instituição sobre esses estágios. E, considerando que a maioria é curso noturno, e considerando uma outra pesquisa que eu acabei de fazer para a Unesco, que 40% desse aluno da Pedagogia trabalha 40 horas por semana, nós ficamos nos perguntando: como que ele tem condição de fazer estagio se as escolas não funcionam aos sábados? Esse estágio, ele é feito de uma maneira escamoteada, o aluno provavelmente obtém a assinatura de um professor, de um diretor, de que ele esteve na escola, mas o estágio não é orientado, não é dirigido. (Pesquisadora P3).

Se pensarmos no estágio como componente obrigatório e com carga

horária definida, Gatti e Nunes (2009) observaram que, nos projetos e ementas

dos cursos analisados, não existe clareza sobre como são realizados,

supervisionados e acompanhados. Não há ainda clareza quanto à sua validade

ou referência, bem como não estão claros, os objetivos, “as exigências, formas

de validação e documentação, acompanhamento, convênios e escolas das

redes.” (GATTI; NUNES, 2009, p.21).

No Parecer CNE/CP n. 28/2001 tem-se que o estágio é:

[...] um momento de formação profissional do formando seja pelo exercício direto in loco, seja pela presença participativa em ambientes próprios de atividades daquela área profissional, sob a responsabilidade de um profissional já habilitado. Ele não é uma atividade facultativa sendo uma das condições para a obtenção da respectiva licença. Não se trata de uma atividade avulsa que angarie recursos para a sobrevivência do estudante ou que se aproveite dele como mão de obra barata e disfarçada. Ele é necessário como momento de preparação próxima em uma unidade de ensino. (BRASIL, 2001b).

Isso pode demonstrar que, ou são considerados totalmente à parte do

“currículo, o que é um problema, na medida que devem integrar-se com as

disciplinas formativas e com aspectos da educação e da docência, ou, sua

realização é considerada como aspecto meramente formal.” (GATTI; NUNES,

2009, p.21).

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Espera-se, contudo, que a prática comece o mais rápido possível para

que, dessa forma, o futuro professor supere suas inseguranças e enfrente as

dificuldades encontradas na escola. O campo do estágio é o momento para se

viver essas descobertas, é o período inicial da sua carreira profissional e dela o

aluno deverá se situar para se projetar futuramente.

Depoimento das Coordenadoras sobre o estágio

Nas Universidades ALFA e BETA, o curso de Pedagogia possui dois

currículos que contemplam dois modelos de formação. Isso porque com a

introdução das Diretrizes, os cursos que estavam em andamento, ainda não

haviam chegado ao seu término. Portanto, a Coordenadora Alfa e a

Coordenadora Beta, ao falarem sobre as horas destinadas ao estágio

contemplam os seguintes apontamentos:

Em tese se consegue articular a teoria com a prática. A partir das diretrizes houve sim uma mudança positiva com a definição do estágio. Mas ainda estamos em transformação do currículo antigo para o currículo novo. Então, o que nós temos são turmas que começaram a fazer o primeiro estágio do currículo novo, que é o estágio de introdução ao campo educacional e que ainda vão fazer nas três áreas que eu acho que são fundamentais para a formação tendo em vista as diretrizes e que são voltados para a docência e para a gestão das instituições escolares. (...) Ou seja, o aluno agora vai acompanhar (...), ter que ter experiência no ensino fundamental (...), ele vai ter que ter experiência na educação infantil e vai ter que ter uma experiência na gestão das escolas. Então, esses três estágios que eu acho que são a base, a sustentação para essa idéia de que o aluno vai se formar para esses três pilares da ação pedagógica, eu ainda acho que é insuficiente se a gente pensar que é só o estágio que vai fazer essa articulação. Eu acho que o maior desafio nosso não é aumentar a carga horária do estágio mais. Do ponto de vista quantitativo está ok. Do ponto de vista da distribuição no período do curso, eu acho que também está adequado. O que eu acho que a gente não consegue ainda, talvez por uma questão de concepção ou de compreensão, é entender a importância desses pilares ao longo do curso. Se durante todas as disciplinas o aluno tivesse a oportunidade de fazer essa ligação com a prática, e não aguardar um momento específico do estagio para que acontecesse essa ruptura, tipo: “agora vocês vão ter acesso à prática, até aqui foi teoria!”, seria o ideal. Mas não se consegue isso em todas as disciplinas. Algumas professoras conseguem, (...) equacionam melhor essa questão. Vou dar um exemplo (...): a disciplina de alfabetização e letramento. As alunas vão para a sala de aula, observam a prática e voltam. Quer dizer, teoricamente seria uma disciplina teórica, mas no desenvolvimento da disciplina o professor propicia esse encontro, essa observação. Então, pensamos que isso poderia ser uma atuação generalizada. Você não teria a expectativa de que só o estágio cumpriria esse papel de romper essa dicotomia. Então eu

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acho que é muito mais um problema de concepção nosso dessa idéia, que está arraigada, de que a teoria vai formar uma ação prática, e na verdade é romper com essa idéia. Muitas vezes a teoria precisa ser formulada, na verdade explicitada através da leitura da prática. Então, você observar uma cena, a atuação de um professor e dali você extrair elementos da teoria que possam te ajudar a construir uma boa ação pedagógica, acho que isso seria o ideal. (Coordenadora Alfa). Aqui na BETA nós sempre trabalhamos com uma carga horária maior que as 400 horas. (...) Isso para que o aluno reflita: o que eu venho fazer aqui, qual é a minha identidade constituída como profissional? A partir do 6° período começamos o estágio supervisionado que já é direcionado para escolas especificas e é onde começam as disciplinas de metodologia. (...) No caso do currículo de 2008 nós temos uma certa antecipação dessa metodologia. Se pegarmos ai o 4° período nós já começamos com as metodologias. Então, diferencia um pouco mais. Porque o estágio supervisionado, aqui também na BETA, eu posso te falar do currículo de 1998, o aluno tem o contato de uma semana, com a sala de aula, de observação, ele então identifica uma demanda da escola, gerado pela própria comunidade da escola. Na outra semana ele retorna aqui para a faculdade sobre a supervisão dos professores do Núcleo Informativo, ele elabora matérias, intervenções, para que na terceira semana ele retorne ao local de estágio para desenvolver as atividades. Quando nós falamos a questão da prática e da teoria aqui nós temos a proposta mesmo das duas coisas estarem imbricadas. Verificando esse espaço, porque ele também vai no encontro das diretrizes, esse espaço como espaço de investigação. Muitos alunos, muitos grupos também aproveitam esse período de estágio para que possam observar a tese da sua pesquisa, que vai contribuir para a construção da monografia, no trabalho final de curso. Então nós temos uma proposta que caminha junta, teoria / prática enriquecida com a proposta de espaço de investigação mesmo, de pesquisa. O estágio supervisionado é visto como o momento de investigação de observação da prática. O que é um ponto que as diretrizes pressupõem também né. Isso é um aspecto positivo das diretrizes porque ela fala da questão da docência na educação infantil e percebida a sala de aula como espaço de investigação, de pesquisa, uma espécie de laboratório mesmo para que os professores possam desenvolver pesquisas. (Coordenadora Beta). Qualquer curso que você faz não te prepara integralmente para uma coisa. Qualquer curso que você faça a sua preparação é uma preparação dentro dos moldes da possibilidade, não da necessidade. Então, nossos estágios não são assim estágios “eu vou sair de lá totalmente preparado, não tem mais nada a ser feito”. Não existe isso. Mas nós temos estágios muito bem trabalhados, e nós temos estágio na gestão, na docência, de observação, nas instituições não escolares (e esses outros todos nas instituições escolares). Então, nós temos uma organização de estágio capaz de dar a esse aluno uma visão bastante clara do que seja realidade. (Coordenadora Gamma).

A Coordenadora Alfa confirma que a articulação entre a teoria e a

prática acontece em partes e o que é desejável não é o aumento da carga

horária curricular das aulas e atividades práticas. O desafio para ela é a

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convergência dos pilares ao longo do curso. Para ela, deve-se romper com

a concepção arraigada de que a teoria vai formar uma ação para a prática,

enquanto na verdade é importante que se faça a releitura da prática, que o

aluno volte para a sala de aula e discuta o que vivenciou.

Para a Coordenadora Beta o estágio deve ocorrer de forma

imbricada com a teoria, com as elaborações de atividades e projetos de

intervenções, e com a produção da monografia que é o que leva o aluno a

se envolver no espaço de investigação e pesquisa. O estágio é o momento

do qual o aluno deve observar, investigar e pesquisar. Já a Coordenadora

Gamma acredita que o estágio não prepara totalmente o aluno para a

realidade e que nenhum curso pode prepará-lo integralmente. Ela entende

que o estágio prepara o aluno dentro dos moldes da possibilidade, não da

necessidade.

Sendo assim, Severino (2003) diz que a relação pedagógica não

pode se apoiar no espontaneísmo, em dons naturais, mesmo que essas

atitudes colaborem na dinâmica, como forma de interação humana.

Entende-se que esse espontaneísmo teórico ou prático, é inimigo da

saudável prática educacional que busca referências científicas e

habilidades técnicas. Ou seja, o estágio é o momento em que o aluno

desenvolve essas competências técnicas, mas ele sozinho não garante

uma formação profissional condizente às necessidades educativas.

Segundo Severino (2003):

O investimento na formação profissional do educador não pode, pois, reduzir-se a técnica. Formar um educador não é repassar-lhe conhecimentos acadêmicos, pois isso não assegura a fecundidade de sua prática, que precisa subsidiar efetivas mudanças na sociedade pela transformação dos educandos. Ela precisa ser política, expressar sensibilidade às condições histórico-sociais da existência dos sujeitos envolvidos na educação. Sendo política, ela se tornará intrinsecamente ética e contribuirá para a consolidação da cidadania. (SEVERINO, 2003, 156).

Depoimento das Professoras sobre o estágio

Diante disso, o desafio do estágio para a Professora Gamma está na

articulação e no comprometimento tanto das instituições formadoras,

quanto das escolas que não vêem o estagiário, aluno de Pedagogia, como

um futuro professor. Ela diz ser pouca a quantidade de horas destinadas ao

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estágio, porém justifica que é pouco quando esse aluno fica desvinculado,

tendo apenas uma orientação na universidade e não no campo da prática.

Depois, enfatiza que o aluno de Pedagogia está saindo das universidades e

não esta dando conta de alfabetizar, que este seria o nó da educação.

Ressalta que o aluno também, tem que fazer a sua parte e que talvez com

mais horas de estágio a formação poderia melhorar.

A Professora Alfa já enfatiza que 300 horas é tempo suficiente para

se fazer um bom trabalho, que o problema está na sua execução. Ela

defende, ainda, que o curso deveria ser mais teórico do que prático, porque

os alunos do curso de Pedagogia, segundo ela, vão para prática muito

antes do que se espera, pois são alunos pobres e que necessitam de

trabalho. Para ela, do que se necessita mesmo é maior fundamentação

teórica. É ter uma análise sobre a experiência e levar essas 300 horas de

estágio a sério.

Severino (2003) afirma que a condição profissional do educador só

terá qualidade se, ao longo das etapas de sua formação, for lhe

“assegurado um complexo articulado de elementos que traduzam

competências epistêmica, técnica e científica, criatividade estética,

sensibilidade ética e criticidade política.” (SEVERINO, 2003, p.159).

Eu tendo a achar que 300 horas são suficientes. Agora, nós não podemos deixar de falar de uma coisa, ao que me chega, não ocorre só no curso que eu conheço. (...) E o que eu vejo é que o estágio é muito pouco levado a sério dentro das instituições e pelos próprios alunos. Se a gente for pensar que são 300 horas de trabalho, é coisa demais. Se a gente levar a sério essas 300 horas, dá sim, para fazer um bom trabalho. Eu faço a defesa de um curso de Pedagogia mais teórico do que prático. (...) Mas, eu acho que nossos alunos, em geral, vão para a prática, claro que não é uma prática refletida como é desejado que seja o estágio, mas eles vão para a prática até muito antes do que se espera porque são alunos pobres. (...) Meus alunos todos, ou a grande maioria, trabalhavam (...) em escolas particulares. Tinham um trabalho precário em escolas públicas ou outras experiências educativas. Eu vejo que o curso de Pedagogia, a maior carência dele é de teoria. A gente precisa de uma formação mais teórica, maior fundamentação, sair um pouco dessa crise de que não se sabe em que lugar se quer chegar e ter uma formação mais nas humanidades com esse aluno. Então eu considero que essas 300 horas estão de bom tamanho se forem levadas a sério, se forem horas sobre as quais se tem supervisionamento (sic), interpretação disso que é realizado ali, uma análise sobre aquela experiência realizada no estágio para que essa prática se torne práxis. (Professora Alfa).

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No caso do Curso de Pedagogia da BETA, eu considero suficiente, pois o Estágio perpassa todo o curso. (...) Pelas diretrizes nós temos 300 horas de estágio. Aqui no curso de Pedagogia, hoje, nos temos 400 horas de estagio. Ë pouco? É. E mesmo a forma como a gente trabalha os estágios aqui no curso. Por quê? Porque dá a supervisão aqui na GAMMA, a gente não tem uma supervisão lá no campo de estágio. O aluno faz o estágio na escola que é mais conveniente para ele: a escola próxima a casa dele; a escola próxima ao trabalho dele. Entendeu? Não existe um projeto de estágio que fale assim: nós vamos levar esse grupo de alunos para aquela escola e ali nos vamos ficar um período x e fazer assim. Não existe! O aluno fica muito desvinculado, fica o estágio supervisionado que, na verdade, de supervisionado não tem nada. A gente espera que o aluno também faça a parte dele. Eu enquanto Professora, eu tento planejar o estágio de forma a articular a teoria e a prática. (...) Então, para mim o estágio que eu tenho aqui na sala de aula, não é apenas um encontro apenas para orientar aluno na sala de aula. Só como exemplo: eles desenvolvem textos, leituras de textos, eles fazem pesquisas a partir da leitura de textos, eles fazem uma proposta de intervenção. Então, eu tenho uma outra proposta que eu sei que esta ainda longe de chegar numa proposta realmente mais efetiva, que a gente possa dizer que essas 400 horas de estágio realmente é suficiente para o professor sair daqui e fazer valer. Eu acho que esse é o nó da educação hoje. O aluno de Pedagogia está saindo daqui e não está dando conta de alfabetizar os nossos alunos. Então, eu não sei o que esta acontecendo (...). (Professora Beta). Essa relação teoria e prática, a gente não esta dando conta dela. Só com essas 400 horas de estágio... não sei se também as disciplinas de metodologia...não sei....existe um “nozinho” aí, que nós precisamos descobrir o que é...(Professora Gamma).

Nos depoimentos dos atores da pesquisa, ficou evidente que o

estágio é um campo dentro da formação que necessita ser refletido. Tanto

as atividades práticas quanto a forma instituída para a sua realização. A

preocupação maior gira em torno dessa forma desarticulada que tem sido

realizado o estágio entre as instituições superiores e as escolas. O estágio

recebe o nome de estágio supervisionado, mas segundo depoimentos, de

“supervisionado não tem nada”. De forma geral, para os atores, o ideal

seria ter um estágio articulado desde o início do curso, onde ele pudesse

fundamentar com a prática o que ele vê na teoria. Contudo, duas

entrevistadas compartilham da mesma opinião que, segundo ambas, nas

instituições em que, trabalham percebem que, em tese, se consegue

preparar com o estágio o aluno do curso de Pedagogia. E explicam que

independente do curso, o aluno não egressa totalmente preparado para

atuar como um ser maduro e experiente. Tendo em vista esse fato, a

preparação acontece dentro dos moldes das possibilidades acadêmicas e

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profissionais e, que de certa forma, busca inserir nas habilidades desses

futuros professores, a capacidade de crítica e de reflexão. Severino (2003)

acredita que só se pratica uma reflexão a partir de situações reais e que a

preparação do educador deve torná-lo um profissional qualificado,

consciente dos valores da educação.

4.3 Culpabilização

De acordo com o ponto de vista das Pesquisadoras entrevistadas, o PL

da RP poderia ser interpretado de modo a que o trabalho prático e os estágios

para a formação fossem feitos posteriormente à graduação. Todas acreditam

que as Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia determinam uma

relação importante entre a teoria e a prática, no qual o aluno aplica seus

conhecimentos teóricos concomitante aos exercícios que o levam a entender o

funcionamento da escola infantil e da educação básica, bem como a identificar

os alunos de cada fase desse aprendizado. Dentre elas, apenas a pesquisadora

P2 não conhecia o PL, mas, ao falar sobre a responsabilidade dada aos

professores sobre o fracasso escolar, ressalta que os Pedagogos são os mais

desprofissionalizados.

Arroyo (2003) defende que o professor deve ter o domínio sobre o seu

trabalho, gerando, assim, uma forma dessa classe se fortalecer politicamente.

Segundo o autor, existem alguns mitos que estão entranhados no meio

educacional que são aceitos com muita naturalidade. Um deles seria acreditar

que se prepararmos o professor, teremos resolvido o fracasso escolar. Um outro

mito seria acreditar que o problema não está tanto na falta de preparo, mas sim,

no tipo de preparo, transmitido nos cursos de formação. Para Arroyo (2003), a

“desqualificação do mestre é apenas um dos aspectos da desqualificação da

própria escola.” (ARROYO, 2003, p. 104).

Em seus estudos, Arroyo (2003) acredita que há uma tradição arraigada

“nas teorias pedagógicas de que quem sabe o que ensinar e como ensinar

terminará ensinando desde que o educando seja „normal‟.” Sobre isso, quando

não se culpa o professor pelos insucessos, culpa-se o aluno. Ambos vítimas

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das lacunas educacionais que deterioram a sistematização do conhecimento. A

respeito da culpabilização dada aos professores sobre o “fracasso escolar”,

Arroyo considera que:

O processo educativo foi reduzido a um processo de ensino-aprendizagem: alguém que ensina algo para alguém que (se tiver capacidades individuais) aprenderá. Nesta concepção, o preparo do transmissor – docente – passa a ser tão priorizado que se estabelece uma relação mecânica entre seu preparo e o êxito ou fracasso do processo. O fracasso escolar passa a ser explicado basicamente pelo despreparo do docente ou pelo tipo de preparo que leve à prática; consequentemente, a superação desse fracasso crônico da escola passará pela revitalização dos centros de formação. (ARROYO, 2003, p.107).

É muito comum ouvirmos a retórica de culpabilização dos professores e

alunos pelo insucesso do processo pedagógico. Muitas vezes a falta de

condições mínimas para o trabalho é que compromete o seu resultado. O

poder público não pode se exaurir das responsabilidades que tem diante das

situações que limitam e oprimem o profissional na construção da cidadania. A

escola é o local onde ocorre o vínculo entre educadores e educandos e sendo

assim, ela deve abrigar e mediar um projeto educacional legítimo e ético que

perpasse a formação dos professores como o princípio desse compromisso.

Depoimento das Pesquisadoras sobre a culpabilização

As relações político-administrativas que regulamentam o sistema

educativo e papel dos professores nos diferentes níveis desse mesmo sistema

tomaram força na medida em que se constituía a profissão docente. Para

Sacristán (1998), a profissão docente é uma semiprofissão, pois para além do

espaço concreto da prática dentro da sala de aula, “o trabalho dos professores

é condicionado pelos sistemas educativos e pelas organizações escolares em

que estão inseridos.” (SACRISTÁN, 1998, p. 71). A culpabilização dada aos

professores da educação básica vem da desvalorização do seu trabalho como

uma profissão que segundo P2, seja especializado. Com isso, se questiona a

identidade desse profissional.

(...) todo mundo acha que sabe ensinar. E todo mundo ensina alguma

coisa. Essa é a coisa da desprofissionalização. Os Pedagogos de 1ª.

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à 4ª. séries são os mais desprofissionalizados, porque (...) o que

caracteriza um profissional é o domínio do conhecimento próprio

daquele grupo. (...) Os professores de 5ª. à 8ª. eles tem uma auto-

estima bem melhor. (...) Porque eles acham que dominam o

conhecimento especializado. Ou seja, o grupo de referencia deles pra

segurar uma identidade menos desvalorizadas é a dos geógrafos,

dos historiadores, dos matemáticos, dos físicos, etc. Então, é esse

conhecimento que eles acham que dominam. Agora, o Pedagogo de

1ª. à 4ª. não tem aonde se segurar. Porque se discute até se existe

uma ciência educacional. A maioria das pessoas acredita que não

existe uma ciência da educação. (Pesquisadora P2).

(...) acho que a justificativa para você pensar numa residência

pedagógica eu vou lhe dizer o que eu penso: Não é uma questão do

fracasso da escola, como a gente vê. Porque a escola também não

fracassa tanto. Se a gente for olhar nós temos problemas de

desempenho, mas o País não parou por causa disso. Nós precisamos

melhorar porque a nossa posição social, na produtividade, em

patentes, em você poder criar alternativas, ela só vai melhor

efetivamente quando a educação atingir um nível de qualidade

melhor, um nível de conhecimento que for disseminado. Isso tem a

ver com a educação escolar, tem muito a ver. Mas, a nossa escola

tem problemas que vão desde a gestão, desde financiamento, a

construções escolares, infra-estrutura. E temos questões culturais,

das comunidades, das culturas comunitárias, e os problemas de nível

sócio-econômico que nós encontramos aqui no País que são

problemas extremamente sérios, que não vai ser uma bolsa família

que vai resolver. Vai passar por outros canais, pode ser uma ajuda

para você não morrer de fome, mas só não morrer de fome não ajuda

a pessoa a ser pessoa. (...) um projeto dessa natureza, de

institucionalizar uma residência pedagógica, eu vou dizer para você,

não estou desvalorizando um projeto dessa natureza, acho que ele

pode ser bem vindo. Mas, acho que é mais um remendo que para

tentar solucionar uma questão que diz respeito às universidades e

instituições de ensino superior. No meu entender se houver uma

política mais bem definida, mais cerrada em relação ao

acompanhamento dos cursos formadores de professores para os

primeiros anos da escolaridade (então estou falando educação infantil

e primeiras, quartas, quintas séries, conforme o sistema), eu acho

que nós teríamos metade dos problemas que nós temos. Não é que

um curso de graduação vá preparar completamente um profissional.

Nenhum curso faz isso, mas você pode dar uma boa base para que,

no momento em que ele entre no sistema do trabalho, ele possa ter

condições, e com a experiência, com a ajuda dos colegas e com o

processo de educação continuada, com essa boa base ele tem um

gancho para melhorar a suas posturas pedagógicas, a sua

capacidade de ensinar, os seus conhecimentos, o seu impacto

didático. Agora, sem essa base ele é uma pessoa desprovida de

conhecimentos básicos. Então, nós vamos remendar mais uma vez.

(Pesquisadora P3).

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Para a P3, a escola não fracassa tanto e a RP poderia ser entendida

como a um “remendo” que apenas ocultaria os problemas provenientes das

instituições superiores ao que se refere a formação de professores. Para ela,

falta uma política educacional que fiscalize e acompanhe os cursos de

licenciatura de perto. P3 e a Coordenadora Gamma compartilham da mesma

opinião quando relatam que nenhum curso prepara totalmente o profissional,

mas que, todavia, os cursos podem dar um boa base, boas condições para que

o aluno melhore a sua postura pedagógica e a sua capacidade de ensinar.

Para ambas, essa base é fundamental para a formação inicial.

Apoiando-se nesses relatos e de acordo com o Parecer CNE/CP n.

28/2001, “a prática é o modo como as coisas vão sendo feitas cujo conteúdo é

atravessado por uma teoria.” Dessa forma, a formação do educador deve

transformá-lo em um profissional consciente do significado da educação, para

que possa estender essa consciência aos educandos e assim, contribuir para

que eles construam a dimensão coletiva e solidária de sua existência.

(SEVERINO, 2003, p.147).

Para P2, a prática deve ser inserida ao longo da formação teórica e não

separada dela. De acordo com a especialista, o aluno deve aprender a ser um

professor trabalhando passo a passo ao que aprende com a teoria e não achar

que a escola é algo para ser pensada ou utilizada no futuro, como algo

inatingível.

[...] não pode ser nem o saber sem ofício, nem ofício sem saber. (...)

você tem que saber quais são os pressupostos, os paradigmas que

você esta operando, você tem que saber como se faz (...), como é

que você analisa o material, todas as técnicas...mas você tem que

fazer! (...) Porque você só vai aprender quando você errar. Você vai

errar e aí você vai ver o erro. A gente pensa que sabe. O susto que

os alunos tomam é quando eles chegam lá, na sala de aula. Porque

se eles só observaram ou ouviram falar, quando chegam lá é um

choque. (Pesquisadora P2).

Depoimento das Coordenadoras sobre a culpabilização

Já, para a Coordenadora Alfa, culpar os professores pelo desempenho

do aluno ou ainda a formação dada pelos cursos de Pedagogia é um

pensamento bastante contraditório. Para a profissional, deve-se pensar quem

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são esses alunos de Pedagogia e porque optam a seguir essa carreira. Que o

desafio de melhorar a qualidade do ensino da Educação Básica e da formação

inicial está vinculada à melhoria da carreira desse profissional e a formação

continuada.

Falar que uma coisa é a teoria, outra coisa é a prática é uma grande dicotomia. Uma hora o aluno tem que saber sobre a prática, outra hora é o momento que ele precisa ir lá (...). Eu não acredito nessas coisas, acho que é muito mais complexo do que isso. Que as teorias são forjadas pela analise da prática, a prática alimenta a elaboração da teoria, enfim, a gente tinha que ter um pensamento mais contraditório para dar conta dessa questão da prática pedagógica. Eu acho que não é esse o problema do curso. E também acho que a gente não deve analisar a formação, nem a inicial, nem a continuada, desvinculada da situação do profissional, ou seja, não adianta falar que a gente vai melhorar, vamos colocar residência pedagógica, um projeto desse tipo e que ai nós vamos resolver o problema da formação e teremos uma boa escola. Acho que a questão da formação tem a ver com as características da profissão. Quem são as pessoas que procuram a Pedagogia? Essa é uma questão que tem se discutido muito, ou mais recentemente ela tem vindo à tona. (...) nem temos discutido muito como se deveria, mas ela tem se tornado mais observável para nós. O que eu estou querendo dizer: se você isola essa discussão, uma discussão é a formação e outra coisa é a carreira docente, as condições de trabalho, você não vai responder adequadamente esse desafio de melhorar a qualidade. Porque o aluno que faz o vestibular para Pedagogia, ou que procura o curso de Pedagogia, esse aluno o procurou por diversas razões e muito menos freqüentemente porque ele quer ser um professor. Porque essa carreira não é atraente. Então, se a gente não melhorar isso, dificilmente vamos melhorar essa formação. Os países que deram conta de equacionar melhor essa questão, eles investiram na carreira. Para que? Para que não necessariamente os melhores alunos do ensino secundário, mas aqueles que realmente queiram ser professor porque têm vontade política ou porque têm uma vocação, se é que existe essa questão da vocação, enfim. Pelo mesmo motivo que a pessoa escolhe ser hoje advogado, por exemplo, que também já foi uma carreira pouco prestigiada. Essas coisas mudam mesmo porque elas são resultado de uma mudança social. Se a gente conseguir valorizar a profissão docente eu acho que isso vai repercutir nos cursos de formação. Não resolve, mas repercute. (...) Estou chamando a atenção assim: são coisas importantes mas elas têm que caminhar juntas. Tem que melhorar a carreira e tem que melhorar a formação inicial e tem que melhorar a formação continuada desse profissional. Se você só pensa na formação inicial eu acho que não vai haver resultado, não vai responder. (Coordenadora Alfa).

Já, para a Coordenadora Beta, a questão da desvalorização do

professor é histórica e está vinculada à desvalorização salarial. Sendo assim,

ela acredita que existem outros pilares que norteiam a qualidade do ensino,

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além da formação docente e que o PL de uma RP não resolva as questões do

fracasso escolar sozinho.

[...] nós já temos um aspecto histórico na nossa formação que é a desvalorização do professor, a desvalorização salarial, vamos dizer assim. Acho que esse é um aspecto que precisa ser discutido. Além disso, até que ponto essa residência pedagógica vai garantir a formação de qualidade desse indivíduo, ou garantir a eliminação do fracasso, ou a redução drástica desse fracasso? Porque nós temos outras variáveis também. Nós temos variáveis estruturais, que é a infra-estrutura da escola, nós temos a questão da nutrição, então vamos para o eixo familiar, a educação familiar, como a família percebe o processo educativo, social. Então, até que ponto a gente pode considerar a residência pedagógica como algo que pode resolver esse aspecto. Acho que ela pode promover uma diminuição, mas será que ela resolve, se a gente entrar na questão do discurso de diminuição, redução do fracasso escolar, será que ela vai resolver? Eu acho que não! (Coordenadora Beta). [...] Então, eu acho que os políticos deveriam ter um trabalho muito maior do que aprovar uma lei de uma Residência Pedagógica, como se isso estivesse consertando alguma coisa, como se a formação do professor fosse responsável pelo fracasso escolar. (...) será que o governo quer gastar com a educação? Porque não é prioridade nacional a educação. No dia que for, ele gasta com a educação. Assim como é a medicina. A gente vê como são as brigas, as lutas da classe com o governo, sempre por causa da desvalorização do profissional. Eu acho que os médicos ainda levam vantagem porque são mais unidos. Mas, os professores são mais importantes, porque até para ser médico precisa de professor. (Coordenadora Gamma).

A Coordenadora Gamma reflete que existe um desprestígio na profissão

de educador, pois o Governo não investe nela como prioridade. Ressalta que a

Classe dos Médicos é mais unida do que a dos professores, porém acredita

que os professores são mais importantes quando enfatiza que até para ser

médico, precisamos tê-los. Aponta que os políticos não deveriam aprovar a RP,

pois ela não consertaria os problemas provenientes da formação do professor,

como se essa formação fosse a responsável pelo fracasso escolar.

Depoimento das Professoras sobre a culpabilização

Sobre a culpabilização dada aos professores, as três professoras

entrevistadas manifestaram suas opiniões, ampliando os olhares da

qualificação profissional desde a formação inicial dos professores, como a

formação continuada, já que o que está no cerne do conhecimento são as

viabilidades para a melhoria da qualidade da educação.

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Segundo Bourdieu (1997), o pesquisador deve contextualizar e respeitar

as pessoas que estão dando os seus depoimentos, pois entrevistar alguém é

muito mais que apenas ouvir; é compreender, é refletir sobre a fala dos atores.

Tentar saber o que se faz quando se inicia uma relação de entrevista é em

primeiro lugar, tentar conhecer os efeitos que se podem produzir sem o saber,

por esta espécie de intrusão sempre um pouco arbitrária, que esta no princípio

da troca; é tentar esclarecer o sentido que o pesquisador se faz da situação, da

pesquisa em geral, da relação particular na qual ela se estabelece, dos fins que

ela busca e explicar as razões que o levam a aceitar a participar dessa troca.

Em um contato prévio das gravações, duas professoras mencionaram que

pouco ou nada sabiam a respeito da RP e apontam o porquê de uma

insatisfação ou receio, caso o PL fosse aprovado. Já a terceira entrevistada, a

Professora Gamma, aponta vantagens e desvantagens nesse contexto.

Eu acho que uma questão que a gente precisa atacar de frente no

Brasil é que o problema do trabalho docente, o problema da

qualidade na educação no Brasil é, em geral, remetido aos

professores. Quer dizer, os professores são sempre

responsabilizados pelo problema da educação, o dito fracasso

educacional aí que o senador Marco Maciel se refere, e que eu

prefiro nem falar em fracasso escolar. Mas essa responsabilização

dos professores eu acho injusta e inadequada. Primeiro, porque eu

acho que o problema da educação pública no Brasil não é só com os

professores. O problema de um processo de aprendizagem, um

processo escolar que não tem sucesso ao final de sua trajetória, que

não cumpre as expectativas, ele só pode ser explicado por uma

multiplicidade de fatos. A primeira delas é a desigualdade desse

país. (Professora Alfa).

Não considero a Residência Pedagógica pré-requisito para a

melhoria da qualidade do ensino. Esta é resultado de um conjunto de

variáveis que podem contribuir para que atinjamos melhores

resultados. Mas não vejo como uma redentora dos problemas sociais

que vivenciamos. É muito fácil culpar o professor, difícil mesmo é

viver com o salário indigno dessa profissão. Isso é tão verdade que a

Residência Médica não garante a qualidade dos serviços de saúde.

(Professora Beta).

[...] porque quando falam assim: os nossos professores não estão capacitados...o que que (sic) é isso? Será que é quem esta saindo hoje do cursos de Pedagogia, ou quem ta aí na ativa, trabalhando? O que está acontecendo com a Educação continuada desses professores? Essa educação continuada eu entendo também, que é você comprar um bom livro e fazer a leitura dele. Os nossos professores tem condições com o salário que tem de comprar livros? Então, veja só, por um lado eu acho que essa residência educacional seria belíssima, mas por outro lado, eu acho que existem muitos

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contras para a gente pensar na viabilidade dessa residência. A gente tem que pensar um pouco mais sobre isso. Eu espero que o Governo não coloque essa residência educacional como obrigatória, e sim como uma complementação e que dá algum tipo de benefício para quem quiser participar dessa residência educacional. (Professora Gamma).

A Professora Alfa é enfática quando questiona que culpabilizar os

professores é algo muito sério e que responsabilizar o professor pelo fracasso

escolar não cabe nenhuma flexão. Ela afirma que o problema da educação

pública no Brasil não é devido apenas aos professores, que isso seria uma

injustiça. Ela acredita que os problemas dos processos de aprendizagem são

variados, múltiplos, começando pela desigualdade social dos brasileiros. De

acordo com Galdón (2004)

[...] uma vez aceita a multidimensionalidade do fracasso escolar, não parece coerente que as medidas propostas para reduzi-lo sejam unidimensionais e isoladas. Não existem caminhos fáceis (...) ao contrário, as estratégias mais eficazes devem ser baseadas em propostas globais e sistêmicas, em reformas profundas que levem em conta as demandas sociais do futuro e num esforço sustentado ao longo de vários anos. (GALDÓN, 2004, p.29).

A Professora Beta ao falar sobre os problemas sociais aponta para as

dificuldades que os professores enfrentam diante aos baixos salários. A mesma

opinião é compartilhada pela a Professora Gamma que reforça que a

remuneração dos professores não proporciona que consigam investir na própria

qualificação. Severino (2003) também argumenta que muitos problemas

relativos aos processos econômicos e sociais, sobretudo o aviltamento salarial e

a degradação do trabalhador, estão diretamente ligados à preparação científica

e pedagógica e isso compromete o atual modelo de formação de educadores.

(SEVERINO, 2003, p.143).

Outro dado relevante que foi apontado na fala da Professora Gamma é

sobre a preparação dos professores que seriam, no caso, os responsáveis pela

“tutela” e aquisição do saber dos pedagogos recém formados (ou residentes). O

professor mais antigo (tutor) não teve, além de sua formação, uma capacitação

que não fosse do seu próprio estágio acadêmico, ou da sua própria prática.

Como é que esse professor receberia outro profissional sob a sua

responsabilidade e tutela?

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Será que esse professor que está lá nas escolas, ele também foi bem formado pra receber aquele professor que já formou e que vai fazer a residência educacional? Ele está preparado para receber esse outro profissional? Porque já é um profissional também... Será que esse professor que está lá ele tem capacidade para receber esse outro profissional? Sabe? (Professora Gamma).

Para a Pesquisadora 1, na construção da LDB, no Fórum de Defesa da

Escola Pública, “tinha a ideia tornar o estágio obrigatório, em estágio pago

obrigatório, como uma das Diretrizes da LDB, no que diz respeito à formação de

professores.” (Pesquisadora 1). Essa ideia poderia ser mais aceita do que a

proposta de residência executada após a formação.

Se pensarmos na Educação e nos quatro modelos de formação de

professores, é assegurado pela LDB, em seu Título VI, Dos Profissionais da

Educação, que para atuar na educação básica é admitido que este profissional

seja graduado em curso de licenciatura plena, em universidades e institutos

superiores de educação, ou que tenha a formação mínima em nível médio, na

modalidade Normal. (BRASIL, 1996). Contudo, diante do PDE, o Governo

prioriza metas que eleve a qualidade da educação básica no Brasil e também o

nível de estudos do cidadãos. Uma das propostas do PDE estava em criar um

piso salarial para os professores já que mais de 50% desses profissionais

recebiam menos de R$800,00 por 40 horas de trabalho. Para tanto, um dos

pontos fortes desse plano é quando traz que “investir na educação básica

significa investir na educação profissional e na educação superior porque elas

estão ligadas, direta ou indiretamente”. (BRASIL, 2007b).

4.4 O Projeto Lei da Residência Pedagógica

Depoimento das Pesquisadoras sobre a RP

O eixo norteador, nesse momento da pesquisa, buscou entender o que

os atores pensam a respeito do PL sobre a RP. Apenas a Pesquisadora P2

mencionou que não conhecia o PL, mas acredita que a prática ao longo da

formação a agrada mais. P1 e P3 não foram contra a uma RP, entretanto,

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salientaram em discutir, primeiramente, que o ideal mesmo é ter uma formação

inicial como as Diretrizes propõem, ou seja, a idea de se ter ao longo da

formação a prática docente. Para P1, a idéia de colocar o aluno imerso no dia a

dia da escola é algo bastante promissor, porém acredita que essa prática

sugerida numa pós-formação inicial, deixaria as instituições

descompromissadas e os alunos soltos no sistema educacional, portanto, as

universidades devem ser responsáveis pelos alunos.

Sendo assim, ressalta que essa prática deve ser feita dentro da

formação do aluno, no último ano concomitante com o trabalho de conclusão

de curso ou ainda, sugere incluir um aumento de seis meses a um ano na sua

formação acadêmica e, não depois de concluir seus estudos de graduação.

P3 acredita que primeiramente deve-se mexer com a graduação, para

depois pensar em um RP ulterior a formação. Ela compara o internato que os

médicos fazem com o estágio do curso de Pedagogia e revela que o MEC e o

Conselho Nacional de Educação não avaliam o que está sendo realmente dado

nos estágios nos cursos em geral. E que não existe um acompanhamento

adequado para verificar se o estágio está sendo oferecido de acordo com as

normas estabelecidas e que se acrescentarmos uma RP na maneira que se

encontram as instituições isso será só mais um remendo.

Eu estive estudando o Projeto e acho que nós temos alguns problemas, mas não seria em relação ao Projeto. Eu me lembro que quando nós pensamos no Projeto da LDB - Fórum em Defesa da Escola Pública - tínhamos a ideia de tornamos o estágio obrigatório em o estágio pago obrigatório, como uma das diretrizes na LDB. No que se diz respeito à formação de professores. Qual era o problema? É que como você tem necessidade de uma grande formação e o Sistema de Ensino teria que garantir (...) o pagamento dos estagiários, não teria condições, naquele momento, de colocar isso como uma obrigação da LDB. Não haveria recursos para bancar todos os estagiários necessários no âmbito da escola. Então, tem uma questão que não é problema, né? A gente tem que achar uma solução, que é do (sic) investimento necessário para que isso seja garantido. Que uma Residência Pedagógica ela tem que ser como uma Residência Médica. Tem que ter um pagamento, tem que dar pro estudante uma garantia de sobrevivência. E eu gosto mais da idéia de que a gente tenha durante o curso de formação esse tempo do estudante. Eu gosto da ideia das Diretrizes que é de colocar a prática desde o começo e ao longo do curso. Porque quando você tem uma Residência Pedagógica, a idéia que vai ficando é que você pode ter um curso todo teórico e depois você tem a prática. Então, eu gosto mais da idéia de você durante o tempo todo ir aproximando o estudante que ele vai gradativamente se apropriando dos conhecimentos necessários até pra entender aquela realidade, para

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poder intervir nela e transformá-la, né? Essa é a ideia da prática: entender para aprender o que tem que fazer, mas é como você tem que aprender e se apropriar dos conhecimentos teóricos, práticos, técnicos e, enfim, até tecnológicos da tecnologia, para poder transformar essa realidade. A profissão de educador é isso! Não é pra você ficar observando e mirando uma realidade. Mas é para intervir nela e transformar (...). No entanto, você poderia ter no último ano, aí sim, ou um semestre inteiro, ou um ano inteiro, um estágio conjuntamente com o trabalho de elaboração de conclusão de curso, enfim, como é que você a partir desse trabalho de contato com a escola pública...né... que poderia ser um estagio pré-profissional , uma residência profissional pedagógica, nada impede...é...mas como parte da formação. Porque aí, você também compromete a instituição formadora quando você coloca a RP no sistema, você joga também pro sistema isso, somente pro sistema. O aluno já saiu da universidade. Então qualquer lacuna, digamos assim, ou problema que você tenha tido na sua formação teórica, que sempre tem, acaba não sendo problema da universidade. Então, tem que fazer parte da sua formação, nem que for pra gente colocar quatro anos e meio para a formação e não quatro anos, ou três, como hoje ainda é em grande parte das instituições. Agora, a ideia que o estudante fique imerso no dia a dia da escola ela é uma idéia que é bastante promissora, pelo menos no último momento do estágio, do momento pré-profissional. (Pesquisadora P1). Eu não conheço esse Projeto sobre a Residência Pedagógica, no qual o modelo seria a Residência Médica. Mas eu acho que a proposta de se fazer a prática ao longo do curso é pra mim fundamental. E porque não dá para você fazer uma coisa separada da outra. (...) nada impede que essa formação vai sendo dada durante o curso. (Pesquisadora P2) Se o médico não ficasse no hospital as horas que ele tem que ficar, ao lado de médicos mais experientes e com um orientador de residência, na verdade um orientador de internato como eles chamam porque ainda é durante o curso. Eles têm um orientador de internato, eles fazem o internato durante o curso, que seria o nosso estagio. Então, é uma irresponsabilidade das instituições de ensino superior não terem esse projeto. Por outro lado, o Ministério da Educação não avalia isso. Não há uma avaliação, um acompanhamento adequado para verificar o que está sendo realmente dado nesses cursos, se o estágio está sendo realizado de acordo com o que se espera das normatizações. O conselho nacional também, de certa maneira, não tem condições de fazer esse acompanhamento adequadamente, e as instituições então, nesse Brasil imenso, fazem o que querem. E tanto as públicas quanto as privadas. Agora, mais as privadas porque elas não formam o grosso dos professores. (...) A gente sempre tem dificuldades quando entra numa profissão, mas o tipo de dificuldade que eles apresentam não era para apresentar. São dificuldades básicas porque eles não tiveram na graduação. Posto isso, se em nível de Brasil, em nível do conjunto formador, nós temos esses problemas com o estágio, nós vamos ter o mesmo problema com a residência. Porque nós somos mestres em dar um jeitinho, eu não acredito que a residência venha resolver um problema que o estágio já poderia avançar. Eu não sou contra um tipo de idéia de uma residência posterior à formatura, só que do jeito que está, sem mexer com a graduação, vai ser mais um remendo. (Pesquisadora P3).

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De acordo com estes depoimentos, trazemos novamente à tona o PIBID

que nada mais é que um Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à

Docência. Acredita-se que, dessa forma, esteja proporcionando a valorização

do magistério ao apoiar os estudantes de licenciatura plena, principalmente,

das instituições municipais públicas e comunitárias, sem fins econômicos, de

educação superior a se inserirem na Educação Básica com uma formação

docente mais fundamentada e aprimorada. Espera-se, contudo, aquilo que as

pesquisadoras declaram ser o mais adequado para a formação, ou seja,

vincular as instituições superiores com a escola de forma articulada e refletida.

O PIBID pode ser um programa que sane o problema da falta de

acompanhamento na execução do estágio dos estudantes do magistério nas

escolas. Isso fica evidente quando a Pesquisadora 3 nos revela que o estágio

por si só já poderia avançar se realmente fosse articulado e fiscalizado tanto

pelas universidades como pelas escolas, numa parceria acreditada.

Para P1, poderia se pensar em um período exclusivo de prática, que ela

chamou de período pré-profissional, do qual o aluno se dedicaria ainda mais a

prática. Contudo, ela enfatiza que esse período seria durante a formação desse

aluno. Pois, somente assim, a instituição formadora teria a responsabilidade

pela sua formação. Ela ainda reflete que se o residente não estiver ligado à

instituição formadora, ele estará desvinculado ao Sistema e as instituições

devem se comprometer na formação deste professor. Uma outra forma de se

pensar essa dedicação da parte prática, segundo ela e como já se disse é

aumentando a carga curricular e, consequentemente, a carga horária do curso

de Pedagogia, pois o estágio é o momento em que o aluno deve intervir na

realidade e transformá-la.

Depoimento das Coordenadoras sobre a RP

A Coordenadora Alfa nos revela que não conhece profundamente a RP,

mas que um PL expressa um nascimento de uma proposição e é de direito o

cidadão conhecer, opinar e se posicionar em prol de seus interesses e dos

interesses da sociedade, frente as questões políticas e de interesse comum.

Contudo, tem o cuidado de avisar que não conhece os bastidores e as

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discussões que levaram o autor do PL a fazer essa proposta. De acordo com

ela:

Olha, é muito difícil expressar minha opinião porque é um assunto

que só conheci agora. A lei esboça um nascimento, pode ou não ser

uma expressão (...). Essa gênese de um direito ou de uma

proposição que se quer e que é resultado de uma discussão social.

Conhecer uma lei, para poder opinar, eu teria também que conhecer

os bastidores dessa lei, quais as discussões, o que levou o Marcos

Maciel a fazer essa proposta, como esta essa questão no Congresso

Nacional e, portanto, na sociedade. Mas você está pedindo minha

opinião e eu vou dar com essa ressalva de que eu possa vir a mudar

de posição futuramente, quando eu possa ter mais conhecimento

dessa questão. (Coordenadora Alfa).

A Coordenadora Alfa ainda acredita que MM institui uma RP como uma

saída milagrosa e que, a seu ver, mais 800 horas obrigatórias de prática após

um universo de teoria, ainda não daria conta desse objetivo, que é preparar o

aluno para a realidade. Para ela, a concepção de estágio é que o aluno antes

da prática possa vivenciar algumas situações e que a ideia que a RP perpassa

é que o curso seria inicialmente todo teórico e após a formação ele vivenciaria

a prática, o que na sua opinião não resolveria.

Li o Projeto de Lei e a justificativa. A primeira ressalva que eu faço ao

projeto: ele pensa como se fosse uma saída milagrosa. A outra coisa,

que volta a essa discussão que você está propondo, será que o fato

dele ficar imerso na prática, depois de ele ter tido um banho de teoria

e mais essas 800 horas obrigatórias vai dar conta? Será que a gente

não pode também, se não mudar a concepção, ser só mais uma lei?

Porque a idéia dos estágios um pouco é essa né, do aluno antes de

na prática, que ele possa vivenciar situações. O quê que vai

acrescentar? São mais 800 horas? É ele ter terminado todo o curso

para fazer? Eu acho que isso não resolve. (Coordenadora Alfa).

Para se ter melhores professores o investimento se daria nos planos de

carreira desde a formação inicial até a formação continuada. A Coordenadora

Alfa sugere que o profissional que se submetesse a um concurso público e

fosse aprovado, antes de assumir uma sala de aula, poderia ter essa prática

imposta no PL de uma RP como favorável à sua preparação e ao seu

desempenho docente. No estágio probatório, em que se submetem todos os

concursados, ele seria instruído e acompanhado por um professor mais

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experiente (um tutor), o que daria a esse professor maiores condições de

inserção no âmbito profissional. Para ela, essa medida poderia ser mais

eficiente do que se criar uma RP nos moldes de uma residência médica,

achando que essa proposta poderia resolver os problemas da formação inicial.

Eu acho que o que resolveria é a melhoria dessa carreira e quem sabe pensar propostas na legislação que façam com que a entrada desse profissional, ao ser submetido a um concurso público e ser aprovado, ou ao ser contratado por uma escola, que ele passe por um processo inicial de inserção sem assumir uma turma, talvez fosse mais eficiente nesse sentido. Ou seja, ele vai ser contratado mais no estágio probatório a instituição deve assegurar o acompanhamento de um professor tutor experiente, criar condições para que a entrada desse profissional na vida profissional se desse com um acompanhamento. Não sei, estou pensando aqui que eu acho que seria mais eficiente do que você, nos moldes da residência médica achar que vai resolver esse problema da qualidade porque o aluno vai estar inserido ali na vida cotidiana da escola. (...) Tem que melhorar a carreira e tem que melhorar a formação inicial e tem que melhorar a formação continuada desse profissional. Se você só pensa na formação inicial eu acho que não vai haver resultado, não vai responder. (Coordenadora Alfa).

Já a Coordenadora Beta faz uma série de reflexões que determinam o

seu posicionamento que para a RP ser aprovada necessitaria de ser

reformulada. Aponta para questão do posicionamento do mercado diante a um

profissional que submete a receber uma bolsa ao invés de um salário para se

qualificar. O mercado ainda pode não dar garantias de permanência e de

contrato, após a execução dessas 800 horas obrigatórias e gerar um

movimento de rotatividade entre esses residentes. Ou seja, após o término da

exigência, o profissional estaria à disposição do mercado sem garantias de

emprego. Diante disso, a Coordenadora Beta não vê vantagens para se

constituir uma RP. Outro problema é não dar continuidade aos processos

educacionais, uma vez que o professor da escola, aquele que já está em

exercício, não teria condições de receber esse novo profissional proveniente de

uma RP, por não ter sido incluído ao processo como o responsável pela

formação de outros formadores.

É interessante porque eu percebo a proposta de Residência Pedagógica muito parecida com a proposta de diretrizes no seguinte sentido: ela possui pontos positivos e negativos. (...) Quando a gente fala em Residência Pedagógica nós falamos de uma proposta do egresso, ele se forma no curso de Pedagogia e ele possa atuar, vivencia o estágio numa determinada escola durante dois anos, a

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gente pensa que ele só pode fazer isso se ele for remunerado. Daí, como seria essa remuneração? Compatível com o salário atual de um profissional já formado, experiente? A proposta é que ainda não seja. Daí, (...) como esse mercado de trabalho iria se posicionar. Nós teríamos um profissional já formado, vivenciando essa residência por dois anos e recebendo, em termos salariais, bem menos do que um profissional que já atua. Isso não poderia gerar um movimento do próprio mercado de solicitar uma certa rotatividade desses profissionais nas próprias escolas, para esses profissionais atuarem durante um determinado tempo, atuam durante dois anos, daí eu recontrato outros que vão participar dessa residência pedagógica e com isso eu vou ter um gasto menor, esse profissional recebe uma remuneração menor. (...) Até que ponto também os estados da Federação vão ter condições de oferecer bolsas para esses profissionais. Então, o que nós temos hoje, uma política de investimento na formação de professores para atuarem na educação básica, então nós podemos dizer, até, de certa forma, se é uma política, se é um dos pressupostos do governo, lógico que ele vai investir. Mas, como investir se nós temos aí milhares de professores precisando de uma formação. Será que vamos ter incentivos para todos eles? Será que as escolas também, e aí tem outro lado, será que as instituições escolares estão preparadas para receber esse profissional? Para cumprir com o pressuposto dessa residência que é não só observar, mas também intervir, contribuir com esse processo durante um tempo? E ela lidar com esse profissional que vai estar dois anos junto dela, dentro, participando do processo, e ai ele encerra, vem outro profissional... Quebra. (...) e há uma necessidade de uma continuidade no processo. (...). (Coordenadora Beta).

Apesar de todos os pontos citados pela Coordenadora Beta refutarem o

PL que na sua opinião é muito sintético, todavia, ainda acredita que essa

proposta serve para que tenhamos maior discernimento e possamos assim

observar a prática educativa de forma a contribuir com novas discussões no

âmbito da sociedade.

Eu acredito que esse projeto, apesar dessas questões colocadas, é muito positivo porque toda proposta que a gente tem que possa ampliar o nosso campo de observação, de prática, naquela área que nós nos propusemos a nos formar, só vem a contribuir. Porém, esse projeto de lei é também muito sintético, ele não detalha mesmo a que veio, de que forma se daria. De que forma até se daria essa intervenção do estado, do município nessas escolas que vão ofertar, vão se abrir como espaço de experiência, de vivência, desse profissional que está sendo formado. Ele não delineia isso, não detalha. E aí, ele então se apresenta como projeto mas também joga para a sociedade. “Olha, então vamos discutir sobre”. E a gente tem alguns profissionais respeitados da área discutindo. Mas, ele a meu ver, nesse momento necessita ser enriquecido, detalhado. Agora, cabem ajustes, né? (Coordenadora Beta).

Para a Coordenadora Gamma, o curso de Pedagogia deveria

proporcionar aos alunos uma carga teórica maior, mais do que a carga horária

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do estágio. Em sua opinião, a RP não resolveria o problema que se desenvolve

na apropriação dos fundamentos teóricos que embasam o curso. Acredita que

mesmo assim, uma RP poderia ser positiva. Porém, converge com a opinião da

Coordenadora Beta ao levantar a questão de saber quem seria o profissional

responsável pela tutoria desse residente, já que os professores não teriam,

digamos assim, o preparo para orientar esse profissional.

[...] eu ainda não me debrucei sobre a RP para refletir. (...) Nós estamos precisando aumentar é a carga teórica. O conhecimento teórico está muito defasado. (...) Realmente, nós estamos precisando aumentar a carga horária para que o aluno, pedagogo, adquira maior conhecimento do seu objeto de estudo que é a criança, o adolescente e até mesmo o adulto na educação de jovens e adultos. Essa que é a flexibilização curricular, para onde você vai, qual é o campo que você quer lidar? E mais os outros afazeres pedagógicos. Então, eu acho que está precisando de mais um ou dois anos é de teoria, e depois viria a residência. Para mim, na residência só ele não vai suprir essa deficiência teórica que ele tem e que prejudica a prática. Muita coisa que esta errada é por deficiência teórica, falta de conhecimento teórico. (...). Eu penso que só temos a ganhar com essa residência pedagógica, mas quem lá na escola iria ser o professor orientador se nós não estamos tendo pessoas bem formadas? (...) Como que faz com os professores das escolas rurais, do interior bravo, como eles vão receber o pedagogo para essa residência? (...) a primeira coisa que se tem que fazer é mudar a cabeça dos políticos. Eles têm que pensar a educação de maneira mais seria. E não fazer certos arremedos aqui, ali, como se isso fosse consertar a educação. Exigir que tivesse um profissional de peso, mas também pagar bem. (Coordenadora Gamma).

Depoimento das Professoras sobre a RP

Das três professoras entrevistadas apenas a Professora Alfa mencionou

que não conhecia o PL sobre a RP e se posiciona contrariamente a sua

aprovação por acreditar que o que se deve fazer é dar boas condições para o

professor da Educação Básica trabalhar. Porém, todas apontam a inviabilidade

de se instaurar um RP diante da realidade dos alunos que na sua maioria são

trabalhadores.

Bom, primeiro tenho que te dizer que eu nem conhecia esse projeto (...) e, ao que me parece, não deve ser à toa que eu não conheci o projeto porque eu não levo a sério uma proposta dessa natureza e espero que um projeto desse não passe. (...) O que os nossos professores no Brasil precisam é, antes de tudo, de boas condições de trabalho, de boas condições de remuneração, ser bem remunerado, ter uma carreira e um plano salarial que lhes estimule a buscar sempre melhorar, estudar, se qualificar para ter uma

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promoção, uma condição melhor dentro da carreira. Nada disso hoje a gente tem garantido. Veja o problema com a lei do piso nacional salarial. No momento que a gente tem a possibilidade de fixar um piso, que ainda que a gente possa considerar baixo, em muitos estados e municípios do Brasil vai fazer uma verdadeira revolução, porque o que se paga é muito menos, o que a gente vê é uma resistência enorme por parte de alguns estados e setores do Brasil. Eu acho que essa residência pedagógica é uma coisa descabida (enfática). O que a gente precisa é concentrar na formação universitária ou em nível superior desses professores de educação básica, dar a eles boas condições de trabalho, equipar bem nossas escolas (quando eu penso em equipar não estou falando só de equipamentos físicos, mas também de um bom corpo de profissionais ali dentro) e, sobretudo, ter condições de trabalho que assegure a esse professor uma dedicação exclusiva (Professora Alfa). Não considero a Residência Pedagógica pré-requisito para a melhoria da qualidade do ensino. Esta é resultado de um conjunto de variáveis que podem contribuir para que atinjamos melhores resultados. Isso é tão verdade que a Residência Médica não garante a qualidade dos serviços de saúde. (Professora Beta). A Proposta, no meu entendimento é belíssima, eu acho que a gente poderia avançar muito, se a gente pudesse colocar uma proposta dessa para ser executada na qual o professor tem algo a mais a favor dele, mais prática. Mas eu fico me perguntando: que bolsa que é essa? Se o piso salarial de 800 reais, se o Governo ta aí ta tentando burlar isso e não deixa passar. A gente escuta aí (...) que o Governo não vai ter condições de pagar o piso. (...). Como é que seria essa bolsa? Seria uma bolsa realmente condizente com a necessidade desse aluno. Primeira coisa seria isso. Segunda coisa, a realidade dos nossos alunos. Os nossos alunos eles trabalham e estudam. Então realmente, como é que eles vão fazer essa residência pós-formados? Realmente essa bolsa, os benefícios deveriam ser muito grandes. Porque se não eles não tem condições. Aí eu vejo que isso será um empecilho se isso for obrigatório nos cursos de Pedagogia. Talvez sim, como algo a mais, mas não como algo obrigatório, não como: só recebe o diploma se passar pela residência. Eu vejo assim, por um lado um trabalho belíssimo de residência educacional que seria ideal... mas. Agora vou levantar uma outra questão. Será que esse professor que esta lá nas escolas, ele também foi bem formado pra receber aquele professor que já formou e que indo fazer a residência educacional? Ele ta preparado para receber esse outro profissional? Porque já é um profissional também... (Professora Gamma)

A Professora Beta também não acredita que uma RP poderia contribuir

para a qualidade do ensino e aponta que a Residência Médica (modelo para a

construção da RP do senador MM), também não garante a qualidade dos

serviços da saúde.

Outra questão mencionada nos depoimentos é a remuneração. A

Professora Gamma questiona qual seria o valor dessa bolsa após a formação

desse professor, demonstrando uma preocupação referente ao mínimo

estabelecido pelo Governo aos profissionais da educação e que nem sempre é

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efetivado. Levanta ainda a dúvida de como é que seria essa obrigatoriedade,

bem como se preocupa com aquele professor que já está no exercício da sua

carreira e que de certa forma será o professor-regente, ou seja, cabe a ele

essa responsabilidade de ensinar o residente? Ele teria a responsabilidade de

transmitir suas experiências e suas metodologias, além de responsabilizar-se

por seus alunos da Educação Básica.

Contudo, a Professora Gamma acredita que se a RP fosse colocada a

favor da melhoria da prática poderia contribuir, mas não com o peso de

obrigatoriedade, porque dessa forma, inviabilizaria as condições de ascensão

da carreira diante das diversas dificuldades econômicas e sociais. O mesmo

ponto de vista é compartilhado pela Pesquisadora 3 que reflete:

Como é que esse aluno vai deixar um salário, não só trabalham, eles são chefes de família. 30% são chefes de família, 40% trabalham 40 horas, 68% trabalham em outras áreas, poucos trabalham na área da educação. Então, como é que ele vai deixar um emprego registrado para virar um bolsista para depois ver se vai ser professor. Nós temos um cenário complicado. Nós vemos que os alunos (...), principalmente Pedagogia, eles são mais velhos, ou seja, eles procuram [estou falando de (sic) Brasil, todas as instituições] eles, em geral, são mais velhos, estão fora da faixa que seria esperada para o nível superior, estão depois dos 30 anos. Ou seja, são pessoas que procuram uma formação já estando empregados, já estando maduros, como uma segunda opção profissional (...). Então, o universo de pessoas que hoje estão procurando esse curso é um universo de pessoas um pouco mais velhas, de nível socioeconômico bem mais baixo, e que estão procurando uma ascensão social a partir de uma (sic) outra possibilidade. Abrir espaço aqui de um estágio é muito difícil. A residência provavelmente atenderia os jovens que fazem os cursos regulares nas boas universidades. Ou seja, nós vamos chover no molhado (sic). (Pesquisadora P3).

Gatti e Barreto (2009) confirmam o que a Pesquisadora 3 menciona

sobre o perfil dos estudantes do curso de Pedagogia. As autoras revelam ainda

que os estudantes do curso de Pedagogia são, em grande maioria, alunos

trabalhadores e a obrigatoriedade tornaria esse projeto, ainda mais inexequível,

pois não releva a realidade dessas pessoas. Fica inviável obrigar que um aluno

abra mão de seu emprego para o cumprimento de uma residência e isso é

confirmado nos relatos inseridos nesse estudo e que veremos no próximo

subcapítulo. Podemos entender que isso dificulta a aprovação e aumenta a

dúvida sobre a validade do PL.

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4.5 Alunos: o que pensam sobre a Residência Pedagógica?

Foram aplicados questionários aos estudantes nos últimos anos do

curso de Pedagogia, englobando questões relativas a dados pessoais, vida

escolar, trabalho, satisfação com o curso e investigando o que pensam sobre a

RP caso fosse implantada nos moldes em que se encontra. Todavia, também

preocupamos em averiguar o que pensam sobre o estágio. Consta nos

questionários aplicados, uma observação de que os dados seriam confidenciais

e tratados estatisticamente, de modo que permaneceriam no anonimato. Foram

cedidos espaços nas aulas das turmas e a solicitante ficou à disposição caso

solicitassem esclarecimentos de alguma questão. Dessa forma, o questionário

é um instrumento utilizado para se obter dados de um determinado grupo social por intermédio de questões a ele formuladas. Serve para determinar as características desse grupo em função de algumas variáveis predeterminadas, individuais ou grupais.” (MARTINS JÚNIOR, 2008, p. 208).

Em cada universidade foram distribuídos 10 questionários

aleatoriamente, respeitando alguns critérios, como por exemplo, ser do último

ano do curso de Pedagogia e, obviamente, querer participar dessa pesquisa.

Houve 28 questionários devolvidos e são com as respostas dadas a eles que

trabalhamos.

Para identificarmos quem é o aluno do curso de Pedagogia e o que

pensam, pontuamos questões estruturadas fechadas que foram norteadoras:

gênero; tipo de instituição em que cursou a maior parte da sua vida escolar;

alunos que trabalham; setores em que trabalham; satisfação do curso e a

importância das aulas teóricas. Essa última questão tratou de identificar o

porquê da resposta de cada aluno, pedindo que o mesmo se justificasse de

acordo com a sua opção assinalada. Vejamos a seguir o que os gráficos nos

apontam.

Verificamos com Gatti e Barreto que o número de homens que optam

pelo curso de Pedagogia ainda é muito baixo. O processo de feminização

predomina especialmente no magistério das séries iniciais do ensino

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fundamental e da educação infantil. Segundo as autoras, 92,5% são mulheres

e 7,5% homens. (GATTI; BARRETO, 2009, p.162).

Em nosso estudo, dos 28 questionários devolvidos, 26 são mulheres e

apenas 2 homens, ou seja, 93% e 7% respectivamente. Observe no Gráfico 1

esses dados.

Gráfico 1: Gênero dos alunos Fonte: Dados da Pesquisa 2010

A feminização presente no magistério se deve a fatores como o aumento do mercado de trabalho, decorrentes da ampliação do atendimento escolar, como também da procura dos homens por novas profissoes que ofereciam melhores sálarios, quando do início da industrialização do país. Outros autores enfocam e discutem a associação, presente no imaginário social, entre escola e maternidade. Porém, o conceito de feminização do magistério não se refere apenas à participação maciça de mulheres nos quadros docentes, mas também à adequação do magistério às características associadas tradicionalmente ao feminino, como o cuidado. (UNESCO,2004, p.45).

Quando perguntamos qual o tipo de instituição que os alunos do curso

de Pedagogia cursaram ao longo da vida escolar, tivemos os seguintes dados:

26 alunos (93%) responderam que cursaram o ensino público a maior parte da

suas vidas. Apenas 1 aluno disse vir de instituição privada. E um questionário

não foi respondido. Observe o Gráfico 2:

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Gráfico 2: Tipo de Instituição que cursou a maior parte da vida escolar Fonte: Dados da Pesquisa 2010

A maior parte dos alunos já trabalha, ou seja, 25 alunos respoderam que

já exercem alguma atividade remunerada, o que corresponde a 89%. Apenas 2

pessoas (7%) não trabalham ainda e 1 pessoa (4%) não respodeu a questão.

Veja o Gráfico 3:

Gráfico 3: Alunos que trabalham Fonte: Dados da Pesquisa 2010

Já os setores em que exercem suas atividades profissionais são

variados. Porém sobressalta o setor educacional. Gatti e Barreto (2009) nos

revelam que muitos estudantes já trabalham como docentes e 40,8% deles

contribuem para o sustento da família. De acordo com as autoras, esse

processo de escolarização de famílias que possuem uma renda média, cujo o

intervalo é de tres a dez salários mínimos, pode ser interpretado como uma

forma de ascensão de certos estratos populacionais a carreiras mais

qualificadas. (GATTI; BARRETO, 2009, p.164).

Contudo, de acordo com os dados das 25 pessoas que exercem alguma

atividade remunerada, observamos que 14 pessoas já trabalham com

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educação, totalizando cerca de 56%, sendo seguido pelas atividades

administrativas no total de 5 pessoas, ou seja, 20%. Conforme mostra o Gráfico

4, outras atividades foram citadas, como na área de confecção e costura,

recursos humanos, laboratórios técnicos e serviço público, totalizando mais

20%, o que corresponde a 5 pessoas. Apenas 4% se designou ao comércio, o

que nessa pesquisa equivale a 1 pessoa. (Ver Gráfico 4).

Gráfico 4: Setores de trabalho Fonte: Dados da Pesquisa 2010

Perguntamos a eles se estavam satisfeitos com o curso. Obtivemos os

seguintes resultados que o Gráfico 5 nos revela: 82% se consideram

satisfeitos, ou seja, 23 alunos. Já 4 alunos dizem estar insatisfeitos (14%), e

um aluno não respodeu (4%).

Gráfico 5: Satisfação com o curso de Pedagogia Fonte: Dados da Pesquisa 2010

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Todavia, entendemos que era necessário saber onde esses alunos viam

as deficiencias ou relevancias do curso.

Portanto, o próximo gráfico (Gráfico 6), trouxe a preocupação que vários

pesquisadores e estudiosos relatam ao dizer que o curso de Pedagogia deve

ter um embasamento teórico muito contudente e fundamentado.

De acordo com Severino (2003), a “apropriação dos conteúdos de

nossas experiências se dá através da aprendizagem, a qual só se realiza em

função dos recursos da personalidade dos sujeitos.” Para ele, o aluno que vai

lidar com o desenvolvimento, aprendizagem e personalidade dos sujeitos deve

dar muita atenção aos estudos da Psicologia em Educação, bem como

apropriar-se de conhecimentos da História que o levem a refletir a sua

condição social e a interagir nas diversas culturas. Severino (2003) acredita

que:

O educador precisa amadurecer uma consciência de que pertence à humanidade e de que a existencia só tem sentido pleno se ultrapassar os limites da individualidade e do grupo social particular. Nesse sentido, as ciencias humanas, e sobretudo a antropologia, fundamentam a busca filosófica de um sentido para a existencia da humanidade como um todo/ uno solidário. (SEVERINO, 2003, p.2003).

Vejamos o que os alunos disseram a respeito das aulas teóricas:

Gráfico 6: Sobre o que acham das aulas teóricas Fonte: Dados da Pesquisa

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Ao todo, 18 alunos consideram que as aulas teóricas são muito

importantes para o aprendizado, representando 64%. Já 10 dicentes acreditam

que as aulas teóricas são importantes, representando 36% dos alunos. De

acordo com os depoimentos dos atores dessa pesquisa, observamos ainda que

existe certa tendência em acreditar que o curso de Pedagogia poderia ser

melhor fundamentado, melhor estruturado, a partir das aulas teóricas. Nas falas

dos atores desse estudo, percebemos que é de suma importância a

fundamentação teórica, pois é com a fundamentação filosófica, antropológica

das ciências humanas e sociais que o educador consegue ter discernimento

frente aos aspectos complexos provenientes dos relacionamentos dos sujeitos

com o seu ambiente natural e social. (SEVERINO, 2003, p.148). É o que a

Professora Alfa diz em seu depoimento:

Eu vejo que o curso de Pedagogia, a maior carência dele é de teoria. A gente precisa de uma formação mais teórica, maior fundamentação, sair um pouco dessa crise de que não se sabe em que lugar se quer chegar e ter uma formação mais nas humanidades com esse aluno. (Professora ALFA).

É também o que a Coordenadora Gamma relata:

Nós estamos precisando aumentar também a carga teórica. O conhecimento teórico está muito defasado. 60 horas / aula, com um monte de feriados, um monte de coisas. Realmente, nós estamos precisando aumentar a carga horária para que o aluno, pedagogo, adquira maior conhecimento do seu objeto de estudo que é a criança, o adolescente e até mesmo o adulto na Educação de Jovens e Adultos. Essa que é a flexibilização curricular. Para onde você vai, qual é o campo que você quer lidar? E mais os outros afazeres pedagógicos. Então, eu acho que está precisando de mais um ou dois anos é de teoria. (Coordenadora Gamma).

Dessa forma, buscando entender ainda mais o estudante de Pedagogia

foi inserido no questionário duas questões abertas, a qual eles se posicionasse

frente ao seu curso. Na questão 24 perguntamos a ele: “Se você pudesse

mudar algo no seu curso o que você mudaria? Por quê?”. Foram 23 respostas

e elas seguem abaixo:

As atividades de cultura e arte deveriam ser incentivadas e não cobradas em formulários;

Aumentaria a carga horária das disciplinas de artes, filosofia, psicologia, sociologia e antropologia

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Se eu pudesse exigia mais qualidade do curso, pois acho que o nosso curso tem muita cobrança, e assim acaba sendo desvalorizado por aqueles que estão fazendo sem interesse. Já ouvi frases do tipo: “estou fazendo pedagogia, ou vou fazer pedagogia porque é um curso mais fácil”. E parece que a própria faculdade reproduz isso, quando se percebe que muitas vezes falta instrumentos para apresentarmos os trabalhos...

Colocaria mais atividades práticas;

Eu mudaria a carga horária das disciplinas práticas (aumentaria);

Na faculdade existe uma distância entre a teoria e a prática, ao mesmo tempo que os professores criticam o método bancário de Paulo Freire, é só isso que ocorre, muito blá-blá-bla´ (sic) e pouco espaço de discussão e prática;

O curso deveria ser mais prático, ensinar o professor (sic) a lidar com situações reais da sala de aula. Entretanto, a teoria não poderia ficar de lado. Tem muito professor “enchendo lingüiça”, enrolando o mesmo assunto o semestre todo, portanto, deveriam ceder aulas para outros que querem trabalhar;

Aumentaria a quantidade de aulas práticas e metodologias;

Deixaria o 8º período só para o estágio;

Acrescentaria mais disciplinas que fizessem ligação entre a teoria e a prática. Mais estudo sobre a infância e a criança;

Mudaria a forma como os estágios são realizados. Os deixaria para o final do curso, com um enfoque nas aulas que já tivemos.

Aumentaria a carga horária de estágios porque teríamos mais preparo;

Acrescentaria mais orientações para as aulas práticas;

Colocaria professores mais organizados e comprometidos com os conteúdos de sua disciplina;

Alguns professores estão um pouco ultrapassados e não utilizam nenhuma metodologia nova;

Os professores mais velhos são muito tradicionais;

A falta de compromissos de alguns professores, porque estão em um espaço público e não dão aula devidamente. Gostaria que as disciplinas relacionassem mais o teórico com o prático, para não ficar dois campos distanciados em minha atuação;

Alguns professores utilizam o mesmo método de ensino sempre e isso deixa a aula cansativa;

Mudaria o currículo porque ele continua muito teórico e tradicional. Teórico porque a relação com a prática, apesar de ter carga horária suficiente, não acontece da mesma maneira significativa. E tradicional porque a teoria oferecida, além de repetir sempre, não amplia o conteúdo;

Alguns professores. Porque alguns não são capacitados para a disciplina assumida, outros por se acharem superiores demais. Gostaria de ter aulas mais dinâmicas;

Eu cancelaria algumas aulas, porque do jeito que elas acontecem são totalmente desnecessárias;

Gostaria que aplicassem mais provas como forma de avaliação, pois, particularmente, apenas seminários e trabalhos em grupo contribuíram pouco para a fixação dos conteúdos mais importantes;

A metodologia. Porque a maioria das vezes são os próprios alunos que dão aulas. Mudaria também a forma de avaliação. Poderiam mesclar trabalhos com provas;

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Apesar de 82% responderem que estão satisfeitos em sua totalidade,

quando foram interrogados sobre o que mudariam no curso muitos revelaram

certa insatisfação ao que se refere ao desenvolvimento das aulas teóricas, seja

na metodologia utilizada pelo professor, ou pelo descompromisso dos mesmos

com os alunos. Criticam o currículo e a forma que os estágios são realizados.

Acreditam que as aulas da forma que são ministradas não atribui nenhuma

relevância para a sua formação. Criticam a forma tradicional de ensino e

sugerem que as aulas teóricas sejam mais próximas das aulas práticas, ou

seja, que sejam articuladas. Alguns alunos aumentariam as práticas por

acharem que dessa forma, estariam se preparando melhor para a realidade da

escola. Contudo, as maiores reclamações foram sobre o descompromisso e a

metodologia ultrapassada utilizada pelos professores. As percepções dos

estudantes sobre a forma que são avaliados também é um dado muito

importante. Todavia, a necessidade de serem realmente argüidos nos revela

que esse aluno está preocupado com o que ele tem absorvido no âmbito do

conhecimento. Algumas disciplinas foram mencionadas nas falas dos

estudantes, por sua importância e pela necessidade de se ter um estudo maior

e mais aprofundado, como por exemplo, a psicologia (sobre o estudo da

criança e da infância), a antropologia, a filosofia, a sociologia, a cultura e a arte.

No entanto, contestam que muitas aulas parecem ser desnecessárias para a

sua formação.

Concomitante com o pensamento de se vincular a teoria e a prática,

Severino (2003) revela que para a formação do magistério o currículo deve ser

simultaneamente multidisciplinar, transdisciplinar e interdisciplinar, ou seja,

aproximar a formação do professor à reflexão crítica e criteriosa, a partir de

situações reais. Segundo ele, só um professor reflexivo é capaz de construir

um conhecimento “realmente importante e eficaz para modificar sua ação.”

(SEVERINO, 2003, p.152).

Na questão 25, última do questionário, investigamos o que pensam os

alunos a respeito desse PL de uma RP. Explicamos o que viria a ser a RP43,

como e a quem se aplicaria, e perguntamos: “Você, o que acha? Justifique a

sua resposta”. De acordo com o Gráfico 7, temos os seguintes dados:

43 Ver Apêndice A: ir à pág.183.

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Gráfico 7: Sobre a Residência Pedagógica Fonte: Dados da Pesquisa

A questão mais assinalada é a que considera que o PL é bom, mas que

já trabalham. Encontramos 11 questionários com essa resposta marcada, o

que representou 36% do total. Porém, apenas oito pessoas justificaram. A

seguir o relato delas:

(X) acha bom, mas já trabalha

Já trabalho com educação e fico imaginando como seria abrir mão do que já faço, para receber uma bolsa e não ter nenhuma garantia de continuar trabalhando;

Acredito que essa iniciativa pode contribuir para a qualidade na educação e para direcionar o Pedagogo ao final do curso. Entretanto, a área de docência não desperta atenção em mim;

Creio que este projeto ajudará a minimizar os efeitos negativos da Educação tanto para o professor quanto para o aluno;

Acho que a RE melhoraria substancialmente a qualidade da formação do profissional de educação, entretanto a implantação seria muito conflituosa, uma vez que muitas pessoas trabalham fora e provavelmente a bolsa para custos não conseguiria suprir a necessidade destes trabalhadores. Outro fator complicador seria a falta de garantias de emprego e de qualidade de remuneração, o que não é um problema na área médica;

Importantíssimo que o aluno de Pedagogia vivencie a prática desde a sua entrada na faculdade, para não se assustarem no inicio da sua prática como professor. O que percebo nos meus colegas de sala que não trabalham na área de educação é que eles estão formando e não sabem o que vão fazer ao assumir uma sala de aula;

Esse projeto não seria bom para aqueles que já trabalham como professores! Muitos já têm uma vivencia escolar há muito tempo, pois já fizeram o magistério e, desde então, são professores;

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Acho bom o projeto do Senador, porém penso que na questão da remuneração como seria, se seria compatível ao salário do professor hoje que já não é grandes coisas;

Se pode contribuir para melhorar a educação eu concordo;

Apesar de um estudante revelar a preocupação com a formação e o

despreparo do aluno ao assumirem uma sala de aula pela primeira vez, outras

justificativas revelaram o que outros atores que participaram da pesquisa

também pontuaram tais como: qual seria os valores dessa bolsa, ou seja, qual

seria esta remuneração; falta de garantias de emprego; como se daria a RP

para quem já trabalha como professor. Essas indagações norteiam a

inviabilidade desse PL se instituir.

A segunda questão mais assinalada é a que trata positivamente o PL,

com 27% do total, ou seja, 8 pessoas responderam, porém duas não

justificaram. Segue as justificativas:

(x) acha ótimo e faria com gosto

Porque a pessoa se sentiria mais segura ao entrar na sala de aula;

Aprovo a medida porque o estudante de Pedagogia sendo preparado na prática com acompanhamento de um profissional dedicado e competente, este estará melhor preparado para o mercado de trabalho e mais seguro para contornar e intervir em situações de evasão entre outras;

Dessa forma, o Pedagogo teria certeza da profissão que escolheu, uma vez que iria vivenciar mais a prática;

O que talvez falte aos cursos da licenciatura é o que tão vemos em curso como o de Medicina, odontologia com as residências. A prática seria mais bem vivenciada com reações reais, alem de se obter uma ética profissional [sic] a educação que nos falta em vários momentos;

A RP poderá ser uma experiência ótima desde que tenhamos professores compromissados e competentes para dar orientações e “não fazerem de conta” como aconteceu em meus estágios e práticas. O professor-tutor deve ter disponibilidade para acompanhar o aluno na escola e realmente trabalhar para a formação prática dos estudantes de pedagogia;

Mas só faria se eu estivesse no início do curso;

Ao justificarem esta opção, três alunos revelaram certa insegurança ao

entrarem na sala de aula como professores ou estagiários. Um aluno acredita

que com a RP poderia vivenciar situações reais como no curso de Medicina e

outro estudante revela sua insatisfação com os professores do curso e aponta

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que nos estágios não houve uma prática orientada. O que confirma mais uma

vez aquilo que Gatti e Nunes (2009) descrevem em suas pesquisas sobre o

estágio: não se sabe como eles são realizados, analisados e acompanhados.

Na sequência, a terceira questão mais assinalada com 13%, relata que

as pessoas acham que o PL é bom, mas não gostariam de fazer. Porém,

apenas uma pessoa justificou sua escolha:

(X) acha bom, mas não gostaria de fazer

Dei essa resposta porque se hoje tivesse que fazer isso ia ser muito difícil, pois tenho pressa para formar, mas acho que isso não é o único fator que iria melhorar o ensino. Com certeza é um item muito importante, portanto essa lei deveria ser aprovada sim, até porque quem entra para o curso só com interesse de obter diploma, ou só porque não paga iria pensar bem antes de assumir um curso tão importante e que deve ser encarado com responsabilidade;

Nesse caso, é importante pontuar que muitos alunos que entram para o

curso de Pedagogia são mais velhos e entram para obterem uma ascensão

profissional. Com isso, o futuro profissional almeja a formação o quanto antes.

Com 10% do total, os que acham que o PL é desnecessário (3 pessoas)

justificaram:

(X) acha desnecessário

Acho desnecessário pelo fato de que o problema não está apenas com o aumento da carga horária, e sim na estruturação da teoria com a prática. Ou seja, a questão curricular é um fator que ressalta essa discussão;

Nas aulas práticas (estágios) em nosso curso, podemos perceber a necessidade de mais carga horária, pois o tempo na sala de aula não é suficiente para o nosso aprendizado;

Não é isso que a Educação precisa para diminuir o fracasso escolar. A Educação precisa de professores, pedagogos comprometidos com ela, pessoas que realmente amam o que faz. Precisa ainda de valorização financeira e moral para motivar os pedagogos durante sua atuação. Não adianta nada incluir uma residência se o que realmente precisa não for incluído. Falta ainda maior apoio e empenho do governo que deixa muito a desejar, principalmente, para a rede estadual;

Os alunos apesar de optarem pela mesma questão posicionam-se de

formas diferentes: enquanto um acredita que o problema não esta somente no

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aumento da carga horária e sim na questão curricular que articule a teoria com

a prática, outro acredita que o curso necessita de mais carga horária para se

fundamentar melhor. Já o ultimo depoimento nos revela que a RP não seria

necessária, pois o que se necessita é de professores e políticas mais

comprometidos com a educação.

Ainda encontramos 2 questionários que tiveram marcados a questão que

acha que o PL é ruim, porém acredita que a prática é importante para o

aprendizado, totalizando 7%. Porém, não justificaram a sua opção.

Ao levantarmos esses dados percebemos que muitos alunos acreditam

que o estágio é determinante para a sua formação. Porém, sem uma boa

fundamentação teórica não se consegue efetivar a prática. Os alunos sentem-

se inseguros ao irem a campo, pois o estágio não é de fato supervisionado.

Sentem-se desamparados e acreditam que as aulas práticas poderiam ser

estendidas de forma a melhorar o seu desempenho.

Outro dado importante levantado por eles, é que a implantação desse PL

de uma RP seria muito conflituosa, pois aqueles que já trabalham e não podem

abrir mão de seus salários por uma bolsa de estudos, certamente, ficariam

prejudicados. A questão salarial sempre está presente nesses depoimentos

porque o salário do professor já é muito reduzido, então ao se pensar em uma

bolsa de estudos, provavelmente, está seria ainda menor que o próprio salário

de um professor no início de carreira. Os alunos também sentem falta da

articulação entre a teoria e a prática, e de uma metodologia que agregue

métodos de avaliação contundentes, como por exemplo, a aplicação de provas

individuais.

Contudo, algumas universidades do estado de São Paulo e do Rio de

Janeiro, por iniciativa própria, iniciaram um projeto similar ao da RP durante a

formação do aluno. Dessa maneira, este modelo de formação, concomitante

com a graduação, permite que as instituições formadoras e as escolas

interajam com uma responsabilidade mútua sobre o futuro professor. O curso

de Pedagogia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), criado em

2007, abrange um modelo de formação muito similar e com o mesmo nome,

Residência Pedagógica, no qual os alunos buscam superar a distância entre a

teoria e a prática pela participação sistemática e sequencial de estudantes-

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residentes nas práticas pedagógicas de instituições de Educação Básica.

(BARROS, 2010, p.105).

Devemos salientar que, nesse projeto, o aluno-residente é um estudante

da graduação (do curso de Pedagogia, Normal Superior ou Letras). Ou seja,

não é como sugerido no PL do senador MM que visa essa formação prática

após o egresso e somente para o curso de Pedagogia. Outro fator

fundamental é que esse aluno-residente é instruído pelo professor-orientador

da instituição superior em que está matriculado, além de receber um

direcionamento do professor-regente da escola em que exerce a sua atividade

prática. Juntos, escola e universidades são parceiros.

Outro projeto que visa a um programa de alfabetização de qualidade é o

Projeto Escola Pública e Universidade na Alfabetização e que é conhecido

também, como Bolsa Alfabetização. Considerado como uma das principais

ações do Programa Ler e Escrever do estado de São Paulo,

prevê a atuação de estudantes universitários nas classes de 1ª série do Ensino Fundamental para apoiar professores dessas turmas na complexa tarefa de garantir a alfabetização das crianças que freqüentam a escola pública estadual. (SÃO PAULO, 2010).

O objetivo do programa é apoiar os professores da rede pública que

estão na sala de 1º ciclo do Ensino Fundamental, e ao mesmo tempo atuar na

formação inicial do professor. Os alunos universitários nesse projeto são

chamados de alunos-pesquisadores e são indicados pelas instituições de

ensino superior parceiras. Nesse programa, tem se a preocupação de levar:

[...] às instituições formadoras, problemas relacionados à didática da alfabetização e à prática educativa em sala de aula para torná-los conteúdos de formação inicial dos futuros professores. (BARROS, 2010, p.104).

Isso permitiria ao aluno-pesquisador acompanhar o processo de ensino

e aprendizagem da leitura e da escrita, sob o apoio e incentivo de um

professor-regente (da escola) e, ainda, sob a supervisão de um professor-

orientador (da universidade), que serão acompanhados ao longo do ano. E a

bolsa é um valor que o Governo do Estado de São Paulo oferece à

universidade para cada sala de aula atendida na rede estadual. De acordo com

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a Secretaria do Estado de São Paulo, tais recursos são usados pelas IES para

viabilizar a proposição e execução dos projetos pedagógicos a serem

desenvolvidos por seus alunos, em classes e no horário regular de aula da 1ª

série do Ciclo I do Ensino fundamental das escolas da rede pública estadual de

ensino. (SÃO PAULO, 2010).

De modo geral, projetos e programas como esses podem realmente

fazer a diferença na aprendizagem e na construção de novas metodologias

para a aquisição do conhecimento de alunos e professores. A relação entre

escola pública e ensino superior proporciona o diálogo entre o real e o ideal,

que nem sempre são pensadas por ambas as partes. Essa interlocução

proporciona discussões entre pesquisadores, educadores, alunos e

legisladores, pois entende-se que o debate de ideias aventam novas soluções.

Em síntese, os atores que participaram dessa pesquisa atribuem

importância à relação que deve existir entre a escola pública ou privada e o

ensino superior de forma a proporcionar o diálogo entre o real e o ideal, que

nem sempre são pensadas conjuntamente e por ambas as partes. O desafio

pela qualidade dos cursos de formação inicial está em se fundamentar

teoricamente nos pilares das ciências humanas e sociais, e dessa forma, se

articular com a prática educativa no âmbito do desenvolvimento da

aprendizagem. Contudo, salienta-se que essa qualidade está na forma de se

executar e avaliar o estágio supervisionado desses cursos de formação.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Estado Democrático do Direito é tido como um formulador de políticas

públicas, cujas funções sociais como saúde, educação, previdência, moradia,

saneamento básico, entre outras são assumidas por ele. Sendo assim, discutir

um Projeto de Lei faz parte do processo social dos papéis que o cidadão deve

assumir frente à dimensão política uma vez relacionada com o processo

decisório. Ao Estado, é imperativo fazer escolhas sobre que área social atuar,

onde atuar, por que atuar e quando atuar. Essas escolhas, se transformam em

decisões e são condicionadas por interesses de diversos grupos sociais e

representam conquistas que se traduzem legalmente em direitos ou garantias

defendidos pela sociedade. À cidadania cabe a atenção sobre seus

representantes por meio de um acompanhamento crítico e constante.

Dessa forma, pretendeu-se neste trabalho, revisitar as regulamentações

que, historicamente, determinaram a profissão de educador. De início as

transformações históricas que transferiram para o Estado o poder que a Igreja

detinha sobre a Educação. E assim, a formação docente no contexto nacional

passou por várias mudanças desde a expulsão dos jesuítas no século XVIII até

os dias de hoje, visando, sobretudo, adequar e definir o papel dos professores,

e assim, construir a sua identidade, bem como definir o espaço para a sua

formação.

Historiou-se a trajetória do curso de Pedagogia no Brasil e os principais

elementos históricos da carreira do magistério chegando aos quatro modos de

formação previstos na LDB n. 9.394/96. Porém, a partir da Resolução CNE/CP

n.1 de 2006, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de

Pedagogia a formação inicial, em graduação – licenciatura, fosse a formação

necessária para a docência na Educação Infantil e nos anos iniciais da

Educação Básica como pedagogo. Isso gerou uma mudança nos currículos das

instituições de ensino superiores de Pedagogia e mesmo naquelas que

oferecendo curso normal superior optaram por se transformar em cursos de

pedagogia. Todos os cursos das instituições pesquisadas se encontram em

transição curricular, já que foi a partir de 2007 que se instaurou o novo currículo

atendendo às exigências desta resolução. Essa transitoriedade gerou certa

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comparação entre o que educadores chamaram de currículo novo e currículo

antigo. Acredita-se que o currículo novo tem mais avanços no campo do

estágio, uma vez que será voltado para a Educação Infantil, para primeiras

séries do Ensino Fundamental e ainda, para a gestão das escolas.

Também em 2007, um Projeto de Lei (PL) sobre uma implantação de

uma Residência Pedagógica (RP) ou Residência Educacional (RE) é lançado

pelo Senador Marcos Maciel (MM). Nele, os cursos de Pedagogia são

apontados como os responsáveis pela formação desqualificada dos

professores, dirigindo-se principalmente, aos diferentes campos de atuação do

estágio, que acabam por não inserir o aluno do curso superior aonde, segundo

ele, realmente deveriam atuar, ou seja, na sala de aula da Educação Básica,

quando os alunos aprendem a ler e escrever. Sem conseguir acesso ao autor

do PL, objetivou-se desenvolver caminhos que o fundamentassem, bem como,

a sua criação e que ainda analisasse a justificativa criada para a sua

aprovação.

Por se considerar precária a qualidade dos cursos de Pedagogia, o PL é

uma proposta que visa a incluir mais 800 horas de prática após a formação

inicial dos professores da Educação Básica e da Educação Infantil, mas não se

volta para as outras licenciaturas que também formam o professor, como as

das Ciências Biológicas, Filosofia, Geografia, História e Línguas, considerando

que o problema do fracasso escolar esteja apenas nos cursos de Licenciatura 1

(Pedagogia), na formação dos alfabetizadores.

Investigamos que o modelo de RP proposto se baseou no modelo de

Residência Médica (RM) e que aqui no Brasil se constitui modalidade de ensino

de pós-graduação, destinada aos médicos e que sob a forma de cursos de

especialização é caracterizada por treinamento em serviço. Já para os

Pedagogos, a oferta do PL de uma RP apesar de sugerir o modelo de RM não

elevaria a formação deste professor no nível de pós-graduação, o que poderia

inviabilizar ainda mais a busca por esse curso.

Anterior à criação do PL, mais especificamente em 2001, se discutia no

Parecer CNE/CP 28/2001, que o estágio curricular supervisionado é um modo

especial de atividade de capacitação de serviço, onde o estagiário assume

efetivamente o papel de professor. Com a Resolução CNP/CP n. 1/06, que

instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia, em

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seu art. 8º, mais especificamente em seu inciso IV, se refere ao estágio

curricular como um modo de assegurar aos graduandos a experiência de

exercício profissional, em ambientes escolares e não escolares, a ser realizado

ao longo do curso e, prioritariamente, em Educação Infantil e nos anos iniciais

do Ensino Fundamental.

No sentido de melhorar a qualidade dessa educação, temos algumas

ações governamentais, instituídas pelo Decreto 6.024/07 que chamam a União,

os Estados e Municípios a dividirem a responsabilidade pela qualidade da

Educação Básica, percebendo que para isso é necessário uma integração

entre a formação inicial dos professores e a formação continuada.

O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) é um desses

programas que visa a atribuir metas e ações por meio dos Planos de Ações

Articuladas (PAR), para superar e acabar com as fragmentações do sistema

educacional, dando autonomia aos estados e municípios para rever suas

necessidades e prioridades tentando assim, atender a formação exigida na Lei

n. 9.394/96. Uma ação do PAR que chamamos a atenção nessa pesquisa é a

criação do Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica

que busca formar até 2014, 330 mil professores que estão em exercício e que

não possuem o nível superior de ensino. Essa preocupação se refere não só a

uma elevação do grau de escolaridade alcançada, mas também na busca da

qualidade desse ensino, pois quase que conjuntamente decretou a Política

Nacional de Formação dos Profissionais do Magistério da Educação Básica,

que foi instituída pelo Decreto 6.755/09.

Ainda para melhora a qualidade do ensino, foi regulamentado e instituído

o piso salarial dos profissionais do magistério público da educação básica pela

Lei 11.738/08 e sancionada pelo Presidente Luís Inácio Lula da Silva visando

valorizar o profissional da educação estabelecendo que até 31 de dezembro de

2009, para 40 horas de jornada de trabalho semanais, o piso salarial seria de

R$950,00 (novecentos e cinquenta reais). Obedecendo ao art. 5º dessa

mesma Lei, determinou-se que esse piso salarial deve ser atualizado,

anualmente, sempre no mês de janeiro, respeitando os percentuais de

crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do

ensino Fundamental, definido nacionalmente, nos termos da Lei 11.494, de 20

de junho de 2007, que cria e estabelece as normas para o Fundo Nacional de

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Desenvolvimento da Educação (FUNDEB). Em janeiro de 2010, o piso salarial

para os profissionais do magistério atingiu aos R$1.024,00 (mil e vinte e quatro

reais) para 40 horas semanais. Mesmo que ainda não seja uma remuneração

condizente a importância do papel do professor, essa ação é, sobretudo, um

grande salto para o seu reconhecimento e sua valorização.

É sabido que a formação dos profissionais da educação é objeto de

grande preocupação quanto ao seu destino e a dificuldade de ensinar é um

efeito da evolução geral das sociedades industriais modernas, não podendo,

então, ser reduzida à desvinculação entre a relação dos jovens e dos

professores com o saber. Dessa forma, as práticas profissionais deveriam ser

aprendidas pelos professores para que, ao terem contato com seus alunos a

transmissão do saber, proporcione a eles novos conhecimentos e novas

indagações.

Sendo assim, a experiência dos alunos dos cursos de Pedagogia de

cada instituição pesquisada foi analisada no âmbito dos estágios e do curso em

questão. Quando se buscou a participação dos alunos, certamente, buscou dar

a está pesquisa o olhar do aluno prestes a se formar. Então, coube a ele

revelar suas expectativas, suas críticas e sua possível refutação referentes a

uma implantação de uma RP. Revelou-se que as aulas teóricas são muito

relevantes para a sua formação e que se pudessem mudar algo no curso, em

geral, seria aumentando as aulas práticas e as suas orientações para

desenvolvê-las. O fato de propiciar-lhes a oportunidade de pensar e criticar o

modelo de RP, bem como o estágio, é a parte mais relevante do questionário,

pois assim revelaram seus pontos de vista e suas dúvidas a respeito do PL.

Como vértice de análise, buscamos também a opinião das professoras

do estágio supervisionado que frisaram que embora o executem da melhor

maneira, ainda assim, o aluno fica “solto” na busca dessa vivência.

Da mesma forma, essa linha de pensamento também é compartilhada

pelas pesquisadoras especialistas em educação. Segundo elas, o estágio pode

ser escamoteado e não atingir o que se espera: que é uma reflexão da teoria

sobre a prática. Todas, no entanto, convergem que o estágio das práticas

pedagógicas seja realizado conforme propõe as Diretrizes para o curso de

Pedagogia: desde o início e ao longo de toda sua formação acadêmica.

Refletem ainda, que o PL de uma RP pode ser apenas um remendo em cima

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dos problemas provenientes do estágio, e que as instituições de ensino

superior e universidades deveriam se preocupar mais com a formação desse

aluno.

Um ponto divergente entre professoras, coordenadoras e pesquisadoras

é referente às horas de estágio. Enquanto umas acreditam que 400 horas de

estágio ainda é pouco para formação, ou que o curso de Pedagogia deveria ser

ainda mais teórico, que deveria possuir maior carga horária, outras pensam

que 300 horas de estágio bem feito, bem articulado, bem embasado é o

suficiente para a formação do professor. Contudo, todas acreditam que

nenhum curso, por melhor que seja, possa dar ao aluno o que ele só aprenderá

realmente vivenciando.

O problema que se instaura no PL é referente à qualidade dos cursos de

Pedagogia frente às dificuldades vivenciadas pelo professor dentro da sala de

aula. A responsabilidade pela aprendizagem recai sobre esse profissional que

ensina de forma autônoma e desvinculada de um saber sobre a prática. Dessa

forma, o processo educativo é reduzido ao processo de ensino-aprendizagem e

que, nessa concepção, o professor passaria a ser tão priorizado que se

estabeleceria uma relação mecânica entre o seu preparo e o êxito ou o

fracasso do processo.

Se as altas taxas de reprovação na primeira série do ensino fundamental

(hoje primeiro ano) estão relacionadas somente como a falta de preparo dos

alfabetizadores, certamente, o termo fracasso escolar debruçaria sobre a

formação deste profissional sem incluir nenhum outro viés como determinante

para sua explicação. Contudo, o fato de tomar consciência de que o fracasso

escolar pode ter a sua origem nas carências econômicas, sociais e culturais

leva-nos a refletir que o professor não pode ser julgado sozinho nesse

processo educativo.

Dessa forma, buscando entender a RP encontramos no Sistema

Educacional Francês um modelo de formação para os professores dentro das

Instituts Universitaires de Formation de Maitres, as IUFMs, que investem em

seus alunos desde o Liceu para a vida acadêmica e os preparam assim, para a

carreira de professores. No entanto, o que se passa naquele país é um

investimento na formação profissional dos docentes, já que ao passarem nos

cursos de formação de professores, ainda no período probatório, já começam a

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receber como professores efetivos. As autoridades daquele país entenderam

que para melhorar a qualidade do ensino também era necessário atrair o aluno

para essa profissão. E, dessa forma, teria que valorizar o professor,

principalmente o professor da Educação Infantil e do Ensino Elementar, e dar a

ele a oportunidade de progredir na sua profissão. É como se fosse a nossa

estrutura educacional, uma preparação desde o Ensino Médio para a formação

docente e ao terminar os estudos universitários o aluno sairia com o certificado

de Mestre. Esse modelo de formação poderia ser pensado em contexto

nacional, já que se busca que os jovens se interessem pela carreira de

professor e por sua valorização.

Porém, ao indagarmos e pesquisarmos sobre o PL de uma RP como um

programa que pudesse valorizar a profissão do professor concluímos baseados

nas entrevistas, que para existir essa valorização profissional e,

consequentemente, uma melhoria na qualidade do ensino deve-se investir na

carreira do professor, prioritariamente. É fundamental investir na formação

inicial de forma que a teoria seja fundamentada nos pilares das ciências

humanas e a prática seja um exercício da ação pedagógica. Além disso, é

necessário dar ênfase à formação profissional e continuada, pois todas as

formações se articulam entre si no contexto em que a aprendizagem é um

processo que não se desvincula. Sendo assim, a valorização da carreira

docente no que tange os aspectos salariais é para muitos, a porta de entrada

para atrair jovens que se interessam em ingressar nas licenciaturas.

Percebemos, no entanto, que o PL possui uma preocupação bastante

significativa, que é colocar o recém-formado dentro de uma sala de aula, sem

que o mesmo tenha vivido uma experiência prática nas séries iniciais da

Educação Básica. Mas isto não basta para que seja aprovado e instituído.

Certamente, o que MM aponta em seu PL sobre o estágio pode ser

verificado com as pesquisas de Gatti e Nunes (2009), e Gatti e Barreto (2009)

de que o estágio dos cursos de Pedagogia são registrados como parte das

estruturas curriculares, mas muitas vezes não se especificam como eles se

realizam, como são supervisionados e, ou acompanhados. Essa mesma

diretiva é reforçada nos depoimentos das pesquisadoras e das professoras.

Contudo, se não há clareza ao que se refere à execução, validação,

documentação, acompanhamento, convênio entre escolas das redes e,

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sobretudo, na vivência dos alunos das universidades com a sala de aula,

concluímos que é necessário que os órgãos e conselhos federais, estaduais e

municipais se envolvam na busca pela regulamentação e fiscalização de um

estágio mais comprometido com a formação desses futuros professores e com

a qualidade do ensino da educação como um todo.

O estágio é um momento em que o aluno pode experimentar e aprender

com as dificuldades ou erros possíveis. Diante disso, acredita-se que o estágio

é uma situação para se refletir a ação pedagógica guiado por um orientador,

por uma pessoa mais experiente, que articule com ele a teoria e ação. Todavia,

torna-se fundamental interligar a formação dos professores no âmbito das

instituições superiores com a escola e com os órgãos normatizadores de

ensino. Creio que este é o maior desafio frente a proposições que almejam que

a formação inicial dos professores seja fortemente embasada e articulada com

o que se deseja transmitir na Educação Básica.

Acreditamos, então, que é importante acompanhar esse PL que nasce

na esfera do próprio legislativo e tendo que o Poder Executivo não subordinou

o Poder Legislativo na tramitação das proposições sobre educação. Até o

momento da entrega dessa pesquisa, o PL n. 227 de um RE ou RP

encontrava-se sem emendas e nos trâmites do Senado. Ocorreu na data de 15

de abril de 2009 uma Audiência Pública para se discutir o referido documento.

No entanto, aguardamos o Parecer oficial da Comissão que teve a

oportunidade de se discutir o presente projeto nessa acareação.

Creio que este PL não será aprovado nos moldes em que se encontra já

que alguns fatores apontados no decorrer desta pesquisa assim o revelaram.

Fatores como obrigatoriedade e a indicação das séries para se concluir a RP,

bem como, o ingresso em concursos públicos estão entre lacunas. Isso dificulta

a sua aprovação e aumenta a dúvida sobre a sua validade. Tomando como

base o perfil dos professores ditado por Gatti e Barreto (2009) que revelam que

os estudantes do curso de Pedagogia são, em grande maioria, alunos

trabalhadores, a obrigatoriedade tornaria esse projeto, ainda mais inexequível,

pois não releva a realidade dessas pessoas. Fica inviável obrigar que um aluno

abra mão de seu emprego para o cumprimento de uma residência e isso é

confirmado através de alguns relatos inseridos nesse estudo.

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Mesmo oferecendo-se uma bolsa de estudos, o PL é omisso ao não

dizer os valores mínimos para a sua efetivação. Todavia, sabemos da luta por

um piso salarial mínimo para 40 horas de trabalho semanais e que a classe dos

profissionais da educação reivindicou. O valor do piso hoje esta próximo a dois

salários mínimos e essa realidade ainda está longe da almejada pelos

educadores. Uma bolsa de estudos não poderia ser menor do que o valor do

piso, mas daí surge a incompatibilidade da formação. Os profissionais que já

atuam e que agora buscam a formação de nível superior, estariam em situação

desfavorável, pois teriam que abrir mão dos benefícios salariais atingidos por

tempo de carreira para atuarem como residentes, não terem garantias

profissionais, além de receberem bem menos.

Uma iniciativa do MEC para valorizar ainda mais a profissão do

professor veio com a criação do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à

Docência, ou PIBID pela CAPES\MEC em janeiro de 2008. Tal programa tem

por finalidade a de valorizar o magistério e dar suporte aos estudantes de

licenciatura, das instituições públicas, de educação superior bem como as

instituições de ensino superior reconhecidas como comunitárias. Essas bolsas

são voltadas ao aprimoramento da formação docente e visam elevar o padrão

de qualidade da Educação Básica.

Contudo, o PIBID é uma proposta que se assemelha ao PL do senador

MM que visa à implantação de uma RP, porém a proposta do PIBID é conciliar

a formação inicial, com o estágio supervisionado dentro das escolas da rede

pública, dando suporte metodológico e de práticas docentes, valorizando o

espaço da escola pública como campo de experiência e de construção do

conhecimento.

Dessa forma, envolvendo instituição superior e instituição de educação

básica e concedendo bolsas acredita-se que essa integração apóie a

valorização do magistério e a melhoria da qualidade do ensino como um todo.

Algumas universidades lançaram projetos de iniciativa própria similares

ao proposto ao PL de uma RP. Porém, o diferencial é que este projeto é

direcionado aos próprios alunos de seus cursos de licenciaturas. Vinculam o

aluno às escolas e mantém aprovação e bolsa concedida pelo Governo do

Estado.

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A análise dos aspectos teóricos e práticos da aprendizagem constitui-se

como um estudo específico, que abrange diversas possibilidades de novas

pesquisas com diferentes formas de percepções e interpretações. O campo do

estágio necessita de mais análises por se constituir como parte fundamental

para a formação dos alunos e em especial, dos professores. Um estudo mais

detalhado sobre o estágio probatório também poderia ser refletido.

Sendo assim, novas pesquisas podem ajudar a verificar a validade

desses projetos e assim, encontrar soluções que agreguem na qualidade da

educação básica, professores mais qualificados, menos inseguros e mais

satisfeitos.

Deve-se fazer um estudo mais aprofundado, localizado que investigue

os estágios para a docência; que busque nas ementas e na prática, como são

realizados, supervisionados e acompanhados. Acredito também que o PIBID

deva ser estudado categoricamente para que, assim, possa oferecer uma

análise do acompanhamento dos alunos universitários e dos alunos da

Educação Básica que são beneficiados com uma educação mais

fundamentada e mais engajada com o aprendizado.

Finalmente, mesmo sem considerar que o PL de uma RP possa resolver

o problema da alfabetização, ou do fracasso escolar, consideramos que é uma

proposta que nos faz pensar não somente na importância que o estágio tem

para a formação docente, mas também na forma que se tem articulado a teoria

com a prática dentro do âmbito escolar, mais especificamente, nas salas de

aula da Educação Básica. Em suma, o PL nos faz refletir que o problema da

formação de educadores é um problema global em sua totalidade. Assim, não

podemos pensar que os diferentes níveis do ensino possam ser melhorados

isoladamente. Acreditamos que a essência dos cursos de Pedagogia está em

se pensar a sua relação com a prática e com seus elementos constitutivos da

relação pedagógica, ou seja, com os alunos, com os conteúdos, os métodos, a

sociedade, articulados pela ação do educador e norteados pelas políticas

públicas educacionais que preservam os direitos sociais do cidadão.

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REFERÊNCIAS

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ANEXO A

PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 227, DE 2007

Acrescenta dispositivos à Lei nº 9.394, de 20

de dezembro de 1996, para instituir a

residência educacional a professores da

educação básica.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O art. 65 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 passa a

vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:

“Art. 65.

.......................................................................................

Parágrafo único. Aos professores habilitados para a

docência na educação infantil e nos anos iniciais do ensino

fundamental será oferecida a residência educacional, etapa

ulterior de formação, com o mínimo de oitocentas horas de

duração, e bolsa de estudo, na forma da lei. (NR)”

Art. 2º A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com

o acréscimo do seguinte artigo 87-A:

“Art. 87-A. Decorridos dois anos após a vigência do

parágrafo único do art. 65, torna-se obrigatório, para a atuação do

professor nos dois anos iniciais do ensino fundamental, o

certificado de aprovação na residência educacional.”

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

A formação de professores para atuar na educação básica, mormente

nos anos iniciais do ensino fundamental, quando se concentra o processo básico do

ensino-aprendizagem da alfabetização, tem passado nos últimos anos por intensa

crise.

Durante mais de um século, os professoras e professores dos cursos

então chamados de “primário” e “pré-primário”, destinados a crianças de quatro a dez

anos de idade, eram formadas nas Escolas Normais.

A história da educação brasileira registra uma consonância quase

perfeita entre as demandas dessas crianças e as professoras “normalistas”, que,

durante três anos de intensivo estudo de conteúdo e de metodologia, se preparavam

para seu atendimento. Nos cursos normais, alternavam-se as aulas teóricas e práticas,

de forma que fossem adquiridas as principais habilidades e competências necessárias

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aos futuros mestres. É certo que nem todos perseveravam na difícil empreitada de

alfabetizar crianças e adultos. Mas o sucesso da aprendizagem da maioria atestava a

adequação do processo formativo.

Enquanto isso, os poucos professores demandados pelos antigos

ginásios e colégios, que constituíam nosso ensino secundário, na maioria recrutados

da classe média, eram profissionais liberais ou licenciados em faculdade de filosofia,

ciências e letras. Com a massiva democratização do acesso às escolas primárias e

secundárias, dois fenômenos ocorreram simultaneamente: a necessidade de

muitíssimos mais professores e a premência de uma formação em nível superior, esta

última requisitada pelas situações mais complexas a serem enfrentadas nas escolas.

Ao mesmo tempo em que caía a qualidade do ensino e da

aprendizagem no ensino fundamental e médio, deteriorava-se a formação dos

docentes. Em grande parte, pelo dito antes – a formação tradicional não atendia as

novas situações. Também pelas condições dos que passaram a demandar a profissão

do magistério, oriundos agora das classes populares menos escolarizadas. Muito mais

pelo relaxamento dos processos de ensino nas habilitações para o magistério que

sucederam os cursos normais a partir de 1972 e na maioria dos cursos superiores de

pedagogia, que se multiplicaram sem critério desde o mesmo ano.

Os resultados estão aí, há mais de duas décadas: os estudantes

aprendendo cada vez menos e os professores cada vez mais inseguros, quer os

preparados em nível médio, quer os que freqüentaram os cursos “normais superiores”

ou cursos de pedagogia, muitos em período noturno, muitos em regime modular como

“escolas de fins de semana”, todos sem a necessária articulação entre teoria e prática.

A “residência médica” inspira o presente projeto de lei. Sabemos da

importância na formação dos médicos os dois, ou mais anos, de residência, ou seja,

do período imediatamente seguinte ao da diplomação, de intensa prática junto a

profissionais já experientes, em hospitais e outras instituições de saúde, quando não

somente são testados os conhecimentos adquiridos como se assimilam novas

habilidades exigidas pelos problemas do cotidiano e pelos avanços contínuos da

ciência.

A Lei nº. 9.394, de 1996, que fixa as diretrizes e bases da educação, já

previu, em seu artigo 65, trezentas horas de prática de ensino obrigatórias durante a

formação dos professores. Entretanto, nem as escolas que atualmente oferecem

cursos normais nem as instituições superiores com cursos de pedagogia estão tendo

condições de desenvolver esse estágio de forma satisfatória, nem os alunos,

geralmente já trabalhadores, têm previsto tempo adequado durante os quatro anos de

formação para se dedicarem a esta carga horária de prática. Além disso, no caso dos

cursos de pedagogia, abriu-se um leque tão amplo de campos de estágio que poucos

alunos têm oportunidade de exercer sua prática no lugar e no momento mais

importantes da vida dos educandos, que são os dois anos de maior intensidade da

alfabetização – os seis e sete anos de idade.

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As taxas de reprovação na primeira série do ensino fundamental são

alarmantes. A cada ano, ingressam no ensino fundamental público cerca de 2.900.000

crianças. Mas, estão matriculadas na antiga primeira série 5.600.000 crianças – o que

indica a existência de 2.700.000 repetentes. Entre as inúmeras causas desta

catástrofe, que irá comprometer o futuro de milhões de brasileiros, está o atual

despreparo dos professoras e professores para o desafio da alfabetização. E se

examinarmos a situação entre os jovens e adultos, a situação é ainda mais grave: há

décadas tentamos erradicar o analfabetismo e ainda convivemos com 19 milhões de

analfabetos absolutos e quase 40 milhões de outros analfabetos funcionais. Sem

dúvida alguma, a falta de preparo dos alfabetizadores está na raiz da questão.

A residência educacional, tal como se propõe neste projeto de lei, não é

um período de estudos integrado aos cursos normais ou cursos de pedagogia, mas

um período de formação e trabalho ulterior a eles, que deve ser regulamentado nos

aspectos pedagógicos pelos Conselhos de Educação e, nos aspectos administrativos

e financeiros, pelos sistemas de ensino, com a necessária colaboração da União. A

força do atual projeto é dada pela exigência da residência educacional como pré-

requisito de atuação nos anos iniciais de qualquer rede de ensino, pública ou privada.

No caso da pública, o certificado de residência poderia ser obrigatório como título nos

concursos públicos, de acordo com lei geral ou dos sistemas de ensino.

O âmbito da obrigatoriedade fica limitado aos dois anos iniciais do

ensino fundamental não somente em razão da importância desse momento de

alfabetização no processo educativo como também para permitir viabilidade financeira

aos órgãos contratantes e de formação que irão investir nesse reforço estratégico de

formação docente.

A proposta concede tempo superior a um ano para a implantação de

seus dispositivos, de modo a viabilizar a oferta da residência para os recém-formados

e os que irão se habilitar no decorrer do ano de sua publicação. Obviamente,

garantem-se os direitos adquiridos aos atuais professores em exercício, embora um

programa de residência como atualização profissional possa ser oferecido pelos

sistemas de ensino aos professores que atuam nos anos iniciais do ensino

fundamental.

Acreditando que esta medida contribui para a melhoria da qualidade de

nossa educação, pública e privada, confio na compreensão e aprovação do projeto por

meus Pares.

Sala das Sessões, 04 de maio de 2007.

Senador MARCO MACIEL

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APÊNDICE A

ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA

Aplicada aos Professores do Curso de Pedagogia

Eixo 1) O curso de Pedagogia – Licenciatura:

Desafios

Perspectivas

O perfil do aluno de Pedagogia

Horas de estágio e de prática docente X Aprendizagem

Diretrizes Curriculares Nacionais

Eixo 2) A experiência da Prática Docente nos cursos de Formação de

Professores: Licenciatura em Pedagogia:

Desafios

Perspectivas

A relação teoria-prática

Tempo de Prática durante o curso X Aprendizagem X Qualidade do

Ensino

Eixo 3) A Residência Pedagógica para os recém-graduados do curso de

Pedagogia:

Desafios e/ou dificuldades X melhoria da qualidade do Ensino

Fundamental

Perspectivas

Viabilidade (ou não)

Carreira

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APÊNDICE B44

PESQUISA Prática Docente QUESTIONÁRIO Nº

Data de Aplicação: / /

INSTRUÇÕES:

Assinale somente uma alternativa por questão;

Somente na questão 22 escolha três alternativas;

Não deixe nenhuma questão sem resposta;

Caso tenha alguma dúvida ou necessite de informações, comunique-se com o pesquisador. I – DADOS DO GRADUANDO

1- Nome (opcional):

2- Sexo: ( ) feminino ( )

masculino

3- Data de nascimento: / /

4- Estado civil: ( ) solteiro(a) ( ) casado(a) ( )

separado(a)

( ) viúvo(a) ( ) outros

5- Possui filhos? ( ) não ( ) sim Quantos?

6- Bairro em que mora: 7- Município de residência: 8- Você estudou a maior parte da sua vida

escolar em qual tipo de instituição? (

)Municipal ( ) Estadual ( )

Particular ( ) Federal

II – VIDA ACADÊMICA

9- Estuda atualmente em qual

período do curso de Pedagogia? ( )

período

10- Em qual tipo de instituição? ( )

Estadual ( ) Federal ( )

Particular

11- Em qual turno?

( )manhã ( )tarde ( )noite

12- Você é bolsista?

( ) Sim ( ) Não

13A- Você participa de

algum programa do

governo? ( ) Sim

( ) Não

13B- Se sim responda qual

?

14- Você já realizou as

atividades práticas

obrigatórias do seu curso? (

) Sim ( ) Não

15 A- Se sim, qual

período foi iniciado a

prática? ( ) período

15 B- Em qual rede de

ensino? ( )Particular ( )

Pública

16- Se não, em qual período elas se iniciarão? ( )

período

17- Você considera a prática da sua profissão

enquanto estudante do curso de Pedagogia:

( )Muito enriquecedora, mas são poucas horas para a

prática

( )Muito enriquecedora, com carga horária suficiente

para o aprendizado

( )Pouco enriquecedora, pois não me acrescentou

novos conhecimentos

( )Pouco enriquecedora, mas indispensável

( ) Desnecessária

18 A– Você se considera

satisfeito(a) com seu curso?

( ) Sim ( ) Não

19 –Você já fez ou faz

alguma atividade ligada

à pesquisa?

( )Sim. Qual?

( ) Não

!8 B – Justifique sua resposta 20 – Você pretende

continuar com sua vida

acadêmica quando

terminar sua graduação?

( ) Sim ( ) Não

44 Esse questionário possui outra formatação, pois foi pensado em viabilizar as informações de acordo com o tempo disponibilizado. O original possui duas páginas.

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V – SOBRE A SUA PRÁTICA

21A- Você trabalha? ( ) não ( ) sim

21B- Se sim, em qual área? ( )comércio, vendas ( ) serviços gerais ( ) educação ( )do lar ( ) auxiliar

administrativo

( )outros – Qual?

22- O que você faz quando tem um tempo livre? (escolha três alternativas):

( ) descansa/ dorme ( )namora ( ) afazeres domésticos

( ) lê assuntos do seu interesse ( ) estuda ( ) pratica esportes

( ) encontra com seus amigos/parentes ( )assiste filmes/ Tv ( )outros.

Quais?_____________________

23- Você acredita que as aulas teóricas do seu curso são o que para o seu aprendizado?

( ) muito importantes ( ) importantes ( ) mais ou menos importantes ( ) pouco importantes ( ) não

importantes – Justifique sua resposta.

24- Se você pudesse mudar algo no seu curso o que você mudaria? Por quê?

25- A Residência Educacional, ou Residência Pedagógica é um Projeto de Lei que visa levar o recém- formado em

Pedagogia para a sala de aula. Seriam mais 800 horas de prática da qual o residente seria tutorado o tempo todo

por um professor regente (como por exemplo, o que acontece na Residência Médica). Nesse Projeto de Lei seria

fornecido uma bolsa para os custos, mas os residentes deveriam cumprir a carga horária, obrigatoriamente, nos 2

primeiros anos. Não se propõem vínculos empregatícios ou estabilidade na função após seu término. Mas seria uma

exigência como pré-requisito de atuação para os anos iniciais, ou o certificado da Residência Pedagógica valeria

como títulos em concursos públicos. Segundo o autor do Projeto de Lei, o Senador Marco Maciel, para que o

fracasso escolar diminua (evasão, repetência), o professor deveria ser mais bem preparado e assim, saberia lidar

com todas as dificuldades que ocorrem no interior da escola, principalmente, nos anos iniciais quando se dá a

alfabetização. (MARCOS MACIEL – Senador do DEM e autor do Projeto de Lei n227 sobre a Residência

Pedagógica). VOCÊ O QUE ACHA? JUSTIFIQUE A SUA RESPOSTA. ( ) acha bom, mas não gostaria de fazer

( ) acha bom, mas já trabalha

( ) acha ótimo e faria com gosto

( ) acha ruim, mas acha a prática importante para o aprendizado

( ) acha ruim, mas não se opõe

( ) acha desnecessário

Justifique a sua resposta.

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Muito obrigada pela sua participação e colaboração, fundamentais para o desenvolvimento dessa pesquisa.

Os dados aqui apresentados são confidenciais, ou seja, não serão divulgados as respostas individuais, nem o seu

nome.

Para finalizar, você aceita participar das entrevistas45 que serão realizadas pessoalmente na segunda etapa dessa

pesquisa?

( ) não ( ) sim

Em caso afirmativo, por favor, informe os seguintes dados:

Nome:

Telefone:

E-mail:

45 Esta entrevista será realizada em local, data e horários previamente combinados.