DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE ... · ADNAMAR SANTOS –...

78
CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS EVENTO: Audiência Pública N°: 0469/09 DATA: 29/04/200 9 INÍCIO: 14h32min TÉRMINO: 18h24min DURAÇÃO: 03h51min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h51min PÁGINAS: 77 QUARTOS: 47 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO LÚCIA MORAES – Relatora Nacional pelo Direito Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana. CELSO SANTOS CARVALHO – Diretor do Planejamento Urbano da Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades. ETHEL PROENÇA BRAGA – Representante do Departamento de Planejamento Urbano e Conflitos Fundiários do Ministério das Cidades. GILDA PEREIRA CARVALHO – Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão. RAQUEL ROLNIK – Relatora Especial para o Direito à Moradia da Organização das Nações Unidas. DARCI FRIGO – Representante da Plataforma Dhesca Brasil. GILBERTO CARDOSO AGUIAR – Representante do Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM. MARCELO BRAGA EDMUNDO – Representante da Central de Movimentos Populares. VERÔNICA KROLL – Representante da União Nacional por Moradia Popular. CRISTIANO MULLER – Representante do Fórum Nacional de Reforma Urbana. COSME VÍTOR – Representante da Associação de Favelas de São José dos Campos e da Central dos Movimentos Populares – CMP. JAIRO SALVADOR – Defensor Público de São José dos Campos, Estado de São Paulo. SUELI OLIVEIRA – Presidente do Conselho Estadual das Cidades e Secretária de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado do Pará. TONHÃO DUTRA – Vereador de São José dos Campos, Estado de São Paulo. ADNAMAR SANTOS – Representante da Cáritas de Manaus. BENEDITO ROBERTO BARBOSA – Representante da União Nacional para o Direito à Moradia. MANOEL COELHO SOARES DIVINO – Representante da União Estadual de Moradia Popular de Goiás. GENIVALDO DOS SANTOS – Representante de São Paulo. DULCE BENTES – Professora e representante do Rio Grande do Norte. SUMÁRIO: Discussão e encaminhamento de proposições do relatório elaborado pela Plataforma Dhesca Brasil sobre a efetivação do direito humano à moradia adequada no Brasil no período 2007-2009. OBSERVAÇÕES Reunião conjunta com a Frente Parlamentar pela Reforma Urbana, com a Relatoria Nacional do Direito Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana, da Plataforma Dhesca Brasil.

Transcript of DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE ... · ADNAMAR SANTOS –...

CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOSEVENTO: Audiência Pública N°: 0469/09 DATA: 29/04/200 9INÍCIO: 14h32min TÉRMINO: 18h24min DURAÇÃO: 03h51minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h51min PÁGINAS: 77 QUARTOS: 47

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

LÚCIA MORAES – Relatora Nacional pelo Direito Human o à Moradia Adequada e Terra Urbana.CELSO SANTOS CARVALHO – Diretor do Planejamento Urb ano da Secretaria Nacional deProgramas Urbanos do Ministério das Cidades.ETHEL PROENÇA BRAGA – Representante do Departamento de Planejamento Urbano eConflitos Fundiários do Ministério das Cidades.GILDA PEREIRA CARVALHO – Procuradora Federal dos Di reitos do Cidadão.RAQUEL ROLNIK – Relatora Especial para o Direito à Moradia da Organização das NaçõesUnidas.DARCI FRIGO – Representante da Plataforma Dhesca Br asil.GILBERTO CARDOSO AGUIAR – Representante do Moviment o Nacional de Luta pela Moradia– MNLM.MARCELO BRAGA EDMUNDO – Representante da Central de Movimentos Populares.VERÔNICA KROLL – Representante da União Nacional po r Moradia Popular.CRISTIANO MULLER – Representante do Fórum Nacional de Reforma Urbana.COSME VÍTOR – Representante da Associação de Favela s de São José dos Campos e daCentral dos Movimentos Populares – CMP.JAIRO SALVADOR – Defensor Público de São José dos C ampos, Estado de São Paulo.SUELI OLIVEIRA – Presidente do Conselho Estadual da s Cidades e Secretária deDesenvolvimento Urbano e Regional do Estado do Pará .TONHÃO DUTRA – Vereador de São José dos Campos, Est ado de São Paulo.ADNAMAR SANTOS – Representante da Cáritas de Manaus .BENEDITO ROBERTO BARBOSA – Representante da União N acional para o Direito à Moradia.MANOEL COELHO SOARES DIVINO – Representante da União Estadual de Moradia Popular deGoiás.GENIVALDO DOS SANTOS – Representante de São Paulo.DULCE BENTES – Professora e representante do Rio Grande do Norte.

SUMÁRIO: Discussão e encaminhamento de proposições do relatório elaborado pelaPlataforma Dhesca Brasil sobre a efetivação do dire ito humano à moradia adequada no Brasilno período 2007-2009.

OBSERVAÇÕES

Reunião conjunta com a Frente Parlamentar pela Refo rma Urbana, com a Relatoria Nacional doDireito Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana, da Plataforma Dhes ca Brasil.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

1

O SR. PRESIDENTE (Deputado Luiz Couto) - Inicialmente, informo que a

Comissão de Direitos Humanos e Minorias, a partir de hoje, ainda em caráter

experimental, começa a utilizar a ferramenta Twitter, uma inovação da Internet

colaborativa, a Web 2.0. Vamos utilizar o Twitter para divulgar notícias e informações

relacionadas ao trabalho desta Comissão e à luta em defesa e promoção dos

direitos humanos em geral.

Para acompanhar esta audiência pública recebendo mensagens de texto,

basta acessar o endereço eletrônico www.twitter.com/cdhcamara.

Esta ação, além de promover as bandeiras dos direitos humanos, contribui

para democratizar a comunicação.

Declaro abertos os trabalhos da presente audiência pública que a Comissão

de Direitos Humanos e Minorias realiza em parceria com a Frente Parlamentar pela

Reforma Urbana, com a Relatoria Nacional do Direito Humano à Moradia Adequada

e Terra Urbana, da Plataforma Dhesca Brasil.

Esta audiência tem como finalidade discutir e encaminhar proposições do

relatório elaborado pela Plataforma Dhesca Brasil sobre a efetivação do direito

humano à moradia adequada no Brasil no período 2007-2009.

A Relatora Nacional pelo Direito Humano à Moradia Adequada e Terra

Urbana, Lúcia Morais, apresentará relatório contendo os resultados do trabalho da

Relatoria entre 2007 e 2009. Nesse período, foram realizadas visitas e missões para

investigar violações ao direito à moradia em 7 cidades: São José dos Campos, São

Paulo; Manaus, Amazonas; Macapá, Amapá; Belém, Pará; Goiânia Goiás; Rio

Grande, Rio Grande do Sul; Natal, Rio Grande do Norte, e Rio de Janeiro.

Informo que a realização deste evento atende a requerimento de autoria do

Deputado Pedro Wilson, 1º Vice-Presidente desta Comissão, e do Deputado Paulo

Teixeira, Presidente da Frente Parlamentar pela Reforma Urbana.

Gostaria de destacar a pertinência dessa iniciativa, a começar porque o direito

à moradia tem enorme impacto sobre os demais direitos e é essencial para definir a

qualidade de vida e o exercício da cidadania. É um direito que está associado, por

exemplo, à questão ambiental e às demandas por um planejamento urbano

sustentável.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

2

Embora seja tão importante e esteja consignado pelo Pacto Internacional dos

Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e Culturais, o direito à moradia é ainda

pouco reconhecido como um direito humano. Portanto cabe a todos nós divulgar e

fortalecer a exigibilidade desse direito.

Esta audiência também é oportuna porque ocorre no momento em que se

debate o programa de habitação popular do Governo Federal, em parceria com

Governos Estaduais e Prefeituras Municipais. Sem dúvida, é um programa de

grande alcance social e, por isso mesmo, deveria incorporar a contribuição dos

técnicos, dos militantes e das lideranças políticas que historicamente têm atuado na

perspectiva da moradia como direito humano.

Quero saudar nossos convidados expositores, tanto do Governo Federal

como do movimento social e da Plataforma Dhesca, que de certa forma representam

um pouco do pensamento dessa militância pelo direito à moradia.

Dessa forma, esperamos que as reflexões e as propostas que serão

apresentadas possam ser objeto da atenção e da incorporação pelo Ministério das

Cidades e outros órgãos do Poder Executivo no programa de habitação popular.

Passamos então a compor a Mesa desta audiência pública convidando os

expositores Dr. Celso Santos Carvalho, Diretor do Departamento de Planejamento

Urbano da Secretaria Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades

(palmas); Dra. Ethel Proença Braga, representante do Departamento de

Planejamento Urbano e Conflitos Fundiários do Ministério das Cidades (palmas);

Dra. Gilda Pereira Carvalho, Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (palmas);

Dra. Raquel Rolnik, Relatora Especial para o Direito à Moradia da Organização das

Nações Unidas (palmas); Dra. Lúcia Morais, Relatora Nacional pelo Direito Humano

à Moradia Adequada e Terra Urbana (palmas).

Como não há espaço para todos, vamos considerar a primeira fila uma

extensão da Mesa. Estão presentes diversas entidades de direitos humanos na luta

pela moradia.

Convido ainda o Sr. Gilberto Cardoso Aguiar, representante do Movimento

Nacional de Luta pela Moradia (palmas); a Sra. Verônica Kroll, representante da

União Nacional por Moradia Popular (palmas); o Sr. Cristiano Muller, representante

do Fórum Nacional de Reforma Urbana (palmas); o Sr. César Santos, representante

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

3

da Confederação Nacional de Associação de Moradores — CONAM (palmas); e o

Sr. Darci Frigo, representante da Plataforma Dhesca Brasil (palmas).

Como disse antes, a primeira bancada do plenário será uma espécie de

extensão da Mesa, já que não há espaço para incluir todos que farão uso da

palavra. Os representantes dos movimentos sociais presentes ficarão na primeira

bancada e suas intervenções serão feitas após as intervenções dos membros da

Mesa.

Dada a exiguidade do tempo disponível, definimos o tempo de 10 minutos

para cada um dos representantes do Poder Público e da Plataforma Dhesca, e de 5

minutos para cada um dos expositores das representação dos movimentos sociais.

É claro que a Mesa considerará, se for o caso, a necessidade de dispor mais tempo.

Antes de iniciar as exposições, gostaria de convidar o Deputado Pedro

Wilson, um dos propositores desta audiência pública, para coordenar os trabalhos

da Mesa. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Pedro Wilson) - Dando continuidade ao

evento, concedo a palavra à Prof.a Lúcia Morais, Relatora Nacional pelo Direito

Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana.

A SRA. LÚCIA MORAES - Boa tarde a todos os presentes a esta audiência

pública. Quero cumprimentar o Deputado Federal Pedro Wilson, que nos atendeu e

solicitou a realização desta audiência pública, e os demais representantes da Mesa.

Destacamos a importância desta audiência pública, na Relatoria Nacional

pelo Direito Humano à Moradia Adequada e Terra Urbana, no sentido de expor um

pouco dos problemas das violações ao direito humano à moradia que vêm

acontecendo no Brasil. Por que estou falando em expor um pouco dos problemas?

Porque, infelizmente, não vamos dar conta de relatar todos os problemas que vêm

acontecendo nas cidades brasileiras.

Nossa grande intenção é que esta Casa possa, realmente, integrar-se à

questão dos conflitos fundiários urbanos e que possa ajudar essa comunidade, essa

população que hoje sofre a violação do direito humano em seu local de moradia, em

sua cidade, em sua casa. Junto a essa violação ao direito à moradia, infelizmente,

acontecem outras violações, como a que envolve a questão da criança, a falta de

alimentação e o próprio risco de morte nessas comunidades.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

4

Nesse sentido — depois o Frigo vai expor o que é a Plataforma Dhesca —, a

Relatoria Nacional do Direito Humano à Moradia é uma das que compõem a

Plataforma Brasileira dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais e

Ambientais. Desde julho, o Brasil conta também com a Relatoria Internacional do

Direito à Moradia, uma relatoria especial, de que é relatora a nossa colega arquiteta

Dra. Raquel Rolnik. Temos, portanto, a possibilidade, hoje, de a Relatoria Nacional,

integrada com a Relatoria Internacional, dar essa visibilidade aos problemas de

violação do direito humano à moradia nas cidades como um todo.

Gostaríamos de ser bastante sucintos na apresentação, porque estão

presentes vários representantes das cidades que foram visitadas e eles também

colocarão a vivência deles no dia-a-dia dessa luta pelo direito humano à moradia.

A Relatoria Nacional, a partir das denúncias que nos foram apresentadas,

juntamente com o Fórum Nacional de Reforma Urbana, a Frente Nacional pelo

Saneamento, o Movimento Nacional de Luta pela Moradia — MNLM, a Central de

Movimentos Populares — CMP — e a Confederação Nacional das Associações de

Moradores — CONAM, seleciona os casos e determina as cidades a serem

visitadas. Mediante denúncia, organizamos missões e visitamos o local para

averiguar as violações.

Vou falar um pouco de cada missão realizada e, posteriormente, vamos

entregar o relatório elaborado durante a missão aos representantes e autoridades

presentes.

Realizamos duas missões em Goiânia. A primeira foi uma missão de

investigação logo após um despejo que aconteceu na ocupação do Parque Oeste

Industrial.

Como a Relatora reside em Goiânia, nós fizemos um monitoramento

constante dessa comunidade e, infelizmente, relato para vocês que, no dia 27 de

abril, na segunda-feira, o líder comunitário Américo Novaes foi condenado pelo júri

popular a 5 anos e 4 meses em regime semiaberto.

Eram duas pessoas arroladas nesse processo de criminalização em função

de que, um dia antes do despejo, um policial recebeu um tiro. Tanto o Américo como

o Josiel foram arrolados no processo. Embora não haja comprovação de que tenha

sido o mandante, ele foi condenado como mandante do crime, e o processo de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

5

criminalização de quem assassinou 2 moradores durante o despejo ainda continua

com uma certa morosidade.

Essa questão do despejo, infelizmente, não aconteceu só em Goiânia. Vem

acontecendo em grande parte das cidades brasileiras. Temos o caso de São José

dos Campos, onde os despejos acontecem constantemente; temos o caso da cidade

de Manaus, onde realizamos também uma missão — os despejos na cidade de

Manaus acontecem constantemente, tanto em ocupações novas como em lugares

em que as famílias já moram há mais de 10, 15 anos. As cidades de São Paulo e

Rio de Janeiro implementam uma política de higienização, que consta basicamente

em remover a população de baixa renda da cidade. Não existe um projeto integrado

da urbanização para fixar essas famílias.

Então esse assunto, esse problema do despejo acontece em âmbito nacional,

e um dos grandes eixos da Relatoria e dos movimentos nacionais é como vamos

conter essa questão do despejo.

Temos também a questão da urbanização dos igarapés. Tanto em Manaus

como na cidade de Belém, para urbanizar os igarapés, são removidas, são

despejadas aquelas famílias para lugares longínquos, para conjuntos habitacionais

construídos fora da cidade, fora da malha urbanizada daquela cidade. Ao se

construir os conjuntos habitacionais, as famílias são transferidas para aqueles

lugares onde não existe qualquer tipo de equipamento comunitário. Em geral,

demora-se de 5 a 10 anos para construir escolas de primeiro grau, de segundo grau,

creche, posto de saúde.

Vou citar um caso de Manaus, o do conjunto João Paulo II, onde as famílias já

estão morando há 6 anos. É uma área de grande proliferação do mosquito da

malária, várias pessoas já contraíram a doença e não há sequer um posto de saúde.

Então há uma luta pela não segregação urbana e pela construção de equipamentos

comunitários para essa comunidade.

Na cidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, onde realizamos uma

missão preventiva, detectamos também a segregação urbana. Foi construída a

cidade de Águeda, fora da cidade, para onde foi levada a população de baixa renda

removida, despejada da área central, também sem nenhum equipamento

comunitário e com um grande problema: a tecnologia adotada para a construção das

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

6

unidades habitacionais. O conjunto foi financiado pela Caixa Econômica Federal e a

tecnologia adotada foi de baixíssima qualidade. Inclusive temos notícias de que

essas casas vieram a desabar devido às chuvas. Então, existe esse grande descaso

na construção desses conjuntos habitacionais.

Temos recebido também — não fizemos uma missão em função disso ainda

—, em cada cidade que visitamos, denúncias sobre a Caixa Econômica Federal

quanto à questão de promover despejo de moradores que moram em conjuntos

habitacionais há vários anos. Esse é o caso do conjunto Tambaú, na cidade de

Manaus, onde as pessoas já moram há 15 anos e, por uma não negociação da

cooperativa com a Caixa Econômica, esta está solicitando o despejo dessas

famílias. Isso também vem acontecendo na cidade de Macapá. Então são despejos

promovidos pela Caixa Econômica Federal contra cooperativas. As famílias querem

negociar e, infelizmente, isso não vem acontecendo.

Temos ainda, na missão de monitoramento na cidade de Salvador, o exemplo

de edifícios ociosos na área central do Pelourinho que foram ocupados por famílias

e que hoje estão ameaçadas de despejo. Elas têm conseguido permanecer na área

por uma luta dos movimentos nacionais de moradia, do fórum nacional e devido a

uma articulação local. Ainda continuam lá mas, infelizmente, esses edifícios ainda

não oferecem condições de habitabilidade para essas famílias — inclusive eles

viriam aqui hoje, mas parece que não foi possível.

Vou citar aqui o exemplo do caso dos edifícios Chile e Lord, na área central

de Salvador e na área do Pelourinho, onde a sétima etapa em construção os

moradores reivindicam que seja ampliada para atender os moradores que hoje estão

no centro e não que seja removida aquela população para dar lugar ao comércio e

ao turismo que acontecem na região.

Na missão de Macapá nós detectamos um grande número de famílias que

moram em cima de rede de esgoto. Elas moram em palafitas, em áreas de alagados

e estão em cima dos esgotos. Então, são 5 mil famílias que moram nessas

condições super precárias. Não há a mínima condição de se dizer que isso é um

conjunto habitacional ou que isso é um bairro devido a essas condições de falta de

saneamento. Infelizmente, não há uma política habitacional nessa cidade que possa

atender essas famílias.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

7

Como último exemplo de violação, vou citar as zonas especiais de interesse

social que, infelizmente, não estão sendo implementadas em grande parte das

cidades que citei. Ou seja, a elaboração dos planos diretores não contou, na grande

maioria, com a participação da comunidade, como determina o Estatuto da Cidade,

portanto têm sido elaborados e implementados um pouco à revelia da comunidade.

Nesse sentido, quero citar o exemplo da cidade de Natal, onde, pela

valorização da orla e pela rica paisagem que esse local propicia, hoje há um projeto

no sentido de remover as famílias que ali moram incentivando transformar as leis em

outras zonas que possam dar lugar a edifícios habitacionais.

Esse exemplo nós temos também na cidade de Salvador, onde famílias que

moram há 20 anos em determinada área estão ameaçadas de despejo para dar

lugar a grandes empreendimentos.

Bom, esses são os focos das violações que gostaria de trazer para vocês.

Teríamos mais coisas para falar em termos de considerações finais, mas vamos

falar ao longo da nossa discussão aqui.

Quero frisar que todas as missões realizadas nessas cidades contaram com

parceria local, com entidades, com os movimentos que já citei aqui. Hoje temos aqui,

representando Manaus, a Caritas, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o

Observatório Cidades, e todas essas missões fazemos em parceria com as

entidades locais.

Agradeço pela oportunidade. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Pedro Wilson) - Obrigado, Dra. Lúcia Morais,

professora da Universidade Católica de Goiás e Relatora Nacional para o Direito

Humano à Moradia Adequada.

Quero registrar, com imensa alegria, a presença dos Deputados Fernando

Chucre, Fernando Nascimento, Chico Alencar e Paulo Teixeira, Presidente da

Frente Parlamentar pelo Direito à Moradia e coautor desse requerimento. (Palmas.)

Quero também registrar a presença de Germana Pires, Diretora da Federação

Nacional dos Arquitetos; Sandro, Vereador de Planaltina; Mardones, de Luziânia;

Jair Amaral e José Manoel, de Águas Lindas; Celso e Cristiano, de Valparaíso;

Midiam, de Águas Lindas; Tito, da União por Moradia; do MDS, e Ana Sueli, do

Governo do Pará.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

8

Ao longo da sessão vamos citando outros companheiros.

Tendo em vista outros compromissos, passo a palavra ao Dr. Celso Santos

Carvalho, Diretor do Planejamento Urbano da Secretaria Nacional de Programas

Urbanos do Ministério das Cidades, pelo prazo de 10 minutos.

O SR. CELSO SANTOS CARVALHO - Obrigado, Deputado Pedro Wilson.

Inicialmente quero cumprimentar a todos, companheiros e companheiras, e

agradecer pela oportunidade de participa deste debate e expor a visão do Governo

Federal, do Ministério das Cidades sobre a questão do direito à moradia no Brasil.

Esse quadro que a Lúcia apresenta é grave, reconhecemos que é grave. A

sociedade, os Municípios, os Estados e o Governo Federal têm responsabilidade

sobre essa questão e devem estar envolvidos na superação desse quadro. Nesse

sentido, o Governo Federal, a gestão do Presidente Lula, no início de 2003, ao

construir o Ministério das Cidades, que tem como missão propor e construir uma

nova política de desenvolvimento urbano para o País, tinha bem claro essa nova

política de desenvolvimento urbano, cuja tarefa é construir cidades que possam

acolher a toda população, superar as injustiças e a exclusão social, garantir o

saneamento e garantir principalmente o direito à moradia. Ou seja, a construção de

uma política de desenvolvimento urbano que garanta o direito à moradia é um dos

objetivos do Governo Federal desde 2003.

No que diz respeito, portanto, às ações do Ministério das Cidades nesse

campo, quero citar 3 grupos de ação: a regularização fundiária dos assentamentos

precários urbanos, a produção habitacional de interesse social e, depois, a

companheira Ethel, que coordena o trabalho de intermediação de conflitos fundiários

urbanos, vai se referir à terceira vertente da ação do Ministério das Cidades.

No que diz respeito à regularização fundiária de interesse social,

reconhecemos que, hoje, no Brasil temos alguma coisa em torno de 15 milhões de

domicílios, ocupados por população de baixa renda, que são irregulares; domicílios,

portanto, onde não se tem garantida a segurança da posse, a segurança da

manutenção dessas famílias nos locais onde construíram suas relações sociais,

econômicas e afetivas.

O programa de regularização fundiária deve avançar na regularização de 15

milhões de domicílios urbanos, cerca de 30% do total de domicílios urbanos no

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

9

Brasil. E quando falamos em regularização fundiária em uma perspectiva de direito à

moradia, isso para nós significa regularizar a posse da propriedade, do domínio

sobre o lote, mas também regularizar questões do ponto de vista urbanístico e

ambiental. A regularização fundiária para nós significa a plena integração dos

assentamentos à cidade.

Com essa perspectiva, já em 2003, na época liderada pela companheira

Raquel Rolnik, a Secretaria Nacional de Programas Urbanos construiu o Programa

Nacional de Regularização Fundiário, o Programa Papel Passado, no qual apoiamos

principalmente os Municípios mas também Estados, organizações não-

governamentais e Defensorias Públicas nas suas ações de regularização fundiária.

Hoje o programa tem um sistema de monitoramento no qual acompanhamos o

processo de regularização em cerca de 2.600 assentamentos em 376 Municípios.

São cerca de 1 milhão e 700 mil famílias, sendo que, desse total — são ações desde

2003, de 1 milhão e 700 mil famílias, que estão em processo de regularização

acompanhados por nós — 326 mil receberam título e, destas, apenas 110 mil

tiveram título registrado em cartório.

Por que de 1 milhão e 700 mil famílias só 100 mil chegaram ao título depois

de 6 anos? Porque o processo de regularização fundiária é extremamente complexo,

extremamente demorado, cheio de entraves; a todo momento existe um empecilho

colocado pelo Judiciário, pelo Ministério Público, pela própria Prefeitura e

principalmente, no nosso modo de entender, porque não existe uma lei federal de

regularização fundiária. Temos, portanto, que aplicar a Lei de Parcelamentos, a Lei

nº 6.766, que foi feita para novos parcelamentos. Quando se tenta adaptar para

regularização fundiária, surgem problemas de interpretação que a todo momento

impedem a continuidade dos processos.

Nesse sentido, o Governo editou agora a Medida Provisória nº 459 que, junto

com o Programa Minha Casa, Minha Vida, traz a proposta de uma lei nacional de

regularização fundiária, no seu Capítulo III.

Nessa proposta, consideramos que pelo menos 3 questões são essenciais.

Primeiro, se reconhece que o Município pode estabelecer por lei o procedimento de

regularização fundiária em seu território — ou seja, o procedimento não fica para ser

definido por assessores técnicos do Judiciário, por juizes ou pela interpretação de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

10

donos de cartório. Segundo, o Município aprova o projeto de regularização fundiária,

e o projeto é estabelecido como próprio para regularização fundiária e não como

projeto de um novo parcelamento. Isso a lei deixa claro. Terceiro, permite que se

faça a regularização fundiária das ocupações em áreas de preservação permanente

desde que um estudo técnico comprove a melhoria das condições ambientais.

Finalmente, a medida traz outros dispositivos, como a instituição da demarcação

urbanística, legitimação de posse e regras para o registro.

Entendemos que esse projeto, se aprovada essa medida provisória com

essas características, principalmente no que se refere à competência de qualquer

Município para aprovar o projeto de regularização fundiária e a possibilidade de

regularizarmos as ocupações em áreas de preservação permanente, de uma forma

ágil, garantindo a melhoria da condições ambientais, vai resolver inúmeros

problemas de regularização fundiária como, por exemplo, aqueles relatados pela

Dra. Lúcia, no que diz respeito aos igarapés de Belém e Manaus. Vai-se ainda

permitir a ocupação em alguns casos em que, se a lei garante o direito à moradia, o

direito ambiental vai ser compatibilizado, permitindo a regularização fundiária em

APPs, desde que se comprove melhorias ambientais.

Então, achamos que essas questões são fundamentais e devem ser

debatidas aqui no Congresso. Pedimos o apoio de todos os Deputados presentes

porque essas medidas são necessárias para se avançar na regularização fundiária.

Com isso, estamos trabalhando num aspecto importante da garantia do direito à

moradia.

No que diz respeito à produção habitacional de interesse social, a Medida

Provisória n.º 459 traz também o Programa Minha Casa, Minha Vida, em que o

Governo Federal apresenta uma proposta de inversão de grandes investimentos

públicos na construção de moradia para a população de renda de até 10 salários

mínimos. Isso mostra, no meu modo de entender, que, enquanto vários outros

países no mundo tentam superar a crise repassando recursos públicos para o

sistema financeiro, felizmente, aqui no Brasil estamos superando a crise repassando

recursos para a construção de moradia popular e aprofundando a defesa do direito à

moradia. Há regras para o uso desses recursos, que vão ter a sua distribuição

regional de acordo com o déficit habitacional. Ou seja, além de gerar emprego e de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

11

auxiliar na superação da crise econômica, estamos também contribuindo com a

ampliação do direito à moradia.

É claro que existem questões complexas como a construção de cidades, que

não é só construção de moradia. Existem várias questões que devem e merecem

ser debatidas no Congresso, junto ao movimento social, e o Governo vai estar

aberto para fazer esse debate e aperfeiçoar esses dispositivos.

Quanto à terceira linha, que diz respeito a intermediação de conflitos e à ação

do Ministério das Cidades e do Conselho das Cidades, depois a companheira Ethel

vai comentar.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Pedro Wilson) - Agradeço ao Dr. Celso

Santos Carvalho, Diretor do Departamento de Planejamento Urbano da Secretaria

Nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades.

Gostaria de registrar a presença dos Deputados Paes de Lira, Paulo Rubem

Santiago, Zezéu Ribeiro, nosso decano da luta urbana no Congresso; Dr. Rosinha e

das Deputadas Luiza Erundina e Luciana Genro.

Antes de passar a palavra à Dra. Ethel Proença Braga, representante do

Departamento de Planejamento Urbano e Conflitos Fundiários do Ministério das

Cidades, gostaria de registrar as presenças de Juliana Machado Brito, do MDT do

Distrito Federal; Wagner Baleeiro, Vereador de São José dos Campos, em São

Paulo; João França, do Sindicato dos Vigilantes do Distrito Federal; Maria Dolores

Santos Costa, da SEPLAN de Rondônia; Gilson Silva, da Força Sindical; Inácio

Pereira, do SINDSEP do Distrito Federal; Marcelo Braga, da Central de Movimentos

Populares; Jairo Salvador, da Defensoria Pública de São Paulo; Tonhão Dutra,

Vereador de São José dos Campos; André Queiroz, da Frente Nacional de

Vereadores pela Reforma Urbana, Cristiano Müller, Gilberto, do Movimento Nacional

de Luta pela Moradia; Ana Suely, do Governo do Pará, e outros que vamos

cumprimentar posteriormente.

Com a palavra, por até 10 minutos, a Dra. Ethel Proença Braga.

A SRA. ETHEL PROENÇA BRAGA - Quero cumprimentar todos os

presentes e agradecer pelo convite.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

12

O trabalho de conflitos fundiários surge, no Ministério, desde a sua origem,

porque caracterizamos como conflito a disputa pela terra, e muitos desses

movimentos têm como estratégia de luta legítima a ocupação de área urbana como

forma de garantia da moradia.

Os movimentos buscam o Ministério na tentativa de construir uma resposta

para esse impasse. Só que muitas dessas situações ocorrem já com a liminar de

reintegração de posse concedida, com a polícia entrando na ocupação. Reverter um

quadro quando já está na fase de conclusão é uma tarefa árdua, e os movimentos

vêm lutando e pressionando para que o Ministério construa uma resposta para esse

tipo de situação.

O Ministério tem, ao longo do tempo, buscado estruturar um trabalho para

essa área. Hoje temos a construção da Política Nacional de Prevenção e Mediação

de Conflitos Fundiários Urbanos, que está sendo discutida no território nacional;

estamos com um grupo de trabalho de conflitos, junto ao Conselho das Cidades,

buscando estruturar ações nos Estados e Municípios para que a discussão não se

esgote no Governo Federal, e temos a comissão interministerial, porque o trabalho

de conflitos é eminentemente de intersetorialidade das políticas públicas dos

Poderes e das esferas do Governo. Então, o exercício tem sido, ao longo desse

tempo, envolver todos esses atores na construção de soluções para essas

situações, respeitando as especificidades locais.

Hoje estamos atuando em 88 casos no País, tentando mobilizar esses atores

e respeitando o pacto federativo. As alternativas passam pela mobilização desses

autores, principalmente o envolvimento das esferas locais de poder.

Temos programas institucionais que precisam ser acessados para que se

consiga garantir o direito à moradia. Nesse sentido, quando contamos com a

parceria e o apoio dos Governos do Estados e dos Municípios, normalmente

conseguimos reverter alguns casos de reintegração de posse. Agora, precisamos

avançar ainda na construção desse trabalho, porque é novo e exige grande esforço

de articulação.

Então, o Governo Federal reconhece a legitimidade dessa demanda, vem

procurando atender e inserir, dentro do aparato institucional, essas situações.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

13

Convido vocês a participarem conosco dos seminários que estarão

acontecendo. O primeiro seminário regional que vai tratar dessa política ocorrerá no

Paraná, nos dias 14 e 15, e os demais vamos informar mais à frente. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Pedro Wilson) - Obrigado à Dra. Ethel

Proença Braga.

Gostaria ainda de registrar a presença de Manoel, da Cidade Ocidental; de

Cristiane, Vereadora de Valparaíso e professora da rede escolar; Cosme Vítor, da

Associação de Favelas, e da Deputada Iriny Lopes, ex-Presidente da Comissão de

Direitos Humanos.

Antes de passar a palavra à Dra. Gilda Pereira de Carvalho, gostaria de tornar

pública uma questão.

A Dra. Lúcia Moraes falou sobre alguns atos que merecem que analisemos a

atuação da justiça. São dois fatos. Primeiro, o processo que envolve Eldorado dos

Carajás, que está há 13 anos paralisado, e agora está no Superior Tribunal de

Justiça para julgar os mandantes do assassinato de 19 trabalhadores. Esse mesmo

tribunal concedeu liberdade para o Sr. Bida, do Pará, que é o reconhecido mandante

do assassinato de Dorothy Stang. Segundo, ontem a Justiça de Goiás condenou o

suplente de Vereador do PSOL Américo Novais, uma das lideranças do Parque

Oeste Industrial. Houve morte no processo de retirada de moradores, e esse

processo de apuração está completamente parado. Enquanto que outro... Ele foi

condenado por mais de 5 anos.

Então, nessa luta pela terra, é importante vermos as nossas

responsabilidades como Parlamentares, e é nesse sentido que todos estamos aqui

presentes. Estamos interessados em discutir, mas vemos dois pesos e duas

medidas no julgamento desses casos e de outros que a Dra. Lúcia citou, em termos

de áreas. A Plataforma Dhesca, então, nos coloca situações em variadas cidades do

Brasil.

Gostaria de me referir a essa situação de Goiás dado que o julgamento

deveria ser igual: uma pessoa que estava lutando na defesa dos moradores é

condenada, enquanto que a verdadeira autoria das mortes ainda não foi apurada.

Peço desculpas a todos, mas gostaria de fazer este registro. Num encontro de

Parlamentares de direitos humanos, o nosso Presidente, Deputado Luiz Couto,

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

14

registrou mais uma vez que esse fato acontecido em Goiânia seja remetido inclusive

a organizações de direitos humanos, dado que a maior parte do caso vai cair no

esquecimento. Agora ainda temos esse caso de condenar um dos lutadores,

enquanto o outro lado não recebe nenhuma penalização ou julgamento. (Palmas.)

Concedo a palavra à Sra. Gilda Pereira Carvalho, Procuradora Federal dos

Direitos do Cidadão.

A SRA. GILDA PEREIRA CARVALHO - Sr. Presidente, eu gostaria de

ressaltar o trabalho magnífico que vem sendo realizado pela relatoria nacional.

Recebemos cópia desses relatórios, que foram encaminhados tanto à Procuradoria

Federal dos Direitos do Cidadão quanto ao Ministério das Cidades e aos outros

Ministérios correlatos.

A esse trabalho persistente e exaustivo da relatoria nós estamos dando

continuidade, cumprindo a nossa missão constitucional prevista no art. 129, II, da

Constituição, que diz que o Ministério Público Federal e os Ministérios Públicos dos

Estados devem zelar para que os poderes públicos cumpram efetivamente os

direitos assegurados na Constituição.

É com essa missão que, então, temos cobrado políticas púbicas neste País

para que seja efetivamente respeitado o direito que está no art. 6º da Constituição,

que é o direito à moradia.

Dando seguimento, o Ministério das Cidades e a Caixa Econômica Federal

têm sido várias vezes cobrados pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão

que, coordenando essas ações a nível nacional, tem pedido aos colegas nos seus

Estados, procuradores regionais dos direitos do cidadão, que efetivamente façam

vistoria e examinem esses relatórios que nos são entregues e que também, de

ofício, passem a dar toda uma prioridade a essas necessidades que chegam pelos

cidadãos que acorrem às procuradorias.

Gostaria de dizer, e já disse isso em reuniões, que há uma política perversa

relacionada à moradia. Eu entendo que, quando são transpostas famílias inteiras

para regiões mais distantes, como vem ocorrendo, a fim de dar continuidade à

política de habitação, nesses programas habitacionais não se contempla, o que para

nós deve haver claramente, o que deve haver de infraestrutura, que seria escola,

posto de saúde, casa para idosos. Isso é o básico num planejamento urbano. Há

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

15

pouco tempo eu cobrei isso de algumas autoridades. Por que não se contempla

nessas alterações de residência esse direito tão claramente dito na nossa

Constituição?

Quero crer que os representantes do Ministério das Cidades, que estão

presentes, devem levar em consideração nos seus projetos isso que parece para

nós muito claro, ou seja, contemplar o cidadão, como já foi anteriormente destacado

pelo representante do Ministério das Cidades, com infraestrura urbana, ambiental,

sanitária.

O que nós vemos, e posso dizer isso porque já visitei esses conjuntos

habitacionais, é que eles são completamente desprovidos do básico. Nós não

podemos deixar de ver que ali há crianças, idosos, que precisam ser respeitados na

sua inteireza, até porque a criança e o adolescente, como diz nossa Constituição,

devem ter prioridade nas políticas públicas.

Outra coisa que quero registrar é que me parece também perversa a política

quando o Estado tem inúmeros imóveis aos quais não está sendo dada utilização

pública, social. (Palmas.) Veio recentemente à Procuradoria Federal a notícia de que

determinado ente descentralizado estaria alienando seus imóveis, quando havia um

plano já ofertado pela própria comunidade para que fossem utilizados para moradia

habitacional, contemplando inúmeros sem-teto.

Por fim, Sr. Presidente, quero registrar como exemplo de atuação que

aconteceu recentemente, e é bem provável que algum movimento social ou entidade

civil tenha presenciado essa questão, se deu em Pernambuco, meu Estado, em que

nos deparamos com inúmeros edifícios na zona metropolitana da Grande Recife,

construídos há trinta anos, que estavam na iminência, muitos deles, de desabar, e lá

moravam milhares de famílias. O que vemos numa situação dessas? A Caixa

Econômica, a entidade financiadora daquele conjunto habitacional, de um lado, e a

população necessitada do outro, e cada um dizendo que o seguro é que paga.

Foi nessa ocasião que tive oportunidade de chamar os órgãos do âmbito

federal para uma conversa, e foi muito, eu digo assim, rica essa reunião, porque me

pareceu que todos os presentes ali estavam convencidos de que não pode haver

esse jogo de responsabilidade. Não pode ficar um ente financiador de um lado,

dizendo que isso é o seguro, e de outro, a comunidade de sem-teto.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

16

De forma que saiu um encaminhamento. Naturalmente que não foi possível

estabelecer uma solução amigável, porque a coisa, realmente, requeria uma

imediata solução e os órgãos administrativos estavam um pouco devagar, de modo

que foi necessário judicializar essa questão. Está judicializada, mas isso não

significa... Aliás, depois dessa reunião, passou a significar que os órgãos de Estado

estavam inteirados e que queriam de boa vontade dar uma solução a este caso.

Por ora, Sr. Presidente, eu me reservaria a responder eventuais perguntas.

Muito obrigada por esta oportunidade. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Luiz Couto) - Muito obrigado, Dra. Gilda.

Passamos a palavra à Sra. Raquel Rolnik, Relatora Especial da Organização

das Nações Unidas para o Direito à Moradia.

A SRA. RAQUEL ROLNIK - Antes de mais nada, boa tarde a todos. Gostaria

muito de agradecer aos Deputados Luiz Couto, Paulo Teixeira e Pedro Wilson pela

iniciativa desta audiência, que é absolutamente oportuna no momento em que esta

Casa começa a discutir uma importantíssima iniciativa no campo da política

habitacional brasileira, que é a MP nº 459, como parte do Programa Minha Casa,

Minha Vida.

Antes de entrar propriamente nesse ponto, eu gostaria apenas de explicar —

porque eu mesma demorei para entender — o que é a Relatoria Especial para o

Direito à Moradia da ONU.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU, que tem sede em Genebra e cria

ou desenvolve direitos, tanto no âmbito civil e político como nos direitos econômicos

e sociais e culturais, também zela pela implementação desses direitos nos países

que são signatários dessas resoluções. Para poder acompanhar a implementação

desses direitos nos países, a Comissão designa um Relator para cada um dos

direitos. Então, são 49 relatores especiais.

O Relator funciona como uma espécie de ouvidor do Conselho para dizer

como as ações estão sendo implementadas nos vários países, tanto do ponto de

vista das experiências positivas como das violações do direito à moradia.

Assumi essa tarefa em maio do ano passado e comecei a atuar a partir daí.

Primeiro, eu fui me informar sobre a definição. Se eu sou Relatora para o

Direito à Moradia Adequada — tem a palavra “adequada”, não é só direito à moradia

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

17

não —, o que é o direito à moradia adequada e como isso está consagrado nas

resoluções das quais o Brasil é signatário — e inclusive incorporou isso na sua

Constituição, como já foi dito aqui?

Eu não vou apresentar aqui toda a base jurídica, até porque há Deputados

aqui que conhecem isso muito melhor do que eu. Do ponto de vista do conceito de

moradia adequada, podemos dizer o que não é. Moradia adequada não é 4 paredes

e um teto em cima da cabeça da pessoa num lugar qualquer. Não é isso, não.

Moradia adequada é uma localização dentro do território, e isso vale para o urbano e

para o rural também, a partir do qual o grupo que habita aquele domicílio, seja uma

família ou não, tenha possibilidade de viver uma vida digna. E uma vida digna

envolve não somente acordar todos os dias, mas poder se desenvolver do ponto de

vista humano e econômico. Então, isso envolve, como já foi mencionado pelos que

me antecederam, acesso às oportunidades de educação, de saúde, aos meios de

sobrevivência, ao emprego, ao trabalho, aos meios de desenvolvimento da pessoa

humana.

É por isso que moradia não é depósito de gente, um lugar onde os pobres —

porque são pobres — podem morar. Afinal de contas, se tomarmos a idéia e o ponto

de partida da moradia como um direito humano, isso vai se contrapor claramente na

nossa sociedade à idéia amplamente majoritária e que estrutura um modelo de

desenvolvimento urbano no nosso País — e não apenas nele, evidentemente — que

é a moradia como uma mercadoria, ou a moradia e o desenvolvimento imobiliário e

a produção da cidade de uma forma geral como um ativo financeiro, como alguma

coisa que faz parte de um circuito de valorização do capital.

Por que eu estou mencionando isso? Quando discutimos e falamos em

política habitacional, o que está por trás das denúncias que foram feitas aqui pela

Relatora Nacional Lúcia Moraes e pela Dra. Gilda? O que está por trás da imensa

dificuldade de reconhecer o direito daqueles que estão morando hoje em

assentamentos irregulares, como as favelas e as periferias irregulares do País,

mencionadas pelo Celso Carvalho, a imensa dificuldade de ver esses

assentamentos plenamente integrados à cidade? O que está por trás é a idéia de

que o ponto de partida da política habitacional não é a moradia como um direito

humano e, portanto, é necessário respeitar o fato de que a terra urbana tem um

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

18

valor no mercado, e que esse valor no mercado é muito mais importante do que o

direito humano de ter um lugar para viver com dignidade. Então, é isso que está por

trás.

Estou falando de alguma coisa que contraria absolutamente as possibilidades

de desenvolvimento da cidade de acordo com as regras do mercado? Não. É

exatamente em função da compatibilidade da existência do mercado com a garantia

dos direitos. Existe Estado, existe Governo, existe regulação, norma e lei

exatamente para poder atender a esses direitos, mesmo diante de uma situação em

que as regras básicas de estruturação da cidade e do território se dão através do

mercado.

E como isso se dá? Primeiro, através de políticas habitacionais que de fato

garantam a moradia digna; o lugar para que a moradia digna possa acontecer,

mesmo se esse lugar tiver um valor maior do que a capacidade econômica daquelas

pessoas que vão morar lá. Por que isso está por trás das questões da violação?

Porque é maravilhoso urbanizar a favela da periferia, num lugar que não tem

nenhuma disputa grande em termos de valor econômico para empreendimentos

lucrativos na cidade.

Por que é tão difícil até hoje usar e mobilizar até o patrimônio público federal,

estadual e municipal, vazio e subutilzado, nos centros da cidades? Estão aqui hoje

companheiros dos movimentos de moradia que há décadas lutam para que esse

patrimônio público seja utilizado para moradia. Por que é tão difícil? Porque até

mesmo dentro do Governo Federal, e ainda nos Governos Estaduais e Municipais,

prevalece a idéia de que um lote ou um imóvel bem localizado tem de ir para o

mercado para fazer caixa e não para atender o direito à moradia digna das pessoas

que não têm casa. (Palmas.) Por isso, na semana passada, movimentos e

Deputados correram para sustar leilão de imóveis públicos vazios e subutilizados

que estavam indo para mercado quando poderiam estar produzindo moradia neste

País.

Mesmo diante de um enorme avanço que tivemos, qual seja o

reconhecimento por parte do Governo Federal de que habitação é fundamental e a

disponibilidade de uma enorme quantidade de recursos sob a forma de subsídio

direto para as famílias, que é o Programa Minha Casa, Minha Vida, e subsídios

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

19

grandes para quem mais precisa, na faixa de renda de zero a 3 salários mínimos,

esse programa foi lançado sem uma palavra sobre onde e como vão se dar essas

moradias; tudo isso sem nenhuma conexão com aquilo que foi um enorme avanço

construído nesta Casa, neste Congresso Nacional, que foi o Estatuto das Cidades.

Depois da mobilização que o País inteiro fez para implementá-lo, o que ganha

um município que está implementando o Estatuto das Cidades? Nada. O que ganha

em termos de acesso a recursos do Programa Minha Casa, Minha Vida, se garantir

que essas moradias aconteçam nas zonas especiais de interesse social, que muitos

prefeitos se arrebentaram para poder aprovar nas Câmaras Municipais, graças à

enorme mobilização social que ocorreu? Não ganha nada.

É exatamente por isso que neste momento é extremamente importante esta

Casa fazer uma audiência pública sobre o direito à moradia, porque é possível e

existam várias emendas de Deputados que estão aqui presentes ou passaram por

aqui, como os Deputados Zezéu Ribeiro, Fernando Chucre e Paulo Rubem, que

tentam introduzir na MP nº 459 pelo menos alguns mecanismos para poder fazer

essa conexão, usando recursos do Programa Minha Casa, Minha Vida para

reabilitação de imóveis; fazendo com que os municípios que os têm, apresentando

como contrapartida terrenos situados em áreas bem localizadas, em zonas

consolidadas, tenham prioridade e mais recursos.

Isso fará com que todo esse processo fortaleça a construção feita ao longo de

décadas no País para garantir o direito à moradia, que é a construção do sistema

nacional de habitação de interesse social, de conselhos de habitação com

participação popular em todas as cidades. Isso é importante para que esse processo

fortaleça o que já foi construído e não vá totalmente, em paralelo a ele, dando força

para o nosso modelo de cidades partidas.

Quero concluir dizendo que o nosso modelo de cidades partidas e de

negação do direito à moradia está muito incrustado na cultura do País e dos

Governos. Aliás, não só na cultura dos Governos, mas também na das elites, que

jamais admitiram a idéia de que podemos compartilhar nossas cidades e territórios

entre pobres, médios e ricos; que podemos conviver nesses espaços em paz e

segurança, compartilhando os espaços públicos e as qualidades da cidade. Essa

cultura ainda não chegou, tanto é que, por exemplo, no Rio de Janeiro, no momento

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

20

em que se está investindo milhões para transformar favelas em cidade, o que é

genial, propõe-se construir muro atrás da favela, como se favelado fosse bicho para

viver enjaulado, o que vai na contramão da integração total, que é o que propõe a

regularização fundiária e a urbanização.

Acho que o momento desta audiência e a denúncia dessas violações nos

trazem a oportunidade de lembrar que os avanços que já foram conseguidos nesta

Casa ainda não estão totalmente assentados nas nossas cidades, na nossa

sociedade, nos nossos Governos. Eles requerem, sim, ainda incentivos fortes da

nossa parte, incentivos fortes da parte dos legisladores, para que seja premiado

quem trabalha na direção das cidades integradas, das cidades adequadas e da

moradia adequada. Embora a construção civil gere empregos e isso seja muito

importante para lutar contra a crise, assim como a indústria gera emprego, casa não

é igual a geladeira, e produzir casas é produzir cidades. Nosso grande desafio é

produzir cidades para todos, e não só cidades para poucos.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Pedro Wilson) - Obrigado, Dra. Raquel

Rolnik, Relatora Especial da Organização das Nações Unidas, ONU.

Gostaria também de registrar a presença de Mirim, de Formosa; já registrei

Profa. Lucimar de Goiânia, Goiás; Manoel Divino, Taís, Jeferson, Silvana, Simone,

Joanita, Laura, Helbens; Prof. Maurício, da Escola Família Agrícola de Padre

Bernardo; Jair Pedro, da Federação Nacional dos Empregados da Caixa, e Ari, da

FENAI.

Passamos a palavra aos representantes de movimentos.

Gostaria de passar a palavra ao Darci Frigo, representante da Plataforma

Dhesca do Brasil. Mas, antes, com muita honra, convido o Deputado Paulo Teixeira,

coautor deste requerimento, para coordenar os trabalhos aqui da nossa audiência

pública.

Bom, não queria fazer a proposta, mas já que é da Dra. Gilda Pereira

Carvalho, não farei nenhum descaso com os nossos representantes que estão aqui.

Sendo assim, convido os representantes para estarem aqui conosco na mesa, dado

que é importante, além de falar, que vejamos também quem está falando.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

21

Convido o Sr. Darci Frigo; Gilberto Cardoso Aguiar, do Movimento Nacional

de Luta pela Moradia; Marcelo Braga Edmundo, da Central de Movimentos

Populares; Verônica Kroll, representante da União Nacional de Moradia Popular; e o

Sr. Cristiano Muller, representando o Fórum Nacional da Reforma Urbana.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Obrigado, Deputado Pedro

Wilson. Cumprimento todos os Parlamentares presentes: Deputada Luciana Genro;

Deputado Zezéu Ribeiro, esse grande fenômeno da luta pela moradia; Deputado

Fernando Chucre, da Frente Parlamentar pela Moradia; Deputado Chico Alencar,

grande batalhador dos direitos humanos; Deputado Pedro Wilson, de quem foi a

iniciativa desta sessão que está à frente no Parlamento brasileiro; Deputado Paulo

Rubem Santiago e o Deputado Paes de Lira.

É muito importante sua presença aqui, Deputado. Quero lhe agradecer pela

presença aqui nesta sessão.

Cumprimento a Comissão de Direitos Humanos por esta iniciativa. Quero

dizer que esta sessão — além de gravada e ir ao ar pela TV Câmara — está sendo

transmitida pelo Twitter, que é um mini blog. Eu estava acompanhando ali. Se isso

pegar no Brasil inteiro, as pessoas vão poder acompanhar as sessões por meio

desse mecanismo.

Esta é a primeira sessão, no Parlamento brasileiro, que está sendo

transmitido pelo Twitter. Parabéns à Comissão de Direitos Humanos por isso.

(Palmas.)

Por 5 minutos, passo a palavra ao Sr. Darci Frigo, representante da

Plataforma Dhesca Brasil.

O SR. DARCI FRIGO - Muito obrigado. É claro que seria mais oportuno ter

apresentado a Lúcia Morais, que é Relatora Nacional, já que a Relatoria pelo Direito

Humano à Moradia Adequada está dentro de um projeto, que foi construído a partir

de 2002, por esta rede que se chama Plataforma Brasileira de Direitos Humanos

Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais, que é constituída por 34 organizações

e movimentos que trabalham e desenvolvem ações de promoção, defesa e

reparação dos direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais visando

ao fortalecimento da cidadania e à radicalização da democracia em nosso País.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

22

Essa plataforma é filiada a uma rede latino-americana, chamada Plataforma

Interamericana de Direitos Humanos, Democracia e Desenvolvimento, presente em

18 países aqui da América Latina. Então, ela tem uma preocupação exatamente de

fazer o processo de monitoramento da efetivação desses direitos sociais no sentido

mais amplo, os direitos que normalmente ficam em segundo plano, já que,

historicamente, sempre se deu mais ênfase aos direitos civis e políticos. Mas

defendemos a interdependência e a indivisibilidade desses direitos. Esse é o

trabalho que a plataforma desenvolve.

A plataforma também desenvolve ação em conjunto com outras redes de

monitoramento exatamente do PDHESC. É esse protocolo que tem a

responsabilidade de viabilizar a efetivação desses direitos humanos, econômicos,

sociais e culturais. Inclusive, na próxima semana, haverá reunião do comitê em

Genebra, e a sociedade brasileira estará representada por diversas redes. E um dos

direitos que também será abordado e debatido junto com esses representantes do

Comitê DHESC será exatamente o direito à moradia, junto com outros direitos

humanos, que estão sendo monitorados. Neste momento, o Brasil também terá que

responder perante esse comitê se está implementando os direitos do DHESC.

Portanto, é importante, na próxima semana, estarmos atentos porque será

uma sessão especial que acontece só a cada 5 anos. É um momento oportuno para

acompanharmos essa questão.

A plataforma que surgiu, em 2002 — olhando essa metodologia, essa

proposta da ONU, a que a Raquel acabou de se referir —, entendeu que o Brasil,

sendo um país continental, teria necessidade de implementar instrumento que

também pudesse monitorar e trabalhar na linha de efetivar os direitos humanos no

nosso País. E a partir daí, construiu-se esse projeto das relatorias nacionais em

direitos humanos.

Implementamos, a partir daí, 6 relatorias, e uma delas é a relatoria do direito

humano à moradia adequada. Temos também a relatoria do direito humano à

educação; a relatoria do direito humano ao meio ambiente, ainda que na ONU não

tenha essa relatoria específica; a relatoria do direito humano à alimentação e terra,

que de agora em diante vai se chamar relatoria nacional do direito à terra, território e

alimentação; e a relatoria do direito humano à saúde e ao trabalho.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

23

Fizemos, neste momento, uma avaliação entendendo que este é um projeto

fundamental para o País, exatamente por capilarizar todas essas denúncias

apresentadas pelos movimentos, pelas organizações e os relatores poderem

monitorar esse processo, para incidir junto aos órgãos públicos, seja no local, seja

no âmbito nacional, para que aquilo que é compromisso do Estado brasileiro seja de

fato efetivado como direito humano. É especificamente nesse ponto que está sendo

debatido o direito humano à moradia.

Então, essa é uma missão concreta desses relatores. E a Lúcia fez um

trabalho brilhante junto com os movimentos e uma série de organizações que

apoiaram o trabalho que ela apresentou. Tem também, embora não para todo

mundo, uma cartilha específica, que foi recentemente lançada, do direito humano à

moradia e à terra urbana.

Nós, neste momento, estamos num processo de finalização do III Programa

Nacional de Direitos Humanos, sociedade civil, Secretaria Especial de Direitos

Humanos e esta Comissão de Direitos Humanos aqui da Câmara dos Deputados.

Entendemos que esse programa pode ser referência para o próximo período

da política pública de direitos humanos no País. Esses relatores nacionais ou

mesmo os internacionais que vão acompanhar a política pública de direitos humanos

no País, poderão ter esse III Programa como referência para efetivação de direitos.

Nos próximos dias, também deveremos debater os últimos passos para estabelecer

as metas, exatamente o que queremos nos próximos anos, em termos de efetivação

dos direitos humanos no País. E que a Secretaria de Direitos Humanos possa, cada

vez mais, ser uma articuladora das políticas de direitos humanos no País, e a

sociedade possa, a partir do PNDH III, monitorar essa política, que não é só

responsabilidade da Secretaria de Direitos Humanos, é responsabilidade de todas

as áreas do Governo, uma responsabilidade transversal do Governo.

Estamos aqui discutindo política pública de moradia, mas sabemos das

interfaces com a questão ambiental, sabemos das interfaces com outras políticas

necessárias também para a efetivação de direitos.

Para finalizar, quero dizer que, neste momento, uma preocupação central da

plataforma das diversas redes de direitos humanos e de organizações é o processo

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

24

de criminalização dos movimentos sociais, das organizações de direitos humanos,

dos defensores e defensoras dos direitos humanos. (Palmas.)

O processo de criminalização acontece exatamente como mecanismo para

barrar o acesso daquelas pessoas excluídas na sociedade aos seus direitos. Ele é,

vamos dizer assim, usado como uma ferramenta para impedir que os pobres,

aqueles que estão segregados na sociedade, possam acessar aquilo que é direito

de todos, aquilo que está estabelecido na Constituição, aquilo que está nos pactos,

nos tratados internacionais; aquilo que está também na nossa consciência como

direito.

E a criminalização tem sido usada sempre para impedir que os trabalhadores,

que as populações pobres possam acessar os direitos econômicos, sociais, culturais

e ambientais, seja trabalho, seja moradia, seja saúde, seja educação, seja qualquer

direito que nós temos como direitos reconhecidos.

Então, precisamos nos preocupar com esse processo de criminalização e

estabelecer que, além das políticas específicas de efetivação de direitos, precisamos

garantir que os movimentos sociais possam continuar desenvolvendo seus

trabalhos. Que as organizações de direitos humanos não sejam pilhadas, inclusive,

dos recursos públicos, por meio desse processo crescente de criminalização que

passa pelo TCU, que peneira os mosquitos para os pobres, mas deixa os camelos

passar para os ricos, para aqueles que usam o grosso dos recursos públicos.

Infelizmente, hoje está se fazendo todo um processo de criminalização contra

as organizações de movimentos sociais exatamente para impedi-las de continuarem

seu processo de articulação, no sentido de que os pobres possam acessar os

direitos humanos.

Creio que a Câmara dos Deputados, o Congresso Nacional têm

responsabilidade também de aprovar o Conselho Nacional de Direitos Humanos

para que possa ser instrumento onde uma série de ações — hoje esparsas no

âmbito das políticas públicas da coordenação — dessa política de direitos humanos

possa ser articulada por intermédio do Conselho Nacional de Direitos Humanos. Isso

precisa ser, de fato, aprovado, para que a sociedade tenha esse instrumento e,

inclusive, possa monitorar a política pública que será aprovada no Programa

Nacional de Direitos Humanos III.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

25

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Muito obrigado, Sr. Darci

Frigo.

Quero parabenizar a Comissão por esse formato de trazer aqui os

movimentos sociais, até porque é paradoxal tentar criminalizar os movimentos

sociais, que no Brasil têm papel fundamental para a garantia do direito à moradia.

O movimento social brasileiro é quem está à frente na defesa do direito à

moradia. Portanto, hoje, aqui, esse formato é fundamental, e o Brasil tem esse

estágio, ainda que tenha esse número de problemas, porque os movimentos

populares foram parte da solução para moradia, e não do problema.

Estão aqui os históricos dos movimentos de moradia. Eles sabem que o

Governo popular tem papel aqui, na garantia do direito à moradia. Portanto, vamos

reagir a essa tentativa de criminalização.

Passo a palavra ao Sr. Gilberto Cardoso Aguiar, representante do Movimento

Nacional de Luta pela Moradia — MNLM, por 5 minutos.

O SR. GILBERTO CARDOSO AGUIAR - Primeiramente, saúdo os

Parlamentares, os representantes do Governo Federal e, especialmente, todos os

companheiros e companheiras que compõem o Movimento Popular Urbano.

Eu queria abordar aqui 3 questões, contar uma história, que é fato, e fazer 2

constatações.

A primeira questão está relacionada com esse debate da tentativa de nos

criminalizar. E, nesse debate, queremos deixar bem claro para o conjunto da

sociedade que nenhum de nós, dirigentes do Movimento Popular Urbano, nenhum

homem, nenhuma mulher, neste País, entra em uma área para morar debaixo da

lona preta porque quer. Nenhum de nós, homem ou mulher, neste País, vai para

uma palafita e leva os filhos porque quer, porque gosta ou porque é

sadomasoquista. Nenhum de nós, militantes, homens e mulheres, vai para dentro de

prédios, muitas vezes em ruínas, porque gosta de sofrer.

Vamos para lá porque esse direito à moradia não é reconhecido neste País.

Vamos para lá porque, na realidade, um conjunto de legislações que já

conquistamos neste País... E, se nós pegássemos as legislações que já

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

26

conquistamos neste País, nós já poderíamos ter avançado e muito na política

urbana.

Nenhum de nós envolveria a família, nenhum de nós envolveria os filhos em

um processo como esse se não acreditasse que hoje essa é a única possibilidade

que vemos e enxergamos de conquistar, de fato, o direito que nos é negado, o

direito que nos é violado.

Por isso, fazemos essas ações, e muitas delas são acompanhadas pela

relatoria DHESC. Fazemos essas ações, porque neste País a questão do uso social

da propriedade não é levada em consideração. Nós fizemos, porque o Estatuto da

Cidade não é respeitado. Nós fizemos, porque o Judiciário, muitas vezes, faz uma

distorção ou faz um olhar única e exclusivamente do ponto de vista da propriedade e

não do ponto de vista social.

A segunda questão está relacionada a um assunto que já foi abordado aqui

pela Raquel. Acho que precisamos nivelar o nosso conceito de moradia. E nivelar o

conceito de moradia significa que moradia é muito mais do que um teto. Ele se

amplia para um conceito de direito à cidade, direito à saúde, direito ao trabalho,

direito à geração de emprego e renda, direito à cidadania, direito à vida. Essa

reflexão, do ponto de vista de uma conceituação mais ampla, vai nos levar, inclusive,

a um debate profundo com o conjunto da sociedade sobre a inter-relação das

políticas sociais ligadas ao desenvolvimento urbano e não ter políticas tão

fragmentadas, como temos, muitas vezes, nos Municípios, nos Estados e no

Governo Federal.

A terceira questão está relacionada com os instrumentos que eu estava

abordando antes. Já temos instrumentos concretos de implementação do direito

efetivo à questão da moradia que não é implementado.

A história que vou contar — só faltam 2 minutos — também é um caso que foi

acompanhado pela relatoria. Trata-se de um prédio da Caixa. Esse prédio da Caixa

foi comercializado por um grande relojoeiro, que pediu dinheiro emprestado para a

Caixa para comprá-lo. Vendeu-o para o crime organizado, o PCC, que entrou no

prédio para abrir um buraco e assaltar o Banco do Estado do Rio Grande do Sul e a

Caixa Econômica Federal. Foram presos os integrantes do PCC pela Polícia

Federal. Nós entramos no prédio. A Justiça deu parecer contrário ao nosso direito à

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

27

moradia e devolveu o prédio para o empresário que repassou o prédio para o crime

organizado. É fato, é história, divulgamos isso, e isso foi acompanhado por vários

setores sociais.

Isso tem a ver com a primeira constatação que queremos apresentar aqui: a

Justiça não é neutra no debate com relação ao desenvolvimento urbano. Ela tem

lado, e esse lado não é o lado do povo. Ela tem lado, e esse lado não é o do direito

à moradia.

A outra constatação é que esta Casa, esses Parlamentares que aqui estão

vão ter muita responsabilidade para que possamos constituir uma legislação que

trabalhe a prevenção de conflitos, que trabalhe a mediação dos conflitos e que

trabalhe os conflitos urbanos como um todo, para que possamos responder com

qualidade à criminalização, ao direito à moradia e à necessidade de constituirmos

instrumentos jurídicos nessa área.

Obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Obrigado, Gilberto.

Passo a palavra ao Sr. Marcelo Braga Edmundo, representante da Central de

Movimentos Populares.

O SR. MARCELO BRAGA EDMUNDO - Boa tarde a todos.

Eu gostaria também de saudar esta iniciativa. Acho importante este debate. É

um debate que tem que ser sempre feito, e é uma grande dívida deste País, deste

Estado, desta Nação, com o seu povo, que é a questão da moradia.

Primeiro, eu gostaria de dizer que não se pode discutir o problema da moradia

nem se vai chegar a nenhuma solução, que existe desde sempre — moradia no

sentido mais amplo, como a Raquel falou —, se não se discutir a questão da

propriedade. Se não se discutir a propriedade, nós não vamos efetivamente

encontrar algum tipo de solução para o problema da moradia. E é realmente uma

situação muito complicada, quando estamos em uma casa em que grande parte

daqueles que a compõem é de proprietários.

Aí, também, quando ficamos falando da criminalização dos movimentos e até

da condenação do companheiro de Goiás, temos de lembrar também que grande

parte desses proprietários condena esses companheiros e criminaliza esses

movimentos sociais. Então, acho importante lembrarmos disso, e é essencial termos

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

28

essa consciência, principalmente nós, do movimento. Todas as discussões são

importantes, mas, fundamentalmente, temos que colocar dentro da sociedade a

discussão da propriedade. É a propriedade que despeja; é a proteção à propriedade

que remove as comunidades. A moradia tem que estar acima do direito à

propriedade. Nós só vamos encontrar solução para esse problema quando a

moradia estiver acima do direito à propriedade. E é o que não vemos.

Eu gostaria de lembrar também que a moradia neste País, desde sempre,

principalmente entre as classes mais pobres, foi construída com a luta desses mais

pobres. Foi por meio das ocupações, dos loteamentos, da ocupação das encostas,

das favelas. Foram eles que construíram. E, ao mesmo tempo, o Estado, que não

cumpriu com esse papel de dar moradia e qualidade de vida a essa população que

trabalhou e que construiu essa cidade, é esse Estado que vem remover, que vem

criminalizar também.

Portanto, não se pode simplesmente falar nos programas, o Governo Federal

dar relevância para a questão de moradia se, ao mesmo tempo, não se garantir o

fim dos despejos e das remoções e investir na recuperação e na reforma desses

imóveis que estão ocupados. Há vários programas. O próprio Minha Casa, Minha

Gente pode virar, no futuro, um argumento para se continuar removendo das áreas

centrais, das áreas com melhor qualidade de vida, porque construirão 1.200, 3 mil

casas, no fim do mundo. Ao mesmo tempo, continuará a remoção: “Olha, você vai

morar em uma casinha”. Nós sabemos de experiências como Nova Sepetiba, no Rio

de Janeiro, onde meninas de 10 anos se prostituem por 2 reais. Tiram as pessoas

de uma área com mais infraestrutura e as colocam nessas casinhas. É bastante

importante tocarmos nessas questões aqui.

Uma outra questão, e aí eu vou falar mais em relação ao nosso Estado, é que

novas formas de higienização são criadas a todo momento. Esse é um processo

antigo, que vem desde o início do século XX, que passa até, no caso do Rio de

Janeiro, pelo episódio do Carlos Lacerda, com a sua política de recuperação de

mendigos, que afogava mendigos, inclusive. E hoje criam-se novos mecanismos,

como esse projeto, recém-aprovado em São Paulo, da concessão urbanística, e a

questão da criação das áreas de recuperação econômica. Obviamente, dentro disso

está imbuída a velha política de ver a cidade como um grande mercado. Discutimos

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

29

essa política como se fosse uma saída mais rápida para recuperação e revitalização

das áreas centrais, quando, pelo contrário, a política mais rápida foi expulsar os

pobres dessas áreas centrais.

No caso do Rio de Janeiro, especificamente, lembro que está sendo

implementada uma política de remoção de forma violenta em nome do choque de

ordem. Além de atacarem camelôs, ambulantes, nesse mesmo processo, fazem

ações em favelas, em comunidades. Violentamente, derrubam 20, 30 barracos. Se

somarmos a quantidade de barracos removidos e derrubados no Rio de Janeiro em

nome do choque de ordem, passando por cima de qualquer lei, de qualquer

processo, é enorme. São políticas que, efetivamente, vão implementando esse

projeto.

Por fim, já que o tempo é muito curto, faço uma denúncia bem clara, que é um

outro lado da criminação — o extermínio das lideranças, principalmente no Rio de

Janeiro, com o implemento e o avanço das milícias, que, nos últimos meses, têm

matado várias lideranças do movimento e da resistência popular no Rio. Lembro-me

de que nós, na última reunião do GT-Conflitos, denunciamos a morte do

companheiro Oséias, de Nova Iguaçu. Uma semana depois, o Vice-Presidente foi

morto pelas milícias.

Esse é um processo muito complicado. Fica claro que nós, os movimentos,

acima de tudo, além da criminalização, de poder ser preso, corremos sério risco de

vida se este País não tomar nenhuma medida que proteja nossa dignidade, nossa

luta. Nós lutamos para fazer aquilo que é obrigação do Estado, que, infelizmente,

nunca cumpriu com sua obrigação, que é dar moradia digna e com qualidade ao

povo brasileiro.

É isso. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Obrigado, Marcelo.

Passo a palavra à Sra. Verônica Kroll, representante da União Nacional por

Moradia Popular.

A SRA. VERÔNICA KROLL - Boa tarde, Deputado Paulo Teixeira.

Eu quero dizer...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Só um minuto.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

30

Paes de Lira foi coronel do 3º Batalhão de Choque do Estado de São Paulo e

agora é Deputado. Na época eu era Deputado Estadual por São Paulo. Acho muito

positiva a sua presença aqui, até porque ali tivemos muitos diálogos positivos, no

sentido de tentar reverter decisões judiciais e reintegrações.

Ele sempre foi um homem de diálogo, o coronel do diálogo. Eu o saúdo,

porque, certamente, sua presença nos ajudará nesse sentido. Ele se interessar por

estar aqui é, ao meu ver, um gesto muito positivo.

Os movimentos populares no Brasil precisam ter o status de um grande ator,

um ator muito bem respeitado. O fato de eu ter virado elite (risos), queria só dizer

que pretendo continuar com essa ligação forte. Não só isso, trazê-lo para essa luta

tão importante quanto a da moradia. Espero que nos somemos a essa luta pelo

direito à moradia, como direito humano a ser respeitado mais fortemente neste

Brasil.

O SR. DEPUTADO CHICO ALENCAR - Paulinho, você tem de castigar a

Verônica. Como elite, você não mais vai dar passagem de avião para ela voltar à

sua base. (Risos.)

A SRA. VERÔNICA KROLL - Não dependo da passagem dele mesmo.

(Risos.) Estou fora.

O SR. DEPUTADO PAES DE LIRA - Acho que nesse rolo aí não mais vai ter

passagem para ninguém.

A SRA. VERÔNICA KROLL - Acabou. Bem, mas brincadeira à parte, o que

eu quero dizer aqui é que — é uma pena a Deputada Luiza Erundina ter saído do

plenário — a Prefeita Luiza Erundina continua nossa prefeita em São Paulo até

hoje. Discutimos com ela conjuntos habitacionais, que hoje têm escolas, creche,

praça, posto policial, um bairro completo. Agora, com a Prefeitura de São Paulo,

tentamos discutir ainda a regularização daquelas terras. Imaginem há quantos anos

isso. A própria Prefeitura não teve a capacidade de regularizar e dar o direito às

pessoas de morarem definitivamente naqueles conjuntos.

Aí eu entro na questão do Plano Diretor da Cidade de São Paulo e outros

planos. Eu e o Secretário, na época, Paulo Teixeira, discutimos, brigamos, deixamos

6 milhões de metros quadrados de terra de ZEIS. Eu pergunto: cadê a ZEIS de São

Paulo? É para atender à elite, Deputado, não aos pobres.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

31

A Cidade Tiradentes, hoje, é perto. Quando se diz que viramos mercadoria,

viramos mercadoria, Raquel, tão sem valor. Se me perguntarem quantas prefeituras

deste País gastam com a coleta do lixo urbano, eu digo que é muito mais do que

com o social.

Quando nos deparamos com o despejo, a família não tem para onde ir e não

tem onde ficar, aí é que vemos que o pobre virou lixo humano. Que valor tem a

pessoa que perde a casa, que perde a família, que perde o seu ente querido, que

era ali onde morava? É isso o que pergunto aos Deputados.

Outra questão, quando o Governo Federal faz os seus programas dentro do

Ministério das Cidades, e aí o Ministério das Cidades não pode ser o agente

promotor e manda para a Caixa Econômica Federal, quem é a Caixa? É um banco

que sempre estará sob ordens do Banco Central.

Então, não dá para dizer que a Caixa Econômica é um banco popular, é um

banco do povo. Poderia ser, se ela não estivesse na mão do Banco Central, aí

poderíamos dizer que a Caixa é um banco do povo.

Quando remetem dinheiro para o Estado, o Município não corresponde. Essa

integração é ainda muita falha. Tem de ser mais implementada. Acho que o Governo

Federal precisa ser mais duro com a questão dos Estados, principalmente com a

questão dos Municípios. Quando enviam dinheiro ao Município, este tem que

urbanizar, regularizar a terra; dá dinheiro para uma construtora abrir uma grande

avenida e manda a construtora dar 5 mil reais a uma família para sair da casa em

que mora há 30, 40 anos, em 2 horas, e uma máquina vai atrás para derrubá-la. Isso

não é um programa honesto. É um programa sujo, é um programa para extinguir,

matar os pobres.

Os Governos têm de ser claros. Estamos vivendo a era da informática, a era

da modernização do País. E como se moderniza? Matando os pobres. Sejam mais

singelos: matem os pobres de uma vez, não aos poucos. São esses programas do

Governo Federal para os Municípios e para os Estados que estão fazendo isso.

Vou concluir dizendo que a questão das terras públicas, sobre o que a Raquel

já falou, é uma vergonha. O INSS possui 3 mil imóveis neste País. Terras que estão

ocupadas há 40, 50 anos, e as pessoas ainda não conseguiram regularizá-las.

Pessoas que moram lá em cima. Este Governo tem que ter o mínimo de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

32

responsabilidade de não deixar o INSS despejar essas famílias, mas regularizar a

situação delas.

Por fim, quero dizer que estou há 2 semanas, em Brasília, discutindo essa

questão do INSS. Para os senhores terem ideia, em São Bernardo do Campo, quem

é de São Paulo sabe, o Hospital Piraporinha é terra do INSS, mas o INSS levou a

leilão o Hospital Piraporinha. Dá para acreditar numa coisa dessas? Não dá.

Busquem o Ministério da Saúde e negociem aquela terra. É assim que são

tratadas as terras públicas, é uma vergonha para o Governo.

Quando se fala de cidade, fico pensando que cidade nós queremos.

Queremos uma cidade para todos. Uma cidade em que todos tenham direito de

morar. Hoje em São Paulo nós vemos a questão da higienização.

O Dito distribuiu o Edifício Mercúrio e o Edifício São Vitor. São 2 prédios que

vão deixar de existir no centro de São Paulo. Por quê? Porque precisam de uma

praça, porque ali próximo está o Mercado Municipal da Prefeitura de São Paulo. Não

somos contra que haja mercado e praça, mas destruir o que não vai ser mais

construído, isso sim é crime. Repito: isso é um crime, custa mais demolir do que

reformar aqueles prédios.

Na semana passada, quando fizemos a denúncia de que na favela

Paraisópolis estão despejando as famílias, eu e o Abraão, a Secretária de Habitação

ligou no meu celular muito brava e depois também discutiu com o Abraão. Ela disse

que vamos responder no Ministério Público por coisas que não são verdade. Temos

prova no papel de que é verdade.

Quanto à criminalização de liderança, quando a Luiza Erundina deixou a

Prefeitura, eu fui uma das lideranças que foi ao antigo DEIC de São Paulo depor

como formadora de quadrilha. Nas ocupações, talvez para o senhor não seja

estranho, nas ocupações de prédio, quantas vezes eu fui à delegacia, fui detida e

respondi a processo. Esses Deputados ficaram iguais uns loucos atrás de mim, isso

não é de hoje. Se eu um dia tiver que ser presa ou morta por essa luta...

Esse caderninho aí é tão maravilhoso, por que não o põe em prática para

uma pessoa que precisa de moradia? Porque é difícil, mas escrever é fácil.

Eu termino por aqui. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Obrigado, Verônica.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

33

Anuncio a presença do Prof. Maurício, da Escola Família Agrícola de

Agroextrativismo de Padre Bernardo; do Sr. Jair Pedro, da Federação Nacional dos

Empregados da Caixa e do Sr. Jair, da FENAE. Está presente entre nós também o

Deputado Geraldo Thadeu, ex-Prefeito da bela cidade de Poços de Caldas, situada

na grande Águas da Prata.

Passo a palavra ao Cristiano Muller, representante do Fórum Nacional de

Reforma Urbana.

O SR. CRISTIANO MULLER - Obrigado, Sr. Deputado.

Boa tarde a todos. O Fórum Nacional de Reforma Urbana é uma articulação

nacional que congrega os 4 movimentos nacionais que atuam na área do direito à

moradia, as Organizações Não-Governamentais, entidades acadêmicas,

profissionais e trabalhadores.

O Fórum Nacional de Reforma Urbana tem como tema a prevenção dos

despejos, um dos eixos centrais de atuação em âmbito nacional. Por força disso, o

Fórum Nacional articulou em 2006 o seminário nacional em Recife, que tirou uma

plataforma brasileira de prevenção de despejos.

Essa plataforma nada mais é do que uma lista de recomendações ao Estado

brasileiro, no sentido de prevenir os despejos neste País.

Essa plataforma foi tirada com base em várias discussões, grupos de trabalho

naquele seminário e também tem como fundamento os inúmeros tratados

internacionais de direitos humanos que este País, o Estado brasileiro, firmou e não

cumpre até hoje.

Dentre esses tratados eu citaria 2, de suma importância: o Pacto Internacional

dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,

Sociais e Culturais, pois o Brasil, apesar de firmatário desses pactos, simplesmente

não os compre. Uma das bandeiras e luta desse fórum é que o Brasil efetivamente

cumpra o que foi firmado e assuma sua condição de, efetivamente, defender as

comunidades afetadas por despejos.

De que forma isso pode ser feito? O Fórum Nacional de Reforma Urbana

protocolou no Ministério da Justiça, no ano passado, proposta de projeto de lei que

reforma o Código de Processo Civil brasileiro. Qual o fundamento dessa proposta de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

34

alteração do CPC? Nada mais é do que efetivamente buscar que essas

comunidades tenham direito a um devido processo legal.

Vejam, o que nós queremos é, nada mais nada menos, que se tenha um

devido processo legal nas ações possessórias, ações reivindicatórias de

propriedade nas ações judiciais, que vão dar ao final, ou no início do processo, um

despejo. O que acontece hoje? Qual é a realidade brasileira no âmbito da legislação

de despejo? A ação judicial intentada e despachada pelo juiz determina despejos

imediatos, em 24 horas, para cumprimento com força policial militar, sem que essas

comunidades sejam chamadas e ouvidas no processo, sem muito menos o direito ao

contraditório, à ampla defesa e à produção de provas.

Essa proposta de projeto de lei que tramita no Ministério da Justiça tem esse

fundamento, parece que básico. Parece que o homem saiu da caverna e já

conseguiu o devido processo legal. Porém, em relação aos despejos, isso não

acontece no Brasil. O que se vê são despejos de cumprimento liminar, imediato,

posse nova ou posse velha, conforme o companheiro Dito comentou há pouco.

Agora, a nova onda do Judiciário é propor ações com posse velha, com posse de

mais de ano e, mesmo assim, conseguir tutela antecipada e liminar para

cumprimento imediato. Isso é absurdo. Claro, a sentença é antecipada.

Além desse tema ser forte dentro do Fórum Nacional de Reforma Urbana,

estamos tentando trabalhar com o Ministério da Justiça, numa articulação, para que

haja efetivamente uma reforma do Código de Processo Civil brasileiro, a fim de que,

em primeiro lugar, haja o devido processo legal; e, em segundo, realmente se

defenda a função social da propriedade.

Existe total dessintonia entre a legislação brasileira, que trata do direito à

moradia, e a legislação brasileira que implementa efetivamente na norma processual

a questão da propriedade. São 2 mundos diferentes: a legislação que defende o

direito à moradia e a legislação que implementa os despejos. Esses 2 mundos não

se comunicam.

No âmbito da legislação material, Código Civil, Estatuto da Cidade, a

propriedade já está relativizada, já não mais é absoluta no Brasil. Mas isso não se

comunica com o Código de Processo Civil, que determina os despejos de maneira

imediata.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

35

Por outro lado, nós não conseguimos, em nenhum momento, e isso é uma

demanda também que tem forte apelo no Fórum Nacional de Reforma Urbana, fazer

uma inter-relação com o Poder Judiciário brasileiro. Nós sabemos que, muito

embora a legislação abra essa oportunidade de despejo imediato, o juiz, a partir do

momento que preside aquele processo, pode, sim, aplicar um ou outro regramento,

regramento protetivo ao direito à moradia, regramento que chama a audiência e

houve as partes, antes de decretar o despejo, mas essa inter-relação é praticamente

impossível no Estado brasileiro.

Não só é impossível, como vemos movimentos totalmente contrários a isso.

Vemos que há um Conselho Nacional de Justiça, que vai totalmente por outro

caminho, caminho que legitima essas ações de despejo. A última resolução

aprovada no Conselho e que prioriza as ações de conflitos fundiários, urbanos e

rurais, cria o Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos Conflitos

Fundiários. E eu pergunto: qual é a priorização que o Conselho Nacional de Justiça,

presidido pelo Sr. Ministro Gilmar Mendes, vai efetuar neste País? É a priorização

do direito à moradia ou a priorização dos despejos? É imediato, é urgente que nos

sentemos com esse Conselho Nacional de Justiça. (Palmas.)

Na semana que vem, eles vão realizar um seminário com os juízes para

pautar exatamente a atuação dos juízes via provimento nacional. E nós temos de

dizer que existe um outro lado da moeda, que existe uma outra legislação brasileira

protetiva do direito à moradia que nós temos de cumprir, que a moradia é uma

garantia social que tem efetivação imediata na Constituição brasileira.

Temos o Estatuto das Cidades no qual constam instrumentos políticos e

jurídicos de regularização fundiária, de garantia de moradia, mas, infelizmente,

parece que o mundo do direito caminha para outro lado. Nós temos, imediatamente,

que nos aproximar e acho que esta Casa efetivamente tem um papel muito

importante para fazer nesse jogo.

Esta Casa pode contribuir com o debate. A Câmara dos Deputados é esse

fórum também. É imediato e urgente que esta Casa se incorpore aos debates, que

vão acontecer e estão acontecendo no Brasil em relação aos conflitos fundiários;

seja parceiro dos movimentos do Fórum Nacional de Reforma Urbana, para que se

consiga estabelecer um novo marco jurídico no Brasil, protetivo do direito à moradia

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

36

e contrário aos despejos, que não respeitam o devido processo legal e não

respeitam a função social da propriedade. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Paulo Teixeira) - Obrigado, Cristiano.

Agora faremos uma primeira rodada de debates com os Deputados.

Peço ao Deputado Chico Alencar, membro desta Comissão, que assuma a

direção da Mesa. Depois, faremos os encaminhamentos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Pelo menos a lista dos

inscritos... É verdade que já começou a Ordem do Dia e toda deliberação de

Comissões ou de qualquer outro ambiente que não o magnífico Plenário fica

prejudicada, mas vamos continuar aqui, até a primeira votação, se for o caso.

Estou aqui vivendo a proverbial solidão do poder. (Risos.)

Não me suicidarei.

O primeiro inscrito é o Deputado Paulo Teixeira, do Partido dos Trabalhadores

de São Paulo.

O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Sr. Presidente, Srs. Deputados,

entidades presentes, inicialmente, parabenizo a Comissão de Direitos Humanos e

Minorias na pessoa do seu Presidente, Deputado Luiz Couto; o Deputado Pedro

Wilson, signatário desta reunião; todos os Deputados presentes, entidades e demais

membros e lideranças de movimentos sociais.

Nós temos um importante processo e gostaria de parabenizar Lúcia Moraes,

que apresentou um extenso relatório.

Sr. Presidente, que esta Comissão envie cópia desse relatório a cada

Prefeitura e instituição nele mencionada, seja instituição municipal, estadual ou

federal, para que o seu conteúdo seja de conhecimento do dirigente da instituição. É

a sugestão que faço.

Parabenizo a Dra. Lúcia Moraes, que viajou o Brasil, juntou-se às demais

entidades, fez um trabalho sério, consistente e apresenta ainda os problemas que

temos em relação ao direito à moradia no Brasil, direito esse que, ao meu ver, tem

muitos avanços legais, muitos avanços institucionais, mas há ainda uma lacuna

imensa no sentido da sua efetivação, da sua concretização. E o relatório ajuda na

reflexão sobre essas lacunas, sobre como concretizar esse direito.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

37

Eu quero ampliar minha reflexão em 2 direções, Sr. Presidente. A primeira

direção é o que disse aqui Raquel Rolnik, que representa a Relatoria Internacional.

Estão em discussão as MPs nºs 459 e 460, que regulamentam o Programa Minha

Casa, Minha Vida. Então, proponho que o conjunto dos Deputados presentes

marquem uma reunião com o Relator, para ver se ele aceita as emendas que

buscam garantir 2 aspectos: que essas casas sejam construídas em lugares

providos de infraestrutura e que se privilegiem aqueles municípios que exigem o

cumprimento da função social da propriedade e, portanto, marcam um avanço na

concretização do Estatuto das Cidades.

A sugestão que faço, Sr. Presidente, é a de que nos reunamos com o Relator

das MPs nºs 459 e 460, para conseguirmos melhorar o relatório. Esse programa tem

muitas virtudes, porque há muitos recursos destinados a ele. Assim, que o Relator

possa acatar aquelas emendas que melhoram o programa.

Quero também, Sr. Presidente, além de sugerir a reunião com o Relator das

MPs, sugerir que esta Comissão, na continuidade, convide o Ministro Gilmar Mendes

para vir a esta Comissão (palmas) para que, juntamente com os movimentos

presentes, possamos fazer um debate com o Poder Judiciário. Por quê? Porque às

vezes há um despejo numa área que foi loteada clandestinamente, numa área que

foi desenvolvida clandestinamente, e o juiz dá a ordem de despejo sem arguir se

aquele loteamento está fora da lei, se o loteador está cometendo um crime, porque

ele vê aquilo de uma maneira formal. Isto é, ele não quer ler a Constituição, não

quer ver a realidade para dizer: “Ali há uma prática de crime; portanto, não posso dar

essa liminar”. Ou: “Aquele terreno está numa zona especial de interesse social, onde

não há o cumprimento da função social da propriedade”. Ele faz uma leitura

formalista do Direito, portanto uma leitura contra o direito. É uma leitura contra o

Estado Democrático de Direito, que prevê, sim, um direito justo, e não um direito

injusto, um direito para poucos.

Portanto, a sugestão que faço é a de que essas mesmas entidades que se

apresentaram, a Relatoria Nacional, a Relatoria Internacional, a Dra. Lúcia Moraes,

a Dra. Raquel Rolnik e a Procuradora que hoje está conosco possam fazer esse

diálogo com o Ministro Gilmar Mendes, para que nós possamos ter uma avaliação,

um diálogo com o Poder Judiciário, que hoje, ao meu ver, muitas vezes não pratica a

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

38

justiça, pratica exatamente o contrário da justiça, que é a injustiça, em casos de luta

pela moradia. Nessa direção, eu acho que esse diálogo deveria aproximar-nos.

Creio que hoje o representante maior da Justiça brasileira, Ministro Gilmar Mendes,

deveria ouvir aqui o que nós Deputados ouvimos em relação a essas violações do

direito à moradia no Brasil.

São estas 2 sugestões, Deputado Chico Alencar: audiência com o Relator das

MPs nºs 459 e 460 e, na continuidade, o convite ao Ministro Gilmar Mendes e a esse

conjunto de entidades para que possamos discutir a Justiça brasileira e a

implementação do direito à moradia.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Perfeito. Obrigado,

Deputado Paulo Teixeira. Além da terceira sugestão, que é a de enviar o relatório

da Plataforma DHESCA às Prefeituras. Excelente. A linha boa é esta: hoje, nós que

somos muito falantes temos de fazer aqui um curso prático de “escutatória”, nós

Parlamentares.

Como há uma demanda, inclusive de representantes de movimentos que aqui

estão, para dar uma palavrinha rápida, sugiro que alternemos. Eu abro mão até da

minha inscrição, para facilitar. Os inscritos são: a Deputada Janete, que não está

presente; o Deputado Fernando Chucre, que também não está presente; o

Deputado Dr. Talmir, que também não está; o Deputado Paulo Rubem, que está

aqui; o Deputado Chico, que abre mão; o Deputado Paes de Lira, que está aqui; e o

Deputado Geraldo Thadeu. Eu pergunto a esses 2 colegas que estão presentes se é

possível entremear, no pouco tempo que resta — imagino que tenhamos de terminar

às 17h, para irmos ao plenário —, com algumas lideranças populares que pediram

também a palavra. Pode ser? Está bem.

Então, começamos com Cosme Vítor, da Associação de Favelas de São José

dos Campos. Mas vamos ter limite de horário, porque cada um de nós fala demais,

não é? Inclusive as lideranças populares. Se possível, por 3 minutos, Cosme.

O SR. COSME VÍTOR - Boa tarde aos Deputados, aos Ministros e ao

Secretário aqui presentes.

Há 2 coisas que gostaríamos de discutir. Primeiro...

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

39

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Com licença, por favor. Só

um minutinho, gente. Há uma organização aqui. Inscrevam-se na Mesa, com Márcio,

Assessor da Comissão, porque senão fico doidinho.

Vamos lá. Protesto tem que ser bem canalizado. Fazer revolução contra nós

mesmos é bobeira.

O SR. COSME VÍTOR - Primeiro, quero falar ao Deputado, porque nós somos

da base, viemos lá do interior, fizemos um sacrifício para chegar aqui, e chegamos

aqui e não temos direito a voz, não temos direito a... Este é meu protesto, certo?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - É, protesto que perdeu o

sentido. Você está falando. O direito à voz está assegurado.

O SR. COSME VÍTOR - Não, não, não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Ah, não?

O SR. COSME VÍTOR - Só falamos porque nós fizemos pressão, senhor. Só

falamos porque eu falei dali, porque se estivesse mandando a regra do jogo, antes...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Meu amigo...

O SR. COSME VÍTOR - Sim, sim, não é...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - ...colabore, não é? Você

está falando, e vai fazer um protesto? Canalize essa energia contra o Supremo, não

contra esta audiência pública. Perdemos tempo.

O SR. COSME VÍTOR - Está bom. Está bom, está bom. Não vamos discutir.

O que eu quero discutir, como representante da Associação de Favelas, é a

ineficácia. Primeiro, o Governo brasileiro não está, neste caso, discutindo os

financiamentos das cidades. É muito fácil vir aqui fazer o discurso, e quem financia

continua financiando.

Estou discutindo especificamente esse projeto de Nova Luz, São Paulo, que é

um escândalo. Lá em São José dos Campos, desde quinta-feira, Ethel Braga sabe

disso, nós estamos enfrentando um batalhão de choque, diferentemente do Coronel

ali, porque eles batem às pampas na gente. Desde quinta-feira. Liga-se para

Brasília, e infelizmente é inútil. Quando Ethel ligou, chamando a tal Cidinha Campos,

que é a Chefe da Assistência Social, ela estava ao meu lado. Está aqui o Defensor

Público Jairo Salvador, que veio também para nos ajudar nesta batalha. Ela ligou,

disse que eu ia falar com ela. Eu estava ao lado dela.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

40

Então, o que está acontecendo com esses financiamentos, principalmente o

Habitar-Brasil/BID, em São José dos Campos, é um escândalo. É um escândalo

protegido pelo Governo brasileiro. Está aqui! É um escândalo de justiça: oficial de

justiça, na Prefeitura, junto com o bate-pau da Prefeitura; oficial de justiça, sem

liminar nenhuma, desalojando as pessoas; ao oficial de justiça quem dá ordens é o

Secretário da Prefeitura, e Lúcia viu isso; é a assistente social que dá a ordem à

Polícia para nos espancar, como está acontecendo lá, infelizmente.

Hoje eu vim aqui e só sairemos de Brasília agora se houver uma solução para

esse Projeto Habitar-Brasil/BID. Ethel está cansada de saber, Raquel Rolnik está

cansada de saber, Paulo Teixeira está cansado de saber, e nenhuma atitude é

tomada. Isso virou comércio de pobre, que é diferente do cachorro. É como ela

disse. Não existe sociedades que protegem os animais? O cachorro não tem uma

casinha? Ele não tem o direito à sua casinha, sacramentado? Por que nós não

temos esse direito? Por que o Governo brasileiro não age, especificamente quanto a

nós, em São José dos Campos? O que está acontecendo de fato naquele malfadado

projeto?

É para beneficiar, como está acontecendo na nossa frente, Rachel sabe muito

bem disso, o Carrefour, que faliu. Depois de 5 anos, faliu o Carrefour, e estão

montando outro. É Marcondes CS, é Fiat Veículos... Vá lá, Raquel, vá ver o que está

acontecendo neste momento, lá. A Polícia Militar, o Comando chega lá, mete o pé

às 5h da manhã na porta da casa da pessoa, sem uma liminar sequer.

Eu gostaria de passar uns 2 segundos para o Defensor Público. Nós fizemos

um sacrifício hoje. Estamos desde as 4h da manhã na rua. E infelizmente — certo?

—, no pouco tempo que nos resta, o que eu quero ver com Rachel, com Paulo

Teixeira, é um ponto final nisso, Paulo. Um ponto final nisso. Há pessoas querendo

se suicidar lá. São trabalhadores. Não são do narcotráfico, Paulo. Tem uma... D.

Cleide, quero falar em nome de Cleide, especificamente. Está lá, a ponto de

suicidar-se. Nós temos até dia 30, agora. Dia 30. O Vereador Tonhão que nos

acompanhe até dia 30, porque dia 30 a madeira come de novo.

Então, quero saber: como é que vamos discutir isso com o Deputado, aqui,

aqui neste plenário? Porque não adianta falar bonito, mostrar tudo, e nós lá

embaixo, no fim da linha. É outra realidade.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

41

Queria dar só 2 segundos para o Defensor Público também.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Se ele conseguir falar em 2

segundos, vai ganhar um prêmio. Mas fale com brevidade, para dar direito aos

outros.

O SR. JAIRO SALVADOR - Serei breve. A Defensoria Pública do Estado de

São Paulo...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Seu nome, por favor.

O SR. JAIRO SALVADOR - Meu nome é Jairo Salvador. Eu atuo na tutela de

direitos coletivos de São José dos Campos, na unidade de Defensoria Pública

daquela cidade. Vimos acompanhando a política de erradicação dos grupos

favelados da cidade pela eliminação física não só das habitações, mas algumas

vezes até mesmo dos próprios moradores, porque segregar esses moradores,

enviá-los para a periferia das cidades significa, na verdade, condená-los à morte. O

rompimento com todos os laços culturais e econômicos têm propiciado a inclusão na

marginalidade. O número de crimes nas periferias têm aumentado muito, em função

do rompimento dos laços econômicos.

O que vimos trazer aqui é esta denúncia de violação do direito humano à

moradia. E não é um caso isolado; é uma política pública do Município, que está

consubstanciada em vários exemplos. Temos vários exemplos, que eu não teria

tempo de listar aqui. São pelo menos 12 casos que a Defensoria Pública está

acompanhando de violação do direito humano à moradia. E o mais grave, o maior

contingente é o da Fazenda Pinheirinho. São cerca 10 mil pessoas que ocuparam

aquela área, e estão lá há 5 anos, sem solução jurídica para o caso.

Temos o caso da Favela do Banhado, numa área central da cidade, em que o

Governo municipal já anuncia, com financiamento do BID, a remoção dessas

pessoas sob o pretexto de que estão em área de proteção ambiental. Dois detalhes:

existe um condomínio de luxo na mesma área, e ninguém cogita a remoção

daqueles moradores. Então, é um tratamento totalmente discriminatório e desumano

o que se dá a essa população pobre, porque São José dos Campos, cidade da

tecnologia, cidade rica, cidade tida como perfeita para qualquer visitante, esconde

sua pobreza, esconde-a nos desvãos, e a Defensoria Pública tem muito trabalho, em

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

42

função da falta de um arcabouço legislativo que nos proteja e que nos dê

instrumentos para que possamos lutar.

Na esteira do que foi dito aqui insistentemente, chegamos à situação quando

ela já está no limite. No limite, juridicamente, há muito pouco a fazer. Nessa

desocupação mesma do Jardim São José, de que se está falando aqui, não existe

norma municipal, como existe no Governo Federal e em nível estadual, para permitir

a transferência de contratos, mesmo depois de determinado tempo. Então, está

havendo um despejo maciço no Jardim São José II, em função dessa transferência

de contrato, e isso está trazendo um problema social muito grave para a cidade e

para o Estado.

Quero agradecer, Deputado, a oportunidade, e deixar aqui nosso protesto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Jairo. Obrigado,

Cosme. O caminho possível, no âmbito do Parlamento e desta Comissão de Direitos

Humanos, é constituir, junto com as entidades e os movimentos — sugestão

inclusive do Deputado Paulo Teixeira —, uma comissão, também composta por

Parlamentares, e irmos lá, a São José dos Campos, porque a questão é global, não

é local, não é só pontual, não. Então, acho que temos de articular e implementar

isso. Peço aos Deputados da Comissão que são de São Paulo que nos ajudem a

viabilizar essa proposta. Muito obrigado.

Peço uma informação: está havendo votação em plenário? Algum assessor

tem essa informação? Porque a luzinha aqui não para de piscar.

Vamos ouvir o Deputado Paulo Rubem Santiago, do PDT de Pernambuco.

O SR. DEPUTADO PAULO RUBEM SANTIAGO - Deputado Chico Alencar,

prezados Deputados, representantes das entidades, vou começar tomando como

ponto de partida a fala do companheiro da Central dos Movimentos Populares, que

enfatizou a necessidade da discussão da propriedade na Constituição, no Estatuto

das Cidades, nas leis orgânicas dos Municípios, nas Constituições estaduais, mas

junto com isso precisamos discutir e alterar, desde a Constituição, a questão do

direito à acumulação.

As terras urbanas, as propriedades urbanas transformaram-se nos últimos

anos em ativos financeiros. O maior exemplo disso aconteceu lá fora, com a crise

das hipotecas nos Estados Unidos, todos os contratos feitos em cima da expectativa

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

43

de lucro das instituições financeiras com aqueles contratos e aquelas hipotecas.

Aqui no Brasil não é diferente. A dificuldade maior é a de que o Poder Público

disponibilize áreas em condições de provimento de infra-estrutura, disponibilize nos

seus orçamentos a prioridade, a resolução do déficit da habitação, e não a

realização de grandes obras viárias, a de que Estados e municípios aguentem a

volúpia da indústria automobilística, que não pode ver crise pela frente. O carro

particular é o grande modelo de transporte público do País. E cansa-me ver cidades

e Capitais que priorizam as grandes obras viárias e não equacionam nem em 20%,

30%, o déficit de moradia nos grandes centros urbanos.

Quem é que determina que a prioridade de uma administração são as

grandes obras viárias, os grande viadutos? Quem determina que os principais

gastos coletivos são com a limpeza urbana, em detrimento dos programas de

organização dos catadores, da reciclagem, das cooperativas? Essa é uma disputa

que precisa ser feita. Não é só a questão da moradia em si.

Outra coisa: temos aqui a Constituição Federal, o Estatuto da Cidade, o

Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, que há 4 anos nos mobilizou

aqui. Votamos a Lei Federal do Sistema Nacional de Habitação, a Lei Nacional de

Saneamento, e parece que continuamos com o frei de mão puxado. Parece que o

período em que se impôs no País o contingenciamento de verbas, em que se proibiu

a Caixa Econômica de contratar para financiar habitação e saneamento lá no

Governo Fernando Henrique, continua, porque nós não conseguimos superar esses

entraves orçamentários.

Este ano estamos completando 10 anos do regime de metas de inflação, cuja

prioridade é retirar recursos do Tesouro, pagar financiamento da dívida pública e

não equacionar. E olhem que todo ano nós votamos aqui — as pessoas que estão

aqui precisam lembrar disso — a Lei de Diretrizes Orçamentárias. Já chegou o

projeto da LDO para 2010. Todo ano nós votamos a Lei do Orçamento Anual, o

Plano Purianual, que também são votados nos Estados e municípios.

Quando nós vimos o lançamento do Programa Minha Casa, Minha Vida, eu

fui um dos Deputados que fizeram várias emendas a essa medida provisória, porque

nós não entendemos como será possível equacionar o déficit de moradia no País,

moradia digna, como é a campanha que nós lançamos para respaldar a PEC da

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

44

vinculação de recursos, sem definir a prioridade na Administração Pública no tocante

à infraestrutura urbana. Não é para estradas, viadutos, grandes obras viárias, vias

expressas, como eu vejo ocorrer em algumas Capitais, dentro do tecido urbano,

para o transporte particular. A prioridade deve ser a conjugação de todos esses

instrumentos.

Veio o Estatuto da Cidade, que em boa parte ficou no papel; o Sistema

Nacional de Habitação de Interesse Social, que também não saiu do papel; a Lei

Nacional de Saneamento, que abriu a possibilidade de os municípios serem

protagonistas no enfrentamento e na resolução dessa questão; agora vão para a

execução orçamentária os contratos da Caixa Econômica; vão para a execução

orçamentária os recursos do Ministério das Cidades; e, apesar de termos ampliado

os contratos, nós ainda estamos muito aquém, e a maior prova disso, Deputado

Chico Alencar, é que recentemente a Caixa Econômica tinha mais de R$ 100

milhões aplicados em títulos da dívida mobiliária, e não me parece que é papel da

Caixa Econômica aplicar em título público. Esses recursos deveriam ser

disponibilizados para financiar, com Estados e municípios, os programas de

habitação, sobretudo da moradia com dignidade.

Então, quero concluir aqui enfatizando isto: não basta só discutir a

propriedade, é preciso discutir a acumulação. A terra urbana, a propriedade urbana,

já se transformou num ativo. Hoje as principais Capitais do País têm a indústria da

construção civil monopolizada por 4 ou 5 grandes empresas, que estão intervindo.

Inclusive já há denúncias de áreas que estavam integradas como Zonas Especiais

de Interesse Social, e estão sob ameaça de desqualificação como ZEIS para a área

poder ser entregue ao processo — entre aspas — “natural” do mercado, para

resolver o problema habitacional.

Muitos de nós que estamos aqui já levamos muita pancada de tropa de

choque em ocupação. Não houve diálogo. Já vimos às 4h, 5h da manhã, chegar a

tropa de choque com oficial de justiça, com liminar da Justiça para reintegrar a

posse de um proprietário que devia 10, 20 anos de IPTU, e o juiz determinou a

reintegração sem sequer citar a Prefeitura do município para saber se aquele

pretenso proprietário estava inscrito na dívida ativa tributária ou não. Isso é comum.

O Poder Judiciário toma decisões de costas para a constitucionalidade do País. O

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

45

Poder Judiciário toma decisões sem ouvir os demais entes da República, que têm de

ser ouvidos, porque todos têm responsabilidade. Se o município vai construir casa

hoje, quem é o maior titular para prover água e esgoto? É o município? Não é, são

os Estados, com as suas empresas estaduais: SABESP, CEDAE, COMPESA,

EMBASA, CAGECE, CAGEPA, e por aí vai. Como é que alguém pode definir uma

ação de reintegração de posse sem sequer ter a certeza de que aquele imóvel

cumpriu suas obrigações tributárias? Isso é o mais comum.

Então, estamos aqui para avançar. É importante a participação dos

representantes dos movimentos populares, das entidades, mas estamos aqui para

avançar. E coloco-me entre aqueles que vão estar à disposição, porque já fizemos

isso com a CPI do Sistema Carcerário, fizemos isso com os conflitos agrários.

Muitos Parlamentares saem daqui e vão para outros Estados, que não são seus

Estados de origem, para reforçar com os mandatos, com a representação política, a

luta dos trabalhadores pela reforma agrária, pela moradia popular, a luta para

construir um País justo, com dignidade.

É isto que eu queria dizer, desde já reiterando que nós temos de discutir

também, do ponto de vista do financiamento, a mudança na política monetária do

País. Não se pode admitir que a maior parte do Orçamento Federal hoje, votado e

aprovado neste Congresso, seja constituído de juros para a dívida pública, uma

parcela de receita para pagar título público e uma parcela quase igualitária para

refinanciar a dívida pública. Assim, não há Programa Minha Casa, Minha Vida, mas

Sem Minha Casa, Sem Minha Vida, e mais um pesadelo para a maioria da

população trabalhadora, que não tem casa, para a maior parte da população que

vive nas cidades, e até hoje não construíram uma política habitacional com

dignidade.

É o que eu quero deixar aqui, e integro-me à Frente Parlamentar, à

Comissão, para dar suporte, dar apoio na luta, nesses conflitos que estão

acontecendo em São Paulo, em Pernambuco também, na Bahia e em outros

Estados, e que têm demonstrado a grande persistência dos trabalhadores na luta

pela moradia popular.

Muito obrigado. (Palmas.)

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

46

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Muito obrigado, Deputado

Paulo Rubem. Intercalando, agora ouviremos Sueli Oliveira, do Pará.

A SRA. SUELI OLIVEIRA - Boa tarde, Deputado Chico Alencar. Em sua

pessoa, quero parabenizar a Câmara pela iniciativa de fazer um debate como este.

Eu faço parte do Conselho Estadual das Cidades. Reunimo-nos hoje, o GT de

Conflitos Fundiários, na parte da manhã, e grande parte dos membros estão aqui

participando deste evento.

Represento o Poder Público estadual, no caso o Governo do Estado do Pará,

em que tem sido manchete a todo momento a forma criminosa como historicamente

foram tratados os movimentos sociais. Hoje o Estado consegue sair desse patamar

de campeão em termos de violência nas áreas rural e urbana, mas isso tem

incomodado uma parte representativa da elite que sempre governou este País e os

Estados.

Quero parabenizar os Deputados que saem dos seus Estados para se

somarem à luta dos trabalhadores urbanos e rurais pela reforma agrária e pela

reforma urbana. Mas quero dizer também que há Parlamentares que saem dos seus

Estados para irem pedir o impeachment do Governo, que saem dos seus Estados

para pedirem a intervenção no Estado do Pará, porque o Governo não está

mandando matar trabalhadores sem-terra, como historicamente foi feito nos últimos

anos. E citamos o massacre de Eldorado, que completou 13 anos agora, no dia 17

de abril.

Então, o Estado está passando por um momento como este, de pedido de

intervenção, pedido de impeachment do Governo estadual, porque não tem tratado a

questão fundiária, a questão agrária, como caso de polícia, e tem tentado dialogar

com os movimentos sociais.

Ontem, o Procurador da República Felício Pontes fez uma reunião com os

movimentos sociais e anunciou que vai apresentar documentos que comprovam que

no Pará a grilagem é tão forte que até existem documentos, registrados em cartório,

comprovando que há propriedades naquele Estado que conseguem ser 15 vezes

maior que o tamanho normal do município. Isso para vermos a gravidade da

situação do Estado, que se perpetuou por muito tempo, pela forma como foi tratada

essa questão fundiária, a questão agrária, a luta pela reforma urbana. E estamos

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

47

aqui para contribuir para esta discussão e ver de que forma o Legislativo Federal

pode participar mais ativamente, para contribuir para mudar um pouco esse cenário

a partir da mudança de legislações.

Nós vamos realizar agora, por intermédio do GT de Conflitos Fundiários,

seminários em todas as regiões brasileiras, como já foi anunciado aqui pela

representante do Ministério das Cidades. Eu acho que é um momento de

contribuição, porque a partir dos debates, também da política nacional, mas em

caráter regional, a Câmara Federal vai ter subsídios suficientes para saber o que é

preciso de fato alterar. E eu acho que Poder Judiciário precisa ser realmente

convidado a participar do debate, porque o que tem ocorrido, no plano do Brasil e no

Pará, é que às vezes se concede uma liminar de reintegração de posse sem ao

menos olhar a questão da cadeia dominial, sem ao menos verificar as dívidas

tributárias daquele imóvel. Não se vê nada. Vai-se lá e...

E há um juiz lá a quem eu dei os parabéns, porque havia um despejo da

Caixa Econômica, de um imóvel, e ele historicamente ficou conhecido no Pará pela

sua ação, que não é comum entre os juízes. Saiu do gabinete, foi à casa da

senhora, tomou um cafezinho, conversou, e resolveu dizer que a Caixa Econômica

tinha apenas de cobrar uma taxa para que a pessoa continuasse morando ali,

suspendendo o despejo. Então, eu acho que são ações como essa que mostram

que precisamos também chamar o Poder Judiciário para tratar do assunto, porque

não será o Executivo ou o Legislativo, sozinho, que vai resolver, a partir do momento

em que o Judiciário concede as liminares de despejo.

Por mais que se tente mudar a legislação, grande parte da população já

morreu. Foi tombada pela bala do crime, pelo despejo. Já perdeu seu imóvel. Eu

acho que o caminho é nos anteciparmos a esse processo e construirmos uma

política de mediação. Temos de mediar, temos de prevenir, porque o que se está

fazendo hoje é só evitar o despejo. Já estão ali, não há muita coisa a fazer. Nós

precisamos, portanto, fazer políticas que sejam preventivas para não chegarmos a

esse estágio, que ainda persiste no Brasil, e no Pará não é diferente.

Então, queremos parabenizá-los e dizer que há uma expectativa de que a

Câmara possa dar uma grande parcela de contribuição à luta para fazer com as

coisas possam avançar, no sentido de que de fato o direito à moradia, o direito

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

48

social à propriedade seja considerado de acordo com o que foi estabelecido na

própria Constituição que passou por esta Casa de Leis.

Muito obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Sueli.

Agora vamos ouvir o Deputado Paes de Lira, do PTC de São Paulo.

O SR. DEPUTADO PAES DE LIRA - Sr. Presidente, Srs. Deputados, ilustres

representantes dos movimentos sociais aqui presentes, vou fazer um contraponto.

Evidentemente, vou trazer a minha experiência, começando pela minha experiência

pessoal de vida.

Eu morei, como foi dito aqui, também lá em Guaianazes, muito perto da

cidade de Tiradentes, quando tinha 6 ou 7 anos de idade. Meu pai era um humilde

sargento da força pública do Estado de São Paulo, e junto com minha mãe, que

varava a noite costurando vestidos para as mulheres da vizinhança, conseguiu

construir alguma coisa. E sempre disseram aos filhos que o caminho para sair

daquela situação extremamente humilde era o estudo e seria posteriormente o

trabalho. Foi essa a linha que nós seguimos em nossa vida.

Hoje eu moro um pouco melhor do que isso. Tenho uma casa pequena, mas

bem arrumadinha, na Zona Sul da Capital. E comandei mesmo, na época do

Terceiro Batalhão de Choque, diversas operações de reintegração de posse,

cumprindo mandados judiciais. É o que a Força Pública faz, é o que a Polícia Militar

faz nesses casos. Cumpre os mandados judiciais de reintegração de posse,

portanto, derivados de sentenças judiciais transitadas em julgado, sentenças

judiciais já sem recurso, e aí apoia os oficiais de justiça. E frequentemente vi e

participei de situações extremamente ruins, extremamente graves, extremamente

tocantes, sob qualquer ponto de vista que se analise humanamente.

Eu nunca prendi a Sra. Verônica, mas de fato ela teve de sair de alguns

lugares que tinha ocupado com seu pessoal, por força da atuação do oficial de

justiça, respaldada pelo Batalhão de Choque que eu comandava. Também nunca

desferimos uma borrachada que fosse, ou disparamos um tiro de borracha na Sra.

Verônica, nem nos seus companheiros dos movimentos sociais.

Senhoras e senhores, acho que os movimentos sociais têm de se organizar

sim, e pressionar, e fazer muita pressão. Todo o mundo está embasbacado, por

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

49

exemplo, parece que maravilhado, com esse recente programa anunciado pelo

Governo Federal para construir 1 milhão de moradias ao longo do ano de 2009.

Digo-lhes o seguinte: qualquer Governo dito popular deveria construir 1 milhão de

moradias por ano — por ano! —, e não deixar para lançar esse programa às

vésperas de uma eleição, ou seja, de maneira eleitoreira, como está sendo feito

agora.

Se o Governo Federal, os Governos Estaduais e os Municipais, de acordo

com as suas capacidades e competências, executassem, já a partir do primeiro dia

de mandato — do primeiro dia de mandato! —, os programas de habitação popular

que deveriam ser executados, porque há dinheiro de sobra para isso, eu estou certo

de que provavelmente a maioria das senhoras e dos senhores não viveria a situação

angustiante aqui referida pelo representante do movimento lá de São José dos

Campos.

Lembro-me, por exemplo, também do caso do Jardim Falcão. Acho que o

Deputado Paulo Teixeira estava lá, no Jardim Falcão, que foi um bairro construído

ao longo de vários anos, de muitos anos, à beira de áreas de mananciais —

portanto, áreas de preservação ambiental, e não deveria haver aquele bairro ali —,

com a vista grossa do poder público, a vista grossa da municipalidade de São

Bernardo do Campo em São Paulo, do Ministério Público e de outras autoridades,

que deveriam ter agido em tempo e esperaram o bairro desenvolver-se, chegar a ser

um bairro, para resolver entrar com uma ação judicial e determinar por via do

mandado judicial definitivo a retirada daquelas pessoas. Foi a minha tropa que

retirou aquelas pessoas, e eu não gostei nada disso. Mas era a lei, e a lei às vezes

traduz-se dessa maneira.

Então, é claro e certo que os movimentos sociais têm de se organizar cada

vez mais, têm de pressionar o poder público, sim. No entanto, democracia é o

império da lei. Democracia é o império da lei! E democracia é equilíbrio. Não se

pode argumentar contra a Constituição para defender teses relacionadas a qualquer

que seja a posição, incluindo a dos movimentos sociais.

Eu ouvi aqui pessoas praticamente defendendo a abolição do direito de

propriedade. Ora, o direito de propriedade é um direito fundamental. É uma garantia

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

50

individual da Constituição da República, dita Constituição Cidadã, votada e aprovada

em 1988. É uma cláusula pétrea. Não pode ser removida.

No entanto, a própria Constituição da República relativizou, naquela ocasião,

o direito de propriedade. A propriedade pode ser e é relativizada quando, por

exemplo, não cumpre sua função social. E há também diversas hipóteses de

desapropriação. Tanto é que as vítimas das desapropriações em todo o País se

contam pela casa dos R$ 100 bilhões que o Governo — Federal, Estadual e

Municipal — deve às pessoas desapropriadas, e há dívidas também relacionadas a

causas salariais, a precatórios salariais, e o Governo não paga, e não pretende

pagar, mesmo porque vem aí a PEC do calote. Eram pessoas humildes também, a

maioria delas trabalhadores que perderam suas casas, ou pessoas de classe média

que construíram uma vida, perderam suas casas e não veem a cor do dinheiro.

Falar contra a Constituição da República, contra o direito da propriedade não

é o melhor caminho, porque senão, amigos, daqui a pouco estaremos a enxergar

uma situação do seguinte tipo: um favelado que exige a propriedade, o barraco do

vizinho, porque o barraco dele tem um cômodo só e o do vizinho tem dois. E onde

vamos parar? Eu alerto contra isso. Alerto contra isso! É preciso levar em

consideração essa situação, e as risadas não vão ajudar. Risadas não ajudam em

nada. Isto aqui é um fórum de debate democrático, e eu exijo respeito.

Muito bem, tendo em vista a necessidade do equilíbrio, tendo em vista que

todos devem respeitar a lei, alguém também falou da criminalização dos movimentos

sociais. Essa criminalização frequentemente ocorre porque as pessoas dos

movimentos sociais — não todas, mas algumas delas —, radicalizando demais o

movimento, acabam por criminalizá-lo.

Falaram contra as decisões do Tribunal de Contas da União, de fiscalização

de verbas públicas, mas ninguém, nenhum de nós, Deputado, Presidente da

República ou representante de movimento social, está acima da lei. Qualquer

centavo de dinheiro público transferido do Governo, Federal, Estadual ou Municipal,

para uma entidade que se propõe a prestar um serviço social, deve ter rigorosa

prestação de contas. Se a prestação de contas não é feita, é claro que o Tribunal de

Contas da União deve intervir, e se for necessário o Ministério Público, a Justiça

deve impedir a continuidade do fluxo de dinheiro para os movimentos que não

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

51

prestam contas, ou para os movimentos que servem de faixada para outros

movimentos que atuam ilegalmente.

Tudo isso é muito importante. É importante o equilíbrio. É importante que a lei

proteja a todos. É importante que os movimentos sociais tenham o direito de existir,

de respirar, de se manifestar. É extremamente importante que na Casa de Leis da

República se faça esta audiência, ouvindo as pessoas, para que elas não só

desabafem, mas exijam dos Parlamentares o estabelecimento de alguns caminhos

para melhorar, de alguns caminhos para chegar às soluções mais viáveis.

Estamos aqui protagonizando isso, mas, por outro lado, devemos lembrar que

o equilíbrio é necessário, que a lei obriga a todos e que a democracia é o império da

lei.

Muito obrigado pela atenção.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Agradeço ao Deputado

Paes de Lira, que agora está numa condição diferente da que seguiu na sua vida.

Aliás, ninguém é Deputado. Isto não é profissão, mandato de Senador, ou de

Vereador, embora alguns queiram seguir carreira. Felizmente, muitos de nós aqui

temos os nossos ofícios, e o Deputado Paes de Lira, nesta condição temporária

eletiva, vai poder agora, ao invés da dura tarefa de cumprir, de apoiar o

cumprimento de decisões judiciais que às vezes eram flagrantemente determinadas

em situações de conflito social, vai poder ajudar a melhorar a lei e inclusive fazer

cumprir também a função social da propriedade. Isso é muito importante.

Houve um pensador que me orientou muito, chamado Alceu Amoroso Lima.

Tive o prazer de conhecê-lo. Ele não era socialista, muito menos comunista, mas

tinha uma reflexão interessante sobre a questão da propriedade, que remonta há

muitos séculos. Ele dizia que o capitalismo tem a seguinte contradição: como ele

afirma, como cláusula pétrea, até, dos seus diplomas legais, que a propriedade é um

bem, se é um bem, ela deve ser estendida a todos, sem exceção. Se, por outro lado,

na sua gênese, ela não pode ser socializada, então ela não é um bem. Esse é um

belo debate, que não é só filosófico. É um debate político.

E, na busca de uma sociedade justa e equitativa, na candência de todas as

manifestações, foi importante o Deputado Paes de Lira trazer aqui o contraponto,

porque às vezes é mais fácil falar só entre os iguais, entre aqueles que têm o

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

52

mesmo pensamento. Isso é da essência do próprio Parlamento. Aqui é o espaço do

dissenso civilizado, e não do consenso. Aliás, a sessão está lá num impasse agora

exatamente porque há um dissenso quanto à matéria em votação. Por isso, vamos

continuar mais um pouquinho, felizmente.

Chamo agora o Vereador Tonhão Dutra, de São José dos Campos.

O SR. TONHÃO DUTRA - Boa noite a todos, quase boa noite, até porque a

reunião vai terminar às 18h, conforme está no Ofício nº 195. Então, temos quase

uma hora para fazer este debate do que foi aprovado nesta Casa de Leis.

Gostaria de cumprimentar a Comissão de Direitos Humanos e Minoria desta

Casa, que é maior que a do Parlamento de que participo como Vereador em São

José dos Campos. É daqui mesmo que temos de partir, deste fórum, para podermos

fazer a defesa dos direitos humanos em todo o Brasil.

Gostaria de dizer também que a fala de Cosme Vítor foi muito importante,

como também a do Dr. Jairo foi muito importante, porque eu sou um Vereador que

acompanha de perto a situação dos moradores de lá do Jardim São José II, dos

moradores do Bairro do Pinheirinho, em São José dos Campos, que fez aniversário

agora — 5 anos! —, e quero aproveitar para cumprimentar a Dra. Raquel e a Dra.

Lúcia, que estiveram lá em 2005 ou 2006, não me lembro.

Mas gostaria de dizer a todos e a todas que este debate que está

acontecendo aqui em São José dos Campos está pior. Em São José dos Campos

há uma desumanidade muito grande. Em São José dos Campos a Prefeitura

governa para os ricos. Em São José dos Campos, quando se faz a casa do rico,

tira-se a casa do pobre. Em São José dos Campos quem elegeu o representante

dos ricos está tirando agora dos pobres para favorecer os ricos. Então, é difícil, em

São José dos Campos, Srs. Deputados, representantes de todo o Brasil, trabalhar

para os pobres.

Agora, trabalhar para os ricos, para os Parlamentares que foram eleitos para

isso, é muito ruim, porque há compromisso nas eleições, no dia a dia, com os ricos.

Os parlamentares pobres que se elegeram com certeza estão trabalhando para os

pobres, estão defendendo os pobres, e hoje isso está difícil também, porque é um

batalhão contra um tostão na defesa dos direitos humanos, do direito à vida

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

53

daquelas pessoas, como foi citado aqui pelo Dr. Jairo, Defensor Público do Estado

de São Paulo, e por Cosme Vítor.

Também gostaria de dizer que o Deputado Paulo Teixeira conhece a cidade

de São José dos Campos, esteve lá semana passada. Não pude estar presente à

palestra dele porque estava em outra atividade também muito importante para a

nossa cidade.

Este fórum que está acontecendo aqui hoje tem de se refletir em São José

dos Campos. Gostaria de me manifestar aqui repudiando o Poder Judiciário, que

combina com os ricos durante a noite para o dia, e quando é de madrugada está a

Polícia lá, tirando os pobres na marra, jogando a mudança deles na rua. Não há uma

política pública de geração de moradia.

Então, faço aqui este apelo. Vim de São José dos Campos. Não vim com

passagem dada a Deputado, não. Vim com uma passagem que foi votada na

Câmara de Vereadores de lá, paga pela população de São José dos Campos, em

defesa dos Direitos Humanos aqui nesta Câmara. Foi votada! Foi feito o

requerimento, foi votado, recebi a passagem apoiado pelos Vereadores.

Mas em São José dos Campos é preciso fazer uma intervenção, sim. Este

Brasil inteiro precisa de uma intervenção. É política de moradia pública? É. Mas

tiraram, por exemplo, os pobres de um lugar chamado Banhado, porque há mais de

R$ 6 milhões dados pela PETROBRÁS para se construir uma estrada que vai

passar por lá, uma rodovia, e por isso tiraram os pobres de lá e colocaram lá longe,

nas periferias.

Deixo aqui meu apelo, como Vereador, representando a Câmara Municipal de

São José dos Campos. Estou aqui me pronunciando nesta Casa de Leis, nesta

Casa dos Deputados Federais, junto com nosso Deputado constituído e eleito para

defender nosso País inteiro, mas é São José dos Campos que estou defendendo

aqui, a nossa cidade, como Vereador daquela cidade, porque ela precisa passar por

intervenções. Mas é preciso fazer intervenções sérias, porque nós temos de

participar. Hoje não dá mais... O senhor ali, representante da Polícia Militar, disse

que tem de haver 2 lados, mas acho que Parlamentar não tem de ter 2 lados, não!

Ou está do lado do pobre ou do lado do rico. Se for do lado do rico, então não

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

54

participe destas discussões. (Palmas.) Tem de estar do lado do pobre para favorecer

o pobre.

Então, deixo aqui minha mensagem, e gostaria de dizer que temos de marcar

mais reuniões em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, no Estado de São

Paulo, porque a política para aqueles governantes que estão lá, infelizmente, é a de

destruir, de matar o pobre.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Vereador Tonhão

Dutra. Na sequência, vamos ouvir Adnamar Santos, da Cáritas de Manaus.

O SR. ADNAMAR SANTOS - Antes de iniciar meu pronunciamento, gostaria

de me referir e dar apoio à situação apresentada pela Conselheira das Cidades e

representante do Governo do Estado do Pará, com relação a que hoje o Governo de

fato dialoga com segmentos da sociedade civil. Isso é importante e dá exemplo para

que outros Estados, para que os 5.561 municípios deste País também possam abrir

esse diálogo com os segmentos da sociedade civil.

Lúcia, Relatora da Plataforma DHESCA Brasil para a moradia adequada,

esteve em Manaus em 2006. Foi provocada pela Cáritas Arquidiocesana de

Manaus, pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana, pelos movimentos que compõe a

rede do Fórum Nacional de Reforma Urbana. Apresentamos também essa situação

quando ainda estávamos como Conselheiro das Cidades em 2005. Esse fato foi

relatado num documento que Lúcia fez. Em visita na época, em 2006, a 8

ocupações em 3 áreas consolidadas, ela elencou os fatos do caos que vivemos na

cidade de Manaus.

A partir da criação da Zona Franca de Manaus, ainda na década de 60,

exatamente em 1967, a cidade teve um crescimento populacional muito grande. Na

época eram 300 mil habitantes. Hoje, são 1 milhão e 800 mil só na Capital. Há 56

bairros consolidados pelo Plano Diretor, mas na realidade são 120 e 37 ocupações.

São fatos que levam a um conflito constante.

Sueli, a grilagem de terras da Amazônia como um todo é uma questão grave

e ainda um legado existente que deve ser superado pelo Estado brasileiro. Existem

terras, áreas que foram visitadas pela Lúcia, das quais constam 5 documentos — 5

títulos definitivos para a mesma área! Como pode isso? São fatos que criam uma

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

55

situação de insegurança total para aquelas pessoas que, muitas vezes, são levadas

a ocupar áreas porque não há uma política pública habitacional naquele Estado.

Construir moradias conjuntas não pode ser feita da mesma forma e

intensidade como se produzem aparelhos no Pólo Industrial de Manaus. Elas estão

sendo construídas fora da área urbana, bem afastadas. As pessoas levam muito

tempo no transporte coletivo dessas áreas periurbanas — não são nem áreas rurais

nem áreas urbanas —aos locais de trabalho. Passam mais de duas horas

transitando. Então, são situações conflitantes com à questão da água.

O Estado do Amazonas é rodeado de água, mas não possui água encanada e

possui somente 8% de saneamento. Portanto, não é somente a questão da moradia,

mas a questão da habitação. É necessário educação, saúde e o transporte de

qualidade. São esses os debates que queremos trazer.

Gostaria de elencar neste momento a questão do Programa Social e

Ambiental de Recuperação dos Igarapés de Manaus. Em 2004, foi contratado um

convênio com o BID de 240 milhões de dólares. Em 2008, mais 270 milhões de

dólares. Somados, são mais de 540 milhões de dólares.

Estão sendo feitas intervenções que não são requalificação nem recuperação

de igarapés. Está sendo feita a canalização dos igarapés da cidade de Manaus, os

quais são muito bonitos para inglês e visitantes verem, mas horrível para a cidade

de Manaus, para a questão ambiental. Tínhamos famílias que há 40 anos, 50 anos

moravam lá, conforme relato. Um dos moradores diz que a única coisa que de fato o

Governo tem feito é retirar as famílias da área de abrangência das obras do

PROSAMIM. As famílias que vivem há décadas na área, conforme pesquisa

realizada pelo próprio Governo, pelo próprio programa, destacam que a única

preocupação do Governo tem sido com o andamento das obras e a remoção das

famílias para áreas distantes.

Um caso bem específico que gostaria de citar é o da D. Maria, uma senhora

de 59 anos que vive só e foi retirada, em 2006, do Igarapé da Cachoeirinha. Os

técnicos do PROSAMIM, com a aprovação dos engenheiros, compararam uma

moradia para ela no bairro de São José, periferia da cidade, dentro de outro igarapé.

Pasmem: ela foi retirada do igarapé e colocada dentro de outro igarapé, em piores

condições. Essa senhora está doente psicologicamente. A Lúcia fez uma visita

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

56

especificamente a esse caso, que foi denunciado no Ministério Público. Tentamos

todos os meios, sem encontrar uma solução. Poderíamos citar inúmeros casos

iguais a esse.

Deputado Paulo Teixeira, espero que esse relatório elaborado pela

Plataforma DHESC, pela Lúcia e pela sua assessora possa chegar aos gestores do

Governo do Estado do Amazonas e da Prefeitura de Manaus, para que conflitos

iguais a esse deixem de acontecer e para que o Sistema Nacional de Habitação e

aquilo que vimos debatendo possa se efetivar nos Estados e nos Municípios.

Fazer simplesmente repasse de recursos do Governo Federal para os

Estados e Municípios e não cumprir aquilo que se deve realizar é simplesmente

brincar de fazer política pública.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Adnamar. Temos

mais 3 inscritos, mas eu chamo a Raquel, a Lúcia, o Celso, a Ethel e a Gilda para

fazerem suas considerações finais daqui da mesa.

O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Sr. Presidente, pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Pois não.

O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Desejo apenas acrescentar, Sr.

Presidente, que, quando encaminharmos os relatórios para o Município de Manaus e

para o Estado do Amazonas, enfim, para todos os Estados e Municípios, também os

enviemos para os Ministérios Públicos Estaduais e as Defensorias Públicas

Estaduais, a fim de que eles tomem as devidas providências. (Palmas.)

Também quero pedir a V.Exa., Sr. Presidente, que, com o Presidente efetivo,

pudessem constituir a comissão que vá a São José dos Campos. Estão presentes 2

Vereadores e representante de movimento de São José dos Campos. O Deputado

Paes de Lira, a Deputada Janete Rocha Pietá, a Deputada Luiza Erundina — não

sei se ainda está, mas ela e estava aqui —o Deputado Fernando Chucre e eu

podíamos tentar um contato com o Prefeito de São José dos Campos (isso teria de

ser feito pelo Presidente efetivo da Comissão), para que ele nos recebesse talvez no

dia 1º de maio, ou seja, depois de amanhã, dada a urgência dessa ação. Não sei se

o Deputado Paes de Lira pode estar presente e se os demais Deputados de São

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

57

Paulo poderão ir; não sei também se a Dra. Raquel Rolnik, a Dra. Lúcia, ou uma das

duas, podem ir conosco a São José dos Campos.

São essas as duas sugestões que quero fazer a V.Exa., além de pedir à

Assessoria da Comissão que elabore convite ao Presidente Gilmar Mendes para o

diálogo que vamos fazer em nome dos Deputados, e nós o assinaríamos

conjuntamente, os Deputados que concordarem, é claro, que estão presentes aqui

hoje.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Deputado Paulo

Teixeira.

Tudo será encaminhado devidamente, uma vez que são propostas

consensuais. A Dra. Raquel tem um vôo daqui a pouco, e pede para fazer uma

brevíssima consideração final. Creio que a Lúcia pode esperar também os 3 últimos

se manifestarem.

A SRA. RAQUEL ROLNIK - Quero dizer, rapidamente, que o principal

instrumento que a Relatoria Internacional tem é a apresentação de um relatório ao

Conselho de Direitos Humanos Internacional sobre a situação do direito à moradia

nos países. Isso acontece quando o Relator faz uma missão ao país, e o Miloon

Khotari, o Relator anterior, veio ao Brasil em 2005. Eu propus que, em relação às

missões feitas pelo Relator, fizéssemos um relatório de avaliação do seguimento de

todas elas, ou seja, o que se deu a partir das recomendações que o Relator fez no

Brasil.

Então, concretamente, como forma de encaminhamento no âmbito da

Relatoria Internacional, vou mandar correspondência para todas as entidades que

estão aqui hoje, e peço, por favor, que elas organizem o material das violações para

que possamos elaborar um relatório nacional como seguimento à missão do Relator

Miloon Khotari, a fim de que eu possa juntar tudo e apresentar ao Conselho de

Direitos Humanos, em Genebra, mostrando como está a situação do direito à

moradia no Brasil.

Por quê? Porque internacionalmente isso não aparece no âmbito do

Conselho. Aparecem situações de países como Camboja, como Sudão, mas essas

as questões que estamos colocando aqui — e muito bem colocado — ficam

invisíveis, ficam na sombra. Porque temos uma legislação muito avançada, temos

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

58

um sistema muito avançado, estamos produzindo moradia, estamos urbanizando

favelas, não aparece o que é de fato o conflito pela terra e pelo acesso à terra

urbana no País.

Então, peço aos senhores que, ao receberem essa correspondência,

imediatamente organizem o material e o mandem, para que possamos preparar isso

e apresentar ao Conselho.

Agradeço muito a oportunidade que tive hoje de ouvir todos esses relatos.

Ficamos, no Conselho, só conversando com diplomatas, com burocratas, e vamos

nos esquecendo de como é mesmo a situação de quem está lá ponta, de quem está

vivendo certas situações e o que está sentindo. Agradeço muito ter podido

testemunhar tudo que testemunhei aqui hoje.

Obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Agradeço à Dra. Raquel

Rolnik, Relatora Especial da ONU para questões de moradia.

Passo a palavra agora a Benedito Barbosa, da União Nacional de Moradia

Popular.

O SR. BENEDITO ROBERTO BARBOSA - Quero, inicialmente, aproveitar

para agradecer muito a oportunidade de estar nesta audiência pública.

Quero comentar duas questões complementares ao que a Verônica já falou

sobre o que está acontecendo em São Paulo. Primeiro, em relação aos edifícios

Mercúrio e São Vito. São 2 prédios, no centro de São Paulo, que eram habitados por

cerca de 800 famílias. Hoje, esses 2 prédios foram desapropriados pela Prefeitura.

O primeiro prédio foi desapropriado há cerca de 4 anos; o outro, agora.

No Edifício Mercúrio, 35 famílias resistiram desocupação do prédio até o dia

11 de fevereiro. Este mês, dia 23 de maio, vamos fazer um ato, pois vão fazer 100

dias que as famílias foram despejadas e desalojadas desses 2 edifícios. As famílias

receberam 2.400 reais, e os proprietários foram beneficiados com imóveis pela

Prefeitura e mais os recursos da desapropriação. Aliás, temos denominado essa

política de pagamento de 2.400 reais ou 5 mil reais pela Prefeitura de São Paulo de

cheque-despejo. Hoje, Prefeitura dá um cheque para as famílias que são removidas,

desalojadas das suas casas no centro da cidade e jogadas para debaixo da ponte

ou para a periferia, porque não têm como comprar uma moradia digna.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

59

As cerca de 600 famílias que moravam no São Vito estavam esperando um

atendimento da Prefeitura de São Paulo, o que seria em moradia digna. Inclusive, o

prédio foi desapropriado com o objetivo de atender às famílias com moradia. Elas

receberam uma carta da Prefeitura dizendo que seriam atendidas com habitação

popular, mas até hoje estão sem atendimento.

Há uma ação civil pública proposta pela Defensoria Pública do Estado de São

Paulo. Estamos acompanhando esse processo. A visita dos Deputados vai ser logo,

no dia 1o de maio. Pensei que teríamos um tempo a mais para preparar a visita. Eu

sugiro que a Defensoria Pública de São Paulo encaminhe a esta Comissão um

relatório mais completo sobre as violações que está acompanhando, para que esta

Comissão possa avaliar todas as violações que estão acontecendo em São Paulo.

A outra questão que a Verônica citou foi em relação às obras públicas do

Governo Federal. O Governo Federal está fazendo várias obras do Programa de

Aceleração do Crescimento nas Capitais, principalmente em São Paulo e no Rio de

Janeiro. No caso de São Paulo, a violação mais flagrante é a situação do

saneamento de duas grandes represas, a Billings e a Guarapiranga, que são as

áreas dos mananciais da cidade. A Prefeitura e o Governo do Estado estão fazendo

o saneamento da represa. Nada contra o saneamento, nada contra a obra, que é

muito importante. O problema é que isso implica remoção de mais de 3 mil famílias,

com cheques de 5 mil reais. Eram famílias que moravam há 30 anos, 40 anos nas

suas comunidades.

Uma das comunidades, a do Parque Cocaia, conseguiu, depois de muita luta

— inclusive pressão das companheiras Lúcia Morais e Raquel Rolnik, que enviaram

cartas ao Prefeito e ao Governador —, 150 moradias. Mas há mais 2.850 famílias

para serem removidas daquelas comunidades.

Pedimos que a Comissão encaminhe uma carta ao Ministro das Cidades,

Márcio Fortes, no sentido de que ele esclareça como está sendo feito o repasse

para as obras do PAC para a Prefeitura de São Paulo. A Prefeitura de São Paulo

está utilizando o dinheiro do Governo Federal para despejar famílias, para colocá-las

fora de suas casas. Nesse sentido, pedimos uma intervenção da Comissão de

Direitos Humanos. Entendemos a emergência de São José dos Campos, mas que

possa ver também o que está acontecendo no Município de São Paulo, com

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

60

centenas de despejos nessas áreas em que há grandes intervenções na cidade de

São Paulo, com favelas e comunidades sendo todos os dias despejadas com o

pagamento de 5 mil reais, o chamado cheque-despejo.

Os despejos são em decorrência das obras do Rodoanel, das obras de

saneamento das represas, das obras do PAC e das obras de urbanização. As obras

que deveriam ser de urbanização e de melhoria da vida das pessoas melhoram a

vida de umas e pioram muito a vida de outras pessoas.

Então, precisamos encontrar um equilíbrio, como disse um Deputado aqui,

diante dessas situações, para que as famílias removidas possam ser atendidas com

moradias dignas e não serem jogadas na rua da noite para o dia.

Finalmente, em relação aos imóveis do INSS, no dia 7 de abril fizemos uma

ocupação em prédio do INSS em São Paulo. A guarda do INSS bateu na gente,

fomos espancados dentro do prédio do INSS. Há inclusive companheiros nossos

sendo processados em São Paulo por causa disso. Mas conseguimos suspender os

leilões. Estavam sendo leiloados 569 imóveis.

A informação que recebemos da Previdência Social é que esses imóveis

seriam vendidos para fazer as novas agências do INSS. Somos a favor que

beneficiário da Previdência seja bem atendido, ao contrário do que vemos muitas

vezes, mas queremos que os imóveis vazios do INSS, em condições, sejam

destinados à moradia.

Depois da nossa pressão, conseguimos a suspensão temporária, por 10 dias,

dos leilões. Agora, conseguimos a suspensão dos leilões por mais 27 dias, para

podermos levantar todos os imóveis em condições de entrar no Programa Minha

Casa, Minha Vida.

Queremos pedir a intervenção da Comissão para encaminhar uma carta ao

Ministro das Cidades, ao Ministro da Previdência Social e ao Ministro do

Planejamento para que suspendam os leilões, até que possamos levantar todos os

imóveis possíveis de serem considerados habitação de interesse social, inclusive

garantindo moradia digna nas áreas da União. Não é possível o Governo Federal

ficar pedindo que os Municípios e os Estados providenciem terreno para fazer

moradia popular enquanto ele próprio vende os imóveis da União. Isso é uma

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

61

contradição. Queremos registrar aqui nosso descontentamento com essa postura do

INSS em relação ao leilão de imóveis e pedir o apoio dos Deputados nesse sentido.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Benedito, pela

rica contribuição, pelo clamor real da vida quotidiana, que raramente repercute no

centro do poder. A planície está chegando ao planalto, felizmente.

Manuel Divino e Genivaldo são os 2 últimos inscritos. Em seguida, ouviremos

a Lúcia e encerraremos a sessão.

Quando começar a votação no plenário da Casa, sob pena de sermos

criticados, porque não estarmos cumprindo nosso dever, a sessão terá de ser

encerrada.

Tem a palavra o Deputado Paulo Teixeira.

O SR. DEPUTADO PAULO TEIXEIRA - Primeiro, quero parabenizá-lo pela

coordenação dos trabalhos.

Sobre São José dos Campos, quero que V.Exa. acresça à comissão 2

Vereadores da cidade que estão aqui representando oficialmente a Câmara

Municipal. São os Vereadores Wagner Balieiro e Tonhão Dutra.

Também peço a V.Exa. que a Comissão oficie ao Conselho Nacional de

Justiça para garantir a participação dos movimentos sociais no seminário sobre

conflitos fundiários que vai ali ocorrer dia 11 de maio. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Perfeitamente. É o

Seminário de Instalação do Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos

Conflitos Fundiários, dia 11 de maio. Foram convidados muitos especialistas, muitas

sumidades de notável saber na questão, mas representantes dos movimentos têm

também de estar presente. Vamos pleitear isso ao Conselho Nacional de Justiça.

Na sequência, concedo a palavra a Manuel Divino, da União Estadual de

Moradia Popular de Goiás.

O SR. MANOEL COELHO SOARES DIVINO - Boa tarde a todos. Meu nome

é Manoel Coelho Soares Divino. Faço parte da União Estadual de Moradia Popular

de Goiás.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

62

Gostaria que refletíssemos um pouco. Estamos discutindo hoje, nesta

audiência pública, os conflitos urbanos e, ontem, como já foi dito, saiu a sentença do

companheiro Américo Novaes sobre a ocupação do Parque Oeste.

Quero que fique bem claro que a sentença não diz respeito apenas a Américo

Novaes, mas a todos os movimentos que lutam pela casa própria.

Pasmem, senhores: depois de 4 anos, a Justiça deu essa sentença porque

não encontrou nenhuma prova. Isso nada mais é do que uma resposta do Judiciário

às grandes imobiliárias de Goiânia, porque fica provado que existência de

conchavos entre imobiliárias, grandes proprietários e administradores permite isso

acontecer.

Hoje, o Parque Oeste se encontra da mesma forma que estava: um

loteamento de mais de 20 anos, com impostos atrasados. Ainda não houve uma

destinação ideal para aquela terra, que, repito, se encontra da mesma forma que

antes. As famílias foram despejadas de lá, tentaram de todas as formas criminalizar

o movimento, desestabilizá-lo. Não se tratava de baderneiros, mas de pais de

famílias que estavam ali porque queriam a sua casa. Prova disso é que todos eles,

depois de longo tempo, estão no Sonho Real, afastados da cidade, mas locados.

Essa prática tem acontecido em Goiás e em muitos outros Estados. A visão

da Justiça sobre propriedade privada tem prevalecido sobre todos os mecanismos já

aprovados, como o Estatuto das Cidades.

É importante que o Presidente Gilmar Mendes esteja presente, até para nos

falar de que forma a Justiça vê isso. Senão, o Estatuto das Cidades e os outros

mecanismos para nada servirão. Quando há a oportunidade de a própria Justiça

resgatar o compromisso com a sociedade, ela não se vale desses mecanismos que

estão à disposição. Então, é importante a presença dele, a fim de que fique claro

para nós de que forma a Justiça hoje vê as cidades; senão, as cidades vão crescer

como Goiânia, com grandes espaços urbanos dentro delas, e as famílias sendo

jogadas para a periferia.

O Governo também tem culpa nisso. Hoje, estamos vendo setores,

construídos com recursos do Governo Federal, que ficam a 3, 4 quilômetros da

cidade. Repito, construídos com financiamento do Governo. Isso tem, inclusive, até

atrapalhado o movimento, que está discutindo a questão da habitação com

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

63

seriedade. Estávamos negociando uma área anexa, dotada de infraestrutura, mas o

proprietário disse que não iria mais negociar, porque o Governo havia feito a Coca-

Cola, a infraestrutura passou por lá, e sua terra iria valorizar. Isso tem acontecido

não só em Goiás, mas em todos os lugares.

Deixo registrados esses fatos que acontecem hoje em nossas cidades.

Obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Muito obrigado,. Manoel

Divino.

É bom reiterar a condenação de Américo Rodrigues, um dos líderes da

ocupação do Parque Oeste, a 5 anos e 4 meses de prisão. Mas também morreram 2

sem-teto. E a condenação dos assassinos? A Justiça neste País ainda é muito

classista.

Vamos seguir ouvindo o Sr. Genivaldo dos Santos e, depois, os professores

César e Dulce.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Convido o Presidente

efetivo da Comissão a assumir a presidência dos trabalhos.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - V.Exa. está cumprindo bem essa tarefa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Tem V.Exa. a palavra,

Deputado Luiz Couto.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, eu estava em outra

atividade, a votação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo —

SINASE, cujo objetivo é fazer com que adolescentes em conflito com a lei tenham

condições de ser recuperados, ressocializados e retornar à sociedade com trabalho

e todas as demais condições.

Esta audiência é muito importante. Os encaminhamentos que aqui foram

feitos serão encaminhados à Mesa Diretora, com a manifestação de todos os

participantes.

Parabenizo todos os que estiveram presentes nesse debate. É sinal de que

essa questão é fundamental. A Comissão de Direitos Humanos é o espaço onde

todos os direitos fundamentais da pessoa humana devem ser tratados. Aqui é

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

64

proibido proibir. Quando se tratar de direito humano, temos de discutir com

profundidade.

Quero, afinal, dizer aos companheiros e companheiras que vamos

encaminhar a quem de direito o resultado desta audiência, para que aquilo que foi

definido seja aplicado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Muito obrigado.

Palavra do Presidente desta Comissão, Deputado Luiz Couto.

Concedo a palavra ao Sr. Genivaldo dos Santos, de São Paulo.

O SR. GENIVALDO DOS SANTOS - Boa tarde a todos.

Nesta Casa — infelizmente, não só dizer que é proibido proibir —, também é

preciso agir em termos de direitos humanos, das necessidades do ser humano.

No meu caso, fez-se necessário eu me deslocar de São Paulo por práticas

ignóbeis, maléficas e perniciosas do Judiciário, tentando se apossar, por 10 anos e

10 meses, de minha moradia, minha cama, minha geladeira, meu fogão, minha caixa

de ferramentas. Fazem-se de analfabetos e cegos, tratando-nos como se fôssemos

truões, que saíssem, como já foi dito nesta Casa, de uma caverna para serem

despejados.

Eis aqui. É só ler e sair prendendo. Estão aqui os nomes, fora outros que não

constam aqui. Saindo de primeira instância, hoje, eu estou no STJ, com um Ministro,

por meio de parecer de Corregedor, mandando-me voltar por onde vim, por onde já

passei. Não bato duas vezes na mesma porta.

Gostaria que esta Casa, que faz todas as normas legislativas, e que o

Senado, que sabatina aqueles que vão ocupar as cadeiras de Ministros, façam com

que cumpram as normativas que estão no Regimento Interno, principalmente na

nossa jurisprudência. Fatos como esses são vergonhosos.

Tenho conhecimento de que Flávio D´Urso já fez novas deliberações sobre a

ação extrajudicial em São Paulo. Hoje em dia, não são mais os que fazem uso da

toga, fora aqueles que não fazem uso dessa vestimenta, mas se escondem por

baixo dela. Abuso de poder, práticas intoleráveis, graves e criminosas.

Deixei minha herdade, minha família desamparada, porque sou o provedor,

para estar aqui, passando fome — de dia, passo fome; à noite, sonho que estou

comendo —, porque o Poder Judiciário me obrigou a estar aqui. Que mandatário,

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

65

que se diz impedido por motivo de foro íntimo, tem coragem, tem brio, tem moral

para proceder? É caso de polícia, é notícia crime — está aqui nos artigos dos

Regimentos Internos do STJ e do STF —, porque esta Casa assim determinou.

Eu necessito de amparo, eu necessito comer, eu necessito estar aqui para

que fatos como esse se extingam de uma vez.

O gerente da Caixa Econômica já realizou novas deliberações;

representantes da ONU já despacharam com Ellen Gracie Northfleet a respeito da

ação extrajudicial. Mas a prática continua, nobres Deputados, senhores que fazem

as nossas leis. Os coronéis, com pistoleiro ou sem pistoleiro, com toga ou sem toga,

continuam mandando.

Muito obrigado.

Um bom prosseguimento a todos nos afazeres e no cumprimento do dever.

(Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Genivaldo.

Vamos para a fase final.

O SR. CELSO SANTOS CARVALHO - Sr. Presidente, peço a palavra para

uma questão de ordem, se possível. É sobre a proposta do Deputado Paulo

Teixeira, no sentido de incluir representantes dos movimentos populares no

seminário do dia 11.

Solicito a participação no seminário do GT Conflitos Fundiários Urbanos, do

Ministério das Cidades.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Vamos tentar. O seminário é

organizado e promovido pelo Conselho Nacional de Justiça, por sugestão do seu

Presidente, o Ministro Gilmar Mendes, que não tem, digamos, muita sensibilidade

para esses movimentos. Mas a nossa função é pleitear, exigir até, que o seminário

seja o mais democrático possível, uma vez que ele dará base à constituição do

Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos Conflitos Fundiários Urbanos

e Rurais. É óbvio, então, que esse seminário não pode ser apenas de uma instância

da sociedade.

Está feita a proposta. A Secretaria desta Comissão a registrou devidamente,

para que tudo seja encaminhado. O tempo é curtíssimo, porque o seminário será

daqui a 10 dias.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

66

Concedo a palavra ao César, professor da Universidade Federal do Rio

Grande do Sul.

O SR. CÉSAR - Boa tarde, senhoras e senhores.

Sou professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Estou aqui

para apresentar um conjunto de relatórios que produzimos com algumas lideranças

de bairros e de localidades de Rio Grande, Município portuário com 196 mil

habitantes. Alguns bairros e localidades são ameaçados por um processo de

expansão portuária em face, basicamente, de projetos do PAC.

A Prefeitura de Rio Grande estima que mais ou menos metade dos imóveis

tem algum problema de regularização. Nesse sentido, as obras do PAC devem

desalojar famílias que residem em áreas passíveis de desapropriação, a fim da

realização de obras de infraestrutura ou terminais portuários.

Neste momento, 814 famílias podem ser desalojadas em 4 localidades.

Infelizmente, hoje, por uma série de circunstâncias, nenhum representante dessas

localidades ou bairros e nenhum representante do Movimento Nacional de Luta à

Moradia está presente. Esse movimento, num município relativamente pequeno, foi

bastante duro, e contou com a presença, em 2007, da arquiteta Lúcia Moraes para

elaboração do seu relatório. Ele sofreu um processo de tentativa de penalização,

inclusive com investigação da situação da Lúcia pela Prefeitura Municipal e de

alguns Vereadores da bancada da Situação, para descaracterizar não somente a

Lúcia, mas também o trabalho da relatoria.

Então, minha participação nesta audiência é para entregar esse conjunto

relatórios que apresenta a caracterização dos moradores e das localidades de 5

bairros que provavelmente tenham processo de desocupação nos próximos 2 anos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Muito obrigado, César.

Recebido o relatório, vamos nos empenhar também para que esse tipo de

antipolítica não prospere.

Com a palavra a Profa. Dulce, do outro Rio Grande, o do Norte.

A SRA. DULCE BENTES - Boa tarde. Fechamos bem, de sul ao norte.

Sou Professora do Departamento de Arquitetura da Universidade Federal.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

67

Por meio do Observatório das Metrópoles e do Departamento, temos um

trabalho de monitoramento das áreas de interesse social com organizações não

governamentais e movimentos de moradia em Natal.

Quero fazer alguns registros. Inicialmente, devo destacar a importância das

relatorias, que conferem um patamar muito diferenciado na cidade perante os

movimentos, gestores e demais segmentos em termos do significado do

monitoramento, do significado desse direito e da rede de proteção social.

Hoje, com o monitoramento, um dos nossos maiores objetivos é ampliar a

rede de proteção em torno da exigibilidade desses direitos na cidade. Temos

realizado, de 2007 para cá, um trabalho muito mais reconhecido e com mais

capacidade de diálogo com os setores que devemos enfrentar, sobretudo o

Executivo municipal, com relação aos mecanismos de proteção social estabelecidos

pelo Plano Diretor.

Natal não apresenta os problemas de despejo na propriedade praticamente

100% citados nesta audiência. A modalidade de despejo se dá através da

desconstrução da legislação que conseguimos aprovar desde 1994. Temos uma

legislação avançada, com reconhecimento das áreas de interesse social e com

regulamentações muito importantes. Há uma área monitorada há 15 anos e que tem

uma resistência muito importante no eixo turístico da cidade.

Temos foco nos assentamentos que estão num eixo estratégico de expansão

do turismo imobiliário, no Nordeste inteiro, em Natal especialmente, uma vez que há

uma pressão muito intensa sobre essas áreas.

Esta semana, fomos surpreendidos por medida do Executivo municipal que

modificou o Plano Diretor, cujo processo de revisão, em 2007, foi extremamente

democrático. Foram 3 anos de exaustivas discussões, e há, portanto, uma

legitimidade e um controle social importantes.

Entramos com uma Representação junto ao Ministério Público — já tivemos

uma audiência segunda-feira — no sentido de retirar o projeto de lei, encaminhado

diretamente para a Câmara Municipal sem discussão alguma, desconstruindo muito

das áreas, modificando zonas lindeiras de zonas adensadas com zonas de interesse

social, propositalmente nas áreas de expansão imobiliária.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

68

Portanto, estamos muito preocupados também — e a Profa. Raquel Rolnik

mencionou isso — com relação a que o município, de um lado, está desconstruindo

os instrumentos de proteção das ZEIS do Plano Diretor que devem dialogar com a

política habitacional, mas, de outro, a Secretaria de Habitação deve estar recebendo

recursos para implementar projetos de construção em outras áreas.

Essa dissociação entre o Estatuto da Cidade, os instrumentos e a política

habitacional é muito grave em termos dos resultados que esperamos para a

efetivação de uma política de habitação que venha para efetivar esses direitos.

Quero dizer que o relatório também está com a Profa. Lúcia. Nós o

publicamos e estamos fazendo a entrega nesta audiência.

Obrigada.

O SR. DEPUTADO CARLOS SANTANA - Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Agradeço à Professora

Dulce.

Passo a palavra pela ordem ao Deputado Carlos Santana, do Partido dos

Trabalhadores, do Rio de Janeiro.

O SR. DEPUTADO CARLOS SANTANA - Peço desculpas aos

companheiros, tanto os Deputados como os dos movimentos, mas estava numa

reunião sobre direitos humanos: os companheiros anistiados do Arsenal da Marinha

e de outros setores, tentando reparar a injustiça contra eles cometida.

Já fiz um discurso sobre o assunto que vou tratar hoje de manhã. Eu moro na

Zona Oeste, em Bangu, a região mais pobre da cidade do Rio de Janeiro. Um dos

sub-bairros de Bangu, a Vila Aliança, hoje, pela manhã, foi ocupada pela Polícia, e

uma criança de 3 anos foi assassinada. Em menos de 1 mês, 3 crianças, no mesmo

local, no mesmo sub-bairro, foram assassinadas. Está um desespero danado. Estou

tentando falar com a Segurança do Rio para tentar discutir o assunto. Não vai trazer

de volta a vida dessa criança nem das outras duas, mas temos de discutir a questão

da violência, que hoje, principalmente para a camada pobre da sociedade, virou

banal. As coisas estão acontecendo a cada momento.

Fico triste também porque algumas lideranças locais não estão percebendo

que o nível de morte das pessoas é enorme. Não estou defendendo ninguém que

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

69

está à margem da lei. Isso tem que estar bem claro. Não estou aqui para defender

bandido, não. Agora, uma criança de 3 anos de idade não carrega fuzil. Como é que

uma criança de 3 anos de idade vai pegar uma arma? Poderia ser meu filho, poderia

ser o filho de qualquer um dos que moram lá.

Quando querem prender um viciado ou uma pessoa na Zona Sul ou em

qualquer condomínio, há uma operação, faz-se uma logística. Mas, numa

comunidade pobre, entra-se dessa forma. O pai da criança me ligou, porque estão

telefonando para ele e dizendo: ”Não procure a imprensa, não procure nada”. Aonde

nós chegamos! Pelo amor de Deus!

Quero reafirmar: não estou aqui defendendo bandido. Bandido tem que ir para

a cadeia. Estou defendendo a vida.

Fico triste porque, na Zona Oeste, com um montão de lideranças políticas,

não vemos as pessoas se unirem em torno da defesa da vida. Nossa luta é pela

vida. O pobre não tem direito a nada, e isso não é uma questão de raça — porque

nós, negros, somos a maioria lá dentro —, mas de são todos aqueles que moram lá

dentro, independentemente de etnia.

O pai dessa criança, há um mês e meio, perdeu a mãe, por doença. Ontem,

ele estava conversando com um pastor evangélico sobre a violência, e hoje

acontece com a filha dele.

Então, quero aproveitar este momento para agradecer a Comissão por estar

funcionando. O único espaço que temos é a Comissão de Direitos Humanos. Mas

não sei aonde vamos parar. A vida, hoje, não tem mais valor.

Sempre fui criado em favela. Antigamente, quando alguém morria, não

conseguíamos almoçar, não íamos ao colégio. Agora, passamos por cima e vamos

para o botequim tomar cerveja ou guaraná. E no outro dia é a mesma coisa.

Amanhã, Deputado Chico Alencar, vamos fazer uma audiência na vila.

Estamos convocando as pessoas internamente. E a minha tristeza é ver que há

lideranças locais dizendo que é fatalidade. Mas como pode ser fatalidade 3 vezes

seguidas? Aí ficam jogando o policial, que também é mal assalariado e não tem

condições de trabalho, contra a população. É irmão brigando contra irmão. No

entanto, essa garota foi levada para a Polícia por policiais.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

70

Já não sei, se não tivéssemos esses microfones para falar, se valeria a pena

— nós, que viemos de movimentos populares, que somos ligados à questão popular

— estar aqui, no Parlamento. Se não existissem esses microfones, não adiantaria

estar aqui. Para quê? Para fingir que estamos fazendo papel de Deputado?

Neste momento, estamos discutindo a candidatura do Rio de Janeiro para

sede das Olimpíadas, mas está lá a maior convulsão. Enquanto no Copacabana

Palace as pessoas estão apresentar as condições do Rio de Janeiro, do outro lado

da cidade está acontecendo isso. Se eu fui abordado por telefone, imaginem o que

deve estar acontecendo em outras áreas.

Peço desculpas a todos os senhores, mas não posso me calar diante do que

estamos passando. Não é uma questão partidária. É a vida. Essa questão é central

para nós. Eu, que nasci numa favela, sei o que é isso. Para chegar a exercer 5

mandatos de Deputado Federal, sei o que vivi.

Hoje as pessoas têm medo de militar na área de direitos humanos porque

parece que estamos defendendo bandido. Não estamos aqui para defender bandido.

Estamos aqui para defender a vida, e isso é fundamental para nós. Quero deixar

isso bem claro, Deputado Chico Alencar, e convidá-lo para, na hora em que o

companheiro quiser, ir à Vila Aliança, porque sabemos do seu papel na luta em

defesa da vida.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado, Deputado Carlos

Santana, que nos está trazendo mais uma notícia trágica, dura, difícil, inaceitável. E

nós temos que reagir. Inclusive, na manifestação de 1º de maio, que será lá em

Santa Cruz, na mesma zona oeste, é importante levar essa denúncia, para que haja

uma investigação sobre a responsabilidade por mais esse crime.

O SR. DEPUTADO PAES DE LIRA - Presidente, pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Pois não, Deputado Paes de

Lira.

O SR. DEPUTADO PAES DE LIRA - Deputado Carlos Santana, percebi a

indignação de V.Exa. e comungo do seu sentimento. Só quero deixar claro que

existe, no Rio de Janeiro, uma política de retomada da segurança pública. Eu vejo

desse modo. E ela produz, de fato, frequentes intervenções em áreas populares,

que, por sua vez, sofrem muito, sofrem demais a influência do crime organizado.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

71

Nessas operações indesejavelmente acabam ocorrendo letalidades que não

atingem os criminosos. Frequentemente, a Polícia Militar do Rio de Janeiro e mesmo

a Polícia Civil perdem bravos policiais no cumprimento do dever, com o cérebro

explodido por balas de fuzis. Não se deve nunca aceitar nem justificar a morte de

uma criança. O que eu posso dizer é que o fato deve ser apurado com muita

cautela, porque muitas vezes afirmar precipitadamente que o projétil letal que atingiu

a criança partiu necessariamente de uma arma policial pode não ser exatamente o

que ocorreu, especialmente numa situação de conflito, com tiros disparados lado a

lado.

Compreendo a indignação de V.Exa., Deputado Carlos Santana, comungo do

seu sentimento de indignação pela morte de uma criança e jamais falaria

contrariamente a ele, mas peço cautela e prudência e que se aguarde a apuração

dos fatos.

O SR. DEPUTADO CARLOS SANTANA - Eu quero dizer, Sr. Presidente, que

sou filho e neto de militar. Eu não quero saber de onde a bala partiu, mas que essa

criança morreu. Então, nós não vamos... Desculpe o nobre Deputado. Nós temos

que parar com esse negócio. Pouco importa para mim de onde partiu a bala. Importa

para mim que uma criança morreu, uma criança que poderia ter um futuro, uma

criança que poderia ter o mesmo futuro do meu filho, que tem 19 anos de idade.

Então, temos de parar com isso.

Aqui não há divisão. E aí é que entramos nessa discussão sobre a divisão:

quem é bonzinho está de um lado, quem é ruim está do outro. Então, não tem essa

discussão. Temos de parar com essa discussão sobre de onde saiu o tiro. Temos de

discutir sobre quem é que vai enterrar essa criança, que essa criança está morta.

Esta a discussão que a sociedade faz. Alguns veículos de comunicação

erradamente colocam... Por isso que eu estou dizendo: nós não estamos aqui para

defender bandido. Esta é uma Casa de leis.

Este é o ano em que mais policiais foram assassinados, e estou indignado

também com isso, porque onde eu moro é onde eles também moram. A zona oeste

é onde há a maior concentração de policiais morando. Só para deixar bem claro, se

quiséssemos fazer populismo, era só dizer o seguinte: “Não, deixa para lá”. Isto é o

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

72

que a grande maioria faz, não bota a cara para apanhar, a grande maioria, repito.

Depois vão até esse povo pedir voto e acham que está tudo bem.

Esse é o motivo da minha indignação. E também é muito até pelas entidades

organizadas, porque, nesta hora, deveríamos estar discutindo. Nós não podemos

colocar irmão contra irmão. É com isso que eu fico triste, porque, no final, colocamos

irmão contra irmão, e aquele que é o menos favorecido. Temos de parar com esse

negócio de colocar irmão contra irmão, porque o que se pergunta à grande maioria

dos companheiros que estão hoje na PM, na Polícia Civil, com o salário que estão

recebendo atualmente, é se eles não querem sair de lá, se eles não querem ter

outra oportunidade. Eu sei porque eu convivo com eles, mas não dá para a gente

mais.

Hoje, não podemos banalizar o tráfico de forma geral. Agora, eu reclamo sim,

porque na zona sul não há uma operação dessa. Na Barra da Tijuca, nos

condomínios, não há uma operação dessa, porque, quando eles querem pegar

alguém, prendem até bonito, botam todo mundo lá presinho, todo filho de classe

média.

Só quero deixar aqui a minha indignação, e não polemizar sobre de onde

saiu a bala.

O SR. DEPUTADO PAES DE LIRA - Nós estamos concordando no essencial,

Deputado. Estamos concordando no essencial, repito, mas V.Exa. não pode tirar

conclusões precipitadas. Então, vamos nos manter exatamente na posição de

indignação pela perda da vida de uma criança de 3 anos, que deveria ser um

cidadão brasileiro com futuro, sem tirar conclusões precipitadas.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Obrigado.

Apesar de o fato ser absolutamente trágico, também isso enriquece a nossa

audiência pública e gera compromisso inclusive da autoridade pública.

O princípio da solidariedade é sempre emotivo, porque parte do sentir na

própria carne. Qualquer um de nós aqui, homens e mulheres, imaginando perder um

filhinho ou uma filhinha com 3 anos de idade numa ação da segurança pública, que

é um serviço público sustentado pela população — e aí houve provavelmente

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

73

também falta da inteligência, da cautela, da estratégia, da logística —, ficaria

absolutamente arrasado e indignado. É isso que nós temos de buscar.

O Deputado Carlos Santana tem razão quando diz que algumas operações,

até contra bandidos do colarinho branco, são cercadas de muita preparação, de

muita inteligência. E o Deputado Paes de Lira, como oficial da Polícia Militar, sabe

que a PM, apesar das dificuldades de remuneração, de estrutura, tem condições

também de planejar ações, embora ninguém negue aqui o potencial destrutivo do

tráfico armado de drogas ilícitas. No Rio de Janeiro isso é um absurdo: são donos de

áreas. Mas é possível fazer operações contra esse tipo de poder nefasto, mas

preservando, digamos, a população civil, em especial as nossas crianças, levando

em conta o horário, com toda a cautela. Ninguém aqui tem os detalhes, mas imagino

que essa criança não tenha sido colocada como escudo. E aí vem sempre a bala

perdida, que tragicamente é encontrada sempre no corpo de alguém que não tem

nada a ver com o confronto.

O que queremos é segurança pública e dignidade para os bairros pobres, a

começar pela moradia adequada. Com isso, nós encerramos aqui esta audiência

pública tão importante, que, aliás, resgata o papel da Câmara dos Deputados, que

não é ficar discutindo problemas internos, nem cometendo abusos. Estamos aqui é

para servir a população e não se servir de benesses. Felizmente hoje resgatamos

um pouco, em várias atividades, Deputado Paulo, esse sentido do nosso mandato,

porque estamos aqui há 2 ou 3 semanas só discutindo o próprio umbigo: vôo para

cá, avião para lá e passagem para cá. Isso é péssimo para o País, embora nós

tenhamos que assumir a responsabilidade. Às vezes essa pauta negativa nós

mesmos é que criamos. Vamos retomar a dimensão da grande política, que é o que

está sendo feito aqui.

Passo a palavra, então, para encerrar, à nossa convidada Lúcia Moraes, da

Relatoria Nacional para o Direito Humano à Moradia Adequada.

A SRA. LÚCIA MORAES - Moradia e Terra Urbana. Eu quero agradecer

imensamente à Comissão dos Direitos Humanos da Câmara, em especial aos

Deputado Pedro Wilson e Paulo Teixeira, que acreditaram na necessidade de, na

Câmara dos Deputados, darmos visibilidade a esse problema da violação do direito

humano.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

74

Agradeço ao Deputado Luiz Couto, que apresentou o requerimento de

realização desta audiência pública, que considero assim muito positiva em termos

de encaminhamentos, de discussões e dessa possibilidade de os Deputados aqui

presentes ouvirem as comunidades, os representantes dos movimentos, das

lideranças, de ouvirem realmente o problema de cada um.

Eu reforço a necessidade de se criar uma Comissão para ir a São José dos

Campos. A Relatoria Nacional esteve lá por 2 vezes, e infelizmente não foi recebida

pela Prefeitura. Numa das vezes constituímos uma comissão composta pela

Relatoria Nacional da Moradia, a Procuradora Federal Ella Wiecko, representando o

CDBPH e pela Dra. Ivana Farina, Presidente do Conselho Nacional do Ministério

Público. Fomos a São José para averiguar a questão da ocupação da Fazenda

Pinheirinho, e também não fomos recebidas pela Prefeitura. Pedimos que entrassem

em contado para que pudéssemos encontrar uma negociação, e eles sequer deram

retorno para a Procuradora Federal.

Então, vemos essa falta de discussão e de negociação da Prefeitura de São

José, enquanto os problemas continuam ocorrendo no dia-a-dia para a comunidade

como um todo.

Quero dizer que, ao tornarmos públicos todos esses relatórios das missões

que realizamos nessas cidades, sabemos que os problemas ocorrem não só nesses

cidades, mas praticamente em todas as cidades brasileiras de médio e grande porte.

Para quem não os recebeu, esses relatórios estão no nosso site:

www.dhescbrasil.org.br. Eles podem ser acessados. Temos também o lançamento

dessa publicação, A Efetivação do Direito à Moradia na Cidade de Natal. O

Observatório das Metrópoles conseguiu fazer essa publicação específica sobre a

missão da cidade de Natal.

Também considero muito positiva a possibilidade de haver essa reunião com

o Dr. Gilmar Mendes. Infelizmente, sempre falamos que o Poder Judiciário é o que

menos recebe, conversa, atende o movimento como um todo e que, durante as

missões, alguns Ministérios Públicos recebem a Relatoria ou são nossos parceiros

na realização da audiência pública. Infelizmente, com outros não conseguimos nem

a cessão do auditório para fazer a audiência, como ocorreu em Manaus na última

missão.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

75

A Dra. Gilda disse que podemos contar com eles. Eu respondi: “Agradeço

imensamente. Sempre temos procurado a Procuradoria Federal, mas infelizmente

ocorre em âmbito nacional, em Brasília. Em âmbito local isso não acontece”. Ela se

mostrou disposta a convocar uma reunião mais ampla, em âmbito nacional, com os

movimentos e a entidade, para discutirmos com os Procuradores Federais essa

defesa do direito humano e, em especial, do direito à moradia, de que estamos

tratando aqui agora.

Solicito também à Comissão que, ao elaborar o relatório com as deliberações

tiradas daqui, que elas sejam encaminhadas a todos os participantes com quem os

senhores tiverem contato. Esperamos que sejam enviadas a todos aqueles de quem

os senhores tiverem o endereço, e nós acompanharemos todos esses

encaminhamentos.

Solicito ainda à Comissão de Direitos Humanos que dê visibilidade às

Comissões afins. Todos os Deputados têm a sua cidade, o seu público, os seus

eleitores e é muito importante que possamos discutir esse assunto mais amplamente

nas outras Comissões. Vimos aqui presente a Frente Parlamentar da Reforma

Urbana. Então, é muito importante que criemos essa ligação mais estreita com a

Comissão.

Quero dizer que todos os relatórios e cartas de apoio que a Relatoria elabora

são encaminhados para as autoridades ligadas ao assunto, como o Ministério das

Cidades, a Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, o Gabinete Civil. Então,

encaminhamos, em âmbito federal e local, para as Prefeituras, para o Governo do

Estado e para as Comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e das

Assembleias Legislativas, a fim de pressionar. A Relatoria, feliz ou infelizmente, tem

essa condição de relatar, sugerir e dar visibilidade ao caso. Por isso damos essa

visibilidade e realmente cobramos maior empenho de todos no sentido de que

possam encaminhar essas soluções de formas pacíficas.

Agradeço imensamente a todos presentes, ao Frigo, ao Marcelo, que é o

assessor da Relatoria e nos ajudou a fazer essas missões nas cidades, cujos

relatórios estamos tornando públicos. No Rio Grande do Sul felizmente realizamos

uma boa missão, mas no dia seguinte a Relatoria estava sendo desqualificada. Eu

fui a um conjunto habitacional e falei que aquela experiência era a pior que eu tinha

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

76

visto, se comparada às que eu já havia passado. Mas aquela era a coqueluche da

Prefeitura. Depois tivemos notícia de que aquelas casas desabaram. Qualquer leigo

falaria o que eu falei sobre aquele conjunto habitacional.

O SR. GERALDO SANTOS - Lúcia, a informação da semana: a construtora

pediu falência, a Prefeitura está reconstruindo as casas em operação de urgência,

com funcionários de todas as Secretarias, e está ajuizando a construtora, que

também foi responsável por construir outras casas, mas as deixou inacabadas.

Então, o Ministério Público Federal está investigando as relações dessa construtora

que ganha as licitações com a Prefeitura Municipal, que vai tentar reaver pelo menos

parte dos recursos investidos naquelas casas que, como a senhora viu, não têm

condições de habitação.

A SRA. LÚCIA MORAES - Agradeço a todos.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, gostaria de fazer um

esclarecimento especial.

Aproveitamos a oportunidade para parabenizar o nosso assessor de

imprensa, Rogério Tomaz, figura que não tínhamos antes, e agora temos. O Márcio

assumia essa função, além da Secretaria. Em boa hora o Rogério Tomaz está na

Comissão de Direitos Humanos.

Utilizamos, na audiência pública de hoje, a ferramenta Twitter, que é uma

inovação da Internet colaborativa da Web 2.0. Toda esta audiência foi acompanhada

em tempo real no www.twitter.com/cdhcamara. Queremos parabenizar o

companheiro Rogério Tomaz pela iniciativa e também dizer que a Casa pode ter

mais esse instrumento, além da TV e da Internet. Assim temos condições de fazer

com que a população possa acompanhar o que está sendo discutido aqui.

O tema habitação adequada, para que as pessoas tenham moradia digna,

com espaço de terra para poder construir suas casas, é fundamental. Ficamos

contentes com isso. É mais um sinal de que a Comissão de Direitos Humanos está e

deve sempre estar à frente.

O SR. DEPUTADO PAULO RUBEM SANTIAGO - Só falta agora construir

moradia adequada em tempo real, de acordo com a real necessidade das pessoas.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Isso. É claro que o Deputado Paulo

Rubem Santiago vai nos ajudar e também a Relatora.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Direitos Humanos

Número: 0469/09 Data: 29/04/2009

77

A SRA. LÚCIA MORAES - Esse é um outro grande problema que não

citamos: a morosidade nas obras públicas.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - É verdade.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Chico Alencar) - Exatamente.

Dito, louvado e ouvido tudo isso na Comissão de Direitos Humanos em

audiência pública sobre o direito à moradia adequada, porque esse também é um

direito humano, precisamos modificar essa cultura de que o direito humano está

vinculado apenas à agressão à pessoa ou à defesa do indivíduo, porque está

vinculado também aos direitos sociais e coletivos.

Agradeço a presença aos Deputados que ficaram aqui até agora, Paes de

Lira, Capitão Assumção e Luiz Couto, do nosso Presidente, absolutamente

democrático, que abre mão até do poder e sabe, por outro lado, que não haverá

nenhum golpe de Estado por parte dos que estão provisoriamente aqui.

Agradeço ainda a presença ao Deputado Paulo Rubem Santiago, a todos os

convidados que nos honraram muito e nos ensinaram bastante e a todos os

presentes. Assim iremos conquistar os nossos direitos, com luta, organização e

interferindo no poder político nacional por meio do Legislativo, a Câmara dos

Comuns. Convém chegar também à Câmara dos Lordes, que é o Senado Federal.

Está encerrada esta reunião de audiência pública. (Palmas.)