DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA ENTIDADE … · Tendo celebrado acordos com a ADMG – GNR,...
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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRECTIVO DA
ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE
Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde (doravante ERS)
conferidas pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio;
Considerando os objectivos da actividade reguladora da ERS estabelecidos no artigo 33.º
do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio;
Considerando os poderes de supervisão da ERS estabelecidos no artigo 42.º do Decreto-
Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio;
Visto o processo registado sob o n.º ERS/085/08_D;
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I. DO PROCESSO
I.1. Origem do processo
1. Em 12 de Novembro de 2008, a ERS recepcionou uma exposição da Associação
Portuguesa para a Defesa do Consumidor (adiante DECO), pessoa colectiva de
utilidade pública com o NIPC 500 927 693 e sede na Rua da Artilharia Um, n.º 79, 4.º,
1269 – 160 Lisboa.
2. Na predita exposição, aquela associação identificou diversas entidades, por
denominação, morada e contacto telefónico que, supostamente, actuariam de forma
discriminatória entre os utentes na marcação de exames complementares de
diagnóstico, concretamente, exames de ecografia obstétrica e colonoscopia,
consoante a entidade financiadora dos mesmos.
3. Ou seja, o exame a realizar por um utente munido de credencial emitida pelo seu
médico de família seria marcado para uma data posterior face a um mesmo exame a
realizar por um utente “particular”.
4. Uma das entidades identificadas em tal exposição da DECO, como alegadamente
praticando tais actos de discriminação dos utentes do SNS, foi a Nova Clínica
Gastroflaviae, Lda.
5. Após análise da referida exposição, o Conselho Directivo desta Entidade, por
despacho de 21 de Novembro de 2008, ordenou a abertura de inquérito registado sob
o n.º ERS/085/08;
6. Considerando que o inquérito entretanto instaurado pela ERS permitiu identificar
diversas entidades que se encontrarão envolvidas pela exposição em questão,
identifica-se doravante, por facilidade, o presente inquérito com o registo
ERS/085/08_D.
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I.2. A exposição da DECO
7. A associação exponente identificou diversas entidades, por denominação, morada e
contacto telefónico que, alegadamente, actuariam de forma discriminatória entre os
utentes que a elas recorrem na marcação de exames complementares de diagnóstico,
concretamente, exames de ecografia obstétrica e colonoscopia, consoante a entidade
financiadora dos mesmos.
8. Com efeito, aquela associação juntou “[…] a listagem das entidades que fizeram
discriminação, de acordo com o estudo por cenário realizado pela DECO […]”.1
9. Na referida listagem, de entre outras entidades, consta a Nova Clínica Gastroflaviae,
Lda. como prestador de exames complementares de diagnóstico de colonoscopia.
10. Porém, e como será visto adiante, esta entidade não é uma entidade convencionada
com o SNS, sendo que, na realidade, existe uma outra Clínica, denominada
Flavimédica, Lda., que opera nas mesmas instalações e utiliza os mesmos contactos
telefónicos que a Nova Clínica Gastroflaviae, Lda.
11. Sendo a Flavimédica, Lda, então, a outorgante de uma convenção com o SNS.
12. Posteriormente, foi dado conhecimento à ERS da publicação de um artigo jornalístico
sob o título “Mais rápido sem credencial”, na Revista “Teste Saúde”, n.º 76, de 26 de
Novembro de 2008.
13. Conforme o teor deste último documento é possível concluir que, em suma, 15 locais
dos contactados pela DECO discriminariam utentes do SNS na marcação de exames
complementares de diagnóstico complementar de ecografia obstétrica e de
colonoscopia.2
I.3. Diligências
14. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, e considerando que a situação
exposta pela DECO indiciava um âmbito subjectivo de prestadores alegadamente
envolvidos potencialmente bastante lato, realizaram-se as diligências de obtenção de
prova consubstanciadas
1 Cfr. ofício datado de 12 de Novembro de 2008 e que instrui o presente processo de inquérito.
2 Cfr. pág. 12, n.º 76 da Revista “Teste Saúde, publicada pela DECO e junta aos autos.
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(i) em contactos telefónicos, estabelecidos no dia 18 de Novembro de 2008, com
todos os 15 prestadores não públicos, constantes da listagem de prestadores
convencionados do SNS na valência de radiologia e/ou ecografia obstétrica e
de endoscopia gastrenterológica e/ou gastrenterologia identificados na
exposição da DECO3, com o intuito de marcação de exames de ecografias
obstétricas e de colonoscopia, respectivamente, quer como utente do SNS,
quer como utente particular;
(ii) em pedidos de elementos remetidos, em 05 de Dezembro de 2008, a cada um
dos 15 prestadores não públicos, constantes da referida listagem de
prestadores convencionados do SNS na valência de radiologia e/ou ecografia
obstétrica e de endoscopia gastrenterológica e/ou gastrenterologia4;
(iii) na análise do artigo jornalístico publicado na Revista “Teste Saúde” n.º 76, pela
DECO5; e
(iv) em consulta e pesquisa do Sistema de Registo de Estabelecimentos
Regulados (SRER) da ERS.
15. Foram ainda efectuadas as diligências tidas por necessárias ao esclarecimento de
factos suscitados após análise de todas as respostas dos prestadores constantes da
referida listagem aos pedidos de elementos da ERS e subsequentes cruzamentos das
informações delas constantes com aquelas que haviam sido transmitidas aquando das
diligências telefónicas da ERS de 18 de Novembro de 2008.
16. Tendo, em algumas situações concretas, sido enviados novos pedidos de elementos,
nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 309/2003, de 10
de Dezembro,
17. Bem como novas tentativas de marcações, via contacto telefónico, junto de alguns dos
prestadores, de exames complementares de colonoscopia, quer como utente do SNS
quer como utente particular.
3 Cfr. listagem do ofício de 12 de Novembro de 2008 e a informação retirada do Sistema de Registo de
Estabelecimentos Regulados (SRER) da ERS.
4 Idem.
5 Vide artigo jornalístico publicado na Revista “Teste Saúde”, n.º 76, páginas 10 a 14, junto aos autos de
inquérito.
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II. DOS FACTOS
18. A Nova Clínica Gastroflaviae, Lda. (doravante designada por Nova Clínica) detém
instalações na Rua de Santo António, Edifício do Marquês, 2.º, n.º 2, 5400 – 069
Chaves, e encontra-se devidamente registada no Sistema de Registo de
Estabelecimentos Regulados da ERS sob o n.º 13 1316.
19. Este prestador não possui a qualidade de prestador convencionado do SNS para a
valência de Gastrenterologia7,
20. Tendo celebrado acordos com a ADMG – GNR, PSP-SAD, PT-ACS, SAMS e SS
CGD.
21. Nas mesmas instalações e com os mesmos contactos telefónicos, funciona uma outra
entidade, a Flavimédica, Lda.
22. Com efeito, a Flavimédica, Lda (doravante designada por Flavimédica) detém
instalações na Rua de Santo António, Edifício do Marquês, 2.º, n.º 2, 5400 – 069
Chaves, e encontra-se devidamente registada no Sistema de Registo de
Estabelecimentos Regulados da ERS sob o n.º 15 4428.
23. Este prestador possui a qualidade de prestador convencionado do SNS para a
valência de Endoscopia Gastrenterológica, não detendo qualquer acordo com outros
subsistemas.
24. Em 18 de Novembro de 2008, a ERS procedeu à diligência consubstanciada na
marcação telefónica de um exame complementar de diagnóstico de colonoscopia para
o contacto telefónico que, conforme informação veiculada pela DECO, pertenceria à
Nova Clínica, alegadamente, uma entidade convencionada do SNS, em resultado da
qual tomou conhecimento que a
“[…] marcação [de exame com credencial emitido pelo Centro de Saúde]
apenas poderia ser efectuada para o dia 10 de Janeiro de 2009.”.
25. E que,
6 Conforme o registo do prestador no SRER e cuja cópia se acha junta aos autos.
7 Vide nota supra.
8 Conforme o registo do prestador no SRER e cuja cópia se acha junta aos autos.
6
“[…] [n]a possibilidade de realização do referido exame a título particular
[…], o mesmo poderia ser realizado no próximo dia 26 de Novembro de
2008, mediante pagamento de € […].” – cfr. memorando da diligência junto
aos autos.
II.1. Da resposta oferecida pela Nova Clínica Gastroflaviae, Lda., datada de 29 de Dezembro de 2008.
26. Em 05 de Dezembro de 2008, a ERS confrontou directamente a Nova Clínica com os
factos resultantes da diligência vinda de referir e solicitou que procedesse,
designadamente, ao envio dos seguintes elementos:
“[…] 1. Cópia do acordo/convenção celebrado entre essa entidade e a
respectiva ARS, para a prestação de cuidados de saúde aos utentes do
SNS para a valência de endoscopia gastrenterológica.
2. Número total de actos de colonoscopia realizados […] no ano de 2008
(até à presente data), apresentados por trimestre, devendo ainda tal
número ser desagregado por entidade financiadora dos utentes – SNS,
diferentes beneficiários de subsistemas, seguros de saúde e particulares.
3. Justificação completa e fundamentada da diferença temporal praticada
[…] na marcação dos actos consoante a entidade financiadora do utente.
4. Pronuncie-se, querendo, sobre os referidos documentos produzidos pela
DECO, bem como sobre o resultado da diligência efectuada pela ERS. […]”
– cfr. ofício datado de 05 de Dezembro de 2008 enviado pela ERS ao
prestador e junto aos autos.
27. Na sua resposta a tal pedido de elementos datado de 29 de Dezembro de 2008, veio a
Nova Clínica, representada pelo seu Director Clínico, alegar, designadamente, que o
acordo/convenção apenas existe entre a Flavimédica, Lda e a ARS do Norte para a
valência de endoscopia digestiva.
28. Por tal facto, a Nova Clínica “[…] realiza apenas exames privados, e para subsistemas
de saúde que não os do SNS, como a utentes da CGD, SAD/PSP; SAD/GNR;
CTT/IOS; SAMS; MÉDIS; ADVANCE CARE e outros seguros de saúde.”.
29. Sendo uma outra entidade, a saber, a Flavimédica, Lda, que realiza exames para o
SNS.
7
30. No respeitante ao número total de exames realizados, o prestador in casu informou a
ERS do seguinte:
[…]
31. Ainda no respeitante à quantidade de exames realizados, a Nova Clínica referiu que o
número de exames marcados e realizados pela Flavimédica é mais do triplo dos
exames realizados pela Nova Clínica, não conseguindo aquela entidade proceder à
marcação de mais exames endoscópicos do que aqueles que está a realizar.
32. Ademais, admite que “[…] Neste momento, a espera de um mês para marcação de
colonoscopia é um prazo aceitável, já que a maioria dos exames são exames de rotina
e “follow up” endoscópicos.”.
33. Finalmente, e no respeitante ao artigo jornalístico da DECO, retorquiu que
“[…] a DECO no referido pedido por telefone, que não é habitual, já que a
marcação de exames do SNS faz-se normalmente por Fax, onde é
assinalado ou não o grau de urgência do pedido e assim é marcado o P1
para mais cedo ou mais tarde, deveria ter indicado que o exame era
urgente e ser-lhe-ia marcado mais cedo, e então, caso não ficasse
satisfeita com a marcação, teria sido encaminhada para falar com o médico
de família do utente e este, caso a urgência existisse, contactaria com o
médico especialista, o que acontece nos casos que impõem urgência. […]”;
34. E ainda que a Nova Clínica e a Flavimédica têm agendas e dias de realização dos
exames independentes e não coincidentes.
35. Resulta também do teor da resposta apresentada pela Nova Clínica, que as
assistentes que procedem à marcação do exame têm instruções para questionar o
utente nos seguintes termos:
“[…] É um exame para realizar a Flavimédica? Ou um exame para realizar
a Nova Clínica? Isto é, é um utente do SNS? Ou é um utente do SAMS? de
SEGUROS? da SAD/GNR ou da SAD/PSP?.[…]”, sendo que, dependendo
da resposta dada, o exame é marcado para uma das duas agendas
existentes. – cfr. ofício da Nova Clínica datado de 29 de Dezembro de
2008.
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II.2. Da resposta oferecida pela Flavimédica, Lda. e pela Nova Clínica Gastroflaviae, Lda., datada de 09 de Fevereiro de 2009
36. Após a análise do teor da referida resposta, afigurou-se essencial avaliar da situação
concreta e esclarecer o modo de funcionamento das duas entidades nas mesmas
instalações.
37. Relembre-se que a Flavimédica é uma entidade convencionada do SNS e encontra-se
registada no SRER da ERS sob o n.º 15 442.
38. Assim, e nessa sequência, a ERS remeteu dois novos ofícios, endereçados à
Flavimédica e à Nova Clínica, ambos datados de 23 de Janeiro de 2009.
39. Assim, a Flavimédica foi interpelada para, no prazo de 10 dias úteis, informar do
seguinte:
“[…] 1. Remessa de cópia da licença de funcionamento do estabelecimento
sito na Rua de Santo António, Edíficio Marquês, n.º 2, 2.º, 5400 – 069
Chaves, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 492/1999, de 17 de
Novembro, regulamento interno e organigrama funcional;
2. Prestação de todas as informações relativas aos recursos humanos,
incluindo nome e categoria profissional, de todos os colaboradores que
prestam serviço na Flavimédica, Lda., especificando designadamente o
número de profissionais de saúde que na mesma prestam serviços,
especialidades de cada um e tipos de exames da responsabilidade de cada
profissional de saúde;
3. Identificação de todos os acordos com entidades financiadoras de
cuidados de saúde detidos pela Flavimédica, Lda e clarificação das áreas,
valências ou actos/exames objecto dos mesmos;
4. Explicação detalhada das eventuais repartições de funções ou de
actividades entre a Flavimédica, Lda. e a Nova Clínica Gastroflaviae, Lda,
designadamente explicitando as regras ou princípios orientadores de
eventual repartição de clientela entre os dois prestadores, com expressa
referência à qualidade dos utentes em questão e eventualmente repartidos
(isto é, se utentes do SNS, beneficiários de subsistemas de saúde,
beneficiários de seguros de saúde ou “particulares”);
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5. Clarificação do título habilitante da utilização das instalações sitas na
Rua de Santo António, Edifício Marquês, n.º 2, 2.º, 5400 – 069 Chaves,
designadamente, especificando a existência de um direito de propriedade
ou de arrendamento e esclarecendo:
i) se um tal direito é, ou não, extensível à plenitude das instalações
existentes na referida morada;
ii) qual a data do início da ocupação das instalações.
6. Confirmação da existência de autonomia visível e claramente identificada
nas referidas instalações entre esta entidade e a Nova Clínica, Lda.
7. Referência precisa e exaustiva das actividades concretamente
desenvolvidas pela Flavimédica, Lda., bem como identificação:
i) da distribuição do capital social pelos sócios da sociedade;
ii) da identificação dos membros dos órgãos sociais da sociedade. [...]”
– cfr. com ofício datado de 23 de Janeiro de 2009 remetido pela ERS à
Flavimédica e junto aos autos.
40. Por sua vez, a Nova Clínica foi interpelada para, no mesmo prazo de 10 dias úteis,
informar dos mesmos elementos conforme descrição supra – cfr. ofício datado de 23
de Janeiro de 2009 e remetido pela ERS à Nova Clínica.
41. Foi apresentada uma resposta comum aos pedidos de elementos em questão,
versando, por isso, sobre os elementos solicitados à Flavimédica e à Nova Clínica -
cfr. resposta dos referidos prestadores datada de 09 de Fevereiro de 2009 e junta aos
autos.
42. Com tal resposta, os prestadores procederam à junção da listagem dos recursos
humanos pertencentes a cada uma das Clínicas9, da listagem de todos os
acordos/convenções outorgados com outras entidades financiadoras pela Nova
Clínica, tendo, in fine, protestado juntar vários documentos sem contudo ter procedido
à sua cabal identificação.
9 Note-se que o pessoal administrativo identificado pelos prestadores, pertence à Nova Clínica Gastroflaviae,
Lda, sendo referido, em suma, que as secretárias da Nova Clínica prestam, à Flavimédica, o serviço de
marcação de exames, por correio, fax, telefone ou presença física. – cfr. documento junto aos autos.
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43. Assim, e no que aqui interessa analisar, os prestadores in casu, para além dos
documentos juntos em cumprimento do solicitado nos pontos 2. e 3. constantes do
pedido de elementos enviado pela ERS,
44. Informaram esta Entidade do seguinte:
(i) Até à presente data, não foi possível obter qualquer resposta por parte
da então Sub Região de Saúde de Vila Real no respeitante ao pedido
de licenciamento da unidade de saúde privada denominada Nova
Clínica Gastroflaviae;
(ii) No respeitante à repartição de funções entre ambos os prestadores, a
Flavimédica tem uma agenda exclusiva para a realização de exames
endoscópicos ao abrigo do convencionado com o SNS;
(iii) Quando a marcação do exame ocorre por telefone, a assistente
pergunta sempre se o utente pretende realizá-lo através do SNS, isto é,
pela Flavimédica;
(iv) Para obstar a qualquer equívoco, a assistente tem instruções para fazer
marcações, na Flavimédica, apenas para utentes do SNS;
(v) Ademais, a fim de evitar qualquer dúvida quanto à qualidade do utente,
optou-se por realizar exames endoscópicos em dias distintos, sendo os
do SNS realizados pela Flavimédica aos sábados e os outros, incluindo
“particulares” realizados pela Nova Clínica às quartas-feira;
(vi) Nunca ocorreu, nem nunca ocorrerá, qualquer discriminação entre
utentes, sendo certo que a “repartição” de utentes decorre unicamente
do facto de só a Flavimédica ter convenção com o SNS;
(vii) O proprietário das instalações onde estão instalados ambos os
prestadores é, desde Setembro de 2006, a Nova Clínica, sendo que a
Flavimédica utiliza os mesmos equipamentos e instalações daquela
prestadora, por força de um convénio entre ambas as sociedades,
desde 1998;
(viii) Há uma afixação autónoma e de forma visível a todos os utentes da
informação da existência de livro de reclamações para cada uma delas,
bem como duas placas identificativas no edício onde as mesmas estão
instaladas;
(ix) No dia da realização de exames pela Flavimédica o gabinete encontra-
se devidamente assinalado, sendo que ambas as Clínicas detêm
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logótipos diferenciados que identificam o executor de todos os exames
e preparações entregues a cada um dos utentes.
45. Finalmente, e no respeitante ao ponto 7. do pedido de elementos da ERS, os
prestadores interpelados informaram que
(i) a Nova Clínica é uma sociedade comercial por quotas, de igual valor,
pertencentes ao sócio […] e à sócia […] e prossegue as actividades
ligadas às áreas constantes do anexo, designadamente, nas áreas de
Ginecologia e Obstetrícia, Cardiologia, Dermatologia e
Gastrenterologia;
(ii) a Flavimédica é uma sociedade comercial por quotas, uma no valor de
[…] do capital social, pertencente ao […], e a outra no valor de […] do
capital social, pertencente ao […], e detém como exclusiva actividade
os exames endoscópicos;
(iii) a Gerência da Nova Clínica pertence a ambos os sócios e a da
Flavimédica ao seu sócio maioritário.
II.3. Da resposta oferecida pela Flavimédica, Lda., datada de 11 de Março de 2009.
46. Considerando o teor da resposta vinda de expôr, a ERS entendeu ser necessário a
prestação de alguns esclarecimentos adicionais sobre a mesma, pelo que remeteu um
novo ofício à Flavimédica, para, no prazo de 10 dias úteis, informar do seguinte:
“[…] 1. Cópia do acordo/convenção celebrado entre essa entidade e a
respectiva ARS, para a prestação de cuidados de saúde aos utentes do
SNS para a valência de endoscopia gastrenterológica, bem como da
respectiva ficha técnica;
2. Cópia do documento identificado com o n.º 1 e referido na referida
resposta de V. Exas., porquanto o mesmo não foi recepcionado;
3. Cópia do documento outorgado entre a Nova Clínica Gastroflaviae,
Lda. e a Flavimédica, Lda. com vista à utilização por esta última de todo o
equipamento e as instalações daquela, conforme referido no ponto cinco da
resposta de V. Exas. em referência;
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4. Esclarecimento sobre se os recursos humanos, identificados no anexo
da resposta de V. Exas. de 09 de Fevereiro de 2009 como pertencendo à
Nova Clínica Gastroflaviae, Lda.,
(i) são comuns à Flavimédica, Lda., ou seja, se os profissionais médicos
da primeira também exercem funções na segunda; e, no caso afirmativo,
(ii) explicação detalhada das eventuais repartições de funções ou de
actividades e informação sobre os horários respeitados pelos profissionais
numa e noutra entidade. [...]” – cfr. ofício datado de 20 de Fevereiro de
2009, enviado pela ERS.
47. Nessa sequência, veio a Flavimédica referir que
i) o Dr. A. é médico especialista na área de gastrenterologia e é o
único médico que trabalha em ambas as sociedades, ainda que em
dias diferentes, concretamente,
ii) quartas-feiras entre as 14 horas e as 19 horas executa exames
endoscópicos para a Nova Clínica e aos Sábados, com
periodicidade quinzenal, entre as 8 horas e as 13 horas e as 14
horas e as 18 horas, executa exames para a Flavimédica, Lda. e
iii) apenas uma enfermeira presta serviço na Flavimédica.
48. Mais procedeu à junção das licenças de funcionamento no âmbito da protecção
radiológica n.º 1016/08 e n.º 1017/08 pertencentes à Nova Clínica e que, considerada
a natureza dos exames realizados pela Flavimédica não são utilizados por esta, – cfr.
documentos juntos ao ofício subscrito pela Flavimédica e datado de 11 de Março de
2009;
49. Bem como um documento denominado de “ficha técnica actualizada” da qual, e no
que importa realçar para a situação em apreço, resulta a denominação social, a
indicação da localização das instalações e dos contactos - sendo que o correio
electrónico indicado é [email protected] - e a descrição de todos os equipamentos
que são utilizados.
50. Finalmente, procedeu à junção da planta das instalações com a indicação das
divisórias utilizadas pela Flavimédica no seu horário de funcionamento, tendo ao seu
dispôr uma única sala para exames endoscópicos.
51. Note-se que a fotocópia da carta da ARS de 14/01/1998 e respeitante à convenção
outorgada com a ARS Norte foi junta em data posterior, após interpelação telefónica –
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cfr. memorando de diligência telefónica de 13 de Março de 2009 e ofício datado de 16
de Março de 2009.
52. Porém, até à presente data, os prestadores in casu não procederam à junção do
documento outorgado entre a Nova Clínica Gastroflaviae e a Flavimédica que
justifique a utilização por esta última de todo o equipamento e as instalações daquela,
conforme referido no ponto cinco da resposta subscrita por ambos os prestadores
datada de 09 de Fevereiro de 2009.
53. Sendo certo que, para o que aqui cumpre analisar, releva que,
54. As duas entidades utilizam as mesmas instalações;
55. As duas entidades utilizam os mesmos equipamentos;
56. As duas entidades recorrem ao mesmo corpo técnico;
57. As duas entidades utilizam os mesmos contactos, telefónico (276 301 080) e de
correio electrónico ([email protected]).
III. DO DIREITO
III.1 Enquadramento Geral
58. De acordo com o n.º 1 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, a ERS
tem por missão a regulação da actividade dos estabelecimentos prestadores de
cuidados de saúde.
59. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 1 do artigo 8.º do
Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, “[...] todos os estabelecimentos prestadores
de cuidados de saúde, do sector público, privado e social, independentemente da sua
natureza jurídica, nomeadamente hospitais, clínicas, centros de saúde, laboratórios de
análises clínicas, termas e consultórios”.
60. Sendo, consequentemente, a Flavimédica e a Nova Clínica prestadores de cuidados
de saúde, para efeitos do referido art. 8.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio.
61. As atribuições da ERS, de acordo com o disposto no n.º 2 do art. 3.º do Decreto-Lei
n.º 127/2009, de 27 de Maio, compreendem “[…] a supervisão da actividade e
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funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde no que
respeita:
a) Ao cumprimento dos requisitos de exercício da actividade e de
funcionamento;
b) À garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde e dos
demais direitos dos utentes;
c) À legalidade e transparência das relações económicas entre os diversos
operadores, entidades financiadoras e utentes”.
62. Por seu lado, constituem objectivos da actividade reguladora da ERS, em geral, nos
termos do art. 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio:
“[…]
b) Assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de
saúde, nos termos da Constituição e da lei;
c) Garantir os direitos e interesses legítimos dos utentes;
d) Velar pela legalidade e transparência das relações económicas entre
todos os agentes do sistema;
e) Defender a concorrência nos segmentos abertos ao mercado […]”.
III.2 Do Tipo Objectivo
III.2.1. Considerações gerais sobre o quadro legal aplicável às entidades convencionadas com o SNS
63. O n.º 4 da Base I da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de
Agosto, estabelece que “os cuidados de saúde são prestados por serviços e
estabelecimentos do Estado ou, sob fiscalização deste, por outros entes públicos ou
por entidades privadas, sem ou com fins lucrativos”, consagrando-se nas directrizes
da política de saúde estabelecidas na mencionada Lei que “é objectivo fundamental
obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua
condição económica e onde quer que vivam, bem como garantir a equidade na
distribuição de recursos e na utilização de serviços” (Base II).
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64. Ora, nos termos do n.º 2 da Base IV da Lei de Bases da Saúde, “para efectivação do
direito à protecção da saúde, o Estado actua através de serviços próprios, celebra
acordos com entidades privadas para a prestação de cuidados e apoia e fiscaliza a
restante actividade privada na área da saúde”.
65. Assim, “o Ministério da Saúde e as administrações regionais de saúde podem
contratar com entidades privadas a prestação de cuidados de saúde aos beneficiários
do Serviço Nacional de Saúde sempre que tal se afigure vantajoso, nomeadamente
face à consideração do binómio qualidade-custos, e desde que esteja garantido o
direito de acesso”;
66. Daqui decorre que “a rede nacional de prestação de cuidados de saúde abrange os
estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos privados e os
profissionais em regime liberal com quem sejam celebrados contratos nos termos do
número anterior”, no âmbito da qual é aplicável o direito de acesso dos utentes aos
cuidados de saúde – cfr. n.º 3 e 4 da Base XII da Lei de Bases da Saúde.
67. Em tais casos de contratação com entidades privadas ou do sector social, os cuidados
de saúde são prestados ao abrigo de acordos específicos, por intermédio dos quais o
Estado incumbe essas entidades da missão de interesse público inerente à prestação
de cuidados de saúde no âmbito do SNS, passando essas instituições a fazer parte do
conjunto de operadores, públicos e privados, que garantem a imposição constitucional
de prestação de cuidados públicos de saúde (art. 64.º da Constituição da República
Portuguesa).
68. Por outro lado, “o Estatuto [do SNS] aplica-se às instituições e serviços que
constituem o Serviço Nacional de Saúde e às entidades particulares e profissionais
em regime liberal integradas na rede nacional de prestação de cuidados de saúde,
quando articuladas com o Serviço Nacional de Saúde.” – cfr. artigo 2.º do Estatuto do
SNS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro.
69. Os prestadores convencionados com o SNS integram, assim, a rede nacional de
prestação de cuidados de saúde, tal como definida no n.º 4 da Base XII da Lei de
Bases da Saúde.
70. Nesta medida, todos os prestadores convencionados do SNS para o exame de
colonoscopia deverão atender todos os utentes portadores de credenciais emitidas
pelos respectivos Centros de Saúde na qualidade de utentes do SNS e nunca a título
particular;
16
71. O que significa, designadamente, que aos utentes do SNS apenas poderão ser
cobradas as taxas moderadoras correspondentes aos actos em causa, sem prejuízo
das isenções previstas no art. 2.º do Decreto-Lei n.º 173/2003, de 1 de Agosto.
72. Por outro lado, a alínea b) do n.º 2 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de Abril,
relativo aos direitos e deveres das entidades convencionadas, estabelece que os
operadores convencionados estão obrigados a “prestar cuidados de saúde de
qualidade aos utentes do SNS, em tempo útil, nas melhores condições de
atendimento, e a não estabelecer qualquer tipo de discriminação”.
73. E note-se que ao referir a equidade na distribuição de recursos e na utilização de
serviços de saúde, a Base II da Lei de Bases da Saúde quer significar igual tratamento
para igual necessidade ou, dito de outra forma, tratamento distribuído de acordo com
as necessidades;
74. Aplicando-se um tal conceito independentemente da fonte de financiamento, aliás em
conformidade com a política de saúde e princípios constitucionais.
75. Assim, o recurso a acordos ou convenções, por parte do Estado, para cumprimento da
imposição constitucional de prestação de cuidados públicos de saúde, deverá ter
sempre como pressuposto a garantia de que os direitos dos utentes do SNS não são,
por tal facto, prejudicados ou total ou parcialmente exauridos de conteúdo.
76. Tudo concorre, desta forma, para a imposição clara e inequívoca das regras relativas
ao acesso à prestação de cuidados de saúde e à não discriminação dos utentes do
SNS às entidades do sector social e/ou do sector privado que, pela via do recurso à
contratação com o Estado, integram a rede nacional de prestação de cuidados de
saúde.
77. Constitui, então, dever das entidades convencionadas receber e cuidar dos utentes,
em função do grau de urgência, nos termos dos contratos que hajam celebrado, bem
como, nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do Estatuto do SNS, aprovado pelo Decreto-
Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro, “cuidar dos doentes com oportunidade e de forma
adequada à situação”, isto é, de forma pronta e não discriminatória.
78. No mesmo sentido, prevê o art. 5.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de Abril que as
convenções se destinam a contribuir para “a necessária prontidão, continuidade e
qualidade na prestação de cuidados de saúde” e “a equidade do acesso dos utentes
aos cuidados de saúde”.
79. Assim sendo, não podem tais entidades convencionadas para o exame de
colonoscopia recusar ou atrasar a prestação de cuidados de saúde a utentes do SNS
17
com base em quaisquer motivos de ordem financeira, de gestão ou outra, sob pena de
colocarem em crise a missão de interesse público que o Estado lhes atribuiu mediante
a celebração de convenção com o SNS.
III.2.2 A violação dos critérios de acesso aos cuidados de saúde no Decreto-Lei n.º 127/2009
80. Para além do enquadramento geral vindo de expor, o direito de acesso aos cuidados
de saúde é igualmente conformado pelo Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio.
81. Efectivamente, e no que concretamente se refere ao objectivo regulatório da ERS de
assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde, as alíneas
a) e b) do artigo 35.º Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, estabelecem que é
incumbência da Entidade
a) Assegurar o direito de acesso universal e equitativo aos serviços públicos
de saúde ou publicamente financiados; e
b) Prevenir e punir as práticas de rejeição discriminatória ou infundada de
pacientes nos estabelecimentos públicos de saúde ou publicamente
financiados.
82. Outrossim, é estabelecido, na alínea b) do n.º 2 do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º
127/2009, de 27 de Maio, que
“Constitui contra-ordenação, punível com coima de € 1000 a € 3740,98 ou
de € 1500 a € 44 891,81, consoante o infractor seja pessoa singular ou
colectiva:
[…]
b) A violação das regras relativas ao acesso aos cuidados de saúde,
incluindo a violação da igualdade e universalidade no acesso ao SNS e a
indução artificial da procura de cuidados de saúde; […]”.
83. O Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, veio, então, tipificar como ilícito contra-
ordenacional comportamentos que consubstanciem uma violação das regras relativas
ao acesso aos cuidados de saúde;
18
84. Designada mas não limitadamente quando os mesmos representem uma violação da
igualdade e universalidade no acesso ao SNS.
85. Ora, já se viu que não podem as entidades convencionadas com o SNS recusar ou
atrasar a prestação de cuidados de saúde a utentes do SNS, quando tanto
consubstancie uma rejeição discriminatória ou infundada dos utentes do SNS, com
base em quaisquer motivos de ordem financeira, de gestão ou outra, sob pena de
colocarem em crise a missão de interesse público que o Estado lhes atribuiu mediante
a celebração de convenção com o SNS;
86. E violarem, de forma clara, as suas obrigações relativas ao acesso dos utentes aos
cuidados de saúde.
87. E daqui decorre os comportamentos verificados da Flavimédica poderiam
consubstanciar uma violação das regras relativas ao acesso aos cuidados de saúde.
88. Sucede, porém, que tais comportamentos não se encontravam tipificados, até ao
momento da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, enquanto
ilícito contra-ordenacional.
89. Assim, e apesar da violação das regras de acesso aos cuidados de saúde serem já
preocupações regulatórias da ERS ao abrigo do anterior Decreto-Lei n.º 309/2003, de
10 de Dezembro, apenas com o referido Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, é
que as mesmas foram erigidas à categoria de ilícito contra-ordenacional punível com
coima;
90. Sendo que, nos termos do n.ºs 1 e 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de
Outubro, na redacção resultante da Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro, (Regime
Geral das Contra-Ordenações e Coimas – RGCO)
“1 – A punição da contra-ordenação é determinada pela lei vigente no
momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de
que depende.
2 - Se a lei vigente ao tempo da prática do facto for posteriormente
modificada, aplicar-se-á a lei mais favorável ao arguido, salvo se este já
tiver sido condenado por decisão definitiva ou transitada em julgado e já
executada”.
91. Ora, os factos supra apresentados são anteriores a 26 de Junho de 2009, data de
entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio, não sendo,
consequentemente, subsumíveis à ilicitude contra-ordenacional a que agora poderiam
estar sujeitos;
19
92. O que ademais constitui a imediata decorrência do princípio fundamental da proibição
de aplicação retroactiva de lei contra-ordenacional.
93. Assim, a presente análise dos factos faz-se somente à luz do referido objectivo
regulatório de assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de
saúde;
94. O qual consubstanciava já, à data dos mesmos, uma atribuição da ERS por lhe
incumbir, entre outras competências, prevenir e punir os actos de rejeição
discriminatória ou infundada de pacientes nos estabelecimentos do SNS, enquanto
concretização da garantia do direito de acesso universal e igual a todas as pessoas ao
serviço público de saúde – cfr. al. d) do n.º 2 do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º
309/2003, de 10 de Dezembro;
95. Sem que, pelas razões vindas de referir, sejam os factos subsumíveis ao referido tipo
contra-ordenacional estabelecido na al. b) do n.º 2 do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º
127/2009, de 27 de Maio.
III.2.3. Da concreta realidade da Flavimédica, Lda.
96. Cumpre ab initio esclarecer que a diligência telefónica do dia 18 de Novembro de
2008, encetada pela ERS pelas 16h 05m, teve como destinatária a Nova Clínica e não
a Flavimédica.
97. Com efeito, e mesmo ressalvando o facto de os contactos telefónicos serem os
mesmos, certo é que, perante o pedido de marcação de exame pelo SNS, em
momento algum a assistente esclareceu a sua interlocutora de que apesar de estar a
falar para a Nova Clínica e que aqueles exames seriam realizados na Flavimédica.
98. Limitando-se a responder,
i) quando questionada da possibilidade de marcação de exames de
colonoscopia pelo SNS, isto é com a respectiva Credencial, que tal
marcação apenas poderia ser efectuada para o dia 10 de Janeiro de
2009 e
ii) quando questionada sobre a possibilidade de realização do referido
exame a título particular, que o mesmo poderia ser realizado no
próximo dia 26 de Novembro de 2008, mediante pagamento de €
[…].
20
99. Ademais, aquela mesma assistente não respeitou o procedimento que, alegadamente,
terá sido ordenado pelos prestadores.
100. Relembre-se que, conforme descrito no ofício subscrito pela Nova Clínica e datado
de 29 de Dezembro de 2008, a assistente teria ordens para questionar “[...] qualquer
utente/doente: privado, do SNS, dos seguros ou de outra entidade, [que efectuasse]
um telefonema para o 276-301080 a pedir a marcação de um exame endoscópico, a
empregada tem de efectuar as seguintes perguntas: É um exame para realizar a
Flavimédica? ou um exame para realizar a Nova Clínica? Isto é, é um utente do SNS?
ou é utente do SMAS? de SEGUROS? [...]”.
101. Com efeito, tal não se verificou e, em nenhum momento, foi a técnica da ERS
informada de que a marcação de exame pelo SNS seria efectuada na agenda da
Flavimédica, sendo aquela levada a pensar que a Nova Clínica seria uma prestadora
convencionada com o SNS.
102. Quando, na verdade e como visto, na listagem da ARS Norte consta a
Flavimédica, como prestador convencionado para a valência de exames endoscópicos
– cfr. novamente informação constante no sítio da internet da ARS Norte.
103. Assim, da diligência telefónica de marcação de exame realizada pela ERS,
resultou (tão somente e sem qualquer distinção entre as diferentes entidades) que,
“a marcação [de exame com credencial emitido pelo Centro de Saúde]
apenas poderia ser efectuada para o dia 10 de Janeiro de 2009.”;
104. Dia esse que, in concreto, corresponde a um sábado;
105. Sendo que a título particular, o exame de colonoscopia já seria marcado
“[…] no próximo dia 26 de Novembro de 2008, mediante pagamento de €
[…].” – cfr. memorando da diligência junto aos autos.
106. Ademais, no ofício subscrito pela Nova Clínica – mas no qual é feita referência
à Flavimédica – é indicado que o número total de actos de colonoscopias realizados
em 2008, a utentes do SNS, foi de […].
107. Facto que, considerando o dia da semana reservado, pela Flavimédica, à sua
realização, resulta no total de (em média) […] colonoscopias por mês.
108. Acresce que, considerando todos os documentos carreados para o processo,
designadamente a listagem de recursos humanos e as informações a esse respeito,
21
bem como as informações constantes do SRER10, pode concluir-se que a realização
dos referidos exames é assegurada por um (único) médico especialista na área de
gastrenterologia coadjuvado por uma (única) enfermeira.
109. E se assim é efectivamente, sempre se deverá questionar do procedimento
adoptado e da efectiva capacidade técnica e humana da Flavimédica para que, no ano
de 2008, o número de exames de colonoscopias realizados seja de […], repete-se,
cerca de […] por mês; e
110. In extremis, cerca de […] exames de colonoscopias realizados por cada
Sábado reservado para o efeito e (apenas) nos quais o médico especialista marca a
sua presença.
111. Com efeito, é aquele mesmo médico o único que trabalha em ambas
as sociedades, ainda que em dias diferentes, pois que, às
i) quartas-feiras entre as 14 horas e as 19 horas executa exames
endoscópicos para a Nova Clínica e
ii) aos Sábados, com periodicidade quinzenal, entre as 8 horas e as
13 horas e as 14 horas e as 18 horas, executa exames para a
Flavimédica, Lda.
112. Mais se refira que este mesmo profissional é sócio de ambas as sociedades,
prestadoras de cuidados de saúde, e exerce as funções de gerência na Nova Clínica,
sendo igualmente seu Director Clínico.
113. Ora, no respeitante à convenção outorgada com a ARS Norte, decorre que, da
análise da carta da ARS de 14/01/1998 atinente ao acordo/convenção, bem como da
leitura da ficha técnica actualizada, ambas tocantes à Flavimédica, é possível concluir
que não foi estipulada qualquer limitação, seja ela de carácter temporal ou material, ao
seu funcionamento.
114. Ou seja, o acordo outorgado com a ARS Norte não restringe a capacidade de
atendimento daquele operador e não estipula, por isso, qualquer limitação de natureza
quantitativa – número de utentes do SNS que podem ser atendidos – e/ou de natureza
temporal – horário de funcionamento.
10 Cfr. informação de ambos os prestadores constantes do SRER e junta aos autos.
22
115. Pelo que, e porque não admite qualquer restrição, a convenção outorgada com
a ARS Norte exige do seu prestador a utilização de todas as suas capacidades.
116. Caso não fosse esta a “intenção” contratual de qualquer uma das partes
outorgantes, uma qualquer limitação teria de ter sido expressamente admitida e aceite
por ambas as partes.
117. Ora, como visto, essa limitação não decorre do estipulado, nem tão pouco das
informações constantes do sítio da internet da ARS Norte, no qual apenas consta a
denominação social, morada e contacto da Flavimédica, Lda.
118. Por outro lado, facilmente se conclui que a organização de agenda da
Flavimédica depende da organização de agenda da Nova Clínica.
Vejamos,
119. A Flavimédica apenas atende utentes do SNS e detém um único médico
especialista de Gastrenterologia e uma enfermeira, realizando apenas exames de
endoscopia gastrenterológica.
120. Para tanto, utiliza as mesmas instalações e os mesmos equipamentos, todos
pertencentes à Nova Clínica.
121. E o horário de funcionamento é (apenas) aos Sábados, das 08 horas às 13
horas e das 14 horas às 19 horas.
122. Ademais, o médico especialista é comum à Nova Clínica, onde exerce as suas
funções de profissional de saúde e de gerente e apenas se desloca à Flavimédica
com periodicidade quinzenal.
123. Tal organização de recursos humanos, equipamentos e horários implica
necessariamente uma limitação à capacidade da Flavimédica;
124. Que resultará, porventura, numa violação contratual sem qualquer fundamento;
125. Ou, pelo menos, numa circunstância que deverá levar à ponderação da
necessidade de manutenção do vínculo contratual.
126. Aliás, tal (in)capacidade foi comprovada através de duas diligências de
marcação telefónicas realizadas por entidades diferentes, em horários e datas
diferenciadas;
23
127. Tendo a ERS, aquando da marcação telefónica realizada no dia 18 de
Novembro de 2008, marcado o exame de colonoscopia (com credencial do médico de
família) para o dia 10 de Janeiro de 2009.
128. E a DECO, para um dia de agenda não comunicado mas que, considerando o
teor do artigo jornalístico junto aos autos, foi marcado após 47 dias da data da
diligência.
129. Ressalva-se que também esta entidade desconhecia que o contacto telefónico
utilizado pertence igualmente a uma entidade terceira, no caso concreto, a
Flavimédica.
130. Tanto assim é que identificou como entidade convencionada a Nova Clínica.
131. E quando relata a diligência de marcação de exames com credencial, em
momento algum, refere a Flavimédica.
132. Tais factos – repete-se, resultantes de duas diligências de marcação
realizadas por entidades diferentes, em horários e datas diferenciadas – são
elucidativos de que os procedimentos seguidos para a marcação e realização de
exames, tal como gizados pelos prestadores, resultam num cumprimento do acordo
com a ARS Norte aquém das expectativas deste outorgante.
133. Sendo, sem dúvida, que, é a organização, repete-se, de recursos humanos, de
equipamentos e horários, assim gizada, pelos e entre os prestadores, que determina a
redução e limitação da capacidade de atendimento da Flavimédica, Lda.,
134. Quando, na verdade, esta Clínica, no respeito pelas suas obrigações de
prestar cuidados de saúde de qualidade, em tempo útil, nas melhores condições de
atendimento, e a não estabelecer qualquer tipo de discriminação face aos demais
utentes, poderia e deveria afectar toda a sua capacidade à prestação de cuidados de
saúde aos seus utentes.
135. Na verdade, a Flavimédica
i) ao apenas deter sob sua orientação um único médico especialista
em gastrenterologia, que ali se desloca quinzenalmente, todos os
sábados, durante 9 horas diárias;
24
ii) ao “reservar” um determinado horário e ao utilizar o equipamento e
as instalações da Nova Clínica (quando, in extremis, esta não os
utiliza), reduz, unilateral e voluntariamente, a sua capacidade de
atendimento aos utentes do SNS.
136. E tal redução, porque unilateral e voluntária, não foi manifestada no momento
da aceitação da convenção e do, consequente, cumprimento dos deveres contratuais
assim impostos.
137. Aliás, repete-se, de todos os documentos juntos, bem como de todo o teor dos
esclarecimentos prestados por ambos os prestadores, não decorre qualquer limitação
contratual ao estipulado com a ARS Norte – nem da ficha técnica, nem da carta da
ARS Norte – cfr. novamente os documentos juntos em 11 e 16 de Março de 2009.
138. Note-se que, até à data, e contrariamente ao requerido, não foi junto qualquer
documento outorgado entre a Nova Clínica Gastroflaviae, Lda. e a Flavimédica, Lda.
com vista à utilização por esta última de todo o equipamento e as instalações daquela,
139. Pelo que, do teor de todos os factos carreados para o processo nada obsta à
conclusão da ERS de que a Flavimédica apenas utiliza as instalações, os
equipamento e os recursos humanos da Nova Clínica quando esta não tem as portas
abertas e quando não os destina à valência de Gastrenterologia.
140. Acresce que, caso se admitisse uma limitação a bel prazer da Flavimédica, tal
poderia significar, in extremis, que a esta Clínica poderia decidir respeitar a sua
obrigação contratual – a de atender os utentes do SNS, consoante a eficácia
financeira da estratégia a adoptar - dependendo tal decisão apenas e tão só da
viabilidade financeira da mesma.
141. Ou seja, poderia decidir atender uma maior percentagem de utentes do SNS
numa determinada fase ou uma menor percentagem noutra fase.
142. Tal um tal comportamento redundaria numa utilização da convenção pelo
prestador conforme as situações economicamente mais convenientes e assim
fundamentar a discriminação praticada.
143. E sempre se dirá que a convenção celebrada com a ARS Norte não terá
seguramente menor valor no que respeita à obrigatoriedade do estrito e rigoroso
cumprimento dos deveres que da mesma decorrem, aos quais aquele pretendeu e
25
desejou aderir, pelo que, não pode admitir-se que a Flavimédica funcione com os
óbices já por demais mencionados.
144. Significa este entendimento que, e considerando o relacionamento entre
ambos os prestadores – note-se que, ambos os prestadores são parcialmente detidos
por um sócio coincidente que, por sua vez, subscreve todos os ofícios em
representação de ambos os prestadores e exerce as suas funções como especialista
de Gastrenterologia em ambas as Clínicas – não pode haver uma reserva de todos os
meios técnicos e humanos a favor de uma única Clínica de forma a reduzir
directamente a capacidade da outra.
145. Ademais, cumpre realçar que o direito do utente à informação não se limita ao que
prevê a alínea e) do n.º 1 da Base XIV da Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, para efeitos
de consentimento informado e esclarecimento quanto a alternativas de tratamento e
evolução do estado clínico;
146. Trata-se, antes, de um princípio que deve modelar todo o quadro de relações
actuais e potenciais entre utentes e prestadores de cuidados de saúde.
147. A informação quanto à existência de duas entidades que funcionam nas mesmas
instalações, com os mesmos equipamentos e com o mesmo corpo clínico deve ser
devidamente transmitida ao utente, ou ao potencial utente, que ali se dirige.
148. Pelo que o dever de informar o utente também aqui se deve aplicar,
149. Na medida em que ao utente médio, à semelhança da técnica da ERS que
encetou a diligência telefónica já documentada, não é fornecida a informação exacta
sobre a entidade que, a final, o vai atender e que detém a convenção com o SNS.
150. Na verdade, aquele mesmo utente não tem conhecimento directo do texto nem da
contraparte da convenção celebrada com a ARS Norte, pelo que, legitimamente, face
à (inexistente) informação transmitida pelo próprio prestador,
151. Julga que a execução do referido exame está a cargo da Nova Clínica.
152. Assim, importa garantir que toda a informação transmitida é suficiente quer para
uma tomada de consciência do conteúdo da convenção, no que respeita à identidade
do prestador convencionado e ao seu conteúdo, quer para o conhecimento da relação
contratual existente com uma entidade terceira.
26
153. E é necessário também que a informação que é disponibilizada seja suficiente
para dotar o utente medianamente esclarecido dos instrumentos necessários ao
exercício da liberdade de escolha nas unidades de saúde privadas.
154. Pelo que, toda a informação transmitida ou comportamento seguido pelos
prestadores que, ainda que por mera negligência, gerem a convicção no utente de que
a convenção pertence à Nova Clínica e não à Flavimédica,
155. Ou ainda que a Flavimédica detém as instalações, os equipamentos e os recursos
humanos que, afinal, não lhe pertencem,
156. Contraria o dever imposto a todos os prestadores de informar de forma completa,
verdadeira e inteligível todos os seus utentes e potenciais utentes.
157. Acresce que, na situação aqui em apreço, a verificação da falta de
transparência é tão mais evidente quando se conclui que o médico especialista é
comum à Nova Clínica, onde exerce as suas funções de profissional de saúde e de
gerente, apenas se desloca à Flavimédica com periodicidade quinzenal, e assina em
representação de ambos os prestadores.
158. Pelo que, e em jeito de conclusão, resulta, consequentemente, do dever de
respeito dos direitos e interesses legítimos dos utentes o concomitante dever de
prestação de informação completa, verdadeira e inteligível;
159. O que, repete-se porque relevante, não se acha cumprido quando o utente que
contacta o 276 331 080 e é atendido por uma profissional que se encontra sob a
orientação da Nova Clínica e marca o seu exame como utente do SNS para uma outra
Clínica, Flavimédica.
160. E também não se acha cumprido quando esta última entidade é, na verdade, a
detentora da convenção do SNS, e não detém instalações, equipamentos e recursos
humanos próprios.
161. Ainda de todo o exposto e considerando que em causa se discute o cumprimento
do acordado com a ARS Norte, entende a ERS recomendar à ARS Norte que proceda
à análise dos pressupostos da contratação da Flavimédica como entidade
convencionada do SNS na especialidade de Gastrenterologia, para exames
endoscópicos, de forma a aferir da manutenção, ou não, dos mesmos face àqueles
que conduziram à celebração do Acordo de Cooperação, porquanto, é um facto que
esta entidade não detém instalações e contactos próprios, instrumentos próprios, e um
27
corpo técnico especializado próprio e apenas se encontra em funcionamento aos
Sábados.
162. E nessa sequência, deverá ainda a ARS Norte aferir da efectiva capacidade de
atendimento da Flavimédica e dos valores facturados ao abrigo da convenção
celebrada com o SNS, atentas as limitações vindas de referir, mormente, o horário de
funcionamento estipulado para a realização dos exames in casu.
IV. AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS
163. A presente decisão foi precedida da necessária audiência escrita de interessados,
nos termos do art. 101.º n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, tendo a
Gastroflaviae e a Flavimédica exercido, de forma conjunta, os seus direitos de
pronúncia nos termos que seguidamente se analisam.
IV.1. A pronúncia da Flavimédica e da Gastroflaviae
164. Por ofício de 4 de Maio de 2009 - junto aos autos e que aqui se transcreve no que
importa relevar -, veio a Flavimédica defender que aquando da diligência telefónica
datada de 18 de Novembro de 2008, “[…] a assistente do consultório interpretou mal o
telefonema, sendo que não cumpriu as determinações que expressamente lhe foram
transmitidas superiormente […]”;
165. E que a referida funcionária “[…] nunca poderia ter dito apenas pode ser efectuado
para o dia 10 de Janeiro de 2009, atenta a ausência de instruções nesse sentido e
considerando que as marcações que exigem maior celeridade são referenciadas pelo
médico de família nos modelos P1 como urgente ou com a menção de diagnóstico
clínico de gravidade.”;
166. Sendo que, nestes casos, a funcionária tem ordens para agendar a realização de
exames com as urgências que os mesmos reclamam.
167. Quando isto ocorre, a funcionária procede à marcação na agenda da própria
Flavimédica; Lda. e comunica que tem de trazer o modelo P1 à clínica, para confirmar
o pedido e a data de marcação antes da realização do exame e receber a respectiva
28
preparação do exame, caso não tenha sido entregue no centro de saúde ou pelo
médico assistente.
168. No que respeita ao horário de atendimento e exames praticado pela Flavimédica,
refere este prestador que “[…] há meses em que a periodicidade é semanal, o que
decorre e depende do número de pedidos de endoscopia que chegam pela via postal
ou fax à Flavimédica.”;
169. E que “[…] quando há muitos pedidos e a lista de espera atinge o máximo de dois
meses, disponibiliza-se mais um sábado para satisfazer oportuna e tempestivamente
os pedidos […]”.
170. Mais referindo que os exames são executados por um médico que detém uma
vasta experiência profissional porquanto, é especialista há mais de 15 anos, e por
uma enfermeira muito treinada e habilitada na mesma área a que se junta a qualidade
do equipamento disponível;
171. Anotando que não é nada de extraordinário o número de exames apresentado –
no total de […] endoscopias por mês – porque a Flavimédica tem vindo a efectuar
exames todos os sábados perfazendo […]colonoscopias por sábado.
172. E defendendo que é rotundamente inexacto que a Flavimédica restrinja o acesso
aos utentes do SNS, rejeitando-se a grave imputação de atitudes discriminatórias.
173. Não sendo verdade que a agenda da daquele prestador dependa da organização
de agenda da Nova Clínica.
174. Na verdade, ambas são autónomas e a marcação de exames desta última é feita
por fax e correio, sendo residual a marcação pelo telefone;
175. E o prestador convencionado tem cumprido pontualmente o contratualizado com a
ARS.
176. Mais confirma o mesmo prestador que na região de Trás-os-Montes inexistem
médicos especialistas na valência de Gastrenterologia, muito embora, tal realidade,
não tenha obstado à capacidade de atendimento que, aumentou, socorrendo-se [o
prestador] de mais sábados e até mais recentemente às terças-feiras à noite.
29
177. Os prestadores recusam liminarmente a alegação da ERS de que existe reserva
de meios técnicos e humanos a favor de uma clínica de forma a reduzir a capacidade
da outra.
178. Com efeito, a Flavimédica tem vindo a aumentar sucessivamente o número de
exames, não ocorrendo qualquer tipo de limitação em favor de uma das clínicas.
179. Finalmente, e no respeitante ao direito do utente à informação, refere o prestador
que “[…] os utentes são informados em todas as circunstâncias (local de realização do
exame médico que faz os exames, dia em que é realizado o exame, tipo de
preparação exigido para a realização e exame) pelos médicos de família e respectivo
centro de saúde; onde se encontram as preparações devidamente assinaladas com o
logótipo da Flavimédica e sua localização, pelo que o dever de informar o utente está
assegurado, nunca tendo havido qualquer confusão quanto a este item […]”
180. Sendo certo que “Os utentes conhecem onde se efectuam os exames, o médico e
o logótipo da mesma, que está impresso e perfeitamente legível em todos os
relatórios, preparações e envelopes que os utentes transportam consigo, bem como
onde eles são realizados, com placas afixadas à entrada da clínica, na recepção e na
sala de endoscopia”.
181. E já no interior da clínica, na sala de espera e na recepção, encontra-se outra
placa com o logótipo da Flavimédica.
182. No respeitante à liberdade de escolha, refere o prestador convencionado que tal é
mais uma utopia considerada a inexistência de opções na região geográfica em
causa, sendo esta da inteira responsabilidade da tutela.
183. Mais confirma que aquando da celebração da convenção foi levado ao
conhecimento da ARS o horário do pessoal e da sua relação contratual com o SNS e
que o prestador operava e utilizava nas instalações e com os equipamentos da Nova
Clínica que os vistoriou;
184. Para além de que não foi estipulada qualquer cláusula de exclusividade de
exercício da actividade apenas se pondo como condição a não existência de
incompatibilidade em relação aos funcionários públicos.
185. Concluindo pelo arquivamento dos autos atenta a inexistência de indícios
probatórios que fundamentam com objectividade e substância a proposta de
deliberação.
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186. E indicando como prova o depoimento do próprio representante legal da
Flavimédica, bem como a audição de algumas testemunhas.
187. Nesta sequência, a audição conforme requerida, foi agendada para o dia 01 de
Junho de 2009, pelas 14h 30m – cfr. fax remetido em 21 de Maio de 2009 para o
Mandatário da Flavimédica e junto aos autos.
188. No âmbito da predita diligência, prestou declarações a funcionária da
Gastroflaviae, H., que declarou, em suma, e no que importa realçar:
- que exerce funções na Gastroflaviae “[…] há cerca de 12 anos a
esta parte e desempenha funções de recepcionista. Mais referiu
que o seu horário de trabalho é de segunda-feira a sexta e,
excepcionalmente, uma vez por mês, trabalha aos sábados de
manhã, e de entre as suas funções assegura a marcação de
exames e consultas via telefone, para a Flavimédica sendo que não
possui qualquer relação laboral com esta última entidade […]”;
- “No caso de utentes do SNS, a marcação é feita através dos
Centros de Saúde, que remetem postais para a Flavimédica. Não
fazem marcações por telefone para os utentes do SNS mas apenas
indicam as datas disponíveis, tanto sendo já em relação à agenda
da Flavimédica, Lda.”;
- “[…] Quando se encontra no trabalho, aos sábados de manhã,
juntamente com uma colega sua, assegura o trabalho administrativo
e de recepção da Nova Clínica mas igualmente recebe as pessoas
que vêm para a Flavimédica, endereçando-as para uma colega, de
seu nome, S.”;
- quando se encontra na recepção, presta a informação a todos os
utentes do SNS quando a sua colega se encontra “cheia de
trabalho” e “mais atrapalhada”;
- “tem a percepção que, em média, são cerca de duas dezenas [os
utentes do SNS que recorrem à Flavimédica ao sábado de manhã],
sendo que à tarde fica apenas a sua colega […] a garantir o
atendimento dos utentes, uma vez que […] o movimento da
Flavimédica, da parte da tarde, é também menor”;
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- adiantou que “[…] não se recorda exactamente do telefonema que
foi realizado pela ERS e não se recorda do que foi questionado.”;
- “Confrontada com a possibilidade de um utente do SNS proceder
à marcação de um exame na Flavimédica mediante a apresentação
de credencial, referiu que tal só é possível através do Centro de
Saúde […] e nunca por telefone, nem sequer por marcação
presencial, pelo próprio utente.”;
- finalmente, no ano de 2008, a Flavimédica funcionou, no máximo,
de 15 em 15 dias, aos sábados.
189. Foi igualmente ouvido no âmbito da diligência realizada o Dr. A. L. que, em suma,
referiu:
- “a regra [de marcação de exames para os utentes do SNS] é a da
entrega da credencial directamente ao utente para que proceda à
marcação. Apesar do afirmado, admitiu que no caso concreto da
Flavimédica e porque é esta a única entidade convencionada
naquela área geográfica, a marcação poderá ocorrer directamente
pelo Centro de Saúde. Com efeito, por vezes, ocorrendo uma
situação de urgência ou dificuldades dos utentes, os médicos do
Centro de Saúde têm liberdade de proceder à marcação telefónica,
directamente para a Flavimédica”;
- “No respeitante à distinção visual entre as duas entidades que
laboram nas mesmas instalações reconhece que, normalmente,
indica a morada para a realização de exames aos utentes do SNS
por pontos de referência, como a Nova Rede e o Jardim do
Bacalhau e nem sabe qual a denominação da entidade que
outorgou a convenção.”
190. Finalmente, e conforme requerido pelos prestadores, foi ouvido o próprio Dr. A.,
que, em suma, referiu
- “[…] a Nova Clínica surgiu primeiramente, tendo sido criada pelo
próprio declarante. Em 1998/99 concorreu às convenções tendo
conseguido obter uma na área da Gastrenterologia e, por isso,
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criado a Flavimédica […] que, por diversas razões, começou a
trabalhar apenas aos sábados;
- “Os administrativos da Nova Clínica apoiam a Flavimédica e não
há qualquer confusão entre ambas as entidades, até porque o
mesmo tipo de exames é realizado pela Nova Clínica apenas às
quartas-feiras. Por vezes, a Flavimédica também trabalha às terças-
feiras e às sextas-feiras, de tarde. […] Na verdade, na Flavimédica,
trabalham mais duas administrativas (duas em Bragança), duas
enfermeiras e um Colega de Coimbra – Dr. […] - que o auxilia
sempre que está de férias ou impedido.”;
- “[…] por telefone, não são feitas marcações pelo SNS porque
aquelas só são feitas mediante a exibição da credencial. Se há
alguma marcação por telefone sem a credencial, a responsabilidade
é das próprias funcionárias.”;
- no respeitante às conclusões da diligência telefónica realizada pela
ERS, conclui que “uma vez que a credencial não foi apresentada a
resposta da funcionária não se percebe porque as ordens são as de
não proceder à marcação, por telefone, de qualquer exame para o
SNS. Admite que não sabe o fundamento da resposta fornecida pela
funcionária mas que tal poderá ter ocorrido apenas por confusão
daquela, uma vez que não está habituada a proceder à marcação
por aquele meio.”;
- “Não existe qualquer confusão entre as entidades que trabalham
nas mesmas instalações. Aliás, para evitar confusões entre as
mesmas, foi já contratada uma nova linha telefónica para a
Flavimédica.”;.
- “[…] realiza cerca de vinte exames [endoscópicos] por sessão,
apesar de este número depender dos aparelhos detidos, do tipo de
exame (se é alta ou baixa) e da experiência profissional. Admite que
a Flavimédica detém muitos apoios e, caso assim o entenda, pode
aumentar o número de exames que realiza actualmente. De entre os
apoios referidos, disse ter uma funcionária que coloca os dados no
computador e outra que orienta os doentes, possui seis aparelhos
endoscópicos e duas máquinas de desinfecção. Para além disso,
refere que realiza os relatórios aquando da realização dos exames.”.
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191. Também no decurso da diligência de prova tal como requerida, foram exibidas as
fotografias da entrada do prédio e da recepção nas quais se visualizam as placas
identificativas de ambas as entidades que foram posteriormente juntas ao processo
por ofício datado de 06 de Junho de 2009.
192. Tendo ainda sido protestado juntar os documentos comprovativos da actualização
da ficha técnica da Flavimédica junto da ARS Norte no respeitante à capacidade, ao
horário e aos recursos técnicos e humanos da Flavimédica.
193. Mais se anote que em anexo ao ofício de 06 de Junho de 2009, veio a Flavimédica
proceder à junção de um documento apelidado de ficha técnica e a planta
demonstrativa da localização das divisórias pertencentes a cada um dos prestadores.
IV.2. Análise
194. Após análise de todo teor da pronúncia dos prestadores, bem como das
declarações vindas de resumir e demais documentos juntos ao processo, resulta que:
i) a marcação de exames de colonoscopia para os utentes do SNS é
realizado junto da Flavimédica mediante marcação directa pelo
Centro de Saúde ou pelo próprio utente, ainda que mediante o uso
de telecópia e, excepcionalmente, por telefone;
ii) tal ocorreu efectivamente aquando da diligência telefónica realizada
pela ERS, em 18 de Novembro de 2008, sendo que apesar de
demonstrar um conhecimento contraditório sobre as suas funções e
vinculação a cada um dos prestadores envolvidos, a funcionária
admitiu ter indicações precisas sobre os métodos de marcação
daquele tipo de exame;
iii) a Flavimédica informou que, na realidade, o seu horário de
atendimento foi alargado para as terças e sextas-feiras (de tarde) e
sábados (todo o dia), pelo que, a capacidade deste prestador é
superior ao anteriormente declarado, assim justificando o número
de exames realizado;
iv) o pessoal administrativo e médico pertencente a ambas as
entidades é diferenciado, muito embora cumpra anotar que a
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testemunha, H., admitiu auxiliar (também) a sua colega de trabalho
quando esta “se encontra atrapalhada” no encaminhamento dos
utentes aos gabinetes da Flavimédica, na prestação das informação
e ainda, no atendimento telefónico - aliás, conforme é admitido pela
própria que foi quem atendeu o contacto telefónico da ERS;
v) as entidades prestadoras detêm a mesma localização mas
encontram-se agora diferenciadas através de placas identificativas
à entrada do edifício e dentro da fracção onde estão instaladas,
deixando, por isso, de haver possibilidade de o utente médio
confundir uma com a outra;
vi) tendo aliás os prestadores aliás referido, em sede de pronúncia ao
projecto de deliberação, que foram já solicitados linhas e números
autónomos para telefone e fax da Flavimédica, de forma a evitar
futuras confusões tal como a verificada nos presentes autos.
195. Ademais, e sem embargo das conclusões vindas de anotar, cumpre relembrar que,
e como tão bem é do conhecimento dos prestadores interessados, os presentes autos
tiveram a sua origem em duas diligências telefónicas realizadas por entidades
diferentes, a DECO e a ERS, em dias e horários diferenciados;
196. Cujas conclusões atingidas, conforme já visto e demoradamente
fundamentado, foram semelhantes, ou seja, foi possível averiguar da existência de
confundibilidade entre uma e outra entidade e da existência de um comportamento
discriminatório do utente do SNS face aos demais, atenta a entidade financiadora do
exame.
197. E se é certo que a questão da confundibilidade se achará agora ultrapassada
em face dos comportamentos entretanto adoptados pelos prestadores em questão, e
consequentemente não ser necessária a manutenção de uma intervenção regulatória
da ERS face a tal concreto aspecto, impõe-se à ERS, ao abrigo das suas
competências, defender os direitos dos utentes e, in concreto,
b) Assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde, nos
termos da Constituição e da lei;
c) Garantir os direitos e interesses legítimos dos utentes – cfr. artigo 33.º do
Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio.
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198. E a esse propósito, remanesce a questão de, efectivamente, da diligência
efectuada pela ERS ter resultado um efeito objectivo de discriminação dos utentes do
SNS;
199. Ou seja, independentemente do facto de, porventura, tanto poder ter sido o
resultado de um lapso de uma concreta funcionária, o resultado concreto para o utente
do SNS que contactasse telefonicamente a Flavimédica era (ou foi) o de ser marcada
a realização do exame de colonoscopia em circunstância temporal desfavorável face a
utentes de outras entidades financiadoras ou “particulares”.
200. E consequentemente deve a ERS garantir, mediante a manutenção da
instrução projectada e oportunamente notificada, o efectivo cumprimento do dever de
não discriminação dos utentes do SNS;
201. Tal como deve manter a recomendação então prevista à ARS Norte,
designadamente para aferição da nova ficha técnica elaborada pela Flavimédica e
comunicada à ERS, mas que deverá ainda ser objecto de aceitação pela ARS Norte.
IV. DECISÃO
O Conselho Directivo da ERS delibera, assim nos termos e para os efeitos do preceituado
nos artigos 41.º, n.º 1 e 42.º, b) do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de Maio emitir uma
instrução, nos seguintes termos:
i) A Flavimédica, Lda. deve cumprir com as obrigações contratuais
impostas pela convenção outorgada com a ARS que, em suma,
implicam a prestação de cuidados de saúde de qualidade, em
tempo útil, nas melhores condições de atendimento, e a não
estabelecer qualquer tipo de discriminação face aos demais
utentes, atendendo todos os seus utentes em função da estrita
ordem de chegada ou do carácter prioritário da concreta situação
clínica.
202. O Conselho Directivo da ERS delibera, ainda, recomendar que a Administração
Regional de Saúde do Norte, I.P. proceda à análise dos meios humanos, técnicos e
materiais actualmente existentes na Flavimédica, Lda., devendo, aferir da efectiva
capacidade de atendimento deste prestador, bem como da aceitação da ficha técnica