Defesa Do Estado e Das Instituições Democráticaspdf

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DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS SISTEMA CONSTITUCIONAL DAS CRISES Em momentos de deturpação da ordem democrática, de ofensa aos mandamentos constitucionais, é necessária a adoção de medidas para reequilibrar a ordem e a normalidade constitucional. Durante a execução dessas medidas, o poder de repressão do Estado é ampliado, mediante a autorização para que sejam impostas aos indivíduos restrições e suspensões de certas garantias fundamentais, em locais específicos e por prazo certo, sempre no intuito de restabelecer a normalidade constitucional. Relembramos que a adoção dessas medidas (estado de defesa e estado de sítio), assim como a adoção de intervenção federal, impede a alteração da Constituição pelo tempo que perdurarem (art. 60, § 1.º). O referido sistema instaurará no País um estado de legalidade extraordinária, em que diversos direitos serão suspensos. Por isso, para que esse ato não se transforme em um golpe de estado ou ditadura, é obrigatória a observância de três princípios: a) necessidade significa que somente situações extremas e excepcionais ensejam a adoção dessas medidas para manutenção da estabilidade da ordem constitucional e das instituições democráticas. Sem necessidade, a decretação dessas medidas pode configurar golpe de estado; b) temporariedade essas medidas devem ser adotadas por prazo determinado, pois, como gera supressão de direitos e concentração de poder, é possível que a adoção de uma delas sem prazo configure regime ditatorial; c) proporcionalidade os estados de defesa e de sítio devem ser proporcionais aos fatos que justificaram a sua adoção. Estado de defesa 1 Conceito: Trata-se de um regime de legalidade extraordinária instaurado por tempo e em local certos e determinados, com o objetivo de preservar a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. Trata-se de uma medida excepcional, mais branda que o estado de sítio. 2 Pressupostos materiais: Objetivamente, o estado de defesa poderá ser decretado em duas hipóteses: a) existência de grave e iminente instabilidade institucional que ameaça a ordem pública e a paz social; b) ocorrência de calamidade de grandes proporções na natureza que atinjam, da mesma forma, a ordem pública e a paz social.

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DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS

SISTEMA CONSTITUCIONAL DAS CRISES

Em momentos de deturpação da ordem democrática, de ofensa aos mandamentos

constitucionais, é necessária a adoção de medidas para reequilibrar a ordem e a normalidade

constitucional. Durante a execução dessas medidas, o poder de repressão do Estado é

ampliado, mediante a autorização para que sejam impostas aos indivíduos restrições e

suspensões de certas garantias fundamentais, em locais específicos e por prazo certo,

sempre no intuito de restabelecer a normalidade constitucional.

Relembramos que a adoção dessas medidas (estado de defesa e estado de sítio), assim

como a adoção de intervenção federal, impede a alteração da Constituição pelo tempo que

perdurarem (art. 60, § 1.º).

O referido sistema instaurará no País um estado de legalidade extraordinária, em que diversos

direitos serão suspensos. Por isso, para que esse ato não se transforme em um golpe de

estado ou ditadura, é obrigatória a observância de três princípios:

a) necessidade – significa que somente situações extremas e excepcionais ensejam a

adoção dessas medidas para manutenção da estabilidade da ordem constitucional e das

instituições democráticas. Sem necessidade, a decretação dessas medidas pode

configurar golpe de estado;

b) temporariedade – essas medidas devem ser adotadas por prazo determinado, pois,

como gera supressão de direitos e concentração de poder, é possível que a adoção de

uma delas sem prazo configure regime ditatorial;

c) proporcionalidade – os estados de defesa e de sítio devem ser proporcionais aos fatos

que justificaram a sua adoção.

Estado de defesa

1 Conceito: Trata-se de um regime de legalidade extraordinária instaurado por tempo e em

local certos e determinados, com o objetivo de preservar a ordem pública ou a paz social

ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de

grandes proporções na natureza.

Trata-se de uma medida excepcional, mais branda que o estado de sítio.

2 Pressupostos materiais: Objetivamente, o estado de defesa poderá ser decretado em

duas hipóteses:

a) existência de grave e iminente instabilidade institucional que ameaça a ordem pública e

a paz social;

b) ocorrência de calamidade de grandes proporções na natureza que atinjam, da mesma

forma, a ordem pública e a paz social.

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3 Pressupostos formais: o juízo de conveniência sobre a decretação do estado de defesa

cabe exclusivamente ao Presidente da República. Todavia, a Constituição exige a prévia oitiva

dos Conselhos da República e da Defesa Nacional, embora o Presidente da República não

esteja adstrito ao parecer desses Conselhos. Devem ser obedecidas as seguintes

formalidades:

a) prévia manifestação dos Conselhos da República e da Defesa Nacional;

b) expedição de decreto presidencial (art. 84, IX).

O decreto presidencial deverá determinar:

O tempo de duração da medida, que não poderá ultrapassar o limite temporal

máximo de trinca dias, prorrogável, uma única vez, por mais trinta dias (art. 136, §§

1 ° e 2°, CF/88);

A área a ser abrangida, sendo que os locais compreendidos devem ser rescritos e

determinados - o estado de defesa não engloba, em termos de amplitude, todo o

território nacional;

As medidas coercitivas que vigorarão durante a sua vigência.

c) aprovação do decreto editado pelo Presidente da República (que consolida a instituição

da medida) pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional.

4 Procedimento: O estado de defesa será instaurado por iniciativa exclusiva do Presidente

da República, após a oitiva dos Conselhos da República e da Defesa Nacional. Emitidos os

pareceres consultivos (não vinculante) dos Conselhos, o Presidente da República é quem

decide se o caso enseja, ou não, a decretação da medida.

Após a decretação do estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República,

dentro do prazo máximo de 24 horas, submeterá o ato, com a respectiva justificativa, ao

Congresso Nacional, que terá o prazo de dez dias para deliberação e somente aprovará a

decretação por maioria absoluta em ambas as Casas Legislativas (art. 136, § 4.º), editando o

respectivo Decreto Legislativo (art. 49, IV). Se o Congresso não aprovar, cessa imediatamente

a medida, com efeitos ex nunc.

Deve haver respeito escrito ao prazo constitucional de trinta dias, que pode ser prorrogado,

uma única vez, por mais trinta dias. Vale lembrar que essa prorrogação também será

submetida ao crivo do Congresso Nacional, dependendo de aprovação da maioria absoluta

de seus membros para se efetivar.

Por último, se a decretação do estado de defesa (e a eventual prorrogação) não forem

suficientes para corrigir as circunstâncias deflagradoras da medida, a solução será recorrer a

um instrumento bem mais rigoroso e austero: o estado de sítio.

5 Medidas coercitivas: São cabíveis as seguintes espécies de medidas coercitivas

(hipóteses taxativas):

a) Restrições aos direitos de reunião, sigilo de correspondência e de comunicação

telefônica e telegráfica (art. 136, § lº, I);

b) Ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos: somente em caso de

calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos daí decorrentes

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c) Prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor dá medida, será por

este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal,

facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial. Essa

comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e

mental do detido no momento de sua autuação.

O executor da medida poderá, também, determinar a prisão de qualquer pessoa por

outros motivos que não seja o cometimento de crime contra o Estado, más, nesse

caso, a prisão ou detenção não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada

pelo Poder Judiciário.

Em qualquer caso, é vedada a incomunicabilidade do preso, a fim de que ele tenha

possibilidade de provocar o controle judicial da legalidade de seu encarceramento, uma

vez que, mesmo durante a medida de exceção constitucionalmente autorizada, deve o

Estado atuar em conformidade com o Direito, nos estritos limites impostos pelo próprio

ordenamento jurídico, e não arbitraria.

6 Controles:

a) Político: O controle político da decretação do estado de defesa é realizado pelo Congresso

Nacional, em três momentos distintos.

1º - Introdutório: compete ao Congresso Nacional apreciar, no prazo de dez dias contados

do seu recebimento, o decreto que institui (ou prorroga) o estado de defesa, para o fim

de, por maioria absoluta de seus membros, aprová-lo (hipótese em que prossegue a

sua execução) ou rejeitá-lo (hipótese em que os efeitos da medida cessarão

imediatamente).

2º - Concomitante: O Legislativo exerce um controle concomitante da execução do estado

de defesa. Com efeito, determina a Constituição Federal que a Mesa do Congresso

Nacional, ouvidos os líderes partidários, designará Comissão composta de cinco de

seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao

estado de defesa.

3º - Sucessivo: O Congresso Nacional realiza um controle sucessivo (a posteriori) do estado

ele defesa, pois, após a sua cessação, as medidas aplicadas durante a sua vigência

serão relatadas pelo Presidente da República, em mensagem ao Congresso Nacional,

com especificação e justificação das providências adotadas, com relação nominal dos

atingidos e indicação das restrições aplicadas.

b) Judicial: é exercido pelo Poder Judiciário, tanto durante a execução do estado de defesa

(concomitante), quanto a posteriori, após a cessação dos efeitos da medida.

1 º Concomitante - O Poder Judiciário poderá ser provocado para reprimir eventuais abusos

e ilegalidades cometidos pelos executores, especialmente mediante a impetração de

mandado de segurança e habeas corpus.

2º Sucessivo - O Poder Judiciário poderá ser chamado a apurar a responsabilidade pelos

ilícitos cometidos por seus executores ou agentes.

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Estado de Sítio

1 Conceito: Trata-se de uma legalidade constitucional extraordinária, na qual é permitida a

suspensão temporária de direitos e garantias fundamentais do indivíduo, com vistas a

preservar e defender o próprio Estado democrático, bem como dar condições para a defesa

da soberania nacional em caso de guerra. É medida excepcional, mais incisiva que o estado

de defesa.

2 Pressupostos materiais: Quatro hipóteses geram a instauração do estado de sítio:

a) A comoção grave de repercussão nacional: há que haver reverberação do

desequilíbrio institucional em âmbito nacional, pois se a comoção só repercute em local

rescrito, a hipótese será de decretação de estado de defesa. De acordo com o magistério

da doutrina, "agitações comuns, simples desordens, motins sem importância reprimem-

se com os meios ordinários da polícia e dos Tribunais. Somente quando estes recursos

vulgares forem insuficientes para assegurar a paz ou restabelecer a ordem decretar-se-á

o estado de sítio" (REPRESSIVO)

b) Ineficácia do estado de defesa: se a decretação do estado de defesa não foi suficiente

para suplantar a crise, impõe-se uma providência mais rígida e gravosa, consistente na

conversão formal da medida anteriormente decretada para o estado de sítio. (REPRESSIVO)

c) Declaração de estado de guerra: situação de guerra, na qual outro Estado Nacional

invade o território nacional. (DEFENSIVO)

d) Resposta a agressão armada estrangeira: pode se efetivar antes mesmo da

formalização da declaração de guerra e que não necessariamente envolve outro Estado

Nacional, pois pode decorrer da atuação de grupos terroristas ou militarizados. (DEFENSIVO)

Vê-se que existem duas modalidades de estado de sítio, o repressivo e o defensivo.

3 Pressupostos formais: a decretação do estado de sítio configura ato complexo, pois

envolve a participação tanto do Presidente da República (titular da iniciativa) quanto dos

Conselhos de Defesa Nacional e da República (órgãos consultivos), além do Congresso

Nacional (órgão autorizador).

O procedimento é um pouco diferente do aplicado ao estado de defesa. Aqui também há

necessidade de se iniciar por meio da solicitação de pareceres meramente opinativos aos

Conselhos da República e da Defesa Nacional, porém, antes de instituir este estado de

exceção, é necessário solicitar ao Congresso Nacional autorização para decretação do estado

de sítio, expondo os motivos determinantes do pedido. A solicitação é necessariamente

fundamentada. Enquanto no estado de defesa a aprovação ou rejeição da medida é posterior

à edição do decreto, no estado de sítio a autorização do Congresso Nacional será necessária

para legitimar a decretação, logo deverá ser anterior ao decreto.

O Congresso Nacional só poderá autorizar o pedido por maioria absoluta. Com a autorização,

o Presidente da República poderá decretar estado de sítio.

4 Decreto: O decreto que institui o estado de sítio deve obedecer aos mesmos requisitos de

tempo, área e medidas coercitivas impostas ao estado de defesa; porém, os limites impostos

serão mais elásticos.

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a) Tempo – se o estado de sítio for decretado em razão de comoção grave de repercussão

nacional ou ineficácia do estado de defesa, o decreto deve fixar o prazo máximo de 30

dias, porém pode ser prorrogado quantas vezes forem necessárias por igual prazo (30

dias). No entanto, se essa medida excepcional for decretada por força de declaração de

guerra ou agressão armada estrangeira, o estado de sítio perdurará pelo tempo

necessário, isto é, enquanto durar o conflito (art. 138, § 1.º).

b) Área abrangida – diferentemente do estado de defesa, no estado de sítio a medida

poderá abarcar até mesmo todo o território nacional.

c) Medidas coercitivas – no caso de decretação de estado de sítio com base em

declaração de guerra ou agressão armada estrangeira, em tese, todo e qualquer direito

e garantia constitucional pode sofrer restrição, desde que conste no decreto presidencial

e tenha passado pelo crivo e autorização do Congresso Nacional.

Depois de publicado o decreto, o Presidente da República designará o executor das medidas

específicas, assim como as áreas abrangidas.

5 Controle:

a) Político

1º Controle prévio: Mediante a necessidade da prévia autorização parlamentar, por votação

da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional.

2º Controle concomitante: Exercido, pelo Congresso Nacional, seja pela comissão

parlamentar designada para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas (art. 140),

seja pela possibilidade de suspender a medida, a qualquer tempo (inciso IV do art. 49),

desde que também observado o quórum de maioria absoluta.

3º Controle posterior: Realizado após a cessação do estado de sítio, com base no relatório

enviado pelo Presidente da República. (art. 141).

c) Judicial

Concomitante: o Poder Judiciário poderá ser provocado para reprimir eventuais abusos

e ilegalidades cometidas pelos executores, especialmente mediante a impetração de

mandado de segurança e habeas corpus.

Sucessivo: após a cessação do estado de sítio, o Poder Judiciário poderá ser chamado

a apurar a responsabilidade pelos ilícitos cometidos por seus executores ou agentes,

conforme prevê o art. 141 da Constituição Federal.