Decisão do stf ao mandado de segurança impetrado a favor da pec 300

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DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado por Lucinio Castelo de Assumção contra ato da Presidência da Câmara dos Deputados que teria retirado da pauta a proposta de votação da PEC 300/2008, que altera a redação do §9º do art. 144 da Constituição. Segundo a inicial, insurge-se o impetrante “contra ato praticado pela Presidência da Câmara dos Deputados que, sem qualquer motivação, retirou da pauta a referida proposta em pleno processo de votação, cujo texto principal foi aprovado por 393 votos favoráveis, maioria qualificada da Casa, restando somente a votação da matéria destacada, por cinco destaques, cujo primeiro já foi votado. ” Dessa forma, “o Presidente da Câmara pratica ato de omissão ao não recolocar em pauta de votação a Proposta de Emenda à Constituição nº 300/2008 ” (fl. 4). Afirma, ainda, que um pequeno grupo de parlamentares, no caso os Líderes dos Partidos, não poderia obstruir tal votação e o direito do impetrante de votar a referida proposta. Alega, por fim, violação direta a diversos dispositivos do Regimento Interno da Câmara dos Deputados e, em especial, ao art. 181, que estabelece que só se interromperá a votação de uma proposição por falta de quórum dos Deputados. Por conseqüência, haveria violação ao devido processo legal parlamentar. Requer, assim, a concessão da medida liminar “para que possa a matéria ser imediatamente posta em discussão e votação na Ordem do Dia” e, no mérito, seja a ação julgada procedente, “confirmando-se a liminar anteriormente deferida”. A Câmara dos Deputados prestou informações às fls. 181- 192, indicando preliminarmente o não cabimento do presente writ, que visa a contestar única e exclusivamente normas regimentais. No mérito, esclarece que aquela Casa estaria atuando de forma legal e de acordo com o Regimento Interno e que a PEC 300/2008 teria tramitação regular. Passo a decidir. Preliminarmente, verifico que se impugna suposto ato omissivo da Presidência da Câmara dos Deputados, consistente na negativa de inclusão da PEC 300/2008 na Ordem do Dia da Casa, para sua discussão e votação. O impetrante alega, em síntese, que a PEC 300/2008 não só foi retirada da pauta sem qualquer motivação, mas também não retorna à Ordem do Dia por “obra e vontade discricionária da Presidência da Casa”, o que violaria o direito do impetrante em votar a referida matéria, consubstanciado, sobretudo, no caput do seguinte dispositivo regimental:

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DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado por Lucinio Castelo de Assumção contra ato da Presidência da Câmara dos Deputados que teria retirado da pauta a proposta de votação da PEC 300/2008, que altera a redação do §9º do art. 144 da Constituição.

Segundo a inicial, insurge-se o impetrante “contra ato praticado pela Presidência da Câmara dos Deputados que, sem qualquer motivação, retirou da pauta a referida proposta em pleno processo de votação, cujo texto principal foi aprovado por 393 votos favoráveis, maioria qualificada da Casa, restando somente a votação da matéria destacada, por cinco destaques, cujo primeiro já foi votado.” Dessa forma, “o Presidente da Câmara pratica ato de omissão ao não recolocar em pauta de votação a Proposta de Emenda à Constituição nº 300/2008” (fl. 4).

Afirma, ainda, que um pequeno grupo de parlamentares, no caso os Líderes dos Partidos, não poderia obstruir tal votação e o direito do impetrante de votar a referida proposta.

Alega, por fim, violação direta a diversos dispositivos do Regimento Interno da Câmara dos Deputados e, em especial, ao art. 181, que estabelece que só se interromperá a votação de uma proposição por falta de quórum dos Deputados. Por conseqüência, haveria violação ao devido processo legal parlamentar.

Requer, assim, a concessão da medida liminar “para que possa a matéria ser imediatamente posta em discussão e votação na Ordem do Dia” e, no mérito, seja a ação julgada procedente, “confirmando-se a liminar anteriormente deferida”.

A Câmara dos Deputados prestou informações às fls. 181-192, indicando preliminarmente o não cabimento do presente writ, que visa a contestar única e exclusivamente normas regimentais. No mérito, esclarece que aquela Casa estaria atuando de forma legal e de acordo com o Regimento Interno e que a PEC 300/2008 teria tramitação regular.

Passo a decidir.Preliminarmente, verifico que se impugna suposto ato

omissivo da Presidência da Câmara dos Deputados, consistente na negativa de inclusão da PEC 300/2008 na Ordem do Dia da Casa, para sua discussão e votação.

O impetrante alega, em síntese, que a PEC 300/2008 não só foi retirada da pauta sem qualquer motivação, mas também não retorna à Ordem do Dia por “obra e vontade discricionária da Presidência da Casa”, o que violaria o direito do impetrante em votar a referida matéria, consubstanciado, sobretudo, no caput do seguinte dispositivo regimental:

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“Art. 181. Só se interromperá a votação de uma proposição por falta de quórum.”

Inicialmente, destaco que a jurisprudência do STF admite o controle dos atos legislativos, não obstante o seu caráter político, “sempre que os corpos legislativos ultrapassem os limites delineados pela Constituição ou exerçam as suas atribuições institucionais com ofensa a direitos públicos subjetivos impregnados de qualificação constitucional e titularizados, ou não, por membros do Congresso Nacional” (MS 24.849, Pleno, Rel. Celso de Mello, DJ 29.9.2006).

Discute-se, em síntese, a sistemática interna de procedimentos da Presidência da Câmara dos Deputados para inclusão ou não de proposição na Ordem do Dia.

A referida questão se relaciona com o poder de agenda da Câmara dos Deputados e representa prerrogativa institucional própria do Poder Legislativo, a fim de que sejam apreciadas as matérias que considere revestidas de importância política, social, cultural, econômica e jurídica para a vida do País (MS – MC 27.931/DF, Rel. Celso de Mello, DJe 31.3.2009).

No presente caso, verifico que a interpretação dada pelo impetrante aos dispositivos regimentais em questão não permite evidenciar afronta ao seu alegado direito líquido e certo, pois envolve norma de organização e procedimento necessária ao funcionamento administrativo daquele órgão, sem que se evidencie qualquer violação de índole constitucional ou de limitação do regular exercício do mandato parlamentar do impetrante. Tal entendimento está em consonância com a jurisprudência pacífica desta Corte (MS 26.062-AgR, Pleno, Rel. Gilmar Mendes, DJe 4.4.2008; MS 25.588-AgR, Pleno, Rel. Menezes Direito, DJe 8.5.2009).

Ademais, ao analisar as informações prestadas pela autoridade coatora às fls. 189-192, verifica-se que a PEC 300/2008 parece estar tramitando regularmente, pois já foi incluída na ordem do dia em mais de uma oportunidade, embora não se tenha concluído, em razão do encerramento das Sessões.

Nesse sentido, a Presidência da Câmara dos Deputados informou que, nos termos do art. 17 do Regimento daquela Casa, “aguarda que os Líderes, que representam os partidos e, em última instância, os parlamentares, cheguem a um denominador que nos leve a ultimar o processo de votação, uma vez que, a par das exigências regimentais, há e sempre houve espaço para a negociação política”, a exemplo de outras propostas que tramitariam naquela Casa e também

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aguardariam inclusão na Ordem do Dia.Ainda que assim não fosse, o impetrante se limitou a

apontar ilegalidades apenas por meio da interpretação e aplicação do regimento interno, sem demonstrar nos autos, de forma clara e inequívoca, que condutas específicas da autoridade coatora configurariam afronta ao Regimento Interno e à Constituição, bem como quando e de que modo elas teriam ocorrido.

Neste ponto, é preciso destacar que o mandado de segurança, em razão de não admitir dilação probatória, exige a demonstração incontroversa dos seus requisitos, bem como dos fatos e provas, de forma pré-constituída (MS-AgR-AgR 26.552/DF, Rel. Celso de Mello, DJe 16.10.2009).

Ante o exposto, na linha da jurisprudência desta Corte e nos termos do art. 23 da Lei 12.016/2009, nego seguimento ao presente mandado de segurança e declaro prejudicado o pedido da medida liminar (art. 21, §1º e art. 205 do RISTF).

Intime-se.Publique-se.Brasília, 3 de novembro de 2010.

Ministro GILMAR MENDESRelator

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