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Revista Pensar Gastronomia, v.3, n.2, Jul. 2017 IDENTIDADE GASTRONÔMICA: O PROCESSO EVOLUTIVO DA GASTRONOMIA EM NOVA VENEZA, DO PONTO DE VISTA CULTURAL E ESTÉTICO Débora Nuernberg Goulart / Universidade do Extremo Sul Catarinense 1 RESUMO A presente pesquisa apresenta questões que envolvem um estudo sobre gastronomia, experiência estética e identidade cultural, correlacionando com a cidade de Nova Veneza- SC. Partindo desta temática, a pesquisa investiga o porquê das pessoas procurarem esta cidade como opção de gastronomia enquanto que nos municípios circunvizinhos existam outras opções. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que inclui pesquisa de campo com a realização de questionários completos pelos proprietários de três estabelecimentos da cidade sendo eles: Restaurante Veneza, Restaurante DivinaArmida e Restaurante Il Caminho. Concomitantemente faz referências a representação da gastronomia como fartura de alimentos, e da gastronomia como uma experiência estética. PALAVRAS-CHAVE Nova Veneza; Gastronomia; Experiência; Identidade Cultural. ABSTRACT The subject research presents questions that involve a study on gastronomy, aesthetic experience and cultural identity, correlating with the city of Nova Veneza-SC. Based on this theme, the research investigates why people seek this town as a gastronomy option while there are other options in the surrounding municipalities. This is a qualitative research that includes field research through questionnaires completed by owners of three establishments in town: Veneza Restaurant, Divina Armida Restaurant and Il Caminho Restaurant. Concomitantly, it makes references to the representation of gastronomy as feast of food and flavors, and gastronomy as an aesthetic experience. KEYWORDS Nova Veneza; Gastronomy; Experience; Cultural Identity. A vida em seu aspecto essencial se resume a satisfação das necessidades básicas e biológicas. A alimentação possivelmente é a mais primordial dessas necessidades. O homem se alimenta para se manter vivo, precisa de carboidratos, para ter energia no seu dia a dia, de proteínas para as funções cerebrais, de vitaminas para a sua saudabilidade. O corpo humano precisa funcionar e o alimento é o combustível e o remédio para o bom desempenho dele. Comer é uma atividade vital, que ainda estimula a produção de dopamina, umneourotransmissor responsável por regular o prazer. Talvez por ter esse valor 1 Artigo apresentado como cumprimento final do Curso de Especialização em Gastronomia- Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC com orientação do Prof. Me. Marcelo Feldhaus – Criciúma, 19 de março de 2017.

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Revista Pensar Gastronomia, v.3, n.2, Jul. 2017

IDENTIDADE GASTRONÔMICA: O PROCESSO EVOLUTIVO DA GASTRONOMIA EM NOVA VENEZA, DO PONTO DE VISTA CULTURAL E ESTÉTICO

Débora Nuernberg Goulart / Universidade do Extremo Sul Catarinense1

RESUMO A presente pesquisa apresenta questões que envolvem um estudo sobre gastronomia, experiência estética e identidade cultural, correlacionando com a cidade de Nova Veneza-SC. Partindo desta temática, a pesquisa investiga o porquê das pessoas procurarem esta cidade como opção de gastronomia enquanto que nos municípios circunvizinhos existam outras opções. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que inclui pesquisa de campo com a realização de questionários completos pelos proprietários de três estabelecimentos da cidade sendo eles: Restaurante Veneza, Restaurante DivinaArmida e Restaurante Il Caminho. Concomitantemente faz referências a representação da gastronomia como fartura de alimentos, e da gastronomia como uma experiência estética. PALAVRAS-CHAVE Nova Veneza; Gastronomia; Experiência; Identidade Cultural. ABSTRACT The subject research presents questions that involve a study on gastronomy, aesthetic experience and cultural identity, correlating with the city of Nova Veneza-SC. Based on this theme, the research investigates why people seek this town as a gastronomy option while there are other options in the surrounding municipalities. This is a qualitative research that includes field research through questionnaires completed by owners of three establishments in town: Veneza Restaurant, Divina Armida Restaurant and Il Caminho Restaurant. Concomitantly, it makes references to the representation of gastronomy as feast of food and flavors, and gastronomy as an aesthetic experience. KEYWORDS

Nova Veneza; Gastronomy; Experience; Cultural Identity.

A vida em seu aspecto essencial se resume a satisfação das

necessidades básicas e biológicas. A alimentação possivelmente é a mais primordial

dessas necessidades. O homem se alimenta para se manter vivo, precisa de

carboidratos, para ter energia no seu dia a dia, de proteínas para as funções

cerebrais, de vitaminas para a sua saudabilidade. O corpo humano precisa

funcionar e o alimento é o combustível e o remédio para o bom desempenho dele.

Comer é uma atividade vital, que ainda estimula a produção de dopamina,

umneourotransmissor responsável por regular o prazer. Talvez por ter esse valor

1 Artigo apresentado como cumprimento final do Curso de Especialização em Gastronomia- Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC com orientação do Prof. Me. Marcelo Feldhaus – Criciúma, 19 de março de 2017.

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que étão intrínseco na vida das pessoas, que se alimentar vai muito além da

necessidade nutricional. Tudo acontece em volta de uma mesa, comemorações

sempre envolvem comida, a festa de aniversário gira simbolicamente em torno do

bolo, um encontro romântico não dispensa um jantar, e assim tantos outros

momentos de nossas vidas.

Deste modo, o ato de se alimentar se transforma em uma experiência.

Esta, segundo os dicionários, é algo que nos acontece, como se refere Larrosa

(1998, p.27) “[...] a experiência é o que nos acontece e se o saber da experiência

tem a ver com a elaboração do sentido ou do sem-sentido do que nos acontece [...]”.

Assim, a experiência acontece de forma diferente em cada individuo, como por

exemplo, comer um bolo de chocolate pode ser algo marcante para uma pessoa, e

pode ser apenas se alimentar para outra. A ação de comer o bolo é comum, mas a

experiência é individual. Acontece para cada qual, de sua maneira, ou simplesmente

somente passa, não acontece.

Alimentos possuem sabores, texturas, cores e aromas diferentes, deste

modo, a gastronomia se apropria deles para transformar uma simples refeição em

uma experiência pessoal inesquecível. Ou seja, tocar profundamente quem

consome através dos seus sentidos e proporcionar prazer a quem come. De acordo

com Feran Adrià 1997, no livroLos secretos de El Bulli, o autor descreve as funções

dos cinco sentidos humanos, que são elas:

Visão2: é o primeiro sentido que entra em ação quando se recebe o prato.

Diz respeito à apresentação dos pratos, das formas, das cores e matizes dos alimentos, a identificação do produto e das elaborações, as quantidades que se serve; a disposição dos alimentos no prato. A conjunção dessas percepções informa a respeito do tipo de comida que vai provar, tradicional, étnica, clássica ou criativa. Também é fundamental observar que na gastronomia o que se pode ver também se pode comer. Olfato: após apreciar visualmente o prato, se percebe os aromas. O olfato desempenha três funções básicas na cozinha: em primeiro lugar desencadeia a produção de sucos gástricos que abrem o apetite e após possibilitam a digestão. Em segundo lugar, permite desfrutar os aromas característicos de cada preparação. E em terceiro lugar, dá noção do estado dos alimentos. Tato: o alimento entra na boca e a temperatura é a primeira a ser percebida. O paladar humano suporta entre – 20

oC a 50

oC. A combinação de distintas

temperaturas em um mesmo prato proporciona sensações diferentes. Após a temperatura se percebe a textura(...) Gosto: é o sentido que tem importância fundamental no ato de comer, poderíamos eliminar os outros, evidentemente eliminando níveis de prazer, mas este não. Gosto é sinônimo de sabor. Sua percepção é singular, as pessoas tem percepções muito distintas em relação ao gosto. Também é importante salientar que o gosto é

2 Grifos do autor

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composto por um conjunto de parâmetros culturais, estéticos e de hábitos. Falando estreitamente de gosto como sentido, as sensações gustativas, durante o ato de comer, podem ser enumeradas da seguinte forma: 1. Percepções dos gostos primários; sabor próprio dos alimentos, isto é, personalidade dos alimentos “gen”, observamos no doce, no salgado, no ácido, no amargo. Percepções das matizes: agridoce; adstringente; picante; balsâmico, etc. 2. Percepção do sabor característico de cada alimento, além das impressões relacionadas com os gostos primários. 3. Apreciação da “harmonia” existente entre os elementos. Audição: O som de certas texturas produzidas na boca, no corte (é o que menos participa durante o ato de comer).

Pratos se transformam em verdadeiras produções artísticas, despertando

as sensações mais diversas e as memórias mais profundas, portanto, para

Stiwell(2013, 334) referindo-se a Ferran Adrià, “[...] as pessoas não viram ao meu

restaurante para se alimentar, [...], mas para ter uma experiência gastronômica”.

No entanto, a qualidade sensorial de um alimento não é uma

característica própria deste, mas sim o resultado de uma interação entre o

consumidor e o alimento. E essa experiência acontece ou não, por influências de

fatores culturais, ambientais, sócio econômicos, e até mesmo induzidos pela lógica

do consumo e as novas tecnologias.

Quando o sujeito se da conta da experiência que o envolve, se revela

para ele o sentido de sua existência. Por esse motivo, cada época é marcada por

seus modismos, também a gastronomia se influencia com isso. Com o passar dos

anos o homem aprendeu e desenvolver cada vez mais a manipulação dos alimentos

e é a natureza a responsável por oferecer os ingredientes ao homem para garantir o

desenvolvimento de sua espécie.

Desde as primeiras civilizações a gastronomia foi se tornando um

elemento cultural do mesmo modo, ou ate mais intrínseco, que os costumes, a

língua e as festas populares, como afirma Freyre, (apud, Araujo, 2014, p.14),

O paladar é o último a se desnacionalizar no ser humano, pois caminha juntamente com a sociedade, a cultura, o tempo, o espaço e sua história alimentar permeada por toda a sua vida. O paladar é talvez o último reduto do espírito nacional; quando ele se desnacionaliza, está desnacionalizando tudo o mais, há uma perda de identidade cultural.

Hoje, existe muita fartura e ao mesmo tempo muita pobreza com relação

à alimentação. Muita diversidade e oferta de produtos e ao mesmo tempo, mau uso

e pouca valorização. Como por exemplo, a tendência gourmet3que incrementa tudo

3Grifo meu

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demasiadamente, correndo o risco de perder a essência de cada ingrediente e a

autenticidade do produto. Em contra partida há atualmente uma forte atração pela

gastronomia de raiz, como a utilização de produtos regionalizados, a pureza dos

alimentos, a simplicidade nas preparações, o respeito à natureza, como, aves

criadas em liberdade, produtos orgânicos, e o não uso de produtos industrializados.

A experiência da gastronomia está ganhando uma nova configuração, a

ideia atual é de que menos é mais, é sentir mais e experimentar menos. Os dias de

hoje permeiam entre a exuberância do homem contemporâneo e a busca, deste

mesmo homem por uma vida mais simples, saudável e autêntica, é um sujeito

confuso, deslumbrado e ao mesmo tempo sensível, que busca a felicidade a

qualquer preço.

É pensando nestas experiências de que fala Larrosa, bem como a ideia

de uma gastronomia de raiz, que trago à cena a cidade Nova Veneza(figura 01), um

lugar situado no interior do Estado de Santa Catarina. Faz extremas geográficas

com municípios como Criciúma, Siderópolis, Forquilhinha, Meleiro, Morro Grande,

Bom Jardim da Serra e São José dos Ausentes e está localizada a 215 km da capital

do Estado, Florianópolis, e conta com uma estimativa aproximada de 12.536

habitantes.

Figura 01 – Vista parcial da cidade de Nova Veneza (2017) Fonte: Disponível em: http://www.portalveneza.com.br

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Recebe esse nome por influência de seus primeiros colonizadores que

vieram da Itália. Eles se destinaram para cá trazidos pela Companhia Metropolitana4,

que tinha a missão de colonizar e povoar essa região. O responsável por essa

fundação, datada oficialmente, de acordo com Bortolotto (1992), em outubro de

1891, por receber o maior contingente de pessoas neste mês, foi Miguel Napoli, um

italiano, da Sicília, radicado nos Estados Unidos, que veio para essas terras como

empresário, frente à empresa Cia Metropolitana. Ele aqui, no início de 1891,

comandou a abertura de estradas, a demarcação de terras e preparou o ambiente

para receber os colonizadores, com a construção de uma serraria. Assim, o pequeno

lugarejo foi se emoldurando, como esclarece Zuleika Alvim, (apud, Bortolotto, 1992,

p.10),

Suas condições de vida nos permeiam entende porque foram eles os primeiros a abandonar a Italia. [...] As famílias venetas contavam com doze ou até quinze elementos ao todo [...]. Todos viviam do pequeno núcleo de terra que lhes pertencia. O pai era a autoridade máxima e o grupo se mantinha unido enquanto a propriedade fornecia os recursos necessários a manutenção [...].[...] toda a população desde os mais abastados aos mais pobres alimentavam-se basicamente de polenta. Nas mesas mais fartas havia também peixe, ovo, salame, mas raramente se comia carne, quando comiam era de porco, carneiro ou cabrito. A carne de vaca ficava reservada para os dias de festa ou quando se adoecia [...]. Também raramente se comia pão de farinha de trigo, [...].O vinho aparecia durante a colheita da uva, [...]; depois desse período usavam o “vinhete”, espécie de vinho de qualidade inferior.

Esse mesmo espaço era cultivado, e produzia uva, milho e muitas outras

iguarias da terra que alimentava as famílias que ali estavam estabelecidas. O queijo

e o salame, normalmente vinham de fora, eram os tropeiros5 que abriam picadas e

desciam a serra a cavalo, com as mulas carregadas de produtos, como o queijo e o

salame, que eram comercializados ou trocados com os colonos em Nova Veneza.

Esses mesmos tropeiros transportavam gado da serra para o Litoral e se

hospedavam nas casas dos colonos até chegar ao destino final. Como descreve,

BORTOLOTTO (1992, p.137),

É necessário citar também que grande parte do comércio de Nova Veneza era estabelecido com o Planalto Serrano, através da estrada da Serra do São Bento. Os colonos vendiam produtos da agricultura e compravam carne e queijos, além de porcos para a engorda, cavalos e vacas.

4 Empresa Norte-Americana que tinha a missão de povoar o interior do Brasil. Sua sede situava-se,

onde hoje é o atual Hospital São Marcos. 5Pessoas que desciam o Planalto Serrano, pela estrada da Serra do São Bento, a fim de comercializar produtos.

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E deste modo os anos foram passando, e a tradição tropeira continuava

fazendo parte do dia a dia da cidade em ascensão, os colonos acolhiam com

aconchego e alimento esse homem que descia a serra e precisava de abrigo e

comida. Assim, em 1959, uma senhora, chamada Luíza, que sempre recebia em sua

casa esses homens da serra, percebeu nesta atividade, uma oportunidade de fonte

de renda.

Começou a comercializar a comida que ela fazia para a família e para os

visitantes, e também de alugar quartos para os possíveis hóspedes. Dentre esses

alimentos estavam a polenta, a fortaia, a galinha caipira ensopada, a minestra, entre

outros pratos da culinária típica italiana(figura 02).

Figura 02 – Imagem ilustrativa da comida típica da época (2017) Fonte:Disponível em:http://www.hotelbormon.com.br/quem-somos

Foi assim que surgiu o primeiro restaurante em Nova Veneza, e que hoje

denomina-seRestaurante Veneza e faz parte do grupo de empreendimentos da

família, que compreende esse Restaurante e mais dois hotéis na cidade.

Depois de 126 anos de colonização da pequena colônia, já é visível seu

reconhecimento pelos seus recursos culturais e turísticos. Eles representam Nova

Veneza com muita expressividade. A gastronomia é o grande diferencial cultural no

município e é a principal motivação para o deslocamento de turistas para esta rota

mágica e bucólica. Sua arquitetura também tem elementos muito significativos, como

as casas de Pedra, a Igreja Matriz São Marcos, o Museu do Imigrante, a chaminé e

o casario antigo da Rua Nicolau Pederneiras. Outros dois símbolos marcantes na

cidade, no que se refere à intensificação cultural entre Nova Veneza e a Itália é a

Gôndola vinda da Itália em 2006, que está situada na Praça Humberto Bortoluzzi, e

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o Carnevaledi Venezia, que acontece todo ano durante a festa da Gastronomia

Típica Italiana. Sobre as características da cidade, de acordo com Portal Veneza6:

Assim colonizada por imigrantes italianos, a cidade herdou usos, costumes e tradições que foram cultivados através de gerações por seus habitantes. Por se manter fiel às tradições, o município recebeu do governo estadual, através da Lei 12.789, o título de Capital Catarinense da Gastronomia Típica Italiana. Nova Veneza é um município rodeado de montanhas com uma bela paisagem que, com sua arquitetura, praças, igrejas e a hospitalidade de seu povo, dispõe de uma diversidade de recantos que constituem um patrimônio histórico/cultural, singular e, sobretudo, natural.

A vida no interior, onde parece que o tempo não passa, e o sabor da casa

da nona, o aconchego da cidade, o desejo de buscar a simplicidade e compartilhar

tradições verdadeiramente autênticas desperta no turista a sensação maravilhosa de

bem estar quando está neste lugar, Nova Veneza.Talvez, seja essa a ideia de lugar

de pertencimento, como se refere Antony Giddens, (apud Canton, 2009, p.15) lugar

“se refere a uma noção especifica de espaço: trata-se de um espaço particular,

familiar, responsável pela construção de nossas raízes e nossas referências de

mundo.”. Já que diante da vida contemporânea que o ser humano leva hoje, a

globalização e a tecnologia fazem com que esse homem troque seu lugar de

aconchego e pertencimento, por lugares de passagem, lugares virtuais, por cidades

com milhões de habitantes e migalhas de amigos, com muitos espaços públicos e

praças, mas muitos esvaziados pelo medo.

Provavelmente esse sentimento de lugar de pertencimento seja um dos

motivos por essa busca pela cidade, é um lugar específico em que o turista se

identifica,uma espécie de refúgioque mantém hábitos interioranos marcados pela

hospitalidade.Além dos restaurantes, a praça é um ponto chave na busca pelo local,

o charme, o encanto e o aconchego dela, faz o turista buscar suas memórias e sua

identidade e a tão sonhada felicidade.

Um bom restaurante vai muito além dos seus produtos oferecidos, dos

produtos concretos, ele conquista pelo intangível, pelos desejos, as emoções e as

sensações. Estes são os elementos integradores da experiência, o cliente sente a

qualidade da experiência que ele procura, através do equilíbrio entre o desempenho

no atendimento dos garçons, na execução do prato, no ambiente harmonioso, a

localização, somados a experiência dos sentidos (sabor, visão, audição, entre

outros). Como acrescentaFlandrin; Montanari (apud, Araújo, 2014, p. 27),

6Disponível em: www.portalveneza.com.br. Acessado em: 23 de fevereiro de 2017.

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O homem civilizado não come somente para satisfazer uma necessidade biológica, mas também para transfomar esse momento em sociabilidade, carregado de um conteúdo social e comunicativo. Seria o que podemos chamar de comensalidade, o ato de comer junto.

O cliente agrega valor ao produto que ele se dispõe a comprar, e esse

valor está relacionado às percepções que ele tem, quanto aos benefícios que esse

produto pode lhe oferecer.

É intrigante pensar na cidade de Nova Veneza, e na sua desenvoltura

com os restaurantes locais. Nos últimos anos, os restaurantes da cidade estão

sempre lotados e a cidade cheia de turistas. Assim, a problemática em questão é

discutir: Quem é esse consumidor da gastronomia em Nova Veneza, e quais os

sentimentos que o anima a buscar Nova Veneza para se alimentar?

Para pensar sobre esse tema e entender sua relação com a gastronomia

local e as possíveis interferências culturais existentes, para isso, foi

pesquisado,além da revisão bibliográfica, três restaurantes da cidade, escolhidos

pela história que construíram ao longo dos anos e seu relacionamento interpessoal

com a clientela e a concorrência. Dentre os estabelecimentos está, o mais antigo e

tradicional, o 1.Restaurante Veneza7, (figura 03),o mais badalado de todos, com

uma clientela mais diversificada, o 2.Restaurante Il Camino8,(figura 05)e o mais

ousado, que une tradição e contemporaneidade, se apropriando da alta

gastronomia, o 3.RestauranteDivina Armida9 (figura 04).

Figura 03 – Restaurante Veneza (2017) Fonte: http://www.viagemeviagens.com/categoria/nova-veneza

7 Disponível em: http://www.viagemeviagens.com/categoria/nova-veneza 8Disponível em: https://www.tripadvisor.com.br/Restaurant 9Disponível em: https://www.tripadvisor.com.br/Restaurant

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Figura 04 – Restaurante DivinaArmida (2017) Fonte: https://www.tripadvisor.com.br/Restaurant

Figura 05 – Restaurante II Camino(2017) Fonte: https://www.tripadvisor.com.br/Restaurant

Com três pontos de vistas distintos, baseados em um questionário, e

partindo das maiores referências de gastronomia da cidade, foi possível, como o

primeiro questionamento, traçar um perfil dos clientes que frequentam os

restaurantes locais.O Restaurante Veneza, afirma que seus clientes até 2014,

compreendia os executivos durante a semana e famílias nos domingos, desde então

a clientela de turistas aumentou, principalmente aos finais de semana e também

durante a semana. Esse turista que além de procurar Nova Veneza, também passa

pela cidade em busca da Rota da Serra do Rio do Rastro, que com a pavimentação

asfáltica pela cidade de Treviso também possibilitou um rápido acesso a cidade de

Nova Veneza. Eles buscam a cidade também e principalmente para encontrar uma

experiência diferenciada como, coloca o Restaurante II Camino, “os clientes não

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procuram apenas a comida, mas querem comer para alimentar suas emoções, e as

vivenciar experiências diferenciadas e especiais.”.

O perfil do cliente de Nova Veneza acompanha uma tendência mundial,

segundo a estudiosa Carolina Sass de Haro10 (2016) sobre as três tendências de

comportamento que influenciam o negócio de bares e restaurantes. Na qual ela

traça o comportamento do consumidor da atualidade, que pode ser comparado com

o consumidor da gastronomia de Nova Veneza, mostrando que estes são movidos

principalmente por influências psicológicas. Ele procura motivação, aprendizado,

atitude, percepção, personalidade, estilo de vida e autoafirmação.

Além dessas motivações pessoais, o consumidor hoje também vive

conectado, isso permite acesso imediato à informação sobre determinado lugar.

Quando um negócio ou restaurante é compartilhado nas redes sociais o desejo de

consumo sobre ele aumenta, e é claro que a procura por ele também. Desde o

advento das redes sociais é extremamente visível o crescimento deste ramo em

Nova Veneza, talvez essa tendência mundial também interfira nesse

desenvolvimento local.

Partindo para o segundo questionamento sobre, o porquê as pessoas

procuram Nova Veneza e não outro local para comer, segundo todos os

entrevistados, além dos turistas virem para Nova Veneza, para encontrar uma

gastronomia farta, com restaurantes alacarte, buffet, massas, pizzas, e muito mais,

também encontram uma cidade culturalmente reconhecida, limpa, organizada e com

um povo acolhedor.

A cultura italiana disseminada no município também é um fator

enriquecedor para o turismo, afinal a região sul de Santa Catarina é colonizada por

muitos imigrantes italianos, que possivelmente se identificam com o local e desejam

compartilhar suas tradições, de forma autêntica e verdadeira. Nesse sentido, Hall

(2005, p. 47) explica que “as culturas nacionais em que nascemos se constituem em

uma das principais fontes de identidade cultural.”. A polenta com galinha ensopada,

queijo, e salame eram um dospratos consumidos diariamente pelos descendentes

de italianos de toda a AMREC – Associação dos Municípios da Região Carbonífera,

e com o passar do tempo e as novas tecnologias alimentícias, o hábito foi sendo

10 Disponível: http:\ www.correiogourmend.com.br.

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deixado de lado. Portanto, comer em Nova Veneza é rememorar experiências de

infância, e ate mesmo ancestrais, destacadas pela sua memória sensorial.

O homem se reveste de autenticidade quando se identifica com sua

cultura, e esse sentimento engrandece sua alma, como aborda Hall (2005, p.08)

“identidades culturais – aqueles aspectos de nossas identidades que surgem de

nosso ‘pertencimento’, culturas étnicas, raciais, linguísticas, religiosas e, acima de

tudo, nacionais”. E também gastronômicos. Essa característica de assumir a

identidade cultural é valorizar suas origens e suas diferenças, pois o ser humano é

único porque é diferente e se distingue dos outros pelas suas particularidades

pessoais e sociais.

O centro histórico, as casas de pedra, a Gôndola, o mais novo ponto

turístico a Ponte Del Morosi e principalmente a Praça Humberto Bortoluzzi com seu

clima encantador e atemporal, também são fatores importantes que determinam a

procura pelo município. A Praça Humberto Botoluzzi(figura 06),faz o frequentador

dos restaurantes passar a tarde toda sentado em seus bancos com a sensação de

paz, aconchego e de boas lembranças. Parece que naquele lugar o tempo não

passa, é um refúgio para quem vive em um tempo turbulento e que escapa pelas

mãos, já que atualmente muitos espaços públicos como praças e parques são

abandonados, sujos e maltratados. O Restaurante Veneza destaca ainda que, “a

praça é um lugar seguro, é um lugar bacana, então o programa começa onze horas

da manhã e termina seis horas da tarde, onde as crianças podem ficar brincando,

correndo e gastando energia, então sabemos que onde os filhos se sentem bem, os

pais se sentem melhor ainda”. Deste modo, destaca Canton (2009, p. 58)

Neste momento histórico da chamada globalização ou mundialização, de deslocamentos constantes nos fazem sentir que o lugar de pertencimento, de aconchego – a Pasárgada- é constantemente substituído por uma necessidade de nos adaptar aos impactos da vida contemporânea e tecnológica. Lugares fixos, conhecidos ou confortáveis, são trocados por não lugares, lugares de passagem, lugares virtuais, lugares que nos impõem outros tipos de trocas.

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Figura 06 – Detalhes de pontos turísticos da cidade(2017) Fonte: http://www.guiasc.tur.br/item/detalhes

Boa comida, técnicas especializadas de culinária, pessoas renomadas a

frente de restaurantes, com formação europeia, como no caso do Restaurante

DivinaArmida, tradição de mais de meio século, que contam com as mãos da

pioneira em gastronomia em Nova Veneza, como o Restaurante Veneza. Entre

outras qualidades diferenciadas quefazem as pessoas procurarem essa cidade e

não outra cidade vizinha para saborearem uma boa comida. Mas, mais uma vez a

experiência fala mais alto, as sensações que Nova Veneza trás a tona, vai muito

além dos sabores e do requinte de um belo prato.Como esclarece ainda, Carolina

SassHaro11(2016) sobre as três tendências de comportamento que influenciam o

negócio de bares e restaurantes, no site Correio Gourmend,

Desde os primórdios o ser humano está em constante busca pela felicidade. Entretanto, isto nunca esteve tão disseminado e explícito como na atualidade. Com a correria do dia à dia, a abundancia de ofertas e o tempo cada vez mais escasso, consumidores desejam viver experiências únicas, ricas, e especiais. Também desejam que produtos e serviços sejam pensados para facilitar a vida e para aumentar a disponibilidade para tempo de descanso e prazer. Destinos turísticos autênticos e pouco explorados ganham força, hotéis que oferecem algo a mais além da hospedagem, como festivais gastronômicos ou o uso do espaço de forma alternativa, enriquecem a experiência; bares e restaurantes temáticos que permitem

11 Disponível: http:\ www.correiogourmend.com.br.

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acesso a culinária e culturas exóticas são grandes exemplos da aplicação desta tendência.

Na sequência o questionamento foi: o que cada estabelecimento tem de

comum com a concorrência local, e o que diferencia dos restaurantes concorrentes.

Para o estabelecimento DivinaArmida, “os restaurantes de Nova estão unidos por

um único bem, Nova Veneza. E que essa união é pela valorização da cidade e do

neoveneziano”. O Restaurante Venezatambém destaca isso e acrescenta, quando

fala sobre a ANET, que é a Associação Neoveneziana de Turismo, fundada pelos

próprios donos de restaurantes para lutarem pelo crescimento da gastronomia local,

com o intuito de desenvolver a rota gastronômica e o desenvolvimento pessoal de

cada estabelecimento. Sobre turismo podemos pontuar,

Esse caráter instrumental para alcançar o desenvolvimento por meio do turismo não pode ser perdido de vista na formulação de uma política de desenvolvimento turístico. Assim, o turismo constitui um objetivo para o turista, como também para a região que deseja atraí-lo. (OLIVEIRA, 2008 p.33)

O Restaurante Veneza descreve ainda que,“para uma cidade se

desenvolver turisticamente, a nossa Rota gastronômica que é um produto da ANET,

que é sim a Associação de todos os estabelecimentos gastronômicos da cidade.

Isso é um crescimento porque a gente está incentivando as pessoas virem para

Nova Veneza e conhecerem todas as opções de gastronomia [...] hoje temos uma

diversidade de restaurantes, fazendo que isso se fortaleça, porque o cliente que

isso, ele não procura sempre a mesma coisa, então cada restaurante parte para

estilos deferentes”.

Assim, cada restaurante tem um viés diferenciado, em que faz da

concorrência uma parceira onde todos saem ganhando. O Restaurante Veneza, por

exemplo, tem uma gastronomia voltada para a comida típica italiana, produzida pelo

imigrante que veio da Itália para o Brasil em busca de uma vida melhor. Polenta,

fortaia, salame com ovos, como já foi citado, esse foi o primeiro restaurante da

cidade, por esse motivo segundo a entrevistada o intuito deles é “resgatar o paladar

típico italiano e consequentemente sua cultura.”.

O Restaurante Il Caminho, também segue pelo viés da comida típica

italiana, porém se destaca pela simplicidade e pela sequência de carnes que serve,

todos os possíveis cortes de carne que um bom conhecedor aprecia. O chamado

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“espeto corrido”, conhecido na região, faz sucesso também aqui. O Brasil é um país

extenso, tem uma extensa distribuição cultural, marcado também pela gastronomia.

No centro, por exemplo, predomina o arroz, feijão, carne de porco, fubá e o café. No

sertão, a carne de sol, o arroz, o feijão e a farinha de mandioca. No nordeste e norte

peixes e frutas. No sul do Brasil, onde se encontra Nova Veneza, predomina a carne

e o mate, ou seja, o tradicional churrasco. O que comprova o gosto da cidade pela

sequência de carnes. Como a exemplo do que já foi citado acima, os tropeiros

desciam a serra e se hospedavam em Nova Veneza para realizar seus negócios, e

para eles a alimentação era baseada na carne.

O Restaurante DivinaArmida, destaca-se tambémpela gastronomia

contemporânea, esta assim é chamada quando o criador origina um conceito novo

abrindo uma brecha para vislumbrar novas possibilidades. O entrevistado destaca,

por exemplo, além de pratos contemporâneos como polenta peneirada, a

harmonização feita entre a Terra da Gastronomia Típica Italiana e o Planalto

Serrano. Em uma noite especial, chamada de Noite Serrana, foramcom pratos

especiais compostos de ingredientes selecionados e combinados, destacando as

duas culturas. Como pão de moranga com costela bovina, destacando a culinária

serrana.

Enfim a culinária de Nova Veneza é riquíssima, trás elementos que

distinguem os restaurantes um do outro, possibilitando também uma boa relação

com a concorrência e até união da mesma pelo bem comum. Elementos típicos

italianos, elementos italianos (de restaurantes não pesquisados) elementos

brasileiros, elementos regionais do sul do Brasil, elementos contemporâneos

compõem essa mesa farta que é Nova Veneza, mas que acima de tudo é recheada

de versatilidade, afabilidade e bom humor.

A quarta e última questão, discute a frase “porque a fome jamais será

apenas de alimento” ondeFerran Adrià 1997, comenta que a gastronomia e

alimentação são duas coisas diferentes. Alimentar-se, é satisfazer as necessidades

físicas, como já foi falado anteriormente, já a gastronomia tem uma função muito

mais sutil, transformando o ato de comer em um prazer para os sentidos e para o

intelecto, para o autor, a gastronomia, mais do que estilo e técnica, consiste em

utilizar com muito carinho os conhecimentos do cozinheiro, para dar satisfação para

as pessoas.

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Contudo, o Restaurante DivinaArmida destaca que “apenas saciar a fome

nunca será o que as pessoas buscam quando procuram um restaurante. A

experiência gastronômica vai muito além. A fome é de sentir-se bem, ser bem

recebido, sentir-se seguro, comer algo diferenciado, boas vibrações, resgate da

historia. Tudo isso e muito mais você consegue buscar quando está em um lugar

diferenciado como é Nova Veneza.”. Deste modo, sentir-se em um lugar

diferenciado é sentir-se reconhecido, e isso confere ao consumidor, um certo nível

de status e de recompensa. Essa ideia se intensificou com o avanço da vida online,

marcas e conceitos se posicionam nas redes sociais e despertam desejos nos

consumidores, no entanto esse sentimento gerado não surgiu com a esfera virtual,

em 1825, Brillat-Savarin, já afirmava, “[...] que o destino das nações costuma ser

decidido em grandes jantares”, e ainda acrescenta, “os seres humanos não tem

paladar apenas para satisfazer um hobby: ele nos convida pelo prazer de corrigir as

perdas resultantes do desgaste da vida.” (WILLIAM, 2013, p.163)

Do mesmo modo, o Restaurante Veneza, também fala sobre experiência,

“para ser uma experiência boa, nós temos que ter uma boa comida, um bom

atendimento, um ótimo local e uma cidade limpa e organizada, então tudo isso junto,

faz a tua galinha com polenta ser uma experiência inesquecível”. Assim, o

consumidor acima de tudo procura com a gastronomia de Nova Veneza o que

procura em qualquer lugar do mundo, uma boa experiência e a possibilidade de se

sentir único e realizado. Como ainda comenta Carolina de SassHaro12

A necessidade de ser reconhecido e sentir-se querido também é inerente do ser humano. Produtos e serviços que permitem ao consumidor de certos status são preferidos e podem arrebanhar legiões de seguidores [...] quando se fala em status, não basta ser o melhor e mais caro, o mais exclusivo (apesar de que ser mais continua sendo relevante) é preciso que seu negócio permita criar histórias de vida de seus clientes. Através da propagação dessas histórias é que será gerado o status para sua marca e seu consumidor, de forma subliminar. [...]

Esta pesquisa iniciou-se com o objetivo de pesquisar sobre a origem do

interesse sobre gastronomia na cidade de Nova Veneza, e porque tamanha procura

nos últimos tempos por essa cidade para se alimentar. Partindo de uma perspectiva

estética e cultural, observou a alimentação como uma experiência, em que o ser

humano não se alimenta apenas para se manter vivo e saudável, mas para poder

12 Disponível: http:\ www.correiogourmend.com.br.

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vivenciar diferentes sensações. Contanto, Sitwell(2013, p.335), relata sobre os

conceitos de Adrià, “A pintura é para os olhos. A musica pode ser maravilhosa, mas

é apenas para os ouvidos, [...] Comer é uma experiência mais intensa. Não existe

nenhum outro momento criativo que articule todos os sentidos.”

Esse é o turista que vem para Nova Veneza, ele deseja uma experiência

prazerosa. Busca isso através de uma comida saborosa, de uma cidade agradável,

de momentos em que ele possa realmente se sentir especial. Esse sentimento de

reconhecimento, se da pelo cuidado da cidade em atender bem os visitantes e

manter semprea cidade limpa e aconchegante. A Praça Humberto Bortoluzzi,

transpira paz de espírito e cultura, ela, assim como a grande oferta de restaurantes

que à circundam, são dois grandes motivos que trazem pessoas à Nova Veneza.

Seja em um ou em outro restaurante, ou na praça o turista se sente acolhido e

seguro.

A comida típica italiana desenvolvida pelo imigrante, a mais de um século

na cidade, com os ingredientes que ele tinha a disposição, que não eram em

abundância, hoje é valorizada com requinte. Talvez por essa simplicidade toda que

ela se torne tão especial, e também por se manter fiel a sua identidade. Valorizar a

cultura é um dos elementos marcantes para os neovenezianos, essa valorização

chama atenção para a cidade, fazendo com que as pessoas se interessem também

por esse lugar, que tanto aprecia sua própria história. Como pontua Bortolotto (1992,

p.1): “Conhecer fatos que envolvem nossos antepassados, suas lutas, sonhos,

valores e esperanças, não é apenas tentar compreender sua história, é

principalmente, descobrir mais sobre nós mesmos”. Essa relação carinho do

neoveneziano com seu lugar de pertencimento aproxima ainda mais o turista dessa

cidade encantadora.

É toda uma atmosfera de contemplação, que condiz com a tendência

atual da contemporaneidade, o desejo de ser feliz e de encontrar a simplicidade, a

pureza, neste caso a gastronomia de raiz, e de buscar a sua própria identidade.

Assim, o município satisfaz as necessidades dos consumidores, mas acima de tudo,

atende aos desejos que alimentam o ego de cada ser humano.

Como diz a música do grupo de Rock Titãs, [...]a gente não quer só

comida, a gente quer comida diversão e arte, a gente não quer só comida a gente

quer saída para qualquer parte[...], então a fome jamais será apenas de alimento. O

homem tem fome de muitas outras coisas, ele necessita de beleza, diversão,

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liberdade, de poder decidir onde quer comer, e o que deseja fazer. Alimentando-se,

para sentir, muito mais que sabor pelo paladar, mas para sentir afeto, amor,

aconchego, reconhecimento, e para buscar a sua tão almejada felicidade.

Referências

ADRIA, Ferran. Lossecretos Del Bulli: recetas, técnicas y reflexiones. Barcelona: Ed. Altaya, AS, 1997. ARAÚJO, Rodrigo Viriato. Saberes Gastronômicos e Formação de Chefs. Jundiaí: Paco Editorial, 2014. BORTOLOTTO, Zulmar Hélio. História de Nova Veneza. Nova Veneza: Prefeitura Municipal, 1992. CANTON, Katia. Espaço e Lugar. São Paulo: Ed. WMF Martins Fontes, 2009. CORREIO GOURMAND. Disponível em: www.correiogourmand.com.br. Acessado em 23 de fevereiro de 2017. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva. Guaracira Lopes Louro, 10 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. OLIVEIRA, Antonio Pereira. Turismo e Desenvolvimento: Planejamento e organização. 5. Ed. Ver. E ampl. Ao Paulo: Atlas 2008. PORTAL VENEZA. Disponível em: http://www.portalveneza.com.br. Acessado em 23 de fevereiro de 2017. SITWELL, Williaam. A história da culinária em 100 receitas. Tradução Áurea AkemiArata. São Paulo: Publifolha, 2013. LARROSA, Jorge.Notas sobre a experiência e o saber da experiência. (COMO FAZERRRR)