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DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · de tudo o que nos rodeia é que vai determinar o ser humano...
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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
LEITURA – TEXTOS QUE ENCANTAM: a literatura na formação de leitores
Autora: Lucélia Dutra Vieira1
Orientador: Núbio Delanne Ferraz Mafra2
Resumo
Este artigo busca fazer uma reflexão sobre a leitura dos alunos na escola, sabendo que o público em questão, muitas vezes, lê pouco e outras, nada lê, enquanto, que as leituras impostas pela escola, algumas vezes, são taxadas de “chatas”, “cansativas”, vistas como pouco atraentes pelos alunos. Pensando nisso, desenvolveu-se um projeto de leitura, pautado na formação de leitores, com livros de literatura, buscando o prazer da leitura. E por que o prazer? Por que, numa sociedade que tem a televisão como centro de lazer e que tudo vem pronto, que não está acostumada a buscar coisas novas e muitas vezes, nem refletir sobre o que está ali na telinha, trata-se de uma contradição forçar uma leitura em que o prepondere a dimensão do prazer. Este artigo descreve o trabalho realizado num colégio estadual da cidade de Londrina, com alunos de 6º ano, onde a literatura foi usada como ponto de partida para as atividades propostas, tendo em vista a formação de um leitor mais crítico e seletivo. O projeto partiu da leitura de obras em voz alta para os alunos, reescrita de textos, a vídeos e, audição de histórias, passando pelo levantamento de histórias da família dos envolvidos e, a leituras mais longas, até chegar às histórias em quadrinhos (HQs). Tudo isto sem perder de vista, o grande objetivo de despertar nos educandos o gosto pela leitura e, assim, desenvolver neles, o prazer pela leitura.
Palavras-chave: Leitura; Literatura; Ensino-Aprendizagem.
1 Introdução
Muito se tem falado sobre leitura e a formação de leitores, e são extensas as
bibliografias que falam sobre o assunto, pois esta tem sido uma grande preocupação
dos profissionais comprometidos com a educação. Contudo, o que se vê, é que a
leitura continua sendo privilégio de poucos, e que a grande massa popular está
distante do mundo da leitura, da cultura propriamente dita, se afastando dia a dia
das literaturas por diversos motivos. Dentre eles, destaca-se, a falta de
1 Especialista em Didática e Metodologia de Ensino pela Universidade Norte do Paraná; professora de Língua Portuguesa do Colégio Estadual Prof. Dr. Heber Soares Vargas, Londrina, PR. 2 Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas; professor do Departamento de Letras Vernáculas e Clássicas, Centro de Letras e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, PR.
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conhecimento e o distanciamento do prazer que uma boa leitura pode trazer a
qualquer pessoa que possa se permitir um momento de contato com este universo
tão rico, que é o da leitura.
Acredito que a formação de leitores deva ser o papel da escola – não
exclusivamente, mas principalmente. Marisa Lajolo já dizia: “A leitura começa na
escola, mas não pode (nem costuma) encerrar-se nela”. (2006, p. 10)
Este artigo pretende fazer uma reflexão acerca do trabalho realizado,
levando em conta o aproveitamento dos alunos, o interesse, a pré-disposição para
fazer algo com relação à leitura e tentar mapear a causa do desinteresse dos
mesmos, com a leitura, além de propor uma nova maneira de fazer leitura na escola.
2 Reflexões sobre a leitura
Falar de leitura é sempre falar de algo complexo e desafiador, pois se por
um lado a leitura é parte intrínseca do ser humano, por outro, se questiona o
distanciamento que, principalmente, os alunos tem da leitura. Esse distanciamento
pode advir de vários fatores; até do medo de não compreender a história, até o
temor de não ter tempo para se ler. Pennac, afirma que: “Além do temor de não
compreender, uma outra fobia a vencer, para reconciliar esse pequeno mundo com a
leitura, é a duração”. (1993, p. 116)
Contudo, há pessoas que não sabem decifrar os códigos linguísticos e
fazem leituras magníficas da vida, das pessoas e do meio em que vivem e daí,
nasce a sabedoria que diferencia um ser humano de outro. As leituras que fazemos
de tudo o que nos rodeia é que vai determinar o ser humano que seremos no futuro,
por isso devemos aprimorar nossas leituras para sermos melhores. Segundo Ribeiro
(2007, p. 128) “ler, num sentido mais amplo, deixa de ser apenas decodificação e
ganha a complexidade de uma atividade cognitiva adquirida e desenvolvida pelo
homem”.
Hoje, temos muitos livros, vasta bibliografia, mas mesmo assim, se apregoa,
a todo canto, que as pessoas, principalmente, os alunos, não gostam de ler. E se
não gostam, por que não gostam? Uma resposta para esta questão, pode se
amparar na fala de Mafra (2003, p. 18) onde se diz: “o aluno faz seu caminho de
leitor solitário”, pois a escola, muitas vezes, não tem interferido em suas leituras.
Mas, isto pode ser mudado quando o professor fizer, segundo Mafra (2003, p. 19)
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“um trabalho de mediação crítica e dialógica” a respeito destas leituras. Aliás, este é
outro fator que tem separado os alunos do mundo da leitura, o fato da escola não
aproveitar as leituras externas dos alunos em sala de aula e ajudá-los na criticidade
dos mesmos, com isso, o objetivo dos educadores de formar um leitor fica mais
distante.
E é nesse contexto que entra o papel do professor. Martins (2006, p. 34), ao
definir qual o papel do professor ao ensinar a leitura, nos diz que “trata-se, antes, de
dialogar com o leitor sobre a leitura, isto é, sobre o sentido que ele dá, repito, a algo
escrito, um quadro, uma paisagem, a sons, imagens, coisas, ideias, situações reais
e imaginárias”.
Já Soares (2008, p. 30-31) afirma que “ler, verbo transitivo, é um processo
complexo e multifacetado: depende da natureza, do tipo, do gênero daquilo que se
lê, e depende do objetivo que se tem ao ler”. A autora esclarece que, quando se quer
desenvolver leituras, temos que tomar cuidado, pois o leitor não pode ser facetado, é
preciso que ele aprenda vários tipos de textos
Nesse último caso – no ensino -, não se trata de escolher este ou aquele complemento para o verbo, isto é, não podem a escola nem os professores optar por desenvolver habilidades de leitura de apenas um tipo ou gênero de texto: a escola deve formar o leitor da ampla variedade de textos que circulam nas sociedades grafocêntricas em que vivemos, e são diferentes processos de leitura e, portanto, diferentes modos de ensinar; é preciso desenvolver habilidades e atividades de leitura de poemas, de prosa literária, de textos informativos, de textos jornalísticos, de manuais de instrução, de textos publicitários etc etc.¨ (SOARES, 2008, p. 31)
É certo que os adolescentes não gostam de ler determinadas leituras, mas
fazem uso de outras, desenvolvendo sua capacidade de comunicação. Ribeiro
(2007, p. 152) afirma:
Diz-se também, com frequência, que o adolescente não lê! É até verdade que a maioria dos jovens não lê muito a chamada literatura de prestígio e só o faz, quando o faz, ao ser obrigado pelos professores. Entretanto, apesar de não ser habitual e espontaneamente leitor da grande literatura, o adolescente está em permanente contato com a leitura, tendo acesso, diariamente, a inúmeros gêneros de textos (uma vez que a circulação da escrita é intensa em nossa sociedade) tais como: panfletos, revistas, out doors, faixas, jornais em ônibus, cartazes em supermercados e lojas em geral, músicas (poemas) que escutam, cantam e copiam com avidez, e ainda blogs, sites, chats entre outros. No caso dos dois últimos exemplos, esse contato permanente com a escrita e a leitura on-line faz com que o adolescente, cada vez mais, torne-se capaz de se comunicar pela escrita de forma eficaz, adequando-se ás exigências do momento e do gênero.
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Por outro lado, é sabido que o fato de ser alfabetizado não quer dizer que se
é leitor. A leitura se realiza a partir do diálogo do leitor com o objeto lido e as palavras
nos tornam aptos a ler nós mesmos e o nosso meio. Essa relação pode ser
prazerosa, mas exige também suor por parte dos envolvidos. E quando se fala em
prazer da leitura, de qual prazer se está falando? Mafra (2003, p.13) questiona:
O interesse do aluno deve ser respeitado – de que interesse se fala? Do seu interesse imediato ou daquele que o projeto pedagógico deve vislumbrar a médio e longo prazo? A escola deve promover o prazer pela leitura – de que prazer se fala? Do sinônimo de pura satisfação ou daquele que problematiza, instabiliza o leitor? A leitura é somente sinônimo de prazer ou pode, muitas vezes, ser também suor, esforço?
É sabido, historicamente, que o prazer nem sempre leva ao aprendizado, é
necessário uma dose de “dor” (no caso, suor e dedicação) para se chegar
melhorado aos seus objetivos. Segundo Rangel, “ler nem sempre é agradável, seja
pelo conteúdo, seja pela forma do texto, seja pelas habilidades requeridas (atenção,
concentração, acuidade, perseverança, etc), seja pelo nosso momento pessoal”
(1990, p. 10). Contudo, se é agradável ou não, não importa; o que importa é que ela
é necessária e indispensável para o ensino-aprendizagem e que, por prazer ou pela
“dor”, os nossos educandos estão, se não afastados, pelo menos arredios ao uso da
leitura como fonte de conhecimento e de ascensão crítica a sociedade em que
vivem.
Os professores, por sua vez, tomam a responsabilidade para si, mas
impotentes diante de tantas nuances, pregam que a falta de rendimento e de
aprendizagem por parte dos alunos ocorre porque não gostam e nem têm o hábito
da leitura. Nestes termos, acabam interpretando que a leitura está em crise na
escola.
Como “em crise”, se cada vez mais se publicam livros e livros, com preços
acessíveis e se as bibliotecas estão cheias de livros e não há leitor nelas? Onde está
o problema? O problema está na visão distorcida que só é leitura quando vem dos
livros? no cômodo uso do livro didático? no mundo globalizado, com tecnologias que
encantam nossos alunos? na falta de estrutura familiar destes? ou quem sabe, na
falta de hábito de leitura dos adultos que convivem com estes alunos?
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Segundo estudos, esse quadro não é por acaso. A geração dos não leitores
não foi criada pela falta de técnica e nem pela falta de vontade de ler. Foucambert
(1994, p. 120) diz:
recorrer à escrita é momento essencial e específico de toda elaboração de um ponto de vista; é um meio de distanciamento e teorização que permite passar do conjuntural, gerado pelo oral, para o estrutural, expresso pelo texto. Todo indivíduo que pretende adquirir poder sobre o mundo é obrigado a desenvolver essa forma de pensamento e, portanto, encontrar-se com a escrita. É aí que entram em jogo a exclusão e a geração do não-leitor – não por impossibilidade técnica ou falta de interesse, de desejo de ler, mas porque grande parte dos indivíduos está excluída dessa experiência social, do estatuto do poder, das preocupações e modos de análise que geram a produção de escritos. Ser leitor é sentir-se comprometido com seu estar no mundo e com a transformação de si, dos outros, das coisas; é acreditar que se apreende o mundo quando se compreende o que o faz ser como é. Essa compreensão é inseparável da ação para transformá-lo e, graças à escrita, para teorizá-lo.
Achar as causas talvez seja, a “maquiagem” para que instale a comodidade
e não se faça nada para mudar este quadro. Mafra (2003, p. 9) diz como muita
propriedade que “entre reproduzir antigos modelos ou apresentar novas propostas,
opta-se pelo meio termo, o muro tão imobilizante para nossas ações”. E isso, a meu
ver, é a pior parte.
A pergunta que não quer calar, no confronto disso tudo, é: o que podemos
fazer para mudar a realidade da falta de “leitura” (compreensão da leitura) na
escola? Pois, segundo Rangel (1990, p. 9), “ler é uma prática básica, essencial, para
aprender” e por isso, precisamos buscar meios para que a leitura se efetive na vida
do aluno a partir de práticas significativas na escola.
E o que são práticas significativas? Para Naspolini, uma atividade é
significativa quando “propõe um desafio que a criança tem condições de enfrentar e
resolver em interação com os demais colegas e com o professor”. A mesma autora
coloca o avesso disso quando diz, na sequência: “quando apresentamos os
conhecimento em partes, ou quando pedimos que a criança copie textos cujo
conteúdo está distante delas, (…) ensinamos por meio de atividades não-
significativas” (1996, p. 12). Por isso, os educadores devem sempre repensar suas
práticas e ver se as atividades que estão desenvolvendo, estão fazendo sentido para
o aluno, sabendo que o aluno de hoje não é o mesmo do passado e por isso requer
metodologias diferenciadas.
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Pennac levanta uma questão importante quando faz um paralelo dos
adolescentes de ontem e de hoje, pois os adolescentes do passado eram apenas
filhos de seus pais e os adolescentes de hoje, são da época deles. “Enquanto que
hoje (...) os adolescentes são clientes totais de uma sociedade que os veste, os
distrai, os alimenta, os cultiva: onde florescem os mcdonald's e marcas de jeans,
entre outros” (PENNAC, 1993, p. 28). E a escola tem que estar preparada para
absorver este público, estar mais próximo dele e ajudá-lo na sua interação com este
mundo diferente que o envolve num emaranhado de relações interacionais.
Pensando nisso, buscamos a leitura, pois sendo ela uma meio de
comunicação, poderemos dialogar com nossos alunos. Para Lajolo (2006, p. 15), “ou
o texto dá sentido ao mundo, ou ele não tem sentido nenhum. E o mesmo se pode
dizer de nossas aulas”. Pennac também ressalta que “o homem constrói casas
porque está vivo, mas escreve livros porque se sabe mortal. Ele vive em grupo
porque é gregário, mas lê porque se sabe só”. (1993, p. 167)
3 O projeto na escola
Convivendo neste ambiente escolar, e percebendo uma lacuna na formação
dos educandos em relação a leitura, desenvolvi um projeto com alunos do 6º ano, do
Colégio Estadual Prof. Dr. Heber Soares Vargas, no período vespertino, para tentar
identificar os reais problemas em relação à leitura. Ao mesmo tempo, procurou-se
levar os envolvidos a ler por prazer e também produzir textos a partir dos textos lidos
ou ouvidos na classe, pois como disse Naspolini (1996, p. 189):
O professor é um mediador entre o conhecimento sociocultural presente na sociedade e o aluno. Sendo o processo ensino-aprendizagem constituído na interação, o professor está atento e aberto às dúvidas, impasses, curiosidade, formulando sínteses, discutindo significados e ultrapassando limites
As obras escolhidas foram fundamentais para que o projeto de leitura de
fato acontecesse na sala de aula, pois são de fácil entendimento para os mesmos e
dá o embasamento teórico para que o aluno possa buscar outras leituras, como
disse Bragatto Filho (1995, p.6), sobre o papel da literatura: “a meta ou função da
literatura na escola de 1º grau: despertar o gosto e o prazer de ler”. E como disse
Faria (1999, p.117):
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Começando pela literatura infantil e juvenil poderemos mostrar caminhos que aprofundem a leitura de nossos alunos e dêem condições aos professores de língua portuguesa para fazê-lo. A literatura erudita virá em seu tempo e lugar, quando houver situação favorável e leitores preparados que possam apreciá-la.
A ideia inicial era que o projeto fosse para alguns alunos dos 6º anos, em
momento diferenciado, contraturno, mas, devido à falta de espaço físico, pois o
colégio tem dualidade administrativa (período da manhã e noite é estadual e à tarde
é municipal), a direção sugeriu – e eu aceitei - que o projeto fosse realizado com
todos os alunos matriculados no 6º ano, durante as aulas de Língua Portuguesa.
Os alunos em questão vêm da comunidade a que a escola pertence e
também, alguns da zona rural, que chegam à escola em transporte escolar. O
público é de classe baixa e média renda, com famílias estruturadas com pai e mãe, e
outros, sob os cuidados de avós e até tios. A escola tem grande valor na vida dos
alunos, pois se ela não é a única, talvez seja a principal referência de organização e
limites para eles. Isto se reflete na assiduidade, pois os alunos não faltam e gostam
de estar na escola.
Primeiramente, esclareci aos alunos que seriam feitas muitas atividades de
leitura até o final do ano e que a participação deles era muito importante, pois o
trabalho fazia parte do PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional do Paraná)
e que eles eram os felizardos de poderem participar do mesmo. Foi salientado que
todas as atividades eram embasadas em autores diversos e que o foco do trabalho
era o desenvolvimento da leitura de cada um deles.
Ao questioná-los sobre o que é leitura, a maioria deu a resposta que é ler
livros, revistas, gibis etc. Não tinham pensado até aquele momento que se lê
também o comportamento das pessoas, imagens, filmes etc., e como Paulo Freire já
dizia: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura
desta não possa prescindir da continuidade da leitura daquele. Linguagem e
realidade se prendem dinamicamente” (2001, p. 11), no que Naspolini (1996, p. 35)
complementa:
Ler não significa somente compreender o que está escrito com letras. Significa também compreender algo sem palavras, que se observa e interpreta, a arquitetura de um prédio, uma obra de arte, uma dança, por exemplo.
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Iniciei o projeto na escola perguntando se alguém da sua família contava
histórias para eles. Dos vinte e dois alunos presentes, apenas dois disseram que
quando eram menores a mãe contava. Perguntei se a mãe ou os avós contavam
histórias do passado; apenas quatro alunos responderam afirmativamente. Quando
indagados se gostavam de ouvir histórias, os olhos brilharam antes de responder
afirmativamente. Aproveitando, disse que iria contar uma história para eles. Se
interessaram e quando falei o título “A Formiguinha e a Neve” e mostrei a capa do
livro, gostaram e quatro alunos disseram que já conheciam a história; penso que
dois deles falaram isso só para chatear.
Comecei a ler a história na frente, em pé, pois como disse Pennac (1993,
p.166), “o homem que lê de viva voz se expõe totalmente aos olhos que o escutam”.
E mostrava as imagens,para que pudessem se interessar pela história. Mesmo
assim, três alunos conversavam sem prestar atenção. Continuei a ler e vi que todos
prestavam atenção se deliciando com a leitura; todos atentos e quietos. No final,
retomei com eles, a história oralmente, falei dos ensinamentos que o livro traz para a
nossa vida, e que muitas vezes nós também deixamos de fazer a nossa parte por
achar que os nossos compromissos são mais importantes do que ser solidários com
os que nos rodeiam. Pela expressão facial dos alunos, este momento foi muito
especial para eles, o que nos faz lembrar de uma fala de Lajolo (1993, p. 59),
quando ela fala da leitura:
Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido de um texto. É, a partir de um texto, ser capaz de atribuir-lhe significação, conseguir relacioná-lo a todos os outros textos significativos para cada um, reconhecer nele o tipo de leitura que seu autor pretendia e, dono da própria vontade, entregar-se a esta leitura, ou rebelar-se contra ela, propondo outra não prevista.
Continuando a atividade, esquematizei, junto com eles, a sequência de fatos
na lousa, a quem a formiguinha solicitou ajuda, a saber:
1º - ao sol; 5º - ao cão;
2º - ao muro; 6º - ao homem;
3º - ao rato; 7º - a morte;
4º - ao gato; 8º - a Deus.
A leitura desta obra sempre encanta os alunos do sexto ano e eles gostam
muito de trabalhar com ele. Após a leitura, solicitei que reescrevessem a história no
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caderno, não para serem avaliados, mas sim, para que eternizassem aquele
momento, o contato com aquela literatura e pudessem desfrutar da magia que a
mesma traz no seu bojo. Naspolini (1996, p. 8-9) nos diz que “o ato de ler só se
completa quando o aluno, tendo se apropriado do conteúdo do texto lido, o transfere
ao escrito”.
Num primeiro momento, três alunos pediram para ir ao banheiro e não
deixei. Depois outros três queriam ir a supervisão, não deixei. Voltaram aos seus
lugares e começaram a escrever, e só se via alunos arrancando as folhas do
caderno e durante a aula cinco alunos pediram para reler o livro, tamanha a
dificuldade na reescrita do texto, mas não deixei. Aos poucos se acalmaram e
começaram a fazer a atividade, vindo de quando em vez, perguntar alguma parte da
história. Os alunos foram terminando a atividade e passei nas carteiras lendo e
dando visto nos cadernos. Todos que li dei “muito bem” embora alguns alunos
tenham erros ortográficos gritantes, não usam pontuação e alguns, não conseguem
nem se lembrar da ordem dos acontecimentos; outros lembram a cronologia dos
fatos, mas não se lembram dos fatos; contudo, gostam de ser elogiados e por isso
não corrigi os erros identificados, para ganhar a confiança dos alunos e,
posteriormente, ajudá-los nas próximas atividades que serão solicitadas, pois, como
disse Naspolini (1996, p. 188) ao falar do aprendizado das crianças, “as crianças não
aprendem da mesma maneira nem ao mesmo tempo” e como disse Guedes (2006,
p. 53) sobre a relação aluno X escola, “a histórica apropriação privada da língua-
padrão já se encarregou de fazer o aluno sentir-se um ser desqualificado para
pensar, dizer e escrever qualquer coisa que não seja o que a escola lhe apresentou
como o que se deve pensar e dizer”. O mesmo autor complementa, na mesma
página, que “o professor de português tem de tomar essa desqualificação como
ponto de partida para o seu trabalho de construção de leitores e escritores” .
Dando continuidade a esta atividade, solicitei que transformassem o texto do
livro “A Formiguinha e a Neve” feito em prosa, em versos. Expliquei que fazer poesia
é brincar com poesia, pois como disse o poeta José Paulo Paes em seu poema
“Convite”:
Poesia é brincar com palavras como se brinca com bola, papagaio, pião.
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Só que bola, papagaio, pião de tanto brincar se gastam. As palavras não: quanto mais se brinca com elas mais novas ficam. Como a água do rio que é água sempre nova. Como cada dia que é sempre um novo dia. Vamos brincar de poesia?
Após passar a poesia na lousa e eles copiarem, convidei toda a classe para
brincarmos com as palavras e fazer uma poesia do livro lido. Escrevi novamente a
sequência da história na lousa para facilitar. Tiveram dificuldade e pediram para eu
fazer o começo, pois não sabiam começar. Disse que podíamos fazer juntos e
juntando uma fala aqui e outra ali, saiu a seguinte estrofe:
A formiguinha para o trabalho vai toda sorridente e alegre vai, um floco de neve cai e ela não consegue andar mais.
Com esse início, ficaram estimulados e apesar das dificuldades, fizeram a
atividade com bastante envolvimento, alguns escreveram com bastante harmonia e
outros nem tanto. Segue uma produção da aluna do sexto ano:
A Formiguinha e a Neve Um floco de neve caiu no pé de uma pobre formiga, que foi pedir ajuda ao sol, que não colaborou. Então ela pediu ajuda ao muro que infelizmente não ajudou. O rato todo com pressa passou, e não ficou. O frio só aumentava e a formiguinha foi e pediu ao gato, mas ele todo manhoso só miava e bocejava.
O cachorro também saiu correndo porque uma raposa o perseguia, então não deu atenção a formiga que pedia. Já o homem colocou a culpa na morte pois ela era muito mais forte. A morte toda sombria explicou a formiga que Deus a via. Então a formiga pediu a Deus,
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e suas preces foram atendidas porque ela foi para o lugar que queria.
(Aluna Giovana B. Borghesi)
Após a reescrita da obra em forma de poesia, os alunos compartilharam com
seus colegas seus textos. Esta atividade foi interessante pois todos queriam ler,
mostrar seu trabalho. Em seguida, fizemos um texto coletivo na lousa, com a ajuda
de todos os alunos, para que aqueles que encontraram dificuldade pudessem se
sentir co-produtores de um texto. Minha participação foi mínima, apenas transcrevi
as sugestões dos alunos e coordenei as falas, garantindo que todos pudessem dar
sua parcela na construção deste texto. O mesmo é transcrito agora.
A Formiguinha e a Neve A formiguinha para o trabalho sai toda sorridente e alegre vai, um floco de neve cai e ela não consegue andar mais. Voltando-se para o sol pede uma ajuda e ele recusa pois, mais forte que ele é o muro, cheio de furo.
Pedindo ao muro, ao rato, ao amigo gato, ao cachorro, ao homem sem nome e a morte com muita sorte, mas ninguém a atende e ela não se ofende. Pede a Deus então, que lhe estende a mão. e a salva do frio e a leva para um campo cheio de flores e amores.
A atividade foi encerrada com a exposição dos textos nas paredes da sala.
E a avaliação que faço é que os objetivos foram alcançados com a turma, houve
grande envolvimento e isso trouxe aprendizado no final. Por esse motivo, repeti a
atividade no ano seguinte, e os alunos levaram os textos de reescrita em versos
para casa, como tarefa. Qual não foi minha surpresa quando o diretor da escola e
pai de uma aluna da sala, veio ao meu encontro para ler o seu texto, a poesia que
fez da obra “A Formiguinha e a Neve”.
Dando continuidade às atividades do projeto, li para os alunos a obra: “Os
5 Tiros de Canhão do Abilolado Capitâo” mostrando as imagens do livro. Não houve
resistência dos alunos desta vez. Quando iniciei a leitura, todos ficaram quietos e
prestaram atenção e gostaram da história. Esse fato se encaixa em outra fala de
Pennac (1993, p. 91): “O homem que lê em voz alta nos eleva à altura do livro. Ele
se dá, verdadeiramente, a ler”.
Em seguida, coloquei o CD para que ouvissem a mesma história sem ter
alguém presente contando para eles e a reação foi muita estranha. Logo que
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coloquei o CD, apesar de ser musicado, os alunos começaram a se mexer, a
conversar baixo com os colegas ao lado e ao serem chamados a atenção para ouvir
a história, se debruçaram na carteira, mostrando grande desinteresse pela atividade;
e alguns mais afoitos disseram que aquilo era muito chato. Mas como disse Pennac
(1993, p. 78) sobre a escola: “A escola não pode ser uma escola do prazer, o qual
pressupõe uma boa dose de gratuidade: ela é uma fábrica necessária de saber que
requer esforço”.
Quando solicitei que reescrevessem a história com suas palavras,
começaram os problemas. Diziam que não sabiam e que não iam fazer. Para
incentivá-los, escrevi na lousa, com a ajuda deles, o nome dos personagens e as
ideias principais, a saber: menino = Moleque; menina = Sozinha; homem = Capitão;
gato = Sebastião; ilha = Cafundó. Sequência da história:
1º - o menino estava no cais;
2º - o Capitão convidou o menino para fazer parte da tripulação;
3º - aconteceu um furacão;
4º - chegaram a ilha;
5º - o gato apareceu com os tesouros;
6º - o homem e gato foram embora e a menina mudou de nome.
Com essa ajuda, o texto ficou praticamente pronto, mesmo assim, alguns
alunos continuavam dizendo que não sabiam fazer e não fizeram. Penso que isso
aconteceu pela dificuldade de escrever algo, mas também, pelo desinteresse que a
audição do áudio causou neles. Concluo que ao trazer o áudio, mais uma
ferramenta, para encantar os alunos, teve efeito inverso e isso desestimulou-os.,
mas como disse Pereira (2007, p.14) sobre os problemas que encontramos no dia-a-
dia: “Problemas são normais e desejáveis, são o resultado natural da mudança. O
único lugar no ciclo de vida em que não há nenhum problema é o lugar em que não
há nenhuma mudança, que é a morte”.
Esperando maior sucesso na nova empreitada, solicitei que trouxessem para
a sala um livro que já leram e que gostaram para socializar com os colegas, mesmo
sabendo que a leitura não foi feita para ser comentada, pois, como disse Pennac
(1993, p. 131), “resta compreender que os livros não foram escritos para que meu
filho, minha filha, os jovens os comentem, mas para que, se o coração lhes mandar,
eles os leiam”.
No dia marcado, a maioria dos alunos trouxeram seus livros e foram a frente
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dos colegas contar um pouco do livro para a classe. A aula foi muito produtiva, os
alunos colaboraram, prestaram atenção e gostaram muito. Escrevi os títulos na
lousa, para que pudessem lê-los posteriormente na biblioteca e realmente, os alunos
procuraram lê-los nos dias subsequentes. Soares (2008) comenta que, quando
queremos desenvolver práticas sociais de leitura, o seu ensino, temos que tomar
cuidado, pois o leitor não pode ser facetado; é preciso que ele aprenda a ler vários
tipos de textos.
Nesse último caso – no ensino -, não se trata de escolher este ou aquele complemento para o verbo, isto é, não podem a escola nem os professores optar por desenvolver habilidades de leitura de apenas um determinado tipo ou gênero de texto: a escola deve formar o leitor da ampla variedade de textos que circulam nas sociedades grafocêntricas em que vivemos, e são diferentes processos de leitura e, portanto, diferentes modos de ensinar; é preciso desenvolver habilidades e atitudes de leitura de poemas, de prosa literária, de textos informativos, de textos jornalísticos, de manuais de instrução, de textos publicitários etc etc. (SOARES, 2008, p.31)
Neste contexto, iniciei o trabalho com folclore, que está presente na vida de
cada um de nós e que encanta por sua magia. Defini o que era folclore e solicitei
que trouxessem, na próxima aula, mitos e lendas que seus pais e avós conhecem.
Faríamos um resgate das histórias familiares. Bragatto Filho (1995, p. 66) nos diz:
Promover em sala de aula, pesquisas dos produtos dessas fontes, isto é, coletar, quer em sala, quer fora dela, junto a familiares, vizinhos, amigos, descendentes de imigrantes, em colônia de pescadores, etc... anedotas, lendas, crendices, causos, provérbios ... e contá-los em classe. E ainda mais do que isso: pesquisá-los também em livros, recriá-los oralmente e em registro formal escrito, em suma, produzir textos orais e escritos, a partir desses elementos da cultura popular
Os alunos trouxeram várias histórias e todos queriam ler para os colegas.
Houve muita interação e algumas vezes tive que interferir pois, apesar do interesse,
os alunos (principalmente, os de sexto ano) não são educados para ouvir o outro até
que concluam o que estão falando. As histórias despertou a curiosidade dos alunos
e isso foi produtivo para o ensino-aprendizagem, pois, como disse Naspolini (1996,
p. 189), “a aprendizagem escolar não começa no vazio”.
Entre tantas, socializo aqui o relato de uma delas, contada pela mãe do
aluno Matheus Schimidt:
– Minha mãe contou, que quando era ainda bebê morava com minha tia. A
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casa dela era feita de bambu e numa noite apareceu um lobisomem. Atacou a casa e conseguiu tocar na cabeça de minha mãe que tinha um ano e meio. Minha tia viu e jogou sal no lobisomem que foi embora.
Trouxeram várias histórias como esta e o mais incrível que eles acreditam
que aconteceu de verdade, não adiantando afirmar que isso é lenda e que
lobisomem não existe. Este material seria digitado pelos alunos na sala de
informática para depois ser colocados num mural na escola, pois como disse
Coscarelli (2007, p. 27) sobre a informática: “a informática precisa entrar na escola
porque ela pode ser um recurso que pode ajudar a minimizar a exclusão de muitos
sujeitos já excluídos em muitas outras situações”. E Pereira (2007, p. 18)
complementa esta ideia, dizendo:
O problema central que uma Sociedade da Informação deve vencer, em primeira instância, é o da exclusão digital, discutido globalmente pela primeira vez em meados da década de 1980. A exclusão digital é uma exclusão de segunda ordem que soma-se a e agrava a exclusão econômica e social.
No entanto, dos vinte computadores existentes, apenas seis estavam
funcionando o que inviabilizou a digitação. Digitar seria o ideal, mas como nem
sempre temos o ideal, pedimos para passarem os textos a limpo e fizemos a
exposição com textos manuscritos mesmos, o que não é ruim para o sexto ano; e
nessa ideia se encaixa a fala de Zumpano (2007, p. 99):
O texto escrito, seja qual for o suporte, é sempre virtual; o leitor atualiza o texto. Quando se abre um livro ou se acende a tela do computador, um texto pode ser atualizado por meio da leitura e interpretação. Quando lemos ou ouvimos um texto estamos atualizando-o. A essa capacidade de atualizar o virtual e de virtualizar o atual podemos chamar letramento.
Para a próxima aula, trouxeram as parlendas, os trava-línguas, as
adivinhações e as frases de caminhão que eles e seus familiares conheciam. Com o
apoio da direção e da equipe pedagógica, tiramos os alunos das três salas do sexto
ano e colocamos no pátio com suas devidas carteiras. Entregamos papel craft,
tesouras e canetinhas e desenharam e recortaram vestidos, camisas, blusas, calças
e escreveram tudo o que recolheram sobre o folclore neles. Se entusiasmaram e
enfeitaram as roupas e depois colaram num cordão. Amarramos o cordão entre as
árvores e os alunos passavam lendo o material exposto. Foi uma tarde muito
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diferente e divertida. Os alunos se organizaram, cooperaram um com o outro, se
respeitaram, escreveram e leram a tarde toda e isto foi muito bom para o
relacionamento de todos; e como disse Pennac (1993) sobre a leitura:
Ele é, desde o começo, o bom leitor que continuará a ser se os adultos que o circundam alimentarem seu entusiasmo em lugar de pôr à prova sua competência, estimularem seu desejo de aprender, antes de lhe impor o dever de recitar, acompanharem seus esforços, sem se contentar de esperar na virada, consentirem em perder noites, em lugar de procurar ganhar tempo, fizerem vibrar o presente, sem brandir a ameça do futuro, se recusarem a transformar em obrigação aquilo que era prazer, entretendo esse prazer até que ele se faça um dever na gratuidade de toda aprendizagem cultural, e fazendo com que encontrem eles mesmos o prazer nessa gratuidade. (PENNAC, 1993, p. 55)
No dia seguinte, queriam continuar a atividade, pois disseram que estava
muito bom. É necessário salientar, que nesta atividade, foi necessário a ajuda de
todos os profissionais da escola: diretor, supervisão, outros colegas professores,
agente de apoio e até a bibliotecária.
Depois de tudo isto, trabalhei com eles duas versões do lobisomem e para
encerrar, fizemos uma tarde diferente. O diretor montou uma sala com data show e
passamos o filme “A saga crepúsculo: lua nova” para os alunos, com direito a pipoca
e eles eles gostaram muito.
Após ter trabalhado com o folclore, introduzi textos de imagem, com o livro
“O amigo da Bruxinha” , de Eva Furnari, embasado no que comenta Bragatto Filho
(1995, p. 56) falando do código visual, presente na literatura infantil, chamado
também de texto não-verbal e tecnicamente chamado de “texto icônico” pelo mesmo
autor na página 55, que nos fala sobre os desenhos: “Configura-se também como
um código, que comunica, insinua e propõe idéias e sentimentos, podendo e
devendo, em conseqüência, ser lido junto com o texto escrito ou até em separado”.
Produziram um texto a partir de uma imagem da obra, sem título. Os alunos,
a princípio se motivaram com a atividade por causa dos desenhos e acharam fácil e
prazerosa. No final, alguns socializaram suas histórias com a classe, lendo na frente
ou sentados em seus lugares. Quando solicitei que escrevessem a mesma história,
só que com o título original “O Chapéu”, alguns não queriam fazer pois, diziam que a
história sairia igual, outros achavam estranho mais fizeram e outros mais, se
recusaram a fazer pois, não queriam usar a mesma imagem. Diziam que sairia igual
e não perderiam tempo escrevendo a história duas vezes. Mesmo argumentando
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com eles que a história não seria necessariamente igual, eles não se convenceram e
se recusaram a fazer. Os outros alunos que concluíram a atividade, fizeram textos
bons, como o da aluna Maria Andrieli Prado Madeira, a saber:
Texto 1 - Alarme Falso Era uma vez, uma bruxa chamada Astrogilda, ela e seu gato Sansão adoravam dormir. Em um dia, os dois estavam dormindo em uma rede, bem a vontade, bem tranquilo, eles viravam para lá, viravam para cá, todos os dois desmaiados. De tanto Sansão virar de um lado para o outro, o chapéu que ele estava usando, caiu. De repente, eles escutaram um barulho, acordaram e viram que o chapéu estava se mexendo. Os dois estavam morrendo de medo, pois não era normal chapéu se mexer sozinho. Ele estava pulando de um lado para o outro, até que aparou e dele saiu um sapo. Astrogilda disse ao gato: Ufaaa! Era apenas um sapo! E os dois voltaram a dormi tranquilos.
Texto 2 - O Chapéu Maléfica e Gemário compraram uma rede no mercadinho da Dulce, instalaram e caíram no sono. Gemário estava usando um chapéu que foi dado pela sua amiga inseparável: Maléfica. Eles estavam tão adormecidos que o chapéu que Gemário estava usando caiu no chão. Maléfica estava dormindo, mas não estava com um sono tão pesado quanto de Gemário. Ela ouviu um ruído e viu que era o chapéu que tinha caído da cabeça dele. Viu que o chapéu estava se mexendo. Então Gemário acordou e os dois ficaram morrendo de medo. O chapéu de repente virou sapo e foi aí que Maléfica lembrou que havia transformado um sapo em chapéu para dar de presente ao gato. Tanto tempo se passou, que o encanto se quebrou e o chapéu havia voltado a ser sapo.
Portanto, concluo que esta atividade surtiu efeito, mas com restrições,
porque tendo em vista a dificuldade de alguns alunos, não consegui que todos
produzissem os dois textos, mas pelo menos escreveram um deles., mas como nos
disse Naspolini (1996, p. 12) sobre a diferença de alunos na sala:
Alguns conseguem realizar o processo rapidamente e são tidos como bons alunos; outros, mais vagarosamente: são chamados recuperáveis ou repetentes potenciais (são alunos que não se apropriam do conteúdo mínimo da série e, assim, não podem compartilhar com sucesso os programas da série seguinte). Uma terceira parcela não consegue fazer a síntese: são os repetentes reais, os multirepetentes, os excluídos da escola. Todavia, é possível, que estes aprendam, quando conseguirem costurar os retalhos e unificar os recortes à própria custa, mesmo fora da escola.
Para incentivar a leitura, iniciei a leitura da obra “O Menino do Dedo Verde”,
de Maurice Druon, que é composto de vinte capítulos. No primeiro dia, li apenas
cinco capítulos. Ficaram todos quietos, prestando atenção e ¨degustando¨ aquela
leitura, até que bateu o sinal e interrompi a mesma, o que desagradou os alunos e
não queriam que eu parasse e nem trocasse de sala; o que era impossível. Na
próxima aula, foi com alegria que fui recebida por uma aluna dizendo que já estava
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lendo o livro em casa. Retomei o que tinha sido lido na aula anterior, oralmente, e
depois li do capítulo seis ao nove para eles. Como já estão familiarizados com a
leitura em voz alta, prestaram atenção e aproveitaram a leitura, pois como disse
Pennac (1993, p. 124); “ler em voz alta não é suficiente, é preciso contar também,
oferecer nossos tesouros, desembrulhá-los na praia ignorante. Escutem, escutem e
vejam como é bom ouvir uma história”. Fiz mais três encontros de leitura com este
livro e em todos eles, os alunos foram muito receptivos. Vários alunos leram a obra
extraclasse e a atividade cumpriu seu objetivos, que era despertar o gosto da leitura
por prazer.
Para descobrir que leituras os alunos apreciam realizei uma pesquisa com
vinte e oito alunos da quinta série. O resultado ficou assim:
01) Qual sua idade?
02) Quantos irmãos você tem?
03) Seus pais são alfabetizados?
14%
75%
7% 4%
10 Anos
11 Anos
12 Anos
13 Anos
14%
32%36%
7%
7% 4%Nenhum
1 irmão
2 irmãos
3 irmãos
4 irmãos
5 irmãos
18
04) Sua família assina alguma revista ou jornal?
05) Tem computador em casa? Tem internet?
06) Quantas horas, em média, você assiste televisão, por dia?
07) Quantas horas você brinca por dia?
100%
0%
Sim
Não
27%
73%
Sim
Não
61%
3%
36%
Sim com internet
Sim sem internet
Não
25%
4%
21%
50%
1 hora
2 horas
3 horas
Mais de 4 horas
19
08) Já reprovou algum ano? Quantos anos?
09) Qual sua disciplina preferida?
10) Gosta de estudar?
11) Gosta desta escola?
36%
7%7%
46%
4%
1 hora
2 horas
3 horas
Mais de 4 horas
Não brinca
89%
11%
Nenhum
1 ano
14%
11%
7%
18%
50%
Português
Matemática
Educação Física
Ciências
Outras
57%18%
25%
Sim
Não
Mais ou menos
20
12) Gosta de ler?
13) Já leu quantos livros neste ano?
14) Que tipo de leitura prefere?
Na questão de número 15 da pesquisa, os alunos deveriam relacionar os
79%
7%
14% Sim
Não
Mais ou menos
61%25%
14% Sim
Não
Mais ou menos
25%
18%
7%7%
43%
Nenhum
1 livro
2 livros
3 livros
Mais de 5 livros
14%
36%43%
7%
Nenhuma
Gibi
Poesia
Ação
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livros que já teriam lido e que gostaram. Foram várias sugestões e, com os títulos,
montei uma sacola na biblioteca com as sugestões dos alunos e mais alguns que
observei na minha experiência como professora e levei para sala de aula, para um
dia de leitura, sem fichamento, sem escrita, apenas o prazer de poder manusear e
ler aquelas obras ou parte delas.
Os alunos receberam com alegria a proposta. Coloquei os títulos expostos
na lousa e pedi que escolhessem. Fizeram um pouco de tumulto no começo, mas
depois se acalmaram e leram, tanto individualmente com em duplas. Pennac (1993,
p. 145) nos diz que
O dever de educar consiste, no fundo, no ensinar as crianças a ler, iniciando-as na literatura, fornecendo-lhes meios de julgar livremente se elas sentem ou não a ¨ necessidade de livros ¨ . Porque, se podemos admitir que um indivíduo rejeite a leitura, é intolerável que ele seja rejeitado por ela.
Foi muito prazeroso e lamentaram quando a aula acabou e queriam levar o
livro para casa. Informei que os mesmos estariam na biblioteca e poderiam
emprestá-lo posteriormente.
Para encerrar o projeto trouxe para a sala de aula uma caixa contendo
histórias em quadrinhos (HQs) e, como os alunos gostam desta literatura, fizeram
um grande alvoroço, cada um procurava o personagem que estava familiarizado.
Trocaram, riram e pediam para levar para casa. Pouco antes do término, da aula,
recolhi e disse a eles que no final das aulas poderiam levar para casa para ler para
os irmãos e pais e que os mesmos, estariam expostos no pátio da escola.
No final das aulas, coloquei todos as HQs expostos no pátio e um pouco
antes do término das aulas, com ajuda da equipe pedagógica, os alunos saíam em
fila e escolhiam um exemplar para levar para casa. Gostaram muito e como a escola
tem três turmas, só consegui emprestar para duas turmas. Os outros acharam ruim e
prometi que levariam durante a semana. E assim foi feito. Conforme os alunos foram
trazendo os exemplares, fui emprestando aos outros alunos e que inclusive, não
precisaram mais devolver. Poderiam ficar com os HQs. Gostaram muito e, o mais
interessante disso, é que, após terem lido, traziam para a escola para trocar com os
colegas, para lerem uns dos outros. Essa atividade surtiu muito efeito e leram por
vários dias, por prazer.
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4 Conclusão
Analisando todas as atividades realizadas durante o projeto de intervenção
na escola, chego à conclusão de que o trabalho com leitura é muito gratificante,
tanto para o professor como para os alunos.
Em salas de aula onde a diversidade é grande, acredito que a leitura seja o
caminho para formar cidadãos mais cultos, críticos, sensíveis e preparados para
enfrentar a vida, porque nada adianta uma escola para todos, quando uma parcela
desse “todos” continuar à margem. Buscar meios para que o ensino e aprendizagem
seja efetiva para todos, inclusive e principalmente, para os alunos das escolas
públicas é o que toda a comunidade escolar deve buscar.
O trabalho realizado com os alunos atingiu seus objetivos pois aproximou
os alunos dos livros, da biblioteca e despertou neles o interesse pela leitura. Foi com
grande alegria que, ao buscar os resultados deste trabalho junto á bibliotecária da
escola, soube que os sextos anos eram os que mais iam na biblioteca e que, mesmo
depois de serem promovidos para o sétimo ano, eles continuam sendo os alunos
mais assíduos e os que mais leem na nossa escola. É claro que este trabalho, tem
que ser contínuo e não pode se restringir a um projeto; contudo, é um começo e
como tal deve ser valorizado.
É certo que vivemos na era da comunicação, que os jovens têem muitas
facilidades e que isso pode afastá-los dos livros. Mas, é certo também, que com um
bom direcionamento desses jovens, mostrando o mundo oculto e desconhecido dos
livros a eles, é possível se não formar leitores, pelo menos, trazê-los para mais perto
do universo da leitura.
Outro fator importante é o profissional que está em permanente contato com
esses jovens; ele precisa ser um leitor, não tem como incentivar leitura, se o próprio
educador não lê. Garcia (1992, p. 76) nos diz:
A argumentação que justifica o sumiço da leitura na escola precisa ser revista e invertida. Estar espremido entre jornadas longas e estafantes, sem tempo para ler e estudar, com baixos salários e sem poder comprar livros ... esses argumentos ratificam e justificam a queda do nível profissional do educador. É preciso inverter a argumentação: ler, sempre que possível e mesmo quando parecer impossível, estudar, aperfeiçoar-se, para poder mais e melhor discutir condições de trabalho e de salário. Esse é o primeiro passo em busca do espaço de leitura na escola: criar uma mentalidade profissional que aceite e tenha a leitura como condição de sobrevivência.
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A condição para se melhorar a leitura na escola passa pelos professores e
pela sua atitude frente a leitura. Se queremos formar leitores, críticos e capazes de
transformar a sociedade em que vivemos, temos que primeiro mudar a realidade dos
profissionais da educação. Para ratificar essa idéia e finalizar este artigo, uso outro
pensamento de Garcia (1992, p. 77) em que ele argumenta:
O coletivo não pode ir bem se os indivíduos não estão bem. Se não existe o especo da leitura em cada educador, como ele poderá existir no coletivo da escola? Por isso a biblioteca escolar/sala de leitura só poderá acontecer se, anteriormente, o educador descobrir a leitura. Caso contrário, a sala, o acervo, o bibliotecário/professor responsável não terão serventia. Por outro lado, é bom lembrar que um programa de leitura a ser desenvolvido na escola não é apenas resultado da soma de indivíduos interessados. Um programa de leitura na escola, que pretenda ir além dos minguados trechos de textos que aparecem nos livros didáticos, deve considerar: - objetivos da leitura (ler para quê); - um acervo (o quer ler); - uma prática pedagógica (como ler); - uma infra-estrutura (recursos materiais e humanos).
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