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Planejamento e orçamento no setor público brasileiro 2 PROGRAMA DE GESTÃO GOVERNAMENTAL Curso Planejamento e Orçamento no Município CAPÍTULO

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O conteúdo deste capítulo foi produzido especialmente para o curso Planejamento e Orçamento no Município, integrante do Programa de Gestão Governamental. Não pode ser reproduzido e/ou utilizado sem a autorização da Secretaria de Estado da Gestão Pública (SGP), Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), Fundação Prefeito Faria Lima - Centro de Estudos e Pesquisa de Administração Municipal (Cepam) e Tribunal de Contas do Estado (TCE).

O texto deste capítulo foi atualizado em 15 de junho de 2009 pelo autor, José Carlos Polo, economista e consultor em finanças públicas.

A padronização de normas e estilos definida para os textos deste capítulo não abrangeu trechos de documentos e legislações, que aparecem reproduzidos com sua formatação original.

InIcIatIva

Tribunal de Contas do Estado de São Paulo www.tce.sp.gov.br

Governo do Estado de São Paulo www.sp.gov.br

Secretaria de Gestão Pública www.gestaopublica.sp.gov.br

aPoIo

Secretaria da Educaçãowww.educacao.sp.gov.br

Secretaria de Economia e Planejamentowww.planejamento.sp.gov.br

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)www.iadb.org

Programa de Modernização do Sistema de Controle Externo dos Estados, Distrito Federal e Municípios Brasileiros (Promoex)http://promoex.irbcontas.org.br/promoex

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestãohttp://www.planejamento.gov.br

coordenação

Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap)http://www.fundap.sp.gov.br

aPoIo técnIco

Escola de Contas Públicas do TCE-SPhttp://www2.tce.sp.gov.br/ecp

Fundação Carlos Alberto Vanzolinihttp://www.vanzolini.org.br

Fundação Prefeito Faria Lima - Centro de Estudos e Pesquisa de Administração Municipal (Cepam)http://www.cepam.sp.gov.br

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aPresentação

Este documento é um material de apoio elaborado especialmente para o Programa de Gestão Gover-namental (PGG), no âmbito do curso Planejamento e Orçamento no Município. Os conteúdos foram produzidos sob a orientação da Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap), sistemati-zados pelo especialista José Carlos Polo e validados por técnicos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP). Neste contexto, o material tem por finalidades referenciar o planejamento das atividades do curso e possibilitar aos participantes a organização de seus estudos e o aprofundamento dos temas abordados.

Os textos são destinados aos técnicos, gestores e contadores municipais que participam do PGG. A publi-cação está estruturada em capítulos e disponibilizada em arquivos no formato pdf. Cada um de seus nove capítulos apresenta um índice com a relação dos conteúdos correspondentes, o que permite ao leitor localizar facilmente os temas abordados na publicação.

Mais informações sobre o curso podem ser encontradas no site http://pgg.fundap.sp.gov.br/.

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1. IntrodUção [P. 5]

2. asPectos geraIs do orçamento [P. 7]2.1. complexidade do orçamento e suas razões [P. 7]

2.2. o orçamento por programa [P. 7]

2.3. crescimento da administração indireta [P. 8]

2.4. Reflexos da Constituição de 1988 [P. 10]

2.5. Unidade do orçamento [P. 12]

2.6. vinculações e fundos especiais [P. 13]

2.7. orçamento das empresas estatais [P. 14]

3. o sIstema de PlaneJamento [P. 15]3.1. conceito de planejamento [P. 15]

3.2. níveis de planejamento [P. 16]

3.3. etapas do planejamento [P. 17]

4. PlaneJamento do setor PÚBlIco [P. 18]4.1. o processo de planejamento na nova constituição [P. 18]

4.2. Participação do Poder legislativo [P. 21]

sUmárIo

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A Constituição de 1988 promoveu profundas alterações no sistema de planejamento e orçamento brasileiro. Pode-se ter uma ideia inicial da importância dedicada a essa matéria na Assembleia Constituinte, pela inovação que representou, a dedicação

de um capítulo exclusivo às finanças públicas, o Capítulo II do Título VI, denominado Da Tributação e do Orçamento.

O grande objetivo dos constituintes foi o de transformar o orçamento num verdadeiro instru-mento de planejamento da administração pública nas três esferas de governo.

Definiram eles como princípios norteadores das normas constitucionais constantes do citado capítulo:

• a modernização dos instrumentos orçamentários, objetivando, especialmente, integrar as atividades de planejamento com as de orçamento, ou seja, as visões de longo e médio com a de curto prazo;

• a recuperação, de modo ordenado, da participação do Poder Legislativo no processo decisório.

A reforma constitucional, com o objetivo de atender a esses princípios gerais, promoveu mu-danças importantes nas regras que faziam parte da Constituição de 1967 e introduziu, na nova Carta, um grande número de dispositivos sobre matéria orçamentária.

Essas alterações foram tão profundas ou mais do que as realizadas no âmbito do Sistema Tributário Nacional. Todavia, os efeitos da "reforma do planejamento e do orçamento", pas-sados 20 anos da promulgação da Constituição, não produziram integralmente os efeitos esperados.

É importante identificar os motivos que vêm frustrando a aplicação plena dos princípios pre-conizados na nova Carta e, com base nisso, dedicar esforços no sentido de evitar que sejam anulados os avanços já alcançados com a nova estrutura de planejamento e orçamento.

Alguns aspectos, interligados entre si, são fatores preponderantes para as dificuldades de implementação das atuais normas, a despeito da excelente contribuição vinda com a edição da Lei de Responsabilidade Fiscal, em maio de 2000. São eles:

IntrodUção

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• a falta de regulamentação a ser estabelecida por lei complementar federal1;

• a pequena divulgação dos princípios norteadores e do significado dos novos instrumen-tos criados;

• a insuficiente assimilação pelos técnicos dos órgãos públicos incumbidos de elaborar os novos instrumentos;

• a inadequada organização dos poderes Legislativo e Executivo para desempenharem eficientemente suas funções no processo.

A análise oferecida neste trabalho dará ênfase ao fato de que as normas orçamentárias – constitucionais e regulamentares – se aplicam não apenas à União, mas também aos 26 estados, ao Distrito Federal e aos cerca de 5.600 municípios.

Considerando que a simplificação dos processos de elaboração e execução orçamentária constitui-se num dos fatores fundamentais para a viabilização dos princípios preconizados pela Constituição de 1988, a primeira parte deste trabalho irá se concentrar em diversos aspectos do sistema, abordando algumas questões interessantes, não só as atuais, mas tam-bém as que antecederam a vigência das novas regras do processo orçamentário no Brasil.

1 A regulamentação do sistema de planejamento e orçamento é exigência ainda não cumprida pelo Congresso Nacional, conforme dispõe o § 9º do art. 165 da Constituição.

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2.1. complexidade do orçamento e suas razões

O orçamento público é frequentemente encarado como um instrumento de difícil compreensão, a ponto de ser considerado, muitas vezes, como uma “caixa preta”, de entendimento restrito aos especialistas da área.

Abstraindo o aspecto da importância do orçamento como instrumento de uma das etapas do sistema de planejamento, uma avaliação superficial nos leva a considerar que, em princípio, não deveria representar tarefa das mais complexas a análise de um documento que simplesmente apresenta receitas de um lado e despesas de outro.

Por outro lado, uma análise mais acurada dos orçamentos públicos evidencia, efetivamente, algumas dificuldades para a sua interpretação.

Diversas causas vêm, sucessivamente, ampliando a complexidade dos demonstrativos orçamen-tários do setor público: a principal delas é a longevidade da Lei nº 4.320/64, reguladora dos balanços e orçamentos públicos.

De fato, após 45 anos, várias alterações ocorreram na técnica de elaboração orçamentária, na abrangência dos gastos públicos, na ampliação da administração indireta e no próprio texto constitucional, sem que essa lei merecesse uma ampla reformulação para adequar-se às novas situações.

2.2. o orçamento por programa

No final da década de 1970, começou a ser disseminada a ideia de elaboração do orçamento por programas, contrapondo-se a um procedimento mais simplista que era apresentado e vota-do pelo Poder Legislativo, apenas sob o enfoque das despesas segundo a natureza dos gastos, como pessoal, material de consumo, serviços de terceiros, investimentos etc., acrescidas das funções e subfunções de governo a que se destinavam.

Alocar os gastos públicos segundo uma visão por programas de governo representou, eviden-temente, um procedimento mais adequado para estabelecer e analisar os objetivos e as metas

asPectos geraIs do orçamento

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da administração pública, associados ao respectivo custo-benefício.

Para estimular as administrações públicas a assimi-larem a nova técnica de orçamento por programa, o Governo Federal, baseado na competência legal estabelecida pelo art. 113 da Lei nº 4.320/64, in-troduziu, no início dos anos 1970, uma nova clas-sificação funcional programática (Portaria nº 9/74, do então Ministério do Planejamento), tornando obrigatória a apresentação dos orçamentos públi-cos discriminados por funções, programas, subpro-gramas e projetos ou atividades.

As informações constantes dos orçamentos públi-cos, do ponto de vista programático, tornaram-se mais ricas, aumentando o nível de detalhamento2. Todavia, do ponto de vista formal, aumentou a complexidade para interpretação, porque:

• a classificação funcional programática, que era re-gida somente por dois dígitos, passou a ser iden-tificada por 11 dígitos;

• as diversas acumulações de valores em níveis de função, programa, subprograma e projeto/ativi-dade não eram facilmente visualizadas;

• manteve-se a anterior classificação pela natureza dos gastos, que representa os insumos dos pro-gramas de governo, na prática significando elabo-rar o orçamento sob duas visões diferentes.

Na realidade, ampliou-se e melhorou-se o nível de detalhamento programático, sem abrir mão da classificação pela natureza dos gastos.

Em razão disso e também pela existência de outras classificações, a apresentação do orçamento aca-bou se tornando mais complexa, particularmente pelo excesso de codificação, o que dificulta a sua transparência. Isso tudo precisa ser repensado com vistas a uma simplificação. O ideal seria de-finir que o orçamento fosse elaborado de forma mais agregada, podendo o detalhamento aconte-cer apenas na fase de execução, o que facilitaria

o processo de elaboração pelo Poder Executivo e de análise pelo Poder Legislativo.

Na verdade, alguma coisa já foi feita nesse senti-do, primeiro pela edição da Portaria nº 42/99, do Ministério do Planejamento, mudando e flexibili-zando a classificação funcional programática, e, segundo, pela edição da Portaria Interministerial nº 163/01, que reformulou a classificação da re-ceita e a classificação econômica da despesa.

Saliente-se que o maior detalhamento implicou, também, aumento do grau de inflexibilidade para utilização dos recursos na fase de execução orça-mentária. Isso porque esse nível de detalhamento, ao integrar o orçamento e ser aprovado pelo Poder Legislativo, transforma-se em lei, cujas alterações futuras demandam novas autorizações legislativas.

2.3. crescimento da administração indireta

Outro fator que representava enorme grau de difi-culdade na interpretação e análise dos orçamentos públicos era a forma de apresentação das despe-sas da administração indireta.

Até a promulgação da Constituição de 1988, as entidades da administração indireta estavam de-sobrigadas de aprovarem seus orçamentos por lei. Isso significava que as dotações destinadas a

O sistema de planejamento e orçamento da administração pública ainda sofre com a falta de modernização da legislação reguladora

2 O detalhamento das funções ampliou-se em cerca de 60%; os programas, anteriormente explicitados sob a forma de subfuncões, em 50%; e os subprogramas em 80%, além de permitir um detalhamento praticamente infinito em nível de projetos e atividades, que eram os dois tipos de ações governamentais.

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cobrir os deficits dessas entidades constavam do orçamento da administração direta por valores globais, e o valor total das receitas e despesas com recursos dessas entidades figurava apenas no texto da lei orçamentária, sem nenhum detalha-mento, que ocorria posteriormente por decreto do Poder Executivo.

Esse procedimento deixava o orçamento um tanto obscuro em razão da ausência de detalhamento de significativa parcela dos gastos públicos, já que era excepcional o crescimento do número de entida-des da administração indireta a partir do final da década de 19503. Não seria um exagero dizer que a multiplicação dessas entidades tinha por moti-vo principal escapar do crivo do Poder Legislativo, fato esse muito lamentável.

Com a nova Carta de 1988 estabelecendo obriga-toriedade para que os orçamentos das autarquias e fundações constassem da lei orçamentária, re-solveu-se o problema da abrangência dos gastos. Por outro lado, não estava resolvida a questão da transparência, porque os orçamentos dessas entidades eram isoladamente incorporados à lei orçamentária sem nenhuma visão global dos gas-tos. Entretanto, houve uma evolução nesse sen-tido. Para isso, colaborou de forma importante o fato de ter sido editada a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que considera o ente estatal sempre pelo conjunto de seus órgãos autônomos. Atual-mente, as autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo poder público submetem-se, no que respeita ao orçamento, às mesmas regras da administração direta.

A unificação dos orçamentos de cada ente fe-derativo é fundamental, apesar de resistências ainda hoje existentes,4 pois esse procedimento permite que se dê maior enfoque no detalha-mento por programas de governo para que os novos princípios estabelecidos pela Constitui-ção sejam atingidos.

Sem a observância desses requisitos, fica muito difícil tornar efetivo o princípio de compatibilida-de entre o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretri-zes Orçamentárias (LDO) e o orçamento anual.

Por fim, há de se considerar, ainda, que a partir dos anos 1970, a atividade pública foi fortemen-te desenvolvida por meio da propagação das em-presas estatais.5

Com a obrigatoriedade de que o orçamento de in-vestimento dessas empresas passasse a integrar a lei orçamentária, acabou sendo criado um vácuo institucional pela falta de regulamentação da for-ma de sua apresentação e incorporação.

Pior ainda, no nível de execução orçamentária, não foi criado nenhum instrumento de acompanha-mento que permitisse avaliar se efetivamente os investimentos realizados estavam contemplados na lei orçamentária.

Da mesma forma que ocorria até pouco tempo atrás no caso das autarquias, para consolidação do orçamento global, simplesmente adicionar os valores de investimento das empresas estatais poderá significar dupla contagem se houver re-cursos provenientes do orçamento da adminis-tração direta.

Para que haja uma adequada consolidação, deve-se considerar somente o investimento realizado com recursos próprios da empresa. Como asse-gurar que o orçamento da estatal evidencie a ori-gem dos recursos se nenhuma regulamentação foi estabelecida para apresentação dos orçamen-tos das empresas?

Logo, a maneira mais segura para identificar a transferência de recursos para essas entidades seria a realização de ampla pesquisa no orça-mento da administração direta. Mas, para au-mentar o grau de dificuldade, pode ocorrer a

3 Em 1948, existiam cerca de 70 autarquias federais, com suas despesas representando 2% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Ao final da década de 1960, já eram mais de 80 entidades, com uma participação de 7,5%. Em 1968, as autarquias respondiam por cerca de 50% do total das despesas públicas e por mais de 70% dos investimentos.4 O orçamento da Prefeitura de São Paulo foi unificado apenas a partir do exercício de 2007.5 No âmbito federal, as empresas evoluíram de cerca de 30, no início dos anos 1950, para 177 em 1982. Na esfera estadual, foram instituídas 49 empresas durante os anos 1950, 175 na década de 1960 e 60 na década de 1970.

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situação na qual os recursos destinados às empresas estatais tenham antes de transitar pelo orçamento de uma autarquia, no caso de essa entidade ser acionista da empresa.

Como consequência, há necessidade de que a pesquisa para análise dos recursos destinados às empresas estatais se estenda também aos orçamentos das entidades da administração indireta.

Outra inovação da Constituição de 1988 foi a obrigatoriedade de as receitas e despesas das fundações instituídas e mantidas pelo poder público integrarem o orçamento nas mes-mas condições da administração direta e das autarquias. A proliferação dessas fundações deveu-se ao fato de que, até então, elas não tinham os seus orçamentos aprovados pelo Poder Legislativo e não se sujeitavam às rígidas regras do setor público.

A Constituição federal, ao determinar (art. 165, § 5º, incisos I e III) que as fundações insti-tuídas e mantidas pelo poder público devem integrar a lei orçamentária, acabou por gerar uma dúvida, pois existem as que são instituídas por lei, mas que, entretanto, têm vida pró-pria e não recebem recursos do Tesouro, ou seja, não são dependentes do poder público. Neste caso, entende o autor, na mesma linha adotada pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), que essas fundações, mesmo sem receber recursos da instância governamental, são caracterizadas como órgãos públicos, já que foram instituídas por lei, devendo, assim, integrar a lei orçamentária e se sujeitar às demais regras vigentes para a administração pública.

Ainda sobre a questão do orçamento das empresas, cabe o registro de que a LRF criou a figura da empresa estatal dependente, aquela que recebe recursos do Tesouro para pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital. As empresas enquadradas nessa situação devem figurar no orçamento pelo total de suas receitas e despesas, equiparando-se, portanto, a uma autarquia.

2.4. Reflexos da Constituição de 1988

A nova Constituição brasileira trouxe para o orçamento algumas novidades, entre as quais se destaca a consolidação do processo de planejamento, influenciado pela instituição de três ins-trumentos, que interagem entre si: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

Se de um lado as novidades foram saudadas como um avanço no sentido de dar ao orça-mento público maior importância dentro do processo de desenvolvimento do País, por outro, algumas complexidades preexistentes e outras surgidas a partir da nova Carta não foram, ainda, devidamente equacionadas, o que está, de certa forma, prejudicando a obtenção dos resultados esperados.

Essas complexidades decorrem, em parte, de algumas imperfeições existentes no texto consti-tucional, mas a maioria reside na falta da regulamentação prevista no art. 165, § 9º, a despeito de permanecer em vigor a Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964.

Como já foi mencionado, a referida lei possui 45 anos e está muito defasada em relação à reali-dade atual. Apesar de terem decorridos quase 20 anos da promulgação da atual Constituição, a

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lei é o único texto regulamentador do processo or-çamentário brasileiro, a despeito das contribuições trazidas pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

O mal maior que a ausência de regulamentação vem causando ao processo reside justamente na mudança mais importante do novo texto constitu-cional, que foi a criação do Plano Plurianual e da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Não havia, até pouco tempo, por parte das unida-des da Federação brasileira, um entendimento fir-me quanto à obrigatoriedade de aplicação desses dois instrumentos, pois algumas correntes defen-diam, erroneamente, a ideia segundo a qual sem a regulamentação, o texto constitucional não preci-sava ser cumprido.

Mesmo para a grande maioria que entendia serem obrigatórios tais instrumentos, restavam dificul-dades imensas para a aplicação de determinados conceitos que foram criados.

A título de exemplo, podem ser citadas as ex-pressões “delas decorrentes” e “programas de duração continuada” que aparecem no texto do art. 165, § 1º, da Constituição, que conceitua o Plano Plurianual, provocando muita confusão entre os técnicos que tratam do assunto, geran-do interpretações as mais variadas possíveis, em detrimento de um pensamento único sobre os objetivos da instituição de um sistema de planejamento orçamentário.

Outra fonte de complexidade foi a criação do chamado orçamento da seguridade social. A distinção feita pela Constituição foi infeliz por confundir a ideia expressada pelo princípio da unidade dos orçamentos por esfera de go-verno. Se existe a figura do orçamento fiscal, que abrange todos os poderes da União, seus fundos e órgãos da administração direta e in-direta, como poderia ser elaborado um outro orçamento abrangendo apenas a seguridade social? Como seria o relacionamento entre os dois? Teria esse novo tipo de orçamento uma execução independente ou seria integrante do orçamento fiscal?

A complexidade é tão flagrante que no próprio Governo Federal a implementação do orçamen-to da seguridade social jamais se efetivou, a não ser pela apresentação de demonstrativos na lei orçamentária e pela designação de cada dotação como pertencente ao orçamento fiscal (F) ou ao orçamento da seguridade social (S). Nas demais esferas, particularmente nos municípios, a questão é, em geral, ignorada. Tanto isso é verdade que as instituições encarregadas da fiscalização da ges-tão orçamentária praticamente não se preocupam, com razão, com essa separação.

Esse aspecto tem muito a ver com a unidade do orçamento, a ser abordada no capítulo seguin-te, em que se procurará demonstrar que a tão desejada unificação dos orçamentos ainda não aconteceu, mas que ela é fundamental para o processo de planejamento, já possibilitam a compatibilização prevista na Constituição entre Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentá-rias e orçamento.

Outra novidade trazida pela nova Carta é o orça-mento de investimento das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto. O dispositivo padece da mesma indefinição sobre a sua aplica-ção nas outras esferas de governo.

Sem a regulamentação solicitada pelo art. 165, § 9º, da Constituição, fica difícil sistematizar a exi-gência em todas as esferas de governo. Para sua adoção, será preciso definir bem a abrangência, o exato conceito de investimento e o funcionamento desse orçamento, ou seja, a sua operacionalização, a fim de que os órgãos de controle e os de fiscali-zação, particularmente o Poder Legislativo e cada Tribunal de Contas, possam desempenhar a sua função e atestar o cumprimento dos investimentos previamente aprovados.

Ainda como novidade, a nova Constituição passou a exigir (art. 165, § 6º) que a lei orçamentária apre-sente demonstrativo regionalizado do efeito sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natu-reza financeira, tributária e creditícia.

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2.5. Unidade do orçamento

O princípio da unidade do orçamento, consagra-do na Lei nº 4.320/64 logo em seu art. 2º, precisa ser encarado como uma das características mais importantes do orçamento público, especialmen-te a partir do momento em que este deixou de ser tratado apenas como uma “lei de meios” para in-tegrar uma sistemática de planejamento do setor público, em que se inclui o Plano Plurianual e Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Unidade significa existir apenas um orçamento com-preendendo todas as ações do poder público, quer arrecadando os recursos, quer empregando-os em programas próprios da atividade estatal.

Entretanto, a história recente do orçamento públi-co mostra que o princípio ainda é um objetivo a ser alcançado, pois embora defendido por técnicos e legisladores, não é adotado integralmente pelas unidades da Federação, em prejuízo das funções de planejamento, controle e avaliação, além de re-duzir a transparência para a sociedade.

Mesmo considerando a contribuição dada pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o principal fator responsável pela não aplicação integral do prin-cípio da unidade nos orçamentos tem sido a pro-liferação das entidades da administração indireta, como as autarquias, as fundações, os consórcios, as empresas estatais e até mesmo algumas formas de fundos especiais, cujas receitas e despesas, muitas vezes, não são analiticamente demonstra-das no orçamento geral.

Hoje, a Constituição federal, em seu art. 165, § 5º, determina que o orçamento fiscal deve compre-ender todos os poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e in-direta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, ou seja, a obediência ao prin-cípio da unidade.

Por outro lado, o mesmo dispositivo prevê orça-mentos distintos para os investimentos das em-

presas estatais e para a seguridade social, mas tudo isso ainda é muito vago. No caso das empre-sas, nenhuma referência é feita em relação às despesas de manutenção de suas atividades.

Sem entrar no mérito do orçamento de investi-mento das empresas estatais, a existência de um orçamento específico para a seguridade social6 representa uma anomalia dentro do processo, pois as respectivas receitas e despesas já figu-ram no orçamento fiscal. Foi um equívoco dos parlamentares constituintes a instituição desse instrumento, sabendo-se que hoje o orçamento é elaborado de forma programática, em que to-das as ações da área são perfeitamente identifi-cáveis no orçamento geral, permitindo todo tipo de análise e comparações para saber se o setor foi devidamente contemplado com os recursos de que necessita.

A redação constitucional do art. 165, § 5º, estabe-lece que a Lei Orçamentária Anual será composta de três tipos de orçamentos específicos: o fiscal, o da seguridade social e o de investimento das empresas estatais. Em relação aos dois primeiros, evidencia-se, claramente, a unidade e universali-dade dos poderes, órgãos, fundos e entidades da administração direta, inclusive as fundações.

Diferentemente do que ocorreu com o orçamento de investimento das empresas estatais, os consti-tuintes não estabeleceram que os orçamentos das autarquias e fundações seriam apresentados na lei orçamentária de forma independente. Portanto, evidencia-se, claramente, a unidade para os orça-mentos fiscal e da seguridade social.

Apesar do desejo de muitos técnicos, a unidade do orçamento ainda é um objetivo a ser alcançado

6 A seguridade social compreende as áreas de saúde, assistência social e previdência, conforme estipula o art. 194 da Constituição.

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Em decorrência da falta de regulamentação a que se refere o art. 165, § 9º da Constituição, as disposições da Constituição de 1967, a regula-mentação contida na Lei nº 4.320/64 e os usos e costumes preponderaram por muito tempo, no sentido de que os orçamentos da administração indireta fossem erroneamente apresentados em separado, contrariando o princípio expresso no atual texto constitucional. Aos poucos, essa cultu-ra vai ficando para trás.

Infelizmente, ainda existem entes federativos que elaboram o orçamento no sistema antigo. Quando muito, os diversos orçamentos – o da administra-ção direta e os da administração indireta – são reu-nidos na mesma lei, mas distintos entre si.

Sem a unidade, o orçamento público brasileiro – da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios – fica muito mais difícil de ser enten-dido, no âmbito do próprio Poder Executivo e pelo Poder Legislativo,7 a quem compete apreciá-lo, emendá-lo e aprová-lo, e pela sociedade em geral.

2.6. vinculações e fundos especiais

A questão das vinculações de receitas e da ins-tituição de fundos especiais frequenta perma-nentemente os debates sobre o planejamento orçamentário. De um lado, uns sustentando que só o planejamento é capaz de contemplar com os de-vidos recursos as áreas de fato prioritárias; de ou-tro, os que defendem a ideia de que setores vitais, como educação e saúde, só podem ser atendidos se houver, na Constituição, dispositivos que garan-tam os recursos necessários.

Têm razão os planejadores, mas é preciso compre-ender que a posição dos “gastadores” é baseada num processo histórico de abandono das áreas sociais, hoje beneficiárias das vinculações. Não é o caso, agora, de se aprofundar nesse caloroso de-bate, que é muito mais complexo do que parece,

mas o País precisa caminhar no sentido de que o planejamento seja de fato o instrumento para con-templar as verdadeiras prioridades nacionais, re-gionais e locais, de modo que mecanismos como o da vinculação venham a se tornar desnecessários.

Além disso, sempre há setores da administração, em todas as esferas de governo, que estão à pro-cura de meios legais para fugir do cumprimento das normas que regem a utilização dos recursos públicos, em nome da racionalidade, da objetivi-dade e da agilidade, geralmente, no seu entender, prejudicadas pela necessidade de se obedecer a um orçamento previamente aprovado, à realização de empenho prévio das despesas, ao processo de licitação e ao concurso público para admissão de servidores. O crescimento espantoso do número de entidades da administração indireta, como au-tarquias, fundações, empresas públicas e socie-dades de economia mista, teve muito a ver com essas afirmações.

Uma das formas utilizadas nas últimas décadas para criar mecanismos especiais para fugir da ri-gidez do sistema público de administração foi a instituição de fundos especiais, que passaram a funcionar com autonomia e recursos garantidos pelas leis que os instituíam.

Esse é, também, um fato extremamente prejudi-cial à sistemática de planejamento orçamentário instituída pela nova Constituição, particularmente quando os fundos especiais:

• reservam para si parte da receita pública, atra-vés de vinculações que em muitos casos ferem o princípio da não afetação das receitas, garantido pelo art. 167, inciso IV, da Constituição;

• seguem, segundo as leis que os instituem, proce-dimentos especiais para o seu funcionamento.

O que tem havido é a utilização indiscriminada de um instrumento nobre criado pela Lei nº 4.320/64, em seu art. 71, que conceitua o fundo como a vin-

7 Os graves problemas envolvendo a apreciação do orçamento federal pela comissão mista do Congresso Nacional, que redundaram na instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito e na cassação de vários congressistas, afora os aspectos éticos e morais, têm como uma de suas causas o fato de o orça-mento ser dominado por um pequeno grupo de pessoas, dada a sua complexidade advinda, também, da falta de unicidade.

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culação do produto de receitas especificadas para atender a determinados objetivos ou serviços. A utiliza-ção do fundo nos estritos termos dessa lei permitiria auferir receitas extras, como doações, contribuições, legados, mediante a garantia de que fossem destinadas ao atendimento de um objetivo predeterminado ou à realização de um serviço previamente conhecido. Além disso, o fundo poderia ser utilizado por uni-dades administrativas de características especiais que realizam serviços específicos, auferindo receitas próprias para a sua manutenção.

O que se condena é o aproveitamento inadequado de um dispositivo da legislação para a criação indis-criminada de fundos especiais, verdadeiros feudos de determinados setores instalados na administração pública, muitas vezes vinculando recursos ordinários, como impostos, taxas, contribuições e outras recei-tas públicas, em prejuízo da ação global de planejamento orçamentário.

No decorrer dos trabalhos constituintes de 1988, os parlamentares já haviam constatado que a prolife-ração dos fundos especiais estava prejudicando a administração pública e o planejamento, a ponto de terem determinado, no art. 36 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que todos os fundos existentes na data da promulgação da Constituição, excetuados os resultantes de isenções fiscais, passassem a integrar o patrimônio privado e os que interessassem à defesa nacional fossem automaticamente extintos se não ratificados pelo Congresso Nacional no prazo de dois anos.

Na verdade, a ideia inicial dos constituintes, consubstanciada na Subcomissão de Orçamento e Fiscaliza-ção Financeira e na Comissão do Sistema Tributário, Orçamento e Finanças, era a de proibir a instituição dos fundos de qualquer natureza. Pressões nas demais fases do processo constituinte permitiram a manu-tenção da situação anterior a 1988.

2.7. orçamento das empresas estatais

Em princípio, a exigência de que os investimentos realizados pelas empresas estatais – empresas públicas e sociedades de economia mista – sejam previamente submetidos à aprovação do Poder Legislativo, se-paradamente, não se constitui em quebra do princípio da unidade, pois essas empresas são organizadas e funcionam sob as regras do direito privado. O mérito de tal exigência é muito discutível, particularmente pelo avanço das privatizações.

Mantida a norma, resta prever, na lei complementar reguladora das finanças públicas, como funcionará o orçamento das estatais no decorrer do exercício e o exato conceito de investimento para fins de inclusão na proposta orçamentária.

Essa conceituação se faz necessária porque determinadas operações realizadas numa empresa podem se caracterizar como investimento, o mesmo não acontecendo em outra empresa, de natureza diferente. Por exemplo, a aquisição de um terreno: se for um banco, o terreno certamente se incorporará ao seu ativo e servirá, talvez, para construção de uma nova filial; se for uma empresa que atua na área de habitação, provavelmente o terreno será utilizado para construir unidades residenciais para posterior revenda, dentro dos seus objetivos estatutários.

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3.1. conceito de planejamento

Uma breve conceituação para mera avaliação do campo de ação da função planejamento permite identificá-la como “uma metodologia mediante a qual se estabelecem e se decidem os objetivos visando à solução de problemas identificados, especificando, com antecedência, as ações e os recursos materiais, humanos e financeiros necessários”.

Desse breve conceito, alguns pontos podem ser anotados como referência:

a) é um processo decisório sistematicamente desenvolvido com antecedência para definir os objetivos que devem ser atingidos, condicionando as decisões que, ao longo de um de-terminado período, deverão ser adotadas para a sua consecução. Como tal, deve-se definir claramente em que níveis hierárquicos ocorrerão as decisões futuras dos objetivos a serem perseguidos pela administração pública.

b) é uma metodologia para uniformizar procedimentos básicos de ação, a fim de estabelecer a interação necessária entre os diversos níveis hierárquicos da administração para um coerente pro-cesso de decisão. Basicamente, busca-se disciplinar procedimentos que possibilitem que as decisões tomadas nos níveis estratégicos superiores sobre diretrizes, estratégias e objetivos globais possam fluir para que os escalões inferiores respondam com propostas que viabili-zem o alcance das metas pretendidas.

Em suma, o planejamento é o processo mediante o qual se procura definir claramente o que fazer e como fazer, visando à utilização racional dos recursos disponíveis para que, com efi-ciência, eficácia, efetividade e humanização, os objetivos pretendidos possam ser atingidos, pois “se um homem não sabe a que porto se dirige, nenhum vento lhe será favorável” (Sêneca).

A falta de um processo decisório, claramente sentida no setor público, e de metodologia ade-quada para a interação de todos os níveis hierárquicos constituem, sem dúvida, a grande dificuldade para que os instrumentos derivados do planejamento atinjam o êxito desejado.

Toda organização deve ter objetivos a serem alcançados. Em uma organização de pequeno porte, as informações podem manter-se apenas na cabeça dos administradores, o que faz, por exemplo, que os planos e projetos sejam tacitamente conhecidos por todos. À medida

o sIstema de PlaneJamento

3

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que a organização cresce e envolve um grande número de pessoas, surge a necessidade de ex-pressar, em termos bem detalhados, os objetivos pretendidos, as estratégias a serem utilizadas, as políticas administrativas e os padrões de com-portamento desejáveis dos seus membros.

Por outro lado, as administrações enfrentam vá-rios estágios de desenvolvimento e situações de realidades diferentes que exigem adequação dos objetivos e da postura organizacional.

Evidencia-se, cada vez mais, a impossibilidade de que uma administração simplista atenda às exigên-cias organizacionais, sendo primordial a adoção de um instrumento que garanta a unidade da Institui-ção e propicie o controle de suas atividades.

3.2. níveis de planejamento

Para conveniente definição da estrutura organi-zacional da função planejamento, é fundamental reconhecer os níveis normalmente percorridos pelo processo decisório. Basicamente, podem ser identificados três níveis: estratégico, tático e operacional.

a) O nível estratégico caracteriza-se pelas de-cisões mais abrangentes de filosofia, diretrizes básicas e objetivos globais da administração. Ocorre nos escalões mais elevados do processo de planejamento, assumindo conotação eminen-temente política. É nesse nível que se indica o que deve ser feito, evidenciando o ideal da adminis-tração a ser perseguido, baseado nas aspirações, nos desejos e nos valores individuais e íntimos das pessoas e dos sistemas sociais envolvidos e interessados. Neste nível de planejamento, normalmente, não há grande preocupação com a precisão do período em que os objetivos de-verão ser atingidos, servindo como indicativo do que se deve perseguir.

b) O nível tático, o segundo da hierarquia do pro-cesso decisório, tem como função estabelecer o que pode ser feito, delimitado pelo que deve ser realizado, estabelecido no nível estratégico, con-

dicionado pelo intervalo de tempo e pelas restri-ções financeiras, organizacionais e tecnológicas.

c) O nível operacional, delimitado pelo que deve e pelo que pode ser feito, estabelecidos nos níveis anteriores, define o que será feito. Tem como prin-cipal característica o detalhamento das decisões do nível tático com a preocupação de implemen-tação operacional do que efetivamente será rea-lizado, estabelecendo as ações para que as metas possam ser atingidas.

Relembrar esses conceitos é muito importante a fim de que se passe da teoria à prática, delimita-da, é claro, pelas condições específicas do setor público e condicionamentos legais estabelecidos pela Constituição e legislação vigentes.

Pode-se efetivamente considerar que o processo decisório de estabelecimento de diretrizes, obje-tivos e metas e a elaboração do Plano Plurianual devem ser enquadrados no nível estratégico.

Nesse nível, define-se o que deve ser feito duran-te o período governamental, sob a coordenação do órgão central de planejamento. É fundamental a participação da alta cúpula dos órgãos das ad-ministrações central e setoriais para que as deci-sões sejam legitimadas e tornem-se viáveis nos demais níveis do planejamento.

A elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei Orçamentária Anual (LOA) enqua-dra-se no nível tático, porque, delimitado pelo que deve ser feito no período governamental, essas leis definem o que pode ser feito diante das circunstân-cias financeiras e conjunturais do exercício.

O nível operacional é desempenhado pela exe-cução orçamentária que define o que será reali-zado no exercício financeiro. O órgão central de orçamento deverá efetuar o acompanhamento da execução orçamentária para adoção das medidas corretivas que se fizerem necessárias ao cumpri-mento das metas estabelecidas. Terá de realimen-tar o órgão de planejamento com as informações necessárias à reavaliação e, se for o caso, altera-ção do Plano Plurianual (PPA).

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3.3. etapas do planejamento

Enquanto o nível de planejamento identifica em qual instância o processo decisório ocorre, as etapas indicam a metodologia que deve ser adotada para uma coerente definição e detalha-mento dos objetivos da administração. Tradicio-nalmente, identificam-se as seguintes etapas: diagnóstico, definição de objetivos, estratégias, plano global de desenvolvimento e planos opera-cionais. Como complemento do ciclo de plane-jamento, o acompanhamento e a avaliação dos programas aprovados e a realimentação do pro-cesso decisório devem ser considerados como etapas do planejamento.

a) O diagnóstico é de fundamental importância no processo de planejamento porque propor-ciona as informações imprescindíveis à formula-ção dos objetivos e das estratégias. Nesta etapa, identifica-se a realidade do campo de ação da administração, mediante análises retrospectivas e prospectivas da situação social, econômica, tec-nológica e organizacional.

b) Da eficiente definição de objetivos depende a eficácia do processo de planejamento e, para tan-to, deve-se distinguir os objetivos globais dos ob-jetivos meio.

Os objetivos globais são a manifestação dos ser-viços principais que a organização se propõe a prestar, ressaltando seus aspectos de natureza e qualidade, devendo ser fixados em termos claros e, principalmente, torná-los de amplo conhe-cimento da administração, com o que se estará eliminando grande parte dos conflitos no proces-so decisório. Como exemplo de objetivo global pode ser citado o de reduzir o índice de mortali-dade infantil.

Os objetivos meio identificam detalhadamente quais são as oportunidades de ação para que os objetivos globais da administração possam ser atingidos. Como exemplo, pode ser indicada a necessidade de construção de postos de saúde

para que o objetivo global de redução do nível de mortalidade infantil possa ser atingido.

É importante essa distinção porque, normalmen-te, o objetivo global ocorre no nível estratégico, ou seja, nos escalões superiores da administração, enquanto o objetivo meio ocorre nos níveis tático e operacional, ou seja, em escalões inferiores.

c) As estratégias são os instrumentos a serem uti-lizados para a execução mais racional das ativi-dades programadas. Devem ser formuladas pela administração em todos os níveis, com base nas políticas emanadas dos escalões superiores. As estratégias têm por finalidade a exploração das potencialidades da organização e redução das suas vulnerabilidades.

d) Os planos globais consistem no documento que consolida as diretrizes gerais que nortearão a administração na especificação dos objetivos globais, dos objetivos meio e das metas, que de-verão ser alcançados a médio e a longo prazos.

e) Os planos operacionais são o seccionamento periódico, normalmente anual, dos planos glo-bais, por meio dos quais são priorizadas as metas que deverão ser viabilizadas a curto prazo, como consequência da limitação econômica, de recur-sos humanos e materiais. Os orçamentos anuais e o seu detalhamento constituem o instrumento mais usual de controle do processo de viabiliza-ção e controle do processo de planejamento.

f) O acompanhamento verifica se as ações estão sendo realizadas, se os meios utilizados estão de acordo com o esperado, se os insumos estão evo-luindo conforme o esperado, bem como adota as medidas corretivas necessárias para que as metas possam ser atingidas.

g) A avaliação procura verificar se os objetivos estão sendo alcançados e se as ações realizadas estão surtindo os efeitos desejados, realimentan-do o processo de planejamento para redefinição, se for o caso, dos objetivos e das metas.

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PlaneJamento do setor PÚBlIco

4Pode-se dizer que no setor público o orçamento tem sido, na prática, a única etapa uti-

lizada do sistema de planejamento, porém encarado como mero instrumento legal, por meio do qual o Poder Executivo obtém autorização legislativa para a realização dos gastos

públicos. Pouca ênfase tem sido dispensada à sua utilização como uma das etapas conceituais do processo de planejamento para a alocação racional e gerenciamento dos recursos públicos, visando à prestação de serviços que devem ser colocados à disposição da população.

Da ausência de um efetivo processo de planejamento do setor público decorre forte a predo-minância do enfoque financeiro que, normalmente, é dispensado aos orçamentos públicos. Nessas circunstâncias, a elaboração orçamentária, que somente deveria tornar viáveis e com-patíveis as metas estabelecidas no processo decisório (Plano Plurianual) com os recursos dis-poníveis, passa a exercer, simultaneamente, os dois papéis: orçamentação e planejamento.

Ocorre que, no escasso tempo que é destinado ao processo de elaboração orçamentária, aca-bam por serem privilegiadas as informações financeiras, em detrimento dos dados físicos.

Passar para um processo de alocação de recursos em que sejam levadas em consideração, além das informações financeiras, também as físicas, requer um adequado tratamento das informa-ções e definição clara das atribuições dos órgãos envolvidos no processo de planejamento.

A concepção de planejamento é fundamental para que ele seja o processo decisório do que deva ser contemplado nos respectivos orçamentos anuais, embasado principalmente em dados físicos, ficando para o órgão orçamentário a função, que lhe é própria, de somente tornar viável os recursos necessários para os programas previamente aprovados nas etapas anteriores do processo.

4.1. o processo de planejamento na nova constituição

Diferentemente das constituições anteriores, a Carta de 1988 estabeleceu a inter-relação dos instrumentos legais que compõem o processo de planejamento do setor público: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA). A eficácia desse princípio constitucional está fortemente condicionada à adequada estrutura-ção dos órgãos envolvidos no processo de planejamento das administrações públicas, a fim de dar a necessária fluidez ao processo decisório.

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Um moderno sistema de planejamento requer, inicialmente, o diagnóstico da situação existen-te e a identificação da realidade atual em termos de necessidade de bens e serviços, que possi-bilitem a definição dos objetivos pretendidos e o estabelecimento das estratégias e diretrizes gerais a serem adotadas.

O passo seguinte de definição dos programas, assim como a quantificação das metas, represen-ta o complemento indispensável para orientar a administração na organização dos meios neces-sários para atingir aos objetivos determinados. Estes são os insumos necessários para a elabora-ção do Plano Plurianual que deve ser submetido à apreciação do Poder Legislativo.

Anualmente, as metas estabelecidas no Plano Plurianual deverão ser priorizadas, a fim de de-finir quais as que, em face da disponibilidade de recursos, deverão ser viabilizadas em cada exer-cício financeiro. Esta fase, de fundamental impor-tância dentro do processo de planejamento, foi contemplada na Carta constitucional com um novo instrumento legal: a LDO, como mecanismo, entre outros objetivos, para estabelecer a inter-relação entre plano e orçamento e possibilitar a necessá-ria coerência entre planos de longo prazo e os de médio e curto prazos.

Esse novo instrumento legal de planejamento do setor público foi criado, também, com o objetivo de permitir a participação prévia do Poder Le-gislativo no processo de elaboração da proposta

orçamentária. Tal sua importância no novo arca-bouço estabelecido pela nova Carta, que é inad-missível conceber a falta de ação conjunta dos órgãos de planejamento e orçamento do Poder Executivo. É conveniente, portanto, que estejam sob um único comando hierárquico para que, harmonicamente, possam negociar com o Poder Legislativo quais as metas que deverão constar da proposta orçamentária.

Após essas etapas – diagnóstico geral, estabele-cimento de diretrizes, identificação dos objetivos, quantificação das metas e custos, viabilização orçamentária –, o acompanhamento, o controle e a avaliação da execução orçamentária passam a representar papel preponderante dentro do sistema de planejamento, no sentido de viabi-lizar operacionalmente as metas estabelecidas. Da adequada avaliação dos resultados obtidos e da realimentação dos planos de longo prazo depende, em grande parte, o sucesso de um sis-tema de planejamento.

Esse macro fluxo de planejamento, consagrado na Constituição federal, que prevê o Plano Pluria-nual como instrumento legal que deverá estabe-lecer as diretrizes, os objetivos e as metas; a Lei de Diretrizes Orçamentárias como mecanismo de priorizar as metas estabelecidas no plano; e a Lei Orçamentária Anual como instrumento de viabili-zação dos recursos necessários para que as metas previstas possam ser atingidas, pode ser visuali-zado no fluxograma da próxima página.

Antes, porém, cabe mencionar a existência de outro princípio consagrado na Constituição, o que trata da regionalização dos planos e orça-mentos públicos. A viabilização desse princípio praticamente impõe aos órgãos do setor pú-blico uma estrutura administrativa que tenha como primeiro nível hierárquico a região e, pos-teriormente, os setores da administração públi-ca, como saúde, educação, transportes etc. No plano municipal, a questão da regionalização praticamente não é aplicável, estando presen-te apenas nos instrumentos correspondentes à União e aos Estados.

Um moderno sistema de planejamento requer diagnóstico da realidade, identificação das necessidades de bens e serviços e estratégia

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sIstema de PlaneJamento

entIdade

comUnIdade

economIa

InFraestrUtUra

elaBora dIagnÓstIco

estratégIas governamentaIs

deFIne oBJetIvos

avalIa Programas e

ProJetos

elaBora Plano

PlUrIanUal

elaBora ldo

elaBora orçamento

acomPanHamento da eXecUção

orçamentárIa

legIslatIvo

entIdade

níV

EL ESTrATéG

ICO

níV

EL TáTICO

níV

EL OP

ErA

CIO

nA

L

eXecUção orçamentárIa

Informações orçamentárias e financeiras

Situação econômica e financeira

Aprovação do orçamento

Proposta orçamentária com a viabilização e compatibilização das metas

Proposta do Plano Plurianual

Lei do Plano Plurianual

Proposta de priorização das metas (LDO)

Aprovação de priorização das metas (LDO)

Medidas corretivas de controle dos fatores de produção

Informações físicas

recursos orçamentários

revisão do plano

Metas

Definição da realidade

Estratégias, programas

e metas

Vulnerabilidades e potencialidades

Demandas sociais

Análise macroeconômica

Carências de infraestrutura

Diagrama elaborado por Waldemar Giomi.

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4.2. Participação do Poder legislativo

O tema da participação parlamentar no proces-so de planejamento e orçamentação é dos mais complexos por envolver variáveis estruturais, operacionais e políticas dos poderes Executivo e Legislativo.

O Poder Legislativo, em função de sua natureza colegiada, tem dificuldade estrutural para uma adequada participação no processo orçamentário. Se, de um lado, a representatividade dos diversos segmentos e regiões da sociedade contribui para o aprimoramento do processo, de outro, a falta de hierarquia, sem responsabilidade individual dos seus componentes, exige que o processo decisó-rio obedeça a um rígido regimento parlamentar, dificultando a fluidez necessária.

Em consequência, o ritual do processo legislativo dos projetos de lei orçamentária acaba tornando o prazo para apreciação da proposta do Poder Executivo extremamente exíguo.

Agrava essa situação o fato de a comissão mista do Congresso Nacional, no caso do orçamento da União, não estar totalmente instrumentalizada tec-nicamente para dar suporte às decisões colegiadas. O papel que exercia anteriormente, simplesmente homologatório no setor orçamentário, de certa for-ma explica a ausência de equipe técnica com co-nhecimento e memória para atuar nessa ampla e complexa área, principalmente diante das dificul-dades de interpretação dos instrumentos, que não se revestem da simplicidade necessária e visão de conjunto, conforme já analisado.

A variável política de participação do Poder Legisla-tivo é a de solução mais complexa, porque os parla-mentares, por representarem regiões e segmentos da sociedade, procuram elaborar emendas de alte-ração à proposta orçamentária dos governos visan-do atender aos interesses de seus representados.

Quando aprovadas, essas emendas normalmente perdem a lógica macro de atendimento de priori-dades globais e passam a observar o interesse in-

dividual dos parlamentares, que, eventualmente, podem ser conflitantes.

Como consequência, a proposta orçamentária, após a aprovação do Poder Legislativo da forma como tem ocorrido, transforma o orçamento em instru-mento gerencial de pouca valia, quer seja pela in-suficiência individualizada de cada dotação, quer seja pela falta de respaldo de receita para viabilizar a execução dos recursos aprovados.

Essa situação provoca uma falta de horizonte para os órgãos da administração pública durante o exer-cício financeiro, e eles ficam no aguardo de que as dotações constantes do orçamento aprovado se-jam liberadas para efetiva utilização. Caracteriza-se, claramente, uma situação de orçamento de caixa e a perda da visão de curto prazo que deveria carac-terizar a execução orçamentária. A convivência com essa situação anômala explica como tem sido pos-sível, ao Governo Federal, em algumas oportunida-des, inclusive recentes, passar parte do exercício sem a aprovação do orçamento da União.

A adoção de um orçamento de caixa gera a incer-teza na liberação dos recursos, impossibilitando o planejamento operacional dos órgãos da ad-ministração. Durante muito tempo, essa anoma-lia foi agravada pelos altos índices de inflação, o que contribuía para aumentar as distorções, pois o atendimento mais rápido ou mais lento das liberações financeiras acabava provocando a alteração dos valores reais das dotações e, con-sequentemente, a modificação das prioridades estabelecidas no orçamento anual.

A outra questão, a da coerência entre as prioridades globais e os interesses políticos individualizados, é ainda mais complexa porque o Congresso Nacional ainda não se estruturou operacionalmente para a adequada análise das propostas orçamentárias encaminhadas pelo Poder Executivo. Ainda que estivesse estruturado, enfrentaria um número de emendas bastante significativo para serem analisa-das em curto espaço de tempo.

Nesse sentido, alguns aspectos devem ser con-siderados:

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• Somente mediante a definição de parâmetros básicos estabelecidos na Lei de Diretrizes Orça-mentárias será possível estabelecer padrões para a análise das emendas individuais dos parlamen-tares. Por exemplo, estabelecer diretrizes cla-ras para a elaboração da proposta orçamentária com limites globais por função, por programas, para despesas de custeio, pessoal etc., poderiam ser instrumentos que, de um lado, limitassem as emendas e, de outro, as direcionassem no sentido de manter a coerência global do orçamento.

• Deveria existir um pacto político a fim de que as emendas de interesse local fossem restringidas ao máximo, evitando descaracterizar a coerência da proposta global. Assim, vale lembrar que o sistema tributário estabelecido pela Constituição de 1988 visava promover profunda descentralização de re-cursos para as demais esferas de governo, redu-zindo significativamente os pertencentes à União, o que, na verdade, não aconteceu em razão da cria-ção de novos tributos federais não compartilhados com os demais entes da Federação brasileira.

Como foi restabelecida a participação parlamentar no processo decisório do orçamento, permitindo aos deputados e senadores a realocação de do-tações, é preciso que o Poder Legislativo e o Po-der Executivo cheguem a um consenso para que a transferência voluntária de recursos a outras esfe-ras de governo ocorra somente em casos extremos, de absoluta prioridade.

É bom salientar que o objetivo primordial da Lei de Diretrizes Orçamentárias, além de promover a liga-ção de plano e orçamento, foi permitir a participa-ção prévia do Poder Legislativo na elaboração da proposta orçamentária, descongestionando e es-tabelecendo parâmetros básicos para o orçamento anual. Se isso não ocorrer, a participação legislativa continuará a ser tumultuada, sem nenhum dire-cionamento para a proposição de emendas pelos parlamentares e sem nenhum critério, a não ser o político, para acatamento ou não pelos relatores.

É fundamental que haja maior interação entre Po-der Legislativo e Poder Executivo para que possam estabelecer acordos prévios sobre diretrizes bási-

cas. Todavia, na impossibilidade de coalizão nesse sentido, é bom ressaltar que a Constituição esta-beleceu mecanismos para que isso seja obtido no próprio processo legislativo, porque o Poder Execu-tivo encaminha a proposta orçamentária e o Poder Legislativo, dentro dos limites constitucionais, tem o poder de alterá-la.

Caso não concorde com as alterações, o Executivo pode utilizar o direito de veto. Com isso, a proposta orçamentária volta ao Legislativo para nova apre-ciação. Se o veto for rejeitado, prevalecerá a po-sição do Poder Legislativo. Se o veto for mantido, caberá ao Poder Executivo encaminhar proposta de crédito adicional suplementar ou especial com os recursos provenientes da despesa vetada.

Infelizmente, esse instituto não vem sendo utiliza-do, como se a sua aplicação pudesse representar rupturas irreparáveis entre esses poderes. Ao con-trário, dentro de um processo democrático, haven-do liberdade de pensamento, é natural que surjam divergências entre pessoas e, especialmente, entre instituições. O fundamental é encontrar os meca-nismos apropriados para alcançar o consenso.

O instituto da compatibilidade entre o Plano Plu-rianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e o or-çamento precisa ser devidamente utilizado para a adequada participação legislativa. Quando não são claramente definidas as metas no PPA e as priorida-des na LDO, tudo passa a ser prioritário na elabora-ção da proposta orçamentária e na apreciação pelo Poder Legislativo.

O detalhamento do PPA não deverá ser genérico demais a ponto de possibilitar que, na fase de ela-boração da LDO, qualquer emenda se torne compa-tível. Também não deverá contemplar metas muito acima da capacidade financeira da administração pública, porque assim o Poder Executivo estará transferindo ao Poder Legislativo parcela signifi-cativa do processo decisório. É admissível que as metas estejam ligeiramente acima dessas possi-bilidades, desde que com segurança, porque nos casos de acréscimos reais de receita ou contrata-ção de operações de crédito será desnecessária a alteração do PPA.