Constitucional e Metodologia Juridica - Desatualizado

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICA PONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerque ITEM A: Constitucionalismo: histórico. Modelos e ciclos constitucionais. Constitucionalismo principialista e neopositivismo. Constituição: concepções. Classificação. Supremacia. Liberalismo e Dirigismo. OBRAS CONSULTADAS: BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª ed. Malheiros: 2009. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3.ª Ed. Saraiva: 2012(2.ª tiragem). FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. Lumen Juris: 2011. SARMIENTO, Daniel. Por um Constitucionalismo Inclusivo. Lumen Juris: 2010. PEREIRA, Rodolfo Viana. Direito Constitucional Democrático. Lumen Juris: 2010 (2.ª tiragem). LEGISLAÇÃO BÁSICA. (Matéria principiológica) 1. Noções Gerais : histórico. Segundo Barroso, o termo constitucionalismo data de pouco mais de duzentos anos, sendo associado ao processo revolucionário americano e Francês. De acordo com a obra do mesmo autor, as ideias centrais do constitucionalismo remontam à antiguidade clássica, no ambiente da pólis grega, por volta do século V a.C. Os pensamentos filosóficos de Sócrates, Platão, Aristóteles ultrapassaram os séculos e são reverenciados até hoje. CONCEITO : O termo constitucionalismo significa, em síntese, limitação do poder (respeito a valores básicos e direitos fundamentais, separação dos poderes, respeito ao devido processo legal) e supremacia da lei. O nome, em regra, está associado a ideia de uma constituição escrita. No entanto, não se pode esquecer do constitucionalismo do Reino Unido, que não é sedimentado em constituição escrita e sim em textos esparsos. Em sentido clássico, o constitucionalismo está ligado a ideia de constituição. No entanto, atualmente, o termo constitucionalismo vai além. Consoante Karl Loewenstein: “a história do constitucionalismo é a busca do homem político pela limitação do poder arbitrário”. Enfim, a ideia básica do constitucionalismo é a limitação do poder. O Constitucionalismo passou por fase, sendo elas: Constitucionalismo antigo; constitucionalismo liberal ou clássico; constitucionalismo moderno; constitucionalismo contemporâneo. As Ideias básicas presentes no constitucionalismo 1

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerque

ITEM A: Constitucionalismo: histórico. Modelos e ciclos constitucionais. Constitucionalismo principialista e neopositivismo. Constituição: concepções. Classificação. Supremacia. Liberalismo e Dirigismo.

OBRAS CONSULTADAS:BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª ed. Malheiros: 2009.BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo. 3.ª Ed. Saraiva: 2012(2.ª tiragem). FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. Lumen Juris: 2011. SARMIENTO, Daniel. Por um Constitucionalismo Inclusivo. Lumen Juris: 2010. PEREIRA, Rodolfo Viana. Direito Constitucional Democrático. Lumen Juris: 2010 (2.ª tiragem).LEGISLAÇÃO BÁSICA. (Matéria principiológica)

1. Noções Gerais : histórico.Segundo Barroso, o termo constitucionalismo data de pouco mais de duzentos anos, sendo associado ao processo revolucionário americano e Francês. De acordo com a obra do mesmo autor, as ideias centrais do constitucionalismo remontam à antiguidade clássica, no ambiente da pólis grega, por volta do século V a.C. Os pensamentos filosóficos de Sócrates, Platão, Aristóteles ultrapassaram os séculos e são reverenciados até hoje.CONCEITO: O termo constitucionalismo significa, em síntese, limitação do poder (respeito a valores básicos e direitos fundamentais, separação dos poderes, respeito ao devido processo legal) e supremacia da lei. O nome, em regra, está associado a ideia de uma constituição escrita. No entanto, não se pode esquecer do constitucionalismo do Reino Unido, que não é sedimentado em constituição escrita e sim em textos esparsos. Em sentido clássico, o constitucionalismo está ligado a ideia de constituição. No entanto, atualmente, o termo constitucionalismo vai além. Consoante Karl Loewenstein: “a história do constitucionalismo é a busca do homem político pela limitação do poder arbitrário”. Enfim, a ideia básica do constitucionalismo é a limitação do poder.O Constitucionalismo passou por fase, sendo elas: Constitucionalismo antigo; constitucionalismo liberal ou clássico; constitucionalismo moderno; constitucionalismo contemporâneo. As Ideias básicas presentes no constitucionalismo são: Garantia de direitos; Separação dos Poderes; e Governo Limitado.O Constitucionalismo antigo (ou da antiguidade) remontam ao período da antiguidade clássica até final do século XVIII, quando surgem as primeiras constituições escritas. As experiências mais importantes na antiguidade são: a) Hebreus: a limitação do governo e limitação do poder fez surgir o Estado Hebreu. O Estado Hebreu era Teocrático, influenciado pela religião, os dogmas religiosos atuavam como limites ao poder do soberano. b) Grécia: considerada a forma mais avançada de governo existente até hoje, chamada de democracia constitucional, participação direta das pessoas nas decisões políticas; início da racionalização do poder. c) Roma: considerado por alguns como um retrocesso a experiência Grega, foi marcada pela liberdade. Rudolf Von Ihering disse: “Nenhum outro Estado foi capaz de conceber a ideia de liberdade de uma forma tão digna e justa quanto o direito romano”. d) Inglaterra: devemos associá-la ao Princípio “Rule of Law”, isto é, o Governo das Leis; substituindo a ideia de que o governo era da pessoa do soberano. Dentro dessa expressão existem dois fundamentos principais: a) Limitação do poder arbitrário (pactos e acordos celebrados entre reis e a população); e b) Igualdade dos cidadãos ingleses perante a lei. Importante observar que nesta fase o sistema constitucional era diferente do que conhecemos hoje.

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueConstitucionalismo liberal ou clássico: para alguns é nesse período que surge o constitucionalismo, eles desprezam o constitucionalismo antigo. O constitucionalismo liberal inicia-se no final do século XVIII e vai até o fim da 1ª Guerra Mundial. Foi influenciado por John Locke, Jean Jacques Rousseau e Montesquieu. O marco teórico são as primeiras constituições escritas (antes só as costumeiras). Também surge a constituição em sentido formal, inaugurando a rigidez constitucional que, por sua vez, fez surgir a chamada Supremacia Constitucional. O primeiro exemplo de Constituição escrita é da Virgínia de 1776, seguida pela Constituição Americana de 1787. O que diferencia as Constituições dos documentos anteriores ao século XVIII, que também deram a estrutura básica da sociedade e do Estado, é que as Constituições são fundadas na democracia (que abrange todos, independentemente de raça, sexo, etc., mais ampla que a democracia ateniense da Antiguidade, restrita apenas aos cidadãos e excludente de mulheres, escravos, etc.). As Constituições são sempre democráticas, tanto que os documentos outorgados (impostos ou elaborados sem a participação popular) são chamados de cartas por parte da doutrina. O surgimento das Constituições está associado ao iluminismo. A primeira constituição da Europa é de 1791, a qual é oriunda da Revolução Francesa de 1789. Daí surgiram três aspectos a) Idéia de constituição escrita (EUA em 1776 e França em 1791); b) Ideia de constituição formal; e c) Supremacia da constituição (base do constitucionalismo). Constitucionalismo Moderno ou Social: essa fase vai da primeira guerra mundial até a segunda guerra. Diante da incapacidade do Estado de atender às necessidades sociais (Estado Liberal), surge a segunda geração dos Direitos Fundamentais ligados ao valor IGUALDADE. Igualdade esta material e não simplesmente substancial. Em tal fase surge a proteção da igualdade SUBSTANCIAL. Não meramente formal perante a lei. Aqui temos uma igualdade material. Aqui estão os chamados direitos sociais, os econômicos e ainda os culturais. Aqui se exige uma atuação POSITIVA do Estado. Leia-se: prestações. Esse direitos são, em sua maioria, coletivos.Constitucionalismo Contemporâneo: inicia-se após o fim da segunda guerra mundial, em 1945. A partir da metade do século passado surge uma corrente filosófica denominada PÓS-POSITIVISMO que busca um equilíbrio entre o jusnaturalismo e o positivismo. Preocupa-se com o aspecto material / conteúdo do direito, e não só com o aspecto formal / científico do direito.Segundo Rodolfo Viana, “A história do constitucionalismo contemporâneo centra-se na ideia de conformação da realidade política segundo uma lógica de contraposição ao mundo volátil, das emoções e das motivações políticas, contra a imagem malévola do Estado nacional, surge como a razão, traço de estabilidade, vetor de segurança.” Sem desprestigiar a contribuição da teoria da constituição como vetor de conformação da realidade política, mister ressaltar que a função controladora da constituição substitui a própria estabilidade enquanto paradigma regulador da ordem política, segundo um processo de constitucionalização do discurso público. No outro giro, autores como Habermas, Canotilho, Ulrich Preuss destacam a necessidade de se fundar o discurso da constitucionalidade a partir do discurso da democracia. A função da constituição enquanto objeto de regulamentação político-social está relacionada à função e limitação do poder, nomeadamente, do poder estatal. Esse é o traço comum que permeia o constitucionalismo clássico e os vários discursos constitucionais.

2) Modelos e ciclos constitucionais.

Modelos e ciclos. Modelo historicista do constitucionalismo inglês: a) garantia dos direitos adquirido de propriedade e liberdade; (b) estruturação corporativa por estamentos; (c) regulação desses direitos por meio de “contrato de domínio”, como a Magna Charta, de 1215, que evoluiu para outros momentos constitucionais como a Petition of Rights, de 1628, o Habeas Corpus Act, de 1679, e o Bill of Rights, de 1689, sedimentando algumas dimensões que

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueestruturam o constitucionalismo. Modelo individualista- revolucionário francês. Direitos naturais do indivíduo (Déclaration Universelle des Droits de L’Homme e du Citoyen, de 1789). Além da propriedade e da liberdade, também se derruba todo o ancién régime, os privilégios de estamentos. A ordem política é querida e constituída através de um contrato social assente nas vontades individuais, expresso por meio do poder constituinte (poder originário da Nação – soberania nacional), que cria um documento escrito, a constituição (para a garantia dos direitos e a limitação do poder político). Modelo estadunidense: permitir ao corpo constituinte do povo fixar num texto escrito as regras disciplinadoras do poder – a constituição como lei superior hierarquicamente (limited government), interpretada pelo Poder Judiciário (judicial review e controle de constitucionalidade) (Canotilho, 2003). Ciclos: Estado Liberal não-democrático (sufrágio restrito, soberania nacional), séc. XIX; Estado Social democrático (sufrágio universal, soberania popular), séc. XX. TEXTO QUE CONSTA NO RESUMO DO 25.º CONCURSO

Pode-se apontar 3 (três) modelos constitucionais, ou paradigmas constitucionais (segundo Rodolfo Viana), são eles: liberal, social e democrático. Vejamos:I) Modelo liberal (século XVIII até início do século XX): o Estado liberal é marcado pela indiferença de valores coletivos. O perfil era de total afastamento do público e privado. A constituição era a ordem jurídica fundamental do estado, desprovida de axiologia, enquanto o código civil trazia a ordem jurídica fundamental da sociedade. Os indivíduos eram formais perante a lei e buscavam a satisfação dos seus interesses sem a intervenção do estado, que era o inimigo tão combatido. A propriedade e o contrato eram os pilares de um regime dedicado à apropriação e à conservação de bens. Os direitos fundamentais se realizavam na autonomia privada, refletindo a clivagem entre público e particular, diante de um estado ausente, tão somente espectador. Acredita-se que o indivíduo é plenamente capaz de satisfazer todas as suas necessidades, bastando que fique livre o máximo possível. O Estado tinha funções mínimas, garantindo a liberdade ao máximo possível. Nesse contexto, tem-se o surgimento da primeira dimensão dos direitos fundamentais, direitos de defesa, com primazia ao indivíduo. É um ideal abstencionista, cunhado na preservação dos direitos naturais e liberdades no seio da sociedade, como prioridade do indivíduo sobre a comunidade(ideais iluministas). O direito era visto despido de valores, como ciência pura. Era uma verdadeira miopia. As constituições marco são a dos EUA de 1787 e Francesa de 1791. Os pressupostos teóricos do modelo liberal advém dos paradigmas da modernidade. Temos uma passagem da teologia ao racionalismo, inversão da perspectiva organicista para a mecanicismo. Assim, as palavras chaves são: as revoluções liberais, o liberalismo e a posição central doindivíduo. Esse modelo traz a noção de constituição moderna: forma escrita, rígida, com a separação estática dos poderes.II) Modelo Social (início do século XX): nas primeiras décadas do século XX, o Estado liberal demonstrou sinais de fadiga, especificamente pela revolução industrial. A mão invisível do mercado (expressão cunhada por John Locke) não foi capaz de solucionar as premências sociais. A percepção de que o ordenamento deveria agir para atenuar as desigualdades e libertar os indivíduos de necessidades propiciou o surgimento do intervencionista Estado social (“welfare state”). Passa-se a reconhecer que todos os indivíduos necessitam de auxílio (em maior ou menor proporção), cuja aptidão natural é do Estado Nacional. Este passa a intervir na atividade socioeconômica (Estado intervencionista ou regulador), para promover o equilíbrio e igualdade material entre as diversas camadas da sociedade. Assim, surgiram os direitos de segunda dimensão, marcado pela efetivação de prestações positivas, pela concessão de direitos promocionais e condições materiais para o desfrute de liberdades. O marco do Estado social é a Constituição de Querétaro (Mexicana de 1917), e de Weimar (Alemã de 1919). Aqui se

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerquevislumbra a força da constituição material e a autonomia da Teoria da Constituição. O viés era a preocupação com os direitos sociais e econômicos, com significativa influência dos ideais comunistas e socialistas de Marx e Engels, que propalavam a concepção de estado como meio para se fazer justiça social. Surgem vários ramos do Direito Público, tais como: Direito Previdenciário, Direito Administrativo, Direito Tributário, inclusive com ampla proteção mesmo nas relações privadas (p. ex. legislação trabalhista e Código de Defesa do Consumidor). O modelo social também entrou em crise por fatores econômicos(queda da bolsa de valores de Nova York, a grande depressão) e políticos ( segunda guerra mundial). Além de outros fatores tais como: da globalização, complexidade, sociedade de risco e crise da democracia representativa.III) Modelo Democrático (final da segunda guerra)A terceira fase inicia-se no final da 2ª Guerra Mundial e acentua-se na década de 1980, com o fim da Guerra Fria. Após a segunda guerra mundial, marcada pelos despautérios dos alemães que, em nome da limpeza étnica e superioridade da raça ariana, cometeram as atrocidades com os judeus sob manto protetivo do “Estado das leis”, a sociedade internacional passou a perceber a existência de problemas comuns a todos os países. O Modelo Democrático tem com paradigma a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, cujo elemento fundante é a dignidade da pessoa humana.O indivíduo passa a ser preocupação não só do seu país de origem, mas de toda a ordem internacional, que, de modo subsidiário, tem o dever de auxiliar na proteção dos assuntos de interesse mundial. Nesse contexto, surgem organismos internacionais (ex: ONU, OMC, União Européia, etc.), com o fim de auxiliar os Estados na proteção dos direitos humanos. O Direito interno passa a interagir intensamente com o Direito Internacional. No Brasil, a Constituição de 1988 marca essa nova consciência (redemocratização). As Constituições pós-segunda guerra têm como pressupostos teóricos o pluralismo, discursividade, principialismo e pós-positivismo. O modelo de Estado Democrático é cooperativo estratégico, com uma administração pública negocial e dialógica, sob o controle da sociedade, já que há um resgate ao princípio participativo, sendo a esfera pública o novo habitat.O paradigma democrático ampliou o conceito de “gerações” (expressão cunhada por Karel Vasak) dos direitos fundamentais (3.ª dimensão dos direitos, ligados à fraternidade e solidariedade), passou a conceber a ideia de bloco de constitucionalidade, eficácia horizontal dos direitos fundamentais, força normativa da constituição, expansão da jurisdição constitucional e reelaboração da interpretação constitucional.

Ciclos constitucionais: Segundo Luiz Roberto Barroso (pg. 121), Jonh Elster identificou sete cinclos constitucionais: “1) entre 1780 a 1791, inúmeros estados situados no continente americano, inclusive os EUA, Polônia e França elaboraram constituições escritas; 2) em 1848, um conjunto de revoluções ocorridas na Europa produziu constituições em mais de cinquenta países, levando em conta, para esse fim, os inúmeros pequenos Estados que viriam a constituir a Itália e a Alemanha ; 3) após primeira guerra mundial, foram criados ou recriados Estados como a Polônia e a Tcheckoslováquia, e na Alemanha entrou em vigor a Constituição de Weimar; 4) após segunda guerra mundial, as nações derrotadas adotaram novas constituições, sob tutela mais ou menos estrita dos aliados; 5) com o fim dos impérios coloniais, uma nova onda se formou, começou com Índia e Paquistão, na década de 40, e chegou ao seu ápice ao longo da década de 60, envolvendo países como a Costa do Marfim, Gana e Nigéria; 6) Com o fim das ditaduras no sul da Europa, nos anos 70, Portugal, Espanha e Grécia ganharam novas constituições democráticas; 7) com o fim das ditaduras latino-americanas, na década de 80, e com a derrocada do comunismo na Europa oriental e central, na virada para a década de 90, inúmeros países adotaram novas constituições.” Extrai-se do exame dos ciclos apresentados

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueque, o poder constituinte comumente se manifesta através de uma revolução, criação de um novo Estado, derrota na guerra, ou transição política pacífica. Complementa o autor: “o poder constituinte se diz fundacional ou pós-fundacional, conforme resulte na formação originária de um Estado ou apenas reordenação de um Estado preexistente.”Conforme entendimento de José Adércio (O CONSTITUCIONALISMO MODERNO E OS CICLOS CONSTITUCIONAIS, encaminhado pelo grupo), os ciclos constitucionais têm como base três momentos distintos, são eles: as fundações, o ciclo da restauração e o ciclo social.1) Segundo o autor, as fundações têm como marco a declaração de independência dos Estados Unidos da América, em 1776, que traz como ideologia a proclamação “do direito de os povos se autogovernarem”. “A grande mudança de enfoque que deu início ao constitucionalismo moderno foi, em verdade, a Declaração de Direitos de Virgínia, de 12 de junho de 1776.” Afasta-se a origem divina e a majestade real para assegurar que todo poder pertence ao povo e, consequentemente, todo o poder deriva do povo. Complementa o autor: “A Constituição dos Estados Unidos da América é vista como um marco na história do constitucionalismo moderno. Ela contém o primeiro exemplo de república como forma de governo, de federalismo como forma de estado e de presidencialismo como sistema de governo.” Arremata afirmando: “Com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão – o outro marco capital do constitucionalismo – base para o texto constitucional francês de 1791, foi pela primeira vez estabelecida, num documento constitucional, “a teoria refletiva no art. 16, segundo a qual só se pode falar de uma constituição, com o sentido que lhe é atribuído pelo constitucionalismo moderno, desde que se observe nos textos uma adesão a certos requisitos anteriormente definidos. Conforme se vê: Art. 16.º A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.” Percebe-se que este ciclo está interligado ao modelo constitucional de Estado liberal. 2)Ciclo das restaurações: depois da queda o regime napoleônico, em 1815, há um restabelecimento das monarquias, que se apresentam de forma limitada. O ciclo das restaurações é marcado por constituições outorgadas, elaboradas sob um processo autoritário (Ex: as constituições napoleônicas do início do século XIX, a dos Bourbons, de 1814, e a do Império do Brasil, de 1824). Insta ressaltar que, todas elas propunham a soberania popular, os princípios universais – aqueles que podem ser aceitos por todas as culturas –, os direitos humanos, o governo representativo e a independência do poder judiciário, ou seja, as constituições da restauração não restabeleceram a monarquia absoluta, mas “apenas introduziram, de forma até generalizada, a monarquia limitada, já experimentada na Inglaterra”. Este ciclo é uma lacuna entre o modelo liberal e social, no entanto, não se pode deixar de reconhecer que o liberalismo perdurou pelo século XIX;3) Ciclo social: segundo o autor, “este ciclo tem início com a promulgação da Constituição Francesa de 1793, a chamada Constituição Jacobina que, a despeito de não ter sido aplicada, teve importante influência no desenvolvimento das ideias políticas, pois foi a primeira a enunciar os direitos sociais, como o direito ao trabalho e à educação.” Em decorrências dessas ideologias vários movimentos revolucionários eclodiram, o do México, em 1910, e o da Rússia, em 1917. “Estas revoltas contribuíram para o amadurecimento, no constitucionalismo moderno, do chamado ciclo social, que orienta a atuação do Estado para uma maior intervenção do Estado no domínio econômico, com a finalidade de estabelecer uma sociedade menos desigual, na qual se reconheça, o que se denomina hoje em dia, justiça social.(...) Predominantemente, as Constituições do século XVIII como a norte-americana (1787) e a francesa de 1791 consagram o liberalismo-individualismo e, não dedicaram maior atenção aos direitos sociais. A inscrição dos direitos sociais nas constituições está na razão direta do recrudescimento da questão social.” As constituições marco deste ciclo são: a) “Constituição Mexicana de 1917 traz em seu bojo valores sociológicos, antropológicos e culturais que, interpretados, procuram resgatar a enorme dívida social e o

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerquecompromisso quanto ao seu resgate; b) O texto político alemão de 1919 (Weimar) possui diversos artigos que versam sobre a constitucionalização de normas de direito social, como por exemplo, o art. 151: “a economia tem que se basear nos princípios de justiça, com objetivo de garantir a todos uma existência digna”. Percebe-se que este ciclo está interligado ao modelo social.

3) Constitucionalismo principialista e neopositivismo.

Com o advento do pós-positivismo (neopositivismo), movimento deflagrado após a segunda guerra mundial, que se traduz, sinteticamente, na reaproximação entre Direito e Moral, bem como na inclusão de aspectos valorativos na criação e interpretação das normas jurídicas, o sistema jurídico passou por uma releitura, repersonificação, com introdução de novos conceitos e paradigmas. Também conhecido como giro Kantiano (“ Kantische Wende”) ou virada Kantiana, o neopositivismo buscou no pensamento clássico de Kant a ideia de que o homem, por ser pessoa, no que distingue das coisas, constitui um fim em si mesmo, assim, não pode ser considerado como simples meio, mero objeto de ação do estado e da sociedade e da própria pessoa, de tal sorte que é vedada a sua instrumentalização e degradação, para repaginar o Direito. Busca harmonia entre o positivismo e o jusnaturalismo. Não é abandono da positividade do direito, é ir além dela.Por motivo de sobrevivência da humanidade, o mundo teve que reagir contra as atrocidades da Alemanha que, fulcrada no seu Estado de Direito, nas Leis, promoveu o holocausto contra os Judeus, no ideário de supremacia da raça. Percebeu-se que, o positivismo jurídico já não se sustentava por si só, era necessário incluir padrões axiológicos nas normas jurídicas, evitando-se, assim, que as normas tivessem qualquer conteúdo, tornando-se válidas pelo simples fato de serem emanadas do Estado. Os estudiosos pós-segunda guerra perceberam que Direito e Moral não são antitéticos, ao contrário se aproximam, inclusive no contexto normativo jurídico. Os princípios foram elevados à categoria de normas jurídicas. A doutrina passou a não mais distinguir norma e princípio. Norma é gênero do qual são espécies os princípios e as regras. A distinção que se busca hoje é princípios e regras. Da leitura alemã de Robert Alexy, tem-se a distinção entre normas-regras, que são aquelas que possuem solução predeterminada no enunciado normativo, resolvem-se pela técnica da subsunção, e normas-princípio, são mandados de otimização, abstratos, abertos e irradiantes. Em caso de conflito, resolvem-se pela técnica da ponderação. Nesse diagrama neopositivista surgiram a nova hermenêutica constitucional, principiologia jurídica, neoconstitucionalismo (expressão cunhada por Miguel Carbonell, introduzida no Brasil por Luiz Roberto Barroso). Ultrapassamos o ideal eminentemente patrimonialista da revolução francesa, a utopia do Estado Social, para alcançar o Estado Democrático de Direito, que não deixa de ser social, tampouco se dissipa nevralgicamente do Estado liberal. Os direitos fundamentais e direitos humanos são postos em evidência. A humanidade passou a ser concebida como pauta universal, respeitando-se à diferença, o multiculturalismo e a plurietinicidade, afastando-se de padrões pré-concebidos para evitar o preconceito.Assim, a ideia de constitucionalismo principialista decorre da constitucionalização dos princípios gerais do direito, que está intimamente interligada ao neopositivismo. A teoria dos princípios passou a ter papel importantíssimo nas constituições pós-guerra (2.ª guerra). Os princípios são o fundamento da ordem jurídica. Na lição de Bobbio, citado por Bonavides, os princípios tem 4(quatro) funções: interpretativa, integrativa, diretiva (princípios programáticos das Constituições) e a função limitativa, sendo máximo o grau de intensidade vinculante dos princípios no exercício das funções limitativa e integrativa.

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4) Constituição: concepções. Classificação. Supremacia. Liberalismo e Dirigismo.

4.1)concepções:

Na concepção clássica, temos as seguintes acepções do termo constituição: sociológico, jurídico, político e cultural.- Concepção Sociológica: Proposta por Ferdinand Lassalle no livro "A essência da Constituição". Enxerga a Constituição sob o aspecto da relação entre os fatores sociais dentro do Estado. Para Lassalle havia uma Constituição real (ou efetiva – definição clássica – é a soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação) e uma Constituição escrita, que não passa de uma folha de papel. A Constituição escrita, para ser legítima, deve coadu com a Constituição real ou efetiva.- Concepção Jurídica ou concepção puramente normativa da Constituição: Hans Kelsen - "Teoria Pura do Direito". A Constituição é puro dever-ser, norma pura, não devendo buscar seu fundamento na filosofia, na sociologia ou na política, mas na própria ciência jurídica. Constituição deve poder ser entendida no sentido: a) lógico-jurídico: norma fundamental hipotética: fundamental porque é ela que nos dá o fundamento da Constituição; hipotética porque essa norma não é posta pelo Estado é apenas pressuposta. Não está a sua base no direito positivo ou posto, já que ela própria está no topo do ordenamento; e b) jurídico-positivo: é aquela feita pelo poder constituinte, constituição escrita, é a norma que fundamenta todo o ordenamento jurídico. No nosso caso seria a CF/88. É algo que está no direito positivo, no topo na pirâmide. A norma infraconstitucional deve observar a norma superior e a Constituição, por conseqüência. Dessa concepção nasce a idéia de supremacia formal constitucional e controle de constitucionalidade, e de rigidez constitucional, ou seja, necessidade de proteger a norma que dá validade a todo o ordenamento. Para ele nunca se pode entender o direito como fato social, mas sim como norma, um sistema escalonado de normas estruturas e dispostas hierarquicamente, onde a norma fundamental fecha o ordenamento jurídico dando unidade ao direito.- Concepção Política: Defendida por Carl Schmitt no livro "Teoria da Constituição". Busca-se o fundamento da Constituição na decisão política fundamental que antecede a elaboração da Constituição - aquela decisão sem a qual não se organiza ou funda um Estado. Ex: Estado unitário ou federação, Estado Democrático ou não, parlamentarismo ou presidencialismo, quais serão os direitos fundamentais etc. - podem estar ou não no texto escrito. O autor diferencia Constituição de Lei Constitucional. A 1ª traz as normas que decorrem da decisão política fundamental, normas estruturantes do Estado, que nunca poderão ser reformadas. A 2ª será que estiver no texto escrito, mas não for decisão política fundamental, ex: art. 242, §§ 1º e 2º, CF - é matéria adstrita à lei, mas que está na Constituição, podendo ser reformadas por processo de reforma constitucional.- Concepção Cultural: A Constituição é produto da cultura (fato cultural). Trabalha de forma complementar todas as concepções descritas acima(sociológica, jurídica e política) desenvolvendo a lógica de que a constituição possui fundamentos diversos arraigados em fatores de poder, decisões políticas do povo e normas jurídicas de dever ser vinculantes. Surge aqui a ideia de uma constituição total.Na concepção moderna, temos as seguintes acepções do termo constituição: força normativa da constituição; constitucionalização simbólica; constituição aberta; constituição dirigente.- Força Normativa da Constituição – Konrad Hesse - critica e rebate a concepção tratada por Ferdinand Lassalle. A Constituição possui uma força normativa capaz de modificar a realidade,

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueobrigando as pessoas. Nem sempre cederia frente aos fatores reais de poder, pois obriga. Tanto pode a Constituição escrita sucumbir, quanto prevalecer, modificando a sociedade. O STF tem utilizado bastante esse princípio da força normativa da Constituição em suas decisões.-Constitucionalização Simbólica – Marcelo Neves. Cita o autor que a norma é mero símbolo. O legislador não a teria criado para ser concretizada. Nenhum Estado Ditatorial elimina da Constituição os direitos fundamentais, apenas os ignora. Ex: salário-mínimo que "assegura" vários direitos.- Constituição Aberta – Peter Häberle e Carlos Alberto Siqueira Castro. Leva em consideração que a Constituição tem objeto dinâmico e aberto, para que se adapte às novas expectativas e necessidades do cidadão. Se for aberta, admite emendas formais (EC) e informais (mutações constitucionais), está repleta de conceitos jurídicos indeterminados. Ex: art. 5º, XI, CF - no conceito de "casa" está incluso a casa e o escritório onde exerce atividade profissional. A ideia dele é que nós devemos urgentemente recusar a ideia de que a interpretação deve ser monopolizada exclusivamente pelos juristas. Para que a Constituição se concretize e necessário que todos os cidadãos se envolvam num processo de interpretação e aplicação da constituição. O titular o poder constituinte é a sociedade, por isso ela deve se envolver no processo hermenêutico de materialização da constituição. Essa idéia abre espaço para que os cidadãos participem cada vez mais nessa interpretação.- Constituição Dirigente. (abaixo explicitada)

4.2) Classificação das Constituições:4.2.1)Quanto ao conteúdo: a) material: correspondem aos termos tipicamente constitucionais, (p. ex. direitos e garantias fundamentais, separação de poderes, etc.), independentemente de estarem expressamente previstas na Constituição; b) formal: correspondem às normas inseridas expressa ou implicitamente em documentos reconhecidos como Constituição, independentemente de tratarem de temas tipicamente constitucionais.4.2.2) Quanto à forma de apresentação: a) escritas: são as Constituições elaboradas de forma solene e consolidadas no mesmo documento, também chamadas de orgânicas e dogmáticas (há previsão expressa, dá certeza da obrigatoriedade. b) constituição não escrita: é formada pelo conjunto de textos esparsos, costumes e jurisprudência. Não esta consolidada num único documento organizado, e por isso é inorgânica. Também é chamada de histórica, porque é formada de textos escritos, jurisprudência e costumes ao longo do tempo. Exemplo Constituição Inglesa, que vem sendo formada desde a Magna Carta de 1215.4.2.3) Quanto ao modo de elaboração: a) dogmática: escrita e sistematizada em um documento que traz ideais dominantes em uma sociedade, num determinado período histórico. Equivale à constituição escrita quanto à forma. b) histórica: elaborada de forma esparsa no decorrer do tempo. Equivale à constituição escrita quanto à forma.4.2.4)Quanto a Origem: a) Democrática, popular ou promulgada : são as constituições elaboradas com a participação popular. Ex.: o povo escolhe os Constituintes, admitem-se iniciativas por parte da sociedade, proposta de artigos por sindicatos, universidades e etc. Um ou outro tema, podem ser levados a peblicitos (manifestação popular prévia a uma decisão política) e referendo (manifestação popular que aprova ou rejeita uma decisão política já tomada). b) Outorgada : é elaborada sem a participação popular, normalmente por governos totalitários. A Constituição brasileira de 1824 (império), de 1937 (a polaca) e a emenda 1ª de 1969 (regime militar) foram outorgadas. A constituição de 1967 foi outorgada de fato, mas não de direito, pois o congresso nacional recebeu projeto do governo militar para análise, no entanto, em período exíguo (curto). c) Cesarista: o governo elabora um projeto que é levado a referendo. É um modelo que se encontra entre a constituição democrática e a outorgada, nela

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueou se aceita tudo, ou se rejeita tudo. Ex.: Constituição chilena do governo Pinochet. d) Dualista ou pactuada: decorre de um acordo entre o Rei e o Parlamento. É referência especifica para os aspectos que formam a Constituição Inglesa.4.2.5) Quanto a estabilidade: A dinâmica da vida social provoca contínuas mudanças nos valores dos seres humanos. Ao mesmo tempo em que se reflete nas normas jurídicas. De outro lado, dentro do possível, o direito também procura organizar os comportamentos sociais, razão pela qual atua em causa e efeito com as mudanças sociais. Em conclusão, se a sociedade muda, o direito também deve mudar.Para que as constituições sejam capazes de acompanhar as transformações, elas admitem modos formais e informações de alteração. Os modos formais são emendas que alteram o próprio texto. Os modos informais não mudam o texto, mas a maneira como o texto é compreendido, o que é feito pela jurisprudência , costumes , doutrina, etc. Para que seja possível a mudança informal, a constituição emprega normas principais (ex.: cidadania) e conceitos jurídicos indeterminados (urgência e relevância). Todavia, uma constituição formada apenas por princípios ou conceitos indeterminados se torna muito vaga, razão pela qual é necessário também usar normas, regras, que dão ideias mais claras e objetivas. Para Canotilho, Celso Bastos e grande parte da doutrina brasileira, recomendam uma constituição que combinam normas princípios e normas regras, o que chamam de constituição aberta, que admite processos formais e informais de alteração. Assim, quanto ao aspecto formal de alteração as constituições podem ser: a) Imutáveis: não admitem qualquer alteração. Significa que toda constituição é pétrea, não há exemplos na atualidade. b ) Rígidas : admitem alteração apenas por processo agravado. No caso Brasileiro, o agravamento visa a legitimação democrática de 3/5, e a estabilidade da mudança em 2 turnos. Não é a cláusula pétrea que caracteriza a constituição rígida, mas sim o rito agravado. Se a constituição rígida tiver cláusula pétrea, ela fica a meio caminho também da constituição imutável, e é chamada por parte da doutrina de constituição super-rígida. c) Semi-rígida : parte da constituição é alterada por procedimento agravado e outra parte por procedimento simples ou flexível. A constituição de 1824 foi semi-rígida em seu artigo 178. d) Flexível: toda Constituição é alterada por procedimento simples. Na Inglatera não há controle de constitucionalidade de leis, pois a constituição é flexível.4.2.6) Quanto a extensão: a) breve ou sintética:trata apenas dos assuntos principais, tais como: princípios fundamentais de organização do Estado e da sociedade. Em regra, são constituições principiológicas. Ex: A constituição americana de 1787. b) Extensa ou analítica : também chamada de prolixa, é aquela elaborada de forma extensa, que desce a pormenores. Ex: CR/88, que combina princípios e regras formando a constituição aberta. 4.2.7) Quanto a finalidade: a) Liberal : coincide com as constituições do século XVII e XIX, com as características do período liberal, acima explicitado. b) Social: s ão constituições que surgem a partir do século XX (Constituição Weimar de 1919), também explicitada. c)Dirigente : Corresponde às Constituições que procuram preservar as liberdades democráticas e a democracia econômica social. Essas constituições utilizam normas programáticas, que tratam de assuntos socioeconômicos, estabelece metas a serem alcançadas por políticas publicas sucessivas. (art 3º, inc III e artigo 7º, inc XI da CR/88). A constituição serve para dirigir a sociedade na busca dos objetivos programáticos. Tem viés de futuro, típica de Estado social e de pano de fundo programático (democracias sociais). d)Balanço: é uma constituição típica dos regimes socialistas, trabalha o presente, registra o avanço na busca do socialismo. Ex.: Constituição Russa e Soviéticas, na fase do socialismo. e) Garantia pode ser empregada como sinônimo de constituição liberal (garante as liberdades) ou constituição social (fala-se eM garantismo no sentido das políticas públicas que resguardam o mínimo necessário aos indivíduos).

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueA constituição Brasileira é: formal; orgânica; escrita; dogmática; democrática ou promulgada; rígida ou supra-rígida; aberta; analítica e dirigente.

4.3) Supremacia. Independentemente das opções ideológicas e políticas do constituinte, toda Constituição tem os seguintes princípios: 1- princípio democrático; 2- limitação de poder; 3- supremacia da Constituição.Do ponto de vista político, a constituição é Suprema porque advém da soberania popular, que se exterioriza através do poder constituinte originário. Por ser resultado da soberania popular a constituição é dotada de supremacia e prevalece sobre o processo político majoritário, isto é, sobre o poder constituído e sobre as leis em geral. As Constituições trazem as normas básicas de estruturação da sociedade e do Estado (decisão política fundamental), elas são os principais documentos jurídicos e subordinam todos os demais (Supremacia da Constituição).

4.4) Liberalismo e Dirigismo.

O esgotamento do Estado liberal, marcado pela postura formalista e abstencionista, deu abertura ao Estado social, cujo paradigma é a intervenção estatal para a promoção de políticas públicas. Assim, o Estado precisou ser remodelado, saindo do liberalismo, para assumir posição ativa, ampliativa, passando a exercer uma função dirigente em prol da justiça social. O liberalismo engloba o aspecto político, ao qual estão associadas a primeira fase do constitucionalismo (revoluções burguesas e implantação do Estado Liberal – final do séc. XVIII e séc. XIX), caracterizado pelo “Estado mínimo”, separação de poderes, liberdades públicas (direitos fundamentais de 1.ª dimensão); e econômico, calcado na propriedade privada e autonomia privada (absolutas, isto é, sem interferências do Estado/Direito), isto é, “livre mercado” (capitalismo “puro”). Ao Estado cabe apenas garantir a propriedade e a liberdade (autonomia da vontade/contratual) privadas, não devendo interferir na vida da “sociedade civil” (vista como separada do Estado).O constitucionalismo do bem-estar social trilha um caminho ideologicamente oposto ao liberalismo, que se fundava na tônica da defesa das liberdades individuais, dos direitos fundamentais contra a ação do próprio Estado, que se limitava em fornecer segurança e proteger às liberdades e à propriedade. Após a 1ª guerra mundial, assiste-se a uma mudança de ideologias no Direito Público mundial. Os direitos fundamentais passam a ser vistos como necessidades positivas, ou seja, o Poder Público passa a intervir através de um fazer para resguardar a igualdade material entre os seres sociais. Nesse contexto surge o dirigismo, que propugna a intervenção do Estado na economia e na vida privada. A propriedade e a autonomia privadas passam a ser limitadas no interesse coletivo (função social) e mesmo reconfiguradas (alteração da própria natureza dos institutos, intrinsecamente; p.ex., “bem socioambiental”), com a “publicização do direito privado”. Não há mais a cisão entre Estado vs. Sociedade civil. Direitos fundamentais de 2ª e 3ª dimensões. Ao Estado cabe dirigir a atividade econômica (e privada em geral) para atingir as finalidades estatais (democrática e constitucionalmente definidas, como “promover o bem de todos” e “construir uma sociedade livre, justa e solidária”), dentro de uma estrutura individual, isto é, os direitos de 1ª dimensão permanecem, ainda que não liberal, mas sim Democrático-Social.

J.J. Canotilho desenvolve a ideia de Constituição dirigente. Para o autor, a constituição passa interferir de modo ativo na sociedade, fornecendo prestações exigidas pelas demandas sociais que clamavam por justiça social. Segue uma rota ideológica oposta ao Estado liberal. A Constituição dirigente não pode ser compreendida como um instituto jurídico-político

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueestruturador do estado e definidor do sistema de competências e atribuições dos seus órgãos. Ela tem função de organização do plano normativo-material global, dotada de um caráter aberto, cláusulas gerais, que vincula os poderes públicos em busca da concretude dos anseios populares. Isso significa uma imposição da ordem constitucional à ordem política, que se sujeita aos postulados constitucionais. Tal posicionamento acabou por ser revisto pelo professor, diante de alguns problemas que foi incapaz de solucionar: problemas de inclusão, de referência, de reflexão, de universalização, de materialização do direito e de reinvenção do território estatal. Assim, passou a seguir a ideia de constitucionalismo moralmente reflexivo, formulado por Ulrich Preuss e seguido de perto por Canotilho. Busca o equilíbrio da pré-ordenação e pós-odenação, entre a força dirigente e a força dialógica, vocacionando à sensibilidade contextual dos fundamentos da Teoria da constituição. É aquele que perfaz, ao mesmo tempo, as exigências constitucionais mínimas, isto é, o conjunto de direitos fundamentais antimajoritários, bem como fundamentos adequados a uma teoria de justiça, definindo as estruturas básicas da sociedade sem se comprometer com situações particulares. Ele aponta 3 núcleos moralmente atrativos: positivação constitucional dos direitos sociais como condição para o livre desenvolvimento da personalidade; a possibilidade de ilhas de particularismos (crianças,idosos,mulheres...); os quatro contratos globais (redução das desigualdades - da tolerância e do dialogo- da democracia- desenvolvimento sustentado).

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerque

ITEM: 1.b. Poder Legislativo. Organização. Atribuições do Congresso Nacional. Competências do Senado e da Câmara. Legislativo e soberania popular. A crise da representação política.

Obras consultadas:BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª ed. Malheiros: 2009.FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. Lumen Juris: 2011. FERREIRA MENDES, Gilmar.Curso de Direito Constitucional. 7ª ed. Saraiva: 2012Legislação básica.Art. 44, 46, 48 e inciso, 49 e incisos, 51 e incisos, 58 e incisos, CR/88.

Noções Gerais

a) Organização

O Legislativo da União é bicameral, exercido pelo Congresso Nacional, formado por duas Casas (Câmara dos Deputados e Senado Federal). Nas demais unidades da federação o legislativo é unicameral, Assembleia legislativa nos Estado e Câmara de Vereadores nos municípios (representantes do povo). Trata-se de bicameralismo do tipo federativo, em razão da nossa forma de Estado (federação). Não há federação sem que os Estados participem da criação da lei. É o princípio da participação na manutenção do equilíbrio federativo. Também é um bicameralismo de equilíbrio ou de equivalência, pois ambas as Casas possuem a mesma importância. Não existe hierarquia jurídica entre Câmara e Senado, e por isso a constituição alterna preferências para essas Casas. Na substituição presidencial a ordem é a seguinte: assunção do vice-presidente, presidente da Câmara e presidente do Senado. Já a presidência do Congresso Nacional é exercida pelo presidente do Senado. Cabe aqui apresentar conceitos básicos: Legislatura - período de 4 anos, que corresponde ao mandato dos deputados. As legislaturas são divididas em 4 sessões legislaturas (coincidem com o ano civil) e cada sessão é dividida em períodos legislativo, que vão de: 2 de fevereiro a 17 de julho, e 1 de agosto a 22 de dezembro (nos intervalos há recesso parlamentar). A Câmara dos deputados representa o povo dos Estados e do DF. Cada unidade federativa terá a representatividade de, no mínimo, 8 Deputados e, no máximo, 70, conforme a população ( LC n.º: 78/93). Os territórios terão 4 deputados federais independentemente da população. A escolha dos deputados é pelo sistema proporcional de votos obtidos pelos partidos, ou coligações, enquanto os suplentes são os não obtiveram números de votos suficientes para alcançar o coeficiente eleitoral. No Brasil, temos hoje 513 deputados federais. O número de deputados federais repercute no número de deputados estaduais. Se o Estado tem 8 deputados federais, terá (x 3 o número de deputados federais) 24 deputados estaduais. “Atingido o número de trinta e seis, será acrescido de tantos quantos forem os Deputados Federais acima de doze.”(art. 27 da CR/88). 0 mandato dos deputados federais é de 4 anos. Idade mínima de 21 anos, possuir condições de elegibilidade e não ser inelegível.

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueO Senado Federal representa os Estados Membros e o DF, cada um com 3 Senadores (territórios não tem Senador). Os Senadores deverão ter no mínimo 35 anos de idade (assim como os deputados não há idade máxima, e nem proibição a reeleição). Os Senadores são escolhidos pelo sistema majoritário, e cada chapa deverá ter um cabeça e dois suplentes (ou seja, vota-se na chapa). Os Senadores terão mandato de 8 anos, sendo renovados a cada 4 anos, na proporção de 1/3 e 2/3. Em razão de nossa forma de Estado federativa (ou federação), os Estados-membros participam da formulação da lei. Não há nenhuma lei no Brasil da qual não participem na sua formulação os membros representantes dos Estados-membros e do DF. O único lugar em que os Estados-membros são iguais, apesar de suas diferenças territoriais, políticas e econômicas, é no Senado, já que cada Estado é representado por 3 senadores. Os senadores são eleitos pelo sistema eleitoral majoritário, diferentemente dos deputados federais, deputados estaduais, que são eleitos pelo sistema proporcional. O mandato do senador: 8 anos. Cada senador é eleito com 2 suplentes que são registrados junto com o candidato ao Senado. Isso significa dizer que se o senador morrer, renunciar, quem assume é o suplente. Mesa é o órgão de direção de um colegiado. A mesa é encarregada pela condução dos trabalhos legislativos e administrativos. Assim, todo colegiado deve ser dotado de uma mesa, órgão administrativo que conduz os trabalhos daquele colegiado. No Legislativo da União existem 3 Mesas. Mesa da Câmara dos Deputados: é formada só por deputados federais. Mesa do Senado Federal: é formada só por senadores. Mesa do Congresso Nacional: é formada por senadores e por deputados federais (nesta ordem). Os cargos das 3 Mesas (Câmara, Senado e Congresso) são: Presidente; Primeiro Vice-Presidente; Primeiro, Segundo, Terceiro e Quarto Secretários, com mandato de 2 anos, vedada a reeleição para o mesmo cargo. A Constituição proíbe a reeleição para o mesmo cargo. Essa não é uma norma de reprodução obrigatória para os Estados e Municípios. No Brasil, o Legislativo da União desempenha precipuamente duas atribuições: a) fiscalizar; b) inovar a ordem jurídica, criando leis. A fiscalização se desempenha através de duas manifestações, ou seja, existem duas espécies de fiscalização: 1ª) Fiscalização Econômico-Financeira (arts. 70 a 75), auxiliada pelo Tribunal de Contas; 2ª) Fiscalização Político-Administrativa, desempenhada pelas Comissões (art. 58). Nesse tópico, cabe-nos analisar a fiscalização político-administrativa, que é desempenhada por comissões. O art. 58 menciona três tipos de comissões: a) Comissão Temática ou Material; b) Comissão Representativa ou de Representação; c) Comissão Parlamentar de Inquérito.1)Comissão Temática ou Material: as Casas Legislativas são divididas em comissões temáticas, também chamadas de comissões materiais. Significa dizer que cada comissão debate um tema, cada comissão debate uma matéria. A organização das comissões está prevista no Regimento Interno de cada Casa. Existe uma característica própria dessas comissões... Em regra, a mesma Comissão existe na Câmara e Senado, ex. Comissão de Saúde na Câmara e Comissão de Saúde no Senado; Comissão de Educação na Câmara e Comissão de Educação no Senado; Comissão de Agricultura na Câmara, Comissão de Agricultura no Senado. A Comissão Temática mais importante é a Comissão de Constituição e Justiça - CCJ. Existe uma na Câmara e uma no Senado. Todo projeto de lei, obrigatoriamente, passa por ela, que faz o controle preventivo de constitucionalidade. Ela fornece um parecer sobre a constitucionalidade do projeto de lei que, se for incompatível, inadequado, inconstitucional, é arquivado. O parecer não é meramente opinativo, é terminativo, com possibilidade de recurso previsto em Regimento Interno de cada Casa. Depois de ser analisado pela CCJ o projeto de lei é endereçado para a comissão temática da sua área. A comissão temática é dotada da delegação interna ou delegação imprópria, que se

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerquetraduz no “poder (art. 58, § 2º, I) para aprovar projetos de lei.” Ou seja, pode aprovar projeto de lei independentemente da manifestação do Plenário.2) Comissão Representativa ou de Representação: Art. 58, § 4º: “Durante o recesso, haverá uma Comissão representativa do Congresso Nacional, eleita por suas Casas na última sessão ordinária do período legislativo, com atribuições definidas no regimento comum, cuja composição reproduzirá, quanto possível, a proporcionalidade da representação partidária.” A Comissão Representativa é mista ou conjunta porque composta por deputados federais e por senadores. 3) Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI: A Constituição de 1988 valorizou a Comissão Parlamentar de Inquérito, concedendo poderes de investigação próprio das autoridades judiciais. Ela empresta ao órgão interno do Legislativo poderes investigativos próprios das autoridades judiciais (art. 58, §3º). Leia-se: poderes de investigação = poderes instrutórios do juiz. Existem duas leis que regulamentam o art. 58,§ 3º, são elas: lei n.º: 1.579/52 (Dispõe sobre as Comissões Parlamentares de Inquérito); lei n.º: 10.001/00, além do CPP, CPC, Regimentos Internos (aplicados subsidiariamente). A toda comissão aplica-se o princípio da participação proporcional dos partidos políticos, princípio da representação proporcional partidária. As comissões e as mesas devem espelhar a representação dentro da Casa legislativa respectiva (art. 58, § 1º). a)Com fundamento nos poderes instrutórios, a CPI PODE: a.1 )Notificar testemunhas e determinar a sua condução coercitiva (testemunha, convidado ou investigado); P.S. 1) Os membros do MP podem ser convocados perante CPI na condição de investigados em razão de fatos relativos ao exercício funcional, no entanto não está obrigado a responder perguntas. O membro não pode ser obrigado a responder sobre fatos que tenha manifestado no exercício de suas atribuições constitucionais. 2) Índio não pode ser obrigado a depor em CPI, pois conduzi-lo coercitivamente traz como consequência a retirada do mesmo do seu habitat, igual a remoção forçada de sua terra, o que é vedado pela CR/88. a.2) CPI pode prender em flagrante. P.S. Não pode prender em flagrante o investigado por falso testemunho porque o investigado não é testemunha. a.3) CPI pode realizar perícias, exames, vistorias.a.4) CPI pode, diretamente, afastar o sigilo bancário e fiscal sem a necessidade de intervenção do Judiciário.P.S: CPI municipal não pode afastar o sigilo fiscal e bancário diretamente, pois não existe Judiciário municipal. CPI criada no parlamento estadual pode. CPI criada no parlamento federal pode. b) A CPI NÃO PODE (precisa da integração do Poder Judiciário): b.1) afastar o sigilo das comunicações telefônicas. Precisa da integração do Poder Judiciário (art. 5.º, XII). Só o juiz pode afastar o sigilo das comunicações telefônicas. A CPI não pode decretar a interceptação, mas pode requisitar quebra de dados telefônicos.b.2) expedir mandado de prisão.b.3) expedir mandado de busca e apreensão. Mandado de busca e apreensão só com determinação judicial.Essas três diligências são denominas de reserva constitucional de jurisdição. Também não pode proibir que o cidadão deixe o território nacional; determinar a apreensão de passaporte; determinar constrição judicial.Requisitos para a constituição da CPI: 1.º) 1/3, no mínimo, dos deputados federais e/ou senadores. 2º) Fato determinado (deve especificar e circunscrever o objeto da investigação, ter relevância pública e estar dentre as atribuições daquela Casa legislativa). 3º) Prazo certo.Não

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerqueexiste CPI permanente, em razão do princípio da segurança jurídica (art. 5º, caput). O regimento interno da Casa legislativa diz qual o prazo. Estes prazos variam de 120 a 180 dias, podendo ser prorrogado, desde que na mesma legislatura.Preenchidos os requisitos, o parlamentar tem direito líquido e certo à CPI . Segundo o STF “CPI é um direito das minorias parlamentares. Se é assim e a minoria de 1/3 entendeu que era caso de instauração de CPI e os requisitos foram cumpridos, se o partido não indicar, o Presidente do Senado deve escolher os membros dos partidos políticos para fazer parte dela” Término dos trabalhos da CPI: Ao final dos trabalhos elabora-se um relatório, que é votado pela CPI. Em sendo o caso, é remetido ao Ministério Público para que promova as ações penais e civis, sem vinculação. Também pode apresentar projetos de lei. P.S. Na CPI pode existir a participação de membros do MP acompanhando os trabalhos da CPI, designado pelo PGR ou PGJ, conforme o caso.Por fim, a CPI pode ser: SIMPLES – formada só por deputados ou só por senadores; MISTA ou CONJUNTA – formada por deputados e senadores.

b) Atribuições do Congresso Nacional. Competência do Senado e da Câmara

O art. 48 da CR/88 traz as atribuições do Congresso Nacional com a necessidade de sanção presidencial. Já o art. 49 da CR descreve competências exclusivas do Congresso Nacional sem a participação do Executivo. Via de regra, estas são exercidas mediante decreto legislativo ou resoluções, que não estão sujeitos a sanção ou veto.O art. 51 da CR prevê competências privativas da Câmara dos Deputados que, via de regra, são exercidas por resolução (não subordinada ao Senado e nem ao Presidente da Republica). Dentre as competências da Câmara estão: ser a casa de origem de praticamente todos os projetos de lei e de emenda (salvo os apresentados pelos Senadores e pelas assembleias legislativas – art. 60 da CF); autorizar por 2/3 dos seus membros o processamento de ações penais contra o Presidente da Republica (julgadas no STF), e dos crimes de responsabilidade julgados pelo Senado (impeachment), etc.A Competência privativa do Senado Federal está prevista no art. 52, dentre elas: a) “processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles (I); processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade (II); aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de: a) Magistrados, nos casos estabelecidos nesta Constituição; b) Ministros do Tribunal de Contas da União indicados pelo Presidente da República; c) Governador de Território; d) Presidente e diretores do banco central; e) Procurador-Geral da República;f) titulares de outros cargos que a lei determinar (III), etc.

c) Legislativo e soberania popular.

Jean Bodin, em 1576 , foi o primeiro pensador a tentar teorizar Soberania. Por ocasião da estruturação e criação do Estado Moderno apareceu o conceito de Soberania como um poder acima dos demais, centralizado nas mãos do monarca. Esse conceito foi fundamental para o processo de unificação do poder. No século XVIII, o constitucionalismo clássico funcionou como elemento de separação entre Estado e Monarca. Assim, a Soberania passa a ser só do Estado.

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueEm 1762, Rosseau reelabora o conceito Soberania, passando a adjetivá-lo, afirmando uma Soberania Popular. A vontade popular é ilimitada no seu poder de criação do direito.Kelsen, citado por Bernardo Gonçalves, afirma que “a soberania é qualidade do poder do Estado, sendo absoluta, já que nenhuma outra manifestação pode se contrapor à vontade estatal”. A doutrina tradicional aponta com características da Soberania: Una (um poder acima de todos); indivisível (aplica-se a todos os acontecimentos internos do Estado); inalienável (se o Estado a perder, ela desaparece); imprescritível (não há limite de duração).A ideia de Soberania popular está interligada a noção de Democracia, etimologicamente Governo do Povo. A democracia pode ser direta, exercida, sem intermediário, pelo titular do poder, o povo, ou indireta, exercida por representantes eleitos pelo povo. São instrumentos da soberania popular direta: o sufrágio, iniciativa popular, plebiscito e referendum.A Soberania popular manifesta-se no poder constituinte. Este inaugura uma nova ordem jurídica através da constituição, define os órgãos e os poderes constituídos e prevê regras capazes de garantir que a nova ordem corresponda à vontade popular. O Poder constituinte é retrato da Soberania popular. O Poder Legislativo, cuja função típica é legislar e fiscalizar, é poder constituído, criado pelo povo através do Poder constituinte. É reflexo da Soberania popular. Portanto, representa o povo. Suas decisões, para serem legítimas, devem corresponder aos anseios do povo (não cabe aqui adentrar no aspecto contramajoritário).

d) A crise da representação política

Representação política “é um fenômeno complexo, cujo núcleo consiste num processo de escolha dos governantes e de controle sobre sua ação através de eleições competitivas. É um conceito multidimensional que abarca o fenômeno da seleção de lideranças, de delegação de soberania popular, de legitimação, de controle político, de participação indireta e determinação de questionamento político.” Segundo Rodolfo Viana “A implementação dos Estados de Direito trouxe a versão indireta da democracia, que passou a ocupar a centralidade do discurso político e monopolizar a configuração concreta dos sistemas democráticos. Os institutos da delegação, da representação, da eleição e do mandato exerceram, desde a origem desses Estados, o protagonismo na compreensão e na tradução do ideal de realização da soberania popular. Muito embora tenha o século XX presenciado a inclusão constitucional de institutos de democracia direta (sobretudo referendo, plebiscito e iniciativa popular), a esperança depositada na “revolução participativa” e na correspondente reforma institucional restou circunscrita à margem da ação política, cujus modus operandi continuou, em sua grande maioria, a refletir na trilogia delegação, representação, controle político. Consequentemente, o “idioma democrático dominante”ainda se identifica com a versão representativa.”Atualmente, a democracia representativa encontra-se na penumbra, haja vista a quebra global da confiança, marcada pela corrupção, descrédito quanto a capacidade das instituições e dos agentes políticos de agir de modo funcionalmente adequado (aumento de desemprego, desajuste quanto ao quadro de financiamento do poder legislativo, declínio dos partidos políticos, queda dos índices de desempenho prestacional...)

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ITEM: 1.c. Ministério Público: História e princípios constitucionais. A tarefa de custos constitutionis: legitimidade e limitações.

Obras consultadas:BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 24ª ed. Malheiros: 2009.FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 3ª ed. Lumen Juris: 2011. FERREIRA MENDES, Gilmar.Curso de Direito Constitucional. 7ª ed. Saraiva: 2012SANTINI, Valter Foleto. O Ministério Público na Investigação Criminal. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2007Legislação básica.Art. 127 a 132 da CR/88.LC n.º: 75/93 e Lei n.º: 8.625/93

Noções Gerais: a) História

A história do Ministério Público não é muito clara. Tem-se relatos do seu surgimento no Egito há mais de quatro mil anos a.C, na figura dos Magiais, funcionários do real poder, que acumulava as funções cíveis e criminais. Na Grécia antiga, aponta-se o Temósteta ou Tesmoteta, cuja missão era a de denunciar os delitos à Assembléia do Povo ou Senado, para que este designasse um acusador. O papel de acusador não era realizado pelo Tesmoteta e sim por um cidadão escolhido para tal desempenho. Em Atenas, a figura Ministerial foi dissipada, pois a acusação era procedida pelo cidadão, mas há registros de Magistrados incumbidos de perseguir crimes públicos cometidos contra pessoas, quando houvesse receio de impunidade do acusado e nos casos em que a vítima não tomava o papel de acusador. Esses Magistrados eram denominados Tesmotestas. Contudo, há quem acredite que a origem dessa instituição se acha no direito

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerquefrancês, nas ordenanças de 25 de março de 1302, de Felipe IV, o Belo, que impôs aos seus procuradores o mesmo juramento dos Juízes, proibindo-lhes o patrocínio de negócios que não fosse o do rei. Na Idade Média, especificamente na França, os Procuradores, a princípio, eram denominados Advogados do Rei, com atribuições, originariamente e exclusiva, em ações civis, qual seja, na defesa dos desprotegidos e hipossuficientes. Com o cerceamento da justiça privada, surgem as incumbências criminais.No Brasil, mais precisamente no período colonial, o Ministério Público funcionava na advocacia da fazenda pública e na promoção de ação penal, época em que deixou de ser privada e passou a ser pública. A institucionalização do Ministério Público em uma Constituição só ocorreu no ano de 1934, que detalhadamente previu a organização do Ministério Público na União, no Distrito Federal e nos Territórios, através de leis federais, bem como a instituição do Ministério Público nos Estados, mediante leis locais. O Código de Processo Penal, datado de 1.941, atribuiu várias funções à instituição. O Ministério Público conquistou o poder de requisição de inquérito policial e de diligências, recebeu como regra, a titularidade na promoção da ação penal pública, embora ainda se permitisse o procedimento judicialiforme, abolido pela Constituição de 1.988. O período áureo do Ministério Público começou na década de 80. A publicação da Lei 7.347/85, que trata da Ação Civil Pública, concedeu ao parquet a função de defesa dos interesses difusos e coletivos. Até então, o Ministério Público desempenhava basicamente funções na seara criminal. No universo cível, o Promotor de Justiça tinha apenas uma atuação interveniente, funcionava como fiscal da lei em ações individuais e em casos específicos. Atualmente, em razão da Constituição Federal de 1988, tem o Ministério Público maior liberdade para proceder as investigações visando à defesa dos direitos sociais e coletivos. Ao Ministério Público foi atribuída a função de proteger o patrimônio público e social, meio ambiente e outros interesses difusos e coletivos. Para desempenhar tais misteres, a Constituição da República, no art. 129, concedeu ao Órgão amplos poderes investigatórios.Na atual conjuntura Brasileira, o Ministério Público é reflexo das garantias asseguradas ao cidadão pelo Estado Democrático de Direito, que ao repartir as funções de acusar e julgar resguardou ao Promotor de Justiça a função acusatória, além de outras tantas, que se destacam pela mesma importância. A redemocratização trouxe para o Ministério Público uma ampliação de sua área de atuação. A Constituição de 1.988 define o Ministério Público no artigo 127 como instituição funcionalmente independente de quaisquer dos Três Poderes e permanente, essencial à função jurisdicional, incumbindo-lhe a defesa do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Reserva ao Ministério Público uma Seção específica no Capítulo das Funções Essenciais à Justiça, define as funções institucionais, as garantias e as vedações de seus membros. O Ministério Público recebeu o papel de curador dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, devendo promover a guarda da democracia e da justiça, da moralidade, dos interesses da sociedade de uma maneira geral, das etnias oprimidas, do meio ambiente, do patrimônio público e dos direitos humanos, devendo promover o inquérito civil e a ação civil pública, dentre outros temas. Na seara criminal a Constituição de 1.988 extinguiu o procedimento penal ex officio, também conhecido como judicialiforme, e assegurou ao Ministério a titularidade da Ação Penal Pública de forma exclusiva.As Constituições da República, anteriores à de 1988, pouco deram importância ao Ministério Público. Vejamos: 1) Constituição de 1891 – citava tão somente que o Procurador-Geral da República era designado entre os membros do Supremo Tribunal Federal. 2)Constituição de 1934 – dizia que o Ministério Público era um órgão de cooperação nas atividades governamentais e a escolha do Procurador-Geral da República tinha que ter aprovação do

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueSenado, criou ainda impedimentos ao exercício do cargo, bem como garantias aos Procuradores. 3) Constituição de 1937 – somente disse que o Procurador-Geral da República seria chefe do Ministério Público Federal. 4) Constituição de 1946 – o Ministério Público ganhou um título autônomo na Constituição, e impôs investidura aos cargos através de concurso público. 5) Constituição de 1967 – foi inserido no Capítulo do Poder Judiciário e a Emenda Constitucional 1/69 colocou-o entre os órgãos do Poder Executivo. 6) Constituição de 1988 – a nova Constituição atribuiu ao Ministério Público funções essenciais, bem como lhe concedeu autonomia administrativa e financeira e independência funcional.

b) Princípios constitucionais

O art. 127, da Constituição Federal brasileira determina quais são princípios constitucionais do Ministério Público. Seu caput determina que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.Estes princípios sinalizam de forma expressa a nova roupagem constitucional do MP, apresentando-se como instituição autônoma não só topograficamente. O MP detém autonomia institucional, quer do ponto de vista institucional, como do ponto de vista administrativo. Os princípios institucionais do MP, constitucionalmente previstos, são: 1) Unidade; 2) Indivisibilidade; 3) Independência funcional1)Princípio da Unidade: unidade significa dizer que, no instante em que um membro do MP fala, ele está se manifestando em nome da instituição. Só existe um MP. Por isso, ele não representa, mas presenta, a instituição, pois é a própria instituição no exercício de suas funções. O MP deve ser observado como uma instituição única e seus membros integram um só órgão sob a direção de um Procurador Geral.2) Princípio da Indivisibilidade: é corolário do princípio da unidade. Os membros do MP podem ser substituídos por outros no exercício da mesma função sem que tenhamos um óbice na atividade desenvolvida. Os membros não se vinculam aos processos em que atuam, podendo ser substituído, pois fala em nome da instituição. 3)Membros do MP agem com independência funcional, sem obediência hierárquica quanto a suas atribuições: o Ministério Público, depois da Constituição de 1988, é órgão constitucional independente, a serviço do cidadão. Se o constituinte lhe atribuiu tantas incumbências e lhe conferiu poderes e prerrogativas, fê-lo cBom a expectativa de que a instituição seja realmente instrumento do povo na defesa de seus direitos, até mesmo contra o Poder Público. Nesse contexto, pois, a independência se insere para garantir a consecução da finalidade da instituição. O MP detém também autonomia administrativa (§ 2º do artigo 127) e autonomia financeira (§3º do artigo 168, CF).

c) A tarefa de custos constitutionis : legitimidade e limitações. O art. 127 da CR/88 nos dá notícia das atribuições genéricas do MP. Estas atribuições genéricas são esclarecidas pelo art. 129. O art. 129 traz as atribuições específicas (consequência do art. 127), cujo rol não é taxativo, émeramente exemplificativo, conforme se extrai do inciso IX, do art. 129. O MP, na tarefa de defesa da constituição, deve fazer repeitar os fundamentos e princípios da soberania e da representatividade popular; os direitos políticos; os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil; a indissolubilidade da União; a independência e a harmonia dos Poderes da União; a autonomia dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; as vedações impostas à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; e, finalmente, a legalidade,

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de Albuquerquea impessoalidade, a moralidade e a publicidade, relativas à administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União. Cabe zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos ao sistema tributário, às limitações do poder de tributar, à repartição do poder impositivo e das receitas tributárias e aos direitos do contribuinte; às finanças públicas; à atividade econômica, à política urbana, agrícola, fundiária e de reforma agrária e ao sistema financeiro nacional; à seguridade social, à educação, à cultura e ao desporto, à ciência e à tecnologia, à comunicação social e ao meio ambiente; e à segurança pública. O MP também defenderá o patrimônio nacional, o patrimônio público e social, o patrimônio cultural brasileiro, os direitos e interesses coletivos, especialmente das comunidades indígenas, da família, da criança, do adolescente e do idoso, pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos da União e dos serviços de relevância pública quanto aos direitos assegurados na Constituição Federal relativos às ações e aos serviços de saúde e à educação e quanto aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade e da publicidade.Finalmente, O Ministério Público também poderá exercer outras funções previstas na Constituição Federal e na lei. Os órgãos do Ministério Público da União devem zelar pela observância dos princípios e competências da Instituição, bem como pelo livre exercício de suas funções. Observe-se que somente a lei poderá especificar as funções atribuídas pela Constituição Federal (LC 75/93 e 8.625/93).A CR/88 diz que cabe ao MP a defesa do ordenamento jurídico, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127). O MP, em regra, atua de duas formas: a) como órgãoagente; b) como órgãointerveniente. Como órgão agente, o MP ajuíza ações penais e ações civis na defesa do ordenamento jurídico. Nesse primeiro momento, atua como parte instrumental, na organização e na disciplina da sociedade através do direito. Ao lado desta função de órgão agente, o MP funciona também como órgão interveniente. Ele possui, mesmo sendo órgão interveniente, poderes de parte. Quando o MP funciona como órgão interveniente, ele atua pela natureza da parte ou pela natureza da relação jurídica processual. A defesa do regime democrático está atrelada à liberdade, igualdade e dignidade da pessoa humana. A defesa dos interesses sociais está relacionada aos interesses relacionados ao bem comum, aqui entendido como interesse geral, interesse de toda comunidade. Interesses sociais são interesses metaindividuais. Proteção da coisa pública e proteção dos bens mais elevados de uma sociedade. Dentre asfunções institucionais do Ministério Público, previstas no art. 129, tem-se a promoção da ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta Constituição (inciso IV). OMP como fiscal da federação defende o pacto federativo. Ele protege a Constituição. O instrumento para tal proteção é a ação direta de inconstitucionalidade interventiva. No instante em que o PGR ajuíza uma ação direta de inconstitucionalidade interventiva na defesa dos princípios constitucionais sensíveis, ele está defendendo o pacto federativo. Assim, está funcionando como custos constitutionis. Ao promover a ação de inconstitucionalidade, o MP busca proteger a força normativa da Constituição, deseja que a Constituição seja obedecida, seja respeitada, atua como custos constitutionis. A Participação do PGR (art. 103, §1º, da CF) nas “ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal” também é mais um exemplo do MP como “custos constitutionis”. Em síntese: em um sentido amplíssimo, pode- se considerar que o MP funciona como fiscal da Constituição por meio de todas as suas atitudes, judiciais ou extrajudiciais, na medida em que todas caminham no sentido de proteção direta ou ao menos indireta das normas da

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 01. Aldirla Pereira de AlbuquerqueConstituição Federal. Num sentido mais específico, fala-se em custos constitutionis como atividade do MP no âmbito do controle de constitucionalidade

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 02.

ITEM A: Constituição e cosmopolitismo. O papel do direito comparado e das normas e jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição.

OBRAS CONSULTADAS:Kildare Gonçalves Carvalho. Direito Constitucional. 13ª Edição. Ed. Del Rey.Mantido boa parte do resumo do MPF 25

Peter Häberle sustenta a canonização da comparação constitucional como um quinto método de interpretação constitucional, além dos quatro desenvolvidos por Savigny (gramatical, lógico, histórico e sistemático). Para ele, a interpretação dos institutos se implementa mediante comparação nos vários ordenamentos jurídicos.

Assim, o Estado constitucional cooperativo deve substituir o Estado constitucional nacional, defende Häberle. Para isso, o recurso ao direito comparado e às normas e jurisprudência internacionais deve ser empregado como método de interpretação, de modo a promover a abertura da sociedade para fora.

“Estado Constitucional Cooperativo é o Estado que justamente encontra a sua identidade também no Direito Internacional, no entrelaçamento das relações internacionais e supranacionais, na percepção da cooperação e responsabilidade internacional, assim como no campo da solidariedade. Ele corresponde, com isso, à necessidade internacional de políticas de paz” (HÄBERLE, 2007, p. 4).

Eis o que requer a interpretação pluralista da Constituição, para moldar uma cidadania que combina a igualdade de oportunidades com respeito à diferença, superando a cidadania homogeneizante e negadora das diferenças:abertura para dentro, isto é, o reconhecimento da sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – todos os que vivem a norma, e não só os juízes constitucionais, acabam por interpretá-la ou pelo menos co-interpretá-la – abertura ao mundo (ou cooperação), isto é, a interpretação do texto constitucional como aberto, cooperante e integrante de uma rede de outros textos constitucionais e internacionais com o mesmo propósito (especialmente no âmbito dos direitos fundamentais).

A importância do direito comparado e das normas e jurisprudência internacionais na interpretação da Constituição decorre da constatação de que, hoje, o direito constitucional não começa onde termina o direito internacional, e o contrário também é válido.Lembre-se, a propósito, o §3º do art. 5º da CRFB. Como diz Häberle (2007, p. 61): “A ideologia do monopólio estatal das fontes jurídicas torna-se estranha ao Estado constitucional quando ele muda para o Estado constitucional cooperativo. Ele não mais exige monopólio na legislação e interpretação: ele se abre – de forma escalonada – a procedimentos internacionais ou de Direito Internacional de legislação, e a processos de interpretação.”

A CRFB abre-se ao mundo e ao Estado constitucional cooperativo em diversos dispositivos: (1) no art. 4º, inc. IX, que erige a "cooperação entre os povos para o progresso da humanidade" em princípio reitor das relações internacionais do País e, no parágrafo único, diz: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 02.

América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações."; (2) nos §§ 2º, 3º e 4º do art. 5º, segundo os quais: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes [...] dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte", "Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais"; "O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão."

Kildare Carvalho (13º Ed., p. 277) faz menção ao que se denomina PODER CONSTITUINTE SUPRANACIONAL, aquele que busca a fonte de validade na cidadania universal, no pluralismo de ordenamentos jurídicos, na vontade de integração e em um conceito remodelado de soberania, buscando estabelecer uma Constituição supranacional legítima, com capacidade, inclusive de submeter as diversas constituições nacionais ao seu poder supremo. É supranacional, porque se distingue dos ordenamentos internos e, também, do direito internacional. Reflexão: já se pode falar em poder constituinte supranacional?

Diante desta tendência mundial de globalização do direito constitucional, Marcelo Neves alude à provável superação do constitucionalismo provinciano ou paroquial pelo TRANSCONSTITUCIONALISMO, mais adequado para as soluções dos problemas de direitos fundamentais e humanos (Lenza, esquematizado, 2012, p. 198). Neste sentido, Canotilho chega a sugerir a formulação da denominada TEORIA DA INTERCONSTITUCIONALIDADE, na busca de estudar as relações interconstitucionais, ou seja, a concorrência, a convergência, justaposição e conflito de várias constituições e de vários poderes constituintes no mesmo espaço político.

Marcelo Neves: “o transconstitucionalismo é o entrelaçamento de ordens jurídicas diversas, tanto estatais como transnacionais, internacionais e supranacionais, em torno dos mesmos problemas de natureza constitucional. Ou seja, problemas de direitos fundamentais e limitação de poder que são discutidos ao mesmo tempo por tribunais de ordens diversas. Por exemplo, o comércio de pneus usados, que envolve questões ambientais e de liberdade econômica. Essas questões são discutidas ao mesmo tempo pela Organização Mundial do Comércio, pelo Mercosul e pelo Supremo Tribunal Federal no Brasil. O fato de a mesma questão de natureza constitucional ser enfrentada concomitantemente por diversas ordens leva ao que eu chamei de transconstitucionalismo”.

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 02. Igor Miranda

ITEM B: Poder Executivo. Histórico. Presidencialismo e Parlamentarismo. Presidente da República: estatuto. Competências. Poder normativo autônomo, delegado e regulamentar. Ministros de Estado.

Obras consultadas:FILHO, João Trindade Cavalcante. Roteiro de Direito Constitucional. 4ª Edição. Gran Cursos, 2011.SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35ª Edição. Malheiros, 2011.

1. Poder Executivo - Histórico.A expressão tem significado variado, ora como função ou Atribuição do Poder estatal (art. 2 CF), outra como o próprio órgão (art. 76 CF).Função típica – chefia de Estado. Atípica – legislar por medida provisória (art. 62 CF) e julgar (apenas o Pedro Lenza utiliza esse exemplo) no “contencioso administrativo” no caso da defesa de multa de trânsito, do IPEM, da SEMAB, do CADE, TIT, etc. *Crítica: A função jurisdicional é marcada pelo caráter definitivo da decisão, inexistente no contencioso administrativo!Sistema de governo é o modo como se dá a relação entre os Poderes dentro de um Estado; sobretudo entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Diferencia-se da forma de governo, que é definida como o modo em que se dá a relação entre governantes e governados.As principais espécies de sistema de governo são: presidencialismo e parlamentarismo. O parlamentarismo surgiu na Inglaterra, a partir dos séculos XII e XIII, como resposta contra os privilégios monárquicos. O presidencialismo remete ao sistema implantado em 1787 nos EUA, com a criação de um Executivo independente do Legislativo, e, ao mesmo tempo, sujeito ao sistema de pesos e contrapesos de Montesquieu.O modelo político constitucional brasileiro apresenta uma hiperpotencialização do executivo, centrado na figura do Presidente que exerce o papel de Chefe de Estado (celebração de tratados e relações internacionais), Chefe de Governo (direção superior da Administração Federal), iniciativa de projetos de lei e edição de medidas provisórias, expedição de regulamentos (art. 84 CF), iniciativa de projetos orçamentários, controle de despesas (art. 163 a 169 CF) e direção das forças armadas.Konrad Hesse – Executivo, aquilo que não está na atribuição do Judiciário e do Legislativo (residual).Origem do Presidencialismo => Convenção de Filadélfia no Estados Unidos da América, influência da monarquia limitada, ou constitucional, da revolução de 1688 na Grã-Bretanha, mas construído sobre o sistema Republicano.Origem do Parlamentarismo => Construção lenta e histórica inglesa no século XVIII. Também possui como marco a revolução de 1688 e a consequente separação de poderes. Em razão da quebra sucessória dos Stuarts (ramo católico), o trono inglês foi assumido pela casa de Hanôver (Jorge I e II), de origem germânica sem identificação com a nação inglesa. Assim, a figura do primeiro-ministro ganhou destaque como o verdadeiro governante (o primeiro foi o Sr. Walpole). Surgiu a figura do impeachment (procedimento penal) e da responsabilidade política (seguir a linha política do parlamento, sob pena de renúncia forçada).

2. Presidencialismo e Parlamentarismo.

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Quadro comparativo apresentado por Bernardo Gonçalves Fernandes:

Presidencialismo Parlamentarismo

Identidade entre chefia de estado e chefia de governo (são a mesma pessoa).Chefe de estado exerce função simbólica de representar internacionalmente o país e de corporificar a sua unidade interna.Chefe de governo executa as políticas públicas. Ou seja, é quem efetivamente governa e também exerce a liderança da política nacional.

Há uma não identidade entre chefia de estado e chefia de governo. O chefe de estado pode ser um rei (um monarca) ou um presidente, ao passo que o chefe de governo é o 1º ministro, que exerce o governo conjuntamente com o seu gabinete (conselho de Ministros).

Estabilidade de governo. Há a figura dos mandatos fixos para o cargo de presidente.

Estabilidade democrática, construída pelo povo nos processos democráticos. Pode até existir a figura do mandato mínimo e do mandato máximo, todavia ele não é fixo. Nesse sentido, tem por fundamento a existência dos institutos: I) possibilidade de queda do gabinete pelo parlamento (através da “moção de censura” ou “voto de desconfiança”) e II) possibilidade cotidiana de dissolução do parlamento pelo gabinete.

Conclusão => No presidencialismo fica mais caracterizada a separação de funções estatais. Isso porque, conforme Michel Temer, no parlamentarismo verifica-se um deslocamento de uma parcela da atividade executiva para o Legislativo.

Executivo Monocrático, Colegial, Diretorial e Dual => Maurice Duverger → monocrático (rei, imperador, ditador, Presidente), colegial (dois homens com iguais poderes – cônsules romanos), diretorial (um comitê – antiga Ex-URSS e, ainda hoje, na Suiça)e dual (parlamentarismo).Brasil – Executivo monocrático, art. 76 da CF.

3. Presidente da República.O Poder Executivo, nos termos do art. 76 da Constituição, é exercido pelo Presidente da República com o auxílio dos Ministros de Estado (cargos de livre nomeação e exoneração do Presidente da República).O chefe do Poder Executivo é o Presidente da República, cujas condições de elegibilidade estão no art. 14, § 5º, é eleito mediante sufrágio universal, para um mandato de 4 anos (art. 82 CF), a partir do princípio da maioria absoluta. A reeleição é possível parar um único período subseqüente, a partir da EC n. 16/97 (Link com Eleitoral – ocasional as condutas vedadas do art. 73 da Lei das Eleições).A eleição é pelo critério majoritário absoluto, que, se não for alcançado no primeiro turno, exige, só então, a realização de novo escrutínio.

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A linha sucessória do Presidente da República será: Vice-Presidente, Presidente da Câmara, Presidente do Senado e Presidente do STF (arts. 78 e ss. da Constituição).

Substituição - Impedimento Sucessão - Vaga

Temporário => Doença, férias. Definitiva => Cassação, Renúncia, morte.

Mandato-Tampão

Regras do art. 81 § 2º CF Vacância dos cargos de Presidente E Vice nos doisPRIMEIROS anos do mandato

Vacância dos cargos de Presidente E Vice nos doisÚLTIMOS anos do mandato

Eleição DIRETA (feita pelo povo) INDIRETA (votam apenas os Deputados e Senadores)

Prazo 90 dias a contar da última vacância

30 dias a contar da última vacância

Desde 1994, em sede de análise de Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1057, o Supremo Tribunal Federal - STF tem reiteradamente entendido que o artigo 81, §1º, da Constituição Federal (regramento da sucessão presidencial no caso de dupla vacância) não é uma norma de reprodução obrigatória pelos Estados e Municípios em suas respectivas Constituições/Leis Orgânicas.

Segundo o Supremo, compete aos entes federados, como decorrência do princípio federativo, o exercício da autonomia política administrativa para estabelecerem as regras da sucessão na hipótese da dupla vacância na chefia do Poder Executivo.

Apesar de o Supremo Tribunal possuir posição firmada pela ausência de simetria a mais de uma década, a evolução jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral - TSE não acompanhou o mesmo entendimento imediatamente.

OTSE entendia que a sucessão na dupla vacância seria matéria de direito eleitoral, tema de competência privativa da União, nos termos do artigo 22, I, da Carta Magna.

No entanto, em 30.6.2011 no julgamento do Mandado de Segurança nº 70.424, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, o Tribunal Superior Eleitoral adotou o entendimento da Corte Suprema acerca da matéria no sentido que a regulação da sucessão local trata-se de questão político-administrativa, pois esta competência está ligada à autonomia política dos entes federados de dispor sobre a organização dos poderes locais.

No mencionado mandado de segurança havia uma inusitada lacuna normativa, a Lei Orgânica municipal previa a realização de eleição suplementar no caso vacância dos cargos de Prefeito e Vice-prefeito nos três primeiros anos de mandato, a ser realizada no período de 90 (noventa) dias, entretanto, sem dispor sobre a modalidade de eleição (direta ou indireta).

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Na solução da lacuna normativa, o TSE acertadamente concluiu que deve haver a busca pela máxima efetividade à soberania popular, com a manifestação direta dos eleitores nas urnas, ainda que as eleições suplementares municipais ocorram no terceiro ano de mandato.

Em outras a partir do julgamento desse caso, a Justiça Eleitoral começou a ser provocada para analisar como ocorreria a sucessão dos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito no segundo biênio do mandato, sendo que vedou as alterações oportunistas das Leis Orgânicas assim como a previsão de assunção do Presidente da Câmara de forma definitiva.

Competência - José Afonso da Silva classifica as atribuições do Presidente da República em três funções básicas: a)Chefia do Estado: art. 84, VII, VIII, XVIII, segunda parte, XV, XVI, primeira parte, XIX, XX, XXI e XXII. b)Chefia do Governo: art. 84, I, III, IV, V, IX, X, XI, XII, XIII, XIV,XVII, XVIII, primeira parte, XXIII, XXIV e XXVII. c)Chefia da Administração Federal: art. 84, II, VI, XVI, segunda parte, XXIV,e XXV.Atribuições delegáveis → Apenas três são delegáveis aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União: a) Inciso VI (decretos autônomos); b) Inciso XII (conceder indulto e comutar penas); c) Inciso XXV, primeira parte – prover (por lógica, abrange o desprover - exonerar) os cargos públicos na forma da lei.Poder Normativo Autônomo: a EC n. 32/2001 positivou a figura dos decretos autônomos, estabelecendo que compete ao Presidente da República dispor, mediante decreto, sobre: a) a organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos (art. 84, inciso VI, da Constituição).A doutrina (veja-se Celso Antônio Bandeira de Mello) criticou duramente essa inovação, mas o STF a respaldou (obter dictum na ADI 3.254, relatora a Ministra Ellen Gracie).Poder Regulamentar: previsto no art. 84, IV, da Constituição. O regulamento de execução explicita a lei sem inovar a ordem jurídica, sem criar direitos e obrigações, em face do princípio constitucional da legalidade. Segundo a doutrina, fixa as regras destinadas a colocar em execução os princípios institucionais delimitados e estabelecidos na lei.Poder delegado: a delegação legislativa ao Presidente da República tem seus limites e contornos previstos no art. 68 da Constituição. Segundo Manoel Gonçalves Ferreira Filho, a delegação pode ser retirada pelo Congresso Nacional a qualquer momento.

Decreto Regulamentar Decreto Autônomo

Natureza Secundário Primário

Inova no ordenamento Não Sim

Hierarquia Infralegal Legal

Matéria Em tese, qualquer lei Taxativa (art. 84, VI CF)

Previsão Art. 84, IV Art. 84, VI

Criação CF/1988 EC 32/2001

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Prerrogativas → NÃO possui imunidades materiais, apenas imunidades processuais! IMUNIDADES FORMAIS : Foro por prerrogativa de função (crime comum STF – crime de responsabilidade SF), Impossibilidade de prisão, salvo por sentença condenatória (precisa do trânsito em julgado? Doutrina não aborda, até mesmo pelo ineditismo prático do tema, mas o CESPE considerou desnecessário na prova para Delegado do Tocantins de 2008); Exame de admissibilidade pela CD (2/3 – tanto para o crime comum como para o crime de responsabilidade) e Imunidade processual temporária (por atos estranhos ao cargo, somente após o mandato – art. 86 §4 → consequências: prescrição fica suspensa, após o mandato não haverá controle de admissibilidade pela CD).Constituição, art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: I - a existência da União; II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação; III – o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País; V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária; VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais. Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. A definição e o procedimento estão disciplinados na Lei n. 1079/50.

Crime Comum Crime de Responsabilidade

Natureza Infração Penal (crime) InfraçãoPolítico-administrativa

Penas Possíveis Reclusão, detenção,Perda de bens, etc.

Perda do mandato(impeachment) e inabilitaçãopara o exercício da função

Provocação PGR por meio de denúncia Qualquer cidadão

Juízo préviode admissibilidade

Câmara dos Deputados (2/3) Câmara dos Deputados (2/3)

Juízo definitivode admissibilidade

STF (decisão de recebimento da denúncia ou queixa)

Não há

Competência STF Senado Federal

Afastamento das funções A partir da decisão de admissibilidade do STF

A partir da instauração do processo pelo Senado

Ministros de Estado => Auxiliares do Presidente na direção superior da Administração Federal.Requisitos → nato ou naturalizado (salvo o Ministro de Estado da Defesa, nato, conforme o inciso VII do § 3 do art. 12 da CF); maior de 21 anos e estar no exercício dos direitos políticos.Atribuições → exercer a orientação, coordenação e supervisão de sua área de competência; referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente (Michel Temer defende que os atos não referendados são nulos; já para o José Afonso da Silva, os atos não referendados são plenamente válidos, o única possível consequência é a demissão do Ministro); expedir

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instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos (Instruções Normativas); apresentar relatório anual de gestão e praticar os atos delegados pelo Presidente. Após a EC 32/2001, o art. 88 da CF determina que lei disporá somente sobre a criação e extinção de Ministério, não mais exigindo lei em sentido estrito para a determinação de estruturação e atribuições.Crimes de responsabilidade sem conexão com o Presidente e nos crimes comuns são julgados pelo STF, nos crimes de responsabilidade com conexão com o Presidente a competência é do Senado Federal.

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Fábio BettoniITEM C: Distrito Federal. Territórios Federais. Origens e evolução dos direitos

fundamentais

Resumo revisado com base na obra Curso de Direito Constitucional. Gilmar Ferreira Mendes et al. 5ª edição.2010.

Distrito Federal: Para abrigar a sede da União, o constituinte criou o Distrito Federal. O Distrito Federal foi criado em razão da necessidade de existência de um território neutro, não pertencente a nenhum dos Estados, para a instalação do governo federal. Criado após a Constituição de 1891, sucedeu o denominado “município neutro”, existente na época que o Estado brasileiro era unitário.Como ente federativo, possui autonomia organizatória, política, administrativa e de Governo (artigos 1º e 18 da CF), ficando a sede do Governo Federal em Brasília, Capital Federal (art. 18, §1º, da CF). Também é sede do Governo do DF (Lei Orgânica, 6º)

Natureza jurídica: trata-se de ente federativo, discutindo-se se possui natureza jurídica de Estado, Município ou entidade sui generis (híbrida). Prevalece tratar-se de entidade híbrida, não sendo Estado, nem Município, devendo ser concebido como “unidade federada com autonomia parcialmente tutelada”, segundo José Afonso da Silva. Ver STF, ADI 3.756. Isso porque possui as mesmas competências dos Estados e Municípios (art. 32, §1º, CF), mas a competência para legislar sobre a organização, Poder Judiciário, Ministério Público e a Defensoria Pública, polícias civil e militar e corpo de bombeiros é da União (arts. 22, XVII, e 48, IX, CF). Esse aspecto limita o poder de auto-organização, autolegislação, autogoverno e autoadministração, quando envolvidas essas instituições.Não dispõe de autonomia para a utilização das polícias civil e militar, sujeitando-se aos limites e à forma estatuídos em lei federal. A Procuradoria-Geral do DF obedece a auto-organização. Ver Súmula 647 STF: Compete privativamente à União legislar sobre vencimentos dos membros das polícias civil e militar do Distrito Federal.

EMENTA: CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. IMPUGNAÇÃO DO

INCISO II DO § 3º DO ART. 1 § 3o Nas referências: II - a Estados entende-se considerado o

Distrito Federal;), BEM COMO DOS INCISOS II E III DO ART. 20 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 101,

DE 04 DE MAIO DE 2000 ( Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá

exceder os seguintes percentuais: II - na esfera estadual: a) 3% (três por cento) para o

Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado; b) 6% (seis por cento) para o Judiciário; c)

49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo; d) 2% (dois por cento) para o Ministério

Público dos Estados; III - na esfera municipal: a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído

o Tribunal de Contas do Município, quando houver; b) 54% (cinqüenta e quatro por cento) para

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o Executivo).

1. É de se reconhecer a legitimidade ativa ad causam da Câmara Legislativa do Distrito

Federal, dado que a presente impugnação tem por alvo dispositivos da LC 101/00 .

Dispositivos que versam, justamente, sobre a aplicação dos limites globais das despesas com

pessoal do Poder Legislativo distrital.

2. O Distrito Federal é uma unidade federativa de compostura singular, dado que:

a) desfruta de competências que são próprias dos Estados e dos Municípios,

cumulativamente (art. 32, § 1°, CF); b) algumas de suas instituições elementares são

organizadas e mantidas pela União (art. 21, XIII e XIV, CF); c) os serviços públicos a cuja

prestação está jungido são financiados, em parte, pela mesma pessoa federada central, que

é a União (art. 21, XIV, parte final, CF).

3. Conquanto submetido a regime constitucional diferenciado, o Distrito Federal

está bem mais próximo da estruturação dos Estados-membros do que da arquitetura

constitucional dos Municípios. Isto porque: a) ao tratar da competência concorrente, a Lei

Maior colocou o Distrito Federal em pé de igualdade com os Estados e a União (art. 24) ; b) ao

versar o tema da intervenção, a Constituição dispôs que a “União não intervirá nos Estados

nem no Distrito Federal” (art. 34), reservando para os Municípios um artigo em apartado (art.

35); c) o Distrito Federal tem, em plenitude, os três orgânicos Poderes estatais, ao passo que

os Municípios somente dois (inciso I do art. 29); d) a Constituição tratou de maneira uniforme

os Estados-membros e o Distrito Federal quanto ao número de deputados distritais, à

duração dos respectivos mandatos, aos subsídios dos parlamentares, etc. (§ 3º do art. 32); e)

no tocante à legitimação para propositura de ação direta de inconstitucionalidade perante o

STF, a Magna Carta dispensou à Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal o mesmo

tratamento dado às Assembléias Legislativas estaduais (inciso IV do art. 103); f) no modelo

constitucional brasileiro, o Distrito Federal se coloca ao lado dos Estados-membros para

compor a pessoa jurídica da União; g) tanto os Estados-membros como o Distrito Federal

participam da formação da vontade legislativa da União (arts. 45 e 46).

4. A LC 101/00 conferiu ao Distrito Federal um tratamento rimado com a sua peculiar

e favorecida situação tributário-financeira, porquanto desfruta de fontes cumulativas de

receitas tributárias, na medida em que adiciona às arrecadações próprias dos Estados

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aquelas que timbram o perfil constitucional dos Municípios.

5. Razoável é o critério de que se valeram os dispositivos legais agora

questionados. Se irrazoabilidade houvesse, ela estaria em igualar o Distrito Federal aos

Municípios, visto que o primeiro é, superlativamente, aquinhoado com receitas tributárias.

Ademais, goza do favor constitucional de não custear seus órgãos judiciário e ministerial

público, tanto quanto a sua Defensoria Pública, Polícias Civil e Militar e ainda seu Corpo de

Bombeiros Militar.

Auto-organização: através de Lei Orgânica, verdadeira Constituição Distrital, com quorum de 2/3 para aprovação e votação em dois turnos, com interstício mínimo de 10 dias entre eles.É vedada a divisão em Municípios (art. 32), bem como devem ser observados os princípios da CF (Poder Constituinte Decorrente). Autolegislação: mesmas competências de Estados e Municípios (art. 32, §1º, CF), exceto competências atribuídas à União.

Autogoverno: Governador DF e Deputados Distritais eleitos diretamente, sem ingerência da União (CF, 32, §§ 2º e 3º). Elege representantes para a Câmara dos Deputados (art. 45, CF) e Senado (art. 46).

Competência Tributária: instituir e arrecadar impostos estaduais e municipais (artigos 145, 155 e 147, todos da CF).

Territórios Federais: “O território é definido por Michel TEMER como uma pessoa de direito público, de capacidade administrativa e de nível constitucional,ligada à União, tendo nesta a fonte de seu regime jurídico infraconstitucional”. Não integram a federação, integram a administração descentralizada da União, sem autonomia organizatória e política (legislativa e de governo), mas possuem personalidade jurídica (autarquia), conforme art. 18, §2º, CF. Não existem atualmente no Brasil. Até 1988 existiram Roraima, Amapá e Fernando de Noronha. O primeiro a ser criado foi o do Acre, em 1904, mas não existia previsão na CF de 1891, passando a ser previsto na CF de 1934 e seguintes. Fernando de Noronha foi incorporado ao território de Pernambuco e transformado em Distrito Estadual. É possível a criação de territórios através de Lei Complementar (art. 18, §3, CF), devendo ser realizado plebiscito. Podem ser divididos em municípios (art. 33, §1º, CF). Direção por Governador nomeado pelo Presidente da república (art. 84, XIV), após aprovação Senado Federal (art. 84, XIV, CF). Elege número fixo de 04 Deputados Federais, exceção ao princípio proporcional. Se tiver mais de 100.000 habitantes, terá órgãos judiciários de 1ª e 2ª instância, membros do MP e defensores públicos federais (art. 33, §2º, e 21, XIII, CF). Delegação da competência da JF para os juízes locais nessa hipótese (art. 100, parágrafo único). A lei disporá sobre eleições para a Câmara Territorial e sua competência deliberativa (art. 33, §3º, CF) e o sistema de ensino será organizado pela União (art. 211, §1º, CF).

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Origens e evolução dos direitos fundamentais:

Apesar de inicial inspiração jusnaturalista, costuma-se afirmar serem os direitos fundamentais frutos de longo processo histórico, marcado por avanços e retrocessos, passaram a compor o ordenamento jurídico-positivo, daí por que se pode afirmar a historicidade desses direitos, que têm hoje reconhecido o caráter universal, inalienável, imprescritível e irrenunciável.

Dirley da Cunha Júnior salienta que “Costuma-se indicar a doutrina antiga do cristianismo como antecedente básico dos direitos humanos. Isto se deve ao fato ao fato de que homens, por serem criados à imagem e semelhança de Deus, possuem alto valor interno e liberdade própria inerente à sua natureza, encerrando uma ideia de que eles têm direitos que devem ser respeitados por todos e pela sociedade política (…). Daí haverem acentuado as teorias contratualistas, sobretudo nos séculos XVII e XVIII, que os soberanos deveriam exercer a sua autoridade com submissão ao direito natural do homem, derivando dessa concepção a primazia do indivíduo sobre o Estado”.

Contribuíram para o surgimento e afirmação dos direitos fundamentais: século XII, Magna Charta Libertatum; Declarações inglesas do século XVII, Petition of Rights, de 1628, firmada por Calos I; o Habeas Corpus Act, de 1679, assinado por Carlos II, e o Bill of rights, de 1969, promulgado pelo Parlamento, sendo a mais importante das declarações inglesas. “Mas foi no século XVIII, com a vitória da revolução liberal na França e a independência das colônias inglesas na América do Norte, que nasceram definitivamente os direitos fundamentais, a partir da Declaração do Bom Povo da Virgínia de 1776, seguida pela Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Após essas Declarações, quase todas as Constituições no mundo passaram a dispor de uma Declaração de direitos, a começar pela Constituição norte-americana de 17 de setembro de 1787, em face das suas primeiras dez emendas, promulgadas em 1791”.

Como os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, se costuma referir-se à classificação dos direitos fundamentais em quatro gerações (ou dimensões para evitar a ideia de sucessão de direitos). Primeira geração/dimensão: consagra direitos fundamentais referentes ao valor liberdade (direitos civis e políticos), decorrentes das revoluções liberais (francesa e norte-americana) ocorridas no final do século XVIII, impondo ao Estado, preponderantemente, dever de abstenção (caráter negativo). Segunda geração/dimensão: ligados à igualdade material, surgiram a partir da Revolução Industrial (século XX), a partir da luta do proletariado pela conquista de direitos sociais, econômicos e culturais. Dizem respeito à assistência social, saúde, educação, trabalho, lazer, liberdade sindical e direito de greve etc . Necessita de prestações materiais e jurídicas (incluindo garantias institucionais) por parte do Estado, concretizando-se na medida dos recursos financeiros disponíveis (“reserva do possível”), tendo por isso menor concretude que os direitos de primeira geração. São chamados direitos sociais, por reivindicarem justiça social, isto é, igualdade de fato. Terceira geração/dimensão: são ligados ao valor fraternidade (ou solidariedade), visando a atenuar as diferenças entre

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nações desenvolvidas e subdesenvolvidas, por meio da colaboração de países ricos com os pobres. Paulo BONAVIDES destaca os relacionados ao desenvolvimento (ou progresso), ao meio ambiente, à autodeterminação dos povos, bem como o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade. São direitos transindividuais (titularidade difusa ou coletiva) destinados à proteção do gênero humano. Gilmar Mendes enquadra o direito à paz nessa categoria, ao passo que Paulo Bonavides reviu sua classificação para incluí-lo entre os direitos de quinta geração, sob o argumento de que faz parte da democracia participativa.Quarta geração/dimensão: associam-se à pluralidade. Ex: democracia, informação e o pluralismo, introduzidos no âmbito jurídico em razão da globalização política.

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ITEM A: Divisão de poderes. Conceito e objetivos. História. Divisão orgânica de poderes. Divisão funcional de poderes. Independência e harmonia entre poderes. Balanceamento entre poderes.

Obras consultadas:Carlos Ari Sundfeld. Fundamentos de Direito Público. 4ª Edição. São Paulo: Ed. Malheiros, 2003.Gilmar Ferreia Mendes e outros. Curso de Direito Constitucional. 12ª Edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2008.José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª Edição. São Paulo: Ed. Malheiros, 2005.José Joaquim Gomes Canotinho. Direito Constitucional. 6ª Edição. Coimbra: Almedina, 1993. Paulo Bonavides. Ciência Política. 17ª Edição. . São Paulo: Ed. Malheiros, 2010.

Legislação básica.Art. 2º e Título IV, da CF.Art. 16 da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.

1. Noções Gerais.

O tema da divisão dos poderes está relacionado com a Teoria Geral do Estado e com o Direito Constitucional, já que cabe à Constituição estabelecer as normas estruturais de um Estado.

Dispõe o artigo 2 da Constituição Federal que “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

Nesse contexto, a Constituição detalha, com especial menção ao Título IV, a organização dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, sem prejuízo de outras regras constitucionais que tratam do tema ao longo do corpo normativo constitucional.

É oportuno lembrar que a divisão dos poderes possui íntima relação com o constitucionalismo moderno e com os direitos fundamentais, pois o artigo 16 da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 já dizia que “A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição”.

2. Conceito.

Para ser real o respeito da Constituição e dos direitos individuais por parte do Estado, “(...) é necessário dividir o exercício do poder político entre órgãos distintos, que se controlam mutuamente. A cada um desses órgãos damos o nome de Poder: Poder Legislativo, Poder Executivo e o Poder Judiciário. A separação dos Poderes estatais é elemento lógico essencial do Estado de Direito”. (SUNDFELD, p. 42, 2003).

3. Objetivos:

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Analisando a Constituição Portuguesa, afirma José Joaquim Gomes Canotilho que “(....) é legítimo afirmar-se que o modelo de separação constitucionalmente consagrado visa, em princípio, identificar o órgão de decisão ajustado, estabelecer um procedimento de decisão justo e exigir um fundamento materialmente legítimo para as tomadas de decisão” (p. 708, 1993).

4. História:

A divisão funcional de poderes remonta a Aristóteles, em “Política”, que identificou três funções básicas exercidas pelo poder político: assembleia-geral, corpo de magistrados e corpo judiciário; hoje equivalentes às funções legislativa, administrativa e jurisdicional. Respectivamente, (a) inovar a ordem jurídica por meio de normas gerais, impessoais e abstratas; (b) atuar concreta e individualizadamente, excetuada a função jurisdicional, por meio das funções de governo e de administração; e (c) resolver conflitos intersubjetivos imparcial e desinteressadamente, com potencial de definitividade.Como dito, ARISTÓTELES (Política) já apregoava a divisão dos poderes em três partes: a) assembléia dos cidadãos: o corpo deliberante, o verdadeiro soberano;b) magistratura: funcionários designados pela assembléia para certas funções;c) corpo judiciário.

A distinção de funções, que remonta à Antiguidade, prosseguiu durante a Idade Média e a modernidade. Aqui já com Grotius e Puffendorf, Bodin e Locke, antes de Montesquieu. No absolutismo, à especialização funcional não correspondia a independência de órgãos especializados. A par da experiência parlamentarista inglesa, que não correspondia exatamente à uma separação de poderes, foi a obra de Montesquieu, de 1746, que sistematizou a separação orgânica do poder como técnica de salvaguarda da liberdade “dos modernos” (concepção burguesa-liberal). Todo homem que detém o poder tende a dele abusar, e o abuso vai até onde se lhe deparam limites; e apenas o poder contém o poder. Então, a separação orgânica do poder consiste em se atribuir cada uma das funções estatais básicas a um órgão (corpo funcional) distinto, separado e independente dos demais. Combina-se a especialização funcional com a independência orgânica. No liberalismo, a separação de funções entre os órgãos independentes deveria ser bastante rígida, mas mesmo Montesquieu já previa que o constante movimento dos órgãos os compele a atuar em concerto, harmônicos, e as faculdades de estatuir (p.ex., aprovar um projeto de lei) e de impedir (veto presidencial) são prenúncios dos mecanismos de freios e contrapesos desenvolvidos posteriormente. A rígida separação de poderes do liberalismo foi inicialmente inserida nas constituições das ex-colônias inglesas na América, que seguiam a Declaração de Direitos de Virginia, de 1776. Após, constituição dos EUA, art. 16 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão e constituições francesas seguintes, espalhando-se pelo “ocidente”. Benjamin Constant teorizou um quarto poder neutro, que faça com os demais o que o poder judiciário faz com os indivíduos, que seria exercido pelo rei.

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A 1ª constituição do Brasil criou o “poder moderador” do Imperador; porém, distorceu a teoria ao atribui-lo também o executivo (para Constant, o poder neutro não poderia jamais coincidir com um dos demais), assim foi até surgir o parlamentarismo em 1846. Com o declínio do liberalismo e a ascensão do Estado Social, a rígida separação dos poderes tornou-se “um desses pontos mortos do pensamento político, incompatível com as formas mais adiantadas do processo democrático contemporâneo” (BONAVIDES, p. 157-158).

“(...) constituição mista, para Aristóteles, será aquela em que os vários grupos ou classes sociais participam do exercício do poder político, ou aquela em que o exercício da soberania ou o governo, em vez de estar nas mãos de uma única parte constitutiva da sociedade, é comum a todas. Contrapõem-se-lhe, portanto, as constituições puras em que apenas um grupo ou classe social detém o poder político”.

5. Divisão orgânica de poderes. Divisão funcional de poderes.

O poder político – ou a soberania – do Estado é uno e indivisível. A expressão “divisão (ou separação) de poderes” não indica cisão no poder; denota a dupla ideia organizatória de divisão (a) de órgãos e (b) de funções do poder (singular) estatal.Divisão orgânica do poder - estrutura estatal em centros de decisão e ação titularizados por agentes públicos cuja conduta é imputada ao Estado; a divisão funcional do poder - atividades a serem desempenhadas pelo Estado.

6. Independência e harmonia entre poderes

Hoje, existe uma tendência de se considerar que a teoria da separação dos poderes construiu um mito. Este mito consistiria em um modelo teórico redutível à teoria dos três

poderes rigorosamente separados: o executivo (o rei e os seus ministros), o legislativo (l.a

câmara e 2.a câmara, câmara baixa e câmara alta) e o judicial (corpo de magistrados). Cada poder recobriria uma função própria sem qualquer interferência dos outros. Foi demonstrado por ElSENMANN que esta teoria nunca existiu em Montesquieu. Em princípio, reconhecia-se ao executivo o direito de interferir no legislativo porque o rei gozava do direito de veto; em segundo lugar, porque o legislativo exerce vigilância sobre o executivo na medida em que controla as leis que votou, podendo exigir aos ministros conta da sua administração; finalmente, o legislativo interfere sobre o judicial quando se trata de julgar os nobres pela Câmara dos Pares, na concessão de anistias e nos processos políticos que deviam ser apreciados pela Câmara Alta sob acusação da Câmara Baixa. Além disso, mais do que separação, do que verdadeiramente se tratava era de combinação de poderes: os juízes eram apenas «a boca que pronuncia as palavras da lei»; o poder executivo e legislativo distribuíam-se por três potências: o rei, a câmara alta e a câmara baixa, ou seja, a realeza, a nobreza e o povo (burguesia) (Conforme CANOTILHO, p. 260).

A interdependência é, porém, uma interdependência dinâmica necessariamente atenta aos aspectos político-funcionais do sistema.

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7. Balanceamento entre poderes

Consolida-se a ideia de balanceamento entre poderes, na medida em que há uma divisão de funções do poder, de forma não exclusiva (não-incomunicável), entre órgãos relativamente independentes entre si, que devem atuar em cooperação, harmonia e equilíbrio.

A independência dos poderes significa que: a) a investidura e a permanência das pessoas num dos órgãos não dependem da c o n f i a n ç a n e m d a v o n t a d e d o s o u t ro s ; b ) n o exe rc í c i o d a s a t r i b u i ç õ e s q u e l h e s e j a m próprias, não precisam os titulares consultar os outros nem necessitam de sua autorização; c) n a o rga n i za ç ã o d o s re s p e c t i v o s s e r v i ç o s , c a d a u m é l i v re , o b s e r va d a s a p e n a s a s disposições constitucionais e legais.

Por outro lado, a harmonia entre os poderes primeiramente se verifica pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. Ainda, nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem sua independência são a b s o l u t a s H á i n te r fe rê n c i a s , q u e v i s a m a o e s t a b e l e c i m e n t o d e u m s i s te m a d e f re i o s e contrapesos, à busca do equilíbrio necessário à realização do bem da coletividade e indispensável para evitar o arbítrio e o desmando de um em detrimento do outro e especialmente dos governados (SILVA, p. 110, 2005).

Cumpre em primeiro lugar, não confundir distinção de funções do poder com divisão ou separação de poderes, embora entre ambas haja uma conexão necessária. A distinção de funções constitui especialização de tarefas governamentais à vista de sua natureza, sem considerar os órgãos que as exercem; quer dizer que existe sempre distinção de funções, quer haja órgãos especializados para cumprir cada uma delas, quer estejam concentrada num órgão apenas. A divisão de poderes consisti em confiar cada uma das funções governamentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos diferentes, que tomam os nomes das respectivas funções, menos o judiciário (órgão ou poder legislativo, órgão ou poder executivo e órgão ou poder judiciário). Se as funções forem exercidas por um órgão apenas, tem-se concentração de poderes.

A divisão de poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: (a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função; assim, as assembléias (congresso, câmaras, parlamento) se atribui a função legislativa; ao executivo, a função executiva; ao judiciário, a função jurisdicional; (b) dependência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação.

O princípio da separação de poderes já se encontra sugerido em Aristóteles, John Locke e Rousseau também conceberam uma doutrina da separação de poderes, que afinal, em termos de versos, veio a ser definida e divulgada por Montesquieu.

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ITEM B: Poder Judiciário: organização e competência. Normas constitucionais respeitantes à magistratura. Lei de Organização da Magistratura Nacional – LOMAN.

Obras consultadas:Dirley da Cunha Júnior. Curso de Direito Constitucional. 5ª Edição. Salvador: Ed. Juspodivm, 2011.Gilmar Ferreia Mendes e outros. Curso de Direito Constitucional. 12ª Edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2008.José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª Edição. São Paulo: Ed. Malheiros, 2005. Legislação básica.

Capítulo III do Título IV da Constituição Federal.Lei Complementar 35/79.

1. Noções Gerais.

O tema da divisão dos poderes está relacionado com a Teoria Geral do Estado e com o Direito Constitucional, já que o Poder Judiciário está compreendido da noção clássica da tripartição dos poderes do Estado.

O Poder Judiciário é o órgão do Estado que tem “(...) por função compor conflitos de interesses em cada caso concreto” (SILVA, p. 553).

O Poder Judiciário está disciplinado no Capítulo III do Título IV da Constituição Federal, cujos órgãos estão descritos no artigo 92 do diploma constitucional.

Dentre outros aspectos, destaca-se que a Constituição regulamenta a organização e competência dos diversos órgãos encarregados da função jurisdicional, estabelecendo ainda os princípios aos quais estão submetidos seus agentes, cujo regime jurídico está disposto infraconstitucionalmente na Lei de Organização da Magistratura Nacional – LOMAN.

2. Organização.

O Poder Judiciário é uno e indivisível, tendo caráter nacional, conforme o voto do Ministro César Peluso na ADIn 3.367-1.

O Poder Judiciário tem por função típica o exercício da jurisdição, bem como funções atípicas de natureza legislativa (art. 96, I, CF) e administrativa (art. 96, I, b, c e d, CF).

O Poder Judiciário restou fortalecido pela CF/88, sendo-lhe asseguradas garantias institucionais e funcionais. São garantias institucionais a autonomia orgânico-administrativa (art. 96) e autonomia financeira (art. 99, §§ 1º a 5º). De outro lado, as garantias funcionais ou da magistratura visam a assegurar a independência e imparcialidade dos juízes (art. 95), quais sejam: vitaliciedade, estabilidade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios, as quais serão analisadas no tópico n. 4, que segue abaixo.

A Constituição de 1988 dotou os tribunais de um poder de autogoverno, concretizado no seu artigo 96, inciso I.

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A organização do Judiciário deve ser disciplinada no Estatuto da Magistratura, estabelecido em lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, observados os princípios previstos na Constituição (art. 93).

Seus órgãos estão elencados no artigo 92 da CF: STF, CNJ, STJ, Tribunais e Juízes Federais, Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares. São órgãos de superposição o STF, STJ e Tribunais Superiores da União.

Compete ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169, a alteração do número de membros dos tribunais inferiores, a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver, a criação ou extinção dos tribunais inferiores, bem como a alteração da organização e da divisão judiciárias (art. 96, II).

A autônoma administrativa e financeira materializa-se nas outorga aos tribunais do poder de elaborar suas propostas orçamentárias dentro dos limites estabelecidos com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias. Prevê-se ainda que As custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça.

A Constituição contempla algumas diretrizes básicas para a organização do Poder judiciário como um todo, tais como ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação (a comprovação da prática jurídica é disciplinada pela Resolução n. 75/2009 do CNJ), a promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antigüidade e merecimento, dentre outras previstas no artigo 93 da Constituição.

Nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores, poderá ser constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas da competência do tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por antigüidade e a outra metade por eleição pelo tribunal pleno.

Ainda, todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Lembra-se, também, que as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros.

Quinto constitucional: A CF reserva 1/5 dos lugares dos TRF's, TJ's, TST e TRT's aos membros do MP com mais de 10 anos de carreira e aos advogados, indicados em lista sêxtupla, com notório saber jurídico, reputação ilibada e mais de 10 anos de efetiva atividade profissional. São requisitos exaustivos, vedada a estipulação de outros por Constituições Estaduais (ver artigos 94, 111-A,I, e 115, I, todos da CF). Para o STF, seu número total não for

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divisível por cinco, arredonda-se a fração restante para o número inteiro seguinte. O STF também decidiu que o Tribunal pode recusar a indicação de um ou mais dos componentes da lista sêxtupla, no caso de faltar requisito para a investidura, com base em razões objetivas, declinadas na deliberação do Tribunal. O que não pode é o Tribunal substituir a lista encaminhada pela respectiva entidade. A solução é a devolução motivada da lista sêxtupla à corporação para que refaça total ou parcialmente.

No STJ, 1/3 da composição deve caber, em partes iguais, aos advogados e membros do MP (art. 104, parágrafo único, CF).

Órgão especial: pode ser criado nos Tribunais com mais de 25 julgadores para exercer atribuições administrativa e jurisdicionais delegadas da competência do pleno (art. 93, XI, CF). Não podem ser delegadas atribuições políticas, com eleições de dirigente, e legislativas, como elaboração de regimento interno (art. 96, I, “a”, CF). Essa composição poderá variar entre 11 e 25 membros, sendo metade das vagas providas por antiguidade e a outra por eleição do Tribunal pleno.

Regime dos Precatórios:Precatório judicial é uma ordem de pagamento emanada do Poder Judiciário e dirigida

às Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença condenatória transitada em julgado que impõe a estas entidades uma obrigação de pagar.

O regime dos precatórios decorre da impenhorabilidade dos bens públicos, devendo a execução da obrigação de pagar imposta às fazendas públicas seguir o procedimento previsto no art. 100 da CF.

A EC 62/2009 promoveu diversas alterações no artigo 100 e acrescentou o artigo 97 do ADCT (regime especial de parcelamento).

Confiram-se informativos que tratam de ADI's propostas em face da referida emenda:

INFORMATIVO Nº 631INFORMATIVO Nº 643

3. Competência:

STF: Órgão de cúpula do Poder Judiciário, cuja principal função é garantir a supremacia da Constituição, com competência adstrita a matérias constitucionais. A CF/88 e a EC 45/04 operaram inovações na jurisdição constitucional. É o intérprete maior da Constituição, mas “(...) não é um Tribunal Constitucional, seja porque a Constituição não lhe reservou essa natureza, seja porque integra o Poder Judiciário, sendo em muitos casos órgão recursal” (CUNHA JUNIOR/2011, p. 1092). Possui competência originária (art. 102, I, CF), recursal ordinária (art. 102, II, CF) e recursal extraordinária (art. 102, III, CF). Esse rol de competências é exaustivo, não podendo ser ampliado por norma infraconstitucional. A EC 45/04 passou a exigir demonstração de repercussão geral das questões constitucionais discutidas como requisito intrínseco de admissibilidade recursal do RE, julgando apenas questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que transcendam os interesses subjetivos da causa. A mesma EC introduziu a possibilidade de edição de enunciado de súmula com efeito vinculante

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(art. 103-A, CF), regulamentado pela Lei n. 11.417/06). O STF tem competência, ainda, para apreciar a Reclamação Constitucional, que teve origem na jurisprudência a partir da teoria dos poderes implícitos (implied powers), tendo sido incorporada ao Regimento Interno do tribunal em 1957 (ver art. 102, I, CF).

Obs.: STF: organização e competência são tratados no ponto 5.b.STJ: compete-lhe uniformizar a interpretação da lei federal e garantir sua observância e

aplicação. Foi criado pela atual CF para compreender a competência do ex-TFR e parte da competência do STF. Possui competência originária (art. 105, I), recursal (105, II) e especial (105, III). Anote-se a competência para julgar o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal, nos termos do artigo 109, §5º, CF.

Obs.: STJ: organização e competência são tratados no ponto 8.b.Tribunais e Juízes Federais: artigos 108 e 109 da CF. Ver Súmula 428 do STJ: compete ao

tribunal regional federal decidir os conflitos de competência entre juizado especial federal e juízo federal da mesma seção judiciária.

Obs. Justiça Comum Federal: organização e competência são tratados no ponto 7.c.Justiça do Trabalho:Trata-se de Justiça especializada em razão da matéria, portanto com competência

taxativamente prevista na Constituição. Prevista pela Carta de 1934 e efetivamente instalada em 01/05/1941, como órgão do Poder Executivo ligado ao Ministério do Trabalho. Passou a ter os contornos hoje consagrados a partir da Constituição Federal de 1946, que a colocou como órgão do Poder Judiciário.

A CF/88 estruturou a Justiça do trabalho com os seguintes órgãos: 1) TST; 2) TRT's; 3) Juntas de Conciliação e Julgamento. Com o advento da EC 24/99, as Juntas de Conciliação e Julgamento foram substituídas por Juízes do Trabalho, os quais exercem sua jurisdição nas Varas do Trabalho (CF, art. 116).

As Varas do Trabalho são criadas por lei, podendo ser atribuída jurisdição aos Juízes de Direito nas comarcas não abrangidas por elas, mas o recurso será para o TRT respectivo.

Tribunal Superior do TrabalhoA composição da Justiça do Trabalho foi alterada pela EC 24 de 9/12/99, que eliminou a

representação classista e substituiu as Juntas de Conciliação e Julgamento por Varas do Trabalho.

Os juízes dos TRT's não são mais indicados em lista tríplice, contentando-se o inciso II do novo art. 111-A da CF que eles sejam indicados pelo próprio TST, sem exigir formação de lista tríplice.;

Tribunais Regionais do TrabalhoJuizes do TrabalhoA lei instituirá as Varas do Trabalho, podendo, nas comarcas onde não forem instituídas,

atribuir sua jurisdição aos juizes de direito. Nas Varas do Trabalho, a jurisdição será exercida por um juiz singular.

Observação: O art 2º da Emenda Constitucional nº 24, de 9.12.99 assegura o cumprimento dos mandatos dos atuais ministros classistas temporários do Tribunal Superior do Trabalho e dos atuais juízes classistas temporários dos Tribunais Regionais do Trabalho e das Juntas de Conciliação e Julgamento.

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Competência da Justiça do Trabalho:Compete à Justiça do Trabalho o processo e julgamento de ações decorrentes de relação

de trabalho entendida esta como toda aquela submetida ao regime jurídico celetista. Na ADI n. 3.395, o STF deu interpretação conforme ao artigo 114, I, da CF, com a redação dada pela EC 45/04, para suspender toda e qualquer interpretação dada ao inciso, que inclua na competência da Justiça do Trabalho a apreciação de causas que sejam instauradas entre o Estado e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo. Da mesma foram, excluem-se contratos de prestação de serviço regidos pelo CDC ou CC.

Importante observar o disposto no §3º do artigo 1114, no sentido de que em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito.

A EC 45/04 incluiu na competência da Justiça do Trabalho julgar as ações que versem sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores, não mais se aplicando a Orientação Jurisprudencial n. 04, da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do TST, que tinha a seguinte redação: “A disputa intersindical pela representatividade de certa categoria refoge ao âmbito da competência material da Justiça do Trabalho”. A partir da emenda, a competência abrange ações entre sindicato de categoria econômica e a empresa por ele representada, desde que decorrentes de relação de trabalho (regime celetista).

Acresceu a competência do trabalho para julgar mandados de segurança quando envolver relação de trabalho, independente de quem seja a autoridade coatora. Antes o STJ entendia que a competência para o julgamento de mandado de segurança se verificava em razão da autoridade coatora, e não da matéria veiculada, o que restou alterado pela EC 45/04.

A citada emenda também acrescentou a competência da Justiça do Trabalho para julgar habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição. No caso do habeas corpus, a hipótese mais comum é a de ordem de prisão do depositário infiel, já que falta à Justiça do Trabalho competência criminal. Antes da EC o STF e STF entendiam que o habeas corpus, por ter natureza criminal, ainda que impetrado em face de decisão proferida por juiz do trabalho em execução de sentença, em ação de natureza civil.

Merece destaque a Súmula Vinculante n. 22: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da EC N. 45/04”.

A Justiça do Trabalho também passou a ser competente para julgar as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho. Antes da EC 45 essa competência era atribuída aos Juízes Federais, que julgavam as ações propostas em face de autuações lavradas pelos fiscais do trabalho, por violação da legislação trabalhista pelo empregador.

Importante ressaltar, também, a competência da Justiça do Trabalho para a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, “a”, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir. Essa competência foi conferida pela EC 20/98 – antes

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exercida pela Justiça Federal -, passando os juízes do trabalho a executar as contribuições sociais devidas pelo empregador e incidentes sobre a folha de salário de seus empregados e as contribuições sociais devidas pelo empregado, quando decorrentes das sentenças que proferirem. Não será competente no caso de acordo extrajudicial não homologado em juízo. Se houver homologação, sim (STJ, CC n. 41233/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 29.11.2004).

Justiça Eleitoral:São órgãos da Justiça Eleitoral: o Tribunal Superior Eleitoral; os Tribunais Regionais

Eleitorais; os Juizes Eleitorais e as Juntas Eleitorais.Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juizes

de direito e das juntas eleitorais.Tribunal Superior EleitoralO Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros, escolhidos:* mediante eleição, pelo voto secreto de seus próprios membros:a) três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal;b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça;* por nomeação do Presidente da Republica, dois juízes dentre seis advogados de

notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal, sem participação da OAB.

O Tribunal Superior Eleitoral elegera seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, e o Corregedor Eleitoral dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça.

São irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de habeas-corpus ou mandado de segurança, que se sujeitam a recurso extraordinário e ordinário para o STF, respectivamente.

Tribunais Regionais EleitoraisHaverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no Distrito Federal.

Compor-se-ão mediante eleição, pelo voto secreto, de dois juizes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça e de dois juizes, dentre juizes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça; de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou no Distrito Federal, ou, não havendo, de juiz federal, escolhido, em qualquer caso, pelo Tribunal Regional Federal respectivo. Alem disso, por nomeação, pelo Presidente da Republica, de dois juizes dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça.

O Tribunal Regional Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os desembargadores. Os juizes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no minimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em numero igual para cada categoria.

Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando: a) forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei; b) ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais; c) versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais; d) anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais ou e) denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas-data ou mandado de injunção.

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Obs.: O MP não participa da composição dos tribunais eleitorais.Justiça Militar:A Justiça Militar se compõe do Superior Tribunal Militar, os Tribunais e Juizes Militares

instituídos por lei, que disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência.O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo

Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exercito, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da Republica dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e dois, por escolha paritária, dentre juizes auditores e membros do Ministério Publico da Justiça Militar. A Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei

Justiça EstadualArtigos 125 a 126 da CF. A competência da Justiça Estadual é residual, compreendendo

tudo o que não for de atribuição da Justiça Federal, do Trabalho ou Eleitoral.Juizados Especiais e de Paz:A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão juizados especiais,

providos por juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau.

Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal.Também criarão justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto

direto, universal e secreto, com mandato de quatro anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de oficio ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, alem de outras previstas na legislação. (art. 98)

CNJ: Apesar do CNJ integrar a estrutura do Poder Judiciário Nacional, não dispõe de função jurisdicional. Foi criado pela EC n. 45/04 (Reforma do Judiciário), que o incluiu no art. 92 e especificou competências no art. 103-B. Cuida-se de órgão administrativo de controle da atuação administrativa, financeira e disciplinar do Poder Judiciário, exceto STF, e de correição acerca do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes. Não pode interferir na independência funcional dos membros e órgãos do Poder Judiciário, nem na autonomia administrativa e financeira. Podem ser ser conferidas outras atribuições pelo Estatuto da Magistratura (art. 103-B, §4º, CF). Não possui competência sobre o STF, que, na condição de órgão máximo do Judiciário, tem preeminência sobre o CNJ, cujos atos e decisões estão sujeitos a seu controle jurisdicional (art. 102, I, r, e art. 103-B, §4º, CF). É composto por 15 membros, sendo 09 magistrados, 02 membros do MP, 02 advogados e 02 cidadãos (art. 103-B, CF). O STF decidiu que a instituição do CNJ é constitucional, não ferindo o princípio da separação dos poderes (cláusula pétrea), pois se trata de órgão de natureza exclusivamente administrativa. Na mesma oportunidade, decidiu que Estados-membros não possuem competência constitucional para instituir, como órgão interno ou externo, conselho destinado ao controle da atividade

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administrativa, financeira ou disciplinar da respectiva Justiça (ver ADI 3.367).

4. Normas constitucionais respeitantes à magistratura.

A Constituição de 1998 assegura aos magistrados as seguintes garantias: a) vitaliciedade; b) inamovibilidade; c) irredutibilidade de vencimentos.

A vitaliciedade assegura que o magistrado somente perderá o cargo mediante sentença judicial transitada em julgado

No primeiro grau a vitaliciedade só será adquirida após dois anos de exercício, somente podendo o juiz perder o cargo, nesse período, mediante de deliberação do tribunal a que o juiz estiver vinculado.

A inamovibilidade garante que o juiz não seja removido do cargo ex officio. No entanto, a Constituição permite ato de remoção, disponibilidade e aposentadoria de magistrado, por interesse público, fundada em decisão corroborada pelo voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla defesa

A irredutibilidade afasta qualquer possibilidade de decisão legislativa com o intuito de afetar os subsídios dos magistrados.

Aos juízes impõem-se algumas vedações específicas, tais como: a) exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério (inclusive de natureza privada, Resolução n. 10/2005, CNJ); b) receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; c) dedicar-se à atividade político-partidária; d) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; e) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

Lembra-se que para exercer atividade político-partidária, deverá o magistrado filiar-se à partido político e afastar-se definitivamente de suas funções (exoneração ou aposentadoria) até seis meses antes das eleições, prazo de desincompatibilização previsto na LC 64/90.

5. Lei de Organização da Magistratura Nacional – LOMAN

Dirley da Cunha Júnior leciona que “O Estatuto da Magistratura consiste num conjunto de normas constitucionais e legais, destinadas à disciplina da carreira da magistratura, forma e requisitos de acesso, critérios de promoção, aposentadoria, subsídio, vantagens, direitos, deveres, responsabilidades, impedimentos e outros aspectos relacionados à atividade do magistrado” (CUNHA JÚNIOR/2011, p. 1073). Lei Complementar, de iniciativa do STF, disporá sobre o Estatuto da Magistratura (art. 93, CF). Lei Complementar 35/79 trata do Estatuto da Magistratura Nacional. Importante a leitura do Código de Ética da Magistratura Nacional, aprovado pelo CNJ.

A LOMAN trata dos órgãos do Poder Judiciário, dos magistrados, das garantias da magistratura e das prerrogativas do magistrado, da disciplina judiciária (dos deveres do magistrado, das penalidades, da responsabilidade civil do magistrado e do Conselho Nacional da Magistratura), dos vencimentos, vantagens e direitos dos magistrados, da magistratura de

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carreira, dispondo ainda sobre ramos da Justiça como a Justiça do Trabalho, Justiça dos Estados, dentre outras.

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ITEM C: Estado-membro. Competência. Autonomia. Bens. Ministério Público como guardião do princípio federativo.

Obras consultadas:Eugênio Aragão. A sociedade civil no Brasil, a globalização e os direitos humanos1.Gilmar Ferreia Mendes e outros. Curso de Direito Constitucional. 12ª Edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2008.Gilmar Ferreira Mendes. A representação interventiva.Revista DIREITO PÚBLICO Nº 9 – Jul-Ago-Set/2005.José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª Edição.São Paulo, Ed. Malheiros, 2005. Legislação básica.

Capítulo III do Título III, art. 34, VII e Capítulo IV do Título IV, da CF.

1. Noções Gerais.

O tema da divisão dos poderes está relacionado com a Teoria Geral do Estado e com o Direito Constitucional, já que envolve a forma de Estado e a conformação dos órgãos estatais.

O Estado-membro está disciplinado no Capítulo III do Título III DA Constituição Federal, ao passo que o Ministério Público está previsto no Capítulo IV do Título IV, das funções essenciais à justiça, do diploma constitucional.

2. Estado-membro.

A organização político-administrativa compreende, como se vê no art. 18 da Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

Os Estados-membros são organizações jurídicas das coletividades regionais para o exercício, em caráter autônomo, das competências que lhes são deferidas pela Constituição Federal, por isso se diz que são coletividades federais autônomas. Os Estados-membros não possuem soberania (que é um dos fundamentos da República), mas mera autonomia, como ocorre com a própria União. Entre Estados e União não há hierarquia, convivendo todos em um mesmo nível jurídico.

Não há como formar novos Estados, senão por divisão d e o u t r o o u o u t r o s ; a C o n s t i t u i ç ã o p r e v ê a p o s s i b i l i d a d e d e t r a n s f o r m a ç ã o d e l e s p o r incorporação entre si, por subdivisão ou desmembramento quer para se anexarem a outros, q u e r p a ra fo r m a re m n o v o s E s t a d o s , q u e r, a i n d a , p a ra fo r m a re m Te r r i t ó r i o s Fe d e ra i s , m e d i a n t e a p ro va ç ã o d a p o p u l a ç ã o d i re ta m e n t e i n t e re s s a d a , a t rav é s d e p l e b i s c i t o , e d o Congresso Nacional, por lei complementar, ouvidas as respectivas Assembleias Legislativas(art. 18, § 3º, combinado com o art. 48, VI).

Para a formação de Estados há requisitos no art. 18, § 3º, que devem ser conjugados com outro requisito do art.48, VI: (i) realização de plebiscito (condição prévia, essencial e 1 Não possui dados bibliográficos do artigo por isso deixei de transcrevê-los.

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prejudicial à 2ª fase); (ii) lei complementar; (iii) audiência das Assembléias Legislativas (cujo parecer não é vinculativo, ao contrário da consulta plebiscitária); (iv) aprovação pelo Congresso Nacional (quorum de maioria absoluta – lei complementar).

A concordância dos interessados permite que o projeto de lei complementar seja discutido no Congresso Nacional, sem, contudo, vinculá-lo, pois esse deverá zelar pelo interesse geral da República e não somente pelos interesses das populações diretamente interessadas.

3. Competência.

S ã o r e s e r v a d a s a o s E s t a d o s a s competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição (art. 25, § 1º); em verdade, n ã o s ó c o m p e t ê n c i a s q u e n ã o l h e s s e j a m v e d a d a s , q u e l h e s c a b e m , p o i s ta m b é m l h e s competem competências enumeradas em comum com a União e os Municípios (23), assim como a competência exclusiva referida no art. 25, §§ 2º e 3º.

A competência dos Estados-membros divide-se em:Não legislativa, administrativa ou materialA á r e a d e c o m p e t ê n c i a d o s E s t a d o s s e limita à seguinte

classificação: competência econômica, social, administrativa, financeira e tributária.Comum, cumulativa ou paralela: trata-se de competência não legislativa comum aos

quatro entes federativos.Residual, remanescente ou reservada: são as que não lhes sejam vedadas, que não

sejam próprias dos outros entes federativos.LegislativaExpressa: capacidade de auto-organização, pela Constituição e leis que adotarem. Art.

25 caput.Residual, remanescente ou reservada: são as que não lhes sejam vedadas, que não

sejam próprias dos outros entes federativos. Art.25 § 1°.Delegada pela União: Tal autorização dar-se-á através de lei complementar. Art. 22,

parág. único.Concorrente: cabe à União legislar sobre normas gerais e aos Estados sobre normas

específicas. Art. 24.Suplementar: No caso da legislação concorrente, se houver inércia legislativa da União,

os Estados poderão suplementá-la, regulamentando as regras gerais sobre o assunto, sendo que na superveniência de lei federal, a aludida norma estadual geral suplementar terá sua eficácia SUSPENSA, no que for contrária. Desse modo, subdivide-se essa competência em SUPLEMENTAR COMPLEMENTAR, na hipótese de já existir lei federal sobre a matéria, cabendo aos Estados e DF na competência estadual apenas completá-las e em SUPLEMENTAR SUPLETIVA, na hipótese da inexistência da lei federal.

Tributária expressa: art. 155.Pedro Lenza afirma ainda que os serviços de gás canalizado serão explorados

diretamente pelos Estados, ou mediante concessão, na forma da lei, vedando-se a regulamentaçãoda referida matéria por MP, conforme expressamente previsto no art. 25 § 2° e em decorrência do art. 246.

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4. Autonomia.A C F a a s s e g u r a , c o n s u b s t a n c i a n d o - s e n a s u a c a p a c i d a d e

d e a u t o - o r g a n i z a ç ã o , d e a u t o - l e g i s l a ç ã o , d e a u t o - g o v e r n o e d e a u t o - administração (arts. 18, 25 e 28).

Auto-organizaçãoA a u t o - o r g a n i z a ç ã o s e concretiza na capacidade de dar-se a própria

Constituição (25). A Constituição Federal assegurou aos Estados a capacidade de auto-organizar-se por Constituição própria, obsevados os princípios dela.

Derivada do Poder Constituinte Decorrente, com lastro no qual são promulgadas as Constituições Estaduais. Está consagrada no caput do art. 25, segundo o qual “os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição”. Os referidos princípios são:

Princípios constitucionais sensíveis – assim denominados, pois sua inobservância pelos Estados no exercício de suas competências legislativas, administrativas ou tributárias, pode acarretar a sanção politicamente mais grave existente em um Estado Federal, a intervenção na autonomia política. Estão previstos no art. 34, VII da CF.

Princípios federais extensíveis – são normas centrais comuns à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, portanto de observância obrigatória no poder de organização do Estado. A Constituição vigente, em prestígio do federalismo, praticamente eliminou estes princípios, restando apenas a regra segundo a qual os vencimentos dos magistrados não podem exceder aos dos Ministros do STF.

Princípios constitucionais estabelecidos – consistem em determinadas normas que se encontram espalhadas pelo texto da Constituição, e, além de organizarem a própria federação, estabelecem preceitos centrais de observância obrigatória aos Estados-membros em sua auto-organização. Subdividem-se em normas de competência (ex.: arts. 23; 24; 25 etc.) e normas de preordenação (ex.: arts. 27; 28; 37, I a XXI etc.). Segundo Raul Machado Horta, são os que limitam a autonomia organizatória dos Estados. Exemplo: preceitos constantes dos arts. 37 a 41, referentes à administração pública.

Autogoverno: Os Estados possuem Poder Legislativo, que se expressa por Assembléias Legislativas;

Poder Executivo, exercido pelo Governador; e Poder Judiciário, que repousa no Tribunal de Justiça e outros tribunais e juízes, com fundamento explícito nos arts. 27, 28 e 125 da Constituição.

Auto-administração e autolegislação.Regras de competência legislativas e não-legislativas. Arts. 18 e 25-28.Regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões.Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas,

aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de Municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.

Regiões metropolitanas: A região metropolitana é um conjunto de municípios cujas sedes se unem com certa homogeneidade urbana em torno de um município-pólo.

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Microrregiões: São formadas de grupos de municípios com certa homogeneidade e problemas administrativos comuns, cujas sedes não estão unidas por continuidade urbana.

Aglomerações urbanas: Segundo José Afonso da Silva, a expressão carece de conceituação, mas pode-se perceber que se trata de áreas urbanas, sem um pólo de atração urbana, quer tais áreas sejam das cidades sedes dos municípios. Segundo Alexandre de Moraes, são requisitos comuns às três hipóteses: (i) lei complementar estadual; (ii) tratar-se de um conjunto de municípios limítrofes; (iii) finalidade: organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.

5. Bens dos Estados.Nos termos do artigo 26 da Constituição Federal, incluem-se entre os bens dos Estados:

a) as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; b) as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros; c) s ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; d) as terras devolutas não compreendidas entre as da União.

6. Ministério Público como guardião do princípio federativo.Segundo o art. 129 da Constituição, é função institucional do Ministério Público, dentre

outras, promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de intervenção da União nos Estados.

Como regra, a Constituição estabelece a autonomia na organização político-administrativa dos entes federados. No entanto, de forma excepcional, poderá haver intervenção federal ou estadual caso se configure situação de anormalidade, suprimindo-se, temporariamente, a autonomia do ente. A intervenção federal pode visar, por exemplo, repelir invasão de uma unidade da Federação em outra, pôr termo a grave comprometimento da ordem pública ou garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes, com a finalidade maior de defender o princípio federativo. No caso de violação de princípios constitucionais sensíveis (art. 34, VII), a intervenção federal dependerá de provimento, pelo STF, de representação do Procurador-Geral da República.

Para o Ministro Celso de Mello, “o mecanismo de intervenção constitui instrumento essencial à viabilização do próprio sistema federativo, e, não obstante o caráter excepcional de sua utilização – necessariamente limitada às hipóteses taxativamente definidas na Carta Política -, mostra-se impregnado de múltiplas funções de ordem político-jurídica, destinadas (a) a tornar efetiva a intangibilidade do vínculo federativo; (b) a fazer respeitar a integridade territorial das unidades federadas; (c) a promover a unidade do Estado Federal e (d) a preservar a incolumidade dos princípios fundamentais proclamados pela Constituição da República”.

A instauração do processo de controle de constitucionalidade, para fins de intervenção, é privativa do Procurador-Geral da República, como representante judicial da União (MENDES, DIREITO PÚBLICO Nº 9 – Jul-Ago-Set/2005, p. 10).

Identifica-se aqui, pois, nitidamente, o interesse jurídico (Rechtsschutzbedürfnis) da União, como guardiã dos postulados federativos, na observância dos princípios constitucionais sensíveis. Mesmo a outorga da representação processual ao Procurador-Geral da República (CF

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de 1988, art. 36, III) – acentue-se que, tal como nos modelos constitucionais de 1946 e de 1967/1969, o Procurador-Geral da República atua nesse processo, hoje em caráter excepcionalíssimo, como representante judicial da União – não se mostra hábil a descaracterizar a representação interventiva como peculiar modalidade de composição judicial de conflitos entre a União e a unidade federada.

Ainda, o controle de constitucionalidade para fins de intervenção poderá ter objeto por “(...) existência de uma grave situação de fato atentatória à efetividade dos princípios constitucionais, particularmente, aos direitos humanos fundamentais”, conforme voto do Ministro Sepulveda Pertence na Intervenção Federal n. 114 (STF, IF 114, Rel. Min. Néri da Silveira, DJU 27.09.1996, RTJ 160/1).

No entanto, o “(...) grau de excepcionalidade que a corte atribuiu ao instrumento terminou por inviabilizá-lo” (ARAGÃO, Eugênio. A sociedade civil no Brasil, a globalização e os direitos humanos).

A Emenda Complementar n. 45 buscou superar a falta de efetividade do processo de intervenção federal em matéria de direitos humanos, criando o incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal nos casos de graves violações aos direitos humanos.

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ITEM A: Direitos sociais: enunciação, garantias e efetividade. Princípio do não-retrocesso. Constitucionalismo dirigente.

Obras consultadas:Cunha Jr, Dirley. Curso de Direito Constitucional. Editora Juspodivm, 2011. 6ª Edição.Fernandes, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Editora Lumen Juris, 2011. 3ª Edição.Krell, Andréas. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha.Sarmento, Daniel. Por um constitucionalismo inclusivo. 2010.

Legislação básica.Art. 6º, 7 (trabalho), 194 (seguridade social), 196 (saúde), 205 (educação), CF.

1. Conceito.

“(...) verdadeiras condições de implementação do objeto primário da justiça social (...), ou seja, a maneira pela qual as instituições sociais mais importantes distribuem direitos e deveres e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social.” (CUNHA JR., p.759)“(...) são aquelas posições jurídicas que credenciam o individuo a exigir do Estado uma postura ativa, no sentido de que este coloque à disposição daquele, prestações de natureza jurídica ou material, consideradas necessárias para implementar as condições fáticas que permitam o efetivo exercício das liberdades fundamentais e que possibilitam realizar a igualização de situações sociais desiguais.” (CUNHA JR., p.759)

DIREITOS SOCIAIS.ENUNCIAÇÃO Direitos de segunda dimensão.Crise da tradição do Estado Liberal – Consagração do Estado SocialMarcos históricos clássicos: constituição mexicana de 1917 e a de Weimar de 1919. Marcos históricos reais: tratados e instituições internacionais de proteção dos direitos

sociais dos trabalhadores.Marco histórico Brasil – C/1834 - Título II da CF (Capítulo I – Direitos e deveres

individuais e coletivos; Capítulo II – Direitos sociais; Capítulo III – Direitos de nacionalidade; Capítulo IV – Direitos políticos e Capítulo V – Partidos políticos). Seguridade e da educação.

Há 3 posições sobre a fundamentalidade dos direito sociais:2

a) todos os direitos sociais são formal e materialmente fundamentais: por isso a sua mera enunciação na CF seria suficiente lhes atribuir um regime diferenciado de aplicabilidade imediata (art. 5º, § 1º) e de limite material para a reforma da constituição (art. 60, § 4º, IV);

b) todos os direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, e, por isso, são normas programáticas que não geram direitos subjetivos e não limitam o constituinte derivado;

2Direito formalmente constitucional : é aquele assim declarado pela constituição. Direito materialmente constitucional: é aquele que se relaciona com as decisões políticas fundamentais da

comunidade política, não precisando necessariamente estar declarado. A diferenciação remonta a Carl Schmitt, para quem somente os direitos materialmente constitucionais seriam constituição e teriam um regime diferenciado.

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c) direitos sociais são apenas formalmente fundamentais, sendo materialmente fundamentais apenas no que tange ao seu núcleo essencial (mínimo existencial):posição amplamente aceita pela maior parte da doutrina e jurisprudência.3

GARANTIAS: Conforme clássica classificação de Barroso (BARROSO, 2006, p. 119), há 3 espécies de garantias para a efetivação dos direitos sociais:

a) sociais: relacionam-se com a participação do indivíduo no controle do processo político e no exercício do direito de petição (art. 5º, XXIV);

b) políticas: destaca-se principalmente o controle externo da administração pelo Congresso, com auxílio do Tribunal de Contas (art. 70 CF); e

c) jurídicas: são aqueles buscados principalmente pela via jurisdicional, destacando-se o mandado de segurança (art. 5o, LXIX e LXX); a ação popular (Art. 5o, LXXIII); o dissídio coletivo (art. 114, § 2º); o mandado de injunção (art. 5o, LXXI); o habeas data (art. 5o, LXXII); a ação civil pública (art. 129, inc. III) as ações diretas de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade (art. 102, I, a), a ADPF (art. 102, § 1º), a ação de declaratória de inconstitucionalidade de por omissão (art. 103, § 2º).

EFETIVIDADE NORMATIVA: Visão tradicional de separação estanque dos poderes implica numa concepção de

direitos sociais como normas programáticas, normas de baixa efetividade.Atualmente, “elas não representam meras recomendações (conselhos) ou preceitos

morais com eficácia ética-política meramente diretiva, mas constituem Direito diretamente aplicável.” (KRELL, p. 20)

Direitos na Medida da Lei (Massgabegrundrechte) – Direitos sociais só se realizam na medida em que as leis os efetivarem.

Mínimo Existencial – para que se possa usufruir dos direitos de liberdade (direitos individuais), antes se faz necessário a implementação e garantia de um piso mínimo de direitos.

SARMENTO (p. 204-205): a) dimensão negativa: opera num limite, impedindo a prática de atos pelo estado ou

por particulares que subtraiam do individuo as condições materiais indispensáveis a uma vida digna;

b) dimensão positiva: conjunto essencial (mínimo) de direito prestacionaisa serem implementados e concretizados que possibilitam ao individuo uma vida digna.

ADPF 45 (controle judicial das politicas publicas) e RE 410.715/SP – Analise do STF sob o mínimo existencial.

Reserva do Possível – concepção de que “...o objeto dos direitos sociais depende da existência de recursos financeiros ou meios jurídicos necessários para satisfazê-los.” (CUNHA JR., p. 761)

SARMENTO, delimitação de aplicação: (p. 199-201)

3 Apesar de retórica ser coincidente, vale mencionar que todo o problema, para esta correte, gira em torno de definir o que é o mínimo existencial, sendo alguns mais pródigos (SARLET) e

outros mais restritivos (RICARDO LOBO TORRES).

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a) fático: razoabilidade da universalização da prestação exigida, considerando os recursos existentes.

b) jurídico: dois aspectos: 1. Admissão que os poderes públicos precisam fazer escolhas de prioridades. 2. Que os direitos sociais fiquem absolutamente vinculados as escolhas exercidas.

Assim, o autor é pela possibilidade excepcional da atuação do Judiciário para a concretização de direitos sociais (essenciais) previstos constitucionalmente, nos moldes e parâmetros acima.

PRINCÍPIO DO NÃO RETROCESSO:4 “Limite material implícito, de forma que os direitos fundamentais sociais já constitucionalmente assegurados e que alcançaram um grau de densidade normativa adequado não poderão ser suprimidos por emenda constitucional e nem mesmo por legislação infraconstitucional,a não ser que tenha prestações alternativas para os direitos em questão.” (FERNANDES, p. 474)

a) Conteúdo negativo: respeitar a não supressão ou a não redução do grau de densidade normativa.

b) conteúdo positivo: efetiva concretização dos direitos fundamentais sociais, para a constante redução das desigualdades fático-sociais.

A discussão sobre a vedação de retrocesso está diretamente relacionada com os direitos sociais, mas não apenas com eles.5 Em essência traz mais uma limitação à liberdade de conformação do legislador, de modo que o núcleo essencial dos direitos sociais, efetivados por medidas legislativas, não mais poderia ser violado, sem o oferecimento de medidas compensatórias. No STF o princípio não ganha força, tendo sido refutado na ADI 2.065/DF, na qual se questionava a constitucionalidade de MP que, dentre outras coisas, revogava dispositivos da lei de custeio de seguridade social (Lei 8.213/91), extinguindo o Conselho Estadual e Municipal da previdência social.

CONSTITUCIONALISMO DIRIGENTE: No plano internacional o constitucionalismo dirigente é atribuído, apenas dentre nós brasileiro e de forma equivocada, a Canotilho e seus escritos no contexto da Constituição portuguesa socialista de 1976. Trata-se de uma proposta de constituição que pretende estabelecer um projeto social compreensivo para o futuro, vinculando a totalidade das decisões, no âmbito social, político e econômico, das gerações futuras, motivo pelo qual impõe deveres positivos/prestacionais para o Estado.

A constituição dirigente contrapõe-se a constituição garantia, modelo clássico do sec. XVIII, cuja função é proteger o status negativos e os direitos de liberdade dos indivíduos contra o arbítrio estatal. No Brasil o movimento ganhou força na discussão sobre a efetividade das normas constitucionais, primeiramente na formulação de José Afonso da Silva e depois com Barroso e seus seguidores. 4Também se usam expressões como princípio da não reversibilidade, princípio da proibição de regressividade, princípio da proibição/vedação de retrocesso, efeito cliquet(essa última

usada por José Adércio Sampaio Leite e cobrada em teste objetivo de provas anteriores do MPF).5 No âmbito do MPF o argumento foi explicitamente utilizado na ADI promovida pelo PGR contra a lei estadual de Santa Catarina que previa áreas de reserva legal inferiores àquelas do Código

Florestal.

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Conquanto ainda muito difundido na jurisprudência não especializada, o movimento tende a perder força, não apenas em função da revisão que Canotilho fez de suas teses, mas também em decorrência dos influxos neoconstitucionalistas.

Canotilho agora, passa à defesa de um “Constitucionalismo Moralmente Reflexivo”.

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ITEM B: Normas constitucionais. Definição. Estrutura. Classificações: normas formalmente e normas materialmente constitucionais; normas de organização, normas definidoras de direitos e normas programáticas; normas autoaplicáveis (preceptivas e proibitivas) e normas não autoaplicáveis; normas de eficácia contida, normas de eficácia limitada e normas de eficácia ilimitada; princípios e regras. Preâmbulos. Efeitos das normas da Constituição brasileira de 1988.

Constituição: Sistema jurídico aberto de regras e princípios.Norma constitucional: “...todas as disposições inseridas numa Constituição, ou

reconhecidas por ela, independentemente de seu conteúdo”. (CUNHA JR., p. 148)Normas materialmente constitucionais: segundo a doutrina majoritária, são as que

regulam os seguintes temas: forma de governo, forma de Estado, separação de poderes, obtenção e exercício do poder e direitos fundamentais; O fundamental é a matéria objeto da norma, sendo irrelevante a sua localização.

Normas formalmente constitucionais: são aquelas que, sem regular os aspectos acima mencionados, são consideradas constitucionais pelo simples fato de terem sido consignadas no texto da Constituição pelo legislador, adquirindo assim status constitucional. Ex.: Art. 242, § 2º - “O Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro, será mantido na órbita federal.

Critica-se na doutrina está classificação, Michel Temer afirma: “à luz da Constituição atual, é irrelevante essa classificação, tendo em vista que, independente de serem normas materiais ou formais, ambas têm igual hierarquia, produzem os mesmos efeitos jurídicos e só podem ser alteradas segundo o rígido e idêntico processo tracejado no texto constitucional que coabitam.”

Normas definidoras de direito e normas de organização: “(...) refletindo a clássica dicotomia Estado/indivíduo, as disposições constitucionais podem ser classificadas em normas de organização, de estrutura ou de competência, e normas definidoras de direitos, sendo as primeiras aquela que dispõe sobre a ordenação dos poderes do Estado, sua estrutura, competência, articulação recíproca e o estatuto dos seus titulares; as outras, as que definem os direitos fundamentais dos jurisdicionados.” (MENDES, COELHO e BRANCO, 2008: 30).

Normas autoaplicáveis (autoexecutáveis, segundo MENDES, COELHO e BRANCO): “(...) consideram-se auto-executáveis as disposições constitucionais bastantes em si, completas e suficientemente precisas na sua hipótese de incidência e na sua disposição, aquelas que ministram os meios pelos quais se possa exercer ou proteger o direito que conferem, ou cumprir o dever e desempenhar o encargo que elas impõe; não-aplicáveis, ao contrário, são as disposições constitucionais incompletas ou insuficientes, para cuja execução se faz indispensável a mediação do legislador, editando normas infraconstitucionais regulamentadoras.”

Normas de eficácia limitada: “são aquelas que apresentam aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade.” (SILVA, 1999).

Norma de eficácia contida (ou restringível, segundo Maria Helena Diniz e Michel Temer): "normas de eficácia contida (...) são aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação

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restritiva da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciando" (SILVA, 1999).

Normas de eficácia plena: “aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem ou têm possibilidade de produzir todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular.” (SILVA, 1999).

Normas programáticas: “definem objetivos cuja concretização depende de providências situadas fora ou além do texto constitucional.” (MENDES, COELHO e BRANCO, 2008: 28). Observar que esta classificação, trazida para o Brasil por José Afonso da Silva, vem sofrendo críticas da moderna hermenêutica constitucional e do movimento neoconstitucionalista, que afirma, grosso modo, que todas as normas constitucionais são dotadas de algum grau de eficácia, ao mesmo tempo que nenhuma possui eficácia plena, já que sempre são passíveis de restrição em face de outras normas constitucionais, situação em que ocorre colisão de direitos. Luis Roberto Barroso e Virgílio Afonso da Silva (filho de José Afonso) são alguns dos críticos da classificação apontada alhures.

Princípios, regras e postulados: Ambos são normas mas diferenciam-se:a) grau de abstração e generalidadeb)grau de indeterminaçãoc) caráter de fundamentalidaded) proximidade da ideia de Direitoe) função normogenética e sistêmica

Some-se a isto o fato de que os princípios são aplicados segundo juízo de ponderação, ao passo que as regras segundo critério do “tudo ou nada”. Ao lado das normas (gênero que divide-se em princípios e regras), há também os postulados6, os quais, segundo ÁVILA (2003: 80), distingue-se dos princípios pois estes “estabelecem fins a serem buscados”.

Para Ávila, os postulados não seriam normas, mas sim metanormas, “situam-se num segundo grau e estabelecem a estrutura de aplicação de outras normas, princípios e regras”, ou seja, os postulados “(...) não impõe a promoção de um fim, mas, em vez disso, estruturam a aplicação do dever de promover um fim”, além disso “(...) não prescrevem comportamentos, mas modos de raciocínio e de argumentação relativamente a normas que indiretamente prescrevem comportamentos.”. São exemplos de postulados a ponderação, a concordância prática e a proibição de excesso, bem como a igualdade, razoabilidade e proporcionalidade.

Regras PrincípiosDimensão da validadeespecificidade e vigência

Dimensão da importânciapeso e valor

Conflito entre regrasPrincipio da especialidadeDeclaração de invalidade

Colisão entre PrincípiosPrincipio da ProporcionalidadeInocorrência de invalidadePrevalência de um sobre o outro

6 Observar que a examinadora cobrou esta distinção na dissertação da prova subjetiva, mencionando, na correção, que os candidatos deveriam abordar a dicotomia princípio/postulado da

proporcionalidade.

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Tudo ou nada Ponderação, balanceamento...Mandamentos de definição Mandamentos de otimização

Preâmbulo: “Na expressão de Peter Häberle, os preâmbulos são ‘pontes do tempo’, exteriorizando as origens, os sentimentos, os desejos e esperanças que palmilharam o ato constituinte originário” (BULOS, 2008: 283). Portanto, o preâmbulo não possui força normativa, não servindo, portanto, como parâmetro para o exercício do controle de constitucionalidade. Esta tese já foi sedimentada pelo STF: ADI 2.076. Na ADI 2.649 da relatoria da Ministra Carmen Lucia, o STF, entendeu haver caráter normativo ao preambulo.

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ITEM C: União. Competência. Bens da União. Federalismo fiscal. Judiciário e Federação.

Introdução: “A União é fruto da junção dos Estados entre si, é a aliança indissolúvel destes. É quem age em nome da Federação. No plano legislativo, edita tanto leis nacionais, como leis federais” (MENDES et all., 2008, p. 802).

Competências:

1) Competência Geral (Competência Administrativa ou Material Exclusiva): “o art. 21 da Carta dispõe sobre a competência geral da União, que é consideravelmente ampla, abrangendo temas que envolvem o exercício de soberano, ou que, por motivo de segurança ou eficiência devem ser objeto de atenção do governo central” (MENDES et all., 2008, p. 817-818).

2) Competência Legislativa Privativa: Listadas na CF, art. 22. O parágrafo único do art. 22 prevê a possibilidade de lei complementar federal vir a autorizar que os Estados-membros legislem sobre questões específicas das matérias relacionadas no artigo.

3) Competência Comum Material (Competências Concorrentes Administrativas): exercida pela União, Estados, DF e Municípios. CF, art. 23.

4) Competência Legislativa Concorrente: CF, art. 24. “A Constituição Federal prevê, além de competências privativas, um condomínio legislativo, de que resultarão normas gerais a serem editadas pela União e normas específicas, a serem editadas pelos Estados-membros” (MENDES et all., 2008, p. 820).

Bens da União: Ver CF, art. 20.

Federalismo Fiscal: Conforme Germana de Oliveira Moraes (2003, p. 306-307), o Federalismo usualmente “resulta dos esforços para integrar sem destruir a diversidade ou para descentralizar sem abandonar a unidade”.

“Subjaz à concepção de Federalismo fiscal essa ideia de que, não obstante a existência de várias ordens estatais – central e periféricas, com autonomia para criar e cobrar seus tributos e decidir sobre os destino do produto de suas arrecadações -, estas permanecem unidas por um sistema fiscal comum”.

Características do Federalismo fiscal brasileiro:

a) Sistema fiscal comum.b) Obediência a um conjunto de diretrizes políticas, princípios e regras contidas na

Constituição Federal e nas Leis Complementares.

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c) Repartição constitucional de competências tributárias.d) Discriminação e distribuição constitucional de rendas.

Judiciário e Federação: Para José Afonso da Silva (2010, p. 556), a ordem judiciária do país compreende: (a) um órgão de cúpula, como guarda da Constituição e Tribunal da Federação, que é o STF; (b) um órgão de articulação e defesa do direito objetivo federal, que é o STJ; (c) as estruturas e sistemas judiciários da União e (d) os sistemas judiciários dos Estados, Distrito Federal e Territórios.

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ITEM A: Mudanças e permanência constitucionais. Poder Constituinte originário e Poder Constituinte derivado. Limitações expressas e implícitas ao poder de reforma constitucional. Experiência histórica.

Obras consultadas: J.J. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da constituição, 7ª Ed., Coimbra, Almedina, 2007. G. Mendes, I. M. Coelho, P. G. G. Branco, Curso de direito constitucional, 4ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2009. P. Bonavides, Curso de direito constitucional, 22ª Ed., São Paulo, Malheiros, 2008. D. Sarmento, Por um constitucionalismo inclusivo: história constitucional brasileira, teoria da constituição e direitos fundamentais, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2010.

1. Poder constituinte originário. Ateoria do poder constituinte é basicamente uma teoria da legitimidade do poder. Surge quando uma nova forma de poder, contida nos conceitos de soberania nacional e soberania popular, faz sua aparição histórica e revolucionária em fins do século XVIII. Esse poder novo, oposto ao poder decadente e absoluto das monarquias de direito divino, invoca a razão humana substituindo Deus pela Nação, como titular da soberania. Importante notar que poder constituinte sempre houve; o que é novo é a sua teorização. E esta só veio a existir por obra da reflexão iluminista, da filosofia do contrato social, do pensamento mecanicista anti-historicista e antiautoritário do racionalismo francês.

A teoria do poder constituinte concebida como tal é atribuída ao abade Sieyés, no bojo da Revolução Francesa, ao divulgar o opúsculo O que é o Terceiro Estado? “Os autores modernos salientam que, no fundo, a teoria do poder constituinte de Sieyés é, simultaneamente, desconstituinte e reconstituinte. O poder constituinte antes de ser constituinte é desconstituinte porque dirigido contra a ‘forma monárquica’ ou ‘poder constituído pela monarquia’. Uma vez abolido o poder monárquico, impõe-se uma ‘reorganização’, um dar ‘forma’, uma reconstrução da ordem jurídico-política. O poder constituinte da Nação entende-se agora como poder reconstituinte informado pela ideia criadora e projetante da instauração de uma nova ordem política plasmada numa constituição. Os poderes conformados e regulados por esta constituição criada pelo poder constituinte (inclusive o poder de rever ou emendar a constituição – poder de revisão) seriam poderes constituídos” (Canotilho).

Existe uma dicotomia entre o conceito de poder constituinte. Para uns, é um puro fato, fora do direito (conceito político) e, para outros, encontra lugar dentro do direito ainda que não seja regulado (conceito jurídico). Assim, enquanto para Canotilho o poder constituinte originário tem um grande aspecto político, mas também jurídico, para Bonavides ele seria puramente político, oriundo das Revoluções e Golpes de Estado, relegando a faceta jurídica ao poder constituinte derivado.

De acordo com a concepção de que o poder constituinte não foi uma novidade do século XVIII, mas apenas a sua teorização, ao longo da história, muitos foram os titulares desse poder. Na Idade Média, era Deus; no Absolutismo, o monarca; na Revolução Francesa, a nação ou povo; na Restauração, o príncipe. Atualmente, não existe controvérsia: o titular desse poder é opovo.

O procedimento constituinte tem especial relevância porque é ele que inicia a cadeia de legitimação democrática e dá fundamento a formas derivadas de legitimação. Canotilho separa as decisões pré-constituintes das decisões constituintes. Nessa primeira etapa, “depois de um primeiro momento desconstituinte traduzido, em geral, na revogação total ou parcial da constituição anterior (...) as decisões pré-constituintes reconduzem-se a: (1) decisões de

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iniciativa de elaboração e aprovação de uma nova constituição; (2) decisão atributiva do poder constituinte (a uma Assembleia Constituinte, por exemplo) e definição do procedimento jurídico de elaboração da nova constituição; (3) leis constitucionais transitórias enquanto não for aprovada uma nova Constituição”. Na sequência, surgem as decisões propriamente constituintes a serem tomadas em um procedimento constituinte representativo, i. é, a assembleia tem poder soberano para fazer e aprovar a constituição, sem a participação direta do povo (representação pura); ou em uma assembleia constituinte não soberana, pela qual elabora-se um projeto de constituição a ser sancionado pelo povo diretamente, através de referendo.

Na teoria clássica, o poder constituinte originário é inicial, ilimitado e incondicionado. Todavia, a doutrina atual vem reformulando essa concepção. O poder constituinte não existe num vácuo histórico-cultural. Ele é condicionado pelos costumes e culturas locais; pela vontade política; pelos direitos humanos consagrados em nível nacional e internacional; pelos princípios da justiça etc.

2. Experiência histórica. “A convocação da Assembleia Constituinte 87/88 por EC levou alguns juristas e políticos da época a defenderem a tese de que ela não corresponderia ao exercício de autêntico poder constituinte originário, mas sim de um poder derivado e, como tal, limitado pela norma que o convocara. Contudo, este posicionamento, francamente minoritário na doutrina, é absolutamente incorreto. A EC 26/85 foi apenas o veículo formal empregado para a convocação da Assembleia Nacional Constituinte de 87/88, mas não o seu fundamento de validade. Este repousava na vontade, presente na sociedade brasileira, e evidenciada em movimentos como o das Diretas Já, de romper com o passado de autoritarismo, e fundar o Estado e a ordem jurídica brasileira sobre novas bases mais democráticas. Tratava-se de autêntica manifestação da soberania popular , e esta não necessita, para exteriorizar-se, do recurso à revolução violenta, podendo também eclodir em contextos de transição pacífica como ocorreu no Brasil” (Sarmento, 2010).

3. Poder constituinte derivado. Para evitar constantes turbulências institucionais com a ruptura da ordem constituída, as constituições preveem o poder constituinte de reforma, que é derivado, condicionado e limitado.Neste tópico é relevante a distinção entre constituições rígidas, semirrígidas e flexíveis. As primeiras somente admitem a reforma por meio de um procedimento especial e solene, distinto do resto do processo legislativo. As semirrígidas são aquelas que reservam algumas matérias à alteração pelo procedimento especial, enquanto outras podem ser alteradas pelo processo legislativo ordinário. Por fim, as flexíveis não possuem formalidades para a sua alteração, podendo ser alteradas pelo legislador ordinário.

A CF/88 é considerada rígida por ser um meio termo entre a inalterabilidade e o modelo flexível.

4. Limitações expressas e implícitas ao poder de reforma constitucional. Sendo um poder de segundo grau, o poder constituinte de reforma possui limites impostos pelo constituinte originário. A restrição temporal veda a alteração constitucional durante certo período de tempo. A CF/88 não albergou essa limitação, porém historicamente, na Constituição de 1824, houve essa previsão.A restrição circunstancial significa a proibição de reforma em épocas de exceção institucional. Nesse sentido, a CF/88 proibiu a emenda à Constituição durante a vigência de intervenção federal, estado de sítio ou de estado de defesa (art. 60, § 1º).A restrição procedimental diz respeito ao processo legislativo diferenciado para a alteração constitucional. Na CF/88, a PEC, quando de iniciativa parlamentar, deve ser subscrita por 1/3

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dos membros da Câmara ou do Senado; por mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros; e pela proposição do Presidente da República. Não se previu a iniciativa popular. Ademais, a aprovação deve preceder votação por 3/5 dos membros em cada Casa do Congresso Nacional em dois turnos de votação. Acaso rejeitada, a PEC somente pode ser reapresentada na próxima sessão legislativa.Por último, as restrições materiais são aqueles temas imutáveis na CF/88, denominados de cláusulas pétreas, que dizem respeito à identidade básica do texto.

Uma questão tormentosa é a justificativa das limitações matérias: se todo o poder emana do povo, porque, então, restringir a possibilidade de emendas constitucionais?Em teoria constitucional, justifica-se dizendo que o poder constituinte originário é expressão direta da vontade do povo e as cláusulas pétreas são limites à vontade dos representantes do povo. Além disso, outra resposta é apontar as limitações materiais como meio de preservação do núcleo essencial do projeto constituinte que, se alterado, desconfiguraria a própria CF/88. Afinal, se o povo quiser alterar substancialmente a Constituição ele sempre poderá promover um novo poder constituinte, que será originário, incondicionado e ilimitado.

Sobre a natureza das cláusulas pétreas,a posição dominante no Brasil postula a natureza jurídica e intocável pelo poder derivado das cláusulas pétreas, por constituírem-se em núcleo essencial da Constituição.O alcance das cláusulas pétreas é evitar reformas que pretendam abolir algumas normas consideradas essenciais e não aquelas que as alteram sem afetar o seu sentido. Assim, não se protege redação de artigo constitucional, mas, segundo Jorge Miranda, o sentido da norma e os princípios nelas modelados. Com efeito, o STF parece ter aderido a essa corrente no MS 23.074-MC: “as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 64, § 4º, da lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina Constitucional originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege”.

Caso o poder reformador ultrapasse os seus limites incide o controle de constitucionalidade. Além da hipótese tradicional do controle repressivo, desde longa data o STF admite o controle preventivo de PECs, por meio de mandado de segurança. Entende-se que o parlamentar federal tem o direito subjetivo de não se submeter à deliberação de projeto tendente a abolir cláusula pétrea.

Visto esses aspectos gerais, falta apenas verificar as espécies de restrições materiais:

(i) Forma federativa de Estado – proíbe-se a afronta às características básicas do federalismo, como a indissociabilidade dos entes, a repartição de competências, a participação dos Estados na formação da vontade da União e a supressão do órgão judiciário responsável por dirimir controvérsias no conflito federativo; a transferências de competências, por si só, não fere a forma federal, desde que resguardado o modelo; o STF já decidiu que emenda tendente a mitigar a imunidade recíproca fere o pacto federativo.

(ii) Separação de poderes – a divisão tripartite de poderes, na vigente Constituição, tende a ser inalterável; daí que a alteração do sistema de governo de presidencialista para parlamentarista seria inconstitucional, pela proximidade entre legislativo e executivo (parlamentarismo monista).

(iii) Voto direito, secreto, universal e periódico – nesta cláusula, petrificou-se a forma como o voto se dá, as pessoas legitimadas e a seu tempo.

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(iv) Direitos e garantias individuais – não somente os direitos previstos no art. 5º são imodificáveis, mas outros espalhados pelo texto constitucional, tendo o STF já apontado dois deles: princípio da anterioridade eleitoral (art. 16) e princípio da anterioridade tributária (art. 150, III, b); sobre os direitos sociais, há divergência: uma primeira corrente entende restritivamente, i. é, só os direitos individuais são cláusulas pétreas, enquanto que outra corrente estende a proteção aos direitos sociais, por entender que o silêncio da Constituição foi um descuido e que implicitamente pode-se extrair dos fundamentos do Estado brasileiro (art. 1º); já os novos direitos fundamentais positivados pelo poder constituinte de reforma não são imutáveis, na medida em que apenas o poder originário pode criar cláusulas pétreas; todavia, sendo mera explicitação de preceitos já existentes (ex. célere prestação jurisdicional), eles são imutáveis; os direitos fundamentais previstos em tratados somente possuem nível constitucional se aprovados na forma do art. 5º, § 3º, caso contrário, tendo status de norma supralegal (HC 88.240, HC 90.171, HC 94.702); logo, é minoritária a corrente que defende a condição de cláusula pétrea desse tratados, ainda mais após a EC 45/04;

(v) Cláusulas pétreas implícitas – não somente as matérias dispostas no art. 60, § 4º, são cláusulas pétreas, mas todas aquelas que dizem respeito à identidade básica da CF (ex. as normas consideradas fundamentos do Estado ((art. 1º)), as que tratam do poder constituinte reformador, do seu procedimento, que falam do titular do poder constituinte originário etc.).

Por fim, uma questão que tem levantado muita polêmica é se a garantia do direito adquirido se sobrepõe à emenda constitucional. Recentemente, o STF, por apertada maioria (MS 24.875), adotou a tese de que a garantia diz respeito a todas as espécies de lei, inclusive a emenda constitucional.

5. Mutações constitucionais. A mutação constitucional nada mais é que a alteração semântica dos preceitos da Constituição, em decorrência de modificações do prisma histórico-social ou fático-axiológico em que se concretiza a sua aplicação. Assim, havendo alterações medianas (e não rupturas) na tábua dos valores sociais e nos fatos sociais adéqua-se a norma à nova realidade, desde que compatível com o espírito da Constituição. Sobre a limitação das mutações, por elas não passarem, em essência, de novas interpretações constitucionais os seus limites devem ser o mesmo, isto é, o próprio texto constitucional, a fim de preservar o espírito e as cláusulas pétreas da Constituição.

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ITEM B: Supremo Tribunal Federal: organização e competência. Jurisdição constitucional.

Obras consultadas: J.J. Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da constituição, 7ª Ed., Coimbra, Almedina, 2007. G. Mendes, I. M. Coelho, P. G. G. Branco, Curso de direito constitucional, 4ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2009.

1. Organização do Supremo Tribunal Federal. O STF compõe-se, atualmente, de onze ministros, escolhidos dentre pessoas de notável saber jurídico e reputação ilibada, maiores de 35 e menores de 65 anos, nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal.

De acordo com o Regimento Interno do STF (RISTF), com exceção do Presidente do Tribunal, cada Ministro integra, formalmente, uma Turma. As Turmas têm competência idêntica. O Presidente de cada Turma é escolhido pelo critério da antiguidade (RISTF, art. 4º, § 4º). Para as matérias mais relevantes, a exemplo de decisões sobre constitucionalidade ou inconstitucionalidade, o Pleno somente poderá deliberar se presentes oito dos onze Ministros, exigindo-se maioria (6 votos) para ser declarada constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei.

O Presidente é eleito diretamente pelos seus pares para um mandato de dois anos, vedada a reeleição. Tradicionalmente, são eleitos os Ministros mais antigos que ainda não tenham exercido a Presidência.

2. Competência do Supremo Tribunal Federal. As competências do STF podem ser divididas, em: “a) originária (art. 102, I, “a” até “r”); b) recursal ordinária (art. 102, II) e c) recursal extraordinária (art. 102, III)”.

Em relação as competências, destacam-se as modificações introduzidas pela EC nº 45/2004: (i) A transferência de competência do STF para o STJ no tocante à homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias (art. 102, I, “h”, revogada; 105, I, “i” e art. 9º da EC 45/2004); (ii) A criação do requisito da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para o conhecimento do recurso extraordinário.

É corrente a afirmação pela doutrina de que as competências do STF são de interpretação restrita, não podendo ser alargadas. Porém, o que se observa na sua jurisprudência é o reconhecimento de algumas competências não previstas expressamente, todavia, que podem ser consideradas implícitasno texto constitucional (v.g MS contra ato de CPI; HC contra a Interpol, em decorrência da competência exclusiva do STF para deferir extradição; MS contra atos que tenham relação com pedido de extradição; MS contra ato individual de parlamentar que pratica ato em nome da Mesa; HC contra qualquer decisão do STJ). Dessa forma, “mesmo numa Constituição tão analítica como a brasileira, não há como não adotar a interpretação compreensiva do texto constitucional” (Gilmar Mendes).

3. Jurisdição constitucional. Subjacente à jurisdição constitucional está a força e supremacia normativa da constituição, na qual todas as normas do ordenamento jurídico devem estar material e formalmente de acordo. Uma definição possível é “complexo de atividades jurídicas desenvolvidas por um ou vários órgãos jurisdicionais, destinados à fiscalização da observância e cumprimento das normas e princípios constitucionais vigentes” (Canotilho).

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Seus domínios típicos são: (i) litígios constitucionais – litígios entre órgãos supremos do Estado e entes federados; (ii) controle de constitucionalidade de leis e outros atos normativos; (iii) proteção aos direitos fundamentais; (iv) controle da formação dos órgãos constitucionais – contencioso eleitoral, todas as demais formas de eleição e as demais formas relevantes de expressão da vontade política (referendos, plebiscitos, formação de partidos etc.); (v) responsabilidade constitucional – intervenção na apuração e penalização dos responsáveis por crimes de responsabilidade (Canotilho.)

Sobre o ponto de vista organizatório, a Jurisdição constitucional subdivide-se de duas formas: (i) modelo unitário – todos os tribunais e juízes têm o dever de, no âmbito dos processos submetidos ao seu conhecimento, aferir a constitucionalidade dos atos em apreciação (controle difuso); (ii) modelo de separação – concentração do controle de constitucionalidade a um Tribunal especificamente competente para tanto, separado dos demais tribunais (controle concentrado). Salienta-se que, hoje, a tendência é a aproximação dos dois modelos. O Brasil adotou inicialmente o sistema norte-americano, evoluindo para um sistema misto e peculiar que combina o critério de controle difuso por via de defesa com critério de controle concentrado por via de ação direta.

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ITEM C: Município: criação, competência, autonomia. Convênios ou consórcios federativos: distinção, aplicação e crítica.

Obras consultadas: José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2009. Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010. Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de direito administrativo. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2011. Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Direito administrativo. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2011. Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Parecerias na administração pública. 5ª ed. São Paulo, Atlas, 2005.

1. Natureza jurídica do Município: Pessoa jurídica de direito público interno. Arts. 1º e 18 da CF/88 estabelecem que o Município integra a Federação. Mas há divisão na doutrina quanto ao seu papel: José Afonso estabelece que não se trata de entidade territorial essencial ao conceito de Federação (os motivos para o referido entendimento são: (i) a Federação não é de Municípios, mas sim de Estados; (ii) a intervenção neles é estadual e não federal; (iii) sua criação, incorporação, fusão e desmembramento se dá por lei estadual, não há Câmara de representantes dos Municípios). Em sentido contrário, Hely Lopes, L.A. David Araújo e Vidal Serrano. Hely Lopes entende que a CF de 88 outorgou ao Município, dentro do âmbito da Federação, a qualificação de “entidade político-administrativa de terceiro grau”.

2. Criação. Previsão no art.18, §4º, da CF (lei complementar federal, estudo de viabilidade municipal, plebiscito ((é condição de procedibilidade)) e lei estadual). Trata, ainda, da incorporação, fusão e desmembramento. Trata-se de procedimento administrativo vinculado – pode ser alvo de controle pelo Judiciário.

A Lei Estadual que cria o Município pode ser objeto de ADI “Ainda que não seja em si mesmauma norma jurídica, mas ato com forma de lei, que outorga status municipal a uma comunidadeterritorial, a criação de Município, pela generalidade dos efeitos que irradia, é um dado inovador,com força prospectiva, do complexo normativo em que se insere a nova entidade política: por isso, avalidade da lei criadora, em face da Lei Fundamental, pode ser questionada por ação direta deinconstitucionalidade (MC na ADI 2.381-RS, rel. Min. Sepulveda Pertence, j. 20/06/2001). EC 57/08 (art.96 dos ADCT) convalidou os Municípios (criados até 31/12/06), embora inexistente a lei complementar federal regulamentadora (ADI 2381 AgR/RS). Lei que altera limites geográficos do município também tem que se submeter ao plebiscito (ADI 1262).

3. Competência. A legislativa se divide em duas: interesse local (art.30, I, da CF, ex. tempo máximo de fila em banco – RE 610221 RG/SC) e suplementar a legislação federal e estadual. A material está prevista no art.23 (comum) e art.30, III a IX, CF/88 (privativa).

4. Autonomia. É a capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior (difere de soberania). O município detém auto-organização (elaboração de lei orgânica), autogoverno, autolegislação e autoadministração. Assim, detém autonomia política, normativa, administrativa e financeira. Elaboração de lei orgânica: requisitos no art.29, caput, da CF. Lei Orgânica não representa Poder Constituinte Decorrente. Autonomia Municipal é princípio sensível (art.34, VII, “c”, da CF).

5. Convênios ou consórcios federativos. A Administração Pública possui distintos modos para se associar a entidades públicas e privadas para facilitar a consecução de suas

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tarefas ou fomentar a iniciativa privada a exercer serviços públicos não exclusivos. O instrumento mais antigo e usual é o convênio. Por meio dele estabelecem-se avenças com particulares e órgãos públicos, com o intuito de fomentar atividades. Suas principais características são:

(i) natureza não-contratual, pela ausência de interesses contrapostos;

(ii) os partícipes têm objetivos e/ou competências institucionais comuns;

(iii) não se cogita de preço ou remuneração;

(iv) possibilidade de denúncia a qualquer momento, sem multa rescisória.

Os convênios não se prestam a instrumentalizar a delegação de serviços públicos a particulares: na delegação ocorre a transferência do exercício de uma atividade de uma pessoa a outra; no convênio, as duas pessoas possuem a mesma titularidade da atividade conveniada, vindo a prestar o serviço em colaboração (ex. saúde, educação etc.)

O art. 116 da lei 8.666/93 disciplina alguns aspectos dos convênios, especialmente aqueles em que há repasse de verbas entre órgãos públicos. Os valores repassados, por não serem preços ou remuneração, estão sujeitos a controle pelo ente que os repassa, pois não se integram ao patrimônio do órgão/ente conveniado, possuindo vinculação no uso.

Em regra, não se exige licitação, pois não há viabilidade de competição quando se trata de mútua colaboração, salvo se houver obrigações recíprocas, com a formação de vínculo contratual.

Em nível constitucional, existem duas disposições que tratam dos convênios: (i) art. 23, par. ún. e art. 241. Na matéria de competências concorrentes, é possível a edição de lei complementar disciplinando as tarefas de cada ente federado. Além disso, a Constituição determina a edição de lei ordinária para disciplinar essas cooperações, por meio de convênio, embora não seja condição de eficácia da norma constitucional.

Outra forma de cooperação, só que restrita a entes federados, é o consórcio, introduzido pela EC 19/98 (art. 241). A lei 11.107/05 estabelece normas gerais sobre o pacto cooperativo, porém não exclui a possibilidade de os Estados e Municípios editarem leis específicas sobre o tema, complementando a lei federal e estabelecendo critérios de conveniência em se associarem ou não.

O objeto dos consórcios públicos é a gestão associada de serviços públicos, com a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à prestação dos serviços transferidos. Essa forma de gerir os serviços públicos é típica do federalismo cooperativo, ao estabelecer uma gestão conjunta de atribuições comuns, sem mitigar a autonomia dos entes federados. Para tanto, o art. 2º permite, entre outras, a contratação sem licitação dos consórcios, promoção de desapropriações e instituição de servidões e convênios, contratos e acordos de qualquer natureza e a arrecadação de tarifas e preços públicos.

A lei se refere a contrato, porém a sua natureza é de convênio (negócio jurídico plurilateral de direito público). Não existem interesses contrapostos, mas convergência de interesses na consecução de atividades constitucionalmente permitidas (competências concorrentes).

Di Pietro critica dizendo que não deveria haver a criação de uma personalidade jurídica própria nos Consórcios, sendo suficiente a criação de uma Comissão. Também se critica

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o fato de uma mesma pessoa jurídica pertencer à Administração Indireta de diversos entes, estando submetido ao controle de todos.

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ITEM A: Estado Federal. Concepções. Classificações. Sistemas de repartição de competência. Direito comparado

Obras consultadas:AlexandredeMoraes.DireitoConstitucional.25aed.SãoPaulo:Atlas,2010.GilmarFerreiraMendes,InocêncioMártireCoelho,PauloGustavoGonetBranco.CursodeDireitoConstitucional. 6aedSãoPaulo:Saraiva,2011.JoséAfonsodaSilva.CursodeDireitoConstitucionalPositivo.SãoPaulo:Malheiros.LuisRobertoBarroso.TemasdeDireitoConstitucional.2ªed.RiodeJaneiro:Renovar,2006,pp.141-151. Coordenação Ives Gandra da Silva Martins; Gilmar Ferreira Mendes e Carlos Valder do Nascimento. Tratado de Direito Constitucional 1. São Paulo,2010.

1. Noções Gerais.

NoBrasil,afederaçãosurgeprovisoriamenteatravésdoDecreton.1,de15.11.1889,juntamentecomaformarepublicanadegoverno,tomandoassentoconstitucionalnaCartade1891.AsConstituiçõesposterioresmantiveramaformafederativadeEstado,emboraofederalismonasConstituiçõesde1937ede1967,bemcomoduranteavigênciadaEmendan.1/69,tenhasidoapenasnominal(“federalismodefachada”).

NoFederalismoclássico,oudual,arepartiçãodopoderérigidamentedivididaentreaUnião(PoderCentral)eosEstados(PoderRegional).Ofederalismobrasileiroatualétricotômico,poisenglobaaUnião(PoderCentral),osEstados(PoderRegional),oDistritoFederaleosMunicípios(Poderlocal).Osterritóriosnãosãoentidadesfederais.

SegundoJoséAfonsodaSilva,paraquehajaautonomiafederativa,sãonecessáriososseguinteselementos:1.órgãosprópriosdecadaentidade(união,estadosemunicípios);e2.possedecompetênciasexclusivasdecadaentidade.

a)DaUnião.AUnião,pessoajurídicadedireitopúblico,possuiumavisãointerna,relativaaosdemaisestadosfederados,eumavisãoexterna,emfacedosdemaisEstadosestrangeiros.Internamente,ageaUniãoempédeigualdadecomosoutrosentesdaFederação,sendodetentoradedevereseobrigações.Noâmbitoexterno,elarepresentatodooEstadoFederado,comosefosseeleunitário,jáqueodireitointernacionalnãoreconheceapersonalidadejurídicadosestados-membrosemunicípios,naqueleâmbito.

b)Dosestadosfederados.Sãocoletividadesregionaisautônomas,semsoberania,masmeraautonomia.EntreosEstadoseaUniãonãoháhierarquia,convivendotodosnummesmoníveljurídico.Aautonomiadefine-secomocondição “degerirosnegóciosprópriosdentrodoslimitesfixadosporpodersuperior”,caracterizando-sepelacapacidadedeautogoverno,auto-organização,autolegislação,autoadministraçãoeautonomiastributária,financeiraeorçamentária.

c)Dosmunicípios.ACF/88,inovadoramente,considerouosmunicípioscomocomponentesdaestruturafederativa,eofezemdoismomentos(artigos1ºe18).AnteriormenteeramcomponentesdosEstados,quedecidiamasuaorganização.Saliente-

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sequeJoséAfonsodaSilvadefendequeosmunicípiosnãopassaramaserentidadesfederativas.Apenasteriamganhadoautonomiapolítico-constitucional(entreoutrosargumentos,porquenãoháintervençãofederalnosmunicípios).PauloBrancoenumeraquatromotivosparaosmunicípiosnãointegraremoEstadoFederal:a)nãoparticipamdavontadefederal,vistoquenãotêmrepresentantesnoSenado;b)nãomantêmumPoderJudiciário,comoocorrecomosestados – membroseUnião;c)aintervençãonosmunicípiossituadosemestado-membroestáacargodeste;d)acompetênciaorigináriadoSTFpararesolverconflitosentreentesfederativosnãoabrangeoscasosemqueosmunicípiosestãoemumdospolosdalide.Grandepartedadoutrina,acompanhadadajurisprudência,noentanto,sustentaqueafederaçãobrasileiraadquiriuapeculiaridadedetertrêsesferasdegoverno,fugindodofederalismoclássicooudual.Possuemosmunicípios,autonomiapolítica,administrativaefinanceira,sendodetentoresdascapacidadesacimadelineadasparaosEstados,guardadasaspeculiaridades.

d)DoDistritoFederal.Antesconsideradoumaautarquiaterritorial,foierigidopelaCF/88àcondiçãodepessoapolítica,integrantedafederação.Suaautonomiaestáconsagradanoart.32daCF,quelheconfereascapacidadesdeauto-organização,autogoverno,autolegislaçãoeautoadministração,emborasoframlimitaçõesemquestõesessenciais,comoasdosincisosXIIIeXIVdoart.21.AcompetêncialegislativadoDFcompreendeasquesãoatribuídasaosEstadoseMunicípios,oPoderLegislativoéexercidopelaCâmaraLegislativa(noregimeanterioroerapeloSenadoFederal),oPoderExecutivopeloGovernadoreoPoderJudiciárionaverdadenãoédele,masdaUnião.

e)Dosterritórios.Sãopessoasjurídicasdedireitopúblicointernocomcapacidadeadministrativaedenívelconstitucional,ligadasàUniãoetendonelaafontedeseuregimejurídicoinfraconstitucional.Nãosãopessoaspolíticas(nãolegislam),possuindomeracapacidadeadministrativa.Nãointegramafederação.CompeteaoCongressoNacionaldisciplinarsuaatividadeeorganizaçãoadministrativaejudicial,eéogovernadorescolhidopeloPresidentedaRepública.ACF/88transformouosterritóriosexistentesemEstados,àexceçãodeFernandodeNoronha,quefoireincorporadoaPernambuco(ADCT,artigos14e15).

2. Concepções

O Estado Federal expressa um modo de ser do Estado (daí se dizer que é uma forma de Estado) em que se divisa uma organização descentralizada, tanto administrativa quanto politicamente, erigida sobre uma repartição de competências entre o governo central e os locais, consagrada na Constituição Federal, em que os Estados federados participam das deliberações da União, sem dispor do direito de secessão. No Estado Federal, de regra, há uma Suprema Corte, com jurisdição nacional e é previsto um mecanismo de intervenção federal, como procedimento assecuratório da unidade física e da identidade jurídica da Federação.

A soberania é atributo do Estado Federal como um todo. Os Estados-membros dispõem de autonomia, que importa, necessariamente, a descentralização administrativa e política. Eles não apenas podem, por suas próprias autoridades, executar leis,

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como também é-lhes reconhecido elaborá-las. Isso resulta em que se perceba no Estado Federal uma dúplice esfera de poder normativo – a da União e a do Estado-membro - sobre um mesmo território e sobre as pessoas que nele se encontram. A autonomia política dos Estados-membros abrange também a capacidade de dotar-se de uma Constituição própria, sujeita embora a certas diretrizes impostas pela Constituição Federal. O fato de eles se acharem unidos em função de uma Carta Federal, e não de um tratado de direito internacional, designa fator diferenciador em relação à confederação.

O federalismo é uma sociedade de Estados autônomos com aspectos unitários porque é, enquanto Estado Federal, uma unidade territorial, unidade de representação e unidade nacional.

Outra característica do federalismo é a de que os Estados-membros tenham voz ativa na formação da vontade da União – vontade que se expressa sobretudo por meio das leis. Para esse fim, historicamente foi concebido o Senado Federal, com representação paritária, em homenagem ao princípio da igualdade jurídica dos Estados-membros. Esses Estados participam da formação da vontade federal, na mesma linha, quando são admitidos a apresentar emendas à Constituição Federal. Na medida em que os Estados-membros não são soberanos, é comum impedir que se desliguem da União, no que o Estado federal se distingue da confederação. Como regra inexiste, portanto, no federalismo, o direito de secessão. Os conflitos que venham a existir entre os Estados-membros ou entre qualquer deles com a União, assumindo feição judiciária, são levados ao deslinde de uma corte nacional. Falhando a solução judiciária ou não sendo o conflito de ordem jurídica meramente, o Estado dispõe do instituto da intervenção federal, para se autopreservar da desagregação, bem como para proteger a autoridade da Constituição Federal.

3. Classificações e Sistema de repartições de competência

Adistribuição(ourepartição)constitucionaldepoderes(oudecompetências)éumdospontosmaisimportantesnoestudodoEstadoFederal.ConsoanteJoséAfonsodaSilva,oprincípiogeralquenorteiaarepartiçãodecompetênciaentreasentidadesfederativaséodapredominânciadeinteresses,peloqualcabeàUniãoasmatériasequestõesdepredominanteinteressegeral,nacional;aosEstadoscabemasmatériaseassuntosdepredominanteinteresseregional;eaosmunicípiosconcernemosassuntosdeinteresselocal.Sóqueatualmenteessadistinçãonãoéfácildeserfeita.Aregraprincipaldafederação,consoanteCelsoRibeiroBastos,éaseguinte:nadaseráexercidoporumpodermaisamploquandopuderserdecididopelopoderlocal,poisoscidadãosmoramnosmunicípios,enãonaUnião.

Dada a existência de ordens central e parciais, a repartição de competência (e de rendas) entre essas esferas, realizada pela Constituição Federal, favorece a eficácia da ação estatal. O modo de repartição indica que tipo de federalismo é adotado. A concentração de competências no ente central aponta para um modelo centralizador (centrípeto); uma opção pela distribuição mais ampla de poderes em favor dos Estados-membros configura um modelo

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descentralizador (centrífugo). Havendo uma dosagem contrabalançada de competências, fala-se em federalismo de equilíbrio.

Outra classificação dos modelos de repartição cogita das modalidades de repartição horizontal e repartição vertical. Na primeira não se admite concorrência de competência entre os entes federados. Esse modelo apresenta três soluções possíveis para o desafio de distribuição de poderes entre as órbitas do Estado Federal. Uma delas efetua a enumeração exaustiva da competência de cada esfera da Federação; outra discrimina a competência da União deixando aos Estados-membros os poderes reservados (ou não enumerados); a última discrimina os poderes dos Estados-membros, deixando o que restar para a União.

Na repartição vertical de competências, realiza-se a distribuição da mesma matéria entre a União e os Estados-membros. Essa técnica, no que tange às competências legislativas, deixa para a União os temas gerais, os princípios de certos institutos, permitindo aos Estados-membros afeiçoar a legislação às suas peculiaridades locais. A técnica da legislação concorrente estabelece um verdadeiro condomínio legislativo.

Quantoaoscritériosdedistribuiçãodecompetência,tem-sequeoBrasiladotaumsistemacomplexo,quebuscarealizaroequilíbriofederativopormeiodeumadistribuiçãoquesefundamentanatécnicadeenumeraçãodospoderesdaUnião(21e22),compoderesremanescentesparaosEstados(25,§1º)epoderesdefinidosindicativamenteparaosMunicípios(30),mascombinacomessareservadecamposespecíficos(nemsempreexclusivos,masàsvezesapenasprivativos)possibilidadesdedelegação(22,parágrafoúnico),áreascomunsemquesepreveematuaçõesparalelasdaUnião,Estados,DFeMunicípios(23),esetoresconcorrentesentreaUniãoeEstados,emqueacompetênciaparaestabelecerpolíticas,diretrizesenormasgeraiscabeàUnião,enquantoquesedefereaosEstadoseatéosMunicípiosacompetênciasuplementar.Arespeito,seguemgráficoeesquemadoprofessorAlexandredeMoraes:

Quadrogeralderepartiçãodecompetênciaadministrativa

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5. Direito comparado .

No direito comparado, as formulações constitucionais em torno da repartição de competências podem se associadas a dois modelos básicos – o clássico, vindo da Constituição norte-americana de 1787, e o modelo moderno, que se seguiu à Primeira Guerra Mundial. O modelo clássico conferiu à União poderes enumerados e reservou aos Estados-membros os poderes não especificados. Para mitigar os rigores dessa fixação taxativa, nos EUA elaborou-se a doutrina dos poderes implícitos. O modelo moderno responde às contingências da crescente complexidade da vida social, exigindo ação dirigente e unificada do Estado, em especial para enfrentar crises sociais e guerras. Isso favoreceu uma dilatação dos poderes da União com nova técnica de repartição de competências, em que se discriminam competências legislativas exclusivas do poder central e também competência comum ou concorrente, mista, a ser explorada tanto pela União como pelos Estados-membros.

ConflitosjurídicosnoEstadofederal:PauloBranco,citandojurisprudênciadoSTF,assimcompilaotemareferenteaoconflitofederativodoart.102,I,fdaCF:seoconflitoenvolveUnião,EstadosouDFeentidadedaadministraçãoindireta,oSTFsomentereconheceasuacompetênciaorigináriaseapendênciaintroduzinstabilidadenoequilíbriofederativoourupturadaharmoniaentreasentidadesdafederação,sendoqueascausasdeconteúdoeminentementepatrimonial,semsubstratopolítico,nãojustificamacompetênciadoSTF.Todavia,seoconflitoseabreentredoisentespolíticos(União,EstadoeDF),nãoenvolvendoentidadedaadministraçãoindireta,háacompetênciaorigináriadoSTF,semqueseindaguedeeventualdanoaoequilíbriofederativo.

ITEM B: Política agrária. Princípios. Objetivos. Instrumentos. Desapropriação para fins de reforma agrária. Política agrícola, usucapião e bens públicos.

Obras consultadas:AlexandredeMoraes.DireitoConstitucional.25aed.SãoPaulo:Atlas,2010.GilmarFerreiraMendes,InocêncioMártireCoelho,PauloGustavoGonetBranco.CursodeDireitoConstitucional. 6aedSãoPaulo:Saraiva,2011.JoséAfonsodaSilva.CursodeDireitoConstitucionalPositivo.SãoPaulo:Malheiros.

Legislação básica.

Política Agrária: Objetivos e Noções Gerais.

Política é um conjunto de diretrizes, princípios e instrumentos destinados a uma finalidade. A política agrária é diferente da política agrícola. Na primeira, há uma dimensão mais ampla, englobando a política agrícola. Nesta, há uma maior predominância de interesses econômicos

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(reforma agrária pelo imóvel ser improdutivo). A política agrária possui uma perspectiva mais social, tratando de questões trabalhistas e previdenciárias no campo. Apolíticaagrícola,cujasaçõesdevemsercompatibilizadascomasdareformaagrária,seráplanejadaeexecutadanaformadalei,comaparticipaçãoefetivadosetordeprodução,envolvendoprodutoresetrabalhadoresrurais,bemcomodossetoresdecomercialização,dearmazenamentoedetransportes,levandoemconta,especialmente,osseguintespreceitos:osinstrumentoscreditíciosefiscais;ospreçoscompatíveiscomoscustosdeproduçãoeagarantiadecomercialização;oincentivoàpesquisaeàtecnologia;aassistênciatécnicaeextensãorural;oseguroagrícola;ocooperativismo;aeletrificaçãoruraleirrigação;eahabitaçãoparaotrabalhadorrural(art.187,caput,IaVIIe§2ºdaCF,);denotando, pois, a prevalência do aspecto econômico .

Nesse sentido, aLeinº4.504/64(EstatutodaTerra)estabeleceque “entende-seporpolíticaagrícolaoconjuntodeprovidênciasdeamparoàpropriedadedaterra,quesedestinemaorientar,nointeressedaeconomiarural,asatividadesagropecuárias,sejanosentidodegarantir-lhesoplenoemprego,sejanodeharmonizá-lascomoprocessodeindustrializaçãodopaís” (art.1º,§2º).

A CF/88alargouoconceitodepolíticaagrícola,aduzindoque,noplanejamentoagrícola,incluem-seasatividadesagroindustriais,agropecuárias,pesqueiraseflorestais(art.187,§1º). Como consectário, constituiáreadecompetênciadosMinistériosdaAgricultura,daPescaeAquiculturaedoMeioAmbienteapolíticaagrícola(art.27,I, “a”;XXIV, “a”;eXV, “a” e “b” daLeinº10.683/03).

A CF optou pela palavra agrícola, evidenciando o eixo econômico da relação do homem no campo. A doutrina critica esta denominação, tendo em vista que o Direito que regula estas relações possui fortes contornos sociais. Elemento ou eixo econômico da política agrária: melhoria da utilização da terra. Ex: Previsão na CF da desapropriação por improdutividade. Elemento ou eixo social na política agrária: melhoria da qualidade de vida do homem do campo. Ex: previsão no ET de dispositivos sobre colonização, contratos.

A reforma agrária é o principal instrumento da política agrícola, pois atua sob um eixo econômico, bem como sob um eixo social. Areformaagráriaé “oconjuntodemedidasquevisemapromovermelhordistribuiçãodeterra,mediantemodificaçõesnoregimedesuaposseeuso,afimdeatenderaosprincípiosdejustiçasocialeaoaumentodeprodutividade” (art.1º,§1º,doEstatutodaTerra).

1. Instrumentos da Política Agrária

Além da reforma agrária, acima citada que configura o principal instrumento da política agrícola, compõe instrumentos da política agrária: os creditícios e fiscais; os preços compatíveis com os custos de produção e a garantia de comercialização (subsídios); o incentivo à pesquisa e à tecnologia; a assistência técnica e extensão rural (assistência técnica pelo INCRA); o seguro agrícola; o cooperativismo; a eletrificação rural e irrigação; a habitação para o trabalhador rural.

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Cumpre salientar que os instrumentos constitucionais do art. 187 não são taxativos, mas garantem a implementação mínima do projeto constitucional de política agrícola.

1. Princípios da PA

Definição: Princípio é uma norma de maximização do sistema, utilizado como baliza hermenêutica (Robert Alexy).

Princípio da função social da propriedade: a função social é tratada na CF e é o centro gravitacional do estudo da propriedade no direito moderno. Surgimento da função social: 1ª fase: O primeiro dado histórico da função social remonta a Aristóteles, para ele a apropriação individual de bens não se justifica se os mesmos não tiverem uma destinação social. Ter-se algo só para ter é pernicioso. 2ª fase: São Tomás de Aquino desenvolve a tese da função social em sua Suma Teológica, nela, é desenvolvida a noção do bem comum. É direito de todos adquirir coisas para garantir sua dignidade desde que o bem comum seja atendido. 3ª fase: Para Leon Duguit, todo o direito está subordinado a uma finalidade. Se o direito possuído pelo indivíduo não tiver finalidade, cabe desapropriação. A CF trata da função social em seu art. 186 e para estar caracterizada deve preencher todos os requisitos constantes naquele dispositivo: 1º requisito:aproveitamento racional e adequado da terra. Para ser atingido, devem ser atendidos níveis fixados pelo órgão responsável quanto à eficiência na exploração e o grau de utilização da terra. (obs: são garantidos os incentivos fiscais referentes ao Imposto Territorial Rural relacionado com os graus de utilização e de eficiência na exploração. Obs2: não são consideradas áreas aproveitáveis no cálculo do grau de utilização da terra as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação ambiental). 2º requisito:adequada utilização dos recursos naturais e da preservação do meio ambiente.Isto tem por finalidade o respeito à vocação natural da terra, através da manutenção do seu potencial produtivo. A preservação do meio ambiente é a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas. 3º requisito: observância às normas relativas às relações de trabalho. Estas possuem abrangência elástica, pois permitem a inclusão de relações de emprego e de contratos agrários (parceria e arrendamento). 4º requisito:bem estar dos proprietários (ou possuidores) e dos trabalhadores. O bem estar está ligado à dignidade da pessoa humana. É cumprido pelo atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, pela observância das normas de segurança do trabalho e por não provocar conflitos e tensões sociais no imóvel. A função social na CF tem uma perspectiva econômica, social e ecológica.

Princípio da justiça social: é a justiça distributiva. A política agrária visa à alteração da estrutura fundiária vigente.

Princípio da prevalência do interesse coletivo sobre o individual: A política agrária é composta por normas cogentes de forte interferência no domínio privado. A política agrária visa ao atingimento de interesses coletivos sobre interesses individuais.

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Princípio da reformulação da estrutura fundiária: É base da política agrícola, permitindo ao Estado uma série de programas para alteração do homem no campo. Há órgãos específicos para cuidar desta reformulação. Ex: INCRA e Ministério da Reforma Agrária.

Princípio do progresso econômico e social: visa ao aumento da produtividade da propriedade rural, garantindo uma melhoria das condições de vida do proprietário/possuidor e um aumento na produção primária do país.

4. Desapropriação para fins de reforma agrária

Nos moldes do definido no art. 184 da Carta Fundamental, compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei. As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro (O STF entende que devem ser pagos por precatório. RE 247866).

O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação. Cabe à lei complementar estabelecer procedimento contraditório especial, de rito sumário, para o processo judicial de desapropriação. (O STF entende que prescinde da intimação feita pessoalmente a ambos os cônjuges para validade da vistoria no imóvel). São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária. Adesapropriação,judicialouextrajudicialmente,éexecutadapeloINCRA,autarquiafederalvinculadaaoMinistériodoDesenvolvimentoAgrário.

Determinaoart.184,§5º,daCFquesãoisentasdeimpostosfederais,estaduaisemunicipaisasoperaçõesdetransferênciadeimóveisdesapropriadosparafinsdereformaagrária.SegundooSTF,aisençãodeveserentendidacomoimunidadeetemporfimnãooneraroprocedimentoexpropriatóriooudificultararealizaçãodareformaagrária.Ademais,ostítulosdadívidaagráriaconstituemmoedadepagamentodajustaindenizaçãodevidae,dadoseucaráterindenizatório,nãopodemsertributados.Todavia,terceiroadquirentedetítulosdadívidaagrárianãogozadareferidaimunidade,umavezqueobenefícioalcançatão-somenteoexpropriado(RE168.110,Rel.Min.MoreiraAlves,DJ19/05/2000).

Osbeneficiáriosdadistribuiçãodeimóveisruraispelareformaagráriareceberãotítulosdedomíniooudeconcessãodeuso,inegociáveispeloprazode10anos.Otítulodedomínioeaconcessãodeusoserãoconferidosaohomemouàmulher,ouaambos,independentementedoestadocivil,nostermosecondiçõesprevistosemlei(art.189,caputeparágrafoúnico,daCF).

ÉaprópriaCFqueestipulaoscasosemqueafunçãosocialdapropriedaderuralécumprida,devendoestaatender,simultaneamente,aosseguintescritériosegrausdeexigênciaestabelecidosemlei:I)aproveitamentoracionaleadequado;II)utilizaçãoadequadadosrecursosdomeioambiente;III)observânciadasdisposiçõesqueregulamasrelaçõesdetrabalho;eIV)exploraçãoquefavoreçaobem-estardosproprietáriosedostrabalhadores(art.186,IaIV).

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São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária: a propriedade produtiva e a pequena (de 1 a 4 módulos fiscais) e média (de 4 a 15 módulos fiscais) propriedade rural (ainda que improdutiva), assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra. ALeinº8.629/93dispõesobrearegulamentaçãodosdispositivosconstitucionaisrelativosàreformaagrária,oconceitodepequenaemédiapropriedaderuraledepropriedadeprodutiva.

Não se confunde latifúndio e minifúndio com pequena e média propriedade, pois estas são fixadas em módulos fiscais e aquelas em módulos rurais. Para ser latifúndio, basta ter no mínimo 1 MR e ser improdutiva. É preciso que o proprietário da pequena ou média propriedade não possua outro imóvel RURAL. Se o sujeito tiver 40 imóveis urbanos e 1 média propriedade, ela não poderá ser desapropriada, pois a lei veda este benefício àquele que possuir outro imóvel rural e não urbano. (Na usucapião especial rural, não pode o indivíduo ter qualquer outro imóvel).

ALeiComplementarnº76/93estabeleceprocedimentocontraditórioespecial,deritosumário,paraoprocessodedesapropriaçãodeimóvelruralporinteressesocial,emconformidadecomomandamentoconstitucionaldoart.184,§3º.

ValedestacardaLCqueasaçõesconcernentesàdesapropriaçãodeimóvelrural,parafinsdereformaagrária,têmcaráterpreferencialeprejudicialemrelaçãoaoutrasaçõesreferentesaoimóvelexpropriando(art.18,caput).Qualqueraçãoquetenhaporobjetoobemexpropriadoserádistribuída,pordependência,àVaraFederalondetivercursoaaçãodedesapropriação,determinando-seaprontaintervençãodaUnião(§1º).Ainda,oMinistérioPúblicoFederalintervirá,obrigatoriamente,apósamanifestaçãodaspartes,antesdecadadecisãomanifestadanoprocesso,emqualquerinstância(§2º).

5. Política Agrícola, usucapião e bens públicos

Será usucapido aquele imóvel rural não superior a cinquenta hectares, desde que o seu possuidor não tiver o domínio de outro imóvel, seja rural ou urbano, e que nele morasse e trabalhasse com sua família a fim de garantir a sua subsistência, tornando-o produtivo. Exigiu a Constituição que a posse fosse contínua e sem oposição, mas prescindiu o justo título e a boa-fé. Veja-se que a intenção da usucapião agrária, ao lado da conotação social de se garantir a manutenção na terra daqueles que nela labutam, também foi a de estimular a produtividade no setor agrícola. Diz-se especial este tipo de usucapião, pois o prazo para a sua constituição é bem inferior à usucapião geral, a qual, segundo o Código Civil, necessita de um prazo de 15 anos, no caso de inexistir título ou boa-fé, podendo ser reduzido para 10 anos se o possuidor constituir atividade produtiva ou estabelecer moradia no imóvel. Conforme a lei substantiva civil, caso o possuidor detenha título e boa fé, o prazo é reduzido de 15 para 10 anos, salvo, se o possuidor detinha título expedido por Cartório e que foi anulado, pois reduzirá para 5 anos. A lei 6969/81 não foi totalmente recepcionada pela CF/88, mas sim a parte que dispõe acerca das normas processuais para o reconhecimento da usucapião judicialmente. Previu esta norma o foro como o da situação do imóvel, a adoção de rito sumaríssimo, com participação do Ministério Público e possibilidade de realização de audiência preliminar em que, constatada a posse do requerente,

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seria ele nela mantido liminarmente até final decisão. Emcontrapartida,vedouqualquerpossibilidadedeusucapiãoemimóveispúblicos(art.191,parágrafoúnico).

ITEM C: Direitos e garantias fundamentais. Concepções. Críticas e justificativas. Aspectos. Dimensões. Eficácia vertical e horizontal. Limites e conflitos

Obras consultadas: GilmarFerreiraMendes,InocêncioMártireCoelho,PauloGustavoGonetBranco.CursodeDireitoConstitucional. 6aedSãoPaulo:Saraiva,2011.

CUNHAJÚNIOR,Dirleyda.Cursodedireitoconstitucional.Salvador:Podivm, 5ª ed.2011.SAMPAIO,JoséAdércioLeite.Direitosfundamentais:retóricaehistoricidade.BeloHorizonte:D

elRey,2004._________.Aconstituiçãoreinventadapelajurisdiçãoconstitucional.BeloHorizonte:DelRey,2

002._________.Princípiosdedireitoambiental.BeloHorizonte:DelRey,2003.SARMENTO,Daniel.Avinculaçãodosparticularesaosdireitosfundamentaisnodireitocompara

doenoBrasil.In:DIDIER,Fredie(Coord.).Leiturascomplementaresdeprocessocivil.Salvador:Podivm,2007.

SARMENTO,Daniel.Direitosfundamentaiserelaçõesprivadas.2.ed.2.tiragem.RiodeJaneiro:EditoraLumenJúris,2008

2. Direitos e garantias fundamentais. Conceito, noções gerais e concepções.

Direitosfundamentaissãodireitosouposiçõesjurídicasqueinvestemossereshumanos,individualouinstitucionalmenteconsiderados,deumconjuntodeprerrogativas,faculdadeseinstituiçõesimprescindíveisaassegurarumaexistênciadigna,livre,igualefraternaatodasaspessoas.

Têmcomonúcleoessencialadignidadehumanaeencontram-sereconhecidosnotextodaConstituição(fundamentalidadeformal)ou,porsuaimportânciaeconteúdo,sãoadmitidoseequiparadospelaprópriaConstituiçãoaosdireitosqueformalmentereconhece,emboradelanãofaçamparte(fundamentalidadematerial).

Brasileiroseestrangeirosaquiresidentespodeminvocá-los;pessoasjurídicaseentesdespersonalizadostambémtêmasuaproteção,contantoquehajacompatibilidadenosentidoontológico(v.g,pessoajurídicapodeimpetrarmandadodesegurança,requererassistênciajudiciáriagratuita,etc...).Emrelaçãoaosestrangeirosnãoresidentesnopaís,deve-seentenderquesãodestinatáriosdosdireitosegarantiasfundamentaisprevistosnaConstituição,salvoqu

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andoaprópriaConstituiçãoexcluiralgumdestesdireitos.Sãocláusulaspétreas,previstosnoart.5ºdaCF/88e,segundooSTF,estãoespalhadosnosdemaisartigosdaCartaMagna.

Asgarantiasfundamentaissãotambémdireitos,chamadosdireitos-garantia,poissãodestinadosàproteçãodeoutrosdireitos.Nãoexistemporsimesmas,masparaamparar,tutelareefetivardireitos.SegundoFERREIRAFILHO,hátrêsespéciesdegarantias:

Garantias-limite:destinam-sealimitaropoder,sãodefesaspostasadireitosespeciaisevisamprevenirviolaçõesadireitos,comoaproibiçãodecensuraparaprotegeraliberdadedeexpressão,aproibiçãodeconfiscoparagarantirapropriedade.

Garantias-institucionais:consistemnosistemadeproteçãoorganizadoparaadefesaeefetivaçãodosdireitos:osistemajudiciário,asdefensoriaspúblicasetodasasinstituiçõesorganizadasparaaproteçãodosdireitos.

Alémdasgarantiasgeraisdestinadasàproteçãodosdireitosfundamentais,aConstituiçãopreviuumconjuntoespecialdegarantiasinstrumentaiscomqueapessoapodereivindicardoPoderJudiciárioaprevençãoecorreçãodeilegalidadesqueameaçamouferemdireitosindividuaisecoletivos.Sãoasdenominadasaçõesconstitucionaisouremédiosconstitucionais:habeascorpus,mandadodesegurança,mandadodesegurançacoletivo,mandadodeinjunção,habeasdata,açãopopulareaaçãocivilpública.

Hádivergênciasdoutrináriasemrelaçãoàterminologiadosdireitosfundamentais,sendoencontradasasseguintesnomenclaturas:direitoshumanos,liberdadespúblicas,direitossubjetivos,direitospúblicossubjetivos,direitosindividuais.Amaioriadadoutrinaacataaterminologia “direitosfundamentais”.

Há várias concepções:direitos fundamentais, humanos, naturais. O critério da divisão em gerações é histórico. Já a classificação em direitos de defesa ou prestacionais é relacionada à estrutura do direito. Direitos naturais: expressão jusnaturalista. Para estes, os direitos humanos são direitos naturais – compõem uma ordem de valores suprapositiva. Direitos humanos x direitos fundamentais: os direitos humanos são utilizados nas previsões de tratados internacionais ou como designação genérica. A expressão “direitos fundamentais” é utilizada para designar os direitos previstos em cada CF. Direitos civis e políticos: são os direitos de 1ª geração. Direitos econômicos, sociais e culturais: são os de 2ª geração. As nomenclaturas se referem aos dois pactos firmados em âmbito internacional.

ParaSAMPAIO,asconcepçõessobreosdireitos humanos sãomateriaiseformais. Asconcepçõesmateriaisprocuramformularumsentidoparaaexpressão “direitoshumanos” quesevinculeaoconteúdodessesdireitos,nasperspectivaspositivista,nãopositivistaeeclética.

Perspectivapositivista:osdireitoshumanosincluememseunúcleodesignificadooreconhecimentopelodireito.Sãoapenasaquelesinteressesoubensreconhecidoscomobásicosoufundamentaisetuteladospelaordemjurídica,segundoseusistemainstrumental.

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Perspectivanãopositivista(religiososejusnaturalistas):identificaosdireitoshumanoscomasaspiraçõesmoraisouasnecessidadeshumanasmaiores,referidastantoàdignidadedohomem,expressanosdireitosdeliberdade,igualdade,segurançaepropriedade,quantoaosseusinteressessociaiseeconômicos.

Perspectivaeclética:procura-sereunirumadimensãojusnaturalistaouhistóricacomadimensãopositivista.

Asconcepçõesformaisprocuramdefiniraformaouaestruturalógicadosdireitos,semapreocupaçãoemidentificarquaisseriamosconteúdosdessesdireitosemumordenamentoconcreto,nasperspectivasteóricasedogmáticas.

Perspectivasteóricas:osautoresprocuramidentificarnosdireitosatributosquedeemaeleaqualidadededireitoshumanosoufundamentais.Referidosatributospodemser:direitosuniversais,inatos,originários,inalienáveis,pré-estatais.

Perspectivas dogmáticas: versam sobre os aspectos definidores dos direitos, tomando como referência um sistema de direito determinado, de âmbito interno ou internacional. A dogmática do consenso é a concepção que vincula o sentido dos direitos ao que for definido pelo consenso de uma sociedade concreta. A dogmática metodológica ou analítica é a linha de estudo que se ocupa com o exame da estrutura da norma de direito fundamental e da perspectiva desse direito como uma categoria jurídica própria.

2.Dimensões

Há divergência na doutrina no uso da expressões geraçõesoudimensões para demonstrar a evolução histórica dos direitos fundamentais. Há, contudo, tendência no âmbito do MPF em privilegiar a expressão dimensão, ao argumento de que, diante da irretroatividade dos direitos fundamentais, gerações indicaria uma ideia de superação de cada etapa, quando, em verdade, há uma adição, ou seja, a 2ª dimensão soma-se à primeira e assim por diante. Nesses termos, utilizar-se-á a denominação dimensão, mantendo-se fiel, pois, ao instrumento convocatório do certame:

1ªdimensão:direitoscivisepolíticos:direitoàvida,àliberdade,àpropriedade,àsegurançaeàigualdade,voltadosàtuteladasliberdadespúblicas.Expressampoderesdeagir,reconhecidoseprotegidospelaordemjurídicaatodosossereshumanos,independentementedaingerênciadoestado,correspondendoaostatusnegativo(negativusoulibertatis)daTeoriadeJellinek,emqueaoindivíduoéreconhecidaumaesferaindividualdeliberdadeimuneàintervençãoestatal;

2ªdimensão:direitossociais,econômicoseculturais:direitosdecunhopositivo,queexigemprestaçõespositivasdoEstadoparaarealizaçãodajustiçasocialedobemestarsocial,alémdasliberdadessociais:liberdadedesindicalização,direitodegreveedireitostrabalhistas.SãopretensõesdoindivíduooudogrupoanteaoEstado,exigindoasuaintervençãoparaatendimentodasnecessidadesdoindivíduo,correspondendoa

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ostatuspositivo(positivusoucivitatis)daTeoriadeJellinek:aoindivíduoépossívelexigirdoEstadodeterminadasprestaçõespositivas;

3ªdimensão:direitosdesolidariedadeoudefraternidade:direitoao meio ambiente ecologicamenteequilibrado,àsegurança,àpaz,àsolidariedadeuniversal,aodesenvolvimento,àcomunicaçãoeàautodeterminaçãodospovos.Nãotêmporfinalidadealiberdadeouigualdadeindividual,maspreservaraprópriaexistênciadogrupo.Destinam-seàproteçãodohomememcoletividadesocial,sendodetitularidadedifusaoucoletiva;

4ªdimensão:direitosdeglobalizaçãoeuniversalização:direitoàdemocraciadireta,aopluralismo,àinformaçãoeosdireitosrelacionadosàbiotecnologia.Constituemabasedelegitimaçãodeumapossívelglobalizaçãopolíticaeconcretizaçãodasociedadeuniversaleabertadofuturo.

JoséAdércioLeiteSampaio,comreservasnosentidodeque,emfunçãodomultiplicadomundodasnecessidades,encontramosasquatrogerações,dealgumaforma,presentes,eatentosaumamescladetempodesurgimentocomaestruturadosdireitos,admiteaclassificaçãodosdireitosfundamentaisemgerações:adosdireitoscivisepolíticos – respondemanecessidadesdeliberdadeeparticipaçãomáximascomigualdadeesolidariedademínimas,projetadasemdireitosmaisnacionaisqueinternacionais;adosdireitossociais,econômicoseculturais,comoprojeçõesdeigualdademáxima,participação,liberdadeesolidariedademínimas,promovidostantonoplanointernoquantointernacional;adosdireitosdefraternidadepressupõemmáximassolidariedade,igualdade,liberdadeeparticipação.Sãoosdireitosdesíntese:paz,desenvolvimento,meioambienteecologicamenteequilibrado,biodireitos,direitosvirtuaisecomunicacionais,asminorias,amulher,acriança,oidosoeosportadoresdenecessidadesespeciais.

Além da divisão história em dimensões (gerações), pode-se estabelecer dimensões (facetas ou atuações) dos direitos fundamentais. Destarte, além da influência no seio individual – subjetivo- os direitos fundamentais são peremptoriamente relevantes para a concretização coletiva dos valores socais (dimensão objetiva).

Dimensãoobjetiva:osdireitosfundamentaisoperamcomoelementosobjetivosfundamentaisquesintetizamosvaloresbásicosdasociedadeeosexpandemparatodaaordemjurídica(eficáciairradiante),queosidentificacomodiretrizesouvetoresparaainterpretaçãoeaplicaçãodasnormasinfraconstitucionais.DáensejoaumdeverdeproteçãodoEstado.

Dimensãosubjetiva:Osdireitosfundamentaissãoposiçõesjurídicassubjetivasessenciaisdeproteçãodapessoa,sãodireitossubjetivosconferidosaosseustitulares.Conformevisto,sãotitularizadosnãoapenasporpessoasfísicas,mastambémporpessoasjurídicaseentesdespersonalizados,sempreequandoasuanaturezapermitaaaplicaçãodosdireitosfundamentais,excluídasaspessoasjurídicasdeDireitoPúblico(titularesdecompetências).

3.Críticas.

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Ascríticasaosdireitoshumanosadvêmdemuitasfrentes(progressistas,conservadores,revolucionários,românticosehistoricistas),sendoarroladasasseguintescríticas:

4. Direitoshumanoscomoguardiõesdadelinquência:

5. Críticaàbaseracionaldosdireitosdohomem:

6. Críticaàbasecontratualdosdireitosdohomem:

7. Osdireitoshumanoscomosubversãoàordemeàautoridade:

8. Críticaaocaráterabstratodosdireitosdohomem:

9. Direitoshumanoscomodiscursodedominaçãodeclasses:

10. Direitoshumanoscomodiscursodejustificaçãodadominaçãosocial:

11. Direitoshumanosaserviçodoimperialismo:

4.Justificativas.

Ajustificaçãodosdireitoshumanospassaporteoriassegundoainterferênciadosujeitonoprocessodeconstrução/explicaçãodefundamentaçãosubjetivista,transubjetivistaeintersubjetivista.

Fundamentaçãosubjetivista:jusnaturalismodeontológicoepelasdoutrinasneoliberaiseemotivistas.

Ojusnaturalismodeontológicocaracteriza-sepeloindividualismoantropocêntrico(éoindivíduo,porserdotadodeautoconsciência,quepodeconhecerosvaloresesobreelesatuar),peloracionalismoedefesadosdireitosnaturais.

Osneoliberaisnegamaexistênciadevaloresquetranscendamaoindivíduo,masdescreemdaexistênciadevaloreseternoseabsolutos.Dentreosneoliberaissurgiramoslibertarianistas(adeptosdeumaabordagemeconômicadosdireitoshumanos)eosdefensoresdateoriamoraldosdireitoshumanos,comadefesadosdireitospré-estataisquelimitamaaçãodoEstadosobreosindivíduos(Dworkin,RawlseCahn).Adoutrinaemotivistacombateasestruturasracionaisquefundamentamosdireitoshumanos,atribuindoaosdireitosumamotivaçãoemocional,emumavisãosentimentaldahumanidade.

Fundamentaçãotransubjetivista:postulaaexistênciadedireitoscomoalgoexternoaoindivíduoeindependentedesuavontade,quandomuitoadependerdesuasinterações,masaindasemqualquerparticipaçãoativaeconscientedasindividualidades.Háduasperspectivasdiferentesaesterespeito:adoobjetivismoaxiológico(existênciaderegrasouvaloresquepossuemvalidadeobjetivaeuniversal)eoutra,nãoaxiológica,quevêosdireitoscomoprojeçãodosvalorescomunitáriosoudasdeterminaçõesdolegisladorpositivooucomoresultadodeestratégiasemumjogo(Teoriadosjogos).

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Positivismo:osdireitoshumanos,comotodososdireitos,nascemcomoEstado,segundocoordenadasarbitráriasdolegisladorpositivo.

Historicismo:osdireitossãofrutosdeprocessoshistóricosedaevoluçãodasidéiasqueacompanhamtaisprocessos.

Holismofuncional:osdireitosnascemdepoisdasociedadeoucomunidadeesejustificampelosfinsintegradoresdatotalidade.Háumavertentemaiscomunitarista(vínculosdepertençaaumacomunidade)eoutramaisfuncionalista(osdireitostêmafunçãodepromoçãodaprópriasociedadecomoserpolíticoesocial).

Atenção.Nestafundamentação,surgemduasdefiniçõesqueconstamdoprograma(pontos9.ce14.c),peloquefaçoumabrevemenção.

Comunitarismo:váriosautores,realçandooaspectoorganicista-aristotélicodeseusentido,definem-nopelosvínculosdepertençaaumadeterminadacomunidadepolítica.Vínculosepolíticarestringemoalcancedotermo,quepoderiafincar-seapenasnoslaçosdevizinhançaesolidariedade,dominadosporumamoralpré-moderna.

Republicanismo:umaversãodofuncionalismoquedestacaafundamentalidadedosdireitosapartirdoseureconhecimentopelacomunidade.Rousseaufoiograndeengenheiromodernodestepensamento,aodefenderaalienaçãodetodosospoderesprivadosemfavordacomunidade.Opodersoberanoabsolutoesagradodeautodeterminaçãoéquedeixavaatodososhomensosbenseliberdadesquedeveriamserusufruídosemrazãodosinteressesdacomunidade.

Fundamentaçãointersubjetivista:conectamaintersubjetividadecomaexperiênciahistóricaoucomarealidadeconcretadaexistênciahumana.Duassãoaslinhasadotadas:alinhadoutilitarismonegativoeaséticasdasnecessidades.

Kaufmannabjuraoquechamadeutilitarismopositivo(prega-seamaiorfelicidadeparaomaiornúmeropossível),defendendoaideiadequea “desgraçademuitos” seriasusceptíveldegeneralização(todoslutamcontraosofrimentoouadesgraça)e,assim,valeriamaisprotegeradesgraçadoqueestimularafelicidade(utilitarismonegativo).

Éticadasnecessidades:anecessidadedesempenhaumpapelfundamentalparaoprocessodeinteraçãosocialsendo,emsi,umvalor,assimcomoévalortudoqueserveparasatisfaçãodasnecessidades.MarxeEngelsobservaramqueoshomensdeveriamestaremcondiçõesdeviver “parapoderfazerhistória”.Noentanto,paravivererapreciso,emprimeirolugar,alimentar-se,beber,terhabitaçãoemoradia.

5.Aspectosecaracterísticasdosdireitosfundamentais:18

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DirleydaCunhaJúniorapresentaasseguintescaracterísticasdosdireitosfundamentais:

2. Historicidadeeuniversalidade:sãoresultadodaevolução,afirmaçãoereconhecimentoaolongodahistória,principalmentedasdeclaraçõesdedireitosdohomem;

3. Inalienabilidade:sãointransferíveiseinegociáveis,poissãodesprovidosdeconteúdoeconômico-financeiroeseustitularesnãopodemdelesdespojar-se;

4. Imprescritibilidade:nãoseperdemcomotempo,nãoprescrevemporquesãosempreexigíveis;

5. Irrenunciabilidade:sãoirrenunciáveis,poisnãosãodisponíveis,masseustitularespodemdeixardeexercê-los;

6. Limitabilidade:nãosãoabsolutos,poispodemserlimitadospelasleiseporoutrosdireitos;

7. Proibiçãoderetrocesso:impedearevogaçãodenormasgarantidorasdedireitosfundamentaiseimpedeaimplementaçãodepolíticaspúblicasdeenfraquecimentodedireitosfundamentais;

8. Concorrência:podemserexercidoscumulativamenteporummesmotitular;

Emrelaçãoàscaracterísticasfuncionaisdosdireitosfundamentais,anote-seateoriadosquatrostatusdeJellinek:

I)statuspassivo(subjectionis):oindivíduoestásubordinadoaospoderesestatais – ordenseproibições;

II)statusnegativo(negativusoulibertatis),emqueaoindivíduoéreconhecidaumaesferaindividualdeliberdadeimuneàintervençãoestatal;

III)statuspositivo(positivusoucivitatis):aoindivíduoépossívelexigirdoEstadodeterminadasprestaçõespositivas;

IV)statusativo(activus):épossibilitadoaoindivíduoparticiparativamentedaformaçãodavontadepolíticaestatal.

SegundoSAMPAIO, sãocaracterísticasfuncionaisdosdireitosfundamentais:

a) desempenhamumpapelcentraldelegitimidadedaordemconstitucional,consideradocomoumcentroligado,funcionalenormativamente,comasoutraspartesdoDireitoConstitucional;

b) operamcomoelementolimitadordaaçãoestataloucomodemandantedapolíticaestataldeintervenção,importandoemdireçãoexegéticatendenteaampliá-

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los,nahipótesedeentendimentoduvidoso,segundoamáximaindubioprolibertate;

c) devemsertomadosemsuabaseantropocêntrica,aindaquenãonecessariamentenosentidodeindividualismopossessivo;

d) apresentamumconteúdoabertoàampliaçãoeprojetadoparaofuturo.Nãoháumatutelaougarantianumerusclaususdedireitosfundamentais,porquenãoháumnumerusclaususdeperigos;

e) nãoadmitemretrocessos,criamobstáculosàsmudançasdeconformaçãoquedevemreproduzir,nomínimo,aefetividadeoufruiçãoanterior(efeitocliquet)7;

f) projetam-senasrelaçõesentreoscidadãoseospoderespúblicos(eficáciavertical),mastambémnasrelaçõesentreparticulares(eficáciahorizontal);

g) sãotitularizadosnãoapenasporpessoasfísicas,mastambémporpessoasjurídicaseentesdespersonalizados,sempreequandoasuanaturezapermitaaaplicaçãodosdireitosfundamentais.Excluem-seaspessoasjurídicasdeDireitoPúblico,àsquaissereservamcompetências,interesseslegítimosoudireitosconstitucionais,quenãopodemsersubsumidossoborótulodedireitosfundamentais;

h) sãofatoresdecisivosdeintegraçãosocialoupontosdepartidaparasetomareterpartenosprocessospolíticos,econômicoseculturaisdeumacomunidade.

6.Eficáciaverticalehorizontal.

Nãohádivergênciaemrelaçãoàprojeçãosobreasrelaçõesentreoscidadãoseospoderespúblicos,adenominadaeficáciaverticaldosdireitosfundamentais.

Aeficáciahorizontal(privadaouexterna)refere-seàprojeçãodosdireitosfundamentaisàsrelaçõesentreparticulares.

NoDireitoComparadoverifica-sequenosEstadosUnidososdireitosfundamentaisimpõemlimitaçõesapenasparaosPoderesPúblicosenãoatribuemaosparticularesdireitosfrentesaoutrosparticulares,comexceçãodaproibiçãodeescravidão.Somenteasatividadesdenaturezaessencialmenteestatal(mesmoseexercidasporparticulares)devemsubmeter-seintegralmenteaosdireitosfundamentaisprevistosnaConstituição. É ateoriadastateaction(açãoestatal).

NaAlemanhaprevaleceateoriadaeficáciaindireta(mediata)dosdireitosfundamentaisnaesferaprivada,

7 Vide a alternativa “b” da questão nº. 10, do 24º Concurso do MPF.20

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quenegaapossibilidadedeaplicaçãodiretanasrelaçõesprivadasporqueacabariaexterminandoaautonomiadavontadeedesfigurandooDireitoPrivado,aoconvertê-loemumameraconcretizaçãodoDireitoConstitucional.

Segundoateoriadaeficáciaindiretaoumediata,aConstituiçãonãoinvesteosparticularesemdireitossubjetivosprivados,maselacontémnormasobjetivas,cujosefeitosdeirradiaçãolevamàimpregnaçãodasleiscivisporvaloresconstitucionais.Osdireitosfundamentaissãoprotegidosnocampoprivadonãopornormasconstitucionais,maspormeiodemecanismostípicosdopróprioDireitoPrivado.

AoJudiciáriosobrariaopapeldepreencherascláusulasindeterminadascriadaspelolegislador,levandoemconsideraçãoosdireitosfundamentaisourejeitar,porinconstitucionalidade,aaplicaçãodenormasprivadasincompatíveiscomtaisdireitos.PrevalecetalteorianaÁustriaenaFrança.

Teoriadaeficáciadiretaeimediatadosdireitosfundamentaisnaesferaprivada.

EstateoriafoidefendidainicialmentenaAlemanhanadécadade50.Osdireitosfundamentaispodemserinvocadosdiretamentenasrelaçõesprivadas,independentementedequalquermediaçãoporpartedolegislador,ressalvando-seanecessidadedeponderarodireitofundamentalemjogocomaautonomiaprivadadosparticularesenvolvidosnocaso.

Parâmetrosparaaponderaçãodeinteresses:ofatodeosparticularesseremtambémtitularesdedireitosfundamentais,desfrutandodeautonomiaprivadaconstitucionalmenteprotegida,impõeumasériedeadaptaçõeseespecificidadesnaincidênciadosdireitoshumanosnocampoprivado.Quantomaioradesigualdade,maisintensaseráaproteçãododireitofundamentalemjogoemenoratuteladaautonomiaprivada,variandoaponderaçãodeinteressestambémemfunçãodanaturezadaquestãoconstitucional.

NaEspanhaeemPortugalvigoramtalteoria,constandonaConstituiçãoPortuguesaqueosdireitosegarantiasfundamentaisvinculamasentidadespúblicaseprivadas.NaItáliaenaArgentinatambéméreconhecidaaeficáciadiretadosdireitosfundamentaisfrenteaosparticulares.

NoBrasilpredominaateoriadaeficáciadiretaeimediatadosdireitosfundamentaisnaesferaprivada,comavinculaçãodiretadosparticularesaosdireitosfundamentais,aceitapelamaioriadadoutrina(JoséAdércio,Sarmento,Barroso)enajurisprudênciaéatesequeoSTFvemadotando,antessemmencionardiretamentetalteoria,masjáconstandoemjulgadosmaisrecentes(STF,RE201819/RJ,Rel.p/AcórdãoMin.GilmarMendes,j.11/10/2005)

Argumentoscontráriossãorefutadosnosseguintestermos:

3. comprometeaautonomiaprivada:nãoéumvalorabsoluto,quedeveserponderadocomoutrosdireitoseinteressesconstitucionais;

4. éantidemocrática,atribuindopoderesexcessivosaojuiz:osjuízesdevemaplicarasnormasjurídicas,quegozamdepresunçãodeconstitucionalidade,sópodendoafastá-lasmedianteargumentaçãofundamentada;

5. gerainsegurançajurídica:aaplicaçãodiretadosdireitosfundamentaistornaasrelaçõ

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esprivadasmaisdinâmicas,ricasdopontodevistaaxiológico,poissignificaevoluçãodaargumentaçãojurídicaedaracionalidadeprática – comunidadedosintérpretes;

6. riscodeautonomiadoDireitoPrivadoecolonizaçãopeloDireitoConstitucional:aaplicaçãopermitequesejamrevigoradososinstitutosdeDireitoCivil,muitosdelesdefasadosdarealidadecontemporâneaerelegadosaoesquecimentoeineficácia(Tepedino).

Sobreaeficáciahorizontalexistemaindaasseguintesteoriasalternativas:

1. Teoriadosdeveresdeproteção.NaAlemanha,autores(Canaris,Isensee)consideramqueoEstadotemaobrigaçãonãoapenasdeabster-sedeviolarosdireitosfundamentais,mastambémdeprotegê-losdiantedelesõeseameaçasprovenientesdeterceiros,inclusiveparticulares;

2. Teoriadaconvergênciaestatista,deJurgenSchwabe(Alemanha-1971):ésempreoEstadooresponsávelúltimoporlesõesadireitosfundamentaisquetêmorigemnasrelaçõesprivadas;Aatividadedosparticulares,mesmoquandodesenvolvidanoâmbitodesuaesferadeautonomiaprivadajuridicamenteprotegida,ésempreimputávelaoEstado,poisdecorredeumapréviaautorizaçãoexplícitaouimplícitadaordemjurídicaestatal(Sarmento,2008).

3. RobertAlexytentouconciliarascorrentes,poistodaselasreconhecemqueasgradaçõesdaeficáciadosdireitosdecorremdaponderaçãodeinteresses,propondoummodelodetrêsníveisdeefeitos:oníveldosdeveresdoEstado,oníveldosdireitosfrenteaoEstadoeonívelderelaçãoentreosparticulares.

7.Limiteseconflitos.

ConformeSAMPAIO(2003),osdireitosfundamentais,numaConstituiçãopluralista,nãopodemserdesconectadosdasoutraspartesdaConstituição.Porisso,elesseirradiamemdireçãoatodaselas,exigindoumainterpretaçãoconformeaosdireitosfundamentais.Nãoéraroquepretensõessupostamenteamparadasemdireitospossamentraremchoque.Háduasformasdesuperarestesconflitos:ouseextraidoenunciadodanormaexercíciosatípicos,exorbitantesouabusivos,porexemplo,comaintroduçãodeumareservadeconvivênciasocialedasliberdadesdosoutros,oubemconsideramos,apriori,todososdireitosabsolutos,deixandoparaocasoconcretoasoluçãodeeventuaiscontenções.

Osdireitosfundamentaisnãosãoabsolutosouilimitados.Oslimitesaosdireitosfundamentaisincidemsobreoexercíciododireito,sobresuamanifestaçãoconcretaenãosobreodireitoemsi.Jáarestriçãodizrespeitoaodireitoemsi,subtraindoalgumasfaculdadesnelecompreendidas.Assim,pode-sedizerquehálimitaçõeserestriçõesdedireitos.

Hárestriçõesdiretamenteconstitucionais,atravésdeprescriçõesconstitucionaisexpressas,quepodemserpormeiodeleisautorizadaspelaConstituição(restriçõeslegaisoulimitesimanentes)quantop

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orexigênciadeinterpretaçãoparasoluçãodecasosconcretos(restriçõesinterpretativas).Exemploderestriçãoconstitucionalexpressaaodireitodeliberdadedeassociaçãoéoartigo5º,XVI,CF: “todospodemreunir-sepacificamente,semarmas,emlocaisabertosaopúblico...”

AsrestriçõesindiretamenteconstitucionaissãoaquelasqueaConstituiçãoremeteaolegisladorinfraconstitucional.Exemplo: “aleisópoderárestringirapublicidadedosatosprocessuaisquandoadefesadaintimidadeouointeressesocialoexigirem” (art.5º,LX).

Hásituaçõesdeconflitoentredireitosfundamentais,nãoprevistastextualmentenaConstituiçãocomolimitaçãodiretaouindireta,quedevemserresolvidaspelolegisladoroupelojuiz,casoestejadiantedeumconflitodedireitosfundamentaisaindanãoreguladopelolegislador.

Asalternativasparaasoluçãodeconflitosentredireitosfundamentaissão:

a) adoçãodeconceitodelimitesimanentesouessenciais,pressupondoumacláusulageraldacomunidadeoudebemcomum,quevedamameaçaàexistênciacoletivaoucomaexigênciadejustificaçãodarestriçãodedireito,emqueresultaateoriarelativadonúcleoessencial;

b) interpretaçãosistemáticaeunitáriadaConstituição,comempregodeumjuízodeponderaçãoeadequaçãodosvaloresconstitucionaiscolidentes.

Nasoluçãodoconflitodedireitosfundamentaisdevemserobedecidasasseguintesorientações:princípiodaunidadedaConstituição;princípiodoidênticovalorconstitucional;daconsideraçãoapenasdevaloresebensveiculadospelotextoconstitucional;doentendimentoqueasnormasdedireitofundamentalsãosempre,apriori,definidorasdedireitossemreservas;daidéiadequeosdireitosfundamentaisnãoservemparaeximirocumprimentodeumdeverouobrigaçãonascidaouemdecorrênciadenormasconstitucionalmenteinseridasnosistemajurídicoeindubioprolibertate. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE: Adequação é a aferição da idoneidade do meio eleito pelo Poder Público para o atingimento do fim colimado. Necessidadeé a inexistência de um meio menos gravoso dentre os igualmente aptos para a realização de um fim ou de um princípio. Proporcionalidade em sentido estrito: é a formula da ponderação (Alexy). Consiste numa análise, grosso modo, de custo-benefício. Analisa-se qual o grau de promoção de P1. Alexy vai analisar se o grau de proteção de P1 por M1 é fraco, médio ou forte; posteriormente, vai analisar o grau de restrição de P2 por M1 (fraco, médio ou forte). Depois, fará o mesmo com M2.

CONFLITO ENTRE REGRA E PRINCÍPIO: A prioridade prima facie é da regra, pois ela já é fruto de ponderação, feita pelo constituinte ou pelo legislador. Pode ser, no entanto, que a aplicação de uma regra gere, no caso concreto, resultados injustos – aí entra o princípio, em caráter excepcional. Isso se chama, em doutrina, superabilidade ou derrotabilidade das regras.

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7.a. Processo legislativo: objeto, ritos e peculiaridades. O devido processo legislativo. Questõespolíticas. Atos interna corporis.

O processo legislativo consiste nas regras procedimentais, constitucionalmente previstas, para elaboração das espécies normativas, regras estas a serem criteriosamente observadas pelos “atores” envolvidos no processo. José Afonso da Silva define o processo legislativo como “um conjunto de atos preordenados visando à criação de normas de direito. Esses atos são: a) iniciativa legislativa; b) emendas; c) votação; d) sanção e veto; e) promulgação e publicação – consubstancia, pois, o devido processo legislativo. A importância fundamental de estudarmos o processo legislativo de formação das espécies normativas é sabermos o correto trâmite a ser observado, sob pena de ser inconstitucional a futura espécie normativa – neste caso vício formal (no processo legislativo).Nos termos do art. 59 da CF/88, o processo legislativo envolverá as seguintes espécies normativas: emendas à constituição; leis complementares, leis ordinárias; leis delegadas; medidas provisórias; decretos legislativos; e, resoluções. O processo legislativo tem início quando alguém ou algum ente toma a iniciativa de apresentar uma proposta de criação de novo direito. O projeto de lei deve ter início na Câmara dos Deputados, se não resulta de iniciativa de senador ou de comissão do Senado. A iniciativa pode ser comum (ou concorrente), se a proposição normativa puder ser apresentada por qualquer membro do Congresso Nacional ou por comissão de qualquer de suas Casas, bem assim pelo Presidente da República, e, ainda, pelos cidadãos, no caso de iniciativa popular; ou reservada, que visa subordinar ao seu titular a conveniência e oportunidade da deflagração do debate legislativo em torno do assunto. Por exemplo: no §5º da CF faculta ao chefe do MP a iniciativa (reservada) de LC que estabeleça sua organização – é notar que, pelo art. 61, §1º, II, d, o constituinte reserva também ao Presidente da Republica a iniciativa. O STF reconheceu a impropriedade terminológica, mas conciliou os dispositivos, entendendo que, no caso “essa ‘privatividade’ (da iniciativa do PR) só pode ter um sentido, que é o de eliminar a iniciativa parlamentar” (ADI 400/ES, RTJ, 139/453).

Na segunda fase (constitutiva), teremos a conjugação de vontades, tanto do Legislativo (deliberação parlamentar – discussão e votação) como do Executivo (deliberação executiva – sanção e veto). Bicameralismo federativo: tratando-se de processo de lei federal, sempre haverá apreciação de duas Casas – iniciadora e revisora. A emenda, em alguns casos, sofre restrições. O STF entende que a emenda deve guardar pertinência com o projeto de iniciativa privativa, para prevenir a fraude a essa mesma reserva. Veto: consiste na discordância do PR e poderá ser total ou parcial. Jurídica quando o projeto de lei é inconstitucional. Política quando contraria o interesse público. Sanção: aceitação do projeto de lei

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Procedimento legislativo (i) ordinário: utilizado na confecção das leis ordinárias, o seu trâmite é mais demorado, admite mais oportunidade para o exame, o estudo e a discussão do projeto (ii) sumário: depende da manifestação de vontade do Presidente da República, a CF lhe confere a faculdade de solicitar urgência em seu trâmite – art. 64 §§ 1º a 3º (iii) especial é utilizado para edição de EC, LC, de leis financeiras, leis delegadas e de medidas provisórias.

Terceira fase (complementar): (i) promulgação: a lei promulgada é válida, executória e potencialmente obrigatória; (ii) publicação: ato pelo qual se levará ao conhecimento de todos o conteúdo da inovação legislativa.

Tratando-se de matéria sujeita à exclusiva esfera de interpretação de "normas de regimento legislativo imune à crítica judiciária, circunscrevendo-se no domínio interna corporis" (RTJ n.112/1023, Rel. Min. Francisco Rezek). Mais ainda, afirma o STF (MS 23.920/DF , Rel. Min. Celso de Mello) que a interpretação incidente sobre normas de índole meramente regimental, por se qualificar como típica matéria interna corporis, suscita questão que se deve resolver exclusivamente no âmbito do Poder Legislativo, sendo vedada sua apreciação pelo Poder Judiciário.

Quanto a questões políticas, não se reconhece indenidade aos atos ou decisões políticas se elas afetam ou ameaçam direitos individuais. Essa é orientação pacífica do Supremo Tribunal Federal desde os primórdios da Republica. A doutrina das questões políticas chegou ao Supremo Tribunal com o famoso epolêmico julgamento do HC 300, impetrado por Rui Barbosa em 1892, em que o jurista se amparou nadoutrina norte-americana da political questions, criada por influência da decisão do Justice Marshall nocaso Marbury vs Madison. Apesar da derrota naquele julgamento, os ensinamentos de Rui Barbosa influenciaram decisivamente a formulação do art. 141, §4°, da Constituição de 1946, precedente remoto do atual art. 5º, XXXV, da CRFB/88. Alternando momentos de maior e menor ativismo judicial, o STF, ao longo de sua história, tem entendido que a discricionariedade das medidas políticas não impede o seu controle judicial, desde que haja violação a direitos assegurados pela Constituição.

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7.b. Garantias institucionais. Garantias de instituição. Crises constitucionais. Estado de defesa eestado de sítio.

Surgindo qualquer violação da normalidade constitucional, surge o denominado sistema constitucional das crises, definido por Aricê Amaral Santos como “...o conjunto ordenado de normas constitucionais que, informadas pelos princípios da necessidade e da temporariedade, tem por objeto as situações de crises e por finalidade a mantença ou o restabelecimento da normalidade constitucional”.

Nesse sentido, José Afonso da Silva observa como importância que “... normas que visam à estabilização e à defesa da Constituição contra processos violentos de mudança ou perturbação da ordem constitucional, mas também à defesa do Estado quando a situação critica derive de guerra externa. Então, a legalidade normal é substituída por uma legalidade extraordinária, que define e rege o estado de exceção”.

Dentro do grande tema da “defesa do Estado e das instituições democráticas”, a CF/88 estabeleceu dois grupos: (i) instrumentos (medidas excepcionais) para manter ou restabelecer a ordem nos momentos de anormalidades constitucionais, instituindo o sistema constitucional de crises, composto pelo estado de defesa e pelo estado de sítio (legalidade extraordinária); (ii) defesa do Pais ou sociedade, através das Forças Armadas e da segurança pública.

Estado de defesaO Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração,

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especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos de: a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; b) sigilo de correspondência; c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica; II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.

Na vigência do estado de defesa: I - a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial; II - a comunicação será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação; III - a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário; IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.

Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta. Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias. O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa. Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa.

Estado de Sítio O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos de: a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; b) sigilo de correspondência; c) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica; II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

O tempo de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação.

Na vigência do estado de defesa: I - a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial; II - a comunicação será acompanhada de

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declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação; III - a prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário; IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.

Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República, dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta. Se o Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no prazo de cinco dias. O Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa. Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa.

Por fim, novamente reiterar que referidos mecanismos devem respeitar o princípio da necessidade, sob pena de configurar arbítrio e verdadeiro golpe de estado, bem como o princípio da temporariedade, sob pena de configurar verdadeira ditadura.

7.c. Justiça Comum Federal: organização e competência.

Organizada em dois graus de jurisdição, a JF é composta pelos TRF’s e pelos Juízes Federais. Sua competência vem estabelecida nos arts. 108 e 109 da CF/88.

Composição dos TRF’s: no mínimo 7 Juízes, recrutados, quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República, devendo ser observado a regra do “quinto constitucional”(art 94)

Requisitos para o cargo: a) ser brasileiro nato ou naturalizado; b) ter mais de 30 e menos de 65 anos de idade.

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Em busca da efetividade do processo e do acesso à ordem jurídica justa, a reforma do judiciário (EC n. 45/2004) previu a instalação da Justiça itinerante e descentralização, nos termos dos §§ 2º e 3º do art. 107: (i) os Tribunais Regionais Federais instalarão a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de equipamentos públicos e comunitários; (ii) os Tribunais Regionais Federais poderão funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo.

Em relação à JF, destacamos a federalização de crimes contra direito humanos, por exemplo, a tortura e homicídio praticados por grupos de extermínio, mediante incidente suscitado pelo PGR no STJ objetivando o deslocamento da competência para a JF. Busca-se, acima de tudo, adequar o funcionamento do Judiciário brasileiro ao sistema de proteção internacional dos direitos humanos.

Algumas súmulasSTJ365 - A intervenção da União como sucessora da Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) desloca a competência para a Justiça Federal ainda que a sentença tenha sido proferida por Juízo estadual349 - Compete à Justiça Federal ou aos juízes com competência delegada o julgamento das execuções fiscais de contribuições devidas pelo empregador ao FGTS. 324 - Compete à Justiça Federal processar e julgar ações de que participa a Fundação Habitacional do Exército, equiparada à entidade autárquica federal, supervisionada pelo Ministério do Exército.270 - O protesto pela preferência de crédito, apresentado por ente federal em execução que tramita na Justiça Estadual, não desloca a competência para a Justiça Federal.208 - Compete a Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal.192 - Compete ao Juízo das execuções penais do Estado a execução das penas impostas a sentenciados pela Justiça Federal, Militar ou Eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeiots a administração estadual.183 - Compete ao juiz estadual, nas comarcas que não sejam sede de Vara da Justiça Federal, processar e julgar ação civil pública, ainda que a união figure no processo. (CANCELADA EM 08.11.2000)173 - Compete a Justiça Federal processar e julgar o pedido de reintegração de em cargo público federal, ainda que o servidor tenha sido dispensado antes da instituição do regime jurídico único.165 - Compete a Justiça Federal processar e julgar crime de falso testemunho cometido no processo trabalhista

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150 - Compete a Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da união, suas autarquias ou empresas públicas.147 - Compete a Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função.122 - Compete a Justiça Federal o processo e julgamento unificado dos crimes conexos de competência federal e estadual, não se aplicando a regra do art. 78, II, "a", do Código de Processo Penal.91 - Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra a fauna. (CANCELADA EM 08.11.2000).82 - Compete a justiça federal, excluídas as reclamações trabalhistas, processar e julgar os feitos relativos a movimentação do FGTS.66 - Compete a justiça federal processar e julgar execução fiscal promovida por conselho de fiscalização profissional.32 - Compete a justiça federal processar justificações judiciais destinadas a instruir pedidos perante entidades que nela tem exclusividade de foro, ressalvada a aplicação do art. 15, II da lei 5010/66.STF522 - Salvo ocorrência de tráfico com o exterior, quando, então, a competência será da justiça federal, compete a justiça dos estados o processo e o julgamento dos crimes relativos a entorpecentes.517 - As sociedades de economia mista só têm foro na justiça federal, quando a União intervêm como assistente ou opoente.511 - Compete a justiça federal, em ambas as instâncias, processar e julgar as causas entre autarquias federais e entidades públicas locais, inclusive Mandados de Segurança, ressalvada a ação fiscal, nos termos da Constituição Federal de 1967, Art. 119, parágrafo 3.504 - Compete a justiça federal, em ambas as instâncias, o processo e o julgamento das causas fundadas em contrato de seguro marítimo. (REVOGADA)

-José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional positivo-Aricê Moacyr Amaral Santos, O estado de emergência, p. 32-LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 15ª ed. rev. atual. e ampl. Sariva: São Paulo, 2011-MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocencio Martires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, Saraiva, 2010.

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ITEM A: Estado-membro. Poder constituinte estadual: autonomia e limitações.

Obras consultadas:Resumo do Grupo do 25º CPRPedro Lenza. Direito Constitucional Esquematizado, 15ª Edição. Ed. Saraiva.Bernardo Gonçalves Fernandes. Curso de Direito Constitucional, 3ª Edição. Ed. Lumen Juris.Legislação básica.CF, art. 1º, caput; art. 18; arts. 25 a 28; art. 11 do ADCT.O assunto está basicamente localizado no Título III da Constituição da República (Da Organização do Estado), Capítulo III (Dos Estados Federados).

A CRFB/88 assegura aos Estados federados autonomia, a qual se consubstancia na capacidade destes de auto-organização, autolegislação, autogoverno e autoadministração (arts. 18, 25 e 28). Autonomia é o poder próprio dentro de um círculo traçado por outro, pressupõe ao mesmo tempo uma zona de autodeterminação e um conjunto de limitações e determinantes jurídicas extrínsecas (heterônomas).

Poder Constituinte Decorrente representa a possibilidade de os Estados-membros, como consequência da autonomia político-administrativa, auto-organizarem-se por meio de suas respectivas constituições estaduais. É um poder derivado, jurídico, subordinado, vinculado, complementar e condicionado.

Na CF/88, tem dois dispostivos que falam de forma direta ou indireta do poder constituinte decorrente. Um deles é o art. 11 do ADCT, e o outro é o art. 25 da CF. O primeiro é mais direito.Qual o nome do princípio que determina que a Constituição Estadual deve obedecer aos paradigmas traçados pela Constituição Federal? É o princípio da simetria, que pode ser deduzido destes dois artigos: 11 do ADCT e 25 da CF. Ele se aplica tanto à Constituição Estadual quanto à Lei Orgânica Municipal. Só que neste último caso, ela tem de observar uma dupla simetria: em relação à Constituição do Estado e à Constituição da República.A Constituição da República só fala em medida provisória para o Presidente. O STF disse que, se houver previsão na CE acerca da edição de medidas provisórias, poderá o governador editá-la. Quanto aos prefeitos, o STF nunca decidiu. Se houver previsão na Lei Orgânica do Município e a CE permita a edição de medidas provisórias para o governador, poderá também o prefeito fazê-lo. Se, contudo, a CE não permitir, não poderá o prefeito editar medidas provisórias, em virtude do desatendimento ao princípio da simetria.

Forma de expressão: Assembleia Constituinte Estadual (art. 11 do ADCT).

Limites (por restringirem a autonomia organizatória devem ser interpretados restritivamente):

1) princípios constitucionais sensíveis: art. 34, VII, da CF;

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;b) direitos da pessoa humana;c) autonomia municipal;d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.

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Se houver violação dos princípios sensíveis, o Procurador-Geral da República poderá ajuizar a ADI Interventiva, que será processada e julgada pelo Supremo Tribunal Federal. Essa ação representa um controle de constitucionalidade concreto e concentrado.Se o Estado viola um princípio sensível, o PGR poderá ajuizar a ADI Interventiva. Se o Supremo não der provimento à essa ação, o presidente não poderá decretar a intervenção. Mas se, caso contrário, o STF der provimento à ADI Interventiva, o Presidente poderá decretar a intervenção federal (único legitimado para tanto).Esse ato do Presidente da República é vinculado ou discricionário? A lei 1.079/50 (Crimes de Responsabilidade), no art. 12.3, tem a previsão específica. Em razão do que diz a lei, a doutrina majoritária considera que é uma to vinculado: ele está obrigado a decretar a intervenção, já que se não o fizer, estará praticando crime de responsabilidade.Essa decisão do STF, segundo entendimento do próprio Tribunal, não tem natureza jurídica, mas sim político-administrativa.

2) princípios constitucionais extensíveis: consubstanciam regras de organização da União, cuja aplicação se estende aos Estados (v. g. art. 93, V);

Extensíveis – não está agrupado, mas estão espalhados pelo corpo da Constituição.Há princípios extensíveis expressos e outros implícitos. São normas organizatórias da União, que se estendem aos Estados-membros. A Constituição prevê o regramento jurídico para um órgão, mas ela manda, expressa ou implicitamente, que esse regramento seja estendido aos Estados.Ex. de princípios constitucionais extensíveis expressos – art. 28 da CF/88:

Art. 28. A eleição do Governador e do Vice-Governador de Estado, para mandato de quatro anos, realizar-se-á no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato de seus antecessores, e a posse ocorrerá em primeiro de janeiro do ano subseqüente, observado, quanto ao mais, o disposto no art. 77. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de1997). A norma do art. 77 (que cuida da eleição do presidente) vai ser estendida para a eleição do governador, em razão do que determina o art. 28.

Ex 2. Art. 75: A Constituição manda que as normas organizatórias do Tribunal de Contas da União sejam estendidas aos Tribunais de Conta dos Estados e aos órgãos fiscalizatórios do Município. Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios. Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.

Esses princípios extensíveis são normas de observância obrigatória pelos Estados, na jurisprudência do STF. Para Novelino, todos os três tipos de princípios constitucionais seriam de observância obrigatória.

Princípios constitucionais extensíveis implícitos Ex: Princípios básicos do processo legislativo (art. 29 e seguintes) + Ex 2. – Requisitos para a criação de CPI (art. 58, § 3º). Art. 58, § 3º da CF - As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de

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fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

A constituição não manda estender essas normas aos Estados, mas o STF considerou que são de observância obrigatória pelos Estados-membros.Se determinadas matérias são de competência do presidente da república, aquelas mesmas matérias deverão ser atribuídas pela Constituição Estadual ao governador. As regras básicas do processo legislativo e os requisitos para a criação de CPIs devem ser iguais nas Constituições Estaduais.

3) princípios constitucionais estabelecidos: limitam a autonomia organizatória dos Estados, regras que revelam, previamente, a matéria de sua organização e as normas constitucionais de caráter vedatório, e princípios de organização política, social e econômica. Subdividem-se em:

3.1) limitações expressas – são consubstanciadas em dois tipos de regras: umas de natureza vedatória e outras de natureza mandatória. As primeiras proíbem explicitamente os Estados de adotar certos atos ou procedimentos (ex.: arts. 19, 150 e 152).

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público; II - recusar fé aos documentos públicos; III - criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;III - cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; IV - utilizar tributo com efeito de confisco; V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público; VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino.

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As segundas(mandatórias) consistem em disposições que determinam aos Estados a observância de princípios que limitam sua liberdade organizatória (p. ex.: arts. 29, 18, § 4º, 31, 37, 42, 98 e 125);

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Art. 18, § 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período determinado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei.(

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:

I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;

II - justiça de paz, remunerada, composta de cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, com mandato de quatro anos e competência para, na forma da lei, celebrar casamentos, verificar, de ofício ou em face de impugnação apresentada, o processo de habilitação e exercer atribuições conciliatórias, sem caráter jurisdicional, além de outras previstas na legislação.

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

§ 1º - A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

§ 2º - Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da legitimação para agir a um único órgão.

3.2) Limitações implícitas – também se subdividem em regras vedatórias e mandatórias (p. ex.: arts. 21, 22 e 30); Competência exclusiva e legislativa privativa da União + Competência dos Municípios.

3.3) Limitações decorrentes do sistema constitucional adotado – geradas pelos princípios que defluem do sistema constitucional adotado: a) do princípio federativo (da igualdade das unidades federadas); b) do mesmo princípio federativo (uma unidade não pode

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exercer coerção sobre outra) c) do Estado Democrático de Direito; d) do princípio democrático; e) dos princípios da ordem econômica e social.

1. Estabelecidos – José Afonso da Silva os divide em três grupos:

I. Expressos – são subdivididos em regras:

i. Mandatórias – vai mandar o Estado fazer alguma coisa. Ex. Art. 37 da CF determina que os Estados obedecem àqueles princípios elencados na norma.

ii. Vedatórias – O art. 19 da CF consubstancia um exemplo. Traz vedações expressas à União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

II. Implícitos – são aqueles que estabelecem competências para os outros entes e que, implicitamente, estabelecem limitações para os Estados. Ex. Se o art. 22 atribui matérias privativamente à União, o Estado está implicitamente proibido de tratar dessas matérias.

Ex 2. Art. 30 – trata das competências municipais, que não podem ser tratadas pelos Estados.

III. Decorrentes – são aqueles que defluem do sistema constitucional adotado. Ex. A nossa Constituição adota a forma federativa de Estado. Desse sistema, decorre o princípio de respeito recíproco entre as unidades da Federação. O respeito recíproco entre os Estados é decorrente do princípio federativo.

ADI 541: “Cabe à Constituição do Estado-membro estabelecer a competência dos seus Tribunais, observados os princípios da Constituição Federal.” Constitucionalidade de dispositivo da constituição estadual que fixa a competência do Tribunal de Justiça para processar e julgar, originariamente, nos crimes comuns ou de responsabilidade, o Procurador-Geral de Justiça.

STF: Constituições Estaduais não podem tornar os governadores imunes à persecução criminal por atos estranhos ao exercício de suas funções.

ADI 1.060: os Estados são obrigados a seguir as regras básicas do processo legislativo, notadamente as regras referentes a iniciativa reservada previstas na Constituição Federal.

ADI 276: se a Constituição Federal estabelece matérias de iniciativa exclusiva do Presidente da República, não podem elas serem versadas na Constituição Estadual.

ADI 676: não se pode subordinar a eficácia dos convênios celebradas por secretários de Estado ou de seus atos e contratos à aprovação da Assembleia Legislativa.

ADI 41: a Constituição do Estado não pode exigir autorização legislativa para que o Estado contraia dívida.

ADI-MC 1228: Constituição estadual não pode determinar a participação da Assembleia Legislativa na escolha do Procurador-Geral da Justiça.

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ADI 687: Constituição estadual não pode impor ao prefeito dever de comparecimento perante a Câmara de Vereadores.

ADI 978: Constituição estadual não pode prever imunidade a prisão cautelar a governadores.

ADI 1.722: Constituição estadual não pode prever revisão constitucional.

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ITEM B: Superior Tribunal de Justiça: organização e competência. Integridade normativa da ordem jurídica federal.

Obras consultadas:Resumo do Grupo do 25º CPRPedro Lenza. Direito Constitucional Esquematizado, 15ª Edição. Ed. Saraiva.Bernardo Gonçalves Fernandes. Curso de Direito Constitucional, 3ª Edição. Ed. Lumen Juris.Legislação básica.Arts. 104 e 105 da CF.O STJ possui base constitucional na Seção III (Do Superior Tribunal de Justiça), do Capítulo III (Do Poder Judiciário), do Título IV (Da Organização dos Poderes) da CF. É o órgão de cúpula da Justiça Comum, ou seja, da Justiça Estadual e da Justiça Federal (não-especializada).

Trata-se de criação da CRFB/88, concebida com o propósito de superar a propalada “crise do Recurso Extraordinário” (nas palavras do Min. Moreira Alves), já que o STF, antes da Carta de Outubro, cumulava as competências de uniformização da interpretação da Constituição de 1967/69 e do direito federal ordinário. Assim, ao STJ coube ser o guardião do ordenamento jurídico federal.

Para José Afonso da Silva, “o que dá característica própria ao STJ são as suas atribuições de controle da inteireza positiva, da autoridade e da uniformidade de interpretação da lei federal”. Gilmar Mendes ressalta que compõe o ethos do STJ o julgamento de REsp, “tendo em vista a função que lhe foi confiada como órgão de uniformização da interpretação do direito federal ordinário”.

O STJ compõe-se de 33 ministros, número mínimo que poderá ser elevado por lei. Seus Ministros são nomeados pelo Presidente da República, após sabatina pelo Senado Federal e aprovação por maioria absoluta (art. 104, parágrafo único, da CF), igualando-se ao quorum da sabatina para os Ministros do STF. Requisitos para o cargo: ser brasileiro nato ou naturalizado, ter mais de 35 e menos de 65 anos, ter notável saber jurídico e reputação ilibada. Composição dos Ministros: 1/3 de juízes dos Tribunais Regionais Federais; 1/3 de desembargadores dos Tribunais de Justiça; 1/6 de advogados e 1/6 de membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, alternadamente.

Suas competências podem ser divididas em três espécies: originária (art. 105, I), recursal ordinária (art. 105, II) e recursal especial (art. 105, III). Apenas no exercício desta última competência é que o STJ atuará como tribunal de sobreposição (com as suas respectivas consequências, tais como a exigência de prequestionamento, impossibilidade de revolvimento do contexto fático-probatório e sobrestamento de recursos repetitivos – Lei n.º 11.672/08).

Outras competências foram outorgadas ao STJ pela EC n.º 45/04, como o julgamento do incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal (art. 109, § 5º), a ser suscitado pelo PGR, nas “causas relativas a direitos humanos federalizados” (José Adércio, “O Conselho Nacional de Justiça e a independência do Judiciário”, p. 97); a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão do exequatur; e a preservação da competência para o julgamento de recurso especial quando a decisão recorrida julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal. Previu-se também o funcionamento, junto ao STJ, do Conselho da Justiça Federal, cabendo-lhe a supervisão administrativa e orçamentária da JF de 1º e 2º graus, com poderes correcionais e decisões de caráter vinculante.

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O tema da “integridade normativa da ordem jurídica federal” relaciona-se à missão constitucional do STJ de assegurar a aplicação uniforme do direito federal. As dificuldades causadas por uma federação tão diversificada como a brasileira impõem a fixação de um órgão unificador da exegese da legislação federal, sob pena de ruptura do conteúdo normativo do pacto federativo. Representa importante fator de estabilidade (isonomia política entre as unidades federadas).

A manutenção da integridade normativa da ordem jurídica federal pode dar-se em dois âmbitos: externo e interno. O externo serve-se dos recursos ordinário/especial e da reclamação constitucional como instrumentos. No âmbito interno do STJ, ganham realce os embargos de divergência, quando os órgãos fracionários (Turmas e Seções) do STJ vierem a firmar interpretações dissonantes sobre uma mesma questão legal. Neste caso, caberá ao Órgão colegiado imediatamente superior uniformizar, na seara interna, a exegese da ordem jurídica federal, mantendo sua integridade.

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ITEM C: Defesa do Estado e das instituições democráticas. Estado de defesa. Estado de sítio. Papel das Forças Armadas.

Obras consultadas:Resumo do Grupo do 25º CPRPedro Lenza. Direito Constitucional Esquematizado, 15ª Edição. Ed. Saraiva.Bernardo Gonçalves Fernandes. Curso de Direito Constitucional, 3ª Edição. Ed. Lumen Juris.Legislação básica.Arts. 136 a 143 da CF.Em seu Título V, a CRFB/88 trata de instrumentos (medidas excepcionais ou estados de exceção) para o restabelecimento da ordem em momentos de anormalidades constitucionais, instituindo o sistema constitucional de crises, composto pelo estado de defesa e pelo estado de sítio (Capítulo I). Trata-se ainda da defesa do país por meio das forças armadas (Capítulo II) e da segurança pública (Capítulo III). Crise aqui se refere ao desequilíbrio entre os grupos de poder, extrapolando os limites constitucionais.

Segundo José Afonso da Silva, o sistema constitucional das crises fixa “normas que visam à estabilização e à defesa da Constituição contra processos violentos de mudança ou perturbação da ordem constitucional, mas também à defesa do Estado quando a situação crítica derive de guerra externa. Então, a legalidade normal é substituída por uma legalidade extraordinária, que define e rege o estado de exceção”. Os mecanismos de restabelecimento da normalidade devem respeitar o princípio da necessidade, sob pena de configurar arbítrio e verdadeiro golpe de estado, bem como o princípio da temporariedade, para não se instalar uma ditadura.

O Presidente da República (PR) pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional (manifestações meramente opinativas), decretar estado de defesa, em duas hipóteses, para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, (i) a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou (ii) atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. O ato deverá ser submetido ao Congresso em 24h (em caso de recesso, será convocado em 5 dias). O Congresso, então, decidirá por maioria absoluta, em 10 dias, e continuará funcionando durante a medida. Isto é, haverá aprovação posterior à decretação. Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa, sob pena de crime de responsabilidade do PR (que pode resultar em impeachment). A duração do estado de defesa não será superior a 30 dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões. A prorrogação deverá ser submetida ao Congresso. Não resolvida a situação, é possível a utilização do remédio mais gravoso (estado de sítio). O estado de defesa não tem abrangência nacional, e, sim, restrita a logradouros especificados pelo decreto. Poderão haver medidas restritivas (não supressivas) do direito de (i) reunião; (ii) sigilo de correspondência; (iii) sigilo de comunicação telegráfica e telefônica. Poderá haver, ainda, ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade, bem como prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida e que será por este comunicada imediatamente ao juiz, vedada a incomunicabilidade do preso.

O estado de sítio é mais grave e pode ser decretado nos casos de (i) comoção grave de repercussão nacional, (ii) ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa e (iii) declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira. A decretação do estado de sítio dependerá de autorização prévia do Congresso. Após ouvir os Conselhos da República e de Defesa Nacional, que emitirão posição não vinculante, o PR enviará solicitação fundamentada ao Congresso, para manifestar-se pela

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maioria absoluta de seus membros. O decreto deverá trazer a duração do estado de sítio (exceto em caso de guerra), as medidas necessárias à sua execução e as garantias constitucionais que deverão estar suspensas. Após a publicação do decreto, o PR designará o executor das medidas e as áreas abrangidas (é possível abrangência nacional). O prazo do estado de sítio ante ineficácia do estado de defesa será de, no máximo, 30 dias, prorrogáveis quantas vezes forem necessárias. Toda prorrogação dependerá de autorização do Congresso. Medidas coercitivas: (a) obrigação de permanência em localidade determinada; (b) detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns; (c) restrições (não supressões) relativas à inviolabilidade de correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei; (d) suspensão de liberdade de reunião; (e) busca e apreensão em domicílio; (f) intervenção nas empresas de serviços públicos; (g) requisição de bens. Apenas no estado de sítio as imunidades parlamentares podem ser relativamente suspensas, observados os requisitos constitucionais. A difusão dos pronunciamentos de parlamentares efetuados em suas Casas Legislativas, desde que liberada pela respectiva Mesa, não sofrerá restrições pelo Executivo.

Ambos os estados de exceção submeter-se-ão a controle políticoprévio, concomitante e sucessivo (Congresso) e controle jurisdicionalconcomitante e sucessivo. Durante o estado de exceção, a CF não poderá ser emendada. Após a medida, o PR prestará contas, respondendo por eventuais abusos.

A Marinha, a Aeronáutica e o Exército constituem as Forças Armadas, instituições nacionais, regulares e de caráter permanente, destinadas à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

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9.a. Ordem social: comunicação social. Direitos políticos: esfera pública e discursividade.

Obras consultadas:

Curso de Direito Constitucional, 5ª ed, Gilmar Ferreira Mendes e outros;

Direito Constitucional, 5ª ed, Leo Van Holthe.

Curso de Direito Constitucional, Dirley da Cunha Jr.

Noções Gerais:

Enquanto o artigo 5º da Carta Magna resguardou as liberdades democráticas do indivíduo de comunicar-se (CF, art 5º, IX), informa-se (CF, art. 5º, XIV) e manifestar seu pensamento (CF, art. 5º, IV), a Ordem Social tratou de proteger os meios pelos quais essas liberdade são difundidas, principalmente os meios ou veículos de comunicação de massas. (Leo Van Holthe).

Tópico ligado ao princípio do pluralismo. Segundo Mendes, “liberdade como dimensão ontológica e, portanto, como valor inerente à dignidade da pessoa humana, a qual precisa abrir-se para o mundo como condição indispensável para o pleno desenvolvimento de sua personalidade”.

Conceito Comunicação Social

Segundo Uadi Lammêgo Bulos (op cit Leo Van Holthe), comunicação, em sentido lato, é toda forma de exteriorização do pensamento escrito ou oral. Em sentido estrito, porém, é o ato de emitir ideias, veiculadas em jornais, revistas, rádios, televisões, dentre tantos instrumentos técnicos que propiciam a manifestação do pensamento, quer através da criação e expressão, quer por intermédio da informação. O qualificativo social designa o meio pelo qual a comunicação se veicula, isto é, através dos meios de informação de massa, atingindo pessoas indeterminadas e em número ilimitado.

Abrangência

A CF garante o direito à manifestação do pensamento, de informação, de criação e de expressão, sob qualquer forma, processo ou veículo de comunicação (art. 220). Para tanto, proíbe se atrapalhe a liberdade de informação jornalística, veda a censura e torna a publicação e veículo impresso de comunicação independente de autorização de autoridade pública. Contudo, como não há direitos absolutos (ponderação), há limites à liberdade de comunicação social, sendo vedado o anonimato; garantido o direito de resposta, bem como a indenização pelo dano material, moral, à imagem, intimidade, vida privada, honra) – art. 5º, incisos IV, V, X, XIII e XIV.

Publicidade e Propaganda

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Nem todo o conteúdo da comunicação social é alvo da liberdade de expressão (publicidade).A propaganda tem conteúdo ideológico, religioso, político-partidário, e “enquanto [...] afasta-se do fim lucrativo, a publicidade objetiva estimular uma necessidade existente – ou criar uma que ainda não existe – com o inequívoco objetivo do [...] lucro” (Fernandes:2004, p. 43).

A CF limita a publicidade do tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias (art. 220, § 4º), denominadas impropriamente de propaganda comercial (leia-se publicidade).

Direito de Antena

Expressão que varia de significado segundo o país. Na Espanha e Alemanha traduz o direito das empresas de comunicação se instalarem e funcionarem plenamente. Em Portugal, designa o direito de resposta. No Brasil, refere a possibilidade de se captar ou transmitir informações por meio de ondas mecânicas ou eletromagnéticas.

ADPF nº 130-STF (Lei de Imprensa)

“A Constituição Federal se posicionou diante de bens jurídicos de personalidade para, de imediato, fixar a precedência das liberdades de pensamento e de expressão lato sensu as quais não poderiam sofrer antecipado controle nem mesmo por força do 'Direito-lei', inclusive de emendas constitucionais, sendo reforçadamente protegidas se exercitadas como atividade profissional ou habitualmente jornalística e como atuação de qualquer dos órgãos de comunicação social ou de imprensa”.

Proibição à Censura x Intervenção Judicial

A CF vedou qualquer tipo de censura política, ideológica e artística, mas não impede a atividade legítima do Poder Judiciário de restringir a liberdade de imprensa para preservar outros valores constitucionais (como a honra e a intimidade), de acordo com juízo de ponderação.

“Os direitos individuais, conquanto previstos na Constituição, não podem ser considerados ilimitados e absolutos, em face da natural restrição resultante do ‘princípio da convivência das liberdades’, pelo quê não se permite que qualquer deles seja exercido de modo danoso à ordem pública e às liberdades alheias. Fala-se, hoje, não mais em direitos individuais, mas em direitos do homem inserido na sociedade, de tal modo que não é mais exclusivamente com relação ao indivíduo, mas com enfoque de sua inserção na sociedade, que se justificam, no Estado Social de Direito, tanto os direitos como as suas limitações” - STF- Informativo 614.

Faixa Etária e Regulação de Diversões, Programas e Espetáculos (Art. 220, § 3º, I e II)

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Limites à liberdade de comunicação, cabendo à lei federal regular diversões e espetáculos públicos informando faixas etárias e horários não recomendados à crianças e adolescentes, bem como garantindo meios legais para que a pessoa e as famílias possam se defender de programas de rádio e de TV que contrariem o disposto no art. 221, bem como da publicidade nociva à saúde e ao meio ambiente.

Contudo, não esquecer: “a liberdade de programação como uma das dimensões da liberdade de expressão em sentido amplo, essencial para construir e consolidar uma esfera de discurso público qualificada” e “O sistema de classificação indicativa seria, então, ponto de equilíbrio tênue adotado pela Constituição para compatibilizar os dois postulados, a fim de velar pela integridade das crianças e dos adolescentes sem deixar de lado a preocupação com a garantia da liberdade de expressão” (STF – Informativo 650 – ADI 2404 – pendente de julgamento).

Autonomia Constitucional do Direito de Resposta (CF, ART. 5º, V).

Segundo STF, Ministro Celso de Mello, o direito de resposta possui autonomia constitucional, sendo que seu exercício independe de regulação legislativa. Constitui prerrogativa fundamental, especialmente se analisada na perspectiva de uma sociedade que valoriza o conceito de “livre mercado de idéias”. Direito à informação correta, precisa e exata. “Se é certo que o ordenamento constitucional brasileiro ampara a liberdade de expressão, protegendo-a contra indevidas interferências do Estado ou contra injustas agressões emanadas de particulares, não é menos exato que essa modalidade de direito fundamental – que vincula não só o Poder Público como, também, os próprios particulares – encontra, no direito de resposta (e na relevante função instrumental que ele desempenha), um poderoso fator de neutralização de excessos lesivos decorrentes da liberdade de comunicação, além de representar um significativo poder jurídico deferido a qualquer interessado 'para se defender de qualquer notícia ou opinião inverídica, ofensiva ou prejudicial (...)'” (Informativo 614).

Exigência de diploma de jornalista x Inconstitucionalidade – RE 511961

Os próprios meios de comunicação é que devem estabelecer os mecanismos de controle quanto à contratação, avaliação, desempenho, conduta ética dos profissionais do jornalismo, podendo as empresas de comunicação estipular critérios de contratação, como a especialidade de determinado campo do conhecimento, e, ainda, a própria exigência de curso superior em jornalismo. Esse tipo de orientação regulatória, ao permitir a autopoiesis do sistema de comunicação social, oferece uma maior proteção das liberdades de expressão. Proteção das liberdades de profissão, de expressão e de informação na ordem constitucional brasileira.

Liberdade x Propriedade de Empresa Jornalística

Não há democracia em uma economia planificada (sem mercado e autonomia privada), e só há liberdade de expressão em uma democracia, esta última depende necessariamente da garantia de liberdade de empresa jornalística, tutelada pela liberdade de associação. Porém, a própria CF limita esta liberdade ao dispor que a propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora ou audiovisual compete privativamente aos

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brasileiros natos, ou aos naturalizados há mais de dez anos ou às pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras com “pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão [...] deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos” (art. 222, § 1º, da CF).

9.b. Norma jurídica e enunciado normativo: identidade versus dualidade. Normas mais do que perfeitas, perfeitas, menos do que perfeitas e imperfeitas. Normas cogentes e normas dispositivas.

Obras Consultadas:

Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, 20ª ed, Maria Helena Diniz;

Lições Preliminares de Direito, 27ª ed, Miguel Reale;

Notas sobre os direitos fundamentais, João Cláudio Gonçalves Leal (http://www.estig.ipbeja.pt/~ac_direito/1Notassobreosdireitosfundamentais.pdf).

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Norma jurídica e enunciado normativo

“Enunciado normativo corresponde a uma proposição jurídica no papel, a uma expressão linguística, a um discurso prescritivo que se extrai de um ou mais dispositivos. Enunciado normativo é o texto ainda por interpretar. Já a norma é o produto da incidência do enunciado normativo sobre os fatos da causa, fruto da interação entre texto e realidade. Da aplicação do enunciado normativo à situação da vida objeto de apreciação é que surge a norma” (Roberto Barroso: 2009, p. 194).

Nas duas situações, encontraremos o suporte físico que se refere algum objeto do mundo (significado) do qual extratamos um conceito ou juízo (significação) [...] a norma é um juízo hipotético-condicional (se ocorrer o fato X, então deve ser a prestação Y)” (Barros Carvalho:2007, p. 8-9). Segundo a concepção clássica, “a norma funciona como esquema de interpretação [...] Com o termo ‘norma’ se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira [...]” (Kelsen:2000, p. 4-6).

“A norma jurídica não se confunde com o enunciado normativo. Os enunciados se constituem como suporte físico das normas, que são as significações deles extraídas. Nada impede que um único enunciado sirva de suporte físico de mais de uma norma, da mesma forma que nada impede que uma única norma seja construída a partir de diversos enunciados” (Leal).

Realidade dúplice das normas

Hodiernamente, a norma é vista sob uma realidade dúplice: “Alexy afirma que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, ao passo que as regras são normas que podem ser cumpridas ou não, uma vez que, se uma regra é valida, há de ser feito exatamente o que ela exige [...] Os princípios apresentam razões que podem ser superadas por razões opostas. A realização dos princípios depende das possibilidades jurídicas e fáticas, que são condicionadas pelos princípios opostos, e assim exigem consideração dos pesos dos princípios em colisão segundo as circunstâncias do caso concreto” (Marinoni: 2010, p. 49-50). “Em suma, os princípios são mandados de otimização que se caracterizam pelo fato de poderem ser cumpridos proporcionalmente às condições reais e jurídicas existentes” (Edilsom Farias:2004, p. 48).

Classificação das leis

Quanto à imperatividade:

(a) são cogentes as normas que excluem “qualquer arbítrio individual. São aplicadas ainda que pessoas eventualmente beneficiadas não desejassem delas valer-se” (Venosa:2010, p. 13). Não podem ser derrogadas pela vontade das partes.

(b) as normas dispositivas podem ser permissivas, quando delegam aos beneficiados o regramento integral da questão por convenção particular; ou supletivas em relação a eventual omissão das partes, caso em que estas normas assumirão caráter de

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obrigatoriedade, como que reproduzindo uma vontade presumida em razão da omissão. Obs.: (1) a distinção por vezes depende da objetividade jurídica e (2) uma das características do fenômeno da publicização do direito civil refere-se à imperatividade.

Quanto à sanção ou autorizamento (Diniz) ou violação (Reale) :

(a) são mais queperfeitas as normas cuja violação determina duas consequências: a nulidade do ato e a aplicação de uma restrição ou pena ao infrator (Miguel Reale). Ex: 1521 do CC.;

(b) são perfeitassão aquelas que fulminam de nulidade o ato, mas não implicam qualquer outra sanção de ordem pessoal (Reale). Ex: Menor de celebra contrato;

(c) menos que perfeitasas que autorizam no caso de serem violadas, a aplicação de pena ao violador, , mas não a nulidade ou anulação do ato (Diniz). Ex: Casamento com inobservância das causas suspensivas;

(d) normas imperfeitassão aquelas cuja violação não acarreta qualquer consequência jurídica. São normas 'sui generis' (Diniz). Obrigações naturais. Ex: Inadimplemento de dívida de jogo (art. 814 do CC).

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9.c. Segurança Pública. Comunitarismo. História dos direitos fundamentais no Brasil

Obrasconsultadas

Curso de Direito Constitucional, 5ª ed, Gilmar Ferreira Mendes e outros;

Direito Constitucional, 5ª ed, Leo Van Holthe;

Curso de Direito Constitucional, Dirley da Cunha Jr.;

Comunitarismo ou Liberalismo? Gisela Gonçalves, Universidade da Beira Interior – Portugal – 1998 (http://www.bocc.ubi.pt/pag/goncalves-gisela-COMUNITARISMO-LIBERALISMO.pdf)

Segurança Pública – Marco Constitucional

A Constituição de 1988 destinou capítulo específico à segurança pública (art. 144), em que a trata como “dever do Estado” e como “direito e responsabilidade de todos”, que visa a “preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”.

Por essa razão, as políticas de segurança pública devem atender ao princípio republicano e democrático, sempre respeitando os direitos fundamentais.

Repartição das Polícias

É implementada por meio da polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpo de bombeiros.

O texto constitucional de 1988 faz referência as seguintes modalidades, nas respectivas funções: a) a polícia ostensiva: prevenir e de reprimir de forma imediata a prática de delitos; b) a polícia de investigação: realiza investigação criminal; c) polícia judiciária: executar as diligências solicitadas pelos órgãos judiciais; d) polícia de fronteiras, marítima, aeroportuária: controle do fluxo de pessoas e de bens.

Conforme jurisprudência do STF, a enumeração constitucional dos órgãos policiais é taxativa. ADIN 236-8/RJ.

As polícias militares e o corpos de bombeiros militares são forças auxiliares e reserva do Exército, sendo subordinados, juntamente com a polícias civis, aos Governadores dos

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Estados, do DF e dos Territórios, aos quais compete a direção administrativa, financeira e funcional da polícia.

Guardas municipais

Não são órgãos policiais. Possuem a função de guarda patrimonial, destinadas à proteção dos bens, serviços e instalações dos Municípios sem a possibilidade de exercício das funções de polícia ostensiva ou judiciária. Além dessa prerrogativa, os municípios podem atuar na segurança pública por meio de restrições administrativas: horário de fechamento de bares e restaurantes ou espaços de venda de bebidas alcoólicas, por exemplo.

Limitação das Forças Armadas

Segundo Alexandre de Moraes, a multiplicidade dos órgãos de defesa da segurança pública, pela nova Constituição, teve dupla finalidade: atendimento aos reclamos sociais e a redução da possibilidade de intervenção das Forças Armadas na segurança interna.

Pela interpretação sistemática dos arts. 142 e 144 e outros dispositivos, conclui-se que a atuação, pelas Forças Armadas, nas políticas segurança está destinada a seguintes circunstancias excepcionais: a) estado de defesa ( art. 136); b) estado de sítio (art. 137); c) intervenção federal(art. 34, III); d) a realização de investigações criminais no âmbito de inquérito policial militar (artigos 7º e 8º, b, do Código de Processo Penal Militar (CPPM); e) operações de policiamento ostensivo no interesse nacional, em casos de visitas de chefes de estados estrangeiros(no art. 5º do Decreto nº 3.897/2001) e; f) ações de policiamento ostensivo por solicitação do Governador de Estado, quando os meios no Estado se mostrarem indisponíveis, inexistentes ou insuficientes.(LC nº 97/1999, art. 15, §2).

Participação popular

Por ser “direito e responsabilidade de todos”, a sociedade pode participar na formulação e no controle da gestão das políticas de segurança. É o que acontece, por exemplo, nos Conselhos de Segurança Pública.

O tema no Supremo:

“O direito a segurança é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucionalmente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o poder discricionário do Poder Executivo.” (RE 559.646-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 7-6-2011, Segunda Turma, DJE de 24-6-2011).

Comunitarismo

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Noções gerais:

O tema se insere em um debate filosófico- político entre “liberais” e “comunitaristas”. Embora tal debate tenha surgido nos anos 80, a questão está enraizada no confronto entre o formalismo kantiano (liberais) e o romantismo hegeliano (comunitarista). Segundo Gisela Gonçalves, “os primeiros partilham a ideia de liberdade de consciência, respeito pelos direitos do indivíduo e desconfiança frente à ameaça de um Estado paternalista; os comunitaristas comungam da desconfiança pela moral abstracta, têm simpatia pela ética das virtudes e uma concepção política com muito espaço para a história das tradições”. Contudo, ambos reconhecem a importância da articulação entre os conceitos de justo e bem.

Justo e bem

Os Liberais defendem a prioridade do "justo sobre o bem" (posição deontológica) e os Comunitaristas afirmam a prioridade do "bem sobre o justo" (posição teleológica). Para os liberais, do ponto de vista moral a "prioridade do justo sobre o bem" significa que os princípios de justiça limitam as concepções de bem que os indivíduos podem escolher e colocar em prática, porque quando os valores escolhidos entram em conflito com os princípios de justiça, são estes que se devem respeitar. Do ponto de vista epistemológico a 'prioridade do justo sobre o bem' denota que os princípios de justiça não podem ser escolhidos com base numa concepção específica do bem, mas que pelo contrário, o facto de escolher princípios de justiça específicos é uma condição para poder fazer uma escolha entre diferentes concepções de bem (Gisela G.). Essas são as base do procedimentalismo de Habermas e que influenciaram John Rawls.

Nesse contexto, a base crítica comunitarista ao liberalismo é a noção de justiça distributiva, priorizando o bem e não os direitos como fazem os liberais. E, como para os comunitaristas, o bem é determinado a partir de sua especificidade histórica e cultural, surge o conceito de comunidade e o seu vínculo com a noção de participação política.

John Rawls e Teoria da Justiça

O livro de John Rawls, Uma teoria da Justiça (A Theory of Justice, 1971), é a origem do debate liberal- comunitário e marco do debate sobre as relações entre ética, direito e política. Rawls sustenta que a sua teoria pretende fixar as condições gerais de perseguição do bem, mas não se ocupa da avaliação de conceitos particulares de bem nem do uso que cada indivíduo pode fazer dos seus recursos legítimos (é anti-perfeccionista). Nesse ponto, é criticada pelos comunitaristas porque possui caráter “generalista dos seus princípios de justiça” e porque trata “de uma teoria da justiça que não pode honrar as suas próprias pretensões porque está ligada a uma concepção implícita de bem”.

Indivíduo e Comunidade

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Os liberais são representados por John Rawls e proclamam a primazia do indivíduo, enquanto os comunitaristas, representados por Charles Taylor e Michael Walzer, defendem a importância das identidades sociais. Sustentam a configuração de valores compartilhados por uma comunidade política, o que justificaria um envolvimento por parte do cidadão, além do momento de participação nas eleições.

“Para os Comunitaristas, um Estado Liberal - simples instrumento de garantia dos direitos, desligado de qualquer forma de conforto pessoal ou comunitário - não é viável socialmente e é destrutor de identidades individuais e colectivas. Os indivíduos são atomizados, apercebem-se dos concidadãos como seres que lhes fazem obstáculo ou que estão ao serviço dos seus projectos privados” (Gisela G.).

Segundo Ximenes, a Constituição de 1988 possui caráter comunitarista, na medida em que ela expressa os valores e princípios que norteiam a sociedade brasileira. Incorporou-se esta influência comunitarista no próprio preâmbulo da CF/88: os “valores supremos” de uma sociedade “fraterna, plaralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social: direitos sociais e individuais, liberdade, segurança, bem-estar, desenvolvimento, a igualdade e justiça.

Ao contrário do que sustentado por Rawls, a premissa comunitarista referente ao sujeito é diversa. Não se reconhece a pessoa como livre e igual perante as outras, mas se admite o direito à diferença e da reivindicação política de bens em nome dessa diferença.

Reivindica-se uma liberdade participativa do cidadão, da qual trata de um patriotismo de tradição humanista e cívica, que não é imposta, externamente, como coerção, mas autoimposta, no exercício da diversidade mantida por ideais motivadores, os quais resultam na participação.

Nesse âmbito, surgiu o “movimento comunitarista” brasileiro, denominada de “ comunitarismo jurídico. A relação entre eles se dá, no qual a participação do cidadão pode se verificar em três premissas: na abertura constitucional (comunidade de intérpretes), na valorização do texto constitucional e na noção de Constituição Dirigente, preocupada com as liberdades positivas.

O constitucionalismo comunitarista compreende a Constituição como uma estrutura normativa que envolve um conjunto de valores – há uma conexão de sentido entre valores compartilhados por uma determinada comunidade política e a ordenação jurídica fundamental e suprema representada pela constituição, cujo sentido jurídico só pode ser apreciado em relação à totalidade da vida coletiva. Portanto, fica claro a tentativa de criar vínculos “comunitários” entre os indivíduos.

História dos direitos fundamentais no Brasil

Noções Gerais:

A evolução dos direitos fundamentais no Brasil seguiu a mesma linha da história mundial (“Ondas” de reconhecimento de direitos e perspectivas de gerações). Contudo, possui momentos de vanguarda na positivação dos direitos fundamentais e períodos de

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retrocesso. Pode ser melhor compreendida por meio do estudo das constituições brasileiras anteriores a 1988, que refletem o momento político que norteava o país ao tempo de suas edições.

Constituição do Império do Brasil de 1824: Superação do Absolutismo. Independência política e unidade nacional. Poder Moderador. Comprometida com os direitos e garantias fundamentais, como as verdadeiras constituições daquela época (Mendes).A Primeira Constituição do Brasil e do no mundo a positivar os direitos do homem 1 . Ocorreu com base no constitucionalismo clássico ou histórico, movimento de ideias em torno do art. 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. “Toda sociedade na qual a garantia dos direitos não for assegurada, nem a separação dos poderes determinada, não tem Constituição. Por essa razão, a Carta assegurou a inviolabilidade dos direitos civis e políticos a partir da liberdade, da segurança individual e da propriedade”.

Constituição de 1891: Superação do regime monárquico. É a primeira republicana. Também enumerou direitos civis e políticos, porém, o fez por meio do título Declaração de Direitos e de forma não exaustiva. Inspirada na Carta americana, ampliou os Direitos Fundamentais, dentre os quais estavam a liberdade religiosa; a liberdade de associação sem armas; garantia da ampla defesa aos acusados; abolição das penas de galés, banimento judicial e morte e; criação do habeas corpus. No entanto, não havia uma política que efetivasse a proteção desses direitos.

Constituição de 1934: Queda da primeira república. Deposto o Governo e entregue à Junta Governativa e, posteriormente, à Getúlio Vargas. Dissolução do parlamento. Revolução Constitucionalista. Nova Constituinte posteriormente à pressão política. Inspirada na Constituição de Weimar, promulgando legislação social e do trabalho, porém, com traços da Constituição Fascista da Polônia de 1935. Além de direitos e garantias individuais, deu início à era das Constituições sociais, consagrando um Estado preocupado com o bem-estar social (Dirley). Positivação de direitos sociais, especialmente trabalhistas. Tentativa de conciliar democracia liberal com socialismo.

Constituição de 1937: Inspirada na Constituição da Polônia (apelidada da “A polaca). Outorgada após o golpe de Estado, de influência fascista. Houve o desaparecimento da democracia e principais direitos fundamentais, como liberdade de imprensa e o direito à livre associação. O art. 123 declarava que os direitos e garantias tinham por "limite o bem público, as necessidades de defesa, do bem estar, da paz e da ordem coletiva, bem como as exigências da segurança da Nação e do Estado em nome dela constituído e organizado nesta Constituição". Assim, todos os direitos fundamentais e garantias constitucionais estavam subordinados aos interesses do Estado, à ordem coletiva e a segurança da Nação, o que legitimava as ações contrárias à dignidade da pessoa humana.

Constituição de 1946: Surge com o movimento de redemocratização. Assegura direitos e garantias individuais, além de diretrizes gerais da ordem econômica e educacional. Avança ao delinear, além dos direitos políticos, o direitos sociais. Adoção do pluralismo partidário.

Constituição de 1967: Produto da revolução de 64. Época da ditadura Militar, em que houve suspensão e supressão de direitos. Alguns parlamentares cassados e outros com

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 09.

direitos suspensos pelos atos institucionais. Preocupou-se muito com a segurança nacional. Ampliação dos poderes do Presidente da República. Após a EC nº. 01/69, manteve-se o regime de exceção e, dentro outras medidas, restringiu imunidades dos parlamentares.

Constituição de 1988 (“Constituição Cidadã): Fruto de em um processo de redemocratização, significou a ruptura com o regime militar (1964 a 1985), havendo "redefinição do Estado brasileiro". Consagração de uma sociedade plural e aberta. Delineou no Título II os Direitos e as Garantias Fundamentais, neles incluídos os direitos e deveres individuais e coletivos, os direitos sociais, os direitos da nacionalidade, os direitos políticos e os partidos políticos. Segundo Dirley, a constitucionalização dos direitos fundamentais dota esses direitos de reforçada proteção jurídica, sendo-lhes reservado um regime jurídico especial, até mesmo contra as demais normas constitucionais. Essa proteção reforçada se evidencia por meio das cláusulas pétreas, da designação de princípios constitucionais sensíveis e da eficácia imediata de direitos fundamentais. Além disso, o catálogo desses direitos é aberto e não exclui outros previstos em tratados internacionais de que o Brasil seja parte. Ademais, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os direitos e garantias fundamentais não estão restritos ao Título II da CF, estando espalhados por todo o texto constitucional, como é de se constatar pela previsão no artigo 225 ao Meio Ambiente equilibrado. Outro exemplo refere aos princípios da ordem tributária, que constituem verdadeiro limite ao poder de tributar do Estado e constituem garantia individual contra o arbítrio estatal.

1Essa informação estava no Resumo do 25º, não consegui confirmar.

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GRUPO I – CONSTITUCIONAL DE METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 10. Antonio Henrique de Amorim Cadete.

ITEM A: Interpretação constitucional. Vigência das regras hermenêuticas tradicionais nesse domínio. Existência de critérios específicos nesse domínio. Neoconstitucionalismo: definição e características. Mutações constitucionais e seus limites. Interpretação constitucional, liberdade de configuração do legislador, jurisdição constitucional e controle concreto de constitucionalidade.

Obras consultadas: citadas durante o texto, através de notas de rodapé.Legislação básica. Impertinente.

INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL.8 (Ver ponto 9.b.: distinção entre norma jurídica e enunciado normativo). HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL OU NOVA HERMENÊUTICA. É uma nova forma de entender e prever a interpretação do direito para além da hermenêutica clássica, criada na época da primazia do Código Civil e em cuja sociedade era mais homogênea. A nova hermenêutica é consequência da jurisprudência do Tribunal Constitucional Alemão, no sistema concentrado europeu. Um dos precursores da nova hermenêutica constitucional é o Konrad Hesse. No Brasil, Canotilho, Paulo Bonavides, Barroso. FUNDAMENTOS DA NECESSIDADE DA CRIAÇÃO DA NOVA HERMENÊUTICA. As normas constitucionais têm especificidades e características peculiares que a diferenciam das leis infraconstitucionais, necessitando de um corpo teórico próprio. Especificidades da norma constitucional: (a)superioridade hierárquica: i) é o resultado da rigidez constitucional (cláusula de proteção e de maior estabilidade, oriunda do procedimento mais dificultoso para sua alteração; e as cláusulas pétreas) e ii) é a norma que estabelece o fundamento de validade das demais normas (norma normarum de Kelsen), não existindo fonte ou fenômeno normativo autônomo para além dos autorizados pela CF; (b)natureza da linguagem: é distinta da linguagem infraconstitucional, porque a CF tem uma linguagem mais aberta, mais principiológica, mais abstrata e pouco densificada; (c)conteúdo específico: a CF teria um conjunto de normas específicas, chamadas normas programáticas, que traçam planos de ação do Estado; (d)caráter político: transformaria em Direito os temas políticos (Luhman: acoplamento entre o plano político-social e o plano jurídico).

SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO: É um princípio resultado de um conjunto subprincípios que lhe dá substância: (a) além de ser a norma formalmente superior, fixando o padrão de validade formal das demais normas; (b) a CF é o local a partir do qual são fixados as possibilidades de sentido das demais normas, é uma fonte de validação semântica do ordenamento jurídico. Assim, além de intervir na validade jurídica das demais normas (derivada da hierarquia superior da constituição), intervém na validade do sentido da norma: só há sentido jurídico válido conforme a constituição; (c) expansionismo constitucional: eficácia horizontal dos DF – drittwirkung – (a CF expande sua força para além da relação estado-particular, incidindo sobre as relações particular-particular) e bloco de constitucionalidade (no caso do Brasil, são os TIDH aprovados pelo rito do art. 5º, §3º da CF. Na França, onde teve sua origem, o bloco de constitucionalidade é mais radical, já que o Conselho Constitucional Francês reconheceu que podem existir normas constitucionais fora do código constitucional, inclusive através de leis ordinárias, passando a existir normas constitucionais fora do código da constituição) ; (d)

8 Aula de “Teoria Constitucional”, do Curso Alcance, preparatório para a 2ª fase do 26º concurso do MPF, professor Rodolfo Viana.

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reordenação dos ramos parciais do direito através de uma “filtragem constitucional”. É preciso passar o ordenamento jurídico (normas infraconstitucionais) pelo filtro constitucional, adaptando-o aos novos institutos constitucionais. É interpretar a legislação infraconstitucional à luz da CF; (e)Atributo interpretativo último do STF: o STF tem uma interpretação monopolizadora, entendendo que lhe compete a última palavra sobre a constituição (MS 26.603/DF, Pleno, julgamento em 04/10/2007), já que a Jurisdição Constitucional tem por finalidade preservar a Supremacia da Constituição (ver o final desse ponto, mais especificamente jurisdição constitucional).

VIGÊNCIA DAS REGRAS HERMENÊUTICAS TRADICIONAIS NESSE DOMÍNIO. EXISTÊNCIA DE CRITÉRIOS ESPECÍFICOS NESSE DOMÍNIO9. A interpretação das normas constitucionais é um conjunto de métodos e princípios desenvolvidos com base em critérios ou premissas diferentes, mas reciprocamente complementares, confirmando o caráter unitário da atividade interpretativa. MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL: (a)método jurídico ou hermenêutico-clássico: preconiza que a Constituição seja interpretada com os mesmo recursos interpretativos das demais leis (regras hermenêuticas tradicionais): interpretação sistemática, histórica, lógica e gramatical (Ver ponto 21.b.: Critérios de interpretação da norma jurídica). O método hermenêutico-clássico tem aplicabilidade às normas constitucionais de alto grau de densidade normativa, com estrutura normativa assemelhada às leis, já que ele não foi concebido para os dispositivos constitucionais com alto grau de abstração que estipulam parâmetros e procedimentos para a ação política; (b)método da tópica ou tópico-problemático: toma a Constituição como um conjunto aberto de regras e princípios, dos quais o aplicador deve escolher aquele mais adequado para a promoção de uma solução justa ao problema que se analisa. Parte-se de um problema concreto para a norma, atribuindo-se à interpretação um caráter prático na busca da solução dos problemas concretizados; (c)método hermenêutico-concretizador: deferentemente do método tópico-problemático, que parte do caso concreto para a norma, o método hermenêutico-concretizador parte da Constituição para o problema. Na atividade interpretativa o intérprete vale-se de suas pré-compreensões, situadas numa dada situação histórica e realidade social, para obter o sentido da norma, além de atuar como mediador (tendo como pano de fundo essa situação histórica e a realidade social) entre o texto e a situação em que ele se aplica (contexto). Essa constante relação entre o texto e o contexto com a mediação criadora do intérprete transforma a interpretação em um movimento de ir e vir (círculo hermenêutico); (d)método científico-espiritual: a Constituição é um sistema cultural e de valores de um povo, cabendo à interpretação aproximar-se desses valores subjacentes à Constituição. Tais valores, entretanto, estão sujeitos a flutuações, tornando a interpretação da Constituição fundamentalmente elástica e flexível, fazendo com que a força de decisões fundamentais submeta-se às vicissitudes da realidade cambiante; (e) método jurídico-estruturante: a norma não se confunde com o seu texto, mas tem a sua estrutura composta também pelo trecho da realidade social em que incide, sendo esse elemento indispensável para a extração do significado da norma. Não é o teor literal da norma (seu texto) que efetivamente regulamenta um caso concreto, mas sim o órgão legislativo, o órgão governamental, o

9Inocêncio Martins Coelho. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 4ª Edição, 2009, Capitulo 1, pág. 119-144. Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 1, pág. 103-111.

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funcionário da administração pública, os juízes e todos aqueles que elaboram, decidem e fundamentam a decisão reguladora do caso concreto. PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. Não há hierarquia entre os princípios de interpretação constitucional, devendo se aplicados conjuntamente: (a)princípio da unidade da Constituição: as normas constitucionais devem ser vistas não como normas isoladas, mas como preceitos integrados num sistema unitário de regras e princípios, que é instituído na e pela própria Constituição. Não se pode separar uma norma constitucional do conjunto em que ela se integra. Eros Grau: “não se interpreta o direito em tiras, aos pedaços”. O intérprete deve encontrar soluções que harmonizem as tensões existentes entre as várias normas constitucionais; (b)princípio da concordância prática ou da harmonização: o aplicador das normas constitucionais, em se deparando com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos (normalmente direitos fundamentais), deve adotar a solução que otimize a realização de todos eles, mas, ao mesmo tempo, não acarrete a negação de nenhum. Essa avaliação nunca é feita a priori, mas apenas no momento da aplicação do texto, quando se pode coordenar, ponderar e, ao final, conciliar os bens e valores constitucionais em conflito. A concordância prática há de ser encontrada em cada caso concreto, segundo os parâmetros oferecidos pelo princípio da proporcionalidade, buscando sempre que a medida de sacrifício de um dos bens em colisão, para a solução justa e proporcional do caso concreto, não exceda o estritamente necessário; (c)princípio da correção funcional: tendo a Constituição instituído um sistema coerente e previamente ponderado de repartição de competências, não se pode através da interpretação de algum preceito, deturpar esse sistema de repartição de funções entre órgãos e pessoas designados pela Constituição (entre as esferas da Federação ou entre os Poderes constituídos); (d)princípio da eficácia integradora: ao construir soluções para os problemas jurídico-constitucionais, o intérprete deve dar preferência àqueles critérios ou pontos de vista que favoreçam a integração social e a unidade política, já que toda Constituição necessita produzir e manter a coesão sociopolítica, enquanto pré-requisito ou condição de viabilidade de qualquer sistema político; (e) princípio da máxima efetividade: a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que lhe confira maior eficácia, maior aptidão para produzir os efeitos que lhe são próprios. Embora se trate de um princípio aplicável a toda norma constitucional, tem espaço de maior realce no campo das normas programáticas e dos direitos fundamentais (art. 5º, §1º da CF); (f) princípio da força normativa da Constituição: toda norma constitucional necessita e um mínimo de eficácia. Deve-se dar prevalência aos pontos de vista que tornem a norma constitucional mais afeita aos condicionamentos históricos do momento, garantindo-lhe interesse atual e conferindo-lhes maior eficácia; (g)princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade: Proporcionalidade: juízo de adequação, necessidade e de proporcionalidade em sentido estrito. O STF não distingue a razoabilidade da proporcionalidade, embora a razoabilidade esteja mais próxima da doutrina anglo-saxã e a proporcionalidade mais próxima da doutrina alemã. Esse princípio precede e condiciona a positivação jurídica, inclusive a de nível constitucional; serve de interpretação para todo o ordenamento jurídico. Em essência, consubstancia uma pauta de natureza axiológica que emana diretamente das ideias de justiça, equidade, bem sendo, prudência, moderação, proibição de excesso, direito justo e valores afins. Sua obediência, no âmbito do direito constitucional, implica restrição à liberdade de conformação do legislador e, por estar intimamente relacionado com os direitos fundamentais e suas restrições, tornou-se

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consubstancial à própria ideia de Estado de Direito; (h)princípio da interpretação conforme a Constituição: não se deve pressupor que o legislador haja querido dispor em sentido contrário à Constituição (presunção de constitucionalidade), de modo que, se uma norma infraconstitucional, pelas peculiaridades de sua textura semântica, admite mais de um significado, sendo um deles harmônico com a Constituição e os demais incompatíveis, deve-se entender que aquele é o sentido próprio da regra em exame. Ademais, modernamente se tem dito que esse princípio consubstancia um mandato de otimização do querer constitucional, significando que, entre diversas exegeses igualmente compatíveis com a Constituição de uma mesma norma, deve-se escolher a que mais se orienta para a Constituição ou a que melhor corresponde às decisões do constituinte. Destarte, A INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO POSSUI, EVIDENTEMENTE, LIMITES: 1) não se pode forçar o significado aceitável das palavras dispostas no texto, 2) nem se pode desnaturar o sentido objetivo que inequivocamente o legislador perseguiu (Ver ponto 21.b.: Limites da interpretação, em especial o sentido literal possível). O âmbito de aplicação desse princípio é, frequentemente, o da interpretação das leis, mas também pode ser aplicado à interpretação de Emendas Constitucionais (também passíveis de controle de constitucionalidade), já que é um instrumento situado no âmbito do controle de constitucionalidade, e não apenas uma simples regra de interpretação. (Ver o final desse ponto, mais especificamente, jurisdição constitucional). Por fim, é imprescindível conferir trechos do julgado do STF transcrito na nota de rodapé10.NEOCONSTITUCIONALISMO: DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS 11 . Não se trata de um modelo consolidado. O termo é usado na Espanha e Itália. Duas vertentes: a) modelo constitucional (conjunto de mecanismos normativos e institucionais) – é o constitucionalismo democrático pós-guerra, com a expansão da jurisdição constitucional; e b) teoria, ideologia e método do direito. Neoconstitucionalismo: b.1) teórico: limita-se a descrever os resultados da constitucionalização. Caracterizado por uma constituição ‘invasora’, catálogo de direitos fundamentais, onipresença de princípios e regras, peculiaridades na interpretação/aplicação das suas normas. Afasta a estatalidade, o legicentrismo (a constituição passa a ser norma jurídica vinculante) e o formalismo interpretativo. Há duas vertentes: mantém o método positivista com objeto parcialmente modificado ou propõe uma mudança radical de método (pós-posivismos); b.2) ideológico: põe em 1º plano a garantia dos direitos fundamentais, em detrimento do objetivo da limitação do poder estatal (traço do constitucionalismo ‘clássico’), porque o poder estatal não é visto mais com temor, mas como aliado e necessário à

10REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE [...]. 1) O princípio da interpretação conforme a Constituição(Verfassungskonforme Auslegung) é princípio que se situa no âmbito do controle da constitucionalidade, e não apenas simples regra de interpretação. A aplicação desse princípio sofre, porém, restrições, uma vez que, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei em tese, o S.T.F. – em sua função de Corte Constitucional – atua como legislador negativo, mas não tem o poder de agir como legislador positivo, para criar norma jurídica diversa da instituída pelo Poder Legislativo. Por isso, se a única interpretação possível para compatibilizar a norma com a Constituição contrariar o sentido inequívoco que o poder legislativo lhe pretendeu dar, não se pode aplicar o princípio da interpretação conforme a Constituição, que implicaria, em verdade, criação de norma jurídica, o que e privativo do legislador positivo . 2) Em face da natureza e das restrições da interpretação conforme a Constituição, tem-se que, ainda quando ela seja aplicável, o é dentro do âmbito da representação de inconstitucionalidade, não havendo que converter-se, para isso, essa representação em representação de interpretação, por serem instrumentos que tem finalidade diversa, procedimento diferente e eficácia distinta. 3) No caso, não se pode aplicar a interpretação conforme a constituição por não se coadunar essa com a finalidade inequivocamente colimada pelo legislador, expressa literalmente no dispositivo em causa, e que dele ressalta pelos elementos da interpretação lógica. [...] (STF, Rp 1417/DF, Pleno, Relator Min. Moreira Alves, julgamento em 09/12/1987, publicação DJ de 15/04/1988 ) (cf. a partir da página 33 do inteiro teor).11 Reprodução do conteúdo do Resumo do 25º Concurso.

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implementação dos direitos fundamentais. Não se limita a descrever, valora positivamente e defende sua ampliação; b.3) Metodológico: especialmente em Alexy e Dworkin, conexão necessária entre direito e moral (leitura moral da constituição). Entronização de valores na interpretação jurídica com o reconhecimento da normatividade dos princípios, reabilitação da razão prática e da argumentação jurídica (Comanducci, 2005).MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS E SEUS LIMITES. A MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL é exercício de um poder constituinte difuso e reflete o entendimento de que a norma não se confunde com o enunciado normativo. A interpretação jurídica é um processo dialético de criação/concretização da norma jurídica, envolvendo: (a)o enunciado normativo (signos linguísticos são um fenômeno social e, portanto, dotados significados multívocos – polissêmicos – e variáveis no espaço/tempo: “moldura” kelseniana), (b)o intérprete (que, por estar inserido num contexto histórico-axiológico, fará uso de valores, “pré-juízos” ou “pré-compreensões” e de sua “memória cultural”, os quais também são variáveis no espaço/tempo) e (c) o caso concreto12. Desse modo, as mutações constitucionais são alterações semânticas de preceitos da Constituição sem alteração de seu texto, em decorrência de modificações no prisma fático-axiológico (ou histórico-social) subjacente à norma constitucional e no qual se concretiza sua aplicação. As mutações constitucionais são decorrentes da conjugação: (a) da peculiaridade da linguagem constitucional (polissêmica e indeterminada); (b) com os fatores externos (de ordem econômica, social e cultural) que a Constituição pluralista intenta regular e que, dialeticamente, interagem com ela, produzindo leituras sempre renovadas das mensagens enviadas pelo constituinte13. Tais alterações semânticas de preceitos da Constituição sem alteração de seu texto (mutações constitucionais) podem resultar: (a) da modificação da hierarquia dos valores dominantes ou pelo surgimento de novas valorações; (b) da superveniência de fatos que modifiquem os dados da incidência normativa; (c) da intercorrência de outras normas que, sem revogar uma regra em vigor, interferem no seu campo de aplicação14. LIMITES ÀS MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS.(1) Limite literal possível (Ver ponto 21.b.: Limites da interpretação, em especial o sentido literal possível), no sentido de que a nova interpretação há de encontrar apoio no teor das palavras empregadas pelo constituinte; (2)não pode violar princípios estruturantes da Lei Maior, (3) tampouco as cláusulas pétreas15.INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL, LIBERDADE DE CONFIGURAÇÃO DO LEGISLADOR, JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E CONTROLE CONCRETO DE CONSTITUCIONALIDADE. A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL (controle judicial de constitucionalidade), cuja finalidade é preservar a Supremacia da Constituição, confere ao STF uma interpretação monopolizadora no sentido de lhe competir a última palavra sobre a interpretação da constituição e, via de consequência, sobre o processo informal de mutação constitucional. Nesse sentido, conferir trechos de importante julgado do STF transcrito na nota de rodapé16. LIBERDADE DE

12Nicolao Dino de Castro e Costa Neto. Proteção jurídica do meio ambiente: I – Florestas, 2003, pág. 81-110.13Inocêncio Martins Coelho. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 4ª Edição, 2009, Capitulo 1, pág. 151-155.14Miguel Reale. Fiolosofia do Direito, 1982, 9ª Edição, pág. 563-564.15Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 1, pág. 151.16EMENTA. Caput. [...] O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E A RESPONSABILIDADE POLÍTICO-JURÍDICA QUE LHE INCUMBE NO PROCESSO DE VALORIZAÇÃO DA FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO – O MONOPÓLIO DA “ÚLTIMA PALAVRA”, PELA SUPREMA CORTE, EM MATÉRIA DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. [...] Corpus. [...] A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO E O MONOPÓLIO DA “ÚLTIMA PALAVRA”, PELO SUPREMO TRIBUNAL

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CONFIGURAÇÃO DO LEGISLADOR. A liberdade de configuração do legislador não é ilimitada, mas pode ser maior ou menor, a depender das disposições constitucionais, dos imperativos de sistematicidade do ordenamento, das tradições de um país, dos valores dominantes, etc. A Constituição estabelece parâmetros, no plano formal e material, aos quais deve a legislação se adequar, e, quando ultrapassados, implicarão inconstitucionalidade formal ou material. No plano formal, é estruturado o poder legislativo e feita a divisão de competências entre os diversos entes federativos. A observância das regras de competência e dos procedimentos estabelecidos pela constituição - em especial o processo legislativo - é um requisito formal para a validade das leis. No plano material, a Constituição estabelece certas regras e princípios que a legislação comum não pode alterar – ou ao menos não pode suprimir – como os direitos fundamentais, que estabelecem limites ao conteúdo possível da legislação, variáveis de acordo com o âmbito de proteção de cada um desses direitos, assim como dos bens e objetos por eles protegidos e garantidos (Ver item 6.c. Direitos e garantias fundamentais. Concepções. Críticas e justificativas. Aspectos. Dimensões. Eficácia vertical e horizontal. Limites e conflitos). Ao contrário das regras, os princípios têm uma dimensão que Dworkin chama de peso: quando dois ou mais princípios incidem sobre a mesma questão, é preciso buscar uma solução que não elimine os princípios em jogo, mas que os harmonize. Ao editar Leis, ao legislador é reconhecida uma grande liberdade para determinar o peso relativo que cada princípio deve ter em um caso concreto. Canotilho chama de liberdade de conformação do legislador a esse campo de liberdade da atividade legislativa. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. O princípio da proporcionalidade, tanto na vertente da proibição do excesso, quanto na vertente da proibição da proteção deficiente (ou insuficiente), constitui importante limite constitucional à liberdade de conformação do legislador, possibilitando, inclusive, o controle judicial da constitucionalidade das leis (jurisdição constitucional). Impende destacar que a omissão legislativa (inconstitucionalidade por omissão) não se confunde com o princípio da proibição da proteção deficiente: “se o Estado nada faz para atingir um dado objetivo para o qual deva envidar esforços, não parece que esteja a ferir o princípio da proibição da insuficiência, mas sim um dever de atuação decorrente de dever de legislar ou de qualquer outro dever de proteção”. “A conceituação de uma conduta estatal como insuficiente, porque ela não se revela suficiente para uma proteção adequada e eficaz, nada mais é, do ponto de vista metodológico, do que considerar referida conduta como desproporcional em sentido estrito”17. Quanto ao princípio da proporcionalidade (em ambos os aspectos) e a liberdade de conformação do legislador, conferir

FEDERAL, EM MATÉRIA DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL. 1. O exercício da jurisdição constitucional, que tem por objetivo preservar a supremacia da Constituição, põe em evidência a dimensão essencialmente política em que se projeta a atividade institucional do Supremo Tribunal Federal, pois, no processo de indagação constitucional, assenta-se a magna prerrogativa de decidir, em última análise, sobre a própria substância do poder . 2. No poder de interpretar a Lei Fundamental, reside a prerrogativa extraordinária de (re)formulá-la, eis que a interpretação judicial acha-se compreendida entre os processos informais de mutação constitucional, a significar, portanto, que “A Constituição está em elaboração permanente nos Tribunais incumbidos de aplicá-la”. Doutrina. Precedentes. 3. A interpretação constitucional derivada das decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal - a quem se atribuiu a função eminente de “guarda da Constituição” (CF, art. 102, “caput”) – assume papel de fundamental importância na organização institucional do Estado brasileiro, a justificar o reconhecimento de que o modelo político-jurídico vigente em nosso País conferiu, à Suprema Corte, a singular prerrogativa de dispor do monopólio da última palavra em tema de exegese das normas inscritas no texto da Lei Fundamental. (STF, MS 26603/DF, Pleno, Relator Min. Celso de Mello, julgamento em 04/10/2007, publicação DJe 241 de 19/12/2008 ). (grifos diversos do original – conferir a partir da página 139 do inteiro teor do acórdão).17Gilmar Ferreira Mendes. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 3, pág. 258.

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o recente julgado do STF transcrito na íntegra na nota de rodapé devido à sua suma importância18. CONTROLE CONCRETO DE CONSTITUCIONALIDADE. A característica fundamental do controle concreto ou incidental de normas parece ser o seu desenvolvimento inicial no curso de um processo, no qual a questão constitucional configura ‘antecedente lógico e necessário à declaração judicial que há de versar sobre a existência ou inexistência de relação jurídica ’19. (Ver item 22.b. Controle Difuso de Constitucionalidade. História. Direito comparado. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade).

18 HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DESMUNICIADA. (A)TIPICIDADE DA CONDUTA. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PENAIS. MANDATOS CONSTITUCIONAIS DE CRIMINALIZAÇÃO E MODELO EXIGENTE DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS EM MATÉRIA PENAL. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO EM FACE DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. LEGITIMIDADE DA CRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE ARMA DESMUNICIADA. ORDEM DENEGADA. 1. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS PENAIS. 1.1. Mandatos Constitucionais de Criminalização: A Constituição de 1988 contém um significativo elenco de normas que, em princípio, não outorgam direitos, mas que, antes, determinam a criminalização de condutas (CF, art. 5º, XLI, XLII, XLIII, XLIV; art. 7º, X; art. 227, § 4º). Em todas essas normas é possível identificar um mandato de criminalização expresso, tendo em vista os bens e valores envolvidos. Os direitos fundamentais não podem ser considerados apenas como proibições de intervenção (Eingriffsverbote), expressando também um postulado de proteção (Schutzgebote). Pode-se dizer que os direitos fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso (Übermassverbote), como também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela (Untermassverbote). Os mandatos constitucionais de criminalização, portanto, impõem ao legislador, para o seu devido cumprimento, o dever de observância do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso e como proibição de proteção insuficiente. 1.2. Modelo exigente de controle de constitucionalidade das leis em matéria penal, baseado em níveis de intensidade: Podem ser distinguidos 3 (três) níveis ou graus de intensidade do controle de constitucionalidade de leis penais, consoante as diretrizes elaboradas pela doutrina e jurisprudência constitucional alemã: a) controle de evidência (Evidenzkontrolle); b) controle de sustentabilidade ou justificabilidade (Vertretbarkeitskontrolle); c) controle material de intensidade (intensivierteninhaltlichenKontrolle). O Tribunal deve sempre levar em conta que a Constituição confere ao legislador amplas margens de ação para eleger os bens jurídicos penais e avaliar as medidas adequadas e necessárias para a efetiva proteção desses bens. Porém, uma vez que se ateste que as medidas legislativas adotadas transbordam os limites impostos pela Constituição – o que poderá ser verificado com base no princípio da proporcionalidade como proibição de excesso (Übermassverbot) e como proibição de proteção deficiente (Untermassverbot) –, deverá o Tribunal exercer um rígido controle sobre a atividade legislativa, declarando a inconstitucionalidade de leis penais transgressoras de princípios constitucionais. 2. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO. PORTE DE ARMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALDIADE. A Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) tipifica o porte de arma como crime de perigo abstrato. De acordo com a lei, constituem crimes as meras condutas de possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo. Nessa espécie de delito, o legislador penal não toma como pressuposto da criminalização a lesão ou o perigo de lesão concreta a determinado bem jurídico. Baseado em dados empíricos, o legislador seleciona grupos ou classes de ações que geralmente levam consigo o

indesejado perigo ao bem jurídico. A criação de crimes de perigo abstrato não representa, por si só, comportamento inconstitucional por parte do legislador penal. A tipificação de condutas que geram perigo em abstrato, muitas vezes, acaba sendo a melhor alternativa ou a medida mais eficaz para a proteção de bens jurídico-penais supraindividuais ou de caráter coletivo, como, por exemplo, o meio ambiente, a saúde etc. Portanto, pode o legislador, dentro de suas amplas margens de avaliação e de decisão, definir quais as medidas mais adequadas e necessárias para a efetiva proteção de determinado bem jurídico , o que lhe permite escolher espécies de tipificação próprias de um direito penal preventivo. Apenas a atividade legislativa que, nessa hipótese, transborde os limites da proporcionalidade, poderá ser tachada de inconstitucional. 3. LEGITIMIDADE DA CRIMINALIZAÇÃO DO PORTE DE ARMA. Há, no contexto empírico legitimador da veiculação da norma, aparente lesividade da conduta, porquanto se tutela a segurança pública (art. 6º e 144, CF) e indiretamente a vida, a liberdade, a integridade física e psíquica do indivíduo etc. Há inequívoco interesse público e social na proscrição da conduta. É que a arma de fogo, diferentemente de outros objetos e artefatos (faca, vidro etc.) tem, inerente à sua natureza, a característica da lesividade.A danosidade é intrínseca ao objeto. A questão, portanto, de possíveis injustiças pontuais, de absoluta ausência de significado lesivo deve ser aferida concretamente e não em linha diretiva de ilegitimidade normativa. 4. ORDEM DENEGADA. (STF, HC 104410/RS, 2ª Turma, Relator Min. Gilmar Mendes, julgamento em 06/03/2012, publicação DJe 062 de 27/03/2012) (conferir a partir da página 12 do inteiro teor do acórdão).19Gilmar Ferreira Mendes. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 10, pág. 1131.

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ITEM B: Elementos da relação jurídica: titular do direito, sujeito obrigado, direito subjetivo, dever jurídico e vínculo jurídico. Ficções legais e presunções legais20.

RELAÇÃO JURÍDICA: CONCEITO: vínculo abstrato, segundo o qual, por força da imputação normativa, uma pessoa chamada de sujeito ativo, tem o direito subjetivo de exigir de outra, denominada sujeito passivo, o cumprimento de certa prestação, sendo que esta última tem o dever jurídico de adimpli-la.Para Reale é espécie de relação social e tem 2 requisitos: a) vínculo entre 2 pessoas; b) que esse vínculo decorra de uma hipótese normativa.O direito prescreve condutas, estabelecendo relações entre os sujeitos, em virtude da verificação de certos acontecimentos. Jhering: a relação jurídica está para o direito como o alfabeto está para a palavra. ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA: 1) sujeito ativo; 2) direito subjetivo, 3) sujeito passivo, 4) dever jurídico; 5) vínculo jurídico; 6) objeto. TITULAR DO DIREITO: SUJEITO ATIVO: titular ou beneficiário principal da relação:SUJEITO OBRIGADO: SUJEITO PASSIVO: devedor da prestação principalDIREITO SUBJETIVO: possibilidade jurídica de que é titular o sujeito ativo de exigir o cumprimento da prestação. TEORIAS explicativas: 1) Teoria Individualista (Rousseau); 2) Teoria da Vontade (Savigny, Windscheid); 3) Teoria do Interesse (Jhering); 4) Teoria Eclética ou Mista (Jellinek).DEVER JURÍDICO: obrigatoriedade de que é investido o sujeito passivo de adimplir a prestação.VÍNCULO JURÍDICO: vínculo de atributividade capaz de ligar uma pessoa a outra, de maneira recíproca. OBJETO: razão de ser do vínculo constituído, sobre o que recai a relação.PRESUNÇÃO LEGAL: suposição ou hipótese de conjuntura estabelecida pela lei. Presume uma ocorrência um abstrato. Estabelece como um fato verdadeiro algo que provavelmente é. Lembrar: presunção de constitucionalidade das lei. FICCÇÃO LEGAL: a lei estabelece como verdadeiro um fato que provavelmente é falso. Direito cria sua própria realidade. Ex: aeronave como bem imóvel para fins de hipoteca, horário de verão.

20 Reprodução do resumo do 25º Concurso.

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ITEM C: Municípios. Regiões metropolitanas. Intervenção federal nos Estados e intervenção estadual nos Municípios.

Obras consultadas: citadas durante o texto, através de notas de rodapé.Legislação básica.Região Metropolitana. Art. 25, §3º CF/1988. LCF 14/1973. Intervenção: Arts. 34 a 36 da CF/1988. Lei 8.038/1990, arts. 19 a 22 (regulamenta o art. 36, II da CF/1988). Lei 12.562/2011 (regulamenta o art. 36, III da CF/1988, a ADI interventiva).

MUNICÍPIOS. REGIÕES METROPOLITANAS. Até a promulgação da CF/1988, a competência para instituir regiões metropolitanas era exclusiva da União, mediante da edição de Lei Complementar Federal (LCF), de acordo com a previsão na CF/196721 e na EC 01/196922. Com fundamento nessa competência, a União editou a LC Federal n.º 14/1973, instituindo as regiões metropolitanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza. A partir da CF/1988, a instituição de regiões metropolitanas passou a depender de Lei Complementar Estadual (LCE)23. Ademais, a CF/1988, a par das regiões metropolitanas, previu a possibilidade de criação de aglomerações urbanas e de microrregiões, acrescendo o requisito de os municípios serem limítrofes. As regiões metropolitanas não constituem ente federativo, sendo apenas uma “área de serviços especiais”, de natureza meramente administrativa24. Não pode invadir a competência/autonomia de entes federados, mormente os Municípios. Pode atingir vários Municípios limítrofes, de um ou mais Estados da Federação, devendo, neste último caso, ser organizada por norma das entidades interessadas. Sua administração pode ser feita por autarquia, estatal, órgão do Estado (Secretarias) ou colegiado de representantes dos entes federados (Comissão ou Conselho). OBS.: As regiões metropolitanas, criadas por LCE, não se confundem com as regiões administrativas previstas no art. 43 da CF/1988, criadas por LCF, a exemplo da SUDAM, SUDENE, SUDECO e SUFRAMA, cujo escopo é o fomento ao desenvolvimento dessas regiões e redução das desigualdades regionais, compreendendo, cada uma, um mesmo complexo geográfico e social. CASUÍSTICA: (1)STF, ADI 2809/RS. Objeto: LCE/RS n.º 11.539, de 01/11/2000, que incluiu o Município de Arroio dos Ratos na Região Metropolitana de Porto Alegre. CONCLUSÃO DO STF: A LCE não é de iniciativa exclusiva do Governador do Estado (art. 61, §1º, II “e” da CF/1988), sendo constitucional a LCE cuja iniciativa foi deflagrada pela Assembleia Legislativa25. (2)STF, ADI 1841/RJ. Objeto: Art. 357, parágrafo único da CE/RJ: “a participação de qualquer município em uma região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião dependerá de prévia aprovação pela respectiva Câmara Municipal”. CONCLUSÃO DO STF: É inconstitucional a

21CF/1967. Art. 157. §10. A União, mediante lei complementar, poderá estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por Municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa, integrem a mesma comunidade sócio-econômica, visando à realização de serviços de interesse comum.22 CF/1967 - EC 01/1969: Art. 164. A União, mediante lei complementar, poderá para a realização de serviços comuns, estabelecer regiões metropolitanas, constituídas por municípios que, independentemente de sua vinculação administrativa, façam parte da mesma comunidade sócio-econômica.23CF/1988. Art. 25. §3º. Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.24 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2009, pág.84.25“Não se trata, portanto, de estruturação e funcionamento de um órgão do Estado apenas, hierarquicamente subordinado ao Governador, mas de organismo composto de diversos entes federados que, em posição de igualdade, somam esforços em prol do bem comum, abrindo mão cada qual de parte de suas respectivas autonomias administrativas em benefício da harmonia do conjunto de todos eles” (STF, ADI 2809/RS, Plenário, Relator Min. Maurício Corrêa, julgamento em 25/09/2003, publicação DJ de 30/04/2004).

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previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 (LCE e Municípios limítrofes) para a instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia aprovação pela Câmara Municipal interessada26. (3)STF, ADI 796/ES. Objeto: Art. 216, §1º da CE/ES: “a criação de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas dependerá de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações interessadas”. CONCLUSÃO DO STF: É inconstitucional a previsão em CE de requisito não previsto na CF/1988 (LCE e Municípios limítrofes) para a instituição de região metropolitana, tal como a necessidade de prévia consulta plebiscitária às populações interessadas27.INTERVENÇÃO FEDERAL NOS ESTADOS. A intervenção federalsomente pode recair sobre Estado-membro, Distrito Federal e Municípios integrantes de território federal. Não cabe intervenção federal em Municípios integrantes de Estado-membro, mesmo que a medida seja pedida por desrespeito, por parte do Município, de decisões de tribunais federais28, já que, “relativamente a esses entes municipais, a única pessoa política ativamente legitimada a neles intervir é o Estado-membro” (STF, IF 590-QO/CE, Plenário, Rel. Min. Celso de Mello, publicação DJ de 09/10/1998). TAXATIVIDADE. A intervenção federal nos Estados e no DF possui hipótesestaxativamente previstas no art.34 da CF, que devem ser interpretadas restritivamente, por tratarem de situação excepcional. Por sua vez, as hipóteses de intervenção federal nos Municípios integrantes de Território estão taxativamente previstas no art. 35, I a IV da CF/1988, ressaltando a inaplicabilidade da 1ª parte do inciso IV, já que o Território não possui CE que indiquem os aludidos princípios a serem observados. COMPETÊNCIA: Somente o Presidente da República é competente para decretar a intervenção federal29 (art. 84, X da CF/1988), sendo necessária, nas intervenções espontâneas, a oitiva do Conselho da República (art. 90, I) e do Conselho de Defesa Nacional (art. 91, §1º, II), cujos pareceres não são vinculantes. DISCRICIONARIEDADE E CONTROLE POLÍTICO: Tanto na espécie na (1) intervenção espontânea como na (2) provocada por solicitação , a decisão do Presidente da República de decretar a intervenção é discricionária, e, caso decretada, submeter-se-á ao crivo do controle político, que será exercido em 24 horas pelo Congresso Nacional e, caso rejeite o Decreto interventivo, há vinculação do Presidente que deverá cessá-lo imediatamente, sob pena de cometer crime de responsabilidade. As demais modalidades de intervenção passam, antes de se concretizarem, pelo crivo judicial, sendo que a (3) provocada por requisição depende do julgamento pelo STF, STJ ou TSE de “pedido de intervenção federal” e a (4) provocada por “ representação interventiva ” (ADI interventiva) depende do julgamento pelo STF. Nesses casos, ao Presidente da República cabe apenas a formalização da decretação da intervenção, estando vinculado à decisão judicial, motivo pelo qual o controle políticoé dispensado, devendo a intervenção limitar-se a suspender a execução do ato impugnado, se isso for suficiente para

26 STF, ADI 1841/RJ, Plenário, Relator Min. Carlos Velloso, julgamento em 01/08/2002, publicação DJ de 20/09/2002.27 “Se cabe ter como saudável sempre a participação do povo no processo político, qual garantia de se vitalizarem as instituições democráticas, não menos certo é que, não se tratando, na espécie, de criar entes políticos federados novos, mas tão-só de dispor sobre providências de interesse administrativo regional, o instrumento de representação popular, assim como consignado na Constituição, por via do processo da lei complementar aprovada pela maioria absoluta da Assembleia Legislativas, é bastante, qual quis o constituinte originário, não sendo, assim, de dar guarida a regras locais criados, no ponto, de procedimento complexo não desejado pela Constituição Federal” (STF, ADI 796/ES, Plenário, Relator Min. Néri da Silveira, julgamento em 02/02/1998, publicação DJ de 17/12/1999).28Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 8, pág. 837.29Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 8, pág. 837.

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restabelecer a normalidade constitucional (art. 36, §3º da CF/1988). Se a medida de suspensão da execução do ato não for suficiente, decretar-se-á intervenção federal em maior amplitude e, neste caso, incide o controle político do Congresso Nacional. ESPÉCIES.1) ESPONTÂNEA: o Presidente da República age de ofício (art. 34, I, II, III e V da CF/1988); 2) PROVOCADA POR SOLICITAÇÃO: quando houver coação ou impedimento ao livre exercício do Poder Legislativo ou do Poder Executivo estadual ou do DF (art. 34, IV c/c art. 36, I, 1ª parte): depende de solicitação do respectivo Poder ao Presidente da República; 3)PROVOCADA POR REQUISIÇÃO: (i) quando houver coação ou impedimento ao livre exercício do Poder Judiciário estadual (art. 34, IV c/c art. 36, I, 2ª parte): depende de requisição do STF (atuando de ofício ou mediante pedido de intervenção federal formulado pelo Presidente do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Federal coacto ou impedido30) ao Presidente da República; (ii) quando houver desobediência a ordem ou decisão judicial (art. 34, VI, 2ª parte, c/c art. 36, II): depende de requisição do STF, STJ ou TSE (conforme a matéria discutida) ao Presidente da República. CASUÍSTICA (quanto à desobediência a ordem ou decisão judicial): (A) A decisão judicial não precisa ter transitado em julgado31; (B) o STF será competente para apreciar o pedido de intervenção e, caso procedente, requisitá-la ao Presidente da República, se a causa em que a decisão ou ordem judicial desrespeitada fundamentar-se em normas constitucionais; caso a decisão tenha se fundado em normas infraconstitucionais, a competência será do STJ, tribunal para o qual converge a Justiça Comum estadual e federal32,33; (C) Se a ordem ou decisão descumprida for da Justiça do Trabalho ou da Justiça Militar da União, a competência para apreciar o pedido de intervenção, e, caso procedente, proceder à requisição ao Presidente da República, é do o STF, independentemente de a fundamentação da decisão ser constitucional ou infraconstitucional, já que a Justiça do Trabalho e a Justiça Militar da União não convergem ao STJ, mas ao STF34; (D)Legitimidade para formular o pedido de intervenção federal em razão de descumprimento de decisão ou ordem judicial: (i) à parte interessada só é possível formular pedido de intervenção federal diretamente ao STJ ou ao STF se, conforme o caso, pretender prover a execução de decisão, respectivamente, do STJ35 ou do STF36, ainda que tenham sido proferidas em grau recursal; (ii) nos demais casos (descumprimento de decisão ou ordem judicial oriunda de TJ, TRF, TRT, etc.), a parte interessada deve formular um requerimento fundamentado ao Presidente do Tribunal de onde se originou a ordem ou decisão, a quem incumbirá, se assim entender a corte especial ou o órgão especial, formular o pedido de intervenção federal ao STJ

30 Art. 19, I da Lei 8.038/1990 e art. 350, I do RISTF.31“ordem ou decisão judicial é expressão que abarca qualquer ordem judicial e não apenas as que digam respeito a sentença transitada em julgado” (STF, IF 94, Plenário, Rel. Min. Moreira Alves, DJ em 03/04/1987).32Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 8, pág. 839.33“Tratando-se de pedido de intervenção federal, destinado a prover a execução de decisão judicial, sobre medida liminar, em ação de reintegração na posse de imóvel, fundada em dispositivo legal federal (infraconstitucional), a competência para o processo e julgamento e do Superior Tribunal de Justiça e não do Supremo Tribunal Federal”. (STF, IF 107 QO/DF, Plenário, Relator Min. Sydney Sanches, julgamento em 03/08/1992, publicação DJ em 04/09/1992).34“1. Cabe exclusivamente ao STF a requisição de intervenção para assegurar a execução de decisões da Justiça do Trabalho ou da Justiça Militar, ainda quando fundadas em direito infraconstitucional: fundamentação. 2. O pedido de requisição de intervenção dirigida pelo Presidente do Tribunal de execução ao STF há de ter motivação quanto à procedência e também com a necessidade da intervenção”. (STF, IF 230 QO/DF, Plenário, Relator Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 24/04/1996, publicação DJ de 01/07/1996).35 Art. 19, II da Lei 8.038/1990.36 Art. 350, III do RISTF.

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ou STF37. Se o Tribunal de origem se recursar a encaminhar o pedido de intervenção ao STF ou ao STJ, não haverá ofensa à competência dessas cortes, motivo pelo qual a parte interessada não poderá se insurgir através de reclamação, por ser incabível38. Ademais, a decisão de não encaminhar o pedido de intervenção ao STF ou ao STJ possui natureza administrativa, motivo pelo qual contra ela não cabe recurso extraordinário39 nem recurso especial.(4)PROVOCADA POR REPRESENTAÇÃO INTERVENTIVA40. (art. 36, III da CF/1988). NATUREZA: Diversamente do que ocorre no processo de controle abstrato de normas, que é um processo objetivo, tem-se, na representação interventiva, uma relação processual contraditória entre União e Estado-membro, fundada numa controvérsia constitucional entre eles quanto à observância de deveres constitucionalmente impostos ao ente federado (observância dos princípios constitucionais sensíveis e aplicação da lei federal). É uma peculiar modalidade de composição judicial de conflitos entre a União e o Estado-membro. LEGITIMAÇÃO ATIVA: Diversamente das outras ações concentradas, é exclusiva do PGR, que atua, de maneira excepcional, como representante judicial da União, e não como custos legis nem como substituto processual da sociedade. LEGITIMAÇÃO PASSIVA: Órgãos estaduais que editaram o ato questionado (há polo passivo já que se trata de relação processual contraditória fundada numa controvérsia constitucional, não sendo um processo objetivo). HIPÓTESES: (A) quando houver violação, por parte do Estado-membro, aos princípios constitucionais sensíveis indicados no art. 34, VII da CF/1988. A violação a tais princípios pode advir da edição de atos normativos, mas também de atos concretos ou omissões (art. 3º, II da Lei 12.562/2011, positivando orientação do STF) atribuíveis a autoridades do Estado-membro. O princípio da dignidade da pessoa humana (direitos da pessoa humana – art. 34, VII, b da CF/1988) pode servir de fundamento para a representação interventiva, no entanto o desrespeito não pode tratar de fato isolado (STF, IF 114/MT, Plenário, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 13/03/1991, publicação DJ de 27/09/1996); (B) quando houver recusa do Estado-membro à aplicação de lei federal: Não é qualquer desrespeito pelo Estado à lei federal que enseja a intervenção, sendo necessário que a recusa à aplicação da lei gere prejuízo generalizado e que não caiba solução judiciária para o problema41. A negativa de vigência do direito federal por parte da autoridade local, pode, ou não, vir acompanhada do argumento de que há conflito entre o direito federal e o direito local, sendo de reconhecer a legitimidade deste. PROCEDIMENTO: regulamentado pela Lei 12.562/2011. Novidade, relativamente ao posicionamento anterior do STF, que não era firme: possibilidade de concessão de medida

37“A parte interessada na causa somente pode se dirigir ao Supremo Tribunal Federal, com pedido de intervenção federal, para prover a execução de decisão da própria corte. Quando se trate de decisão de Tribunal de Justiça, o requerimento de intervenção deve ser dirigido ao respectivo presidente, a quem incumbe, se for o caso, encaminhá-lo ao Supremo Tribunal Federal. Pedido não conhecido, por ilegitimidade ativa dos requerentes”. (STF, IF 105 QO/PR, Plenário, Relator Min. Sydney Sanches, julgamento em 03/08/1992, publicação DJ de 04/09/1992).38 Intervenção federal, por suposto descumprimento de decisão de Tribunal de Justiça. Não se pode ter, como invasiva da competência do Supremo Tribunal, a decisão de Corte estadual, que, no exercício de sua exclusiva atribuição,indefere o encaminhamento do pedido de intervenção. Precedentes do S.T.F. Reclamação julgada improcedente. (STF, Rcl 464/CE, Plenário, Relator Min. Octavio Gallotti, julgamento em 14/12/1994, publicaçãoDJ de 24/02/1995).39Por não se tratar de causa, em sentido próprio, mas de providencia administrativa, da privativa iniciativa do Tribunal de Justiça, não cabe recurso extraordinário contra a decisão daquela Corte, que indeferiu o encaminhamento do pedido de intervenção federal, por suposto descumprimento de decisão judicial (art. 34, IV, da Constituição). (STF, RE 149986/SP, 1ª Turma, Relator Min. Octavio Gallotti, julgamento em 09/03/1993, publicação DJ de 07/05/1993)40Gilmar Ferreira Mendes. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 10, pág. 1340 a 1349.41Paulo Gustavo Gonet Branco. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 8, pág. 835.

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liminar (art. 5º da Lei 12.562/2011). EFEITOS DA DECISÃO42: A decisão do STF constitui conditio juris à efetivação das medidas interventivas, possuindo carga preponderantemente declaratória, sem que tenha o condão de anular ou retirar a eficácia do ato impugnado. Tanto é assim que o art. 36, §3º da CF/1988 (à semelhança das CF’s de 1946 e de 1967/69) refere-se à suspensão do ato43,44 pelo Decreto interventivo do Presidente da República, pressupondo sua subsistência após a pronúncia de ilegitimidade. Em suma, a decisão do STF é: i) simplesmente declaratória de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade do ato concreto ou do ato normativo estadual (sem anular o ato ou retirar-lhe a eficácia); ii) vincula apenas as partes representadas na relação processual (não possui eficácia erga omnes nem efeitos vinculantes, motivo pelo qual a Lei 12.562/2011 não previu tais efeitos nem o cabimento de reclamação) PRECATÓRIOS.NÃO PAGAMENTO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM E DECISÃO JUDICIAL. “INTERVENÇÃO FEDERAL. Pagamento de precatório judicial. Descumprimento voluntário e intencional. Não ocorrência. Inadimplemento devido a insuficiência transitória de recursos financeiros. Necessidade de manutenção de serviços públicos essenciais, garantidos por outras normas constitucionais. Agravo improvido. Precedentes. Não se justifica decreto de intervenção federal por não pagamento de precatório judicial, quando o fato não se deva a omissão voluntária e intencional do ente federado, mas a insuficiência temporária de recursos financeiros”. (STF, IF 4640 AgR/RS, Plenário, Relator Min. Cezar Peluso, julgamento em 29/03/2012, publicação DJe 080 de 24/04/2012). “A atuação estatal voluntária e dolosa com objetivo de descumprir decisão judicial transitada em julgado constitui pressuposto indispensável ao acolhimento de pleito de intervenção federal. [...] No ponto, entendeu-se que as dificuldades financeiras enfrentadas pela Administração Pública do respectivo ente impediriam, temporariamente, a quitação imediata da totalidade de suas dívidas. Assim, reputou-se não configurada intenção estatal de se esquivar ao pagamento dos débitos decorrentes de precatórios judiciais, mas atuação definida pelos limites do possível, com o fito de solucionar a questão”. (IF 5101/RS, rel. Min. Cezar Peluso, 28.3.2012, Informativo N.º 660, ano 2012). INTERVENÇÃO ESTADUAL NOS MUNICÍPIOS. As hipóteses estão previstas nos incisos do art. 35 da CF/1988 e, em regra, o procedimento é o mesmo da intervenção federal, aplicando o princípio da simetria, v.g., competência privativa do Governador; competência para julgar a representação interventiva é do TJ local e, nesse caso, a legitimidade ativa é exclusiva do Procurador-Geral de Justiça (Chefe do MP Estadual); controle político realizado pela Assembleia Legislativa, sendo dispensado na hipótese de provimento à representação interventiva. OBS.: Súmula 637 do STF: Como a decisão tomada pelo TJ local nos casos de intervenção tem

42Gilmar Ferreira Mendes. Curso de Direito Constitucional (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet), 6ª Edição, 2011, Capítulo 10, pág. 1356 a 1358.

43 Art. 36. § 3º. Nos casos do art. 34, VI e VII, ou do art. 35, IV, dispensada a apreciação pelo Congresso Nacional ou pela

Assembléia Legislativa, o decreto limitar-se-á a suspender a execução do ato impugnado , se essa medida bastar ao

restabelecimento da normalidade.44A situação é parecida com a do art. 52, X da CF/1988, mas Gilmar Mendes não trata dos efeitos dessa “ suspensão do ato” efetivada pelo Decreto interventivo nem fala se, a exemplo do Decreto legislativo do art. 52, X da CF/1988, o Decreto interventivoatribuiria eficácia erga omnes à decisão do STF na ADI interventiva. Entretanto, Gilmar Mendes cita um trecho de Pontes de Miranda no qual (pelo menos para mim) é possível se extrair a atribuição de eficácia erga omnes e a desconstituição do ato normativo estadual: “[...] a decisão do Supremo Tribunal Federal é para a intervenção federal, a carga preponderável é só declarativa, pois a suspensão pelo Presidente da República é que desconstitui”. (Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda n. 1 de 1969, 2. Ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1970, t. 2, p. 257)

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natureza político-administrativa, não pode ser objeto de recurso extraordinário a decisão que defere ou indefere o pedido de intervenção estadual em município.TAXATIVIDADE. A intervenção federal nos Estados e no DF possui hipótesestaxativamente previstas no art.34 da CF, que devem ser interpretadas restritivamente, por tratarem de situação excepcional. Por sua vez, as hipóteses de intervenção federal nos Municípios integrantes de Território estão taxativamente previstas no art. 35, I a IV da CF/1988, ressaltando a inaplicabilidade da 1ª parte do inciso IV, já que o Território não possui CE que indiquem os aludidos princípios a serem observados.

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ITEM A: O Estado. Conceito. História. Elementos: território, população e poderestatal.Estado,direitoesociedade.CaracterísticasdosEstados modernos.Tipos:monocracia (monarquiaeditadura)erepública; teocracia, Estado policial-absolutista; Estado liberal, Estado totalitáriomodernoeoEstadodedireitodemocrático esocial. Característicasdo EstadobrasileironaConstituiçãode1988.

Obras consultadas:Dallari, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, 18ª Edição, Ed. Saraiva.Kildare, Gonçalves Carvalho. Direito Constitucional. 10ª Edição. Ed. Del Rey.Silva, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 29ª Ed. Malheiros EditoresResumo teve como base o material elaborado pelo grupo do concurso do MPF25.Legislação básica. Arts. 1º, 2º e 3º da CF.1. Noções Gerais.O tema do Estado relaciona-se com a ciência política e, no Direito, é um dos pontos centrais do Direito Constitucional, visto que define a estrutura do poder político. A denominação Estado (latim: status = estar firme), “significando situação permanente de convivência e ligada à sociedade política, aparece pela primeira vez em “O Príncipe” de Maquiavel, escrito em 1513, passando a ser usada pelos italianos, sempre ligada ao nome de uma cidade independente” – DALLARI, p. 43. Mesmo só tendo sido usada a expressão a partir do séc. XVI, a maioria dos autores admite que a sociedade (então denominada Estado) é, em essência, igual às sociedades que existiram anteriormente - sociedades políticas, com autoridade superior, que fixaram regras de convivência entre seus membros. Alguns autores (dentre eles Karl Schmidt) somente admitem a idéia de Estado a partir do surgimento da idéia e da prática de soberania, no séc. XVII. Ressalte-se que, atualmente, no plano internacional, vive-se a relativização do conceito de soberania, o que influencia a atual idéia de Estado. 2. Conceito.Dallari (p. 99) fala da divergência doutrinária acerca do conceito de Estado e critica o conceito de que Estado é “nação politicamente organizada”. Diz que nação é espécie de comunidade, enquanto Estado é uma sociedade; já a expressão “politicamente organizada” careceria de rigor científico. Segundo ele, a variedade de conceitos revela duas orientações: uma dá ênfase ao elemento força, a outra enfatiza a natureza jurídica. Dentre as que realçam a força, DUGUIT conceitua o Estado como uma força material irresistível, acrescentando que essa força, atualmente, é limitada e regulada pelo direito. A corrente que realça o caráter jurídico não afasta o elemento força, ou a noção de sociedade política; apenas afirma que esses elementos materiais têm existência independente fora do Estado, “só se compreendendo como componentes do Estado após sua integração numa ordem jurídica, o que também se dá com a força, que se integra ao Estado como poder” (DALLARI, P. 99). Ele cita, então, que JELLINEK fixou o conceito jurídico de Estado como sendo “corporação territorial dotada de um poder de mando originário”. Ressalta a idéia de corporação, que é a ordenação jurídica de pessoas. HANS KELSEN preocupou-se em fixar conceito puramente jurídico de Estado, como sendo “ordem coativa normativa a conduta humana”. DALLARI critica este conceito, por ser insuficiente, dizendo que não podem ser afastados os fatores não-jurídicos indispensáveis; assim conceitua o Estado

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como “a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território” (p. 101).KILDARE (p. 30), de outro lado, ressalta que a soberania não seria elemento do conceito de Estado, mas apenas um dos traços do moderno Estado Europeu (é qualidade do poder político). Assim, no conceito de Estado, tanto o poder como a comunidade se submetem ao jurídico, visando á convivência social harmônica, sendo o que poder político o legitima. 3. História.Os autores ressaltam que os “tipos” de Estado não tiveram curso uniforme, exercendo influência em períodos descontínuos. Ainda assim, com pequenas variações tratam das seguintes fases cronológicas: Estado Antigo, Estado Grego, Estado Romano, Estado Medieval e Estado Moderno (KILDARE, p. 37-43).Estado Antigo: civilização egípcia, mesopotâmica, hebraica, persa, judia e outras; traços básicos: a teocracia (poder político como expressão do poder religioso), forma monárquica absoluta e larga extensão territorial; há, ainda, forte estratificação social, com acentuada hierarquização da sociedade.Estado Grego: representado pela polis ou cidade, originária do culto dos antepassados, fundada sobre uma religião; base territorial diminuta; comunidade de cidadãos (não de homens); os estrangeiros e os escravos não detinham essa condição; democracia com participação política apenas dos cidadãos.Estado Romano: assemelha-se ao grego; a base é o agrupamento da família e o culto dos antepassados; alcançou grande base territorial, mas manteve base municipal e urbana; destacou-se por separação do poder público do poder privado. Passou por mudanças: realeza, república e império.Estado Medieval: fala-se em “período medieval”, porque não teria havido, de fato, Estado, pela desintegração da unidade de poder; vai desde a queda do Império Romano do Ocidente (395), ou a queda do Império Romano do Oriente (476) até a tomada de Constantinopla pelos turcos (1453), ou o descobrimento da América (1492). Existiram comunidades parciais, como os grêmios, as corporações de ofício – entidades intermediárias. O poder político estava nos suseranos feudais e, depois, nas corporações e instituições eclesiáticas. Havia concepção patrimonial e fragmentária de poder, que se privatiza.Estado Moderno: surge com ele a própria noção de Estado; poder político passa a ser uno, concentrado no rei; nasce a idéia de soberania; há base territorial e nação; a autoridade do Papa é contestada pela Reforma; no plano econômico, ascensão da burguesia (desenvolvimento do capitalismo). Há evolução: Estado Estamental (de transição; há estamentos: nobreza, clero, povo); Estado Absoluto (predomínio do monarca; também Estado de Polícia, o despotimos esclarecido do séc. XVIII); Estado de Direito (na Alemanha, ou Estado Constitucional, na França – poder político passa a ser titularizado no povo, surgindo idéia de soberania popular, surgem as constituições escritas); Estado Social de Direito (passa a haver intervenção do Estado nos domínios econômico e social). Atualmente, há a integração de Estados em espaços regionais ou continentais (Mercosul e União Européia, p. ex).4. Elementos: território, população e poder estatal.Tradicionalmente, são três os elementos do Estado: povo, território e poder político. São materiais os elementos povo e território, e formal, o poder político. Alguns autores questionam

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a idéia de os elementos serem definidores do Estado (este não se reduz a eles), os elementos seriam apenas pressupostos de existência. José Afonso da Silva aponta um quarto elemento: “o Estado, como se nota, constitui-se de quatro elementos essenciais: um poder soberano de um povo situado num território com certas finalidades” (p. 98). Esses quatro elementos, segundo ele, são organizados pela Constituição.Povo: elemento humano constitutivo do Estado, é comunidade de pessoas e não se confunde com população. Povo é unidade que corresponde a conceito jurídico-político; população é conceito econômico-geográfico (= conjunto de residentes no território, nacionais e estrangeiros). O vínculo jurídico do povo com o Estado é permanente, o da população, pode ser transitório.Território: é o espaço geográfico indispensável à configuração do Estado; não há Estado nômade; o território é o limite espacial de validade de sua ordem jurídica (KILDARE cita Kelsen, p. 59). O território pode ser real (solo, subsolo, águas, espaço aéreo, plataforma continental), ou ficto (embaixadas e legações diplomáticas, navios e aviões – mercantes e militares).Poder Político: poder exprime idéia de força, energia e capacidade; além disso, pressupõe relação interpessoal. “O poder político é o que preside, integra e harmoniza todos os grupos sociais, possibilitando a convivência entre os membros dos grupos sociais, mediante um conjunto de regras que compõe o direito comum a todos eles” (KILDARE, P. 67).Finalidades (Dallari, assim como José Afonso entendem como quarto elemento): finalidades confundem-se com as funções do Estado. Kelsen entende que as finalidades seriam próprias da ciência política, não devendo ser objeto do Direito. O fim do Estado é que os indivíduos e as demais sociedades possam atingir seus fins particulares; ou seja, o fim do Estado é o bem comum.5. Estado, Direito e Sociedade.KILDARE (p. 23): “o Estado, modo específico de organização política, é a base do Poder. Encarna o princípio da ordem e da coerência sobre o qual assenta a sociedade. É o Estado que possibilita a integração e a unificação”. Não é unânime o conceito de sociedade; refere-se à totalidade das relações sociais entre os homens; tem-se entendido por sociedade o maior dos grupos a que um indivíduo pertence, o grupo onde compartilham condições básicas de vida em comum. Dallari aponta como elementos necessários para que um grupo humano possa ser reconhecido como sociedade: a) finalidade ou valor social; b) manifestações de conjunto ordenadas; c) poder social. O Estado é sociedade política; é a organização política da sociedade. DALLARI (p. 108) cita Miguel Reale, dizendo que o Estado apresenta uma face social (relativa a sua formação e a fatores sócio-econômicos), uma face jurídica (o Estado enquanto ordem jurídica) e uma face política (relacionada com as finalidades em razão dos diversos sistemas de cultura). A permanência de meios para assegurar os fins do Estado depende da presença de normas jurídicas (Direito). O Estado deve buscar o máximo possível de juridicidade (limitação do poder), mas não se resume a ele (Direito).Teoria Monista (Kelsen, Hegel, Jellinek): Estado e Direito se confundem. O Direito é apenas positivo.Teoria Dualística (Gurvitch e Duguit): Estado e Direito são duas realidades distintas, independentes e inconfundíveis.

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Teoria do Paralelismo (Giorgio Del Vecchio): Direito e Estado são realidades distintas, mas interdependentes.Teoria Tridimensional do Estado e do Direito (Miguel Reale): o “Estado como unidade integrante de seus três momentos ou valências” (fato, valor e norma).Teoria da Autolimitação do Estado: o Estado não encontra nenhum limitação fora de si mesmo. Não está obrigado a nada se não pela sua própria vontade (Jellinek).6. Características dos Estados Modernos. Tipos: monocracia e república; teocracia, Estado policial-absolutista; Estado liberal, Estado totalitáriomodernoeoEstadodedireitodemocrático esocial.Formação do estado moderno. Início: crise do sistema feudal europeu: concentração do poder político na mão do governante absoluto. Antigo regime: identificação entre o soberano e o estado. Despotismo esclarecido: soberano é o melhor servidor do Estado. Revoluções burguesas: oposição ao absolutismo. Estado liberal: liberação política dos cidadãos. Direitos e garantias individuais. Poder de polícia, defesa externa, administração da Justiça. Privilegia o privado.Estado social: contraste com o individualismo e abstencionismo do Estado liberal. Objetivos sociais do Estado: previdência e saúde públicas, realização de igualdade material, desenvolvimento econômico, intervenção econômica, limitação dos direitos individuais em favor da coletividade, justiça distributiva. Privilegia o público. Estado socialista é um tipo de estado social.Estado de direito democrático e social. Síntese entre constitucionalismo (limitação do poder e supremacia da lei) e democracia (soberania popular e governo da maioria) – BARROSO. Mudança de paradigma, contrário ao paternalismo do estado-providência. Novas articulações entre o público e o privado. Incorpora e supera dialeticamente os estados liberal e social.Formas de governo: monarquia (hereditariedade e vitaliciedade da chefia do Estado) x república (alteração periódica do chefe de Estado). Classificação dualista que remonta a Maquiavel. Aristóteles dividia as formas de governo em três (monarquia, aristocracia e república, que poderiam se degenerar em tirania, oligarquia e democracia) – SILVA. República foi utilizada na CR/88 com o sentido de coisa do povo e para o povo, característica específica de uma coletividade política, não apenas oposição à monarquia (SILVA).Sistemas de governo: parlamentarismo x presidencialismo.Formas de Estado: estado unitário x estado federal (repartição do poder dentro de um mesmo território, em que há mais de uma ordem jurídica incidente num mesmo momento – autonomia dos entes federados, oposta à soberania do entre central).Regimes políticos: autocracia (organizada de cima para baixo, princípio do chefe, soberania do governante) x democracia (organizada de baixo para cima, soberania popular).Monocracia (centro único de força política): negada pelo pluralismo (liberdade de dissenso). Autocracia (concentração de poder político em uma única pessoa): negada pela participação. As duas negações definem atual democracia (BOBBIO).Ditadura: conceito ligado à onipotência do Estado, ao governo sem suporte popular e à concentração de poder em um grupo ou pessoa.Teocracia: submissão das instituições políticas a uma religião. Governo sob influência direta de uma divindade. Exemplos: Vaticano, Irã. Diferente de estados com religião oficial.

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Estado policial: tipo de organização baseada no controle rígido e repressivo da população, notadamente por meio de policia política. Limitação de liberdades individuais.Estado totalitário moderno: mobilização da população em torno de uma ideologia oficial. Pretensão de população hegemônica, organizada em torno de um mesmo fim. Estado tendente a controlar todos os aspectos da vida social e privada dos cidadãos. Forte carisma do líder. Exemplos: Alemanha nazista, URSS sob Stálin. Críticos importantes: Popper e Arendt.7. Característicasdo EstadobrasileironaConstituiçãode1988.“República Federativa do Brasil condensa o nome do Estado brasileiro – República Federativa do Brasil -, o nome do país – Brasil -, a forma de Estado, mediante o qualificativo Federativa, o que indica tratar-se de Estado Federal, e a forma de governo – República. Pátria é termo que exprime sentimentos cívicos (Pátria: terra dos pais; terra que amamos...)” – SILVA, p. 98. República, tal como posta na CF/88, não é apenas oposição à Monarquia, mas também tem o sentido de res publica, coisa do povo e para o povo; assim, se opõe à idéia de Tirania. Estado brasileiro: república federal, estado democrático, plural, inclusivo, fundado soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana e nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e no pluralismo político (art. 1º da CF). Participação política efetiva, em todos os níveis da vida social. Respeito à diferença e coexistência de diferentes projetos de vida dignos. Reconhecimento de um núcleo de individualidade intocável e busca da igualdade material. Regime de livre mercado (liberdade no âmbito econômico), com atuação corretiva e de fomento do Estado. Reconhecimento dos direitos da coletividade como um todo.

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ITEM B: AdministraçãoPública:princípiosconstitucionais.AAdministração Públicadialógica.

Obras consultadas:Resumo teve como base o material elaborado pelo grupo do concurso do MPF25.Também foi utilizado o resumo feito por grupo para realização de prova oral da PGE/RS.Aulas da LFG, da Prof. Fernanda Marinela e pesquisa dos Informativos do STF e do STJ.Legislação básica. Arts. 5º, 37, 41, 169 da CF.Para Celso Antônio Bandeira de Mello, são “Pedras de Toque do Direito Administrativo” os seguintes princípios: o da Supremacia do Interesse Público – confere prerrogativas à Administração, autoriza cláusulas exorbitantes nos contratos, etc. - e o da Indisponibilidade do Interesse Público – é contrapeso à supremacia, limita atuação da Administração. Interesse público primário = o que o povo quer; interesse público secundário = o que o Estado (pessoa jurídica) quer. Deve prevalecer o primário.A Constituição consagra, no art. 37, a idéia de que a Administração Pública está submetida, entre outros, aos seguintes princípios (os do art. 37 são os chamados “Princípios Mínimos do Direito Administrativo”):- Princípio da legalidade, que abrange o postulado da supremacia da lei e o princípio da reserva legal. A supremacia da lei expressa a vinculação da Administração ao Direito, o postulado de que o ato administrativo que contraria norma legal é inválido. O princípio da reserva legal exige que qualquer intervenção na esfera individual (restrições ao direito de liberdade ou ao direito de propriedade) seja autorizada por lei (art. 5°, II). Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite. No âmbito das relações entre particulares, o princípio aplicável é o da autonomia da vontade. Em decorrência disso, a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto ela depende de lei.A utilização de fórmulas legais exageradamente genéricas e a outorga de competência para a sua concretização a órgãos administrativos, mediante expedição de atos regulamentares, podem configurar ofensa ao princípio da legalidade estrita, caracterizando, ademais, ilegítima delegação legislativa. Tendência atual: alargamento do princípio da legalidade com maior limitação à discricionariedade administrativa (em decorrência da submissão da Adm. Pública a princípios e valores) e com a ampliação do controle judicial. Na CF 1891, a Adm. Pública podia fazer tudo que a lei não proibia (vinculação negativa). A partir da CF de 1934, o princípio da legalidade adquiriu a feição de hoje- vinculação positiva. Com a CF 1988, os princípios e valores são dirigidos aos 3 poderes do Estado: há vinculação da Administração a princípios e regras (legalidade ampla, vinculada a princípios), o que significa a ampliação do controle judicial. Legalidade Ampla é base do Estado Democrático de Direito.

Almiro do Couto e Silva: ponderação entre princípio da legalidade e da segurança jurídica. O princípio da legalidade, até pouco tempo tido como incontrastável, hoje encontra limites na sua aplicação, precisamente porque se mostra indispensável resguardar, em certas hipóteses, o interesse público e a confiança dos indivíduos em que os atos do poder público, que lhes dizem respeito e outorgam vantagens, são atos regulares, praticados com observância das leis.Nesse

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sentido, cabe citar:

APOSENTADORIA. CONTAGEM. TEMPO DE SERVIÇO. TEORIA DO FATO CONSUMADO. (...)Observou a Min. Relatora que a negativa do registro da aposentadoria ocorreu após dez anos da concessão inicial e quando a impetrante já contava com 74 anos de idade, ou seja, acima do limite etário para permanência em atividade. Dessa forma, diante da demora injustificada do TCDF na análise do ato de aposentação, o que, inclusive, inviabilizou que a impetrante exercesse seu direito de retornar às atividades para complementação do tempo necessário à segunda aposentadoria especial, seria perfeitamente aplicável à hipótese a teoria do fato consumado (...) - STJ, RMS 26.998-DF, 6/12/2011.

Celso Antônio Bandeira de Mello elenca três restrições excepcionais ao princípios da legalidade: 1) Medida Provisória; 2) Estado de Defesa; 3) Estado de Sítio.

* Ainda dentro do princípio da legalidade, insere-se o princípio da autotutela – segundo o qual a Administração tem o poder de anular seus próprios atos, ou revogá-los, por conveniência e oportunidade, respeitado o direito adquirido e observado o contraditório (v. Súmulas 346 e 473 STF).- Princípio da impessoalidade consubstancia a idéia de que a Administração, enquanto estrutura composta de órgãos e de pessoas incumbidos de gerir a coisa pública, tem de desempenhar esse munus sem levar em conta interesses pessoais, próprios ou de terceiros, a não ser quando o atendimento de pretensões parciais constitua concretização do interesse geral. Enfim, trata-se de ausência de subjetividade. Apresenta dois aspectos: 1) dever de atendimento do interesse público; 2) a atividade administrativa é imputada ao órgão e não ao agente (Teoria da Imputação). O princípio da impessoalidade tem forte aplicação nas regras de concurso público e de licitação; além disso, há a proibição de nepotismo (Súmula Vinculante n. 13, que não se aplica a agente político).*Cabe assinalar, quanto ao princípio da finalidade: para Hely Lopes Meirelles, é sinônimo clássico da imparcialidade e está embutido na impessoalidade; já, para Celso Antônio Bandeira de Mello, é princípio apartado, devendo o administrador cumprir a finalidade da lei (é, pois inerente à legalidade). A finalidade é princípio implícito na CF, art. 37 e 5º, LXIX; é também previsto na Lei 9784 (interpretação da norma administrativa); a ofensa à finalidade pode configurar abuso de poder, por desvio (nulidade do ato).- Princípio da moralidade decorre da necessidade de pôr em destaque que, em determinados setores da vida social, não basta que o a agir seja juridicamente correto; deve, antes, ser também eticamente inatacável. Sendo o direito o mínimo ético indispensável à convivência humana, a obediência ao princípio da moralidade, em relação a determinados atos, significa que eles só serão considerados válidos se forem duplamente conformes à eticidade, ou seja, se forem adequados não apenas às exigências jurídicas, mas também às de natureza moral, sob pena da possibilidade de configuração de improbidade administrativa, com as sanções daí decorrentes (art. 37, §4°, da CRFB/88). Licitude e honestidade seriam traços distintivos entre o direito e a moral, numa aceitação ampla do brocado non omne quod liced honestum est (nem tudo que é legal é honesto). A imoralidade administrativa surgiu e se desenvolveu ligada à idéia de desvio de poder, pois se entendia que em ambas as hipóteses a Adm. Pública se utiliza de meios lícitos para atingir finalidades metajurídicas irregulares. Por isso alguns autores entendem

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que a imoralidade se reduz a uma das hipóteses de ilegalidade que pode atingir os atos administrativos, ou seja, a ilegalidade quanto aos fins (desvio de poder). Entretanto, a idéia de moralidade não se confunde com a de legalidade (porque a lei pode ser imoral e a moral pode ultrapassar o âmbito da lei). A imoralidade administrativa produz efeitos jurídicos, porque acarreta a invalidade do ato, o que pode ser decretado pela própria Administração ou pelo Judiciário. Sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da Administração ou dos administrados que com ela se relacionam juridicamente, embora em consonância com a lei, ofendem a moral, os bons costumes, as regras da boa administração, os princípios da justiça e da equidade, a idéia comum de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa.Ofende a moralidade e a impessoalidade a publicidade institucional em que constarem nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de agentes ou autoridades (art. 37, p. 1º, da CF).- Princípio da publicidade aponta para a necessidade de que todos os atos administrativos estejam expostos ao público, que se pratiquem à luz do dia, até porque os agentes estatais não atuam para a satisfação de interesses pessoais, nem sequer da própria Administração, que, sabidamente, é apenas um conjunto de pessoas, órgãos, entidades e funções, uma estrutura, enfim, a serviço do interesse público. Norberto Bobbio proclama que, idealmente, democracia é o governo do poder visível ou o governo cujos atos se desenvolvem em público, sob controle da opinião pública.. Existe um dever de transparência e, ao mesmo tempo, uma necessidade formal de propiciar para os atos administrativos a plena eficácia, a máxima produção de seus efeitos, como consequência da correta publicidade. O princípio da publicidade tem por finalidade o conhecimento público, assim como permite o controle e a fiscalização e também é marco inicial para a contagem de prazos. Há publicidade sem publicação!Além do art 37 da CF, existem outros dispositivos na CF que confirmam ou restringem o princípio da publicidade. Exceções ao princípio: intimidade e vida privada (art. 5º, X); segurança da sociedade e do Estado (art. 5º, XXXIII); publicidade dos atos processuais pode ser restringida para defesa da intimidade e do interesse social (art. 5º, LX, segredo de Justiça, em processos judiciais e administrativo disciplinar).Cabe citar, antes mesmo da Lei 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação), o STF já decidiu que “a divulgação dos vencimentos brutos de servidores, a ser realizada oficialmente, constituiria interesse coletivo, sem implicar violação à intimidade e à segurança deles, uma vez que esses dados diriam respeito a agentes públicos em exercício nessa qualidade. Afirmou-se, ademais, que não seria permitida a divulgação do endereço residencial, CPF e RG de cada um, mas apenas de seu nome e matrícula funcional. Destacou-se, por fim, que o modo público de gerir a máquina estatal seria elemento conceitual da República” - SS 3902 Segundo AgR/SP, rel. Min. Ayres Britto, 9.6.2011.- Princípio da Eficiência, introduzido no texto da Constituição de 1988 pela Emenda n. 19/98, consubstancia a exigência de que os gestores da coisa pública não economizem esforços no desempenho dos seus encargos, de modo a otimizar o emprego dos recursos que a sociedade destina para a satisfação das suas múltiplas necessidades; numa palavra, que pratiquem a "boa administração”, de que falam os publicistas italianos. Nos Estados burocráticos-cartoriais, o princípio da eficiência configura um brado de alerta, uma advertência mesmo, contra os vícios

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da máquina administrativa, sabidamente tendente a privilegiar-se, na medida em que sobrevaloriza os meios, em que, afinal, ela consiste, sacrificando os fins, em razão dos quais vem a ser instituída. Possui dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público.Idéia presente entre os objetivos da Reforma do Estado. Tem aplicação na aquisição da estabilidade do servidor: que se efetiva após o estágio probatório de 3 anos + avaliação de desempenho (art. 41CF); além disso, o servidor estável poderá perder o cargo por decisão judicial transitada em julgado, por decisão em processo administrativo, ou por meio de procedimento de avaliação periódica de desempenho, regulado em lei complementar (ainda não há). Também há critério de eficiência quanto aos limites de gastos com pessoal pela Administração Pública (art. 169 CF).Ao lado dos princípios mínimos citados, a doutrina, ainda, elenca outros princípios gerais do Direito Administrativo:- Motivação: exige que a administração pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões. Ele está consagrado pela doutrina e pela jurisprudência. Na CF está prevista expressamente para as decisões administrativas dos tribunais e do MP (art 93 e 128, parágrafo 4º). A motivação, em regra, não exige formas específicas, podendo ou não ser concomitante com o ato, além de ser feita, muitas vezes, por órgão diverso daquele que proferiu a decisão. Frequentemente, a motivação consta de pareceres, informações, laudos, relatórios, feitos por outros órgãos, sendo apenas indicados como fundamento da decisão. Constituem motivação do ato, sendo deles parte integrante.- Razoabilidade e proporcionalidade: a razoabilidade é princípio aplicado ao direito administrativo como mais uma das tentativas de impor-se limitações à discricionariedade administrativa, ampliando-se o âmbito de apreciação do ato administrativo pelo poder judiciário (legalidade ampla, vinculada a princípios). A decisão discricionária do funcionário será ilegítima, apesar de não transgredir nenhuma norma concreta e expressa, se é “irrazoável”, o que pode ocorrer quando não se dê fundamentos de fato ou de direito que a sustentam ou; não leve em conta fatos constantes do expediente ou; não guarde proporção entre os meios que emprega e o fim a que deseja alcançar, ou seja, que seja excessiva em relação ao que deseja alcançar. Ainda que haja divergência na doutrina quanto às diferenças entre razoabilidade e proporcionalidade, o STF tem aplicado-os como similares; entende como implícito no art. 5º, no devido processo legal substantivo); está explicito na Lei 9784.- Segurança Jurídica e proteção da confiança: Para Di Pietro, o princípio se justifica pelo fato de ser comum, na esfera administrativa, haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a consequente mudança de orientação, em caráter normativo, afetando situações já reconhecidas e consolidadas na vigência da orientação anterior. Essa mudança de orientação é inevitável, mas gera insegurança jurídica. Daí a regra que veda a interpretação retroativa. O princípio deve ser aplicado com cautela, para não levar ao absurdo de impedir a administração de anular atos praticados com inobservância da lei. Nesses casos, não se trata de mudança de interpretação, mas de ilegalidade, esta sim a ser declarada retroativamente, pois atos ilegais não geram direitos. A segurança jurídica é característica do Estado de Direito e de acordo com

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Sylvia Calmes pode ser dividido em 3 concepções: a) Previsibilidade (calculabilidade), ou seja a antecipação do resultado possível - quando me relaciono com o Estado, devo saber o que pode acontecer; b) acessibilidade (formal: p. da publicidade e material: p. da motivação) e; c) estabilidade das relações jurídicas (face subjetiva: proteção da confiança). A proteção da confiança no seu aspecto substancial é a proteção dos de condutas ou efeitos resultantes de condutas estatais (decadência). No aspecto procedimental possui relação com a não-surpresa. No caso do legislativo, existe a proibição do retrocesso. No caso judicial, o direito à informação, súmulas e a modulação de efeitos das decisões. No caso administrativo, deve-se preservar as expectativas legítimas, observando o contraditório e ampla defesa e a presunção de legitimidade e legalidade dos atos administrativos sempre que a extinção da conduta que cria benefício gera prejuízo ao destinatário. Cabe citar: Registro de aposentadoria e justificação judicial - Em face das especificidades da causa e da necessidade de se garantir a segurança jurídica , a 2ª Turma concedeu mandado de segurança para declarar nula decisão do TCU que negara registro à aposentadoria da impetrante, com o consequente direito de permanecer em inatividade(...) Considerou-se o fato de a impetrante receber os proventos há mais de vinte anos, por força de liminar anteriormente concedida neste writ. Frisou-se que o TCU estaria autorizado a proceder ao registro da aposentadoria com base na validade da justificação referente ao período em que ela trabalhara como professora. Consignou-se que, enquanto não desautorizada em sede judiciária pelos meios processuais adequados, a justificação estaria apta a produzir os efeitos a que se destinaria. ( STF, MS 22315/MA, 17.4.2012)- Contraditório e ampla defesa: a CF de 1988 ampliou o direito de defesa, assegurando aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa. Direitos fundamentais garantias, assecuratórios, instrumentais em relação a outro direito. Não se resume ao direito de manifestação no processo, sendo uma verdadeira pretensão à tutela jurídica, composto pelo direito à informação, direito de manifestação e direito de ver seus argumentos considerados, de onde se extrai o dever de fundamentar as decisões. SV n. 3: “Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão”.Cabe citar: “...entendeu a Min. Relatora que a União não conseguiu comprovar, por meio de prova manifesta, a efetiva ciência do ora impetrante, por meio de notificação pessoal, do desarquivamento do processo administrativo disciplinar e do ato de anulação de sua absolvição. Salientou-se, por conseguinte, que a entrega de telegrama a terceiro não constitui prova suficiente de que seu destinatário o tenha recebido. Seguindo essa linha de raciocínio, destacou-se julgado da Corte Especial no sentido de que, na hipótese de citação pelo correio, seria necessária a entrega da correspondência pessoalmente ao destinatário, sob pena de vício insanável. (STJ, MS 14016, 29/2/2012)- Princípio da Continuidade: exige que a atividade administrativa seja prestada de forma contínua; deriva do princípio da indisponibilidade. Tem aplicação quanto à interrupção do serviço público por falta de pagamento; entende-se necessário o aviso prévio; admite-se o corte, também por respeito ao princípio da isonomia; todavia, serviços essenciais (como energia

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elétrica em hospitais) não podem ser interrompidos. O direito de greve é limitado em face de serviços essenciais e necessidade inadiáveis da comunidade (MIs 670, 708 e 712 do STF). Aplica-se a lei do setor privado. Também em face da continuidade, nos contratos administrativos a regra da exceptio nom adimpleti contractus tem aplicação diferenciada – a Lei 8666/93, art. 78 XV, autoriza o contratado (exceto calamidade, grave perturbação e guerra) a suspender o serviço e buscar a rescisão judicial do contrato, quando ultrapassado o prazo de 90 dias de atraso no pagamento.

Ao lado dos princípios gerais expostos, a doutrina reconhece os princípios da livre concorrência aos cargos públicos; da licitação/concorrência para a realização de obras e serviços públicos; e da responsabilidade civil do Estado.

Quanto à natureza contratual e dialógica da Administração, Gustavo Justino de Oliveira e Cristiane Schwanka explicam que, “com a ascensão de fenômenos como o Estado em rede e a Governança Pública, emerge uma nova forma de administrar, cujas referências são o diálogo, a negociação, o acordo, a coordenação, a descentralização, a cooperação e a colaboração. Assim, o processo de determinação do interesse público passa a ser desenvolvido a partir de uma perspectiva consensual e dialógica, a qual contrasta com a dominante perspectiva imperativa e monológica, avessa à utilização de mecanismos comunicacionais internos e externos à organização administrativa.“Trata-se da Administração Consensual, a qual marca a evolução de um modelo centrado no ato administrativo (unilateralidade) para um modelo que passa a contemplar os acordos administrativos (bilateralidade e multilateralidade). Sua disseminação tem por fim nortear a transição de um modelo de gestão pública fechado e autoritário para um modelo aberto e democrático, habilitando o Estado contemporâneo a bem desempenhar suas tarefas e atingir os seus objetivos, preferencialmente, de modo compartilhado com os cidadãos.”

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ITEM C: Espéciesdedireitossubjetivos:direitosdepersonalidade, direitos absolutos, direitosrelativos,direitospotestativosoude conformação;direitos defamília;direitosdisponíveisedireitos indisponíveis. Direitoscoletivoseinteressesdifusos.Direitos individuaishomogêneos.

Obras consultadas:Gagliano e Pamplona Filho, Pablo Stolze e Rodolfo.Novo Curso de Direito Civil. 11ª ed. Editora Saraiva, vol. I, Parte Geral.Diniz, Maria Helena. Dicionário Jurídico, vol. 2, D-I, Saraiva, 1998.Didier Jr e Zaneti Jr, Fredie e Hermes. Curso de Direito Processual Civil, vol. 4, Direito Coletivo, 4º ed. Ed. Juspodivm.Resumo teve como base o material elaborado pelo grupo do concurso do MPF25Legislação básica. Código Civil, arts. 11-21 e CDC, art. 81.

1 - Espécies de direito subjetivo em sentido estrito (poder de exigir de outrem um comportamento). Segundo Pablo Stolze e Pamplona Filho, “a expressão direito subjetivo designa a possibilidade ou faculdade individual de agir de acordo com o direito (jus est facultas agendi)” e “nela estão envolvidas as prerrogativas de que um indivíduo é titular, obtendo certos efeitos jurídicos, em virtude da norma estabelecida”. Ex: o direito subjetivo de propriedade gera prerrogativas de usar, gozar e dispor do bem.

1.1 - direitos de personalidade: direitos subjetivos que irradiam da personalidade, sem expressão econômica intrínseca, e permitem que a pessoa defenda o que lhe é próprio, no aspecto físico, moral e intelectual. Cláusula geral de tutela da personalidade: princípio da dignidade humana (art. 1º, III, CR). Aspecto extrapatrimonial da proteção do ser humano, em sua essência. Os direitos da personalidade têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais. A tese dominante é de se trata de poderes que o homem exerce sobre a própria pessoa (Stolze e Pamplona, p. 136/137). Discute-se se seria inatos (jusnaturalismo), ou se a sua fonte seria apenas a lei (positivista). Há aqui um ligação com a concepção de direitos humanos. O ser humano é o titular por excelência da tutela dos direitos da personalidade. É nova a previsão dos direitos da personalidade do Código Civil de 2002.

Característica dos direitos da personalidade: absolutos; gerais; indisponíveis (admitem restrição voluntária, desde que não seja absoluta, nem permanente, nem genérica); oponíveis erga omnes; extra-patrimoniais; impenhoráveis; inatos; vitalícios; imprescritíveis (o que prescreve são os direitos patrimoniais correspondentes, mas, p. ex, o reconhecimento da paternidade não prescreve).

Para o STF, a origem dos direitos da personalidade é a concepção (estando os direitos patrimoniais condicionados ao nascimento com vida); já o embrião laboratorial não tem direito da personalidade. A morte extingue os direitos da personalidade; no entanto, o art. 12, p. único, o CC, prevê os parentes postulem medidas para cessar ofensa (como vilipêndio a cadáver);

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entende-se que a ofensa é aos parentes indiretamente (até 4º grau); são eles legitimados em nome próprio. Também o art. 20, p. único, prevê a proteção ao direito da imagem do “de cujus”, a ser postulada pelos parentes próximos (cônjuge, ascendente, descendente).

A pessoa jurídica tem direito à honra objetiva, mas não à intimidade, à integridade física, honra subjetiva. Súmula 227 do STJ e art. 52 do CC.

Os direitos da personalidade admitem tutela específica (art. 461 do CPC) e também reparação. A Lei da ACP admite o dano moral coletivo. A tutela pode ser preventiva ou repressiva.

Os direitos da personalidade compreendem (classificação) a proteção a: 1) vida e integridade física (corpo vivo, cadáver, voz); 2) integridade psíquica e criações intelectuais (liberdade, criações, privacidade, segredo); 3) integridade moral (honra, imagem, identidade pessoal).

1.2 - direito absoluto vs. direito relativo: quanto à eficácia, o poder de agir e legitimamente exigir determinado comportamento pode impor-se a todos (direito subjetivo absoluto), ou a apenas certa(s) pessoa(s).

Segundo M. H. Diniz, para a Teoria Geral do Direito, direito absoluto equivale a “conjunto de normas de imperatividade absoluta ou impositiva, chamadas absolutamente cogentes ou de ordem pública, por ordenarem ou proibirem algo de modo absoluto, determinando a ação, a abstenção ou o estado das pessoas sem admitir qualquer alternativa, e vinculando o destinatário a um único esquema de conduta”; já, para o direito civil, “diz-se daquele oponível a todos ou erga omnes. É o que se opõe a quem quer que seja, havendo uma relação jurídica entre o titular e toda a humanidade, obrigada passivamente a respeitar o direito do sujeito passivo. Por exemplo, o direito de propriedade.” (p. 138).

Ainda conforme Diniz, direito relativo, para o direito civil, “é o oponível a certa pessoa, por ter eficácia limitada, por exemplo, no direito de crédito, o credor só pode acionar o seu devedor, que deve responder pelo cumprimento da obrigação por ele assumida. É, portanto, aquele que produz efeito jurídico inter partes” (p. 177).

1.3 -direitos de família: direitos subjetivos privados que exprimem direitos e deveres da pessoa em razão de sua posição na família.

Diniz: “é o conjunto de normas que regulam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentes e os institutos complementares da tutela, curatela e ausência” (p. 152).

1.4 - direitos disponíveis vs. direitos indisponíveis: diversamente dos últimos, os primeiros podem ser objeto de atos de disposição por parte do titular. Quanto aos direitos da personalidade, por exemplo, só não é possível a disposição total nem a permanente.

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2 -Direito potestativo ou de conformação (sinônimo): “O direito potestativo distingue-se do direito subjetivo [em sentido estrito]. A este contrapõe-se um dever, o que não ocorre com aquele, espécie de poder jurídico a que [...] corresponde [...] uma sujeição [...]. Como não lhe corresponde um dever, não é suscetível de violação e, por isso, não gera pretensões.” Também chamado de “direito de (con)formação”, porque permite ao titular “modificar, de modo unilateral, uma situação subjetiva de outrem, que [...] deve apenas sujeitar-se” ou conformar-se (p. 237).

Conforme definição de Diniz, direito potestativo é “conjunto de funções e deveres outorgados pela lei alguém para reger os bens e a pessoa absoluta ou relativamente incapaz ou que foi declarada ausente. São direitos potestativos os do pátrio poder, tutela e curatela. 2. Diz-se daquele em que seu titular tem poder de influir unilateralmente na situação jurídica de outrem, sem que este possa fazer algo, tendo que se sujeitar à sua vontade (Chiovenda). Por exemplo, o poder de revogar procuração ou de pedir divisão de coisa comum. É o poder que tem alguém, por manifestação unilateral de vontade de criar, modificar ou extinguir relações jurídicas em que outros são interessados (Orlando Gomes). Ou, como prefere De Plácido e Silva, é poder de adquirir ou alienar direitos, ou de exercer sobre seus direitos toda ação de uso, gozo, disposição ou proteção que a lei lhe assegura. Enfim, é o que se caracteriza pelo fato de seu titular poder exercer livremente sua vontade, produzindo efeitos na esfera jurídica de terceiro, sem que este possa impedi-lo” (p. 173).

3 -Direitos coletivos vs. interesses difusos. Há divergências doutrinárias quanto à distinção entre eles (inclusive quanto à divisão em três cateroais); no entanto, o art. 81, p. único, do CDC estabeleceu as categorias que reúnem os direitos coletivos latu sensu (gênero): direitos difusos, direitos coletivos stricto sensu e direitos individuais homogêneos (espécies).

Reputam-se direitos difusos “aqueles transindividuais (metaindividuais, supraindividuais, pertencentes a uma coletividade), de natureza indivisível (só podem ser considerados como um todo), e cujos titulares seja pessoas indeterminadas (ou seja, indeterminabilidade dos sujeitos, não havendo individuação) ligadas por circunstâncias de fato, não existindo um vínculo comum de natureza jurídica, v.g, a publicidade enganosa ou abusiva, veiculada através de imprensa falada, escrita ou televisionada, a afetar número incalculável de pessoas, sem que entre elas exista uma relação jurídica base, a proteção ao meio-ambiente e a preservação da moralidade administrativa” (Didier, p. 74).

“Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos.” (RE 163.231, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 26-2-1997, Plenário, DJ de 29-6-2001.)

Direitos coletivos stricto sensu “foram classificados como direitos transindividuais (com a mesma sinonímia descrita acima), de natureza indivisível, de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas (indeterminadas, mas determináveis, frise-se, enquanto grupo, categoria ou

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classe determinável), ligadas entre si, ou com a parte contrária, por uma relação jurídica base” (Didier, p. 74). A relação jurídica base pode ser por affecio societatis entre os membros do grupo, ou pela sua ligação com a parte contrária. Deve a relação-base ser anterior à lesão (aí a diferença para a propaganda enganosa, só há relação após o dano). Além disso, o elemento diferenciador em relação aos direitos difusos é a determinabilidade.

4 - Direitos individuais homogêneos. Didier ressalta que a gênese dessa proteção/garantia coletiva tem origem na class actions for damages, ações de repação de danos à coletividade do direito norte-americano. É a tutela de coletiva de direitos individuais, em razão de sua homogeneidade. Trata-se de ficção jurídica que atende a um imperativo do direito. O art. 81 do CDC fala apenas em direitos decorrentes de origem comum; Didier ressalta que “o que têm em comum esses direitos é a procedência, a gênese na conduta comissiva ou omissiva da parte contrária, questões de direito ou de fato que lhes conferem características de homogeneidade, revelando, nesse sentir, prevalência de questões comuns e superioridade na tutela coletiva”.

Os direitos individuais homogêneos são os chamados acidentalmente coletivos; há divisibilidade do objeto; uma parcela da categoria pode ganhar e outra pode perder (hipótese de litisconsórcio simples). Exemplos de direitos individuais homogêneos são o caso do anticoncepcional de farinha, bem como o acidente do Navio na Itália. Características dos direitos individuais homogêneos: a) sujeitos indeterminados, mas determináveis; b) pretensão tem origem comum; c) titularidade é certa e individual (há opção legislativa de permitir tutela coletiva)

“O Ministério Público tem legitimidade ativa para a defesa, em juízo, dos direitos e interesses individuais homogêneos, quando impregnados de relevante natureza social, como sucede com o direito de petição e o direito de obtenção de certidão em repartições públicas” (RE 472.489-AgR). Súmula 643 do STF: “O MINISTÉRIO PÚBLICO TEM LEGITIMIDADE PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA CUJO FUNDAMENTO SEJA A ILEGALIDADE DE REAJUSTE DE MENSALIDADES ESCOLARES.”

“Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, [...] legitimado o Ministério Público para a causa. CF, art. 127, caput, e art. 129. O Ministério Público não tem legitimidade para aforar ação civil pública para o fim de impugnar a cobrança e pleitear a restituição de imposto [...] pago indevidamente, [...] dado que, tratando-se de tributos, não há, entre o sujeito ativo (poder público) e o sujeito passivo (contribuinte) uma relação de consumo [...], nem seria possível identificar o direito do contribuinte com 'interesses sociais e individuais indisponíveis'.” (CF, art. 127, caput). (RE 195.056).

ACP. INTERESSES PREDOMINANTEMENTE INDIVIDUAIS. ILEGITIMIDADE. MP. In casu, o MP estadual, ora recorrido, ajuizou ação civil pública (ACP) em desfavor da associação ora recorrente por suposta simulação no negócio jurídico que resultou na venda do imóvel onde seria sua sede, razão pela qual pleiteia o MP a nulidade do ato e o consequente retorno à

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associação do título de propriedade do referido imóvel. (...). A Turma deu provimento ao recurso sob o entendimento de que o MP não possui legitimidade ativa para propor ACP na qual busca a defesa de um pequeno grupo de pessoas, no caso, dos associados de um clube numa óptica predominantemente individual. Ressaltou-se que aproteção a um grupo isolado de pessoas, ainda que consumidores, não se confunde com a defesa coletiva de seus interesses.(...)REsp 1.109.335-SE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 21/6/2011.

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ITEM A: Controle de constitucionalidade: evolução histórica do sistema brasileiro. Legitimidade.

Obras consultadas:BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2004, 14ª Ed.MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocência Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008, 2ª Ed.

Legislação básica.art. 103, CF/88; art. 102, I, "a", CF/88; art. 103, § 2º, CF/88; art. 102, § 1º, introduzido na CF/88 pela Emenda Constitucional nº 3/1993. Lei n. 9.882/99

A Constituição de 1824 não contemplava qualquer sistema assemelhado aos modelos atuais de controle de constitucionalidade. A influência francesa ensejou que se outorgasse ao Poder Legislativo a atribuição de “fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las”, bem como “velar na guarda da Constituição” (art. 15, n. 8° e 9°). Era a consagração de dogma da soberania do Parlamento, à sombra da existência do Poder Moderador. Não havia lugar, nesse sistema, para o mais incipiente modelo de controle judicial de constitucionalidade.

De outra banda, o regime republicano inaugura uma nova concepção sobre o tema. A influência do direito norte-americano parece ter sido decisiva para a consolidação do modelo difuso, consagrado já na chamada Constituição provisória de 1890 (Decreto n. 848, de 11-10-1890), e incorporado na Constituição de 1891. Consolidou-se amplo sistema de controle difuso no Direito brasileiro, sendo inequívoca, à época, a consciência de que esse exame não se havia o controle in abstracto.

Por sua vez a Constituição de 1934 introduziu profundas e significativas alterações no nosso sistema de controle de constitucionalidade. A par de manter as disposições contidas na Constituição de 1891, o constituinte determinou que a declaração de inconstitucionalidade somente poderia ser realizada pela maioria da totalidade dos membros dos tribunais (reserva de plenário – regra do “full bench”). Por outro lado, consagrava a competência do Senado para “suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando fossem declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário”, emprestando efeito erga omnes à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. Talvez a mais fecunda e inovadora alteração introduzida pelo Texto Magno de 1934 se refira à declaração de inconstitucionalidade para decretar a intervenção federal, i.e., a representação interventiva, confiada ao Procurador-Geral da República, nas hipóteses de ofensa a específicos princípios elencados na Constituição(princípios constitucionais sensíveis).

Na contramão dos textos anteriores, a Carta de 1937 traduziu um inequívoco retrocesso no sistema de controle de constitucionalidade. Embora não tenha introduzido qualquer modificação no modelo difuso de controle, o constituinte rompeu com a tradição jurídica brasileira, consagrando princípio segundo o qual, no caso de ser declarada a inconstitucionalidade de uma lei que, a juízo do Presidente da República, fosse necessária ao bem-estar do povo, à promoção ou defesa do interesse nacional de alta monta, poderia o Chefe do Poder Executivo submetê-la novamente ao Parlamento. Confirmada a validade da lei por 2/3 dos votos em cada uma das Câmaras, tornava-se insubsistente a decisão do Tribunal.

De outro giro, a Constituição de 1946 restaura a tradição do controle judicial no Direito 1

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brasileiro. Preservou-se a exigência da maioria absoluta dos membros do Tribunal para a eficácia da decisão declaratória de inconstitucionalidade. Manteve-se, também, a atribuição do Senado para suspender a execução da lei declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal. A Constituição de 1946 emprestou, ademais, nova conformação à ação direta de inconstitucionalidade, introduzida, inicialmente, no Texto Magno de 1934. Atribuiu-se ao Procurador-Geral da República a titularidade da representação de inconstitucionalidade, para os efeitos de intervenção federal, no caso de violação de princípios sensíveis. A intervenção subordinava-se, nessa hipótese, à declaração de inconstitucionalidade do ato pelo Supremo Tribunal Federal.

Por sua vez, a Emenda n. 16, de 26-11-1965, instituiu, ao lado da representação interventiva, e nos mesmos moldes, o controle abstrato das normas estaduais e federais. Consagrou-se o modelo de exame in abstracto(modelo austríaco), sob a forma de uma representação que haveria de ser proposta pelo Procurador-Geral da Republica. Somou-se, pois, aos mecanismos já existentes um instrumento destinado a defender diretamente o sistema jurídico objetivo.

A Constituição de 1967 não trouxe grandes inovações ao sistema de controle de constitucionalidade. Manteve-se incólume o controle difuso. A ação direta de inconstitucionalidade subsistiu, tal como prevista na Constituição de 1946, com a Emenda n. 16/65.

Nessa senda, a Constituição de 1988 ampliou significativamente os mecanismos de proteção judicial, e assim também o controle de constitucionalidade das leis. Preservou a representação interventiva, destinada à aferição da compatibilidade de direito estadual com os princípios sensíveis. Combina o modelo tradicional de controle incidental de normas, os vários instrumentos de defesa de direitos individuais, como o habeas corpus, mandado de segurança, habeas data, mandado de injunção, com as ações diretas de inconstitucionalidade e de constitucionalidade, a ação direta por omissão e a arguição de descumprimento de preceito fundamental.

A grande mudança vai-se verificar no âmbito do controle abstrato de normas, com a criação da ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou federal. O constituinte ampliou o rol de legitimados ativos, de modo a contemplar o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de uma Assembleia Legislativa, o Governador do Estado, o Procurador-Geral da República o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional, as confederações sindicais e as entidades de classe de âmbito nacional.45

45Legitimados universais: podem impugnar, em ADIN, qualquer matéria, sem necessidade de demonstrar nenhum interesse específico. São legitimados universais o Presidente da República, as Mesas da Câmara e do Senado, o PGR, o Conselho Federal da OAB e os partidos políticos;

Legitimados especiais: precisam demonstrar pertinência temática. São legitimados especiais as confederações sindicais, as entidades de classe de âmbito nacional, as Mesas das Assembléias Legislativas estaduais ou da Câmara Legislativa do DF e os Governadores dos estados e do DF. Merece lembrar que, apesar disso, o Governador de um Estado pode impugnar lei de outro Estado, desde que comprove o reflexo da norma sobre sua respectiva unidade federada (é comum essa hipótese em matéria de ICMS)

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ITEM B: Nacionalidade brasileira. Condição jurídica do estrangeiro. Refugiados. Asilo político.

Obras consultadas:BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2004, 14ª Ed.MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocência Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008, 2ª Ed.REZEK, Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. São Paulo: Saraiva, 2010, 12ª Ed.http://www.onu.org.br/acnur-usp-e-unisantos-lancam-publicacao-sobre-perspectivas-do-refugio/

Legislação básica.

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DUDH (art. 15); Convenção de São José da Costa Rica (art. 20) e Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e seu Protocolo.Art. 12 e ss. da CF/88;Art. 5º, LI, da CC/88;

Lei 9.474/97;Lei 6.815/80.

Nacionalidade brasileira. A nacionalidade é um vínculo jurídico-político entre o Estado e o indivíduo. O direito à nacionalidade, consagrado como direito humano na DUDH (art. 15) e na Convenção de São José da Costa Rica (art. 20), é matéria constitucional no plano doméstico. A Convenção de Haia (1930) proclama a liberdade do Estado para determinar quais são seus nacionais, contudo, tal determinação só é oponível aos demais Estados quando revestida de um mínimo de efetividade (idioma, filiação, residência, etc), sob pena de poder ser negado o reconhecimento do vínculo patrial (caso Nottebohm) (REZEK, 2010, p. 293). A CR/88, fundada no critério territorial (jus soli), considera brasileiros natos (nacionalidade originária) os nascidos no Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país (o serviço deve ser público e afeto ao país da nacionalidade dos pais). Adotou o sistema jus sanguinis ao prever como brasileiros natos os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço do Brasil (compreende todo encargo derivado dos poderes da União, Estados e Municípios, suas autarquias, e o serviço de organização internacional de que a República faça parte – REZEK, 2010, p. 192-3). São, ainda, brasileiros natos os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileira, desde sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir no Brasil e optem, a qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira (EC 54/2007). São brasileiros naturalizados (nacionalidade derivada) aqueles que venham a adquirir a nacionalidade brasileira, possuindo todos os direitos do brasileiro nato, salvo o acesso a cargos públicos eminentes (CF, art. 12, §3º) e a garantia de não ser extraditado (CF, art. 5º, LI). Para a naturalização, exigem-se dos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral (CF, art. 12, II, a); dos estrangeiros de qualquer nacionalidade, residência no Brasil há mais de 15 anos ininterruptos e inexistência de condenação criminal (CF, art. 12, II, b); dos estrangeiros que não cumprirem tais requisitos, reclamam-se quatro anos de residência no Brasil, idoneidade, boa saúde e domínio do idioma, podendo o prazo de residência ser reduzido para 1 ano se o naturalizado tiver filho ou cônjuge brasileiro, for filho de brasileiro ou houver prestado ou puder prestar serviço relevante ao Brasil (Lei 6.815/80, art. 113). A perda da nacionalidade, que pode atingir brasileiro nato e naturalizado, ocorre com a aquisição voluntária de outra nacionalidade, salvo no caso de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente no exterior como condição de permanência em seu território ou para exercício de direitos civis. O naturalizado pode perder sua nacionalidade em razão de exercício de atividade contrária ao interesse nacional, mediante decisão judicial transitada em julgado. Aos portugueses com residência permanente no Brasil, se houver reciprocidade em favor de brasileiros (Decreto 3.927/01), serão atribuídos os direitos inerentes aos brasileiros, ressalvados os casos nele previstos (MENDES, 2010, p. 845). Condição jurídica do estrangeiro. Além dos direitos e garantias da pessoa humana, reconhece-se ao estrangeiro o gozo dos direitos civis, com exceção do direito a trabalho remunerado - restrito aos estrangeiros residentes -, e dos direitos políticos. A EC 19/98 permitiu a admissão de

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estrangeiros no serviço público nos termos da lei, especialmente nas instituições universitárias de ensino e pesquisa (CF, art. 37, I, e 207, §1º). A aquisição de imóvel por estrangeiro, embora condicionada, é assegurada até mesmo na faixa de fronteira (CF, art. 190). O direito de pesquisa e lavra de recursos minerais e aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica é exclusivo de brasileiro ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país (CF, art. 176, §1º). Da mesma forma, a propriedade de empresa de radiodifusão sonora de sons e imagens restringe-se a brasileiro nato ou naturalizado há mais de 10 anos (CF, art. 222) ou a pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e que tenha sede no país. Refúgio: é medida de caráter humanitário, que confere proteção de um Estado a estrangeiro, vítima de perseguição baseada em motivos religiosos, raciais, de nacionalidade, de grupo social e de opiniões políticas (Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e seu Protocolo). É aplicado a casos em que a perseguição tem aspecto generalizado. Para sua concessão, basta o fundado temor de perseguição. A Lei 9.474/97 dispõe sobre o Comitê Nacional para os Refugiados – CONARE e o processo de refúgio no Brasil. Asilo político: é medida de caráter político, em que o Estado confere acolhimento a estrangeiro perseguido em virtude de dissidência política, de delitos de opinião, ou de crimes que não configuram quebra do direito penal comum. Normalmente, é empregado em casos de perseguição política individualizada. O asilo político, na sua forma acabada, é territorial: concede-o o Estado àquele estrangeiro que, havendo cruzado a fronteira, colocou-se no âmbito espacial de sua soberania e aí requereu o benefício. Seus pressupostos são a natureza política dos delitos atribuídos ao fugitivo e a atualidade da persecução (estado de urgência). O asilo diplomático tem os mesmos pressupostos, mas é forma provisória de asilo político, só praticado na América Latina. A autoridade asilante reclamará da autoridade local a expedição de um salvo-conduto com que o asilado possa deixar em condições de segurança o Estado territorial para encontrar abrigo definitivo no Estado que se dispõe a recebê-lo (REZEK, 2010, p. 221-5). A concessão tanto de asilo como de refúgio é decisão discricionária do Estado e não está sujeita à reciprocidade.

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ITEM C: Servidores públicos: princípios constitucionais.

Obras consultadas:

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 26ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 21ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª edição. São Paulo: Atlas, 2009.

Legislação básica:art. 37, CF/88; art. 38, CF/88; art. 39, CF/88; art. 41, CF/88. LC 101/2000

Servidores públicos: princ. constitucionais. Além dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, que devem nortear os atos dos servidores públicos (CF, art. 37, caput), a Constituição previu princípios específicos a esses agentes. 1) Regime Jurídico Único (CF, art. 39, caput): segundo entendimento majoritário46, confere à pessoa federativa a opção pelo regime estatutário ou trabalhista, mas, uma vez feita a opção, o regime deverá ser o mesmo para a Administração Direta, autarquias e fundações de direito público. Previsto na redação originária da CF/88, foi abolido pela EC 19/98, mas retornou com a concessão de medida cautelar na ADI 2135. 2) Acessibilidade por concurso público (CF, art. 37, I): baseada nos princípios da igualdade, da moralidade e da competição, a Constituição determina o acesso aos cargos, funções e empregos públicos, da Administração Direta e Indireta47, mediante concurso público48 de provas ou de provas e

46Adotado, dentre outros, por Maria Sylvia Z. Di Pietro, Celso Antônio B. de Mello e José dos Santos Carvalho Filho47 Apesar de as empresas públicas e as sociedades e economia mista estarem sujeitas à admissão por concurso, na hipótese de serem constituídas para exploração de atividade econômica, devem dispor de liberdade para a contratação direta de seus empregados quando o concurso tolher a possibilidade de captarem profissionais especializados ou quando bloquear o desenvolvimento de suas normais atividades (CF, art. 173, §1º, II). (MELLO, p. 280-6 e CARVALHO FILHO, p. 572-602)48 A EC 51/06 previu a admissão de agentes comunitários de saúde e agentes de combate a endemias mediante processo seletivo público (CF, art. 198, §5º), que terá de apresentar características similares as de um concurso público, podendo apenas simplificá-lo naquilo que não interfira com a necessária publicidade, igualdade e possibilidade de aferirem a lisura do certame. (MELLO, p. 280-6 e CARVALHO FILHO, p. 572-602)

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títulos, com validade de até dois anos, prorrogáveis uma vez, por igual período (art. 37, III). São exceções constitucionais ao examinado princípio: a nomeação para cargos de provimento em comissão (art. 37, II); a investidura dos integrantes do quinto constitucional nos Tribunais (art. 94), dos membros dos Tribunais de Contas (art. 73, §§2º e 3º), dos Ministros do STF (art. 101, par. único) e do STJ (art. 104, par. único); o aproveitamento e ex-combatentes que tenham efetivamente participado de operações bélicas durante a 2ª Guerra Mundial (ADCT, art. 53, I) e a contratação para o atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX). 3) Proibição de acumulação remunerada (CF, art. 37, XVI e XVII): veda-se a acumulação remunerada de cargos, funções ou empregos na Administração Direta e Indireta, ressalvada a acumulação de dois cargos de professor; de um cargo de professor com outro técnico ou científico; de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde com profissões regulamentadas; de juiz e de membro do MP com outro de magistério (CF, art. 95, par. único, e art. 128, §5º, II, “d”), desde que haja compatibilidade de horários e respeito ao teto de remuneração. 4) Estabilidade49(CF, art. 41): é o direito de permanência no serviço público, adquirido pelo servidor estatutário após três anos de efetivo exercício e aprovação em avaliação especial de desempenho (art. 41, §4º). Adquirida a estabilidade, o servidor só pode ser demitido50

através de sentença judicial transitada em julgado (art. 41, §1º, I), processo administrativo (art. 41, §1º, II) ou procedimento de avaliação periódica de desempenho (art. 41, §1º, III), assegurada sempre a ampla defesa O servidor estável pode ser exonerado por excesso do quadro, quando for insuficiente a redução de 20% das despesas com cargos em comissão ou função de confiança e a exoneração de servidores não estáveis com vistas a adequar as despesas de pessoal à LC 101/2000 (CF, art. 169, §4º). 5) Sistema constitucional de remuneração51: a) a remuneração dos servidores públicos, inclusive sob a forma de subsídio, somente poderá ser fixada ou alterada por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada a revisão geral anual sempre na mesma data, sem distinção de índices

49"O Tribunal julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo governador do Estado do Rio de Janeiro para declarar a inconstitucionalidade da alínea g, I, e da alínea a, IV, ambas do art. 178 da Constituição estadual, que, preveem, respectivamente, que o defensor público, após dois anos de exercício na função, não perderá o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado, e ser prerrogativa daquele requisitar, administrativamente, de autoridade pública e dos seus agentes ou de entidade particular, certidões, exames, perícias, e outros documentos e providências necessários ao exercício de suas atribuições. Quanto à citada alínea g, considerou-se o advento da EC 19/1998, que ao alterar o art. 41 e respectivos parágrafos, passou a prever a estabilidade de servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público somente após três anos de efetivo exercício, bem como a perda do cargo de servidor público estável tanto por sentença judicial transitada em julgado quanto mediante processo administrativo, assegurada a ampla defesa, e procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, também garantida a ampla defesa.” (ADI 230, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 1º-2-2010, Plenário, Informativo   573 )50 Se for irregularmente demitido, tem direito à reintegração, e quem lhe ocupava o lugar será reconduzido ao cargo de origem, sem direito a indenização, aproveitado em outro ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço (CF, art. 42, §2º). De acordo com a Súmula 21 do STF, o desligamento de servidor ainda não estável, isto é, em estágio probatório, não é livre, pois depende de inquérito ou formalidades legais de apuração de sua capacidade (MELLO, 290-1).51

Trecho do parecer da PGR na ADO 18: (...) Parece fora de dúvida que o procedimento adotado está em desconformidade com o tratamento que a Constituição confere ao tema, acima enunciado. Primeiro, não há qualquer indicativo de que as propostas orçamentárias do Poder Judiciário tenham sido encaminhadas a destempo, o que autorizaria o Executivo a se valer dos valores previstos na lei orçamentária de 2011. Segundo, não há referência a inobservância dos limites acordados na LDO. A Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso Nacional, analisando a proposta encaminhada pela Mensagem 344/2011, observou em relação ao item “gastos com pessoal e encargos sociais”:

"as despesas com pessoal e encargos sociais atingem o valor de R$ 203,24 bilhões em 2012, o que representa um crescimento nominal de 1,75% em relação ao valor autorizado para 2011. Conforme a Mensagem, esse valor corresponde a 32,85% da receita corrente líquida prevista para 2012, situando-se, portanto, aquém do limite máximo previsto na LRF, que é de 50%. Cumpre destacar a redução dessa despesa em termos de percentual do PIB, caindo de 4,41% do PIB na projeção de 2011 para 4,15% em 2012 (vide Tabela 3).Por exigência da Constituição Federal e da LDO, o Poder Executivo apresenta o Anexo V, que discrimina a autorização para os aumentos e alterações na legislação de pessoal no decorrer de 2012, resultando em um montante adicional de R$ 3,6 bilhões nas despesas com pessoal (R$ 6,4 bilhões anualizados)."

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(CF, art. 37, X); b) a garantia de irredutibilidade protege o servidor contra a redução direta de seus vencimentos52, não se estendendo, contudo, às reduções indiretas decorrentes da inflação e incidência de tributos (CF, art. 37, XV); c) para evitar aumentos em cadeia, veda-se a vinculação ou equiparação de qualquer espécie remuneratória para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público (CF, art. 37, XIII); d) a EC 41/03 estabeleceu limites máximos para a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos, percebidos cumulativamente ou não e incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza53(CF, art. 37, XI), aplicáveis à Administração Direta e Indireta, abrangendo as empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias, desde que recebam recursos públicos para pagamento de despesas com pessoal ou custeio em geral. Fixou-se como teto geral para todos os Poderes da União, Estados, DF e Municípios o subsídio mensal dos Ministros do STF. Como subtetos foram fixados, nos Municípios, o subsídio do Prefeito; nos Estados e DF54, varia conforme se trate de servidor do Legislativo (Deputados estaduais), do Executivo (Governador) ou do Judiciário (Desembargadores do TJ), este último aplicável ao MP, Procuradores e Defensores Públicos. e) proíbe-se que os acréscimos pecuniários percebidos por servidor sejam computados ou acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores (CF, art. 37,XIV). 6) Direito de greve e sindicalização (art. 37, VI e VII)55: reconhece-se aos servidores direito à livre associação sindical e de greve a ser exercido nos termos e limites definidos em lei específica.

52 Não se incluem os adicionais e gratificações de caráter específico e transitório (CARVALHO, 2011, p. 682).53 Conforme a EC 47/05, não se computam no teto as parcelas de caráter indenizatório previstas em lei (art. 37, §11º)54 Com a EC 47/05, foi facultado aos Estados e ao DF, mediante emenda às CE e LO, adotarem um único paradigma como limite: os subsídios dos desembargadores do TJ salvo para os Deputados e Vereadores que seguem a regra do art. 37, XI, da CF.55 Norma esta que era tida como de eficácia limitada pelo STF até julgamento do MI 708, em que se propôs solução à omissão legislativa com a aplicação da Lei 7.783/89 (MELLO, 286-7).

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ITEM A: Disposições constitucionais transitórias: conceitos e limites. Recepção. Inconstitucionalidade superveniente

Gilmar Ferreira Mendes e outros. Curso de Direito Constitucional. 2 ed. Ed. Saraiva, 2008.Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 15 ed. Ed. Maleiros, 2004.Luís Roberto Barroso. O Direito Constitucional e A Efetividade de Suas Normas 2.ed., RJ: Renovar, 1993.

ADCT. Conceito. Luís Roberto Barroso, ao falar das disposições transitórias, diz que as mesmas significam: “a influência do passado com o presente, a positividade que se impõe com aquela que se esvai” (BARROSO, 1993, p,310). Pelas palavras do referido autor, fica claro que o mesmo entende que a função maior da ADCT é justamente fazer uma transição entre o ordenamento jurídico que se vai com o ordenamento jurídico que chega, ou seja, fazer um elo de ligação entre duas constituições, evitando, assim, um colapso decorrente da referida transição. Natureza Jurídica. Os dispositivos do ADCT têm natureza jurídica de normas constitucionais de transição, sejam temporárias ou não, fazendo parte do que Raul Rocha Machado chama de Direito Transitório. Mas não há dúvida de que as mesmas são normas constitucionais, não só porque foram elaboradas e promulgadas pelo poder constituinte, como também em face do fato de só poderem ser alteradas por Emenda Constitucional, e, ainda, em função do princípio da unidade da constituição. Revestem-se, portanto, do mesmo valor jurídico da parte permanente da Constituição.Classificação. Vale ressaltar, ademais, que as normas do ADCT, segundo José Afonso da Silva, integram os elementos formais de aplicabilidade, que junto com o preâmbulo, são os que trazem regras para aplicação da Constituição, ajudando a garantir-lhe eficácia.

RECEPÇÃO. É a revalidação de normas que não desafiam materialmente a Constituição. Ou, segundo Kelsen, é um procedimento abreviado de criação jurídica. Isto porque, apenas o conteúdo dessas normas permanece o mesmo, não o fundamento de sua validade. (Do ponto de vista jurídico, as leis não continuam válidas, e sim passam a ser leis novas, com fundamento de validade na nova CF, cujo sentido coincide com a leis anteriores). A recepção pode ser expressa (art. 183 da CF/37) ou implícita. A diferença de forma não repercute negativamente quanto a um juízo de recepção. A forma é regida pela lei da época do ato ( tempus regit actum), sendo irrelevante para a recepção. Basta, assim, que o tema, quanto ao seu conteúdo, seja acolhível sob o prisma da nova ordem constitucional. Por isso, apesar de não existir mais o decreto-lei, ainda são aplicáveis várias normas que foram concebidas sob esta forma. Ex: CP, CPP. Isto porque não há inconstitucionalidade formal superveniente. Da mesma forma, o CTN, foi recebido como lei complementar, o que significa dizer que ele, no que concerne a normas gerais de direito tributário, só pode ser modificado por lei complementar. Importante: deve haver compatibilidade formal e material da lei pré-constitucional à CF anterior.

INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE A inconstitucionalidade pode ser originária ou superveniente. Se a norma legal é posterior à Constituição e já nasce viciada, formal ou materialmente, tem-se caso típico de inconstitucionalidade (originária). Diversamente, é o caso da lei pós-88 que nasce constitucional, mas que deixa de ser compatível com a CF em função de emenda posterior, de mudanças ocorridas nas relações fáticas ou de alteração da interpretação constitucional (mutação constitucional). Diante da mudança da realidade fática, a norma legal

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSque não podia ser acoimada de inconstitucional, ao tempo de sua edição, torna-se suscetível de censura judicial, configurando o processo de inconstitucionalização. Situação semelhante é mudança na concepção jurídica, que pode produzir uma mutação normativa ou a evolução na interpretação, permitindo que venha a ser reconhecida a inconstitucionalidade de situações anteriormente consideradas legítimas. Nas palavras de Gilmar Mendes “ afigura-se possível a caracterização da inconstitucionalidade superveniente como decorrência da mudança de significado do parâmetro normativo constitucional, ou do próprio ato legislativo submetido à censura judicial. Nesses casos, além de eventual processo de inconstitucionalização (situação de transição), pode-se ter a própria declaração de inconstitucionalidade da lei anteriormente considerada constitucional.”(MENDES, 2008, p. 1024)

NÃO-RECEPÇÃO: REVOGAÇÃO OU INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE?

No caso de contradição entre a norma constitucional superveniente e o direito ordinário pré-constitucional, entende o STF que a hipótese de não-recepção corresponde a uma revogação (ADI nº 2, Rel. Min. Paulo Brossard). O raciocínio do ministro se baseou no fato de que não há nulidade absoluta, pois a lei anterior não é nula desde sempre, já que ela era válida sob a égide da CF anterior, mas passou a ser incompatível com a nova CF; logo, não caberia falar em inconstitucionalidade. O voto vencido foi o do Min. Sepúlveda Pertence, que sustentava ser caso de inconstitucionalidade superveniente, já que a incompatibilidade da lei anterior com a nova CF não se resolveria pelo critério cronológico, e sim pelo critério hierárquico (posição do direito italiano e português). A importância desse entendimento reside nas seguintes consequências práticas: a - não cabe ADI contra a lei anterior à nova CF; b – não é necessária a apreciação da não-recepção por quórum especial (art. 97 da CF – cláusula de reserva de plenário); c não incidem os procedimentos aplicáveis à declaração de inconstitucionalidade, como a modulação dos efeitos da decisão, por se tratar de direito intertemporal. Observa-se, no entanto, que uma norma pré-constitucional, ao se incorporar em um diploma pós-constitucional, passa a admitir o controle abstrato (ADI 3619/2006) e também que o STF já admitiu o exame incidental da revogação ou não-recepção do direito anterior no controle abstrato (ADI 3833/2006).

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ITEM B: REGIME CONSTITUCIONAL DA PROPRIEDADE. FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL. DIREITO ADQUIRIDO, EXPECTATIVA DE DIREITO E MUDANÇAS SOCIAIS

DIREITO DE PROPRIEDADE: direito fundamental de âmbito marcadamente normativo. Necessidade de conformação legal, ou seja, confia-se ao legislador, primordialmente, o mister de definir, em essência, o próprio conteúdo do direito regulado. Art. 5, XXII c/c XXIII: a função social da propriedade – e, portanto, sua vinculação social - assume relevo no estabelecimento na conformação ou limitação desse direito. Apresenta-se como garantia institucional e como direito subjetivo. Assim, ao mesmo tempo que depende de concretização e conformação, vincula e obriga o Estado. Âmbito de proteção. O conceito de propriedade sofreu profunda alteração no século passado. A base da subsistência e do poder de autodeterminação do homem moderno não é mais a propriedade em sentido tradicional, mas o próprio trabalho e o sistema previdenciário e assistencial instituído e gerido pelo Estado (Hesse). Logo, o conceito constitucional do direito de propriedade transcende à concepção privatística estrita, abarcando outros valores e relações de índole patrimonial. Definição e limitação. A garantia constitucional da propriedade está submetida a um intenso processo de relativização, sendo interpretada, fundamentalmente, de acordo com os parâmetros fixados pela legislação ordinária. Asdisposições legais têm, portanto, caráter constitutivo (conformação). Necessidade de compatibilização do espaço de liberdade do indivíduo no âmbito da ordem de propriedade com o interesse da comunidade. O poder de conformação não é absoluto por parte do legislador, deve observar o núcleo essencial desse direito (limites dos limites – proporcionalidade). Núcleo essencial: utilidade privada e poder de disposição.

PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIOAMBIENTAL DA PROPRIEDADE.

Pode ser extraído da CF e do Código Civil (art. 1228, § 1º). Propõe que o exercício da propriedade não pode gerar prejuízos a terceiros e, muito menos, ao meio ambiente. Permite-se a estipulação de limitações administrativas. Segundo o art. 186 da CR/88, por exemplo, a função social da propriedade rural é cumprida quando ela atende à utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente. STF: A própria Constituição da República, ao impor ao poder público o dever de fazer respeitar a integridade do patrimônio ambiental, não o inibe, quando necessária a intervenção estatal na esfera dominial privada, de promover a desapropriação de imóveis rurais para fins de reforma agrária, especialmente porque um dos instrumentos de realização da função social da propriedade consiste, precisamente, na submissão do domínio à necessidade de o seu titular utilizar adequadamente os recursos naturais disponíveis e de fazer preservar o equilíbrio do meio ambiente (CF, art. 186, II), sob pena de, em descumprindo esses encargos, expor-se à desapropriação-sanção a que se refere o art. 184 da Lei Fundamental." (MS 22.164, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 30-10-95, DJ de 17-11-95)

DIREITO ADQUIRIDO, EXPECTATIVA DE DIREITO E MUDANÇAS SOCIAIS.

DIREITO ADQUIRIDO. Noção. Princípio da não-retroatividade das leis (Art. 5, XXXVI, CF/88). Consectário do princípio da segurança jurídica. Regra imposta ao juiz, à quem é vedado atribuir à lei efeito retrooperante, e cogente para o legislador, à sua vez proibido de ditar leis retroativas. Conceito.Art. 6º da LICC. Adoção da Teoria Subjetiva (Savigny e Gabba). Superação da Teoria Objetiva da situação jurídica (Roubier). Na definição de Gabba “é adquirido um direito

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSque é consequência de um fato idôneo a produzi-lo em virtude da lei vigente ao tempo em que se efetuou, embora a ocasião de fazê-lo valer não se tenha apresentado antes da atuação da lei nova, e que sob o império da lei então vigente, integrou-se imediatamente no patrimônio do seu titular”. Diferenciação das meras expectativas de direito (decorrentes de fato aquisitivo incompleto). Princípio constitucional do direito adquirido. O princípio do direito adquirido se aplica a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei de direito público e lei de direito privado, ou entre lei de ordem pública e lei dispositiva. É insuficiente, no entanto, para proteger situações relacionadas a direitos de perfil marcadamente institucional (ex: liberdade de associação) ou real, por exemplo. A segurança jurídica, ao revés, mais ampla, vem sendo bastante acolhida, e abrange as expectativas legítimas. Direito adquirido como garantia constitucional. Essa questão foi objeto do RE 226.855. O STF posicionou-se no sentido de que se cuida de uma garantia constitucional e não uma regra doutrinária de solução de questões intertemporais, sendo irremovível, pois, pelo legislador ordinário. Outrossim, uma alteração legislativa que implique a mudança de situações consolidadas, mesmo quando não ofenda o direito adquirido deve preocupar-se com regras de transição, sob pena de haver uma omissão inconstitucional grave. Alteração de regime ou estatuto jurídico. As duas teorias referidas rechaçam a possibilidade de subsistência de situação jurídica individual em face de alteração substancial do regime ou de um estatuto jurídico. Também o STF entende que a proteção ao direito adquirido não obsta a modificação ou a supressão de determinado instituto jurídico. Nesse sentido o voto do Min. Moreira “em matéria de direito adquirido vigora o princípio – que este tribunal tem assentado inúmeras vezes – de que não há direito adquirido a regime jurídico de um instituto de direito. Quer dizer então que a lei nova modificadora aplica-se de imediato.” (RE 94.020). Na ADI 3105, a Corte Suprema reafirmou esta posição, declarando a constitucionalidade da EC 41/03. Para o Supremo, a não-incidência inicial da contribuição sobre os proventos dos inativos não assegura aos aposentados imunidade em relação a tributação, e o fato de não se ter estabelecido a tributação até então não legitima, do ponto de vista do direito adquirido, a preservação indefinida desse status. Proclama-se, portanto, a não existência de um direito adquirido a um estatuto jurídico. Salienta-se, por fim, que não é possível invocar o direito adquirido contra a Constituição, pois o PCO é inicial, ilimitado. As normas constitucionais são dotadas de eficácia retroativa mínima, alcançando efeitos futuros de um fato passado. Respeitam-se apenas – exceto se a CF expressamente declarar o contrário – os efeitos que ocorreram antes da vigência do novo texto constitucional.

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ITEM C: Princípio da isonomia. Ações afirmativas. O pluralismo.

PRINCÍPIO DA ISONOMIA Vertentes. A) Igualdade formal. Prevaleceu no constitucionalismo liberal – igualdade perante a lei. É a ideia de lei igual para todos – não existem mais distinções em razão de privilégios de berço. B) Igualdade material. Prevaleceu no constitucionalismo social – igualdade na lei (no seu conteúdo). Exemplo clássico de luta em torno da igualdade: direitos do trabalhador. b1) Igualdade material socioeconômica. É uma lógica de desigualar, de forma a equiparar aquele econômica ou socialmente mais fraco. Há mudança profunda acerca do conceito de pessoa. Tratam-se desigualmente os desiguais, observado o princípio da proporcionalidade. Proteção dos vulneráveis socioeconomicamentes. b2) Igualdade material cultural. Ideia de garantir igualdade também no plano material e simbólico: igualdade como reconhecimento. Ensina Nancy Frase que “a injustiça social decorre não só de problemas de distribuição de recursos, mas também um problema de reconhecimento”. Fala-se em um direito à equiparação. Segundo essa visão, como destaca o sociólogo português Boaventura de Souza Santos, “há direito a ser igual quando a desigualdade inferioriza (ex: casamento entre homossexuais) e há o direito a ser diferente quando a igualdade descaracteriza.” Portanto, é papel do Direito promover as chamadas políticas de reconhecimento, que visam a dar a devida estima social a grupos que tenham sido historicamente estigmatizados pela sociedade e pelo Estado. Aqui se insere um dos fundamentos da proteção dos índios. Tratá-los como iguais descaracteriza sua cultura. Teoria do impacto desproporcional. Essa teoria (“disparate impact doctrine”) é muito utilizada por Daniel Sarmento e Deborah Duprat em ações ajuizadas pelo MPF; a teoria atua no plano da aplicação do Direito, e não no plano propriamente do conteúdo das normas. As violações à igualdade não são tão flagrantes, por isso precisamos aguçar nossa percepção para perceber se uma norma que tem conteúdo genérico e abstrato, mas cuja aplicação desfavorece sistematicamente uma minoria estigmatizada.Na ADIN 1946, o STF, embora sem citar diretamente a teoria, entendeu que aplicar o teto da Previdência em relação ao benefício da licença-maternidade estendida geraria um impacto desproporcional em relação às mulheres.

AÇÕES AFIRMATIVAS. Conceito. Medidas públicas ou privadas de caráter coercitivo ou não que visam a promover a igualdade material através da discriminação positiva de pessoas integrantes de grupos que estejam em situação desfavorável e que sejam vítimas de discriminação e/ou estigma social.Exs: mulheres, negros, deficientes, índios, etc. (Para efetivar a igualdade material, o Estado pode lançar mão de políticas de cunho universalista — a abranger número indeterminado de indivíduos — mediante ações de natureza estrutural; ou de ações afirmativas — a atingir grupos sociais determinados — por meio da atribuição de certas vantagens, por tempo limitado, para permitir a suplantação de desigualdades ocasionadas por situações históricas particulares). A adoção de políticas que levam ao afastamento de perspectiva meramente formal do princípio da isonomia integra o cerne do conceito de democracia. O modelo constitucional pátrio incorporara diversos mecanismos institucionais para corrigir distorções resultantes da incidência meramente formal do princípio da igualdade. O Min. Ricardo Lewandowski no julgamento da ADPF 186/DF, elucidou o conceito de ações afirmativas, afirmando “que seriam medidas especiais e concretas para assegurar o desenvolvimento ou a proteção de certos grupos, com o fito de garantir-lhes, em condições de igualdade, o pleno exercício dos direitos do homem e das liberdades fundamentais. Explanou

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSas diversas modalidades de ações afirmativas empregadas em vários países: a) a consideração do critério de raça, gênero ou outro aspecto a caracterizar certo grupo minoritário para promover sua integração social; b) o afastamento de requisitos de antiguidade para a permanência ou promoção de membros de categorias socialmente dominantes em determinados ambientes profissionais; c) a definição de distritos eleitorais para o fortalecimento de minorias; e d) o estabelecimento de cotas ou a reserva de vagas para integrantes de setores marginalizados.”. Argumentos favoráveis. 1) Argumento da justiça compensatória (reparação da desigualdade histórica); 2) Argumento da justiça distributiva (por meio da denominada “justiça distributiva” permite-se a superação das desigualdades no mundo dos fatos, através de intervenção estatal que realoque bens e oportunidades existentes na sociedade em benefício de todos); 3) Argumento do pluralismo (pressupõe que pessoas de raças e níveis sociais diferentes, por exemplo, convivam no mesmo meio) 4) Argumento relacionado às políticas de reconhecimento (promoção da igualdade simbólica/cultural). Temporariedade. As políticas afirmativas tem um caráter temporário. Releitura do conceito de igualdade. A adoção das ações afirmativas é resultado de uma releitura do conceito de igualdade. “A partir do Estado Social do Direito, cujo marco é o conhecido welfare state, percebeu-se que a atitude negativa dos poderes públicos era insuficiente para promover, de fato, a igualdade entre as pessoas. Exige-se uma atitude positiva, através de políticas públicas e da edição de normas que assegurem igualdade de oportunidade e de resultados na divisão social de bens escassos. Na lição de Canotilho, não há igualdade no não direito (Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina, 7 ed., 2003. p. 427). Esse senso de discriminação positiva foi analisado com maestria pelo Min. Joaquim Barbosa em sede doutrinária, verbis: ‘Em Direito Comparado, conhecem-se essencialmente dois tipos de políticas públicas destinadas a combater a discriminação e aos seus efeitos. Trata-se, primeiramente de políticas governamentais de feição clássica, usualmente traduzidas em normas constitucionais e infraconstitucionais de conteúdo proibitivo ou inibitório da discriminação. Em segundo lugar, de normas que ao invés de se limitarem a proibir o tratamento discriminatório, combatem-no através de medidas de promoção, de afirmação ou de restauração, cujos efeitos exemplar e pedagógico findam por institucionalizar e por tornar trivial, na sociedade, o sentimento e a compreensão acerca da necessidade e da utilidade da implementação efetiva do princípio universal da igualdade entre os seres humanos.’(BARBOSA GOMES, Joaquim B. Ação afirmativa & princípio constitucional da igualdade – o Direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 49)” (INFO 657. Voto Min. Luiz Fux. ADI 4424/DF e ADC 19/DF). Lei Maria da Penha. STF. Constitucionalidade da discriminação positiva. Conclui o Min. Luiz Fux no citado voto, ao reconhecer a constitucionalidade dos dispositivos da Lei Maria da Penha, ser estreme de dúvidas a legitimidade constitucional das políticas de ações afirmativas, também implementadas por medidas de caráter criminal, já que a referida lei estabelece mecanismos de equiparação entre os sexos, em legítima discriminação positiva que busca, em última análise, corrigir um grave problema social. Limites. Discrímem positivo. Ressalta, porém, que, “por óbvio, todo discrímen positivo deve se basear em parâmetros razoáveis, que evitem o desvio de propósitos legítimos para opressões inconstitucionais, desbordando do estritamente necessário para a promoção da igualdade de fato. Isso porque somente é possível tratar desigualmente os desiguais na exata medida dessa desigualdade. Essa exigência de razoabilidade para a edição de ações afirmativas foi muito

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSbem analisada por Canotilho: ‘(...) o princípio da igualdade é violado quando a desigualdade de tratamento surge como arbitrária. O arbítrio da desigualdade seria condição necessária e suficiente da violação do princípio da igualdade. Embora ainda hoje seja corrente a associação do princípio da igualdade com o princípio da proibição do arbítrio, este princípio, como simples princípio de limite, será também insuficiente se não transportar já, no seu enunciado normativo-material, critérios possibilitadores da valoração das relações de igualdade ou desigualdade. Esta a justificação de o princípio da proibição do arbítrio andar sempre ligado a um fundamento material ou critério material objectivo. Ele costuma ser sintetizado da forma seguinte: existe uma violação arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina jurídica não se basear num: (i) fundamento sério; (ii) não tiver um sentido legítimo; (iii) estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável.’ (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina, 7 ed., 2003. p. 428)” (INFO 657. Voto Min. Luiz Fux. ADI 4424/DF e ADC 19/DF).

DEBORAH DUPRAT: A CR/88 insere-se no modelo do constitucionalismo social, no qual não basta, para observância da igualdade, que o Estado se abstenha de instituir privilégios ou discriminações arbitrárias. Pelo contrário, “parte-se da premissa de que a igualdade é um objetivo a ser perseguido através de ações ou políticas públicas, que, portanto, ela demanda iniciativas concretas em proveito dos grupos desfavorecidos” (Sarmento). Muitos dos preceitos relacionados com a igualdade foram redigidos de forma a denotar a necessidade de ação. A própria Constituição, aliás, consagrou expressamente políticas de ação afirmativa em favor de segmentos sociais em situação de maior vulnerabilidade. Para citar os dois exemplos mais evidentes, o art. 7º, XX, da Carta (incentivo para inserção da mulher), bem como o seu art. 37, VIII (reserva de vagas a pessoas com deficiência).

DIREITO ANTIDISCRIMINAÇÃO: PERSPECTIVAS

Perspectiva antidiferenciação: combater discriminação, com tratamento neutro – sem ações afirmativas. Perspectiva antisubordinação: combater a discriminação com atuação efetiva a superá-la, com ações afirmativas. Esta é mais harmônica com o sistema de valores em que se assenta a Constituição e com a nossa realidade.

COTAS NAS UNIVERSIDADES: O fato de haver uma única raça não significa que o racismo não existe. Isso porque ele remanesce a partir de concepções sociais, culturais e políticas. Promoção do pluralismo. Vivemos em um país que tem como uma das suas maiores riquezas a diversidade étnica e cultural. Porém, para que todos se beneficiem dessa valiosa riqueza, é preciso que haja um contato real e paritário entre pessoas de diferentes etnias. É necessário romper com modelo informal de segregação, que exclui o negro da universidade, confinando-o a posições subalternas na sociedade, especialmente no ensino. As políticas de ação afirmativa baseadas em critérios raciais no ensino superior também são positivas na medida em que quebram estereótipos negativos. Ativismo judicial: quando o Judiciário se depara com normas e medidas que visam a favorecer grupos minoritários e hipossuficientes, a sua postura deve ser diferente. Não deve o Poder Judiciário frear as iniciativas inclusivas, convertendo-se no guardião de um status quo de assimetria e opressão, a não ser quando haja patente afronta à Constituição. Portanto, as políticas de cotas não ofendem a nenhum dos subprincípios em que se desdobra o princípio da proporcionalidade. Quanto à adequação, é evidente que, se o objetivo é promover a inclusão dos negros no ensino superior, a medida encetada é idônea,

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSporque se propõe exatamente a tal fim. No que tange à necessidade, não se vislumbra, a priori, qualquer outra medida que promova, com a mesma intensidade, a finalidade perseguida. Quanto à proporcionalidade em sentido estrito, cumpre atentar para o valor que tem o acesso ao ensino superior na emancipação real dos afrodescendentes no Brasil. Em um quadro social de brutal exclusão do negro, e no marco de uma Constituição que tem como obsessão a conquista do pluralismo e da igualdade material e o combate ao preconceito e ao racismo, deve-se reconhecer a extraordinária importância da promoção dos interesses subjacentes à medida em discussão, na escala dos valores constitucionais.

STF. INFO 663. ADPF 186/DF. O Plenário reconheceu a Constitucionalidade do sistema de cotas (processo de seleção baseado em critério étinico-racial). Na linha da fundamentação supradesenvolvida, o Min. Ricardo Lewandowski entendeu no sentido da legitimidade dos requisitos empregados para seleção guardaria estreita correspondência com os objetivos sociais que se buscaria atingir, vez que o acesso às universidades públicas deveria ser ponderado com os fins do Estado Democrático de Direito e também com os postulados constitucionais que norteariam o ensino público (CF, artigos 205 e 207). Partiu da premissa de que o princípio da igualdade não poderia ser aplicado abstratamente, pois procederia a escolhas voltadas à concretização da justiça social, de modo a distribuir mais equitativamente os recursos públicos. Os programas de ação afirmativa seriam, então, forma de compensar essa discriminação culturalmente arraigada. Ressaltou que, hodiernamente, justiça social significaria distinguir, reconhecer e incorporar à sociedade valores culturais diversificados. Esse modo de pensar revelaria a insuficiência da utilização exclusiva do critério social ou de baixa renda para promover a integração de grupos marginalizados, e impenderia incorporarem-se nas ações afirmativas considerações de ordem étnica e racial. Além disso, discorreu sobre o papel integrador da universidade e os benefícios das ações afirmativas, que atingiriam não apenas o estudante que ingressara no sistema por intermédio das reservas de vagas, como também todo o meio acadêmico, dada a oportunidade de conviver com o diferente. Acrescentou que esse ambiente seria ideal para a desmistificação dos preconceitos sociais e para a construção de consciência coletiva plural e culturalmente heterogênea. Reconheceu que as universidades adotariam duas formas distintas de identificação do componente étnico-racial: autoidentificação e heteroidentificação. Declarou que ambos os sistemas, separados ou combinados, desde que jamais deixassem de respeitar a dignidade pessoal dos candidatos, seriam aceitáveis pelo texto constitucional. Por sua vez, no que toca à reserva de vagas ou ao estabelecimento de cotas, entendeu que a primeira não seria estranha à Constituição, nos termos do art. 37, VIII. Afirmou, de igual maneira, que as políticas de ação afirmativa não configurariam meras concessões do Estado, mas deveres extraídos dos princípios constitucionais. Concluiu, assim, que as cotas encontrariam amparo na Constituição. O Min. Luiz Fux, por seu turno, “ratificou que as ações afirmativas seriam políticas eficazes de distribuição e de reconhecimento, porquanto destinadas a fornecer espécies limitadas de tratamento preferencial para pessoas de certos grupos raciais, étnicos e sociais, que tivessem sido vítimas de discriminação de longa data. Clarificou que a igualdade não se efetivaria apenas com a vedação da discriminação, senão com a igualdade para além da formal, ou seja, a isonomia real como ultima ratio, a atender aos reclamos do não preconceito e da proibição ao racismo como cláusulas pétreas constitucionais.Aquilatou que o direito à diferença reivindicaria implementação ética da igualdade material, escopo que não se

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 13. BRUNO BESSA DE MATTOSalcançaria tão somente com promessas legais abstratas, as quais não se coadunariam com a moderna percepção da efetividade das normas constitucionais. Neste passo, qualificou as cotas em questão como instrumento de transformação social. Preconizou que a construção de sociedade justa e solidária imporia a toda a coletividade a reparação de danos pretéritos, a adimplir obrigações morais e jurídicas. Aduziu que todos os objetivos do art. 3º da CF, que prometeriam a construção de sociedade justa e solidária, traduzir-se-iam na mudança para se alcançar a realização do valor supremo da igualdade, a fundamentar o Estado Democrático de Direito constituído.” A Min. Cármem Lúcia anotou que “ a Constituição partiria da igualdade estática para o processo dinâmico da igualação. Enfatizou a responsabilidade social e estatal de que o princípio da igualdade dinâmica fosse cumprido objetivamente. (...) Aludiu que as ações afirmativas seriam etapa diante de quadro em que a igualdade e a liberdade de ser diferente ainda não teriam ocorrido de forma natural.” O Min. Joaquim Barbosa “frisou que as ações afirmativas definir-se-iam como políticas públicas voltadas à concretização do princípio da igualdade material e da neutralização dos efeitos perversos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física. Apontou que a igualdade deixaria de ser princípio jurídico a ser respeitado por todos e passaria a se consubstanciar objetivo constitucional a ser alcançado pelo Estado e pela sociedade.” OBS. Os demais ministros também fizeram outras considerações de extrema importância. Logo, reputa-se obrigatória a leitura do INFO 663 do STF .

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a. Democracia. Conceito. História. Atributos: soberania popular, legitimação do poder pela expressão livre da maioria, igualdade de oportunidades, proteção de minorias, sufrágio universal, direto e igualitário, voto secreto, periodicidade do sufrágio, pluralismo. Democracia representativa. Instrumentos de democracia direta na Constituição de 1988.

A expressão democracia vem do grego “governo do povo”, sendo um conceito surgido no período axial da Grécia antiga (começa do século 6 A.C.), que estava ligado ao modo de ser da pólis. Neste período o espaço público de deliberação estava presente em quase todos os setores da vida e a democracia era exercitada pelo próprio cidadão, sem intermediários, que comparecia às ágoras (praças) e ali deliberava, participando do processo de elaboração das leis e das opções administrativas, e até mesmo julgando. Com o advento do império romano esta ideia ficou esquecida e veio a ser retomada com o iluminismo por alguns filósofos, em especial Rousseau (O Contrato Social – defendia o modelo grego). Já a democracia moderna vai começar a se esboçar através a ideia de representação política proposta pelo abade de Siéyes.

Democracia substancial consubstancia a proteção dos direitos das minorias (vg., reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo; demarcação de terras indígenas; a constituição das CPIs através de 1/3 dos parlamentares – art. 58, § 3o, CF). Jürgen Habermas e Friedrich Muller ensinam que a democracia exige mais do que eleições livres, com sufrágio universal e possibilidade de alternância do poder, pressupondo, outrossim, a fruição de direitos básicos por todos os cidadãos, de molde a garantir que cada um forme livremente sua convicção e participe livremente dos diálogos políticos.

O sufrágio abrange o direito de voto, de ser votado e de participação em plebiscitos, referendos e iniciativas populares. O sufrágio é universal pois reconhece-se a todos os nacionais do país, independentemente da pertinência a dado grupo ou classe, contrapondo-se ao sufrágio restrito que pode ser censitário (condição econômica) ou capacitário (habilidade intelectual). As Constituições brasileiras negavam, em geral, o direito do sufrágio ao analfabeto. A EC. 25/85 revogou esta orientação, posição consolidada com a CRFB/88. O TSE tem entendimento de que o índio que não saiba se comunicar em língua portuguesa tem o direito de se alistar e votar.

O sufrágio é direto pois, com base no princípio da imediatidade do voto, este é conferido pelo eleitor a determinado candidato ou partido, sem que haja mediação por uma instância intermediária ou por um colégio eleitoral. O sistema proporcional (que faz a eleição de um parlamentar depender dos votos atribuídos a outros colegas de legenda) não retira o caráter de eleição direta.O voto secreto é inseparável da ideia de voto livre. O Plenário do STF (Inf. 645) deferiu medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Procurador Geral da República, para suspender os efeitos do art. 5º da Lei 12.034/2009, que dispõe sobre a criação, a partir das eleições de 2014, do voto impresso.O sistema democrático assegura o voto periódico. O texto constitucional consagra, como cláusula pétrea (art. 60, § 4o, II), a periodicidade do voto, o que traz consigo a ideia de renovação e alternância dos ocupantes dos cargos eletivos e da temporariedade dos mandatos.A igualdade do voto abrange a equivalência quanto ao valor numérico e quanto ao resultado. Não obstante, no sistema proporcional, nem sempre aquele que aufere maior número de votos vence o pleito, porquanto

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.ressai como relevante a força partidária em granjear candidatos carismáticos com vistas à majoração do quociente da agremiação política.O pluralismoindica o direito à diferença como inerente à própria dignidade da pessoa humana, assinalando que o indivíduo é livre para se autodeterminar, imune a intromissões de terceiros.

Os instrumentos da democracia participativa, no Brasil, podem ser: a) aqueles atinentes à representação, basicamente relacionados ao sufrágio universal; b) aqueles tradicionalmente constantes do rol dos instrumentos da democracia direta: plebiscito, referendo e iniciativa popular; c) aqueles inovadores, peculiares da democracia participativa, que consistem nas mais variadas formas de participação da sociedade, como meio de legitimação do poder e exercício da soberania popular.

A seguir, estão elencados os enunciados constitucionais que garantem a democracia participativa no Brasil e que inspiraram a criação, por lei, de diversos outros instrumentos de participação da sociedade. - obrigação de os órgãos públicos prestarem informações de interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, no prazo da lei (Art. 5º, XXXIII – Constituição Federal – CF)

- direito de petição aos poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder (Art. 5°, XXXIV, a - CF);

- reconhecimento da competência do Tribunal do Júri, de caráter eminentemente popular, de participação da sociedade no Poder Judiciário (Art. 5°, XXXVIII - CF);

- legitimidade de qualquer cidadão para propor ação popular, em defesa de direito difuso, objetivando anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural (Art. 5°LXXIII – CF );

- participação da comunidade nas ações de seguridade social (Art. 194,VII – CF);

- participação dos trabalhadores e empregadores nos órgãos colegiados dos órgãos públicos, para defesa de interesses profissionais ou previdenciários (Art. 10 – CF);

- previsão de aprovação da população, por plebiscito, em caso de incorporação, subdivisão ou desmembramento de Estados (Art. 18, § 3° – CF);

- previsão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, para a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios (Art. 18, § 4° – CF);

- previsão de lei sobre a iniciativa popular no processo legislativo estadual (Art. 27, § 4º – CF). Esse dispositivo levou os Estados a regulamentarem a iniciativa popular e a criarem, alguns deles, a Comissão de Legislação Participativa, facilitando a participação popular na iniciativa legislativa;

- colaboração de associações representativas da coletividade no planejamento municipal ( Art. 29, XII – CF). Deu origem ao Orçamento Participativo, em âmbito municipal, em diversas cidades brasileiras;

- previsão de iniciativa popular de projetos de lei de interesse específico do Município, da cidade ou de bairros, mediante manifestação de, pelo menos, cinco por cento do eleitorado ( Art. 29, XIII – CF);

- colocação das contas dos municípios à disposição dos cidadãos, que poderão questionar-lhes a legitimidade e a legalidade (Art. 31, § 3º – CF);

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.- participação dos usuários na administração direta e indireta quando se tratar de prestação de serviços à comunidade (Art. 37, § 3º– CF);

- obrigatoriedade de a Administração direta e indireta criar mecanismos para receber reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral (Art. 37, § 3º, I – CF). Esse dispositivo ensejou a criação de ouvidorias e outras formas de atendimento aos usuários;

- acesso da sociedade a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII (art. 37, §3º,II – CF);

- disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo de cargo, emprego ou função na administração pública (Art. 37, §3º, III – CF). Além das ouvidorias, inspirou a criação das corregedorias no serviço público.

- instituição de conselhos de política de administração e remuneração de pessoal, em todas as esferas da Federação, com a participação dos servidores (Art. 39 – CF);

- realização de audiências públicas das comissões do Legislativo com entidades da sociedade civil ( Art. 58, II – CF);

- viabilização de corregedorias e ouvidorias, no âmbito do Legislativo, para receber petições, reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoa contra atos ou omissões das autoridades ou entidades públicas (Art. 58, IV – CF);

- legitimidade dos cidadãos para iniciativa de leis (Art. 61 e § 2º – CF);

- legitimidade ao cidadão, partido político, associação ou sindicato, para denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União (Art. 74, § 2º – CF);

- participação de seis cidadãos brasileiros natos, no Conselho da República (Art. 89, VII – CF);

- participação de dois cidadãos no Conselho Nacional de Justiça (art. 103-b, XIII -CF);

- previsão de corregedoria, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (Art. 103-B, § 5º, I -CF);

- previsão de ouvidorias de justiça, no âmbito da União, Distrito Federal e Territórios, para receber reclamações e denúncias (Art. 103-B, § 7º -CF);

- participação de dois cidadãos no Conselho Nacional do Ministério Público (Art. 130-A, VI – CF);

- criaçãodeouvidoriasdoMinistérioPúblico, emâmbitofederaleestadual, para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Ministério Público (Art. 130-A, § 5º- CF);

- fiscalização pela sociedade, quanto às atividades das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias, que explorem atividade econômica de produção (Art. 173, § 1º, I – CF).

- participação do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes na política agrícola (Art. 187 – CF);

- participação da comunidade, na gestão administrativa das ações de seguridade social ( art. 194, parágrafo único, inciso VII – CF). Deu origem aos Conselhos de Assistência Social;

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.- participação da comunidade nas ações e serviços públicos de saúde (Art. 198, III – CF). Deu origem aos Conselhos de Saúde;

- participação da população, por meio de organização representativas, na formulação das políticas e no controle das ações da Assistência Social (Art. 204, II – CF);

- colaboração da sociedade na promoção e incentivo da educação ( art. 205- CF) e gestão democrática da educação (Art. 206, VI – CF);

- colaboração da comunidade com o poder público, para a proteção do patrimônio cultural brasileiro (Art. 216, § 1º- CF);

- exercício, pela coletividade, do dever de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações ( Art. 225 – CF);

- participação das entidades não governamentais nos programas de assistência integral à saúde das crianças e adolescentes (Art. 227, §1º- CF);

- participação da sociedade no amparo às pessoas idosas (Art. 230 – CF);

- participação de representantes da sociedade civil, no Conselho Consultivo e de Acompanhamento do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (Art. 79 das Disposições Constitucionais Transitórias).

É importante dizer que, como visto, diversos instrumentos da democracia participativa não estão direta e expressamente previstos na Constituição, mas na legislação infraconstitucional. Trata-se da criação dos Conselhos de direito; Conselhos gestores políticas públicas; Orçamento participativo; Ouvidorias; Comissões de legislação participativa. Tudo inspirado no sistema democrático estabelecido pela Constituição de 1988. Isso significa que, não somente os mecanismos e instrumentos atualmente conhecidos, mas diversos outros podem vir integrar o elenco das formas que compõem a democracia participativa no Brasil, sob a égide da Constituição Cidadã.

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b. Previdência social e assistência social: configuração constitucional e infraconstitucional. A seguridade social como mecanismo de igualdade social e como problema orçamentário.

Como mecanismo de igualdade material, a seguridade social assenta-se no princípio da solidariedade, consubstanciando um conjunto de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, previdência e assistência social, com financiamento a cargo de toda a sociedade, mediante recursos orçamentários e contribuições sociais destinados ao custeio de prestações devidas aos segurados e, na vertente da assistência social, a todos que delas necessitarem (arts. 194, 195 e 203 da CRFB/88), concretizando, neste ponto, um princípio fundamental da República Federativa do Brasil – “construir uma sociedade livre, justa e solidária” (art. 3o, I, CRFB/88).

Especificamente quanto à previdência social, destaca-se o princípio da responsabilidade, cujo núcleo essencial impõe a todos agir de modo que as consequências das nossas decisões presentes sejam compatíveis com uma futura existência humanamente digna.

Como corolário destes postulados ressai o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial que aponta para uma necessária correlação entre os benefícios e serviços da previdência social, como sistema de seguro, e as respectivas fontes de custeio, em ordem a lhe garantir continuidade e certeza de longo alcance.

No âmbito da previdência social e dos direitos sociais de caráter prestacional (v.g., saúde, educação), demarcados por normas constitucionais de cunho dirigente e programático, o princípio da reserva do

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.financeiramente possível impõe ao Poder Público “escolhas trágicas” e prioritárias na alocação dos recursos públicos com vistas à satisfação do mínimo existencial. Na APDF 45, o Min. Celso de Mello consignou que a cláusula da reserva do possível não pode ser invocada pelo Estado com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando desta omissão puder resultar nulificação ou aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de fundamentalidade. Sarmento leciona que a reserva do possível desdobra-se em dois componentes: fático (efetiva disponibilidade de recursos) e jurídico (previsão orçamentária para o custeio). Segundo o autor, em razão do princípio da igualdade, a reserva do possível fática deve ser concebida com razoabilidade da universalização da prestação exigida, considerando os recursos efetivamente existentes, não podendo o juiz condenar o Estado a prestar um direito social que não possa ser estendido às outras pessoas que estejam em situação equivalente.

A dimensão objetiva dos direitos fundamentais implica na força irradiante dos direitos sociais, tornando-se diretrizes para interpretação de outras normas; dever do Estado de proteger perante terceiros tais direitos e de instituir procedimentos e organizações aptos à consecução dos mesmos.

c. A República: perspectiva histórica e concepções. Republicanismo.

REPÚBLICA: perspectiva histórica e concepções.A noção de república aparece entre os clássicos da antiguidade, o humanismo cívico da Itália renascentista, o radicalismo inglês e o constitucionalismo norte-americano como alternativa diante do dilema, sempre imperioso, imposto pela necessidade de dirimir uma realidade caracterizada em termos de ordem e conflito.

Dessa forma, o termo república apresenta-se com diversos significados, de acordo com o contexto em que sua fórmula é aplicada.

Usualmente, o termo República tem sido empregado no sentido de forma de governo contraposta à monarquia. Aquele caracterizado pela eletividade periódica do chefe de Estado, este por sua hereditariedade e vitaliciedade.Na antiga Roma ocorre a transformação de cidade-estado em Império. A república é fundada a partir da substituição do monarca pela instituição do Magistério. Assim, a condução dos assuntos romanos não era mais uma questão régia: o governo se transformou em “coisa do povo”, isto é, em res publica.Em Sobre a República, Cícero enaltece a vida prática e nos apresenta uma reflexão pragmática a respeito das práticas do povo romano, mas conjugada com uma alta concepção da vida política. O homem ciceroniano

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.existe para servir os outros e para se aperfeiçoar na virtude. E, nesse sentido, não há virtude mais excelsa do que a que se expressa na prática de quem se esforça por exercer o governo da república.A república é, então, a gestão pública do governo do povo, entendido este como aquele agregado humano que possui o direito comum a serviço de todos, a partir de um ato voluntário-racional associativo.Segundo o pensar ciceroniano, cada um dos regimes clássicos tem desvantagens. Na monarquia, os restantes cidadãos ficam afastados em demasia das atividades do direito e do governo. Se os melhores dominam (aristocracia), dificulta-se o acesso das maiorias, cuja possibilidade de participação se vê cerceada por não possuírem potestade para a tomada de decisões. No caso em que quem detém o poder é o povo, dado seu caráter igualitário, torna-se inexistente a distinção de graus de dignidade.No entanto, Cícero posiciona-se finalmente a favor da forma mista de governo quando detalha que é ela a que conjuga a fortaleza da monarquia com o respeito pela liberdade dos melhores próprio da aristocracia, e a atenção dos interesses de todo o povo presente na democracia.O ressurgimento da noção de república – nas comunas da Itália renascentista, entre os constitucionalistas ingleses do século XVII e, inclusive, entre os opositores do absolutismo francês – exaltou valores opostos aos que se consideravam causadores da corrupção e dos males sociais em que se haviam transformado as formas monárquicas.Primeiramente, em seu rechaço à dominação e à tirania, o republicanismo reivindicou uma idéia robusta de liberdade. Essa liberdade precisava, para sua sustentação, da virtude dos cidadãos; e essa virtude, por sua vez, requeria certas precondições políticas e econômicas. Um bom governo, então, deveria contribuir para manter e desenvolver estas precondições, e apoiar a presença de cidadãos virtuosos, politicamente ativos.O princípio republicano, então, não deve ser encarado do ponto de vista puramente formal, como algo que vale por sua oposição à forma monárquica. Ruy Barbosa já dizia que o que discrimina a forma republicana não é apenas a coexistência dos três poderes, indispensáveis em todos os governos constitucionais, mas, sim, a condição de que, sobre existirem os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, os dois primeiros derivem, realmente, de eleições populares. Isso significa que a forma republicana implica a necessidade de legitimidade popular do Presidente da República, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais (arts. 28, 29, I e 11, e 77), a existência de assembléias e câmaras populares nas três órbitas de governos da República Federativa (arts. 27, 29, I, 44, 45 e 46), eleições periódicas por tempo limitado que se traduz na temporariedade dos mandatos eletivos (arts. cits.) e, conseqüentemente, não vitaliciedade dos cargos políticos e prestação de contas da administração pública (arts. 30, III, 31, 34, VII, d, 35, II, e 70 a 75).O art. 12 da Constituição não instaura a República. Recebe-a da evolução constitucional, desde 1889. Mantém-na como princípio fundamental da ordem constitucional. Desde a Constituição de 1891, a forma republicana de governo figura como princípio constitucional.Segundo José Afonso da Silva, “hoje não mais protegido contra emenda constitucional, como nas constituições anteriores, já que a forma republicana não mais constitui núcleo imodificável por essa via; só a forma federativa continua a sê-lo (art. 60, § 42, I)”.

Destaca-se, porém, a seguinte observação de Gilmar Ferreira Mendes:

A periodicidade dos mandatos é conseqüência do voto periódico estabelecido como cláusula pétrea. Uma emenda não está legitimada para transformar cargos políticos que o constituinte originário

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previu como suscetíveis de eleição para cargos vitalícios ou hereditários. Isso, aliado também à decisão do poder constituinte originário colhida das urnas no plebiscito de 1993 sobre a forma de governo, gera obstáculo a uma emenda monárquica.

Mas o princípio é protegido contra os Estados, prevista a intervenção federal naquele que o desrespeitar (art. 34, VII, a – princípio constitucional sensível).

REPUBLICANISMO

Republicanismo é a ideologia segundo o qual uma nação é governada como uma república, na qual o chefedeEstado é indicado por métodos não-hereditários, frequentemente através de eleições.

Republicanismo pré-modernoO Republicanismo Clássico ou Pré-Moderno ou Humanismo Cívico corresponde ao período da Renascença e pós-renascença.A idéia pré-moderna é acompanhada de uma visão cíclica da história, característico desse momento do republicanismo, e por isso essa tradição centra-se na temporariedade do poder. Os republicanos enxergavam que a corrupção era o ciclo decaído da vida pública e que poderia ser evitado, ou adiado revitalizando a virtude ou mudando as leis agrárias.A importância da lei cívica constituindo a liberdade foi amplamente apreciada pelos republicanos pré-modernos. A regra da lei era vista como oferecendo uma garantia maior de segurança do que a regra do monarca poderoso. Era vital o sentimento da liberdade derivada da presença visível de garantias e ausência de dominação institucionalizada que por si mesma levava a uma forma de empoderamento. Na época, também era importante o senso de ser um membro de uma sociedade livre.Os republicanos pré-modernos geralmente condenavam a discórdia e acreditavam que o sucesso de um corpo político poderia ser medido por seu equilíbrio, por sua capacidade de evitar conflitos.

Republicanismo IluministaDa metade para o final do século XVIII muitos iluministas europeus consideravam o republicanismo obsoleto, mas há afirmações explícitas do republicanismo na Europa anterior à Revolução Francesa. Montesquieu, Rousseau, Kant, autores considerados iluministas, manifestaram-se como republicanos. Nos Estados Unidos, Montesquieu, e na França, Rousseau foram apontados como anunciadores de uma forma moderna de republicanismo e ambos foram de importância considerável para as duas grandes revoluções do século XIII.O republicanismo iluminista modificou o republicanismo pré-moderno originado na Renascença. Apesar de suas influências, a virtude e a visão cíclica da história são substituídas por uma crença maior nas leis, no direito e no progresso. Autores como Montesquieu, Rousseau e Kant contribuem e elaboram idéias como a da separação dos poderes, do contrato social, da soberania popular, da legitimidade de regimes constitucionais, levando para o campo da teoria política a crença iluminista no desenvolvimento da razão e com ele o desenvolvimento social.

Republicanismo Americano

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.O republicanismo americano é considerado mecânico por não possuir suas bases na honra e na virtude, nem mesmo a virtude individual chega a ser tema relevante de sua agenda. O republicanismo da revolução americana está preocupado com mecanismos institucionais que possibilite a soberania e evite a corrupção.O tema da separação dos poderes tornou-se importante quando verificou-se que a Revolução Americana, ao desafiar as bases das antigas autoridades executivas, havia dado excessivo poder ao legislativo. Quando os federalistas notaram que o legislativo inundava os outros poderes, eles restauraram o poder executivo para efetuar o balanço.

A novidade dos constitutional framers americanos não estava na delegação da soberania popular, que é uma idéia antiga, mas sim em mecanismos constitucionais específicos desenvolvidos para prevenir o perigo dos legisladores discriminarem em seus próprios favores e, assim, a tornarem possível a tirania. Brugger chama o sistema americano de republicanismo mecânico. Nos Estados Unidos, passa a haver uma mecânica e formalizada separação dos poderes que até então não tinha sido vista nas repúblicas anteriores.

Republicanismo contemporâneo

Desde fins dos anos 1980 e começos dos 1990, a partir do debate debate entre entre liberais e humanistas cívicos, tem ressurgido uma corrente teórica republicana, ou neorrepublicana, especialmente nos países anglo-saxões. Os principais autores dessa ressurgimento são, do ponto de vista da Teoria Política (ou da Filosofia Política ), o irlandês Phillip Pettit , autor de Republicanism e, do ponto de vista da História, o inglês Quentin Skinner , autor de Liberty before Liberalism.

A teoria neorrepublicana de Pettit baseia-se na ideia de liberdade como "não-dominação" ou, de maneira mais direta, como "não-arbitrariedade". Para definir essa categoria, Pettit recupera as "duas liberdades" definidas por Isaiah Berlin (retomando uma ideia do francês BenjaminConstant), a liberdade negativa e a positiva.

A liberdade positiva consiste na participação direta dos cidadãos na vida política, com eles decidindo pessoal e constantemente os assuntos públicos; é o modelo característica e propriamente democrático, da Atenas idealizada por J.-J. Rousseau, em que todos participam do público e não há exatamente vida privada. Todos os cidadãos são livres porque submetem-se às leis que eles mesmos fizeram .

A liberdade negativa consiste na ação desimpedida dos cidadãos em suas vidas particulares, em que o Estado é limitado e não oferece muitos empecilhos para os cidadãos. Como o que importa é a ausência de obstáculos à ação dos indivíduos - e há leis que devem impedir algumas ações, como as que proíbem matar -, toda lei é vista como cerceadora das liberdades. Os cidadãos participam da vida política por meio do processo representativo, ou seja, por meio da escolha de representantes (deputados). Esse é o ideal liberal, como exposto, por exemplo, por John Locke .

A liberdade como não-arbitrariedade considera que as leis não são fundamentalmente obstáculos à ação individual, mas são constituidoras das liberdades: sem leis, ou seja, sem Estado não é possível a liberdade. Todavia, os cidadãos não participam da vida política (i. e., do Estado) o tempo inteiro nem é o "povo" reunido em assembleia pública na ágora o autor das leis; a atuação dos cidadãos consiste em exercer um papel de fiscal e controlador do Estado, pelos mais variados meios, de modo a evitar e a impedir as arbitrariedades estatais. No modelo de Pettit, o processo legiferante continua nas mãos dos representantes eleitos, ou seja,

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 14.dos deputados. O grande exemplo histórico é a Roma republicana, anterior ao Império e ao governo de Otávio Augusto ; por esse motivo, essa teoria também é chamada de "neo-romana". Alguns grandes teóricos republicanos históricos são Cícero, Nicolau Maquiavel e AlgernonSidney.

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ITEM A: a. Políticas Públicas. Conceito. Objetivos e âmbitos. Instrumentos. Ministério Público, Judiciário e políticas públicas.

Políticas públicas são ações estudadas, planejadas e organizadas pelo governo, com ou sem a participação dos setores privado e não-governamental, voltadas para resolução de problemas específicos ou simplesmente para o desenvolvimento da sociedade. Têm como objetivos: (a) responder demandas, principalmente dos setores marginalizados da sociedade, considerados como vulneráveis; (b) ampliar e efetivar direitos de cidadania, também gestados nas lutas sociais e que passam a ser reconhecidos institucionalmente; (c) promover o desenvolvimento, criando alternativas de geração de emprego e renda como forma compensatória dos ajustes criados por outras políticas de cunho mais estratégico (econômicas); (d) regular conflitos entre diversos atores sociais que, mesmo hegemônicos, têm contradições de interesses que não se envolvem por si mesmas ou pelo mercado e necessitam de mediação. Os instrumentos de políticas públicas podem ser classificados como: (a) organizacionais; (b) programáticos; (c) normativos ou de ordenação; (d) financeiros; (e) de melhora do conhecimento; e (f) comunicativos. Muitos autores também fazem referência à existência de instrumentos específicos nos âmbitos da política de saúde (Lei nº 8.080/90); da política nacional do meio ambiente (Lei nº 6.938/81); da política nacional de mobilidade urbana (Lei nº 12.587/12); da política nacional do idoso (Lei nº 8.842/94); da política nacional de resíduos sólidos (Lei nº 12.305/10); da política nacional de recursos hídricos (Lei nº 9.433/97); da política agrícola (Lei nº 8.171/91); da política nacional do livro (Lei nº 10.753/03); da política federal sobre saneamento básico (Lei nº 11.445/07); da política nacional de atendimento dos direitos da criança e do adolescente (Lei nº 8.069/90); da política urbana (Lei nº 10.257/01); da política nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres (Lei nº 11.340/06), dentre outras.

TIPOLOGIA CARÁTER OBJETO

Instrumentos organizacionaisVinculante para a

administraçãoAuto-organização

Instrumentos programáticosVoluntário para os

afetadosImpulso e planejamento

Instrumentos normativos Vinculante Regulação e ordenação

Instrumentos financeirosVoluntário para os

afetadosFomento

Instrumentos de melhora do conhecimento

VoluntárioDifusão de formação e

informaçãoInstrumentos comunicativos Simbólico Difusão de valores

O Poder Judiciário, em conjunto com o Ministério Público, deve exigir explicações objetivas e transparentes sobre a alocação de recursos públicos por meio das políticas governamentais, de forma a estar apto a questionar tais alocações com os poderes políticos sempre que necessário. Boa parte dos problemas de efetividade dos direitos sociais decorre mais de desvios na execução de políticas públicas do que de falhas na elaboração dessas mesmas políticas. O controle dessa execução deve, ao mesmo tempo, respeitar o planejamento das políticas públicas, abster-se de realocar recursos escassos de maneira irracional e individualista e,

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sobretudo, realizar com maior eficiência os direitos sociais. Se o legislador tiver feito ponderações e escolhas válidas, à luz das colisões de direitos e de princípios, o Judiciário deverá ser deferente para com elas, em respeito ao princípio democrático. Para ir além, confira-se, na doutrina, Fábio Konder Comparato, “Ensaio sobre o juízo de constitucionalidade de políticas públicas” in: Revista de Informação Legislativa, ano 35, n. 138, abr./jun. 1998, pp. 39-48; Virgílio Afonso da Silva, “O Judiciário e as políticas públicas”, Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento, Direitos sociais: fundamentação, judicialização e direitos sociais em espécies, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 587-599, Maria Paula Dallari Bucci, “Buscando um conceito de políticas públicas para a concretização dos direitos humanos”, in: Maria Paula Dallari Bucci, Direitos Humanos e Políticas Públicas, São Paulo: Pólis, 2001, pp. 05-16; na jurisprudência, STF RE 665764 AgR (saúde); STF RE 417408 AgR (meio ambiente); STF AI 708667 AgR (moradia); STF AC 2971-MC (serviços públicos); STF ARE 635679 AgR (educação).

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ITEM B: Responsabilidade civil do Estado. Responsabilidade subjetiva e objetiva. Atos ultra vires. Ação de regresso.

O tema da responsabilidade civil do Estado abrange os aspectos da responsabilidade contratual, disciplinada na legislação ordinária (Lei nº 8666/93, e outras leis esparsas) e da responsabilidade extracontratual, disciplinada no art. 37, § 6º da C. F. Ocorre diante dos seguintes requisitos: (a) consumação do dano; (b) ação ou omissão administrativa; (c) nexo causal entre o dano e a ação ou a omissão administrativa; (d) a oficialidade da atividade causal e lesiva; (e) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (STF RE 481110 AgR). O art. 37, § 6º da C. F. de 1988 adotou as regras da responsabilidade objetiva do Estado e da responsabilidade subjetiva do agente público. O dispositivo constitucional exige que o ato praticado por agente público cause dano a terceiros. Não se exige culpa ou dolo, mas apenas uma relação de causa e efeito entre o ato praticado pelo agente e o dano sofrido por terceiro. A teoria adotada quanto ao nexo de causalidade foi a do dano direto e imediato, também denominada teoria da interrupção do nexo causal. Para o STF, descabe ao intérprete fazer distinções quanto ao vocábulo “terceiro” contido art. 37, § 6º, devendo o Estado responder pelos danos causados por seus agentes qualquer que seja a vítima, servidor público ou não. A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço (STF RE 591874). Para a configuração da responsabilidade objetiva do Estado não é necessário que o ato praticado seja ilícito. Para Maria Sylvia Zanella di Pietro, o ato, mesmo que lícito, para implicar o dever de indenizar também deve ser antijurídico, no sentido de ato causador de dano anormal (porque supera os iconvenientes normais da vida em sociedade) e específico (atingindo uma pessoa ou um grupo de pessoas determinadas, que sofrem dano não experimentados pelos demais membros da sociedade). O Estado também responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes, ainda que fora do horário de expediente. O preceito inscrito no art. 37, § 6º, da C. F., não exige que o agente público tenha agido no exercício de suas funções, mas na qualidade de agente público. Por outro lado, responde subsidiariamente pelas obrigações das pessoas jurídicas de direito público e de direito privado prestadoras de serviço público que instituírem. Registre-se, contudo, que a responsabilidade do Estado por ato de concessionário pode ser solidária e não meramente subsidiária, como ocorre, por exemplo, nas ações coletivas de proteção a direitos difusos, a despeito do que dispõe o art. 38, § 6º da Lei nº 8.987/95.

A jurisprudência predominante no STJ é no sentido de que, em matéria de proteção ambiental, há responsabilidade civil do Estado quando a omissão de cumprimento adequado do seu dever de fiscalizar for determinante para a concretização ou o agravamento do dano causado pelo seu causador direto. Trata-se de responsabilidade subsidiária, cuja execução poderá ser promovida caso o degradador direto não cumprir a obrigação, assegurado, sempre, o direito de regresso, com a desconsideração da personalidade jurídica (STJ REsp 1071741).

A presença do binômio dever de agir-possibilidade de agir será sempre exigida nos casos de responsabilização do Estado por culpa. Nesse sentido, são apontadas como causas excludentes

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da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiros. É causa atenuante a culpa concorrente da vítima. A caracterização de um fato como caso fortuito ou força maior decorre de um elemento subjetivo (ausência de culpa) e outro objetivo (inevitabilidade do evento). O evento pode até ser previsível, mas deve ser inevitável, mesmo diante de toda a diligência que empregue o poder público. É preciso considerar se existem meios materiais disponíveis, e a possibilidade efetiva de sua utilização. Não se reclama a imprevisibilidade do evento. Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por esse ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, em sentido estrito, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço. A qualificação do tipo de responsabilidade imputável ao Estado, se objetiva ou subjetiva, constitui circunstância de menor relevo se ficar demonstrado pelo acervo probatório que a inoperância estatal injustificada foi condição decisiva para a produção do resultado danoso.

Em matéria de transporte público, a responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva. É o entendimento também consagrado pelo STF na Súmula 187. Isso significa que, no caso de transporte, o Estado não pode se eximir da responsabilidade invocando a culpa de terceiro; ele responde objetivamente, porém tem direito de regresso contra o terceiro responsável pelo dano. O fato de terceiro que exonera a responsabilidade é aquele que com o transporte não guarde conexidade. Em matéria de serviços notariais, o Estado responde, objetivamente, pelos atos que causem dano a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa. O tabelionato não detém personalidade jurídica ou judiciária, sendo a responsabilidade pessoal do titular da serventia. Somente o tabelião e o Estado possuem legitimidade passiva. Em matéria de estacionamentos, o Poder Público deve assumir a guarda e responsabilidade do veículo quando este ingressa em área pertencente a estabelecimento público apenas quando dotado de vigilância especializada para esse fim. Em tal hipótese, a responsabilidade se funda no descumprimento de uma obrigação contratual. Em matéria de presos foragidos, o Estado só responderá pelo crime praticado se o nexo de causalidade for demonstrado. É necessário que haja um intervalo de tempo pequeno entre a fuga e o ato lesivo. Em matéria de atos legislativos, há uma tendência no sentido de aceitar a responsabilidade do Estado por atos normativos pelo menos nas seguintes hipóteses: (a) leis inconstitucionais; (b) atos normativos do Poder Executivo e de entes administrativos com função normativa, com vícios de inconstitucionalidade, em que o pedido de indenização deve ser precedido de declaração de inconstitucionalidade, ou ilegalidade, em que não há necessidade de prévia declaração pelo Judiciário; (c) leis de efeitos concretos, que causam dano específico e anormal; e (d) omissão do poder de legislar e regulamentar. Em matéria de atos judiciais, muitas teorias tem sido elaboradas para defender a tese da irresponsabilidade do Estado. É o caso, dentre outras, das seguintes teorias: (a) soberania do Poder Judiciário; (b) incontrastabilidade da coisa julgada; (c) falibilidade dos juízes; (d) independência da magistratura; (e) risco assumido pelo jurisdicionado.

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O fato de a Constituição Federal prever ação de regresso às pessoas jurídicas de direito público contra o funcionário responsável pelo dano não impede que este último seja acionado conjuntamente com aquelas, vez que a hipótese configura típico litisconsórcio facultativo (STF RE 90071). Não obstante, em prevalecendo tal entendimento, há que se reconhecer a solidariedade entre a pessoa de direito público e seu agente, o que torna inadequada a denunciação da lide, e cabível o chamamento do processo. Para o STF, o fato de a Constituição garantir o direito de uma ação, em que a prova de culpa é dispensável e o pagamento assegurado pelas forças do erário não priva o lesado da oção de agir diretamente contra o funcionário, culpável e solvável, em busca de um procedimento mais expedido de execução (STF RE 105157, STF RE 77169 e STF RE 90071). Há, no entanto decisão recente no sentido de não se admitir que o lesado mova a ação diretamente contra o agente público, que somente responde administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular (STF RE 327904). Em linhas gerais, se a ação é proposta com fundamento na responsabilidade objetiva ou na culpa anônima do serviço, sem identificar o agente causador do dano e sem falar em culpa ou dolo, não se admite a denunciação da lide, porque estaria sendo introduzido argumento novo, não colocado pelo autor da ação; pelo contrário, se a própria vítima, ao propor a ação já pleiteia a indenização com fundamento na culpa ou dolo do agente público, admite-se a denunciação da lide. Para ir além, confira-se, na doutrina, dentre outros, Alexandre Freitas Câmara, “Intervenção forçada de terceiros e responsabilidade civil do Estado”, in: Revista Dialética de Direito Processual, n. 39, jun. 2006, pp. 09-24.

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ITEM C: Imunidades e incompatibilidades parlamentares. Direito comparado.

Há imunidades parlamentares de natureza material e formal. A imunidade material, tambem chamada de inviolabilidade, consiste na exclusão de cometimento de crime por parte de deputados e senadores por suas opiniões palavras e votos. Exclui, ainda, qualquer pretensão de ressarcimento de eventual dano material ou moral decorrente da atuação do congressista. Qualquer declaração feita nas dependências do Congresso Nacional, seja na Tribuna ou nas Comissões, é objeto da inviolabilidade parlamentar, não sendo necessário analisar se existe ou não nexo causal entre as afirmações e o exercício do cargo para se aplicar a inviolabilidade. Esse elo deve ser comprovado apenas nos casos em que o deputado ou parlamentar encontrar-se fora das dependências da Casa legislativa (STF INQ 655). A imunidade propriamente dita, dita formal, é prerrogativa processual que envolve a disciplina da prisão e do processo de congressistas. Quanto à prisão, estatui-se que, salvo flagrante de crime inafiançável, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos dentro do período que vai desde sua diplomação até encerrar-se definitivamente seu mandato por qualquer motivo. Podem, pois, ser presos nos casos de flagrante de crime inafiançável, mas aí os autos serão remetidos, dentro de 24 horas, à Casa respectiva, para que, pelo voto secreto da maioria (absoluta) de seus membros, resolva sobre a prisão e autorize, ou não, a formação de culpa (art. 53, §§ 1º e 3º). Quanto ao processo, não importa a natureza do crime, nem se é ou não afiançável: o congressista poderá ser processado criminalmente sem licença de sua Casa, de sorte que, proposta ação penal contra um deputado ou senador no exercício do mandato, o STF pode receber a denúncia e instaurar o processo, com a única obrigação de dar ciência do ato à respectiva Casa. Essa ciência tem por fim tornar conhecida a existência da ação penal, a fim de que algum partido político representado na Casa do parlamentar processado possa, querendo, propor a sustação do processo. Neste caso, não correrá o prazo prescricional do crime enquanto o durar o mandato do imputado (art. 53, §§ 1º e 2º). Essa imunidade não protege o congressista em relação a crimes praticados antes da diplomação. O art. 53, § 8º da C. F. declara que as imunidades subsistem, inclusive, durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional que sejam incompatíveis com a execução da medida. O texto constitucional só se refere ao estado de sítio, não ao estado de defesa. Isso não quer dizer que durante este os congressistas percam a imunidade, mas que a imunidade só persiste, no que tange ao estado de sítio, com as mesmas características previstas nos § 2º e 3º. A inviolabilidade persistirá em qualquer hipótese, e não tem previsão de suspensão nem mesmo durante o estado de sítio. O privilégio de foro (art. 54, § 4º), a limitação do dever de testemunhar (art. 53, § 5º) e a isenção do serviço militar (art. 53, § 6º) são prerrogativas e não imunidades parlamentares. Ressalte-se que a prerrogativa processual de serem inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados não se aplica aos parlamentares indiciados em inquérito policial ou que figurem como réus em processo penal (STF INQ 2839).

A iniciativa do procedimento investigatório para apurar a conduta de parlamentares federais deve ser confiada ao MPF contando com a supervisão do ministro relator do STF, não estando a Polícia Federal autorizada a abrir de ofício inquérito policial. Essa atividade de supervisão

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judicial deve ser desempenhada desde a abertura do procedimento investigatório até o eventual oferecimento, ou não, de denúncia (STF INQ-QO 2411). E uma vez iniciado o julgamento do parlamentar, a superveniência do término do mandato eletivo não desloca a competência para outra instância (STF INQ 2295).

As incompatibilidades são regras que impedem o congressista de exercer certas ocupações ou praticar certos atos cumulativamente com o mandato. Constituem, pois, impedimentos referentes ao exercício do mandato. Referem-se ao eleito. Não interditam candidaturas, nem anulam a eleição de quem se encontra em situação eventualmente incompatível com o exercício do mandato. Umas se caracterizam desde a expedição do diploma do eleito; outras, apenas desde a posse do mandato. O texto constitucional prevê incompatibilidades funcionais, negociais, políticas e profissionais. As incompatibildades funcionais interditam aos deputados e senadores (a) desde a diplomação: aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público (art. 54, I, “b”); (b) desde a posse: ocupar cargo ou função de que sejam demissíveis “ad nutum” naquelas mesmas entidades (art. 54, II, “b”), ressalvado o de ministro, de governador de Território, de secretário de Estado, do Distrito Federal, de Território, de prefeitura de capital ou chefe de missão diplomática temporária (art. 56). As incompatibilidades negociais vedam, desde a diplomação: firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes (art. 54, I, “a”). A caracterização de “contrato de cláusulas uniformes” não alcançado pelas incompatibilidades é controvertida em doutrina; típicos são os chamados “contratos de adesão”, tais como o de transporte, fornecimento de gás, energia elétrica, etc. As incompatibilidades políticas são as que proíbem aos congressistas serem titulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo. As incompatibilidades profissionais são as que impedem aos congressistas, desde a posse: (a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exerça função remunerada (art. 54, II, “a”); (b) patrocinar causa em que seja interessada pessoa jurídica de direito público, autarquia, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público (art. 54, II, “c”). “Patrocínio de causa” é expressão técnico-processual e se refere ao exercício do “ius postulandi”, que só cabe a advogado; de sorte que essa incompatibilidade diz respeito ao impedimento de o congressista-advogado defender interesses de constituinte seu em processo judicial contra aquelas entidades.

As imunidades parlamentares não são encontradas apenas na Constituição brasileira: também estão presentes no direito comparado, e, nesse particular, em países que adotam, à semelhança do Brasil, o regime federativo. É o caso dos Estados Unidos, onde os congressistas não podem ser presos durante as sessões, e na ida ou regresso delas, a não ser por traição, crime comum ou perturbação da ordem pública. Fora do recinto das Casas, não têm obrigação de responder a interpelações acerca de seus discursos ou debates. Diferentemente do que ocorre no Brasil, os congressistas norte-americanos não podem, durante o período para o qual foram eleitos, serem

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nomeados para cargos públicos federais que tenham sido criados ou cuja remuneração tiver sido aumentada nesse período. Por outro lado, nenhuma pessoa ocupando cargo no governo federal norte-americano poderá ser membro de qualquer das Casas Legislativas enquanto permanecer no exercício do cargo. Já na Alemanha, os congressistas não podem, em hipótese alguma, serem submetidos a processo judicial ou ação disciplinar ou serem chamados a responder, fora do Parlamento Federal, por voto ou discurso que tenham proferido no Plenário ou em uma de suas comissões. Essa disposição não se aplica, contudo, a injúrias difamatórias. Os congressistas só serão presos ou chamados a responder por atos puníveis com a autorização do Parlamento Federal, salvo quando a prisão se der em flagrante delito ou ao longo do dia seguinte. É igualmente necessária a autorização do Parlamento Federal para qualquer outra restrição de liberdade pessoal de congressitas, dentre o que se inclui a abertura de processos judiciais. Todo processo penal ou instaurado contra congressistas bem como toda detenção ou qualquer outra restrição de liberdade pessoal de parlamentar serão suspensos quando houver pedido do Parlamento Federal nesse sentido.

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ITEM A: Direito à educação: configuração constitucional e infraconstitucional.

Obras consultadas:Resumão do 25º. Concurso. Legislação básica.CF, art. 205 a 214.Lei 9.394/96 (LDB)Lei 10.172/01 (Plano Nacional de Educação )

Trata-se de direito fundamental social, previsto no art. 6º e nos art. 205 ss. CF, regulado no plano infraconstitucional pela Lei 9.394/96 (LDB, Lei de Diretrizes e Bases) e pela Lei 10.172/01 (PNE, Plano Nacional de Educação, de duração decenal), este último em atenção ao art. 214 CF. A justificativa de sua fundamentalidade normalmente é instrumental, ou seja: trata-se de pré-condição para a autonomia pública (Habbermas) ou pré-condição para a autonomia privada (Rawls). O art. 205 vai nesse sentido ao afirmar que a educação visa o pleno desenvolvimento da pessoa, de modo a prepará-la para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. COMPOSIÇÃO DOS NÍVEIS DE ENSINO:56 A LDB divide a educação escolar em básica e superior. A educação básica é obrigatória e gratuita, estendendo-se àqueles em idade própria (4-17 anos) ou não. (art. 208). O acesso à educação básica é direito público subjetivo e o seu não oferecimento importa responsabilidade da autoridade responsável (art.208, §§ 1º e 2º). Importante: Até a EC 59/09 apenas era direito público subjetivo o acesso ao ensino fundamental. Após a emenda ampliou-se a obrigatoriedade e a gratuidade para toda educação básica, de modo que é possível afirmar que o mínimo existencial em matéria de educação estendeu-se. Frisa-se que não basta a mera matrícula, porquanto a CF confere direito a várias prestações acessórias, como oferecimento de material escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (art. 208, VII). Há abundante jurisprudência do STF e STJ afirmando a obrigatoriedade dos municípios oferecerem o ensino infantil, configurando hipótese legítima de controle de políticas públicas a ingerência do Judiciário nas demandas que pleiteiam a construção de creches. (RE 410.715-5; REsp 511.645/SP). O acesso à educação superior se faz

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BÁSICA (art. 208 CF)

Obrigatória e gratuita.

SUPERIOR

a) Infantil (até 6 anos): art. 30 LDB

- creches (até 3)

- pré-escola (4-6)

b) Fundamental: (art. 32 LDB)

- A partir de 6 anos;

- Duração de 9 anos.

c) Médio: (art. 35 LDB)

- 3 anos de duração mínima

- Acesso e permanência de acordo com a capacidade de cada

um.

- MS contra diretor de faculdade privada (Competência da

Justiça Federal);

- Outras ações contra faculdade privada (Competência da

Justiça Estadual)

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de acordo com a capacidade de cada um (art. 208, V) devendo ser oferecido a todos igualdade de condições para o acesso e permanência (art. 206, I).57

REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS: É competência comum propiciar meios de acesso à educação (art. 23 CF) e competência concorrente legislar sobre educação e ensino (art. 24, IX CF). Vigora o princípo do federalismo cooperativo entre os entes federados (art. 211 caput e § 4º CF). Municípios atuam propritariamente no ensino fundamental e infantil. Estados atuam propritariamente no ensino médio e fundamental. Cabe à União as funções redistributiva e supletiva. (art. 211, §§ 1º, 2º e 3º CF)

DIMENSÃO NEGATIVA DO DIREITO À EDUCAÇÃO: O art. 206, II explicita que uma dimensão do direito à educação é a liberdade de aprender e ensinar. Questão controversa é a possibilidade de homeschooling (ensino doméstico), prática comum nos EUA, onde é aceita com algumas restrições (State of Wisconsin, Petitioner vs. Jonas Yoder et al). No STJ há manifestação, de questionável constitucionalidade, não admitindo (MS 7.407), valendo destacar os seguintes dispositivos: art. 229 CF, art. 22 ECA e 246 CP. A liberdade de ensinar relaciona-se com a dimensão existência do professor expressar suas ideias, mas também com necessidade de manutenção do pluralismo (art. 206, III). A autonomia das universidades é garantia institucional para a efetivação da liberdade de ensinar. O ensino religioso é opcional e as comunidades indígenas têm direito de utilização de sua lingua materna no processo de apendizagem (art. 210).

GRATUIDADE: A CF impõe a gratuidade do ensino público nos estabelecimentos particulares (art. 206, IV), motivo pelo qual é inconstitucional a cobrança de taxa de matrícula (Súmula vinculante 12 STF).

EXPLORAÇÃO PRIVADA: A exploração privada e onerosa é possível, não sendo necessário qualquer tipo de outorga pelo poder público, nos moldes do que ocorre no campo da saúde. (art. 209).

FINANCIAMENTO: Se faz de forma direta pelas receitas orçamentárias dos entes federados, havendo sistemática de vinculação que excepciona o princípio da não afetação.58 É possível instituir contribuição social do salário educação, de competência da União, cujas cotas são distribuídas proporcionalmente ao número de alunos matriculados nas redes públicas de ensino. (art. 212, §§ 5º e 6º).

JURISPRUDÊNCIA:a) cotas raciais: o STF julgou recentemente (abril de 2012) a ADIN que discutia a constitucionalidade das cotas raciais, confirmando a constitucionalidade destas por estarem de acordo com a Constituição Federal, uma vez que a igualdade material no caso é alcançada através de técnica de “justiça distributiva”, onde há a intervenção do Estado para realocação de bens e oportunidades em benefício de todos (Informativo 663 do STF). b) transferência para instituição congênere: o STF assentou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 9.536/97, sem redução do texto, no que se lhe empreste o alcance de permitir a mudança, nele disciplinada, de instituição de ensino superior particular para pública,

57 O ponto importa uma reflexão à luz da discussão das ações afirmativas (PONTO 13, c).

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UNIÃO ESTADOS MUNICÍPIOS

No mínimo 18% da receita de impostos. No mínimo 25 % de impostos,

compreendida as transferências.

No mínimo 25 % de impostos,

compreendida as transferências.

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encerrando a cláusula "entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino" a observância da natureza privada ou pública daquela de origem, viabilizada a matrícula na congênere, isto é, dar-se-á a matrícula em instituição privada se assim o for a de origem e em pública se o servidor ou o dependente for egresso de instituição pública (Informativo 380).

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ITEM B: Princípios constitucionais do trabalho. Ciência e tecnologia. Democracia e sociedade de risco.

Obras consultadas:Resumão do 25º. Concurso. ALBUQUERQUE, Armando. Teoria Democrática Contemporânea: de Schumpeter a Mainwaring. In LeiturasComplementares de Direito Constitucional – Teoria do Estado. Salvador: Editora JusPODIVM, 2009.FERNANDES, Bernardo Gonçalves (org.) Interpretação Constitucional: Reflexões sobre (a nova) hermenêutica.FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional - 3. ed. - Rio de Janeiro: Lumen Juris,2011.FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Os passos da hermanêutica: da hermenêutica à hermenêutica filosófica,da hermenêutica jurídica à hermenêutica constitucional e da hermenêutica constitucional à hermenêutica constitucionalmente adequada ao Estado Democrático de Direito. Juspodivm: Salvador, 2010.Legislação básica.CF, Art. 6º a 11 da CF.

A Constituição da República elegeu o valor social do trabalho como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, inciso IV) e um dos pilares da ordem econômica (art. 170, caput), reconhecendo o trabalho como um direito social do ser humano (art. 6º, caput).

Atualmente, não resta mais dúvida que os direitos sociais previstos no Capítulo II, do Título II, da Constituição compõem o denominado catálogo de direitos fundamentais previstos na Carta Magna, o direito a um trabalho digno caracteriza-se como um direito fundamental de segunda dimensão, exigindo, para a sua implementação, uma atuação positiva por parte do Estado (caráter prestacional).

E foi justamente com essa finalidade, qual seja, assegurar o direito a um trabalho digno, que a Constituição estabeleceu uma série de princípios aplicáveis à relação de trabalho.

De acordo o Ministro do TST Maurício Godinho Delgado, os princípios constitucionais do trabalho pode ser classificados em três grandes grupos:

O primeiro rol diz respeito a efetivos princípios constitucionais do trabalho. Trata-se de diretrizes afirmativas do labor humano na ordem jurídico-cultural brasileira: a da valorização do trabalho, em especial do emprego; a da justiça social; a da submissão da propriedade à sua função socioambiental; a diretriz da dignidade da pessoa humana.

O segundo rol diz respeito a princípios constitucionais de amplo espectro, não exatamente originados em função da idéia e realidade do trabalho, porém que hoje também atuam, de modo importante, no plano justrabalhista.

Não se construíram e se desenvolveram, é certo, em função do temário juslaborativo, elaborando-se, originalmente, em torno de matérias distintas daquelas específicas ao ramo

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especializado do Direito do Trabalho. Contudo, por diferentes razões passaram a ter influência no campo trabalhista contemporâneo, afetando, muitas vezes com significativa força, sua realidade normativa.

Trata-se, em especial, das diretrizes da proporcionalidade, da não-discriminação e da inviolabilidade do direito à vida.

O terceiro rol abrange, finalmente, princípios clássicos do Direito do Trabalho, preexistentes à Carta de 1988, mas que foram por ela absorvidos. Na medida desta absorção, tais diretrizes adquiriram status constitucional, fortalecendo seu poder de projeção na ordem jurídica do País.

Este grupo de princípios diz respeito não somente à dimensão coletiva como também à individual trabalhista. Trata-se dos princípios da liberdade e autonomia associativas e sindicais e da interveniência sindical na negociação coletiva, no plano do Direito Coletivo do Trabalho. No plano do Direito Individual do Trabalho, os princípios da norma mais favorável, da continuidade da relação de emprego e da irredutibilidade salarial.

Verifica-se, portanto, que a Constituição, ao estabelecer uma série de princípios informadores da relação de trabalho procura proteger a parte hipossuficiente na relação empregatícia (o empregado), visando atenuar, no plano jurídico, o desequilíbrio existente no plano fático.

Ciência e Tecnologia: a Constituição, em seu art. 218, estabelece que o Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas. Como refere Bernardo Gonçalves Fernandes, isso reflete uma preocupação mundial, mas que não vira as costas para as particularidades da realidade brasileira, pois a pesquisa tecnológica deve voltar-se para as soluções de problemas nacionais e para o desenvolvimento da produção nacional e regional, como asseguram os parágrafos do citado dispositivo constitucional59.

Releva mencionar o seguinte precedente do STF:

"O termo ‘ciência’, enquanto atividade individual, faz parte do catálogo dos direitos fundamentais da pessoa humana (inciso IX do art. 5º da CF). Liberdade de expressão que se afigura como clássico direito constitucional-civil ou genuíno direito de personalidade. Por isso que exigente do máximo de proteção jurídica, até como signo de vida coletiva civilizada. Tão qualificadora do indivíduo e da sociedade é essa vocação para os misteres da Ciência que o Magno Texto Federal abre todo um autonomizado capítulo para prestigiá-la por modo superlativo (capítulo de nº IV do título VIII). A regra de que ‘O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas’ (art. 218, caput) é de logo complementada com o preceito (§ 1º do mesmo art. 218) que autoriza a edição de normas como a constante do art. 5º da Lei de Biossegurança. A compatibilização da liberdade de expressão científica com os deveres estatais de propulsão das ciências que sirvam à melhoria das condições de vida para todos os indivíduos. Assegurada, sempre, a dignidade da pessoa humana, a CF dota o bloco normativo posto no art. 5º da Lei 11.105/2005 do necessário

59 § 1º - A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso das ciências.

§ 2º - A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional.§ 3º - O Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia, e concederá aos que delas se ocupem meios e condições especiais de trabalho.§ 4º - A lei apoiará e estimulará as empresas que invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento de seus recursos humanos e que pratiquem sistemas de remuneração que assegurem ao empregado, desvinculada do salário, participação nos ganhos econômicos resultantes da produtividade de seu trabalho.§ 5º - É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de sua receita orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à pesquisa científica e tecnológica.

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fundamento para dele afastar qualquer invalidade jurídica (Ministra Cármen Lúcia)." (ADI 3.510, Rel. Min. Ayres Britto, Plenário, DJE de 28-5-2010).

DEMOCRACIA E SOCIEDADE DE RISCO Segundo Armando Albuquerque, a democracia é um tema que remonta há 2.500.

contemporânea das primeiras sistematizações do pensamento político, a democracia traz consigo aos dias atuais um percurso de inesgotáveis possibilidades60. Embora seja produto da cultura grega do século VI a.C., existem muitas nuances que distinguem suas primeiras configurações daquelas que ressurgem nas democracias modernas e, principalmente, nas contemporâneas.

Bernardo Gonçalves Fernandes afirma que mais do que referirmos ao “governo do povo”, seria correto afirmar que a democracia é uma lógica na qual o povo participa do Governo e do Estado. Hoje a democracia não se restringe à escolha dos atores políticos, mas inclui ainda uma proteção constitucional que afirma: a superioridade da Constituição; a existência de direitos fundamentais; a legalidade das ações estatais; um sistema de garantias jurídicas e processuais.

A partir da Teoria dos Sistemas de Niklas Luhmann, pode-se concluir que o sistema, para ser democrático, precisa conviver com o risco da alta complexidade do ambiente, viabilizando a contínua mudança, suscetível aos influxos comunicativos do ambiente.

Nesse contexto, insere-se o tema da sociedade de risco, abordado pelo sociólogo alemão Ulrich Beck, que se relaciona com a ausência de previsibilidade das consequências das “novas tecnologias” apresentadas pela ciência. Aqui se insere a degradação ambiental no centro da teoria social, como os acidentes nucleares, a liberação de substâncias químicas em grande escala, a alteração e manipulação da composição genética da flora e da fauna, os quais podem comprometer a própria existência da humanidade.

A concepção de Estado de Segurança desenvolvida por Ulrich Beck vincula a legitimidade das instituições estatais na manutenção da segurança dos cidadãos em termos ecológicos. O sociólogo alemão traz o conceito de irresponsabilidade organizada para explicar como e porque as instituições da sociedade moderna devem reconhecer inevitavelmente a realidade da catástrofe, ao mesmo tempo em que também a negam, evitando a indenização e o controle. Assim, a consciência do perigo em grande escala e de riscos catastróficos provoca uma dinâmica de transformação política e cultural que abala as burocracias do Estado, desafia o predomínio da ciência e traça de novo as fronteiras e linhas de combate da política contemporânea.

PALAVRAS-CHAVE: princípios, constitucionais, trabalho, democracia, ciência.

60 Robert Dahl, citado por Armando Albuquerque, afirma: “ que nós compreendemos por democracia não é o que um ateniense no tempo de Péricles compreendia por este termo. As noções

gregas, romana, medieval e da renascença se misturam com aquelas de séculos mais tarde produzindo uma confusão de teorias e práticas que são muitas vezes profundamente contraditórias”.

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ITEM C: Arguição de descumprimento de preceito fundamental.

Obras consultadas:CUNHA JÚNIOR., Dirley da. Arguição de descumprimento de preceito fundamental. In: DIDIER JR., Fredie (org.). Ações constitucionais. 5. ed. Salvador: Juspodivm, 2011.SARMENTO. Daniel. Apontamentos sobre a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamenal. In: TAVARES, André Ramos; ROTHENBURG, Walter Claudius (Orgs.). Argüição de descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da Lei n. 9.882/99. São Paulo: Atlas, 2002.Legislação básica:CF, Art. 102, §1º.Lei 9.882/1999

ADPF. Mesmo com as mudanças ocorridas a partir de 1988, que reforçaram o controle concentrado em detrimento do difuso em virtude da criação da ADC e da ampliação do rol de legitimados das ações de controle abstrato, subsistiu um espaço residual expressivo para o controle difuso, diante das matérias insuscetíveis de exame no controle abstrato (direito pré-constitucional, normas revogadas, direito municipal em face da CF). É exatamente nesse espaço, responsável pela repetição de processos e consequente demora na definição de controvérsias constitucionais relevantes, pois apenas poderiam ser levadas ao STF através de RE, que se inseriu a ADPF, prevista no art. 102, §1º, da CF e regulamentada pela Lei 9.882/99. Modalidades: A doutrina reconhece a existência de duas modalidades de ADPF, ambas propostas perante o STF: (i) autônoma: processo de natureza objetiva, que visa a evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, representando típica modalidade de jurisdição constitucional abstrata, desvinculada de qualquer caso concreto; (ii) incidental 61 : processo de natureza objetivo-subjetiva, que pressupõe a existência de uma lide intersubjetiva, na qual tenha surgido controvérsia constitucional relevante sobre a aplicação da lei ou do ato do Poder Público questionado em face de algum preceito fundamental. Subsidiariedade: “O art. 4º, §1º, da Lei 9.882/99 instituiu o “princípio da subsidiariedade” da ADPF, fonte de acirrada controvérsia62. Contudo, quando se trata de ADPF autônoma, parece fora de dúvida que o juízo sobre o atendimento do princípio em questão deve ter em vista a existência de outros processos objetivos de fiscalização de constitucionalidade, que possam corrigir de maneira adequada a lesão a preceito fundamental63”. Objeto: qualquer ato ou omissão do Poder Público64, seja normativo ou não normativo65; abstrato ou concreto; anterior ou posterior à CF; federal, estadual ou municipal; proveniente de qualquer órgão ou entidade do Legislativo, Executivo ou Judiciário (não imunizado pela coisa julgada); mesmo o já revogado ou cujos efeitos se tenham exaurido. Parâmetro de controle: sem embargo do postulado da unidade da Constituição, pelo qual não se cogita hierarquia entre as normas constitucionais, os preceitos

61 O relator da ADI 2231 deu interpretação conforme ao art. 1º, par. único, I, da Lei 9.882, a fim de excluir de sua aplicação controvérsias constitucionais concretamente postas em juízo. No

entanto, o julgamento final da medida liminar encontra-se suspenso em virtude de pedido de vista (Informativo STF, n. 253, de 3 a 7 de dez./2001).62

André Ramos Tavares e Dirley da Cunha Jr. entendem, minoritariamente, que o pressuposto da subsidiariedade somente se aplica à argüição incidental. Em relação à ADPF incidental, também há discussão sobre a possibilidade de a subsidiariedade ser aferida em face de mecanismos ordinários de controle difuso.63

Excerto das ADPFs 187 e 207, subscritas por Deborah Duprat.64

Daniel Sarmento defende que a expressão Poder Público compreende os atos de particulares praticados em razão do desempenho de função pública delegada (SARMENTO, 2002, p. 92).65

Na incidental, prevalece a posição de que só é cabível contra ato normativo.

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fundamentais devem ser identificados a partir da compreensão da CF como uma ordem de valores (hierarquia axiológica), por meio da qual se pode vislumbrar as normas mais relevantes da Constituição, ligadas aos valores supremos do Estado e da sociedade. Apesar de ser difícil indicá-los a priori, há certo consenso quanto aos princípios fundamentais (CF, arts. 1º a 4º); aos direitos e garantias fundamentais; às cláusulas pétreas (CF, art. 60, §4º); aos princípios sensíveis (CF, art. 34, VII) (MENDES, 2010, p. 1333-6). Legitimados: os mesmos da ADI (ver resumo ADI/ADC). A versão aprovada pelo Congresso, atenta à modalidade incidental, que visa justamente à abertura da jurisdição constitucional aos cidadãos, admitia a legitimidade de qualquer indivíduo afetado por ato do Poder Público, mas o dispositivo foi vetado, fazendo com que a argüição incidental perdesse aplicabilidade66. Procedimento: A petição inicial deve conter a indicação do preceito fundamental violado, a indicação do ato questionado, a prova da violação e o pedido com suas especificações. Cuidando-se de argüição incidental, exige-se ainda a comprovação da controvérsia judicial relevante sobre o preceito fundamental. Admitida a argüição e examinado o pedido de liminar, se houver, o relator poderá ouvir as autoridades responsáveis pelo ato questionado, possibilitar a audiência das partes nos processos que ensejaram a argüição, requisitar informações adicionais, designar perito e determinar audiências públicas com experts. Os amici curiae podem apresentar manifestação escrita e fazer sustentação oral. O relator lançará relatório, com cópia para todos os Ministros, e pedirá dia para julgamento. Na ADPF incidental, operar-se-á uma “cisão” entre a questão constitucional e as demais questões suscitadas no caso concreto, subindo para apreciação do STF apenas a primeira delas, pois remanesce a competência dos órgãos judiciários ordinários para decidir a respeito da pretensão deduzida (CUNHA JR., 2011, p. 610). Medida cautelar: A concessão opera efeitos ex nunc, salvo quando o STF entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa. Pode visar à suspensão do ato impugnado, do andamento de processos ou dos efeitos de decisões judiciais ou de qualquer medida relacionada com a matéria discutida. A concessão de liminar depende de decisão da maioria absoluta dos membros do STF, ressalvados os casos de extrema urgência, de perigo de lesão grave ou de período de recesso, em que pode ser concedida pelo relator ad referendum do Pleno. Decisão definitiva: depende da presença de 8 ministros, com voto de pelo menos 6 deles. Exige-se que o STF independentemente de julgar procedente ou improcedente a argüição, fixe as condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental. Os efeitos da decisão são ex tunc (passíveis de modulação - art. 11), erga omnes e vinculantes, alcançando “os demais órgãos do Poder Público”, o que torna a decisão em ADPF mais ampla que a proferida em ADI ou ADC, sendo cabível reclamação nos casos de descumprimento.

PALAVRAS-CHAVE: AUTÔNOMA/INCIDENTAL; LESÃO/CONTROVÉRSIA: HIERARQUIA AXIOLÓGICA; SUBSIDIARIEDADE.

66 Dificilmente os legitimados se valerão da argüição incidental, pois podem lançar mão da modalidade autônoma, que não se submete ao requisito da prévia demonstração de controvérsia

constitucional relevante.

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ITEM A: Configuração constitucional e infraconstitucional da proteção à família, a criança, ao adolescente e ao idoso.

Legislação básica.Art. 226 ao art. 230 da CF.Arts. 1514, 1521, 1523, 1535, 1565 e 1723 do Código Civil.Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso).Dec. 3.413/2000 – Promulga a Convenção sobre os Aspectos Civil do Sequestro Internacional de Crianças, concluída na cidade de Haia, em 25 de outubro de 1980.

É a base da sociedade e terá especial proteção do Estado (art. 226 CF), havendo deveres constitucionalmente estabelecidos entre seus membros, tais quais o dos pais de criar, educar e assistir filhos menores e o dos filhos de ajudá-los e ampará-los na velhice, carência ou enfermidade (art. 229 CF). Trata-se da expressão mais eloquente da adoção de características comunitaristas em nosso ordenamento, havendo regulamentação infraconstitucional do dispositivo, como na criminalização de condutas que atentem contra a família (Título VII do CP) e na regulamentação da obrigação alimentar entre familiares (art. 1.696 e 1.697 CC). A Constituição de 1988 abandonara a concepção tradicional de família formada apenas pelo casamento, reconhecendo a proteção de arranjos monoparentais (art. 226, § 4º). Também reconheceu a proteção pelo Estado da união estável (art. 226, § 3º). A despeito de a redação do art. 226, § 6º falar de união estável entre homem e mulher, e de uma interpretação histórica demonstrar que o constituinte não pretendeu estender aos casais homossexuais a proteção conferida à união estável, o STF reconheceu que os casais formados de pessoas do mesmo sexo podem constituir união estável e, por conseguinte, fazer jus aos mesmos direitos conferidos às famílias heterossexuais. Os principais argumentos foram: a) a igualdade entre homo e heterossexuais e a liberdade de manifestar a respectiva sexualidade (art. 5º CF); b) a família é núcleo de afetividade, que não se diferencia entre pessoas de diferentes sexualidades; c) o art. 226, § 3º traz norma de inclusão, que não visa restringir a proteção das famílias homoafetivas. (ADI 4277 e ADPF 132). Com base nessa decisão o STJ, ao decidir o REsp 1183378 / RS avançou no tema e entendeu possível o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, entendendo inexistente no ordenamento pátrio qualquer vedação à habilitação para o casamento de pessoas do mesmo sexo.CRIANÇA, ADOLESCENTE E JOVEM: A proteção constitucional antes dedicada à criança e ao adolescente foi estendida ao jovem (EC 65/2010). Crianças são aqueles com idade de 0 a 12 anos incompletos; adolescentes são aqueles com idade de 12 anos completos aos 18 incompletos. O ECA regula o tema em sede infraconstitucional e se aplica às crianças e aos adolescentes. Excepcionalmente o ECA se aplica àqueles que já completaram 18 anos, como na aplicação de medidas sócio educativas e de proteção, antes do advento dos 21 anos (art. 122, § 5º e STJ HC 27.363). Dentre os princípios, destacam-se: Princípio da proteção integral: Impõe ao Estado, à família e à sociedade, com absoluta

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prioridade, assegurar ao jovem, à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência comunitária, à proteção contra a negligência, à discriminação, à exploração, à discriminação,à violência, à crueldade e à opressão; Princípio do melhor interesse da criança: Impõe que no caso concreto o aplicador do direito deve buscar a solução que proporcione maior benefícios para a criança, adolescente ou jovem e não para os demais envolvidos nos conflitos de interesse. O princípio do melhor interesse foi argumento decisivo na decisão do STJ sobre a possibilidade de casal homossexual adotar menor (STJ 889.852), porquanto atenderia ao melhor interesse da criança. Com a manifestação contrária da PGR, o art. 254 do ECA, que dispõe sobre a infração administrativa de transmitir espetáculos fora do horário indicado pelo Ministério da Justiça, está sendo considerado inconstitucional pelo STF, matéria ainda pendente de julgamento com o Min. Joaquim Barbosa. (ADI 2404). No âmbito da cooperação jurídica internacional em matéria civil destaca-se a convenção de Haia de 1980 sobre o aspecto civil do sequestro internacional de crianças, que toma como objetivo concretizador do melhor interesse da criança o retorno imediato da criança ilicitamente transferida para qualquer estado contratante. (art. 1º). A autoridade central brasileira para o tema é a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência.INIMPUTABILIDADE: Por disposição constitucional os menores são inimputáveis (art. 228), aplicando-se aos menores que praticam atos equiparados a crimes medidas de proteção e aos adolescentes medidas de proteção e medidas sócio-educativas. Muito se discute na doutrina se o art. 228 é cláusula pétrea que impediria a redução da maioridade penal. IDOSO: Ao idoso, considerado para fins legais o maior de 60 anos, foi conferida especial proteção pela constituição, tema regulamentado pela Lei 10.741/03. Dentre os direitos garantidos, vários deles para os maiores de 65 anos, destaca-se: a) o recebimento de benefício de prestação continuada (LOAS), quando não possuir meios para sua manutenção (art. 34); b) o direito de gratuidade nos transportes coletivos urbanos (art. 39 c/c 230, § 2º CF), dispositivo cuja constitucionalidade já foi afirmada pelo STF (ADI 3.768); c) direito, nos termos do regulamento, a certas vantagens nos transportes coletivos interestaduais (art. 40).

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ITEM B: Silogismo jurídico clássico: subsunção, premissa maior normativa, verificação dos fatos, conclusão.

Segundo uma concepção formalista de Direito, a atividade jurisdicional consistiria em dizer qual é o Direito in concreto, por meio de um processo de dedução lógica. Assim, a aplicação da lei poderia ser reduzida à estrutura de um silogismo, no qual a norma legal seria a premissa maior, a enunciação do fato a premissa menor e a decisão da sentença a conclusão. Não se admitia qualquer oposição entre a vontade do intérprete e a do legislador, cabendo ao jurista tão somente explicar a lei e não reformá-la, subsumindo os fatos concretos à determinação abstrata da lei. Essa concepção prevaleceu nos séculos XVIII e XIX, durante a época da codificação do direito francês, que resultou no Código de Napoleão em 1804, tendo sido adotada, entre outras, pela Escola da Exegese francesa (Proudhon, Melville, Pothier, Blondeau, etc,), pelo pandectismo alemão (Windcheid, Brinz, Glück) e pela Escola Analítica da Inglaterra (Austin, Blackstone, Beale). Miguel Reale critica essa doutrina, afirmando que “as coisas são bem mais complexas, implicando uma séria de atos de caráter lógico e axiológico, a começar pela determinação prévia da norma aplicável à espécie, dentre as várias possíveis, o que desde logo exige uma referência preliminar ao elemento fático”. Na realidade, “a norma não fica antes, nem o fato vem depois no raciocínio do juiz, pois este não raro vai da norma ao fato e vice-versa, cotejando-os e aferindo-os repetidas vezes até formar a sua convicção jurídica.” Ainda segundo REALE, “o ato de subordinação ou subsunção do fato à norma não é um ato reflexo e passivo, mas antes um ato de participação criadora do juiz, com sua sensibilidade e tato, sua intuição e prudência, operando a norma como substrato condicionador de suas indagações teóricas e técnicas”. As ideias do legalismo exegético foram também combatidas por várias escolas interpretativas, dentre elas: o utilitarismo de Jeremy Bentham, o teleologismo de Ihering, a teoria da concreção jurídica de Engisch, Esser e Larenz, a experiência prática de Oliver Wendell Holmes, a livre investigação científica de François Geny, a ofensiva sociologista de Eugen Ehrlich, o movimento do direito livre, a jurisprudência dos interesses, a jurisprudência sociológica dos Estados Unidos, a lógica experimental de John Dewey, a teoria egológica de Carlos Cossio, o rácio-vitalismo de Recaséns Siches, a teoria da argumentação de Perelman e o realismo norte-americano e escandinavo.

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ITEM C: Igualdade de gênero. Direitos sexuais e reprodutivos.

Inicialmente, importa referir que a igualdade de gênero está formalmente expressa na Constituição, erigida a direito fundamental, sendo o primeiro direito fundamental expresso no rol do artigo 5° da Carta (inciso I), a qual afirma que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. De outro lado, a legislação está repleta de leis específicas que buscam dar a esta igualdade de gênero formalmente reconhecida na Carta, um conteúdo material, tornando-a efetiva. Especificamente e sem a intenção de esgotar o tema, se pode verificar na legislação que regula as relações de trabalho (CLT), exemplo de lei infraconstitucional que tenta tornar efetiva a igualdade de gênero. Assim, observa-se nos arts. 372 e s.s. dispositivos da legislação laboral especialmente protetivos à mulher trabalhadora, buscando extirpar as diferenças injustificáveis existentes entre homens e mulheres nas relações de trabalho. Corroborando essa proteção que busca à igualdade material, importa referir a Lei 9.029/95 que proíbe a exigência de atestados de gravidez e esterilização e outras práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência nas relações de trabalho.Igualmente, no âmbito internacional, o Brasil é signatário da Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, promulgada pelo Decreto 4.377/02. No ponto, também é válido mencionar a Lei Maria da Penha, como mais um instrumento de dignidade da mulher, que busca dar concretude material ao comando constitucional mencionado. “O controle da sexualidade sempre esteve presente no ordenamento jurídico brasileiro como garantidor da constituição da família heterossexual e da procriação legítima (..). Tal controle levou à criminalização de um conjunto de comportamentos considerados ‘atentatórios’ à família (adultério), à saúde (contágio de doença venérea) e liberdade sexual, assim como acarretou a criminalização da prática do aborto, exceto quando resulta de violência sexual.” (BARSTED, 2010: 247). “O direito brasileiro, em linhas gerais, apresenta duas possibilidades no que refere ao exercício da sexualidade: um exercício estimulado para procriação e constrangido ao âmbito familiar, e um exercício proibido e, por consequência, criminalizado.” (Idem, p. 248). Essa realidade sofreu, e sofre, questionamentos por parte de movimentos feministas e GLBTs, passando o Estado, paulatinamente, a incorporar nas políticas públicas cuidados com temas como a prevenção e promoção da saúde, contra o contágio de DSTs; a aprovação de lei de planejamento familiar (Lei 9.263/96) e o acolhimento, pelo Ministério da Saúde e pelo SUS, da cirurgia de mudança de sexo, fruto de Ação Civil Pública movida pelo MPF, que resultou na edição da Portaria do Ministério da Saúde nº 1.707, de 19 agosto de 2008, fixando que a cirurgia para mudança de sexo (transgenitalização) faria parte da lista de procedimentos do SUS. Mais recentemente, importante passo foi dado com o reconhecimento, pelo STF, da união civil de pessoas do mesmo sexo, tema que dispensa aprofundamento pela sua atualidade.

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“Em relação especificamente às mulheres, a Constituição Federal de 1988 as discriminações na vida familiar e, em 2003, o novo Código Civil suprimiu as referências ‘as expressões ‘comportamento desonesto da filha’ e ‘ virgindade da mulher’, inseridas no Código Civil de 1916.” (BARSTED: 248). “No campo da proteção contra violação de direitos, a ratificação de diversas convenções internacionais, como a Convenção de Belém do Pará para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (...). A partir de 2003, novas demandas por proteção foram introduzidas na legislação penal, que implicaram o reconhecimento da ilicitude do assédio sexual, do tráfico de pessoas, da tipificação explícita do estupro marital e de maior severidade para os crimes sexuais.” (Idem). “Em 2005, a Lei 11.106 (...) alterou diversos artigos do Código Penal, na maioria claramente discriminatórios. Assim, por exemplo, o art. 5º dessa lei declara revogados os incisos VII e VIII do art. 107, que considerava extinta a punibilidade do estuprador que se casasse com a vítima.“No terreno da descriminalização, os avanços foram poucos. Assim, a legislação penal restringiu- se apenas à descriminalização do adultério, deixando de fora a demanda pela descriminalização do aborto voluntário.” (idem). Reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos: “(...) importa admitir que as demandas por direitos sexuais significam a normatização da sexualidade (...). Isso, por um lado, significa o reconhecimento de direitos, de garantias e proteções e, por outro, abre espaço para que o ordenamento jurídico exerça a sua função na definição de possibilidades e limites. Esse controle não é isento de intenções e valores.” (idem) “(...) o conceito de direitos sexuais aponta duas vertentes diversas e complementares. Uma aponta para o campo da liberdade e da autodeterminação individual, compreendendo o livre exercício da sexualidade, sem discriminação coerção ou violência e sem a interferência do Estado, a não ser para garantir o exercício desses direitos. A segunda vertente indica a necessidade de formulação e implementação de políticas públicas de qualidade, acesso à informação e ao avanço científico que possibilitem seu efetivo exercício e, nesse caso, a interferência do Estado se faz necessária.” Quatro princípios, segundo Piovesan, devem orientar os direitos sexuais e reprodutivos, são eles: a universalidade, a indivisibilidade, a diversidade e o democrático. SIEGEL (2010: 281), afirma que “(...) a abordagem baseada na igualdade de gênero para direitos reprodutivos considera o controle sobre quando ser mãe como crucial para o status e bem-estar das mulheres (...)” “O controle sobre se e quando dar à luz é também de crucial dignidade e importância para as mulheres. Investir as mulheres do controle sobre se e quando dar à luz rompe com a presunção costumeira de que as mulheres existem para

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 17. Carlos Eduardo Raddatz Cruz

cuidar dos outros. E reconhece as mulheres como agentes que se auto-governam (...)” (SIEGEL, 2010: 281). “(...) A abordagem baseada na igualdade de gênero para os direitos reprodutivos se opõe a leis que restringem o aborto e a contracepção na medida em que tais leis pressupõem ou reforçam normas do costume (...)”(SIEGEL, 2010: 283). “Hoje, a maior parte de quem abraça a abordagem baseada na igualdade de gênero para os direitos reprodutivos opõe-se a restrições legais ao aborto porque: (...) essas restrições têm punido mulheres por atividade sexual sem responsabilizar os homens na mesma medida.”É relevante anotar que a questão envolvendo, entre outros, os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, foi amplamente discutida pelo Supremo, na questão da possibilidade legal do aborto de fetos anencéfalos (ADPF n° 54/DF). Consta no informativo STF 661: “Na espécie, aduziu inescapável o confronto entre, de um lado, os interesses legítimos da mulher em ver respeitada a sua dignidade e. de outro, os de parte da sociedade que desejasse proteger todos os que a integrariam, independente da condição física ou viabilidade de sobrevivência. Sublinhou que o tema envolveria a dignidade humana, o usufruto da vida, a liberdade, a autodeterminação, a saúde e o reconhecimento pleno de direitos individuais, especificamente os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres”. Ao final, como sabido, o STF julgou procedente a ADPF para dar aos dispositivos do CP que proíbem o aborto, interpretação conforme, impendido qualquer leitura dos aludidos dispositivos da lei penal, que pudessem entender como criminosa a conduta da mulher que promove a interrupção terapêutica do parto em face da anencefalia do feto devidamente diagnosticada. É importante frisar ainda que, como é de conhecimento de todos, a questão conta com parecer da Dra. Deborah Duprat, que foi pela procedência da demanda. Em um dos trechos do parecer, que aborda a questão da autonomia reprodutiva da mulher, consignou a examinadora que “a questão em debate nestes autos envolve a autonomia reprodutiva da mulher, que tem como fundamento constitucional nos direitos à dignidade, à liberdade e à privacidade. É evidente que essa autonomia não é de natureza absoluta. Entendo que a ordem constitucional também proporciona proteção à vida potencial do feto – embora não tão intensa quanto à tutela da vida após o nascimento -, que deve ser ponderada com os direitos humanos das gestantes para o correto equacionamento das questões complexas que envolvem o aborto”.

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ITEM A: Orçamento público voltado às políticas sociais: controle social e do Ministério Público Federal.

Obras consultadas (para todo o ponto n. 18):-Mendes, Gilmar Ferreira; Coelho, Inocêncio Mártires; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. Re. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2009.-Sarmento, Daniel. Por um Constitucionalismo Inclusivo: História Constitucional Brasileira, Teoria da Constituição e Direitos Fundamentais. Lumen Juris, 2010.- Barroso, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009.-A Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência comentada / Coordenação de Ana Paula Cro- sara de Resende e Flavia Maria de Paiva Vital . _ Brasília : Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2008. p. : 164 cm. http://www.presidência.gov.br/sedh/corde.-http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/livros/20021195.pdf”,- http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/publicacoes/pessoa-com-deficiencia/pg

Legislação básica. (geral para o ponto)CF: Art. 5º, 7º, 165/167, 203, 227Lei n. 8.142/90; LRF; Lei 7.853/89; Decreto 3.298/99; Lei 8.112/90; Lei 8.213/91; Loas; Lei 10.098/00; Lei 10.216/01; Lei 8.899/94; Lei 9.868/99.

1. Noções Gerais. Em uma democracia, a ideia essencial é que as decisões políticas mais importantes sejam tomadas pelo próprio povo ou seus representantes. Tais decisões envolvem o dilema entre necessidades infinitas e recursos escassos. Em especial, a implementação de políticas sociais demandam custos, razão pela qual é preciso contextualizar o tema da efetividade destes direitos à luz dos problemas orçamentários. A escassez moderada de recursos é um fato da vida que não pode ser ignorado, motivo pelo qual é possível o argumento da reserva do possível, conquanto seja patente a possibilidade do judiciário controlar excessos (ex: invertendo o ônus da prova - REsp 764.085). Temos aqui uma questão de dosagem, uma vez que ao princípio majoritário se impõem limites (ex: proteção às minorias, garantia de direitos básicos), mas o exagero na intervenção externa ao Legislativo pode revelar-se antidemocrático, por cercear além da razoabilidade o poder do povo de se autogovernar.

2. Orçamento.

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O orçamento é instrumento de planejamento (intervenção indireta/função planejadora determinante para o setor público e indicativa para o setor privado), e é o local por excelência para a realização de escolhas trágicas, tanto no que toca às fontes de financiamento dos direitos sociais, quanto no que se refere às prioridades de gastos. Além disso, o orçamento é instrumento poderoso para a realização das atividades redistributivas do Estado, concretizando princípios tributários de equidade como a progressividade fiscal e as imunidades, na medida em que destina as verbas arrecadadas aos mais pobres.

3. Despesas, vinculação e desvinculação: Para garantir a destinação dos recursos arrecadados para a efetivação dos direitos sociais utiliza-se a técnica da afetação, o que representa exceção constitucionalmente autorizada (art. 167, IV CF). Sobre os percentuais para saúde e educação cf. tópicos 19 c e 16 a. Sob o argumento de que a maior parte do orçamento é engessado pelas vinculações constitucionais e pelas despesas correntes de caráter obrigatório, o que impede o Governo de executar seus programas, criou-se a DRU (desvinculações de receitas da União), por meio da qual se desvinculam recursos de impostos e contribuições sociais e de intervenção afetados, no percentual de 20% (art. 76 ADCT).O STF já se manifestou pela sua constitucionalidade (RE 537.310). A última prorrogação da DRU foi aprovada em 7 de dezembro de 2011.

Art. 167, IV, CF/88: “São vedados: a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo”

Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais. (Alterado pela EC-000.068-2011)

4. Controle social:

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A participação popular pode ocorrer através de mecanismos próprios institucionais ou não. Indiretamente e institucionalmente, o controle social do orçamento se dá por meio da comissão mista, composta de deputados e senadores (art. 166, § 1º CF: II - examinar e emitir parecer sobre os planos e programas nacionais, regionais e setoriais previstos nesta Constituição e exercer o acompanhamento e a fiscalização orçamentária, sem prejuízo da atuação das demais comissões do Congresso Nacional e de suas Casas, criadas de acordo com o art. 58.), a quem cabe exercer o acompanhamento e fiscalização orçamentária. De forma direta podemos mencionar todos os mecanismos de participação política, como a presença em audiências públicas, o voto, o direito de petição e de ajuizar ação popular. Para um exemplo mais específico, podemos citar a participação e controle social institucional nos Conselhos67 e Conferências68de Saúde, nos termos dos §1º e 2º do art. 1º, Lei n. 8.142/9069, ou mesmo não institucional nas Plenárias Nacionais de Saúde.70 A LRF foi alterada em 2009 com o intuito de incentivar a transparência e fomentar a participação popular na gestão fiscal. Há obrigação estatal de divulgação (inclusive na internet) de diversos documentos fiscais (art. 48 LRF); a faculdade de participação popular em audiências públicas (art. 48, I); o amplo direito de petição de informações (art. 48-A).

Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos. Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante: (Redação dada pela Lei Complementar nº 131, de 2009).: I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009). II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público; (Incluído pela Lei Complementar

67 § 2° O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo.68 § 1° A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada quatro anos com a representação dos vários

segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de

saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou

pelo Conselho de Saúde.69 Vide também EC 29/2000. 70 Vide “ http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/livros/20021195.pdf”, p. 27, painel com o Procurador da República Humberto Jacques de Medeiros.

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nº 131, de 2009). III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao disposto no art. 48-A. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009). Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes a: (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009). I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for o caso, ao procedimento licitatório realizado; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009). II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários. (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).

5. Controle do mp: cf. tópico 5.a. (MP, judiciário e políticas públicas). O STJ já realizou controle de política pública determinando a inclusão de verba na LOA do ano seguinte (REsp. 493.811).

ITEM B: Direitos das pessoas portadoras de deficiência: configuração constitucional e infraconstitucional.

A história da construção dos direitos humanos das pessoas com deficiência compreende quatro fases: a fase da intolerância, a fase da invisibilidade, a fase assistencialista, marcada pela perspectiva médica e biológica de que a deficiência era uma “doença a ser curada”, e uma quarta fase, orientada pelo paradigma dos direitos humanos, em que emerge o direito à inclusão social e a necessidade de eliminar obstáculos e barreiras culturais, físicas e sociais que embaraçam a dignidade dos portadores de deficiência. Sob essa inspiração, foi adotada pela ONU a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), reconhecendo que todas as pessoas devem ter a oportunidade de alcançar de forma plena o seu potencial. A Convenção e seu Protocolo Facultativo foram os primeiros tratados internacionais de direitos humanos aprovados nos termos do art. 5º, §3º, da CR/88, possuindo, desta forma, status material e formalmente constitucional. A Convenção contempla as vertentes repressiva (proibição de discriminação) e promocional (promoção de igualdade),

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enunciando deveres aos Estados para viabilizar a dignidade, a autonomia individual, a efetiva participação e inclusão71 na sociedade, a não discriminação, o respeito pela diferença, a igualdade de oportunidades e a acessibilidade72 da pessoa com deficiência (PIOVESAN, 2011, p. 277-281). Em sede doméstica, destacam-se:

CF, veda discriminação no tocante a salário e critérios de admissão (CF, 7º, XXXI), e reserva mercado de trabalho para os portadores de deficiência (CF, 37, VIII);

a Lei 7.853/89 - criou a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE, instituindo, ainda, diversos direitos e garantias.

Decreto 3.298/99 regulamentou a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, que inclusive dispõe sobre aspectos institucionais e formas de incentivo ao acesso de portadores de deficiência à educação e ao trabalho.

Lei 8.112/90 (art. 5º, § 2º) - o percentual máximo de 20% das vagas de cada concurso público às pessoas com desde que as atribuições do cargo postulado sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras.

Lei 8.213/91 (art. 93) prevê a obrigatoriedade de as empresas preencherem percentuais de seus cargos com beneficiários reabilitados e pessoas portadoras de deficiência habilitadas. Para tanto, a assistência social dispõe de serviços de habilitação e reabilitação de pessoas com deficiência, garantindo aos que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família o benefício mensal de um salário mínimo (CF, art. 203, IV e V; LOAS, art. 20 a 21-A). A aposentadoria do portador de deficiência, tanto no regime próprio como no regime geral de previdência, foi ressalvada da vedação constitucional contida nos arts. 40, §4º, e 201, §1º, podendo lei complementar prever a adoção de requisitos e critérios diferenciados para sua concessão (Lei 8.213/91, art. 57, extensível aos servidores públicos cf. STF: MI 1613, MI 1737, MI 1967).

71 No texto “Vamos_falar_inclusao” Ela Wiecko Volmer de Castilho e outro esclarecem sobre o direito de acesso do deficiente às classes comuns da rede regular e sobre a possibilidade de crime de abandono intelectual.72 Na ADI 3816, que impugna norma estadual do ES sobre isenção de pedágio em rodovia estadual para deficientes, o PGR manifestou-se pela procedência parcial (interferência do Poder Legislativo na organização do Poder Executivo, ao atribuir competência deste para expedir o documento comprobatório da isenção), mas reconheceu o caráter social da norma, especialmente em vista da correlação entre a previsão e o exercício do direito de ir e vir dos portadores de necessidades especiais, voltado a compensar as dificuldades vividas. ADI ainda pendente de julgamento.

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Atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino (CF, art. 208, III), tendo a Lei 9.394/96 (arts. 58 a 60), ao regulamentar a educação especial, atentado para currículos, métodos, técnicas e recursos educativos específicos, bem como professores especializados e capacitados para a integração dos educandos portadores de deficiências nas classes comuns.

O direito à integração social e à acessibilidade determina a criação de programas estatais de prevenção, atendimento especializado, treinamento para o trabalho e a convivência e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação dos portadores de deficiência (CF, art. 227, §1º, II). Considerando que a falta de acessibilidade lhes retira a autonomia e independência inerentes à dignidade humana, a CF incumbiu o legislador infraconstitucional da elaboração de normas sobre construção e adaptação de logradouros, de edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo (CF, arts. 227, §2º, e 244), papel este cumprido pela Lei 10.098/00. A Lei 8.899/94 dispõe sobre a concessão de passe livre às pessoas com deficiência no transporte coletivo interestadual e é regulamentada pelo Decreto 3.691/00. A Lei 10.048/00, por sua vez, prioriza o atendimento às pessoas portadoras de deficiência, exigindo a prestação de um serviço diferenciado oferecido pelas repartições públicas e concessionárias de serviço público, incluindo-se as instituições financeiras.

Lei 10.216/01 regulamenta a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais, redimensionando o modelo de assistência à saúde mental no Brasil.

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ITEM C: Ação Declaratória de constitucionalidade.

(vide também item 18, b, Direito Processual Civil, Grupo III)

1) Antecedentes históricos: Desde a Constituição de Weimar e, posteriormente, a Lei Fundamental de Bonn, reconhece-se a dupla função do controle abstrato de normas, como instrumento de defesa da Constituição, permitindo eliminar normas inconstitucionais, e de manutenção da segurança jurídica, quando extingue dúvidas sobre a higidez da situação jurídica. No Brasil, a discussão sobre a natureza dúplice do controle abstrato tem seus primórdios na representação interventiva instituída pela CF/34 e aperfeiçoada pela CF/46, em que se permitia ao PGR argüir a inconstitucionalidade do ato estadual, se dela tivesse convencido, ou encaminhar junto ao pedido de argüição um parecer no qual opinava pela constitucionalidade do ato. Com o advento da EC 16/65, que introduziu o controle de constitucionalidade abstrato em sede constitucional, embora se tenha positivado no Reg. Interno do STF a possibilidade de o PGR encaminhar parecer contrário junto com a representação de inconstitucionalidade, mantiveram-se as controvérsias sobre o caráter ambivalente do controle, que somente se solucionaram com a introdução da ADC na CF/88 pela EC 3/93.

2) Objeto: Mesmo paradigma da ADI. Lei ou ato normativo federal, que abrange, além das espécies normativas do art. 59 da CF, resoluções de tribunais, do CNJ e do CNMP, atos do Poder Executivo com força normativa e tratados internacionais, desde que ligados diretamente à Constituição. A norma deve ter sido produzida posteriormente ao parâmetro constitucional invocado. Apesar de a ADC ter sido criada por emenda, em 17/03/93, o STF admite como objeto leis e atos normativos anteriores à EC 3/93. Exige-se que o ato normativo esteja em vigor no momento da propositura da ação. Excluem-se da ADC perante o STF: normas constitucionais originárias; atos normativos secundários; leis declaradas inconstitucionais em decisão definitiva do STF, cuja eficácia tenha sido suspensa pelo Senado (CF, art. 52, X); leis ou atos normativos revogados; leis temporárias após o término de sua vigência; medida provisória revogada, havida por prejudicada ou não convertida em lei; as leis e atos normativos estaduais e municipais, que poderão, contudo, ser objeto de ADC no âmbito do TJ, desde que exista previsão na respectiva CE.

3) Parâmetro de controle: Semelhante à ADI. Alcança todo o bloco de constitucionalidade, abrangendo as regras e os princípios constitucionais, explícitos e implícitos, assim como as disposições materialmente constitucionais alheias ao texto constitucional, valendo ressaltar os tratados internacionais de direitos humanos aprovados nos termos do art. 5º, §3º. Podem ser invocadas como parâmetro tanto as

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 18.

normas do texto permanente quanto as transitórias (ADCT) cuja eficácia não esteja exaurida, desde que vigentes.

4) Características: processo objetivo, unilateral, não contraditório, sem partes, no qual há um requerente, porém, inexiste requerido. Esse caráter objetivo repercute nas regras procedimentais: o requerente não pode desistir da ação proposta; a causa petendi não se adstringe aos fundamentos constitucionais invocados pelo requerente, mas abarca todas as normas que integram a CF; não se admite intervenção de terceiros ; as decisões são irrecorríveis, salvo os embargos de declaração e o agravo contra decisão do relator; é incabível ação rescisória, exceção de suspeição e de impedimento (ADI 2321); não há prazo prescricional ou decadencial.

5) Legitimados: originariamente (EC n. 3/93), eram legitimados apenas o Pres. da República, as Mesas do Senado e da Câmara e o PGR. A EC n. 45/04 estendeu a legitimidade aos legitimados para propor ADI (CF, art. 103). O STF, contudo, estabeleceu o vínculo de pertinência temática com seus objetivos institucionais como critério de verificação da representatividade adequada das confederações sindicais, entidades de classe de âmbito nacional, Mesas de Assembléias Legislativas ou da Câmara Legislativa do DF, Governadores dos Estados ou do DF. O partido político deve ter pelo menos um representante no Congresso Nacional; a organização sindical que congregue, pelo menos, três federações representativas da categoria atingida pela norma impugnada; a entidade de classe de âmbito nacional que congregue integrantes de categoria econômica/profissional represente toda essa categoria e conte com associados em, no mínimo, 9 Estados. Vale destacar: os requisitos da legitimidade devem ser aferidos no momento da propositura da ação; a legitimidade do Pres. da República independe do exercício de seu poder de veto; partidos políticos, confederações sindicais e entidades de classe devem estar acompanhados por advogado com poderes específicos (os demais possuem capacidade postulatória); admite-se a legitimidade das associações de associações (ADI-AgR 3153).

6) Procedimento: a petição inicial deve ser apresentada em duas vias, trazendo cópia do ato normativo questionado e dos documentos comprobatórios do pedido. Em razão do princípio da presunção de constitucionalidade das leis, a ADC tem como pressuposto de admissibilidade a legitimação para agir in concreto (assim denominado por G. MENDES), consistente na existência de um estado de incerteza (não basta simples controvérsia doutrinária), gerado por dúvidas ou controvérsias relevantes sobre a legitimidade da lei, que ponham em risco aquela presunção (entendimento jurisprudencial positivado no art. 14, III, da Lei 9.868/99). Verificada a admissibilidade da ação, o relator, após o julgamento do pedido cautelar, se houver, determina a audiência do PGR, sendo dispensada a manifestação do AGU. Emitido o parecer ministerial, o relator poderá apresentar relatório com cópia a todos os ministros e pedir dia para julgamento. Embora tenham sido vetadas as disposições que previam a participação de amicus curiae na ADC, dado o seu caráter ambivalente, é de se lhe aplicar o disposto no

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 18.

art. 7º, § 2º, da Lei 9.869, que admite, na ADI, a manifestação de amici curiae, inclusive por sustentação oral, considerada a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes. É majoritário o entendimento de que descabe a intervenção de co-legitimado, mesmo como assistente litisconsorcial. O relator pode solicitar informações a Tribunais sobre a aplicação da norma no âmbito de sua jurisdição, designar peritos e ouvir depoimentos. O julgamento exige quorum de deliberação de, pelo menos, oito ministros (desnecessário que seja atingido numa mesma sessão), sendo proclamada a constitucionalidade com votação de seis deles.

7) Medida Cautelar: objetiva paralisar, em instâncias inferiores, o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo questionado até o julgamento da ADC.

8) Efeitos: são em regra ex tunc, erga omnes e vinculantes quanto aos atos dos órgãos judiciários (exceto STF73), da Adm. Pública direta e indireta dos entes federados, mas não o Legislativo (ou o exercício da função legislativa atípica pelo Executivo). É possível que o STF restrinja os efeitos temporais da decisão, fixando outro termo a partir do qual será eficaz, desde que haja deliberação de no mínimo 2/3 de seus membros e seja fundada em razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social (modulação temporal). A eficácia vinculante abrange a parte dispositiva da decisão e os fundamentos determinantes do julgado (transcendência dos motivos determinantes). Nos processos judiciais que estiverem em curso, seja na instância ordinária ou extraordinária, caberá ao órgão jurisdicional considerar a decisão proferida pelo STF no momento de julgar (arts. 462, 475-L, §1º, 741, par. único, do CPC). A inobservância pelos magistrados, bem como pela Administração, da diretriz firmada em controle abstrato de normas enseja a propositura de reclamação constitucional por qualquer sujeito atingido.

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Luís Roberto Barroso e Lênio Streck sustentam que a decisão que conclui pela constitucionalidade do ato não se reveste da autoridade da coisa julgada material,

podendo o STF reapreciar questão já definitivamente julgada se ela retornar à sua análise sob nova roupagem. Outros, como Fredie Didier, afirmam que isso se dá porquanto a

decisão se submete à cláusula “rebus sic stantibus”.

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ITEM A: Liberdade de expressão, religiosa e de associação. Os direitos civis e a Constituição de 1988.

Obras consultadas:FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson, Direito Civil, Teoria Geral, 8ª ed. 2ª tir. Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2010.KOATZ, Rafael Lorenzo-Fernandez. As liberdades de expressão e de imprensa na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 391-448.LEITE, Fábio Carvalho. Liberdade de crença e a objeção à transfusão de sangue por motivos religiosos. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 449-480.SARMENTO, Daniel. A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais: o debate teórico e a jurisprudência do STF. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 131-166.SARMENTO, Daniel. O Crucifixo nos Tribunais e a Laicidade do Estado. Revista Eletrônica PRPE.Disponível em: <http://www.prpe.mpf.gov.br/internet/content/download/1631/14570/file/RE_%20DanielSarmento2.pdf> . Acesso em: 24.05.2012.WEINGARTNER NETO, Jayme. Liberdade religiosa na jurisprudência do STF, p. 481-530. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.Legislação básica.Art. 5º, IV, VII, VIII, IX, XVII a XXI, 220, 222, § 1º, da CF.

1. Liberdade de expressão, religiosa e de associação.

Liberdade de expressão: IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

Há basicamente duas dimensões do direito à liberdade de expressão: a substantiva (em que se considera tal liberdade como um valor em si mesmo, isto é, uma garantia relacionada à própria dignidade da pessoa humana, já que a capacidade de dizer o que pensa e de ouvir o que quiser é um dos valores mais marcantes da condição humana, ligada ao próprio desenvolvimento da personalidade do indivíduo) e a instrumental (em que se considera a liberdade de expressão como um meio, um instrumento para a promoção de outros valores constitucionalmente consagrados, como a democracia, a opinião pública independente e o pluralismo político). O art. 5º, IV e IX, da CF, protege fundamentalmente a liberdade de expressão em sua dimensão substantiva; os arts. 220 e ss. voltam-se à dimensão instrumental,

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como meio de promoção de outros direitos fundamentais. É possível fracionar o conteúdo da liberdade de expressão em: a) liberdade em sentido estrito : engloba o direito individual de manifestação do pensamento, sentimentos etc; b) liberdade de informação : engloba o direito de informar e de receber informações verdadeiras; c) liberdade de imprensa : engloba o direito- dever de os meios de comunicação social divulgarem fatos e opiniões.

Colisão dos direitos fundamentais: A solução para a colisão entre princípios, segundo Robert Alexy, deve ocorrer por meio da técnica da ponderação, com a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade; a ponderação estabeleceria uma “relação de precedência condicionada” entre os princípios em conflito, sendo que a aplicação do princípio dependeria das condições fáticas de cada caso concreto. Porém, a doutrina vem desenvolvendo a teoria de que as liberdades de expressão e de imprensa situam-se numa posição privilegiada dentro da Constituição, por permitirem o desenvolvimento de atributos inerentes à pessoa humana e servirem de instrumento para o exercício de outros direitos fundamentais. Assim, a liberdade de expressão ocuparia uma posição preferencial (prioridade “prima facie) e, na solução dos conflitos envolvendo, de um lado, a liberdades de expressão, e de outro, outros princípios constitucionais, deve ser resolvido, via de regra, privilegiando-se aquela liberdade. Assim entendem Luís Roberto Barroso e Marinoni. Segundo Marinoni: “Alexy argumenta em favor de uma teoria que considera vários princípios que, embora não possam ser rigidamente hierarquizados, podem ser colocados em ordem mediante uma relação de prioridade “prima facie”. Ou seja, nãoé possível hierarquizar os princípios de modo a permitir a que se chegue a um único resultado – ou se ter uma “ordem dura”-, mas é viável uma “ordem mole” [...] Admite-se, assim, que os princípios da liberdade e da igualdade jurídicas têm uma prioridade prima facie ”. É por este motivo que, “quando, por exemplo, o direito de liberdade de expressão colide com o direito à honra, já existe em favor do direito da liberdade uma carga argumentativa implícita. Assim, caso a argumentação em favor do direito da personalidade não seja capaz de demonstrar que o direito de liberdade deva ceder, isso não ocorrerá. Para que um princípio possa se sobrepor ao princípio da liberdade é preciso uma argumentação mais forte do que a necessária para sustentá-lo” (Marinoni: 2010, p. 72 e 130). Porém, o STF não tem aplicado a liberdade de expressão como um valor significativo relevante, de maneira prima facie , segundo Rafael Koatz (PROVA ORAL NO 25º CONCURSO). Liberdade de empresa jornalística: a liberdade de expressão depende necessariamente da garantia de liberdade de empresa jornalística, tutelada pela liberdade de associação; porém, a própria CF limita esta liberdade ao dispor que a empresa jornalística e de radiodifusão sonora ou audiovisual compete privativamente aos brasileiros natos, ou aos naturalizados há mais de dez anos, ou às pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras com “pelo menos setenta por cento do capital total e do capital votante das empresas jornalísticas e de radiodifusão [...] deverá pertencer, direta ou indiretamente, a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos” (art. 222, § 1º, da CF). Jurisprudência do STF: a) ADI 869/99: é inconstitucional a

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expressão do art. 247, § 2º, do ECA, que autorizava a suspensão da programação da emissora por até 02 dias, ou da publicação de periódico por até 02 números, caso divulgassem nome, ato ou documento de procedimento instaurado contra criança ou adolescente, a que se atribua ato infracional (violação ao art. 5º, XLV, da CF); b) ADI 2.566-MC: o STF indeferiu medida cautelar e manteve a vedação à prática de proselitismo de qualquer natureza na programação das emissoras de radiodifusão comunitárias (art 4º, § 1º, da Lei 9.612/98); c) ADI 956/94: é constitucional a proibição de utilização de gravações externas, montagens ou trucagens, na propaganda eleitoral gratuita (art. 76, §1º, Lei 8.713/93); d) ADI 2.677-MC: o STF indeferiu medida cautelar e manteve a proibição de participação, em propaganda eleitoral, de pessoas filiadas a outros partidos que não o responsável pelo programa político (art. 45, § 1º, I, Lei 9.096/95); e) ADI 3.741/2006: é inconstitucionalvedar a divulgação de pesquisas eleitorais 15 dias antes do pleito, por violar a liberdade de informação (art. 35-A, da Lei 9.504/97); f) ADI 4.451/2010: é inconstitucional a proibição de veiculação de charges, sátiras ou programas humorísticos, envolvendo questões ou personagens políticos, durante o período eleitoral, por corresponder a inaceitável censura legislativa prévia e restrição desproporcional ao direito de crítica (suspensão integral da eficácia do inciso II e de parte do inciso III, do art. 45, da Lei 9.504/97, e por arrastamento dos §§4º e 5º desse artigo); g) ADI 2.815/03: os Estados da federação não possuem competência para proibir a publicação de fotos eróticas ou pornográficas em anúncios e comerciais, porque cabe à União legislar sobre propaganda comercial; h) ADPF 130/2009:a Lei de Imprensa, como um todo, foi considerada incompatível com a CF/88, por ser considerada um instrumento legal que limitava de maneira irrazoada a liberdade de imprensa; i) RE 511.961/2009: considerou-se incompatível com a CF/88 a exigência de apresentação de diploma universitário de jornalismo, prevista no art. 4º, V, do Decreto-lei 972/69, como condição para a obtenção do registro profissional de jornalista, no Ministério do Trabalho; segundo o Min. Gilmar Mendes: “a formação específica em curso de graduação em jornalismo não é meio idôneo para evitar riscos à coletividade”, “o jornalismo é uma profissão diferenciada por sua estreita vinculação ao pleno exercício das liberdades de expressão e informação”, “a reserva legal estabelecida no art. 5º, XIII,não confere ao legislador o poder de restringir o exercício da liberdade a ponto de atingir o seu próprio núcleo essencial”; j)ADPF 183/2009: Deborah Duprat ajuizou esta ADPF, pleiteando que seja declarada incompatível com a CF/88 a Lei 3.857/60, que criou a Ordem dos Músicos do Brasil, por restringir o exercício da profissão de músico e a liberdade de expressão, em violação ao art. 5º, IV, IX e XIII, da CF/88 (pendente de julgamento, mas no RE 414426, o STF declarou que a atividade de músico prescinde de controle, já que não há potencial lesivo, para que se exija inscrição em conselho profissional, sendo manifestação artística protegida pela garantia da liberdade de expressão); l) ADPF 187 e ADI 4274-2: conferiu-se interpretação conforme ao art. 287, do CP(Apologia de crime ou criminoso:Art. 287 - Fazer, publicamente, apologia de fato criminoso ou de autor de crime), e ao art. 33, §3º, da Lei 11.343/06 9(§ 3o Oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para juntos a

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consumirem), respectivamente, de forma a excluir qualquer exegese que permita a criminalização da defesa da legalização das drogas ou de qualquer substância entorpecente, inclusive através de manifestações e eventos públicos; m) ADI 1969: é inconstitucional decreto autônomo editado pelo Governador do DF, que, a pretexto de assegurar o direito ao trabalho em ambiente de tranquilidade, impunha restrições à liberdade de reunião e de expressão, proibindo a utilização de carros, aparelhos e objetos sonoros nas manifestações públicas realizadas na Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos Ministérios e na Praça do Buriti; n) HC 82.424/2003 (Caso Ellwanger e os discursos de incitação ao ódio ou hate speech): o STF, por maioria, denegou a ordem postulada, reconhecendo como crime de racismo a publicação de livros próprios e de terceiros, com conteúdo antissemita, bem como sua imprescritibilidade; o) HC 83.996/2004 (Caso Gerald Thomas): a ordem foi concedida em favor de diretor teatral que, diante de vaias e xingamentos do público, simulou ato de masturbação e abaixou as calças, mostrando as nádegas para a platéia; o STF consignou que o art. 233, do CP, deve ser interpretado de forma a excluir qualquer exegese que viole a liberdade de expressão artística e cultural.

Liberdade religiosa: VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

“compreende três formas de expressão [...]: (a) liberdade de crença [...] mas também compreende a liberdade de não aderir a religião alguma [...]. (b) liberdade de culto [...] na prática dos ritos, no culto, com suas cerimônias, manifestações [...] na forma indicada pela religião escolhida [...]. (c) Liberdade de organização religiosa [...] diz respeito à possibilidade de estabelecimento e organização das igrejas e suas relações com o Estado” (Silva:2001, p. 251-254). Neste último aspecto, impende destacar a característica laica do Estado e a imunidade tributária como garantia da liberdade religiosa. A proteção constitucional à liberdade religiosa, portanto, não se refere à tutela a uma corrente de idéias ou pensamentos, mas à compreensão de um direito mais amplo de liberdade de consciência, que assegura a autodeterminação existencial e ética dos indivíduos, que se desdobra em diversos campos, como o filosófico, o ideológico e o religioso (LEITE: 2011, p. 456). Resguarda-se o ensino fundamental religioso com matrícula facultativa (art. 210, § 1º, CF) e assistência religiosa nas entidades civis e militares (art. 5º, VII, da CF), bem como a escusa de consciência, por meio da qual ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa , salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recursar-se a cumprir prestação alternativa (art. 5º, VIII, CF).

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Caso das testemunhas de Jeová e adeptos da Christian Science: quanto à objeção de consciência, por motivos religiosos, à realização de transfusão de sangue, a doutrina e a jurisprudência majoritária defendem que a vida é intangível e que o princípio da dignidade da pessoa humana autorizaria o médico a realizar a transfusão, independentemente da vontade do paciente, quando cientificamente se prova que este é o único meio apto a salvar a vida em iminente perigo. A Resolução 1.021 do Conselho Federal de Medicina estabelece que é dever do médico praticar a transfusão de sangue, ainda que haja oposição do paciente ou de seu responsável, apoiando-se na excludente de ilicitude do art. 146, §3º, I, do CP. Essa posição diverge do que tem sido aplicado em países como EUA e Alemanha, que tendem a assegurar a objeção à transfusão de sangue, em proteção à liberdade religiosa (LEITE: 2011, p. 469). Civilistas como Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves (2010, p. 173) defendem a objeção à transfusão de sangue, tratando-se de manifestação livre de pessoa maior e capaz.

Crucifixos nos tribunais: Daniel Sarmento defende que crucifixos, assim como qualquer outro símbolo religioso, não podem ser mantidos em espaços eminentemente públicos do Poder Judiciário, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da laicidade estatal; o autor aduz que laicidade não se confunde com laicismo, já que este representa verdadeira animosidade do Estado para com a religiosidade, enquanto aquela configura apenas relação de neutralidade e imparcialidade estatal para com todas as manifestações religiosas,de maneira a assegurar o exercício igualitário da liberdade religiosa, em um ambiente de pluralismo religioso e mundividencial. Por outro lado, este autor defende a constitucionalidade de alguns feriados religiosos, bem como gastos públicos na conservação de igrejas barrocas, Cristo Redentor, por não ofender a laicidade estatal, tendo em vista interesses públicos em jogo (proteção da liberdade religiosa dos trabalhadores católicos e do patrimônio histórico e cultural do Brasil, respectivamente). Jurisprudência do STF. ADI 2.076-5: não há inconstitucionalidade na ausência de invocação a Deus na Constituição estadual do Acre , diante da ausência de força normativa do Preâmbulo da Constituição Federal; RE 325.822-2: reconheceu-se a imunidade tributária de templos de qualquer culto, vedada a instituição de impostos sobre o patrimônio, renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades religiosas (interpretação extensiva conferida pelo STF, permitindo a imunidade tributária ao exercício de atividades não religiosas, por parte das igrejas); STA 389 AgRg: considerou-se razoável medida adotada pelo MEC, no sentido de admitir que certos grupos religiosos realizem as provas do ENEM durante o sábado, após o pôr-do-sol, por representar providência mais condizente com o dever de neutralidade religiosa do Estado, diante dos problemas decorrentes da designação de dia alternativo.

Liberdade de associação: objeto do art. 5º, XVII até XXI, da CF: XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o

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trânsito em julgado; XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente;

Conceito: “no dizer de Pontes de Miranda – ‘toda coligação voluntária de algumas ou de muitas pessoas físicas, por tempo longo, com o intuito de alcançar algum fim (lícito), sob direção unificante’ [...] Seus elementos são: base contratual, permanência (ao contrário da reunião),fim lícito, [...] inclui tanto as associações em sentido estrito ([...] de fim não lucrativo) e as sociedades (...).

Contém quatro direitos: o de criar associação (e cooperativas), que não depende de autorização; o de aderir a qualquer associação [...]; o de desligar-se [...]; o de dissolver espontaneamente a associação [...].

Duas garantias coletivas [...]: (a) veda-se a interferência estatal no funcionamento [...] (b) as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, trânsito em julgado [...] Há duas restrições expressas: [...] não seja para fins lícitos ou de caráter militar. E é aí que [...] autoriza a dissolução por via judicial” (Silva: 2001, p. 269-271). Jurisprudência do STF. Súmula 629: A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classeem favor dos associados independe da autorização destes; ADI 1.194: a obrigatoriedade do visto de advogado para o registro de atos constitutivos de pessoas jurídicas (art. 1º, §2º, Lei 8.906/94) não ofende os princípios constitucionais da isonomia e da liberdade associativa; ADI 3.045: atos emanados do Executivo ou Legislativo, que provoquem a compulsória suspensão ou dissolução de associações, mesmo as que possuam fins ilícitos, são inconstitucionais; RE 432.106: não se deve confundir associação de moradores com a figura do condomínio, razão pela qual é indevido impor mensalidade a morador ou proprietário de imóvel, que a ela não tenha aderido; ADI 3.464: viola os princípios constitucionais da liberdade de associação e da liberdade sindical, em sua dimensão negativa, a norma legal que condiciona, ainda que indiretamente, o recebimento do benefício do seguro-desemprego à filiação do interessado a colônio de pescadores de sua região; RE 437.971-AgRg e RE 520.629-ED-AgR: a legitimação das organizações sindicais, entidades de classes ou associações, para o mandado de segurança coletivo, é extraordinária, ocorrendo nesse caso substituição processual, não se exigindo autorização expressa dos filiados (art. 5º, LXX, CF); diferente é o caso previsto no art. 5º, XXI, CF, que trata de representação processual, em que se exige autorização expressa dos filiados:XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente.

2. Os direitos civis e a Constituição de 1988.As principais teorias sobre a vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, segundo Daniel Sarmento(2011, p. 131-165), são: a) Doutrina da “State action”: nos EUA tem prevalecido a visão de que, em regra, os direitos fundamentais não se estendem às relações

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privadas e apenas são impostos aos Poderes Públicos,com exceção apenas da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão;b) Public Function Theory: teoria também gerada no cenário norte-americano, segundo a qual os particulares que agirem no exercício de atividades tipicamente estatais estarão sujeitos às limitações dos direitos fundamentais; c) Teoria da eficácia horizontal mediata ou indireta dos direitos fundamentais: concepção dominante no direito germânico, que prega a impossibilidade de aplicação direta desses direitos nas relações privadas, por implicar ofensa à autonomia da vontade; contudo, caberá ao legislador de Direito privado, por meio de cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados, definir o grau de conformação dos direitos fundamentais, no âmbito privado; d) Teoria da eficácia horizontal imediata ou direta dos direitos fundamentais:também gerada no cenário germânico, essa teoria defende que, embora alguns direitos fundamentais vinculem apenas o Estado, outros, pela sua natureza, podem ser invocados diretamente nas relações privadas,independentemente de qualquer mediação por parte do legislador, revestindo-se de oponibilidade erga omnes; e) Teoria dos deveres de proteção:concepção de origem igualmente alemã, em que se defende que o Estado, tanto ao editar normas como ao prestar a jurisdição, está obrigado não apenas a abster-se de violar direitos fundamentais, como também a protegê-los diante de lesões e ameaças provenientes de particulares (Claus Canaris); aqui sobressaem as dimensões da vedação ao excesso e da proibição da proteção deficiente, relativas ao princípio da proporcionalidade. Jurisprudência do STF. RE 158.215-4: na hipótese de exclusão de associado decorrente de conduta contrária aos estatutos, impõe-se a observância do devido processo legal, com a garantia da ampla defesa; RE 161.243-6: STF acolheu pedido de trabalhador brasileiro, empregado da empresa aérea Air France, para ter seus direitos trabalhistas equiparados aos empregados de nacionalidade francesa (o estatuto da empresa assegurava certos direitos apenas aos trabalhadores franceses); RE 201.819-8: A União Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras.

Liberdade de pensamento: art. 5º, IV e V.

Estes dois dispositivos estão intimamente relacionados. Ao vedar o anonimato, a intenção da Constituição é evitar manifestações abusivas de pensamento, identificando os responsáveis por elas.A responsabilização passa pela questão de não existir direitos absolutos. A liberdade de expressão do pensamento é livre, mas encontra limites em outros direitos também consagrados pela Constituição.Uma denúncia anônima pode ser utilizada como prova no processo?Denúncia anônima não pode ser utilizada como prova. Entretanto, ela pode ser utilizada para levar a informação à autoridade competente. Através desse conhecimento, ela irá investigar, verificando se houve ou não o crime.

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Segundo o STF, a investigação é autônoma em relação à denúncia, não havendo contaminação. Seria absurdo que a autoridade não pudesse investigar o fato porque a denúncia foi anônima.Escritos apócrifos poderia ser utilizados como prova?O STF admite escritos apócrifos como prova em duas situações:

1. Quando constituir o próprio corpo de delito – ex. carta que caracteriza crime contra a honra;

2. Quando for produzido pelo próprio acusado – ex. caso de bilhete numa extorsão mediante seqüestro.

Sempre que se trabalhar com direitos fundamentais, deve-se lembrar que eles são aplicados na maior medida possível, mediante princípios. Assim, somente o caso prático definirá os contornos que ditarão o aproveitamento de dados como provas no processo.

Liberdade de consciência, crença e culto: art. 5º, V.

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

Qual a diferença entre a liberdade de consciência, de crença e de culto?A mais ampla de todas elas é a liberdade de consciência. Quando se fala em liberdade de consciência, pode a pessoa ser religiosa ou não. Ademais, abrange a liberdade em relação a convicções filosóficas políticas.A liberdade de crença está mais relacionada ao aspecto religioso, sendo a liberdade de ter uma religião, uma fé. Já a liberdade de culto nada mais é do que a exteriorização da liberdade de crença.Quando se fala em proteção aos locais e de culto e suas liturgias, não se restringe ele aos templos e locais reservados. Contudo, deve a liberdade de culto ser compatibilizada às demais liberdades públicas.O Estado brasileiro é laico, não-confessional ou secular. Desde o advento da República, houve a separação no Brasil entre o Estado e a Igreja. Essa neutralidade do Estado Brasileiro não se confunde com ateísmo; laicidade não é a mesma coisa que o ateísmo.O ateísmo não deixa de ser uma forma de manifestação religiosa: questiona-se a presença de Deus. O fato de o Estado ser laico significa que deve ele manter uma neutralidade em relação às concepções religiosas.A neutralidade do Estado laico é indispensável para o respeito à pluralidade religiosa. Habermas fala que a neutralidade no exercício do poder é condição indispensável para uma garantia simétrica da liberdade religiosa.A laicidade do Estado brasileiro fica evidente no art. 19, I, da CF/88:

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de

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dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

O Estado brasileiro não só protege a manifestação religiosa como reconhece o papel importante desempenhado na órbita social. O que a CF/88 não admite é que o Estado beneficie ou prejudique determinada religião. A república é chamada de governo das razões; assim, os argumentos religiosos não podem ser utilizados na seara pública. Os argumentos devem ser racionalmente justificáveis.Foi questionado perante o CNJ o uso de crucifixos em Tribunais: o referido Conselho entendeu que os símbolos religiosos são símbolo da cultura brasileira e não ferem a neutralidade do Estado.Na STA 389, o STF foi instado a se manifestar acerca da marcação específica de prova em data diversa da anteriormente definida, tendo entendido o Tribunal que não havia qualquer afronta ao direito de liberdade religiosa, vez que, no ato de inscrição, poderia ser assinalada a opção de “condição especial”, não se justificando que o Estado formulasse uma prova diferente para cada religião. Os argumentos utilizados pelo STF foram o princípio da igualdade e a neutralidade do Estado.

STA 389:

Ementa

EMENTA: Agravo Regimental em Suspensão de Tutela Antecipada. 2. Pedido de restabelecimento dos efeitos da decisão do Tribunal a quo que possibilitaria a participação de estudantes judeus no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) em data alternativa ao Shabat 3. Alegação de inobservância ao direito fundamental de liberdade religiosa e ao direito à educação. 4. Medida acautelatória que configura grave lesão à ordem jurídico-administrativa. 5. Em mero juízo de delibação, pode-se afirmar que a designação de data alternativa para a realização dos exames não se revela em sintonia com o principio da isonomia, convolando-se em privilégio para um determinado grupo religioso 6. Decisão da Presidência, proferida em sede de contracautela, sob a ótica dos riscos que a tutela antecipada é capaz de acarretar à ordem pública 7. Pendência de julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nº 391 e nº 3.714, nas quais este Corte poderá analisar o tema com maior profundidade. 8. Agravo Regimental conhecido e não provido.

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ITEM B: Direitos e interesses das comunidades indígenas e das remanescentes de quilombos. Comunidades tradicionais. Papel do Ministério Público na defesa das minorias.

Obra consultada:ANJOS FILHO, Robério Nunes dos. O Supremo Tribunal Federal e os direitos dos povos indígenas. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no Supremo Tribunal Federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 911-954.BARRETO, Helder Girão. Direitos indígenas: vetores constitucionais. Curitiba: Juruá, 2004.http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-index.phphttp://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wspLegislação básica.Arts. 22, XI, 49, XVI, 210, §2º, 231 – 232, da CF, 68, da ADCT.Decreto 4.887/03Convenção 169 da OITArt. 7º, II, da MP 2.186-16/2011Lei 9.985/00

Além das múltiplas e heterogêneas comunidades indígenas e quilombolas, temos inúmeras comunidades tradicionais, destacando-se as extrativistas, as comunidades ribeirinhas e os ciganos. Todos esses grupos têm em comum um modo de vida tradicional distinto da sociedade nacional de grande formato. O grande desafio para a 6ª CCR e para os Procuradores que militam em sua área temática é assegurar a pluralidade do Estado brasileiro na perspectiva étnica e cultural, tal como constitucionalmente determinada. O art. 68 do ADCT é direito fundamental, ligado à moradia, à igualdade substantiva e justiça social, à medida reparatória a resgatar dívida histórica, ao direito coletivo das comunidades de manterem sua identidade etno-cultural (já que a terra é o elo que mantém a coesão do grupo) e ao direito difuso de toda a sociedade brasileira à sobrevivência cultural das específicas formas de viver dos quilombolas. O art. 68 é suficientemente denso a permitir sua aplicação imediata. Duas leituras são possíveis: (a) a transferência da propriedade depende de desapropriação: a própria CF operou a afetação das terras ocupadas pelos quilombolas a uma finalidade pública de máxima relevância, eis que relacionadas a direitos fundamentais de uma minoria étnica vulnerável: o seu uso, pelas próprias comunidades, de acordo com seus costumes e tradições, de forma a garantir a reprodução física, social, econômica e cultural. Os proprietários particulares não podem reivindicar a posse da terra ou buscar proteção possessória antes da desapropriação ou da imissão provisória na posse. Diante da privação da posse, só podem postular indenização, tal qual na desapropriação indireta. Já os quilombolas podem se valer de todos os instrumentos processuais adequados à efetivação e à proteção do seu direito à posse, mesmo antes da desapropriação e até independentemente dela, contra o proprietário ou terceiros; (b) a própria CF já transferiu a propriedade: o ato de reconhecimento tem caráter declaratório, daí porque o gozo do direito de propriedade coletiva é imediato (a partir do art. 68), podendo ser tutelado em juízo independentemente de prévia desapropriação. A desnecessidade de desapropriação não impede o pagamento de indenização a eventual exproprietário privado, para melhor

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acomodar os interesses em jogo. O Decreto 4.887/03, que regulamenta o procedimento administrativo de titulação das terras quilombolas e, se for o caso, sua desapropriação, (a) não é autônomo, pois baseado na Convenção 169 da OIT e na Lei nº 9.784/99 e, ademais, ainda que fosse, é válido decreto que regulamenta diretamente norma constitucional consagradora de direito fundamental suficientemente densa e de aplicabilidade imediata (superação do modelo legicêntrico) (parecer na ADIn 3239, Sarmento). 1740, Conselho Ultramarino: quilombo é “toda habitação de negros fugidos que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e não se achem pilões nele”. Almeida: no Império, basta que passem de dois, mas mantém-se a mesma definição. Com a proclamação da República, o quilombo desaparece do Direito por quase 100 anos até a CF/88. Para esta, o quilombo é uma autonomia construída no tempo; não é o local onde se encontra vestígios, mas onde os agentes sociais estão (critério da autoatribuição – o grupo se autodefine). Duprat: remanescentes de quilombos, índios e diversos outros grupos étnicos, uma vez que sabidamente não foram tratados na CF por falta de conhecimento do constituinte, mas estão também amparados, e, no momento em que se revelarem, terão o mesmo tratamento jurídico que os grupos étnicos expressamente referidos estão a ter. Quando a CF prestigia os modos de viver, fazer e sentir desses grupos e as sua formas de expressão, está dando a esses grupos a capacidade de autodefinição. Cabe ao Judiciário verificar se há, a partir dessa auto-identificação, pertinência ou não com o direito que é referido, mas jamais cabe ao Judiciário, ao administrador ou a qualquer outro grupo étnico diverso dizer o que aquele grupo é. A autodefinição também é o critério da Convenção 169 da OIT. Norma emancipatória não pode ser interpretada à luz de concepções da época escravocrata. A questão dos remanescentes dos quilombos não difere em nada da questão indígena, a propriedade de suas terras é como “território cultural” (Almeida e Duprat, 2003). Diferença entre o regime de terras indígenas da Constituição Federal de 1988, em relação às Constituições de 1934, 1946 e 1967 (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO): A Constituição Federal de 1891 (art. 64) transferiu aos Estados-membros todos os imóveis públicos que não fossem necessários aos serviços da União ou indispensáveis à defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e ferrovias federais. Na CF/34, transferiu-se para os indígenas, então chamados de silvícolas, a posse das terras por eles ocupadas permanentemente, vedando sua alienação; tais terras estavam situadas em Estados-membros e estavam ou sob domínio público ou sob domínio particular. Assim, restou constitucionalizado o conflito pela posse da terra, tendo de um lado os indígenas e suas comunidades, e do outro os Estados-membros e particulares (frequentemente aliados). Na CF/46, reconheceu-se aos silvícolas a posse das terras onde se achavam permanentemente localizados, com a condição de não a transferirem. Essa situação manteve-se inalterada até o advento da CF/67 (art. 186), que estendeu (ou explicitou) à posse indígena o “usufruto exclusivo” dos recursos naturais e de todas as utilidades nela existentes. A EC 69, inovando, declarou nulos e extintos os efeitos de quaisquer naturezas sobre o domínio, a posse e a ocupação das terras ocupadas por indígenas. Se os Estados-membros, até então, podiam invocar em seu favor a aplicação do art. 64 da CF/1891, a partir da CF/69 já não poderiam fazê-lo com tanta convicção. Aqui, agregou-se mais um elemento de conflito à já tão instável relação entre índios e não índios. Na CF/88, declarou-se como pertencentes ao domínio da União as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas (art. 20, XI); tal disposição é explicitada pelo art. 231 da mesma Carta, em que se

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destaca o dever de demarcá-las (BARRETO: 2004, p. 105-106). Conceito de conhecimento tradicional associado (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO DA PGR): Conhecimento tradicional consiste na informação ou prática individual ou coletiva de comunidade indígena ou de comunidade local, com valor real ou potencial, associada ao patrimônio genético, segundo o art. 7º, II, da MP 2.186-16/2011 (Dicionário de Direitos Humanos da Escola Superior do Ministério Público da União). Conceito de comunidade tradicional (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO DA PGR): engloba as comunidades indígenas, quilombolas e as locais. “Inexiste definição, dada pela lei, de comunidade local. O conceito de populações tradicionais chegou a ser inserido no projeto de lei da Lei 9.985, de 18/07/2000, aprovado pelo Congresso Nacional, mas foi objeto de veto presidencial. A lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei 9.985, de 18/07/2000) estabelece direitos e obrigações para as populações tradicionais, mas não as define.Analogicamente, pode ser usado o conceito empregado na Lei 9.985/2000, quando trata das populações em reservas de desenvolvimento sustentável, que são qualificadas como tradicionais e caracterizadas por terem a sua existência baseada ‘em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica’. A lei do Sistema Nacional das Unidades de Conservação não inclui os índios e quilombolas, fala apenas das comunidades locais no conceito de populações tradicionais. Trata-se de uma incorreção, visto que é indubitável que as comunidades indígenas e quilombolas estão incluídas no conceito de populações tradicionais.Entrementes, baseando-se na linha de entendimento sobre comunidades locais veiculada na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que incorretamente exclui as comunidades indígenas e quilombolas do conceito de populações tradicionais, podemos definir comunidade local como aquela com modo de vida e inter-relações sociais e materiais indissociáveis à diversidade biológica e à reprodução dos conhecimentos tradicionais a ela associados. São os pescadores artesanais, os seringueiros, a comunidade quilombola formada pelos negros e índios remanescentes de quilombos, a população ribeirinha. No que atina à definição de comunidade indígena, insta, primeiramente, anotar que a Constituição da República de 1988, dirigiu-se aos índios adotando expressões como ‘grupos indígenas’ (art. 231, § 5º, CF), ‘índios’ (art. 231, § 1º e 2º, ‘populações indígenas’ (art. 22, XI e 129, V, CF), ‘comunidades e organizações indígenas’ (art. 232). Poderia o legislador constituinte ter atribuído explicitamente a menção a povos indígenas, pois no artigo 4º do Estatuo Ápice de 1988, prescreveu sobre a autodeterminação dos povos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade. Luciano Mariz Maia chega a sugerir que a não utilização da expressão “povos indígenas” não foi sem propósitos, pois a expressão “povos” aparece no direito internacional, sempre vinculado ao direito político que estes têm à autodeterminação, e ao estabelecimento de um governo próprio e soberano. É assim que vem expresso na Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, de 1966, e no âmbito da Organização Internacional do Trabalho, com a Convenção 169 relativa aos Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes. Conclui que as expressões ‘grupos indígenas’ e ‘populações indígenas’ podem ser utilizadas como sinônimas de ‘comunidades indígenas’, para fins de aplicação dos preceitos constitucionais e legais de proteção, mesmo porque, segundo definição dada por Frans Moonem, ‘comunidade indígena’ é

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um grupo local de um povo indígena.Os conhecimentos dessas populações tradicionais são reconhecidos pela Constituição Federal de 1988 como patrimônio cultural brasileiro, bens de natureza imaterial ou material, tomados individualmente ou em conjunto. Integram a categoria de bens de interesse público, porque o artigo 129, V da CF/88 atribui ao Ministério Público a defesa judicial dos direitos e interesses das populações indígenas, e coletivo lato sensu ou difuso, porquanto o elenco do inciso III desse comando do artigo 129 não é exaustivo, é exemplificativo. Por isso, ainda que apenas um indivíduo da comunidade tradicional detenha o conhecimento associado à biodiversidade, este sempre detém natureza coletiva. Isto não ficou tão claro na definição de “acesso ao conhecimento tradicional associado” veiculada no art. 7º, V, da Medida Provisória 2186-16/2001. Importante sublinhar que a Convenção da Biodiversidade em seu preâmbulo reconhece a “estreita e tradicional dependência de recursos biológicos de muitas comunidades locais e populações indígneas com estilos de vida tradicionais”.Estabelece também em seu artigo 8, ‘j’, que os países signatários devem preservar o conhecimento e práticas das comunidades locais e encorajar a repartição dos benefícios oriundos da aplicação destes conhecimentos’. Esse reconhecimento da necessidade de proteção não só da biodiversidade, mas também da sociodiversidade e de suas inter-relações, em nível da Convenção da Biodiversidade, é assaz relevante, visto que aquela convenção internacional, na nossa concepção, foi incorporada no nosso ordenamento jurídico constitucional como direito humano fundamental.A Constituição Federal protege ainda as "manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional" (Dicionário de Direitos Humanos da Escola Superior do Ministério Público da União). Principais aspectos do Caso Raposa Serra do Sol (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO DA PGR): nesse caso, discutiu-se a possibilidade de serem excluídos da área demarcada trechos de terras que foram ilegalmente ocupados por terceiros não-índios, especialmente fazendeiros que plantavam arroz, através da adoção de um modelo que foi chamado demarcação descontínua. Esses trechos, caso excluídos, tornar-se-iam glebas isoladas dentro das terras indígenas, razão pela qual foram chamadas de ilhas. O STF avalizou o modelo contínuo de demarcação de terras indígenas, afastando a possibilidade de ilhas, mas estabeleceu algumas condições (chamadas salvaguardas institucionais), para o usufruto dos índios sobre suas terras: a) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos, existentes em terras indígenas não se sobrepõe ao interesse público da União, na forma da Constituição e de lei complementar (art. 231, § 2º, da CF); b) o usufruto dos índios não abrange a exploração mercantil dos recursos hídricos e dos potenciais energéticos, que sempre dependerá de autorização do Congresso Nacional (art. 49, XVI, da CF); c) o usufruto dos índios não alcança a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que sempre dependerão de autorização do Congresso Nacional, assegurando-lhes a participação nos resultados da lavra; d) o usufruto dos índios não compreende a garimpagem nem a faiscação, devendo-se obter a permissão de lavra garimpeira; e) o usufruto dos índios não se sobrepõe aos interesses da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho igualmente estratégico, serão implementadas a critério dos órgãos competentes, independentemente de consulta às

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comunidades indígenas e à FUNAI; f) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal, na área indígena, é assegurada e ocorrerá independentemente de consulta às comunidades indígenas e à FUNAI; g) o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas, vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação; h) o usufruto dos índios na área afetada por unidade de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes, devendo a comunidade indígena ser ouvida e assegurado seu direito de participação na unidade; i) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deverá ser admitido na área afetada à unidade de conservação, nos horários e condições estipulados pelo ICMBio; j) admitem-se o ingresso, trânsito e permanência de não-índios em terras indígenas não afetadas ecologicamente, observadas, porém, as condições da FUNAI; l) esse ingresso, trânsito e permanência de não-índios não poderá ser objeto de cobrança de tarifa ou quantia, por parte das comunidades indígenas; m) não será exigida tarifa ou qualquer outro valor pela utilização de estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou outros equipamentos públicos; n) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou qualquer outro ato negocial que atente contra o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena; o) nas terras indígenas, é vedada a qualquer pessoa estranha à etnia nativa a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária e extrativista; p) as terras sob ocupação indígena, bem como o usufruto das riquezas naturais pelos indígenas e a renda indígena (art. 43, do Estatuto do Índio) gozam de imunidade tributária; q) é vedada a ampliação de terra indígena já demarcada; r) os direitos dos indígenas sobre suas terras são imprescritíveis, reputando-se todas elas como inalienáveis e indisponíveis; s) é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, situadas em seus territórios. No Caso Raposa Serra do Sol, ganhou destaque a “Teoria do fato indígena”, segundo a qual a Constituição Federal trabalhou com data certa (a data de sua promulgação) como parâmetro para se aferir a tradicionalidade e ocupação permanente de um determinado espaço por certa etnia indígena (exigência de ocupação indígena na data da promulgação da CF/88). Possibilidade de revisão de demarcação de terras indígenas (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO DA PGR): Não obstante o STF, no Caso Raposa Serra do Sol (Pet 3.388), ter declarado a vedação à ampliação de terra indígena já demarcada, o STJ declarou posteriormente que o processo administrativo de demarcação de terra indígena, levado a termo em data anterior à promulgação da CF/88, pode ser revisto, quando conflitar com os ditames constitucionais de tutela das terras indígenas (MS 14.987/DF). Professores índios em escolas públicas e necessidade de concurso público (PROVA ORAL DO 25º CONCURSO DA PGR): Segundo a Convenção 169 da OIT, os programas e serviços educacionais concebidos para os povos interessados deverão ser desenvolvidos e implementados em cooperação com eles, para que possam satisfazer suas necessidades especiais e incorporar sua história, conhecimentos, técnicas e sistemas de valores, bem como promover suas aspirações sociais, econômicas e culturais (art. 27.1.). Além disso, os Poderes Públicos deverão garantir a transferência progressiva da responsabilidade pela execução de programas educacionais à própria população indígena (art. 27.2) e deverão reconhecer o direito das comunidades indígenas de criar suas próprias instituições e sistemas de educação, desde que satisfaçam normas mínimas

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estabelecidas pela autoridade competente em regime de consulta com os indígenas (art. 27.3). Desse modo, é plausível sustentar a possibilidade de professores índios, em escolas públicas instituídas no âmbito das comunidades indígenas, sem a necessidade de concurso público amplo para toda a sociedade nacional, a fim de se assegurar a autodeterminação da população indígena, nos termos do art. 27, da Convenção 169, da OIT, e a garantia do direito à educação com a utilização da língua materna da etnia específica e de seus processos próprios de aprendizagem, segundo o art. 210, § 2º, da CF/88. Porém, quando o Poder Público realizar concurso público, para provimento do cargo de professores em escolas indígenas, deverá realizar certame específico e diferenciado, a fim de garantir que a atividade docente seja exercida prioritariamente por professores oriundos da respectiva etnia (art. 8º, da Resolução 03/99, da Câmara de Educação Superior). Para isso, cabe aos Estados investir na formação de professores indígenas, dentro da própria comunidade.

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ITEM C: SistemaÚnicodeSaúde.Princípiosediretrizesnorteadoras.

Obra consultada:LEIVAS, Paulo Gilberto Cogo. O direito fundamental à saúde segundo o Supremo Tribunal Federal. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 635-648.MAUÉS, Antônio G. Moreira & SIMÕES, Sandro Alex. Direito Público Sanitário Constitucional. In: Manual Conceitual do Curso de Especialização à Distância em Direito Sanitário para Membros do Ministério Público e da Magistratura Federal. Brasília: Unb, 2002, p. 477/512.Legislação básica.Arts. 6º, 194, 196 a 200, CF.Lei 8.080/90

1. Sistema Único de Saúde.A saúde é direito fundamental previsto no art. 6º e 196 CF, de cuja feição institucional se

preocupou o constituinte nos artigos 197 ao 200 da CF. Pode se manifestar em uma dimensão positiva/prestacional (fornecimento estatal de insumos terapêuticos) ou negativa (deveres de abstenção).74 O principal mecanismo de efetivação do direito à saúde é o sistema brasileiro de saúde, conceito amplo que abrange o sistema único (público) e o sistema privado (suplementar, art. 199 CF) e se encontra inserido em um sistema maior, a seguridade social, motivo pelo qual a ele se aplicam todos os objetivo previstos no art. 194 CF. SUS (Lei 8.080/90): É a principal política pública em matéria de saúde, visando, na forma do art. 196 CF, à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. A fonte constitucional o SUS é o art. 198, que o conceitua como uma rede regionalizada e hierarquizada de ações e serviços públicos, de acordo com as diretrizes da descentralização (com direção única em cada esfera de governo); do atendimento integral (com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais) e da participação da comunidade.

2. Princípios e diretrizes norteadoras.Podem ser considerados princípios do Direito à saúde (PROVA ORAL DO 25º

CONCURSO), segundo Antônio Maués e Sandro Simões (2002, p. 427-429), diretrizes estas que também informam o Sistema Único de Saúde, os que seguem: PRINCÍPIO DA UNIDADE: determina que os serviços e ações de saúde devem pautar-se nas mesmas políticas, diretrizes e comandos. Enfatiza que o SUS deve articular todos os serviços existentes no país, coordenando-os para que haja otimização dos escassos recursos e ganho de escala, evitando-se a sobreposição de estruturas. Da unidade decorre: a) inevitabilidade de integração dos entes subnacionais ao SUS, dentro da lógica de um federalismo cooperativo; b) total legitimidade de que um cidadão, na falta de recursos adequados em sua cidade, recorra aos serviços da municipalidade vizinha, cabendo ao gestor estadual adotar as medidas necessárias para que o município faltoso passe a cumprir as obrigações que lhe cabem. REGIONALIZAÇÃO E HIERARQUIZAÇÃO: A regionalização indica a necessidade de que haja organização por

74 Acredito que o exemplo da Revolta da Vacina ocorrida no Rio no início do século passada reflete bem um dever de abstenção estatal no campo sanitário. Outros exemplos

da jurisprudência são a vedação à utilização de produtos que contenham amianto ou absesto (STF, ADI MC 3.937) ou a proibição de importação de pneus usados (STF, ADPF 101).

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circunscrições territoriais, que devem levar em conta o dinamismo e a complexidade do sistema, adaptando as ações e serviços ao perfil epidemiológico local. A hierarquização se relaciona com a necessidade de organização do atendimento em distintos níveis de complexidade, assinalando que o acesso aos serviços de saúde deve ocorrer a partir dos mais simples em direção aos níveis mais altos de complexidade. (primário, secundário e terciário). DESCENTRALIZAÇÃO: Os serviços devem ser primordialmente executados pelos municípios, em atenção ao princípio da subsidiariedade, de modo que somente devem ser atribuídas ao Estado e à União as tarefas que os Municípios e Estados não puderem executar satisfatoriamente, ou que requeiram dimensão regional ou nacional. Aqueles que se opõem á tese da responsabilidade solidária em demandas de fornecimento de medicamentos, prevalecente no STF, apontam que a desconsideração das competências e responsabilidades estatuídas pelos entes federados, com a consequente condenação da União, prejudica a diretriz da descentralização. UNIVERSALIDADE: A universalidade horizontal (aspeco subjetivo) impõe a necessidade de que o acesso ao SUS esteja aberto a todos, independentemente de prévia vinculação a qualquer sistema contributivo, como ocorria antes da Constituição de 1988. Difere-se da universalidade vertical (aspecto objetivo), que se relaciona com as prestações oferecidas. Universalidade não implica desnecessidade de fontes de financiamento, aplicando-se as regras gerais do art. 195 CF. Nesse campo foi adotada a estratégia de vinculação constitucional de receitas pela EC 29/2000, que alterou a redação do art. 198 CF, constituindo exceção ao princípio da não-afetação orçamentária.75 Há discussão se a universalidade implica gratuidade.76INTEGRALIDADE / IGUALDADE / SELETIVIDADE / DISTRIBUTIVIDADE: A integralidade impõe a assistência em quaisquer dos níveis de complexidade, incluindo atividades de prevenção epidemiológica (vacinação), o mais amplo espectro de atendimentos (consultas, cirurgias, internações), de assistência farmacêutica e de prestação de serviços e de fornecimento de insumos necessários à integração ou reintegração do indivíduo à vida social (próteses). Embora alguns pretendam ignorar, como fez o STF enquanto influenciada pelo voto do Min. Celso de Melo na ADPF 54, a integralidade esbarra na escassez de recursos. Por isso deve ser compatibilizada com os princípios da igualdade/seletividade/distributividade (art. 194, III e 196 CF), cuja principal função é bitolar a integralidade e compatibilizá-la com a reserva do possível. Sobre o controle judicial, o STF vem entendendo: a) pela necessidade de atentar para as políticas públicas já formuladas pelo SUS; b) pela necesidade de verificar a existência de registro da prestação de saúde na ANVISA (Recomendação 31 CNJ); c) que a lentidão administrativa para atualizar suas listas de medicamentos e seus protocolos pode justificar a concessão das prestações pleiteadas nelas não constantes; d) que não pode o Judiciário determinar o fornecimento pelo Estado de medicamentos experimentais sem eficácia comprovada. (STA 175).

75Estados devem destinar 12% e os municípios 15% de suas receitas próprias para o financiamento de ações e serviços públicos de saúde, ao passo que a União deve despender o valor apurado no ano anterior, corrigido pela variação nominal do PIB. Em 7/12/11 foi aprovada a lei que regula a EC 29, destacando-se a definição do que pode ser considerado gastos com saúde e a vedação da criação de uma contribuição substitutiva da CPMF.76 Pela gratuidade WEICHERT (integrante do MPF). Pela possibilidade de instituição de taxa para quem tenha capacidade contributiva SARLET e TORRES.

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ITEM A: Finanças públicas. Temas sujeitos à reserva de lei complementar. Emissão de moeda. Normas sobre o Banco Central. Orçamentos públicos: plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamentos anuais. Vedações orçamentárias. Disponibilidade de recursos a órgãos dotados de autonomia. Normas sobre despesas de pessoal.

Obras consultadas:Resumo 25º MPFAulas Alcance, LFG e EnfaseLegislação básica.Inserida no Texto para melhor visualização1. Temas sujeitos à reserva de lei complementar (art. 163, CR/88): finanças públicas (LC 101/00); dívida pública externa e interna, incluída a das autarquias, fundações e demais entidades controladas pelo Poder Público (L 8.383/91); concessão de garantias pelas entidades públicas; emissão e resgate de títulos da dívida pública (art. 34, § 2º, I, ADCT); fiscalização das instituições financeiras (L. 4595/64); fiscalização financeira da administração pública direta e indireta (L. 4595/64); operações de câmbio realizadas por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (L 4131/62, DL 9205/46 e DL 9602/46); compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguardadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvimento regional (LC 101/00 e L. 4595/64). 2.Emissão de moeda: competência da União, exclusivamente pelo banco central (art. 164, CRFB). 3.Banco Central: vedação para conceder, direta ou indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou entidade que não seja instituição financeira; possibilidade de comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros; depositário das disponibilidades de caixa da União (§§ 1º, 2º, e 3º, do art. 164, da CRFB). 4.Orçamentos Públicos (art. 165, CR/88, §1°, §2° e §5°): são três leis que compõem o orçamento, mas a idéia de orçamento é UNA: I) PPA (4 anos); II) LDO (1 ano); III) LOA (1 ano). Elaborar o orçamento significa planejar. Essas três leis são ordinárias e temporárias, que deveriam ser elaboradas de acordo com LC geral que iria auxiliar todos os entes federativos (art. 165, §9°, CR/88). São elaboradas de forma harmônica, regidos de principio da unidade, se integrando finalisticamente. Os prazos para envio estão no art. 35, §2°, ADCT: PPA (agosto do primeiro exercício financeiro), LDO (abril de cada ano) e LOA (agosto de cada ano). Os prazos para Estados e Municípios podem ser definidos nas Constituições Estaduais ou Leis Orgânicas, respectivamente. A iniciativa das leis é do chefe do executivo. PPA LDO LOAEstabelece as grandes metas e prioridades/objetivos da administração pelos próximos quatro anos.É uma lei bastante

É um pouco mais concreta, pois irá estabelecer as metas e objetivos pelo prazo de um ano.Ou seja, dirá como realizará as metas do PPA

Estabelece receitas e despesas, ou seja, quanto de dinheiro o ente tem para realizar as metas e prioridades, pelo período de um ano.

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abstrata. naquele ano (pelo período de um ano).

A LDO terá dois anexos, chamados de anexo de metas fiscais, onde irá estabelecer metas relativas à receitas, despesas e resultado, relativas ao endividamento (como está a situação da dívida pública) e anexo de riscos fiscais, uma reserva de contingência, uma reserva que seja apta a suportar gastos oriundos de imprevisibilidades.5.Vedações orçamentárias e Princípios constitucionais orçamentários: a) exclusividade em matéria orçamentária (art. 165, §8°, CR/88): orçamento não pode conter dispositivo estranho à fixação de despesa e previsão de receita e não pode comportar caudas orçamentárias (dispositivo de lei material), exceções ao principio da exclusividade: autorização dirigida ao chefe do executivo para que ele possa abrir por decreto, acredito suplementar, e autorização para contratação de operações de crédito. b) Especialidade/ Especialização: orçamentos devem especificar e discriminar os créditos, os órgãos a que se destinam e o tempo em que deve realizar as despesas. Espécies: I) quantitativa (art. 167, VII, CR/88): determina a fixação do montante de gastos, proibindo a concessão e a utilização de créditos ilimitados. II) qualitativa (art. 5, c/c art. 15,§1° c/c art. 20, parágrafo único, Lei 4320/64): esta recomenda a vinculação dos créditos aos órgãos públicos, as rubricas orçamentárias devem ser especificadas de acordo com sua natureza. III) temporal (art. 167, §2°, CR/88): limita a vigência dos créditos especiais e extraordinários ao exercício financeiro a que forem autorizados, salvo se o ato de autorização que tiver sido promulgado dos quatro últimos meses do ano. c) Legalidade. Espécies (sub-princípios) I) super-legalidade: tem haver com a supremacia da constituição, as leis orçamentárias devem se coadunar com as normas constitucionais; II) reserva de lei: o orçamento deve ser aprovado por meio de lei formal; III) primado da lei: o poder regulamentar da administração pública só se pode manifestar nos espaços deixados pelo legislador quando aprova os orçamentos. d) Não vinculação de imposto a fundo, órgão ou despesa (art. 167, IV, CR/88): em regra, a receita dos impostos vai para custear os serviços uti universi. Exceções: vinculação de recursos para ensino, fundo de combate a erradicação da pobreza, para realização de atividades da administração tributária, para a prestação de garantias às operações de crédito em antecipação de receitas. É possível vincular receitas de taxas e contribuições de melhoria. e) Universalidade (art. 165, §5°, CR/88): todas as receitas e todas as despesas devem estar previstas na lei orçamentária. Exceção: os tributos que podem ser cobrados de um ano para outro, sem que estejam previstos na lei orçamentária, pois para eles vigoram a anterioridade (vide súmula 66, STF). f) Anualidade: para cada ano deve haver um orçamento, permite o controle. g) Unidade (art. 165, §5°, CR/88): a peça orçamentária deve ser única e uma só, contendo todos os gastos e receitas, cuida-se de princípio formal, isto é, o documento é único. h) Princípio da Superioridade e Indisponibilidade do Interesse Público na Atividade Arrecadatória de Tributos = Significa que esta superioridade prevalece sempre, a não ser que exista um interesse individual que se oponha a este interesse. i) Princípio da Transparência = Decorrência direta da publicidade e, portanto relaciona-se também com a fiscalização — se as receitas estão sendo bem aplicadas.

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Obs:o parágrafo 5º, do art. 165 enuncia universalidade e unidade. E, eu posso dizer que, o parágrafo 5º, do art. 165 induz ao equilíbrio (medidas de compensação para renúncia de receita ou criação de despesa) e a transparência. Também necessária a observância do princípio do planejamento.6.Disponibilidade de recursos a órgãos dotados de autonomia (art. 168, CR/88) : serão entregues no dia 20 de cada mês por duodécimos. 7.Limites com despesa de pessoal (art. 169, CR/88 com alteração pela EC/19 – reforma administrativa- e art. 19, LC 101/00): a soma dos gastos de pessoal de cada ente federativo deve ser ater aos limites estabelecidos em LC (LC101/00), art. 19 e 20.art. 20 LRF = estabelece a repartição dos limites globais, através de percentuais que deverão ser repartidos entre os Poderes Públicos e seus órgãos. Desta forma:- União (50% da receita corrente líquida) distribuída da seguinte maneira: a) 2,5% para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas da União; b) 6% para o Judiciário; c) 40,9% para o Executivo, destacando-se 3% para as despesas com pessoal decorrentes do que dispõem os incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e o art. 31 da Emenda Constitucional nº 19 e d) 0,6% para o Ministério Público da União.- Estados (60% da receita corrente líquida) = a) 3% (três por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado; b) 6% (seis por cento) para o Judiciário; c) 49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo; d) 2% (dois por cento) para o Ministério Público dos Estados.- Municípios (60% da receita corrente líquida) = a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver; b) 54% (cinqüenta e quatro por cento) para o Executivo.Obs.: Este dispositivo foi objeto da ADIN 2238/DF – item XV: “Art. 20: o art. 169 da Carta Magna não veda que se faça uma distribuição entre os Poderes dos limites de despesa com pessoal; ao contrário, para tornar eficaz o limite, há de se dividir internamente as responsabilidade”.

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ITEM B: Relatório de Prestação de Conta Institucional da Atuação do Ministério público na Defesa da Cidadania.

Obras consultadas:Resumo 25º MPFsítio do MPFLegislação básica.Inserida no Texto para melhor visualizaçãoO art. 129, II, da CRFB atribuiu ao Ministério Público a função de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância Pública aos direitos assegurados na constituição, promovendo as medidas necessárias para a sua garantia.Por sua vez, a LC 75/93 (LOMPU) prevê (art. 16 e 41) a figura do Procurador dos Direitos do Cidadão, com poderes para expedir instruções para o exercício de suas funções.Cumpre ao PGR a função de elaborar relatórios das atividades do MPF (art. 49, XXI, LC 75/93).Atendendo a Resolução 01 do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) deverá apresentar anualmente relatório de suas atividades.Por fim, a Instrução Normativa nº 01/03 estabelece normas para elaborar relatório mensal de produtividade dos membros da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, das Procuradorias Regionais dos Direitos do Cidadão e das Procuradorias do Direito do Cidadão (relatório que abrangerá atividades judiciais e extrajudiciais). Como exemplo dos temos o Relatório de atividades 2010, da PFDC:1. Deficientes – Há grupo de trabalho (GT). Integra o CONADE. Acessibilidade (desenho universal) nas obras do PAC; nas agências bancárias (execução judicial, via PRDC nos Estados, de TAC não cumprido); nas unidades do MPF; contratação de empregados no MPF; Política do livro acessível (agilizar tramitação do decreto); vaga em concurso (sugestões ao novo decreto).2. Alimentação adequada – superação de barreiras ao acesso. Há GT. Integra Comissão Especial do CDDPH e, como observador, o Consea. Recebidas informações sobre fiscalizações in loco do Bolsa Família; acompanhamento, junto ao FNDE, no repasse direto de valores à alimentação escolar. 3. Comunicação social –Há GT. Workshop Marco Regulatório das Comunicações; consulta pública sobre classificação indicativa; parecer técnico ao CFP sobre merchandising ao público infanto-juvenil; violação de DH pelas TVs; reabertura de unidades do MC para autorização de rádios comunitárias. 4. Criança e adolescente (CA) – Campanha contra exploração sexual de CA; informações sobre execução do orçamento; voto na medida socioeducativa; reunião sobre diversidade e bullying; reuniões sobre depoimento de vítimas e testemunhas de violência sexual e de proteção na internet. 5. Memória e verdade – criou-se GT em set/2010. Ao Arquivo Nacional, que sejam suprimidas exigências de autorização de terceiros para acesso a informações; busca de restos mortais no Araguaia, Comissão da Verdade, acesso aos arquivos do Estado e decisão da CorteADH que condenou o Brasil. 6. Direitos sexuais e reprodutivos – livre e responsável decisão sobre reprodução, exercício da sexualidade sem discriminações. Há GT. Inclusão de companheiro do mesmo sexo como

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dependente na DIRPF e benefícios previdenciários; uso do nome social de travestis e transexuais; proibição de doação de sangue a não-heterossexuais é grave violação a seus DH. 7. Educação –não-cobrança de contribuições em colégios militares; minuta de TAC sobre ENEM; revalidação de diplomas de médicos formados em Cuba. 8. Igualdade – quotas para negros em estágios no MPF; e cursos para preparação para o concurso para PR; ensino de história e cultura afro.9. Integridade física e psíquica – tráfico de pessoas – PFDC coordena o GT de DH dos MP do Mercosul. 10. Interlocução com organismos internacionais de defesa dos DH – nota técnica sobre projeto de lei sobre efeitos jurídicos das decisões de OIDDH; impropriedades dos projetos de lei sobre Conselho Nacional de DH; 11. Condição análoga à de escravo – participa da Conatrae; Carta de Marabá; recebeu visita da Relatora da ONU sobre escravidão contemporânea. 12. Megaeventos e moradia – Criado GT em out/2010. 13. Mulher – enviou aos PGJ ofício sobre dificuldade de ações articuladas nos Est e Mun devido à carência de visões integradas sobre segurança pública.14. Idosos – influiu na Lei 12.213 (Fundo Nacional do Idoso); sugere cartaz para divulgar gratuidade e desconto de 50% no transporte coletivo. 15. Previdência e Assistência Social – Há GT. Proposto TAC ao INSS para revisão periódica das aposentadorias por invalidez, não acatado; acompanhamento do movimento dos médicos-peritos e da instituição de controle de ponto dos servidores das agências do INSS; enunciados do GT.16. Saúde – redução da mortalidade infantil; melhoria da saúde materna, eliminação da hanseníase, inclusão de novos medicamentos, atualização de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas.17. Saúde mental – Reforma Psiquiátrica Antimanicomial (Lei 10.216/01), rede de atenção em saúde mental (recuperação) e medida de segurança. 18. Segurança pública –DH no Complexo do Alemão; à CSSPH informações sobre tentativa de criminalização de movimentos sociais e ações da PM-RS; reunião com agentes distritais sobre violência da PM-DF; seminários sobre Tortura, Proteção a defensores de DH, e Testemunhas.19. Sistema prisional – direito de voto aos presos provisórios; propôs cooperação entre CNPG e PFDC para saúde, educação e sistema prisional; inspeção à cadeia pública; assistência jurídica ao preso; nota técnica sobre projeto de lei que altera CP para elevar o período para livramento condicional.20. Terra/Reforma agrária – atualização dos índices de produtividade, combate à violência/despejos forçados, assistência. Há GT; desapropriação, assentamento, regularização e crédito fundiário, educação rural.21. Outras – Hidrelétrica Belo Monte (representou à vice-PGR para ADPF contra Dec. 788/05, pois comunidades indígenas não foram ouvidas); pleiteou ao CSMPF a inclusão de DH no 25º concurso para PR.

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ITEM C: Índios. Ocupação tradicional. Procedimento para reconhecimento e demarcação de terras indígenas. Usufruto.

Obras consultadas:Resumo 25º MPF

Ela Wiecko - Direitos Humanos das Populações Indígenas – Dropbox

Duprat terras indígenas e o judiciário – Dropbox:

Legislação básica. Inserida no Texto para melhor visualização

1. Índios. Utilizar o termo “povos indígenas” ao invés de “população indígena”, tendo em vista a previsão da autodeterminação. (Ela Wiecko - Direitos Humanos das Populações Indígenas - Dropbox): “o conceito de povo, embora pressuponha um conjunto de pessoas que, em geral, compartilham um dado território geográfico, agrega dimensão cultural. Quando falamos em população, essa dimensão também pode estar presente, mas não necessariamente. Ao contrário, quando falamos em povo, a palavra carrega um conjunto de sentidos que explicita mais quando qualificamos esse povo como brasileiro, latino-americano, europeu ou como indígena.” (...) “Maria Helena Pinheiro Penna ressalta que o reconhecimento universal do avanço conceitual dos direitos indígenas articula-se com o conceito de autodeterminação e constitui processo aberto. A aceitação do termo ‘povos’ pressupõe o esclarecimento dos significados: político (direito de escolha, participação democrática); econômico (processo para satisfação de necessidades humanas); cultural (respeito à identidade cultural) e controle e gerenciamento de recursos naturais”. Artigo 46 da Declaração das Nações Unidas Sobre Direitos dos Povos Indígenas. 2. Ocupação tradicional (Duprat terras indígenas e o judiciário – Dropbox): 1) “os territórios indígenas, no tratamento que lhes foi dado pelo novo texto constitucional, são concebidos como espaços indispensáveis ao exercício de direitos identitários desses grupos étnicos. As noções de etnia/cultura/território são, em larga medida, indissociáveis”.2) Constituições dos países capitalistas inscreveram como direito fundamental o direito de todos serem proprietários (caráter universal e indisponível), o que diverge do direito de propriedade em si (direito patrimonial). A inversão desses valores tem sido comum atualmente sendo que, aos índios, “se recusa a ocupação de seus espaços definitórios, subtraindo-lhes a possibilidade de exercício amplo de seus direitos identitários, em nome do suposto direito de propriedade”. 3) “Não bastasse a disputa que se estabelece entre direitos indígenas e direitos de propriedade, há forte incompreensão no que diz respeito ao que sejam terras tradicionalmente ocupadas”. Vez por outra o conceito resvala para a imemoriabilidade, e o juiz exige a produção de um laudo arqueológico que evidencie que a presença indígena no local remonta a tempos pré-colombianos”. “o requisito da imemorabilidade, no entanto, de há muito foi abandonado. A uma, por sua impossibilidade lógica. O processo dito colonizador avançou sobre esses territórios, descaracterizando-os. A duas, porque esse mesmo processo promoveu

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deslocamentos constantes, e a territorialização desses povos teve que ser constantemente redefinida. E, a três, porque estamos a tratar de populações que existem no presente, com perspectivas de vida atuais e futuras, e que não podem ser condenadas a um imobilismo do passado” Em resumo: A ocupação tradicional não é caracterizada (a) pela imemorialidade; (b) nem pela ocupação pré-colombiana; não há laudo arqueológico porque a territorialidade dos povos indígenas é constantemente redefinida por múltiplos aspectos; desde (a) a ação (expropriatória) do colonizador (“não há como recuperar Copacabana para os índios”); até (b) a própria ação dos povos indígenas, com perspectivas de vida atuais e futuras.O conceito de terras tradicionalmente ocupadas exige uma compreensão narrativa das vidas dos povos indígenas, que não é mera repetição do passado que as originou, mas participação num sentido presente da experiência história de sua reafirmação e transformação. Exige-se laudo antropológico, que permite a compreensão e a tradução linguístico-cultural das maneiras como o grupo se vê ao longo de sua trajetória existencial, como vê o mundo e nele se organiza. Esse laudo não é “neutro” ou “objetivo” e deve conferir “força normativa” ao grupo (Duprat, 2011) Não descaracteriza o animus possidendi dos índios terem sido forçados a se retirar de suas terras (STF, ACO 323/93).Indigenato, desde 1680, com o Alvará de 01.04, “reservado o direito dos índios, primários e naturais senhores dela”; na Lei de Terras – Lei 601/1850, constitucionalizado em 1934, na CF/67, bens da União, em 88, direitos “originários”. Os territórios indígenas são propriedade da União e de posse (permanente) privada, mas coletiva, cabendo exclusivamente aos índios o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos.3. UsufrutoUsufruto exclusivo quer dizer que não é transferível para qualquer apropriação individual e que os resultados de qualquer uso ou trabalho será sempre coletivo. Logo, é possível o uso indireto, como o trabalho alheio ou o contrato que explore riqueza do território. É vedado o exercício do direito de propriedade (brasileiro) nas terras indígenas, onde é cogente o direito consuetudinário indígena, que pode permitir apropriação individual segundo seus costumes (Marés, 1998). “Salvaguardas institucionais” – STF no Caso Raposa Serra do Sol: o usufruto exclusivo: (a) pode ser relativizado por relevante interesse público da União em LC; (b) não abrange (b.1) o aproveitamento dos recursos hídricos e potenciais energéticos (autorização do CN); (b.2) pesquisa e lavra de riquezas minerais (índios têm participação nos resultados, e idem); (b.3) garimpagem nem faiscação (exige permissão); (c) Política de Defesa Nacional, cujas ações são implementadas independentemente de consulta às comunidades e à Funai; idem para as ações das Forças Armadas e a Polícia Federal; (d) não impede a instalação pela União de equipamentos públicos; (e) em unidade de conservação fica sob responsabilidade do ICMBio, que administra a UC e deve ouvir as comunidades; nas UC admite-se visitantes e pesquisadores não-índios; no restante da área, idem mas administrado pela Funai; sempre sem cobrança; (f) terras indígenas não podem ser objeto de arrendamento ou qualquer ato ou negócio que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade; (g) são vedadas aos não-índios a caça, pesca, coleta ou agropecuária extrativa. Terra, usufruto e rendas gozam de imunidade tributária plena. É vedada a ampliação de terra já demarcada (certamente contra

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posição do MPF). Direitos às terras são imprescritíveis, inalienáveis e indisponíveis. É assegurada a participação das UF em todas as etapas do processo de demarcação.4. Procedimento para reconhecimento e demarcação de terras indígenasDemarcação de terras indígenas – é declaratório; a proteção jurídica deve existir mesmo antes da demarcação (não é assim na renitente jurisprudência retrógada-civilista-liberal), já que baseada na mera ocupação tradicional, isto é, na posse (relação fática) conforme a visão (direito consuetudinário) do próprio povo indígena (assim determina o art. 231, §1º, da CF). Roteiro – Dec. 1.775/96: 1. Iniciativa – Funai; 2. Identificação e delimitação – Funai; 3. Ato de declaração dos limites da terra indígena de “ocupação tradicional” e determinando a demarcação – MJ; 4. Demarcação física – Funai; 5. Confirmação dos limites demarcados – decreto do Presidente da República; 6. Registro no RGI e na SPU - Funai; pós-demarcação: análise da boa-fé das benfeitorias dos não-índios: Funai. A comunidade é envolvida diretamente em todas as fases do procedimento. Antropólogo faz estudo antropológico de identificação e coordena grupo técnico que realiza estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e levantamento fundiário; com trabalhos de campo, em centros de documentação, órgãos fundiários, registros de imóveis, etc.; após aprovado o relatório pelo Presidente da Funai, seu resumo é publicado no DOU e no DOE. Estatuto do Índio: Executivo deve demarcar as terras em até 5 anos (até 19.12.1978); o art. 67 do atual ADCT: até 05.10.1993. Não houve cumprimento. Prazos não aplicáveis para áreas não conhecidas. Cabe ação declaratória para exigir a demarcação. Contra a demarcação processada não cabe interdito possessório, facultado aos interessados a via petitória ou demarcatória.

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ITEM A: Conselho Nacional do Ministério Público. História, composição, competência e funcionamento. Corregedoria Nacional. Legitimidade e críticas.

Obras consultadas:

MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 5ª ed. Saraiva. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24ª ed. Malheiros. LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 12ª ed. Saraiva. SAMPAIO, José Adércio Leite. O conselho nacional de justiça e a independência do judiciário.77 STRECK et al, Os limites constitucionais das resoluções do CNJ e CNMP. 78

Legislação básica

Art. 130-A, CF

EC 45/2004

Lei nº 11.372/2006

Regimento Interno do CNMP 79

1. Noções Gerais: órgão de controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros. Cabe destacar que é da competência do Senado Federal o processo e julgamento dos membros do CNMP nos crimes de responsabilidade e do STF para julgar ações contra o Conselho (arts. 52, II, e 102, I, r).

2. Conselho Nacional do Ministério Público: na linha de entendimento de José Afonso (SILVA, p. 568) e Gilmar Mendes (MENDES, p. 1137) no tocante ao CNJ – acerca do qual asseveram se tratar de órgão interno do Poder Judiciário (rechaçando a ideia de controle externo) em razão do predomínio de magistrados na respectiva composição –, pode-se afirmar, com base no mesmo raciocínio, que o CNMP é órgão interno do Ministério Público.

3. História: introduzido pela EC 45/2004 no contexto da Reforma do Judiciário.

4. Composição: art. 130-A, incisos e §1º, CF. Note-se que a maioria (8) é advinda do próprio MP. A existência de membros vindos de outras carreiras, pode ser vista como a conjugação da “legimitidade burocrático-corporarativa” (SAMPAIO, p. 252) de duas categorias de imediata interação com o MP, com a legitimidade democrática, de dois cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada. De acordo com o art. 17 do respectivo Regimento Interno, são órgãos do CNMP: Plenário; a Presidência; a Corregedoria; as Comissões e a Secretaria –Geral.

77 Acesso parcial pelo Google books.78 http://www.conamp.org.br/Acesso%20Pblico/mat%C3%A9ria%20Os %20limites%20constitucionais%20das%20Resolu%C3%A7%C3%B5es%20do%20CNJ%20e%20CNMP.pdf79 http://www.cnmp.gov.br/portal/images/stories/Normas/Resolucoes/

res_31_Regimento_interno_versao_atualizada_2011.pdf

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5. Competência: art. 130-A, §2º, CF. A propósito, merece destaque a classificação adotada por José Adércio (SAMPAIO, p. 274 e ss) ao tratar das atribuições do CNJ, a qual pode ser aplicada ao CNMP. a) atribuições políticas: zelar pela autonomia do Ministério Público e pelo cumprimento da lei orgânica, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; a.1) atribuição de planejamento: zela pela autonomia de adotar o papel de gestor estratégico dos recursos administrativos, humanos, logísticos e financeiros do Ministério Público; a.2) atribuição de defesa da soberania (no original fala-se de soberania judiciária): deve adotar todas as medidas necessárias contra as ameaças e as violações advindas dos outros Poderes e, com certas cautelas, de setores da sociedade, em defesa da “soberania” do MP. “Não se trata de atitude corporativa, mas institucional, pois o Conselho não é sindicato de classe e sim órgão de poder” (p. 276). a.3) atribuição de poder regulamentar: todavia, sem poder inovar na ordem jurídica. “Não pode, por conseguinte, permitir o que a lei proíbe ou ordenar o que a lei não obriga; nem alterar, restringir ou ampliar direitos, deveres, ações ou exceções; tampouco é dado exemplificar o que o legislador definiu por taxativo, ou suspender ou adiar a execução da lei, instituir tribunais ou criar autoridades públicas, nem tampouco estabelecer formar de exteriorização de um ato, diferentes daquelas determinadas por lei”. a.4) atribuições mandamentais: recomendar providências, no sentido de ordem para integrantes e servidores do MP, acompanhada das sanções cabíveis a todo descumprimento de mandado de autoridade competente. Para autoridades públicas externas, tem a natureza de representação, que, se não vincula aos resultados, obriga, ao menos, a diligências e respostas; sanção, todavia, política e difusa (“pressão por persuasão”). a.5) atribuições de economia interna: elaborar seu regimento, prover os cargos necessários à sua administração; fixar critérios para promoção de seus servidores, conceder licenças etc. b)atribuições de controle administrativo: zela observância do art. 37 da Constituição Federal e apreciar a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público a União e dos Estados; c)atribuições de ouvidoria: receber reclamações contra membros ou órgãos do Ministério Público da União ou dos Estados, inclusive contra seus serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional da instituição. d)atribuições correicionais e disciplinares: a atribuição disciplinar pode ser originária ou derivada. A originária ocorre quando se instaura a sindicância, a reclamação ou o processo disciplinar em decorrência de representação feita ao Conselho. Já a derivada pode ser a avocatória, quando já existe um processo em trâmite e o CNMP avoca; ou revisional, feita de ofício ou mediante provocação, em relação aos processos disciplinares de membros do Ministério Público da União ou dos Estados julgados há menos de um ano. e)atribuição sancionatória: consequência da atribuição disciplinar. Pode determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa. f)atribuição informativa e propositiva: elaborar relatório anual, propondo as providências que julgar necessárias sobre a situação do Ministério Público no País e as atividades do

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Conselho. Não se resume, todavia, a elaboração de relatório. Entende-se que pode, por exemplo, elaborar notas técnicas, seja por iniciativa própria, seja a requerimento de outros Poderes, sobre anteprojetos de leis ou projetos de lei que tramitam no Congresso, desde que caracterizado o interesse do MP.

6. Funcionamento: a CF restringiu-se a definir que o CNMP será presidido pelo PGR, bem como que o Presidente do Conselho Federal da OAB oficiará junto àquele. De acordo com José Afonso, faz-se necessária regulamentação legal (SILVA, p. 604).

7. Corregedoria Nacional: o Corregedor Nacional é eleito dentre os membros do Ministério Público que integram o CNMP para um mandato coincidente com o seu mandato de conselheiro, na forma do art. 30 do Regimento Interno do CNMP. A recondução ao cargo é proibida pela Constituição Federal (130-A, §3º). É interessante observar que, no CNMP, o Corregedor é eleito, ao passo que, no CNJ, a função de Corregedor necessariamente é exercida pelo Ministro advindo do STJ (art.103-B, §5º,CF).

8. Legitimidade e críticas: o CNMP somente pode aplicar as sanções disciplinares decorrentes da prática de condutas previamente definidas em lei, sendo o inciso III do parágrafo 2º do art. 130-A da CF mera norma definidora de competência. a) Com a criação do CNMP, foi olvidada a necessidade de ser estabelecido, quanto aos membros dos Conselhos, um lapso temporal de vedação ao exercício de outra função pública, que não exija a prévia aprovação em concurso público, terminando por permitir e estimular que benesses futuras sejam colhidas em troca de posicionamentos atuais – basta lembrar, v.g., que o Executivo é um dos principais destinatários da atuação funcional do Ministério Público, tendo, não raro, interesse na punição disciplinar de seus algozes, ao que deve ser acrescido um largo espectro de mecanismos de retribuição pelos favores que possam vir a ser prestados. b) Outra crítica que pode ser feita consiste na grave mácula à forma federativa adotada no Brasil, gerando uma federação imperfeita, concebida e gerada a partir de movimentos centrífugos, mas que, na prática, fortalece o centro em detrimento da periferia. Com efeito, dos quatorze membros do Conselho, cinco integram o Ministério Público da União já em relação aos vinte e seis Ministérios Públicos Estaduais, apenas três serão seus representantes, sendo nítido o desequilíbrio entre as unidades federadas. c) Por outro lado, conforme Gilmar Mendes, uma competência “de grande significado institucional, nesse contexto, é aquela referente à expedição de atos regulamentares. É uma das atribuições que, certamente, tem ensejado maiores contestações e polêmicas. “ (MENDES, p. 1137) Consolidando a crítica: “no Estado Democrático de Direito, é inconcebível permitir-se a um órgão administrativo expedir atos (resoluções, decretos, portarias, etc.) com força de lei, cujos reflexos possam avançar sobre direitos fundamentais”. (STRECK et al, Os limites constitucionais das resoluções do CNJ e CNMP) 80

80 http://www.conamp.org.br/Acesso%20Pblico/mat%C3%A9ria%20Os %20limites%20constitucionais%20das%20Resolu%C3%A7%C3%B5es%20do%20CNJ%20e%20CNMP.pdf

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9. Casuística: compete ao STF processar e julgar as ações contra o CNMP (Pet QO 3674); suspensão da eficácia da Resolução 15/2006 do CNMP, que dispunha sobre o valor do teto remuneratório dos membros e servidores do MPU e MP do Estados (ADI 3831); suspensão do art. 5º, § 1º, da EC 45/2004 (ADI 3472 MC, transcrição no Informativo 392): “Por considerar densa a plausibilidade da alegação de desrespeito ao § 2º do art. 60 da CF, que dispõe sobre o processo legislativo referente à proposta de emenda constitucional, o Tribunal concedeu liminar requerida em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP para suspender a eficácia das expressões "e do Ministério Público", "respectivamente" e "e ao Ministério Público da União", contidas no § 1º do art. 5º da Emenda Constitucional 45/2004 ("Art. 5º O Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público serão instalados no prazo de cento e oitenta dias a contar da promulgação desta Emenda, devendo a indicação ou escolha de seus membros ser efetuada até trinta dias antes do termo final. § 1º Não efetuadas as indicações e escolha dos nomes para os Conselhos Nacional de Justiça e do Ministério Público dentro do prazo fixado no caput deste artigo, caberá, respectivamente, ao Supremo Tribunal Federal e ao Ministério Público da União realizá-las."). Entendeu-se que a inovação promovida pelo Senado quanto à indicação e escolha supletiva de nomes para o Conselho Nacional do Ministério Público teria implicado alteração substancial no texto aprovado, em dois turnos, pela Câmara dos Deputados, segundo o qual caberia, também ao STF, o aludido mister.” (noticiado no Informativo 385/STF)

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ITEM B: Critérios de interpretação da norma jurídica: gramatical, sistemático, histórico, teleológico, interpretação conforme a Constituição. Limites da interpretação, em especial o sentido literal possível. Conflitos aparentes de normas e os critérios para sua solução.

Obras consultadas:

LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 3ª ed. Fundação Calouste Gulbenkian. MÜLLER, Friedrich. Metodologia do direito constitucional. 4ª ed. RT. CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7ª ed. Almedina. MENDES, Gilmar Ferreira et al. Curso de direito constitucional. 5ª ed. Saraiva. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional. Lumen juris. DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 11ª ed. Saraiva. NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 33ª ed. Forense.

Legislação básica:

Decreto-lei 4.657/43 (LINDB), art. 2º

1. Noções Gerais: os critérios de interpretação são métodos clássicos da hermenêutica jurídica, surgidos a partir do embate entre as teorias da voluntas legislatoris (teoria subjetiva ) e voluntas legis (teoria objetiva)(DINIZ, p. 418-419 e FERNANDES, p. 151-154), “que, ao longo do tempo, foram sendo aperfeiçoados pelos cientistas do direito.” (FERNANDES, p. 154). Os demais itens transitam em torno desse tema.

2. Critérios de interpretação da norma jurídica: “Na interpretação do Direito Positivo o técnico recorre a vários elementos necessários à compreensão da norma jurídica, entre eles o gramatical, também chamado literal ou filológico, o lógico, o sistemático, o histórico e o teleológico.” (NADER, p. 275) “Os elementos históricos, genéticos, sistemáticos e teleológicos da concretização não podem ser isolados uns dos outros e do procedimento da interpretação gramatical como este não pode ser isolado daqueles.” (MÜLLER, p. 75-76) Gramatical: revela o conteúdo semântico das

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palavras. É o momento inicial do processo interpretativo. O intérprete deve partir da premissa de que todas as palavras têm sentido e função próprios, não havendo palavras supérfluas; o produto dessa forma de interpretação pode ser restritivo (limita o sentido de uma norma, ainda que a sua estrutura literal seja ampla), extensivo (amplia o sentido da norma para além do contido em sua estrutura literal) ou abrogante (quando, associado a uma interpretação sistemática, o intérprete percebe que o sentido da norma vai de encontro ao de outra norma que lhe é hierarquicamente superior). Sistemático:é fruto da ideia de unidade do ordenamento jurídico. A CF deve ser interpretada como um todo harmônico, em que nenhum dispositivo deve ser considerado isoladamente. Histórico: busca o sentido da lei por meio de precedentes legislativos, de trabalhos preparatórios e da occasio legis (circunstância histórica que gerou o nascimento da lei). Teleológico: procura revelar o fim da norma, o valor ou bem jurídico visado pelo ordenamento com a edição de dado preceito. “A ideia do fim não é imutável. O fim não é aquele pensado pelo legislador, é o fim que está implícito na mensagem da lei. Como esta deve acompanhar as necessidades sociais, cumpre ao intérprete revelar os novos fins que a lei tem por missão garantir.” (NADER, fl. 280). De acordo com Müller, “a interpretação histórica e a interpretação genética são subcasos da interpretação sistemática.” Ademais, “tanto a interpretação sistemática quanto a interpretação teleológica têm por escopo a combinação de vários, quando não todos os elementos de concretização sob a designação 'sistemáticos' ou 'teleológicos'.” (MÜLLER, p. 78) Por fim, não há hierarquia predeterminada entre os diferentes critérios. Interpretação conforme a Constituição: 81no caso de normas polissêmicas, deve-se dar preferência à interpretação que lhes confira um sentido que seja mais consentâneo com a constituição. Além de “princípio de controlo” 82 (CANOTILHO, p. 1226), a interpretação conforme é também “modalidade de decisão do controle de normas” (MENDES, p. 1427), pela qual se declara ilegítima uma determinada leitura da norma legal – desde que haja um “espaço de interpretação”. Decorre da supremacia da Constituição e da presunção de constitucionalidade das leis. Essa forma de interpretação tem dois limites: não pode contrariar a literalidade da lei, nem o fim contemplado pelo legislador. “Assim, segundo a corrente majoritária, o STF não poderia atuar como legislador positivo, mas sim como legislador negativo.” (FERNANDES, p. 169) No entanto, Gilmar Mendes reconhece que, nas ADIs 1105 e 1227, o STF “acabou adicionando-lhes novo conteúdo normativo, convolando a decisão em verdadeira interpretação corretiva da lei.” (MENDES, p. 1431) Por outro lado, ao discorrer sobre a evolução da jurisprudência do STF acerca da possível equiparação dessa técnica de decisão com a declaração de nulidade sem redução de texto, acentua o referido autor: “Ainda que se não possa negar a semelhança dessas

81 O tema constou da questão 2, item I, da prova objetiva do 26º.82 Canotilho (p. 1226) aponta três dimensões para o princípio: 1) princípio da prevalência da constituição (eleger a interpretação não contrária à constituição); 2) princípio da conservação de normas (não se deve declarar a norma inconstitucional se há um sentido em conformidade com a constituição); 3) princípio da exclusão da interpretação conforme a constituição mas “contra legem” (não se pode contrariar a letra e o sentido da norma através de uma interpretação conforme).

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categoria e a proximidade do resultado prático de sua utilização, é certo que, enquanto na interpretação conforme à Constituição se tem, dogmaticamente, a declaração de que uma lei é constitucional com a interpretação que lhe é conferida pelo órgão judicial, constata-se, na declaração de nulidade sem redução de texto, a expressa exclusão, por inconstitucionalidade, de determinadas hipóteses de aplicação do programa normativo sem que se produza alteração expressa do texto legal.” (MENDES, p. 1428)

3. Limites da interpretação, em especial o sentido literal possível: como a interpretação da norma jurídica pode gerar várias soluções distintas, mostra-se necessário o estabelecimento de limites. Nesse contexto, Larenz ensina: “Diz acertadamente MEIER-HAYOZ que o 'teor literal tem, por isso, uma dupla missão: é ponto de partida para a indagação judicial do sentido e traça, ao mesmo tempo, os limites da sua actividade interpretativa'. Uma interpretação que se não situe já no âmbito do sentido literal possível, já não é interpretação, mas modificação de sentido.” (LARENZ, p. 453-454) E conclui o referido autor: “Por conseguinte, o sentido literal a extrair do uso linguístico geral ou, sempre que ele exista, do uso linguístico especial da lei ou do uso linguístico jurídico geral, serve à interpretação, antes de mais, como uma primeira orientação, assinalando, por outro lado, enquanto sentido literal possível – quer seja segundo o uso linguístico de outrora, quer seja segundo o actual –, o limite da interpretação propriamente dita. Delimita, de certo modo, o campo em que se leva a cabo a ulterior actividade do intérprete.” (LARENZ, p. 457) Na mesma linha, leciona Müller: “Por razões ligadas ao Estado de Direito, o possível sentido literal circunscreve, não em último lugar no Direito Constitucional, o espaço de ação de uma concretização normativamente orientada que respeita a correlação jusconstitucional das funções. O teor literal demarca as fronteiras extremas das possíveis variantes de sentido, i.e, funcionalmente defensáveis e constitucionalmente admissíveis. Outro somente vale onde o teor literal for comprovadamente viciado.” (MÜLLER, p. 74)

4. Conflitos aparentes de normas e os critérios para sua solução: o conflito aparente de normas resolve-se pela aplicação dos critérios da hierarquia, temporalidade e especialidade. Esses critérios decorrem da interpretação sistemática, que compreende o ordenamento jurídico como um todo dotado de unidade, evitando contradições internas. Critério hierárquico: norma superior prevalece sobre a inferior. Critério cronológico: norma mais recente revoga a norma mais antiga. Critério especialidade: norma especial não revoga a norma geral, mas cria uma situação de coexistência, sendo aplicada no que for específica. Antinomias de segundo grau (conflitos entre os critérios): a) entre o hierárquico e o cronológico, prevalece o primeiro; b) entre o da especialidade e o cronológico, prevalece o primeiro; c) entre o hierárquico e o da especialidade, não há uma prevalência a priori, porém, “segundo Bobbio, dever-se-á optar, teoricamente, pelo hierárquico, uma lei constitucional geral deverá prevalecer sobre uma lei ordinária especial, pois se se admitisse o princípio de que uma lei ordinária especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princípios

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fundamentais do ordenamento jurídico estariam destinados a esvaziar-se, rapidamente, de seu conteúdo. Mas, na prática, a exigência de se aplicarem as normas gerais de uma Constituição a situações novas levaria, às vezes, à aplicação de uma lei especial, ainda que ordinária, sobre a Constituição. A supremacia do critério da especialidade só se justificaria, nessa hipótese, a partir do mais alto princípio da justiça: 'suum cuique tribuere', baseado na interpretação de que 'o que é igual deve ser tratado como igual e o que é diferente, de maneira diferente'.” (DINIZ, p. 475-476) Esse tema constou da questão 10, alternativa 'b', da prova objetiva do 25º.

5. Casuística: “O princípio da interpretação conforme a Constituição ('verfassungskonforme auslegung') é princípio que se situa no âmbito do controle de constitucionalidade, e não apenas como regra de interpretação. A aplicação desse princípio sofre, porém, restrições, uma vez que, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei em tese, o STF – em sua função de corte constitucional – atua como legislador negativo, mas não tem o poder de agir como legislador positivo, para criar uma norma jurídica diversa da instituída pelo legislativo. Por isso, se a única interpretação possível para compatibilizar a norma com a Constituição contrariar sentido inequívoco que o Poder Legislativo lhe pretendeu dar, não se pode aplicar o princípio da interpretação conforme, que implicaria, em verdade, criação de norma jurídica, o que é privativo do legislador positivo” (ADI 1417, 1998).

“No que se refere ao inciso II do art. 28 da lei ("Art. 28 A advocacia é incompatível, mesmo em causa própria, com as seguintes atividades:... II - membros de órgãos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais e conselhos de contas, dos juizados especiais, da justiça de paz, juízes classistas, bem como de todos os que exerçam função de julgamento em órgãos de deliberação coletiva da administração pública direta e indireta;"), julgou-se, por maioria, parcialmente procedente o pedido, para dar interpretação conforme no sentido de se excluírem os juízes eleitorais e seus suplentes. Vencido (...).” (ADIs 1105 e 1127, noticiado no Informativo 427)

“O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental ajuizada, pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde - CNTS, a fim de declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, I e II, do CP. Prevaleceu o voto do Min. Marco Aurélio, relator.(...)” (ADPF 54, noticiado no Informativo 661)

ITEM C: 21.c. Ordem econômica. Atividade econômica em geral: fundamentos, objetivos, princípios, direito de iniciativa. Exploração de atividade econômica pelo Estado: regulação, fiscalização e planejamento. Diretivas para os regimes de concessão e permissão de serviços públicos. Propriedade e emprego de recursos minerais e de potenciais hidroelétricos. Monopólios federais: atividades monopolizadas e regime jurídico do monopólio. Abuso do poder econômico.

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Responsabilidade de pessoas jurídicas e de seus dirigentes nas infrações à ordem econômica e financeira e à economia popular.

Obras consultadas:

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24ª ed. Malheiros. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de direito constitucional. Lumen juris. HOLTHE, Leo Van, Direito constitucional. 6ª ed. Juspodivm. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 14ª ed. Malheiros. PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. Verbo jurídico. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 25ª ed. Malheiros. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 16ª ed. Lumen Juris.

Legislação básica

Arts. 1º; art. 20, VIII e IX; 21, XII, 'b'; 170 a 181, CF

EC 6/95

Lei nº 8.884/94

Lei nº 8.987/95

Lei nº 9.074/95

Lei nº 12.529/11

Lei Delegada 4/1962

1. Noções Gerais: conforme José Afonso, o Título VII da CF (Da Ordem Econômica e Financeira) é exemplo de elemento sócio-ideológico, revelando “o caráter de compromisso das constituições modernas entre o Estado individualista e o Estado Social, intervencionista”. (SILVA, p. 44) “O surgimento de normas constitucionais sobre o conteúdo e os limites dos direitos econômicos (a chamada 'Constituição Econômica') resultou da necessidade de se compatibilizar os ideais do liberalismo econômico com a justiça social exigida pelo Estado Social de Direito, a fim de assegurar condições de vida digna aos trabalhadores, reprimir o abuso do poder econômico tendente à dominação dos mercados e ao aumento arbitrário dos lucros, fazendo da livre iniciativa um postulado altamente condicionado e subordinado à realização da justiça social.” (HOLTHE, p. 875) Vale destacar que, no conceito de constituição econômica, além da liberdade econômica e da intervenção do Estado nesse domínio, podem ser incluídos também o regime de minas, jazidas e demais riquezas naturais, normas relativas ao trabalho, nacionalização, planejamento e empresa (PETTER, p. 38)

2. Ordem econômica:83 âmbito no qual se manifesta a íntima relação entre direito e economia. 84 Para Fábio Nusdeo, a economia existe porque os recursos são sempre escassos frente à multiplicidade das necessidades humanas. De acordo com Dirley da

83 Ela é parcela da ordem jurídica, mundo do dever ser, sendo um conjunto de normas que institucionaliza uma determinada ordem econômica (mundo do ser).

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Cunha Jr. (Curso..., p. 1025 apud FERNANDES, p. 1025), a ordem econômica define-se como o “conjunto de elementos compatíveis entre si, ordenadores da vida econômica de um Estado, direcionados a um fim.” A ordem econômica na CF tem por finalidade “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios indicados no art. 170”, os quais “consubstanciam uma ordem capitalista.” (SILVA, p. 788). Aproxima-se do conceito de constituição econômica – “conjunto de preceitos que institui determinada ordem econômica (mundo do ser) ou conjunto de princípios e regras essenciais ordenadoras da economia” (GRAU, p. 79) –, cujas normas podem estar agrupadas no texto constitucional ou dispersas no seu corpo (constituição econômica formal), ou, ainda, abranger normas infraconstitucionais (constituição econômica material) (GRAU, p. 78). O tema constou da questão 42 da prova objetiva do 20º.

3. Atividade econômica em geral: atividade voltada à satisfação de necessidades, o que envolve a utilização de bens e serviços, recursos escassos. Conforme Eros Grau (ADPF 46), atividade econômica latu sensu é gênero do qual serviço público – prestado preferencialmente pelo setor público, incidindo a figura do privilégio – e atividade econômica stricto sensu – prestado preferencialmente pelo setor privado, incidindo a figura do monopólio, no caso de atuação por participação do Estado –, uma vez que são matérias que podem ser imediata ou potencialmente objeto de exploração lucrativa. Atuação estatal, em contraposição a intervenção, significa a presença ativa do Estado no campo da atividade econômica em sentido amplo. Fundamentos: na lição de José Afonso, a ordem econômica na CF tem por fundamentos a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa (SILVA, p. 788), os quais também são princípios fundamentais da República (art. 1º, CF), sendo caracterizada pelo modo de produção capitalista (SILVA, p. 786). No tocante à valorização do trabalho humano, destacam-se a proteção do trabalho diante dos titulares do capital em busca de uma composição conciliadora (“mais trabalho” e “melhor trabalho”) e a íntima relação com o princípio da dignidade humana (PETTER, p. 41-46). Acercada livre iniciativa, figuram liberdade de comércio, de produção individual e coletiva, de qualquer negócio e exercício de qualquer profissão, liberdade privada (de explorar qualquer atividade econômica) e pública (não restrição a normas estatais senão em virtude de lei); inclui liberdade de empresa e de trabalho; engloba não apenas a liberdade de iniciativa econômica, mas política, ética e cultural, e envolve a liberdade de concorrência; reiterada no parágrafo único do art 170,CF. Objetivos: art. 170, CF, i.e., “assegurar a todos existência digna” (propiciar a que se usufrua o mínimo necessário à satisfação das necessidades humanas) “conforme os ditames da justiça social” (ideia ampla, mas que pode ser apontada como ideal da igualdade de bens materiais, visando à diminuição de diferenças impeditivas da realização de outros importantes propósitos positivados na

84 Origem etimológica da palavra: oikos+nomos = casa+norma, organizar/administrar a casa (ou a pólis). Organizar, administrar a casa/ por meio de normas é tarefa do direito.

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CF, especialmente a dignidade humana; tem cunho ético e cultural). Esses dois objetivos consagram expressamente o princípio da inclusão social e econômica, tratado por Canotilho, como princípio da democracia econômico-social, , fulcro no art. 3, I, II e III, CF. Princípios: incisos do art 170, CF. Soberania nacional;propriedade privada; função social da propriedade (relativização do caráter absoluto da propriedade no que tange ao direito de usar, gozar e dispor de um bem sem qualquer preocupação social; arts 182, § 2º, e 186, CF); livre concorrência (possibilidade de os agentes econômicos atuarem sem embaraços juridicamente justificáveis, em determinado mercado, visando à produção, circulação e consumo de bens; garante o livre jogo das forças/competição em disputa por clientela e mercado); defesa do consumidor (conferir tratamento diferenciado ao consumidor, reconhecendo sua inferioridade de fato, enquanto agente econômico vulnerável nas relações de consumo); defesa do meio ambiente; redução das desigualdades regionais e sociais; busca do pleno emprego (significa o desenvolvimento e aproveitamento das potencialidades do Estado; pode ser considerado ainda como elemento essencial da economia capitalista, uma vez que é a partir da remuneração que se dá o consumo e a circulação de riquezas na economia de um país); tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no país. Direito de iniciativa: “Compreende o direito que todos possuem de se lançarem no mercado de trabalho por sua conta e risco, liberdade de lançar-se à atividade econômica sem encontrar restrições do Estado. Está ligada à concepção liberal do homem, evidenciando sua individualidade. Logo, também é fundamento que conduz necessariamente à livre escolha do trabalho que, por sua vez, constitui uma das expressões fundamentais da liberdade humana.” (…) “A livre iniciativa, bem compreendida, não só consubstancia alicerce e fundamento da ordem econômica, como também deita raízes nos direitos fundamentais, aos quais se faz ínsita uma especial e dedicada proteção.” (PETTER, p. 46 e 48)

4. Exploração de atividade econômica pelo Estado: inicialmente de se notar que o item não segue a linha de pensamento adotada pela doutrina, sobretudo a de Eros Grau, de que a exploração da atividade econômica por parte do ente público ocorre quando este atua paralelamente aos agentes privados com intuito de lucro na esfera de titularidade da iniciativa privada. O referido autor denomina essa atividade de exploração de exercício de atividade econômica em sentido estrito. A atividade exercida por meio de atuação estatal como agente normativo e regulador, com consequente fiscalização, não é área de titularidade da iniciativa privada. Trata-se de atuação estatal sobre a atividade econômica em sentido amplo. Em verdade, Eros Grau chama de intervenção sobre o domínio econômico a atividade estatal que regula, normatiza a atividade econômica em sentido estrito. De se destacar, ainda, que regulação e fiscalização se aplicam à atividade econômica em sentido amplo, envolvendo tanto a atividade econômica em sentido estrito, como a prestação de serviços públicos. Regulação é uma função administrativa que se traduz, segundo Diogo de Figueiredo, no exercício de competência administrativa normativa a qual

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sujeita atividades a regras de interesse público, como corolário da função de controle, voltada à observância dessas prescrições. A atividade de regulação reclama a de fiscalização, atividade que tem por escopo assegurar a efetividade e eficácia do que foi normativamente definido. Ademais, o planejamento seria uma forma de ação racional, caracterizada pela previsão de comportamentos econômicos e sociais futuros, pela formulação explícita de objetivos e pela definição de meios de ação, apenas qualificando a forma de intervenção estatal na atividade econômica em sentido amplo, sendo obrigatório para a atuação do ente público e indicativo para o ente privado.

5. Diretivas para os regimes de concessão e permissão de serviços públicos: “o art. 175 estabelece os princípios do regime da concessão e da permissão de serviços públicos a empresas particulares” (SILVA, p. 803). A concessão de serviços público, prevista especificamente na Lei nº 8.987/95,“é o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública transfere à pessoa jurídica ou consórcio de empresas a execução de certa atividade de interesse coletivo, remunerada através do sistema de tarifas pagas pelos usuários.” (CARVALHO FILHO, p. 306) Além da concessão, pode valer-se o Estado ainda da permissão de serviço público, acerca da qual há divergência quanto à respectiva natureza jurídica. Celso Bandeira de Mello defende que – não obstante a evidente desnaturação do instituto, como se verifica do disposto no art. 40 da Lei nº 8.987/95 – “a permissão de serviço público, segundo conceito tradicionalmente acolhido na doutrina, é o ato unilateral e precário, 'intuitu personae', através do qual o Poder Público transfere a alguém o desempenho de um serviço de sua alçada, proporcionando, à moda do que faz na concessão, a possibilidade de cobrança de tarifas dos usuários.” (MELLO, p. 747), no que é acompanhado por Di Pietro. Por outro lado, Carvalho Filho define a permissão de serviço público como sendo “o contrato administrativo através do qual o Poder Público (permitente) transfere a um particular (permissionário) a execução de certo serviço público nas condições estabelecidas em normas de direito público, inclusive quanto à fixação do valor das tarifas.” (CARVALHO FILHO, p. 343). 85Di Pietro observa

85 Mantive aqui o seguinte trecho do resumo do 25º, que se atém mais a aspectos de direito administrativo: O poder público pode outorgar gratuitamente a permissão ou conferi-la a título oneroso, hipótese em que o permissionário deverá pagar-lhe uma retribuição pelo desfrute daquela situação jurídica. O Estado vale-se da permissão justamente quando não deseja constituir o particular em direitos contra ele, mas apenas em face de terceiros. Pelo seu caráter precário é utilizada, normalmente, quando o permissionário não necessita alocar grandes capitais para o desempenho do serviço ou quando pode mobilizar, para diversa destinação e sem maiores transtornos, o equipamento utilizado ou, ainda, quando o serviço não envolve implantação física de aparelhamento que adere ao solo, ou, finalmente, quando os riscos da precariedade a serem assumidos pelo permissionários são compensáveis seja pela rentabilidade do serviço, seja pelo curto prazo em que se realizará a satisfação econômica almejada.

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que o dispositivo não faz referência à autorização de serviço público. No seu entender, os serviços chamados autorizados não têm a natureza de serviços públicos, são apenas atividades que, pela sua importância para o interesse público, ficam sujeitas a maior controle por parte do estado (ela lamenta, entretanto, que o art. 21, XII, da CF ainda faça referência à autorização como forma de delegação do serviço público). Aplicam-se, para a escolha do concessionário ou permissionário, as regras gerais previstas na Lei nº 8.666/93, com as modificações decorrentes da Lei nº 8.987/95 e da Lei nº 9.074/95.

6. Propriedade e emprego de recursos minerais e de potenciais hidroelétricos: o art. 20 da CF, nos inc. VIII e IX, estabelece serem bens de propriedade da União os potenciais de energia hidráulica e os recursos minerais, inclusive os do subsolo. Tais bens são considerados como propriedade distinta do solo, observando o regime de exploração ou aproveitamento previsto no art.176, CF. Em relação aos potenciais hidroenergéticos, incide ainda o disposto no art. 21, XII, 'b', da CF. Observar que a EC 6/95, a qual alterou o conceito de empresa brasileira, também afetou o art. 176, § 1º, da CF (SILVA, p. 798)

7. Monopólios federais: monopólio é forma de intervenção do ente público em atividade que, em princípio, deveria ser de titularidade da iniciativa privada – atividade econômica em sentido estrito – que é retirada da iniciativa privada para ficar reservada à exploração exclusiva estatal, afastando-se a competição. No nosso sistema jurídico, há duas formas de exploração direta de atividade econômica pelo Estado. Uma, dita necessária, utilizada para resguardar a segurança nacional ou relevante interesse coletivo (art. 173, caput), em que o Estado concorre de igual para igual com os demais particulares. A outra, prevista no art. 177 da CF, que diz respeito ao monopólio. O termo monopólio exprime a exploração exclusiva de um negócio. O monopólio privado é vedado pela Constituição, porque permite a dominação do mercado e a eliminação da concorrência. É o oposto da concorrência perfeita. Caracteriza-se pela inexistência de competição em determinado mercado, no qual o agente econômico tem poder para estabelecer o preço dos produtos. Difere-se do oligopólio, em que há concentração econômica parcial, no qual o poder de mercado se divide entre poucos agentes econômicos. O oligopólio caracteriza a estrutura de mercado pela concorrência imperfeita. O monopólio privado é incompatível com o sistema de defesa da concorrência previsto na Constituição. Já o monopólio estatal é permitido pela Constituição para algumas atividades expressamente elencadas no art. 177. Diversamente do monopólio privado, que busca o aumento arbitrário dos lucros, o monopólio estatal visa à proteção do interesse público. Atividades monopolizadas: referem-se a três ordens: petróleo,gás natural e minério ou minerais nucleares (SILVA, p. 807), estando relacionadas no art. 177 da CF 86 em rol taxativo

86 I- a pesquisa e a lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos; II- a refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; III- a importação e a exportação dos produtos e derivados básicos resultantes das atividades previstas nos incisos anteriores; IV- o transporte marítimo do petróleo

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segundo Celso Antonio B de Mello (MELLO, p. 800). O monopólio na exploração do petróleo permite a participação (royalties), por parte de Estados, DF, Municípios e até de órgãos da administração direta da União (art. 20, § 1º) no produto de sua exploração. Regime jurídico do monopólio: o regime de monopólio tem a natureza de intervenção direta do Estado, com caráter exclusivo, em determinado setor da ordem econômica. Antes da Emenda nº 9/95 era vedado à União ceder qualquer tipo de participação na exploração de jazidas de petróleo. Agora, o § 1º do art. 177 permite, nos termos de lei, que a União contrate empresas estatais ou privadas para a realização das atividades ligadas ao petróleo, isto é, a atividade continua monopolizada, embora seja possível a sua concessão.

8. Abuso do poder econômico: com o objetivo de proteger a livre concorrência, a Constituição Federal adota princípio relativo à repressão aos abusos do poder econômico. O poder econômico é uma constante na economia moderna, do que não é condenado. Somente seu abuso, ou seja, a indevida utilização da força de mercado por parte dos agentes econômicos causa a repressão estatal, visando sua repressão. O art. 173, § 4º, da CF estabelece as diretrizes para a configuração do abuso do poder econômico, as quais são regulamentadas pela lei (Lei nº 8.884/94 com as alterações da Lei nº Lei nº 12.529/11). Para Paula Forgioni, configura-se a partir da atuação no mercado com independência e indiferença em relação aos outros agentes, sendo denominado abuso de posição dominante. Tal prática reduz a parcela minoritária a condutas de sujeição. Note-se que não é necessário que o agente atue com completa ausência de concorrência, basta que a concorrência não seja de tal grau que influencie, de forma significativa, o comportamento do monopolista.

9. Responsabilidade de pessoas jurídicas e de seus dirigentes nas infrações à ordem econômica e financeira e à economia popular: não há dúvida quanto à responsabilização das pessoas jurídicas por atos danosos, pautada tanto nas previsões de direito administrativo e econômico, quanto nas normas de direito civil. A relevância do tema se traduz na possibilidade de responsabilização penal. Assim, em relação aos demais crimes praticados pela pessoa jurídica, a Constituição Federal não foi explícita, mas permitiu que a legislação infraconstitucional estipulasse sanções penais cabíveis para a chamada criminalidade econômica (além da ambiental), nos termos do art. 173, § 5º. WALTER CLAUDIUS ROTHENBURG, analisando o referido dispositivo constitucional, ensina: “Fora de dúvida, entretanto, que a responsabilidade penal da pessoa jurídica está prevista constitucionalmente e necessita ser instituída, como forma, inclusive, de fazer ver, ao empresariado, que a

bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; V- a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados, com exceção dos radioisótopos cuja produção,comercialização e utilização poderão ser autorizadas sob regime de permissão, conforme as alíneas b e c do inciso XXIII, do “caput” do artigo 21 desta Constituição Federal.

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empresa privada também é responsável pelo saneamento da economia, pela proteção da economia popular e do meio ambiente, pelo objetivo social do bem comum, que deve estar acima do objetivo individual, do lucro a qualquer preço. Necessita ser imposta, ainda, como forma de aperfeiçoar-se a perquirida justiça, naqueles casos em que a legislação mostra-se insuficiente para localizar, na empresa, o verdadeiro responsável pela conduta ilícita”.87Destaca Gianpaolo Smanio88 ainda que a Organização das Nações Unidas, em seu VI Congresso para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente, em Nova Iorque em julho de 1979, no tocante ao tema do delito e do abuso de poder, recomendou aos Estados-membros o estabelecimento do princípio da responsabilidade penal das sociedades.

10. Casuística: Súmula 646; 89 compatibilidade do regime de privilégio da ECT com a ordem constitucional vigente (ADPF 46); constitucionalidade formal e material do conjunto de normas (ambientais e de comércio exterior) que proíbem a importação de pneumáticos usados (STA 171, ADPF 101); passe livre às pessoas portadoras de deficiência não viola os princípios da ordem econômica, da isonomia, da livre iniciativa e do direito de propriedade, nem o da ausência de indicação de fonte de custeio (ADI 2649); constitucionalidade da lei que confere meia entrada aos estudantes (ADI 1950); constitucionalidade da gratuidade do transporte público a idosos (ADI 3768); ELETRONORTE atua em regime de concorrência (RE 599628); impenhorabilidade dos bens da ECT (RE 220906); "A propriedade do produto da lavra das jazidas minerais atribuídas ao concessionário pelo preceito do art. 176 da Constituição do Brasil é inerente ao modo de produção capitalista. A propriedade sobre o produto da exploração é plena, desde que exista concessão de lavra regularmente outorgada." (ADI 3273).

87 A pessoa jurídica criminosa. Curitiba: Juruá, 1997. p. 24 apud Gianpaolo Smanio. A responsabilidade penal da pessoa jurídica in Revista Jusnavigandi. http://jus.com.br/revista/texto/5713/a-responsabilidade-penal-da-pessoa-juridica88 A responsabilidade penal da pessoa jurídica in Revista Jusnavigandi. http://jus.com.br/revista/texto/5713/a-responsabilidade-penal-da-pessoa-juridica89 Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área.

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ITEM A: Subsistema de atenção à saúde indígena. Distritos sanitários e controlesocial.Financiamento.

Obras consultadas:Mariana Filchtiner Figueiredo. Direito à saúde - Leis n. 8.080/90 e 8142/90. Ed. Juspodivm.Manual de atuação – Saúde indígena – 6ª CCR/MPF (2008).Legislação básica.Arts. 19-A a 19-H da Lei n. 8080/90.

1. Subsistema de atenção à saúde indígena - SASIO SASI integra o SUS e abrange as ações/serviços de saúde às populações

indígenas, individual ou coletivamente. Caberá à União, com seus recursos próprios, financiar o SASI, sendo que os Estados, Municípios, outras instituições governamentais e não governamentais, poderão atuar complementarmente no custeio e execução das ações.

A Política Nacional de Atenção à Saúde Indígena restou aprovada pela Portaria do Ministério da Saúde nº 254, de 31 de janeiro de 2002, objetivando o acesso à saúde pelos indígenas, de acordo com os princípios e diretrizes do SUS, contemplando a diversidade social, cultural, geográfica, histórica e política de modo a favorecer a superação dos fatores que os tornam mais vulneráveis aos agravos à saúde de maior magnitude e transcendência entre os brasileiros, reconhecendo a eficácia de sua medicina e o seu direito à cultura. 2. Distritos sanitários e controlesocial

Os Distritos sanitários constituem em um espaço etno-cultural dinâmico e delimitado, promovendo a reordenação da rede de saúde e das práticas sanitárias e desenvolvendo atividades administrativo-gerenciais necessárias à prestação da assistência.

Os DSEIs têm seu território fixado segundo: população, área geográfica e perfil epidemiológico; disponibilidade de serviços, recursos humanos e infraestrutura; vias de acesso aos serviços do SUS; relações sociais entre os povos/sociedade regional; distribuição demográfica, que não coincide com os limites dos Estados/Municípios onde estão localizadas as terras indígenas.

Os DSEIs devem prestar atenção básica à população indígena aldeada, mediante atuação de Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena (EMSI), nos moldes do Programa Saúde da Família (PSF), compostas por médicos, enfermeiros, odontólogos, auxiliares de enfermagem, agentes indígenas de saúde, etc.

O MPF possui como missão relevante nessa área a busca pela autonomia do DSEI, recomendando à Funasa que forneça as condições para que isso aconteça. O PR deve conhecer a estrutura do DSEI e dos recursos humanos e financeiros necessários para a execução dos serviços.

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O TCU permite, temporariamente, que a Funasa faça convênios com ONGs, Estados/Municípios para composição das EMSI, devendo realizar concurso para execução direta, no prazo do art. 4º, I, da Lei 8.745/93.

Cada DSEI tem um CDSI (Conselho Distrital de Saúde Indígena), que é integrado por Conselhos Locais (CL): órgão de controle social que elabora o Plano de Saúde Distrital e fiscaliza a prestação de contas. O MPF deve fiscalizar se os recursos estão sendo empregados em conformidade com o plano distrital.

Os CL são paritários, com representantes dos usuários (escolhidos pelas comunidades indígenas)/governo/prestadores de serviços/trabalhadores do setor de saúde.

MPF deve impedir que a interferência do Estado na escolha dos membros do CDSI o deslegitime ou reproduza práticas tutelares; pressionar para a instalação dos CDSI/CL; buscar a representatividade de todos os grupos étnicos abrangidos; fiscalizar a realização das suas reuniões, a efetivação das deliberações e capacitação dos conselheiros. 3. Polos-base

Primeira referência para os agentes indígenas de saúde das aldeias. Os polos-base podem estar localizados em comunidade ou em Municípios de referência, a depender de vários fatores, entre eles condições estruturais para mantê-lo, bem como e, sobretudo, manifestação da comunidade indígena sobre a sua localização mais adequada. Cada Polo-Base cobre um conjunto de aldeias. Os Polos-Base estão estruturados como Unidades Básicas de Saúde e devem contar com atuação de equipe multidisciplinar de saúde indígena, composta principalmente por médico, enfermeiro, dentista e auxiliar de enfermagem.

Além dos Polos-Base que, em alguns casos, revelam-se mais como “unidades administrativas”, existem, de acordo com a atual estrutura do Subsistema de Saúde Indígena, postos de saúdes, sendo recomendável, nesse caso, haver um em cada aldeia.

Existem, ainda, as Casas de Saúde Indígena que recebem, alojam e alimentam pacientes, encaminhados pela aldeia/polo-base, e acompanhantes, prestam assistência de enfermaria 24h, marcam consultas, exames ou internações.

Cada aldeia/comunidade deve ter um Agente Indígena de Saúde vinculado a um Posto de Saúde, além de Agentes Indígenas de Saneamento. MPF deve garantir que o agente tenha capacidade e legitimação (índio da comunidade específica, fale sua língua, ≥16 anos).4.Compromisso com a diversidade cultural na saúde indígena:

Cada povo assume diferentes formas de representação do processo saúde-doença e das intervenções terapêuticas. Os sistemas tradicionais de saúde são o principal recurso de atenção à saúde da população indígena, apesar da presença das estruturas “ocidentais”, condicionam a relação dos indivíduos com a saúde e a doença e influem na relação com os serviços de saúde (procura ou não dos serviços, aceitabilidade das ações, compreensão das mensagens) e na interpretação dos casos de doença. O reconhecimento da diversidade cultural e o respeito aos seus sistemas

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tradicionais de saúde são imprescindíveis. Há dever de prestar políticas públicas adequadas à diversidade cultural. Deve ser estimulada a articulação entre os saberes tradicionais e a medicina científica. Convenção 169 da OIT: os serviços de saúde devem ser planejados e administrados em cooperação com os povos e levar em conta as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais. Declaração da ONU: Os povos indígenas têm direitos às suas próprias medicinas tradicionais e a manter suas práticas de saúde. Lei 9.836/99: dever-se-á levar em consideração a realidade local e as especificidades da cultura dos povos indígenas. O Ministério da Saúde deve, situados os povos em áreas regularizadas ou não, adotar todas as medidas possíveis visando ao seu pleno atendimento, no campo da saúde e do saneamento básico, inclusive com a execução de obras de caráter permanente ou temporário. É inexigível a autorização da FUNAI, prévia ou posterior, para submeter índios ou comunidades indígenas a procedimentos médicos, inclusive cirúrgicos. 5.Recursos financeiros:

Duas fontes (a) repasse mensal de recursos orçamentários do Tesouro Nacional aos DSEIs para execução direta ou mediante celebração de convênios para as ações complementares na saúde indígena; e (b) repasse fundo a fundo pela Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde (Incentivos à Atenção Básica – IAB e Especializada – IAE, que só podem ser repassados às unidades federativas que tenham assinado Termos de Pactuação que observem os Planos Distritais e tenham sido aprovados pelos CDSI/CL; os credenciados assinam Termo de Compromisso de Prestador de Serviço).

Os Recursos são destinados para investimentos na rede de serviços, cobertura assistencial ambulatorial e hospitalar e demais ações de saúde, excluída se exclusivamente realiza atividade administrativa. Prioridade para a rede pública. Sistema de Informações de Saúde Indígena (SIASI): atendem cada nível gerencial com indicadores.

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ITEM B: Controle Difuso de Constitucionalidade. História. Direito comparado. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

Obras consultadas:Uadi Lammêgo Bulos. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva.Gilmar Ferreira Mendes e outros. Curso de Direito Constitucional. Ed. saraivaSite consultado: http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/A_tendencia_de_abstrativizacao.pdf

1. HistóriaA origem do controle difuso data de 1803, nos Estados Unidos, no famoso caso

“Caso Marbury v. Madison”, julgado pelo magistrado Marshall. Foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição da

República de 1891. 2. Direito comparadoa) Portugal foi o primeiro país da Europa a adotar o controle difuso. Como peculiaridade, destaca-se que se o Tribunal Constitucional português declarar por três vezes a inconstitucionalidade da norma, pode ser instaurado o processo de controle concentrado, por iniciativa de qualquer dos seus juízes ou do Ministério Público.b) a Carta espanhola de 1978 prevê o uso do incidente de inconstitucionalidade. Por esse instituto, o juiz, ao questionar a constitucionalidade da norma no caso concreto, submete a análise dessa questão prévia ao Tribunal Constitucional.c) O juiz na Itália não possui competência para decidir sobre a constitucionalidade da norma. Assim, ao se deparar com um litígio que traga esse debate como questão prejudicial, o juiz deve encaminha-lo a Corte Constitucional. 3. Conceito e características

Todo juiz ou tribunal pode apreciar a inconstitucionalidade das leis ou atos normativos de forma incidental. Pela via da exceção ou de defesa, qualquer das partes pode requerer a declaração de inconstitucionalidade de norma determinada, como questão prejudicial, pois só assim a questão principal poderá ser solucionada. O juiz pode declarar a inconstitucionalidade de ofício ao analisar o caso concreto.

Não se confundem controle difuso e incidental (realizado na apreciação de um caso concreto, por via e exceção; a questão constitucional é prejudicial), mas no Brasil, em regra, se superpõem (BARROSO). O controle difuso se dá no exercício normal e regular da função jurisdicional, em processo judicial entre litigantes. São três critérios de classificação: difuso x concentrado, via incidental x via principal e concreto x abstrato. Controle incidental concentrado: ADPF. Controle por via principal e concreto: ação direta interventiva.

Cláusula de reserva de plenári o . Art. 97 CR/88: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”. Procedimento regulado pelos arts. 480 a 482 do CPC.

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Súmula vinculante 10: “Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, art. 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte".

É dispensada a remessa ao órgão especial ou pleno se já houver pronunciamento destes ou do STF (art. 481, PU, CPC). Há precedente do no sentido de que a ele não se aplica o art. 97: “O STF exerce, por excelência, o controle difuso de constitucionalidade quando do julgamento do recurso extraordinário, tendo os seus colegiados fracionários competência regimental para fazê-lo sem ofensa ao art. 97 da CF.” (RE 361.829-ED, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJE de 19-3-2010). Gilmar Mendes (2007, p. 1076) entende de forma diversa: com base no regimento interno do STF, afirma que nos processos de competência das Turmas, será feita remessa ao Plenário, em caso de relevante arguição de inconstitucionalidade.3. Efeitos

A declaração de inconstitucionalidade no controle difuso produz efeitos ex tunc e inter partes.

A inconstitucionalidade declarada como questão prejudicial não transita em julgado (limite objetivo da coisa julgado) nem afeta terceiros estranhos ao processo (limite subjetivo). A doutrina majoritária no Brasil situa a inconstitucionalidade no campo da nulidade, em razão da supremacia da constituição. Decisão que a reconhece tem natureza declaratória, e retroage até o nascimento do ato viciado. STF tem admitido, em casos excepcionais, mitigação da retroação de efeitos, mediante ponderação de princípios e aplicação analógica do art. 27 da Lei 9868/99.

Segundo o art. 52, X, CR/88, cabe ao Senado suspender a lei declarada inconstitucional pelo STF em controle difuso, no todo ou em parte, conferindo eficácia erga omnes à decisão. Pela doutrina majoritária, o Senado não está vinculado à decisão do STF, existindo um campo de discricionariedade para decidir pela suspensão ou não da norma e sua extensão. O Senado tem competência para suspender norma federal, estadual e municipal.

Abstrativização do controle difuso: aumento da força vinculante dos julgados do STF em controle difuso. Os efeitos conferidos ao controle in abstrato de constitucionalidade também são aplicados ao controle concreto, sem a participação do Senado. Através do instituto da mutação constitucional, o STF passa a interpretar que o art. 52, inc. X da CF visa apenas dar publicidade às suas decisões proferidas no controle difuso, em sede de recurso extraordinário, já que a própria Corte atribui efeito vinculante e eficácia erga omnes. Fenômenoligado ao instituto da transcendência dos fundamentos.

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ITEM C: Recurso extraordinário. Arguição de repercussão geral das questões constitucionais.

Obra consultada:Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart. Processo de Conhecimento. Ed. Revista dos Tribunais.Legislação básica.Arts. 543-A e 543-B do CPC.

Segundo Fredie Didier Junior e Leonardo Carneiro da Cunha (Curso de Direito Processual Civil, v. 3, 2011, p. 322-353) o RE tem por função resguardar a interpretação dada pelo STF aos dispositivos constitucionais.

Hipóteses: 1) contrariedade direta e frontal a dispositivo da Constituição Federal (Vide Súmula 636), incluindo a contrariedade a tratado internacional sobre direitos fundamentais independentemente do quórum de aprovação, isto é, independente do status formal de norma constitucional; 2) validade de lei ou ato local em contrariedade à CF; 3) declaração de inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, sendo, nesse caso; e 4) lei local em contrariedade a lei federal, suscitando a questão constitucional da competência legislativa.

A arguição de repercussão geral é um requisito de admissibilidade do RE, que deve constar em tópico específico da petição, sendo, portanto, ônus do recorrente. A presença da arguição de repercussão geral nas razões recursais pode ser analisada na origem. O que o Tribunal de origem não pode fazer é entrar no mérito da repercussão.

Somente o STF pode analisar a repercussão geral. Há uma presunção em favor da existência de repercussão geral que somente pode ser afastada por 2/3 do Pleno do STF, cuja análise é feita através do chamado plenário virtual. Ressalva-se que se existir na Turma (a quem compete à apreciação do recurso extraordinário) no mínimo quatro votos pela presença da repercussão geral, o recurso será admitido, dispensando-se a remesa do caso ao Plenário.

A decisão contrária à súmula ou jurisprudência dominante do STF tem presunção absoluta de repercussão geral.

A repercussão geral de questões econômicas, políticas, sociais e jurídicas é um conceito aberto e serve como filtro recursal para reforçar a força vinculativa das decisões do STF, resultando numa objetivação do controle difuso, sendo admitida a participação de amicus curiae na discussão sobre a existência da repercussão geral.

No tribunal de origem é feita uma análise por amostragem, encaminhando-se ao STF os recursos extraordinários escolhidos e sobrestando-se os demais. Com a decisão sobre o RE paradigmático há um efeito regressivo, pois o Tribunal de origem pode retratar-se da decisão contrária ao STF ou, então, encaminhar o RE. Neste último caso, o STF pode reformar liminarmente o acórdão contrário à decisão paradigmática.

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A repercussão geral somente passou a ser aplicada após a alteração do RISTF, em maio de 2007. No início os tribunais deixavam de exercer o Juízo de retratação e encaminhavam os recursos sobrestados sem qualquer decisão. O STF não aceita mais isso. O Tribunal deve fundamentar o motivo de não haver exercido o juízo de retratação.

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ITEM A: Direitos fundamentais culturais. Multiculturalismo e interculturalidade. Direito à diferença e ao reconhecimento.Referência:1 - Resumo dos pontos – 25 concurso2 – Artigo: “Proteção constitucional dos direitos fundamentais culturais das minorias sob a perspectiva do multiculturalismo” – in Revista de Informação Legislativa – Senado Federal - Ana Maria D´Ávila Lopes3 - Gilmar Mendes e Paulo Gustavao Gonet Branco – Curso de Direito Constitucional – 2012 – Saraiva.4 – Artigo: “O Direito sob o marco da plurietnicidade e multiculturalidade” – Débora Duprat – disponível nos arquivos do Dropbox.5 – Artigo: “O Estado Pluriétnico” - Deborah Duprat.6 – Artigo: “Multiculturalismo e Direitos Humanos” - Vera Maria Candau.7 – Artigo: “Direito fundamental cultural na visão do Supremo Tribunal Federal” – Inês Virgínia Prado Soares – material disponível no Dropbox.8 – Uadi Lammêgo Bulos – Curso de Direito Constitucional – 2009 – Saraiva.9 – Direitos Humanos e Justiça Internacional – Flávia Piovesan – 2011 – Saraiva.10 – Comentário Contextual à Constituição – José Afonso da Silva – 2009 – Saraiva.

Direitos fundamentais culturais:- Segundo Ana Maria D’avila Lopres - Os direitos culturais, incluídos na segunda geração dos direitos fundamentais, surgiram nos inícios do século XX, com o intuito de defender e promover basicamente o direito à educação, visto que, à época, a expressão direito cultural estava associada à idéia de instrução. Com o passar dos anos, e graças ao processo mundial de globalização e aos aportes teóricos do Multiculturalismo, ampliou-se o conteúdo do termo cultura, sendo hoje entendido como toda manifestação criativa e própria do sentir e pensar de um grupo social. “A cultura é um conjunto de traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social. A cultura engloba, além das artes e das letras, o modo de viver junto, o sistema de valores, as tradições e crenças.” (UNESCO, 2002).José Afonso da Silva observa que a introdução do princípio democrático no Estado de Direito implica em que os direitos culturais próprios dos seguimentos sociais e étnicos que compõem a população brasileira passem a fazer parte dos direitos fundamentais, a que o Estado obriga-se a resguardar e proteger.Segundo Inês Virgínia Prado Soares, a construção do direito ao patrimônio cultural foi marcada por três grandes frentes:

a) Movimento internacional de valorização do patrimônio cultural, especialmente após as duas grandes guerras mundiais;

b) Concepção de referencialidade - além da história oficial e dos grandes monumentos, percebeu-se a necessidade de valorizar os bens culturais de referência para a comunidade, em práticas cotidianas;

c) Direito à diversidade cultural, não somente nas manifestações, mas também pela tutela do patrimônio cultural no território de cada povo.

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Normas internacionais que tratam do tema dos direitos culturais: Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e o Pacto de São José da Costa Rica (1969). Além disso, a UNESCO tem relevante importância na delimitação dos direitos culturais. Em 1989, na Recomendação sobre a Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular, reconheceu-se que os bens intangíveis integram o patrimônio da humanidade e tem importância e impacto não somente nas relações culturais entre os povos, mas também nas relações sociais, econômicas e políticas.Em 2005, na Convenção sobre Diversidade Cultural, rejeitou-se a concepção de que os interesses econômicos sobre as atividades, bens e serviços culturais sejam preponderantes (e muito menos exclusivos). Ademais, o próprio Pacto de São José da Costa Rica (art.26) determina a implementação progressiva dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios.Os direitos fundamentais culturais são aqueles ligados às manifestações espirituais, materiais, intelectuais e afetivas previstas ou aceitas no sistema de justiça brasileiro por marcarem, de modo peculiar, a sociedade brasileira (por portarem valores de referência ligados à identidade, memória ou ação).José Afonso da Silva destaca que as intervenções e competências públicas em matéria cultural se baseiam no duplo aspecto da cultura: valor simbólico que representa uma identidade coletiva e na dimensão interativa que se manifesta num poder de transformação social. Essa dimensão coletiva é efetivada pela atuação estatal em três áreas: política de proteção cultural, política de formação cultural e política de promoção cultural.Hoje, não mais deve entender-se que existem hierarquias de culturas nem imposições de modelos comportamentais. Assim, com base nesse entendimento é que foram aprovadas, nas 31a e 33a sessões gerais da UNESCO em 2002 e 2005, respectivamente, a “Declaração Universal sobre Diversidade Cultural” e a “Convenção sobre a proteção e promoção da diversidade das expressões culturais” estabelecendo, esta última, entre seus princípios: “Art. 2o Princípios orientadores (...) 3. Princípio da igual dignidade e do respeito de todas as culturas A protecção e a promoção da diversidade das expressões culturais implicam o reconhecimento da igual dignidade e do respeito de todas as culturas, incluindo as das pessoas pertencentes a minorias e as dos povos autóctones.” (UNESCO, 2006) Toda cultura, enquanto não afronte a dignidade humana, é válida e valiosa e, como tal, deve ser respeitada e protegida. Desse modo, os direitos fundamentais culturais que, na sua origem, referiam-se apenas ao direito à educação, mudaram hoje de conteúdo. Assim, enquanto o direito à educação passou hoje a ser identificado como instrução e compreendido como um direito social, conforme o previsto no art. 6º da Constituição Federal de 1988, os direitos fundamentais culturais passaram a se referir a todas as manifestações materiais e imateriais dos diversos

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grupos humanos. Foi dessa forma como o constituinte brasileiro concebeu esses direitos, prevendo-os nos artigos 215 e 216. Com efeito, no art. 215, estabelece-se a obrigação do Estado de proteger todas as manifestações populares, indígenas, afro-brasileiras e de todos os outros grupos participantes do processo civilizatório nacional, enquanto que, no art. 216, define-se o patrimônio cultural brasileiro como o conjunto de bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, que sejam portadores de referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Portanto, os direitos fundamentais culturais não podem mais ser entendidos como sinônimos de instrução ou educação, sem que isso implique qualquer intenção de diminuir-lhes sua importância ou transcendência para o desenvolvimento da personalidade humana. A presente proposta, diferentemente, dirige-se a contribuir para a valorização da diversidade cultural de todos os povos, por meio do cumprimento e aperfeiçoamento das normas nacionais e internacionais vigentes.Proteção constitucional da diversidade cultural humana - Não existe nada mais rico do que a diversidade humana. Impor padronizações ou modelos culturais é ir de encontro à própria natureza do ser humano e, conseqüentemente, ir contra sua dignidade, princípio fundamental do Estado brasileiro (art. 1o, III). A norma prevista no caput do art. 5o, “todos são iguais”, deve ser interpretada no âmbito jurídico da sua aplicação. Todos, perante o Direito, são iguais, e assim devem ser tratados pelo Direito. Não obstante, inexistem dois seres humanos biologicamente iguais e, muito menos, culturalmente iguais. O Direito deve tratar as pessoas como iguais, mas não visar igualá-las. Deve-se promover o reconhecimento e a valorização de todos os grupos culturais. Valorização esta que deve ser inculcada desde os primeiros anos de formação da pessoa, fixando-se, nos programas de ensino fundamental, o respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais, conforme dispõe a Constituição (art. 210). O ensino da história brasileira, por sua vez, deve levar em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro (art. 242, § 1o). O resgate ao respeito da diversidade é um imperativo do Estado Democrático de Direito, no qual todas as culturas devem ter o direito de manifestar-se livremente, conforme o estabelecido no inciso IX, do art. 5o: “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Portanto, é tarefa do Estado reconhecer, em primeiro lugar, essas diferenças para assim protegê-las, proibindo qualquer tipo de discriminação e promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de discriminação (inc. IV do art. 3o). Entretanto, não é suficiente apenas proclamar o reconhecimento da diversidade cultural (art. 215), ou da liberdade de manifestação de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (art. 5o, IX), ou a proibição de qualquer forma de discriminação (art. 3o, III), se não se estabelecem normas concretas de proteção e promoção desses direitos. Assim, é competência comum da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios: “Art. 23. (...) III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; IV – impedir a

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evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural; V – proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência; (...)” Impende salientar que a referida obrigação não deve ficar reduzida à atuação do Poder Público, devendo existir a colaboração da sociedade (216, § 1o). Com efeito, a sociedade não pode ficar à margem da efetivização dos direitos fundamentais. A Constituição Federal prevê diversos mecanismos de participação popular na defesa de seus direitos. Participação esta que pode ser de forma individual como, por exemplo, por meio do exercício do direito de petição para denunciar ou reclamar a violação de algum direito (conforme a alínea “a” do inciso XXXIV do art. 5o) ou da ação popular para defender o patrimônio histórico e cultural (inciso LXXIII do 5o), ou de forma coletiva, por meio da ação civil pública. A responsabilidade da sociedade está também evidenciada na atividade econômica que, mesmo de natureza privada, deve viabilizar o desenvolvimento cultural e o bem-estar da população (art. 219). Assim, por exemplo, na produção e programação das emissoras de rádio e televisão devem ser atendidos os seguintes princípios: “Art. 221. (...) I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; (...)” Destarte, Estado e sociedade devem juntar esforços para a concretização dos direitos fundamentais culturais, porque, somente dessa forma, poder-se-á afirmar que se vive em uma sociedade democrática, na qual todas as pessoas têm iguais direitos de desenvolver plenamente sua personalidade.Saliente-se que, na defesa dos direitos culturais, as considerações em torno da cláusula da “reserva do possível” não podem se afastar do núcleo consubstanciador do “mínimo existencial”.Políticas públicas culturais foram objeto de análise pelo STF nas ADI 2302 e ADI 2808. Em ambas, o STF julgou a improcedência das leis estaduais impugnadas, em razão do vício de iniciativa. As leis referidas foram de iniciativa do Legislativo estadual, mas criavam órgãos ou atribuíam responsabilidades a órgãos (Secretaria de Cultura) do Poder Executivo, violando o art. 61, §1º, II, ‘e’, CRFB/88.As manifestações culturais expressam direitos fundamentais ligados à liberdade e à memória e podem sempre ser objeto de ponderação com outros direitos de igual valor e importância para o sistema jurídico, a exemplo da vedação à crueldade com animais.O STF, tanto no caso da “Farra do Boi”, quanto na hipótese das “Brigas de Galo”, privilegiou a preservação dos elementos da fauna.A liberdade de manifestação cultural é um direito cultural, mas não está necessariamente ligado à produção e preservação dos bens culturais que integram o patrimônio cultural brasileiro. A autora ainda acrescenta que todo bem cultural brasileiro resulta de um processo de manifestação cultural. Entretanto, nem toda manifestação cultural é consolidada em um bem cultural brasileiro.O STF desempenha relevante papel de indicar para o setor econômico um protagonismo na promoção das atividades culturais. Ex: constitucionalidade da lei

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estadual que assegura o pagamento de 50% para o ingresso em casas de diversões, praças desportivas e similares aos jovens de até 21 anos (ADI 2163). Na ADI 1950, o STF sustenta que os produtos culturais oferecidos pelo setor privado são meios de complementar a formação dos estudantes. Na ADI 3512, o STF considerou constitucional lei que previa acesso a locais públicos de cultura e lazer com meia-entrada para doadores regulares de sangue. Essa modalidade de intervenção estatal no domínio econômico consiste na intervenção por indução.Com relação à extensão da imunidade tributária aos álbuns de figurinhas, o STF destacou a importância do direito cultural ao exercício da democracia e que tal direito não deveria se fragilizar por um juízo subjetivo acerca da qualidade cultural ou valor pedagógico de uma publicação destinada ao público infanto-juvenil. Para a Suprema Corte, o constituinte originário não teria feito ressalvas quanto ao valor artístico ou didático de uma publicação, não cabendo tal juízo de valor para o aplicador da norma constitucional (RE 221.239).O luto é caracterizado como manifestação cultural imaterial e necessita de espaços para sepultamento. Entretanto, o STF entendeu que apenas os cemitérios que são extensões de entidades de cunho religioso são abrangidas pela imunidade tributária do art. 150, VI, b, CRFB/88. Os cemitérios explorados comercialmente por empresas que alugam e vendem jazigos não fariam jus ao benefício fiscal mencionado (RE 578562).Os bens arqueológicos, paleontológicos ou espeleológicos são bens materiais do patrimônio cultural brasileiro e de propriedade da União. Além disso, extrapola a competência concorrente do Estado a consideração legal de que os bens arqueológicos, paleontológicos ou espeleológicos integram o patrimônio cultural estadual.Ademais, os bens arqueológicos, paleontológicos ou espeleológicos devem ser tutelados por todos os entes federativos, sem que esta tarefa os sobrecarregue desproporcionalmente. ADI 3525 / ADI 2544.A memória histórica como direito cultural, especialmente em relação aos documentos produzidos na época do regime autoritário brasileiro (1964-1985), foi levada à análise do STF, pelas ADIs 3987 e 4077, ainda pendentes de julgamento.Dentro da perspectiva democrática, para revelação da verdade, para reparação simbólica das vítimas e familiares do regime ditatorial e, ainda, para a formação e tutela a memória coletiva e da memória histórica, cabe a elaboração e implementação de políticas públicas que estabeleçam, dentre outras ações, as seguintes: fomento da investigação histórica, garantia de amplo acesso aos documentos governamentais produzidos no período ditatorial, criação de museus, parques ou outros espaços públicos dedicados à memória dos mortos, pedidos oficiais de desculpas às vítimas ou aos familiares dos mortos e desaparecidos e a designação de espaços públicos para narrativas, exposições e/ou debates que revelem os atos de violência praticados pelo Estado e seus agentes.A CRFB/88 trata os documentos como bens culturais que podem integrar o patrimônio cultural brasileiro. Ademais, cabe à administração pública a gestão da documentação

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governamental e as providências para franquear sua consulta a quem dela necessitar, como forma de tutelar e consolidar a cidadania cultural (art. 216, CRFB/88).No plano infraconstitucional, a lei 8.159/91 trata da política nacional dos arquivos públicos e privados. Ocorre que o Decreto 4.553/2002, que regulamenta a referida lei, estabeleceu prazos extremamente longos para acesso a documentos públicos que contenham informações cujo sigilo seja considerado imprescindível. Outrossim, foi editada a lei 11.111/05, que repete a concepção de segredo, tão prejudicial e absolutamente contrária aos valores e fundamentos de um Estado Democrático de direito.Nas referidas ADIs, o Procurador Geral da República argumenta que “a integridade e a revelação dos conteúdos dos registros históricos, especialmente nos países que, como o Brasil, passaram por um processo de transição política, desempenham papel importante para a consolidação do regime democrático e para a proteção dos direitos individuais e coletivos. (...) Não se trata de uma questão de interesse privado, mas de expressão pública”.Diante do exposto, percebe-se que a concepção do STF é de que os direitos culturais devem ser garantidos e que o setor econômico tem enorme relevância para que estes direitos sejam fruídos efetiva e amplamente. Ademais, observa-se que o STF não se vale de outras áreas de conhecimento para julgamento dessa matéria, no sentido de estabelecer conceituações dos direitos culturais em geral. Da mesma maneira, embora sempre os reconheça como direito fundamental, não se preocupa em estabelecer o teor dos dispositivos constitucionais que versam sobre a matéria cultural.

Obs. Na classificação doutrinária de tipos de constituição há a chamada “CONSTITUIÇÃO CULTURALISTA”, que segundo Bulos (p. 33): “defensores dessa concepção: Stein, Michele Ainis, Grimm. A constituição, para os culturalistas, é produto do fato cultural. Nesse sentido, seria apropriado falarmos numa constituição cultural, formada pelo conjunto de normas constitucionais referentes à educação, ao ensino, ao desporto, as quais visam tutelar, em sentido amplo, o direito à cultura”Com base nisso, realizei pesquisa na CF/88 para saber quais normas se referem à cultura ou aspecto cultural geral. O rol segue abaixo:Art. 4º - Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.Art. 5º - LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios

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arqueológicos; IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural; V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; IX - educação, cultura, ensino e desporto;Art. 30. Compete aos Municípios: IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.CAPÍTULO III - DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTOArt. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais.Seção IIDA CULTURAArt. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.§ 1º - O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.§ 3º A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual, visando ao desenvolvimento cultural do País e à integração das ações do poder público que conduzem à: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 48, de 2005)

I defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro; II produção, promoção e difusão de bens culturais; III formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas

dimensões; IV democratização do acesso aos bens de cultura; V valorização da diversidade étnica e regional.

Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I - as formas de expressão;II - os modos de criar, fazer e viver;III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às

manifestações artístico-culturais;V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,

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arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.§ 3º - A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais.§ 4º - Os danos e ameaças ao patrimônio cultural serão punidos, na forma da lei.§ 6 º É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a fundo estadual de fomento à cultura até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, para o financiamento de programas e projetos culturais, vedada a aplicação desses recursos no pagamento de: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

I - despesas com pessoal e encargos sociais; II - serviço da dívida; III - qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos investimentos

ou ações apoiados. Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal.Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente

que objetive sua divulgação;III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme

percentuais estabelecidos em lei;Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.§ 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.Art. 242. § 1º - O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro.

MulticulturalismoO Multiculturalismo – também chamado de pluralismo cultural ou cosmopolitismo – tenta conciliar o reconhecimento e respeito à diversidade cultural presente em todas

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as sociedades. “A expressão multiculturalismo designa, originariamente, a coexistência de formas culturais ou de grupos caracterizados por culturas diferentes no seio das sociedades modernas (...). Cabe salientar que o preâmbulo da Declaração Universal sobre a diversidade cultural assim estabelece: “a cultura deve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças”.Estado brasileiro – pluriétnico e multicultural. Fundamentos: originalmente decorre de esforço hermenêutico, mas é reforçado pela Convenção nº 169 da OIT, pela Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais e pela Declaração dos Povos Indígenas.Noção central: há grupos portadores de identidades específicas e que cabe ao direito assegurar-lhes o controle de suas próprias instituições e formas de vida e seu desenvolvimento econômico, e manter e fortalecer suas entidades, línguas e religiões, no âmbito dos Estados onde moram.Imperativo ético: a defesa da diversidade cultural passa a ser, para os Estados nacionais, um imperativo ético, inseparável do respeito à dignidade da pessoa humana.Constituição de 1988: fala não só em direitos coletivos, mas também em espaços de pertencimento, em territórios, com configuração em tudo distinta da propriedade privada. Esta, de natureza individual, com o viés da apropriação econômica. Aqueles, como locus étnico e cultural. O seu artigo 216, ainda que não explicitamente, descreve-os como espaços onde os diversos grupos formadores da sociedade nacional têm modos próprios de expressão e de criar, fazer e viver (incisos I e II).

Considerações de Debora Duprat acerca do Multiculturalismo:1 - afirma que não se coloca mais em dúvida que o Estado nacional é pluriétnico e multicultural, e que todo o direito em sua elaboração e aplicação, tem esse marco como referência inafastável. Prossegue Duprat enaltecendo que no seio da comunidade nacional há grupos portadores de identidades específicas e que cabe ao direito assegurar-lhes o controle de suas próprias instituições e formas de vida e seu desenvolvimento econômico, e manter e fortalecer suas entidades, línguas e religiões dentro do âmbito do Estado onde moram. Assim, a defesa da diversidade cultural passa a ser, para os Estados Nacionais, um imperativo ético, inseparável do respeito à dignidade da pessoa humana.2 – o quadro atual é de um direito que abandona a visão atomista do indivíduo e o reconhece como portador de identidades complexas e multifacetadas.3 – a Constituição brasileira, na linha do direito internacional, rompe presunção positivista de um mundo preexistente e fixo, assumindo que fazer, criar e viver dão-se de forma diferente em cada cultura, e que a compreensão de mundo depende da linguagem do grupo.4 – nesse cenário, a Constituição reconhece expressamente direitos específicos a índios e quilombolas, em especial seus territórios. Mas não só a eles. Também são

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destinatários de direitos específicos os demais grupos que tenham formas próprias de expressão e de viver, criar e fazer.5 – inspirado nessa compreensão vem o Decreto 6040/2007, do Poder Executivo Federal, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Duprat salienta que é emblemática a composição da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT): composta de seringueiros, fundos de pasto, quilombolas, faxinais, pescadores, ciganos, quebradeiras de babaçu, pomeranos, índios e caiçaras, dentre outros.6 – aliás, antes mesmo dele, a Convenção 169, da OIT, apresenta um rol de direitos específicos a todos os grupos cujas condições sociais, econômicas e culturais os distinguem de outros setores da coletividade nacional.7 – à vista dos novos paradigmas constitucionais e do direito internacional, o maior desafio é adaptar a legislação preexistente à Constituição de 1988 e a aplicação do direito infraconstitucional como um todo, visto que não contemplam adequadamente esses grupos. Duprat sugere então que: aplicar esse direito preexistente, tout court, sem levar em conta suas especificidades seria perpetuar o quadro de exclusão e lançar por terra as conquistas constitucionais. De outro giro, colocá-los à margem do direito à espera da elaboração de leis que os contemplem especificamente é um desatino. Não é demais lembrar que os direitos culturais e étnicos, porque indissociáveis do princípio da dignidade da pessoa humana, têm o status de direito fundamental. São, portanto, de aplicação imediata.

Existem diferentes noções de multiculturalismo, nem todas no sentido ‘emancipatório’. O termo apresenta as mesmas dificuldades e potencialidades do conceito de ‘cultura’, um conceito central das humanidades e das ciências sociais e que, nas últimas décadas, se tornou terreno explícito de lutas políticas.” (SANTOS; NUNES, [200]). Mikhaël Elbaz (2002, p. 27), pela sua vez, ensina que Multiculturalismo é um conceito e uma ideologia, cuja polissemia somente pode ser entendida no âmbito da desestruturação da narração nacional, sob os efeitos da globalização. Nesse sentido, o Multiculturalismo pode ser entendido de diferentes formas, assim: 1. O Multiculturalismo comunal e corporativo - O Multiculturalismo comunal e corporativo deriva da lógica da politização da luta entravada pelas minorias na busca pelos seus direitos historicamente negados. É essa uma lógica que ao mesmo tempo é pragmática e instrumental, na medida em que objetiva criar novos titulares de direitos. O reconhecimento pelo Estado da diversidade cultural e dos direitos das minorias passa inevitavelmente pela mediação institucionalizada de uma elite saída da própria minoria. Esse tipo de Multiculturalismo provoca tanto apoios como rejeições, haja vista colocar em discussão as dicotomias: espaço público/privado, universalismo/relativismo de valores, direitos individuais/coletivos, objetivismo/subjetivismo. Semprini (1999, p. 90 et seq.) chama essas dicotomias de “aporias conceituais”,afirmando que as diferenças entre a epistemologia multiculturalista e a monoculturalista tornam difícil qualquer mediação dialética, transformando as

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controvérsias decorrentes desse choque em quatro principais aporias conceituais: a) essencialismo versus construtivismo: a noção de essencialismo é utilizada pelos defensores do Monoculturalismo para sustentar que as minorias e suas identidades são dados objetivos da realidade social, “peças imóveis do mosaico social”. Diferentemente, no enfoque construtivista, endossado pelos multiculturalistas, as identidades minoritárias são o produto da própria evolução histórica da sociedade, num contínuo processo dinâmico e transformador. Os monoculturalistas utilizam o enfoque essencialista como argumento para legitimar o status quo e justificar qualquer oposição a mudanças. Uma das manifestações teóricas do essencialismo é o genético, “para o qual cada grupo humano está condicionado definitivamente quanto à sua inteligência e em seu potencial de mobilidade social conforme seu patrimônio genético” (SEMPRINI, 1999, p. 91). Nessa linha de pensamento, o prêmio Nobel de Medicina James Watson pronunciou-se ao atribuir como causa do atraso do continente africano a menor – segundo ele – capacidade intelectual dos negros. Afirmação pela qual teve que posteriormente se desculpar (BBC BRASIL, 2007). b) universalismo versus relativismo: o universalismo defende a existência de valores e julgamentos morais absolutos. Ensina Semprini (1999, p. 92) que a “utopia universalista nasce com o Iluminismo, concretiza-se nas revoluções americana e francesa e é traduzida politicamente nas instituições democráticas”. Contrariamente, os relativistas afirmam “a impossibilidade de estabelecer um ponto de vista único e universal sobre o conhecimento, a moral, a justiça, ao menos na medida em que existam grupos sociais ou minorias com finalidades e projetos de sociedade diferentes” (SEMPRINI, 1999). Para os multiculturalistas, o universalismo é uma violência, haja vista pretender eliminar a diferença e impor um ponto de vista particular apresentado como universal. c) igualdade versus diferença: a igualdade é a base da utopia universalista que, ignorando as desigualdades econômicas, culturais e sociais dos indivíduos, prevê direitos cuja real eficácia se perde no formalismo, favorecendo e fortalecendo a maioria. Para os multiculturalistas, o espaço social é heterogêneo. Dessa forma, qualquer aplicação de uma lei que seja cega às diferenças existentes entre os indivíduos e os trate como se estivessem em igualdade de condições estará sendo claramente discriminatória. d) reconhecimento subjetivo versus mérito objetivo: os multiculturalistas salientam a importância do reconhecimento para ajudar a fortalecer a auto-estima dos membros dos grupos minoritários. Esse reconhecimento é concretizado com a adoção de livros didáticos e programas de ensino nos quais é resgatada a contribuição histórico-social das minorias e, especialmente, se concretiza por meio de ações afirmativas, como as cotas educacionais. Essa perspectiva é fortemente criticada pelos monoculturalistas, que defendem a política do mérito, ressaltando o aspecto positivo da competência e reivindicando critérios objetivos de avaliação. Semprini (1999, p. 95) qualifica essas quatro aporias como oposições para justamente salientar seu caráter conflitual e aparentemente insolúvel, cuja análise exige uma visão de conjunto e interdisciplinar.2. O Multiculturalismo como ideologia política - O Multiculturalismo como ideologia política busca se apoiar menos no Estado do que contestar o monoculturalismo. Nesta

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perspectiva, o ressentimento multiculturalista é contra o eurocentrismo e o androcentrismo, demandando uma releitura da história e a desconstrução da comunidade do saber. Busca-se, assim, partir da noção da existência de humanos diferenciados e não de um ideal de igualdade, que oculta versões e interpretações da diferença fundadas numa unidade imaginária. Numa análise da sociedade americana, Semprini afirma que, desde a Declaração da Independência dos Estados Unidos, as elites políticas e culturais do país provinham da tradição puritana e anglo-saxônica, condicionando o ulterior desenvolvimento americano. Assim, acrescenta que “a alma do país permaneceu branca, anglo-saxônica e protestante (WASP)” (SEMPRINI, p. 24), deflagrando a concepção do modelo de cidadão americano como o homem, branco-anglo-saxão e protestante, excluindo-se, como tal, qualquer indivíduo que não reunisse essas qualidades.3. O Multiculturalismo e a Síndrome Benetton - O Multiculturalismo e a Síndrome Benetton refere-se à mercantilização da cultura. O mundo como um bazar faz temer a babelização da cultura, mas assinala simultaneamente a capacidade da reinterpretação contextualizada dos produtores e receptores das mensagens e dos bens. O mundo tem-se convertido numa aldeia global, caracterizando-se como um mosaico de sabores, sons e cheiros, que mostra que o Multiculturalismo não necessariamente significa pluralismo cultural, mas, às vezes, reduz a cultura a uma única adaptada às exigências locais. Elbaz (2002, p. 31) afirma que a generalização desse Multiculturalismo nas grandes cidades pode dificultar ainda mais a convivência de populações heterogêneas devido à falta de um referencial comum que as permita viver juntas. Após a análise dos três modelos, Elbaz (2002, p. 32) resume o Multiculturalismo a duas proposições: − apesar das nossas diferenças, todos somos humanos, afirmação derivada da concepção pauliana fundadora do universalismo cristão, que reconhece a alteridade como parte interna da humanidade; − é graças às nossas diferenças que podemos aceder à humanidade, proposição decorrente da “lectura herderiana del mundo, que presume que todo conjunto humano tiene um Geist, una singularidad que tiene derecho a preservarse y a transmitirse” (ELBAZ, 2002, p. 33).4. A contribuição de Will Kymlicka na defesa das minorias culturais - Além das controvérsias na doutrina a respeito da própria definição de minorias, pouco tem sido feito para estabelecer um elenco especial de direitos visando garantir o pleno exercício da cidadania e a inclusão na sociedade dos grupos minoritários.Nesse sentido, a contribuição de Kymlicka (1996) tem sido notável. O autor canadense distingue, inicialmente, dois modelos de Estados multiculturais (KYMLICKA, 1996, p. 14): a) o Estado multiétnico: correspondente ao Estado onde convivem várias nações devido a um processo de imigração como, por exemplo, os Estados Unidos, Canadá e Austrália. Não obstante os imigrantes não ocuparem terras natais, podem ser considerados grupos minoritários, com a condição de que se estabeleçam conjuntamente e obtenham competências de autogoverno. O grande desafio dos estados chamados multiétnicos é garantir que os imigrantes possam ter acesso aos direitos de participação política, visto que o maior problema existente em muitos estados é que o exercício da cidadania depende da nacionalidade. As formas

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tradicionais de aquisição da nacionalidade são duas: a) nascer no território do Estado (ius soli); b) ser descendente de um nacional (ius sanguinis). O primeiro critério é basicamente utilizado pelos Estados de imigração (como os Estados do continente americano), enquanto que o segundo critério é utilizado pelos Estados de emigração (estados europeus na sua maioria). De qualquer forma, esses critérios são hoje inadequados levando-se em consideração o alto grau de mobilidade das pessoas no mundo globalizado. Assim, os estados europeus não são mais estados exclusivamente de emigração, pois muitos deles apresentam um significativo número de imigrantes, enquanto que os estados americanos apresentam uma expressiva população que emigra a outros estados em busca de novas oportunidades de vida. A impossibilidade do acesso à condição de nacional desses imigrantes é extremamente grave na medida em que esse fato provoca sua exclusão do exercício da cidadania, o que, pela sua vez, decorre da limitação e, até negação, de muitos direitos fundamentais. (GELBAZ; HELLY, 2002). b) o Estado multinacional: no qual coexistem mais de uma nação devido a um processo de convivência involuntária (invasão, conquista ou cessão) ou voluntária (formação de uma federação) de diferentes povos. As minorias desse tipo de estado são basicamente nações que existiam originariamente no território do estado, passando a conviver com outras nações que chegaram posteriormente, como é o caso dos aborígines canadenses, dos índios americanos ou dos indígenas brasileiros. Durante muito tempo, os estados americanos, e outros tradicionalmente considerados estados de imigração como a Austrália ou o Brasil, ignoraram os direitos das suas nações originárias, fundados na errônea e lamentável concepção de que essas nações “não tinham cultura” ou “eram de cultura inferior”, em relação à cultura ocidental. Kymlicka dirige sua atenção, precisamente, a esses grupos minoritários, às nações originárias, consoante com a definição tradicional de minoria da ONU, que apenas reconhece os grupos com especiais características étnicas, lingüísticas ou religiosas como minorias. Dessa maneira, Kymlicka dedica sua Teoria do Multiculturalismo a analisar as culturas minoritárias entendidas essas apenas como nações ou povos. Não obstante o autor canadense afirme não desconhecer a existência ou a importância de outros grupos minoritários, como as mulheres, homossexuais, idosos, etc. Limitação que não prejudica a importância da repercussão das suas propostas na defesa das minorias em geral. Desse modo, Kymlicka (1996) propõe o reconhecimento dos seguintes três tipos de direitos especialmente destinados a garantir a proteção das minorias e sua inclusão na sociedade: a) Direitos de autogoverno: a maioria das nações minoritárias tem recorrentemente reivindicado o direito a alguma forma de autonomia política ou de jurisdição territorial. Direito esse que está previsto na Carta das Nações Unidas de 1945, no artigo 1o, no qual se estabelece o direito de autodeterminação dos povos. O grande problema tem sido a delimitação do significado do termo “povos”, visto que tradicionalmente esse direito não tem sido aplicado às minorias nacionais internas (as minorias originárias, como os indígenas), mas apenas às colônias de ultramar (“tese da água salgada”). Essa limitação mencionada por Kymlicka tem provocado a negação de qualquer direito

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de autogoverno às nações originárias dos estados multinacionais; b) Direitos especiais de representação: direitos que visam garantir a participação das minorias no processo político, por meio de, por exemplo, ações afirmativas; c) Direitos poliétnicos: dirigidos a fomentar a integração das minorias na sociedade. sses direitos se concretizam, por exemplo, na exigência de subvenção pública para as práticas culturais das comunidades ou para ter acesso em condições de igualdade ao intercâmbio de bens e serviços. Desses três grupos de direitos, impõe-se ressaltar, para fins deste artigo, o terceiro grupo, ou seja, os direitos poliétnicos que objetivam a proteção das diferentes manifestações culturais das minorias, acorde com um modelo de Estado Democrático de Direito, no qual todos os seres humanos devem ter seus direitos fundamentais garantidos, excluindo-se qualquer forma de discriminação.

Multiculturalismo, políticas de ação afirmativa e construção da democraciaConsideramos estas questões fundamentais para o desenvolvimento de processos de democratização na nossa sociedade. Em geral, temos uma visão muito formal da democracia, onde a cidadania quase se manifesta exclusivamente através do exercício dos direitos políticos, da cidadania formal. Evidentemente estes são elementos fundamentais mas, hoje em dia, temos que ampliar o sentido da cidadania e incorporar a reflexão sobre a cidadania cultural, uma cidadania que desnaturalize o “mito da democracia racial”, ainda tão presente no nosso imaginário coletivo, reconhece as diferentes tradições culturais presentes numa determinada sociedade, é capaz de valorizá-las e fazer com que estas diferentes tradições tenham espaços de manifestação e representação na sociedade como um todo. Nesse sentido, é fundamental para uma democracia plena o reconhecimento da cidadania cultural . Chauí (1999:14-15) afirma que cidadania cultural significa, “antes de tudo, que a cultura deve ser pensada como um direito do cidadão – isto é, algo de que as classes populares não podem ser nem se sentir excluídas (como acontece na identificação popular entre cultura e instrução) e que a cultura não se reduz às belas-artes - como julga a classe dominante. (....) A Cidadania Cultural define o direito à cultura como: - direito de produzir ações culturais, isto é, de criar, ampliar, transformar símbolos, sem reduzir-se à criação nas belas artes; - direito de fruir os bens culturais, isto é, recusa da exclusão social e política; - direito à informação e à comunicação, pois a marca de uma sociedade democrática é que os cidadãos não só tenham o direito de receber todas as informações e de comunicar-se, mas têm principalmente o direito de produzir informações e comunicá-las. Portanto, a cidadania cultural põe em questão o monopólio da informação e da comunicação pelos mass media e o monopólio da produção e fruição das artes pela classe dominante; - direito à diferença, isto é, a exprimir a cultura de formas diferenciadas e sem uma hierarquia entre essas formas”.

Obs. Não encontrei no STF julgado com referência às expressões “multiculturalismo” ou “interculturalidade”.

Interculturalidade:

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Multiculturalismo e perspectiva intercultural

O multiculturalismo é um dado da realidade. A sociedade é multicultural.Pode haver várias maneiras de se lidar com esse dado, uma das quais é a interculturalidade. Esta acentua a relação entre os diferentes grupos sociais e culturais. Na nossa sociedade os fenômenos de apartheid social e também de apartheid cultural, em forte interrelação, se vêm multiplicando. Neste contexto, a perspectiva intercultural se contrapõe à guetificação e quer botar a ênfase nas relações entre diferentes grupos sociais e culturais. Quer estabelecer pontes. Não quer fechar as identidades culturais na afirmação das suas especificidades. Promove a interação entre pessoas e grupos pertencentes a diferentes universos culturais. A perspectiva intercultural não é ingênua. É consciente de que nessas relações existem não só diferenças, como também desigualdades, conflitos, assimetrias de poder. No entanto, parte do pressuposto de que, para se construir uma sociedade pluralista e democrática, o diálogo com o outro, os confrontos entre os diferentes grupos sociais e culturais são fundamentais e nos enriquecem a todos, pessoal e coletivamente, na nossa humanidade, nas nossas identidades, nas nossas maneiras de ver o mundo, a nossa sociedade e a vida em sua totalidade. Esta é uma questão difícil. Em geral temos muita dificuldade de lidar com as diferenças. A sociedade está informada por visão cultural hegemônica de caráter monocultural. Especialmente a educação está muito marcada por esse caráter monocultural. O “outro” nos ameaça, confronta e nos situamos em relação a ele de modo hierarquizado, como superiores ou inferiores. Muitas vezes não respeitamos “outro”, ele é negado, destruído, eliminado, algumas vezes fisicamente e outras no imaginário coletivo, no âmbito simbólico. A interculturalidade aposta na relação entre grupos sociais e étnicos. Não elude os conflitos. Enfrenta a conflitividade inerente a essas relações. Favorece os processos de negociação cultural, a construção de identidades de “fronteira”, “híbridas”, plurais e dinâmicas, nas diferentes dimensões da dinâmica social. A perspectiva intercultural quer promover uma educação para o reconhecimento do “outro”, para o diálogo entre os diferentes grupos sociais e culturais. Uma educação para a negociação cultural. Uma educação capaz de favorecer a construção de um projeto comum, onde as diferenças sejam dialeticamente integradas e sejam parte desse patrimônio comum. A perspectiva intercultural está orientada à construção de uma sociedade democrática, plural, humana, que articule políticas de igualdade com políticas de identidade. Direitos Humanos e multiculturalismo nos colocam no horizonte da afirmação da dignidade humana num mundo que parece não ter mais esta convicção como referência radical. Neste sentido, trata-se de afirmar uma perspectiva alternativa e contra-hegemônica de construção social e política.

Direito à diferença e ao reconhecimento:OBS. Mendes e Gonet Branco – p. 178 em diante: embora a expressão pluralismo venha adjetivada com “político”, trata-se de princípio com abrangência muito maior, SIGNIFICANDO PLURALISMO DA PÓLIS, OU SEJA, UM DIREITO FUNDAMENTAL À

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DIFERENÇA EM TODOS OS ÂMBITOS E EXPRESSÕES DA CONVIVÊNCIA HUMANA, tanto nas escolhas de natureza política quanto nas de caráter religioso, econômico, social e cultural. A ESSÊNCIA É: NÃO SÓ, MAS TAMBÉM. CORRELATA À IDÉIA DE PLURALISMO ESTÁ TAMBÉM A DE TOLERÂNCIA. – reconhece-se o direito ao erro, ou seja, o direito de todo indivíduo de acreditar no que bem entender e de levar a vida como lhe convier, com a só condição de que as escolhas pessoais não causem prejuízo a outrem, nem impeçam o exercício de igual direito pelos demais integrantes do grupo.

Acerca do tema Débora Duprat afirma: 1 - a visão do Estado-nação orientado por uma lógica unitária e legiscentrista foi atingida pela obsolescência, ao ser confrontada com os problemas gerados por uma nova noção de nação, cuja unidade pressuposta na verdade ocultava o fenômeno da pluralidade do corpo social, e mesmo com a noção de soberania, traduzida na capacidade de ordenação autárquica dos fatos sociais sob seu domínio territorial, à vista principalmente do capital transnacional, que engendrou uma legalidade supraestatal e retirou do Estado a possibilidade de previsão e controle de aspectos relevantes da vida social.2 - assim, o que o direito recobra, e a Constituição brasileira, a exemplo dos demais campos do saber, revela, é o espaço ontológico do outro, do diferente, antes destituído de qualquer conteúdo porque subsumido ao universal. 3 - a Constituição de 1988 o fez de forma absolutamente explícita. Primeiro, impondo ao Estado o dever de garantir “a todos o pleno exercício dos direitos culturais”, apoiando e incentivando “a valorização e a difusão das manifestações culturais [...] populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional” (art. 215, caput e §1o), que se traduzem em suas “formas de expressão e em seus modos de criar, fazer e viver” (art. 216, I e II). Tratou exaustivamente e em caráter pragmático do território cultural necessário ao exercício desses direitos pelas populações indígenas, emprestando-lhe significado especial, divorciado da pauta patrimonial, porquanto espaço essencial à existência de uma coletividade singular (art. 231, caput e §1º). Por essa razão, o texto constitucional assegura a inviolabilidade desse território de forma quase absoluta, admitindo alguma relativização apenas na hipótese de “relevante interesse público da União”, a ser definido em lei complementar (art. 231, §6º), exigindo-se autorização do Congresso Nacional e aquiescência da comunidade afetada (art. 231, §3º).4 - é importante assinalar que, ao assumir o caráter pluriétnico da nação brasileira, que não se esgota nas diferentes etnias indígenas, como evidencia o parágrafo 1º do art. 215, a Constituição de 1988 tornou impositiva a aplicação analógica do tratamento dado à questão indígena e aos demais grupos étnicos. Assim, diante desse novo padrão de respeito à heterogeneidade da regulamentação ritual da vida, impõe-se a exata compreensão das pautas de conduta que agora orientam os diversos atores sociais, em particular os agentes públicos e políticos. 5 - em princípio, a inserção do Estado na vida desses grupos deve respeitar primeiramente o fato de que “grupos étnicos são categorias atributivas e

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identificadoras empregadas pelos próprios atores” (Barth 2000:27), razão de a Constituição lhes assegurar auto-representação (art. 216, I), uma vez que formas de expressão são conjuntos de signos por meios dos quais se revela a representação da realidade (Foulcaut 1966: 89). Assim, requer-se que a coletividade possa se reconhecer em suas formas de expressão, sob pena de lhes negar realidade, o que implica dizer que a representação da realidade partilhada envolve necessariamente a representação de si própria, ou seja, a autocompreensão do grupo. Dessa forma, interdita-se ao legislador, ao administrador, ao juiz e a qualquer outro ator estranho ao grupo dizer o que este é de fato.5 - corolário do mesmo preceito constitucional é o banimento definitivo das categorias, positivadas no ordenamento jurídico pretérito no trato da questão indígena, de aculturados ou civilizados, seja porque a noção de cultura como totalidade, como perfeita coerência de crenças unívoca e homogeneamente partilhadas, é ultrapassada, seja porque, nas relações interétnicas, as situações de contato não significam o abandono dos códigos e valores que orientam cada grupo, verificando-se antes a possibilidade de articulação em alguns setores ou domínios específicos de atividades, mantidas as proscrições de interações tendentes a proteger partes de sua cultura da confrontação e da modificação (Barth 2000:35).6 - assim, a atuação do Estado em relação a esses grupos, de modo a garantir seu direito à identidade, pressupõe a compreensão de suas formas de ver e conhecer o mundo. Sendo uma compreensão de sentido, todavia, a compreensão de uma outra cultura não se dá mediante a atitude objetivamente adotada pelo observador diante de estados e sucessos fisicamente mensuráveis, requerendo-se, ao contrário, a participação em um processo de entendimento.

Flávia Piovesan (p. 56) preconiza que: ao longo da história as mais graves violações aos direitos humanos tiveram como fundamento a dicotomia do “eu vs. o outro”, em que a diversidade era captada como elemento para aniquilar direitos. Vale dizer, a diferença era visibilizada para conceber o “outro” como um ser menor em dignidade e direitos, ou, em situações limites, um ser esvaziado mesmo de qualquer dignidade, um ser descartável, um ser supérfluo, objeto de compra e venda (como na escravidão) ou de campos de extermínio (como no nazismo). Nesta direção, merecem destaque as violações da escravidão, do nazismo, do sexismo, do racismo, da homofobia, da xenofobia e de outras práticas de intolerância. Como leciona Amartya Sem, “identidade pode ser uma fonte de riqueza e de acolhimento, como também de violência e terror”. O autor ainda tece aguda crítica ao que denomina como séria “miniaturização dos seres humanos” (“miniaturization of human beings”), quando é negado o reconhecimento da pluralidade de identidades humanas, na medida em que as pessoas são “diversamente diferentes”.Continua Piovesan (p. 57): torna-se, contudo, insuficiente tratar o indivíduo de forma genérica, geral e abstrata. Faz-se necessária a especificação do sujeito de direito, que passa a ser visto em sua peculiaridade e particularidade. Nessa ótica, determinados sujeitos de direitos, ou determinadas violações de direitos, exigem uma resposta

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específica e diferenciada. Em tal cenário as mulheres, as crianças, a população afrodescendente, os migrantes, as pessoas com deficiência, entre outras categorias vulneráveis, devem ser vistas nas especificidades e peculiaridades de sua condição social. Ao lado do direito à igualdade, surge, também como direito fundamental, o direito à diferença. Importa o respeito à diferença e à diversidade, o que lhes assegura tratamento especial.

Assim, segundo Piovesan, são fases do princípio da igualdade:1a fase: igualdade formal;2a fase: igualdade material;3a fase: igualdade como reconhecimento. (fala do reconhecimento de identidades – igualdade orientada por critérios como gênero, orientação sexual, idade, raça e etnia).

O DIREITO À DIFERENÇA PRESSUPÕE O DIREITO A SER IGUAL QUANDO A DESIGUALDADE NOS INFERIORIZA E O DIREITO A SER DIFERENTE QUANDO A IGUALDADE NOS DESCARACTERIZA.O princípio da igualdade impõe que todas as pessoas devem ser tratadas pelo Estado com o mesmo respeito e consideração (Dworkin). E tratar a todos com o mesmo respeito e consideração significa reconhecer que todas as pessoas possuem o mesmo direito de formular e de perseguir autonomamente os seus planos de vida, e de buscar a própria realização existencial, desde que isso não implique a violação de direitos de terceiros.Articular igualdade e diferença : uma exigência do momento

Esta é uma questão fundamental no momento atual. Para alguns a construção da democracia tem que colocar a ênfase nas questões relativas á igualdade e, portanto, eliminar ou relativizar as diferenças. Existem também posições que defendem um multiculturalismo radical, com tal ênfase na diferença, que a igualdade fica em um segundo plano. No entanto, na minha opinião, o problema não é afirmar um polo e negar o outro, mas sim termos uma visão dialética da relação entre igualdade e diferença. Hoje em dia não se pode falar em igualdade sem incluir a questão da diversidade, nem se pode abordar a questão da diferença dissociada da afirmação da igualdade. Uma frase do sociólogo português Boaventura Souza Santos, sintetiza de maneira especialmente oportuna esta tensão: "temos direito a reivindicar a igualdade sempre que a diferença nos inferioriza e temos direito de reivindicar a diferença sempre que a igualdade nos descaracteriza." Neste sentido, não se deve opor igualdade à diferença. De fato, a igualdade não está oposta à diferença e sim à desigualdade Diferença não se opõe à igualdade e sim à padronização, à produção em série, a tudo o “ mesmo”, à “mesmice”. O que estamos querendo trabalhar é, ao mesmo tempo, negar a padronização e lutar contra todas as formas de desigualdade presentes na nossa sociedade. Nem padronização nem desigualdade. E sim, lutar pela igualdade e pelo reconhecimento das diferenças. A igualdade que queremos construir assume a promoção dos direitos básicos de todas as pessoas. No entanto, esses todos não são

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padronizados, não são os “mesmos”. Têm que ter as suas diferenças reconhecidas como elemento de construção da igualdade. Considero que essa temática nos próximos anos vai suscitar uma grande discussão, um debate difícil, que desperta muitas paixões, mas que é fundamental para se avançar na afirmação da democracia. Hoje em dia não se pode mais pensar numa igualdade que não incorpore o tema do reconhecimento das diferenças, o que supõe lutar contra todas as formas de preconceito e discriminação.Cabe salientar, como já afirmado, que o direito fundamental à diferença encontra base constitucional notadamente nos fundamentos da república – dignidade da pessoa humana e no pluralismo político – José Afonso da Silva – p. 37-40.

Exemplos atuais:UNIÃO ESTÁVEL DE PESSOAS DO MESMO SEXODireito ao reconhecimento. Dignidade da pessoa humana: quando se quer proteger e emancipar os grupos que são vítimas de preconceito, torna-se necessário travar o combate em dois fronts: no campo da distribuição e no campo do reconhecimento. No campo da distribuição, trata-se de corrigir as desigualdades decorrentes de uma partilha não equitativa dos recursos existentes na sociedade. E no campo do reconhecimento, cuida-se de lutar contra injustiças culturais, que rebaixam e estigmatizam os integrantes de determinados grupos.Como a homossexualidade está distribuída homogeneamente por todas as classes sociais, a injustiça contra os homossexuais deriva muito mais da falta de reconhecimento do que de problemas de distribuição. A distribuição até pode ser afetada, como quando, por exemplo, discrimina-se o homossexual no acesso ao mercado de trabalho, mas os problemas de distribuição são, em regra, uma consequência da falta de reconhecimento, e não o contrário.COTASDireito antidiscriminação: perspectiva antidiferenciação (combater discriminação, com tratamento neutro – sem ações afirmativas) e perspectiva antisubordinação (combater a discriminação com atuação efetiva a superá-la, com ações afirmativas). Esta é mais harmônica com o sistema de valores em que se assenta a Constituição brasileira, bem como a mais consentânea com a realidade de um país fortemente marcado pela desigualdade, em todas as suas dimensões.

ITEM B: Súmula vinculante. Legitimidade e críticas. Mecanismos de distinção.

Referência:1 - Gilmar Mendes e Paulo Gustavao Gonet Branco – Curso de Direito Constitucional – 2012. Saraiva.2 - Uadi Lammêgo Bulos – Curso de Direito Constitucional – 2009 – Saraiva.3 - Resumo dos pontos – 25 concurso.

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4 - Comentário Contextual à Constituição – José Afonso da Silva – 2009 – Saraiva.5 – Direito Constitucional – Teoria do Estado e da Constituição – Direito Constitucional Positivo – Kildare Gonçalves Carvalho – 2009 – Del Rey.

Common law: tradição da vinculação dos precedentes. No direito brasileiro, isso não era uma tradição. Importou-se aqui o modelo norte-americano de controle de constitucionalidade (difuso e incidental), mas não houve incorporação do stare decisis, pois a decisão do STF no controle difuso não vinculava as demais instâncias. Isso gerou uma disfunção séria.CR/34: tentou resolver isso ao introduzir o dispositivo que hoje está no art. 52, X, da CF/88: possibilidade de o Senado Federal suspender o dispositivo declarado inconstitucional pelo STF. A ideia era dar efeito erga omnes às decisões do STF em controle difuso. Mas essa solução não vingou, porque o Senado nuncaexerceu pra valer essa competência. Com a previsão do controle abstrato, criou-se a possibilidade de o próprio STF conferir efeitos erga omnes à sua decisão (representação de inconstitucionalidade, na EC 16/65). A EC 3/93, que criou a ADC, trouxe o efeito vinculante para esta ação (só com a Lei 9968 houve extensão para a ADI e para a ADPF). Mas o controle difuso continuava do mesmo jeito. Por isso surge a súmula vinculante.Súmulas não vinculantes: Gilmar Mendes observa que a súmula não vinculante já possui um perfil indiretamente obrigatório, uma vez que, por conta dos recursos, constitui instrumento de autodiscilpina do STF, que somente deverá afastar-se da orientação nela preconizada de forma expressa e fundamentada.

Requisitos:I – Quórum de 2/3 dos membros do STF;II – Reiteradas decisões sobre matéria constitucional;A súmula vinculante só deve ser editada quando o debate estiver maduro.III – A não pacificação da controvérsia deve gerar prejuízo à segurança jurídica.

Legitimidade para propor a criação: os da ADI mais o Defensor Público Geral da União e os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares. - Bulos - MAS, ASSIM COMO NAS ADINS, DEVE HAVER PERTINÊNCIA TEMÁTICA - p. 1085.O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo. (Lei nº 11.417/2006).O MUNICÍPIO É LEGITIMADO INCIDENTAL. Todos os demais acima SÃO LEGITIMADOS AUTÔNOMOS – SEM NECESSIDADE DE SE TER UM PROCESSO EM ANDAMENTO (LENZA);Processo administrativo: Se o recorrente alegar que a decisão administrativa contraria enunciado da súmula vinculante, caberá à autoridade prolatora da decisão impugnada,

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se não a reconsiderar, explicitar, antes de encaminhar o recurso à autoridade superior, as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso.Legitimidade:I – Ajuda a combater a morosidade da justiça (celeridade);II – Impede a divergência jurisprudencial (uniformização) – impede a insegurança jurídica e disparidade de entendimentoIII - Uma das grandes inovações da implantação da súmula vinculante, foi a possibilidade de os legitimados requererem também o cancelamento ou a revisão da súmula, o que combateu muitos dos críticos da súmula, que diziam que haveria uma cristalização do direito constitucional; a própria amplitude da legitimação foi salutar.

Críticas:I – Ataca a independência dos juízes;II – Engessamento da jurisprudência;O efeito vinculante seria incompatível com o princípio da livre convicção do juiz e do juiz natural, tornando as demais instâncias judiciais meras carimbadoras da decisão do Supremo. Para resolver isso, háde se utilizar o overruling e o distinguishing.Overruling: ideia de superação do precedente. Só o STF pode fazê-lo.Distinguishing: a partir das especificidades de um caso concreto, há uma decisão diferente. Não se trata de negativa do precedente, e sim negativa de sua aplicabilidade no caso concreto. Realiza-se, no caso concreto, uma distinção do caso. Qualquer juiz pode fazê-lo. É uma distinção na qual o precedente é afastado em razão de uma circunstância fundamental que o diferencia do caso anterior. Isso não significa que o precedente está sendo abandonado, mas, no caso específico, devido a uma circunstância fundamental que o diferencia, ele será afastado.

Aspectos destacados da Súmula Vinculante na Constituição e na Lei 11.417/2006:

1- derivado do stare decisis - “mantenha-se a decisão e não se perturbe o que foi decidido - stare decisis et quieta non movere”;2 - competência exclusiva do STF;3 – surge no controle difuso;4 - O EFEITO VINCULANTE NÃO ATINGE OBVIAMENTE O PODER LEGISLATIVO NEM O PRÓPRIO STF – SOB PENA DE FOSSILIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. (STF – Rcl 2617 – informativo 377).

5 – não se confunde com a súmula da jurisprudência dominante do STF – acerca disso, salienta Uadi Lâmmego Bulos as diferenças entre ambas:

SÚMULA TRADICIONAL SÚMULA VINCULANTE

Não vincula os órgãos do Judiciário, nem do Vinculam os órgãos do Judiciário e

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Executivo; da Administração Pública, direta e indireta de todas as esferas;

Funcionam como precedentes judiciais, que podem ou não ser adotados;

Padroniza a exegese de uma norma jurídica;

Eficácia entre as partes - quando acatada; Eficácia irrestrita - erga omnes;

- OBS. BULOS - MAS A EC 45/2004, NO SEU ART. 8º, POSSIBILITOU AS SÚMULAS TRADICIONAIS PRODUZIREM EFEITOS VINCULANTES - súmulas anteriores precisam da aprovação de 2/3 dos ministros do STF;- STF - "Súmulas vinculantes. Natureza constitucional específica (art. 103-A, § 3º, da CF) que as distingue das demais súmulas da Corte (art. 8º da EC 45/04). Súmulas 634 e 635 do STF. Natureza simplesmente processual, não constitucional. Ausência de vinculação ou subordinação por parte do Superior Tribunal de Justiça." (Rcl 3.979-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 02/06/06)

6 – Objetivo das súmulas vinculantes- A súmula TERÁ POR OBJETIVO A VALIDADE, A INTERPRETAÇÃO E A EFICÁCIA DE NORMAS DETERMINADAS, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários OU ENTRE ESSES E A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUE ACARRETE GRAVE INSEGURANÇA JURÍDICA E RELEVANTE MULTIPLICAÇÃO DE PROCESSOS SOBRE QUESTÃO IDÊNTICA.

7 – Lenza destaca que em se tratando de omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas. Mas não se veda o uso direto de outros meios jurídicos como ação ordinária, o mandado de segurança etc. o que não pode é a reclamação direta, sem recurso até mesmo perante a Administração.

8 – Lei 9784/99 - ATENÇÃO - LEI DO PROCESSO ADMINISTRATIVO - QUE TAMBÉM FOI ALTERADA PELA REGULAMENTAÇÃO DA SÚMULA: Art. 64-A. Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).Art. 64-B. Acolhida pelo Supremo Tribunal Federal a reclamação fundada em violação de enunciado da súmula vinculante, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento do recurso, que deverão adequar as futuras decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).- DIFERENTEMENTE A LEI NÃO FIXOU RESPONSABILIDADE DOS MAGISTRADOS.

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9 - No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

10 – há possibilidade de modulação dos efeitos da súmula vinculante – art. 103, §4º, da CF/88.11 - A proposta de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante não autoriza a suspensão dos processos em que se discuta a mesma questão.12 - Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação.13 - Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas.14 - Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.15 - Deve ser seguido o princípio da adequabilidade das súmulas ao fato - como condição indispensável à incidência do efeito vinculante - Bulos - p. 1097.

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ITEM C: Ação direta de inconstitucionalidade: origem, evolução e estado atual. Efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

Referência:1 - Gilmar Mendes e Paulo Gustavao Gonet Branco – Curso de Direito Constitucional – 2012. Saraiva.2 - Uadi Lammêgo Bulos – Curso de Direito Constitucional – 2009 – Saraiva.3 - Resumo dos pontos – 25 concurso.4 - Comentário Contextual à Constituição – José Afonso da Silva – 2009 – Saraiva.5 – Direito Constitucional – Teoria do Estado e da Constituição – Direito Constitucional Positivo – Kildare Gonçalves Carvalho – 2009 – Del Rey.

A origem e evolução da ação direta de inconstitucionalidade confunde-se com a própria origem e evolução do controle de constitucionalidade no Brasil.A origem e evolução do controle de constitucionalidade já foi objeto de questão dissertativa na prova do MPF.Com base no Curso de Direito constitucional de Gilmar Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco segue rápida síntese da origem e evolução do controle de constitucionalidade (p. 1131 e ss.):

CONSTITUIÇÃO DE 1824: não contemplava qualquer sistema assemelhado aos modelos hodiernos de controle de constitucionalidade. A influência francesa ensejou que se outorgasse ao Poder Legislativo a atribuição de “fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las”, bem como “velar na guarda da Constituição” (art. 15, nº 8º e 9º). (aplicava-se a tese do Legiocentrismo). Igualmente, impediu a existência de um controle de constitucionalidade o Poder Moderador.

CONSTITUIÇÃO DE 1891: consolidação do modelo difuso por influência norte-americana – especialmente por causa de Rui Barbosa. O controle era por via de exceção ou incidental.

CONSTITUIÇÃO DE 1934: A Constituição de 1934 manteve o controle de constitucionalidade DIFUSO, mas trouxe três inovações: a) a REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE INTERVENTIVA; b) a regra da RESERVA DE PLENÁRIO

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(quorum especial) para decretação da inconstitucionalidade pelos Tribunais; c) a competência do SENADO para SUSPENDER a EXECUÇÃO de lei declarada inconstitucional definitivamente pelo Supremo Tribunal Federal.- obs. KILDARE – TAMBÉM O MS PODERIA CONSTRASTAR ATO INCONSTITUCIONAL – ART. 113 – p. 396.

CONSTITUIÇÃO DE 1937: A Constituição de 1937, autoritária e centralista, traduziu retrocesso no sistema de controle de constitucionalidade. Embora não tivesse modificado o CONTROLE DIFUSO, permitiu que, em sendo declarada a inconstitucionalidade de lei que, a juízo do Presidente da República, fosse necessária ao bem-estar do povo ou ao interesse nacional, tal lei poderia ser novamente submetida ao Parlamento. Se este a confirmasse por dois terços dos membros de ambas as Casas, tornar-se-ia insubsistente a decisão do Tribunal. Por outro lado, cumpre notar que a Carta de 1937 vedou, expressamente, ao Judiciário conhecer das questões exclusivamente políticas (art. 94), e o mandado de segurança perdeu a qualidade de garantia constitucional, passando a ser disciplinado pela legislação ordinária. E o CPC, de 1939, excluiu da apreciação judicial, na via mandamental, os atos do Presidente da República, dos ministros de Estado, dos governadores e interventores dos Estados (art. 319).

CONSTITUIÇÃO DE 1946: A Constituição Democrática de 1946 a) restaurou o sistema de 1934 e, via EC nº 16/65, trouxe grandes inovações: b) instituiu o controle ABSTRATO, por meio da AÇÃO (ou representação) DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, contra lei em tese (estadual ou federal), conferindo unicamente ao PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA a legitimidade ativa, estendendo a competência ao STF; c) estabeleceu o CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE pelos Tribunais de Justiça, competentes para julgar inconstitucionalidade de LEI MUNICIPAL perante a Constituição do ESTADO (pela EC 16/65); d) ainda, disciplinou a apreciação de recursos extraordinários por fundamento constitucional.

- Gilmar Mendes acerca da EC 16/45 - A Emenda n. 16, de 1965 , e o controle de constitu cionalidad e abstrato - A Emenda n. 16, de 26 de novembro de 1965, instituiu, ao lado da representação interventiva, e nos mesmos moldes, o controle abstrato de normas estaduais e federais. A reforma realizada, fruto dos estudos desenvolvidos na Comissão composta por Orozimbo Nonato, Prado Kelly (Relator), Dario de Almeida Magalhães, Frederico Marques e Colombo de Souza, visava a imprimir novos rumos à estrutura do Poder Judiciário. Parte das mudanças recomendadas já havia sido introduzida pelo Ato Institucional n. 2, de 27 de outubro de 1965. A Exposição de Motivos encaminhada pelo Ministro da Justiça, Dr. Juracy Magalhães, ao Presidente da República ressaltava que “a atenção dos reformadores tem-se detido enfaticamente na sobrecarga imposta ao Supremo Tribunal e ao Tribunal de Recursos”. Não obstante, o próprio Supremo Tribunal Federal houve por bem sugerir a adoção de dois novos institutos de legitimidade constitucional, tal como descrito na referida Exposição de

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Motivos: “a) uma representação de inconstitucionalidade de lei federal, em tese, de exclusiva iniciativa do Procurador-Geral da República, à semelhança do que existe para o direito estadual (art. 8º, parágrafo único, da Constituição Federal); b) uma prejudicial de inconstitucionalidade, a ser suscitada, exclusivamente, pelo próprio Supremo Tribunal Federal ou pelo Procurador-Geral da República, em qualquer processo em curso perante outro juízo”. “A representação, limitada em sua iniciativa, tem o mérito de facultar desde a definição da ‘controvérsia constitucional sobre leis novas, com economia para as partes, formando precedente que orientará o julgamento dos processos congêneres’. Afeiçoa-se, no rito, às representações de que cuida o citado preceito constitucional para forçar o cumprimento, pelos Estados, dos princípios que integram a lista do inciso VII do art. 7º. De algum modo, a inovação, estendendo a vigilância às ‘leis federais em tese’, completa o sistema de pronto resguardo da lei básica, se ameaçada em seus mandamentos. Já a prejudicial agora proposta, modalidade de avocatória, utilizável em qualquer causa, de qualquer instância, importaria em substituir aos juízos das mais diversas categorias a faculdade, que lhes pertence, no grau da sua jurisdição, de apreciar a conformidade de lei ou de ato com as cláusulas constitucionais. Ao ver da Comissão, avocatória só se explicaria para corrigir omissões de outros órgãos judiciários, se vigorasse entre nós, como vigora por exemplo na Itália, o privilégio de interpretação constitucional por uma Corte especializada, a ponto de se lhe remeter obrigatoriamente toda questão daquela natureza, levantada de ofício ou por uma das partes em qualquer processo, desde que o juiz ou tribunal não a repute manifestamente infundada. Ao direito italiano pedimos, todavia, uma formulação mais singela e mais eficiente do que a do art. 64 da nossa Constituição, para tornar explícito, a partir da declaração de ilegitimidade, o efeito erga omnes de decisões definitivas do Supremo Tribunal, poupando ao Senado o dever correlato de suspensão da lei ou do decreto — expediente consentâneo com as teorias de direito público em 1934, quando ingressou em nossa legislação, mas presentemente suplantada pela formulação contida no art. 136 do estatuto de 1948: ‘Quando la Corte dichiara l’illegittimità costituzionale di una norma di legge o di atto avente forza di legge, la norma cessa di avere efficacia dal giorno sucessivo alla publicazione della decisione’”. Nos termos do Projeto de Emenda à Constituição, o art. 101, I, k, passava a ter a seguinte redação: “ k) a representação de inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa, federal ou estadual, encaminhada pelo Procurador-Geral da República ”. ADOTAVA-SE O MODELO DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONCENTRADO SEM ELIMINAR O CONTROLE DIFUSO.

CONSTITUIÇÃO DE 1967/EC 01/1969: A Constituição de 1967 não modificou sensivelmente o sistema então existente. Apenas: a) ampliou a REPRESENTAÇÃO INTERVENTIVA, para também ‘prover à execução de lei federal’. A EC nº 1/69 previu: b) o controle de constitucionalidade de lei municipal, em face da Constituição Estadual, para fins de INTERVENÇÃO ESTADUAL no MUNICÍPIO. A EC nº 7/77 introduziu: c) a representação de INTERPRETAÇÃO DE LEI/ATO NORMATIVO FEDERAL/ESTADUAL ao STF, único legitimado o Procurador-Geral da República, instituto descartado pela ordem seguinte. A mesma Emenda consagrou: d) a possibilidade de o STF deferir

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MEDIDA CAUTELAR em representação de inconstitucionalidade (com a EC 07/77). (Bulos - p. 123).

CONSTITUIÇÃO DE 1988A Constituição de 1988 representa importante marco na evolução do controle de constitucionalidade, por haver inovado em numerosos aspectos. Problema que já se detectava muito antes dela era a posição desconfortável que assumia o Procurador-Geral da República ao ter de propor, como único legitimado, representações de inconstitucionalidade das quais discordava, o que o levava, ao final, como ‘custos legis’, a opinar pela sua improcedência. Houve assim, a ruptura do chamado “monopólio da ação direta” outorgado ao Procurador-Geral da República.

Isto posto, a CF 88: a) ampliou o ROL DE LEGITIMADOS à propositura da ADIn (art. 103), dando imensa relevância ao controle abstrato e concentrado perante o STF (efeitos ‘erga omnes’); b) instituiu a possibilidade de AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (art. 103, §2º); c) manteve o sistema de controle difuso e por exceção (efeitos ‘inter partes’), com reserva de plenário nos tribunais e possibilidade de suspensão da lei impugnada, pelo Senado (efeitos ‘erga omnes’); d) manteve a previsão da MEDIDA CAUTELAR em ADIn (art. 102, I, ‘p’; e ) conferiu ao ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO ( não mais ao Procurador-Geral da República, face à cisão de suas atribuições ) o papel de defensor do ato normativo impugnado, deixando ao PGR a tarefa de ‘custos legis’;e) por força da ECnº 3/93, instituiu a AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE de lei/ato federal (efeitos vinculantes e ‘erga omnes’), de legitimidade igualmente plúrima ( art. 103, §4º), impondo natureza ambivalente ao controle concentrado de constitucionalidade; f) ainda pela ECnº3/93, estabeleceu a ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL perante o STF, que se destina a um controle amplo dos atos do Poder Público, embora subsidiário às demais formas, nos termos da Lei 9882. A ADPF ESTAVA PREVISTA DESDE O TEXTO ORIGINÁRIO DA CF/88 – NÃO FOI INTRODUZIDA PELA EC 03/93, QUE APENAS ALTEROU DE PARÁGRAFO ÚNICO PARA §1º.

OBS. BULOS - ao reforçar a anatomia do controle concentrado, o constituinte de 1988 acabou reduzindo, mas não eliminando, o controle difuso. Quer dizer, A COMPETÊNCIA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ORDINÁRIA (de titularidade dos juízes) FOI, DE CERTA FORMA, ATENUADA, MAS NÃO EXTINTA;

ASSIM:CF - 1891 – SURGE O CONTROLE DIFUSO OU POR VIA DE EXCEÇÃO;EC 16/65 – SURGE O CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE.

EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE

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A – Erga omnes – eficácia contra todosB – Ex tunc (princípio da nulidade) – salvo exceçõesAqui há também a situação do efeito repristinatório da decisão. Não se trata de repristinação, pois, diante da nulidade da lei inconstitucional, a L1 revogada sempre esteve em vigor, não tendo sido revogada em momento algum. Além disso, a repristinação pressupõe o surgimento de uma L3 que restaure a validade da lei L1.No campo dos efeitos, pode ocorrer a chamada modulação dos efeitos da decisão (art. 27 da Lei nº 9.868/99). Os Ministros podem, diante de um caso concreto em que haja razões de segurança jurídica ou que acarrete excepcional interesse social, modular os efeitos da decisão do Supremo, de forma a que ela tenha efeitos ex nunc. Esta técnica flexibiliza o princípio da nulidade, aproximando-o da teoria da anulabilidade. O quorum para decidir pelo efeito ex nunc é 2/3 dos Ministros (8). Exs: atos praticados por servidor que não era oficial de justiça. A lei que previa isso foi considerada inconstitucional. Como ficam os atos já praticados? O STF achou melhor não anulá-los, dando efeitos ex nunc à sua decisão. 2 – Aumento do subsídio de magistrados que o receberam de boa-fé. Lei declarada inconstitucional ex nunc.C – Efeito vinculanteEm relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública (102, §2º). O efeito vinculante surge com a EC nº 03/93, para a ADC. Até a EC45, não havia previsão constitucional de efeitovinculante para a ADI. A Lei nº 9.868/99 previu, no art. 28, parágrafo único, efeito vinculante para a decisão em sede de ADI. Questionou-se a constitucionalidade desse dispositivo (Questão de Ordem no Agravo Regimental da RCL nº 1880). O Supremo entendeu constitucional a Lei nº 9.868/99 e ressaltou a similitude substancial de objetos entre a ADC e a ADI.Vai além da parte dispositiva, abrangendo os fundamentos determinantes da decisão. Em geral, os autores entendem que o fundamento determinante é aquele que não pode ser modificado sem alteração da parte dispositiva. É a ratio decidendi – elemento básico da decisão. Distingue-se do obter dictum.A lógica que inspira o efeito vinculante é a de reforço da posição da corte constitucional. Assim, a corte formula uma regra geral (contida nos fundamentos determinantes) que não pode ser descumprida. Assim, fixa-se um modelo, cujo descumprimento enseja a reclamação.MEDIDA CAUTELARSuspende o ato impugnado, com efeito vinculante, podendo até restabelecer o direito anterior. Tem eficácia ex nunc, salvo disposição em sentido contrário. Em caso de rejeição de liminar, não há efeito vinculante, em regra.

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ITEM A: Atendimento do Ministério Público à comunidade. Estratégias de comunicação das ações do Ministério Público.

Obras consultadas:CNMP. Sugestões para uma política de comunicação do Ministério Público. Reunião de 30/03/2011. In: http://www.cnmp.gov.br/portal/images/stories/cpcom/Documentos/Comitedepoliticas/Reuniaomarco2011/sugestoes-de-uma-politica-de-comunicacao-para-o-ministerio-publico.pdf, acesso em 02/06/2012.DOTTI, Renê Ariel. A atuação do Ministério Público na proteção dos interesses difusos. In: Justitia, v. 47, n. 132, out./dez. 1985. pp. 9-38.MAZZILLI, Hugo Nigro. Acesso à justiça e o Ministério Público. In: Justitia, v. 51, n. 146, abr./jun. 1989. pp. 68-78.SILVA, Cátia Aída. Promotores de Justiça e novas formas de atuação em defesa de interesses sociais e coletivos. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais [online]. 2001, vol.16, n.45, pp. 127-144. http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v16n45/4334.pdf, acesso em 02/06/2012.Legislação básica:arts. 32, II e 43, XIII, Lei 8.625/93

1. Atendimento do Ministério Público à comunidade. Noções gerais.Entre as principais funções do membro do MP, com vocação constitucionalmente democrática, está o atendimento ao público, por meio do qual desempenha tarefa de ombudsman, tomando ciência direta das violações de direitos e abusos de poder. Além de concretizar o direito fundamental de petição do cidadão e constituir um importante canal de acesso à Justiça, o contato direto com a comunidade permite a colheita de elementos para promover as medidas extrajudiciais e/ou judiciais em defesa dos direitos constitucionais (MAZZILLI, 2007, 91-163).O atendimento ao público é uma das mais antigas atribuições do Ministério Público, por meio do qual seus membros orientam, informam, fazem encaminhamentos, recebem denúncias e reclamações (SILVA, Cátia Aida, 2001).2. Especificidades.Para viabilizar a universalidade do atendimento, impende assegurar acessibilidade física às pessoas portadoras de deficiência (Lei 10.098/0034) e dispensar atendimento prioritário, imediato e diferenciado às pessoas portadoras necessidades especiais, aos idosos, às gestantes, às lactantes e às pessoas acompanhadas por crianças de colo (Lei 10.048/2000). Além disso, no caso das populações indígenas e das minorias socioculturais, é recomendável que o atendimento seja acompanhado por um antropólogo.3. Eficiência no atendimento e papel do MPF.Mostra-se imprescindível, no atendimento à comunidade, a realização de uma triagem das irregularidades cuja solução efetivamente se insira dentre as atribuições do MPF, pois grande parcela das pessoas que buscam o auxílio da Instituição o fazem no intuito de resolverem problemas marcadamente individuais, cuja defesa é vedada ao MPF (art.15, LC 75/93). Para um melhor direcionamento e otimização do atendimento, é oportuna a elaboração de um cadastro que registre dados essenciais da pessoa atendida e da inconformidade apresentada. Se o problema explanado pelo cidadão não se incluir dentre as atribuições do MPF, deve-se lhe

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assegurar uma orientação adequada de como resguardar seus direitos, encaminhando-o à instituição incumbida da apreciação da questão (GAVRONSKI, 2005, p.29-38).DOTTI (1985) e SILVA (2001) atribuem a essa função de atendimento um papel fundamental para que o membro do MP não se permita enclausurar apenas como um profissional de gabinete, mas exerça de modo eficiente o mandato coletivo para o qual está legitimado.4. Estratégias de comunicação das ações do MP.Uma comunicação eficiente é ferramenta essencial para a ponte entre a comunidade e o MP. De um lado, promove o acesso do cidadão ao conteúdo da Constituição e das leis, sobretudo as que têm cunho social; de outro, difunde o papel do MP, visando à compreensão da sociedade sobre a atuação do membro do MP como agente de transformação social. Nessa linha, foi criado pela Portaria CNMP-PRESI 58/10 o Comitê de Políticas de Comunicação Social do Ministério Público, que objetiva promover a integração e o desenvolvimento da comunicação do MP no Brasil , incentivando o planejamento, a articulação das ações e a difusão de boas práticas em comunicação pública, visando à ampliação da transparência, ao fortalecimento da imagem institucional e à aproximação MP-cidadão.Ao estabelecer o Planejamento Estratégico Nacional, o CNMP estabeleceu como principais diretrizes para a área de comunicação: 1) facilitar o diálogo do cidadão com o MP; 2) fortalecer a comunicação institucional; 3) aprimorar o intercâmbio de informações; 4) intensificar parcerias e trabalho em rede de cooperação com setores público e privado, sociedade civil organizada e comunidade em geral. Estabeleceu, ainda, como princípio básico das estratégias de comunicação, reconhecer a comunicação pública como processo fundamental ao cumprimento do dever constitucional de transparência das instituições públicas e como consequência do direito coletivo à informação; como meio necessário à ampliação da participação e do acesso dos cidadãos aos serviços prestados pelo MP; devendo orientar-se pelos princípios da informação, impessoalidade, transparência e prestação de contas.É necessário também fazer menção à Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação), que estabelece a obrigatoriedade da divulgação de informações de interesse geral ou coletivo (garantindo algumas hipóteses de confidencialidade) e determina que estejam acessíveis na internet dados relacionados à estrutura, gastos, processos licitatórios e contratos dos órgãos públicos, dentre eles o MPF; além disso, também garante a qualquer interessado o pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos.

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ITEM B: Estatuto constitucional dos agentes políticos. Limites constitucionais da investigação parlamentar. Crimes de responsabilidade. Controle social, político e jurisdicional.

Obras consultadas:AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001.BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.FREIRE JÚNIOR, Américo Bedê, O Controle Judicial de Políticas Públicas. São Paulo: RT, 2005.LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11. ed. São Paulo: Método, 2007.MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.Legislação básica:CF, arts. 51 a 58 e 86;Lei 1.079/50;Lei 1.579/52.

1. Estatuto constitucional dos agentes políticos.90

Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. O Estatuto do Congresso Nacional vem previsto a partir do art. 53 da CRFB. É o conjunto de regras diversas do direito comum previstas na Constituição que dão aos parlamentares direitos, prerrogativas, deveres e incompatibilidades. Quanto às prerrogativas, ressalta-se: a) imunidade material (são invioláveis civil e penalmente por opiniões, palavras e votos); b) imunidades formais: b.1) prerrogativa de foro; b.2) não ser preso ou não permanecer preso91 ; b.3) possibilidade de sustar o processo penal em curso contra ele – art. 53, § 3º, CF; b.4) limitação quanto ao dever de testemunhar; b.5) isenção de serviço militar. Tais prerrogativas são irrenunciáveis (Ruy Barbosa, citado por BULOS, p. 776).Objetivo: assegurar independência no exercício das atribuições do Legislativo (fiscalizar e inovar na ordem jurídica). Por simetria, aplicam-se as mesmas prerrogativas aos deputados estaduais e distritais (art. 27, § 1º, CF).Atenção às hipóteses de perda e cassação do mandato parlamentar (art. 55, CF).2. Limites constitucionais da investigação parlamentar.A CPI atua como longa manus do Poder Legislativo. Por isso, sujeita-se ao controle jurisdicional originário do STF (CF, art. 102, I, 'd' e 'i').Alguns atos a CPI pode determinar diretamente, sem integração do Judiciário, em razão de seus poderes instrutórios (“poderes de investigação próprios das autoridades judiciais”, art. 58, § 3º, CF). Por autoridade própria, a CPI pode determinar os seguintes atos, sem necessidade de participação do Poder Judiciário (art. 2°, Lei 1.579/52):

90A rigor, magistrados e membros do MP também se enquadram no conceito de agentes políticos (RE 228977); aqui, tratamos apenas dos membros do Legislativo, pois os demais são tratados em pontos distintos do edital.91O STF entende ser possível a prisão decorrente de sentença judicial transitada em julgado (INQ. 510).

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- Notificação de testemunhas, investigados e convidados: o cidadão comparece perante a CPI ostentando uma destas qualidades. O investigado também é tratado como indiciado. Incide o princípio da não-autoincriminação (TAVARES, 2008, p. 1.103; BULOS, p. 804) (STF, HC 73.035).- Condução coercitiva de testemunha: a testemunha virá depor debaixo de vara.- Realização de exames, vistorias e perícias.- Afastar o sigilo bancário, fiscal e de registros telefônicos do cidadão: a CRFB permite a quebra do sigilo sem a necessidade de autorização judicial. Este ato só pode ser determinado pelas CPIs do Congresso, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e da Assembleia Legislativa (STF, ACO 730). As CPIs de Câmaras Municipais não têm autoridade para afastar sigilo bancário e fiscal diretamente. Entendendo pela necessidade da quebra de sigilo, a CPI municipal deverá se socorrer do Poder Judiciário. A decisão da CPI em quebrar os sigilos deve sempre ser fundamentada (art. 93, IX, CF: se o juiz deve fundamentar sua decisão, a CPI também deve, pois está de posse de poderes de autoridade judicial - STF, Inq. 2314). A CPI pode afastar o sigilo mas deve obediência ao princípio da colegialidade: quem determina a quebra é toda a CPI, e não o seu presidente (STF, MS 23.669). A quebra do sigilo telefônico refere-se somente aos dados de chamadas telefônicas, e não ao teor das conversas.A CPInão pode, por não deter autoridade para tanto (é necessária autorização judicial):- Expedir mandado de prisão.- Expedir mandado de busca e apreensão (inviolabilidade de domicílio exige ordem judicial, art. 5º, XI, CF).- Expedir mandado de interceptação telefônica: de acordo com o art. 5º, XII, CRFB, somente o juiz pode determinar a interceptação telefônica. A CPI pode, no entanto, oficiar diretamente à companhia telefônica solicitando dados telefônicos. Segundo BULOS (2008), são limites constitucionais formais das CPI:- Impossibilidade de investigar fato indeterminado: deve focar-se em fato concreto, mas admite-se que investigue outros fatos conexos (STF, HC 100.341);- Impossibilidade de renegar o quórum constitucional: 1/3 dos membros da Casa92;- Impossibilidade de exceder prazo certo, que pode ser prorrogado: o STF já entendeu, em votação não unânime, que podem existir prorrogações sucessivas dentro da mesma legislatura, conforme prevê a Lei nº 1.579/52, sendo tal limite intransponível (STF, HC 71.261);- Impossibilidade de desvirtuamento do âmbito funcional: os poderes são apenas investigatórios. Não pode acusar, nem julgar; devendo enviar suas conclusões ao MP, se for o caso, para que promova a responsabilização civil ou penal dos infratores93.São limites constitucionais materiais:- Separação de poderes: ver STF, HC 79.411 (convocação de Des. para depor; art. 146, RI/SF) e STF, MS 27.483 (impossibilidade de quebra de sigilo judicial por CPI);- Estado democrático de direito;- Reserva constitucional de jurisdição, inclusive busca e apreensão pessoal e domiciliar;- Direitos e garantias fundamentais (STF, MS 23.576 e MS 30.906);- Princípio republicano.

92 Direito das minorias parlamentares (STF, MS 24.831).93 Trata-se de “monopólio da última palavra dos tribunais” e em certos temas também da “primeira palavra” , na expressão de CANOTILHO, citado por BULOS, p. 809.

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- Não poderá também invadir área de competência de Estados e Municípios (MENDES et alli, p. 903).Segundo o STF, cabe à CPI apurar apenas fatos relacionados à Administração (BULOS, p. 801).3. Crimes de responsabilidade.Crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas definidas na legislação federal, cometidas no desempenho da função, que atentam contra a existência da União, o livre exercício dos Poderes do Estado, a segurança interna do país, a probidade na Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais e o cumprimento das leis e das decisões judiciais. O rol do art. 85 da CF é meramente exemplificativo.As sanções estão previstas no art. 52, p. único: perda do cargo e inabilitação, por oito anos, para o exercício de qualquer função pública (inclusive cargos de natureza política: STF, RE 234.223).A representação por crime de responsabilidade pode ser formulada por qualquer cidadão. Para apuração dos crimes de responsabilidade do Presidente da República, o processo divide-se em duas partes: a) juízo de admissibilidade, na Câmara dos Deputados (em votação nominal, ostensiva) e; b) processo e julgamento, no Senado Federal (a comissão processante será constituída de 1/4 da composição do Senado). Arts. 13 a 38, Lei n° 1.079/50. Art. 51, I; art. 52, I e II; e art. 86, todos da CF (comissão processante → procedência da imputação → libelo acusatório → contestação → julgamento, presidido pelo Presidente do STF). A condenação exige quórum de 2/3 (votação nominal).O Poder Judiciário não pode alterar a decisão política do Congresso Nacional. O mérito da decisão é inatacável. O Judiciário pode anular o julgamento por ofensa a princípios constitucionais, mas não pode modificar o mérito da decisão.Também são julgados pelo Senado Federal em caso de crime de responsabilidade: Ministros do STF, membros do CNJ e do CNMP, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União. Ministros de Estado e os comandantes das Forças Armadas são julgados pelo Senado nos crimes de responsabilidade, quando estes forem conexos aos praticados pelo Presidente. Caso contrário, serão julgados pelo STF.A Lei nº 1.079/50 prevê os tipos criminais de responsabilidade e o procedimento para o julgamento, que deve ser analisado à luz da CF/88 (ver STF, MS 20.941 e BULOS, p. 921).4. Controle social, político e jurisdicional.Segundo LOEWENSTEIN94, o Estado Democrático de Direito significa que aqueles que exercem o poder político o fazem dentro dos critérios estabelecidos pela ordem jurídica, respeitando os seus princípios e regras, com o objetivo de cumprir suas finalidades e que os detentores do poder estão submetidos ao controle dos destinatários do poder.Nessa linha, por controle social entende-se a participação da sociedade no acompanhamento e verificação das ações da gestão pública na execução das políticas públicas, avaliando os objetivos, processos e resultados. O controle é fiscalização, sindicalização, investigação, acompanhamento da execução daquilo que foi decidido e constituído por quem tem o poder político ou a competência jurídica de tomar decisões de interesse público. O controle social é direito público subjetivo dos integrantes da sociedade de fiscalizar as atividades do Estado e decorre tanto do princípio republicano (art. 1º, CRFB), como do direito fundamental de

94Teoria de la constitución, p.54, citado por SILVA, CÁTIA (2001).

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participação política reconhecido na própria CF e nos documentos internacionais de Direitos Humanos. O princípio da participação também está positivado no art. 37, § 3º, CF, introduzido pela EC 19/98 (AFONSO DA SILVA, p. 659). Dentre as formas de controle social, destacam-se a possibilidade representação e petição aos Poderes Públicos e os orçamentos e planejamentos participativos.O controle político em sentido amplo (lato sensu) pode ser interpretado como o controle exercido pelas instituições políticas sobre os atos dos administradores das coisas públicas, em uma análise mais restritiva (stricto sensu) pode ser classificado como o controle exercido pelos representantes eleitos do povo sobre os atos dos administradores públicos, eleitos ou não.95

O controle exercido pelo Poder Judiciário sobre os atos da Administração tem suas origens na tripartição dos Poderes, prevista por Montesquieu no século XVIII e adotada por todas as constituições liberais, a partir do século XIX. A ideia de pesos e contrapesos na regulação e limitação dos Poderes coloca o Poder Judiciário como peça central neste sistema.Há forte crítica ao controle jurisdicional de políticas públicas (déficit de legitimidade, reserva do possível), mas é certo que, diante da inação do Legislativo e do Executivo ou do desrespeito a direitos fundamentais (STRECK)96, tal atuação é o único meio para se garantir o mínimo existencial diante de omissões (in)constitucionais (STF, Ag.RE 639.337: educação infantil e reserva do possível)97.Segundo SANTI ROMANO98: “só é possível reconhecer Estado de Direito onde: a) o Estado se submete à jurisdição; b) a jurisdição deva aplicar a lei preexistente; c) a jurisdição seja exercida por uma magistratura imparcial (obviamente, independente), cercada de todas as garantias; d) o Estado a ela se submeta como qualquer pars, chamada a juízo em igualdade de condições com a outra pars” E, ainda: “...Tal concepção corresponde ao princípio ‘rule of law’- governo da lei, e não dos homens- que inspirou o direito constitucional anglo-saxão na longa e árdua luta pela supremacia do Direito e superação do arbítrio”.

95 Sobre controle externo da administração pelo Congresso, com auxílio do Tribunal de Contas (art. 70 CF), ver tópico 8.c.96Citado por BEDÊ FREIRE JR, 2005.97“Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político-jurídicos que sobre eles incidem em caráter mandatório, vierem a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional” (Min. Celso de Mello, Ag.RE 639.337).98 Citado por ATALIBA (apud SILVA, CÁTIA; 2001).

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ITEM C: As funções essenciais à Justiça: Advocacia privada e pública. Representação judicial e consultoria jurídica da União, dos Estados e do Distrito Federal. A Defensoria Pública.

Obras consultadas:AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2001.BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11. ed. São Paulo: Método, 2007.MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.Legislação básica:CF, arts. 37, § 12; e 131 a 135;Lei 8.906/94;LC 73/93;LC 80/94 (com a redação dada pela LC 132/2009).

1. As funções essenciais à Justiça: Advocacia privada e pública.O Poder Judiciário desempenha papel capital para conter os Poderes Legislativo e Executivo nas fronteiras dispostas constitucionalmente às suas ações. Como meio de limitação do próprio Poder Judiciário, entretanto, recusa-se que ele possa agir por iniciativa própria. A jurisdição não acontece sem provocação externa. A prerrogativa de movimentar o Judiciário mostra-se crucial para que o mecanismo de fiscalização do sistema constitucional – e portanto da efetividade das normas no Estado de Direito Constitucional – seja operante. O freio dos Poderes a ser aplicado pelo Judiciário depende, para realizar-se, da ação dos entes e pessoas que oficiam, perante os juízos e que, por isso, exercem funções essenciais à Justiça.O Capítulo IV do Título da Organização dos Poderes, que se segue às normas sobre o Legislativo, Executivo e Judiciário, cuida dos sujeitos que, sendo estranhos à estrutura do Judiciário, são imprescindíveis para que este Poder se desincumba da sua missão constitucional. Esses sujeitos são o Ministério Público, os Advogados – públicos e particulares – e a Defensoria Pública.O constituinte não tratou a Advocacia Pública, a Privada e a Defensoria Pública com a minúcia que devotou ao Ministério Público – opção que não deve ser interpretada como valoração diferente da relevância dos entes que compõem esse Capítulo da Carta. Todos, dentro das suas peculiaridades, são fundamentais para a realização da Justiça.O advogado é tido como “indispensável à administração da Justiça”99 e tem a sua liberdade de ação assegurada pela inviolabilidade de seus atos, proclamada no art. 133 da CF. Tal inviolabilidade, contudo, não é absoluta, mas limitada pela lei, como o dispositivo expressamente assinala. O advogado pode ser punido pelos abusos que cometer, na forma da legislação civil e mesmo penal. A caracterização do advogado como indispensável à administração da Justiça, ademais, não revogou as hipóteses legais – restritas – em que se admite que a parte se dirija diretamente ao Judiciário, sem o intermédio do advogado, como no 99 STF, MS 30.906 (CPI/ECAD): “as prerrogativas legais outorgadas aos Advogados possuem finalidade específica, pois visam a assegurar, a esses profissionais do Direito - cuja indispensabilidade é proclamada pela própria Constituição da República (CF, art. 133) -, o exercício, perante qualquer instância de Poder, de direitos próprios destinados a viabilizar a defesa técnica daqueles em cujo favor atuam ”. Ver também: HC 98.631.

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GRUPO I – DIREITO CONSTITUCIONAL E METODOLOGIA JURÍDICAPONTO N. 24. Stanley Valeriano

caso de habeas corpus, ações revisionais, Justiça do Trabalho e juizados especiais (STF: ADI's 1.105, 1.127, 1.194, 2.522, 2.652, 3.026 e 3.168).2. Representação judicial e consultoria jurídica da União, dos Estados e do Distrito Federal.A Advocacia Pública exerce a defesa em juízo das pessoas políticas e é desempenhada por detentores de cargos, organizados em carreira, de Procurador do Estado , do Município, do Distrito Federal, bem como de Advogado da União, de Procurador da Fazenda, de Procurador Federal ou Procurador do Banco Central. No tocante à carreira, deve-se observar o disposto no art. 37, § 12, CF (STF, RE 558.258 e ADI 484). A Advocacia Pública integra o Poder Executivo, a quem deve prestar consultoria e assessoramento jurídico; logo, esses órgãos não desfrutam de independência funcional (STF, ADI 217).3. A Defensoria Pública.A Defensoria Pública e a garantia constitucional da assistência jurídica, integral e gratuita encontram fundamento na primeira onda renovatória de acesso à justiça, conforme célebre estudo de CAPPELLETTI e GARTH (LENZA, p. 610). Os economicamente hipossuficientes têm a previsão de serem defendidos em juízo e orientados juridicamente por profissionais do Direito, ocupantes do cargo de Defensor Público, que a eles ascendem por concurso de provas e títulos e que, para a eficiência da sua relevante função, têm garantida a inamovibilidade e vedada a advocacia fora das atribuições institucionais100. A importância das Defensorias Públicas foi acentuada com a atenção que lhes votou a Emenda Constitucional nº 45/2004. As Defensorias Públicas estaduais, desde 2004, têm asseguradas a autonomia funcional e administrativa (STF, ADI 3965) e a iniciativa de proposta orçamentária, dentro dos limites aplicáveis.

100 STF, ADI 4270: O STF declarou, “com eficácia diferida a partir de doze meses, a contar desta data, a inconstitucionalidade do art. 104 da Constituição do Estado de Santa Catarina e da Lei Complementar 155/97 dessa mesma unidade federada. Os dispositivos questionados autorizam e regulam a prestação de serviços de assistência judiciária pela seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, em substituição à defensoria pública”.

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Resumo do 25º atualizado e ampliado por Cristina Nascimento de Melo

ITEM A: Direito à saúde e ordem constitucional. Fornecimento de medicamentos essenciais

Obras consultadas:Barroso, Luís Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. Dantas, Nara Soares; Silva, Ramiro Rockenbach da. Medicamentos excepcionais. Escola Superior do Ministério Público da União, 2006. Gavronski, Alexandre Amaral (et a.l). Financiamento da saúde – Grupo de Trabalho “saúde”. Escola Superior do Ministério Público da União, 2008.Leivas, Paulo Gilberto Cogo. O direito fundamental à saúde segundo o STF, in: Direitos Fundamentais no STF, balanço e crítica. Ed. Lumen Juris, 2010.Mendes, Gilmar Ferreira; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 6ª Edição. Instituto Brasiliense de Direito Público, 2011.Schirmer, Paula Martins-Costa. Obrigação de fornecimento de medicamentos experimentais ou excepcionais não previstos nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas do Sistema Único de Saúde, in: Temas aprofundados do Ministério Público Federal. Ed. JusPodivm, 2011.Toledo Júnior, Flavio Corrêa de. O instrumento que regula o financiamento mínimo da Saúde: a Lei Complementar nº 141/2012. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3179, 15mar.2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21289>. Acesso em: 18 de maio 2012. Notícias veiculadas na imprensa sobre a LC 141 (acesso em 18/05/2012):http://www.conass.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=338:especial-regulamentacao-ec-29-confira-as-principais-noticias-veiculadas-hoje-sobre-o-impacto-da-regulamentacao-da-emenda-&catid=3:noticias&Itemid=12Legislação básica.Art. 6º, 196 a 19 da Constituição Federal, Art. Lei nº 8080/90, EC 29, LC nº 141/2012.

1. Direito à saúde e ordem constitucional.A CF/88 é aprimeira Constituição brasileira a consagrar o direito fundamental de proteção à saúde. Antes o tratamento dispensado ocorria por disposições esparsas. A cláusula de aberturado art. 5, § 2º, CF estabelece que os direitos fundamentais possuem aplicação imediata, não traçando diferenciação entre os direitos sociais e os direitos individuais e coletivos. O direito à saúde é estabelecido pelo artigo 196 da Constituição Federal como (1) “direito de todos” e (2) “dever do Estado”, (3) garantido mediante “políticas sociais e econômicas (4) que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos”, (5) regido pelo princípio do “acesso universal e igualitário” (6) “às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.1.1 - Sistema Único de Saúde: é concebido como o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta. A iniciativa privada poderá participar do SUS em caráter complementar. Entre as principais atribuições doSUS, está a “formulação da política de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos e outros insumos de interesse para a saúde e a participação na sua produção” (art. 6º, VI, da Lei 8.080/90).O SUS não é um serviço ou uma instituição, mas um Sistema, que significa um conjunto de unidades, de serviços e ações que interagem para um fim comum. Em síntese, os princípios

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Resumo do 25º atualizado e ampliado por Cristina Nascimento de Melo

doutrinários do SUS são a universalidade, a eqüidade e a integralidade, e sua organização está baseada na regionalização, hierarquização, resolutividade, descentralização, participação dos cidadãos e complementaridade do setor privado (GAVRONSKI, pág. 27). Notas do Grupo de Trabalho “Saúde” do MPF sobre os princípios reitores do Sistema Único de Saúde (GAVRONSKI, pág. 28):

“Diferentemente dos princípios da universalidade e da integralidade que expressamente constam do texto constitucional, “direito de todos”, “acesso universal” (art. 196), “atendimento integral” (art. 198, II), não há no texto previsão expressa do princípio da equidade. No sentido do texto, pode-se admitir seu acolhimento pela expressão “igualitário” do caput do art. 196. Todavia, há que se receber com redobradas ressalvas os discursos dos gestores públicos em saúde (secretários e ministro) que, sem qualquer base constitucional ou mesmo legal, vêm tentando sustentar, com o nítido intuito de consolidar a ideia a partir da repetição, a existência do princípio constitucional da equidade como fundamento para mitigar os princípios da universalidade (excluir do SUS quem pode pagar) ou da integralidade (excluir procedimentos demasiadamente caros, só por esse fundamento). Enquanto a universalidade refere-se aos titulares do direito à saúde (todos), a integralidade refere-se ao objeto (tudo). Na conhecida expressão do professor Gilson de Carvalho: “o tudo para todos”. Em nosso entender, na verdade, a integralidade abrange, necessariamente, o tratamento completo e eficaz para todos os agravos (doenças) em saúde; não se estendendo, segundo pensamos, a ponto de abranger todo e qualquer tratamento receitado por qualquer médico, seja ele do SUS ou não.

Reforçam esse entendimento a redação do texto constitucional, que assegura o “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais” (art. 198, II), e da Lei Orgânica da Saúde (Lei n. 8.080/1990), que inclui no campo de atuação do SUS a execução de ações de ‘assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica’ (art. 6º, I, d)”

1.2 - Financiamento: O financiamento do Sistema Único de Saúde, nos termos do art. 195, opera-se com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,além de outras fontes. A Emenda Constitucional n.º 29/2000 assegurou percentuais mínimos a serem destinados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a saúde. No entanto, inexistia a lei complementar exigida no § 3º do art. 198. O § 4º do art. 77 do ADCT dispunha que na ausência da lei complementar, a partir do exercício financeiro de 2005, se aplicaria à União, aos estados, DF e municípios o disposto naquele artigo. Finalmente, após nove anos de tramitação no Congresso Nacional, foi editada a LC nº 141 (em janeiro de 2012). Durante todos esses anos – 2005 a 2012 – prevaleceram as disposições do art. 77 do ADCT, que doravante perde a sua eficácia por ter sido editada a lei complementar 141.Comentários sobre a LC 141: Um dos principais avanços é a definição do que é gasto com saúde. Entre os investimentos incluídos para efeitos da apuração dos recursos mínimos em ações e serviços públicos de saúde estão: remuneração dos profissionais de saúde na ativa; gastos com capacitação de pessoal e investimentos na rede física do Sistema Único de Saúde (SUS); produção, aquisição e distribuição de insumos, como medicamentos e equipamentos médico-odontológicos; gestão e ações de apoio administrativo; entre outros (art. 3º).

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Resumo do 25º atualizado e ampliado por Cristina Nascimento de Melo

Ficamexcluídos: obras de saneamento básico, vacinação de gado, pagamento de aposentadorias e pensões e de salários de servidores, ações de assistência social (como o “bolsa família”), entre outras (art. 4º), evitando que os governadores e prefeitos “maquiem” os gastos da saúde pública. Atenção: despesas decorrentes de saneamento básico, como dito, ficam excluídas do conceito de “ações e serviços públicos de saúde”, no entanto, as despesas relativas a saneamento básico dos distritos sanitários especiaisINDÍGENAS e de COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOS são incluídas (art. 3º, VII, LC 141) e, desse modo, poderão ser custeadas com esses valores mínimos estabelecidos a serem aplicados em ações e serviços de saúde.

Ademais, com a regulamentação, os recursos só poderão ser utilizados em ações e serviços de “acesso universal” que sejam “compatíveis com os planos de saúde de cada ente da federação” e de “responsabilidade específica do setor saúde, não se aplicando a despesas relacionadas a outras políticas públicas que atuam sobre determinantes sociais e econômicos, ainda que incidentes sobre as condições de saúde da população” (art. 2º).

A lei também define como será feita a prestação de contas, fiscalização e transparência dos gastos na saúde, descrevendo as atribuições de tribunais de contas, órgãos do Executivo e Conselho Nacional de Saúde, vinculado ao governo.

Outro destaque relevante são as vinculações de percentuais das receitas fiscais para serem aplicados com exclusividade na saúde: municípios, 15% de suas receitas; estados, 12% de suas receitas; e a União o valor do ano anterior acrescido da variação do PIB (mesmos percentuais já fixados no art. 77 do ADCT). Se acontecer de o PIB ter variação negativa em relação ao ano anterior, não se poderá reduzir o seu valor. Outro ponto é que os recursos da saúde não podem sofrer contingenciamento.

O destaque que criava a CSS, uma espécie de nova CPMF, foi rejeitado. Foi também excluída emenda que retirava os recursos do Fundeb da base de cálculo para definição do percentual mínimo para a área de saúde. Foram vetados os dispositivos que previam um gasto mínimo de 10% da receita da União e o aumento do investimento federal caso haja revisão para cima do Produto Interno Bruto (PIB), ao qual os gastos são vinculados. Tais vetos foram duramente criticados pelos especialistas e pela oposição, poisa lei não teria cumprido o seu objetivo de aumentar os investimentos públicos na área da saúde, já que não teria elevado o investimento da União nesse setor, criando vinculações realmente significativas apenas para Estados e Municípios.

Não realizada a despesa obrigatória em saúde, Estados e Municípios ficam sujeitos a certos embaraços (Toledo Júnior): 1 - Intervenção de outro nível federado (Art. 34, VII, “e”, bem assim o art. 35, III, ambos da Constituição); 2 - Restrição nas transferências constitucionais de impostos, feitas pela União e Estado, sob as condições prescritas no art. 26 da Lei 141;3 - Bloqueio das transferências voluntárias da União e Estado (Art. 25, §1.º, “b” da Lei de Responsabilidade Fiscal);4 - Possível parecer desfavorável do Tribunal de Contas que, se confirmado no Parlamento, sujeita o Chefe do Poder Executivo à inelegibilidade (Art. 1º, I, “g”, da Lei Complementar 64, de 1990, com a alteração da LC 135/2010).

Veja os dispositivos que tratam da transferência voluntária:

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Art. 25. Para efeito desta Lei Complementar, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação,a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde. § 1o São exigências para a realização de transferência voluntária, além das estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias: I - existência de dotação específica; II - (VETADO) III - observância do disposto no inciso X do art. 167 da Constituição; IV - comprovação, por parte do beneficiário, de: a) que se acha em dia quanto ao pagamento de tributos, empréstimos e financiamentos devidos ao ente transferidor, bem como quanto à prestação de contas de recursos anteriormente dele recebidos; b) cumprimento dos limites constitucionais relativos à educação e à saúde; c) observância dos limites das dívidas consolidada e mobiliária, de operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, de inscrição em Restos a Pagar e de despesa total com pessoal; d) previsão orçamentária de contrapartida. § 2o É vedada a utilização de recursos transferidos em finalidade diversa da pactuada. § 3o Para fins da aplicação das sanções de suspensão de transferências voluntárias constantes desta Lei Complementar, excetuam-se aquelas relativas a ações de educação, saúde e assistência social.

Princípio da complementaridade do setor privado: Quando, por insuficiência do setor público, for necessária a contratação de serviços privados, esta deve dar-se sob três condições: a) o contrato deverá ser celebrado conforme as normas de direito público (art. 199, § 1º, da CF; arts. 24 a 26 da Lei n. 8.080/1990); b) a instituição privada deverá estar de acordo com os princípios básicos e com as normas técnicas do SUS; c) a integração dos serviços privados deverá se dar na mesma lógica do SUS. Entre os serviços privados, devem ter preferência os serviços não-lucrativos (hospitais filantrópicos, santas casas - art.199, § 1º da CF).

1. 3 - Repartição de competências: Competência legislativa concorrente (CF/88, art. 24, XII, e 30, II).Competência administrativa comum (art. 23, II). O Poder Judiciário, acompanhado pela doutrina majoritária, tem entendido que a competência comum dos entes resulta na sua responsabilidade solidária para responder pelas demandas de saúde.O Supremo Tribunal Federal, em sua composição plena, no julgamento da Suspensão de Segurança 3.355-AgR/RN, fixou entendimento no sentido de que a obrigação dos entes da federação no que tange ao dever fundamental de prestação de saúde é solidária. Entretanto, a solidariedade passiva entre os entes federativos não pode ser utilizada como entrave protelatório no curso de processo judicial em que se pleiteia o acesso a medicamentos – direito fundamental que pode ser requerido a qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios (STF: RE-AgR 607381, julgado em 31/05/2011).

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1. 4 – Fornecimento de medicamentos essenciais: Da Política Nacional de Medicamentos: as três esferas governamentais possuem atribuições relativas à assistência farmacêutica, a qual deve englobar as atividades de seleção, programação, aquisição, armazenamento e distribuição, controle da qualidade e utilização – compreendidas a prescrição e a dispensação – de medicamentos (artigos 16, X; 17, VIII; e 18,V, da Lei n. 8.080/1990 e item 3.3 da Portaria MS n. 3.916, de 30 de outubro de 1998 –Política Nacional de Medicamentos). De forma simplificada, os diferentes níveis federativos, em colaboração, elaboram listas de medicamentos que serão adquiridos e fornecidos a população.

Medicamentos essenciais x medicamentos excepcionais: Medicamentos essenciais: são medicamentos comuns, que compõem uma farmácia básica, normalmente de baixo custo unitário, e que, em seu conjunto são destinados ao tratamento da maior parte das enfermidades que acometem a população brasileira. Medicamentos excepcionais, ou de alto custo, ou de dispensação em caráter excepcional – são aqueles “utilizados em doenças raras, geralmente de custo elevado, cuja dispensação atende a casos específicos”(Política Nacional de Medicamentos (item 7 da Portaria MS n. 3.916/1998). São excepcionais, mas não deixam de ser essenciais, na medida em que asseguram a vida e o bem estar do usuário.A Portaria nº 2981/2009 do Ministério da Saúde estabelece quais medicamentos deverão ser fornecidos pelos Municípios, Estados e União, conforme a complexidade da doença, a garantia da integralidade do tratamento da doença no âmbito da linha de cuidado e a manutenção do equilíbrio financeiro entre as esferas da federação.

Financiamento dos medicamentos excepcionais: Compete ao Ministério da Saúde efetuar os repasses de recursos destinados à aquisição dos medicamentos excepcionais, de acordo com as tabelas de cofinanciamento e aos Estados compete uma contrapartida de recursos financeiros para aquisição, seleção e programação dos medicamentos, além da dispensação dos medicamentos àqueles usuários do SUS que vierem a necessitar dos mesmos.

Objeções apresentadas pelo poder público para fornecimento de medicamentos:1) Objeções de caráter socioeconômico:1.1) A escassez de recursos financeiros e a reserva do Possível: O posicionamento do Ministério Público restou firmado no Simpósio sobre Política Nacional de Saúde, no ano de 2005: O MP não admite qualquer postura do gestor que busque flexibilizar direitos previstos na Constituição Federal. Quando todos os entes públicos das três esferas da federação estiverem cumprindo a EC 29 (a Emenda Constitucional número 29/2000 determina a aplicação de recursos mínimos em saúde), o MP poderá estar aberto à discussão da idéia de equidade; 1.2) Os interesses econômicos da indústria farmacêutica: gestores de saúde alertam para o ato predatório decorrente de meros interesses econômicos do setor industrial de fármacos.2) Objeções de caráter técnico: 2.1) a não-aquisição do medicamento (licitação) e o consequente não-fornecimento, embora constante em lista oficial- Deve-se questionar sobre o porquê do atraso e, principalmente, sobre a dinâmica de planejamento; 2.2) A não-previsão em listas oficiais de medicamentos 2.3) A não-previsão em listas oficiais de medicamentos para doença (embora constante da listagem pública para outra patologia); 2.4) A ausência de registro no órgão de vigilância sanitária 2.5) O fato de o tratamento estar em fase experimental ou a inexistência de evidência científica de sua eficácia e segurança.

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Inclusão de medicamentos nas listas oficiais: será possível discutir a inclusão de novos medicamentos nas listas referidas, no âmbito de ações coletivas e/ou de ações abstratas de controle de constitucionalidade. Tal inclusão, contudo, deve ser excepcional, uma vez que as complexas avaliações técnicas – de ordem médica, administrativa e orçamentária – competem primariamente aos Poderes Legislativo e Executivo (Barroso, pág. 35).

Fornecimento de medicamentos não incluídos nas listas oficiais: Em que pese inexista consenso na jurisprudência dos Tribunais Superiores acerca da natureza da norma do art. 196 da Constituição, considerando alguns julgados a sua natureza programática e outros defendendo que dela se poderiam extrair direitos subjetivos aptos a gerar exigências de prestações positivas do Poder Público, a melhor doutrina (nesse sentido, Ana Paula de Barcellos) orienta que, em se tratando de direito à saúde, apenas as prestações que compõem o assim denominado “mínimo existencial” e aquelas que configurem opções políticas juridicizadas dos poderes constituídos poderiam ser objeto de condenação dos entes públicos a implementá-las em prazo determinado (TRF2: AI 167964).

O STJ já decidiu que “o não preenchimento de mera formalidade – no caso, inclusão de medicamento em lista prévia – não pode, por si só, obstaculizar o fornecimento gratuito de medicação a portador de moléstia gravíssima, se comprovada a respectiva necessidade e receitada, aquela, por médico para tanto capacitado” (REsp 684646).

O STF, no julgamento da STA 178, asseverou que a omissão administrativa em não fornecer o medicamento pode ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações individuais quanto por ações coletivas, desde que haja instrução processual com ampla produção de provas, o que poderá configurar um obstáculo à concessão de medida cautelar.

Prescrição de medicamento excepcional por médico não integrante do Sistema Único de Saúde:Relevância. Posicionamento do Ministério Público. Firmado no Simpósio sobre Política Nacional de Saúde, em 2005: A universalidade e a integralidade pressupõem o ingresso do cidadão no Sistema Único de Saúde e a submissão à respectiva política pública definida nos planos de saúde correspondentes (nelaincluídos os protocolos clínicos) cabendo ao MP fiscalizar a submissão dessas políticas aos princípios constitucionais.O efeito da tutela jurisdicional sobre a gestão de saúde: recomendável que a atuação do Ministério Público, judicial ou extrajudicial, contemple, na medida do possível, não somente o fornecimento de medicamento específico, mas pleitos pela adoção de medidas de caráter abrangente e que considerem os deveres do gestor de saúde.

Resumo do ENTENDIMENTO DO STF sobre acesso a medicamentos: 1) Sobre a judicialização da saúde: “(...) no Brasil, o problema talvez não seja de judicialização ou, em termos mais simples, de interferência do Poder Judiciário na criação e implementação de políticas públicas em matéria de saúde, pois o que ocorre, na quase totalidade dos casos, é apenas a determinação judicial do efetivo cumprimento de políticas públicas já existentes. (...)Assim, também com base no que ficou esclarecido na Audiência Pública, o primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política estatal que abranja a prestação de saúde

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pleiteada pela parte. Se a prestação de saúde pleiteada não estiver entre as políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de (1) uma omissão legislativa ou administrativa, (2) de uma decisão administrativa de não fornecê-la ou (3) de uma vedação legal a sua dispensação;2) Proibição de fornecimento de medicamento que não possua registro na ANVISA : é vedado à Administração Pública fornecer fármaco que não possua registro na ANVISA; O registro de medicamento, como ressaltado pelo Procurador-Geral da República na Audiência Pública, é uma garantia à saúde pública. Em casos excepcionais, a importação de medicamento não registrado poderá ser autorizada pela ANVISA; 3) Necessidade de privilegiar o tratamento fornecido pelo SUS: O segundo dado a ser considerado é a existência de motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS. Em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente. Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso; 4) Inexistência de tratamento na rede pública: Situação diferente é a que envolve a inexistência de tratamento na rede pública. Nesses casos, é preciso diferenciar os tratamentos puramente experimentais dos novos tratamentos ainda não testados pelo Sistema de Saúde brasileiro; 5) Novos Medicamentos: Quanto aos novos tratamentos (ainda não incorporados pelo SUS), é preciso que se tenha cuidado redobrado na apreciação da matéria. O conhecimento médico não é estanque, sua evolução é muito rápida e dificilmente acompanhável pela burocracia administrativa. Há necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos. Assim não se pode afirmar que os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas dos SUS são inquestionáveis, o que permite sua contestação judicial; 6) Sobre os altos custos dos medicamentos: o alto custo de um tratamento ou de um medicamento que tem registro na ANVISA não é suficiente para impedir o seu fornecimento pelo Poder Público; 7) Efeito multiplicador: Não procede a alegação de temor de que esta decisão sirva de precedente negativo ao Poder Público, com possibilidade de ensejar o denominado efeito multiplicador, pois a análise de decisões dessa natureza deve ser feita caso a caso, considerando-se todos os elementos normativos e fáticos da questão jurídica debatida.ATENÇÃO: No STJ, estão pendentes de julgamento (conforme andamento em 17/05/2012), entre outros, os seguintes recursos: o Resp 1102457, em que se debate a obrigatoriedade de fornecimento pelo Estado de medicamentos não contemplados em portaria do Ministério da Saúde, e o Resp 1101725, que definirá a possibilidade de aplicação de multa contra o ente estatal nos casos de descumprimento de obrigação de fornecer o medicamento. Já o Resp 1069810, trata do fornecimento de medicamento necessário ao tratamento de saúde, sob pena de bloqueio ou sequestro das verbas do Estado a serem depositadas em conta-corrente.O STF decidiu que possui repercussão geral controvérsia sobre: a obrigatoriedade de o Poder Público fornecer medicamento de alto custo (RE 566471 RG, em 15/11/2007), a possibilidade de bloqueio de verbas públicas para garantia de fornecimento de medicamentos (RE 607582, em 13/08/2010) e a legitimidade do Ministério Público para ajuizar para ajuizar ação civil

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pública com objetivo de compelir entes federados a entregar medicamentos a pessoas necessitadas (RE 505533, em 01/04/2010).

Possibilidade de bloqueio de verbas públicas: É entendimento jurisprudencial sedimentado no âmbito do STF (AI 553712 AgR / RS) e do STJ(REsp 900.458/RS; REsp 840912/RS; REsp 851.760/RS, dentre outros) de ser legítimo o bloqueio de verbas públicas para o fim de garantir o fornecimento de medicamento à pessoa que dele necessite, quando houver o risco de grave comprometimento da saúde do demandante.

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Resumo do 25º atualizado e ampliado por Cristina Nascimento de Melo

ITEM B: Inconstitucionalidade por omissão. Ação direta e Mandado de injunção.

Obras consultadas:Cunha Júnior, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 4ª Edição. Salvador: Juspodivum, 2010.Fernandes, Bernardo Gonçalves. Remédios constitucionais. Salvador: Juspodivm, 2010.Lenza, Pedro. Direito Constitucional esquematizado. 14ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2010. Mendes, Gilmar Ferreira; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 6ª Edição. São Paulo: Instituto Brasiliense de Direito Público, 2011.Moraes, Alexandre de. Direito Constitucional. 19ª Edição. São Paulo: Editora Atlas, 2006.Sarlet, Ingo Wolfgang; Marinoni, Luiz Guilherme; Mitidiero, Daniel. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Editora RT, 2012.Legislação básica.Constituição Federal e Lei nº 9.868/99

Inconstitucionalidade por omissão: Seu controle é novidade da CF/88. Pressupõe a inobservância de dever constitucional de legislar, que pode resultar tanto de comandos explícitos quanto de implícitos. Objetiva combater a “Síndrome da inefetividade das normas constitucionais”.

ADI por omissão: O art. 103, §2º da CF/88 estabelece que, declara a inconstitucionalidade por omissão de

medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em 30 dias. A ADI por omissão busca tornar efetiva a norma constitucional destituída de efetividade, ou seja, somente as normas constitucionais de eficácia limitada.

Omissão total: legislador não empreende a providência legislativa reclamada.Omissão parcial: ato normativo atende apenas parcialmente ou de modo insuficiente a

vontade constitucional. Pode ser:a) parcial propriamente dita: a lei existe mas regula de forma deficiente o texto. b) parcial relativa: surge quando a lei existe e outorga determinado benefício a certa

categoria mas deixa de concedê-lo a outra, que deveria ter sido contemplada. Nesse caso, tem prevalecido o conteúdo da súmula 339/STF: “não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia”.

- objeto: omissão é de cunho normativo (mais ampla que legislativo), englobando, além do Poder Legislativo, atos do Executivo e o Judiciário. ADI 1836: ação é extinta por perda do objeto se revogada a norma que necessite de regulamentação. STF entende que não há omissão se o processo legislativo já se iniciou (ADI 2495). No entanto, caso haja mora excessiva neste processo, pode haver inconstitucionalidade (ADI 3682).

Não cabe fungibilidade entre ação direta de inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção, tendo em vista a diversidade de pedidos (STF, MI 395-QO)

- Competência: STF (art.102, I, “a”). - Legitimidade ( Art.12-A da Lei 9868/99): os mesmos da ADI (rol do art.103 da CF). - Procedimento (art.12-E): aplicação subsidiária das normas relativas à ADI, com as

exceções previstas nos §§ do próprio art.12-E.

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- Cautelar (art.12-F): pode ser suspensão da aplicação da lei ou ato normativo questionado (omissão parcial), bem como suspensão de processos judiciais/procedimentos administrativos, ou ainda outra providência a ser fixada pelo Tribunal.

- Decisão: tem caráter mandamental (Anordnungsklagerecht)a) Poder competente: é dada ciência, sem prazo. STF tem acenado com a possibilidade de fixação de prazo: ADI 3682: fixou prazo de 18 meses para elaboração da lei, foi chamado de “parâmetro temporal razoável”, com expressa ressalva de que não se tratava de imposição de prazo para atuação legislativa do CN. b) órgão administrativo: deve atender no prazo de 30 dias, sob pena de responsabilidade, ou em outro prazo estipulado pelo Tribunal em casos excepcionais (art.12-H). Fungibilidade entre ação de inconstitucionalidade por ação e por omissão: Não obstante ambas as modalidades de ação direta não se confundirem, uma distinção clara entre elas não está livre de dificuldades. O atendimento insatisfatório ou incompleto de exigência constitucional de legislar configura afronta à Constituição. Dessa forma, o STF admitiu a fungibilidade (ADI 875).

Mandado de Injunção: ação constitucional de natureza civil e procedimento especial, que visa viabilizar o exercício de direitos, liberdades constitucionais ou prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania ou cidadania, que estão inviabilizados por falta de norma regulamentadora de normas constitucionais. Quanto ao antecedente histórico há divergência na doutrina, alguns apontam o writ of injuction do direito estadunidense, outros institutos do ordenamento português.

Constitui ação especial de controle concreto ou incidental de constitucionalidade das omissões do poder público, quando a inércia estatal inviabiliza o desfrute de algum direito fundamental (Cunha Júnior, pág. 810).

Divergência doutrinária: quais direitos tutelados pelo mandado de injunção? Manoel Gonçalves Ferreira Filho: apenas direitos políticos e ligados à nacionalidade (excluindo os direitos sociais). Celso Ribeiro Bastos, J.J Calmon de Passos: direitos fundamentais do título II da CF. Barroso, José Afonso da Silva, Dirley da Cunha Jr.: o MI abrange todos os direitos fundamentais, sejam individuais, coletivos, difusos e sociais, encontrem-se inseridos ou não no Título II da CF.

Requisitos: falta de norma regulamentadora de norma constitucional de eficácia limitada e inviabilização do direito, liberdade ou prerrogativa prevista na Constituição devido à inércia do legislador (nexo de causalidade – STF, MI 708).

Não basta para a descaracterização da inércia a mera apresentação do projeto de lei, sendo necessária a sua devida deliberação. Assim, a inertia deliberandi (demora na deliberação sobre projeto de lei que visa regulamentar norma constitucional de eficácia limitada) - numa mudança de entendimento do STF (MI 361)- passou a ser considerada para efeitos de cabimento de MI.

Não cabe mandado de injunção:a) para buscar uma “melhor interpretação” (ou uma “interpretação mais justa”) da norma regulamentadora já existente. Com efeito, se existente norma regulamentadora não cabe MI, pouco importando se insatisfatória ou inconstitucional, pois tão situação não seria comparável à ausência de norma regulamentadora (STF, MI 60-3, 254);b) em caso de falta de regulamentação de norma infraconstitucional;c) também não cabe MI para disciplinar relações jurídicas decorrentes de medida provisória não convertida em lei, em virtude de recusa ou omissão do Congresso Nacional (STF, MI 415);

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d) para implementação de isonomia de vencimentos entre servidores públicos (STF, MI 347);e) se ainda não expirado o prazo fixado na Constituição para edição da norma regulamentadora (STF, MI 60-3).

Legitimidade ativa: qualquer pessoa. STF admite ajuizamento de MI coletivo (MI 361-RJ). O MP também possui legitimidade ativa para impetração de MI: art. 129, II da CF e art.6º da LC 75/93, nos casos que envolvem direitos difusos e coletivos previstos na Constituição e inviabilizados pela falta de norma regulamentadora. Pessoa de direito público: o STF parece ter superado o entendimento anterior pela ilegitimidade ativa da PJ de direito público para impetração de MI (STF, MI 725).

Legitimidade passiva: órgãos e entidades pública encarregada da viabilização (normativa) de direitos previstos na CF. Para o STF as entidades privados que estiverem sendo beneficiados pela falta de regulamentação não possuem legitimidade ad causam passiva, pois não estão obrigados a editar a regulamentação respectiva e não poderiam, nem mesmo, como atuar como listisconsorte passivo (STF, MI 352).

Competência: depende e quem é competente para editar a norma. STF - Arts.102, I, “q”, e 102, II, “a”, da CF; STJ; art.105, I, “h”; TSE 121, §4, V.

Procedimento: por falta de lei prevendo procedimento específico, adota-se o procedimento do mandado de segurança (art. 24, par. único, Lei nº 8.038/90). No entanto, apesar ser cabível liminar em MS, o STF reiteradamente já decidiu que não caberá concessão de medida liminar no mandado de injunção (STF, MI 342; 530; 535; 536). Também entende o Pretório Excelso ser incabível a cominação de pena pecuniária pela continuidade da omissão legislativa (STF, MI 689).

Havendo admissibilidade, o legitimado passivo terá dez dias para prestar informações. Após, o MP terá dez dias para opinar (atuando como custus legis). Com ou sem o parecer do MP, os autos serão conclusos ao juiz, para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em trinta dias (art. 12, Lei nº 12.016/09).

Da decisão dos TJ ou TRFs, denegatórias ou concessivas de MI, cabe recurso especial ao STJ (e não recurso ordinário constitucional, como se dá em relação à decisão denegatória em MS e HC – art. 105, II, CF). O manejo equivocado do recurso, nesse caso, implica em erro grosseiro e afasta a aplicação do princípio da fungibilidade (STJ, Pet.192-0)

Efeitos da decisão: a) tese não concretista: apenas decreta a mora do Poder omisso.b) concretista individual intermediária: fixa um prazo para o Legislativo suprir a omissão,

findo este prazo sem o saneamento passa o autor a ter assegurado o seu direito. c) concretista individual direta: implementa o direito apenas para o autor da ação. d) concretista geral: decisão com efeitos erga omnes até que sobrevenha a norma. O STF

adotou nos primeiros julgamentos a posição não concretista, atualmente tem adotado a posição concretista geral (MI 670, 708 e 712). A colmatação será limitada temporalmente até a atuação do legislador.

A omissão pode ser suprida mediante a adoção do próprio texto da norma constitucional, como se fosse auto aplicável, em caso de não observância do prazo judicial determinado para legislar; por meio de outra lei que regule situação similar e, até mesmo, por soluções normativo-judiciais criadas no caso concreto (STF, MI232; 284; 543; 679; 562).

Ação de inconstitucionalidade por omissão

Mandado de injunção

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Legitimidade ativa Art. 103, CF Qualquer pessoa física, jurídica ou até mesmo associações ou coletividades na figura do MI

coletivo aceito jurisprudencialmente.

Quanto à competência Controle concentrado Controle difusoProcedimento Lei 12.063/09 (alterações na Lei

9868/99)Lei 12.016/09

Liminar Cabível (art. 12-F, Lei 9868/99) Não cabeNexo de causalidade Não exige interesse de agir dos

legitimados ativos universais, mas apenas dos legitimados ativos

não universais (especiais)

Exige a demonstração de nexo de causalidade, ou seja, de

interesse de agir do impetrante, seja ele qual for (pessoa física,

pessoa jurídica, etc).Espécie de processo Objetivo SubjetivoParâmetro Norma constitucional de eficácia

limitadaNorma constitucional de eficácia

limitadaEfeitos da decisão de mérito

Erga omnes. Dá-se ciência ao poder competente e, tratando-se de órgão administrativo, impõe-se

prazo de 30 dias para editar a norma.

Inter partes. Porém, à luz dos Mis 670, 708, 712 conferiu-se

efeitos erga omnes, adotando-se a corrente concretista geral.

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ITEM C: Conselho Nacional de Justiça. História, composição, competência e funcionamento. Corregedoria Nacional.

I. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. HISTÓRIA.A Reforma do Judiciário, que se iniciou com a Proposta de Emenda à Constituição nº 96/1992, de autoria do Deputado Hélio Bicudo, previu a criação do atual Conselho Nacional de Justiça. Com a forte defesa do Relator Nelson Jobim voltou-se a pensar no controle externo do Judiciário, com participação de representantes de diversos setores da sociedade. A magistratura era contrária, mas já alguns magistrados aceitavam a idéia de um órgão de composição “híbrida”, formada por integrantes dos tribunais de cúpula. O projeto foi arquivado em agosto de 1995.Após seu desarquivamento no mesmo ano, o projeto foi entregue à relatoria do Deputado Aloysio Ferreira Nunes, sendo que 14 emendas foram apresentadas tratando do controle externo do Poder Judiciário. Aprovado pela Câmara, o texto seguiu para o Senado Federal, onde recebeu diversas emendas e modificações na estrutura do Conselho. Em 2004 foi aprovada a Emenda Constitucional nº 45, a denominada Reforma do Judiciário, disciplinando, em seu artigo 103-B, o Conselho Nacional de Justiça. Órgão administrativo-constitucional do Poder Judiciário, com status semi-autônomo ou de autonomia relativa. A estatura constitucional decorre de sua previsão expressa no texto da Constituição. È órgão da estrutura do Poder Judiciário, conforme previsto no art. 92, I-A (São órgãos do Poder Judiciário: I - o Supremo Tribunal Federal; I-A o Conselho Nacional de Justiça...). A natureza administrativa é conferida pelo rol de atribuições previstas no art. 103-B, § 4º, CF/88 (controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes; zelar pela autonomia do Poder Judiciário; zelar pela observância do art. 37 e apreciar a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário; receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário; rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares contra membros ou órgãos do Poder Judiciário), pois tais atribuições escapam da feição jurisdicional eis que se submetem ao controle judicial pelo STF. Não é órgão da União, mas instituição federal de âmbito nacional, cujo caráter federativo já foi afirmado pelo STF.II. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. COMPOSIÇÃO.O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de quinze membros, com mandato de dois anos, admitida uma recondução, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 103-B, CF). A formação híbrida - dos 15 (quinze) Conselheiros, 9 (nove) são oriundos da magistratura e os outros 6 (seis) não, sendo dois membros do Ministério Público, dois advogados e dois cidadãos – demonstra a inspiração democrática e o pluralismo de representações e indicações. Dentre os magistrados há diversidade de instâncias e de ramos do Judiciário. O princípio federativo é reafirmado em virtude da dualidade das entidades federativas na representação das justiças federal e estadual e da indicação dos membros do Ministério Público (um do MPU e outro do MP Estadual).A EC nº 61/2009 esclareceu que o CNJ é composto, dentre os seus quinze membros, não por um Ministro do STF (como dizia a redação original da EC 45/2004), mas pelo Ministro Presidente do STF. Transformou, assim, o Presidente do STF em membro nato do CNJ, não tendo que ser sabatinado pelo Senado Federal (o art. 103-B, §2º disciplina que apenas os demais membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal).

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Outra alteração advinda com a EC 61/2009 foi a retirada da restrição de idade para a composição do STF que, na redação original, trazida pela EC 45/2004, estabelecia idade mínima de 35 anos e máxima de 66 anos. Dessa forma, atualmente não há limite de idade para os membros do CNJ. Tal alteração teve o nítido objetivo de adequar a composição da Presidência do CNJ sempre ao Ministro Presidente do STF, pois é possível que esse ocupe a presidência com mais de 66 anos.Ademais, a EC 61/2009 ainda estabeleceu que presidente do CNJ (que será o Presidente do STF) será substituído, nas suas ausências, impedimento e afastamentos pelo vice-presidente do STFe não por outro membro do CNJ, preservando o caráter institucional da direção do CNJ (Lenza, pág. 634). III. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. COMPETÊNCIA. Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, as constantes do art. 103-B, § 4º, incisos I a VII, da CF/88. Estas atribuições podem ser classificadas em atribuições políticas, de controle administrativo, de ouvidoria, correicionais e disciplinares, sancionatória e informativa e propositiva.O CNJ não pode adentrar na análise dos atos jurisdicionais, nem rever decisão de conteúdo judicial, restringindo-se sua competência apenas ao âmbito administrativo (STF, MS 25879).IV. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. FUNCIONAMENTO.São órgãos do Conselho: O Plenário, a Presidência, a Corregedoria Nacional de Justiça, as Comissões e a Secretaria-Geral. O Conselho será presidido pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal, que votará em caso de empate, ficando excluído da distribuição de processos naquele tribunal.As comissões são permanentes ou temporárias, com participação proporcional entre os conselheiros, preservando sempre que possível a representação das diversas categorias funcionais, integradas sempre por pelo menos um conselheiro não-magistrado. Dedicam-se ao estudo de temas e de atividades de interesse do Conselho ou relacionadas com suas competências. Ao Plenário compete as atribuições de controle administrativo e financeiro do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados. As sessões do Plenário podem ser ordinárias ou extraordinárias. As sessões ordinárias são realizadas quinzenalmente, em dias úteis e as extraordinárias serão convocadas pelo presidente, fora do calendário semestral, sobre assuntos relevantes e urgentes, bem como a requerimento de um terço dos conselheiros. A pauta das reuniões será encaminhada aos conselheiros quando da convocação das sessões plenárias e assuntos que nela não estejam incluídos somente poderão ser discutidos mediante aprovação de dois terços dos presentes.Para a constituição válida do Plenário é exigido o quórum mínimo de dez conselheiros, as decisões serão tomadas por maioria simples dos conselheiros presentes, exceto nos casos em que seja exigido quorum qualificado. O conselheiro não pode abster-se da votação nos temas relacionados a controle de atos administrativos e procedimentos disciplinares, mas pode se declarar impedido ou suspeito. O conselheiro pode apresentar indicação ou proposta escritas, devendo o presidente designar relator para apresentar relatório e voto escritos na sessão seguinte e, em casos urgentes e relevantes, poderá designar relator para apresentar relatório e voto orais para discussão e votação na mesma sessão.

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Apresentado o relatório, o presidente poderá dar a palavra ao interessado, recorrente ou peticionário e ao réu ou recorrido, para sustentação oral por até 15 minutos, mesmo prazo para pronunciamento do Procurador-geral da República e do presidente do Conselho Federal da OAB. O julgamento, uma vez iniciado, será ultimado na mesma sessão, salvo pedido de vista ou conversão em diligência, se necessária à decisão da causa.Cada conselheiro pode falar duas vezes sobre o assunto em discussão e por mais uma vez, em caso de modificação do voto. Se pedir vista dos autos, deve apresentá-los para prosseguimento da votação na primeira sessão ordinária subseqüente. O conselheiro ausente da leitura do relatório ou dos debates não proferirá voto, salvo quando se der por esclarecido ou em caso de desempate na votação, nesta hipótese deverão ser renovados o relatório e a sustentação oral.Concluídos os debates, o presidente tomará os votos, primeiro do relator e, a seguir, dos demais conselheiros. Encerrada a votação, o presidente proclamará a decisão, sendo redigido o acórdão pelo relator ou pelo conselheiro que houver proferido o primeiro voto prevalente. Os atos e decisões do Conselho são irrecorríveis e, em caso de obscuridade, contradição ou omissão, pode o interessado requerer sejam prestados esclarecimentos, no prazo de cinco dias.V. CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA À Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional da justiça, compete receber e processar reclamações e denúncias de qualquer interessado, relativas aos magistrados e aos serviços judiciários auxiliares, serventias, órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, e exercer funções executivas do Conselho, de inspeções e de correições. A Corregedoria Nacional de Justiça tem a seguinte estrutura organizacional: I - Gabinete da Corregedoria; II - Juízes Auxiliares e III – Assessoria da Corregedoria.

constitucionalidade do CNJ (ADI 3367) : O STF julgou constitucional o CNJ. A presença de não magistrados não viola a cláusula pétrea inserta no art. 60, §4º, III e art. 2º da CF/88. O CNJ integra o Judiciário (não se trata de controle externo); em sua composição os integrantes da magistratura superam a maioria absoluta (9 em 15) e suas decisões podem ser revistas pelo STF (art. 102, I, r).

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