Congresso do Desporto16Dez05-MGuimarães-comunicação · Slide 2 Uma primeira análise recai sobre...

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1 Congresso do Desporto Lisboa, 16 Dezembro 2005 Por Mário Guimarães Em primeiro lugar quero endereçar os melhores cumprimentos aos responsáveis pelas entidades oficiais aqui presentes, aos colegas e amigos, alguns de longa data e a todos os participantes em geral. Um agradecimento à organização pelo convite que muito me honra. Slide 1 DESPORTO ESCOLAR EM PORTUGAL Percursos sinuosos… rio Guimarães rio Guimarães Uma nota prévia ao tema que irei abordar, refere-se ao facto de ser habitual a inclusão dos temas relativos ao Desporto Escolar (DE) - um sub-sistema do Sistema Educativo - nas iniciativas de debate e discussão relacionadas com o Desporto. Não sendo, por outro lado, habitual debater-se a temática do DE, em Congressos, Conferências, Debates, etc. organizados no âmbito da Educação.

Transcript of Congresso do Desporto16Dez05-MGuimarães-comunicação · Slide 2 Uma primeira análise recai sobre...

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Congresso do Desporto Lisboa, 16 Dezembro 2005

Por Mário Guimarães

Em primeiro lugar quero endereçar os melhores cumprimentos

aos responsáveis pelas entidades oficiais aqui presentes, aos

colegas e amigos, alguns de longa data e a todos os participantes

em geral.

Um agradecimento à organização pelo convite que muito me

honra.

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DESPORTO ESCOLAR EM PORTUGAL

Percursos sinuosos…

MMáário Guimarãesrio Guimarães

Uma nota prévia ao tema que irei abordar, refere-se ao facto de

ser habitual a inclusão dos temas relativos ao Desporto Escolar

(DE) - um sub-sistema do Sistema Educativo - nas iniciativas de

debate e discussão relacionadas com o Desporto. Não sendo, por

outro lado, habitual debater-se a temática do DE, em Congressos,

Conferências, Debates, etc. organizados no âmbito da Educação.

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Este pormenor poderá passar despercebido a alguns e, até não ser

considerado de grande importância, mas entendo ser um factor

visível da problemática que pretendo desenvolver nesta minha

comunicação.

Procurei situar a minha abordagem em três etapas principais:

1ª – Caracterizando a vastidão e a complexidade do sistema de

factores que interagem no fenómeno do DE;

2ª – Procurando delinear algumas das linhas orientadoras e

respectivas estratégias que considero ajustadas à situação actual

do DE;

E 3ª – Reforçando os aspectos prioritários de actuação a

promover.

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Uma primeira análise recai sobre os diversos níveis de factores

que devem nortear uma discussão coerente e efectiva sobre o DE.

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Isto é, não é aceitável colocar em causa por razões de natureza

organizacional, os conceitos ou princípios fundamentais de

participação e formação a garantir pelo DE. Como por exemplo, a

integração no mesmo quadro competitivo de equipas de escalões e

géneros diferentes. Deste modo, os princípios que visam uma

participação e uma experiência competitiva gratificante, são

menos importantes do que a resolução de natureza organizacional

que visa colocar todos no quadro competitivo. Um outro exemplo,

será justificar a participação dos praticantes federados no quadro

competitivo da mesma modalidade do DE, meramente por

questões operacionais de dificuldade em controlar o processo. Se

o princípio de encaminhar o praticante federado para práticas de

DE diferentes daquelas em que é federado fosse o considerado, o

sistema teria de encontrar as soluções operacionais, adequadas a

cumprir esse desígnio, mesmo que sejam de difícil execução. No

entanto, sabemos que às vezes é mais fácil contornar os

princípios.

Não pretendo com este exemplo, sugerir que a decisão de permitir

a participação de jovens federados nas equipas escolares da

mesma modalidade, tenha tido essa mesma justificação, de facto

não o sabemos, pois o documento orientador “Jogar pelo Futuro”

apresenta essa medida, mas não encontrámos a sua justificação.

Não pretendo, igualmente, discutir a minha posição sobre esta

temática, mas simplesmente tento ilustrar a falta objectividade no

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debate ou na discussão destes problemas. Realmente, seria

importante saber se essa medida vai ao encontro do princípio da

“Promoção da Saúde”, “do Desenvolvimento da Cidadania” ou da

“Formação de Bons Candidatos a Praticantes” como o referido

documento elege, certamente que os posicionamentos são

diversos, mas a razão de natureza operacional é que nunca deverá

ser colocada perante tão importante decisão.

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Conceitos e princípios

• Intervenção dos Sistemas (Educativo e Desportivo);

• Esclarecimento entre Desporto Escolar e Desporto na Escola;

• Os Congressos EF e do DE;• Análise comparada de modelos

internacionais

No que respeita ao debate sobre Conceitos e Princípios associados

ao DE, colocarei os 4 pontos assinalados no quadro, como

justificativos de uma análise e discussão alargada.

Como este Congresso reivindica estes objectivos, e não sendo

possível abordar um leque tão vasto de temas, darei particular

importância ao papel e intervenção dos Sistemas Educativo e

Desportivo no DE.

Fundamentalmente, porque é um assunto sempre presente em

épocas eleitorais, e que sistematicamente não tem trazido grande

esclarecimento. Os discursos têm-se caracterizado por conceitos

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tão amplos que sustentam vastos leques de opções. O actual

Programa de Governo, a este respeito, não foge à regra, senão

vejamos: “No quadro das relações com o sistema desportivo, a partilha de

competências entre a Administração Pública e o movimento associativo deverá

sempre obedecer a um esforço comum que garanta participação, equilíbrio,

desenvolvimento, transparência e verdade desportiva.”

Um breve relance sobre o modelo de alguns países que

correspondem a exemplos típicos, sugerem a existência de 3

conceitos principais e vários de organização mista. Centrar-me-ei,

assim, nos 3 principais.

O modelo exclusivamente escolar, coloca as principais opções

do Estado no apoio à actividade realizada nas escolas, deixando à

iniciativa privada o apoio ao associativismo. Este modelo

associado a alguns países nórdicos, permite garantir recursos

consideráveis ao trabalho realizado nas escolas, mas fragiliza os

resultados desportivos. Registe-se que, actualmente, a Educação

Física Escolar (EF) na Suécia encontra-se integrada numa área

disciplinar denominada “Educação para a Saúde” a par com a

Educação Alimentar, Ambiental e outras, o hábito de actividade

física está de tal modo já enraizada na sociedade que a EF pode

assumir um carácter menos relevante e associado a outras

prioridades educativas.

O modelo exclusivamente desportivo, organiza-se em torno da

reprodução dos modelos de organização desportiva federada na

escola. A Austrália, é um exemplo próximo deste conceito, tendo

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ultimamente apresentado resultados significativos a nível

desportivo. Esta opção passa por financiar as Escolas, no sentido

de poderem integrar as organizações desportivas regionais e

nacionais. É deixada à Escola a decisão sobre o tipo de

participação e as modalidades a que aderem. Tem influenciado a

qualidade das organizações, pois as escolas seleccionam a sua

participação por critérios de qualidade/custo em função da oferta

existente.

O modelo estatal, centra a responsabilidade organizativa no

Estado, criando uma estrutura similar à organização federada, mas

adaptada às características do meio escolar. A FNSS francesa é

um exemplo típico desta opção. Pressupõe uma hierarquia de

competências, evoluindo à medida que o escalão etário, também

evolui. Desde a total responsabilidade da escola pela participação

desportiva nos escalões mais jovem, evolui para um

relacionamento integrado com as autarquias nos escalões

intermédios de participação competitiva e atribui a

responsabilidade exclusiva do sistema desportivo a partir da fase

de orientação e especialização desportiva. Esta delimitação de

sectores de intervenção, poderá ter vantagens na rentabilização de

recursos, mas parece ter fragmentado o percurso desportivo dos

jovens. Actualmente, tem sido difícil manter esta opção, devido à

necessidade de muitas modalidades gerirem a carreira desportiva

dos seus praticantes, logo desde o seu início e, provavelmente,

devido à crise que a Escola francesa atravessa.

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Portugal, tem-se caracterizado pelo “modelo globalizante e

pulverizante”, isto é, o estado garante apoios às escolas para a

prática desportiva dos jovens, garante o mesmo ao movimento

associativo desportivo e, ainda, garante o mesmo às autarquias

para os mesmos destinatários. Este modelo de tal modo

envolvente, á parte a ironia, paralisa o jovem ficando sem saber

qual a oferta a escolher. Talvez encontremos aqui a justificação

para o fraco rácio de participação desportiva dos portugueses.

É fácil entender qual o resultado da pulverização na distribuição

dos recursos, todos ficam satisfeitos porque foram contemplados,

ninguém consegue ser verdadeiramente eficaz com a reduzida

parte que lhe coube.

Em 2000, o ex-IND apresentou uma execução orçamental que

rondou os 100 milhões de euros (20 milhões de contos) cujo

destino foi o apoio aos diversos programas de desenvolvimento

da prática desportiva do País, ao mesmo tempo, consultando o

Relatório de Contas do Estado desse ano, pode verificar-se que as

autarquias locais integraram em rubricas de apoio ao Desporto,

uma verba superior a 100 milhões de euros (também à volta de 20

milhões de contos). Poderemos conjecturar sobre a vantagem de

enquadrar estes recursos numa lógica comum de

desenvolvimento, direccionando os apoios para determinados

projectos considerados prioritários. Do modo actual, não há

apoios que cheguem.

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Interessará, também, reavivar os debates introduzidos nos

diversos Congressos Nacionais de EF e do DE que deixaram um

legado de sugestões e orientações estratégicas objectivas sobre o

desenvolvimento do DE. A esse respeito sugiro a leitura das

moções aprovadas desde o 1º Congresso Nacional EF até ao

último realizado em 2003.

Tem igualmente interesse, relembrar as afirmações proferidas no

1º Congresso DE em 1998, pelo então Director do GCDE,

Manuel Brito: “Não poderemos ter grandes avanços quantitativos e qualitativos no

Desporto Escolar se, questões como, por exemplo, a rede escolar, a carga horária lectiva

semanal dos alunos e a sua distribuição, as instalações desportivas, os transportes

escolares, a formação dos professores e a própria qualidade no ensino da Educação

Física, não contribuírem para promover ou facilitar o desenvolvimento harmónico de

todo o sistema.” O interesse reside na actualidade das questões

colocadas, mesmo após mais de 7 anos passados e vários elencos

governativos, a natureza das questões não se modificou

significativamente.

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Enquadramento institucional

• A dança dos ministérios;• A importância relativa dos Gabinetes;• O modelo de financiamento.

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Este nível de abordagem integra um tema bastante sensível, o

Financiamento. Fonte apetecível de interesses, principalmente nos

momentos de crise económica.

Por via das opções estratégicas relativas à contenção da despesa

pública, a Escola está, actualmente, bastante fragilizada e debate-

se com muitas dificuldades para cumprir a sua missão.

Naturalmente, o DE reflecte estas dificuldades nas escolas devido

à incerteza associada ao desenvolvimento das actividades.

Certamente, todos os presentes que trabalham diariamente nas

escolas percebem como é difícil organizar um projecto sem

orçamento, em participar em iniciativas sem a garantia de retorno

das despesas efectuadas e sem previsão dos seus montantes. Mas

é assim que funciona.

A aflição é grande, e ainda mais a contradição entre a importância

atribuída ao DE – um dos temas centrais do Congresso do

Desporto, instrumento de grande aposta da sociedade portuguesa,

sem esquecer o Governo anterior que até elaborou metas do DE

para uma década, ou seja até 2013, mesmo sem sequer saber qual

o orçamento com que pode contar no final de cada ano – como

sabemos as receitas para as actividades do DE advêm do jogo

social sendo por natureza incertas.

E apesar das verbas garantidas pelo jogo social ao DE serem,

actualmente, atribuídas por via directa e estarem consignadas em

lei, não são configuráveis com uma actividade educativa

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permanente que requer recursos estáveis e objectivos.

Normalmente, a opção das escolas é a de manter as actividades

previstas com base no anterior para não gorar as expectativas dos

alunos, mesmo à custa da qualidade em que essas actividades

decorrem. É usual os professores fazerem deslocar os alunos aos

jogos e encontros nos seus veículos particulares, mesmo sabendo

que não estão a coberto pelo Seguro Escolar… Nenhum modelo

de desenvolvimento deveria assentar numa base como esta.

Muito mais poderia ser dito sobre o modelo de financiamento,

mas optei por referir uma componente importante do problema.

No que se refere à constante dificuldade em o Ministério da

Educação integrar o DE verdadeiramente no seu seio, reflecte,

também, a sua inaptidão para lidar com áreas educativas que de

algum modo se interligam com outros sectores da sociedade, é o

caso do ensino profissional, do ensino artístico e ultimamente o

próprio Plano Tecnológico. Constituem-se áreas isoladas e quase

sempre desenvolvidas através de projectos autónomos desligados

dos restantes. Não admira, deste modo, a instabilidade orgânica

do DE no ME, sem que isso, nalguns casos passados, esteja

associado a falta de importância.

No entanto, um nível orgânico elevado na estrutura da

Administração Pública (AP) acabará sempre por possibilitar o

desenvolvimento de medidas que de outro modo não serão meras

intenções ou discursos. Ilustrarei este facto com um exemplo

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relacionado com a intervenção no 1º CEB, área que abordarei

mais adiante, mas o facto de o GCDE ter sido, em tempos,

equiparado a uma Direcção Geral, permitindo o acesso do seu

Director às reuniões de cúpula do Ministério Educação, garantiu

que um Director Regional devidamente esclarecido e cúmplice

entre os seus pares, tenha durante algum tempo exigido que a

Inspecção Geral Ensino da sua região questionasse e exigisse

junto dos professores o cumprimento do Programa de EF nas

escolas abrangidas. Os seus efeitos ainda hoje são visíveis. Ora

uma medida desta natureza, controversa e pouco habitual, só foi

possível pelo posicionamento institucional do GCDE.

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Quadro legislativo

• As Leis de Bases (Educação / Desporto);• As leis orgânicas;• A aplicação e a regulamentação dos

instrumentos legislativos.

Sobre esta matéria terei de sugerir a todos os interessados uma

leitura atenta do trabalho do meu colega e amigo Manuel Pina que

soube reproduzir no trabalho de investigação da sua Tese de

Mestrado com objectividade e particular inteligência alguns dos

percursos sinuosos do DE nas últimas décadas e a respeito do

qual aproveitarei algumas passagens: disse ele em 1997: “…a

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evolução histórica do DE em Portugal, reflecte claramente, a

dificuldade que tem existido na construção de um modelo

organizacional que se afirme, definitivamente, como uma solução

de continuidade.” E diz mais adiante: “…é, também, urgente a

criação de uma estrutura sólida, eficaz, participada e

reconhecida por todos. Doutra forma, não será possível o

desenvolvimento pleno da prática desportiva no seio da escola”.

É a visão de quem assiste ás constantes alterações do quadro

legislativo e normativo, originando repercussões desastrosas na

estabilidade necessária à sustentação dos projectos educativos.

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Estrutura organizacional

• O Programa e os seus objectivos;• A estrutura nacional• O orçamento;• As ligações ao Sistema Desportivo e às

Autarquias;• O 1º Ciclo do Ensino Básico;

• A avaliação dos resultados

A Estrutura Organizacional do DE tem assentado num

instrumento base que é o Programa do DE. Este instrumento de

referência não tem sofrido alterações de grande monta na última

década e, tem mesmo vindo a ser cirurgicamente melhorado,

constituindo actualmente um documento de trabalho que revela

bastante maturidade e adequação, apesar de abranger

exclusivamente os 2º e 3º ciclos do EB e o Ensino Secundário.

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Houve claramente um retrocesso, pois em tempos o Programa do

DE abrangia todos os ciclos de ensino.

Apesar da sua maturidade e ajustamento, será efectivamente um

documento em fim de vida, caso o DE assuma orientações

organizacionais distintas como nos é permitido prever pelos sinais

que têm vindo a ser emitidos por alguns responsáveis.

Outros problemas terão de ser equacionados, como o da estrutura

de coordenação do DE que apresenta um caso típico de

desajustamento da AP. Nesta situação os agentes de coordenação

do DE relacionam-se hierarquicamente de forma dupla, ou seja,

articulam-se paralelamente com a Direcção Regional e com a

Coordenação Nacional. Se nuns casos pode causar respostas

contraditórias, noutros casos, tem sido visível não responder nem

a um nem a outro.

É neste panorama de alguma liberalização de procedimentos que

vamos encontrar um dos principais obstáculos à estruturação de

uma matriz ideológica e política para esta área. As situações de

“facto consumado” que avulsamente se têm vindo a constituir no

que respeita à articulação com o Sistema Desportivo (SD) e com

as autarquias, certamente irão condicionar o modo e o tempo das

reformas que são necessárias ao sistema.

São conhecidas as vantagens de já se estar no “terreno antes do

jogo começar” e é, igualmente, conhecida a importância

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estratégica que o número de praticantes assume para o suporte e o

financiamento do SD. Por isso, nem há problemas se ainda

andarem de fraldas ou usarem chucha. Com alguma ironia poder-

se-á dizer que, apesar de não estar ainda licenciada, já abriu a

caça ao praticante desportivo.

Esta questão poderá parecer retórica, mas não! As dificuldades

que o Sistema Educativo (SE) e, principalmente as escolas, têm

evidenciado na qualificação das suas práticas, isto é, garantir a

sua universalidade, ecletismo e inclusividade, não poderá ser

substituído por soluções, certamente cheias de generosidade, mas

desviantes dos desígnios anteriormente referidos.

Ajuda e apoio à escola por parte da comunidade é sempre bem

vindo (SD, autarquias, privado), quer seja no plano técnico,

melhorando a qualificação dos Profissionais de Educação Física

(PEF), quer seja no plano pedagógico, ajudando os PEF a adquirir

competências de treino ou até no plano logístico, facilitando o

acesso dos jovens a instalações desportivas adequadas ou

garantindo o encaminhamento daqueles que desejam continuar as

práticas desportivas para além da escola, mas nunca retirando a

responsabilidade da condução das práticas à escola e aos seus

agentes educativos.

Gostaria de aprofundar esta temática, debatendo a situação do 1º

CEB.

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Tem-se generalizado a crença de que algumas actividades da

Educação Física, adequadas a este nível de ensino, como jogos,

danças ou patinagem, entre outros, não constituem matérias de

ensino, mas sim, actividade lúdica. Por outro lado, a sociedade

espera da escola uma solução para os problemas da afirmação

desportiva do País. Estas crenças têm contribuído para que a

comunidade educativa, na sua maior parte, não reconheça e

confunda o conteúdo pedagógico da EF.

A EF, no 1º Ciclo, tem essencialmente uma natureza pedagógica

com uma forte componente lúdica, e, portanto, é o professor da

turma o único que possui a competência necessária para

encaminhar a actividade no seu sentido correcto e dela extrair

todas as consequências formativas para a criança. Todo o

processo de ensino-aprendizagem, que diferentes áreas do

conhecimento exigem, tem neste nível de ensino o professor

generalista como eixo fundamental – ele é especialista neste

grupo etário de alunos, tal como o médico de família é

especialista à generalidade do apoio a cuidados de saúde.

Para que não vá cair no esquecimento, relembro, também, o

trabalho de investigação conduzido pelo Prof. Dr. Leonardo

Rocha em 1998 no âmbito da sua Tese de Doutoramento, quando

constata que alguns professores deste nível de ensino referem a

dimensão pedagógico-didáctica da EF pouco dominada devido a

lacunas na sua formação inicial. Ora, se é este o problema, será

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lógico investir na sua resolução. Ou em sentido figurado, quando

o médico tem dificuldade em acertar com a terapêutica, é

substituído pelo enfermeiro? Naturalmente, procura garantir o

apoio de meios auxiliares e vai a Congressos, isto é, actualiza-se!

Portanto, qualquer intervenção do DE neste nível de ensino,

deverá garantir estritamente o apoio às actividades de

complemento curricular, fora do horário lectivo e no pressuposto

que dão continuidade às práticas regulares de EF que sejam

possíveis nessa escola.

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Programa operacional

• Os horários;

• O quadro de actividades;• As instalações;

• Os modelos de participação competitiva;• Os projectos educativos e os professores

responsáveis.

Sobre as condições de realização do DE na Escola, tem surgido

pouco debate construtivo, não sei se por ser um tema de menor

importância ou se para se discutir é preciso saber do se fala?

As condicionantes de aplicação do DE na escola, não são

influenciáveis exclusivamente por instrumentos do DE,

relacionam-se e, na maioria dos casos, são determinadas por

factores externos ao DE.

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Vejamos o caso dos horários destinados ao DE nas Escolas.

Dependem do horário disponível dos alunos para a prática,

dependem das instalações disponíveis para a prática e dependem

do horário disponível do professor para os treinos.

Uma análise criteriosa desta situação deverá considerar vários

panoramas em que a situação das escolas não é toda igual.

Existem os casos das escolas superlotadas – aquelas que

funcionam em regime duplo, quase todas as dos grandes centros

populacionais não são a maioria das escolas, mas têm cerca de

60% da população estudantil do País) – Não existe espaço de

coincidência entre os 3 factores anteriormente referidos, excepto

no final das aulas e durante o período de almoço e, o caso das

escolas que funcionam em regime normal (das 9h00 às 16h00) –

aquelas que se situam em localidades de reduzida densidade

populacional, em decréscimo e, normalmente afastadas dos

grandes centros – A disponibilidade aparece exclusivamente após

o término das aulas.

A realidade tem demonstrado que, neste último caso das escolas

afastadas dos grandes centros, os alunos que mais beneficiam do

DE são aqueles que residem próximo do estabelecimento de

ensino, os restantes, estão dependentes dos transportes escolares

que os deslocam para as suas aldeias e, normalmente, não

contemplam a possibilidade dos alunos ficarem mais tempo na

escola.

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As escolas superlotadas, não têm obtido grande sucesso com

oferta de DE após as 18h30, apesar de algumas teimosamente

apostarem nessa solução. É um fenómeno, ainda pouco

esclarecido, mas deve ter a ver com as dificuldades de gestão

familiar que decorrem da vida nos grandes centros urbanos. Por

via de regra e apesar de ser desaconselhado pelo DE, o horário

que a maioria destas escolas destina ao DE situa-se durante o

período de almoço dos alunos.

A escola onde lecciono considero que apresenta características

muito comuns à maioria das escolas superlotadas dos grandes

centros, a oferta de DE, também me parece típica: oferta de

modalidades desportivas tradicionais durante o período de almoço

e actividades de carácter pontual realizadas em espaços distantes

da escola que possibilitam o desenvolvimento de projectos

associados à relação com a natureza e de preocupação ambiental.

Nestes casos, a realização das actividades é sempre com prejuízo

de outras áreas lectivas.

O que nos parece estranho, neste caso, é o facto de existirem

diversas instalações desportivas na proximidade pertencentes a

associações desportivas locais e a privados que estão desocupadas

durante grande parte do dia, mas só disponibilizam o acesso aos

alunos da escola mediante pagamento. Até hoje, ainda não foi

possível garantir o funcionamento de Núcleos de DE nessas

instalações, de manhã para os alunos que tem aulas à tarde e de

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tarde para os alunos que têm aulas de manhã. Certamente que se

trata de inabilidade da nossa parte para resolver o problema.

O modelo em vigor para a participação competitiva, é o possível,

está optimizado e será difícil fazer melhor, trata-se do resultado

do trabalho que muitos colegas com responsabilidade na

Coordenação do DE têm vindo a desenvolver e demonstra a nossa

capacidade para rentabilizar recursos quando eles se manifestam

insuficientes. Claro que não me refiro exclusivamente aos

recursos financeiros, mas também, às variáveis de contexto

limitadoras e inflexíveis à natureza deste trabalho.

De um modo geral, poderá caracterizar-se esta situação por um

modelo em que os jovens não têm a quantidade de momentos

competitivos que seria desejável, não competem com outros

colegas de igual nível de prestação competitiva e despendem

demasiado tempo em situações que não estão directamente

relacionadas com a competição, como as deslocações e os tempos

de intervalo entre jogos nas concentrações.

Deste modo, procurei traçar um quadro geral da problemática

associada ao DE no nosso País, identificando os seus aspectos

mais polémicos e exemplificando, quando necessário, situações

típicas da realidade.

A parte final desta minha comunicação, será destinada ao

lançamento de sugestões para debate, que no meu entender,

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poderão ser boas pistas na resolução de alguns problemas que

aqui foram levantados.

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Prioridades (I):

• Nível Conceptual:– Definição de responsabilidades do Estado– Delimitação de sectores (Administração central,

local e privado)

Considero fundamental clarificar que apoia o quê, como, em que

situações e com que recursos.

Parece-me desejável que as práticas de DE sejam garantidas pela

Escola através dos seus agentes educativos, podendo contar com o

apoio técnico, pedagógico e logístico das autarquias e dos demais

agentes desportivos.

Os recursos públicos disponíveis devem ser concentrados nesta

lógica, decorrendo por conta e risco das entidades externas à

escola a promoção de iniciativas paralelas que se destinem ao

mesmo grupo de destinatários. Ou seja, devido às fragilidades

orçamentais, o estado deverá concentrar os recursos destinados a

esta área no apoio à Escola e não dispersar os meios por diversos

agentes de intervenção comunitária.

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Prioridades (II):

• Nível Institucional: – Organismo Coordenador Independente

(Instituto, Unidade de Missão, Alto Comissariado, Federação, etc.)

Os recursos são públicos, a aposta deve ser na Escola Pública.

Em primeira instância, o Governo deveria rapidamente transpor

para a realidade portuguesa a recomendação do Conselho da

Europa adoptada em 2003 no Comité de Ministros sobre o

desenvolvimento da EFD nas crianças e jovens nos países

europeus, nomeadamente: “It is agreed that the number of hours of physical

education in the curriculum should move towards a compulsory legal minimum of 180

minutes weekly, in three periods, with schools endeavouring to go beyond this

minimum where this is possible. Children and young people should, however, have one

hour of physical activity every day, which would include physical education and sports

lessons in or out of school time, and other out-of-school exercise (for example, walking

or cycling to school).”

Relembro que a EF nas escolas públicas só tem uma carga horária

de 180minutos nas escolas do que não manifestem dificuldades

em a garantir, podendo nalguns casos ser reduzida, nas restantes

escolas é de 135 minutos.

Como a AP se têm revelado incapaz de garantir solidez e

continuidade aos projectos nesta área, perante o avanço de

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fenómenos associados à saúde, como a epidemia de obesidade e

os fenómenos de marginalidade associados à grande instabilidade

sócio-económica, deverá ser encontrada uma solução que reflicta

essa urgência e gravidade social. Temos o exemplo dos fogos, da

tóxico-dependência, da modernização tecnológica, todas

merecedoras de um organismo que coordena e articula

competências que se distribuem por vários ministérios e sectores

da sociedade portuguesa. Denomine-se de alguma maneira e tenha

o formato que se entender mais ajustado, mas não pode deixar de

ter estas valências e de possibilitar a agilização de procedimentos

até aqui impossíveis de conseguir.

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Prioridades (III):

• Nível Organizacional:– Redes locais (ADEs)– Níveis de participação desportiva– Definição do quadro de dupla participação

(federada / escolar)– Modelo de acompanhamento e supervisão

As dificuldades enunciadas no plano organizacional do sistema,

advém da conhecida, mas não assumida, tendência centralizadora

do Estado, por vezes, camuflada de desconcentração de serviços

que mais não fazem do que complicar e atrapalhar o

desenvolvimento.

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Os projectos, em alguns casos, são de uma qualidade fora do

comum, mas vêem-se limitados quando a sua execução recai

sobre agentes sem relação com a prática. Não é habitual ver o

arquitecto responsável por um projecto, a empilhar tijolos ou a

assentar cimento!

Assim, o DE deve basear a sua prática e as suas iniciativas na

capacidade organizativa e mobilizadora da Escola e para tal deve

estabelecer uma rede funcional entre elas, garantindo que a nível

local são encontradas as melhores soluções e, ao mesmo tempo,

as decisões são participadas pelos destinatários. A estrutura do

DE deve supervisionar e acompanhar, nunca organizar.

Parece-nos incoerente que se releve a importância das boas

práticas e a sua apologia, mas ainda não se tenha colocado em

prática um programa de apoio à disseminação da experiência da

Associação Desportiva Escolar de Sintra (ADE), que ao longo de

vários anos tem revelado ser uma solução credível e sustentável,

amplamente elogiada por vários sectores, incluindo a

Administração Pública Educativa e Desportiva. Mas realmente,

pouco ou nada foi feito para a sua extensão a outras zonas do

País.

É deste tipo de redes que precisamos, baseados na iniciativa local,

apoiadas e acompanhadas por quem o deve fazer.

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A ideia dos colegas de Sintra deve ter sido espiada porque o

Reino Unido, tem em desenvolvimento um Programa intitulado

“Learning through PE and Sport” que aposta nesta lógica de redes

locais, devidamente apoiadas para garantir a desejável ligação

entre a actividade realizada na escola e a sua continuidade fora da

dela.

Slide 11

Learning through PE and SportThe Physical Education, School Sport and Club Links Strategy

(ENG)

• Specialist schools are maintained secondaryschools1 that receiveadditional funds (they raise£50,000 from sponsorshipand receive a £100,000 capital grant and £123 perpupil recurrent funding peryear for four years).

Muitos jovens não se preocupam muito sobre o nível da

competição em que participam, eles desejam é jogar! A criação de

redes de participação de proximidade permite garantir a desejada

frequência competitiva sem grandes custos, por outro lado

permite organizar os quadros competitivos em grupos de nível

que equilibre o nível competitivo. Os conhecidos 120 a zero, em

competições de DE, são o 1º passo para a desmobilização da

prática desportiva.

Será que nos interessa promover praticantes activos, ou

praticantes de bancada ou de PS2.

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Reforço esta ideia, o DE, ao contrário do SD que visa o resultado,

tem um carácter pedagógico e inclusivo, possibilitando a todos os

jovens que o desejam, usufruir do treino de uma modalidade

desportiva e tenham experiências competitivas.

Para o sucesso deste modelo, exige-se proximidade dos

responsáveis e mecanismos de acompanhamento frequente das

actividades. A criação de supervisores para aconselhamento e

orientação da actividade das escolas é factor decisivo para a

interligação dos processos e das políticas. Tem semelhanças com

o modelo de redes de estágio pedagógico que algumas escolas de

formação de professores estruturaram no terreno, a ULHT e a

FMH são um exemplo.

Slide 12

Prioridades (IV):

• Nível Operacional:– Protocolo de utilização de instalações

desportivas– Oferta selectiva das actividades por idades

Recuperando a referência a Manuel Brito sobre a necessidade de

se tomarem medidas conjugadas para produzir efeitos harmónicos

no sistema, de nada servem medidas estruturantes de política para

o sector se questões básicas como a disponibilidade de momentos

para a prática, porque é disso que se trata e convém não esquecer,

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não estiver assegurada por instrumentos de apoio normativo e

programático.

Um passo nesse sentido deverá ser a disponibilização de todas as

instalações desportivas próximas das escolas para utilização em

práticas de DE, quando as instalações escolares estiverem

superlotadas ou não tenham as condições necessárias para

algumas praticas desportivas.

Quer através de um modelo de contratualização ou através da

determinação do “interesse público”, seria desejável que as

instalações desportivas fossem rentabilizadas pelas escolas

durante os períodos de menor ocupação dessas entidades.

Em suma, o DE não deve assumir as mesmas formas para todos

os alunos, as suas finalidades e objectivos devem ser comuns, mas

a sua operacionalização deve reger-se por princípios de decisão

local, ajustada a regras e orientações e de acordo com as

características do contexto e dos seus destinatários.

Finalizando, o diagnóstico há muito que vem sendo feito, as

terapêuticas podem ser de impacto suave – exigem tempo,

paciência, rigor e relativamente poucos recursos na sua aplicação,

normalmente não provocam muitos efeitos secundários, mas é

difícil conseguir chegar ao fim; podem ser terapias de choque –

são onerosas, provocam grandes desequilíbrios e fragilizam “o

paciente” durante algum tempo, mas são rápidas e eficazes; e

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temos as terapias milagrosas, são baratas, fáceis e sem efeitos

secundários, basta estar atento à comunicação social, além das

crianças, ainda existem alguns adultos que acreditam no Pai

Natal!

Boas Festas a todos.