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20. Capítulo 20
Comunicações sem fios Carlos A. Fernandes
20.1 Introdução
De entre todas as tecnologias de informação que nos envolvem no dia-a-dia, os
telemóveis são os dispositivos que usamos quase como uma extensão inseparável do
nosso corpo. Conferem-nos o poder de comunicar à distância instantaneamente, em
movimento e sem fios, praticamente sem restringir o local onde nos encontramos, onde
se encontra o destinatário ou a fonte de informação. Proporcionam a possibilidade de
conversação, a partilha de imagem e de dados em tempo real e até a possibilidade de
controlar outros dispositivos.
Este privilégio extraordinário, que já consideramos banal, só se tornou possível há
muito pouco tempo, à escala da evolução do Homem. Durante séculos as trocas de
informação à distância faziam-se por intermédio de mensageiros que viajavam entre o
emissor e o destinatário. Por exemplo, quando Pedro Álvares Cabral chegou em 1500 a
Porto Seguro, Brasil, teve de destacar duas naus da sua armada para fazer chegar a
Portugal a notícia da sua descoberta, uma viagem de quase dois meses. Para melhor
percebermos quão recente é a tecnologia para comunicação instantânea à distância,
podemos tomar como referência o aparecimento da escrita há cerca de 5200 anos e
escalar o tempo decorrido até ao presente como se correspondesse a um único ano, com
o aparecimento da escrita a 1 de Janeiro; nesse calendário escalado, a invenção do
telégrafo com fios ocorreria só a 18 de Dezembro, a telegrafia sem fios em 22 de
Dezembro e o aparecimento dos primeiros telemóveis a 27 de Dezembro. As versões
“smart” apareceriam a meio do dia 31 de Dezembro.
Podemos dizer que a aventura das comunicações sem fios começou por volta de 1873
quando James Clerk Maxwell escreveu as equações que previam a existência de ondas
electromagnéticas (OEM), capazes de propagar com uma velocidade finita e igual à da
luz (ver Capítulo 19). Analiticamente a onda radiada por uma fonte pontual pode ser
representada por um vector da forma
( ) ( ) ̂
em que r representa a distância do observador à fonte e t representa o tempo; é
a frequência angular e é a constante de propagação ou número de onda. Entre
a frequência e o comprimento de onda verifica-se a relação em que
representa a velocidade de propagação da onda. No vácuo m/s. O
vector unitário ̂ define a polarização da onda e é transversal à sua direcção de
propagação,
A comprovação experimental da existência de OEM só veio a ser feita por Hertz, em
1887. Hertz encarou o desafio como um mero trabalho académico, sem suspeitar que
seria o precursor de uma nova era e que as ondas de rádio iriam ter um impacto
extraordinário para o avanço da civilização.
Alguns cientistas como Oliver Lodge, Chandra Bose, e Alexander Popov, reproduziram
a experiência de Hertz, aperfeiçoarem a tecnologia e demonstraram-na para sinalização
sem fios. Mas foi Guglielmo Marconi quem anteviu a possibilidade de explorar
comercialmente as OEM para telegrafia sem fios. Patenteou o seu sistema de
transmissão e estabeleceu um serviço comercial de telegrafia sem fios em 1902 que se
generalizou rapidamente por todo o mundo [1]-[3].
Figura 20.1 – James Maxwell (1831-1879); Heinrich Hertz (1857-1894); Guglielmo
Marconi (1874-1937).
Os desenvolvimentos que se seguiram nesta área a nível teórico e experimental bem
como o ritmo a que aconteceram foram estonteantes, suportados em iguais avanços
noutras disciplinas, como a física, a electrónica e a matemática [4], [5]. A primeira
emissão comercial de rádio (com áudio) fez-se em 1919. Em 1930 descobriu-se a
radiação da nossa Galáxia no espectro de rádio, levando ao nascimento da
Radioastronomia. Na mesma década desenvolveu-se o Radar e a Televisão. Em 1957 foi
lançado o primeiro satélite de comunicações, marcando uma nova era das comunicações
à distância. Os telemóveis começaram a ser desenvolvidos na década de 70, iniciando a
revolução do acesso pessoal e imediato às comunicações móveis via rádio. Nas últimas
duas décadas ficaram disponíveis outras aplicações destinadas ao grande público como
a localização por satélite (ex. GPS), as redes de dados sem fios Wi-Fi ou as ligações
Bluetooth.
É interessante reparar que as comunicações baseadas em OEM começaram por almejar
alcances muito elevados, mas são hoje de uso generalizado também para distâncias cada
vez mais curtas, reduzindo-se em alguns casos a uns meros centímetros. É o casos dos
recentes sistemas de comunicação de campo próximo (NFC – “near-field
communications”) que permitem emparelhar dispositivos aproximando-os tipicamente a
menos de 5 cm.
20.2 A experiência de Hertz
Hertz, enquanto estudante de doutoramento na Universidade de Berlim, começou por
declinar um desafio lançado por Helmoltz em 1879 para investigar a relação entre os
campos electromagnéticos e a polarização dieléctrica de materiais isolantes. Hertz
analisou o problema e considerou não ser tecnicamente viável na altura, por requerer o
uso de frequências muito elevadas.
No entanto manteve o interesse e voltou ao assunto quando se tornou professor em 1886
na Technische Hochschule Karlsruhe na Alemanha. Apercebeu-se de como poderia
gerar e detectar ondas electromagnéticas ao descarregar uma garrafa de Leyden1 através
de uma bobina2. Observou por acaso o aparecimento de uma faísca na fenda de uma
espira que estava próxima da bobina.
Figura 20.2 – Esquema da montagem apresentada por Hertz em 1886 (adaptada de [1]).
O circuito que desenvolveu e que pode agora ser visto como um sistema de rádio
completo, está representado esquematicamente na Figura 20.2. O emissor é constituído
por uma bobina de indução (A) ligada a um par de varões metálicos colocados topo a
topo com uma pequena fenda entre si (B) e terminados por esferas (C) e (C´). Estes
varões e esferas com cerca de meio comprimento de onda formam o elemento radiador,
a que hoje chamamos o dipolo de Hertz – a antena. O receptor é uma simples espira
com uma pequena fenda (M) cujo espaçamento pode ser ajustado para facilitar a faísca.
1 Dispositivo inventado em 1745 para armazenar cargas electroestáticas. Foi o antecedente do que se
designa actualmente por “condensador” nos circuitos electrónicos. 2 Enrolamento de muitas voltas de um fio condutor.
A
C C’ B
M
3 m .25 m .25 m
.8 m
1.2 m
Quando se alimenta a bobina de indução e se produzem faíscas na fenda (B) do dipolo,
aparecem faíscas na fenda (M) da espira colocada a uma certa distância. O perímetro da
espira usada na montagem da Figura 20.2. indica que estava sintonizada para um
comprimento de onda da ordem da ordem de 8 m, ou seja para uma frequência de 37.5
MHz. Posteriormente Hertz incluiu uma capacidade (garrafa de Leyden) no circuito da
bobina de indução para formar um circuito ressonante e assim controlar a frequência da
onda radiada. A utilização de circuitos ressonantes permitiu melhorar significativamente
a sensibilidade da detecção.
Este resultado por si só não era suficiente para demonstrar as equações de Maxwell e a
existência de ondas electromagnéticas. Note-se que nesta altura já eram conhecidos
alguns sistemas de sinalização à distância baseados em indução magnética, que no
entanto não tinham nada a ver com as OEM. Maxwell previra que a luz era um
fenómeno de natureza electromagnética, pelo que seria necessário demonstrar que as
novas “ondas invisíveis” de Hertz satisfaziam as propriedades conhecidas da luz como a
polarização, a reflexão, a refracção e sobretudo a velocidade de propagação. Hertz
apercebeu-se que a demonstração das propriedades ópticas só seriam viáveis usando
comprimentos de onda razoavelmente mais pequenos que os dispositivos usados para os
testes. Hertz comprovou as propriedades referidas acima usando ondas centimétricas.
No que respeita ao elemento radiador acrescentou ao dipolo um espelho cilíndrico-
parabólico para criar direccionalidade.
Pode-se considerar que o segundo grande contributo dos trabalhos de Hertz foi a
descoberta da forma de fazer as OEM separarem-se dos condutores e propagarem-se no
espaço como previsto nas equações de Maxwell, ou seja a invenção do conceito de
antena.
Figura 20.3: Montagem rudimentar para reproduzir a experiência de Hertz.
A experiência de Hertz pode ser facilmente reproduzida num laboratório de ensino
recorrendo a objectos correntes, ver Figura 20.3. Para as antenas de emissão e de
recepção podem usar-se dipolos, constituídos a partir de varetas metálicas. Para gerar as
faíscas pode ser usado um isqueiro piezoeléctrico devidamente desmontado para
permitir o acesso aos terminais, que deverão ser ligados aos terminais de um dos
dipolos. Os terminais do outro dipolo podem ser ligados à entrada de um altifalante
auto-amplificado. A fenda entre as duas varetas de cada dipolo terá de ser
convenientemente ajustada.
De cada vez que se accionar o isqueiro, ouvir-se-á um estalido no altifalante, associado
à diferença de potencial que se estabelece nos terminais da antena de recepção quando
esta é envolvida pelo campo electromagnético gerado pela antena de emissão. Será fácil
transmitir por exemplo símbolos do código Morse a pequenas distâncias.
20.3 As primeiras transmissões via rádio
Hertz morreu prematuramente em 1894, mas o seu trabalho e os respectivos resultados
foram amplamente divulgados quer através das suas publicações quer através das
publicações de Oliver Lodge. Os vários investigadores que continuaram os seus
trabalhos dedicaram-se principalmente a aperfeiçoar o detector e as antenas, na maior
parte dos casos com o objectivo de aumentarem o alcance da ligação e de transmitirem
informação. Para além de Lodge, destacaram-se Chandra Bose, Alexander Popov,
Nicola Tesla e Guglielmo Marconi. Alguns destes, e nomeadamente Marconi,
acrescentaram aos seus sistemas uma chave de Morse3 no circuito de emissão e
auriculares na recepção para poderem escutar e interpretar os apitos típicos do código
Morse.
A comunicação transatlântica de Marconi
Marconi, eminentemente experimentalista, foi o único que conseguiu que os seus
inventos nesta área tivessem um impacto directo e duradouro na sociedade. Cedo
concluiu que para obter alcances elevados tinha de aumentar o tamanho das antenas e
trabalhar com comprimentos de onda na ordem da centena de metros. Nestas
frequências o rendimento típico das antenas é inferior a 1-2% o que obrigava a usar
potências de emissão da ordem das dezenas de kW.
Marconi propôs em 1901 a primeira ligação por ondas Hertzianas (nome dado na altura
às ondas de rádio) entre os continentes Europeu a Americano. As antenas foram
instaladas em Poldhu, Inglaterra e em St. Jones’ Newfoundland na América do Norte. A
Figura 20.4a mostra a antena instalada em Poldhu. Era um cone invertido com cerca de
60 m de diâmetro e 66 m de altura, formado por vários fios condutores ligando a
circunferência no topo com o vértice no solo, Figura 20.4b. Nestas frequências o solo
comporta-se como um bom reflector pelo que o cone e a sua imagem formam uma
antena do tipo dipolo – a antena mono-cone. No entanto a antena da Figura 20.4a
desmoronou numa tempestade alguns dias antes da demonstração de Marconi e teve de
ser substituída na experiência por uma provisória. Estima-se que terá usado um
comprimento de onda de 170 m e uma potência de 17 kW.
3 Interruptor de pressão que permitia abrir e fechar rapidamente o circuito de emissão para gerar o código
Morse. Este dispositivo já era usado nos sistemas de telegrafia com fios.
a) b)
Figura 20.4: a) Antena instalada em Poldhu, Cornualha, Inglaterra, para a primeira
emissão transatlântica de Marconi. b) Modelo da antena.
A explicação científica dos resultados de Marconi
O anúncio do sucesso na ligação foi acolhido com cepticismo pela comunidade
científica. Argumentavam que a acentuada curvatura da Terra entre os dois continentes
deveria impedir a propagação em linha recta das OEM, tal como acontece com a luz,
ver Figura 20.5a. No entanto Marconi não só repetiu a experiência com testemunhas
idóneas como iniciou mais tarde um serviço comercial de telegrafia sem fios.
A interpretação dos resultados experimentais de Marconi e a modelização dos
fenómenos físicos associados ocuparam a comunidade científica durante as décadas
seguintes, não só para explicar mas sobretudo para definir regras de projecto para este
tipo de ligações. Demonstrou-se que para distâncias pequenas para além do horizonte a
cobertura era assegurada pelo fenómeno da difracção, isto é, o encurvamento da
direcção de propagação da onda acompanhando o contorno da Terra – trajecto (1) na
Figura 20.5b, Embora a difracção permita a extensão da cobertura para além do
horizonte, o sinal atenua-se mais fortemente com distância do que em espaço livre e o
efeito é agravado com o aumento da frequência.
Para distâncias maiores e condições adequadas a cobertura era assegurada por uma
reflexão das OEM na chamada ionosfera, seguindo um trajecto semelhante ao (2) na
Figura 20.5b. A ionosfera é uma camada de gás ionizado que se forma espontaneamente
na alta atmosfera (tipicamente acima de 50 km) por acção da radiação solar e da
radiação cósmica. O índice de refracção da ionosfera é menor ou igual a 1 e depende da
densidade electrónica do meio ionizado. Para frequências baixas como a usada por
Hertz na sua ligação, o índice de refracção da ionosfera torna-se negativo impedindo a
penetração da onda, sendo esta totalmente reflectida. Acima da uma frequência crítica, a
ionosfera vai-se tornando transparente para as OEM deixando de as reflectir.
Assim fica claro que Marconi usou uma frequência propícia para a difracção e a
reflexão na ionosfera funcionarem ambas; no entanto essa frequência foi escolhida com
base noutros critérios, sem o conhecimento prévio da física destes dois fenómenos.
Figura 20.5: Propagação de ondas rádio próximo da superfície da Terra. a) Propagação
rectilínea antecipada pelos cépticos da experiência de Marconi; b) Mecanismos que
suportaram a ligação transatlântica de Marconi: reflexão na ionosfera (1) e difracção da
“onda de solo” (2).
20.4 O espectro electromagnético
O passo seguinte na investigação foi naturalmente passar da transmissão de código
Morse para a transmissão de áudio. A estratégia anterior de gerar OEM com base em
faíscas não era eficaz para a transmissão de telefonia pelo que se deu a primeira
mudança de paradigma: a substituição do gerador de impulsos (faíscas) por um gerador
de onda contínua. Um impulso, portanto um sinal com duração curta no tempo, gera
uma gama de frequências bastante larga. Pelo contrário um sinal sinusoidal contínuo no
tempo gera uma única frequência o que apresenta vantagens como se explica a seguir.
A associação de informação a esta onda contínua (“continous wave” – CW) começou
por ser feita por modulação da sua amplitude (AM)4. Esta modulação gera uma estreita
banda de frequências em torno da frequência central, que no entanto é muito mais
estreita que a associada aos impulsos dos sistemas de faíscas. Assim, os sistemas CW
trouxeram a possibilidade de definir bandas e canais de frequência para os serviços de
rádio que foram aparecendo sucessivamente. Foram distribuídas no espectro de
frequências de forma coordenada em todo o mundo para minimizar interferências entre
serviços. Os nomes dessas bandas e os nomes de alguns serviços de rádio estão
indicados na Figura 20.6. por ordem crescente de frequências.
a) b)
Figura 20.6: a) Espectro electromagnético, designações das bandas e aplicações. b)
Detalhe do espectro de rádio frequência.
4 Processo em que a amplitude da onda sinusoidal portadora é variada no tempo em proporção da
amplitude do sinal de informação que se pretende transmitir.
O espectro de rádio frequência estende-se da dezena de kHz até cerca de 3 GHz. Está
assinalado na Figura 20.6a e está expandido na Figura 20.6b. As comunicações de longa
distância do início do século XX, incluindo a radiodifusão com modulação de amplitude
(AM), funcionavam nas frequências mais baixas do espectro de rádio. A sua utilização
acabou por ser suplantada pelas comunicações via satélite, mas ainda subsistem
presentemente em comunicações militares de recurso, difusão de padrões horários ou de
outros sinais de referência. Para frequências sucessivamente mais elevadas, surge a
rádio difusão em modulação de frequência (FM), a televisão, as comunicações móveis,
as redes sem fios (como o Wi-Fi), entre várias outras aplicações mais recentes.
No espectro de microondas (Figura 20.6a) inclui-se o radar, as ligações de dados entre
estações de telecomunicações, as comunicações com satélites e recentemente as redes
sem fios que tendem para ritmos de transmissão da ordem de 1 Gbit/s. Na última década
tem sido também desenvolvida tecnologia para utilizar o espectro imediatamente abaixo
do infravermelho, por exemplo para imagiologia como se explicará na secção 20.6.
Fica pois claro que cada aplicação tem bandas reservadas no espectro electromagnético,
podendo estas estar subdivididas em canais para acomodar vários serviços. Por exemplo
a banda de radiodifusão em FM (87.5 MHz a 108 MHz na maior parte dos países) está
dividida em canais que são atribuídos a cada estação emissora. O espaçamento entre as
frequências centrais de canais adjacentes é de 100 kHz ou de 200 kHz conforme a
legislação dos países. Sendo a banda total limitada, conclui-se portanto que o número de
estações emissoras que podem operar na mesma região geográfica sem interferirem
entre si é limitado.
20.5 Exemplos de aplicações recentes das ondas de rádio
Ao longo do século XX e nos nossos dias tem-se desenvolvido um número incontável
de aplicações que usam as ondas de rádio, muitas delas fascinantes pela forma como
influenciaram o nosso modo de vida. Nesta secção apontamos dois exemplos dos mais
recentes, explicando brevemente o seu funcionamento para dar uma pequena ideia da
complexidade que nos escapa.
20.5.1 Comunicações móveis
“Olá, onde estás” é uma saudação típica quando falamos pelo telemóvel. Podemos estar
em qualquer lado e ter acesso a tudo e a todos que estejam ligados à rede. O uso não
podia ser mais simples, pelo que é acessível até a crianças. Por isso dá-nos a ilusão de
que nasceu sem esforço, quando alguém teve a ideia. Vamos então aflorar um ou dois
aspectos da complexidade que não vemos.
Como oferecer mais conversas telefónicas simultâneas que os canais disponíveis
Tal como a radiodifusão em FM, as comunicações móveis têm bandas de frequência
específicas atribuídas no espectro electromagnético, subdivididas em canais. Numa
primeira visão muito simplista poderíamos dizer que cada chamada telefónica ocupa um
canal. Neste caso, dividindo a largura de banda total disponível (para um dado sistema
de comunicações móveis) pela largura de banda de cada canal, obtém-se o número de
chamadas telefónicas simultâneas permitidas pelo sistema. Nos sistemas reais esse
número é da ordem de poucas centenas, pelo que é pertinente perguntar como é possível
satisfazer centenas de milhares de chamadas telefónicas simultâneas no país com as
poucas centenas de canais telefónicos disponíveis?
a) b)
Figura 20.7: a) Cobertura electromagnética tradicional de uma região, com uma única
estação base e um único conjunto de canais de rádio; b) Cobertura celular com uma
estação base por célula e 4 subgrupos de canais não repetidos. Cada subgrupo é
designado pelas letras A, B, C e D.
A resolução deste problema passa pela utilização de várias estratégias simultâneas que
são aqui explicadas também de forma simplista; a solução real é bem mais complexa.
Admita-se para simplificar que cada operador de comunicações móveis dispõe de
apenas 80 canais em todo o país o que representa, na visão simplista, capacidade para
oferecer apenas 80 chamadas telefónicas simultâneas. Mas em vez de usar uma única
estação base5 para cobrir toda a região como na Figura 20.7a, esta pode ser dividida em
várias sub-regiões, cada uma com a sua estação base e com um subconjunto dos canais
disponíveis como indicado na Figura 20.7b (cada letra representa um subconjunto
independente de 20 canais não repetidos). A cada uma das sub-regiões chamaremos
“células”. A escolha dos subconjuntos de frequências em cada célula tem de ser feita de
maneira a não repeti-las em células adjacentes. Se a cobertura rádio de cada estação
base não exceder os limites da sua célula (para não interferir com outras distantes com o
mesmo subconjunto de canais), então o número de chamadas telefónicas simultâneas na
mesma região sobe para 380 = 20 canais × 19 células.
É fácil perceber que quanto menor for o raio das células utilizado na subdivisão da
região inicial, maior será o número de chamadas telefónicas simultâneas que pode ser
oferecido. Esta estratégia pode ser complementada com uma partilha de cada canal por
vários utilizadores, dividindo entre eles o tempo de acesso ao canal: ou seja, o mesmo
5 Tem um papel semelhante ao da estação emissora nos sistemas de radiodifusão, mas também recebe os
sinais transmitidos pelos telemóveis e ainda executa muitas outras funções avançadas.
B
A
B
C
D
B
B
A
A A
A
A
C
C
C
D
D
A
D
canal pode ser acedido sequencialmente por vários utilizadores com uma cadência tão
rápida que cada utilizador não se aperceba que a sua comunicação é na realidade
intermitente. Estra estratégia permite aumentar ainda mais o número de chamadas
telefónicas simultâneas, mantendo o número inicial de canais. Há outras estratégias para
o mesmo efeito que não se abordam aqui.
Como localizar os telemóveis para estabelecer uma ligação
A mobilidade do utilizador é um outro desafio a ter em conta. Convém não esquecer que
quando um telefone móvel pretende comunicar com outro telefone móvel, não sabe
onde este se encontra. No limite pode estar noutro país. É portanto necessário haver um
registo automático da célula em que se encontra cada telemóvel que está activo em cada
momento, nem que seja noutro país. Assim, quando um número é digitado no telemóvel
decorrem as seguintes operações (explicação simplificada): o telemóvel sinaliza a
estação de base que pretende fazer uma chamada; a estação base atribui um canal para a
comunicação e passa a informação do número de destino a um sistema central que gere
a busca da estação base onde se encontra o telemóvel pretendido; essa estação de base
sinaliza esse telefone sobre a entrada de uma chamada e atribui-lhe um canal de
comunicação. Sinaliza para trás que o processo está completo e os telemóveis
finalmente são postos em comunicação. Todo este processo é automático e decorre em
poucos segundos.
Por outro lado se o telemóvel estiver em movimento, por exemplo seguindo um
percurso semelhante ao indicado na Figura 20.7b, percebe-se que o utilizador aravessa
várias células consecutivamente. Significa que ao longo do percurso a comunicação vai
ter de comutar automaticamente entre diferentes estações base, mudando de canal de
cada vez. Naturalmente, estes saltos entre estações base e canais têm de ocorrer de
forma transparente para o utilizador. Significa que em paralelo com a comunicação que
o utilizador mantém com um destinatário, existe uma outra em que o telefone móvel
troca informação automaticamente com várias estações base próximas, para o sistema
poder escolher aquela que oferece a melhor qualidade de serviço em cada momento e
definir qual a menor potência que o telefone deve radiar para poupar a bateria sem
prejudicar a qualidade da ligação.
O desafio das antenas
Ao contrário dos sistemas fixos como a Televisão, em que a orientação das antenas é
ajustada uma vez para optimizar a ligação, nos sistemas móveis espera-se que as antenas
produzam a melhor resposta independentemente da posição, orientação e condições de
utilização do telemóvel. Há aspectos específicos a resolver no lado das antenas da
estação base, mas os maiores desafios e a maior inovação encontram-se do lado da
antena do telemóvel.
Nos telemóveis modernos deixou de se ver a antena. Alguns poderão pensar que perdeu
a importância e deixou de existir. Antes pelo contrário, as antenas são imprescindíveis
para o funcionamento do telemóvel e são um dos elementos mais difíceis de projectar.
O facto de não se verem prende-se com questões estéticas e de comodidade para o
utilizador, mas este requisito aparentemente fútil traz dificuldades sérias do ponto de
vista técnico.
O problema é que para ser eficiente, qualquer antena tem de ter uma dimensão de pelo
menos metade do comprimento de onda, ou seja cerca de 10 a 15 cm o que impede de
transferir simplesmente a antena tipo dipolo dos primeiros telemóveis para dentro da
sua caixa. Quando a antena não está optimizada, reflecte de volta para o emissor a
energia que era suposto radiar. É comum os telemóveis serem compatíveis com
diferentes sistemas (e portanto diferentes bandas) como o GSM, 3G ou LTE bem como
outros serviços como o Bluetooth, Wi-Fi e NFC, sem falar na necessidade de
compatibilizar as antenas com as bandas destes serviços em diferentes regiões do
Globo. Isso requer não uma, mas eventualmente várias antenas no telemóvel, pelo que
rapidamente surgiu o desafio para as integrar no seu interior. E o desafio é ainda mais
dificultado pela necessidade adicional de as antenas continuarem a funcionar
adequadamente quando se segura o telemóvel junto ao corpo e pela necessidade de
satisfazerem os limites de exposição do corpo à radiação electromagnética.
a) b)
Figura 20.8: a) Exemplo de uma torre com as antenas da estação base. b) Exemplos de
antenas integradas no interior de telemóveis (tiras metalizadas convenientemente
dobradas).
Este desafio ocupou (e continua a ocupar) milhares de cientistas e engenheiros em todo
o mundo. A miniaturização da antena passa por dobrar engenhosamente tiras metálicas
impressas sobre um plástico apropriado, de tal forma a que a antena fique ressonante
nas diversas bandas de funcionamento. Esta condição de ressonância corresponde à
transferência óptima da energia do emissor para o ar. Alguns exemplos destas antenas
podem ser vistos na Figura 20.8b (tiras mais claras), já integradas em partes do
telemóvel. As antenas são projectadas e optimizadas com o auxílio de simuladores
electromagnéticos poderosos, antes de se passar ao protótipo. É interessante referir que
de cada vez que um novo modelo de telemóvel é lançado, as respectivas antenas têm de
ser redesenhadas uma vez que o seu funcionamento correcto depende fortemente dos
detalhes mais pequenos de cada telemóvel.
Estes são apenas alguns aspectos da complexidade do problema das comunicações
móveis relacionados com a radiação electromagnética. Há vários outros aspectos como
as interferências causadas por reflexões em paredes, as sombras e atenuações
provocadas por obstáculos ou atravessamento de paredes que não são abordadas aqui.
20.5.2 RFID
Todos estamos familiarizados com os cartões de acesso aos sistemas de transportes ou
com os identificadores para pagamento nas auto-estradas, que permitem a sua leitura e
identificação pela simples aproximação ao leitor (sem necessidade de contacto ou
visualização). Esta tecnologia faz parte da classe dos dispositivos de identificação por
radiofrequência (RFID). É uma área que está em franco desenvolvimento e que também
promete alterar alguns paradigmas da vida em sociedade.
Características básicas da tecnologia
O sistema RFID é constituído por um conjunto de identificadores electrónicos que
podem ser associados a objectos e por um sistema que permite a leitura via rádio da
informação contida nesses identificadores. Os identificadores, normalmente conhecidos
pela designação em inglês “tags”, contêm uma memória para armazenamento de dados
(onde se inclui um código de identificação único) e um sistema de comunicação via
rádio constituído por um circuito de emissão/recepção e por uma antena. Como se
percebe da descrição, a aplicação principal destes sistemas é a identificação automática
sem contacto, geralmente a curta distância, podendo em alguns casos ser estendida para
estimar automaticamente também a localização.
Difere dos tradicionais códigos de barras pelo facto de permitir a leitura de um grande
número de unidades ao mesmo tempo, mesmo que os “tags” não estejam visíveis, e pelo
facto de permitir que a leitura e aquisição de dados seja completamente automatizada.
Note-se que na maior parte dos casos a leitura dos códigos de barras exige um operador
para passar o leitor pelo código de cada produto.
Figura 20.9: Constituição básica de um sistema RFID.
“Tag” Produto etiquetado
Circuito integrado
Leitor de RFID
etiqueta
Antena do leitor
etiqueta
Transmissões rádio
O circuito electrónico da etiqueta de RFID está normalmente em hibernação, acordando
apenas quando recebe um sinal de interrogação via rádio emitido pelo leitor. Nessa
altura o “tag” devolve (também via rádio) a sua identificação e eventualmente a
informação que tem na memória voltando depois ao estado de hibernação até à
interrogação seguinte. Como em qualquer sistema de rádio, existem bandas para
operação de RFID regulamentadas em todo o Globo, cobrindo o LF, HF, UHF e
microondas. Também está regulamentada a potência de emissão máxima do sinal de
interrogação.
Desafios da tecnologia
Consoante as suas características, os “tags” podem ser colocados por exemplo em peças
ou ferramentas em ambiente fabril, em produtos de consumo, ou mesmo em animais
domésticos ou em gado. Os principais desafios para a tecnologia são a redução do factor
de forma dos “tags”, a melhoria do alcance e fiabilidade da leitura em condições
adversas e também a redução do custo unitário do “tag” para valores residuais. Estas
características foram alcançadas de forma extraordinária numa categoria de “tags” que
opera na banda de UHF: o “tag” é fino e flexível como uma folha de papel, pequeno
com cerca de 15 cm2 de área, com um alcance de cerca de 10 m e com um custo unitário
de cerca de 0,10€ (Figura 20.10ª).
Estas características tornaram-se possíveis nesse tipo de “tags” devido aos seguintes
avanços importantes da tecnologia: o circuito electrónico do “tag” foi reduzido ao
tamanho da cabeça de um alfinete e fixado em papel; por outro lado o circuito foi
desenvolvido de maneira a dispensar a bateria, sendo a energia necessária para o seu
funcionamento retirada da própria onda electromagnética de interrogação. Na literatura
designam-se este tipo de “tags” como “passivos”.
a) b)
Figura 20.10: Exemplos de “tags” de RFID passivos para operação na banda de UHF. a)
“Tags” comerciais; b) Protótipo de um “tag” desenvolvido em laboratório para
integração em malas de viagem.
O que domina o tamanho do “tag” é a antena, devido à necessidade de satisfazer o já
referido limite face ao comprimento de onda. A antena, constituída por tiras metálicas,
pode ser impressa directamente em papel. Aliás está em desenvolvimento tecnologia
que permite produzir todo o “tag” por impressão, incluindo o circuito electrónico. Se
este processo chegar à produção em massa, permitirá realizar o sonho de imprimir estas
etiquetas electrónicas directamente nas embalagens dos produtos, com a mesma
facilidade dos actuais códigos de barras.
No entanto, sobretudo em UHF e em Microondas, o funcionamento das antenas (e
portanto o alcance da leitura) é seriamente prejudicado quando os “tags” são colocados
em objectos metálicos ou contendo líquidos ou próximo do corpo humano. Nesses casos
é necessário utilizar topologias alternativas para as antenas, que normalmente as tornam
um pouco mais espessas e mais caras. Esta é uma área ainda em desenvolvimento.
Potencialidades da tecnologia
Uma vez que a leitura e a aquisição da informação dos “tags” pode ser feita de forma
automática, abre-se um mundo novo para a gestão dessa informação e criação de novos
serviços. No limite pode-se encarar cada “tag” como o nó de uma grande rede de
informação. Estando os “tags” colados em produtos de consumo, peças em linhas de
montagem, documentos e objectos do dia-a-dia, estamos a falar de uma rede de
proporções gigantescas e que corporizam o conceito emergente da Internet das Coisas
(“Internet of Things” – IoT). Naturalmente o conceito integra outras tecnologias para
além do RFID, como diversos tipos de sensores, telemóveis, PCs, etc.
O conceito de IoT, ainda em desenvolvimento, visa criar ambientes “inteligentes” que
facilitem o dia-a-dia dos utilizadores. Listam-se alguns exemplos de aplicações que
estão em diferentes fases de desenvolvimento ou de testes, desde os incipientes aos
protótipos:
Um frigorífico capaz de indicar a gaveta onde se encontra uma determinada
embalagem congelada anteriormente, de avisar quais os produtos com a validade
a expirar, e de organizar a lista de compras e enviá-la para o telemóvel em
resposta a um SMS.
Um provador de roupa de loja capaz de reconhecer as peças que estão a ser
vestidas, sugerir alternativas, e providenciar a sua entrega no provador.
Uma mala de viagem integrando um chip RFID regravável para ser utilizado no
“check-in” para registar os detalhes do percurso e permitir o encaminhamento
automático sem erros humanos da mala para os sucessivos voos e ainda permitir
ao passageiro fazer o seguimento da mala no seu telemóvel.
Uma caixinha de medicamentos capaz de avisar assim que forem horas de tomar
um medicamento regular, que seja capaz de esclarecer se o medicamento foi
realmente tomado ou não e que mantenha um registo dos medicamentos
tomados.
Sensores no chão de um apartamento capazes de detectar a situação
potencialmente anormal de uma pessoa caída e imóvel e emitir automaticamente
um alarme para um telefone pré-definido.
Um dispositivo associado aos óculos para ajudar pessoas com
disfuncionalidades cognitivas (ex. Alzheimer) a reencontrar o caminho de volta
para a sua casa.
Encaradas como aplicações isoladas algumas destas podem parecer fúteis, mas se
pensarmos num sistema integrado, o cruzamento de diversas aplicações e tecnologias
poderá proporcionar serviços mais avançados e úteis.
20.6 Alguns temas de investigação
Os novos desenvolvimentos na área das comunicações via rádio têm vindo a migrar nas
duas últimas décadas para frequências progressivamente mais altas, para as ondas
milimétricas e sub-milimétricas. Para além de permitirem obter dispositivos mais
pequenos dado o comprimento de onda ser pequeno, permitem também larguras de
banda muito grandes para satisfazer a partilha rápida de enorme quantidade de
informação.
Não só tem sido possível desenvolver geradores de ondas milimétricas e sub-
milimétricas em tecnologia do estado sólido (o que vulgarmente se designa por circuitos
integrados), como o custo da tecnologia tem vindo a descer tornando-a acessível para
aplicações para o grande público,
Nestas frequências as antenas metálicas tornam-se pouco eficientes e mais difíceis de
construir. Há uma tendência para aproximar às soluções da óptica, pelo que passam a
ser atractivas por exemplo as antenas baseadas em lentes. A Figura 20.11a apresenta um
exemplo desse tipo de antena, com uma forma apropriada para favorecer o desempenho
das designadas redes muli-Gigabit. Estas redes podem oferecer ritmos de transmissão
da ordem de 5 Gbit/s (cerca de cem vezes mais “rápidas” que as actuais redes wireless).
O mesmo tipo de antenas pode ser utilizado para imagiologia, isto é, para obter imagens
na parte milimétrica ou sub-milimétrica do espectro electromagnético, Figura 20.11b.
Tem utilidade por exemplo em radioastronomia Figura 20.12a, mas pode ser utilizado
também para aplicações bem mais terrenas como em aplicações de segurança em
lugares sensíveis, Figura 20.12b. As técnicas recentes permitem uma resolução bem
melhor que a apresentada na figura, mas em locais públicos a resolução das imagens é
automaticamente reduzida ou a imagem é mesmo suprimida quando não há sinais de
alarme, como forma de preservar a privacidade dos sujeitos.
a) b)
Figura 20.11: Exemplos de antena baseadas em lentes dieléctricas. a) Aplicação para
pontos de acesso de redes multi-Gigabit em 60 GHz. b) Utilização para obter imagens
do fundo de radiação cósmica em ondas milimétricas.
Poder-se-á perguntar porque não se continua a utilizar o tradicional Raio-X para esta
função. É que, ao contrário do Raio-X que corresponde a radiação electromagnética
ionizante (portanto potencialmente perigosa para os tecidos vivos) a radiação na zona
milimétrica do espectro não representa o mesmo tipo de preocupação. Por esse motivo o
espectro de rádio tem vindo a ser considerado também para imagiologia médica, embora
em frequência mais baixas, entre 1 GHz e 5 GHz, que são menos atenuadas pelos
tecidos humanos que as ondas milimétricas e sub-milimétricas. Esta tem sido uma área
de investigação muito activa, sobretudo em relação ao rastreio do cancro da mama.
a) b)
Figura 20.12: Exemplos de imagens na parte de ondas milimétricas do espectro
electromagnético. a) Nebulosa de Orion (NASA); b) Imagens de aplicações de
segurança.
Uma outra área em franco desenvolvimento é o dos dispositivos biomédicos para usar
junto ao corpo ou mesmo implantados, com capacidade de comunicação via rádio. Esses
dispositivos permitem monitorizar funções vitais e transmiti-las sem fios para
dispositivos externos. Podem ser utilizados em próteses cardíacas, na monitorização da
pressão intracraniana ou da compressão em próteses articulares. O desafio para as
antenas é a sua miniaturização e simultaneamente o aumento da sua eficiência que fica
seriamente afectada pela presença do corpo. A melhoria da eficiência é fundamental
para prolongar a longevidade da bateria dos dispositivos. Para coadjuvar esse objectivo,
a comunicação dos dispositivos implantados pode ser feita para um repetidor colocado
na roupa a poucos centímetros e este, sendo externo e com uma bateria mais acessível é
que se encarrega de transmitir um sinal mais forte para sistemas de controlo mais
distantes.
20.7 Conclusão
Hertz, que respondeu à curiosidade de um aluno em 1886 dizendo que não via qualquer
utilidade para as ondas electromagnéticas, ficaria certamente estarrecido se tivesse tido
a possibilidade de assistir a tudo o que se passou desde a sua experiência em Karlsruhe
até aos nossos dias. E a aventura continua, com novos avanços a acontecerem a um
ritmo cada vez mais acelerado.
Figura 20.13: Evolução no tempo (escala logarítmica) de alguns sistemas rádio.
Espera-se que os alunos que estão a entrar agora no Mestrado em Engenharia
Electrotécnica e de Computadores (MEEC) do Instituto Superior Técnico venham a ser
num futuro próximo protagonistas em alguma parte da aventura das ondas de rádio.
Estarão à altura do desafio na altura própria? Vejamos a Figura 20.13 que assinala
alguns sistemas rádio com as respectivas datas de lançamento. A primeira barra vertical
representa o intervalo de tempo em que o autor deste Capítulo e os seus colegas
contemporâneos foram alunos no Instituto Superior Técnico. A matéria de estudo estava
naturalmente limitada ao que se conhecia até essa altura, sem qualquer vislumbre do que
poderia acontecer no futuro. Mas a formação recebida foi a base fundamental para essa
geração (e as seguintes) poderem participar activamente no desenvolvimento dos novos
sistemas e mudanças de paradigmas que se sucederam.
A segunda barra vertical corresponde ao intervalo de tempo em que os alunos que agora
começam o curso, estarão no IST. Há mais informação a aprender do que na altura da
primeira barra. Mas a lógica da Figura 20.13 manter-se-á, com o aparecimento de novas
tecnologias, por agora desconhecidas, a serem protagonizadas pelas novas gerações de
engenheiros. Espera-se que os alunos do MEEC venham a ter um papel relevante no
processo. Haverá no entanto “nuances” relativamente à situação de trinta anos atrás: as
mudanças de paradigma tecnológico ocorrerão mais frequentemente, e a concorrência
na investigação e nos empregos será exponencialmente crescente dada a multiplicação
de novos centros de conhecimento em partes do mundo outrora subdesenvolvidos, que
produzem milhões de indivíduos altamente qualificados.
É claro que este alerta apresentado a propósito dos sistemas rádio é igualmente aplicável
a outras áreas da Engenharia electrotécnica. Assim, os novos alunos terão de preparar-se
desde o primeiro ano do curso para enfrentarem depois desafios profissionais que serão
cada vez mais exigentes.
Os temas abordados neste Capítulo serão desenvolvidos em algumas disciplinas do
MEEC, em particular na área de especialização de Telecomunicações. Os aspectos
básicos relativos à propagação das ondas electromagnéticas e aplicações serão
abordados na disciplina de Propagação e Radiação de Ondas Electromagnéticas, do 1º
ciclo. Os aspectos mais aplicados serão abordados nas seguintes disciplinas do 2º ciclo
do MEEC: Antenas, Radiopropagação, Sistemas de Telecomunicações, Sistemas de
Telecomunicações via Rádio, Sistemas de Comunicações Móveis, e Redes Móveis e
sem Fios.
20.8 Bibliografia
[1] J. D. Kraus, Antennas, McGraw Hill, 1998
[2] W. E. Gordon, A Hundred Years of Radio Propagation, IEEE Trans. Antennas and
Propagation, Vol. AP-33, No. 2, pp. 126-130, Fev. 1985
[3] J. D. Kraus, Antennas Since Hertz and Marconi, IEEE Trans. Antennas and
Propagation, Vol. AP-33, No. 2, pp. 131-136, Fev. 1985
[4] H. Sobol, K. Tomiyasu, Milestones of Microwaves, IEEE Trans. Antennas and
Propagation, Vol. AP-50, No. 3, pp. 594-611, Mar. 2002
[5] W. Wiesbeck, D. J. Cichon, The Link from Heinrich Hertz to Modern
Communication, European Microwave Conference, Bologna, pp. 886-894, Set. 1995