comunicação e Relação das Crianças com Adultos

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Relação das Crianças com Adultos

Preâmbulo:

Uma das condições necessárias ao desenvolvimento humano, é o estabelecer

de uma relação de vínculo entre a criança e os adultos que a acolhem e esta

com outras crianças do seu meio familiar, social e escolar.

O desenvolvimento consiste não só numa tarefa conjunta, mas recíproca – a

criança não é a única a desenvolver-se; a família desenvolve-se desde a

gestação, a preparação do seu nascimento, o próprio nascimento e todas as

etapas futuras da vida da criança.

A criança é um projecto familiar que precisa de ser desenvolvido e em famílias

onde se foca na promoção do desenvolvimento da criança há objectos e

diversas actividades mediadoras da acção infantil, os bebés são incentivados a

gatinhar, a andar, a manipular objectos, a buscar aconchego, a brincar de

esconde-esconde, a observar com atenção e interesse outras crianças e outros

bebés, a cantar e a dançar.

As crianças um pouco mais velhas, além das acções descritas, apreciam jogos

de faz-de-conta, cantam, dançam, disputam objectos, ouvem histórias,

escrevem bilhetes, planeiam festas, envolvem-se em investigações sobre

animais, plantas e, principalmente, em brincadeiras, fazem amigos, choram e

são consoladas, entre outras coisas.

A criança, no seu desenvolvimento, depende da experiência na interacção com

parceiros mais experientes, das práticas culturais concretas, capacitando-as

progressivamente a nomear nomes e objectos, a imitar pessoas e/ou outros

elementos que observa, a aprender a cuidar de si, a distinguir os sons, a

desenhar, a formular perguntas, a elaborar respostas, influenciando-se e sendo

influenciada. 

A criança apropria-se de novas formas de acção sobre o meio e desenvolve

maneiras de sentir, agir e pensar e vai delineando o conhecimento de si.

Os adultos são fortes mediadores das condições de desenvolvimento da

criança.

Relação da criança com os adultos da família:

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A família, não é apenas “o quotidiano biológico”, mas também a forma de

funcionar, a rede de significados que faz parte de todos e na qual a criança

está inserida. 

Se a família possui uma cultura depressiva, violenta, ou não-violenta, mas

apática, entre outras formas de existência familiar existentes na sociedade

marcada pela desigualdade de acesso a bens sociais e culturais diversos, se é

estruturada, integrada no meio ou desagregada, +e um factor da vivência futura

da criança até à idade adulta.

O desenvolvimento da criança não é avaliado apenas a partir das importantes

significações recíprocas construídas nas interacções de mãe, família e filho.

Nos diferentes contextos do quotidiano, a crianças apropria-se de diversas

competências sociais, a depender das suas condições pessoais e da forma

como interage com outras as pessoas, com os objectos e as situações –

elementos cheios de significados que precisam ser interpretados pelos seus

pares mais experientes. 

Com estes pares, a criança aprende a ver mais longe, a fazer conquistas. 

Os pares ajudam-na a realizar acções que a levam para além de si mesma,

com o seu apoio para conhecer o mundo e a si, numa relação onde há cuidado

e vínculo afectivo.

Porém, com os afectos e representações, existem as práticas quotidianas que

devem ser rigorosamente observadas:

A criança brinca? Como brinca? Ela vê TV? De que maneira? Alguém lhe dá

comida? Como isso acontece? Como foi comemorado o seu aniversário? 

A criança tem necessidade destes afectos e destas práticas porque a grande

parte da aprendizagem dá-se pela observação e pelo “fazer junto”.

Relação da criança com outros adultos:

Quem não observa as acções presentes em seu meio terá dificuldades em

aprender como esse meio se estrutura. 

O papel educativo da comunidade, dos pais e dos educadores consiste, no

erguer e no apoiar da criança para que discirna o entre o bom e o mau no

mediar-lhe a construção dos significados das acções, no dar importância aos

estímulos recíprocos e no partilhar de projectos, a formação da sua identidade

e o ensinar da responsabilidade.

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A criança deve sentir que não é apenas mais um no círculo, familiar, escolar ou

social, mas sim que compartilha o espaço; ela deve sentir-se doadora e

receptora de afectos e responsabilidades.

O adulto, para além do afecto que dá à criança deve responsabilizá-la

gradualmente, promovendo a sua inserção no meio, atendendo ao seu

progresso psico-motor, envolvendo-a, activa e atentamente, na interacção com

o seu ambiente em diferentes níveis de competência.

Este envolvimento da criança pode assumir as formas de:

- Persistente; envolve alguma resolução de problemas e algum desafio,

frequentemente indicados por uma primeira tentativa falhada; inclui quer

mudança de estratégias quer a utilização da mesma estratégia;

- Simbólico; envolve o uso de formas convencionais de comportamento como a

linguagem, faz-de-conta, linguagem gestual, desenhos, etc.. 

A principal característica é a descontextualização;

- Codificado; envolve o uso de formas convencionais de comportamento que

são dependentes do contexto e que dependem de referentes ou estímulos

perceptualmente presentes; inclui o uso de linguagem compreensível,

- Construtivo; envolve a manipulação de objectos para criar, fazer, ou construir

alguma coisa; inclui juntar objectos nalgum tipo de forma espacial; exige

alguma indicação de intencionalidade;

- Diferenciado; envolve coordenação e regulação do comportamento que

reflecte elaboração e progresso na direcção da convencionalização; inclui

interacção activa com o ambiente. 

- Atenção focalizada; inclui observar ou escutar características no ambiente

durante pelo menos 3 segundos; é caracterizada por uma expressão facial

séria, e um acalmar da actividade motora;

- Indiferenciado; envolve interacção com o ambiente sem diferenciar o

comportamento; inclui comportamentos repetitivos; de nível inferior. 

- Atenção ocasional; envolve atenção mais descontraída e mais vasta; inclui

monitorização do ambiente. 

- Não envolvido; envolve falta de ocupação; exige a ausência de qualquer um

dos outros comportamentos; inclui comportamentos que não se encorajaria ou

ensinaria a criança a fazer. 

A criança pode exibir os comportamentos típicos acima referidos na direcção

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de ou com:

• Criança. 

• Adultos. 

• Objectos (isto é, brinquedos, materiais, ou outros aspectos do ambiente

físico). 

• Self (roupa ou partes do corpo). 

- Tipos de ensino pelo adulto::

• Redireccionar - parar o envolvimento actual da criança para a levar a fazer

algo diferente. 

• Introduzir - dar uma nova actividade a uma criança que não está envolvida no

momento. 

• Elaborar - fornecer informação ou materiais relacionados com as actividades

actuais da criança mas indo além do âmbito das especificidades da actividade.

Construir a partir das actividades do momento ou da linguagem das crianças

fornecendo-lhes informação e materiais adicionais e relacionados, sem solicitar

uma resposta à criança. 

• Seguir - desencadear uma resposta relacionada com as actividades em que a

criança está envolvida no momento. 

• Informar - fornecer informação sem elaborar a partir da actividade actual da

criança. A actividade é iniciada e dirigida pelo professor e não é responsiva a

uma actividade iniciada pelas crianças. 

• Reconhecer - responder às crianças ou suas actividades sem as descrever,

desenvolver, ou seguir. O comportamento do educador revela às crianças que

ouviu ou viu o que elas fizeram mas não acrescenta à interacção ou

actividade. 

• Elogiar - aumentar o afecto para transmitir prazer ou admiração pelas

crianças, pelo seu comportamento, ou pelos seus produtos. Caracteriza-se por

uma mudança perceptível na entoação, em relação à voz e afecto normal do

professor. A aparente intenção do educador é reforçar a participação da

criança numa actividade transmitindo-lhe prazer ou admiração. 

- Tipos de afecto: 

• Nível de actividade - quantidade de energia que o educador despende no

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sentido de ir ao encontro das necessidades das crianças. 

• Expressão positiva – medida em que o educador transmite entusiasmo,

excitação, felicidade e afecto durante as interacções com as crianças. 

• Expressão negativa - medida em que o educador transmite desprazer ou

infelicidade (franzir de sobrancelhas, comentários sarcásticos, “mau humor”, e

negatividade). 

• Envolvimento visual – medida em que o educador segue visualmente as

actividades das crianças. Existem dois níveis: atenção aproximada e

exploração. A atenção aproximada passa por examinar com que rigor o

educador presta atenção às actividades das crianças que trabalham na sua

presença. A exploração implica observar as crianças na sala que não estão

directamente envolvidas com o educador. 

• Responsividade física – frequência do contacto físico entre o educador e as

crianças. 

• Responsividade emocional - medida em que o educador interage com as

crianças de uma forma calorosa e protectora. 

• Consistência das interacções - previsibilidade ou consistência das respostas

do educador às crianças (implica consistência dos comportamentos do

educador ao longo do tempo e com as diferentes crianças). 

• Responsividade em relação aos interesses das crianças - medida em que as

interacções do educador são baseadas nos interesses das crianças. 

• Directividade em relação à criança - medida em que o educador permite que

as crianças ditem o ritmo e conteúdo das actividades. 

• Tom - tom das interacções do educador com as crianças (quantidade de

controlo inferido através do tom); relaciona-se com a frequência de

comunicação autoritária ou controladora. 

• Inclusão em actividades - participação de crianças com necessidades

especiais em actividades com outras crianças na sala. 

• Ensino de competências específicas - medida em que o educador ensina

competências específicas às crianças com necessidades especiais. 

• Adequação do conteúdo - medida em que o conteúdo vai ao encontro do nível

do desenvolvimento específico das várias crianças na sala. 

Fonte: http://www.fpce.up.pt/qualinterac/conceitos.htm

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Resumo:

O desenvolvimento humano ocorre a partir do contacto com outras pessoas e

com o meio em que vive. A família, a escola e o meio social podem ser

espaços privilegiados para que a interacção aconteça. 

A criança deve ter espaços educativos, lúdicos e social, é fundamental que

neles haja espaço adequado e planejado para o desenvolvimento de

actividades diversificadas que promovam e favoreçam o desenvolvimento de

crianças, que são educadas e/ou cuidadas em período integral.

Os espaços devem ser visualmente limpos, claros, permitindo que as crianças

se sintam à vontade para desenvolver as suas capacidades de criar e imaginar,

bem como, interagir e serem capazes de exercer uma série de actividades

indicadas à sua idade.

È bom relembrar sempre que, no acto de brincar, as crianças são favorecidas

nos diversos aspectos: afectivos, cognitivos e sociais. 

Desta forma, ao brincar a criança recria e repensa os acontecimentos que lhes

deram origem, sabendo que brinca. 

O brincar e a brincadeira ocorrem por meio da articulação entre a imaginação e

imitação da realidade. Para brincar é preciso que a criança tenha uma certa

independência para escolher com quem e quais os papéis que irá assumir no

interior de um determinado tema e enredo, cujo desenvolvimento depende

somente da vontade de quem brinca 

A criança, ao brincar, desenvolve o movimento e a mudança da percepção,

resultantes da mobilidade física, a relação com os objectos e suas

propriedades físicas, bem como a combinação e associação entre eles, os

conteúdos sociais, os limites definidos pelas regras, entre outros. 

O brincar deve ser uma actividade permanente no dia-a-dia da educação

infantil promovendo a sua personalidade, os seus desejos e sonhos e a

reconstrução, numa pequena escala, da sua representatividade no mundo.

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João Loureiro

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É preciso ouvir as crianças

Sociólogo da infância aponta a necessidade de percebê-las com um grupo

com ideias próprias, distinto dos demais, e diferenciado entre os indivíduos

que o compõem

 

A sociologia da infância se propõe a construir a primeira fase da vida do ser

humano livre de interpretações nas quais as crianças se desenvolvem

independentemente da construção social, das suas condições de existência e

das representações e imagens historicamente construídas sobre e para elas.

Trata-se de uma área nova, recém-desbravada por pesquisadores de todo o

mundo. Manuel Jacinto Sarmento, diretor do Centro de Educação da

Universidade do Minho, em Portugal, é um deles. "Os estudos têm dito, há 20

anos, de maneira enfática, que os pequenos necessitam ser conhecidos em

sua verdadeira realidade."

Durante visita ao Brasil para uma série de encontros, eventos e visitas,

Sarmento concedeu entrevista à repórter Cristiane Marangon logo após sua

exposição em um congresso de educação infantil realizado em Maceió (AL).

"Tenho aprendido muito com os brasileiros e com suas experiências concretas

de vida. Há muita troca de conhecimento e esses intercâmbios também são de

muita aprendizagem."

É possível definir um tipo de infância?

Essa questão é controversa e muito debatida por diferentes autores. Alguns

dizem que é necessário falar da infância no singular para tratá-la como

categoria social. Os sociólogos que trabalham com essa visão se preocupam

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com indicadores sociais de demografia ou de economia e também de natureza

simbólica. Na demografia, procura-se perceber de que modo o grupo infantil

estabelece relações de porcentagem com outros agrupamentos populacionais

e quais são os diferentes espaços que ocupam na sociedade. Do ponto de

vista econômico, entende-se que as crianças, com exceção daquelas

vinculadas ao trabalho infantil, se caracterizam por não participar da economia

e, por isso, não são importantes como classe econômica. No simbólico, as

concessões que existem traduzem-se nos modos de agir dos adultos em

relação às crianças. Há também os sociólogos que trabalham na base

interpretativa ou crítica, que tendem a encontrar e pluralizar as formas de

infância. Consideram que a ação caracteriza a categoria pelos desempenhos

coletivos e individuais, que são atravessados pelos gêneros, pelas classes

sociais, pelas etnias, pelas diferenças que dizem respeito ao espaço no mundo

e tendem a enfatizar que existem várias infâncias.

E qual é o seu entendimento sobre a infância?

Não é possível dizer que há uma única infância. Necessitamos articular as

concepções para perceber o que é comum a todas as crianças. Na minha

opinião, ela deve ser percebida como um grupo geracional, distinto do mundo

adulto. As crianças são diferentes umas das outras e, nessa diversidade, há

fatores sociais acentuados, que não são puramente individuais. Por exemplo,

há elementos comuns por uma parte de tempo de suas vidas, pois vivem sob a

guarda de responsáveis, já que não são capazes de ficarem sozinhas. No

entanto, isso mudou ao longo do tempo. A independência delas tem sido

retardada em relação ao que ocorria há 20 anos. A entrada no mercado de

trabalho se dava mais cedo e, por isso, ficavam longe da guarda de seus pais

precocemente.

Como a infância tem sido interpretada pelos adultos?

Vivemos em um tempo em que há uma coincidência de várias concepções -

desde que a criança deve ser submetida a processos rigorosos de controle de

autoridade até a que ela, sendo um ser de direito, precisa ser respeitada na

sua autonomia. Essas representações são bem diferenciadas e acompanham

a história da humanidade nos últimos 250 anos. É possível dizer que há dois

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polos. Um deles é que a criança é um ser irracional e imoral e, por isso, deve

ser submetida a processos de racionalização e moralização, que acontecem

pela educação, seja familiar ou escolar. A outra concepção é que a criança é

naturalmente boa e que, para educá-la, basta sustentar e apoiar seu

desenvolvimento. Vale ressaltar que essas compreensões são produzidas,

principalmente, na sociedade ocidental e disseminadas pelo mundo. É preciso

que todos saibam que existem infâncias diferentes. No Brasil, por exemplo, há

comunidades indígenas em que só se deixa de ser criança ao se tornar pai ou

mãe.

Como o docente pode chegar mais perto do que as crianças pensam para

estabelecer uma comunicação mais adequada?

A escola foi edificada com base em um modelo cognitivo, ou seja, um

entendimento de homem, de sociedade, de cultura e de criança, que sempre

formou os educadores. A instituição escolar é pensada como um lugar de

transmissão de cultura para um sujeito que está inserido na sociedade e em

processo de transição. A passagem pela escola serve para que isso seja

garantido. Ela está centrada na comunicação, portanto, no poder do adulto

sobre a criança, pois se supõe que os pequenos são seres em

desenvolvimento e passam por várias etapas. No entanto, os estudos da

criança têm dito, há 20 anos, de maneira muito enfática, que elas necessitam

ser conhecidas em sua verdadeira realidade. A própria psicologia tem

desmentido as etapas de desenvolvimento concluídas por Jean Piaget,

consideradas adultocêntricas, pois o desenvolvimento humano é feito em

contextos sociais e culturais. Não há linearidade e nem teleologia que

independam de contexto e também de circunstância em que se encontram os

pequenos. Precisamos trabalhar em uma renovação na concepção que forma

os professores, pois eles decidem o trabalho nas escolas.

Quais são os danos para as crianças mais afastadas culturalmente da

escola?

Elas reagem desenvolvendo estratégias de sobrevivência, como abandonar a

escola precocemente e procurar sentido para a vida fora desse espaço. Isso

nada mais é que uma atitude de resistência. O indivíduo encontra satisfação e

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referência pessoal no contato com amigos e vizinhos e, por isso, passa a criar

aspirações e expectativas compatíveis com essas motivações. No entanto, é

importante destacar que há benefícios mesmo quando há danos, pois essas

crianças encontram duas coisas fundamentais na escola: um espaço público e

de convivência. No primeiro caso, elas são reconhecidas como membros de

uma sociedade, o que é simbolicamente importante. No segundo, é

fundamental conviver com outras crianças e poder desenvolver as culturas de

pares. É claro que pode haver outros benefícios, mas isso depende da

capacidade que a escola tem de gerir sua autonomia e de ir ao encontro dos

que estão mais afastados de sua cultura, promovendo relações, produzindo

seu conhecimento a partir do que se percebe e, nessas circunstâncias, poder

lidar e gerir mais adequadamente o abandono, se ele acontecer.

O senhor defende que as crianças participem de maneira ativa na vida

social. De que maneira?

A participação da criança na sociedade é um elemento novo que está expresso

no documento A Convenção sobre os Direitos da Criança, das Nações Unidas,

de 1989, em que se consagrou a ideia de que a criança não pode ser ignorada

em sua opinião sobre os aspectos que lhe dizem respeito, atendendo à

capacidade que ela tem de exprimir a própria opinião. Sua participação social

significa que o conhecimento que ela tem deve ter voz, deve ser auscultada e

deve ter efeito, ou seja, influenciar seu modo de vida. Atualmente há um

movimento nas cidades amigas da criança, cujo eixo central é ouvi-las na

formulação de políticas públicas no que diz respeito ao mobiliário, ao

equipamento, à mobilidade, à programação de atividades etc. Elas deveriam

ser ouvidas também politicamente e isso não tem a ver com o fato de ter direito

a voto, ainda que não seja uma ideia não instrumentada. Isso acontece em

alguns grupos sociais. Em uma comunidade indígena brasileira, por exemplo,

sempre que há um assunto importante, todos se reúnem em assembleia e têm

direito de exprimir opinião. A decisão cabe aos mais velhos, mas sempre

depois de ouvir a todos. Inclusive, as mulheres grávidas podem falar duas

vezes porque é considerado o filho que se desenvolve no seu ventre. Isso é a

ruptura com um modelo mental do nosso tempo em que a criança não tem

participação política porque não fala.

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Como funcionaria na prática?

Trata-se de criar dispositivos institucionais para auscultação das vozes das

crianças por meio de inquéritos de opinião, caixas de sugestões, linhas de

comunicação - seja telefônica ou pela internet - e realização de processos de

audição. Isso pode, em alguns casos, nomear representantes dos grupos

infantis organizados com seus conselhos para serem ouvidos. É um modelo

que reproduz as democracias ocidentais. Essa atitude necessita ser

permanente, não pode se esgotar no dia a dia e precisa de dimensão mais

profunda, seja na escola, na cidade ou na família. Há vários municípios que

desenvolvem atividades e projetos assim. Os mais conhecidos são os de

algumas cidades italianas.

Muitos produtos direcionados ao público infantil são feitos por adultos e,

inclusive, carregam os valores do mundo adulto. De que maneira isso

influencia a vida das crianças?

Na cultura industrial, em que os conteúdos e os produtos são feitos pelos

adultos para o consumo infantil, nunca se deixa de reproduzir os estereótipos

do mundo adulto. Walt Disney, por exemplo, tem uma produção cultural própria

de grande difusão com conceitos e valores identificados como patriarcais,

paternalistas, conservadores, que revelam padrões de uma família burguesa

ocidental em que raras vezes se encontram modelos diferentes dos brancos

anglo-saxônicos. Essas produções também são formas culturais influentes e

com muita capacidade de atração. Isso se deve ao fato de elas jogarem na

dimensão da ficcionalidade, que é importante na cultura da infância, ou seja,

na transposição imaginária do real e da ludicidade. Alguns estudos têm

mostrado que há uma grande homologia entre os movimentos imaginários dos

adultos e os das crianças na produção da indústria cultural infantil e que essa

relação vai acompanhando o fluxo dos tempos.

O senhor afirma em seus estudos que as crianças são produtoras de

cultura. Como é possível, se elas são influenciadas pelos adultos?

As crianças não estão sob a tutela dos adultos o tempo todo. Elas sofrem

processos de socialização na relação com os pais, as famílias, os vizinhos e os

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professores, mas também se envolvem socialmente com seus pares. Nas

brincadeiras e nos jogos, seja em tempo real ou virtual. Isso é comum e

importante. Mesmo atravessadas pelos adultos, elas produzem culturas

próprias. É comum atribuir ao adulto o título de produtor cultural, mas é

importante ressaltar que eles também são atravessados pelas culturas que

herdaram. Não há diferença sobre a condição do adulto como produtor cultural

e a da criança. O pintor Pablo Picasso, por exemplo, foi um produtor cultural

revolucionário, que alterou muito a cultura ocidental e fez muitas relações com

as quais convivia. Produção cultural, mesmo quando genial, é sempre feita na

relação. É importante que as crianças produzam a própria cultura nas

condições que têm para fazer isso.