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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR MERIDIONAL ESCOLA DE DIREITO GRADUAÇÃO EM DIREITO Ricardo Borges Meira Lacort Silveira A NATUREZA COMO SUJEITO DE DIREITO: DO CONTRATO SOCIAL AO CONTRATO NATURAL Passo Fundo, 2016

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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR MERIDIONAL

ESCOLA DE DIREITO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

Ricardo Borges Meira Lacort Silveira

A NATUREZA COMO SUJEITO DE DIREITO:

DO CONTRATO SOCIAL AO CONTRATO NATURAL

Passo Fundo, 2016

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Ricardo Borges Meira Lacort Silveira

A NATUREZA COMO SUJEITO DE DIREITO:

DO CONTRATO SOCIAL AO CONTRATO NATURAL

Projeto de pesquisa apresentado como requisito

para aprovação na disciplina de Trabalho de

Conclusão de Curso III da Escola de Direito da

IMED.

Orientador: Prof. Dr. Sérgio Ricardo Fernandes de

Aquino

Passo Fundo, 2016

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DEDICATÓRIA

Dedico a minha família por todo apoio, em especial

ao meus pais Jorge e Nely.

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AGRADECIMENTOS

Após a conclusão da minha segunda graduação,

agradeço as pessoas que contribuíram de algum modo

na minha conquista.

A minha família, por toda importância que têm na

minha vida.

A Marília, minha namorada, por estar ao meu lado

nessa caminhada.

Ao meu orientador Prof. Dr. Sérgio Ricardo

Fernandes de Aquino por me oportunizar estudar e

aprofundar o conhecimento na área ambiental.

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EPÍGRAFE

“Os limites do meu conhecimento são os limites do meu mundo”

Ludwig Wittgenstei

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RESUMO

A Natureza é conhecida como berço de toda vida na terra e responsável pelo equilíbrio natural

dos seres vivos. Sendo a essa recebe a pressão que as ações humanas e seus efeitos acarretam

de forma negativa sobre todo o equilíbrio natural. Essa situação levanta a necessidade de

estabelecer o equilíbrio entre Natureza e Homem. Tendo como base, a análise da conceituação

das Teorias do Contrato Social com ênfase as de Jean-Jacques Rousseau, de cunho

antropocêntrico e do Contrato Natural de Michel Serres, de cunho biocêntrico, para melhor

compreensão para a proteção da Natureza. Na abordagem da importância do Tratado

Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas – UNASUL, para promover a utilização

atualmente do Contrato Natural e a manutenção socioambiental na América do Sul. Bem como,

a contribuição nas Constituições dos países membros da UNASUL, em especial no Brasil e no

Equador, em como cada nação trata a temática ambiental em seu ordenamento. A partir dessa

situação, tem-se como objetivo geral analisar a melhor compreensão para a proteção da

Natureza, bem como, seu reconhecimento como sujeito de direito. O critério metodológico

utilizado para a investigação reside no método dedutivo. Ao final, pode-se concluir que, por

meio do modelo de contrato social elaborado por Rousseau, no século XVIII, não se consegue

o desenvolvimento econômico e o crescimento social desejável no século XXI ao mesmo

tempo, oferecer o encontro e o equilíbrio entre homem e a Natureza, para tanto, sendo

necessário um novo contrato, para integrar o entendimento biocêntrico na perspectiva de

complementariedade ao antropocêntrico, para que assim, Natureza tenha o reconhecimento

como “ser próprio”.

Palavras-chave: Contrato Natural. Contrato Social. Natureza. Ser próprio. UNASUL

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ABSTRACT

Nature is known as the cradle of all life on earth and responsible for the natural balance of living

beings. Therefore, it receives the pressure that human actions and their effects, resulting in a

negative form on the whole natural balance. This situation raises the need to establish a balance

between Nature and Man. Based on the analysis of the concepts of the Theorys the Social

Contract with the emphasis of Jean-Jacques Rousseau, of anthropocentric nature, and the

Natural Contract of Michel Serres, of biocentric nature, for better understanding for the

protection of Nature. The approach of the importance of the Constitutive Treaty of the Union

of South American Nations - UNASUL, to promote the use currently of the natural Agreement

and the maintenance socio-environmental in South America. As well as the contribution in the

Constitutions of member countries of UNASUL, especially in Brazil and Ecuador, how each

country deals with environmental issues in their planning. From this situation, it has as main

objective to analyze the best understanding for the protection of nature, as well as its recognition

as a subject of law. The methodological criteria used for research lies in the deductive method.

In the end, it can be concluded that, through the social model contract drawn up by Rousseau

in the eighteenth century, is not achieved economic development and the desirable social

growth in the twenty-first century at the same time providing the reunion and the balance

between Man and Nature, for this purpose, requiring a new contract to integrate the

understanding biocentric the complementary perspective to the anthropocentric, for once,

nature has recognition as "be himself."

Keywords: Natural contract. Social contract. Nature. Be himself. UNASUL.

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SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS ............................................................................................... 1

1. O CONTRATO SOCIAL ..................................................................................................... 3

1.1. Origens do Contrato Social ............................................................................................... 3

1.2. O triunfo da razão e a importância do Contrato Social na organização social. ........ 11

1.3. Os limites do contrato social na relação Homem e Natureza: a necessidade de outro

paradigma ............................................................................................................................... 21

2. O CONTRATO NATURAL .............................................................................................. 30

2.1. A transição do Contrato Social ao Contrato Natural ................................................... 30

2.2. O Contrato Natural como expressão do Biocentrismo................................................. 38

2.3. As contribuições do Contrato Natural ao Tratado Constitutivo das Nações Sul-

Americanas – UNASUL ......................................................................................................... 46

3. OS DIREITOS DA NATUREZA ...................................................................................... 52

3.1. Natureza como sujeito de direito: desdobramentos Constitucionais Sul-americanos a

partir do Contrato Natural .................................................................................................... 52

3.2. Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas – UNASUL .................... 60

3.3. As Constituições do Brasil e do Equador, no entendimento da natureza como sujeito

de direito .................................................................................................................................. 67

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 78

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 80

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

As relações sociais dos seres humanos, são discutidas por meio dos fundamentos

teóricos e nos ideais propostos por importantes filósofos políticos da modernidade como

Thomas Hobbes, John Locke, Jean-Jacques Rousseau, na formulação das Teorias do Contrato

Social, que debatem sobre as relações sociais dos seres humanos, para as considerações da

organização social por meio das sociedades.

Na Teoria de Rousseau, o Contrato Social é simbolizado pela premissa fundamental da

inalienabilidade e do ideal de Liberdade dos seres humanos, que ocorre por meio das escolhas

e decisões desses sujeitos, exclusivamente antropocêntricas. Sendo necessário na organização

social, compreender que a humanidade não está sozinha na terra.

No Contrato Natural descrito por Michel Serres de ideais biocêntricos, há o

entendimento que existem outros seres vivos, não-humanos no Mundo, os quais juntos fazem

parte da Natureza como Ecossistema, pensamento essencial para estabelecer o equilíbrio na

relação Homem e Natureza.

O idealizado reconhecimento da Natureza como “ser próprio” pelo Contrato Natural,

utilizado para embasar a discussão sobre a proteção Ambiental na América do Sul, como ocorre

no Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas – UNASUL, busca na integração

Sul-Americana a proteção da biodiversidade.

Portanto, o problema da pesquisa, assenta-se sob a ótica do reconhecimento da Natureza

como Sujeito de Direitos, se este reconhecimento favorece a proteção, enfatizada pela

UNASUL, mesmo que modelo de Contrato Social elaborado por Rousseau, não ofereça o

encontro e o equilíbrio entre homem e a Natureza? A essa questão, o presente trabalho busca

esclarecer.

Nessa linha de pensamento, para solucionar a presente questão, são debatidas no

presente trabalho as relações sociais dos Seres Humanos, discutidas pelos filósofos políticos da

modernidade Hobbes, Locke e Rousseau, na formulação das Teorias do Contrato Social, os

quais contribuíram para a organização social por meio das sociedades. Onde as Teorias de

Rousseau, representam momento de grande importância na trajetória do Homem natural para a

compreensão do Pacto Social.

O Contrato Social de Rousseau, simbolizado pela premissa fundamental da

inalienabilidade e do ideal de Liberdade dos seres humanos, que ocorre por meio das escolhas

e decisões desses sujeitos, exclusivamente antropocêntricas, não consegue o desenvolvimento

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social e o crescimento econômico desejável e oferecer a organização entre Homem e Natureza

vislumbrada no século XXI a partir do modelo de contrato social elaborado por Rousseau.

Há necessidade de revisar as escolhas e as decisões, e observar, por meio do

entendimento do Contrato Natural descrito por Serres, que existem outros sujeitos no mundo,

os quais juntos fazem parte da Natureza como Ecossistema. E que a Natureza necessita que os

seres humanos busquem, na perspectiva de complementariedade e unicidade, o entendimento

do biocentrismo junto ao antropocentrismo de forma simbiótica. E que a partir da necessidade

de preservar o mundo natural, se faz necessário, por meio da análise do reconhecimento da

Natureza como “ser próprio” do Contrato Natural, a compreensão sobre a importância da

proteção ambiental, como sujeito de direito, contida nos ordenamentos pátrios dos países,

membros da UNASUL.

Assim, o objetivo geral da pesquisa visa determinar, a partir de subsídios teóricos, os

preceitos do Contrato Social de cunho antropocêntrico e do Contrato Natural de cunho

biocêntrico para estabelecer qual dos dois modelos apresentados possibilitam a manutenção

socioambiental, nos países Sul-Americanos, Equador e Brasil, membros da UNASUL.

Da mesma forma, a pesquisa tem como objetivos específicos, definir partindo da

conceituação das Teorias antropocêntricas do Contrato Social, com ênfase as de Rousseau, e

das Teorias biocêntricas do Contrato Natural, a melhor compreensão para a proteção do meio

ambiente. Avaliar quais mecanismos jurídicos que os países membros da UNASUL, Equador

e Brasil, utilizam para se integrar ao entendimento biocêntrico na perspectiva de

complementariedade ao antropocêntrico, para a proteção na Natureza. Assim como, identificar

a partir do estudo do Tratado da UNASUL, qual contrato é utilizado atualmente na América do

Sul, o antropocêntrico ou biocêntrico. E analisar sobre a ótica do reconhecimento da Natureza

como “ser próprio” do Contrato Natural, se há compreensão sobre a importância da proteção

ambiental, como sujeito de direito, no Equador e no Brasil.

As técnicas de pesquisa que são utilizadas na elaboração do presente trabalho, se

estabelecem sobre a Pesquisa Bibliográfica – documental de doutrinas e demais documentos

que versem sobre a temática proposta, bem como a utilização da Categoria e o Conceito

Operacional, seja por Adoção ou Composição.

O método de abordagem utilizado para a investigação reside no Método Dedutivo, cuja

premissa maior é transição do Contrato Social de cunho antropocêntrico ao Contrato Natural

de cunho biocêntrico, e a premissa menor, se caracteriza na utilização dos subsídios da

UNASUL de qual contrato utilizar.

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1. O CONTRATO SOCIAL

O filósofo Jean-Jacques Rousseau em sua obra Contrato Social, aponta a importância

de um pacto entre todos os homens, e vislumbram por meio da Razão a proteção das liberdades

individuais, a limitação do poder do Estado, a alienação do interesse individual para promover

a vontade geral. Contudo, na evolução da sociedade, as relações existentes entre os seres

humanos e não-humanos ultrapassaram os limites da postura antropocêntrica, sendo necessária

outra atitude de caráter complementar dos indivíduos frente a retomada de ideal natural.

1.1. Origens do Contrato Social

No decorrer da evolução humana observa-se que as pessoas buscaram modos de

preservação da sua integridade física frente as hostilidades dos ambientes naturais, os quais

caracterizavam seu habitat, sem que tivessem de abandonar as diversas formas de atingir seus

interesses individuais, de conseguir recursos para subsistência, abrigo frente a condições

climáticas adversas, nos conflitos com rivais, nas disputas territoriais e para conquistas de

parceiras.

As características preservacionistas, relativas de indivíduo para indivíduo, modificaram-

se passando de indivíduo a grupo com interesses ímpares, os quais deixaram a partir de vestígios

históricos1 – pinturas rupestres, utensílios e ferramentas – as características existências de cada

grupo, com objetivos individuais e coletivos, bem como, formas de determinar sua evolução

social, econômica, estilo de vida, e hábitos alimentares, durante a Era cenozóica2.

Por meio do modo de vida que os indivíduos primitivos criavam junto à Natureza, esses

se encontravam plenamente livres, não sendo mais um antropóide3 presente na Natureza,

1 Ramo da Antropologia, a Antropologia cultural investiga “[...] as culturas humanas no tempo e no espaço, suas

origens e desenvolvimento, suas semelhanças e diferenças. Tem foco de interesse voltado para o conhecimento

do comportamento cultural humano [...]”, e por meio de estudos arqueológicos tem “[...] como objeto de estudo

as culturas do passado, extintas “[...] buscando por meio de “[...] tentativa de reconstrução do passado por meio

da busca de vestígios e restos de materiais não perecíveis e resistentes à destruição através do tempo [...]”.

MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. 6 ed. São

Paulo: Atlas, 2005, p. 4/5. 2 MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 90. 3 Segundo Marconi e Presotto, na Classificação Zoológica do homem, este se localiza “[...] na Ordem: Primata,

Subordem: Antropóides (primatas, macacos e humanidade). O homem origina-se da evolução de antigos

primatas. Não descende dos macacos, mas ambos têm um tronco primata comum. [...]”. MARCONI, Marina

de Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 53. Grifo original da obra em

estudo.

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juntamente com macacos e grandes símios, e sim, se caracterizando como homem natural4,

detentor de conhecimentos rudimentares e capaz de exercê-los, para sua melhor adaptação ao

seu habitat.

O homem natural, na sua condição de liberdade perante a Natureza e a todos os seres

vivos ao seu redor, não encontra obstáculos para utilizar de todas as maneiras, as mais diversas

formas de preservação da sua vida, seus “direitos” e, sob igual critério, na realização de seus

desejos. Esses conflitos se originam pelas disputas de interesses que objetivam as conquistas

individuais e refletiam no enfraquecimento do interesse dos grupos.

A importância da dimensão coletiva, anteriormente ao advento da própria escrita,

apresentava formas de organizações específicas de cada agrupamento, os quais demonstravam

suas necessidades e expressavam seus costumes. O estudo do direito dos povos sem escrita,5

confirma o entendimento que por meio das reuniões, o homem natural efetivou a um todo

coletivo, formas e normas para satisfazer seus interesses juntamente com os do grupo, clã, povo,

comunidade, e sociedade, sendo configurados como povos primitivos.

No panorama anterior ao discurso da Modernidade6, os grupos humanos se formulavam

com a introdução dos indivíduos no ambiente familiar7, de laços sanguíneos, hierarquia

patriarcal, obediência as normas de condutas e aos costumes. Fortaleceu-se a compreensão da

identidade de um grupo social que, nesse momento, era exercido pelo clã,8 por meio do convívio

social dos indivíduos, os quais possuíam objetivos comuns, ou simplesmente vinculados por

afinidades e laços de parentescos.

4 De acordo com Marconi e Presotto “[...] a partir de transformações psicossomáticas básicas, a evolução

hominída foi gradativa e contínua, levando a modificações necessárias para o aperfeiçoamento do gênero Homo

em relação ao meio [...]”. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia:

uma introdução. p. 77. Grifo original da obra em estudo. 5 Aguiar, apresenta a importância para o estudo do Direito, o entendimento do direito dos povos sem escrita.

Povos pré-históricos, que anterior a escrita já apresentavam modos de exercício dos seus direitos. O autor ao

citar John Gilissen, aponta as características desses povos “[...] a) Por não serem direitos escritos, os esforços

de formulação de regras jurídicas abstratas são bastantes limitadas; b) Como cada comunidade tinha o seu

próprio costume, pois vivia isolada, praticamente sem contato com outras comunidades, há grande diversidades

nesses direitos [...]”. AGUIAR, Renan. História do Direito 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 28/29. 6 “[...] estilo, costume de vida ou organização social que emergiram na Europa a partir do século XVII e que

ulteriormente se tornaram mais ou menos mundiais em sua influência.”. GIDDENS, Anthony. As

conseqüências da modernidade. Tradução de Raul Fiker. São Paulo: Editora da UNESP, 1991, p. 11. 7 Para Rousseau, “[...] A mais antiga de todas as sociedades e a única natural é a da família [...]” para o filósofo,

é a família “[...] o primeiro modelo das sociedades políticas, o chefe é a imagem do pai, o povo representa os

filhos, e sendo todos nascidos iguais e livres, só alienaram sua liberdade para atender à própria, conveniência

[...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. Tradução de Vicente

Sabino Júnior. São Paulo: Pillares, 2013, p. 25. 8 Segundo entendimento de Aguiar “[...] Independente do sistema adotado pela sociedade chega-se sempre, pela

ampliação dos laços consanguíneos, à formação de grupos relativamente extensos – os clãs [...]” para o autor

é neles que “[...] há origens comuns e, dessa forma, identidade cultural, o que facilita a unificação [...]”.

AGUIAR, Renan. História do Direito. p. 31.

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Esses indivíduos, permaneciam unidos por conta de não existir o entendimento de

propriedade,9 sendo que a própria terra era considerada de todos os membros do clã, a qual

poderia ser, a partir da determinação do chefe do grupo, colocada à disposição de determinada

família que pertencesse ao clã, em um delimitado período de tempo, para essa exercer atividades

agrícolas, sendo devolvida ao grupo posteriormente.

Ponto de grande relevância da organização10 desses grupos, se configura no indivíduo

que abre mão de seus interesses, sua liberdade individual ou a do seu grupo familiar para atender

e satisfazer a um interesse maior, o da coletividade. É crucial nesse momento a reunião

voluntária de grupos de indivíduos que juntos originam a formação da Sociedade11, tão

complexa quanto a própria origem da Sociedade Política12 (Estado).

Nessa linha de pensamento, os sujeitos sociais têm suas necessidades tuteladas, e estão

vinculados a normas positivadas hierarquizadas, cuja autoridade é exercida com o objetivo de

alcançar um bem maior, próprio a todos, pois torna-se necessária a distinção central13 entre o

Estado natural, anterior, para o Estado civil como a instituição da organização e corpo político.

Nesse debate sobre o Estado natural e o Estado civil, é preciso mencionar Nicolau

Maquiavel14 (1469-1527), principalmente com relação a obra O Príncipe, pois esse é o autor do

pensamento do Estado como instituição política. A partir do seu pensamento, estabelece-se a

ordem social, cujo objetivo é conter a desordem característica da condição humana.

9 Aguiar, com relação aos direitos das coisas, exercidos nos clãs, menciona que “[...] O chefe não era considerado

proprietário do solo sendo ele pertencente a toda comunidade. Mesmo que as parcelas fossem repartidas pelo

chefe, entre as famílias, isso era por curto lapso de tempo. Depois da colheita, toda terra voltava a pertencer ao

clã como um todo [...]”. AGUIAR, Renan. História do Direito. p. 32. 10 Segundo Marconi e Presotto, “[...] Nas sociedades simples, a organização política varia muito, relacionando-

se quase sempre com o ritual, o sagrado e os laços de parentesco [...]”. MARCONI, Marina de Andrade;

PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 9. 11 O adensamento populacional originário contribuiu para a formação das Sociedades, que originaram as Cidades

propriamente ditas. Para Azambuja, a compreensão do conceito de Sociedade “[...] é um coletividade de

indivíduos reunidos e organizados para alcançar uma finalidade comum [...]”. AZAMBUJA, Darcy. Teoria

geral do Estado. 44. ed. São Paulo: Globo, 2005, p. 2. 12 De acordo com Limongi, “[...] A tese de que a origem da sociedade política está num contrato implica que a

sociedade política é um artifício, isto é, uma forma de associação a que os homens não são conduzidos pelo

movimento natural de suas paixões e na qual não estão desde sempre inseridos de maneira espontânea ou

irrefletida (como a família, por exemplo), mas uma comunidade que os homens resolvem instituir

voluntariamente, na medida em que têm razões e motivos para isso [...]”. LIMONGI, Maria Isabel de

Magalhães Papaterra. Os Contratualistas: Hobbes, Locke e Rousseau. In: RAMOS, Flamarion Caldeira;

MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado

& Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 98. 13 LIMONGI, Maria Isabel de Magalhães Papaterra. Os Contratualistas: Hobbes, Locke e Rousseau. In: RAMOS,

Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia Política: Para os cursos

de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. p. 98. 14 Nas palavras de Bressan, Maquiavel “[...] Introduz o conceito de Estado como instituição política necessária à

manutenção da ordem social ou para evitar a inevitável desordem provocada pela natureza humana imitável

[...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino (org.)

Gestão, democracia e governabilidade: diálogo a partir de experiências. Passo Fundo, (RS): IMED, 2006, p.

31.

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Nas manifestações do posicionamento do filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679),

sobre as diferenças entre o Direito natural e o Direito Positivo, se observa no sistema do filósofo

sobre o Estado, que o homem, por meio dos seus instintos básicos deve seguir as leis da

Natureza15, para sua própria conservação, porém, somente por meio do poder coercitivo do

Estado, que a paz e a segurança podem ser estabelecidas e mantidas a todos.

Segundo o ideal de organização promovida pelo Estado, os indivíduos tutelados não

dispunham da sua liberdade, pois deviam obediência estatal. Para que esses não fossem

expurgados das condições de convivência estabelecidas pelo Estado e permanecessem na sua

condição natural, deveriam unir as forças como indivíduos livres, e buscar a organização

política do seu grupo social.

Centrado nesse posicionamento, todos deveriam se manter unidos de forma organizada16

e ligados por interesses mútuos, para não se subjugarem ao poder do Estado. Essa é a

problemática apresentada por Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) por meio do ideal de um

Pacto Social17 entre todos os indivíduos, como solução para toda sociedade.

Para Rousseau, a ideia do Pacto Social deveria versar sobre a manutenção dos

indivíduos no Estado natural, sem que fosse necessário entregar o poder ao povo constituído.

Para John Locke (1632-1704), por meio de sua compreensão sobre as relações entre o povo e o

Estado18, muito antes do ideal rousseauniano ser apresentado, apresentava em seus

posicionamentos que a Soberania do Estado faz parte do Pacto Social.

O filósofo Locke como teórico do Direito natural19, busca a liberdade dos indivíduos,

por meio da construção da esfera de liberdade destes sujeitos, frente a esfera estatal, tendo seu

15 Para Hobbes, “[...] A Lei da Natureza é preceito ou norma geral, estabelecido pela razão mediante o qual se

proíbe a um homem fazer algo destrutivo contra sua própria vida” [...]. NEUMANN, Franz. O império do

Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. São Paulo: Quartier Latin, 2013, p. 184. 16 Segundo Marcondi e Presotto, “[...] A organização política é um aspecto cultural encontrado em todos os

grupos humanos, simples ou complexos. A condição necessária para a sua existência é a formação de grupo e

subgrupos, cujas relações requerem controle social. [...]”. MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zelia

Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 138. 17 Para Rousseau, os indivíduos tem de exercer suas forças para manterem-se no Estado natural, sendo que para

isso “[...] Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja de toda a força comum a pessoa e os bens

de cada associado, e pelo qual, cada um, unindo-se a todos, só obedeça, portanto a si mesmo, e permaneça livre

como antes [...]”, sendo que para o autor, solução para esse problema, está no Contrato Social. ROUSSEAU,

Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 39/40. 18 Na discussão sobre a temática de Soberania e Povo, John Locke discorre a sua visão sobre a função do estado,

“[...] de preservar a liberdade e a propriedade de cada um, julgando as disputas e pleitos de acordo com as leis

que forem feitas, mas que o limite da execução destas leis é próprio país [...]”. MARES, Carlos Frederico.

Soberania do povo, poder do Estado. In: NOVAES, Adalto (Org.) A crise do Estado-nação. Rio de Janeiro:

Civilização brasileira, 2003. p. 237/238. 19 NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p.

209/210.

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ideal positivado na Natureza humana. Que é valorizada por tal capacidade pelo filósofo, pois

assim, o homem assume a harmonia universal, o interesse individual e o interesse comum.

Partindo do conceito do termo Contratualimo20 e por meio de sua contextualização21, se

extrai a contribuição de ideais Contratualistas, dos grandes filósofos políticos, em suas obras

Hobbes com a obra Leviatã (1651), Locke com a obra Dois tratados sobre o governo civil (1679-

80) e Rousseau com duas obras: o Discurso sobre a origem e os Fundamentos da desigualdade

entre os homens (1755), tão importante quanto o seu maior tratado, o Contrato social (1762).

No caso de Rousseau, este teve notória influência na Revolução Francesa, as suas

publicações acrescentaram fundamentos para os debates que cercam o homem natural, a

concretização de um Contrato entre todos os homens, a Soberania22 dos homens e os moldes da

organização social.23

A manifestação principiológica das Teorias do Contrato Social24 trazidas por Hobbes ao

Estado, Locke ao mercado e Rousseau a comunidade são fundadas e debatidas sobre o Direito

natural racional e nas relações que esses princípios apresentam na organização social, tanto para

o indivíduo como para coletividade. A materialização dessas teorias esclarecem qual o projeto

civilizacional criado pela Modernidade, a qual terá eficácia e eficiência a partir do

desenvolvimento das atividades estatais.

Para melhor entendimento e compreensão sobre esse tema serão utilizadas como

propostas a serem debatidas, as teorias abordadas por Rousseau, como matriz teórica e, em

20 Para Bressan “[...] O contratualismo é a primeira grande filosofia política da modernidade [...]” e tendo “[...]

Rousseau (1712-1778) grande importância intelectual na Revolução Francesa (1789) com suas teorias sociais

em duas obras celebres, Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdades entre os homens (1755) e

Contrato Social (1762) [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair;

PIES, Marcelino. (org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 33. 21 Limongi ao escrever sobre os Contratualistas Hobbes, Locke e Rousseau, destaca que “[...] De modo geral, o

termo Contratualismo designa toda teoria que pensa que a origem da sociedade e do poder político está num

contrato, um acordo tácito ou explicito entre aqueles que aceitam fazer parte dessa sociedade e se submeter a

esse poder [...]”. LIMONGI, Maria Isabel de Magalhães Papaterra. Os Contratualistas: Hobbes, Locke e

Rousseau. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia

Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. 2012, p. 97. 22 Para Mares, “[...] A soberania foi pensada como uma criação dos homens em sociedade como uma construção

ou invenção que os fizesse gerir seu próprio destino, teria, para isso, que ser una, indivisível, inalienável,

imprescritível, e pertencente ao povo “[...]. MARES, Carlos Frederico. Soberania do povo, poder do Estado.

In: NOVAES, Adalto (Org.) A crise do Estado-nação. p. 237. 23 Para Rousseau “[...] a sociedade organiza-se por meio de costumes e convenções aos quais os indivíduos

aderem e por cujo cumprimento se responsabilizam [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado

na perspectiva da questão ambiental. Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2011, p. 24. 24 Segundo Santos, ao referenciar a conceituação de Michael Lessnoff, sobre a origem do Contrato Social essa

[...] remonta a obra de um monge alsaciano, Monegold de Lautenbach, que nos finais do século XI defendeu a

ideia de contrato social em nome do Papa Gregório VII na sua luta contra o imperador [...]. SANTOS,

Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição

paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 8. ed. São Paulo: Cortez,

2011, p. 129.

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contraste, os pensamentos de Locke e Hobbes, bem como outros pensadores que discorrem

sobre a origem da Sociedade, o seu poder25 político soberano, estando tudo em um Contrato,

fundamentado na autonomia da vontade de cada indivíduo.

Para Rousseau, o poder absoluto deve ser protegido, pois é a representação da soberania

intrínseca do Estado, no qual o direito da comunidade não é dado à autoridade do Soberano,

pois, se o povo desse ao Soberano seu poder, o seu próprio direito, deixaria de ser Povo.26

O mencionado filósofo aponta que no Estado da Natureza, o Homem natural nasce livre,

sem maldade, feliz na sua condição de vida, liberto de qualquer modo de escravidão27, estando

fora do ambiente estatal, sendo que, a própria sociedade que o corrompe, arruína a sua vida e o

transforma em escravo das evoluções que o Estado vislumbra.

Sendo que as evoluções estatais abarcam um ponto de grande importância a ser

debatido, a aquisição de posses, concretizada pela propriedade privada,28 e que resulta nas

desigualdades existentes entre os ricos, detentores de riquezas, e os pobres, quais são

subjugados por aqueles.

É necessário, segundo os ideais de Rousseau, a criação de um instrumento capaz de

regular as desigualdades que o desenvolvimento da civilização trouxe a sociedade. Para ordenar

essa regulação foram criados, por meio de um Contrato,29 os ideais de Sociedade política,

Autoridade e de Estado entre todos do Povo. Sem que a Soberania deixe de estar nas mãos do

povo, na sua essência de natureza coletiva.

Neste entendimento a vontade geral dos indivíduos apresenta duas ideias que são,

aparentemente, contraditórias,30 na primeira, ao mesmo tempo que Rousseau apresenta como

25 Para Azambuja, “[...] Poder é a força por meio da qual se obriga alguém a obedecer [...]”. AZAMBUJA, Darcy.

Teoria geral do Estado. p. 5. 26 Santos, remete que para Rousseau “[...] o poder da comunidade se manifesta ‘por todos, com todos’ a

comunidade não aliena ao soberano direito de legislar. O cidadão não obedece senão a si próprio e não pode

ser forçado a nada senão a ser livre (sempre que a sua vontade não estiver à altura da vontade geral) [...]”.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição

paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. p. 138. 27 Para Rousseau “[...] uma vez que homem nenhum tem autoridade natural sobre seu semelhante [...]” para o

filósofo, alienar a própria liberdade para outrem é um ato insensato “[...] é uma convenção vã e contraditória

estipular, de um lado, uma autoridade absoluta e, de outro, uma obediência sem limites [...]”. ROUSSEAU,

Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 31-33. 28 Segundo Marconi e Presotto, “[...] A propriedade é um aspecto da cultura humana, universal, que que delimita

os direitos e privilégios que uma ou um grupo de pessoas têm sobre as coisas [...]”. MARCONI, Marina de

Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 132. 29 Para Azambuja, “[...] por esse contrato o homem cede ao Estado parte de seus direitos naturais, criando assim

uma organização política com vontade própria, que é a vontade geral. Mas, dentro dessa organização, cada

indivíduo possui uma parcela do poder da soberania, e portanto recupera a liberdade perdida em consequência

do contrato social [...]”. AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. p. 61. 30 Segundo Santos, na visão de Rousseau “[...] Só existe uma solução: a vontade geral como um exercício

essencial de soberania inalienável e indivisível [...] tal ideia contraditória de que [...] Quem se recusar a

obedecer à vontade geral, será obrigado a fazê-lo por todo o corpo. Isso significa apenas que será forçado a ser

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forma de manifestação da vontade geral no Contrato Social, quando os indivíduos são livres,

esses somente obedecem a si próprios.

Na segunda ideia, sendo que o momento em que os indivíduos se recusam a fazer algo

em prol do grupo, são forçados a serem livres, pois essa ideia traz o entendimento de que quem

não age para a coletividade não é considerado livre31.

Nessa linha de pensamento, sem que haja opressão entre os homens, todos são livres ao

exercerem o seu direito de propriedade já que a materialidade da propriedade da terra e seu o

usufruto advém do trabalho humano, especificamente de cada um, estando o indivíduo livre do

contexto monetário e de desigualdade trazido por Locke32, pelo contrário, ligado ao ideal de

igualdade33 na racionalização da vida social comunitária.

A partir da utilização racional do intelecto humano para determinar sua liberdade

individual, o Contrato Social elaborado por Rousseau corrobora na busca da proteção de ideais

de dignidade dos indivíduos. Desvincula-se a sociedade da representatividade dada ao Soberano

por meio do poder de determinação das condutas morais das vidas dos indivíduos, as quais

serão determinadas por representantes escolhidos pelo Povo para criar as leis.

O Contrato deve ser geral, igualitário a todos do Povo, de forma universal, sem que de

nenhuma forma, seja impedida a vontade geral, pois para que haja a sua ocorrência, esse deve

ser efetivado por meio da representação34 civil soberana, na defesa dos interesses sociais de

todo o povo, sem que esse se mantenha preso a um poder regulamentador dos seus direitos, do

contrário não é possível que exista qualquer Povo.

livre [...]”. SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na

transição paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. p. 130. 31 Para Tárrega e Lemes, “[...] a ideia de liberdade delineia um modelo de sujeito capaz da autodeterminação, e

capaz de ser sujeito da conhecida autonomia privada. Autonomia para eleger suas relações jurídicas. O sujeito

que há de deliberar por si, com competências para se servir do contrato para dispor de suas esfera de interesses

[...]”. TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo

democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes

Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de

Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. Curitiba: Instituto Memória Editora, 2015, p. 337. 32 John Locke, um dos mais importantes filósofos ingleses e teóricos do contratualismo. ROUSSEAU, Jean-

Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Tradução de Laurent

de Saes. São Paulo: EDIPRO, 2015, p. 103. 33 Santos, confirma o ideal de igualdade de Rousseau “[...] a liberdade não pode subsistir sem igualdade [...]” o

estado tem de intervir e garantir ambas “[...] é precisamente pelo fato de a força das circunstâncias tender

sempre para destruir a igualdade que a força da legislação deve tender sempre para a conservar [...]”. SANTOS,

Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição

paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. p. 136. 34 Azambuja, relata que para Rousseau, um problema a ser superado, é “[...] encontrar uma forma de associação

que defenda e proteja com toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada um,

unindo-se a todos, não obedeça no entanto senão a si mesmo, e permaneça tão livre como antes [...]”.

AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. p. 99/100.

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Nesse contexto, a soberania do homem é absoluta e inalienável. Essa expressa os seus

direitos, a propriedade privada e o gozo de sua utilização, bem como o poder do povo, sem que

infrinja as leis obrigacionais de conduta e morais civilizatórias. Nessa linha de pensamento, a

sociedade organizada evita os conflitos de interesses entre os homens sem que haja a alienação

da sua liberdade, e assim, almejando garantir cenários mais pacíficos35.

Para preservar esses ideais a partir do Contrato social, os representantes escolhidos pelo

Povo se reunirão e poderão governar sob a vontade geral,36 que é o lugar no qual emana o poder.

A Soberania será exercida por determinadas pessoas, as quais criarão as leis que somente serão

aceitas quando ventilarem os interesses do Povo, para que, a partir desse momento, ser

vinculadas a todos de forma unânime.

A representatividade da Soberania, fundada nos ideais preconizados por Rousseau,

apresenta pontos distintos quando se refere ao dimensionamento a ser alcançado,37 pois a

vontade geral é a manifestação da Soberania, sendo esta destinada a pequenos ou grandes

Estados ou a qualquer proporção da Sociedade.

Para que as decisões acerca dos interesses do povo sejam tomadas com esses objetivos,

se faz necessário as reuniões, contando com a presença de toda a sociedade, bem como a de

seus representantes. Quando as decisões de cunho geral, bem como as relações de convívios,

forem asseguradas pelo Contrato Social, não haverá nenhuma forma de alienação da liberdade

de cada um, pois esse é o objetivo do Contrato.

A partir da obra de Rousseau pode-se observar que a proteção38 da inalienabilidade da

pessoa é algo fundamental pois, não obstante essa venha a se alienar para satisfazer os interesses

da vontade geral, não deixará de ser livre. Para esse filósofo, não é admissível que se utilize o

35 AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. Passo Fundo: IMED Editora, 2014, p.

188. 36 Segundo Scariot “[...] Na ideia de contrato social, desenvolvida por Rousseau, não é o monarca que detém a

soberania; é o povo que a exerce, baseado na vontade geral e na lei [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução

do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 24. 37 Para Azambuja, “[...] Rousseau preconiza a criação de pequenos Estados e a democracia direta [..]” da mesma

forma “[...] a população do estado deve ser pequena, para poder reunir-se frequentemente [...]”. AZAMBUJA,

Darcy. Teoria geral do Estado. p. 61. Complementa Bobbio, “[...] a fórmula rousseauniana é válida para os

pequenos números, não para os grandes [...]” BOBBIO, Norberto Qual o Socialismo?: debate sobre uma

alternativa. Tradução de Iza de Salles Freaza. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1983, p. 69. 38 Segundo Aquino através da visão de Rousseau “[...] percebe-se que a soma dos esforços justifica e protege a

liberdade de cada pessoa. A vontade geral é mais significativa e forte em detrimento à vontade de um único

ser humano no sentido de preservar a inalienabilidade humana [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de.

Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia

concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.).

Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da

Faculdade Meridional. p. 196.

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Contrato Social para tornar qualquer pessoa um escravo, seja de forma voluntária ou forçada

pela autoridade de outro homem.

O Contrato Social é um pacto entre todos os homens, por meio da Razão,39 vislumbra a

proteção das liberdades individuais, a limitação do poder do Estado,40 a alienação do interesse

individual e alcança a soberania da vontade geral. Insiste-se no desenvolvimento de todos sem

que seja necessário se firmar no Direito do mais forte, na escravidão do semelhante, mas sim,

no ideal antropocêntrico, que deve ser protegido.

Essa é a expressão racional humana, sendo que os indivíduos, ao tomarem suas decisões,

buscam assegurar seus direitos, estes fundamentais à sua sobrevivência na esfera estatal, sua

dignidade como ser humano, sua liberdade natural, que mesmo ao aliená-la na concretização

do bem maior, no interesse da coletividade, por intermédio do Contrato, a mantém como

anteriormente a alienação.

O poder é soberano e exercido por meio do interesse geral41, ou seja, a única autoridade

legítima definida, no caso do Contrato, trata-se da vontade geral42. Essa representação é

detentora da autoridade sobre todos, guarida nos ideias de Rousseau, materializada no Contrato

Social e essencial para organização da sociedade.

1.2. O triunfo da razão e a importância do Contrato Social na organização social

Para a elaboração de Teorias Contratualistas Maquiavel, em pleno século XVI, já

introduzia para a Sociedade discussões acerca do conceito de Política como uma ação humana,

independente de religião. Esse fato contribuiu para que houvesse uma severa crítica da Igreja

39 Ao trazer a compreensão de que a Razão venceu, Aquino remete ao estilo poético de Rousseau, o qual “[...]

convence no sentido de se enxergar, com clareza, como a pluralidade de opiniões de pessoas livres e iguais

constitui a unidade da vontade geral [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao

Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE,

André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e

sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional.

p. 198. 40 Segundo Scariot “[...] O Estado passa a ser visto como uma organização política cujos poderes devem ser

limitados não somente por uma lei, mas por uma lei com força suficiente para vincular também o Estado [...]”.

SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 25. 41 Para Rousseau a Soberania é “[...] o exercício da vontade jamais se pode alienar, e que o soberano, que é

somente um ser coletivo, só pode ser representado por si mesmo; é possível transmitir-se o poder, mas não a

vontade [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 53. 42 AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 188.

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Católica e do Estado como instituições políticas, necessárias para manutenção da ordem

social.43

As manifestações principiológicas dos filósofos-pensadores ingleses Hobbes e Locke

no século XVII que elaboram e discutiram posicionamentos acerca da Teoria Contratualista, de

papel fundamental na fundamentação do Estado frente a autonomia dos indivíduos inseridos na

sociedade. Na França do século XVIII, Rousseau junta-se a lista de importantes Contratualistas,

sendo que sua posição produz críticas ao Contrato presente a sociedade da época, e as

desigualdades existentes no contexto social.

Muito embora o Contratualismo não seja uma posição estritamente moderna,44 obteve

sua posição de importância como corrente de pensamento por intermédio dos filósofos

Contratualista. Na Modernidade45, os referidos pensadores, propuseram-se a explicar por meio

do Contratualismo a origem e a necessidade do Estado, fundamentados na tríade, Estado de

Natureza/Contrato/Estado.

Nesse período histórico, os três Contratualistas aqui estudados, centralizaram em suas

Teorias, no ponto de que o homem, por não ser apenas um antropóide e sim um ser racional,46

que conclui, que para se sair das inconveniências do Estado natural, deve, por meio de um Pacto

social celebrado entre todos, criar um poder civil maior que o de cada indivíduo isolado, o poder

denominado de Estado47.

43 BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (Org.).

Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 31. 44 Segundo Limongi, “[...] Embora não se trate de uma posição estritamente moderna, nem restrita às filosofias

de Hobbes, Locke e Rousseau, o Contratualismo adquiriu o estatuto de um movimento teórico ou corrente de

pensamento precisamente com esses autores [...]”. LIMONGI, Maria Isabel de Magalhães Papaterra. Os

Contratualistas: Hobbes, Locke e Rousseau. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI,

Yara (Org.). Manual de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e

Ciências Sociais. p. 97. 45 Para o Bressan, “[...] O ponto de partida é a afirmação de que o homem pode ser concebido a partir de uma

condição natural (estado de natureza), em que ele desfruta, enquanto indivíduo, de um poder natural (liberdade

e igualdade) absoluta [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair;

PIES, Marcelino. (org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 33. 46 Segundo Bressan, “[...] Devido aos inconvenientes do estado natural, esse homem (que não é um animal

selvagem, mas um ser racional) pode chegar a conclusão sobre as causas de tais inconvenientes e procurar uma

saída, que pode ser através da celebração de um contrato (pacto) do qual participam todos os homens, para

criar um outro poder, mais precisamente, um poder civil chamado ‘Estado’ [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias

do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão, democracia e

governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 33. 47 Segundo Scariot “[...] O modelo contratualista baseia-se, principalmente, na ideia de que o Estado é uma

criação artificial dos homens, por meio de um acordo firmado pela maioria dos indivíduos; esse contrato

legitima o poder político e racionaliza o poder exercido pelo Estado, pois este se sustenta no consentimento

dos cidadãos [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental.

p. 23.

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Os posicionamentos dos filósofos Contratualistas são materializados como fundamentos

do projeto do Contrato Social48 sendo conhecido também como projeto civilizatório, já que

estabelece, sob o ângulo do Contratualismo, as relações dos homens para com os homens na

sociedade política, não ficando restrito apenas às relações jurídicas,49 bem como às relações dos

indivíduos para com o Estado.

Centrado no ideal organizacional estatal, os indivíduos, por obediência ao Estado, não

dispunham da sua liberdade. Esses sujeitos para proteção de sua condição natural de liberdade,

segundo a Teoria de Rousseau devem se unir, por meio da vontade geral. Do contrário, devem

obedecer às condições de convivência estabelecidas pelo Estado, chegando a transferir seus

direitos para essa entidade.50

Seguindo a afirmação de “obediência estatal”, essa contribui na construção da

importância do Contrato Social e na organização social. Por meio dos apontamentos dos

principais pensadores Contratualistas estudados, – com ênfase em Rousseau – e em seus

posicionamentos, presentes no Contrato Social, assinalam discordâncias frente as Teorias bases

para criação do Contrato e da Soberania estatal.

Muito embora, esses pensadores políticos não partilhassem dos mesmos ideais políticos,

mas de uma sintaxe comum51, ao fato de que o Contratualismo se apresenta como um ponto em

48 Na Visão de Novaes “[...] O Contrato Social procurou dar forma à sociedade civil tomando o indivíduo como

fundamento do poder político mas, ao mesmo tempo, pensando em Estado capaz de assegurar a todos a

liberdade e a igualdade [...]” para tanto, a autor acrescenta que “[...] foi necessário “ encontrar uma forma de

associação que defendesse e protegesse de toda força a pessoa e os bens de cada associado e pela qual cada

um, unindo-se a todos, não obedecesse, entretanto, senão a si mesmo e continuasse tão livre quanto antes”

[...]”. NOVAES, Adalto. Invenção e crise do Estado-nação. In: NOVAES, Adalto (Org.) A crise do Estado-

nação. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2003. p. 14. 49 Para Limongi, “[...] a tese contratualista implica que a política se funda sobre uma relação jurídica. Pois, o

contrato, que dá início a associação política, é um ato jurídico (trata-se de uma figura do direito privado

romano) pelo qual as partes contratantes estabelecem direitos e deveres recíprocos. Para o Contratualismo, a

sociedade política não apenas se funde sobre a relação jurídica, como se distingue das outras formas de

comunidade precisamente por isso [...]”. LIMONGI, Maria Isabel de Magalhães Papaterra. Os Contratualistas:

Hobbes, Locke e Rousseau. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.).

Manual de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências

Sociais. p. 98. Grifo original da obra em estudo. 50 Segundo Neumann, ao debater a opinião de John Locke, traz a luz importante fato “[...] Aplicando as velhas

categorias do direito privado, ele conclui, em oposição ao direito romano, que ninguém pode transferir mais

direitos do que possui. Assim, como no estado de natureza não dá as pessoas o direito de afetar a liberdade e a

propriedade, então eles também não podem transferir tal poder ao Estado. [...]”. NEUMANN, Franz. O império

do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 211. 51 Para Limongi, “[...] há algo como o Contratualismo, um ponto em comum que une Hobbes, Locke e Rousseau.

Se esses autores não partilham dos mesmo ideias políticos e das mesmas tradições, partilham por certo de uma

sintaxe comum [...]”. LIMONGI, Maria Isabel de Magalhães Papaterra. Os Contratualistas: Hobbes, Locke e

Rousseau. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia

Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. 2012. p. 98. Grifo

original da obra em estudo.

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comum entre os filósofos, no qual cada um contribuiu com suas Teorias, sendo essas de grande

importância e abordagem separadamente.

Dentre os pensadores Contratualistas, Hobbes, teve importante participação no período

iluminista, tendo surgido como um segundo Maquiavel52, pois contribui, por meio de suas

Teorias, no desenvolvimento do conceito de Estado, bem como na justificativa que argumenta

a importância do Estado53, bem como o papel54 a ser desempenhado para atender aos súditos.

Em seu debate sobre o Direito natural e o Direito Positivo, o referido filósofo remete ao

homem natural,55 como de suma importância seguir as Leis de Natureza56, as quais regem a

organização e a convivência de todos. Sendo que tais leis criam obrigações tanto para os

indivíduos como para o soberano, que está subordinado as Leis da Natureza,57 uma vez que

essas são normas são imutáveis, eternas e divinas.

Ao mesmo tempo o filósofo estabelece de forma racional58 que o único poder capaz de

assegurar a paz59 entre os indivíduos e garantir a segurança a todos é o poder Estatal. Aponta

52 NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 183. 53 Para o Bressan, “[...] Os argumentos de Hobbes para justificar o Estado são os seguintes: os homens são sempre

os mesmos em relação a sua natureza. Os homens, no seu estado natural são iguais quanto às faculdades do

corpo e do espírito [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES,

Marcelino. (org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 34. 54 Segundo Scariot ao debater Hobbes, apresenta que este “[...] o Estado deveria se esforçar para garantir bem

estar ao maior número de súditos [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da

questão ambiental. p. 23. 55 Bressan, ao abordar o posicionamento de Hobbes, aponta que “[...] na condição natural os homens são iguais

e livres, tendo o direito (ou a liberdade) de usar todos os recursos disponíveis para preservar a sua vida [...]”.

BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão,

democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 34. 56 Na apresentação sobre aspectos do posicionamento de Hobbes, frente a Lei de Natureza Pogrebinschi apresenta

que “[...] A primeira definição de lei de natureza que se encontra no Leviatã, no início do capítulo XIV, é

certamente a mais conhecida: ‘um preceito ou regra geral, estabelecido pela razão, mediante o qual se proíbe

a um homem fazer tudo o que possa destruir sua vida ou privá-lo dos meios necessários para preservá-la’. Da

primeira lei de natureza ‘pela qual se ordena que todos os homens procurem a paz’ (Leviatã, XIV, 5), deriva a

segunda lei que prescreve o contrato ‘na medida em que tal considere necessário para a paz e para a defesa de

si mesmo’ (Leviatã, XIV, 5), e dela deriva a terceira lei de natureza que comanda “que os homens cumpram os

pactos que celebram” (Leviatã, XV, 1) [...]”. POGREBINSCHI, Thamy. Hobbes, Thomas. In: BARRETO,

Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. São Leopoldo: Editora Unisinos; Rio de Janeiro:

Editora Renovar, 2009. p. 438. Grifos originais da obra em estudo. 57 Pogrebischi expõe a visão de Hobbes “[...] O soberano que sucede a outro não se subordina – como também

não se subordinava seu antecessor – às leis civis, mas ‘está sujeito às leis da natureza, porque tais leis são

divinas e não podem ser revogadas por nenhum homem ou Estado’ (Leviatã, XXIX,9) [...]”.

POGREBINSCHI, Thamy. Hobbes, Thomas. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia

do Direito. p. 438. Grifo original da obra em estudo. 58 Segundo de Neumann, ao abordar os ideais de Hobbes trata que “[...] Em consonância com o direito natural,

tais medidas e ações servem para a realização desse fim, e nesse sentido o Estado é pela primeira vez justificado

racionalmente. [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na

sociedade moderna. p. 185. 59 Scariot apresenta a fundamentação da Teoria de Hobbes, sendo que “[...] A teoria desenvolvida por Hobbes,

fundamenta-se na importância de um Estado soberano, civil, cujo objetivo principal é a preservação da paz

entre o indivíduos. Por isso, há a necessidade de estabelecer um pacto, um contrato, delegando poderes ao

Estado para que os defenda [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão

ambiental. p. 23.

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que para tanto, o poder do Povo deve ser delegado ao Soberano, deixando de estar nas mãos

dos indivíduos.

Na concepção de Hobbes, na essência da Natureza humana o homem é “lobo de si

próprio”, posicionamento semelhante ao de Maquiavel, que considerava a Natureza humana

como imutável, e os homens como ingratos, volúveis, simulados e dissimulados.60 Para Hobbes,

por meio dessa característica singular, o homem para alcançar seus objetivos sem medir

esforços, guerreia contra todos.61

Para sair da condição proporcionada pela Natureza humana, Hobbes eleva o poder

Soberano ao caráter do absoluto, do indivisível, sendo que esse deve ser exercido por intermédio

do medo dos súditos, única forma de obediência62. O pacto, uma vez estabelecido, não pode ser

desfeito, salvo, se o soberano detentor do poder, agir contra princípios de preservação da vida

dos súditos.63

O posicionamento de Hobbes versa sobre a existência do Direito, que para o filósofo

somente sendo possível dentro do Sistema de Estado,64 dessa forma, não existindo fora do

âmbito estatal. Uma vez que para o filósofo, o Estado é o criador, bem como, é fonte do

Direito.65

No entanto, ao trazer mais esclarecimentos para o debate sobre qual Direito terá

procedência66 – o natural ou o Positivado, uma vez que para o Hobbes todos os homens são

60 BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão,

democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 31. 61 Segundo Bressan, “[...] Se cada homem tem o direito a todas as coisas não há segurança para viver o tempo

que a natureza permite a cada homem, de modo que a situação de guerra de todos contra todos instaurando o

medo da morte em todos os homens [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In:

ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de

experiências. p. 34-35. 62 Scariot apresenta que para Hobbes “[...] O poder exercido pelo governo do soberano é perpétuo e absoluto, não

estando sujeito às leis civis, podendo aboli-las ou revoga-las a qualquer momento [...]”. SCARIOT, Nadia

Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 23. 63 Aponta Bressan que “[...] O poder proposto por Hobbes é absoluto e indivisível, senão fosse assim não seria

soberano. Esse governa pelo medo que impõe aos súditos, única forma de levá-los a obediência [...]”.

BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (Org.).

Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 35/36. 64 Na interpretação de Hobbes “[...] o Estado é o único criador do direito, que pode decidir sozinho o que é certo

e o que é errado, que o próprio Estado não pode causar mal algum, que a obediência às leis do Estado precede

em importância todos os deveres da consciência [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria

política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 184. 65 SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 23. 66 Segundo o Neumann, “[...] O próprio Hobbes se declara a favor da procedência do direito natural,

implicitamente abandonando assim seu conceito político de direito. ‘Todo homem deve esforçar-se para

alcançar a paz’ e para garantir a paz temos de ‘transferir a um outro tais direitos como se conservassem um

pedaço da Humanidade’ [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico

na sociedade moderna. p. 185.

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lobos – o autor concorda que haja limitação no poder do Estado, frente a conservação da vida

humana, fato relevante na importância do Contrato Social.67

De igual valor, para importância do Contrato, o afame filósofo John Locke, o qual

proporcionou grandes contribuições por meio das suas teorias e pensamento sobre a relação do

homem com o Estado. Em seus posicionamentos políticos, verificam-se os ideais da esfera de

liberdade dos indivíduos frente a esfera de soberania estatal. Sem que mesmo apareça em seus

escritos a palavra Soberania.68

Em suas discussões sobre a identidade da Lei da Razão com a Lei na Natureza (Direito

natural), o citado filósofo demonstra como aquela faz parte do direito divino.69 Segundo Locke,

é importante que todos respeitem as Leis, pois o Direito natural se aplica a todos e não se deve

violar princípios,70 essenciais para convivência mútua, pois do contrário, a pessoa deve ser

castigada.

Deste modo, Locke71 oferece críticas aos posicionamentos de Hobbes frente ao seu

debate sobre o Direito natural e o Direito Positivo, as quais se encontram implícitos na sua

descrição do Estado de Natureza.72 Locke, como teórico do Direito natural, busca construir uma

esfera de liberdade dos indivíduos73 frente ao Estado, partindo da valoração da Natureza

humana, posição contrária à de Hobbes.74

67 Nessa linha, Pogrebischi traz o posicionamento de Hobbes que “[...] O contrato, assim, vem justamente a

garantir que as leis naturais sejam obedecidas pois estas são condição necessária para alcançar a paz [...]”.

POGREBINSCHI, Thamy. Hobbes, Thomas. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia

do Direito. p. 439. 68 Segundo Neumann “[...] Assim como é certo o fato de que ele estendeu a esfera de liberdade individual frente

à soberania do Estado, é certo também que ele constitui uma esfera de soberania estatal que de modo algum é

insignificante. É verdade que a palavra ‘soberania’ não aparece em seus escritos; mas esse fato não nos leva a

assumir que ele ignorava a realidade [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema

jurídico na sociedade moderna. p. 209. 69 Para Locke “[...] A Razão é a revelação natural por meio da qual o Pai Eterno de luz e fonte de todo

conhecimento comunica a humanidade aquela porção de verdade que Ele depositou no escopo das faculdades

naturais [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade

moderna. p. 209. 70 Locke considera como princípios “[...] a proibição de autodestruição, a igualdade dos homens e a proibição

para que ninguém maltrate seu vizinho, nem sua vida, sua liberdade ou sua saúde [...]”. NEUMANN, Franz. O

império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 209. 71 De acordo com Neumann, Locke “[...] Sua descrição do estado de natureza contém, uma crítica implícita a

Hobbes. Ele escreve sempre com os olhos voltados para Hobbes [...]”. NEUMANN, Franz. O império do

Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 210. 72 Segundo descrição de Locke “[...] o estado da natureza é um estado de paz e harmonia em que os indivíduos,

através de sua inteligência e força, apropriam-se os meios necessários à preservação da vida [...]”. BRESSAN,

Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (Org.). Gestão,

democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 36. 73 Ao analisar as ideias de Locke, Scariot aponta que “[...] Ao contrário de Hobbes, em Locke há a construção de

uma estado de natureza de caráter individualista, com o predomínio de interesses e experiências pessoais [...]”.

SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 24. 74 Para Locke “[...] a Lei natural possui comandos obrigacionais e deve continuar a ser respeitada após a

instituição do poder civil (ao contrário de Hobbes, para quem a Lei natural não possui efetividade e é substituída

totalmente pela lei civil quando passagem para o estado de sociedade) [...]”. SILVA FILHO, José Carlos

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Para Locke, o Estado natural é regido de harmonia e reciprocidade nas ações humanas

e sobre as circunstâncias da necessidade de existência do Estado.75 Para o filósofo, há o

surgimento de uma questão, que encontra justificativa na teoria de Hobbes76 para a justificativa

do Estado, sendo que para tal indagação, está contida na Teoria de Hobbes, os motivos para o

surgimento do Contrato Social.

Nesse contexto, um dos fundamentos basilares da necessidade do Estado e tanto quanto,

do surgimento do Contrato Social extraído dos posicionamentos dos pensadores estudados é a

proteção da propriedade. Todavia, na visão de Locke, a propriedade já existe no Estado da

Natureza.77 Não se observa, nessa linha de pensamento, a existência de uma criação estatal

como afirmam as teorias de Hobbes e Rousseau.78

Nas afirmações de Locke, que remonta a ideias bíblicas, a propriedade é dada ao homem

no momento em que Deus dá a Adão79 a propriedade da terra. Contudo, dessa afirmação nasce

a questão de como então surge a propriedade privada, sendo que todos os homens são filhos de

Deus, respondida por Locke que apresenta a resposta por intermédio do trabalho80 humano.

Nessa linha de pensadores, tens Rousseau considerado como o primeiro pensador

moderno81 a ver e solucionar a problemática existente entre o Direito Material e Soberania,

Moreira da. LOCKE, John. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. São

Leopoldo: Editora Unisinos; Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2009. p. 542. 75 NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 210. 76 Hobbes justifica o Estado em sua Teoria. “[...] eles existe para excluir a possibilidade de conflitos violentos,

para preservar os direitos de liberdade natural e para proteger a propriedade. Estes são os motivos para o

surgimento do Contrato Social. [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema

jurídico na sociedade moderna. p. 210. 77 Locke define a propriedade “[...] como o conjunto dos bens, da vida e da liberdade. A mudança fundamental é

que a propriedade é anterior ao contrato, portanto um direito natural [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do

Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão, democracia e

governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 36. 78 Segundo Neumann, ao abordar o posicionamento de Locke, frente a propriedade afirma que “[...] A

propriedade, contudo, não significa somente um poder sobre as coisas, mas inclui também a liberdade

individual e a proteção do corpo. Essa propriedade já existe no estado natural. Portanto, ela não é criada pelo

Estado, como é o caso nas teorias de Hobbes, Spinoza e Rousseau; trata-se de uma direito anterior ao Estado

[...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p.

210. 79 Silva Filho apresenta que Locke “[...] usando a Bíblia, como relato das eras iniciais de existência humana,

retorna até o momento em que Deus concede a Adão a propriedade das terras, frutos e animais. [...]”. SILVA

FILHO, José Carlos Moreira da. LOCKE, John. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de

Filosofia do Direito. p. 543. 80 No pensamento de Locke “[...] O trabalho, isto é, a energia consciente produzida pelo corpo, é exatamente

aquilo que diz respeito, de modo exclusivo, ao indivíduo (a propriedade de próprio corpo). Ademais, é um

dever do homem, cujo cumprimento é necessário para observar a Lei natural que prescreve a autopreservação,

produzindo, como de resultado, a propriedade individual [...]”. SILVA FILHO, José Carlos Moreira da.

LOCKE, John. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 544. Grifos

originais da obra em estudo. 81 De acordo com Neumann, Rousseau “[...] O primeiro pensador moderno a ver e solucionar o problema de uma

síntese entre direito material e soberania, entre liberdade e governo. Seu problema consiste em solucionar a

questão de como é possível para os indivíduos tornar-se membros de uma comunidade sem abrir mão de sua

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entre Liberdade e Governo.82 Para o filósofo o problema versa em como o indivíduo ao entrar

na vivência de comunidade, não abre mão de sua autonomia, bem como para coexistência de

Liberdade e Estado,83 para realizar a justiça material no Estado.

Por meio da compreensão sobre a manutenção dos indivíduos no Estado natural, sem

que para isso seja necessário transferir o poder do povo ao Estado,84 Rousseau é interpretado

de forma distinta, com apontamentos sobre sua teoria, que por vezes, o prestigiam, bem como

o colocam frente a contradições.

No debate sobre a importância do Contrato Social na organização social, Rousseau é

considerado como um absolutista de Estado, diferente de Hobbes e demais absolutistas de

Estado.85 Esse argumento é fundado pelo não reconhecimento de Rousseau a qualquer forma

de liberdade individual frente a esfera do Estado.

Nessa linha de pensamento, não é possível compreender o todo do ideal de Rousseau,

na construção e confirmação da importância86 do Contrato Social. Para não considerar as formas

de liberdade vislumbradas, o filósofo apresenta condições87 a serem cumpridas, sendo uma

política e outra social, do contrário os indivíduos se tornam impotentes frente ao Estado.

autonomia; ou seja, como é possível realizar ao mesmo tempo o Estado e a liberdade, realizar a justiça material

no Estado [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade

moderna. p. 225. 82 Para Bressan, “[...] O grande contratualista francês constrói uma visão crítica do contrato, a partir dos mesmos

pressupostos teóricos, ou seja, da contraposição entre estado de natureza e estado político [...]”. BRESSAN,

Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão,

democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 38. 83 Segundo Bressan, Rousseau vislumbra no Contrato Social, meio de solucionar o problema “[...] O desafio que

Rousseau se propõe é estabelecer uma forma de contrato que eleve a liberdade e a igualdade natural à condição

política, ou seja, que na sociedade política o homem, mesmo se constituindo, como um homem artificial, não

elimine a sua condição natural de liberdade e de igualdade, mas a transforme numa instituição moral e política,

ampliando, portanto, o seu alcance [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In:

ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (Org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de

experiências. p. 40/41. 84 Para Rousseau “[...] Dizer que o homem se dá gratuitamente é afirmar uma coisa absurda e incompatível;

semelhante ato é ilegítimo e nulo, pela simples razão de que não mais está em seu juízo perfeito aquele que o

faz. Dizer a mesma coisa de todo um povo é supor um povo de loucos: a loucura não gera direito [...]”.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 32. 85 NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 225. 86 Ao abordar as obras de Rousseau (Discurso sobre a origem e os Fundamentos da desigualdade entre os homens

e Contrato Social), Neumann destaque um fato relevante no ideal de Rousseau presente no Contrato, “[...] No

Discurso, é apresentada a causa sociológica da desigualdade do homem; as razões pelas quais o homem tendeu

para a sociedade civil. No Contrato Social, por outro lado, ele mostra o caminho da uma nova e melhor

sociedade [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade

moderna. p. 228. Grifos originais da obra em estudo. 87 Neumann afirma que na visão de Rousseau, a qual se distingue de Hobbes pelo fato de que “[...] mantém todos

os direitos naturais dos indivíduos sob a égide do Estado, e isso quando se cumprem duas condições: uma

política, a realização da democracia genuína; e outra social, a realização de igualdade econômica e social.

Apenas se estas condições são cumpridas as vontades dos indivíduos não podem como devem se tornar

impotentes frente à vontade do Estado. [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e

sistema jurídico na sociedade moderna. p. 225/226.

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Ao embasar a importância da criação do Pacto Social, Rousseau considera o fato da

existência de obstáculos que atrapalham a manutenção dos indivíduos no Estado natural, da

mesma forma, a força empregada por cada um para se manter nesse estado. Considera que

somente por meio da união de forças88 seja possível ao indivíduos confrontar a resistência que

os obstáculos oferecem em dificultar a esse, se manter no estado de Natureza.

Na sua obra, Rousseau destaca que a proteção da inalienabilidade da pessoa é algo

necessário, de caráter fundamental, cuja renúncia a liberdade é incompatível com a Natureza

humana,89 pois, não obstante venha a se alienar para satisfazer os interesses da vontade geral,90

o indivíduo não deixará de ser livre.

O Contrato Social é um pacto entre todos os homens, que por meio da Razão, vislumbra

a valorização das liberdades individuais,91 a limitação do poder do Estado, a alienação do

interesse individual e alcança a organização e soberania da vontade geral. Insiste-se no

desenvolvimento de todos sem que seja necessário se firmar no Direito do mais forte,92 mas

sim, no ideal antropocêntrico, que deve ser protegido.

88 Por meio do seu entendimento sobre o Pacto Social Rousseau, relata “[...] Eu imagino os homens chegando ao

ponto em que os obstáculos, que prejudicam sua conservação no estado natural, os arrastam, por sua resistência,

sobre as forças de cada indivíduo pode empregar para se manter nesse estado [...] considerando que “[...] como

é impossível aos homens engendrar novas forças, mas apenas unir e dirigir as existentes, não dispõem de outro

meio para se conservar a não ser formando, por agregação [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato

social: princípios do direito político. p. 39. 89 Para Rousseau “[...] Renunciar à sua liberdade é o mesmo que renunciar à sua qualidade de homem, ao direitos

da humanidade até mesmo a seu deveres. Não há compensação possível para aquele que a tudo renuncie.

Semelhante renúncia é incompatível com a natureza do homem, e é subtrair toda moralidade às suas ações

como retirar tora liberdade à sua vontade [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do

direito político. p. 32/33 90 Segundo o referido filósofo “[...] que a soberania, sendo apenas o exercício de vontade geral, jamais se pode

alienar, e que o soberano, que é somente um ser coletivo, só pode ser representado por si mesmo; é possível

transmitir-se o poder, mas não a vontade [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do

direito político. p. 53. 91 Aquino, considera que o Contrato Social “[...] oportunizou a valorização da Liberdade como pressuposto

comum a todos os seres humanos [...]” AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato

Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André

Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e

sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional.

p. 188. 92 Segundo Aquino, “[...] A elaboração de uma Contrato Social não se fundamenta no ‘direito do mais forte’

porque essa condição não permite o exercício e reivindicação de direitos os quais sejam expressão de uma

autoridade legítima [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o

tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 196.

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A partir do argumento de que o Contrato Social surge com o objetivo de preservar o

Estado de Natureza,93 fundamentado na autonomia da Razão,94 freado nas ideias em que

Rousseau95 vislumbra em uma sociedade melhor, genuína, verdadeira, que abdica de vaidades

e encontra na submissão comum, um direito necessário e obrigatório.

A reflexão da criação do Contrato Social por Rousseau fundamentado pela Razão96

demonstra a valorização da liberdade do indivíduo como pressuposto ao reconhecimento

comum de nossa Humanidade. O interesse individual deve se submeter ao coletivo para garantir

a união de todos em prol de cenários mais pacíficos.

Essa é a expressão racional humana, onde os indivíduos, ao tomarem suas decisões

fundamentadas de forma racional, buscam assegurar sua liberdade,97 que, mesmo ao aliená-la

na concretização do bem maior, no interesse da coletividade, por intermédio do Contrato, a

mantém como anteriormente a alienação a sua condição de indivíduo liberto da esfera estatal.

Para tanto, se faz importante destacar que para construção do ideal de Povo, promovido

pelo pensamento Contratualista, Rousseau apresentava precauções frente às realizações dos

93 Segundo Neumann, “[...] Se, porém, o objetivo do Contrato Social é preservar o estado de natureza o quanto

for possível, parece necessário limitar a soberania do Estado, que nasce do próprio Contrato Social, com a

finalidade de preservar uma antagonismo presente na razão de ser (raison d’être) do contrato social [...]”.

NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 210.

Grifos originais da obra em estudo. 94 Ao discutir os posicionamentos da filosofia crítica de Immanuel Kant (1724-1804), frente a crítica da razão e

a fundamentação da moral, Ramos aborda que para o filósofo “[...] Que a razão possa bastar a si mesma para

determinar a vontade ficará provado pelo conceito de liberdade [...]”. RAMOS, Flamarion Caldeira.

Moralidade, Sociedade Civil e Estado: Kant e Hegel. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion;

FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência

Política, Filosofia e Ciências Sociais. p. 149. 95 Ao confrontar os ideias de Rousseau sobre a sociedade, em suas obras, o Discurso sobre a Origem, Economia

Política e o Contrato Social, Neumann apresenta que “[...] Diferentemente da sociedade efetiva examinada no

Discurso e que se mostrou má, sua Economia Política e o seu Contrato Social empreenderam a tarefa de

encontrar uma comunidade humana genuína e verdadeira, que pode abdicar dos motivos da força, da avareza

e da vaidade, e que se encontra plenamente sob a submissão comum de um direito intimamente reconhecido

como obrigatório e necessário. [...]”. NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema

jurídico na sociedade moderna. p. 231. Grifos originais da obra em estudo. 96 Segundo Aquino ao tratar da criação do Contrato Social, refere-se que “[...] a criação de um projeto nacional

como o Contrato Social oportunizou a valorização da Liberdade como pressuposto comum a todos os seres

humanos. Convenciona-se estabelecer a submissão da vontade individual pela geral a fim de garantir uma

perfeita união entre as pessoas e garantir cenários mais pacíficos [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes

de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia

concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.).

Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da

Faculdade Meridional. p. 188. 97 Nesse ponto, se faz importante destacar, segundo Ramos, o posicionamento Kant frente a sua crítica da razão

e a fundamentação da moral, “[...] Segundo a concepção comum de liberdade, ser livre seria fazer o que se

quer, sem seguir nenhuma regra ou princípio prestabececido. A concepção kantiana aponta no sentido contrário

da concepção do senso comum: liberdade não é agir sem nenhuma regra, mas ser capaz de seguir uma regra

livremente imposta pela própria razão [...]”. RAMOS, Flamarion Caldeira. Moralidade, Sociedade Civil e

Estado: Kant e Hegel. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual

de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. São

Paulo: Saraiva, 2012. p. 147/148.

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seus pensamentos. E em determinado ponto acreditava na autossuficiência do Estado agrário,98

ligado à vontade geral e a liberdade do indivíduo, distante do pensamento de escravidão e de

condicionamento de inalienabilidade desses direitos.

Centrado nos ideais postados no Contratualismo, os indivíduos para decidirem suas

escolhas, de forma racional, tem no Contrato Social a plena inserção na proteção da autonomia

de cada um, inalienabilidade da liberdade, e aos direitos individuais, todos frente aos dilemas

trazidos pela evolução da Sociedade.

O homem chegou ao topo onde se posiciona como o núcleo de tudo e todos, centrado

nos ideais antropocêntricos, que se exacerbam ao passo do desenvolvimento das relações

sociais dos indivíduos. Tudo se concentra em suas mãos, e por intermédio delas molda e

concentra ao bel prazer, o poder do interesse humano. Pois, o Contrato Social se apresenta como

determinante para os ideais antropocêntricos.

Na afirmação de que o homem é o centro de tudo, e que tudo deve vir a sua vontade,

surge um ponto importante a ser debatido, a humanidade não está sozinha no planeta, vive

conjuntamente com demais organismos vivos, que devem ser inseridos dentro da égide de um

Contato, assim como o Contrato Social. O homem não deve pensar somente em sua existência,

e sim, ampliar sua compreensão sobre a importância da Natureza.

1.3. Os limites do Contrato Social na relação Homem e Natureza: a necessidade de outro

paradigma

A trajetória histórica do homem natural foi permeada por diversos fatores que alteraram

sua condição de vida, sua forma de convivência99 com os demais indivíduos que integram sua

família, clã, grupo ou Sociedade, bem como, a utilização do intelecto para que, partindo da

Razão, chegasse a conclusão de que o indivíduo encontrava na vontade geral,100 a força de

conter o poder do Estado.

O homem natural, na sua condição de liberdade perante a Natureza e entre todos os seres

vivos que habitavam seu território, era envolvido em conflitos e disputas com seus pares, por

98 Segundo Foglia, Rousseau defendia em sua celebre obra “[...] a ideia de uma federação mundial com a

finalidade de manter a paz social, mas tinha precauções quanto à realização desse pensamento, pois a harmonia

e o estabelecimento de direitos internacionais nunca seriam promovidos por príncipes interesseiros ou pela

simples ampliação do comércio. Acreditava em Estados agrários auto-suficientes com apoio aos direitos

populares, representados pela vontade geral, e aos direitos universais distantes da escravidão ou da sujeição,

sendo esses direitos inalienáveis, mesmo em tempos de guerra [...]”. FOGLIA, Sandra Regina Pavani. Lazer

e trabalho: um enfoque sob a ótica dos direitos fundamentais. São Paulo: Ltr, 2013. p. 31. 99 AGUIAR, Renan. História do Direito. p. 31. 100 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 39; 53.

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intermédio de interesses que objetivavam as conquistas individuais e posto de liderança,

centradas nos ideais de dominância e de poder.

Nessa trajetória, chegasse ao ponto de partida das Teorias Contratualistas,101

fundamentadas nas manifestações principiológicas dos filósofos ingleses Thomas Hobbes e

John Locke em pleno século XVII e do célebre Jean-Jacques Rousseau na França do século

XVIII, sendo tais pensadores fundamentais em suas épocas, para a contribuição da organização

da ordem social102.

Esses três pensadores, centralizaram suas teorias no ponto específico103 de que o

homem, por não ser um animal, pelo contrário, ser um indivíduo racional, utiliza do seu

intelecto em suas decisões, para celebrar uma união voluntaria sob a égide do Contato, ao

mesmo ponto, em que apresentam divergências104 para compor as relações sociais e a política

em grupo.

No momento em que o homem está ligado ao Estado da Natureza, Rousseau105 destaca

que esse se encontra livre desde seu nascimento, feliz na sua condição de homem natural. Essas

qualidades decorre pelo fato do indivíduo se afastar da esfera estatal, porquanto a própria

Sociedade o corrompe e, ainda, o transforma em escravo das evoluções que o Estado promove.

Contudo, o próprio Rousseau rememora em sua obra, a proteção da inalienabilidade da

pessoa pelo fato da ser incompatível com a Natureza humana, a renúncia a liberdade.106 Se essa

condição não for respeitada, é admissível que se utilize da abnegação a liberdade para tornar

qualquer pessoa um escravo,107 em toda e qualquer hipótese, uma vez que nenhum homem tem

domínio sobre outro homem.

101 SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição

paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. p. 129. 102 Kelsen, aponta ordem social como sendo “[...] Uma ordem normativa que regula a conduta humana na medida

em que ela está em relação com outras pessoas [...]” KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de

João Baptista Machado. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 25. 103 Segundo Pinheiro filho e Chut “[...] De acordo com a teoria contratualista, esses indivíduos, voluntariamente,

uniram-se por meio de um pacto ou contrato que lhes forneceu a condição de cidadão, o status civilis [...]”.

PINHEIRO FILHO, José Muinõs; CHUT, Marcos André. ESTADO. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.).

Dicionário de Filosofia do Direito. p. 287. 104 Segundo Ramos, “[...] Parte da divergência entre Hobbes, Locke e Rousseau, consistia no modo em que cada

autor concebia a relação entre a ética e a política: para Hobbes, por exemplo as noções de bem e mal, justo e

injusto são inteiramente convencionadas, inexistentes na ausência de um poder soberano; para Locke e

Rousseau, esses valores já existem no estado de natureza e o contrato social serve em boa medida para assegurá-

los [...]”. RAMOS, Flamarion Caldeira. Moralidade, Sociedade Civil e Estado: Kant e Hegel. In: RAMOS,

Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara (Org.). Manual de Filosofia Política: Para os cursos

de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. 2012. p. 143. 105 Segundo Rousseau “[...] O homem nasce livre, e se encontra em toda parte sob ferros. [...]”. ROUSSEAU,

Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 23. 106 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 33. 107 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 31.

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Os ideais rousseaunianos fundamentaram a criação do Contrato Social que na sua

visão,108 seria capaz de regular as desigualdades sociais pois, se a Natureza confere poder

absoluto ao homem o Pacto Social confere ao corpo político o poder absoluto. Nesse momento,

quando a orientação para a convivência surge pela manifestação coletiva e assegurada pelo

mencionado documento tem-se a Soberania.

A partir desse cenário, chega-se ao entendimento que o indivíduo, utilizando a Razão,109

deve sair das inconveniências atreladas ao Estado Natural, o Pacto Social, celebrado entre todos

os indivíduos e externalizado por meio da vontade geral, tem o objetivo de preservar o Estado

de Natureza,110 valorizar a liberdade do indivíduo111 e a limitar o poder do Estado.112

Nessa linha de pensamento, o indivíduo detentor da Razão tem no Estado Natural, o

ambiente segundo Locke, regido de harmonia e reciprocidade nas ações humanas, com as

vantagens que conforme Rousseau,113 a Natureza proporciona, como liberdade e direito

ilimitado. Diferentemente no Estado de Natureza, descrito por Locke114 como sendo um Estado

onde está presente a paz e a harmonia, e o homem por intermédio da sua inteligência, encontra

meios para preservar a sua vida e por Rousseau,115 como local onde o homem se encontra livre

e feliz na sua condição de homem natural.

Após já ter sido apresentado por meio do posicionamento dos pensadores do

Contratualismo, da importância do Contrato para a organização social e a proteção à

inalienabilidade da liberdade do indivíduo, a autonomia funda-se nos critérios eleitos pela

Razão, o Contrato Social tem sua inserção na proteção dos direitos dos indivíduos frente a esfera

estatal e aos problemas trazidos pela evolução da Sociedade.

108 Rousseau ao tratar dos limites do poder soberano, remete que “[...] Assim como a Natureza concede a cada

homem um poder absoluto sobre todos os seus membros, o pacto social confere ao corpo político um poder

absoluto sobre todos os seus, e é este mesmo poder que, orientado pela vontade geral, usa, como já disse, o

nome de soberania. [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 61. 109 , Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como

expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira;

BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação

Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 198. 110 NEUMANN, Franz. O império do Direito. Teoria política e sistema jurídico na sociedade moderna. p. 210. 111 AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade. p. 188. 112 MARES, Carlos Frederico. Soberania do povo, poder do Estado. In: NOVAES, Adalto (Org.) A crise do

Estado-nação. p. 237/238. 113 [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social: princípios do direito político. p. 47. 114 Conceituação do Estado da Natureza por Locke. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In:

ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (Org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de

experiências. p. 36. 115 Abordagem de Rousseau, sobre o Estado da Natureza ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social:

princípios do direito político. p. 23.

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Fato de grande importância a ser destacado da relação que o Contrato Social

proporcionou entre o homem e a Natureza, passa pelo fato de que a sociedade no passar dos

tempos, se torna cada vez mais complexa,116 sendo que o próprio Contrato não se apresentada

em condições de gerir essas relações humanas.

As relações existentes entre os seres humanos e não-humanos ultrapassam os limites da

postura antropocêntrica,117 vindo a ser necessária outra postura – de caráter complementar –

dos indivíduos frente a retomada de ideal natural, que agora passa pela transição da saída do

homem do centro de tudo.

Frente a isso a Razão cede espaço à racionalização118 e tudo se torna “coisa” para atender

aos interesses humanos. Sendo que o próprio processo civilizatório da modernidade teve como

pilares, princípios de racionalidade119 que contribuíram na organização social e tecnológica

estatal.

No entanto, a evolução da Sociedade que, aparentemente, trouxe problemas ao convívio

social dos indivíduos, também contribuiu para que esses sujeitos se posicionassem como

detentores do “poder” em meio a uma Sociedade antropocêntrica. Contudo, passa-se percebido

o fato do Contrato Social ter limites estabelecidos de modo a evitar conflitos cada vez mais

complexos, entre a Sociedade atual com a Natureza.

Por esse motivo, o atual modelo de Contrato antropocêntrico – alargado – em que se

insere a sociedade, se encontra limitado,120 pois não reflete a vida social e as relações humanas

116 Para Aquino “[...] Na medida em que as sociedades se ampliam e se tornam mais complexas, o Contrato Social

não consegue oferecer aquele cenário de outrora de organização [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes

de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia

concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.).

Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da

Faculdade Meridional. p. 199. 117 Segundo entendimento de Aquino “[...] Quando, historicamente, as sociedades se aperfeiçoam e se tornam

mais complexas, o Contrato Social não possibilita a conservação das relações humanas, porque essas, agora,

ultrapassam os limites da postura antropocêntrica e demandam outras mais significativas, especialmente

aquelas nas quais resgatam a partilha de um vínculo biológico comum [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo

Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de

uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete

Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu

em Direito da Faculdade Meridional. p. 189. 118 AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 199. 119 Para Leff, “[...] O processo civilizatório da modernidade fundou-se em princípios de racionalidade econômica

e instrumental que moldaram as diversas esferas do corpo social: os padrões tecnológicos, as práticas de

produção, a organização burocrática e os aparelhos ideológicos do Estado [...]”. LEFF, Enrique. Saber

Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Traduzido por Lúcia Mathilde Endlich

Orth. 8. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2011. p. 133. 120 Segundo Zambam “[...] A relevância da fundamentação do direito ao desenvolvimento sustentável reflete os

limites do atual modelo, tanto considerando o seu referencial teórico quanto sua efetivação e as consequências

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com a Natureza, pois o modelo de crescimento econômico121 baseado na utilização, por vezes,

indiscriminada dos recursos naturais122 é considerado um dos principais problemas ambientais

da atualidade.

Para tanto, considera-se que o pacto celebrado em todos os seres humanos que habitam

a terra, tem para sua consecução a integração do interesse mútuo123 e que não se estabelece

exclusivamente no ideal antropocêntrico, que está ligado ao seu objeto, e assim, não alcança a

preservação de todos os seres vivos presentes no planeta.

Partindo dessa posição124 destaca-se que essa ocasião se caracteriza, não por ser um

momento de transição, mas sim, de oportunidade para que seja possível pensar como o Contrato

Social trata sem abandonar os pensamentos antropocêntricos, formas de contemplar os seres

não-humanos nas relações com toda sociedade.

No atual cenário mundial em que se encontra a sociedade, não é mais possível a visão

de que o mundo gira sobre uma plataforma industrial,125 onde os objetivos cruciais da sociedade

visíveis na quase totalidade das relações humanas e na vida social. A instrumentalização das pessoas e a

utilização indiscriminada do recursos naturais e ambientais, figuram entre os maiores preocupações atualmente

[...]”. ZAMBAM, Neuro José. Desenvolvimento Sustentável: Direito dos cidadãos e compromisso de todos.

In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito,

democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação da Faculdade Meridional. Passo

Fundo: IMED Editora, 2013. p. 93. 121 Na relação do homem com a Natureza, Leff aponta que “[...] O crescimento econômico avança à custa da perda

de fertilidade da terra e da desorganização dos ecossistemas, enfrentando a inelutável degradação entrópica de

todos os processo produtivo [...]” LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da

natureza. Traduzido por Luís Carlos Cabral. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2006. p. 135. 122 Na abordagem da exploração dos recurso naturais, Leff aponta que “[...] Hoje em dia, o problema do

esgotamento dos recursos naturais não se apresenta apenas em termos das reservas provadas de hidrocarburetos

e minerais no planeta [...]” mas sim, por meio da “[...] crescente produção de entropia [...]”. LEFF, Enrique.

Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 136. 123 Para Aquino “[...] O pacto entre todos que habitam a terra amplia-se pela compreensão desse vínculo necessário

e ambivalente, pois a preservação de todos os seres vivos os quais habitam essa “casa comum” denota

participação, mas representa, antes, uma razão seminal, interior, a qual resgata a necessidade de um profundo

exercício de Alteridade, no mundo, cujo fundamento não se exaure na postura antropocêntrica [...]” AQUINO,

Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como

expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira;

BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação

Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 190. 124 Conforme posicionamento de Aquino, ao abordar a evolução histórica da sociedade e os limites da postura

antropocêntrica, expõe que “[...] percebe-se, nesse argumento, uma transição da Contrato Social ao Contrato

Natural como expressão utópica de consolidação dessa relação amistosa e proxêmica [...]”. AQUINO, Sergio

Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como

expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira;

BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação

Stricto Sensu em Direito da Faculdade Meridional. p. 189. 125 Segundo Lacerda, Rosa e Ferrer, “[...] Na era das revoluções científicas e industriais, o mundo era considerado

uma enorme máquina, que trabalhava a todo vapor, utilizando de todos os recursos disponíveis em prol do

crescimento, tendo como objetivo único o desenvolvimento tecnológico [...]”. LACERDA, Emanuela Cristiane

Andrade; ROSA, Alexandre Morais da; FERRER, Gabriel Real. A propriedade ante o novo paradigma do

estado constitucional moderno: A sustentabilidade. Revista Novos Estudos Jurídicos – Eletrônica. Itajaí:

Univali, v. 19, n. 4, dez. 2014. p. 1201.

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são econômicos,126 atrelados as inovações tecnológicas e industriais, sem que sejam

mensurados os impactos ambientais das atividades executadas pelo homem.

Ao ponto em que ao serem mensurados, que sejam efetivamente considerados e

ponderados tais impactos ao planeta, bem como, aos objetivos almejados de crescimento e

desenvolvimento da sociedade, para que se alcance o ideal de fortalecimento da economia

concomitantemente a consciência ambiental.

Com o avanço tecnológico,127 o homem conseguiu explorar locais até então impossíveis

ou improváveis, devido ao aprimoramento dos meios técnicos de exploração. Concomitante a

isso, os impactos causados por essas explorações afetam diretamente grandes dimensões da

vida terrestre.

Sendo que a exploração de recursos naturais reflete diretamente na economia,128 onde a

cadeia produtiva na velocidade atual necessita de cada vez mais recursos, que são extraídos do

meio natural onde se encontram, na forma de “coisas” a serem exploradas e utilizadas, para que

ao homem almeje lucro, crescimento e desenvolvimento.

Nessa linha, as Sociedades por meio da sua característica econômica extrativista

contribuem para que haja, uma crescente desconsideração129 da Natureza130, bem como,

desrespeito dos meios naturais de onde são extraídos os recursos naturais ofertados

gratuitamente131, pois esses são vistos como bens a serem explorados economicamente e por

resultarem em lucros.

126 Na abordagem sobre o modo de vida da sociedade e os impactos causados pela economia se encontra centro

de tudo, Canotilho e Leite apontam que “[...] O economicentrismo reduz o bem ambiental a valores de ordem

econômica, fazendo com que qualquer consideração ambiental tenha como ‘pano de fundo’ o proveito

econômico pelo ser humano [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito

constitucional ambiental brasileiro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 163. 127 De acordo com Lacerda, Rosa e Ferrer, “[...] o avanço da tecnologia e das pesquisas técnico-científicas permite

processos de extração cada vez maiores dos recursos naturais, antes inacessíveis ou, até mesmo, inimagináveis

pelo homem (explorar as profundezas dos oceanos, do espaço cósmico, etc.) [...]” LACERDA, Emanuela

Cristiane Andrade; ROSA, Alexandre Morais da; FERRER, Gabriel Real. A propriedade ante o novo

paradigma do estado constitucional moderno A sustentabilidade. Revista Novos Estudos Jurídicos –

Eletrônica. Itajaí: Univali, v. 19, n. 4, dez. 2014. p. 1205. 128 Para Leff “[...] A economia afirma que o sentido do mundo está na produção; a natureza é coisificada,

desnaturalizada de sua complexidade ecológica e convertida em matéria-prima de um processo econômico; os

recursos naturais tornam-se simples objetos de exploração de capital [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade

Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 146. 129 Na abordagem sobre a Natureza como bem de consumo, Leff acrescenta que “[...] a natureza é desnaturalizada,

fracionada e mutilada; sua organização ecossistêmica e termodinâmica é ignorada e convertida em recursos

naturais discretos, em matérias-primas usadas como simples insumos no processo de produção, que não são

produtoras de uma substância de valor [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social

da natureza. p. 172. Grifos originais da obra em estudo. 130 No presente estudo, para a melhor compreensão do tema debatido, a categoria Natureza e a Meio Ambiente,

serão abordados como sinônimos de toda vida na Terra. 131 Segundo Leff “[...] A natureza é concebida como um bem abundante e gratuito, como uma ordem que tem

capacidade própria de regeneração, cuja existência não dependa diretamente do compromisso econômico [...]”.

LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 172.

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A visão da Natureza com bem econômico de exploração, arraigada sobre a ótica do

antropocentrismo, vem sendo debatida, pois para a economia, a Natureza passa a ser uma forma

de capital132 natural com valoração econômica. Dessa forma, nos modelos de exploração

comumente utilizados, ocorre a exploração conservacionista, como forma de mitigar os

impactos causados por tais processos.

Na caminhada por uma nova concepção do paradigma homem e Natureza, passa-se pela

condição de valoração econômica da biodiversidade como “reservas da natureza”,133 não apenas

pela gama de espécies da fauna e da flora a serem protegidas, mas, pelas riquezas que se

encontram inseridas.

Nessa linha, a Natureza é compreendida como um bem de consumo, um objeto a ser

conservado, mas não por ser essencial a vida humana na terra, e sim, para ser explorada

economicamente, ser utilizada nos processos e cadeias produtiva. Tendo como forma de

equilibrar essa relação, a exploração econômica racional134, que considere os impactos gerados

por cada ação humana.

A concepção de um novo paradigma na relação Homem e Natureza, tem passagem pela

crise ambiental,135 que busca paradigmas na relação da Economia com Natureza, tendo como

base a lei da entropia136 como limitadora da exploração econômica frente aos recursos naturais

renováveis e não renováveis.

Na compreensão mais aprofundada da relação Economia e Natureza, sobre os processos

ligados a bioeconomia,137 para encontrar alternativas de produção sobre a ótica da entropia,

132 De acordo com Leff “[...] Na era da economia ecologizada, a natureza deixa de ser um objeto do processo de

trabalho para ser codificada em termos de capital – capital natural –, generalizando e ampliando as formas de

valorização econômica da natureza. Nesse sentido, junto às formas de exploração intensiva, promove-se um

uso “conservacionista da natureza [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da

natureza. p. 146. 133 Segundo Leff “[...] A biodiversidade aparece não apenas como uma multiplicidade de formas de vida, mas

como ‘reservas da natureza’ – territórios e hábitat de diversidade biológica e cultural – que estão sendo

valorizados por sua riqueza genética, seus recursos ecoturísticos e sua função como coletores de carbono [...]”.

LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 146/147. 134 No debate sobre o desenvolvimento sustentado, Leff aponta que “[...] a racionalidade econômica carece de

flexibilidade e maleabilidade para ajustar-se às condições sustentabilidade ecológica do planeta. [...]”. LEFF,

Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 148. 135 Nessa temática, Leff menciona que a crise ambiental “[...] irrompeu em um mundo no qual a economia ficou

desprovida de lei e de valor, no qual a natureza se desnaturaliza e se coisifica, em que a dialética procura

ancorar-se nas leis da natureza, em que o mundo se converte em uma hiper-realidade onde o simbólico parece

perder sua referencialidade e conexão com o real [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a

reapropriação social da natureza. p. 172. 136 Segundo Leff “[...] Os limites do crescimento econômico são estabelecidos pela Lei-limite da entropia, que

rege o fenômenos da natureza e conduz o processo irreversível e inelutável da degradação da matéria e da

energia no universo [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p.

176. Grifos originais da obra em estudo. 137 Para Leff “[...] O paradigma emergente da bioeconomia é baseado, pois, em um conceito físico-econômico de

entropia e uma visão sistêmica das inter-relações dos processos econômicos com o ambiente biogeoquímico.

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limitando a exploração dos recursos naturais, para a construção de um novo paradigma,138 e

assim, almejar um equilíbrio.

A evolução por qual passaram as Sociedades, trouxe a necessidade de enfrentamento de

diversas crises, entre essas, as de cunho ambiental, devido principalmente ao modo de vida da

humanidade, e a exigência de novos paradigmas, novas formas de encarar a Natureza.

Do mesmo modo, o modelo que a sociedade deve adotar para que sejam contempladas

em suas relações a proteção dos seres não-humanos, está diretamente relacionado com a

assinatura de um novo Contrato, um novo paradigma, que tenha como base não tão somente os

ideais antropocêntrico, mas sim, ideias de valorização da Natureza.

Trata-se de uma questão ambiental139 que deve ser trabalhada na busca de alternativas

para que a Sociedade possa incorporar novas formas de compreender que os modelos

econômicos atuais – antropocêntricos – devem levar em consideração meios de controlar as

ações do homem para com a Natureza.

O Pensamento organizacional voltado diretamente aos ideias e adágios antropocêntricos

da sociedade, que vislumbra unicamente impedir o conflito entre os indivíduos se apresenta

obsoleto. Contudo, no cenário atual de crise140 com a Natureza, única alternativa plausível é o

paradigma das mudanças comportamentais141, para assim, evitar que o caos e a destruição da

Natureza se materializem.

Quando o homem compreender de forma satisfatória que a Natureza deve ser preservada

não para ser um item de uma lista, mas sim, porque ela representa a habitat de todos os seres

Esse novo olhar sobre a produção, a partir das leis da termodinâmica, ajudou a entender o crescente fluxo de

energia degradada que conduz à insustentabilidade ecológica do processo econômico [...]”. LEFF, Enrique.

Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 184. 138 Conforme aborda Leff “[...] Trata-se, pois, da construção de uma paradigma produtivo que integre a ordem

ecológica (a produtividade neguentrópica e o potencial ecológico) com a ordem simbólica (a significação

cultural, a criatividade humana) [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da

natureza. p. 197. 139 Leff, ao tratar da racionalidade ambiental, na ótica das problemáticas da racionalidade produtiva afirma que

“[...] A questão ambiental estabelece que assim a necessidade de introduzir reformas democráticas no Estado,

de incorporar normas ecológicas ao processo econômico e de criar novas técnicas para controlar os efeitos

contaminantes e dissolver as externalidades socioambientais geradas pela lógica do capital [...]”. LEFF,

Enrique. Saber Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. p. 133. 140 Conforme Pereira, “[...] Vivemos uma crise profunda, em que são necessárias mudanças de paradigmas e busca

da ética, para que possa haver o equilíbrio entre o homem e a natureza e par que não se instale o caos e a

destruição do planeta [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe;

PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. Caxias do Sul: Educs, 2009.

p. 49. 141 Segundo Leff “[...] Em resposta a essa crise ambiental, foram propostas e difundidas as estratégias do

ecodesenvolvimento, postulado a necessidade de se criar novas formas de produção e estilos de vida baseados

nas condições e potencialidades ecológicas de cada região [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental:

a reapropriação social da natureza. p. 135.

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humanos, se estará dando um passo na história, em direção a efetivação de um Contrato entre

homem e Natureza, o Contrato Natural.

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2. O CONTRATO NATURAL

O filósofo francês Michel Serres, na obra “O Contrato Natural”, retoma a caminhada

humana alicerçada no Contrato Social, e sinaliza também, a necessidade de um novo paradigma,

um Contrato Natural, que se posicione tanto nas relações dos seres humanos, e destes, para com

os seres não-humanos, pois o homem passou de um ser dominado pela Natureza a dominador.

Contudo, mudanças comportamentais são necessárias para que haja integração do homem com

a Natureza, no momento atual da sociedade.

2.1. A transição do Contrato Social ao Contrato Natural

Os pensamentos de Jean-Jacques Rousseau sobre a importância do Contrato Social tem

grande relevância na passagem do Homem142 do Estado Natural ao Estado Civil, pois foi nesse

momento em que mudanças ocorreram, e o indivíduo que habitava em locais onde as regras

eram estabelecidas por meio do conhecimento que advinha do instinto, passa a viver sob a

judicie da moral civilizatória e da obrigatoriedade de respeitar as leis que regram a conduta

social.

Quando se observa que o homem natural é o ator principal do Contratualismo,143

percebe-se qual a finalidade desse, a preservação da inalienabilidade do homem. A primeira

grande conquista da Filosofia Política na Modernidade é a união dos interesses individuais do

Povo em prol da coletividade, ou seja, encontrar meios de consolidar a vontade geral, por meio

da alienação dos indivíduos sem confrontar seus direitos com os de qualquer outro homem.

A partir desse momento o ser humano cresce intelectualmente, as suas atitudes sociais

estão regidas sobre as Teorias do Contrato Social. O indivíduo que somente observava seus

representantes, começa a utilizar da Razão nas suas interações sociais. Essa é a expressão

racional humana que promove o indivíduo como detentor das suas decisões, visando assegurar

sua liberdade natural.

142 Fato importante que Rousseau trata em seu livro, diz respeito, O Estado Civil do homem “[...] Essa passagem

do estado natural ao estado civil produz no homem uma mudança muito acentuada, substituindo em sua conduta

a justiça ao instinto e dando às suas ações a moralidade que antes lhes faltava [...]”. ROUSSEAU, Jean-Jacques.

Do contrato social: princípios do direito político. p. 47. 143 Na discussão sobre a dicotomia entre a sociedade civil e a sociedade política, Bressan, faz referência ao

Contratualismo no que pese, “[...] A grande virtude do contratualismo é trazer para o âmbito humano a

construção de soluções para os impasses e dilemas evidenciados na condição natural dos homens [...]”.

BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino. (org.). Gestão,

democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 45.

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A vida do homem natural não apresenta problema, por ser “indivíduo puro”, liberto de

qualquer opressão e tendo como expressão máxima a liberdade individual. No entanto, ao passo

que se torna um indivíduo social, passa enfrentar os problemas144 advindos da organização

social,145 que representa a expressão máxima da união dos interesses individuais, a vontade

geral.

Quando todos os homens se tornam livres, não há obstáculos que os impeçam de exercer

o seu Direito da propriedade, que advém do esforço do seu trabalho. No entanto com a utilização

da moeda, surgiram as desigualdades, bem como as riquezas, e dessa forma, o acúmulo de bens

entre os quais, a propriedade privada, ideias defendidos por Locke146 em suas Teorias do

Contrato Social, sendo essas contrárias as Teorias de Rousseau, as quais são ligadas aos ideais

de igualdade e a liberdade dos indivíduos.

A Teoria Contratualista de Rousseau, visa sanar as desigualdades sociais, solucionar os

problemas que o desenvolvimento da civilização acarretou. Nesse caso, normas de organização

social, se tornam necessárias para ordenar as decisões e as relações sociais. O Contrato Social,

se configura como meio de resolução, ao reconhecer os indivíduos como responsáveis por suas

decisões, por conta da inalienabilidade da liberdade e materializa a vontade geral, como ponto

importante na organização social.

Para tanto, o poder organizacional não deixa de estar nas mãos do povo, para passar a

autoridade do Soberano. O Povo é a expressão plena da essência da natureza coletiva dos

indivíduos, que utilizando da Razão, buscam a proteção das suas liberdades individuais, da

alienação do interesse individual em prol da coletividade, almejando assim, alcançar a soberania

da vontade geral e limitar o poder do Estado.

No entanto, no decorrer do tempo o homem natural, indivíduo do estado natural, passou

a ser um homem civil, vivendo dentro do Estado Civil. Na sociedade civil, por diversos fatores,

as condutas humanas se tornam agressivas a todos os seres humanos e não-humanos, as

144 Conforme Bressan, “[...] para Rousseau, os problemas humanos iniciam com a constituição da sociedade

civil [...]”. BRESSAN, Suimar. Teorias do Estado na modernidade. In: ANDRADE, Jair; PIES, Marcelino.

(org.). Gestão, democracia e governabilidade: diálogos a partir de experiências. p. 39. 145 Para Rousseau “[...] Tal foi ou deve ter sido a origem da sociedade e das leis, deram novos entraves ao fraco e

novas forças ao rico, destruíram irreparavelmente a liberdade natural, fixaram para sempre a lei da propriedade

e da desigualdade, fizeram uma hábil usurpação um direito irrevogável, e em proveito de alguns ambiciosos,

sujeitaram, a partir de então, todo gênero humano ao trabalho, à servidão e à miséria [...]”. ROUSSEAU, Jean-

Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. p. 112. 146 Santos, ao debater sobre os aspectos da Teoria do Contrato Social, destaca na Teoria de Locke que “[...] a

introdução da moeda alterou drasticamente as relações sociais da propriedade, ao subverter a equação entre

propriedade e capacidade de utilização [...]”. SANTOS, Boaventura de Sousa. Para um novo senso comum:

a ciência, o direito e a política na transição paradigmática – A crítica da razão indolente: contra o

desperdício da experiência. p. 135.

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sociedades que anteriormente se configuravam como, familiares, de pequenos grupos, de

determinados indivíduos, se tornaram complexas147 e as mudanças nas atitudes dos indivíduos

sociais, contra tudo e todos se fazem necessárias.

Nesse momento, torna-se importante debater sobre a real efetividade do Contrato Social

nas relações sociais entre os homens, e agora, para com a Natureza, na efetiva preservação do

mundo natural 148. Ao partir de um contexto, onde o antropocentrismo ignora o que não é

humano, e o descreve como simples objeto de exploração para atender as necessidades

humanas, percebe-se um significativo distanciamento na relação Homem e Natureza.

As modificações comportamentais149 que todos os indivíduos sociais devem apresentar

– frente a essa relação descrita anteriormente – não são considerados fáceis de ocorrer, por

estarem ligadas diretamente a cultura das condutas sociais, a ideais de consumo, e do processo

econômico, todas situações inseridas nas sociedades organizadas. Todos os habitantes são

responsáveis diretos por essas mudanças, seja nas relações entre os seres humanos ou desses

com a Natureza.

Essa abordagem comportamental deve elucidar quais são os problemas ambientais que

as ações humanas150 em Sociedade acarretam a Natureza, desde pequenos lapsos de despejo de

lixos urbanos em local inadequado, ao ponto das discussões sobre as alterações climáticas

mundiais, redução da produção em massa, reeducação para o consumo, desenvolvimento

consciente, entre outros pontos de suma importância para a proteção da vida na terra, e da

própria terra, berço de toda forma de vida.

147 Para Aquino “[...] na medida em que as sociedades se ampliam e se tornam mais complexas, o Contrato Social

não consegue oferecer aquele cenário outrora de organização. A Razão cede espaço para a racionalização.

Todos se tornam objetos, se tornam “coisas” para atenderem aos interesses egoístas e indiferentes dos seres

humanos [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado

constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 199. 148 Aquino, traz a luz da discussão no seu estudo sobre a passagem do Contrato Social ao Contrato Natural “[...]

O Contrato Social é suficiente para preservar, também, o mundo natural caracterizado como “ser próprio” junto

aos seres humanos? A resposta somente surge pelo esclarecimento do que pode vir a ser um Contrato Natural

[...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 199. 149 Para Leite e Ayala, as mudanças de comportamento são extremamente dificultosas, como mencionado por

Carlos Pimenta “[...] Nós não sabemos o que estamos a fazer, mas continuamos a fazer porque é muito difícil

mudar [...]”. LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Direito ambiental na sociedade de

risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 29. 150 Conforme Pereira, “[...] No âmbito da natureza, são muitos os problemas ecológicos que resultam da sociedade

atual, dos métodos de consumo de energia, de matéria-prima e, principalmente, dos rejeitos dos produtos

eliminados no ambiente [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe;

PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. p. 17.

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O consumo humano cresce em meio ao desenvolvimento das sociedades. Essa

afirmação contextualizada na sociedade atual, está diretamente relacionada à poluição em

grande parte dos ambientes naturais. O desenvolvimento151 a todo custo, que em épocas

passadas era entendido como meta a ser alcançada tanto por países desenvolvidos como aqueles

em desenvolvimento, esbarrou na carência de recursos essenciais (minerais, lenhosos, líquidos

entre outros), e na incapacidade de renovação de determinados elementos naturais.

A massificação da produção de todos os tipos, das diversas cadeias de consumo, reflete

diretamente nas características das sociedades atuais,152 essas no passado quando primitivas,

almejavam obter o necessário a sua subsistência.153 A alimentação e manutenção humana

advinha da sua própria produção de alimentos, como legumes, cereais, vegetais, frutos,

tubérculos, raízes e das principais criações domésticas, que proporcionavam, carne, leite,

gordura, lã, sebo, couro, atendendo tais necessidades essenciais à manutenção da vida humana.

Esses produtos são cada vez mais necessários para atender a demanda mundial, não

reflete a alimentação de toda população mundial, devido a diversos fatores. Sendo que ao

mesmo tempo, a massificação produtiva, acarreta em agressões (as mais diversas formas de

poluição) à Natureza. Pois essas são as contribuições da espécie humana para que haja, uma

acentuada crise ambiental global e um crescente desrespeito aos recursos naturais ofertados

pela Terra.

A sociedade de consumo154, em âmbito mundial, é a responsável por ter modificado as

relações sociais de uma gama da população com a Natureza, em todo o mundo. O

151 Conforme Giddens “[...] até que ponto o ‘desenvolvimento’ atual poderá imitar as trajetórias seguidas pelos

países já industrializados. Já chegamos a um ponto em que os resultados dessas trajetórias encontram-se sob

enorme pressão. Não obstante, há que se reconhecer uma certa ‘licença para poluir’ [...]”. GIDDENS, Anthony.

A política da mudança climática. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de janeiro: Zahar, 2010, p. 90. 152 Conforme Pereira, “[...] Com o decorrer dos séculos XIX e XX, o consumo aumentou exageradamente,

chegando no século XXI, no que se convencionou chamar de hiperconsumo. A base de toda nossa sociedade

se tornou o consumo [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe;

PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. p. 13. 153 Segundo Marconi e Presotto, “[...] As sociedades primitivas ou simples, em geral, têm uma economia de

subsistência que não se restringe a produzir somente o necessário para sobreviver [...]”. MARCONI, Marina

de Andrade; PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 125. 154 Na visão de Flores “[...] somos todos sujeitos e objetos da chama sociedade de consumo que começou a ser

instalada no mundo ocidental a partir do industrialismo [...]” o autor pontua dois pontos importantes sobre

sociedade de consumo, no primeiro destaca que “[...] até a década de 70, o poder político das nações

industrializadas e a visão estreita de alguns grupos científicos atribuíram a crise ambiental ao crescimento

demográfico que, principalmente nos países em desenvolvimento, estaria provocando uma grande pressão

humana sobre os recursos naturais do planeta [...]”, e no segundo, que “[...] que foi a partir da década de 90

que se começou a perceber que o impacto ambiental dos altos padrões de consumo das sociedades e classes

afluentes, dando-se assim, um segundo destacamento da preocupação ambiental, relacionando-se seus

problemas ao consumo [...]”. FLORES, Nilton Cesar. A sustentabilidade ambiental em suas múltiplas faces.

São Paulo: Millennium editora, 2012, p. 32/33. Grifos originais da obra em estudo.

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consumismo155 como atributo da sociedade ocorre desmedido e desfreado, ao ponto de ser

“irracional”, e pode ser visto como expressão –antropocêntrica – egoísta dos seres humanos,

onde adquirir para satisfazer desejos, não importando as formas necessárias de obtenção e o

não dimensionamento da poluição156 que será direcionada a Natureza, é a único objetivo que

prevalece.

No debate sobre a poluição resultante das atividades econômicas humanas, as interações

entre os seres vivos não-humanos, podem ser utilizadas para explicar as interações entre os

homens e seu lixo, em sua postura poluidora.157 Partindo do modo de vida dos animais

irracionais, se observar por meio da etologia158, ciência que estuda o comportamento animal,

que a comunicação desses seres, ocorre por movimentos, gestos, excrementos, urinas e qualquer

outro tipo de secreção odorífera.

Todos os seres não-humanos, e os humanos não fogem à regra, produzem secreções

odoríferas, que fazem parte da interação entre os membros da espécie, tanto quanto, com

representantes de outras espécies. Além desse emprego, os seres não-humanos, se utilizam das

suas excreções como meio de demarcação de território, que é de suma importância a

sobrevivência da espécie, evitando disputas e assim, resguardando a perpetuação.

Na Sociedade a postura poluidora do homem de “poluir para adquirir”, pode ser

observada como similar a dos seres não-humanos, pois os homens utilizam dessa premissa de

155 “De maneira distinta do consumo, que é basicamente uma característica e uma ocupação dos seres humanos

como indivíduos, o consumismo é atributo da sociedade. Para que uma sociedade adquira esse atributo, a

capacidade profundamente individual de querer, desejar, e almejar deve ser, tal como a capacidade de trabalho

na sociedade de produtores, destacada (“alienada”) dos indivíduos e reciclada/reificada numa força externa que

coloca a “sociedade de consumidores” em movimento e a mantém em curso como uma forma específica de

convívio humano, enquanto ao mesmo tempo estabelece parâmetros específicos para as estratégias individuais

de vida que são eficazes e manipula as probabilidades de escolha e condutas individuais”. BAUMAN,

Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias. Tradução de Carlos Alberto

Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008, p. 41. Grifos originais da obra em estudo. 156 Para Serres, a postura de poluidor dos seres vivos, se explica na relação de demarcação de território “[...] como

uma conduta generalizada entre as espécies vivas: o próprio se adquire e se conserva pelo sujo. Melhor ainda:

o próprio é o sujo [...]”. SERRES, Michel. O mal limpo: poluir para se apropriar?. Tradução de Jorge Bastos.

Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011, p. 14. Grifos originais da obra em estudo. 157 Segundo Aquino, “[...] No âmbito mundial, essa postura de poluir para se apropriar é observada como clareza.

Todos os dias, milhares de pessoas consomem diversos produtos, desde comidas, produzidas organicamente

até instrumentos tecnológicos os quais permitem a sua estadia na mainstream contínua da internet [...]”.

AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 201, Grifo original da obra em estudo. 158 Conforme Serres, “[...] A etologia, a ciência dos comportamentos animais, descreve amplamente ninhos,

terreiros, covis, buracos, nichos ecológicos... ou seja, os hábitats, e também a maneira como as sujeiras dos

machos os definem e protegem [...]”. SERRES, Michel. O mal limpo: poluir para se apropriar?. p. 13.

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poluir para demarcar o que é de sua propriedade 159, ou de sua utilização. Como resultado do

consumo desenfreado, a cada dia são produzidas toneladas de resíduos, os quais ao serem ou

não destinados adequadamente, deixam os rastros da ação humana sobre a Natureza, como

sendo-a de propriedade humana. Evidencia-se, nesse caso, a postura antropocêntrica.

É importante que exista um equilíbrio entre os mais diversos processos objetos do

desenvolvimento humano e a Natureza. É essencial que as ações humanas de exploração de

recursos naturais, sejam efetuadas de forma responsável, consciente e preventiva, visando

minimizar os impactos e a reduzir os efeitos da degradação ambiental160 ao meio explorado,

bem como, a toda vizinhança ambiental.

Nesse contexto, a preservação ambiental é tão importante quanto os ideais de

inalienabilidade de Rousseau. A Natureza, como expressão máxima de organismo livre, precisa

que seus indivíduos não-humanos, desprovidos de consciência,161 sejam protegidos, não tão

somente pelo que produzem, ou proporcionam aos seres humanos, e sim, principalmente pela

sua importância no equilíbrio ecológico, que permite a existência humana na Terra.

O Contrato Social, como expressão de um projeto antropocêntrico da Modernidade, que

objetiva regular as desigualdades entre os indivíduos que o desenvolvimento da civilização

trouxe a sociedade, não espelha as relações do Homem com a Natureza. Os ideais de Rousseau,

inseridos no contexto histórico do século XVIII e proposto por meio do materialização do

Contrato Social visam somente os seres humanos, sem constar os seres vivos integrantes do

Planeta Terra no qual todas as formas de visa coabitam em sinergia.

A necessidade de uma mudança cultural162 centrada na proteção da biodiversidade, deve

ser expandida, não tão somente em ideais preservacionista e conservacionista, meros deleites

159 O referido autor, explica que “[...] o cuspe suja a sopa, o logotipo objeto, a assinatura a página pela mesma

palavra, com a mesma origem e o mesmo sentido. A propriedade se marca, como o passo deixa seu traço [...]”.

SERRES, Michel. O mal limpo: poluir para se apropriar?. p. 15. Grifo original da obra em estudo. 160 Para Leff, “[...] A degradação ambiental emerge do crescimento e da globalização da economia. Essa escassez

generalizada se manifesta não só na degradação das bases de sustentabilidade ecológica do processo

econômico, mas como uma crise de civilização que questiona a racionalidade do sistema social, os valores, os

modos de produção e os conhecimentos que o sustentam [...]”. LEFF, Enrique. Saber Ambiental:

Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. Traduzido por Lúcia Mathilde Endlich Orth. 8. ed. Rio

de Janeiro: Vozes, 2011, p. 56. 161 Para Aquino, “[...] A Natureza é objeto de infinita expressão humana, porque é desprovida de (auto)consciência

ou outras formas de comunicação que apresentam semelhante sintonia aos graus de cognição dos seres

humanos [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado

constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 200. 162 Ao abordar a temática da mudança cultural, Marconi e Presotto, explicam que é a mudança “[...] é qualquer

alteração da cultura, sejam traços, complexos, padrões ou toda uma cultura, o que é mais raro. Pode ocorrer

com maior ou menor facilidade, dependendo do grau de resistência ou aceitação [...]” podendo ocorrer por

diversos fatores, entre os quais as catástrofes que para os autores “[...] podem exercer especial influência,

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de indivíduos engajados. A Sociedade deve buscar, como outrora fez ao Contrato Social, na

atualidade, aos ideais de um Contrato de cunho biocêntrico, entre homens e Natureza,

fundamentado no respeito e na relação entre humanos e não-humanos, sem domínio, onde surge

o Contrato Natural.163

Na obra “O Contrato Natural”, o filósofo francês Michel Serres, retoma a caminhada

humana alicerçada no Contrato Social, e sinaliza, também, a necessidade de um Contrato

Natural, que se posicione tanto nas relações dos seres humanos, e destes, para com os seres não-

humanos, pois o homem passou de um ser dominado pela Natureza a dominador164.

Na vigência do Contrato Social, as sociedades se aperfeiçoaram e se tornaram

complexas, com relações sociais transfronteiriças. Diante desse contexto, o consumo dos

recursos naturais para satisfazer a necessidade economia mundial se multiplicou. Crises

econômicas se tornaram integradas às sociedades, pois não há equilíbrio entre os meios de

produção com o meio natural na exploração cada vez maior de matéria prima, a fim de sanar

todas as crises surgidas por essas intervenções165 humanas desmedidas.

Das ações humanas, Serres166 aponta duas teses sobre essas interações de extrema

importância sobre as intervenções humanas, pois apresentam caminhos distintos que a

sociedade tem a possibilidade de escolher, para tanto, devem ser ponderadas as consequências

que cada uma das ações, acarretam a coletividade.

Para o filósofo, se considerar as ações humanas como inocentes, não se modifica nada

e tudo segue como historicamente ocorreu, e a sociedade só tem a ganhar, contudo, se as ações

representarem perdas, se perde tudo, e a sociedade pode não estar preparada para os reflexos de

suas atuações.

levando a alterações significativas na cultura de uma sociedade [...]”. MARCONI, Marina de Andrade;

PRESOTTO, Zelia Maria Neves. Antropologia: uma introdução. p. 42. 163 Segundo Serres, “[...] Do mesmo modo que o contrato social reconhecia alguma igualdade entre os signatários

humanos do seu acordo [...]” também o “[...] Contrato Natural reconhece, em primeiro lugar, a nova igualdade

entre a força das nossas interações globais e a globalidade do mundo [...]”. SERRES, Michel. O Contrato

Natural. Tradução de Serafim Ferreira. Lisboa: Instituto Piaget, 1994, p. 77. 164 Para Serres, “[...] A mudança global que hoje se trava não só atrai a história ao mundo, como transforma

também a força deste último em precariedade, numa infinita fragilidade. Outrora vitoriosa, a terra é agora

vítima [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 27. 165 Para Serres, “[...] Por causa das nossas intervenções, o ar modifica a sua composição [...]”. SERRES, Michel.

O Contrato Natural. p. 16. 166 Para Serres, é necessário prever e decidir sobre as decisões humanas a serem tomadas, sendo que “[...] Apostar,

portanto, dado que os nossos modelos podem servir para sustentar as duas teses contrárias. Se considerarmos

as nossas ações inocentes e ganharmos, não ganharemos nada, a história avançará como sempre; mas se

perdermos, perdemos tudo, sem estarmos preparados para qualquer possível catástrofe. Mas se, ao invés,

escolhermos a nossa responsabilidade: se perdermos, não perderemos nada, mas se ganharmos, ganharemos

tudo, continuando como agentes da história. Nada ou perda de um lado, ganho ou nada do outro: isso elimina

toda a dúvida [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 16.

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Ao passo que o filósofo aponta que se for escolhida a responsabilidade de todos os

indivíduos, e nesse caso, a sociedade vir a perder, esta nada terá perdido, e se vir a ganhar, terá

ganho tudo, e por consequência, os homens, seguem como sujeitos da história humana por meio

de suas ações.

Nessa linha de pensamento, observa-se que as ações humanas contribuem de diversas

formas para as alterações biológicas, químicas e físicas do planeta, as quais afetam diretamente

a Natureza. As decisões para que medidas sejam tomadas a fim de se solucionar esses cenários,

partem da mobilização de uma sociedade global, uma vez que a terra é o habitat de todos, e não

se pode simplesmente abandoná-la, nem fugir dos efeitos e das condições da escolha do modo

de vida humana.

A partir dessa crise civilizacional, inserida sob o ângulo da Razão, o sistema social

antropocêntrico vigente é tema de permanente debate, pois, há incerteza de que existe

racionalidade167 na relação entre Homem e a Natureza, nos valores morais, nos modos de

produção, ao ponto primordial, de reconhecimentos da Natureza, como pilar de sustentação da

Sociedade mundial.

Nessa linha de pensamento, os debates ligados a postura antropocêntrica da sociedade

vem ao encontro do que aponta Gudynas,168 sobre em que meio das ações humanas, surgem as

reclamações que exigem que sejam tomadas medidas de proteção da biodiversidade, bem como,

a produção e disposição da elevada quantidade de resíduos produzidos pelas grandes cidades.

167 Conforme Pereira, “[...] o homem é dotado de inteligência, de racionalidade e por isso pode e precisa fazer

algumas reflexões cientificas sobre a forma de produção de bens, a hierarquização dos bens consumíveis, a

devolução dos resíduos à natureza, com vista à efetivar garantias de sobrevivência e de dignidade das presentes

e futuras gerações [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe; PEREIRA,

Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; HORN,

Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. Caxias do Sul: Educs, 2009. p. 27. 168 Para Gudynas “[...] De esta manera surgem demandas, cuestionamientos y reclamos de todo tipo, que van

desde exigir la protección de especies amenazadas hasta manejar adecuadamente los resíduos en las grandes

ciudades [...]”. GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales.

GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. peruana Lima:

Peru, 2014, p. 23.

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O Contrato Natural de Serres, por meio do ideal simbiótico169, busca reencontrar170 os

indivíduos humanos e não-humanos, alicerçado no respeito, no amor171, na mudança de postura

dos homens, na valorização e na proteção da Natureza, bem como, da Terra como casa de toda

vida.

Não se trata da passagem de uma geração social, para uma geração natural, mas do

reconhecimento como “ser próprio” que é a Natureza.172 Similarmente a ideia da evolução dos

Direitos Fundamentais nas diversas dimensões existentes, sem ocorrer uma substituição de

direitos173 e sim uma complementariedade. Dessa forma, por analogia de entendimento, busca-

se por meio do aperfeiçoamento intelectual, uma efetiva simbiose do antropocentrismo com o

biocentrismo, para promover a proteção da Natureza.

2.2. O Contrato Natural como expressão do Biocentrismo

Durante o século XVIII, sobre a vigência do Contrato Social, os homens detentores da

Razão, utilizaram da racionalidade para concretizar seus ideias antropocêntricos. Na caminhada

169 Para Aquino “[...] O Contrato Natural é caracterizado como simbiótico, ou seja, reconhece a necessidade do

respeito e não admitiria as formas de domínio, de demarcação [...]” o autor complementa “[...] Trata-se de um

contrato cujo fundamento é as relações amistosas que evitam o surgimento e a proliferação de parasitas [...]”.

AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 204. 170 Segundo Gudynas, “[...] En lugar de mantener el divorcio entre la Natureza y el ser humano, hay que propiciar

su reencontro. Para lograr esta transformación civilizatória, uma de las tareas iniciales radica em la

desmercantilización de la naturaleza [...]”. GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética

biocéntrica y políticas ambientales. p. 14. 171 Para Serres, é importante que exista amor com a Terra “[...] Amar os nossos dois pais, natural e humano, a terra

e o próximo; amar a humanidade, a nossa mãe humana e a nossa mãe natural, a Terra [...]” SERRES, Michel.

O Contrato Natural. p. 80/81. 172 Segundo Serres, o retorno a natureza “[...] implica acrescentar ao contrato exclusivamente social a celebração

de uma Contrato Natural de simbiose e de reciprocidade em que a nossa relação com as coisas permitiria o

domínio e a possessão pela escuta admirativa, a reciprocidade, a contemplação e o respeito, em que o

conhecimento não suporia já a propriedade, nem a acção o domínio, nem estes os seus resultados ou condições

estercorárias [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 65. 173 Segundo Eça e Vilela “[...] A classificação dos direitos humanos em gerações é criticada por ampla doutrina

nacional e internacional, tendo em vista que o surgimento de novos direitos fundamentais ao longo da história

e da evolução das sociedades apresenta caráter cumulativo. Assim, o termo "geração" encontra-se ultrapassado,

posto que não expressa o significado de complementaridade, aglutinação de valores, podendo representar

erroneamente o entendimento de substituição de uma geração por outra. Dessa forma, é mais correto o uso do

vocábulo "dimensões" para designar as várias etapas de expansão e aquisição de novos direitos fundamentais

ao longo da evolução da sociedade no decorrer dos séculos da história. Cumpre ainda esclarecer que as

dimensões abordadas não são estanques e se comunicam, visto que uma não exclui a outra, diante do caráter

de indivisibilidade e interdependência [...]”. EÇA, Vitor Salino de Moura; VILELA, Janaina Alcântara. Os

Direitos fundamentais sociais: considerações sobre sua efetividade. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra;

Salino, Vitor. Direito Material e Processual do Trabalho na perspectiva dos Direitos Humanos. São Paulo:

Ltr, 2014. p. 40.

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de aperfeiçoamento intelectual os indivíduos detentores da Razão, se encontram inseridos no

Estado Civil, onde está presente o Contrato Social.

O referido Contrato, encontra-se fundado nos pensamentos de Rousseau. Esse contexto

representa a judicie da moral civilizatória e, também, obrigatoriedade de respeitar as leis que

regram a conduta social. Sob a égide do Contrato Social, as sociedades cresceram,

desenvolveram, e se tornaram, com o advento das tecnologias industriais complexas.

As relações entre os indivíduos sociais, que outrora ocorriam em meio a Natureza,

dentro de uma mesma família, em pequenos grupos, clãs, e sociedades, atualmente, ocorrem

entre todos os seres humanos. As fronteiras nacionais forma superadas e no momento atual, as

interações humanas são globalizadas.

Os indivíduos por estarem inseridos em uma Sociedade cujos pensamentos

antropocêntricos, representam o centro de toda organização social, acabam não se dando por

conta que esses pensamentos não refletem mais a totalidade das relações humanas. A existência

de um Contrato com os seres não-humanos é entendida como necessária, e surge como vetor de

integração para que haja o desenvolvimento integral da teia da vida.

Outrora, o homem natural em sua esplendecência de vida livre no Estado natural, tinha

a Natureza como seu “senhor de dominação” pois suas condições – clima, luz, escuridão,

floresta, mar, animais, o desconhecido – advinham de formas ameaçadoras, pondo-se a ser

respeitada pelos indivíduos a fim de evitar a própria morte. Dessa forma, a Natureza174 nas lutas

travadas contra o Homem, se sobressaía vencedora.

A vida na Terra,175 não depende do Homem para seu desenvolvimento, pois antes

mesmo de seu surgimento, a Natureza já perfazia a cobertura de grande parte do globo terrestre.

Cada pedaço de Terra e de Mar com todos os tipos de organismos vivos, formavam uma cadeia

simbiótica e proporcionavam as condições necessárias a manutenção dessa rede viva, local onde

se situam todos os seres vivos.

Por meio da Razão humana e a visão de domínio,176 o Homem passou a não temer a

Natureza e a se posicionar a frente dos seus desafios. Agora, impera seu potencial de

174 Como afirma Serres, sobre a forma da Natureza agia sobre o homem “[...] Outrora incorporado ou distribuído

pela terra entre as florestas ou as montanhas, os desertos e os bancos de gelo, ligeiro de corpo e de ossos, o

sujeito desaparecia. Não era preciso que o universo se armasse para o esmagar: um vapor, uma gota de água

bastava para o matar; engolido como um ponto, era este o homem de ontem, vencido pelo clima na guerra

travada entre ambos [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 34/35. 175 Na discussão sobre a vida na terra, Serres aponta que “[...] A terra existiu sem os nossos inimagináveis

antepassados, poderia muito bem existir hoje sem nós e existirá amanhã ou ainda mais tarde, sem nenhum dos

nossos possíveis descendentes, mas nós não podemos existir sem ela [...]”. SERRES, Michel. O Contrato

Natural. p. 58. 176 Conforme abordam Canotilho e Leite “[...] A razão humana situa o ser humano em uma irrevogável posição

de proeminência sobre a natureza. O fato do ser humano não agir tão instintamente como os demais seres,

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exploração, de reivindicação, a sua posição vencedora, tendo o Homem o título de dominador177

e a terra a de vítima178, que deve se subjugar perante a vontade do dominador.

A Natureza na sua grandiosidade tem a capacidade de se regenerar, de se depurar das

agressões que sofre, sendo essas de formas naturais cíclicas ou produzidas pela mão do homem.

No entanto, com a evolução do Homem na Terra e o desenvolvimento da visão antropocêntrica

de explorador179 e consumidor, este depreda mais e mais, a Natureza, sem que essa consiga se

purificar, bem como, restaurar o equilíbrio na mesma velocidade da destruição causada pelas

atitudes humanas180, cujo resultado é a perda de biodiversidade.

Fica evidente, a partir da leitura dos ideais de Serres181, que se torna necessário um

Contrato Natural, um Pacto, como ocorreu outrora com o Contrato Social, mas que agora, com

objetivo de evitar a ameaça da morte coletiva, um novo Contrato que deve ser assinado por

todos os Homens – mundo humano – com a Terra – mundo biológico – sendo esse o Contrato

Natural, busca por meio na união de esforços de diferentes nações, a efetividade do elo entre

Homem e Natureza.

Da relação homem e Natureza, fato a ser elencado na postura de Serres em sua obra,

tem relação a preocupação sobre a densidade demográfica,182 em como o seres humanos, em

sua evolução, desde o Estado natural ao Estado em se que encontram na atualidade,

podendo decidir a maioria de suas ações, faz com que possa subjugar a natureza, embora não devesse

transformando-a de acordo com as suas necessidades [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José

Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 162/163. 177 Para Pereira, “[...] No que tange ao critério de dominação, o homem, desde os primórdios dos tempos, busca

ser dono da natureza [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe;

PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. Caxias do Sul: Educs, 2009.

p. 53. 178 Para Serres, “[...] Outrora vitoriosa, a terra é agora vítima [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 27 179 Segundo Leff “[...] A acumulação de capital, as taxas de exploração dos recursos e os padrões de consumo,

chegaram a ultrapassar a capacidade de carga e diluição dos ecossistemas, levando a formas e ritmos sem

precedentes de degradação ecológica, de extinção biológica, de erosão de solos e de destruição de

biodiversidade [...]”. LEFF, Enrique. Saber Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder.

p. 176. 180 Conforme abordam Canotilho e Leite “[...] o modo de vida humano, baseado, preponderantemente, em valores

econômicos, causou impactos no ambiente nunca vivenciados em toda história [...]”. CANOTILHO, José

Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 163. 181 Segundo Serres “[...] Um novo pacto, um novo acordo prévio, que devemos estabelecer com o inimigo objetivo

do mundo humano: o mundo tal e qual. Uma guerra de todos contra tudo [...]”, não sendo apenas rever os atos

da sociedade, “[...] Mas mais do que isso, trata-se da necessidade de rever e de voltar a assinar o mesmo contrato

social primitivo. Este diz-nos respeito para o melhor e para o pior, segundo a primeira diagonal, sem mundo;

agora que sabemos associar-nos perante o perigo, precisamos de conceber, ao longo da outra diagonal, um

novo pacto a assinar com o mundo: o Contrato Natural [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 31/32. 182 Serres trata do impacto das grandes concentrações humanas “[...] graças ao crescimento e a densas

concentrações, acabamos, assim, de ultrapassar uma dimensão crítica de maneira que, aglutinados, os pontos

de Pascal acabaram por formar diversas variedades: superfícies, volumes e massas [...]” sendo que “[...]

Existem agora lagos de homens, agentes físicos no sistema físico da terra. O homem é uma reserva, a mais

forte e unida da natureza. É um ser-em-toda-a-parte [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 36.

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conseguiram estar e ocupar todos os cantos da Terra, principalmente em grandes centros

urbanos com elevada concentração populacional.

Dessa ocupação, Serres183 aponta que os seres humanos constituem de forma conjunta,

em suas relações, uma camada sobre a Terra tão grande como os oceanos, os desertos, atmosfera

e as áreas do polos árticos e antárticos. Salienta o filósofo que nesse momento para que haja um

equilíbrio nas relações dos Homens para com a Natureza, deve-se ampliar o Contrato Social

para outro: o Contrato Natural.

Por conta do pensamento antropocêntrico, da ocupação continental e todas as relações

decorrentes, como a crise da civilização, que se expõe cada vez maior, o Contrato Natural se

apresenta como meio de efetivar o equilíbrio, por meio de implementar nos debates do modo

de vida da sociedade, um pensamento biocêntrico, de recontro com a Natureza.

Para tanto, se faz necessárias mudanças comportamentais184 nas relações do Homem

para com o a Natureza, ao mesmo tempo reaproximá-los, e reconhecer que a forma de vida

escolhida pela Sociedade sob a égide do Contrato Social, deve ser repensada, pois a postura

antropocêntrica185 deve ser revista, antes que (mais) desastres insanáveis ocorram. A partir

dessa postura, surge a Sociedade de Risco.186

Observa-se, a partir desses argumentos, que não se deve abandonar aquilo em que já se

conquistou, e sim, fazer semelhante a evolução dos direitos dos homens, nas diversas dimensões

existentes, sem que haja uma sucessão de Contratos. Nesse caso, o pensamento biocêntrico

revela uma preocupação, tanto com humanos quanto não-humanos187 pela coletividade, ou seja,

no Contrato Natural estão, também, todas as conquistas humanas.

Esses debates devem almejar, por meio da busca de mudanças, tanto comportamentais

de integração do homem com a Natureza, como novas alternativas de exploração econômica e

183 Para Serres “[...] A natureza global, o planeta-terra na sua totalidade, sede de inter-relações cruzadas e

recíprocas entre os seus elementos locais e os subconjuntos gigantes, oceanos, desertos, atmosfera ou bancos

de gelo, é a nova correlação dessas novas camadas de homens [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural.

p. 39. 184 De acordo com Serres “[...] O crescimento dos nossos meios racionais conduz-nos, a uma velocidade difícil de

calcular, na direção da destruição do mundo que, por um efeito de retorno muito recente, pode condenar-nos a

todos, e não já por localidades, à extinção automática [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 31. 185 Segundo Canotilho e Leite “[...] De fato, a visão antropocêntrica tradicional caracteriza-se pela preocupação

única e exclusiva com o bem-estar do homem [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens

Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 164. 186 Conforme abordam Canotilho e Leite “[...] A Teoria da Sociedade de Risco, característica da fase seguinte ao

período industrial clássico, representa a tomada de consciência do esgotamento do modelo de produção, sendo

esta marcada pelo risco permanente de desastres e catástrofes. [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes;

LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 156. 187 Nessa temática, Serres defende que “[...] Cruzam-se, assim, os dois contratos fundamentais [...]”. SERRES,

Michel. O Contrato Natural. p. 32.

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utilização dos recursos naturais, consumo consciente, e pensamento preservacionista, tanto para

a vida humana na terra, como de todos seres não-humanos.

É necessário que haja a evolução do pensamento antropocêntrico para se insistir na

união de esforços entre os seres humanos das diferentes nações. Deve-se deixar de lado o “eu”

egoísta, individualista188 e utilizar o “nós” altruísta, cooperativista em um ir e vir entre as

posturas egoístas e altruístas, na busca das mais diversas integrações conscientes, almejadas

pelo pensamento do amor ao próximo, bem como do amor a Terra189, ligados aos ideais do

biocentrismo.

Contudo, as mudanças no modo de vida das sociedades modernas, não se apresentam

como façanhas as quais podem ser facilmente alcançadas, principalmente por essas estarem

inserida, em meio a um mundo ligado ao processo e desenvolvimento econômico190 e ao

profundo consumismo.

Nessa linha de pensamento, a postura biocêntrica de proteção dos seres não-humanos,

entra em choque com os objetivos da exploração humana,191 que almeja meios de ampliar o

crescimento e a produção econômica, bem como, as cadeias de consumo, sendo consequência

dessa visão antropocêntrica as alterações e transformações da Natureza pela vontade do homem.

Evidente que toda exploração humana acarreta mudanças globais, diminuição de

florestas, extinção de espécies da flora e da fauna, poluição do solo, água e ar e ainda, favorece

a usurpação do habitats naturais da biodiversidade, sem que haja a proteção e preservação dos

recursos naturais.

Mesmo que a Natureza tenha capacidade de regeneração, as atividades humanas

resultam em um desequilíbrio que afeta todo o ecossistema. No atual momento da existência

188 Segundo Ferry “[...] Há quem diga, também sem refletir um instante nem olhar a história, que nossas sociedades

estão mais ‘individualistas’, mais egoístas e ávidas do que nunca. Mas objetivamente, pois não é uma questão

de gosto, o contrário é que é histórica e factualmente verdadeiro: nunca a preocupação com o outro foi tao

grande, quanto hoje, e não somente me palavras [...]”. FERRY, Luc. Do amor: uma filosofia para o século

XXI. Traduzido por Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: DIFEL, 2013. p. 86. 189 Na discussão sobre a importância do amor entre as pessoas Serres, aponta a existência de duas leis “[...] Amai-

vos uns aos outros e amemos o mundo [...]”, pois para o filósofo, é tão importante quanto que exista o amor

entre as pessoas, que exista amor dessas para com a Terra “[...] Amar os nossos dois pais, natural e humano, a

terra e o próximo; amar a humanidade, a nossa mãe humana e a nossa mãe natural, a Terra [...]” SERRES,

Michel. O Contrato Natural. p. 80/81. 190 Segundo Canotilho e Leite “[...] Pode-se afirmar que a sociedade moderna criou um modelo de

desenvolvimento tão complexo e avançado que, faltam meios capazes de controlar e disciplinar esse

desenvolvimento [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito

constitucional ambiental brasileiro. p. 158. 191 Para Canotilho e Leite “[...] O modo de vida humano não consegue, ao menos no momento, abandonar a ideia

de que o ambiente é, de alguma forma, servil. Acrescente-se que o homem ainda acha que detém o poder de

transformar e entender a natureza, mas essa posição de superioridade constitui-se num enorme e ledo engano

[...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental

brasileiro. p. 165.

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humana192, não se pode determinar quais serão as transformações que resultarão, nem sua

grandeza e complexidade.

No entanto, como aborda Serres193, se observa que a ignorância temporal da sociedade

por não saber a magnitude dessas mudanças, acarreta em dúvidas de como proceder, e sobre

que decisão tomar acerca das catástrofes naturais as quais se tornam mais comuns nas diversas

regiões do globo.

A principal questão a ser elencada sobre as transformações que o homem promove na

Natureza, contudo, está condicionada pela mudança comportamental em escala mundial, que

deve elucidar quais são os problemas ambientais (danos) que as ações humanas acarretam para

a Natureza, bem como quais são as contribuições para se mitigar esse crescente desrespeito ao

mundo natural a partir do reconhecimento como “ser próprio”.

Por esse motivo, o Contrato Natural, entendido como expressão do pensamento

biocêntrico, é uma ferramenta a ser usada com o objetivo de restaurar o equilíbrio entre a

sociedade que necessita da exploração para satisfazer suas necessidades e a proteção da

Natureza, e da própria terra, berço de toda forma de vida.

O ponto de partida para os debates em escala global sobre a consciência194 se encontra

sobre as ações humanas que acarretam em alterações climáticas mundiais, e que somente com

a união de esforços de todos, sendo cada indivíduo peça importante para a incorporação do

pensamento biocêntrico em seu modo de vida, que esses cenários de desequilíbrios graves

podem ser alterados.

Para tato, um fator que está diretamente ligado a uma mudança comportamental é o da

Sociedade de consumo,195 ou seja, a postura antropocêntrica das sociedades. O crescimento

populacional, a ocupação de grandes centros urbanos, desenvolvimento a qualquer custo, a

192 Para Pereira, “[...] A humanidade, no século XXI, vive uma crise ambiental marcada pela ingerência do homem

sobre o meio ambiente, desrespeitando os limites impostos pela natureza, visando à busca do poder econômico

e esquecendo o fator primordial de todos: a preservação das espécies e o cuidado a um meio ambiente

sustentável para as gerações presentes e futuras [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; PEREIRA, Henrique

Mioranza Koppe; PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética ambiental. In: PEREIRA,

Agostinho Oli Koppe; HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. p. 46. 193 Segundo Serres “[...] Não restam dúvidas, sobretudo, de que não sabemos pensar as relações entre o tempo que

passa e o tempo que faz: uma só palavra para duas realidades que parecem diferentes. Haverá modelo mais

rico e mais completo, relativamente à mudança global, aos equilíbrios e aos seus atractores, do que o do clima

e da atmosfera? Eis-nos encerrados num círculo vicioso [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 50. 194 Para Serres, “[...] o nosso saber e as nossas inquietações, porque o nosso industrioso saber-fazer intervém talvez

de modo catastrófico nessa natureza global que, segundo os mesmos antepassados, não dependia de nós [...]”.

SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 49. 195 FLORES, Nilton Cesar. A sustentabilidade ambiental em suas múltiplas faces. São Paulo: Millennium

editora, 2012, p. 32/33.

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massificação da produção de todos os tipos de bens de consumo, representam as características

das sociedades atuais.

A velocidade que o consumismo se apresenta em escala global, nos mais diversos bens,

representa o lado negativo da sociedade, que reflete os objetivos de adquirir para satisfazer, não

sendo importante as formas necessárias de obtenção. A partir dos fundamentos trazidos pela

visão antropocêntrica, percebe-se que o estilo de desenvolvimento civilizacional é “irracional”

e segrega, mais e mais, a relação entre Homem e Natureza.

Sendo que a postura antropocêntrica como bem já se discutiu em momentos anteriores

deste estudo, deve ser revista para possibilitar a introdução de uma visão biocêntrica, a qual

visa por intermédio do Contrato Natural, reencontrar196 o Homem junto com a Natureza. Sob

igual critério, o modo de vida das sociedades deve se adaptar para uma redução da produção de

bens em massa, na reeducação do consumo, na educação do desenvolvimento consciente, em

que visa alcançar, na visão de Serres197, o retorno à Natureza.

As atividades humanas, acarretam mais diversas formas de poluição ao planeta. Essa

atitude poluidora pode ser utilizada para explicar as interações entre as Sociedades e seu lixo,

ponto tratado de forma impar por Serres,198 acerca da poluição que pode ser vista como uma

forma de demarcação de propriedade.

No entanto, a humanidade em seu modelo de existência, despeja diariamente toneladas

de resíduos, sobre a terra, água e o ar, e dessa forma, deixa um rastro sobre a Natureza, como

se essa fosse mais um bem de consumo. Dessa forma, a dominação humana por intermédio da

demarcação de suas propriedades por meio do lixo, acarreta por espalhar as imundícies199

produzidas por todo o globo.

A Terra é composta por diversos organismos vivos, que juntos formam um Ecossistema.

Para tanto, o planeta apresenta de forma natural um equilíbrio para a manutenção de toda vida,

ao passo, que no decorrer de sua história, as Sociedades inventaram meios de organizar as

relações sociais dos indivíduos, de modo a evitar que o caos dominasse a todos.

Segundo esses argumentos, Serres200 demonstra que por intermédio do Contrato Natural

há necessidade de se construir um novo equilíbrio, de proporção global, que precisa agregar o

196 GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. Peruana Lima:

Peru, 2014, p. 14. 197 SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 65. 198 SERRES, Michel. O mal limpo: poluir para se apropriar?. p. 15. 199 Para Serres, “[...] Por isso, a imundície do mundo imprime a marca da humanidade, ou dos seus dominadores,

o sinete imundo da sua posse e da sua apropriação [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 58. 200 Segundo Serres, ao explanar sobre os equilíbrio da terra e do homem, introduz que “[...] Precisamos de pensar,

construir e colocar em prática um novo equilíbrio global entre estes dois conjuntos [...]”. SERRES, Michel. O

Contrato Natural. p. 64.

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balanço natural da Terra e o construído pelo Homem. Pensamento similar ao que busca a

comunhão dos ideais antropocêntricos e biocêntricos.

Para se constituir o Contrato Natural como expressão desse compromisso responsável

dos seres humanos com a Terra, as suas ações sobre os recursos disponibilizados pela Natureza,

precisam evitar ou mitigar os impactos que a existência humana causa ao planeta, mas sim, o

efetivo equilíbrio201, de ordem simbiótica, sem que haja qualquer forma de dominação.

Nesse momento o Homem deve, ao repensar suas ações, reaprender202 o que um dia

aprendeu no ambiente familiar, estudou no ambiente escolar e fundamentou na academia, que

a humanidade não é nada na Terra sem a Natureza, pois precisa dela tanto quanto precisa do ar

para sobreviver e da água para saciar sua sede.

A partir desse caminho, as sociedades, por intermédio das nações as quais fazem parte,

buscam na união de interesse internacionais a sua consolidação por meio de Acordos, Pactos e

Tratados à alternativas eficientes de solução de crises nas mais diversas áreas e, principalmente

ambiental, de forma organizada e fortalecida por diversas nações, afim de encontram uma

solução para os impactos da vida humana na Terra.

Na América do Sul, mais precisamente nas nações que procuram enfrentar a

problemática ambiental, por meio da efetivação do contrato com a Natureza, busca-se de

maneira efetiva, mitigar e evitar os impactos que as ações humanas acarretam ao Ecossistema,

para que, o equilíbrio na relação Homem e Natureza, seja um dos legado a se deixar as futuras

gerações.203

Dentre os diálogos internacionais surgem documentos globais e setoriais que almejam

discutir as problemáticas mundiais e regionais, como ocorre por meio do Tratado Constitutivo

da União de Nações Sul-Americanas – UNASUL, firmado entre países sul-americanos, que

201 De acordo com Serres “[...] essa relação renovada que mantemos agora com o mundo, outrora o nosso dono e

ainda há pouco o nosso escravo, em todo o caso sempre o nosso hospedeiro e agora o nosso simbiota [...]”.

SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 65. 202 Como aborda Pereira, “[...] O homem precisa aprender a ser humano novamente, voltando a ter a sincronia

com a natureza, respeitando-a e sua integralidade e complexidade [...]”. PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

PEREIRA, Henrique Mioranza Koppe; PEREIRA, Mariana Mioranza Koppe. Hiperconsumo e a ética

ambiental. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe; HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de

Consumo: meio ambiente. Caxias do Sul: Educs, 2009. p. 47. 203 Segundo Leite e Ayala, “[...] o fato de que hoje a defesa do meio ambiente está relacionado a um interesse

intergeracional e com necessidade de um desenvolvimento sustentável, destinado a preservar os recursos

naturais para as gerações futuras, fazendo com que a proteção antropocêntrica do passado perca fôlego, pois

está em jogo não apenas o interesse da geração atual [...]” LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de

Araújo. Direito ambiental na sociedade de risco. p. 47.

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consideram204 importante a integração regional com fim de concretizar o desenvolvimento

sustentável.

É necessário insistir, como caminho de efetivação dos ideais do Contrato Natural de

Serres, na aproximação do pensamento biocêntrico as sociedades atuais, arraigadas ao

consumismo e exploração descontrolada dos recursos naturais, e com objetivo de embasar a

discussão sobre a proteção Ambiental nos países latino-americanos.

Nesse caso, a postura biocêntrica não deifica a Natureza, não a torna um ser intocável,

mas sinaliza, especialmente ao ser humano que, apesar dos séculos de evolução, esse não pode

se considerar como fenômeno superior ao mundo natural, mas que está inserido junto aos

demais seres vivos. Essa epifania permite, aos poucos, consolidar formas de pensamentos e

atitudes os quais favoreçam essa integração com o respeito devido à biodiversidade, aos

ecossistemas que constituem essa “Casa Comum”.

2.3. As contribuições do Contrato Natural ao Tratado Constitutivo das Nações Sul-

Americanas – UNASUL

Na evolução histórica do Homem em suas relações sociais, o Contrato Social, não

representa hoje, a totalidade das interações humanas e não-humanas. O Contrato Natural de

Serres, surge como meio de sanar as lacunas do Contrato Social sobre a relação Homem e

Natureza, visando restabelecer o equilíbrio.

Contudo, a principal questão a ser elencada pelo Contrato Natural, está sobre as

transformações que o Homem faz na Natureza, condicionadas pela mudança comportamental

em escala global. As quais devem elucidar quais são os problemas ambientais cujas ações

humanas, acarretam em danos a Natureza, bem como, quais são as contribuições para se mitigar

essa acentuada crise ambiental global, e um crescente desrespeito ao mundo natural a partir do

reconhecimento como “ser próprio”.

Correlato as transformações na Natureza, está o posicionamento da humanidade, que

se caracteriza como o núcleo de todas as relações com a vida na Terra, a partir dos ideais

204 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, “[...] CONVENCIDAS de que a integração e a

união sul-americanas são necessárias para avançar rumo ao desenvolvimento sustentável e o bem-estar de

nossos povos, assim como para contribuir para resolver os problemas que ainda afetam a região, como a

pobreza, a exclusão e a desigualdade social persistentes [...]”. UNASUL. União das Nações Sul-americanas.

Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-

Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016.

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antropocêntricos. A partir desse poder de moldar o ambiente ao seu redor, a humanidade

caminha em direção a um futuro preocupante.

Na medida em que os ideias humanos ainda subjugam a Natureza, percebe-se como

objetivos do crescimento e desenvolvimento205 econômicos, industriais e tecnológicos, não

obstante, tragam benefícios imediatos, acarretam diferentes malefícios, não tão somente à

Natureza em toda sua complexidade, como também para a Humanidade.

Nessa linha de pensamento, a sociedade atual – antropocêntrica – se encontra em meio

a uma crise ambiental de proporções globais,206 na qual a questão principal está focada no

modelo de vida das sociedades, em meio a um mundo moldado pelo desenvolvimento

econômico, consumismo e desrespeito a Natureza.

O modelo atual de vida das sociedades mostra-se insustentável,207 tanto com relação a

necessidade de mudanças comportamentais de consumismo, produção e exploração para

atender a demanda mundial, como a errônea visão arraigada à sociedade da Natureza como bem

de consumo.

Dessa visão antropocêntrica da atual sociedade mundial, um ponto importante a ser

debatido se manifesta: a humanidade não está sozinha no planeta, mas vive conjuntamente com

demais organismos vivos, e para tanto tem de buscar um equilíbrio – sustentabilidade208 – por

205 Segundo Carvalho e Adolfo, “[...] A humanidade avança em direção ao desenvolvimento tecnológico e ao

controle da natureza, porém, se por um lado esse avanço trouxe benefícios, por outro apresenta malefícios para

o meio ambiente e para o ser humana [...]”. CARVALHO, Sonia Aparecida de; ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva.

Sustentabilidade e Tecnologia: Perspectivas para o Direito Contemporâneo. In: BOFF, Salete Oro;

PIMENTEL, Otávio; FORTES, Vinícius Borges. (Org.). Direito e desenvolvimento sustentável: a

(necessária) proteção jurídica da biodiversidade e a (necessária) regulamentação do acesso à biodiversidade e

aos conhecimentos tradicionais. Passo Fundo: IMED Editora, 2013. p. 169/170. 206 Segundo Canotilho e Leite “[...] Crise que é multifacetária e global, com riscos ambientais de toda ordem e

natureza: contaminação da água que bebemos, do ar que respiramos e dos alimentos que ingerimos, bem como

perda crescente da biodiversidade planetária. [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens

Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 86. 207 Segundo Carvalho e Adolfo, “[...] O atual modelo de desenvolvimento mostra-se insustentável, inviabilizando

a evolução sustentável da sociedade contemporânea. E entre as implicações sociais, econômicas e ambientais

do paradigma do desenvolvimento econômico, destaca-se uma situação de crise ambiental, a ideia de que a

humanidade sofre um problema de percepção, como falta de visão de outro, não somente do ser humano, mas

de todos os seres vivos [...]”. CARVALHO, Sonia Aparecida de; ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva.

Sustentabilidade e Tecnologia: Perspectivas para o Direito Contemporâneo. In: BOFF, Salete Oro;

PIMENTEL, Otávio; FORTES, Vinícius Borges. (Org.). Direito e desenvolvimento sustentável: a

(necessária) proteção jurídica da biodiversidade e a (necessária) regulamentação do acesso à biodiversidade e

aos conhecimentos tradicionais. Passo Fundo: IMED Editora, 2013. p. 170. 208 De acordo com Carvalho e Adolfo, “[...] É indispensável que o desenvolvimento do século XXI alcance a

sustentabilidade, á qual o ser humano volte a integrar-se, antes de estar à parte da natureza [...]”. CARVALHO,

Sonia Aparecida de; ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva. Sustentabilidade e Tecnologia: Perspectivas para o Direito

Contemporâneo. In: BOFF, Salete Oro; PIMENTEL, Otávio; FORTES, Vinícius Borges. (Org.). Direito e

desenvolvimento sustentável: a (necessária) proteção jurídica da biodiversidade e a (necessária)

regulamentação do acesso à biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais. Passo Fundo: IMED Editora,

2013. p. 170.

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meio das contribuições do Contrato Natural, entre o Homem, a Natureza e os meios de

exploração.

A Humanidade não deve pensar somente em sua existência, e sim, ampliar sua

compreensão sobre a importância da Natureza, evoluir o pensamento antropocêntrico, e superar

o conceito do homem como subjugador da Natureza, na busca das mais diversas integrações

conscientes, almejadas pelo pensamento biocêntrico.

Nesse caso, se faz necessário a união de esforços tanto da coletividade, como das

diferentes nações, para efetivar os ideais contidos nas propostas do Contrato Natural.209 As

nações devem buscar nos ideais de um Contrato de cunho biocêntrico, reaproximar o Homem

com a Natureza, com fundamento no respeito e na relação entre humanos e não-humanos, sem

domínio210 que acarreta em violência, destruição ou privação dos benefícios trazidos pelo

aperfeiçoamento da teia da vida.

Essa a união de interesses de todas as nações mundiais sobre um tema especifico é

algo complexo, pois leva em consideração diversos fatores, e interesses os quais, nem sempre,

demonstram essa “boa vontade” de se constituir, de articular condições sob a lógica comum a

fim de se preservar a dignidade no seu sentido mais amplo. A forma de resolução encontrada

de efetivação de interesses humanos globais comuns se concretiza por meio de Acordos e

Tratados entre nações vizinhas ou pertencentes a um mesmo bloco econômico.

Para tanto, os Acordos e Tratados devem conjugar interesses comuns entre os países

membros de determinado grupo a fim de ratificá-los. Quando as nações acordam sobre esses

termos, o seu conteúdo integra seus ordenamentos jurídicos, para que seja possível com a união

de todos a materialização dos ideais propostos.

Assim, algumas nações Sul-americanas juntamente com países membros da

Comunidade Andina de Nações – CAN e do Mercado Comum do Sul – MERCOSUL se uniram

para integrar seus conhecimentos.211 Sendo que no dia 23 de maio de 2008, em Brasília, foi

criada a UNASUL, por meio do seu Tratado Constitutivo.

209 SERRES, Michel. O Contrato Natural. Tradução de Serafim Ferreira. Lisboa: Instituto Piaget, 1994, p. 77. 210 SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 27. 211 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, “[...] ENTENDENDO que a integração sul-

americana deve ser alcançada através de um processo inovador, que inclua todas as conquistas e avanços

obtidos pelo MERCOSUL e pela CAN, assim como a experiência de Chile, Guiana e Suriname, indo além da

convergência desses processos [...]”. UNASUL. União das Nações Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11

de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília

em 23 de maio de 2008. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-

2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de 2016.

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O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, firmado entre países

latino-americanos,212 representado pela República Argentina, a República da Bolívia, a

República Federativa do Brasil, a República do Chile, a República da Colômbia, a República

do Equador, a República Cooperativista da Guiana, a República do Paraguai, a República do

Peru, a República do Suriname, a República Oriental do Uruguai e a República Bolivariana da

Venezuela.

Com objetivos maiores do que livre comércio, circulação de pessoas e mercadorias, os

países sul-americanos, incluindo as nações pertencentes a CAN e ao Mercosul, buscaram na

criação da UNASUL,213 a constituição de uma identidade e cidadania sul-americana, para

desenvolver um espaço regional integrado em diversos campos, como da política, econômica,

no social, cultural, ambiental, bem como, na área de energia e de infra-estrutura.

Com relação a temática ambiental, o Tratado da UNASUL traz em seu preâmbulo

ideais de harmonia com a Natureza para um desenvolvimento sustentável, sendo essa posição

harmônica ventilada pelo Contrato Natural de Serres, para que seja possível o reencontro do

Homem com a Natureza.

Nessa linha, tem-se que a forma mais apropriada juridicamente para caracterizar o

Contrato Natural pode ser contemplada pelo Tratado Constitutivo da UNASUL,214 o qual busca

na união de diversos países sul-americanos, por meio dos ideais dos países andinos, resgata o

vínculo do homem com a Natureza, o Sumak Kawsay, a Pacha Mama e o Buen Vivir.

212 UNASUL. União das Nações Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o

Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso

em: 04 jul. de 2016. 213 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, almeja AFIRMANDO sua determinação de

construir uma identidade e cidadania sul-americanas e desenvolver um espaço regional integrado no âmbito

político, econômico, social, cultural, ambiental, energético e de infra-estrutura, para contribuir para o

fortalecimento da unidade da América Latina e Caribe. UNASUL. União das Nações Sul-americanas.

Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-

Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016. 214 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, “[...] RATIFICANDO que tanto a integração

quanto a união sul-americanas fundam-se nos princípios basilares de: irrestrito respeito à soberania, integridade

e inviolabilidade territorial dos Estados; autodeterminação dos povos; solidariedade; cooperação; paz;

democracia, participação cidadã e pluralismo; direitos humanos universais, indivisíveis e interdependentes;

redução das assimetrias e harmonia com a natureza para um desenvolvimento sustentável [...]”. UNASUL.

União das Nações Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado

Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016.

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50

A materialização215 do referido Contrato, se encontra por meio dos objetivos

determinados na UNASUL aos países membros, bem como, pela filosofia andina do Buen

Vivir.216 Nessa linha de pensamento, o Contrato de Serres passa a ser uma Utopia concretizada,

pelos ideais de integração dos países sul-americanos, por meio da UNASUL, já que preconiza

condições para se viver bem e não viver melhor217.

O referido contrato entre o Homem com o Mundo Natural, tem por meio do Tratado

Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas UNASUL, forma efetiva de proteção218 de

todos os seres vivos no seus ecossistemas naturais, assim como, os recurso naturais, de grande

importância para o equilíbrio da vida humana na Terra, já que, por exemplo, sem água não há

vida.

215 De acordo com Aquino “[...] Sem a UNASUL, o Contrato Natural não se apresenta como opção aperfeiçoada

do projeto racionalista e antropocêntrico no Contrato Social [...]” sendo que para o autor “[...] O Contrato

Natural não é uma abstração vazia, uma ideia sem sentido, ao contrário, representa o devir para uma época

saturada das ‘promessas de amante’ enunciadas pelos seres humanos e para apenas seres humanos. O Contrato

Natural é essa aposta no improvável, numa Utopia Concreta que, pouco a pouco e silenciosamente, se manifesta

na vida de todos dos dias [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural:

o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 209/210. 216 “[...] el ‘paradigma comunitario de la cultura de la vida para vivir bien’, sustentado en una forma de vivir

reflejada en una práctica cotidiana de respeto, armonía y equilibrio con todo lo que existe, comprendiendo

que en la vida todo está interconectado, es interdependiente y está interrelacionado. Los pueblos indígenas

originarios están trayendo algo nuevo (para el mundo moderno) a las mesas de discusión, sobre cómo la

humanidad debe vivir de ahora en adelante, ya que el mercado mundial, el crecimiento económico, el

corporativismo, el capitalismo y el consumismo, que son producto de um paradigma occidental, son en diverso

grado las causas profundas de la grave crisis social, económica y política. Ante estas condiciones, desde las

diferentes comunidades de los pueblos originarios de Abya Yala, decimos que, en realidad, se trata de una

crisis de vida”. HUANACUNI MAMANI, Fernando. Buen vivir/ Vivir bien: Filosofía, políticas, estrategias

y experiencias regionales andinas. Peru: CAOI, 2010, p. 6. Grifos originais da obra em estudo. 217 “En la visión del vivir bien, la preocupación central no es acumular. El estar en permanente armonía con todo

nos invita a no consumir más de lo que el ecosistema puede soportar, a evitar la producción de residuos que

no podemos absorber con seguridad. Y nos incita a reutilizar y reciclar todo lo que hemos usado. En esta

época de búsqueda de nuevos caminos para la humanidad, la idea del buen vivir tiene mucho que enseñarnos.

El vivir bien no puede concebirse sin la comunidad. Irrumpe para contradecir la lógica capitalista, su

individualismo inherente, la monetarización de la vida en todas sus esferas, la desnaturalización del ser

humano y la visión de la naturaleza como “un recurso que puede ser explotado, una cosa sin vida, un objeto

a ser utilizado”. HUANACUNI MAMANI, Fernando. Buen vivir/ Vivir bien: Filosofía, políticas, estrategias

y experiencias regionales andinas. p. 33. 218 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, busca o equilíbrio com a Natureza, mencionando

em seu art. 3º alínea “g” que “[...] A União de Nações Sul-americanas tem como objetivos específicos: g) a

proteção da biodiversidade, dos recursos hídricos e dos ecossistemas, assim como a cooperação na prevenção

das catástrofes e na luta contra as causas e os efeitos da mudança climática [...]”. UNASUL. União das Nações

Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de

Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016.

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O Contrato Natural, por meio do ideal simbiótico219 busca reencontrar220 os indivíduos

humanos e a Natureza, em tudo o que ela representa como Simbiose das mais diversas formas

de vida. Sendo que esse recontro é importante para que sejam efetivados todos os mecanismos

que visam a proteção e preservação da vida na terra, sendo humana e não-humana.

Esse Contrato Natural, se apresenta como ferramenta a ser usada com o objetivo de

restaurar o equilíbrio, entre o homem – a economia – e a Natureza, para efetivar a proteção da

biodiversidade e da própria terra. Observa-se, nas nações membros da União de Nações Sul-

Americanas UNASUL, um potencial de efetivação em âmbito nacional e regional.

O importante equilíbrio da relação dos seres humano e não-humanos tem sua efetivação

por meio da concretização do reconhecimento por parte da sociedade da Natureza como sujeito

detentor de direito e merecedor de respeito. Não se deve reconhecer o Mundo Natural como

bem a ser infinitamente explorado.

Para tanto, a importância e o reconhecimento da Natureza deve ser primeiramente

compreendida pela sociedade e agregada no modo de vida dos indivíduos. Sob idêntico

raciocínio, a filosofia dos povos andinos estabelece sua ligação à Terra como essa sendo a mãe

de toda vida, para posteriormente, vir a introduzir nos ordenamentos jurídicos das nações esse

reencontro com a Natureza. Essa ligação do povo originário andino com a Mãe Terra

(Pachamama) se traduz numa forma harmoniosa e equilibrada de vida, constitucionalmente

assegurada.

219 AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da

UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela

Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa

de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 204. 220 GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. peruana Lima:

Peru, 2014, p. 14.

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3. OS DIREITOS DA NATUREZA

A postura biocêntrica almeja que a Natureza deve ser preservada e reconhecida como

sujeito detentor de direito. Essa temática permeia debates em diversos países Sul-Americanos,

com ênfase, entre os que utilizam do Tratado Constitutivo da UNASUL, como meio de

introduzir a visão biocêntrica preservacionista e a elevação da Natureza como “ser próprio” nas

alterações de suas normas constitucionais, como ocorreu no Equador e Bolívia, que encararam

os ideais de convívio com a Natureza de forma mais equilibrada.

3.1. Natureza como sujeito de direito: desdobramentos constitucionais sul-americanos a

partir do Contrato Natural

Na sociedade do século XXI conhecida como globalizada221, o ritmo frenético de

desenvolvimento e complexificação, juntamente com os processos econômicos e o consumo de

produtos oriundos de matéria prima não-renovável, cresceram na mesma proporção. O

resultado dessoas atitudes são as mais diversas crises222 – humanas e não-humanas – as quais

se observa pela crise econômica que afeta todas as nações, principalmente as subdesenvolvidas.

Para satisfazer as necessidades humanas, as sociedades buscam nos recursos naturais

disponíveis, a exploração que vise atender suas necessidades e as demandas do processo

econômico.223 Nesse ponto, ocorre um entrave entre a necessidade dos homens por mais bens

e por maior consumo, sem abandonar o antropocentrismo,224 com a proteção da Natureza e de

221 Segundo Rocha, “[...] Neste início de século XXI, surge uma nova forma de sociedade, se pode chamar de,

conforme autores, de globalizada, pós-moderna, modernidade-reflexiva, modernidade líquida [...]”. ROCHA,

Leonel Severo. TEMPO. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. São

Leopoldo: Editora Unisinos; Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2009. p. 800. 222 Ao abordar o função do homem na Natureza, Calgaro aponta a crise ambiental em que vive o homem no século

XXI “[...] A humanidade no século XXI, vive uma crise ambiental marcada pela ingerência do homem sobre

o meio ambiente, desrespeitando os limites impostos pela natureza, visando à busca do poder econômico e

esquecendo do fator primordial de todos: a preservação das espécies e o cuidado a um meio ambiente

sustentável para as gerações presentes e futuras [...]”. CALGARO, Cleide. Desenvolvimento sustentável e

consumo: a busca do equilíbrio entre o homem e o meio ambiente. In: PEREIRA, Agostinho Oli Koppe;

HORN, Luiz Fernando Del Rio. (Org.). Relações de Consumo: meio ambiente. Caxias do Sul: Educs, 2009. 223 Segundo Cechin, na visão do economista Nicholas Georgescu-Roegen “[...] A natureza é a única limitante do

processo econômico [...]”. CECHIN, André. A natureza como limite da economia: a contribuição de Nicholas

Georgescu-Roegen. São Paulo: Senac São Paulo/Edusp, 2010, p. 13. 224 Gudynas, quebra as lanças contra o antropocentrismo “[...] Un sistema que impone una valoración que es

extrínseca y que solo puede ser otorgada por los humanos. Valores que, hay que decirlo, en la actual

civilización dominante, la capitalista, se devivan, sobre todo, de las demandas del capital. Así, una planta, um

animal, una cascada, los minerales, el petróleo o los bosques no poseen valores en sí mismos o proprios, sino

que sus atributos les son otogados por las personas. Este es un punto crucial. El manejo utilitarista de la

naturaleza es uno de los componentes articuladores al modelo de desarrollo al que le es necessaria la

apropiación de los recursos naturales, para sostener el crescimiento económico. Y este es outro de los

elementos de disputa. [...]”. GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas

ambientales. p. 13.

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todos os seres vivos que a compõem e dos recursos naturais, por meio do pensamento

biocêntrico.

Existe nesse raciocínio, a necessidade de manter as bases da economia mundial por meio

da exploração de todos os recursos disponíveis sendo esses imprescindíveis. A crise

ambiental225 gera desequilíbrio entre a produção de bens de consumo e a preservação ambiental,

figura em todos os campos. Nesse momento, percebe-se a necessidade de proteção mais

significativa em defesa da biodiversidade, dos ecossistemas, da Terra.

As atividades econômicas, cada vez mais necessárias pela sociedade, acarretam na

exploração desfreada da Natureza, resultando na produção de toneladas de lixo diariamente.226

Esses resíduos voltam à Natureza na forma de poluentes, contaminadores e esterilizadores da

vida, que deixam o rastro da passagem no Homem na Terra.

Nesse contexto, o Contrato Social não consegue regular as relações que outrora

efetivamente fazia, a visão antropocêntrica deixa de ser absoluta, e a Natureza não é mais

compreendida como simples bem de consumo a ser explorada. As Nações e as sociedades

passam por alterações227 que refletem diretamente essa nova relação contratual, o novo

paradigma entre Homem e Natureza, bem como, os mecanismos responsáveis dos processos

produtivos.

O Contrato Natural, surge como meio de estabelecer respeito do Homem para com a

Natureza. A Razão Instrumental228 cede espaço para a Razão Sensível229 com o objetivo de

225 Leff, ao abordar a Crise Ambiental, menciona que “[...] À crise de recursos deslocou a natureza do campo de

reflexão filosófica e da contemplação estética para reintegrá-la ao processo econômico. A natureza deixou de

ser um objeto de trabalho e uma matéria-prima para converter-se em uma condição, um potencial e um meio

de produção [...]”. LEFF, Enrique. Racionalidade Ambiental: a reapropriação social da natureza. p. 224. 226 Para Cechin, “[...] Do ponto de vista material, a economia transforma bens materiais valiosos em rejeitos que

não podem ser mais utilizados. Mas isso não significa que a função das atividade econômicas seja a produção

de lixo. [...]”. CECHIN, André. A natureza como limite da economia: a contribuição de Nicholas Georgescu-

Roegen. p. 13. 227 Segundo Lacerda, Rosa e Ferrer, “[...] As alterações que permeiam a sociedade e aos Estados Nacionais são

produtos das constantes mutações e necessidade que surgem com os avanços e as necessidade de

transformações, especialmente no que tange a uma vida melhor e mais saudável para o planeta que igualmente

possibilite a continuidade do desenvolvimento [...]”. LACERDA, Emanuela Cristiane Andrade; ROSA,

Alexandre Morais da; FERRER, Gabriel Real. A propriedade ante o novo paradigma do estado constitucional

moderno: A sustentabilidade. Revista Novos Estudos Jurídicos – Eletrônica. p. 1203/1204. 228 Representa “[...] o tipo de racionalidade a que recorremos quando ponderamos a aplicação dos meios mais

simples para chegar a um dado fim. A máxima eficiência, a melhor ratio custo-produção, é a medida do

sucesso”. TAYLOR, Charles. A ética da autenticidade. Tradução de Luís Lóia. Lisboa: Edições 70, 2009, p.

20. 229 Nas palavras de Maffesoli, "[...] Trata-se de algo que permanece ou, melhor, preexiste no coração de todo

homem antes de qualquer construção intelectual. É propriamente isto que chamarei 'razão interna' de todas as

coisas. Razão esta que é tanto uma constante, de certo modo uma estrutura antropológica, quanto, ao mesmo

tempo, só se atualiza, se realiza, neste ou naquele momento particular. Para dizer o mesmo em outras palavras,

trata-se de uma racionalidade de fundo que se exprime em pequenas razões momentâneas". MAFFESOLI,

Michel. Elogio da razão sensível. Tradução de Albert Christophe Migueis Stuckenbruck. 4. ed. Petrópolis,

(RJ): Vozes, 2008, p. 58.

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concretizar mecanismos para regulamentar a relação entre seres humanos e o mundo natural,

firmados na busca do equilíbrio desta relação, bem como, meios de superar essa visão de

dominação,230 de violência, de depredação da vida comum.

Entre os fundamentos apresentados, existem alguns pontos231 importantes na evolução

da dimensão do antropocentrismo para a dimensão do biocentrismo, que passam pelo

compreensão de que o Homem não está sozinho, que a Natureza pode ser degrada pela ação

humana, e que o Homem não domina a Natureza, e deve buscar a convivência pacífica. Pois as

atitudes dos indivíduos devem refletir a problemática ambiental232 vivenciada e objetivar, por

meio de atitudes racionais, a proteção da Natureza.

As ações humanas233 afetaram o equilíbrio necessário para a vida na Terra. E de certa

forma, as consequências das explorações – cada vez maiores – dos recursos naturais, por parte

do Homem, contribuem para as mudanças ambientais globais. Os impactos dessas mudanças

ameaçam a economia, afetam drasticamente a todo Ecossistema, ao ponto de ser discutível a

sustentabilidade do planeta como a casa da Humanidade.

Fato importante a ser destacado no Contrato Natural, é o posicionamento do filósofo

Serres, por meio, de como deve ser a relação Homem e Natureza, sem ter por base a dominação

mas, a forma Simbiótica234, para que por meio da reciprocidade a Natureza se torne Sujeito

detentor de Direitos.

230 Segundo, Leite e Ayala, “[...] A ideia do passado, enraizada entre nós, de que o homem domina e submete a

natureza à exploração ilimitada, perdeu seu fundamento[...]” sendo que para os autores “[...] A tendência atual

é evoluir-se em um panorama muito menos antropocêntrico, em que a proteção da natureza, pelos valores que

representa em si mesma, mereça um substancial incremento [...]”. LEITE, José Rubens Morato; AYALA,

Patryck de Araújo. Direito ambiental na sociedade de risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p.

46. 231 No debate sobre a necessidade de interação do Biocentrismo e o Antropocentrismo, Leite e Ayala, apontam

algumas preocupações centrais que o antropocentrismo deve seguir para como a Natureza “[...] 1. o ser humano

pertence a um todo maior, que é complexo, articulado e interdependente; 2. a natureza é finita e pode ser

degradada pela utilização perdulária de seus recursos naturais; 3. o ser humano não domina a natureza, mas

tem de buscar caminhos para uma convivência pacífica entre ela e sua produção, sob pena de extermínio da

espécie humana [...]”. LEITE, José Rubens Morato; AYALA, Patryck de Araújo. Direito ambiental na

sociedade de risco. p. 45. 232 Para Leff, “[...] A problemática ambiental abriu um processo de transformação do conhecimento, expondo a

necessidade de gerar um método de pensar de forma integrada e multivalente os problemas globais e

complexos, assim como a articulação de processos de diferentes ordem de materialidade [...]”. LEFF, Enrique.

Saber Ambiental: Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. p. 56. 233 Segundo Leff, “[...] a superexploração dos ecossistemas, que o processos produtivos mantinham sob silêncio,

desencadeou uma força destrutiva que em seus efeitos sinérgicos e acumulativos gera as mudanças globais que

ameaçam a estabilidade e sustentabilidade do planeta [...]” para o autor “[...] o impacto dessas mudanças

ambientais na ordem ecológica e social do mundo ameaça a economia como um câncer generalizado e

incontrolável, mas grave ainda do que as crises cíclicas do capital [...]”. LEFF, Enrique. Saber Ambiental:

Sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. p. 56. 234 Para Serres, “[...] o direito de simbiose define-se pela reciprocidade: aquilo que a natureza dá ao homem é o

que este lhe deve dar a ela, tornada sujeito de direito [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 66.

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Nesse cenário, reconhecer a Natureza como sujeito, detentor de direito, é o foco dos

debates em diversos países Sul-Americanos, com grande expressão nos latino-americanos, que

por meio de alterações nas normas constitucionais pátrias, encaram os ideais de convívio com

a Natureza de forma mais sadia e equilibrada.

Essa deixa de ser o que se demonstrou ao longo deste estudo: um patrimônio, uma

“coisa”, um bem de consumo a ser explorado infinitamente para se satisfazer as demandas de

uma economia na qual tem como métrica de satisfação um crescimento infinito.

Por meio do Novo Constitucionalismo Democrático Latino-americano,235 esses países

buscam reorganizar e revisar modelos jurídicos e democráticos existentes, como se observa

pelas Constituições236 do Brasil, Colômbia, Bolívia, Venezuela, Equador entre outras nações,

que vislumbram maior participação popular.

Nessa linha, o momento de efetivação da Teoria do Novo Constitucionalismo latino-

americano busca na participação popular e na legitimidade do povo, por meio do processo

constituinte fazer as alterações constitucionais,237 superando o Constitucionalismo marcante

das nações da América do Sul.

A concretização da Teoria do Novo Constitucionalismo Democrático Latino-americano,

passa pelo Contrato Natural, entendido como mecanismo capaz de estabelecer maior respeito

pela Natureza, capaz de estabelecer o equilíbrio entre o Homem e a Natureza, embasado no

respeito para com os seres não-humanos e os recursos naturais. E assim, a Natureza deve ser

vista pela sociedade, não mais como bem a ser explorado indiscriminadamente, mas como um

sujeito detentor de direito, e merecedor de respeito.

O reconhecimento da Natureza se concretiza na expressão de “ser próprio”, que se

encontra presente em países andinos, onde a compreensão harmoniosa pela terra está presente

235 Segundo Tárrega e Lemes, “[...] A América Latina buscando em muitas territorialidade a reorganização

política, muitas de cunho popular, instaurada a revisão dos modelos democráticos, numa proposta experimental

a que se tem denominado Novo Constitucionalismo Democrático Latino-americano [...]”. TÁRREGA, Maria

Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo democrático latino-

americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes Augusto; HILÁRIO,

Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de Portugal: Movimentos,

Direitos e Instituições. p. 339. 236 Segundo Tárrega e Lemes, “[...] Elas são os documentos fundantes para as novas teorias e para o estudo do

novo constitucionalismo que se associa a ativismos em favor da implantação de modelos mais participativos

[...]”. TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo

democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes

Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de

Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 339. 237 Conforme Brandão, ao abordar a Teoria do Novo Constitucionalismo sobre a percepção de Roberto Vicino

Pastor e Rubén Martínez Dalmau, aponta que a Teoria “[...] ostenta como preocupação central a legitimidade

democrática da Constituição, garantindo a participação política – de forma que só a soberania popular pode

determinar a alteração Constitucional [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-

americano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 13.

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no modo de vida da população, por meio da filosofia do “Buen Vivir”238 e do reconhecimento

da Terra como mãe de toda a vida.

O referido contrato entre o Homem com o Mundo Natural, tem por meio do Tratado

Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas - UNASUL, a forma de efetivar a proteção239

de todos os seres vivos nos seus ecossistemas naturais e os recursos naturais. E a UNASUL

representa esse espírito, ao proporcionar a disseminação da postura dos povos andinos.

Os ideais presente na filosofia andina do “Buen Vivir”240, buscam a vida integrada dos

seres que habitam o planeta. O seu modo de vida, ligados diretamente aos produtos provenientes

do ceio da terra, faz com esses povos, permaneçam no equilíbrio Homem-recursos-Natureza,

sem opressão e escravidão dos recursos naturais.

Nessa linha de pensamento, cabe destacar que o Contato Natural apresentado por Serres

é a expressão de uma Utopia, que busca a concretização, sem deixar de levar em consideração

para a materialização do contrato, que o mundo “gira” sob processos econômicos. Assim, o

pensamento biocêntrico, de proteção da Natureza, entra em choque com os ideias

antropocêntricos de exploração econômica.

Para tanto, os ideais de equilíbrio entre Homem e Natureza presentes no Contrato

Natural, encontram na crise da civilização, meios de implementação dos ideias no modo de vida

da sociedade. A maneira de utilização e exploração dos recursos naturais, o consumo de forma

consciente, e principalmente as mudanças comportamentais, são algumas alternativas a serem

seguidas pela sociedade.

238 Segundo Aquino, “[...] Dentre os povos sul-americanos, os andinos estão em maior sintonia com a Natureza e

possibilitam o cumprimento desinteressado e amoroso [...]” do Contrato Natural qual possibilita compreender

a Natureza como ‘ser próprio’ “[...] afim de acolher todos os seres vivos. Essa filosofia é denominada como

Buen Vivir [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado

constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 208. Grifo original da obra

em estudo. 239 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, busca o equilíbrio com a Natureza, mencionando

em seu art. 3º alínea “g” que “[...] A União de Nações Sul-americanas tem como objetivos específicos: g) a

proteção da biodiversidade, dos recursos hídricos e dos ecossistemas, assim como a cooperação na prevenção

das catástrofes e na luta contra as causas e os efeitos da mudança climática [...]”. UNASUL. União das Nações

Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de

Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016. 240 Segundo Aquino, “[...] Viver e conviver, nessa linha de pensamentos são as estratégias nas quais se perpetuam

os diálogos entre a trindade indivíduo-sociedade-espécie e a terra descritos, microscopicamente, na América

do Sul. Essa é busca pelo equilíbrio e harmonia naquilo que se torna fundamental, comum ao bem-viver de

todos com tudo [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado

constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 208.

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Ponto importante nos debates sobre a mudança do modo de vida das sociedades frente

a Natureza, está ligado ao que apresenta Gudynas241, sobre o grande volume de informações e

os alertar dos impactos ambientais e consequente perda da biodiversidade, que o problemático

modo de vida causa e acarreta em diversos setores da sociedade nas últimas décadas.

O resultado almejado das uniões de esforços de diferentes nações, as quais buscam

nessas integrações, meios de ampliar o crescimento econômico, concomitantemente com a

proteção e preservação dos seus recursos naturais, e assim, estabelecer o reencontro do homem

com a Natureza.

Por esse motivo, o Contrato Natural aparece como complemento àquilo que foi iniciado

pelos ideais do Contrato Social e que, hoje, não consegue estabilizar essa relação sem insistir,

mesmo que com outros enunciados, na sua permanente e insaciável exploração.

A materialização242 do referido Contrato, se encontra por meio dos objetivos

determinados na UNASUL, bem como, pelos preceitos da Filosofia Andina do Buen Vivir. O

Contrato Natural diante desse contexto, passa a ser uma Utopia concretizada, pelos ideais de

integração dos países sul-americanos, por meio da UNASUL, e as recentes Constituições Sul-

Americanas representam esse espírito.

Verifica-se que um ponto importante e essencial para o reconhecimento da Natureza

como sujeito de direito, e não mais um objeto a ser explorado pela vontade humana. A filosofia

do Sumak Kawsay, Pacha Mama e do Buen Vivir dos povos andinos, espelha o reconhecimento

almejado do Homem para a Natureza, por meio do elemento essencial para a conceder os ideias.

Nesse caso, o posicionamento de reconhecimento, é essencial como afirma Serre, que haja o

Amor243como elo de ligação, pois sem este não há união.

Para a concretização dos ideais de reconhecimento da Natureza como “ser próprio”,

“Sujeito”, “detentor de direitos”, como um dos primados da Teoria do Novo Constitucionalismo

241 Segundo Gudynas “[...] En las útlimas décadas se ha acumulado un enorme volumen de información que alerta

sobre lo serios impactos ambientales y la perdida de biodiversidad em todo el planeta. A su vez, esta

problemática se hace cada vez más evidente para amplios sectores ciudadanos [...]”. GUDYNAS, Eduardo.

Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. p. 23. 242 De acordo com Aquino “[...] Sem a UNASUL, o Contrato Natural não se apresenta como opção aperfeiçoada

do projeto racionalista e antropocêntrico no Contrato Social [...]” sendo que para o autor “[...] O Contrato

Natural não é uma abstração vazia, uma ideia sem sentido, ao contrário, representa o devir para uma época

saturada das ‘promessas de amante’ enunciadas pelos seres humanos e para apenas seres humanos. O Contrato

Natural é essa aposta no improvável, numa Utopia Concreta que, pouco a pouco e silenciosamente, se manifesta

na vida de todos dos dias [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes de. Do contra social ao Contrato Natural:

o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André Karam;

ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.). Direito, democracia e sustentabilidade:

anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade. p. 209/210. 243 Segundo Serres, “[...] Não existe nada de mais real do que o amor, que é a única lei [...]”. SERRES, Michel. O

Contrato Natural. p. 82.

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latino-americano, são necessários debates sobre essa temática nas esferas que compõem a

integração entre as nações.

No ideal de reconhecimento, devem ser desconstruídas244 as posturas antropocêntricas,

as culturas de possessão e exploração. E da mesma forma, alterações nas políticas públicas

mundiais, e incorporação do reconhecimento nos ordenamentos jurídicos pátrios acerca da

preservação da biodiversidade.

Nessa linha de pensamento, alguns países da América do Sul em maior relevância os

Latino-americanos, nas últimas décadas promoveram alterações em suas Constituições245, para

introduzir o reconhecimento de novos Direitos Fundamentais, dentre os quais, a Natureza, como

um bem ambiental246 bem como, por meio dos ideias biocêntricos, a compreensão como sujeito

de direitos.

Sendo que esses modelos de Novo Constitucionalismo Democrático Latino-americano,

configuram com fins de garantir o reconhecimento de novos sujeitos, que passam por intensos

processos de inclusão247de reconhecimento, e de emancipação. Tendo a participação popular

fator determinante para concretização.

Dos países Sul Americanos, o Brasil ao instituir um Estado Democrático, por meio do

processo constituinte de 1988, obteve resultados satisfatórios248, no que tange a garantias da

ordem democrática, o reconhecimento de direitos coletivos e plurais, bem como, dos Direitos

Fundamentais, ambos fundamentados na Constituição da República Federativa do Brasil.

244 Para Gudynas, “[...] La liberación de la naturaleza de esta condición de sujeito sin derechos o de seimple

objeto de propriedad, exigió y exige, un esfuerzo político que le reconozca como sujeito de derechos. [...]”.

GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. p. 13. 245 Segundo Tárrega e Lemes, “[...] Em países latino-amaericanos, nas três últimas décadas foram promulgadas

constituições mais democráticas, e num modelo analítico, permeado de direitos e sujeitos. Elas são os

documentos fundantes para as novas teorias e para o estudo do novo constitucionalismo que se associa a

ativismos em favor da implantação de modelos mais participativos [...]”. TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte

Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo democrático latino-americano e os novos

sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves.

Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p.

339. 246 Segundo Canotilho e Leite ao tratarem do Direito Ambiental, destacam que “[...] Olhando em volta, é seguro

dizer que a constitucionalização do ambiente é uma irresistível tendência internacional [...]”. CANOTILHO,

José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 87. 247 Para Tárrega e Lemes, “[...] Os sujeitos de direito, nesses modelos ainda continuam num intenso processo de

demanda pro inclusão e emancipação [...]”. TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor

Martins. O novo constitucionalismo democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER,

Gisela Maria; COSTA Hermes Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia

a partir do Brasil e de Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 344. 248 Conforme Brandão, “[...] o resultado do processo constituinte de 1988 foi satisfatório em vários aspectos,

notadamente, na garantia da ordem democrática e dos direitos fundamentais que iniciou uma nova

institucionalização de nossa recente democracia [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo

pluralista latino-americano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015. p. 16/17.

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A norma constitucional de 1988 foi a precursora na história do país a tratar da temática

ambiental em um capítulo próprio que trata exclusivamente do Meio Ambiente. Em especial

destaque-se o artigo 225,249 que preceitua as diretrizes da preservação e do direito a todos de

viver em um ambiente ecologicamente equilibrado. No entanto, as suas bases utilizam da

postura antropocêntrica alargada para estabelecer as condutas e interações Homem-Natureza.

Contudo, a Constituição pátria foi escrita sobre o fórmula estritamente antropocêntrico

para estabelecer as condutas e interações Homem-Natureza, e na atualidade não segue a

tendência de alguns países latino-americanos, que por meio do Contrato Natural e dos ideais

biocêntricos250, alteraram suas Constituições, para promover a Natureza como Sujeito de

Direitos.

Alguns países latino-americanos reformularam suas Constituições251 com o objetivo de

estabelecer um equilíbrio entre as relações humanas com a Natureza, e assim, instituir o

reconhecimento, nas Normas Constitucionais, da Natureza como sujeito de direitos, por

intermédio de uma maior participação popular.

Nesse países Latino-Americanos, com ênfase no Equador e na Bolívia pretendeu-se com

a reformulação constitucional, um constitucionalismo plurinacional comunitário252 onde a

participação popular teve grande importância nas alterações, com destaque as organizações dos

povos indígenas253, os quais possuem forte ligação com a terra, e por intermédio de filosofias

ligadas ao respeito e a busca da convivência harmoniosa com a Natureza.

249 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá- lo para as presentes e futuras gerações. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>.

Acesso em 26 jul. de 2016. 250 Segundo Canotilho e Leite, “[...] A constitucionalização do ambiente emerge nos primeiros momentos, em

fórmulas estritamente antropocêntricas, espécie de componente mais amplo da vida e dignidade humana; só

mais tarde, componentes biocêntricos são borrifados no texto constitucional ou na leitura que deles se faça

[...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental

brasileiro. p. 90. 251 TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo

democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes

Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de

Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 339. 252 Na abordagem sobre o novo constitucionalismo do Equador e da Bolívia Tárrega e Lemes, apontam que nesses

países pretende-se “[...] um constitucionalismo plurinacional comunitário, identificado com um modelo não

universal e único de Estado de Direito, reconhecedor da coexistência de experiências de sociedades

interculturais (sejam indígenas, comunais, urbanas e camponesas) e com práticas de pluralismo igualitário

jurisdicional [...]”. TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo

constitucionalismo democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria;

COSTA Hermes Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do

Brasil e de Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 344. 253 Brandão ao apresentar as características do novo movimento latino-americano, insere que tais, “[...] são

resultados da organização dos movimentos indígenas nesses países e da positivação do Sumak Kawsay e da

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Como ocorre no Equador, onde há ligação do povo com a mãe Terra, com o

posicionamento do Sumak Kawsay254 da Pacha Mama e do Buen Vivir, que se faz presente na

Constituição255 equatoriana de 2008. E assim, o povo discute acerca da forma capitalista de

crescimento e desenvolvimento do país, bem como, a formatação das constituições.

Nessa linha de pensamento, o almejado reconhecimento da Natureza como sujeito de

direito, passa pela integração dos ideais abordados no Contrato Natural aos desdobramentos

Constitucionais dos países sul-americanos, por meio da Teoria do Novo Constitucionalismo

latino-americano.

Assim, para que haja a concretização dos ideais de reconhecimento da Natureza como

“ser próprio”, é de suma importância que ocorram debates sobre a temática ambiental, tanto na

esfera interna nacional, como na esfera externa, entre as nações integrantes de Grupos ou

Blocos, ou signatárias de Acordos e Tratados, como ocorre entre as nações pertencentes a

UNASUL, que desempenha papel crucial na América do Sul.

3.2. Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas – UNASUL

A América do Sul – América Latina – é composta por diversos países, onde cada nação

possui uma vasta cultura, arraigada em tradições e costumes que perduram no decorrer de

séculos256. Cada Estado-nação (províncias) tem sua estruturação econômica ligada as

características produtivas, cadeia econômica e riquezas da sua terra.

Por vezes, um único país não apresenta características de força econômica e política

para externar seus interesses frente a outros países, mesmo sendo vizinhos, parceiros

econômicos ou potências mundiais. Assim, para obterem maior visibilidade internacional, são

necessárias uniões entre nações.

Pachamama, que questiona o crescimento capitalista baseado no desenvolvimento [...]”. BRANDÃO, Pedro.

O novo constitucionalismo pluralista latino-americano. p. 48. 254 A Constituição do Equador preceitua no preâmbulo “[...] CELEBRANDO a la naturaleza, la Pacha Mama, de

la que somos parte y que es vital para nuestra existencia [...]” da mesma forma que trás “[...] Una nueva forma

de convivencia ciudadana, en diversidad y armonía con la naturaleza, para alcanzar el buen vivir, el sumak

Kawsay [...]”. ECUADOR. Constitución de la República del Ecuador de 2008. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 27 jul. 2016. 255 Segundo Brandão, “[...] a Constituição equatoriana, em seu preâmbulo já anuncia uma nova forma de

convivência cidadã, em harmonia com a natureza, para alcançar o Samuk Kawsay. Posteriormente, reconhece

o direito a um ambiente saudável e ecologicamente equilibrado, que garante o Buen Vivir (art.14) [...]”.

BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-americano. p. 151. 256 De acordo com Oliveira “[...] A América Latina é um continente marcado pela pré-existência de diversos povos

indígenas, com diferentes graus de culturas e conhecimento [...]”. OLIVEIRA, Rodrigo Rios Faria de. Unasul:

sua implementação. São Paulo, Baraúna, 2014. p. 43.

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Diversos são os processos de aproximação e integração entre as nações, pertencentes a

uma mesma região geográfica, bloco econômico ou importância no cenário mundial. Na

América Latina257, o processo de integração, mesmo não sendo considerado novo, se caracteriza

como um dos mais dinâmicos ligado ao desenvolvimento econômico da região.

Para se formalizar as intenções entre nações Sul-americanas, são elaborados Protocolos,

Acordos, Tratados que visam preceituar todos os interesses mútuos dos países membros de

determinado grupo, para que haja a ratificação dos objetos acordados como necessários para

que o grupo obtenha os ideais almejados com essa união.

Por intermédio de interesse de algumas nações Sul-americanas, surgiram diversos

tratados de ratificação de interesses, nas mais diversas áreas. Na Comunidade Andina, ocorreu

o Pacto Andino – Acordo de Cartagena258 – em 1969 tendo como membros signatários, Bolívia,

Equador, Colômbia e Peru, a Venezuela259 tendo entrado em 1973, e o Chile em 1977.

O Acordo de Cartagena260, em seu artigo 1º apresenta como objetivo principal fortalecer

a integração das nações andinas, fundada nos princípios da igualdade, justiça, paz, solidariedade

e democracia, além de diversos acordos firmados, nas áreas do comércio, política, e economia.

A Comunidade Andina na busca para atender o acordo firmado, conjugou esforços de

integração, cujos avanços ocorreram na integração dos países, desde a estruturação da Corte

Andina de Justiça, ao Conselho Andino de Ministros das Relações Exteriores. No ano de 1996,

assinou-se o Acordo de Trujillo, que criou a Comunidade Andina de Nações261, e que ampliou

os objetivos acordados anteriormente.

257 Segundo Cesar, na América Latina “[...] la integración ha representado un movimineto sócio-político de los

países más dinámicos de la región han utilizado para fortalecerse y superar los retos y obstáculos. Auque el

sueño de la integración de América Latina no sea algo nuevo, estuso siempre presente em la historia de la

región, teniendo siempre como una fuerza impulsora em su desarrollo económico [...]”. CESAR, Raquel

Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración latino-americano. In: CADEMARTORI, Daniela Mesquita

Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción jurídica de la Unasur. Florianópolis: GEDAI/UFSC, 2013. p.

21. 258 COMUNIDAD ANDINA. Acuerdo de Integracion Subregional Andino (Acuerdo De Cartagena)

Disponível em: <http://www.comunidadandina.org/Normativa.aspx?link=TP>. Acesso em: 10 set. de 2016. 259 A Comunidade Andina de Nações, sempre manteve a formação originária, e segundo Cesar “[...] Venezuela,

que dejó a la Comunidade para unirse al Mercado Común del Sur – MERCOSUR, em 2006 [...]”. CESAR,

Raquel Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración latino-americano. In: CADEMARTORI, Daniela

Mesquita Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción jurídica de la Unasur. p. 26. 260 O art. 1 do Acordo de Cartagena, visa “[...] El presente Acuerdo tiene por objetivos promover el desarrollo

equilibrado y armónico de los Países Miembros en condiciones de equidad, mediante la integración y la

cooperación económica y social; acelerar su crecimiento y la generación de ocupación; facilitar su

participación en el proceso de integración regional, con miras a la formación gradual de un mercado común

latinoamericano [...]”. COMUNIDAD ANDINA. Acuerdo de Integracion Subregional Andino (Acuerdo

De Cartagena) Disponível em: <http://www.comunidadandina.org/Normativa.aspx?link=TP>. Acesso em: 10

set. de 2016. 261 Segundo Cesar, a estruturação do Pacto Andino passa pela “[...] estruturación del Pacto Andino, la creación

del Tribunal Andino de Justicia, el Parlamento Andino y el Consejo Andino de Ministros de Relaciones

Exteriores jugaron um papel decisivo [...]” sendo que após os avanços de integração entre os países em “[...]

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Nessa linha de pensamento, por intermédio das evoluções dos acontecimentos no

cenário internacional, ocorreu a constituição do Mercado Comum do Sul262 - Mercosul263. A

partir de 1991, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, constituem esse bloco para fins de alinhar

os objetivos comuns econômicos. A Venezuela, após sair do Comunidade Andina, ingressa

como membro em 2006 ao Mercosul. Observa-se que as nações associadas ao Mercosul, eram

aquelas que integravam a Comunidade Andina.

O Mercosul tem por objetivo conforme artigo 1º. do Tratado de Assunção264, da livre

circulação de bens, serviços e produtos, bem como, mercadorias entre os países, além de

propiciar tarifas externas e políticas externas comuns, e a coordenação de políticas

macroeconômicas e setoriais entre os membros. A partir da assinatura do Protocolo de Ouro

Preto, em seu artigo 34 o Mercosul passou a ter personalidade jurídica de Direito

Internacional265.

1996 fue firmado el Acordo de Trujillo, que creó la Comunidad Andina de Naciones, modificándose, de esa

forma, el Acuerdo de Cartagena [...]”. CESAR, Raquel Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración

latino-americano. In: CADEMARTORI, Daniela Mesquita Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción

jurídica de la Unasur. p. 25. 262 De acordo com Cesar “[...] El Mercado Común del Sur surge em el contexto de la evolución de los

acontecimentos internacionales, en particular, la consalidación de grandes espacios económicos, lo que

provocó la importancia de lograr una adecuada inserción internacional para los países de economia más débil

[...]”. CESAR, Raquel Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración latino-americano. In:

CADEMARTORI, Daniela Mesquita Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción jurídica de la Unasur. p.

29. 263 Por meio do Tratado de Assunção, os países membros acordaram conforme preceitua o art. 1. “[...] Los Estados

Partes deciden constituir um Mercado Común, que deberá estar conformado al 31 de diciembre de 1994, el

que se denominará ‘Mercado Común del Sur’ (MERCOSUR) [...]”. MERCOSUR. Mercado Común del Sur.

Tratado para la Constitución de um Mercado Común entre La Republica Argentina, La Republica Federativa

del Brasil, La República del Paraguay y La República Oriental del Uruguai. Disponível em:

<http://www.mercosur.int/innovaportal/v/4054/2/innova.front/textos-fundacionales>. Acesso em: 04 set. de

2016. 264 Art 1. Este Mercado Común implica: -La libre circulación de bienes, servicios y factores productivos entre los

países, a través, entre otros, de la eliminación de los derechos aduaneros y restricciones no arancelarias a la

circulación de mercaderías y de cualquier otra medida equivalente; -El establecimiento de un arancel externo

común y la adopción de una política comercial común con relación a terceros Estados o agrupaciones de

Estados y la coordinación de posiciones en foros económico comerciales regionales e internacionales; -La

coordinación de políticas macroeconómicas y sectoriales entre los Estados Partes: de comercio exterior,

agrícola, industrial, fiscal, monetaria, cambiaria y de capitales, de servicios, aduanera, de transportes y

comunicaciones y otras que se acuerden, a fin de asegurar condiciones adecuadas de competencia entre los

Estados Partes; -El compromiso de los Estados Partes de armonizar sus legislaciones en las áreas pertinentes,

para lograr el fortalecimiento del proceso de integración. MERCOSUR. Mercado Común del Sur. Tratado

para la Constitución de um Mercado Común entre La Republica Argentina, La Republica Federativa del

Brasil, La República del Paraguay y La República Oriental del Uruguai. Disponível em:

<http://www.mercosur.int/innovaportal/v/4054/2/innova.front/textos-fundacionales>. Acesso em: 04 set. de

2016. 265 MERCOSUR. Mercado Común del Sur. Tratado para la Constitución de um Mercado Común entre La

Republica Argentina, La Republica Federativa del Brasil, La República del Paraguay y La República Oriental

del Uruguai. Disponível em: <http://www.mercosur.int/innovaportal/v/4054/2/innova.front/textos-

fundacionales>. Acesso em: 04 set. de 2016.

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Com objetivos maiores do que somente Zona de livre comércio, circulação de pessoas

e mercadorias, alguns países sul-americanos, incluindo as nações pertencentes ao Mercosul e a

Comunidade Andina de Nações, almejavam sobre a influência do sucesso da União Européia266,

a união de todas as nações do continente sul-americano, nos diversos campos, e dessa forma,

surgiu a Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA), que posteriormente recebeu a

denominação de União de Nações Sul-Americanas – UNASUL.

A partir dessas condições a UNASUL foi criada com objetivos gerais consoantes no

artigo. 2°267 do Tratado Constitutivo, almejando construir de forma participativa um espaço de

integração entres as Nações sul-americanas, para eliminar a desigualdade socioeconômica,

concretizar a inclusão social a participação da população, e fortalecer a democracia.

Tendo como nações membros268 a República Argentina, Estado Plurinacional de

Bolivia, República Federativa del Brasil, República de Chile, República de Colombia,

República del Ecuador, República Cooperativa de Guyana, República del Paraguay, República

del Perú, República de Suriname, República Oriental del Uruguay, República Bolivariana de

Venezuela.

A criação da UNASUL269, se caracteriza de forma específica pela constituição de uma

identidade e cidadania sul-americana, para desenvolver um espaço regional integrado em

diversos campos, como da política, econômica, social, cultural, e ambiental, bem como, nas

áreas de energia e de infra-estrutura. A dimensão funcional da UNASUL, se caracteriza pela

base política-institucional da Comunidade Andina de Nações270.

266 Segundo Cesar “[...] Bajo la inluencia del éxito de la UE, hubo el surgimento de ideias y propuestas para

llevar a cabo la integración más allá del campo económico, promocionado también la integración ne la

política social, y cultural. La maduración de estas ideas dieron origen a la Comunidad Sudamericana de

Naciones (CSN o CASA), que más tarde se llamó la Unión de Naciones Suramericanas - UNASUR [...]”.

CESAR, Raquel Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración latino-americano. In: CADEMARTORI,

Daniela Mesquita Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción jurídica de la Unasur. p. 32. 267 UNASUL. União das Nações Sul-americanas. Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o

Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008.

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso

em: 04 jul. de 2016. 268 UNASUR. Unión de Naciones Suramericanas. Disponível em: <http://www.unasursg.org/es/estados-

miembros/> Acesso em: 10 set. de 2016. 269 O Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, almeja AFIRMANDO sua determinação de

construir uma identidade e cidadania sul-americanas e desenvolver um espaço regional integrado no âmbito

político, econômico, social, cultural, ambiental, energético e de infra-estrutura, para contribuir para o

fortalecimento da unidade da América Latina e Caribe. UNASUL. União das Nações Sul-americanas.

Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-

Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 04 jul. de

2016. 270 CESAR, Raquel Coelho Lenz. UNASUR y el proceso de integración latino-americano. In: CADEMARTORI,

Daniela Mesquita Leutchuk de. et al. (Org.). La construcción jurídica de la Unasur. p. 26.

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Nessa linha de pensamento, alguns temas se apresentam como de maior relevância na

abordagem do Tratado da UNASUL, frente às problemáticas presentes nas nações membros,

que são referentes especialmente, aos desafios populacionais. Os temas sociais que mais se

debatem nesses espaços são as culturas presentes na União, a economia, o comércio, e ao Meio

Ambiente/Natureza. Nesse caso, abordam-se, com mais profundidade, os temas referentes a

população e Natureza271.

A taxa de crescimento populacional, se torna um ponto central de articulação social e

políticas, pois a UNASUL se faz presente em uma das regiões mais urbanizadas do mundo,

localizada na América Latina e Caribe. As nações membros da UNASUL no ano de 2015272

concentravam juntas 412.296.000 habitantes, o que representa 65% (sessenta e cinco por cento)

da população da América Latina.

Mesmo que os países da União de Nações Sul-Americanas, possuam juntos uma

significativa expressão populacional, e que atualmente está em ascensão, ocorre a preocupação

com relação a estruturação demográfica e o crescimento médio anual das populações273, a qual

resulta em um decréscimo populacional no decorrer das décadas.

Correlata a questão populacional abordada, Serres274, aborda no Contrato Natural

preocupação semelhante sobre a densidade demográfica, dos seres humanos de todos os cantos

da Terra, e os impactos que essa gama populacional acarreta ao equilíbrio Homem - Natureza.

271 Ambos os temas, população e Natureza, Michel Serres, aborda em sua obra O Contrato Natural, onde o filósofo

apresenta que seres humanos constituem de forma conjunta em suas relações, de proporções a serem

comparadas a “[...] os subconjuntos gigantes, oceanos, desertos, atmosfera ou bancos de gelo, é a nova

correlação dessas novas camadas de homens [...]”, e dessa ocupação a humanidade contribui para o

desequilíbrio entre homem e Natureza. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 39. 272 Segundo Oviedo a UNASUL representa “[...] En conjunto, la población de los países que conforman la Unión

de Naciones Suramericanas (UNASUR) es de 412.296.000 habitantes a 2015, que representan el 65% de la

población de América Latina [...]” da mesma forma que “[...] Asimismo, la UNASUR es una de las regiones

más urbanizadas del mundo y en ella se localizan seis de las ocho ciudades de más de 4 millones de habitantes

con que cuenta América Latina y el Caribe [...]”. OVIEDO, Enrique et. al (org.). UNASUR. Un espacio de

cooperación e integración para el desarrollo. Santiago: Comissão Económica das Nações Unidas para a

América Latina eo Caribe (CEPAL), 2014, p. 9. Disponível em <http://www.unasursg.org/es/publicaciones-

unasur> Acesso em: 10 set. de 2016. 273 Ao abordar a Dinâmica e Estruturação demográfica, Oviedo apresenta que “[...] El ritmo de incremento de la

población de la UNASUR ha ido disminuyendo con los años. En el período comprendido entre 1950 y 1975,

la UNASUR registró una tasa de crecimiento anual del 2,5%. Sin embargo, para el período comprendido entre

2015 y 2025 se aprecia una reducción de la tasa de crecimiento de la población, que será de un 0,8% anual,

y se espera que se reduzca aun más entre 2025 y 2050, período en que registrará un valor del 0,3% anual

[...]”. OVIEDO, Enrique et. al (org.). UNASUR. Un espacio de cooperación e integración para el desarrollo.

p. 10. Disponível em <http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em: 10 set. de 2016. 274 Nessa linha de pensamento, Serres aborda no Contrato Natural acerca do impacto das grandes concentrações

humanas à Terra “[...] graças ao crescimento e a densas concentrações, acabamos, assim, de ultrapassar uma

dimensão crítica de maneira que, aglutinados, os pontos de Pascal acabaram por formar diversas variedades:

superfícies, volumes e massas [...]” sendo que para o filósofo“[...] Existem agora lagos de homens, agentes

físicos no sistema físico da terra. O homem é uma reserva, a mais forte e unida da natureza. É um ser-em-toda-

a-parte [...]”. SERRES, Michel. O Contrato Natural. p. 36.

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Nos países da UNASUL, concomitantemente surgem outros fatores que estão ligados

diretamente à necessidade de redução populacional, como as taxas de mortalidade e de

fecundidade275, e o envelhecimento276 em geral da população. Essas questões, afetam todas as

nações, mesmo de forma desuniforme, em maior ou menor intensidade.

A temática ambiental, um ponto importante tratado pelas Nações Sul-Americanas em

seu Tratado Constitutivo, onde no artigo. 3º “g”,277 estão presentes os objetivos relacionados à

proteção da biodiversidade, dos recursos hídricos e dos ecossistemas, questões que estão no

cenário mundial como fundamentais a serem solucionadas.

Os países membros da UNASUL, assim como outros países do mundo, enfrentam

problemas ambientais278, das mais diversas formas, que circulam entre exploração de recursos

naturais, a perda da biodiversidade que agrega na fauna, a caça predatória e pesca

indiscriminada, e na flora, os desmatamentos florestais279 ilegais, e extração de subprodutos

florestais, e a exploração e degradação do solo, por atividades extrativistas, e criação de gado.

275 Segundo Oviedo “[...] Ambas variables han influido en estos cambios demográficos, que se han producido con

mayor intensidad en algunos países de la UNASUR. En el quinquenio comprendido entre 1950 y 1955, la tasa

global de fecundidad (TGF) era de 5,5 hijos por mujer; en el quinquenio 2010-2015, la TGF se redujo a 2,2

hijos por mujer. En los próximos 15 años, esta tasa seguirá disminuyendo y se ubicará bajo el nivel de

reemplazo de la población, pues las mujeres tendrán en promedio 2,0 hijos en el quinquenio comprendido

entre 2025 y 2030 [...]”. OVIEDO, Enrique et. al (org.). UNASUR. Un espacio de cooperación e integración

para el desarrollo. p. 10/11. Disponível em <http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em:

10 set. de 2016. 276 De acordo com Oviedo “[...] En la medida en que avanza la transición demográfica y se producen descensos

de la mortalidad, y sobre todo de la fecundidad, se asiste a un proceso paulatino de envejecimiento de la

población. Los países de la UNASUR no han estado ajenos a este proceso de envejecimiento y, si bien hoy

tienen alrededor de un 11,2% de población mayor de 60 años, en 2025 este porcentaje aumentará al 14,6% y

en 2050 será del 24,9%. Además, de los 12 países que la componen, 3 ya se ubicaban en 2010 en una fase

avanzada de envejecimiento: Uruguay (18,4%), Argentina (14,5%) y Chile (13,1%). Se espera que para 2050

los países que actualmente están en una fase más incipiente del envejecimiento superen el 14% de población

de 60 años y más [...]”. OVIEDO, Enrique et. al (org.). UNASUR. Un espacio de cooperación e integración

para el desarrollo. p. 10. Disponível em <http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em: 10

set. de 2016. 277 Conforme o Art 3º alínea “g” o UNASUL busca como um dos seus objetivos “[...] a proteção da biodiversidade,

dos recursos hídricos, e dos ecossistemas, assim como a cooperação da prevenção das catástrofes e na luta

contra as causas e os efeitos da mudança climática [...]”. UNASUL. União das Nações Sul-americanas.

Decreto n.º 7.667 de 11 de janeiro de 2012, promulga o Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-

Americanas, firmado em Brasília em 23 de maio de 2008. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Decreto/D7667.htm>. Acesso em: 10 set. de

2016. 278 Para Oviedo, os problemas ambientais que os países da UNASUL enfrentam “[...] comprometen su capacidade

de sostener el desarrollo, como la pérdida de biodiversidad y de bosques, la sobrexplotación de los recursos

naturales, la degradación de los suelos y el agotamiento de las pesqueiras [...]” OVIEDO, Enrique et. al (org.).

UNASUR. Un espacio de cooperación e integración para el desarrollo. p. 58. Disponível em

<http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em: 10 set. de 2016. 279 A cerca da perda das florestal, Oviedo apresenta que “[...] La pérdida de superficie boscosa es uno de los

mayores problemas ambientales para la sustentabilidad del desarrollo [...]”. OVIEDO, Enrique et. al (org.).

UNASUR. Un espacio de cooperación e integración para el desarrollo. p. 58. Disponível em

<http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em: 10 set. de 2016.

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Esses problemas, também são percebidos nas áreas urbanas desse países, devido a

contribuição dos grandes centros urbanos280, que em todos os países Sul-americanos não

seguiram a planejamentos, crescem desordenadamente e acarretam devido ao modo de vida das

populações, a produção excessiva de resíduos, que contaminam ar, solo, e as águas.

E assim, alguns países Sul-americanos, observaram na realidade regional que mudanças

deveriam ocorrer em suas Constituições, frente a postura para com a Natureza, para que assim,

esta fosse elevada a posição de sujeito, e dessa forma, tendo seus direitos reconhecidos. Pois as

Constituições de diversos países281 do mundo, não apresentavam o respeito a Natureza,

tampouco, seu fundamental reconhecimento.

Nessa linha de pensamento, os países Latino-americanos membros da UNASUL, como

já abordado, nas últimas décadas passaram por momentos de alterações em suas

Constituições282, afim de introduzir novos Direitos Fundamentais, assim como, novos sujeitos

detentores desses direitos, como ocorreu com a Natureza, que de um bem ambiental283 subiu a

condição de “sujeito”, em algumas Constituições, por meio dos ideias biocêntricos e de uma

maior participação popular.

Assim, a postura biocêntrica almeja que a Natureza deve ser preservada e reconhecida,

para tanto, alguns países da América do Sul utilizaram do Tratado Constitutivo da UNASUL,

como meio de introduzir a visão biocêntrica preservacionista, bem como, a elevação da

Natureza como “ser próprio” em seus ordenamentos pátrios, como ocorreu no Equador e na

Bolívia.

280 Oviedo ainda acrescenta que os problemas ambientais, passam “[...] Además, la urbanización acelerada y sin

planificación así como los patrones insostenibles de producción y consumo han incrementado la

contaminación del aire y la producción de basura [...]”.OVIEDO, Enrique et. al (org.). UNASUR. Un espacio

de cooperación e integración para el desarrollo. p. 58. Disponível em

<http://www.unasursg.org/es/publicaciones-unasur> Acesso em: 10 set. de 2016 281 Segundo Brandão “[...] Nos últimos trinta anos, as Constituições ao redor do mundo demonstravam forte

preocupação na manutenção do status quo e desrespeito à natureza e ao ecossistema [...]”. BRANDÃO, Pedro.

O novo constitucionalismo pluralista latino-americano. p. 46. 282 TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo

democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes

Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de

Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 339. 283 CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental

brasileiro. p. 87.

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3.3. As Constituições do Brasil e do Equador, segundo o entendimento da Natureza como

Sujeito de Direito

Na caminhada histórica do Homem na busca de meios capazes de proteger a

inalienabilidade de sua liberdade, bem como as relações sociais e a mitigação das desigualdades

entre os indivíduos, frente as mudanças que o desenvolvimento da civilização trouxe a

sociedade, os indivíduos passaram por diversos momentos, nos quais se evidenciou a

necessidade de regulamentação de suas ações por meio de um Pacto Social necessário a fim de

se assegurar a estabilidade da ordem sócio-política-econômica.

O Contrato Social de Rousseau se apresentou como meio de organização social,

proteção da liberdade individual, alienação do interesse individual em prol da coletividade para

se alcançar a soberania da vontade geral e limitar o poder do Estado, não obstante esses ideais

tenham sido construídos a partir das posturas antropocêntricas.

Para aproximar o Homem e a Natureza, os ideais do Contrato Social de Rousseau,

devem ser contemplados juntamente com os ideais biocêntricos de Michel Serres, para se

reconhecer e viabilizar a integração entre os seres humanos e não-humanos nessa rede vital do

Planeta Terra. Nesse caso, a Natureza se manifesta, agora, como “Sujeito de Direitos”, desde a

dimensão cultural dos povos andinos até a linguagem jurídica, seja do Tratado Constitutivo da

UNASUL, bem como das Constituições de países como Equador e Bolívia.

Para se compreender esse cenário de diálogo transconstitucional, se faz necessário uma

breve retomada histórica do momento do Constitucionalismo284 ao do Direito Contemporâneo,

sendo que o Termo Constituição285, já integrava a Sociedade desde a Antiguidade clássica, ao

Estado Moderno286, nos campos da Ciência Política e do Direito. Fato de que todas as

sociedades políticas no decorrer dos séculos sempre tiveram uma Constituição representada

pela forma e organização de suas instituições.

284 Segundo Queiroz “[...] Entende-se por constitucionalismo o movimento político jurídico iniciado há pouco

mais de duzentos anos na Europa, destinado a estabelecer em cada Estado uma constituição escrita em texto

único orgânico e com supremacia sobre as demais normas jurídicas [...]” QUEIROZ, Ari Ferreira de. Direito

Constitucional. 16 ed. Jardim Leme: JHMizuno, 2014. p. 105. 285 Segundo Barroso, “[...] O termo constituição deriva imediatamente do verbo constituir e tem origem remota o

vocábulo latino constitutionis, [...]”, sendo que “[...] constituição significa o modo de ser específico de uma

determinada coisa, os elementos que a individualizam, ou ainda o ato de sua criação [...]”. BARROSO, Luís

Roberto. CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p.

144/145. Grifo original da obra em estudo. 286 Conforme Barroso, “[...] É certo, contudo que tanto a noção como o termo constituição já integravam a ciência

política e o Direito de longa data, associados à configuração do poder em diferentes fases da evolução da

humanidade, da Antiguidade clássica ao Estado moderno [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO.

In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 145.

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Parte-se do momento em que se coloca em questão a necessidade de limitação do

poder287 do Estado, no qual se observa que este limite deve ser feito não penas por um Contrato,

uma lei, mas sim, por um instrumento capaz de ser estendido também ao próprio Estado. Dessa

forma, surgem as Constituições no cenário da Modernidade.288

O Constitucionalismo moderno apresenta como objetivo289 centralizado na necessidade

de elaborar uma documento escrito, de tal importância, que deve ser respeitado por todos, sendo

indivíduo, sociedade ou Estado sem distinções, com força de um texto constitucional290.

O Estado Constitucional tem em sua fundamentação basilar determinada por dois

princípios291 que almejam a Teoria da separação de poderes e garantias dos Direitos Humanos.

Onde a primeira fase ocorre em meio ao constituições no Estado Liberal,292 momento de grande

importância histórica da sociedade por ser tratar do iluminismo, que tem como foco além de

outros fatores, o indivíduo e a Natureza.

Nesse momento, a partir da influência dos pressuposto basilares do Constitucionalismo

moderno, dos ideais do Iluminismo e da Revolução Francesa,293 os indivíduos detentores da

Razão colocaram-se a discutir sobre a inviolabilidade de seus direitos de liberdade, cujo marco

de passagem do Estado Liberal para o Estado de Direito.

287 SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 25. 288 Para Barroso, “[...] O constitucionalismo moderno, fruto das revoluções liberais, deu à ideia de constituição

sentido, forma e conteúdo específico [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO,

Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 145. 289 Segundo Scariot, “[...] O principal objetivo do constitucionalismo moderno é a elaboração de um constituição

escrita, pois no período medieval havia apenas regras consuetudinárias. A existência de um texto

constitucional, que deve ser respeitado por todos e também pelo próprio Estado, configura-se como um

contraponto ao poder absoluto e incontrastável exercido pelo rei ou soberano [...]”. SCARIOT, Nadia Award.

A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 25. 290 Conforme Barroso, “[...] Na perspectiva moderna e liberal, a Constituição não tem caráter meramente

descritivo das instituições, mas sim a pretensão de influenciar sua ordenação, mediante uma ato de vontade e

de criação usualmente materializado em uma documento escrito [...]”. BARROSO, Luís Roberto.

CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 145. 291 SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental. p. 26. 292 Segundo Scariot, “[...] A primeira fase do constitucionalismo moderno baseia-se nas constituições jurídicas do

Estado liberal (séculos XVIII e XIX), no qual emerge o movimento denominado de “iluminismo”, cujas

preocupações centrais são o indivíduo, a natureza, a felicidade e o progresso, além de fundamentar,

teoricamente, o liberalismo político e econômico [...]”. SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na

perspectiva da questão ambiental. p. 26. 293 Para Barroso “[...] A Resolução Francesa, cuja deflagração é simbolizada pela queda da Bastilha, em 1789, foi

um processo mais profundo, radical e tormentoso de transformação político e social [...]” sendo que “[...] A

verdade, contudo, é que foi a Revolução Francesa – e não a americana ou a inglesa – que se tornou o grande

divisar histórico, o marco de advento do Estado liberal [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO.

In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 145/146.

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A Constituição,294 se expressa, dentro desse argumento, como mecanismo superior e

fundamental. É norma máxima a ser obedecida tanto pela sociedade295 que está abraçada por

tal norma, como para o Estado, que tem sua criação e organização constitucionalmente, e deve

proteger seus cidadãos, sem que para isso descumpra a doutrina constitucional.

Para tanto, a norma constitucional é dotada de superioridade jurídica296 sobre todas leis,

decretos, que compõe o ordenamento jurídico pátrio. A Constituição não pode ser alterada sob

qualquer pretexto.297 Observa-se, aqui, como se tornam necessários mecanismos legislativos

capazes de evitar a perda daqueles conteúdos descritos como essenciais ou fundamentais para

uma vida social sadia e pacífica.

Na vigência do Direito contemporâneo298 verifica-se, mais e mais, o fenômeno da

Constitucionalização do Direito, no qual a Constituição, como norma jurídica superior, goza da

supremacia formal bem como material, e passa a estar centralizada nos sistemas jurídicos

nacionais, para ser utilizada como ferramenta de interpretação de todas as leis

infraconstitucionais.

Dessa caminhada histórica, chega-se ao momento em que à Constituição, descrita como

norma superior, tem na evolução da Sociedade um ponto de desequilíbrio, pois sua construção

remonta em primazia a proteção dos Direitos Fundamentais do Homem e a organização estatal,

e trata de forma abstrata os direitos de seres não-humanos.

Assim, não proporciona o reencontro do Homem com a Natureza, tampouco o

reconhecimento da Natureza, como sujeito de direito. Sendo que nesse momento, devem ser

294 Segundo Barroso “[...] A Constituição, portanto, cria ou reconstrói o Estado, organizando o poder político,

provendo acerca de direitos fundamentais, valores e fins públicos e disciplinando o modelo de produção e os

limites de conteúdo das normas que integrarão a ordem jurídica por ela instituída [...]”. BARROSO, Luís

Roberto. CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p.

145. 295 Segundo Kelsen, “[...] A conduta humana disciplinada por um ordenamento normativo ou é uma ação por esse

ordenamento determinada, ou a omissão de tal ação [...]”. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. p. 16 296 Ao debater sobre o conteúdo e supremacia das normas constitucionais, apresenta que a Constituição “[...] É

dotada de superioridade jurídica em relação a todas as normas do sistema: a rigor, nenhum ato jurídico pode

substituir validamente se incompatível com a Constituição [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO.

In: BARRETO, Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 147. 297 Nesse ponto de alteração Constitucional, Kelsen aborda que “[...] A Constituição estadual pode – como

Constituição escrita – aparecer na específica forma constitucional, isso é, em normas que não podem se

revogadas ou alteradas como as leis normais mas somente sob condições mais rigorosas [...]” para tanto “[...]

a Constituição prescreve para a sua modificação ou supressão um processo mais exigente, diferente do processo

legislativo usual; que, além da forma legislativa, existe uma específica forma constitucional[...]”. KELSEN,

Hans. Teoria pura do direito. p. 248/249. 298 Segundo Barroso, “[...] O Direito contemporâneo é caracterizado pela passagem da Constituição para o centro

do sistema jurídico, onde desfruta não apenas da supremacia formal que sempre teve, mas de uma supremacia

material axiológica [...]” ao ponto da “[...] Constituição transforma-se no filtro por meio do qual se deve ler

todo o Direito infraconstitucional [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO, Vicente

de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 148.

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debatidos temas elencados ao futuro da Constituição,299 da mesma forma, que o futuro da

Humanidade.

Ao tratar do tema não se pode fechar os olhos para a caminhada histórica da legislação

brasileira bem como o Constitucionalismo nacional, desde o descobrimento do Brasil300 até o

século XXI, pois pode-se observar que a Natureza já configurava como objeto a ser explorado,

por um lado, e a necessidade de ser protegida, por outro.

Contudo, em nenhum momento da construção constitucional pátria, se observou que

ocorreu algum posicionamento para reconhecer a Natureza além de um bem natural, tampouco

pela constituinte 1988, que apenas reconheceu na Constituição da República Federativa do

Brasil a importância de proteção301 do bem ambiental, de uso comum do povo.

Salienta-se que anteriormente a instituir o Estado Democrático por meio da Constituição

Federal de 1988, o país já apresentava preocupação em proteção da Natureza, em 1981 com

promulgação da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente - PNMA302 que trouxe em seu

artigo 2º, os objetivos da preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia

a vida.

A Lei 6.938/81, criou no seu artigo 6º303 o Sistema Nacional do Meio Ambiente, assim

como, o Conselho Nacional do Meio Ambiente, para se implementar princípios e diretrizes

299 Para Barroso, os temas discutidos na Constitucionalização do Direito acerca do futuro da Constituição, são

representados pelo “[...] papel do Estado e suas potencialidades como agente de transformação e de promoção

dos direitos fundamentais; a legitimidade de jurisdição constitucional e da judicialização do debate acerca de

determinadas políticas públicas; a natureza substantiva ou procedimental da democracia e o conteúdo das

normas constitucionais que a concretizam [...]”. BARROSO, Luís Roberto. CONSTITUIÇÃO. In: BARRETO,

Vicente de Paulo (Org.). Dicionário de Filosofia do Direito. p. 148. 300 Segundo Scariot “[...] o primeiro ciclo econômico do Brasil formou-se a partir da extração e exploração de

madeira obtida pelo pau-brasil. O período de extração de madeira que termina no século XIX marca a extinção

do pau-brasil [...]” SCARIOT, Nadia Award. A evolução do Estado na perspectiva da questão ambiental.

p. 36. 301 Conforme aborda Canotilho e Leite “[...] A riqueza de ‘terra e arvoredo’, que surpreendeu e, possivelmente

encantou Pero Vaz de Caminha em 1500, finalmente foi reconhecida pela Constituição brasileira de 1988,

passados 488 anos da chegada dos portugueses ao Brasil [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE,

José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p 83. 302 “[...] Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação

da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento

sócioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana [...]”.

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus

fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>. Acesso em 10 set. de 2016. 303 A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente preceitua “[...] Art. 6º. Os órgãos e entidades da União, dos

Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder

Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o Sistema Nacional do

Meio Ambiente - SISNAMA, assim estruturado: II - órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do

Meio Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo,

diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar, no âmbito de

sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e

essencial à sadia qualidade de vida; (Redação dada pela Lei nº 8.028, de 1990) [...]”. BRASIL. Lei nº 6.938,

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presentes na Lei na gestão dos Entes públicos, com objetivo de relacionar a preservação da

qualidade ambiental e manutenção do seu equilíbrio ecológico junto às atividades econômicas

do país, bem como, fiscalizar e nortear por meio do poder de polícia da administração pública

a proteção ambiental.

A Lei da PNMA foi o ponto de partida de um paradigma jurídico-econômico304 de

grande relevância no panorama nacional. No entanto, ponto fundamental no debate sobre a

proteção ambiental é a Constituição da República Federativa de 1988, que pela primeira vez

traz em seu arcabouço a temática do Meio Ambiente305.

A norma nacional brasileira não foi a primeira Constituição da América Latina306 a

inserir o tema do Meio Ambiente, ocorreu nas constituições do Equador, Chile, Guatemala,

Guiana, Haiti, Honduras, Nicarágua, Panamá e Peru. Na Argentina, país fronteiriço brasileiro,

reformou sua Constituição307, bem como, a visão sobre a temática ambiental308.

A Constituição brasileira no caput do artigo 225309, preceitua o Meio Ambiente

ecologicamente equilibrado, bem como, o dever de defendê-lo e preservá-lo do Poder Público

de 31 de agosto de 1981. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm>. Acesso em

10 set. de 2016. 304 Segundo Canotilho e Leite, “[...] Somente a partir de 1981, com a promulgação da Lei n. 6.938/81 (Lei da

Política Nacional do Meio Ambiente), ensaiou-se o primeiro passo em direção a uma paradigma jurídico-

econômico que holisticamente trata-se e não maltratasse a terra [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes;

LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 83. 305 Segundo Machado “[...] As Constituições brasileiras de 1946 (art. 5º, XV) e de 1967 (ar. 8º, XVII) previram o

estabelecimento de ‘normas gerais pela União’ sobre determinadas matérias [...]” sendo que “[...] Não previam,

contudo, normas gerais sobre meio ambiente, pois o tema nelas não estava incluído especificamente com essa

nomenclatura [...]”. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 23. ed. São Paulo:

Malheiros Editores Ltda, 2015. p. 142. 306 Machado ao discutir o tema do Direito brasileiro, apresenta que “[...] A Constituição de 1988 pela primeira vez

no Brasil insere o tema ‘meio ambiente’ em sua concepção unitária. Não foi a primeira Constituições da

América Latina a fazê-lo, tendo sido precedida pelas Constituições do Equador e do Peru de 1979, Chile e

Guiana de 1980, Honduras de 1982, Panamá de 1983, Guatemala de 1985, Haiti e Nicarágua de 1987 [...]”.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 141. 307 A Constituição Argentina preceitua no “[...] Artículo 41. Todos los habitantes gozan del derecho a un ambiente

sano, equilibrado, apto para el desarrollo humano y para que las actividades productivas satisfagan las

necesidades presentes sin comprometer las de las generaciones futuras; y tienen el deber de preservarlo. El

daño ambiental generará prioritariamente la obligación de recomponer, según lo establezca la ley. Las

autoridades proveerán a la protección de este derecho, a la utilización racional de los recursos naturales, a

la preservación del patrimonio natural y cultural y de la diversidad biológica, y a la información y educación

ambientales. Corresponde a la Nación dictar las normas que contengan los presupuestos mínimos de

protección, y a las provincias, las necesarias para complementarlas sin que aquéllas alteren las jurisdicciones

locales. Se prohíbe el ingreso al território nacional de residuos actual o potencialmente peligrosos, y de los

radiactivos [...]”. ARGENTINA. Constitución de la Nación Argentina de 1994. Disponível em

<http://www.casarosada.gob.ar/nuestro-pais/constitucion-nacional>. Acesso em 10 set. de 2016. 308 Segundo Machado ao abordar a Constituição da Argentina, apresenta que nessa “[...] há uma inovação na regra

constitucional da Argentina que é preciso apontar – a possibilidade de o Governo nacional elaborar normas

fundamentais para o meio ambiente, o que antes era tarefa das Províncias [...]”. MACHADO, Paulo Affonso

Leme. Direito Ambiental Brasileiro. p. 145. 309 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, preceitua no “[...] Art. 225. Todos têm direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras

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e a coletividade. Nessa linha, a norma pátria constitucionalizou310 a proteção ambiental no

ordenamento jurídico brasileiro.

Percebe-se, a partir dessa leitura, como a Constituição Federal de 1988 atribuiu status

de Direito Fundamental311 ao Direito do Ambiente, da mesma forma que trouxe a proteção

ambiental como um dos seus objetivos normativos312. Na dimensão constitucional brasileira, a

temática do meio ambiente também está prevista no artigo 23313, que estabelece a competência

comum dos entes públicos para a proteção ambiental.

Diversos autores consideram como uma inovação da Constituição de 1988, ao trazer

dentro da esfera da tutela dos direitos coletivos, o reconhecimento da existência do “bem

ambiental314” o qual por não pertencem ao público tampouco ao privado, é um bem da

coletividade, para uso comum do povo.

Nessa abordagem, a Constituição Federal de 1988, se apresentou como inovadora em

inserir a proteção do “meio” ambiente, e ao impor como dever de defender e preservar tanto ao

Poder Público como a coletividade315. No entanto, em nenhum momento, se observou na

gerações [...]”. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 26 jul. de 2016. 310 Segundo Sarlet e Fensterseifer “[...] além de ‘constitucionalizar’ a proteção ambiental no ordenamento jurídico

brasileiro (art.225) inserido do Título “Da Ordem Social”, a nossa atual Lei fundamental conta com diversos

outros dispositivos em matéria de proteção ambiental, relacionando a tutela ecológica [...]”. SARLET, Ingo

Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Notas sobre os deveres de proteção do Estado e a garantia da proibição

de retrocesso em matéria socioambiental. In: STEINMETZ, Wilson; AUGUSTIN, Sérgio (Org.). Direito

Constitucional do Ambiente: Teoria e Aplicação. Caxias do Sul: Educs, 2011. p. 10. 311 Para Sarlet e Fensterseifer, “[...] A CF/88 (art. 225, caput, e art. 5º, § 2º) atribuiu ao direito ao ambiente o status

de direito fundamental do indivíduo e da coletividade, bem como consagrou a proteção ambiental com um dos

objetivos ou tarefas fundamentais do Estado Democrático – e Socioambiental – Direito brasileiro [...]”.

SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Notas sobre os deveres de proteção do Estado e a

garantia da proibição de retrocesso em matéria socioambiental. In: STEINMETZ, Wilson; AUGUSTIN, Sérgio

(Org.). Direito Constitucional do Ambiente: Teoria e Aplicação. p. 10. 312 De acordo com Canotilho e Leite, ao analisar do art. 225 CF “[...] nota-se que houve uma preocupação do

legislador brasileiro no sentido de não só proteger os animais em virtude de sua função ecológica ou sua

utilidade econômica, mas também em virtude da sensibilização perante a visa, seja esta humana, seja não

humana [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional

ambiental brasileiro. p. 169. 313 “[...] Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: VI - proteger

o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; [...]”. BRASIL, Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 26 jul. de 201 314 Segundo Fiorillo “[...] o legislador contribuinte de 1988 trouxe uma novidade interessante: além de autorizar a

tutela de direitos individuais, o que tradicionalmente já era feito, passou a admitir a tutela de direitos coletivos,

porque compreendeu a existência de uma terceira espécie de bem: o bem ambiental [...]”. FIORILLO, Celso

Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 3. Grifos

originais da obra em estudo. 315 Dessa temática, segundo Canotilho e Leite, “[...] No regime constitucional brasileiro fica claro que o ambiente

é tratado como bem de interesse comum da coletividade, sendo sua proteção dependente de responsabilidade

compartilhada entre o Estado e a coletividade [...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens

Morato. Direito constitucional ambiental brasileiro. p. 168.

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Constituinte, tampouco na atualidade, movimento para reconhecer a Natureza com status de

sujeito de Direito, da mesma forma que ocorre nos países andinos.

Nesse caso, a Constituição pátria foi escrita primeiramente sobre o fórmula estritamente

antropocêntrico, posteriormente para antropocêntrico alargado, na qual a Natureza é

considerada um bem de uso comum a todos e que na atualidade não segue a tendência dos

países Latino-americanos, que por meio dos ideais biocêntricos316, inseriram em suas Normas

Constitucionais, o reconhecimento do Natureza como Sujeito de Direitos.

Por outro lado, alguns países Latino-americanos, ao buscarem um novo paradigma, um

novo Contrato entre as relações humanas com a Natureza, reformularam suas Constituições317

com o objetivo de estabelecer um equilíbrio nesta relação, por meio de Normas constitucionais

que reconheçam a Natureza como sujeito de direitos, por intermédio de uma maior participação

popular.

Esse momento é apresentado sobre a ótica do Novo Constitucionalismo latino-

americano,318 onde se busca na efetiva participação popular as alterações constitucionais, dentre

os diversos tema sociais, se encontra a atual visão dos povos latino-americanos sobre a

Natureza, como sujeito e não mais como um simples bem tutelado.

Destacam-se os países da América Andina, os quais por meio da filosofia do “Buen

Vivir”319, almejam o equilíbrio entre Homem e Natureza de foram amorosa, pois tem na Pacha

Mama como mãe de toda vida, o caminho para reconhecimento da Natureza como sujeito de

direito nas Constituições pátrias, para assim, ser preservada.

316 Segundo Canotilho e Leite, “[...] A constitucionalização do ambiente emerge nos primeiros momentos, em

fórmulas estritamente antropocêntricas, espécie de componente mais amplo da vida e dignidade humana; só

mais tarde, componentes biocêntricos são borrifados no texto constitucional ou na leitura que deles se faça

[...]”. CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato. Direito constitucional ambiental

brasileiro. p. 90. 317 TÁRREGA, Maria Cristina Vidotte Blanco; LEMES, João Vitor Martins. O novo constitucionalismo

democrático latino-americano e os novos sujeitos de direito. In: BESTER, Gisela Maria; COSTA Hermes

Augusto; HILÁRIO, Glorite Marques Alves. Ensaios de direito e de sociologia a partir do Brasil e de

Portugal: Movimentos, Direitos e Instituições. p. 339. 318 Conforme Brandão, ao abordar a Teoria do Novo Constitucionalismo sobre a percepção de Roberto Vicino

Pastor e Rubén Martínez Dalmau, aponta que a Teoria “[...] ostenta como preocupação central a legitimidade

democrática da Constituição, garantindo a participação política – de forma que só a soberania popular pode

determinar a alteração Constitucional [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-

americano. p. 13. 319 Conforme Aquino, “[...] Dentre os povos sul-americanos, os andinos estão em maior sintonia com a Natureza

e possibilitam o cumprimento desinteressado e amoroso [...]” pois o objetivo desses povos é de “[...] de acolher

todos os seres vivos. Essa filosofia é denominada como Buen Vivir [...]”. AQUINO, Sergio Ricardo Fernandes

de. Do contra social ao Contrato Natural: o tratado constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia

concreta. In: TRINDADE, André Karam; ESPINDOLA, Angela Araújo da Silveira; BOFF, Salete Oro. (Org.).

Direito, democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Direito da

Faculdade. p. 208. Grifo original da obra em estudo.

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Entre os países Andinos, o Equador passou a frente a visão brasileira, sendo que em

setembro de 2008, promulgou sua nova Constituição da República do Equador. Por meio do

processo constituinte do Novo Constitucionalismo, do ideal biocêntrico, e da participação

popular320, introduziu o conceito de “direito da Natureza”321.

A Carta Magna equatoriana celebra no preâmbulo 322a Natureza, a Pacha Mama, sendo

essa a mãe que permite, oportuniza condições ao desenvolvimento da vida, bem como

almejando alcançar o Buen Vivir e o Sumak Kawsay, por meio de uma forma de convivência da

sociedade de forma cidadã, e harmoniosa com a Natureza.

Para compreender os pontos relevantes que levaram o Constituinte323 equatoriano a

materializar sobre a Teoria do Novo Constitucionalismo324, a Natureza na Constituição e não

apenas do Meio Ambiente325, ao ponto de determinar a Natureza como detentora de direito, tem

de ser analisar o reconhecimento da existência Pacha Mama326 pela sociedade andina, em

320 Segundo Gudynas “[...] El caso ecuatoriano es el primeiro en el que la polis, la ciudadania, aceptó um nuevo

contrato social que reconoce los direchos de la Naturaleza. En este caso, la mayoria ciudadania aprobó el

texto constitucional que incluye otra visión sobre el ambiente [...]”. GUDYNAS, Eduardo. Derechos de la

naturaleza Ética biocéntrica y políticas ambientales. p. 71. 321 A Constituição do Equador preceitua no “[...] Art. 71. La naturaleza o Pacha Mama, donde se reproduce y

realiza la vida, tiene derecho a que se respete integralmente su existência y el mantenimiento y regeneración

de sus ciclos vitales, estructura, funciones y procesos evolutivos [...]”. ECUADOR. Constitución de la

República del Ecuador de 2008. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 27

jul. 2016. 322 A Constituição do Equador preceitua “[...] CELEBRANDO a la naturaleza, la Pacha Mama, de la que somos

parte y que es vital para nuestra existencia [...]”, na busca alcança “[...] Una nueva forma de convivencia

ciudadana, en diversidad y armonía con la naturaleza, para alcanzar el buen vivir, el sumak kawsay [...]”.

ECUADOR. Constitución de la República del Ecuador de 2008. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 27 jul. 2016. 323 Segundo Pietro Méndez, o constituinte observou “[...] La relación de los pueblos ecuatorianos con la

naturaleza es generalmente positiva y respetuosa, aunque no siempre sea biocêntrica; La relación de los

pueblos ecuatorianos con la naturaleza no es la misma entre las distintas culturas que habitan las diferentes

regiones de nuestro país, al punto que inclusive podemos encontrar diferentes construcciones de Pacha Mama;

Los distintos pueblos detentan conocimientos ancestrales acerca de los ciclos vitales [...]”. PIETRO

MÉNDEZ, Julio Marcelo. Derechos de la naturaleza: fundamento, contenido y exigibilidad jurisdiccional.

Quito: Corte Constitucional del Ecuador; CEDEC, 2013. p. 64. 324 Segundo Brandão, O Novo Constitucionalismo “[...] tem se materializado nos processos constituintes da

Venezuela, Bolívia e Equador [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-

americano. p. 14. 325 Conforme Moreno e Leite “[...] En la Asamblea Nacional Constituyente el debate sobre la naturaleza y no

solo medioambiente [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la naturaliza In:

MUÑOZ, Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea Nacional del

Ecuador. Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>.

Acesso em 10 Set. 2016. p. 58. 326 Para Moreno e Vaca “[...] Mediante un acuerdo nacional democrático se recogió en Montecristi la cosmovisión

de pueblos y nacionalidades sobre la existencia de la Pachamama que, junto con la voluntad de encontrar un

camino alternativo al capitalismo y al neoliberalismo, se propuso como un nuevo modelo de desarrollo y el

cambio de la matriz productiva [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la

naturaliza. In: MUÑOZ, Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea

Nacional del Ecuador. Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 10 Set. 2016. p. 59.

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destaque o povo indígena, mediante um acordo nacional democrático e sua importância no

cenário nacional do Equador, para um novo modelo econômico, fundado na justiça e no direito

Por intermédio da cosmovisão327 do povo e da nacionalidade sobre a existência da

PachaMama, os cidadãos puderam buscar uma nova forma de se verem frente ao ambiente

natural,328 aos recursos naturais escassos, bem como, sobre o modo de vida atual da sociedade

equatoriana, que pode resultar em alterações globais.

A Constituição equatoriana trata na Segunda Seção o Ambiente sano, sendo que o artigo

14329 positiva o direito que a população possui de viver em um ambiente sadio e ecologicamente

equilibrado, semelhante ao que trata o artigo 225 da Constituição brasileira, contudo, a Magna

Carta equatoriana, vai além, pois visa garantir a sustentabilidade e o Buen Vivir e o Sumak

Kawsay.

E no Capítulo Sétimo dos Derechos de la Naturaleza, trata em especial no artigo 71,330

o direito que a Natureza ou PachaMama, que deve ser respeitado integralmente. Para a

elaboração desse artigo, o Constituinte apresentou como argumentos331 que ventilam a Pacha

327 “Todas las culturas tienen una forma de ver, sentir percibir y proyectar el mundo, al conjunto de estas formas

se conoce como Cosmovisión o Visión Cósmica. Los abuelos y abuelas de los pueblos ancestrales, hicieron

florecer la cultura de la vida inspirados en la expresión del multiverso, donde todo está conectado,

interrelacionado, nada está fuera, sino por el contrario “todo es parte de...”; la armonía y equilibrio de uno

y del todo es importante para la comunidad. Es así que en gran parte de los pueblos de la región andina de

Colombia, Ecuador, Bolivia, Perú, Chile y Argentina, y en los pueblos ancestrales (primeras Naciones) de

Norteamérica pervive la Cosmovisión Ancestral o Visión Cósmica, que es una forma de comprender, de

percibir el mundo y expresarse en las relaciones de vida. Existen muchas naciones y culturas en el Abya Yala,

cada una de ellas con sus propias identidades, pero con una esencia común: el paradigma comunitario basado

en la vida en armonía y el equilibrio con el entorno”. HUANACUNI MAMANI, Fernando. Buen vivir/ Vivir

bien: Filosofía, políticas, estrategias y experiencias regionales andinas. p. 27. 328 Segundo Moreno e Vaca “[...] Para crear una nueva manera de entendernos como humanos y con nuestro

entorno natural, comprendiendo que los recursos naturales son escasos y que nuestra forma de vida podría

llevarnos a cambios globales [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la naturaliza.

In: MUÑOZ, Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea Nacional

del Ecuador. Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 10 Set. 2016. p. 58. 329 A Constituição equatoriana preceitua no art. 14 “[...] Se reconoce el derecho de la población a vivir en un

ambiente sano y ecológicamente equilibrado, que garantice la sostenibilidad y el buen vivir, sumak kawsay

[...]”. ECUADOR. Constitución de la República del Ecuador. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 27 jul. 2016. 330 A Constituição equatoriana preceitua que “[...] Art. 71. - La naturaleza o Pacha Mama, donde se reproduce y

realiza la vida, tiene derecho a que se respete integralmente su existencia y el mantenimiento y regeneración

de sus ciclos vitales, estructura, funciones y procesos evolutivos. Toda persona, comunidad, pueblo o

nacionalidad podrá exigir a la autoridad pública el cumplimiento de los derechos de la naturaleza. Para

aplicar e interpretar estos derechos se observaran los princípios establecidos en la Constitución, en lo que

proceda. El Estado incentivará a las personas naturales y jurídicas, y a los colectivos, para que protejan la

naturaleza, y promoverá el respeto a todos los elementos que forman un ecosistema [...]”. ECUADOR.

Constitución de la República del Ecuador. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>.

Acesso em 27 jul. 2016. 331 De acordo com Moreno e Vaca, a mesa constituinte apresentou como argumentos a elaboração do art. 71 que

“[...] Se incluye a la Pachamama como significación de un sujeto y representación de las culturas andinas que

le reconocen como una madre que da vida y por tanto una especie de deidad que fecunda la tierra. La justicia

ambiental se hace presente cuando se reconoce como obligación o deber de los individuos o colectividades el

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Mama como sujeito, bem como sua representação na cultura andina do Buen Vivir e da Mãe

Natureza.

A partir desse contexto, o Equador reconhece em sua Magna Carta a Natureza como

sujeito de direito, com objetivo de sanar uma dívida histórica332 sobre o reconhecimento do

direito das Pessoas Jurídicas, não obstante que essa seja uma ficção. Não reconhecer o Direito

da Natureza, que é composta por uma biodiversidade de seres vivos significa insistir na sua

“invisibilidade” como “ser próprio” e utilizá-la como simples objeto de exploração mercantil

para atender aos infinitos desejos humanos.

Por esse motivo, é necessário, desmistificar algumas concepções333, que ventilam sobre

as consequências desse reconhecimento do Direito da Natureza ocasionaria, na atividade

econômica-comercial da mineração, na caça e pesca, e principalmente na forma de vida da

população, incluindo os costumes tradicionais, como a caça e a pesca.

Não obstante o Estado Plurinacional do Equador334 seja composto por diversas culturas,

verifica-se a manifestação de divergências sobre as formas de exploração e quais os bens a

serem explorados. Para tanto, por meio do reconhecimento da Natureza como sujeito de Direito,

proteger los ciclos vitales de la naturaleza para garantizar también nuestra propia existencia. Especialmente

de los pueblos y nacionalidades cuya relación no es solo de supervivencia sino cultural, precautelando

etnocidios [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la naturaliza. In: MUÑOZ,

Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea Nacional del Ecuador.

Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso

em 10 Set. 2016. p. 61. 332 Segundo Moreno e Vaca, o constituinte almejou com o reconhecimento da Natureza “[...] Declarar sujeto de

derechos a la naturaleza, permitió, en primer lugar, superar una deuda histórica contraída el día que

otorgamos derechos a las personas jurídicas que son una ficción jurídica, mientras que la naturaleza está

conformada en su mayoría por seres sintientes [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas.

Derechos de la naturaliza. In: MUÑOZ, Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo

constitucional. Asamblea Nacional del Ecuador. Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: <

http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 10 Set. 2016. p. 65. 333 Aos objetivos do Constituinte equatoriano, conforme Moreno e Vaca acrescentasse “[...] Es segundo lugar, era

indispensable desmitificar algunas concepciones como: a) El reconocimiento de los derechos de la naturaleza

no permitiría realizar actividades extractivas; b) La eliminación de la práctica de caza y pesca deportiva; c)

Que los pueblos y nacionalidades no puedan mantener sus formas de vida, incluyendo la caza y pesca

tradicional [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la naturaliza. In: MUÑOZ,

Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea Nacional del Ecuador.

Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso

em 10 Set. 2016. p. 66. 334 Segundo Moreno e Vaca, o reconhecimento da Natureza como “ser próprio” acarreta que “[...] El alcance de

los Derechos de la naturaleza implica que toda actividad antropogénica no debe alterar la capacidad de la

naturaleza del mantenimiento y regeneración de sus ciclos vitales [...]” e cabe ao Estado Plurinacional do

Equador por “[...] se asienta en diversos ecosistemas de los que nacen culturas, cosmovisiones, y también

conflictos sobre la forma de explotación de los recursos, el tipo de recursos explotados [...]” tal regulação.

MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas. Derechos de la naturaliza. In: MUÑOZ, Pabel; NAVAS,

Marco (Org.) Nueve años de desarrollo constitucional. Asamblea Nacional del Ecuador. Quito – Ecuador:

El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em: < http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 10 Set. 2016.

p. 66.

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77

aponta-se que toda atividade humana que tem ligação direta com a Natureza, não deve resultar

em modificação das características, tampouco afetar em todas as formas, o ciclo natural da vida.

A partir do reconhecimento do Direito da Natureza por meio da filosofia do “Buen

Vivir” juntamente com o posicionamento de um Estado Plurinacional, o Equador mudou sua

visão antropocêntrica, ligada a exploração da Natureza em seus recursos naturais renováveis e

não renováveis, para a visão de cunho biocêntrico, afim de poder proteger e ter condições de

responsabilizar responsáveis por catástrofes ambientais, como no caso equatoriano Aguinda

versos Chevron Texaco335.

Por intermédio da observação da legitimidade do Povo para alterar a Constituição

trazida na Teoria do Novo Constitucionalismo336 latino-americano, se verifica que a

Constituição brasileira não é considerada como utilizadora dessa Teoria337, ao passo que nas

Constituições do Equador 2008 e da Bolívia 2009 se observa a materialização da Teoria338 por

intermédio dos movimentos populares, principalmente os indígenas.

335 De acordo com Moreno e Vaca trata-se do “[...] Caso Frente de Defensa de la Amazonía vs. Chevron Texaco

(en Ecuador caso Aguinda vs. Chevron Texaco), en el que la falta de toda legislación tendiente a aplicar el

principio de precaución o remediación ambiental en los contratos petroleros, permitió que dieciocho billones

de galones de ‘aguas de formación’ se depositen en piscinas no forradas, y que además, en 1995, el propio

Estado ecuatoriano firme un acuerdo con Texaco que le eximía de toda responsabilidad de la contaminación

en el Amazonía ecuatoriana durante casi tres décadas [...]”. MORENO, Cecilia Medina; VACA, César Egas.

Derechos de la naturaliza. In: MUÑOZ, Pabel; NAVAS, Marco (Org.) Nueve años de desarrollo

constitucional. Asamblea Nacional del Ecuador. Quito – Ecuador: El Telegráfo E.P. 2016. Disponível em:

<http://www.asambleanacional.gob.ec/es>. Acesso em 10 Set. 2016. p. 66. 336 Segundo Brandão “[...] as características materiais do Novo Constitucionalismo buscam intensificar a

participação popular no âmbito democrático, construindo uma aproximação entre o governo e a soberania

popular, mediante novas formas de democracia e participação cidadã [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo

constitucionalismo pluralista latino-americano. p. 23. 337 Brandão apresenta que a Constituição brasileira na concepção de Roberto Vicino Pastor e Rubén Martínez

Dalmau “[...] ainda que anuncie alguns traços essenciais, não é considerada um exemplo desse Novo

Constitucionalismo, devido ao seu processo constituinte deficitário de legitimidade democrática [...]”.

BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-americano. p. 16. 338 Segundo Brandão “[...] essas experiências foram materializadas nos processos constituintes do Equador (2007-

2008) e da Bolívia (2009) [...]”. BRANDÃO, Pedro. O novo constitucionalismo pluralista latino-americano.

p. 19.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entende-se que não se consegue o desenvolvimento social e o crescimento econômico

desejável, conjuntamente com o estabelecimento do equilíbrio da relação do homem com a

Natureza vislumbrada por ideias de modos de vida sustentados do século XXI, a partir do

modelo de Contrato Social elaborado por Rousseau com fundamentos antropocêntricos.

Para tanto, é necessário revisar as escolhas e as decisões alicerçadas nos ideais

antropocêntricos e observar, no biocentrismo por meio do entendimento do Contrato Natural

descrito por Michel Serres, que existem seres não-humanos no mundo, os quais juntos fazem

parte da Natureza, que proporciona toda vida na terra.

A Natureza necessita que os seres humanos busquem, na perspectiva de

complementariedade e unicidade, o entendimento do antropocentrismo junto ao biocentrismo,

de forma simbiótica, para que o equilíbrio entre Homem e Natureza ocorra a fim de se assegurar

às presentes e futuras gerações condições para uma vida digna e sadia.

O modo atual de vida da humanidade, a partir desse contexto, deve mudar e se adaptar

a uma forma mais harmoniosa com a Natureza, por meio da redução da massificação da

produção, na reeducação do consumo, para que a sociedade possa almejar no desenvolvimento

e consumo consciente, o retorno à Natureza.

É somente com a união de esforços de toda humanidade, em especial de cada indivíduo

considerado peça importante para a incorporação do pensamento biocêntrico em seu modo de

vida, que essa união resulta em benefícios ao Homem bem como a Natureza e que cenários de

desequilíbrios possam ser modificados.

A partir do debate sobre a proteção Ambiental no Tratado Constitutivo da União de

Nações Sul-Americanas – UNASUL – deve-se analisar de que forma a Natureza é abordada

nos ordenamentos pátrios de países latino-americanos mesmos da UNASUL, como Equador e

Brasil.

Para ser possível ventilar, por intermédio da compreensão sobre a importância da

proteção ambiental, que na Constituição Federal de 1988 a Natureza teve seu reconhecimento

como bem ambiental de uso comum a todos e sua proteção como de responsabilidade da

coletividade e o do Estado, ideias do pensamento antropocêntrico alargada, porém, sem ter o

status de sujeito de direito.

Percebe-se, no ordenamento jurídico equatoriano de 2008, que há a elevação e o

reconhecimento e a compreensão sobre a importância da proteção ambiental, como sujeito de

direito. A Natureza como “ser próprio” sendo ideal do biocentrismo, presente no Contrato

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Natural. Nesse caso, o país pode almejar o desenvolvimento social e crescimento econômico,

de forma responsável.

Nessa linha de pensamento, para solucionar a presente questão, foram debatidas no

presente trabalho algumas hipóteses acerca da temática que contribuíram para a elaboração da

resposta do problema de pesquisa, pois apontaram, as relações sociais dos Seres Humanos,

discutidas pelos filósofos políticos da modernidade, Thomas Hobbes, John Locke e Jean-

Jacques Rousseau, na formulação das Teorias do Contrato Social, que contribuíram para a

organização social por meio das sociedades. As Teorias de Rousseau, representam momento de

grande importância na trajetória do Homem natural para a compreensão do Pacto Social.

A partir do modelo de contrato social elaborado por Rousseau, não se consegue o

desenvolvimento social e o crescimento econômico desejável e oferecer a organização entre

Homem e Natureza vislumbrada no século XXI, pois esse é simbolizado pela premissa

fundamental da inalienabilidade e do ideal de Liberdade dos seres humanos, que ocorre por

meio das escolhas e decisões desses sujeitos, exclusivamente antropocêntricas.

A Natureza precisa para sua maior proteção, que os Seres Humanos busquem, na

perspectiva de complementariedade e unicidade, o entendimento do antropocentrismo junto ao

biocentrismo, de forma simbiótica. Para tanto, é necessário revisar as escolhas e as decisões, e

observar, por meio do entendimento do Contrato Natural descrito por Michel Serres, que

existem outros sujeitos no mundo, os quais juntos fazem parte da Natureza como Ecossistema.

A partir da necessidade de preservar o mundo natural, se faz necessário, por meio da

análise do reconhecimento da Natureza como “ser próprio” do Contrato Natural, a compreensão

sobre a importância da proteção ambiental, como “sujeito de direito”, contida nos ordenamentos

pátrios dos países do Equador e do Brasil, membros da União de Nações Sul-Americanas -

UNASUL.

Os fundamentos apresentados, diante do problema de pesquisa deste estudo que versou

sob a proteção da Natureza correlata ao seu reconhecimento como Sujeito de Direitos enfatizada

pela UNASUL com base no Contrato Social elaborado por Rousseau, demonstra que o Contrato

Social não oferece, hoje, o encontro e o equilíbrio entre Homem e a Natureza.

A postura antropocêntrica estabelecida por meio das Teorias do Contrato Social deve

ser revista para que se possibilite a introdução e assimilação de uma visão biocêntrica, junto a

antropocêntrica, pois aquela tem como objetivo almejado por intermédio do Contrato Natural,

o reencontro do Homem e da Natureza.

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REFERÊNCIAS

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constitutivo da UNASUL como expressão de uma utopia concreta. In: TRINDADE, André

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democracia e sustentabilidade: anuário do programa de Pós-graduação Stricto Sensu em

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