CENTRO UNIVERSITRIO DAS FACULDADES · A proibição da produção de provas ilícitas tem...
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CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES
METROPOLITANAS UNIDAS
CURSO DE DIREITO
DA INADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA
NO PROCESSO CIVIL À LUZ DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.
JAQUELINE GIULIETTI
R.A.: 483.318/0
Turma: 3209C
Tel.: (11) 8223-2496
E-mail: [email protected]
São Paulo
2008
CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES
METROPOLITANAS UNIDAS
CURSO DE DIREITO
DA INADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA
NO PROCESSO CIVIL À LUZ DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988.
JAQUELINE GIULIETTI R.A.: 483.318/0 Turma: 3209C
Tel.: (11) 8223-2496 E-mail: [email protected]
Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, como exigência parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Ailton Cocurutto.
São Paulo
2008
BANCA EXAMINADORA:
Professor Orientador: _____________________________
Professor Argüidor: ______________________________
Professor Argüidor: ______________________________
Dedicatória
Aos meus pais, por acreditarem em meu potencial e por me ensinarem a matéria da
vida, ao meu namorado, pela presteza de todas as horas e grande incentivo, e aos meus
colegas de sala, que ao longo desta jornada acadêmica me acompanharam na
insistente busca pelo saber.
A vocês dedico este estudo.
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus. Em seguida, agradeço ao meu orientador, Prof.
Ailton Cocurutto, por tornar possível a elaboração do presente trabalho, que
outrora era só projeto, e hoje, se apresenta como uma obra devidamente
concretizada.
“... em uma sociedade onde existem leis, a liberdade não pode consistir senão
em poder fazer o que se deve querer, e em não ser constrangido a fazer o que
não se deve desejar”.
(Montesquieu – Do Espírito das leis)
SINOPSE
A proibição da produção de provas ilícitas tem interpretação doutrinária e
jurisprudencial. Em síntese, prova ilícita é um meio de produção probatória que
ofende o direito material.
No âmbito do direito penal, é possível produzir provas mediante
autorização judicial, como exemplo, a gravação telefônica, a quebra de sigilo
bancário, o que por sua vez, é expressamente vedado no âmbito de direito civil (objeto
do presente estudo), em virtude do princípio constitucional da inadmissão das provas
ilícitas, que é quase absoluto.
Alguns processualistas afirmam que há que se evitar os extremos, ou seja, a
aceitação pura e simples das provas ilícitas, ou a proibição destas, medindo-as.
Ressaltam ainda que todo princípio constitucional, num dado
momento, pode dar lugar à flexibilização. Aqui se verificam os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade para admissão da prova ilícita, visando assegurar
um bem jurídico maior, qual seja, a vida.
Já os constitucionalistas, por sua vez, entendem que não é possível, em
hipótese alguma, a produção da prova ilícita dentro do processo. Tal princípio deve
ser tido em caráter absolutório, sem flexibilização alguma.
Depreende-se então que esta é uma questão muito controvertida, na qual
nos aprofundaremos neste estudo.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................
CAPÍTULO I – TEORIA GERAL DAS PROVAS
1.1 Conceito e finalidade da prova..........................................................................
1.2 Objeto de prova……………….........................................................................
1.3 Meios de prova………………………………………………………………
1.4 Valoração das provas…......................................................................................
1.5 Poderes instrutórios do Juiz…………….........................................................
1.6 Momentos da prova…………………………………………………………
1.7 Ônus da prova………………………………………………………………
CAPÍTULO II – DOS PRINCÍPIOS
2.1 Devido processo legal.......................................................................................
2.2 Contraditório…………………………………………………………………
23 Ampla defesa…………………………………………………………………
2.4 Dispositivo…………………………………………………………………...
2.5 Oralidade……………………………………………………………………
2.6 Identidade física do Juiz……………………………………………………
2.7 Concentração dos atos processuais…………………………………………
2.8 Imediatidade…………………………………………………………………
2.9 Irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias………………
2.10 Aquisição processual……………………………………………………
2.11 Livre convencimento motivado pelo Juiz…………………………………
CAPÍTULO III – DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROVA
ILÍCITA..............................................................................................................
3.1 Conceito de prova ilícita…………………………………………………...
3.2 Da inadmissibilidade da prova ilícita no processo civil..............……………
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3.3 Da admissibilidade da prova ilícita no processo civil....................................
3.4 Do posicionamento jurisprudencial………………………….........................
3.5 Da prova emprestada………………………………………………………..
3.6 Da prova ilícita por derivação………………………………………………
3.7 Conseqüências da admissão da prova ilícita…………………………………
CONCLUSÃO.......................................................................................................
BIBLIOGRAFIA..................................................................................................
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INTRODUÇÃO
A propositura de um processo judicial pressupõe a necessidade de uma
decisão acerca de determinado fato ou direito, causador de conflito entre duas ou mais
pessoas, conflito esse que não foi solucionado extrajudicialmente entre as partes
envolvidas.
Para alcançar o provimento jurisdicional acerca de determinada lide, faz-se
necessário que as partes comprovem que as alegações feitas no decorrer do processo
são verdadeiras, encaixando-se aqui neste contexto as provas.
Tamanha é a relevância desta comprovação das alegações no caminho
processual, que o direito processual civil se dedica com afinco no estudo do direito
probatório.
No entanto, ao realizar o estudo das provas, deve-se, assim como em todas
as outras matérias, realizar de forma sistemática interpretações acerca de determinadas
normas inseridas no ordenamento jurídico.
Portanto, é impossível realizar o estudo desta matéria negligenciando
normas e princípios presentes em nosso ordenamento jurídico, motivo pelo qual este
estudo aborda os princípios relacionados à prova.
Em virtude dessa necessária observância, se chega facilmente à conclusão
de que essa produção de provas que objetiva a versão mais apurada de determinado
fato deve ser realizada de modo a respeitar essa inviolabilidade das garantias
fundamentais, além de todo o resto do ordenamento jurídico.
A partir desse entendimento, pode-se observar que a produção de provas
deve estar em consonância com a legislação vigente, de modo que, em regra, as
provas ilícitas são consideradas inadmissíveis no processo civil.
No entanto, é importante ressaltar a existência de uma parte minoritária na
doutrina que entende que a partir do momento em que o Estado-Juiz é provocado, seu
escopo é dar o provimento jurisdicional da forma mais justa possível, em
concordância com o ordenamento, através da análise do evento que gerou a lide.
Por derradeiro, o presente estudo visa explanar as correntes doutrinárias
sobre a admissibilidade da prova ilícita no processo civil, proporcionando uma visão
geral da matéria debatida.
Para a elaboração do presente estudo, foi utilizada a pesquisa doutrinária,
jurisprudencial, análise da Constituição Federal de 1988 e do Código de Processo
Civil Pátrio.
CAPÍTULO I – TEORIA GERAL DAS PROVAS
1.1 CONCEITO E FINALIDADE DA PROVA
Prova é todo e qualquer elemento lícito e legítimo que possa colaborar para
a formação do convencimento do magistrado. Tudo que seja lícito e legítimo pode ser
legalmente utilizado como meio de prova. Nas palavras de Vicente Greco Filho:
“a prova é todo elemento que pode
levar o conhecimento de um fato a
alguém. No processo, a prova é todo
o meio destinado a convencer o juiz a
respeito da verdade de uma situação
de fato”. 1
Da própria conceituação acima exposta já se pode identificar a finalidade
da prova, que é exatamente formar o convencimento do julgador, ou seja, ele sempre
será o destinatário das provas produzidas nos autos. Toda prova produzida tem esse
escopo, convencer o magistrado da verdade dos fatos trazidos aos autos, ou seja, a
prova busca sempre “uma certeza relativa suficiente na convicção do magistrado2”.
1.2 OBJETOS DE PROVA
O objeto da prova são os fatos, mas não todos. Fatos sem pertinência (sem
ligação com a causa) devem ter a sua prova recusada pelo magistrado, sob pena de se
desenvolver uma atividade inútil. Os fatos pertinentes, por sua vez, são objetos de
prova.
Fatos relevantes também são objetos de prova, porquanto podem
influenciar na convicção e no livre convencimento do juiz ao decidir a lide. Fatos
irrelevantes, por conseqüência são fatos impertinentes, que não podem ser objetos de
prova, pelas razões já colocadas.
Fatos notórios e fatos incontroversos independem de provas, vez em que o
primeiro é de conhecimento público, ultrapassando os limites da relação processual, e
o segundo é fato sobre o qual as partes envolvidas na relação processual não
divergem.
1 FILHO, Vicente Greco. Direito Processual Civil Brasileiro. 14ª ed. p. 179-180, v.2. 2 Idem.
Apenas fatos controvertidos serão objeto de prova. E por fim, independem
de prova os fatos em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.
Em suma, fatos objetos de prova são:
Fatos pertinentes
Revelantes
Controvertidos
Não notórios
Não submetidos à presunção legal
A corroborar com tal assertiva, dispõe o Código de Processo Civil, em seu
artigo 334:
“Não dependem de prova os fatos
I-notórios;
II-afirmados por uma parte e
confessados pela parte contrária;
III-admitidos no processo como
incontroversos;
IV- em cujo favor milita presunção
legal de existência ou de
veracidade.”
Em regra, o direito não é objeto de prova. Fato é que, quando o direito
invocado não compuser a legislação federal, a parte que o alegou deverá fazer prova
deste direito, seja ele componente da legislação estadual, municipal ou alienígena.
Na verdade, essas são as ditas legislações “setorizadas”, que não são de
conhecimento obrigatório do magistrado, por isso nasce aqui a necessidade de provar.
Já com relação ao direito federal, não há que se falar em “prova do direito”,
pois este sim é de conhecimento obrigatório do juiz.
Acerca do assunto, dispõe o artigo 337 do Código de Processo Civil:
“A parte, que alegar o direito
municipal, estadual, estrangeiro ou
consuetudinário, provar-lhe-á o teor
e a vigência, se assim o determinar o
juiz”.
1.3 MEIOS DE PROVA
O Código de Processo Civil prevê em seu capítulo VI, os meios de prova passíveis de utilização durante a instrução processual. São eles: o depoimento pessoal, a confissão, a exibição de documento ou coisa, a prova documental, a prova pericial e a inspeção judicial. Além disso, o artigo 332 do artigo supra prevê a permissão da utilização de:
“todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não
especificados neste código, que sejam hábeis a provar o fato a que se deseja consubstanciar”.
1.4 VALORAÇÃO DAS PROVAS
A valoração das provas ocorre no momento em que o juiz, diante do
conjunto probatório produzido pelas partes e constantes nos autos, atribui valor as
provas produzidas, atendendo aos fatos e as circunstâncias constantes nos autos, já que
não existe na lei determinação do peso legal de cada prova produzida.
O sistema que orienta a conclusão do magistrado é o sistema da persuasão
racional, consagrado no artigo 131 do Código de Processo Civil Pátrio, que dispõe:
“O juiz apreciará livremente a prova,
atendendo aos fatos e circunstâncias
constantes dos autos, ainda que não
alegados pelas partes; mas deverá
indicar, na sentença, os motivos que
lhe formaram o convencimento”.
No ato da avaliação das provas, é possível se valer de três sistemas que
podem nortear a conclusão do juiz: o sistema da livre apreciação ou convicção íntima
(aqui o juiz tem ampla liberdade de decidir independente do que consta nos autos e de
acordo com os critérios de valoração íntimos), o sistema da prova legal (onde cada
prova tem o seu valor, ficando o juiz vinculado às provas apresentadas, cabendo-lhe
apenas computar o que lhe foi apresentado), e o sistema da persuasão racional do juiz
(sistema que vige no Brasil, onde o juiz tem a liberdade de apreciar a prova e a
obrigatoriedade de fundamentar a sua decisão).
Dessa forma, diante do caso discutido, o magistrado poderá valorar as
provas de acordo com a sua liberdade de apreciação, porém sem se desvincular do
material probatório constante nos autos, devendo assim, fundamentar as razões de seu
convencimento, em respeito ao princípio da verdade formal.
Tal fundamentação assegura as partes aferirem que a convicção do
magistrado foi realmente extraída do material probatório constante nos autos e
também que os motivos levam logicamente à conclusão obtida na sentença.
1.5 PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ
O juiz tem grande importância para bom andamento do processo e no seu
deslinde, bem como desenvolve um trabalho ativo e de grande relevância na instrução
processual.
O magistrado, ao desempenhar sua função como representante do Estado-
Jurisdição deve ter o objetivo de atingir a harmonia e paz social por meio do processo,
pois assim, estará cumprindo a função social deste. Para julgar os processos sob sua
jurisdição, o juiz irá se valer das provas legais e moralmente legítimas produzidas
pelas partes e trazidas aos autos, bem como, quando estas não forem suficientes para
motivar a sua decisão, pode determinar a produção de ofício das provas que entender
necessárias para formar seu convencimento.
No processo civil brasileiro moderno, o juiz passa a exercer uma função
mais atuante e mais participativa. O magistrado está investido no cargo de uma forma
mais investigativa, isto ocorre, com suporte nas reformas processuais que ocorreram
nas últimas décadas. Assim, resta claro a importância do juiz que é uma das peças
fundamentais na condução do processo, pois depende dele em grande parte, o correto
desenrolar da lide para trazer justiça às partes e fazer cumprir a função estatal, tudo
isto com base na provas contidas nos autos.
1.6 MOMENTOS DA PROVA
São quatro os momentos da prova: requerimento, deferimento, produção e
apreciação da prova.
O requerimento das provas deve ser feito na petição inicial do Autor ou na
contestação do Réu.
Artigo 282 do Código de Processo Civil:
“A petição inicial indicará:
VI- as provas com que o autor
pretende demonstrar a verdade dos
fatos alegados”.
Artigo 300 do Código de Processo Civil:
“Compete ao réu alegar, na
contestação, toda matéria de defesa
expondo as razões de fato e de
direito, com que impugna o pedido do
autor e especificando as provas que
pretende produzir”.
Dessa forma, o magistrado só pode determinar prova de ofício em
complementação de prova já requerida (em respeito ao princípio do dispositivo), sob
pena de comprometer-se e perder a condição de imparcialidade que lhe é necessária e
da qual é revestido.
O momento do deferimento é executado pelo magistrado quando profere o
despacho saneador, deferindo assim as provas que deverão ser produzidas no curso do
processo e que foram requeridas pelas partes.
Como exemplo, o momento da produção de prova oral é na própria
audiência de instrução e julgamento designada pelo juiz, também sendo possível a
produção antecipada de prova, se ela for necessária para assegurar a efetividade do
processo principal, por meio de processo cautelar próprio.
1.7 ÔNUS DA PROVA
Ônus é um encargo, uma incumbência, o que difere de um dever, pois este
com o seu descumprimento gera conseqüência. Com relação ao ônus, essa
conseqüência “pode” existir.
No artigo 333 do Código de Processo Civil, temos regras subjetivas,
relacionadas às partes:
Artigo 333 do Código de Processo Civil:
“O ônus da prova incumbe:
I- ao autor, quanto ao fato
constitutivo de seu direito;
II- ao réu, quanto à existência de
fato impeditivo, modificativo ou
extintivo do direito do autor”.
Assim, ao autor cabe fazer a prova do fato que alega, e ao réu, produzir as
provas de fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito do autor.
Embora o artigo supra fale apenas da figura autor- réu, mister se faz à
distribuição do ônus da prova entre todos os sujeitos que figuram como partes no
processo.
Assim, temos a figura do litisconsorte ativo, a quem cabe a prova dos fatos
constitutivos de seu direito na petição inicial; litisconsortes passivos, a quem compete
à produção de prova de fato extintivo, impeditivo ou modificativo do direito do autor;
assistente que terá o mesmo ônus probatório do assistido; litisdenunciado que é réu da
ação de regresso proposta pelo denunciante, a quem compete à produção de prova de
fato extintivo, impeditivo ou modificativo do direito do autor, e na qualidade de
assistente litisconsorcial do denunciante terá os mesmos ônus probatórios que este
tiver na relação ao litígio com o adversário comum.
Temos também o chamado ao processo, sendo também réu em
litisconsórcio passivo com o chamador, aplicasse o inciso II do artigo 333 do Código
de Processo Civil; o nomeado ao processo também se encaixa neste inciso se aceitar a
nomeação e assumir a condição de réu no litígio; o Ministério Público sempre deverá
provar os fatos alegados nas causas em que militar, quando atuar como fiscal da lei.
Entretanto, temos também quem afirme que estas regras dispostas neste
artigo são direcionadas ao juiz, sendo assim regras objetivas, pois ele (magistrado) se
valerá delas no momento da realização de seu julgamento.
Ressalte-se aqui que se já existem provas nos autos não há que se falar em
ônus, pois o magistrado julga conforme as provas existentes, independente de quem as
produziu. Porém, somente sobre fatos trazidos aos autos é que se pode falar em ônus.
Nesta linha, Cândido Rangel Dinamarco ensina que:
“somente quanto aos fatos que
integram o objeto da prova pode
existir, para alguma das partes, o
ônus de provar. Assim, como fato não
provado equivale a fato não alegado,
para o processo fato não alegado é
fato irrelevante e, portanto não
poderá ser fundamento da decisão
nem será objeto de prova
(ressalvados os raros casos em que o
juiz suscita de ofício fatos não
alegados). Desse modo, nenhum fato
irrelevante será provado no processo
e, portanto ninguém terá o encargo
de prová-lo” 3.
Ainda em se falando de ônus probatório, importante mencionar os casos de
inversão deste ônus, que ocorre em três situações, no caso de presunções legais,
inversão contratual e no caso de inversão do ônus prevista no artigo 6° do Código de
Direito do Consumidor. Abaixo segue o quadro explicativo, para melhor entendimento
da questão:
Presunções legais: no caso de réu revel, ele fica dispensado de
provar em virtude dos efeitos da revelia;
Inversão contratual: ela é possível nos contratos, salvo se a
questão versar sobre os direitos indisponíveis, e se a inversão
tornar excessivamente difícil o exercício do direito de provar;
Inversão prevista no artigo 6° do Código de Direito do
Consumidor: esta inversão se dá por ato do magistrado,
quando verifica que o consumidor é figura hipossuficiente na
3 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª ed. p. 72. v.III.
relação processual, ou ainda constata verossímeis as suas
alegações.
CAPÍTULO II – PRINCÍPIOS 2.1 DEVIDO PROCESSO LEGAL
Este princípio previsto em nossa Constituição Federal garante ao indivíduo ser devidamente processado nos termos de normas jurídicas anteriores ao fato que ensejou a instauração do competente processo.
Artigo 5° inciso LIV da Constituição Federal: “Ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Assim, toda pessoa deve estar sujeita ao crivo do Poder Judiciário, frente a
qualquer imposição que atinja a sua liberdade ou os seus bens. Esse crivo atuará mediante o juiz natural, em processo onde o contraditório é garantido e assegurado a ampla defesa. Sobre o assunto, Alexandre de Moraes se manifesta no sentido de que:
“o devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao assegurando-lhe paridade total de condições com o
Estado-persecutor e plenitude de defesa (direito a defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável4”.
2.2 CONTRADITÓRIO Alexandre de Moraes ensina ainda acerca do contraditório:
“é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor5“.
Assim, tem-se por este princípio, que as partes devem ser intimadas de todos os atos processuais praticados no processo e devem poder reagir contra aqueles que considerem prejudiciais.
2.3 AMPLA DEFESA
Por ampla defesa, entende-se o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário.
2.4 DISPOSITIVO
Este princípio reza que o magistrado deve julgar de acordo com o ora alegado e provado pelas partes. Em síntese, o juiz não pode levar em conta os fatos que não foram alegados pelas partes, tampouco formar sua convicção com meios que não se produziram com observância as regras gerais.
Existem duas críticas neste contexto: a primeira versa sobre a questão das provas produzidas de ofício, pelo juiz, que não foram apresentadas pelos litigantes. A segunda aborda a questão de estabelecer que, quando se trata de direito, inexiste saber
4 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 12ª ed. p. 124. 5 Idem. p. 124.
privado. Este preceito está presente no artigo 2°, 128, 130 e 132 parágrafo único do Código de Processo Civil.
Artigo 2° do Código de Processo Civil:
”Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e forma legais”.
Artigo 128 do Código de Processo Civil:
“O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito à lei exige iniciativa da parte”.
Artigo 130 do Código de Processo Civil: “Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias”.
Artigo 132 parágrafo único do Código de Processo Civil “Em qualquer hipótese, o juiz que proferir a sentença, se entender necessário, poderá mandar repetir as provas produzidas”.
2.5 ORALIDADE De acordo com esse princípio, os atos processuais devem ser
predominantemente orais. Este princípio possibilita a obtenção de melhor resultado, conforme a
lei e a verdade dos fatos que forem prestigiadas com explanações retóricas. Ainda não é tão presente no processo civil, em contrapartida, no direito do trabalho e nos juizados especiais federais a oralidade é muito utilizada.
2.6 IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ
Reza este princípio que o magistrado que presidir a instrução do processo, a audiência, e que colher as provas orais, será o juiz que irá proferir a sentença. Isso porque o juiz que tiver maior contato com as partes e testemunhas terá melhores condições de sentenciar o feito do que aquele magistrado que não tenha presidido a audiência. 2.7 CONCENTRAÇÃO DOS ATOS PROCESSUAIS
Por este princípio, tem se que todos os atos do processo, inclusive a sentença, devem ser realizados o mais proximamente possível uns dos outros, para que o magistrado possa proferir uma decisão justa e concisa.
A proximidade temporal entre aquilo que o juiz apreender, por sua
observação pessoal, e o momento em que deverá avaliá-lo na sentença, é elemento decisivo para a preservação das vantagens do princípio em tela.
A corroborar com tal assertiva, temos o artigo 455 do Código de
Processo Civil: “A audiência é uma e contínua. Não sendo possível concluir num dia só, a instrução, o debate e o julgamento, o juiz marcará o seu prosseguimento para dia próximo”.
Para ressaltar esse princípio, temos ainda o artigo 456 do Código de Processo Civil:
“Encerrado o debate ou oferecido os memoriais, o juiz proferirá a sentença desde logo ou no prazo de 10 (dez) dias”.
Tais artigos deixam perfeitamente claro que o lapso temporal é importante neste princípio, pois quanto mais próximos os atos processuais, maior lógica entre eles e melhor e mais conclusiva será a sentença proferida pelo magistrado.
Tem-se aqui que a lógica dos atos processuais leva o Juiz à proferir a sentença mais conclusiva, fundamentada e com melhores qualidades, em virtude da concentração dos atos processuais.
2.8 IMEDIATIDADE
Este princípio é um dito “desdobramento” do princípio da oralidade, disposto no artigo 446, II, do Código de Processo Civil: “Compete ao juiz em especial
II-proceder direta e pessoalmente à colheita das provas”.
Dessa forma, o juiz deve, imediatamente, colher as provas, para que assim possa proferir a sentença investido de maior segurança para que de forma conclusiva, diga o direito.
2.9 IRRECORRIBILIDADE EM SEPARADO DAS DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS
As decisões proferidas intermediariamente não podem ser recorridas no mesmo procedimento, para evitar que sofram interrupções constantes e com isso protele-se à prestação jurisdicional final, por isso é necessário recorrer das decisões interlocutórias em separado, em que o recurso próprio no caso é o agravo de instrumento.
2.10 AQUISIÇÃO PROCESSUAL
O princípio da aquisição processual ou comunhão das provas expõe que a prova não pertence à parte. Uma vez produzida, passa a integrar o processo, pouco importando quem a produziu. Tanto que, não pode a parte seccionar a prova para aproveitar apenas a parcela que lhe interessa apresentada em juízo, a prova pertence ao processo e não as partes, podendo ser aproveitada em favor ou desfavor de qualquer pólo (ativo ou passivo) da demanda.
2.11 LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO PELO JUIZ O magistrado pode se valer do seu livre convencimento para decidir uma
questão, devendo tão somente fundamentar as razões de seu convencimento, em face dos elementos dos autos e do ordenamento jurídico.
Ainda que a matéria controvertida exija a participação de expert, o convencimento do Juiz não fica adstrito a este, pois o juiz considera sempre a integralidade do conjunto probatório existente nos autos.
CAPÍTULO III - DO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PROVA ILÍCITA 3.1 CONCEITO DE PROVA ILÍCITA
A proibição da prova ilícita no processo é preceito de ordem constitucional, contido no artigo 5°, inciso LVI, que dispõe: “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
Assim, para conceituar prova ilícita e diferenciá-la de ilegítima e ilegal,
vale aqui dar destaque as palavras do Professor e Membro do Ministério Publico Ailton Cocurutto:
“Por ora, podemos consignar que provas ilícitas são aquelas colhidas em infringência as normas de direito material, por exemplo, a obtida mediante tortura física ou psicológica. Consoante a melhor doutrina, as provas ilícitas não se
confundem com as provas ilegais e as ilegítimas. Ilícitas são as obtidas com afronta ao direito material. Ilegítimas são as obtidas em desrespeito ao direito processual. Ilegais são as que afrontam o ordenamento jurídico como um todo, de modo que são o gênero da qual são espécies as provas ilícitas e ilegítimas6”.
Do conceito supra, extraem-se as diferenças entre ambos os tipos de provas, pois enquanto prova ilícita é aquela prova que ofende o direito material, prova ilegítima fere preceito de ordem processual, porquanto, prova ilegal fere todo o ordenamento jurídico, todo um conjunto jurídico.
Cândido Rangel Dinamarco conceitua prova ilícita da seguinte forma:
“Prova ilícita são as demonstrações de fato obtidas por modos contrários ao direito, que no tocante as fontes de prova, quer quanto aos meios probatórios. A prova será ilícita – ou seja, antijurídica e, portanto ineficaz a demonstração feita – quando o acesso à fonte probatória tiver sido obtido de modo ilegal ou quando a utilização da fonte se fizer por modos ilegais. Ilicitude da prova, portanto, e ilicitude na obtenção das fontes ou ilicitude na aplicação dos meios7.”.
O Código de Processo Civil, em seu artigo 332, dispõe sobre o tema:
“Todos os meios legais, bem como os moralmente ilegítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa”.
6COCURUTTO, Ailton. Fundamentos de Direito Processual. 1ª ed. p. 65. 7 DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª ed. p.49.
Ressalte-se que a prova ilícita é vedada expressamente pela Constituição Federal e vedada também pelo nosso Código de Processo Civil, que só admite as provas moralmente legítimas e obtidas por meios legais.
3.2 DA INADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA NO PROCESSO CIVIL
A Constituição Federal, no artigo 5º prevê em seu inciso LVI que são
inadmissíveis no processo as provas obtidas por meio ilícito. São as denominadas
provas vedadas.
O direito à produção de provas, como já dito, não é absoluto. Não é
admissível que o direito garanta a produção de provas em detrimento de valores
exaltados pela sociedade, como a moralidade e a legitimidade, ou ainda em detrimento
dos direitos e garantias fundamentais do homem. Além disso, a doutrina entende que
não é aconselhável a liberdade ampla na produção de provas, visto que as provas
podem ser inidôneas a produzir o convencimento, em virtude de falta de base
científica no seu fundamento, ou pela possibilidade de ensejarem a manipulação ou a
fraude, ou ainda por representar um constrangimento pessoal inadmissível ao sujeito
que a produz. 8
Nesse sentido, se manifesta Humberto Theodoro Júnior, frisando que a
atividade processual não poderá ficar distraída ou impassível à conduta ilícita da parte
para influir na atividade do órgão jurisdicional. Preleciona ainda que:
"quando veda a prova obtida
ilicitamente, o que tem em mira é o
preceito constitucional, não é o fato
processual em si mesmo, mas a
necessidade do coibir e desestimular a
violação às garantias que a Carta Magna
e o ordenamento jurídico que a 8 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 6ª ed. Salvador: Juspodium, 2006. P. 493
complementa instituíram como regras
indispensáveis à dignidade humana e à
manutenção do império da lei9".
Em análise do acima exposto, verifica-se que a vedação da prova ilícita consistiria
em certa “repressão”, melhor dizendo, uma desistimulação a produção de provas ilícitas, que
violem os direitos constitucionais.
As provas ilícitas em comento nunca devem ser confundidas com as provas
ilegais e as ilegítimas. Reitere-se aqui que as provas ilícitas são aquelas, como ditas,
obtidas através de violação de normas de direito material enquanto as ilegítimas são
aquelas obtidas através de violação ao direito processual. As provas ilegais, por sua
vez, são o gênero do qual são espécies as provas ilícitas e as ilegítimas.
Frederico Marques completa o entendimento pela inadmissibilidade da
prova ilícita:
"o ordenamento jurídico é uma
unidade e, assim, não é possível
consentir que uma prova ilícita,
vedada pela Constituição ou por lei
substancial, possa ser aceita no
âmbito do processual".
Existem diversos critérios para a inadmissibilidade de determinado meio de
prova. As provas podem ser consideradas ilícitas em virtude de seu objeto, em virtude
9 THEODORO JÚNIOR, Humberto - A Gravação de conversa telefônica como meio de prova, www.oab-mg.org,br
do meio pela qual foram obtidas, em virtude de seu valor ou ainda em virtude do meio
pelo qual elas são inseridas no processo.
3.3 DA ADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA NO PROCESSO CIVIL
Esta é uma questão extremamente controvertida no meio jurídico, e no
âmbito do processo civil existem posições bem divergentes. Enquanto alguns
defendem radicalmente a admissão das provas ilícitas, outros entendem que a
admissibilidade da prova ilícita é inconstitucional e, portanto, nunca deve existir.
Segundo o doutrinador Barbosa Moreira: 10
"De acordo com a primeira tese devem prevalecer
em qualquer caso o interesse da Justiça no
descobrimento da verdade, de sorte que a ilicitude da
obtenção não subtraia à prova o valor que possua
como elemento útil para formar o convencimento do
juiz, a prova será admissível, sem prejuízo da sanção
a que fique sujeito o infrator.
Já para a segunda tese, o direito não pode prestigiar
o comportamento antijurídico, nem consentir que
dele tire proveito quem haja desrespeitado o preceito
legal, com prejuízo alheio; por conseguinte, o órgão
judicial não reconhecerá eficácia à prova
ilegitimamente obtida".
A controvérsia do tema se encontra, substancialmente, na ponderação entre
os direitos fundamentais do homem e a sua inviolabilidade, e os princípios processuais
civis, aliados à tentativa, essencial ao processo, da busca da verdade substancial ou
material, para que assim se atinja um dos direitos constitucionais do homem, qual seja
o acesso ao provimento jurisdicional.
10 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de Direito Processual, 6 ed, Saraiva, São Paulo, p. 108.
Não há que se falar em hierarquia entre princípios constitucionais, e por
isso a discussão se torna ainda mais complicada.
Pugnando pela admissão das provas ilícitas, temos Nelson Nery Jr.,
afirmando que: “A ilicitude do meio de obtenção da prova seria afastada quando, por
exemplo, houver justificativa para a ofensa a outro direito por aquele que colhe a
prova ilícita11”.
Está presente neste pensamento de Nelson Nery Jr., a teoria da
proporcionalidade, onde se deve analisar o caso concreto para assim decidir pela
admissão ou inadmissão da prova ilícita.
Essa corrente da proporcionalidade é fundada na ponderação sobre qual
dos bens jurídicos tutelados pelos princípios são mais importantes, o direito à imagem,
à privacidade, enfim, às garantias fundamentais, ou o direito à prova, ao contraditório
pleno, ao livre acesso à justiça. Esses são os fundamentos que levam essa corrente
minoritária a pensar que o melhor caminho é a análise do caso concreto.
Na possibilidade de antinomia entre os princípios constitucionais, gerada a
partir da decisão sobre a admissibilidade ou não de provas ilícitas, tem-se que a
melhor solução é avaliar a peso, e a importância dos bens jurídicos tutelados e
verificar qual deles deve prevalecer, análise esta sugerida por Dwork 12 quando trata
da antinomia de princípios. Este doutrinador sugere que para solucionar estes conflitos
é necessário refletir sobre a axiologia vigente na sociedade no momento em que o 11 JR., Nelson Nery. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. São Paulo. ed. RT,5ª ed, 1999 p.151. 12 MAGALHÃES, Luzivan Falcão Cabral. A ilicitude probatória em conflito: a proporcionalidade como meio de superação. Site do Curso de Direito da UFSM. Santa Maria-RS. Disponível em: <http://www.Ufsm.br/direito/artigos/processo-penal/ilicitude-probatoria.htm>
conflito é analisado, valorando o que é relevante segundo o senso comum, e
desvalorando o que deve ser minorado, também segundo a sociedade de um modo
geral. É a utilização do chamado princípio da proporcionalidade, mencionado por
Paulo Bonavides. 13
Alguns doutrinadores entendem, no entanto, que existem alguns critérios
que norteiam a análise da admissibilidade, tais como a imprescindibilidade, a
proporcionalidade e a punibilidade do agente que pratica o ato de onde se origina a
prova.
A imprescindibilidade informa que a prova somente poderá ser admitida
quando esta for absolutamente imprescindível, o que quer dizer, quando não houver
nenhuma outra forma de provar o alegado a não ser a prova em questão14.
A proporcionalidade informa que o juiz deverá, no momento da decisão da
admissibilidade, sopesar os valores vigentes na sociedade para assim aferir qual deve
ser o valor a prevalecer.
A punibilidade do agente por sua vez, informa que, qualquer que seja a
decisão adotada pelo juiz no sentido de admitir ou não a prova em questão, o agente
que a praticou deve ser punido pela prática de ato vedado pela lei.
13 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 17ª ed. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2005. P. 398 14 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 6ª ed. Salvador: Juspodium, 2006. P. 495
3.4 DO POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL
Importante trazer alguns julgados com relação ao tema em embate, para melhor
elucidação da questão controvertida. Abaixo segue um julgado cível do Supremo Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo:
Processo civil. Prova. Gravação de
conversa telefônica feita pela autora
da ação de investigação de
paternidade com testemunha do
processo. Requerimento de juntada
da fita, após a audiência da
testemunha, que foi deferido pelo juiz.
Tal não representa procedimento em
ofensa ao disposto no art. 332 do
CPC, pois aqui o meio de produção
da prova não é ilegal, nem
moralmente ilegítimo. Ilegal é a
interceptação, ou a escuta de
conversa telefônica alheia (grifo
nosso). Objetivo do processo, em
termos de apuração da verdade
material ("a verdade dos fatos em que
se funda a ação ou a defesa").
Recurso especial não conhecido.
Votos vencidos. Por maioria, não
conhecer do recurso especial.
Vencidos os srs.ministros relator e
Waldemar Zveiter. Resp 9012/RJ.
Apelação cível n°: 70014607683, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do
Sul/RS:
Apelação Cível. Anulação e revisão de contrato.
Confissão de dívida. Prova ilícita. A gravação
de telefonema feita por um dos interlocutores
não constitui prova ilícita. Precedentes do STJ
(grifo nosso). A prova não confirma a prática
de usura ou vício de vontade capaz de justificar
a nulidade de escritura pública da confissão de
dívida e constituição de hipoteca.
Improcedência de todos os pedidos.
Segue a ementa da apelação cível julgada no Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul, onde resta caracterizada que a gravação de ligação telefônica de terceiros, mesmo
que com a anuência de um dos interlocutores, consubstancia-se prova ilícita perante o
interlocutor inciente de tal circunstância:
Responsabilidade civil. Ação de indenização
por danos morais e materiais de ex-empregado
em virtude de referências desabonatórias
fornecidas deliberadamente por ex-
empregadora. Agravo retido. Contradita.
Gravação de ligação telefônica de terceiros
com o assentimento de um dos interlocutores.
Prova ilícita frente ao interlocutor não
insciente. Acusações não comprovadas. É de ser
mantida a contradita realizada frente à
testemunha que auxiliou a autora na produção
de prova ilícita para instruir a presente
demanda. A gravação de ligação telefônica de
terceiros, mesmo que com a anuência de um
dos interlocutores, consubstancia-se prova
ilícita perante o interlocutor insciente de tal
circunstância (grifo nosso). Ausência de
quaisquer das hipóteses excepcionais a
justificar a utilização da prova havida por
ilícita. Precedentes do TJRS e do STF. No
mérito, os elementos de convicção trazidos à
baila não dão baluarte à versão esponsada na
exordial, de que a demandada teria prestado
informações desabonatórias com relação à
pessoa da autora frente à solicitação de
referência por parte de outros empregadores
potenciais, motivo pelo qual a improcedência
da pretensão indenizatória é medida que se
impõe. Negaram provimento ao agravo retido.
Desproveram o apelo. Apelação cível n°:
70022288245, Quinta Câmara Cível, Tribunal
de Justiça do RS. Relator: Paulo Sérgio
Scarparo, julgado em 12/12/07.
Segue ainda decisão do Tribunal de Minas Gerais sobre o assunto:
Indenização por danos materiais e morais.
Acidente de trânsito. Culpa comprovada do
condutor. Responsabilidade solidária do
proprietário do veículo. Prova ilícita.
Inadmissível. Prova pericial. Presunção “iuris
tantun”. Valor de indenização. Devido.
Responde o proprietário do veículo,
solidariamente, pelos prejuízos causados por
condutor a terceiro, independente de qualquer
relação existente entre os mesmos. A prova
ilícita deve ser extirpada do processo, por mais
relevância que tenha, principalmente diante
dos modernos princípios de direito
constitucional (grifo nosso). Apelação cível n°:
2.0000.00.508832-4/000 – Comarca de Sete
Lagoas – Relator: Exmo. Sr. Des. Pereira da
Silva.
Constata-se assim que o tema em embate não é uma questão pacífica tanto na doutrina
quanto na jurisprudência, é o que resta demonstrado pelas decisões colacionadas ao
presente estudo.
3.5 DA PROVA EMPRESTADA
A prova emprestada não está nos meios de provas previstos no Código de
Processo Civil, mas é igualmente admissível.
Prova emprestada nada mais é que a prova retirada de outro processo,
admitindo-se a sua validade contra quem também participou do processo anterior e
pôde contraditá-la (aspecto esse fundamental para a admissão desta prova).
Essa prova, porém, terá o seu valor novamente atribuído/apreciado pelo
magistrado da causa em que foi juntada, tendo em vista as novas circunstâncias na
segunda ação e novos argumentos sobre ela apresentados.
Ressalte-se, porém que só é possível juntar prova emprestada no processo
discutido se a prova ora alegada não está contaminada pela ilicitude, pois se
contaminada não é hábil para provar os fatos alegados.
A doutrina majoritária opõe certas restrições à admissibilidade da prova
emprestada, devendo ser observados alguns requisitos para sua eficácia em outro
processo, que são:
a) a parte contra quem a prova é produzida deverá ter participado do
contraditório na construção da prova no processo em que a originou;
b) existência de identidade entre os fatos do processo anterior com os fatos
a serem provados, deve haver ligação; e
c) que seja impossível ou difícil à reprodução da prova emprestada no
processo em que se pretenda demonstrar a veracidade de certa alegação15.
Reitere-se aqui que a pessoa contra quem é produzida a prova
emprestada deve ter sido parte no processo que a originou, processo este onde o
contraditório foi assegurado, pois só assim a prova emprestada terá validade. O juiz
poderá se for o caso, determinar a produção de prova emprestada ex offício, aplicando-
se aqui a regra do artigo 130 do Código de Processo Civil, que dispõe:
“Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da
parte, determinar as provas necessárias à
instrução do processo, indeferindo as
diligências inúteis ou meramente
protelatórias”.
3.6 DA PROVA ILÍCITA POR DERIVAÇÃO
15 http://www.tex.pro.br/wwwroot/00/071019apontamentos_max.php
Prova ilícita por derivação diz respeito àquelas provas em si mesmas
lícitas, mas a que se obteve por intermédio de uma determinada informação obtida por
prova ilicitamente colhida.
O ilustre Alexandre de Moraes conceitua prova ilícita por derivação da
seguinte forma:
“Em conclusão, as provas ilícitas,
bem como todas aquelas que dela
deriva, são constitucionalmente
inadmissíveis, devendo, pois, serem
desentranhadas do processo, não
tendo, porém, o condão de anulá-lo,
permanecendo as demais provas
lícitas e autônomas delas não
decorrentes 16”.
Dessa forma, toda prova derivada da prova obtida de forma ilícita, também
seguirá a sua sorte. Ada Pellegrini Grinover bem ressalta que esta prova é regida pela
chamada:
“Teoria dos frutos da árvore
envenenada, cunhada pela Suprema
Corte americana, segundo a qual o
vício da planta se transmite a todos
os seus frutos 17”.
16 MORAES, Alexandre de Moraes. Direito Constitucional. 12ª ed. p.129 17 GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal 8ª ed. p. 163
Dessa forma, toda prova obtida por intermédio de informação obtida de
forma ilícita não será válida para comprovar fatos, devendo seguir a teoria da árvore
envenenada mencionada por Ada Pellegrini Grinover.
Neste contexto, é necessário se fazer uma observação:
“Se a prova ilícita não foi
absolutamente determinante para o
descobrimento das derivadas, ou se
estas derivam de fonte própria, não
ficam contaminadas e podem ser
produzidas em juízo18”.
Por isso, é necessária especial atenção neste aspecto, que se apresenta de
forma muito sutil, mas que pode cominar com a admissão da prova obtida.
3.7 CONSEQÜÊNCIAS DA ADMISSÃO DA PROVA ILÍCITA
E qual seria a conseqüência da admissão de uma prova ilícita no bojo de
um processo? Entende a doutrina dominante que a prova ilícita, sendo considerada
pela Constituição brasileira como inadmissível, não pode sequer ser juntada aos autos.
Porém, se for o caso, nasce o direito de exclusão da prova.
Se uma sentença basear-se em prova obtida ilicitamente será
considerada, como regra, nula. Porém, se o magistrado comprovar que fundamentou
sua decisão em outras provas existentes no processo, a prova ilícita deverá ser
desentranhada dos autos, mas a sentença será válida.
Se apesar da vedação à admissão processual das provas ilícitas, as mesma
forem produzidas e valoradas, este problema não se resolverá dentro da esfera
18GRINOVER, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal 8ª ed. p. 163
processual, pois nesse caso, trata-se de atipicidade constitucional, considerando que as
provas obtidas ilicitamente sempre estão a violar algum preceito constitucional que se
traduz em norma de garantia.
Assim impõe-se como conseqüência da atipicidade constitucional, a total
ineficácia jurídica das provas ilícitas que ingressarem no processo.
Se a prova ilícita tiver sido admitida no primeiro grau de jurisdição, caberá
ao Tribunal em grau de recurso desconsiderá-la; não ocorrendo, na hipótese,
supressão de um grau de jurisdição, uma vez que a questão controvertida foi objeto de
apreciação no juízo a quo. Se a sentença transitou em julgado, e se apoiou,
exclusivamente, numa prova ilícita, seus efeitos poderão ser rescindidos com a
impetração de ação rescisória, onde será alegará a violação do disposto no art. 5º, LVI
da Constituição Federal.
CONCLUSÃO
Conclui-se, portanto, que a melhor solução é a não admissão da prova
ilícita em hipótese alguma, em respeito ao que dispõe a nossa Constituição Federal em
seu artigo 5°, inciso LVI, ao vedar expressamente a prova ilícita. “São inadmissíveis, no
processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
Isso porque, em primeiro lugar deve-se respeitar a nossa Lei Maior,
garantidora do Estado Democrático de Direito, assegurando ao indivíduo direito à
imagem, a intimidade, e impondo limites na produção probatória, evitando assim que
provas obtidas mediante ofensa ao direito material sejam admitidas no processo.
As provas devem respeitar os limites impostos pela Constituição Federal, e
não há que se falar em flexibilização do princípio da proibição da prova ilícita, pois se
assim ocorrer, a Constituição Federal deixa de ser a nossa Lei Maior e cede às
questões inferiores e particulares do subjetivismo de cada caso.
Vale dizer que a prova ilícita deve ser sempre rejeitada, reputando-se assim
não apenas a afronta ao direito positivo, mas também aos princípios gerais do direito,
especialmente nas Constituições assecuratórias de um critério extenso quanto ao
reconhecimento de direitos e garantias individuais.
Finalizando o raciocínio, toda e qualquer prova ilícita deve ser
radicalmente repudiada no processo, garantindo assim a legalidade processual e
evitando a inconstitucionalidade das provas produzidas, vez em que o direito não deve
proteger alguém que tenha infringido preceito legal para obter qualquer prova, com
prejuízo alheio. Nestes casos, o órgão jurisdicional tem o dever de ordenar o
desentranhamento dos autos da prova ilicitamente obtida, não lhe reconhecendo
eficácia.
Este é o preço que se paga por viver em um Estado Democrático de Direito,
sob a égide de uma Constituição Federal defensora dos valores democráticos,
deixando para trás o sistema de exceção, em que as garantias individuais e sociais
eram diminuídas, e algumas vezes, até ignorada, e cuja finalidade precípua era
garantir os interesses da ditadura.
BIBLIOGRAFIA
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Oliveira, 2004.
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