CENTRO INTEGRADO DE ESTUDOS E PESQUISAS DO … · Segundo a tradicional filosofia da Medicina...

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CENTRO INTEGRADO DE ESTUDOS E PESQUISAS DO HOMEM - CIEPH CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM NATUROPATIA NINA UGNIWENKO DIETOTERAPIA CHINESA PRINCÍPIOS ALIMENTARES DENTRO DE UM SISTEMA TERAPÊUTICO MILENAR. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA. FLORIANÓPOLIS 2015

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CENTRO INTEGRADO DE ESTUDOS E PESQUISAS DO HOMEM - CIEPH

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM NATUROPATIA

NINA UGNIWENKO

DIETOTERAPIA CHINESA

PRINCÍPIOS ALIMENTARES DENTRO DE UM SISTEMA TERAPÊUTICO MILENAR.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.

FLORIANÓPOLIS

2015

NINA UGNIWENKO

DIETOTERAPIA CHINESA

PRINCÍPIOS ALIMENTARES DENTRO DE UM SISTEMA TERAPÊUTICO MILENAR.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.

Artigo apresentado ao Curso de Pós-Graduação em Naturopatia, do Centro Integrado de Estudos

e Pesquisas do Homem (CIEPH), como requisito para obtenção do título de Especialista.

Orientadora: Profa. Francine Ferrari

FLORIANÓPOLIS

2015

NINA UGNIWENKO

DIETOTERAPIA CHINESA

PRINCÍPIOS ALIMENTARES DENTRO DE UM SISTEMA TERAPÊUTICO MILENAR.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.

Artigo apresentado ao Curso de Pós-Graduaçao em Naturopatia,

do Centro Integrado de Estudos e Pesquisas do Homem (CIEPH), como requisito para obtenção do título de

Especialista.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________________

Profa. Msc. Francine Ferrari Centro Integrado de Estudos e Pesquisas do Homem - CIEPH

____________________________________________ Prof. Esp. Marcelo Fabián Oliva

Centro Integrado de Estudos e Pesquisas do Homem - CIEPH

____________________________________________

Profa. Msc. Luisa Regina Pericolo Erwig Banca

Centro Integrado de Estudos e Pesquisas do Homem - CIEPH

Florianópolis, ______________ de _______________ de 2015.

RESUMO

A dietoterapia chinesa é uma das práticas da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) e

profundamente enraizada no seu amplo contexto terapêutico e filosófico há milhares de anos. O objetivo da dietética chinesa é alcançar o equilíbrio interno por meio de uma composição alimentar harmônica e energeticamente equilibrada. A presente revisão bibliográfica objetivou conhecer os princípios que regem a terapia nutricional

chinesa dentro do sistema terapêutico milenar da MTC. Constatou-se que a dietética chinesa se fundou através da observação dos elementos da natureza e muito antes das pequisas modernas sobre a nutrição ocidental. Diferentemente dela, a dietoterapia chinesa classifica os alimentos conforme seus aspectos energéticos e

os efeitos que os diferentes sabores, naturezas e movimentos exercem no organismo de cada indivíduo. Os dados desta pesquisa foram coletados em bibliotecas universitárias e sites de busca relacionados com o tema.

Palavras chave: Dietoterapia Chinesa. Medicina Tradicional Chinesa. Terapia

alimentar chinesa.

ABSTRACT

The Chinese dietetic therapy is one of the pillars of the Traditional Chinese Medicine (TCM) and deeply rooted in its broad therapeutical and philosophical context for thousands of years. The Chinese dietetics objective is to achieve inner balance

through a harmonic and energetically balanced diet. The present bibliographic review shows the main points of the Chinese nutritional therapy within the ancient therapeutic concepts of TCM. The Chinese nutrition therapy has its origins in the observation of the elements of nature long before the modern research of western

nutrition existed. Unlike the latter, the Chinese dietetic classifies food according to the energetic aspect of each aliment and impact the different tastes, natures, and movements may have on the organism of each individual person. University libraries and search engines results related to the subject were used for the research of this summary.

Key words: Chinese dietetic therapy, Chinese Tradicional Medicine, Chinese

nutrition therapy

ZUSAMMENFASSUNG

Die Chinesische Diätetik ist eine der Haupttherapieverfahren der Traditionellen Chinesischen Medizin (TCM). Sie ist seit tausenden von Jahren tief mit deren breiten therapeutischen und philosophischen Kontext verwurzelt. Ziel der chinesischen

Ernährungslehre ist, mit einer harmonischen und energetisch ausgewogenen Nahrungsmittelzusammenstellung das innere Gleichgewicht zu erlangen. Die vorliegende bibliographische Arbeit stellt die Grundprinzipien vor, welche der chinesischen Diätetik innerhalb der antiken therapeutischen Lehre der TCM zu

Grunde liegen. Die chinesische Ernährungstherapie entstand bereits lange vor den modernen Forschungen der westlichen Ernährungswissenschaften, aus der Beobachtung der Naturelemente. Im Gegensatz zu ihr, stuft die chinesische Diätetik Nahrungsmittel in ihre energetischen Aspekte und Effekte ein, welche

Temperaturverhalten, Geschmäcker und Wirkrichtungen auf den Organismus jedes Individuums ausüben. Die Daten dieser Studie wurden anhand von Literatur aus Universitätsbibliotheken und mit dem Thema verwandten Webseiten erarbeitet.

Schlüsselwörter: Chinesische Diätetik, Traditionelle Chinesische Medizin,

Chinesische Ernährungstherapie

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 6

2 METODOLOGIA .................................................................................................... 7

3 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................ 8

3.1 FUNDAMENTOS DA MEDICINA CHINESA E DIETOTERAPIA CHINESA ...... 8

3.1.1 O conceito do QI .................................................................................................... 9

3.1.2 O conceito de Yin e Yang.................................................................................... 10

3.1.3 Yin e Yang na alimentação ................................................................................. 10

3.1.4 A teoria dos Cinco Movimentos .......................................................................... 12

3.1.5 Os órgaos e vísceras na MCT ............................................................................ 16

3.1.6 Os órgãos digestivos e o significado do Movimento Terra na Dietoterapia

Chinesa ................................................................................................................ 17

3.1.7 Formação do Qi dos Alimentos ........................................................................... 18

3.2 CLASSIFICAÇÕES DA DIETOTERAPIA CHINESA ......................................... 20

3.2.1 A natureza dos alimentos: quente, morna, neutra, fresca, fria ......................... 20

3.2.2 O movimento dos alimentos: ascendente, descendente, neutro, centrífugo e

centrípeto ............................................................................................................. 22

3.2.3 Os sabores: doce, ácido, salgado, amargo, picante ......................................... 24

3.3 DIETOTERAPIA CHINESA APLICADA NA SÍNDROME UMIDADE- CALOR

NO INTESTINO GROSSO (DACHANG)…………………………………...……..29

4 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 31

REFERÊNCIAS ................................................................................................... 32

6

1 INTRODUÇÃO

A dietoterapia chinesa está enraizada com a abordagem da Medicina Chinesa

e suas práticas e segue os mesmos princípios. Seus fundamentos compreendem a

saúde como a harmonia do ser humano como parte integrante da natureza através

de um equilíbrio dinâmico entre as energias que compõem o universo. Nos antigos

registros chineses encontram-se ensinamentos alimentares que são muito diferentes

dos conceitos da dietética ocidental moderna. Os curadores chineses consideram a

terapia alimentar o primeiro passo para qualquer tratamento. Obras clássicas já

deram grande importância, cerca de 2000 mil anos atrás, para o uso dos alimentos

como forma de prevenção, manutenção da saúde e como terapêutica para diversos

distúrbios (CÓRDOVA, 2007, p. 13, 29; FAHRNOW, 2003, p. 10-15; SIEDENTOPP,

2009, p. 8).

De acordo com Beinfield e Korngold (2009, p. 398), a dietética chinesa avalia

questões qualitativas e classifica os alimentos de acordo com seu caráter

energético, levando em consideração seu sabor, sua natureza, para onde a energia

do alimento se direciona dentro do corpo, ou seja, seu movimento energético,

enquanto a dietética ocidental apresenta análises quantitativas de todos os

componentes e nutrientes contidos nos alimentos, contando calorias, vitaminas e

minerais. Nos dias de hoje, muitas pessoas buscam propostas alimentares que

sejam boas para todos e o tempo todo. Na dietoterapia chinesa não existem

indicações alimentares generalizadas. Cada plano alimentar é desenvolvido através

da necessidade do indivíduo naquele momento, porque “[…] não há dois momentos

iguais na vida de uma pessoa, nem duas pessoas idênticas nesse mundo”

(CÓRDOVA, 2007, p. 13).

Reconhecendo a importância da alimentação para a saúde e como forma

fundamental nas orientações e práticas da Naturopatia, este trabalho visa informar

sobre uma outra maneira de compreender a nutrição. A presente revisão objetivou

introduzir os fundamentos que regem a MTC e apresentar as características

energéticas dos alimentos através das classificações da dietética chinesa: as cinco

naturezas, os cinco movimentos e os cinco sabores.

7

2 METODOLOGIA

A presente pesquisa é de caráter bibliográfico e procura explicar o problema

proposto através de referenciais teóricos. A análise dos dados teve como objetivo

contribuir para o conhecimento científico sobre os princípios da dietoterapia chinesa

na Medicina Tradicional Chinesa.

Os dados da presente revisão bibliográfica foram coletados em bibliotecas

universitárias, livros e sites de busca nas línguas portuguesa e alemã. O

levantamento bibliográfico foi realizado através da seleção dos materiais disponíveis

relacionados com o tema da pesquisa. As referências bibliográficas encontradas

foram publicadas entre 1992 e 2008. A escassez de material nos sites de busca

justifica a utilização de referenciais independentes do ano de publicação.

O período da busca de publicações, a leitura, a análise do material

bibliográfico e a redação da pesquisa foi entre dezembro de 2014 e maio de 2015.

8

3 REVISÃO DE LITERATURA

Neste capítulo está apresentada a revisão de literatura deste trabalho. Ela

está dividida em dois tópicos: “Os fundamentos da Medicina Chinesa e dietoterapia

chinesa” e “As classificações na dietoterapia chinesa”.

3.1 FUNDAMENTOS DA MEDICINA CHINESA E DIETOTERAPIA CHINESA

A Medicina Chinesa é considerada uma das mais antigas formas de medicina,

pois entende o homem de forma integrada, ou seja, leva em consideração os fatores

físicos, emocionais, mentais e espirituais. A Dietoterapia Chinesa nasceu através da

observação da natureza e do conceito energético Qi, ou T´CHI, que fundamenta os

conhecimentos milenares da MTC (CÓRDOVA, 2007, p. 13). Através dessas

observações surgiram os conceitos das duas forças - Yin e Yang - e a teoria dos

Cinco Movimentos. Na Medicina Chinesa, os órgãos e suas vísceras

complementares, chamados Zang-Fu, não são órgãos como na Medicina

convencional ocidental. Segundo Pérez (2008, p. 174), eles são considerados

unidades energéticas com ligações por todo o organismo. A filosofia da

Bioenergética é regida por leis e princípios que possibilitam o entendimento do

homem como ente bioenergético que se encontra sob influências do cosmo e da

terra. Dessa forma, o organismo produz de forma cíclica e periódica uma série de

manifestações que estão intimamente relacionadas com as influências externas.

De acordo com Kleinrath (2008, p. 19), todos esses fundamentos levaram a

classificar os alimentos de acordo com os cinco circuitos funcionais, sua ampla

relação com os sistemas internos Zang-Fu e através dos seguintes aspectos

energéticos:

- Natureza: quente, morna, neutra, fresca, fria

- Movimento: ascendente, descendente, neutro, centrífugo, centrípeto

- Sabor: doce, ácido, salgado, amargo, picante

Outras importantes observações, como a constituição do indivíduo, seu

temperamento, seus hábitos, seu estilo de vida, as estações do ano, o clima

predominante, a forma e horários em que come, também estão sendo levados em

consideração na criação de uma dieta terapêutica. Portanto, cada indicação

9

alimentar é feita individualmente e para um momento específico (CÓRDOVA, 2007,

p. 13).

3.1.1 O conceito do QI

Segundo a tradicional filosofia da Medicina Chinesa, o Qi é a energia vital do

corpo e de tudo que é contido no mundo. É a energia que permeia o universo e que

diferencia um ser vivo e um não-vivo, porque é ele que nutre todos os sistemas do

organismo (CÓRDOVA, 2007, p. 29). Segundo Pérez (2008, p. 25-26), o Qi é visto

como força em movimento e a matéria é considerada um estado de condensação de

energia. Ele define a energia como princípio primário que parte do TAO, fonte de

todas as coisas. Para os orientais, o Qi é a origem de tudo e a base dos estudos da

MTC, independente de suas diversas formas de manifestação.

Conforme Córdova (2007, p. 31-32), a energia vital circula dentro dos canais

de energia, chamados meridianos, a fim de nutrir todos os sistemas do organismo. O

Qi se apresenta através de várias formas no corpo, desempenhando uma vasta

gama de funções (MACIOCIA, 1996, p. 57). Dentro do entendimento da Medicina

Chinesa, o indivíduo é compreendido como uma unidade energética, que

desenvolve o seu processo vital entre o Céu e a Terra. A energia é o princípio que

unifica e regula todas as estruturas do ser humano. As energias humanas são

produzidas pelo homem através da alimentação e da respiração e da energia

adquirida geneticamente (PÉREZ, 2008, p. 173-174).

Segundo os ensinamentos da Medicina Chinesa, o indivíduo recebe uma

quantidade de energia dos seus antepassados e dos pais no ato da concepção,

chamada Qi Ancestral. Pérez (2008) elucida que depois do nascimento, essa

energia ancestral junta-se ao Qi Nutritivo, que é adquirido do meio ambiente através

da respiração e da alimentação. A soma das duas forma a essência de cada

indivíduo (Jing), a energia mais valiosa que determina a duração da vida. Dentro dos

conceitos da MTC, ela é armazenada nas glândulas suprarrenais. Os Rins

correspondem ao sistema responsável pelo crescimento e desenvolvimento.

Córdova (2007, p. 30-31) alerta que essa essência deve ser usada somente em

situações emergenciais, quando o organismo não consegue se nutrir mais.

10

3.1.2 O conceito de Yin e Yang

O TAO, a essência primária do cosmo, é o conceito em que tudo se

fundamenta na Medicina Chinesa. De acordo com Fahrnow (2003, p. 15-24), ele

pode ser definido como energia em movimento cíclico, que se repete em todos os

fenômenos da natureza e que é composto por duas energias opostas e

complementares ao mesmo tempo, o Yin e o Yang. Essas duas forças se encontram

em um contínuo movimento e em um processo de incessante renovação. Segundo

os antigos filósofos chineses, Yang representa o dia, o sol, o calor, a primavera e o

verão, dentre vários outros aspectos; e Yin, a noite, a lua, o frio e, portanto, outono

e inverno. Como o dia não existe sem a noite, nem alegria sem tristeza, desta forma

Yin e Yang só existem juntos, complementando e equilibrando um ao outro, se

encontrando em um contínuo processo de equilíbrio dinâmico.

Autoroche (1992, p. 15-18) afirma que os dois aspectos sempre se encontram

em movimento de crescimento e decrescimento recíproco. As alterações climáticas

nas quatro estações mostram esse fenômeno: o clima passa progressivamente do

frio ao calor entre o inverno, a primavera e o verão. Conforme esse processo, o

Yang cresce, enquanto o Yin decresce. O mesmo fenômeno ocorre nas atividades

fisiológicas dentro do corpo humano. O indivíduo encontra-se energeticamente

equilibrado quando o corpo apresenta a mesma quantidade dos conteúdos Yin e

Yang. O excesso de um provoca uma diminuição do outro. Quando um deles estiver

debilitado, o outro entrará em excesso. A persistência de um desequilíbrio

energético de Yin e Yang, pode levar ao aparecimento de uma doença no nível

orgânico.

3.1.3 Yin e Yang na alimentação

O dia é visto como manifestação Yang e corresponde ao período Yang do

homem, no qual ele desenvolve as suas atividades. Por isso, deve-se começar o dia

com uma grande carga de energia, recebida através dos alimentos do café da

manhã e da respiração (PÉREZ, 2008, p. 174). Mediante a Dietética Chinesa, os

aspectos Yin e Yang são importantes na preparação de uma refeição. Na maioria

das vezes é possível alterar a quantidade dessas duas energias na comida. A forma

do preparo, a temperatura em que o alimento é servido e a combinação com outros

11

alimentos muitas vezes influenciam a sua natureza básica, mas não sempre, porque

os alimentos são quentes ou frios em si. A termia do alimento tem a ver com o efeito

que exerce sobre o organismo. Os alimentos aquecem ou esfriam o corpo. Córdova

(2007, p. 73) dá o seguinte exemplo:

“[…] o molho de pimenta, mesmo sendo servido gelado, continua

sendo de natureza quente e, portanto, YANG. Já certos alimentos,

quando servidos quentes e cozidos, têm a sua natureza báscia

alterada. Por exemplo, a banana é de natureza fria, porém cozida

com canela, torna-se de natureza morna.”

Segundo FAHRNOW (2003, p. 17-20), os alimentos úmidos e refrescantes

fornecem energia Yin, enquanto alimentos secos e quentes reforçam o Yang.

Pessoas friorentas que gostam do clima mais quente e que apresentam cansaço,

desânimo, peso nas pernas, muitas vezes acompanhado por edemas, tem uma

predominância Yin e portanto precisam de uma alimentação mais Yang, como

caldos quentes e alimentos aquecidos por mais tempo, que tiram a umidade do

alimento e do corpo para recuperar o equilíbrio. Conforme Hollmayer (2006, p. 98),

estufar, grelhar, torrar, refogar, fritar e secar são formas de preparo que acrescentam

o componente Yang à comida. Dessa forma, a natureza do alimento, ou seja, sua

termia, pode ser alterada para morna ou quente. Fahrnow (2003, p. 17-20) concorda

que as pessoas do tipo Yin se beneficiam em cozinhar ou refogar legumes, frutas e

grãos antes do consumo e acrescenta que elas deveriam evitar alimentos crus, por

conterem muito Yin. Eles exigem um grande gasto energético, porque o organismo

precisa primeiro aquecê-los à temperatura corporal para conseguir processar os

nutrientes. Autoroche (1992, p. 133-134) explica que os alimentos crus esfriam muito

o organismo, dificultando assim o trabalho de digestão e absorção, afetando

principalmente o órgao Baço.

Hollmayer (2006, p. 99) elucida que indivíduos calorentos com sintomas de

calor - como hiperatividade, face vermelha, sede, suor excessivo, corpo quente e

que preferem estações do ano mais frias - apresentam um excesso de Yang e

necessitam de mais Yin na sua alimentação. Eles deveriam dar preferência aos

alimentos frescos e frios que contêm mais partes líquidas e que permanecem o

menor tempo possível no fogo. É recomendável incrementar mais líquidos no

preparo dos alimentos, como o acréscimo de água e caldos para umedecer as

12

partes mais secas. As pessoas do tipo Yang podem consumir com mais facilidade

alimentos crus e crocantes e com menor tempo de cozimento, que tornam a sua

composição mais refrescante. Pessoas com a energia Yang predominante deveriam

evitar estimulantes, como café, chá preto, álcool, pimenta e tabaco; comidas

grelhadas e fritas também deveriam ser evitadas, assim como carne vermelha, que

contém muita energia Yang.

Através do acréscimo de temperos e ervas é possível também modificar e

equilibrar os aspectos Yin e Yang da refeição. Temperos do tipo Yang, como canela,

pimenta e cravo, elevam a energia Yang da refeição e beneficiam pessoas com

deficiência da mesma. Ervas e condimentos refrescantes de natureza Yin, como

hortelã, aneto e agrião, ajudam as pessoas com falta de Yin (FAHRNOW, 2003, p.

17-24).

3.1.4 A teoria dos Cinco Movimentos

Do conceito de Yin e Yang surgiram os cinco circuitos funcionais. Há muitos

séculos, os sábios chineses tentavam descrever o mundo que lhes era perceptível, a

força e a energia de todas as formas manifestadas através de um modelo. Desta

forma, surgiu a filosofia dos Cinco Movimentos, conhecidos também como os Cinco

Elementos1, que são Madeira, Fogo, Terra, Metal e Água (FAHRNOW, 2003, p. 25).

Fahrnow (2003, p. 11) define os cinco circuitos funcionais da seguinte forma: “O

interrelacionamento entre elas e as diversas formas de manifestação do mundo

observável tornam esse modelo aberto e dinâmico. Tudo está relacionado com todas

as coisas e tudo se influencia mutuamente.”

Neste conceito, todos os seres vivos, suas estruturas físicas, emocionais e

mentais, como órgãos e vísceras, órgãos dos sentidos, tecidos corporais e todas as

manifestações do mundo, como estações do ano, cores, sabores, cheiros,

características climáticas, estão relacionados e interconectados. O conceito de

contínua interatividade, que rege um constante movimento de geração e dominância

entre os cinco circuitos, define o homem como parte do cosmo e suas interações se

refletem nele. O seguinte diagrama mostra esta interligação. Cada circuito gera o

1 Ao longo do trabalho será usado o termo “cinco movimentos” ou “circuitos funcionais”, em vez de “cinco elementos”, por transmitir a ideia de uma constante interação entre os elementos da natureza (FAHRNOW, 2003, p. 6).

13

seguinte no Ciclo de Nutrição ou Produção (Sheng) e é controlado mutuamente pelo

Ciclo de Dominância ou Controle (Ke). O fluxo de energia é descrita mediante a

regra “mãe / filho”, na qual cada elemento alimenta o seguinte, assim como a mãe

nutre o filho. Dessa forma, um movimento fraco é protegido pelo reforço da “mãe”,

do elemento precedente, enquanto o excesso de um movimento é regulado através

do “filho”, do elemento subsequente (AUTOROCHE, 1992, p. 23-29).

Figura 1 – Cinco Movimentos: Ciclo de Geração e Dominância. Fonte: adaptado de Fahrnow (2003, p. 27).

Hirsch (1990, p. 12-13) resume o Ciclo Sheng e o Ciclo Ke da seguinte forma:

“Madeira queima, produzindo Fogo, de cujas cinzas se forma a Terra,

e dentro dela se condensa o Metal que expulsa de si a Água, da qual

brota Madeira. Ou seja: Madeira nutre Fogo, que gera Terra, que

engendra Metal, que gera Água, que nutre Madeira […]. Mas a Água

apaga o Fogo, que funde o Metal, e Metal corta a Madeira, que

esgota a Terra, e Terra absorve a Água […].”

A teoria dos Cinco Movimentos não explica somente as relações fisiológicas

recíprocas que existem entre os órgãos e suas vísceras, mas também suas

influências entre eles nas situações patológicas e sua grande importância no

diagnóstico (AUTOROCHE, 1992, p. 29). Como descrito em seguida, a tradição

chinesa relaciona vários aspectos e manifestações com cada circuito funcional.

Hirsch (1990, p. 7-11) os classifica da seguinte forma:

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Madeira

O movimento Madeira corresponde ao órgão Fígado e sua víscera

complementar, Vesícula Biliar. A Madeira representa primavera, vento, crescimento

e movimento. Ela está relacionada ao sabor azedo, à cor verde, aos tendões e

ligamentos, aos olhos, à raiva, irritabilidade e imaginação. O Fígado é nutrido pelo

sabor azedo e pela cor verde e fortalece o Coração. Dessa forma os alimentos

azedos e verdes se dirigem primeiramente para este órgão.

Fogo

Os fenômenos naturais que geram atividade, calor, ascensão e expansão

pertencem ao movimento Fogo. O órgão Coração e sua víscera, Intestino Delgado,

correspondem a ele. Este circuito representa o verão e cria o sabor amargo, que

nutre o Coração e fortalece o sangue, os vasos e as artérias. Portanto, os alimentos

amargos e de cor vermelha atuam diretamente sobre este órgão. O Coração dá

força ao Estômago e governa a língua e a fala.

Terra

Mudança e transformação são características do movimento Terra, que se

relaciona com o órgão Baço e sua víscera, Estômago. A umidade cria a Terra e a

Terra gera o sabor doce e a cor amarela, que nutrem o Baço. Por isso os alimentos

amarelos e doces o tonificam. O Baço nutre os músculos, governa a boca e fortalece

o Pulmão.

Metal

A secura produz o movimento Metal. O órgão Pulmão e sua víscera, Intestino

Grosso, pertencem a ele. Momentos de seleção e purificação simbolizam este ciclo e

a estação do outono. O Metal cria o sabor picante, que nutre a epiderme e o

Pulmão. Ele é alimentado pela cor branca, governa o nariz e fortalece os Rins.

Alimentos que penetram diretamente o Pulmão, são os de cor branca e de sabor

picante.

15

Água

Entre os processos naturais do movimento Água encontram-se as

características retração, declínio e eliminação. A Água representa o inverno e gera o

sabor salgado que nutre os Rins, os ossos e as medulas. Os Rins são nutridos pela

cor azul índigo ou preto, fortalecem o Fígado e governam as orelhas. Portanto, os

alimentos salgados e pretos se dirigem primeiramente para este órgão.

O seguinte quadro apresenta algumas dessas correspondências que

correlacionam fenômenos da natureza com o organismo:

MADEIRA FOGO TERRA METAL ÁGUA

ESTAÇÕES Primavera Verão Final de cada

estação Outono Inverno

ÓRGÃOS Fígado Coração Baço-Pâncreas Pulmão Rim

VÍSCERAS Vesícula-

Biliar

Intestino

Delgado Estômago

Intestino

Grosso Bexiga

TECIDOS Tendões Vasos Músculos Pele Ossos

ÓRGÃOS DOS

SENTIDOS Olhos Língua Boca Nariz Ouvido

SENTIDOS Visão Fala Gustação Olfato Audição

EMOÇÕES Fúria Euforia Preocupação Tristeza Medo

CORES Verde Vermelho Amarelo Branco Azul /

Preto

SABORES Ácido /

Azedo Amargo Doce Picante Salgado

GRÃOS Trigo Feijão Arroz Cânhamo Milhete

CARNE Frango Carneiro Boi Cavalo Porco

CLIMAS Vento Calor Umidade Secura Frio

ESTÁGIO DE

DESENVOLVIMENTO Nascimento Crescimento Transformação Colheita Estoque

YIN-YANG Yang

Mínimo

Yang

Máximo Centro Yin Mínimo

Yin

Máximo

EXPRESSÕES Grito Riso Canto Choro Gemido

SECREÇÕES Lágrima Suor Saliva Catarro Urina

DIREÇÕES Leste Sul Centro Oeste Norte

ODOR Rancoso Queimado Perfumado Cárneo Pútrido

Quadro 1– Cinco Elementos e suas correspondências. Fonte: adaptado de Maciocia (1996, p. 29).

16

3.1.5 Os órgaos e vísceras na MCT

Diferente da Medicina Convencional Ocidental, na Medicina Chinesa os

órgãos Yin (Zang) e suas vísceras complementares de natureza Yang (Fu) são

considerados sistemas internos com ligações por todo o organismo, e não só

representações anatómicas-fisiológicas (CÓRDOVA, 2007, p. 30). Essas ligações

ocorrem através dos meridianos que levam o Qi de um sistema a outro.

Os órgãos Yin armazenam as substâncias vitais, ou seja a Essência (Jing), a

Energia Vital (Qi), o Sangue (Xue) e os Fluídos Corpóreos (Jin Ye). Eles fornecem

matéria básica e representam o aspecto estrutural. Os sistemas Yang correspondem

ao aspecto funcional, pois são responsáveis pela transformação dos alimentos e

líquidos para produzir o Qi e Xue que são enviados para os órgãos. Portanto, as

vísceras Fu estão constantemente recebendo, movimentando, transformando e

excretando substâncias. Na Medicina Chinesa, os Zang-Fu são chamados

acoplados, pois são intimamente interligados. Seu relacionamento é de caráter

estrutural-funcional, mas o principal foco de atenção está sobre os órgãos Zang,

porque são eles que estocam e preservam as substâncias vitais e refletem o estado

emocional (MACIOCIA, 1996, p. 90-92).

Sistemas yin: Sistemas yang:

Fígado (Gan) Vesícula Biliar (Dan)

Coração (Xin) Intestino Delgado (Xiaochang)

Baço (Pi) Estômago (Wei)

Pulmão (Fei) Intestino Grosso (Dachang)

Rim (Shen) Bexiga (Pangguang)

Pericárdio (Xinbao) Triplo Aquecedor (Sanjiao)

Como apresentado no capítulo anterior, cada par acoplado corresponde a um

circuito funcional com inúmeras propriedades e funções dentro do organismo.

Significante para um equilíbrio e uma boa saúde é a interação harmônica entre eles

e todas as estruturas envolvidas e relacionadas aos Zang-Fu (KLEINRATH, 2008, p.

6). Maciocia (1996, p. 41, 90) salienta que a relação mútua entre os órgãos Yin e as

emoções é de grande importância na Medicina Chinesa, pois ilustra a unidade do

corpo e da mente. Diferente da visão ocidental, na Teoria Chinesa os processos

17

mentais e a fisiologia emocional são atribuídos pela ação dos sistemas internos,

Zang-Fu. Sua relação é mútua, pois o estado dos sistemas afeta as emoções e as

emoções afetam os sistemas. O equilíbrio do Fígado é afetado pela fúria, o Coração

pela euforia, o Baço pela preocupação, o Pulmão pela tristeza e o Rim pelo medo.

Esta relação mostra a importáncia de alimentar-se em ambientes tranquilos e sem

pressa, estresse ou preocupações (CÓRDOVA, 2007, p. 189-191).

3.1.6 Os órgãos digestivos e o significado do Movimento Terra na Dietoterapia

Chinesa

A Medicina Chinesa considera cinco estações, em vez de quatro. A quinta

estação representa o movimento Terra. Ela corresponde aos noves últimos dias e

aos nove primeiros dias de cada estação. Por isso, o circuito funcional Terra é

considerado o centro dos processos vitais, aonde tudo volta na mudança das

estações para se reabastecer de energia (CÓRDOVA, 2007, p. 37). Beinfield e

Korngold (2008, p. 400) ilustram que a Terra é formada pelo órgão Yin Baço (Pi) e

sua víscera Yang Estômago (Wei) e explica que uma boa digestão é sinônimo de um

bom funcionamento do Baço no entendimento da Medicina Chinesa. Uma

alimentação adequada é fundamental para seu funcionamento correto.

O Baço tem diversas funções dentro da MTC. Ele é responsável pelo

processo digestivo, pela absorção e transformação de alimentos sólidos e líquidos

em energia nutrícia (Gu Qi) e pela distribuição do Qi nutritivo por todos os sistemas

do organismo, a fim de nutri-los. Uma das principais atividades do Baço é secar a

umidade do corpo. No processo digestivo, o Baço utiliza o fogo digestivo que recebe

dos Rins. Por isso, o Baço não gosta de umidade nem do frio. Ele precisa de um

ambiente seco para exercer as suas funções. Quando o Baço não está funcionando

bem, qualquer tratamento dietético não fará efeito, porque sem um Baço equilibrado

os alimentos não serão aproveitados pelo organismo. Portanto, ele é considerado o

órgão principal do sistema digestivo dentro da Dietoterapia Chinesa (KLEINRATH,

2008, p. 5-6; BEINFIELD; KORNGOLD, 2009, p. 400-409).

O fluxo natural do Qi do Baço é ascendente, para levar o Qi do alimento para

o Pulmão (Fei). Se o Baço não estiver com força suficiente e o Qi do Baço se

encontra enfraquecido, significa que o fluxo do Qi é descendente, os alimentos não

18

serão transformados adequadamente e ocorrerá diarreia (MACIOCIA, 1996, p. 59).

Kleinrath (2008, p. 7) acrescenta que, quando o Baço se encontra em desequilíbrio e

não consegue executar suas funções, o corpo apresenta sintomas como cansaço e

falta de apetite, principalmente pela manhã, fome canina, compulsão por doces, má

digestão, flatulência, fezes soltas e moles, muitas vezes com restos de alimentos,

edemas, déficit de memória, hipotrofia em membros, hemorragias, ptoses, sensação

de peso no corpo e na cabeça, obsessões e preocupações excessivas. Segundo

Autoroche (1992, p. 133-134), abdômen inchado e dolorido, dor agravada pela

pressão, pirose, eructações e nojo pelo odor da comida também podem ser

sintomas de uma atividade funcional diminuida do Baço. O autor sublinha a

importância da alimentação qualitativa e quantitativamente equilibrada para evitar

doenças.

Antigos textos chineses ensinam que o melhor momento para se preparar

para o dia e iniciar as atividades é a partir das 3 horas. Pérez (2008, p. 37-39, 174)

explica que o Qi Nutritivo abastece a cada duas horas um determinado sistema

interno através dos meridianos. Esse ciclo periódico de circulação é chamado de

biorritmo. Neste período, cada Zang-Fu alcança sua atividade máxima. O período de

máxima energia do Pulmão e do Intestino Grosso é das 3 às 7 horas. É o melhor

momento para a evacuação de dejetos alimentares e também para exercícios

respiratórios, pois as energias do ar ingeridas através da respiração se juntarão

depois com a energia da alimentação para formar todas as energias do organismo.

O melhor horário para o café da manhã é entre as 7 e 9 horas, quando o Estômago

está no período da sua máxima energia para receber os alimentos. Em seguida,

entre as 9 e 11 horas, o Baço inicia sua atividade de transformação da energia dos

alimentos ingeridos. Entende-se, então, que o horário do Elemento Terra, entre as 7

e 11 horas, é o período de aproveitamento máximo dos aportes alimentares.

Portanto, a Dietoterapia Chinesa considera o café da manhã como a refeição mais

importante do dia.

3.1.7 Formação do Qi dos Alimentos

No processo de transformação dos alimentos em Qi, executado pelo Baço,

recebe-se o “Qi dos Alimentos” ou “Qi dos Grãos”, chamado Gu Qi. Embora seja

uma forma bruta do Qi que ainda não pode ser utilizada pelo organismo, o Gu Qi

19

representa a base inicial para a produção de formas mais refinadas do Qi e do

Sangue (MACIOCIA, 1996, p. 59-60). Conforme Kleinrath (2008, p. 9), a energia do

alimento é considerada a maior fonte energética através da qual o indivíduo

consegue renovar a sua energia em geral.

A qualidade do Gu Qi depende da qualidade do alimento e do equilíbrio do

Baço e do seu acoplado Estômago. Alimentos de pouca qualidade enfraquecem

estes órgãos digestórios e a qualidade do Gu Qi diminui, consequentemente. Isso

leva a sintomas de deficiências e fraquezas. Portanto, a escolha de alimentos de

boa qualidade é de suma importância na Dietoterapia Chinesa (KLEINRATH, 2008,

p. 9).

Sobre a formação do Qi do alimento, Pérez (2008, p. 174) explica que, no

primeiro momento, quando o Estômago recebe os alimentos, ele separa a energia

da matéria para o maior aproveitamento do componente energético. O que não é

mais proveitoso será encaminhado para o Intestino e excretado. Quando esta

decomposição foi feita, o Estômago envia o componente energético do alimento - a

essência - para o Baço, que, por sua vez, o transforma em Qi dos alimentos (Gu Qi).

No próximo passo, o Baço encaminha o Gu Qi em ascendência para o Pulmão, onde

se junta com o ar para formar o Qi Torácico. Maciocia (1996, p. 62) acrescenta que a

partir dele se desenvolve a essência dos alimentos, o Qi nutritivo2 e o Qi defensivo

(Wei Qi), que constituem a energia vital do indivíduo.

Segundo Pérez (2008, p. 37, 38, 39), do Pulmão o Qi está sendo levado para

o Coração, onde é transformado em Sangue (Xue). Esta transformação ocorre sob

auxílio do Qi do Rim e pelo Qi Original. O Qi Nutritivo está intimamente relacionado

ao Xue e flui com ele pelos vasos sanguíneos e pelos meridianos conforme os

biorritmos, a fim de dinamizar e nutrir todas as unidades energéticas Zang-Fu e,

dessa forma, todos os sistemas do organismo. Essa circulação da energia nutrícia

ocorre de forma ininterrupta, durante 24 horas por dia.

2 Autoroche (1992, p. 35) elucida que existem vários termos em chinês para descrever a energia nutrícia, como Rong Qi, Ying Qi ou Yong Qi.

20

3.2 CLASSIFICAÇÕES DA DIETOTERAPIA CHINESA

Assim como tudo no mundo, os alimentos também podem ser classificados

como Yin e Yang. Da mesma forma que a energia Yin é de natureza fria e

movimento descendente e o Yang de energia quente e movimento ascendente,

existem também alimentos que esfriam o organismo e outros que o aquecem e

alimentos que levam o fluxo de energia para baixo e outros que fazem a energia

ascender. Não somente as estações do ano, mas também o sabor dos alimentos

influenciam os órgãos, sua estrutura fisiológica-emocional e todos os outros

sistemas do corpo. Cada alimento promove efeitos específicos sobre as funções do

organismo. Portanto, os alimentos podem ser classificados quanto ao sabor, sua

natureza e o movimento que exerce seu fluxo de energia dentro do corpo

(CÓRDOVA, 2007, p. 59).

3.2.1 A natureza dos alimentos: quente, morna, neutra, fresca, fria

A natureza dos alimentos refere-se aos aspectos Yin e Yang de cada

alimento, ou seja, à sua qualidade térmica. Os alimentos de natureza fresca e fria

aumentam o aspecto Yin e resfriam o corpo, enquanto os alimentos de natureza

morna e quente aquecem o organismo, aumentando o Yang. Os alimentos de

natureza neutra são equilibradores. Eles nem esquentam, nem esfriam (CÓRDOVA,

2007, p. 73).

De acordo com Siedentopp (2009, p. 8) é possível influenciar uma carência ou

um acúmulo de energia do organismo por meio da característica térmica que cada

alimento apresenta. Quando ocorre uma carência, os alimentos aquecedores

equilibram esta deficiência e os alimentos refrescantes ajudam a diminuir um

acúmulo de energia (FAHRNOW, 2003, p. 28). A natureza dos alimentos também

influencia a temperatura corporal (HOLLMAYER, 2006, p. 95).

Alimentos de natureza quente e morna

Alimentos quentes e mornos expulsam o frio e aquecem o corpo, fortalecem o

seu aspecto Yang e movimentam o Qi para cima e para fora. Eles são usados

principalmente nas estações de outono e inverno para fortalecer a energia vital. São

21

indicados quando o Qi está enfraquecido, em quadros com deficiência de Yang e

para doenças que se manifestam com sintomas de frio. Ingeridos em excesso,

levam ao calor interno. Os alimentos quentes são contraindicados em quadros de

calor e excessos de Yang (SIEDENTOPP, 2009, p. 269). Alimentos quentes

encontram-se sobretudo nos grupos dos condimentos e ervas, como canela,

gengibre seco, pimenta caiena, pimento-do-reino. Segundo Hollmayer (2006, p. 96),

os alimentos com a característica térmica morna são encontrados em todos os

grupos alimentares, sobretudo naqueles de sabor doce e picante, como por

exemplo: abobrinha, alecrim, alho-poró, batata doce, cebola, coentro, damasco

seco, frango, ginseng, leite de coco, manjericão, manteiga, salsa.

Alimentos de natureza fresca e fria

Os alimentos de natureza fresca e fria diminuem o calor interno e abaixam o

fogo. Por isso, são usados em maior quantidade na primavera e no verão. Eles

nutrem a parte Yin do organismo, como o sangue (Xue) e os líquidos orgânicos,

acalmam o espírito (Shen), movimentam o Qi para baixo e desaceleram o fluxo da

energia vital. O consumo excessivo pode levar à uma estagnação do Qi, ao frio

interno e a gerar umidade no corpo. Portanto, são contraindicados em quadros de

excesso de Yin e sintomas de frio e indicados para doenças do tipo Yang,

caracterizadas por excesso de calor, que gera deficiências de Yin (SIEDENTOPP,

2009, p. 269). De acordo com Hollmayer (2006, p. 96), muitas frutas, verduras e

saladas apresentam uma natureza fria, sobretudo os alimentos amargos e muito

ácidos, como as frutas cítricas. Outros exemplos são: alface romana, algas, aspargo,

banana, broto de bambu, mariscos, sal, tomate. Alimentos frescos se encontram em

quase todos os outros grupos alimentares, sobretudo nos alimentos classificados

como ácidos, amargos e doces, como por exemplo: abacaxi, acelga, agrião, aipo,

alcachofra, aveia, chuchu, cogumelo, espinafre, pêra, tofu, trigo.

Alimentos de natureza neutra

Os alimentos neutros possuem efeitos suaves, harmonizadores e

equilibradores. Eles tonificam o Qi e são indicados tanto para desequilíbrios por

calor como por frios. A base de cada plano alimentar é feita pelos alimentos

22

energeticamente neutros, mesmo quando uma pessoa com um desequilíbrio

necessita de uma alimentação com um elemento de ênfase Yang ou Yin. Em cada

refeição o organismo deve estar abastecido com bastante energia de alimentos

neutros. Por isso, eles se encontram em maior quantidade nos diversos grupos dos

alimentos básicos. Exemplos são: ameixas, amêndoa, arroz, azeitona, batata-

inglesa, beterraba, cenoura, centeio, coco, couve, couve-flor, inhame, mel, shitake

(SIEDENTOPP, 2009, p. 269; FAHRNOW, 2003, p. 39; CÓRDOVA, 2007, p. 75).

3.2.2 O movimento dos alimentos: ascendente, descendente, neutro, centrífugo

e centrípeto

Cada alimento possui a capacidade de mover energia em determinadas

direções dentro do corpo. São cinco movimentos energéticos que o fluxo do Qi do

alimento pode exercer dentro do corpo: ascendente, descendente, neutro, centrífugo

e centrípeto. Vários alimentos geram mais de um tipo de movimento do Qi

(CÓRDOVA, 2007, p. 76).

Alimentos de movimento ascendente

A ação dos alimentos com a direção energética ascendente é dirigir o Qi para

cima. Os alimentos deste movimento aliviam diarreia, varizes, hemorróidas e

prolapsos de órgaos e deveriam ser ingeridos mais na primavera, pois a direção

energética de ascendência ou subida assemelha-se ao movimento da Madeira

(CÓRDOVA, 2007, p. 76). Eles se encontram em maior quantidade entre os

alimentos de sabor picante. Um exemplo clássico é o efeito da pimenta dentro do

organismo, que se mostra em vermelhidão de cabeça, olhos lacrimejantes e face

suada (HOLLMAYER, 2006, p. 97). Exemplos de alimentos com movimento

ascendente são: abobrinha, açúcar, aipo, alho, arroz, batata doce, batata inglesa,

beterraba, coco, coentro, inhame, noz-moscada, tâmara, vinho (CÓRDOVA, 2007, p.

76).

23

Alimentos de movimento descendente

Alimentos de movimento descendente fazem o Qi mover-se para baixo. Eles

são laxativos e diuréticos, como os alimentos de sabor amargo (HOLLMAYER, 2006,

p. 97). Segundo Córdova (2007, p. 77) aliviam vômitos, tosse, soluços e asma. Eles

devem ser ingeridos em maior quantidade no outono, pois o movimento

descendente corresponde ao movimento do Metal. Exemplos para alimentos com

direção energética descendente são: aipo, alface, amora, banana, chá verde, broto

de bambu, caldo de cana, cogumelo, espinafre, maçã, óleo de gergelim, painço,

quiabo, tofu, tomate, trigo, vinagre.

Alimentos de movimento neutro

Os alimentos com a direcao energética neutra não deslocam o Qi. O

movimento neutro corresponde ao movimento da Terra. Os seguintes alimentos se

classificam como alimentos de movimento neutro: abacaxi, abóbora redonda, aveia,

feijões azuki e branco, folha de rabanete, ovo de pata (CÓRDOVA, 2007, p. 78).

Alimentos de movimento centrífugo

Alimentos de movimento centrífugo tem a ação energética de levar o Qi para

a superfície do corpo. Eles são tonificantes e abrem os poros, portanto fazem suar e

reduzem a febre. São principalmente indicados para o verão, porque o movimento

centrífugo, ou seja, do interior para o exterior, representa o movimento do Fogo, que

corresponde à estação do verão (CÓRDOVA, 2007, p. 77-78). Segundo Hollmayer

(2006, p. 97), os alimentos de direção energética centrífuga se encontram em maior

quantidade entre os alimentos de sabor doce ou picante. Exemplos são: alecrim,

canela em pau, coentro, cebola branca, gengibre seco, hortelã-pimenta, manjerona,

pimenta verde e vermelha, vinho (CÓRDOVA, 2007, p. 78).

Alimentos de movimento centrípeto

Alimentos de movimento centrípeto, cuja direção energética vai rumo ao

centro, fazem o Qi mover-se para o interior do corpo. Eles fecham os poros, portanto

24

são bons para comer no inverno para preservar o Qi. O movimento centrípeto, do

exterior para o interior, corresponde ao movimento da Água, cuja estação é o

inverno. Eles reduzem inchaço abdominal e facilitam os movimentos peristálticos

(CÓRDOVA, 2007, p. 78). Eles se encontram sobretudo entre os alimentos ácidos e

amargos, pois os alimentos de movimento centrípeto também se caracterizam por

manterem os líquidos orgânigos dentro do corpo (HOLLMAYER, 2006, p. 97).

Córdova (2007, p. 78) cita os seguintes exemplos: alface, algas, frutos do mar, sal,

óleo de gergelim.

3.2.3 Os sabores: doce, ácido, salgado, amargo, picante

O sabor do alimento é definido por sua qualidade intrínseca e não equivale

sempre ao sabor identificado pelo paladar. Os cinco sabores são levados pelo Qi do

alimento para dinamizar os sistemas internos e para favorecer energeticamente

principalmente os órgãos Yin. O azedo vai ao Fígado, o amargo ao Coração, o doce

vai ao Baço, o apimentado ao Pulmão, o salgado aos Rins (FAHRNOW, 2003, p. 30,

35; LING-SHU, 1995, p. 415). Fahrnow (2007, p. 31) explica a relação entre os cinco

sabores e os órgaos Yin da seguinte forma:

“Do ponto de vista tradicional chinês, os órgãos ou seus circuitos

funcionais produzem as emoções. O órgão e sua respectiva emoção

são vistos como uma unidade inseparável: quando o fígado está

sobrecarregado, a pessoa fica “azeda”, irritadiça […]. O sabor azedo

relaxa o fígado e reduz a irritabilidade; […].”

Todos os sabores fortalecem os órgãos correspondentes, quando usados

moderadamente. Em excesso, prejudicam e enfraquecem o Qi do determinado

órgão. O desejo por um sabor indica uma deficiência do órgão correspondente e

uma aversão ao sabor é indicativo para um excesso (CÓRDOVA, 2007, p. 61).

Conforme Autoroche (1992, p. 22), os cinco sabores possuem efeitos adstringentes,

dispersadores, ressecantes, umectantes, relaxantes, compressores, amolecedores e

endurecedores para equilibrar o Qi do corpo. Ele classifica os picantes e doces

como Yang e os ácidos, amargos e salgados como Yin. Segundo Córdova (2007, p.

60), existem vários alimentos que atuam sobre mais de um sistema e a cada

25

alimento pertence um ou, muitas vezes, mais que um sabor. A cevada, por exemplo,

tem sabor doce e salgado, porque atua sobre os circuitos funcionais Terra e Água.

Maciocia (1996, p. 46) acrescenta que cada sabor exerce um determinado efeito

sobre as funções do organismo, portanto a escolha dos diferentes sabores na

alimentação requer certas precauções, sobretudo quando consumido por um longo

período de tempo.

O sabor ácido

Os alimentos ácidos influenciam principalmente a energia do Fígado e

pertencem, portanto, ao circuito funcional Madeira. Conforme Córdova (2007, p. 70-

71), eles tonificam a energia do Pulmão e harmonizam o Qi do Coração. O sabor

ácido possui efeito adstringente, nutre o Yin e protege e produz fluidos corpóreos.

Portanto, os alimentos ácidos podem controlar a perspiração e a diarreia e

interromper o fluxo excessivo de todas as secreções, como lágrimas, salivação e

micção excessiva (MACIOCIA, 1996, p. 45; SIEDENTOPP, 2009, p. 269). Por outro

lado, o sabor ácido ajuda a formar os líquidos digestivos e a controlar a hiperacidez.

Relacionado ao movimento Madeira, o sabor ácido nutre os tendões, atinge os

nervos e, portanto, deve ser consumido com cuidado em casos de dor crônica neste

sistema. Um consumo excessivo potencializa as estagnações de Qi e Xue

(MACIOCIA, 1996, p. 46). Hirsch (1990, p. 21) acrescenta que o excesso ou a

ausência do sabor ácido lesiona o Fígado e a Vesícula Biliar e atrapalha a produção

do Qi do Coração. O excesso de energia impede o livre fluxo de Qi do órgão

precedente (o órgão “mãe”). Portanto, o consumo excessivo de alimentos ácidos

incomoda os Rins (LING-SHU, 1995, p. 442). Conforme o ciclo de dominância

excessiva, a Madeira exaure a Terra. Portanto, o excesso do ácido prejudica o Baço

(CÓRDOVA, 2007, p. 65). De acordo com Siedentopp (2009, p. 269), a ação

adstringente do sabor ácido faz com que ele possa manter fatores exopatógenos

como Vento e Frio dentro do corpo e dificultar a sua liberação. Portanto, os

alimentos deste sabor devem ser evitados nas patologias que se caracterizam por

Vento e Frio, como por exemplo um resfriado com características Yin (calafrios,

excreção líquida e clara). Em excesso, podem provocar prisão de ventre, gases,

úlceras, irritação da pele e do estômago, dilatação abdominal, causar retenção de

líquidos e juntar muco nos tecidos. Muitas frutas, algumas ervas e legumes são

26

classificados como sabor ácido. Exemplos são: frutas cítricas, azeitonas, iogurte,

morango, pêssego, queijo e tomate (CÓRDOVA, 2007, p. 70-71).

O sabor amargo

O sabor amargo fortalece e acalma o Coração e o fogo dos sentimentos,

alivia angústia, ansiedade e insônia. Portanto, são pertencentes ao circuito funcional

Fogo. Os alimentos amargos tonificam o Qi do Rim, harmonizam o Qi do Pulmão e

nutrem o Qi do Baço (CÓRDOVA, 2007, p. 64). O sabor amargo possui efeito

laxante e ressecante. Existe uma grande ação do elemento Fogo sobre a Terra no

ciclo de nutrição, pois os alimentos de sabor amargo estimulam a digestão, drenam

fluidos corporais, eliminam a umidade e favorecem a diurese e as eliminações

intestinais. São indicados para estagnações alimentares, acúmulo de umidade e

doenças com presença de muco. Ingeridos em excesso podem provocar deficiências

de Yin e Xue (SIEDENTOPP, 2009, p. 269). O excesso de energia no Coração, pelo

uso excessivo do sabor amargo, pode incomodar o órgão “mãe”, ou seja, impedir o

livre fluxo do Qi do Fígado (LING-SHU, 1995, p. 442). Conforme o ciclo de

dominância excessiva, o Fogo derrete o Metal. Dessa forma, o sabor amargo em

excesso lesiona o Pulmão (CÓRDOVA, 2007, p. 65). Maciocia (1996, p. 46)

acrescenta que o excesso do amargo fere também os ossos e por isso deve ser

evitado nas doenças ósseas. Além disso, podem causar perda de apetite, dores de

cabeça, instabilidade emocional, fraqueza (porque os amargos reduzem o Qi) e pele

seca. A falta do sabor amargo pode provocar retenção de líquidos e estagnação do

Qi. Exemplos para alimentos de sabor amargo são: acelga, alface, chá de camomila,

couve, soja, vinho (CÓRDOVA, 2007, p. 67).

O sabor doce

O sabor doce tonifica a energia do Baço. Ele é considerado um sabor neutro

na Medicina Chinesa. Os alimentos naturalmente doces, como cenoura e beterraba,

nutrem a essência e portanto devem ser ingeridos em maior quantidade. Eles

fortalecem os músculos e o organismo como um todo, principalmente os órgãos

Estômago e Baço, cuja importante função na digestão e absorção de alimentos já foi

descrita no capítulo 2.1.6. Os alimentos doces tonificam, harmonizam e regulam o

27

Qi, dissolvem estagnações, equilibram e acalmam, umidificam, são analgésicos e

espasmolíticos. Eles são principalmente indicados para quadros com secura e

escassez de líquidos orgânicos, pois fortalecem o Yin (SIEDENTOPP, 2009, p. 269).

Córdova (2007, p. 64, 68) elucida que o sabor doce nutre o Pulmão, harmoniza a

energia do Fígado e dispersa o Qi do Coração. Os alimentos doces acalmam

sensações agudas de desconforto, pois regulam o Shen (a mente) e as emoções.

Conforme o ciclo de dominância excessiva, a Terra absorve a Água e portanto o

sabor doce em excesso fere o Rim (CÓRDOVA, 2007, p. 65). Usado em excesso,

lesiona também o órgão precedente, impedindo assim o livre fluxo do Qi do Coração

(LING-SHU, 1995, p. 442).

Deve-se diferenciar os alimentos do sabor doce sadio do sabor doce tóxico,

que contém açúcar branco. Os doces tóxicos geram um excesso de umidade, o que

pode provocar uma série de doenças. Além disso, podem atingir os músculos e

causar debilidade muscular (MACIOCIA, 1996, p. 46). Segundo Córdova (2007, p.

68), o excesso pode provocar também lentidão física e mental, prisão de ventre e

sonolência, e a falta do sabor doce pode causar desnutrição. Exemplos: abóbora,

abobrinha, arroz, cenoura, semente de girassol, mel, ovo de galinha, trigo sarraceno,

óleo de gergelim.

O sabor picante

O sabor picante mobiliza a energia do Pulmão e ativa a circulação do Qi. Ele

movimenta e distribui a energia vital pelo organismo, é revigorante (aumenta o Yang

Qi), abre os poros, provoca a transpiração, dissolve estagnações, liberta a superfície

do corpo e, dessa forma, expulsa fatores exopatógenos, além de espantar a tristeza.

Os alimentos de sabor picante aquecem o corpo, facilitam a digestão e a saída de

muco. Eles limpam as cavidades nasais, sendo benéficos para pessoas com

bronquite ou asma crônica. São indicados também para pele oleosa, porque limpam

e retiram a oleosidade excessiva. Os alimentos picantes tonificam a energia do

Fígado (dispersando o Vento) e harmonizam o Qi do Rim (CÓRDOVA, 2007, p. 69).

Usados em excesso, provocam calor e secura no corpo, queimam a pele, provocam

tonturas e instabilidade (SIEDENTOPP, 2009, p. 269). Maciocia (1996, p. 46) alerta

que, por terem característica de dispersar, os alimentos picantes devem ser evitados

na deficiência de Qi. Ingeridos em excesso incomodam o órgão “mãe”, o Baço

28

(LING-SHU, 1995, p. 442). Conforme o ciclo de dominância, os alimentos picantes

em excesso lesionam o Fígado, pois o Metal corta a Madeira. Eles se encontram em

muitos temperos e legumes, como por exemplo: agrião, alecrim, alho, coentro,

hortelã-pimenta, manjericão, pimentos (CÓRDOVA, 2007, p.: 65, 69).

O sabor salgado

O sabor salgado fortalece os Rins. Os alimentos de sabor salgado amaciam a

rigidez de músculos e glândulas, tonificam a energia do Coração, nutrem o Fígado e

harmonizam o Qi do Baço (CÓRDOVA, 2007, p. 64, 69-70). Além disso, dissolvem

estagnações, possuem um efeito umectante e fluem em descendência, ajudando

assim na diurese e na evacuação. Um consumo excessivo deste sabor enfraquece o

Qi dos Rins (SIEDENTOPP, 2009, p. 269). De acordo com Maciocia (1996, p. 46), os

alimentos salgados devem ser evitados nos casos de deficiência de Sangue (Xue),

porque podem secá-lo. O excesso pode levar à obesidade e oleosidade da pele,

provocando acne e calor exagerado. Ling-Shu (1995, p. 442) acrescenta que, além

disso, o consumo excessivo do sal atrapalha o órgão precente, o Pulmão. Conforme

o ciclo de dominância, a Água apaga o Fogo. Dessa forma, sal em excesso

prejudica o Coração. Exemplos de alimentos de sabor salgado são algas, aveia,

cevada, frutas secas, painço, frutos do mar (CÓRDOVA, 2007, p. 65, 70).

A todos os sabores pertencem também os sabores tóxicos, que devem ser

evitados, pois lesionam os sistemas. Córdova (2007, p. 61) exemplifica:

Sabor tóxico azedo: vinagre, álcool e alimentos avinagrados, como aqueles

em conservas.

Sabor tóxico amargo: café, fumo, alimentos defumados.

Sabór tóxico doce: açúcar

Sabor tóxico picante: bebidas alcoólicas, pimenta e fumo.

Sabor tóxico salgado: sal e alimentos conservados com sal.

29

3.3 DIETOTERAPIA CHINESA APLICADA NA SÍNDROME UMIDADE- CALOR NO

INTESTINO GROSSO (DACHANG)

O Intestino Grosso (Dachang) é uma víscera e portanto Yang e forma junto com

seu acoplado Yin, Pulmão (Fei), o Movimento Metal. Pela vista da MTC, entre as

principais funções do Dachang se encontram o recebimento dos alimentos pelo

Intestino Delgado (Xiaochang), a absorção dos fluidos e a excreção das fezes.

Através da sua íntima ligação com o Pulmão, desequilíbrios emocionais como

tristezas podem lesionar o Intestino Grosso (MACIOCIA, 1996, p. 365). Uma das

patologias que afeta o Dachang é a síndrome umidade- calor, ou seja, uma forma de

diarréia que pode ser originada por frio ou por umidade- calor. Sua etiopatogenia

pode ser múltipla tanto de origem exógena (Waixie) como endógena (Neixie). Entre

as causas encontram- se transtornos alimentares (Shang shi), distúrbios emocionais

(Xiezhi) e fatores perversos e exopatógenos (Liuyin) (PÉREZ; MARTÍNEZ, 2007, p.

144, 148).

Segundo Maciocia (1996, p. 366), o Dachang é diretamente afetado pela dieta.

Tanto o consumo excessivo de alimentos Yang como alimentos Yin podem provocar

a síndrome de umidade- calor como padrão de excesso. Pérez e Martínez (2007, p.

197, 242-243) acrescentam que sua etiologia pode se originar na ingestão excessiva

de componentes Yang como álcool, doces refinados, alimentos oleosos e quentes,

comida pesada e calórica de difícil digestão, bebidas e alimentos frios e crus (Yin). A

cronificação de uma síndrome de fleumas- umidade devido à insuficiência dos

órgãos digestivos como o Baço, Estómago e Intestino Delgado também pode

provocar essa síndrome e afetar o Intestino Grosso. Uma outra causa pode ser a

invasão dos fatores exopatógenos calor e umidade no Estómago e no Intestino

Grosso, sobre tudo no verão e no outono.

Conforme Pérez e Martínez (2007, p. 150), o frio contido nos alimentos não

cozidos e bebidas frias provoca alterações no equilíbrio hídrico. Autoroche (1992, p.

103) explica que dessa forma o Baço enfraquecido não consegue executar sua

função de secar a umidade o que leva ao excesso de umidade endógena não

metabolizada. Essa retenção de umidade inibe a função do Intestino Grosso de

absorção dos fluídos e excreção de fezes, o que resulta em diarréia. Em

combinação com a ingestão abundante de alimentos Yang e o excesso de calor

30

exógeno pode ser provocada a transformação da umidade em umidade- calor o que

lesiona o Intestino Grosso (PÉREZ, MARTÍNEZ, 2007, p. 150).

Sintomas- chaves da síndrome umidade- calor no Intestino Grosso são: diarréia

com muco e sangue e dor abdominal. O muco nas fezes é decorrente do acúmulo

de umidade e o sangue é indicativo de calor (MACIOCIA, 1996, p. 366). Pérez e

Martínez (2007, p. 242, 243) e Maciocia (1996, p. 366) citam como manifestações

clínicas: odor desagradável das fezes, queimação no ânus, sede sem desejo de

ingerir líquidos, urina escassa e escura, febre e calafrios, sudorese, sensação de

peso nos membros inferiores, digestão difícil com sensação de plenitude no

epigástrio e tórax, dor abdominal com urgência na defecação e frequentes crises

diarréicas. A língua é vermelha com saburra pegajosa e amarelada e o pulso é

rápido e escorregadio.

O princípio do tratamento para a síndrome umidade- calor é dispersar o calor e

drenar a umidade (MACIOCIA, 1996, p. 367; PÉREZ, MARTÍNEZ, 2007, p. 243). A

natureza dos alimentos deve ser fresca para dispersar o calor, como acelga, agrião,

amora, aveia, caqui, óleo de gergelim e tofu. O movimento dos alimentos utilizados

deve ser ascendente para dirigir o Qi para cima. Exemplos são: abobrinha, aipo,

arroz, batata- doce, inhame (CÓRDOVA, 2007, p. 76, 77, 81). Os sabores podem

variar entre azedo e doce. Os alimentos doces para tonificar os órgãos digestivos e

o sabor ácido para nutrir o Yin e devido ao seu efeito adstringente que interrompe a

diarréia (MACIOCIA, 1996, p. 45; SIEDENTOPP, 2009, p. 269). Deve ser evitado a

ingestão de comida crua, de alimentos que geram umidade como doces refinados,

laticínios e excesso de trigo, tanto como comidas gordurosas e calóricas e alimentos

que aumentam o calor (AUTOROCHE, 1992, p. 133-134; MACIOCIA, 1996, p. 366;

PÉREZ, MARTÍNEZ, 2007, p. 197, 242-243).

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4 CONCLUSÃO

Conclui-se que os princípios que regem a alimentação dentro do contexto da

Medicina Chinesa se diferenciam muito dos conceitos nos quais se baseiam a

alimentação e as pesquisas de nutrição no ocidente. Na dietoterapia chinesa, cada

alimento exerce funções específicas no organismo, conforme seu sabor, sua

natureza, seus movimentos energéticos e sua relação com os sistemas internos

dentro dos cinco movimentos.

O trabalho mostrou que uma alimentação correta não só ajuda a prevenir

doenças. Os princípios alimentares da MTC são os portais de acesso a um equilíbrio

energético interno que leva à autorregulação do organismo, restabelecendo dessa

forma a saúde, ou seja, o equilíbrio do homem com seu ambiente. A dietoterapia

chinesa ensina que, para o desenvolvimento de uma dieta terapêutica, é

fundamental avaliar o ser humano de forma holística conforme sua situação

energética, sua constituição física e psicoemocional, respeitando os movimentos da

natureza.

O estudo mostra o papel importante que a alimentação apresenta na vida das

pessoas. Ela é um recurso terapêutico valioso que busca a participação ativa do

indivíduo no seu tratamento. Desta forma, a divulgação de informações relacionadas

aos benefícios desta terapia alimentar é de extrema importância.

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REFERÊNCIAS

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1992.

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Chinesischen Medizin. In: Forschende Komplementärmedizin 16: 262–269, 17 de

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Ernährung als Chance zur Gesunderhaltung und Wiedergutmachung. Disponível em:

<http://www.dr-siedentopp.de/tl_files/_zeitschrift/Symposium_Jeana_2009.pdf>.

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