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CENTRO DE ESTUDO EM TERAPIA COGNITIVO- COMPORTAMENTAL ALINE CALAES MOREIRA Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo Comportamental e a Violência Conjugal no Brasil SÃO PAULO 2014

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CENTRO DE ESTUDO EM TERAPIA COGNITIVO-

COMPORTAMENTAL

ALINE CALAES MOREIRA

Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo

Comportamental e a Violência Conjugal no Brasil

SÃO PAULO

2014

ALINE CALAES MOREIRA

Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo

Comportamental e a Violência Conjugal no Brasil

Monografia apresentada ao Centro de Estudo em Terapia Cognitivo-Comportamental (CETCC) – Curso de Especialização, para a obtenção do título de Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental Orientadora: Profª. Msc. Eliana Melcher Martins Coorientadora: Profª. Drª. Renata Trigueirinho

Alarcon

SÃO PAULO

2014

Fica autorizada a reprodução e divulgação deste trabalho, desde

que citada a fonte.

Calaes Moreira, Aline

Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo Comportamental e a

Violência Conjugal no Brasil/ Aline Calaes Moreira, Eliana Melcher Martins,

Renata Trigueirinho Alarcon – São Paulo, 2014.

29 f + CD-ROM

Trabalho de Conclusão de Curso (especialização) – Centro de Estudos em Terapia Cognitivo Comportamental (CETCC). Orientação: Profª. Msc. Eliana Melcher Martins Coorientação: Profª. Dr

a. Renata Trigueirinho Alarcon

1. Terapia Cognitivo Comportamental. 2. Violência Conjugal. I. Calaes Moreira, Aline. II. Martins, Eliana Melcher. III. Alarcon, Renata Trigueirinho. IV. Título.

Nome: Aline Calaes Moreira

Título: Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo Comportamental e

a Violência Conjugal no Brasil

Monografia apresentada ao Centro de Estudos em

Terapia Cognitivo Comportamental como parte das

exigências para obtenção do título de Especialista em

Terapia Cognitivo Comportamental.

BANCA EXAMINADORA

Parecer: ____________________________________________________________ Orientadora: Profa. Msc. Eliana Melcher Martins _____________________________ Parecer: ____________________________________________________________ Coorientadora: Profa. Dra. Renata Trigueirinho Alarcon ________________________

São Paulo, ___ de __________________ de ______

AGRADECIMENTOS

Agradeço ao Universo por esta oportunidade de aprendizado que me

proporcionou através destes dois anos de convivência com pessoas que me

agregaram muito para o meu crescimento profissional. São as amizades

construídas durante este tempo na Especialização, a saudades vai ficar.

À professora Drª Renata Trigueirinho Alarcon por toda a dedicação e

disponibilidade em me orientar neste trabalho.

Aos diretores do CETCC, professora Msc. Eliana Melcher Martins e Sr. Elcio

Martins, que me acolheram e permitiram me apaixonar ainda mais pela Terapia

Cognitivo Comportamental.

Agradeço em especial a meus pais que sempre acreditaram em mim,

presença constante em minha vida. Gratidão eterna!

RESUMO

MOREIRA, Aline C. Revisão Bibliográfica da terapia Cognitivo Comportamental

e a Violência Conjugal no Brasil. Trabalho de conclusão do curso. Especialização

de Psicologia Clínica em Terapia Cognitivo Comportamental – CETCC. São Paulo,

2014.

O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão sistemática de artigos

científicos de psicologia a respeito da violência conjugal no Brasil, investigando

como a Terapia Cognitivo Comportamental é aplicada no tratamento das vítimas que

sofreram agressão. Utilizando os bancos de dados das bibliotecas virtuais: Scielo e

Pubmed, o período de coleta informações foi de janeiro a abril de 2014, com artigos

publicados a partir do ano de 2006, ano em que a Lei Maria da Penha entrou em

vigor, até dezembro de 2013. Com os artigos previamente selecionados, foi feita

uma leitura flutuante para a construção do trabalho. Constatou-se que existem

muitas publicações a respeito de violência conjugal, porém nenhum estudo

específico que retrate a Terapia Cognitivo Comportamental no tratamento de

brasileiras que sofreram violência conjugal, portanto é necessário mais

investimentos e estudos para verificar como a TCC pode ser utilizada nessa

população.

Palavra-chave: Violência conjugal, violência contra a mulher, violência e gênero,

terapia cognitivo Comportamental.

ABSTRACT

The aim of this study was to carry out a systematic review of scientific articles in

Psychology about intimate partner violence in Brazil, investigating how Behavior

Cognitive Therapy is applied to the treatment of victims who have been through

aggression. Using data of virtual libraries: Scielo e Pubmed, the period of information

collection was from January to April 2014, with articles published from 2006, year

when Maria da Penha Law came into effect, until December 2013. With articles

previously selected, a fluctuating reading was done for the accomplishment of the

work. The efficiency of BCT in treating women who have gone through intimate

partner violence has been determined, however it is necessary more investigation

and study to check how CBT can be used in this population.

Keywords: Violence Conjugal, Violence against Women, Violence and Gender,

Intimate Partner Violence e Behavior Cognitive Therapy.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO........................................................................................................7

1.1 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA................................................................................9

1.2 TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL..............................................14

2. OBJETIVO............................................................................................................16

3. METODOLOGIA...................................................................................................17

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................18

5. CONCLUSÃO.......................................................................................................24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................26

ANEXO.................................................................................................................29

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1. INTRODUÇÃO

No decorrer das últimas décadas as mulheres vem conquistando um

papel relevante dentro na sociedade, deixando de ser apenas a dona de casa,

mãe e esposa, para se tornar um elemento fundamental nas transformações

sócio, político e econômicas do país. Com o passar dos anos se inseriu no

mercado de trabalho e conquistou seu espaço, enfrentando desafios e

dificuldades de igual para igual com os homens. Embora muito já se tenha

alcançado, a mulher ainda sofre preconceitos, por ser considerada do sexo

frágil em uma cultura e sociedade machista.

Em pleno século XXI, com toda essa emancipação da mulher, depara-

se todos os dias com dados a respeito da violência conjugal, um problema de

saúde pública que é vivenciado com muita frequência, atingindo muitas

mulheres.

Segundo as Nações Unidas, violência contra a mulher é:

“Qualquer ato de violência baseado na diferença de gênero, que resulte em sofrimentos e danos físicos, sexuais e psicológicos da mulher; inclusive ameaças de tais atos, coerção e privação da liberdade seja na vida pública ou privada" (Conselho Social e Econômico, Nações Unidas, 1992).

A violência doméstica é um problema de saúde pública que atinge

indistintamente mulheres de todas as classes sociais, etnias, religiões e

culturas. Geralmente as agressões acontecem dentro de casa, sendo que o

agressor é o próprio marido ou companheiro. A vítima, por falta de

informação, vergonha e medo das ameaças do agressor, muitas vezes

esconde essa realidade. Até os anos 60, poucos estudos tinham se dedicado

à análise da temática e a violência exercida sob a proteção das paredes do lar

estava subjugada ao domínio privado, preservada pelo silêncio e pelo

segredo familiar. A partir do movimento feminista e do reconhecimento das

graves consequências desse fenômeno para a vivência dos casais e dos

filhos que conviviam no mesmo contexto, a questão passou a ser mais

problematizada (FALCKE, 2009).

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No âmbito das relações interpessoais a violência contra as mulheres pode se apresentar como agressões ao corpo, violação ou coerção sexual e agressões emocionais ou psicológicas, incluindo ofensas e diferentes formas de desqualificação. No âmbito das relações sociais a violência se manifesta no menor acesso a recursos materiais e simbólicos e a espaços de poder e de tomada de decisão, o que gera maiores níveis de pobreza e dependência econômica entre as mulheres. Essa desvalorização social da população feminina alimenta preconceitos e estereótipos, que se refletem nas relações interpessoais. Ou seja, existe um círculo vicioso entre a violência social e a violência interpessoal muitas vezes difícil de ser rompido. As instituições atuam como mediadoras entre a violência social e a violência interpessoal, assumindo, portanto, um importante papel na reprodução da violência tanto quanto na quebra do círculo da violência”, conforme Debert e Gregori (2008) apud Villela et al.(2011).

Segundo Saffioti (2002, p. 198) apud Coertz e Souza (2008), a violência

contra a mulher ocorre porque a "ideologia de gênero é insuficiente para garantir a

obediência das vítimas potenciais do ditame do patriarca". Apesar disso, e

considerando ainda a força de concepções tradicionais de gênero, as publicações

indicam que casais envolvidos em relacionamentos violentos buscam manter as

expectativas (externas e deles próprios) relacionadas à constituição e manutenção

do lar e aos papéis que entendem dever ser cumpridos pela mulher, como mãe e

esposa, e pelo homem, como pai e marido. Nesse sentido, interroga-se se em um

relacionamento amoroso as diferenças nas concepções de gênero podem ser

relacionadas aos desentendimentos e agressões físicas, psicológicas ou sexuais

(CORTEZ e SOUZA, 2008).

Para Avanci et al. (2013), entre os fatores associados aos problemas de

saúde mental das mulheres, a violência vivida na infância e na idade adulta tem

recebido especial atenção por parte dos especialistas. A Organização Mundial da

Saúde salienta que a violência entre as mulheres é a principal causa de problemas

de saúde mental, levando a um aumento do consumo de calmantes e

antidepressivos nesse grupo.

Ainda, conforme elucida Avanci et al (2013):

Há altos índices de violência em todo o mundo infligida às mulheres desde a infância. Estima-se que 55% das mulheres sofreram algum tipo de violência em sua vida. Na infância, as estimativas de violência são cerca de 7% a 40% e, na idade adulta, de 10% a 56% das mulheres relataram abusos físicos de seu parceiro pelo menos uma vez na vida. Além disso, a probabilidade de re-vitimização por violência na idade adulta é alta, de tal forma que as mulheres com um histórico de violência física ou sexual na infância tendem a ser duas ou três vezes mais expostas à violência por parceiro íntimo do que aquelas que não sofreram abuso na infância. As mulheres também

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são afetadas pela violência nas comunidades em que vivem, como o tráfico de drogas, assaltos e roubos, sequestros, assassinatos e conflitos armados, que afetam significativamente as suas vidas diárias, especialmente aquelas que vivem em áreas mais pobres. O medo e a insegurança gerada nessas condições pode causar problemas mentais, exacerbando as vulnerabilidades tanto no pessoal e no contexto familiar.

No entanto, ainda existem muitas lacunas a serem abordadas sobre violência

e saúde mental das mulheres, especialmente devido à tendência de estudos para

priorizar aspectos mais isolados sem, contudo, discuti-las de uma forma mais

contextual. A maioria dos estudos investigam as seguintes linhas de pesquisa: as

consequências imediatas e subsequentes de violência, especialmente de abuso

sexual; os efeitos da violência por parceiro íntimo; e o período em que a violência

ocorreu na vida da mulher, como a infância, gravidez e pós-parto, as fases

particularmente sensíveis, segundo Avanci et al., (2013)

Em virtude desta problemática social, este trabalho tem como intuito principal

pesquisar, através de estudos já publicados no Brasil, a violência doméstica/conjugal

e a Terapia Cognitivo Comportamental como instrumento no tratamento das

mulheres que sofreram agressão.

A Terapia Cognitivo Comportamental é uma das abordagens da Psicologia

que vem se sobressaindo com resultados positivos em tratamentos de diversas

ordens, e através de um levantamento bibliográfico, será investigado como essa

abordagem pode ser utilizada como ferramenta no tratamento de mulheres

violentadas e agredidas por seus parceiros.

1.1 A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Compreende-se violência doméstica como aquela que ocorre no espaço

privado do lar, e denominam-se as principais: a violência conjugal, a violência contra

crianças/adolescentes e a violência contra o idoso (KRUG et al., 2003 apud

BOECKEL, 2013). Ou seja, entende-se no presente trabalho que a violência

conjugal é uma das diferentes formas de violência doméstica. A violência conjugal

refere-se aos atos cometidos entre namorados ou cônjuges que incluem violência

psicológica, física e sexual, assim como lesão corporal grave em decorrência da

inadequada resolução de conflitos. Sem dúvida, essas diferentes formas se

apresentam associadas, ou seja, não aparecem isoladamente.

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Oliveira e Gomes (2011) ressaltam:

A violência conjugal ganhou visibilidade, sobretudo pelos movimentos feministas, que denunciaram o poder patriarcal e seus efeitos de opressão dos homens contra as mulheres. Suas ações compreenderam mobilizações sociais em prol da punição exemplar dos agressores; intervenções, como abrigos para mulheres vítimas, grupos de conscientização para mulheres e mais tarde também para agressores; e ainda, estudos que comprovaram a alta prevalência da violência contra as mulheres e as severas consequências para a

saúde delas.

Conforme Lamoglia e Minayo (2009), a violência conjugal é um fenômeno

polissêmico que se expressa de várias formas: abusos psicológicos, maus tratos

físicos, abusos sexuais e outros. Mulheres e homens são atingidos nas relações,

porém, em razão da especificidade de gênero, de forma diferenciada. Em situações

de violência conjugal, os homens costumam ser agredidos pela mulher, mas com

crueldade e gravidade menor do que as mulheres são atingidas por eles. A violência

conjugal ocorre com casais de todas as classes sociais, raças, idades, etnias e

orientação sexual e, embora os motivos sejam os mais variados possíveis, sua raiz é

o poder patriarcal que promove a desigualdade e a dominação do homem nas

relações de gênero (LAMOGLIA e MINAYO, 2009).

A violência conjugal sobre mulher tem implicações negativas ao nível do

exercício da parentalidade, ao interferir no modo como esta se reconhece como

mulher e como progenitora, conforme Holden, Stein, Ritchie, Harris e Jouriles, 1998;

Sani (2008) apud Sani e Cunha (2011).

Segundo Sani e Cunha (2011):

A literatura sobre o tema sustenta que o stress proveniente da violência doméstica afeta as práticas educativas da progenitora (e.g. Levendosky, Lynch & Graham-Bermann, 2000), podendo esta tornar-se inconsistente, menos responsiva, negligente ou usar mesmo com os seus filhos estratégias mais duras, como ameaça, coacção ou abuso físico (Bowker, Arbitell & McFerron, 1990; Dias, 2004; Dubowitz, Black, Kerr, Hussey, Morrel, Everson & Starr Jr., 2001; Hester, Pearson & Harwin, 2002; Magen, Conroy, Hess, Panciera & Simon, 2001; Monteiro, 2000). Para os filhos, as práticas disciplinares coercivas potenciam uma série de consequências negativas, além do risco de reexperienciação de violência como ofensor e/ou vitima nas relações futuras (Almeida, Gonçalves & Sani, 2010; Cecconello, De Antoni & Koller, 2003).

Em 1985 foi criada a primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), na

cidade de São Paulo, pretendendo ser um espaço no qual as mulheres em situação

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de violência se sentissem seguras para denunciar seus agressores. Nas DDM, o

atendimento deveria ser realizado unicamente por mulheres e contar, além do corpo

de policiais - delegadas, investigadoras e escrivãs -, com apoio psicológico e social.

Para atuar nas DDM, as equipes foram treinadas para lidar com as agressões como

crimes e estabelecer uma relação de acolhimento e confiança com as usuárias

(BLAY,(2003) apud VILLELA et al.,(2011).

Delegacia da Mulher é instituição sui generis, setor especializado do serviço

da Polícia Civil de cada Estado e é, tipicamente, polícia judiciária, o que equivale a

dizer que ela atua como correia de transmissão entre os serviços de polícia e o

sistema judiciário. O seu objetivo maior é, portanto, a instrução dos inquéritos

policiais que levarão ao judiciário as queixas-crimes para julgamento (RIFIOTIS,

2004).

A Lei 11.340/06 conhecida como Lei Maria da Penha é um dos direitos de

mulheres agredidas por seus companheiros e entrou em vigor em 2006, quando

Maria Da Penha Maia Fernandes ganha na justiça, depois de lutar mais de 20 anos

para que seu agressor fosse punido. A partir desta lei ser reconhecida, muitas

ONGs, órgãos públicos e instituições começaram a surgir para garantir a segurança,

como também os direitos destas mulheres. Essa Lei tem como proposta criar

mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar, e prevê

campanhas e programas que promovam o enfrentamento da violência (RAMOS,

2010).

Segundo a mesma autora, pode constatar em um grupo terapêutico criado

para ajudar, orientar e apoiar, que as mulheres do grupo inicialmente não se

reconheciam como agentes ativas na relação, capazes de tomar suas decisões,

buscar seus direitos e viver sem o companheiro ou com o companheiro e sem a

violência. As mulheres relatavam o medo de enfrentar os problemas da vida, como

uma relação conjugal violenta, a falta de emprego, os cuidados com a saúde, entre

outros, que caracterizavam o medo de se responsabilizarem por si mesmas.

A compreensão de que a violência contra as mulheres não é um fenômeno

natural nem uma experiência de caráter privado tem exigido dos formuladores de

políticas públicas o esforço de capacitar os serviços para identificar a violência e

tratá-la como um agravo de natureza social que produz consequências (VILLELA et

al., 2011).

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As primeiras intervenções específicas junto a homens agressores foram em 1998, em forma de grupos de reflexão, no contexto das ONGs Instituto Papai, do Recife, Instituto Promundo e Instituto Noos, do Rio de Janeiro, além do Centro Especial de Orientação à Mulher Zuzu Angel, de São Gonçalo (RJ). Os centros de reeducação de agressores, projetados na Lei Maria da Penha, já começam a sair do papel – o primeiro, em março de 2009, em Nova Iguaçu (RJ). Vale salientar que se desenvolve desde 2006 um projeto multicêntrico com quatro universidades federais brasileiras com o objetivo principal de delinear um modelo de atendimento psicossocial a homens autores de violência numa "perspectiva crítica"

. (OLIVEIRA e GOMES, 2011).

Conforme os mesmos autores, já no universo acadêmico brasileiro, as

pesquisas sobre violência e gênero vêm crescendo enormemente, desde os anos

90, de início e majoritariamente bem atreladas à perspectiva feminista. No entanto,

as pesquisas sobre homens autores de violência atraem um interesse bem menor,

apesar do no âmbito internacional estarem despontando desde a década de 1980.

Segundo Oliveira e Gomes (2011), ainda existem diferentes cenários de

confrontação entre parceiros íntimos, um tipo que tem sido bem retratado pelos

meios de comunicação como "espancamento da mulher", e outro, mais sutil, que

pode se enquadrar na "normalidade" da coabitação conjugal (porém não sem

consequências danosas para a saúde), em que a violência pode ser vista como

autorizada tanto por homens como por mulheres.

Os homens alegam o uso da violência contra a mulher pelos motivos:

ciúme/infidelidade, desemprego ou dificuldade financeira do homem, dependência

química, agressão física ou psicológica da companheira, outros "erros" dela (como

cobrança e falta de compreensão, recusa sexual, confrontação, domínio sobre o

companheiro e destituição da palavra dele, desonestidade, desobediência e

emprego dela), discussões sobre criação de filhos e finanças da casa, divergências

quanto aos papéis de homem e mulher, dificuldade de dialogar, medo de perder o

controle sobre a mulher.

No enfrentamento dessa problemática, “o acolhimento das mulheres em

situação de violência doméstica, nos serviços de saúde, ocorre de maneira

fragmentada e pontual, pois os profissionais não estão preparados para atender, de

maneira integral, essa demanda”. (LETILLIERE e NAKANO, 2011).

Ainda para Letilliere e Nakano (2011), à prática clínica, em que esses atos

tendem a se manter no anonimato,, o posicionamento dos profissionais de saúde é

de não atender às necessidades das mulheres, restringindo suas ações a

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encaminhamentos, o que também nem sempre resulta em resposta adequada às

demandas das mulheres.

O Abuso doméstico cresce a cada dia no mundo inteiro apesar de muitas

medidas e leis implantadas para proteger a integridade e segurança das mulheres,

por isso o acompanhamento psicológico é de extrema importância para sanar este

ciclo da violência e trabalhar perdas e traumas.

O efeito da violência sobre a vítima é profundo e pode conduzir a problemas de

saúde, tanto psicológicos como físicos, segundo Hamberger e Holtzworth-Monroe

(2007) apud Dattilio (2011).

As vítimas de abuso doméstico desenvolvem “regras cognitivas”, que são

pensamentos disfuncionais, que precisam ser trabalhados para conseguirem mudar

suas emoções e, consequentemente, seus comportamentos. Este padrão de

pensamento, “regras cognitivas”, faz com que a vítima continue neste ciclo vicioso

do abuso doméstico, sem buscar ajuda, apoio e proteção.

Para Durand e Schraiber (2007), a prevalência da violência no período de

estação por parceiro íntimo tem sido considerada uma questão de saúde pública,

por seu impacto direto e indiretamente na mortalidade e morbidade materno-infantil.

Segundo as mesmas autoras, devido a ampla quantidade de prevalências

encontradas no mundo, muitos estudos tem mostrado que este fenômeno é

frequente e responde por questões de saúde reprodutiva de difícil tratamento.

Estudos realizados em países em desenvolvimento mostram uma variação em

relação a violência física entre 3,8% a 31,7%, enquanto nos Estados Unidos e

Canadá encontra-se uma variação entre 0,9% a 20,1%. No Brasil estudos com

puérperas em maternidades revelam taxas de violência com parceiros íntimos na

gestação com dados de 7,4% a 18,2% na forma física, e 61,7% na psicológica.

Lamoglia e Minayo (2009) ressaltam que a partir de numerosos estudos, há

hoje evidências indiscutíveis de que a violência conjugal se caracteriza como um

problema de Saúde Pública. Segundo o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde,

publicado pela OMS (2002), são as mulheres, muito mais que os homens, que

adoecem e morrem vítimas da violência masculina, embora possam ser agressivas

em seus relacionamentos. Esse informe relata que 25% das mortes de mulheres em

idade fértil estão associadas à violência, sendo que mais de 60% delas foram

cometidas por seus companheiros. A saúde física e mental das vítimas de violência

intrafamiliar e sexual é afetada por vários agravos, dentre os quais: lesões,

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traumatismos, gravidez indesejada, DST, aborto espontâneo, problemas

ginecológicos, asma, disfunções sexuais, distúrbios alimentares, depressão,

ansiedade, abuso de álcool e drogas. E cerca de 35% das enfermidades e queixas

médicas das mulheres se devem à violência nas relações conjugais conforme Giffin

(1994) apud Lamoglia e Minayo (2009).

A violência doméstica e o estupro são a sexta causa de morte ou

incapacidade física em mulheres de 15 a 44 anos, mais do que todo tipo de câncer,

acidentes de trânsito e vitimização em situações de guerra. Além do mais, a

violência conjugal contra a mulher enfraquece seu papel social no interior do lar,

tendo efeitos reais e difusos sobre a situação psicossocial e de saúde dos filhos, o

que repercute no aumento da violência social (MORGADO, 2004, apud LAMOGLIA e

MINAYO, 2009).

Segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento, no Brasil, a violência conjugal contra a mulher também é responsável por perda de produtividade, diminuição do desempenho no trabalho, absenteísmo laboral e perda do emprego. Desta forma, fica claro que, além dos custos humanos, esse tipo de violência representa uma imensa carga econômica para as sociedades e um aumento da demanda para o uso de serviços sociais (LAMOGLIA e MINAYO, 2009).

1.2 TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL

A Terapia Cognitivo Comportamental é uma abordagem da psicologia que se

baseia fundamentalmente em como as cognições têm influência controladora sobre

as emoções e comportamento, e o modo pelo qual o pensamento influencia as

emoções e consequentemente comportamentos. Aaron Beck foi o pioneiro nesta

abordagem, desenvolvendo teorias e uma metodologia para aplicar as intervenções

cognitivas e comportamentais, conforme destaca Wright et al. (2008). O termo

“terapia cognitiva” hoje é usado por muitos da área da psicologia como “ terapia

cognitivo comportamental”, e é este último termo que será utilizado neste trabalho.

Aaron Beck (1964) estabeleceu que a psicoterapia seria estruturada, de curta

duração, voltada para o presente, direcionada para a solução de problemas atuais e

modificando os pensamentos disfuncionais e comportamentos (inadequados e

inúteis).

Segundo elucida Judith S.Beck:

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A terapia cognitivo comportamental (TCC) além de estar baseada em uma formulação cognitiva, crenças e estratégias comportamentais, também se baseia em uma conceitualização, ou melhor, compreensão do paciente (suas crenças específicas e padrões de comportamentos). A TCC tem sido adaptada a pacientes com diferentes níveis de educação e renda, bem como uma variedade de culturas e idades, desde crianças até adultos com uma idade mais avançada. É usada atualmente em cuidados primários e outras especializações de saúde, escolas, programas vocacionais e prisões, entre outros contextos. É utilizada no formato de grupo, casal e família. (2013, p. 23).

Conforme a autora, as pesquisas dizem que a TCC tem sido amplamente

testada desde que foram publicados os primeiros estudos científicos em 1977,

conforme Rush, Beck, Kovacs e Hollon (1977) apud Beck (2013). Até o momento,

mais de 500 estudos científicos demonstraram a eficácia da TCC para uma ampla

gama de transtornos psiquiátricos e problemas psicológicos.

A abordagem da terapia cognitiva comportamental é construtivista, no sentido

que reconhece que a construção ou interpretação que o individuo faz da realidade

pode estar baseada em informações únicas, categorias pessoais ou viesses de

percepção ou cognição, Leahy (2006) apud Mahoneu (1991). Segundo Leahy

(2006), a TCC não defende o “poder do pensamento positivo”, e sim o poder de

identificar o que quer que esteja sendo pensado.

A TCC, por ser uma terapia focada na solução de problemas, treina as

habilidades dos indivíduos para a tomada de decisões, através de várias técnicas,

desde a identificação de pensamentos automáticos, crenças centrais e

intermediárias, aprofundando em técnicas específicas como role play, exposição,

visualização, relaxamento e mindfulness, entre tantas outras. Uma das

características da TCC é que o cliente é o seu co-terapeuta, ou seja, seu próprio

terapeuta.

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2. OBJETIVO

O objetivo do presente estudo foi realizar uma revisão sistemática de artigos

científicos disponíveis em bancos de dados online relacionados à violência conjugal,

investigando como a terapia cognitivo comportamental é utilizada no tratamento das

vítimas no Brasil.

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3. METODOLOGIA

Para realização deste trabalho de conclusão de curso, a metodologia utilizada foi

uma pesquisa bibliográfica exploratória, utilizando os seguintes bancos de dados

online: Scielo e Pubmed.

A busca foi realizada utilizando-se as seguintes palavras-chave: violência

conjugal, violência contra a mulher, violência e gênero, e terapia Cognitivo

Comportamental. Em inglês as palavras-chave: intimate partner violence and

Behavior Cognitive Therapy.

O período reservado para a coleta dos artigos foi de janeiro a abril de 2014.

Como critério de inclusão, selecionaram-se trabalhos científicos publicados a partir

do ano de 2006, data a qual entrou em vigor a Lei Maria da Penha, até o ano de

2013 que trataram especificamente do tema violência conjugal e TCC em mulheres

vítimas de violência no Brasil. Foram excluídos os artigos que trataram de violência

doméstica de forma geral ou que não trouxeram a TCC em seu escopo.

Com o material previamente definido, foram estabelecidos etapas e um

cronograma a ser seguido para a conclusão do trabalho. Primeiramente foi feita uma

leitura flutuante do resumo, buscando apreender o tema central de cada artigo e

assim elaborar o trabalho com introdução, resultados/discussão e conclusão.

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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Essa revisão bibliográfica teve como foco a pesquisa de artigos científicos

encontrados no banco de dados online da Scielo e Pubmed. Foram encontrados 26

artigos referentes à violência conjugal. Contudo, somente um artigo (CORTEZ,

PADOVANI e WILLIAMS, 2009), preencheu os critérios de inclusão desse trabalho.

Diante da escassez de literatura específica, foram incluídos dados de alguns

artigos de revisão, livro de referência sobre o tema e outros que trouxeram

informações relevantes.

Segundo Vandenberghe (2006), a terapia comportamental de casal surgiu em

países nos quais, durante séculos, uma segregação rígida dos papeis de gênero

havia garantindo a homens e mulheres a socialização necessária para se adequar

aos seus destinos na família. Ainda conforme o autor, quando duas guerras

mundiais retiraram, durante anos, grandes números de homens europeus e norte-

americanos do mercado de trabalho, abriu-se o espaço para a entrada de mulheres

em funções anteriormente fechadas para elas. Junto com o movimento político de

emancipação feminina que conheceu seus maiores sucessos na primeira metade do

século XX, essa redistribuição do trabalho levou a uma mudança profunda na cultura

conjugal. Na segunda metade do século XX, a mulher de classe média já tinha uma

profissão (VANDENBERGHE, 2006).

Pode-se afirmar que os principais objetivos da terapia cognitivo comportamental,

no tratamento de casais em conflito, são a reestruturação de cognições

inadequadas, o manejo das emoções, a modificação de padrões de comunicação

disfuncionais e o desenvolvimento de estratégias para solução de problemas

cotidianos mais eficazes. Outros procedimentos utilizados são as alterações de

comportamentos que formam padrões negativamente específicos (DATTILIO, 2004

apud PEÇANHA e RANGÉ, 2008).

A primeira geração de terapeutas comportamentais de casal tinha uma formação em Análise Aplicada do Comportamento. Típico nesse modelo é o interesse exclusivo para comportamento publicamente observável e quantificável. Procuraram-se então as causas do comportamento em variáveis ambientais. Aplicadas às relações de casal, cada parceiro estabelece, com seu comportamento, as contingências que controlam o comportamento do outro. Este

19

movimento explicitamente promoveu, como filosofia da vida em casal, a ideia de que as pessoas investem no relacionamento para crescer como indivíduo. Logo, o bom funcionamento conjugal depende da preponderância de reforçamento positivo nas trocas. Para isso, precisa-se compartilhar tarefas e responsabilidades de forma equilibrada. Problemas surgem quando cônjuges fazem uso excessivo de estratégias de controle aversivo, ou quando os padrões habituais de reforçamento não são recíprocos, assim que um dos dois aproveita da união enquanto o outro é prejudicado por ela (STUART, 1969; PATTERSON e HOPS, 1972, apud VANDENBERGHE, 2006).

Existem algumas regras básicas que costumam ser discutidas com casais

como pertinentes e úteis para aquele parceiro que deseja falar. Discute-se que

relatos breves, objetivos, claros, descritos em termos comportamentais e focados em

problemas específicos costumam ser os primeiros passos no sentido de uma

comunicação mais eficaz. Além disso, destaca-se a apresentação de pensamentos e

sentimentos pessoais, enfatizando os aspectos positivos e negativos em um

determinado contexto. Por último, enfatiza-se a comunicação gentil e polida, como é

empregada na interação social em geral, conforme ilucida Schmaling et al.(1997)

apud Peçanha e Rangé (2008).

É fundamental que se inicie a terapia cognitivo comportamental com uma

sessão para esclarecimento de todas as informações que o paciente necessite sobre

seu tratamento. O papel do terapeuta é educar e familiarizar o paciente em relação

aos seus problemas, esclarecendo todas as dúvidas, informando e acolhendo.

O primeiro objetivo da TCC é fazer do paciente um colaborador ativo, aliado

aos profissionais envolvidos e consequentemente tornar o procedimento terapêutico

mais efetivo. É importante que o paciente tenha conhecimento a respeito de como

será o tratamento, assim será o seu próprio terapeuta, utilizando as ferramentas da

TCC.

A TCC apresenta-se como uma terapia importante e eficaz no tratamento da

violência conjugal, tanto com as vítimas como os agressores também, pois os

psicoeduca com novas formas de se comportar e pensar, com técnicas cognitivas

comportamentais, como identificação de pensamentos disfuncionais, reestruturação

cognitiva e técnicas de relaxamento e respiração (DATTILIO, 2011).

A identificação de pensamentos automáticos pode ser feita através do Registro

de Pensamento Automáticos (RPD) e do diagrama de cinco partes. A reestruturação

cognitiva muda a maneira de interpretar aquele pensamento disfuncional. A

respiração controlada ajuda a manter o relaxamento muscular e oxigenar o cérebro.

20

Muitas outras técnicas podem ser utilizadas, porém é o terapeuta que avalia se

aplica ou não, dependendo da situação ou caso.

Conforme Epstein e Baucom (2002) apud Peçanha e Rangé (2008) apontaram:

As emoções têm um papel igualmente relevante no funcionamento da vida amorosa. Sentimentos como raiva, medo, ansiedade e tristeza podem influenciar de forma negativa as cognições e os comportamentos de ambos os parceiros. Por outro lado, emoções como amor e felicidade podem influenciar positivamente o convívio conjugal Casais que há muito tempo estão vivenciando grandes níveis de estresse em seus relacionamentos tendem a ter mais os primeiros sentimentos do que os segundos. Por exemplo, uma parceira que solicita a ajuda do marido para carregar um objeto pesado, e esse não a atende por problemas de saúde que ela ainda desconhece, pode ficar com raiva ao não ser atendida em sua solicitação. Ela pode pensar: “ele nunca me ajuda” e gritar que ele é egoísta.

Conforme Peçanha e Rangé (2008), a falta de comunicação entre os

parceiros é um dos principais problemas para os conflitos. Algumas pessoas têm

dificuldades para expressar o que pensam e o que sentem.

A resolução inadequada de problemas cotidianos é outro fator comportamental que também pode ter consequências indesejáveis para os parceiros em seu relacionamento. Por exemplo, um marido pode ter dificuldade em definir um problema de ordem financeira com sua esposa, o que pode acabar por manter o casal mergulhado em dívidas. Além disso, os casais têm de lidar com temas específicos que podem ser conflitantes, como a educação dos filhos, relata Dattilio e Padesky (1995) apud Peçanha e Rangé (2008).

Geralmente, a primeira sessão é realizada com a presença de ambos os

cônjuges. Essa é uma oportunidade para o terapeuta verificar as áreas

problemáticas no relacionamento, a interação entre o casal, o modo como eles se

comunicam, os pontos fortes da relação, os fatores externos que possam estar

estressando os parceiros etc. As informações que são obtidas nessa sessão irão

auxiliar no processo de formulação de hipóteses preliminares sobre os motivos do

conflito conjugal (SCHMALING et al., 1997).

Após a entrevista inicial, duas sessões costumam ser conduzidas. Cada uma

contando com a presença de apenas um dos parceiros. O objetivo seria coletar

informações que talvez não tenham sido apresentadas inicialmente. Um parceiro

poderia ficar inibido na presença do outro e não revelar situações como, por

exemplo, abuso na infância, violência intrafamiliar, adultério e desejo de se divorciar.

Algumas questões éticas se impõem nessas entrevistas individuais. As informações

21

prestadas nessas sessões só podem ser reveladas com a autorização dos

participantes, exceto em alguns casos específicos. Por exemplo, no caso de

violência física é necessário que o cônjuge abusado seja encaminhado para

instituições competentes (DATTILIO e PADESKY 1995).

Um dos objetivos da terapia Cognitivo Comportamental é organizar os

pensamentos disfuncionais. Esse é um processo realizado em diferentes etapas. O

objetivo é fornecer ao casal habilidades que possam diminuir os seus conflitos e com

o processo terapêutico aprendam a lidar com as emoções.

A identificação das distorções cognitivas é outra etapa relevante. O terapeuta ensina o casal a relacionar essas distorções com os pensamentos automáticos. A apresentação de uma folha contendo uma lista de distorções é bastante eficaz para atingir esse objetivo. Ambos os cônjuges aprendem também a verificar e questionar suas crenças intermediárias e centrais. São empregadas algumas técnicas específicas, como, o questionamento socrático, a técnica da flecha descendente, e dramatizações (DATTILIO, 2004 apud PEÇANHA e RANGÉ, 2008).

Segundo elucida Cortez, Padovani e Williams (2009):

A aplicação de grupos terapêuticos é uma das alternativas para o desenvolvimento de um programa com agressores (Sinclair, 1985, Faulkner et al., 1992; Soares, 1999), sendo que há muitas diferenças entre os programas aplicados, ocorrendo variações de duração e de abordagem (Gondolf, 1996a; 1996b; 1997; Soares, 1999). De modo geral, esses programas seguem uma diretriz comum que poderia ser identificada dentro da modalidade cognitivo–comportamental, orientada por princípio de gênero (Soares, 1999). Outra característica desse tipo de programa é o fato, como afirma Sinclair (1985), de os grupos serem mais efetivos do que o aconselhamento individual por haver uma possível diminuição de vergonha, culpa e isolamento na interação com os demais membros.

Na leitura dos trabalhos científicos selecionados para esta revisão

bibliográfica, constatou a evidência de sequelas e traumas ocasionados pela

violência doméstica e as consequências na vida da vítima, causando danos físicos e

psicológicos, podendo desenvolver transtorno de estresse pós traumático,

depressão e até abuso de substâncias, como álcool e drogas.

O levantamento bibliográfico foi realizado através do Scielo e Pubmed, porém

este trabalho pode ser considerado como a única fonte de pesquisa no Scielo, pois

22

no Pubmed os poucos artigos encontrados não relataram intervenções realizadas no

Brasil.

Conforme estudo realizado por Iverson, et al (2011), o Transtorno de Estresse

Pós Traumático (TEPT) e a Depressão quando tratados com a Terapia Cognitivo

Comportamental, reduzem o risco de mulheres sofrerem a violência por parceiro

íntimo no futuro, porém ainda há uma escassez de pesquisas para avaliar a

eficiência das intervenções da TCC para proteger o estado emocional e psicológico

das vítimas que sofrem agressão.

Os sintomas do TEPT e da depressão pode comprometer a capacidade

cognitiva e afetiva, interferindo com a capacidade de identificar e evitar parceiros ou

situações de risco, conforme Iverson, et al (2011). Ainda, segundo os mesmos

autores, as mulheres que experimentam a violência conjugal podem estar envolvidas

em um ciclo vicioso de abuso, com a vitimização interpessoal levando a sofrimento

psiquiátrico na forma de TEPT e depressão.

Segundo Oliveira e Gomes (2011):

A pesquisa de Reichenheim et al. sobre prevalência de violência entre

parceiros íntimos, realizada em 2002/2003, em 15 capitais brasileiras e no Distrito Federal, envolvendo 6.760 mulheres, usando como instrumento a Escala de Táticas de Conflito (formulário R, de Straus), a prevalência global de agressão psicológica, abuso físico "menor" e "grave" no casal foi de 78,3%, 21,5% e 12,9%, respectivamente, índices muito altos em relação a países como EUA e europeus. O abuso físico total atinge entre 13,2% e 34,8% nas várias cidades, sendo que as prevalências foram mais altas no Norte e no Nordeste. Constatou-se ainda que quanto menor a idade e a escolaridade, maior o índice de violência. Oliveira e Gomes (2011), desagregando por gênero, verificou-se que mesmo elas batendo mais em geral, nas situações em que são vítimas estão em clara desvantagem sofrendo mais consequências para a saúde, o que é coerente com a literatura internacional de abordagem semelhante. Os autores defendem, então, a ideia de que não se pode concluir apressadamente que a violência entre parceiros íntimos é qualitativamente e quantitativamente simétrica em relação ao sexo, que as estruturas de poder e dominação devem ser contempladas. Oliveira e Gomes (2011), conclui-se ainda que existem diferentes cenários de confrontação entre parceiros íntimos, um tipo que tem sido bem retratado pelos meios de comunicação como "espancamento da mulher", e outro, mais sutil, que pode se enquadrar na "normalidade" da coabitação conjugal (porém não sem consequências danosas para a saúde), em que a violência pode ser vista como autorizada tanto por homens como por mulheres. Estudo de Schraiber et al., também recente, sobre "prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo", em diferentes regiões do Brasil,

23

também infere sobre padrões distintos de violência conjugal: um mais brando e ocasional e outro mais crônico, de natureza progressiva; embora não falem da violência feminina.

Diante das considerações acima, fica evidente que a violência conjugal faz

cada vez mais parte de nossas vidas, seja no noticiário no jornal, rádio, um vizinho

ou até mesmo um ente querido que sofre este tipo de violência. Contudo, apesar de

estudos e leis para tratar este problema de saúde pública, ainda falta muito para

podermos sanar este ato violento. Orgãos filantrópicos e governamentais se

movimentam para que esta realidade mude, e que o índice de violência psicológica,

verbal ou física contra a mulher diminua cada vez mais. As ciências como a

psicologia, sociologia e antropologia buscam entender este fenômeno social que

atinge a sociedade em geral, por isso é imprescindível o desenvolvimento de

pesquisas nessas áreas.

24

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sociedade vem se transformando a cada dia devido ao avanço tecnológico,

a velocidade das informações, e até através das mudanças ambientais, que acabam

afetando e influenciando a todos do planeta. Em consequência disto, as relações

humanas também mudam para poder se adequar as novas formas de pensar e agir.

O intuito deste trabalho foi investigar se há pesquisas e estudos com a

Terapia Cognitivo Comportamental realizados para ajudar mulheres que sofreram ou

sofrem agressão doméstica, resgatando assim sua autoestima, seja como mãe,

profissional, e principalmente como mulher, já que as feridas foram abertas e

precisam ser cicatrizadas.Observou-se que as estatísticas são alarmantes referentes

a dados apresentados em pesquisas e trabalhos a respeito da violência conjugal.

Foi especificada nesta revisão bibliográfica apenas a violência entre

parceiros íntimos, porém não se pode deixar de considerar que a violência é algo

muito mais complexo, envolvendo qualquer indivíduo, seja uma criança a um idoso.

Apesar de leis e políticas públicas criadas para proteger e garantir os direitos das

mulheres, ainda existe um aumento considerável em relação às mulheres

violentadas.

Quando se fala em violência doméstica, apenas se pensa na vítima, e se

esquece de que o agressor também precisa de ajuda para modificar este

comportamento maléfico que prejudica a todos os envolvidos, inclusive ele próprio.

Por isso, é interessante as autoridades também criarem políticas públicas para a

promoção, prevenção, informação, para que os agressores possam contar com

ajuda psicológica. Em muitos casos de agressão, o que desencadeia a violência do

parceiro, foi o ciúme obsessivo.

Parece utopia essa forma de pensar, porém fica claro que não se deve tratar

somente os efeitos, e sim a causa, ou seja, não adianta apenas proteger e apoiar as

mulheres, sendo que o agressor muitas vezes é vítima de um passado de rejeição,

problemas e violência.

Essa revisão bibliográfica de artigos constatou a carência de material

específico que abordasse a Terapia Cognitivo Comportamental como ferramenta no

tratamento de mulheres que sofreram agressão por seus companheiros.

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Buscou-se encontrar na Pubmed artigos que relatassem pesquisas e

resultados a respeito da violência conjugal e a terapia cognitivo comportamental.

Não foi encontrado nenhum artigo que relatasse a realidade no Brasil, como era o

intuito do trabalho. Mesmo na literatura geral sobre o assunto mostrou-se escassa.

Encontrou-se um número satisfatório de artigos publicados a respeito de

violência doméstica, que abrange não só a violência entre o casal, como crianças e

idosos, porém nada específico com a abordagem da Terapia Cognitivo

Comportamental no contexto conjugal. Nota-se a importância de mais publicações

referentes a este problema social ao qual estamos inseridos.

O companheiro agressor também precisa de ajuda e apoio para entender

seus atos e uma nova oportunidade para refletir e mudá-los, para que não continue

repetindo seu comportamento no futuro com a mesma companheira e/ou futuras

companheiras.

Diante destas colocações acima, é imprescindível o desenvolvimento de

pesquisas que consolidem a importância da terapia Cognitivo Comportamental no

auxílio de mulheres e também companheiros agressores, para que possa

conscientizar não só os psicólogos, mas a todos profissionais da saúde e órgãos

públicos responsáveis.

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Termo de Responsabilidade Autoral

Eu, Aline Calaes Moreira, afirmo que o presente trabalho e suas devidas

partes são de minha autoria e que fui devidamente informado da responsabilidade

autoral sobre seu conteúdo.

Responsabilizo-me pela monografia apresentada como Trabalho de

Conclusão de Curso de Especialização em Terapia Cognitivo Comportamental, sob

o título “Uma Revisão Bibliográfica sobre a Terapia Cognitivo Comportamental

e a Violência Conjugal no Brasil”, isentando, mediante o presente termo, o Centro

de Estudos em Terapia Cognitivo-Comportamental (CETCC), meu orientador e

coorientador de quaisquer ônus consequentes de ações atentatórias à "Propriedade

Intelectual", por mim praticadas, assumindo, assim, as responsabilidades civis e

criminais decorrentes das ações realizadas para a confecção da monografia.

São Paulo, __________de ___________________de______.

_____________________

Assinatura do (a) Aluno (a)