Catalogo Jornada Cinema Mudo

49
1 6 a 15 de agosto de 2010 São Paulo

description

Catalogo cinema mudo, jornada

Transcript of Catalogo Jornada Cinema Mudo

Page 1: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 1/49

1

6 a 15 de agosto de 2010 São Paulo

Page 2: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 2/49

 Filmagem de Terje Vigen

Page 3: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 3/49

 Visita ao AcervoFilmes de Arquivo doInstituto Sueco de Cinema

Programa 1 – CensuraO Rio da vidaCagliostroO AbismoO JardineiroAsta Nielsen

Programa 2

Filmando Ana BoleynA Aurora de um amanhã

Programa 3A Rua das lágrimas

Programa 4Uma visita a Selma Lagerlöf A Carne e o diaboGreta Garbo

Programa 5A Mulher divinaVento e areiaLars Hanson

Programa 6Rua Meschanskaia, 3 / Sofá e cama

Programa 7A Chegada do rei do Sião a LogårdstrappanCenas da vida do rei Oscar IIViagem às ruínas de AngkorNa terra dos Moïs: exploração e caça

 Secretaria do AudiovisualCinemateca BrasileiraCuradoriaCuradoria musical

Músicos e artistas convidados

Cinédia 80 anosOde parnaso- punk aos 80 anos

Lábios sem beijos 

Em busca do BrasilTrenzinho CaipiraCompanhia Paulista de Estrada de FerroCompanhia MogyanaO Segredo do corcunda – a cor em Gilberto RossiO Segredo do corcundaHilda Machado Pesquisadora do Cinema

 Jon Wengström apresentaO Cinema Silencioso SuecoConferência de abertura

Programa 1Na primavera da vidaMadame de Thèbes

Programa 2Quando o capitão Krogg foi fazer o seu retratoA Prisioneira da Fortaleza de KarlstenNos grilhões da escuridão

Programa 3Terje VigenO Mosteiro de Sendomir

Programa 4A Feitiçaria através dos tempos

Programa 5Contra o orgulhoEinar Hanson

Programa 6As garotas de NorrtullTora Teje

Programa 7A Herança de Ingmar

Exposição

78

1214

20

21

24

2727323435

45

46

47

48

48

50

52

37

43

Sumário

Destaques de PordenoneQuadra de Ases Americanos

RegeneraçãoO SupersticiosoEste mundo é um teatroGolpes de audáciaRaymond Griffith

 Janela para a América LatinaTesouro inca

Wara wara

Produções silenciosascontemporâneasPreservação e coronelismo,

Que cavação é essa?

Mesas de debates

Referências bibliográficas

Agradecimentos

Créditos

Instituições colaboradoras

54

57

63

63

69

72

59

73

74

15

Silencioso Brasileiro 49

51

53

61

62

65

 Aposta (sem blefe) de Pordenone

orgia e cachoeira,som direto e silêncio,cinzas e tesouros

7677788081

82

83

84

85

87

91

91

92

 Abreviações

cp: companhia produtora; d: direção; da: direção de arte; df : direção de fotografia; e: elenco; ee: efeitosespeciais; mo: montagem; mor: música original; p: produção; r: roteiro

94

Page 4: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 4/49

7

Newton Cannito

Secretário do AudiovisualMinistério da Cultura

A  Jornada Brasilei ra de Cinema Silen cioso  é uma oportunidade singular e instigantepara conferir com outros olhos obras audiovisuais diversas, no resgate de filmessignificativos na história do cinema brasileiro e mundial, abrindo espaço para ainovação e a ousadia de linguagem. Chega à s ua quarta edição uma mostra quese destaca pela proposta estética original e criativa e se consolida na agenda dacidade de São Paulo.

Sendo a única mostra de cinema voltada a esse gênero, desprivilegiado nos meiosexibidores, sua inovação não para por aí, pois a dinâmica de obras audiovisuaiscom música ao vivo possibilita uma experiência inovadora aos que apreciam a artecinematográfica. Releitura é a palavra do momento, e nada é mais contemporâneodo que estimular diferentes formas de fruição.

É com grande satisfação que a Secretaria do Audiovisual – Sav/MinC apoia arealização deste evento por meio da Cinemateca Brasileira. Iniciativas como esta,além de enriquecer a formação cultural brasileira, contribuem para a restauração,preservação e difusão de acervo raro e de importância inquestionável para ahistória do cinema.

Por fim, convidamos a todos a participarem de uma experiência diferente nesta Jornada que, sem dúvida, trilhará próspero caminho e será capaz de, a um sótempo, divertir, informar e incentivar a reflexão.

Secretaria do Audiovisual

Johnson

Page 5: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 5/49

9

Cinemateca Brasileira

excelência, mas vale destacar o famoso Häxan / A Feitiçaria através dos tempos (1922), de Benjamin Christensen, numa cópia que o curador do arquivo sueco, JonWengström, considera a mais bela de seu acervo. Agradecemos a colaboração doSvenskafilminstitutet / Kinemateket e de seu curador, que ainda fez uma seleção detítulos internacionais conservados naquele arquivo e proferirá a conferência inauguralda IV Jornada Brasileira de Cinema Silencioso.

Agradecemos também a colaboração de Paolo Cherchi Usai, do comitê diretor dasGiornate del Cinema Muto, de Pordenone, pela seleção de programas desse evento,representado nas Jornadas em uma seção permanente – neste ano com ênfase emproduções americanas.

Completando a parte internacional, é com grande satisfação que, em sua seção Janela para a América Latina, a IV Jornada focaliza o longa-metragem Wara wara,realizado em 1929 por José Maria Velasco Maidana, único silencioso remanescenteda produção boliviana, recém-restaurado no laboratório L’Immagine Ritrovata, emBolonha, na Itália.

Voltando à produção brasileira do período, acreditamos oferecer um excelentecontexto para homenagear os 80 anos da produtora Cinédia, fundada por AdhemarGonzaga em 1930. Para tanto, a IV Jornada apresentará Lábios sem beijos,dirigido por Humberto Mauro, único filme silencioso da produtora. Conhecer oureconhecer, lembrar e discutir os sonhos e as ações dos pioneiros do nosso cinemasão disposições que a Jornada coloca para seu público que, cada vez mais, integraespecialistas e não-especialistas, tornando a história do nosso cinema mais próximada experiência coletiva.

Mais uma vez, contamos com o talento do músico e compositor Livio Tragtenberg,responsável pela curadoria musical do acompanhamento ao vivo dos filmes exibidosna Sala Cinemateca-BNDES. Além desta sala, e das projeções silenciosas na SalaCinemateca-Petrobras, e dado o grande sucesso das sessões musicadas na Sala SãoPaulo na edição de 2009, a IV Jornada apresenta projeções ao ar livre junto aoAuditório Ibirapuera. Esperamos, desse modo, levar a experiência a um público cadavez maior.

É com entusiasmo que a Cinemateca Brasileira percebe ter, nessa abordagemdo passado sem traços do saudosismo que paralisa (ao contrário, uma abordagemmoderna, que aponta para o futuro), tantos parceiros, sem cuja colaboração esta

 Jornada não seria possível.

E então... é novamente agosto, vamos jornadear ! 

Damos então continuidade à marcha do cinema silencioso.

 Jornadear  é um verbo que a cidade de São Paulo conjuga, no mês de agosto, quandoa Cinemateca Brasileira apresenta sua já consolidada Jornada Brasileira de CinemaSilencioso – evento que ilumina temas, cinematografias e personalidades do cinemamundial produzido entre finais do século XIX até aproximadamente 1930, quandoo som, sincronizado à imagem e agregado ao suporte fílmico, modificou para semprenossa concepção de cinema.

É com o sentimento de ver consolidada uma importante ação de difusão cinematográficaque realizamos esta quarta edição. Um acontecimento que, por três anos consecutivos,foi merecedor da fidelidade e de uma afluência crescente do público, gera a confiançade que, para além da qualidade das manifestações culturais e artísticas apresentadas acada ano, o assunto “cinema silencioso”, em si, é valoroso e oportuno.

O formato da Jornada permite: retomar esse cinema antigo através de umaprogramação cuidadosamente selecionada e com acompanhamento musical aovivo, articulando experiências visuais e narrativas do passado com uma atmosferasonora contemporânea; conjugar u m saudável entretenimento com reflexões acercada conservação e restauração de filmes; conhecer a produção brasileira do períodoem diálogo com o que se produziu na América Latina e com as cinematografias deoutros países; e promover discussões em mesas temáticas nas quais pesquisadoresapresentam e fortalecem suas abordagens históricas sobre o cinema do período.

Para que um evento ganhe consistência no calendário cultural, talvez a chave necessáriaseja a inovação dentro da continuidade. Apostando na equação, a IV Jornadamanteve a organização de seus contornos gerais. A seção brasileira apresentará otema Trenzinho Caipira, com filmes documentais e de ficção que tratam da atividadeferroviária durante a década de 1920. Participam da seção documentários de longa-metragem restaurados pela Cinemateca Brasileira nos últimos anos, assim como olonga-metragem de ficção O Segredo do corcunda, de Alberto Traversa (1924),objeto de um grande estudo da pesquisadora Hilda Machado, a quem a Cinematecapresta justa homenagem. A alegria de organizar e apresentar esta seção se completacom o acompanhamento do violinista e diretor do Museu Villa-Lobos, Turíbio Santos,especialmente convidado.

Fortalecendo o diálogo com as cinematografias do mundo, e trabalhando em conjuntocom o arquivo de filmes sueco, o Svenskafilminstitutet / Kinemateket, a Jornadaapresenta um panorama do cinema do período silencioso da Suécia, e os trabalhosde restauração de filmes que há décadas vêm sendo desenvolvidos naquele país.Trata-se de um dos conjuntos mais brilhantes da história do cinema, com diretoresconsagrados como Victor Sjöström e Mauritz Stiller, e grandes atores, como LarsHanson e Greta Garbo. Difícil apontar uma obra específica em uma mostra de tal

IV Jornada Brasileira deCinema Silencioso

Page 6: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 6/49

11

Mosteiro de Sendomir

Page 7: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 7/49

13

passaram a ser um espetáculo completo, produtos finais padronizados e, como tal,apareciam do mesmo jeito em qualquer cinema de qualquer parte do mundo.

O que Dibbets sugere é que, antes do advento do sonoro, cada espetáculocinematográfico era único. O que diz é que, antes, os espectadores compareciam aum espetáculo multimídia que era prioritariamente desempenhado do lado de cá datela. Com o som no filme, entravam no cinema para ver somente o que aconteciana tela, ou do outro lado da tela, como diziam alguns. A emoção de assistir umfilme transformou-se de happening  coletivo numa relação entre o filme e o espectadorindividual. A capacidade do exibidor ou da plateia de intervirem no processo decomunicação reduziu-se ao mínimo.

Um dos propósitos fundamentais da Jornada Brasileira de Cinema Silenciosoé possibilitar a seus espectadores – através de apresentações arquivísticas – arecuperação do caráter dionisíaco do espetáculo cinematográfico, no que ele temde celebração arrebatada e amorosa. Tenho certeza de que alguns espectadores queseguiram as três primeiras edições da Jornada concordarão comigo que, em algumassessões memoráveis, logramos plenamente nosso intento.

Nesta nova edição da Jornada insistimos nesse propósito e tivemos a colaboraçãocalorosa de Jon Wengström, curador da Coleção de Filmes de Arquivo do InstitutoSueco de Cinema. Qualquer coisa que se possa dizer sobre amizade seria discreto emrelação a Jon – aliás, ele próprio extremamente discreto em suas manifestações deamizade. Colaborador permanente da Jornada, desta vez Jon foi o máximo. Durantemeses trocamos mensagens, até estabelecer a seleção final dos filmes que vieram doarquivo sueco (e várias vezes tive de dizer não à sua proposta de incluir mais um título).

 Jon providenciou fotografias para o catálogo, selecionou imagens para a exposição, fezpessoalmente a tradução para inglês de intertítulos de filmes que existiam apenas emsueco. E ainda se dispôs a apresentar sessões.

Carinhosa para com a Jornada também é a relação de Paolo Cherchi Usai, do comitêdiretivo das Giornate del Cinema Muto de Pordenone, nossa irmã mais velha. Numademonstração de que carinho é uma via de mão-dupla, por proposta de Paolo,alguns programas de nossa seção “Em busca do Brasil – Amazônia Silenciosa”, daIII Jornada, serão apresentados na vigésima nona edição das Giornate, no próximomês de outubro.

Em belíssimas cópias, o amor será apresentado na IV Jornada sob diferentesmanifestações e para quase todos os gostos: o amor tórrido, o fraternal e o maternal,o diábolico e o idílico. Um dos exemplos extremos dessa presença é TretiaMeschanskaia / Rua Meschanskaia 3 ou Sofá e cama (Abram Room, 1927),uma espécie de Dona Flor e seus dois maridos em locação moscovita. Confesso que,dando asas a uma “interpretação local”, ao assisti-lo pela primeira vez, imediatamentelembrei-me da marchinha “Ride... palhaço”, de Lamartine Babo, gravada em 1933pelo autor em dupla com Mário Reis.

 Eu sou o seu Pierrô,Colombina (bis)

 Reparte esse amor  Metade pra mim Metade pro teu Arlequim

Coisas de amor

Num antigo momento da Cinemateca Brasileira – que este mês (ao menos pelaminha cronologia) completa seus 70 anos –, a sublime Lygia Fagundes Telles declarounuma reunião de Conselho em que se debatiam diferenças internas (elas nunca estãosuperadas!), que tudo era uma questão de amor.

Realizar a Jornada Brasileira de Cinema Silencioso é uma questão de amor, com assuas complexidades, eventuais desapontamentos e alegres satisfações. Amor para comos colegas da Cinemateca, que oferecem seu apoio, solidariedade e ajuda “no queprecisar”; amor ao público que anualmente prestigia as sessões da Jornada, sugere,comenta e pede mais; amor ao cinema, aos filmes e à sua preservação – da qual aapresentação é parte integrante.

No mais importante livro sobre a missão dos arquivos audiovisuais publicado esteséculo (o livro é de 2008),  Film Curatorship – Archives, Museums, and the Digital Marketplace,Paolo Cherchi Usai, David Francis, Alexander Horwath e Michael Loebenstein(arquivistas de diferentes gerações) dialogam sobre vários aspectos das atividades dosarquivos, discutindo e propondo a definição do que seria a maneira mais modernade conceituar o conjunto de seu sistema de trabalho. O conceito é o de “curadoriacinematográfica”, que consiste na arte de interpretar a estética, a história e a tecnologia docinema através da coleta seletiva, da preservação e da documentação sobre filmes, e sua exibição emapresentações arquivísticas.

Por “apresentação arquivística” entenda-se a exibição – nas instalações do próprioarquivo ou em locais externos, desde que o arquivo tenha pleno controle das condiçõestécnicas de apresentação – da obra cinematográfica de forma a possibilitar que aexperiência do contato seja organizada de maneira consistente com sua identidadehistórica, de forma a gerar um novo conhecimento. Significa oferecer ao público omaior número possível de informações sobre a obra e seu contexto histórico, bemcomo apresentá-la nas condições mais próximas possíveis das de sua apresentaçãopública original (bitola, cor, velocidade de projeção corretas, etc.). Em termos decuradoria, um “conteúdo”, privado de seu contexto ou fruição, é apenas um item deconsumo, de mercadoria (daí o uso preferencial do termo “obra” ou “artefato” nomundo arquivístico e museológico).

Karel Dibbets, historiador de cinema holandês, destacou alguns pontos relativos àsmudanças do espetáculo cinematográfico quando do advento do som, a partir de1926. Até então, os filmes eram apresentados com orquestras, pequenos conjuntosou músicos individuais que faziam o acompanhamento ao vivo, eventualmente como acréscimo de ruídos e mesmo de falas. Com a transferência desses sons para apista inscrita na película – ou em discos, como ocorreu provisoriamente com o usodo sistema Vitaphone –, o cinema perdeu seu caráter de espetáculo multimídia epassou a ser um evento de uma mídia única. Os filmes não chegavam mais às salascomo mercadorias semimanufaturadas que necessitavam de complementações einterpretações locais – do exibidor, dos músicos e da plateia. Com o som, os filmes

Carlos Roberto de SouzaCurador

Page 8: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 8/49

A seleção de filmes suecos apresentados este ano na Jornada, por sua densidade erefinamento, coloca a questão do uso da música no cinema silencioso num patamar delinguagem mais complexo e sofisticado.

O refinamento dos recursos utilizados nesses filmes, como tratamento de cores,fotografia, montagem, enquadramentos, soa como música das imagens em movimento.Me assombraram o ritmo e o envolvimento sensorial que eles propiciam. Apesar dadiversidade estilística – épico-poético, drama, comédia, policial – essa qualidade rítmicaestá sempre presente.

A questão colocada pelo compositor de música de cinema David Raksin – “No que,exatamente, a música contribui para um filme?” – torna-se ainda mais instigante quandonos deparamos com o cinema silencioso e suas relações com o espectador de hoje. Assim,

no que a música ao vivo pode contribuir para o filme silencioso?Para o filósofo esloveno Slavoj Zizek, a “música de cinema possui uma dimensão superiorpara causar distúrbios na ordem simbólica do filme”. (Zizek, Slavoj, The Metasteses of

 Enjoyment , New York,1994.) De certa forma, esse é um dos objetivos que perseguimos na Jornada (complementandoa curadoria de Carlos Roberto), no sentido de uma revitalização – mais do que umapretensa “atualização” que, de resto, soa ridículo quando se trata de criação artística – docinema silencioso, ao buscarmos, ao lado de condições ideais de exibição e sonorização,uma leitura sonora do cinema silencioso através da escolha de criadores musicais quepossam estabelecer diálogos instigantes com as plateias de hoje. Assim, a ideia de que a música ao vivo possa criar reflexos, e reflexões paralelas ao filme,tem sido um dos vetores na escolha dos músicos participantes. Seja por aproximação oupor distanciamento (irônico ou conceitual) as musicalizações buscam sobretudo estabeleceruma conversa criativa, ao invés de uma moldura decorativa, com as narrativas fílmicas.

A  Janela para a América Latina  apresenta o filme silencioso boliviano Wara Wara, que já vem sonorizado com a música do importante compositor contemporâneo, tambémboliviano, Cergio Prudencio (1955). Ele é criador da Orquestra Experimental deInstrumentos Nativos, em seu país, nos anos de 1980. Realizou música para mais dequarenta filmes, tendo recebido vários prêmios. Será, portanto, uma oportunidade únicapara se travar contato com sua obra.

 Este ano, o Auditório Ibirapuera acolhe uma sessão da Jornada, que tem tudo para serespecialíssima, iniciando uma parceria que, esperamos, perdure e se integre à própria

 Jornada. O filme suecoHäxan /A Feitiçaria através dos tempos (1922) irá encantarcom luzes e visões fantasmagóricas. Filmes que documentam a ferrovia no Brasil também são destaque na programação,repercutindo a imagem-fetiche dos Irmãos Lumière nos primórdios do cinema, e queterão um tratamento sonoro diversificado, seja na sonoplastia ou na colagem musical,compondo um painel de sonoridades que dialogam com a memória do espectador. Temosmúsicos representativos da chamada música popular  musicando filmes na homenagem aos80 anos da Cinédia, ampliando assim a palheta de timbre e estilos musicais. Mais uma vez, a seleção musical da Jornada apresenta uma ampla diversidade sonora,não apenas no sentido de estilos e gêneros musicais, mas também nas diferentes formas deabordagem das imagens.Literalmente, este ano as imagens e sons estão nos trilhos...

Pondo sons e imagens nos trilhos...Livio Tragtenberg Curador musical

Ana FridmanFormada em Música e Dança pela Unicamp, atua como compositora, pianista, arranjadora,bailarina e professora de Percepção e Harmonia. Em 2002 ganhou a bolsa Virtuose emComposição para estagiar com o grupo londrino Kinetic Concert. Lançou em 2004,pelo selo Zabumba Records / Rob Digital, o CD

O Tempo, a Distância e a Contradança, com

músicas e arranjos de sua autoria, incluindo trilhas que compôs para teatro e dança. Entreos lugares que lecionou estão: Instituto de Artes da Califórnia, Unicamp, unidades do Sescde São Paulo, Ongs e Companhias Teatrais. Em 2007 foi convidada pela Guildhall School

de Londres para ministrar um workshop  sobre ritmos brasileiros.

André AbujamraMultiinstrumentista, compositor, produtor e ator paulistano. Na década de 1980 montou abanda Os Mulheres Negras, que o projetou no cenário musical alternativo em São Paulo.Depois passou pelo Karnak e hoje está em carreira solo. Compõe para cinema e teatro;entre seus trabalhos recentes estão uma participação na trilha de O Bicho de 7 cabeças e a trilha toda de Carandiru. Abujamra também atua como produtor musical, e trabalha junto com artistas como Pato-Fu e Duo Portal. Recentemente lançou seu terceiro CD solo,intitulado Mafaro, que tem recebido excelentes críticas, e já está com shows marcados por

todo o mundo até 2011.

BasaviziGrupo formado em 2008 para desenvolver pesquisas sobre a improvisação livre comoforma de processo criativo e de composição, que resultaram também em outra pesquisasobre o uso de tecnologia digital e analógica para  performances  ao vivo. Formado por umtrio paulistano, o grupo desenvolveu diversos arranjos instrumentais. Sempre focado

na interação entre instrumentos tradicionais, ainda que tocados de forma não usual, etecnologias high e low-tech.

Daniel MurrayViolonista. Em 1997 conquistou o segundo prêmio no Concours International de Guitarrede Trédrez-Locquémeau, na Bretanha, França. Há 15 anos trabalha como intérprete,arranjador e compositor. Em 2007 gravou Suíte Retratos de Radamés Gnatalli  com o Trio Opus12, de violões. Em 2008, lançou seu primeiro CD solo ...universos sonoros para violão e tape..., compatrocínio da Petrobras. Integrou em 2009 o Quarteto Tau de violões, com Breno Chaves, José Henrique Rosa Campos e Fabio Bartoloni, e formou com o violonista e compositor

Chico Saraiva o Duo Saraiva-Murray, que acaba de voltar de uma turnê pela Europa.

15

Músicos e Artistas Convidados

Page 9: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 9/49

Gustavo Barbosa LimaFormado em Música (clarinete), fez especialização na França. Frequentou o curso deMúsica Eletroacústica do GRM de Paris e lecionou em escolas da região parisiense.Obteve o 1o Prêmio de Clarinete da Associação Leopold Bellan de Paris e o 1o Prêmiode Clarinete do VIII Concurso Jovens Instrumentistas Brasil. Compôs trilhas paraespetáculos de dança e filmes; participou das edições de 2007 e 2009 da Jornada Brasileirade Cinema Silencioso. Foi clarinetista da Orquestra Jazz Sinfônica de 2001 a 2003.Integrante do Duoportal, lançou em 2000 o CD  Música de um povo imaginário. Na áreada música erudita, atua com a pianista Scheilla Glaser. É professor de clarinete e músicade câmara da Escola de Música do Estado de São Paulo desde 2000. Pós-graduado emAdministração de Empresas pela FIA, participa da coordenação pedagógica de vários

projetos artísticos.

Laércio de Freitas

Pianista, maestro, arranjador e compositor. Graduou-se em piano no ConservatórioCarlos Gomes. Fez parte da Orquestra Tabajara de Severino Araújo e do Sexteto deRadamés Gnatalli. Em 1973 lançou o LP  Laércio de Freitas e o som roceiro. Atuou comoarranjador e regente em companhias de discos. Acompanhou artistas como ÂngelaMaria, Maria Bethânia, Maria Valle, Emílio Santiago, Nancy Wilson, Clara Nunes,The Supremes, entre outros. É arranjador da Banda Sinfônica do Estado de SãoPaulo, para a qual também ministra aulas de Prática de Execução Conjunta. Em 2001assinou os arranjos do tema para piano e orquestra de  Amazonas: um poema sinfônico, de João Donato e Everardo de Castro, apresentado no Teatro Amazonas, em Manaus.

Livio TragtenbergEscreve músicas para teatro, vídeo, cinema e instalações sonoras. Compôs obrasinstrumentais, sinfônicas, eletroacústicas e operísticas. Em 1987 ganhou o prêmio Vitaepela ópera Inferno de Wall Street ; em 1991 foi contemplado com uma bolsa da FundaçãoGuggenheim pela composição da ópera Tatuturema. Gravou os discos Temperamental , Othelloe Anjos Negros, Pasolini Suite e Coleção de Novas Danças Brasileiras. Apresenta-se regularmenteno Brasil e no exterior. É autor dos livros  Artigos Musicais, Contraponto e  Música de Cena.Desde 1995 colabora com o coreógrafo Johann Kresnik em produções de teatro-dançana Alemanha. Criou a Orquestra de Músicos das Ruas de São Paulo e a Nervous CityOrchestra em Miami (Estados Unidos). Também criou a Blind Sound Orquestra, com

músicos cegos acompanhando filmes silenciosos.

Marcelo PolettoArtista plástico por formação acadêmica; educador por opção política; músico pornecessidade. Com a bailaria Morena Nascimento, forma o Duo UNS, que apresenta

suas próprias composições de forma s imples e direta.

Marcio NigroMúsico premiado, jornalista, compositor, engenheiro de áudio e produtor musical. Hámais de dez anos explora as novas tecnologias da criação musical. Em 2002 lançou olivro Áudio e Vídeo D igital no Macintosh , em parceria com João Velho. Em 1998 fundoua produtora Trio Digital, que compõe jingles para TV. Como compositor de cinema,ganhou o prêmio de melhor trilha sonora por Encarnação do Demônio, no Festival

de Paulínia (2008) e por É proibido fumar (2009), no Festival de Brasília.

Daniel SzafranPianista solo. Trabalhou com Laura Finnochiaro, Zé Rodrix, Mauricio Pereira, EdvaldoSantana, entre outros. Foi durante três anos pianista da banda do Programa Fanzine,da TV Cultura. Com o parceiro Mauricio Pereira, coproduziu e tocou piano no CD Mergulhar na Surpresa. Fez trilhas para peças e produziu CDs de outros artistas. Em 1992,a Rádio Cultura AM de São Paulo fez com ele um programa especial de uma hora. Foipianista do Piratininga Bar por 16 anos, no bairro da Vila Madalena, em São Paulo, casa

bastante conhecida dos paulistanos pelos bons pianistas que por lá passaram.

Danilo MoraesNascido em São Paulo, cantor, compositor e guitarrista, trabalhou com artistas comoChico César, Ná Ozzetti, Miriam Maria, Premê, Wandi Doratiotto (seu pai, com quemproduziu o disco Pronto ), Mário Manga, Ceumar, Inácio Zatz, Celso Sim, entre outros.Lançou seu disco solo em 2003 e foi selecionado para o projeto Rumos do Itaú Cultural.Com a banda Banguela, Danilo apresentou-se durante vários anos nas casas de forró de

São Paulo e, em 2004, lançou o disco Na Pista. Em 2009 iniciou o projeto de seu novodisco Danilo Moraes e os Criados Mudos, apresentando-se em cidades de todo o Brasil.

Dante PignatariFormou-se em piano na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de SãoPaulo. Já se apresentou no Brasil, Inglaterra, Espanha e Alemanha, dedicando-seespecialmente à música de câmara. Trabalhou na produção, edição e apresentação deprogramas para a Rádio Cultura FM. Coordeno u e foi pianista do projeto Poesia paulista- Doze canções, que resultou no CD do mes mo nome. Foi colaborador da revista Bravo!  de1997 a 2001, e desde 2005 escreve notas de programas para a OSESP. Ministra aulas

de piano e cursos livres de música.

Dino VicenteAtua como músico, compositor, arranjador e produtor musical nas áreas de publicidade,cinema, teatro, instalações e multimídia. Começou sua carreira cedo, tocando pianona montagem da peça  Bonitinha, mas Ordinária, dirigida por Antunes Filho. Já compôscom Arrigo Barnabé e, recentemente, escreveu a trilha sonora do longa-metragem 400

contra 1, do diretor Caco Souza.

Duo N1Formado por Alexandre Fenerich e Giuliano Obici em julho de 2007, o duo nasceuda vontade de criar um ambiente de experimentação sonora a partir da  performance musical e do improviso. Já se apresentou em festivais de arte eletrônica, cinema e música,

bares e galerias de arte. Em 2009 lançou o CD  Jardim das Gambiarras Chinesas - Broken Music Machines , registro das experimentações musicais criadas até então. Desde 2009explora também performances audiovisuais, criando peças para ver-ouvir – um modo deatuação que marcou sua participação na Mostra Live Cinema de 2009, com a performance 

“Marulho Oceânico”.

Eric NowinskiComeçou sua carreira no teatro em 1980 sob a orientação da atriz Célia Helena. Seusprincipais trabalhos são: Às margens da Ipiranga, dirigido por Fauzi Arap; Tartufo, de Molière,dirigido por José Rubens Siqueira; Os coveiros, de Bosco Brasil, dirigido por Hugo Possolo;e  Barrela, de Plínio Marcos, dirigido por Sérgio Ferrara. Seu trabalho mais recente é a

transposição para o palco do conto O Espelho, de Machado de Assis.

17

Page 10: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 10/49

Matheus LestonMúsico, compositor, produtor musical e professor. Formado em contrabaixo e TeoriaMusical no Centro de Estudos Musicais. É tecladista do grupo Patife Band. Em 2009participou do projeto Ao redor de 4’33’  na Bienal do Mercosul. Lecionou a disciplina MúsicaErudita no Século XX no Curso de Arte Contemporânea do Instituto Tomie Ohtake.Compôs a trilha sonora de diversos curtas-metragens, entre eles Mais uma Noite, de

Pedro Morelli e Luis Eduardo Amaral, e Sombras, de Dalila Martins.

Max de CastroNascido no Rio de Janeiro, mudou-se para São Paulo ainda criança. Estimulado pelo paiWilson Simonal, interessou-se por música muito cedo. Influenciado por Djavan, Jorge Ben Jor e Cassiano, formou em 1992 a banda Confraria, ao lado de Pedro Mariano e DanielCarlomagno. No começo de 2000, lançou pela gravadora Trama o seu primeiro disco solo,Samba Raro. Em 2002 lançou Orquestra Klaxon, com parcerias de Erasmo Carlos, MarceloYuka, Nelson Motta, Fred Zero Quatro e Seu Jorge. Em 2005 lançou seu terceiro disco, Maxde Castro, o mais autoral de todos eles, e nele conta com a participação do percussionista Naná

Vasconcelos e do Trio Mocotó.

Ricardo CariobaA criação de formas visuais e sonoras que não estavam previstas na programação de máquinaseletrônicas é a ideia que está por trás da nova série de trabalhos e projetos de Ricardo Carioba.Por meio de fotografias digitais e analógicas, vídeos e impressões de imagens eletrônicas, oartista aproveita a inteligência eletrônica para inventar possibilidades de experiência em espaçodigital. Desde as fotografias, com que conferia materialidade a ambientes virtuais (Panoramada Arte Brasileira, MAM-SP, 1999), até as simulações feitas em computador (Paço das Artes,2003), persegue não o desvendamento dos mecanismos internos da “caixa preta”, mas aintervenção nos processos eletrônicos que ali ocorrem, formalizando a poética desse espaço.

Ricardo ReisAo lado de Miriam Biderman coordena a Effects Filmes, especializada na finalizaçãode longas-metragens e documentários. No cinema destacou-se pelos seus trabalhos definalização de som, entre eles, Suprema felicidade, de Arnaldo Jabor; A Encarnaçãodo demônio, de José Mojica Martins (prêmio de Edição de Som no Festival de Paulíniaem 2008); e Noel, o poeta da vila, de Ricardo Van Steen (prêmio de Edição de Som noFestival de Miami de 2007). Na televisão, sobressaiu-se por trabalhos nas séries Travessia,dirigida por João Batista de Andrade, e Carandiru, outras histórias, de Hector

Babenco, Roberto Gervitz e Walter Carvalho.

Ricky VillasViolonista, baixista e compositor. Paulistano, atua no cenário musical brasileiro desde 1980.Participou das bandas Bom Quixote, Performática, La Vie en Rose e Banda Zero (queganhou um disco de ouro). Tem parcerias com Ronaldo Bastos, Celso Fonseca, EduardoAmarante, Fredy Haiat e Guilherme Isnard. Representou o Brasil em diversos festivaisno exterior e participou do Projeto World Party ao lado dos músicos holandeses TomazGeretsem e Georgia Dias. Fomou-se no Audio Engineering Institute (SAE), de Amsterdã.

Ruggero RuschioniGraduou-se em Composição e Regência na Faculdade Santa Marcelina; especializou-seem Multimídia na Media Research Lab New York University e fez mestrado em Cinema,Rádio e Televisão na Escola de Comunicações e Artes da USP. Atualmente é professordo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e professor-assistente da FaculdadeCásper Líbero. Tem experiência nas Artes com ênfase em música, e atua principalmentecom temas de computação gráfica, música computacional, realidade virtual, 3D tempo

real, síntese sonora e sincronia.

Simone Sou“Percuterista”, desenvolve pesquisa baseada em ritmos brasileiros e do mundo, adaptandotécnicas de percussão às de bateria. Gravou com e acompanhou músicos e compositorescomo Itamar Assumpção, Mutantes, Chico César, Zeca Baleiro, Zélia Duncan, ElzaSoares, Jards Macalé, Paulo Miklos, Robertinho Silva, Otto, entre outros. Atualmente

toca com a Orquestra Mundana, liderada por Carlinhos Antunes.

Turíbio SantosGravou 65 álbuns para Erato-WEA (Paris),Chant du Monde (Paris), Kuarup, Visom e Ritornelo(Rio de Janeiro) e editou coleções de partituras pela Max-Eschig (Paris) e Ricordi (SãoPaulo). Em 1983 criou a Orquestra de Violões do Rio de Janeiro. Em 1999 regravou aobra completa de Heitor Villa-Lobos para violão ao lado de compositores como EdinoKrieger, Sérgio Barboza, Nicanor Teixeira, Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth,para uma série de cinco CDs em comemoração aos 500 anos do Descobrimento doBrasil. É membro-fundador do Conseil d’Entr’aide Musicale (UNESCO). Em 1985foi nomeado diretor do Museu Villa-Lobos e Chevalier de la Legion D’Honneur. Seus

últimos lançamentos discográficos foram Turíbio Santos interpreta Agustin Barrios, ViolãoSinfônico e a Introdução ao Choro, todos sob a regência de Silvio Barbato. Foi indicado para

o Grammy Latino em 2008.

Wilson SukorskiCompositor, músico eletrônico, performer  multimídia, criador e produtor de conteúdosmusicais para rádio, vídeo e cinema, designer   e construtor de instrumentos musicaisinusitados, e pesquisador em áudio digital. Trabalha em diversas atividades musicais noBrasil e no exterior: compõe para cinema, vídeos experimentais, instalações de áudioarte, arte urbana, arte e novas mídias, e se apresenta como performer  musical em shows e

 performances monoband .

Zé Luiz RinaldiDoutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; colaborouintensamente com os diretores Luiz Antônio Martinez Corrêa, Bia Lessa, Celina Sodré,Fábio Ferreira, Gilberto Gawronsky, Jefferson Miranda e Ulysses Cruz. Premiado pelabolsa Vitae de Artes, criou e dirigiu a ópera  Deslimites da Palavra (CCBB-RJ, 2000). Seutrabalho recebeu o prêmio Rumos Musicais Tendências e Vertentes, do Itaú Cultural,e o prêmio de edição da Cartografia Musical Brasileira, como representante da atual

produção artística nacional.

Zérró dos SantosContrabaixista, arranjador, compositor e produtor. Zérró dos Santos tocou ao lado de

músicos como Geraldo Azevedo, Leni Andrade, Família Caymmi, Miúcha, Célia, NaraLeão, Maurício Aihorn, Alaíde Costa, Alceu Valença, entre outros. Participou da Rio Jazz Orquestra e também das gravações dos discos de Elza Soares, Martinho da Vilae Nana Caymmi. É criador e líder do grupo Zérró Santos Big Band Project, formadopor 6 saxofones, 2 trompas, 4 trombones, 1 tuba, 5 trompetes, contrabaixo, guitarra,

acordeom, bateria e percussão.

19

Page 11: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 11/49

21

Cinédia 80 anos

Ode parnaso- punk aos 80 anosHernani Heffner

De forma sintética, pode-se dizer que a Cinédia é uma produtora cinematográficabrasileira fundada em março de 1930. Está fazendo, portanto, 80 anos. Sendo assim,seus predicados históricos seriam o pioneirismo industrial, a configuração de umproduto fílmico de sucesso para o mercado, a revelação de talentos técnicos e artís-ticos, e a criação de alguns filmes marcantes do ponto de vista estético. Suas limitaçõesdiriam respeito à carência de um projeto cultural mais decisivo, à formulação de ummodelo de produção de inspiração estrangeira, ao precário acabamento da maioriadas produções. Em que pese os variados e diferentes contextos por que passou, suaglória e sua danação estariam ligados à sobrevivência por esses longos, lentos e proble-máticos 80 anos de vida do cinema e do país.

Essa persistência incomoda e intriga. O que a teria levado tão longe? O que ateria sustentado para além de uma época de ouro, encerrada em meados do séculopassado? Não existe resposta simples ou fácil a estas indagações. Com maior oumenor empenho, é possível sustentar em alguma medida as indicações positivas ounegativas listadas acima. Estaríamos diante de uma iniciativa complexa? Seu criador,o jornalista e cineasta Adhemar Gonzaga, não pensava assim. O desafio era grande,mas óbvio: fazer cinema por prazer, lucro e arte com vistas a modernizar o paísde um ponto de vista moral, social e cultural. Desenvolver as potencialidades paraenriquecer econômica e existencialmente a todos – público, homens de cinema, anação. A boa e velha utopia.

As energias descarregadas nesta solene tarefa viraram uma referência, uma narra-tiva, uma lenda; talvez um mito? E o que nos contaria este mito? Machado de Assisafirmava que a missão da literatura brasileira do século XIX era captar e trans-mitir o sentimento nacional em formação. Ou melhor, era inventar esse sentimento,abstraído dos rostos, das vozes, das ruas, do destino, de qualquer destino que sequisesse atribuir ao homem brasileiro. Gonzaga se lançou a proposta semelhante,sem nenhuma crença ingênua sobre o “poder” do cinema. No momento em que semencionasse a “força” das imagens, emergia a deixa para qualificá-la em sentidopreciso. O Brasil e Cinema Brasileiro d everiam aflorar pela palavra jovem, decidido,renovador, expressivo e criativo.

Este caldo primordial arremessado ao futuro encontra seu núcleo de expansão napassagem do silencioso ao sonoro, no amor à imagem perante à inevitável ditadurado som, no sucesso da primeira experiência diretorial, fundada em uma crença devalores juvenis e na paixão por Griffith, Stroheim, Murnau, Mauro e uns poucosmais. A Cinédia era o futuro inevitável e necessário, mas seus primeiros tempos, maisespecificamente suas três primeiras produções, tinham que reter e na verdade fundaresse sentimento de um cinema nacional. A encarnação disso pode ser a liberaçãocrescente da mulher, o modernismo carioca, a licenciosidade da canção popular ouqualquer outra manifestação histórica corriqueira. O espírito vagueia pela ousadiaformal, empresarial e cultural de propor um cinema fadado ao malogro. Na contra-corrente de uma sobrevivência necessária, arriscar-se no deleite de uma experiêncialivre de pressões mais amplas. A expulsão do paraíso viria, mais cedo ou mais tarde,mas como era conhecida e esperada, não tinha grande importância frente à chamacontrabandeada para os sets de filmagem.

Nas palavras do próprio Gonzaga: “Não se trata de fazerum filme apenas. Já se fizeram muitos. Trata-se de fazeruma indústria de filmes. Estabilidade, produzir um após

outro. O cinema é a indústria mais completa do mundo.Egoísta. Não admite improvisações nem adaptações. Oque falta é maquiagem, dizem uns. Precisa melhorar afotografia, dizem outros. Mas a maquiagem depende deboa iluminação do artista, do cinegrafista, da qualidadedos refletores e da força elétrica. Esta, por sua vez, deuma possante e dispendiosa subestação... E que adian-tará uma boa iluminação, sem estudos de gama, semsensitometria, da parte científica do laboratório, enfim?E que valerão estes estudos, sem máquinas de revelaçãoautomática e contínua?”

O projeto da Cinédia derivou em grande parte das rela-ções de Gonzaga com um grupo de jovens amantes epraticantes do cinema. Somente a partir do acúmulode crises associadas aos altos investimentos e às baixasbilheterias iniciais, sem mencionar o anacronismo dapersistência em um modelo “silencioso”, Gonzaga seafastou dos amigos e desenvolveu uma estratégia de profis-

sionalização crescente do negócio, instaurando relaçõesde trabalho mais regulares, compatibilizando despesa ereceita e pondo de lado preconceitos contra os demais

produtos fílmicos (cinejornais, curtas documentais e deficção, filmes publicitários, institucionais, etc.). Forammais de 700 produções de pequena duração e 55 longas-metragens até 1952. A Cinédia chegou a possuir trêspalcos de filmagem, laboratório, sala de som, dois almo-xarifados para cenários e figurinos, sala de montagem,camarins e restaurante, entre outros departamentos. Tevecâmeras como a Mitchell e a Super-Parvo, reveladora ecopiadora Debrie, sistema de gravação e mixagem RCA,grua de madeira e de ferro, refletores Mole-Richardson,fotômetros Weston, entre outros equipamentos pioneirosno país. E por lá passaram ou se formaram realizadores,técnicos, atores e cantores.

O próprio Gonzaga exerceu quase todas as funçõesdentro do estúdio, de ator a montador, de cenógrafoa roteirista, de locutor a diretor, mas foi sobretudoprodutor e administrador. A ação gonzaguiana aindanão foi estudada e compreendida em sua justa medida.

Brasil, 1930, 35mm, preto e branco, 53min, 24qpscp: Cinédia; p e r: Adhemar Gonzaga; d, df  e mo: Humberto Mauro; e: Lelita Rosa (Lelita), Paulo Morano (Paulo), DidiVianna (Didi), Gina Cavalieri, Tamar Moema (Tamar), Augusta Guimarães, Alfredo Rosário (tio de Lelita), Décio Murilo,Máximo Serrano, Adhemar Gonzaga, Humberto Mauro, Leda Lea, Renato Oliveira, Carmem Violeta, Carlos Eugenio,

Luiz Gonzaga Martins, Ivan Villar, Fernando LimaOrigem da cópia: Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro

Lábios sem beijos

Lelita é uma jovem moderna, que encontra Paulo casualmente num táxi. Voltam a se falar durante uma festa. Odesentendimento inicial não impede que os dois passem a se ver, nascendo entre ambos arrebatadora paixão. Certodia, Lelita encontra sua prima Didi chorando sentidamente, e descobre que o motivo dessa mágoa chamava-se Paulo

Morano. Paulo acusa sua ex-namorada, Tamar, de ter preparado a intriga e ter colocado Lelita contra ele.Depois de muita insistência e dos assédios de Paulo, Lelita decide falar com ele e obrigá-lo a cumprir seucompromisso com Didi. Superados alguns percalços durante o trajeto de automóvel, Lelita e Didi chegam ao

encontro com Paulo, ocasião em que se desfaz todo o equívoco.

Filmagem de Lábios sem beijos. Adhemar Gonzaga (sentado) e Álvaro Naher (de chapéu)

Page 12: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 12/49

23

Crítica de Pery Ribas sobre Lábios sem beijos. Cinearte, 13 janeiro 1932

Page 13: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 13/49

25

feitas pela Cinemateca Brasileira de dois fantásticos documentários sobre compa-nhias de estradas de ferro da década de 1920, e também de propiciar um contatocom a versão mais completa (em termos de metragem e de cor) até hoje possívelde O Segredo do corcunda, filme em que o transporte ferroviário tem grandeimportância, por ser ele que faz a ligação entre campo e cidade, cenário em quese desenvolvem os conflitos dessa história.

O outro significado da escolha é um desafio aos espectadores da Jornada:em quantos outros dos filmes exibidos o trem desempenha um papel simbó-lico importante?

Um exame superficial dos programas nos permite colher alguns exemplos. É detrem que Letty Mason (Lillian Gish) penetra nos domínios em que Vento e areia modificarão para sempre seu destino. Algumas cenas-chave de A Carne e o diabo transcorrem numa estação ferroviária e é de trem que von Harden (John Gilbert)volta para os fatídicos braços de Felicitas (Greta Garbo). Igualmente de trem queVolódia (Vladimir Fogel) chega a Moscou, distraído ainda do que o espera na cidadegrande. Nos filmes suecos, a presença das linhas férreas é mais escassa, sobretudoporque o barco e o trenó eram meios de locomoção mais adequados num país emque água e neve abundam. Mesmo assim, é numa viagem de trem que GunnarHede (Einar Hanson) combina a aventura que o enlouquecerá em Contra oorgulho. Mas trens estão presentes em outros filmes. Em quantos? Descubram!

Em 1926, durante sua campanha à presidência do Brasil, Washington Luizpropalou que “governar é abrir estradas”. Com isso, atrelava o país à “moder-nização” das regras do capitalismo ocidental que apostava na indústriaautomobilística e na exploração extensiva dos recursos petrolíferos do planeta.Sabemos ao que isso nos levou.

As consequências artísticas da opção foram menores: a poesia dos trens de ferro,ou de aço, continuou e co ntinua frequentando filmes feitos em todo o mundo.No fundo, no fundo, o ser humano resiste como um ser poético. (CRS)

Vento e areia

Cuidado com o carvão no olho. Não debruçar demais para não estourar a cabeça deencontro às pilastras das caixas d’água de onde saía aquele enorme tubo de couro por ondeo trem bebia... Os postes elétricos do lado dos trilhos, que suspendiam numa chicotada os

 fios que novamente se curvavam para, de repente, subirem de novo. [...] Tinha vontade dedescer e bater também nas rodas de ferro com um poderoso martelo. Ou ser guarda-trem,

 para perfurar os bilhetes. Ou maquinista, para apitar sem parar, não parar mais e varartodos os túneis do mundo.Pedro Nava, Baú de ossos

O trem, símbolo máximo da Revolução Industrial durante o século XIX, modificouradicalmente as relações do homem com o mundo à sua volta. As distâncias encolherame o próprio tempo precisou ser reformado: as horas foram padronizadas de forma a sepoder estabelecer quadros de horários e os passageiros não perderem seus trens.

No final do século, o trem encontrou-se com uma invenção tecnológica que revolu-cionaria o entretenimento de massas: o cinema. Não é à toa que, ao lado da saídados operários de suas usinas em Lyon, a estaçãozinha de La Ciotat, vizinha à RivieraFrancesa, fosse um dos primeiros lugares escolhidos pelos irmãos Lumière para fixarsua câmera com a finalidade de registrar a chegada de um trem.

Cinquenta segundos de imagem em movimento que se transformaram numa quaseobsessão dos cinegrafistas das décadas seguintes. Centenas de chegadas de tremforam filmadas em todo o mundo, muitas delas (a maioria?) com o mesmo enquadra-mento, ou muito semelhante ao do registro dos Lumière. Quando os filmes ficarammais longos e surgiram documentários sobre cidades, era raro que uma das imagensinseridas não fosse a de um trem chegando a uma estação.

A escolha do tema “trem” para o destaque brasileiro desta Jornada tem duplo signifi-cado. Trata-se de uma oportunidade privilegiada para exibir as restaurações recentes

Em Busca do Brasil

Trenzinho Caipira

Page 14: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 14/49

Companhia Paulista de Estrada de Ferro

Documentário dividido em três partes. Na primeira, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro instala, em espaços daCompanhia Docas de Santos, uma oficina para montar 750 vagões com estruturas recebidas dos Estados Unidos. Otrabalho, de abril a dezembro de 1929, é realizado em Santos para evitar o transporte de cerca de 20 mil toneladas de peças,o que implicaria num custo superior a 800 contos de réis. Diversas fases da montagem dos vagões: os depósitos, os guindastes

auxiliares, as diferentes seções de trabalho. O refeitório dos operários e encarregados, montado num vagão. O dr. MartinsFontes, diretor do serviço médico que atendeu 180 operários, posa ao lado do pessoal no encerramento da empreitada.

Na segunda parte, o documentário mostra a cidade de Rio Claro e as oficinas da CPEF: ferraria, serraria, marcenaria,pintura e transporte dos vagões. Na terceira parte, a via férrea dupla entre Jundiaí e Campinas e as oficinas de reparo de

locomotivas elétricas e a vapor na primeira cidade. Seções de trabalho, transporte das locomotivas e saída dos operários.

Brasil, 1930, 35mm, preto e branco, 62min, 18qpscp: Rossi-Film

Origem da cópia: Cinemateca Brasileira

Companhia Mogyana

A Companhia Mogyana de Estradas de Ferro foi eterna rival da Companhia Paulista. Ambas foram criadas por grupos defazendeiros do interior do estado de São Paulo, e a fundação Mogyana se constitui em 1872, exatamente no ano em quea CPEF inaugura o trecho ligando Campinas a Jundiaí. O primeiro trecho da Mogyana foi inaugurado em 1875, e ligavaCampinas à Jaguariúna e, no mesmo ano, a linha chegava à Mogi Mirim. O último trecho construído pela Mogyana foi

inaugurado em 1921, quando seus trilhos chegaram a Passos, em Minas Gerais.

O filme documenta diversas atividades da companhia e suas oficinas de montagem e construção de locomotivas a vapore vagões de carga e de passageiros.

Brasil, década de 1920, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 56min, 18qpscp: Guarany Filme

Origem da cópia: Cinemateca Brasileira

27

Page 15: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 15/49

29

Page 16: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 16/49

31

Page 17: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 17/49

O Segredo do corcunda – a cor em Gilberto Rossi

Hilda Machado

A localização de cópia em nitrato, virada, daquele que parece ser o único dos filmesdo italiano Alberto Traversa que resistiu ao tempo e ainda pode ser visto – O Segredodo corcunda –, lança luz sobre o uso da cor por um dos melhores fotógrafos docinema silencioso brasileiro. A cópia permite uma aproximação maior à obra deGilberto Rossi, um italiano que ensinou os paulistas a fazer cinema, já que a cor erauma das razões para o velho Rossi ser, nos anos 1920, considerado o melhor fotógrafo

paulista. Mesmo o impiedoso realizador José Medina, ferino crítico do cinema brasi-leiro, reconhecia a excelência da escolha dos “positivos em cores fracas, salmon,amarelo, azul, etc., com as quais Rossi conseguia efeitos muito delicados. Gostava devirar o positivo em sépia, bem fraquinho; Rossi era um artista” 1. A cópia descobertapermitirá que o público apreenda melhor o que era o cinema no período silencioso.Os filmes do chamado cinema mudo não são assistidos hoje como em sua época. Opróprio ritmo acelerado que marca esse cinema para o grande público não passade uma alteração moderna da velocidade de projeção, causada por equipamentoinadequado. Falta a música performática que o acompanhava. E, principalmente, ascópias pálidas e incompletas apenas lembram a fotografia original, pois a cor sumiu.O Segredo do corcunda é todo ele virado em diferentes densidades. As sequên-cias alternam caprichosas viragens – como a combinação apontada por FranciscoMoreira como “de viragem azul e sepiada sobre uma base laranja da Pathé” 2 – comsequências tintadas sem nuance – como aquelas em verde que sublinham as propostasdocumentais da fazenda. A concepção da viragem, o uso da cor no cinema silencioso,se apoiava num código compartilhado por realizadores e público, em que cada cor erainvestida de um significado simbólico, onde o vermelho, por exemplo, é o emblemarecorrente, a cor convencional, de paixão ou violência. O processo ob rigava à classi-ficação das sequências (...), à escolha das partes que, de acordo com o sentido a elasatribuído, deveriam receber uma determinada cor (...), sendo as sequências agrupadaspara receberem sua cor. Um dentre os letreiros de O Segredo do corcunda – todos

sem viragem –, ao introduzir um  flashback , desvenda o significado desse uso da cor,característico do período: “A vida de cada um é um livro de páginas de muitas cores ...claras, escuras, róseas e negras...”

A fotografia com viragem de Gilberto Rossi pode explicar o sucesso do filme. Um êxitocomercial segundo os padrões e a linguagem da época, O Segredo do corcunda foilançado em São Paulo, capital, exibido em vários cinemas de bairro e distribuído nointerior do estado e na praça de Minas Gerais. No Rio, o crítico Pedro Lima fez umacrítica favorável e o filme foi ainda exibido em Portugal – no Porto e em Lisboa –, oque levou João Cypriano a afirmar a Maria Rita Galvão, no seu indispensável Crônicado cinema paulistano, que O Segredo do corcunda “foi o primeiro filme brasileiroexibido no estrangeiro”. (...)

Maria Rita Galvão, Crônica do cinema paulistano. São Paulo, Ática, 1978, p.221.Francisco Moreira. Conversa com a autora. Rio de Janeiro, 4 de setembro de 1997.

12

O Segredo do corcunda  falseia cinematograficamente o interior de S. Paulo 3:filma-se gado (emprestado do matadouro de Vila Mariana, que hoje pertence àCinemateca Brasileira) pastando no relevo plano daquele bairro da zona sul de SãoPaulo. Paralelamente produz-se um figurino adequado com poucos recursos: lenço nopescoço, por exemplo. Há também habilidade na administração de dificuldades desuperprodução (trens chegam em estações cheias, charretes cruzam as ruas da cidade) eas locações são escolhidas com sensibilidade. (...)

A fotografia de Gilberto Rossi, que descreve a paisagem rural na tradição pictóricada paisagística acadêmica, entusiasmou o crítico Benedito Duarte, e desequilibraO Segredo do corcunda. Esse desnível entre a qualidade do aspecto documentalda obra frente às pretensões ficcionais do filme é típico do cinema silencioso médiobrasileiro. O documentário dentro de O Segredo do corcunda (– as externas) –explode o espaço teatral que confina os interiores aos planos médios e abre espaçopara a excelente fotografia de Gilberto Rossi, fotógrafo da estatura de Edgar Brasil eHumberto Mauro, com quem uma comparação se faz inevitável. É a mesma descrição

da paisagem rural, característica do mestre em sua primeira fase, em Cataguases.Os planos gerais entusiasmaram Benedito Duarte, para quem eles legitimam o filme:“Essa legitimidade se deve, em grande parte, à excelente fotografia de Gilberto Rossi,a atingir nessa fita alturas que não seriam ultrapassadas, certamente, depois, na idadede ouro do cinema mudo brasileiro. Há quadros de uma beleza plástica tão pura, tãodespida de virtuosismo, mas tão integrada na narrativa, tão funcional, como se diriahoje, que nos faz lembrar a obra ingênua de certos pintores primitivos” 4. (...)

Alberto Traversa parece ser diluído pela historiografia brasileira (a italiana, com seurico cinema silencioso, ainda não se ocupou dele) no perfil mais geral do rude cavador,mais um dos italianos que apenas sabendo manipular uma câmera, aqui vieram fazer  a América. Traversa participou do grande auge do cinema italiano: em 1914 havia80 produtoras na Itália, algumas com renome mundial: o país exportava cinema.Segundo fontes argentinas, Traversa dirigiu para as produtoras Savoia, Ambrosio,Latina Arts, Musical Film e Jupiter Film. (...)

A ida de Traversa para a Argentina faz parte do fenômeno da imigração italiana paraaquele país. No final da década de 1910, fugindo talvez da guerra ou seguindo o fluxoimigratório, o aventureiro Traversa vai para a Argentina, esperançoso com o pulsodaquela cinematografia: entre 1915 e 1921 foram produzidos mais de 100 filmes.Alberto Traversa chega à Argentina exatamente em 1915. Já no ano seguinte, ele

dirige um longa, Bajo el sol de la pampa. Depois ele dirigiu dois filmes produzidospor Mario Gallo: En buena ley  (1919) e En un dia de gloria (1918), este últimopossivelmente um projeto paralisado.

Ainda em 1918 ele rodou Los Inconscientes, um longa na linha da Ambrosio, quefoi apresentado como um filme científico sobre “a fatalidade da lei atávica”, a heredita-riedade do alcoolismo. (...). Miguel Couselo5 afirma ter Alberto Traversa permanecidono país apenas até 1920. Possivelmente, a crise que termina com o silencioso argentinoo expulsa para o Brasil. (...)

Benedito Duarte. “Alberto Traversa e O Segredo do corcunda”. Catálogo da Retrospec-tiva do Cinema Brasileiro, São Paulo, Museu de Arte Moderna, 1954.

4

Miguel Couselo e outros.  Historia del cine argentino. Buenos Aires, Centro Editor de LatinoAmérica, 1984, p.16.

5

Em Busca do Brasil

3 Trata-se aqui de um equívoco da Autora: a cena se passa diegeticamente nos pampasgaúchos (N.E.).

33

Page 18: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 18/49

35

O produtor-protagonista de O Segredo do corcunda, João Cypriano, afirmou,sempre a Maria Rita Galvão: “Rossi e Traversa inventavam truques que ninguémsabia como eram feitos (...); a cena do delírio, em que aparece uma série de imagenssuperpostas, cada qual num canto da tela”, foi totalmente criada pelos dois. A própriasequência do hospício – ainda segundo Cypriano – “não estava no enredo, (...) a ideia édele”, Traversa. As superposições, a ideia de delírio, o hospício, a semelhança do herói,naquele plano patético, com o louco de Conrad Veidt, o claro-escuro da fotografia sãouma bem recriada linguagem expressionista.

O último dos três homens que fizeram O Segredo do corcunda, a história de JoãoCypriano não foge a conhecido padrão. Típico realizador paulistano dos anos 1920,nascido na periferia, em Franco da Rocha, João Cypriano (...) mudou para São Pauloainda menino. E se apaixonou por cinema. Para ver filmes sem pagar ingresso, vendiabala na plateia ou carregava tabuletas de propaganda pelas ruas. Adulto, sobreviveude seu ofício, encanador, e frequentava a Escola de Artes Cinematográficas Azurri, deArturo Carrari. Na escola onde se reuniam ingênuos operários que sonhavam ser atoresde cinema, João Cypriano fica amigo de Francisco Garcia, também encanador por

profissão. João escreve um argumento, ambos economizam durante dois anos – dozecontos de réis – e convidam o melhor fotógrafo de São Paulo, Gilberto Rossi, paraa equipe. João Cypriano acumulou as funções de argumentista, roteirista e produtor,desempenhando ainda o papel do protagonista, o galã do filme. Sua família carinho-samente durante anos guardou a cópia de nitrato virada que João levou para exibir naEuropa. Se projetada – até hoje só foi vista em moviola – suas cores alargarão mais aideia do que eram os filmes silenciosos médios brasileiros. Nossa aproximação com opassado fílmico é sempre uma construção presente, pois o espectador hoje é um outro,e outras são as relações estabelecidas na sala escura entre ele e os velhos filmes. Muitasdas intenções de O Segredo do corcunda não mais se realizam. Envelheceram. Masa viragem mostra que nem toda a imagem está fadada a um envelhecimento precoce.A viragem de Rossi pode hoje ser degustada como alternativa à dieta cromática donaturalismo hegemônico. O tempo não age de maneira uniforme e implacável: setentae três anos depois, poucas intenções originais de O Segredo do corcunda se realizampara o espectador cinematográfico. Mas essa cor, que tão facilmente se perde nos filmes,e aqui resistiu ao tempo, mantém sua eficácia.

Hilda MachadoPesquisadora do CinemaSilencioso Brasileiro

Lauro Ávila Pereira

Em 1987, O Segredo do corcunda foi exibido na sala de cinema do Museu LasarSegall. Presente naquela sessão estava Hilda Machado. Ali, começou a obsessão dapesquisadora pelo filme.

O interesse de Hilda foi despertado ao observar curiosa a reação daquela plateia não-habituada ao cinema silencioso: durante a projeção, os presentes riam e se d ivertiam

ao tentar identificar, em vão, entre os personagens, qual seria o corcunda do título.

Por mais de dez anos, realizou intensa pesquisa sobre o filme – perseguiu as biogra-fias dos atores, do diretor Alberto Traversa e do fotógrafo Gilberto Rossi. Percorreuarquivos, bibliotecas e cinematecas no Brasil, na Itália e na Argentina, em umminucioso e exaustivo trabalho de recuperação de pistas escritas e visuais sobre ofilme e seus realizadores. Entre as preocupações de sua pesquisa, estava a relação entreo olhar do público e a proposta do realizador. Discutia as irregularidades do filme, oscaminhos de produção e sua inserção no cenário do cinema brasileiro da época. Otrabalho de Hilda Machado rebateu a ideia de que os realizadores do cinema silen-cioso brasileiro fossem ingênuos e de qu e a estética destes filmes pudesse ser tachadade “primitiva”.

A intensidade com que Hilda se dedicou à pesquisa sobre O Segredo do corcunda esteve presente em toda sua trajetória. Foi militante socialista, tendo sido presa nofinal dos anos de 19 70 por lutar contra a ditadura militar e participar da organizaçãode um movimento socialista. Levou a crítica social para o audiovisual, com o curta

 Joilson marcou, de 1986, do qual assina roteiro e direção. O curta, sobre jovensda periferia paulistana, foi premiado nos festivais de Gramado (melhor direção efotografia), Fortaleza (diretor e ator) e ganhou também o troféu Macunaíma de melhorcurta no Rio Cine, no ano de 198 7.

Hilda Machado foi professora do curso de cinema da Universidade Federal Fluminensee incansável pesquisadora da área, deixando diversos artigos e ensaios, principalmentesobre a história do cinema silencioso brasileiro. Por sua experiência de “escavadora”de acervos, soube valorizar este tipo de trabalho e defendeu a integração entre aacademia e as instituições de memória, pregando a superação da divisão do trabalhoacadêmico (intelectual) e de preservação (manual).

Em 2002 lançou o livro Laurinda Santos Lobo – mecenas, artistas e outros marginais em SantaTeresa (Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2002), resultado de uma extensa pesquisa sobreo bairro e a relação entre os artistas e mecenas da elite carioca. Também escreveupoesia – foi premiada na 1a Mostra de Poesia Carioca em 1998.

Hilda Machado faleceu em 2007, deixando pesquisas que enriqueceram a história docinema brasileiro e uma obra artística marcada pela sensibilidade e crítica social.

O Segredo do corcunda

Dois empregados em uma fazenda de café – o jovem João e um corcunda idoso, Marcos – são despedidos por Pedro,o administrador vilão. O corcunda revela que o capataz foi o assassino do pai do rapaz, e João salva uma mocinha emperigo, a filha do patrão, que os readmite. O capataz tenta eliminar o rapaz quando os jovens começam a namorar,mas, na luta, acaba sendo morto pelo corcunda. Um ano depois, a felicidade idílica coroa o final: os jovens estão

casados e com um filho.

Brasil, 1924, 35mm, com viragem e t ingimento, 49min, 20qpscp: Rossi Filme; p: João Cypriano e Francisco Garcia; d: Alberto Traversa; df : Gilberto Rossi

e: João Cypriano (João), Francisco Garca (Marcos), Inocência Collado (Rosa, filha de Carlos), FranciscoMadrigano (Pedro),Philomeno Collado (Carlos Fernandes, o fazendeiro), Raphaela Collado (Dolores, mãe de João), Benedito Ortiz (Benedito),

Enne Traversa, Nino Ponti, Annunciata Mena MadriganoOrigem da cópia: Cinemateca Brasileira

Cinemais n.9, janeiro-fevereiro 1998.

Hilda Machado nasceu em 1952. Fez mestrado em Artes pela Universidade de São Paulo (1987)e doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2001). A poeta-cineasta lecionava na Universidade Federal Fluminense, trabalhando especialmente na área depesquisa e realização cinematográficas. Estudou cinema em Cuba e atuou como pesquisadora

do uso da imagem na história junto à coleção fotográfica do Warburg Institute, da Universidadede Londres, na Inglaterra, além de t er passagens como pesquisadora por várias universidades einstituições no Brasil e exterior. Faleceu em 2007.

Em Busca do Brasil

Page 19: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 19/49

37

O Cinema Silencioso Sueco

 Jon Wengström

As primeiras imagens em movimento captadas na Suécia foram feitas em agostode 1896 por Max Skladanowsky, inclusive algumas cenas cômicas de ficção, e oprimeiro evento sueco de maior importância registrado em celuloide foi a exposição

de Estocolmo em maio de 1897. O acontecimento foi filmado pelo famoso cinegra-fista francês Alexandre Promio, que percorria a Europa trabalhando para os irmãosLumière. A exposição aconteceu numa ilha no centro de Estocolmo, e em uma parteainda existente desse material, a câmera é colocada em um barco que se move ao longode uma conhecida rua à beira da água, um exemplo bastante pioneiro de utilizaçãoda câmera em movimento. A primeira filmagem feita por um cinegrafista sueco foi oregistro, com 18 metros, da chegada do rei Choolalongkorn, do Sião, ao palácio realde Estocolmo, em julho de 1897, onde ele é recepcionado pelo rei Oscar II. A cena,chamada Konungens af Siam landstigning vid Logårdstrappan / Chegadado rei Sião a Logårdstrappan, é de autoria de Ernst F lorman, que trabalhou comoassistente de Promio durante a exposição mundial. Florman foi, várias vezes, contra-tado pela família real sueca para registrar eventos, e seu último filme conhecido é Enbildserie ur Konung Oscar:s lif  / Cenas da vida do rei Oscar II  (1908), do qualuma cópia sobrevivente termina com um belo plano colorido a mão.

Durante a primeira década do cinema sueco, os filmes de não-ficção predominarame, em 1907, uma primeira série de cinejornais começou a ser produzida pela SvenskaBiografteatern, sediada na cidade de Kristianstad, no sudeste da Suécia (o estúdio conti-nuou produzindo cinejornais semanais até o início da década de 1960). Sob o comandodo famosíssimo coordenador de produção Charles Magnusson, a Svenska Biografteaternaventurou-se na realização de filmes de ficção alguns anos depois, utilizando comofonte obras literárias famosas e acontecimentos históricos. Outros estúdios e produ-

tores também se lançaram na produção de filmes de ficção, como Frans Lundberg, emMalmö, e N.P. Nilsson, em Estocolmo. Deste último, os trabalhos mais conhecidos sãoFröken Julie / [ Senhorita Júlia ] (1912) e Fadren / [ O Pai ] (1912), adaptados depeças de Strindberg e dirigidos pela realizadora Anna Hofman-Uddgren.

A realização verdadeiramente profissional de filmes na Suécia começou, porém, nofinal de 1911, quando Charles Magnusson decidiu abandonar Kristianstad e trans-ferir as operações da Svenska Biografteatern para Estocolmo. Magnusson construiu osnovos estúdios na ilha de Lidingö, nos arredores da c idade e, em 1912, contratou trêsrenomados atores e diretores de teatro para realizar seus filmes. Os três eram VictorSjöström, Mauritz Stiller e Georg af Klercker, que em pouco tempo seriam as princi-pais figuras do cinema sueco. Como parte de seu treinamento profissional, Magnussonestimulou que os três interpretassem papéis em filmes produzidos por outras compa-nhias. Magnusson estabeleceu também, nesses primeiros anos, acordos de produção edistribuição com outros estúdios, como a filial da Pathé Frères em Estocolmo. Um dosprimeiros filmes suecos de longa metragem sobreviventes até os dias de hoje é I lifvets

Nascido em 1964, Jon Wengström graduou-se na Universidade de Estocolmo, em 1988, emLiteratura, Filosofia e Cinema. Começou a trabalhar no Instituto Sueco de Cinema, em 1990,como programador de filmes e se tornou coordenador de programação em 1996, posição emque permaneceu até 2003, quando foi nomeado para sua posição atual de Curador da Coleçãode Filmes de Arquivo. Conferencista sobre assuntos de arquivo e sobre a História do CinemaSueco em numerosas cinematecas e festivais em todo o mundo, colabora muito com artigosno Journal of Film Preservation, publicação da Federação Internacional de Arquivos de Filmes. Étambém vice-coordenador da Comissão de Programação e Acesso às Coleções, da Fiaf.

 Jon Wengström apresenta

stav Molander e Julius Jaenzon filmando A Herança de Ingmar

Page 20: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 20/49

39

exibido na Jornada Brasileira de Cinema Silencioso de 2008. Essa “receita” para realizarfilmes de sucesso também foi adotada por outros estúdios na época. Por exemplo, pelaSkandia que, em 1919, adaptou duas famosas novelas do escritor norueguês BjørnstjerneBjørnson: Synnöve Solbakken, e Ett farligt frieri / [ Um Namoro perigoso ].

A outra figura mais importante do cinema silencioso sueco foi Mauritz Stiller. ComoSjöström, em seus primeiros anos foi muito prolífico, realizando filmes de gêneros eestilos variados. O trabalho mais significativo de Stiller, anterior à Idade de Ouro, prova-velmente é Vingarne / As Asas  (1916), adaptado do conto “Mikael”, de HermanBang (a mesma história foi filmada por Carl Theodore Dreyer na Alemanha em 1924).O interessante sobre o filme – e no que a versão de Stiller se diferencia da de Dreyer

 – é o acréscimo à história de uma moldura autorreflexiva, característica que pode serencontrada em outros filmes do diretor, como em Thomas Graals bästa film / OMelhor filme de Thomas Graal (1917). Stiller adaptou também para a tela duasnovelas finlandesas, Sången om den eldröda blomman / Canção sobre a florescarlate (1919) e Johan (1921), ambas rodadas em partes remotas do norte da Suéciae que contêm cenas de grande impacto visual, como a audaciosa corrida sobre troncosde árvores que flutuam num rio, feita pelo personagem principal (interpretado por Lars

Hanson), no primeiro dos títulos. Mas a maior fonte literária da Svenska Biografteaterndurante a Idade de Ouro foram as obras de Selma Lagerlöf, sendo a mais importantedelas Herr Arnes pengar / O Tesouro de Arne (1919), de Stiller. Uma história decobiça e redenção situada na Suécia do século XVII, com tomadas espetaculares dofantasma de uma moça assassinada. As histórias de Selma Lagerlöf se revelaram grandefonte para filmes, frequentemente porque lidam com elementos de um misteriosomundo, com espíritos de mortos que se manifestam aos vivos – o que forneceu excelentematerial visual e ajudou a criar o clima de exotismo desses filmes suecos da época. Aescritora era muito ciosa quanto à adaptação de suas histórias, e sempre manteve umaboa relação com Sjöström, além de ter Stiller em alta consideração, afirmando ter elecapturado excelentemente sua escrita em Herr Arnes pengar. No entanto, se reveloumenos entusiástica com algumas adaptações que fez posteriormente de seus trabalhos,como Gunnar Hedes saga / Contra o orgulho (1923). Ela se opôs muito ao roteiroe relutou em aceitar que seu nome fosse associado ao filme. Mas, Stiller, já no roteiro,criava um lindo conto de perda e sofrimento, e mostrava como se poderiam encontrarconsolo e redenção na arte e no amor. A mais famosa adaptação de Selma Lagerlöf éKörkarlen / A Carruagem fantasma, rodada por Sjöström em 1920 e lançada em1o de janeiro de 1921, e que atualmente seja talvez encarada como o melhor filme silen-cioso sueco e um verdadeiro clássico do cinema. O filme tem uma estrutura narrativacomplexa: a história de um homem que faz um retrospecto de sua vida, e das injustiçase males que infligiu a outros, é contada em  flashbacks – eventualmente flashbacks dentrode flashbacks –, criando uma espécie de estrutura de múltiplas camadas que, contudo,

parecem cristalinas à medida que o filme se desenrola. Körkarlen também é famosopor seu uso de múltiplas exposições, criadas pelo diretor de fotografia Julius Jaenzon.

Outras personalidades, além de Sjöström e Stiller, ajudaram a dar forma ao cinemasilencioso sueco. Um dos mais famosos é Gustaf Molander, que começou sua carreiraescrevendo o roteiro de Terje Vigen com Sjöström e continuou fazendo filmes até adécada de 1960 (além de ter sido o d iretor que projetou a atriz Ingrid Bergman ao estrelatoem meados dos anos 1930). Durante o p eríodo silencioso, Molander demonstrou grandehabilidade na realização de filmes de gêneros variados, desde trabalhos ambientadosem diferentes períodos históricos a dramas e comédias contemporâneos. Provavelmentesua contribuição mais notável como diretor de filmes silenciosos tenham sido as duasadaptações componentes do ciclo de filmes feitos a partir da obra Jerusalém, de SelmaLagerlöf,Ingmarsarvet /A Herança de Ingmar (1925) e Till Österland / [ Para oOriente ] (1926). Esses filmes foram a continuação de Ingmarssönerna / [ Os Filhosde Ingmar ] (1919) e Karin Ingmarsdotter  / Karin, filha de Ingmar  (1920),dirigidos por Sjöström. Ingmarsarvet é uma comovente descrição da vida em uma

vår / Na primavera da vida (Paul Garbagni,1912), da Pathé de Estocolmo, rodadonos estúdios da Svenska Biografteatern pois a Pathé não dispunha de estúdios própriosna Suécia. A característica mais notável deste filme é que Sjöström, Stiller e Klerckernele desempenham os principais papéis.

Sjöström e Stiller, as duas figuras mais famosas do trio, rapidamente aprenderam seuofício e realizaram um espantoso número de filmes – chegavam a seis ou sete porano. Talvez o mais plenamente bem-sucedido desses primeiros tempos seja IngeborgHolm, dirigido por Sjöström em 1913, um drama sobre uma mãe solteira que perde aguarda dos filhos. O filme causou tanto impacto em seu lançamento que desencadeouum debate e uma modificação na legislação sueca, que então passo u a favorecer as mãessolteiras. Mas o filme tem também aspectos visuais interessantes, e o q ue mais chamaa atenção talvez seja a maneira como Sjöström usa a profundidade de campo – a açãose desenvolve, numa mesma tomada, em diferentes planos espaciais. Outra surpreen-dente característica do filme é o estilo de interpretação contido, que se tornaria umadas marcas registradas do cinema silencioso sueco.

Terje Vigen, realizado por Sjöström em 1916 e lançado no ano seguinte, é um filme

notável por muitas razões. Não apenas porque é um filme s obre a passagem do tempoe o comovente retrato de um velho homem (interpretado pelo próprio Sjöström) quedecide enfrentar seus sentimentos de perda e vingança, mas também porque provocoua mudança da política de produção da Svenska Biografteatern. Ele marca o iníciodo que se tornou conhecido como Idade de Ouro do Cinema Sueco (período quese diz habitualmente ter durado até 1924). Foi a produção mais cara feita até entãoe, quando o filme se tornou um grande sucesso financeiro e obteve uma boa reper-cussão crítica, o estúdio decidiu mudar radicalmente sua política de produção. De vintefilmes por ano, a produção anual caiu para alguns apenas, que passaram a ter umapreparação mais longa e cuidadosa, além de um orçamento maior. Como muitos dos

 justamente mostrar a interação do homem com a natureza. Todos esses aspectos – g rande orçamento, o uso de uma famosa obra literária e a filmagem em locação – consubstanciaram a nova política da Svenska Biografteatern.

Mas devemos ser cuidadosos no uso da expressão Idade de Ouro e na divisão defilmes feitos antes e depois de Terje Vigen. A Idade de Ouro caracteriza não apenasuma tal qualidade dos filmes, mas também um certo modo de produção da indústriacinematográfica do período. Muitas fitas realizadas antes de 1917 têm sido injustamentenegligenciadas, assim como muitas produções de depois de 1917 nada têm de notáveis. Averdade sobre Terje Vigen, contudo, é que ele contribuiu para que o cinema ganhassecredibilidade e respeitabilidade culturais. Foi o primeiro filme a ter uma resenha assinadanum jornal sueco, escrita por um crítico literário muito famoso. Teve também muitosucesso no exterior, e a filmagem em locações, nas quais o homem é visto lutando contraos elementos, tornou-se parte do “exotismo” ou “originalidade” do cinema sueco, quepareciam fascinar as plateias estrangeiras. Esse diferencial predominou também nofilme seguinte de Sjöström, Berg-Ejvind och hans hustru / Os Proscritos (1918),

filmes realizados a partir de então, TerjeVigen  se baseava numa famosa obraliterária, no caso, um longo poema doescritor norueguês Henrik Ibsen (o filmeé talvez a melhor adaptação já vista deum poema para a tela). Outra caracterís-tica marcante é que foi rodado sobretudoem locações. Sjöström e o renomadodiretor de fotografia Julius Jaenzon utili-zaram maravilhosos cenários não apenascomo pano de fundo espetacular parao desenvolvimento do drama, mas para Julius Jaenzon

Page 21: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 21/49

41

O final da Idade de Ouro do cinema sueco é habitualmente fixado em 1924, com olançamento de Gösta Berlings saga / A Saga de Gösta Berling ], para sempreinscrito no cinema como o momento de revelação da atriz Greta Garbo. Até então, elaera praticamente desconhecida (era ainda aluna da Escola de Arte Dramática quandofoi selecionada por Stiller para o elenco do filme – por recomendação de Molander, oentão diretor da escola. Quando o filme foi lançado, Stiller e Greta Garbo já haviamdeixado a Suécia. Depois de um abortado projeto em Istambul (então Constantinopla),chegaram a Berlim, onde Greta foi escolhida por G.W. Pabst para o elenco de Diefreudlose Gaße / A Rua das lágrimas (1925). Leo B. Mayer, produtor da MGM,viu Gösta Berlings saga e ofereceu a Stiller e a Greta um contrato em Hollywood.Naquele momento, Sjöström também já havia deixado a Suécia e ido para a Américado Norte – e o mesmo fizeram o ator Lars Hanson e o roteirista Hjalmar Bergman.Mas, como dito, seria tolice considerar inferiores todos os filmes feitos na Suécia depoisde 1924. Ingmarsarvet é um filme que veremos na Jornada mas, além deste, do finalda era silenciosa, temos também o primeiro filme de Alf Sjöberg, Den starkaste /[ O Mais forte ] (1929), notável e visualmente muito bem realizado, filmado no marÁrtico. Outro filme de interesse, depois de 1924, é Flickan i frack / [ A Garota desmocking  ] (Karin Swanström, 1925), com algumas das primeiras cenas de travestismono cinema sueco. Sua realizadora dirigiu o utros três filmes silenciosos e, após o adventodo sonoro, tornou-se a chefe de p rodução da Svensk Filmindustri.

Filmes de não-ficção continuaram a ser produzidos durante todo o período silencioso, enão apenas sob a forma de cinejornais semanais. Bengt Berg foi um importante diretorde documentários e fez uma série de curtas e longas-metragens que descreviam a vidaanimal e selvagem na Suécia, iniciando assim uma tradição que seria levada ao apogeupor Arne Sucksdorff nas décadas de 1940 e 50. Berg reuniu-se também ao cinegrafistaGustaf Boge e ao príncipe Wilhelm em viagens a países estrangeiros em meados dadécada de 1920. Esses filmes eram realizados com propósitos educativos e distribuídosem escolas, o que acontecia também com uma grande quantidade de filmes de ficçãoda Svenska Biografteatern e da Svensk Filmindustri.

Ainda antes da evasão dos grandes talentos, a Svensk Filmindustri iniciara umamudança em sua política de produção, afastando-se do tradicional look   dos filmessuecos para criar algo que acreditava ter mais apelo internacional. Dois primeirosexemplos – os mais bem-sucedidos – foram Klostret i Sendomir / O Mosteirode Sendomir (1920), de Sjöström e Erotikon (1920), de Stiller. O filme de Sjöströmnão está entre seus mais conhecidos mas, na época, foi um dos que tiveram maior

Outra obra cinematográfica dissidente, mas de escala muito maior, é Häxan  / AFeitiçaria através dos tempos, quase um monumento na história do cinemasilencioso sueco, com poucos equivalentes em qualquer outra parte do mundo.Häxan  foi realizada pelo diretor dinamarquês Benjamin Christensen e é uma curiosacombinação de explicações e dramatizações didáticas da visão medieval sobre demôniose bruxarias. Não se parece com nenhum outro filme feito na época na Suécia; e esse

estudo verdadeiramente pessoal sobreos recalques impostos pela moral epela religião sobre os seres humanospermanece ainda hoje como umapoderosa experiência visual. Christensennão foi o único talento estrangeiro a quemse ofereceu a oportunidade de realizarfilmes na Suécia. Entre outros contratados,esteve seu compatriota Carl TheodoreDreyer, que realizou Prästänkan  / AQuarta aliança da sra. Margarida (1920) para a Svensk Filmindustri.

pobre vila rural, desequilibrada pela chegada de um fanático religioso (interpretadopor Conrad Veidt) – e chega a ser melhor contribuição que a dada por Sjöström para omesmo ciclo de filmes. A obra tem todas as características familiares dos filmes clássicossuecos: mostra a interação do homem com a natureza em cenários espetaculares, e sebaseia numa famosa fonte literária. E justamente por ter sido feita num momento emque já se considerava encerrada a Idade de Ouro do cinema silencioso sueco, indica oquanto o uso desse rótulo deveria ser aplicado com mais cautela.

Evidentemente nem todos os filmes suecos do final da década de 1910 e começo daseguinte se passam em locações nem mostram a luta do homem contra a natureza emcenários autênticos. Stiller fez muitas comédias em ambientes da classe alta urbana, eNorrtullsligan / As Garotas de Norrtull (1923), de Per Lindberg, é uma comédiasobre quatro secretárias que vivem juntas numa metrópole e, em comunidade tentamsobreviver no mundo governado por chefes. O filme, adaptado de uma novela de ElinWägner, é notavelmente moderno ao retratar mulheres que lutam pela auto-suficiência,auto-sustentabilidade e a autoconfiança. Outra figura importante do período silenciosofoi o autor de desenhos animados Victor Bergdahl, que entre 1915 e 1922 realizou nadamenos do que 17 filmes curtos com o personagem Capitão Grogg. Eles demonstram

que Bergdahl pode ser comparado com qualquer outro animador mundial do período.Em Kapten Grogg skall portätteras / Quando o capitão Grogg foi fazer seuretrato (1917), Bergdahl engenhosamente mistura animação e seres vivos, e ele própriointerpreta o pintor contratado para fazer o retrato de Grogg.

No final dos anos 1910, a Svenska Biografteatern começou a expandir e consolidarainda mais sua posição no mercado cinematográfico sueco; fundiu-se a outrascompanhias e, em 1919, batizaram-se como Svensk Filmindustri (ainda existente),uma companhia completa, verticalmente integrada, que não só era a maior produtoramas também a maior distribuidora e a maior proprietária de salas de exibição. Nomomento em que se fundiram, reestruturaram e rebatizaram, aumentou também anecessidade por melhores e maiores instalações de filmagem. Os novos estúdios emRåsunda, ao norte de Estocolmo, ficaram prontos para uso na primavera de 1920 (oprimeiro filme produzido nas novas instalações foi Körkarlen ).

Quando, dez anos antes, Magnusson transferira as operações da Svenska Biografteaternpara Estocolmo, ele contratara não apenas Sjöström e Stiller, mas também Georg afKlercker. Este, com seu espírito contestador, quis ser seu próprio chefe, e logo se desen-tendeu com Magnusson. Em 1915, Klercker decidiu se mudar para Göteborg, na costaoeste da Suécia, onde realizou uma série de filmes de aventura e ação para o estúdioHasselbladfilm, estabelecido pela famosa fábrica de câmeras Hasselblad. Klerckertinha gosto por filmes de ação e aventura, que narrava com eficiência e muita incli-

nação por composições espetaculares. Aslocações externas dos filmes de Klerckernão se prestam a mostrar a interação dohomem com a natureza, mas a aproveitaros cenários na criação gráfica de efeitosimpactantes, como em seu magníficoFången på Karlstens fästning  / APrisioneira da Fortaleza de Karlsten (1916). Os filmes de Klercker para aHasselblad faziam sucesso mas, poruma infeliz e irônica virada do destino,a Hasselbladfilm foi logo assumida pela

Skandia – um dos estúdios envolvidos na fusão com a Svenska Biografteatern queresultou na formação da Svensk Filmindustri. Klercker, impossibilitado de trabalharcom Magnusson, teve de compreender que seus dias como diretor de filmes estavamdefinitivamente encerrados.

A Prisioneira da Fortaleza de Karlsten

A Feitiçaria através dos tempos

Page 22: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 22/49

43

repercussão. Fez enorme sucesso de bilheteria e foi vendido para mais de 50 países. Éum filme de época, ambientado na Europa central e não há nada de muito “sueco”nele, embora seja um trabalho g raficamente muito fascinante, em que pela paisagemse criam interessantes padrões que acentuam o isolamento dos locais e a claustrofobiade uma história de amores clandestinos. Erotikon foi concebido inicialmente como oprimeiro de uma série de filmes em locações u rbanas, sob a direção de Stiller e com umasedutora atriz no papel principal. Por diversas razões, o projeto nunca se concretizoumas, como filme isolado, Erotikon sobrevive como a mais deliciosa comédia realizadapor Stiller. No final da década de 1920, o caminho da “internacionalização” ficoumais forte e a Svensk Filmindustri chegou a criar uma companhia subsidiária, a IsepaFilms, responsável apenas por coproduções internacionais. O melhor exemplo éFörseglade läppar / [ Lábios selados ] (1927), filmado por Gustaf Molander naItália, coproduzido pela National Film AG de Berlim e a famosa Les Films Albatros,de Paris. O clássico de Anthony Asquith exibido na Jornada Brasileira de CinemaSilencioso de 2008, A Cottage on Dartmoor / Uma Casa em Dartmoor (1929),

também foi coproduzido pela Svensk Filmindustri e lançado na Suécia,em uma versão um pouco diferente da inglesa, como Fången n:r 53. Masalguma coisa havia sido perdida quando a busca pela internacionalização

prevaleceu sobre outros interesses: muitos dos filmes realizados na segundametade da década de 1920 poderiam ter sido feitos por qualquer pessoaem qualquer lugar do mundo.

Há muitas hipóteses sobre a razão de os filmes silenciosos suecos teremalcançado tanto sucesso e provocado tanto impacto a partir de meadosda década de 1910. Talvez seja correto dizer que os melhores filmes dadécada de 1910 e começo da seguinte tiveram apelo por seu exotismoe originalidade, mas também porque particularmente incluíam algouniversalmente entendido. Embora a produção cinematográfica suecafosse pequena em comparação com a de outros países, a combinação degrandes talentos individuais à frente e atrás das câmeras, um elevado nívelde sofisticação técnica, o engenhoso uso de locações naturais e a riquezapsicológica das histórias e dos personagens transformaram os filmes silen-ciosos suecos num cinema nacional dos mais interessantes e ricos dasdécadas de 1910 e 20.

Um enorme percentual do patrimônio cinematográfico sueco tragicamentese perdeu quando toda a coleção de negativos originais de filmes silenciososproduzidos pela Svensk Filminidustri (e suas encarnações anteriores) foi

destruída num incêndio, em 1941. Um aspecto desse trágico acidente é que mais de50% da produção silenciosa sueca perderam-se completamente (no caso de Sjöström

e de Stiller, os números são ainda piores: apenas 15 dos 43 filmes suecos de Sjöströmsobreviveram, e apenas 14 dos 45 de Stiller). Outro aspecto diz respeito aos trabalhos depreservação ou restauração de filmes suecos do período silencioso que ficaram quase intei-ramente restritos ao uso de cópias de exibição em nitrato, mais ou menos gastas, comomateriais de duplicação. Muitas delas também apenas na forma de cópias resumidaspara distribuição escolar ou mesmo em formato ainda mais fragmentário. Felizmente,cópias em nitrato (e mesmo negativos originais de coproduções) ainda são localizadasem arquivos estrangeiros. Na última década, filmes como I lifvets vår, Madame deThèbes  (Stiller, 1915), Hämnaren / O Estivador  (Stiller, 1915), Dödskyssen / OBeijo da morte (Sjöström, 1916), Karusellen / [ Carrossel ] (Buchowetzki, 1923) ePolis Paulus’ påskasmäll  (Molander, 1925) vieram se somar à lista de filmes redes-cobertos. E novos materiais de filmes, como Klostret i Sendomir e Gunnar Hedessaga, foram descobertos em anos recentes, tanto na Suécia quanto no exterior, forne-cendo outras fontes para novas e melhores restaurações. Estamos esperançosos de quehaja mais tesouros a serem descobertos, o que quiçá nos permitiria aprofundar nossacompreensão do cinema silencioso sueco.

O Mosteiro de Sendomir

Greta Garbo (à esquerda) em Pedro, o vagabundo / Luffar - Peter

Conferência de aberturaConvidado a fazer a conferência inaugural da IV Jornada Brasileira deCinema Silencioso, Jon Wengström falará sobre o Cinema Silencioso Sueco,

com excertos de filmes.

Page 23: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 23/49

PROGRAMA 1

Na primavera da vidaI lifvets vår

Gerda, com a morte da mãe, é enviada ao comendador von Seydling, que a concebera em um de seus amoresescusos. O comendador entrega a menina a uma senhora que a vende a uma quadrilha que explora criançasmendigas. Cyril Alm a salva e a cria na casa de sua mãe. Muitos anos depois, Gerda sucumbe aos encantos dotenente von Plæin e foge de casa. Vinte anos se passam: Gerda é uma atriz famosa e o próprio pai a corteja. Cyril aprocura para reencontrar o passado, salva-a de um incêndio e tem o incentivo do comendador para desposá-la.

Suécia, 1912, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 54min, 16-17qpscp: Pathé Frères; d: Paul Garbagni; r: Abdon Hedman baseado no romance Första älskarinnan, de August Blanche;

df : Willi Neumaier; e: Victor Sjöström (Cyril Alm), Anna Norrie (senhora Alm, mãe de Cyril), Georg af Klercker(comendador von Seydling), Selma Wiklund af Klercker (Gerda), Mauritz Stiller (tenente von Plæin), Astrid Engelbrecht(Sara Andersson), Victor Arfvidson (Brooms), Georg Fernquist, Erland Colliander, William Larsson, Valdemar Dalquist,

Henrik Jaenzon, Martha JosefsonOrigem da cópia: Svenska Filminstitutet

Madame de Thèbes

Uma cigana é amaldiçoada pelo pai e precisa renegar seu filho ilegítimo para que ele tenha sucesso na vida. Elaentrega a criança à condessa Júlia, que acaba de perder seu próprio filho. Trinta e cinco anos depois, o condeRoberto tornou-se um político importante prestes a ser nomeado ministro de Assuntos Estrangeiros. Seu rivalno Parlamento é o barão von Volmar, mas, por uma fatalidade, o conde apaixona-se pela filha do barão. Este,por sua vez, através de manobras escusas, descobre que Roberto é filho da famosa Madame de Thèbes, profetiza

consultada por todos os políticos, e usa essa informação para arruinar a carreira do conde.

Suécia, 1915, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 50min, 17qpscp: AB Svenska Biografteatern; d: Mauritz Stiller; r: Martin Jørgensen, Louis Levy; df : Julius Jaenzon; e: Ragna

Wettergreen (Ayla, conhecida como Madame de Thèbes), Nicolay Johannsen (conde Roberto), Albin Lavén (barão vonVolmar), Karin Molander (Louise von Volmar), Märta Halldén (condessa Júlia), Doris Nelson (Ayla quando jovem)

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

Madame de Thèbes

45

Page 24: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 24/49

47PROGRAMA 3

Terje Vigen

Terje Vigen é um pescador que vive numa ilha que é bloqueada po r navios ingleses durante a guerra, em 1809. Ele

tenta furar o bloqueio para buscar alimentos para sua mulher e filha, mas é capturado e mandado para a prisão.Libertado cinco anos depois, descobre que seus entes queridos morreram de fome. Terje se torna um homemrecluso e jura se vingar do homem que provocou seu sofrimento. Mas quando chega a oportunidade da vingança,

a voz de uma criança faz com que seu ódio seja superado.

Suécia, 1917, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 56min, 17qpscp: AB Svenska Biografteatern; p: Charles Magnusson; d: Victor Sjöström; r: Gustaf Molander e Victor Sjöström, baseadono poema homônimo de Henrik Ibsen; df : Julius Jaenzon; da: Axel Esbensen e Jens Wang; e: Victor Sjöström (Terje Vigen),

August Falck (lorde inglês), Edith Erastoff ( lady inglesa), Bergliot Husberg (sra. Vigen), William Larsson (novo proprietárioda casa de Terje e oficial do navio inglês), Gucken Cederborg, Jenny Tschernichin-Larsson

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

O Mosteiro de SendomirKlostret i Sendomir

Dois nobres, a caminho de Varsóvia, no século XVII, passam a noite num mosteiro. Curiosos, pedem a um mongeque lhes conte a histó ria do local. Ali vivera um podero so conde de nome Starchensky, com a mulher Elga e a filh a.Elga, porém, foi infiel ao marido e teve uma relação com o próprio primo. Ao desvendar a trama, Starchensky

decidira dedicar sua vida e fortuna à construção do mosteiro em que agora se encontravam.

Suécia, 1921, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 80min, 17qpscp: AB Svenska Biografteatern; d e r: Victor Sjöström, baseado em conto de Franz Grillparzer;

df : Henrik Jaenzon; e: Tore Svennberg (conde Starchensky ), Tora Teje (Elga), Richard Lund (Oginsky), Renée Björling(Dortka), Albrecht Schmidt (administrador), Gun Robertson (filha do conde), Erik A. Petschler (nobre), Nils Tillberg

(nobre), Gustaf Ranft (abade), Yngwe Nyquist (criada), Axel Nilsson (frade), Jenny Tschernichin-Larsson(mulher do carvoeiro), Emil Fjellström (frade)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 2

Quando o capitão Grogg foi fazer o seu retratoNär Kapten Grogg skulle porträtteras

Combinação de filmagem ao vivo e animação. Um pintor, insatisfeito com seus trabalhos, recebe a visita docapitão Grogg, que deseja um quadro seu, de corpo inteiro. Mas o capitão não fica contente com a maneira como

o pintor retrata seu nariz, avermelhado pelos efeitos da bebida.

Suécia, 1917, 35mm, preto-e-branco, 7min, 18qpscp: AB Svenska Biografteatern; d, da e e: Victor Bergdahl (pintor)

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

 A Prisioneira da Fortaleza de KarlstenFången på Karlstens fästning

De Faber é um inventor que fracassa na tentativa de descobrir uma nova fórmula de explosivo. A descoberta,porém, é realizada pelo professor Plussman, da Suécia, e De Faber, disfarçado de conde, visita Plussman e quercomprar a fórmula. Como o inventor se recusa a vendê-la, De Faber a rouba e sequestra Mary, filha do professor.O sequestro é visto por pessoas que alertam a polícia, o pai da moça e Johnson, seu namorado. Prisioneira numafortaleza construída sobre uma ilha rochosa, Mary consegue enviar uma mensagem de socorro dentro de umagarrafa. Johnson e alguns pescadores seguem para a ilha para resgatar Mary, que consegue fugir das garras dos

sequestradores quando percebe a chegada de seus salvadores.

Suécia, 1916, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 64min, 16qpscp: Hasselblads Fotografiska AB; d: Georg af Klercker; r: Willy Grebst e Georg af Klercker; df : Gösta Stäring;

e: Nils Chrisander (De Faber), Maja Cassel (Mary Plussman), Manne Göthson (Johan Plussman), Arvid Hammarlund(doutor Johnson), Gustaf Bengtsson (assistente de De Faber), Victor Arfvidson (Berger, guardião da fortaleza),

William Engeström (pescador)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

Nos grilhões da escuridãoI mörkrets Bojor

Acusada de matar o marido, Ellin or Petipon fica traumatizada e perde a memória . Mesmo sem provas conclusivas,a moça permanece presa durante alguns anos, sob observação. Relata ao pastor da prisão os acontecimentos deque vai se lembrando, inclusive a corte que lhe fazia o conde Xavier. Por intercessão do pastor, Ellinor é libertadae, ainda desnorteada, ouve num café a conversa de um grupo de malfeitores que trama roubar a mansão Petipon.Ellinor alerta seu filho, já rapaz, e se junta ao bando para atrapalhar os planos criminosos. Em seu leito de morte,

o conde Xavier confessa ter assassinado o dr. Petipon.

Suécia, 1917, 35mm, preto-e-branco, 43min, 16qpscp: Hasselblads Fotografiska AB; d: Georg af Klercker; r: Willy Grebst; df : Carl Gustaf Florin;

e: Sybil Smolova (Ellinor Petipon), Carl Barcklind (dr. Petipon), Artur Rolén (filho de Ellinor), Ivar Kalling (conde Xavier),Frans Oscar Öberg (pastor da prisão), Karl Gerhard, Hugo Björne, Ludde Gentzel, Helge Kihlberg, Nils Wahlbom, Victor

Arfvidson, Gustaf BengtssonOrigem da cópia: Svenska Filminstitutet

Terje Vigen

Page 25: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 25/49

Corinne Griffith em Into her kingdom  / APrincesa russa (Sven Gad, 1926) e The Lady inermine / A Dama em arminho (James Flood,1927); Laura La Plante em Her big night / Quenoite aquela! (Melville W. Brown, 1926); EstherRalston em Fashions for women / A Mulhere a moda (Dorothy Arzner, 1927); e Pola Negriem Barbed wire / Amai-vos uns aos outros (Rowland V. Lee, 1927) e The Woman on trial /A Ré amorosa (Mauritz Stiller, 1927).

A 3 de junho de 1927, Einar Hanson sofreu umacidente de automóvel quando voltava de um

 jantar com Greta Garbo e Mauritz Stiller emHollywood. O ator passou mais de quatro horasagonizando até que o encontrassem, ainda vivo, àespera de socorro. Morreu a caminho do hospitalo ator que, conforme algumas revistas propalavam,seria o sucessor de Rudolph Valentino.

Einar Hanson é ator no filme A Rua das lágrimas / Die freudlose Gaße.

EINAR HANSON

O belíssimo jovem Einar Hanson foi descobertopor Mauritz Stiller quando atuava no TeatroDramático Real, de Estocolmo. Foi dirigido porStiller que estrelou Gunnar Hedes saga  /Contra o orgulho, filme que o consagraria nocinema sueco. Em 1924 participou da tentativade Stiller, em companhia de sua também prote-gida, Greta Garbo, de realizar em Constantinopla(depois Istambul) uma versão cinematográfica doromance A odalisca de Smolensk , de Vladimir Sem itoy.Contudo, a companhia produtora abre falênciae o trio volta para a Suécia, passando antes porBerlim, onde Greta Garbo tem um papel impor-tante e Einar apenas um papel secundário em Diefreudlose Gaße / A Rua das lágrimas.

Einar vai para Hollywood em 1925, na compa-nhia de Stiller e Greta Garbo e imediatamenteinterpreta papéis principais em filmes dos grandesestúdios, como galã de suas principais estrelas:

15 junho 1899, Estocolmo, Suécia - 3 junho 1927, Hollywood, Estados Unidos

Contra o orgulho

PROGRAMA 4

 A Feitiçaria através dos temposHäxan

A partir de um início lento, com imagens de uma série de gravuras em madeira ou xilogravura e desenhos, o filmeencaminha-se para uma progressão de vinhetas dramáticas que ilustram a força espantosa da feitiçaria na IdadeMédia. Embora obviamente um trabalho de pura imaginação, o filme assume as dimensões de um documentário,

produto da extensa pesquisa realizada por Christensen antes de iniciar o projeto.Trata-se de um filme ficcional de horror em forma de documentário, e apresenta uma extraordinária fotografia,estrutura não-linear e iconografia grotesca. Os desiguais valores de produção e a crueza dos motivos visuais enfatizama eficácia do filme, e acrescentam uma inesperada autenticidade à sua abordagem voyeurista. A despeito dos esforçosda censura para proibir o filme, ele se transformou numa sistemática influência sobre os realizadores do século XX.

O filme marcou o divórcio dos caminhos de Christensen e a indústria cinematográfica dinamarquesa. Em seguida,ele concentraria suas atividades no cinema alemão, antes de ir para Hollywood em 1928.

Existe uma outra versão do filme, de menor duração, lançada em 1968, com narração feita pelo lendário escritorda geração beat  William S. Burroughs ( Naked Lunch ) e trilha musical composta por Jean-Luc Ponty.

Suécia, 1922, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 106min, 20qpscp: AB Svensk Filmindustri; d e r: Benjamin Christensen; df : Johan Ankerstjerne; da: Richard Louw; mo: Edla

Hansen; e: Benjamin Christensen (Demônio), Ella la Cour (Karna, uma feiticeira), Emmy Schønfeld (assistente deKarna), Kate Fabian (donzela apaixonada), Oscar Stribolt (monge glutão), Wilhelmine Henriksen (Apelone, uma pobre

velha), Astrid Holm (Anna, mulher do gráfico), Karen Winther (sua irmã mais moça), Maren Pedersen (Maria, bruxa), Johannes Andersen (frei Henrik, juiz do tr ibunal), Herr Westermann (carrasco), Clara Pontoppidan (irmã Cec ília),Tora Teje (a histérica do episódio moderno)Origem da cópia: Svenska Filminstitute

Gunnar Hede é criado por sua orgulhosa mãe, que deseja que o rapaz se torne respeitável para fazer jus à riquezada família. Mas Gunnar é mais interessado em seu avô, que começou a vida como violinista andarilho mas ficourico ao conduzir um rebanho de renas selvagens para vendê-lo nos mercados do sul da Suécia. O rapaz apaixona-se por Ingrid, uma violinista que viaja com um casal de artistas ambulantes, e renuncia à fortuna familiar paratambém se tornar um violinista andarilho. Gunnar tenta também repetir a façanha do avô, conduzindo renas parao sul, mas a líder do rebanho o arrasta pela neve durante muitos quilômetros e o incidente o enlouquece. Gunnar

é levado de volta ao solar da família, onde Ingrid ocupa-se dele e finalmente o cura com a música.

O filme é construído sobre uma atração sensacional com raízes na cultura nórdica – uma marca registrada de Stiller –, no caso,a audaciosa travessia na neve que envolve o que parecem ser zilhões de renas. A atração emerge do conflito entre comércio e arte,com os poderes redentores da arte vencendo a batalha. Stiller equilibra criativamente as demandas da arte elevada ao colocar

 personagens em ambientes o mais modestamente artísticos que se possa imaginar, o que também oferece comoventes momentos decomédia. (...) A estratégia narrativa inspira uma inédita confiança em efeitos fotográficos com sonhos, memórias e alucinaçõescomo traços motivadores, até que o poder da música restaure a sanidade e a felicidade, com a prosperidade completando o tripé.

 Jan Olsen. Catálogo da XXVIII edição das Gior nate del Cinema Muto de Pordenone, 2009.

Contra o orgulhoGunnar Hedes saga

Suécia, 1923, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 73min, 17qpscp: AB Svensk Filmindustri; p: Charles Magnusson; d: Mauritz Stiller; r: Alma Söderhjelm e Mauritz Stiller, baseado no

romance En herrgårdssägen, de Selma Lagerlöf; df : Julius Jaenzon e Henrik Jaenzon; da: Axel Esbensen; e: Einar Hanson(Gunnar Hede), Hugo Björne (sr. Hede), Pauline Brunius (sra. Hede), Mary Johnson (Ingrid), Adolf Olschansky

(sr. Blomgren), Stina Berg (sra. Blomgren], Thecla Åhlander (Stava), Ingeborg Strandin (criada), Gösta Hillberg (advogado)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 5

49

Page 26: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 26/49

51

Ela fez também uma breve mas memorávelaparição em Häxan  / A Feitiçaria atravésdos tempos  (Benjamin Christensen, 1922).O filme termina com um episódio dos temposmodernos, pois Christensen queria mostrar

que o que era percebido como maquinações dodemônio nos tempos medievais não difere devários problemas mentais revelados por estudospsiquiátricos que estiveram na moda na viradado século passado. No episódio, Tora Teje fazalguns retratos breves, precisos e tocantes de váriasmulheres com cleptomania, tendências histéricase outras desordens nervosas. No ano seguinte, elafez talvez a sua melhor interpretação, como umadas mulheres secretárias de Norrtullsligan  / AsGarotas de Norrtull (Per Lindberg, 1923), quemoram em uma espécie de comunidade e tentamsobreviver num mundo masculino. O personagemque interpreta tem também a carga adicional deprecisar cuidar de um irmão muito mais jovem(as convenções do tempo não permitiriam que opersonagem pudesse ser encarado como uma mãesolteira criando seu próprio filho).

Embora sua carreira no cinema tenha sido muitobreve e esporádica, Tora Teje provoca uma

duradoura impressão como uma das melhoresatrizes suecas do c inema silencioso. Ao interpretara esposa de um fazendeiro no século XIX, umabatalhadora “mãe solteira” na Estocolmo contem-porânea, uma mulher dilacerada às beiras de umcolapso nervoso, ou a rica e levemente entediadamulher de um “marido cego”, ela traz profundi-dade, compreensão, inteligência e beleza à tela,sempre sugerindo que há muito mais nos persona-gens do que à primeira vista se revela.

TORA TEJE

Tora Teje foi uma das mais famosas atrizes teatraissuecas no início do século XX, construindo seunome através de uma série de notáveis interpreta-ções no Teatro Sueco e no Teatro Dramático Real,em Estocolmo, entre as quais, de alguns grandes

papéis femininos da literatura como Fedra e LadyMacbeth. Quando, em 1920, começou a atuarem filmes, tornou-se efetivamente a maior dasestrelas suecas, uma diva, e objeto de numerososartigos na revistas de cinema, figurando emambiente elegantes e com roupas extravagantes.Ela encarnou, assim, a emergência de um tipode modernidade no mundo do espetáculo sueco,com um brilho internacional, semelhante aliásao personagem que ela interpreta em Erotikon (Mauritz Stiller, 1920).

Tora Teje atuou em apenas nove filmes silenciosose um sonoro, mas suas interpretações memoráveiscontribuíram para a fama duradoura e a qualidadede muitos deles. Seus primeiros papéis cinemato-gráficos foram o da principal intérprete femininaem dois filmes de Victor Sjöström, mostrando suaversatilidade como atriz: o filme de época Klostreti Sendomir /O Mosteiro de Sendomir (1920),no qual ela cria o comovente retrato de uma

mulher dividida entre a família e o homem queama, e Karin Ingmarsdotter / Karin, filha deIngmar (1920), também um filme de ambientaçãohistórica, no qual interpreta a maltratada mulherde um fazendeiro. Ela é, entretanto, mais conhe-cida por sua interpretação em Erotikon, no qualdesempenha a cortejada esposa de um cientista.Seu personagem é evasivo e envolve os homens aseu redor, mas ela lhe dá grande profundidade e,com nuances delicadas em suas expressões, revelaquando o verdadeiro amor cruza seu caminho.

17 janeiro 1893, Estocolmo, Suécia - 30 abril 1970, Estocolmo, Suécia

A atriz Tora Teje está nos filmes O Mosteiro de Sendomir / Klostret i Sendomir eA Feitiçaria através dos tempos / Häxan.

 As Garotas de NorrtullNorrtullsligan

Pegg muda-se para Estocolmo, na esperança de conseguir melhores oportunidades de trabalho. Ela divide umapartamento com três outras garotas que enfrentam as tentações e as armadilhas de uma metrópole que rapi-damente se moderniza. Uma das moças perde o emprego após tomar parte em uma greve; outra prefere largaro emprego a aceitar as investidas de seu chefe. O filme é narrado em primeira pessoa por Pegg e os intertítulosexpõem, além de detalhes da história, seus sentimentos e reações aos acontecimentos, e ainda, informações que

nos ajudam a compartilhar suas opiniões, o que dá à narração uma qualidade memorialística.

Per Lindberg (1890-1944) estudou com o famoso diretor de teatro alemão Max Reinhardt e desenvolveu impor-tante carreira no cinema, mas sobretudo nos palcos teatrais. Depois de As Garotas de Norrtull, seu segundofilme, voltaria a dirigir apenas em 1939. Em 1940 realizou Juninatten / [ Noite de junho ] seu filme mais conhe-

cido devido à participação de Ingrid Bergman.

 As Garotas de Norrtull  é um dos filmes mais corajosos e apreciáveis da década de 1920 europeia. Antes de 1923,os filmes apresentavam personagens femininas individuais de carne e osso, mas  As Garotas de Norrtull  abre um

 precedente ao lidar com um elenco dominado por quatro mulheres extremamente dinâmicas. (...) O roteiro de Hjalmar Bergman transcende a imagem familiar das mulheres como objetos decorativos. O quarteto feminino percorre a vida humanacom passos largos. (...) O filme se assemelha a um inteligente livro de memórias, quase um diário. A direção de Lindberg fogedas convenções da época e suas mulheres ainda hoje parecem muito modernas, com seus penteados e chapéus discretos, por

exemplo; e as minúcias da vida cotidiana destacam-se com muita vivacidade.Peter Cowie. Scandinavian Cinema, Londres, Tantivity Press, 1992.

Suécia, 1923, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 85min, 21qpscp: Bonnierfilm; p: Stellan Claësson and Karin Swanström; d: Per Lindberg; r: Hjalmar Bergman, baseado no romancehorônimo de Elin Wägner; df : Ragnar Westfelt; e: Tora Teje (Pegg), Inga Tidblad (Baby), Renée Björling (Eva), Linnéa

Hillberg (Emmy), Egil Eide (chefe de Pegg), Tollie Zellman (Gorel, prima de Pegg), Olav Riégo (noivo de Gorel), Stina Berg(tia de Pegg), Lili Ziedner (agitadora), Lauritz Falk (Putte, irmãozinho de Pegg), Nils Asther (filho da senhoria), Gabriel Alw

(noivo de Eva), Torsten Bergström (primeiro namorado de Pegg), John Ekman (chefe de Baby)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 6

Page 27: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 27/49

Placas de vidro docinema silencioso sueco

Exposição

O setor histórico do Instituto Sueco de Cinema é depositário de uma coleção de43 mil placas de vidro oriunda da AB Svensk Filmindustri – e de sua predecessora,a AB Svensk Biografteatern – que registram a produção sueca de 1911 a 1967.Um enorme projeto iniciado em 2007 pretendia fazer a digitalização de todasessas imagens, mas a tarefa revelou-se acima das possibilidades orçamentárias.Diante disso, priorizou-se a digitalização de todos os negativos referentes aoperiodo do cinema silencioso sueco e às produções de Ingmar Bergman, tendoem vista as solicitações relativas ao trabalho de Bergman.

A exposição que apresentamos foi feita mediante a sugestão do curador da JornadaBrasileira de Cinema Silencioso de que Jon Wengström selecionasse imagenscaptadas durante a filmagem de trabalhos que apresentamos na IV Jornada. Aqualidade dessas imagens nos desperta um enorme desejo de ter contato com omaior número possível delas – e de comparar os esforços de realização suecoscom os que realizávamos no Brasil no mesmo período.

 A Herança de IngmarIngmarsarvet

O pequeno Ingmar perde toda a herança, inclusive a fazenda Ingmarsson, por obra de um cunhado alcoólatra. Já crescido, quer se t ornar professor mas, duran te u ma no ite de tempestade, o fantasma de seu avô prometeamaldiçoá-lo se ele não se tornar um fazendeiro como seus ancestrais. Nessa mesma noite de tempestade, omístico Helgum chega à vila e rapidamente se torna líder de uma comunidade de fanáticos que se instala nafazenda Ingmarsson. Ingmar, apaixonado por Gertrudes, passa o inverno trabalhando na floresta, mas volta, aoser informado sobre a tentativa de Helgum de se aproximar da moça. Ao ir tirar satisfações com Helgum, Ingmaro defende dos irmãos de uma moça enlouquecida pela doutrinação do fanático e, na briga, leva uma facada.

Helgum decide partir, mas um incidente faz com que a irmã mais velha de Ingmar, paralítica, ande para salvarseu filho pequeno de morrer queimado. Todos acreditam em um milagre de Helgum e decidem vender tudo paraacompanhá-lo a Jerusalém. No dia em que a fazenda Ingmarsson vai a leilão, o juiz Person a compra, a pedido dafilha, apaixonada por Ingmar que se compromete a se casar com ela, apesar de apaixonado por Gertrudes. Estaenlouquece. Ingmar casa-se com a filha do juiz mas, no dia das núpcias, Gertrudes o procura e lhe entrega umpacote que encontrara por acaso, oculto no travesseiro do falecido cunhado de Ingmar e que contém o que restara

da herança deixada pelo pai de Ingmar, que teria permitido a ele comprar a fazenda e ficar com Gertrudes.

Suécia, 1925, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 100min, 20-24qpscp: Nord-Westi Filmaktiebolag; p: Oscar Hemberg; d: Gustav Molander; r: Ragnar Hyltén-Cavallius e Gustaf Molander,

baseado no romance Jerusalem I: I Dalarne , de Selma Lagerföf; df : J. Julius; e: Märta Halldén (Karin), Ivan Hedqvist(Stark Anders), John Ekman (Elias, marido de Karin), Lars Hanson (Ingmar), Mathias Taube (Halvor Halvorsson), MonaMårtenson (Gertrudes Storm), Nils Arehn (mestre-escola Storm), Conrad Veidt (Helgum), Ida Brander (mãe de Gertrud),

 Knut Lindroth (juiz Berger Sven Person), Jenny Hasselqvist (Barbro)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 7

53

Page 28: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 28/49

55

   V   I   S   I   T   A   A   O   A   C   E   R   V   O  –   C   I   N   E   M   A   T   E   C   A   S   U

   E   C   A

O Rio da vida

 Visita ao Acervo

Filmes de Arquivo doInstituto Sueco de Cinema

 Jon WengströmCurador do Acervo de Filmes de Arquivo do Instituto Sueco de Cinema

A Coleção de Filmes de Arquivo do Instituto Sueco de Cinema tem, como parteintegrante de sua missão, o objetivo de incorporar tudo o que é projetado noscinemas suecos, inclusive cópias de filmes estrangeiros. Isso acontece, entretanto,apenas sob a forma de depósito voluntário, e esta política tem sido praticadasomente nas últimas décadas. Como, então, materiais de filmes silenciosos estran-geiros entraram para a coleção?

O Clube de Cinema Sueco e, depois, o Arquivo de Filmes Históricos, precursoresda Coleção de Filmes de Arquivo do Instituto Sueco de Cinema, foram sempre oorganismo nacional responsável pelos filmes e, consequentemente, o guardião dosmateriais em nitrato, incluindo cópias suecas de filmes silenciosos estrangeiros, deposi-tadas por distribuidores locais ou por colecionadores privados.

Ao longo dos anos, alguns desses materiais em nitrato se deterioram além da possibili-dade de salvaguarda e foram descartados, e outros foram repatriados, antes de seremduplicados, para arquivos de seus países de produção. Mas alguns ficaram no Arquivo,e foram duplicados e preservados pelo Instituto Sueco de Cinema – como o rolo com19 filmes da Gaumont realizados entre 1899 e 1901, apresentados na Jornada doano passado. Esse trabalho continua em andamento, na medida em que o acervo emnitrato ainda está em processo de identificação e catalogação.

Uma das mais recentes e espetaculares descobertas na coleção de nitratos foi aexistência da cópia sueca, quase completa, do filme até então considerado perdidoThe Dawn of a tomorrow / A Aurora de um amanhã (James Kirkwood, EUA,1915), estrelado por Mary Pickford. O filme restaurado foi exibido até agora apenasno festival Il Cinema Ritrovato, em Bolonha (Itália) e no V Seminário Mulheres eCinema Silencioso, realizado em Estocolmo em 2008.

Entretanto, é habitual que a coleção de filmes estrangeiros em nitrato apareça apenas

sob a forma de fragmentos. A mais interessante coleção de fragmentos é constituídapor cortes feitos pelas autoridades da censura sueca. Essa coleção foi incorporada,ainda na década de 1940, pelo Arquivo de Filmes Históricos e contém alguns materiaismuito raros. Entre os materiais apresentados na Jornada deste ano estão corte deThe River / O Rio da vida (Frank Borzage, 1928) e Cagliostro (Richard Oswald,1928). Nesses dois casos, os filmes sobreviveram, mas os cortes da censura sueca são osúnicos materiais em 35mm que existem no mundo.

A censura sueca está entre as mais antigas do mundo, e começou a funcionar jáem 1911. Uma das principais razões para seu estabelecimento foi Afgrunden / OAbismo (Urban Gad, 1910), estrelado por Asta Nielsen. Quando o filme foi apresen-tado na Suécia, os censores consideraram excessiva a famosa dança gaúcha de AstaNielsen, e decidiram cortar a cena antes de autorizar sua exibição nas salas. O corte dacensura foi preservado e cedido ao arquivo do Instituto Dinamarquês de Cinema, emCopenhague (a produção, afinal, é dinamarquesa) para a restauração do filme.

Page 29: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 29/49

57

O Rio da vidaThe River

O Rio da vida  é tido por alguns como um dos

filmes silenciosos mais eróticos. Com a liberdadeque lhe permitiram o sucesso mundial e o Oscarrecebido por 7th  Heaven  / Sétimo céu, FrankBorzage realizou um filme pleno de sensualidade,sobre um jovem do campo iniciado no amor por

uma misteriosa mulher da cidade.

O fragmento de O Rio da vida  que apresentamosé um corte feito pelos censores suecos e é o únicomaterial em 35mm do filme localizado até o presente.Paradoxalmente, a única coisa que sobreviveu é aparte que foi cortada, supostamente para não ser vista

(pelo menos pelas plateias suecas).

Estados Unidos, 1929, 35mm, preto-e-branco, 2min, 24qpscp: Fox Film; d: Frank Borzage; df : Ernest Palmer;

e: Charles Farrell, Mary DuncanOrigem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 1 – Censura na Suécia

Cagliostro

Cagliostro – Liebe und Leben einesgroßen Abenteurers

De acordo com este filme, o alquimista e videnteCagliostro não era um charlatão e um gatuno, masum homem decente que tenta escapar da sua vida de

crimes com a ajuda da virtuosa Lorenza.

O fragmento apresentado é um corte da censurasueca e novamente o único material em 35mm quesobreviveu. Na França, o material existente do filmeé uma cópia Pathé-Baby em 9,5mm. O nitratooriginal do fragmento apresentado foi restaurado pela

Cinemateca Francesa.

França/Alemanha, 1929, 35mm, preto-e-branco, 2min, 18qpscp: Films Albatros; d: Richard Oswald; df : Maurice

Desfassiaux e Jules Kruger; e: Hans Stuwe (Cagliostro),Alfred Abel, Renee Heribel (Lorenza)

Origem da cópia: Svenska Filminstitute

Cagliostro

A maior parte da coleção em nitrato que ainda está sendo identificada e catalogada,sobretudo os filmes de não-ficção e mesmo os cinejornais, é formada por materiais quemostram personalidades e eventos suecos das primeiras décadas do século passado.Alguns filmes estrangeiros de não-ficção vêm sendo também descobertos à medidaque o trabalho continua. Apenas em 2007 foi identificado e preservado um assunto deum cinejornal alemão que apresenta a filmagem de Anna Boleyn / Ana Bolena, deErnst Lubitsch (1920). A cópia em nitrato e a nova cópia de projeção estão preservadasem Estocolmo, mas um novo contratipo e u ma segunda cópia foram repatriados paraa Alemanha. Em 2009, dois rolos de documentários de viagem [travelogues] francesessobre a Ásia oriental foram preservados (Un Voyage aux r uines d’Angkor / Umaviagem às ruínas de Angkor e Au pays des Moïs: explorations et chasse  /No país dos Moïs: exploração e caça ). A origem desses materiais não foi deter-minada, mas temos razões para acreditar que pertenciam ao príncipe sueco Wilhelm,ele próprio um famoso cinegrafista de materiais de não-ficção das décadas de 1920 e30. Na verdade, pensou-se que ele próprio teria dirigido esses filmes, mas um deles foiidentificado como uma produção francesa de 1908, e o outro provavelmente tambémé francês e da mesma época.

Sempre que os recursos o permitiram, a Coleção de Filmes de Arquivo teve orçamentopara a compra de filmes não suecos conservados em arquivos estrangeiros. Além declássicos do cinema internacional, o arquivo reuniu algumas ricas coleções especiaiscomo, por exemplo, a de cinema silencioso soviético. No final da década de 1960 eno começo da seguinte, adquirimos cópias do Gosfilmofond (Cinemateca Russa), emMoscou, de filmes de diretores famosos como Eisenstein, Dovjenko, Pudovkin, Vertov,Kulechov, e também de filmes preciosos de diretores menos conhecidos, como TretiaMeschanskaia / Rua Mechanskaia, 3 ou Sofá e cama (1927), de Abram Room.

Aquisições recentes de filmes estrangeiros do período silencioso concentraram-senaqueles de específico interesse sueco: filmes rodados na Suécia ou com contribuiçãosueca significativa na frente ou atrás das câmeras, e em suas melhores versões possí-veis. Filmes deste tipo incluem os de Greta Garbo: Die freudlose Gaße / A Ruadas lágrimas  (G.W. Pabst, Alemanha, 1925) e Flesh and the devil / A Carnee o diabo (Clarence Brown, EUA, 1926), adquiridos respectivamente do Museu deCinema de Munique e da Warner Brothers, e The Wind / Vento e areia (VictorSjöström, EUA, 1928), da George Eastman House (o filme tem música sincroni-zada e efeitos sonoros, como foi lançado); e uma cópia do fragmento existente daúnica colaboração de Victor Sjöström com Greta Garbo, The Divine woman /A Mulher divina  (EUA, 1928), adquirida da Cinemateca Russa em meados dadécada de 1990 – na verdade, o fragmento foi identificado por pesquisadores suecos

de cinema que estavam trabalhando em Moscou. Outra importante descoberta emum arquivo estrangeiro aconteceu no final da década de 1970, quando uma cópia deum filme em três rolos, de 1912, guardada na coleção da Biblioteca do Congresso,em Washington, Estados Unidos, revelou-se como o primeiro filme de Sjöström,Trädgårdsmästaren / O Jardineiro. O filme havia sido proibido pelos censoressuecos e nunca foram feitas cópias no país; o filme só foi exibido no exterior, com inter-títulos em línguas estrangeiras.

Em conclusão, a coleção de filmes silenciosos estrangeiros do Acervo de Filmes deArquivo do Instituto Sueco de Cinema é, em parte, o resultado de trabalhos depreservação e restauração executados pelo arquivo e, em parte, resultado de umaativa política de aquisição, e como tal constitui forma parte integral e importante daevolução e do desenvolvimento das práticas históricas executadas pelo Arquivo. Elainclui tanto clássicos conhecidos como filmes menos famosos e até mesmo filmes delinha. É com satisfação que apresentamos exemplos dessa coleção na Jornada de SãoPaulo. Que a seleção lhes agrade!

Page 30: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 30/49

Nascida em uma família de classe operária, fezcerca de oitenta filmes em pouco mais de vinteanos de carreira. Cursou a Escola Real de Teatro,

em Copenhague, e trabalhou nos palcos dinamar-queses por uma década.De forte personalidade,ficou grávida aos 20anos; insistiu em ter acriança, recusando-se acasar com o pai de suafilha, apesar dos precon-ceitos sociais contramães solteiras. Em 1910,contra as opiniões deseus parceiros teatrais,estreou no cinema com

 ASTA NIELSEN11 setembro 1881, Copenhague, Dinamarca - 25 maio 1972, Copenhague, Dinamarca

59

O Abismo, realizado com Urban Gad, cenógrafode seu teatro e com quem se casou dois anosdepois. O filme fez um sucesso colossal e a lançoucomo uma das primeiras estrelas cinematográficasverdadeiramente internacionais. Suas apariçõespessoais provocavam tumultos na Europa e forado continente.

Logo após, Asta Nielsen e Urban Gad aceitaramum convite para trabalhar no cinema alemão e,entre 1911 e 1915, realizaram mais de trinta filmespara a produtora PAGU – Projektions-AG Union.Ela participava ativamente em diferentes aspectosda realização cinematográfica, como a escolha deelenco e locações, cenografia, figurino e publici-dade, e em 1920 criou sua própria companhiaprodutora, a Maxim-Film.

Nielsen era brilhante em papéis trágicos e cômicos;sua sensualidade igualava sua inteligência, seusrecursos dramáticos e sua agilidade física. Eraextraordinária na interpretação de personagens

não convencionais, que desafiam limitações sociaise sexuais. Ela expressava os conflitos íntimosde uma maneira inédita no cinema. Era direta,

natural e moderna. Com sua silhueta esbelta,acentuada por trajessugestivos – de farraposa vestidos extravagantes

 –, ela cruzava de formaconvincente, de um filmepara outro, as fronteirasde sexo e de classe.

Um dos filmes maisinteressantes de AstaNielsen foi Hamlet (Sven Gad e Heinz

Schall, 1921). Havia precedentes de grandesatrizes teatrais interpretando papéis masculinos

 – Eleanora Duse, por exemplo, fez isso váriasvezes. Mas Asta dá uma sutil reviravolta ao nãointerpretar um homem, mas sim uma mulherdisfarçada de homem, adicionando uma novacamada à complexidade dos sexos. Hamlet baseou-se menos em Shakespeare e mais num livro

popular da época, que propalava que Hamlet era,na verdade, uma moça criada como rapaz paragarantir um herdeiro ao trono da Dinamarca.

Asta Nielsen estrelou A Rua das lágrimas  /Die freudlose Gaße  ao lado de uma estrela emascensão cuja fama ultrapassaria a sua, Greta Garbo,que afirmava: “Ela me ensinou tudo que sei”.

Com a chegada do cinema sonoro, Asta Nielsenrealizou apenas um filme e, em meados da décadade 1930, voltou para a Dinamarca, embora ogoverno nazista quisesse, oferecendo-lhe facilidadesde produção, conservá-la como a maior joia de seu

O Abismo Afgrunden

Magda, professora de piano, encontra no bonde o jovem engenheiro Knud. Tão logo se acham comprometidos,

ele a convida para conhecer seus pais, que moram no campo. Magda conhece então Rudolph, principal atraçãode um espetáculo de circo; apaixona-se e foge com ele. Algum tempo depois, Knud localiza Magda na cidade,mas ela prefere continuar com Rudolph. Sentindo ciúme com as infidelidades do amante, Magda o provoca numsensual número de dança “gaúcha”. Uma briga provoca a demissão do casal do espetáculo de varidades; Magdapassa a tocar piano em cafés para mantê-los. Novamente Knud a descobre e tem com ela um encontro íntimo, que

é interrompido pela chegada de Rudolph. No confronto, Magda mata o amante.

Dinamarca, 1910, 35mm, preto-e-branco, 37min, 16qpscp: Kosmorama; p: Hjalmar Davidsen; d e r: Urban Gad; df : Alfred Lind; e: Asta Nielsen (Magda Vang), Robert Dinesen(Knud Svane), Poul Reumert (Rudolph Stern), Hans Neergaard, (Peder Svane, pastor, pai de Knud), Hulda Didrichsen (mãede Knud), Emilie Sannom (Lilly d’Estrelle, cantora do espetáculo de variedades), Oscar Stribolt (garçom), Johannes Fønss,

Arne Weel, Torben Meyer.Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

 A importância de Afgrunden reside sobretudo em seu tema, oretrato dos poderosos sentimentos de posse e submissão sexual, ena extraordinária atuação de Asta Nielsen e Poul Reumert, maisdo que em sua construção formal. (...) O que importa realmenteé a apresentação chocantemente realista do destino. Isso fica mais evidente do que nunca na famosa dança que Nielsen e Reument interpretam e que demonstra sem disfarceso que o restante do filme apenas insinua. Nesta dança, Asta Nielsen amarra Poul Reument com uma corda e, em seguida,dança ao redor dele, esfregando o corpo contra o do parceiro. Ocaráter erótico desse número fez do filme um grande sucesso e lhedeu a reputação de “quase pornográfico”.

Ron Mottram, The Danish cinema before Dreyer : Metuchen,N.J./Londres: Scarecrow Press, 1988.  Janet Bergstrom, Asta Nielsen’s early German Films, in  Prima di

Caligari .Cinema tedesco 1895-1920 / Before Caligari. German Cinema1895-1920. Pordenone. Bilioteca dell’Immagine, 1999.

O JardineiroTrädgårdsmästaren

Uma garota fica apaixonada pelo filho de seu patrão, um jardineiro dono de uma grande estufa de flores. O jardineiro manda o filho para longe, teoricamente pa ra dar fim a uma relação socialmente indesejável, mas, naverdade, para se aproveitar da moça. Como esta recusa as investidas do jardineiro, ela e seu velho pai são suma-riamente demitidos. A jovem conquista a proteção de um velho general rico mas, com a morte dele, é expulsa pelafamília e cai na vida mundana. Arrependida, volta a sua vila natal, mas as lembranças do passado terminarãopor destruí-la. O Jardineiro foi o primeiro filme de Sjöström, e nunca foi exibido nos cinemas suecos porque foiintegralmente proibido pela censura. O produtor conseguiu, na época, uma projeção especial para o primeiro-ministro sueco, mas isso de nada adiantou. Nenhuma cópia foi tirada na Suécia e, por isso, não sobreviveu – ouassim se pensava. Mas, obviamente, o filme fora exportado para alguns países. Estreou em Copenhague e foi maistarde exportado para os Estados Unidos. Em meados da década de 1970, uma cópia americana com intertítulosem inglês (com o nome Broken spring rose ) apareceu na Biblioteca do Cong resso. Não é uma obra preservadapela Cinemateca Sueca mas por um outro arquivo, daí sua presença fora da seleção sueca, e sua inclusão nesse

programa de filmes censurados.

Suécia, 1912, 35mm, preto-e-branco, 34min, 18qpscp: AB Svenska Biografteatern; d: Victor Sjöström; r: Mauritz Stiller; df: Julius Jaenzon; e: Victor Sjöström(o jardineiro), Gösta Ekman (o filho do jardineiro), Lili Bech (a moça), John Ekman (o general), Mauritz Stiller

(passageiro no barco), Gunnar Bohman, Karin AlexanderssonOrigem da cópia: Svenska Filminstitutet

 Afgrunden foi um sucesso explosivo, para a divertida surpresa detodos os envolvidos (apenas o diretor de fotografia tinha experiênciacinematográfica anterior) e marcou o início da carreira de Asta Nielsen como uma estrela realmente internacional. (...) Nielsenescreve em sua autobiografia que ela e Gad fizeram o filme parachamar a atenção dos empresários teatrais de Copenhague para ostalentos que estavam desperdiçando em papéis insignificantes. (...) A exaltada naturalidade da interpretação de Nielsen nesse períodoera resultado de um estudo cuidadoso. Ela escreve sobre comoaprendeu depressa a melhorar sua interpretação observando-se natela, onde tudo é ampliado. A persona natural que ela projetouao longo de uma série de personagens foi criada propositadamente para a câmera e para a tela.

Page 31: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 31/49

61

Filmando Ana BolenaBakomfilm Anna Boleyn

Trecho de cinejornal da UFA, filmado por ocasião da visita do presidente da República Alemã Friedrich Ebertaos estúdios da produtora, onde Ernst Lubitsch filma Ana Bolena. Emil Jannings e Henny Porten chegam de

automóvel para as filmagens.

Alemanha, 1920, 35mm, preto-e-branco com tingimento e viragem, 2min, 18qpscp: UFA Universum Film AG; e: Ernst Lubitsch, Emil Jannings, Henny Porten

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 2

 A Aurora de um amanhãThe Dawn of a tomorrow 

A história se passa na Inglaterra, e Mary Pickford interpreta Glad, “a mais pobre e feliz órfã de Londres”. Nodecorrer do filme, este anjo inspirado no mundo de Dickens abriga uma mãe e uma criança abandonadas,evita um suicídio, evita violências domésticas e impede que o namorado Dandy sucumba a uma vida de crimes.A beleza dos primeiros planos exibe uma extraordinária precisão expressiva e tornam esse filme de MaryPickford uma revelação. Essa obra era considerada perdida até que uma cópia nitrato tingida, versão exibida

na Suécia, foi identificada na Coleção de Filmes de Arquivo do Svenska Filministitutet, em 2005.A restauração foi completada em 2008.

O filme é uma adaptação de um romance e uma peça de Frances Hodgson Burnett, autora dos consagrados  Little Princess / ( A Princesinha) e Little Lord Fauntleroy / (O Pequeno lorde).

Estados Unidos, 1915, 35mm, preto-e-branco com tingimento e viragem, 67min, 17qpscp: Famous Players Film Company; p: Daniel Frohman; d: James Kirkwood; r: Eve Unsell baseado em romance e peçahomônima de Frances Hodgson Burnett; e: Mary Pickford (Glad), David Powell (Dandy), Forrest Robinson (sir Oliver

Holt), John Findlay (William, criado de sir Oliver), Robert Cain (Oliver, sobrinho de sir Oliver), Margaret Seddon (Polly),Blanche Craig (Bet), Ogden Childe

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

firmamento de estrelas. Voltou a trabalhar emteatro e, em 1946, publicou sua autobiografia, bemhumorada e repleta de sabedoria. Escreveu contos,artigos para jornais e revistas, e uma série radio-fônica sobre a arte de envelhecer. Desenvolveu

também um expressivo trabalho como artistaplástica, além de ter dirigido um filme sobre suaprópria carreira.

Segundo o poeta Guillaume Apollinaire, AstaNielsen era “o delírio do bêbado e o sonho dohomem solitário”.

“Baixem as cortinas diante dela”, escreveu certa vez Bela Balazs, depois de ver Asta Nielsen representar a morte de Hamlet, “baixem as cortinas, pois ela é única”.

 A geração de hoje não pode compreender o que suamáscara lívida, de olhos imensos e ardentes, significava para os anos 1910 e 20. Outras usaram aquela franja lisa e reta de cabelos negros; mas ninguémsenão ela – talvez também Louise Brooks – pareciainseparável daquela aparência estilizada. Uma épocahipercultivada, instável e sofisticada encontrara seuideal em Asta Nielsen, mulher intelectual, cheia derefinamentos, com rosto de pierrô lunar, pálpebras pesadas, mãos que pareciam conter feridas invisíveis,como as de Eleonora Duse. (...)

 Mas Asta Nielsen foi mais do que o ideal de uma geraçãoque cultivava o linear e o arabesco. (...) Sua humanidadequente, cheia de fôlego, de presença, refutava o abstrato,bem como o caráter abrupto da arte expressionista. (...)

 Nunca se rebaixava à afetação; quando travestida, nuncachocava. Podia representar de calças sem ambiguidade.

 Pois o erotismo de Asta Nielsen estava longe de todo equívoco;tratava-se sempre, para ela, de uma paixão autêntica.

Seu penteado em franja às vezes a levava a representarvamps , mas Nielsen não tinha qualquer frieza calculista.Sentia-se nela aquele fogo devorador que não vai apenasdestruir os homens, mas também a ela mesma. (...)

 Não se conseguiu esquematizar Asta Nielsen. E é justamente porque ela soube conservar sua maneira de ser,seu próprio rosto, que nunca foi contratada para filmarem Hollywood, onde não poderiam transformá-la.

 Nielsen é tipicamente nórdica, saída das lendas selvagensdo Edda, e mesmo tendo filmado muito pouco em seu país natal, a Dinamarca, permanece nos filmes alemãesuma figura à parte, não apenas porque os diretoresdinamarqueses Urban Gad e Sven Gad (...) dirigirama maioria de seus filmes: em torno dela persiste aquelaaura complexa quando filma com diretores alemães,como Pabst ou Bruno Rahn.

Lotte Eisner,  A tela demoníaca. Rio de Janeiro: Paze Terra, 1985.

Asta Nielsen está no elenco do filme A Rua das lágrimas / Die freudlose Gaße

Caricatura da dança gaúcha de O Abismo, feitapor Urban Gad, diretor do filme

Page 32: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 32/49

63

Uma Visita a Selma Lagerlöf Ett besök hos Selma Lagerlöf

Documentário com a escritora Selma Lagerlöf, autora de vários livros adaptados pelo cinema sueco e primeira mulher aganhar o prêmio Nobel de Literatura, em 1909. O filme mostra a casa em que mora numa vila tranquila. Em seguida,a escritora vai a uma cidade vizinha assistir o filme The Tower of lies / Castelos de ilusões, com Norma Shearere Lon Chaney, realizado por Victor Sjöström a partir de seu romance Keisarn av Portugallien. O filme não existe mais, mas

vemos Selma Lagerlöff examinar algumas imagens do filme, com rolo no colo, perto de uma janela.

Suécia, 1926, 35mm, cor, 6min, 20qpscp: Film AB Le Mat-Metro-Goldwyn; d: Raoul Le Mat

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 4

 A Carne e o diaboFlesh and the devil

Leo von Harden e Ulrich von Eltz são ligados desde criança por uma profunda amizade. Servem num colégiomilitar alemão e, em uma licença, Leo fica apaixonado por Felicitas, esposa de um poderoso conde. Num duelo,Leo mata o conde e, antes de partir para a África, pede a Ulrich que cuide de Felicitas. Ulrich, ignorante do amor

de Leo por Felicitas, apaixona-se e se casa com ela. Com a volta de Leo, Ulrich divide-se entre a amizade e o amorde Felicitas – que estimula a paixão de Leo. Acusado pelo pastor Voss de manter um caso amoroso com Felicitas,Leo perde o controle de suas emoções, tenta matá-la e duela com o amigo de toda sua vida.

O filme marcou um momento decisivo da carreira e da vida pessoal de Greta Garbo. A princípio, ela não queriatomar parte no filme. Ela havia concluído The Tempress / Terra de todos, estava cansada, e seu contratocom a Metro-Goldwyn-Mayer não lhe permitia fazer a longa viagem à Suécia que desejava. Uma carta dura daMGM a alertou sobre as sérias consequências que provocariam sua recusa em voltar ao trabalho. Na verdade,isso foi o ensaio da batalha que, após A Carne e o diabo, ela travou com os chefes do estúdio e que terminarampor fazer com que fosse uma das estrelas mais bem pagas de Hollywood na época. A química romântica entreGreta Garbo e John Gilbert foi o sonho de qualquer diretor, porque não era apenas interpretação. Segundoa lenda, Gilbert propôs casamento a Garbo durante a produção; ela aceitou, mas escapou no último minuto.O filme marcou o início de um dos mais famosos romances hollywoodianos de sua idade de ouro. Apesar doromance tórrido, Garbo e Gilbert não se casaram, mas continuaram a fazer filmes juntos até depois da chegadado cinema sonoro (embora a carreira de Gilbert tenha sofrido um sério abalo quando sua voz foi ouvida pelaprimeira vez). Garbo ficou muito impressionada com o trabalho de direção de Clarence Brown e com a fotografiade William Daniels, e exigiu continuar trabalhando com eles nos filmes seguintes na MGM. Acima de tudo, ela

elegeu Daniels como seu fotógrafo ideal.

Estados Unidos, 1926, 35mm, preto e branco, 113min, 20qpscp: Metro-Goldwyn-Mayer; p: Irving Thalberg; d: Clarence Brown; r: Benjamin Glazer baseado no romance  Es

war , de Hermann Sudermann; df : William Daniels; da: Cedric Gibbons e Fredric Hope; mo: Lloyd Nosler; e: JohnGilbert (Leo von Harden), Greta Garbo (Felicitas), Lars Hanson (Ulrich von Eltz), Barbara Kent (Hertha von Eltz),William Orlamond (tio Kutowski), George Fawcett (pastor Voss), Eugenie Besserer (mãe de Leo), Marc McDermott

(conde von Rhaden), Marcelle Corday (Minna)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

 A Rua das lágrimas

Die freudlose Gaße

Na Viena de 1921, parte dos habitantes da rua Melquior padece as horrendas consequências de uma profundainflação. Existem apenas duas pessoas ricas na rua: o açougueiro e a sra. Greifer, que dirige uma loja de roupas eum clube noturno frequentado pela classe abastada de Viena. Anexo ao clube, há um hotel de alta rotatividade,onde as moças pobres que o frequentam se prostituem para pagar a sra. Greifer e comprar comida para suasfamílias. A história segue as desventuras de duas mulheres: Maria, filha de um pai cruel e brutal, que sucumbe àsatrações da prostituição; e Greta, oriunda de uma família acostumada a melhores condições de vida, que resiste àtentação do dinheiro fácil. No final do filme, Elza, moça doente e empobrecida, assassina o açougueiro; e os pobres

da rua, ao escutar os sons vindos do clube noturno, iniciam uma revolta contra os ricos.

Nenhuma cópia da versão original deste fil me sobreviveu. Diversas ações da censura destruíram-no sistematicamen tena Alemanha, ao mesmo tempo em que as versões estrangeiras também sofreram cortes extensos e foram alteradas.Uma reconstrução inicial do filme foi empreendida por Enno Patalas, do Museu de Cinema de Munique, em1989, baseada em cópias de três versões estrangeiras distribuídas na Rússia, na Inglaterra e na França. Para oestabelecimento da ordem na versão que apresentamos, uma outra cópia francesa e uma americana também foramconsultadas, além de fragmentos da versão alemã recentemente descobertos. A ordem desta versão e os intertítulos

são baseados tanto no relatório de censura de 1926 como nas versões estrangeiras. Mas, mesmo esta reconstruçãoé, no máximo, apenas uma aproximação da versão original, sobretudo porque ainda faltam partes do filme que, deacordo com o roteiro e outros registros, chegaram a existir.

Alemanha, 1925, 35mm, preto-e-branco com tingimento e viragem, 149min, 19qpscp: Sofar-Film-Produktion; p: Michael Salkin e Romain Pinès; d: Georg Wilhelm Pabst; r: Willy Hass baseado no romance

homônimo de Hugo Bettauer; df : Guido Seeber, Curt Oertel e Walter Robert Lach; da: Hans Sohnle e Otto Erdmann;mo: Mark Sorkin; e: Asta Nielsen (Maria Lechner), Greta Garbo (Greta Rumfort), Werner Krauss (açougueiro), EinarHanson (tenente Davy), Jaro Fürth (Hofrat Rumfort), condessa Agnes Esterhazy (Regina), Karl Etlinger (Rosenow), Ilka

Grüning (sra. Rosenow), Henry Stuart (Egon Stirner), Robert Garrison (Canez), Valeska Gert (sra. Greifer), condessa Tolstoi(srta. Henriette), Alexander Murski (dr. Leid), Tamara Tolstoi (Lia Leid), Grigori Chmara (garçom), Hertha von Walther

(Elza), Max Kohlhase (sr. Lechner), Sylvia Torff (sra. Lechner), Loni Nest (Mariandl), Mario Cusmich (coronel Irving), EdnaMarkstein (sra. Merkl), Otto Reinwald (marido de Elza), M. Raskatoff (Trebisch), Krafft-Raschig (soldado)

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 3

Page 33: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 33/49

GRETA GARBO

Greta Lovisa Gustafsson era a filha mais novade uma família de operários suburbanos deEstocolmo. Em 1920 começou a trabalhar comobalconista da PUB, uma loja de departamentos.Em pouco tempo estava posando com chapéuspara o catálogo da loja e, em seguida, parapequenos filmes de propaganda da empresa. Em1922 interpretou um pequeno papel na comédiacurta Luffar-Petter  / [ Pedro, o vagabundo ](Erik A. Petschler) e ganhou uma bolsa paraestudar na Academia Real de Arte Dramática. Foi

na Academia que Mauritz Stiller a descobriu e deonde a tirou para estrelar Gösta Berlings saga / A Saga de Gösta Berling (1924). Em Berlim,sob a direção de G.W. Pabst, Greta coadjuva AstaNielsen em Die freudlose Gaße / A Rua daslágrimas. O sucesso de público e de crítica dasduas fitas solidificam a posição d e Greta – já com onome de Garbo – como uma das primeiras atrizesda Europa. Contratada pelo presidente da Metro-Goldwyn-Mayer, Louis B. Mayer, juntamente comMauritz Stiller, Greta chega a Hollywood, ondeestrelará, de 1926 a 1941, 25 longas-metragens,sempre para a MGM, produtora para a qualassegura grandes lucros. Aos 36 anos, consideradaum mito da arte cinematográfica, Greta Garboabandona o cinema.

Garbo sofria de depressão crônica e passou muitosanos tentando se livrar disso através da filosofiaoriental e de um regime alimentar saudável.Entretanto, nunca parou de fumar nem de beber.

Certa ocasião, Garbo declarou a uma revista

francesa: “Eu me sinto como uma criminosa que estásendo caçada. Quando os fotógrafos me cercam,eles atraem multidões. Eu fico amedrontada acimade meu controle com tanta gente me olhando. Mesinto quase envergonhada”.

“Eu nunca disse: ‘Eu quero ficar sozinha’. Eu disse:‘Eu quero que me deixem sozinha’. Há um mundode diferença entre as duas coisas”.

 No começo da primavera de 1925, Louis B. Mayera encontrou! Ao ver Greta Garbo no filme GöstaBerling  , em Berlim, ele sabia, tanto quanto queestava vivo, que tinha descoberto um símbolo sexualalém de sua imaginação – ou de qualquer outra.

18 setembro 1905, Estocolmo, Suécia - 15 abril 1990, Nova Iorque, Estados Unidos

O seu rosto tinha a beleza pura da Maria na Pietàde Michelangelo, e contudo brilhante de paixão. Osofrimento de sua alma era tão grande que o públicoamericano perdoaria os muitos casos amorosos deTorrent   / Laranjais em flor   [Monta Bell,1926], o primeiro filme de Garbo nos Estados Unidos. Finalmente, o casamento – o obstáculo que se inter- punha entre o sexo e o prazer – podia ser esquecido! Finalmente, achara-se a respos ta para as jovens atrizesque queriam representar apenas garotas boazinhas.

 No que diz respeito às estrelas femininas estabelecidas,era apenas uma questão de um ano ou dois antes queo poderoso apoio dos estúdios fosse retirado de todaselas. A coincidência temporal do advento dos filmes falados forneceu uma razão plausível para se dar ao público como desculpa pelo desaparecimento de muitas favoritas. Mas não havia uma atriz em Hollywood quenão compreendesse a verdadeira razão: Greta Garbo. Desde o momento em que Torrent  entrou em produção,nenhuma atriz contemporânea seria novamente felizconsigo mesma. Todo o estúdio MGM – incluindo Monta Bell, o diretor –, assistiu as tomadas diáriascom grande alegria ao perceber o quanto Garbo criava,a partir de um roteiro pobre e antiquado, a sombracomplexa e encantadora de uma alma na tela. E erauma sombra tão gigantesca que as pessoas não falavamsobre ela. Nas festas, duas ou três vezes por semana,eu encontrava Norma Shearer e Irving Thalberg, Hunt Stromberg, Paul Bern, Jack Conway e Clarence Brown, todos contratados da MGM. Se, por acaso, umdos homens era tão desumano a ponto de falar de um filme de Garbo, uma das g arotas diria “Sim, ela nãoé divina?”, e mudaria para um assunto que causasse

menos desespero.Louise Brooks, “Gish and Garbo”. Lulu in Hollywood .University of Minnesota Press, 2000.

Clarence Brown (diretor de A Carne e o diabo): A Carne e o diabo  foi meu primeiro filme paraa MGM, e ele realmente criou Garbo. Ele tambémalavancou o romance Garbo-Gilbert. Greta Garbo tinhaalgo que ninguém nunca tinha visto na tela. Ninguém. Eu não sei se ela sabia que tinha isso, mas ela tinha. Eeu posso explicar isso em poucas palavras.

 Eu fazia uma cena com Garbo – muito bem. Eu faziatrês ou quatro tomadas. Estava muito bom, mas eu

65

A Rua das lágrimas

Page 34: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 34/49

67

   V   I   S   I   T   A   A   O   A   C   E   R   V   O  –   C   I   N   E   M   A   T   E   C   A   S   U

   E   C   A

A Mulher divina

nunca ficava plenamente satisfeito. Quando eu via amesma cena na tela, entretanto, ela tinha alguma coisaque não tinha no set.

Garbo tinha algo atrás dos olhos que você não podiaver, a não ser que a fotografasse em primeiro plano.Você podia ver o pensamento. Se ela precisava olhar para uma pessoa com ciúme e para outra com amor, elanão precisava mudar de expressão. Você podia ver issoem seus olhos quando ela olhava de uma para outra. E ninguém mais podia fazer isso na tela. Garbo faziaisso sem nenhum domínio do inglês.

 Para mim, Garbo começa onde todos terminam. Elaera uma pessoa tímida, sua carência de inglês provo-cava nela um ligeiro complexo de inferioridade. Eucostumava dirigi-la com muita calma. Eu nunca aorientava falando alto, mas sempre num sussurro. Ninguém no set sabia o que eu havia d ito a ela, e ela

 gostava disso. Ela odiava ensaiar. Preferia ficar longeaté que todos tivessem ensaiado; então ela entrava e fazia a cena.Kevin Brownlow, The Parade’s gone by... Universityof California Press, 1997.

 Às 9 horas, o trabalho podia começar. “Digam àsenhorita Garbo que estamos prontos”, dizia o diretor.“Eu estou aqui”, respondia uma voz grave, e elaaparecia, perfeitamente vestida e penteada como a cena pedia. Ninguém poderia dizer por que p orta ela haviaentrado, mas ela estava lá. E às 18 horas, mesmo quea tomada pudesse ser concluída em cinco minutos, elaapontava para o relógio e ia embora, com um sorrisode desculpas. Ela era muito rigorosa consigo mesmae dificilmente ficava satisfeita com seu trabalho. Elanunca assistia copiões nem ia aos lançamentos, mas,alguns dias depois, num começo de tarde, entravasozinha em algum cinema de bairro, sentava num lugardiscreto e saía apenas quando a projeção terminava,escondida atrás de seus óculos escuros.

 Jacques Feyder, que dirigiu Greta Garbo em TheKiss /O Beijo (1929) e na versão alemã de AnnaChristie  (1931). A versão em inglês foi dirigidapor Clarence Brown em 1930 e foi o primeirofilme em que Garbo falou.

Os 27 filmes de Greta Garbo

Carlos Drummond de Andrade

27, tem certeza? Não importa. Para mim são 24. Lembro-me bem.Conto um por um, de 1926 

a 1941, de vida contínua. De minha vida. De The Torrent a Two-faced woman. Entre os dois, um abismoonde aprisionei, para meu gozo, Greta Garbo.Ou ela me aprisionou? Será que não houve nada disso?  Alucinação, apenas? O tempo é imperscrutável. São tudo visões.Greta Garbo, somente uma visão, e eu sou outra. Neste sentido nos confundimos,realizamos a unidade da miragem. É assim que ela perdurano passado irretratável e continua no presente,esfinge andrógina que ri e não se deixa decifrar.(...) Dela quiseram fazer uma ninfa obediente,autômato de impulsos programados. Foram vencidos.

(...)Que é a realidade do real ou da ficção? Que é personagem de uma históriamostrada no escuro, sempre variável,sempre hipótese,na caleidoscópica identidade da intérprete? 

Como posso acreditar em Greta Garbonas peles que elegeusem nunca se oferecer de todo para mim, para ninguém?  Enganou-me todo o tempo. Não era mitocomo eu pedia. Escorregando entre os dedosque tentavam fixá-la, Marguerite Gauthier, Lillie Sterling,Susan Lenox, Rita Cavallini, Arden Stuart, Marie Walewska, água, água, múrmura águadeslizante,máscaras tapando a grande máscara para sempre invisível. A vera Greta Garbo não fez os filmesque lhe atribui minha saudade.Tudo se passou em pensamento. Mentem os livros, mentem os arquivosda ex-poderosa Metro Goldwin Mayer.

 Agora estou sozinho com a memóriade que um dia, não importa em sonho,imaginei, maquinei, vesti, amei Greta Garbo. E esse dia durou 15 anos. E nada se passou além do sonhodiante do qual, em torno ao qual, silencioso, fatalizado, fui apenas voyeur.

Greta Garbo é atriz de A Rua das lágrimas / Die freudlose Gaße, A Mulherdivina / The Divine woman e A Carne e o diabo / Flesh and the devil

Page 35: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 35/49

Lars Hanson está no elenco dos filmes A Herança de Ingmar / Ingmarsarvert,A Mulher divina / The Divine woman e A Carne e o diabo/ Flesh and the devil

69

LARS HANSON

Dotado desde a adolescência de grande talento,Lars Hanson estudou arte dramática em Estocolmoe em Helsinque, na Finlândia, tornando-se um atorshakespeariano de grande popularidade. Estreouno cinema em 1915, pelas mãos de Mauritz Stiller,diretor com quem continuou trabalhando ao longodos anos. Foi com Stiller que se consagrou emdois filmes notáveis, Erotikon (1920) – estreladotambém por Karen Molander, com quem Larsse casaria dois anos depois – e Gösta Berlings

saga / A Saga de Gösta Berling  (1924), quechamaria a atenção de Hollywood para uma atrizcoadjuvante: Greta Garbo.

Com o rosto de traços delicados e mãos que pareciamesculpidas em porcelana, Lars encarnava o arqué-tipo do sueco suave de seu tempo. A pedido da atrizamericana Lillian Gish, Hanson foi para Hollywoodem 1926, para contracenar com ela no filme TheScarlet letter / A Letra escarlate, sob a direçãode Victor Sjöström. A química entre os dois prota-gonistas transformou o filme em uma das grandesreferências de romance no cinema da época.

26 julho 1886, Göteborg, Suécia - 8 abril 1965, Estocolmo, Suécia

Atuou em diversos filmes americanos como Fleshand the devil / A Carne e o diabo, CaptainSalvation  / O Jovem redentor  (John S.Robertson, 1927), Buttons / Meu comandante (George W. Hill, 1927) e, em 1928, voltou atrabalhar com a amiga Lillian Gish em TheWind / Vento e areia, também sob a direção deSjöström. A sequência da noite de casamento destefilme demonstra o talento excepcional de seusatores e é considerada por muitos uma das mais

belas interpretações do cinema silencioso.

Com o advento do cinema falado, Hanson retornouà Suécia. Seu sotaque era carregado demais para opúblico americano. Participou de diversos espetá-culos teatrais em toda a Europa e ganhou umainfinidade de prêmios, entre eles o Eugene O’Neil,até hoje considerado o mais importante prêmio doteatro sueco.

Foi casado com Karin Molander até 1965, quandofaleceu, aos 78 anos. Permanece como um dos maisinfluentes atores suecos de todos os tempos.

Vento e areia. Lars Hanson, Lilian Gish e William Orlmond (da esquerda para direita)

 A Mulher divinaThe Divine woman

A jovem inglesa Mariana, abandonada pelos pais pobres, quer ser atriz e se muda para Paris. Apaixona-se porLuciano, desertor do Exército. Para provar seu amor por Mariana, o rapaz rouba um vestido e é preso.

A Mulher divina, dirigido por Victor Sjöström, em Hollywood, e coadjuvado pelo também sueco Lars Hanson,é o único filme desaparecido de Greta Garbo. O fragmento existente (10 minutos dos 81 originais), e o que apre-sentamos nesta Jornada foi identificado na Gosfilmofond / Cinemateca Russa, em 1990. Nele, numa graciosa cenade despedida interpretada por Garbo e Hanson, a atriz aparece relaxada e risonha, desmentindo a lenda de que

só riria em Ninotchka (1939), seu penúltimo filme.

Estados Unidos, 1928, 35mm, preto-e-branco, 10min, 22qpscp: Metro-Goldwyn-Mayer; p: Irving Thalberg; d: Victor Seastrom (Sjöström); r: Dorothy Farnum; df : Oliver T. Marsh;

mo: Conrad A. Nervig; e: Greta Garbo (Mariana), Lars Hanson (Luciano), Lowell Sherman, Polly Moran, DorothyCumming, John Mack Brown, Cesare Gravina 

Origem da cópia: Svenkska Filminstitutet

PROGRAMA 5

 Vento e areiaThe Wind

Letty muda-se para o oeste do Texas para morar no rancho de seu primo Beverly. Em sua viagem, ela fica inco-modada com o vento incessante. Roddy nota isso e a amedronta dizendo que habitualmente o vento enlouqueceas mulheres. Lige, vizinho de Beverly, apanha Letty na estação de trem. Depois de quilômetros de vento e areia,chegam ao rancho onde Cora, esposa de Beverly, imediatamente manifesta seu ciúme em relação ao marido e aosfilhos, que demonstram seu carinho por Letty. Cora afinal pede que Letty deixe o rancho e, sem alternativas, a moçaaceita uma proposta de casamento de Lige. Mas Letty sente profundo desprezo pelo marido que, ofendido, jura quenunca a tocará. Um dia, Lige parte para reunir-se a outros vaqueiros. Letty, muito transtornada pelo vento, pedeque o marido a leve junto, mas Lige recusa-se. Mesmo assim, ela tenta segui-lo, mas volta para casa, ferida numatempestade de areia. Roddy chega ao rancho machucado e Letty cuida dele, que tenta se aproveitar dela. Lige chegae, pela primeira vez, ficando contente ao vê-lo, se beijam. Lige parte novamente e, durante uma nova tempestade deareia, Letty enlouquece. Roddy a salva e tenta estuprá-la, mas Letty o mata. Ela tenta enterrar o corpo, mas o ventoa impede e ela novamente perde a razão. Lige volta, ela confessa seu crime e ele compreende como o vento a afetou.

Quer levá-la para longe do rancho, mas Letty declara que nunca o abandonará.

Trabalhar em Vento e areia foi uma das minhas piores experiências em cinema. A areia era atirada sobre mim por oito motores deaeroplanos, e potes de enxofre também foram usados para produzir o efeito de tempestades de areia. Eu ficava queimada e corria orisco de perder os olhos. Meus cabelos eram queimados pelo sol forte e quase arruinados pela fumaça de enxofre e pela areia.

Quando vimos o filme na tela, inclusive Irving Talberg, pensamos que era o melhor filme que já havíamos feito. Mas os meses se passavam, e o filme não era lançado. Escutei rumores de que o filme estava sendo remontado. Fui chamada de volta ao estúdioe Irving explicou que oito dos maiores exibidores do país haviam visto Vento e areia e insistiam que o final fosse mudado. Emvez do desaparecimento da heroína na tempestade, ela e o herói deveriam se reconciliar num final feliz. Ficamos com o coração

 partido, mas fizemos o que eles queriam.Lillian Gish. The Movies, “Mr. Griffith and Me”, de Lillian Gish e Ann Pinchot . Prentice-Hall, Inc., 1969.

Louise Brooks sobre Lillian Gish e Greta Garbo Parece fatal lembrar que, depois que Lillian Gish assistiu uma projeção de Gösta Berling, declarou que tinha fé em L. B. Mayer porque ele trouxera Greta Garbo para Hollywood. Ela não poderia adivin har que esse e vento tornaria obsoletosos papéis à la Gish tão rapidamente quanto o estúdio pudesse terminar com seu contrato. Antes do início da produçãode Torrent, o estúdio deixou Garbo meio solta, tirando fotografias para publicidade, e ela pode testemunhar Lillian Gishtrabalhando em La Bohème [King Vidor, 1926]. Ao assistir a única estrela americana cuja integridade, dedicaçãoe força de vontade elevavam sua interpretação aos padrões de disciplina e excelência que Garbo aprendera na Europa,ela percebeu que a atriz impotente, triturada durante horas de indecisão, imprevisibilidade e falta de resoluções não eranecessariamente a lei da produção cinematográfica americana. Em maio de 1926, a revista Photoplay publicou uma

 frase de Garbo “Serei feliz quando me tor nar uma estrela tão grande como Lilli an Gish. Então, não precisarei mais de publicidade nem tirar fotografias apertando a mão de boxeadores campeões”.

Louise Brooks, “Gish and Garbo”. Lulu in Hollywood . University of Minnesota Press, 2000.

Estados Unidos, 1928, 35mm, preto-e-branco, sonoro, 72min, 24qpscp: Metro-Goldwyn-Mayer; d: Victor Seastrom (Sjöström); r: Frances Marion, baseado no romance homônimo de Dorothy

Scarborough; df : John Arnold; da: Cedric Gibbons e Edward Withers; mo: Conrad A. Nervig; mor: William Axt;e: Lillian Gish (Letty), Lars Hanson (Lige), Montagu Love (Roddy), Dorothy Cumming (Cora), Edward Earle (Beverly),

William Orlamond (Sourdough), Carmencita Johnson, Leon Janney e Billy Kent Schaefer (filhos de Cora)Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

Page 36: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 36/49

71

Vento e areia

Page 37: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 37/49

73Rua Meschanskaia 13 / Sofá e camaTretia Meschanskaia

Um casal, Liudmila e Kolia, mora num pequeno apartamento em Moscou. Volodia, um amigo de Kolia, chegaà cidade e não consegue encontrar moradia. Kolia convida Volodia para ficar em seu apartamento e dormir nosofá. Quando Kolia viaja a negócios, Liudmila e Volodia apaixonam-se e têm um caso. Furioso a princípio, Koliaacalma-se, muda-se para o sofá e os três passam a morar juntos até o momento que Liudmila revela sua gravidez.

Os dois homens tentam decidir o que fazer, mas é Liudmila quem toma suas próprias decisões.

 Moscou tem carência de moradias,como Londres, Berlim, Paris e qualquer outra cidade, pequena ou grande. Em Moscou,a superpopulação gera certos males sociais, os mesmos males soci ais gerados em Londres, Berlim e Paris. A superpopulaçãoconstrange o ser humano em sua luta por independência, liberdade e saúde. Abram Room, que é um bom psicólogo, entendeo problema e se decide a expô-lo e enfrentá-lo. Ele sabe que ao fazer isso ele tem o apoio do governo soviéti co. Na Inglaterra,

onde existe uma carência de cerca de um milhão de moradias, os diretores de cinema não fazem esse tipo de coisa.

Sofá e cama mostra o que acontece quando duas pessoas vivem apertadas em um cômodo, e mostra o que acontecequando as duas aumentam para três. Room expõe seu assunto; nós sabemos o que vai acontecer, e esperamos que aconteça.

 Mas ficamos profundamen te interessados pela maneira que o d iretor usa para retratar pictoricament e o estad o mental eas reações psicológicas desses três. Tudo se encaminha para uma crise, um rompimento, mas Liudmila toma a decisão, a

única possível: rompe com tudo e parte para começar uma nova vida.

 A mulher é igual ao homem. A mulher precisa ser livre, independente. As velhas tradições morais da superioridademasculina estão erradas. A superpopulação precisa ser abolida, diz Room, em busca de uma nova vida, uma vida livre,

baseada na completa igualdade social. A.W., Close Up (Suíça), maio 1929

União Soviética, 1927, 35mm, preto-e-branco, 86min, 20qpscp: Sovkino; d: Abram Room; r: Viktor Shklovsky e Abram Room; df : Gregori Giber; da: Vasili Rakhals e Sergei Yutkevich;

e: Lyudmila Semyonova (Liudmila), Nikolai Batalov (Kolia), Vladimir Fogel (Volodia), Leonid Yurenyov (porteiro),Yelena Sokolova (enfermeira)

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 6

Chegada do rei do Sião a LogårdstrappanKonungens af Siam landstigning vid Logårdstrappan

Suécia, 1897, 35mm, preto-e-branco, 1min, 18qpsd e df : Ernest Florman; e: Chulalongkorn, rei do Sião; Oscar II, rei da Suécia

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

PROGRAMA 7

Cenas da vida do rei Oscar IIEn bildserie ur Konung Oscar:s lif 

Cortejo de cavalaria; Oscar II despede-se de Frederico VIII num barco; bandeira da Suécia colorida à mão.

Suécia, 1907, 35mm, preto-e-branco e cor, 3min, 16qpscp: Nya London; d e df : Ernest Florman; e: Oscar II, rei da Suécia; Frederico VIII, rei da Dinamarca

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

 Viagem às ruínas de Angkor Voyage aux ruines d’Angkor

O filme acompanha um grupo de turistas que chega a Saigon, no Vietnã, e sobe o rio Mekong. Vista das margense das vilas ribeirinhas. Chegada à capital do Camboja e viagem em carros de boi até o conjunto das ruínas de

Angkor. Diversas vistas das ruínas.

França, 1908 (?), 35mm, preto-e-branco, 25min, 18qpsd: Monseigneur le Duc de Montpensier

Origem da cópia: Svenska Filminstitutet

Na terra dos Moïs: exploração e caça Au pays des Moïs: exploration et chasse

Um grupo de turistas vai de Saigon à terra dos Moïs, inicialmente de automóvel e depois a cavalo. Detalhes daviagem. Ao encontrarem um acampamento da tribo Chô Mas, os exploradores acompanham a caçada de umbúfalo. Maneiras dos Chô Mas fazerem fogo. Refeição. Ritos executados pelas sacerdotisas. Pormenores da caçada

durante a qual os exploradores matam alguns búfalos.

França, 190?, 35mm, preto-e-branco, 25min, 18qpsOrigem da cópia: Svenska Filminstitutet

Page 38: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 38/49

Destaques de Pordenone

Quadra de Ases Americanos Aposta (sem blefe) de Pordenone

Paolo Cherchi UsaiPesquisador, historiador, presidente da Fundação Haghefilm, membro do conselho diretor dasGiornate del Cinema Muto de Pordenone, Itália

Se vocês acompanharam esta seção desde o início – quer dizer, desde a segunda

edição da Jornada –, notaram que as Giornate del Cinema Muto di Pordenone (ofestival italiano “gêmeo” da Jornada, prestes a completar seus trinta anos) até agorasugeriram a nossos amigos da Cinemateca Brasileira um programa “internacional”de obras-primas, convencido que estamos de que o grande cinema não conhecefronteiras geográficas. Façamos desta vez uma exceção, propondo uma quadra deases, todos americanos. Uma outra exceção se deve ao fato de que três das quatro joiasque verão este ano são comédias. Todas comédias de alta classe.

Não tenham medo: o cardápio será adaptado a todos os gostos. Se acreditavam queas grandes divas do cinema silencioso fossem estupendas apenas em assuntos dramá-ticos, Glória Swanson os fará mudar de ideia com Stage struck / Este mundo éum teatro  (Allan Dwan, 1925), uma subversiva homenagem à tradição do teatroambulante, com sequências coloridas de tirar o fôlego. Se gostam de absurdo e desurreal, When the clouds roll by / O Supersticioso (1919) é feito para vocês.Muito antes que Victor Fleming se tornasse um “clássico” da epopeia sulista comGone with the wind / E o vento levou... (1939), seus princípios haviam-novisto adotar um tom muito mais despreocupado: mérito naturalmente de DouglasFairbanks, aqui em grande forma nas vestes de um enamorado supersticioso. Mas omérito é também de uma desenfreada imaginação visual que encontra seu ápice nasequência dedicada a um estupefaciente balé de hortaliças no estômago do protago-nista (não podemos dizer-lhes mais: é ver para crer).

Se, em vez disso, estão com disposição para descobertas, prometo que não ficarãofrustrados com Griffith. Não, não estou falando de D.W. Griffith, diretor de gênio

 – mas francamente pouco dotado na arte de fazer rir. Refiro-me a Raymond Griffith,uma das grandes “descobertas” na história de Pordenone, verdadeiramente umprecursor da “comédia impassível” (deadpan comedy );. Hands up! / Mãos ao alto! (Clarence Badger, 1926) é uma de suas obras mais inspiradas, uma deliciosa investidano gênero do faroeste, com um toque de ironia no que se refere aos mórmons). Nósde Pordenone não temos dúvida: Raymond Griffith deveria ser colocado ao lado deChaplin, Keaton e Harold Lloyd.

E se, afinal, quiserem tocar com as mãos o nível de perfeição alcançado pelo cinemacom apenas vinte anos de seu nascimento, permitam-se uma pausa nas comédiascom Regeneration  / Regeneração  (1915) e observem as coisas que sabia fazer

o jovem Raoul Walsh, ex-assistente de Griffith (D.W.). The Birth of a nation / ONascimento de uma nação havia sido produzido apenas um ano antes, e Walsh

 já anunciava um tipo cinema que estaria na moda em época muito posterior com aapoteose do film noir . Regeneration não é apenas uma lição de estilo, nem apenasuma incendiária reportagem sobre a criminalidade americana: é também um exemplobrilhante de realismo social (o filme foi rodado sobretudo em locações) e de sobrie-dade expressiva. Hollywood não inventou nada em seus anos de ouro: tudo já pode serencontrado em Regeneration e em seu admirável sentido de economia expressiva.

 Já que falamos de “clássicos”, deixem-me aproveitar a ocasião para explicar umpouco mais detalhadamente a “filosofia” sobre a qual se apoia a seleção anual paraa Jornada. Pordenone deu início no ano passado a uma nova seção sob o título “Ilcanone rivisitato” [O cânone revisitado], dedicado à revisão dos grandes filmes quetraçaram o percurso da história do cinema durante seus silenciosos princípios. Mas oque é o “cânone”? É fácil demais responder dizendo que o termo compreende filmesreconhecidos por todos como monumentos indiscutíveis das imagens em movimento.A questão é muito mais complicada, mas é legítimo começar por admitir que umfilme “canônico” é antes de tudo um filme que merece ser encontrado muitas vezes,quer dizer, ser visto e revisto sem medo de cansaço. É uma constatação óbvia que, nocontexto de um festival de cinema, todavia merece algum aprofundamento. Por que ocânone no cinema silencioso é tratado como tal, e como se tornou um cânone? Quem

ratificou sua posição de absoluta proeminência na historiografia do cinema,e combase em quais critérios? Os nossos predecessores fizeram uma escolha justa ou equivo-cada? Quais circunstâncias culturais orientaram sua seleção das “obras-primas” parao primeiro panteão do cinema? E se acreditamos que nossos antepassados erraram,como demonstrar que a razão está conosco?

Em suma, há uma razoável quantidade de motivos para revisitar os cânones do cinemasilencioso. O mais importante é que hoje podemos revê-los com mais confiança emnossos recursos, agora que temos à disposição um atlas menos vago de um mundofascinante e com muitos mapas ainda desconhecidos. A estratégia proposta porPordenone a nossos companheiros da Jornada é essa mesma: rever com olhos novosaquilo que acreditávamos já conhecer; rever não como um ato de nostalgia no que dizrespeito às certezas que perdemos, mas como o início de um diálogo com os especta-dores e com a novidade de seu olhar. Temos muito que aprender com vocês.

75

Page 39: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 39/49

O Supersticioso When The Clouds Roll By

O rico e amável Daniel Boone Brown é vítima das experiências psicológicas de UlrichMetz, um cientista louco que decidiu transformá-lo numa espécie de cão pavloviano. Saúdedebilitada, sono inquieto, indisposição nervosa e irritável, atraso no trabalho e superstiçõesque preocupam e atemorizam, tudo faz parte das maquinações de Metz para enlouquecerDaniel. Alimentado pelo mordomo a serviço de Metz, Daniel tem um terrível pesadelo emque os componentes da refeição transformam-se em demônios que o atormentam. O jovemliteralmente sobe pelas paredes e enfrenta uma inundação colossal. Os experimentos de Metz

levarão Daniel ao suicídio?

Estados Unidos, 1919, 35mm, preto-e-branco, 86min, 19qpscp: Douglas Fairbanks Pictures; p: Douglas Fairbanks,d: Victor Fleming; r: Thomas J. Geraghty;df : William C. McGann e Harris Thorpe; e: Douglas Fairbanks (Daniel Boone Brown), Kathleen

Clifford (Lucette Bancroft), Frank Campeau (Mark Drake), Ralph Lewis (Curtis Brown), Daisy Jefferson (Bobby De Vere), Bull Montana (Pesadelo), Herbert Grimwood (dr. Ulrich Metz), AlbertMacQuarrie (Hobson), Victor Fleming, Thomas J. Geraghty, William C. McGann, Harris Thorpe

Origem da cópia: MoMA – The Museum of Modern Art / Film Preservation Center

Douglas Fairbanks fora levado de Nova Iorque para Hollywood em meados dadécada de 1910 numa tentativa de fazer com que artistas da Broadway carreassemprestígio para as produções cinematográficas. Mas era um ator de poucos recursose de sucesso secundário e, durante algum tempo, foi pouco aproveitado. Começou aganhar crescente prestígio quando a roteirista Anita Loos e seu marido, o diretor JohnEmerson, iniciaram a realização de comédias modernas em que o herói, descontentecom a vida normal, ou com sua relação com a namorada, lançava-se em aventurasacrobáticas. Sobre esse período, escreveu Anita Loos:

 Em deferência ao ídolo d e Doug, T heodore Roosevelt, a ação s empre deveria estar de acordo

com “a vida enérgica”, e meus heróis sempre tinham de estar em movimento. Às vezes eutentava uma cena de amor que necessitava que Doug se acalmasse e fosse sentimental poralguns momentos, mas ele, em geral, interrompia dizendo com uma careta: “Eu não possointerpretar isso, Nita! Eu não sou ator!”. Assim, as minhas mais sedutoras cenas de amortinham de ser interrompidas com uma ação abrupta e muitas vezes inesperada de Dougsaltando para o lustre ou nadando rio acima por uma cachoeira. Doug era tão corajoso que,não importando o risco, nunca permitia que um dublê o substituísse. Numa ocasião apenas ele foi covarde na f rente de todos nós. Foi durante uma cena em que meu herói preci sava estourarum pneu de automóvel com um alfinete de chapéu. John Emerson rodou a cena diversas vezes,mas Doug estragava o plano no momento de enfiar o alfinete no pneu. Afinal, ele desistiu econfessou: “Eu não consigo fazer isso. Estou com medo”. Todos pensamos que Doug estavabrincando, mas ele realmente estava com medo que o pneu estourasse e ele ficasse cego, e Johnteve de que usar o primeiro e último dublê de que Doug precisou.Anita Loos. A girl like I . Ballantine Books, 1975.

Esta comédia surreal – primeiro filme dirigido por Victor Fleming – foi a segundaprodução de Douglas Fairbanks para a United Artists, criada em 1919 por ele, D.W.Griffith, Charles Chaplin e Mary Pickford – com quem Douglas se casaria no anoseguinte, realizando o ideal de casamento do maior herói do cinema americanocom a Namorada da América. (Mary Pickford comparece à IV Jornada Brasileirade Cinema Silencioso com o filme A Aurora de um amanhã, na seção Visita aoAcervo de Filmes de Arquivo do Instituto Sueco de Cinema).

A partir de 1920, Fairbanks modificaria radicalmente a orientação de sua carreira,dedicando-se à produção e interpretação de heróis de filmes de aventuras comambientação histórica, começando por The Mark of Zorro / A Marca do Zorro (Fred Niblo).

RegeneraçãoRegeneration

Owen cresce nos cortiços novaiorquinos e se transforma em líder de um bando que passaa maior parte do tempo bebendo, jogando e praticando pequenos furtos. Paralelamente,a jovem Marie Deering abandona a vida da alta sociedade e estabelece uma casa missio-nária na zona de criminalidade da cidade. Quando encontra Marie, que toma a seu encargoensiná-lo a ler e escrever, Owen percebe que andara até ali pelo lado errado da vida e dá oprimeiro passo no caminho da regeneração. A história se complica, contudo, pelo fato de opior inimigo de Owen, o promotor Armes, paladino contra o crime na cidade, também estar

apaixonado por Marie.

Estados Unidos, 1915, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, 64min, 18qpscp: Fox Film Corporation; d: Raoul Walsh;r: Raoul Walsh, baseado na autobiografia My Mamie

 Rose, de Owen Frawley Kildare;df : Georges Benoît; e: John McCann (Owen Conway aos 10 anos), James A. Marcus (Jim Conway), Maggie Weston (Maggie Conway), H. McCoy (Owen Conway aos

17 anos), Rockliffe Fellowes (Owen Conway aos 25 anos), Anna Q. Nilsson (Marie “Mamie Rose”Deering), William Sheer (Skinny), Carl Harbaugh (promotor Ames)

Origem da cópia: MoMA – The Museum of Modern Art / Film Preservation Center

Aos 28 anos, e após haver realizado uma dezena de curtas-metragens, Raoul Walshacabara de sair de The Birth of a nation / O Nascimento de uma nação (1915),no qual foi um dos assistentes de D.W. Griffith e interpretou o papel de John WilkesBooth (o assassino de Abraham Lincoln). Em sua autobiografia, Walsh credita Griffithpor havê-lo ensinado tudo sobre a realização cinematográfica de ficção, mas tambémsobre as técnicas de produção que o auxiliariam a tirar proveito das locações novaior-quinas que utilizou em Regeneração.

Além de seu enredo violento e do status de primeiro longa-metragem de Raul Walsh,Regeneração deve sua importância a ser igualmente o primeiro longa-metragemque fala do ambiente da marginalidade e dos  gangsters, na mesma linha de TheMusketeers of Pig Alley (1912), de D.W. Griffith, curta-metragem sobre o ambientecriminal. Baseado na autobiografia de Owen Kildare (afastado da criminalidade e doanalfabetismo por uma professora), que se dedicou ao jornalismo, Regeneração nãosegue o mesmo caminho de seu mestre, que utiliza um estilo entre romantismo erealismo. Walsh prefere a linha do verismo: a grande maioria dos “atores” interpretaseus próprios papéis, o que dá ao filme um ar quase documental muito perturbador.A miséria parece transpirar dos fotogramas que descrevem as ruas, os bares e asmoradias, de onde emana uma miséria que é descrita como o berço da criminali-dade. Walsh, contrariamente a alguns de seus sucessores, não trabalha sobre o aspectoromântico ou misterioso do personagem e de seu meio, nem procura transformá-loem ícone ou herói. Owen é um maldoso gentil (ou o inverso), um personagem inteiro

que prefigura bastante as grandes figuras picarescas que atravessarão a carreira dogrande cineasta americano, fascinantes justamente por seu realismo e sua verossimi-lhança. A própria professora é uma matriz dos personagens femininos que nos filmesde Walsh têm sempre um lugar importante.

O que espanta em Regeneração é sua complexidade narrativa, pois, além de ser umapintura realista dos bairros pobres de Nova Iorque, o enredo é também um pequenoafresco que descreve a trajetória do jovem  gangster . O filme – com uma espantosaeconomia no uso de intertítulos – emprega um número grande de personagens secun-dários que, embora não sejam atores, têm consistência e se encaixam na narrativa eem seus esquemas dramáticos ou simbólicos. O cinema tinha pouco mais de vinteanos, e é impressionante constatar que Raoul Walsh, digno aluno de D.W. Griffith,utiliza uma linguagem plenamente adulta, sóbria, enérgica e, em alguns momentos,lírica. A câmera (em geral fixa) executa alguns movimentos muito bonitos, semnenhuma gratuidade. O conjunto é conduzido pelo senso rítmico típico do cinemade Raoul Walsh.

77

Page 40: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 40/49

79

multidões e cinegrafistas que a cidade tinha visto. A procissão triunfal pela capital do cinema parecia ter sido coproduzida por Cecil B. DeMille e Erich von Stroheim.

 Meu primeiro encontro com Gloria Swanson foi inteir amente fora de contexto. Ela estava em Rochester divulgando sua linha de vestidos “Forever Young”, e passeando por grandes lojas dedepartamento. Como eu era conhecido como alguém do cinema, fui convidado pela adminis-tração das lojas para cuidar de um almoço em sua homenagem. Gloria começou a fazer filmesem 1915, quando era uma adolescente em Chicago. Quando a conheci, em 1952, Gloria eraagradável, calma e uma mulher sexy que aparentava ter de vinte e oito a trinta e três anos. Poranos e anos, ela teve de participar de encontros com senhoras de cabelos brancos que diziam:“Oh, senhorita Swanson, a senhorita era minha estrela favorita quando eu era garotinha”. Eu tinha senso suficiente para não dizer a ela que via seus filmes desde que era pequeno. Noalmoço, tiraram nossa fotografia juntos. Gloria está colocando um cravo na minha lapela. Elaestá com um sorriso e um fogo no olhar que poderia incendiar um arquivo todo com filmes denitrato. Eu estou ali olhando como um bobo, pronto para ser preparado por um martelo paraum bife assado.

 James Card. Seductive Cinema. University of Minnesota Press, 1999.

Este mundo é um teatroStage Struck

 Jenny, garçonete de um modesto restaurante à beira do rio Ohio, sonha em ser atriz econquistar o coração de Orme, seu companheiro de trabalho, que opera com destreza a

chapa de fazer panquecas. Para viabilizar seus sonhos, Jenny faz, em segredo e por correspon-dência, um curso de interp retação. Orme, por sua vez, é fascinado por atrizes, não importa deque tamanho ou formato, e as paredes de seu quarto são forradas de fotografias delas. Coma chegada do barco que anualmente percorre o rio apresentando espetáculos de variedades,Orme tem a oportunidade de se aproximar de Lillian Lyons, uma atriz em carne e osso. Jennyfaz tudo para evitar que Orme sucumba aos encantos da vamp e, com a ajuda do empresário

das variedades, finalmente consegue participar de um espetáculo.

Estados Unidos, 1925, 35mm, preto-e-branco com viragem e tingimento, e cor, 77mincp: Famous Players-Lasky Corporation; d: Allan Dwan; r: Forrest Halsey e Sylvia LaVarre a partir

de uma história de Frank R. Adams; df : George Webber; da: Van Nest Polglase e René Hubert;mo: William LeBaron; e: Gloria Swanson (Jennie Hagen), Lawrence Gray (Orme Wilson), Ford

Sterling (Waldo Buck), Gertrude Astor (Lillian Lyons), Oliver Sandys (Hilda Wagner), Carrie Scott(sra. Wagner), Emil Hoch (sr. Wagner), Margery Whittington

Origem da cópia: National Film and Television Archive / British Film Institute

 James Card, durante muito tempo curador de filmes do arquivo da George EastmanHouse, escreveu sobre Gloria Swanson:

 Em 1925, apareceu um outro filme da dupla Allan Dwan-Gloria Swanson: Stage Struck. Mais uma vez, Gloria aparecia como operária oprimida. Ela fazia uma garçonete num restau-rante barato à margem do rio que sonhava em ser uma grande atriz. O filme começa com umelaborado prólogo em Technicolor em seu sonho de triunfo no palco. Ironicamente, a sequênciado sonho é documental e profética da carreira de Gloria Swanson na época: em 1925 ela erauma das mais admiradas e invejadas personalidades glamourosas do cinema, em um tempoque marcou o ápice do estrelato de Hollywood. E tinha voltado da França para Hollywood,recém-tornada marquesa de la Falaise de la Coudraye, para uma das maiores recepções com

Gloria Swanson

Page 41: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 41/49

RAYMOND GRIFFITH

Raymond Griffith iniciou a carreira cinematográ-fica em 1915. Durante sua vida, trabalhou comoator, figurante, roteirista, cenógrafo, mímico eprodutor. Conhecido mundialmente como “OComediante do Chapéu de Seda”, foi um dosgrandes mestres do humor, da sátira e da paródia.

Filho de uma família de atores, fez sua estreianos palcos quando tinha apenas 15 meses devida. Aos nove anos, tendo já protagonizadodiversos espetáculos teatrais, foi acometido poruma difteria pulmonar e teve suas cordas vocaisdanificadas. Perdeu sua voz quase por completo.

Impossibilitado de atuar, Raymond entrou parao circo. Trabalhou como dançarino, professorde dança e excursionou pela Europa com uma

companhia francesa de mímica.

Em 1910, aos 15 anos, foi convocado a prestarserviços para a Marinha dos Estados Unidos. Apóso desligamento do serviço militar, trabalhou paraos estúdios Vitagraph, L-KO e Triangle.

Em 1916 começou uma parceria com o renomadodiretor Mack Sennett. Dedicou-se principalmenteà produção de filmes, cenografia e elaboração deroteiros. Em 1921 foi convidado para trabalharcom o renomado diretor Marshall Neilan,retomando sua carreira de ator e logo assinandocontrato com a Goldwyn Pictures.

23 janeiro 1895, Boston, Estados Unidos / 25 novembro 1957, Los Angeles, Estados Unidos

Durante o período na Goldwyn, Griffith criouum estilo único de atuação. Seus personagens nãoeram explicitamente cômicos e suas caracterizaçõeseram repletas de atrevimento. Tudo temperadocom uma incrível criatividade artística, chegandoàs vezes aos níveis da palhaçada burlesca.

Esse estilo de atuação atraiu a atenção dos estúdiosda Paramount Pictures e, em 1924, Griffith foicontratado para atuar em Changing husbands / [ Troca de maridos ] (1924), de Paul Iribe.Na Paramount, também atuou nos filmes Pathsto paradise / [ Caminhos do paraíso ] (1925)e Hands Up! / Golpes de audácia  (1926), deClarence G. Badger. Foi aclamado pela críticapor sua inteligência iconoclástica e apontado pormuitos como rival de Charles Chaplin.

Griffith continuou atuando até o advento docinema falado – seu último papel é uma inesque-cível aparição como oficial francês no final de Allquiet on the Western front / Sem novidadesno front (Lewis Milestone, 1930). Aposentou-sede suas funções de ator, mas nunca do mundo docinema. Trabalhou como produtor e roteirista atéo final da vida.

Casado com a atriz Bertha Man, Raymond Griffithmorreu aos 74 anos, vítima de um engasgamentoalimentar seguido por asfixia.

Golpes de audáciaHands Up!

No final da guerra civil americana, o presidente Lincoln recebe a boa notícia de que umamina de ouro de Nevada fornecerá todos os recursos necessários para o esforço de guerra doNorte. O presidente quer que lhe tragam o ouro imediatamente. Ao mesmo tempo, Jack, umespião do Sul, recebe a missão de interceptar o carregamento de ouro. Em sua missão, eleencontra duas irmãs e se apaixona por elas, enganando oficiais nortistas ao forjar uma falsaidentidade. Com o término da guerra, Jack precisa resgatar as irmãs de quem se enamorou,bem como o pai delas, de uma tribo de índios. Mas o dilema permanece: com qual das duas

ele se casará, já que as ama com igual paixão?

Estados Unidos, 1926, 35mm, preto-e-branco, 63min, 24qpscp: Famous Players-Lasky Corporation; p: Jesse L. Lasky e Adolph Zukor; d: Clarence G. Badger;r: Monte Brice e Lloyd Corrigan a partir de uma história de Reggie Morris;df : H. Kinley Martin;

ee: Barney Wolff; e: Raymond Griffith (Jack), Virginia Lee Corbin (Alice Woodstock), Marian Nixon(Mae Woodstock), Mack Swain (Silas Woodstock), Charles K. French (Brigham Young), Noble Johnson

(Touro Sentado), Montagu Love (capitão Edward Logan), George A. Billings (Abraham Lincoln)Origem da cópia: MoMA – The Museum of Modern Art / Film Preservation Center

 Não é das melhores comédias de Raymond Grif fith, considerando que o s eu assunto, a guerracivil americana, perde cinquenta por cento da sua graça exibido fora dos Estados Unidos.Comédia sem nexo, mas, contudo, agradará aos admiradores de Raymond Griffith. Tem assuas boas cenas. O princípio é interessante. Idem a cena do duelo. Todas as cenas passadasdentro da mala-postal são engraçadíssimas e bem apanhadas. A cena em que ele ensinacharleston aos índios também é muito boa. Aquelas perseguições no final estão muito bem feita s e jogadas. Um pouco longo o filme que,como disse, apesar de não ser dos bons de Raymond Griffith, agradará aos seus fãs com umameia dúzia de trechos impagáveis.Coadjuvação excelente. Marion Nixon, Virginia Lee Corbin e, principalmente, MackSwain, vão muito bem.Cinearte n.31, 29 setembro 1926

81

Page 42: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 42/49

83

pioneiros do cinema dos anos de 1920, da era de ouro do cinema silencioso boliviano.Longe de poder ser considerada uma indústria estabelecida, o cinema boliviano era (eainda é) entregue aos cuidados e às iniciativa de visionários como Pedro Sambarino,Arturo Posnanky e José Maria Velasco Maidana. Todos criadores de laboratórioscinematográficos que funcionavam de modo absolutamente artesanal na cidadede La Paz. Em 1925, Velasco Maidana finalizou seu primeiro longa-metragem, LaProfecía del lago. O filme foi censurado e destruído pelas autoridades municipais,pois contava a história de amor entre uma dama da aristocracia e seu criado de origemindígena. Entre 1928 e 29, dirigiu Wara Wara, a história de um amor impossível entreuma princesa inca e um nobre conquistador espanhol. O filme mostra a conquistado Império Inca pelo exército de Pizarro e foi uma verdadeira superprodução. Em1933, durante a Guerra de Chaco, Maidana trabalhava em seu último filme quandoresolveu encerrar suas investidas no cinema. Retornou para a atividade que sempreesteve mais próxima do seu coração, a música. Em dezembro de 1938 foi convidadopara apresentar em Berlim sua Orquestra Sinfônica, a Ameríndia. Alguns anos depois,fundou a Orquestra Sinfônica Nacional, mas sua inquietação artística, e talvez,sua amargura por ser mais reconhecido no exterior do que em seu próprio país, ofizeram sair da Bolívia. Imigrou para o México e depois para os Estados Unidos, ondeconheceu a pintora Dorothy Hood, com quem viveu até o final de sua vida.

Em 1989, no ano de sua morte, foi encontrado na casa de sua família em La Pazum baú contendo inúmeros rolos de filmes em nitrato. Não havia traços de cópiaspositivas, e a maior parte do material era composta por negativos originais de câmera.Um exame preliminar mostrou que a maioria dos rolos era relativa ao filme WaraWara. Graças ao Instituto Goethe de La Paz, uma parte desse material foi enviadaa um laboratório alemão, que se responsabilizou por fazer uma cópia em películacom o objetivo de recuperar o que fosse possível. Até 2001, na verdade, a “versãorestaurada” de Wara Wara ressentia-se das partes que faltavam no filme, mas os anosseguintes, de pesquisa e investigação, lançaram luzes importantes sobre a fase silen-ciosa do cinema boliviano. Apenas em 2009, com a intenção de restaurar o filme apartir de seu negativo original, foi possível recuperar os 150 metros de película, corres-pondentes à parte final da obra. A complexa operação de reconstrução da narrativafoi baseada em fontes primárias – o próprio negativo que foi ordenado não segundouma narrativa linear, mas em blocos, de acordo com diferente período de colorizações

 – e em fontes secundárias, como a peça de Diaz Villamil, recortes de jornais de época,documentos de família e entrevistas com atores e colaboradores do filme. Sabemostambém que Cesar Carces B. foi o responsável por “sincronizar” as projeções dofilme com a execução ao vivo de música étnica. Foi preciso um período de vinte anospara trazer de novo à vida essa obra lendária do cinema boliviano. Ainda estão emandamento pesquisas para a reconstrução das viragens e o acompanhamento musicaloriginais. Mas também essa atividade poderá ser trabalho para pioneiros.

 Janela para a América LatinaAinda quase úmido dos banhos de revelação do laboratório L’Immagine Ritrovata,(Bolonha, Itália), onde foi restaurado e, há pouco mais de um mês, apresentado noprestigioso festival Il Cinema Ritrovato – organizado pela Cineteca della Comune diBologna –, temos a enorme satisfação de apresentá-lo antes mesmo de sua reestreiaem seu país de origem.

Stefano Lo Russo

A restauração dos negativos originais, preservados pela Fundação CinematecaBoliviana, realizou-se no laboratório L’Immagine Ritrovata, em Bolonha, na Itália,em 2010. Os negativos foram restaurados digitalmente em 2K, duplicados em películae, ao final, tirou-se uma cópia positiva com som combinado. A trilha sonora de CergioPrudêncio e a edição de Fernando Vargas foram recriadas de acordo com estudos defontes primárias e secundárias.

“É a uma Bolívia de estrutura semi-feudal que chega o cinema. Filho pródigo dasociedade industrial, rejeitado pela classe dominante, foi embalado e colocado paradormir ao som das cantigas de ninar da divisão internacional do trabalho. Essascaracterísticas socioeconômicas foram determinantes para o destino do cinemaboliviano, renegado desde sempre e condenado a um permanente trabalho forçadodiante da contínua indiferença do Estado” (Pedro Susz).

Pedro Susz, fundador da Cinemateca Boliviana, acredita que para se fazer cinemana Bolívia é preciso ter alma desbravadora. Assim também acreditava José MariaVelasco Maidana, músico profissional e artista multitalentoso, considerado um dos

 Wara Wara

O pacífico reino de Hatun Colla é invadido por um exército de conquistadores espanhóis que destroem povoados ematam o chefe Calicuma e sua esposa Nitaya. No caos reinante, o sumo sacerdote Huillac Huma consegue salvar aprincesa Wara Wara e levá-la por passagens secretas até uma caverna nas montanhas. Neste esconderijo, Huillac Humaprepara por cinco anos um exército de nativos com o qual pretende vencer os espanhóis. A princesa Wara Wara é suaúnica esperança, pois ocupará o trono de Atahuallpa, assim que conquistarem a vitória. Um dia, o capitão Tristán dela Vega, à frente de uma pequena tropa de espanhóis, chega nas proximidades do esconderijo e raptam a princesa. Ocapitão Tristán quer defendê-la, mas é ferido na batalha que então se inicia. Para compensá-lo de sua nobre ação, WaraWara leva o capitão à caverna e cuida de seus ferimento s. Apaixonam-se e sonham com uma vida juntos. Mas o sacerdoteHuillac Huma e outros indígenas da tribo de Wara Wara preferem antes a princesa morta do que uma aliada dosinvasores. O casal é abandonado para que morra de fome, mas eles se salvam e se dispõem a começar uma nova vida.

Bolívia, 1930, 35mm, preto-e-branco, 69min, 24qpsp: Urania Film; d: José Maria Velasco Maidana; r: José Maria Velasco Maidana, Antonio Diaz Villamil a partir da peça La voz dela quena de Antonio Diaz Villamil;df : Mario Camacho, Jose Jimenez e José Maria Velasco Maidana; da: Arturo Borda, Marthade Velasco e Alicia Diaz Villamil; e: Juanita Taillansier, Martha de Velasco, Arturo Borda, Emmo Reyes, Jose Velasco, Guillermo

Viscarra, Damaso Delgado, Raul Montalvo, Juan Capriles, Humberto ViscarraOrigem da cópia: Cinemateca Boliviana

Tesouro inca

Page 43: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 43/49

85

Que cavação é essa?

Concebido como um programa duplo, Que cavação é essa? Apresenta, em sua primeira parte, Um alegre churrascona estância do Coronel Alexandrão, filme “do natural” silencioso, realizado pela Prosopopeia Actualidades no finaldos anos 1910; na segunda parte, o Complemento Nacional n. 9545: “Restaurare” , cinejornal realizado em 1974que se beneficiou da Lei do Curta para exibição em cinemas. Preservação e coronelismo, orgia e cachoeira, som direto e

silêncio, cinzas e tesouros. O tema de Que cavação é essa? é o próprio cinema brasileiro.

Rio de Janeiro, 2008, 35mm, preto-e-branco e cor, 19mincp: Universidade Federal Fluminense; d e r: Estevão Garcia e Luís Rocha Melo; df : William Condé; da: Mariana Kaufman ePaula Gurgel; mo: Gustavo Bragança; e: Cosme Monteiro, Sílvia de Carvalho, José Marinho, Érica Collares, Hernani Heffner,

Severino Dadá, Godot QuincasOrigem da cópia: Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro

fala sobre a dupla ação do tempo, ao mesmo tempo destruidora e transformadora;fala ainda sobre as múltiplas tradições do cinema brasileiro, do filme pornográficoao “povo fala”.

Se é verdade que, passado algum tempo, todo filme de ficção acaba se tornando umdocu-mentário, o contrário também pode ocorrer. A melhor forma de se relacionarcom um filme “do natural” é entendendo o quanto há de “posado” em cada um deles.Desvinculados das regras gramaticais do espetáculo cinematográfico convencional,esses filmes “do natural” revelam uma outra e nada óbvia relação com o real. Aqueleshomens e mulheres de luminosidade oscilante, que frequentemente denunciam acâmera com o olhar, são hoje personagens de fantásticas histórias desabrigadas, aserem reconstruídas pela sensibilidade de cada um de nós.

Produções Silenciosas Contemporâneas

Preservação e coronelismo,orgia e cachoeira,som direto e silêncio,cinzas e tesouros

Tendo sido realizado com os recursos da primeira edição do Programa SAV/Forcine,o curta-metragem Que cavação é essa?  nasceu também do curso de Históriado Cinema Brasileiro (um curso de fato histórico, no duplo sentido do termo) queHernani Heffner ministrou no Rio de Janeiro durante um ano (2005-20 06). Hernaniconseguiu a façanha de reunir uma plateia numerosa que comparecia ao Odeontodos os sábados, das nove da manhã ao meio-dia, para ver filmes brasileiros empelícula e discutir sobre eles. O primeiro módulo do curso, que durou de junho adezembro de 2005, foi em grande parte dedicado ao cinema silencioso feito no Brasil,com ênfase nos chamados filmes “tirados do natural” (cinejornais, filmes de viagem,de família ou de autoridades).

A equipe de Que cavação é essa?, a maior parte dela composta de estudantes decinema da Universidade Federal Fluminense, assistiu a esses filmes, se integrou e se

entregou inteiramente ao projeto de um curta co ncebido como um programa duplo,que dialoga com o cinema silencioso não a partir da tradição dos filmes “posados” (deficção) mas da quase desconhecida herança dos filmes “do natural” (documentários).

Nos anos 1920, costumava-se relacionar a “cavação” aos “naturais”. Isso foimarcante para a história do cinema brasileiro, pois até hoje pouco se fala dascavações “posadas” – e elas existiram, como ainda existem, em grande número.Os “cavadores” consistiam na verdadeira escória da humanidade para aqueles quedefendiam o cinema-espetáculo nos padrões internacionais. Cinema com c maiúsculosó poderia ser o “posado”. Mas para cada filme “posado”, a “canalha tocadora derealejo” produzia cem “naturais” – inadmissível! O tempo e o descaso encarregaram-se de reduzir tudo – filmes “posados” ou “naturais” – ao total desaparecimento oua algumas poucas obras preservadas em cinematecas. Que cavação é essa?  falasobre esse descaso, mas também sobre o comprometimento do cinema com o poder;

Estevão GarciaCineasta, crítico de cinema e pesquisador, graduado em Cinema pela Universidade FederalFluminense, mestre em Estudos Cinematográficos pela Universidade de Guadalajara, México.Pesquisador do projeto Trocas Simbólicas e Econômicas no Cinema da América Latina.Organizador e programador do Cineclube Sala Escura – Sessão Latina da Cinemateca do MAMdo Rio de Janeiro. Além de Que cavação é essa?, dirigiu, entre outros filmes, Artesanos (2003)

e O Latido do cachorro altera o percurso das nuvens  (2005).Luís Alberto Rocha MeloCineasta e pesquisador, doutorando em Comunicação, Imagem e Informação pela UFF e redatorda revista Contracampo  (www.contracampo.com.br). Além de Que cavação é essa?, realizou,entre outros trabalhos, os documentários Fernando Py (1994), Fragmentos – Uma narrativaintranquila (1997) e O Galante rei da Boca (com Alessando Gamo, 2004).

Page 44: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 44/49

86

   M   E   S   A   S   D   E   D   E   B   A   T   E   S

Mesas

 A declaração da FederaçãoInternacional de Arquivos deFilmes sobre Acesso Livre e afunção dos arquivos

 Jon Wengströmcurador da Coleção de Filmes de Arquivo do Instituto Sueco de Cinema

Luís Alberto Rocha Melo eEstevão Garciarealizadores de Que cavação é essa?

 José Inácio de Melo SouzaFoi pesquisador da Cinemateca Brasileira. Autor de vários livros, entre os quais Paulo Emíliono paraíso e Imagens do passado – São Paulo e Rio de Janeiro nos primórdios do cinema. Atualmentetrabalha com o sistema de exibição dos primórdios, tendo lançado em parceria com aCinemateca Brasileira e o Arquivo Municipal de São Paulo uma página no site  daCinemateca Brasileira sobre os cinemas da cidade entre 1895 e 1929.

 Júlio Lucchesi MoraesMestrando em História Econômica da FFLCH-USP, dedica-se a pesquisas nas áreas deEconomia da Cultura e História Econômica da Cultura. Aluno convidado da GoetheUniversität Frankfurt am Main, Alemanha, entre 2008 e 2009. Ganhador do prêmioCarlos e Diva Pinho de melhor monografia em Economia da Arte do departamento deEconomia da FEA-USP com a pesquisa São Paulo: Capital Artística - a cafeicultura e as artesna Belle Époque.

Salas de cinema em São Paulo eno Rio de Janeiro nas primeirasdécadas do século XX 

ne-teatro Paulistano, Rua Vergueiro, anos 1920

87

Page 45: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 45/49

89

Feitiçaria através dos tempos

Page 46: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 46/49

91

Bergstrom, Janet. “Asta Nielsen’s early German films”.  Prima di Caligari. Cinema tedesco 1895-

1920 / Before Caligari. German Cinema 1895-1920. Pordenone: Biblioteca dell’Imagine,1999.

Brooks, Louise. Lulu in Hollywood . University of Minnesota Press, 2000.

Brownlow, Kevin. The Parade’s gone by... University of California Press, 1997.

Card, James. Seductive Cinema. University of Minnesota Press, 1999.

City girls – Frauenbilder im Stummfilm. Catálogo da retrospectiva realizada durante o LVIIInternationale Filmfestspiele, Berlim, 2007.

Cowie, Peter. Scandinavian Cinema. Londres: Tantivity Press, 1992.

Eisner, Lotte. A tela demoníaca. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

Gish, Lillian e Pinchot, Ann. The Movies, Mr. Griffith and Me, de Lillian Gish e Ann Pinchot.Prentice-Hall, Inc., 1969.

Loos, Anita. A girl like I . Nova Iorque, Ballantine Books, 1975.

Machado, Hilda. “O Segredo do corcunda: a cor em Gilberto Rossi”. Cinemais n.9, jan-fev,1998.

Mottran, Ron. The Danish cinema before Dreyer . Metuchen-Londres: Scarecrow Press, 1988.

Nava, Pedro. Baú de ossos. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1974.

Olsen, Jan. Comentário sobre Gunnar Hedes saga. Catálogo da XXVIII edição dasGiornate del Cinema Muto, Pordenone, 2009.

Referências bibliográficas

Agradecimentos

Alexandre Pietro, Alice Gonzaga Assaf, Edina Fujii, Ednalva Soares Martins, Estevão Garcia,Francisco Gaytan, Hubert Alquéres, João Marcos, José Carvalho Motta, José Quental, KarinBizzarro, Lauro Avila, Liegen Clemmyl Rodrigues, Luciana Sima, Luiz Alberto Rocha Melo,

Marcelo Fujii, Marisa Tomazela, Mary Keene, Natália de Castro Soares, Oga Mendonça, PauloMoinhos, Pena Schmidt, Sara Mejia, Sidnei Gonçalves, Ronald Goes, Vera Wey

Lars Hanson

Page 47: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 47/49

93

 João Luiz Silva Ferreira (Juca Ferreira)

Ministro de Estado da Cultura

CINEMATECA BRASILEIRA 

Newton Cannito

Secretário do Audiovisual

Maria Dora Genis Mourão (Presidente)Leopoldo Nosek (Vice-Presidente)

Andréa K. Lopes (Coordenadora Administrativa)

Sociedade Amigos da Cinemateca SAC

A Jornada Brasileira de Cinema Silencioso é uma atividade realizada com a colaboração de toda aequipe da Cinemateca Brasileira e da SAC:

Adilson Inácio Mendes, Adinael Alves de Jesus,Adriana Maria da Cruz Lima, Adriana Souza,Adriano Campos Pedreira, Agnaldo TadeuDias, Alexandre Dotta Cristófaro, Alexandre G.Araújo, Alexandre Hadade Machado, AlexandroNascimento Genaro, Alexandre Vasques, AlineMarques dos Santos, Ana Vera do Amaral F. L.Martins, André Custódio Mascarenhas, AndréaSenna, Anna Paula Nunes, Arthur Teixeira Sens,Baltazar Freitas de Andrade, Bruna ApostólicoZavatti, Bruna Venâncio dos Anjos, Bruno FeitosaSantos, Bruno Machado da Silva, Caio Figueiredo,Carlos Cesar L. Gomes, Carlos Eduardo de Freitas,Carlos Wendel de Magalhães, Carina Barros,Carmen Lúcia Quagliato, Cecilia Lara, CésarRicardo Palmeira, Cícero Antonio Brasileiro eSilva, Cinara Dias, Claudete dos Santos FerreiraLeite, Claudia Rossi, Claudio Piovesan, CleusaSouza da Silva, Daniel Kasai, Daniel O. Albano,Daniel Shinzato de Queiroz, Daniel Zuim

Salmazo, Danielle Divardin, Danilo Tamashiro,Dario Malta Ciriacco, Debora Ferreira dos Reis,Deigmar Macial Alves, Dimas Kubo, Edgar Brunoda Conceição, Eliana Queiroz, Elisabete da Silva,Elisa Ximenes, Elton Campos, Ernani Max Nula daSilva, Ernani R. O. Cioffi, Ernesto Stock, FabianaAparecida Marques Lima, Fabiana FerreiraLopes, Fabiana Gomes, Fábio Benedicto Zeferino,Fábio Kawano, Fabíola Teixeira do Nascimento,Felipe Diniz, Fernanda Guimarães, FernandaValim, Fernando Fortes, Flavia Barretti, FrancineTomo, Francirlei de Maria Nassar Veloso, MariaFernanda Coelho, Maria Paula Galdino, FranciscoCesar Filho, Frederico Arelaro, Gabriela Sousa deQueiroz, Gilvando de Oliveira dos Santos, GisaMillan, Giselda Conceição J. de Moura, Gleici M.Maciel Caputo, Gustavo Henrique Neves Leite,Henri Nillesen, Ingrid Rodrigues Gonçalves,Israel Mendes de Lima, Ivan Xavier de Souza,

 Jair Leal Piantino, Janaina Santina Paulino, Jesus Fernandez, João Marcos de Almeida, JoãoPedro Moraes, José Francisco de Oliveira Mattos, Josiane da Ponte, Katia Dolin Lopes, KellyGois Almeida, Kelly Santos de Lima, LarissaDomingos de Sá, Larissa Rebello, LeandroFinotti Pardi, Leonardo Henrique Monteiro deGorni Scabello, Luciana Pilon, Luciana LopesSalviano, Luciano Oliveira, Luisa Malzoni, LuizFernandes Carneiro, Luiz Gonzaga Fernandes,Luiz Gustavo Pereira Pinto, Marcos Kurtinaitis,Maria Alves de Lima, Maria Aparecida da SilvaSantana, Maria Aparecida dos Santos, MariaBeatriz Ferreira Leite, Maria Fernanda Coelho,Maria Paula Diogo Russo, Marília AlmeidaSantos de Freitas, Marcelo Comparini, MariaTereza da Silva Augusto, Marina Couto, MoemaMuller, Melani Vargas de Araújo, MillardSchisler, Myrna Malancone, Niels Kloumberg,Olga Futemma, Pamela Ribeiro Cabral, Patrícia

Andrade, Patricia de Filippi, Patrícia Mourão,Paula Pripas, Pedro Martins A. Souza, PedroSokol, Priscila Cavichioli, Priscila de AlmeidaXavier, Rafael Nascimento da Cunha Carvalho,Rayane Jesus da Silva, Regislaine ReginaDomingos, Renata Cezar de Oliveira, RenataC. Machado, Ricardo Costantini, RodrigoArchangelo, Rodrigo Mercês, Rosemary doNascimento Cioffi, Sandra Santini, Sergio T.Felicori, Sueli P. F. de França, Stela Maris Suzanados Santos, Sung Sun Fai, Sylvia Carolina C. deMatos, Tathiana Lopes, Tereza Cristina RibeiroRuiz, Thais Bayer, Thais Sandri, Thiago deMiranda e Fonseca, Thiago Dellorti, ThiagoIgnácio Branchini, Thiago Jordes, UmbertoPinheiro, Virginia das Flores B. Vieira, Vivian deLuccia, Vivian Malusá, Vivianne Arques Gomes,Walter Tiago Domingos, William Vilson deFreitas, Yara Mitsue Iguchi.

Créditos

Carlos Roberto de Souza

Curadoria

IV JORNADA BRASILEIRA DE CINEMA SILENCIOSO

Livio Tragtenberg 

Curadoria musical

Rafael SampaioProdução executiva

Maíra TorrecillasCoordenação de produção

Daniela Lazzari

Produção

Lucas GervillaProdução musical

Remier LionCoordenação editorial

Élcio Miazaki

Projeto gráfico

Carlos Roberto de SouzaEstevão Garcia

Hernani Heffner Jon Wengström

Lauro Ávila PereiraLivio Tragtenberg Luís Rocha Melo

Paolo Cherchi UsaiStefano Lo Russo

Textos do catálogo

Carlos Roberto de SouzaDaniela Lazzari

 João Marcos de Almeida

Traduções

Carlos Roberto de SouzaCláudio Piovesan Jon Wengström

 José Francisco de Oliveira Mattos

Transcrição, tradução erevisão de intertítulos

Carlos Roberto de Souza

 João Marcos de AlmeidaRemier Lion

Pesquisa

Ana Paula GomesRevisão de textos

 João Marcos de AlmeidaFernando Fortes

Digitalização de fotogramas /fotografias / textos

F&M ProCultura

Assessoria de imprensa

Eugênio Puppo (Direção e Montagem)

Vinheta

Bruno LogattoDaniel Kasai

 João Marcos de Almeida

Site

Imprensa Oficial do Estado de São PauloImpressão do material gráfico

Estúdios Quanta

Iluminação

R4Som ProSom

FEDEX

Transporte de cópias

4EstaçõesLegendagem eletrônica

KM ComexDespachante alfandegário

Allianz

Seguro de filmes

Page 48: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 48/49

95

Instituições colaboradoras

Brasil

257 B Sawmill Road (Rte.367)

Hamlin, PA 18427Estados Unidoswww.moma.org

MoMAThe Museum of Modern Art 

Film Preservation Center

Estados Unidos

Av Infante Dom Henrique 8520021-140 - Rio de Janeiro – RJ

www.mamrio.org.br

Cinemateca do Museude Arte Moderna – RJ

Itália

www.cinetecadelfriuli.org

Giornate del CinemaMuto de Pordenone

Inglaterra

21 Stephen Street, Londres WIT I LN,Reino Unido

 J Paul Getty Conservation CentreKingshill Way, Berkhamsted, Herts, HP4 3TP,

Reino Unidowww.bfi.org.uk

BFIBritish Film Institute

Suécia

Caixa Postal 27 126102 52 Estocolmo, Suécia

www.sfi.se

Swedish Film Institute/Svenska Filminstitutet

(Instituto Sueco de Cinema)

Rua Santa Cristina, 0522241-250 - Rio de Janeiro - RJ

www.cinedia.com.br

Cinédia EstúdiosCinematográficos

 Av União Dos Ferroviários, 176013201-160 - Jundiaí - SP

11 4522 4727

Museu da CompanhiaPaulista de Estrada de Ferro

México

www.filmoteca.unam.mx

Filmoteca de la UNAMUniversidad Nacional Autónoma

de México

Page 49: Catalogo  Jornada Cinema Mudo

7/17/2019 Catalogo Jornada Cinema Mudo

http://slidepdf.com/reader/full/catalogo-jornada-cinema-mudo 49/49

96