Capa - Artur Rogério

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Livro pertencente à Decalogia Ladrona

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Artur Rogério

Capa This language is the junket of laughable

Jaboatão dos Guararapes, novembro de 2009.

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Artur Rogério © Alguns direitos reservados

Projeto Gráfico Wellington de Melo Revisão Bruno Piffardini Tradução Suerda

Obs.: A equação do primeiro poema foi roubada do honorável matemático Bruno Piffardini.

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01. JUNKET

2 5 +6=0

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02. CAPA E eu que pensava que dava umas oito horas Dois Mais Dois Uma pergunta, uma pergunta, uma pergunta Acaba hoje que hoje tu fizera a uma história Que nem ontem A voz dela era a da dela do começo da vida E ela e é a uma última memória A voz que me olha De cima da língua Deus Não existe E ela Amor Não existe Que me fez e que me fez ao mundo da volta

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E os meus irmãos E os meus amigos A ele A aquela que ama o que acontecerá ao meu pai A que me ama Deus e Deus Ele A minha voz, a mesma, outra, manchava a roupa Rezamos Ouvidos Linha invisível Que nem ontem Mas Ela mais grande Eu mais grande Tem boi Tem umas sete cidades e uns dois milhões de morros, sendo que os morros de Sirinhaém têm rochas negras que descansam na pele verde como saudáveis sinais de carne, e essas rochas são tão

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lindas que mereciam ser fotografadas por um fotógrafo contratado de Recife A ela Roupa de dormir e casar, véu, véus de reflexos partidos de um poste aceso no claro-escuro da rua São José, cabelos mais pequenos vermelhos, meus irmãos de cócoras na calçada Barreiros A cidade Sem luz Ela e eu, linha, cabelos amarrados ao pé da mesa, palafita, orégano, literatura, Coca Zero, sem necessidade de viver na vida Mas não dava E nem ontem Porque eu ainda amaria ele e ela e ele ainda temos os três Na vida Em hoje Ainda falta dizer que eu amo ela e ainda mais não interessa Aqui

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Pra ela Vara o nosso silêncio cobrado cinco Amassa uns sonhos de quem dorme É o amor E é maior que um livro que um sino Porque é tanta história que agora não devo dizer nada agora.

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03. CAPA Acho que acabou virando um saco de sal no centro da cabeça que tem toda cabeça quando tem mais fora a cabeça dentro um saco de sal. Vejo e olhos da cabeça as telhas ressecas e eu recolhendo a remela que pedra de sal doente é passar a vassoura em cima da mesa (sem que ninguém veja) Ela vive prali, tá no centro da cabeça a cabeça que come o sal Teve uma vez quando estourei a pipoca Voa pelo vidro quebrado E rebatizado este caralho que não serve pra nada, nem pra tu Tu nem sabe o que é isso Mas faz e, pra que não aconteça, tapa meu nariz quando falo E a flor na bochecha é quando sonha o bicho Isso virou um caminhão de vassouras virado sobre a mesa (sem que ninguém veja) Crianças, chinesas De negros escravos

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E umas chupetas de açúcar e um sorvete de limão e um chaveiro No sal conservados Quando eu acordo e tenho a flor presa E um negócio preso à flor, que faz rendas e que faz outras coisas Isso é uma cabeça E uma coleira presa àquele cara que hoje de tarde eu vi, pela janela do ônibus, perdido na ponte do Cabanga Isso virou Lata, calça, tábua, jarra, decalogia, livraria, um computador desses assim que tem Isso doce E fumaça Claudete Abdalla, amor tímido Virou tudo E nem eu Virou tudo Tu só não virou a capa do livro.

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04. CAPA Loiro bom Loiro de rola loira Loiro quase marrom Já se vê tudo, menos o coração Teu único músculo Presa de burro Literatura Loiro duro Loiro puro Loiro loira O loiro mijou na minha boca Foi quando vi o Barba Loira Loiro de capim e bolas loiras Igual a mim Sendo que loiro Sendo que bom Sendo que viva Pára

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Loiro Abre Loiro Abre Logo Se a lua passou O sol passiva.

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05. CAPA Loiro loiro Loiro bom Loiro sempre de bom humor. Imagino o loiro entrando no céu: Licença, meu senhor! E São Pedro bonachão: - Entra, loiro, você não precisa pedir licença.

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06. CAPA Eu dava dinheiro a Amara e Branca Se o dinheiro fosse meu Eu dava dinheiro a Amara e Branca Porque ninguém merece mais que elas comer queijo manteiga no café da manhã, pão francês Nem eu Somente a minha mãe, dona Amara e Branca, e o meu pai Eu dava dinheiro Uma televisão, um telefone moderno, uma cama Eu dava Se a cama, o telefone e a televisão fossem meus Eu dava Dinheiro Se o dinheiro fosse meu Eu dava A Amara e Branca Um olho Uma mão

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Um pé Um rim Se estes olhos, mãos, pés e o rins fossem meus Eu dava A Amara e Branca Uma vida como a vida daquela mulher que me perguntou a hora semana passada na Estação de trens Um espetinho de frango com bacon Eu dava E Deus.

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07. CAPA Um homem doente é uma criança doente E uma mulher grávida E um homem de farda E o adolescente na revista de mulher nua E uma criança Depois da capa E um homem sai da cama e veste na farda A mulher água as capas O boyzinho esquece a foto e deita na cama Depois alguém adoece e, já no finalzinho da tarde, uma menininha maquiadinha de desenho japonês é encarada pela revista que tem aquele cara Mas quando ninguém mais vê nada Depois da capa A desimportância da última página.

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08. TRADUÇÃO O meu de versos nem veio mais pro parque E depois daquela confusão ao pé do ouvido Que eu nem ouvi Quando eu tava no lixeiro, nem seio porquê O barulho uma mãos de dedos elas não sarou aqui a florzinha a virilha a perna da dele Boca de camarão Olhos de repolho E os pêlos de cor O silêncio do parque agora cingido nas lingeries dessas mulheres que rastejam com malhas de malhação Ele me disse um dia que um dia daria a confissão Mas eu não sabia E que ele, nesse dia, se ia embora como alguém que vai embora ou retorna ao centro da Terra O meu de versos, ele vinha

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Ali No lixeiro Mãos de dedos... Tem um saquinho de pipoca.

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09. SUERDA Depois dos vinte e quatro anos Ela bordou o pano Depois dos vinte e cinco anos Ela bordou o pano Aqui tem peixe, tarrafa, saberé, uma jangada, Manhattan Nesse momento, ela emborcou a praia, pisoteou a ilha de gelo pra me dar um beijo curto Eu bocejei e nem dei pelo feitiço, pela maldade, do amor E eu não morri por isso Matem-na! Foi a filha do pescador! Eu estou vivo! As cidades me ensinaram a usar muito mal as palavras E as pessoas, dessas que nascem pra nascer e morrem O mar não ensina nada O mar não tem coração

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Nem existe O mar Nem se excita com os pés descalços no domingo e no sábado O mar O mar mata tudo, e também uns cadeados, uns cocos Umas árvores Ele prefere morrer sozinho Sentir apenas os movimentos dos peixes como gases Liberar os gases Múltiplos Multiplamente O mar não guarda Nem aguarda Foi ela A filha do pescador me ensinou É que estamos no mar E ele

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Quando a gente morrer Mas ninguém vai viver Nem Nada Nada vale atirar ao mar Todo barco é um ladrão Nada O céu é o espelho de todo texto que resta para a vida, uma merda de tela roubada esburacada por pequenas explosões e sangue quente de cordeiros Vai tomar no cu E eu continuo vivo Pés e joelhos secos Graças à filha de Seu Nêgo.

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10. CAPA A bicicleta de cela amarela E o dono dela eu nem sei onde é que tá Deve ser aquele cara da Torcida Jovem Ou e o marido de Branca Mas eu acho que a bicicleta não é do marido de Branca porque a bicicleta tem guidão e cela amarela E parece uma bicicleta de veado ou e de criança Sendo que tem cela alta Óia ela ali, menino, encostada Então deve ser de alguém dos homens do dominó Só não pode ser das meninas, muito menos daquela com um cachinho costurado na testa Nem dos cachorros (nem tua) Nem minha Nem de Branca Nem de Andréia Nem de China porque China é muito gordo Nem do filho de Branca porque o filho de Branca é muito pequeno pra isso A bicicleta deve ser desse bêbado que chegou

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Deve ter esquecido ontem Ele nem se lembra de nada Agora Só da cachaça e do cheiro dos pentelhos torrados da galega que chegou agora com ele agora Eita Ele só se lembra da cachaça E a galega que chegou com ele é daquele tipo de mulher que não pode casar, pois, se casar, fodeu, Deus manda fechar essa putaria Ela não é a dona Ninguém aqui é A bicicleta de cela amarela que tem a cela alta Ali Abandonada Ela Ao lado daquela outra bicicleta ali encostada que tem o guidão preto, um adesivo verde, uma cesta, a cela baixa Mas essa não interessa.

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11. THIS Os homens que são homens, quando estão bêbados, eles se beijam As mulheres preferem se beijar durante o dia Sem o risco de tirar a camisa Ou se apaixonar Se estiverem maquiadas e magras e, de preferência, em posse duma bolsa baratíssima Eu sei que estes poemas, embora populares, não serão populares nem aqui, nem na China É a vida que não se escreve a vida Escrita E a vida desses escritores de merda Mas a literatura é como a vida Uma bela merda Que nem essas músicas de axé Que ninguém olha, nem canta, nem nada, e faz mas só dança feito alguém que só dança

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Não posso Porque é ao som dessas músicas que os homens que são homens, quando estão bêbados, eles se beijam E os homens não podem deixar de se beijar Não posso Nada deve mudar.

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12. JUNKET Eu quero que você se foda como eu Quando preciso escrever um poema E você Em vez de escolher ver uma música E você Imbecil Eu quero que os escritores se fodam Quero que entre no teu cu até a metáfora e a lembrança amarga daquele besourão Eu acho que eu não quero um beijo seu Eu acho que eu quero que você escreva E fique fodido É o amor E fique com uma doença incurável, uma infecção na bunda E fique com tudo Eu

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Porque eu fico com esses poemas e nenhum poema é meu Nem mais um livro Nem mais Nada Tudo aqui é teu.

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13. LANGUAGE Eu não sirvo pra nada E o meu nome é bonito Escrito na capa do livro Que não serve pra nada Longe do meu umbigo Puro.

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14. OF Eu tenho medo de machucar ela Quando ela arreganha as pernas Por isso eu machuco eu Por isso eu machuco ele Ferro o queixo onde é cego o teu pescoço Peito as tuas costas partidas, elas as costas quentes de um pastor Nada é bonito no mundo Tirando aquele menino que dança hip hop E a mulher que criou ele É que eles não são daqui Mas essas arvorezinhas são a memória de um elefante grande Sobras de artérias, talos infectados tossidos da goela da Terra As arvorezonas são abscessos que entulham todas essas histórias idiotas que esses escritores escrevem E tu O resto é o silêncio no silêncio e comentários sobre o silêncio

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Que depois que a gente morre vira água Que depois que a gente morre a gente não precisa tomar água Nem café E somos esquecidos por isso Sobra água Sobra o café Sobra açúcar Sobra sabonete Depois que a gente morte E a notícia sobra Desimporta Passa a dor de barriga e a dor na coluna Passa o nocaute diário que sofremos na hora do sono, soberano, essa vergonha, esse colo, essa fragilidade de toda gente, inclusive daquela que arregimenta fileiras de fiéis em posse de facas de serra e cordas que sufocam, sangue oposto estocado nas bochechas, donos de vidas e do segredo improvisado Passa o medo o desejo de machucar ela E tu morre Quando todo mundo morre E tu morre

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A dona deste corpo sobre o qual somos parasitas alegres vendados daninhozinhos E ela morre quando tu morre E depois de um tempo nasce um negócio por aí Lindo feito uma arvorezona E tu Te fode.

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15. LAUGHABLE Saudades de minh’alma antiga Una e repartida Meio bailes, cintos, rum, palmilhas, meio palafitas Meio guaiamum, meio lagosta Meio moça Meio moça Meio brisa apodrecida que arrepia o rio me inebria Recife e suas sombras à luz do dia Os clarões da madrugada Onde eu me perdia e me declarava Vinho na ponta da língua, um sarau, uma homenagem póstuma, um festival da prefeitura, duzentos reais... Pátio do Terço, Nossa Senhora do Carmo, Pátio de São Pedro Vagava eu desabitada dum homem que se foi sem dizer nada Andava eu levada ao sabor do vento, que me invadia pelas telhas quebradas, pelas falhas no encaixe de portas e janelas, ao bater de asas de uma barata É boa a vida quando se vive duplicada

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Maquiada A mulher passa bonita Eu é ela E vivida Saudades da noctívaga! Saudade de viver a vida!

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16. LAUGHABLE Cafona é passar pela vida Sem escrever uma poesia Poesia de escola, de mochila, de oficina Poesia de Rua, do Sertão, da Academia Poesia que não rima é de Artur Rogério Que até hoje não compreende o poético que há no tédio, no prédio e no menino cego Tirando ele, sobra o resto e a verdade Tirando ele, sobram os velhos e a contemporaneidade Não se fala assim de Clarice Lispector Mas nem em cima do prédio, do tédio, do menino cego Cafona é ser bicha sem dar bichada Escrever dez livros sem dizer nada E decepcionar Fábio E tantos caras assim, tipo, meio que E chorar uma madrugada pelo medo de Wellington Cafona é acreditar na literatura como um trabalho Escrever como um pedreiro e não arranjar dinheiro

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Cafona é morrer Cafona é escrever uma decalogia É ser poeta e escrever Poesia.

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17. A O que me salva é o silêncio Não isto A capa de gordura é maior do que eu pensava O que me salva é a ressaca Tou vivo O que me salva é a última O suco de graviola O que me salva é a morte Tou vivo O que me salva é a bíblia Não um verso A capa de gordura é maior do que eu pensava E ainda tem o osso e aquilo de dentro do osso O que me salva é a praia E a rocha E essa tinta azul que faz tempo que tá para secar de vez A parte de minh’alma que vive bem longe de tuas mãos Me salva Mãos de sabão Mãos de correntes pelo chão

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Mãos de mijo Mãos de pipoca O que me salva é a ordem É a voz Não o carnaval O que me salva é o futebol E a água Da praia E a bicicleta de cela amarela E a injeção E a morte E o presidente da república E a polícia A praia Não a literatura A praia A praia A capa de gordura E toda essa merda eu não sei pra quê me salva.

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18. ARTUR A bicicleta de guidão e cela amarela é de Branca Podia ser uma bicicleta Amarela Ou uma bicicleta laranja de correia frouxa Disfarçada Mas é ela Quadro, guidão, freio quebrado, duas rodas Feito outras Bicicleta amarela, magricela, igual a tantas Mas aquela é de Branca.

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19. LAUGHABLE Mas fica só na capa O que eu tava querendo dizer com tanta poesia linda é que um cara jogando baralho é mais bonito que um cara escrevendo E é mais importante Se a gente colocar assim, um do lado do outro, de madrugada E um músico também é mais bonito que um cara que escreve Todo mundo entende Até um cara num violino ou num teclado eletrônico, todo mundo entende e vê e entende e tal E tem até quem não goste e tal e tal de tal tipo de música e tal e discuta e tal e não entenda e tal Mas todo mundo entende a poesia e o samba E fica só na capa Feito o meu livro Feito o livro daquele meu amigo que me disse que não é exatamente meu amigo e tal Mas tem o título

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Fica só na capa Feito Recife Feito uma festa Mas é o caso de achar bonito uma capa Todas as capas Já que os escritores merecem uma capa E o cu na vara.

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20. ROGÉRIO Depois que Rodrigo descobriu que eu sou escritor, ele me arrumou uma cadeira. A arte mais difícil de uma casa é a abraçadeira. Objetinho simples, invocado, anel quebrado, aro faltando um pedaço, um parafuso reto pra acochar o círculo. Não tem máquina de lavar, chuveiro elétrico, dvd, microondas, internet, geladeira, nada ultrapassa na dificuldade e na necessidade a abraçadeira. Todo fogão tem o seu encaixe de ferro, dois dedos de um cano fino. E a mangueira; um lado o registro que vai pro bujão, o outro lado o que abraça o encaixe do fogão. Se a mangueira abraça frouxa, aí vem a abraçadeira com todo o seu poder reservado. É preciso ter paciência e força pra ajustar bem; aí é quando se revela o mistério, e aumenta a fome. E, pior que isso, aumenta a vontade de comer aquele feijão com charque e jerimum e maxixe assim. Um bife acebolado. Dois bifes acebolados. Dois bifes acebolados com batata frita e com aquele negócio que coloca. Mas às vezes a mangueira sozinha já fica tão acochada no encaixe do fogão que a abraçadeira vira desnecessária. A abraçadeira vira um objetinho sem sentido. Manga com leite, banana prata com ovo, suco de tamarindo, este livro. E esquecemos pra quê serve aquele

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arozinho de ferro. Mas ela não liga. Volta pra Marte, volta pra fila inclusive satisfeita. Não existe e nunca morre a terrível abraçadeira.

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21. CAPA Vendo assim, de perto, pela capa, até parece que este livro é um “experimentalismo” de um tal escritor-escritor-cinéfilo-camiseta-flúor (tomando pela qualidade dos textos) Este livro é uma pica deste tamanho No teu cu Porque o que eu quero é ver a tua cara retorcida feito a cara daquela crente que foi mordida por um sagüi Dar o cu não é tão prático como naqueles filmes Mas é prazeroso, diferente dos filmes Feito a dor e o desconforto que existe na gozada Antes da energia elétrica Mas voltando ao teu desinteresse Voltando à capa O mundo é muito bonito mesmo E feio E os poemas falam tão bem disso tudo... E os boys de Fernando Pessoa falam tão bem de tudo...

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Tão lindamente eles falam sobre todo este desconforto... Que eles me deixam deveras de pau duro...

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22. CAPA Olha, e quem tiver um poema escrito Meta-o no cu Com a mesma fé com que o escreveu E que cada metáfora seja mais uma polegada Que cada capa seja mais um Darth Vader Faça-se de cada verso novo, um novo cabaço Enfim descabaçado por duas mil cabeçadas Que cada suspiro poético e inspiração seja o encontro com o negão tarado que fugiu do presídio após treze anos comendo o cu de Renatinho Alpiste Um pingo no carpete É o botão rachado Da roseira inflamada Que a cada imagem criada despenque na cara mil cestas de bucetas de pêlos anilados Mas pra quem não é veado, é poeta, o que dá no mesmo

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Quem tiver um conto, um romance, um bilhete, o cacete Quem tiver um verso, uma poética, um livro de cabeceira, qualquer merda dessas Leia com o cu O que importa na vida não é a literatura O que importa na vida é sonhar e, logo cedo, relatar a um ouvido bem próximo os quadros do sonho, se emocionar acompanhado, constatar que essa poesia, esse paraíso, é o que nos salva e nos mantém por aí, na repetição enfadonha dessa igual comédia, nesses dias de sol ou chuva e as noites, às vezes com lua e às vezes com cinco gatos enfileirados cochilando como guardas reais escorados no escuro olvidado do mesmo lado.

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23. CASPA Um homem é um homem e o gato bebe leite Três razões para não ser homem A bunda O sêmen A caspa.

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24. CAPA Como se não bastava A mesa da outra é preta e a mesa de Branca é branca E Branca me disse que hoje que comprou limão na feira porque lembrou de mim É por isso que continuo escrevendo Essa tua literatura tem muito poema A poesia A poesia A poesia Entendeu A poesia Sim Com a tua literatura rola o contrário Eu escrevo, escrevo, escrevo e já fico de saco cheio de escrever Assim Por conta desses motivos todos e tal Ainda bem que Branca ainda contraria as Leis e ainda fica sendo linda como uma página vazia ainda

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Feito como uma árvore Caga de cima da árvore E eu não sou escritor nem nada E ainda sou diferente de Branca Que me ama, apesar de eu ser poeta, um excelente poeta, apesar E Esse negócio de achar que esse espetinho vai me salvar Ainda vai me livrar dessa vida E Ainda sinto um desejo E E como se não bastava É branca a cadeira da minha anja.

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25. CAPA As mulheres não deviam comer As mulheres não deviam comer espetinho frango nem se apaixonar por homens tipo tu O homem mais bonito é feio E muitas mulheres ainda se colocam como enfermeiras em mesas de bar, ressacas e dias de praia Cuidam dos homens como se fossem mães Como se não sofressem Como se não amassem Como se não comessem As mulheres não deviam comer espetinho As mulheres não deviam comer nada.

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26. IS É engraçado Sei lá É engraçado Ele dançando enrolando os braços É engraçado A menina certa que também ri da cadeira de plástico Porque é engraçado Porque é engraçado Apesar dele ser homem, ele é engraçado Apesar dela ser mulher, ela é engraçada Porque é engraçado Sei lá Ela olhando Ele dançando enrolando os dois braços.

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27. CAPA E eu que nem falo inglês Porque eu não sou brega E eu sou superior a vocês Porque eu escrevo poemas Que nem o escritor de hoje Que faz design de literatura Ou matemática de tradução O que é a mesma porcaria Vai te foder

E ainda faltam seis Pra começar a voltar o fim Melhor acabar logo Eu este humor de assassino

Eu queria que Jorge Luís Borges tivesse escrito O Livro do Cu - Mas ele escreveu... E que Machado de Assis tivesse chupado o teu cu - Mas ele escreveu... Aí eu não precisava escrever Assim

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Que nem tu E pra tu ver E a gente é assim por causa das nossas brincadeiras na neve, das nossas torradas e chá, das girafas e do chimarrão E porque a pica de Brennand ainda não deu pra foder Deus E meu sonho é virar ateu, mas eu não consigo largar a vela Eu vou morrer sem aprender a falar inglês E, olha, eu tou muito preocupado com isso Porque o cara que trabalha na portaria do inferno é um cara muito estourado e muito ligado àqueles filmes de Quentin Tarantino e ele só fala inglês E, como se sabe, o Diabo fala inglês Os bichos que comem a gente falam Tudo fala inglês E mas até Caetano Veloso fala inglês

Eu fiquei de escrever um poema E nunca escrevi nenhum Nem um livro E, olha, eu continuo vivo E tou muito preocupado com isso.

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28. CAPA Eu tou achando que eu vou gripar Mas Whitney Houston vai me salvar Vês! Carbonizada símile humana! Mataste de desgosto o morcego que te guardava! A capa! Lê a mão que te afaga! Engole o escarro da boca que te beija! E tal E hoje eu só acredito em Jesus Cristo Na revista da prefeitura E em Whitney Houston E num programa que passa na televisão E na minha poesia linda E tá cada dia mais linda É de fazer jorrar uns dois baldes e meio de lágrimas e sangue e cachaça assim, tipo, escorrendo pelo meio-fio do Mercado da Boa Vista

É poesia linda como orquídeas

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Mas eu nunca vi uma orquídea E é linda como o luar do sertão Linda como uma árvore de natal daquelas feitas de galho seco e algodão

Uma vez eu falei inglês com um cara da Inglaterra E ele riu Mas e ele era tão lindo E ele riu Lindo como este poema Que é mais lindo que tu E tu nem conheceu o cara da Inglaterra E tu também não conhece a minha mãe

Eu tou achando que eu vou gripar, mas eu ainda tenho seis poemas pra escrever e um pra terminar É uma merda Vês! Catarro no A4 da folha de ofício! Quimera, lúbrica, feérica! Salva-me em teu colo, oh musa! Ímpio ornitorrinco quiçá quão morto vivo A culpa é da Coca-cola e do capitalismo.

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29. CAPA Tinha eu e ele Tinha uma banana preta, podre E um grampeador que queria porque queria aterrissar aqui, vê, nessa veia Jurando que não morderia e não levaria a água E a velha de cera rodou o pião no canto da sala Ainda parou quieta, alvoroçada A cadeira A papa sacolejando na buchada Um corpo chapinhando na papa Meias paradas Unhas alvoroçadas, uma sombra Cadeira E eu quero foder aquele crente pra ele saber o que é ter fé e devoção Ia aterrissar na veia Mas que o meu negócio é buceta Ele tem uma voz tão linda, mas tão linda, ainda mais quando recita as receitas da bíblia Cai aos pés da velha um bebê de plumagem rala, úmido

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As asas crescem devagar, desajeitado, um embola-bosta E no piso de falsa madeira cresce uma mancha de água salobra, mas água de lágrimas Nossas sombras, de móveis, ele falou isso Pousou um mosquito no joelho da criança Mas eu e ele era bonito E pés gelados, o filho decolando da janela Pois só tinha só eu e ele Foi Esse senhor Esse senhor Senhor.

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30. CAPA A boca dele Debaixo do nariz dele Sai pra fora Porque, por último, eu guardo o melhor Tipo Quando a gente almoça Tipo Quando a gente morre Tipo quando a gente fuma quando acorda Os cânticos esfumaçados, ei-los semeados em vil fantasia sobre as palafitas de Brasília! Oh! Goethe! Oh! Baudelaire! Oh! Joyce! Oh! Whitman! Oh! Borges! Oh! Fernando Monteiro! A boca da dele Na calçada Eu vi Barreiros

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Que merda é essa de pós-modernidade e tal e, hein? Se eu pudesse eu mudaria meu corpo todo santo dia Um lado, homem Um lado, mulher Estética e eficácia Não existe pecado Toda palavra faz cirurgia plástica Pois A boca da dele Debaixo do nariz dele Fala.

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31. CAPA Escrever poesia é negócio de veado, pra quem não tem o que fazer Não sei se escrevo porque sou veado ou sou veado porque escrevo Drummond Carlos. Os índios e em seus paramentos Não usam flores humanas Usam plumagem de aves mortas E umas vezes de aves vivas E às vezes eu penso nuns currais Nos bois, bodes, porcos, pintos, dormindo em baias escuras e empoçadas E focinhos enferrujados apoiados em grades de carne Às vezes eu penso neles, assim Que eu queria estar lá com eles Dormindo J. G.

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Focinho furado, a grade do focinho do porco, rabos, corpos lacrimejados Da Paz Enquanto durmo, minha alma faz carreira nos campos e morros o arredor Um sonho, às vezes E depois virar recheio de coxinha, de canudinho, salpicão, de torta salgada Ou João Cabral. Eu nem queria dizer nada Mas escrever é uma merda Bom é ter um filho, uma casa, um homem, uma mulher, tomar cerveja, fumar, comer carne, gema mole, chupar manga, trabalhar, ver filme, ter mãe, dormir Mas é uma merda escrever Eu nem queria dizer nada E não acaba W.

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32. LANGUAGE É engraçado Sei lá É engraçado Ele dançando enrolando os braços É engraçado A menina certa que também ri da cadeira de plástico Porque é engraçado Porque é engraçado Apesar dele ser homem, ele é engraçado Apesar dela ser mulher, ela é engraçada Porque é engraçado Sei lá Ela olhando Ele dançando enrolando os dois braços.

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33. CAPA Carai! Chega deu uma dor! Chega deu uma dor! China! Juiz da cara de rapariga O telefone da Oi, de tarde, deu pânico Isso é um cara raçudo demais esse Dutra Puto safado! Frango! Filho da rapariga! Besta-fera! Agora pode esperar que o final a gente já sabe qual é Da licença? Dá licença do meio? É uma cruz, é? Legal teu pau, filho da puta Não veja um que não roube quando é um pernambucano Tem pra onde correr mais não, meu velho Eu estourava a mão na cara dele A gente já tá acostumado com isso: nadar, nadar, nadar e morrer no seco Tem que acreditar. Acredita! Ele é menina... Olha a menina aqui pra tu, ó! Me dá o caju! Eu já tomei uma, me dá o caju! Juiz ladrão! Porrada é solução! Pernambuco, porra, Pernambuco é muito discriminado, porra!

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Eu não falei? Eu não falei que ia dar merda? A gente já sabe qual é o final, caralho Quer mais alguma coisa?

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34. CAPA Hoje eu vi meu pai No meio das minhas pernas Quando eu tava assim, tipo Meio que escaldado E fui vestir a cueca Um morto prende o pé do outro Ele ancora a ilha Farinha de milho Navio e a vela saindo da bunda Farinha de osso, cinzas da foto Jogou-se ao fogo Filho de rapariga O filho na barriga, sua e vomita Pai de cabeça pra baixo Enterrado Filho debaixo da cama Antes da caça, cuecas quebradas

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Louças velhas, boneco sem olho E mãos nas canelas Dentro da bermuda Lá na rua Desaparecidos, iluminados, rua Sê cego em terra cega É a vida quando viva A luz, a morte segreda O manto largo, as armas serão levadas pelo rio Nas minhas pernas Depois, jamais Hoje eu vi meu pai E ele me disse que poesia não há será na capa.

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ÍNDICE

01. JUNKET........................................................................5 02. CAPA ...........................................................................6 03. CAPA..........................................................................10 04. CAPA..........................................................................12 05. CAPA..........................................................................14 06. CAPA..........................................................................16 07. CAPA..........................................................................17 08. TRADUÇÃO..............................................................18 09. SUERDA.....................................................................20 10. CAPA..........................................................................23 11. THIS. ..........................................................................25 12. JUNKET......................................................................27 13. LANGUAGE. .......................................................... 29 14. OF. ..............................................................................30 15. LAUGHABLE........................................................... 33 16. LAUGHABLE........................................................... 35 17. A...................................................................................37 18. ARTUR. ..................................................................... 39 19. LAUGHABLE. ..........................................................40 20. ROGÉRIO..................................................................42

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21. CAPA..........................................................................44 22. CAPA..........................................................................46 23. CASPA........................................................................48 24. CAPA..........................................................................49 25. CAPA..........................................................................51 26. IS..................................................................................52 27. CAPA..........................................................................53 28. CAPA..........................................................................55 29. CAPA..........................................................................57 30. CAPA..........................................................................59 31. CAPA..........................................................................61 32. LANGUAGE..............................................................63 33. CAPA..........................................................................64 34. CAPA.........................................................................66

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