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Noções de Texto e Aspectos da Comunicação Unidade 1

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Noções de Texto e Aspectos da Comunicação

Unidade 1

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Noções de Texto e Aspectos da Comunicação

IntroduçãoO ato da comunicação implica expressar-se de forma eficaz na própria

língua. Para que isso ocorra, é necessário não só apropriar-se das normas e estruturas do padrão culto, como também da linguagem como um instru-mento utilizado pelos interlocutores e modificado e manipulado constante-mente por eles.

ObjetivosNesta unidade, você estudará:

• As noções de texto e os aspectos da comunicação.

• A coesão e a coerência.

• A fala e a escrita.

• A variedade linguística.

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Noções de Texto e Aspectos da ComunicaçãoEntende-se o texto como uma unidade de sentido ou como um conjunto

de unidades de sentido. Portanto, o significado de uma parte não é autôno-mo, ele só existe quando se relaciona com outras partes. O texto, assim como um tecido, constrói-se numa relação de fios que se entretecem.

Para que o texto tenha um significado global, é preciso estabelecer uma combinação geradora de sentidos em que todas as partes se inter-rela-cionem.

A seguir, você analisará algumas definições de texto, de autores que ser-vem de referência para este estudo.

Segundo Koch e Travaglia:

O texto será entendido como uma unidade linguística concreta, que é tomada pelos usuários da língua, em uma situação de interação comunicativa específica, como uma unidade de sentido e como pre-enchendo uma função comunicativa reconhecível e reconhecida, inde-pendentemente da sua extensão. (KOCH; TRAVAGLIA, 1997, p. 9).

Aquele pai não entende nada

- Um biquíni novo?

- É, pai.

-Você comprou um no ano passado...

- Não serve mais. Eu cresci, pai.

- Como não serve mais? No ano passado você tinha 14 anos, agora tem 15, não cresceu tanto assim...

- Não serve, pai.

- Está bem, está bem. Toma o dinheiro. Compra um biquíni maior.

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- Maior, não, menor, pai.

Aquele pai, também, não entendia nada.

(VERISSIMO; L. F. Disponível em: <http:// chaodeestrelascassilan-dia.blogspot.com.br/2011/05/leitura-e-interpretacao-texto-cronica.html >. Acesso em: 23 dez. 2014).

Você deve ter percebido que nesse breve conto de Luís Fernando Veris-simo não aparecem os nomes das personagens, mas são identificadas pelo lugar social que ocupam: pai e filha.

Fazendo uma paráfrase do que diz M. H. Duarte Marques (1990), é possí-vel dizer que um texto, para ser definido como tal, deve ter coerência e coesão. Isso significa que os enunciados devem estar inter-relacionados, encadeados entre si.

Por outro lado, a extensão do texto pode ser variável e a materialidade com que se apresenta também varia: pode ser uma foto, um vídeo, uma frase, um poema, um texto em prosa, uma conversa informal ou telefônica. Também pode apresentar-se como um artigo científico, notícias, um filme, entre outros.

Desdobrando o conceito, a autora propõe a presença de coesão e coe-rência para que o significado esteja presente entre os interlocutores. Ela tam-bém propõe a necessidade de uma unidade de sentido para que realmente se estabeleça a comunicação.

Um exemplo clássico, muito citado, é o caso de Victor Hugo, escritor do romance Os Miseráveis. Quando a obra ficou pronta, ele mandou os originais para o seu editor, com um bilhete, no qual havia escrito apenas: “?”. Depois que o editor leu o romance, escreveu outro bilhete em que se lia somente: “!”.

Hoje em dia, mesmo fora da situação de comunicação entre autor e edi-tor, é possível compreender que Victor Hugo estava interrogando seu editor com algo como: “Que tal?” ou “Está bom?”. E o editor responde dando a enten-der que está maravilhoso, estupendo.

Na contemporaneidade, quando se lê Os Miseráveis, surgem as mesmas exclamações, agora vindas do leitor. Segundo Fiorin e Savioli (2006, p.18), o texto é “um todo organizado de sentido, delimitado por dois brancos e pro-

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duzido por um sujeito num dado espaço e num dado tempo”.

Os autores fazem um acréscimo à definição de texto: a presença de um sujeito. Aqui eles não se referem ao sujeito gramatical (aquele que pratica ou sofre a ação do verbo), mas a um indivíduo que ocupa determinado lugar e fala desse lugar, num espaço (lugar) não geográfico, numa situação social e num tempo, pois é importante verificar o “quando” para o texto ter sentido.

Esse lugar no discurso é governado por regras anônimas que definem o que pode e o que deve ser dito. Somente nesse lugar constituinte, o texto (dis-curso) vai ter um dado efeito de sentido. Se for falado em outra situação que remeta a outras condições de produção, seu sentido, consequentemente, será outro. Na medida em que se retiram fragmentos de um discurso e se inserem em outro discurso, é feita uma transposição de suas condições de produção. Mudadas as condições, a significação desses fragmentos ganha nova configu-ração semântica (BRANDÃO, 1993).

Aspectos da ComunicaçãoDeve ter ficado claro para você o significado de texto. Agora, veja como

os interlocutores funcionam num dos esquemas de comunicação mais co-nhecidos e funcionais, traçado pelo linguísta Jakobson (1969).

Locutor e AlocutárioEstes dois primeiros elementos constituem-se em sujeitos determina-

dos por condições sociais historicamente delineáveis e portadores das signifi-cações ideológicas de tais condições. Ou seja, locutor e alocutário vão ocupar determinado lugar social (como já visto anteriormente) e esse lugar é deter-minado por condições sociais conhecidas, marcadas pela história.

Para se conhecerem melhor os elementos da comunicação, devem ser colocados em evidência os protagonistas do discurso (quem fala e para quem se fala). As respostas para essas questões vão determinar outros dois novos elementos da comunicação:

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Código linguístico ( a materialidade, o idioma)

Para que o discurso atinja a sua finalidade de comunicação, é fundamen-tal que o código linguístico seja comum ao locutor e ao alocutário. Veja o que aconteceu entre um turista francês e uma baiana vendedora de acarajé pelo fato de não usarem o mesmo código linguístico (a mesma língua).

Um diálogo entre um turista francês e uma baiana vendedora de acarajé, em Amaralina:

Turista: Qu’est que c’est ça? (Traduzindo: o que é isso?)

Baiana: Tem que cessá, sim.

T. : Comment? (Como?)

B. : Com a mão também, sim.

T. Je ne comprend pas. (Eu não compreendo)

B. Se não vai comprar, passe à frente, porque a fila tá grande. (N.C.)

Esse diálogo evidencia o fato de que códigos linguísticos diferentes ge-ram uma situação de não comunicação.

O código linguístico e o tipo de discurso são condicionados aos papéis que locutor e alocutário desempenham. Vale dizer que o discurso é resultante das relações dos papéis sociais.

Agora, é possível acrescentar novos elementos:Locutor

(Remetente)

Contato (Forma como se dá a comunicação)

Código (Linguístico)

Alocutário

(Remetente)

Contexto

(Referente)

Locutor

(quem fala)

Discurso

(o que é falado)

Alocutário

(para quem se fala)

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Pode-se compreender, então, que para haver comunicação, segundo Jakobson, há um locutor (aquele que fala), um alocutário (aquele para quem se fala), um contexto (que aqui significa as condições de produção), a men-sagem (que é o discurso), o contato (via em que o discurso acontece) e, final-mente, o código linguístico (o idioma em que se fala).

É interessante que, a partir do momento em que você conhece os ele-mentos da comunicação, passe a analisar as suas falas e as falas do outro di-rigidas a você. Pergunte-se às vezes: “De que lugar essa pessoa está falando comigo?”, “De que lugar eu vou responder à questão proposta?”. Vai ser uma experiência muito produtiva em relação à comunicação.

Funções da Linguagem Centradas nos Elementos de Comunicação

Sabe-se que qualquer produção, oral ou escrita, tem um objetivo, pois a forma como a comunicação é construída pode provocar efeitos diversos. En-tão é preciso considerar os seguintes elementos: emotivos (identificar qual a emoção envolvida no momento da comunicação), informativos (buscar com-preender as informações que estão sendo passadas) e performativos da lin-guagem (que tipo de performance está sendo desempenhada).

Para que se possam entender melhor esses elementos, Jakobson (1969, p. 118-129) traça os fatores constitutivos de todo processo linguístico e do ato

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de comunicação verbal, relacionando os elementos de comunicação com as funções da linguagem, como se pode ver a seguir:

A função emotiva está centrada no locutor; é a expressão direta da ati-tude de quem fala em relação àquilo de que se fala. Essa função deve ser usa-da quando a subjetividade destaca-se no texto. No discurso escrito, o estrato puramente emotivo da linguagem é apresentado pelas interjeições, exclama-ções; no discurso oral é apresentado pela expressão fisionômica, tom de voz, pausas, entre outros. Essas marcas são de atitude pessoal do emitente, isto é, daquele que fala. Elas dão um colorido às manifestações verbais nos níveis fônico ou gramatical. Por exemplo: conforme se pontua ou se pronuncia uma expressão, o sentido pode mudar. Leia em voz alta as frases a seguir, obser-vando a pontuação:

Isso é comigo?/ Isso! / É comigo. / Isso? / É comigo? / Isso é comigo! Isso é. / Comigo. / Isso é comigo...

Ou então:

Booooa noite! / Boa noite. / Boa noite? / Boa noooite!

Existe a história de um ator cuja peça teatral consistia em dizer de 48 formas diferentes a expressão “boa noite”. Tente algumas formas. Veja como a função emotiva colabora para a expressão comunicati-va.

Se a comunicação estiver orientada para o destinatário, há a função cona-tiva. A palavra conativa vem do latim conatus, que quer dizer “ação de coagir”. Ela aparece, em sua forma mais específica, no uso do vocativo e do imperati-vo. Nessa função há o desejo de impulsionar o alocutário ou destinatário da mensagem para determinado comportamento. Por isso, o uso do imperativo

Locutor

(função emotiva)

Mensagem

(função poética)

Alocutário

(função conativa)

Contexto (função referencial)

Contato (função fática)

Código (função metalinguística)

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exerce uma voz de comando forte. Por outro lado, esse tipo de frase não pode ser submetido ao julgamento de verdadeiro ou falso. Já as frases declarativas podem ser submetidas à prova da verdade. Outra diferença é que as frases declarativas podem ser transformadas em interrogativas, o que não acontece com a função conativa.

Esse tipo de função é muito usado nas propagandas. Um texto publicitá-rio antigo dizia: “Compre baton” repetidamente, na tentativa de quase hipno-tizar o consumidor. A mensagem que era transmitida por uma voz autoritária e persuasiva era quase manipulatória.

Se a mensagem estiver orientada para o contexto, haverá a função re-ferencial ou denotativa. Embora ela apareça em muitas mensagens, deve-se considerar a participação adicional de outras funções. A função referencial pode ocorrer em reportagens, certos tipos de correspondências, textos de caráter científico, entre outros. É uma das funções mais presentes na vida co-tidiana.

A “função referencial” nada mais é do que o referente, que é o objeto ou a situação à qual a mensagem se refere. A objetividade é a marca dessa fun-ção. No entanto, um texto impessoal e objetivo traduz um comportamento linguístico de quem o produziu. Por isso, é preciso desconfiar de sua aparente neutralidade. Por quê? Porque, quando se fala, escolhem-se determinadas pa-lavras que acabam “traindo” a imparcialidade.

Por exemplo, uma manchete “impessoal” diz: “Cidade abandonada; auto-ridades incompetentes”. Há imparcialidade? Não, embora seja uma manche-te bem objetiva. Agora, compare com esta outra manchete: “Cidade cuidada; obras em todos os bairros”. Há imparcialidade? Não. Por quê? Há uma intenção de valorizar o que é feito. Se a objetividade é o resultado de uma atitude pre-meditada, pode acontecer uma manipulação a fim de alcançar determinado objetivo. Nos dois casos é possível verificar formas de manipulação.

Outra função da linguagem centra-se no contato (suporte físico por meio pelo qual a mensagem caminha do remetente para o destinatário). Trata-se da função fática. Essa função se evidencia pela troca de fórmulas ritualizadas pre-sentes nos diálogos, cujo objetivo é prolongar a comunicação. Como exem-plos, é possível citar: “Alô, está ouvindo?”, “Pois é!”. Essa função ocorre também nas situações em que se deseja preencher o silêncio. Então, fala-se do tempo,

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de filmes, entre outros. É importante levar em consideração se a comunicação se faz por telefone, por carta, por meio de um diálogo convencional ou outras formas.

A função da linguagem que se refere ao código é a função metalinguís-tica. Nesta função, o texto faz uso do código para explicar a linguagem e seus usos. Ou seja, metalinguagem significa falar da própria linguagem. O dicioná-rio é um exemplo de obra metalinguística. Em outro exemplo, Carlos Drum-mond de Andrade, em um poema intitulado O lutador, fala da luta do poeta com as palavras. Veja os primeiros versos:

“Lutar com palavras / é a luta mais vã / entanto lutamos/ mal rompe a manhã.”

Em todo o texto, o poeta mostra que existe um embate no momento do uso das palavras. Além da função metalinguística, há no poema a função centrada na mensagem, que recebe o nome de função poética.

Vale dizer que, quando se diz “poética”, a tendência é achar que essa função só se aplica à poesia, mas não. Ela deve ser estudada no âmbito dos problemas gerais da linguagem e não pode ser reduzida apenas à poesia.

Veja o exemplo de Jakobson: “Por que você sempre diz ‘Joana e Mar-garida’ e nunca ‘Margarida e Joana’? Será porque prefere Joana à sua irmã gê-mea? De modo nenhum; só porque assim soa melhor” (JAKOBSON, 1969, p. 128). Essa é uma questão de sonoridade que marca um idioma. No entanto, a função poética não está somente na busca do melhor som para enunciar a mensagem, mas também no trabalho com a linguagem, na conotação.

Portanto, o estudo da função poética deve abranger toda a poesia e ultrapassar esse limite. Não se pode restringir o estudo da poesia à função po-ética. Por exemplo, a poesia épica põe em destaque a função referencial da linguagem; a lírica, orientada para a primeira pessoa, destaca a função emo-tiva; a poesia súplice, ou exortativa, destaca a segunda pessoa, vem imbuída da função conativa.

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A elaboração do texto com função poética parte de um trabalho de se-leção e arranjo das palavras além da exploração de seus significados, criando efeitos sonoros e rítmicos no texto.

Ao estudar as funções da linguagem, deve-se ter em mente que é muito raro um texto ser de apenas um tipo de função. Haverá uma função domi-nante, mas podem aparecer outras em segundo plano.

Coesão e Coerência

CoesãoA coesão garante a unidade do texto por meio do uso adequado de ele-

mentos gramaticais e lexicais. Enquanto a coerência está diluída no texto, a coesão aparece de forma clara. Por isso afirma-se que, por meio da constru-ção, percebe-se a coesão, que pode ser entendida como a “liga” do texto.

Observe que no exemplo “Estava dormindo porque o sol nasceu”, o texto é incoerente devido ao uso indevido da conjunção “porque”, que dá uma ideia de causa. O correto seria usar um operador argumentativo de tempo. A frase então ficaria: “Estava dormindo quando o sol nasceu”.

Enquanto a coerência é subjacente ao texto, a coesão é revelada por meio das marcas linguísticas, índices formais na estrutura da sequência lin-guística e superficial do texto que formam um fio condutor. Coesão, então, é a relação de nexos que se estabelecem entre os elementos que constituem uma superfície textual.

Num texto, há coesão quando existe uma conexão entre os períodos, produzindo o sentido do texto. Para alcançar essa união entre os vários enun-ciados, existem classes de palavras chamadas de elementos de coesão ou co-nectivos. São elas: preposições, conjunções, pronomes e advérbios.

Entre elas destacam-se as conjunções, que têm a função de pôr em evi-dência as relações entre os enunciados. Os pronomes, por sua vez, podem

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substituir ou determinar um nome; e os advérbios podem modificar o sentido de um verbo, de um adjetivo e do próprio advérbio. Esses elementos não são formas vazias que podem ser substituídas entre si sem nenhuma consequên-cia, ao contrário: são formas linguísticas que carregam um significado, promo-vem a coerência e, para usá-las, são necessários critérios especiais, tais como:

• Manter uma estrutura no texto para garantir que ele esteja organi-zado, com começo, meio e fim;

• Visualizar o conjunto com uma leitura atenta, verificando se o “todo” do texto faz sentido;

• Observar como se forma a conexão entre os enunciados, verifican-do se um período está ligado ao outro e se acontece o mesmo com os parágrafos.

Operadores do Tipo Lógico e do Tipo DiscursivoÉ importante fazer uma revisão do uso dos operadores argumentativos

representados pelas conjunções.

Cunha (1972, p. 532) conceitua as conjunções como “vocábulos gramati-cais que servem para relacionar duas orações ou dois termos semelhantes da mesma oração”. As conjunções podem ser coordenativas ou subordinativas. Percebe- se facilmente a diferença entre elas ao comparar as construções de orações às construções de nomes. Por exemplo:

(1) Estudar e cantar. O estudo e o canto.

(2) Estudar ou cantar. O estudo ou o canto.

Veja que a conjunção coordenativa não se altera com a mudança da construção, pois liga elementos independentes, que estabelecem entre eles relações de adição, como no primeiro caso, e de alternância, como no segun-do. Essa é a característica das conjunções coordenativas, elas coordenam sem que haja dependência entre os elementos.

Observe agora os enunciados seguintes:

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(3) Quando tiver estudado o assunto, pode ensaiar o canto.

(4) Depois do estudo, o canto.

Note que, no exemplo três, há a dependência da primeira oração (quan-do tiver estudado o assunto) em relação à segunda (pode ensaiar o canto). Já no exemplo 4, no lugar da conjunção subordinativa “quando” há uma prepo-sição (“depois” substituindo “após”) que está colocando a dependência de um elemento a outro (só depois de ter estudado é que pode ensaiar).

Operadores do Tipo Lógico e do Tipo DiscursivoTendo visto como se organizam os elementos de um período em relação

à coordenação e à subordinação, é importante situá-los. Portanto, observe dentre os recursos que auxiliam na manutenção da coesão, quais são os prin-cipais operadores argumentativos, cujo papel no texto é de manter a logicida-de e promover a coerência:

Relações dos Operadores do Tipo LógicoDisjunção

Exemplo: ou.

Condicionalidade

Exemplos: se, caso, desde que.

Causalidade

Exemplos: já que, visto que, tanto (assim) que, porque, então, assim, por isso.

Mediação

Exemplos: para que, para, a fim de que.

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Relações dos Operadores do Tipo Discursivo Argumentativo

Disjunção

Exemplo: ou – quando se propõe “isto ou aquilo”.

Conjunção

Exemplos: e, também, tanto quanto/como, além disso, além de, nem (no sentido de “e não”), não só, mas também, ainda – quando se acrescenta, soma.

Contrajunção

e (no sentido de “mas”), mas, no entanto, porém, entretanto, todavia, contudo, embora, apesar de, ainda que, mesmo que – quando expressa opo-sição entre os elementos do período.

Explicação

Exemplos: pois, porque, que – para justificar ou explicar.

Conclusão

Exemplos: assim, portanto, logo, por isso, então, pois, por conseguinte – para demonstrar a que resultado se pode chegar.

Se você prestar atenção ao que fala ou ao que lê, verá que os operadores lógicos e argumentativos dão o sentido e organizam logicamente a comuni-cação, seja oral, seja escrita.

CoerênciaA coerência é responsável pela unidade semântica, pelo sentido do tex-

to, e envolve não só aspectos lógicos e semânticos, mas também cognitivos.

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É um fator que não se encontra presente no texto, mas constrói-se a par-tir dele, envolvendo o autor e o leitor. Com a sua experiência de vida, o autor cria no texto uma determinada situação com uma finalidade. O leitor, com base no seu conhecimento e nas suas experiências, vai atribuir sentido ao tex-to.

Observe um exemplo em que o sentido do texto é incoerente, incomple-to: “No sertão as casas ficaram alagadas devido ao mau tempo, embora não tenha chovido e a seca tenha sido intensa”.

Ora, existem dois motivos para as casas alagarem: vazamento de água ou chuva. Ao consultar suas experiências e conhecimento do mundo, você verifica que se for levada em consideração a forma como as pessoas valorizam a água nas regiões de seca e no sertão, não haveria a possibilidade de vaza-mento; por outro lado, também lá não chove. Há uma incoerência cognitiva, tornando o sentido ausente.

Coesão e coerência são duas faces do mesmo fenômeno, assim, de-fine-se a coerência textual como uma lógica interna que deve existir para dar verossimilhança e verdade ao texto.

A incoerência pode acontecer quando:

1. O locutor usa dois processos verbais em duas fases distintas de sua realização (entende-se por processos verbais fatos acontecidos em determi-nados períodos de tempo).

Exemplo: Maria já tinha lavado a roupa quando chegamos, mas ainda estava lavando roupa.

Observe que a locução verbal “tinha lavado” dá a ideia de processo aca-bado e o advérbio “ainda”, juntamente com a locução “estava lavando”, dá a ideia de processo não acabado.

O correto seria dizer: Maria já tinha lavado a roupa quando chegamos, mas ainda não tinha passado a ferro.

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2. Há uma relação de oposição contrariando a relação da causa que pare-ce ser a mais plausível e esperada, como no exemplo:

“João não foi à aula, entretanto estava doente”.

Nota-se que as duas partes do período não estão coesas porque o termo “entretanto” dá ideia de oposição. Deveria ser atribuída uma relação de cau-sa, nesse caso, utilizando conjunções do tipo: pois, porque, devido ao fato de, entre outras.

Algumas opções corretas para construir essa frase seriam:

• João não foi à aula porque estava doente.

• João não foi à aula pois estava doente.

• João não foi à aula devido ao fato de estar doente.

3. Há uma informação que contraria o conhecimento geral.

Exemplo: A galinha estava grávida.

Para determinar a coerência de um texto, é necessário considerar:

a) a combinação entre os elementos linguísticos do texto;

b) o conhecimento prévio sobre o mundo em que o texto se insere;

c) o tipo de texto.

Você viu várias formas de manter a coerência, de dar sentido ao que se escreve e de como atribuir sentido ao que se lê. Procure praticar o que foi exposto anteriormente para assegurar a qualidade e a verdade aos seus tra-balhos.

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Fala e EscritaAs gramáticas tratam, em geral, das relações entre fala e escrita, tendo

como parâmetro a língua escrita. Esse procedimento dá uma visão um tanto preconceituosa, valorizando a língua escrita como se fosse a fonte, quando na verdade o indivíduo aprende, em primeiro lugar, a fala e depois a escrita.

Quando uma criança ingressa na escola, já domina a fala e expõe suas opiniões, tem noções de distância e tamanho. Partindo desse ponto de vista, é necessário verificar:

• Como se processa a linguagem oral;

• Quais os pontos de contato e de afastamento entre as modalida-des oral e a escrita;

• Quais os componentes em evidência no ato da fala e da escrita e como desenvolver essas habilidades .

Para marcar as diferenças entre fala e escrita, observe algumas caracterís-ticas que marcam essas modalidades.

Características da fala

• Pressuposição de um ouvinte

A comunicação é imediata, logo, na linguagem oral, há um falante e um ouvinte. Até mesmo naquele caso em que o falante diz que

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“fala com seus botões”, para dizer que está falando sozinho, há a necessidade de um ouvinte.

• Rapidez na enunciação

Pensa-se e logo se enuncia, não há elaboração vocabular. Quando há o diálogo, a fala acontece com naturalidade.

• Comunicação em que não há fontes para pesquisa

Neste caso, fala-se o que se sabe ou o que se tem em mente. O que é dito é fruto do conhecimento do falante e, se houver dúvida, o próprio interlocutor (o ouvinte) pede esclarecimento no momen-to da fala.

• Possibilidade de explicações no caso de turnos de fala

Os pontos que tiverem ficado obscuros podem ser explicados. En-tende-se por turnos de fala quando, num diálogo ou conversa em grupo, cada locutor fala e dá espaço para que outro falante tome a palavra.

• Retomadas, repetições e explicações em turnos de fala

O interlocutor retoma, repete e explica conforme o seu desejo.

Características da escrita

• A presença de um leitor

A presença do leitor é fundamental, mas a presença física do autor é desnecessária, além de que entre o momento da escri-ta e o da leitura há a distância no tempo e no espaço.

• A produção reflexiva

É necessário um plano de escrita, visto que, de acordo com a estrutura desejada, elabora-se um projeto do que se preten-de escrever e é possível recorrer a outros textos com o intuito de fundamentar as ideias.

• Revisão do texto

As partes reescritas serão marcas propostas pelo próprio pro-dutor do texto.

• Texto à disposição do leitor

Depois de considerado pronto pelo autor e publicado, o texto fica à disposição do leitor sem que o autor tenha controle das

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consequências. Um exemplo que deixa clara essa característi-ca pode ser visto no filme “O poeta e o carteiro”.

Nela, o poeta Pablo Neruda compôs um poema para a sua es-posa. Para conquistar a namorada, o carteiro copia o poema e o dedica à moça. Quando o poeta toma conhecimento do fato, diz ao carteiro que ele não poderia ter feito aquilo, pois aquele poema era para outra mulher e não para a namora-da dele. O carteiro então respondeu: “Um poema serve para quem precisa dele”. O poeta riu e assentiu.

• Possibilidade de fazer escritas e reescritas

Muitas vezes as escritas e as reescritas são dependentes da autocrítica ou da posição dos leitores. Sendo assim, o segredo do bem escrever é reescrever até que o autor se sinta satisfei-to.

Portanto, a linguagem pode ser usada em duas modalidades, nas seguin-tes formas:

• Linguagem oral: usada em diálogos, bate-papos, entrevistas, pa-lestras, situações conversacionais, entre outros;

• Linguagem escrita: usada no cotidiano, nos artigos científicos, nas dissertações, nas cartas, nas composições poéticas, nos contos, nas crônicas, nos romances, entre outros.

Se forem comparadas linguisticamente a fala e a escrita, é possível notar que a fala é mais livre e tem expressões dinâmicas enfatizadas pela expressão corporal, tom da voz, pausas, digressões e, frequentemente, algumas contra-ções como “né” (não + é ) , entre outros. Por outro lado, a escrita exige um maior domínio da língua culta. Diversos erros como os de grafia e os de con-cordância não são permitidos e a estrutura deve ser coerente, assim como a coesão entre as partes do texto deve ficar evidente.

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Variedade LinguísticaEntende-se por variedade linguística as diversas linguagens usadas nas

inúmeras situações do cotidiano. Você verá a seguir as variedades sincrônicas (usadas no tempo presente ou num mesmo plano temporal) e as variedades diacrônicas (formas de linguagem e suas mudanças que ocorrem em tempos diferentes), assim como a diferença entre as linguagens utilizadas por você e por seus avós.

Variedades Sincrônicas

São simultâneas, observáveis num mesmo plano temporal e determina-das por fatores geográficos, socioculturais e estilísticos.

• Fatores geográficos

São dialetos ou palavras usuais de uma região, vila ou aldeia. Por exemplo, não é utilizada a mesma linguagem e suas expressões no Rio Grande do Sul e no Rio Grande do Norte. Certamente existem diferentes termos para designar a mesma situação.

• Fatores socioculturais

Pode ser família, classe, padrão cultural, atividades habituais. Clas-ses sociais diferentes apresentam formas diferentes de comunica-ção; por outro lado, conforme a profissão exercida pelo indiví-duo, palavras usadas especificamente no trabalho podem ser trazidas para a linguagem cotidiana.

• Fatores estilísticos

Variação observada de momento para momento na atividade lin-guística, vista como uma adequação que o indivíduo realiza, cons-tituindo-se na satisfação de necessidades cognitivas próprias de seus atos verbais. Ou seja, a forma como cada indivíduo constrói a sua comunicação para adequá-la à situação da fala. Um exemplo é a diferença dos registros utilizados numa conferência e no contato familiar.

Variedades Diacrônicas

São as variedades dispostas em vários planos de uma só tradição histó-rica.

Trata-se de pesquisar as variações ocorridas em diferentes períodos his-

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tóricos. Por exemplo, a variação de uma palavra no português medieval, no português do século XVIII e no português da modernidade.

Um exemplo é a palavra “embora” numa visão diacrônica. No século XIX dizia- se “emboahora”, na modernidade usa-se “embora”, mas atualmente na fala dos jovens pode-se ouvir “bora” ou até “bó”.

Algumas considerações:

• A linguagem será “colorida” de uma forma diferente. De acordo com o tema da conversa e a escolha das palavras, define-se se ha-verá mais paixão ou mais indiferença no ato comunicativo.

• Levando-se em consideração a situação em que se executa o ato da

• fala e para quem o falante se dirige, a escolha das palavras tam-bém traz variações na linguagem.

• Novos padrões para classificar os erros linguísticos surgem quando são consideradas as diferenças entre as linguagens escrita e falada, assim como a temporalidade e outros registros usados para o ato comunicativo.

• Um indivíduo entra em contato com uma diversidade linguística, em situações diferentes, e não só a compreende, como também produz. Para isso, basta comunicar-se em um grupo social variado.

Não existe uma linguagem única, assim como há muitas variantes e situ-ações adequadas para cada tipo de linguagem. Portanto, é muito importante respeitar essas variações, pois a língua está em constante modificação.

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Noções de Texto e Aspectos da Comunicação

Saiba maisLeia o artigo: O texto como objecto empírico: consequências e desafios para a linguística, de Maria Antónia Coutinho. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/artigo076.pdf>. Acesso em: 22 dez. 2014.

Este artigo analisa a relação entre textos e gêneros de texto, inte-grando contribuições da linguística textual, do interacionismo socio-discursivo e da semântica textual. Os textos são entendidos como objetos empíricos e como sistemas complexos.

Leia o livro: Coesão e Coerência Textuais,de Leonor Lopes Fávero. Dis-ponível em: <http://tinyurl.com/q3r47or>. Acesso em: 22 dez. 2014.

A finalidade deste livro é examinar os fatores de coesão e coerência, procurando tornar explícitos alguns mecanismos de estruturação e de compreensão de textos.

Leia o livro: O texto e a construção dos sentidos, de Ingedore Villaça Koch.

Esse é um livro para se entender o que é e como se constrói um bom texto.

Leia o livro: A língua de Eulália, de Marcos Bagno.

Neste livro, você poderá compreender melhor como funcionam as variações linguísticas.

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SínteseNesta unidade, você estudou os aspectos de discurso e texto, bem como os diversos enfoques feitos por autores da área. Observou e analisou textos em que a coerência e a coesão são fundamentais para estabelecer o sentido. Viu que o Brasil, apesar de ter um único idioma, pode apresentar variações típicas de cada estado e estudou que tanto para a fala como para a escrita há regras, e que não se pode considerar a linguagem oral como uma linguagem de erro.

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