Cabrita Reis

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Os Outros, in Pavilhão 27, Júlio de Matos, Lisboa

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A P28 inaugura ‘Os Outros’, na quinta-feira, às 21.00, no Pavilhão 27 do Hospital Júlio de Matos,em Lisboa

A “associação de desenvolvimento cultural e artístico” P28 inaugura, esta quinta-feira, às 21 horas, a exposição Os Outros, de Pedro Cabrita Reis, na qual o escultor e pintor posou para Artur Moreira, Francisco Gromicho, Francisco Guerra, Marta Sales e Walter Barros, numa subversão da lógica convencional do acto de expor.

Em Os Outros, o espaço do pavilhão 27 do Centro Psiquiátrico de Lisboa é utilizado para potencializar a relação entre os desenhos destes cinco artistas e as esculturas luminosas (literalmente) de Pedro Cabrita Reis.

Se, normalmente, a presença do artista na exposição está presente nas obras que assina, aqui é o protagonista que figura em todos os retratos, que foram posteriormente objecto de uma pós-intervenção, da autoria de Cabrita Reis, com vista a integrá-los no espaço.

Acerca do carácter assumidamente arrojado da exposição, o responsável pela P28 e co-produtor de Os Outros, Sandro Resende, realça o carácter desafiador desta instalação: “Nunca fomos uma organização convencional”, declara, acerca da disponibilidade que a P28 manifestou em acolher a “ideia” de Pedro Cabrita Reis.

“A nossa intenção não é realizar um circo de horrores, apesar do espaço em que a exposição se realiza”, explica, “houve uma preocupação em dar muito espaço, para deixar as obras respirar.” Impera então realçar a preponderância do local no carácter de Os Outros, que utilizam uma disposição

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minimalista guiada por um critério conceptualmente apurado, baseado na justaposição dos quadros e da luz néon das peças de Cabrita Reis, dispostas de modo a criar situações de choque entre as expectativas do visitante e a configuração das salas de exposição.

Para além de Os Outros, a P28 espera inaugurar, ainda no final do mês de Maio, um novo espaço de exibição nas docas de Alcântara (Lisboa). O próprio Pedro Cabrita Reis será o primeiro artista a expor nesta nova galeria. Para já, os 34 desenhos de Os Outros (e as 40 esculturas que os acompanham) estarão no Pavilhão 27 do Hospital Júlio de Matos até dia 30 de Junho, entre as 10.00 e as 17.00, de 2.ª a 6.ª-feira, e as 14.00 e as 20.00, aos sábados.

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Como os outros pavilhões, este tem também uma letra - P - e um número - 27. Nas oitos salas, estão expostos 37 desenhos de cinco artistas residentes do atelier do Hospital Júlio de Matos. Pedro Cabrita Reis ofereceu-se como modelo para os retratos. “Os Outros”, até 30 de Junho.

O Hospital Júlio de Matos aparece cedo na vida de Artur. É o próprio que o diz num texto para o catálogo da exposição “Os Outros”, ontem inaugurada no novo Pavilhão 27 do agora Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, antigo Júlio de Matos - e no qual se revela. “As minhas crises eram reincidentes e os internamentos foram-se sucedendo uns após os outros, sem nunca resolver os problemas de fundo. (...) Hoje estou bem. (...) Tenho 42 anos e corro atrás dos meus sonhos.”Artur Moreira corre atrás de sonhos, quer refazer a vida, depois do mergulho na solidão que se seguiu a um divórcio. “Atravessei o meu deserto, é verdade”, diz já em entrevista. Agora vive com a mãe. E corre “com um Ferrari Testarossa depois de ter entrado com um Fiat 600” - assim encara as melhorias que sente depois de um “trabalho muito árduo, que absorveu imensa energia e paixão, e uma carga emocional muito grande”. Um percurso que quase confunde a terapêutica com a dedicação ao desenho, nos últimos sete anos.É um dos quatro artistas/doentes/residentes da exposição com Pedro Cabrita Reis - o pintor aceitou o convite de Sandro Resende, orientador de desenho e pintura no serviço de reabilitação do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa e responsável da Associação P28 Associação de Desenvolvimento Criativo e Artístico, para participar em mais um

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projecto que junta artistas de dentro e de fora do hospital, desta vez no Pavilhão 27, espaço de exposições de arte contemporânea, também ontem inaugurado.Em resposta ao convite, Cabrita Reis ofereceu-se como modelo aos cinco artistas/doentes. E escolheu “Os Outros” para nome da exposição de desenhos de Artur Moreira, Francisco Gromicho, Marta Sales, Walter Barros e Francisco (que prefere não dar o apelido). “O trabalho foi muito emotivo, muito rápido, instantâneo. Eles trabalharam enquanto o Pedro se movimentava.” No fim, já com os 37 desenhos escolhidos, Cabrita Reis compôs peças escultóricas com luz que reflecte nos retratos e assim passam também a auto-retratos. Os desenhos com as esculturas nas oito salas do pavilhão.A luz de fora preenche o espaço que se espraia por salas pequenas e outras mais amplas, de cada um dos lados iguais de um longo corredor. Sobrepõe-se à memória de vidas que aqui ficaram suspensas, de forma definitiva ou temporária. Uma memória que se arruma, como reflexo, no esquecimento. Mas isso é antes de as grades em quadrícula sobre as janelas no interior das paredes nos lembrarem que aqui também houve histórias de internamento.Cumprir a vidaFrancisco recorda o dia em que entrou e entregou tudo o que tinha, mesmo os simples acessórios, como o cinto das calças que, naquele sítio, por precaução, ganhavam novo significado. Gosta de desenhar mas preferia não ter de o fazer se isso significasse não ter sofrido e ter de vir ao hospital agora como doente externo. Depois de um curto internamento, sente-se melhor. Tem 70 anos e quer

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cumprir a vida, os projectos de leituras, passeios e visitas - os sonhos que acumulou.Num dos dois desenhos que tem expostos, não se vê mas adivinha-se a cara de Cabrita Reis, com os óculos posados na forma arredondada da barriga, com os pés e as dobras da camisa bem definidos. No outro desenho, as palavras “jacente”, “Holbein” e “Mantegna” (numa evocação do “Cristo” do pintor alemão Hans Holbein - 1487-1543 -, inspirado do italiano Mantegna) que Cabrita Reis escreveu a vermelho a seu lado.Nem Francisco nem Artur Moreira pensaram em quem convidar para a inauguração. A pergunta parece não fazer sentido, mas acaba por motivar respostas. Talvez a irmã, para Francisco, que parece ser a única pessoa que tem. Talvez a mãe, diz Artur, “agora que não sai tanto em passeios comigo por eu já não ter a mesma necessidade de espairecer”.“Estou num caminho secundário à procura do nó para entrar de novo na auto-estrada”, continua Artur. Perdeu-se nos chavões que catalogam as pessoas como esquizofrénicas ou psicóticas. “As doenças mentais são estigmatizadas. Mas acho que todos nós somos potenciais esquizofrénicos.” E para quem não sabe: “A reabilitação de um doente mental está sempre associada a um enorme sofrimento.” O projecto de Sandro Resende, com a Associação P28 Associação de Desenvolvimento Criativo e Artístico, desde 2002 no Júlio de Matos e noutros espaços em Lisboa, centra-se nessa ideia de reabilitação pela arte. “Nós reabilitamos espaços mas também reabilitamos pessoas, nem que seja as pessoas que vêm cá e nunca antes viram uma exposição”, diz. Especifica: “A nossa ideia é puxar o artista de fora para dentro do hospital para as

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pessoas perceberem que a exposição dos doentes é uma exposição contemporânea, conceptual”, como outra. “Não há aqui a explorar a ideia” dos artistas/doentes como “seres diferentes”. “Este é um trabalho de desenho e escultura.”Interpretação em espelho Na sala com mais desenhos, Cabrita Reis também preencheu o espaço com mais esculturas de madeira, cimento e luz, que se equilibram como seres interligados entre si. O efeito da luz sobre os desenhos muda consoante a posição de quem observa, da mesma forma que o desenho que retrata o modelo e pintor muda consoante a perspectiva de quem o retrata.“Há uma interpretação do Pedro através das esculturas e da iluminação”, diz Sandro Resende. Poder-se-ia também dizer que em cada desenho há uma interpretação do modelo, da sua silhueta, da sua forma que, segundo Francisco Gromicho, 48 anos, se presta ao trabalho que faz desde que frequentou a escola de artes visuais do Arco, em Lisboa, nos anos 1980. “Eu trabalho muito com o volume, com a sensualidade da forma. E as formas arredondadas de Pedro Cabrita Reis proporcionam isso.”Quando Sandro Resende lhe falou do projecto, Gromicho sentiu receio como noutras alturas da vida em que teve medo das coisas se tornarem demasiado grandes para poder lidar com elas. Receia porque idealiza, como idealizou as respostas desta entrevista. Sofre de esquizofrenia emotiva, relacionada com o envolvimento emocional com o mundo e com as pessoas, explica. “É uma vivência muito interior, muito pessoal. Fico a memorizar o que vivi, o que as pessoas disseram, nem sempre consigo fazer o luto das situações ao

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longo do dia. Tenho dificuldade em passar à frente e avançar.” Por isso, completa, aceitou este desafio com o Pedro Cabrita Reis como uma proposta “para a frente”.Na folha de papel em branco, avança sem medo. Como na grande folha onde cabem três figuras de Cabrita Reis. À frente da obra, revive o momento de um ou dois minutos que durou o processo de criação “muito intuitivo”: “Na pose em que [Cabrita Reis] está deitado, com cores, vejo os pés, depois levanta-se, circula, e as costas são em cinzento, como se a figura estivesse a sair do peito. À esquerda está em cruz, no canto.”Como pessoa rebelde que é, incapaz de um trabalho regular, precisa de rotina para “procurar chão”.“O desenho é uma forma de disciplina e reflecte por vezes um estado de alma. Vou controlando a minha saúde através do desenho. Às vezes sinto-me diferente, insuficiente socialmente, e então talvez procure nas formas essa lacuna, embora eu também escolha a solidão, mas uma solidão preenchida com as imagens que me rodeiam”, diz.Desenhar para possuir“Desenhar uma pessoa é a melhor forma de a possuir”, escreve Marta Sales no catálogo, onde transcreve um curto diálogo com Pedro Cabrita Reis:“M - Pedro, estás possuído.P - E como foi?M - Foi um prazer (Pausa)Vou pedir um café, já volto. Fica sossegadinho e não gires a cabeça 360º, que isso assusta as pessoas.”Numa das oito salas, o retrato feito por Marta Sales do artista em pé de braços abertos começou pela mão esquerda e o contorno foi desenhado com um traço único. Em frente, a escultura de luzes que

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Cabrita Reis imaginou para esta sala está a abraçar a imagem.Num outro desenho que ocupa uma das paredes sobrepõe várias silhuetas, em traço fino, de Cabrita Reis sobre uma figura de contornos e formas preenchidas sentada.“Marta Sales é, dos cinco, a que faz um desenho mais directo, mais fiável”, diz Sandro Resende. Marta é jovem, arquitecta e tem talento, mas um futuro incerto. “Gromicho é um artista muito expressivo.” Desenha como respira. Não parou nas cinco horas intensivas que durou o projecto. “O Artur é uma pessoa mais emotiva e interage mais com o modelo, com o Pedro”, completa Sandro Resende. Artur sabia sempre responder quando lhe perguntavam o que queria ser. “Arquitecto”, dizia. Mas agora nota: “As coisas não são sempre como esperávamos que fossem.”Ainda podem ser, parece querer dizer Sandro Resende.Artur Moreira já expôs no Palácio das Galveias e Francisco Gromicho vendeu vários retratos. Além das várias exposições com artistas profissionais no Pavilhão 28, os artistas do atelier do hospital já expuseram em projectos na Culturgest e na Gulbenkian. “Há esta necessidade de eles passarem estes muros baixinhos mas que na cabeça deles são muito altos.”

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Dentro do hospital psiquiátrico Júlio de Matos, há um pavilhão que é, desde há cinco anos, um lugar experimental de arte contemporânea. Chama-se Pavilhão 28 e exibe regularmente exposições nas quais participam conjuntamente artistas emergentes, consagrados e outros que são doentes psiquiátricos. Sandro Resende é o mentor do projecto e esta semana, num outro pavilhão, o 27, inaugura mais uma etapa. A exposição chama-se “Os Outros” e junta no mesmo espaço os seguintes nomes: Artur Moreira, Francisco Gromicho, Francisco Guerra, Marta Sales, Walter Barros e... Pedro Cabrita Reis. Todos eles têm em comum o facto de serem artistas, mas Cabrita Reis é o único que não é diagnosticado com uma doença mental e foi ele que serviu de modelo para os desenhos que agora se expõem, frente-a-frente com as suas esculturas.Os doentes e alunos do ateliê de arte (terapia ocupacional) de Sandro Resende fazem um percurso coerente e continuado que já extrapolou as suas actividades, com exposições na Galeria de São Bento, Gulbenkian, Culturgest e Sala do Veado. O estigma de serem doentes é factor que não entra no conceito dos projectos do P28 pois, como diz Sandro Resende, “ao pensar que estou a quebrar esse estigma, estou, pelo contrário, a criá-lo”.Quem são os artistas que participam nesta exposição? Fazem-no por uma questão de tratamento? Sandro Resende: São pessoas que fazem a sua vida normal e vêm todos os dias pintar aqui. É como uma pequena escola em que não há notas, mas em que se aprende a fazer pintura, fotografia, vídeo e outras coisas. Não é terapêutico, porque se um artista vê que o seu trabalho não tem aceitação isso é frustrante como para qualquer um. Querem

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trabalhar e a sua arte faz parte de um processo pessoal.Como se deu o encontro com Pedro Cabrita Reis e porquê a escolha desta abordagem tão primordial como o retrato? Pedro Cabrita Reis: Ao aceitar o convite que o Sandro me dirigiu, optei por criar uma situação-base porque, no fundo, uma aula de desenho de modelo é um acontecimento que está ligado à simplicidade, ao ponto de partida. Uma forma de começarmos todos a partir do zero, encenando a noção de desenhar um modelo que estamos a ver. Não me interessava fazer um workshop em relação ao meu trabalho. A minha ambição interior era estabelecer uma metodologia identitária entre mim e eles.O contacto entre todos deu-se apenas na sessão do exercício de desenho ou houve encontros prévios? PCR: Tudo aconteceu durante a sessão em que inclusive havia elementos dos media presentes. Havia pessoas a desenhar enquanto eu falava com outras e isso fazia parte. Tudo se deu nessas horas: a proposta, o desenvolvimento do trabalho e o encontro com a opinião pública. Foi um bolo compacto com um carácter performativo.A escultura criada no espaço pauta-se por um relacionamento com as obras dos doentes ou pelo seu confronto? PCR: O meu trabalho, ao longo dos anos, tem registado uma presença constante de elementos de luz. Especificamente luzes fluorescentes que para mim não funcionam no sentido de iluminação, mas como matéria, é como um tijolo ou uma barra de ferro. Pareceu-me oportuno que o meu trabalho fosse trazido para aqui no sentido de criar uma participação no projecto como autor, assim como eles, que fazem

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isto todos os dias. Nunca seria possível criar algo condescendente em relação ao entendimento da experiência diária destas pessoas. Concebi uma peça composta por unidades de luz e que se espalham pelas salas e pontuam a minha relação com os desenhos deles.Ou seja, isto é um enorme retrato do Pedro Cabrita Reis feito por outros e pelo próprio... PCR: Podes mesmo chamar retrato de grupo com luzes. O que é engraçado é que estas peças de luz (radicalmente simples e frágeis) vão ser vistas como objecto e reflectidas nos vidros das molduras, porque estão em transparência sobre os desenhos. Não constituem um entrave na observação. Os desenhos passam a fazer parte da escultura e vice-versa, numa peça única.E isto é um projecto paralelo ao seu percurso ou integra-se como um fio condutor? PCR: Não sei dizer com clareza. Tendo a acreditar que isto é uma coisa que eu inscrevo no meu processo. Não considero um desvio nem um fait-divers. Tive sempre ocasiões em que trabalhei em conjunto com outras pessoas. Não houve nisto curiosidade mórbida nem de entretenimento cultural. Tem havido com esta exposição uma tempestade mediática que me incomoda. É óbvio que isto tem um interesse mediático forte, gera curiosidade e, inerentemente, gera a chegada rápida e em catadupa dos agentes de informação. O que revela duas coisas: uma é que este trabalho está a ser bem divulgado pela equipa, a outra é o lado perverso da curiosidade dos media em relação às coisas “esquisitas”. No fundo, o classicismo da proposta (desenhos emoldurados e esculturas facilmente identificáveis como minhas) varre logo do debate a maluquice, a alienação...

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Chegas aqui e vês uma exposição, nada mais. No fundo, o produto é altamente deceptivo em relação às expectativas.Embora em Portugal não se fale nisso, são fortes na América, por exemplo, as correntes da arte bruta, da arte informal ou da ousider art, que pode ser entendida como a arte das pessoas que estão de fora do sistema artístico... Pode-se incluir “Os Outros” nestes campos? SR: Não. A arte bruta é diferente, pois trata de expulsar os males da própria pessoa para uma tela e depois há uma interpretação do psicólogo. Na arte bruta, o artista enche um quadro com informação própria, com o seu passado, as suas doenças... aqui não acontece isso. É um trabalho de arte contemporânea. Imaginemos que o Pedro adoece e vem fazer tratamento aqui ao hospital. Continua a ser um artista. Não há aqui o folclore da arte bruta que é muito puxada para a loucura. Estes doentes trabalham para poderem ter uma obra coerente e terem a oportunidade de a apresentar a galeristas e curadores.Os problemas de cada um são postos à parte neste trabalho. Isso é uma tomada de posição em relação à outsider art e à arte bruta? PCR: A arte bruta tem a ver com o começo da psicanálise, com a libertação das pulsões interiores, fazer sem pensar... Uma coisa que os surrealistas de alguma maneira seguiram. Depois ramificou-se para outras escalas de pensamento. A sua origem já vem do século XVII. Há colecções no centro da Europa com obras feitas por pessoas ditas “diferentes” que suscitaram um apetite coleccionista. No século XIX, os românticos implementaram a apetência pelos artistas “malditos”. A par disso há uma constelação de coisas colaterais como a atracção pela estranheza, que continua

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naquilo que se chama os “gabinetes de curiosidades”, principalmente na Alemanha, que juntavam coisas como ossos de baleia, frutas gigantes, pinturas eróticas e obras de arte feitas por doentes mentais. Havia a ambição de exaltar o individualismo e estratificar a anormalidade do mundo. É preciso ver que o interesse de Jean Dubuffet [o incentivador da arte bruta] não nasce do zero.E esta exposição... PCR: Não tem nada a ver!..“Os Outros” estão no pavilhão 27 (Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, Av. do Brasil, 53) de quinta a 30 de Junho. Aberto de segunda a sexta das 10.00 às 17.00. Sábados das 14.00 às 20.00. A entrada é gratuita.terça-feira, 27 de Abril de 2010

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Exposição com Pedro Cabrita Reis e artistas/doentes do atelier de artes plásticas do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (pólo Júlio de Matos). Em “Os Outros”, Pedro Cabrita Reis é reinterpretado pelos artistas/doentes do CHPL. É um processo criativo que tem como suporte estético final o desenho e escultura. Pedro Cabrita Reis serve de modelo aos artistas/doentes cujo resultado é a reprodução variada da sua figura, apresentada por Artur Moreira, Francisco Gromicho, Francisco Guerra, Marta Sales e Walter Barros. Como resultado desta troca relacional, “Os Outros” é uma exposição onde os desenhos dos artistas/doentes coabitam com a intervenção escultórica de Pedro Cabrita Reis.

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Dentro do hospital psiquiátrico Júlio de Matos, há um pavilhão que é, desde há cinco anos, um lugar experimental de arte contemporânea. Chama-se Pavilhão 28 e exibe regularmente exposições nas quais participam conjuntamente artistas emergentes, consagrados e outros que são doentes psiquiátricos. Sandro Resende é o mentor do projecto e esta semana, num outro pavilhão, o 27, inaugura mais uma etapa. A exposição chama-se “Os Outros” e junta no mesmo espaço os seguintes nomes: Artur Moreira, Francisco Gromicho, Francisco Guerra, Marta Sales, Walter Barros e... Pedro Cabrita Reis. Todos eles têm em comum o facto de serem artistas, mas Cabrita Reis é o único que não é diagnosticado com uma doença mental e foi ele que serviu de modelo para os desenhos que agora se expõem, frente-a-frente com as suas esculturas.Os doentes e alunos do ateliê de arte (terapia ocupacional) de Sandro Resende fazem um percurso coerente e continuado que já extrapolou as suas actividades, com exposições na Galeria de São Bento, Gulbenkian, Culturgest e Sala do Veado. O estigma de serem doentes é factor que não entra no conceito dos projectos do P28 pois, como diz Sandro Resende, “ao pensar que estou a quebrar esse estigma, estou, pelo contrário, a criá-lo”.Quem são os artistas que participam nesta exposição? Fazem-no por uma questão de tratamento?Sandro Resende: São pessoas que fazem a sua vida normal e vêm todos os dias pintar aqui. É como uma pequena escola em que não há notas, mas em que se aprende a fazer pintura, fotografia, vídeo e outras coisas. Não é terapêutico, porque se um artista vê que o seu trabalho não tem aceitação isso é frustrante

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como para qualquer um. Querem trabalhar e a sua arte faz parte de um processo pessoal.Como se deu o encontro com Pedro Cabrita Reis e porquê a escolha desta abordagem tão primordial como o retrato?Pedro Cabrita Reis: Ao aceitar o convite que o Sandro me dirigiu, optei por criar uma situação-base porque, no fundo, uma aula de desenho de modelo é um acontecimento que está ligado à simplicidade, ao ponto de partida. Uma forma de começarmos todos a partir do zero, encenando a noção de desenhar um modelo que estamos a ver. Não me interessava fazer um workshop em relação ao meu trabalho. A minha ambição interior era estabelecer uma metodologia identitária entre mim e eles.O contacto entre todos deu-se apenas na sessão do exercício de desenho ou houve encontros prévios?PCR: Tudo aconteceu durante a sessão em que inclusive havia elementos dos media presentes. Havia pessoas a desenhar enquanto eu falava com outras e isso fazia parte. Tudo se deu nessas horas: a proposta, o desenvolvimento do trabalho e o encontro com a opinião pública. Foi um bolo compacto com um carácter performativo.A escultura criada no espaço pauta-se por um relacionamento com as obras dos doentes ou pelo seu confronto?PCR: O meu trabalho, ao longo dos anos, tem registado uma presença constante de elementos de luz. Especificamente luzes fluorescentes que para mim não funcionam no sentido de iluminação, mas como matéria, é como um tijolo ou uma barra de ferro. Pareceu-me oportuno que o meu trabalho fosse trazido para aqui no sentido de criar uma participação

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no projecto como autor, assim como eles, que fazem isto todos os dias. Nunca seria possível criar algo condescendente em relação ao entendimento da experiência diária destas pessoas. Concebi uma peça composta por unidades de luz e que se espalham pelas salas e pontuam a minha relação com os desenhos deles.Ou seja, isto é um enorme retrato do Pedro Cabrita Reis feito por outros e pelo próprio...PCR: Podes mesmo chamar retrato de grupo com luzes. O que é engraçado é que estas peças de luz (radicalmente simples e frágeis) vão ser vistas como objecto e reflectidas nos vidros das molduras, porque estão em transparência sobre os desenhos. Não constituem um entrave na observação. Os desenhos passam a fazer parte da escultura e vice-versa, numa peça única.E isto é um projecto paralelo ao seu percurso ou integra-se como um fio condutor?PCR: Não sei dizer com clareza. Tendo a acreditar que isto é uma coisa que eu inscrevo no meu processo. Não considero um desvio nem um fait-divers. Tive sempre ocasiões em que trabalhei em conjunto com outras pessoas. Não houve nisto curiosidade mórbida nem de entretenimento cultural. Tem havido com esta exposição uma tempestade mediática que me incomoda. É óbvio que isto tem um interesse mediático forte, gera curiosidade e, inerentemente, gera a chegada rápida e em catadupa dos agentes de informação. O que revela duas coisas: uma é que este trabalho está a ser bem divulgado pela equipa, a outra é o lado perverso da curiosidade dos media em relação às coisas “esquisitas”. No fundo, o classicismo

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da proposta (desenhos emoldurados e esculturas facilmente identificáveis como minhas) varre logo do debate a maluquice, a alienação... Chegas aqui e vês uma exposição, nada mais. No fundo, o produto é altamente deceptivo em relação às expectativas.O Pedro disse uma vez numa conversa com Jorge Molder para a Gulbenkian: “(...) olho sempre de um lugar que outros talvez considerem excessivamente individualista para a época, se comparado com a generalidade das boas consciências praticantes. Sinto-me relativamente de fora, num lugar de grande vastidão, e nas obras que aí faço vou perscrutando o mundo em pensamento e aprendo a esquecer coisas que em tempos julgava saber importantes”. Esta citação relaciona-se com o que estamos presentemente a ver?PCR: Essa conversa ilustra com plenitude um debate que jamais se extinguirá em torno daquilo que é suposto ser as motivações sociais ou políticas da criação artística. Há pessoas que não querem saber disso para nada, e provavelmente são os mais saudáveis. Eu inscrevo-me numa família de pensamento que acha que a criação artística per se é já uma leitura política do mundo. Por isso não tem que sofrer as vicissitudes, as anedotas e os ridículos de uma arte que, praticada por outras famílias, pressupõe ser activa, beligerante e participativa, recorrendo a meios e formas de expressão de uma infantilidade e superficialidade assustadoras sob o diáfano pretexto de com isso estarem a participar na luta política. Eu acho que a única forma que tens de ser plenamente político é seres plenamente silencioso, criativo e atento a tudo o que está à tua volta. Mesmo uma pintura monocromática é provavelmente mais forte enquanto intenção política do que um tipo que,

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imbuído das melhores razões, faz uma fotografia do Rodney King a levar pancada da polícia. Não há maneira melhor de fazer isso do que simplesmente pôr um vídeo no youtube. A política faz-se através da arte, mas de modo diferente, caso contrário é propaganda. A arte serve para expandir a inteligência das pessoas. Só se faz isso colocando perguntas e não dando respostas ou verificando factos. Isso é chamar estúpidas às pessoas e considerar que o público não tem capacidade para conceber o mundo. É preciso acrescentar algo que não haja antes.Isso tem a ver com o que disse há pouco sobre o lado sensacionalista dos média em relação a esta exposição?PCR: É propor uma verificação do curso normal dos acontecimentos. Aqui exacerbou-se isso. E fez-se uma declaração política que foi afirmar que estas pessoas não são malucas, fazem arte e eu vim fazer uma exposição com eles. Ponto final.SR: Aqui ninguém corta as orelhas (risos)...O Pedro, durante a fase de desenho, foi como um performer...PCR: tentei estar em permanente movimento, fixar algumas posições... Li algumas coisas e com isso saiam ideias que fizerma parte da construção daquele momento.Construiu uma personagem? Criou um subtexto?PCR: Nada disso. Peguei num livro de poemas e ia lendo. Em certos momentos foi uma coisa puramente física, em relação com objectos, noutros foi como medir o corpo encostado à parede. Fez-se um percurso de vários momentos tendo como ponto de partida a questão do modelo e obrigando-os a desmarcarem-se, mudando constantemente de

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posição. Isso é importante, é um treino de atenção. De facto, a coisa que é verdadeiramente importante, e que é a base de todo o trabalho intelectual, é o espanto. O espanto é um conceito filosófico grego que representa a capacidade de manter a curiosidade em pleno e permanente estado de ebulição. Essa é a condição base da qual todos os artistas devem partir: estar em permanente estado de espanto. Isso treina-se e é uma pré-disposição que não pode nunca arrefecer para se captar tudo o que está à nossa volta. Por isso resolvi estar em posição permanente de fuga.Embora em Portugal não se fale nisso, são fortes na América, por exemplo, as correntes da arte bruta, da arte informal ou da ousider art, que pode ser entendida como a arte das pessoas que estão de fora do sistema artístico... Pode-se incluir “Os Outros” nestes campos?SR: Não. A arte bruta é diferente, pois trata de expulsar os males da própria pessoa para uma tela e depois há uma interpretação do psicólogo. Na arte bruta, o artista enche um quadro com informação própria, com o seu passado, as suas doenças... aqui não acontece isso. É um trabalho de arte contemporânea. Imaginemos que o Pedro adoece e vem fazer tratamento aqui ao hospital. Continua a ser um artista. Não há aqui o folclore da arte bruta que é muito puxada para a loucura. Estes doentes trabalham para poderem ter uma obra coerente e terem a oportunidade de a apresentar a galeristas e curadores.Os problemas de cada um são postos à parte neste trabalho. Isso é uma tomada de posição em relação à outsider art e à arte bruta?PCR: A arte bruta tem a ver com o começo da

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psicanálise, com a libertação das pulsões interiores, fazer sem pensar... Uma coisa que os surrealistas de alguma maneira seguiram. Depois ramificou-se para outras escalas de pensamento. A sua origem já vem do século XVII. Há colecções no centro da Europa com obras feitas por pessoas ditas “diferentes” que suscitaram um apetite coleccionista. No século XIX, os românticos implementaram a apetência pelos artistas “malditos”. A par disso há uma constelação de coisas colaterais como a atracção pela estranheza, que continua naquilo que se chama os “gabinetes de curiosidades”, principalmente na Alemanha, que juntavam coisas como ossos de baleia, frutas gigantes, pinturas eróticas e obras de arte feitas por doentes mentais. Havia a ambição de exaltar o individualismo e estratificar a anormalidade do mundo. É preciso ver que o interesse de Jean Dubuffet [o incentivador da arte bruta] não nasce do zero.

E esta exposição...PCR: Não tem nada a ver!.

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“Os Outros” inaugura no Pavilhão 27, dia 29 de Abril, às 21H00. Trata-se de uma exposição com Pedro Cabrita Reis e artistas/doentes do atelier de artes plásticas do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (pólo Júlio de Matos).Em “Os Outros”, Pedro Cabrita Reis é reinterpretado por Artur Moreira, Francisco Gromicho, Francisco Guerra, Marta Sales e Walter Barros. Pedro Cabrita Reis serve de modelo aos artistas/doentes cujo resultado é a reprodução variada da sua figura. Desta troca relacional, “Os Outros” é uma exposição onde os desenhos dos artistas/doentes coabitam com a intervenção escultórica de Pedro Cabrita Reis.Inauguração | 29 de Abril | 21H0029 de Abril a 30 de Junho 2010 De 2ª a 6ª das 10H00 às 17H00 / Sábados das 14H00 às 20H00Pavilhão 27 Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa Avenida do Brasil, n.º53 1749-002 LisboaTel. + 351 933 858 779 [email protected] www.pavilhao28.comwww.pedrocabritareis.comData: 2010-04-29Local: Pavilhão 27, Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (Avenida do Brasil, n.º53)

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Os Outros é o desfecho de um processo criativo em que o corpo de Pedro Cabrita Reis se assumiu como ponto de partida.Pedro Cabrita Reis trabalhou com os artistas/doentes do Atelier de Artes Plásticas do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, ao usar o seu corpo como matriz de um processo de produção artística e de um consequente levantar de mundos – o dos artistas/doentes que “O” desenharam.

Esta troca relacional permitiu o conhecimento do eu pelo reconhecimento dos outros e teve o papel como suporte (único) estético à multiplicidade de identidades, isto é, à reprodução variada da figura de Pedro Cabrita Reis apresentada sob a identidade de cada um dos artistas/doentes.

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rr A associação cultural de desenvolvimento cultural e artístico, P28, inaugura esta quinta-feira a exposição “Os Outros”, no Pavilhão 27. Esta mostra é o desfecho de um processo criativo, onde o corpo de Pedro Cabrita Reis se assumiu como ponto de partida. Os 34 desenhos que agora se expõem e as esculturas de luz de Cabrita Reis coabitam numa exposição colectiva - “uma peça única”, sublinha o artista. “Os Outros” resulta dos olhares de Artur Moreira, Francisco Gromicho, Marta Sales, Walter Barros e Francisco Guerra. “Existem tantos mundos quantas pessoas e tantos mundos quantos olhares. É infinito o conjunto de possibilidades que há de entender o mundo”, lembra o artista plástico, que aceitou este desafio de se expor. Deitado no chão sobre uma tela branca, em cima de um banco a declamar, em pé encostado num canto da parede - Cabrita Reis ajudou a criar um jogo de imagens durante a sessão de desenho. “Acima de tudo o que me emocionou foi a forma imediata de como se lançaram ao desenho. Não reparei em qualquer tipo de hesitação, angústia ou ansiedade”, disse o artista, assegurando que se revê em todos os trabalhos. Desde 2004, que a P28 é um lugar experimental de arte contemporânea. Um espaço que “surgiu por necessidade”, já que nenhuma galeria queria expor os trabalhos dos artistas doentes, explicou Sandro Resende, coordenador do espaço. Regularmente exibe exposições nas quais participam conjuntamente artistas emergentes e doentes psiquiátricos. A P28 espera inaugurar, ainda no final de Maio, um

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novo espaço de exibição nas docas de Alcântara (Lisboa). Pedro Cabrita Reis será o primeiro artista a expor neste espaço. Pode ver esta exposição "Os Outros" até 30 de Junho, de Segunda a Sexta-feira, das 10h00 às 17h00; ou aos Sábados, das 14h00 às 20h00

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Pedro Cabrita Reis (n. 1956) “… dá a ver, mas dá também a ouvir, a cheirar, a tocar, a topar de súbito com a evidência da nossa nudez essencial... Exibe o cenário e o reverso do cenário, porque toda a pintura, ou o que lhe quiserem chamar, é igualmente uma profunda reflexão acerca da arte de pintar…”, diz António Lobo Antunes. Em Os Outros o corpo de Cabrita Reis é o ponto de partida do processo criativo dos artistas do Atelier de Artes Plásticas do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa. Da troca relacional nasce a reprodução variada da figura de Cabrita Reis apresentada sob a perspectiva de cada autor.

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