Brasil - Abrigo Crianças e Jovens, Analisando o direito à convivência familiar
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-GRADUADOS EM POLTICA SOCIAL
MESTRADO EM POLTICA SOCIAL
ANA PAULA GOMES DA SILVA
ABRIGO:
analisando o direito convivncia familiar
DISSERTAO DE MESTRADO
DEPARTAMENTO DE SERVIO SOCIAL
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-
GRADUADOS EM POLTICA SOCIAL
NITERI
SETEMBRO/2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-GRADUADOS EM POLTICA SOCIAL
MESTRADO EM POLTICA SOCIAL
ANA PAULA GOMES DA SILVA
ABRIGO:
analisando o direito convivncia familiar
DISSERTAO DE MESTRADO
DISSERTAO APRESENTADA AO
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-GRADUADOS
EM POLTICA SOCIAL DA UFF COMO
REQUISITO PARCIAL A OBTENO DO
TTULO DE MESTRE EM POLTICA SOCIAL
ORIENTADORA: Prof NVIA VALENA BARROS
NITERI
SETEMBRO/2008
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-GRADUADOS EM POLTICA SOCIAL
MESTRADO EM POLTICA SOCIAL
ANA PAULA GOMES DA SILVA
ABRIGO:
analisando o direito convivncia familiar
DISSERTAO DE MESTRADO
DISSERTAO APRESENTADA AO
PROGRAMA DE ESTUDOS PS-
GRADUADOS EM POLTICA SOCIAL DA UFF
COMO REQUISITO PARCIAL A OBTENO
DO TTULO DE MESTRE EM POLTICA
SOCIAL APROVADA PELA COMISSO
EXAMINADORA ABAIXO ASSINADA.
ORIENTADORA: Prof NVIA VALENA BARROS
BANCA EXAMINADORA:
Prof.Dr. MARIA EUCHARES MOTTA
Prof.Dr. RITA DE CSSIA FREITAS
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Todos os direitos reservados. proibida a reproduo total ou parcial do
trabalho sem autorizao da universidade, da autora e do orientador.
Ficha Catalogrfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoat
S586 Silva, Ana Paula Gomes da.Abrigo: analisando o direito convivncia familiar / Ana Paula
Gomes da Silva. 2008.
152 f.
Orientador: Nvia Valena Barros.
Dissertao (Mestrado em Poltica Social) Universidade FederalFluminense, Escola de Servio Social, 2008.
Bibliografia: f. 126-133.
1. Infncia e juventude. 2. Famlia. 3. Poltica Social. 4. Abrigo.
I. Barros, Nvia Valena. II. Universidade Federal Fluminense. III. Ttulo.
CDD 301.45
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DEUS,
que sempre ilumina meus passos.
Ao meu marido Marcos,
Companheiro, amor, amigo de todas as horas
que me ensina a ser forte e no desistir nunca.
A minha av Conceio, minha me, meu porto seguro
que me ensina a ser corajosa.
A meus pais, Jorge e Rosngela,
que me deram grandes exemplos de luta e superao.
A meus sogros, Aldima e Adelino,
sempre carinhosos e presentes.
s minhas irms, Juliana e Rosana,
pela presena sempre marcante em minha vida.
A amiga Carol e cunhada Mariana,
ambas irms de corao
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AGRADECIMENTOS
professora Nvia Valena Barros, orientadora deste trabalho, pela forma de
ateno sempre crtica e enriquecedora.
Carol, pela leitura crtica e reviso criteriosa deste trabalho.
Aos professores do Mestrado pelo incentivo e dedicao que disponibilizaram a
turma.
Aos alunos do curso de Estudos Ps-Graduados em Poltica Social da UFF, em
especial, Ariane, Juliana, Liandra, Mariza, Rosana e Tatiana, que participaram
desta trajetria sempre demonstrando apoio e solidariedade.
equipe da Casa Abrigo de Itatiaia pela abertura e disponibilidade em fornecer
subsdios nossa pesquisa, assim como aos profissionais da SecretariaMunicipal de Promoo Social de Itatiaia.
Ao Conselho Tutelar de Itatiaia, tambm pela abertura, disponibilidade e
ateno.
Aos companheiros da Rede Municipal de Ateno Criana e Adolescente de
Itatiaia pelos momentos de fervorosa discusso sobre a temtica.
E, especialmente, s crianas e adolescentes que exercitam seu poder de luta
a cada dia numa instituio de abrigo.
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RESUMO:
A infncia e juventude viveram historicamente uma prtica de
institucionalizao que se mantm at os dias atuais. O direito convivncia
familiar de crianas e adolescentes que vivem em abrigos um fato ainda
muito discutido, mas pouco implementado de fato devido precarizao scio-
historica de polticas sociais voltadas para esta parcela da populao e para
suas famlias. Aliam-se a este fato a precria capacitao e o pouco
conhecimento das legislaes e determinaes legais sobre esta temtica por
parte das instituies e seus profissionais. Desta forma o presente estudo
busca analisar como vem se desenvolvendo o direito convivncia familiar das
crianas e adolescentes institucionalizadas sob medida de proteo a partir da
perspectiva profissional e das crianas e adolescentes envolvidos e da anlise
scio-histrica das prticas de institucionalizao e da poltica scio-
assistencial para esta parcela da populao.
Palavras-Chave: Infncia e Juventude, Famlia, Poltica Social, Abrigo
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ABSTRACT:
Childhood and adolescence have lived, historically, an institutionalization
practice up to at the present time. Family living rights of sheltered children and
adolescents is a fact much discussed, but not really implemented due to the
socio-historical precariousness of social policies addressed to this part of the
population and their families. Along with part of the institutions and
professionals, the precarious capacitating and the low knowledge about legal
legislation and requirements about this theme goes with it. Therefore, the
present study seems to analyze the way children and adolescent right of the
institutionalized ones as protection measures from professional and children
and adolescents perspective and the socio-historical analysis of
institutionalization and social-populist politic directed to this part of the
populations have been developing.
Key Words:childhood and youth, family, social politics, refuge
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A compreenso da problemtica em jogo, das
relaes sociais, das foras em presena, da
conjuntura, dos espaos institucionais, da contra-
hegemonia, o que pode transformar o trabalho
social num movimento real.
(Vicente de Paula Faleiros)
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LISTA DE SIGLAS
ASG Auxiliar de Servios Gerais
CMDCA Conselho Municipal de Direitos da Criana e do
Adolescente
CRAS Centro de Referncia de Assistncia Social
CREAS Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social
CT Conselho Tutelar
ECA Estatuto da Criana e do Adolescente
LOAS Lei Orgnica da Assistncia Social
PNAS Poltica Nacional de Assistncia Social
PNCFC Plano Nacional de Convivncia Familiar e Comunitria
SGD Sistema de Garantias de Direitos
SUAS Sistema nico de Assistncia Social
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LISTA DE QUADROS E TABELAS
Brasil: distribuio de volunt. por funo desempenhada nos abrigos 44
Mudanas ideolgicas trazidas pelo Paradigma da Proteo Integral 77
Eixos estratgicos do PNCFC 78
Principais atribuies e limites do Conselho Tutelar 93
Responsabilidade Compartilhada 123
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SUMRIO
Introduo 13
1.Famlia e Infncia: trajetrias e desafios 15
1.1 Polticas Pblicas e Famlia: trajetria e limites 15
1.2 A Prtica de Institucionalizao de Crianas: coisa do passado? 29
1.3 A (Re) Construo atual da prtica de institucionalizao de crianas:
alguns dados 36
2. As Polticas Sociais para Infncia e Juventude na Contemporaneidade:
Institucionalizao e Mudana de Paradigma 53
2.1 Polticas Sociais para Crianas e Adolescentes institucionalizados:
Evoluo da Poltica de Infncia e Juventude e a Mudana do Paradigma
Legal no Brasil 53
2.2 Polticas de Famlia e Assist. Social caractersticas e objetivos 65
2.3 Uma nova tentativa: O Plano Nacional de Promoo, Proteo e
Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes Conv. Familiar e
Comunitria 76
3. O direito a convivncia familia nos abrigos em dados: a experincia de
Itatiaia 84
3.1 Trajetria Metodolgica 84
3.2 O municpio de Itatiaia: contextualizao histrica e desenv. 89
3.3 O direito a convivncia familiar no contexto histrico e local de Itatiaia
a partir de alguns indicadores de anlise 95
3.3.1. O direito a convivncia familiar pela tica dos profissionais 95
3.3.2. O direito a convivncia familiar pela tica das crianas e
adolescentes institucionalizados 117
Consideraes Finais 122
Referncias Bibliogrficas 126
Anexos 134
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INTRODUO
A institucionalizao de crianas e adolescentes uma questo
recorrente, ao menos, no ltimo sculo. Historicamente esta prtica se
desenvolveu como medida assistencialista e autoritria impetrada contra as
famlias pobres que, sob a justificativa da pobreza, tinham seus filhos
separados de sua origem.
Na atualidade, a prtica de institucionalizao de crianas e
adolescentes ainda se mantm, ignorando-se o direito convivncia familiar,
preconizado pela Constituio Federal e pelo Estatuto da Criana e do
Adolescente. Muitas das motivaes para a institucionalizao permanecem as
mesmas, girando em torno da pobreza, da falta de condies econmicas das
famlias para cuidar de suas crianas.
A partir das reflexes acerca desta temtica que se constri este
estudo onde se procura enfocar como se processa o desenvolvimento e
integrao social das crianas e adolescentes em situao de abrigo com suas
famlias
A iniciativa deste estudo parte de minha experincia profissional como
assistente social junto Vara nica da Comarca de Itatiaia, onde atuo, entre
outras, na Vara da Infncia e Juventude. Tal experincia com aes que
envolviam crianas e adolescentes institucionalizados suscitou o desejo de
estudar a forma como se desenvolvia e garantia o direito convivncia familiar
no abrigo do municpio devido ao longo perodo de institucionalizao
observado por mim nos estudos sociais realizados junto a esta demanda.
Sendo assim, buscamos realizar um estudo/pesquisa que trouxesse a tona
dados da realidade local junto demanda com o devido embasamento terico-
metodolgico que permitisse uma leitura adequada desta realidade.
Assim, no primeiro captulo buscou-se realizar uma pesquisa
bibliogrfica a respeito do tema onde, inicialmente, procurou-se fazer um breve
estudo dos conceitos e das polticas sociais desenvolvidas em torno dasquestes relativas famlia at ento formuladas e implementadas no pas. A
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seguir foi realizada uma pesquisa bibliogrfica a respeito do tema
institucionalizao de crianas e adolescentes onde se busca traar uma
trajetria poltico-cultural desta prtica no pas, assim como foi trazida uma
anlise em mbito nacional acerca do tema institucionalizao de crianas e
adolescentes no pas.
No segundo captulo buscou-se realizar uma discusso em torno das
atuais polticas sociais para crianas e adolescentes, polticas de famlia e
assistncia social, em especial luz do Plano Nacional de Promoo, Proteo
e Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes Convivncia Familiar e
Comunitria formulado pelo governo federal e de suas metas, e do Estatuto da
Criana e do Adolescente.
O terceiro captulo abrange a pesquisa e avaliao dos dados coletados
no abrigo do municpio de Itatiaia, regio sul-fluminense do estado, gerido pelo
governo municipal, e no Conselho Tutelar deste municpio.
Esta pesquisa qualitativa buscou analisar como vem se implementando
o direito a convivncia familiar nos abrigos. Inicialmente, pretendamos realizar
entrevistas com os profissionais do abrigo (equipe tcnica e coordenao) e
com as crianas e adolescentes que se encontravam abrigados buscando dar
voz aos anseios e desejos queles que se destina o direito a convivncia
familiar. Entretanto, aps realizadas algumas entrevistas, notamos a ausncia
de um ator importantssimo nesta discusso, o Conselho Tutelar, j que este
em muito interage nos procedimentos de abrigamento no municpio. Sendo
assim, realizamos tambm entrevistas com alguns representantes do Conselho
Tutelar do Municpio de Itatiaia.
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CAPTULO I
FAMLIA E INFNCIA: TRAJETRIAS E DESAFIOS
1.1 Polticas Pblicas e Famlia: trajetria e limites
Ao discutir o tema famlia, pode-se observar que ao longo dos sculos
foram traadas diversas concepes de famlia, e, conforme aponta ries
(1981), principalmente, a partir do sculo XIX, as configuraes em torno da
construo scio-histrica familiar vem assumindo diversas caractersticas, que
vo do modelo padronizado de famlia burguesa nos moldes europeus, at
outros tantos arranjos, vigentes em todo o mundo.
O modelo europeu familiar de ncleo patriarcal foi importado ao longo
das dcadas, chegando e se desenvolvendo nos pases perifricos de acordo
com as caractersticas especficas de cada pas.
No Brasil, este modelo de famlia nuclear chega como forte iderio a ser
seguido. Entretanto, considerando a famlia nuclear burguesa, no podemos
afirmar que este iderio tenha sido incorporado de fato, dadas as
caractersticas do pas, de sua cultura e costumes j instalados e incorporados
pela populao brasileira.
Em nosso pas, as famlias podiam, at recentemente, ser
caracterizadas, de forma geral, como patriarcais. O patriarcalismo foi uma das
caractersticas de famlia que perdurou por muito tempo, e ainda se encontra
presente, em diversos arranjos familiares. Este fator constitui uma das vrias
dificuldades, em um cenrio complexo, para se conceituar as famlias
brasileiras como em um nico modelo de padronizao
a famlia patriarcal de que estamos falando uma espcie dematriz que permeia todas as esferas do social, a da poltica,
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atravs do clientelismo e do populismo; a das relaes de trabalho
e de poder, onde o favor e a alternativa da violncia preponderam
nos contratos de trabalho e na formao dos feudos polticos,
muito mais que a idia de direitos universais do cidado; e por fim,
nas prprias relaes interpessoais em que a personalidadecordial do brasileiro impe pela intimidade e desrespeita a
privacidade e a independncia do indivduo. Alm disso a matriz da
famlia patriarcal, com sua tica implcita dominante, espraiou-se
por todas as outras formas concretas de organizao familiar, seja
a famlia dos escravos e dos homens livres no passado, seja a
famlia conjugal mais recente.(ALMEIDA, 1987: 55)
Nas famlias mais empobrecidas, a posio do homem provedor fora,muitas vezes, dividida com as mulheres, encaradas tambm como mo-de-
obra, dividindo, ou seno, assumindo o papel de provedoras da casa e do
sustento dos filhos. As crianas, em diversos perodos histricos, no
necessariamente eram criadas no seio de sua famlia de origem, podendo ser
criadas por toda uma comunidade atravs de laos de parentesco ou afinidade,
passando de lar em lar durante sua infncia caracterizando o que Fonseca
(1990) chama de circulao de crianas e, quando, no raramente, entravam
precocemente no mercado de trabalho remunerado ou no.
A circulao de crianas nos permite identificar o que alguns autores
contemporneos1 conceituam como famlia na atualidade, onde se
descaracteriza o lao consangneo como nica forma de identificao familiar.
Segundo bibliografia pesquisada2, podemos identificar inmeros
conceitos de famlia trabalhados. Entretanto, considerando sua utilizao na
implementao de polticas pblicas, baseamo-nos no conceito de famlia
trabalhado por Helosa Szymanski (2002: 9) onde compreende-se como
famlia, uma associao de pessoas que escolhe conviver por razes afetivas e
assume um compromisso de cuidado mtuo e, se houver, com crianas,
adolescentes e adultos, podendo ter ou no laos de parentesco.
Esta definio engloba inmeras possibilidades de arranjos e rearranjos
familiares no sentido de incentivar a discusso e mudana do que, oficialmente,
para fins de incluso em polticas pblicas, se considera famlia.
1Ver: Brant de Carvalho, 2003; Freitas, 2000; Mioto, 1997.
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Considerando a realidade brasileira, podemos observar a utilizao do
conceito de famlia nuclear pelas polticas pblicas como uma ao pouco
democrtica, j que nossa realidade familiar no est restrita a tal conceito.
Mas tal conceituao encontra-se presente em diversos e diferentes contextos
histricos do pas, que retrata um perfil societrio hierrquico e centralizador.
Tendo como ponto de partida a Proclamao da Repblica, o Brasil
herda uma tradio cvica pouco encorajadora (CARVALHO, 2006) aps
sculos de colonizao, que deixaram, entre outras coisas, analfabetismo e
escravido. A Primeira Repblica introduz um modelo federativo
descentralizado, o que facilitou a formao de oligarquias estaduais,
especialmente com a aproximao com as elites locais, que gera um re-
ordenamento na estrutura de gesto estatal. A Primeira Repblica traz em seu
contexto poltico-social a influncia do coronelismo que, segundo Carvalho era
a aliana desses chefes polticos locais com os presidentes dos estados e
desses com o presidente da Repblica (2006: 41). Esta relao de dominao
exercida pelos coronis vinha carregada de uma legitimidade implcita,
considerando-se os aspectos paternalistas existentes nas relaes de
reciprocidade e de obrigaes mtuas inerentes a tais processos.
Desta forma, ainda conforme Carvalho, no houve no Brasil, at 1930,
movimentos populares exigindo maior participao eleitoral (2006: 42),
situao influenciada, entre outras coisas, pelo lento e gradual processo de
aprendizado democrtico que mantinha tenso o embate contra o
conservadorismo e o colonialismo.
Durante a Primeira Repblica (...) eram os chefes de polcia queinterferiam em casos de conflito, e sua atuao no era
exatamente equilibrada. Ficou famosa a afirmao de um
candidato presidncia da Repblica de que a questo social
nome genrico com que se designava o problema operrio era
questo de polcia. (CARVALHO, 2006: 63)
Seguindo a tendncia mundial e os impactos dessas mudanas na
2Ver: Sarti, 2003; Mioto, 1997; Brant de Carvalho, 2003; Almeida, 1987.
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ordem poltica interna do pas, o Brasil comea a desenvolver seu sistema de
proteo social que, segundo Pereira (2006:125) pode ser tipificada como um
sistema de bem-estar perifrico, j que no trouxe como caractersticas
fundamentais a poltica do pleno emprego, o universalismo dos servios sociais
e o impedimento da queda e da reproduo da pobreza.
Considerando a conjuntura poltico-social do Brasil, a mesma no seguiu
a risca o modelo de polticas sociais nos pases capitalistas avanados, tendo
seus momentos de expanso especialmente durante os regimes autoritrios e
conservadores.
Este fato denota, em parte, a influncia poltica que as prticas
coronelistas e clientelistas tiveram e, ainda tm, em nossa cultura poltica.
Demonstra ainda a dificuldade de organizao e mobilizao das classes
trabalhadoras e mais pauperizadas da populao, tendo em vista que as
medidas de desmobilizao dessas classes j eram postas em prtica desde o
incio do sculo XX, e que durante o perodo de governo do ento Presidente
Getlio Vargas (1930 - 1945) h a cooptao dos sindicatos dos trabalhadores
e a criao os institutos profissionais, que vem gerar imensa estratificao da
classe trabalhadora, alm de manter excludos os trabalhadores informais e os
sem emprego.
Assim, a proteo social no Brasil teve como perfil a regulao poltica,
econmica e social. A partir da Revoluo de 1930, a poltica social era,
especialmente, conquistada atravs de barganhas populistas entre o Estado e
parcelas da sociedade, caracterstica que permaneceria imbricada nas polticas
sociais at os dias atuais.
Especialmente na Ditadura Vargas, implementou-se aes estatais
bastante diferentes das anteriormente aplicadas, que eram baseadas no
liberalismo econmico. Com Vargas, o Estado torna-se amplamente
paternalista, transmutando a noo de direito, at ento pouco divulgada na
sociedade, em benesse, dificultando, assim, a transformao do favor em
direito, dificuldade ainda maior de mudana de mentalidade poltica, no s da
classe poltica como tambm da populao beneficiada por estes favores.
Ainda nos dias atuais, tal mentalidade permanece camuflada no
desenvolvimento e implementao de polticas sociais, em especial as de nvellocal.
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Aps o primeiro governo de Vargas, a meta do Estado passa a ser o
desenvolvimento nacional, com nfase no aspecto econmico, como forma de
impulsionar o crescimento do pas. Neste sentido, a poltica social passa a ter
como objetivo central do governo, o desenvolvimento humano, assim como a
incluso da questo da educao na agenda poltica, j que a necessidade de
mo-de-obra qualificada era emergente. A, novamente, desvirtuando o objetivo
das polticas sociais como direito, j que a motivao para o aumento do foco
poltico na educao no a aceitao deste como um direito, mas sim uma
necessidade de crescimento econmico.
Conforme aponta Santos pode-se concluir que permanece a noo de
cidadania destituda de qualquer conotao pblica e universal. Grande parteda populao pr-cvica e nela no se encontra intrnseca nenhuma pauta
fundamental de direitos (SANTOS, 1987: 78).
Dados os objetivos de modernizar aceleradamente a economia e
aumentar as taxas de acumulao, nas dcadas de 1960 e 1970, as polticas
governamentais no se propuseram a alterar significativamente a desigualdade
social no pas. Passam, ao contrrio, a agir atravs de polticas compensatrias
no sentido de amenizar os problemas sociais, sem o intuito, contudo, deinterferir na gnese destes problemas.
As duas dcadas acima citadas foram marcadas internacionalmente,
pelo desenvolvimento do padro do Welfare State, que nos pases mais
desenvolvidos iniciou-se j nas dcadas de 1940 e 1950. Considerando todo o
atraso e as distores da questo de direitos no Brasil, alguns autores, como
Santos (1987), Carvalho (2006), Vianna (1998), Pereira (2006), entre outros,
consideram que no pas tivemos um Estado de Bem Estar apenas perifrico, jque no desenvolvemos os direitos essenciais ao Welfare State, como em
alguns pases europeus. Nestes, desenvolveu-se o Estado de Bem Estar
denominado social-democrata, que trazia como principais caractersticas o
rompimento com a determinao do mercado, o desenvolvimento de polticas
sociais redistributivas e universalidade de acesso aos bens.
Esta nova perspectiva poltico-ideolgica revela uma nova forma de
relao entre Estado e mercado, com o Estado intervindo mais na economia e
na rea social, atuando como provedor de bens e servios sociais. Este modelo
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de Estado inaugura uma nova forma de entender e tratar das necessidades
bsicas da sociedade, no considerando apenas os mnimos sociais, mas
tendo como base os ideais de cidadania.
O Estado passa a tratar no somente
de polticas de manuteno de renda geralmente sob a forma de
uma rede de segurana impeditiva do resvalo de cidados social e
economicamente vulnerveis para baixo da linha da pobreza
legitimada pela sociedade -, como outros mecanismos adicionais
de proteo social como: servios sociais universais, proteo ao
trabalho (em apoio ao pleno emprego) e garantia do acesso a
esses bens e servios (PEREIRA, 2006: 112)
No Brasil, a poltica social, independente das influncias do Welfare
State internacional, manteve-se, em diversos contextos histricos, dependente
da poltica econmica que acarretava um grande negligenciamento das efetivas
garantias de suprir as necessidades bsicas da populao.
O sistema de bem-estar brasileiro, diferentemente dos pases
capitalistas avanados que surgiram longe de forte dependncia econmica ecolonialista, expressou as limitaes decorrentes destas dependncias,
distanciando-se, em grande parte, das referncias do pleno emprego e dos
servios sociais universalizantes.
No Brasil, conforme apontam estudiosos da questo3, nunca se
implementou de fato o Welfare State, como na Europa. Aqui, as estruturas e a
cultura poltica dificultaram, se no impediram, que o Welfare State se
desenvolvesse conforme se previa originalmente.
O contexto poltico brasileiro na poca da implementao e
desenvolvimento do Welfare State na Europa encontrava-se impregnado de
uma cultura paternalista e clientelista que j vinha imbricada nas aes
governamentais do Estado brasileiro,
o caso brasileiro afigura-se como um misto ou combinao de
elementos presentes na classificao de Esping-Andersen (1991),
3Ver: Santos, 1987; Fleury, 1994.
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a saber: intervenes pblicas tpicas e seletivas prprias dos
modelos liberais -; adoo de medidas autoritrias e
desmobilizadoras dos conflitos sociais tpicas dos modelos
conservadores -; e, ainda, estabelecimento de esquemas
universais e no contributivos de distribuio de benefcios eservios caractersticos dos regimes social-democratas. E tudo
isso foi mesclado s prticas clientelistas, populistas, paternalistas
e de patronagem poltica, de larga tradio no pas. (PEREIRA,
2002: 127)
Segundo nos aponta Draibe (1998), o contexto poltico nacional sempre
apresentou tensas contradies em sua dinmica. Estas especialmente devido
ao envolvimento de interesses de diversas categorias que, num sistema poltico
que aliava movimentos to conservadores como o populismo, clientelismo e
patrimonialismo, dificilmente seriam capazes de impedir a reproduo das
distores que se apresentavam no desenvolvimento do Welfare State
brasileiro.
J na dcada de 1970, o Estado passa a intervir mais na criao e
consolidao de polticas sociais como forma estratgica de responder a
insatisfao da sociedade civil, como forma de reaproximar o Estado da
sociedade. E no visando as satisfaes das necessidades bsicas, mas sim
como meio poltico de manuteno do poder e das altas taxas de crescimento
econmico.
Neste perodo de mudanas polticas e estruturais h, visivelmente,
alteraes no papel e na responsabilidade das famlias com relao proteo
social de seus membros. A, se inicia um processo onde o Estado passa a se
retirar do foco da proteo social, transferindo responsabilidades sociais para a
sociedade e para as famlias.
Tomando como foco o contexto mundial do ps-Welfare State pode-se
identificar a famlia como um imprescindvel espao de proteo social, uma
vez que o Estado vem se desresponsabilizando deste papel no sentido de
comear a transformar-se no Estado Mnimo posteriormente consolidado.
Considerando as mobilizaes da sociedade com o fim da ditadura
militar, as polticas de proteo social tiveram grande visibilidade na dcada de1980, tendo pauta garantida nas discusses da agenda poltica que
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determinaram a promulgao da Constituio Federal de 1988.
Os conceitos de direitos sociais, seguridade social,
universalizao, equidade, descentralizao poltico-
administrativa, controle democrtico, mnimos sociais, dentre
outros, passaram, de fato, a constituir categorias-chave
norteadoras da constituio de um novo padro de poltica social a
ser adotada no pas. (PEREIRA, 2006: 152)
As inovaes trazidas pela Constituio Federal de 1988 trazem em seu
bojo o carter redistributivista das polticas sociais, alm de maior
responsabilidade pblica na sua regulao, produo e operao. Como coloca
Draibe (1998: 16),
a Constituio de 1988 registra:
a ampliao e extenso dos direitos sociais;
a concepo de seguridade social como forma mais
abrangente de proteo;
um certo afrouxamento do vnculo contributivo como princpio
estruturante do sistema;
a universalizao do acesso e a expanso da cobertura;
a recuperao e redefinio de patamares mnimos comuns
dos valores dos benefcios sociais e, enfim,
um maior comprometimento do estado, projetando mesmo um
acentuado grau de proviso estatal pblica de bens e servios
sociais.
Diante desta nova realidade trazida pela Constituio Federal, onde se
viam garantidos os direitos bsicos da sociedade, os setores ligados ao
neoliberalismo, em mbito internacional, trouxeram questionamentos quanto
liberdade de mercado e superposio do Estado em relao garantia das
necessidades bsicas.
Este novo iderio traz, em mbito nacional, a incorporao das
determinaes externas de mudanas polticas e econmicas, submetendo as
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questes sociais a estas, levantando a bandeira da globalizao, da
flexibilizao e da privatizao. Esta nova forma de gerir a poltica social no
pas traz alteraes significativas na articulao entre Estado e sociedade no
que se refere ao processo de proteo social, significando a diminuio do que
se considera qualidade de vida e padres de cidadania para determinadas
parcelas da populao.
Este modelo adotado pelo Estado inicia um processo de grandes
mudanas no pensamento poltico e econmico, passando a priorizar a
promoo de polticas de liberdade econmica e individualismo, que traz em
seu bojo aes de minimizao de benefcios sociais, degradao de servios
pblicos, desregulamentao do mercado de trabalho, entre outros,
o neoliberalismo descobre os perigosos efeitos do
Welfare State. So eles: a desmotivao, a concorrncia
desleal (porque protegida), a baixa produtividade, a
burocratizao, a sobrecarga de demandas, o excesso de
expectativas. O perigo est especialmente no impulso aos
movimentos sociais em torno de suas demandas. E a
concluso : mais mercado livre e menos Estado social.
(BEHRING, 2003:58)
No processo de constituio deste novo modelo poltico-econmico e
ideolgico, o Estado tem sua condio de provedor de polticas sociais limitada,
restringindo-se a tornar os territrios nacionais mais atrativos s inverses
estrangeiras (BEHRING, 2003:59). relevante destacar tambm o surgimento
do discurso da crise fiscal do Estado que vem a justificar o corte dos gastos
sociais.
Neste sentido, a famlia, como espao de proteo social, ganha novas
responsabilidades e demandas. Porm, sem estrutura institucional que lhe
embase as aes e necessidades,
notrio o crescente interesse pela questo da famlia, asmudanas internas que vm sofrendo, suas funes e
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configuraes, a redefinio dos papis dos seus membros, as
relaes de gnero, assim como o reconhecimento de sua
importncia na gesto e superao da crise de (mal) bem-estar em
que se vive hoje. (FREITAS, 2000)
Assim, pensar a famlia na contemporaneidade requer considerar os
fatores relevantes de reestruturao produtiva, assim como o processo de
retrao das aes sociais do Estado, que desloca a responsabilidade por suas
aes a terceiros, ou seja, famlia e sociedade.
Considerando o processo atual de reestruturao do trabalho, de
extrema relevncia a manuteno dos vnculos com as redes primrias,
sobretudo porque a famlia valoriza-se como espao de acolhimento,
segurana e cuidado, de transmisso da cultura e valores, de garantia de
educao (RIBEIRO, 2004: 660).
Entretanto, podemos observar que, dadas as transformaes
econmicas das ltimas dcadas, as comunidades vm sofrendo com um
esgaramento dos vnculos familiares resultado do processo de
empobrecimento e miserabilidade a que esto expostas s famlias no pas.Neste sentido, inclui-se a esta situao o processo ideologizante da cultura do
individualismo, que prejudica ou interrompe o ciclo de solidariedade entre as
redes primrias que se estabelecem entre famlias e comunidades,
o Estado e a famlia desempenham papis similares, em seus
respectivos mbitos de atuao: regulam, normatizam, impem
direitos de propriedade, poder e deveres de proteo e assistncia.Tanto famlia quanto Estado funcionam de modo similar, como
filtros redistributivos de bem-estar, trabalho e recursos. (BRANT
DE CARVALHO 2005:268 APUD SOUZA 2000)
Influenciado pelo iderio neoliberal que, j desde a dcada de 1980 se
desenvolvia nos pases capitalistas avanados, o Estado brasileiro incorpora a
noo de que a sociedade e a famlia deveriam partilhar com eleresponsabilidades antes exclusivas dos poderes pblicos,
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mesmo sem se ter claro quem na sociedade deveria assumir
responsabilidades antes pertencentes ao Estado, quem e com
que meios financiaria a proviso social, e que formas de
articulao seriam estabelecidas entre Estado e sociedade no
processo de satisfao de necessidades sociais, foram concebidas
frmulas que exigiam da sociedade e da famlia considervel
comprometimento (PEREIRA, 2004: 31)
Entretanto, a despeito do que se pretende com a poltica neoliberal,
existem alguns limites aos quais a famlia encontra-se submetida, tais como o
carter contraditrio dela mesma. No h, consenso em seu interior, ao
contrrio, momentos de tenses e controvrsias que no a caracterizam como
ambiente de proteo constante e linear.
Conforme aponta Pereira (2004: 38) uma outra dificuldade, ao se eleger
a famlia como fonte privilegiada de proteo social quanto s mudanas na
sua organizao, gesto e estrutura.
De acordo com o que j fora discutido inicialmente, existem vrios tipose conceitos de famlia, no podendo este complexo conceitual ser tratado e
analisado homogeneamente.
Neste sentido, o papel da proteo social para as famlias deveria ser o
de oferecer-lhes alternativas realistas de participao cidad (PEREIRA,
2004: 40) tendo em vista a multiplicidade de arranjos familiares e condies
scio-econmicas reais em detrimento de exigir que as famlias assumam
responsabilidades que extrapolam suas potencialidades.
Segundo Sarti (2005), a famlia pobre no se constri como um ncleo,
mas como uma rede, com ramificaes que envolvem a rede de parentescos
como um todo configurando obrigaes morais e dificultando a
individualizao. Desta forma, podemos entender que, no pas, dificilmente
tenha se caracterizado o modelo de famlia nuclear j que a cultura e a
situao econmica dificultavam este processo de individualizao necessrio
caracterizao de tal modelo burgus.
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Neste sentido, a importncia da famlia para os pobres est relacionada
s caractersticas de nossas instituies pblicas, incapazes de substituir as
funes privadas da famlia.
Contexto caracterstico da dcada de 1990, onde as condieseconmicas, de reestruturao produtiva do trabalho e funcionamento do
mercado trazem repercusses srias para as famlias afetando sua
sobrevivncia material e alterando as redes de sociabilidade, identidades e
representaes sociais existentes,
no Brasil o processo de acirramento da desigualdade social
expressa no empobrecimento da classe trabalhadora aliado a um
quadro de desemprego, de desqualificao, precariedade e
informalidade do trabalho reproduz a excluso social destes
segmentos que, por sua condio de sujeito em desenvolvimento,
depende essencialmente de sua famlia. (...) Na verdade, as
condies sociais e econmicas refundam uma tendncia j
historicamente predominante na sociedade brasileira, qual seja, a
de resolver na esfera privada questes de ordem pblica. Na
ausncia de direitos sociais na famlia que os indivduos tendem a
buscar recursos para lidar com as circunstncias adversas. Dessa
forma, as mais diversas situaes de precariedade social,
desemprego, doena, velhice tenderam a ser solucionados na
famlia, como responsabilidade de seus membros. (ALENCAR,
2000: 73)
Assim, permanece a tendncia de repassar quase exclusivamente
responsabilidades para a famlia em situaes de vulnerabilidades sociais e oEstado tende a se desobrigar da reproduo social sob o discurso da
solidariedade e da descentralizao.
Neste contexto de repasse de responsabilidade, inclui-se tambm o
processo poltico-ideolgico de individualizao da sociedade a que esto
expostas as famlias atravs do trabalho e do incentivo ao consumo estimulado
pelos meios de comunicao,
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bom lembrar que tanto a famlia quanto o Estado so
instituies imprescindveis ao bom funcionamento das sociedades
capitalistas. Os indivduos que vivem em sociedade necessitam
consumir, alm de bens e mercadorias, servios que no podem
ser obtidos pela via do mercado. (BRANT DE CARVALHO, 2005:268)
As aes das polticas sociais tm o objetivo de trabalhar com o resgate
das competncias familiares, sendo autonomizadoras do ser humano. Porm,
as polticas pblicas vm trabalhando numa perspectiva substitutiva.
Esta cultura poltica de total descompromisso com os servios pblicos e
sociais acarreta uma quase que total desassistncia populao que passa a
enfrentar critrios cada vez mais rgidos de miserabilidade na tentativa de
garantir seu direito de acesso aos programas sociais.
As transformaes societrias vm afetando ideologicamente
identidades, modos de vida e formas de sociabilidade, com as quais os mais
prejudicados so a populao mais carente, a parcela mais excluda dos bens
e servios da populao.
Tenta-se, hoje, estabelecer uma parceria entre famlia, Estado e
sociedade e para Pereira (1994),
tal parceria s ser promissora se a famlia no substituir o
Estado nas responsabilidades que lhe cabem, nem o Estado e a
sociedade continuarem fazendo de conta que a famlia no mudou.
Neste caso, para que a solidariedade informal dentro da famlia
seja preservada, o Estado tem que fazer a sua parte, suprindo
tradicionais deficincias das polticas pblicas com relao a
membros especficos da famlia (...). O objetivo da participao dos
Estados nacionais, como subsistemas das sociedades globais, no
processo de valorizao da famlia deve, portanto, ser de
incentivar a solidariedade familiar e a proteo primria que s a
famlia pode oferecer no importa a configurao que tenha
assumido , mas preservando sempre a margem de manobra e o
desenvolvimento pessoal de todos os seus membros para podercompetir em p de igualdade no novo cenrio mundial ora em
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evidncia. (PEREIRA, 1994: 112)
O papel da famlia como espao de proteo primria historicamente
dificilmente fora incentivado poltica e socialmente. Neste sentido, tivemos uma
longa trajetria de um processo de institucionalizao de crianas e
adolescentes, uma vez que suas famlias no eram consideradas aptas a
exercer uma paternidade adequada e considerada responsvel. Assim, o Brasil
conta com uma histria de prtica de atendimento institucional que j dura
longos sculos.
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1.2 A Prtica de Institucionalizao de Crianas: coisa do passado?
Quando tratamos da institucionalizao de crianas no nosso pas como
uma prtica recorrente durante mais de um sculo atrs, observamos, atravs
de documentos e bibliografia especializada, que esta sempre foi uma prtica
aplicada aos filhos de famlias pobres que necessitavam do auxlio do Estado.
Nesta trajetria verificamos at os dias atuais prticas recorrentes que
caracterizam as aes de atendimento infncia pobre no incio do sculo XX,
que muitas vezes se desdobram em idias e prticas atuais no tocante ao
atendimento institucional criana e ao adolescente.
A questo central do abandono, e a conseqente institucionalizao de
crianas e adolescentes, assim como no passado, se apresenta pelo fato de
as normas, as leis e as prticas assistenciais, que alm de
estigmatizarem os pobres com acusaes de irresponsabilidade e
de desamor em relao prole, deram origem a uma perversidade
institucional que sobrevive at nossos dias: paradoxalmente,desde os sculos XVIII e XIX, a nica forma de as famlias pobres
conseguirem apoio pblico para a criao de seus filhos era
abandonando-os. (VENNCIO, 1999:13).
Se analisarmos as diversas formas de abandono de crianas e
adolescentes, tambm, nos dias atuais, pelas formas de gesto poltica,
justifica-se com culpabilizao, responsabilizao das famlias pelo abandono
de sua prole. Todavia, tal abandono se inicia, em muitos dos casos, pela
ausncia ou falta de efetividade de polticas pblicas. Segundo Barros (2005:
112) o procedimento de abandono da criana no Brasil, desde sua
colonizao, pode ser considerado como um processo freqente e continuado.
Durante os sculos XIX e XX, crianas e adolescentes eram colocados
em asilos e orfanatos sob a justificativa da pobreza ou orfandade, muito
embora a maioria destas crianas tivesse famlia. Na trajetria de construo
de direitos sociais e de polticas pblicas as demandas que levaram umnmero inestimvel de crianas brasileiras aos internatos dos sculos XIX e XX
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no foram devidamente enfrentadas ao nvel das polticas pblicas (RIZZINI,
2004: 14). Tal contexto contribuiu ainda mais para a to enraizada prtica de
institucionalizao de crianas. A reverso de tal quadro encontra inmeras
barreiras poltico-ideolgicas, que caminham para a tendncia de segregao,
excluso e miserabilidade que se encontra submetida grande parte da
populao brasileira.
Neste sentido, com relao s famlias que abriam mo de seus filhos
como forma de cuidado, as definies legais e regimentais estigmatizavam os
protagonistas do abandono (VENNCIO, 1999: 17). Com o passar do tempo a
prpria noo do abandono se altera, especialmente, com a criao de
instituies de assistncia quando
se, num primeiro perodo, o gesto de enjeitar o filho podia ser
assimilado ao infanticdio, em outro, significava enviar a criana a
uma instituio que cobria os gastos com roupas, medicamentos e
contratao de ama-de-leite, sugerindo assim que o ato decorria
da preocupao paterna ou materna em relao ao destino da
prole (VENNCIO, 1999: 18)
Assim, a opo poltica em no trabalhar a necessidade humana e sim
criar mecanismos de controle da populao pauperizada marca a poltica
assistencial da poca. A criao de abrigos para enjeitados cumpria assim um
dupla funo crist: evitava o infanticdio e possibilitava que os cristos
exercessem a caridade e o amor ao prximo (VENNCIO, 1999: 24).
Conforme observamos na bibliografia especializada da poca, sculo
XIX, havia determinao de
que todos os meninos e meninas desamparados fossem
assimilados condio de enjeitados. Embora a lei fizesse
referncia a reentrega da criana aos respectivos pais, sem nus
para estes ltimos, no deixa de ser trgico reconhecer que toda e
qualquer criana pobre, para ser socorrida, era obrigada a entrar
no circuito do abandono (...)
No perodo ps-independncia, o padro indiferenciado da
assistncia foi mantido no Brasil. Toda e qualquer criana pobre,
para ser socorrida pelo hospital, devia ser registrada como
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enjeitada. (VENNCIO, 1999: 34)
A opo pelo modelo asilar de atendimento infncia no Brasil, desde o
sculo XIX se pauta, especialmente, sobre a necessidade de prestar
assistncia, porm com o objetivo de controle social da populao pobre, no
muito diferente de outras pocas quando se tratava esta populao como
perigosa.
a ampla categoria jurdica dos menores de idade (provenientes
das classes pauperizadas) assume, a partir da segunda metade do
sculo XIX, um carter eminentemente social e poltico. Osmenores passam a ser alvo especfico da interveno
formadora/reformadora do Estado e de outros setores da
sociedade, como as instituies religiosas e filantrpicas.
(RIZZINI, 2004: 22)
Desta forma, a prtica de recolhimento de crianas em instituies se
desenvolveu como principal instrumento de assistncia infncia no Brasil.Com o passar dos anos a categoria de internatos caiu em desuso para a
populao mais abastada, para os filhos de ricos. Entretanto, permanece como
prtica recorrente para a populao pobre, at hoje considerados como no
sculo XIX, como ameaadores da ordem social, da sociedade.
O incio do sculo XX foi marcado por diversas iniciativas, como a
atuao do Estado no planejamento e implementao de polticas e aes
voltadas causa do menor abandonado. Foi neste perodo que se deu acriao do 1 Juzo de Menores do pas e a aprovao do Cdigo de Menores,
em 1927.
O Juzo de Menores, na pessoa de Mello de Mattos, estruturou
um modelo de atuao que manteria ao longo da histria da
assistncia pblica no pas at meados da dcada de 1980,
funcionando como rgo centralizador do atendimento oficial ao
menor no Distrito Federal, fosse ele recolhido nas ruas ou levadopela famlia. O juzo tinha diversas funes relativas vigilncia,
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regulamentao e interveno direta sobre esta parcela da
populao, mas a internao de menores abandonados e
delinqentes que atraiu a ateno da imprensa carioca, abrindo
espao para vrias matrias em sua defesa, o que, sem dvida,
contribuiu para a disseminao e aceitao do modelo. Pelacrescente demanda por internaes desde a primeira fase do juzo,
percebe-se que a temtica popularizou-se tambm entre as
classes populares, tornando-se uma alternativa de cuidados e
educao para os pobres, particularmente para as famlias
constitudas de mes e filhos (RIZZINI, 2004: 29 e 30).
Entretanto estas famlias eram representadas de forma negativa pela
poltica de assistncia infncia, consideradas incapazes de manter seusmembros junto a si, de educar e disciplinar seus filhos. Este mito de
desorganizao familiar dos pobres se constri paralelamente a constituio da
assistncia social no pas por parte do Estado, tendo por prtica a
desqualificao pessoal e familiar em suas aes e atendimentos sociais aos
necessitados.
Legalmente, com o passar dos anos, o Estado permanece a confirmar e
reforar a concepo que julga incapazes as famlias pobres de educar seus
filhos, haja visto o Cdigo de Menores promulgado em 1979 que cria a
denominao menor em situao irregular, vindo a to somente manter a
concepo at ento vigente no antigo Cdigo de 1927 que submetia as
famlias pobres a interveno desmedida do Estado.
Todavia, esta legislao trouxe muitos questionamentos, especialmente,
dada a conjuntura desta poca. Conforme j apontado anteriormente, o pas
vivia intensa contestao poltica e social, especialmente com os movimentos
pr-democracia que exigiam o fim da ditadura militar. Neste bojo,
crescia o entendimento de que o tema era cercado de mitos,
como o de que as crianas denominadas de menores
institucionalizadas ou nas ruas eram abandonadas; o mito de
que se encontravam em situao irregular (Cdigo de Menores:
1979), ou de que a grande maioria fosse composta por
delinqentes (RIZZINI e RIZZINI, 1991: 75).
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E tomava corpo a compreenso de que o foco deveria recair sobre as
causas estruturais ligadas s razes histricas do processo de desenvolvimento
poltico-econmico do pas, tais como a m distribuio de renda e a
desigualdade social.
Diante desta conjuntura que trazia uma abertura poltica, contando ainda
com intensa participao da sociedade civil atravs de organizaes no-
governamentais, que se criam as bases para a implementao da nova lei
que entraria em vigor o Estatuto da Criana e do Adolescente. O que
promove um processo de abertura das imensas instituies de internao de
crianas e adolescentes na comunidade, resultado de um incio de mudana na
forma de atendimento infncia no Brasil que priorizavam a manuteno da
criana em meio social, em suas famlias.
Os anos trouxeram o empenho e a dificuldade na implementao do
ECA. Este trazia considerveis mudanas a respeito da internao de crianas
e adolescentes de acordo com a medida aplicada. O abrigo passa a ser uma
medida de carter provisrio e excepcional, aplicado como forma de proteo
criana e ao adolescente em situao considerada de risco pessoal e social; e
a internao, somente para adolescentes, como uma medida de carter scio-
educativo de privao de liberdade.
A dificuldade na implementao do ECA quanto questo da
institucionalizao se d, em certa medida, a em uma tendncia social em
fazer crer que os ndices de violncia e criminalidade diminuiriam atravs do
recolhimento e confinamento de jovens e crianas considerandos em situao
de risco em instituies, descaracterizando a provisoriedade e
excepcionalidade da medida de abrigo.
Neste sentido, a sociedade passa a cobrar medidas, ditas mais
enrgicas, do Estado com vistas a livr-los do incmodo que traz a infncia
pobre. Isto porque, segundo dados do IPEA, as crianas e adolescentes que se
encontram abrigados no pas so, prioritariamente, pobres, estando inclusive
nesta situao sob a justificativa da pobreza. Porm, tal viso negligencia
assim o disposto no art. 23 do ECA, onde se afirma que a falta de condies
econmicas no caracteriza motivo para o afastamento do convvio familiar de
crianas e adolescentes.O ECA traz dispositivos que garantem o convvio familiar e comunitrio
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onde afirma que:
As entidades que desenvolvem programas de abrigo devero
adotar os seguintes princpios: I preservao dos vnculos
familiares; II integrao em famlia substituta, quando esgotados
os recursos de manuteno na famlia de origem; III atendimento
personalizado e em pequenos grupos; IV desenvolvimento de
atividades em regime de co-educao; V no desmembramento
de grupo de irmos; VI evitar, sempre que possvel, a
transferncia para outras entidades de crianas e adolescentes
abrigados; VII participao na vida da comunidade local; VIII
preparao gradativa para o desligamento; IX participao de
pessoas da comunidade no processo educativo. (ECA, artigo 92)
Entretanto, a realidade pode no estar de acordo com o determinado
pela legislao anteriormente citada. Observada a inexistncia de dados
referentes s instituies de abrigamento e populao atendida,
acredita-se que a maior parte dos grandes internatos
conhecidos como orfanatos tenha sido desativada. No se sabeao certo se esta informao verdadeira. Em seminrios e
debates, ocorridos em diferentes estados, ouve-se falar que
diversas instituies mantm o tipo de atendimento asilar do
passado, embora sejam denominadas de abrigos. (RIZZINI,
2004: 49)
Conforme podemos observar, a questo da prtica de abrigamento de
crianas e adolescentes encontra-se em meio a inmeras dificuldades, como asituao de pobreza e conflitos familiares que, na realidade, impedem o
convvio familiar de crianas e adolescentes; os problemas das entidades como
a superlotao, a alta rotatividade dos abrigados, a falta de continuidade no
atendimento de crianas e adolescentes e suas famlias, entre outras.
Desta forma, a instituio que oferece medida de abrigo como medida
temporria de afastamento da famlia resultantes de situaes consideradas de
risco, permanece com atuao semelhante aos antigos internatos que nunca
tiveram carter de poltica pblica e nem to pouco visavam a reintegrao
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familiar. Consideravam a famlia inapta, culpada pela situao de misria e
pobreza vivenciada pelas crianas e adolescentes, conforme hoje,
recorrentemente, observamos nas instituies de abrigo.
As caractersticas assistencialistas e autoritrias que fundaram a poltica
de infncia no Brasil permanecem de forma histrico-cultural confrontando-se
diariamente com a poltica contempornea que visa garantir a promoo do
desenvolvimento integral de crianas e adolescentes.
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1.3 A (Re) Construo atual da prtica de institucionalizao de crianas:
alguns dados
Diante da histrica prtica de institucionalizao de crianas e
adolescentes no Brasil, o Estatuto da Criana e do Adolescente surge em meio
s mobilizaes pr-democracia do final da dcada de 1980, que trazem em
seu bojo as discusses de mudana e aprovao da Constituio Federal de
1988. Neste sentido, tanto a Constituio Federal quanto o ECA asseguram
como direitos fundamentais de crianas e adolescentes a convivncia familiar4,
oferecendo, nos casos de abrigamento, incentivo manuteno e
fortalecimento dos vnculos familiares e, quando no for possvel, promover a
insero em famlia substituta o mais breve possvel.
Estas duas legislaes iniciam um processo de intensas mudanas e
reviso das prticas adotadas no desenvolvimento das aes para crianas e
adolescentes no pas. Entretanto, este processo, passados 17 anos da
promulgao do ECA e 18 anos da Constituio Federal, ainda no se
consolidou, no conseguindo impor a reordenao das aes necessrias
implementao da lei, de fato.
O Estatuto da Criana e do Adolescente, em seu art. 101, pargrafo
nico, define a medida de abrigo como medida provisria e excepcional,
utilizvel como forma de transio para colocao em famlia substituta, no
implicando privao de liberdade.
Na busca pela reordenao exigida pela lei, nos casos do atendimento
em instituies que oferecem medida de abrigo, h que se considerar alguns
princpios como, por exemplo, a substituio da tendncia assistencialista por
propostas de carter scio-educativo e emancipatrio; prioridade manuteno
da criana e do adolescente na famlia e na comunidade, buscando-se prevenir
o abandono; garantia do pleno desenvolvimento fsico, mental, moral e social
s crianas e aos adolescentes em condies de liberdade e dignidade;
garantia de que o abrigo seja de fato uma medida de proteo social
4Art. 227 da Constituio Federal e art. 4 e 19 do Estatuto da Criana e do Adolescente.
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caracterizada pela provisoriedade.
Buscando avaliar tais medidas no pas, foi realizado no ano de 2002 o
Levantamento Nacional dos Abrigos para Crianas e Adolescentes da Rede
de Servio de Ao Continuada5.
Este levantamento examina a situao de instituies que tm a
responsabilidade de cuidar de uma parte das crianas e
adolescentes do Brasil (...) O que se analisa nesta pesquisa so as
condies do atendimento nessas instituies, luz dos princpios
do ECA, com nfase na garantia do direito convivncia familiar e
comunitria (SILVA, 2004: 17 e 18)
Este Levantamento coloca-se diante de inmeras dificuldades. Uma
delas refere-se tendncia nacional em avaliar os objetivos de programas e
projetos, limitando a avaliao a um conjunto de medidas de aferio de
objetivos com baixa referncia social ou poltica (LOBATO, 2004: 96), em
detrimento da utilizao da avaliao como um poderoso instrumento de
melhoria das condies de exerccio da coisa pblica (...), um mecanismo
privilegiado nas relaes entre Estado e sociedade (LOBATO, 2004: 96).
Segundo coloca Souza (2003), este trabalho, o Levantamento Nacional
dos Abrigos para Crianas e Adolescentes da Rede de Servio de Ao
Continuada, busca no se limitar exclusivamente aos fracassos da poltica,
mas procuro centrar esforos para uma avaliao em que pesem as questes
polticas de deciso, elaborao e implementao da poltica de proteo social
infncia e adolescncia no Brasil, especialmente, as medidas de abrigo.
Neste levantamento foram avaliadas quinhentas e oitenta e nove
instituies que oferecem medida de abrigo vinculadas Rede SAC no pas,
que, no momento da pesquisa, abrigavam 19.373 crianas e adolescentes.
Partindo dos dados levantados pelo Levantamento Nacional dos
Abrigos para Crianas e Adolescentes da Rede SAC, buscamos avaliar em
5A Rede de Servios de Ao Continuada (SAC) uma ao da esfera federal na rea deassistncia social, incluindo-se na modalidade servios assistenciais, juntamente com oatendimento de crianas em creches (SAC/Creche), com os servios de habilitao e
reabilitao de pessoas portadoras de deficincias (SAC/PPD) e com atendimento a idosos emasilos ou em meio aberto (SAC/Idosos). As caractersticas bsicas destes servios so oatendimento continuado e a definio de recursos em valoresper capit.
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que medida as entidades que oferecem medida de abrigo priorizam a
convivncia familiar segundo as orientaes do ECA, a partir de alguns
indicadores de avaliao baseados nos dados da referida pesquisa.
Os indicadores utilizados neste trabalho limitam-se a uma breve
avaliao de como vem se dando o incentivo convivncia familiar nos abrigos
pesquisados, no utilizando, portanto, todos os indicadores em que se baseia a
referida pesquisa. Os indicadores utilizados foram: nmero de crianas e
adolescentes abrigados, idade, grau de escolarizao, motivos apontados para
o abrigamento, tempo de permanncia na instituio, situao familiar e
jurdica, definio do conceito de famlia, atuao dos recursos humanos na
instituio, incentivo a manuteno do vnculo familiar, conhecimento do
Estatuto da Criana e do Adolescente, e, por ltimo, dificuldades apontadas na
reinsero familiar.
Considerando o perfil da populao brasileira, temos que 34% desta
composta de crianas e adolescentes, cerca de 57,1 milhes de pessoas.
Segundo dados do IBGE, aproximadamente metade destas crianas e
adolescentes pode ser considerada pobre ou miservel, utilizando como critrio
rendaper capitainferior a meio salrio mnimo.
Referindo-se pesquisa realizada pelo IPEA, existiam nos 589 abrigos
pesquisados, no ano de 2002, cerca de 20.000 crianas e adolescentes
abrigadas em todo o pas na Rede SAC. Com relao idade, mostrou-se que
mais da metade das crianas e adolescentes tm entre 7 e 15 anos de idade,
estando em idade escolar de nvel fundamental.
Este dado pode demonstrar as dificuldades enfrentadas pelas famlias no
acesso a equipamentos pblicos de apoio s mes e aos pais trabalhadores,
que oferecem proteo e cuidados a crianas a partir de 7 anos, servios que
s so oferecidos nas creches para crianas de 0 a 6 anos, que, aliada a
outras condies, pode gerar situaes consideradas negligentes com a
criana e o adolescente.
Tendo em vista o estigma interposto sobre as famlias pobres brasileiras de
no ter condies de cuidar de seus filhos, justifica-se o no direito a manter
vnculos com seus filhos, devido situao de vulnerabilidade a que esto
circunscritos. Entretanto, como observa Faleiros (2004), no possveldissociar o padro de convivncia familiar das questes mais amplas de
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frustrao, humilhao, reduo dos direitos sociais e privao causadas pelo
desemprego e pela diminuio do papel do Estado na garantia da
sobrevivncia das famlias por meio da proviso de polticas sociais.
Diante das dificuldades estruturais que as famlias pobres vivenciam, de grande
violncia estrutural, observa-se uma transferncia de responsabilidade para a
esfera privada (da famlia) das responsabilidades at ento assumidas pela
esfera pblica, num avano social que trouxe inmeras conquistas.
(...) a famlia se encontra muito mais na posio de um sujeito
ameaado do que de instituio provedora esperada. E
considerando sua diversidade, tanto em termos de classes sociais
como de diferenas entre os membros que a compem e de suasrelaes, o que temos uma instncia sobrecarregada, fragilizada
e que se enfraquece ainda mais quando lhe atribumos tarefas
maiores que a sua capacidade de realiz- la. (CAMPOS e MIOTO,
1998: 37)
Neste bojo que se remete o tradicional atendimento institucional a
crianas e adolescentes em situao de vulnerabilidade, baseado na
desqualificao da parcela da populao a que pertencem suas famlias.
Entre os principais motivos do abrigamento de crianas e adolescentes
pesquisados esto: carncia de recursos materiais da famlia (24,1%);
abandono pelos pais ou responsveis (18,8%); violncia domstica (11,6%);
dependncia qumica de pais ou responsveis (11,3%); a vivncia da rua
(7,0%); a orfandade (5,2%); a priso dos pais ou responsveis (3,5%) e o
abuso sexual praticado pelos pais ou responsveis (3,3%).
Pelo menos quatro dos fatores acima citados esto relacionados pobreza, contrariando o disposto no ECA, que em seu art. 23, pargrafo nico,
determina que condio financeira no ser critrio para perda ou suspenso
do poder familiar. Esta constatao leva ao
questionamento sobre os limites das instituies em seu papel de
incentivar o retorno da criana convivncia familiar e em fazer
cumprir o princpio da brevidade da medida de abrigo. Isto porque,se o empobrecimento das famlias est na raiz da medida de
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abrigo, difcil supor que intervenes pontuais famlia ou ao
violador de direitos possam estancar os problemas que levaram a
criana ou adolescente ao abrigo. (SILVA, 2004)
Desta forma, a equao do problema pode estar no desenvolvimento depolticas pblicas abrangentes voltadas famlia conforme j dispunha a
Constituio Federal em seu art. 266 quando afirma que o Estado assegurar a
assistncia famlia na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violncia no mbito de suas relaes.
Entretanto, a partir dos anos 1990, contrariamente ao que determina
nossa Constituio Federal, no processo de constituio de um novo modelo
poltico-econmico e ideolgico, o Estado tem sua condio de provedor depolticas sociais limitada, restringindo-se a tornar os territrios nacionais mais
atrativos s inverses estrangeiras (BEHRING, 2003:59). Com o surgimento
do discurso da crise fiscal do Estado, onde se buscou diminuir os gastos
sociais encobrindo as reais intenes de diminuio do custo do trabalho em
funo da redistribuio destes gastos em prol do empresariado.
Quando se trata do tempo de permanncia nas instituies, observa-se
que mais da metade das crianas e adolescentes encontra-se nas instituiesh mais de 2 anos, estando 32,9 % institucionalizados entre 2 e cinco anos,
13,3 % esto nos abrigos entre 6 e 10 anos e 6,4 % h mais de 10 anos
abrigados.
Como podemos observar, o fato de mais da metade das crianas e
adolescentes institucionalizados estar h mais de dois anos nesta situao
denota a existncia de alguns fatores determinantes, como o acolhimento nos
abrigos sem deciso judicial; a falta de uma fiscalizao mais contundente porparte do Judicirio, do Ministrio Pblico e dos Conselhos Tutelares; a
inexistncia, muitas vezes, de profissionais capacitados para realizar
intervenes no ambiente familiar dos abrigados; a colocao de crianas e
adolescentes em abrigos fora de seus municpios; o entendimento equivocado
de alguns profissionais de que o abrigo o melhor lugar para as crianas e
adolescentes; ausncia de polticas pblicas ou apoio s famlias; utilizao
indiscriminada da medida de abrigamento pelo Conselho Tutelar.Ainda segundo o Levantamento Nacional, apenas 54,6% das crianas e
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adolescentes institucionalizados tinha processo nas Varas da Justia, isto
quando o art. 93 do Estatuto da Criana e do Adolescente determina que as
instituies que oferecem medida de abrigo devem comunicar Justia sobre
crianas e adolescentes acolhidos em seus programas sem medida judicial em
at 2 dias teis.
Neste sentido devemos observar que, na aplicao destas medidas, os
rgos competentes devem considerar que a mesma tem como objetivo a
proteo da criana ou adolescente podendo ser aplicada de maneira isolada
ou cumulativamente, ou vrias medidas ao mesmo tempo, com o intuito de
proteo e de sanar a situao de risco a que as crianas e adolescentes
estavam sendo submetidas.
Com relao situao familiar, a pesquisa demonstrou que 87% das
crianas e adolescentes pesquisados tm famlia, sendo que 58,2 % mantm
vnculo com seus familiares, que os visitam periodicamente. 22,7% no
mantm vnculo constante, a famlia aparece para visitas esporadicamente.
Segundo a pesquisa, apenas 11,3 % do total das crianas e adolescentes
pesquisados no tm famlia ou a mesma encontra-se desaparecida.
Neste contexto, considerando que as medidas de abrigo so medidas de
proteo e devem, de acordo com a necessidade, ser aplicadas juntamente
com outras medidas sociais, no podemos afirmar que tal trabalho de proteo
e resgate de direitos esteja sendo realizado de forma adequada j que a maior
parte das crianas e adolescentes tm famlia, mas permanecem abrigadas. As
situaes de pobreza e das condies econmicas, presentes nas situaes de
abrigamento evidenciam a ausncia de uma estrutura de proteo social mais
efetiva que d conta, minimamente, de gerar condies sociais bsicas
necessrias manuteno das crianas e adolescentes em seus lares.
Diante de tal avaliao deve ser considerado um outro ponto pesquisado
neste Levantamento Nacional de bastante relevncia na atuao das
instituies que oferecem medida de abrigo que com relao aos
profissionais atuantes nestas e a forma de atuao destes considerando os
modelos de famlia adotados no trabalho nos abrigos
At fins do sculo XIX a ateno infncia e adolescncia
desamparados, como eram caracterizados, era feita atravs de entidadesreligiosas e beneficentes. J no sculo XX surge a necessidade de maior
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controle sobre as aes que no partiam do governo, transformando-as em
aes estatais. Assim, comearam a ser introduzidos critrios tcnico-
cientficos no atendimento s crianas e adolescentes.
Com a consolidao do Estatuto da Criana e do Adolescente e as
mudanas estimuladas pelos movimentos sociais, surge na agenda de
discusso da questo da garantia de direitos infncia e adolescncia,
exigindo novas estratgias na preveno ao abandono e colocando na pauta a
necessidade de as medidas de abrigo acontecerem de forma aberta e
promotora de cidados, priorizando a garantia do direito a convivncia familiar
e comunitria.
Segundo considerou a pesquisa,
os profissionais das entidades que oferecem programas de
abrigo passam a ter o papel de educadores, o que requer no
apenas profissionalizao na rea, mas tambm a existncia de
uma poltica de Recursos Humanos que envolva seleo
adequada; capacitao permanente, considerando as
peculiaridades e dificuldades do trabalho desenvolvido; incentivos
e valorizao, o que tambm inclui uma remunerao adequada.
(SILVA E MELLO, 2004: 103)
Assim, considerando o papel estratgico das instituies de abrigo na
implementao de uma parte da poltica destinada s crianas e adolescentes
que necessitam de proteo, imprescindvel conhecer e avaliar o trabalho dos
profissionais que atuam nestas instituies.
Com relao aos dirigentes das instituies, a pesquisa revelou que
60,4% so mulheres e 38,9% so homens, ambos com mdia de 48,6 anos de
idade. No que se refere escolaridade observou-se que 42,8% deles tm
ensino superior completo; 18% cursaram ps-graduao e 9,2% no
concluram o ensino superior. Dentre os demais, 21,4% concluram o ensino
mdio, sendo que apenas 7,6% possuem escolaridade inferior ao ensino mdio
completo.
Quanto ao tipo de profisso/ocupao dos dirigentes pesquisados
constatou-se que 24,8% possui formao ou ocupao no mbito das cinciassociais ou humanas, destacando-se os assistentes, que correspondem a 10,7%
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do total. Os profissionais do ensino correspondem a 22,8% do total de
dirigentes e os profissionais que se auto denominaram religiosos correspondem
a 11,7% do total de dirigentes.
Considerando a peculiar situao das crianas e adolescentes em
situao de abrigo, as instituies que oferecem tal medida devem contar com
profissionais necessrios para o atendimento cotidiano dos abrigados. Tendo
em vista as diretrizes do ECA, o atendimento em regime de abrigo requer trs
grupos bsicos de recursos humanos.
1 Equipe tcnica de carter multidisciplinar;
2 Responsveis pelo cuidado direto e cotidiano das crianas e
adolescentes abrigados;
3 Pessoal de apoio operacional que desempenha as atividades de
organizao diria e manuteno do abrigo.
De acordo com o Levantamento Nacional, foram encontrados 16.432
profissionais nas instituies pesquisadas. Destes, 25,5% eram responsveis
pelos cuidados diretos com as crianas e adolescentes; 21,2% eram de apoio
operacional e 11,3% faziam parte da equipe tcnica. Os 42% restante estavam
identificados com atividades de administrao institucional, servios
especializados e servios complementares.
Em relao ao vnculo empregatcio, 59,2% do quadro de funcionrios
dos prprios abrigos, enquanto 25,3% so voluntrios e 15,5% atuam por meio
de convnios ou parcerias. Como principal motivao para trabalhar no abrigo,
a humanitria foi citada por 44,3% dos dirigentes pesquisados.
Neste ponto da avaliao realizada pelo IPEA cabe uma anlise da
insero do voluntariado nos abrigos considerando o dado de granderelevncia anteriormente exposto.
Segundo revelou a pesquisa, 64% dos abrigos pesquisados declararam
trabalhar com servio voluntrio, estando 58% deste total na regio sudeste do
pas, regio que mais recorre ao trabalho no-remunerado. Notamos tambm
que 88% destas instituies so no-governamentais, sendo que, com relao
religio, 78% declararam possuir laos com instituies confessionais,
estando 44% inspiradas na religio catlica, 14% na religio evanglica e 11%baseadas na doutrina esprita.
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Os voluntrios que atuam nas instituies de abrigo no pas somam 35%
do total de trabalhadores destas instituies, prestando, assim, servios
gratuitamente.
A tabela a seguir nos mostra um pouco da dimenso do trabalhovoluntrio nos abrigos do pas:
Brasil: distribuio dos voluntrios por funo desempenhada nos
abrigos
Funo desempenhada no abrigo
N de
voluntrios
(A) Percentual
Total de
Profissionais
(B)
Percentual
(A/B)
Equipe tcnica 462 11,2% 1.325 34,9%
Assistente social 84 2,0% 361 23,3%
Coordenador tcnico 30 0,7% 171 17,5%
Nutricionista 82 2,0% 126 65,1%
Pedagogo 81 2,0% 231 35,1%
Psiclogo 184 4,5% 431 42,7%
Assessor de coordenao - 0,0% 1 0,0%Psicopedagogo 1 0,0% 3 33,3%
Tcnico em nutrio - 0,0% 1 0,0%
Cuidado direto 286 6,9% 2541 11,3%
Educador/ monitor/ pajem/ cuidador 227 5,5% 2258 10,1%
Pai/ me social 59 1,4% 283 20,8%
Apoio operacional 213 5,2% 2.308 9,2%
Auxiliar de servios gerais (faxineiro,zelador,jardineiro, auxiliar de limpeza
etc.) 90 2,2% 1.236 7,3%
Cozinheiro 39 0,9% 571 6,8%
Motorista 66 1,6% 277 23,8%
Segurana/ vigia 18 0,4% 223 8,1%
Coordenador de servios gerais - 0,0% 1 0,0%
Administrao institucional 1.053 25,5% 2.054 51,3%
Administrador/ gerente 278 6,7% 515 54,0%
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Advogado 219 5,3% 259 84,6%
Auxiliar administrativo (secretria,
digitador,office-boy, telefonista etc.) 88 2,1% 502 17,5%
Captador de recursos 352 8,5% 485 72,6%
Contador 109 2,6% 261 41,8%Almoxarife 0 0,0% 3 0,0%
Assistente contbil - 0,0% 1 0,0%
Bibliotecrio 1 0,0% 1 100,0%
Cobrador 0 0,0% 10 0,0%
Recepcionista - 0,0% 2 0,0%
Coordenador de lares - 0,0% 6 0,0%
Coordenador de servios - 0,0% 1 0,0%
Coodenador de almoxarifado 1 0,0% 1 100,0%
Coordenador de estoque de alimentos 1 0,0% 1 100,0%
Jornalista 3 0,1% 3 100,0%
Supervisor das casas-lares - 0,0% 1 0,0%
Tcnico em seguranao do trabalho - 0,0% 1 0,0%
Tradutor 1 0,0% 1 100,0%
Servios especializados 1.108 26,8% 2.113 52,4%
Dentista 370 9,0% 470 78,7%
Enfermeiro 46 1,1% 85 54,1%Fisioterapeuta 53 1,3% 86 61,6%
Fonoaudilogo 74 1,8% 118 62,7%
Mdico clnico 140 3,4% 194 72,2%
Mdico pediatra 170 4,1% 243 70,0%
Mdico psiquiatra 42 1,0% 78 53,8%
Professor de educao fsica - 148
Professor de ensino regular 47 1,1% 380 12,4%
Tcnico em enfermagem (auxiliar) 38 0,9% 197 19,3%
Terapeuta ocupacional 26 0,6% 53 49,1%Coordenador de atividades agrcolas - 0,0% 1 0,0%
Coordenador da rea de sade 5 0,1% 5 100,0%
Engenheiro civil 1 0,0% 1 100,0%
Eqoterapeuta 1 0,0% 1 100,0%
Instrutor de profissionalizao 16 0,4% 49 32,7%
Musicoterapeuta 1 0,0% 1 100,0%
Professor de educao especial - 0,0% 2 0,0%
Tetapeuta comportamental 1 0,0% 1 100,0%
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Servios Complementares 969 23,4% 1.537 63,0%
Estagirio 323 7,8% 577 56,0%
Professor de reforo escolar 236 5,7% 432 54,6%
Recreador 297 7,2% 372 79,8%
Acompanhantes em passeios 15 0,4% 15 100,0%Cabeleleiro 2 0,0% 2 100,0%
Costureiro 14 0,3% 20 70,0%
Estimulao precoce 8 0,2% 8 100,0%
Professor de atividades complementares 52 1,3% 85 61,2%
Massagista 1 0,0% 1 100,0%
Monitores de atividades ocupacionais:
tric,croch, pintura em tecido, bordado
a mo,tapearia, costuras, brech 10 0,2% 11 90,9%
Orientador espiritual/religioso 9 0,2% 12 75,0%
Tcnica reiki 2 0,0% 2 100,0%
Outros 43 1,0% 61 70,5%
TOTAL 4.134 100,0% 11.939 34,6%
Fonte: IPEA/DISOC (2003). Levantamento Nacional de Abrigos para Crianas e Adolescentes da RedeSAC.
Conforme podemos notar atravs dos dados apresentados, o trabalho
voluntrio no se constitui apenas em atividade complementar ao programa de
abrigo, ao contrrio, vem atuando em funes essenciais ao atendimento de
crianas e adolescentes em situao de abrigo, diferentemente do que dispe
o ECA. A pesquisa apontou ainda que 59% das 589 instituies pesquisadas
so dirigidas por voluntrios. Notamos ainda que destes dirigentes voluntrios,
59% declararam faz-lo por questes humanitrias e 42% por razes de cunho
religioso.
Com relao aos servios especializados notamos que estes somam
27% do total de voluntrios nas instituies, com especial enfoque nos servios
de sade.
Ainda que, em menor proporo, observa-se igualmente a
presena de trabalhadores no remunerados nas equipes tcnicas,
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isto , entre os profissionais que so responsveis pelo programa
e que orientam o atendimento personalizado s crianas e aos
adolescentes. Assim, somando-se os coordenadores tcnicos,
assistentes sociais, pedagogos e psicopedagogos, psiclogos,
nutricionistas e tcnicos em nutrio tm-se um total de 1.325profissionais, sendo 462 voluntrios, o que corresponde a 35%.
Aqui pode-se formular duas hipteses: a primeira que o exerccio
no-remunerado dessas aes deve ser predominantemente
motivado por questes religiosas, uma vez que se trata de
atividades que exigem muita ateno e que, se mal prestadas,
podem resultar em desgaste fsico, mental e emocional. Assim, a
ncora da f deve ser central para a prestao voluntria desses
servios. Em segundo lugar, por mais dedicados que sejam os
voluntrios, de maneira geral no devem dispor do tempo
necessrio ao atendimento satisfatrio das crianas e dos
adolescentes abrigados, j que cumprem funes que so
essenciais no programa de abrigo. Dessa forma, a rotina do abrigo
pode estar comprometida. (BEGHIN e PELIANO, 2004: 265)
Neste sentido, considerando os dados apresentados pela pesquisa com
relao ao direito a convivncia familiar, notamos que somente 5% dos abrigosdirigidos por voluntrios atendem aos critrios de apoio as famlias dos
abrigados com o intuito de incentivar a convivncia, e evitam a separao de
grupo de irmos. Este percentual se mostra inferior os abrigos governamentais
que somam o percentual de 8%.
Com relao s aes realizadas junto s famlias no sentido de auxiliar
os responsveis das crianas e adolescentes a superarem as dificuldades que
determinaram o afastamento destes do lar, observamos que somente 13% dasinstituies dirigidas por trabalhadores no-remunerados preencheram todos
os critrios considerados na pesquisa (realizao de visita s famlias,
organizao de grupos de apoio, articulao com programas governamentais
ou comunitrios de auxlio s famlias).
O incentivo convivncia com outras famlias tambm foi um aspecto
importante apontado pela pesquisa. Com relao a esta notamos que um
pouco mais de 25% dos abrigos dirigidos por voluntrios atendem aos critrios
elencados pela pesquisa. Neste caso a proporo superior de instituies
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governamentais, que somam 18%.
Conforme podemos avaliar, a insero do voluntariado nos abrigos
pesquisados bastante significativa, sendo a maior parte dirigida por pessoas
que exercem esta atividade voluntariamente, estando a religio como principaljustificativa para a realizao destas atividades associada questo da
caridade.
Neste sentido, no podemos garantir que estas atividades estejam
vinculadas compreenso trazida pelo ECA, j que motivaes religiosas e
caritativas podem tender a descambar para o assistencialismo, contrariando a
noo do direito social que traz a poltica pblica.
Nossa trajetria poltica de assistncia social historicamente no se
associa emancipao dos sujeitos e sim, visualiza uma solidariedade
hierarquizada e moralista, de manuteno do status quo (BEGHIN e
PELIANO, 2004: 283), no conseguindo o Estado assegurar, na forma de um
direito social, o atendimento de crianas e adolescentes em situao de risco
social e pessoal inseridos em instituies de abrigo.
A parceria entre Estado e sociedade civil se coloca como fundamental
para o desenvolvimento de uma atuao mais digna e democrtica junto a
crianas e adolescentes em situao de risco. Entretanto, a participao da
sociedade civil no deve eximir o Estado de suas responsabilidades sociais,
sobretudo na realizao e manuteno dos direitos de crianas e adolescentes,
em especial do direito a convivncia familiar. Cabe ressaltar ainda a
importncia do respeito diversidade cultural de casa criana e adolescente
institucionalizado, incluindo-se a questo religiosa.
Para avaliar o esforo dos programas de abrigo em promover a
preservao dos vnculos familiares foram considerados dois grupos de aes
desenvolvidas pelas instituies:
1 aes de incentivo convivncia das crianas e adolescentes com
suas famlias de origem;
2 aes referentes ao no-desmembramento de grupos de irmos
abrigados.
Referente ao primeiro grupo de aes, pesquisa revelou que 79,8% das
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instituies mantm informaes sistematizadas sobre as famlias dos
abrigados; 65,9% promovem visitas das crianas e adolescentes aos lares de
suas famlias; 41,4% permitem a visitao livre das famlias ao abrigo sem
datas e horrios preestabelecidos. Entretanto, quando considerando as
instituies que praticam os trs critrios conjuntamente, o percentual se reduz
para apenas 25,5%.
Com relao ao segundo grupo, o no-desmembramento do grupo de
irmos um dos princpios para o atendimento em instituies de abrigo
considerando que a separao entre eles pode agravar a sensao de
abandono e rompimento vivenciados pelas crianas e adolescentes afastadas
de suas famlias.Neste sentido, a pesquisa revelou que 63,8% das instituies afirmaram
priorizar a manuteno ou a reconstituio de grupo de irmos, enquanto
62,1% adotam o modelo de agrupamento vertical6, predominando uma
diferena superior a 10 anos entre a maior e a menor idade. 62,3% oferecem
atendimento misto, atendendo a meninos e meninas.
Assim como a manuteno dos vnculos afetivos entre abrigados e
familiares, outro ponto importante para a garantia do direito convivncia
familiar o desenvolvimento de condies, por parte das famlias, para receber
seus filhos de volta, superadas as dificuldades que determinaram o
afastamento. Considerando que as entidades de abrigo podem realizar aes
de valorizao da famlia, alm de buscar estabelecer a conexo e a insero
dos familiares na rede de proteo social disponvel e nas demais polticas
pblicas existentes, o Levantamento Nacional revelou que, dentre as aes
desenvolvidas neste sentido, 78,1% das instituies realizam visitas
domiciliares s famlias; 65,5% fazem acompanhamento social destas famlias;
34,5% organizam reunies ou grupos de discusso e de apoio para as famlias
dos abrigados; 31,6% encaminham as famlias para insero em programas
oficiais ou comunitrios de auxlio/proteo famlia.
Quando tratamos de colocao em famlia substituta como opo
importante frente prtica de institucionalizao de crianas e adolescentes
em situao de risco, observamos que 22,1% das instituies pesquisadas
6Definio de limites de idade que os abrigos adotaram como critrio para institucionalizao
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desenvolvem aes como o incentivo integrao em famlia substituta, a
elaborao e envio de relatrios peridicos para as Varas da Infncia e
Juventude e a implementao de programas de apadrinhamento.
Neste sentido, o modelo de famlia tradicionalmente adotado no pas
de famlia nuclear burguesa, representado por pai, me e filhos. Entretanto,
temos que admitir que coexistam uma diversidade de outros arranjos familiares
que, muitas vezes, so desqualificados, ou at mesmo no considerados, por
no corresponderem ao modelo familiar socialmente valorizado por padres
culturais mais rgidos. Estas prticas discursivas e de posturas, quando
desenvolvida, especialmente por profissionais de instituies que oferecem