Biologia Botânica - Conceito de Espécie

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CONCEITO DE ESPÉCIE 1 Conceito de Espécie- Categoria e Táxon Diogo Figueiredo 2001 Índice Conceito de Espécie- Categoria e Táxon................................................................................... 1 Objetivo: ................................................................................................................................. 1 Introdução............................................................................................................................... 1 Espécie- Categoria.................................................................................................................. 2 1. Conceito Nominalista ..................................................................................................... 2 2. Conceito Tipológico ....................................................................................................... 2 4. Conceito Evolutivo......................................................................................................... 3 5. Conceito Filogenético .................................................................................................... 4 6. Conceito Feneticista ....................................................................................................... 5 7. Conceito de Van Valen (1976) ....................................................................................... 5 Conclusão ............................................................................................................................... 6 Objetivo: - Apresentação crítica de diferentes conceitos de espécie - Dificuldades de aplicação do conceito Introdução O que é uma espécie? Responder a esta questão pode parecer bastante simples para as pessoas comuns, mas temos que reconhecer que a Biologia ainda não conseguiu encontrar uma resposta satisfatória para esta questão. Existem organismos bem diferenciados, de fácil classificação e identificação. Todavia, muitos outros existem que apresentam pequenas diferenças entre si, sobretudo quando ocorrem em regiões geográficas diferentes. Por exemplo, poderão ser diferenças na coloração, com comprimentos de determinadas estruturas, etc. A questão que se coloca aos taxonomistas é se a estas diferenças se encontram também associados a organismos (taxa) realmente distintos ou se as diferenças correspondem a simples variações de um mesmo ser vivo. São muitos os exemplos na literatura científica em que espécies descritas e nomeadas como “novas” são posteriormente incluídas em espécies já existentes e vice-versa. Uma vez que a espécie é o grupo taxonómico (ou táxon) de nível mais baixo que geralmente é usado nas classificações, quando se classifica procura-se agrupar os organismos em espécies e associar estas em conjuntos ou categorias cada vez mais inclusivos (classificação ascendente). De acordo com Mayr (1987), a espécie-táxon é um objeto natural reconhecido e definido pelos taxonomistas. A espécie-categoria é o lugar dado à espécie-táxon.

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CONCEITO DE ESPÉCIE

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Conceito de Espécie- Categoria e Táxon Diogo Figueiredo 2001

Índice Conceito de Espécie- Categoria e Táxon................................................................................... 1

Objetivo:................................................................................................................................. 1

Introdução............................................................................................................................... 1

Espécie- Categoria.................................................................................................................. 2

1. Conceito Nominalista..................................................................................................... 2

2. Conceito Tipológico....................................................................................................... 2

4. Conceito Evolutivo......................................................................................................... 3

5. Conceito Filogenético .................................................................................................... 4

6. Conceito Feneticista ....................................................................................................... 5

7. Conceito de Van Valen (1976)....................................................................................... 5

Conclusão ............................................................................................................................... 6

Objetivo:

- Apresentação crítica de diferentes conceitos de espécie - Dificuldades de aplicação do conceito

Introdução

O que é uma espécie? Responder a esta questão pode parecer bastante simples para as pessoas comuns, mas temos que reconhecer que a Biologia ainda não conseguiu encontrar uma resposta satisfatória para esta questão. Existem organismos bem diferenciados, de fácil classificação e identificação. Todavia, muitos outros existem que apresentam pequenas diferenças entre si, sobretudo quando ocorrem em regiões geográficas diferentes. Por exemplo, poderão ser diferenças na coloração, com comprimentos de determinadas estruturas, etc. A questão que se coloca aos taxonomistas é se a estas diferenças se encontram também associados a organismos (taxa) realmente distintos ou se as diferenças correspondem a simples variações de um mesmo ser vivo. São muitos os exemplos na literatura científica em que espécies descritas e nomeadas como “novas” são posteriormente incluídas em espécies já existentes e vice-versa. Uma vez que a espécie é o grupo taxonómico (ou táxon) de nível mais baixo que geralmente é usado nas classificações, quando se classifica procura-se agrupar os organismos em espécies e associar estas em conjuntos ou categorias cada vez mais inclusivos (classificação ascendente). De acordo com Mayr (1987), a espécie-táxon é um objeto natural reconhecido e definido pelos taxonomistas. A espécie-categoria é o lugar dado à espécie-táxon.

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1. Conceito Nominalista Não é propriamente um conceito já que nega explicitamente a existência da espécie. De acordo com a versão mais extremista do nominalismo metodológico, na natureza só existem objetos individuais. As espécies não correspondem assim a uma entidade real na natureza. Segundo Mayr (1991), não há argumento mais demolidor contra a postura nominalista que o fato das tribos da Nova Guiné, com uma cultura da Idade da Pedra, reconhecerem como espécies exatamente a mesmas entidades naturais que os taxonomistas ocidentais.

2. Conceito Tipológico No conceito tipológico as espécies são caracterizadas por propriedades. Um organismo pode pertencer a uma classe ou não, dependendo da presença ou ausência dos atributos próprios de cada classe. Entende-se que a categoria espécie existe "por si mesmo" (anterior aos organismos que contém) e, portanto, procuram-se os indivíduos que pertencem a essa categoria, em vez de os agrupar. Assim, segundo este conceito, as espécies seriam imutáveis e podiam ser definidas a partir de um exemplar, que seria o tipo da espécie. Segundo Mayr (1991), uma espécie tipológica é uma identidade que se diferencia de outras espécies através de características diagnosticas constantes. Este é o conceito de Lineu. O conceito tipológico utiliza caracteres morfológicos que servem de divisão entre as espécies (Taxonomia Tradicional). Alguns autores ao criticarem este conceito argumentam que, de acordo com o formulado, "uma espécie é o que o taxonomista diz que é". 3. Conceito Biológico O conceito biológico é o modelo mais popular entre os taxonomistas atuais. Um dos seus maiores expoentes foi Mayr (a primeira definição foi formulada em 1940) que concebe a espécie do seguinte modo: "As espécies são grupos de populações naturais interfecundas e que estão isoladas

do ponto de vista reprodutor de outros grupos" (Mayr, 1991). Este tem sido criticado por não proporcionar mecanismos para o reconhecimento das espécies. Por outro lado, a ausência de fluxo genético não leva, com freqüência, à diferenciação das populações isoladas por barreiras intransponíveis, mesmo que por longos períodos, se essas populações continuarem submetidas a pressões seletivas semelhantes; a definição de Mayr apresenta, ainda a desvantagem de não

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levar em conta o aspecto temporal da evolução. Tem igualmente sido criticada pela sua falta de operacionalidade, pois não existem, com freqüência, elementos que permitam ajuizar da existência de um fluxo genético ou de um isolamento reprodutor entre várias populações. Finalmente, este conceito não cobre os casos das espécies assexuadas que, à semelhança das espécies sexuadas, possuem fundos genéticos próprios e são resultados dos processos evolutivos. Trata-se de um conceito que só se pode aplicar num tempo geológico concreto, por exemplo, o atual. A longo da história genealógica e filogenética das espécies, o conceito biológico não tem um significado claro. Se uma espécie A, extinta, origina duas espécies: B e C (Fig. 1). Não se pode aplicar à espécie troncal A o conceito biológico de espécie, já que a sua extinção deixa sem sentido a expressão "que estão isoladas do ponto de vista reprodutor de outros grupos". O isolamento reprodutor como mecanismo de diferenciação e segregação entre grupos biológicos afeta as espécies que convivem no mesmo momento.

Fig 1- Evolução de uma espécie (sem ramificação - cladogénese). Com base no conceito tipológico e fenético seriam consideradas três espécies distintas (A, B e C). O conceito biológico não é aplicável. Os conceitos evolutivos e filogenéticos identificam apenas uma espécie.

4. Conceito Evolutivo A incapacidade dos conceitos tipológico e biológico para discernir de forma eficiente uma "linhagem" com novidades evolutivas ao longo do tempo foi a que levou Simpson a formular o conceito evolutivo:

Uma espécie evolutiva é uma linha evolutiva (uma seqüência de populações ancestrais descendentes) evoluindo independentemente de outras e com um destino

evolutivo unificado e tendências próprias (Simpson, 1961). Algumas críticas têm sido feitas a esta definição: - aplicabilidade reduzida; não se pode conhecer a priori qual o destino evolutivo e quais as tendências de uma espécie. Mesmo em relação aos fósseis, só com um bom registro, o que é raro, seria possível reconhecermos a posteriori qual o seu destino evolutivo bem como as tendências próprias. - não fornece qualquer indicação sobre a delimitação da espécie ao longo do tempo. Consideram-se dois processos pelos quais se desenrola a evolução: um diz respeito a um contínuo evolutivo ao longo do qual uma espécie pode ir sofrendo alterações adaptativas graduais e que se designa por anagênese e um outro denominado

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cladogênese que está ligado aos fenômenos da especiação e produz a diversidade específica. Enquanto no primeiro caso existe apenas uma linha evolutiva, pelo segundo processo a partir de uma linha evolutiva obtêm-se duas ou mais linhas evolutivas. De acordo com a definição evolutiva de espécie é teoricamente impossível a delimitação vertical de uma espécie na dimensão temporal, pelo que ela terá de ser arbitrária, tendo-se em consideração, para o efeito, a quantidade de alterações surgidas ao longo do tempo. - uma outra crítica a este conceito feita pelos filogeneticistas diz respeito à impossibilidade de se reconhecer se as formas fósseis são formas ancestrais de determinada espécie mais recente ou se pertencem a linhas evolutivas diferentes.

5. Conceito Filogenético Em 1966, foi editada a versão inglesa do livro de Hennig “Sistemática Filogenética”. Foi a partir desta edição que ressurge o conceito filogenético de espécie. Existem diferentes versões deste conceito, mas todas elas se caracterizam por aceitar o conceito evolutivo e biológico, e delimitam as espécies de um modo ou de outro (aspecto prático que a aproxima ao conceito tipológico). De acordo com o conceito filogenético, a delimitação temporal das espécies poderia ser feita considerando os pontos de ramificação das linhas evolutivas. Ainda segundo os filogeneticistas, no processo evolutivo deve apenas ser considerada a cladogénese e que as formas ancestrais não podem ser reconhecidas, mas somente hipotetisadas; deste modo, nenhuma forma fóssil deveria ser considerada como uma forma ancestral de uma espécie mais recente. Segundo Hennig, espécies são:

“Grupos de indivíduos que estão interligados por relações tocogenéticas (relações genealógicas entre indivíduos”).

“As espécies deveriam ser então definidas como um complexo de comunidades

reprodutoras espacialmente distribuídas” A definição de Hennig tem em conta as relações genealógicas entre indivíduos com capacidade de reprodução entre eles e a distribuição espacial. Mais tarde, em 1978 Wiley propõe uma nova versão do mesmo conceito, que é uma síntese do conceito evolutivo e do conceito biológico: "Uma linha evolutiva única de populações ancestrais-descendentes de organismos que mantêm a sua identidade em relação a outras linhas evolutivas semelhantes e

que têm tendências evolutivas e destino histórico" (Wiley, 1978). A espécie é concebida como formada por organismos que evoluem de forma independente (como o conceito evolutivo), mantendo a sua identidade relativamente a outras linhas. Esta identidade manifesta-se através das relações reticulares que se

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produzem mediante a reprodução entre organismos semelhantes. A tendência evolutiva e o destino histórico fazem referência à ordem estabelecida pela evolução em que as linhas evolutivas e as espécies se identificam. Por outro lado, subentende-se que os nós das ramificações na cladogénese representarão os limites temporais das espécies já que as "espécies-filhas" deixarão, em muitas as circunstâncias, de serem idênticas à espécie ancestral, em virtude do fundo genético destas ter se desintegrado no momento da especiação. As espécies são assim definidas como sendo unidades biológicas independentes, conduzidas pela evolução e que mantêm uma coesão e identidade mediante a reprodução.

6. Conceito Feneticista Os feneticistas, embora aceitando a evolução orgânica, consideram que não é possível nem desejável entrar no mérito dos aspectos evolutivos na classificação. Assim, propõem que as espécies sejam definidas apenas com base nas semelhanças dos organismos, considerando todos os caracteres e atribuindo-lhe igual peso. Servindo-se dos métodos numéricos Sneath e Sokal (1973) definem espécie como sendo: "O menor (o mais homogêneo) agrupamento que pode ser reconhecido segundo um

dado critério como sendo distinto de outros agrupamentos" Segundo outros autores feneticistas a espécie não é mais do que a "unidade taxonômica operacional" (UTO). As principais críticas que são feitas a este conceito são:

- Operacionalidade reduzida, pois é impossível considerar todos os caracteres. Os próprios feneticistas reconhecem esta impossibilidade, fato que levou os seus autores, Sokal e Sneath, a considerarem que no mínimo deveriam ser considerados 70 caracteres de todos os tipos (morfológicos, fisiológicos, etológicos, etc.), que não se reduzissem aos aspectos morfológicos e que abrangessem também as diferentes fases do ciclo de vida. A seleção dos caracteres deverá ser da responsabilidade dos especialistas do grupo taxonômico.

- Como os feneticistas não aceitam inferências filogenéticas, o que levou

alguns autores a fazer críticas, por vezes exageradas e injustas: “A taxonomia fenética é uma questão de olhar, ver, inferir, codificar e agrupar” (Hull, 1970).

7. Conceito de Van Valen (1976)

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Segundo alguns taxonomistas, a seleção natural tem um papel mais importante como força coesiva ou separativa do que a presença ou ausência de fluxo genético entre populações da mesma espécie. Os genes teriam, portanto, uma importância reduzida na evolução, sendo esta controlada largamente pelos fatores ecológicos. Em 1976, Van Valen, propôs a seguinte definição de espécie:

“Uma linha evolutiva (ou conjunto de linhas evolutivas estreitamente relacionadas) que ocupa uma zona adaptativa minimamente diferente de qualquer outra linha

evolutiva que exista no interior da sua área de distribuição e que evoluciona separadamente de todas as outras linhas evolutivas fora da sua área de

distribuição”. De acordo com este conceito, se duas espécies isoladas do ponto de vista reprodutor e consideradas como sendo ecologicamente equivalentes habitam em áreas distintas; se entrarem em contato uma com a outra devido ao desaparecimento da barreira que as separava, e se uma delas eliminar a outra por competição intra-específica, então as duas espécies teriam de ser consideradas como pertencentes à mesma espécie, apesar do isolamento reprodutor. As espécies não podem ser de fato dissociadas do seu meio ambiente, não deverão igualmente sê-lo do seu fundo genético ou da sua morfologia.

Conclusão

Não foi ainda encontrada uma definição ideal de espécie, ou seja, que considere a espécie como uma entidade em evolução no espaço e no tempo; uma entidade com um fundo genético e uma morfologia adaptada ao meio ambiente em que está integrada. ATENÇÃO Estas notas não dispensam a leitura e consulta das seguintes leituras complementares: Almaça, C. 1982. Museus de Zoologia e Investigação Científica. Edição ciclostilada, 48pp. Bird, G.W. (1971). Taxonomy: The Science of Classification. In: Plant Parasitic Nematods, 117- 137. Mayr, E. (1991). One Long Argument: Charles Darwin and the Genesis of Modern Evolutionary

Thought. London: Penguin. Rodrigues, P.D. (1990). Estudar Sistemática Zoológica, porque não? A perspectiva de um zoólogo.

Ciência, 8-14. Savage, J.M. 1995. Systematics and the Biodiversity Crisis. BioScience, vol. 45, nº 10, 673-679. Simpson, B.B. & Cracraft, J. 1995. Systematics: The Science of Biodiversity. BioScience, vol. 45, nº

10, 670-672. Wheeler Q.D., 1995. Systematics and Biodiversity- policies at higher levels. BioScience Supplement,

21- 28.