BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA À …...LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS CNIS Cadastro Nacional...

175
BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA: observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann PATRÍCIA ALPES DE SOUZA Recife 2014

Transcript of BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA À …...LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS CNIS Cadastro Nacional...

BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA À PESSOA COM DEFICIÊNCIA:

observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife

a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann

PATRÍCIA ALPES DE SOUZA

Recife

2014

PATRÍCIA ALPES DE SOUZA

Benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência:

observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife

a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito do Centro de Ciências Jurídicas/Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito. Área de concentração: Estado, Constitucionalização e Direitos Humanos. Linha de pesquisa: Direitos humanos, sociedade e democracia. Orientador: Artur Stamford da Silva

Recife

2014

S729b Souza, Patrícia Alpes de

Benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência: observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann / Patrícia Alpes de Souza. – Recife: O Autor, 2014.

173 f.

Orientador: Artur Stamford da Silva. .

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CCJ. Programa de Pós-Graduação em Direito, 2014.

Inclui bibliografia.

1. Direito Constitucional - Brasil. 2. Assistência social – Recife (PE). 3. Direito – aspectos sociais. 4. Deficientes – benefícios. I. Silva, Artur Stamford da (Orientador). II. Título.

342 CDD (22. ed.) UFPE (BSCCJ2014-010)

PATRÍCIA ALPES DE SOUZA

Benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência:

observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife

a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do título de mestre em direito. Linha de Pesquisa: Estado, Constitucionalização e Direitos Humanos. Grupo de Pesquisa: Direitos humanos, sociedade e democracia. Orientador: Artur Stamford da Silva

A banca examinadora composta pelos professores abaixo, sob presidência do segundo, submeteu à candidata, em nível de mestrado, a julgou nos seguintes termos: Menção geral:_______________________________________________ Professor Dr. Artur Stamford da Silva (Orientador/UFPE) Julgamento:________________________ Assinatura_______________________ Professor Dr. João Paulo F. de Souza Allain Teixeira (Examinador 1/UFPE) Julgamento:________________________ Assinatura_______________________ Professor Dr. Francisco Antônio de Barros e Silva Neto (Examinador 2/UFPE) Julgamento:________________________ Assinatura_______________________ Professor Dr. Antônio Carlos dos Santos Xavier (Examinador/UFPE) Julgamento:________________________ Assinatura_______________________

Recife

2014

A Gustavo Campelo Elldorf,

com amor.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Artur Stamford, pois sem o seu entusiasmo esta dissertação não

seria possível;

Aos professores João Paulo Allain Teixeira e Gustavo Ferreira Santos que me

acompanham desde as primeiras experiências acadêmicas nas atividades de PIBIC

e Monitoria, ainda na Graduação.

Ao professor Francisco Barros pela colaboração que prestou para a

elaboração deste trabalho;

À minha mãe, aquela que conhece todas as ―verdades‖ sobre mim;

Ao meu pai pela sua delicadeza;

Aos meus irmãos, certeza de que nunca estarei sozinha;

À família e aos amigos, pois as conquistas de nossas vidas nunca são

individuais, mas coletivas;

Aos servidores, defensores públicos federais, terceirizados e estagiários da

Defensoria Pública da União, porque compartilhamos de um mesmo sonho;

Aos assistidos da Defensoria Pública da União, porque me ensinam e me

transformam todos os dias.

RESUMO

SOUZA, Patrícia Alpes de. Benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência: observações de decisões nos juizados especiais federais em Recife a partir da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann. 2014. 173 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / FDR, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2014. Para pesquisar como o direito constitucional de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família está sendo vivenciado nos Juizados Especiais Federais em Recife, foram coletados dados em demandas judiciais. Observou-se como o sistema do direito – por meio de sua organização central (o Judiciário) e da atuação dos participantes nas demandas – comporta-se perante mudanças sociais, como no caso da substituição do modelo médico e biológico para o modelo social de deficiência, segundo o qual a deficiência resulta da interação entre os impedimentos e as barreiras sociais. Observaram-se, também, como mudanças legislativas influenciam a comunicação jurídica, como aquela advinda da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de Nova York e da Lei n. 12.470/2011, que se adequou ao modelo social quanto à concessão do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência. Tomando a doutrina, textos legislativos, perícias, decisões administrativas e judiciais como informações à comunicação jurídica, analisamos quantitativa e qualitativamente a comunicação nas demandas judiciais e a produção de sentido a partir da Teoria dos Sistemas Sociais de Luhmann. Afirma-se que nesses Juizados os participantes permanecem utilizando concepções presentes em legislação revogada, insistindo-se em submeter a avaliação da deficiência unicamente à perícia médica judicial, a despeito dos demais elementos constantes no processo judicial, ignorando-se a avaliação social por assistente social. Palavras-chaves: Direito, Assistência Social, Deficiência, Juizados Especiais Federais, Sistemas Sociais.

ABSTRACT

SOUZA, Patrícia Alpes de. Monthly minimum wage to disabled person: Observations of decisions in Federal Special Courts in Recife from the social systems theory of Niklas Luhmann. 2014. 173 f. Dissertation (Master's Degree of Law) - Programa de Pós-Graduação em Direito, Centro de Ciências Jurídicas / FDR, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2014.

To investigate how the constitutional right to a monthly minimum wage to disabled person attesting not have means to provide maintenance itself or have it provided by his family is being applied in Recife Federal Special Courts, information were collected in lawsuits. We observed how the system of law - through its central organization (the judiciary) and the performance of the participants in demands - behaves towards social change, as in the case of replacement of medical and biological standard for social standard of disability, which disability results from the interaction between the social barriers and impediments. It was also observed how legislative changes influence the legal communication, like that arising from the Convention on the Rights of Persons with Disabilities of New York and the Law n. 12.470/2011, which adapt the concession of continuous benefits to people with disabilities to the social standard. Taking the doctrine, legislation, expertise, administrative and judicial decisions as information on legal communication, we analyze quantitatively and qualitatively the communication in lawsuits and meaning production, using Luhmann‘s theory of Social Systems. It is argued that these Courts participants uses concepts from legislation rescinded, insisting on submitting the evaluation of disability only to judicial medical expertise, regardless of the other elements contained in the lawsuit, ignoring the social evaluation by a welfare worker. Keywords: Law, Social Welfare, Disability, Federal Special Courts, Social Systems

LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

CNIS Cadastro Nacional de Informações Sociais PLENUS Sistema de consulta, mantido pela Empresa de Tecnologia e

Informações da Previdência Social HISMED Histórico de Perícias Médicas CPC Código de Processo Civil BPC Benefício de Prestação Continuada CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde JEFs Juizados Especiais Federais LOAS Lei Orgânica de Assistência Social INSS Instituto Nacional do Seguro Social

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

CID-10 Classificação Internacional de Doenças (Décima Revisão) INPS Instituto Nacional de Previdência Social FUNRURAL Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural CF/88 Constituição Federal de 1988 RDH Relatório do Desenvolvimento Humano PNAA Programa Nacional de Acesso à Alimentação MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome STF Supremo Tribunal Federal ACESSUAS-TRABALHO

Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho

SUMÁRIO

Introdução............................................................................................................. 9

1 Sociedade e proteção assistencial à pessoa com deficiência...................... 27

1.1 Assistência social como política de proteção.................................................. 28

1.2 Pobreza e novos enfoques.............................................................................. 33

1.3 O modelo social de deficiência........................................................................ 43 2 O benefício de prestação continuada e a pessoa com deficiência.............. 49 2.1 Avaliação da deficiência segundo a legislação................................................ 50 2.2 Novos parâmetros para a análise administrativa da deficiência...................... 60 2.3 Perícia Judicial e a avaliação da deficiência em juízo...................................... 71 3 O direito da pessoa com deficiência ao benefício de prestação

continuada comunicado nos juizados especiais federais............................... 80

3.1 Juizados Especiais: simplificação de ritos e restrição da comunicação.......... 82

3.2 Avaliação social e apatia.................................................................................. 91 3.3 Perícia médica judicial e argumentação jurídica.............................................. 109 4 O conceito de deficiência nos JEFs: uma observação a partir da teoria

dos sistemas sociais............................................................................................ 130

4.1 Sociedade e direito: aprendizado e estabilidade contrafatual das

normas.................................................................................................................... 131

4.2 Decisão judicial e legislação: comunicações do sistema do direito................. 136 4.3 Modelo social de deficiência: normatização sem institucionalização ou identificação de sentido.......................................................................................... 144 4.4 Deficiência nos JEFs: inconsistência e inadequação social das decisões....... 148 Reflexões finais....................................................................................................

Referências........................................................................................................... 153 159

Referências consultadas..................................................................................... 167

Introdução

O direito, nesta pesquisa, não é um dado, uma coisa, não é texto, nem

linguagem, nem contexto. Direito não é uma instituição, um instrumento, um

mecanismo. Nossa pesquisa é norteada pela perspectiva de que o direito é uma das

formas de comunicação humana; portanto, um sistema de comunicação da

sociedade. Passamos a apresentar as consequências desse enfoque.

A primeira delas foi termos por objetivo observar como é comunicado o direito

ao benefício de prestação continuada da pessoa com deficiência no âmbito dos

Juizados Especiais Federais (JEFs) em Recife, para o que coletamos dados em

processos judiciais. Lembramos que considerar o direito como comunicação não

implica se dedicar à pesquisa sobre o processo comunicativo. Aqui, comunicação

não tem qualquer relação com o processo de comunicação, não há que se falar em

ouvinte, falante, canais de comunicação, nada referente à estrutura comunicacional.

Essa primeira consequência permitiu à pesquisa seguir caminhos e rumos

inesperados, pois, a partir da observação dos dados, seguiram-se reflexões e

percepções sobre o direito ao benefício de prestação continuada à pessoa com

deficiência. Constatamos disparidades entre concepções de ―pessoa com

deficiência‖, afinal, decisões estão sendo tomadas aplicando-se leis revogadas.

Como veremos.

A segunda consequência foi considerar como informações a participação dos

atores que funcionam nos processos judiciais. Com isso, comunicações dos

representantes do INSS, peritos médicos, peritos judiciais, peritos sociais,

advogados, defensores públicos federais, autores e magistrados participam da

produção do direito ao benefício de prestação continuada da pessoa com

deficiência. Pesquisamos, portanto, a visão de deficiência que tem sido informada

pelos participantes dos processos judiciais para observarmos a comunicação do

direito ao benefício de prestação continuada.

Mantendo a tradição de pesquisa jurídica, inicialmente exploramos as

informações provenientes da legislação e da doutrina sobre o assunto. A

Constituição Federal1 (artigo 203, inciso V), a Lei Orgânica da Assistência Social –

1 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5

de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acessado em 15 nov. 2013.

LOAS (Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993)2 e a Política Nacional de

Assistência Social são informações que contribuem para sedimentar a Assistência

Social como política pública e como direito de cidadania, desassociada do primeiro

damismo, do clientelismo e da caridade. A doutrina especializada debate novas

formas de avaliação da pobreza além do critério puramente monetário, atingindo-se

novos enfoques como o das necessidades básicas, do desenvolvimento das

capacidades, do estudo dos processos de exclusão etc.. Ademais, a própria

definição de deficiência é revisada, passando de um conceito puramente médico e

biológico para ser concebida a partir da interação dos impedimentos com as

barreiras sociais.

Na Carta Magna, em seu art. 203, há prevista a garantia de um salário

mínimo de benefício mensal à ―pessoa portadora de deficiência‖ que comprove não

possuir meios para prover sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua

família. Na Lei nº 8.742/19933, em sua redação originária, lemos: ―pessoa portadora

de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho‖.

Ocorre que a Convenção de Nova York, de 30 de março de 2007, incorporada ao

ordenamento jurídico pátrio com status constitucional por meio do Decreto nº

6.949/2009, definiu que:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.

4

Como se pode ler acima, a Convenção de Nova York adotou o modelo social

de deficiência, segundo o qual, os impedimentos de natureza física, mental,

intelectual ou sensorial devem ser avaliados em interação com as demais barreiras,

a fim de verificar se há restrição da participação plena e efetiva da pessoa, na

sociedade, em iguais condições com as outras. Tal conceito foi incorporado pela Lei

2 BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a

organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 3 Id., Ibid..

4 BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os

Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013.

Orgânica da Assistência Social – LOAS5 em sua redação atual, dada pela Lei nº

12.470/2011, com vista à concessão do benefício de prestação continuada à pessoa

com deficiência.

Por sua vez, o Decreto nº 6.214/20076 (com redação dada pelo Decreto nº

7.617, de 17/11/2011) condicionou a concessão do benefício à pessoa com

deficiência à avaliação da deficiência e do grau de impedimento, com base nos

princípios da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde

(CIF)7. Conforme descrição da Organização Mundial da Saúde, a CID-10

(Classificação Internacional de Doenças, Décima Revisão) e a CIF são

complementares. As condições de saúde são classificadas na CID-10, com base

etiológica, proporcionando um diagnóstico. A CIF, por sua vez, fornece informações

adicionais acerca da funcionalidade e da incapacidade, associados aos estados de

saúde. Ou seja, a utilização de ambas as classificações permite uma avaliação mais

ampla da saúde, pois ―duas pessoas com a mesma doença podem ter níveis

diferentes de funcionamento, e duas pessoas com o mesmo nível de funcionamento

não têm necessariamente a mesma condição de saúde‖.8

Em seguida, foi emitida a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de

20119, com o fim de estabelecer os critérios, procedimentos e instrumentos para a

avaliação social e médico-pericial da deficiência e do grau de incapacidade da

pessoa com deficiência requerente do Benefício de Prestação Continuada da

Assistência Social. Conforme a Portaria, a avaliação da deficiência e do grau de

incapacidade é constituída pelos componentes Fatores Ambientais; Atividades e

5 BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a

organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 6 BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação

continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U, 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 7 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade,

Incapacidade e Saúde. 222p. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 8 Id., Ibid.. 9 BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro

Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26/05/2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/ 2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20 de%2024.05.11.pdf/view>. Acessado em: 25 out. 2013.

Participação; e Funções e Estruturas do Corpo. A Portaria prevê instrumentos para

avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, destinados ao Assistente Social

e ao Perito Médico.

Ocorre que, com o indeferimento Administrativo, o sistema do direito, por

meio da organização da jurisdição, é solicitado a apresentar respostas às demandas

sociais, pois o requerente pode reclamar judicialmente. Se o valor da causa

ultrapassar sessenta salários mínimos, as Varas Federais Comuns serão

competentes para analisar o feito. De outra banda, limitando-se o valor da causa ao

teto dos Juizados, ou se o autor renunciar ao crédito excedente, o litígio será julgado

pelos Juizados Especiais Federais (JEFs).

A competência dos JEFs se dá na grande maioria das demandas uma vez

que o benefício assistencial tem valor mensal de um salário mínimo, sem décimo

terceiro salário; bem como, em razão da prescrição quinquenal dos débitos da

Fazenda Pública (caso não se verifique condição suspensiva ou interruptiva).

O requerente do Benefício de Prestação Continuada poderá, fazendo uso do

jus postulandi nos JEFs, ajuizar a demanda sem a presença de advogado.

Outrossim, poderá solicitar assistência jurídica da Defensoria Pública da União, caso

se enquadre no critério de hipossuficiência exigido por este órgão (renda familiar não

superior ao limite de isenção do imposto de renda), ou solicitar assistência de

advogado particular.

Para a comprovação do direito em juízo, a lei dos Juizados Especiais

prescreve que o Juiz poderá inquirir técnicos de sua confiança, permitido às partes a

apresentação de parecer técnico. Bem como, poderá, de ofício ou a requerimento

das partes, realizar inspeção em pessoas ou coisas, ou determinar que o faça

pessoa de sua confiança, que lhe relatará informalmente o verificado (art. 35, Lei nº

9.099/1995)10.

A pesquisa de dados apontou que os juízes dirigem os processos sem

submeterem-se aos dispositivos previstos no Decreto nº 6.214/200711 e na Portaria

10

BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais e dá outras providências. Brasília: D.O.U. 27 de setembro de 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 11

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U, 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 201112. Destarte, evidenciou-se a

autonomia da organização jurisdicional na fixação dos procedimentos a serem

adotados para se avaliar a deficiência, bem como, na comunicação de um conceito

próprio de deficiência e de direito à assistência social, desatrelado do Decreto e da

Portaria, no que tange às perícias efetuadas e aos quesitos avaliados. Outrossim,

verifica-se que o laudo médico judicial assume uma posição central na comunicação

desenvolvida no âmbito dos JEFs, posto que é utilizado como ―razão de decidir‖, nas

sentenças e acórdãos, em detrimento dos outros elementos no processo.

Constatou-se que na grande maioria das demandas apenas foi realizada

perícia médica, ignorando-se a análise social na avaliação da deficiência, conforme

preceitos da CIF13. No que tange às conclusões da perícia médica, averiguou-se o

uso da terminologia presente em legislação assistencial ultrapassada. Ademais,

limita-se a possibilidade de comunicação, haja vista que a realização de audiências

dá-se em um número restrito de processos, o mesmo se diga em relação à

oportunidade das partes manifestarem-se acerca dos conteúdos das perícias

médicas judiciais, periciais sociais, mandados de verificação e documentação

juntada aos autos. Em diversas Ações, tendo o perito médico concluído pela

capacidade, pela incapacidade parcial definitiva ou incapacidade total temporária, o

juízo proferiu sentença de improcedência sem conceder espaço para que o

demandante se manifestasse acerca da prova. Ou seja, a pesquisa tem

demonstrado que a prática dos JEFs não tem acompanhado as alterações legais

quanto à análise da deficiência.

Para tratar dessa problemática, poderíamos pesquisar o direito ao benefício

de prestação continuada da pessoa com deficiência limitando-nos aos textos legais,

portanto, à visão de ordem jurídica como ―construção escalonada de diferentes

camadas ou níveis de normas jurídicas‖.14 Afinal, o tratado internacional de direitos

12

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26/05/2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/ 2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20 de%2024.05.11.pdf/view>. Acessado em: 25 out. 2013. 13

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. 222p. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 14

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 8 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 247.

humanos, incorporado internamente com status constitucional, alteraria o sentido da

expressão ―pessoa com deficiência‖ para fins de proteção jurídica.

Ocorre que a prática jurídica não sofre alterações porque há novidade

legislativa, com a publicação de textos legais. Isso evidencia a insuficiência da

perspectiva relatada no parágrafo anterior. Afinal, com ela, não teria sido possível

pesquisar como o direito ao benefício está sendo vivenciado, comunicado,

produzido. Para isso recorremos à teoria dos sistemas sociais luhmanniana, a qual

viabiliza observar o direito não como conjunto ordenado de estruturas normativas,

mas sim como operações do sistema jurídico que, como toda operação social, são

comunicações. Para além das estruturas (regras, normas, textos), com Luhmann15

pudemos ver o direito como aquilo que é comunicado pelo direito como direito, ou

seja, pudemos observar como está sendo comunicado o direito ao benefício no

âmbito dos JEFs em Recife, ou ainda, como os argumentos dos participantes em

processos judiciais produzem um sentido de direito ao benefício no sistema jurídico.

Para esclarecer uma terceira consequência, ainda que a título de introdução,

lembramos que Maturana e Varela16 lançaram o conceito de autopoiese para definir

a capacidade de os seres vivos produzirem a si mesmos por meio de suas próprias

operações, diferenciando-se do meio. Outrossim, esses autores definem reprodução

como o processo que dá origem a duas unidades da mesma classe que, embora

tenham a mesma organização que a unidade original e aspectos estruturais

semelhantes a essa organização, têm também aspectos estruturais diferentes, em

relação a ela e entre si. Portanto, ao se reproduzir, o sistema biológico varia.

Ademais, é possível que duas unidades autopoiéticas estejam acopladas de tal

maneira que as suas interações adquirem um caráter recorrente ou estável,

constituindo perturbações recíprocas. Assim, unidade e meio desencadeiam (não

determinam) modificações estruturais de modo recíproco (acoplamento estrutural).17

A manutenção dos organismos como sistemas dinâmicos (operacionalmente

independentes) em seu meio está centrada na compatibilidade organismo/meio. É o

que Maturana e Varela chamam de adaptação, consequência necessária do

acoplamento estrutural entre unidade e meio. De outra banda, caso as interações do

15

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 96. 16

MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena, 2001. 17

Id., Ibid., 2001. p. 52-87.

ser vivo em seu meio se tornam destrutivas e haja a interrupção da autopoiese, há

perda da adaptação.18

Essas ideias, conforme descreve Marcelo Neves, foram exploradas por

Luhmann ao trazer a autopoiese para as ciências sociais e propor uma teoria da

sociedade19. No entanto, Luhmann afasta-se do modelo biológico de Maturana e

Varela ao distinguir os sistemas constituintes de sentido (psíquicos e sociais) dos

sistemas não constituintes de sentido (orgânicos e neurofisiológicos). Nos sistemas

constituintes de sentido, a auto-observação passa a ser componente da reprodução

autopoiética. Assim, o manejo da diferença sistema/ambiente e a referência

simultânea a si mesmo e ao ambiente mantém o caráter autopoiético do sistema.

Em Luhmann, o ambiente não se comporta como mera perturbação do sistema,

constitui o seu ―fundamento‖. De outro giro, o fechamento auto-referencial dos

sistemas de sentido também se afasta da concepção clássica de sistemas fechados

e abertos. Não há isolamento causal entre sistema e ambiente, pois o fechamento é

condição para a abertura20.

No caso de nossa pesquisa, as consequências resultantes da ideia de

autopoiese viabilizaram observarmos que, por meio das operações (comunicações)

internas ao sistema do direito, recursivamente, o próprio direito seleciona o que será

tido como pertencente ao interior e exclui aquilo que pertence ao entorno e, assim,

produz e reproduz o sentido do direito (fechamento operativo).21 Essas ideias

permitiram olharmos para o fato de, repetimos, os juízes dirigem os processos sem

submeterem-se à definição de deficiência da Convenção e aos dispositivos previstos

na LOAS22, no Decreto nº 6.214/200723 e na Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de

18

Id., Ibid., 2001.p. 115. 19

NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã: Uma Relação Difícil: O Estado Democrático de Direito a partir e além de Luhmann e Habermas. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 61-63. 20

LUHMANN, Niklas. Sistemas Sociales: Lineamentos para uma teoría general. Barcelona: Anthropos. 1998. p. 58-59. 21

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 97. 22

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 23

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

24 de maio de 201124, sem cairmos na causalidade de afirmações como ―os juízes

assim julgam por comodidade, afinal, não se limitar à perícia médica e exigir a

análise social na avaliação da deficiência, conforme preceitos da CIF25, é reduzir sua

produtividade‖.

Esse tipo de afirmação causal, não teve lugar em nossa pesquisa justamente

por Luhmann não adotar uma visão dicotômica sobre direito e sociedade; antes,

entende o direito como um sistema parcial, um subsistema da sociedade, por isso a

expressão ―direito da sociedade‖ é referente às comunicações sobre direito na

sociedade, ou ainda, comunicações sobre lícito/ilícito. A relação direito e sociedade,

é uma relação circular reflexiva, pois, ao mesmo tempo em que a sociedade é

entorno do sistema do direito, as operações do sistema do direito são operações da

sociedade. Com as suas operações, introduz um corte na sociedade, gerando um

entorno específico do direito e possibilitando o questionamento das influências deste

entorno social sobre o direito. Portanto, definindo o que deverá ser manejado como

comunicação especificamente jurídica, o ―sistema do direito realiza a sociedade

enquanto se diferencia dela‖.26 Foi sob essa lógica que desenvolvemos nossa

pesquisa, observando como está sendo vivenciada a comunicação do direito ao

benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência, no direito.

Outra consequência resultou da visão de sentido. O sistema oscila entre

autorreferência e heterorreferência e o resultado desta re-entry é denominado

―sentido‖. Para os sistemas de sentido, o mundo é informação virtual que necessita

de sistemas para gerar informações, para dar sentido de informação às irritações

selecionadas.27 Reafirma-se, assim, a importância e o lugar dessa teoria para nossa

pesquisa devido, justamente, a essa ideia de sentido.

Aplicando esses conceitos, compreendemos que as transformações do que é

comunicado como proteção assistencial à pessoa com deficiência na sociedade será 24

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 25

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. 222p. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 26

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 70-90. 27

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 28-29.

processada pelo sistema do direito a partir de suas próprias operações, de acordo

com o código binário próprio do direito (lícito/ilícito). Por exemplo, a literatura

especializada (doutrina jurídica e de serviço social), os pleitos dos movimentos

sociais, a legislação nacional e internacional e suas mudanças podem provocar

irritações no sistema do direito que, todavia, por meio de suas próprias operações,

das comunicações desenvolvidas entre juristas, organizações jurídicas e seu

entorno social interno, produzirá o sentido do que é direito. Dessa perspectiva de

sentido, nosso objeto passou por olhares bem diversos dos presentes na literatura

dogmática jurídica.

Seguindo as consequências da aplicação da teoria da sociedade de Luhmann

para nossa pesquisa, citamos a perspectiva de organizações. Como ―sistemas

autopoiéticos, que se produzem e se reproduzem a si mesmos por meios de

operações próprias‖.28 Distinguem-se de outros sistemas autopoiéticos mediante

decisões, recordando e antecipando outras operações do mesmo sistema,

―transformam a incerteza em certeza, através da conexão de decisões‖.29 Formam-

se organizações no interior de sistemas funcionais uma vez que esses últimos não

possuem mecanismos de exclusão, enquanto as organizações ―selecionam o que

admitem‖, regulam o comportamento dentro de sistemas funcionais, organizam o

trabalho, a profissionalização, submetem a instruções etc..30 Ademais, as

organizações são os únicos sistemas sociais que podem comunicar-se com o

entorno.31

Os Juizados Especiais Federais, aplicando essa perspectiva teórica, são

organizações do sistema do direito. Integrantes do Judiciário, são organizações

centrais do sistema jurídico por suas decisões serem fundamentais na produção de

sentido de direito. Deste modo, não obstante a existência de uma valoração social e

de uma legislação em vigor a tratar do tema do direito assistencial à pessoa com

deficiência, aplicando as ideias acima, temos que o conceito de ―pessoa com

deficiência‖ para fins de concessão do benefício de prestação continuada também é

28

LUHMANN, Niklas. Organización e decisión. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2010. p. 25. 29

Id., Ibid., p. 70-71. 30

MANSILLA, Dario Rodriguez; NAFARRATE, Javier Torres. Introdución a la teoria de la sociedad de Niklas Luhmann. México: Herder. 2008. p. 480. 31

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 668.

comunicado no momento das operações da organização dos Juizados Especiais

Federais.

Ainda sobre essa consequência, dada à necessidade de decidir e à liberdade

na busca de razões (questionáveis) para esta decisão, temos a atividade do julgador

como mais uma fonte de comunicação, todavia ―restringida pelos pontos de vista da

justiça. E pela tríade necessidade, liberdade e restrição que produz o direito‖32.

Afinal, nem as leis, nem os contratos são obrigados a decidir. Já aos tribunais se

impõe a competência dever decidir/poder decidir sobre todas as questões jurídicas,

razão pela qual a organização da jurisdição é o sistema parcial que compõe o centro

do direito. Somente aos tribunais cabe manejar o paradoxo do sistema, mediante a

diferenciação sistema/entorno. Todos os demais campos não judiciais (conclusão de

contratos e legislação, por exemplo) pertencem à periferia, na qual estão presentes

interesses, mas nenhuma necessidade de decisão.33

Exatamente por essa ausência de necessidade de decisão é que a periferia,

em contato com as demais funções da sociedade (economia, vida doméstica,

política), mantém a autonomia do direito. Os tribunais se encontram em um

isolamento cognitivo mais drástico, se comparado com os legisladores e com os

contratantes. Verifica-se que o acesso aos tribunais se dá de maneira seletiva, pois

nem todas as questões jurídicas se lhes apresentam. Ademais, apenas dentro do

centro são possíveis outras formas de diferenciação, como a hierarquia.34 Somente,

portanto, os tribunais, por observação de segunda ordem, supervisionam a

consistência das decisões jurídicas (leis, contratos, decisões judiciais), o que

significa interpretar de maneira argumentativa.35

Ao posicionar a organização da jurisdição no centro do sistema do direito,

Luhmann não pretendeu defini-la como unidade do sistema. Há direito fora dos

tribunais. De outro giro, atribui-lhe a função de ―desdobramento do paradoxo do

sistema‖, recorrendo-se a formas (organização e hierarquia) não apresentáveis no

sistema unitário. Por sua vez, à periferia deslocam-se as ―funções e processos que

32

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 366. 33

Id.,Ibid., p. 381-383. 34

Id.,Ibid., p. 384-386. 35

Id.,Ibid., p. 389.

são compatíveis com o fato de manterem-se abertos à variedade, à adaptação e às

pressões do entorno‖.36

Assim, da mesma forma que as modificações na valoração social da proteção

assistencial à pessoa com deficiência não constituem norma, mas apenas

informações para o sistema do direito, as alterações no texto da Constituição

Federal, das leis, decretos e portarias não são assimiladas como ―inputs‖ pelas

organizações jurídicas. Principalmente porque, como dito acima, os tribunais

encontram-se em um isolamento cognitivo maior em relação ao seu entorno social o

que se dá, principalmente em razão da sua reprodução por meio de uma rede de

decisões recursivas. Daí ser possível o sistema do direito, por meio de suas

organizações, no caso desta pesquisa os JEFs, comunicar um conceito de

deficiência não como reprodução dos termos contidos em legislações.

Voltando ao início da introdução, nessa pesquisa direito é ―generalização

congruente‖ de expectativas normativas, generalização que se produz a partir da

condensação da normatização, da institucionalização e da identificação de sentido.

Direito, portanto, não é exclusivamente norma, nem instituição, nem identidade de

sentido (linguagem), pois a normatização reflete a continuidade de uma expectativa,

a qual pode vir a ser frustrada, saliente-se, e nem por isso deixa de ser norma; a

institucionalização possibilita um consenso geral suposto, independente da

aprovação individual; e a identificação, por sua vez, garante ―a unidade e a inter-

dependência do sentido, independentemente das diferenças objetivas entre as

expectativas‖. Assim, a ―generalização gera uma imunização simbólica das

expectativas contra outras possibilidades‖.37

Ocorre que há uma discrepância no funcionamento desses mecanismos que,

devido a sua heterogeneidade, podem generalizar expectativas diferentes e

incompatíveis. Por exemplo, existem mais expectativas normativas do que

possibilidades de institucionalização. Outrossim, normas oficialmente proclamadas

poderão não ser institucionalizadas, quer seja porque os juízes não a aplicam, quer

seja porque não possuem reflexos na vida cotidiana. Por fim, pode haver a

identificação de sentido na defesa de determinados interesses que, contudo, não

36

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 398-399. 37

LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito. Vol. I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983. p. 110.

são normatizados ou institucionalizados, por meio de mecanismos de exigência ou

de sanção.38

Aplicando esses conceitos, pudemos observar que a norma que dispõe sobre

a deficiência sob a ótica de um modelo social, prevendo a avaliação conforme as

diretrizes da CIF39 não foi institucionalizada e não houve identificação de sentido no

âmbito da organização dos JEFs. Em inúmeros processos, sequer se atentou para

as alterações legislativas, antes foram utilizadas legislações revogadas. Assim, não

foi possível a fixação de um sentido de deficiência desatrelado das concepções de

―incapacidade para o trabalho e para a vida independente‖, bem como, da análise

social como componente da CIF, como explicitaremos ao longo da pesquisa.

Por fim, lembramos que para Luhmann, justiça é ―complexidade adequada na

tomada de decisões consistentes‖, quer dizer, justiça não se relaciona apenas com a

consistência das decisões, mas também com a capacidade de resposta do sistema

jurídico ao sistema social (irritabilidade).40 Aplicando essa visão de justiça, pudemos

considerar que, no caso do objeto deste estudo – a comunicação do direito ao BPC

à pessoa com deficiência – as decisões judiciais nos JEFs ainda utilizam conceitos

previstos em legislação revogada, assim, há explícita inadequação das decisões

judiciais em relação às mais recentes informações (concepções) de deficiência e

assistência social. Bem como, verificamos a inconsistência das decisões, haja vista

que variam os procedimentos de uma Vara para outra, inclusive, dentro de uma

mesma Vara, de um processo para outro.

Para compreendermos tais fatos, coletamos dados na doutrina especializada,

na legislação pátria e internacional e na Jurisprudência dos Tribunais, bem como,

coletamos dados de comunicações levadas a efeito no dia-a-dia dos Juizados

Especiais em Recife. Com esses dados, observamos como as comunicações, no

cotidiano das ações judiciais, produzem o sentido do direito à assistência social da

pessoa com deficiência, isto a despeito das modificações legais. Para tanto,

observamos os argumentos utilizados pelos participantes, os procedimentos

escolhidos e o conteúdo das decisões.

38

Id., Ibid., p. 110-112. 39

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. 222p. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 40

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 287.

Os processos analisados limitam-se àqueles ajuizados perante os Juizados

Especiais Federais em Recife (14ª, 15ª, 19ª Varas Federais). Tal restrição teve lugar

em razão do valor da demanda que, na imensa maioria dos casos, não excede

sessenta salários mínimos, atraindo a competência absoluta dos Juizados Especiais

Federais.

Outrossim, limita-se a presente pesquisa às ações ajuizadas no ano de 2012.

Tal recorte se deu em virtude de as importantes alterações na legislação

infraconstitucional terem sido implementadas no ano de 2011, a saber: Lei nº

12.470, de 201141; Decreto nº 7.617, de 201142; Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1,

de 24 de maio de 201143. No ano de 2012 haviam tramitado ações suficientes para

avaliar, na prática judicial, como tais alterações estão sendo comunicadas, o que

nos permitiu verificar se o novo modelo social de deficiência e a avaliação conforme

a Classificação Internacional de Funcionalidade tem repercutido nas comunicações

dos Juizados Especiais Federais em Recife.

Outro elemento delimitador da pesquisa foi a abrangência da análise.

Limitamos a análise dos processos até o momento dos Acórdãos proferidos pelas

Turmas Recursais. Esta limitação justifica-se pelo fato de que é irrisório o número de

processos – em que se discute a comprovação da deficiência – que ultrapassam tais

instâncias, pela razão de que não se conhecem os incidentes de uniformização de

41

BRASIL. Lei nº 12.470, de 31 de Agosto de 2011. Altera os arts. 21 e 24 da lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; altera os arts. 16, 72 e 77 da lei nº 8.213;altera os arts. 20 e 21 e acrescenta o art. 21-a à lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; e acrescenta os §§ 4o e 5o ao art. 968 da lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília: D.O.U. de 01/09/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12470.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 42

BRASIL. Decreto nº 7.617, de 17 de novembro de 2011. Altera o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto no 6.214, de 26 de setembro de 2007. Brasília: D.O.U. de 18/11/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7617.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 43

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013.

jurisprudência em caso de reexame de fato (Súmula 42 da TNU44), o mesmo se diga

do Recurso Especial (Súmula 7 do STJ45).

Foram analisados todos os oitenta e seis processos judiciais visando à

concessão do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência,

protocolados em 2012 e que a Defensoria Pública da União foi habilitada para o

patrocínio da parte autora.46 Esta escolha deu-se em razão da delimitação do tema,

que se pautou por observar como nos Juizados Especiais Federais está sendo

produzido o sentido de direito à ―prestação continuada para pessoas com

deficiência‖, ou seja, que critérios e elementos constituem esse direito a partir das

comunicações realizadas no âmbito do JEF, espaço social em que a Defensoria

Pública Federal é atuante.

Sobre o tema, lembramos que Luciano Oliveira ressalta a necessidade do

pesquisador, em uma dissertação ou tese, determinar-se pela objetividade e pela

neutralidade axiológica, o que não significa ser ―um sujeito politicamente neutro‖,

mas sim que ―no momento de colher na realidade - jurídica ou sociológica, pouco

importa - os elementos para sustentar o seu argumento, ele deverá adotar uma

postura metodológica neutra‖.47 Entendemos que o fato de utilizarmos nesta

pesquisa apenas os processos em que a Defensoria Pública da União atuou no

patrocínio da parte autora não afasta a neutralidade da pesquisadora, afinal se trata

de um corte metodológico objetivo para viabilizar maior homogeneidade dos casos

analisados, evitando-se desvios em razão da atuação distinta de um advogado para

outro. Esta delimitação não se confunde com influência na análise dos dados.

Não há, tampouco, que se falar em prejuízo da ―verdade científica‖ em razão

da atuação desta autora como defensora pública federal. Com efeito, conforme

preleciona Artur Stamford, o arbítrio na escolha do tema da pesquisa difere-se do

44

BRASIL Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais. Súmula 42. Brasília: TNU, 2010. Disponível em: <https://www2.jf.jus.br/phpdoc/virtus/listaSumulas.php>. Acessado em: 25 out. 2013. 45

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 7. Brasília: STJ, 1990. Disponível em: <http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stj/stj__0007.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 46

Com exceção dos Processos nº 0508312- 38.2012.4.05.8300T; 0508114- 98.2012.4.05.8300S; 0519905-64.2012.4.05.8300T. Uma vez que nas referidas ações não se exauriu a fase instrutória, decidiu-se que tais dados não estão aptos a responder aos questionamentos propostos na análise quantitativa e qualitativa. 47

OLIVEIRA, Luciano. Sua Excelência o Comissário e outros ensaios de sociologia jurídica. Rio de Janeiro: Letra Legal, 2004. p. 140-141.

―preconceito deliberado, aquele relativo à manipulação dos dados‖48. Assim, no

compromisso com essa verdade, transcrevemos no texto da dissertação trechos de

sentenças, laudos, acórdãos etc., em vez de fazer simplesmente a narrativa indireta.

Os trâmites processuais, as sentenças e os acórdãos poderão ser analisados pelo

leitor por meio da consulta pública, disponível no sítio eletrônico da Justiça Federal

em Pernambuco49. Os demais documentos poderão ser acessados após prévio

requerimento às Varas Federais.

Com a análise dos dados coletados, pudemos observar a produção de

sentido do direito à assistência social, ou seja, como tem sido realizada a

comunicação, nos Juizados Especiais Federais em Recife, sobre o direito à

assistência social da pessoa com deficiência. Para isso, seguimos o seguinte

caminho: no primeiro capítulo, abordamos o desenvolvimento do conceito de

assistência social, ou seja, a passagem de sua visão filantrópica para a concepção

de política de proteção. Ademais, expomos que os enfoques sobre a pobreza não se

limitam à perspectiva econômica, monetária, passando a atingir abordagens mais

amplas, como a inclusão das necessidades básicas, do desenvolvimento de

capacidades, dos processos de exclusão em seu teor, etc.. Por fim, tratamos da

construção do modelo social de deficiência, em substituição ao modelo médico e

biológico, quando a deficiência passou a ser observada como resultado da interação

da pessoa com o ambiente.

No segundo capítulo, exploramos o quanto essas novas concepções de

assistência social e deficiência não se limitam ao âmbito acadêmico, mas passaram

a ocupar posição central na legislação vigente. A Convenção de Nova York e a

LOAS50, por exemplo, definem ―pessoas com deficiência‖ como ―aquelas que têm

impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os

quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e

efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas‖. É nítida

a substituição, na legislação atual, do conceito de ―incapacidade‖ pelo de

48

STAMFORD, Artur. E por falar em Teoria Jurídica, onde anda a cientificidade do Direito?. Rio de Janeiro: Mundo Jurídico, 2003. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/sis _artigos/artigos.asp?codigo=415>. Acessado em: 18 set 2013. 49

PERNAMBUCO. Justiça Federal de Pernambuco. Recife: JFP, 2013. Disponível em: <www.jfpe.jus.br>. Acessado em: 20 set. 2013. 50

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

―impedimento‖, o que implica não haver mais uma concentração da deficiência

apenas no indivíduo, mas uma ampliação a partir da interação com as barreiras

sociais. A proteção social, assim, desvia-se da seara da ―vida independente‖ e do

―trabalho‖, atingindo esferas mais amplas que dizem respeito à ―participação plena e

efetiva na sociedade‖.

As alterações da Lei nº 12.435, de 201151 foram regulamentadas pelo Decreto

nº 7.61752, de 2011 e pela Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1 de 24 de maio de

201153, condicionando a concessão administrativa do Benefício de Prestação

Continuada à pessoa com deficiência à avaliação da deficiência e do grau de

impedimento, com base nos princípios da CIF54. Assim, passou-se a exigir a realização

de avaliação social, que considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, e a

realização de avaliação médica, que considerará as deficiências nas funções e nas

estruturas do corpo. Ainda no segundo capítulo exploramos como, com o

indeferimento Administrativo, o sistema do direito, por meio da organização da

jurisdição, mas precisamente dos Juizados Especiais Federais, é solicitado a

apresentar respostas às demandas sociais. Aqui, a pesquisa buscou verificar como

os conceitos de assistência social e deficiência são comunicados internamente de

acordo com os contornos delineados pelo próprio sistema do direito e pela

organização jurídica, utilizando-se dos procedimentos probatórios definidos na

legislação processual e na prática dos Juizados Especiais Federais.

No terceiro capítulo, a partir da análise dos dados coletados na pesquisa,

podemos constatar que a realização de audiências em um número restrito de

processos, bem como, a limitação das oportunidades em que as partes poderão

51

BRASIL. Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social. Brasília: D.O.U. de 07/07/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12435.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 52

BRASIL. Decreto nº 7.617, de 17 de novembro de 2011. Altera o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto no 6.214, de 26 de setembro de 2007. Brasília: D.O.U. de 18/11/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7617.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 53

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 54

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. 222p. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013.

manifestar-se acerca da perícia médica judicial findam por restringir a construção do

direito à assistência à pessoa com deficiência nos Juizados Especiais Federais em

Recife ao conteúdo comunicado pelos juízes e peritos médicos judiciais. Ademais,

observamos que a perícia social não tem desempenhado um papel importante na

avaliação da deficiência nos Juizados Especiais Federais, conforme preceitua a

CIF55. Diferentemente da perícia médica judicial que, mesmo não vinculando

legalmente os juízes, na prática, são utilizadas nas sentenças e acórdãos como

―razão de decidir‖ a despeito da existência dos demais elementos trazidos ao

processo (ou não trazidos, no caso da ausência de perícia social ou realização de

audiência). É o que tratamos de pesquisar.

Reservamos ao quarto capítulo a análise dos fenômenos descritos na

pesquisa de dados pautados pela teoria dos sistemas sociais de Luhmann. Neste

momento da pesquisa, observamos como o sistema do direito - subsistema da

sociedade responsável por comunicar sobre lítico/ilícito - processa mudanças

sociais. Como sistema autopoiético, o direito, aplicando sua codificação binária

(lícito/ilícito), produz, no caso de nossa pesquisa, o sentido jurídico de pessoa com

deficiência, de assistência social, de benefício.

Distingue-se legislação e decisão judicial. Os Juizados Especiais Federais

são vistos como organizações que compõem o centro do sistema do direito, pois

organizam e profissionalizam a competência jurídica. Como Judiciário, como

organização do sistema jurídico, comunicam o direito ao Benefício de Prestação

Continuada da pessoa com deficiência por meio de sua rede recursiva de decisões.

A legislação, nessa visão, acopla estruturalmente o sistema político ao sistema

jurídico. As leis funcionam como informações a serem processadas no interior da

organização jurídica (JEFs).

Em razão dessa diferenciação entre decisão judicial e legislação é possível

compreender a existência de normatização sem institucionalização ou identificação

de sentido. Tratando-se da legislação que dispõe sobre a deficiência sob a ótica do

modelo social, a partir das diretrizes da Classificação Internacional de

Funcionalidades, Incapacidade e Saúde, a análise de dados demonstra que, a

despeito da normatização, não houve a institucionalização ou a identificação de

sentido no âmbito da organização dos Juizados Especiais Federais, uma vez que os

55

Id., Ibid., 2003.

conceitos revogados permanecem em utilização. Por fim, avaliamos tal

distanciamento a partir do conceito de justiça de Luhmann, como a ―complexidade

adequada na tomada de decisões consistentes‖. Lançamos luz na necessidade de

tratamento isonômico para casos similares, bem como, na capacidade de resposta

do sistema jurídico ao sistema social.

1 Sociedade e proteção assistencial à pessoa com deficiência

O conceito de pessoa com deficiência sofreu intensas modificações ao longo

dos últimos anos. De um conceito puramente biológico, passa a abranger as

circunstâncias socioeconômicas em que está inserido o indivíduo. Assim, a

deficiência não se encontra apenas na pessoa, mas na sociedade que exclui e limita

o seu pleno desenvolvimento. Outrossim, transforma-se o papel da assistência

social em relação às pessoas com deficiência em condições de hipossuficiência. Se

antes as diretrizes apontavam para um caráter caritativo e estigmatizante,

contemporaneamente, privilegiam-se a autonomia, as capacidades e as habilidades

individuais, como política pública de proteção.

Ocorre que tais modificações, encampadas pela literatura especializada,

pelos movimentos sociais, pela legislação pátria e internacional etc., não atuam de

forma determinante em relação ao sistema do direito e suas organizações. Isto

porque adotamos a Teoria dos Sistemas Sociais de Luhmann, segundo a qual, o

sistema produz seus próprios limites em face do entorno e, a partir de suas próprias

operações, produz as suas relações com ele. Neste processo, torna-se possível a

distinção entre a referência a si mesmo e a referência a todo o resto.56

Contudo, impende ressaltar que Luhmann não adota uma visão dicotômica

(direito e sociedade). Do contrário, entende o direito como um sistema parcial, um

subsistema da sociedade (o direito da sociedade). Trata-se de uma relação

ambígua, pois, ao mesmo tempo em que a sociedade é entorno do sistema do

direito, as operações do sistema do direito são operações da sociedade. Com as

suas operações, o direito introduz um corte na sociedade, gerando um entorno

específico do direito e possibilitando o questionamento das influências deste entorno

social sobre si. Portanto, definindo o que deverá ser manejado como comunicação

especificamente jurídica o ―sistema do direito realiza a sociedade enquanto se

diferencia dela‖.57

Inserido em ordens sociais gerais, o direito depende de estruturas que servem

a outras funções e, havendo mudanças nessas estruturas, também as levará em

consideração. Por esta razão se diz que o direito opera de modo normativamente

56

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005, p. 65 e 132-133. 57

Id., ibid., p. 70-90.

fechado e cognitivamente aberto. Contudo, as modificações geradas no entorno

poderão ser aproveitadas pelo direito apenas sob a forma prevista pelo sistema.

Como motivo de aprendizado, cognitivamente, e não como imposição de novas

normas.58

A explanação desses conceitos é pertinente à nossa pesquisa uma vez que

partimos da compreensão que a transformação do que é comunicado como proteção

assistencial à pessoa com deficiência na sociedade será processada pelo sistema

do direito a partir de suas próprias operações, de acordo com um código próprio.

Repita-se, a literatura especializada, os movimentos sociais, a legislação nacional e

internacional podem provocar irritações no sistema do direito que, todavia, por meio

de suas próprias operações, das comunicações desenvolvidas entre juristas,

organizações jurídicas e seu entorno social interno, produzirá o sentido do que é

direito.

A evolução do sistema da sociedade desencadeia mudanças no arcabouço

jurídico que, a seu turno, possibilita a estabilização de conquistas institucionais do

processo evolutivo. De acordo com a perspectiva evolutiva, ―o direito, enquanto

elemento imprescindível da estrutura social, é sempre consequência e causa ao

mesmo tempo‖.59

Aplicando essas ideias, cientes de que os acontecimentos do entorno, quando

relevantes, não são ignorados pelo direito, iniciemos abordando a formatação da

assistência social no Brasil, de sua passagem da concepção filantrópica à política

pública. Bem como, do caminho percorrido entre o modelo médico e o modelo social

de deficiência.

1.1 Assistência social como política de proteção

No Brasil, a Assistência Social tem sido marcada historicamente por um

conteúdo filantrópico. Fomenta-se a ideia de que ―o mundo abre suas portas para os

‗aptos‘ e só deixa de fora os culpados pela própria pobreza. Assim, políticas sociais

são direcionadas aos mais pobres entre os mais pobres‖.60 Este caráter, segundo

Yazbek, ―vem contribuindo para reiterar sua tradição de ‗não-política‘, sua 58

Id., Ibid., p. 114 -115. p. 133. p. 146-151. 59

LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito. Vol. II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985. p. 116. 60

CAVALCANTI, Soraya Araujo Uchoa. Reforma do Estado e políticas sociais no Brasil. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 34-53, nov. 2001. p. 49.

interferência cíclica, secundária e isolada, regida por princípios de subsidiaridade‖.61

Segundo a autora, a assistência social poderá, ambiguamente, fomentar a inclusão

social ou reiterar a exclusão, pois ―se é campo concreto de acesso a bens, serviços

e recursos, se pode favorecer o protagonismo dos excluídos, pode também ser

definidora de um lugar social à margem, de uma experiência de apartação‖.62

Yazbek denuncia o fato de que a população-alvo da Assistência Social

encontra-se submersa ―numa ordem social que os desqualifica, ‗cidadãos às

avessas‘, indivíduos marcados por clichês: ‗inadaptados‘, ‗casos sociais‘, portadores

de ‗altos riscos‘, alvo de pedagogias de ‗reerguimento‘ e de promoção‖.63 Daí o

entrave para se constituir a Assistência Social como política pública e direito de

cidadania, desassociada do primeirodamismo, do clientelismo e da caridade.

Neste contexto, Sposati alerta para uma necessidade de se afastarem as

concepções inespecíficas da Assistência Social, quer porque subordinam as

provisões das políticas sociais ao mercado, quer porque partem de um paradigma

focalizado, considerando ―a assistência social como responsável pelo pobre, pela

pobreza ou por aquele que não tem capacidade de ser consumidor‖.64 Este último

bloco age segundo o paradigma da cidadania invertida, ―não operaria sob o

referencial da necessidade, mas sim com necessitados sociais comumente

estigmatizados como carentes‖.65

São diversas as situações que caracterizam concepções inespecíficas da

Assistência Social: é vista como processante de outras políticas sociais, portanto,

sem conteúdo próprio; operaria prioritariamente na mediação institucional,

possibilitando o trânsito do usuário para outra política social; é genérica nas

atenções e específica na clientela (pobreza absoluta), concepção altamente

estigmatizadora.66

Como política de proteção, por outro lado, atua preventiva e protetivamente,

provê proteção básica e especial, não se limita ao legal ou ao formal, é extensiva.

Rompe com a noção abstrata de cidadãos ―e se direciona para um conceito do real

61

YAZBEK, Maria Carmelita. As ambiguidades da assistência social brasileira após dez anos de LOAS. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 25, n. 77, p. 11-29, mar. 2004. p. 19. 62

Id., ibid., p. 21. 63

Id., ibid., p. 22. 64

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. p. 37. 65

Id., ibid., p. 37. 66

Id., ibid., p. 37-40.

que trabalha a partir de potencialidades, talentos, desejos, capacidades de cada um

e dos grupos sociais‖. 67

Um marco importante na firmação da assistência social como política pública

foi dado pela Constituição Federal de 1988, que prevê:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

68

Em seu artigo 203, inciso V, institui ―a garantia de um salário mínimo de

benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não

possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família,

conforme dispuser a lei‖69. A antiga Renda Mensal Vitalícia (Lei nº 6.179/7470)

permaneceu em vigor até a posterior regulamentação da Lei Orgânica da

Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 199371), por meio do

Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 199572.

67

Id., ibid., p. 42. 68

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acessado em 15 nov. 2013. 69

Id. Ibid., 1988. 70

BRASIL. Lei no 6.179, de 11 de dezembro de 1974 - Institui amparo previdenciário para maiores de

setenta anos de idade e para inválidos, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 12/12/1974. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6179.htm>. Acessado em: 26 set 2013. 71

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 72

BRASIL. Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995. Regulamenta o benefício de prestação continuada devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso, de que trata a lei 8.742, de 07/12/1993, que dispõe sobre a organização da assistência social. Brasília: D.O.U. de 11/12/1995.

A Renda Mensal Vitalícia, no valor de metade do maior salário-mínimo vigente

no País, não podendo ultrapassar 60% do valor do salário-mínimo do local de

pagamento, era devida aos maiores de 70 anos e aos ―inválidos, definitivamente

incapacitados para o trabalho‖, que não exercessem atividade remunerada ou não

auferissem rendimento superior ao valor da renda mensal vitalícia, bem como, que

não fossem mantidos por pessoa de quem dependiam obrigatoriamente e não

tivessem meios de prover ao próprio sustento.73

Ademais, os beneficiários deveriam atender aos seguintes requisitos: filiação

ao regime do INPS, em qualquer época, no mínimo por 12 (doze) meses,

consecutivos ou não, vindo a perder a qualidade de segurado; exercício de atividade

remunerada incluída no regime do INPS ou do FUNRURAL, mesmo sem filiação à

Previdência Social, por no mínimo por 5 (cinco) anos, consecutivos ou não; ingresso

no regime do INPS após completar 60 (sessenta) anos de idade sem direito aos

benefícios regulamentares. A verificação da ―invalidez‖ era realizada em exame

médico-pericial a cargo da Previdência Social urbana ou rural.74

A LOAS veio tentar romper com o caráter filantrópico, clientelista da

Assistência Social, definindo os parâmetros de ação na garantia desses direitos.

Todavia, para diferentes segmentos da sociedade, persiste a ideia de que todos os

sujeitos nascem em condição de igualdade e, com esforço e determinação

individuais, seria possível superar as barreiras econômicas. Para aqueles que se

mostram contrários a este posicionamento, esta lógica fomentaria a individualização

da questão e a culpabilização dos indivíduos.75

Assim, a CF/88 e a Política Nacional de Assistência Social viriam enfatizar a

dimensão da proteção social como responsabilidade do Estado e da coletividade,

―distanciando-se de uma perspectiva de favorecimento por uma condição de

incapacidade‖.76

Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d1744.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 73

BRASIL. Lei no 6.179, de 11 de dezembro de 1974 - Institui amparo previdenciário para maiores de

setenta anos de idade e para inválidos, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 12/12/1974. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6179.htm>. Acessado em: 26 set 2013. 74

Id., Ibid. 75

MORGADO, Rosana. Assistência Social: Novos e Velhos Desafios. In: SOUZA, Nadia Regina Oliveira Queiroz de (Org.). Política de assistência social no Brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. p. 19-20. 76

Id., Ibid., p. 23.

Problematiza-se, igualmente, as concepções de ―mínimos sociais‖ e

―necessidades básicas‖, que podem partir de uma visão reducionista da vida,

centrada apenas na condição de sobrevivência. A crítica a esta mentalidade centra-

se no fato de que, além da renda, um conjunto de bens e serviços sociais seria

fundamental para a vida em sociedade.77

A CF/88 prescreve como direitos sociais ―a educação, a saúde, a

alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a

proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma

desta Constituição‖ (art. 6º). Todavia, os artigos seguintes, do 7º ao 11º, referem-se

apenas aos direitos dos trabalhadores assalariados. Nesta mesma esteira, o art. 193

indica que ―a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o

bem-estar e a justiça sociais‖. Percebe-se, então, que os direitos sociais ainda estão

extremamente marcados pela condição de trabalhador assalariado formal, e não

pelo status de cidadão.78

Ocorre que, com a denominada ―crise da sociedade salarial‖, a precarização

das relações de trabalho, as terceirizações, a informalidade, o desemprego

estrutural etc., existe uma grande parcela da população que se encontra fora da

esfera do trabalho assalariado e protegido. Neste contexto, a Assistência passaria a

cumprir o papel econômico e político de integração à ordem, antes pertencente ao

trabalho assalariado, principalmente por meio dos programas de transferência

monetária, possibilitando o acesso aos bens de consumo.79

Tal processo, em que se dá centralidade à política de Assistencial Social no

enfrentamento das condições sociais, principalmente por meio de transferências

monetárias, acarretaria no prejuízo de referendar ―a cultura da equidade e da

assistência social como o principal mecanismo de administração da desigualdade.‖80

77

Id., Ibid., p. 21. 78

BACKX, Sheila. Mínimos Sociais no Contexto. In: SOUZA, Nadia Regina Oliveira Queiroz de (Org.). Política de assistência social no Brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. p. 30-31. 79

SITCOVSKY, Marcelo. Particularidades da expansão da Assistência Social no Brasil. In: MOTA, Ana Elizabete da (Org). O Mito da assistência social: ensaios sobre Estado, política e sociedade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2010. p. 153-156. 80

MOTA, Ana Elizabete da; MARANHÃO, Cezar Henrique; SITCOVSKY, Marcelo. As tendências da política de Assistência Social, o SUAS e a formação profissional. In: MOTA, Ana Elizabete da (Org). O Mito da assistência social: ensaios sobre Estado, política e sociedade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2010. p. 186.

O problema está no fato de ―ser a política de proteção social, e não parte da política

de proteção social‖.81

Na contemporaneidade, fala-se em ―nova pobreza‖ e o Estado assume

também os aptos – pessoas sem trabalho, com baixa remuneração, em condição de

vulnerabilidade econômica e social –, além daqueles que são, tradicionalmente,

considerados inaptos para o trabalho. Tal processo é acompanhado,

contraditoriamente, da restrição ao acesso, com a imposição de critérios

adicionais.82 É o que se analisa em seguida.

1.2 Pobreza e novos enfoques

Os programas de transferência de renda têm sido objeto de grandes embates,

ora são festejados, ora alvos de críticas. Não é nosso enfoque defender um ou outro

lado desse confronto, mas compreendê-los discutindo conceitos como ―pobreza‖,

―necessidades básicas‖, ―mínimos sociais‖, ―inclusão/exclusão‖.

Com efeito, a ―renda mínima‖ pode ser uma proposta liberal/neoliberal, em

que a transferência financeira substitui os demais programas sociais, a partir da

individualização e privatização da questão social. De outra banda, pode significar

uma proposta progressista, no campo da redistributividade e inclusão social para a

cidadania, complementando os serviços básicos. 83

No âmbito nacional, o enfoque predominante sobre a pobreza tem sido a

partir da perspectiva monetária, sendo pobres aqueles que se situam abaixo de uma

linha de rendimento monetário, que pode ser absoluta (a partir de requisitos

nutricionais) ou relativa (de acordo com o padrão vigente em cada sociedade).

Considerando-se apenas a dimensão econômica, limitam-se as intervenções, com

ênfase no crescimento econômico ou nos programas de transferência de renda.84

Abordagens mais amplas do conceito de pobreza partem da existência de

variáveis não monetárias, ―das que dizem respeito ao acesso aos serviços básicos

81

Id., ibid., p. 189. 82

SITCOVSKY, Marcelo. Particularidades da expansão da Assistência Social no Brasil. In: MOTA, Ana Elizabete da (Org). O Mito da assistência social: ensaios sobre Estado, política e sociedade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2010. p. 156-157. 83

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. A inclusão social e o programa de renda mínima. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 22, n. 66, p. 76-90, jul. 2001. p. 78-79. 84

CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. p. 68-71.

(educação, saúde, habitação, transporte etc.), às que mensuram processos de

natureza psicossocial (participação, auto-estima, autonomia, capacidade etc.)‖. O

enfoque das necessidades básicas concentra-se na qualidade e nas condições de

vida, incorpora a noção de pobreza relativa.85

Potyara realiza um contraponto crítico entre necessidades humanas e os

mínimos de provisão requeridos pela política de assistência social. Para a autora, a

LOAS apresenta incoerências quando, em seu artigo primeiro, define dever da

Assistência prover ―os mínimos sociais‖ através de um conjunto integrado de ações

de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às ―necessidades

básicas‖.86

Porém, segundo Potyara, ―mínimo‖ e ―básico‖ são conceitos distintos. O

primeiro ―tem a condição de menor, de menos, em sua acepção mais ínfima,

identificada com patamares de satisfação de necessidades que beiram a

desproteção social‖.87 O segundo, em contraposição, ―expressa algo fundamental,

principal, primordial, que serve de base de sustentação indispensável e fecunda ao

que a ela se acrescenta‖.88 O mínimo ―pressupõe supressão e cortes de

atendimentos‖,89 enquanto ―o básico requer investimentos sociais de qualidade para

preparar o terreno a partir do qual maiores atendimentos podem ser prestados e

otimizados‖.90

Potyara ressalta o entendimento exposto pelo Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento (PNUD), da Organização das Nações Unidas, por meio de

seu primeiro Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), elaborado em 1990,

segundo o qual não há vínculo automático entre desenvolvimento humano e

desenvolvimento econômico. 91

Com efeito, para o PNUD, desenvolvimento significa um alargamento das

escolhas que possibilite que as pessoas tenham uma vida longa e saudável,

adquiram conhecimento e tenham acesso aos recursos necessários para um padrão

de vida decente. A estes fatores poderão se adicionar ―liberdade política, econômica

85

Id., ibid., p. 70. 86

PEREIRA, Potyara A. P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2007. p. 25-26. 87

Id., ibid., p. 26. 88

Id., ibid., p. 26. 89

Id., ibid., p. 26. 90

Id., ibid., p. 26. 91

Id., ibid., 27-28.

e social a oportunidades para ser criativo e produtivo, desfrutar de respeito próprio e

ter garantidos os direitos humanos‖.92 Ou seja, o desenvolvimento humano vai além

da expansão da renda e da riqueza, tendo dois lados ―a formação de capacidades

humanas, tais como a melhoria da saúde, conhecimento e habilidades – e o uso que

as pessoas fazem de suas capacidades adquiridas – para lazer, fins produtivos ou

ser ativo em questões culturais, sociais e políticas‖.93

Para Potyara, a distinção entre ―necessidades básicas‖ e das demais

categorias diz respeito aos impactos negativos, ou sérios prejuízos, caso não sejam

devidamente satisfeitas. Esses prejuízos dizem respeito à vida material dos homens

(física) e à participação social como sujeitos (informados e críticos). Assim, existiriam

dois conjuntos de necessidades básicas objetivas e racionais – saúde física e

autonomia –, como precondições para se alcançarem ―objetivos universais de

participação social‖.94

Outrossim, segundo a autora, as políticas de provisão social só terão

racionalidade e eficácia se forem previstos e administrados os encandeamentos

positivos para a frente e para trás entre os seus diversos programas, projetos e

prestações de benefícios e serviços, bem como, em relação às políticas

econômicas. Os encandeamentos negativos, também deverão ser previstos com o

fim de serem evitados.95 Exemplifica:

Para a frente: são encadeamentos que criam ou não condições alargadas de necessidades, a partir dos efeitos que a oferta de um programa ou medida de política social produz no campo econômico e vice-versa. Exemplo de encadeamentos positivos: programa de manutenção de renda (renda mínima, renda básica) para segmentos sociais de baixos rendimentos que, além de melhorar as condições alimentares da população-alvo, aquecem, dentre outros efeitos acumulados, o consumo de bens essenciais. E exemplo de encadeamentos negativos: programa de manutenção de renda guiado por um critério de elegibilidade tão rigoroso que condiciona os seus beneficiários a abdicarem de outros benefícios que, acumulados, melhorariam as suas condições de vida e de cidadania. [...] Para trás: são encadeamentos que produzem demandas de natureza econômica requeridas como precondição (positiva ou negativa) ao desempenho de programas ou medidas de política social. Exemplo de encadeamentos positivos: programas de inclusão e manutenção e inclusão de crianças pobres nas escolas, os quais requerem diferentes modalidades

92

United Nations Development Programme. Human Development Report 1990. New York: Oxford University Press, 1990. 189 p. Disponível em: <http://hdr.undp.org/sites/default/files/reports/219 /hdr_1990_en_ complete_nostats.pdf>. Acessado em: 26 set. 2013. 93

Id., ibid. 94

PEREIRA, Potyara A. P. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2007. p. 68. 95

Id., ibid., p. 28-30.

de financiamento, inclusive bolsas de estudo. E exemplos de encadeamentos negativos: programas de renda mínima que preveem a extinção de benefícios e serviços sociais preexistentes.

96

Segundo Potyara, o reforço aos encadeamentos positivos ―constitui

procedimento político necessário para impedir que a provisão social, no que se

refere ao básico, seja instrumento de reprodução da pobreza ou ‗armadilha‘ desta‖.97

Tanto a perspectiva monetária, quanto o enfoque das necessidades básicas

vislumbram a pobreza sob a perspectiva das privações materiais. Assim, ambas

possuem limitações quanto à elaboração de programas de combate à pobreza, uma

vez que não apontam os fatores condicionantes e de reprodução da pobreza.98

Por sua vez, Amartya Sen define pobreza como a privação de capacidades

que as pessoas possuem para ―levar o tipo de vida que elas valorizam‖.99 Nestes

termos, desenvolvimento é um processo de expansão das liberdades reais das

pessoas, requerendo que se removam as suas principais fontes de privação:

―pobreza e tirania, carência de oportunidades econômicas e destituição social

sistemática, negligência dos serviços públicos e intolerância ou interferência

excessiva de Estados repressivos‖.100

Assim, as liberdades substantivas poderão, em determinadas situações

vincular-se diretamente à pobreza econômica, em outras, poderão resultar da

carência de serviços públicos, bem como, da negação de liberdades políticas e civis.

Existem outras influências que atuam sobre a privação de capacidades (pobreza

real), além da baixa renda.101

Contudo, Amartya Sen não ignora o fato de que a privação econômica seria

uma das causa principais da pobreza, uma vez que poderia tornar a pessoa

suscetível a outros tipos de violação. Ou seja, a ―privação de liberdade econômica

pode gerar a privação de liberdade social, assim como a privação de liberdade social

ou política, pode, da mesma forma, gerar a privação de liberdade econômica‖.102

96

Id., ibid., p. 29 e 30. 97

Id., ibid., p. 30. 98

CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. p. 71. 99

SEN, Amartya Kunar. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 33. 100

Id., ibid., p. 16-17. 101

Id., ibid., p. 16-17. 102

Id., ibid., p. 23.

Pontua-se, ademais, que a relação entre renda e capacidades é variável entre

comunidades, famílias e indivíduos distintos. Desvantagens como a idade,

deficiências ou doenças poderão tanto reduzir o potencial para auferir renda, quanto

para converter a renda em capacidade, pela necessidade de compra de

medicamentos, instrumentos etc. Assim, ―a ‗pobreza real‘ (no que se refere à

privação de capacidades) pode ser, em um sentido significativo, mais intensa do que

pode parecer no espaço da renda‖.103

O problema na identificação das capacidades básicas é análogo à dificuldade

de se estabelecer as necessidades básicas. Com efeito, Sen não elaborou uma lista

de capacidades, o que se entende que foi proposital, deixando-se tais

especificações em aberto para definir-se de acordo com os diversos contextos

culturais. Ocorre que, no momento de aplicar-se essa concepção, acaba-se por

utilizar critérios similares aos das necessidades básicas, quais sejam, saúde,

educação, nutrição etc. Todavia, atente-se para o fato de Sen ter provocado uma

nova concepção de pobreza que vai além da mera dimensão econômica 104

Outra abordagem diz respeito ao conceito de exclusão – um dos termos mais

controvertidos da matéria, sendo utilizado em referência a fenômenos diversos. Com

o tema da ―nova pobreza‖, ―exclusão‖ deixou de referir a grupos específicos,

―referindo-se à natureza dos vínculos que unem indivíduos e sociedade‖.105 A

novidade em relação aos enfoques das necessidades básicas e capacidades

residiria na ampliação dos indicadores. Outrossim, essa concepção permitiria uma

melhor compreensão dos processos de exclusão.106

Reforça-se a ―dimensão relacional do conceito de exclusão social‖, pois a

pobreza passa a ser vista como fruto de ―processos e relações sociais‖. Além das

condições subjetivas, envolvidas no processo da pobreza (perda da autoestima e da

identidade, enfraquecimentos dos laços familiares, sociais e comunitários), atenta-se

para as interações estabelecidas com os demais setores sociais (vizinhos, família,

comunidade, instituições etc).107

103

Id., ibid., p. 121. 104

CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. p. 72-73. 105

Id., Ibid., p. 74. 106

Id., Ibid., p. 74. 107

Id., Ibid., p. 75.

Assim, a partir do conceito de ―exclusão social‖, diversos autores reforçam a

necessidade de se compreender que as necessidades humanas ultrapassariam

aquelas meramente biológicas, carecendo atingir um patamar básico de inclusão

social.108 Tal posição, todavia, não está isenta de críticas.

Robert Castel denuncia o fato de a palavra ―exclusão‖ ser aplicada

indistintamente para definir ―todas as modalidades de miséria do mundo‖. Tal

circunstância, no pensamento do autor, oculta e traduz, o estado atual da questão

social. Para ele, a heterogeneidade de seu uso findaria por rotular, a partir de uma

―qualificação puramente negativa que designa a falta, sem dizer no que ela consiste

nem de onde ela provém‖.109 Ademais, falar em exclusão produziria uma

autonomização de ―situações-limite que só têm sentido quando colocadas num

processo‖.110

Castel aponta como tarefa da sociologia analisar os fatores que precedem a

exclusão para medir os riscos da ruptura social. Pois, na ―maior parte dos casos, ‗o

excluído‘ é de fato um desfiliado cuja trajetória é feita de uma série de rupturas em

relação a estados de equilíbrio anteriores mais ou menos estáveis ou instáveis‖.111

O autor entende que as políticas de inserção apresentam um mérito

inconteste. Todavia, afirma que seriam pensadas como estratégias limitadas no

tempo, mas que o provisório acabaria se tornando um regime permanente.

Correndo-se o risco de a ―luta contra a exclusão‖ tornar-se um ―pronto-socorro

social‖. Deter-se nesses empreendimentos ―implica na renúncia de intervir sobre o

processo que produz essas situações‖.112

O pensamento da exclusão e a luta contra ela corresponderia, portanto, a um

tipo clássico de focalização da ação social, delimitando-se as zonas de intervenção,

caracterizando-se ―populações-alvo‖ a partir de um déficit preciso: ―inválidos,

deficientes, idosos, economicamente frágeis, crianças em dificuldade, famílias

monoparentais, etc.‖.113

108

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Desafios para fazer avançar a política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP , v. 22, n. 68, p. 54-82, nov. 2001. p. 60. 109

CASTEL, Robert; WANDERLEY, Mariangela Belfiore.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. Desigualdade e a questão social. 3. ed., rev. ampl. São Paulo: EDUC, 2010. p. 25. 110

Id., ibid., p. 25. 111

Id., ibid., p. 28. 112

Id., ibid., p. 32-33. 113

Id., ibid., p. 33.

Este procedimento acabaria por substituir ações mais ambiciosas, e mais

custosas, de políticas sociais gerais, que atuariam tanto com finalidades preventivas

quanto reparadoras. Ademais ―as medidas específicas que visam ajudar públicos em

dificuldade e sua instalação em sistemas de categorização‖ findariam por lhes

atribuir ―um status de cidadão de segunda classe‖.114 Neste contexto que a

discriminação positiva converte-se em discriminação negativa, pois ―certas

categorias da população se vêem obrigadas a um status especial que lhes permita

coexistir na comunidade, mas com a privação de certos direitos e da participação em

certas atividades sociais.‖115

Segundo Luciano Oliveira, para a visão antidualista, não faz sentido falar em

―incluídos‖ e ―excluídos‖, se ambas as categorias ―são produzidas por um mesmo

processo econômico, que de um lado produz riqueza e, do outro, miséria‖.116 Ocorre

que o autor propõe a adoção de um ponto de vista diverso em relação à visão

antidualista da ―funcionalidade dos excluídos‖, da perspectiva da ―acumulação

global‖. Nomeia os ―miseráveis‖ como excluídos do mundo ―normal‖, a partir de ―um

ponto de vista valorativo acerca do que seja um modo de viver humano‖.117

Outrossim, pontua, com a existência de seres humanos ―desnecessários

economicamente‖ ou ―sem lugar no mundo‖, desenvolve-se um sentimento de

hostilidade e de uma mentalidade exterminatória dos excedentes ―já não

assimiláveis pelos processos tradicionais de trabalho e socialização‖.118

Ainda persiste em alguns setores da sociedade a ótica liberal/neoliberal de

que o indivíduo deve manter a si e à sua família com a força de seu trabalho,

segundo a qual a assistência social seria uma ameaça, devendo ser negada de todo

ou, no máximo, dirigida aos incapacitados para o trabalho. Daí o paradoxo entre os

critérios de elegibilidade entre o direito à assistência e à previdência, bem como, o

estigma que associa a assistência à ajuda aos pobres.119

114

Id., ibid., p. 51. 115

CASTEL, Robert; WANDERLEY, Mariangela Belfiore.; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. Desigualdade e a questão social. 3. ed., rev. ampl. São Paulo: EDUC, 2010. p. 43. 116

OLIVEIRA, Luciano. Os Excluídos existem? Notas sobre a elaboração de um novo conceito. Rev. Bras. Ci. Soc., São Paulo, v. 12, n. 33, p.1-11, fev. 1997. Disponível em: <http://www.anpocs.org.br/portal/publica coes/rbcs_00_33/rbcs33_04>. Acessado em: 19 dez. 2013. 117

Id., ibid. 118

Id., ibid. 119

RODRIGUES, Mavi Pacheco. Projeto Ético-Político e a política de assistência: a centralidade da luta pela afirmação de direitos. In: SOUZA, Nadia Regina Oliveira Queiroz de (Org.). Política de assistência social no Brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. p. 16.

Ou seja, a vinculação da Assistência Social à ―pobreza absoluta‖ contribui

para a cristalização de uma noção que é o seu oposto, a ―desassistência social‖,

porque estigmatiza os pobres, ―rebaixando o seu status de cidadania‖, uma vez que

―o pobre tem que abrir mão de seus direitos individuais‖ para receber assistência

social, constituindo o que alguns autores chamam de ―cidadania invertida‖.120

Assim, o modo como a ―terceira esfera‖ é vista, torna-se determinante para a

construção de uma inclusão pela cidadania ou, do contrário, uma inclusão pela

exclusão, onde o indivíduo é ―reconhecido pelo não ter, ou por ser necessitado,

pobre, negro, subnutrido, morador de habitação subnormal, enfim um conjunto de

qualificações discriminatórias que, ao dizer que reconhece, afasta‖.121

Em Luhmann, exclusão consiste em uma forma, cujo outro lado, o da

inclusão, refere-se à oportunidade de que as pessoas, em um contexto de

comunicação, sejam consideradas socialmente. Nas sociedades funcionalmente

diferenciadas, a regulação da inclusão pertence aos sistemas parciais e, não há uma

instância central. Os indivíduos devem ser sujeitos de direitos e dispor de ingressos

suficientes para poder participar em todas as comunicações (economia, política,

educação, religião etc.). Outrossim, a dependência múltipla dos sistemas funcionais

reforçam os efeitos da exclusão, uma vez que a exclusão real de um sistema reduz

as possibilidades de inclusão nos demais.122

Neste contexto, os direitos humanos são essenciais à diferenciação funcional

da sociedade, pois, se os indivíduos têm acesso aos sistemas de funções de

maneira diferenciada, conforme critérios internos a cada sistema, permanece aberta

a possibilidade de reprodução autopoietica dos diversos sistemas, contra a

tendência expansiva de outros.123

Outra problemática relevante para a nossa abordagem diz respeito ao valor

da renda per capita familiar que ensejará à concessão do benefício de prestação

continuada. Sposati observa que esses valores precisariam partir de patamares de

inclusão social, não de condições de vida precárias, evitando-se, com isso, por

120

PEREIRA, Potyara A. P. Como conjugar especificidade e intersetorialidade na concepção e implementação da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 54-62, mar. 2004. p. 56. 121

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Desafios para fazer avançar a política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP , v. 22, n. 68, , p. 54-82, nov. 2001. p. 56. 122

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. Cidade do. México: Herder, 2007. p. 490-502. 123 LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 172.

exemplo, as discriminações entre a ―cesta básica do pobre‖ e a ―cesta básica do

trabalhador‖.124

A própria Política Nacional de Assistência Social (Resolução nº 145, de 15 de

outubro de 2004), distingue ―segurança de rendimentos‖ de ―mínimo inadequado‖.

Conforme este texto, a ―segurança de rendimentos não é uma compensação do

valor do salário-mínimo inadequado, mas a garantia de que todos tenham uma

forma monetária de garantir sua sobrevivência, independentemente de suas

limitações para o trabalho ou do desemprego‖.125

O critério de renda estabelecido pela LOAS126, por sua vez, parte do

pressuposto de que um salário mínimo é suficiente para manter uma família de

quatro pessoas, dentre elas, uma com deficiência. Ademais, uma vez que é

necessária a comprovação de renda de todo o núcleo familiar, atribui-se uma

responsabilidade principal à família e subsidiária ao Estado. Torna-se, portanto, um

―benefício familiar‖.127

Com efeito, a Lei nº 8.742/1993128 define como hipossuficiente para fins de

recebimento do BPC ―a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um

quarto) do salário-mínimo‖ (Art. 20, § 3o). Maiores restrições são elencadas por meio

do Decreto nº 6.214/2007, pois considera renda mensal bruta familiar:

[...] a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19. (Art. 4º, VI)

129

124

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Desafios para fazer avançar a política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 54-82, nov. 2001. p. 62. 125

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: CNAS/MDS, 2004. Disponível em: <http://www.renipac.org.br/pnas_2004.pdf>. Acessado em: 29 out. 2013. 126

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 127

GOMES, Ana Lígia. O Benefício de Prestação Continuada: uma trajetória de retrocessos e limites. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP, v. 22. n. 68, p. 111-139, nov. 2001. p. 116. 128

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 129 BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Ou seja, além de impor a contabilização de ―pensões alimentícias‖ no cálculo

da renda familiar, o Decreto ainda estabelece que, com exceção do disposto no art.

19, parágrafo único, o BPC pago à pessoa com deficiência, e o benefício

previdenciário de valor mínimo pago ao idoso, também integrariam a ―conta‖ de

rendimentos familiares.

Ademais, percebe-se, uma disparidade entre as linhas de hipossuficiência

traçadas pelos diversos programas assistenciais no País. A Lei no 10.689, de 13 de

junho de 2003 (Cria o Programa Nacional de Acesso à Alimentação – PNAA)130, fixa

como beneficiária do PNAA, a unidade familiar com renda mensal per capita inferior

a meio salário mínimo (art. 2o, § 2o). O Plano Brasil sem Miséria (Decreto nº 7.492,

de 02/06/2011131), coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e

Combate à Fome (MDS), estabeleceu como público-alvo os brasileiros com renda

per capita de até R$ 70,00 por mês. O mesmo critério foi adotado pelo Programa

Bolsa Família (Lei nº 10.836, de 9 de janeiro de 2004132).

Os antigos programas do Governo (unificados pelo Bolsa Família), chamados

remanescentes,133 previam como famílias beneficiárias: Bolsa Escola (com renda

mensal per capita de até R$ 90,00); Bolsa Alimentação (com renda mensal per

capita de até R$ 90,00); Cartão Alimentação (famílias com renda entre R$ 50,01 e

R$100,00); e Auxílio Gás (com renda mensal per capita de até ½ salário mínimo).

Ou seja, os beneficiários dos diversos programas governamentais de transferência

de renda seriam tratados de maneira desigual.

Observe-se que, em decisão recente (Reclamação 4374/PE), o Pleno do STF

apreciou a matéria, declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de

nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. Vejamos:

130

BRASIL. Lei no 10.689, de 13 de junho de 2003. Cria o Programa Nacional de Acesso à

Alimentação – PNAA. Brasília: D.O.U. DE 16/06/2003. Disponível em : <http://www.planalto .gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.689.htm>. Acessado em: 02 nov. 2013. 131

BRASIL. Decreto nº 7.492, de 2 de junho de 2011. Institui o Plano Brasil Sem Miséria. Brasília: D.O.U. de 03/06/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-014/2011/Decreto/D7492.htm>. Acessado em: 05 nov. 2013. 132

BRASIL. Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Cria o Programa Bolsa Família e dá outras

providências. Brasília: D.O.U. de 12/01/2004. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.836.htm>. Acessado em: 07 nov. 2013. 133

Esses programas não receberam novas famílias a partir de outubro/2003 (início do Programa Bolsa Família). Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro 2003, convertida na Lei nº 10.836, de 2004.

EMENTA [...] Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada improcedente. (Grifo nosso).

134

Uma parcela da doutrina entende que os programas de transferência de

renda devem garantir direitos além do ―mínimo existencial‖, significando estímulo à

cidadania, à autonomia dos beneficiários. Isto porque, mais do que o acesso ao

benefício, a transferência de renda promoveria o ―direito a ter relações sociais‖,

fortaleceria a autoestima, permitiria o acesso ao crédito, asseguraria as diversas

situações que compõem o risco social.135 E esta ―noção de risco não implica

somente a iminência imediata de um perigo, mas quer dizer também uma

possibilidade de, num futuro próximo, ocorrer uma perda de qualidade de vida pela

ausência de uma ação preventiva‖.136

Pelo exposto, pudemos verificar que não há perspectivas unívocas de

pobreza e assistência social a serem adotadas. Contudo, evidencia-se a

insuficiência das análises a partir de aspectos meramente de renda. Bem como,

alerta-se para o risco de os critérios extremamente rigorosos produzirem uma visão

estigmatizante.

1.3 O Modelo social de deficiência

134

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 4374/PE. Brasília: STF, 2013. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28rcl%29%284374%2ENUME%2E+OU+4374%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/a9gc2ln>. Acessado em: 09 nov. 2013. 135

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. A inclusão social e o programa de renda mínima. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 22, n. 66, p. 76-90, jul. 2001. p. 84. 136

Id. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. p. 44.

Em sua primeira fase, a proteção dos direitos humanos fundamentou-se na

igualdade formal, marcada pela proteção geral e abstrata. Posteriormente, uma

outra vertente, da igualdade material, orientou-se pelo critério socioeconômico,

correspondendo ao ideal de justiça social e distributiva.137 Ocorre que se passou a

compreender que a violação dos direitos humanos alcançaria prioritariamente os

grupos vulneráveis, razão pela qual, a implementação desses direitos requereria,

além de políticas universalistas, políticas específicas, acrescidas do valor da

diversidade.138

Assim, sendo insuficiente tratar o indivíduo de forma geral e abstrata, impor-

se-ia o reconhecimento de suas particularidades, pelo que surgiria, ao lado do direito

à igualdade, o direito à diferença. Neste contexto que se desenvolve uma nova

vertente que defende a igualdade material com vista ao reconhecimento de

identidades. Destarte, à redistribuição foi somado o reconhecimento, sendo certo

que ―essa feição bidimensional da justiça mantém uma relação dinâmica e dialética,

ou seja, os dois termos relacionam-se e interagem mutuamente, na medida em que

a discriminação implica pobreza e esta implica discriminação‖.139

Ou seja, a relação da sociedade com a pessoa com deficiência teria

transitado de uma fase de intolerância; passando pela invisibilidade; e uma fase

assistencialista, segundo as perspectivas médica e biológica, focada no portador de

deficiência; até chegar, finalmente, em uma quarta fase, pautada pela inclusão

social, com ênfase na relação pessoa e ambiente, com vista a superar barreiras

culturais, físicas e sociais. Nesta quarta fase, a deficiência desloca-se do indivíduo e

centra-se na sua relação com o ambiente, construído coletivamente. Neste sentido

que se apontam os deveres do Estado para eliminar os obstáculos.140 E, superando-

se as deficiências do ambiente, viabilize-se o exercício das liberdades.141

137

PIOVESAN, Flávia. Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: inovações, alcance e impacto. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 34 e 35. 138

Id. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 2.ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 56-59. 139

Id. Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: inovações, alcance e impacto. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 35-36. 140

Id., ibid., p. 46-47. 141

GALINDO, Bruno. Direito à liberdade: dimensões gerais e específicas de sua proteção em relação às pessoas com deficiência. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 98-100.

A nomenclatura adotada na Convenção de Nova York, ―pessoa com

deficiência‖, e utilizada contemporaneamente em substituição à expressão utilizada

pela CF/88, ―portador de deficiência‖, dá a conotação de que a deficiência é ―parte

da pessoa, integrando-se a ela, e não algo que estava perto em virtude posse ou

portabilidade‖.142 Outras terminologias, também consideradas ultrapassadas pela

doutrina, com o propósito de valorizar as pessoas com deficiência, considerando-as

especiais, findavam por segregá-las.143

Para Werneck, a ―ética da igualdade‖, admitia ―modelos de gente‖,

valorizando ―única e exclusivamente o que as pessoas têm de semelhança‖,

permitindo ―hierarquizar condições humanas‖. A ―ética da diversidade‖, em

contraposição, apoia-se ―na certeza de que a humanidade encontra infinitas formas

de se manifestar, não admite a comparação entre diferentes condições humanas,

nem privilegia uma delas em detrimento de outras‖.144

Sassaki descreve conceitos pré-inclusivistas, a começar pelo ―modelo médico

de deficiência‖, segundo o qual as pessoas com deficiência são tratadas como

doentes, precisando de tratamento, reabilitação, para se adequarem à sociedade.

Conforme o autor, o ―modelo médico de deficiência tem sido responsável, em parte,

pela resistência da sociedade em mudar suas estruturas e atitudes‖.145

O referido modelo privilegiava os fatores biológicos e médicos, segundo a

perspectiva da Classificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e

Desvantagens, publicada em 1976, pela Organização Mundial de Saúde, ―partindo

da análise do que é ‗normalidade‘ para definir deficiência‖.146

No final da década de 60, o movimento pela integração social começa a

inserir as pessoas com deficiência nos sistemas gerais, com a pretensão de

derrubar as práticas de exclusão social, que se configuravam desde a exclusão total

até a segregação institucional. Nesta esteira que a ―normalização‖, na década de 70,

142

ARAUJO, Luiz Alberto David. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seus reflexos na ordem jurídica interna no Brasil. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 55 143

WERNECK, Claudia. Você é gente?: O direito de nunca ser questionado sobre o seu valor humano. Rio de Janeiro: Wva, 2003. p. 34. 144

Id., Ibid., p. 29-30. 145

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. p. 29. 146

SILVA, Roberta Cruz da. Direito à saúde. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 115.

pretendeu proporcionar, para pessoas internas em instituições ou segregadas, um

ambiente parecido com aquele vivenciado pelas demais pessoas.147

Ainda na tentativa de integração, que o princípio do Mainstreaming, na

década de 80, pretendia encampar o referido processo de desinstitucionalização.

Contudo, corriqueiramente, tal processo era manejado com a simples colocação

física do aluno com deficiência em salas regulares. Ocorre que, a partir do fim da

década de 80, percebeu-se que a prática tradicional de integração social era

insuficiente para acabar com a discriminação ou viabilizar uma participação plena,

em igualdade de oportunidades.148

Com efeito, o modelo de ―integração‖ permite apenas uma inserção parcial e

condicional das pessoas com deficiência que demonstrem aptidão, e, por meio de

concessões dos sistemas, adaptam-se aos modelos existentes. Assim, as

transformações são superficiais e partem do pressuposto que apenas as pessoas

com deficiência se beneficiam da integração. Outrossim, a integração ―disfarça as

limitações para aumentar as chances de inserção‖, caracterizando-se pela ―simples

presença de pessoas com e sem deficiência em um mesmo ambiente‖.149

O modelo de integração reflete, portanto, o modelo médico da deficiência, por

meio de um esforço unilateral da pessoa com deficiência (e de seus aliados) que

deve ―moldar-se aos requisitos dos serviços especiais‖, ―acompanhar os

procedimentos tradicionais‖, ―contornar os obstáculos‖, ―lidar com atitudes

discriminatórias‖, desempenhar papeis sociais individuais ―com autonomia, mas não

necessariamente com independência‖.150

Em contraposição, pelo modelo social de deficiência, a própria sociedade

reconhece a sua participação na criação de desvantagens.151 Ademais, enxerga na

deficiência uma das infinitas formas de ―manifestação da diversidade humana‖.152

Em decorrência de sua humanidade, todas as pessoas ―têm o direito de participar

147

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. p. 31-32. 148

Id., ibid., p. 32-34. 149

WERNECK, Claudia. Você é gente?: o direito de nunca ser questionado sobre o seu valor humano. Rio de Janeiro: Wva, 2003. p. 52-53. 150

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. p. 34-35. 151

id., ibid., p. 41. 152

WERNECK, Claudia. Você é gente?: o direito de nunca ser questionado sobre o seu valor humano. Rio de Janeiro: Wva, 2003. p. 49.

ativamente da sociedade contribuindo com o seu melhor talento para o bem comum,

qualquer que seja ele‖.153

Neste sentido, Lima Júnior e Gonçalves compreendem a deficiência como

uma construção social e uma questão contextual. A deficiência não é uma

característica intrínseca do sujeito, mas da sociedade que dificulta a inclusão de

todas as pessoas, cada uma com suas especificidades.154 Essa visão, segundo os

autores, rejeita a contraposição entre deficiência e normalidade. Preferem contrapô-

la à ideia de eficiência:

Pode-se entender que um cadeirante possui uma deficiência diante de uma escada, mas, se tiver acesso à formação adequada, poderá ser eficiente para desempenhar adequadamente diversas atividades de natureza intelectual. Enquanto isso, uma pessoa com deficiência mental poderá ter dificuldade para desenvolver atividades intelectuais, mas poderá se revelar perfeitamente eficiente no desempenho de atividades de outra natureza, como subir escadas. A deficiência, nessa perspectiva, sempre depende do contexto em que as pessoas se encontram e das expectativas que a sociedade tem em relação a elas.

155

Assim, ―sociedade inclusiva‖ seria aquela que contempla todas as condições

humanas, por meio de uma inserção total e incondicional que beneficia a todos

(pessoas com ou sem deficiência). Tal modelo exige rupturas nos sistemas e

grandes transformações, pois, de fato, a sociedade se adapta para atender os

direitos e as necessidades de todas as pessoas (com ou sem deficiência). A

sociedade inclusiva não pretende apenas a colocação física de pessoas com ou sem

deficiência em um mesmo ambiente. Valorizam-se as individualidades, razão pela

qual não disfarça as limitações, ―a partir da certeza de que todos somos diferentes

não existem ‗os especiais‘, ‗os normais‘, ‗os excepcionais‘, o que existe são pessoas

com deficiência‖.156

Sassaki aponta como conceitos inclusivistas: autonomia – domínio do

ambiente físico e social que a pessoa com deficiência frequenta para atingir seus

objetivos, com privacidade e dignidade; independência – faculdade de decidir sem

153

Id., ibid. p. 49. 154

LIMA JÚNIOR, Jayme Benvenuto; GONÇALVES, Francysco Pablo Feitosa. A proteção dos direitos da pessoa com deficiência na jurisprudência da Corte Interamericana e da Corte Europeia de Direitos Humanos. In: In FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 464. 155

Id., ibid. 156

WERNECK, Claudia. Você é gente?: O direito de nunca ser questionado sobre o seu valor humano. Rio de Janeiro: Wva, 2003. p. 52-53.

depender de outras pessoas, decorrente da quantidade e qualidade das informações

disponíveis, bem como, da autodeterminação; empowerment – ―processo pelo qual

uma pessoa, ou um grupo de pessoas, usa o seu poder pessoal inerente à sua

condição – por exemplo: deficiência, gênero, idade, cor – para fazer escolhas e

tomar decisões, assumindo assim o controle de sua vida (Sassaki, 1995b)‖.157

A partir da ótica da ―sociedade inclusiva‖, busca-se, outrossim, a ―equiparação

de oportunidades‖, para que todas as pessoas possam ter acesso aos serviços,

bens, ambientes construídos e naturais; a ―rejeição zero‖, segundo a qual as

instituições são desafiadas a criar programas e serviços para melhor atenderem as

pessoas com deficiência; e a ―vida independente‖, permitindo às pessoas com

deficiência uma ―maior participação de qualidade na sociedade, tanto na condição

de beneficiários dos bens e serviços que ela oferece como também na de

contribuintes ativos no desenvolvimento social, econômico, cultural e político da

nação‖.158

Essa ótica inclusiva que admite a deficiência como mais uma das expressões

da diversidade humana, bem como, vislumbra nas pessoas com ou sem deficiência

seres dotados de igual dignidade não permaneceu restrita ao âmbito acadêmico. Do

contrário, provocou irritações no sistema político, promovendo alterações na

legislação nacional e internacional. Como veremos adiante, o ―modelo social de

deficiência‖, em substituição ao ―modelo médico‖, assim como, o compromisso dos

Estados com o reconhecimento e desenvolvimento das capacidades e habilidades

da pessoa com deficiência passaram a ocupar posição central na legislação vigente.

157

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. p. 36-38. 158

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. Vide Declaração de Princípios da Disabled People‘s International (1981), Programa Mundial de Ação Relativo às Pessoas com deficiência da Ass. Geral da ONU (1982), Normas sobre equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência da Ass. Geral da ONU (1993). p. 39-41 e 50-53.

2 O benefício de prestação continuada e a pessoa com deficiência

Observe-se que este novo ―modelo social‖ de deficiência, descrito no primeiro

capítulo, possibilitou irritações no sistema político, provocando alterações na

legislação pertinente. Com efeito, a Carta Magna, em seu art. 203, prescreve a

garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa ―portadora de

deficiência‖ que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou de

tê-la provida por sua família.159 Por sua vez, a Lei 8.742/1993160, em sua redação

originária, dispunha que ―pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para

a vida independente e para o trabalho‖.

Ocorre que a Convenção de Nova York, de 30 de março de 2007, incorporada

ao ordenamento jurídico pátrio com status constitucional por meio do Decreto n.

6.949/2009, definiu que:

Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.

161

Impende observar que a Convenção de Nova York não traz em si o vetusto

vocábulo ―incapacidade‖. Em contraposição, utiliza-se do termo ―impedimento‖, que

não se dá isoladamente, mas em ―interação com diversas barreiras‖. Outrossim, o

olhar da proteção desvia-se da seara da ―vida independente‖ e do ―trabalho‖,

atingindo esferas mais amplas que dizem respeito à ―participação plena e efetiva na

sociedade‖.

De outra banda, a palavra ―capacidade‖ aparece diversas vezes na

Convenção, em meio às seguintes construções: ―respeito pelo desenvolvimento das

capacidades das crianças com deficiência‖; ―conscientização sobre as capacidades

159

A proteção à pessoa com deficiência está presente em inúmeros outros artigos da Constituição Federal, o que denota a preocupação do constituinte com este tema (Art. 5. XXXI; art. 23, II; art. 24, XIV; art. 37, VIII; art. 40, § 4º - I; art. 201, § 1º; art. 208, III; Art. 227, § 1º, II e § 2º -; Art. 244). 160

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 161

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013.

e contribuições das pessoas com deficiência‖; ―reconhecimento das habilidades, dos

méritos e das capacidades das pessoas com deficiência‖; ―pessoas com deficiência

gozam de capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas‖,

―acesso de pessoas com deficiência ao apoio que necessitarem no exercício de sua

capacidade legal‖, ―possibilitar que as pessoas com deficiência conquistem e

conservem o máximo de autonomia e plena capacidade física, mental, social e

profissional‖.162

Referida alteração no nível constitucional findou por provocar a substituição

da definição anterior, presente na LOAS, que passou a adotar a seguinte redação

com a Lei nº 12.470/2011:

Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

163

Apesar de o Benefício de Prestação continuada ser integrante do Sistema

Único de Assistência Social – SUAS, o fato de sua operacionalização ser da

competência do Instituto Nacional do Seguro Social (instituição vinculada à

Previdência Social) traz repercussões práticas importantes na formação do direito.

Outrossim, a atuação do INSS no âmbito administrativo, concedendo ou

negado o benefício assistencial, atrai a competência para o julgamento das lides

para a Justiça Federal, mais especificamente, para os Juizados Especiais Federais,

em razão do valor da causa. Fato que também influencia na formação do direito ao

benefício de prestação continuada, uma vez que esta justiça especializada opera

com peculiaridades próprias.

2.1 Avaliação da deficiência segundo a legislação

162

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013. 163

BRASIL. Lei nº 12.470, de 31 de Agosto de 2011. Altera os arts. 21 e 24 da lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; altera os arts. 16, 72 e 77 da lei nº 8.213;altera os arts. 20 e 21 e acrescenta o art. 21-a à lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; e acrescenta os §§ 4o e 5o ao art. 968 da lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília: D.O.U. de 01/09/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12470.htm>. Acessado em: 25 out. 2013.

Quando da publicação da Lei que organiza a Assistência Social - LOAS (Lei

nº 8.742/1993) vigiam os seguintes dispositivos legais: CIDID (ICIDH), da OMS, de

1989; Lei nº 7.853/1989; Decreto nº 914/1993. Conforme o Decreto nº 914 de

06/09/1993:

Art. 3º Considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que apresenta, em caráter permanente, perdas ou anormalidades de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, que gerem incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano. (Grifo nosso).

164

Tanto a Lei nº 8.742/93 quanto o Decreto nº 1.330/94 passaram a definir

―pessoa portadora de deficiência‖, como sendo ―aquela incapacitada para a vida

independente e para o trabalho‖. Não determinavam, contudo, o que seria ―vida

independente‖.165 Maior restrição foi dada pelo Decreto nº 1.744/95:

[...] pessoa portadora de deficiência: aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho em razão de anomalias ou lesões irreversíveis de natureza hereditária, congênitas ou adquiridas, que impeçam o desempenho das atividades da vida diária e do trabalho. (Grifo nosso).

166

Assim, o decreto em comento introduziu a irreversibilidade e limitou ―vida

independe‖ a impedimentos para o desempenho das atividades da vida diária.167

Até 1997, a concessão do benefício de prestação continuada era efetuada a

partir da análise de laudo emitido pelo SUS, pelo INSS ou por entidade com

competência técnica reconhecida. Somente com a Medida Provisória nº 1.473-

164

BRASIL. Decreto nº 914, de 6 de setembro de 1993. Institui a política nacional para a integração da pessoa portadora de deficiência, e dá outras providências. (deficientes). Brasília: D.O.U. de 08/09/1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0914.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 165

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 415-452. 166

BRASIL. Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995. Regulamenta o benefício de prestação continuada devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso, de que trata a lei 8.742, de 07/12/1993, que dispõe sobre a organização da assistência social. Brasília: D.O.U. de 11/12/1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d1744.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 167

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 415-452.

33/1997, substituída por outras MPs até a conversão na Lei nº 9.720/1998, a

concessão do benefício passou a depender de exame médico pericial e laudo,

realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social.

Tal mudança pretendia eliminar os critérios subjetivos de concessão e as fraudes.168

A partir de 1997 a disciplina e uniformização dos procedimentos seguiam as

determinações da Resolução INSS/PR nº 435, de 18 de março de 1997 e da Ordem

de Serviço DSS nº 577 de 05/08/1997.169 Conforme a Resolução INSS/PR nº 435,

de 18 de março de 1997, o AVALIEMOS, constitui instrumento de orientação aos

profissionais, fazendo jus ao benefício aquele que obtiver somatório igual ou

superior a 17 (dezessete) pontos. Eram avaliados os seguintes itens: aptidão para o

trabalho (0 ou 6); visão, audição e palavra (0 ou 3); atividades de vida diária (0 a 6);

locomoção (0 a 6); instrução (0 ou 3); excretores (0 ou 3); manutenção permanente

de cuidados médicos, de enfermagem ou de terceiros (0 ou 3); oligofrenia e

deficiência mental (1 a 6); síndrome e quadros psiquiátricos (1 a 6).170

No Processo-Consulta 6.286/2001 PC/CFM/Nº 32/2003, o Conselho Federal

de Medicina encaminhou orientação ao Ministério Público em relação ao Sistema de

Administração de Benefícios por Incapacidade (SABI), sistema que controlava todo o

processo de concessão de benefícios por incapacidade, determinando,

automaticamente, o período de duração do benefício. O Conselho decidiu que a

interferência de programas informatizados na fixação do diagnóstico e do tempo

estimado de afastamento do trabalho fere a autonomia do profissional, pois o

―resultado da perícia é de exclusiva decisão do médico, que a toma baseado em

normas, leis e no seu julgamento pessoal, não podendo esta decisão ser submetida

à aprovação de um programa de computador‖.171

Posteriormente, o Decreto nº 3.298/99 foi alterado pelo Decreto nº

5.296/2004, passando a definir deficiência como ―toda perda ou anormalidade de

uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade

168

Id. Ibid. p. 415-452. 169

Id. Ibid. p. 415-452. 170

BRASIL. Resolução INSS/PR nº 435, de 18 de março de 1997. Estabelece normas e procedimentos para a operacionalização do Benefício de Prestação Continuada Devido à Pessoa Portadora de Deficiência e ao Idoso e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 04/04/97. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d1744.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 171

BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM n.º 1.658/2002. Normatiza a emissão de atestados médicos e dá outras providências. (Parcialmente alterada pela Resolução CFM nº 1851, de 18.08.2008). Brasília: CFM, 2002. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2002/1658_2002.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser

humano‖. O Decreto contribuiu para uniformizar os enquadramentos, todavia,

restringindo o acesso ao BPC por meio da referência taxativa às categorias de

deficiência.172 Vejamos:

Art. 4

o É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra

nas seguintes categorias: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004) II - deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004) III - deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60

o; ou a ocorrência simultânea

de quaisquer das condições anteriores; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004) IV - deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização dos recursos da comunidade; (Redação dada pelo Decreto nº 5.296, de 2004) e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho; V - deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências.

173

Destarte, nesta primeira fase, além da incapacidade omniprofissional, a

legislação exigia do beneficiário do BPC a incapacidade para a vida independente

172

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 415-452. 173

BRASIL. Decreto nº 5.296 de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis n

os 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às

pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 03/12/2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5296.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013.

(desempenho das atividades da vida diária), critério mais rígido do que aquele

exigido para a concessão da aposentadoria por invalidez.174 Ocorre que, já em 2007,

por meio da Ação Civil Pública nº 2007.30.00.000204-0, determinou-se que a

capacidade para prática de atos da vida cotidiana (banhar-se, comer, vestir-se,

caminhar), por si só, não impedia a concessão do benefício.175

Como explanado acima, a Convenção Internacional sobre os Direitos das

Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em

30 de março de 2007, lançou novas bases para a proteção da pessoa com

deficiência, a partir de um novo conceito. A referida Convenção foi aprovada pelo

Congresso Nacional, nos termos do § 3º do art. 5º da Constituição Federal, por meio

do Decreto Legislativo nº 186, de 2008, e promulgada pelo Decreto nº 6.949, de 25

de agosto de 2009.

Já em 2007, o Decreto no 6.214 submeteu a concessão do BPC à pessoa

com deficiência à avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, com base nos

princípios da CIF, estabelecida pela Resolução da Organização Mundial da Saúde no

54.21, aprovada pela 54a Assembléia Mundial da Saúde, em 22 de maio de 2001.

Assim, além da avaliação médica, haveria de se realizar também a avaliação social,

a cargo do serviço social do INSS.176

O Decreto em comento define ―incapacidade‖ como ―fenômeno

multidimensional que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da

participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em

correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e

social‖ (Art. 4º, III).177

174

BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2012. 175

BRASIL. Justiça Federal. Seção Judiciária do Estado do Acre. Decisão: Benefício previdenciário previsto no art. 203, V, da CF/88 e art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93. A capacidade do postulante para praticar atos da vida cotidiana (banhar-se, comer, vestir-se, caminhar), por si só, não é determinante para o indeferimento do benefício pelo INSS. Brasília: Autos n. 2007.30.00.000204-0 classe 7100 – ação civil pública. Disponível em: <http://www.ac.trf1.gov.br/noticias/2007/not04-12.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013. 176

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 415-452. 177

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a lei n

o 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a lei n

o 10.741, de 1

o de outubro de 2003, acresce parágrafo

ao art. 162 do decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de

A implementação das alterações, contudo, apenas se efetivou a partir de

01.06.2009, após a publicação da Portaria Conjunta MDS/INSS 1º, de 29 de maio de

2009178, que instituiu os instrumentos para avaliação da deficiência e do grau de

incapacidade de pessoas com deficiências requerentes do BPC, por meio de

avaliação social – considerando e qualificando os fatores ambientais, atividades e

participação, a ser realizada por assistente social; bem como, de avaliação médica –

considerando e qualificando as funções do corpo, atividades e participação, a ser

realizada por médico-perito.179 Em 2011, a LOAS passou a ter nova redação:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) [...] § 2

o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com

deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011). (Grifo nosso).

180

Ademais, a lei orgânica da assistência social estabelece que a concessão do

benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento,

composta por avaliação médica e social, realizadas por médicos peritos e por

assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social (art. 20 § 6º). Outrossim,

considera impedimento de longo prazo aquele que produza efeitos pelo prazo

mínimo de dois anos (art. 20, § 10).

Tem-se debatido a constitucionalidade do dispositivo que acrescenta o

requisito ―impedimento de longo prazo aquele que produza efeitos pelo prazo

mínimo de 2 (dois) anos‖ e a sua conformidade com o ideal de proteção à pessoa

com deficiência. Com efeito, a CF/88 não estabeleceu período mínimo de duração

da deficiência.

28/09/2007. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 178

Atualmente revogada pela Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011. 179

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 415-452. 180

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

De outra banda, o Decreto nº 6.949/2009 (promulga a Convenção

Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo

Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007) define pessoas com

deficiência como sendo:

[...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas.

181

Ou seja, a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com

Deficiência refere-se ao ―impedimento de longo prazo‖ sem, contudo, fixar lapso

temporal.

Em sentido oposto, para o Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001

(Promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de

Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência), ―deficiência‖ abrange

tanto as restrições permanentes, quanto as transitórias. Vejamos:

[...] o termo ‗deficiência‘ significa uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social.

182

Na Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes da ONU (Resolução

aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em 09/12/75),

não há referência à ―permanência‖. Assim, o termo ―deficiência‖, diz respeito a

―qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as

necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma

deficiência, congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais‖.183

181

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013. 182

BRASIL. Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001. Promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: D.O.U. de 09/10/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/d3956.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013 em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ decreto/2001/d3956.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 183

ONU. Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, 09 de dezembro de 1975, Nova York, USA. Disponível em: <

O Conselho Federal de Medicina, ao questionar a regularidade do Sistema

SABI, ressalta a inexistência de diretrizes técnico-científicas capazes de fixar, com

exatidão, o período de tempo necessário para um organismo recuperar-se de uma

doença. Pois,

[...] não existe, nos manuais médicos, protocolos ou diretrizes, do ponto de vista técnico-científico, nenhuma doença onde possam ser estabelecidos, com exatidão, períodos de tempo predeterminados ou preestabelecidos a serem concedidos para afastamento do trabalho visando a recuperação dos pacientes.

184

As alterações da Lei nº 12.435, de 2011 foram regulamentadas pelo Decreto

nº 7.617, de 2011, que modificou o Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007185,

condicionando a concessão do BPC à pessoa com deficiência à avaliação da

deficiência e do grau de impedimento, com base nos princípios da Classificação

Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF. Assim, passou-se a

exigir a realização de avaliação social, que considerará os fatores ambientais, sociais

e pessoais, e de avaliação médica, que considerará as deficiências nas funções e

nas estruturas do corpo. Por fim, ambas considerarão a limitação do desempenho de

atividades e a restrição da participação social, segundo suas especificidades. Isto

com a finalidade de ―comprovar a existência de impedimentos de longo prazo de

natureza física, mental, intelectual ou sensorial‖, bem como, ―aferir o grau de

restrição para a participação plena e efetiva da pessoa com deficiência na

sociedade, decorrente da interação dos impedimentos a que se refere o inciso I com

barreiras diversas‖ (art. 16, § 5o).186

http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:44IzQ7SEHOkJ:portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec_def.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acessado em: 25 nov. 2013. 184

BRASIL. Conselho Federal de medicina. PROCESSO-CONSULTA CFM N° 6.286/2001 PC/CFM/Nº 32/2003. A perícia médica é um ato médico e não pode ter seu resultado determinado por programa de informática, pois isto fere a autonomia do médico. Brasília: CFM, 2003. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/pareceres/CFM/2003/32_2003.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 185

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a lei n

o 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a lei n

o 10.741, de 1

o de outubro de 2003, acresce parágrafo

ao art. 162 do decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de

28/09/2007. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. 186

Id., Ibid., 2007.

Outrossim, a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1 de 24 de maio de 2011187

revogou a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 01, de 29 de maio de 2009,

estabelecendo novos critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social

e médico pericial da deficiência e do grau de incapacidade das pessoas com

deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social.

Assim, destaca-se na legislação pátria uma nova modalidade de avaliação da

deficiência e do grau de impedimento, com base nos princípios da Classificação

Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF, por meio de avaliação

social e avaliação médica. Verifica-se, portanto, que o sistema político passou a

comunicar a proteção assistencial à pessoa com deficiência conforme o ―modelo

social de deficiência‖. Além de a legislação já não se referir à deficiência como

―incapacidade para o trabalho‖, há um esforço pela inclusão da pessoa com

deficiência, estimulando-se as suas habilidades.

A própria Resolução n º 145, de 15 de outubro de 2004188, que instituiu a

Política Nacional de Assistência Social, chamou a atenção para a necessidade de se

observarem as ―capacidades‖:

[...] Uma visão social capaz de entender que a população tem necessidades, mas também possibilidades ou capacidades que devem e podem ser desenvolvidas. Assim, uma análise de situação não pode ser só das ausências, mas também das presenças até mesmo como desejos em superar a situação atual. Uma visão social capaz de identificar forças e não fragilidades que as diversas situações de vida possua. (Grifo nosso).

189

Neste mesmo sentido, o Decreto nº 6.949/2009 (Promulga a Convenção

Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo

Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007)190 estabelece como

187

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 188

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: CNAS/MDS, 2004. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/assistencia social/arquivo/Politica%20Nacional%20de%20Assistencia%20Social%202013%20PNAS% 202004%20e%202013%20NOBSUAS-sem%20marca.pdf>. Acessado em: 29 out. 2013. 189

Id., Ibid., 2004. 190

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em

compromisso dos Estados Partes ―promover a conscientização sobre as

capacidades e contribuições das pessoas com deficiência‖ (art. 8, 1. c), bem como,

―promover o reconhecimento das habilidades, dos méritos e das capacidades das

pessoas com deficiência e de sua contribuição ao local de trabalho e ao mercado

laboral‖ (art. 8, 2. iii).191

Com este objetivo, o art. 21-A, incluído pela Lei nº 12.470, de 2011192, prevê,

em caso de exercício de atividade remunerada pelo beneficiário do BPC, apenas a

suspensão do benefício. Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora,

o indivíduo poderá requerer a continuidade do pagamento do benefício suspenso,

sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do

grau de incapacidade. Outrossim, a contratação de pessoa com deficiência como

aprendiz não acarreta a suspensão do benefício de prestação continuada, limitado a

2 (dois) anos o recebimento concomitante da remuneração e do benefício.

A Lei nº 12.435/2011 dispôs ainda que ―o desenvolvimento das capacidades

cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas

de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou

cessação do benefício da pessoa com deficiência‖ (art. 21, § 3o).193

Observe-se que o Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS, por meio

da Resolução nº 18, de 24 de maio de 2012194, instituiu o Programa Nacional de

Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho – ACESSUAS-TRABALHO, com

objetivo de ―promover a integração dos usuários da assistência social ao mundo do

trabalho, por meio de ações articuladas e mobilização social‖.

30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013. 191

Id., Ibid., 2009. 192

BRASIL. Lei nº 12.470, de 31 de Agosto de 2011. Altera os arts. 21 e 24 da lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; altera os arts. 16, 72 e 77 da lei nº 8.213;altera os arts. 20 e 21 e acrescenta o art. 21-a à lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; e acrescenta os §§ 4o e 5o ao art. 968 da lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília: D.O.U. de 01/09/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12470.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 193

BRASIL. Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social. Brasília: D.O.U. de 07/07/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12435.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 194

BRASIL. Resolução nº 18, de 24 de maio de 2012. Institui o Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho – ACESSUAS-TRABALHO. D.O.U. nº 101 de 25.05.2012. Disponível em: <http://www.apaebrasil.org.br/noticia.phtml/46417>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Outrossim, a Portaria Interministerial nº 2, de agosto de 2012195, institui o

Programa de Promoção do Acesso das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do

Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social à Qualificação Profissional

e ao Mundo do Trabalho – Programa BPC Trabalho.

Nesta mesma esteira, a Portaria Normativa Interministerial nº 18, de 24 de

abril de 2007196, criou o Programa de Acompanhamento e Monitoramento do Acesso

e Permanência na Escola das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do Benefício

de Prestação Continuada da Assistência Social - BPC/LOAS – PROGRAMA BPC

NA ESCOLA.

2.2. Novos parâmetros para a análise administrativa da deficiência

O Benefício de Prestação Continuada integra a proteção social básica no âmbito

do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, instituído pelo Ministério do

Desenvolvimento Social e Combate à Fome (art. 1o, § 1o do Decreto nº 6.214, de 26 de

setembro de 2007)197. Compete ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate

à Fome, por intermédio da Secretaria Nacional de Assistência Social, a

implementação, a coordenação-geral, a regulação, financiamento, o monitoramento

e a avaliação da prestação do beneficio. O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS,

a seu turno, é o responsável pela operacionalização do Benefício de Prestação

Continuada (art. 2o e art. 3 o do Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007).

195

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Portaria Interministerial nº 2, de 2 de agosto de 2012. Institui o Programa de Promoção do Acesso das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social à Qualificação Profissional e ao Mundo do Trabalho - Programa BPC Trabalho. Brasília: D.O.U. de 03.08.2012 (nº 150, Seção 1, pág. 76). Disponível em: <http://www.apaebrasil.org.br/noticia.phtml/47165>. Acessado em: 25 nov. 2013. 196

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Portaria Interministerial nº 18, DE 24 DE ABRIL DE 2007. Cria o Programa de Acompanhamento e Monitoramento do Acesso e Permanência na Escola das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social - BPC/LOAS, com prioridade para aquelas na faixa etária de zero a dezoito anos. Brasília: D.O.U. de 26.04.2007. Disponível em: < http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2007/Portaria%20Interministerial%20no%2018-%20de%2024%20de%20abril%20de%202007.pdf>. Acessado em: 25 nov. 2013. 197

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Incumbe, privativamente, aos ocupantes do cargo de Perito Médico da

Previdência Social e, supletivamente, aos ocupantes do cargo de Supervisor

Médico-Pericial, a caracterização da invalidez para benefícios previdenciários e

assistenciais (art. 170, caput e parágrafo único, do Decreto nº 3.048, de 06 de maio

de 1999, com redação dada pelo Decreto nº 6.939, de 2009198; art. 2o da Lei

no 10.876/2004199).

O Perito Médico da Previdência Social poderá solicitar ao médico assistente

do beneficiário que forneça informações sobre antecedentes médicos a este

relativas (art. 170, parágrafo único, do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999200,

com redação dada pelo Decreto nº 6.939, de 2009). Outrossim, os Peritos poderão

requisitar exames complementares e pareceres especializados a serem realizados

por terceiros contratados ou conveniados pelo INSS, quando necessários ao

desempenho de suas atividades (art. 2o, parágrafo único, da Lei no 10.876, de 2 de

junho de 2004201).

Destarte, as avaliações médico-periciais deverão considerar a documentação

do médico-assistente e os resultados dos exames complementares, apresentados

pelo requerente.202 Neste mesmo sentido, a Turma Nacional de Uniformização, no

Processo nº 2006.83.00.521008-4, concluiu pela nulidade da decisão recorrida,

tendo em vista a não apreciação dos atestados médicos apresentados pela parte

autora.203 Outrossim, a Resolução nº 1.658/2002, do Conselho Federal de

198

BRASIL. Decreto nº 6.939, de 18 de agosto de 2009. Altera dispositivos do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999. Brasília: D.O.U. de 19/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6939.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 199

BRASIL. Lei no 10.876 - de 2 de junho de 2004 . Cria a Carreira de Perícia Médica da Previdência

Social, dispõe sobre a remuneração da Carreira de Supervisor Médico-Pericial do Quadro de Pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 3/6/2004. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2004/10876.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 200

BRASIL. Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999. Aprova o regulamento da previdência social, e dá outras providências.. Brasília: D.O.U. de 07/05/1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 201

BRASIL. Lei no 10.876 - de 2 de junho de 2004 . Cria a Carreira de Perícia Médica da Previdência

Social, dispõe sobre a remuneração da Carreira de Supervisor Médico-Pericial do Quadro de Pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 3/6/2004. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2004/10876.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 202

GONZAGA, Paulo. Perícia médica da previdência social. 4 ed. São Paulo : LTR, 2006. 203

KATO, Cesar Augusto; KAMPA, Rose. Direito constitucional à prova e a perícia médica previdenciária no juizado especial federal. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 69-115.

Medicina204 dispõe que o ―atestado médico goza da presunção de veracidade,

devendo ser acatado por quem de direito, salvo se houver divergência de

entendimento por médico da instituição ou perito‖.

Segundo a mesma Resolução, na elaboração do atestado médico, o médico

assistente indicará o provável tempo de repouso estimado necessário para a sua

recuperação. Contudo, compete apenas ao médico perito a decisão do benefício

previdenciário, utilizando-se termos como ―aposentadoria, invalidez definitiva,

readaptação‖. Assim, a utilização de termos previdenciários incumbe apenas aos

médicos peritos oficiais, sob pena de responsabilização ética do médico

assistente.205 Ademais, conforme o Manual de Perícia Médica da Previdência Social,

somente as conclusões médico-periciais prevalecerão para efeito de concessão e

manutenção dos benefícios por incapacidade, podendo ser contestadas na via

recursal da Previdência Social e no Judiciário.206

No que tange à avaliação social, de acordo com a Instrução Normativa

INSS/PRES nº 45, de 06 de agosto de 2010 e alterações207, as ações profissionais

do Serviço Social do INSS fundamentam-se no art. 88 da Lei nº 8.213, de 1991,

no art. 161 do Regulamento da Previdência Social e na Matriz Teórico-Metodológica

do Serviço Social da Previdência Social publicada em 1994. A Instrução normativa

aponta entre os recursos técnicos utilizados pelo Assistente Social o parecer social,

a pesquisa social, o cadastro das organizações da sociedade e a avaliação social da

204

BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM n.º 1.658/2002. Normatiza a emissão de atestados médicos e dá outras providências. (Parcialmente alterada pela Resolução CFM nº 1851, de 18.08.2008). Brasília: CFM, 2002. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2002/1658_2002.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 205

―São decisões neste sentido: CRM-AL (Resolução 2.061/95): considerou coerção o médico assistente determinar prazos em atestados ou laudos médicos, constrangedores aos peritos e auditores. CRM-PR (Parecer 1.713/06): ao determinar capacidade ou não para o trabalho, o médico assistente age como perito de paciente próprio, infringindo o CEM, art. 120. CRM-MG (Resolução 292/08): recomenda que não se utilizem em atestados determinações previdenciárias‖ (BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico : benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2012. p. 61-62). 206

BRASIL. Instituto Nacional de do Seguro Social. Diretoria de Benefícios. Coordenação Geral de Benefícios por incapacidade. Manual de Perícia Médica Previdência Social. Brasília: INSS. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/restritos/90/pericia/cap01.htm>. Acessado em: Acessado em: 25 nov. 2013. 207

BRASIL. Instrução normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de agosto de 2010. Dispõe sobre a administração de informações dos segurados, o reconhecimento, a manutenção e a revisão de direitos dos beneficiários da Previdência Social e disciplina o processo administrativo previdenciário no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Brasília: D.O.U. de 11/08/2010. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/38/inss-pres/2010/45_1.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

pessoa com deficiência aos requerentes do Benefício de Prestação Continuada -

BPC/LOAS.208

O Parecer Social consistiria, basicamente, no pronunciamento profissional do

Assistente Social, com base no estudo social, podendo ser emitido na fase de

concessão, manutenção, recurso de benefícios ou para embasar decisão médico-

pericial. Cabe ao assistente social a escolha do instrumento a ser utilizado para

elaboração do parecer (visitas, entrevistas colaterais ou outros).209

A pesquisa social constitui-se recurso técnico

[...] voltado para a busca do conhecimento crítico e interpretativo da realidade, favorecendo a identificação e a melhor caracterização das demandas dirigidas ao INSS e do perfil sócio-econômico cultural dos beneficiários como recursos para a qualificação dos serviços prestados.

210

O Cadastro das Organizações da Sociedade consiste em ―instrumento que

facilita a necessária articulação para o desenvolvimento do trabalho social e

atendimento aos usuários da Previdência Social‖. Finalmente, a avaliação social é

[...] instrumento destinado à caracterização da deficiência e do grau de incapacidade, e considerará os fatores ambientais, sociais, pessoais, a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social dos requerentes do Benefício de Prestação Continuada da pessoa portadora de deficiência.

211

Como dito acima, a legislação pátria (art. 16, caput, do Decreto nº 6.214, de

26 de setembro de 2007) passou a adotar, para a avaliação do direito ao benefício

de prestação continuada à pessoa com deficiência, a Classificação Internacional de

Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, estabelecida pela Resolução da

Organização Mundial da Saúde no 54.21, aprovada pela 54a Assembleia Mundial da

Saúde, em 22 de maio de 2001.212

208

Id., ibid., 2010. 209

Id., ibid., 2010. 210

id., ibid., 2010. 211

id., ibid., 2010. 212

O Conselho Nacional de Saúde emitiu a Resolução no 452, de 10 de maio de 2012, determinando

a utilização da CIF pelo SUS. Vide: BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 452, de 10 de maio de 2012. Brasília: CNS, 2012. Disponível em: < http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:009tCD2ZqY0J:conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso452.doc+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Observe-se que a ―CIF permite descrever situações relacionadas com a

funcionalidade do ser humano e as suas restrições‖213. Está organizada em duas

partes: (1) Funcionalidade e Incapacidade; (2) Fatores Contextuais. Cada uma

dessas partes possui dois componentes. A Funcionalidade e Incapacidade divide-se

em: componente corpo (sistemas orgânicos e estruturas do corpo); componente

Atividades e Participação (capacidade e desempenho). Os Fatores Contextuais

dividem-se em: Fatores Ambientais e Fatores Pessoais (compõem os fatores

contextuais, mas não estão classificados na CIF em razão da grande diversidade

cultural). A funcionalidade e a incapacidade são concebidas a partir da interação

dinâmica entre os estados de saúde e os fatores contextuais. 214 A seguir, as

definições no âmbito da CIF:

Funções do corpo são as funções fisiológicas dos sistemas orgânicos (incluindo as funções psicológicas). Estruturas do corpo são as partes anatómicas do corpo, tais como, órgãos, membros e seus componentes. Deficiências são problemas nas funções ou nas estruturas do corpo, tais como, um desvio importante ou uma perda. Atividade é a execução de uma tarefa ou ação por um indivíduo. Participação é o envolvimento de um indivíduo numa situação da vida real. Limitações de atividade são dificuldades que um indivíduo pode ter na execução de atividades. Restrições de participação são problemas que um indivíduo pode enfrentar quando está envolvido em situações da vida real Fatores ambientais constituem o ambiente físico, social e atitudinal em que as pessoas vivem e conduzem sua vida.

215 (Grifo nosso).

Conforme descrição da Organização Mundial da Saúde, a CID-10

(Classificação Internacional de Doenças, Décima Revisão) e a CIF são

complementares. As condições de saúde são classificadas na CID-10, com base

etiológica, proporcionando um diagnóstico. A CIF, por sua vez, fornece informações

adicionais acerca da funcionalidade e da incapacidade, associados aos estados de

saúde. Ou seja, a utilização de ambas as classificações permite uma avaliação mais

ampla da saúde, pois ―duas pessoas com a mesma doença podem ter níveis

213

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 214

id., ibid., 2003. 215

id., ibid., 2003.

diferentes de funcionamento, e duas pessoas com o mesmo nível de funcionamento

não têm necessariamente a mesma condição de saúde‖.216

O Decreto nº 6.214/2007 (com redação dada pelo Decreto nº 7.617, de

17/11/2011) estabeleceu diretrizes semelhantes, submetendo a concessão do

benefício à pessoa com deficiência à avaliação da deficiência e do grau de

impedimento, com base nos princípios da Classificação Internacional de

Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF. Em seguida, foi emitida a Portaria

Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011217, com o fim de estabelecer os

critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da

deficiência e do grau de incapacidade da pessoa com deficiência requerente do

Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social.218

Conforme a Portaria, a avaliação da deficiência e do grau de incapacidade é

constituída pelos componentes Fatores Ambientais; Atividades e Participação; e

Funções e Estruturas do Corpo. A Portaria prevê instrumentos para avaliação da

deficiência e do grau de incapacidade, destinados ao Assistente Social e ao Perito

Médico, assim dispostos:

I – Assistente Social: a) avaliação social, considerando e qualificando o componente ―Fatores Ambientais‖, por meio dos domínios: produtos e tecnologia; condições de moradia e mudanças ambientais; apoio e relacionamentos; atitudes; e serviços, sistemas e políticas; b) avaliação social, considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Social‖, para requerentes com idade igual ou superior a dezesseis anos, por meio dos domínios: vida doméstica; relações e interações interpessoais; áreas principais da vida; e vida comunitária, social e cívica; c) avaliação social, considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Social‖, para requerentes com idade de três a quinze anos, por meio dos domínios: relações e interações interpessoais; áreas principais da vida; vida comunitária, social e cívica;

216

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. 217

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 218

Observe-se que o Conselho Nacional de Saúde, por meio da Resolução nº 452, de 10 de maio de 2012 resolveu que a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF seria utilizada no Sistema Único de Saúde.

d) avaliação social, considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Social‖, para requerentes com idade de seis meses a dois anos, por meio dos domínios: relações e interações interpessoais; áreas principais da vida; e e) avaliação social, considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Social‖, para requerentes com idade inferior a seis meses, com valor máximo em todos os domínios, denotando dificuldade completa. II – Perito Médico: a) avaliação médico-pericial considerando e qualificando o componente ―Funções do Corpo‖, por meio dos domínios: funções mentais; funções sensoriais da visão; funções sensoriais da audição; funções da voz e da fala; funções do sistema cardiovascular; funções do sistema hematológico; funções do sistema imunológico; funções do sistema respiratório; funções do sistema digestivo; funções do sistema metabólico e endócrino; funções geniturinárias; funções neuromusculoesqueléticas e relacionadas ao movimento; e funções da pele; b) avaliação médico-pericial considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Médica‖, para requerentes com idade igual ou superior a três anos, por meio dos domínios: aprendizagem e aplicação de conhecimento; tarefas e demandas gerais; comunicação; mobilidade; e cuidado pessoal; c) avaliação médico-pericial considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Médica‖, para requerentes com idade de seis meses a dois anos, por meio dos domínios: aprendizagem e aplicação de conhecimento; tarefas e demandas gerais; comunicação; mobilidade; e d) avaliação médico-pericial considerando e qualificando o componente ―Atividades e Participação – Parte Médica‖, para requerentes com idade inferior a seis meses, com valor máximo em todos os domínios, denotando dificuldade completa. Art. 3º O Perito Médico do INSS identificará e justificará tecnicamente, em resposta ao quesito do instrumento de avaliação, a existência de alteração importante na estrutura do corpo que implique mau prognóstico, a ser considerado no qualificador final da deficiência. Art. 4º O Perito Médico do INSS responderá o quesito sobre a duração dos impedimentos incapacitantes do requerente do BPC, com vistas a avaliar a conformidade com o conceito de ―impedimentos de longo prazo‖ constante na definição de ―pessoas com deficiência‖ da Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, aprovados pelo Decreto Legislativo nº 186, de 2008, e promulgados pelo Decreto nº 6.949, de 2009, assinalando campo correspondente nos instrumentos de avaliação da deficiência e do grau de incapacidade. [...]

219

Para a qualificação dos ―fatores ambientais‖ consideram-se as barreiras

existentes, avaliando-se o ambiente social – relações de convívio familiar,

219

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013.

comunitário e social, considerando a acessibilidade às políticas públicas, a

vulnerabilidade e o risco pessoal e social a que a pessoa com deficiência está

submetida. Bem como, o ambiente físico – território onde vive e as condições de

vida presentes, considerando a acessibilidade, salubridade ou insalubridade. Por

sua vez, no componente ―funções do corpo‖, a avaliação médico-pericial qualificará

o grau de deficiência identificada. Por fim, para a qualificação do componente

―atividades e participação‖, as avaliações social e médico-pericial consideram as

dificuldades presentes, o impacto e a influência dos fatores ambientais na avaliação

do desempenho para atividades (execução de uma tarefa ou ação por um indivíduo)

e participação (ato de se envolver em uma situação real de vida). A seguir, os

domínios a serem avaliados, conforme a Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de

maio de 2011220:

AVALIAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA FATORES AMBIENTAIS I - PRODUTOS E TECNOLOGIA – e1: Refere-se a qualquer produto, instrumento, equipamento ou tecnologia, inclusive os adaptados ou especialmente projetados para melhorar a funcionalidade de uma pessoa incapacitada. Analisar conforme a necessidade do requerente. Indicadores = disponibilidade; acesso com dificuldade (despesa, distância geográfica entre o domicílio e o local de acesso, qualidade e periodicidade). II – CONDIÇÕES DE MORADIA E MUDANÇAS AMBIENTAIS – e2: Refere-se ao ambiente natural ou físico. Indicadores = grau de vulnerabilidade e de risco social (acessibilidade, privacidade da moradia, insalubridade e precarização do ambiente). III – APOIO E RELACIONAMENTOS – e3: Refere-se às pessoas que fornecem proteção, apoio físico ou emocional. Refere-se ainda, aos relacionamentos com outras pessoas, na casa, na comunidade, escola ou apoio em outros aspectos das suas atividades diárias. Indicadores = Inexistência de apoio e relacionamentos; apoio e relacionamentos insatisfatórios, que dificultam o convívio no âmbito das relações familiares, comunitárias, institucionais e sociais. IV – ATITUDES – e4: Refere-se às atitudes que são as consequências observáveis dos costumes, práticas, ideologias, valores e normas. Essas atitudes influenciam o comportamento individual e a vida social em todos os níveis, dos relacionamentos interpessoais e sociais às estruturas políticas, econômicas e legais. Indicadores = atitudes preconceituosas, discriminatórias e/ou negligentes, que influenciam o comportamento e as ações da pessoa com deficiência. V – SERVIÇOS, SISTEMAS E POLÍTICAS – e5: Refere-se à rede de serviços, sistemas e políticas garantidoras de proteção social. Indicadores = Não tem acesso, pela distância ou inexistência do serviço, ou o acesso disponível não supre suas necessidades. ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO – PARTE SOCIAL

220

Id, Ibid., 2011.

VI - VIDA DOMÉSTICA – d6: Refere-se à realização de ações e tarefas domésticas do dia a dia. Exemplo: limpeza e reparos domésticos, cuidar de objetos pessoais, da casa e ajudar os outros. Indicadores = limitação no desempenho para executar uma tarefa ou tarefas com auxílio ou assistência pessoal. VII - RELAÇÕES E INTERAÇÕES INTERPESSOAIS – d7: Refere-se à realização de ações e condutas necessárias para estabelecer interações pessoais, de maneira contextual e socialmente estabelecidas com outras pessoas (estranhos, amigos, familiares e companheiros). Indicadores = limitação no desempenho para manter relações interpessoais e controlar comportamentos de maneira contextual e socialmente estabelecida. VIII - ÁREAS PRINCIPAIS DA VIDA - d8: Refere-se à realização das tarefas e ações necessárias para participar das atividades de educação e transações econômicas. Indicadores = limitação no desempenho em participar e executar determinada tarefa. IX – VIDA COMUNITÁRIA, SOCIAL E CÍVICA - d9: Refere-se às ações e tarefas necessárias para participar da vida social organizada fora do âmbito familiar, em áreas da vida comunitária, social e cívica. Indicadores = limitação no desempenho em participar e realizar atividades relacionadas à vida comunitária, social e cívica. AVALIAÇÃO MÉDICO-PERICIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA FUNÇÕES DO CORPO X - FUNÇÕES MENTAIS - b1 XI – FUNÇÕES SENSORIAIS DA VISÃO - b2 XII – FUNÇÕES SENSORIAIS DA AUDIÇÃO - b2 XIII – FUNÇÕES DA VOZ E DA FALA - b3 XIV - FUNÇÕES DO SISTEMA CARDIOVASCULAR - b4 XV - FUNÇÕES DO SISTEMA HEMATOLÓGICO - b4 XVI – FUNÇÕES DO SISTEMA IMUNOLÓGICO - b4 XVII – FUNÇÕES DO SISTEMA RESPIRATÓRIO - b4 XVIII – FUNÇÕES DO SISTEMA DIGESTIVO - b5 XIX – FUNÇÕES DOS SISTEMAS METABÓLICO E ENDÓCRINO - b5 XX - FUNÇÕES GENITURINÁRIAS - b6 XXI – FUNÇÕES NEUROMUSCULOESQUELÉTICAS E RELACIONADAS AO MOVIMENTO - b7 XXII – FUNÇÕES DA PELE - b8 EXISTE ALTERAÇÃO IMPORTANTE NA ESTRUTURA DO CORPO, QUE CONFIGURE MAU PROGNÓSTICO NESTE MOMENTO ? ( ) Não ( ) Não é possível prognosticar ( ) Sim Justifique: [ _ _ _ _ TEXTO _ _ _ _ ] ATIVIDADES E PARTICIPAÇÃO – PARTE MÉDICA XXIII – APRENDIZAGEM E APLICAÇÃO DE CONHECIMENTO - d1: Refere-se ao desempenho em aprender, aplicar o conhecimento aprendido, pensar, resolver problemas e tomar decisões. XXIV – TAREFAS E DEMANDAS GERAIS - d2: Refere-se aos aspectos gerais da execução de uma única tarefa ou de várias tarefas, organização de rotinas e superação do estresse. XXV – COMUNICAÇÃO - d3: Refere-se às características gerais e específicas da comunicação, por meio da linguagem, sinais e símbolos, incluindo a recepção e produção de mensagens, manutenção da conversação e utilização de dispositivos e técnicas de comunicação.

XXVI – MOBILIDADE - d4: Refere-se ao movimento de mudar o corpo de posição ou de lugar, carregar, mover ou manipular objetos, ao andar ou deslocar-se. XXVII - CUIDADO PESSOAL - d5: Refere-se ao cuidado pessoal como lavar-se e secar-se, cuidar do próprio corpo e de parte do corpo, vestir-se, comer, beber e cuidar da própria saúde. A DEFICIÊNCIA IMPLICA IMPEDIMENTOS DE LONGO PRAZO? (Igual ou superior a 2 anos ) ( ) Sim ( ) Não é possível prever neste momento, mas há chances dos impedimentos se estenderem por longo prazo ( ) Não Justifique: [ _ _ _ _ TEXTO _ _ _ _ ]

A Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011221 implementou

diversas alterações em relação ao texto anterior, sendo as principais as que

seguem. Na nova versão, qualificado o componente ―Funções do corpo‖, o Perito

Médico do INSS identificará a existência de alteração importante na estrutura do

corpo, que implique mau prognóstico no momento atual. A existência de tal situação

resulta na elevação do qualificador atribuído ao componente Funções do Corpo em

um nível (de N para L; de L para M; de M para G; de G para C; e C será mantido em

C), para fins de análise do direito na Tabela Conclusiva de Qualificadores.222

Outrossim, na nova versão dos instrumentos de avaliação, nenhum dos

domínios do componente ―Atividades e Participação‖ é avaliado em crianças

menores de 6 meses de idade, recebendo automaticamente qualificação máxima,

indicativa de dificuldade completa (C = 4).223

Ademais, impende ressaltar, no que se refere ao componente ―Fatores

Ambientais‖, a CIF qualifica tanto as barreiras como os facilitadores, contudo, na

avaliação para fins do BPC, qualificam-se apenas as barreiras existentes, sendo os

facilitadores considerados, mas não qualificados. Bem como, os ―Fatores pessoais‖

(sexo, raça, idade, escolaridade, outros estados de saúde, condição física, estilo de

221

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 222

Id., ibid., 2011. 223

Id., ibid., 2011.

vida, hábitos etc) são levados em consideração no processo de avaliação, tal qual

na CIF, mas não são qualificados. 224

De acordo com a Portaria, os resultados dos componentes ―Fatores

ambientais‖, ―Atividades e participação‖ e ―Funções do corpo‖, qualificadas as

barreiras, dificuldades ou deficiências como nenhuma (N), leve (L), moderada (M),

grave (G) e completa (C), geram uma Tabela Conclusiva de Qualificadores que

define a concessão ou indeferimento do benefício.225

No que se refere aos componentes, ―Fatores Ambientais‖ e ―Atividades e

Participação‖, o qualificador final será a média ponderada dos qualificadores

atribuídos pelos avaliadores aos respectivos domínios. Como já foi dito

anteriormente, se algum domínio do componente ―Atividades e Participação‖ deixar

de ser avaliado, será, automaticamente, qualificado pelo sistema como dificuldade

completa.226

Por sua vez, no componente ―Funções do Corpo‖, o qualificador final

corresponde ao maior qualificador atribuído a qualquer dos domínios avaliados,

exceto se recair em ―Funções da voz e fala‖ e/ou ―Funções da pele‖.227

Caso o maior qualificador tiver sido atribuído a ―Funções da voz e fala‖ e/ou

―Funções da pele‖, o qualificador final corresponderá à média ponderada dos

qualificadores atribuídos a todos os domínios do componente ―Funções do Corpo‖,

isto se ―o ‗qualificador final médio ajustado‘ obtido seja superior ao maior qualificador

atribuído a qualquer dos demais domínios (b1, b2, b3, b4, b5, b6 e/ou b7)

isoladamente‖.228

224

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 434-439. 225

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 226

MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 441. 227

Id., ibid., 2011. 228

Id., ibid., 2011. p. 441-442.

Nas situações em que ―esse ‗qualificador final médio ajustado‘ calculado no

exemplo anterior seja inferior ao maior qualificador atribuído a qualquer outro

domínio (isoladamente). Nestes casos, o maior valor atribuído a um desses domínios

prevalece como qualificador final do componente ‗Funções do Corpo‘.‖ 229

Por fim, repita-se, ao ―final da avaliação médico-pericial do componente

‗Funções do Corpo‘, o profissional deverá responder a um quesito sobre a existência

de alteração importante na estrutura do corpo, que implique mau prognóstico

naquele momento‖.230 Apesar de o cálculo da média entre os qualificadores ser um

método questionável para a avaliação da deficiência, como já exposto acima,

podemos observar na Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011 a

preocupação com a avaliação de indicadores que ultrapassam a existência ou

inexistência de doença.

2.3 Perícia Judicial e a avaliação da deficiência em juízo

A partir da leitura do primeiro capítulo, verifica-se a construção de um modelo

social de deficiência, em substituição ao modelo médico. Nos itens anteriores,

demonstrou-se que tais modificações tiveram, inclusive, reflexo no sistema político,

com a promulgação de leis, decretos e portarias visando à implementação desta

nova modalidade de avaliação com base nos princípios da Classificação Internacional

de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF, com vistas à concessão do

benefício de prestação continuada.

Como explanado acima, a Convenção de Nova York adotou o modelo social

de deficiência, segundo o qual, os impedimentos de natureza física, mental,

intelectual ou sensorial devem ser avaliados em interação com as diversas barreiras,

a fim de verificar se há restrição da participação plena e efetiva da pessoa, na

sociedade, em igualdades de condições com as demais. Tal conceito foi incorporado

pela LOAS, em sua redação atual, dada pela Lei nº 12.470/2011231, com vista à

concessão do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência.

229

Id., ibid., 2011. p. 442. 230

Id., ibid., 2011. p. 442. 231

BRASIL. Lei nº 12.470, de 31 de Agosto de 2011. Altera os arts. 21 e 24 da lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; altera os arts. 16, 72 e 77 da lei nº 8.213;altera os arts. 20 e 21 e acrescenta o art. 21-a à lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; e acrescenta os §§ 4o e 5o ao art. 968 da lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília: D.O.U. de 01/09/2011. Disponível em:

O Decreto nº 6.214/2007232 (com redação dada pelo Decreto nº 7.617, de

17/11/2011) estabeleceu diretrizes semelhantes, submetendo a concessão do

benefício à pessoa com deficiência à avaliação da deficiência e do grau de

impedimento, com base nos princípios da Classificação Internacional de

Funcionalidades, Incapacidade e Saúde. Em seguida, foi emitida a Portaria Conjunta

MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011233, com o fim de estabelecer os critérios,

procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da

deficiência e do grau de incapacidade da pessoa com deficiência requerente do

Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social.

Ocorre que, com o indeferimento Administrativo, o sistema do direito, por

meio da organização da jurisdição, é solicitado a apresentar respostas às demandas

sociais. Contudo, tais fatos externos (novo conceito de deficiência definido

socialmente, reflexos na legislação pátria) serão processados internamente de

acordo com os contornos delineados pelo próprio sistema do direito. Ademais, na

Teoria dos Sistemas Sociais de Luhmann, nem todas as situações sociais terão

valor de informação para o sistema, o qual poderá permanecer indiferente.

Para os sistemas de sentido, como são os sistemas da sociedade em

Luhmann, ―o mundo é um potencial de surpresas ilimitado; é informação virtual que,

não obstante, necessita de sistemas para gerar informações; ou, melhor dizendo,

para dar-lhe o sentido de informação a certas irritações selecionadas‖.234

Com vistas à compreensão de como está sendo comunicado o direito à

assistência social à pessoa com deficiência, observamos os JEFs em Recife como

organização do sistema do direito que opera autonomamente (em relação ao

sistema do direito como um todo). Questionamos como os JEFs, a partir de seus

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12470.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. 232

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 233

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 234

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 29.

procedimentos, têm avaliado a deficiência para fins de concessão do benefício de

prestação continuada. Como será demonstrado adiante, a pesquisa de dados

apontou que os juízes dirigem os processos sem submeter-se aos dispositivos

previstos no Decreto nº 6.214/2007235 e na Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24

de maio de 2011236. Assim sendo, evidenciou-se a autonomia da organização

jurisdicional na fixação dos procedimentos a serem adotados para se avaliar a

deficiência, bem como, na comunicação de um conceito próprio de deficiência e de

direito à assistência social, desatrelado do Decreto e da Portaria, no que tange às

perícias efetuadas, bem como, aos quesitos avaliados.

Por essa razão, impende fazer breve digressão acerca do conceito de ―prova

judicial‖. Segundo Moacyr Amaral Santos, juridicamente, o termo ―prova‖ é

empregado em várias acepções. Pode significar ―a produção dos atos ou dos meios

com os quais as partes ou o juiz entendem a verdade dos fatos alegados‖. Pode

significar ―o meio de prova considerado em si mesmo‖ ou ―o resultado dos atos ou

dos meios produzidos na apuração da verdade‖. Provar, contudo, é o ―meio utilizado

para persuadir o espírito de uma verdade‖. O autor fala da ―verdade relativa, não da

verdade absoluta, sempre procurada, nunca alcançada‖.237

O Código de Processo Civil, no art. 332, emprega a palavra ―prova‖ como

sinônimo de meio de prova ou instrumento.238 Seriam eles o depoimento pessoal e

confissão, a prova documental, a prova testemunhal, a inspeção judicial, a prova

pericial etc..

São objetos de prova os fatos: relevantes (que possam influenciar o

julgamento da lide); pertinentes (que têm relação direta ou indireta com a causa);

controversos (afirmados por uma das partes e impugnados pela outra, vedado ao

235

BRASIL. Decreto nº 6.214, de 29 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 236

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. 237

SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. vol. I - 5ª ed.- São Paulo: Saraiva, 1983. p. 2. 238

SILVA, Ovídio, A. Baptista da. Curso de processo civil: processo de conhecimento. vol. 1. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 339.

juiz introduzir fatos ou fundamentos novos); e precisos (que indicam situações

determinadas ou específicas).239

Dada a relevância que a legislação atribuiu às perícias sociais e médicas na

avaliação da deficiência nos moldes da Classificação de Funcionalidade,

Incapacidade e Saúde - CIF, neste momento, destaca-se a perícia judicial como

elemento central na apreciação do direito ao benefício de prestação continuada em

juízo. A perícia judicial (ou prova pericial) tem lugar ―quando o fato probando exigir

conhecimentos especiais de natureza técnica ou científica‖.240

No que concerne à instrução processual, a Lei nº 9.099/1995241 admite todos

os meios de prova moralmente legítimos, ainda que não especificados em lei (art.

32). Por sua vez, o art. 12 da Lei nº 10.259/2001242 prevê a nomeação de pessoa

habilitada para a realização de exame técnico. Outrossim, o § 2o do art. 12, da Lei nº

10.259 dispõe, expressamente, que ―nas ações previdenciárias e relativas à

assistência social, havendo designação de exame, serão as partes intimadas para,

em dez dias, apresentar quesitos e indicar assistentes‖. Assim, percebe-se a ênfase

dada ao exame pericial nas lides desta natureza.243

A Lei nº 10.259/2001, igualmente, refere-se à inspeção judicial em pessoas ou

coisas, de ofício ou a requerimento das partes, a ser realizada pelo juiz,

pessoalmente ou por meio de pessoa de sua confiança, que lhe relatará

informalmente o verificado (art. 35, parágrafo único).244

Para a realização da perícia judicial, o juiz formulará os quesitos que entender

necessários, bem como, apreciará a pertinência dos quesitos apresentados pelas

239

LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo,Revista dos Tribunais, 2007. p. 77. 240

SILVA, Ovídio, A. Baptista da. Curso de processo civil: processo de conhecimento. vol. 1. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 367. 241

BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais e dá outras providências. Brasília: D.O.U. 27 de setembro de 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 242

BRASIL. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Brasília: D.O.U. de 13/07/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10259.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 243

TOURINHO NETO, Fernando da Costa; FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais federais cíveis e criminais: comentários à Lei 10.259, de 12.07.2001. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. 244

BRASIL. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Brasília: D.O.U. de 13/07/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10259.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

partes (arts. 425 e 426, CPC245). Para o desempenho de sua função, podem o perito

e os assistentes técnicos utilizar de todos os meios necessários, ouvindo

testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder

de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas,

desenhos, fotografias e outras quaisquer peças (art. 429, CPC). Tratando-se de

perícia complexa, que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, o

juiz poderá nomear mais de um perito e a parte indicar mais de um assistente

técnico (art. 431-B, CPC).

Nem sempre é possível a nomeação de peritos especializados, o que

possibilitaria a arguição de que o laudo estaria cientificamente incorreto ou possuiria

baixa qualidade técnica (art. 424, I do CPC).246 Insta observar, contudo, que,

segundo o art. 17 da Lei no 3.268/1957 e o Parecer CFM 19/1998, o médico está

habilitado para exercer suas atividades profissionais em qualquer área,

independentemente da especialidade, estando proibido apenas de anunciar

especialidade que não possua.247

A Lei dos Juizados Especiais ressalta a liberdade do juiz para determinar as

provas a serem produzidas, para apreciá-las e para dar especial valor às regras de

experiência comum ou técnica (art. 5º, Lei nº 9.099/1995)248. Esta informação

adquirirá relevância quando da análise dos dados coletados, uma vez que o parecer

médico judicial assume uma posição central na comunicação desenvolvida no

âmbito dos JEFs, posto que é utilizado como ―razão de decidir‖ nas sentenças e

acórdãos.

Assim, diante da relevância da perícia judicial nas ações envolvendo o

benefício de prestação continuada, impende destacar que doutrinadores como

Marinoni e Arenhart discutem a legitimidade do resultado da perícia judicial em razão

da maior ou menor participação das partes na sua formação. Bem como, apontam a

importância da indicação, nas sentenças e acórdãos, dos fatos controvertidos e das

245

BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Brasília: D.O.U. de 17/01/1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 246

FARAH, Elias. Perícia médica. In: Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo : Nova Série, v. 15, n. 30, p. 371-402, jul./dez. 2012. 247

BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2012. 248

BRASIL. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais e dá outras providências. Brasília: D.O.U. 27 de setembro de 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

provas admitidas e produzidas, permitindo-se o controle sobre o objeto da valoração

do juiz, evitando-se a valoração de prova não produzida. Além da mera indicação,

esses doutrinadores entendem necessária a explicação do conteúdo da perícia com

o fim de verificar o entendimento do juiz acerca das provas e verificar se os

elementos constantes nos autos foram distorcidos.249

Ressaltam que, antes do juiz estabelecer a ligação entre a prova e o fato,

deverá valorar a sua credibilidade e idoneidade, inclusive para fins de

esclarecimentos, conforme o art. 435, CPC, ou realização de uma segunda perícia,

na forma do art. 438, CPC. Bem como, além da valoração individualizada, advertem

que os elementos do processo deverão ser avaliados conjuntamente, em diálogo.250

Observe-se que, nos casos em que são realizadas perícias especializadas,

separadamente, pode-se concluir que as patologias analisadas de forma isolada não

são incapacitantes, quando, se analisadas em conjunto, poderiam alcançar resultado

distinto.251

Para Marinoni e Arenhart, não bastaria ao julgador mencionar as provas que o

convenceram, mas demonstrar o porquê das provas produzidas pela parte

perdedora não o convenceram. No caso de utilização de regra da experiência

técnica, o ―juiz deverá não apenas referir e explicar a regra científica, como também

precisar o grau e a qualidade da sua aceitação, além de contextualizá-la em face do

litígio e das eventuais outras provas e presunções‖.252

Ocorre que esses mesmos autores posicionam-se no sentido de que a prova

pericial, por ser uma ―prova técnica‖, possuiria maior possibilidade de convencer o

juiz, razão pela qual, em caso de decisão conflitante, caberia ao magistrado ―explicar

por que a prova pericial não foi suficiente para esclarecer os fatos e fez com que o

julgamento de apoiasse nas outras provas, ou por que os esclarecimentos

solicitados ou a segunda perícia não puderam suprir as suas imperfeições‖.253 Neste

mesmo sentido, Ovídio Baptista entende que, apesar de as conclusões emitidas no

249

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. 2 ed . p. 286- 287, 792. 250

Id., ibid., p. 287-299. 251

KATO, Cesar Augusto; KAMPA, Rose. Direito constitucional à prova e a perícia médica previdenciária no juizado especial federal. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 69-115. 252

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. 2 ed . p. 287-299. 253

id., ibid., p. 819.

laudo pericial não sejam vinculativas para o juiz, que pode formar seu

convencimento com base em outros elementos de prova, esta rejeição deverá ser

fundamentada. 254

Ademais, a prática tem demonstrado que a quantidade de demandas judiciais

―acaba induzindo o juiz a um raciocínio de simples homologação da conclusão

pericial e ainda, com tendência de confirmação por seus próprios fundamentos as

sentenças atacadas pela via recursal‖.255 Nos Juizados Especiais, notadamente, a

informalidade e simplicidade dos atos processuais, com o fim de combater o

formalismo excessivo, com o passar do tempo tornaram-se ―verdadeira precarização

do processo e das prerrogativas processuais‖.256 Exemplifica-se.

Uma vez que não há exigência pelo patrocínio de advogado na causa, os

autores dirigem-se ao setor de atermação dos Juizados Especiais Federais, onde os

próprios servidores que fazem o atendimento ao público preparam a ―demanda‖. Em

determinados casos, há a inserção de vários pedidos revisionais de benefício

previdenciário, fundamentando-se em diversas teses revisionais de modo

indiscriminado, podendo ensejar a formação de coisa julgada, acarretando em

prejuízo ao direito do segurado.257

Outro ponto questionado diz respeito à irrecorribilidade das interlocutórias em

sede de Juizados Especiais Cíveis, principalmente no que tange às decisões

proferidas em sede de execução. Não existindo tal previsão, as partes têm que

utilizar o mandado de segurança como sucedâneo de recurso.258

Outrossim, a dispensa de relatório (art. 38 da Lei nº 9099/95), em razão dos

princípios da simplicidade, informalidade e celeridade poderá acarretar em prejuízo

254

SILVA, Ovídio, A. Baptista da. Curso de processo civil: processo de conhecimento. 7.ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2005. v.1. p. 369. 255

KATO, Cesar Augusto; KAMPA, Rose. Direito constitucional à prova e a perícia médica previdenciária no juizado especial federal. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. p. 69-115. p. 88. 256

SERAU JR., DONOSO, Denis. Os Juizados Especiais Federais e a retórica do acesso à justiça. In: SERAU JR., DONOSO, Denis (Coord.). Juizados especiais federais : reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. p. 22. 257

id., ibid., 2012. 258

CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis estaduais e federais : uma abordagem crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.

do contraditório no processo, tendo ―produzido verdadeiras decisões despidas de

fundamentação‖.259

Discute-se, ademais, a legitimidade da motivação per relationem. Conforme o

art. 46 da Lei nº 9099/95, o julgamento em segunda instância constará apenas da

ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte

dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do

julgamento servirá de acórdão. Ocorre que, utilizando-se deste dispositivo, alguns

julgadores têm renunciado integralmente suas justificativas, ―fazendo como se

fossem suas as argumentações constantes no julgado anterior. Na nova decisão, o

juiz não revela qualquer opinião própria a respeito do que está decidindo‖.260

Os fenômenos apontados acima, contudo, não podem ser compreendidos

isoladamente. Os Juizados Especiais foram idealizados com a finalidade, dentre

outras, de combater a denominada ―litigiosidade contida‖, bem como, possibilitar o

acesso à justiça a uma ampla gama da sociedade, até então marginalizada.

Estimava-se que, em dez anos, os JEFs teriam cerca de 200 mil processos. Ocorre

que as previsões iniciais foram em muito superadas261, em 2012 a Justiça Federal

Comum obteve um total de 966.868 casos novos, enquanto que os Juizados

Especiais Federais alcançaram o número de 1.178.802 casos novos.262

Ademais, em relatório elaborado pelo CNJ, constatou-se que o Instituto

Nacional do Seguro Social figura como principal litigante no Judiciário, presente em

79% das Ações dos Juizados Especiais Federais no período de 01/01/11 a

31/10/2011.263

Assim, neste panorama que deveremos compreender a proteção assistencial

à pessoa com deficiência no que diz respeito aos litígios que envolvem a concessão

259

SERAU JR., DONOSO, Denis. Os Juizados Especiais Federais e a retórica do acesso à justiça. In: SERAU JR., DONOSO, Denis (Coord.). Juizados especiais federais : reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba : Juruá, 2012. p. 26. 260

FELISBERTO, Adriano Cesar; IOCOHAMA, Celso Hiroshi. O princípio da motivação nas decisões judiciais de segunda instância dos juizados especiais cíveis = The principle of motivation in the judgments of the second instance of the special civil court. In: Revista de processo, v. 35, n. 190, p. 127-153, dez.2010. p. 132. 261

MENDES, Gilmar Ferreira: um divisor de águas na história da justiça federal. Revista CEJ, v. 15, p. 8-14, jul. 2011. 262

BRASIL Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2013: ano-base 2012. Brasília: DPI/CNJ, 2012. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/relatorio_jn2013.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013. 263

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. 100 Maiores Litigantes. Brasília: DPI/CNJ, 2012. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/100_maiores_l itigantes.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013.

do BPC: uma imensa demanda dos JEFs, tendo superado as expectativas iniciais;

uma Justiça especializada que possui como principal litigante a Autarquia

Previdenciária; no polo ativo, a hipossuficiência do beneficiário do BPC; o impasse

entre a prestação jurisdicional célere e a qualidade dos julgamentos.

A análise dos dados coletados evidencia a preferência pela utilização das

informações obtidas por meio da perícia médica judicial nas sentenças e acórdãos,

em textos bastante simplificados, isto a despeito da existência de outros elementos

nos processos. Conforme será demonstrado, ignora-se a análise social na avaliação

da deficiência, conforme preceitos da CIF. Por fim, há limitação na possibilidade de

comunicação, haja vista que a realização de audiências dá-se em um número

restrito de processos, o mesmo se diga em relação a oportunidade para as partes

manifestarem-se acerca dos conteúdos das perícias médicas judiciais, periciais

sociais, mandados de verificação e documentação juntada aos autos. Tais

procedimentos acarretarão no afastamento das decisões judiciais nos JEFs em

relação à Convenção de Nova York e à LOAS. É o que se passa a demonstrar.

3 O direito da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada

comunicado nos juizados especiais federais

Neste momento, passamos a analisar como se têm realizado as

comunicações nos processos para concessão do BPC à pessoa com deficiência nos

JEFs em Recife. Para tanto, impende destacar que o conceito de comunicação em

Luhmann, adotado nesta pesquisa, afasta-se da concepção tradicional de

comunicação como processo de duas cifras, em que há transmissão de informações

do emissor ao receptor. Na metáfora da transmissão, a atenção volta-se para o

emissor e para o ato de comunicar, entendendo-se que há unidade de significado,

tanto para o emissor quanto para o receptor, do conteúdo que se transmite. Do

contrário, na teoria dos sistemas sociais, a comunicação é um processo de três

seleções: unidade de informação, ato de comunicar e ato de entender. Assim, a

comunicação se realiza quando há compreensão, independentemente da aceitação

ou da rejeição do conteúdo comunicado. De outra banda, a comunicação provoca a

possibilidade de rejeição, resistência.264

Luhmann realiza uma abstração conceitual, enumerando os seguintes

sistemas: máquinas; organismos; sistemas sociais e; sistemas psíquicos. Os

sistemas sociais são: interações; organizações e; sociedades.265 O sistema

sociedade não se define a partir de uma essência ou por uma moral determinadas,

mas, unicamente, pela operação que produz e reproduz a sociedade, qual seja, a

comunicação. Como já explanado, é o sistema oniabarcador, abrangente de todas

as comunicações.266

Ademais, diferencia as comunicações realizadas pelos sistemas de interação

e pelas organizações. Para Luhmann, ―os sistemas de interação se formam quando

se utiliza a presença de pessoas para resolver o problema da dupla contingência

através da comunicação‖.267 A evolução das estruturas sociais influi na relação entre

interação e sociedade, principalmente pelo desenvolvimento de técnicas de

comunicação sem interação, como a escrita e a imprensa. Com as formas de

diferenciação dos sistemas da sociedade, são diferenciados e especificados os

264

LUHMANN, Niklas. Sistemas Sociales: Lineamentos para uma teoría general. Barcelona: Anthropos. 1998. p. 141-149. 265

Id., Ibid. p. 27. 266

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 48-55 267

Id., Ibid., p. 645.

modos de interação no interior dos sistemas funcionais e de suas organizações, a

exemplo das audiências em juízo.268

Enquanto as interações estão presentes em todas as sociedades, as

organizações são uma aquisição evolutiva e pressupõem um nível de

desenvolvimento relativamente alto. A organização, assim como a sociedade e a

interação, é ―uma forma determinada de trato com a dupla contingência‖.269 São

―sistemas autopoiéticos, que se produzem e se reproduzem a si mesmos por meio

de operações próprias‖.270 Distinguem-se de outros sistemas autopoiéticos mediante

decisões, ―transformam a incerteza em certeza, através da conexão de decisões‖,

recordando e antecipando outras operações do mesmo sistema.271

Como sistemas autopoiéticos, as organizações são sistemas fechados e, por

isso, autônomos. Suas próprias estruturas regulam por meio de que informações o

sistema se deixa irritar, razão pela qual o entorno é uma construção própria da

organização. Reconhece-se o fechamento operativo do sistema organizacional

tendo por base suas decisões próprias, que servem de premissa a decisões

posteriores, absorvendo-se a incerteza (rede de decisões recursivas). Além de

requerer um ―contínuo reabastecimento de informações e motivos‖, o que se dá pelo

próprio sistema, o processo de tomada de decisões também ―captura estímulos que

provém do entorno‖, bem como, produz efeitos em outros sistemas autopoiéticos.

Neste processo de decisão e processamento de sentido, simultaneamente à

redução de incerteza e ao aclaramento de ambivalências, regeneram-se incerteza e

ambivalência.272

Apesar da possibilidade de se formarem organizações sem relação com

quaisquer sistemas funcionais da sociedade, as organizações jurídicas formam-se

dentro do sistema do direito ―para a realização das operações próprias da

organização e para a execução do primado da função do sistema funcional‖.273

Ressalte-se que nenhuma organização abrangerá todas as operações do sistema,

razão pela qual há educação fora das escolas, tratamentos médicos fora dos

268

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 643-653. 269

Id., Ibid., p. 655-657. 270

LUHMANN, Niklas. Organización e decisión. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2010. p. 25. 271

Id., Ibid., p. 70-71. 272

Id., Ibid., p. 90-101. 273

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 667.

hospitais, atividades políticas fora do Estado e, naturalmente, direito fora das

organizações jurídicas (tribunais, em particular).274

Formam-se organizações no interior de sistemas funcionais uma vez que

esses últimos não possuem mecanismos de exclusão, enquanto as organizações

―selecionam o que admitem‖, regulam o comportamento dentro de sistemas

funcionais, organizam o trabalho, a profissionalização, submetem a instruções etc.275

Ademais, as organizações são os únicos sistemas sociais que podem se comunicar

com o entorno.276

Os referidos conceitos são pertinentes na compreensão do objeto desta

pesquisa na medida em que situamos os JEFs como organizações do sistema do

direito que comunicam um sentido de direito à assistência social à pessoa com

deficiência por meio de sua ―rede de decisões recursivas‖. De outra banda, o

entorno também produz estímulos nos JEFs. Nosso próximo passo será demonstrar

como se têm realizado tais comunicações.

3.1 Juizados Especiais: simplificação de ritos e restrição da comunicação

Nos processos analisados nos Juizados Especiais Federais em Recife,

identificou-se que a simplificação dos ritos implica na impossibilidade de aferição dos

requisitos para a concessão do BPC à pessoa com deficiência conforme delineados

na legislação. Ou seja, a impossibilidade de identificar-se a existência de

―impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os

quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e

efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas‖.277

Tal fato se dá, inclusive, pela inobservância de dispositivos considerados

―norteadores‖ desta justiça especializada, a saber, a oralidade, a informalidade, a

autocomposição, a imediação, dentre outros. Com efeito, a simplificação dos

procedimentos, suprimindo-se as audiências e a possibilidade de manifestação das

274

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 667. 275

RODRÍGUEZ, Darío Rodríguez; MANSILLA, Javier Torres Nafarrate. Introdución a la Teoría de la sociedad de Niklas Luhmann. México: Herder, 2008. p. 480. 276

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2007. p. 668. 277

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

partes, bem como, limitando-se o contato entre as partes e o magistrado, tem

causado prejuízo à aferição do direito em discussão nos moldes previstos na

legislação.

O que se detectou foi a restrição da possibilidade de comunicação a

determinados observadores, especialmente os juízes e peritos médicos judiciais,

diminuindo-se as intervenções argumentativas e a exposição de razões da parte

autora. Tal fato foi constatado a partir da análise dos seguintes dados: na 14ª Vara

Federal, em apenas 38% dos processos houve a realização de audiência; na 15ª

Vara Federal, em apenas 8% dos processos houve a realização de audiência; na 19ª

Vara Federal, em apenas 35% dos processos houve a realização de audiência.278

Portanto, do total de 86 processos avaliados (autores maiores e menores de 18

anos), em apenas 29% houve a realização de audiências.279

Gráfico 1 – Audiências realizadas

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas.

Outrossim, verificou-se a prática de não submissão dos laudos médicos ao

contraditório, com vista à correção de omissões e contradições, elaboração de

quesitos complementares e, até mesmo, possibilitar a realização de nova perícia.280

Nos vinte e cinco (25) processos em que a perícia médica judicial concluiu pela

278

14ª Vara Federal: 15 Processos com audiência; 24 Processos sem audiência; 15ª Vara Federal: 2 Processos com audiência; 22 Processos: sem audiência; 19ª Vara Federal: 8 Processos com audiência; 15 Processos sem audiência. 279

Observe-se que, na elaboração dos gráficos, entendendo que as frações decimais não trariam modificações nas constatações, utilizamos apenas números inteiros. 280

Neste momento, optamos por utilizar dados apenas de processos envolvendo maiores de 18 anos com vistas a propiciar uma maior homogeneidade na pesquisa quantitativa. Conforme será demonstrado adiante, nas perícias envolvendo menores, ora utiliza-se o termo ―incapacidade para o trabalho‖, ora ―impedimento para atividades próprias da idade do menor‖.

CAPACIDADE para o trabalho (autores maiores de 18 anos), em nenhum deles foi

realizada audiência, bem como, em apenas um (01) processo houve a intimação do

autor para manifestar-se acerca do laudo médico emitido pelo perito do juízo.281

Gráfico 2 - Capacidade

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

De outra banda, nos dezesseis (16) processos em que a perícia médica

judicial concluiu pela INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE para o trabalho

(autores maiores de 18 anos), os atos processuais se deram da seguinte forma: na

14ª Vara Federal, em 89% dos processos foi realizada audiência e em 56% dos

processos a parte autora foi intimada para se manifestar acerca do laudo médico

judicial; na 15ª Vara Federal, em 0% dos processos houve audiência e em 0% dos

processos a parte autora foi intimada para se manifestar acerca do laudo médico

judicial; na 19ª Vara Federal, em 100% dos processos houve audiência e em 0% dos

processos a parte autora foi intimada para se manifestar acerca do laudo médico

judicial.282

281

Na 14ª Vara (6 Processos): Audiência (0 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (0 Processos); sentenças procedentes (0 Processos). Na 15ª Vara (7 Processos): Audiência (0 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (0 Processos); sentenças procedentes (0 Processos). Na 19ª Vara (12 Processos): Audiência (0 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (1 Processo); sentenças procedentes (0 Processos). 282

14ª Vara (9 Processos): Audiência (8 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (5 Processos); 15ª Vara (4 Processos): Audiência (0 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (0 Processos); 19ª Vara (3 Processos): Audiência (3 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (0 Processos).

Gráfico 3 - Incapacidade total e permanente

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Por fim, nos vinte e dois (22) processos em que a perícia médica judicial

concluiu pela INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA, PARCIAL E DEFINITIVA

ou PARCIAL E TEMPORÁRIA para o trabalho (autores maiores de 18 anos) foram

realizados os seguintes atos: na 14ª Vara Federal, em 36% dos processos foi

realizada audiência e em 29% dos processos a parte autora foi intimada para se

manifestar acerca do laudo médico judicial; na 15ª Vara Federal, em 40% dos

processos houve audiência e em 0% dos processos a parte autora foi intimada para

se manifestar acerca do laudo médico judicial; na 19ª Vara Federal, em 33% dos

processos houve audiência e em 33% dos processos a parte autora foi intimada

para se manifestar acerca do laudo médico judicial.283

283

14ª Vara (14 Processos): Audiência (5 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (4 Processos); 15ª Vara (5 Processos): Audiência (2 Processos); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (0 Processos); 19ª Vara (3 Processos): Audiência (1 Processo); intimação do autor para manifestar-se acerca do laudo (1 Processo).

Gráfico 4 - Incapacidade total e temporária; parcial e definitiva. parcial e temporária

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Ou seja, nos 63 processos (autores maiores de 18 anos) em que houve a

realização de perícia médica judicial, em apenas 17% dos processos houve a

intimação da parte autora para manifestar-se acerca do laudo médico pericial. Bem

como, em apenas 30% dos processos houve a realização de audiência. Evidencia-

se a restrição da comunicação para fins de definição da deficiência à perícia médica

judicial, a ser apreciada pelo juiz.

Quando da constatação da ―capacidade‖ pela perícia médica judicial, é

possível verificar uma uniformidade nos procedimentos das três varas federais no

sentido de não se realizar audiência ou não se efetuar a intimação da parte autora

para manifestação. Todavia, quando o parecer médico judicial adota outras

conclusões, fica demonstrado grande variação nos procedimentos de uma vara para

outra e, até mesmo, dentro de uma mesma vara (em casos que a conclusão da

perícia médica judicial foi equivalente). Há, portanto, inconsistência entre as

decisões judicias pela realização ou não realização das audiências e intimações

acima apontadas.

Decisões da própria organização inibem e resguardam a atuação dos

membros (juízes) e, assim, dão o sentido ao direito material a partir de informações

obtidas em um processo bastante simplificado. É o que se deduz das decisões das

Turmas Recursais que, em inúmeros acórdãos, decide que a falta de intimação da

parte autora para manifestar-se acerca do laudo pericial não é causa de nulidade

nos JEFs, conforme Enunciado nº 84 do FONAJEF 284. De outra banda, no Processo

nº 0518000-24.2012.4.05.8300S, apesar de reconhecer que o CPC impõe a

intimação da parte autora para manifestar-se acerca do laudo pericial, a Turma

Recursal decide que a interposição de recurso com a manifestação sobre este

documento acaba por suprir tal nulidade. Ou seja, a organização, por meio de suas

decisões reiteradas, possibilita que se mantenham os mesmos procedimentos

adotados quando da vigência da legislação anterior, que previa o modelo médico de

deficiência.

Em diversos processos, nos casos em que o perito médico judicial concluiu

pela capacidade, incapacidade parcial temporária, parcial definitiva ou total

temporária, os juízes emitiram sentença de improcedência, sem a citação da

Autarquia Previdenciária para contestar ou oferecer proposta de acordo. No

Processo nº 0501073-80.2012.4.05.8300T, o juízo de primeiro grau aplica o art. 285-

A, do CPC.285 Vejamos:

In casu, a perícia médica constatou que a parte autora apresenta incapacidade parcial e temporária. Nesse sentido, afirmou o perito que a autora precisaria de 2 a 4 meses para normalização dos níveis de hormônios tiroideanos após aumento da dose, esclarecendo que, pelos exames mais recentes, não apresenta evidências de mestástases à distância, tendo assim, um bom prognóstico. Após o controle dos níveis homormais com a levotiroxina, a pericianda poderá levar uma vida normal, sem sintomas clínicos, sem incapacidade para realizar atividades laborais. Informou ainda que a autora é capaz de realizar as atividades da vida diária independente. Desse modo, concluo pela ausência do requisito da incapacidade laborativa. Por fim, em homenagem à celeridade processual - princípio reforçado em sede de Juizado Especial -, tratando-se de demanda manifestamente improcedente, entendo cabível o julgamento da ação sem ouvida da parte contrária, que não suportará qualquer ônus em vista de se tratar de sentença que lhe é favorável. Ressalto que esta prática, que já vinha sendo largamente utilizada no âmbito dos Juizados Especiais de todo o país, findou positivada no nosso ordenamento jurídico a partir da edição da Lei nº 11.277/06, que inseriu o art. 285-A no Código de Processo Civil, com a seguinte previsão: ―Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.” Isso posto, julgo improcedente o pedido formulado. (Grifo nosso).

284

Neste sentido: Processos nº 0504904-39.2012.4.05.8300S, 0504860-20.2012.4.05.8300S, 0521710-52.2012.4.05.8300, 0505689-98.2012.4.05.8300, 0504944-21.2012.4.05.8300T, 0510874-20.2012.4.05.8300S, 0515686-08.2012.4.05.8300S. 285

Neste mesmo sentido: Processos nº 0500306-42.2012.4.05.8300T, 0501855-87.2012.4.05.8300S, 0503675-44.2012.4.05.8300S, 0504860-20.2012.4.05.8300S, 0509192-30.2012.4.05.8300T, 0510874-20.2012.4.05.8300S, 0517848-73.2012.4.05.8300T, 0520754-36.2012.4.05.8300T.

A aplicação do art. 285-A do CPC evidencia a posição central ocupada pela

perícia médica judicial, tida como inquestionável, pois, sequer, é citada a Autarquia

Previdenciária para compor a lide. Assim, as peculiaridades do caso concreto seriam

avaliadas pelo perito médico judicial. A partir da emissão do seu laudo, todo o resto

será matéria ―unicamente de direito‖. Ou seja, afasta-se qualquer possibilidade de

haver elementos capazes de contradizer o laudo médico judicial. Observe-se ainda

que o ―princípio da celeridade processual‖ é apontado como razão para assim

proceder nos Juizados Especiais Federais. No que se refere ao julgamento

antecipado da lide, a Turma Recursal utiliza-se do art. 330 do CPC. É o que se

verifica no Processo nº 0521710-52.2012.4.05.8300:

[...] Não merece prosperar tal argumentação da Parte Autora. É que não se pode olvidar ser o Juiz o destinatário último das provas, cabendo a ele (e somente a ele) a incumbência de analisar e sopesar em que momento processual a lide estaria pronta para julgamento. O próprio CPC corrobora tal assertiva, quando, nos termos do seu art. 330, faculta ao magistrado a possibilidade de resolução antecipada da lide naqueles casos em que ele estiver convencido da existência suficiente de provas que permitam o exato conhecimento da lide porfia deduzida em juízo. — Na hipótese, as informações fornecidas pelo perito foram consideradas suficientes para a formação do convencimento do Juiz singular, não havendo, pois, que se falar em cerceamento de defesa.(Grifo nosso)

286

Ou seja, em determinados momentos, a jurisprudência das Turmas Recursais

afasta a aplicação do CPC aos JEFs, e em outros momentos, admite-a. Ocorre que,

conforme ilustrado acima, as decisões judiciais o fizeram com o intuito de justificar a

ausência de intimação da parte autora para se manifestar acerca do laudo, a

ausência de citação da parte Ré, a ausência de audiência. Destarte, além da

preponderância das informações da perícia médica judicial na argumentação dos

magistrados, ainda se evidencia a restrição da comunicação ao próprio juiz, como

―destinatário último das provas‖, a quem cabe a decisão pelo julgamento antecipado

da lide caso esteja ―convencido da existência suficiente de provas‖. Exclui-se,

286

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0521710-52.2012.4.05.8300 de 18/12/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=499085&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0521710-52.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

portanto, a possibilidade das partes, por meio de comunicação, resistir às razões

lançadas e provocar novas percepções.

Outrossim, decisões das Turmas Recursais salientam a inexigibilidade de

realização de perícia médica por especialistas, conforme se infere do Processo nº

0520754-36.2012.4.05.8300T287:

[...] — É certo que, em determinadas situações, faz-se mesmo necessário um segundo exame, o que ocorre quando o primeiro laudo é insuficiente ou lacônico; muitas vezes, até o próprio perito recomenda a realização de segundo exame por um especialista. — Saliente-se, ademais, que a obrigatoriedade da perícia ser realizada exclusivamente pelo especialista comprometeria severamente as varas federais do interior, dado que, em diversos municípios não há disponibilidade de médicos das mais variadas especialidades, razão pela qual a realização da perícia com o médico disponível na localidade é a única opção viável. Da simples análise do laudo médico-pericial, observa-se que a pretensão deduzida não merece acolhimento, de sorte que novo laudo pericial não teria o condão de afastar a veracidade do resultado da prova técnica já acostada aos autos. - No presente caso, os laudos se manifestam de forma indubitável quanto à capacidade laborativa da parte autora. Ademais, além de realizados por médicos especialistas, não apresenta nenhum vício, que possa acarretar a anulação da prova. O fato do laudo ter concluído contrariamente ao argumento da parte autora não é razão para que seja realizada nova perícia. (Grifo nosso).

288

Em outros processos o juízo determinou à parte autora indicar apenas uma

especialidade médica para a realização da perícia médica judicial, como se observa

no Processo nº 0519715-04.2012.4.05.8300.289 Por fim, impende lançar luz sobre as

decisões da Turma Recursal com base no art. 46 da Lei nº 9.099/95, segundo o qual

o ―julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação

suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for

confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de

acórdão.‖ É o caso do Processo nº 0511772-33.2012.4.05.8300T, em que o Acórdão

resume-se ao texto transcrito abaixo:

287

Neste mesmo sentido: Processo nº 0504944-21.2012.4.05.8300, 0510874-20.2012.4.05.8300S, 0519715-04.2012.4.05.8300S. 288

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0520754-36.2012.4.05.8300 de 29/11/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=496142&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0520754-36.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 289

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0519715-04.2012.4.05.8300 de 13/11/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=493579&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0519715-04.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

EMENTA PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE PARCIAL. REQUISITOS DO ART. 20 DA LEI Nº 8.742/93. NÃO ATENDIMENTO. RECURSO INOMINADO IMPROVIDO. - Trata-se de Recurso Inominado interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de beneficio assistencial a deficiente (LOAS), conforme previsão contida no art. 203, inciso V, da Constituição Federal de 1988 e, bem assim, na Lei nº 8.742/93. - O art. 203, inciso V, da Carta Federal de 1988, prevê ―a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei‖. - Por sua vez, a Lei nº 8.742/93 dispõe, em seu art.20, caput, que ―o benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família‖. - No mérito, constatou-se no exame pericial que a parte autora apresenta incapacidade parcial para o labor. - É certo que a capacidade parcial, por si só, não possui o condão de desqualificar o pretenso beneficiário ao amparo assistencial. Todavia, é preciso nesse caso que o julgador se convença pela análise sócio-econômica da realidade em que a parte autora está inserida que esta faz jus, sim, ao benefício. - No presente caso, analisando-se o laudo pericial à luz das peculiaridades do caso concreto (idade, experiência profissional e grau de instrução do periciando), infere-se ser indevido o benefício requerido. -Recurso Inominado improvido. Sentença mantida por seus próprios fundamentos (art. 46 da Lei 9.099/95). - Sem condenação em honorários, eis que a autora é beneficiária da gratuidade da justiça. (Grifo nosso).

290

Constata-se, portanto, a redução da comunicação nos JEFs ao perito judicial

e aos juízes, uma vez que são realizadas audiências e intimações para

manifestações em um conjunto restrito de processos. Além do que, conforme se

verificou, dificilmente há reforma da sentença em sede recursal, razão pela qual, os

argumentos lançados pelas partes nos recursos pouco participam na construção do

sentido de benefício de prestação continuada nos JEFs291.

Em comentário ao conceito de comunicação em Luhmann, Dario Rodriguez

adverte que os ―excluídos‖ não são considerados pessoas em um contexto

290

Neste mesmo sentido: Processos nº 0504141-38.2012.4.05.8300T, 0502270-70.2012.4.05.8300T, 0517848-73.2012.4.05.8300T. 291

14ª Vara: Quantidade de recursos já julgados pela Turma Recursal: 22 processos; Processos reformados pela Turma Recursal: 1 Processo; 15ª Vara: Quantidade de recursos já julgados pela Turma Recursal: 15 processos; Processos reformados pela Turma Recursal: 1 Processo; 19ª Vara: Quantidade de recursos já julgados pela Turma Recursal: 9 processos; Processos reformados pela Turma Recursal: 1 Processo. Obs: Dados coletados até 10/11/2013.

comunicacional, mas apenas corpos. Ou seja, não são considerados ―alter cuja

compreensão constitui a terceira seleção necessária para que se produza

comunicação‖.292 Nesse mesmo sentido, Gert Verschraegen salienta que os direitos

humanos e as liberdades fundamentais, em Luhmann, não se limitam às esferas

privadas, do contrário, habilitam o indivíduo a participar de diversas esferas

comunicativas.293

Assim, em razão das descrições dos procedimentos judiciais acima

apontadas, podemos constatar que a comunicação do direito à assistência à pessoa

com deficiência nos JEFs exclui a parte autora, uma vez que restringe à petição

inicial a expressão de seus argumentos, não oferecendo um espaço para rejeição do

conteúdo comunicado pelos juízes e peritos médicos.

Ocorre que a legislação vigente, considerando a deficiência como fenômeno

multidimensional, requer uma análise mais detalhada da deficiência encontrada e

dos ambientes social e físico em que se encontra inserido o requerente. Somente a

interação entre esses elementos poderá indicar uma limitação do desempenho da

atividade e restrição da participação do indivíduo. Contudo, a simplificação do

processo nos JEFs impede a avaliação da deficiência conforme o modelo social e

nos moldes da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e

Saúde – CIF, isso porque se restringe a comunicação aos peritos médicos judiciais e

aos juízes, não sendo considerados, no contexto comunicacional, os argumentos da

parte autora, bem como, as informações fornecidas por meio da perícia social,

sendo esse o próximo ponto a ser abordado.

3.2 Avaliação social e apatia

Conforme desenvolvido anteriormente, as alterações na legislação pátria

estabeleceram que a avaliação da deficiência e do grau de impedimento seria

realizada por meio da avaliação social e da avaliação médica. No âmbito da

Administração Pública, institui-se que tais avaliações serão realizadas pelo serviço

292

RODRÍGUEZ, Darío Rodríguez; MANSILLA, Javier Torres Nafarrate. Introdución a la Teoría de la sociedad de Niklas Luhmann. México: Herder, 2008. p 441-442. 293

VERSCHRAEGEN, G. Human rights and modern society: a sociological analysis from the perspective of system theory. Journal of Law and Society, v.29, n. 2, p. 258-281. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/1467-6478.00218/abstract>. Acessado em: 25 nov. 2013. p. 274.

social e pela perícia médica do INSS, com base nos parâmetros da CIF. Ou seja, a

apreciação do pedido do requerente exige a avaliação social do componente

―Atividades e Participação‖ e do componente ―Fatores Ambientais‖. A avaliação

médico-pericial, por sua vez, considerará o componente ―Funções do Corpo‖ e o

componente ―Atividades e Participação – Parte Médica‖.

Ocorre que tais exigências, previstas na legislação, bem como, aplicadas no

nível da Administração Pública (ao menos teoricamente, já que a análise das

operações no âmbito administrativo não é objeto deste trabalho), não se verificaram

na prática dos JEFs. Com efeito, além de ter se constatado uma verdadeira apatia

em relação à avaliação social por meio do profissional habilitado (assistente social),

ainda se verificou uma confusão entre o conceito de ―avaliação social‖ com a mera

estimativa da renda familiar per capita. Ignora-se a análise social como componente

da avaliação da deficiência.

Na maioria dos processos, a análise social resumiu-se à avaliação da

documentação juntada aos autos e às informações prestadas em audiência,

tomando-se por critério basicamente a avaliação da renda familiar. Atente-se para o

total de perícias médicas, sociais e mandados de verificação (autores maiores e

menores de 18 anos): Na 14ª Vara Federal, em 87% dos processos foi realizada

perícia médica judicial; em 0% dos processos foi realizada perícia social judicial; em

15% dos processos foi realizado mandado de verificação; Na 15ª Vara Federal, em

92% dos processos foi realizada perícia médica judicial; em 42% dos processos foi

realizada perícia social judicial; em 4% dos processos foi realizado mandado de

verificação; Na 19ª Vara Federal, em 87% dos processos foi realizada perícia

médica judicial; em 0% dos processos foi realizada perícia social judicial; em 4% dos

processos foi realizado mandado de verificação.294

294

14ª Vara (39 processos): Perícia médica (34 Processos); Mandado de verificação (6 Processos); Perícia Social (0 Processos). 15ª Vara (24 Processos): Perícia médica (22 Processos); Mandado de verificação (1 Processo); Perícia Social (10 Processos). 19ª Vara (23 Processos): Perícia médica (20 Processos); Mandado de verificação (1 Processo).

Gráfico 5 – Procedimentos realizados

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Observando-se o gráfico, podemos extrair a informação de que a realização

de perícia médica judicial dá-se de forma constante e homogênea nas três varas

federais. Quanto à realização de perícia social, apenas foi constatada na 15ª Vara

Federal e, mesmo assim, de modo não constante (em menos da metade dos

processos). O mandado de verificação, por sua vez, foi realizado em todas as varas,

mas de modo não constante.

A partir da pesquisa qualitativa de dados, constatou-se que, em alguns

processos em que não foi realizada a avaliação social por assistente social e a

perícia médica judicial concluiu pela ―incapacidade parcial‖, o próprio perito médico

faz esta avaliação, em determinadas ocasiões para opinar pela impossibilidade de

reintegração ao mercado de trabalho em razão da interação do impedimento com as

barreiras sociais, em outros casos para opinar pela possibilidade de reintegração.

Em outros processos, o perito médico judicial permanece silente em relação à

possibilidade ou impossibilidade de reintegração ao mercado de trabalho do

periciando com incapacidade parcial.

Na primeira hipótese (em que o perito médico judicial opina pela

impossibilidade de reintegração ao mercado de trabalho), exemplifica-se com o

Processo nº 0514577-56.2012.4.05.8300S295 e o Processo nº 0501017-

295

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0514577-56.2012.4.05.8300 de 31/08/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=482005&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0514577-56.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

47.2012.4.05.8300S296. No primeiro processo, o parecer médico foi acolhido pelo juiz

de primeiro grau (julgando-se procedente a demanda), no segundo processo, tal

parecer foi rejeitado, em razão da incapacidade ser apenas parcial (julgando-se

improcedente a demanda).

Na segunda hipótese (em que o perito médico judicial opina pela possibilidade

de reintegração ao mercado de trabalho), exemplifica-se com o Processo nº

0501855-87.2012.4.05.8300297. Nesse processo o perito médico do juízo indica as

profissões que o periciando poderá desempenhar, uma vez incapacitado para a

atividade habitual. Assim, a sentença judicial foi de improcedência em razão do

parecer médico desfavorável. Já no Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300298, o

médico perito judicial informa que, apesar da incapacidade parcial, o periciando

estaria apto a realizar as suas atividades habituais, parecer este que foi acolhido

pelo julgador de primeiro grau (julgando-se improcedente a demanda).

Na terceira hipótese (em que o perito informa a incapacidade parcial, mas não

oferece análise social), exemplifica-se com o Processo nº 0501218-

39.2012.4.05.8300. Apesar de o perito do juízo entender pela incapacidade parcial e

definitiva, o juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido, com base no seguinte

fundamento:

[...] No presente caso, a perícia médica atestou a demandante não poder realizar atividades laborativas que envolvam esforço físico, agachamento, dentre outras similares. Ora, considerando que a autora possui precária formação intelectual e só trabalhou como lavadeira e agricultora – atividades para as quais está incapacitada -, reputo ser bastante improvável sua inserção profissional.

299

296

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0501017-47.2012.4.05.8300 de 24/01/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta /processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=446867&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0501017-47.2012.4.05.8300> . Acessado em: 25 out. 2013. 297

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0501855-87.2012.4.05.8300 de 08/02/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta /processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=449435&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0501855-87.2012.4.05.8300> . Acessado em: 25 out. 2013. 298

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300 de 24/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=459161&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0505689-98.2012.4.05.8300> . Acessado em: 25 out. 2013. 299

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0501218-39.2012.4.05.8300 de 27/01/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=447555&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0501218-39.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Todavia, a sentença a quo foi reformada pela Turma Recursal (que julgou

improcedente o pedido em razão da incapacidade ser apenas parcial). Outro

exemplo nesta última hipótese é o do Processo nº 0507404-78.2012.4.05.8300T300,

em que o juízo julgou improcedente o pedido, em razão de a incapacidade ser

apenas parcial.

Assim, além de o médico perito judicial não ser o profissional habilitado para

desempenhar a função do assistente social, da forma em que os procedimentos têm

se realizado, conforme demonstrado acima, há inconsistência das decisões em

razão de julgamentos díspares.

Relembre-se que, conforme o modelo social de deficiência previsto na

Convenção de Nova York, a deficiência não é apenas uma constatação médica, mas

a avaliação da interação dos impedimentos com as barreiras sociais, que podem

obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com

as demais pessoas. Ocorre que nos JEFs em Recife, conforme se depreende dos

processos analisados, há nítida separação entre os momentos da avaliação da

deficiência (por perícia médica) e da avaliação social (análise da renda familiar per

capita). Confira-se o acórdão proferido pela Turma Recursal no Processo nº

0515842-93.2012.4.05.8300301:

[...] - O requisito da miserabilidade, parte controversa neste processo, é regulado nos termos do § 3º, do preceptivo mencionado, consoante o qual “se considera incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo”. - Estabelece o §1º do art. 20 da mencionada lei que ―a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.‖ - No caso dos autos, o grupo familiar é composto pela parte autora, um irmão menor e seus genitores, sendo a renda proveniente exclusivamente de labor do genitor, que apura, em média, R$ 900,00 mensais (anexo 31). - Realizada audiência de instrução, assim se manifestou o julgador monocrático: “De acordo com o relato da testemunha, o autor mora com a mãe, o pai e um irmão menor. Toda a renda é proveniente do trabalho do pai em valor

300

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0507404-78.2012.4.05.8300T de 24/07/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/ cadastro/modelo/exibe_modelo_publicado.wsp?tmp.anexo.id_processo_documento=8094564&tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=463956> . Acessado em: 25 out. 2013. 301

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0515842-93.2012.4.05.8300 de 18/09/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=484767&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0515842-93.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

um pouco acima do salário mínimo. A testemunha relatou que a casa é simples, que o menor precisa pagar serviços de psicólogo, que as contas de água e luz estão sempre atrasadas, restando configurado o estado de miserabilidade.” - Com efeito, muito embora deva-se prestigiar a prova oral colhida em audiência, é certo que esta deve estar em harmonia com os demais elementos constantes do processo, em especial as provas materiais colacionadas pela própria parte autora. - Pois bem. Compulsando os autos, verifico que o comprovante de residência juntado demonstra que o grupo familiar, em 02/03/2012, consumiu R$ 103,31 (cento e três reais e trinta e um centavos) de energia elétrica (anexo 08), sendo, ainda, de R$ 78,08 (setenta e oito reais e oito centavos) a sua fatura mensal da COMPESA, em 13/04/2012 (anexo 16). Foi colacionado também recibo de pagamento referente à "aula de reforço", datado de 06/04/2012, no importe de R$ 35,00 (trinta e cinco reais), assim como vias do IPTU da competência de 2012, no equivalente a R$ 40,00 (quarenta reais) e declaração feita pela instituição educacional Escola Pedro Leandro, no sentido de que o valor da mensalidade paga é de R$ 70,00 (setenta reais) (anexo 16). - Ora, percebe-se claramente que os documentos juntados pela parte autora fazem prova negativa de sua situação de miserabilidade, indo, inclusive, de encontro ao depoimento testemunhal, motivo pelo qual este não goza de qualquer credibilidade. - Desse modo, pode-se inferir, a partir da análise sistemática de todas as provas produzidas nesta demanda (oral e material), que o grupo familiar ou possui renda não declarada nos autos ou sobrevive confortavelmente com a remuneração de R$ 900,00 (novecentos reais) percebida pelo genitor. De qualquer modo, o seu nível de vida é incompatível com uma situação de penúria social e hipossuficiência econômica, sendo certo que a finalidade do benefício assistencial não é possibilitar maior conforto ao pretenso beneficiário, mas amparar aquele que, de fato, vive em situação de extrema miséria, o que não é o caso dos autos. - Por conseguinte, não faz o menor jus ao benefício assistencial. [...] ACÓRDÃO. (Grifo nosso)

Ou seja, neste último processo, os juízes da Turma Recursal acordaram que

a família do autor ―ou possui renda não declarada nos autos ou sobrevive

confortavelmente com a remuneração de R$ 900,00‖, em contrariedade à lei,

destinada a amparar a família em situação de ―penúria‖ ou ―extrema miséria‖. A

decisão judicial utiliza das informações de despesas familiares para afastar a

―miserabilidade‖ do grupo familiar, desconsiderando-se as demais barreiras sociais,

inclusive, aquelas apontadas pelo perito médico judicial, a seguir transcritas:

[...] O autismo infantil é uma doença que traz sérias consequências para o portador e para a sua família. A mãe, como principal cuidadora, passa a viver em função do doente, de suas exigências, da sua dependência permanente. A criança autista é um indivíduo com necessidades especiais, daí a importância de adaptar-se à prestação de cuidados e vigilância permanentes do filho, seja em casa ou fora dela. *A necessidade da presença materna no acompanhamento do filho na peregrinação por consultórios, hospitais e profissionais de saúde.

*Distúrbios no desenvolvimento da linguagem, aprendizagem, de habilidades básicas, autonomia, independência, mobilidade, má integração social, segurança. *Distúrbios de percepção (isolamento como consequência da pouca percepção; falta de percepção do perigo ou, ao contrário, medo excessivo em situações corriqueiras); *Distúrbios comportamentais (indiferença, hiperatividade, impulsividade, destrutibilidade, agressividade, ansiedade, desatenção, acessos de auto-agressividade, agitação psicomotora; fugas); Como a genitora é a principal cuidadora, o pai poderá sair para trabalhar fora. Atualmente, o periciando frequenta a escola municipal, escola normal, Severina Lira- Prefeitura do Recife, Tamarineira, com precário rendimento. O autismo prejudica de forma direta também o desenvolvimento físico do periciando e, conseqüentemente, a sua preparação à vida adulta: o periciando apresenta inúmeras deficiências: Linguagem, comunicação, auto-cuidados, habilidades sociais/interpessoais, auto-orientação, escolaridade e segurança. A incapacidade é definitiva, inviabilizando o exercício de atividades laborativas no futuro. [...] O desenvolvimento do periciando é compatível com o seu grau de desenvolvimento. Alguns fatores afetam diretamente o seu desenvolvimento: fatores macrosistêmicos (renda familiar, grau de instrução dos pais,profissão); fatores microcrosistêmicos (qualidade das interações e relações entre os membros familiares e pessoas próximas). Portanto, o contexto socioeconômico em que o periciando está inserido tem importância crucial no desenvolvimento do mesmo. [...] Mesmo o autismo sendo uma doença crônica, permanente, incapacitante para toda a vida, sem cura, com prognóstico pessimista, o periciando necessita manter acompanhamento com equipe multidisciplinar: neurologista, pediatra, psicóloga, fonoaudióloga, terapia ocupacional, psicopedagoga, entre outros. Essa equipe multidisciplinar poderá desenvolver técnicas específicas de comunicação verbal, educação, integração social, habilidades, além da intervenção medicamentosa, visando minorar/reduzir suas incapacidades e desenvolver suas habilidades. (Grifo nosso)

302

Mesmo que o perito do juízo tenha declarado a necessidade de tratamento

interdisciplinar do periciando (que estaria com baixo rendimento) para o

desenvolvimento de suas habilidades, os julgadores da Turma Recursal reformaram

a sentença a quo, utilizando-se, dentre outros, do argumento de que as despesas

básicas do núcleo familiar fariam prova negativa do direito do autor, seriam elas: R$

103,31 com energia elétrica, R$ 78,08 com a COMPESA, R$ 35,00 com "aula de

reforço", R$ 35,00 com IPTU e R$ 40,00 da instituição educacional Escola Pedro

Leandro. Verifica-se que a Turma Recursal, neste julgamento, vincula a assistência

social à ―pobreza absoluta‖, bem como, adota uma perspectiva meramente

monetária da pobreza, desconsiderando outras variáveis. 302

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0515842-93.2012.4.05.8300 de 18/09/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=484767&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0515842-93.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Observa-se que neste processo foi realizada a avaliação de fato

incontroverso, pois o juízo de primeiro grau determinou a realização de perícia

médica quando o indeferimento administrativo deu-se em razão da renda familiar per

capita, reconhecendo-se, administrativamente, o impedimento total e definitivo. No

que tange ao fato controvertido – realidade socioeconômica do autor – a análise

deu-se a partir das informações obtidas em audiências e da documentação juntada

aos autos, sem a realização de perícia social. Registre-se que tal análise conduziu a

julgamentos totalmente contraditórios, uma vez que o juízo de primeiro grau

entendeu estar caracterizada a situação de hipossuficiência, enquanto que a Turma

Recursal, com base nos mesmos elementos aferidos pelo juízo a quo, emitiu

decisão no sentido de afastar a vulnerabilidade do grupo familiar.

De acordo com a decisão supra, famílias com a mesma renda familiar per

capita, estariam sujeitas aos mesmos resultados na avaliação do direito ao BPC,

independentemente do grau de impedimento da pessoa com deficiência e das

barreiras sociais suportadas. Mais uma vez se evidencia o afastamento das

decisões judiciais do modelo social de deficiência, segundo o qual os impedimentos

e as barreiras deverão ser avaliados interativamente. Os juízes da Turma Recursal,

ao avaliarem a renda, simplesmente ignoraram o grau de impedimento e as demais

barreiras sociais.

No Processo nº 0504141-38.2012.4.05.8300T, não houve audiência, não

houve submissão do laudo médico judicial ao contraditório, não houve realização de

mandado de verificação ou análise social por assistente social. A sentença judicial

concluiu pela possibilidade de realização de atividade laboral como ―vendedora,

secretária ou balconista, conforme sugere o expert‖. A seguir, trechos do parecer

médico judicial:

O(a) periciando(a) é portador(a) de alguma doença, lesão, sequela ou deficiência (indicar qual a doença e o respectivo CID)? Desde quando? (indique o perito data provável) Houve amputação traumática das falanges distais dos 3º, 4º e 5º dedos da mão esquerda (S68.2). A lesão decorreu de ―choque‖ que teria ocorrido em novembro de 2011 segundo o relato da periciada. Em caso positivo, tal doença, lesão, sequela ou deficiência incapacita o(a) periciando(a) para o desenvolvimento de atividades laborativas? Sim. Há incapacidade para trabalhos braçais ou que demandem o uso concomitante das duas mãos. [...] A incapacidade é total (inviabilizando toda e qualquer atividade laborativa) ou parcial (inviabilizando apenas algumas atividades laborativas)? Em caso

de incapacidade parcial, exemplificar tipos de atividade que podem ser exercidos pelo(a) periciando(a). Incapacidade parcial. Poderia, por exemplo, trabalhar como vendedora, secretária ou balconista. [...] A incapacidade é temporária ou permanente? A incapacidade descrita é permanente. [...] CONCLUSÃO Houve lesão grave em mão esquerda que levou a amputação das falanges distais do 3º, 4º e 5º dedos. Há dor e limitação na movimentação da mão esquerda que torna a periciada definitivamente incapaz para a função de doméstica.

303

Assim, consta na sentença:

[...] Ora, considerando que se trata de incapacidade apenas parcial, que a autora ainda é bastante jovem (conta com 43 anos), que possui o ensino fundamental completo (estudou até a 8º série), que consegue ter uma vida independente da ajuda de terceiros e que poderia trabalhar em funções como nas de vendedora, secretária ou balconista, conforme sugere o expert, não é caso de deferimento do benefício aqui pleiteado. Importante lembrar que a demandante só está incapaz definitivamente para a função de doméstica. (Grifo nosso).

304

A Turma Recursal manteve a sentença por seus próprios fundamentos (art.

46 da Lei nº 9.099/95). Destarte, acolhendo as ―sugestões‖ de profissões apontadas

pelo perito médico judicial, o juiz de primeiro grau e os juízes da Turma Recursal

afastaram o direito ao benefício de prestação continuada. Os JEFs aplicam alguns

critérios previdenciários à concessão de benefícios assistenciais. Contudo, ignoram,

por exemplo, a possibilidade de recebimento do auxílio-doença enquanto ocorre a

reabilitação profissional para função diversa da habitualmente desempenhada (art.

18, c, da Lei nº 8.213/1991). Bem como, ignoram, no âmbito da Assistência Social, o

Programa BPC-Trabalho.

Em um processo envolvendo um menor de idade (Processo nº 0519948-

98.2012.4.05.8300), o juízo fundamentou a decisão de improcedência no parecer

médico judicial, no ponto em que conclui que a incapacidade não seria total, mas

apenas parcial. Outrossim, o magistrado de primeiro grau utilizou o parecer médico

303

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0504141-38.2012.4.05.8300 de 20/03/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=455052&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0504141-38.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013. 304

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0504141-38.2012.4.05.8300 de 20/03/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=455052&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0504141-38.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

elaborado pelo assistente técnico, que conclui tratar-se o periciando de um ―portador

de necessidades especiais‖. Eis o parecer médico do juízo:

QUESITOS DO JUIZ 1) [...] 2) [...] 3) O(a) periciando(a) é portador(a) de alguma doença, lesão, sequela ou deficiência (indicar qual a doença e o respectivo CID)? Desde quando? (indique o perito data provável). Há sequelas motoras e cognitivas leves decorrentes de ruptura de malformação arteriovenosa encefálica (Q28.2). O quadro clínico se manifestou quando o periciado tinha 6 anos segundo o relato. 4) Em caso positivo, tal doença, lesão, sequela ou deficiência incapacita o(a) periciando(a) para o desenvolvimento de atividades normais para a sua idade? As sequelas são leves e limitam (não incapacitam totalmente) a execução de atividades próprias da idade do periciado. Há sequelas cognitivas leves que não impedem totalmente o periciado de aprender, mas tornam o processo de aprendizagem mais lentificado e difícil. Há, ainda, déficit motor leve à direita que não impede o menor de andar sem auxílio, mas que dificulta para correr. As questões contidas neste quadro (n. 5 a 7) somente devem ser respondidas caso a resposta ao quesito anterior (n. 4) tenha sido positiva, pela existência de incapacidade laborativa. 5) Qual a data de início da incapacidade? (indicar uma data provável). Com que elementos o perito chegou a tal conclusão? A incapacidade descrita existe desde 11/12/08, data do primeiro exame que constata o quadro. 6) A incapacidade/invalidez é temporária ou permanente? Considero a incapacidade descrita temporária, pois está havendo boa melhora funcional (readaptação) com o crescimento e o tratamento. Sugeriria reavaliação em 2 anos. 7) A incapacidade é total (abrangendo qualquer atividade habitual) ou parcial (abrangendo apenas algumas atividades habituais próprias da idade do periciando)? Há incapacidade parcial (para algumas atividades próprias da idade do periciado, ver resposta do quesito 4). 8) O(a) periciando(a) é passível de recuperação ou de reabilitação? Está havendo readaptação funcional. 9) Em face da doença constatada no periciado, é necessário o acompanhamento permanente, ao longo do dia, de um dos pais do menor (ou dos dois)? Esse acompanhamento impede os pais de saírem de casa para trabalhar? O menor pode estudar, ainda que em escola adequada à sua deficiência ou doença? Não precisa do acompanhamento permanente dos pais e pode estudar em escola convencional (apesar de poder necessitar de acompanhamento psicopedagógico mais intensivo porque o processo de aprendizado será mais lento do que o esperado para a faixa etária). 10) O(a) periciando(a) consegue ter uma vida independente, vale dizer, sem contar com a ajuda de terceiros para realizar as atividades normais de sua idade (vestir-se, alimentar-se, caminhar e fazer sua higiene pessoal)? Sim. Não há incapacidade para as atividades citadas na questão. 11) A enfermidade constatada no(a) periciando(a) é controlável por medicamento ou intervenção cirúrgica? Caso afirmativo, tais medicamentos e/ou tratamentos são fornecidos pelo Sistema Único de Saúde – SUS?

Precisa de fisioterapia, de terapia ocupacional e acompanhamento psicopedagógico (esse tratamento existe no SUS). [...] CONCLUSÃO O periciado tem uma malformação arteriovenosa (MAV) congênita que, há alguns anos, causou hemorragia cerebral (ruptura da MAV). Houve boa recuperação clínica e boa readaptação funcional. As sequelas são leves e limitam (não incapacitam totalmente) a execução de atividades próprias da idade do periciado. Há sequelas cognitivas leves que não impedem totalmente o periciado de aprender, mas tornam o processo de aprendizagem mais lentificado e difícil. Há, ainda, déficit motor leve à direita que não impede o menor de andar sem auxílio, mas que dificulta, por exemplo, para correr. (Grifo nosso)

305

Abaixo, o trecho da sentença judicial:

[...] No caso sob luzes, foi realizada prova pericial, concluindo o perito do juízo, de forma clara e fundamentada, que o demandante é portador de seqüelas motoras e cognitivas leves decorrentes de ruptura de malformação arteriovenosa encefálica desde os seis anos, doença que causa incapacidade laborativa apenas parcial e temporária pelo período máximo de 2 (dois) anos, só impedindo o desempenho de determinados tipos de atividade, ou seja, não incapacitam totalmente, porquanto apenas limitam a execução de atividades próprias da idade do periciado, e tornam o processo de aprendizagem mais lentificado e difícil. O laudo pericial ainda esclarece "que o déficit motor leve à direita não impede o menor de andar sem auxílio, mas dificulta, apenas, para correr" (quesito nº 4). Apurou-se ainda que o menor não necessita do acompanhamento permanente dos pais e pode estudar em escola convencional (quesito nº 9). Ora, considerando que a parte autora tem apenas 10 anos de idade, que está havendo readaptação funcional (quesito nº 8), e que, por fim, a enfermidade pode ser controlada por tratamentos fornecidos pelo SUS (quesito nº 11), entendo que não é caso de impedimento de longo prazo, não havendo prejuízo total e duradouro da capacidade laborativa do demandante, ainda mais ao se considerar que "havendo boa melhora funcional (readaptação) com o crescimento e o tratamento"(quesito nº 6). Vale notar, ainda, que o próprio laudo elaborado pelo assistente técnico da Defensoria Pública da União - DPU (anexo nº 8) conclui que: "Na realidade, trata-se de um portador de necessidades especiais, que poderá se desenvolver plenamente, porém respeitando a limitação da perda de força em membro inferior direito." Outrossim, como os requisitos para a concessão do benefício devem ser concomitantes e restou afastado um deles, deixo de apreciar o requisito econômico. (Grifo nosso)

306

305

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0519948-98.2012.4.05.8300 de 19/11/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=492845&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0519948-98.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 306

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0519948-98.2012.4.05.8300 de 19/11/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=492845&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0519948-98.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Verifica-se que a decisão judicial baseou-se nas seguintes razões: 1 –

―incapacidade laborativa apenas parcial e temporária pelo período máximo de 2

(dois) anos‖; ―não incapacitam totalmente‖; 2 – ―o menor não necessita do

acompanhamento permanente dos pais e pode estudar em escola convencional‖; 3

– ―a parte autora tem apenas 10 anos de idade‖; 4 – ―está havendo readaptação

funcional‖; 5 – ―a enfermidade pode ser controlada por tratamentos fornecidos pelo

SUS‖; 6 – ―não havendo prejuízo total e duradouro da capacidade laborativa do

demandante‖; 7 - "Na realidade, trata-se de um portador de necessidades especiais”.

Observe-se que, em diversos momentos, o juiz ressaltou a inexistência de

incapacidade total, inclusive, ―incapacidade laborativa‖. Pelo que se tem analisado

até o presente momento, a legislação assistencial não exige a incapacidade total,

bem como, em relação aos beneficiários menores de idade (e até mesmo em

relação aos adultos), não se fala em incapacidade laborativa. Ademais, o juiz

informa que o perito médico havia indicado incapacidade ―temporária pelo período

máximo de 2 (dois) anos‖, quando, na verdade o perito médico judicial sugeriu

―reavaliação em 2 anos‖.

Outrossim, ressalta a pouca idade do menor, a desnecessidade de

acompanhamento permanente dos pais, o fato de poder estudar em escola

convencional, a possibilidade de readaptação funcional e o fornecimento de

tratamentos pelo SUS. Por fim, evidencia o fato de tratar-se de ―portador de

necessidades especiais, que poderá se desenvolver plenamente‖.

São constatações da perícia médica judicial que não foram ressaltadas na

sentença: as sequelas ―tornam o processo de aprendizagem mais lentificado e

difícil‖; o déficit motor ―dificulta para correr‖; apesar de estudar em escola

convencional, pode ―necessitar de acompanhamento psicopedagógico mais

intensivo porque o processo de aprendizado será mais lento do que o esperado para

a faixa etária‖; ―Precisa de fisioterapia, de terapia ocupacional e acompanhamento

psicopedagógico‖.

Ressalte-se que nos dois últimos processos analisados a avaliação social por

assistente social, em consonância com um ―modelo social de deficiência‖, associaria

as deficiências encontradas pela perícia médica judicial aos componentes ―Fatores

Ambientais‖ a fim de verificar a existência de barreiras sociais que dificultassem o

desenvolvimento de atividades e participação na sociedade, em igualdade de

condições com as demais pessoas. Como não houve perícia social, tal avaliação foi

realizada pelo próprio juiz.

Assim, em razão da ausência do parecer social, resta prejudicada a aferição

do componente ―fatores ambientais‖ e dos domínios a ele relacionados como:

disponibilidade de produtos, instrumentos, equipamentos ou tecnologias para

melhorar a funcionalidade da pessoa com deficiência; grau de vulnerabilidade e de

risco social da moradia e mudanças ambientais; existência de pessoas que

forneçam proteção, apoio físico ou emocional, bem como de relacionamentos em

outros contextos; existência de atitudes preconceituosas, discriminatórias e/ou

negligentes, que influenciem o comportamento e as ações da pessoa com

deficiência; acesso à rede de serviços, sistemas e políticas garantidoras de proteção

social etc.. Tais fatores poderão ter impactos ou influências no desempenho para

atividades e participação.307

Nos processos em que foram realizados mandado de verificação ou parecer

social (total de dezoito processos, envolvendo autores maiores e menores de idade),

com exceção de quatro processos308, a perícia social ou o mandado de verificação

se deu após o perito médico do juiz ter atestado a incapacidade total e permanente

(acima de 2 anos) ou, nos casos em que não houve perícia médica, quando o

indeferimento se deu pela renda. Na 14ª Vara Federal (6 mandados de verificação) e

na 19ª Vara Federal (1 mandado de verificação), os mandados de verificação

responderam aos seguintes quesitos do juízo:

1. O(a) Autor(a) vive em companhia de outras pessoas? Especificar nome, estado civil, idade, profissão, escolaridade e renda de tais pessoas. 2. A moradia é própria ou alugada? Caso seja alugada, informar valor do aluguel. 3. Quais as condições da moradia (quantidade de cômodos, dimensões, conservação da mobília, higiene, descrição dos bens, entre outros)? 4. Algum integrante da família do(a) Autor(a) recebe benefício ou assistência dos governos federal, estadual e/ou municipal?

307

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011 - estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013 308

Processos nº 0521185-70.2012.4.05.8300; 0515294-68.2012.4.05.8300; 0517692-85.2012.4.05.8300; 0511771-48.2012.4.05.8300.

5. Existem pessoas integrantes do grupo familiar em tratamento médico ou psicológico regular? Especificar.

309

Na 15 Vara Federal (10 avaliações sociais e 1 mandado de verificação), tanto

o mandado de verificação, quanto as avaliações sociais responderam a quesitos

semelhantes aos acima apontados:

1 – Informar o número de pessoas que compõem a família do(a) demandante, vivendo sob o mesmo teto com aquele(a), esclarecendo as razões de coabitação de pessoas estranhas ao grupo familiar – aquelas além dos ascendentes e descendentes, se for o caso; 2 – Informar os nomes completos, CPF, as respectivas datas de nascimento e atividades laborais exercidas, formais e informais, de todas as pessoas que residem com a parte autora; 3 – Informar o valor da renda mensal auferida por cada componente da entidade familiar e, em conseqüência, a renda mensal familiar; 4 – Informar a existência de pais, filhos ou irmãos que não residam mais com a parte autora, apontando sua profissão e rendimentos mensais, bem como nome e endereço. Saliente-se que deve ser mencionado o auxílio desses ao grupo familiar em estudo, caso prestado. 5 – Informar quais são as despesas fixas mensais do grupo familiar (aluguel, água, luz, medicação, transporte e alimentação). Em caso de despesas com medicamentos, esclarecer se houve tentativa de obtê-los junto ao SUS. 6 – Informar, detalhadamente, as condições da residência do(a) demandante e realizar registro fotográfico, se autorizado. 7 – Prestar outros esclarecimentos que julgar pertinentes para a solução da causa, devendo, inclusive, valer-se do depoimento(s) de vizinhos(s) para melhor elucidar a situação de fato.

310

Assim, verifica-se que as avaliações sociais por assistente social são em

número inexpressivo (presentes em 10 processos, de um total de 86 processos

analisados), restringindo-se aos processos da 15ª Vara Federal, em sua grande

maioria após o perito médico do juiz ter atestado a Incapacidade total e permanente

(acima de 2 anos) ou, quando não realizada a perícia médica, nos casos em que o

indeferimento administrativo foi motivado pela critério da renda familiar per capita.

Do que se pode concluir que a análise social por assistente social, nos JEFs, não

compõe o conceito de deficiência.

309

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0513856-07.2012.4.05.8300 de 27/08/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=479471&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0513856-07.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 310

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0509971-82.2012.4.05.8300 de 25/06/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=470429&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0509971-82.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Ademais, cumpre salientar que os pareceres sociais restringem-se à

composição familiar, habitação, bens materiais, situação econômica. Bem como, em

suas conclusões, limitam-se (em sua maioria)311 a indicar a renda familiar per capita,

aproximando-se bastante do conteúdo do mandado de verificação. Verificou-se,

inclusive, que em um dos poucos processos em que o perito assistente social emitiu

conclusão além da mera descrição da renda familiar per capita, o juiz de primeiro

grau não acolheu as suas razões, decidindo de forma contrária ao parecer social

(Processo nº 0511668-41.2012.4.05.8300). Ressalte-se que não houve audiência, o

que reforça o apego aos critérios de renda para aferição da situação

socioeconômica, bem como, da utilização do parecer social apenas como

instrumento para medir a renda per capita familiar de ¼ do salário mínimo vigente.

Vejamos:

PARECER: Identificamos que o autor é bastante carente, sobrevivendo da renda do Programa Bolsa Família e vizinhos. Ocasionando assim, o estado de vulnerabilidade social. Conclui-se que a família é muito carente, vivendo em situação de miséria, onde o autor necessita de sua inserção no Benefício Prestação Continuada-BPC, para que possa suprir suas necessidades básicas. (Grifo nosso).

312

SENTENÇA No caso dos autos, a teor das informações contidas no laudo da perícia social, que descreveu minuciosamente a situação econômica do autor (anexo 26), este reside com a mãe e o irmão. Porém, verifico que o pai do autor trabalha e conta com o recebimento mensal de uma considerável renda, superior ao salário mínimo (CNIS – anexo 17). Ora, trata-se de filho menor inválido, sendo evidente a relação de dependência econômica deste, de sorte que a renda de seu genitor não pode ser desprezada. Ainda que, de fato, o autor não resida na companhia de seu pai, este tem a obrigação legal de prover-lhe o sustento. A concessão do amparo assistencial pressupõe que o titular do benefício não disponha de condições financeiras para prover sua subsistência e que membros de sua família igualmente não contem com recursos para tanto. Evidentemente, isso não ocorre no caso dos autos. (Grifo nosso).

313

311

Exceção: Processos nº 0505002-24.2012.4.05.8300S; 0509971-82.2012.4.05.8300S; 0511668- 41.2012.4.05.8300S; 0511771- 48.2012.4.05.8300T. 312

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0511668-41.2012.4.05.8300 de 23/07/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=474700&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0511668-41.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 313

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0511668-41.2012.4.05.8300 de 23/07/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=474700&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0511668-41.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Por sua vez, no Processo nº 0511771- 48.2012.4.05.8300T314 o parecer social

atestou a vulnerabilidade do grupo familiar, mas não foi sequer mencionado na

sentença, que se restringiu a mencionar que o laudo pericial médico apontou que

não há sinais exteriores da doença (HIV). Repita-se, as barreiras sociais não são

associadas aos impedimentos com o fim de verificar a restrição na participação. Já

no Processo nº 0506587-14.2012.4.05.8300T, o assistente social fez relatório

analítico, bem como, concluiu que a renda familiar per capita é inferior a ¼ do salário

mínimo. Vejamos:

9. SITUAÇÃO ECONÔMICA A família sobrevive da renda de Sr. [...] proveniente do salário de R$ 647,54 (seiscentos e quarenta e sete reais e cinquenta e quatro centavos). A Sra. [...] informou que o autor faz uso do medicamento: RISPERIDONA adquirido no comércio por R$ 37,00 (trinta e sete reais). A cada trimestre o autor retorna para a consulta com a neurologista, é acompanhando por psicóloga e fonoaudióloga na APAE todas as quartas-feiras. Uma tia paterna do autor paga sua consulta no INTERAGIR. O autor faz uso de fraldas descartáveis, tem intolerância a lactose, necessita de uma alimentação diferenciada com frutas, cereais, leite a base de arroz que custam caros, pois a família não tem dificuldades de suprir, por falta de recursos financeiros. [...] RELATÓRIO ANALÍTICO As informações colhidas pela vizinhança não relatou qualquer fato que discordasse das informações fornecidas pela genitora. Durante entrevista a Sra. [...] ficou bastante emocionada, lamentou a situação que sua família está passando, porque tinha uma vida financeiramente equilibrada e atualmente passa por privações para manter o sustento do grupo familiar. Informou também que a escola do filho [...] está atrasada faz três meses, e ano que vem vai transferi-lo para escola pública. Não tem condições de trabalhar porque o autor requer cuidados permanentes. Os genitores do sobrinho [...] não ajudam no seu sustento, ficando sob responsabilidade da família do autor. Os pais de [...] são aposentados, recebem salário mínimo e ajudam a filha apenas no pagamento da conta de água. PARECER Com base nessas informações colhidas e na situação encontrada concluo que, o autor e sua família vivem com renda inferior a ¼ do salário mínimo, comprometendo a manutenção das necessidades básicas.

315

314

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0511771-48.2012.4.05.8300 de 24/07/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=475049&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0511771-48.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 315

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0506587-14.2012.4.05.8300 de 27/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=461688&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0506587-14.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Ocorre que o juiz de primeiro grau não se ateve às informações prestadas

pelo profissional de serviço social e, sem a realização de audiência, utilizando-se da

renda familiar constante no sistema de dados do INSS, proferiu a seguinte sentença:

[...] Conforme consulta ao CNIS, verifico que a genitora do demandante possui vínculo empregatício, recebendo salário no importe de R$ 657,69 (seiscentos e cinquenta e sete reais e sessenta e nove centavos), relativo ao mês de julho. Ademais, o genitor da parte autora também está laborando, tendo percebido o valor de R$ 1.039,34 (um mil trinta e nove reais e trinta e quatro centavos), referente também a julho. Logo, forçoso reconhecer que o requisito da renda familiar per capita inferior a ¼ de salário mínino não foi atendido. (Grifo nosso).

316

Tendo havido Recurso Inominado da parte autora, a Turma Recursal julgou

improcedente o pedido, agora não mais em razão da renda familiar per capita, mas

afastando as conclusões emitidas pelo perito assistente social, em razão da

interpretação dada pelos juízes da Turma em relação às fotografias juntadas ao

processo no laudo social. Vejamos:

[...] - Quanto à alegação da parte autora de que sua genitora não possui qualquer fonte de renda desde 2010, tal fato entra em conflito com a informação constante do CNIS, por meio da qual se constata que pelo menos até 02/2012 houve o recebimento de contraprestação salarial, no importe de um salário mínimo, pago pela empresa FRIGOMALTA LTDA (anexo 16, fl. 04). - Na verdade, ainda que se leve em consideração a não fruição de renda pela genitora desde 2010, bem como o argumento de que o salário do genitor no mês de julho estaria superior em razão do terço constitucional de férias, verifica-se da análise do Laudo Social (anexo 19), que a condição de vida da parte autora não é compatível com a renda declarada, sendo certo que um grupo familiar em situação de penúria social não possui o padrão de vida exposto nas fotos constantes do anexo 19. - É certo que a finalidade do benefício assistencial não é possibilitar maior conforto ao pretenso beneficiário, mas amparar aquele que, de fato, vive em situação de extrema miséria, o que não é o caso dos autos. (Grifo nosso).

317

Tanto o juiz de primeiro grau, quanto a Turma Recursal afastaram as

conclusões emitidas pelo assistente social, o primeiro, para contraditá-las com as

316

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0506587-14.2012.4.05.8300 de 27/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=461688&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0506587-14.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 317

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0506587-14.2012.4.05.8300 de 27/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=461688&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0506587-14.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

informações prestadas unilateralmente pela Autarquia Previdenciária (CNIS),

limitando-se a avaliar a pobreza pelo critério monetário, a segunda, para valorar as

informações trazidas no laudo social em discordância com a análise efetuada pelo

próprio perito. Assim, a argumentação do caráter ―técnico científico‖ da perícia

médica judicial não é identificada em relação à perícia social.

No Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300, a Turma Recursal informa que,

―em casos excepcionais, as circunstâncias pessoais do postulante – v.g., idade,

família, despesas médicas, escolaridade, local de residência – podem autorizar a

concessão do benefício‖. Ocorre que, apesar de não haver manifestação expressa

do órgão julgador acerca do uso da palavra ―excepcionalidade‖, é possível

depreender do texto que a regra para a concessão do BPC seria para aqueles

requerentes acometidos por ―incapacidade total‖, conforme parecer emitido pela

perícia médica e que, apenas em ―casos excepcionais‖ as ―circunstâncias pessoais

do requerente‖ seriam avaliadas para a concessão do BPC. Vejamos:

EMENTA: CONSTITUCIONAL — PREVIDENCIÁRIO — BENEFÍCIO ASSISTENCIAL — DEFICIENTE — LOAS — — ART. 203, INCISO V, DA CF/88 — LEI Nº 8.742/93 — SÚMULA Nº 29, DA TNU — INAPLICABILIDADE — INEXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORAL — CONCLUSÕES DO LAUDO PERICIAL — RECURSO INOMINADO IMPROVIDO. [...] — Destarte, em relação à incapacidade, conforme dicção da Súmula nº 29, da TNU, “para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento‖. — Por tal razão, de acordo com o juízo adotado pela e. TNU, em casos excepcionais, as circunstâncias pessoais do postulante – v.g., idade, família, despesas médicas, escolaridade, local de residência – podem autorizar a concessão do benefício. Melhor dizendo, diante de um contexto fático probatório com o qual se mostre possível inferir-se que as condições circundantes do requerente, associadas à dificuldade oriunda da enfermidade que o assola, dificilmente lhe permitirão inserir-se no mercado de trabalho, de modo a permitir que atenda ao próprio sustento, fica caracterizada a sua incapacidade e, conseqüentemente, satisfeito tal requisito, ainda que a pericia judicial tem concluído em sentido contrário, ou mesmo que se trata de incapacidade meramente parcial; excepcionalidade, contudo, que não restou caracterizada no caso em apreço. [...]

318

318

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300 de 15/02/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=450539&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0502299-23.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

Conforme introduzido nos primeiros capítulos, o conceito de deficiência

segundo o modelo social impõe a análise social como regra, não como

excepcionalidade, sem a qual não é possível avaliar de que forma a doença, em

interação com as barreiras sociais, poderá limitar as atividades e a participação na

sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Com efeito,

conforme tais diretrizes, a análise unicamente do fator corpo é insuficiente para

avaliar a deficiência.

A partir da pesquisa empírica verifica-se que a organização do sistema do

direito (JEFs) não tem utilizado o conceito de deficiência conforme a CIF, ignorando

a avaliação social por assistente social como seu componente. Ademais,

principalmente nos casos em que a perícia médica concluiu pela incapacidade

parcial e permanente, incapacidade parcial e temporária ou incapacidade total e

temporária, a avaliação da possibilidade de desempenho de atividade laboral

remunerada e inserção no mercado de trabalho (adultos) deu-se a partir de

informações do laudo médico judicial, de informações obtidas em audiência ou da

documentação juntada ao processo, situação esta que conduziu a decisões díspares

para casos equivalentes, tanto em relação aos procedimentos realizados quanto aos

julgamentos de mérito. Por fim, a avaliação social é confundida com a avaliação da

renda per capita familiar, bem como, a atividade do assistente social é equiparada à

atividade do oficial de justiça avaliador.

3.3 Perícia médica judicial e argumentação jurídica

Como já esclarecido anteriormente, a Lei nº 12.470/2011 provocou alterações

no art. 20 da Lei nº 8.742/1993, especialmente na parte do texto referente ao

conceito de deficiência. Repita-se, conforme a redação originária:

Art. 20. [...] § 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho. (Grifo nosso)

319

Posteriormente, a Lei nº 12.435320 de 2011 deu a seguinte redação:

319

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013.

Art. 20. [...] § 2o [...] I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas; (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011). (Grifo nosso).

Para finalmente, com a Lei nº 12.470 de 2011321, o conceito de deficiência

restar desatrelado do conceito de incapacidade laboral:

Art. 20. [...] § 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) [...] § 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011). (Grifo nosso)

Portanto, na legislação vigente, não se fala mais em ―incapacidade para a

vida independente e para o trabalho‖. Observe-se que os próprios quesitos

direcionados ao perito médico judicial vinculam as respostas à questão da

capacidade/incapacidade laboral, conforme se depreende no Processo n° 0501855-

87.2012.4.05.8300:

QUESITOS DO JUÍZO:

1) A parte autora é ou já foi paciente do(a) ilustre perito(a)?

2) Quais profissões o demandante declara já ter desempenhado? (Por

exemplo: foi agricultor, depois empregado em fábrica na atividade de

auxiliar de produção e teve como última atividade a de motorista)

3) O(a) periciando(a) é portador(a) de alguma doença ou de alguma

seqüela? Quais? Desde quando? Indique o perito uma data provável.

4) Qual a data do início da incapacidade?

5) Essa doença ou seqüela incapacita para o exercício de atividade

laborativa? Quais elementos levaram à convicção pericial (tais como

atestados, exames radiológicos, declarações da parte e perícias médicas do

INSS acostadas aos autos virtuais)? Tal incapacidade é temporária ou

definitiva?

320

Id., ibid., 1993. 321

Id., ibid., 1993.

6) Caso a incapacidade seja temporária, qual o prazo ideal para tratamento

durante o qual o(a) autor(a) não poderia trabalhar na sua atividade

habitual?

7) Tal incapacidade inviabiliza o exercício de toda atividade laborativa

(incapacidade total) ou apenas de algumas atividades laborativas (parcial)?

8) Esclareça o perito, caso a incapacidade seja parcial, se o(a) autor(a)

pode exercer a atividade que habitualmente executa/executou, indicando,

caso negativo, as atividades que poderá desempenhar, levando em conta o

grau de escolaridade, idade e as condições sócio-econômicas.

9) O(a) periciando(a) é capaz para realizar as atividades da vida diária

(banhar-se, vestir-se, pentear-se, comer, passear etc.) independentemente

da ajuda de terceiros?

10) O(a) periciando(a) está acometido de: tuberculose ativa, hanseníase,

alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível

incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose

anquilosante, nefropatia grave, estado avançado de doença Paget (osteíte

deformante), síndrome da deficiência imunológica adquirida

(AIDS), contaminação por radiação e/ou hepatopatia grave ?

11. No caso do autor ser portador da Síndrome da Deficiência Imunológica

Adquirida (AIDS), descreva o Sr(a). Perito(a) quais os sinais exteriores da

doença, esclarecendo se eles interferem na sua capacidade laborativa.

12) É necessário que o periciando faça uso constante de medicação?

Em caso afirmativo, a medicação é fornecida pelo SUS?

13) Preste o senhor Perito os esclarecimentos adicionais que considerar necessários. Os esclarecimentos devem ser elaborados de forma clara e com linguagem acessível aos leigos (juiz, advogados e partes). QUESITOS DO INSS: 1) A Autora foi devidamente identificada e submetida a exame clínico completo? 2) As queixas apresentadas são sugestivas de alguma patologia? Caso positivo, qual seria esta patologia? 3) Os dados objetivos do exame físico estão em correspondência com as queixas apresentadas? 4) Qual o diagnóstico? 5) Há invalidez? Temporária ou permanente? 6) Há incapacidade para o desempenho das atividades da vida independente? 7) É possível precisar a data em que a doença, mal ou seqüela tenha acometido a Autora? Com base em que se pode afirmar isso? 8) É possível aferir a data de início da incapacidade? Caso positivo, qual seria esta data? Com base em que se pode afirmar isso? 9) É possível afirmar se a incapacidade do autor foi intermitente? Com base em que se afirma isso? 10) Qual(is) o(s) exame(s) realizado(s) para se chegar às conclusões acima? 11) Preste o Sr. Perito qualquer outra informação que possa ser útil à

solução da demanda.322

322

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0501855-87.2012.4.05.8300 de 08/02/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=449435&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0501855-87.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

Destaca-se o quesito 8 do juízo, em que o perito médico judicial é solicitado a

fazer a avaliação social do periciando, informando a possibilidade de sua

reintegração ao mercado de trabalho, a partir da análise da idade e das condições

socioeconômicas. Em alguns outros processos tal quesito não foi elaborado,

conforme exemplificado acima com o Processo nº 0501218-39.2012.4.05.8300. De

acordo com as observações no item 3.2, a resposta a essas perguntas é crucial para

a procedência ou improcedência dos pedidos. Ademais, atente-se para a

inexistência de quesitos elaborados pela parte autora, por meio da Defensoria

Pública da União. Apesar de não ter sido verificado empiricamente, podemos refletir

se essa iniciativa poderia conduzir a conclusões diferentes daquelas emitidas em

razão dos quesitos acima apontados

No que se refere aos quesitos médicos nos processos envolvendo menores

de idade, em alguns momentos constatou-se a elaboração dos mesmos quesitos

direcionados aos adultos, questionando-se, pois, a incapacidade para o trabalho.323

Em outras Ações questiona-se a frequência escolar e o grau de escolaridade, bem

como, a necessidade de dedicação exclusiva do genitor ou responsável, impedindo-

o de exercer atividade remunerada.324 Por fim, no Processo nº 0515842-

93.2012.4.05.8300S, os quesitos analisam melhor as especificidades do menor de

idade, em relação ao adulto. Vejamos:

3) Em face da deficiência, doença ou seqüela constatada no menor de idade, é necessário o acompanhamento permanente ao longo do dia, de um dos pais do menor (ou dos dois)? Esse acompanhamento impede os pais de saírem de casa para trabalhar? O menor pode estudar, ainda que em escola adequada à sua deficiência ou doença? 4) Qual o impacto da deficiência nas atividades diárias do menor? Existem obstáculos ao seu convívio familiar ou social? 5)A deficiência prejudica o seu desenvolvimento físico ou mental e sua preparação à vida adulta? 6) O seu desenvolvimento é compatível com a sua faixa etária e seu contexto socioeconômico?

325

323

Processo n° 0501849-80.2012.4.05.8300 (15); 0505002-24.2012.4.05.8300 (15); 0504794-40.2012.4.05.8300 (19). 324

Processo n° 0511771-48.2012.4.05.8300 (15); 0511668-41.2012.4.05.8300 (15); 0515294-68.2012.4.05.8300 (15); 0515895-74.2012.4.05.8300 (15); 0513663-89.2012.4.05.8300 (14); 0504038- 31.2012.4.05.8300T (14); 0519948-98.2012.4.05.8300 (19); 0508222-30.2012.4.05.8300 (14) 0514470- 12.2012.4.05.8300S (14). 325

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0515842-93.2012.4.05.8300 de 18/09/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=484767&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0515842-93.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

Assim, as perícias médicos judiciais e as decisões judiciais continuam a

utilizar a expressão ―incapacidade laboral‖. Observe-se que em alguns acórdãos da

Turma Recursal, inclusive, cita-se, expressamente, a legislação já revogada326, com

se pode verificar no Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300S:

EMENTA. CONSTITUCIONAL — PREVIDENCIÁRIO — BENEFÍCIO ASSISTENCIAL — DEFICIENTE — LOAS — — ART. 203, INCISO V, DA CF/88 — LEI Nº 8.742/93 — SÚMULA Nº 29, DA TNU — INAPLICABILIDADE — INEXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORAL — CONCLUSÕES DO LAUDO PERICIAL — RECURSO INOMINADO IMPROVIDO. — Da análise das normas acima transcritas, ressai a imprescindibilidade de se satisfazer a dois requisitos para o reconhecimento à percepção do beneficio assistencial em tela, quais sejam: primeiro, a caracterização da incapacidade do requerente para exercer atividades laborativas, em decorrência de sua deficiência (incapacidade) e, segundo, a situação de penúria em que ele se encontra, de sorte que, da conjugação desses dois pressupostos, transpareça a sua impossibilidade de prover o seu sustento e/ou o de sua família (miserabilidade). — No que se refere ao primeiro requisito, deficiência física ou mental incapacitante (incapacidade), note-se que o §2º, do art.20, da Lei nº 8.742/93 esclarece que ―para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho‖. Já o requisito da miserabilidade é regulado nos termos do o § 3º, do preceptivo mencionado, consoante o qual ―se “considera incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo‖. [...](Grifo nosso)

327

De outra banda, nos processos em que se atenta para as modificações

legislativas, não se distingue o novo texto do anterior já revogado, pois a deficiência

continua a ser vinculada à capacidade laboral, como está posto no Processo nº

0518000-24.2012.4.05.8300S:

EMENTA. CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIENTE. LOAS. ART. 203, INCISO V, DA CF/88. LEI Nº 8.742/93 COM REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 12.435/11. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. REQUISITOS LEGAIS NÃO SATISFEITOS. NULIDADE DE OFENSA AO CONTRADITÓRIO SANADA. RECURSO INOMINADO IMPROVIDO. [...]

326

Neste sentido: Processos nº 0506587-14.2012.4.05.8300; 0504458-36.2012.4.05.8300S; 0519444-92.2012.4.05.8300; 0502270-70.2012.4.05.8300T; 0507404-78.2012.4.05.8300T; 0515686-08.2012.4.05.8300S; 0504860-20.2012.4.05.8300S; 0501855-87.2012.4.05.8300S; 0517848-73.2012.4.05.8300T. 327

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300 de 15/02/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=450539&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0502299-23.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013.

3. Por sua vez, a Lei nº 8.742/93 dispõe, em seu art. 20, caput, que ―O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família”. Conforme inciso I do parágrafo 2º do referido artigo, entende-se por pessoa com deficiência, “aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas”. A redação antiga do dispositivo estabelecia que “Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.” 4. Da análise das normas acima transcritas, ressai a imprescindibilidade de se satisfazer a dois requisitos para o reconhecimento à percepção do beneficio assistencial em tela, quais sejam: primeiro, a caracterização da incapacidade do requerente para exercer atividades laborativas, em decorrência de sua deficiência (incapacidade) e, segundo, a situação de penúria em que ele se encontra (miserabilidade), de sorte que, da conjugação desses dois pressupostos, transpareça a sua impossibilidade de prover o seu sustento e/ou o de sua família. 5. No caso em tela, o laudo pericial afirma que a parte autora não apresenta incapacidade, pode levar uma vida independente, nada levando a crer que terá uma participação diminuída na sociedade pelo que foi constatado pelo perito, não se enquadrado, portanto, no conceito de deficiente físico exigido pela Lei nº 8.742/93 com redação dada pela Lei nº 12.435/11. (Grifo nosso).

328

Na leitura desta ementa, atente-se para o fato de que a Turma Recursal

continua apegada ao conceito de deficiência vinculado à incapacidade laboral. Bem

como, ao final, utilizam-se os termos ―vida independente‖ e ―deficiente físico‖,

ignorando-se a nova redação, que menciona ―impedimentos de longo prazo de

natureza física, intelectual ou sensorial‖.329

Ademais, apesar de se reconhecer, em alguns acórdãos, a possibilidade de

concessão do Benefício de Prestação Continuada diante da ―incapacidade parcial‖, a

Turma Recursal, em alguns processos, condiciona à existência de uma

incapacidade total, como está posto no Processo nº 0521710-52.2012.4.05.8300330:

―São os requisitos para a concessão do benefício, pois: a) Incapacidade total; b)

Miserabilidade‖. 331

328

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0518000-24.2012.4.05.8300 de 17/10/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=489550&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0518000-24.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013. 329

Neste mesmo sentido: Processos nº 0518000-24.2012.4.05.8300S; 0514828-74.2012.4.05.8300T; 0515686-08.2012.4.05.8300S; 0518000-24.2012.4.05.8300S. 330

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0521710-52.2012.4.05.8300 de 18/12/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=499085&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0521710-52.2012.4.05.8300. Acessado em: 25 out. 2013. 331

Conferir também: Processo nº 0521473-18.2012.4.05.8300T.

Ou seja, tanto no juízo de primeiro grau quanto na Turma Recursal, fixa-se

como parâmetro para a obtenção do BPC a incapacidade total e permanente

(superior a 2 anos). Tais informações podem ser verificadas pelos dados obtidos a

partir da análise dos processos em que a perícia médica judicial concluiu pela

―capacidade laboral da parte autora‖ (autores maiores de 18 anos). Em 100%

dessas Ações a sentença de improcedência foi motivada pela ausência de

incapacidade/impedimento.332

Gráfico 6 - Capacidade

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Nos processos em que a perícia médica judicial concluiu pela

INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA; PARCIAL E DEFINITIVA; PARCIAL E

TEMPORÁRIA para o trabalho (maiores de 18 anos), as sentenças de

improcedência em razão da ausência de impedimento/incapacidade permaneceram

altas (77%). Frise-se que os processos em que o perito médico judicial atestou a

―incapacidade parcial‖ e, mesmo assim, o juízo de primeiro grau julgou o pedido de

BPC procedente, também possuem em comum o fato de que os peritos atestaram a

332

Na 14ª Vara (6 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (0 Processos); sentenças de improcedência pela renda (0 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (6 Processos); sentenças homologatórias de acordo (0 Processos); Na 15ª Vara (7 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes ( 0 Processos); sentenças de improcedência pela renda (0 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (7 Processos); sentenças homologatórias de acordo ( Processos); Na 19ª Vara (12 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (0 Processos); sentenças de improcedência pela renda (0 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (12 Processos); sentenças homologatórias de acordo (0 Processos).

redução na capacidade de competir no mercado de trabalho, a dificuldade de

reabilitação ou a necessidade de reabilitação para outra função da parte autora.333

Gráfico 7 - Incapacidade total e temporária; parcial e definitiva; parcial e temporária

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Nos processos em que a perícia médica judicial conclui pela incapacidade

total e permanente, as sentenças de improcedência em razão da ausência de

incapacidade/impedimento caem para 0%, bem como, são celebrados acordos entre

as partes em 25% dos processos.334

333

Na 14ª Vara (14 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (2 Processos); sentenças de improcedência pela renda (1 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (11 Processos); sentenças homologatórias de acordo (0 Processos). Observe-se que, nos dois casos em que a sentença foi de procedência, os peritos médicos judiciais, apesar de qualificar a incapacidade como parcial e permanente, evidenciaram a redução na capacidade de competição no mercado de trabalho e a dificuldade de reabilitação (Processos n. 0514577- 56.2012.4.05.8300S e n. 0505489- 91.2012.4.05.8300T); Na 15ª Vara (5 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (2 Processos); sentenças de improcedência pela renda (0 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (3 Processos); sentenças homologatórias de acordo (0 Processos). Foram julgados procedentes os pedidos do Processo n. 0501698-17.2012.4.05.8300S, em que o Perito não fixa data para recuperação (incapacidade total e temporária), bem como, no Processo n. 0501218- 39.2012.4.05.8300, em que o perito médico judicial atesta a incapacidade parcial e definitiva e a necessidade de reabilitação para o exercício de outra função (sentença reformada pela Turma Recursal); Na 19ª Vara (3 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (0 Processos); sentenças de improcedência pela renda (0 Processos); sentenças de improcedência pela ausência de impedimentos/incapacidade (3 Processos); sentenças homologatórias de acordo (0 Processos). 334

Na 14ª Vara (9 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes (2 Processos); sentenças improcedentes pela renda (4 Processos); sentenças improcedentes pela ausência de impedimentos/incapacidade (0 Processos); sentenças homologatórias de acordo ( 3 Processos). Na 15ª Vara (4 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes ( 1 Processos); sentenças improcedentes pela renda (3 Processos); sentenças improcedentes pela

Gráfico 8 - Incapacidade total e permanente

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Vincular a concessão do benefício apenas aos casos em que foi constatada a

incapacidade total e permanente para o trabalho, finda por equiparar os requisitos de

concessão do benefício assistencial aos requisitos para a concessão da

aposentadoria por invalidez (benefício previdenciário). Ou seja, em contradição com

a legislação vigente, exclui a possibilidade de a assistência social funcionar como

fomentadora do desenvolvimento das ―habilidades‖ e ―capacidades‖ da pessoa com

deficiência.

Como ressaltado nos primeiros capítulos, a Convenção Internacional sobre os

Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em

Nova York335, estabelece como compromisso dos Estados Partes ―promover a

conscientização sobre as capacidades e contribuições das pessoas com deficiência‖

(artigo 8, 1. c), bem como, ―promover o reconhecimento das habilidades, dos méritos

e das capacidades das pessoas com deficiência e de sua contribuição ao local de

trabalho e ao mercado laboral‖ (artigo 8, 2. iii). Igualmente, a Resolução n º 145, de

15 de outubro de 2004, que instituiu a Política Nacional de Assistência Social,

chamou a atenção para ―uma visão social capaz de entender que a população tem

ausência de impedimentos/incapacidade (0 Processos); sentenças homologatórias de acordo ( 0 Processos). Na 19ª Vara (3 Processos), foram proferidas as seguintes sentenças: sentenças procedentes ( 0 Processos); sentenças improcedentes pela renda ( 2 Processos); sentenças improcedentes pela ausência de impedimentos/incapacidade (0 Processos); sentenças homologatórias de acordo ( 1 Processos). 335

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013.

necessidades, mas também possibilidades ou capacidades que devem e podem ser

desenvolvidas‖336.

Repita-se que o art. 21-A, incluído pela Lei nº 12.470, de 2011337 prevê, em

caso de exercício de atividade remunerada pelo beneficiário do BPC, apenas a

suspensão do benefício. Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora,

o indivíduo poderá requerer a continuidade do pagamento do benefício suspenso,

sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do

grau de incapacidade. Outrossim, a contratação de pessoa com deficiência como

aprendiz não acarretaria a suspensão do benefício de prestação continuada, limitado

a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da remuneração e do benefício.

A Lei nº 12.435, de 2011338, dispôs ainda que ―o desenvolvimento das

capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não

remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de

suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência‖ (artigo 21, § 3o).

Por fim, atente-se para o Programa Nacional de Promoção do Acesso ao

Mundo do Trabalho – ACESSUAS-TRABALHO, para o Programa BPC Trabalho e

para o Programa BPC na Escola. Ou seja, conforme se depreende da legislação

pátria, a possibilidade de desenvolvimento de habilidades não impede a concessão

do BPC, do contrário, ensejaria um estímulo para tal. Razão pela qual as decisões

que julgam improcedentes os pedidos, exclusivamente, no fato da ―incapacidade‖

ser parcial, distanciam-se das diretrizes legais.

Nos processos abaixo apontados também se verifica um problema de

identificação de sentido e autonomia da assistência social em relação à previdência

social. Com efeito, apesar de gerido pelo INSS, o Benefício de Prestação

Continuada, conforme a legislação, operaria sob a lógica da assistência social, qual

seja, de proteção aos necessitados. Enquanto que a previdência social operaria sob

a lógica da contribuição e do trabalho.

336

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: CNAS/MDS, 2004. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/assistencia social/arquivo/Politica%20Nacional%20de%20Assistencia%20Social%202013%20PNAS% 202004%20e%202013%20NOBSUAS-sem%20marca.pdf>. Acessado em: 29 out. 2013. 337

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 338

Id., Ibid., 1993.

No Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300S, o juiz argumentou no sentido

de que, pelo fato da autora nunca ter exercido atividade laboral, ―sua incapacidade

não é causa de impedimento de qualquer atividade habitual, já que não possui uma‖.

Ou seja, transmite-se a ideia de que a proteção assistencial apenas se dirigiria

aqueles indivíduos que tenham exercido atividade laboral anterior (lembre-se que

era assim que funcionava a extinta Renda Mensal Vitalícia). Ademais, ignora-se que

o conceito de impedimento, conforme a disposição legal, ultrapassa a campo do

trabalho, atingindo uma esfera muito mais ampla, qual seja da ―participação plena e

efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas‖. Vejamos:

II- FUNDAMENTAÇÃO [...] No caso em comento, após realizada perícia médica foi constatado que a parte autora é portadora de Sequela de Câncer de mama. A partir daí, o perito judicial concluiu, de forma clara e fundamentada, que a demandante está incapaz parcialmente, ou seja, apenas para o desempenho de determinados tipos de atividade, as quais necessitem grandes esforços físicos, movimentos repetitivos e exposição ao calor. Entrentanto, a pericianda nunca exerceu atividade laborativa remunerada e, dessa forma, sua incapacidade não é causa de impedimento de qualquer atividade habitual, já que não possui uma. Ora, com esse quadro, considerando que se trata de incapacidade apenas parcial, que a autora tem 57 anos de idade e que nunca teve outra atividade laborativa (veja-se a ausência de registros no CNIS e na CTPS – anexos 2 e 9), entendo que pode perfeitamente continuar a ser uma dona de casa, como sempre foi até hoje, não havendo que falar em impossibilidade de reinserção no mercado de trabalho, se nele nunca esteve. Ademais, além de ser a doença tratável no SUS, a doença atingiu a mama direita e a autora é canhota. É para casos como o da autora que a legislação prevê o Loas etário, quando o interessado atinge os 65 anos de idade, passando assim ao conceito de hipossuficiente tão-somente pela idade avançada, sem que seja necessário perquirir a existência ou não de incapacidade laborativa. No entanto, a autora deverá, se lhe aprouver, esperar a idade mínima de 65 anos para postular então o amparo social. [...]

339

No Processo nº 0507327- 69.2012.4.05.8300S, a seu turno, o julgador

argumenta que, haja vista que a demandante ―nunca laborou‖, pode ―habilitar-se a

função compatível‖. Ou seja, da premissa de ―não trabalho‖, conclui pela

―possibilidade de trabalho‖, em evidente contrasenso. Vejamos:

II- FUNDAMENTAÇÃO [...] No caso em comento, após realizada perícia médica foi constatado que a parte autora é portadora de Câncer de mama e déficit funcional

339

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0502299-23.2012.4.05.8300 de 15/02/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=450539&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0502299-23.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

em membro superior direito. A partir daí, o perito judicial concluiu que a demandante está incapaz de forma parcial e definitiva, ou seja, apenas para o desempenho de determinados tipos de atividade, as quais demandem o uso da força física de média a grande intensidade, exposição ao calor e movimentos repetitivos. Ora, considerando que se trata de incapacidade apenas parcial, que a autora ainda é relativamente jovem (conta com 50 anos), que a doença tem prognóstico otimista, que o tratamento medicamentoso e o cirúrgico estão disponíveis no SUS e que a demandante possui o nível médio e nunca laborou, podendo, assim, habilitar-se a função compatível, não restou preenchido o primeiro requisito para a concessão do benefício. Concluir diversamente seria admitir o deferimento do amparo social a todos aqueles que apresentassem alguma deficiência parcial, o que não é, à evidência, o que determina a norma legal. Portanto, não há como se conceder o benefício pleiteado. Outrossim, como os requisitos para a concessão do LOAS devem ser concomitantes e restou afastado um deles, deixo de apreciar o requisito econômico. (Grifo nosso).

340

Por fim, foram elaboradas propostas de acordo pela Autarquia Previdenciária

apenas nos casos em que a perícia médica judicial conclui pela INCAPACIDADE

TOTAL E DEFINITIVA (acima de 2 anos) para o trabalho (dados referentes aos

processos em que os autores são maiores de 18 anos). Nos processos em que a

perícia judicial concluiu pela CAPACIDADE, INCAPACIDADE TOTAL E

TEMPORÁRIA, PARCIAL E DEFINITIVA, PARCIAL E TEMPORÁRIA para o

trabalho (maiores de 18 anos), não houve a proposta de acordo. Dessas

informações podemos concluir que a deficiência para fins de concessão do BPC, na

concepção da Autarquia Previdenciária, quando atua em juízo, equivale a uma

incapacidade total e permanente para o trabalho.

A partir da análise dos dados colhidos, evidencia-se que a avaliação da

deficiência para fins de concessão do BPC, no âmbito dos JEFs, continua apegada

aos conceitos revogados pela legislação atual. Ou seja, permanece atrelada à

avaliação do fator corpo, com base exclusivamente na CID, por meio de avalição

pericial médica. Ademais, a ―incapacidade‖ é direcionada para o âmbito do trabalho,

sendo exigida uma incapacidade total, ignorando-se que as alterações na legislação

ampliam o alcance da proteção assistencial, com fins à ―participação plena e efetiva

na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas‖.

340

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0507327-69.2012.4.05.8300 de 11/05/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=463736&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0507327-69.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Interessante observar, a partir da pesquisa de dados, que os argumentos

levantados nas decisões judiciais nos JEFs comunicam as informações trazidas pela

perícia médica judicial como ―boas razões‖, a ponto de legitimar a atividade

jurisdicional. Verificou-se que, quando a perícia médica judicial indica a inexistência

de ―incapacidade‖ para o trabalho (adultos) ou para atividades próprias da idade do

periciando (menores), os magistrados de primeiro grau proferem a sentença de

improcedência, independentemente da análise dos outros dados trazidos ao

processo (documentação médica do autor e pareceres elaborados pelos assistentes

técnicos, informações prestadas em audiências, parecer social etc), bem como, sem

a intimação da parte autora para manifestar-se acerca do parecer e apresentar

eventuais impugnações.

Assim, sequer a parte Ré é citada para compor o polo passivo e possibilitar a

auto composição. Restringe-se a comunicação no processo ao perito médico judicial

e ao juiz. Nesses casos em que o juiz emite decisão sem a realização de audiência,

sem a oportunidade de vista das partes ao laudo e sem a consideração dos demais

documentos colacionados ao processo, parte-se do pressuposto de que o laudo

médico elaborado pelo perito do juízo é impassível de equívocos e, portanto,

incontestável. Decisões que acabam sendo mantidas na instância recursal.

A Ação Judicial nº 0517692-85.2012.4.05.8300T341 é um exemplo em que se

restringiu a comunicação ao laudo médico judicial, negando-se a possibilidade de

impugnação. Neste processo, a Autora faleceu logo após a sentença que julgou o

pedido improcedente com base no laudo médico. Com efeito, a partir dos dados

obtidos na perícia realizada no dia 30/10/2012, o perito médico judicial concluiu que

a autora ―pode desempenhar função laboral, não havendo qualquer incapacidade

laboral‖. Após a emissão do referido laudo, foi proferida sentença de improcedência,

―Sentença TIPO A‖ (conforme nomeou o magistrado), com base no parecer médico

pericial. No dia 30/05/2013 a Autora faleceu, sendo esta a descrição contida na

certidão de óbito: ―parada cardiorrespiratória, insuficiência respiratória aguda, crise

asmática grave, infecção trato respiratório‖.

Independentemente da correção ou incorreção do parecer médico judicial,

interessa-nos observar que não houve audiência ou intimação da parte autora para 341

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0517692-85.2012.4.05.8300 de 10/10/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=488768&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0517692-85.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

manifestar-se. Outrossim, não há qualquer menção na sentença à documentação

médica apresentada na Inicial e emitida pelos médicos que acompanhavam o

tratamento da autora. Inclusive, um dos atestados, datado de 05/10/2012, informa

internamento hospitalar ―sem previsão de alta‖. Na sentença, não consta qualquer

referência às características socioeconômicas da Autora, como idade, escolaridade

e profissões desempenhadas no passado.

Depreende-se que a utilização do argumento de cientificidade do parecer

elaborado pelo perito médico do juízo objetiva afastar a necessidade de apreciação

dos outros elementos trazidos pelas partes ao processo judicial (documentação

médica do autor, parecer emitido pelo assistente técnico, informações obtidas por

meio do mandado de verificação ou parecer social etc.). Senão, vejamos a decisão

proferida pela Turma Recursal no Processo nº 0519444- 92.2012.4.05.8300342:

EMENTA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE LABORATIVA. AUSÊNCIA. REQUISITOS DO ART. 20 DA LEI 8.742/93. NÃO ATENDIMENTO. RECURSO IMPROVIDO. [...] - Quanto ao requerimento de anulação da sentença, é importante ressaltar que o juízo, quando da formação do seu convencimento, levou em conta as provas documentais, os argumentos e a legislação aplicável à situação posta em julgamento. - No presente caso, o laudo se manifesta de forma indubitável quanto à capacidade da autora. Ademais, não apresenta nenhum vício, que possa acarretar a anulação da prova. O fato do laudo ter concluído contrariamente ao argumento da parte autora, não é razão para que seja realizada nova perícia. – Não é demais relembrar que o Perito, na condição de auxiliar do Juízo, exerce seu mister de modo imparcial, como terceiro desinteressado na lide. Não há óbice, portanto, em adotar suas conclusões como razão de decidir, permeadas que são por critérios técnico-científicos, os quais não restaram elididos pelos elementos trazidos aos autos. - No que se refere ao pedido de reforma da sentença, infere-se do laudo pericial (doc. 16) que a parte autora, conquanto portadora de transtorno do retardo mental leve, sob o CID – X – F 70.0, está capaz para exercer atividades laborativas. - Esclarece o perito que por ser tal paciente portador de transtorno do retardo do desenvolvimento mental leve, tendo o diagnóstico F 70.0 – CID-X – OMS, entidade clínica essa onde há leve déficit de inteligência, em média tais indivíduos chegam a atingir até 70% do potencial normal de inteligência, porém a avaliação global da inteligência, o treinamento e a reabilitação podem melhorar as habilidades intelectuais e a adaptação social, passando os mesmos a ter condições de exercer atividades laborais, portanto, o paciente em tela, não apresenta prejuízo acentuado para exercer atividades laborativas, a vida independente está preservada.

342

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0519444-92.2012.4.05.8300 de 08/11/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=489260&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0519444-92.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

- Por tais razões, ausente o requisito da incapacidade, ainda quando analisadas as peculiaridades do caso concreto, não merece acolhimento o pedido de concessão de benefício assistencial [...].(Grifo nosso).

343

Resta clara a adoção da perícia médica judicial como ―razão de decidir‖ nos

processos envolvendo a concessão do benefício de prestação continuada. Neste

mesmo sentido, no Processo nº 0503043-18.2012.4.05.8300S, o juízo de primeiro

grau julgou o pedido improcedente com base no seguinte argumento:

F U N D A M E N T A Ç Ã O

No presente caso, desde logo se verifica que a parte autora não padece de incapacidade laborativa, o que, nos termos da legislação aplicável à espécie figura como requisito indispensável à concessão do benefício perseguido. Com efeito, da análise dos autos, vejo que o laudo do perito designado por este Juízo conclui, de forma clara e enfática, pela inexistência de incapacidade temporária ou definitiva da parte demandante para o trabalho. Assim, considerando o teor do referido laudo médico-pericial, entendo que a improcedência da pretensão deduzida é manifesta, dispensando a produção de prova testemunhal que, qualquer que seja o resultado, será sempre insuficiente para afastar essa conclusão. Dessa forma, sob pena de dispêndio desnecessário de recursos materiais e humanos, tanto pela administração pública como por este JEF, entendo viável o julgamento antecipado do mérito, embora sem o chamamento do réu ao processo. Como no JEF o procedimento pode ser relativizado, visando, dentre outros objetivos, à economia processual, inibir a mera e injustificada reiteração formal de atos sem qualquer interferência racional quanto ao conteúdo configura medida de razoabilidade. Ademais, o precedente reportado é favorável ao réu, de modo que nenhum prejuízo se lhe encerra, permanecendo incólumes os princípios constitucionais que informam o processo civil. É evidente que, no contexto atual do direito brasileiro, haja vista a recente introdução na Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional nº. 45/2004, do princípio do razoável tempo de tramitação do processo (artigo 5º, LXXVIII, da CF/88), postulados processuais, como o contraditório, exigem uma aplicação mais dinâmica e menos formalista. Assim, num caso concreto em que, apresentando ou não a parte ré a defesa, o juízo já tem consciência, logo de início, de que o julgamento será desfavorável à parte autora, não se concebe a prática de um ato processual sem a menor necessidade. Nesses casos, não havendo prejuízo à defesa, não se pode suscitar violação ao contraditório, que resultou preservado à parte autora ao apresentar a causa de pedir na petição inicial.

344Grifei.

343

Neste mesmo sentido: Processos nº 0519715-04.2012.4.05.8300; 0519444- 92.2012.4.05.8300T; 0503675-44.2012.4.05.8300S; 0510874-20.2012.4.05.8300S; 0504944-21.2012.4.05.8300; 0505689-98.2012.4.05.8300T; 0519954-08.2012.4.05.8300T. 344

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0503043-18.2012.4.05.8300 de 02/03/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=452324&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0503043-18.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

A Turma Recursal manteve a decisão recorrida, fazendo constar a seguinte

informação no ementário: ―DEMAIS MEIOS DE PROVAS NÃO CONVINCENTES‖.

Ocorre que, em momento algum do decisum, informa quais seriam os ―demais meios

de provas‖, bem como, porque não seriam ―convincentes‖. Vejamos:

CONSTITUCIONAL – PREVIDENCIÁRIO – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL – DEFICIENTE – CAPACIDADE LABORATIVA – DEMAIS MEIOS DE PROVAS NÃO CONVINCENTES – REQUISITO INSATISFEITO – NÃO CONCESSÃO – IMPROVIDO. 1. Trata-se de Recurso Inominado interposto pela parte autora contra sentença improcedente proferida em sede de Ação Especial Cível com a qual se objetivou a concessão de benefício assistencial à deficiente (LOAS). 2. O requisito miserabilidade não foi objeto de litígio, sendo o fato controvertido a questão da incapacidade. 3. Eis que o laudo pericial (anexo 8) constatou que a parte autora não era incapacitada para o trabalho, embora seja portadora do transtorno mental, possuindo prognóstico favorável. No atestado juntado aos autos pela parte autora (anexo 2), o medido atestou pela incapacidade, ressaltando, inclusive, que possuía idéias suicidas. 4. É cediço que o juiz não está adstrito as conclusões do laudo pericial, podendo julgar em sentido contrario em virtude do princípio do livre convencimento. Todavia, neste caso, o laudo foi bastante categórico e completo pela capacidade, advertindo que, de fato, a parte autora detinha a perturbação da saúde mental a nível neurótico, mas nada que gerasse a incapacidade e que fizesse perder o senso crítico, a vontade e os rendimentos intelectuais. 5. Dessa maneira, a concessão de benefício assistencial à deficiente é inviável, Pode, contudo, a parte autora requerer o benefício ao completar a idade para o benefício assistencial ao idoso, sendo indispensável a análise do requisito da miserabilidade quando do requerimento administrativo. 6. Para fins processuais, ficam prequestionados os arts. 1º e 5º da CF/88, e especificamente o a art. 5º, LV da CF/88. 7. Sem honorários em virtude da Justiça Gratuita. 8. Recurso inominado improvido.

345

Conclui-se, então, que a perícia médica judicial foi o único ―meio de prova‖

(conforme a literalidade da ementa) considerado. Percebe-se que o sistema do

direito utiliza informações de outros sistemas sociais adaptando-as às suas próprias

estruturas, dando-lhes a forma que lhe são pertinentes e utilizando-se dessas

informações em sua argumentação como ―boas razões‖, mesmo que contestáveis

cientificamente ou em face dos demais elementos trazidos ao processo (ou não

trazidos, no caso da ausência de perícia social ou realização de audiência).

345

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0503043-18.2012.4.05.8300 de 02/03/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=452324&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0503043-18.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

O mesmo não ocorre com a perícia social, uma vez que tais pareceres são

utilizados, basicamente, para apontar a constituição do núcleo familiar e da renda

per capita, bem como, são corriqueiramente afastados pelos juízes quando tais

informações entram em confronto, por exemplo, com as informações obtidas por

meio do Cadastro Nacional de Informações do INSS ou, até mesmo, em razão das

informações obtidas em audiência. Tais fatos apenas reforçam que a força

probatória e a qualidade da perícia serão comunicadas pela própria organização, e

não em razão de comunicações externas.

Analisando a fundamentação das sentenças de primeiro grau (excetuando-se

as sentenças homologatórias de acordo), constatamos que em grande parte dos

processos a motivação restringe-se ao laudo médico judicial, em detrimento dos

demais elementos do processo, quais sejam: informações prestadas em audiência,

idade, escolaridades, profissões desempenhadas, perícia social, mandado de

verificação, arquivos do INSS (CNIS, PLENUS, HISMED), processo administrativo,

documentação médica juntada pela parte autora etc..

Em setenta e um (71) processos analisados em que foram realizadas perícias

médicas judiciais (autores maiores e menores de 18 anos) e proferidas sentenças

não homologatórias de acordo, em 49% houve referência, na sentença de primeiro

grau, a algum outro elemento dos autos, enquanto que em 51% dos processos, a

sentença apenas se referiu às informações prestadas pelo perito médico judicial,

nada mais.346

346

Na 14ª Vara Federal (30 processos): em 20 processos houve a referência a outras informações na sentença; em 10 processos houve referência apenas à perícia médica na sentença. Na 15ª Vara Federal (22 processos): em 10 processos houve a referência a outras informações na sentença; em 12 processos houve referência apenas à perícia médica na sentença. Na 19ª Vara Federal (19 processos): em 5 processos houve a referência a outras informações na sentença; em 14 processos houve referência apenas à perícia médica na sentença.

Gráfico 9 - Motivação da sentença de 10 Grau

Fonte: elaborado pela autora, como resultado das pesquisas

Evidencia-se a posição central ocupada pela perícia médica judicial na

formação do convencimento dos juízes de primeiro grau nas ações envolvendo a

concessão do benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência, em

detrimento dos demais elementos, pois, em 51% dos processos, sequer são citados

na sentença. Tal fato, inclusive, é evidenciado no próprio corpo da sentença. É o que

se depreende da análise do Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300T. Vejamos

toda a fundamentação da decisão:

F U N D A M E N T A Ç Ã O No presente caso, desde logo se verifica que a parte autora não padece de incapacidade laborativa, o que, nos termos da legislação aplicável à espécie figura como requisito indispensável à concessão do benefício perseguido. Com efeito, da análise dos autos, vejo que o laudo do perito designado por este Juízo conclui, de forma clara e enfática, pela inexistência de incapacidade temporária ou definitiva da parte demandante para o trabalho. Assim, considerando o teor do referido laudo médico-pericial, entendo que a improcedência da pretensão deduzida é manifesta, dispensando a produção de prova testemunhal que, qualquer que seja o resultado, será sempre insuficiente para afastar essa conclusão. Dessa forma, sob pena de dispêndio desnecessário de recursos materiais e humanos, tanto pela administração pública como por este JEF, entendo viável o julgamento antecipado do mérito, embora sem o chamamento do réu ao processo. Como no JEF o procedimento pode ser relativizado, visando, dentre outros objetivos, à economia processual, inibir a mera e injustificada reiteração formal de atos sem qualquer interferência racional quanto ao conteúdo configura medida de razoabilidade. Ademais, o precedente reportado é favorável ao réu, de modo que nenhum prejuízo se lhe encerra, permanecendo incólumes os princípios constitucionais que informam o processo civil. É evidente que, no contexto atual do direito brasileiro, haja vista a recente introdução na Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional nº. 45/2004, do princípio do razoável tempo de tramitação do processo (artigo 5º, LXXVIII, da CF/88), postulados processuais, como o contraditório,

exigem uma aplicação mais dinâmica e menos formalista. Assim, num caso concreto em que, apresentando ou não a parte ré a defesa, o juízo já tem consciência, logo de início, de que o julgamento será desfavorável à parte autora, não se concebe a prática de um ato processual sem a menor necessidade. Nesses casos, não havendo prejuízo à defesa, não se pode suscitar violação ao contraditório, que resultou preservado à parte autora ao apresentar a causa de pedir na petição inicial. (Grifo nosso).

347

No processo acima não foi realizada audiência e o juiz sentenciante acolheu

integralmente as conclusões periciais:

[...] 9. O (a) demandante pode ou não pode desempenhar sua atual profissão mesmo acometido (a) da doença por ele alegada? Ou seja: encontra-se capaz ou incapaz para o exercício de sua atual profissão? Quais elementos levaram a convicção pericial (tais como atestados, exames radiológicos, declarações da parte e perícias médicas do INSS acostadas aos autos virtuais)? A pericianda encontra-se capaz para desempenhar sua atividade laborativa (feirante), uma vez que não envolve esforço físico intenso. Cateterismo cardíaco executado em 16/04/2010 evidenciou oclusão em 1/3 médio de coronária direita, artéria descendente anterior ocluída no óstio, diagonal com lesão severa em óstio, 1/3 médio da circunflexa com lesão severa. Em 18/05/2010 foi submetida à revascularização miocárdica (mamária-DA, safena-mg e diagonal) com sucesso cirúrgico. A pericianda realizou ecocardiograma em 11/08/2011 que identificou ventrículo esquerdo com função sistólica pouco reduzida (fração de ejeção de 48%, sendo normal a partir de 53%), átrio esquerdo de dimensão normal (36mm, sendo o normal até 40mm) e leve alteração de relaxamento do ventrículo esquerdo. Esta discreta redução da função cardíaca impede realização de atividades laborativas com esforço físico intenso, mas esforços físicos leves/moderados poderão ser realizados. (Grifo nosso).

348

Por sua vez, no Processo nº 0505489-91.2012.4.05.8300T, a fundamentação

abrangeu outros elementos. Vejamos:

No caso em comento, após realizada perícia médica foi constatado que a

parte autora é portadora de Câncer de amam há aproximadamente um ano.

A partir daí, o perito judicial concluiu que a demandante está incapaz de

forma parcial e definitiva, ou seja, apenas para o desempenho de

determinados tipos de atividade, as quais necessitem do uso da força,

movimentos repetitivos e exposição ao calor.

347

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300 de 24/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=459161&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0505689-98.2012.4.05.8300> . Acessado em: 25 out. 2013. 348

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300 de 24/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=459161&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0505689-98.2012.4.05.8300> . Acessado em: 25 out. 2013.

Entretanto, é valido ressaltar que, apesar da demandante ainda ser

relativamente jovem (conta com 47 anos), não é alfabetizada, sempre

laborou em atividades do tipo braçal (lavadeira de roupas) e sua

patologia tem caráter imprevisível. Ora, uma pessoa nestas condições,

segundo o próprio expert, não tem mais como reabilitar-se para nova

atividade, muito menos como prover seu próprio sustento e

sobrevivência, por isso, entendo razoável considerar sua incapacidade

como total e definitiva. Ademais, a doença da autora segue piorando,

pois não é reversível e o seu prognóstico é pessimista. A DII foi fixada

pelo expert em 24/04/2011, baseando-se em data de cirurgia que foi

responsável pela seqüela incapacitante.

Fundamental é esclarecer que, o juiz, presentes outros elementos de

convicção, está livre para proferir sua decisão, sendo seu dever analisar as

condições socioeconômicas do indivíduo – tais como a idade, pobreza,

baixa instrução formal e condições da doença – e o contexto social no qual

inserido o problema, que é de grave crise econômica. Assim, deve o juiz,

para verificar o direito ao benefício pretendido, analisar a questão posta não

apenas do ponto de vista médico, mas também da perspectiva quanto à real

e efetiva possibilidade de retorno ao mercado de trabalho, levando em conta

as peculiaridades acima citadas. (Grifo nosso) .349

No processo supra mencionado, o perito médico judicial emitiu o seguinte

parecer:

5) A incapacidade é total (inviabilizando toda e qualquer atividade laborativa) ou parcial (inviabilizando apenas algumas atividades laborativas)? Em caso de incapacidade parcial, exemplificar tipos de atividade que podem ser exercidos pelo(a) periciando(a). R. Incapacidade parcial pois a periciada terá que evitar atividades que necessitem do uso da força, movimentos repetitivos e exposição ao calor, porém a mesma não é alfabetizada, o que dificultará uma reabilitação para atividades que fujam dessas características, neste caso, podendo enquadra-la em incapacidade total. 6) Qual o trabalho exercido pelo periciando quando da constatação de sua incapacidade? R.Lavadeira de roupas. 7) A doença o impede para o exercício da atividade laborativa descrita na questão anterior? Como? R. Sim,por ser necessário o uso de esforços físicos e movimentos repetitivos.

350

349

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0505489-91.2012.4.05.8300 de 11/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=457217&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0505489-91.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013. 350

BRASIL. Justiça Federal de Pernambuco. Processo nº 0505489-91.2012.4.05.8300 de 11/04/2012. Brasília: JFP, 2012. Disponível em: <https://creta.jfpe.jus.br/cretainternetpe/consulta/ processo/detalhe.wsp?tmp.processo_judicial.id_processo_judicial=457217&tmp.processo_judicial.nr_processo_judicial=0505489-91.2012.4.05.8300>. Acessado em: 25 out. 2013.

Destarte, enquanto no Processo nº 0505689-98.2012.4.05.8300T, a

fundamentação da sentença restringiu-se ao parecer médico judicial, no Processo nº

0505489-91.2012.4.05.8300T, a fundamentação judicial abrangeu outros elementos

como idade, escolaridade, profissões desempenhadas no passado, características

da doença e o próprio parecer médico judicial que concluiu pela ―dificuldade de

reabilitação‖.

Ocorre que, conforme já apontado, nos processos analisados, mesmo que os

juízes indiquem na sentença outros elementos além da perícia médica judicial, com

o fim de conceder o BPC à pessoa com ―incapacidade parcial‖, as decisões de

procedência apenas ocorreram nos casos em que o perito médico judicial atestou a

redução na capacidade de competir no mercado de trabalho, a dificuldade de

reabilitação ou a necessidade de reabilitação para outra função. Portanto, repita-se,

a perícia médica judicial é o principal elemento utilizado na motivação das sentenças

emitidas nos Juizados Especiais Federais, enquanto que a avaliação social possui

repercussão quase que inexistente.

Conforme a teoria dos sistemas sociais de Luhmann, tal fenômeno é possível

em razão do fechamento operativo e da abertura cognitiva do sistema do direito. As

mudanças na valoração social da deficiência e da assistência social são

processadas internamente pelo sistema do direito e pelas organizações jurídicas

segundo o código lícito/ilícito, como informações, e por eles aproveitadas ou

descartadas. Igualmente, de Luhmann, extraímos a diferenciação entre legislação e

decisão judicial. Em razão da necessidade de decisão, os tribunais manejam o

paradoxo do sistema, diferenciando sistema/entorno, razão pela qual ocupam o

centro do sistema do direito e estão em um isolamento cognitivo mais drástico. A

legislação, por sua vez, encontra-se na periferia, em maior contato com as demais

funções sociais. A partir dessas ideias podemos compreender a possibilidade de

comunicação de um sentido de direito ao benefício de prestação continuada à

pessoa com deficiência desatrelado da legislação vigente. Bem como, o fato de

haver normatização sem institucionalização ou identificação de sentido. Maior

aprofundamento será dado no próximo capítulo.

4 O conceito de deficiência nos JEFs: uma observação a partir da teoria dos

sistemas sociais

Para a teoria dos sistemas sociais, diferentemente das demais teorias, o

direito não é um conjunto ordenado de estruturas, mas um conjunto de operações

que, como toda operação social, são comunicações. Assim, para além das

estruturas (regras, normas, textos), o direito é aquilo que o direito comunica como

direito. Por meio das operações (comunicações), internas ao sistema do direito,

recursivamente, o próprio sistema seleciona aquilo que pertence ao seu interior e

exclui aquilo que pertence ao entorno e, assim, produz e reproduz o sentido do

direito (fechamento operativo).351

Este fechamento operativo tem como consequência a determinação do

sistema por auto-organização, pois suas estruturas constroem-se e transformam-se

por operações próprias. Autopoiese significa, portanto, ―produção do sistema por si

mesmo‖. Estruturas, a seu turno, são ―esquemas de seleção que permitem

reconhecer e repetir‖, ―condensam as identidades‖, para ―confirmá-las em cada nova

situação‖, para generalizá-las.352

Assim, porque delimitam o âmbito das operações com capacidade de enlace,

o âmbito de possibilidades, as estruturas são condições da autopoiese do sistema. A

constância da autopoiese, por sua vez, permite a formação de estruturas. Contudo,

não indica que tipo de estruturas ou programas normativos se desenvolverão, pois

tais operações ocorrem no presente e de modo simultâneo. As comunicações

jurídicas confirmam ou modificam as estruturas, sempre partindo do estado anterior,

razão pela qual os sistemas autopoiéticos são históricos.353

Apenas por meio do fechamento operativo, da autodeterminação e da auto-

organização é possível a compatibilidade do sistema com o entorno desordenado.

Apenas os sistemas operativamente fechados podem construir uma alta

complexidade, diferenciando-se do entorno. 354

351

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 97-97. 352

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 67-70. 353

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 105-339. 354

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 47-67.

Conforme já apontado acima, identificamos os JEFs como organizações do

sistema do direito que comunicam um sentido de direito à assistência social da

pessoa com deficiência por meio de sua rede de decisões recursivas. Deste modo,

não obstante a existência de uma valoração social e de uma legislação em vigor a

tratar do tema, aplicando as ideias acima, temos que o conceito de ―pessoa com

deficiência‖ para fins de concessão do benefício de prestação continuada também é

comunicado no momento das operações da organização dos JEFs.

4.1 Sociedade e direito: aprendizado e estabilidade contrafatual das normas

Para compreendermos como é possível a comunicação de um sentido de

deficiência na sociedade diverso daquele comunicado no sistema do direito e em

suas organizações, impende destrinchar a relação ambígua, descrita por Luhmann,

entre sistema do direito e sociedade. Conforme o autor, uma vez que a sociedade é

o sistema oniabarcador de todas as comunicações, o sistema do direito, como

subsistema da sociedade, insere-se nas ordens sociais gerais, fazendo uso de

estruturas que servem a outras funções. Por esta razão, as mudanças nas

estruturas sociais também são processadas internamente pelo ordenamento jurídico.

Processar internamente significa utilizar o código próprio do sistema. 355

Ou seja, pertencem ao sistema jurídico apenas as comunicações

coordenadas pelo código lícito/ilícito ao direito. Este código representa a unidade do

sistema, mas não é uma norma, é ―a estrutura de um mecanismo de reconhecimento

e um procedimento de coordenação da autopoiese da sociedade‖.356 A distinção

entre sistema e entorno que permite a referência recíproca, lembrando que tais

relações partem das operações do próprio sistema, de uma rede recursiva

denominada ―fechamento‖.357 Assim, o sistema do direito processará as informações

presentes na sociedade acerca da deficiência e da assistência social, e comunicará,

por meio do código lícito/ilícito, aquilo que é direito à assistência social da pessoa

com deficiência e aquilo que não é direito à assistência social da pessoa com

deficiência.

355

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 110-115. 356

Id., ibid., p. 126. 357

Id., ibid., p. 132.

Se, por um lado, é possível, normativamente, prever que as expectativas

normativas do sistema se imporão, de outro, também são capazes de aprendizado e

modificação em um determinado contexto cognitivo.358 Neste sentido:

O fechamento normativo consiste, então, no contexto de auto-observação contínua do sistema segundo o esquema de legalidade/ilegalidade. O aprendizado, a modificação das normas, tornam-se possíveis ou pelo fato de que já não sejam aceitáveis certas consequências jurídicas – induzidas internamente –; ou pela modificação na valoração social do sentido sobre as normas específicas – induzida externamente.

359

Por meio do aprendizado, as normas podem sofrer variação, sejam induzidas

internamente (comunicações jurídicas), sejam induzidas externamente (valoração

social). De outra banda, também é possível ao sistema do direito e suas

organizações permanecer comunicando os sentidos de deficiência e assistência já

expectados. Para compreendermos a distinção entre fechamento e aprendizado é

essencial ter em mente que o conceito de evolução de Luhmann está vinculado a

uma crescente complexidade, em face da qual o sistema adapta suas estruturas

mediante o fechamento operativo e a codificação. Assim, diante da pressão seletiva,

as informações do entorno mantém-se excluídas, a não ser que o sistema tenha

interesse em processá-las. Para isso, desenvolve a capacidade de distinguir

autorreferência e heterorreferência.360

O sistema oscila, pois, entre autorreferência e heterorreferência e o resultado

desta re-entry é denominado ―sentido‖. Para os sistemas de sentido, o mundo é

informação virtual que necessita de sistemas para gerar informações, para dar

sentido de informação às irritações selecionadas.361 O sistema do direito põe em

prática a autorreferência mediante uma argumentação formal, a partir de textos,

protocolos. Com a heterorreferência, por sua vez, remete às relevâncias que estão

no entorno. Os fatos externos, se juridicamente relevantes, não podem ser

ignorados pelo direito, que poderá aceitar, como informação, as metas normativas

preestabelecidas de outras fontes sociais e processá-las internamente.362 Os

sentidos de deficiência e assistência social comunicados pelo direito e por suas

358

Id., ibid., p. 136. 359

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 137. 360

Id., ibid., p. 350-352. 361

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 28-29. 362

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 141-458.

organizações resultam, portanto, das referências aos próprios textos jurídicos e às

informações dos demais sistemas sociais.

Desse modo, as comunicações da ciência médica, da ciência social, da

política, da economia etc., se relevantes ao sistema do direito e suas organizações,

serão por eles processadas internamente. Contudo, as cognições heterorreferenciais

são operações internas ao direito, visto que o sistema jurídico não atribui ao entorno

normas, mas conhecimento.363 Tratam-se de construções próprias do sistema, de

auto irritação a partir de influxos provenientes do entorno. O sistema poderá

encontrar em si mesmo a causa da irritação ou poderá atribuir a causa da irritação

ao entorno, aproveitando-a ou descartando-a.364

Para se transformar em decisões de direito, o conhecimento deverá adquirir a

forma prevista pelo direito, por meio de normas jurídicas. Por outro lado, a

autorreferência permanecerá assegurada pela possibilidade de não haver

aprendizado: estabilidade contrafatual das normas. Portanto, sistema e entorno

coexistem.365 Apesar da possibilidade de não aprendizado, repita-se, o sistema do

direito é um sistema do sistema da sociedade. Com as mudanças na sociedade, o

sistema do direito, a partir de suas próprias operações, também mudará a forma com

que leva em consideração tais modificações.366

Como visto no primeiro capítulo, a literatura apontou para a insuficiência das

concepções inespecíficas de Assistência Social, tida como processante de outras

políticas sociais e vinculada à pobreza absoluta, sendo altamente

estigmatizadora.367 Assim, desvinculada da caridade e do clientelismo, desenvolveu-

se um novo conceito de Assistência Social como política pública, a atuar preventiva

e protetivamente, provendo proteção básica e especial, sendo extensiva na atuação

e trabalhando a partir das ―potencialidades, talentos, desejos, capacidades de cada

um e dos grupos sociais‖.368

Da mesma forma, compreendeu-se como insuficiente a perspectiva

meramente econômica da pobreza. Passou-se a pensar em abordagens mais

363

Id., Ibid p. 147. 364

LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. p. 87 365

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 143-149. 366

Id. Ibid. p. 111-115. 367

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. p. 37-40. 368

Id., Ibid., p. 42.

amplas, a partir de variáveis não monetárias. A pobreza passa a ser vista como fruto

de ―processos e relações sociais‖. Além das condições subjetivas envolvidas, atenta-

se para as interações estabelecidas com os demais setores sociais.369 Outrossim,

pensou-se a pobreza como a privação de capacidades, oriundas tanto da pobreza

econômica quanto da carência de serviços públicos, da negação de liberdades

políticas e civis etc..370 De outra banda, a partir do conceito de ―exclusão social‖,

reforça-se a necessidade de se compreender que as necessidades humanas

ultrapassariam aquelas meramente biológicas, carecendo atingir um patamar básico

de inclusão social.371

O próprio conceito de deficiência sofre modificações. Enquanto que na

perspectiva médica e biológica parte-se da análise do que é normalidade para definir

deficiência, segundo a perspectiva da Classificação Internacional das Deficiências,

Incapacidades e Desvantagens,372 no modelo social, a deficiência desloca-se do

indivíduo e centra-se na sua relação com o ambiente, construído coletivamente.373

Conforme já ressaltado, os Juizados Especiais Federais, como organizações

do sistema do direito, também contribuem, por meio de suas comunicações, para a

formação do sentido do direito assistencial da pessoa com deficiência. Como visto

no terceiro capítulo, decisões da Turma Recursal condicionam a concessão do

benefício às situações de ―penúria social‖ ou ―extrema miséria‖, portanto, à pobreza

absoluta, como foi informado no Processo nº 0515842-93.2012.4.05.8300. Bem

como, comunicam o conceito de pobreza a partir de critérios meramente monetários,

como é o caso da vinculação estrita ao critério de renda familiar per capita de ¼ do

salário mínimo vigente, como foi exemplificado com o Processo nº 0511668-

41.2012.4.05.8300.

369

CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. p. 75. 370

SEN, Amartya Kunar,. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 16 e 17. 371

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Desafios para fazer avançar a política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP , v. 22, n. 68, p. 54-82, nov. 2001. p. 60. 372

SILVA, Roberta Cruz da. Direito à saúde In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 115. 373

PIOVESAN, Flávia. Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: inovações, alcance e impacto. In: Carolina Valença Ferraz, George Salomão Leite, Glauber Salomão Leite e Glauco Salomão Leite (coords.). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 46 e 47.

Evidencia-se que o sistema do direito e suas organizações comunicam o

direito à assistência social e, por meio de suas operações, rejeitam ou acolhem as

informações do entorno. Ademais, mesmo se houver aprendizado, os

conhecimentos provenientes de outros sistemas funcionais da sociedade adotarão a

forma estabelecida pelo sistema do direito e por suas organizações. Com esta

perspectiva podemos compreender como é possível aos JEFs fazer uso dos

conhecimentos da ciência social e, concomitantemente, rejeitar o parecer emitido

pelo perito assistente social do juízo. Ao mesmo tempo em que, utilizando-se dos

conhecimentos da ciência médica e das informações comunicadas pelo perito

médico judicial, revestindo-as do caráter de ―cientificidade‖ (não atribuído ao parecer

social), adotam-nas como bons argumentos, conforme está posto na decisão da

Turma Recursal no Processo nº 0519444-92.2012.4.05.8300. Outrossim, o próprio

conteúdo dos pareceres sofre limitações impostas pela organização, uma vez que

respondem aos quesitos elaborados pelo juízo e pelas partes.

Apesar da possibilidade de não aprendizado, mister relembrar a ambiguidade

da relação entre sistema do direito e sociedade. Com efeito, o sistema do direito é o

―órgão da sociedade de que se lança mão para dar forma às concepções

cambiantes sobre o mundo‖.374 Como sistema social, apresenta uma função

relacionada com a ―possibilidade de comunicar expectativas e de levá-las ao

reconhecimento na comunicação‖.375 Ou seja, ―preparar-se, ao menos no nível das

expectativas, ante um futuro incerto‖, produzido pela sociedade.376

Ademais, há que se recordarem as prestações que o direito proporciona ao

seu entorno intrassocial e aos demais sistemas sociais, quais sejam, dirigir

comportamentos e solucionar conflitos. Neste sentido, o sistema do direito autoriza

que os comportamentos sejam baseados no direito, e não na ―moral‖ ou na ―razão‖,

bem como, em caso de conflitos, possibilita à sociedade recorrer ao sistema do

direito.377 Assim, a não adequação do direito aos valores cambiantes da sociedade

poderá gerar um problema para a própria autopoiese do sistema, como será visto no

item 4.4.

374

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 151. 375

Id., ibid., p. 182. 376

Id., ibid., p. 187. 377

Id., ibid., p. 216.

4.2 Decisão judicial e legislação: comunicações do sistema do direito

A partir dos dados coletados, pudemos constatar que, mesmo havendo norma

constitucional e infraconstitucional comunicando um novo conceito de deficiência,

adequado ao modelo social, as decisões judiciais permanecem utilizando a

terminologia prevista na legislação revogada. Assim, em vez de se comunicar a

deficiência como impedimentos de longo prazo, os quais, em interação com diversas

barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade

de condições com as demais pessoas, conforme previsto na Convenção de Nova

York, as perícias médicas e as decisões judiciais nos JEFs ainda utilizam as

expressões ―incapacidade‖, ―total‖, ―parcial‖, ―para o trabalho‖, ―para a vida

independente‖.

Outrossim, a previsão da LOAS (redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011),

exigindo avaliação social e médica, não teve repercussão nos JEFs. Isto porque,

além das avaliações sociais por assistente social serem em número inexpressivo,

nos casos em que foram realizadas, limitaram-se à descrição da renda familiar per

capita, após já ter sido juntado laudo médico judicial declarando a incapacidade total

e permanente ou nos casos em que o indeferimento administrativo deu-se em razão

da renda. Do que se pode concluir que a análise social por assistente social, nos

JEFs, não compõe o conceito de deficiência. Por fim, constatou-se que os

componentes da CIF, previstos no Decreto nº 7.617, de 2011 e na Portaria Conjunta

MDS/INSS nº 1 de 24 de maio de 2011 – legislação direcionada à análise perante a

Administração Pública – não são avaliados nos quesitos direcionados aos peritos

pelos juízes e pelas partes.

Assim, nem a norma constitucional, nem a legislação infraconstitucional,

tampouco as portarias e decretos direcionados à Administração Pública foram

capazes de modificar o sentido de direito à assistencial social da pessoa com

deficiência comunicado pela organização jurídica (JEFs). Para compreendermos tal

constatação – que a Constituição e a lei não vinculam as decisões judiciais –

utilizamos a teoria dos sistemas sociais de Luhmann e o seu conceito de evolução.

Para o autor da Teoria dos Sistemas Sociais, a evolução ocorre tanto com a

―diferença‖ quanto com a ―adaptação‖ entre sistema e entorno. Assim, a evolução

depende da variação dos elementos autopoiéticos vigentes; da seleção da estrutura

que possibilitará essa variação continuar em condição de reproduções seguintes; da

estabilização do sistema, tornando possível a reprodução autopoiética da forma que

experimentou mutação.378 O direito evolui a partir desse movimento entre diferença

e adaptação ao seu entorno.

Segundo Luhmann, a escrita permitiu o fechamento do direito sob a forma de

textos jurídicos e a sua diferenciação em relação a outros tipos de textos, relaciona-

se à ―antecipação de desenganos‖. Contudo, a estabilidade das expectativas não

radica nos signos linguísticos e a escrita não garante ―segurança‖ ao direito de que

haverá ―estabilidade do sentido em si‖. Tal fato iria de encontro à dinamicidade com

que opera o sistema autopoiético de comunicação da sociedade e impediria a

evolução do direito.379

Ou seja, a legislação não engessa o direito, pois, em um contexto de

comunicação, surgem novas diferenciações texto/interpretação, texto/contexto,

sentido literal/sentido implícito, expondo o direito fixo no texto escrito a uma contínua

observação. As leis são utilizadas como informação e a evolução do direito é

possível mediante a diferenciação entre texto e interpretação.380 Daí que, em

Luhmann, não há hierarquia entre a competência legislativa e a competência judicial,

mas observação mútua, em que cada um busca compreender como o outro observa

o mundo, operando-se, portanto, uma restrição recíproca do espaço de decisão.

Assim, a própria ―vinculação à lei‖ será objeto de interpretação dos tribunais.381

De outra banda, a necessidade de decisão imposta aos juízes e tribunais

coloca-os no centro do sistema do direito. Nem as leis, nem os contratos são

obrigados a decidir. Já aos tribunais se impõe a competência dever decidir/poder

decidir sobre todas as questões jurídicas, razão pela qual, a organização da

jurisdição é o sistema parcial com a incumbência de manejar o paradoxo do sistema,

mediante a diferenciação sistema/entorno. Todos os demais campos não judiciais

(conclusão de contratos e legislação) pertencem à periferia, onde podem se

apresentar interesses, mas nenhuma necessidade de decisão.382

378

Id., ibid., p. 303-304. 379

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p 315 - 317. 380

Id., ibid., p. 317-318. 381

Id., ibid., p.. 364-367. 382

Id., ibid., p. 381-383.

Ao juiz é imposta a dupla exigência de ter que decidir, e de maneira justa. A

necessidade da decisão e a liberdade na busca de razões (questionáveis) para esta

decisão ―resultam restringidas pelos pontos de vista da justiça. E esta tríade de

necessidade, liberdade e restrição que produz o direito‖.383 Ainda que o autor não

pretendesse uma teoria da decisão, reconhecendo a posição central da decisão do

tribunal para o sistema jurídico, entendeu relevante uma compreensão sobre o

assunto. E afirma que, neste ponto, o sistema se torna um enigma, pois a decisão

―tem sempre a ver com uma alternativa: um ou mais caminhos elegíveis‖,384 apenas

se constrói no presente, não se apoia em um direito vigente inquestionável.

Contudo, não ignora as decisões precedentes e as consequências para as decisões

futuras.385

Exatamente por essa ausência de necessidade de decisão que a periferia, em

contato com as demais funções da sociedade (economia, vida doméstica, política),

mantém a autonomia do direito. Os tribunais encontram-se em um isolamento

cognitivo mais drástico se comparado com os legisladores e com os contratantes.

Verifica-se que o acesso a eles se dá de maneira seletiva, pois nem todas as

questões jurídicas lhes são apresentados. Ademais, apenas dentro do centro são

possíveis outras formas de diferenciação, como a hierarquia.386

Aplicando-se essas ideias aos resultados de nossa pesquisa empírica

tentamos uma explicação para o fato dos novos modelos de deficiência e assistência

social comunicados em outros sistemas sociais irritarem de modo mais intenso a

produção legislativa, enquanto que, ao chegarem aos tribunais, possuem uma

resistência maior à sua aceitação como informações.

Por tudo, fica evidenciado que o direito ao benefício de prestação continuada

da pessoa com deficiência não está fixo na legislação, da mesma forma em que não

é aquilo que o juiz comunica em suas decisões. Também não corresponde ao que a

doutrina jurídica, de serviço social, ou os movimentos sociais informam. Tampouco é

o que a Administração Pública informa por meio de seus procedimentos. É, pois, a

reunião não estável e em eterna mutação de todas as comunicações jurídicas. Em

razão da delimitação do nosso tema, abordamos aqui as comunicações do sistema

383

Id., ibid., p. 366. 384

Id., ibid., p. 369. 385

Id., ibid., p. 369-371. 386

Id., ibid., p. 384-386.

do direito em relação ao direito à assistência social da pessoa com deficiência nos

Juizados Especiais Federais.

Nesse momento, para compreendermos o porquê dos tribunais

desempenharem um papel central no sistema do direito, faz-se relevante elucidar

que somente os tribunais, por observação de segunda ordem,387 supervisionam a

consistência das decisões jurídicas (leis, contratos, decisões judiciais), o que

significa interpretar de maneira argumentativa.388 Conforme explicitado na análise

quantitativa e qualitativa dos dados, pudemos perceber que os juízes, na

fundamentação da sentença argumentam, utilizando-se das conclusões emitidas

pelo perito médico judicial como ―boas razões‖ para conceder ou negar o benefício

de prestação continuada à pessoa com deficiência e, assim, impor a autoridade de

suas decisões.

Em Luhmann, a argumentação jurídica é auto-observação do sistema do

direito que, recursivamente, reage às diferentes opiniões, ou as antecipa, e lhes

atribui os valores conforme ao direito/não conforme ao direito, ―trata-se, pois, de

comunicação predisposta à controvérsia tanto que a disposição sobre o símbolo de

validade como a pura leitura da lei deve permanecer excluída do conceito de

argumentação‖.389

Ademais, o ato de interpretar não objetiva a autoiluminação, mas a

preparação de uma argumentação que utilizará ―o interpretado em um contexto de

comunicação que contribui ao reconhecimento da autoridade‖.390 Assim, ―toda

argumentação jurídica que expõe a interpretação do texto tem, por isto, uma relação

com a decisão: uma relação com a decisão sobre os assuntos de outros‖. Por esse

motivo, deve estar orientada pela comunicação.391

A argumentação ―expõe razões que dão a preferência a uma interpretação

particular em detrimento de outra‖.392 As razões ―não são simplesmente pontos de

vista significativos, mas ordenações complexas de ideias que justificam com isso

387

Em Luhmann, o observador de segunda ordem é aquele que maneja o código lícito/ilícito no sistema do direito, ou seja, ―no nível da observação dos observadores‖. LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p 241. 388

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 389. 389

Id., ibid., p. 415. 390

Id., ibid., p. 427. 391

Id., ibid., p. 428. 392

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 430.

seus efeitos de exclusão‖.393 Portanto, razões são distinções introduzidas por um

observador que, ao observar um texto, proporciona a si (por interpretação) um

espaço livre de argumentação.394

As razões dirigem-se à redundância e, por isso, as boas razões possibilitam a

consistência (justiça) do sistema (tratar os casos iguais de maneira igual e os casos

desiguais de maneira desigual).395 Comunicar ―bons argumentos‖ não é suficiente,

fazendo-se necessário demonstrar que possuem consistência em relação ao direito

vigente.396

Aplicando essas ideias à pesquisa, observamos que o alegado ―caráter

científico‖ da perícia médica judicial é comunicado como ―boa razão‖ para se deferir

ou indeferir o benefício de prestação continuada. Isto a despeito da existência de

outros elementos no processo (documentação médica do autor e pareceres

elaborados pelos assistentes técnicos, informações prestadas em audiências,

perícia social etc.) ou, mesmo, a possibilidade de se realizarem outros

procedimentos processuais aptos a confrontar a perícia judicial (audiências,

intimações para manifestação etc.).

Como visto, as operações do sistema jurídico comunicam ―o poder de

convencimento das melhores razões‖.397 Contudo, essa busca não visa unicamente

evitar erros, mas se dá em meio a um ―sistema que permanentemente organiza e

aprende por si mesmo‖,398 realizando a distinção variedade/redundância,

organizando a própria complexidade. Processo que ―se acelerará mediante

acoplamentos estruturais com outros sistemas de funções‖,399 internalizando a

diferenciação entre autorreferência (conceitos) e heterorreferência (interesses).400

O conceito de acoplamento estrutural torna-se bastante relevante para a

nossa pesquisa no momento em que se evidencia a utilização pela organização

jurisdicional (JEFs) de informações do sistema científico, por meio da perícia médica

e da perícia social. Para tanto, impende relembrar a observação de que, na teoria

dos sistemas sociais, interessam tanto o fechamento operativo dos sistemas

393

Id., ibid., p. 432. 394

Id., ibid., p. 435. 395

Id., ibid., p. 437. 396

Id., ibid., p. 436. 397

Id., ibid., p. 439. 398

Id., ibid., p. 439-440. 399

Id., ibid., p. 440. 400

Id., ibid., p. 440.

autopoiéticos quanto as relações entre sistema e entorno. Em razão do fechamento

operativo, a autopoiese do sistema só se efetua por operações próprias, sempre

internamente, nunca em seu entorno. Em consequência do acoplamento estrutural o

―sistema supõe determinadas características de seu entorno, confiando

estruturalmente nele – por exemplo, em que o dinheiro, em geral, aceite-se, ou que

se possa esperar que as pessoas sejam capazes de determinar a hora‖.401 Ademais,

o acoplamento estrutural é uma forma de dois lados, uma distinção, que restringe e

facilita a influência do entorno sobre o sistema.402 Todavia, é preciso atentar para o

fato de que,

Como o sistema se encontra determinado por suas próprias estruturas e só pode ser digitalizado (=especializado) por suas próprias operações, os eventos do entorno não podem intervir como ―inputs‖, qualquer que seja sua pertença ao sistema, nem sequer na esfera dos acoplamentos estruturais. [...] Assim, no sistema mesmo os acoplamentos estruturais somente podem suscitar irritações, surpresas e perturbações.

403

O entorno, ao irritar o sistema, ele mesmo não é irritado. Tal fato apenas

poderá ser constatado pelo observador. Igualmente, o sistema registrará tal irritação

apenas por meio de suas próprias estruturas. Assim, os acoplamentos estruturais,

por inclusão e exclusão, possibilitam a concentração da irritabilidade, ao mesmo

tempo que preparam as contingências, pois ―sem acoplamentos estruturais na

relação dos sub-sistemas sociais entre si, o direito – no sentido do uso moderno da

palavra –, permanece como algo corrompido‖.404

Por acoplamento estrutural, o sistema do direito e suas organizações utilizam

conhecimentos provenientes de outros sistemas funcionais da sociedade, a exemplo

da perícia médica e da perícia social. Todavia, tais conhecimentos não intervêm

como inputs nos JEFs, pois, para servirem de informação nesse âmbito, deverão

adotar a forma prevista pela própria organização. Daí que a perícia realizada em

juízo não observa apenas as regras técnicas do sistema científico, mas

principalmente, as normas vigentes nos JEFs (em relação ao tempo para realização

da perícia e emissão do parecer, à restrição dos fatos analisados em razão dos

quesitos, à própria especialidade médica do perito etc.). Esse seria um motivo pelo

401

Id., ibid., p. 508. 402

Id., ibid., p. 403

Id., ibid., p. 510. 404

Id., ibid., p. 513.

qual é possível verificar grande divergência entre os quesitos apresentados aos

peritos judiciais e aqueles presentes na Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de

maio de 2011,405 direcionados aos peritos do INSS.

A partir desta perspectiva podemos compreender como os JEFs fazem uso

dos conhecimentos da ciência social e, ao mesmo tempo, rejeitam o parecer emitido

pelo perito assistente social do juízo. Ao passo que, utilizando-se dos

conhecimentos da ciência médica e das informações comunicadas pelo perito

médico judicial, revestindo-as do caráter de ―cientificidade‖ (não atribuído ao parecer

social), adotam-nas como bons argumentos. Ou seja, a própria organização define

qual informação é dotada de cientificidade.

O fato de o direito ser comunicado também em uma organização como os

JEFs, com diretrizes e procedimentos peculiares, contribui para a formação de um

sentido próprio de deficiência e assistência neste âmbito. Segundo Luhmann, a

organização e a profissionalização da competência jurídica asseguram a

independência e a proibição de denegação de justiça. O fato de serem membros de

uma organização obriga os juízes a cumprirem suas tarefas e a procederem de

determinadas formas. Ademais, a organização filtra as repercussões das decisões

dos juízes, pois ―protegido pela organização e pela profissionalização, o tribunal faz

a apresentação de sua própria decisão como interpretação e aplicação do direito

vigente que transforma o direito vigente‖.406

Os procedimentos judiciais ―seduzem a que se colabore, especificam papéis,

até que a decisão aparece como um resultado ‗lógico‘ do procedimento jurídico‖.407

No caso do objeto da nossa pesquisa empírica, pudemos constatar que os

procedimentos realizados nos JEFs, visando à simplicidade e à celeridade dos ritos,

acabam moldando o direito que será comunicado. Com efeito, a supressão de

audiências e oportunidades para manifestações restringem a participação das partes

na formação do sentido de deficiência nos JEFs, que acaba sendo limitado às

405

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011- estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:svWYMI1aK6wJ: www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Anexo% 2520III%2520-%2520Conceitos%2520e%2520Criterios-%2520de%252024.05.11.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br> . Acessado em: 10 dez. 2013. 406

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 391-394. 407

Id., ibid., p. 395.

informações comunicadas pelos magistrados e pelo perito médico judicial. Ademais,

dificultam as impugnações com vista à correção de omissões e contradições,

elaboração de quesitos complementares e, até mesmo, a possibilitar a realização de

nova perícia. O mesmo se diga em relação à apatia dos JEFs em relação à perícia

social como componente da CIF.

A avaliação da deficiência apenas pelo perito médico judicial coaduna-se com

a necessidade de julgamento de uma maior quantidade de processos, conforme as

metas do Conselho Nacional de Justiça.408 Contudo, vai de encontro ao modelo

social de deficiência previsto na legislação, que exige uma análise mais minuciosa,

por médico e assistente social. O que é agravado ainda mais quando a perícia

médica não é realizada por especialista ou quando não é possível a análise conjunta

por mais de um especialista.

Ao posicionar a organização da jurisdição no centro do sistema do direito,

Luhmann não pretendeu defini-la como unidade do sistema. Como já apontado

acima, há direito fora dos tribunais. De outro giro, atribui-lhe a função de

―desdobramento do paradoxo do sistema‖, recorrendo-se a formas (organização e

hierarquia) não apresentáveis no sistema unitário. Por sua vez, à periferia deslocam-

se as ―funções e processos que são compatíveis com o fato de manterem-se abertos

à variedade, à adaptação e às pressões do entorno‖.409

Assim, do mesmo modo que as alterações na valoração social da proteção

assistencial à pessoa com deficiência não constituem norma, mas apenas

informações para o sistema do direito, as alterações no texto da Constituição

Federal, das leis, decretos e portarias não são assimiladas como ―inputs‖ pela

organização jurídica. Como dito acima, os tribunais encontram-se em um isolamento

cognitivo maior em relação ao seu entorno social. Daí a possibilidade do sistema do

direito, por meio da organização dos JEFs, comunicar um sentido de deficiência

desatrelado do conceito previsto na legislação, apresentando a sua decisão como

―interpretação e aplicação do direito vigente‖. Ir de encontro à rede de decisões

408

BRAGA, Tatiane Freire e Mariana. Presidentes aprovam seis metas nacionais para garantir mais eficiência ao Judiciário em 2014. Agência CNJ de Notícias, Brasília, 19 nov. 2013. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/26931-presidentes-aprovam-seis-metas-nacionais-para-garantir-mais-eficiencia-ao-judiciario-em-2014>. Acessado em: 05 jan. 2014. 409

LUHMANN, Niklas. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. p. 398-399.

recursivas da organização é uma tarefa difícil de desempenhar. É o que passamos a

desenvolver no próximo item.

4.3 Modelo social de deficiência: normatização sem institucionalização ou

identificação de sentido

Neste momento, reportamo-nos à abordagem luhmanniana de Direito como

―generalização congruente de expectativas normativas‖. Como será desenvolvido

adiante, o próprio Luhmann reconhece discrepâncias no funcionamento desse

mecanismo, o que é fundamental para a compreensão da normatização do modelo

social de deficiência e os percalços para a sua institucionalização nos JEFs.

Vejamos.

Para Luhmann, o mundo se apresenta de modo complexo e contingente.

Nesse contexto, desenvolvem-se estruturas seletivas de expectativas que assimilam

experiências e controlam o problema da complexidade e da contingência a partir de

técnicas de abstração de regras e de seleção de formas, restringindo o âmbito da

possibilidade de opções. Assim, ―a orientação a partir da regra dispensa a

orientação a partir das expectativas‖,410 bem como, reduz os riscos de erros das

expectativas, pois supõe ―que aquele que diverge age erradamente, que a

discrepância se origina, portanto, não da expectativa (própria) errada, mas da ação

(alheia) errada‖.411

Todavia, diante da complexidade do mundo, as estruturas estão expostas a

desapontamentos. Daí que se fala em expectativas normativas (quando permanece

a oposição à realidade decepcionante) ou expectativas cognitivas (quando há

modificação da expectativa desapontada e adaptação à realidade decepcionante).

Não se olvidando que ―uma expectativa constantemente desapontada, esvai-se‖.412

O Direito, na Teoria dos Sistemas de Luhmann, é uma generalização

congruente de expectativas normativas, a partir da condensação da normatização,

da institucionalização e da identificação de sentido. Pois,

[...] o comportamento social em um mundo altamente complexo e contingente exige a realização de reduções que possibilitem expectativas. Na dimensão temporal essas estruturas de expectativas podem ser

410

LUHMANN, Niklas. Sociologia do Direito. Vol. I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983. p. 53. 411

Id., Ibid., p. 53. 412

Id., Ibid., p. 71.

estabilizadas contra frustrações através da normatização. Frente à crescente complexidade social isso pressupõe uma diferenciação entre expectativas cognitivas (disposição à assimilação) e normativas, além da disponibilidade de mecanismos suficientes para o processamento de desapontamentos, frustrações. Na dimensão social essas estruturas de expectativas podem ser institucionalizadas, ou seja, apoiadas sobre o consenso esperado a partir de terceiros. Dada a crescente complexidade social isso exige cada vez mais suposições fictícias do consenso e também a institucionalização do ato de institucionalizar através de papéis essenciais. Na dimensão social essas estruturas podem ser fixadas externamente através de um sentido idêntico, compondo uma inter-relação de confirmações e limitações recíprocas. Dada a crescente complexidade social isso exige uma diferenciação dos diversos planos da abstração.

413

Grifei.

Em Luhmann, a normatização daria continuidade a uma expectativa, apesar

de poder vir a ser frustrada; a institucionalização possibilitaria um consenso geral

suposto, independente da aprovação individual; a identificação, por sua vez,

garantiria ―a unidade e a inter-dependência do sentido, independentemente das

diferenças objetivas entre as expectativas‖.414 Assim, a ―generalização gera uma

imunização simbólica das expectativas contra outras possibilidades‖.415

Ocorre que há uma discrepância no funcionamento desses mecanismos que,

devido a sua heterogeneidade, podem generalizar expectativas diferentes e

incompatíveis. Por exemplo, existem mais expectativas normativas do que

possibilidades de institucionalização. Outrossim, normas oficialmente proclamadas

poderão não ser institucionalizadas, quer seja porque os juízes não a aplicam, quer

seja porque não possuem reflexos na vida cotidiana. Por fim, pode haver a

identificação de sentido na defesa de determinados interesses que, contudo, não

são normatizados ou institucionalizados, por meio de mecanismos de exigência ou

de sanção.416

Apesar de ―incongruência natural dos mecanismos de generalização‖,417

Luhmann aponta possibilidades de soluções coerentes, como a necessidade de

atuação conjunta dos mecanismos das diferentes dimensões, garantindo a

compatibilidade recíproca por meio da restrição de expectativas comportamentais.

Assim, as expectativas comportamentais generalizadas congruentemente

constituem o direito do sistema social, cuja função ―reside em sua eficiência seletiva,

413

Id., Ibid., p. 109-110. 414

Id., Ibid., p. 110. 415

Id., Ibid., p. 110. 416

Id., Ibid., p. 111-114. 417

Id., Ibid., p. 114.

na seleção de expectativas comportamentais que possam ser generalizadas em

todas as três dimensões‖.418

Contudo, com a diferenciação funcional dos sistemas, gera-se um incremento

―de possibilidades e com isso as chances e a pressão no sentido da seleção‖.419

Significando que os diversos sistemas parciais ―provocam o surgimento de projeções

normativas mais acentuadamente divergentes – e em número maior que o possível

de tornar-se direito‖, sobrecarregando o fator seletivo da institucionalização.420

No caso do objeto deste estudo – norma que dispõe sobre a deficiência sob a

ótica de um modelo social, prevendo a avaliação conforme as diretrizes da CIF –, a

partir da análise de dados foi possível verificar que, a despeito da normatização, não

houve a institucionalização ou a identificação de sentido no âmbito da organização

dos JEFs. Isto porque, em inúmeros processos, sequer atentou-se às alterações

legislativas, utilizando-se de legislação já revogada e, em outros casos, em que se

pontuaram tais alterações, não foi possível a fixação de um sentido unívoco de

deficiência, desatrelado das concepções de ―incapacidade total para o trabalho e

para a vida independente‖.

A própria organização dos JEFs contribui para o distanciamento entre

legislação e decisões judiciais. Isto porque os Juizados operam de acordo com

estruturas visando ao processamento de sua imensa demanda de modo célere. Para

isso, simplificam os ritos, fato observado na pesquisa empírica (restrição na

realização de audiências, de análises sociais por assistente social, de intimações

das partes para manifestarem-se acerca dos pareceres e mandados juntados aos

autos, extinção do processo nos moldes do art. 285-A, do CPC etc.). Portanto, as

normas que regem os procedimentos nos JEFs são obstáculo para a

institucionalização daquelas que normatizam o modelo social de deficiência.

Conforme descreve Luhmann, quem possui expectativas contrárias à

instituição ―tem que contraditar bases comportamentais aceitas, já abertamente

assumidas pelos demais‖.421 Ademais, deverá encontrar argumentos capazes de

desestabilizar a instituição e propor alternativas. Por sua vez, ―as expectativas

institucionalizadas podem ser seguidas imperceptivelmente, quase que

418

Id., Ibid., p. 114-116. 419

Id., Ibid., p. 177. 420

Id., Ibid., p. 177. 421

Id., Ibid., p. 81-82.

distraidamente‖.422 A instituição não bloqueia os desvios, mas ―motiva aquele que

não queira arcar com as consequências a não expressar sua discordância no

sentido da instituição‖.423 Pois ―fortalece a impressão de uma opinião unitária acima

da multiplicidade das expectativas fáticas, tornando assim as expectativas

expectáveis‖.424 Daí a dificuldade de se argumentar contrariamente às práticas

sedimentadas nos JEFs: análise da deficiência conforme o modelo médico, por meio

de perícia médica judicial.

Repita-se, o fato de haver normatização no âmbito da legislação

(comunicação de expectativas temporais) não significa que haverá a

institucionalização (concordância genérica em face de expectativas sobre

expectativas) no âmbito da organização da jurisdição. Para tanto, seria necessário a

sobreposição das normas jurídicas previstas na legislação assistencial em face das

práticas já institucionalizadas nos JEFs, ampliando-se a quantidade e a qualidade

dos procedimentos realizados. Tal fato é dificultado pelo fato de os JEFs atuarem

como organização e, portanto, com base em uma rede de decisões recursivas, o

que diminui as possibilidades de modificação das estruturas.

No que tange às identificações de sentido, em Luhmann, representam as

―sínteses de muitas expectativas, concretizáveis e particularizáveis conforme as

necessidades‖.425 Tratam-se de feixes de possíveis expectativas, modificáveis por

meio da experiência, e que regulam a substituição de expectativas antigas por

novas. Ocorre que ―o controle da consistência só pode ser realizado com o auxílio

das abstrações de sentido‖,426 daí a sua superficialidade. Assim,

[...] a ―consistência do direito‖, buscada com todos os meios da lógica, no sentido da ausência de contradições, não é uma garantia necessária, nem alcançável e sequer suficiente, para a consistência das expectativas, mas apenas um filtro valioso que separa a massa das contradições imagináveis e torna o resto passível de decisões.

427

Com a pesquisa, observamos problemas na identificação do sentido de

deficiência a partir de uma perspectiva social. Com efeito, os procedimentos e

decisões, além de extremamente simplificados, variaram de um processo para outro,

422

Id., Ibid., p. 82-83. 423

Id., Ibid., p. 83. 424

Id., Ibid., p. 83. 425

Id., Ibid., p. 97. 426

Id., Ibid., p. 97. 427

Id., Ibid., p. 97.

não se permitindo a fixação de sentidos unívocos de ―impedimentos‖, ―barreiras

sociais‖, ―participação plena e efetiva‖, ―igualdade de condições‖. Limitando-se às

avaliações do fator corpo e da renda familiar per capita, os JEFs se abstêm de

contribuir com a comunicação jurídica dos demais elementos.

4.4 Deficiência nos JEFs: inconsistência e inadequação social das decisões

Em continuação à perspectiva do sistema do direito como ―generalização

congruente de expectativas normativas‖, passamos a analisar as consequências da

inadequação das decisões judiciais nos JEFs ao modelo social de deficiência a partir

da ideia luhmanniana de justiça.

Em Luhmann, justiça é ―auto-observação e autodescrição do sistema‖.428 É

autorreferência do sistema, como observação, no nível dos programas, na forma de

norma, sujeita ao desengano. Afastando-se do conceito de valor, entende-se a

justiça como fórmula de contingência do sistema jurídico, sob a forma de uma

conclusão circular.429 Para o sistema jurídico, que já se encontra bastante

positivado, a fórmula de contingência diz respeito à possibilidade de que as normas,

decisões, argumentos, sejam manejados diferentemente.430

Reconhece-se a justiça como norma, nunca, todavia, como um programa

determinado. Para que haja a garantia da unidade do sistema, toda norma deve

pretender ser justa, o que não garante que o será.431 Como fórmula de contingência,

a justiça não pretende ser ―uma afirmação acerca da essência ou da natureza do

direito, nem um princípio fundador da validade jurídica nem, finalmente, um valor

que fizera aparecer o direito como algo digno de preferência‖.432 Em uma sociedade

em que a prática jurídica é orientada por textos (conceitos, dogmas), pode-se

designar justiça como ―consistência da tomada de decisão‖,433 na forma de regras

que tratam os casos iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual.434

428

LUHMANN, Niklas. El derecho de la sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005, p. 278. 429

Id., Ibid ., p. 278-281. 430

Id., Ibid., p. 282. 431

Id., Ibid., p. 283. 432

Id., Ibid., p. 284-285. 433

Id., Ibid., p. 289. 434

Id., Ibid., p. 289.

Quanto mais informações um sistema tem de processar, mais dependerá da

redundância, ou seja, a consideração das informações precedentes. Assim, é função

da redundância determinar quais comunicações têm valor de informação no sistema

do direito. Assim, se justiça é a ―consistência das decisões, então podemos dizer

também: justiça é redundância‖.435 Ocorre que ―a redundância não é a única

condição da autopoiese do sistema. Variedade é a segunda condição‖.436 Ambas

podem aumentar simultaneamente e, a partir da transformação desta relação, que o

sistema produz sua adaptação ao entorno.437

Daí que justiça não se relaciona apenas com a consistência das decisões.

Justiça é a ―complexidade adequada na tomada de decisões consistentes‖,438 quer

dizer, capacidade de resposta do sistema jurídico ao sistema social (irritabilidade).

Contudo, o sistema jurídico não poderá abranger todas as situações sociais, razão

pela qual tem que reduzir complexidade (indiferença).439

No caso do objeto deste estudo, qual seja, da comunicação do direito ao BPC

da pessoa com deficiência, verificou-se que as decisões judiciais nos JEFs ainda

utilizam conceitos previstos na legislação revogada. Ou seja, relacionam a

deficiência à incapacidade para o trabalho, a partir das constatações da perícia

médica judicial, mostrando-se apáticas às avaliações sociais como componentes da

CIF. Seria possível argumentar que a avaliação médica da deficiência, com base

apenas no fator corpo, considerando-se beneficiário do BPC apenas o indivíduo

incapaz total e permanentemente para o trabalho, conduziria a decisões

consistentes e, portanto, justas. Isso porque a avaliação da deficiência conforme um

procedimento mais simplificado impossibilitaria que novas questões fossem

suscitadas, diminuindo, portanto, a quantidade de elementos a serem analisados e

debatidos e, consequentemente, diminuindo a variedade das decisões.

Ocorre que, nos moldes em que têm se realizado os processos nos JEFs,

verificou-se a inconsistência das decisões haja vista que variam os procedimentos

de uma vara federal para outra, inclusive, dentro de uma mesma vara, de um

processo para outro. Como visto, processos similares (com a mesma razão de

indeferimento administrativo ou com a conclusão do parecer médico judicial similar),

435

Id., Ibid., p. 417-420. 436

Id., Ibid., p. 422. 437

Id., Ibid., p. 422-424. 438

Id., Ibid., p. 287. 439

Id., Ibid., p. 287.

ora se realizou audiência, ora não; ora se admitiu o contraditório em relação ao

parecer, ora não; ora se determinou a realização de perícia social, ora não; ora se

determinou a realização de mandado de verificação, ora não; ora a avaliação social

foi efetuada pelo perito médico judicial, ora pelo assistente social judicial, ora pelo

mandado de verificação, ora com base em informações colhidas em audiência, ora

com base em informações do sistema do INSS. Assim, foram produzidas decisões

inconsistentes em relação a casos similares submetidos ao JEF e inconsistentes em

relação ao direito comunicado na legislação.

Ademais, em Luhmann, a justiça não está apenas atrelada à consistência

das decisões, mas também à adequação social, ou seja, à capacidade de adaptação

do sistema ao seu entorno social. Assim, a justiça não se realizaria apenas com a

elaboração de decisões idênticas para casos equivalentes, mas também com a

resposta adequada do sistema às irritações provocadas pelo entorno. Repita-se, os

fatos externos, se juridicamente relevantes, não podem ser ignorados pelo direito.440

Outrossim, relembre-se a função do direito relacionada com a ―possibilidade de

comunicar expectativas e de levá-las ao reconhecimento na comunicação‖.441 Bem

como, as suas prestações ao entorno intrassocial e aos demais sistemas sociais,

quais sejam, dirigir comportamentos e solucionar conflitos.442

A justiça para a teoria dos sistemas sociais de Luhmann vai além da

consistência interna das decisões, pois, como fórmula de contingência, implica no

―ser-possível-de-outro-modo‖ e ―ser dependente-de-alguma-outra-coisa‖. Opera,

destarte, ―na fronteira entre o Direito e seu ambiente externo e se dirige

simultaneamente à variabilidade histórica da justiça e à sua dependência do

ambiente‖.443

Por meio da ―re-entry‖, a justiça, como auto-observação do Direito, com as

diferenciações internas entre autorreferência e heterorreferência, relaciona direito e

ambiente social, reivindicando sua adequação ecológica. Por essa razão, o Direito,

contemporaneamente, ―busca seus critérios da justiça em seus ambientes, em

diferentes discursos da sociedade, no discurso pedagógico, científico, médico,

440

Id., Ibid., p. 141. 441

Id., Ibid., p. 182. 442

Id., Ibid., p. 216. 443

TEUBNER, Gunther. Justiça autosubversiva: fórmula de contingência ou de transcendência do Direito?. Revista Eletrônica do Curso de Direito – PUC Minas Serro, Belo Horizonte, n. 4, p. 17-54, out. 2011. ISSN 2176-977X. Disponível em: <http://periodicos.pucminas.br/index.php/Direito Serro/article/view/2259>. Acessado em: 26 dez. 2013.

político ou econômico‖.444 Contudo, ressalte-se que as ―demandas externas da

sociedade, dos homens e da natureza‖ são uma construção jurídica interna.445

Assim, ―autoridades externas não podem oferecer quaisquer critérios substanciais

da justiça‖, bem como, ―a justiça não pode ser produzida a partir da mera recursão a

decisões judiciais‖.446 A justiça ―sabota as decisões jurídicas‖, abrindo ―um novo

espaço de incerteza e de indeterminação do Direito‖.447

Nas demandas envolvendo a concessão do benefício de prestação

continuada à pessoa com deficiência há produção de decisões inconsistentes e sem

adequação social, portanto, injustas. Conforme os dados analisados constataram-se

decisões inconsistentes entre si, haja vista que variam os procedimentos de uma

vara judicial para outra, inclusive, dentro de uma mesma vara, de um processo para

outro.

Ademais, verificou-se a inconsistência das decisões judiciais em relação ao

modelo social de deficiência comunicado na legislação. Ou seja, não se tem

avaliado a deficiência a partir da relação do indivíduo com o ambiente, conforme

disposição expressa na Convenção de Nova York, de 30 de março de 2007 e na Lei

nº 12.470/2011. Do contrário, observou-se o apego aos critérios médicos de

avaliação, ignorando-se os preceitos da Classificação Internacional de

Funcionalidades, Incapacidade e Saúde – CIF, estabelecida pela Resolução da

Organização Mundial da Saúde no 54.21.

Outrossim, nos processos analisados, a deficiência permaneceu atrelada ao

conceito de incapacidade para o trabalho, em contraposição ao conceito delineado

na Convenção de Nova York, em que o impedimento atinge esferas mais amplas

que dizem respeito à ―participação plena e efetiva na sociedade‖. Igualmente,

constatou-se uma resistência para a concessão do benefício nas ocasiões em que

foi constatada a ―incapacidade parcial‖, olvidando-se o comprometimento dos

Estados signatários da Convenção de Nova York com a efetivação de medidas que

possibilitem às pessoas com deficiência que ―conquistem e conservem o máximo de

444

Id., Ibid., 2013. 445

Id., Ibid., 2013. 446

Id., Ibid., 2013. 447

Id., Ibid., 2013.

autonomia e plena capacidade física, mental, social e profissional, bem como plena

inclusão e participação em todos os aspectos da vida‖.448

Exigindo-se a ―incapacidade total para o trabalho‖ para a concessão do

Benefício de Prestação Continuada, como já salientado anteriormente, as decisões

judiciais nos JEFs afastam-se, igualmente, das disposições legais do art. 21-A,

incluído pela Lei nº 12.470, de 2011449, que prevê, em caso de exercício de atividade

remunerada pelo beneficiário do BPC – Deficiência, apenas a suspensão do

benefício; do artigo 21, § 3o, que dispôs que ―o desenvolvimento das capacidades

cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas

de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou

cessação do benefício da pessoa com deficiência‖; do Programa BPC Trabalho; do

Programa BPC na Escola.

Por fim, a vinculação da concessão do BPC ao totalmente incapaz para o

trabalho e ao ―mais pobre entre os pobres‖, indica que as decisões judiciais

permanecem atreladas a uma concepção estigmatizante de assistência social 450,

em oposição à visão de assistência social como política de proteção, atuando

preventiva e protetivamente, trabalhando a partir de potencialidades.451 Outrossim,

ignora-se as variáveis não monetárias da pobreza452 e os encadeamentos positivos

e negativos, para frente e para trás, das políticas de provisão social em relação aos

seus diversos programas, projetos e prestações de benefícios e serviços, bem

como, em relação às políticas econômicas.453 Observa-se, destarte, a inadequação

das decisões judiciais em relação às novas concepções de deficiência e assistência

social.

448

BRASIL. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013. 449

BRASIL. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. 450

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. p. 37-40. 451

SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. p. 42. 452

CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. p. 70. 453

PEREIRA, Potyara A. P.. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2007. p. 28-30.

Reflexões finais

O tema desta pesquisa consistiu na observação da comunicação do direito ao

benefício de prestação continuada da pessoa com deficiência nos Juizados

Especiais Federais em Recife. Pesquisamos como o novo modelo social de

deficiência tem sido comunicado nas práticas desta organização jurisdicional.

Inicialmente, exploramos as informações provenientes da legislação e da doutrina

acerca do assunto. Pudemos compreender o surgimento de novas abordagens da

assistência social, da pobreza e da deficiência. Tais modificações repercutiram,

inclusive, nas normas constitucionais e na legislação assistencial, com a

comunicação do modelo social de deficiência, a partir de avaliações médica e social,

conforme a CIF.

Com a análise dos processos judiciais, investigamos os procedimentos por

meio dos quais os JEFs avaliam a deficiência para fins de concessão do benefício

de prestação continuada. Pudemos constatar que, após o protocolo da petição inicial

e a triagem, os atos processuais resumem-se, basicamente, aos seguintes:

realização de perícia médica; perícia social ou mandado de verificação; intimação

das partes para se manifestarem acerca das perícias; proposta de acordo pelo INSS

e resposta do autor; audiência; prolação de sentença de procedência, improcedência

ou homologatória de acordo; recurso inominado da parte autora ou do INSS;

prolação de acórdão de procedência ou improcedência. Verificou-se, todavia, que

tais procedimentos não ocorriam de modo uniforme em todas as varas e em todos

os processos.

Constatou-se a realização de perícia médica mesmo quando o indeferimento

administrativo fundamentou-se na renda familiar ―per capita‖ superior a ¼ do salário

mínimo. Outrossim, houve a análise da renda familiar mesmo nos processos em que

o indeferimento motivou-se na ausência de incapacidade/impedimento de longo

prazo. Pudemos averiguar uma quantidade bem reduzida de audiências realizadas e

intimações para as partes impugnarem as perícias produzidas. Ademais, as

intimações das partes para manifestação, a realização de perícia social, mandado

de verificação e audiências variavam de acordo com as conclusões emitidas no

laudo médico judicial.

Nos processos em que o perito médico judicial concluiu pela ―capacidade

laboral‖, emitiram-se sentenças de improcedência após a perícia, sem intimação das

partes para manifestação, sem a realização de perícia social ou mandado de

verificação, sem a realização de audiência.

De outro lado, os processos em que a perícia médica judicial concluiu pela

―incapacidade total e permanente‖ para o trabalho constituem as únicas hipóteses

onde houve proposta de acordo pelo INSS. No que tange à realização perícia social,

de mandado de verificação, de intimação para manifestação, de audiência, tais

procedimentos variaram de uma vara para outra. Prevaleceram as sentenças de

improcedência pela renda, seguidas das homologatórias de acordo e das sentenças

de procedência.

Por fim, nos processos em que a perícia médica judicial concluiu pela

―incapacidade total e temporária, parcial e permanente ou parcial e temporária‖ para

o trabalho, igualmente, os procedimentos judiciais acima apontados variaram de

uma vara para outra e de um processo para outro. Prevaleceram as sentenças de

improcedência em razão da ausência de ―incapacidade‖, seguidas de um percentual

mínimo de sentenças de procedência e homologatórias de acordo.

Pode-se inferir da pesquisa de dados que, nos JEFs em Recife, comunica-se

o direito ao BPC como devido às pessoas incapacitadas total e permanentemente

para o trabalho, de acordo com as conclusões do perito médico judicial. Ademais,

constatou-se a prevalência das informações do laudo médico judicial na

fundamentação das sentenças, em detrimento dos outros elementos apresentados

no processo, como idade, escolaridade, profissões desempenhadas no passado,

documentação médica colacionada. Tal fato é agravado pela restrição na

possibilidade de manifestação das partes em relação à perícia médica por meio de

audiências ou impugnações. Razão pela qual se conclui que a comunicação do

sentido de direito ao BPC da pessoa com deficiência, nos JEFs em Recife, restringe-

se ao perito médico judicial e ao juiz.

No que tange às perícias sociais, foram realizadas em apenas uma vara dos

juizados especiais federais em Recife, após a informação da ―incapacidade total e

definitiva‖ pela perícia médica judicial ou quando o indeferimento administrativo

fundamentou-se na renda familiar e não houve perícia médica. As partes não são

intimadas para se manifestar acerca do laudo social. Outrossim, constatou-se a

equiparação dos quesitos avaliados pelo oficial de justiça no mandado de verificação

e pelo assistente social na perícia social, restringindo-se as conclusões a apontar a

renda familiar ―per capita‖. Pode-se perceber que os juízes, nas sentenças,

confrontaram as conclusões das perícias sociais e dos mandados de verificação

com as demais informações do processo. Tal fato, como apontado acima, não se

efetuou em relação à perícia médica judicial.

Uma vez que a perícia social restringe-se a descrever a renda familiar ―per

capita‖, a avaliação da possibilidade de integração ao mercado de trabalho foi feita

em alguns processos pelo próprio perito médico, nos demais pelo juiz, a partir de

outras informações apresentadas. Com a análise dos dados coletados foi possível

verificar que a avaliação da deficiência conforme a CIF não tem sido implementada

nos JEFs. Isto porque a avaliação da deficiência permanece atrelada ao modelo

médico, por meio da realização de perícias médicas. A perícia social não participa

da construção do sentido de deficiência. Ademais, ainda se relaciona a deficiência à

incapacidade para o trabalho, conforme dispunha a legislação assistencial anterior.

Inclusive, mesmo nos processos envolvendo menores, não foram raras as ocasiões

em que a conclusão pericial médica e a sentença judicial utilizaram o termo

―incapacidade para o trabalho‖. Pode-se conferir a equiparação entre os requisitos

para a concessão do benefício assistencial e para a aposentadoria por invalidez, não

se diferenciando assistência e previdência social. Os quesitos avaliados não incluem

os qualificadores da CIF.

Pudemos observar que a simplificação dos ritos nos JEFs, ―em homenagem à

celeridade processual‖, conforme destacado nas próprias decisões judiciais, impede

a avaliação da deficiência conforme o modelo social. Isso porque a restrição na

realização de audiências e de oportunidades para as partes se manifestarem acerca

da perícia médica dificulta que sejam confrontadas com outros elementos do

processo. Ou seja, impossibilita a aferição da existência de barreiras que,

associadas aos impedimentos, obstruem a participação plena e efetiva na sociedade

em igualdades de condições com as demais pessoas. Em relação à participação das

Turmas Recursais na formação do sentido do direito ao BPC da pessoa com

deficiência, verificamos baixos índices de reforma, bem como, a manutenção da

sentença de primeiro grau pelos próprios fundamentos.

A partir da pesquisa de dados, tendo como marco teórico a teoria dos

sistemas sociais de Luhmann, analisamos que o sistema do direito e suas

organizações podem aceitar, como informação, e processar internamente as

modificações na valoração social da deficiência e da assistência social e, em razão

do fechamento operativo, podem manter excluídas tais informações. Tal constatação

permite explicar como é possível ao JEF atrelar a concessão do BPC à pobreza

absoluta. Bem como, comunicar o conceito de pobreza a partir de critérios

meramente monetários e rejeitar o modelo social de deficiência, apegando-se ao

modelo médico. Isso, a despeito de uma vasta literatura e dos movimentos sociais

comunicando diferentemente.

O mesmo se diga acerca da inexistência de identidade entre o direito

comunicado pela legislação e o direito comunicado pelas decisões judiciais. Apesar

de haver norma constitucional e infraconstitucional informando um novo modelo

social de deficiência, percebemos nas decisões judiciais a utilização da terminologia

prevista na legislação revogada (―incapacidade‖ no lugar de ―impedimento‖; para o

―trabalho‖, em vez de ―participação na sociedade‖). A previsão da LOAS (redação

dada pela Lei nº 12.470, de 2011) exigindo tanto a avaliação social quanto a

avaliação médica para a configuração da deficiência não teve repercussão nos

JEFs. Isto porque, além das avaliações sociais por assistente social serem em

número inexpressivo, nos casos em que foram realizadas limitam-se à descrição da

renda familiar per capita. Outrossim, constatou-se que os componentes da CIF,

previstos no Decreto nº 7.617, de 2011 e na Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1 de 24

de maio de 2011 não são avaliados nos quesitos direcionados aos peritos.

Pudemos compreender tal fenômeno a partir da noção de centro e periferia

descrita na teoria dos sistemas sociais. Segundo Luhmann, os tribunais situam-se

no centro do sistema do direito, enquanto que a legislação encontra-se em sua

periferia. Apenas aos tribunais incumbem às decisões e o manejo do paradoxo do

sistema. Assim, a organização da jurisdição encontra-se em um isolamento cognitivo

maior em relação ao seu entorno social. Daí a possibilidade do sistema do direito,

por meio da organização dos JEFs, comunicar um conceito de deficiência

desatrelado do conceito previsto na legislação. A partir da análise de dados, foi

possível verificar que, a despeito da normatização, não houve a institucionalização

ou a identificação de sentido do modelo social de deficiência no âmbito da

organização dos JEFs.

Ocorre que, nos moldes em que têm se realizado os processos nos JEFs,

verificou-se a inconsistência das decisões haja vista que variam os procedimentos

de uma vara judicial para outra, inclusive, dentro de uma mesma vara, de um

processo para outro. Assim, foram produzidas decisões inconsistentes em relação a

casos similares submetidos ao JEF, bem como, inconsistente em relação ao direito,

uma vez que a legislação também é comunicação jurídica. Ademais, em Luhmann, a

justiça não está apenas atrelada à consistência das decisões, mas também à

adequação social, ou seja, à capacidade de resposta adequada do sistema às

irritações provocadas pelo entorno. A vinculação da concessão do BPC ao

totalmente incapaz para o trabalho, em condições de ―extrema miséria‖, indica que

as decisões judiciais permanecem vinculadas ao modelo médico de deficiência e a

uma concepção estigmatizante de assistência social. Observa-se, destarte, a

inadequação das decisões judiciais em relação às novas concepções de deficiência

e assistência social.

Por fim, a partir da pesquisa teórica e da análise qualitativa e quantitativa

identificamos diversas possibilidades para futuras investigações. Dentre elas, a

aplicabilidade do CPC aos Juizados Especiais Federais. Como descrito, as decisões

judiciais nos JEFs em determinados momentos aplicam o CPC àquela instância, em

outras, afastam-no. Mister analisar se existem diretrizes a nortear os procedimentos

efetuadas nos JEFs ou se tais decisões são meramente casuísticas.

Outrossim, constatou-se uma carência de estudos acerca da efetivação do

modelo social de deficiência nas demandas administrativas pelo Benefício de

Prestação Continuada com o fim de verificar a aplicabilidade da CIF naquele âmbito.

Igualmente interessante estudar quais as repercussões das decisões judiciais dos

JEFs, como comunicações jurídicas, nos procedimentos administrativos. Ou seja,

avaliar a relação entre Judiciário e Administração, portanto, entre sistema do direito

e sistema político.

Merece aprofundamento a relação entre perícia científica e decisão judicial. A

partir dos conceitos de acoplamento estrutural e corrupção sistêmica, podem ser

pesquisadas as tendências expansivas de um sistema sobre o outro. Ademais,

tratando-se de classificação relativamente recente, é pertinente observar a aplicação

da CIF em outros âmbitos, como na Justiça do Trabalho, nas lides envolvendo

Direito Administrativo, no SUS e na própria Previdência Social, por exemplo.

Constatamos que o fato do benefício de prestação continuada, apesar de

benefício assistencial, ser gerido pelo INSS, trouxe inúmeras repercussões para a

comunicação do direito, impende discutir se assistência e previdência deverão ser

tratadas a partir de uma mesma lógica ou se é necessária uma maior delimitação de

seus âmbitos. Ou seja, se o modelo social de deficiência poderá ser aplicado nos

mesmos moldes à Previdência Social, ou se existem diferenças intransponíveis

entre essas duas esferas.

Referências

ARAUJO, Luiz Alberto David. A convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência e seus reflexos na ordem jurídica interna no brasil. In: Ferraz, Carolina Valença; Leite, George Salomão (Coords). Manual Dos Direitos Das Pessoas Com Deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. BACKX, Sheila. Mínimos Sociais no Contexto da Proteção Social Brasileira. In: SOUZA, Nadia Regina Oliveira Queiroz de (Org.). Política de assistência social no Brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. P. 29-44. BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2012. BRASIL. Conselho Federal de medicina. PROCESSO-CONSULTA CFM N° 6.286/2001 PC/CFM/Nº 32/2003. A perícia médica é um ato médico e não pode ter seu resultado determinado por programa de informática, pois isto fere a autonomia do médico. Brasília: CFM, 2003. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/pareceres/CFM/2003/32_2003.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM n.º 1.658/2002. Normatiza a emissão de atestados médicos e dá outras providências. (Parcialmente alterada pela Resolução CFM nº 1851, de 18.08.2008). Brasília: CFM, 2002. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2002/1658_2002.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Conselho Nacional de Justiça. 100 Maiores Litigantes. Brasília: DPI/CNJ, 2012. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/100_maiores_l itigantes.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Conselho Nacional de Justiça. Justiça em números 2013: ano-base 2012. Brasília: DPI/CNJ, 2012. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/relatorio_jn2013.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 452, de 10 de maio de 2012. Brasília: CNS, 2012. Disponível em: < http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:009tCD2ZqY0J:conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso452.doc+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Senado Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acessado em 15 nov. 2013. ______. Decreto nº 914, de 6 de setembro de 1993. Institui a política nacional para a integração da pessoa portadora de deficiência, e dá outras providências. (deficientes). Brasília: D.O.U. de 08/09/1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0914.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995. Regulamenta o benefício de prestação continuada devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso, de que trata a lei 8.742, de 07/12/1993, que dispõe sobre a organização da assistência social. Brasília: D.O.U. de 11/12/1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d1744.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013.

______. Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999. Aprova o regulamento da previdência social, e dá outras providências.. Brasília: D.O.U. de 07/05/1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Decreto nº 3.956, de 8 de outubro de 2001. Promulga a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência. Brasília: D.O.U. de 09/10/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2001/d3956.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Decreto nº 5.296 de 2 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis nos 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 03/12/2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5296.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007. Regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência e ao idoso de que trata a lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e a lei no 10.741, de 1o de outubro de 2003, acresce parágrafo ao art. 162 do decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 28/09/2007. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6214.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Decreto nº 6.939, de 18 de agosto de 2009. Altera dispositivos do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999. Brasília: D.O.U. de 19/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6939.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Decreto nº 6.949 de 26 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Brasília: D.O.U. de 26/08/2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/decreto/d6949.htm>. Acessado em: 22 ago. 2013. ______. Decreto nº 7.492, de 2 de junho de 2011. Institui o Plano Brasil Sem Miséria. Brasília: D.O.U. de 03/06/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-014/2011/Decreto/D7492.htm>. Acessado em: 05 nov. 2013. ______. Decreto nº 7.617, de 17 de novembro de 2011. Altera o Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovado pelo Decreto no 6.214, de 26 de setembro de 2007. Brasília: D.O.U. de 18/11/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7617.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. ______. Instituto Nacional de do Seguro Social. Diretoria de Benefícios. Coordenação Geral de Benefícios por incapacidade. Manual de Perícia Médica Previdência Social. Brasília: INSS. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/restritos/90/pericia/cap01.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Instrução normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de agosto de 2010. Dispõe sobre a administração de informações dos segurados, o reconhecimento, a

manutenção e a revisão de direitos dos beneficiários da Previdência Social e disciplina o processo administrativo previdenciário no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Brasília: D.O.U. de 11/08/2010. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/38/inss-pres/2010/45_1.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Justiça Federal. Seção Judiciária do Estado do Acre. Decisão: Benefício previdenciário previsto no art. 203, V, da CF/88 e art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93. A capacidade do postulante para praticar atos da vida cotidiana (banhar-se, comer, vestir-se, caminhar), por si só, não é determinante para o indeferimento do benefício pelo INSS. Brasília: Autos n. 2007.30.00.000204-0 classe 7100 – ação civil pública. Disponível em: <http://www.ac.trf1.gov.br/noticias/2007/not04-12.pdf>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Brasília: D.O.U. de 17/01/1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869compilada.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Lei no 6.179, de 11 de dezembro de 1974 - Institui amparo previdenciário para maiores de setenta anos de idade e para inválidos, e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 12/12/1974. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6179.htm>. Acessado em: 26 set 2013. ______. Lei nº 8.742/1993 - Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 08/12/1998. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os juizados especiais cíveis e criminais e dá outras providências. Brasília: D.O.U. 27 de setembro de 1995. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001. Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Brasília: D.O.U. de 13/07/2001. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10259.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Lei no 10.689, de 13 de junho de 2003. Cria o Programa Nacional de Acesso à Alimentação – PNAA. Brasília: D.O.U. DE 16/06/2003. Disponível em : <http://www.planalto .gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.689.htm>. Acessado em: 02 nov. 2013. ______. Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Cria o Programa Bolsa Família e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 12/01/2004. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.836.htm>. Acessado em: 07 nov. 2013. ______. Lei no 10.876 - de 2 de junho de 2004. Cria a Carreira de Perícia Médica da Previdência Social, dispõe sobre a remuneração da Carreira de Supervisor Médico-Pericial do Quadro de Pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 3/6/2004. Disponível em: <http://www3.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2004/10876.htm>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei no 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social. Brasília: D.O.U. de 07/07/2011. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12435.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. ______. Lei nº 12.470, de 31 de Agosto de 2011. Altera os arts. 21 e 24 da lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; altera os arts. 16, 72 e 77 da lei nº 8.213;altera os arts. 20 e 21 e acrescenta o art. 21-a à lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993; e acrescenta os §§ 4o e 5o ao art. 968 da lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Brasília: D.O.U. de 01/09/2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12470.htm>. Acessado em: 25 out. 2013. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social. Brasília: CNAS/MDS, 2004. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/assistencia social/arquivo/Politica%20Nacional%20de%20Assistencia%20Social%202013%20PNAS% 202004%20e%202013%20NOBSUAS-sem%20marca.pdf>. Acessado em: 29 out. 2013. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Instituto Nacional do Seguro Social. Portaria Conjunta MDS/INSS nº 1, de 24 de maio de 2011 - estabelece os critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médico-pericial da deficiência requerentes do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social. Brasília: D.O.U. nº 100, de 26.5.2011. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2011/Portaria%20Conjunta%20MDS-INSS%20no%201-%20de%2024.05.11.pdf/ view>. Acessado em: 25 out. 2013. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Portaria Interministerial nº 2, de 2 de agosto de 2012. Institui o Programa de Promoção do Acesso das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social à Qualificação Profissional e ao Mundo do Trabalho - Programa BPC Trabalho. Brasília: D.O.U. de 03/08/2012 (nº 150, Seção 1, pág. 76). Disponível em: <http://www.apaebrasil.org.br/noticia.phtml/47165>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Portaria Interministerial nº 18, de 24 de abril de 2007. Cria o Programa de Acompanhamento e Monitoramento do Acesso e Permanência na Escola das Pessoas com Deficiência Beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social - BPC/LOAS, com prioridade para aquelas na faixa etária de zero a dezoito anos. Brasília: D.O.U. de 26.04.2007. Disponível em: < http://www.mds.gov.br/acesso-a-informacao/legislacao/assistenciasocial/portarias/2007/Portaria%20Interministerial%20no%2018-%20de%2024%20de%20abril%20de%202007.pdf>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Resolução INSS/PR nº 435, de 18 de março de 1997. Estabelece normas e procedimentos para a operacionalização do Benefício de Prestação Continuada Devido à Pessoa Portadora de Deficiência e ao Idoso e dá outras providências. Brasília: D.O.U. de 04/04/97. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/antigos/d1744.htm>. Acessado em: 15 nov. 2013. ______. Resolução nº 18, de 24 de maio de 2012. Institui o Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho – ACESSUAS-TRABALHO. D.O.U. nº 101 de 25.05.2012. Disponível em: <http://www.apaebrasil.org.br/noticia.phtml/46417>. Acessado em: 25 nov. 2013.

______. Supremo Tribunal Federal. Reclamação 4374/PE. Brasília: STF, 2013. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp? s1=%28rcl%29%284374%2ENUME%2E+OU+4374%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/a9gc2ln>. Acessado em: 09 nov. 2013. CÂMARA, Alexandre Freitas. Juizados especiais cíveis estaduais e federais: uma abordagem crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. CARNEIRO, Carla Bronzo Ladeira. Concepções sobre pobreza e alguns desafios para a intervenção social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 26, n. 84, p. 66-90, nov. 2005. CASTEL, Robert; WANDERLEY, Mariangela Belfiore; WANDERLEY, Luiz Eduardo W. Desigualdade e a questão social. 3. ed., rev. ampl. São Paulo: EDUC, 2010. CAVALCANTI, Soraya Araujo Uchoa. Reforma do Estado e políticas sociais no Brasil. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 34-53, nov. 2001. FARAH, Elias. Perícia médica. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo: Nova Série, v. 15, n. 30, p. 371-402, jul./dez. 2012. FELISBERTO, Adriano Cesar; IOCOHAMA, Celso Hiroshi. O princípio da motivação nas decisões judiciais de segunda instância dos juizados especiais cíveis = The principle of motivation in the judgments of the second instance of the special civil court. Revista de processo, v. 35, n. 190, p. 127-153, dez. 2010. GALINDO, Bruno. Direito à liberdade: dimensões gerais e específicas de sua proteção em relação às pessoas com deficiência. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (Coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. GOIS, João Bosco Hora et al. Avaliação do beneficio de prestação continuada: características sociais, proteção social e seus efeitos. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 29, n. 96, p. 65-92, nov. 2008. GONZAGA, Paulo. Perícia médica da previdência social. 4 ed. São Paulo: LTR, 2006. KATO, Cesar Augusto; KAMPA, Rose. Direito constitucional à prova e a perícia médica previdenciária no juizado especial federal. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. LIMA JÚNIOR, Jayme Benvenuto; GONÇALVES, Francysco Pablo Feitosa. A proteção dos direitos da pessoa com deficiência na jurisprudência da Corte Interamericana e da Corte Europeia de Direitos Humanos. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007. LUHMANN, Niklas. Sistemas Sociales: Lineamentos para uma teoría general. Barcelona: Anthropos. 1998. ______. El Derecho de la Sociedad. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2005. ______. La sociedad de la sociedad. México: Herder, 2007. ______. Organización e decisión. México: Herder Editorial/Universidad Iberoamericana, 2010. ______. Sociologia do Direito. Vol. I. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1983. ______.. Sociologia do Direito. Vol. II. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1985.

MARINONI, Luiz Guilherme, Sérgio Cruz Arenhart. Prova. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. MANSILLA, Dario Rodriguez; NAFARRATE, Javier Torres. Introdución a la teoria de la sociedad de Niklas Luhmann. México: Herder. 2008. MARCELINO, Miguel Abud. Avaliação Social e Médico-pericial para acesso ao benefício de prestação continuada da assistência social – BPC. In: SAVARIS, J. A. (Org.) et al. Curso de Perícia Judicial Previdenciária: Noções elementares para a comunidade médico-jurídica. 1. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. MATURANA, Humberto R.; VARELA, Francisco J. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana. São Paulo: Palas Athena, 2001. MENDES, Gilmar Ferreira. Os Juizados Especiais Federais: um divisor de águas na história da justiça federal. Revista CEJ, v. 15, p. 8-14, jul. 2011. MORGADO, Rosana. Assistência Social: Novos e Velhos Desafios. In: QUEIROZ, Nádia Regina Oliveira; OLIVEIRA, Ana Lúcia Santos de.; ALMEIDA, Valéria de F. S. M. de; CAVALCANTI, Ludmila, F. (Org.). Política de assistência social no Brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. p. 19-28. MOTA, Ana Elizabete da; MARANHÃO, Cezar Henrique; SITCOVSKY, Marcelo. As tendências da política de Assistência Social, o SUAS e a formação profissional. In: MOTA, Ana Elizabete da (Org). O Mito da assistência social: ensaios sobre Estado, política e sociedade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2010. NEVES, Marcelo. Entre Têmis e Leviatã: Uma Relação Difícil: O Estado Democrático de Direito a partir e além de Luhmann e Habermas. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. OLIVEIRA, Luciano. Os Excluídos ‗Existem‘?: Notas sobre a elaboração de um novo conceito. Rev. Bras. Ci. Soc. São Paulo, v. 12, n. 33, p.1-11, fev. 1997. Disponível em: <http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_33/rbcs33_04>. Acessado em: 19 dez. 2013. ______. Sua Excelência o Comissário e outros ensaios de sociologia jurídica. Rio de Janeiro: Letra Legal, 2004. ONU. Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, 09 de dezembro de 1975, Nova York, USA. Disponível em: < http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:44IzQ7SEHOkJ:portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/dec_def.pdf+&cd=1&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acessado em: 25 nov. 2013. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Disponível em: <http://arquivo.ese.ips.pt/ese/cursos/edespecial/CIFIS.pdf>. Acessado em: 18 set. 2013. PEREIRA, Potyara A. P. Como conjugar especificidade e intersetorialidade na concepção e implementação da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 54-62, mar. 2004. ______. Necessidades humanas: subsídios à crítica dos mínimos sociais. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2007. PERNAMBUCO. Justiça Federal de Pernambuco. Recife: JFP, 2013. Disponível em: <www.jfpe.jus.br>. Acesso em: 20 set. 2013. PIOVESAN, Flávia. Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência: inovações, alcance e impacto. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012.

______. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 2.ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2011. RODRIGUES, Mavi Pacheco. Projeto ético-político e a política de assistência: a centralidade da luta pela afirmação de direitos. In: SOUZA, Nadia Regina Oliveira Queiroz de (org.). Política de assistência social no brasil: desafios para o assistente social. Rio de Janeiro: COMAER, 2011. RODRÍGUEZ, Darío Rodríguez; MANSILLA, Javier Torres Nafarrate. Introducción a la Teoría de la sociedad de Niklas Luhmann. México: Herder, 2008. SANTOS, Moacyr Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial. vol. I – 5. ed.- São Paulo: Saraiva, 1983. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 2. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1997. SEN, Amartya Kunar. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. SERAU JR., DONOSO, Denis. Os Juizados Especiais Federais e a retórica do acesso à justiça. In: SERAU JR., DONOSO, Denis (Coord.). Juizados especiais federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. SILVA, Roberta Cruz Da. Direito à saúde IN: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil: processo de conhecimento. vol. 1. 7.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. SITCOVSKY, Marcelo. Particularidades da expansão da assistência social no brasil. In: MOTA, Ana Elizabete da (ORG). O mito da assistência social: ensaios sobre estado, política e sociedade. 4. Ed. São Paulo: Cortez, 2010. P. 147-179. SPOSATI, Aldaiza de Oliveira. A inclusão social e o programa de renda mínima. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 66, p. 76-90, jul. 2001. p. 78-79. ______. Desafios para fazer avançar a política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade. São Paulo, SP , v. 22, n. 68, , p. 54-82, nov. 2001. ______. Especificidade e intersetorialidade da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 30-53, mar. 2004. STAMFORD, Artur. E por falar em Teoria Jurídica, onde anda a cientificidade do Direito?. Rio de Janeiro: Mundo Jurídico, 2003. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=415>. Acessado em: 18 set 2013. TOURINHO NETO, Fernando da Costa; FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais federais cíveis e criminais: comentários à Lei 10.259, de 12.07.2001. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME. Human Development Report 1990. New York: Oxford University Press, 1990. 189 p. Disponível em: <http://hdr.undp.org/sites/default/files/reports/219/hdr_1990_en_complete_nostats.pdf>. Acessado em: 26 set. 2013. VERSCHRAEGEN, G. Human rights and modern society: a sociological analysis from the perspective of system theory. Journal of Law and Society, v.29, n. 2, p. 258-281. Disponível em: <http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/ 1467-6478.00218/abstract>. Acessado em: 25 nov. 2013. WERNECK, Claudia. Você é gente?: O direito de nunca ser questionado sobre o seu valor humano. Rio de Janeiro: Wva, 2003.

YAZBEK, Maria Carmelita. As ambiguidades da assistência social brasileira após dez anos de LOAS. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP , v. 25, n. 77, p. 11-29., mar. 2004.

Referências Consultadas ALVARENGA, Paula Bernhard. Da possibilidade de supressão da audiência de instrução e julgamento nos juizados especiais cíveis. Revista brasileira de direito processual, v. 17, n. 65, p. 239-246, jan./mar. 2009. ALVES, Francisco Glauber Pessoa. A conciliação e a Fazenda Pública no direito brasileiro. Revista de Processo. Ano 35, n. 187, p. 84-98, set. 2010. ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. AMARAL, Carolline Scofield. O critério de aferição da miserabilidade para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada (artigo 203, inciso V, da CF): a construção e reconstrução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal Revista Síntese: trabalhista e previdenciária, v. 24, n. 279, p. 24-49, set. 2012. ANDRIGHI, Fátima Nancy. Primeiras reflexões sobre o pedido de uniformização de interpretação no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. In: FUX, Luiz (Org.). Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbosa Moreira. São Paulo: RT, 2006. APPIO, Eduardo. Direito das minorias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. ARAUJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. Brasília: Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, 1997. ARAUJO, Luiz Alberto David. Em busca de um conceito de pessoa com deficiência. In: GUGEL, Maria Aparecida; COSTA FILHO, Waldir Macieira da; RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes (Org.). Deficiência no Brasil: uma abordagem integral dos direitos das pessoas com deficiência. Florianópolis: Obra Jurídica, 2007. p. 11-24. ARAZI, Roland. La prueba en el proceso civil. 2ed. Buenos Aires: La Rocca, 1998. ASSIS, Araken de. Duração razoável do processo e reformas da lei processual civil. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 56, n. 372, p. 11-27, out. 2008. BALERA, Fernanda Penteado. O benefício da prestação continuada para pessoas com deficiência no STF. In: Revista de direito social, v. 9, n. 35, p. 131-146, jul./set. 2009. BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2012. BATISTA, Flávio Roberto. Questões Problemáticas sobre a Transação com o INSS nos Juizados Especiais Federais: Eficiência Administrativa e Acesso à Justiça. In: SERAU Jr., Marco Aurélio (Org.). Juizados Especiais Federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. p. 103-119. BAUER, Martin W.. Análise de Conteúdo Clássica: uma revisão. In: BAUER, Martins W., GASKELL,George (Org.). Pesquisa Qualitativa com texto, imagem e som. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 189-217. BEHRING, Elaine Rossetti. Contra-reforma do estado, seguridade social e o lugar da filantropia. Serviço Social e Sociedade. São Paulo, SP, v. 24, n. 73, p. 101-119. ______.; BOSCHETTI, Ivanete. Política social: fundamentos e historia. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2011. BEHRING, Elaine Rossetti. Política social no capitalismo tardio. 1 ed. São Paulo: Cortez Editora e Livraria Ltda, 1998.

BERIZONCE, Roberto Omar. Control de la perícia científica. In: FUX, Luiz (Org.). Processo e Constituição: estudos em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira, São Paulo: RT, 2006. BERNARDO, Leandro Ferreira; FRACALOSSI, William. Direito Previdenciário na visão dos Tribunais: Doutrina e jurisprudência. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. BORA, Alfons. Technoscientific Normativity and the ‗‗Iron Cage‘‘ of Law. Science, Technology & Human Values. January, 2010, vol. 35 no. 1 p. 3-28. Disponível em: <http://sth.sagepub.com/content/35/1/3>. Acessado em: 25 nov. 2013. ______. Systems Theory, Discourse, Positionality: Towards a better understanding of the interior architecture of functional differentiation in sociological Systems Theory. Bielefeld: Bielefeld University, 2009. Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:qfrGsg0bqkUJ:www.uni-bielefeld.de/soz/personen/bora/pdf/Bora-Vortrag-Semantiktagung-englisch-2009-03-18.pdf+&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acessado em: 25 nov. 2013. BOSSCHART, Louise Emily. Uma análise crítica da prova pericial médica. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo: Nova Série, v. 13, n. 25, p. 197-210, jan./jun. 2010. BUCHILI, Beatriz da C. Mateus. Meios e Fontes de prova no processo de conhecimento: prova testemunhal, documental, pericial, atípica ou inominada. In: KNIJNIK, Danilo; CARPES, Artur. Prova judiciária: estudos sobre o novo direito probatório. Porto Alegre: Livr. do Advogado, 2007. p. 51-68. CALMON FILHO, Petrônio. O Conflito e os Meios de sua Solução. Revista Síntese. Ano XII, n. 71, p. 37-51, mai./jun. 2011. CÂMARA, Alexandre Freitas O princípio da oralidade e o sistema recursal nos juizados especiais. Revista brasileira de direito processual, v. 18, n. 72, p. 13-21, out./dez. 2010. CAMPOS, Edval Bernardino. Assistência social: do descontrole ao controle social. Seviço Social e Sociedade. São Paulo, SP, v. 28, n.88, p. 101-121, nov. 2006. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant G. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2002. CARAM JÚNIOR, Moacyr. O julgamento antecipado da lide, o direito à ampla defesa e ao contraditório. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001. CARDOSO, Oscar Valente. Auxílio-doença e alta programada: procedimento em baixa?. Revista Síntese: trabalhista e previdenciária, v. 22, n. 263, p. 7-28, maio 2011. p. 7-28. CARNELUTTI, Francesco. A Prova Civil. 4. ed. Campinas: Bookseller, 2005. CARDONE, Marly A.. Perícia do INSS X perícia judicial. Revista LTr: legislação do trabalho, v. 73, n. 1, p. 46-48, jan. 2009. CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Acesso à justiça: juizados especiais cíveis e ação civil pública: uma nova sistematização da teoria geral do processo. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2007. CASTRO, Carla Rodrigues Araújo de. Prova científica: exame pericial do DNA. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2007. COLMENERO, Fernando Pinto. Princípio da livre apreciação da prova e prova pericial, uma questão de ângulo: Brasil e Portugal. Revista dos tribunais, São Paulo, v. 89, n. 780, p. 437-457, out. 2000.

COSTA, Jose Ricardo Caetano. A efetivação e concretização dos direitos sociais previdenciários nos dez anos dos juizados especiais federais: um balanço necessário. In: SERAU JR., Marco Aurélio, DONOSO, Denis (Org.). Juizados especiais federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. p. 21-31 COSTA, Ricardo C. R.. Notas sobre exclusão social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 29, n. 96, p. 93-109, nov. 2008. COSTA, Sandro José de Oliveira. Aspectos polêmicos do benefício de prestação continuada. Revista IOB: trabalhista e previdenciária, v. 21, n. 248, p. 212-223, fev. 2010. COSTA, Yvete Flávio da. A efetividade do processo nos juizados especiais federais. Direito Federal: revista da Associação dos Juízes Federais do Brasil, v. 23, n. 83, p. 259-266, jan./mar. 2006. CUNHA, Luciana Gross. Juizado especial: ampliação do acesso à justiça? In: SADEK, Maria Tereza (Org.). Acesso à Justiça. São Paulo: Konrad Adenauer Stiftung, 2001. p. 43-73. DUARTE, Adriana. O Processo de reforma da previdência social pública brasileira. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 24, n. 73, p. 120-141, mar. 2003. DINALLI, Aparecida; CINTRA, Jorge Antônio Conti. Do acesso à justiça: juizados especiais cíveis. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, SP, v. 13, n, 51, p. 25-44, abr.-jun. 2005. FALCÃO, Maria do Carmo Brant de Carvalho. Assistência social: reflexões sobre a política e a suas regulação. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 87, p. 123-131, set. 2006. FARIA, José Eduardo. Direitos humanos, direitos sociais e justiça. 1. ed. São Paulo: Malheiros, 1998. FELISBERTO, Adriano Cesar; IOCOHAMA, Celso Hiroshi. O princípio da motivação nas decisões judiciais de segunda instância dos juizados especiais cíveis. Revista de processo, v. 35, n. 190, p. 127-153, dez. 2010. FERRAZ, Leslie Shérida. Acesso à justiça: uma análise dos juizados especiais cíveis no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010. FERREIRA, William Santos. Direito Constitucional. Prova pericial nos Juizados Especiais Federais: acesso à justiça e modelos de operacionalização do direito constitucional à prova. In: SERAU JR., Marco Aurélio; DONOSO, Denis (Org.). Juizados Especiais Federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Manual dos juizados especiais cíveis estaduais e federais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. FIGUEIREDO, Antônio Borges de. Desenho Universal e meio ambiente do trabalho: acessibilidade da trabalhadora portadora de deficiência. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária. Porto Algre, v. 21, n. 246, p. 87-98, dez. 2009. FIKER, José. Linguagem do laudo pericial: técnicas de comunicação e persuasão São Paulo: Leud, 2005. FOLMANN, Melissa; SOARES, João Marcelino. O benefício de assistência social previsto na CF/88, artigo 203, V, à luz da Lei nº 12.435/2011. In: BERWANGE, Jane Lucia Wilhelm; FOLMANN, Melissa (Org.). Previdência social: nos 20 anos das Leis 8.212/91 e 8.213/91 e nos 10 anos dos juizados especiais federais. Curitiba: Juruá, 2011. p. 187-217. FONSECA, Ricardo T. M. da. O novo conceito constitucional de pessoa com deficiência: um ato de coragem. In: FERRAZ, Carolina Valença; LEITE, George

Salomão (coords). Manual dos direitos das pessoas com deficiência. São Paulo: Saraiva, 2012. FREITAS, Douglas Phillips; FREITAS, Karinne Brum Martins. Perícia social: o assistente social e a perícia no judiciário. Florianópolis: OAB/SC, 2003. FREITAS, Felipe Simor de. O benefício de prestação continuada devido à pessoa portadora de deficiência física e a inclusão social. Revista de previdência social, v. 36, n. 375, p. 143-152, fev. 2012. FUCHS, Peter. Niklas Luhmann: Observed. Disponível em: <http://www.fen.ch/texte/gast_fuchs_luhmannobserved.pdf>. Acessado em: 12 set. 2013. GAULIA, Cristina Tereza. Juizados especiais cíveis: o espaço do cidadão no poder judiciário. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1998. GÓIS, João Bosco Hora et al. Avaliação do benefício de prestação continuada: características sociais, proteção social e seus efeitos. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 29, n. 96, p. 65-92, nov. 2008. GOLDMAN, Sára Nigri. Proteção social e velhice: um desafio para o serviço social. In: QUEIROZ, Nádia Regina Oliveira; OLIVEIRA, Ana Lúcia Santos de.; ALMEIDA, Valéria de F. S. M. de; CAVALCANTI, Ludmila, F. (Org.). Política de assistência social no Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. GOMES, Ana Lígia. O Benefício de Prestação continuada; uma trajetória de retrocessos e limites. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 111-139, nov. 2001. GOUVEIA, Carlos Alberto Vieira de. Benefício por incapacidade & perícia médica: manual prático. Curitiba: Juruá, 2012. GRECO, Leonardo. O conceito de prova. Revista da Faculdade de Direito de Campos, v. 4/5, n. 4/5, p. 213-269, 2003/2004. GRINOVER, Ada Pellegrini. A obrigatoriedade da audiência de conciliação nos juizados especiais cíveis: uma lição para o processo comum. Revista síntese de direito civil e processual civil, v. 12, n. 72, p. 59-63, jul./ago. 2011. KAUSS, Laís Fraga. Benefícios por incapacidade: a evolução do trato judicial na PFE/INSS. Revista Síntese: trabalhista e previdenciária, v. 23, n. 276, p. 211-217, jun. 2012. LADENTHIN, Adriane Bramante de C.. O indispensável papel do advogado nos Juizados Especiais Federais. In: SERAU JR., Marco Aurélio; DONOSO, Denis (Org.). Juizados Especiais Federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. LARA, Paulo Cesar de. A "incapacidade social" como fator a ser explorado positivamente nos laudos periciais para efeito de concessão de benefícios previdenciários ou assistenciais. Revista brasileira de direito previdenciário, v. 2, n. 10, p. 5-23, ago./set. 2012. LIMA, Ângela Maria de Lourdes Dayrell de. A descentralização, o ambiente e as mudanças organizacionais da política de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 24, n. 73, p. 23-45, mar. 2003. LOPES, José Reinaldo de Lima. Crise da norma jurídica e a reforma do judiciário. In: FARIA, José Eduardo (Org.). Direitos humanos, direitos sociais e justiça. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 68- 93. LOPES, Márcia Helena Carvalho. O tempo do SUAS. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 87, p. 76-95, set. 2006.

MACHURA, Stefan. Introduction: procedural justice, law and policy. Law & Policy, no. 1. p. 1–14, 1998. Disponível em: <http://www.readcube.com/articles/10.1111/1467-9930.00040?locale=en>. Acessado em: 20 dez. 2013. MANGONE, Kátia Aparecida. Análise da aplicação do Código de Processo Civil aos Juizados Especiais Federais Cíveis. In: SERAU JR., Marco Aurélio; DONOSO, Denis (Org.). Juizados Especiais Federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba: Juruá, 2012. MARINONI, Luiz Guilherme. Da teoria da relação jurídica processual ao processo civil do estado constitucional. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 54, n. 347, p. 11-43, set. 2006. ______. Direito Fundamental à duração razoável do processo. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 57, n. 379, p. 11-27, mai. 2009. ______.; ARENHART, Sérgio Cruz. Procedimentos especiais: procedimentos especiais do CPC e de leis extravagantes: ações constitucionais, ações coletivas, Juizados Especiais Cíveis, arbitragem. 3. ed. rev. Atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Prova. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. MANTOVANI, Aline Cristina; SOUZA, Peterson de; COSTA, Yvete Flávio da. A adoção do critério da invalidez social para a concessão de aposentadoria por invalidez. Revista do direito trabalhista, v. 6, n. 33, p. 91-102, dez. 2010. MARTINS, Samir José Caetano. Livre convencimento, racionalidade e controle da prova pericial. Revista dialética de direito processual, n. 115, p. 109-123, out. 2012. MELLO, Marcelo Pereira da; DELTON, R. Soares Meirelles. Juizados especiais: entre a legalidade e a legitimidade: análise prospectiva dos juizados especiais da Comarca de Niterói, 1997-2005. Revista direito GV, v. 6, n. 2, p. 371-397, jul./dez. 2010. MELO, Sandro Nahmias. A garantia do conteúdo essencial dos direitos fundamentais. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, SP, v. 11, n. 43, p. 82-97, abr.-jun. 2003. MESQUITA, José Ignácio Botelho de. O Juizado especial em face das garantias constitucionais. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 53, 330, p. 916, abr. 2005. MORAES, Ricardo Quartim de. O benefício assistencial à luz da estrutura constitucional da seguridade social. Revista da AGU, v. 9, n. 23, p. 277-294, jan./mar. 2010. MORENO FILHO, Ivo da Silva. LOAS: a possibilidade do múltiplo recebimento familiar. Revista de previdência social, v. 35, n. 369, p. 739-745, ago. 2011. MOTA, Ana Elizabete da; MARANHÃO, Cezar Henrique; SITCOVSKY, Marcelo. O Sistema único de Assistência Social e a formação profissional. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 87, p. 163-177, set. 2006. MUNIZ, Egli. Os serviços de proteção social: um estudo comparado entre Brasil e Portugal. São Paulo: Cortez, 2005. MUNIZ, Egli. SUAS e os serviços socioassistenciais. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 28, n. 88, p. 139-159, nov. 2006. NOGUEIRA, Vera Maria Ribeiro. Assimetrias e tendências da seguridade social brasileira. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 65, p. 95-123, mar. 2001.

OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Juizados Especiais e ampliação da Justiça Federal. Revista do Tribunal Regional Federal: 1. Região, v. 22, n. 3, p. 65-67, mar. 2010. PAIVA, Beatriz Augusto; ROCHA, Paulo Eduardo. O Financiamento da política de assistência social em perspectiva. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 83-110, nov. 2001. PAIVA, Beatriz Augusto. O SUAS e os direitos socioassistenciais: a universalização da seguridade social em debate. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 87, p. 5-23, set. 2006. PEREIRA, Luciano Meneguetti. Análise crítica do benefício de prestação continuada e a sua efetivação pelo Judiciário. Revista CEJ, v. 16, n. 56, p. 15-27, jan./abr. 2012. PIEROTTI, Wagner de Oliveira. Questões controvertidas envolvendo a Lei 8.742/93. Revista da AGU, v. 9, n. 24, p. 315-332, abr./jun. 2010. PIOVESAN, Flávia. Proteção internacional dos direitos econômicos, sociais e culturais. Genesis: Revista de Direito do Trabalho, Curitiba, PR, n. 118, p. 512-528, out. 2002. ______. Ações afirmativas e direitos humanos. Revista USP, São Paulo, SP, n. 69, mar./mai., p. 36-43, 2006. ______. A proteção dos direitos humanos no sistema constitucional brasileiro. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, SP, v. 11, n. 45, p. 216-236, out.-dez. 2003. PORTO, Maria Célia da Silva. Cidadania e ‗(des)proteção social‘: uma inversão do Estado brasileiro? Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 17-33, nov. 2001. RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes. As normas constitucionais de tutela das pessoas portadoras de deficiência. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, SP, v. 12, n. 47, p. 145-198, abr.-jun. 2004. RODRIGUES, Mavi Pacheco. Projeto ético-político e a política de assistência: a centralidade da aluta pela afirmação dos direitos. In: QUEIROZ, Nádia Regina Oliveira; OLIVEIRA, Ana Lúcia Santos de.; ALMEIDA, Valéria de F. S. M. de; CAVALCANTI, Ludmila, F. (Org.). Política de assistência social no Brasil. 2 ed. Rio de Janeiro: Comaer, 2011. p. 8-18. JORDÃO, Tatiana Sada. Programa de cobertura previdenciária estimada: reflexões sobre a alta programada. Repertório IOB de jurisprudência: trabalhista e previdenciário, v. 24, n. 281, p. 200-205, nov. 2012. SANTOS, Marisa Ferreira dos. Assistência social: breves comentários e o benefício de prestação continuada. Revista ION Trabalhista e Previdenciária, v. 17, n. 202, p. 35-49, abr. 2006. SANTOS, Regina Maria dos. O serviço social e a exclusão/inclusão social dos portadores de HIV/AIDS: demandas e desafios nos hospitais públicos. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 85, p. 7-28, mar. 2006. SERAU JR, Marco Aurélio; DONOSO, Denis. Os Juizados Especiais Federais e a retórica do acesso à justiça. In: SERAU JR, Marco Aurélio; DONOSO, Denis (Org.). Juizados especiais federais: reflexões nos dez anos de sua instalação. Curitiba : Juruá, 2012. p. 21-31. SILVA, Cristiane Ribeiro da. Panorama histórico dos direitos sociais e a pessoa portadora de deficiência. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária, Porto Alegre, RS, v. 17, n. 201, p. 39-58, mar. 2006. SILVA, Marcelo Cardozo da. Aspectos do benefício de prestação continuada. Justiça do trabalho, v. 24, n. 279, p. 114-135, mar. 2007.

SILVA, Maria Lúcia Lopes da. Cidadania, globalização e previdência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 68, p. 5-16, nov. 2001. SILVA, Maria Ozanira da Silva e (Et al.). A descentralização da política de assistência social: da concepção à realidade. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 22, n. 65, p. 124-145, mar. 2001. SIQUEIRA, Claudio Drewes José de. O beneficio de prestação continuada e a preponderância dos critérios subjetivos de análise contextual. In: GUGEL, Maria Aparecida Gugel; COSTA FILHO, Waldir Macieira da; RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes (Org.). Deficiência no Brasil: uma abordagem integral dos direitos das pessoas com deficiência. Florianópolis: Obra Jurídica, 2007. p. 11-24. SPOSATI, Aldaíza de Oliveira. O primeiro ano do sistema único de assistência social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 87, p. 96-122, set. 2006. STEIN, Rosa Helena. Capital social, desenvolvimento e políticas públicas. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 24, n. 73, p. 157-197, mar. 2003. TAKAHASHI, Bruno. Aspectos processuais dos benefícios previdenciários por incapacidade. Revista CEJ, v. 16, n. 56, p. 28-43, jan./abr. 2012. TEUBNER, Gunther. El Derecho como sujeto epistémico: Hacia una epistemología constructivista del Derecho. Disponível em: < http://publicaciones.ua.es/filespubli/pdf/02148676RD37473068.pdf>. Acessado em: 20 dez. 2013. TORRES, Júlio Cesar. Sociedade civil como recurso gerencial? Indagação acerca da política de assistência social no Brasil. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 24, n. 73, p. 142-156, mar. 2003. TREZUB, Cláudio Jose. Fundamentos para a Perícia médica judicial previdenciária. In: SAVARIS, José Antônio (Org.). Curso de perícia judicial previdenciária: noções elementares para a comunidade médico-jurídica. coordenador. Florianópolis: Conceito Editorial, 2011. TUTUNGI JÚNIOR, Nicola. Reformas processuais, acesso à justiça e os juizados especiais da fazenda pública. Revista de Direito de Informática e Telecomunicações - RDIT, v. 6, n. 11, p. 81-105, jul./dez. 2011. WITTHAUS, Rodolfo E. Prueba pericial: régimen legal, peritos y consultores técnicos, honorarios: legislación y jurisprudencia, incumbencias profesionales, pericia arbitral. 2. ed. Buenos Aires: Universidad, 2003. WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. WERNECK, Claudia. Muito prazer, eu existo: um livro sobre as pessoas com síndrome de down. 4. ed. Rio de Janeiro, Wva, 1995. XAVIER, Flavia da Silva. Pressupostos ético-jurídicos da perícia médica nas ações de benefícios por incapacidade. In: SAVARIS, José Antônio (Org.). Curso de perícia judicial previdenciária: noções elementares para a comunidade médico-jurídica. Florianópolis: Conceito Editorial, 2011. p. 45-67. YASBEK, Maria Carmelita. A assistência social na prática profissional: história e perspectivas. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, SP, v. 27, n. 85, p. 123-132, mar. 2006. ZARZUELA, josé Lopes; MATUNAGA, Minoru; THOMAZ, Pedro Lourenço. Laudo pericial: aspectos técnicos e jurídicos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.