BELO HORIZONTE 2013 - 2° Congresso Brasileiro de ... · Mais recentemente, em 25 de Janeiro de...
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2º CONGRESSO BRASILEIRO DE POLÍTICA, PLANEJAMENTO E GESTÃO EM SAÚDE
UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM PROJETO POSSÍVEL
A práxis dos profissionais da Atenção Primária à Saúde no processo de notificação de
violência contra crianças e adolescentes
Deborah Pedrosa Moreir1
Geisy Lanne Muniz Luna2
Samira Valentim Gama Lira3
Maria de Fátima de Carvalho Mello4
Aline de Souza Pereira5
Luiza Jane Eyre de Souza Vieira6
BELO HORIZONTE
2013
1 Universidade de Fortaleza
2 Universidade de Fortaleza
3 Universidade de Fortaleza
4 Universidade Estadual do Ceará
5 Faculdades Nordeste- FANOR DeVry
6 Universidade de Fortaleza
A PRÁXIS DOS PROFISSIONAIS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO PROCESSO
DE NOTIFICAÇÃO DE VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES7
THE PRAXIS OF PROFESSIONALS OF PRIMARY HEALTH CARE IN THE PROCESS OF
NOTIFICATION OF VIOLENCE AGAINST CHILDREN AND ADOLESCENTS
A PRÁXIS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NA NOTIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA
Resumo: A violência contra criança e adolescente configura-se atualmente como um problema
social e de saúde pública e a identificação e acompanhamento dos casos ainda é um grande
desafio para os profissionais de saúde. Nesse sentido o presente estudo teve como objetivo
analisar a percepção dos profissionais de saúde da Atenção Primária à Saúde sobre a Notificação
da Violência contra Crianças e Adolescentes em sua práxis. Trata-se de uma pesquisa descritiva
com abordagem qualitativa, realizada em uma Unidade Básica de Saúde de referência para
violência da cidade de Fortaleza, Ceará, entre agosto e setembro de 2012. Contou com a
participação de 12 profissionais cadastrados na Estratégia Saúde da Família e os critérios de
inclusão utilizados foram profissionais que trabalhem na unidade há mais de seis meses, atendam
crianças e/ou adolescentes e aceitem participar da pesquisa. O instrumento de coleta de dados foi
uma entrevista individual a partir de questões norteadoras e estes foram analisadas pela Análise
de Conteúdo. Todos os preceitos éticos foram respeitados. Os agrupamentos temáticos surgidos
no discurso dos profissionais sinalizaram que as dificuldades para efetivarem a notificação de
maus-tratos na prática da atenção básica foram: falta de capacitação na área, medo de represálias
por parte do agressor, falta de estrutura dos serviços de apoio, dentre outros. Também emergiu
dos discursos a importância dos Agentes Comunitários de Saúde como o elo entre comunidade e
7 Recorte de um projeto de pesquisa em andamento intitulado “Notificação de maus-tratos em crianças e
adolescentes por profissionais da Equipe de Saúde da Família – Fortaleza”, com início em 2007 e término
previsto para 2014. Vale salientar que está pesquisa apresentada foi realizada em 2012.
equipe de saúde, pois os mesmos trazem para o âmbito da unidade básica os casos de violência
ocorridos em suas áreas de atuação e, por fim, o conhecimento acerca da ficha de notificação,
onde a maioria dos profissionais afirmou saber de sua existência, porem, muitos nunca tiveram a
oportunidade de ver ou preencher a mesma. Conclui-se que o reconhecimento da violência e a
notificação de maus-tratos, em crianças e adolescentes por profissionais da Estratégia Saúde da
Família, estão ligados ao “saber reconhecer” e ao “ter como fazer”, nesse sentido, o
desenvolvimento de programas de formação continuada, o aprimoramento das instituições de
proteção à criança e ao adolescente e a ampliação das redes de suporte profissional poderão
reduzir o grau de insegurança profissional em reconhecer e notificar e, deste modo, aumentar o
número de notificações dos casos de violência.
Palavras chave: Violência; Adolescente; Notificação; Papel Profissional.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2002) define violência como o uso
intencional da força física, do poder, real ou sob forma de ameaça contra si próprio, contra
outrem, ou contra um grupo ou comunidade, que resulte ou tenha possibilidade de resultar em
lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação de liberdade.
A violência, de acordo com dados do Ministério da Saúde, constitui a segunda causa
de óbitos no quadro da mortalidade geral brasileira e entre os 5 e 49 anos é a primeira causa entre
todas as mortes ocorridas (BRASIL, 2002a).
Deste modo, pode-se observar a gravidade do fenômeno, que acaba repercutindo em
todo território brasileiro e compõe grande problema de saúde pública, inerente, principalmente, à
sensação de insegurança causada em todas as classes sociais e ao custo financeiro que vem
representando para todos (FERRIANI; GARBIN; RIBEIRO, 2004).
Sabe-se, porem, que existem grupos mais vulneráveis à violência e é essencial que
estes recebam atenção especial como as crianças e adolescentes, o qual é o foco deste estudo,
além disso, destacam-se também os idosos e as mulheres.
A violência contra crianças e adolescentes não é um fato recente e, por alguns
períodos da história, foi fortalecida e era uma prática habitual, justificada e aceita pelas diferentes
sociedades, estando presente no desenvolvimento das mesmas (PIRES; MIYAZAK, 2005).
Nesse ínterim, a legislação brasileira sobre violência foi tratada na Constituição
Federal (BRASIL, 1988) e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (BRASIL, 1990), que
tornaram a notificação de casos suspeitos ou confirmados como ação obrigatória por parte de
profissionais da área de saúde e educação, prevendo penas para os mesmos e para os
estabelecimentos de saúde e educação que deixassem de comunicar os casos de seu conhecimento
(BRASIL, 2010). Com estas medidas começou-se a contextualizar a importância da percepção
diária em cada setor envolvido na vida social desse público infanto-juvenil.
Diante de tal panorama e seguindo as recomendações da OMS, feitas na Assembleia
Geral das Nações Unidas (ONU) em 1996, o Ministério da Saúde (MS) declarou que a violência
se constitui em um importante problema para a saúde pública e publicou a Política Nacional de
Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências (BRASIL, 2001a) e definiu um
instrumento de notificação, às autoridades competentes, de casos de suspeita ou de confirmação
de violência contra crianças e adolescentes, Portaria MS/GM nº 1.968 (BRASIL, 2001b).
Mais recentemente, em 25 de Janeiro de 2011, foi criada a portaria nº 104/2011
(BRASIL, 2011), onde são definidas as terminologias e relação de doenças, agravos e eventos em
saúde pública de notificação compulsória, estabelecendo fluxo, critérios, responsabilidades e
atribuições aos profissionais e serviços de saúde.
Segundo Silva et al (2009), a notificação constitui-se como um instrumento de
proteção à criança e/ou adolescente que está sob cuidado profissional na Instituição, porém,
muitos profissionais, por falta de conhecimento e por insegurança, podem deixar de agir diante de
uma situação de violência ou até mesmo agir de forma errônea. O ECA, mesmo sem explicitar
como fazer a notificação, respalda e apoia esse procedimento. A falta de confiança dos
profissionais no aparato estatal, associada à falta de capacitação para o acompanhamento e
compreensão do desenvolvimento do fenômeno da violência, pode impedir que a notificação seja
efetivada, apesar da exigência legal contida no ECA (SILVA et al, 2009).
JUSTIFICATIVA
Diante da complexidade configurada e ao perceber o aumento de casos de violência contra
crianças e adolescentes que chegam diariamente aos serviços de saúde, surgiu-me inquietações e
reflexões acerca da abordagem da violência na atenção básica, tendo em vista que esse serviço é
considerado ”porta de entrada” para o Sistema Único de Saúde.
O estudo tem como relevância ressaltar a realidade da notificação de maus-tratos em
crianças e adolescentes por profissionais da Estratégia Saúde da Família, no intuito de formular dados
para o planejamento de ações que visem oferecer táticas que venham a facilitar a pratica da notificação
de maus-tratos.
A pesquisa nessa área traz subsídios para fomentar Políticas Públicas no setor, no
intuito de conscientizar para a importância do aperfeiçoamento profissional na abordagem de
casos de violência contra criança e adolescente.
OBJETIVOS
Analisar a percepção dos profissionais da Atenção Primária em Saúde sobre a Notificação de
Violência contra Crianças e Adolescentes em sua práxis.
REFERENCIAL TEÓRICO
Violência contra criança e adolescente
Segundo Minayo (2001), a violência contra crianças e adolescentes é todo ato ou
omissão cometido pelos pais, parentes, outras pessoas e instituições capazes de causar dano
físico, sexual e/ou psicológico à vítima. Implica, de um lado, uma transgressão no poder/dever de
proteção do adulto e da sociedade em geral e, de outro, numa coisificação da infância. Isto é, uma
negação do direito que crianças e adolescentes têm de serem tratados como sujeitos e pessoas em
condições especiais de desenvolvimento.
Destacam-se duas formas de violência contra criança e adolescente e ambas
distinguem-se por algumas características. A violência intrafamiliar corresponde a toda ação ou
omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito ao
desenvolvimento da criança ou adolescente. Pode ser cometida dentro ou fora de casa por algum
membro da família, incluindo pessoas que passam a assumir função parental e de relação de
poder à outra, ainda que sem laços de consanguinidade. A violência doméstica, por sua vez, inclui
outros membros do grupo, sem função parental, mas que convivem no espaço doméstico.
Incluem-se aí empregados, pessoas que convivem esporadicamente e agregados (BRASIL,
2001c).
Salienta-se que a violência é um fenômeno de difícil apreensão pelo grau de
subjetividade, polissemia e controvérsia que contém, entretanto, pode-se analisá-la em suas
distintas formas e expressões (MINAYO, SOUZA, 1998). Convém realçar que a violência contra
a criança e o adolescente abrange conceitos específicos de violência física, psicológica, sexual e
de negligência, os quais são abordados a seguir.
Violência física
Violência física é cometida quando uma pessoa, que está em relação de poder à
criança, causa ou tenta causar dano não acidental, por meio do uso da força física ou de algum
tipo de arma que pode provocar - ou não - lesões externas, internas ou ambas. Segundo
concepções mais recentes, o castigo repetido, não severo, também é considerado como violência
física (BRASIL, 2001c).
Violência psicológica
A violência psicológica, segundo Camargo e Buralli (2006), evidencia-se como a
interferência negativa do adulto sobre a criança e sua competência social, conformando um
padrão de comportamento abusivo. As formas mais comuns são: rejeitar, isolar, aterrorizar,
ignorar, corromper e criar expectativas irreais ou extremadas sobre a criança ou adolescente.
A violência psicológica se traduz como uma das modalidades mais difíceis de ser
identificada e consequentemente de ser combatida. Ela perpassa todas as demais modalidades de
violência, visto que as experiências de maus tratos físicos, psicológicos, sexuais e negligência
acarretam para a maior parte das vítimas traumas de dimensões profundas. Além disso, se
configura ainda pela sua especificidade que consiste em atos que destorcem a imagem e
acarretam prejuízos à identidade da pessoa, tais como: xingamento, humilhações, discriminação,
entre outros, levando a pessoa a sentir-se desvalorizada, sofrer de ansiedade e adoecer com
facilidade, podendo inclusive, em casos de longo tempo se agravar de forma profunda chegando
até a morte (ABRAPIA, 2002).
Violência sexual
Segundo Deslandes (1994), a violência sexual, é entendida como todo ato ou jogo
sexual, relação hetero ou homossexual na qual o agressor está em estágio de desenvolvimento
psicossexual mais adiantado que a criança ou adolescente, com o objetivo de estimulá-la
sexualmente ou utilizá-la como meio para alcançar satisfação sexual. Gonçalves e Ferreira (2002)
complementa afirmando que, algumas vezes, não há, necessariamente, sinal corporal visível. A
estimulação sexual pode ocorrer sob a forma de práticas eróticas e sexuais (violência física,
ameaças, indução, vouyerismo, exibicionismo, produção de fotos e exploração sexual).
Negligência
De acordo com Camargo e Buralli (2006), a negligência é o tipo mais frequente de
maus-tratos e é explicada como o fato da família se omitir em prover as necessidades físicas,
emocionais e educacionais de uma criança ou adolescente. Configura-se quando os pais ou
responsáveis falham em alimentar, vestir adequadamente, medicar ou educar seus filhos. Azevedo
e Guerra (1989) ressalta que é importante perceber e distinguir a relação da negligência com as
condições sociais de vida dos pais, aspecto relevante em uma realidade como a brasileira. Logo,
se uma criança está mal alimentada porque os pais não conseguem obter dinheiro para alimentá-
la adequadamente, o caso não será considerado como de negligência. Entretanto, se todo o
dinheiro conseguido e que deveria ser destinado, prioritariamente, para a alimentação dos filhos é
desviado para o consumo de bebidas alcoólicas, então poderia se configurar um cuidado
negligente.
A violência que ocorre dentro das famílias ainda é um assunto cercado de tabus e
sabe-se que as experiências da infância, sejam elas boas ou más, se refletirão na personalidade
adulta. Muszkat (2001) refere que famílias podem ser despreparadas para compreender,
administrar e tolerar seus próprios conflitos e tornarem-se violentas por tradição. Acredita-se que
o ciclo da violência contra crianças e adolescentes está vinculado diretamente ao relacionamento
afetivo entre pais e filhos. Muitas crianças se sentem ameaçadas, negligenciadas, abandonadas e
não encontram motivos, no seu próprio ambiente, para acreditarem que são importantes.
Constantemente submetidas à violência, aprendem, erradamente, que só através de tal forma
poderão resolver conflitos, contribuindo, deste modo, para a manutenção da violência geração
após geração (PEREIRA, 2005).
A notificação como instrumento de prevenção à violência
O instrumento da notificação deve dar inicio a um processo que se caracteriza muito
mais como assistência e auxilio, não como punição. Algumas experiências tem mostrado que a
intervenção do setor saúde pode ser mais efetiva quando a saúde e o bem-estar de todos os
envolvidos colocam-se como objeto primeiro da ação, buscando-se equacionar os direitos de
todos os membros da família ao invés de alimentar o confronto entre direitos subjetivos (LUNA,
2007).
O Brasil começou a se preocupar e a tratar a violência contra crianças e adolescentes,
como um problema de saúde após os anos 60, sobretudo na área da pediatria (GUERRA, 2001).
No final da década de 80 houve uma atenção crescente em relação ao tema e, em 1988, o texto da
atual Constituição Brasileira que em seu artigo 227 determina que “é dever da família, da
sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Assegurando,
assim, direitos à criança e ao adolescente (BRASIL, 1988).
O reconhecimento da necessidade em proteger crianças e adolescentes, garantindo
seu crescimento e desenvolvimento saudáveis, veio ampliar as políticas e estratégias voltadas
para a emergente questão da violência ocorrida nas últimas décadas contra este grupo e, no dia 30
de junho de 1989, foi aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) pelo Congresso
Nacional e, posteriormente, transformado na Lei Federal nº 8069 em 13 de julho de 1990 o qual
veio a se constituir no instrumento legal na garantia da cidadania de crianças e adolescentes. Com
a implementação do ECA, a lei passa a dar prioridade absoluta à criança e/ou adolescente por
parte da família, da sociedade e do Estado, mudando a concepção de atendimento à criança e ao
adolescente (BRASIL, 2006a).
Mesmo reconhecendo "a distância entre intenção e prática", é preciso saudar o
estatuto, com suas concepções abrangentes dos direitos dos jovens, indo desde a criança como
sujeito de direitos abstratos até as disposições jurídicas para a sua proteção em caso de delito
(LUNA, 2007).
Além do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Penal também prevê
penalidades para o abuso infantil, com pena que varia de dois meses a um ano de detenção ou
multa, podendo ser aumentada para um a quatro anos se caracterizada lesão corporal grave e para
quatro a doze anos em caso de morte (BRASIL, 1988).
Neste movimento, em direção à proteção da criança e do adolescente, o Ministério da
Saúde elaborou, em 1993, uma proposta preliminar de prevenção e assistência à violência
doméstica (BRASIL, 1993).
Atenção Primária à Saúde
A conferência de Alma-Ata definiu a Atenção Primária a Saúde (APS) como
"cuidados essenciais baseados em métodos de trabalho e tecnologias de natureza prática,
cientificamente críveis e socialmente aceitáveis, universalmente acessíveis na comunidade aos
indivíduos e às famílias, com a sua total participação e a um custo suportável para as
comunidades e para os países, à medida que se desenvolvem num espírito de autonomia e
autodeterminação" (BRASIL, 2001d).
A Constituição de 1988 aprovou o Sistema Único de Saúde (SUS) o qual forneceu os
princípios para a reorganização da Atenção Básica no Brasil e tem sido o Programa Saúde da
Família (PSF), atualmente conhecido como Estratégia Saúde da Família (ESF), o viabilizador da
construção de um novo modelo de atenção a saúde.
De acordo com Mendes (2012), no Brasil, inventou-se algo sem similar na literatura
internacional, pois aqui atenção primária denomina-se atenção básica, o que, para o autor, reforça
a concepção de algo simples que pode ser banalizado. Em função dessa visão ideológica da
atenção primária à saúde, interpreta-se primário como primitivo, mas, ao contrário, o significante
primário quer referir-se ao complexo princípio da Atenção Primária à Saúde: o do primeiro
contato.
A Atenção Básica de Saúde (ABS) é definida como o modo de organização e
funcionamento da porta de entrada preferencial do sistema de saúde e com ênfase na função
resolutiva dos serviços, sobre os problemas de saúde mais comuns da população, com redução de
custos econômicos, mas com atendimento às demandas da população por ações de atenção á
saúde de primeiro nível, caracterizando-se por um conjunto de ações de saúde no âmbito
individual e coletivo que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o
diagnostico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde através do uso de tecnologias
de elevada complexidade e baixa densidade, que devem resolver os problemas de saúde de maior
frequência e relevância em seu território (BRASIL, 2006b).
Seus fundamentos são possibilitar o acesso universal e contínuo a serviços de saúde
de qualidade e resolutivos; efetivar a integralidade em seus vários aspectos; desenvolver
relações de vínculo e responsabilização entre as equipes e a população adscrita, garantindo a
continuidade das ações de saúde e a longitudinalidade do cuidado; valorizar os profissionais de
saúde por meio do estímulo e acompanhamento constante de sua formação e capacitação;
realizar avaliação e acompanhamento sistemático dos resultados alcançados, como parte do
processo de planejamento e programação; estimular a participação popular e o controle social
(MENDES, 2012).
METODOLOGIA
As asserções da pesquisa direciona-nos para um estudo descritivo com abordagem
qualitativa.
Na pesquisa qualitativa o pesquisador é ativo descobridor do significado das ações e
relações que se ocultam nas estruturas sociais (CHIZZOTTI, 2000). De acordo com Minayo
(2002), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde ao espaço profundo das relações, dos processos e
dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
Realizou-se na Atenção Básica do município de Fortaleza-Ceará. Atualmente
Fortaleza é dividida em 6 Secretarias Regionais (I, II, III, IV, V e VI). Na SER I, é formada por
15 bairros e moram cerca de 360 mil habitantes, SER II é formada por 20 bairros, onde moram
325.058 pessoas, SER III possui 378.000 habitantes que estão distribuídos em 17 bairros, SER IV
abrange 19 bairros e sua população é cerca de 305 mil habitantes, SER V possui 570 mil
habitantes dos 18 bairros e SER VI com população estimada em 600 mil habitantes e atende a 29
bairros. Em relação ao serviço de atenção básica, Fortaleza possui 92 Unidades Básicas de Saúde
distribuídas nas SER‟s. Desses, 12 estão na SER I, 12 na SER II, 16 na SER III, 12 na SER IV, 20
na SER V e 20 na SER VI (PREFEITURA DE FORTALEZA, 2011). Nesse estudo a pesquisa
será realizada na Secretaria Executiva Regional IV.
A SER IV possui 33 Equipes de Saúde da Família, onde escolhemos, por amostra, 05
equipes lotadas em uma Unidade Atenção Primária à Saúde (UAPS), pois trata-se de uma
unidade-escola, vinculada à uma Universidade.
A UAPS é considerada referência no atendimento de vítimas de violência na Regional
IV, essa realidade foi fundamental na escolha desses profissionais para este estudo, pois a maioria
já foi capacitada na área.
Os sujeitos do estudo foram profissionais de saúde (enfermeiros e cirurgiões-
dentistas) da Estratégia Saúde da Família. No primeiro momento foi solicitado a participação de
todos os profissionais de nível superior da ESF, contudo no período de coleta de dados alguns
médicos encontravam-se de férias e o restante se negou a participar, ficando então a participação
restrita de enfermeiros e cirurgiões-dentistas.
Os critérios de inclusão adotados pelo estudo foram: ser profissionais cadastrado na
Equipe Saúde da Família, trabalhar na Unidade há mais de 6 meses, atender crianças e/ou
adolescentes em sua práxis e aceitar participar da pesquisa.
A coleta dos dados foi realizada durante os meses de agosto a setembro de 2012
através de entrevista individual com a utilização de um roteiro com questões norteadoras sobre a
notificação da violência contra crianças e adolescentes. Para a coleta de dados foi realizado visita
na Unidade de Saúde, explicado à coordenação sobre os objetivos do estudo e posteriormente
obtivemos permissão para entrevistar os profissionais. Essas entrevistas aconteceram nos
intervalos das consultas.
O instrumento de coleta de dados foi uma entrevista, definida como um encontro
entre duas pessoas, com o propósito de que uma delas obtenha informações a respeito de
determinado assunto, por meio de uma conversação de natureza profissional. É um procedimento
utilizado na investigação social, para coleta de dados ou para ajudar no diagnostico ou no
tratamento de um problema social (LAKATOS; MARCONI, 1999).
A entrevista utilizada contempla as informações sobre as características
sociodemográficas e sobre o conhecimento do profissional acerca da ficha de notificação e as
facilidades e dificuldades no reconhecimento das vitimas de violência. Durante a coleta de dados
foi solicitado assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido – TCLE.
Dentre as técnicas de análise, resolvemos adotar a análise de conteúdo de Bardin
(2011) que é definida como um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando a obter
indicadores, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, que permitam a inferência de conhecimentos relativos ao discurso dos entrevistados.
Após a análise dos dados emergiu-se as seguintes categorias:
1. Falta de Preparo Profissional para Abordagem da Violência
2. Medo do Profissional frente a Casos de Violência
3. A Notificação como Instrumento de Prevenção à Violência
Vale salientar, que todos os preceitos éticos foram respeitados a partir da Resolução
196/96, e foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza - UNIFOR,
onde recebeu aprovação para realização do estudo, sob o parecer 072/2007.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Caracterização dos Sujeitos
O estudo contou com a participação de doze profissionais, sendo: seis cirurgiões
dentistas e seis enfermeiros da equipe de saúde da família, os quais atuavam diretamente
desenvolvendo ações em suas áreas de adscrição/responsabilização. Nem todos os profissionais
que compõem a equipe foram entrevistados; faltaram dois médicos e uma enfermeira.
Visando à preservação do anonimato dos sujeitos, escolheu-se a denominação de
profissional, seguido do número correspondente a ordem de entrevista.
Quadro 1 – Caracterização dos profissionais de saúde – CE- 2012
Profissional Profissão Sexo Idade Estado
Civil
Renda
Familia
r R$
Religião Qualificação
Profissional
P01 Enfermeiro F 35 Casada 2.000,0
0
Católica Pós em outra
área
P02 C. Dentista F 38 Viuva 3.500,0
0
Católica Pós em Saúde
Púb.
P03 Enfermeiro M 35 Casado 3.000,0
0
Não
Católica
Pós em outra
área
P04 C. Dentista F 60 Casada ---- Não
Católica
Pós em Saúde
Púb.
P05 Enfermeiro F 47 Solteira ---- Católica Pós em Saúde
Púb.
P06 Enfermeiro F 45 Outro ---- Católica Pós em outra
área
P07 C. Dentista F 29 Solteira ---- Não
Católica
Pós em outra
área
P08 C. Dentista F 35 Casada ---- Católica Pós em outra
área
P09 Enfermeiro F 32 Casada 7.000,0
0
Não
Católica
Pós em outra
área
P10 C. Dentista F 30 Casada ---- Católica Pós em Saúde
Púb.
P11 Enfermeiro F 42 Casada 6.000,0
0
Católica Não possui
P12 C. Dentista F 41 Solteira 16.000,
00
Católica Pós em outra
área
Categorias:
Falta de Preparo Profissional para Abordagem da Violência
A falta de preparo do profissional em reconhecer a violência foi uma reclamação
comum e quase unânime entre os sujeitos da pesquisa e, segundo os mesmos, isso dificulta que
ações pertinentes ao fenômeno da violência contra crianças e adolescentes sejam desenvolvidas, o
discurso abaixo confirma tal evidenciação.
“A falta de preparo do profissional é um fator que dificulta a identificação da
violência, associado a falta de informação pela falta de notificação...” (P10)
A maioria dos participantes do estudo não possui formação em saúde da família.
Portanto, há uma necessidade visível de se discutir e rever essa fragilidade encontrada na equipe
fornecendo cursos de capacitação ao profissional da área para que o mesmo esteja habilitado a
reconhecer a violência e estar apto a tomar as medidas necessárias.
Isto corrobora o pensamento de Deslandes (1994), segundo o qual a identificação dos
casos de maus-tratos que chegam aos serviços públicos de saúde é uma realidade possível, desde
que fornecidas aos profissionais condições instrumentais e esclarecidas suas responsabilidades
com essas crianças e adolescentes.
Os discursos que se seguem demonstram a realidade descrita pelos entrevistados em
relação às dificuldades na abordagem da violência, onde se percebe que a necessidade de
capacitação na área está presente na maioria das respostas.
“O principal fator é o despreparo do profissional para reconhecer a criança ou
o adolescente vítima da violência quanto à abordagem.” (P02)
“A falta de capacitação profissional é um dos fatores, mas tem outros como
falta de suporte e de equipamentos como RX e falta de vínculo com os familiares.” (P03)
A atitude dos profissionais frente à abordagem da violência cometida contra a criança
e o adolescente se encontra intimamente relacionada com a capacitação ou não do profissional
em reconhecer tal fato. Embora o tema esteja assumindo maior visibilidade em vários estudos e
pesquisas ainda se observa o despreparo dos profissionais das diferentes áreas que lidam com a
problemática.
A identificação da violência nos serviços de saúde é ainda carregada de muitas
incertezas. A questão não tem sido tratada na maioria dos currículos de graduação (ALMEIDA,
1998). Deste modo, muitos profissionais não dispõem de informações básicas que permitam
diagnosticá-la com um mínimo de certeza.
Segundo Gomes et al. (2002), vem sendo destacado na literatura internacional que a
não identificação dos casos de maus-tratos e sua consequente não notificação se relacionam à
falta de conhecimento por parte dos profissionais em detectar os sintomas.
Acerca do conhecimento da ficha de notificação e de seu correto preenchimento ficou
evidente o desconhecimento e despreparo dos profissionais em relação à questão. Alguns
afirmam que nunca viram a mesma, consequentemente, não sabem preenchê-la, ficando
comprovado pelos relatos abaixo:
“Não conheço essa ficha, nem sei como deve ser preenchida, mas sei que tem
aqui.” (P08)
“Eu nunca preenchi a ficha, pra falar a verdade nunca vi.” (P12)
Apesar dos profissionais afirmarem ter ciência da existência da ficha de notificação, o
conhecimento do seu teor não é efetivado. Evidenciando, mais uma vez, o despreparo do
profissional em relação à questão da violência e de sua devida notificação.
“A ficha existe na unidade, entretanto eu nunca tive a experiência em detectar
tal violência, por isso nunca a preenchi.” (P02)
“Nunca preenchi, nem sei se tenho dificuldades” (P09)
Prover um programa de educação permanente aos profissionais da saúde, formando
um quadro de pessoal devidamente capacitado e qualificado, como também seguro de suas ações,
é de extrema importância para que os mesmos executem as ações pertinentes às suas funções com
mais segurança e exatidão.
Profissionais qualificados são de extrema importância para o manejo dos casos, bem
como para a qualidade das informações contidas no instrumento de notificação, a qualificação
profissional deve ser sempre estimulada, o Ministério da Saúde, através da Portaria GM/MS nº
198 (BRASIL, 2004) de 13 de fevereiro de 2004, implantou a Política Nacional de Educação
Permanente que tem como proposta de ação estratégica contribuir para transformar e qualificar as
práticas de saúde, a organização das ações e dos serviços de saúde, os processos formativos e as
práticas pedagógicas na formação e desenvolvimento dos trabalhadores de saúde (BRASIL,
2004).
Na Estratégia Saúde da Família (ESF) a necessidade de formação permanente dos
profissionais torna esse desafio maior, pois vai de encontro com as formas tradicionais de ensino
socialmente reconhecidas (MENDONÇA et al, 2010).
Medo do Profissional frente a Casos de Violência
O medo é outro fator que contribui para a subnotificação. Os profissionais de saúde
demonstram uma grande relutância em assumir uma notificação de violência contra criança e/ou
adolescente e não se sentem seguros em fazê-lo, pois, além do receio em abordar a família,
alegam que não têm suporte de outros órgãos.
Os discursos mostram com clareza a insegurança em trabalhar com situações
delicadas como a violência, as quais envolvem denúncia, notificação e escassez de parcerias
como: Conselho Tutelar, Delegacia da Criança e do Adolescente, e outras.
“O receio da abordagem com a família e, alem disso, o Conselho Tutelar, às
vezes, nem aparece, a falta de capacitação também prejudica porque o profissional não valoriza
a notificação, por exemplo, a notificação da dengue, muitas vezes não é feita.” (P01)
A ameaça do agressor aos profissionais é um argumento invocado, com certa
frequência, para justificar a não-notificação dos casos de violência (BRASIL, 2002a).
“O medo do profissional em relação à família da vitima porque a gente pode
ser ameaçada, falta de preparo do profissional para identificação de violência e falta de
informação pela falta de notificação. (P10).
A violência contra a criança e o adolescente é uma demanda antiga para os
profissionais de saúde, mas estes, em sua maioria, não desenvolveram meios para seu
enfrentamento. Isso ocorre por medo do profissional de envolvimento legal, embora haja amparo,
especialmente, no Estatuto da Criança e do Adolescente, para que as ações desenvolvidas surtam
efeito e não prejudiquem o trabalhador da saúde (PIRES, 2004).
O medo está claro tanto no discurso dos enfermeiros como no dos cirurgiões-
dentistas, que tentam justificar esse sentimento através do fato de estarem mais próximos da
comunidade e do contato mais frequente que estes profissionais possuem com a mesma. Os
profissionais que atuam na ESF exercem suas ações em territórios definidos e, pela própria
característica do processo de trabalho, criam vínculos com a comunidade o que pode acarretar no
aumento do medo e/ou receio na abordagem às vítimas de violência, pois eles encontram-se
muito próximos da comunidade, como representa a fala abaixo:
“A gente tem receio de abordar a família porque a gente entra e sai todo dia
daqui e nós não temos segurança, falta de referência, mas eu identifico.” (P05)
Deslandes (1999) defende que este quadro só poderá ser revertido quando algumas
ações fundamentais forem tomadas, como a criação de uma dinâmica de responsabilidade
institucional para a notificação dos casos, pois se de um lado é responsabilidade do profissional
notificar, por outro é a instituição que deve garantir esta conduta profissional, protegendo o
indivíduo de “arcar” com todas as pressões, compartilhando a responsabilidade pelo caso. Há que
se criar uma "rotina institucional" para a notificação, identificando-se etapas e atribuições.
Essa realidade nos remete à necessidade de construção de uma rede de apoio pela
gestão, que consiga dar segurança ao profissional que trabalha na ESF. Sem ela, continuará
ocorrendo a hegemonia do silêncio, em detrimento da fala de protesto e das ações contra essa
conjuntura que aflige as comunidades nas quais os profissionais procuram melhorar a qualidade
de vida dos moradores (FERREIRA JÚNIOR, 2010).
A Notificação como Instrumento de Prevenção à Violência
Nas falas dos profissionais entrevistados, independentemente de sua categoria
profissional, podemos constatar o déficit de notificação nos casos de violência contra criança e
adolescente como também é salientada a importância da mudança deste quadro para que ações
possam ser tomadas e estratégias geradas a partir do estudo epidemiológico dos casos.
Em 2004, a portaria GM/MS 2.406 (BRASIL, 2004b) disseminou a notificação
compulsória da violência, de acordo com a lei 10.778/2003 (BRASIL, 2003) que estabelece essa
forma de registro, e a lei 10.886/2004 (BRASIL, 2004a), também chamada lei Maria da Penha,
que tipifica a violência domestica. Mais recentemente, em 2006, o Ministério da Saúde lançou a
„matriz pedagógica‟8 para a formação de redes de atenção integral para mulheres e adolescentes
em situação de violência domestica e sexual (BRASIL, 2006c).
Geralmente, a notificação realizada numa instancia dos serviços de saúde segue para
o Conselho Tutelar da cidade onde o evento violento ocorreu, com cópia para a secretaria de
saúde do município. A principal finalidade desse ato é dar apoio e proteção à criança e ao
adolescente e sua família. Para os serviços de saúde, o registro tem ainda o objetivo de gerar um
perfil dos problemas e da demanda e, assim, subsidiar o planejamento adequado de atenção às
vitimas nas unidades básicas e no sistema como um todo (LUNA, 2007).
“Há déficit de notificação. Seria muito importante que os equipamentos
sociais nos dessem mais apoio, porque assim a gente teria um retrato da comunidade e ver o que
pode ser trabalhado na família. Com subnotificação não há como trabalhar estratégias para
melhorar.” (P01)
A prática da notificação de violência contra criança e adolescente pode ser
considerada indicador de um melhor monitoramento da violência. Isso pode ser justificado pela
fala abaixo.
“É importante para se ter conhecimento dos casos de violência e,
consequentemente, implantação de políticas de saúde pública.” (P06)
Nos discursos que se seguem, podemos constatar que a notificação é reconhecida
pelos profissionais como um poderoso instrumento de política pública, pois serve para fornecer
dados, dimensionando, assim, a questão da violência e sua dinâmica, como também serve para
implantação de políticas e estratégias que visem minimizar sua ocorrência.
“...serve como histórico do atendimento e poderia desencadear ações
8
� Conjunto de informações que se ancoram entre o instrumental teórico e o aprimoramento técnico. (BRASIL, 2011)
intersetoriais e apoio jurídico”. (P03)
“É um mecanismo importante para proteção das crianças e adolescentes.”
(P08)
“Ah! É fundamental para o acompanhamento e informação dos casos e
também possibilita o planejamento de ações.” (P10)
Os profissionais de saúde têm um papel importante na luta contra a violência e é
necessário esclarecer que a notificação não se trata de uma denúncia, mas de uma ferramenta que
promove políticas públicas reduzindo riscos e danos associados à violência contra as crianças e
adolescentes, permitindo, ainda, que se conheça as diversas formas de violência, suas vitimas e
agressores, fazendo-se o encaminhamento devido e necessário, assim como, promover a
assistência às vítimas.
O ato de notificar é um elemento crucial na ação pontual contra violência, na ação
política global e no entendimento do fenômeno. Apesar disso, muita controvérsia permeia ainda o
tema, sem perspectiva de solução imediata. Pode-se deduzir que o instrumento da notificação
deve dar inicio a um processo que se caracteriza muito mais como assistência e auxilio e não
como punição. Algumas experiências tem mostrado que a intervenção do setor saúde pode ser
mais efetiva quando a saúde e o bem-estar de todos os envolvidos colocam-se como objeto
primeiro da ação, buscando-se equacionar os direitos de todos os membros da família ao invés de
alimentar o confronto entre direitos subjetivos (LUNA, 2007).
Para incentivar o adequado preenchimento das fichas de notificação são essenciais as
parcerias com as instituições formadoras de profissionais de saúde, bem como com entidades de
classe dos profissionais de saúde. Profissionais de outras áreas como educação, promoção social,
dentre outros, podem ser envolvidos também no processo de notificação. As notificações que
envolvem crianças e adolescentes devem ser encaminhadas obrigatoriamente também aos
conselhos tutelares da infância e da adolescência (BRASIL, 2008).
O reconhecimento da violência e a notificação de maus-tratos, em crianças e
adolescentes por profissionais da Estratégia Saúde da Família, estão ligados ao “saber
reconhecer” e ao “ter como fazer”. Nesse sentido, o desenvolvimento de programas de formação
permanente, o aprimoramento das instituições de proteção à criança e ao adolescente e a
ampliação das redes de suporte ao profissional poderão reduzir o grau de insegurança deste em
reconhecer e notificar e, deste modo, aumentar o número de notificações dos casos de violência,
bem como, possibilita realização de futuras reestruturações que se façam necessárias nas políticas
de atenção como também na própria ficha. O profissional não deve apenas se conectar com a
realidade é preciso nela intervir.
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