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    ARTIGO

    Ano 1 - nmero 1

    abril-junho 2008

    por Luiz Gonzaga Belluzzo

    Insero Externa e Desenvolvimento: Mitos do Consenso

    Liberal

    Garantem os pais da matria que, nesse mundo de capitais em movimento livre e cobioso,enlaado a fluxos de comrcio em expanso, os benefcios podem ser muitos.

    Para pases como o Brasil, os especialistas da corrente principal recomendam a trindadeinfalvel: metas de inflao, dficit nominal zero, cmbio flutuante. Em seu cardpio, figura amudana de composio do gasto pblico, excessivamente inclinado para o dispndiocorrente, em prejuzo do investimento. Digo, sem ironia, que as sugestes so procedentes. Aelas juntaria banal recomendao destinada aos pases de moeda no-conversvel, nummundo de recorrente instabilidade monetria e financeira: manter reservas adequadas e nodeixar escapar o supervit em conta corrente. O carregamento das reservas em moeda localest caro por conta dos equvocos de avaliao do Banco Central do Brasil. Mas, emcontrapartida, o pas abocanha um prmio de liquidez que nos permite alongar prazos nasoperaes de financiamento domstico. O vcio equvoco dos juros reais elevados alia-se virtude o prmio de liquidez implcito nas reservas para proporcionar o dissabor dacontinuada valorizao do real.

    A viso dominante ainda sustenta que o comrcio internacional roda de acordo com ospreceitos da teoria das vantagens comparativas de David Ricardo. No modelo ricardiano, ospases especializam-se na venda de produtos de menor custo relativo. As economias

    nacionais devem especializar-se naquilo que fazem melhor, no em comparao com o quefazem outras economias, mas, sim, em relao a outras atividades internas. Assim, ointercmbio internacional de mercadorias se faz entre bens finais, com a mxima eficinciapossvel, em cada estgio do progresso tecnolgico.

    Deveriam pases como o Brasil acreditar piamente nesses preceitos?

    A constituio do espao econmico internacional na segunda metade do sculo XX e aindustrializao

    da periferia

    Talvez apropriado aos interesses e diviso do trabalho proposta pela Inglaterra no sculoXIX, esse paradigma sobreviveu s reformas da ordem econmica internacional concertadaem Bretton Woods. Sob o patrocnio da liderana norte-americana e a superviso do GATT e

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    do FMI, as regras adotadas previam um sistema de taxas de cmbio fixas, mas ajustveis,restrio ao movimento de capitais e nveis reduzidos de endividamento externo em moedaestrangeira. A ausncia de fluxos de capitais, diz o economista Jan Kregel, levou a uma teoriado ajustamento do balano de pagamentos baseada em alteraes na absoro domstica, ouseja, na expanso ou contrao da demanda nominal em moeda local. Este mecanismokeynesiano buscava freqentemente o auxlio de valorizaes/desvalorizaes da taxa decmbio com o propsito de afetar os preos relativos entre bens comercializveis e no-

    comercializveis.

    Mas a ordem econmica do ps-guerra esteve distante de qualquer semelhana oucoincidncia com as hipteses expostas acima. O espao econmico internacional foiconstrudo a partir das modalidades de integrao propostas pela economia americana, cujahegemonia foi exercida de forma muito distinta daquela exibida pela Inglaterra, centropropulsor da economia global no sculo XIX e nas duas primeiras dcadas do sculo XX.Sobretudo depois da Guerra de Secesso, nos Estados Unidos, na segunda metade do sculoXIX, os bancos de investimento passam promover a fuso entre o capital industrial e a alta

    finana. Pouco a pouco todos os setores da economia foram dominados por grandesempresas, sob o comando do capital financeiro.

    Aps a Segunda Guerra Mundial, a internacionalizao da corporao americana suscitou,depois da reconstruo, a resposta competitiva da grande empresa europia. Essa rivalidadevai promover o investimento produtivo cruzado entre os Estados Unidos e a Europa e aprimeira rodada de industrializao fordista na periferia do capitalismo.

    Durante a chamada era dourada, a expanso do comrcio envolvia, sobretudo no primeiro

    momento, o intercmbio de bens finais de consumo e de capital entre os parceiros doAtlntico Norte. Depois da revoluo chinesa e da guerra da Coria, entrariam na dana oJapo e, mais tarde, a prpria Coria e Taiwan, todos apoiados em estratgias deindustrializao baseadas em empresas nacionais estimuladas a exportar e incorporarinovaes. O catching up dos asiticos buscou inspirao nas vantagens comparativasdinmicas, sob o olhar benevolente dos Estados Unidos. A Amrica Latinadesenvolvimentista foi integrada a este surto de expanso. O Brasil valeu-se de polticasnacionais de industrializao que, no mbito domstico, trataram de promover ainternacionalizao da economia, ou seja, a repartio de tarefas entre as corporaesmultinacionais, as empresas estatais e os empreendimentos privados nacionais, os doisltimos encarregados de produzir os bens intermedirios e matrias-primassemiprocessadas.

    A era dourada terminou no dollar glut e, em 1971, na decretao unilateral dainconversibilidade da moeda americana razo de 35 dlares por ona troy de ouro. Depoisda crise de hegemonia e de produtividade dos anos 70 do sculo passado, a expansoamericana retomou a iniciativa. No s imps a liberalizao financeira urbi et orbi, com

    impulsionou a metstase produtiva para o Pacfico dos pequenos tigres e novos drages. Apartir da o mundo presencia um cataclismo na diviso internacional do trabalho. A siatorna-se formidvel produtora e processadora de peas e componentes baratos (sem

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    excluso dos bens finais). Conforma-se uma mancha manufatureira, grande importadora dematrias-primas, que pulsa em torno da China, reintegrada ao circuito capitalista desde asreformas do final dos anos 1970.

    No incio do sculo atual, as relaes de troca no comrcio mundial deixam de inclinar-se afavor das manufaturas e contra os produtos primrios. O Brasil foi abalroado pela incrvelelevao dos preos das commodities e, abenoado por natureza, reduziu significativamenteos riscos de uma crise de balano de pagamentos, origem dos choques inflacionrios e dasamplas flutuaes do produto e da renda nas ltimas dcadas. Mas no territrio dosasiticos, de mo-de-obra barata, cmbio desvalorizado e abundncia de investimento diretoestrangeiro, que se produzem as novas manufaturas. O deslocamento das filiais em busca doglobal sourcing obriga a economia nacional americana a ampliar o seu grau de aberturacomercial e a gerar um dficit comercial crescente. Torna-se incontornvel acomodar aexpanso manufatureira e comercial dos novos parceiros, produzida em grande parte pelodeslocamento do grande capital americano na busca de maior competitividade.

    As teorias convencionais sobre ajustamentos (e desajustamentos) do balano de pagamentos(monetaristas, keynesianas e novo-clssicas) no funcionam, assim como esto sob avaliaonegativa as hipteses sobre a movimentao de capitais. H espanto e decepo nos crculosbem-informados a respeito da direo dos fluxos financeiros. Na idia dos dinossauros daeconomia liberalizada, eles deveriam fluir dos pases desenvolvidos para os mercadosemergentes. Mas, droga! os emergentes, com seus supervits em conta corrente eformao acelerada de reservas financiam o dficit da economia dominante, alm deameaar a aquisio de empresas e bancos com os recursos acumulados nos FundosSoberanos.

    Na verdade, os macroeconomistas do mainstream esto desorientados diante das forastectnicas que ora transtornam a economia global. Para eles, o mundo est de ponta-cabea,mas na verdade suas teorias que precisam ser postas de cabea para cima. Por isso dizemenormidades a respeito das relaes entre riqueza, crdito, poupana e investimento.

    Mais do que as proezas de Greenspan, a estratgia dos asiticos at a exploso dos preosdas commodities garantiu inflao baixa e sustentou o dlar como moeda reserva. OsEstados Unidos ganharam liberdade para a adoo de polticas monetrias e fiscais

    anticclicas, fontes das taxas elevadas de crescimento e da inflao de ativos, estapropiciadora do efeito riqueza, para fruio das famlias viciadas no endividamento e nohiperconsumo. A cada ciclo de expanso, o dficit em conta corrente se eleva.

    Em outras partes da periferia, os capitais cobiosos jogam e ganham no rouba-monte combancos centrais obcecados por taxas de cmbio e taxas de juros fora do lugar. A, se nemmesmo os avies de carreira trafegam nos ares, o que se h de falar da indstria e dos bonsempregos?

    A mo visvel do Estado na competio capitalista

    Tanto para algumas verses do progressismo marxista quanto para as correntes dopensamento conservador, globalizao o novo nome da mo invisvel e seusautomatismos, a cujos desgnios temos de nos submeter sem tugir nem mugir. A histria real

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    da expanso capitalista apresentou uma trajetria um tanto mais complexa do que poderiaser deduzido das leis de movimento deste modo de produo. Nas diferentes etapas docapitalismo, a constituio das situaes nacionais envolveu a articulao entre algumasinstncias fundamentais:

    as relaes de poder entre os Estados Nacionais, no mbito da diviso internacional dotrabalho em transformao;

    regimes monetrios e cambiais, com sua hierarquia de moedas nacionais, sistemas decrdito e mercados financeiros;

    padres tecnolgicos e de organizao empresarial;

    formas de concorrncia entre as empresas;

    normas de formao do salrio e do consumo dos trabalhadores e de outras camadasassalariadas;

    distintos padres de interveno estatal na esfera econmica.

    Para no comprar material de desmanche ideolgico, seria conveniente relembrar que oprocesso de globalizao, sobretudo em sua dimenso financeira de longe a maisimportante foi o resultado das polticas que buscaram enfrentar a desarticulao do bem-sucedido arranjo capitalista do ps-guerra.

    As decises polticas tomadas pelo governo americano, diante da decomposio do sistemade Bretton Woods, j no final dos anos 1960, foram ampliando o espao supranacional decirculao do capital monetrio e produtivo. A poltica americana de reafirmar a supremaciado dlar acabou estimulando a expanso dos mercados financeiros internacionais, primeiroatravs do crdito bancrio euromercado e praas off shore e, mais recentemente,atravs do crescimento da finana direta. A liberalizao financeira facilitou sobremaneira odeslocamento da grande e mdia empresa americana para as regies de menor custo relativoda mo-de-obra. A centralidade do dlar nas transaes internacionais ensejou a formaode desequilbrios produtivos e monetrios que esto na origem da exuberncia dos doisciclos recentes e da crise financeira em curso.

    Um estudo recente, encomendado pela Unio Europia, revela aspectos importantes doprocesso de internacionalizao da grande empresa nos anos 1990: 1) nos pases emdesenvolvimento, os benefcios do investimento estrangeiro tais como absoro detecnologia, adensamento de cadeias industriais, crescimento das exportaes dependeramdas polticas nacionais; 2) os pases em desenvolvimento que cresceram mais e exportarammelhor foram os que conseguiram administrar uma combinao favorvel entre cmbiodesvalorizado e juros baixos.

    As questes relativas s estratgias de localizao da corporao transnacional moderna oude suas mutaes morfolgicas (constituio de empresas-rede, com concentrao dasfunes de deciso e de inovao e disperso das operaes comerciais e industriais) devemser avaliadas a partir do jogo entre as polticas econmicas nacionais. O fenmeno seapresenta, prima facie, sob a forma de contestao das estruturas oligopolistas

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    estabilizadas que regulavam a concorrncia no perodo anterior. Analisada com maisprofundidade, essa generalizao da concorrncia explicita uma nova etapa de concentraoe centralizao dos blocos de capital, sob a gide e a disciplina do capital financeiro. Aeconomia mundial est atravessando um momento de intensificao da rivalidadeintercapitalista (o que no exclui acordos e coalizes, mas os supe) e, neste clima, nenhumprotagonista capaz de garantir a posio conquistada. Por isso, todos se sentemcompelidos a ganhar a dianteira.

    Para escndalo dos liberais, a grande empresa que se lana s incertezas da concorrnciaglobal necessita cada vez mais do apoio dos Estados Nacionais dos pases de origem. OEstado est envolvido na sustentao das condies requeridas para o bom desempenho dassuas empresas na arena da concorrncia generalizada e universal. Elas dependem do apoio eda influncia poltica de seus Estados Nacionais para penetrar em terceiros mercados(acordos de garantia de investimentos, patentes etc.), no podem prescindir dofinanciamento pblico para suas exportaes nos setores mais dinmicos e seriamdeslocadas pela concorrncia sem o benefcio dos sistemas nacionais de cincia e tecnologia.

    Na era da arrancada chinesa, superstio acreditar que a abertura financeira e a exposiopura e simples do setor industrial concorrncia externa seriam capazes de promover amodernizao tecnolgica e os ganhos de competitividade. Os estudos mais especializados eaprofundados sobre o tema mostram que a concorrncia nos mercados contemporneosest marcada por caractersticas que no guardam qualquer semelhana com as crendicessimplificadoras dos fanticos do livre-cambismo e das vantagens comparativas.

    At mesmo os estudiosos mais conservadores reconhecem a existncia de economias de

    escala e de escopo, economias externas, estratgias de ocupao e diversificao dosmercados, conglomerao e acordos de cooperao. Neste jogo s entra quem tem cacifetecnolgico, poder financeiro e amparo poltico dos Estados Nacionais. O resto est naarquibancada batendo palmas. Estas caractersticas essenciais da concorrncia e docomportamento das empresas, sobretudo na rea industrial, esto completamente ausentesdas elucubraes dos que pretendem ensinar-nos as virtudes milagrosas do curandeirismoque aspira a foros de cincia.

    Capitalismo, Estado e interesse nacional

    Enquanto elaborava o texto que ora apresento aos leitores da revista, a memria foidespertada para Industry and Trade, o livro da maturidade de Alfred Marshall, mestre deKeynes. Nele, o autor escreve uma longa nota de rodap destinada a qualificar e modificar asabstraes dos Principles of Economics. Nos dois volumes, Marshall desenvolve uma longa eprofunda anlise histrica das relaes entre industrializao, comrcio exterior e os ideaisnacionais. Escrito em 1920, o livro exprime os estertores da liderana industrial da Gr-Bretanha. Marshall revela uma percepo clara do processo que levou emergncia daAlemanha e dos Estados Unidos como potncias concorrentes e vitoriosas, no mbito daglobalizao construda sob a hegemonia inglesa no ltimo quartel do sculo XIX.

    O teste da liderana, diz ele, a capacidade de fazer coisas que os outros viro a fabricarum pouco mais tarde, mas ainda no esto prontos e habilitados a fazer. Uma das melhoresindicaes da natureza e extenso da liderana de um pas pode ser encontrada no carter

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    dos bens que exporta e importa. Mas h uma razo superior. A liderana industrial importante para os ideais da Nao. Se um indivduo inteiramente devotado aos interessesmateriais uma pobre criatura, ainda mais ignbil uma nao desprovida de ideaisnacionais, isto , ideais que reconhecem a vida nacional como uma instncia superior meraagregao de indivduos.

    Marshall estava perfeitamente habilitado a compreender no s o que se chama atualmentede catching up, mas os fatores que constituem a sociabilidade moderna. Ela se move deforma contraditria e problemtica entre o interesse material do indivduo produzido pelaviso do mercado e a comunidade imaginria constituda no mbito poltico-jurdico doEstado Nacional. Benedict Anderson forjou a expresso comunidade imaginria para definiros sentimentos de pertinncia construdos em torno da idia de Nao. Os membros de umacomunidade nacional no se conhecem, jamais trocaro olhares com seus compatriotas, mas,ainda assim, na imaginao de cada um est viva a imagem de sua comunho [...]independentemente da desigualdade e da explorao que possa prevalecer, a nao concebida como uma profunda e horizontal camaradagem.

    A decretao do fim da poltica e sua submisso ao mercado falsa. No capitalismo, oeconmico constitudo pela poltica da grande empresa, do capital financeiro e do mass-media. A rivalidade entre grandes empresas, a febre de fuses e aquisies e a sucesso decrises financeiras tornam inevitvel a mediao do Estado nas disputas entre oscompetidores privados sob pena da desestruturao dos mercados. Alm dessa funo deregulao sistmica, o Estado Nacional contemporneo no pode abdicar de outra que lhe inerente enquanto instncia exclusiva de totalizao das relaes sociais. no interior doEstado que se realiza a mediao entre o movimento estrutural das foras econmicas do

    capitalismo globalizado e o interesse nacional.

    Essa expresso vaga no pode ser definida como uma situao, mas como um processo deconstituio e reconstituio do espao jurdico-poltico onde se desenvolvem as relaesentre a formao e apropriao da renda, da riqueza e a luta dos cidados que buscam agarantia e a ampliao dos direitos civis, econmicos e sociais.

    Nas duas globalizaes a do ltimo quartel do sculo XIX e a que se desenvolve sob o olhardos contemporneos so umbilicais os nexos, sublinhados por Marshall, entre a

    hiperindustrializao da periferia emergente promovida por polticas que cuidam dointeresse nacional e a financeirizao cosmopolita das economias ps-industriais noCentro.

    No por acaso, a definio do regime chins se debate entre o capitalismo de Estado e osocialismo de mercado.

    E o Brasil?

    A opinio dominante hoje no Brasil cultiva com esmero o hbito de ignorar a experinciaalheia e, pior, trata de desqualificar e desfigurar o seu prprio passado, quando no seempenha denodadamente em promover o completo esquecimento. Vamos deixar de lado asrelaes carnais entre Estado e grande empresa nos Estados Unidos e tratar da nossa turma.No h exemplo nos pases perifricos a includos o Chile e os Tigres Asiticos e a China

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    de renncia a polticas deliberadas de reestruturao produtiva ou de estmulo modernizao e conquista de mercados. Seja qual for a estratgia adotada liderana dasexportaes ou preeminncia do mercado interno os casos bem-sucedidos de avanoindustrial e produtivo na dita era da globalizao tm um trao comum: intencionalidade ecoordenao pblica.

    No que diz respeito ao Brasil, quase todos concordam em que se esgotaram as formas definanciamento, de incentivos e de proteo, responsveis pela sustentao dodesenvolvimento industrial brasileiro ao longo de mais de cinco dcadas. Este esgotamentofoi acompanhado, depois da crise da dvida externa dos anos 1980, de um profundodesequilbrio financeiro e fiscal do Estado, o que imobilizou a sua capacidade decoordenao e de induo.

    A perda de dinamismo da industrializao brasileira provocou, no incio dos anos 1990, umareao extremada nas hostes liberais: abrir a economia e expor os empresrios letrgicos aosares benfazejos da globalizao. O silogismo em que se desdobra a premissa grotesco em

    sua simplicidade: se a indstria brasileira perdeu a capacidade de investir ou de semodernizar, a soluo submet-la aos constrangimentos e disciplina da concorrnciaexterna.

    Isto para no falar da encrenca macroeconmica engendrada com requintes de ourives pela longa e gloriosa valorizao do cmbio. Hoje em dia ainda so muitos os que no sederam conta dos estragos causados indstria brasileira pela combinao funesta entrejuros reais elevados e cmbio valorizado.

    Preferimos abraar as receitas liberal-conservadoras para os pases emergentes. Repito aquio que disse no livro Poder e Dinheiro (Vozes, 1997): elas so dedues vulgares dos modelosabstratos da teoria neoclssica. Seno vejamos: a ampla abertura comercial est apoiada navetusta teoria das vantagens comparativas, sem as tmidas modificaes da nova teoria docomrcio; as privatizaes e o no-intervencionismo do Estado emanam do modelocompetitivo de equilbrio geral; a liberalizao financeira decorre da hiptese dos mercadoseficientes.

    As disputas ideolgicas intervencionismo vs. no-intervencionismo e integrao

    internacional vs. polticas nacionais padecem do vcio das oposies excludentes queentorpecem a compreenso da dinmica do capitalismo, do seu movimento contraditrio,eivado de crises e de suas recuperaes. Estado vs. Mercado, assim como integraointernacional vs. polticas nacionais, no so perspectivas incompatveis que se chocam e seexcluem. No capitalismo, a ontologia do econmico supe a unidade indissocivel entre aperspectiva do mercado e o seu desmascaramento pelo Estado coordenador. A outraperspectiva preenche o vazio do que no pode ser percebido a partir da primeira. Essainterseco das instncias esteve sempre presente nas diferentes configuraes histricasdo capitalismo, desde o mercantilismo at a sua etapa atual.

    Est mais do que na hora de superarmos falsas dicotomias e nos lanarmos ao trabalhocriativo indispensvel para construir as novas instituies financeiras, pensar na reformafiscal, enfim dar tratos bola para estabelecer uma nova relao entre o Estado e o setorprivado, em termos mais favorveis ao desenvolvimento do pas.

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