Avaliação da Qualidade Biológica da Ribeira da Pantanha ... · À Ana, por me receber no...
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Avaliação da Qualidade Biológica da Ribeira da Pantanha, Nelas, Centro de Portugal
Mariana Filipa Breda Mamede da Cruz Mestrado em Biologia e Gestão da Qualidade da Água Departamento de Biologia 2014
Orientador Maria da Natividade Ribeiro Vieira, Professor Associado, Faculdade de Ciências
Coorientador Ruth Maria de Oliveira Pereira, Professor Auxiliar Convidado, Faculdade de Ciências
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Todas as correções determinadas
pelo júri, e só essas, foram efetuadas.
O Presidente do Júri,
Porto, ______/______/_________
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Dissertação submetida à Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, para a obtenção do grau de mestre em Biologia e Gestão da Qualidade da Água, da responsabilidade do Departamento de Biologia. A presente tese foi desenvolvida sob a orientação científica da Doutora Maria da Natividade Vieira, Professora Associada com Agregação do Departamento de Biologia da FCUP; e coorientação científica da Doutora Ruth Pereira, Professora Auxiliar Convidada do Departamento de Biologia da FCUP.
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Agradecimentos
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à Professora Doutora Ruth e à Professora Doutora
Natividade pelo convite para participar neste estudo e pela minha integração na equipa de
investigação na Fundação para a Ciência e Tecnologia, no âmbito do CIIMAR. Agradecer-lhes pelo
apoio e ajuda prestada ao longo deste ano, pelas várias saídas de campo na tentativa de obter os
melhores resultados e por acreditarem na minha capacidade de trabalho.
À Professora Doutora Sónia Mendo pela oportunidade de trabalhar no Laboratório de
Biotecnologia Molecular do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro.
À Joana Lourenço, pela colaboração, pela paciência e por todo o trabalho e tempo que dispensou,
quer nas saídas de campo, quer no laboratório, assim como pela óptima recepção que tive no
Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro.
Ao Professor Doutor Fernando Carvalho, pela colaboração nas análises de radionuclídeos nos
sedimentos e na água da Ribeira da Pantanha.
Ao Professor Guerner, pela disponibilização do laboratório de Geologia e de material, e ao Renato
Guimarães, pelo acompanhamento e ajuda.
À Ana, por me receber no laboratório e me ensinar a cuidar das Daphnias, e a todos os colegas do
laboratório 1.39 que colaboraram na manutenção das culturas.
Aos que acompanharam as saídas de campo, muitos responsáveis por conduzir até lá, e ao Hugo
Silva, pela paciência na triagem.
À Laura e à Íris, aquelas que compreenderam por percorrer o mesmo percurso, obrigada pelos
cafés, pelos jantares, pelas noitadas e vá... ao Paulo também!
Aos AMIGOS e à FAMÍLIA, mesmo os que não estão cá, pelas conversas, incluindo as da treta,
por aturarem as birras, pelas risotas e, acima de tudo, por terem feito parte do caminho que me
trouxe até aqui – por me lembrarem que a vida não é só trabalho!
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Resumo
A ribeira da Pantanha é um afluente direto do rio Mondego que nasce a cerca de 2 km
sudoeste do centro de Nelas, percorrendo sensivelmente 7,500 km até desaguar no rio Mondego,
na localidade de Caldas de Felgueiras. Esta ribeira foi alvo de constantes escorrências de metais e
de radionuclídeos desde a abertura da mina da Urgeiriça – zona de exploração de urânio -,
recebendo uma carga perigosa para os seres vivos que aí vivem, bem como para a população que
usa essa água para consumo ou para regar as suas culturas.
Para avaliar o impacto dessas descargas, foram recolhidas amostras de água e de
sedimento, para quantificação de radionuclídeos da série de decaimento do urânio, amostras da
comunidade de macroinvertebrados, para avaliação da qualidade biológica da água, e ainda
amostras de água para exposição de Daphnia magna, com o intuito de verificar se existem danos
genotóxicos, através do ensaio cometa.
Verificou-se que a água contem quantidades consideráveis de atividade de radionuclídeos,
que a comunidade de macroinvertebrados está perturbada, de tal forma que, após a mina da
Urgeiriça, a ribeira foi qualificada de “água fortemente poluída” segundo o IBB e de “água
extremamente contaminada” segundo o IBMWP. Da mesma forma, após o ponto de descarga do
efluente de mina, verificou-se um aumento significativo dos danos no ADN de D. magna.
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Abstract
The Pantanha stream is a direct tributary of the Mondego river, which rises at about 2 km
southwest of the center of Nelas, covering roughly 7,500 km until dewater in the Mondego river in
the village of Caldas de Felgueiras. This stream was a target of constant runoff since the opening
of the Urgeiriça mine – uranium exploration area – receiving a dangerous load of metals and
radionuclides for the living beings in the stream and for the human population that uses this water
for consumption and to water their crops.
To evaluate the impact of these loads, water and sediment samples were collected, to
quantify radionuclides from uranium decay series, macroinvertebrate community samples, to
evaluate the biological quality of the water, and also water samples to expose Daphnia magna,
aiming to check the existence of genotoxic damage, with the comet assay.
The results showed that there are considerable amounts of radionuclide activity in the water,
that the macroinvertebrate community is disturbed, with the stream qualified as “strongly polluted
water” according to IBB and “extremely contaminated water” according to IBMWP. Similarly, after
the mine effluent discharge point, there was a significant increase in DNA damage in D. magna.
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Índice
1. Introdução 1
1.1. Os recursos geológicos e a exploração mineira 1 1.1.1. Recuperação de minas abandonadas 2 1.1.2. As minas de urânio em Portugal 3
1.2. O Urânio 4 1.2.1. Especiação e Biodisponibilidade 7 1.2.2. Toxicocinética 8 1.2.3. Toxicidade 10 1.2.4. Avaliação da ecotoxicidade e da genotoxicidade de compostos químicos 12
1.3. Enquadramento Legal 14 1.3.1. Os macroinvertebrados como bioindicadores da qualidade da água 15 1.3.2. Daphnia magna como organismo modelo em ensaios ecotoxicológicos
passíveis de ser integrados na avaliação da qualidade da água segundo a DQA 18 1.4. Objetivos 20
2. Materiais e Métodos 22 2.1. Local de Estudo 23
2.1.1. Canas de Senhorim e a bacia do Mondego 23 2.1.2. O Complexo Mineiro da Urgeiriça 24 2.1.3.Tratamento de Efluentes 25 2.1.4. A ribeira da Pantanha 26
2.2. Amostragem de água e sedimentos para caracterização fisíco-química e para análise de radionuclídeos 28
2.2.1. Análise Granulométrica dos sedimentos 28 2.3. Amostragem da comunidade de macroinvertebrados 29
2.3.1. Avaliação da Qualidade Biológica da Água 29 2.4. Ensaio dos efeitos genotóxicos em Daphnia magna 30
2.4.1. Exposição de Daphnia magna 30 2.4.2. Ensaio Cometa 31
3. Resultados e Discussão 34 3.1. Análise Granulométrica do sedimento 34 3.2. Avaliação físico-química das amostras de água 35 3.3. Análise de Radionuclídeos nas amostras de água 35 3.4. Avaliação da Qualidade Biológica da Água 36
3.4.1. Índices Bióticos e de Diversidade 36 3.5. Ensaio Cometa com D. magna 40 3.6. Considerações Finais 42
4. Referências Bibliográficas 44
Anexos Anexo I Fórmula de cálculo do Índice de Diversidade de Shannon-Wiener Anexo II Fórmula de cálculo do Índice de Equitabilidade de Pielou Anexo III Fórmula de cálculo do Índice Biótico Belga (IBB) e classe de qualidade correspondente Anexo IV Fórmula de cálculo do Índice Biótico IBMWP e nível de qualidade corresponddente
1 1 2 3 4 7 8 10 12 14 15 19 20
22 22 22 24 25 26 28 29 29 30 30 30 31
34 34 35 35 36 37 40 42
44 53 54 54 55 56
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Lista de Figuras Figura 1. Mapa do Norte de Portugal ilustrativo da localização dos principais depósitos de urânio.
Fonte: http://www.abrunhosa.blogspot.com
Figura 2. Esquema da cadeia de decaimento radioativo urânio-238. Fonte:
https://sites.google.com/site/uraniotoxicologiaffup/propriedades
Figura 3. Ciclo do urânio. Fonte: Stojanović et al., 2012.
Figura 4. Diagrama conceptual dos processos controladores da biodisponibidade e bioacumulação
dos metais no ambiente. Fonte: Drexler et al., 2003.
Figura 5. Esquematização do conceito de Bom Estado de uma massa de água superficial. Fonte:
INAG, I.P. 2006. Implementação da Directiva Quadro da Água em Portugal. Ministério do
Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional. Instituto da Água I.P.
Figura 6. Ephemeroptera, larva.
Figura 7. Dysticidae, Coleoptera, adulto.
Figura 8. Chironomidae, Diptera, larva.
Figura 9. Dapnhia magna, adulta.
Figura 10. Extrato da Carta Geológica de Portugal, à escala de 1/500 000. Fonte:
http://www.cienciaviva.pt/img/upload/Granito%20em%20Canas%20de%20Senhorim%20-
%20Parte%20I.pdf
Figura 11. Fotografia aérea da área mineira da Urgeiriça, antes da intervenção (2006). Fonte: EDM
e DGEG, 2011.
Figura 12. Fotografia aérea da área mineira da Urgeiriça, durante a intervenção. Fonte: EDM e
DGEG, 2011.
Figura 13. Fotografia aérea da área mineira da Urgeiriça, no final da intervenção (2008). Fonte:
EDM e DGEG, 2011.
Figura 14. Diagrama do processo de tratamento de efluentes em execução na estação de
tratamento de efluentes na Urgeiriça. Fonte: EDM e DGEG, 2011.
Figura 15. Ribeira da Pantanha.
Figura 16. Fotografia da Mina da Urgeiriça, ilustrativa dos pontos de amostragem da Ribeira da
Pantanha. Fonte: https://www.google.pt/maps/
Figura 17. Amostragem de água, ribeira da Pantanha.
Figura 18. Crivos e tabuleiro usados na análise granulométrica. .
Figura 19. Amostragem de Macroinvertebrados, ribeira da Pantanha.
Figura 20. Crivos para lavagem das amostras de macroinvertebrados.
Figura 21. Lupa binocular.
Figura 22. Frasco de cultura de Dapnhia magna.
Figura 23. Fotografias dos diferentes tipos de cometas observados, do 0 ao 4, da esquerda para a
direita.
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Figura 24. Representação gráfica dos resultados da análise granulométrica dos sedimentos da
Ribeira da Pantanha, em percentagem de fração, na primavera de 2014.
Figura 25. Representação gráfica dos resultados dos índices bióticos IBMWP e ASPT para as três
estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira
estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
Figura 26. Representação gráfica dos resultados do índice biótico IBB para as três estações de
amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1
só foi amostrado na última estação).
Figura 27. Representação gráfica dos resultados da abundância em EPT (Ephemeroptera,
Plecoptera e Trichoptera), em Oligochaeta e em Chironomidae, dada pela percentagem, para as
três estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira
estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
Figura 28. Representação gráfica dos resultados da riqueza específica (S), do índice de
diversidade de Shannon (H') e do índice de equitabilidade (E), para as três estações de
amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1
só foi amostrado na última estação).
Figura 29. Representação gráfica dos resultados do ensaio cometa em Daphnia magna exposta a
água da Ribeira da Pantanha nos cinco pontos de amostragem e no controlo negativo.
Figura 30. Representação gráfica da distribuição da percentagem de cada tipo de cometa nos
diferentes pontos de amostragem e no controlo negativo.
iv
Lista de Tabelas
Tabela 1. Coordenadas geográficas dos pontos de amostragem selecionados.
Tabela 2. Resultados dos parâmetros físico-químicos da água avaliados in situ nos cinco pontos de
amostragem selecionados na Ribeira da Pantanha, com base em amostras recolhidas na
primavera de 2014.
Tabela 3. Resultados da radioatividade em solução (mBq/L ± d.p.) na água da Ribeira da
Pantanha, pontos 1, 3 e 5 e em Caldas de Felgueiras, com base em amostras recolhidas na
primavera de 2014. (n.d.: não detetado ou abaixo do limite de deteção).
Tabela 4. Representação dos resultados dos índices bióticos IBMWP e IBB e da consequente
classificação da qualidade da água, nos cinco pontos amostrados na primavera de 2014.
Tabela 5. Resultados estatísticos do teste de Dunnett, demonstrando os valores de p para cada
ponto contra o controlo negativo.
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1. Introdução Geral
1.1 Os recursos geológicos, sua exploração e impactos ambientais
Os recursos geológicos existentes no nosso planeta dividem-se em água, solos, recursos
energéticos e recursos minerais. Estes últimos, por sua vez, podem ser classificados como
minerais metálicos (minérios), industriais (matérias-primas), preciosos (raros ou difíceis de obter)
ou minerais para construção (geomateriais). Os locais onde se encontram substâncias minerais de
interesse económico são designados por jazidas minerais e estes recursos minerais podem
classificar-se em metálicos e não metálicos. Os minérios são, portanto, associações minerais
numa jazida cuja extração dos elementos neles contidos se efetua em minas, a céu aberto ou por
galerias subterrâneas (Bateman, 1950).
É de notar que, numa jazida ou filão, os minerais costumam encontrar-se associados e não
isolados, ou seja, quando se explora para se obter um dado elemento (ferro, chumbo, cobre, etc)
acabamos por remover outros a eles associados. Daí que seja necessário recorrer a processos de
tratamento do minério para obter apenas o elemento que desejamos. E, portanto, da imensa
quantidade de material extraído, apenas uma pequena porção será aproveitada, sendo que os
outros elementos passam a fazer parte dos resíduos que resultam do processo de exploração
(Lottermoser, 2003; Gusmão, 2008).
Assim, resultam vários impactos ambientais da exploração mineira, tanto associadas aos
resíduos sólidos produzidos, como resultantes da formação de escombreiras, vetores de poluição
das águas superficiais, subterrâneas e do solo, bem como riscos físicos resultantes da própria
estrutura da mina, que pode colapsar, devido à remoção de material do seu interior, levar a
deslizamentos de terras ou à instabilidade dos taludes (Peterson et al., 2002; Loayza-Muro et al.,
2010; EDM e DGEG, 2011; García-Gomez et al., 2014). Além disso, é evidente a consequente
perda da qualidade da água, para consumo e para rega, e a perda da produtividade do solo, bem
como a degradação da paisagem, manifesta na alteração dos cursos dos rios e no abate da
floresta (Fazenda et al., 2002; Peterson et al., 2002; Loayza-Muro et al., 2010; Radić et al., 2014).
A exposição ao oxigénio de resíduos minerais metálicos, nomeadamente de sulfuretos,
urânio e carvão, em conjunto com o contacto com a água e a ação de bactérias catalíticas, origina
efluentes muito perigosos por fenómenos de drenagem ácida (Lottermoser, 2003; Favas e Conde,
2000; Carvalho et al., 2011). O ar e água atuam como agentes oxidantes, provocando a
acidificação dos resíduos e a solubilização de metais para a fase aquosa, dando origem a um
efluente de elevada perigosidade para o ambiente devido à sua capacidade de dissolução e
transporte de metais e à sua agressividade química, derivada do seu pH reduzido (Favas e
Conde, 2000; Lottermoser, 2003; Carvalho et al., 2011; Radić et al., 2014). A presença de
sulfuretos contribui para este fenómeno, pois são oxidados em ácido sulfúrico, segundo a equação
abaixo descrita (Lottermoser, 2003; Radić et al., 2014).
2
4 FeS2 + 15 O2 + 2 H2O ↔ 2 Fe2(SO4)3 + 2 H2SO4
Por outro lado, a percolação da água das chuvas ao longo das pilhas de resíduos dissolve
o ácido sulfúrico restante daquele que pode ter sido usado no tratamento do minério pobre
(Carvalho et al., 2011; Carvalho et al., 2014c).
A toxicidade e a mutagenicidade dos solos, dos sedimentos e das águas nestas áreas e
nas suas zonas envolventes são extremamente preocupantes, principalmente quando se trata da
exposição combinada a metais e radionuclídeos, pois mesmo em doses abaixo dos limites
admissíveis podem levar a efeitos significativos nos organismos, devido às reações sinergéticas
entre estes dois tipos de compostos (Hudcová et al., 2013).
1.1.1. Recuperação de minas abandonadas
Devido aos problemas resultantes da exploração mineira negligente do passado, como o
seu abandono, deixando todos os resíduos expostos, tornou-se evidente a necessidade de
remediar estas situações, bem como de alterar as práticas desta atividade, tornando-a hoje uma
indústria ecologicamente capaz, principalmente pelo estabelecimento de normas de exploração e
de encerramento (Fazenda et al., 2002; Carvalho, 2008; Gusmão, 2008).
A exploração mineira está presente no nosso país há cerca de 2000 anos, desde a
ocupação romana (Duarte, 1995). No entanto, várias minas cessaram a sua atividade no final do
século passado, tendo a Empresa de Desenvolvimento Mineiro sido mandatada para levar a cabo
a sua remediação, segundo o Decreto-Lei 198-A/2001, de 6 de julho (ME, 2001). Entre as
diversas áreas mineiras, as de urânio foram selecionadas como prioritárias, devido aos riscos
ambientais e para a saúde humana que apresentavam (Pereira et al., 2014). No que diz respeito à
qualidade ambiental, pretende-se reduzir os níveis das substâncias tóxicas presentes nas
matrizes ambientais para limites abaixo dos quais não deverá haver danos para os seres vivos
(Gusmão, 2008).
Assim, a recuperação das áreas mineiras deve incidir em várias componentes,
nomeadamente (EDM e DGEG, 2011):
Nas escombreiras ou bacias de rejeitados, onde pode ocorrer dispersão de poeiras pelo vento
ou percolação através do solo após dissolução pelas chuvas. A base das escombreiras deve
ser impermeabilizada de forma a confinar os resíduos, preferencialmente com instalação de
um sistema de drenagem adequado.
Nas cortas, ou depressões resultantes das explorações a céu aberto, as quais são
normalmente usadas para armazenar os resíduos da exploração, que devem também ser
confinados.
Nas águas de escorrência, de poços e túneis de minas, carregadas de materiais dissolvidos
e/ou em suspensão, cuja difusão pode ser mais ou menos pronunciada. É fundamental
encaminhar os efluentes para um local onde possam permanecer e, de preferência, ser
3
tratados, evitando a contaminação de aquíferos, cursos de água ou de bacias. O tratamento
baseia-se normalmente na adição de compostos químicos que potenciem a precipitação dos
compostos perigosos. Por outro lado, devem-se desviar águas limpas para impedir que
passem pelos rejeitados e que sejam contaminadas. Encher os túneis e galerias, de forma
criar ambientes anóxicos, para impedir a oxidação dos sulfuretos e a formação de drenagens
ácidas.
Em paralelo, devem também ser tomadas atitudes para garantir o sucesso das medidas
tomadas ao longo do tempo e a sua aceitação pela população, tais como (EDM e DGEG, 2011):
a monitorização de diversos indicadores, que permite o controlo dos dados obtidos, para
avaliar a situação corrente, e a adaptação, caso seja necessário. Esta etapa recai sobre os
recursos aquáticos, incluindo as águas subterrâneas, o ar e o solo, pela avaliação da
qualidade de cada um.
a conservação do património, fundamentalmente no que respeita a valorização positiva da
história de locais outrora caracterizados pela atividade mineira. Nos casos mais bem
sucedidos, estas áreas tornam-se atrações turísticas, de modo que é de interesse comum
certificar a segurança dos visitantes.
o enquadramento paisagístico, inserido normalmente no próprio processo de reabilitação, que
possibilita a atenuação do impacto visual e, em alguns casos, há um aproveitamento
recreativo do espaço, tendo em conta o bem-estar da população local e a capacidade atrair de
potenciais visitantes.
1.1.2. As minas de urânio em Portugal
A procura de urânio começou no início do século XX, com a descoberta de rádio pelo casal
Curie a partir do decaimento radioativo do urânio (U) (Pereira et al., 2014).
Em Portugal, o primeiro jazigo de urânio foi descoberto em 1907, na aldeia de Barracão,
Guarda, e a maior mina deste minério, a mina da Urgeiriça, foi aberta em 1913 (Carvalho, 2008;
Prazeres, 2011; Pereira et al., 2014). Neste complexo, ocorreu também processamento químico
de U, para produção de sulfato de rádio e concentrados de óxidos de urânio, e foi criada a
Empresa Nacional do Urânio (ENU), entidade responsável pela vigilância e controlo radiológico
dos depósitos mineiros (Carvalho, 2008; Carvalho et al., 2014c; Pereira et al., 2014). Após
algumas décadas de exploração, primeiro de sais de rádio e posteriormente de urânio, todas as
explorações do nosso território encontram-se fechadas, desde 2001, devido à perda de
competitividade no mercado internacional (Fazenda et al., 2002; Carvalho, 2008; Pereira et al.,
2014).
O que resultou desta exploração desmedida e negligente foram cerca de 13 milhões de
toneladas de resíduos perigosos radioativos, acumulados em 60 minas abandonadas (Carvalho,
2008; Pereira et al., 2014). Todavia, nos dias de hoje, foram já recuperadas algumas áreas de
4
exploração de urânio, tal como o complexo mineiro
da Urgeiriça, onde foram levados a cabo trabalhos
de confinamento dos materiais radioativos e de
neutralização das águas ácidas (Carvalho, 2008;
Gusmão, 2008).
Como se pode observar pela figura 1, os
principais depósitos de urânio no nosso país estão
confinados à zona centro norte interior,
nomeadamente nos distritos de Viseu, de Coimbra,
da Guarda e de Portalegre, onde se encontra
também o complexo da Urgeiriça no distrito de
Viseu (Carvalho, 2008; Pereira et al., 2014).
1.2. O Urânio
O urânio (U) é um metal pesado radioativo descoberto na Alemanha em 1749 por Martin
Heinrich Klaproth (Katz e Rabinowitch, 1961; Tasat et al., 2012). Ocorre naturalmente na crosta
terreste, particularmente em rochas ígneas, onde apresenta uma concentração de 2 - 4ppm,
sendo maioritariamente explorado em países como Rússia, Canadá, Austrália e África Central
(Katz e Rabinowitch, 1961; Prazeres, 2011; Tasat et al., 2012; Kraemer e Evans, 2012). É um
elemento que se encontra naturalmente no estado sólido e que apresenta número e peso
atómicos de 92 e 238,03, respectivamente, pertencente assim ao período 7 da tabela periódica e
ao grupo dos actinídeos – grupo 4: metais de transição interna (Trudinger e Swaine, 1979). Este
grupo engloba apenas elementos radioativos, como o tório (Th), embora os dez que se seguem ao
urânio – designados transuranídeos - possam ser produzidos artificialmente, tal como o plutónio
(Pu), que também se encontra na natureza, ou como o amerício (Am) e o férmio (Fm), criados
unicamente em laboratório (Prazeres, 2011).
O urânio está presente em diversas formas minerais caracterizadas por serem radioativas,
que podem ser divididas essencialmente em (Gusmão, 2008; Prazeres, 2011):
Uraninite, ou dióxido de urânio, de cor preta, contém também pequenas concentrações de
rádio e chumbo, e constitui o minério de urânio mais abundante a nível mundial. É a principal fonte
de urânio para a produção de combustível nuclear na forma de pecheblenda;
Torbernite, um mineral secundário de urânio de tons de verde, que resulta da sua
associação com fosfatos. Presente em granitos, pode ser designada por uranite de ferro ou cupro-
uranite, devido à presença de cobre na sua estrutura, e é ainda um mineral hidratado, pelo que a
perda de moléculas de água leva à formação da meta-torbernite, um pseudomorfo. É a forma mais
abundante em Portugal;
Figura 1. Mapa do Norte de Portugal ilustrativo da localização dos principais depósitos de urânio. Fonte: http://www.abrunhosa.blogspot.com
5
Autunite, outro mineral secundário de urânio, desta feita de tom amarelo-esverdeado, e
isomorfo da torbernite, porém em vez de cobre contém cálcio e é fluorescente sob luz ultravioleta,
sendo talvez esta propriedade o que mais diferencia estes dois minerais. Um tipo de autunite rara
mundialmente mas comum no nosso país é a sabugalite, cujo nome resulta do facto de ter sido
identificada pela primeira vez no Sabugal, distrito da Guarda.
Assim, o urânio é um mineral metálico emissor de partículas alfa, com propriedades rádio e
quimiotóxicas, com 26 isótopos conhecidos e todos instáveis, desde U217 a U242, sendo U238, U235 e
U234 os únicos que existem naturalmente (Katz e Rabinowitch, 1961; Prazeres, 2011). Os isótopos
de U238 e U235 podem dar origem a cadeias de decaimento radioativo, com emissão de energia
ionizante: o primeiro para a desintegração do urânio e o segundo para o actínio (Prazeres, 2011;
Tasat et al., 2012).
A figura 2 mostra essa primeira
cadeia, com os sucessivos isótopos-filho e
os respetivos tempos de meia vida
(ps://sites.google.com/site/uraniotoxicologi
affup/propriedades). Portanto, o
decaimento do urânio dá origem a
isótopos instáveis e também radioativos,
até chegar ao Pb206, esse sim estável e
não radioativo (Ivanovich e Harmon, 1992;
Reis, 2007).
Um ponto a destacar no fenómeno
da radioatividade, e já mencionado para o urânio, é a emissão de partículas α, β ou γ pelo núcleo
atómico, designado por radionuclídeo. As partículas α correspondem a núcleos de hélio, com dois
protões e dois neutrões; as partículas β podem simbolizar a emissão de um eletrão e um
antineutrino de eletrão ou de um positrão e um neutrino de eletrão; as radiações γ caracterizam-se
por elevada frequência e conteúdo energético, correspondendo à emissão de radiação
eletromagnética na forma de fotões (Ivanovich e Harmon, 1992; Reis, 2007; Prazeres, 2011).
Apesar de nas emissões α e β o emissor decair sempre para outro elemento, isso pode ocorrer ou
não para a radiação γ (Reis, 2007; Prazeres, 2011). A radiação γ penetra nos organismos sem
necessitar de estar em contacto com eles e radiação β tem uma capacidade de penetração nos
materiais superior ao das partículas α (Ivanovich e Harmon, 1992; Prazeres, 2011). No entanto, a
radiação α, uma vez dentro das células, é extremamente perigosa, pois estas partículas, de
grandes dimensões, podem ser descarregadas diretamente nos componentes celulares, ou seja,
apresenta um poder de ionização mais forte do que a radiação β (ver subcapítulo 1.2.3.)
(Ivanovich e Harmon, 1992; Carvalho et al. 2014a).
Enquanto as fontes naturais de urânio estão essencialmente relacionadas com os
processos geoquímicos naturais da geodinâmica da Terra, as fontes antropogénicas estão
Figura 2. Esquema da cadeia de decaimento radioativo urânio-238. Fonte: ps://sites.google.com/site/uraniotoxicologiaffup/propriedades
6
relacionadas com a indústria, da combustão de carvão, da produção de energia nuclear, de armas
de urânio empobrecido e da produção e aplicação de fertilizantes fosfatados, podendo existir
urânio natural, enriquecido e empobrecido consoante a sua composição química isotópica (Tasat
et al., 2012; Stojanović et al., 2012). A sua concentração nos sedimentos pode ser 100 vezes
superior em zonas de exploração mineira comparativamente aos seus níveis naturais (< 10 µg/g
de solo). Nas águas subterrâneas, a concentração de U pode ultrapassar centenas de
microgramas por litro em condições naturais, sofrendo uma enorme bioacumulação em todos os
componentes do meio como resultado das atividades antropogénicas, mesmo nos seres vivos
sujeitos a exposições crónicas (Tasat et al., 2012; Lagauzère et al., 2013).
Assim, pode descrever-se o ciclo global do urânio na natureza segundo a figura 3
(Prazeres, 2011; Qiao et al., 2012; Stojanović et al., 2012):
1. O urânio encontra-se imobilizado nas rochas e/ou nos minerais como U (iv), de forma
estável, extremamente resistente à lixiviação, em formações como uraninites e outros
óxidos hidratados;
2. Essas rochas podem ser degradadas, tendo em conta as propriedades do solo, o pH e o
Eh. Em condições adequadas da solução do solo, ou seja, quando esta se encontra ácida
e oxidante, ocorre a reação de oxidação U4+↔ U6+ + 2e-, formando assim U (vi) solúvel;
3. O urânio neste estado de oxidação é móvel na litosfera, desde que esteja presente água
para transportá-lo, formando complexos com carbonatos e com (hidr)óxidos de ferro ou
manganês;
4. Pode ocorrer nova imobilização, quer por redução, quer por precipitação – com formação
de minerais de U (iv), tal como a autunite e a torbernite.
A capacidade de armazenamento a longo prazo nos sedimentos depende de parâmetros
geoquímicos e biológicos que afetam a solubilidade e a mobilidade do urânio, dependendo estas
Figura 3. Ciclo do urânio. Fonte: adaptação de Stojanović et al., 2012.
7
da sua especiação, da química do soluto e das fases sólidas e de fenómenos como precipitação,
sorção ou complexação (Lagauzère et al., 2013). Assim, a água é o meio de transporte de eleição
do urânio, que apenas apresenta uma ameaça na forma solúvel U (vi), de modo que qualquer
fenómeno de contaminação cessa assim que este sofre redução para U (iv) (Stojanović et al.,
2012). A precipitação (incluindo oxidação-redução), como forma de remover o urânio em solução,
é a única forma de proteger o meio ambiente contra a sua dispersão e é eficaz (Stojanović et al.,
2012). Os radionuclídeos, presentes no ambiente como resultado de fenómenos naturais ou de
atividades humanas, apresentam um período longo de persistência (variável consoante o
radionuclídeo – ver figura 2) e um risco elevado, quer para o ambiente quer para a saúde humana,
dos quais o urânio é um dos que tem um tempo de meia vida mais longo, como se pode observar
na figura 2, de 4468 x 109 anos para o U238 (Qiao et al., 2012; IRSN, 2012).
1.2.1. Especiação e Biodisponibilidade
Para uma melhor avaliação do risco de exposição ao urânio, é fundamental compreender
como este se compartimenta e se move no ambiente e qual a sua biodisponibilidade segundo a
sua especiação, isto é, o tipo e a quantidade de diferentes espécies, formas ou fases presentes
num material (Markich, 2002; Drexler et al., 2003; Qiao et al., 2012; García-Gomez et al., 2014).
De facto, a biodisponibilidade - capacidade de um metal se ligar/atravessar a superfície celular de
um organismo - depende intrinsecamente da forma físico-química do metal em questão (Markich,
2002; Drexler et al., 2003). Alguns fatores bióticos e abióticos atuam como fatores modificadores,
que determinam a quantidade de metal que vai interagir com a superfície biológica, onde se liga
ou é absorvido (Markich, 2002; Drexler et al., 2003; García-Gomez et al., 2014). Uma vez
associado ao organismo, pode adquirir diferentes potenciais tóxicos, pelo que para além da
caracterização físico-química é ainda fundamental uma avaliação da toxicidade dos metais nos
seres vivos (Markich, 2002; Drexler et al., 2003; García-Gomez et al., 2014).
Existe uma grande variedade de fatores físico-químicos determinantes da especiação e
também da consequente toxicidade do urânio nos seres vivos em sistemas de água doce,
especialmente a dureza da água, a alcalinidade, o pH e a matéria orgânica natural (Markich,
2013). É importante não confundir os efeitos destes fatores, normalmente associados pois um
aumento em iões de Ca2+ ou Mg2+ resulta num aumento da alcalinidade e do pH (Markich, 2013).
Por outro lado, enquanto os iões responsáveis pela dureza da água inibem a
associação/assimilação do urânio com a superfície celular, a alcalinidade provoca o mesmo efeito
devido a alterações na sua especiação em solução, complexando com carbonatos (Markich,
2013). Aliás, dependendo das variações no pH e na composição iónica da água, o ião uranilo
(UO22+) pode complexar com outros (hidroxilos, carbonatos, fosfatos, fluoretos, cloretos, ácidos
húmicos) ou ser adsorvido em minerais (oxi/hidróxidos de ferro ou manganês, argilas) ou em fases
particuladas orgânicas (Malmqvist e Hoffsten, 1999; Lagauzère et al., 2013). O urânio nesta forma
8
hexavalente é a espécie dominante a pH inferior a 5; contudo, é a pH alcalino que aumenta a
formação de complexos carbonatados solúveis e, portanto, móveis (Vandenhove et al., 2007).
Tanto o uranilo livre como os seus complexos carbonatados são assimiláveis pelos seres vivos,
embora o uranilo possa ter uma maior biodisponibilidade, uma vez que formas complexas –
moléculas grandes – não são passíveis de ser absorvidas pela superfície das células (Drexler et
al., 2003; Vandenhove et al., 2007; Lagauzère et al., 2013).
De facto, a resposta biológica parece estar dependente das espécies presentes e da sua
atividade, e não da concentração total - o ião uranilo parece ter duas vezes mais afinidade com a
superfície celular do que os seus hidróxidos (Markich, 2002). Embora a toxicidade deste metal
diminua com o aumento da dureza da água, este fenómeno parece não estar relacionado com a
sua especiação, mas antes com a sua competição com os catiões de cálcio e/ou magnésio na
superfície das células (tal como referido anteriormente), pois se menos urânio se consegue ligar a
elas, menos conseguirá ser absorvido e causar danos (Markich, 2002).
O urânio atravessa as membranas celulares como se fosse cálcio, pois há uma grande
semelhança entre o ião uranilo e os catiões de cálcio, no que toca à sua conformação e raio
iónico, o que lhe permite competir pelos canais ou transportadores destes elementos essenciais
(Markich, 2013). No entanto, não tem qualquer papel conhecido nas funções bioquímicas normais
(Markich, 2002).
1.2.2. Toxicocinética dos metais
A presença de urânio no meio aquático pode atingir valores de 0,01 a 11,1 µg/L e até
mesmo 2 mg/L em locais uraníferos, particularmente se existir exploração desses recursos, onde
pode atingir 20 mg/L ou mais (Al Kaddissi et al., 2011; Plaire et al., 2013). Aqui, a exposição a
metais pode dividir-se em direta - através da coluna de água, por adsorção à superfície celular ou
por absorção através da membrana celular, onde fatores bióticos e abióticos condicionam a
biodisponibilidade - e indireta – quando a ingestão de partículas e/ou de organismos
contaminados através dos níveis tróficos potencia bioacumulação e bioamplificação - que atuam
paralelamente (Rainbow, 2002; Drexler et al., 2003; Rainbow, 2007). A fase inicial de uptake é a
adsorção rápida à superfície, sendo os fenómenos de sorção mais pronunciados em organismos
pequenos, com grandes áreas superficiais, seguindo-se uma bioacumulação lenta no interior dos
tecidos, até se atingir o equilíbrio entre os metais no meio e nos tecidos (Drexler et al., 2003).
Porém, os organismos não respondem à mera presença de metais no meio ambiente; é
fundamental haver uma associação metal-organismo (Drexler et al., 2003). Para isso, é
necessário que sejam assimilados, estando sujeitos a diferentes eficiências de assimilação,
dependendo de condições ambientais, como a temperatura, e das condições fisiológicas dos
seres vivos (Drexler et al., 2003). Assim, há que considerar diferentes etapas, esquematizadas na
figura 4 (Drexler et al., 2003; Loayza-Muro et al., 2010; Lagauzère et al., 2013):
9
Absorção, onde ocorre a entrada de metais no organismo;
Distribuição, através do sangue ou da hemolinfa, para vários tecidos conforme as
propriedades das espécies metálicas presentes e as respetivas afinidades com células e
biomoléculas.
Metabolização, limitada para alguns metais, consistindo apenas na remoção de um ligando
ou conjugação a outro com vista à excreção, no entanto, podendo dar origem a metabolitos que
podem ser ainda mais tóxicos que o composto inicial;
Excreção ou eliminação, normalmente pela urina, onde há excreção de metais em formas
solúveis, ou pelas fezes, se processados pela bílis. Nos mamíferos a excreção pode ainda ocorrer
através da produção de leite.
Quando a taxa de assimilação é superior às de destoxificação e de excreção em conjunto, os
metais podem acumular-se a um nível estável em certos tecidos do organismo, cuja afinidade
com os metais é variável, de forma que alguns são ótimos reservatórios, como o fígado e os
ossos, outros nem tanto, como os músculos (Drexler et al., 2003; Rainbow, 2007). Depois, podem
interferir com os mecanismos metabólicos normais; os seus efeitos manifestam-se quando a
concentração de um metal metabolicamente ativo é superior ao limite de controlo do organismo,
por um período de tempo suficiente para tal (Rainbow, 2007). Por sua vez, o destino dos metais
acumulados está também associado à sua fonte de exposição: se estão presentes na fase soluta,
ligam-se à superfície externa dos organismos; se são ingeridos, associam-se aos órgãos internos
(Rainbow, 2007).
Figura 4. Diagrama conceptual dos processos controladores da biodisponibidade e bioacumulação dos metais nos seres vivos. Fonte: Drexler et al., 2003.
10
Devido à sua semelhança com o cálcio, o urânio é capaz de substituí-lo na estrutura
cristalina de hidroxiapatite do esqueleto e precipitar depois com os grupos fosfato da estrutura
óssea, da mesma forma que pode ser incorporado nas carapaças dos cladóceros, ricas em
carbonatos e fosfatos (Kraemer e Evans, 2012). Assim, a alimentação parece ser uma fonte
importante de entrada deste elemento nos organismos e é possível observar claramente que a
ecologia alimentar dos organismos aquáticos tem influência na quantidade de urânio
bioacumulada (Malmqvist e Hoffsten, 1999; Kraemer e Evans, 2012). De facto, este metal aparece
em concentrações mais elevadas nos níveis tróficos inferiores do que superiores, o que não
acontece para outros metais como o mercúrio (Kraemer e Evans, 2012). Portanto, embora todos
os metais sejam transferidos ao longo da cadeia alimentar, o urânio não sofre bioamplificação; há
uma fraca eficiência de assimilação do metal, o que faz com que para cada nível trófico haja
menos metal para assimilar, proveniente da alimentação (Rainbow, 2002; Kraemer e Evans,
2012). É de notar ainda que as populações de organismos que evoluíram na presença de
concentrações elevadas de certos metais desenvolveram mecanismos de homeostasia e outras
estratégias para regular os níveis de elementos potencialmente tóxicos, como os metais, dos
quais se destacam: a inibição de assimilação; a destoxificação; o armazenamento/aprisionamento
– por sinal, o mais importante para uma vasta gama de organismos, em que há a incorporação em
grânulos inorgânicos (fosfatos ou sulfuretos) ou a ligação a metalotioneínas e outras proteínas de
forma a sequestrar os metais em compartimentos celulares; o aumento da taxa de eliminação
(Rainbow, 2002; Drexler et al., 2003; Rainbow, 2007; Tasat et al., 2012).
Os riscos associados à exposição dos seres vivos ao urânio são determinados por:
Forma química – solubilidade e enriquecimento: quanto mais solúvel, maior a perigosidade,
pois maior é a facilidade de ser transportado em fluidos corporais (plasma) e maior a afinidade
com os diversos tecidos biológicos. O urânio hexavalente parece ser o mais tóxico, apesar de as
formas mais insolúveis tenderem a persistir acumuladas por muito tempo. Pode combinar-se e
afetar o metabolismo de diversos compostos, ligando-se a proteínas e sendo absorvido por
fosfatos e carbonatos. O maior risco deste elemento parece ser bioquímico e não radioquímico
(Tasat et al., 2012);
Forma física – morfologia e tamanho: quanto menores as partículas maior o seu perigo,
pois maior será a razão entre a área superficial e o volume, potenciando a ação tóxica. Os óxidos
metálicos na forma de nanopartículas conseguem translocar-se pelas membranas celulares, cujo
mecanismo de defesa é desconhecido, e a sua ação depende das propriedades químicas (Tasat
et al., 2012);
Via de exposição – nos sistemas aquáticos temos que considerar tanto a respiração
quanto a dieta como principais vias de exposição de metais, enquanto a via dérmica apresenta
uma contribuição mínima devido à barreira exterior que representa, com a exceção de alguns
organismos (e.g. oligoquetas, anfíbios) (Drexler et al., 2003; Tasat et al., 2012).
11
1.2.3 Toxicidade
Assim, o potencial tóxico de elementos radioativos depende do efeito radiológico
combinado com o químico, assim como das taxas dos processos em que está presente
(assimilação, excreção e destoxificação) e não da concentração total acumulada (Rainbow, 2007;
Tasat et al., 2012; Stojanović et al., 2012; Lagauzère et al., 2013). De facto, os processos de
excreção e/ou destoxificação iniciam-se de imediato, sem ser necessário atingir uma
concentração mínima no organismo para tal (Rainbow, 2002). Em geral, os efeitos começam
quando a concentração de metal acumulado – influenciado pelo metal biodisponível no meio -
excede as taxas de excreção e destoxificação em conjunto, variando o potencial de acumulação
no nível seguinte com forma destoxificada acumulada (Rainbow, 2002).
O mecanismo de ação deste composto metálico parece partir do estímulo da produção e
acumulação intracelular de espécies reativas de oxigénio (ROS), como é comprovado pela
sobrestimulação das defesas antioxidantes (Lourenço et al., 2012). Quando as defesas
antioxidantes não são eficazes, as ROS provocam stress oxidativo - um desequilíbrio no estado
de oxidação da célula, que leva a uma perda do potencial redutor - comprometendo a transdução
de sinais, modificando mecanismos e danificando diversos componentes celulares (Al-Shami et
al., 2012; Tasat et al., 2012; Lourenço et al., 2012; Pereira et al., 2014).
O forte potencial do urânio para degradar os organelos é devido à sua enorme afinidade
com fosfatos, que permite que ataque o ADN e as mitocôndrias, ricas neste grupo, para além da
sua competição com minerais essenciais, como o cálcio (Al Kaddissi et al., 2011; Tasat et al.,
2012). Estes danos manifestam-se através da formação de micronucleos, de aductos e de
quebras na cadeia de ADN, que são assim biomarcadores de genotoxicidade (Al-Shami et al.,
2012; Tasat et al., 2012; Lourenço et al., 2012). Assim, as células expostas apresentam disfunções
em lípidos, proteínas e ADN, devido à oxidação, e os subprodutos da reação acumulam-se dentro
dos lisossomas, podendo ser exocitados da célula, na tentativa de eliminar os compostos
alterados (Lourenço et al., 2012). Esta ação química pode levar a mutações genéticas,
principalmente pelo metabolismo oxidativo, comprometendo o crescimento celular, provocando
cancro e doenças autoimunes, fenómenos amplificados pela radioatividade (Tasat et al., 2012).
Por outro lado, os danos no ADN aumentam com um fenómeno designado por LET, do
inglês Linear Energy Transfer, ou seja, transferência linear de energia, fenómeno esse que é
particularmente significativo para as partículas alfa (energéticas, com massa e momento elevados,
mas velocidade reduzida); os eletrões, pelo contrário, têm valores baixos de LET (Lourenço et al.,
2011a). Isto é, estas partículas, emitidas na forma de radiação por alguns radionuclídeos, como U,
Ra, Rn, Po e Th, tendem a perder energia rapidamente com a distância e possuem um fraco
poder de penetração nos tecidos; todavia, quando ingeridas e/ou inaladas podem ser
descarregadas diretamente sobre as células e danificar os seus componentes (Pereira et al.,
2014). Nomeadamente, podem causar quebras na cadeia dupla de ADN, o tipo mais prejudicial de
12
danos moleculares, o que não só estimula o potencial mutagénico e carcinogénico, caso os danos
não consigam ser reparados ou não o sejam corretamente, como pode levar depois a rearranjos
incorretos dos cromossomas viáveis e mesmo à morte (Lourenço et al., 2011a; Lourenço et al.,
2012).
Ao manifestar-se no material genético, gerações não expostas podem sofrer efeitos
carcinogénicos, para além da diminuição da fertilidade e do crescimento dos descendentes (Tasat
et al., 2012).
1.2.4. Avaliação da ecotoxicidade e da genotoxicidade de compostos químicos
Embora normalmente se recorra a análises químicas para avaliar a contaminação de solos
e de água, estas não são suficientes, pois não têm em conta a biodisponibilidade real dos
contaminantes em geral e dos metais em particular, que depende de interações com outros
elementos constituintes destas matrizes (Lourenço et al., 2012). Da mesma forma, não basta fazer
uma avaliação ao nível de biomonitorização, quando se trata de impacto derivados de exposições
ambientais, pois sem identificação dos contaminantes e quantificação dos seus níveis, é difícil
estabelecer relações causa-efeito, e desta forma identificar as fontes de contaminação. É
necessário conjugar as análises químicas, que não indicam de que forma os efeitos das
exposições foram incorporados pelas comunidades naturais, com a avaliação ecotoxicológica dos
efeitos causados pelas matrizes ambientais contaminadas e com a biomonitorização (Callisto et
al. 2001).
Neste contexto, os biomarcadores têm–se revelado ferramentas relevantes, na medida em
que permitem, de forma rápida e precoce, avaliar a exposição e as respostas dos organismos a
exposições ambientais (Lourenço et al., 2011b; Lourenço et al., 2012). Os biomarcadores
representam respostas biológicas ao nível molecular, celular ou fisiológico decorrente da
exposição a um xenobiótico ou dos seus efeitos (Lourenço et al., 2011b; Lourenço et al., 2012).
Alguns biomarcadores funcionam como sinais de alarme, na medida em que permitem detetar
exposições, ou efeitos sub-letais, antes que estes se traduzam em efeitos mais graves que podem
comprometer a viabilidade das populações naturais. Na verdade, apesar dos níveis de
organização biológica superiores (população; comunidade) serem ecologicamente mais relevantes
que os inferiores (indivíduo; molecular) por vezes demoram muito tempo a manifestar os efeitos
das perturbações, e quando isso realmente ocorre, muitas vezes os danos nos ecossistemas são
já irreparáveis. Contudo, é possível estabelecer uma relação entre os dois níveis, na medida em
que a resposta a um tóxico pode levar a mudanças alimentares ou a metabolismos
compensatórios, que exijam energia que seria de outra forma utilizada no crescimento ou na
reprodução, alterando assim a dinâmica populacional (Massarin et al., 2010). Uma vez que há
diferente sensibilidade/tolerância aos tóxicos entre os progenitores e a descendência, graças, por
exemplo, a mecanismos de adaptação, deve-se avaliar os seus efeitos a longo prazo, numa
13
escala transgeracional, (Massarin et al., 2010).
Os efeitos ao nível do indivíduo passíveis de serem avaliados, como o sucesso
reprodutivo, exigem concentrações de poluentes mais elevadas do que as necessárias para se
verificarem efeitos ao nível molecular (Jha, 2008). As concentrações mais baixas capazes de
estimular respostas a nível molecular são também, de uma forma geral, mais representativas das
concentrações presentes no ambiente. Em suma, as consequências ecológicas podem ser
prevenidas ao detetar atempadamente respostas ecotoxicológicas, nomeadamente através do
recurso a biomarcadores (Jha, 2008). Estas representam um fenómeno dependente da exposição,
do tempo e das características de cada espécie, nomeadamente dos tecidos ou células, podendo
depois manifestar-se de inúmeras formas na medida em que os mecanismos de ação são também
variados (Jha, 2008).
Os compostos genotóxicos interagem com o ADN e podem formar-se aductos,
micronucleos ou quebras na sua cadeia, pelo que estamos perante um biomarcador de danos
específicos no ADN mas não específico de contaminante (Jha, 2008; Ternjej et al., 2009). Para
detetar quebras na cadeia de ADN, pode-se recorrer ao ensaio cometa, aplicável a uma vasta
gama de organismos diversos, permitindo assim detetar danos mesmo a níveis baixos e
estabelecer correlações entre o aumento da concentração de contaminantes com o aumento de
danos no ADN e perturbações no crescimento, desenvolvimento e reprodução, por exemplo, ao
nível da diminuição de produção de embriões (Jha, 2008; Ternjej et al., 2009).
O ensaio cometa (single cell gel electrophoresis – SCGE) é um método extremamente
apelativo dado a sua simplicidade, sensibilidade, rapidez, versatilidade, os seus custos
relativamente baixos e a qualidade das imagens resultantes (Collins et al., 1997; Collins, 2004). É
usado comummente como teste de genotoxicidade, podendo definir o tipo de dano presente, com
manipulações subtis como a introdução de enzimas específicas a lesões, e também ser usado em
monitorização ecológica, em conjunto com organismos bioindicadores (Collins et al., 1997; Collins,
2004).
Este ensaio baseia-se no princípio que o ADN, no núcleo, está organizado em loops (laços)
superenrolados, ADN esse que é organizado nos nucleossomas onde se enrola em volta das
histonas, levando à compressão da molécula de ADN (Collins et al., 2008). O que determina se
dado segmento surge na “cauda do cometa” é o relaxamento desse superenrolamento, ou seja, a
“cauda” é formada por loops relaxados e quantos mais danos, maior o relaxamento dos loops e
maior a intensidade da cauda – e não propriamente o seu comprimento, que parece estar
associado apenas ao tamanho dos loops (Collins et al., 1997; Angelis et al., 1999; Collins, 2004;
Collins et al., 2008). À medida que aumentam os danos, aumenta a também intensidade relativa
de coloração do ADN na “cauda”, ou seja, a fluorescência total do cometa diminui (Collins, 2004;
Collins et al., 2008). Na “cabeça do cometa” encontram-se os loops superenrolados intactos, sem
danos e, portanto, sem quebras que os permitam libertar-se e ser arrastados na eletroforese
(Collins et al., 1997).
14
É na eletroforese que os fragmentos de ADN, atraídas pelo ânodo, migraram para o
exterior do nucleóide – núcleo sem proteínas - e formaram a “cauda do cometa” (Angelis et al.,
1999; Collins e Horváthová, 2001). O parâmetro principal deste processo é a voltagem através do
gel, que deve ser descrito como V/cm na plataforma. A camada de gel deve ser fina para não
arrastar a corrente, que se não terá que ser aumentada para manter V/cm desejado (Collins et al.,
2008).
1.3. Enquadramento legal da avaliação da qualidade da água de ecossistemas de
água-doce
A Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro de 2000,
conhecida como Directiva-Quadro da Água (DQA), tem em vista a gestão e a proteção dos
sistemas aquáticos através de acções integradas, como a avaliação ecossistémica da qualidade
da água e a redução de contaminações com substâncias perigosas (CE, 2000; INAG, 2006). A
aplicação da DQA em Portugal é da responsabilidade do Instituto da Água (INAG), tendo sido
transposta pela Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro, ou Lei da Água, e pelo Decreto-Lei 77/2006,
de 30 de Março (AR, 2005; MAOTDR, 2006). Está ainda descrito nesta directiva que todas as
massas de água devem atingir o Bom Estado até 2015, sendo este o resultado da combinação de
um bom Estado Ecológico e de um bom Estado Químico, ou seja, deve haver o menor desvio
possível das condições de referência registadas num local idêntico em termos de características
geográficas e hidrológicas, mas livre de qualquer pressão humana significativa, onde as
comunidades bióticas são diversificadas e abundantes, com organismos sensíveis e autóctones –
a este local dá-se a designação de local de referência (ARH do Centro, 2011a; INAG, 2009).
O Estado das massas de água é sempre descritivo do pior resultado – Ecológico ou
Químico – segundo o princípio one out-all out. O Estado Ecológico baseia-se na estrutura e
funcionamento dos ecossistemas, nomeadamente na avaliação de elementos de qualidade
biológica, físico-química geral e hidromorfológica, enquanto o Estado Químico revela as
substâncias presentes no meio e que não estariam em condições naturais, as quais são
suscetíveis de afetar o meio aquático e os seres vivos, pela sua persistência, toxicidade e
bioacumulação (INAG, 2009).
Daqui surge o conceito de normas de qualidade ambiental (NQA), exposto pela Diretiva
2008/105/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, transposta
para a legislação portuguesa pelo Decreto-Lei nº 103/2010, de 24 de Setembro de 2010, cujo
objetivo é estabelecer níveis máximos de concentração de certas substâncias na água, nos
sedimentos e na biota, que por definição não devem ser ultrapassados para se assegurar a
qualidade do meio ambiente, bem como a saúde humana; caso o sejam, o Estado Químico é
considerado insuficiente (INAG 2009; MAOT, 2010). Estas substâncias estão descritas como
15
“substâncias prioritárias”, se apresentam um risco ambiental significativo, ou como “outros
poluentes”, se exigem medidas específicas, e a sua avaliação é feita pelos fatores temperatura,
condições de oxigenação, salinidade, acidificação e condições relativas a nutrientes, destacando-
se ainda as “substâncias prioritárias perigosas”, as quais têm prioridade em relação aos restantes
poluentes no que toca às ações de remoção (MAOT, 2010; INAG 2009). Alguns metais estão
integrados nesta lista de substâncias prioritárias e cabe ainda a cada estado membro classificar e
definir normas para outros de interesse a nível nacional, sendo que, para as substâncias com
níveis já definidos, os estados membro nunca poderão estabelecer limites próprios mais
permissivos (CE, 2008). Tendo em conta que fenómenos de poluição pontuais podem não ser
detetados pela análise físico-química da água, é fundamental complementá-la com análises do
sedimento e dos seres vivos, onde compostos como os metais pesados têm tendência a
acumular-se, revelando deste modo processos de contaminação histórica (CE, 2008; INAG 2009).
Os valores-limite estabelecidos
permitem a comparação da qualidade da
água em todos os estados membro, como se
pode constatar na figura 5, cujas classes do
Estado Ecológico são Excelente, Bom,
Razoável, Medíocre e Mau, correspondendo
respetivamente à representação gráfica de
azul, verde, amarelo, laranja e vermelho, e as
classes do Estado Químico são Bom e
Insuficiente, a azul e vermelho (INAG 2006;
INAG 2009).
Assim, são desenvolvidos programas de monitorização, tendo em vista a possibilidade de
comparação dos resultados obtidos entre os diferentes estados membro; no entanto, esta
comparação revelou-se difícil, uma vez cada estado membro pode escolher os índices biológicos
a usar, as tipologias das massas de água variam geograficamente e, sobretudo, devido à falta de
especificidade dos conceitos descritivos do estado ecológico, ou seja, a distinção entre cada
classe está sujeita à interpretação de cada um (CE, 2000; Hering et al., 2010; Moss, 2008). Além
disso, em Portugal existe uma falta de informação padronizada relativamente à monitorização
integrada de parâmetros físico-químicos e biológicos (CE, 2000; INAG 2009). É também
fundamental ter em conta a variabilidade sazonal dos parâmetros avaliados, realizando as
amostragens para que a sua frequência ilustre todos os cenários de forma precisa e com um
reduzido grau de incerteza (CE, 2000).
Figura 5. Esquematização do conceito de Bom Estado de uma massa de água superficial. Fonte: INAG, I.P. 2006.
16
1.3.1. Os macroinvertebrados como bioindicadores da qualidade da água
Os invertebrados bentónicos são considerados elementos relevantes para a avaliação do
estado ecológico das massas de água, ao nível das componentes composição e abundância,
sendo estes vantajosos graças à facilidade e rapidez de colheita, à facilidade na identificação
taxonómica e à sensibilidade a poluentes orgânicos e inorgânicos e a alterações hidrológicas,
morfológicas e de acidificação (INAG, 2009). Além do mais, são sensíveis à degradação geral do
estado do sistema aquático e apenas não o são à presença excessiva de nutrientes (INAG, 2009).
Estes organismos, que são considerados bioindicadores, refletem fenómenos de poluição,
presentes e ocorridos no passado, pois os danos neles provocados persistem no tempo, ao
contrário das análises químicas que apenas indicam a qualidade da massa de água referente ao
momento em que as amostras foram recolhidas (Alba-Tercedor e Sanchéz-Ortega, 1988; Callisto
et al., 2001; Bio et al., 2011).
Os macroinvertebrados aquáticos são cosmopolitas e podem povoar quase todo o tipo de
habitats, mesmo aqueles onde ocorrem condições extremas, desde águas fortemente salinizadas
a lagoas de tratamento de águas residuais ou nascentes de águas termais. Podem ainda habitar
ambientes lóticos ou lênticos, embora as comunidades sejam mais diversas em riachos florestais
de substrato de pedra e cascalho (Bouchard, 2004). A adaptação a ambientes tão distintos é
sinónimo de grande diversidade e abundância, de modo que se estima haver mais de 20000
espécies só na ordem Díptera, para além de muitas que ainda provavelmente não foram
identificadas em todos os grupos de macroinvertebrados (Bouchard, 2004; Serra et al., 2009).
A grande diversidade de macroinvertebrados é evidenciada também pelos diferentes
grupos funcionais que se encontram e estão relacionados com quatro características base (Jesus,
2008; Serra et al., 2009):
Fisiologia respiratória: respiração aérea, branquial, cutânea, pulmonar, branquial/aérea ou
branquial/cutânea;
Fisiologia alimentar e tipo de partículas ingeridas: retalhadores herbívoros/detritívoros, coletores
filtradores/detritívoros, raspadores minerais/orgânicos, predadores mastigadores/sugadores,
limnívoros;
Habitat e mobilidade dos organismos: patinadores, planctónicos, mergulhadores, nadadores,
sésseis ou fixos, pouco móveis;
Preferência de habitat quanto à velocidade da corrente: entre exclusivamente reófilos e
exclusivamente limnófilos.
A crescente pressão no meio aquático, principalmente dulciaquícola, coloca em risco a
presença destes organismos, em especial dos mais sensíveis, comprometendo as diversas
funções que eles executam nos referidos meios (Bouchard, 2004; Serra et al., 2009). De facto, os
macroinvertebrados aquáticos têm um papel crucial nas redes tróficas aquáticas e terrestres, onde
por um lado temos consumidores primários - de algas e de material alóctone proveniente das
17
margens – e predadores de microrganismos - como bactérias, fungos e outros invertebrados -
mas por outro são igualmente presas, quer de outros insetos aquáticos, quer de peixes ou aves
(Bouchard, 2004; Serra et al., 2009). Há ainda organismos detritívoros que contribuem para a
reciclagem da matéria orgânica e, apesar de se obterem amostras pequenas com diversas
espécies nas recolhas de campo, os macroinvertebrados em geral são extremamente apelativos
com indicadores biológicos (Gerhardt e Bisthoven,1995; Peterson et al., 2002; Antunes et al.,
2007; Alvial et al., 2012).
Pelo facto dos macroinvertebrados aquáticos apresentarem uma natureza sedentária,
permite estabelecer relações causa-efeito entre os padrões espaciais de variação e as fontes
pontuais de contaminação das massas de água, tornando-os uma ferramenta importante para
estudos de monitorização ambiental (INAG, 2009; Callisto et al., 2001; Peterson et al., 2002; Alvial
et al., 2012).
Assim, os macroinvertebrados aquáticos dividem-se segundo a sua sensibilidade à
contaminação das massas de água da seguinte forma (Callisto et al., 2001; Bouchard, 2004; Serra
et al., 2005):
Organismos sensíveis ou intolerantes: como o nome indica, apenas estão presentes em
águas não poluídas, pelo que são bons indicadores de boa qualidade da água.
Essencialmente representados pelas ordens Plecoptera, Ephemeroptera (figura 6) e
Trichoptera, são uma métrica da qualidade da água pelo cálculo da percentagem de taxa
destes grupos (% EPT);
Organismos tolerantes: que se encontram em condições intermédias, mas não extremas, de
poluição. Englobam organismos das ordens Coleoptera (figura 7), Megaloptera, Heteroptera
e Odonata;
Organismos resistentes: estão presentes independentemente do grau de contaminação da
massa de água, sendo os únicos em zonas muito degradadas, onde, por vezes, chegam a
atingir abundâncias elevadas. Neste grupo podemos encontrar a ordem Diptera (figura 8) e
as classes Mollusca ou Anelida, sendo que os últimos dois grupos são considerados
indicadores de má qualidade da água.
De acordo com esta classificação, é possível, através da determinação da
presença/ausência dos diferentes grupos, sua abundância relativa e identificação dos grupos
tróficos funcionais medir as alterações estruturais na comunidade, como o aparecimento ou a
Figura 6. Ephemeroptera, larva.
Figura 7. Dysticidae, Coleoptera, adulto.
Figura 8. Chironomidae, Diptera, larva.
18
proliferação de espécies mais adaptadas ou mesmo o desaparecimento total ou parcial da
comunidade (Bio et al., 2011). Seguindo estes pressupostos, desenvolveram-se índices bióticos,
isto é, um esquema conceptual que permite avaliar as massas de água estabelecendo uma
relação entre os grupos taxonómicos detetados e o grau de poluição, com o aumento da qual
deverá haver uma redução da diversidade, com perda progressiva de certos grupos, começando
pelos mais sensíveis (Alba-Tercedor e Sanchéz-Ortega, 1988; Cota et al., 2002). Existem muitos
índices bióticos atualmente (devido ao forte regionalismo), no entanto todos se baseiam no
mesmo princípio: atribuição de uma cotação correspondente a uma maior qualidade ecológica
quanto mais espécies indicadoras de boa qualidade estiverem presentes (Coimbra et al., 1996;
Callisto et al., 2001; Cota et al., 2002). Fornecem assim uma ideia geral da situação do
ecossistema, facilmente compreendida, mesmo por quem não domina esta área científica, apesar
de estabelecer uma correlação fraca as flutuações sazonais da comunidade que condicionam os
resultados dos índices (Alba-Tercedor e Sanchéz-Ortega, 1988; Cota et al., 2002).
O meio aquático é um reservatório de contaminantes provenientes das mais diversas
atividades humanas, onde os seres vivos são afetados de forma direta, através de efeitos letais e
sub-letais, ou de forma indireta, através da alteração das relações interespecíficas, da qualidade
do alimento e do habitat (Courtney e Clements, 2002; Antunes et al., 2007). Em ambos os casos,
a subsequente redução da abundância de indivíduos, perda de espécies sensíveis e redução da
diversidade acaba por comprometer a sustentabilidade dos ecossistemas aquáticos (Courtney e
Clements, 2002; Antunes et al., 2007). Neste contexto, as relações entre as atividades mineiras, a
poluição com drenagens ácidas ricas em metais e a degradação das comunidades aquáticas
estão bem estabelecidas (Courtney e Clements, 2002; Muscatello e Liber, 2010).
De entre as consequências da poluição com drenagens ácidas de explorações mineiras,
destacam-se os efeitos negativos nas comunidades bióticas, resultantes não apenas do aumento
da acidez das águas (efeito do pH), como também do elevado conteúdo em metais dissolvidos
(Loayza-Muro et al., 2010; Al-Shami et al., 2012). Estas alterações podem manifestar-se na
diminuição da abundância de macroinvertebrados e da sua riqueza específica, na diminuição do
habitat disponível, pois os metais precipitam nas partículas dos sedimentos, e na diminuição da
qualidade do alimento, podendo manifestar-se ainda como deformações morfológicas (Loayza-
Muro et al., 2010; Al-Shami et al., 2012; Alvial et al., 2012). Assim, as espécies sensíveis
desaparecem e as comunidades são dominadas pelas tolerantes e resistentes (Loayza-Muro et
al., 2010; Alvial et al., 2012).
Os efeitos de contaminações com metais são mais difíceis de detetar quando estão
presentes em concentrações baixas/moderadas do que quando são elevadas, mais ainda quando
outros compostos mitigam os seus efeitos, como cálcio, substâncias húmicas e partículas finas de
compostos orgânicos (Malmqvist e Hoffsten, 1999). Além disso, no meio ambiente os organismos
estão normalmente expostos a misturas de contaminantes e não a componentes individuais, o que
pode levar a que os efeitos se manifestem de modo mais pronunciado, mesmo a concentrações
19
inferiores ao NOEC (concentração sem efeito observável), se atuam de forma sinergética, ou
menos pronunciados, caso os seus efeitos sejam antagonistas, e não se sabe como o
ecossistema responde às alterações por eles provocadas na comunidade (Malmqvist e Hoffsten,
1999; Peterson et al., 2002; Beyer et al., 2014).
1.3.2. Daphnia magna como organismo modelo em ensaios ecotoxicológicos
passíveis de ser integrados na avaliação da qualidade da água segundo a
DQA
Os ensaios ecotoxicológicos não estão previstos na diretiva quadro da
água; contudo, pelo facto de alguns possuírem já protocolos padronizados e
serem efetuados com organismos sensíveis e capazes de manifestar
respostas rápidas aos contaminantes, podem vir a ser uma excelente
ferramenta de avaliação a integrar na DQA.
Entre os organismos teste mais amplamente usados, os crustáceos
planctónicos apresentam uma ampla distribuição por diversos habitats e
encontram-se na base das cadeias alimentares, como consumidores primários, o que por um lado
significa que são os primeiros animais a serem expostos aos contaminantes, por outro que são a
via da sua transmissão aos níveis tróficos superiores (Ternjej et al., 2009; Radíc et al., 2014). O
reduzido tamanho, a sensibilidade aos poluentes, a reprodução partenogénica, as exigências
simples de cultura e de alimentação e o curto ciclo de vida são algumas das razões que tornam
Daphnia magna (Cladocera, Branchiopoda, Crustacea) (figura 9), um organismo modelo para
estudos ecotoxicológicos em laboratório, especialmente quando se pretende avaliar efeitos
multigeracionais (Baird e Barata, 1999; Plaire et al., 2013; Pellegri, et al., 2014; Radíc et al., 2014).
Porém, ainda que a partenogénese lhes confira uniformidade genética, o que proporciona
resultados repetíveis e reproduzíveis, este organismo está sujeito a variações inter-laboratoriais
nos resultados obtidos, devido, principalmente à variabilidade genética entre gerações usadas em
diferentes laboratórios (Baird e Barata, 1999). Por vezes, surgem também machos e efípias (ovos
de resistência) nas culturas; contudo, a reprodução sexuada não é uma fonte significativa de
variabilidade genética em laboratório, sendo principal a variação interclonal (Baird e Barata, 1999).
Na verdade, existem vários tipos de ensaios padronizados com estes organismos, como o
teste de reprodução de 21 dias, onde são avaliados parâmetros como as taxas de mortalidade, de
crescimento e de reprodução, assim como o tempo de maturação sexual e o tamanho da ninhada
(Danga et al., 2012). No entanto, a mortalidade é pouco sensível às concentrações ambientais,
sendo os parâmetros reprodutivos mais relevantes, ainda que exijam um período de exposição
relativamente longo (Barata et al., 2008; Danga et al., 2012). Através de ensaios de feeding
inhibition, onde se avalia a taxa de consumo de algas, é possível calcular efeitos subletais ao nível
do crescimento e da reprodução, num período máximo de 24 horas (Barata et al., 2008).
Figura 9. Dapnhia magna adulta.
20
Outro método rápido e sensível de deteção de danos subletais em Daphnia magna
consiste no recurso a biomarcadores moleculares de toxicidade como, por exemplo, a inibição de
actividade enzimática ou alterações no ADN (Pellegri et al., 2014; Rivetti et al., 2015). Este último
é um biomarcador específico de genotoxicidade, havendo diferentes tipos de alterações conforme
o composto responsável; por exemplo, da exposição a radionuclídeos resultam quebras duplas na
cadeia de ADN, detetáveis através do ensaio de cometa (Jha, 2008; Ternjej et al., 2009).
1.4. Objetivos
No contexto acima descrito, a presente dissertação teve como objetivo avaliar o impacto de
descargas de água residuais das lagoas de tratamento do complexo de exploração de urânio da
Urgeiriça (Canas de Senhorim, Viseu), já sujeito a obras de remediação, na Ribeira da Pantanha,
um afluente do Rio Mondego. Para tal, recorreu-se a análise da comunidade de
macroinvertebrados da ribeira, em paralelo com a avaliação de efeitos genotóxicos em D. magna,
após exposições de 24h a amostras de água da ribeira, através do ensaio de cometa. Deste
modo, será igualmente possível inferir sobre possíveis melhorias na qualidade da água, já
resultantes das obras de remediação levadas a cabo na zona.
Este trabalho ganha grande relevância, pois apresenta uma perspetiva única até agora, na
medida em que é a primeira vez que estes parâmetros são usados de forma conjunta, para a
avaliar os impactos de descargas de minas de urânio, contaminadas com metais e radionuclídeos,
nos sistemas recetores.
Sintetizando as questões fundamentais para as quais este estudo procura respostas
temos:
Qual o estado ecológico da Ribeira da Pantanha atualmente, após descargas pontuais,
mas perpetuadas ao longo do tempo, de águas residuais ricas em metais e
radionuclídeos?
Qual a relação entre a perturbação da comunidade de macroinvertebrados aquáticos e a
poluição com metais?
Quais as vantagens de combinar índices bióticos com o uso de biomarcadores de
genotoxicidade?
Para esse efeito, a dissertação encontra-se estruturada nos seguintes capítulos:
Capítulo 1: Introdução Geral, dividida em quatro subcapítulos que focam - a exploração
mineira, com enfâse nos seus impactos ambientais e consequente necessidade de proceder a
obras de remediação ambiental. Neste contexto deu-se particular ênfase às minas de urânio em
Portugal. O urânio, principal elemento destas áreas mineiras suas características, especiação e
biodisponibilidade, toxicocinética e toxicidade. Algumas ferramentas de avaliação da ecotoxicidade
21
e genotoxicidade foram igualmente descritas. Por último, após o enquadramento legal da
avaliação da qualidade de sistemas de água doce, que são os recetores das drenagens ácidas
destas áreas mineiras, com referência à Directiva-Quadro da Água e às Normas de Qualidade da
Água, fez-se uma breve abordagem ao uso da comunidade de macroinvertebrados na avaliação
do estado ecológico, e referiu-se a possibilidade de se efetuarem em paralelo ensaios de
toxicidade rápidos que permitam uma avaliação complementar da qualidade da água em meios
contaminados com radionuclídeos. No final da introdução foram descritos os objetivos do trabalho
e as questões formuladas.
Capítulo 2: Materiais e Métodos, onde se descrevem as metodologias empregues ao longo
deste estudo. Esta secção está dividida nos subcapítulos de amostragem de água e sedimento
para análise de parâmetros físico-químicos; amostragem da comunidade de macroinvertebrados
para avaliação biológica da qualidade da água e avaliação da genotoxicidade, através do ensaio
cometa.
Capítulo 3: Resultados e Discussão, onde se apresentam com recurso a gráficos e tabelas
os principais resultados, à medida que os mesmos foram discutidos à luz do conhecimento
existente.
Capítulo 4: Considerações finais, onde se integraram críticas e perspetivas futuras.
23
2. Materiais e Métodos
2.1. Local de Estudo
O complexo mineiro da Urgeiriça localiza-se no centro de Portugal, no distrito de Viseu e
engloba três áreas de exploração de urânio: as minas da Urgeiriça, em Canas de Senhorim,
concelho de Nelas; a mina da Quinta do Bispo e a mina da Cunha Baixa, ambas no concelho de
Mangualde (EDM e DGEG, 2011; Pereira et al., 2014).
2.1.1. Canas de Senhorim e a bacia do Mondego
A vila de Canas de Senhorim está
localizada no maciço antigo ibérico central, região
caracterizada por granitos monzoníticos porfiróides
com intrusões de filões de quartzo e rica em falhas
(figura 10) (ARH do Centro, 2011b). Apresenta um
clima temperado mesotérmico, com estações de
Verão e Inverno bem definidas, segundo a
classificação de Koppen, com valores de
temperatura, precipitação e escoamento médios
anuais de 13ºC, de 1100 mm e de 600 mm,
respetivamente (ARH do Centro, 2011a; ARH do
Centro, 2011b).
A região está ainda englobada na bacia do
rio Mondego. Em 6.658,6 km2 dos 11.477,50 km2 da região hidrográfica Vouga-Mondego-Lis onde
está inserida, existem 224 massas de águas das quais 191 são rios e 7 são rios fortemente
modificados. Os rios dividem-se em rios do litoral centro, rios montanhosos, rios do norte de
pequena dimensão e rios do norte de média-grande dimensão (ARH do Centro, 2011b).
As águas em melhor estado ecológico estão localizadas principalmente no interior e a
altitude elevada, nas zonas de cabeceiras dos rios. Na bacia do Mondego, 24 % das massas de
água apresentam estado inferior a bom, dos quais 19 estão na sub-bacia do Mondego,
provavelmente devido à agricultura e a descargas diretas de matéria orgânica proveniente de
efluentes urbanos e da agropecuária (ARH do Centro, 2011a; ARH do Centro, 2011b). Prevê-se
que em 2015, 75% das massas de água atinjam o estado de “bom”, especificamente 79% dos
rios, ainda que 60% dos rios considerados em risco não se encontrem em monitorização e que
24% dos rios não tenham o seu estado químico determinado (ARH do Centro, 2011a; ARH do
Centro, 2011b). A comunidade de macroinvertebrados foi o fator com pior resultado na avaliação
do estado ecológico dos rios, até ao momento, responsável pela atribuição de resultados
Figura 10. Extrato da Carta Geológica de Portugal, à escala de 1/500 000. Fonte: http://www.cienciaviva.pt/img/upload/Granito%20em%20Canas%20de%20Senhorim%20-%20Parte%20I.pdf
24
inferiores a bom estado ecológico (ARH do Centro, 2011b).
2.1.2. O Complexo Mineiro da Urgeiriça
O pólo da Urgeiriça foi o mais importante no país, chegando a ter seis poços abertos ao
longo da veia de minério, numa extensão de 1600m de distância e de 500m em profundidade.
Esta área mineira destacou-se ainda por possuir a Oficina de Tratamento Químico (OTQ),
construída entre 1950 – 1951, onde foram produzidas no total cerca de 4400 toneladas de U3O8
(Gusmão, 2008; Prazeres, 2011; Pereira et al., 2014).
A partir de 1970 iniciou-se a exploração subterrânea, em que o minério extraído era
esmagado, empilhado e pulverizado com ácido sulfúrico (H2SO4) que percolava pela pilha,
resultando na lixiviação de urânio e acabando por dissolver concomitantemente uma variedade de
metais pelo seu caminho (Gusmão, 2008; EDM e DGEG, 2011; Pereira et al., 2014).O efluente
resultante, assim como os licores provenientes das galerias de todas as minas de urânio do centro
do país, eram encaminhados para colunas de resina de permuta iónica em leito fluidizado, resinas
essas que eram levadas para a estação de tratamento químico para valorização do urânio e
produção de concentrado de urânio (Gusmão, 2008; Prazeres, 2011; Pereira et al., 2014).
Os resíduos da estação de tratamento químico - águas residuais e pequenas partículas -
eram encaminhados para uma bacia de deposição (Barragem Velha) e o efluente líquido era
transferido para uma lagoa (Barragem Nova), ao qual se adicionava cloreto de bário para
neutralizar o pH (EDM e DGEG, 2011; Pereira et al., 2014). Daqui resultava uma lama rica em
precipitados metálicos, cujas concentrações de U, Ra e Pb atingiam valores de 50 kBq/kg, e que
era posteriormente depositada em lagoas de evaporação na área; a restante água neutralizada
era encaminhada para a Ribeira da Pantanha, levando à sua contaminação periódica, por largos
anos (EDM e DGEG, 2011; Pereira et al., 2014).
Surge, então, um conjunto de medidas interventivas, cuja evolução no terreno é visível nas
figuras 11, 12 e 13, para mitigar e reabilitar toda a área afetada pelo processo de mineração, que
visaram essencialmente o depósito dos resíduos perigosos de toda a área mineira na zona da
barragem velha e seu devido confinamento e selagem, com impermeabilização das escombreiras
(EDM e DGEG, 2011). No entanto, desta estrutura provêm lixiviados, pelo que se implementou um
sistema de recolha para os encaminhar à estação de tratamento de efluentes (ver secção 2.1.3.),
assim como um sistema de drenagem das águas pluviais para evitar o contacto com as escórias
(EDM e DGEG, 2011).
Na zona da barragem nova houve também impermeabilização do solo e a bacia foi cheia
com águas provenientes da estação de tratamento de efluentes (EDM e DGEG, 2011). Foram
ainda instalados instrumentos de monitorização de poeiras (inferiores a 10 µm) e de monitorização
radiológica, através da radiometria superficial em choques por segundo (cps) e da radiação
externa choques em dose absorvida (µGy/h) (EDM e DGEG, 2011; Gusmão, 2008; Prazeres,
25
2011). De facto, houve uma melhoria nestes parâmetros depois da intervenção, de tal forma que o
máximo atual da radiometria é o valor considerado normal para zonas graníticas (EDM e DGEG,
2011).
Importa ainda realçar que, de forma a reforçar o abastecimento de água ao processamento
industrial do urânio, foi constituída, no início da década de 1980, a barragem de Valinhos
integrada no curso da ribeira da Pantanha, na área Mineira de Valinhos, englobada nas minas da
Urgeiriça (EDM e DGEG, 2011). Esta área foi intervencionada juntamente com a área da
Urgeiriça, cuja remediação ambiental recaiu sobre a remoção de escombros e a recuperação das
áreas saneadas da envolvente à Albufeira do Açude de Valinhos, com limpeza e modelação de
fundos, assim como uma etapa final de beneficiação e recuperação ambiental da envolvente e
ainda tratamento paisagístico (EDM e DGEG, 2011).
2.1.3. Tratamento de Efluentes
O principal objetivo do tratamento de efluentes de minas de exploração de minério
radioativo é a neutralização da acidez e a redução da radioatividade, através da remoção de
radionuclídeos da cadeia de decaimento do urânio resultantes da lixiviação dos minérios (EDM e
DGEG, 2011; Pereira et al., 2014). Na mina da Urgeiriça, a água de percolação apresenta valores
de pH muito baixos, níveis de U e U/Ra elevados, comparando com a água de escorrência
superficial - aliás, a água de percolação contém 10 vezes mais U em solução que as águas de
mina - e baixo oxigénio dissolvido e Ra (Duarte, 1995; Antunes et al., 2007; Carvalho et al., 2011).
Uma vez que os rios poluídos com metais permanecem ameaçados devido à sua acumulação nos
sedimentos e água subterrânea, há uma grande preocupação em melhorar a qualidade dos
efluentes que são lançados nos cursos de água (Lagauzère et al., 2013; Carvalho et al., 2014c).
Para isso, utiliza-se, cal e cloreto de bário (BaCl2) como agentes de correção do pH e
precipitantes, o que permite a deposição e posterior decantação dos complexos formados. Na
prática, como demonstra a figura 14, as águas de escorrência são encaminhadas para a estação
de tratamento, composta por três reatores, para correção química, e por duas bacias de
Figuras 11, 12 e 13. Fotografias aéreas da área mineira da Urgeiriça, antes da intervenção (início de 2006); durante a intervenção; no final da intervenção (2008). Fonte: EDM e DGEG, 2011.
26
sedimentação, para precipitação gravítica das partículas sólidas suspensas (EDM e DGEG, 2011;
Pereira et al., 2014).
Este tratamento reduz efetivamente a concentração de urânio e a atividade de rádio226 nas
águas de mina, ainda que não as elimine completamente (EDM e DGEG, 2011). Após algum
tempo de retenção nas bacias de decantação o efluente é libertado nos cursos de água mais
próximos, que no caso da mina da Urgeiriça é a Ribeira da Pantanha (secção 2.1.3.).
2.1.4. Ribeira da Pantanha
A ribeira da Pantanha, vísivel na figura 15, é um afluente direto
do rio Mondego que nasce a cerca de 2 km sudoeste do centro de
Nelas, percorrendo sensivelmente 7,5 km até desaguar no rio
Mondego, na localidade de Caldas de Felgueiras (Agri-pro Ambiente
Consultores, 2004). A sua bacia hidrográfica compreende cerca de 6
km2, por onde a ribeira cruza campos de cultivo e de pastoreio, alguma
floresta e indústria e ainda a zona mineira da Urgeiriça, sendo também
alvo das descargas da unidade têxtil Borgstena (Agri-pro Ambiente
Consultores, 2004).
Esta ribeira foi alvo de constantes descargas perigosas durante a atividade do complexo
mineiro da Urgeiriça. De facto, a contaminação desta ribeira foi confirmada pela deteção de
radionuclídeos da série de decaimento do urânio na água, na matéria em suspensão e nos
sedimentos, a concentrações elevadas (Carvalho et al., 2009; Carvalho et al., 2014b). Da mesma
forma, existem evidências de que esta contaminação chegava realmente ao rio Mondego, onde
Figura 15. Ribeira da Pantanha.
Figura 14. Diagrama do processo de tratamento de efluentes em execução na estação de tratamento de efluentes na Urgeiriça. Fonte: EDM e DGEG, 2011.
27
foram detetadas, na secção intermédia, concentrações elevadas de radionuclídeos na água, na
matéria em suspensão, nos sedimentos e ainda em peixes como o barbo comum ibérico (Barbus
bocagei Steindachner) e o boga-dos-rios (Pseudochondrostoma polylepis Steindachner),
comparando com outros rios, ainda que a níveis que não representam riscos para os peixes nem
para as populações que deles se alimentem (Carvalho et al., 2007).
Desta forma, foram selecionados cinco pontos de amostragem, evidenciados na figura 16,
que foram fotografados, georreferenciados e onde foram recolhidas amostras de água, de
sedimentos e de macroinvertebrados, cuja metodologia está descrita nos subcapítulos seguintes.
O ponto 1 corresponde ao ponto de referência, localizado a montante da área mineira de
Valinhos e, portanto, antes da zona de contaminação. O ponto 2, apesar de já se localizar na área
mineira da Urgeira, encontra-se a montante do ponto de descarga do efluente da mina. O ponto 3
corresponde à confluência do efluente da mina com a ribeira e os pontos 4 e 5 localizam-se
sucessivamente a jusante deste ponto. As coordenadas geográficas dos pontos de amostragem
Figura 16. Fotografia da Mina da Urgeiriça, ilustrativa dos pontos de amostragem da Ribeira da Pantanha. Fonte: https://www.google.pt/maps/
28
estão descritas na tabela 1.
2.2. Amostragem de água e sedimentos para caracterização fisíco-química e para
análise de radionuclídeos
Para caracterização físico-química da água da ribeira foram
medidos, com um medidor multiparamétrico portátil (HI 9828
Multiparameter Meter with GPS, Hanna Instruments), parâmetros físico-
químicos in situ, nomeadamente a temperatura, o pH, o oxigénio
dissolvido, a condutividade, a salinidade, os sólidos totais dissolvidos e o
potencial de oxidação. No mês de Abril, procedeu-se à recolha de uma
amostra de água (figura 17) em cada ponto de amostragem (figura 16)
para a exposição de Daphnia magna, para avaliação da genotoxicidade
pelo ensaio cometa (ver secção 2.5.), assim como sedimento para
análise granulométrica (ver secção 2.2.1). As amostras de água foram
congeladas a -20ºC, no escuro, e as de sedimento refrigeradas a 4ºC
em sacos pretos, até análise posterior (INAG, 2008).
Simultaneamente, foram recolhidas amostras de água e de sedimento para identificação e
quantificação dos radionuclídeos, nos pontos 1, 3, 5 (figura 16) e ainda outro ponto em Caldas de
Felgueiras, junto ao local de confluência da ribeira com o rio Mondego. Para o efeito, recolheram-
se entre 10 a 15 L de água em cada ponto, os quais foram imediatamente filtrados, por pressão,
através de filtros de membrana de acetato de celulose, com 0,45 µm de poro e 142 mm de
diâmetro. A amostra filtrada foi posteriormente acidificada com HNO3 p.a., a pH<2 para evitar a
adsorção dos radionuclídeos às paredes dos bidões de transporte (de polietileno) (Falcão et al.,
2005; Carvalho et al., 2014b). As amostras de sedimento foram recolhidas com um amostrador
manual na camada superior, as quais foram posteriormente armazenadas em caixas de plástico e
crivadas no laboratório, para separar apenas a fração inferior a 63 m (Carvalho et al., 2014b).
Através de co-precipitação, separação radioquímica e eletrodeposição, removeram-se os
radioelementos das partículas do sedimento, que foram depositados em discos de aço inoxidável
polido (Carvalho et al., 2014b). Os radionuclídeos foram medidos por espetrometria alfa, através
detetores de silício implantados com iões (ORTEC EG&G) (Carvalho et al., 2014b).
Ponto 1 Ponto 2 Ponto 3 Ponto 4 Ponto 5
40º 30’ 58’ 9’’ N
7º 53’ 9,3’’ O
40º 30’ 27,1’’ N
7º 50’ 00,4’’ O
40º 30’ 23,0’’ N
7º 53’ 04,2’’ O
40º 30’ 21,6’’ N
7º 53’ 02,5’’ O
40º 30’ 19,6’’ N
7º 53’ 00,1’’ O
Figura 17. Amostragem de água, ribeira da Pantanha.
Tabela 1. Coordenadas geográficas dos pontos de amostragem selecionados.
29
2.2.1. Análise granulométrica dos sedimentos
Nos 5 pontos de amostragem acima mencionados (figura 16) para as amostras de água
foram recolhidas amostras de sedimento com uma pá, as quais foram colocadas em sacos de
plástico pretos, e posteriormente armazenadas a 4ºC. Uma semana antes da análise foi removida
a matéria orgânica visível e as amostras foram colocadas na estufa a 40ºC, de forma a facilitar a a
crivagem a seco das amostras (Guy, 1969). Esta etapa foi prolongada principalmente devido ao
ponto 4 que continha uma elevada quantidade de água, por ser composta por sedimentos finos.
Para a crivagem das amostras foram selecionados 4 crivos de malhas 2mm, 1mm, 0,5mm
e 0,063mm (figura 20), considerados representativos das
principais frações de sedimento: > 2mm, cascalho; entre 1 e
2 mm, areia muito grossa; entre 0,5 e 1 mm, areia grossa;
entre 0,063 e 0,5 mm, areia média a fina; < 0,063, areia
muito finas, silte e argilas (Guy, 1969). Após a crivagem
determinou-se o peso seco de cada fração retida em cada
um dos crivos, e a sua proporção relativa na amostra total,
pesada antes da separação, foi determinada.
2.3. Amostragem da comunidade de macroinvertebrados
As saídas de campo para amostragem da comunidade de macroinvertebrados foram
programadas de acordo com as estações do ano – Outono/Inverno e Primavera/Verão – tendo em
conta as diferentes fases do ciclo de vida dos organismos
(macroinvertebrados) e as alterações sazonais na qualidade da
água, dependentes de outros fatores que não apenas as
descargas do efluente de mina, nomeadamente a variação das
condições climatéricas e dos regimes hidrológicos. No entanto,
foram realizadas duas campanhas de amostragem (Primavera e
Verão de 2013) de forma a obter dados preliminares da
avaliação da qualidade da água.
Os organismos foram recolhidos em cinco pontos (figura 16), tendo em vista os objetivos
do estudo – monitorização de investigação. Assim, os pontos foram numerados de montante para
jusantes, sendo o ponto mais a montante considerado um ponto de referência – por se localizar a
montante da barragem de Valinhos, atualmente já recuperada, e, portanto, a montante da área
mineira.
Os macroinvertebrados aquáticos (> 1 mm) foram recolhidos, em cada um dos pontos de
amostragem, com uma rede de malha de 500 µm, arrastada no sentido oposto à corrente ao longo
Figura 18. Crivos e tabuleiro usados na
análise granulométrica.
Figura 19. Amostragem de macroinvertebrados,
ribeira da Pantanha. Primavera 2014.
30
de 1 metro (figura 19). Os organismos foram acondicionados em caixas de plástico, com
sedimento e água em quantidade suficiente para não haver limitações de oxigénio dissolvido
durante o transporte até ao laboratório. Já no laboratório, as amostras foram fixadas com álcool
absoluto e posteriormente processadas para triagem dos organismos.
2.3.1. Avaliação Biológica da Qualidade da Água
Antes da triagem, as amostras recolhidas no campo para análise da
comunidade de macroinvertebrados foram colocadas num conjunto de crivos,
sendo o menor de 0,5 mm e o maior de 2 mm, e posteriormente lavadas
cuidadosamente em água corrente para retirar o agente fixador e o sedimento
fino, de modo a facilitar a triagem dos organismos. A triagem foi feita em
tabuleiros brancos com alguma água, recolhendo os organismos a olho nu com
a ajuda de uma pinça para frascos com etanol a 70% onde ficaram
preservados (INAG, 2008). A identificação dos organismos foi feita
posteriormente recorrendo-se a uma lupa binocular (Zeiss Stemi DV4, 32x) e a
guias de identificação (Tachet et al., 2000; Serra et al., 2009) (INAG, 2008).
Posteriormente procedeu-se à contagem dos indivíduos por unidade
sistemática, nomeadamente- família para as ordens: Oligochaeta, Coleoptera e
Diptera; género para as ordens: Plecoptera, Ephemeroptera e Odonata.
Após a identificação e contagem dos organismos presentes nas
amostras recolhidas em cada ponto de amostragem, procedeu-se ao cálculo da
riqueza específica, dos índices de diversidade de Shannon-Wiener (anexo I) e
de equitabilidade de Pielou (anexo II), dos índices bióticos e da percentagem
de EPT (Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera), de Oligochaeta e de Chironomidae. Em
Portugal, os índices mais utilizados são o Índice Biótico Belga (IBB) (De Pauw e Vanhooren, 1983)
(anexo III) e o índice Iberian Biological Monitoring Working Party (IBMWP) (Alba-Tercedor e
Sanchéz-Ortega, 1988) (anexo VI), adaptado a partir do índice Biological Monitoring Working Party
(BMWP), aplicável às ilhas britânicas, para a Península Ibérica.
2.4. Ensaio dos efeitos genotóxicos em Daphnia magna
2.4.1 Exposição de Daphnia magna
Os cladóceros da espécie D. magna utilizados no ensaio que se passa a descrever foram
provenientes de uma cultura mantida em laboratório, na Faculdade de Ciências da Universidade
do Porto, numa câmara termostática Liebherr TS 606/3-1 WTW®, em condições de temperatura e
Figura 20. Crivos para lavagem das amostras de macroinvertebrados.
Figura 21. Lupa binocular.
31
fotoperíodo constantes (20±2 ºC; 16hL:8hE). As culturas são realizadas em
meio ASTM – que corresponde a um meio de água doce artificial utilizado em
ensaios de toxicidade padronizado (ASTM, 1980), como exemplificado na
figura 22. Sendo um meio de elevada dureza e pobre em oligoelementos,
exige a adição de suplementos orgânicos, que neste caso consiste num
extrato de alga marinha Ascophillum nodosum (Algea Fert Solid, Norway), de
absorvância ajustada para 0,62 num comprimento de onda de 400nm. As
culturas são alimentadas R. subcapitata (3x105 cel/ml), diariamente, sendo o
meio renovado a cada dois dias. Os organismos usados neste ensaio nasceram entre a 3ª e a 5ª
ninhadas e tinham menos de 24h no início da exposição.
No ensaio, os organismos foram expostos a meio ASTM e às amostras de água da ribeira
da Pantanha, recolhidas em cada um dos cinco pontos de amostragem atrás referidos (figura 16),
sem qualquer diluição. Foram feitas 4 réplicas para cada amostra e para o CTL, nas quais foram
expostos 15 neonatos num volume de 50mL, por réplica, o que corresponde a um volume mínimo
> 2 mL/organismo. A exposição decorreu durante 24h, e durante o ensaio os organismos não
foram alimentados, nem receberam qualquer aditivo orgânico. Após este período de exposição, os
organismos de cada réplica foram colocados em eppendorfs, em 800 µL de solução de tampão
PBS (1x) + EDTA 20 mM + 10% DMSO, e posteriormente preservados no gelo.
2.5.2. Ensaio Cometa
Todos os processos realizados devem ser executados de forma cuidadosa, para manter ao
máximo a integridade do ADN, para que os danos visualizados sejam apenas resultado do agente
agressor e não da nossa intervenção (Collins, 2004). A metodologia usada foi descrita por Park e
Choi (2007).
Os organismos foram inicialmente macerados com um pistão, suavemente, de forma a
libertar as células causando os menores danos possíveis. Seguiu-se uma centrifugação a 200 rfc
(força centrifuga máxima) durante 10 minutos, após a qual se retirou parte do sobrenadante de
modo a concentrar as células. A aliquota foi ressuspendida e removeram-se, com uma
micropipeta, 10 µL para um eppendorf com agarose low melting point (0,5%) a 37ºC, de onde se
retiram então 150 µL para dispor ao longo da lâmina, previamente coberta de agarose normal
melting point (1%), cobrindo finalmente com a lamela.
A lise celular foi feita com as células já embebidas na agarose para que permaneçam
imóveis, com detergente rico em sais, para a remoção do citoplasma e das histonas (proteínas
nucleares) e rompimento dos nucleossomas, enquanto o ADN se mantém superenrolado no
nucleóide (Angelis et al., 1999; Collins, 2004; Collins et al., 2008). A solução de lise é ajustada
para pH 10 e a placa deve ser mantida no escuro, num período mínimo de 1 hora.
A solução tampão de eletroforese contém Na2EDTA 20 mM, NaOH 10 M e água destilada
Figura 22. Frasco de cultura de Dapnhia
magna.
32
(4ºC), onde as lâminas foram colocadas por 15 minutos antes de correr a eletroforese (43V,
300mA, 10 min), etapa essencial para a desnaturação do ADN e separação das duas cadeias.
Deve-se acrescentar ainda brancos para completar filas na tina, se for o caso. Após neutralização
com tampão Tris-HCl (pH = 7,5; 4ºC), o gel pode ser armazenado (indefinidamente), o que facilita
a visualização dos cometas, uma vez que se encontram todos no mesmo plano – evita
sobreposição (Collins, 2004).
O ADN foi visualizado ao microscópio de fluorescência após coloração com corante
específico, brometo de etídio. A classificação é dividida em 5 classes, consoante a intensidade da
cauda – o parâmetro mais fiável para medir as quebras no ADN, ao discriminá-los pela gama mais
vasta possível (virtualmente do 0 ao 100%); o tamanho da cauda não indica corretamente os
níveis de danos e o momento da cauda não tem uma relação linear com os danos nem reflete a
aparência do cometa (Collins, 2004). Considera-se a classe 0 quando o cometa não apresenta
cauda e progressivamente até à classe 4, em que quase todo o ADN está na cauda, e conta-se,
por lâmina, 100 cometas (escala de 0 – 400) selecionados de forma aleatória, imparcial e
representativa de todo a lâmina, evitando cantos, bolhas de ar e cometas sobrepostos, tendo em
conta que a rejeição de muitos destes elementos leva à inclinação para moléculas sem danos
(Collins, 2004; Collins e Horváthová, 2001). A inspeção visual deve ser feita sempre pelo mesmo
operador para diminuir o erro e a variação dos resultados (Collins e Horváthová, 2001).
Para análise estatística dos valores obtidos na visualização de 100 células por cada
réplica, calculou-se uma média para cada ponto e para o controlo, que corresponde à soma da
cotação de 100 células. Através do programa STATISTICA, realizou-se uma ANOVA univariada de
forma a calcular diferenças entre os níveis de danos em cada ponto. Através do teste de
comparação de Dunnett, verificou-se a origem das diferenças entre os grupos expostos e o
controlo negativo, com uma significância de 0,05 (Collins, 2004).
Figura 23. Fotografias dos diferentes tipos de cometas, do 0 ao 4, da esquerda para a direita.
34
3. Resultados e Discussão
3.1. Análise Granulométrica do Sedimento
A figura 24 mostra a representação gráfica da percentagem de cada fração granulométrica
de sedimento existente nos diferentes pontos de amostragem. Como é possível verificar, registou-
se uma distribuição semelhante entre os diferentes locais amostrados exceto no ponto 4, onde
predominaram frações mais finas. Isto talvez se deva às características morfológicas da ribeira,
pois o ponto 4 corresponde a uma zona de afunilamento do curso de água, o que faz com que a
velocidade da corrente se faça sentir de modo mais pronunciado e, assim, que as partículas
maiores sejam transportadas. Essa fração mais grosseira parece ser posteriormente depositada
ao longo do curso, o que contribuiu para que no ponto 5 se tenha registado uma percentagem de
cerca de 70% de cascalhos e ser o ponto onde se registou menor percentagem de areias, siltes e
argilas.
Os metais pesados tendem a estar presentes em concentrações elevadas nas frações
mais finas (< 63 μm), ricas em argila e silte, com as quais têm grande afinidade (Moore et al.,
1989; Singh et al., 1999). Fenómenos de sorção, coprecipitação e complexação entre os metais e
a superfície destas partículas são também consideráveis, pois quanto menores, maior será a
razão área superficial: volume (Moore et al., 1989; Singh et al., 1999). Contudo, as análises de
metais do sedimento ainda não estão disponíveis para que se possa estabelecer a relação entre
as concentrações de metais e a granulometria do sedimento da ribeira.
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
1 2 3 4 5
pe
rce
nta
ge
m d
a fra
çã
o
ponto de amostragem
Frações Granulométricas
Areia muito fina, silte e argilas
Areia média a fina
Areia grossa
Areia muito grossa
Cascalho
Figura 24. Representação gráfica da análise granulométrica dos sedimentos da Ribeira da Pantanha, em percentagem relativa de cada fração, com base em amostras recolhidas na primavera de 2014.
35
Tabela 2. Resultados dos parâmetros físico-químcos da água avaliados in situ nos cinco pontos de amostragem selecionadosna Ribeira da Pantanha, com base em amostras recolhidas na primavera de 2014.
3.2. Avaliação físico-química das amostras de água
Em relação aos parâmetros físico-químicos analisados in situ, representados na tabela 2,
registou-se um aumento da temperatura, da salinidade, da condutividade, dos sólidos totais
dissolvidos e do potencial de oxidação/redução, entre os pontos localizados antes e depois da
descarga de efluente da mina. Por oposição, o nível de oxigénio dissolvido diminuiu e o pH não
apresentou um padrão linear, ainda que o valor mais baixo tenha sido registado no ponto
imediatoamente a jusante da descarga.
Assim, nas condições descritas e em zonas de concentrações de U elevadas (> 200 μg/L),
as espécies dominantes deverão ser hidróxidos e carbonatos de uranilo, como (UO2)3(OH)5
+ e
(UO2)2(OH)
3CO
3 (Markich, 2002).
3.3. Análise de Radionuclídeos nas amostras de água
Como se pode observar na tabela 3, registou-se uma tendência de aumento nas
concentrações dos isótopos de urânio (U234, U235 e U238) e de tório Th230, a jusante no ponto de
descarga do efluente, enquanto os valores registados para estes radionuclídeos apresentaram
valores reduzidos – mas não nulos – a montante da área mineira. A jusante do ponto de descarga
do efluente os níveis aumentaram, mas diminuíram no ponto mais a jusante de todos, em Caldas
de Felgueiras, antes da confluência com o Rio Mondego. Por outro lado, os radionuclídeos de
Th232, Ra226 e Po210, apresentaram uma distribuição algo inesperada, na medida em que o primeiro
surgiu num valor mais elevado no ponto de referência e o rádio e o polónio apresentam o seu
valor mais elevado no local de amostragem mais distante da mina (não se tivermos em conta o
ponto de Caldas de Felgueiras). É ainda de notar que o chumbo (Pb210) não está presente na
área, ou está a valores inferiores aos que os métodos permitem detetar. Todos estes isótopos
Ponto 1 2 3 4 5
Temperatura (ºC) 11,91 13,04 17,64 17,94 18,27
%OD > 100 86,4 81,9 75,4 73,7
OD (ppm) 8,67 7,53 6,89 6,76
pH 6,02 7,12 5,59 6,04 5,81
Salinidade 0,04 0,04 0,33 0,33 0,33
Condutividade (μ/cm) 91 96 682 616 670
Condutividade (μS/cm2) 79 74 582 533 574
TDS (ppm) 46 48 336 309 336
Potencial de Oxidação -197,4 -201,3
36
analisados apresentam longos períodos de semi-vida, o que significa que os níveis detetados
resultam de descargas cumulativas na ribeira.
É fundamental reforçar que, aquando da confluência com o Rio Mondego, os valores são
ainda bastante elevados, o que pode contribuir para os riscos ambientais e de saúde pública.
Comparando com resultados obtidos anteriormente, às obras de remediação da mina da
Urgeiriça (Falcão et al., 2005), as concentrações destes radionuclídeos diminuíram cerca de 10
vezes, ainda que no ponto 1 se encontrem ligeiramente mais elevadas.
A atividade dos radionuclídeos nos sedimentos (a aguardar resultados) deverá ser mais
elevada, tendo sido reportados valores de 9118 Bq/Kg (peso seco) em 2010, a jusante do ponto
de descarga do efluente da mina na ribeira da Pantanha (Carvalho et al. 2014b). Ou seja, apesar
da remediação realizada evidenciar melhorias no que toca à presença de radionuclídeos na água,
estes persistem nos sedimentos (Carvalho et al. 2014b) e podem afectar a comunidade biótica,
nomeadamente de macroinvertebrados.
3.4. Avaliação da Qualidade Biológica da Água
Na totalidade dos pontos de amostragem foram identificados 89 organismos distribuídos
pelas ordens Diptera, Oligochaeta, Plecoptera, Coleoptera e Ephemeroptera, referidas por ordem
decrescente de abundância. No ponto 1, local de referência, registou-se o maior nível de
abundância (34 indivíduos), com um maior número de organismos sensíveis do que qualquer
outro local. Este foi o único ponto onde se registaram efemerópteros, porém, com menor riqueza
específica (3) que nos outros pontos. Por sua vez, o ponto 2 apresentou uma maior diversidade de
famílias, ainda que com menos indivíduos, num total igual ao ponto 5 (24 indivíduos). Nos pontos
3 e 4 foram detetados apenas 2 organismos de taxa diferentes, o que demonstra o impacto da
mina uma vez que estes locais se localizavam imediatamente após a zona de descarga, ainda que
no ponto 5, mais a jusante, tenham aparecido já alguns organismos, mas sobretudo indicadores
de má qualidade biológica.
Tabela 3. Resultados da radioatividade em solução (mBq/L ± d.p.) na água da Ribeira da Pantanha, pontos 1, 3 e 5 e em Caldas de Felgueiras, com base em amostras recolhidas na primavera de 2014. (n.d.: não detetado ou abaixo do limite de deteção).
Radioactividade em solução (mBq/L ± d.p)
Local de amostragem
Ponto 1 n.d
Ponto 3 n.d
Ponto 5 n.d
Caldas de Felgueiras n.d
238U 235U 234U 230Th 226Ra 210Pb 210Po 232Th
63,8 ± 1,6 3 ± 0,2 65 ± 1,6 0,95 ± 0,14 31,7 ± 3,0 7,5 ± 0,4 1,13 ± 0,05
1230 ± 56 58,3 ± 3,5 1232 ± 56 1,6 ± 0,1 35,5 ± 1,8 6,1 ± 0,3 0,07 ± 0,03
1145 ± 32 51,7 ± 1,8 1144 ± 32 3,2 ± 3,2 86,6 ± 8,0 10 ± 0,5 0,23 ± 0,07
406 ± 15 18,5 ± 0,9 407 ± 15 1,6 ± 0,2 35,5 ± 2,3 7,7 ± 0,4 0,19 ± 0,07
37
0
5
10
15
20
25
30
IBMWP ASPT IBMWP ASPT IBMWP ASPT
Primavera/Verão 2013 Outono/Inverno 2013 Primavera/Verão 2014
IBMWP e ASPT
Ponto 1
Ponto 2
Ponto 3
Ponto 4
Ponto 5
3.4.1. Índices Bióticos e de Diversidade
No que refere aos índices bióticos e de diversidade não foi possível chegar a qualquer
resultado para os pontos 3 e 4, tendo em conta que para os dois taxa presentes em cada um
destes locais havia apenas um indivíduo. Entre o ponto 1 e 2 não se verificaram diferenças
relevantes nos índices bióticos – enquanto o ponto 2 apresentou resultados ligeiramente
superiores para os índices IBMWP e para o IBB, o ponto 1 apresentou um valor mais elevado no
índice ASPT, o que evidencia a maior cotação dos taxa presentes, confirmado pela elevada
percentagem de EPT (61,8%) e pela ausência de Oligochaeta (figuras 25, 26, 27). O ponto 5
demonstrou estar afetado pelas descargas de efluente, ainda que de forma menos pronunciada
que os dois locais que o antecedem, sendo caracterizado essencialmente pela presença de
Oligochaeta (90%) (figura 27).
Loayza-Muro et al. (2010) verificou igualmente uma % EPT elevada nos locais de
referência, que variou entre os 32 e os 67%, estando ausentes dos locais contaminados por
metais, onde predominavam Chironomidae e Coleoptera. Courtney e Clements (2002) verificaram
uma variação na presença de efemerópteros segundo o gradiente de contaminação (maior quanto
mais a jusante da fonte de contaminação).
É ainda importante referir que foram realizadas campanhas de amostragem no ano de
2013 para obtenção de resultados preliminares. Comparando com os resultados aqui descritos,
verificou-se uma diminuição drástica da abundância de organismos (na primavera de 2013 foram
identificados 5429, dos quais mais de metade eram Chironomidae) e houve também perda de
diversidade, nomeadamente de organismos das ordens Odonata e Coleoptera (fig. 28).
Figura 25. Representação gráfica dos resultados dos índices bióticos IBMWP e ASPT para as três estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
38
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
IBB IBB IBB
Primavera/Verão 2013 Outono/Inverno 2013 Primavera/Verão 2014
IBB
Ponto 1
Ponto 2
Ponto 3
Ponto 4
Ponto 5
No entanto, ao nível da avaliação da qualidade segundo os índices, as diferenças não
foram marcantes, pois a zona era fortemente dominada por espécies tolerantes e em todas as
estações só se encontraram famílias sensíveis nos pontos a montante da fonte de contaminação
(pontos 1 e 2) (figuras 25, 26, 27).
As diferenças entre os resultados podem ser consequência da degradação da zona, devido
às obras de integração paisagística da escombreira da mina, provocando a deposição de areias e
terra no leito da ribeira, ou mesmo do efeito de descargas pontuais antes da amostragem de 2014,
pois verificaram-se sinais de deposições metálicas na zona de interceção com a ribeira. É também
fundamental referir que o ano foi atípico, do ponto de vista climático, com precipitações frequentes
e abundantes e temperaturas mínimas baixas, durante todo o período de primavera, o que pode
ter perturbado o ciclo de vida normal dos macroinvertebrados. Por outro lado, no verão, as
Figura 27. Representação gráfica dos resultados da abundância em EPT (Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera), em Oligochaeta e em Chironomidae, dada pela percentagem, para as três estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
Figura 26. Representação gráfica dos resultados do índice biótico IBB para as três estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
39
elevadas temperaturas máximas levaram a que o caudal do rio diminuísse imenso, havendo
mesmo locais secos, onde não se encontraram organismos.
A conjugação dos resultados dos parâmetros físico químicos da água com os índices
biológicos permitiram desenhar um gradiente de perturbação resultante das descargas do efluente
da mina, na medida em que as comunidades de macroinvertebrados dos pontos a jusante
demonstraram um melhor estado da água, havendo também já alguma recuperação no último
local de amostragem. Como tal, ao analisarmos as classes de qualidade da água segundo o IBB,
podemos constatar que os pontos 1 e 2 correspondem à classe II – água ligeiramente poluída
(verde); os pontos 3, 4 e 5 à classe V - água fortemente poluída (vermelho). No entanto, estas
diferenças não são tão evidentes se examinarmos os resultados segundo o IBMWP: os pontos 3,
4 e 5 pertencem igualmente ao pior nível de qualidade – água extremamente contaminada
(vermelho) – enquanto os pontos 1 e 2 surgem seguidamente na classificação anterior – água
muito contaminada (laranja) (tabela 4).
0
2
4
6
8
10
12
S H' E S H' E S H' E
Primavera/Verão 2013 Outono/Inverno 2013 Primavera/Verão 2014
Riqueza específica (S), Diversidade de Shannon (H') e Equitabilidade (E)
Ponto 1
Ponto 2
Ponto 3
Ponto 4
Ponto 5
Figura 28. Representação gráfica dos resultados da riqueza específica (S), do índice de diversidade de Shannon (H') e do índice de equitabilidade (E), para as três estações de amostragem na Ribeira da Pantanha (o ponto 4 não foi amostrado na primeira estação; o ponto 1 só foi amostrado na última estação).
Tabela 4. Representação dos resultados dos índices bióticos IBMWP e IBB e da consequente classificação da qualidade da água, nos cinco pontos amostrados na primavera de 2014.
IBMWP Cor IBB Classe/Cor
Ponto 1 22 Laranja 7 II / Verde
Ponto 2 25 Laranja 8 II / Verde
Ponto 3 0 Vermelho 0 V / Vermelho
Ponto 4 0 Vermelho 0 V / Vermelho
Ponto 5 3 Vermelho 2 V / Vermelho
40
3.5. Ensaio Cometa com D. magna
Após a exposição de 24h às amostras de água recolhidas nos diferentes pontos de
amostragem definidos na Ribeira da Pantanha, registou-se mortalidade nas amostras
correspondentes aos pontos 3, 4 e 5, a qual atingiu 10,0% (± 11,5), 31,7% (± 16,7) e 11,7% (± 10).
Os organismos sobreviventes encontravam-se essencialmente à superfície da água, enquanto nos
restantes efluentes nadavam normalmente.
A figura 29 representa a
cotação média dos cometas
formados para cada ponto e
para o controlo. Com base na
ANOVA, detetaram-se
diferenças significativas entre
as cotações (p = 0,000007; F =
14,18), com 19 graus de
liberdade para o erro em 24
totais, embora isso não se
tenha verificado no que toca à
comparação entre os diferentes
tipos de cometas (Figura 29).
Os efeitos genotóxicos do
urânio em neonatos de dáfnias
estão já comprovados,
nomeadamente por Plaire et al., 2013, mesmo em concentrações baixas, sendo esta menos
pronunciada em exposição pós-eclosão.
Para discernir a origem de tais diferenças, realizou-se um teste de comparação, Dunnett,
comparando os resultados de cada ponto com o controlo (Post Hoc: M> CTL). Este teste, cujos
valores de p estão representados na tabela 5, permitiu constatar que todos os pontos exceto o
ponto 1, de referência, são significativamente diferentes do controlo (p < 0,05) (figura 29).
O ponto 3 foi o local onde se verificaram mais danos genotóxicos e também valores mais
elevados de atividade dos três isótopos de urânio avaliados. O ponto 5 apresenta valores um
pouco mais baixo de urânio mas mais elevados de Ra226, Po210 e Th230 e, de entre os locais
significativamente diferentes do controlo negativo, é o que apresenta cotações dos cometas mais
baixas. Se tivermos ainda em conta que no ponto 1 a radioatividade em solução do urânio é ainda
menor, assim como os danos detetados no ADN (não significativos), podemos inferir que este
elemento terá tido um papel importante nos efeitos genotóxicos observados, que terão estado
associados à emissão de partículas α, bem como à presença de outros metais, mesmo não
radioativos.
Figura 29. Representação gráfica dos resultados do ensaio cometa em Daphnia magna exposta a água da Ribeira da Pantanha nos cinco pontos de amostragem e no controlo negativo. As barras indicam o desvio padrão. Diferenças significativas destacadas com *.
41
0
10
20
30
40
50
60
70
comets de valor 1 comets de valor 2 comets de valor 3 comets de valor 4
Pe
rce
nta
ge
m
Percentagem de Cada Tipo de Cometa
CTL
Ponto 1
Ponto 2
Ponto 3
Ponto 4
Ponto 5
É de notar que a mortalidade observada evidencia a toxicidade do efluente e impede que
os radionuclídeos se possam acumular nos organismos e ter efeitos sub-letais. Daí que o ponto 3
seja o local com mais danos apesar da menor mortalidade.
A exposição de dáfnias às próprias drenagens ácidas de mina (DAM) aumenta a
ocorrência de danos genotóxicos, tendo-se verificado um aumento no momento da cauda dos
cometas com o aumento da concentração em DAM no meio de exposição, num estudo realizado
como objetivo de avaliar os efeitos tóxicos e genotóxicos de DAM (Radic et al., 2014).
As dáfnias, como organismos filtradores, parecem ser mais suscetíveis a exposições de
metais na fase dissolvida e nas partículas. Por este motivo, Ternje et al. (2009) procuraram
igualmente avaliar o potencial do ensaio cometa como uma ferramenta de biomonitorização para
comunidades planctónicas expostas a efluentes ricos em alumínio e detetaram cometas de valor
mais elevados nestes organismos do que em crustáceos planctónicos verdadeiramente
Tabela 5. Resultados estatísticos do teste de Dunnett, demonstrando os valores de p para cada ponto, contra o controlo negativo.
Figura 30. Representação gráfica da distribuição da percentagem de cada tipo de cometa nos diferentes pontos de amostragem e no controlo negativo.
42
herbívoros, como Calanoida.
Os resultados obtidos indicam que, realmente, a ribeira da Pantanha apresenta risco de
exposição genotóxica, o qual resulta de descargas do efluente ainda que tratado, ou então do
possível aporte de metais e de radionuclídeos acumulados no sedimento, para a coluna de água.
Os níveis de radionuclídeos detetados são suficientes para provocar efeitos genotóxicos, após
curtas exposições, e serão certamente responsáveis pela reduzida abundância e diversidade de
macroinvertebrados no sedimento, a jusante do ponto de descarga, o que testemunha a má
qualidade da água desta ribeira, mesmo após as obras de remediação. É assim expectável que os
organismos presentes há imensas gerações neste local apresentem uma degradação geral do
material genético, o que poderá contribuir para a degradação das comunidades bióticas que
usufruem deste sistema aquático.
3.6. Considerações Finais
Os resultados obtidos demonstram o risco ecológico da drenagem das águas da estação
de tratamento da escombreira da mina da Urgeiriça na ribeira da Pantanha, revelando que as
medidas tomadas na sua remediação não estão ainda a ser eficazes no que toca ao controlo da
qualidade da água, quer ao nível da presença de radionuclídeos, quer da degradação da fauna de
macroinevertebrados. Isto traduz-se numa água extremamente contaminada (IBMWP) após o
ponto de drenagem para a ribeira.
De facto, conclui-se que estas descargas, ainda que pontuais, ou as descargas efetuadas
no passado, são responsáveis pela degradação da ribeira da Pantanha, nomeadamente pela
morte dos macroinvertebrados, representada pelos resultados dos índices de diversidade e
índices bióticos calculados. O ensaio com Daphnia magna permitiu avaliar a exposição aguda a
organismos da coluna de água, sujeitos ao efeito de descargas pontuais. Este bioindicador
demonstrou efeitos genotóxicos em 24 h, pelo que são esperados danos nas populações locais
de macroinvertebrados, onde gerações foram já expostas cronicamente. O ensaio cometa
revelou-se assim uma ferramenta passível de ser incorporada na avaliação da qualidade da água
segundo a DQA, em bacias sujeitas a efluentes industriais e mineiros, graças à sua sensibilidade
mesmo a exposições de curta duração.
Na mesma perspetiva, deverá avaliar-se a genotoxicidade dos sedimentos da ribeira, onde
os radionuclídeos permanecem acumulados a níveis superiores aos detetados na água. Esta
avaliação poderá ser feita através da exposição de Chironomus spp, usado frequentemente em
ensaio cometa. Uma análise multivariada poderia ser também interessante na perspectiva de
descrever os factores ambientais responsáveis pelas perturbações bióticas.
Tendo em conta que estamos perante uma região de exploração de urânio, onde se
verificaram efeitos não só ao nível da composição da comunidade de macroinvertebrados, mas
43
também ao nível do material genético deveriam estar definidos valores-limite, para solos, água e
seres vivos, na legislação portuguesa.
45
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%20Parte%20I.pdf
54
Anexo I Fórmula de cálculo do Índice de Diversidade de Shannon-Wiener
S – número total de espécies na comunidade.
pi – proporção de indivíduos da espécie i na comunidade.
Anexo II Fórmula de cálculo do Índice de Equitabilidade de Pielou
S – número total de espécies na comunidade.
pi – proporção de indivíduos da espécie i na comunidade.
H’ – índice de Shannon-Wiener.