Autoimunidade

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AUTOIMUNIDADE Doença autoimune Define-se como uma sequela patológica de uma resposta autoimune Esta resposta produz-se devido á rotura dos mecanismos de tolerância que permitem ao organismo descriminar entre o que lhe é e o que não lhe é próprio A resposta imunológica dirigida aos componentes próprios (auto-Ags) caracteriza-se pela presença de auto-Acs e de células T auto-reactivas Em termos práticos, a detecção de auto-Acs é relativa- mente fácil de realizar e, em associação com a clínica, constitui a base do diagnóstico das doenças autoimunes

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Doença autoimune

Define-se como uma sequela patológica de uma resposta autoimune

Esta resposta produz-se devido á rotura dos mecanismos de tolerância que permitem ao organismo descriminar entre o que lhe é e o que não lhe é próprio

A resposta imunológica dirigida aos componentes próprios (auto-Ags) caracteriza-se pela presença de auto-Acs e de células T auto-reactivas

Em termos práticos, a detecção de auto-Acs é relativa-mente fácil de realizar e, em associação com a clínica, constitui a base do diagnóstico das doenças autoimunes

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Doença autoimune

Mecanismos de rotura da tolerância

1. Activação policlonal de linfócitos B

2. Activação policlonal de linfócitos T

3. Mimetismo molecular

4. Exposição de Ag do “próprio”, normalmente indisponível

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Mecanismos de rotura da tolerância1. Activação policlonal de linfócitos BÉ possível que algumas doenças autoimunes, em que se

desconhece o auto-Ag, sejam devidas a respostas atípicas provocadas por infecções bacterianas lentas

Também os vírus podem dar-lhes origem por vários meca-nismos, como seja induzindo a produção de IFN-γ que, ao provocar a expressão de HLA-II nas células que habitualmente não o fazem, levam a uma auto-apre-sentação antigénica e activação policlonal dos linfócitos B anérgicos

É disso exemplo o LED, que pode ser inicialmente causado por uma infecção bacteriana, com subsequente activa-ção de muitas células B anérgicas e produção de Acs que reconhecem muitos Ags do “próprio”

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Mecanismos de rotura da tolerância2. Activação policlonal de linfócitos TÉ um processo pelo qual os linfócitos T são activadas por

acção de um activador policlonal, tal como um superan-tigénio

Superantigénios – são moléculas derivadas de bactérias e de outros agentes patogénicos que se ligam às molécu-las da classe II do MHC nas APC, mas em locais diferen-tes daqueles em que os Ag processados se ligam

Desta forma, os superantigénios são apresentados aos linfócitos T, na ausência do fenómeno de restrição, activando vários clones destas células

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Mecanismos de rotura da tolerância3. Mimetismo molecularO mimetismo molecular ocorre quando estruturas seme-

lhantes são partilhadas por moléculas diferentes, como sejam as sequências lineares de aminoácidos ou aspe-ctos conformacionais entre microorganismo e hospedei-ro

Quando um Ag estranho é muito semelhante a um Ag do “próprio” há uma possível reactividade cruzada

É disso exemplo o que se observa na febre reumática em que os Acs produzidos inicialmente contra os estrepto-cocos podem reagir contra moléculas que se expressem na superfície das células do coração, do que resulta a lesão cardíaca

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Mecanismos de rotura da tolerância 4. Exposição de Ag do “próprio”A lesão tissular directa ou a rotura por traumatismo ou

infecção das barreiras que protegem lugares privilegia-dos, fazem com que os Ags previamente resguardados se libertem ou fiquem expostos ao sistema imunitário que os entende como Ags estranhos

É disso exemplo o que se observa na esclerose múltipla em que a mielina, principal componente das células de Schwann e dos oligodendrócitos, fica exposta sempre que há lesão do nervo

Este, sujeito à acção dos Acs acaba por não se poder reparar e ao ficar sem protecção vai fazer uma con-dução anormal dos impulsos nervosos

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Doença autoimune

A associação de uma determinada doença autoimune com um auto-Ac em particular, está mais baseada na evi-dência estatística e epidemiológica do que com uma relação de causa-efeito

Os auto-Acs podem não ser a causa da doença e inclusive podem não contribuir para ela, mas podem ser marca-dores de diagnóstico muito úteis

A especificação antigénica de alguns auto-Acs contribui para a identificação de alguns subgrupos de doentes que diferem no prognóstico e na resposta à terapêutica

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Doenças autoimunes

Podem ser multissistémicas ou específicas de órgão e ao serem causadas por diferentes tipos de Ags, também são diversas as alterações imunológicas que se observam

Nas primeiras encontramos vários auto-Acs com especifica-ção contra moléculas nucleares ou citoplasmáticas e as manifestações de doença tanto decorrem da acção dire-cta desses auto-Acs como podem ser devidas à deposi-ção de imunocomplexos (IMC)

As segundas caracterizam-se pela presença de auto-Acs dirigidos, primariamente, contra um só órgão ou contra órgãos relacionados entre si

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Doenças autoimunes

Embora apresentem um espectro clínico muito amplo, todas possuem uma série de características comuns:

– Associação familiar, de carácter poligénico– Curso clínico subagudo– Preferência pelo sexo feminino– Pico de incidência na puberdade e por volta dos 40/50 anos– Manifestações clínicas sistémicas, mas não específicas de

órgão e manifestações clínicas próprias de órgão nas dele específicas

– Infiltração de células mononucleadas nos tecidos afectados– Associação com determinados Ags do sistema principal de

histocompatibilidade– Somatório, frequente, de várias doenças autoimunes numa

mesma pessoa

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Doenças autoimunes

Diagnóstico laboratorialMétodos para pesquisa de autoAcs:

– Imunoflorescência directa (IFD)– Imunoflorescência indirecta (IFI) – Contraimunoelecroforese (CIE)

– Imunoenzimoensaio (ELISA)– Radioimunoensaio (RIA)– Imunoblotting (Western-blot)

A pesquisa e titulação dos auto-anticorpos faz-se no soro

O título varia com o decurso e a evolução da doença, mas não é obrigatório haver uma correlação entre a variação do título e a actividade clínica da doença

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Imunofluorescência indirecta

É das técnicas de imunohistoquímica a mais usada porque permite a despistagem de vários auto-Acs em simultâneo e também a sua titulação

Nestes métodos, o substrato (Ag) é imobilizado numa fase sólida, geralmente uma lâmina, e incubado com o soro do doente

Após uma lavagem, os Acs do doente (geralmente IgG) ligados especificamente, são detectados utilizando AC anti-IgG

Um dos fluorocromos geralmente utilizado como conjugado é o isotiocianato de fluoresceína (FITC) que provoca uma fluorescência de cor verde-maçã

Com estas técnicas podem estabelecer-se padrões de fluo-rescência

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Técnicas de Imunofluorescência

Substratos usados:

• Células epiteliais humanas (Hep2)*• Células amnióticas humanas• Cortes de órgãos de rato e murganho

– Rim– Fígado– Estômago

• Esófago de macaco• Pâncreas de macaco• Rim de macaco

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Técnicas de Imunofluorescência

Células epiteliais humanas (HEp-2)• É o substrato mais comum e é uma linha celular que foi

originalmente isolada de um carcinoma da laringe• São cultivadas “in vitro” directamente nas lâminas• Características:

– Núcleo grande– Grandes e múltiplos nucléolos– Várias figuras mitóticas– Grande diversidade de Ag nucleares e citoplasmáticos– Uniformidade e homogeneidade da distribuição antigénica

de célula para célula– Alta sensibilidade e especificidade

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Técnicas de Imunofluorescência

Células epiteliais humanas (HEp-2)Padrões morfológicos observados:

• Homogéneo – fluorescência uniforme do núcleo inteiro, ou seja, não são detectadas estruturas individuais

• Nucleolar – cora o nucléolo intensamente• Nucleares – padrão homogéneo em concentração de

fluorescência na periferia nuclear• Mosqueado – cora em grãos finos, o núcleo ou o cito-

plasma• Centromérico – cora os pontos de contacto entre as

fibras e os cromossomas

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Evidência de núcleos e nucléolos em células HEp-2

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• Acs anti-nucleares (ANA)

São Acs inespecíficos de órgão já que os seus auto-Ags se encontram em todas as células nucleadas

Os ANAs denominam-se de acordo com:

– A sua localização celular (centrómero, nucleolar)– O seu padrão de fluorescência (mosqueado, homogéneo) – O nome do doente em que pela primeira vez foram encon-

trados (Sm, Ro, La, Jo-1)– Doenças que lhe estejam associadas (SSA, SSB)– A molécula contra a qual reajam (U1snRNP, ADN)

Há mais de 50 tipos de Acs dirigidos contra outras tantas estruturas moleculares do núcleo celular

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• ANA

(RNP, Sm, SSA, SSB, Scl70, Centrómero, Jo-1)Títulos elevados em doenças do tecido conjuntivo

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• Acs anti-ADN

São de 2 tipos:

1. Os que reagem com sequências específicas denucleótidos do ADN de cadeia simples ou ssADN

Encontram-se em:

– Pessoas normais– LED– Artrite reumatóide– Esclerodermia – Síndrome de Sjögren– Mononucleose infecciosa– Hepatite crónica activa– Cirrose biliar primária– Glomerulonefrite crónica

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• Acs anti-ADN

2. Os dirigidos contra o dsADN ou ADN nativo e também contra os ssADN

Os Acs anti-ADN (IgG) são marcadores biológicos do LED porque há uma razão directa entre a sua presença e a actividade clínica da doença e em que um aumento da concentração de Acs contra dsADN precede a recidiva para depois se reduzirem durante a exacerbação clínica

Por isso está indicada a monitorização a cada 6 semanas e suspeita-se de crise quando eles aumentam de 25% entre amostras

Quando o doente possui Acs IgM, tem menor risco para afecção renal e se forem IgA apresenta manifestações clínicas de vasculite, ↓C3, ↑VS, mas menos tendência para nefrite ou artrite

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• Acs anti-ribonucleoproteínasTambém se designam de ENAs (Extractable nuclear antigens)

As partículas de ribonucleoproteínas são compostas por uma ou mais moléculas de RNA que se associam com uma ou mais proteínas

Do total de ribonucleoproteínas destacam-se 3 grupos:

(scRNP) - Ribonucleoproteínas citoplasmáticas de pequeno tamanho, que incluem os RNA transcritos pela RNA polimerase III

(snRNP) - Ribonucleoproteínas nucleares de pequeno tamanho, que incluem os RNA transcritos pela RNA polimerase II

(snoRNP) - Ribonucleoproteínas nucleolares de pequeno tamanho, que incluem os RNA transcritos pela RNA polimerase I

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1. Ac anti-Ro/SSAO autoAg (Ro/SSA) é uma scRNP que contém pequenas

moléculas de RNA ricas em uridina (hYRNA) e uma só proteína de 52, 54 ou 60KD, para quem a antigenici-dade é mais dirigida

Encontram-se em:• 70-90% de Síndrome de Sjögren primário• 40-60% de LED• 70-90% de lúpus cutâneo subagudo• > 90% de crianças com lúpus neonatal• E % discretas em:

– Artrite reumatóide– Esclerose sistémica– Polimiosite– Cirrose biliar primária

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2. Ac anti-La/SSBO autoAg (La/SSB), predominantemente nuclear, é uma

fosfoproteína que se une a pequenos RNA transcritos pela RNA polimerase III, de entre os quais os RNA citoplasmáticos (hYRNA) da ribonucleoproteína Ro

Isto deve explicar a frequente coexistência de anti-Ro/SSA e anti-La/SSB no mesmo doente, como acontece em mais de 95% das mães com filhos que desenvolvem lúpus neonatal

Encontram-se em:

• 90% de SS primário• 50% de SS secundário• 6-15% de LED, associado a uma menor prevalência de

afecção renal

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3. Ac anti-UsnRNP

As partículas de ribonucleoproteína de pequeno tamanho ricas em uracilo (UsnRNP) são formadas por polipépti-dos e moléculas de RNA de pequeno tamanho com ura-cilo abundante (UsnRNA) transcritas, em geral, pela RNA polimerase II

Estão descritas mais de 10 UsnRNP, de que a U1snRNP e a U2snRNP são as que clinicamente mais importam

Os Acs que se desenvolvem contra U1snRNP designam-se simplesmente por Anti-RNP, são IgG do subtipo IgG1, e podem penetrar nas células vivas e alcançar o núcleo onde causam apoptose

Os Acs que se dirigem contra o núcleo proteico comum são incluídos no termo Acs Anti-Sm

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3. Ac anti-UsnRNP

• Acs anti-Sm associam-se aos anti-RNP e encontram-se em:

- 30% de LED, como critério de diagnóstico

• A presença isolada de anti-RNP em concentrações ele-vadas identificam com:

– DMTC (doença mista do tecido conjuntivo) que apresenta fenómeno de Raynaud, edema das mãos, esclerodactilia, sinovites, miosites, doença pulmonar e hipomotilidade esofágica

– 30-40% de LED, que cursa com fenómenos de Raynaud e doença pulmonar intersticial e menos glomerulonefrite

• A presença de Acs antiU2snRNP encontra-se em:

– 15% de doentes com MCTD– E frequência idêntica em doentes LED

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• Ac anti-topoisomerase I

O auto-Ag é a enzima nuclear topoisomerase-I (topo I) quefacilita a replicação do ADN e de que resulta o Ac Scl-70

São fundamentalmente das classes IgG e IgA e encontram-se em 20-40% de doentes com esclerodermia difusa

São marcadores de doença e diversos estudos têm apontado para uma elevada incidência de cancro na sua presença

A sua associação com DRB1*11, é um factor de risco para o desenvolvimento de fibrose pulmonar nestes doentes

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• Acs anti-centrómero (ACA)Os principais auto-Ags centroméricos são as proteínas:

– Cenp-A– Cenp-B*– Cenp-C, contra os quais se produzem os ACA,

principalmente da classe IgG, subtipo IgG1

A IFI é fundamental para a sua detecção uma vez que apresenta padrão típico de células em divisão

Encontram-se em:

- Síndrome de CREST- Esclerose cutânea limitada, com melhor prognóstico do

que a forma difusa de esclerodermia em que a sua pre-sença é mais rara

Quase todos os doentes com ACA têm fenómeno de Raynaud

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• Acs anti-centrómero

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• Ac anti-Jo1

Inclui-se nos ANAs uma vez que o Ag é um ENA, uma RNA sintetase

Para a sua detecção são necessárias técnicas sensíveis, já que a expressão de Ag é baixa

Encontra-se exclusivamente em doentes com miosite, pelo que é marcador de diagnóstico

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• Ac anti-PCNA(Proliferating cell nuclear antigen)

O auto-Ag é uma proteína auxiliar, a ADN polimerase γ

Embora com um padrão IFI característico a sua identifi-cação exacta tem de ser feita por outras técnicas uma vez que é marcador e diagnóstico do LED

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• Acs anti-nucleolares

Inclui um grupo heterogéneo de auto-Acs que se desenvol-vem perante os principais AutoAgs:

– RNA polimerases I, II e III - participam na transcrição do DNA

– Fibrilarina - intervém no processamento do RNA transcrito pela RNA polimerase I

– Proteína Th (To) - faz parte de uma ribonucleoproteína nucleolar

– Pm/Scl - presente na região granular do nucléolo tem função desconhecida

Surgem especialmente em doentes com esclerodermia/ esclerose sistémica e em IFI ao produzirem 3 padrões diferentes, podem definir 3 subgrupos de doentes

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• Acs contra estruturas do citoplasma

– Acs anti-citoplasma dos neutrófilos (ANCA)

– Acs anti-mitocôndria (AMA)

– Acs anti-músculo liso (ASMA)

– Acs anti-microssomas hepáticos e renais (LKM)

– Acs anti-ribossoma –Dirigidos contra a proteína P0, apresentam-se unicamente em do-

entes com LED, numa % de 5-10 e associando-se a uma maior incidência de afecção neurológica e hepática

– Acs anti-aparelho de GolgiEncontram-se em:

• LED, SS, AR e doenças infecciosas

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Evidência de citoplasma em células HEp-2

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• Acs anti-citoplasma de neutrófilos (ANCA)São um grupo muito heterogéneo de Auto-Acs, mais IgG e

menos IgA ou IgM, dirigidos contra várias proteínas dos grânulos citoplasmáticos dos monócitos e dos GNs, pelo que estão associados a patologias clinicamente muito di-ferentes, mas de que sobressaem as relacionadas com:

– Vasculites de pequenos vasos• Com gravidade e preferência pelo rim e pulmão

– Vasculites secundárias• Infecções, conectivopatias, ds malignas, ↓C, HTA

– Doenças inflamatórias intestinais• Colite ulcerosa, Doença de Crohn

– Hepatopatias autoimunes• Cirrose biliar primária, hepatites autoimunes tipo 1 e 2

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• ANCA

Os principais Auto-Ags são:

– Nos grânulos primários:• Proteinase 3 (PR3) → c-ANCA• Mieloperoxidase (MOP)* → p-ANCA*• Elastase*• Catepsina G*• Lisozima

– Nos grânulos secundários:• Lactoferrina*• lisozima

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• ANCA

Detectam-se por IFI sobre neutrófilos humanos fixados em etanol e/ou formol com o que se diminui a interferência dos ANA e se evidência a possível existência de padrão atípico, quando os a-ANCA estão presentes, como acon-tece em doenças intestinais inflamatórias

Métodos ELISA (imunoensaio em fase sólida) permitem a posterior identificação dos diferentes Auto-Ags especí-ficos

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c-ANCA (PR3)Exibem um padrão granular citoplasmático

Apresentam mais de 90% de especificidade para o dia-gnóstico da granulomatose de Wegener sendo que a sensibilidade dependerá da fase de actividade em que a doença se encontre

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p-ANCA (MOP)Exibem um padrão peri-nuclear

Associam-se às vasculites sistémicas e às glomerulonefri-tes necrosantes com aumentos nas fases activa e de pré-recidiva

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• Acs anti-mitocôndria (AMA)São frequentes, em títulos elevados, na cirrose biliar primá-

ria. Títulos mais baixos associam-se a outras doenças hepáticas

O principal auto-Ag é o componente E2 do complexo piru-vato-desidrogenase mitocondrial contra o qual se desen-volvem auto-Acs M2

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• Acs anti-músculo liso (ASMA)

Em associação com os ANA são marcadores serológicos de hepatite autoimune de tipo 1

São um grupo heterogéneo de auto-Acs contra Ags do cito-esqueleto das células do músculo liso

Títulos baixos podem encontram-se tanto na população normal como em infecções virais ou neoplasias

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• Acs anti-microssomas hepáticos e renais (LKM)(LKM – Liver Kidney microssomal)

Estes auto-Acs são dirigidos contra Ags do retículo endoplas-mático do hepatócito, que são na sua maioria proteínas da superfamília de enzimas do citocromo p450

Os Acs contra LKM-1, dirigidos contra o citocromo P450IID6, são marcadores da hepatite autoimune de tipo 2

Também podem surgir em cerca de 7% de doentes com hepatite crónica activa a Vírus C

Os Acs contra LKM-2, detectaram-se em doentes com hepa-tite induzida pelo ácido tienílico e os Acs contra LKM-3 estão presentes em 10-15% de doentes com hepatite Delta

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• Doenças autoimunes não específicas de órgão

– Lupus eritematoso disseminado – Síndrome de Sjögren– Esclerodermia– Poliartrite reumatóide– Sindroma de Sharp– Poliomiosite– Vasculites (microangiopatia e doença de Wegener)

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• Lupus eritematoso disseminado

Critérios de diagnóstico, revistos em 19821/11 – Eritema malar2/11 – Lúpus discóide3/11 – Fotossensibilidade4/11 – Úlceras orais ou nasofaríngeas, em regra

indolores5/11 – Artrites6/11 – Serosites7/11 – Afecção renal8/11 – Alterações neurológicas9/11 – Alterações hematológicas10/11 – Alterações imunológicas11/11 – ANAs

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AUTOIMUNIDADE• Lupus eritematoso disseminado

Painel de Auto-Acs contra:• dsADN e/ou Sm - manifestações renais e de órgãos• U1snRNP – fenómeno de Raynaud• Ro/SSA, La/SSB – fotossensibilidade, Síndrome de

Sjögren secundário, lúpus cutâneo subagudo e lúpus neonatal

• Centrómero e topoisomerase-I (Scl-70) – sintomas de esclerodermia

• Fosfolípidos (cardiolipina) e β2-glicoproteína I – mani-festações trombóticas e neurológicas

• rRNP – manifestações neurológicas• Histonas – lúpus induzido por fármacos

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• Síndrome de Sjögren

Critérios de diagnóstico• Sintomas oculares** – sensação de secura ocular de mais

de 3 meses de evolução, sensação recorrente de areia nos olhos e utilização frequente de lágrimas artificiais

• Sintomas bucais** - sensação de secura de boca com mais de 3 meses de evolução, tumefacção persistente ou remitente das maiores glândulas salivares ou abundante ingestão de líquidos às refeições

• Sinais oculares – objectivados por testes• Histopatologia – demonstração da presença de focos de

células mononucleadas no tecido das glândulas salivares• Afecção glandular salivar – demonstrada por cintigrafia,

sialografia ou fluxo salivar não estimulado

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• Síndrome de Sjögren

Painel de Auto-Acs contra:

• Ro/SSA• La/SSB• ANAs (≥ 1/320)• Factor reumatóide (≥ 1/320)

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• Acs específicos de órgãos

Muitas das doenças autoimunes caracterizam-se pela pre-sença de auto-Acs dirigidos contra determinados com-ponentes de órgãos e tecidos

Alguns são-no contra componentes do sistema endócrino:• glândulas tiroideia e paratiroideia• pâncreas• cápsulas SR• ovário • testículo

E outros reagem contra outros órgãos do corpo como:• tracto GI• sistema nervoso• pele • rim• fígado

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• Acs contra glândula tiroideiaOs principais são os que se dirigem contra:

1. Peroxidade tiroideia (TPO)*

2. Tiroglobulina (TG)– Tiroidite de Hashimoto*– Doença de Graves– Tiroidite subaguda– Tiroidite idiopática

3. Receptor de TSH (TSHR)– IgG inibidora de união à TSH

• Doença de Graves*• Tiroidite de Hashimoto• Hipotiroidismo idiopático

– IgG estimulante• Doença de Graves

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1. Acs anti-peroxidade tiroideia (TPO)

– A TPO é a principal enzima de síntese das hormonas tiroideias

– Os Acs são, predominantemente, de tipo IgG, sub-classes IgG1 e IgG4 e pequenas concentrações de tipo IgA

– Alguns Acs contra TPO reagem de forma cruzada contra a TG

– São característicos da tiroidite de Hashimoto– Podem também ser detectados no carcinoma da ti-

róide, tiroidite focal e em 20% de população sã– Podem lesar as células tiroideias activando directa-

mente a cascata do complemento ou por citotoxici-dade celular deles dependente

– A sua concentração está correlacionada com a fase activa da doença

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2. Acs anti-tiroglobulina (TG)

Participam no início da doença que só se desenvolve quando se produzem linfócitos T citotóxicos especí-ficos, levando ao depósito de imunocomplexos na glândula

Têm sido encontrados em outras endocrinopatias auto-imunes como a anemia perniciosa (27%), doença de Addison (28%) e DM (20%)

Títulos baixos podem encontrar-se em população sã: mulheres (18%)homens (3-6%)

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3. Acs contra o receptor de TSH

Uns inibem o funcionamento da tiróide (TSBAb) e encon-tram-se em doentes com tiroidite atrófica e hipotiroi-dismo severo

Outros estimulam-na (TSAb) e são a causa do hipertiroi-dismo na doença de Graves-Basedow, em que apre-sentam uma prevalência de 95%

A sua principal utilidade passa pelo diagnóstico, acompa-nhamento do efeito terapêutico dos fármacos anti-tiroideus e controlo da gravidez de mulheres com esta doença, em que se pode observar um hipertiroidismo fetal, por volta do 3º trimestre, devido à transferência placentar passiva de TSAb

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• Acs anti-pancreáticos

Os principais são:

– Anti-células dos ilhéus (ICA)

– Anti-superfície das células dos ilhéus (ICSA)

– Anti-glutamato descarboxilase (GAD)

– Anti-insulina (IAA)

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1. Anti-células dos ilhéus (ICA)

– A sua acção está dirigida contra os ilhéus no seu conjunto e não só contra as células β

– Surgem como resposta à lesão destas células pelos linfócitos T

– Quanto > a prevalência de DM tipo1 na população, > é o nº de pessoas sãs que apresentam ICA

– Os ICA 512 são úteis na detecção de pessoas em risco de desenvolverem DM tipo 1

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2. Anti-superfície das células dos ilhéus (ICSA)

– Reagem contra Ags presentes na membrana plas-mática das células β

– Inibem o transporte de glucose para o interior das células dos ilhéus, pelo que comprometem a liber-tação de insulina

– Levam à destruição das células β por citotoxicidade de tipo celular ou por activação do Complemento

– Não se correlacionam bem com os ICA e têm técnica laboratorial difícil

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3. Anti-glutamato descarboxilase (GAD)

– Na DM tipo 1 os Acs estão principalmente dirigidos contra a isoforma GAD 65

– Quando estão presentes, servem para identificar os diabéticos tipo 2 que podem desenvolver DM tipo 1

– Encontram-se de forma quase exclusiva em doentes com ICA, porque a GAD representa um componente do AG dos ICA

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4. Anti-insulina (IAA)

– Importam no diagnóstico precoce da DM tipo 1, nos menores de 4 anos de idade, em que o seu valor preditivo é muito alto

– Este valor aumenta se se encontram combinados com outros Acs

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• Acs contra as suprarrenais

Doença de Addison autoimune

É devida à existência de Acs contra as proteínas da fracção microssómica das células secretoras do córtex suprar-renal

Não se conhece o papel patogénico destes Acs pelo que se admite que eles possam ser mais a consequência do que a causa da destruição endócrina, da responsabili-dade dos linfócitos T

Surgem em 50% de doentes com insuficiência SR primária

Na mulher, a sua presença, para além de ser marcador de doença de Addison pode também apontar para hipogo-nadismo hipogonadotrófico

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• Acs contra os espermatozóides

A sua presença define a infertilidade imunológica e podem formar-se tanto nos homens como nas mulheres

Se acontece nos homens, deve-se à perda de tolerância imunológica

Se acontece nas mulheres, quer dizer que houve deposi-ção de espermatozóides no tracto genital com uma barreira epitelial comprometida, na cavidade peritoneal ou no tracto GI

Encontram-se, no soro e nas secreções genitais, Acs de tipo IgG e IgA, respectivamente

São mais comuns os que se desenvolvem contra glucopro-teínas da membrana plasmática ou proteínas do acros-soma do espermatozóide

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• Acs contra componentes do tracto GI

Os mais importantes são os Acs contra:

– Gliadina

– Reticulina

– Endomísio

– Transglutaminase tissular

– Células parietais gástricas

– Factor intrínseco

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1. Acs anti-gliadina (AAG)

A gliadina, fracção do glúten de trigo solúvel em álcool, é uma mistura de cerca de 50 componentes que se separam electroforeticamente em 4 grupos (α, β, γ, e ω-gliadinas)

A gliadina-A é uma das α-gliadinas, que sendo muito rica em glutamina e prolina se assemelha à proteína E1b do Adenovírus 12, com quem tem reacções cruzadas, sendo admissível pensar que este adenovírus poderá actuar como desencadeante de doença celíaca

Os Acs podem ser da classe IgA e IgG (IgG1 e IgG3)

Úteis no diagnóstico e acompanhamento de doença celíaca

A dieta sem glúten faz baixar rapidamente a IgA e de for-ma mais lenta a IgG

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2. Acs anti-reticulina (AAR)

Dos 5 tipos de AARs só os R1 são de interesse clínico e têm por Ags, o colagénio tipo III e a fibronectina

Observam-se em doentes com doença celíaca, e têm uma especificidade de 99-100% e uma sensibilidade de 60-90%

Também se identificam na dermatite herpetiforme e na doença de Crohn (20%), sendo os IgA os mais especí-ficos

Tendem a desaparecer ao fim de vários meses sobre a supressão do glúten na dieta

Se se associarem aos Acs anti-gliadina e anti-endomísio fazem com que o valor preditivo positivo seja de 93% quando os 3 são positivos e se negativos, o valor predi-tivo negativo é de 100%

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3. Acs anti-endomísio (AAE) / (AAtTG)O endomísio, que contém colagénio e reticulina, é uma

estrutura de suporte que cobre o conjunto de fibras lisas e estriadas que se encontra no terço médio do esófago

O principal e provavelmente único Ag é a transglutaminase tissular que é uma enzima citoplasmática, dependente do cálcio, que cataliza ligações cruzadas na fibronectina, colagénios II, V e XI e no procolagénio

Os AAE de tipo IgA, positivos na dermatite herpetiforme, podem surgir antes que a doença celíaca se torne activa, correlacionam-se bem com o grau de atrofia produzida nas vilosidades intestinais

Negativam ao fim de 1-12 meses depois de retirado o glúten da dieta e são negativos na doença de Crohn e no doente celíaco com deficiência em IgA

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5. Acs anti-células parietais gástricas (PCA)

O Ag contra o qual se desenvolvem é a H+/K+ ATPase gástrica que se encontra unida á membrana das células parietais gástricas e que tem uma função de bomba de protões responsável pela secreção do ácido gástrico

Encontram-se em 55-90% de doentes com anemia perni-ciosa, que é o estadio final da gastrite atrófica crónica de tipo A, em que há uma perda selectiva de células parietais e um infiltrado da submucosa por leucócitos e plasmócitos com impedimento da produção de factor intrínseco

Outros Acs podem desenvolver-se contra o pepsinogénio secretado pelas células gástricas principais e, em 30% de doentes com infecção por Helicobacter pylori, podem encontrar-se Acs contra os canalículos das células parie-tais

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• PCA

Estão presentes em 90% de doentes com gastrite atrófica e anemia perniciosa

Em 40% de doentes da tiróide e títulos baixos em 10-15% no idoso são

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6. Acs anti-factor intrínseco (IFA)

O factor intrínseco é uma glicoproteína, segregada exclusi-vamente pelas células parietais gástricas, que se une à cobalamina para, através de receptores, a introduzir nas células do íleon de onde passa para o sangue

A sua falta leva á instalação de anemia perniciosa que é mais comum em pessoas com mais de 40 anos, de pele branca, olhos claros e grupo sanguíneo A

Os IFA são de tipo I e II e enquanto os primeiros competem com a cobalamina para o local de união com o factor intrínseco, os segundos parece que vão ocupar o local que seria de união desta aos receptores no íleon

Os IFA são mais sensíveis e específicos que os PCA para o diagnóstico de anemia perniciosa

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• Acs contra componentes do sistema nervoso

Os principais são os Acs contra:

• O receptor de acetilcolina– Miastenia gravis – Afecções do timo

• Proteínas neuronais (mielina)– Esclerose múltipla– Neurite optica idiopática– Sindroma de Guillain-Barré

• Gangliósidos neuronais– Neuropatias periféricas

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• Acs contra estruturas da pele1 - Acs contra os desmosomas

Os desmosomas são moléculas que mantém a união entre os queratócitos epidérmicos

São muito específicos de pênfigo vulgar e pênfigo foliáceo

2 - Acs contra a zona da membrana basal epidérmica

Dão origem a várias doenças ampolhosas da pele devido ao ataque a estruturas que fazem a união entre a der-me e a epiderme

3 - Acs contra a filagrina / queratina (AKA)

Têm uma sensibilidade diagnóstica de 40-55% para a artrite reumatóide e uma especificidade superior ao factor reumatóide

Um resultado negativo não exclui a doença

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• Acs contra estruturas do rim

Os que mais importam são os dirigidos contra a membrana basal glomerular, constituída por colagénio tipo IV, la-minina e proteoglicanos

São geralmente IgG (IgG1) e ocasionalmente de tipo IgA ou IgM

Na rara doença de Goodpasture, que cursa com hemorra-gias pulmonares e falência renal, há Acs contra as membranas basais tanto alveolares como glomerulares